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Wilson Alves-Bezerra Malangue Malanga

Este documento presenta extractos de 30 poemas del libro "Malangue Malanga" de Wilson Alves-Bezerra. Los poemas exploran temas como el exilio, la identidad y la lengua a través de imágenes de viajes, paisajes y encuentros. Cambian rápidamente entre diferentes idiomas y dialectos latinoamericanos.

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Wilson Alves-Bezerra Malangue Malanga

Este documento presenta extractos de 30 poemas del libro "Malangue Malanga" de Wilson Alves-Bezerra. Los poemas exploran temas como el exilio, la identidad y la lengua a través de imágenes de viajes, paisajes y encuentros. Cambian rápidamente entre diferentes idiomas y dialectos latinoamericanos.

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MALANGUE MALANGA

WILSON ALVES-BEZERRA

MALANGUE MALANGA
(30 poemas para ler no exílio)

1
WILSON ALVES-BEZERRA

2
MALANGUE MALANGA

LA MARGE

3
WILSON ALVES-BEZERRA

MULTINACIONAL CARTONERA

4Nombres Cartonera (Bolivia)


facebook.com/4NombresCartonera
Butecanis Editora Cabocla (Brasil)
facebook.com/BUTECANIS
Candeeiro Cartonera (Brasil)
facebook.com/candeeirocartonera
Va Cartonera (Brasil)
facebook.com/va.cartonera.3
Vento Norte Cartonero (Brasil)
facebook.com/ventonortecartonero
La Joyita Cartonera (Chile)
facebook.com/lajoyita.cartonera.10
Cartonera Island (España)
facebook.com/Cartoneraisland
Ediciones Karakarton (España)
facebook.com/Ediciones-Karakarton-1634023983592369
La Marge (France)
facebook.com/atelierlamarge
Proyecto Editorial Los Zopilotes (Guatemala)
facebook.com/proyectoeditorialzopilotes
La Rueda Cartonera (México)
facebook.com/larueda.cartonera
Pachuk Cartonera Editorial (México)
facebook.com/pachukrtonera.editorial
Viento Cartonero (México)
facebook.com/vientocartonero
Kuvinanga Cartão D’Art (Moçambique)
facebook.com/kuvaninga
Viringo Cartonero (Perú)
facebook.com/viringo.cartonero

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MALANGUE MALANGA

Diagramación(ção)
Jamir Gonçalves Ferreira

Ilustraciones(ções)
Cristina Rios Leme

MAYO/MAIO DE 2019

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WILSON ALVES-BEZERRA

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MALANGUE MALANGA

1
Outra vez, sou seu diário de viagem. You walk
silently because you don’t speak no one of the
national languages. Oranges, apples and blackberry
juice. Sua língua lambe cardápios. Seus dedos
movem cartões de crédito. Visa que se chama visa.
Pantalla blanca. Del otro lado de tu gran estepa
verde, steps on another grass, se derrumba el jardín
de Disney. Lo contado, en la lengua en que tengo
cátedra, vivido con uma soledade desgraciada, en
la lengua que no tengo más. El taxista somalí surge
de aquí, un negro que no es un perro, pero que
se escaperró de Mohamed Hassan Adid. Surgió na
boca da rodovia de Calgary. Não é de Magreb, my
cab, my life, lo resume todo. A mais interessante
pessoa preta. I am here since the ninities. Dear
maratonist, running away without Adidas...
Mohamed Farrah Hassan Aidid. Look: At Somalia
we speak the same language, we pray for the same
God, but we are fighting against our brotheres. It’s
just a war. The country belongs to the people, but
the people is against the state. Cuando uno no está
en su lengua materna, donde estará? Lamer la carta
y olerla, shaking dollars. We are killing each other,
we are fighting for nothing. O que somos no sonho
do somali? Dame tu mezcla de dialectos, que todo
irá sonar distinto en todas partes, y seré tu diario
otra vez. Nos abrazamos en la oscura street and
nobody knows about estar aquí. Cómo se llamaba
el que escapa en cab? Te llamabas pantalla blanca

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WILSON ALVES-BEZERRA

cuando te conocí. Dame swing para apropiarme


de tus fonemas, dame palavras lengua labios. Que
me duele pensar que el taxista es el nordestino del
universo. Dame uma choza para chamar de casa,
um cauce para llamarlo vida. Dame tu boca para
llamar lalíngua.

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MALANGUE MALANGA

2
O soroche me despacha pal costado del monte.
Me duermo mascando folhas amargas. Corazón
esparramado na cama. O trem não dá tréguas nas
terras da serra. La lana del llama pa Lima, mamita.
Mamicas das índias na beira da estrada de Lima.
Marmita na bolsa, la puta índia se está chupando
el ceviche en la costa, en el culo, en las bolas. Una
tiene que sobrevivir. Um cerro bom pra morrer,
pra turista que nunca comeu um cuy. Lambuzo
meu olho das alturas do monte, esfrego os olhares
en el Urubamba. Soy la trucha de las águas frias,
que es maravilla, que es marafona, que eres triste,
vida. Nunca que eu vou chegar ao mar. Um viento
de sierra que cerra meus olhos como os cegos do
monte se gelam à cerração. A cabeça que zomba,
que zune, que late. Mis ojos serranos cerrados,
meus olhos molhados, os olhos do índio no chão.
A musa de cabelo abacate dá voltas numa cabeça
de coruja pintada. Una moneda, um poco de pão.
Um grano de maíz, negro rojo rizado amarillo
machacado. Um grão jamais divisado, dividido,
dispensado. Hambre. El que pisa seus olhos se
lambuza de séculos. La cholita sonríe con aires de
feto, con dientes de coca que nunca despiertan.
Soy yo el que le clava la clave.

