EDITORA DA
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS.
UNICAMP,
Retor: Carlos Vost
Coordenador Geral da Universidade: Joe Martins Filho
Conselho. Edional: Ateio Pereira Chagas, Alfredo
“Miguel Ozorio de Almeida, Antonio Carlos Bannwart,
CCézar Francisco Ciacoo (Presidente), Eduardo Guiemaries,
Heermégencs de Freitas Leitio Filho, Jayme Antunes
Maciel ifoior, Luiz Cesar Marques Filho, Geraldo
Severo de Souza Avila
Diretor Executivo: Eduardo Guimaries
PAUL HENRY
AA FERRAMENTA IMPERFEITA
Lingua, Sujeito e Discurso
Com um posficio de
Oswald Ducrot
Traduséo:
Maria Fausta Pereira de CastroSUMARIO
PROLOGO,
A pressupos
configuragio epistémiea da fingiisties a.
1. SUIEITO NA LINGUISTICA. A PROPOSITO
DAPRESSUPOSIGAO sree an)
Introdugiio ~ Duas perspeetivas tedrieas, dias
‘concepgies da pressupasigio
Capitulo I-A pressuposigao na teoria da gramética ..
c
‘apitulo II - Da pressuposigao Kagiea ao ato de linguagem ..
Conelusio - Enunciado, ato de linguagem ¢ pressuposigio:
‘oavesso da conliguragio epistémica da linguistic 3I. SUJEITO, LINGUAGEM E SABER. EM TORNO
DA LINGUISTICA........
Capitulo I - A lingiéstica no campo e fora do campo
da complementaridade
© campo da complementaridade .
A “maquina logica’ ou 0"
mato combinatéri
0 “sujeito da ciéneia
O buqué invertido
© "sujeito da linguagem" e o “sujeito méltiplo"
Capituto 11-0 sujeito e o significante
Para concluir...
NOTA SOBRE A PRESSUPOSIGAO E 0 SENTIDO
LITERAL (Oswald Ducrot)
Bibliografia
11
113
8
120
20
136
155
193
203
239
PROLOGO
A PRESSUPOSIGAO_ EA CONFIGURACAO
EPISTEMICA DA LINGUISTICA
E na obra de Frege, em um artigo publicado na
Zeitschrift fiir Philosophie und philosophische — Kritik ©
consagrado a andlise das relagdes entre sentido e referéncia que
a nogdo de pressuposigéo viu-se investida de um valor, tanto
te6rico quanto conereto, que marca o comego da sua elaboragio. E
preciso contudo reconhecer, ainda que a ma
depois dos lingilistas que se
se habituado a referir-
introduzida apenas. lateralmente. Nel
Tinguagem ordindria sofre deste defeito de com cla podermos
formar expresses que, do ponto de vista da forma gramatical,
€ adequadas.p: um objeto,
a1 determin a, pois depende
Assim, por exemplo,
esse texto de Fr
parecem determina
Eenquanto, em eertos casos,
da verdade de uma proposig
© pais europeu que tem fromeiras comuns com outros
dez paises diferentes
ou, se preferirmos
uA segiténcia de mimeros reais que converge mais lenta-
mente
sdo expressdes que, para retomar os termos de Frege, parecem
designar um objeto quando, de fato, essas expresses nao
referencia. Ainda segundo Frege, isso deve-se ao fato das seguintes
proposigies
Um pais europew tem fromeiras comuns com dex
outros. paises. diferentes
Uma seqiténcia de mimeros reais converge mais
Jentamente que todas as outras seqiténcias de nimeros
serem falsas,
Considere-
agora a frase
© pais europeu que tem fronteiras comuns com nove
outros paises diferentes 6 a Alemanha Federal
1 propésito da proposigio
Um pais europeu tem fronteiras comuns com nove
outros paises. diferentes
que Frege introduz a expressi
geralmente por pressuposto. Se
contida na frase global, cla est
modo que em
verausgesetzt, que se traduz
indo ele, essa proposigo niio est
as pressuposta do mesmo
Kepler morreu_na miséria
2
€ pressuposto que o nome proprio Kepler designa alguma coisa,
mas isso ndo faz parte do "conteddo" desta frase. Essa aproximagio
centre nomes préprios ¢ expresses que, por sta forma gramatical,
parecem determinadas ¢ adequadas para designar um objeto, esté
fundada sobre 0 fato de os pressupostos serem comuns a uma
assergio © & assergio contraria (X ndo morrew na mixéria como
© pais europeu que tem fronteiras comuns com outros paises
nao é X). Parcecria, portanto, que os pressupostos eseapam
contra-assergio, o que evidentemente cria um problema 16
quando se tem em vista a questio d
Entretanto, o essencial nao esti
Frege estabelece uma distingio entre nomes proprios ¢ expresso
gramaticais que pressupostos. E que para os nom
proprios, a existéncia ou a ndo-existéncia de.uma referéneia repouss,
sobre 1 evidencia enquanto s fazem intervir wn
julgamento que no repousa necessariamente sobre a evidéncia,
como é 0 caso do exemplo acima das seqiincias de nimeros reais,
ai que Frege vé um defeiro da linguagem ordinaria: a existéncia
de expresses gramaticais que introduzem pressupostos. seria
responsivel pelo fato de se poder falar muito seriamente © muito
logicamente de coisas que nao existem no sentido forte mas apenas,
se 6 possivel dizer assim, verbalmente ou no pensamento,
Encontramos aqui o problema de fundo de que trata Frege:
trata-se de impedir a ilusio ou a ficgdo de intrometersse na
linguagem quando esta visa 0 conhecimento, a verdade. Antes de
Freze, os logicos tinham sobretudo insistido sobre as ambigiidades,
Tinguagem, Frege formula uma nova questio ao mostrar que
ss das questoes de re ,
uum mundo de fiegbes, dar aparéncia
que os objetos cxistem, quando cles nao existem,
Desde entio a nogo de pressuiposi¢io conhe:
avatares. Freqiientemente destacada do valor coneeitual que Ihe
, reeoberta por interpretagées espont ela
‘aparece hoje na lingilfstica © na teoria do discurso servindo
apenas, na maioria das vezes — pela oscilagao incessante do seu
a muitos
Bvalor conccitual nas suas interpretagdes esponténeas —, para tapar
bburacos, para ocultar as dificuldades tebricas e priticas encontradas
nnessas matérias. Ao mesmo tempo a questéo parece ter sido
deslocada; ela ndo trata mais das relagdes entre o conhecimento ©
a ilusio na linguagem, mas daquelas entre a semantica ¢ a sintaxe
na gramética, entre a lingua ¢ o discurso na linguagem. A questio
(0 pode, portanto, ser considerada como um sintoma
fundamentais com que a lingiifstica se depara hoje; problemas que
giram em torno de duas questoes-chaves: a semintica © a
ima Fazio suficiente para que os trabalhos
dos lingiistas sobre pressuposi¢ao meregam um exame aprofundado.
E a isso vem acrescentar-se tudo aquilo que decorre do lugar que
a lingiistica ocupa hoje com rela
questio de Frege permanece. A consolidagio das _posigoes
materialistas em epistemologia ¢ em hist6ria das ciéncias transforma
‘08 pontos de vista sobre 0 que Frege chamava ci
‘comecar pelo que concerne a propria lingiistica © &
seu objeto.
Ja em Saussure, pode-se reconhecer uma ambigtidad
esse respeito, Lé-se no Cours de linguistique générale que "é a
lingua que faz a unidade da linguagem’,’ que “a lingua é um todo
‘© um principio de classificagdo".’ Essa maneira de conceber a lingua
prende-se as preocupagbes epistemoligicas a que Saussure, para
instituir a ia, atribuiu, como Marx no seu
proprio dominio, tanta importincia, Mas, a0 lado disso, Ké-se no
Curso que a lingua € uma ins ouro depositado
pelt pritica da fala nos sujeitos pertencentes a uma mesma
comunidade, um sistema gramatical existindo virtualmente em cada
cérebro, ou mais exatamente nos eérebros de im conjunto de
individuos, j4 que a lingua nao esti completa
No Curso’ de lingdistica geral aparece assim 0 que deve ser
reeonhecido como uma contradigio no sentido materialista do
termo. Ainda que identifique social © essencial como sendo da
ordem da lingua, individual © acessério “ou mais exatamente
4
acidental’, como sendo da order
lingua nio € fungio do sujeito f
da fala, embora pense que “a
es,
principalmente a respeito da analogia. Lé-se efetivamente no Curso
que, embora sendo de ordem gramatical, “a analogia & de natureza
psicoldgica (..), ela supie a conseiéncia ea compreensdo de uma
relagio unindo as formas entre clas (..), a ctia
resultado sé pode pertencer primeiro & fala, ela 6 ob
sun sujeito isolado"
Em vez de ver af a necessidade de um casamento da
gramética © da psicologia (0 que queremos nos outorgar com o
desenvolvimento da psicolingiistica), observaremos apenas que com
0 sentido retorna o syjeito, 20 mesmo tempo que aflora uma
contradigio que Saussure articula com as oposigdes da lingua © da
fala, do coletivo c do individual, do social © do psicolégico, do
essencial e do accss6rio, do homogeneo ¢ do heterogéneo, do todo
unificado edo diverso etc... Trata-se, portanto, de uma contradicio
fundamental da qual pode-se dizer que cla faz parte integrante do
corte saussuriano, sancionando a posteriori 0 advento. da
cicntificidade na lingiistica. Como pano de fundo, © que
questio € a materialidade da lingua.’ Tem-se portanto tres
elementos articulados: o retorna ao sentido & ao sujeito © a questio
da materiatidade da lingua, Ai esté a forma especifica que toma
para a lingUfstica a contradigio entre objeto real © objeto de
conhecimento, inerente & construgio do objeto proprio de toda
ter um objeto’, diz Lacan!
psicanslise € uma ei
‘pode-se sustentar que uma cigncia € espeeificada
por um objeto definido, pelo menos por um certo nivel de operacio,
eprodutivel, que chamamos experiéncia. Mas devemos ser muito
prudentes porque esse objeto muda, ¢ singularmen
e, no curso dit
evolugio de uma cigncia®, O fato de que Lacan fale também da
lingua ¢ do sujeito di a essa referéncia todo sew alca istinto
do cuja apropriagio ele permite pela modalidade doconhecimento, 0 objeto de conhecimento tem com esse real uma
relagdo contradit6ria.* Isso nao quer dizer que esse objeto scja ideal
ce que scja proprio da sua natureza ideal ser contraditério com 0
real. Nao se trata de opor 0 mundo das idéias a0 mundo das coisas,
proclamando sua irredutibilidade. Isso seria equivalente a falar em
termos de inadequagio ¢ ndo de contradigao, Ver-se-é que é
a adequagio do objeto de conhecimento © do abjeto real. O objeto
de conhecimento € to material quanto o objeto real, mas cle ¢
to. Reconhecé-lo permite precisar em que
consiste a materialidade do objeto de conhecimento sem reduzi-lo
a um reflexo pensado do objeto real. © objeto de conhecimento €
objeto que muda, que tem uma histéria inscrita na hist6ria da
éncia da qual & objeto, na confrontagio de suas teorias, nas
priticas especificas que o caracterizam, assim como nas cond
iistoricas que produziram essa historia, essas confrontagdes, essa
pritica, Em vez de se perguntar se a lingua € uma instituigao social,
a realizacto de uma faculdade inata ou as duas coisas ao mesmo
tempo, € simultancamente a histéria da lingtistica, a confrontagio
de suas teorias, a pratica do lingiista sobre a linguagem na sta
especificidade que devem ser interrogadas quando se quer
aprender alguma coisa da materialidade da lingua enquanto objeto
de conhecimento. E desse ponto de vista que se revela contraditoria
a relagao entre objeto de conhecimento de lingua ¢ o real do qual
cesse objeto de conhecimento, através da especificagio dos conceitos
na teoria e da prética dos lingbistas sobre a lingwagem, permite uma
apropriagdo pela modalidade do conhecimento, A contradi
€ portanto essencial; ela nao faz parte da “ordem das coisas", mas
se inscreve no processo de produgo dos conhecimentos
quanto proceso hist6rico em que as ciénci sovinhas.
A forma historiea que € dada a contradigao objeto reab-objeto de
conhecimento a um certo momento, por exemplo no Cours de
linguistique générale, s6 se torna reconhecida como contradigio
a partir de um certo momento © em certas condigées que no
dependem apenas do que se passa na lingtistica mas também do
que ocorre fora da lingiistica. Dizer que a contradigio no é
16
imediatamente reconhecida no quer dizer contudo que ela nao
funcione como tal: ao longo das paginas que se seguem, sera
afirmado que, sob formas historieas varidveis que conservam stia
especificidade, uma contradigio especifica entre objeto real e objeto
de conhecimento & constitutiva do objeto proprio de toda ciéncia
cenquanto justamente esta tem um objeto proprio que a especi
Salvo na hipdtese do desaparecimento desse objeto ¢ portanto da
bsorgio da ciéncia em questio por outras ciént
ssibilidade que nio deve ser excluida e sobre a qual a
cigneias fornece exemplos —, nfo se trata de eliminar essa
contradiggo mas apcnas de reconhecer que praticar uma ciéncia é
sempre, em Giltima instancia, trabalhar sua contradigao espeetfica de
modo que o exame das diversas formas coneretas dessa contradigio
permita a depreensio de seus elementos. Sua articulagao constitu:
© que se convencionara chamar a configuragdo epistémica da
cigncia em questa,
Para limitarmo-nos a lingiifstica, naquilo que observamos
em Saussure, podemos distinguir dois elementos fundamentais. De
um lado um elemento que ndo & proprio da lingiistica, um
desdobramento da forma-sujeito” opondo individuo e comunidade
ou sociedade, isto €, sujeito individual e sujeito coletive. De
outro lado um elemento especifico, a relagao do sentido com a
marevialidade —fonica ou gréfiea da linguagem. Essex dois
elementos entram em jogo a partir do momento em que se Formula
materialidade da fingua, isto é, desde que se levanta a
questo da relagio entre objeto de conheeimento e objeto real na
lingistica.E claro, portant, que afatamos a ida segundo a qual
que especifi 1 existéneia de uma certa regio do
real com vocagio para tornar-se objeto priprio de uma ci
antes de qualquer investigagio cientifica. Entretanto, como cada unt
be, hi linguas: 0 francés, 0 polonés, o bambara, por exemplo, E.
como se diz um faro, um fato de experiéncia mesmo, Que as
linguas tenham existido antes de qualquer esboco da fingiistic
também um faro. Mas justamente os lingtistas sabem melhor do
que ninguém, mesmo se as veres ouvindo-os poder-se-ia pensar que
a questio d© esquecem, que o francés, como qualquer outra lingua, nao se
deixa pegar assim, que & primeiro uma diversidade tanto temporal
quanto espacial e que € preciso pelo menos um conceito de lingua,
€ nao apenas um conceito simplesmente, para poder pensar uma
unidade dessa diversidade.”” E o que jé argumentava Saussure ao
dizer que a linguagem é 0 diverso © que € preciso a lingua pi
fazer a unidade da linguagem, para construi-la,
Formulada de maneira mais geral, a questo agora € saber
se pode caracterizar_o real de que uma cigncia ¢ 0 objeto
jependentemente da ciéncia que permite precisamente conhecé-lo
Ou, mais exatamente, que tora possivel sta apropriagao pela
mmodalidade do conhecimento. Essa questio ndo & indépendente
daguilo que, alé 0 presente, permanece como um outro paradoxo,
saber: que a conte possa ser operante ainda que ela ado seja
observivel pontualmente como tal. De fato esse duplo
indica © lugar que ocupam as ideologias no processo de produgio
dos conhecimentos. Com efeito, dizer que se pode earacterizar 0
de que uma cigneia se apropria peli modalidade do
cimento supie que exista pelo menos uma outra forma de
apropriagio desse real. Evidentemente niio se trata de sustentar que,
cigncia pelo intermédio da qual ele se
ohjeto real de um objeto de conhecimento. Nesse sentido,
podie-se dizer que existiam linguas antes de qualquer lingbistica,
Uma coisa & reconhecer o primado do ser sobre 0 conhecimento,
conh
oulra & afirmar que, sem o saber, cada pessoa € um lingdiista e que
a pritica do Tingiista sobre a finguagem ¢ a sitematizagin “reflex
de prdticas “espontaneas’ de quem quer que fale uma Lingua, Ess;
6 mais uma maneira de contornar a contradigio objeto real-objeto
de conhecimento ou, mais exatamente, de produzir uma apropriagio
ignorando-a ao mesmo tempo. E exatamente 0 que se pode
observar com respeito Aiquilo que alguns lingdistas chamam de “a
inmigato lingdistica do sujeiwo falance'
io forjada para legilimar, no interior
da propria linggiistica, a pritica do lingbista sobre a linguagem
Limitando-nos. a Chomsky, essa nogdo intervém — lembremo-lo —
1s
em dois niveis,
pritico, trat
m um nivel pritico © um nivel tebrico. No nivel
inicialmente de poder decidir se tal ou tal forma,
de clementos tomados como fazendo parte da
lingua, em fungao de regra c c
gramatica, pertence ou nio a
conta de que, por exemplo:
0 cachorro ouve 0 tadrao
0 ladrao é ouvido pelo cachorro
0 cachorro owve 0 ladrdo entrar
sio frases do portugués enquanto
O ladrao entrar é owvide pelo cuchorro
io €. Se esta ou aquela forma pertence ou nio a lingua ¢ algo que
se considera como diretamente acessivel & intui¢ao lingtisti
Depoi ipenas depois, apela-se para a intuigao lingistica para,
por excmplo, dissociar as regras cuja aplicagio muda o sentido,
daqucla que ‘nvio © mudaria, para poder levantar as formas que
parceem ligadas por uma rckacio, incluida af a de sentido,
fazer com que essas formas sejam geradas por seqiiéneias de reer
que déem conta de sua diferenga © de st 0. A intuigio
lingiistica 6, portanto, ieiro momento,
constituir a lingua como um todo empirico (aquito que esti ou nao
cesta na lingua), Em um segundo momento, no interior do todo
empirico considerado como constituido de tal modo, opera-se uma
constantemente para eritérios
espécie de experimentagio que a
de sentido considerados
lingitistica. Bis 0 que diz respeito a intuigio Tingiistica no nivel
pritivo. No nivel te6rieo, d ssa intuigio um fundamento, que
€ a competéncia — lingiiistica. ‘Todo sujeito falando wma
detorminada lingua disporia dessa competGneia—cujos fundamentos,
seriam inatos — ainda que o que ele diga coneretamente afaste-se
mais ou menos do que ele mesmo reeonhece como farendo parte
da lingua “propriamente dita’
mo dirclamente acessiveis & intu
»Go nos deteremos
centre teoria © pritica, que o
primeira vista, quanto no fa
{que as priticas lingdisticas “espontiinea
into na circularidade das relagées
yelo & intuigao Tingiistica instaura a
fornecem, Estas, do ponto
de vista da tcoria em questdo, fornecem aqui ¢ ali formas que
pertencem ou no & lingua, assim concebida; © que importa nio &
tanto que essas formas existam ou no tu
4 julgamentos que se possam fazer sobre clas. O apelo a intuigio
lingiistica justfica portanto a consideragao das formas construfdas
a partir da tcoria e para fins te6ricos. O exemplo acima pode com
efeito servir para mostrar que uma transformagio (no caso a
ransformagio ativa-passiva) ndo pode ser uma operagio definida na
superficie som evar em conta a estrutura dos const da
Irase." Isso torna possivel uma experimentagio no sentido forte do
termo. Ao mesmo tempo, isso mostra que a prética que permite
construir elementos de uma gramitica, tal como a conccbe
Chomsky, nio opera fora da teoria, numa relagio especular com 0
real que ela apenas revelaria. Uma defasagem entre objeto teGrico
€ objeto real introduzida ¢ dela depende a existéncia de
verdadciras questées e, portanto, tamb \deiras respostas
Pode-se dizer pois que a nogio de intuigio lingiistica é aquilo que,
no quadro dessa teoria, dé corpo a configuracio epistémica da
Lingijstica da qual retomamos os elementos fundamentais:
desdobramento da forma-sujcito (com a oposigio competéncia-
diesempenho) © questio do sentido na sta relagio com a
materialidade fonica ou grifica da linguagem. Em outras palavras,
esa nogio representa na pritica do lingtista, no quadro dessa
(coria, uma apropriagio da contradigdo entre objeto real ¢ objeto
de conhecimento, mas trata-se de uma modalidade de apropriagio
tem por caracteristica descanhecer seu objeto (a contradigio)
0 por um outro. O apelo aos fatos pelo viés da intuigio
idade um apelo a cvidéncias e representagies
ia do sentido, evidéncia da individualidade: do
nit
lingiistica
ideolbgicas: evid
sujeito enquanto unidade de uma interioridade singular © de ste
universalidade.
20
a de que © que s¢ avangou sobre a lingiistica
1, chegamos a conclusio’ de que, na pratica
cientifica, a apropriagao da relagio entre objeto real e objeto de
conhccimento apela necessariamente para as formagies ideologicas,
variaveis segundo as teorias, pelas quais se raliza coneretamente
apropriagio. Por que neeessariamente uma (algumas)
que podemos agora
procurar aprofundar antes de abordar a especificidade das,
formagées ideoligieas. Dissemos apropriagdo de uma
A resposta & questéo que acaba de ser ievantada
ss de tudo do que se entende por conmradigito © em
a do que se entende por apropriagia. A contradigao aqui
la nao é uma contradigao pontual, como a contradigio no
s ico. J4 insistimos sobre esse ponte, A categoria de
contradigZo que permite pensar a relagio entre objeto real e objeto
de conhecimento no processo de produgio dos conkecimentos 6 a
aque foi claborada por Marx. Assim, a contradigio que desenvolve
© antagonismo de classe $6 6 contradicio do ponto de vista da Tuta
de classes, isto 6, da historia no sentida do materialismo histérico.
Precisemos mais ainda, De uma eerta mancira, a contradigio &
estabelevida pelas relagdes de produ
constitutivas da divisio de classes;
io © de reproducio
as classes néio preexistem is
as, de modo que nao hi primeiro a contradigio ¢
depois seu desenvolvimento, a contradigio & 0 proprio
desenvolvimento, Ela esta presente desde sempre e sé 6 suplantada
por uma transformagao revoluciondria das relagdes de produgiio, Do
mesmo modo dizse que a contradigio objeto real-objeto de
10. em uma cigneia no é pontual, que
Jo ao futuro de uma ciéneia reinscrita no processo de
produgio do conhecimento, Localmente, cla s6 se manifesta sob a
forma de dificuldades tedricas e priticas encontradas no exereicio
de uma cigneia, pontos de fuga como a questio da cnunciagiio, a
dos universais ou a do sentido na lingiistia.
