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F o t ie ( 8 5 ) 3 2 3 8 - 2 3 2 3 / 3 2 3 8 - 1 3 8 4
F o x : ( 8 5 ) 3 2 3 8 - 1 3 3 1 - F o r t i e i a
ISBN 978-85-0 2-0 90 34-7
Dados Internacionais de C atalogao na Publicao (CIP)
$ ] > , (C mmo B rasil eira do l ivro, SP, Brasil )
i Direitos fundamentais sociais / J. J, Gomes
- j C gnptil l io. . , (et al . J; ogrdengdgres J. i . Gomgs C anoiill io,
: : J. V j Mateus O rione Gonalves Correia e rrca Paula fidrcho
; V " j C orreia. So P aul o: S arnivc, 20 1 0 .
\ Outros aiitores: rica Paula Barch C orreio, Fjvia
'[ Pioveson, I ngoWoLfpng S ail st, t o e O none Gonalves
: j Correia, Wgl er CIq u m S othenburg. ,
"| _' ' '
' j l . Dirpitos fundamentais 2. Direitos sociais I.
, | C onotiihc, 1 . 1 . Gomes. I I . C orreio, tica Paulo Barch. I l i.
' ; Pioveson, fl yio, E . S arlet, I rgc Wolfgang. V. Correio,
i Marcus O rione G onalyes. V I. R othemburg, Cl audius [et a l j .
: ; - ; j 0 9-1 1 1 1 3 C U W. 1 25
! ndice para catlogo sistemtico:
1 . Direitos fundamentais sociais 347. 1 21
M iM WB S OkS e t Mc
f one:!it) 3344-2920 / 3344-795! V . ' - ?
fox: (?) 3344-i/O ? - BicsSc .
. coiis/ roowro s v f t ; ; : v , ; J v
A/. Inisiicficic, 5330 - Scfeffercpac : v
( s e : 2! 322V 2882/321 2-28G 5 r : ': A ' ;: : - x " ' - l
fcc{62) 3224-301 6-Gonifl
MATO GROSSO DO SM/MATO GROSSO : : / ~
I a i l 4 l-A, 31 48- C r to
f : M 382-M8-te(67)3382l U r-C empoG ranae
MINAS GERAIS ^
..MatTBhsStia,%9fiBjoinha; r.:: V;- ,
?cno: (31 ) 3425-830 0- f o x : (35) 3429831 0 - Belo Hosztro
PARVAMAP *
: TrwW|lnqgfc,-f86^M6fim|)K'4 ; >
iene: (91) 3222-9034 / 3224-5038
Fc 91 )324)99-B el m
parahA/sahta catarina
R s Ccrselheso l ocdo, 2895 - Picdo Volta
FoneAax: (41) 3332-4894-Cunhbo
P E R JWC O / E A tA A G . JO S R I WA G O A S .
RuaCortedofiloispo,1 85B0 4 V9 1
: .tineyei) It t ^S IiK S t ) zHS 0 : 1 X
ilBHR O PRETO (H O P A U lO l- -
Av fimasco Junqueira, 1255&otro
Fone: (14) 3&KH 841 -Fox:'tl 6) 361 M284 = Ribeiro P r *
R ioonA gmo/ B riR trosA KTo _ "
Ruo Visconde de S anl iLbiW, 11 3 )1 9Wo Isabel
: t e : (21) 2577-9494 - f cc (21 ! 2577-8867 / 257/ -55S 5 T
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A vA . J n a e r , 2 3 1 - E a p p a ~
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Po r t o A le gr e
SA0PAU10 ?:
/w.A/iWliai, 92-Bami Fuid r
Fone:toXll)261S-36-5iofg'x) , -
Diretor editorial Antonio t i izde Toledo Pinto
Oiretor de produo editorial luiz Hoberto Caria
Assistente editorial SosamSimneSiha
Produo editorial ligia Alves
Clarissa Borasi Maria
Preparao de originais Mona l i d a de Oliveira Godoy
Camilla Bazzoai de Medeiros
Arte e diagramao Cristina Aparecida Agudo de Freitas
Mnia Landi
Reviso de provas f it o de Cssia Queiroz Oorgati
Sita de Cssia S. Pereira
Servios editoriais Ana Paula Mazzoco
Baine Cristina da Silva
Capa AnaDobn
Data de fechamento da edio: 6-4-2010
Dvidas?