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WILSON ALVES-BEZERRA

3
Bienvindo, patrón! Chusto aqui na avenida fica os
travestido, as prostituta e os homossexual. Se você
quisser tem de tudo para você, e só escolher. Mas
justo o polaco nao vai te deixá entrar no quarto,
porque aí ele te vai a cobrar mais caro, porque van a
ser dois pessoa. E o polaco nao vai te deixar a você a
ficar com a prostituta ou o travestido no seu quarto
de você. O Hotel Pilsudski está na cidade desde o
ano setenta, quando a cidade era tica. Agora que
hai negocios por todas parte, eles recebem o dinero
dos brasileiro, dos paraguaio e dos gringo que vem
para fazê turimo. Entón eles dificultan as cossa
para vocêis. Verdade que a polacota tinha quase
dois metro. Tinham le avisado que ela era gostossa,
mas despois que ela abrió la boca, ele non falô nada
mais. Dirro que não era polacona, no. Era filha de
famiglia que veio fugida des Alemania. Mas que ela
sólo sabia umas palavrinha, que a professora de a
escola falô que era melhor que falasse bem uma sola
lengua que várias por la metad. Mas que ela sabia
do alemão, do espanhol e do português um poco.
Mas que ela não sabia como es que si escrevia esta
lengua que ella falava. E que foram alguns temas
que atraparom ela como aquel do Tim Maia, do me
gustava tanto de você. Foi este tema que me atrapou
e me fez comprar a lengua portuguessa, te digo.
Hoje de noite vou cantar umas canciones argentina
do folclore nosso. Aqui a gente tem uma festa
muito importante que é a festa do imigrante. Sigue

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MALANGUE MALANGA

hablando la polacota, entre milhares de plantações


de erva marte, de madeireiras, de rios boiantes com
carcaças mortas, decolo desorelhado, Tim Maia
amassa a farinha do pão.

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WILSON ALVES-BEZERRA

4
O culto irrestrito à liberdade encontra um limite na
terra onde o chão não é meu, pero se disse que es
nuestro. El viento que le acosa a la Isla, cuando se sopla
la mona, me saca de quicio, me reventa el alma. Soy
el loco que le acecha o seu olho de esguelha. Este país
era todo y ya no es nada. Producíamos azúcar y hoy lo
compramos de ustedes. Uma lagartixa verde atravessa
o quarto, mais lenta que a lagartixa cinza da pátria.
As ruínas do labirinto tomaram de assalto a vista en
la Habana Vieja. O Plymouth 56 passa rasgando a
seda sombria, olhos bebem do seu combustível. O
preço do peso é a queda. O mar vomita o mar pela
Ilha. Abre sua grande boca o mistério. Patada de
mula. Inocula uma pergunta. Un pomo de agua. La
lengua cambia mis palabras. Sua boca cavoca minha
alma e peço baterias aéreas. Só ofereço meus gritos e
não me interessa o sossego. O louco uiva pendurado
na nuvem, por um dedo. Um fio de baba que lhe
escorre da boca. La luna llena de Cuba, el potrerito
cheio de luz. Avassaladora salobra água do rio corre
por dentro da fenda suja da minha sede. Um calango
na praça assombrando a lua. Atravesso a ilha num
barco de pesca com rodas de fenemê, gritando que
a diferença entre nós é o tempo de plantar a cana:
queimá-la, cortá-la e beber seu sumo. Envelheço
num barril contigo: Amargo, espesso, fervilho – é o
vento que assola o barco. Isla es mar y mundo y más.
Quero me afogar na borda, porque nasceu o dia e
vou beber o mar inteiro até chegar-lhe à boca.

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MALANGUE MALANGA

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Topo com vos. Más allén de los 70 anos. Más allén
de la corbatillera. Más allén de los muertos en el
estádio. Cuando me decí que es la hora, yo topo. Y
pienso que es la copa américa. Pero en el estadio hay
partidas sin vuelta. El choque. Não estão jugando. És
em sério. E no hay partido. El vuelo de los tanques,
los aviones en el palacio. Palacios no va a jugar.
Hace 15 años que no juega, desde o 99. Alguien
me diz, que dizem, são dieziciete. Sem brincadeira.
Los palacios em chamamé. A gente pela caje, pelo
mundo, pelo mar. E penso: dançamos. Bailamos e
nos fudimos. Dónde fue que nos lo perdimos? Allén
del sueño, del cambio, quando fue que se tiró el
carro al pântano, la bala al crânio, quando se fudió
o país e o presidente? Anteolhos atónitos, anteojos:
cabeça destroçada, antagónicos, los últimos versos
que te escribo, a las cinco de la tarde. Confio que es
la hora, pero es la hora de los Hornos. La cordillera
tem color ratón. Ratão pelo cu dos torturados, más
allén de la cordillera que ainda les vão meter por cu.
Choque do fusil, no hay guerra civil, mi general mata
a geral, e más allén de e até o Jarra. O meu general
não suportava a gente. Mi general quer cacete ao
culo. Me pregunto: quem vai ao cu do general? No
hay partido y topo com Palacios. Me mira, sus olhos
de fuego. Atira, sus balas non doces. Palacios nos
tiene fríos. Adónde vamos a irmos, irmãos? Adonde
vamos a fugarnos, fugir-nos? Y el presidente parte
num caixón. Topo com vos. Quien soi, guevon?

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WILSON ALVES-BEZERRA

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La integraçõm latino-americana tendría que ser
por el portunhol, me decía el cura de Cariacica. Y
yo no lho entendía. Lhe preguntaba, le pregunbata
y su porca la tuerca torcía. Mientras bebe a onça o
agua, e lhe abocanhaba al pernil la bunda, dirro
dixit: la integraçom es la contribuçom de una y
de otra parte: “ustedes entram com la ón, e nós
com la ão. Em el espacio mismo de las discusión,
a gente se entiende. Con fusión es que o caldo hay
de nascer. Um lenguaje pan-tanino, de la piel de
lengua al cuero de las lenguas, un portunhol sin
esperantos, sin esperanças, sin demoras.” Así dirro
dixit el cura. Manifiesto modernista a esas hora? –
a cotorra comunista da cacerola em agonía – me
lhos pregunta. – Que lenguas habla, la mulata
de Maracaibo, la prieta de Santiago de Cuba, el
neguinho de Salvador y la polaca de Pomerode?
Muy muchas, me contesta o Quixote. Cada um fala
a língua que pode, e não se entende mesmo assim.
Com as mezcla das mistura, ai sempre algo que se
diz, algo que se perde, algo que se gana, algo que
se desenganará. Ou es que querei falar em inglês,
esperanto e latim, guevón? O maçarico vem do
norte, e vai cortando cielos grises y grisalhos.
Passarito de lo caraglio, que línguas falará? – A
língua de los passarinho. Como lo sabemos desde el
niño: que lenguas falharão.

