0 notas0% acharam este documento útil (0 voto) 92 visualizações10 páginasFlorestan - O Ensino Da Sociologia Na Escola Secundária Brasileira (1959) (1977)
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Quanto 20 Japlio, ‘além de trabalhos mais minuciosos,
6 de ser citado Jules Henry, que, em “Cultural Discontinuity
and the Shadow of the Past” (Scientific Monthly, margo de
1948, péginas 248-164), salienta a alteragio dos costumes e
instituigdes em conseqtiéncia sdmente da. adogo dos métodos
ocidentais da inddstria. 0 direito, em tais casos, no opera
a mudanca, limitando-se a emprestar a coergio as mudancas
introduzidas.
As leis juridicas nko tém objeto proprio, podendo cons-
tituir contetido dessas normas quaisquer matérias, como 0
diz com propriedade William Seagle, em The Quest for Law:
“the law is the one art which, unfortunately, has no subject
matter of its own” (Pig. X). Assim, qualquer assunto pode
ser regulado pela legislagio, inclusive, também, reformas
tecnol6gicas, como a criagio da usina de Volta Redonda ¢
a TVA, por forca de lei. As modificagdes tecnolégicas, j4
se lembrou o caso do Jap&o, podem, por sua ver, provocar
alteragées de costumes, parcialmente previsiveis, com certa
probabilidade, que, para maior eficitneia, poderio usar a
coergiio organizada, Déste sucinto raciocinio conelui-se que
a Jei juridica poderé, em tais casos, inovar além do Ambito
cultural restrito, em casos em que ela provoca a modificagio
material.
Concluindo e para discussio, a fim de oportuna amplia-
gio, afirmo:
2) —a lei juridica normalmente nao inova, limitando-
-se, por via de regra, a emprestar a fOrca coercitiva organi-
zada aos costumes existentes;
'b) — consegue inovar, as suas préprias instituigdes, sem
austneia de dificuldades, para ajusté-las a mudangas ocor-
ridas em outros setores da vida. social;
©) — excepcionalmente a lei juridica tem fungio teleo-
l6gica mais ampla, quando ela altera aspectos materiais ou
teenolégicos, que venham a produzir mudangas sociais, par-
cialmente previstveis,
y
i
O BNSINO DA SOCIOLOGIA NA BSCOLA
SHOUNDARIA BRASILEIRA
‘Fromnsran Funnanpes
A questiio de se saber se a sociologia deve ou nfio ser
ensinada no curso secundério se coloca entre os temas de
maior responsabilidade, com que precisam se defrontar 08
sooiélogos no Brasil. Os interdsses profissionals alimentam
‘a presungio de que seria uma medida priticamente impor-
tante ¢ desejavel a introdugiio da sociologia no curriculo da
escola secundéria brasileira. Admite-se que as oportunida-
des docentes concedidas aos licenciados em cidncias sociais
sito demasiado restritas. A ampliagio do sistema de maté-
vias do ensino secundério permitiria garantir uma absoreao
regular ou permanente dos licenciados nesse setor e garanti-
ria As seegées de Oitncias Sociais das Faculdades de Filosofia
uma certa equivaléneia com as demais seegées, no que con-
cerne 2 motivacio material dos alunos, que procuram essas
‘Faculdades porque pretendem dedicar-se ao exercicio do ma-
gistério secundério e normal. ais interésses so natural
mente legitimos, Nas condigdes brasileiras, 6 quase impos-
sivel estimular 0 progresso das pesquisas sociolégicas sem
que se eriem perspectivas de aproveitamento real de mio-de-
-obra, especializada. Contudo, a questo nem mereceria ser
diseutida, se sdmente pudesse ser encarada a In dos inte-
résses profissionais dos sociélogos, por mais nobres e louvé-
veis que fOssem os seus fundamentos ou os efeitos que déles
poderiam advir.
Os estudos que foram feitos pelos especialistas sdbre
essa questo demonstram que, para os sociGlogos, o ensino
da sociologia no curso secundério representa a forma mais
construtiva. de divulgagio dos conhecimentos sociolégicos ©
—9—‘um meio ideal, por exceléncia, para atingir as fungdés que
a citmcia precisa desempenhar na educagto dos jovens na,
vida moderna, A difustio dos conhecimentos sociolégicos
poderé ter importancia para o ulterior desenvolvimento da.
sociologia. Mas, o que entra em linha de conta, no racio-
cinio dos especialistas, nfio é ésse aspecto pragmético. Sa-
Yienta-se, ao contrério, que a transmissio de conhecimentos
sociolégicos se liga & necessidade de ampliar a esfera dos
ajustamentos e contréles sociais conscientes, na presente fase
do transig&io das sociedades ocidentais para novas técnicas
de organizagio do comportamento humano. As implicagdes
désse ponto de vista foram condensadas por Mannheim sob
a epigrate — “do costume ds ciéncias sociais” e formuladas
de uma maneira vigorosa, com as seguintes palavras: “En-
quanto o costume e a tradigio operam, a cincia social é
desnecesséria, A ciéncia da sociedade emerge quando e onde
© funcionamento automAtico da sociedade deixa de propor-
cionar ajustamento, A anélise consciente ¢ a coordenagio
consciente dos processos sociais entiio se tornam necessi-
rias”*, © ensino das ciéneias sociais no curso secundério
seria uma condigio natural para a formagio de atitudes ca-
pazes do orientar 0 comportamento humano no sentido de
aumentar a eficiéneia e a harmonia de atividades baseadas
em uma compreensio racional das relagdes entre os meios €
os fins, em qualquer setor da vida social.