A cesse www. saraivajur. com. br
N e n h uma p o r t e de s t a p ub lica o p o de r s e r r e p r o duzida p o r qualque r me io
o u fo r ma s e m o p r v ia o ir fo r izo o da Edit o r a S ar aiv a.
A v io la o do s dir e it o s aut o r ais cr ime e s t ab e le cido n o L e i n . 9 . 6 1 0 / 9 8 e
p un ido p e lo ar t igo 1 8 4 do Cdigo Pe n al.
N D ICE
J. J. Gomes Canotilho
0 dir e it o co n s t it ucio n al co mo cin cia de dir e c o o n cle o
e s s e n cial de p r e s t a e s s o ciais o u a lo caliza o in ce r t a da s o cia-
lidade ( co n t r ib ut o p ar a a r e ab ilit a o da fo r a n o r mat iv a da
co n s t it ui o s o cial) ........................................................................ 11
l 2 Re t r o s p e ct iv a ..................................................................................... 11
1 A an lis e e s t r ut ur al da p o s i o jur dico - p r e s t acio n al..... 11
II Os dir e it o s s o ciais e o s camale e s n o r mat iv o s ............. 12
III O dir e it o p o l t ica, o dir e it o e co n o mia........................ 13
IV O lo cal in ce r t o da s o cialidade ........................................... 13
V A go v e man ce do t e r ce ir o cap it alis mo e a co n s t it ui o s o cial 18
1. Co lo ca o do p r o b le ma................................................... 18
2 . Os p r e s s up o s t o s e co n mico - fin an ce ir o s do Es t ado S o cial.. 19
3 . O Es t ado S o cial co mo in s t r ume n t o da in clus o s o cial 2 0
2- D e s afio s me t dico s e me t o do lgico s s us t e n t ab ilidade n o r ma
t iv a do Es t ado S o cial................................................................ 2 2
I A dir e c o at r av s do dir e it o ................................................. 2 3
II Re fr ac e s me t dico - me t o do lgicas ................................... 2 5
1. A de t e r min a o do s n v e is e s s e n ciais de p r e s t a e s
s o ciais ................................................................................ 2 5
J. J. Gomes Canotilho
O dir e it o do s p o b r e s n o act iv is mo judici r io ................................ 3 3
rica Paula Barcha Correia
A r e la o h o mo afe t iv a e o dir e it o de s e gur idade s o cial uma le i
t ur a a p ar t ir do s dir e it o s fun dame n t ais ............................................ 3 7
5
0 D IREITO CON S TITUCION A L COMO
CI N CIA D E D IREC O - O N CL EO ES S EN CIA L
D E PRES TA ES S OCIA IS OU A L OCA L IZ A O
IN CERTA D A S OCIA L ID A D E ( CON TRIB UTO
PA RA A REA B IL ITA O D A F OR A N ORMA TIVA
D A CON S TITUI O S OCIA L )
J. J. Gomes Canotilho*
Re t r o s p e ct iv a
I A anlise estrutural da posio jurdico-prestacional
A o faze r mo s o t r ab alh o de cas a p ar a e lab o r ar e s t a in t e r v e n o , r e s o l
v e mo s in t e r r o gar - n o s s o b r e o ace r t o t e r ico e do gm t ico das n o s s as an t e
r io r e s in cur s e s p e lo t e ma da s o cialidade e s t at al e p e la co n s t it ui o do s
dir e it o s e co n mico s , s o ciais e cult ur ais . Te mo s de co n fe s s ar que o r e s ul
t ado , e m t e r mo s p r t ico s , n o an imado r . Re s o lv e mo s , p o r is s o , r e v is it ar
o t e ma, de s de lo go p o r que s e as s is t e a in quie t an t e s r e gr e s s e s , n o s p lan o s
do ut r in r io , me t o do lgico e jur is p r ude n cial, quan t o co n cr e t iza o do s
p r in c p io s da s o cialidade n o s e s t ado s de dir e it o de mo cr t ico s 1. Ve jamo s ,
per suma capita, as n o s s as an t e r io r e s p o s i e s s o b r e o p r o b le ma. Em t r a
b alh o in t it ulado To me mo s a s r io o s dir e it o s e co n mico s , s o ciais e cult u
r ais 2, p r o cur amo s faze r um e s t udo an al t ico - e s t r ut ur al s o b r e a "p o s i o
*Pr o fe s s o r Cat e dr t ico da F aculdade de D ir e it o da Un iv e r s idade de Co imb r a.