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MALANGUE MALANGA

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Afrofalantes disparam advices em la puerta del
puerto dessa ida y entrada. Son los reyes del
Harlem disfrazados de concerjes. Correm llamas
para cada lado, where are you from – migas de
frontera – tienen palabras estocadas, men’s agem
like dogs mean en las patas de los migrantes, hay
sheriffs articulados. Farejam coca en la facha de los
prietos. Qué se passa de um lado para el otro lado?
Palabras, ideas, desejos desire daqui. Willrich se
come um sanduíche de shit happens: sempre a
procura dum afroamerican terrorist, drug dealer
o asshole igual que él. Keep on move, keep on
move. Não keepo in that muvuca, brancão. Quer
beque to way you once belonga? No fumo. Go
to the Radio equis hole. On your fiat, get your
hands up. Go open your bag. No tenho beque,
no tengo yerba, não tenho brilho, no tengo pepa,
Ni papeles, só os livros. Bina trabarrar. Professor,
you? Professar la palabra del dios mostaza. Muslim
moustache? Mostaza is God to your sandwich de
asshole. Willrich no presta su palavra, no libera las
entrada. Willrich is kidding, billy the kiddin-me.
Pay the bills, sir, or you be arrested under au ar lol.
Lol, repetí. Lol. Cool. Y además: Quis my eggs.
Non. Me arrastra, me arresta. Cool. Tomé asiento
por quince anos y ahora también soy afrofalante
de la migra. Next mundo can. No los dejo passar,
no los derro, los desterro.

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WILSON ALVES-BEZERRA

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Não as cores aceleradas nas telas nem os altos
comedores de sol, mas o frio envaidecido das
tardes; o molhado triturador de ossos nas esquinas
do Rio Hudson nas frestas do seu pescoço. Não
as pegadas de um dinossauro árabe na virilha da
sua estátua da liberdade, mas o frio do seu corpo
nu, mais erótico que o raio x do aeroporto dos
quakers, sua orelha em chamas. Não a liberdade
e sua sombra pelo alto muro do homem codorna
projetadas, mas o frio que se filtra no largo beso
de Domingo y Alba, poucos antes da deportação.
Não a Marilyn suada, suas tetas lambuzadas de
Kennedy, mas o frio de um corpo triguenho entre
oceanos sepultado por um negro qualquer. Não
a heroína que ferveu o ghetto, colheres e testas
borbulham, mas o frio que exala, numa rua de
Baltimore, on the living body of Edgar Allan Poe.
Não o corvo exaltado, plumagens negras e titica
sobre a pele de Palas, mas o grito, sempre o grito,
rouco, robusto, que vem do Leste da Ilha. Não a
dança da bunda, Guantanamera entre putas, na
Baía dos Corpos, mas o vácuo frio da garrafa vazia
de García Lorca. Não a morte dos Brothers Castro,
bombas, charutos e guayaberas made in USA, mas
o frio de um míssil, apontado ao baile dos selenitas
isleños. Não. Ginsberg andou por aqui, caçando
ginger ale na gôndola do supermercado, shaking
hands com minha caveira inchada. Não sinto frio
em seu refrigerador. Nevermore.

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MALANGUE MALANGA

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Sulamita cruza o rio grande, sand, sunny lands, diego
aguante. O seio erizado a roça desabrocha desablusa,
desierto sur suores chupa, sul amici lands. Não
existem mais the nort americans, los musulmanes
los latinos somos tus nuevos marroquinos, Liao
Dixit, filósofo chino de la nueva york yankee.
Podemos ter um hijo alto, tener dos filhos médios,
ou pedir pelo número. Com um gesto, apilar los
muertos em apartamentos e nos cemitérios os vivos.
Ora pro nobis sorrisus. Estadunidentes já não
mordem. Cubanos modelam camisas color goiaba.
Além do limbo a bala. En la bodeguita te buscaba. A
la yegua mía en el carro de Faraón te comparo, noite
adentro, te sufro sulamíngua, te abraso, Sulamisma
otra. Entre cañaverales, chupándose os cachos de
pasión e ira, repisándose las brisas, your eyes in my
soul. No existem los norte-ameriscambos. No more
amores, hay moros en la costa, Sulamina sube, San
Diego baja, wasted landscape. Tu piel salpicada de
sois, tu boca ébria y ácrata. Álame sobre las waters,
fallow me bajo las sábanas, súbeme deseos de sur y
ser y sal. Y vámonos de aquí. Corre, beloved yegua,
que así no te pegan las balas.

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WILSON ALVES-BEZERRA

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Na rua dourada de repente estava minha presença
indecisa, difusa como o furta cor da camisa,
caminhando entre a gente reaça – da escolhida raça
– topete, gumex e séculos de opressão. Minhalma
mulata tropica entre poodles. Decretos contra o
noodle dos chineses, o beiço dos beiçudos e outra
vez sussurro: onde está o muro de Trump? Flocos
de neve cinza sisudos contestam: Fora turcos, ursas,
negros, latinos e opalas! Fora daqui, ao longe, ao
fundo, a Cuba, ao Hades! Thank you, my Lord, for
this Thanksgiving. Let’s eat the turkey and fuck the
chicks. I am proud to be a man, to be white, to be
rich. I am proud, my Lord, of not drink red wine,
but whiskey. I believe in God, in corn, in porn, in
Jesus. I don’t give a shit for the poors and inmigrants.
It’s all the same and I really love turkeys and chicks.
After all it’s all about postmodernism. Amen. Amen.
Hey, man! Era a sexta, era a quinta avenida, minha
presença passava assustada. Procissão de malas por
milhas. Quem liga os leds da Ilha era a Nike, era a
Virgin, era a Disney? Era a sétima e cada fome dormia
soterrada na erva, na neve, num táxi. Procuro uma
vela ao vento dos mares, um malecón de melhores
presságios. Não é possível sair: alísios não levam
indocumentados, adverte Willrich. Pastiche de Chip’s
congela sem lábia, acendo um puro entre putos na
Central do parque. A selva celestial descomuna-
me, um maconheiro do Harlem surge. Avançava
contra o fluxo e era muitos, sua pele refletia as

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MALANGUE MALANGA

Twin Towers. Não cedia espaço à buzina amarela,


à europeia só pernas nem aos ternos e pastas.
Gingava o não-garota da não praia e cada chicano
de balcão e guichê se exaltava. What? – perguntava
ou antes não dizia nada. Minha discoteca de dúvidas
já não soava. A neve arrancava calores da pele.
A guerra de que todos sabíamos. A bombas de
espera. Síria, Sonora, Afeganistão, Paraisópolis;
depois Rússia, Irã, minha crina, para terminar em
Cohab e Coréia. Têm sorte aqui... o chão nunca
racha nas ruas da nova Iorque. A galeria do reggae
lança gritos a Montego Bay – tristeza, maconha e
pão caseiro. Outra vida como está não tem, os
passos que vem se afrouxando, a sola desliza sobre
a neve dos ratos. O peito é repentinamente tomado
de susto, orgulho, escárnio. Mergulho nas ancas
da estátua e rebolo. A pulsação se espalha e cada
prédio ginga. Finalmente encilho o cavalo de José
Martí. Não tem mais ninguém aqui... e outra vez
respiro: because the grave, because the grace or
my disgrace.... There is no more lordes. O chão
explode ou não explode? Nenhum calhorda que me
fareje, que me escaneie, que me avalize. Uma terra
sem signos se arreganha ao infinito. Meu coração,
sunflowers no veludo dos anos idos. Minha beca
precisa, minha boca imprecisa, I am finally nigger
again.