Os Temas Focalizados no Brasit
‘Varios especialistas procuraram discutir ésse problema
no Brasil. Aqui nfio seria possivel examinar thdas as contri-
Duigées que mereceriam consideragio. Por isso, seleciona-
‘mos alguns trabalhos, que ilustram possibilidades intelectuais
diferentes de focalizagiio do mesmo tema, Em primeiro lugar,
ontaca Gq Manmmmns, Freedom, Power, and Demceratio Planning,
iniversity Press, N. York, 1950 (Part III, passim; cltagio
extraida da pg. 175),
estilo as questées que permitem delimitar as fangBes por
assim dizer universais do ensino da sociologia. Em thdas as
sociedades modernas, que foram afetadas pela formagéo ou
pela expansiio da economia capitalista, tais quosties se co-
Jocam inevitavelmente. Os educadores foram os pioneiros
na apresentagiio e no exame dessas questdes no Brasil, pois
foram éles os primeiros a chamar a atencio para as possi-
Dilidades da educagio em face das alteragées das condigdes
de existéncia social. A idéia de preparar as geracdes novas
para “uma civilizagio em mudanga” tornowse uma receita
de considerdvel disseminagio, Contudo, coube a Emilio Wil-
Jems, através de artigos e de publicagies esparsos, propor
problemas dessa ordem com maior espirito de exatidiio cien-
tifica. Ble nfo s6 contribuin para abrir novas perspecti-
vas, em nosso meio intelectual, para o debate da significagtio
do ensino das citncias sociais, quanto para assinalar certas
esferas em que uma intervencio racional, com apoio em
conhecimentos antropol6gicos e sociolégicos obtidos empiri
camente, poderia favorecer a mudanga de determinadas ati
tudes em um sentido desejavel. No que concerne & funcko
geral do ensino das citncias sociais em um sistema educa-
cional que 0 comportaase, 0 ponto em que insiste é 0 relativo
as condigées de vida politica nas sociedades democraticas.
‘Blas exigem capacidade pronta de escolha e de sjustamento
rapido a situagSes extremamente instéveis, o que torna neces-
sdrio um adestramento educacional prévio para o exercicio
continuo do espirito eritieo com base no conhecimento his-
térico-sociolégico do meio social ambiente *, Quanto A opor-
tunidade de influenciar deliberadamente os ajustamentos
sociais, Emilio Willems se dedicou especialmente aos resul-
tados previsiveis da manipulagio de técnicas de adestramento
e de educagio em determinados setores, como o das popula-
Ges alemfis ou teuto-brasileiras no sul do pais ¢ 0 das popu-
lagées caboclas, tendo em vista introduzir maior uniformi-
dade sociocultural na sociedade brasileira. como um todo €
2 Hesas {délas foram desenvolvidas em artigcs publicados em
© Estado de So Paulo.
—a-um minimo de integragio social nas diversas aglomeragées
‘hhumanas regionais®,
Com referéncia & definigfio das fung6es universais da
sociologia no sistema educational, merecem uma referéncia
especial alguns trabalhos agrupados no “Symposium. sdbre
0 Ensino da Sociologia ¢ Etnologia” ‘, no qual esté natu-
ralmente subjacente a consideragio das possibilidades edu-
cativas do professor de sociologia no Brasil. As idéias dos
autores ocorrem em planos diferentes de apreciagio do pro-
blema, pois uns retém aquelas fungies no seio do ensino
secundério, enquanto que outros se restringem As mesmas no
ensino superior. Os seguintes excertos oferecem um exem-
plo da uniformidade que, niio obstante, foi alcangada. espon-
‘tAneamente na discusstio da questtio que nos interessa: 1)
“0 estudo ¢ o ensino da sociologia decorrem, a nosso ver, dos
prinefpios gerais afirmados acima. 0 seu escopo deve ser,
antes de tudo, munir o estudante de instramentox de ansilise
objetiva da realidade social; mas também, complementar-
mente, 0 de sugerir-thes pontos de vista mediante os quais
‘possa compreender o seu tempo, © normas com que poderé
construir a sua atividade na vida social”*; 2) “De thdas,
a preocupacio comum — e ésse 6 0 escopo do ensino da
sociologia na escola secundaria — 6 estabelecer um conjunto
de nogdes bésicas e operativas, capazes de dar ao aluno uma
visto nfo estética nem dramética da vida social, mas que
The ensine técnicas e The suscite atitudes mentais capazes de
Jevé-lo a uma posi¢io objetiva diante dos fendmenos sociais,
estimulando-lhe o espfrito critic e a vigilincia intelectual
ue so social e psicoldgicamente titeis, desejaveis e recomen-
8 Cf, Assimilagdo ¢ Populagées Marginais no Brasil, Comp. 1a,
Nac, 8. Paulo, 1940; Aeulturagio dov Alomdes no Brasil, Comp, Bd.