Que sentido pode-se dar, nessas condigées, & afirmagio
segundo a qual uma formagio ideolégiea é susectivel de realizar em
uma prética uma apropriagio de uma contradigio?® A primeiea
rel
21vista isso dé a entender que se pode pensar essa contradigio na
erioridade, a do sujito, suscotivel de reunir u0
seu desenvolvimento os dois termos. Retomemos a contradigio de
isse que se descnvolve no antagonismo de classe. Afirmar que
it contradigo esi sob a jurisdigio da categoria de. sujeito
enquanto unidade de uma interioridade seria 0 mesmo que dizer
mnultan
que esse sujcito pode est
classes antagonistas, que ele & portanto a detern
relagies de producio c de reprodugio, que ele ocuparia a po
de um sujeito da hist6ria, Ora, © que Marx afirma, contra Hegel,
aproveitando as ligées do materialismo, ¢ que a contradigio de
classe sé pode ser eoncebida como objeto de um sujeito, que, de
quaquer modo, ‘sujeito da historia’, que a histéria do ponto
de vista mate 1m “processo sem Sujeito nem Fim(s)™."" No
que diz respeito wo processo. de produgio dos. conhecimentos,
depreende-se uma conelusio semelhante da leitura da Science de
la logique (Ci Logica) de Heye! por Lenine.Dado 0 que
foi visto a respeito da materialidade do objeto de conhecimento
da relagio objeto de conhecimento-objeto real, deve-se dizer que a
contradigio objeto real-objeto de conhecimento nao € o objeto de
uum sujeito capaz de verifiear a conformidade do objeto de
conhecimento com 0 objeto real, Assim como nao hi sujeito da
historia, nao ha sujeito do proceso de produgéo do conhecimento
fou sujeito da Ciéneia, Ocorre que, do ponto de vista do
‘materialismo hist6rico, 0 proceso de produgio do conhecimento,
tenquanto processo histérico, realiza-se concretamente sob formas,
hiscéricas variadas — ver mais adiante — , nas priticas, sociais,
principalmente no que chamamos a pritica cientifiea,
egar que a pritica cientifica através da qual se realiza
concretamente © processo de produgio do conhecimento nie seja
qualquer tipo de prética social, Quando se quer manter de mancir
conseqtivnte «ts posigées materialistas contra © subjetivismo © 0
idcalismo, € preciso estar alerta para no se inverter a ordem das
‘questdes. E preciso sobrctudo evitar a armadilha que consistiria em
dizer que a prética civntifica é antes de tudo, simplesmente uma
ade propria enquanto pritica, talver
pritica, tendo sua especili
tiniea prética tendo uma tal especificidade — alguns diriam uma
pravis. —e que 6 secundariamente uma pr
entifiea 6 primeiro, como toda pritic
secundariamente & uma pritica especilica, Ora, como em toda
1 social, os individuos humanos coneretos que, se no sio os
tos, so pelo menos os agentes, “agem na e sob a determinagio
das formas de existéncia historiea das relagGes sociais de produ
© reprodugio (proceso de trabalho, divisio © organizagio do
trabalho, processo de producao € reprodugio, luta de classes
cle) Dizer que esses agentes agem na e sob a determinagio das
Formas hist6ricas de existéncia é dizer que eles so constitufdos em
sujeitos nas praticas sociais & por elas. No que concerne ao
do processo de produgio de conhecimentos, eles se constituem ma
prética cientifica e por essa pritica como sujeitos, ciemtistas,
pesquisadores, pensadores, «
Ora, precis
social. A praia
uma pritiea social,
agentes,
que constituem
ha
Pode-se agora compreender
apropriagiio de uma contradi¢ao, que como tal escap
de sujeito, possa realizar-se concretamente em uma pritiea, © (b)
que, quando direta ou indiretamente levanta-se a questo da re
entre objeto de conhecimento © objeto real em uma
encontra-se necessariamente, de um modo ou de outro, a categoria
de sujeito, © que no inicio nao passava de uma const.
na Ieitura de Saussure © no exame do papel da nogio da intui
lingiistica na pratica do lingiista ligada a certas teoria
recebcu um comeco de explicacio teGriea, Aqui depr
definigio posiriva’ da Idcotogia, definigio que suspende to
coneepgio desta como um erro, magoria ete... alguma
coisa de puramente ideal, sem rekigio com a realidade: ela aparece
como um dos clementos necessirins av proceso de producio de
conhecimento. Além do mais, se se aumite que praticar uma cigncia
ibalhar sua contradigio espeeffica, a Kdcologia & nesse processo
emento primordial.Ocorre que, apesar de real ¢ efetiva — 0 que nos remete
ropriagio objeto real-objeto de
perde, retomando 0 termo
para a questo da adequagio—,
‘conhecimento na pritica de uma ciénc
de Althusser, seu objeto (a contradi¢do), substituindo-o por um
outro, como a gio lingtistica ‘ou 0 funcionamento
ico da linguagem. E necessério portanto precisar 0
uma formagio ideotogica tem um
objeto que Por exemplo, a ideologia da transparéncia
da linguagem ou a idcologia da individualidade do processo de
pensamento. 0 objeto de uma formagao ideoligica é real no sentido
em que Saiil Karsz, em um exemplo particularmente notivel, diz
que Deus 6 real.” Em um segundo nivel aparece uma diferenga
fundamental entre cigncias ¢ formagées ideolbgicas: ndo hd, para
una formacde ideoldgiea, 0 equivalente a contradigito objeto
real-objeto de conhecimento._ Isso se deve ao fato de 0 objeto de
uma formagao ideol6gica que intervém no proceso de produgio de
conhecimentos — limito-me a esse aspecto — representar para os
agentes da pritica cientifica, constituldes como sujeites dessa
pritica, a contradigio objeto real-objeto de conhecimento sob suas
diferentes formas. Contradigao que escapa & categoria de sujcito.
Ora, © nfo se pode derrapar nesse ponto delicado, nio hi
iniciamente a contradigio € depois sua representagio — a
contradigio s6 existe na medida em que hé uma pritica cientifica
‘que a desenvolve —, donde agentes dessa pritica constituidos como
sujeitos nessa prética por essa mesma representagio. Nessas
condigies, falar da adequagio do objeto de uma formagi
idolégica no tem sentido, a questo da adequi
8 propésto da relagio entre objeto de conhecinento e objeto real
ncias. & ainda preciso especificar que essa questio da
adequagio nao pode ser fevantada em referéneia as estruturas de
lum “sujeito” que a refletiria de um modo Kantiano, ela stem
sentido enquanto referéneia & pritica’ cientifiea © a0
desenvolvimento das cigncias, lembrando-se que as formagées
idcolbgicas coneretas que realizam a apropriagio da contra
objeto real-objeto de conhecimento fazem parte das condigives
24
hist6ricas precisas nas quais essa pritica ¢ esse desenvolvimento
podem ocorrer. Em resumo, a questéo da adequacao s6 pode ser
convenientemente configurada se destacada das condigies histGricas
que a determinam Seno recai-se sobre a famosa questio. da
verdade absoluta, questo que substitui a da adequagio na filosofia,
idcalista. Como mostrou Lecourt para a dupla tese do reflexo,"* hé
uma ordem das questdes que deve ser respeitada: a relagio entre
abjeto real ¢ objeto de conhecimento no proceso de produgao dos
conhecimentos cientificos é uma relagao da adequagao-contradi
mas a contradigéo é primeira na medida em que ela é constituiiva
do objeto proprio de uma ciéncia, a adequagao esta em segundo
lugar e é historica
Isso nos leva a precisar a natureza das formagdes
idcoldgicas cujo lugar no proceso de produgio dos conhecimentos
foi posto em evidéncia, Digamos para comegar que nio ha
neeessariamente, em toda formagio social, produgio de
conhccimentos cientificos. Nao se trata aqui de trazer nossa
contribuigao para as discussdes sobre a origem da “ciéneia moderna”
(na Grécia antiga, ou com Galileu, ou com Descartes etc.).
Queremos apenas dizer que o process de produgéo do
conhecimento & suscetivel de tomar ¢ tomou formas histéricas
diversas. Tudo 0 que se pode dizer € que o proceso implica uma
certa divisio que decorre da contradi¢io objeto real-objeto de
conhecimento, a qual funda igualmente, sem que possa ver af um
Fetorno & concepeao continuista do desenvol
autonomia relativa do proceso de produ
Pode-se evidentemente colocar de um lado dessa divi
dlo outro ideologia com a condigéo de reconhecer-se que os dois
elementos desse par sio suscetiveis de variagdo simultinea. Nao
basta dizer que as ciéncias antigas ndo sio exatamente as
modernas ainda que ja scjam ci¢ncias (a geometria de Thales, por
cxemplo), pois isso seria ao mesmo tempo colocar-se na posigio de
precisar partir em busca da esséncia dessa ci lade. O que
importa é a condigio de possibilidade da divisio; o que deve ser
evado em conta é 0 par ciéncias-ideologias no processo de
produgio de conhecimento € nao apenas um dos dois termos. A
25divisio, o par, realizando-se coneretamente de manciras dif
de acordo com o modo de produgio, enquanto sistema con:
das relagdes de produgio € das forgas produtivas, que domina a
formagio social
S6 posso fornecer indicagdes globais © parciais ps
centrever aquilo que torna historicamente possivel a divisio
produgio material ¢ aprop priticas de contradiedes entre
objetos de conhecimento ¢ objetos reais. Sabe-se que mas socicdades
feudais « pratica cientifica foi essencialmente iniciada c controlada
pela Igreja. Sabe-se igualmente que nas sociedades capitalistas 0
desenvolvimento das. cid estreitamente ligado ao da
escolarizacio © as formas especii tomaram, Essa €
io, Para algm dessa constatagao diremos que esse
vinculo traduz 0 fato de que, nas formagbes sociais feudais como
nas formagécs sociais capitalistas, tenha existido ou exista, nas
superestruturas idcoldgicas, um aparelho ideol6gico de Estado cujo
lugar particular entre os outros aparelhos ideologicos da
superestrutura esta na origem da formagio ¢ da reprodugio de uma
distingo entre © que se convencionou chamar de as ideolagias
tedricas © as ideologiaspriticas. Trata-se ainda af de um par ou
mais exatamente de um tipé ciéncias, ideologias —priticas,
ideologias teéricas, eujos txés elementos devem ser considerados
ha sua Examinar como
modificada na passagem do modo de produgao feudal para 0 modo
de produgao capitalista, esse seria o abjeto de um estudo especifico,
‘nos-cmos aqui, neste momento, em observar que essa
dio, que define os trés termos, é determinada pelo modo de
produgio; de maneica mai ica, cla esta ligada A forma
subseqiiente do proceso de trabalho, da divisdo e da organizagio
do trabalho (sobretudo representada pela oposi¢io entre trabalho
manual e trabalho intelectual), da qualificagdo da forga do trabalho,
da inter das cigncias no processo de produgio econdmica e
na luta ideoldgica de classe (essa lista nao é limitativa)
Sustentaremos que os tres elementos do trips, ideologies
priticas, ideologias tedricas, ciéncias, no podem cxistir
26
separadamente de tal modo que nao poderia haver, se essa posigao
€ correta, producio-reprodugio de conhecimentos cientificos se as
3 de uma distingdo entre
cdo mais propor uma primeira formulagao das posigdes tedricas
que deveriam ser sustentadas a propésito das relagdes entre ciéncias
c ideologias no processo de producio dos conhecimentos. E possivel
formular duas proposigées a esse respeito:
(1) As formagoes ideoldgicas pelas quais se realiza’ a
apropriagdo da contradigdo objeto real-objeto de co-
nhecimento na prética cientifica resuliam de ideolo-
gias tedricas.
(2) As ideologias tebricas estdo ligadas ao que Louis
Althusser chama de 0 Aparelho Ideolégico do Estado
dominante,® a saber, nas formagdes ——_sociais
capitalista, ao A.I.E. escolar (Aparelho Ideolégico do
Estado es-colar).
A cessas duas proposigées acrescentarfamos uma terceira, proposta
por Dominique Lecourt.
(3) As ideologias priticas imprimem sua forma e seus
limites as ideologias tedricas.
Essas formulagées exigiriam especificagoes, particularmente.
para articulé-las com a distingdo idcologias proletarias-ideologias,
burguesas (ou ideologias da classe dominante-ideologias da classe
dominada). Elas constituem apenas um ponto de partida que vai nos
permitir reformular a questio das relagdes entre linguagem e
conhecimento de onde partimos.
Voltemos pelo caminho até agora percorrido. Partimos da
questio da pressuposigio enquanto reveladora das dificuldades
te6ricas e praticas com que se depara hoje a lingiistica. Para além
dessas dificuldades, essa questdo nos interessa na medida em que
2condensa duas outras questées: (a) a questio da rel
objeto real ¢ objeto de conhecimento (no exeretcio de uma cigncia
particular, a lingiistica) e (b) a questéo das-modalidades
intervengio da linguagem no processo de produgao-reprodugio de
nheeimentos (reformulagio da questio de Frege).
9 entre
ragio absolutamente
que ela recobre, uma
Essa _condensagio € uma confi
F, proporcional ao peso
singu
pode ser abordada, de um ponto de vista cientifico, negligenciando-
se a lingiistica, enquanto, inversamente, a questao (b) faz. parte da
‘questi (a) pelo proprio fato da existéneia da questo (b). E nesse
aspecto que 0 problema da pressupasigio nos interessa e af esti a
» de a primeira parte deste trabalho ser consagrada a uma
controntagio dos trabalhos lingiifsticos sobre
se deve esperar, contudo, encontrar nesta primeira parte do (raba
uma nova teoria (lingiistica ou outra) da pressuposi
confrontagio dos trabalhos em questi conduz sobretude a uma
desconstrugio da nogio de pressuposigio, desconstrugio que
permite confirmar 0 que f alo a propdsito dos elementos da
conliguraga ica da lingiistica (desdobramento da forma
sujeito ¢ questio do sentido na sua relagio com a materialidade
‘a ou grafica da linguagem) © precisar 0 funcionamento © a
articulagio, Um trabalho como este inscreve-se necessariamente
dentro de permite que se atinjam, como tais,
as questics do sujeito © do sentido que, entretanto, a lingiistica
formula de um certo modo, a0 mesmo tempo em que sempre as
ié resolvidas. As mesmas observagdes aplicam-se ao trabalho
c ito em que ele recorre & na questo
Poder-se-ia portanto concluir que
‘0 que nos falta é uma “teoria do sentido" e uma “teoria do sujeito’.
‘Aqui a resposta nao tarda. Ela ¢ formulada da mancira r
por Louis Althusser "como todas ase s, inelusive aqu
» que uma palavra designe uma coisa ow
significagio, inclusive as evidéncias da (ran
cessa evidéncia de que voc’ ¢ eu somos sujeitos — ¢ que isso
28
constitui um problema — é um efeito ideol6gico, o efeito ideoligico
elomentar" (Ideologia e aparethos idealdgicos de Estado, p.30).
E Lio impossivel ter uma “teoria do sentido" ou "teoria do
sujeito” quanto esses objetos so cat
ideologicas ¢ nfo objetos de conhec impasse parece
portanto total, De fato, cle indica somente que a lingiéstica Levanta
um certo niimero de” qu com uma acuidade qu
encontra em nenhuma outra ¢ a nos pie na obrigaga
priticos. Essas questdes podem
pendentes na andlise das relagdes entre
esbogada acima. A q
ideoligico, Sabe-se que essa nio é a palavra nem tampouco o que
Foucault chama de "acontecimento discursive" Seria efetivamente
iguagem ou do discurso que tem como
questies sobre a produgio, reprodugio
© apropriagio materiais desses objetos cuja pertinéncia, entretanto,
nao se pode negar. Enquanto no fornecermos respostas a essas
questées ndo poderemos controlar o retorno sob diversas formas,
mm -domindncias empiristas ou idcalistas, da ideotogia da
a da linguagem na pratica da lingiiistica. Essa ideologia,
confusio entre objeto de conhecimento c objeto real,
assegura, na lingiistica, o liame entre as questies do sujeito © do
sentido sob formas tais que esti sempre delas se separando para a
elas voltar sem cessar. De um certo modo podemos dizer portanto
que se trata de assegurar 0 dominio daquilo que torna possivel a
apropriagio da contradicio objeto real-objto de con
transparé
enraizada
alirmamos que dispomos hoje de elementos, com a
procurarmos por eles li onde esto, a saber, de um lado nas teorias
das idcologias enquanto regio do materialismo histérico ¢, de outro
do, na psicandlise.
»elaborar 0 conceito de inconsciente, Lacan soube
Lirar as conseqiiéncias do fato de Freud, desde a ciéneia dos sonhos,
(er sido levado a fazer hipoteses sobre a linguagem que rompessem
com a ideologia da sua transparéncia, Essa ruptura com a
twansparéneia da linguagem € uma conseqiiéncia neces
problematica da psicandlise, Com efcito, embora a psi
seja nem uma ‘teoria do sujeito", nem uma “woria
c Finguagem’, mas uma ciéncia especificada pelo seu
lacanianas: "o inconseiente & um conccito forjado no rastro daquilo
que opera na eonsttuigao do sujeito" ¢“o inconsciemte € estruturado
um efeito. Mais precisamente, o sujeito que constitui sua mat
prima é efeito da linguagem. & finalmente essa posiga
definir 0 sujeito como efeito exclui tomé-lo como centro, fonte,
unidade de uma interioridade etc... Contudo, um problema
permanece, que 6 0 de saber se levantando essa €
tem que consistem exatamente, a linguagem nao é objeto de ci¢ncia
alguma, De uma certa m pode-se dizer que a linguagem
desempenha ise, um papel at
sentido com relagio & linghistica, Donde formu!
naiureza forncce, para ser explicito, significantes c esses significantes
organizam de modo inaugural as relagées humanas, fornecem as
cestruturas ¢ modelam-nas". Nao se deve superestimar a inci
de uma tal formula mas ess: ia de naturalidade do siguificante
cria realmente um problema, Na segunda parte deste livro, mostr
se como sc pode tirar partido da teoria das relagdes entre
significantes ¢ constituicdo do sujeito, principalmente no que diz
respeito aos processos de apropriagio e assujcitamento. Mostra
que, apesar desses elementos, cla deixa pendente a questio da
com relagio & ps
30
materialidade dos objetos de conhecimento ¢ dos objetos
ideologicos. Essa reserva instaura, como campo de questdes, as
laces entre idcologia ¢ efeito sujcito, especialmente a propésito
0 com a dicotomia
ica & também
ia na segunda parte deste livro, com aqucla dos aspectos d
ao do regime de materialidade que concerne is relagses entre
lingua, ciéncias ¢ ideologias. Reafirmando que a lingua ndo ¢ a
idcologia nem 0 formalismo, a ciéncia deli
eonecito que permite pensar essas relagies. A partir de
Pécheux,” decidimos designar esse conceito recorrendo ao termo
de discurso.
do desdobramento da forma
ideologia pratica/ideologi
abord:
31NOTAS
* Ferdinand de Saussure, Cours de linguisique générale, p. 25
* tia, p. 31.
5 ia, p26.
“A lingua no € menos que a fala um objeto de natureza cone
uma grande vantagem pars o estado. Of signos lingifticos, por serem
essencialmente psiquios, ndo So abstragdes, as associagdes ratfiadas pelo
consentimento eoletivo, evjo conjunto constitu a lingua, sto realidades que
Seu lugar no cérebro” Saussure, CLG, p 32
7 4. Lacan, "Os quateo eonceitos fundamentais da psieandlise”.p. 13.
* Sobre a distingio objeto real-objeto de conhecimento, ver L. Althusser, Lire
Je Capital, I, pp. 46D.
"Todo sujeito humano, ito & socal, s6 pode ser agente de uma pritica se ele
‘este forma de sujcito. A forma-sujet é com feito a forma de existénciahist6rica
de tovlo individvo agente das priticas socks pois as relagdes de produgio © de
reproducio compreendem necessariamente, como parte integrante, 0 que Lenine
cchama de as relagdes sociais Guridico) ideolbgias:* L. Althusser, “Remarques sur
tune catégorie: procs sans sujet ni fins)", pT
2 Ainda que nio se trate de uma obra de lingiista, o trabalho de R.Balibar e
. Laporte sobre a formagio de vm francés lingua nacional (R. Balibar © D.
Laporte, Le francais national) mostra que a questo de saber 0 que € 0 francés ow
mesmo do francés no € assim tio simples como parece, Os problemas posts pelas
classifieagdes em patos, dialetos, ioletos et, propria emergéacia da nocdo de
idioleto enquanta "lingua individual” conirmam que passada a evidéncia de que 0
francés existe, que nasceu Ja unio Jo gaulds ¢ do latim, mais diversos outros
clomentos, que no € a mesma "coisa" que o alemdo, © poionés ow © bambara,
delimitagio dos contornas desse objeto nio & uma’ coisa simples. Ver-se-d em
Sseguida que o conecito de auronomua relauwva da lingua permite transformar, de
certo modo, 6s pontos de visa sobre essa questo.
Observemos que uma graméticagerativa deveria também dar conta das Frases
‘malformadas enquanto resullada dos erros na aplicacio das rgras de lormagio, Em
lum certo sentide, o campo de aplicagio de uma gramética gerativa ullrapassa 0
{quadro do todo da lingua para, em principio, estender-se a0 todo dos envnciados
Possiveis bem ov malformados. Ai esté um fndice do poder do conceito de gramstien
ferativa com relagdo a qualquer forma de andlise distrib ional. Em contrapartida,
{2 questao de saber se 0 todo dos enunciados possveis & definivel de outro modo
3além daquele puramente formal permanece inteira (sobre esse ponte ver J-Cl
Milner, Rcofes de Cambridge et de Pensyvunie: dus théores de fa transformation).
vortante para nds aut €salientar que o apelo 8 intuig fingustica aa tors
amticas geraivas garantiu empiticamente & existencia de uina linha de
emaragi sem’ a qual © projeto de uma cela grants sen simplemente
Noam Chomsky © George A. Miller, Ltanayseformelte des langues natreles,
p.,
A questio de saber se toda formagio ideoligica € apropriagio de uma
contradigho € no momento deisada de lado.
"= L. Althusser, “Remarques sur une catégore: procs sans sujet mi fins)" © D.
Lecourt, Une ens er som en,
D, Lecour, op. cit.
1. Althusser, "Remanues sur une eatégorie: procs sans suet niin)" p70.
7 »NGo saberiamos sustentar sobre 0s objeto reais deus, religido um diseurs0
que enunciaria eieatiieamente aquilo mesmo que oulsos discersos ehunciam
{ologicamente. Deus existe, podemos encontrite a partir de objelos tricos tats
como a computsio 4 repetigio, a religio enquanto apacetho bleoligico do Estado,
4 anilise cientifiea “da problematiea propria aos. discursos.teologicos. EE
Dreeisamente a parti da analisecietiica da eligi, da divindade ete. que aerites
materalista pode estapae dos dilemas-armadilha fidefsmo-atesmo, religioso-laio,
Ditemas-armadiha, pois os dois termas de cid par si0 igualmente relgiosos,
respectivamente postivo-neyativo.S. Kars, Tagore et pote: Louis Aldus,
s
'§ Dominique Lecout, Une ers et som enje «essai sur fa poston de Lénine en
phitosopie
" Louis Althusser, ldcologia © aparcths ideoligicos de Estado,
® D, Lecourt, “Sur Parchéologie du savoir,
* Michel Foucault, Lurchéologie du savoir. Ver também a erica dessa angio
‘em D. Leeourt, op
® 4. Lacan, XI, p23.