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WILSON ALVES-BEZERRA

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MALANGUE MALANGA

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A Mono Ilha língua-me. De qual tupi caraleado
você tá falando? Quem tem um amiguinho de
outro país, a professora não sei se quis, mas não
deu alternativa. E uma outra língua, quem já,
quem nunca, quem dá, quentura... Professora,
mas a Bolívia é país? Com todas as mudanças que já
aconteceram, mesmo assim, cada dia mais teremos
só uma língua pátria. Fala português, caraleo! Hoje
é o monoday, o roledei da monolíngua caralea.
Pónganse caritas de monos, bolivianos, peruanos,
africanos e amarelinhos de olho puxado. O mano
dizia: seus arrombado da porra, eu falo é língua
geral! Fazer revolta da vacina, comer escalpo dos
brocha municipal estadual e federal. A professora
montessoura freiriana eclética sincopada sem
pinto repintia e o cu temporizava: a pátria patraz,
nunca serão, oremos a oração: creio em pais deus,
gordo escamoso, arrochador de virgens na peia,
arregaçou, matou, morreu, ressuscitou e ainda tem
uma fucking church que cobra uma baba, a mais,
a men e cada uma de nós paga e cada uma de nós
arrombada, e cada uma de nós manipulada fudida
enrabada. Mas um day adia adieu ainda: sem rabisco
no muro na calçada no livro na tela na favela, sem
escrito em nada nenhum. No man’s langue.

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WILSON ALVES-BEZERRA

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La lengua la santa la menta. La vela la muerta la
tumba. La abuela la cruz laquê-ma. Fermez la bouche
la langue la mouche. La buela cora zón no para. La
tía cora cornalina. La madre cora som bandido.
Las mil horas mil hojas son baldías. La luna oh Lia
sangre. Cala noche pesa dela e minga. Maga Pata
lógica ha los place plícius. Pizca huele bizca ojos
pálidos. Mor ciega mor ango mor tero. Mor alpes
mor tejos mor tales. La ve seis, la ve cinco, no la
ve más. Celos fue. La tierra l’otra ganta. Lá civa lá
crima lá craia la gringa. A la crán a la zán al a gito.
La gi tana su tana mi mana. La titud, lejos mud, anti
radar, limbo. Donde estai, gringa. Le sale babear,
dejame lamer, dejame babosear. Chatear con vino,
con venia, con valium. El mundo sin lengua. Vivan
los tábanos, los álamos, los cólicos. Viva la vivalma,
viva la negra leyendo, el mini capitólio del libro de
la little cema. C’est moi en marabá. C’est toi em
Tarapacá. C’emos sola y soul man, en la tierra del
happy handy – craft. La murga la curia la lady vina.
La fiesta o la réstia de sol en my pri son? A la mar
al muro, amar o murro? La con fusión de vuelta a
volta. La menta de la santa y lengua.

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MALANGUE MALANGA

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Hay silencio en el habla de los bocarrotas; o pior do
amor passou; hay ausencia en el país de los Anjos.
La impossibilitude, impossibilitarde, a impossibili-
mensa, rezo de la imposibilicrença, a impossibilitad,
a vontade, a impossibilimassa, o impossibilicâncer,
o impossibilivento, o impossibilipasso, a pneu-
moembocadura da boca larga y larga, la lluvia na
impossilitrança da cabelaria, a possilicavalgadura,
a impossibilivaga carga de árduos fardos faina. A
impossibilirápida, a impávida, ávida, a avulitocatifuga,
a impossibilitura, a impossibilimétrica impos-
sibiligrande, a impossibiliglande, a impossibili-
farte, a carta ao impossibilimedo, el secreto de la
impossibilialma. A reiterativotarde, a carne im-
possibilimorta, a ordem dos impossibilipadres no
receptivo voo das agricolivespas, nêsperas, su-
colifrutillas, sorvolicúbicas, as impossibilitúrgidas
tetolipeitúfidas, as mênstras, impossibilimúltiplas,
avicolivúlvicas, apetitibilimúltiplas fagolicendias
impossibilichúpiras châmulas vulvítreas. Y sigue el
silencio de los Anjos en la boca podrida de los bo-
quirrotos en la niebla de uma tarde morta.

23
WILSON ALVES-BEZERRA

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Acorda em meio à madrugada muda. Uma orgia de
silêncios tranca a trinca de nascer da labareda solaz.
Janela afora aflita aflora uma sirena urbana, una sereia
humana, que trina o apita o llora del otro lado da rua,
la frontera seca de la rua que cruzo, com la mirada,
com la manada uruguaiana, com la lamuria, la lação y
le digo Señora! Sinhora non, senhorita mia! Tuteame,
voseame, baboseame, manoseame que sola estoy
de este lado, cariño. Calambres calamares celulares
celestiais. Os corpos, los cuerpos, the bodies, tienen
partes lindas, partes tristes, partidos perdidos, partidas
programadas, países muros ciudades divididas,
invadidas, compartidas, desiertas, deseadas, escamas
de la virgen mínima. Seu canto me atiça para o lado
outro lado da frontera seca. Formigas em Artigas pican
em portunhol, as baratas de Uruguaiana por la mañana
embaralham as falas na gaveta da señora señorita mía,
que faze bilingues marmitas para os que puedan comer
lá. Tristeza en la cama, um maremoto um terremoto
um mato perpétuo um moto, feijão arroz batatinha e
uma mistura proteína, uma carne uma sentença, una
porción de paciencia, fría y cruda, uma loncha de
sorda-muda-língua. La senhora quer-me saber again,
entre escama y teta, entre la cola y o colo, entre carne
fria e piscosa e a plêiade de calores calambres gozosos.
Me chama e queima que voy. Todouvidos novamente
uníssono Uliço-a. Uísque-se na fronteira, me lo
dices. E boi, boi, boi, de que se cara preta duerme y
come, ser again tu home hasta nomás poder, aqui jazz
um afeto. Mergulo-a.