‘Nac. 8. Paulo, 1946; O Problema Rural Brasileiro do Ponto de Vista
Astropot Négioo, Secr, da Agric. Ind, e Com. do Hstado de 8. Paulo,
1944; “Assimflacto e Kducagiio", In Revista Brasileira do Hetudos
Pedaoégievs, Vol. IV, N? 11, 1045, pigs, 179-181,
4. Of. Sociologia, Vol. XI-N.’ 3, 1949.
5, Anzio Cin: 5 min rs
es ‘om, “Soelologia; Hnsino © Wstudo”, in rev. cit,
éveis numa era que nfo 6 mais de mudanga apenas, mas
de crise, crise profunda e estrutural” °; 8) “Tendo como seu
objetivo permanente, a natureza humana, a ciincia do social
traz uma contribuigio importante &s relagdes humanas, faci-
litando a compreensio e a tolerdncia, polindo as arestas,
suavizando 0s conflitos entre os individuos, por isso mesmo
que thes abre os olhos para as suas causas. A sociologia
concorre para. uma racionalizaglo do comportamento.hu-
mano — na medida em que éste pode ser racionalizado” ";
4) “O principal objetivo da difustio da Citncia da Sociclo-
gia, como o da difusio de qualquer outra cléncia, ¢ a com-
preensio, por parte do homem, da natureza. specialmente
‘precisa éle de uma compreensiio da natureza humana ¢ da
atuagiio dos processos sociais, de modo que possa acomodar-se
com éxito a essa parte da realidade e assim conseguir a0
menos certo grau de contrdle sobre ela”®; 5) “Em qual-
quer caso, no nivel secundario, normal ou universitdrio, a
ase etnolégica torna-se cada vex mais necesséria para a
compreensio do homem ¢ desenvolvimento das ciéncias que
fle se ocupam’®. Idéias semelhantes foram defendidas pelo
autor desta comunicagio, mas de um modo restrito: as
transformagées ocorridas nas sociedades modernas substi-
tufram largamente of ajustamentos sociais baseados no conhe-
cimento pessoal intimo e em normas estabelecidas pela tra-
digo por ajustamentos sociais baseados em situagdes de inte-
ésses e em convicgées senstveis ds flutuagdes dos movimentos
sociais ou aos influxos da propaganda, Dai a necessidade
de defender a liberdade e a seguranga. dos individuos, através
de uma preparagio educativa susceptivel de adestré-los, espe-
6. LA, Cost Prrmo, “Bnsino da Soclologia nas Hscolas Se-
‘eundérlas", In rev. elt, pag. 307.
7. J. A, Rios, “Contribulgdo para uma Didaitien da Sociologia”,
tn rey, elt, pig. 815,
& Donat Prmsox, “Difustio da Citneia Socioldgien nas Tsco-
tas", in rey. eit, pig. 325.
9 0, DA Costs Hovaroo, “O Hnsino dos Conseltes Biisteos da
Btnologia”, in rev, elt, pag. 835.
—8—cificamente, para a escolha com fundamento racional. “De
fato, 6 de esperar-se que a educagio pelas citncias sociais
erie personalidades mais aptas a participagio das atividades
polfticas, como estas se processam no estado moderno”*,
Em segundo lugar, esto as questdes relacionadas com
‘a concepio que preside a integragio da sociologia em um
determinado sistema educacional, em wm ou mais niveis do
ensino, Neste particular, a situagio brasileira é verdadeira-
mente caética, Um dos artigos jé citados™, demonstra que
a posigio da, sociologia no sistema educacional brasileiro
oscila de maneira irregular, ao sabor de inspiragbes ideol6-
gicas de momento, Mantendo a discussiio nos limites da
situagho atual, em que a sociologia 86 figura no curriculo das
escolas normais, constata-se que hé um indisfarcével con-
traste entre as idéias correntes sdbre as fungées da socio-
logia como fator educativo e a concepgio que alimenta e
norteia legalmenta a atividade docente dos professires de
sociologia. Na verdade, o programa vigente restringe a
influéncia propriamente educativa dos professdres de socio-
Jogia ¢ no situa devidamente os alunos em face dos proble-
mas que precisarlio enfrentar futuramente, como professd-
es de escolas primérias, em diferentes tipos de comunidades,
nas quais preci viver, desempenhando papeis sociais
fora do campo pedagégico mas de alcance edueativo.
Entre og trabalhos que abordaram ésse problema, des-
tacamos os de Panl Arbousse-Bastide e Anténio Candido.
© primeiro faz uma andlise exaustiva e brilhante das diver-
sag alternativas que se colocam, necessdriamente, na orga-
nizagio de um programa de ensino da. sociologia na escola
secundaria, as quais se refletem em todos os planos possfveis
de programagio da matéria, de graduagto do treinamento, de
fixagiio dos limites de idade e de critérios pedagégicos, de
orientagio da conduta ativa do professor em face do aluno,
ete, Aborda, enfim, quest6es que, infelizmente, nffo atraem
10. ¥, Feananons, “O Signifleado das Clenelas Soclals no Mundo
‘Moderno”, in Filosofia, Oiénoias © Letras, 18, outubro de 1951, pg. 98.
J. L.A. Cosma Preto, art. eft, pligs, 296-808,
4
‘a devida curiosidade em nosso meio e caem na esfera da
filosofia da educago prdpriamente dita. Dai a fdrga que
ganham certas idéias, que precisam ser incluidas no reper-
tério dos que discutem a conveniéneia de introdusir a socio-
logia no ensino secundério. © ensino secundirio ¢ forma
tivo por exceléncia; éle nfio deve visar a acumulacio enci-
clopédiea de conhecimentos, mas a formagio do espirito dos
que of reecbem. ‘Torna-se, assim, mais importante a maneira.
pela qual os conhecimentos so transmitidos, que 0 conteddo
da transmissiio, Entre 0 ensino de teorias em conflito ou
de orientagdes dogméticas na sociologia ¢ “os estudos verti-
cai de uma sociedade dada”, Arbousse-Bastide preferia 08
segundos, por abrirem aos jovens caminhos mais frutiferos
de conhecimento da realidade social. © trabalho de Ant6-
nio Candido abre uma, pista fecunda: seria conveniente escla-
vecer a que inspiragto se prende o ensino da sociclogia.