1 Ve ja- s e n uma in cis iv a dis cus s o do p r o b le ma n o t r ab alh o co le ct iv o co o r de n ado p o r M. B o v e r o ,
Qtiale Libert. D izio n ar io m n imo co n t r o i fals i lib e r ali, Ro ma- B ar i, L at e r za, 2 0 0 4 .
2 Pub licado in icialme n t e n o n me r o e s p e cial do Boletim da Faculdade de Direito de Coimbra Es t u
do s e m Ho me n age m ao Pr o f. D o ut o r A n t n io de A r r uda F e r r e r Co r r e ia, 1 9 8 8 , e r e p ub licado n o
n o s s o liv r o Estudos sobre direitosfundamentais, Co imb r a, 2 0 0 3 , p . 3 5 e s .
n
jur dico - p r e s t acio n al. O n o s s o o b je ct iv o e r a r e co r t ar uma p o s i o jurdico-
-prestacional co m a me s ma de n s idade jur dico - s ub je ct iv a do s dir e it o s de
de fe s a. N o e n t an t o , e e mb o r a t e n h a s ido r e co n h e cido que o Es t ado , o s
p o de r e s p b lico s e o le gis lado r e s t o v in culado s a p r o t e ge r e a gar an t ir
p r e s t a e s e x is t e n ciais , a do ut r in a e a jur is p r udn cia ab r a ar am uma p o s i
o cada v e z mais co n s e r v ado r a: ( i) as p r e s t a e s e x is t e n ciais p ar t e m do
m n imo p ar a uma e x is t n cia min imame n t e co n dign a: ( ii) s o co n s ide r adas
mais co mo dime n s e s de dir e it o s , lib e r dade s JL gar an t ias _(dire it o _ _v ida,
dir e it o ao de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade , dir e it o o up r in c p io - _da_dign i^
dade da p e s s o a h uman a) do que co mo e le me n t o s co n s t it ut iv o s A - dir e it o s
s o ciais : e ( iii) a p o s i o jur dico - p r e s t acio n al as s e n t a p r imar iame n t e e m
everes o b je ct iv o s , prima facie do Es t ado , e n o e m dir e it o s s ub je ct iv o s
p r e s t acio n ais de r iv ado s dir e ct ame n t e da co n s t it ui o .
Tal co mo s e p o de r v e r n a r e t r ica ar gume n t at iv a do Tr ib un al Co n s
t it ucio n al Po r t ugus n o cas o r e fe r e n t e ao r e n dime n t o s o cial de in s e r o ( A c.
5 9 0 / 0 2 ) , a jur is p r udn cia r e co n duz o dir e it o ao r e n dime n t o s o cial de in s e r
o ide ia de co n t e do m n imo do dir e it o a um m n imo de e x is t n cia
co n dign a e acab a p o r co lo car e n t r e p ar n t e s e s o s p r p r io s dir e it o s e co n
mico s , s o ciais cult ur ais 3. A me t dica jur is p r ude n cial t e n de a t r an s fo r mar - s e
e m uma me t o do lo gia fun cio n al de o b t e n o de v e n cime n t o de cis r io .
II Os direitos sociais e os camalees normativos
Vo lt amo s ao t e ma quas e de z an o s de p o is e m t r ab alh o in t it ulado Me
t o do lo gia fuzzy e camale e s n o r mat iv o s n a p r o b le m t ica act ual do s dir e i
t o s e co n mico s , s o ciais e cult ur ais 4. Em t al e s t udo p r o cur amo s p r o b le ma-
t izar a de p e n dn cia le gal do s dir e it o s co n s t it ucio n ais s o ciais t e n do e m
co n t a a r e s e r v a de co fr e s fin an ce ir o s . D e ce r t o mo do , a n o s s a p e r s p e ct iv a
dir igia- s e n o s e n t ido de s alv ar a dime n s o n o r mat iv a da s o cialidade me
dian t e do is e s que mas : ( i) p r o cur ar n o v as v ias p ar a a de s - in t r o v e r s o da
s o cialidade e s t at al; e ( ii) dis t in guir e n t r e direitos constitucionais sociais e
polticas pblicas de r e aliza o de dir e it o s s o ciais . A lin h a ide o lgica de
fun do p o de r ia s e r r e s umida da s e guin t e fo r ma: o car ct e r dir ige n t e da
3 Ve ja- s e a cr t ica de s s e acr do e m Jo r ge Re is N o v ais , Os princpios constitucionais estruturantes da
Repblica Portuguesa, Co imb r a, 2 0 0 4 , p . 6 7 .