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MALANGUE MALANGA

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La cálida y ardiente caña. Lacanha mi pasto verde.
Lacaña del chancro. Lacorta laquema latoma.
Lacera o sintoma. Borráchalo goma. Lá cálida
férvida atómica chama de la caldeira. El chancro
el llanto o espanto. Champanha de chanto. O
tiempo que mueve las folhas las hojas las páginas
de la caña. Sonido de sombras adiadas. Sol sobre
o solo, sólo el sol en el sobre sin carta. Sólido
quemante, aguarrás, agua-furtada, aguas calientes,
aguardentes, aguardar, aguantar, aguássima, aguas
abajo. La mar que se agita nas folhas ventadas
de lacanha cortada. L’amare adiada estación de
sirenas. Lamismamar em desierto. La mar de muros
de murmurios de mármol de memoria. Lasolas
debiendo. Olas de aliento. De laberintos de folhas
cortadas. Fólios folículos. Infinita serpiente roja,
granizada, lalama lallama desdibujada. O sumo
o bagaço o baguço la cera. El que te leva te lava y
quema. Te cruzo temores temblores te pierdo. La
caña me consume. Tus vientos de mares de can que
me cubren de carne la carne.

25
WILSON ALVES-BEZERRA

16
La húmeda lengua del deserto; a língua fria del
inferno; lalíngua materna do mamilo, lalangue
lasciva dos senderos que bifurcan. Ya no vive acá el
poeta. La sombra del general nos prohíbe decir que
te quiero. Exiliados. La lengalenga langue. Lúbrica
lámina. Lengalenga lejos langue lingue. Longe
demais para volverecer. Flora demais para semente
mínima. Cacho multifruta néctares beijaflorexílios
para cajitas de tangue. Explode a perdigota mina
na sola da inquieta face do pé, rapé, olho de
vidro e prótese peniana. Explode a homozigota
espirra mítica da nacionalidade anfíbia. Explode
o hinacional internacional sociamínima. Sabiás
vão indo, explode Kombi caveirão, o tanque, el
pecho anguláceo, el orgullo de la pátria apátrida,
la esclavitud de los índios, filhos criollos negros
prietos. As minhas brânquias na terra imensa, pelos
patas pingos. Saravá Sereia Saionara Saliva. Las
apuestas postas na eleição de quien, un hámster, un
gangster, um estadista. Las apuestas ruleta rusa, tiros
en las ideas, dívidas, dúvidas, dádivas. La vuelta que
no principia. Um siglo que se acaba, um siglo que
se tarda. Se acabó: la fartura, a fratura. La factura:
fíbula rota. Hablá con com vicción: Lalangue no
mangue da míngua.

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MALANGUE MALANGA

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O olho del ojo de los eyes. Bleeding vinte days
at nowhere. De los ais de Lausanne de los Andes
de los Álamos. De donde avance a língua de fogo
del sangre of my final judgement. Ninguém será
culpable de nadie, nobody is um naco de pátria,
everybody is um punhado de exiles, de maravilles,
de adioses y aires libres. Jesus is um coyote, es
un cohete en la boca de milles days and away.
Jesus is um círio sangrando em manos afegãs;
ela da Venezuela da favela do canavial. All of us
fora de lugares. Rosarios de pesares, nightmares
navegados sob olhares islâmicos ilhados do outro
lado de milhão de barcos de refugiados. And we
never give up, Andes nievan pasados, antes berros
que ocaso, habrás de seguir pues we never give up.
Adonde no hay nada, aonde os ais são as olas do
naufrágio. Cantará a maré ao revés do barco mais
uma vez más, girará entre o preço do passe e a peso
da pressa. Girará loca ante un estado fatal, ante
un estado terminal. Antes la nada que um país
asesino. Mejor la mar que la muerte inerte, que
el ressorte de la pistola sin piscina. Finally almost
a human being. Finally a ghost y un gusto a partir.

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WILSON ALVES-BEZERRA

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Al fondo de la choza, a las orillas del rio Riverside,
uma asa de graúna, blackbird, passo preto, flota no
fundo do topo de uma árvore de fruta pão. Toda
reflexiva, a jaguatirica cisca cabeza abajo mirando
céus, galinhas de olhos súbitos, ardentro acurrucados
ronronam yaguaretés. Mammals amores freund joy
and a kiss in xis neck. A graúna pica no topo da
cabeça mas só quem lambe morcega a barriga do
exilio é o mamífero implícito num juriti ancestral.
Você quis aparecer y no te pude ver. You gave me
bissous, contra a luz, e na foto não estamos visíveis.
Cuando pasen los años, quando vazarem os rios.
Foi entonces que no fim da tarde, do ocean mar
a beira river, Tenente Horacio no peito atira-se,
the left side, e folhas avulsas revoam, atiram-se do
juriti jaguaretês. O cuerpo atira-se ao mar também.
Salobras sombras do seu voo, revoo de folhas e
de urubus. Au revoir los pájaros, flotam as folhas
do tempo y la prima y avulsa pena de árbol. Tu
cuerpo de un balazo clavado filtra el sol y flota. Una
amazónica y silenciosa tarde arde en las entranhas
del muerto. Y vos et moi and tutti les animaux en la
única civilidade available: lenguas enlazan respuestas.

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MALANGUE MALANGA

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La qué es un trozo de pregunta, la qué es lo que
queda cuando se va la esperança o se anuncian
caracoles omphalos discos luas. Su gran cabeza, su
cuerpo delgado, la cu de la qué es un nueve que
no se pudo mover, no se pudo acostar en la cama
de hojas de la trama de la página. La u de la qué y
la e de la qué, qué es lo que son? Qué jamás van
a ser? Qué, que lo sos todo: clave bisagra sudores
sunshine sumários olho d’água. Delira desliza no
lodo da errância e as canaletas da espinha. No
tobogã de um what se bate, no súbito a de um quoi
a gritar, se a sombra se arrasta se em brasa. Lo
circular – qué – la duración – qué – retumbante
– qué – la trampa hacia las olas – qué – Asias de
sombras para perguntar – qué. Todo que no se
sabe lo sos cuando sabes a ofrenda. Tu cabeza es un
ojo, miolo, me acecha da cerca, mientras duermo
y me asombra. Uma onda de qué. La qué que
ergue ante a lumina a dúvida a súbita a inerte, num
monumento de escombros. E sai o sal da saliva, e
salgo yo da llovizna y tudo um mar bravio de qué.