Exta pode ser encarads de manciras diferentes (como ponto
de vista, como téonica social e como ciénoia partioular) @
seria de toda conveniéncia, para a orientagio do préprio
ensino da matéria, definir com clareza o nfvel em que @
reflexio sociol6gice. ¢ considerada ou desenvolvida, 16 pena
que 0 autor nfo tenha examinado as implicagGes de seu modo
de colocar 0 problema, pois éle sugere um bom Angulo para
se delimitar a posigiio da sociologia nos diferentes niveis do
ensino ®,
Em terceiro Ingar, estiio as questées que permitem evi-
denciar as fungées por assim dizer especificas, que aconse-
Thariam a inclusfio da sociologia no currfeulo da. escola se-
cundéria brasileira. As opiniées entre os soci6logos estéio
divididas. Tanto hé os que defendem a introdugiio da. sociolo-
gia na escola secundéria (mais precisamente: nos programas
oficiais do colégio), quanto os que repelem categdricamente
essa solugo. A justificagio de ambas as espécies de deci-
12, Pav Amousse-Bastipe, 1/Bnseignement de ta Sociologie dans
les Hooles Secondaires, conteréncia; exemplar datllografado em poder
do autor.
18, AnrOx1o Cinomo, of, art. cit,
aes6es 6 feita no plano das idéias e das conviegdes de o1
geral; ninguém tentou fundamentar socioldgicamente as
razées da propria opinifio, Sdmente Costa Pinto abordou
alguns aspectos do problema, ao assinalar os motivos das
flutaages da sociologia na escola secundéria brasileira.
Segundo os resultados.de sua andlise, “a animadversio da
Jegislaggo vigente ao ensino das ciéncias sociais ¢ um dos
seus caracteristicos centrais”, atestando que “a difusfio de
nogées cientificas sdbre organizagio econdmica, social, po-
itica e cultural, 6 menosprezada como objeto de instrugdo
@ quase temida como instrumento de educagéo”.
‘Neste ponto, somos levados a supor que seria da maior
convenitneia que se situasse socioldgicamente o problema ¢
se procurasse refletir sdbre as possibilidades da introdugio
da sociologia no ensino secunddrio brasileiro & luz de argu-
mentos fornecidos pela propria andlise sociolégica. Talvez
se possam apontar algumas limitagdes em tal orientagio.
Questées dessa complexidade nunca devem ser consideradas
em térmos estritos, de dados obtidos através de wma disci-
plina cientifica; além disso, o caminho para os principios
gerais, dos quais dependem a propria organizagio de um sis-
tema ¢ a posigfio que dentro déle devem ocupar as diversas
matérias ensinadas, deve ficar 0 mais possivel livre, pois cabe
a filosofia da educagio ¢ 2 politica educacional estabelect-
los e pd-los em prética. De qualquer modo, os dados ofe-
recidos pela reflexio sociolégica constituem, no caso, 08
mais legitimos pontos de partida para as deciades que pre-
cisam ser tomadas nessa esfera da politica e da adminis:
tragiio.
Diagnostico da Sitwagio Brasileira
Do ponto de vista pritico, a questiio de se saber se a
sociologia deve ou nfio ser inclufda no curriculo oficial da
escola secundiria brasileira possui a mesma naturesa que
14, L.A, Cosma Puvno, loc. elt, Trechos extratdos das pags
296.297,
— 96 —
qualquer outra questiio, relativa As possibilidades de intro-
dusivse determinada inovagio dentro de um sistema dado.
Quando o sociélogo se propée uma questiio desta ordem, éle
comega pela anélise do sistema existente de fato, no qual
se pretende introduzir a inovagio. Depois, passa para uma
fandlise mais complexa, em que o sistema é considerado em
relagio com as condigdes séelo-culturais que o suportam. E,
por fim, chega & andlise dos efeitos presumivels da inovar
‘lo, tendo em mira o grau de integragio estratural e as
eondicées de funcionamento do sistema, como uma unidade
relativamente auténoma e como um complexo de relagdes
dependentes no sefo de unidades maiores. Embora seja im-
possivel seguir aqui, rigorosamente, ésse provedimento meté-
ico, achamos que nos devemos ingpirar néle, na apresenta-
clo suméria de nossas reflexGes © sugestes.
© ensino secundério preenche no sistema educacional
brasileiro uma fungio educativa auxiliar e dependente, Seu
objetivo consiste em preparar os educandos para a admissio
nnas escolas de nivel superior. Por sua natureza e por seus
fing, tom sido deserito como um “ensino aquisitivo”, de ea-
réter humanisticorliterdrio, de extensfio enciclopédica © de
acho propedéutica, mais préso A tradigao aoadémica herdada
do pasado, que &s necessidades intelectnais impostas pelo
presente,” Doutro lado, a anélise sociolégicn pbs em evi-
déncia as contradigées que se agitam em seu seio e demons-
trou que elas niio sto ainda suficientemente profundas para
produzirem a neutralizagio de influéneias nascidas da antiga
‘mentalidade edueacional e de interésses ultraconservadores .
Os efeitos de tais contradigées, que estabelecem, segundo
Fernando de Azevedo, um contraste vivo entre “duas épocas
© duas histérias inversas” nas tendéncins de evolugio do
ensino médio no Brasil, se revelam no cereeamento das ten-
tativas recentes de renovagio pedagégica, as quais, apesar de
6, Of, Fenxaxvo on Aznveno, A Cultura Brasileira, 2* ed Com.
‘wa, Nac, § Paulo, 1944 (Parto TI, caps. III-V; esp. pfgs. 967-868,
‘870, 815-376, 978979, 894, 418-414, 420-480).