4 Es t e t r ab alh o fo i p r e p ar ado p ar a um co lquio e m Madr id, p r o mo v ido p e la Un iv e r s idade Car lo s
III, s o b r e Dereclios econmicos, sociales e aturales, e m 2 2 / 2 6 de ab r il de 1 9 9 6 . Es t t amb m p ub licado
e m Estudo sobre direitosfundamentais, cit ., p . 9 3 s .
co n s t it ui o s o cial n o s ign ifica a o p t imiza o directa e j do s dir e it o s s o
ciais , an t e s p o s t ula a gr aduab ilidade de r e aliza o de s t e s dir e it o s . Gr adua-
b ilidade n o s ign ifica, p o r m, r e v e r s ib ilidade s o cial.
O p r o b le ma de s t a p o s i o que e la fo i r ap idame n t e ult r ap as s ada p e la
ch amada cr is e do Es t ado S o cial e p e lo t r iun fo e s magado r do glo b alis mo
n e o lib e r al. Em caus a e s t n o ap e n as a gr aduab ilidade , mas t amb m a
r e v e r s ib ilidade das p o s i e s s o ciais .
III 0 direito poltica, o direito economia
Quas e n a me s ma alt ur a do t r ab alh o an t e r io r , in iciamo s a ap r o fun dar
as n o s s as dv idas s o b r e o tom e o dom do n o s s o dis cur s o 5. Co me o u a
gan h ar ce n t r alidade me t dica aquilo a que ch amamo s paradoxia da autos-
suficincia das n o r mas jur dico - co n s t it ucio n ais , s o b r e t udo o suferdiscurso
social e m t o r n o do s dir e it o s fun dame n t ais .
Tr at av a- s e , co mo b v io , de uma p r o p o s t a de le it ur a cr t ica da co n s t i
t ui o dir ige n t e s o cial. A s cr t icas dir igidas p o r quadr an t e s cult ur ais o p o s t o s
p e lo s cult o r e s da s o cio lo gia cr it ica e p e lo s ade p t o s da co n s t it ui o , quadr o
r e b e lde a p r o gr amas co n s t it ucio n alizado s le v ar am- n o s a co n s ide r ar que as
p o l t icas co n s t it ucio n alizadas fe ch ar am a co mun ica o co m o dir e it o r e s p o n
s v e l e x p r e s s o n a cr ia o jur dica p o r me io de p act o s e de co n ce r t a o s o cial,
que r co m o dir e it o reflexivo ge r ado n a r ua, n o as falt o , n o e mp r e go p ar ale
lo , n a e co n o mia s ub t e r r n e a. Em b o a me dida, a s o cialidade co n s t it ucio n al
dir ige n t e e s t av a co lo cada s o b a p r e s s o de do is an t in o r mat iv is mo s : o das s o -
cio lo gias cr t icas e o do s t e r ico s lib e r ais . O co mp r o mis s o co n s t it ucio n al
p o s s v e l p ar a man t e r a fo r a n o r mat iv a da co n s t it ui o s o cial p as s av a, a n o s s o
v e r , p o r uma le it ur a mais p s - p o s it iv is t a da s o cialidade e s t at al.
IV 0 local incerto da socialidade
Vo lt amo s r e ce n t e me n t e ao t e ma do s dir e it o s s o ciais e a s o cialida
de e s t at al6 e p r o cur amo s faze r o p o n t o da s it ua o quan t o co n s t it ui o
5 Cfr ., p r e cis ame n t e , o t r ab alh o "O t o m e o do m n a t e o r ia jur dico - co n s t it ucio n al do s dir e it o s fun da
me n t ais ", in Estudos sobre direitos fundamentais, cit ., p . 1 1 5 s . O t e x t o in icial fo i lido n o Colquio In
ternacional de Direito Constitucional r e alizado e m Re cife ( 2 2 / 2 4 de ago s t o de 1 9 9 6 ) .