® Pécheus, Les whit de La Patice
O SUJEITO NA LINGUISTICA
APROPOS
SITO DA PRESSUPOSICAOINTRODUGAO
DUAS PERSPECTIVAS TEORICAS
DUAS CONCEPCOES DA PRESSUPOSICAO
Mesmo reconhecendo que eles ndo conhecem bem st
natureza,! so sobretudo os lingiiistas que hoje se interessam pel
pressuposi¢ao, Partiremos dessa atualidade da pressuposigio. A
nogio da pressuposigdo é itil aos lingiiistas por varias razies
veremos como, depois de ter indicado o contexto em que isso se di
Do ponto de vista lingiistico, a pressuposigao esti estreitamente
ligada a teoria da gramatica. Enquanto durante um longo periodo
a fonologia ocupou o primeiro plano da cena, a teoria da gramética
tornou-se a questo central em lingtifstica. Para explicar essa
mudanca de perspectiva, apelou-se freqientemente para a idéia de
uma hierarquia de complexidade crescente das estruturas
linguisticas, indo da fonologia 4 semAntica, Em primeiro lugar os
lingiistas ter-se-iam ocupado com toda naturalidade dos aspectos
mais simples da lingua e, quando 0 conhecimento destes foi
considerado razoavelmente estabelecido, ter-se-ia passado
antes de abordar a seméntica. Na realidade, por tras dessa i
uma hierarguia de estruturas da lingua hé outra coisa além da
37explicagdo da importincia tomada atualmente pela teoria da
gramatica, Hé toda uma concepgio de lingua, estrutura complexa
cujos elementos de base, as "unidades minimas’, seriam os fonemas
(ou 0s tragos distintivos de fonemas como o trago sonoro/surdo que.
opée em francés b e p por exemplo), dos quais os outros niveis de.
estruturas derivariam por combinagdes: as palavras so combinag
de fonemas, as frases combinagées de palavras ete.
a isso, como em Jakobson, a idéia de uma
liberdade daqueles que usam a lingua: suas possibil
seriam quase nulas no nivel fonol6gico, mais importantes no nivel
sintatico © predominantes no seméntico, Encontra-se
redesenhado o lugar da subjetividade vos falantes na lingua, Nao se
trata de negar que as escolhas em questéo possam ser
eventualmente determinadas, por outro lado, pelas crengas,
conhecimentos que cada um divide ou no
a ordem da linguagem parece depender, pelo menos em
um certo nivel, daqueles que a empre;
Ver-se-< mais adiante como, com a nogio de pressuposigio,
encontrase uma referéncia semelhante a crengas,
conviegdes, conhecimentos ete..2 E pre aqui
uma primeira bifureagio possivel easo se permanega no quadro de
uma concepedo de lingua que deriva da que acabamos de evocar,
isto 6, se ficamos no quadro do estruturatismo, ou que dele nos
afastemos. Em outros termos, & preciso distinguir duas correntes,
nos trabalhos lingiiisticos sobre a pressuposicio, Em primeiro lugar
uma corrente estruturali mente representada por Ducrot
em segundo lugar uma corrente transformacionalista o
Harris € Chomsky. As duas correntes distinguem-se pelo lugar
atribuido a teoria da gramética, pois a importincia predominante
(que the foi atribuida traduziu-se em uma reviravolta na concepgio
de lingua enquanto hicrarquia das estruturas articuladas. A partir de
Chomsky a gramatica engloba tudo, a fonotogia, a sintaxe © a
semintica, no se fala mais das estruturas da lingua mas dos
componentes da gramética (componentes fonoligicos, sintiticos ©
seminticos). Além do mais, ¢ esta é uma mudanga fundamental, 0
componente de base passa a ser a sintaxc, os componi
38
fonoligicas e semanticos, pelo menos numa primeira concepeao da
gramética, s6 fornccem interpretagSes do que ja foi definido no
nivel sintatico. Ha af uma ruptura que, entre outras coisas, torna
caduca a idéia de uma escala ascendente da liberdade do locutor no
uso da lingua, liberdade em que se alojaria sua subjetividade,
através do que passariam suas opinides, suas erengas, suas
es proprias ete... Nesse sentido, esse projeto de un
da gramatica retoma ¢ prolonga a tradigdo saussuriana na
uma recusa (parcial)® da subjetividade, como modo de
10 dos “fatos da linguas'. De acordo com a formula de
prépria linguagem que € criadora e no o sujeito que
portanto também a concepeao da lingua como
ferramenta ou instrumento que se acha afastada, Entretanto, js
comentamos anteriormente, atrav
chase
reintroduzida nessa teoria da gramética, Portanto, por vias diversas,
fessa_nogio acha-se desempenhando um papel anélogo nas
perspectivas estruturalista ¢ transformacionalista. Isso mereee que
nos detenhamos por aqui, pois significa que a dificuldade tworica
que se mostra dessa mancira passa além daquilo que opée essas
duas correntes da finghistica e as duas concepgdes da linguagem que
as subjazem. Em ambos os casos, 0 que esti em questo & 0 que se
apresenta sob 0 aspecto das relagdes da linguagem © da
subjetividade com seus corotirios, erengas, opinides, convieybes ete
Sem compromisso de demonstrar 0 que de ser adiantado,
pode-se concluir que a mudanga de perspes
permitir a saida dessa dificuldade, deve visar © que recobrem as
nogdes de subjetividade, de crenca ou de opinido na sua relagio
com a linguagem, isto é o que depende de uma teoria do efeite
sujeito ¢ dos efeitos ideoldgicos. Antes de chegar a essa perspect
examinaremos a problematica da pressuposigao na lingiistica at
das formas especificas que cla toma nas correntes que foram
contrapostas.
39NOTAS
" D, Lightfoot, “Les présupposés dans la grammairetransformationnell
? Bis, a titulo de exemplo, duas “defini da pressuposigio: “NOs reservamos
1 palavra pressupecicio para definir as representagses necesshrias ao ouvinte para
‘que 0 enunciado se integre @ uma comunicacio normal” (Ducrot: "Logique et
Tinguistique, p18).
“As pressuposigoes, ito 6, as convicgbes do locstor a propésito do unverso™
(Lightfoot, "Les présupposés dans la grammaire transformationnelle, p18),
> Ctausine Normand, “Propositions et notes en vue d'una lecture de Ferdinand
de Saussure" assim como Haroche, Henry e Pécheuy, "La sémantique et la coupure
41CAPITULO I
A PRESSUPOSICAO_NA TEORIA
DA GRAMATICA'
da pressuposigao na teoria da gramética est
ada a uma critica ao modelo de gramética referido acima. Mais
precisamente, o que se contestou no modelo definido por Chomsky
em Aspects of theory of syntax € a possibilidade de separar 0
componente sintitico ¢ o componente semantico fazendo deste um
componente puramente interpretative. No centro do debate
c a nogio de restrigio de sclegao ligada a essa concepeao
do componente seméntico, Convém portanto lembrar as,
caractcristicas essenciais do modelo de gramética em ques
A. gramética definida em Aspects por Chomsky deve
cumprir dois objetivos:
er capaz de fazer corresponder, por meio de um
conjunto finito de regras formais, a qualquer representa
de uma frase em um sistema de categorias for
ou eventualmente varias descrigSes seménticas dessa frase em um
sistema de categorias semanticas igualmente universais..
a3b) dar conta das propriedades das frases (ambigitidade,
relagio de sentido, independentes de qualquer contexto,
gramaticalidade ou desvio em relagio
se revelam a intuigio lingiistica imedia
lingua.
alidade) tais como
a de todo sujeito que fala a
A gramética deve, portanto, permitir a definigao, para uma
frase julgada incorreta do ponto de vista da lingua, de quais so as,
regras da gramética que foram infringidas, E assim que card
que uma frase tal como:
(1) * a mesa pensa em vock
poss parecer incorreta porque o verbo pensar s6 pode ser
adequadamente empregado com um sujeito animado. E preciso
lembrar que o desvio em relagio & gramétiea no implica a
impossibilidade de atribuigdo de sentido ou significagio a uma frase
com essa caracteristica
© objetivo de uma gramitica nao é dar conta do sentido on
da significagaio das frases que podem
© saber lingistico ou competéncia de todo sujeito falando uma
Tingua, saber ou competéneia que the permita formular, a
propésito de toda frase enunciavel, um julgamento que diga se essa
frase € ou no correta, Isso nao significa que nio & possivel
“comprecnder” as frases gramaticalmente incorretas. Inversamente,
é possivel que frases gramaticalmente corretas sejam praticamente
‘ aso, em particular, das frases nas quais &
eneaisad uma rekitiva etc. tal como « homem que vin a mulher
que matou 0 cachorro que mordeu o guarda que pegow o ladrio
que pegou o colar que the dew 0 home que ela encomrou que
© guarda prendew na estrada que o cachorre ete,
Voces conhecem a historia, A gramiatica,
concebe Chomsky, deve poder dar conta de (ais fras
praticamente clas no sto observaveis, pois sew carter mais ou
menos “incompret
gramatical
" ndo & atribuido a uma incorregio
fal gramitica nio pode ser exclusivamente fundada
sobre a anilise de frases observaveis ¢, conseqiientemente, cla deve
ser um disposi
A distingio entre competéncia © desempenho permite dar
conta do fato de que frases “incompreensiveis’ possam ser
gramaticalmente corretas, ¢, inversamente, de que frases
gramaticalmente incorretas possam ter um sentido ou uma
significagio. O- sc a0 & do dominio do
desempenho ¢ © papel do "contexto de situagio" na produgio ©
interpretagéo das frases sempre foi reconhecido, independente do
contetido de seus termos. O mesmo ocorre com a representagao
semdntica que pode ser associada a uma frase © que sb deve
depender dessa frase.
A representagio semintica deve responder a uma tinica
fa: dar conta do fato de que, independentemente de toda
cia a_um contexto, possa-se considerar duas frases
formalmente diferentes — como semanticamente equivalentes ou,
inversamente, que uma mesma frase possa ser interpretada de varias
manciras. Nesse iiltimo caso, pelo menos dua
semnticas distintas devem poder ser associa
gramética,
Assim a frase:
(2) Eu vi ohomem com bindculo (J'ai vu Uhomme avec
des jumelles)
ja em que se pode compreender que alguém vin
um homem através de um bindeulo ou que alguém viu um homem
que usava binéculo. A gramitica deve associar a um:
essa duas representagies set . Trata-se agora de saber em
que nivel deve operar a diferenciagio dessas duas interpretagdes
da frase. Isso no poderia ocorrer no nivel da
representagio fonética (salvo se se considera que as duas
interpretagdes sio diferenciadas por tragos prosédicos, no nivel dat
acentuagio, o que parece ser o caso em ocorréncia),
Frase como
45Aspects & que essa diferenci
componente sintético; © componente semanti
interpretativo, ele associa para cada estrutura de frase definida no
vel do componente sintitico uma e apenas uma representagio
frases formalmente distintas
vel de stia represent ideradas como
nio diferencisveis no nivel da representagii ica, argumenta-
que elas derivam de uma mesma estrutura sintitica de base pela
aplicagio do que se chama uma fransformagao, que nao afetaria
4 interpretagao, no que ela depende da lingua. Considera-se em
geral que isso ocorre, por exemplo, numa frase ativa e em sua
forma passiva. Conseqientemente, é no nivel da estrut
profunda (no sentido que acaba de ser tembs
diferenciagao das representa
E
‘© componer
intitica
do) que a
operada.
.¢ sentido que © componente sintitico aparece como
agora vollarmos ao problema das _mis-formagdes
gramaticais, vemos que estas podem ser de diversos tipos. Seja por
provir de uma aplicagio incorreta das regeas que delinem a
estrutura profunda, seja pela apli
cestruturas profundas que nao admitem essas transformiagies ou de
‘uma aplicagdo incorreta dessas transformagoes. Resta um tereeiro
tipo de mé-formacio: € aquele que apresenta uma frase t
que serviu de exemplo acima, frase na qual um verbo que,
gramaticalmente, 56 poderia ser empregado com um sujeito
animado é empregado com um sujeito inanimado, & para dar conta
desse tipo de mi-formagio que Chomsky introduziu a nogio de
resirigao de selegao, O componente sintitico & tomado como
definindo as seqiléneias constituidas de formants. gramaticais tais
como N, V ete. a cada um dos quais esté ligado um stinbolo
complexo Q, ele mesmo constituido por um conjunto de tragos tais
como, para um substantive, comum, enumerdvel, —animada,
Jumano ete. Uma tal seqiéncia & dita pré-terminal, A cada
elemento de uma frase, ou mais exatamente de sua representagio
io de transform:
46
fonética cujos elementos sao os formantes gramaticais
anexado pelo Kéxico um simbolo complexo C aniilogo. a0
procedente, A representagio fonctica, munida desses.simbolos
‘complexos C, é chamada de seqiiGncia terminal. A gramatica associa
a essa seqiiéncia terminal uma seqiiéncia pré-terminal, isto é, para
cada formante lexical corresponde um formante gramatical. Existe
uma regra gramatical que estipula que, se 0 simbolo da seqiiéncia
{terminal nao € idéntico ao simbolo complexo Q do formante
gramatical que Ihe corresponde na seqiiéncia pré-terminal, entiio a
frase ¢ gramaticalmente malformada ¢ a mé-formagio resulta da
violacio de uma restriga
desenvolveremos aqui, Chomsky mostrou que no quadro de uina tal
gramética a categoria do substantivo & dominante, do ponto de vista
da relagio, sobre a do verbo © a do adjtivo. De tal modo au
traduinse-ia pelo fato de que, na seqiéneiagramati
4 uma frase, 0 simbolo complexo correspondendo ao formante
gramatical do verbo nao comportaria o trago sujeito animado que
figuraria no simbolo complexo do formante lexical correspondente.
Nao
1a representagao semantica. Na gram
\gos de sclegio que compdem os simbolos complexos. so
considerados como tragos sintdticos ¢ niio como tragos seminticos,
A hipétese da natureza sintética dos tragos de sele nnforme
a logica do modelo de gramatica com componente semintico
interpretativo. Ocorre, contudo, que a posigio de Chomsky sobre
esse ponto é apresentada em Aspects com muito mais prudéncia do
‘que de um modo geral adotamos. A possibilidade de uma retomada
dda fungao das regras de sclegao pelo componente semantico esté af
expressamente encarada, De um modo mais geral, Chomsky insistiu
sobre 0 fato de que “a relagio entre regras sintéticas © regras
seminticas nao é um assunto esgotado, permanecendo um leque de
possibifidades que merecem um exame aprofundado"?
Alem do
ica na gran
¢ pode confundir os simbolos complexos C © Q com
sa definida em Aspects, 0s
ais a questio das relagies entre sintaxe ©
ver levantada, Ao dizer queos tragos de selegio sio de natureza si
aa diferenciar 0 caso de fras
violagio de uma regra de sek
“incongruéncia puramente sem:
20 componente seméint
semintica da
‘itica, Chomsky foi levado
ja anomalia pode ser explicada pela
do, daquelas que apresentam uma
ica ou pragmatica’, que pertencem
coe devem estar marcadas na representagio
natureza das “incongruéncias
é especificada, Ri e a isso uma outra
aquela que diz. respy centre. "sistema
sistema de conhecimento ou de erengas’. Segundo
entre esses dois sistemas deve ser considerada
‘que separa semantica ¢ sintaxe,
muito tempo, os dois
ir de mancira obscura’?
semintico” ©
Chomsky, a frontei
como tio incerta quanto aqui
pois, observa ele, "como jé notamos ha
sistemas parecem interf
Seja a frase:
B) O homem que morreu ontem bate & porta.
Qual a naturez
seméntica ow pragm: gramitica? Pod
responder a essas questes de maneira pragmética; se se pode
rt cuja violagio
lade de (3) € de frases semelhantes, entio
ticularidade pertence a gramética © & competéncia
lingiistica. E assim que procede Kuroda a propésito de um outro
caso, aquele de:
(A) Le professeur a épousé Paul.’ (A. professora
casouse com Paul.)
Essa frase levanta uma dificuldade para a teoria das
restrigies de selegio. Com efeito, é preciso poder excliir frases
como:
(8) Pierre a épousé Paul. (Pierre casou-se com Paul.)
48
‘A primeira solugao em que se pensa é a de introduzir no
mbolo complexo anexado ao formante lexical que dé "casar-se” wm
trago de sele¢io que imponha que 0 sujcito ¢ o objeto desse verbo
sejam de géneros opostos. De fato, a oposigio, clissica na
gramética francesa, entre género e sexo poderia aparecer como um
argumento em favor da tese do cardter sintético dos tragos de
selegdo. Infelizmente, essa restri¢ao exclui tanto (4) quanto (5). Para
contornar a dificuldade, Kuroda propds a introdugio de uma
transformagio de insergio lexical capaz de incluir na forma de
base tragos semdnticos do tipo (+ masculino) ou (- masculino). No
‘caso de uma frase como (4), uma transformagao substituiria em um
contexto como ..a épousé (casou-se) (+ maseulino) o traco (+
masculino) vinculado ao formante lexical correspondente a
professor pelo trago (- masculino). Essa solugao, embora
permanccendo no quadro de uma concepgio interpretativa do
componente semantico, supde uma reestruturagio do modelo de
gramética exposto em Aspecis. Ela sup6e uma intervengio do
componente semantico no componente sintatico. Segundo Kurod
poder-se-ia caracterizar sobre essa base os casos de pressuposi
que pertencem a gramatica: 0 verbo épouser (casar) pressuporia
tum sujeito ¢ um complemento de sexo (c nao de género) opostos,
© que explicaria que em (4) interpreta-se “le professeur” como
designando uma mulher ¢ ndo um homem. O mesmo tipo de
solugio poderia valer para, por exemple, “le docteur’ ("o doutor’, ef
nota (4) ) © mesmo, hi pouco tempo, para “le commissaire de
police” (0 delegado de policia) pois 0 concurso acaba de ser aberto
is mulheres. Contudo, essa solugio cria ainda um problema pois
no permite excluir, por exemplo:
(©) Le curé a épousé Paul. (O padre casou-se com
Paul.)
verdade que os casos em que a solucio nio & aplicével
pertencem a uma lista fechada (que € preciso supor como revisavel
como mostra 0 exemplo do delegado de policia). Seria entio
suficiente indicar no léxieo os casos em que a transformagio de
49substituigao do trago € ou nao aplicavel. A solugio aparece entio
‘muito pouco satisfat6ria do ponto de vista tebrieo pois, entre outras,
coisas, cla fere seriamente o carater dedutivo da gramética. Ela
torna, mesmo num caso ainda relativamente simples como este aqui,
a fronteira entre "sistema scmintico" ¢ “sistema de crengas ¢ de
conhecimentos" bem permedvel. Além disso, os problemas que
acabam de ser levantados pem em evidéncia o liame que existe,
se tipo de g
€ semintica © aquela que deve permitir a distingdo entre “sistema
semintico" ¢ “sistema de erengas € de conhecimentos
ramatica, entre a fronteira que deve separar sintaxe
Parece haver uma solugio para sair desse impasse. Esta
consistiria em dizer que a gramética deve comportar regras que
permitam formar e analisar (4) assim como:
(7) Marie casou-se com Paul.
que nao € do dominio da gramética especificar em quais casos
cessas regras se aplicam ou no, Ao introduzir uma distingio entre
‘sistema semintico” ¢ "sistema de crengas © de conhecimentos",
Chomsky reconhece implicitamente que sua concepgao da gra
abre lugar para um externo @ lingua na linguagem, para alguma
‘a que escaparia & universalidade que fundaria a competénci
lingistica através da universalidade dos principios gerais sobre
quais repousariam as regras da gramética, a universalidade da teor
¢ das catcgorias fonéticas, a universalidade enfim das categorias
emiinticas pressuposta pela nocao de represent.
além das divergéncias que podem aparecer na operacionalizagio, 0
projeto transformacionalista de gramtica procura empurrar para 0
mais longe possivel a fronteira entre o que na linguagem pertenceria
4 lingua © & competéncia lingiistica © © que constituiria o externo
a lingua na Tinguagem. Tal projeto descavolve-se claborando uma
concepgio da subjetividade individual representada pelas opinides,
crengas, convi de uma forma de subjetividade
universal andloga aqucla que representa a nogio de-sujeito episté~
‘mico cm Piaget: "sob o sujeito individual, na sua consciéncia ¢ sua
idcagio particular, € preciso considerar as estruturas das,
o semantica, Para
50
coordenagées de agdes comuns a todos 0s sujeitos ¢ so essas
coordenacdes gerais (psicobioligicas assim como mentais) que n6s,
chamamos de 0 sujeito epistémico'® Essa “definigdo" do sujeito
epistémico deve ser aproximada de uma daquclas que Chomsky
prope para a competéncia lingiiistica: “parece claro que nds,
devemos considerar a competGncia li mento de
uma lingua — como um
mpenho, sistema constituido pelas
potencialmente infinito de frase que em cada
desc tipo, isto é em cada gramética, “hi elementos
s, Wdiossineréticos, que determinam uma lingua humana
a, ¢ elementos universais gerais, condigdes que alingem a
forma e a organizagio de toda lingua humana e que constituem 0
universal.” Havers, portant ts
qu, soba forma de cada Hogua particular, € uma
realizacio ¢, enfim, o nivel do desempenho sustentado por sua vez
pelo segundo, o conhecimento da lingua. Cada um desses niveis &
de possibilidade do seguinte e cada
ais do que uma realizagao particula
‘Assim a base universal deve ser concebida como a base de todas
linguas possiveis, existentes ou nao, passada, atual ou vindoura. Do
mesmo modo, 0 desempenho s6 realiza muito parcialmente. a
competéncia que necessariamente o sustenta, uma vex que cle 56
abranje um conjunto finito de frases, enquanto a competéncia des
poder, potencialmente, estender-se a um conjunto infinito de frases,
com 6 qual o individuo s6 se confronta de mancira
pressentido como uma condi
uum deles pressupée muito
conhecimento. © experiéncia, afirmando que a organizacio do
comportamento pressupée um conhecimento potencial que iri
sempre muito além daquilo que a experigneia como tal pode
encerrar® A nogio de subjetividade individual, mas, ao mesmo
tempo, as bases universais inatas da competéncia lingtistica, sio
‘uma potencialidade de todo sujeito, contanto que esteja apto a falar.
51E nesse sentido que se pode falar de uma forma de subjetividade
universal, de um sujeito da competéncia lingbistica.
Aqui, preciso lembrar que as duas concepgies da
subjetividade que se acham como em confronto pressupdem u
outra, ou, mais precisamente, que, se a teoria nos apresenta uma
forma universal de subjetividade como condigao de possibilidade
de existéncia da subjetividade individual, é na realidade o inverso,
a saber, a hipétese individual, sua “evidéncia’, que torna necessaria
a hipdtese racionalista de uma forma de subjetividade universal, no
‘50, de uma “esséncia da linguagem humana,” Em outros termos,
€ porque consideramos um sujeito fonte de comportamento, de
conduta, de escolha, de decisaes, tendo opinides, conviegbes ete.
que 0. problema’ das condigdes de possibilidade — desses,
comportamentos, condutas ete... ma medida em que eles sio
organizados, aparece sob a forma da existéncia de uma forma de
subjetividade universal que representa as propriedades de rodo
sujeito possivel, na medida em que ele é capaz de pensar ¢ falar.
Assim, no é surpreendente que o que se apresenta como extern
a lingua na lings ionado com opinides, conviegics,
ali
crengas etc, sada sujeito pode partilhar ou no.
Para contornar as dificuldades com que se depara a
realizagio do projeto de gramatica definido em Aspects —
dificuldades que evoeamos apenas parcialmente — em vez de adotar
uma solugio do tipo pragmitico como aquela exposta por Kuroda,
foi proposto que se renuncie & separagdo entre sintaxe © semantica
tal como cla foi definida, Comegamos argumentando como
MeCawley” que os tragos de selegio nio sao de natureza sintitica,
‘mas seméntica, Chegamos a fazer da representagiio semdntica a
estrutura mais profunda e dela derivar as estruturas sintiticas e as
estruturas superficiais.”
A introducio da nogio de pressuposigo na teoria da
sgramatica foi inicialmente uma caracteristica daqutcles que viam nos
fendmenos de pressuposicio uma prova conclusiva para ndo se.
separar seméntica © sintaxe. Nessa perspectiva Lakoff"
introduziu, relacionada com a nogdo de pressupo:
, uma nogiio
52
ituta da
de gramaticalidade relativa que ele propde como subs
nogio de gramaticabilidade — claborada por Chomsky em Aspects
Assim, segundo Lakoff, uma frase como:
(8) 0 cachorro acha que 0 gato é mau.
pressupde que os cachorros possam pensar. Se partilhamos essa
opinido, a frase seré julgada gramatical, sendo cla seré declara
agramatical. A nogio de gramaticabilidade esta portanto assujei
a subjetividade individual, dependendo de crengas, 0}
conviegies, conhecimentos etc... que cada um partilha oun
mesmo modo frases tais como:
(0) A terra gira
ou
(10) 0 ferro de passar pesa mais quente do que frio.
seriam julgad maticais por um leitor pré-galileano ow pré~
relativista, Ocorre que LakolT insiste sobre o fato de que essa
concepgio da gramaticabilidade no implica que 0 "saber
lingiistico” nao possa ser separado do “conhecimento do mundo’
Ao contrario, segundo cle, os principios gerais que permititi
emparelhar uma frase © as pressuposigoes que garantem sta
gramaticabilidade fazem parte da competéncia linghistica € sao
pantilhadas por todo sujeito que conhece a lingua. Um dos,
argumentos mais fortes em favor dessa concepcao € a existén
frases apresentando © que seria muito amplamente reconhecido
como uma “contradigio". Seja a frase:
(1) Ele for morto mas nao morreu. (ou ele foi mono
mas -ndo esté morte.)
of, uma tal contradigdo deve estar mareada na
tica da frase.