16, Idem,
—9—seu aleance construtivo, nfo tém conseguido por isso atingir
os seus fins e ganhar um minimo sequer de continuidade.
A posig&o do ensino secundério no sistema educacional
brasileiro permite detini-lo socioldgicamente, portanto, como
um tipo de “edueagfio estitica”, que visa imicamente a con-
servagio da ordem gocial"", 1 claro que essa posi¢fio nasce
da prépria fangio por éle desempenhada no sistema educa-
cional geral e sera mantida enquanto éste nfo for alterado
como um todo, em sua estrutura e em seus fins. Doxtro
Jado, também parece evidente que a persisténcia da velha
mentalidade educacional e a influéncia dos cfreulos sociais
que a sustém se explicam, socioldgicamente, pelo fato das
tradigées © de instituig6es socials como a famflia ou a
igreja manterem ainda uma parte considerdvel de sua ati-
vidade educativa. As regiGes do pais em que isso nfo acon-
tece, apesar de altamente populosas e econdmicamente. im-
portantes, abrangem uma 4rea territorial relativamente pe-
quena, em face das regides em que a vida social esté mais
préxima do padréo antigo. Mas, em conseqtiéneia, se esta-
delece uma vinculagio muito forte entre a defesa da estabi-
Tidade do sistema educacional brasileiro e as concepgdes
‘ou os interésses educacionais que orientam as intervengGes
politicas administrativas de camadas conservadoras, 80-
cialmente poderosa e influentes. Bis 0 corolério dessa. si-
tuagio: um ensino médio sem possibilidade de tornarse um
“instrumento conseiente de progresso social”, isto 6, incapaz
de proporeionar uma “educagtio dindmica” *,
Niio 6 preciso muita sagacidade para se pereeber que,
mantendo-se as condigées atuais, o sistema educacional bra-
sileiro nfio comporta um ensino médio em que as ciéncias
sociais possam jogar algum papel. Onde prevalece a opinifio
de que os ajustamentos sociais proporeionados por meios tra-
17. Sdbre a nogilo de “edueagiio estitiea”, cf. Cx. A. Hutwooo,
Methods in Sociology, Duke University Press, ‘Durham, North Caro-
Una, 1983, pags, 170-180.
18. SObre a nogio de “educacko dinimica”, cf. Oh. A. Hutwooo,
loc, lt.
— 98 —
dicionais so satisfatérios, o reconhecimento da necessidade
da edueagio pelas ciéncias sociais tem que ser forgosamente
pequeno. Dada a forma de articulneflo das eseolas secundé-
rias ao ensino superior, o tinico critério que poderia incenti-
var a introdugio das citncias sociais no currfeulo do ensino
de grau médio 6 0 que se basein nas necestidades impostas
pelos estudos universitérios. Asse eritério, todavia, nfio pode
produzir efeitos duradores seniio onde a complexidade da
réde do ensino superior secundada por uma certa conviccio,
garantida por opinides firmemente estabelecidas, de que a
aprendizagem das diversas matérias ou especializacdes do
ensino superior ofereee dificuldades compardveis. Foi ésse
critério que permitiu a inclusiio da sociologia no currfeulo
do colégio, transitdriamente, e a razdio apontada que favo-
receu, do ponto de vista pedagégico, a sua répida eliminagio,
0 argumento de que certas disciplinas complicam ainda mais
a vida escolar dos alunos possuia naturalmente uma eficitn-
cia muito redusida, em se tratando de um ensino enciclopé-
ico. Daf o restrito interdase que pode apresentar, no Brasil,
a questiio de se saber se 6 possfvel, mantendose o carter
propedéutico do ginésio e do colégio, entrosar org&nicamente
os ensinos de grau médio e de grau superior. Os critérios
fornecidos pela tradigio juridico-literéria ou pela nogio vil-
gar corrente de que 0s rudimentos de fisica, quimiea e bio-
logia capacitam os alunos para qualquer aprendizagem ulte-
rior no campo das “ciéncias” excluem tda possibilidade de
solo racional. Quando esta puder ser atingida, gracas
A transformagiio da mentalidade dominante uo trato dos pro-
Dlemas pedagégicos, entio ruird a propria concepgiio de
ensino secundério “aquisitivo” e “enciclopédico”, deixando
de existir as razdes que poderiam aconselhar a introdugio
das ciéncias sociais no eurriculo do ensino médio, com fun-
damento nas exigéneias do ensino superior.
Tsso nos leva a considerar a questo de outro Angulo.
‘Trata-se de saber se 0 sistema educacional brasileiro se ajus-
ta, estrutural ¢ funcionalmente, as condig6es de existéncia
social imperantes nos tipos de comunidades em que éle se
integra. A relativa preservagio da antiga mentalidade edu-cacional e da posigio tradicional do ensino de grau médio no
sistema escolar sugere, desde logo, que algo se manteve quase
inalterado nas relages das escolas secundérias e superiores
com as necessidades sociais que satisfazem. Em outras pala-
vras, a conservagio do cardter aquisitive, enciclopédico ©
propedéutico do ensino de grau médio se explica pela conser-
vacgho do caréter jurfdico-profissional do ensino superior.
A anfilise sociolégica demonstra que éste no se alterou subs-
tancialmente, quanto & sua significagdo e & sua fungi sociais.