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WILSON ALVES-BEZERRA

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É o fim dessa lenga língua, da litania, do miserere
da matilha, da novena, da dezena, da centena, da
milícia. Celebrai a inutilidade da poesia. É o fim,
hoje que a polícia matou Ricardo, com dois tiros,
na frente do pão de açúcar, na luz cinzenta da
tarde. Hoje, sim, hoje, dois tiros, no en legítima
defensa, not in the War of Irak, but in my place.
Matou com rapidez, no peito, com dois tiros, não
no passado colonial, não no monte de açúcar que
se chamava pão, nem na senzala, não. Na Mourato
Coelho, a da elite descolada, não a do bandeirante
com os vinte mil índios na corda. El libre policía,
nascido no Capão, livre, free like you, like me.
Mas Ricardo, para que passear com o papelão
reciclado, se nem o poema ao lado te enxerga, de
hoy hasta el fin de los días, vano afán, ciego sordo
y sombrio, c’est la fin des haricots. Da picada. De
la flor. No hay pinheiros em Pinheiros, Ricardo,
como sabes. Aca es território alheio. Não seu. Que
vengan los turistas a pasear al safari de los prietos,
delante de la pizzería, cerca del mercado burgués.
Venham todos vocês, los que puedan, los que
quieran, ya no existe este país. Ya no es de nadie,
não é de nada, já não custa nada este país.

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MALANGUE MALANGA

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En este local y en todo el distrito de Miraflores
está prohibida la discriminación. Saca la mano del
claxon. En esta obra está prohibido silbar o acosar
a las mujeres. Respetemos a las normas. Hoy será el
mejor día de tu vida. Mañana también. Lo estamos
filmando por su seguridad. Regula tu alarma,
evita la multa. Jugar en exceso causa ludopatía.
En Starbucks nos preocupamos por tu seguridad:
Cuida tus objetos personales. Recuerde que está
prohibido ingresar en estado etílico; ingresar con
paquetes grandes; ingresar con animales; comer,
beber o fumar en estaciones y buses; ingresar con
objetos punzo cortantes y/o armas de fuego; ingresar
con material inflamable y/o explosivo; comercio
ambulatorio; usar una tarjeta preferencial que
no le pertenezca (Será decomisada y bloqueada);
usar patinetas dentro de las estaciones. La empresa
se reserva el derecho de suspender en cualquier
momento la venta de bebidas alcohólicas si el
cliente presenta signos de embriaguez. Esta obra
NO cuenta con licencia de edificación. Por tanto,
infringe la ley. Somos libres? Miéntele al censo.
Fujimori nunca +.

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MALANGUE MALANGA

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No saguão de um feijão, aeroportos no prato com
bacon escondem estilhaços do homem bomba do
ano. Duzentos museus muçulmanos com vítimas
mutiladas atacam em sincronia fina, fixa, traseiros
de chefes de estado. Em meio aos tiros, inocentes
sírios atiraram terroristas no chão da fábrica. Um
presidente latinoamericano se arrancava dedos para
ter a impressão de Guernica na alma. O Estado
Islâmico, consternado, falou na ONU: nosso
inocente e exilado sono é culpa das crianças pobres
de lá. Ferimentos à bala, no meu lombo, ferimento
no ombro à faca, ferimentos na pupila da família
emigrada. Um cão pastor professa no aeroporto
londrino em busca de cocaína ou bombas na mochila
das mulas colombinadas. Um cão infernal parisino
cheira as tetas da brasileira por armas, mísseis, leites
e a verdadeira ameaça da moça humana. A gente vai
de mãos dadas, garganta adentro, e lá estão o ovo
frito da melhor qualidade, a linguiça que dava pena,
tinha uma lasca de bomba, uma sombra de grito,
uma gota de bala no rabo de um inocente Charles.
Davam tiros davam ovos davam mijo davam sombra
que não davam em nada. No saguão da salsicha
uma bicha brasileira terrorista muçulmana preta
era currada, em nome da segurança nacional. Pelo
cassetete da Rainha não salva, todos os policiais
serão sempre inocentados, centauros, teteias.

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O corvo de Hannover indica: seremos nacionalizados
(ao cabo de setecentas bombas quicando entre
mísseis). O corvo de Hannover pondera: não haverá
mais guerras (além das necessárias). E o corvo de
Hannover ainda diz: nunca mais. E faremos muros,
se preciso corvo. A minha visão e o milho florescem
e as mais vermelhas frutas e as mais suculentas trutas
e os mais rosados salmões. Estamos todos no centro
da ilha e essa gente de pescoços líricos, altivos
e lúcidos se dá as mãos e as línguas germânicas
contra as línguas eslavas. Um pouco de sangue lava
a Hauptbahnhof na hora da merenda. Mas mãe,
cadê a ferida da bala? Se agasalha, meu filho, e pega
cinco potinhos: um para a grana do pão e outro
para a grana das almas, um para a grana da anfeta
e outro para a grana das almas, um para a grana da
pinga e outro para a grana das almas. Mamãe quero
ser punk em Berlim mas o corvo de Hannover não
era o corvo de Viena não era o corvo de Paris não
era o corvo de Praga e o guarda me falou que não
são seis estes potes de esmola e no Brasil não há
corvos porque carcará não deixou nada. Vejo lindos
dinossauros no porão, nos dormentes e o fiscal
principia a inspecionar os vagões. Nunca estiveram
nas fábulas os estrangeiros do trem. Bicava um olho
do filhote o mavioso preto cego patriarca. O grande
soco inglês reverbera mais uns ossos cidade adentro,
da sonata de beethoven para pedrada e faca.

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A tua língua verdadeira estrangeira. A tua beira de
boca ejacula fermenta inocula e o chão que rebusco
não me rebeija os pés. Opilý, Milene, cizí mḝsto,
releva-me ao outro lado, o rito do curso da mera
morfose, do automático golem. Portálova zena,
touzil po krizení. Nadava pelos rios da ostra austra
e nada conforta. Limbo de lebre no gelo. Pelo
eriçado, corça ante corpora, nódula névoa. Cukru
stromu, anseia o que escreve, assombra o que
excita, interdita. Zakázané dvere. Quando eu for
a lembrança sua, haverá outra trava, outra guarda,
outro canto a esses corvos. Haverá o que levar ao
outro lado. Práva, práni, prekrocení. Passem os
rios ante o passante. Vschni budeme mrtví. A tua
única voraz e imaterna língua, prelozit me. Insistir
ao fogo perene é preciso. Odsouzeni k tichu não
mais. O seu rosto esquecido, o seu vestido a
mover-se na praça impressa de Viena da primeira
carta. O fantasma que serei há de escrever-lhe:
vrána, a sina, a ruína de insistir. Ser o seu açude
em Ravensbrück, sua saliva. Leito, suspiro, dopisy
do vetru. Tudo o que não se pode compreender. A
tua língua verdadeira estrangeira outra vez.