Segundo L
representagao §
33Consideremos a frase:
(12) 0 ferro de passar é mais quente mas ele nao é
mais pesado,
Para um fisico que reconhece a validade da tcoria da
relatividade, uma tal frase apresenta uma contradigao cuja natureza
rio ¢ diferente da que aparece em (11). Contudo, para aqueles que
nunca ouviram falar na relagio massa-energia, cla € perfcitamente
banal. Parece portanto perigoso dizer que a contradigio de (11),
assim como a de (12) para alguns, faz parte do seu “sentido
inteinseco", para retomar os termos de Chomsky, Isso poe em
evidéncia a relagao que existe entre a nogio de "contradigdo" como
6 usada aqui © uma teoria da enunciagio cujos principios dev.
ser formulados, Essa mesma relagio, nés a reencontramos em um
exemplo tratado pelo proprio Lakoff. Scguindo Searle, ele observa
que, quando um juiz I& uma sentenga (como cada um poderia fa
lo se, por exemplo, ela € divulgada em um jornal), ele realiza 0 que
Searle chama de um aro de linguagem, isto é, um ato que s6 pode
ser realizado por uma enunciagio dentro de certas eircunst
no caso transformar um acusado em condenado. Por essas razics,
Lakoff considera que a frase:
(13) Mesmo nao sendo juiz, Jean leu a sentenca,
condenando assim o homem & prisdo perpétua.
comporta uma contradigio proveniente do fato de que 0 verbo
condenar pressupie um sujeito que se considera com 0 poder de
condenar. Ainda, segundo Lakotf, « pressuposigdo em questio deve
poder ser mareada na representagio semintica da frase a fim de
que a “contradigio" de (13) possa ser explicada. A teoria da
tenunciagio que se acha aqui implicitamente introduzida na teoria da
itica foi desenvolvida por Austin ¢ Searle. Ela sera longamente
teoria da pressuposigao proposta
esse filtimo aspecto das concep
fo na teoria da gramati
n observar que essa teoria da enunciagio
pressupde um sujeito enunciador de tal modo que, embora ele si
aparega com a nogio de pressuposis nte uma forma de
subjetividade que se acha reintroduzida na gramética,
contentemo-nosNOTAS
" Lamento no ter tomado conhecimento no momento da redagio deste
capitulo do estuda de Ryszard Zuber, La stuctre présuppositionnlle du langage,
Pans, Dunod, 1972, Esse estado tray presses interessantes a respeto das relagdes
‘entre pressuposigio, constituintes © teansformagées. Por outto lado, 0 Teitor
‘encontrara informagdes complementares em uma série Je artigos recentemente
radvridos: Chomsky, Questions de sémanique, Pars, Le Soul, 175. Enfim certos
aspects *téenicos" da relagio entre proposiqBes relativas © pressuposigio so
Ucsenvolvidos em Henry, "Constructions felatives et articulations discursives",
Langages 37, masgo 1975.
* Noam Chomsky, Aspets of the theory of syntax, p. 159.
tug, p. 159.
* a tradugio desta frase pordese a paniculaidade do francés com que jogs
‘avor para encetar sua dicusso sobre a necessiade de se exe frases com (5)
Spierre eaou-s com Paul” eas possvs olugbes Jo problema. Le professeur apie
4 tanto part o mascuno como para o feminino em francis, Asim di-se tanto M.
Ie professeurfte doctaur tex coro Me. le professeurfledoceurete.(N. da.)
F Jean Piaget, “es problémes principaux de Pépistémologie des
smathématiques’, pp. 56344
© Noam Chomsky, Le langage et a pensée,p. 106
id, p. 107.
8 sacho que se examinarmos o problema cssio da psicologia, o de dar conta
{8 conhesimente humano, nio poderemos evitar o choque diante da enorme
‘isparidade entre conhecimento © experiénca, No caso Ja linguagem, entre a
trata gerativa que exprime a competenetsinicial do loeutor e es dados magros
edegencridos sobre os quais foi consteuida essa gramitica” Ibid. p. 15.
° i, p. 128
© MeCawiey, “The role of semantics ia grammar"
" Exemplos de gramstica desse tipo so sobretudo propostos por Hutchins,
‘The generation of sync structures from a semantic base.
1 Ver David Lightfoot, “Les présupposés dans a grammaire
transformationnelle™
1 Georges Lakoff, "Presupposition and relative well-formedness"
37CAPITULO II
DA PRESSUPOSICAO LOGICA AO
ATO DE LINGUAGEM
Os contornos da nogio de pressuposi¢io utilizados na
perspectiva das graméticas gerativas permanecem bastante
imprecisos; cla escapa a uma apreensio intuitiva por ca
roupagem que a encobre (cla é definida em relacio a
certos tipos de mas-formagdes nao redutiveis pelas outras rege:
gramitica). Com Ducrot, encontramos uma nogio. muito mais
dirctamente interpretavel, 0 que evidentemente constitui uma
vyantagem, pois isso di a ilusio de que se trata de alguma coisa de
muito mais conereto, © portanto mais real, mas que pode,
evidentemente, ser também uma armadilha,
Ducrot perecbeu perfeitamente esse fato e parece-me que,
percorrendo © conjunto dos trabalhos que ele publicou sobre a
questéo na sua sucessio cronol6gica, a claboragio conceitual
efetuada por ele sobre a pressuposi¢ao nao tem outra finalidade
senio escapar das contradigées que nio deixam de surgir qizndo a
representagio subjetiva da nogio torna-se prevalente. O ponto de
59Ia de Duerot & a nogio formada no dominio da filosofia da
linguagem (Frege, Strawson) em que cla tinha um econtetido te6rico,
relacionado coma teoria da referéncia, ¢ em contrapartida um
sentido “téenico" ligado questio do campo da negagio global de
uma proposicéo complexa. E esse sentido "téenico
questo quando Frege diz. que ney
que esti em
(14) Se o ferro fosse menos denso que a dgua ele
flutuaria, wares
no signilica negar ao mesmo tempo que o ferro se}
denso que a agua, mas apenas ar entre a densidade
rclativamente & agua © a propriedade de flutuar sobre a agua. E
pelo menos 0 que ressalta da confrontagio com:
de fato mais
(13) E falso. que se 0 ferro fasse menos denso. que a
digua ele fatuaia
Por outro lado, a mesm
anilise nao se aplica a:
(16) 0 ferro é mais denso que a agua e nao jflutua,
que, do ponto de vista da hidrostatiea, é uma pardfrase de (14). Em
outras palavras, (16) ndo se comporta do mesmo modo que (14)
ante a negagio global como mostra a confrontagio com:
(17) E falso que 0 ferro seja mais denso que a agua
e que ele nao flutue.
Frege analisa esse fendmeno dizendo que a subordinagio
cm (14) implica uma dependéncia entre as duas partes da
proposigio que explica por que nao se pode substituir a proposi
introduzida por subordinagdo por uma outra propos
mesmo valor verdade como em:
(18) Se 0 ferro nao fosse oxiddvel ele fluwaria.
60
Essa dependéncia nao existe na “pardfrase’ (16) uma vez
que se pode fazer a substituigio sem mudar 0 valor verdade da
proposicio global
(19) O ferro é oridavel ¢ ele nao flutua,
Dir-se-4, portanto, para designar essa dependéncia, que (14)
pressupde que o ferro seja de fato mais denso que a agua.
Ducrot apossou-se em um primeiro momento do sentido
Genco" da nogio de pressuposicio, mantendo antes de tudo 0
critério da negagéo como meio para por em evidéncia a necessidade
de distinguir em um enunciado o que cle pressupSe daquilo que ele
pide. Esse sentido “téenico” foi provisoriamente destacado do
contetido teérico que & a contraparte na tcoria da referéncia em
Froge ¢ Strawson. Esse contetido te6rico foi substituido por uma
definicio inicialmente muito frouxa de pressuposigio. Apoiando-se
na idéia de que 0 que proibe (18) © autoriza (14) € 0 fato de
percebermos um liame entre 0 contetido das duas partes de (14),
liame que esté de acordo com a dependéncia marcada pela
, enguanto em (18) ele nao existe, Donde uma das
primeiras definigoes: "Nés reservamos a palavra ‘pressuposi¢go’ para
designar as representagdes nccessérias ao ouvinte para que 0
enunciado integre-se a uma comunicagao normal’.' Uma tal
evidentemente muito mais ampla ¢ ni
vio se enquadra no
io, Além do mais ela faz. do reconhecimento
dos pressupostos pelo ouvinte uma condicéo do emprego normal de
um enunciado, enquanto 0 contedido da pressuposigio parece que
nfo deve necessariamente ser admitido pelo ouvinte mas fazer 0
papel de hipdtese ou de posigdo a partir da qual o locutor enuncia
alguma coisa. Assim,
(20) E a crise do petréleo que torna necessério 0
bloqueio dos salérios.
que pressupGe que um bloqueio dos salirios € (em qualquer
situagio) necessério ¢ enuncia que a causa dessa necessidade ¢ a
61crise atual do petroleo, inscre-se muito bem em uma comunicagio
normal sem que a necessidade desse bloqueio seja admitida por
uunanimidade. Caminhamos assim para uma nova definigao que deixa
de fazer dos pressupostos condigdes de emprego normal de um
enunciado para transformé-los em elementos do seu contetdo que
tém um modo dc apresentagio especifico, ligado a0 seu
comportamento na negacio (como, alids, na interrogagio © no
encadeamento).* Essa passagem, & preciso frisar, é realizada sobre
da interpretagio da nocdo, reconstituida a partir do seu
enico’, em um modelo da comunicagio, ¢ nao sobre o
lo da teoria (aquela da referéneia em Frege enquanto légico)
em que cla tinka sido investida do seu contetido teérico inicial,
io € de se cstranhar que essa passagem seja
acompanhada de uma dissociagio. completa entre referencia e
pressuposigao, operada também, evidentemente, sobre o terreno da
interpretacio. Esse ponto é fundamental para 0 prosseguimento de
andlise; também estamos obrigados, a qualquer preco, a fazer
uma digressio que considere a relagio entre. pressuposica
referéncia em Frege.
1
A claboracdo conecitual da nogio de pressuposigio em
Frege faz parte do projeto de constituigio de uma Begriffishrift,
isto é de uma conceitografa, destinada a remediar as imperfeigses
da linguagem natural (Sprache), ficando entendido que Frege
rofere-se expressamente sobre esse ponto a Leibniz e a idgia de que
basta ter uma boa linguagem para que nao seja mais possivel dizer
ou escrever algo que nao seja bem pensado ¢, portanto, suscetivel
de ser reconhecido como verdadeiro ou falso, Acessoriamente, 0
trabalho de construgdo de uma tal conceitografia, se nao permite
climinar as imperfeigdes da linguagem otdindria, permite, pelo
menos, como veremos, dissolvé-las, devolvendo’ assim a. cx
linguagem um ar de credibilidade no scu uso controlado.
6 nccessirio que um mesmo
‘maneiras, que nio fosse para poder eserever que, em um tridngulo
‘ABC, a intersegio das medianas oriundas de A e de B ¢ das,
medianas oriundas de B € C so um tinico ¢ mesmo "objeto". Na
terminologia de Frege, dir-se-A que se trata de nomes com sentido
diferente tendo mesma referéncia. Isso posto, Frege considera que
0s erros légicos provenientes do fato de que expresses com a
iparGncia de nome proprio nao tenham referéncia io menos
perigosos que os provenientes da ambigiidade das expressbes
denunciadas por todos os livros de légica. A utilizacdo de expressies
tais como a "Vontade do povo" pode conduzir a abusos demagogicos
ic estabelecer que em nenhum sentido essa
expresso tem referéncia reconhecida’? Portanto, uma
cconceitografia deve ser tal que “cada expresso gramaticalmente
bem construida, como um nome proprio, pela
introduzir novos signos, como os nomes préprios, sem que se tenba
assegurado que eles tém mesmo uma referencia’
ia deve ser tal
Por outro lado, ja o dissemos, a conceitogr
que toda proposigio possa ser dita verdadcira ou falsa, Frege
transporta essa exigéneia para a preéedente, dizendo que uma
proposigio, do ponto de vista légieo, ndo passa de uma mancira de
nomear 0 verdadeiro e 0 falso, Donde a idéia de considcrar todas,
as proposigdes como expressdes de sentido diferente, como nomes
diferentes, tendo por referéncia ou "Verdadciro" ou "Falso". Se se
a essa maneira de
considerar as proposigées no introduz dificuldades particulares, cla
cchega mesmo a apresentar sGrias vantagens. E necessério
acrescentar ainda que Frege precisa que uma tal cxigéncia s6 tem
razdo de ser quando ha interesse pelo conhecimento pois podemos
considerar outros niveis da linguagem, particularmente a fieedo, na
{qual a questio da verdade ou da falsidade das proposigées no tem
sentido, uma vez que esse uso da linguagem néo visa 0
conhecimento mas apenas as representagdes ow sentimentos
despertados. pelo sentido das proposigies ou, ainda, "as belas
8sonoridades da lingua’. © problema é que, se as linguas devem
tomar possivel a ficgdo, clas abrem, pelo mesmo movimento, 0
caminho para a demagogia (ter escolhido como ilustragio “a
vontade do povo’, isto é, uma nog&o que concerne a politica, no €
evidentemente um acaso) ¢, do ponto de vista do conhecimento, 20
erro € a ilusio. A esse respeito, a "linguagem ordinaria sofre deste
defeito de com cla podermos formar expresses que, do ponto de
a da forma gramatical, parecem determinadas e adequadas para
designar um objeto, enquanto, em certos casos, essa determinagéo
falha pois depende da verdade de uma proposicio’? Para Frege,
fessasproposigSes no esto verdadeiramente contidas nas
proposigSes em que aparecem as expresses gramaticais referenciais
correspondentes, que so apenas vorausgesetzt por estas, isto 6,
instituidas antes, preestabelecidas, ou ainda, como de um modo
geral se tem traduzido, pressupostas.
_ Do que precede, conclui-se que € para explicar porque a
Tinguagem ordiniria ¢ feita de modo que, do ponto de vista do
‘conhccimento, seu emprego possa conduzir ao erro, a ilusio ou A
demagogia que Frege introduz a nogio de pressuposigio. Ela
caracteriza, do ponto de vista do conhecimento, o estatuto das
expressdes gramaticalmente referenciais com relagio ao es
niomes préprios. Quanto a estes tli
fato de eles terem ou nio uma refer
nio pode depender de
modo algum da verdade de um pensamento’.® Enfim, expressies
gramaticalmente referenciais e nomes préprios opdem-se na medida
em que, para as prim depende
da verdade de um pensamento enquanto, para os iltimos, cla s6
repousa sobre uma forma de evidéncia, Para Frege, "a vontade do
povo" nio tem referén
fem questo ndo é identifiedvel com a evidéncia subj
individual (a qual poderia na sua singularidade proceder dail
mas sobre um tipo de eonsenso, Isso nos leva a considerar, junto do
sentido ¢ da referencia, 0 terceiro termo da teoria da signilicagio
em Frege, a saber a representagdo (Vorstellung).
tid
Frege convida-nos com efeito a distinguir, além do s
da referdneia de um signo, 0 que ele chama de sua representa
que & a forma subjetiva individual da significagio. Enquanto 0
sentido de um signo pode ser “a propricdade comum de varios
idividuos" ¢, por isso, ele néo faz parte "do modo da alma
*, a representagio deve ser sempre “atribuida a alg
* Dois individuos no podem nunca, efetivamente, ter a
representagio de um mesmo objeto ¢, ainda que seja as
vezes possivel apontar semethangas entre essas representagdes, a
‘compuragio néo pode ser rigorosa, pois ‘seria impossivel reunir
as representagSes na mesma conscincia’.® Convém aqui
examinar mais minuciosamente como Frege
irredutivelmente individual da representagio, pois af reside um dos
seus pontos fracos. Ele s6 dt maiores detalhes sobre 0 que entende
por representagio nos casos em que o signo pode denotar “um
objeto perceptivel pelo sentido’. Nao exclu, contudo, que se possa
falar de representagies evocadas por um signo que nao teria essa
particularidade (ele eonsidera 0 caso do nome proprio Bucéphale)
e tampouco exclui que as expressdes referenciais desprovidas de fato
de referencia possam dar lugar & representacao. Nesses casos, diz
apenas que “um pintor, um € um naturalista ligardo sem
divida representagdes bem diferentes a0 nome ‘Bucéphale”.” No
caso em que 0 signo denota um objeto perceptivel, a variedade
interindividual da representacio € conccbida como sendo de
natureza psicoldgica. Frege esboca uma psicologia da pereepgio
de sua ligagdo com as intuigdes © as representagoes, que faz,
intervir as impressdes sensiveis ¢ as a is ou externas que
thes respondem, bem como as marcas deixadas na alma por aquclas
cis, Se nos referimos a essa psicologia da
representa es, a variabilidade interindividual i
pode (er outro fundamento séndo a variabilidade interindividual das,
‘ages internas ou externas que respondem as impresses sonsivei
isto ¢, afinal, a individualidade irredutivel dos processos do
pensamento. Cada individuo reage a seu modo ao mundo sensivel;
diante de um objeto pereeptivel cada um forma sua representagio
essencialmente irredutivel a de qualquer outro individuo; cada signo
65evoca na mente do ouvinte uma repr
comparada a de nenhum outro indi
Oeorre que o se
tem uma, sio propriedades nao
distingue a repr io do sentido © da referencia. Ma
sobre 0 que pode fundar-se essa nio-individuatidade do sentido ¢ da
referencia? Certamente nio é — dado 0 que ocorre com a
representagdes — sobre a singularidade empitica do objeto
denotado, quando o signo pode denotar um objeto material, Quanto
ao sentido, Frege indica duas bases distintas da nfo-individualidade.
Primeiro 0 fato de que ‘nao se podera negar que a humanidade
;possti um {esouro comum de pensamento que se transmite de uma
geragio a outea’.” Em segundo lugar a idgia de que "o sentido de
‘um nome proprio & dado a quem quer que conhega suficientemente
a lingua ou o conjunto das designagdes de que ele faz parte”." A
igacdo entre essas das bases da nio-individualidade do sentido —
thesaurus de pensamentos, comum a todas as geragées
conhecimento da lingua ou dos conjuntos de significa
permanece contudo obscura, Quanto a referéncia, ela é
sariamente ndo-individual, assim como o sentido, porque a
0 entre 0 signo, seu sentido e sta refer
ndo se pode di nio-individualidade da refercneia
decorra da nio-individualidade do sentido, pois varios sentidos,
distintos podem corresponder & mesma referéncia. A originalidade
a tcoria da significacdo em Frege deve-se ao fato de cle recusar-se
a considerar que 0 sentido denominador comum das
proceda de sta Higagio
das concepgdes empiristas; principalmente,
€ possivel reduzir ao tridngulo de Ogden ¢ Richards o sistema dos
Gs termos: refertneia, sentido © representagio. Na aust
outras bases as conseqii
relagoes entre sentido e referéneia permanecem misteriosas © que,
para os nomes proprios sobre os quais afinal de contas tudo
66
neia de uma referéneia e sua identificagio s6
repousa, a exis
podem ser justificadas invocando um const
coria da significago em Frege deve ser
fio das ligagdes entre conhecimento ¢
(0, que se baseia na idéia de que & apenas na ¢ pela linguagem
que aqucle ¢ esta se misturam, porque as Knguas so feitas de tal
forma que € possivel construir expressbes tendo gramaticalmente
(isto é do ponto de vista da linguagem © do sentido) valor
refercncial enquanto nada garante que clas tenham de flo uma
referéncia, E, com efeito, somente se se reduz unicamente aos.
nomes proprios a rel cia que se pode
coneeber que uma conceitogts mento a0
abrigo da ilusio ou possa ser, para palavras, uma
Tinguagem do pensamento cognoseitivo, uma vez que cla é de tal
modo organizada que “cada expressio gramaticalmente bem
construida, como um nome proprio, pelt ajuda de signos jé
introduzidos, tem necessariamente uma rel de tal forma
Essa dificuldade da
jonada com sua concep
que "no soja possivel a introdugio de novos signos como nomes
proprios sem que se esteja seguro de que cles tém mesmo uma
m resumo, a nogio de pressuposigio em Frege
insepardvel do papel fundamental atribuido aos nomes proprios no
uuso da linguagem visando © conhecimento quando se conecbe que
na ¢ pela finguagem.
cesta $6 se mistura ao erro ow a ilusd
Se voltarmos agora ao trabalho de elaboragio conecitual
efetuado por Ducrot sobre a presstiposigao, ncle poderemos
distinguir por comodidade trés tempos. Primeiro tempo (de qui
demos conta): retomada da nogao de pressuposiglo a partir do
sentido "téenico”(ligado ao fendmeno da negacio) ¢ reinterpret
dessa nogio no quadro de um modelo da comunicacio
essiria a0 ouvinte para que o enunciado integre:
0 normal). Segundo temp
precedente que faz da verdade das pressuposigies urna
orcondigio para o emprego normal dos enunciados." Essa critica
apresenta-se inicialmente sob a forma de um questionamento do
trabalho de Frege considerado como o representaate dessa tese. A.
critica comporta dois aspectos; um aspecto teérico que mos parece
pouco perlinente, pois passa a0 largo do conteido tedrico da nogio
de Frege, © um aspecto “téenico” que pie em primeiro plano 0
critério da negagi ceiro tempo: reconhecimento da
insuficiéneia do sentido “técnico™ para dar um fundamento tanto
tedrico quanto analitico (na produgio da anilise semintiea dos
ccnunciados) & nogio de pressuposicio © desenvolvimento de uma
teoria das 0, suscetivel de responder
uundo tempo antes
de pasar ao Cereciro que & aqucle em que intervém as nogives dle
alos © jogos de linguagem,
Antes de abrir caminho para nossa necessiria digressio
sobre a teoria da significagio em Frege, base da teoria Iégica da
pressuposigie, dissemos que a transformagio a que Ducrot
submetew sta: prim: io da nog
em conta o contetido te6rico inicial desta, valorizando, antes de
tudo, seu aspecto “é E isso que precisamos agora justificar
antes de tirar as conseqiiéneias, sobretudo porque essa op
como acabamos de dizer ao delinirmos 0 segu
expediente de Ducrot, & apresentada como uma
comportando dois aspectos: um te6rico e outro téenico, Comecemos
pelo aspecto te6rico. Enquanto Frege insiste sobre o fato de que a
cexisténcia de uma referéncia s6 tem interesse quando se busca 0
conhecimento porque ‘para conhee:
considera, entretanto, que sua coneepeao da pressuposigaio implica
que os enunciados cujos pressupostos no sio verdadciros sio, de
fra muito geral, “logicamente inavalidveis". Toda questi
© que quer dizer "logicamente inavaliével". Para Frege
significa apenas que tais enunciados nao tém valor, ou pior, podem
causar erro ow ilusio, do ponto de vista do conhecimento ou da
ciéncia. Nao & portanto nada surpreendente que, como observou
trawson," 0 uso da palavra falso em Frege — no que toca a
68
ao uso que
E verdade
nogio de pressuposigio — no corresponda
habituaimente se faz dela na "Tinguagem ordinar
também que, como diz Ducrot, 0 logico que adota a tese segundo
a qual um caunciado cujos pressupostos sao falsos & logicamente
lidvel, “constr6i muito mais um conceito de falsidade do que
Isso supde, entretanto, que
inavaliavel” ou, se
desereve um conecito preexistent
se chegue ao conecito de
preferirmos, ao de decidibilidade, Mas o que acontece com esse
coneeito de falso rei I de se revelar a “intuigao
lingitistica imediata’, como esereve Ducrot, desse conceito que
bastaria ser descrito © no produzido? Nos, pessvalmente,
contestomos formalmente que se possa falar de um conccito
preexistente de falsoc que estaria em ago na linguagem em geral.