Subsiste, sob o novo regime republicano, o velho ideal de
“homem culto”, que conferia aos diplomas de ensino supe-
rior uma qualificago honorifica ¢ dava. aos seus portadores
a regalia de exercerem as ocupagées consideradas nobilitan-
tea, De modo que as escolas superiores continuam a servir
como canais de ascencio social ou, quando menos, como sis-
tema de peneiramento, destinado a selecionar as personall-
dades aptas para a lideranca politica e administrative. Em
face das transformagées por que vem passando a sociedade
brasileira, de forma varifvel conforme as regi6es do pats,
podese afirmar que ésse 6 um fendmeno de demora cultural
¢ social. Procurase assegurar para o ensino superior uma
significagio e uma funcdo que éle tende a perder com rela-
ttiva celeridade, em particular nas zonas onde o desenvolvi-
mento urbano, comercial e industrial 6 mais intenso. Dentro
de certas condigées de estabilidade, o ensino superior podia
realmente conferir prest{gio de fundamento honorifico, operar
‘como meio de seleciio social dentro de certas camadas econd-
micamente privilegiadas e, mesmo, servir como instramento
de ascengfio social de personalidade cuja lealdade para com
a ordem social vigente podia ser conhecida e controlada.
Mas, quando esias condigées de estabilidade deixam de exis
tir, como passou a acontecer nos grandes micleos urbanos a
partir da segunda década deste século (através principal-
mente da chamada “democratizagtio do ensino”), 6 dbvio que
a preservacio de antigos critérios de avaliag#lo 86 pode nascer
de acomodag6es transitérias de interésses sociais ou de equi-
19. Cf. Fumxaxpo pe Amevapo, op. clt., esp. pigs. 875-376,
— 100 —
‘yocos produszidos pela forga. das tradigdes. Chega-se por essa
‘via a uma conclusio que tem qualquer coisa de paradoxal.
Em nome da tradiggo se mantém todo um sistema educacio-
nal arcaico, que est justamente produzindo efeitos que, cedo
ou tarde, acabardo de solapar a ordem social defendida pela
tradigéo.
© ‘nico argumento que permitiria justificer socioldgi-
camente o processo educativo desencadeado por ésse sistema
educacional 6 0 que dix respeito aos fins visudos. ‘De fato,
a selecio e a formagio de pessoal apto para o exerefeio de
atividades de lideranca polftico-administrativa e para o de
sempenho de profissdes como a de engenheiro, agrénomo,
professor, médico, advogado, nfio 6 de somenos importincia
para um pais como o Brasil. Contudo, mesmo que as ten-
déncias atuais de desenvolvimento do sistema educacional
brasileiro se ampliassem, de modo a incluir néle tddas as
possibilidades de adestramento profissional pela escola e @
satisfazer quaisquer exigencias de selecao recional de mao
de obra especializada ou técnica, ainda. se poleria dizer que
tal sistema nfo corresponderia ds necessidades gerais do
meio social ambiente. As condiges peculiares de formagio
a sociedade brasilira exigem muito mais do ensino, ste
niio poderé operar como “instramento consciente de progresso
social” enquanto nfo for organizado tendo em vista esas
condigées — seja para corrigir os seus efeitos negativos, seja
para alterélas em um sentido socialmente construtivo — e
as fungbes dinfmicas da escola, em qualquer dos seus niveis,
nas comunidades brasileiras rurais ou urbanas,
# neste plano que o tema da inclustio das ciéncias sociais
no curriculo do ensino médio precisa ser examinado, Exis-
sociedades civilisadas contempordneas, que reeomendam a in-
trodugtio das citncias sociais na escola secundéria. A peda-
gogia moderna nasceu sob a inspiragio, que nfio foi inven-
tada pelos sociélogos, de que é impossivel formar 0 homem
para viver nessas sociedades sem desenvolver adestramentos
complexos dentro de uma ampla drea dos conhecimentos
cientificos sdbre os méveis psleol6gicos ¢ sécio-culturais do
101 —comportamento humano, Para os especialistas brasiletros,
Porém, essas razdes de ordem geral possuem uma importdncia
secundiria, Elas correspondem a situagées e a processos
que se reproduzem na sociedade brasileira de forma mi
gada ou que se localizam, dentro dela, em determinadas
féreas sociais. O mesmo nio se pode dizer de situagies e
Processos inerentes & socledade brasileira, em seu estado
atual, os quais exigem, por outras razées que nfio aquelas,
um ensino eapaz de orientar dindmicamente 0 processo edu:
cativo, evidente, mesmo, que a educagiio nao poder4 preen-
cher idénticas fungGes construtivas senfio em pafses econd-
mica ¢ socialmente subdesenvolvidos. Em suma, nés conta-
mos com a oportunidade de utilizar certos conhecimentos
cientificos para a solugo de problemas que estiveram, em
outros paises mais adiantados, nas préprias raizes materiais
¢ morais:da constituigiio das ciéncias sociais.
No podemos discutir aqui nem as implicagées dessa
maneira de encarar o assunto, nem os dados empfricos em
que ela repousa. Por isso, escolhemos um pequeno exemplo,
que permitiré fustrar o alcance a solides da afirmacio.
B sabido que o processo de desenvolvimento da consciéncia
de afiliagio nacional e das obrigagdes politicas resultantes
tem sido prejudicado, no Brasil, pelas condigdes sociais em
‘que se processaram a desagregactio do regime servil, a instau-
ragio da democracia pelo regime republicano ¢ federativo,
a formagho das classes sociais a organizagiio dos partidos.