6 Cfr . o t r ab alh o de 2 0 0 6 , 30 anos de Constituio da Repblica: a s e dime n t a o do s dir e it o s fun da
13
p o r t ugue s a de dir e it o s s o ciais . Os t p ico s que s alie n t amo s fo r am o s
s e guin t e s :
1) Continuao da crtica ideolgica "car t a de dir e it o s s o ciais
A car t a co n s t it ucio n al de dir e it o s s o ciais n o mais do que um co n
jun t o de p r e ce it o s s e m de t e r min ab ilidade ap licat iv a, imp o s it iv o s de p o l t i
cas p b licas car act e r izada p e la mis t ur a de "ke y n e s is mo e co n mico e de
h uman it ar is mo s o cializan t e .
2) Contestao do arqutipo antropolgico
A dime n s o e s t r ut ur an t e da s o cialidade an dav a ligada ( e ain da s e
man t m) a uma concepo antropolgica complexa, cujo ce n t r o o in div duo
co mo p e s s o a, co mo cidado e co mo t r ab alh ado r . Es t a t r in dade an t r o p o l
gica, p o r mais o n t o lo gicame n t e r adicada que s e ja, v - s e co n fr o n t ada co m
quat r o de s lo ca e s co n t e x t ualizado r as : ( i) ace n t ua o da dignidade da
pessoa co mo p r in c p io fun dan t e da s o cie dade , mas s imult an e ame n t e
de s s ub s t an t izado r da aut o n o mia jur dico - co n s t it ucio n al do s dir e it o s s o ciais ;
( ii) dessubjectivizao regulatria co n duce n t e s ub s t it ui o da cidadan ia
s o cial p e la cidadan ia do co n s umido r ; ( ii) dessolidarizao liberal empresarial
r e lat iv ame n t e ao s e n car go s s o ciais ; e ( iv ) cr t ica da e fic cia e e ficin cia do s
s e r v i o s p b lico s s o ciais p e las co r r e n t e s e co n mico - r e gulado r as da boa
govemao.
N o co lo car e mo s o dis cur s o n o p lan o do ide o lo gis mo , h o je o b s e s s iv o
n o s quadr an t e s lib e r ais que p r o cur am um r e v is io n is mo s e m fr o n t e ir as de
fo r ma a p ur ificar as co n s t it ui e s p o r me io da e x p uls o do s dir e it o s e co
n mico s , s o ciais e cult ur ais . In t e r e s s a- n o s mais a de s co n s t r u o do ar qu
t ip o an t r o p o lgico . Co me ce mo s p e la hipertrofia da dignidade da pessoa
humana.
A p ar e n t e me n t e , o r e cur s o dign idade da p e s s o a h uman a co mo p r in
c p io o n t o fe n o me n o lgico fun dan t e da dignidade social da p e s s o a h uman a
n ada t e r ia de p r o b le m t ico . O de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade an co r ado
n a dign idade da p e s s o a ain da o fun dame n t o mais in que s t io n v e l das
p r e s t a e s s o ciais a car go do Es t ado . Mas o t e s t e dx ico de jur is p r udn
cia co n s t it ucio n al p o r t ugue s a ap o n t a p ar a o e s v aziame n t o s o lidar s t ico
de s t a e s t r at gia dis cur s iv a do Tr ib un al Po r t ugus . O leading case o A cr
do n . 5 0 9 / 2 0 0 2 s o b r e o r e n dime n t o de in s e r o s o cial que v e io alt e r ar o
me n t ais e o lo cal in ce r t o da s o cialidade ( t e x t o in dit o ) , e mb o r a co m le it ur a e m Co imb r a ( Cur s o de
D ir e it o s Human o s ) e e m S o Paulo ( Cur s o de D ir e it o S o cial) .
14
an t e r io r r e gime do r e n dime n t o m n imo gar an t ido . O ce r n e ar gume n t at iv o
do Tr ib un al acab o u p o r s e r o da co n fo r midade o u n o do r e gime le gis lat iv o
de fin ido r do s ub s dio de in s e r o s o cial co m o p r in c p io jur dico - co n s t it u-
cio n al fun dan t e da dign idade da p e s s o a h uman a. Es t e p r in c p io p o s t ular ia
s e mp r e um agas alh o p r e s t acio n al as s e gur ado r de uma e x is t n cia min ima
me n t e co n dign a. A dign idade da p e s s o a s s e r ia afe ct ada s e o r e gime jur -
dico - le gis lat iv o n o gar an t is s e o s "m n imo s da dign idade . O p r o b le ma
que a e s t r at gia dis cur s iv a do Tr ib un al, s o b a ap ar e n t e s o lide z da dign idade
da p e s s o a h uman a, acab a p o r p r o ce de r r e du o e id t ica da s o cialidade ,
co lo can do e n t r e p ar n t e s e s o s dir e it o s ^e co n mico s , s o ciais e cult ur ais . Em
t o da a s ua r adicalidade , a o r ie n t a o do Tr ib un al co n duzir ia a e s t e r e s ult a
do de s o lado r : n o h dir e it o s s o ciais aut o n o mame n t e r e co r t ado s , mas r e -
fr ac e s s o ciais da dign idade da p e s s o a h uman a afe r idas p e lo s standards
m n imo s da e x is t n cia.