Voltaremos a esse ponto, pois o que diz aqui Ducrot a respeito da
palavra filso vale para ele = de um modo geral — para qualquer
palavra na qual reconhega uma significagao literal, imediatamente
apreensivel.
bamos de ve ito da critica a0 uso
© que a prop
palavra falso em Frege ¢ do sentido a dar & tese segundo a qual a
verdade dos pressupostos 6 uma condigio da avaliahilidade ligica
ease, de uma mancira mais geral, a idGia
segundo a qual Frege seria 0 campedo da concepgio que assimila
1s pressupostos as condigies de emprego normal dos enunciados ©
no aos elementos do scu conteado. Do ponto de vista da
problemitica de Frege, "emprego normal” nao tem muito sentido;
& preciso eselarecer de que uso se trata, Por outro lado, a posigio
ege quanto a saber se os pressupastos fazem ow ndio parte do
contéudo dos enunciados (do seu sentido, na sta terminologia) &,
apesar do que ele diz quando introduz & palavra vorausgesetzt,
muito mais sutil do que sugere Ducrot: & questo nio € erucial do
scu ponto de vista, Mais especificamente, as perspectivas de Ducrot
c de Frege sio radicalmente diferentes do ponto de vista te6rico,
Frege nao procura, como o pretende abusivamente Ducrot,
na linguagem, ele quer apenas definir wn uso légico da linguagem
(logico significando aqui adequado para 0 conhecimento © para a
09cigneia). Ducrot, a0 conteirio, procura
que seria a0 mesmo tempo uma semi
pressupde que uma tal Logica exista, @ que
inguagem wna lox
© empreendime:
0 nos parcee evidente
Do que foi dito acima, conclui-se, como haviamos
nciado, que mesmo admitindo que as eriticas feitas a Frege, por
Ducrot, sobre 0 plano (e6rico no so radicalmente incompativeis
com a problemética de Frege e que, levando-se em conta as
contradigées © 08 pontos obseuros que a sua formulagio mostra,
a passa na sua essneia ao largo da problemtica em
questio — como aliés as criticas formuladas por Strawson © por
Russel. Agora, se ndo nos esquecenins de que Duerot busca uma
ligica na finguagem, compreendemos melhor por que a nogio de
pressuposigio em Frege the
que € limitada a certos usos d
a nogio de pressuposigio, Duerot baseia
essa nogao tem em Frege, liguda 8 questo da negagio, Isso levou
Duerot a duvidar da ligagao entre pressuposigio e relerGacin Sobee
esse ponto, notar-se-4 inicialmente que niio hi evidéncia de que essa
ligagiio seja assim tio estreita em Frege como se tem dito, ji que
ele mosira qual a relagio existente entre 6 funcionamento das
expressdes ditas referencias e, por exemplo, o funcionamento das
subordinadas eondigionais, como em:
cee restritiva demais, na medida em
Tinguagem. Para estender portanto
¢ no sentido "téenico" que
(21) Se Pierre tivesse partide, Jean teria voltado,
A critica de Ducrot no esta entectanto ai; ela contesta 0
Iratamento diferencial aplicado aos dois tipos de relativas, as
restritivas © as deseritivas explicativas. Para Frege, quando
Tunciona como deseritiva, a rel io introdwz pressupostos, Ele
toma como exemplo de descritiva 0 caso em que a relative refere-se
um nome proprio como em:
(22) Jean, que sabe que Pierre esti aqui, néo vind
_ Frege considera que, do ponto de vista da pressuposi
no hi diferenca entre esse enunciado e 0 seguinte
wD
(23) Jean sabe que Pierre estd aqui € nao vird,
Para Ducrot, ao contririo, a aplicagio do eritério da
negagdo permite distinguir cm (22) 0 que esse enunciado
wressupde” (que Pierre ui) do que ele “poc* (que Jean nio
vird), Paroce-nos que essa conclusio é um pouco apressada © que
cla s6 se bascia sobre uma “intuigio lingiistica", que alids nada
permite just Pode-se, particularmente, observar que 0
cenunciado:
(24) E falso que Jean, que sabe que Pierre esti aqui,
6 freqicntemente julgado malformado c é interpretado de maneira
9 ocorre quando a relativa € restritiva). Esse aio
G entretanto um argumento suficiente. Para maior clareza, € itil
considerar 0s casos. em que 0 estatuto da relativa & ambiguo. Seja
por exemplo:
(25) Os sindicatos que defendem os trabathadores
conclamam a greve
nciras dil
Esse enunciado ¢ interpretado de dus 1
se se considera que todos os sindicatos defendem os trabalhadores
(de fato ou por definigao) e portanto também conclamam & greve,
‘ou que unicamente certos sindicatos conelamam & grove, aqueles,
precisamente que defendem os trabalhadores, enquanto 0s outros
de fato nao os defendem,
mente, constata-se que a interpretagio de um
da “opin” de cada um do que ct
de virgulas ou de uma entonagio
Experiment:
tal cnunciado depend
presenga ou da ausén
caracteristica, Além do 1
lis no cnunciado:
(26) E falso que os sindicatas que defendem — os
trabalhadores conclanem a greve
narelativa imente interpretada como uma r
que seja a entona
apesar de se en
ainda decisive. A questio é saber se a diferenga
funcionamentos da relativa deve-se ao fato de que uma pressupse
© contetide da relativa © no a outra ow ainda a outea coi
ceselarecer um pouco mais essa questo, &
nas quais uma relativa pode func
caso dos nomes proprios, ha duas outras possibilidades. A primeira
& aqucla cm que a idemtificagio da referéncia
independentemente do contetdo da relativa. E 9
tiva qualquer
undo argume:
re os dois
0, por exemplo,
(21) O menino que voce viu ontem, que veio me ver,
estd de nove aqui.
Em tal enun chan
fancione como uma deseritiva sind
condigées nas quais as duas rela
papel portanto que sio as con
muneiado que determi
como ja foi visto em (25).
A segunda possibilidade de funcionamento, deseritive da
relativa € aqucka em que o contetido dest
peopriedade geral daquilo rat
alla que ela se ref
de emprego. do
im o fuacionamento efetivo da rel
pode ser considerado
Wo peo grupo
(28) Os edes, que sto animais, podem ser domesti«
cados.
pois & pouco provivel que esse enuneiado seja interpretado como se
ele se apli uma espécie particular de cies, os que sio
animais, © no aos outros, Se é assim, € porque a animalidade &
uma propricdade geralmente reconhecida nos cies. A segunda
possibilidade de haver um funcionamento deseritiva da relativa no
n
faz apenas intervir portanto as condigdes de emprego desta, mas 0
proprio contetido desse enunciado: & preciso que as propricdades
ccnunciadas, via relativa, possam parecer como sendo propricdades
universalmente reconhecidas. De que tipo de propriedades pode se
a no ser daquclas que procedem de conhecimentos
jentificos ou daquilo que se mostra come tal, isto é, propricdades
consideradas como fazendo parte da natureza dos objetos
designados (como a animalidade do io)?
Nossa andilise mostra que o modo de funcionamento das
no & uma propriedade intrinseca aos enunciados nos quiais
tuparecem, mas que cle pode depender do que chamaremos de
‘agora_em diante de as condigdes de funcionamento dese
tenunciados. Isso nos permite precisar 0 peso tebrico da discussao
sobre a relagio entre © modo de funcionamento das relativas © a
imitimos com Frege que € apenas no e4so em
que relativa funciona sobre 0 modo resteitive que hi
pressuposigii, entio somos necessariamente conduzidos i conclusio
de que a existéncia on a ndo-esisténcia de lais pressupostos pode
depender de suas condigies de funcionament © nie apenas do
centnciado tomado isokidamente, Nao € indiferente dizer que os
pressupostos fizem parte das condigdes de emprego, pois isso s6
em sentido se se considera que de toda mancira o cnunciado
comporta pressupostes. Se admitinios que a presenga de virgulas ou
de uma entonagio caracteristiea € interpretada de mancira varivel,
ulmitimos ainda que o critério di negagio nie fornece um
argumento, permitindo estabelecer ineontestavelmente que os
enunciados. em que uma rekuiva funciona como deseritiva
comportim uma pressuposigéo ligada a essa relat io
podemos exeluir scm uma justificativa que a presenga de uma
de uma propriedade sintitica da frase, seja somente
uma condigao necessiria © condigio suf
hhaja pressuposigio no enunciado, Pelo menos nesse caso torna-se
Fa presenga de uma pressuposicio como um
possivel consider
Bprecisamente o que quel
no pode apoiar-se uni
tornando-se 1
negar Ducrot, Acontece que essa posigio
jente sobre o sentido t
a intervengio de uma teoria das relagies
entre lingua ¢ discurso, O proprio Ducrot reconhece que as regras
dle negagiio, de interrogacio e encadeamento que Ihe serviraim para
a necessidade de se distinguir 0 que um enunciado pie do
que ele pressupse “nia poderiam constituir um procedi
descoberta que produziria, imediatamente,
vento de
lises lingiisticas de
detalhe™™ © que, se esas regras
necessdrias para que um enunciado sej
a rigor, condigées,
considerade 6
pressuposto, seria muito perigoso considerd-las como condigies
sulicientes’.” E preciso portanto introduzir 0 tereciro tempo do
trabalho de claboragio conceitual da nogio de pressuposi
realizado por Ducrot.
Iv
A nogio de pressuposigdo em Ducrot faz parte de
projeto teérico que visa por em evidéncia a existén
Togica na lingua enquanto, geralmente, as ligagies da layica e da
Hinguagom so coneebides como sendo de naturezaexclusivamente
Essa logica da lingua, que & também concebida como
tuma scméntica, é assimilada, ver-se-4, as regras do jogo instituindo
'S entre individuos na finguagem, Nesse sentido elt
ria também uma psicologia social da lingua. EE por isso
‘ma que "0 fendmeno da pressuposigao (..) provoca
‘© aparccimento no interior da lingua de todo um dispositive de
convengies c de leis, que deve ser compreendido como um quadro
institu gulando 0 debate dos individuos'."* Noutro lugar
¢ levamos em consideragio 0 fendmeno da
pressuposigio, ¢ se definimo-lo, a0 nosso modo, como um poder
Juridico dado ao locutor sobre 0 destinatério, é preciso entio
que a agio dos interlocuto um,
feito acidem ‘
na propria
organizagio da lingua’ ele acresce , conseqitentemente, &
em mais que um simples instrumento para comunicar
scrito na sintaxe ¢ ao Léxico todo
lingua 6
informagies", que “ela comport
tum cédigo das relagies humana:
nos de que Duerot
‘As cilagées que precedem lembram
assenta sua concepgio da pressuposigao, enquanto forma de
mplicito, sobre uma critica da assimilagio da lingua a um c6digo,
instrumento da comunicagio ou meio de manifestar o pensamento
por simbolos que o tornam acessivel. Mais precisamente, sc no &
possivel considerar que a lingua & um ebdigo, é que esse modo de
representagao nio deixa nenhum lugar para a necessidade tanto
‘quanto social de uma forma consciente de implicito que
e, poder se manifestar na ¢ pela linguagem. Ai
para ele o papel da pressuposigio.
De uma certa mancira, pode-se dizer que Ducrot vira pelo
0 0 problema de Frege. Este dltimo procura liberar a
m da ilusio ¢ da demagogia que neta se imiscuem devido
la linguagem ordiniria, Duerot, ao contritio,
parte da idgia de que existe uma necessidade ao mesmo tempo
icolbgica de ilusio ¢ demagogia, conscicntemente
desejadas, para fazer a hipdtese de que a lingua deva
necessariamente ser tal que torne possivel essa produgio voluntaria
de ilusiio ¢ de demagogi
E porisso que Duerot eshoga uma teoria da persuasso e da
influgncia ‘social que no deixt “de ter rekagio com a_ dos
tratar essa questo, Parte da idgia de
ontradito"e que, portanto,"ni0 se
psicessocilogos que quien
que "tudo 0 que é dito pode
poderia anunciar uma opiniio ou um desejo sem expé-los, pelo
as eventuais objegdes dos interlocutore
cessirio "para toda crenga fundamental, quer se
e de uma ideologia social ou de um ponto de vista (parti pris)
pessoal, encontrar, se ela se exprime, um meio de expresso que
io a exponha, que no a transforme num objeto determinavel ©
portanto contestavel’. Acrescenta que ess crenga tem
contra sua “principal forga, ©
no seu perpétuo (re)dizer"2! E
necessidade de se exprimir porque
stia principal fonte de evidén
15preciso portanto poder di
+ sem ter dito, exprimir efetivamente
certos contetidos (erengas, ponto de vista pessoal ow ideologia
social) sem para tanto poder ser obrigado a reeonheeer que os
cexprimimos voluntariamente, Seria entio previso nio apenas poder
F os conteados — isso & necessério para que cles sejam
cfetivamente expressos — mas também que cles possam ser
wos de tal mancira que a responsabilidade de (@-los
exprimido nao possa ser imputavel ao loculor. Em outros termos,
seria preciso que na manilestagio voluntéria desses contetidos fosse
apagada sua ligagio com o sujeito da enunciagio, Mais exitamente,
seria preciso conceber um processo de desdabramento do sujeito
da enunciagde, um desses sujeitos sendo identificado ao locutor ©
considerado como {vel pelos contetidos formulades, 0 outro,
© duplo do primeire, no sendo mais identificado ao loculor
fomando, por esse fato, 0 estatuto de sujeito universal,
Compreender-se-ia entio que os contedidos vineulados a esse
segundo sujeito da enunciagao parccem investidos dessa especie de
evidéncin que € 0 atributo do sujeito dito universal, sujeito da
cigneia ou daquilo que se mostra como tal
Introduzindo @ proceso de desdobramento do sujeito da
cnunciasio cujos principios acabamos de indicar, nds si pensamos,
em dar uma base (eérica para aquilo que’ de outro’ modo
permanceeria bastante misterioso, a saber, 0 porque da elie
seonhecida pelo proprio Ducrot, do modo de apresentagio
a dos conteddos, que constitui a pressuposigio. Ebvo,
entretante, qt io esse processo nis introduzimos elementos
sdrieos que no aparccem na anilise de Duerot ¢ que nio provém
mais da teoria psicossocioligica da persuasio e da influéncia, mas
da teoria com que se devem relacionar os canccitos de sujeito
universal © de (eoria das ideologias © das
formas de existéncia da subjetividade. Nao é nessa diregio que se
tencaminhou Ducrot, pois seu objetivo é mostrar que a pressuposigao
E de nalureza lingitstica, o que significa que os pressupostos devam
set considerados como fazendo parte da significagio literal dos
cnunciados. E af que intervém a distingio fundamental no quadro
de sua problematica dos pressupostos ¢ dos subentendidos,
espe
lentificagio, a saber,
1
dio entre pressupostos ¢ subentendidos, tal como
Ja por Ducroi, repousa sobre uma primeira distingio
ies que podem estar asso
io. entre significagto literal &
distingio € superposta
cla 6 produ
‘opcrada no conjunto das si
a um enunciado: a dis
significagdo —ndo-literal,
‘uma segunda, a do imp!
teérica de Ducrot em relagio aos seus predecessores se reduz a
formular que, uma vez essas duas distingbes admit 0 Se
recortam, de tal modo que as associadas a um
‘enunciado podem ser repartidas om quatro categorias definidas pelo
quadro abaixo:
plicito explicito
literal pressupostos postos
o-literal subentendidos conclusdes
nceessirias
Vimos sobre 0 que se assenta a distingio do implicito ¢ do
explicito: sobre a necessidade tanto psicol6gica quanto social de
recorrer ao implicito, O resto repousa sobre a oposigio do literal ¢
do nio-literal, E precisamente essa distingao que Ducrot identifica
com a da lingua ¢ do discurso. Ao fazé-lo, cle confere a essa
um conteiido teérieo que, ainda que amarrado a
concepgies anteriores dessa ligacio, ndo deixa por isso de requerer
discussio, justamente pelo que essas concepgdes implicam do ponto
de vista da tcoria da significagio. Vollaremos a esse_ponto,
portanto, depois de cxaminarmos sobre 0 que Ducrot funda a
distingio do literal © do nao-literal
De imediato, a distingio em questio aparece_como
problematica, ao mesmo tempo pressuposta e exigindo justitical
‘A distingio € pressuposta quando se diz que para apreender 0
implicito da_pressuposigio, considerada como lazendo parte da
nsignificagio literal, nccessirio nenhum expediente ligicw ow
psivologico de natureza diversa dos mecanismos utilizados. para
comprecnder as. significag
Ss lingiifsticas mais clementares’s
caquanto © mesmo no aconteceria com as signifieagées que podem
estar discursivamente associadas a um enunciado. A distingao
sinda pressuposta quando se diz que a relagio de um enunciado
com as signilicagies literais € uma relagio imediata © estivel. O
imediatismo dessa relago poe em jogo a relagao do sujeito com ©
cnunciado © com a lingua. Por essa via, tem-se a hipotese de que
uma parte extdvel (isto 6, independente dos sujeitos
se mostrar para “quem quer que conhega sulicientem;
(para_retomar os termes de
uscetivel de
te a lingus
Frege) ou ainda de se revelar “a
intuicdo imediata’ (para retomar dessa vez os termos do proprio
Duerot). Desse modo esti justificado 0 que anuncianas a propisito
da discussio sobre © estatuto do conecito de fulso em Frege,
posto fquele elaborado por Strawson ¢, depois, por Ducret (ef. pp,
57-8). Mas, enquanto o sujcito s6 intervinha em Frege no nivel das
relagées entre 0 sentido © a referéneia dos nomes proprios, essa
intervengio da subjetividade linghistica (sobre a qual deveriamos
dizer, se Ihe damos direito de cidadania, que
psicossocial) € estendida ao conjunto das relagdes de sign
Contrast com a estbildade eo imeatatnm da rela
enunciado com suas signifieagdes literais, as significages nao-tiverais
(os subentendidos © as conclusies neeessirias) mantém com o
enuinciado uma relagio mediata e inst iato dessa
ova relagao seria devido ao fato de que um expedicnte intelectual
ou psieologico precisa intervir, expediente que toma por base as
ignificacdes literais © assegura a passagem para as significacdes
nio-literais © que tem a forma de uma associagio de signilicagives
ou de uma inferéneia, Ducrot esta sobre esse ponto totalmente de
acordo com Searle que escreve: "o discurso figurativo & parasitario
com relago ao discurso literal, pois (segundo ele) ndo & possivel
enunciar uma frase atribuindo-he um sentido figurative se nao
temos 0 sentido literal como base do uso figurative" A. tinica
diferenga & que onde Searle fala de “discurso literal’, Ducrot fala de
significacdes Tingiifsticas fiterais. Quanto ao segundo aspecto das
sua natureza 6
a
rel. O carater med
8
(orais, sua variabilidade decorreria do fato de su:
significagdes ndo-
relagio com 0 enunk
‘cognitivos que podem variar de um sujeito para outro, em fungio do
contexto © das “circunstineias da clocugao", o que é indicative de
que estamos na ordem do discurso (intervengio da enunci
Pr
nos processos de produci
(0 de significagio correspondendo respectivamente ao que no
por significagies literais c significagées nio-
Mas, por outro lado, contestamos a idgia de que scja
falar de uma semdntica da lingua eujo _processo de
constitu plicitamente contido na propria nogio de
significacdo literal tal como foi definida por Duerot, isto &
fantasiacla pelas propricdades de imediatismo, estabilidade,
acessibilidade direta & intuigio lis .. Essa incidéncia,
mesmo tempo que fixa nosso horizonte, reconduz-nos ao card
problemitico da distingio estabelecida por Ducrot_ no
mesmo do seu proprio discurso, Até o momento, nos exames do
ssa distingio, nos nos detivemos nos lugares em
que cla & pressuposta; a teoria da significagio que encontramos
e compativel com as intimeras concepgdes ainda con
inclusive a econecpgio nominalistatradici
n outro lugar, é tomada uma distancia
tessa concepgao quando ele diz. que “as significagdes dos enunciados,
tomados fora do contexto (portanto si es literais) nso
constituem de modo algum fatos ou dados, mas resultam de uma
decisio livre do lingiista’2* Ao adotar essa posiga
‘com a perspectiva chomskyniana de uma formal
Tingaistica, ainda que nao endosse todos os pressupostes adotados,
no projeto dos transformacionalistas da Escola de Cambridge. Para
Ducrot, trata-se de definir o que se pode almente entender
por deserigto seméntica de wma lingua.
‘com relagio a
Lembremos, uma vez mais, que para Chomsky
gramatica & um dispositive que deve satisfazer dus eondigé
”a) ser eapaz de fazer corresponder, por meio de um
conjunto de regras formais, a qualquer representagdo fonética de
uma frase, em um sistema de categorias fonéticas universais, uma
ou, eventualmente, varias descrigées semanticas dessa frase, em um
sistema de categorias seminticas universai
b) dar conta das propriedades das fr
relagées de sentido, gramaticabilidade ou desvio relativo i
gramaticabilidade) tais como se revelam &
imediata de todo sujeito que fala a Kingua.
imbigiidade,
intuigdo lingiistica
© projeto de deserigio si
iro olhar,
ica de Duerot parece, ao
prim © mais ambicioso porque essa deserigao &
definida como “um conjunto de conhecimentos que permitem prever
o sentido que recebe efetivamente um enunciado da
uma das situagées em que ele 6 empregado’
Particularmente ambicioso do projeto deve-se a0 f
deve operar uma certa an
ra em cada
© carater
to de que ele
e das situagies que és _nio
compreendemos bem em que consistiria exatamente. © projeto
chomskyniano parece mais limitado, pois pressupde que, através da
intuigdo lingbistica, pode-se afastar do contexto © chegar 2
representagées semanticas, sendo que as relagés
significagie: io consideradas como do dominio da gramatica
mas do dominio da teoria do desempenho. Quanto a Duerot, cle
considera que “aquilo que se chama de ocorréncia fora do contexto
ada mais é do que uma ocorréncia num contexto artificialmente
simplificado' © que, conseqiientemente, as significagées consti
ladas nessas condigées podem impedir que se preveja o sentido
cfetivamente recebido nos contextos naturais. A divergéncia entre
as dois projetos aparece mais como uma diferci
(fundada sobre uma apreciagao diferente das condigdcs reais de
realizagio do projeto) do que uma divergéncia de fundo, pois
Ducrot supde, de todo modo, que se pode definir uma signilieacto
literal ndo-contextual. Essa diferenca de abordagens explica,
igualmente, porque Ducrot rejeita a idgia de que scja precise
estabelecer a priori que a descrigio semantica dos
permite prever seu sentido efetivo em cada
80
ucrot mantém a exigéneia segundo a qual para uma relagio de
sentido R. inivamente pereebida entre dois cnunciados A © Bde
uma lingua L, deve corresponder uma relagio formal R’, ma
metalinguagem de deserigio L’. Através de tudo que foi exposto,
Duerot protegeu'se das wumerosss objegdes formulates contra
aquilo que, mal ou bem, pode aparecer como exigéneias arbitrarias
do projeto chomskyniano.