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Automáticos portugueses brindam garrafas de
água francesa, bolachas espanholas, refrigerantes
norteamericanos e azeitonas nacionais. Na linha
vermelha, o penteado moicano, o ponteado nacional,
a ginga ancestral de índios e pretos faz o ébrio
mulato gritar e dizer: Ei, favela! Ei, aí alguém sabe
o que é favela? Alguém sabe o que é cocaína, o que é
a guerra? Como há mil anos dorme-se em Lisbona,
nenhum gajo responde, estrangeiros muxoxos no
comboio, na doca, no cais. Descem eslavos, suevos,
normandos, celtas e sírios do autocarro e partem ao
silencioso bairro do Chiado. Ao chegar, a escrava
branca como as metáforas de brancura do Góngora,
Capitolina, automática rapariga portuguesa, repete
a fórmula e ignora a malícia feita água ao cántaro, o
sorriso, o bom dia e a fala do timorense que chega
conversando à pensão. Os códigos de Óbidos, da
Galícia e da polícia são sempre aplicados a quem
contraria os ditames de Cristo e Salazar, melhor
lugar não há que o da obediência, diz Carpintolina
no pasto inculto da Pensão Marisela. A menina sueva
não passa do bom dia, não passa da porta, cheia de
pretos de Angola, brasileiros da Bahia, e malandros
do senado. A menina sueva vai embora suando
no calor que quer ser tropical do país que não
conseguiu ser luso e continuará tentando por mais
alguns dias, antes de ser anexado pela Catalunha,
que o vai pegar à unha, como um toureiro sevilhano
até tudo se arrojar ao mediterrâneo mar. Desolées
marujo, começa tudo outra vez, que tem o dia do
negrão, e nem tudo é boé da fixe a si.

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Se alguém tentar alguma gracinha, na rua do
ouro, não chega vivo ao igrejão do Vito. Tem tanta
armadura e lança que não tem limpeza de pele que
resista à graxa e tanta é a chuva ácida no temporal
de Praga que soldado põe armadura e ainda leva
guardachuva e capa. É foda o casco de metal, e mais
foda é o cavalo vir lhe quebrar, e o Deus impedir
você de comer a polacota amada, a galega, a fada ou
o elfo da lenda eslava. Deus é foda de deixar tanto
pato, tanto pomba, tanto faisão, tanto frangão, tanto
peru, tanto cordeiro e tanta lebre sendo servidos
enquanto a armadura já fode com sua barriga inteira.
Que se lasque. O arcebispo da cara de peixe é que vai
morrer aspirando a merda que ele soca para o fundo
do cu dos tchequinhos, porque os manos da tortura
já formaram comigo e vai ser tanta bosta pelo funil
de porra que ele vai engasgar no inferno. Não vou
deixar barato. E vou botar fogo nesta porra toda,
porque quem precisa de ferreiro, contrata. Quem
não precisa, espera para saber o que acontece. Em
geral, é que o arcebispo professa sobre os esqueletos
de cavaleiros, o comerciante e o povinho. Que o
arcebispo quer cantar as glorias do elixir das lutas,
do zebu confiança e do Ferreiro ferrolho, e diz ao
vulgo que há de pagar com dobrões metálicos, que
tudo o mais lhe será então recompensado e salvo e
na moda. O latim da missa já não alcança pessoa, o
alemão dos judeus da moda, o tchecão dos eslavos
sobra, e o negócio é não falar mais língua nenhuma,
é só fazer o chicote triscar para fulano dançar miúdo.
Assim se constrói um reino coeso e se deixa o Kafka
do tamanho que ele há de ser.

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Entra sem perguntar na igreja do Alvor, porque é a
casa de vocês também, é a casa de todos, diz o lenço
sobre rugas do Algarve. Reza de cuecas um pai nosso
sem crença. Limpa ao menos seu suor no banco,
amassa o pó no genuflexório dos pretos e confessa
não saber pecar. O deus dourado gira no altar
do Alvor. Gira a pomba e se seca no seu sudário.
Repete um rosário sem pressa, pé ante pé o sol
escaldante vai se chocar com Ceuta, até que o anjo
português venha, caiado com o pincel dos mouros
e lhe diga em árabe as coisas que você já sabia há
tempos. As escutas no confessionário se conectam à
vela eletrônica. Os ossos no armário das bebidas, o
cardeal cabeça de peixe, a virgem viúva e o homem
ventura, tudo se afigura sobre sua cabeça. O pai
nosso excita os morcegos do Alvor. Era tão bela a
ideia do deus, era tão densa a cortina do incensário.
Eram lindos no equinócio os miráculos. Uma roda
de pretas me prega sermões pela nuca, uma corda de
brancas suas ancas que giram. Vai dar no banheiro
um pio, que a pomba rolando e sorrindo com a boa
nova. Vai dar na vila a nova, vai pôr à prova não a
fé, mas as pedras da comunidade. Giram deuses,
morcegos, azeitonas e os covardes querem ainda o
antigo culto.

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Lascivas agitam-se sobre a grande maré dos textos
as mãos que não retem o que catam. Há um corpo
alvo, boiando na correnteza, ante o assombro que
o prisma, e logo vai ser esquecido. Entre as letras,
lamento, não se pode ser um sábio, dizem as visões
que assaltam. Lendo este corpo em braile, já se
sabe, e logo se esquecerá. Tudo há de perecer tão
jovem, como os jovens camonianos que contam suas
sílabas, rebuscando a aliteração. Tudo há de aparecer
tão velho, seus primeiros versos deitados fora, na
prateleira dos lançamentos. Tudo há de padecer
lamentos de quem já soletrou e é triste. Tudo Hades
aparecer sem mitos. O limite das gulosas bocas ante o
verbo ínfimo e impessoal. Il y a. O grão que não nutre
a fala. Um ganido no falo apertado não se fixa no que
se tarda. O papel rascunhado é de quem. Ao medo,
ao segredo, ao degredo, nem jornais mais bastavam.
Tintas da madrugada, impressas em popa e mastros.
Não haverá mais farol ou radar, para alumiar, o que
esses olhos trafegam à passagem de um trem.