A s e gun da de s lo ca o da s o cialidade r e me t e - n o s p ar a a p r o b le m t ica
da dessubjectivao regulatria. D e uma fo r ma o u de o ut r a, o s figur in o s do
"Service publique, fr an ce s a, e do "Daseinsvorsorge, ale m, jus t ificav am
a e x is t n cia de s e r v i o s gar an t ido r e s de cidadan ia s o cial e e co n mica
quan t o ao s b e n s p b lico s e s s e n ciais . S ub jace n t e mis s o do Es t ado S o cial,
e s t av a a ide ia do s b e n s s o ciais " ( s ade , e n s in o , s e gur an a, t r ab alh o ) co mo
bens pblicos que s e x ce p cio n alme n t e p o diam s e r p r o s s e guido s p o r p r iv a
do s . A co n v e r gn cia das p o l t icas lib e r alizado r as ( glo b ais e e ur o p e ias ) e
p r iv at izado r as jun t ame n t e co m a at r ib ui o a e n t idade s in de p e n de n t e s da
co mp e t n cia r e gulat r ia co n duze m a uma r o t a o de 3 6 0 gr aus n a qualifi
ca o de s s e s b e n s . A go r a s o bens privados que s e x ce p cio n alme n t e de v e m
s e r p r o s s e guido s p o r s e r v i o s p b lico s . A s o cialidade e s t at al um lugar
in ce r t o . Po r um lado , a ide ia de s e r v i o s p b lico s de in t e r e s s e e co n mico
ge r al uma fr mula de man ut e n o do ace s s o a b e n s e s s e n ciais ( e n e r gia,
gua, t e le co mun ica e s ) n o j n a qualidade de cidado social, mas s im n a
qualidade de utente o u de consumidor. E p o s s v e l que , e m t e r mo s de e fi
c cia e e ficin cia, o n o v o mo de lo s e ja mais t r an s p ar e n t e e r acio n al, mas
n o l quido que l o n de falh a o me r cado o Es t ado S o cial p o s s a s e r s ub s
t it u do p o r um co n glo me r ado de s e r v i o s p r iv ado s aqui e ali s e n s v e is s
r e s p o n s ab ilidade s s o ciais . Is t o n o s co n duz ao t e r ce ir o t e s t e da s o cialidade .
Que m e s t iv e r at e n t o s t e n dn cias p o l t icas e e co n micas n e o lib e r ais
facilme n t e co mp r e e n de r que o me r cado de s e r v i o s t e n de a p r e e n ch e r o
e s p a o s o cial e m do m n io s t o s e n s v e is co mo h o s p it ais , e s t ab e le cime n t o s
de e n s in o , s is t e mas de s e gur an a s o cial. A act ual p r e s s o n o s e n t ido de
t r an s fo r mar o s s e r v i o s p b lico s e m indstrias de servios n o de v e n e ce s
15
s ar iame n t e s e r r e me t ida p ar a o camp o do s male f cio s e co n mico s do n e o -
lib e r alis mo . D ar e mo s do is e x e mp lo s , um r e lacio n ado ao dir e it o s ade e
o o ut r o , ao dir e it o ao e n s in o .