cariter
parentemente
Quanto ao projeto de Ducrot, s a
utépico nfo € razio suficiente para afasté-lo como hipste:
trabalho capaz de produzir um certo conhecimento dos fendmenos
ds nea rabes pertinentes prov do que
ignificagio. Ainda at
sua realizagio pode incorporar como hipotese sobre a (cor
te
, & justam © ponto que reencontramos as
significacio, Os
a 80 ¢ lingua. No
oposigies entre 6 literal ¢ o ndo-literal entre dis
6 obrigado a destacar, no conjunto dos eonhecimentos necess
para predizer 08 sentidos de um enunciado nas suas diferentes
condigaes de emprego, um componente linguistico que “atribuiria
a ca enunciado, independente de qualquer conteto wa ert
jeserigio, que chamarcmos de significagio"™ © um componente
cnunciado pelo componente lingiistico ¢ dadas as circunstinci
au ele € pronuneado, prever © sentido efetivo desse enunc
situagdo. & efetivamente da maior urgéncia, considcrando 0
posto (¢ aquilo que nio se quis levar em conta), tomar as
para no cair na confusio em que se esta
que foi
edidas, necessiri
81mergulhado se fosse nec
{rio explicar que © enunciado Que
fempo! contém as significagbes de nds ndo remos nada a dizer!,
eotd fazendo um tempo do cao een. Ao fazé-to, passamos de uma
definigdo sempre pressuposta da opo: literal © 0 nao-
Titeral para uma definicao puramente operacional, figada a exigén
um valor preditivo da significagio identificada A sua deserig
semdntica, O interesse em considerar essa definigdo operacional
reduz. ao minimo as hipdteses contidas na oposi¢io entre 0
a teoria da significagio que esti implicitamente
ncorporada neste projeto de descrigdo semantica da lingua, a saber,
a hipotese segundo a qual a discursividade sé imerviria na
passagem, nas situagaes de emprego, da signifieagio para 0
sentido ¢ de forma alguma no processo de producio ¢ de
reprodugao das préprias.significagies. Essa hip6tese, ainda que
adequada a0 tipo de evidéneia empirica que adviria, pela
intervengio da “intuigdo lingistica", da contemplagao da linguager
no seu funcionamento sobre si mesma, no deixa de ser aquela que
inar com as bases
io conetitual realizado por Duerot
io de pressuposigao, & preciso examinar os efeitos dessa
hipotese sobre a teoria da lingua ea da significagio. E ela que abre
© caminho para aa io da lingua a um jogo que se
confundiria amplamente com a existéncia cotidiana, jogo no qual
i participaria assimilada a um ato de linguagem, como
‘© movimento de uma pega no jogo de xadrez. E o que veremos
awora,
Desde 0 comego da e concepedo que assimila a
lingua a um eédigo, através da qual Duerot opde-se a que se ponha
todo o implicito do lado
definir a lingua A moda de
instrumento da comunicaca
ure, como um codigo,
lerada como um
jogo ou, mais exatamente, como impondo as regras de um jogo que
se confunde amplamente com a existéncia cot
tomada de posigio € um pouco surpreendente, exatamente na
‘medida em que, em lugares decisivos do ponto de vista do corte que
marca sua contribuigio te6rica aos fundamentos da lingtistica,
Saussure serviu-se da comparagdo da lingua a um jogo. A
comparacio é utilizada por Saussure:
44) no momento em que estabelece a oposigio entre o que
nna linguagem 6 interno a Kingua ¢ o que the & externo: “é interno
tudo que muda o sistema em qualquer grau’, portanto no a matéria
de que sio feitas as unidades (resp. para o jogo de xadrez, as
‘ou a forma material das pegas) nem o fato de que a Ii
pasado da Roma antiga a Galia (resp. para 0 jogo da Pérsia a
Europa), mas em compensagdo 0 aumento ou a diminuigio do
ngimero de pegas pois isso “atinge profundamente a “gramaticw’ do
jogo"
b) no momento em que opie diacronia &
{que 86 contam as posigaes respectivas das unidades © nio 0
que se tenha chegado a elas por tal ou tal caminho (resp. pi
posigio das pegas sobre o tabuleiro em dcterminada ctapa do jogo
€ no, ao longo da partida, para 0 fato de se ter chegado a essa
posigio por tal ou tal seqi movimentos ¢ de jogadas);
©) 6, cnfim, esse € 0 ponto mais importante, no momento
valor em oposi
incronia dizendo
em que ele defi
‘alor pode ser eansiderado como o micleo da ruptura — devertamos
issuriana”™ apoiando-nos nas conclusdes da
indagacio ep ‘a que Claudine Normand submeteu 0
Cours de linguistique —générale.® Actes
principio estrcitamente ligado a idéia da lingua como que
abre a possibilidade de uma tcoria geral da lingua’, sob seus
aspectos fonolégicos, morfologicos © sintiticos, fundando a
autonomia relariva dessas propricdades com relagiio &
{A esse respeito mostramos também que © corte em questo deixa
ter escrito corte —
83fora do seu campo a seméntica © que, para tratar dela, s
recorre novamente a palavra e ao sujcito, o que est em contradicio
com 0 fato de que o prinefpio lembrado acima tem "como efeito
cortar qualquer recurso ao sujeito, quando se trata da lingua’
centdo a instituigao social ow remete a questao da
semdntica para a constituigio de uma semiologia enquanto teoria
geral dos signos. E uma maneira de dizer que a significagio nao
catamente de natureza Tinglistica. Dessa conelusdo, mantemos,
jiclo nosso lado, que efetivamente a significagio mio & de naturcza
sentido de Saussure, a no ser na sua rela
fonologia, a morfologia © a
idéia de que o principio de w procura de uma
semiologia qualquer ou na idcntificagio da lingua com uma
igo social (no sentido em que geralmente ent
alavra), vendo nessa solug
lear a necessidade de um recurso a un
Uo efeito sujeito cujos projetos no pod
por Saussure dado que dependiam dos cortes voile albures, na
obra de Marx ¢ na de Freud, para ser mais preciso,
© que precede justifiea a tomada de posigio de Duerot,
com a condigao de limiti-la unicamente ao dominio da se
Sobre esse terreno ¢ correto dizer que Saussur
de uma concepgio da lingua enquanto instrumento que permite sos
sujeitos "ver seus pensamentos’ © comunicé into, tal
interrogagio critica de Saussure nao é conduzida por Ducrot para
tomar o camino que acabamos de indicar algumas finhas acima,
mas para tomar a frente de uma posigio que chamariamos de
totalmente oposta. De uma certa maneira, © que Ducrot propde &
transportar para o dominio da significagio a comparagio da lingu
4 um jogo, comparagio que s6 caberia na fonologia, na morfologi
na sintaxe, isto & naquilo que, pela sta relativa autonomi
forma de linguagem considerada na relagio consigo mesma, Ducrot,
além do mais, ndo se contenta com uma comparagio que em
Saussure pode apareeer como tendo, antes de tudo, apenas um valor
didatico, Ele identifica efetivamente a lingua a um jogo, que nio
somente regularia as relagbes interpessoais, na medida em que estas
84
realizam-se pela Finguagem, mas ainda que seria sua propria
substincia,
sforn
Para chegar a tal conclusio Ducrot usa e tr
tworia dos atos de linguagem de Scarle, assim como a sua anslise
ja durante um jogo como o xadrez.* Segundo
da atividade realiz
Searle, as regras de um jogo como o xadrez tém uma earacteris
1s so constiturivas do jogo no seguinte s
fundamental; ela
nar outras regras € portanto outros
8) poder
jogos;
as regras 0 jogo nao existiria © no seria possivel
te no fato de jogar uma partida
ue ele quer dizer quando afirma
itutivas, Searle opie 0 jogo de
reve da seguinte maneira
b) sei
cempenhar-se na atividade que con
de xadrez, Para precisar melhor 0
que as regras do xadrez siio cons
xadreza um jogo imaginario que de
Imaginemas (...) wna sociedade de sédicos
cujos membros gostam de se maliratar entre
eles gritando nos ouvides uns dos outros. Su-
pontumos que para satisfacer essa quedinha
eles adotem a convendo de sempre gritar
BANG para producir esse efeito. Nesse caso,
como no do xadrez, trata-se de uma atividade
implicando uma convencao, Mas, diferente:
mente do xadrez, a convencdo nao manifesta
‘aqui regras constinutivas subjacentes. Contra
riamente ao case do xalrez, esse procedimento
convencional procura obter un resultado natu
ral
Gragas a esse jogo imagindrio, Searle pode estabelecer a
diferenga entre a matureza constituriva das regras € a forma con
vencional gragas as quais elas sio representadas. Essa distingio &
inda detalhada pela observagio de que seria possivel dar uma outra
forma ao jogo de xadrez, por exemplo substituindo © tabulciro
85por uma seqiéneia de nimeros € as pegas por outros simbolos
apropriados e associando a cada simbolo 0 ntimero correspondente
A casa em que a pega seria representada por esse simbolo sobre 0
{abuleiro. O jogo permanece um “jogo de xadrez’ na medida em
que, na transposigéo, conservam-se as regras, Tendo assim
caracterizado as regras do jogo de xadrez, dizendo que clas sio
constitutivas, pode-se dizer que se empenhar numa partida de
xadrez implica uma submissao deliberada as regras do jogo de onde
(5 atos realizados no deslocamento das pegas sobre 0 tabulciro (se
nos limitamos ao modelo tradicional) tiram scu valor ¢ seus efeitos.
tunicamente na conformagio com as regras que 0s atos realizados
podem ser interpretados ‘pelo parceiro como manifestando a
intengao rar com cle na atividade que constitui jogar uma
partida de xadrez, A partir dai, concluimos que, para Searle,
trapacear nao € jogar endo é por acaso, na nossa opiniio, que 0
jogo de xadrez seja escolhido como modelo privilegiado pois, salvo
circunstncias totalmente excepcionais, no se pode nem trapacear
nem blefar no jogo de xadrez: 6 um jogo sem ambigiidade, [sso
significa, porém, que nio se possa indagar sobre a estra
adversirio, mas esta s6 pode ser concebida como uma seqti
alos, que, tomados cada um isoladamente, no sofrem da
ambighidade.
1c daguilo que & um jogo de xadse7,
ther sobre a analogia entre jogo &
jolar uma forma de eomportamento
a qu
linguagem.
cogido por regras™
Particulares is quais se obedece ao falar tal ou tal
‘mas as regras subjacentes “atualizadas © manifestadas nas
como no exemplo do xadrez".” Searle precisa justificar
te que essas regras existem realmente © para isso vai
intertradutibilidade -gundo ele,
agdes convencionais,
exatamente como as
ica e a forma em que 0
ia de niimeros representam
basear-se
"as linguas naturais diferentes representam
diferentes das mesmas regras subjac
formas do jogo de xadrez: a forma cla
abuleiro & substituido por uma seq
86
duas aplicagées conven diferentes das regras do jogo de
xadrez. Em’ um certo sentido, poder-se-ia considerar que essa
concepgio das regras encontra uma justificativa na concepgio das
graméticas transformacionais que considera que s6 a estrutura
profunda contribui para o sentido © de que além disso el
tuniversal, Serfamos assim levados de volta aos problemas,
Formulados na primeira parte deste trabalho, Mas as coisas no so
, pois Scurle considera que a analogia entre
sustenta no momento em
{que as significages entram em questo. Essa tomada de posigio
introduz uma contradigio na teoria de Searle que Ducrot™ niio
deixou de observar e sobre a qual teremos que vollar. Por ora, se
essa identificagio das regras ¢ excluida, de que tipos de regras quer
le? © importante, no scu ponto de vista, que essas
‘am 0 que se faz a0 falar ec, portanto, que o
nto a clas seja equivalente a renunciar a falar; com clas
deve ser ou tudo ou nadia. S por essa qualidade que elas
podem ser constitutivas como as regras do jogo de xadrez. Ha
todavia uma diferenga, Na falta do jogo de xadrez, haveria uma
atividade lidiea que poderia realizar-se de diversas manciras ¢ com
relagio qual as regras do jogo de xadrez perderiam rel
0 sct cariter restritivo, Ao contrario, para o jogo que s¢ jogs
falar, se a intengdo é significar, mio haveria solugio de troca
possivel. E ai que intervem a nogio de are ilocuciondrio (nogio
© por nenhum outro meio, a ndo ser que se retorne au
concepgiio puramente instrumentalista da linguagem (que Sear
parece fotalmente decide a exlui uma vez que cle admite que os
fora de qualquer sistema den
Contd nesta hipdese, masa eventuaidade eoatemplada eve set
relacionada com a limitagio que impde & analogia entre linguagem
¢ jogo). A nogio de ato ilocucionario define-se no interior de uma
anilise daquilo que se faz quando se diz. alguma coisa,
87amente resumidos, os diferentes tipos de
idera que se pode realizar ao di
alos que Searle coi alguma
4) pronunciar uma frase (equivalente a deslocar uma pega
sobre o tabulciro de acordo com as regras de deslocamento das
pecas sem por isso pretender tomar parte numa partic
b) significar alguma coisa, isto
Tinguagem, realizar um ato tal como: af
formular uma questo, comandar ou qualquer coisa de parecide
(cquivalente a deslocar uma pega, de acordo com as regras, quando
© a sua vez no jogo, ¢ com a intengio de tomar parte em una
partida);
quando se trata de
mar, ordenar, prometer,
©) procurar produzir, pelo fato de ter significado alguma
coisa, certos efeitos sobre 0 destinatirio (por 0 adversirio. em
ificuldade, procurar ganhar a partida tc.)
| ¢ do que possa ser dizer alguma
coisa, constatarse que a exceucio de (b) supse um ato como (a) e
que a exceugio de (¢) supe um ato coma (b) © como (a). Eo ato
correspondente a (bh) que chamamos de ao ilocuciondrio, (a)
sendo chamado de aro locuciondria ¢ (6) ato perlocuciondrio.
Ora o que distingue (b) de (a) €, segundo Searle, a
intencionalidade no sentido de que se pode dizer uma frase sem
significé-la como quando toma-se essa frase para submeté-la a uma
anilise lingitistica, Searle faz portanto da intencionalidade do
Jocutor wn elemento exsencial sem o qual o que é dito nao é
una patavra,
Podemos agor a que tipo de regras Searle faz
alusdio quando diz que “falar é adotar uma forma de comportamento
‘do por regras’. O ato locucionirio & aquele que eorresponde ao
nico nivel das convengdes pelas quais as regras podem “ser
aplicadas. O ato perlocuciondrio caracteriza 0 objetivo procurado
pelo fato de adotar © comportamento em questio © no 0 proprio
comportamento. Apenas 0 ato ilocucionirio 6 constitutive ©
88
corresponde & aplicagio do equivalente as regras subjacentes do
jogo de xadrez. portanto as regras que regem os alos
ilocucionarios que constituem a substincia espeeifica da atividade de
linguagem, Essas regras so para tomar ou largar © s6 hii escalha
num segundo nivel, entre, por exemplo, dizer Je promets em vez
de I promise,” o que seria ai uma questio de convengio enquanto
“o fato de empregar obrigatoriamente certos procedimentos para
exprimir uma promessa (numa sittagio apropriada) € aqui do
dominio das regras & no das convengtes proprias do francés © do
inglés"
Uma vez isso formulado, resta, como jé observamos, a
hipitese de qu le, entre a realizagio de atos de Tinguagem
¢ jogos, 6 pode haver uma analogia parcial pois, diz ele, “as pegas
de um jogo como 0 xadrez nio tém como caracteristica significar
qualyuer coisa que seja’. Portanto, ele se recusa a identifiear pura
© simplesmente a lingua a um jogo. Isso deve-se essencialmente a
duas razdes. Primeira razio: no momento de considerar que todos
6s atos ilocucionirios no sao exceutiveis fora da lingta enquanto
sistema de regras que os constituem, isto é, no momento d
«que sua significagio s6 6 definivel em relagao a lingua (logo, contida
inguia) Searle hesita. Ora, admilir que possa ser assim &
wunciar ao carter constitutivo das regras, conservando-Ih
apenas um carter convencional, Segunda razio:
fundamental ¢ nao independente da primeira) Scarle nao se decide
quanto a considerar que as regras subjacentes, as rege
constitutivas possam ser clas também, num outro sentido, tomadas
‘como convencionais, Em outros terms, ele no reconheee 0 que
chamamos de 0 arbitrdrio generalizado ow 0 arbitrdrio do
sistema, © qual deve ser cuidadosamente distinguido do arbit
do signo, Ducrot insistiu com razo sobre o fato de que nao & 0
arbitrario do signo que marca o corte saussuriano; segundo cle, 6 0
reeonhecimento do arbiteario do sistema expresso em Saussure pela
idéia de que a linguagem & uma instituigio social e que as regras da
* "Gu prometo" em vez de I promise ("eu prometo")
*lingua so convencionais. A idéia de considerar 0 signo como
arbitrario é bem anterior a Saussure ¢, isoladamente, cla no nos
tira do nomin: sua a uma instituigio
social € © ponto fraco da teoria saussuriana; ele procede do
antropomorfismo sociolégico do scu tempo que constitui a
sociedade em sujcito. E a intervengao da “massa falante’, “das forgas
sociais trabathando-thes (para os sujeitos falantes) a lingua’
fato de a "lingua nao scr livre’, do fato de o "tempo gasta
como ele gasta os velhos muros". Poderiamos multiplicar as citagdes,
que no Cours de linguistique génerale marca o carater pré:
ista da conccp¢o do tempo ¢ da sociedade nas suas
com a linguagem. Isso ja foi feito em outro lugar,” © nos
no vamos insistir nese ponto a nio ser para dizer: (1) que a
questo das relagdes da linguagem e das formagées socials,
permanece em patita, pelo menos sob forma negativa as finguas nio
so superestruturas, ainda que nio estejam por isso fora da historia
das formagées sociais; (2) 0 feito sujeito enquanto efeito material
deve ser considerado, de um lado, como um produto da autonom
relativa daquilo que na linguagem € “fato da lingua” (no sentido
saussuriano). Para nds, portanto, jt lembramos acima, nao se
no no nivel do arbitra
ingio entre valor ¢ signif
relativa da morfologia, da fonologi
sentido de que essa autonomia é uma cont
que marca o conceito de lingua enquanto condic
desses aspectos do funcionam
e dos efcites de
Eisso
0 de conhecimento
io material da Tinguagem,
E a partir das posigdes (c6ricas que acabamos de lembrar
que iremos examinar a titima fase da operagio que Ducrot realiza
identificando pressuposicio € ato ilocuciondrio depois de ter
interpretado, baseando-se no arbitririo do sistema, a teoria de
Searle, Para Ducrot, é com efeito uma convengio social que confere,
0s alos ilocucionarios scu valor ilocuciondrio. Para dizer isso, ele
-a.a teoria dos performativos de Benveniste, que explicou 0
cariter performative de expresses como eu prometo (ao dizer eu
prometo, no afirmo simplesmente alguma coisa, mas tambi
realizo 0 ato de prometer) dizendo que ela procede (a) do emprego
90
do pronome pessoal ew pelo qual o locutor mostra-se, cle mesmo,
no seu proprio discurso e do presente do indicativo que representa
no discurso 0 momento da enunciacio (eu prometia ¢ ele promete
no si performativos); (b) do fato de que um verbo como
prometerdesigna um “ato individual de alcance social” ou ainda de
que “os atos denotados por esses verbos sejam olhadas como
restrtivos’, Benveniste vé na existéncia desses verbos, como na
existéncia do pronome pessoal ew ¢ do presente do indicative, a
marea da presenca da subjetividade ma linguagen. Ou
Benveniste define desse modo como subjetividade ndo € nada além
ionalidade de Searle (e, seja dito
de passagem, por nés, {i mais na linguagem do que a
intencionalidade porque uma ¢ outra devem ser concebidas como
feito), Ducrot recusa a anilise de Benveniste porque, para estender
8 pressuposigio 0 carter ilocuciondrio dos performativos, é preciso
que cle separe esse carter do emprego de morfemas "auto:
na superficie pelo menos, em numerosos casos de
ssenta-se sobre a idéia de que, das dias
te, uma nio € necessiria € a outra nao é
rarece como niio-necessiria, desde
le, © performative como uma
pressupo
condigies de Benvei
ste. A primeira condi
que se considere, como Austin
c ilocucionario enquanto, na superficie, 0s outros
ilocucionarios nio se fazem sempre acompanhar do emprego de
jorfemas "auto-refereneiais". No que concerne a segunda condigio,
nao scria suficiente porque hé muitos outros atos individuais de
alcance social de tal modo que, empregar os verbos que os
designam na primeira pessoa do presente do indicativo, no possa
ser considerado como a realizagio do ato em questio, E “a
sociedade que, segundo Ducrot, intervém para atribuir 4 formula
eu te desafio um poder particular, para dar a seu emprego esse
efeito cm que 0 destinatério ‘abaixa a cabeca’ (ou, simplesmente,
deve confessar-se inferior) se ele no for capa, de acompan
ago em questio; com a contrapartida de que, se cle for capaz de
realizar tal ato, o locutor tera de reconhecé-lo como seu ig
poder que a socicdade conferiria a certas fSrmulas, Duerot quali
on© de juridico. E desse modo que ele diz. que ew te censure, pelo
‘menos quando dito por um superior a um inferior, tem como efeito
‘dcixar o inferior marcado por uma qualificagio que, dai por diante,
faz parte de sua personatidade juridica (grifo nosso)’. A partir
dai Ducrot formula uma série de definigdes:
Agio: "toda atividade de um sujeito (grifo nosso) quando
caracterizada de acordo com as modificagdes que cla tra7, ou quer
Lrazer, ao mundo (compreendendo-se ai modilieagdes trazidas &
situacio, fisica ou social, do sujeito que age — gril nosso)".
Agdo Juridica: —atividade (de um sujeito, portanto)
“earacterizada por uma transformagio das relaedes legais existentes
entre os individuos (grfo nosso) concernidos”.
Ato juridico: “caso particular da ago juridica (...) quando
se considera a transformagio das. relagGes legais como cl
primeiro da atividade © no como a conseqiiéncia de um ef
logicamente ou cronologicamente anterior." Isso. significa que
cometer um crime nio é em si uma agio juridica mesmo se
depende da lei, mas o enunciado de uma’ scatenga por um
magistrado é, cm compensagio, um ato juridico. Portanto, & me
a sociedade que confere ao ato sua natureza € nio 0 ato que & por
si mesmo, de natureza juridica, do mesmo modo qu
que confere ao ato de dizer ew prometo um
por isso, juridico. A definigao de ato juridico s6 tem portanto coma
fungdo apagar a intencionalidade ou a subjetividade ligada 8 ago,
tal como foi d io se julgam intengoes: querer a morte
de alguém ndo é um crime mas apenas o fato de ter matado
gum, Em suma, considerando a so
juridica, Duerot no faz nada m:
subjetividade (passiva) ou a intencionalidade (ativa) que Benveniste
(para o performative) © Searle (mais amplamente pi
ilocuciondrio) tinham introduzido na definigio do ato ilocu:
Ao fazé-lo, Ducrot submete-se a lei da Idcologia (no sentido em
que Althusser emprega esse termo cm Idéologies er appareils
idéologiques d’Etat... Althusser, 1970) que determina que consi-
derar a sociedade como sujeito’ ou 0 homem como sujelto sto
sociedade
2
apenas duas faces de uma tinica ¢ mesma operaao. Além do
mais, ele demonstra uma vez mais, como se ainda fosse necesséio,
que a ideologia juridica € a instincia dominante da ideolo;
mundo de produgio capitalista (Althusser, id
Através de tudo o que foi dito, é possivel dizer que a
pressuposigio, enquanto ato ilocucionsrio, € um ato juridico. Em
outras palavras dizer:
E voce quem vird.
G juridicamente, do ponto de vista da lei da lingua, dizer a
vird c, por outro lado, anunciar que o alguém que vird é 0 voce a
A isso pode-se acrescentar que a sangio
i lingua € a polémica, na medida em que
marca a diferenga que hi entre responder com:
(29) Nao, é Pierre.
(30) Nao, ninguém vird.
a0 enunciado precedent
Para identificar completamente a Ii um jogo eujas
regras sio regras juridicas, no sentido em que foram defini
falta obscrvar que tudo 0 que foi dito 56 se sustenta com a condigio
de que o, ou pelo menos sobre uma
significagao das palavras. E unicamente nessa condigao que se pode
Gl) Pierre suspeita que Jean vird.
declara juridicamente (= pressupde) Jean vind. Em outros termos,
€ preciso admitir que a sociedade confere juridicamente as pal
uma significagio literal, Nesse sentido diseutir sobre a significagtio
das palavras é 0 equivalente a polemizar sobre os pressupostos. Essa
6 a ra7do por que pudemos anunciar acima q\
3icagdo discursivamente derivada ¢ da si
condigio que, sobre © plano teérico, abre o caminho para a
identificagao da lingua a um jogo “que se confunde amplamente com
a existéncia cotidiana’, Duerot 0 faz sendo mais saussuti
Saussure na identificagao da lingua a uma instituigao social.
Ihe permite incluir, sob forma de substancia, as signifieagoes
na lingua.