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Quinhentos anos de trabalho forçado, pele
esculpida a látego, e depois da alforria o contrato
de fiscal de cu. Convidou-se a deixar a cidade, a
unidade, o reino, e foi plantar laranjas no Algarve,
despois de cruzar o mar oceano a nado, a nada, ou
quase nada. O mar imenso e recoberto de pó; areias
do mediterrâneo nos olhos, sangue pisado vomitado
do atlântico. A sardinha não entende as águas, e o
cristão do degredo há de ter fiscalizado o seu cu:
não trabalhas? Lugar de preto é na pedra de mó.
Quem é sua família acá nestas terras, pois? A vida
de molhar o pão que o diabo amassa com o suor do
rosto que se molhara na lida. Plantar o grão, recolher
laranjas e ao cair da foice noturna, ver as hordas de
piratas de papoulas, mouras mascando desejos sob
a burka. Al Mutamid se inquieta. Estaremos ao
futuro mortos, os impérios hão de ser cocô e pus, a
luz de Al Gharb um borrão de imagens de antanho,
de Bizâncio, de Al Aldalus, só restarão o desejo do
olvido. Dejetos e destroços que no mar se vem e se
vão. Cabeças de imperadores serão assadas: como
batatas, como sardinhas. Quem as comerá? O preto
da pele curtida, que se lembra ainda do último dia,
há décadas, em que deixou a casa, saberá que a brasa
funda a história. Deus por mim não olha, na noite,
no campo, nem meus olhos ele pode ver.

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Graça pergunta se é exílio, degredo ou refúgio o
que faz o marujo preto girar parafuso, cantando-
-se ao mar. Se é sotaque ou batuque o que torna
incompreensível a escuta ante as misérias no cais. O
migrante responde certeza, memória e uma pedra
de mó. Nenhum português usa uma camisa mais
de cinco vezes, ele ensina. Vivo com pouco, viveria
com nada. Uns carapaus pescava e os dividia com
os gatos. Haveria comboios no arroio para o peixe
vomitado chegar ao Porto no hotel Del Rei Dom
Preto Segundo. A cantilena lusitana dá pano para
a manga da camisa rasgada. O preto roto migrado
vai se mostrar disposto, vai cobrir o rosto para não
ser deportado, para não ser levantado em suspeitas
vãs. No fim das contas era só psicose, o mar sem
cardume, o sol sem seu lume, o poço para saques
d’água no banco. O hard disk lacrado, enviado
à Bahia de Todos os Santos, para descarrego.
Graça se pergunta se a mente é imune à maresia,
se a nostalgia é que funde o recôndito do homem
preto que só queria atravessar o mar de longo, para
além do medo, e encontrar pela rua a moça bela e
branquela que não tivesse vergonha de lhe tomar
da mão. Graça não sabe não.

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WILSON ALVES-BEZERRA

O AUTOR

Wilson Alves-Bezerra nasceu em la ciudad


monstro de São Paulo no año da serpente según
o sempre exótico calendário chinês: 1977. Ano
em que el poeta español Vicente Aleixandre foi
congratulado com o premio Nobel de literatura.
Como muitos brasileños que habitam a “pauliceia
desvairada” es hijo de migrantes do árido nordeste
o terra do pau do Brasil. Seus primeiros anos de
vida transcurrieron entre casas calles y campos
baldíos de um bairro popular localizado na área
periférica da capital paulista. Começou a ser
alfabetizado na escuela próxima de onde morava e
a desenvolver o gosto por la lectura. Tempo depois
ingressou en el curso de letras de la Universidade
de São Paulo. En la misma instituição defendió su
trabajo de maestria em 2005 na área de literatura
hispanoamericana. Em 2010, año del tigre, a
tese de doutorado em literatura comparada na
Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Dois
anos después fue publicada bajo el título: Da
clínica do desejo a sua escrita. Tem realizado traduções
da obra de Horacio Quiroga y Luis Gusmán. Não
se sabe por qué extraño motivo no es hincha do
glorioso São Paulo Futebol Clube. “La vanguardia
se fue al vinagre”. Da sua produção publicada se
podem citar los siguientes libros: Histórias zoófilas
e outras atrocidades (2013), Vertigens (2015), O pau
do Brasil (2016), Exílio aos olhos, exílio às línguas
(2017/ Portugal); Vapor Barato (2018); Cuentos de

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MALANGUE MALANGA

zoofilia, memoria y muerte (2018/ Chile). “Lalangue


for poetry is desesperanto”. Fue vencedor do
prestigiado premio Jabuti em 2016 na categoria
poesia por escolha del público lector. Colabora
com resenhas críticas de livros em algumas seções
culturais de importantes periódicos nacionales.
E exerce la función docente en la Universidade
Federal de São Carlos (Estado de São Paulo).

Contatos:

Facebook: Wilson Alves Bezerra


(facebook.com/profile.php?id=100011607316158)

E-mail: [email protected]

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WILSON ALVES-BEZERRA

Na época em que tanto se parla y habla de


globalización, de fluxos e reflujos del capital
financeiro, de ondas migratórias de seres humanos
que morrem em el mar o tentando fugir da
hambre o traspor um muro, de cinematográficas
histórias de corrupción y roubo por toda parte e
de parte de políticos, empresários y associados,
de violentas repressões aos estudantes que salen às
ruas para protestar contra as injusticias humanas,
de crueles assassinatos de líderes comunitários e de
campesinos e indígenas, de alcaldes y prefeitos que
desde suas mansões ordenam destruir os murais
pintados por artistas plásticos de rua, de taxas
elevadas de inflación do mercado e de especulação
bancaria que producen mais fome y miséria, nós
cartoneros que sempre acreditamos na capacidade
de soñar criando libros com belas capas de
papelão, cartón que resgatamos de muchos lugares
antes de ir para o lixo e contaminar ainda más el
planeta, decidimos, pues, apostar em una acción
conjunta através da poesia, de uma poesia que
com su peculiar linguaje nos permite quebrar as
distâncias que nos separam, apesar de estarmos
tão próximos no mapa, de termos tanta historia
en comum, de una poesia que com sua dicção
multilíngue nos revela al hombre nas durísimas
circunstâncias de hoy, de uma poesia que desde
seu lugar de origen se proyecta para um mundo
de pesadelos e ilusiones. Aqui está nuestra aposta

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MALANGUE MALANGA

al editarmos el instigante livro de Wilson Alves-


Bezerra, a quem agradecemos o gesto despojado
de darnos sus poemas para que circulem livres,
sin barreras e sem timbres nacionais. Um gesto
que mobiliza pela segunda vez a multinacional
cartonera (a primeira foi com o livro TUDO de
Douglas Diegues), cujo objetivo essencial es el de
ratificar a visão y la lección que um dia nos legou o
poeta mor, César Vallejo:

!Y si después de tantas palabras,


no sobrevive la palabra!
¡Si después de las alas de los pájaros,
no sobrevive el pájaro parado!
¡Más valdría, en verdad
que se lo coman todo y acabemos!

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