A L e i Co n s t it ucio n al n . 1 / 9 7 ( 4 - Re v is o ) acr e s ce n t o u ao ar t . 6 4 2
( dir e it o s ade ) e m n o v o in cis o o n de s e e s t ab e le ce :
A r t . 6 4 , n . 3 Par a as s e gur ar o dir e it o s ade in cumb e p r io r it ar iame n t e
ao Es t ado :
( . . . )
d) D is cip lin ar e fis calizar as fo r mas e mp r e s ar iais e p r iv adas da me di
cin a, ar t iculan do - as co m o s e r v i o n acio n al de s ade , p o r fo r ma a as s e gu
r ar , n as in s t it ui e s de s ade p b licas e p r iv adas , adequados padres de
eficincia e qualidade", ( gr ifo n o s s o )
Es s e in cis o co n s agr a a e x p r e s s a v alo r iza o co n s t it ucio n al do s p adr e s
de e ficin cia e qualidade que , al m de e s t ar e m co n s o n n cia co m as dis p o
s i e s da Un io Eur o p ia n as quais s e e s t ab e le ce co mo o b je ct iv o a gar an t ia
de um nvel elevado de proteco da sade humana, s uge r e o n o v o co n t e x t o
do princpio da economicidade n a p r e s t a o de s e r v i o s p b lico s . A de mais ,
ap o n t a p ar a dife r e n t e s e s que mas o r gan izat iv o s do s e r v i o p b lico de s ade
co mo ge s t o e mp r e s ar ial e r e gime co n v e n cio n al e p ar a s is t e mas e s p e c fico s
de mo n it o r iza o e co n t r o lo do s r e s p e ct iv o s s e r v i o s . Po r s ua v e z, o e le v ado
n v e l de p r o t e c o p r e s s up e a excelncia e a govemao clnica ( clin icai
go v e r n an ce ) co mo v e culo de qualidade cl n ica e co mo in s t r ume n t o de
e x ce ln cia as s is t e n cial. A p r o gr e s s iv a e s p e cifica o de p adr e s de qualidade ,
r e co r t ado s e m t e r mo s de ge s t o , r e gula o , p r o ce dime n t o e co n t r o lo , acab a
p o r t e r in cidn cia mat e r ialme n t e p o s it iv a n o s direitos dos doentes ( dir e it o
aut o n o mia e in fo r ma o , lib e r dade de e s co lh a, dir e it o e quidade n o ace s s o ,
dir e it o a t r at ame n t o e m p r azo clin icame n t e r azo v e l co m ge s t o r acio n al e
e ficie n t e ajus t e das lis t as de e s p e r a, dir e it o p ar t icip a o de mo cr t ica do s
do e n t e s o u as s o cia e s de do e n t e s n a de fin i o de e s calas de p r io r idade s e
s ua de fin i o de p e r o do s de e s p e r a clin icame n t e ace it v e is ) . D e v e mo s t e r
s e r e n idade b as t an t e p ar a r e co n h e ce r que a o p t imiza o do s dir e it o s s o ciais
n o de r iv a s o u p r imo r dialme n t e da p r o clama o e x aus t iv a do t e x t o co n s
t it ucio n al, mas da go o d go v e r n an ce do s r e cur s o s p b lico s e p r iv ado s
afe ct ado s ao s is t e ma de s ade .
O s e gun do e x e mp lo r e lacio n a- s e co m o dir e it o ao e n s in o . O p ar adig
ma co n s t it ucio n al p o r t ugus do e n s in o as s e n t a n a ce n t r alidade de uma r e de
de e s t ab e le cime n t o s p b lico s de e n s in o . Mas a ide ia de rede p as s o u a s e r
in t e r p r e t ada p o r algun s s e ct o r e s co mo r e de de e s t ab e le cime n t o s de e n s in o ,
16
ab r an ge n t e do e n s in o p ar t icular e co o p e r at iv o , e m que r e co n h e cido a
t o do s o s e s t ab e le cime n t o s de e n s in o uma dime n s o p b lica. O e n s in o ,
e m t o do s o s s e ct o r e s p b lico , p r iv ado e co o p e r at iv o , um servio p
blico. E b v io que e s s a in t e r p r e t a o s e s t ar e m co n fo r midade co m a
Co n s t it ui o s e e la n o imp licar a n e ut r aliza o do imp e r at iv o co n s t it ucio
n al de cr ia o da r e de de e s t ab e le cime n t o s p b lico s e s t at ais de e n s in o
p b lico , p o is e s s a a matriz republicana de e n s in o co n s t it ucio n alme n t e
co n s agr ado . Vale a p e n a, p o r m, ap r o fun dar as de s lo ca e s n o r mat iv as de