Deve-se dizer para tanto que negamos a exis
dicionatios, das escolas, da Academia, dos deeretos ou das leis pelas
quais legisla-se em matéria de significagdes ¢ de lingua? Ni
justamente necessirio ver af a prova da intervengdo da sociedade
tem matéria de lingua? Responderemos categoricamente, no que diz,
respeito a lingua, pela negativa. Uma lingua nao se cri rctos
© a intervengao direta ow indireta do Estado na matéria faz-se pelo
intermédio de aparelhos ideoligicos de Estado, sobretudo, ¢ de
‘mancira preponderante na nossa sociedade, pela escola. Sendo de
natureza ideolégica, essa intervengao legislante do Estado cm
a de lingua pode apenas codificar empregos, ela nio produz
por si mesma significagdes. Ocorre que o Estado nio € a socicdade
ou, para falar em termos um pouco mais precisos, a form:
social, Evidentemente, nao negaremos que os processos pelos quais
significagbes so produzidas e reproduzidas, enquanto efeitos de
significagdo, operam no interior da formagio social dos diversos
aparelhos ideoldgicos. Mas, justamente, a formagio social nio é
composta de sujeitos; nela s6 se podem definir lugares aos qua
esto vinculadas condigSes de produgio e de reprodugio de
Ses." Desse ponto de vista, no ha mais significagbes
lidas para todos € essa 6 precisamente a razio pela qual
0 Estado, direta ou indiretamente, intervém pelo viés das inst
(0 que diz o direito) que apresentamos. A intervencio ideoligica
Jo tem efetivamente outea ra7io de existéncia a no ser
(0 social que se oponha &
lta de classes, mascarando-a, para reproduir as relagdes de classes
«, desse modo, as relagdes sociais de produgio, Voltaremos a todos
esses pontos na segunda parte deste trabalho mas é preciso
werescentar ainda que, pela sta intervengio ideolgica, o Estado
literais,
jas
4
reproduz, “igualmente’ trabathadores © niio-trabalhadores como
sujeitos idcoldgicos, mesmo em matéria de linguagem, mas uma das
condigdes de possibilidade e, simultancamente, um dos limites dessa
a, 0 fato de a Hingua nao
‘2 autonomia
ser uma superestrutura. J4 0 dissemos, mas nunca é demais repetir,
essa autonomia rel mia das condiges de produgio do efcito
sujeito © como tal cla € necesséria para compreender © provesso
pelo qual os homens, enquanto suportes biologices, sio produzidos
como sujcitos da Idcologia e do Estado, Ora, € af precisamente que
encontramos 9 problema deixado de lado por Duerot, da
necessidade de se levar em consideragio as relages da semantica
da sintaxe,
intervengio.
vi
A maneira com que Duerot criticou a teoria dos
9 & eonvincente. O argument
essencial avangado por Duerot & que hi um nimero de verbos
designando “atos individuais de aleance social” de tal modo que 0
fato de empreai-los na primeira pessoa do indicativo presente nao
possa ser considerado como a realizagio do 3 s designam,
Ora, parece-nos que todos os exemplos qu podem ser
interpretados como indo cxatamente contra essa tese. Ele nos di
quatro exempios: ew te reconforto, eu te desprezo, eu te estimo,
eu combo de voce. De um lado, esses quatro exemplas, a0
contririo de ew prometo, ew ordeno, fazem intervir nio apenas 0
as igualmente 0 pronome reflexive da segunda pessoa (tu). E
verdade que se pode dizer eu reconforto, eu desprezo, eu
estime, ev combo som precisar quem ow 0 que se reconforta,
despreva ete. Designa-se assim a ago que se est realizando. Mas
& preciso reconheeer também que s6 em circunstancias bastante
excepvionais ew prometo ou ew ordeno podem ser considerados
como a realizagio de uma promessa ow o fato de dar uma ordem
sem que se tenba de especificar o que se promete ou se ordena.
jambém designar simplesmente a ago que se esté
performativos em Benveniste
Alii isso pode
95realizando no momento, eu prometo estou fazendo uma
Promessa) como eu ando (= eu estou andando) ou eu escreve (=
cu estou escrevendo). Inversamente, no nos parece nada evidente
que ao dizer, em certas circunstancias, eu te reconforto niio se
possa por esse mesmo gesto reconfortar alguém. Do mesmo modo,
a0 enviar a alguém um telegrama com estas dnicas palavras ew
zombo de vocé (ou cu estou zombando de voce), esté-se, sim ou
nao, zombando do destinatdrio? Nao 6, portanto, de modo algum
também evidente que, ao dizer eu prometo, cu realizo sempre uma
a, nem que ao dizer ew te reconforto iio se realize a aco
guém. De resto, 0 proprio Ducrot indica o papel
quando ele trata do exemplo de eu te censuro,
pois, para dizer que essas palavras sio identilicdveis com a agio de
censurar, & preciso que ew seja um superior dirigindo-se a um
inferior. Mas entio sc as “circunstincias’ desempenham um tal
Papel, pode-se ainda considerar que o cardter performative ou
io de eu prometo ou de eu te censuro faa parte de uma
De
ilocucioné
significagio literal qualquer desses enunciado
presenga dos morfemas ‘auto-refercnciais", qu aracteristica
sintética e semantica, enquanto efeito de sentido da simate, reto-
ma sua importincia, Ocorre que, em qualquer circunsti
ando (je marche) nao poderia (diferenciando-se de eu fulo,, ew
‘minto, entre outros) ser considerado como uma maneira qualquct
de realizar a ago de andar a ndo ser num sentido dito figurado
Ge marche (eu ando) = eu aceito ou eu estou de acordo). Ora,
pode-se observar também que hé vérias outras manviras de fazer
essa além de dizer eu prometo; de modo que as
igdes que podem estar vinculadas a esse enunciado nao the
Ao examiné-lo, ndo mais de uma mancira isolada,
mas no quadro da discursividade, estamos reconhecendo que ew
Prometo pode comutar com outras superficies, Veremos aparceet
como substitutes possiveis de eu prometo coisas como eu me
comprometo a, 0 meu dever etc... inclusive expresses que serio
julgadas como s6 podendo significar a mesma coisa que eu prometo
num sentido dito figurado (em referéncia ao diciondrio). Ora, nio
somente ‘equivalentes’ de ew prometo depenerio do
96
que os enunciados so produzidos ou iaterpretados. Mas en
prometo no é io diferente de eu andolje marche quanto se quis,
dizer, a nio ser que se admita que, por tris de todos os
“equivalente: is de um desses enunciados, hd uma
ic, um niieleo invariante, o que representaria
volta 4 tese de um sistema universal dos conecitos, € a0 problema
da representagio semantica,
‘As mesmas observagies valem evidentemente para a
oposicio suspeita quefacha que, com a diferenga, todavia, de que
essa oposigdo ¢ codifieada nos diciondrios. Mas tem-se af uma rao
suficiente para considerar que, em todos scus empregos, suspeitar
que € diferente de achar que pelo fato de seus empregos
pressuporem a verdade daquilo que se suspeita? No nosso ponto de
vista nfo, isso s6 pode ser verdade nos easos em que as condigSes
de produgio © de reprodugio da significagao desses enunciados
exclu ua combtagio, 0 que mio & verdadeiro em todos os casos.
Ve-se agora, portant, que a concepgao da lingua em Ducroteasa-se
com uma concepgio extremamente restrtiva da discursividade,
Como ele proprio reconhece, cle a reduz, como Kant ¢ Leibniz, a
um forma de dedutbitidade. E pelo menos o que se observa quando
cesereve que "ha uma razio suplementar para reeusar & deserigiio dos
pressupostos um carter discursivo, & q nimeras css (.)
0 presuposto nao poderia, de modo algum, ser deduzido do posto,
ainda que se d& & palavra deduzir um sentido bastante amplo
Nés Ihe concedemos suas premissas (que 0 pressuposto nio pode
er deduzido do posto) mas no stias conclusées.
em geral
”NOTAS
* Oswald Ducrot, “Logique et linguistique’, p18.
ta, *Présupposés et sous-entendus”
> Gottlob
Frege, “Uber Sinn und Bedeutung’ p. 117
ia
5 tid, p. 116.
© Wi. p. 117
7 tid, p. 106
"ia
° ia. p. 10s.
© oid, p. 106
© tia, p. 104
2 rem como da concepgio instrumentalista que asimila a Kingua a um e6digo.
5 p. F Strawson, Mending reference and truth values
Doucrot, Dire et ne pas die, pp. 40-1
25 ¥ peto menos assim que Duerot definia seu pojeto em 1966 (Uma ver que
ros liviamos da idea de que & preciso reencontrar a qualquer prego a Kipea na
Tinguagem, torna-se pose procurar une Kigea na ingagetn'— Duero, "Logie
Elingisique). Ainda que no fetomada sob esa forma explcta nos trabalhos
fnaisfeeentcs, @ concep mais ampla da Kica da inguagem exposta desde 1966
Encontiae no nivel do componente ingustico no plano do que, de agora em
Siane € ehamado de "deszrigso semntc™
© Oswald Ducrot, Dire e ne pas dire, p. 103,
» tia
ia,
wig
» Wi.% Ainda que tenhamosassinalado que Duerot por outro ade critica aconcepio
‘nstrumentalista da linguagem, € preciso notar aqui que é exatamente uma volta 3
uma concepeio dessa natureza que € realzada,
® Oswald Ducrot, Dire et ne pas dir, p. 6
™ twig
> ia,
* John R. Searle, "Human communication theory and the philosophy of
language’, p. 124
* 0, Ducrot, Dire tne pas die, p. 112
® tid, p. 106
® tia. p. 107
” id, p. a1
* 0, Ductot, Dire et ne pas dire, pp. 45.
% Ferdinand de Saussure, Cours de linguistique générale.
Gi, Haroche, P. Henry, M. Pécheux, "La sémantique et 1a. coupare
saussurienne’, p. 96.
dine Normand, "Propositions et notes en vue dune lecture de Ferdinand
Seace, Speech at
° tod, p79.
% 1. Seate, Les aces de langage, p 8
» hid, p. 0
* Oswald Ducrot. Preficio para a tradugio francesa de Speech acts de J. R.
Searle, p. 20.
73. L. Austin, ow to do things with words
* Wid, p. 83,
oid, p68
© Ver sobretudo Cl. Normand, op. ct
© 0, Ducrot, id, p. 72
100
Wid, p. 7.
M4 pcheus, Analye automatique du discours
"© yoia., p24
101CONCLUSAO
ENUNCIADO, ATO DE LINGUAGEM E
PRESSUPOSICAO:; O AVESSO DA
CONFIGURAGAO_EPISTEMICA
DA LINGUISTICA
Ao termo do exame das teorias lingiifsticas da
igdio que foi objeto dos capitulos precedentes — cxame
contestaremos — lembraremos que se as duas
que recorrem & nogio de pressuposigio
m dominadas por problemiticas divergentes, uma cont
as relagées entre seméntica e sintaxe numa gramatica gerativa, a
foutra as relacdes entre lingua e discurso na Finguagem, clas se
encontram em indmeros pontos da sua utilizagio dessa nogio, Em
Ducrot, a nogio de pressuposigao permite desenvolver uma er
questo da pressuposicdo cujos limites cla assume. Ela no impede
‘uma volta a um certo funcionalismo na medida em que a base da
ressuposigio seria a existéncia na lingua de qualquer coisa que
tornaria possivel uma modalidade de insergao dos conteiidos sob
forma de implicito literal cuja ida_pelas
consideragées de natureza psicosso (cf. pp. 74-5). Em um
certo sentido a critica da instrumentalidade fixa-se no que é necessé-
103rio do ponto de vista te6rico para que se possa cons
pressuposi
idorar a
0 como decorrente da Kingua © nao da discursividade,
A teoria das gramticas gerativas toma també
ncia com relagio as concepgdes instrumentalists de linguagem
pelo menos através da idé rater "criativo" da linguagem, Essa
distancia é portanto independente da questio da pressupwigio, A
nogdo de pressuposigo #6 intervém nessasteorias para dar conta
de eertos efeitos de significagto que s6 parceem depender da
estrutura superficial ow da represontagao.semantica quando €
considcrada como a estrutura miais profunda. Parece portanto que
mogio de pressuposigio permit: idemtfcar os efeitos ‘de
Significagao de uma naturcza particular, Hgados ao ato de inguagem
como tal. Ora, justamente, a0 ligar pressuposiqao c ato. de
linguagem, traz-se de volta um sujito, enquanto origem desse ato,
mesmo se se considera que esse sujeito interioriza um sujeito
universal que regula a atividade ov se se toma a sociedade como
uma instneia que rege juridicamente as sinificagées para ele. Mais
fundamentalmente, obscrvaese que a necesidade’ Leériea que
determina a assungo da pte de un
uma certa
enquanto
educa npetnci ngistie, ovo fato de fazer da so dade um
sujeito exercendo controle juridico sobre a lingua, advém do fato de
considerar 0 individuo falante como um simp ee
tempo lugar ¢ sujeito dos seus proprios pensamentos. E para
explicar como esse sujeito pode funcionar assim que formulamos
tuma categoria de sujeito universal ou coletivo que seria sua “ra
psicol6gica ou social,
mples sujeito, ao mesmo
Para resumir a situagio, pode-se dizer que a nogik
oressupsico, tal como fol elaboraa nas tras lngscns, et
ligada a uma coneepedo da seméntica baseada na nogao de
significagio literal. Ora, o que parece demonstrar a existéncia dos
efeitos de pressuposigao, ¢ que sé poderemos dar conta de certas,
relagdes intuitivamente reconheciveis entre frases em termos de
regras sintiticas e de significagées literais se alargarmos 0 dominio
destas até o que chamamos de 0 performativo ou o ilocucionéio.
Ao dizer que o efeito de significagdo proprio da pressuposicao é um
104
valor imposto pela sociedad, 0 que Ducrot procura é exatamente
tornar literais esses efcitos de significagao, Do mesmo modo, quer
6 componente semntico seya considerado como 0 componente mai
profundo ou como um componente interpretative, integrando
performativos & representacio, estende-se igualmente o dominio das
significagdes literais Aquilo que é necessirio para dar conta das
relagdes entre frases que parecem escapar ao modelo
A estratégia € exatamente fazer de tal
decorra da lingua, ¢ ndo € surpreendente
nessas condigées que reencontremos no scu propésito todos os
clementos da configuracio epist€mica da lingi aber, 0
‘mento da forma-sujeito ¢ o problema da semantica. Além
., esse desdobramento nao foi apenas reconhecido no nivel
teérico. Fomos levados, a propésito de certas construgées relativas,
‘a falar de “desdobramento do sujeito da enunciagio’. Essa
formulagio deve ser considerada como provisGria e sera remanejada
nna seqiéncia deste trabalho. O que podemos tentar fazer agora &
cular os dois niveis em que vimos funcionar o desdobramento,
c da anilise de certas construgdes. Qual é 0
alcance de tal tentativa? Ele € duplo. Como veremos adiante, trata-
se de caminhar na diregio de um dominio da contradigio objeto
real-objeto de conhecimento na lingbistica, Trata-se ainda de cernir,
na sua estrutura (0 desdobramento) ¢ na medida em que cles tém
alguma coisa a ver com a linguagem, certos aspectos daquilo que
chamamos de assujeitamento ou efeito sujeito. Que a linguagem
tenha algum papel no processo de assueitamento, parece que nio
possivel contestar, em particular no que diz respeito aos aspectos
ideolgicos desse processo. Mas de que forma concreta a linguagem
trabalha nesse processo, essa é uma questio a propésito de que se
dispde apenas de elementos fragmentérios. O fato de ter
reconhecido que 0 desdobramento da forma-sujeito pode ter uma
io com certas construgdes € um elemento que podemos levar
A esse respeito, 0 inventario estabelecido por Ducrot, dos
casos sobre os quais podemos levantar a questio da pressuposigio,
€ igualmente alguma coisa de muito preciosa. Resumindo, a
propésito do efcito de pressuposicio, 6 importante lembrar que
transformacional cla
modo que a pressuposi¢
relat
105cortas relag ses parceem depender do sentido © nao
apenas da sintaxe. A questéo do suporte desse sentido esta
levantada ¢ € a essa questo que Duerot responde a0 invocar a
sociedade, Se abandonamos uma concepeao da semntica baseada
numa separagio nitida entre seméntica ¢ sintaxe ¢ na nogio de
vista
te6rico, parece possivel mostrar que a pressuposigéo € um caso
particular das relagées entre frases que estio na origem da
Produgdo © da reprodugao das significagoes. Essa posigao coincide
fem certos aspectos com aquela exposta por Foucault em
Arqueologia do saber, que considera que as relagées entre frases,
assim como as relagées Iogicas entre proposigées, ainda que
suscetiveis de serem descritas de maneira aut6noma, s6 sio
concebiveis sobre um fundo de relagées de cocxisténcia entre
enunciados, no interior do que ele chama de formagoes discursi-
vas. E assim que Foucault afirma que "é no interior de uma relagio
significagio literal ou na nocio equivalente do ponto di
subjetivismo, pela sua insisténcia sobre o problema da materialidade
daquilo que acontece pela linguagem, Foucault desenvolve com a
nogio de enunciado 0 que se pode chamar do avesso da
configuragio epistémica da lingiistica. Em Foucault, no ni
enunciativo, nao ha efetivamente sujeito, mas uma posigao de sujeito
suseetivel de ser ocupada por individuos diversos. "Descrever uma
formulagdo enquanto enunciado, escreve Foucault, nao consiste em
analisar as relagdes entre o autor ¢ o que ele diz (ou quis dizer, ou
disse sem querer), mas em determinar a posigio que pode e deve
ocupar todo indviduo para ser 0 sujeito.” Sob o titulo
Liarchéologie du savoir, 0 que procura Foucault é, entre outras
coisas, fundar uma cigncia que tenha um objeto proprio, o discurso,
4que daria conta da materialidade dos objetos ideologicos ¢
dos objetos de conhecimento, isto é, da materialidade do processo
de producdo-reproducio das. significagses. A configuragio
cpistémica dessa "ciéncia do discurso” apresenta-se na verdade como
sendo o avesso da configuragao epistémica da lingifstica na medida
em que ela esté centrada na materialidade quase circunstancial dos
106
cenunciados ¢ substitui © desdobramento da forma-sujeito por
lugar determinado e vazio que pode ser efetivamente preenchido
por individuos diferentes". Notar-se-4 que Foucault s6 procut
articular sta nogio de discurso com o conceito de lingua num
sentido muito particular que ilumina justamente a relagdo entre a
configuracio epistémica do objeto discurso a da lingiistica,
© anti-subjetivismo de Foucault lova-o a deixar de lado a
questao do amento, a questo do sujeito. Ora, 0 fato de
escamotear essa questio tem conseqiiéncias muito importantes.
Sobretudo, sem cla nio se pode pensar a relagao existente entre 0
desdabramento da forma-sujeito © a distingio entre ideologias
praticas ¢ ideologias tedricas de que falamos no Prétogo. Além do
imais, cla impede que se possa dominar a contradigio objeto real-
objeto de conhecimento na lingitistica, sem apelar para a psicologia
ou a sociologia, Por essa razio, desenvolveremas a seguir as
indicagoes dadas no Pr6logo, no que toca as relagdes entre
iguagem e constituicéo do sujeito de um lado ¢ entre ideologia ©
assujeitamento do outro.
107NOTAS
* Foucault, Liarchéotogie du savoir, p. 119.
tia, p. 126
109UW
SUJEITO, LINGUAGEM E SABER
EM TORNO DA LINGUISTICACAPITULO I
A LINGUISTICA NO CAMPO E FORA DO
CAMPO DA COMPLEMENTARIDADE
© campo da complemeataridade
(© lugar atribuido ao sujeito nas teorias lingifsticas comanda
1 posicéo tomada com relagio ao sentido, naquilo que se entende
por lingua; ele determina a concepgio global da gramética e, pa
‘além, 0 tipo de prova assim como 0s resultados. Isso é verdadeiro
mesmo quando 0 sujeito esti encoberto como na lingiifstica
distribucional oriunda de Harris, Como pano de fundo das
divergéncias entre as teorias, perfilam-se concepgdes diferentes do
que se entende por ciéncia em geral © por cientificidade na
lingiistica em particular. Tudo isso nos leva a mio mais nos
limitarmos ao terreno especifico da lingiiéstica, para explorarmos os
0s, aquilo que do externo da lingiistica opera nas teorias
tao determinante.
que a lingiistica cmergiu numa conjuntura cientifica ¢ ideol6gica
cujos cixos podem ser descritos. Como contraponto a evidéncia de
que a finguagem pode ser enfocada ao mesmo tempo como uma
*realidade psicol6gica’ ¢ como “uma realidade social’, ¢ inicialmente
13psicologia e sociologia que encontramos no contexto da lingi
Lembremos uma vez mais as refer cexplicitas de
Whitney © aos elementos de psicologia, sobretudo através. da
evocagio de uma faculdade geral comandando. os signos.!
Lembremos que as posigdes teGricas que dcterminam a elabe
das graméticas gerativas desembocam sobre uma psicolingiiistica
exja renovacao a partir de Chomsky & notavel, enquanto com as
posigies construfdas por Harris a questo da adequacio apela para
a sociologia (determinacdo dos "tragos das situagies sociais").!
Ao mesmo tempo, a lingiistica oriunda da gramitica
hist6rica ¢ da filologia marca uma ruptura com relagio as (eorias
puramente mentalistas da linguagem, inclusive aquelas que evocam
alidade dos povos’
Tocamos aqui na posi stica no campo
coberto pelo que, correta ou incorretamente, chamamos de as
“cigncias humanas" ¢ as “ciéncias sociais". A propria oscilago que
nstata na identificagio dessé campo é reveladora. Ela é
testemunha de que cle € dominado por uma problemitica que
designaremos globalmente como sendo aquela da
complementaridade ¢ que podemos resumir esquematicamente em
uma frase: do humana, tudo aquilo que ndo é de ordem do
psicolégico, € sociale reciprocamente. O- que caracteriza
portanto essa problemitica é que nao hi hiato entre o psicoldgico
Co social: toda realidade humana & ou bem uma, realdade
psicolégica, ou bem uma realidade so
Enfase & posta seja sobre o psicok
psicoligico sustenta-se diante do social pela
animalidade humana, com 0 corpo orginico, de tal modo que 0
social como realidade auténoma supe sempre um psicoligico, a
menos que se absorva no organicismo. Tn
psicoligico ante a animalidade pela refer
como testemunha @ contraria 0 comportamentalismo que afasta
precisamente esse corte postulando no psicolégico uma pa:
continua do a
Segundo as tworias, a
sobre © social. O
agem
al ao humano, Em resumo, formular uma
dade social autnoma supde uma realidade psicolégica
114
inversamente. Hé portanto uma circularidade da dupla realidade
psicoligica/realidade social.
‘A linguagem, sendo propria do homem por oposi¢ao a0
animal, encontra-se numa posigo notivel no campo da comple-
mentaridade. A existéncia da linguagem ¢, de um lado, invocada
‘como apoio a uma irredutibilidade do humano A animalidade, isto
6, da realidade autonoma da dupla psicol6gico/social. Ao mesmo
tempo, no campo da complementaridade, a linguagem aparcce de
maneira privilegiada como aquilo que assegura a articulagio do
psicolégico © do social, principalmente em torno da nocio de
comunicagio. Donde os temas bem conhecidos da linguagem
cenquanto instrumento de comunicagao, das relagdes entre linguagem
ce socializagio, linguagem c desenvolvimento psicol6gico, linguagem
€ recorte da realidade (hipétese de Sapir-Whorf, em particular)
te... Mas 0 que nos importa aqui é que de uma certa maneira nio
ha lugar no campo da complementaridade para a lingiistica. Sendo
da ordem do humano, a linguagem deve reduzir-se a uma realidade
psicolégica c/ou social, Sob 0 dominio da problemética da com-
plementaridade, no hé lugar para 0 conceito de lingua e para uma
cordom de realidade auténoma correspondeate. E, entretanto, nesse
campo que a lingiistica isola um espago que rompe a compl
mentaridade € que, por isso, & constantemente contestado, amea-
gado de ser encoberto por um ou outro polo da dupla psicologico
€ social. Nesse sentido, 6, por exemplo, significative © projeto de
uma “psicologia social da linguagem", pretendendo deduzir as
propriedades das linguas a partir dos seus mecanismos de
‘comunicagao e de suas "leis de interagio social’. Poderfamos, alids,
multiplicar as ilustragdes do fato de a psicologia ¢ a sociologia
tentarem ¢ nfo poderem deixar de tentar absorver ow anexar 0
objeto proprio da lingiiistica. Ao mesmo tempo, a lingiistica
conserva nas suas margens aderéncias com o campo no qual cla faz,
seu ninho, isto é, antes de tudo, com a psicologia ¢ a sociologia. Isso
std muito claro em Saussure mas também € verdadeiro na
lingiistica atual, tanto de Harris quanto de Chomsky com as
postas diferentemente sobre um ou outro polo. Mostramos,
15longo da primeira parte deste trabalho centrando-nos na questio
sintoma da pressuposigio.