No decorrer de 65 anos de polftica republicana, as camadas
sociais que se achavam afastadas do exerefcio direto do poder
niio tiveram oportunidades para compreender que as ages
do Govérno interessam a todos os cidadiios, afetando-os dire-
tamente em seus interésses e seguranga ou indiretamente por
empenharem de um modo ou de outro o proprio futuro da
‘Nagfo, como uma comunidade politica. Isso ocorrea prin-
cipalmente porque na antiga ordem senhorial ¢ escravocrata
um amplo contingente da populactio nfo tinha, acesso direto
© responsével a papéis politicos socialmente autonomos &
Porque nenhuma instituigéo social (inclusive os partidos),
se incumbiu dos adestramentos politicos que se tornaram
—m—
necessérios para a coexisténcia dos “cidadios” em umn de-
mocracia. A ateng&o para o fendmeno s6 surgiu quando se
verificou que ésse estado de coisas comprametia 0 funcio-
namento do regime democrético e punha em risco o futuro
da Nagfo. As solugdes que se propuseram, entretanto, mesmo
por autores que possuiam conhecimento sociolégico e histé-
rico — como Alberto 'Térres e Oliveira Vianna — nfio situa-
ram devidamente a importincia que a escola assumia, por
imposigio mesma das circunstdncias hist6rico-sociais de for-
magio da sociedade brasileira. Embora a escola nfo esteja,
acima do entrechoque dos interésses econdmicos e das lutas
politicas, 6 claro que ela poderia ter desempeahado um papel
construtivo na formagio de. conseiéncia efvica dos cidadios,
contribuindo para criar uma éticn de responsabilidade e
uma atitude de autenomia critica em face do funcionamento
das instituigdes politicas ou das injungées personalistas dos
mandatérios do poder.
Para ésse fim, poderia concorrer todo o sistema educa-
cional brasileiro, A formaco da personalidade constitu um
processo que néio comeca na escola e que, portanto, nfo
encontra nela ‘um térmo certo. Da escola priméria 2 uni-
versidade @sse process se desenrola. em continnidade, so-
frendo aqui ¢ ali interrupodes de sentido ou alteragdes dos
contedidos das experiéneias, mas se subordinando & forma de
‘um crescimento orginico. Quanto a escola secundaria bra-
sileira, nfo 6 dificil perceberse qual seria a contribuigio
das ciéncias sociais para a formagio de atitudes cfvicas ¢
para a constituigio de uma consciéncia politica definida em
‘t6rno da compreenstio dos direitos ¢ dos deveres dos cidadios.
‘Em um pais diferenciado demogréfica, econdmica, cultural
e socialmente, um adestramento adequado, vivo e construfdo
através de experitncias concretas, sdbre as condig6es mate-
riais e morais de existéncia, constitai um meio por excelén-
cia de socializagio, A questio esté em nfo por os alunos
diante de “entidades”, de “idéias abstratax” ou do “homem
em gral’, O Brasil contém wm nfimero suticiente de popu-
lagdes para que o ensino possa progredir, gradualmente, dos
dados do senso comum para as nogies gerais e as constru-
ae‘gGes comparativas. Uma inovagiio com ésie aleance contri-
Buiria, por sua vex, para por um paradeiro & estranha ano-
malia que corr6i o ensino brasileiro, especialmente do giné-
sio para cima. Apesar de suas pretenses humanisticas, éle
nifo forma uma concepgfio cosmopolita do mundo, porque
the faltam os elementos s6lidos de cultura geral, que ela
pressupée. Apesar de ser o veiculo de transmissfio do pa-
triménio cultural nfo s6 de uma civilizagio, mas de um
ovo, no fortalece os sentimentos e as convicgées que resul-
tam da aceltagio plena de uma comunidade de interésses, de
idéias, de ideais de vida ¢ de valores existenciais de cariter
“nacional”. Isto porque, desde o passado colonial ¢ imperial,
© ensino humanistico sempre representou uma fonte de com-
plexos, de restentimentos e de atitudes de inseguranga dos
brasileiros em face das chamadas “nagées cultas”. fisse en-
sino elaborou e refinou “sentimentos coloniais”, favorecendo
a aceitagiio expontinea de eritérios de vida intelectual ¢ de
avaliagiio étnico-cultural que educavam os brasileiros a se
subordinarem aos centros culturais estrangeiros ou aos seus
representantes,
Duas conseqiiéncias decorrem dessa exposigio suméria.
Primeiro, a inclusfio da sociologia no curriculo da escola
secundéria brasileira 6 possivel. Mantendo-se as condigdes
atuais do sistema educacional brasileiro: com fundamento
nas exigencias da diversificagio do ensino superior. A cria-
gio de novas faculdades, em que o ensino de matérias como
a filosofia, a hist6ria, psicologia, a economia, a antropolo-
gia, a politica, a sociologia, ete, 6 feito regularmente, torna
essa necessidade real. Mas, isso seria pouco frutifero, tendo-
-se em vista os fins propriamente formativo da educagio
pelas citncias sociais. Ou, alterando-se as condigées atuais
do sistema educacional brasileiro, em sua estrutura, em sea
funcionamento e na mentalidade pedagégica dominante: com
fundamento na conveniéncia pritica de reforgar os processos
de socializacdo operantes na sociedade brasileira. Bsta seria
solugho ideal, tendo-se em vista que o ensino das cléncias
sociais na escola secundéria brasileira se justifica como um
fator consciente ou racional de progresso social. Segundo,
10 —
ee
*
na discussio dessa questo o sociélogos nfo podem se isentar
do exame aberto de outros temas, que seriam evitaveis em
uma consideragio geral do assunto. Entre ésses temas, dois
adquirem relévo expressive, De um lado, qualquer que seja
‘a Tazo que fundamente a incluso das ciéncias sociais no
curriculo do ensino de gran médio no Brasil, 6 impraticével
a preservactio de técnicas pedagégicas antiquadas, Em par-
ticular, conviria intervir, concomitantemente, nas condigées
que dio a ésse ensino um caréter “aquisitive”. De outro,
a idéia de introdusir inovagdes no curriculo da escola se-
cundéria brasileira ganha outra significagto, quando exami-
nada & luz da propria influéncia construtiva da edueagtio
pelas cidncias sociais em um pafs em formagio, como o
Brasil, Aos argumentos apresentados, seria possfvel acres-
centar que esse ensino possui um interesse pritico-especffico,
que hoje ainda nfo é evidente. % que éle poder4 contribuir
para preparar as geragées novas para manipular técnicas
racionais de tratamento dos problemas econdmicos, politicos,
administrativos ¢ sociais, a8 quais dentro de pouco tempo,
presumivelmente, terfio que ser exploradas em larga eseala
no pais,
Bugestées Préticas
A discussiio desenvolvida nfio tem por objeto impor certas
solugées ou um ponto de vista pessoal. Ao contrério, ela
nascen do desejo de procurar um debate mais profundo do
assunto, aproveitando a experiéncia dos demais especialis-
tas brasileitos. Por isso, seria possivel reunir suas conse-
qiténcias préticas em alguns t6picos, na forme de perguntas,
‘em que se deveria concentrar, no momento, a atengiio erf-
‘tica dos especialistas interessados ¢ a busca das solugdes
mais adequadas. Tsses t6picos podem ser reduzidos, con-
ceptualmente, ao seguint
1) Quais so as fungdes que o ensino da sociologia pode
preencher na formagio da personalidade e que randes,
de ordem geral aconselham a incluso da matéria,
no eurrfculo do ensino de grau médio?
105 —2)
3)
5)
8)
‘A. que concepg&o deveria se subordinar o ensino da
sociologia nos diversos graus de ensino, inclusive
no secundrio? A definigio clara da concepgio
apresenta a maior importincia te6riea e prética,
pois dela depende a relacio a ser estabelecida entre
ineios e fins na educagéio,
Porque se deve desejar a introducho da sociologia
no ensino secundério brasileiro: a) por causa das
exigtncias dos cursos universitérios, acessfvels atual-
mente, que pressupdem conhecimentos prévios da
matéria? b) porque 6 preciso criar condigées plis-
ticas de formagio da personalidade e de preparagio
para a vida na sociedade brasileira?
Quais so as fungdes que o ensino da sociologia estd.
em condigées de preencher atualmente na escola. se-
cundéria brasileira e, em particular, em que sen-
tide poderd contribuir para alterar o sistema edu-
cacional brasileiro, de modo a fazer com que a
educagio se torne um “instrumento consciente de
progresso social” nos diferentes meios sociais em
que se integra no Brasil?
Quais sfo as alteragses de ordem pedagégica, que
seriam aconselhéveis, tendo-se em vista as condigdes
de integracio estrutural e de fancionamento da es-
cola secundéria brasileira, para que o ensino da
nociologia possa preencher as funcSes assinaladas?
Quanto ao aleance das inovagées, com fundamento
sociolgico: a) o gindsio comportaria ou nfo uma
diseiplina com o nome de “Dlementos de Oiénci
Sociais”; onde deveria ser localizada tal disciplina;
qual seria seu contetido ideal?; b) 0 colégio
deveria voltar a possuir uma estrutura mais flexi-
vel, na qual se introduzisse, convenientemente, 0
ensino especial de matérias como a psicologia, a
economia ¢ a sociologia, ou seria aconselhAvel man-
ter uma disciplina unificada, como um curso mais
adiantado de “Citncias Sociais”?
— 106 —
DUAS BXPHRIGNCIAS NO ENSINO
DA SOCIOLOGIA
Onacy Nocumma
No curso de bacharelado da Escola de Sociologia e Polt-
tica de Sio Paulo, o ensino da Sociologia, como o das demais
disciplinas fundamentais, est, organizado numa “sequéncia”’
de programas que incluem o de “introdugio” © os de dife-
rentes setores de especializacdo do respectivo campo, sendo
cada programa ministrado no decorrer de um semestre leti-
‘yo, em duas aulas semanais. Os programas da “seqiiéncia”
estilo distributdos, sem simultaneidade, da primeira & quarta
série do bacharelado. Assim, a “seqtitncia” de Sociologia
compreende: Introdugtio & Sociologia, no primeiro ano; Orga-
nizagfio Social, no segundo; Desorganizagio Social, no ter-
ceiro; Comportamento Coletivo, no terceiro; Psicologia Social,
no quarto; e Pesquisas Sociolégicas no Brasil, igualmente
no quarto ano.
‘Desde antes de 1948, vimos dando, no curso de bacha-
relado, além do programa de “Métodos de Pesquisa Social”,
colocado fora da “seqiéncia” de Sociologia, ¢ de “Introdu-
gio” a esta disciplina. A partir de 1948, com 0 desdobra-
mento do programa de “Organizagio e Desorganizagio So-
cial”, que vinha sendo dado pelo Prof. Emilio Willems,
ficamos incumbidos da parte relativa “Desorganizagio
Social” hem como dos programas de “Comportamento Cole-
tivo” e “Pesquisas Sociolégicas no Brasil”, o {timo introdu-
ido em 1951.
© objetivo do presente trabalho 6 expor 0 que nos pa-
rece mais significative da experiéneia que vimos colhendo,
pela atividade didética, com referéncia aos programas de
“Desorganizagiio Social” ¢ “Pesquisas Sociolégicas no Brasil”.
— wt