A posigio singular da linghistica fez com que ela tenk:
podide aparecer, © apareca ainda, como uma ciéncia humana ow
social piloto, enquanto, ao mesmo tempo, ela esta
nesse campo que € contestado na sua autonomia, E verdade que a
linguistics, a0 conquistar seu direito de cidadania, in
Inguagem enquanto realidade relativamente independente do
sicologico e do social. Admite-se geralmente que haja uma ordem
41 finguagem relativamente aut6noma . E essa situagio nova que
desereve Lacan num treeho no inicio de A instdncia da letra no
inconsciente ou a razio segundo Frewk *., a dualidade
ctnogréfiea da natureza © da cultura esti prestes a ser substituida
por uma concepgio ternéria — natureza, sociedade, cultura — da
condigio humana, em que provavelmente o terceiro termo redurit-
em, OU Seja, Aquilo que distingue essencialmente a
1 das sociedades animais".”
sociedade hu
Nos niio podemos esgotar o tema aqui pois isso significaria
‘enganar-se sobre a porta real da irrupgao da lingtifstica no campo
das ciéncias humanas ou sociais. Com efeito, se ha ui lugar para
a linguagem como realidade relativamente autdnoma nesse campo,
se houve uma ruptura na complementaridade © na circularidade dt
dupla _psicol6gico/social, essa complementaridade¢ essa
circularidade se restabelecem facilmente
termos em ver de dois. Uma v
cham:
ido. sobre_ os tr8s
io coringa, € 0 caso de
assim, de comunicagio € © principal instrumento desse
fechamento do campo da reatidade humana, Mas permancee unia
questo pendente, lancinante, aguela da ordem de realidade da
lingua, da sua forma de materialidade.
Pedemos dizer agora que sio a psicologia¢ a socoloia
que retormam quando surge essa questio e que
posigio da lingistica no campo da complementaridade, Mas
uma maneira excessivamente abstrata de formulae o problema,
‘Surge aqui uma dificuldade que parece que provém do fato
de 56 podermos conceber a realidade da linguagem através de (1)
16
uma relagio exterioridade/interioridade © (2) como uma "coisa’
Relagio exterioridade /interioridade, isso pode tomar, por exemplo,
1 forma: lingua como instituigio/lingua como realidade depositada
nos cérebros dos individuos. Digamos que, do ponto de vista do
sujeito que tematizamos aqui, exterior & o social (c, pa
cio fisico), 0 interior é o psicologico. E preciso alojar a
em algum lugar Ii dentro, a0 mesmo tempo no
exterior. Quanto a realidade da linguagem como coisa’, admitimos
que ela nio ma no tempo (0 latim, o gaulés, 0
francés etc...) © no espago (0 francés, 0 alemio, o polonés etc.
‘mas essa coisa variavel no tempo seria sempre, aqui €
agora, uma coisa, Além do mais essa realidade da Tinguagem &
considerada decomponivel em elementos, mas esses elementos si0
também concebidos como “coisas” (as palavras, as frases cl
Conceber assim a realidade da linguagem esta em rela
com as operagées concretas de comparagao, substituigio/com-
binagio com as quais operam os lingilistas © com base nas quais,
Jakobson, ao idenified-tas as operagbes que estariam implicadas na
produgio de qualquer mensagem, define os dois yrands cies da
io, contexto © metonimia de um lado; selegao,
fora de outro).!
Como todos aqueles que abordam a realidade da linguagem
, Jakobson supde que o lingiiista apenas reproduz ©
descreve: de maneira sistem: as operagées que faz
espontancamente, consciente ou inconscientemente, 0 sujcito
inte. Desse ponto de vista, a lingiifstica seria apenas a
explicitagio de um saber que possuiria, principalmente sem se dar
conta, todo sujeito falante, Esse saber que estaria na origem da
evidéncia da realidade da linguagem é, além do mais, considerado
como formulivel de mancira reflexiva. A descrigao sistemdtica
recorre a comparagées, elassificagbes etc... que podtemos conecber
em toda sua generalidade (0 que remeteria a um sujeito do tipo
piagetiano), mas que podemos também considerar de mancira
restritiva como idéntica as Gnicas operagies que faz 0 sujcite
falando, ou selecionando © combinando os elementos que
wstituem suas mensagens. Supde-se que se possa tomar
17consciéncia dessas operagdes reflexivamente (sobre modelo, por
exemplo, da abstragao refletora de Piaget). Por outro lado, o sujeito
toma os elementos de suas mensagens em um estoque (0 “eédig
para Jakobson) que nao Ihe pertence: é 0 fato da exterioridade.
Enfim, a selecio © a combinagao das palavras sao assujeitad
restrigées que também fazem parte do cédigo © que portanto nio
sao individuais, Essas restrigdes constituem, para ser preciso, 0
saber linglistico do sujeito falante.
A “midiquina I6gica* ou 0 "aut
Resumo agora as caracteristicas do sujeito que se
manifestam, a propésito da linguagem, no campo da comple-
mentaridade. Esse sujeito € ao mesmo tempo individual, universal
€ social, Sua dimensio especificamente universal esta ligada as
s de comparacio, substituigao, concatenagio que estio
implicadas na composicao e interpretagao de toda mensagem. Essas
(© como idéntico, em um certo nivel,
que podemos conceber a partir do modelo
de Tiiring (autémato abstrato) mais ou menos
propriamente lingiistica, e também social
uersubjetiva, desse sujeito é relativa, de um lado,
ao estoque de elementos sobre 0 qual cla opera ¢, por outro, a
especificagio da maquina 16 u funcionamento sobre esse
cestoque de elementos. Essa especificagio corresponde as limitagoes
a que se submetem a sclecao (por cxemplo, s6 os elementos
ilares" so substituivcis) © a combinagio dos elementos (por
exemple, certos verbos supdem um sujeito animado). Enfim, toda
mensagem tem um caréter individual porque representa a escolha
de uma produgdo particular no conjunto de todas as produgd
possiveis da miquina a specificada. Donde de uma
"liberdade do locutor” na qual & possivel alojar muitas coisas: a
afetividade, as motivagées, a criatividade individual (que nao deve
ser confundida com 0 que Chomsky chama de a "criatividade da
linguagem", que se refere a idéia de que 0 conjunto das produgdes
possiveis, das mensagens diferentes, é in
cca € potencialmente
us.
infinito), as erengas, as opinides ete... Isso constitui a dimensio
propriamente individual do *sujeito da linguagem” no campo da
complcmentaridade, dimensio que se pode considerar como
constituida na intersubjetividade do social ou somente ma
individualidade,
No nivel de gener
modelo do “sujeito da finguagem’
que descrevemos ao referirmo-nos a Jakobson, vale pa
Lcorias lingiisticas, em particular para Chomsky ¢ Harris. Salvo que,
independentemente de outras especificagdes que aparecem depois,
a hipdtese do cardter subjetivo dessa reatidade
re 0 cariter disereto © recorrente, portanto
1, dos elementos constituintes do ato de fala © 0
sentido rejeitado no social, s6 ha em Harris uma deserigao eujo
o sujeito falante, mas apenas o lingtiista. Saber quais|
sio as propriedades que devemos supor no lingiiista, saber se clas,
tém uma relagio com aquelas do sujcito falante, nio é seu
problema, Ele volta a essa questo apenas indiretamente, no nivel
do problema da adequagio da descrigio, confrontando esta com a
40 do sentido pelos "tragos de situagdes sociais'. Fora
ade em que nos colocamos, esse
10 campo da complementaridade,
todas as
no nivel do problema da especificagdo da maquina logica. Isso no
tem nada de surpreendente na medida em que, considerada sobre
essa base, af reside todo o problema da Tinghistica: & essa
especificagio que define a gramaitica enquanto sistema de regras
particulares. E tam s¢ nivel que se levantam as questées que
levam a distingdo entre competéncia e desempenho na perspectiva
iS gerativas, € & da aceitabilidade na perspectiva
distribucionalista,
Nio voltaremos a esse ponto, pois decidimos situar-nas de
agora em diante nos contornos da lingtifstica © nao mais sobre seu
proprio terreno, a nao ser para frisar 0 parentesco deste "sujeito da
linguagem" com o sujcito piagetiano. A tinica diferenca & que Piaget
formula a questio da génese da “méquina logica’ que r
19Tingiistica que levanta a possibilidade de
do sujcito piagetiano ao “sujeito da linguagem’.
© problema apelando para um empirismo confesso ¢
tematico no nivel dos principios. Descritivamente, na medida em
as emprestadas do ncopositivismo légico podem
s, isso deve ser relacionado com o ponto de vista
extensional que cle adota como mostrou Milner;” ponto de vista
que 0 opde ao de Chomsky, que seria o da compreenss
Para Chomsky, como para Piaget, 0
conhecimento” ou “da ciéneia” é interno ao sujeito indi
em em ger
como um e1so particular da
maquina logica, em toda sua generalidade, © define um primeiro
ivel de contingénci tica da realidade da linguag
geral, De outro lado, uma segunda ordem de esp
caracteriza cada lingua como um caso particular da maquina ligica,
especificada no primeiro nivel e define um segundo nivel de
contingéncia, idiossiner:
ermo de Chomsky. De fato, nao hd nenhuma razio te6ri
se parar em tao bom caminho para tentar recobrir complet
© campo das ¥. weis da realidade da linguagem no
espago mo tempo, depreendendo subsistemas da lingua
caracteristica de uma época, de uma regio, de um meio social,” ou
mesmo de um individuo.” Em tvoria, no hi
atribuiveis a priori 4 formalizagio, Na pritica, ha sempre um
residuo que, na perspectiva das gramiticas gerativas, faz ressurgit
as dimens6es sociais © individuais do "s
vies do desempenho. J na perspectiva distribucionalista, em que
120
Jo tem seu lugar, encontramo-nos ma situ
subclasses ao infinito em Fungio
de eritérios operacionais,
Na perspectiva das gramiticas gerativas, no pano de fundo
do “sujito da Finguagem’, em seu fundamento, acha-se postulada,
yuina logica® de ordem mais geral que a especificagio
relativa & finguagem em geral; maquina logica que & a condigio de
possibilidade das especificagSes ulteriores © de sua teorizagao, B.
sobre essit maquina que repousa a unidade da teoria © & cla que
d ia a posigo do “sujeito do conhecimento” ou do
sujcito da cigneia", Na perspectiva distribucionalista, o principio da
unidade da (eoria (a qual deve englobar 0 conjunto das
cespecificagées necesséias para produzir a singularidade de todo
corpus Tigado a uma situagio © a um meio dados como caso
particular de uma gencralidade que cobre outras situagbes ¢ outros
eins) conduz a uma situagio andloga, salvo que @ generalidade
totalizante que & assim formulada nio € mais apresentada como
sendo da ordem da subjetividade do animal humano falante, mas
apenas como definindo © ponto de vista da cientificidade © da
objetividude com relagdo & reatidade da linguagem. Nos dois eases,
t de produzir uma unidade da diversidade dessa realidade.
Essa unidade ¢ formulada em referéncia a uma posigao do "sujeito
da cigncia" que, como cm Piaget," pode ser considerada como
interiorizada pelo sujeito falante ou como exterior a esse sujcito, em
tum lugar situado fora do alcance da conting
ujeito da ci € definida de mancira puramente
no se, como em Piaget, atribuimo-the em cltima
posigio do
formal, mes
’incia um fundamento bioncuropsicolégico, ou at
iam as estruturas logico-matematicas, ou um
cia de uma "relagio absoluta © necessaria das
menos proprios aos seres vivos quanto em
coisas, tanto nos fei
todos os outros’.!?
Essa configuracio do “sujeito da ciéncia” serve para ilustrar
‘o que se pode chamar de a fungdo totalizante do formalismo,
‘Totalizante naquilo que, para fundar a ordem da linguagem numa
121seja cla obj
realidade, iva, ou soja ao mesmo tempo subjetiva ¢
universal, essa fungéo opera uma ruplura no campo. da
complementaridade do social e do psicoldgico, deixando intacto
aquilo que reeobre a complementaridade dese campo, a saber, a
dimensio hist6rica. Nao qualquer dimensio da histéria; ndo aquela
tem especial que esti incluida na defini¢ao do sujeito epistémico de
que procede de niveis em niveis, sendo a0
€ suficienre do nivel seguinte,
cficiente, uma vez formulado um nécleo funcional
ristico da ordem humana, Essa historia, ou mais
(c/ow arqucologia) decorre de uma
ria causa de si, existéncia de um “sujeito
da historia” representado pelo niieleo funcional) do. proce
produgo do conhecimento, A dimensio da hist6tia & qual faco
referi aquela que se acha formulada no conccito de “luta de
classes’. Esse conccito € totalmente ocultado pela complemen-
laridade do campo definida petos pélos do psicoldgico e do social,
na alterndneia que faz passar da produgio da sociedade, baseada
nas relagées entre os sujeitos, a produgio dos sujeitos pela
dade em que cles devem ocupar um lugar.
0 de
Se a configuragio do "sujeito da cigncia" no campo da
complementaridade culmina num formalismo totalizante, e
a des;
0 do paradoxo que se possa ver af nesse momento que isso
decorre, em primeiro lugar, do fato de essa vonliguragio passar 20
largo da dimensio da histéria formulada pelo conccito de “luta de
classes"; dimensio da historia que a complemen
funso ocultar.
aridade tem por
A critica ao formalismo na lingiistica es l,
para ser feita; tanto no proprio terreno da lingiistica, do interior
desta,” quanto do exterior, isto é, do nosso ponto de vista aqui. Eu
me contenta lo na sua relagdo com a problemitica da
complementaridade. © formalismo, cuja origem alguns remontam
& idéia de lingua como todo € principio de classificagio, marca
incomtestavelmente uma passagem para o materialismo da
complementaridade. E, com cfeito, a idéia de lingua como todo ¢
122
principio de classificagio que sanciona @ posteriori a ruptura da
Lingijstica com a gramética histérica ¢ a filologia sustentada por
io continuista da historia. & também essa idéia que
a universal e racional,
uma concep.
marca a posteriori a ruptura com a gram:
teflozo das leis do pensamonto. Ela representa, nas formulagies de
Saussure, a posigio do conceito de lingua e libera as condighes de
um estudo conereto de uma realidade da linguagem na su
diversidade e sua materialidade. Mas, vimos, ha limites nessa
ruptura, limites ainda vigentes na finguistica de hoje, a despeito do
que pensam (odos aqueles que dizem que remontar a Saussure
voltar ao dilivio. Quaisquer que sejam as contribuigées cientificas
incontestiveis das teorias recentes, clas no impedem 0
explodir 0 conecito de ling
io do formalismo, pela
4a ou do conhecimento, que se
(re)fechamento do campo que f
Ora, paradoxalmente, 6 com a c
configuragao de um "su
opera, a partir desses limites, o (re)fechamento do
ito da_linguay
£. absolutamente
chomskyniano, 0 da competénci
tum certo sujeito do campo da complementarida
ser breve, podemos chamar de sujeito comportamental, Mas se,
além do’ mais, Chomsky chegou a dizer que "a investigacio
istica leva a postular estruturas ¢ prinefpios mentais que ndo
penas inconscientes, mas para além dos limites de natureza
introspectiva possivel’* se para explicitar o que cle entende por
firma que "cada um de nds dominou ¢ se
te um sistema de gramitica que atribui
3s utilizamos esse saber sem
, marea uma ruptura em rel
c, aquele que, para
competéncia ele
representou internam
descrigies estruturais a essas frases,
fstarmos conscientes on. mesmo sem que seja_possivel estar
consciente no decorrer da produgio dessas frases ou na sua
compreensio quando clas so produzidas pelos outros’ tudo isso
io deve, porém, levar a supor, apressadamente, convergéncias,
Piaget também, vimos, fala de inconsciente cognitivo. Ele afirma
explicitamente que a cvidéncia completa das coordenagbes werais da
es do "sujeito epistémico’, implicaria unva
mente sem fim’, pois seria necessirio
jeralidade cada vex maior, até 0
“repress
retornar de nivelplano biofisico, para atingir as coordenagées “iniciais". Ele vé nesse
rocesso até mesmo o fundamento do acordo da matemtica com
© real, partindo do prinefpio que as estruturas légico-matematicas
sao construidas a partir das coordenagdes mais gerais das atividades
do sujeito, as quais se furndam em tiltima instancia, acabamos de ver,
sobre coordenagies orginicas. Portanto, ha mesmo uma certa
convergéncia entre 0 sujeito psicoldgico piagetiano € 0 sujeito da
linguagem chomskyniano, convergéncia que aliés jé encontramos ¢
‘que apenas acabo de tornar mais precisa. Mas deve-se dizer a partir
dai que o inconsciente (ou a inconsciéncia?) de que se trata aqui e
1 tem alguma coisa a ver com o inconsciente freudiano? Deixarei
Por enquanto essa interrogagdo em suspenso para enfatizar que &
‘no nivel da configurago de um "sujeito da ciéncia’, pelo vies da
hipotese de uma interiorizagdo de um saber" no individuo (saber
a0 qual se reduziria estruturalmente todo saber lingiistico
concebivel (Chomsky), ou mesmo todo saber concebivel em geral
(Piaget)), que a possibilidade de uma articulagao entre psicologia ¢
lingiistica encontra-se restabelecida. Que esse saber esteja fora do
alcanee da conseiéneia individual” na atividade da linguagem ou na
atividade em geral, é secundario. Porém ¢ util observar que essa
configuragio de um "sujeito da ciéncia’ coincide com a volta A
confusio entre objeto real ¢ objeto de conhecimento, ou pelo menos
a0 desconhecimento da sua natureza contradit6ria (natureza mental
dos principios que esto na base da gramética ¢ fundamento
orginico dos principios gerais do saber que regula a atividade
humana). Argumento aqui que a configuragio de um tal "sujeito da
ciéncia’ € sempre acompanhada por uma forma de redugio do
‘objeto de conhecimento ao objeto real
Quanto ao papel do formalismo no exterior da lingiifstica,
foi claramente caracterizado por Pierre Raymond cujas observagies
wei aqui in extenso:
--oformalismo lingilistico, que de imediato
ajudou omecanismo do pensamento, apdia-se,
antes, sobre wm conceito fundamental, 0 da
124
weatscras poset fomece um merle de
tacotha ard um mateatino ripe do pen
views endo pus; le da iusto de que
problemdtien sua ewolugao ue ofirmaines, eh
dual que ele digs ele nos leva ao confroto
meme onveral, no moles dso
mmo o homem por toda parte porador da I
Velad? convidando.opedagoge a redundinca:
como o mal nto émuncn dabélico, 0 ‘deal de
harmonia venceu antecipadamente todas as
contradigaes
tanto 0
Como ja indiquei, Raymond aqui nao °
formalismo na lingiistica quanto sua expressio fora da lingiifstica,
no campo da_complementaridade. assim © papel desse
formalismo no (re)fechamento desse campo € sta relagio com 0
encobrimento nele, da dimensio da hist6ria, formulada pelo
conccito de luta de classes. Com a introdugao de estruturas l6gico~
matemiticas, através de uma certa exploragio da matemitica, &
‘ado o problema da modalidade de existéncia do objeto da
125ca ¢, para alé
edida em ie o dimenes
classes" ndo tem lugar na problet da complementaridade, isso
ees oe east eee oe
nese campo, coat apuio da indsiduliede; co pevcree a
cbjetnidade da verdad Genin, Deno claro uc ado se neta de
ogee a anes
au pean om eucade€ una lorie Setloges done nia
concepgio abstrata da objetividade cic
© buque
wvertide
A verdade nao é abstrata, € conereta, diz Lenine.” ©
ave dizer sobre isso? Uma passgern do polio da segue eae
da radu soc, 4 seonomin pica s0 fons teatro
por fenimsnos lion. Fomemos a Inger © peas om ge
essa tuts io se desenvolveu ai é també:
verdide inseparivel da propria exténcia das classes na sovedade
burguesa constitui-se, cle o formula ingenuamente, como a lei
© periodo elissivo
126
natural, imutivel, da sociedade humana. Seria atingir o limite que
ia burguesa nao ultrapassars’.” Mare diz: “A economia
ode continuar uma ciéncia se a luta de classes
ente ou 36 se manifesta por fendmenos isolados"; isso
significa que a economia politica burguesa ¢ uma ciéncia que
partir de um certo momento deixa de sé-lo; que tudo aquilo que
{inha todos os atributos da objetividade © da verdade cicntifiea
perde-os. Nao € porque essa verdade teria sido apenas uma
aparéncia de verdade escondendo uma outra verdade absoluta ©
escondida, mas porque a realidade foi transformada, nio por uma
causalidade interna 2s suas estruturas, operando como a condi
necessiria ¢ suficiente da sua transformagao, mas pelo
desenvolvimento da luta de classes. Ora, a Inta de classes, se eka
pressupée exatamente a divisio em classes, ¢ portanto F
produgio que determinem essa di i
uma estrutura. Bla é de ordem politica. Situar 0 conceito de elass
nessa dimensio € expor-se a obje 4, sob a categoria
do politico, um sujeito da historia, causa primeira. Sabe-se que
aqui que Marx se separa de Hegel afirmando, sobre a base do
principio materialista do primado do ser sobre 0 conhecimento, que
io se poderia antecipar as transformagées materiais da realidade
e que, no campo da luta das classes, toda especulagio sobre as
formas da realidade humana, sobretudo sobre 0 que
seria ah sprovida
de qualquer fundamento «i
la sabemos do que poderia ser o material
i Tudo © que se pode dizer é que 0
s* represen io da objetividade
da verdade cientificas no que diz respeito a historia conereta dos
homens conerctos no campo dessa luta de classes, E uma
objetividade ¢ uma verdade pritica, concrota, que visa a realidade
no como uma substncia ou uma coisa, fosse ela reduzida a uma
cestrutura puramente formal, mas enquanto processo mat
A contribuigio decisiva de Marx para a teoria do processo
de produgio do conhecimento cientifico deve-se a relagio que ele
estabelece entre a forma-sujeito do politico ¢ a formasujeito do
politica 56
pecifc
tori, numa sociedade comunista, s6 pode set
ico. Podemos, portanto, di
127cimento cientifico2" No campo da complementaridade, essas
formas-sujeito estéo separadas na neutralidade da Ciéncia;
Marx estabelece o principio da subordinagio da segunda a primei
a0 mesmo tempo, 0 proeesso de produgio do coahccimento
ienlifico cai no campo da lata de class
data dese principio & que a posigao do
0 da ciéncia’ aio € a posigio de um “sujito universal,
, do qual se poderia dizer que, nos seus limites, seu
damento € mental ow orginico, mas a posigio de um sujito
historico, assujeitado &divisio em classes. E somente a partir desse
principio que se pode coneeber que 0 materialismo historico nfo
saberia representar para a classe do ecient,
objetiva, conereta, que ele se bem
minada, a tnica suscetivel de u
Brita, Do ponto de vista da classe dominant o “seit da
do campo da complementaridade representaré a posi¢io da
objetiitade da verdadecintcas © comhecemes 0 Papel que
dessa complementaridade. O
ismo histGrico supe uma posi¢ao de sujeito da ciéncia que
rompa com esse sujeito permanente, eterno, se}
a0
no fora-do-lugar
ou por sta génese no modelo do sujeito
ico piagetiano, integrand 0 processo de produgio do
Ita de
epi
conhecimento, concebido como auténomo com rel
Que isso nao signifique cair na armadilha da dist
erdade absoluta" © "verdade relativa’ (0 fato de que a verdade