s e n t ido in s in uadas p e lo co n ce it o de r e de , amp liada de s e r v i o p b lico de
e n s in o . A o in co r p o r ar - s e n a r e de , o e n s in o p ar t icular e co o p e r at iv o p r o cu
r a, dir e ct a o u in dir e ct ame n t e , fo me n t ar e s que mas de co n co r r n cia e n t r e
o s v r io s e s t ab e le cime n t o s de e n s in o qual n o alh e ia a ide ia de marke
ting co me r cial. Es t a co n co r r n cia s e r ia, de r e s t o , um fact o r de cis iv o p ar a
aume n t ar a e ficin cia e a r e n t ab ilidade do e n s in o p b lico , p o is e la p e r mi
t ir ia que o s ut e n t e s dir e ct o s do s e r v i o as fam lias s e co n v e r t e s s e m
e m r b it r o s do mercado de ensino p o r me io do e x e r c cio do direito escolha
de escola. Mais do que is s o , ain da. A co n ce p o jaco b in a de e n s in o , t r adu
zida n a un icidade e un ifo r midade da o fe r t a e s co lar , s e r ia s ub s t it u da p o r
um s is t e ma p lur al mar cado pela flexibilidade do sistema educativo mais ap t o
p ar a a co n cr e t iza o do livre desenvolvimento dos jovens ( co mb at e n do - s e ,
in clus iv e , de fo r ma mais e ficaz, o s fe n me n o s de ab an do n o e de in s at is fa
o e s co lar ) . Po r lt imo , o e s que ma e m co n co r r n cia s e r v ir ia de e s t e io
p r p r ia r e le git ima o do s is t e ma de e n s in o me dian t e o s me can is mo s de
avaliao e controlo externos in dis p e n s v e is p r o mo o de qualidade e
e fic cia de t o da a r e de de e s t ab e le cime n t o s de e n s in o . b o m de v e r que
o n cle o ce n t r al das n o v as p r o p o s t as s e r e co n duz t r an s fo r ma o de t o do
o s is t e ma de e n s in o e m uma empresa educacional, ce n t r ada e m p r o b le mas
da ut iliza o r acio n al do s r e cur s o s e da ge s t o da qualidade . A t e le o lo gia
in t r n s e ca da lib e r dade de ap r e n de r e de e n s in ar p e la e s co la p b lica d
lugar a uma o ut r a co mp r e e n s o fin al s t ica. O dir e it o e s co la o direito
aprendizagem das leges artis de uma p r o fis s o in s e r ida n o me r cado de t r a
b alh o . Em t e r mo s mais an al t ico s , dir - s e - a que o dir e it o e s co la ( i) o
dir e it o o b t e n o de me io s p ar a e s t udar ; ( ii) o dir e it o ap r e n dizage m das
le is da p r o fis s o ; e ( iii) o dir e it o a r e s ult ado s fo r mat iv o s e m co n co r r n cia
co m as e x ign cias da p r o cur a e da o fe r t a do me r cado de t r ab alh o p ar a jo v e n s .
O act ual co n fr o n t o de mo de lo s a "un iv e r s idade p b lica r e p ub lican a e
a un iv e r s idade p r iv ada liv r e de mo n s t r a, co m e x ub e r n cia, que t amb m
n e s s e do m n io a s o cialidade e s t at al j n o o que e r a, e mb o r a co n t in ue mo s
fi is b o n dade da e s co la p b lica r e p ub lican a, liv r e , igual e laica.
17
VA governance do terceiro capitalismo e a
constituio social
Co mo o t t ulo e m e p gr afe , r e digimo s um t r ab alh o que s e de s t in av a
a s e r dis cut ido e m S o Paulo e m s e t e mb r o de 2 0 0 9 . Po r mo t iv o s p e s s o ais ,
n o n o s fo i p o s s v e l co lo car a s ua dis cus s o n o e s p a o p b lico . Co mo v e r -
- s e - , o camp o da an lis e r e t o ma algun s p as s o s do s it in e r r io s an t e r io r e s ,
mas p r o cur a t amb m que s t io n ar o mo de lo de aco social universal in s in u
ado p e la go v e r n an ce do t e r ce ir o cap it alis mo .
1. Colocao do problema
Em s ub s t it ui o do Es t ado S o cial co n s t it ucio n alme n t e co n fo r mado
p r o p e - s e umas v e ze s de fo r ma s ub - r e p t cia, o ut r as v e ze s e m t e r mo s
ab e r t ame n t e fr o n t ais que o t e r ce ir o cap it alis mo co m a s ua s o cie dade
ab e r t a co n duz n e ce s s ar iame n t e a um co r o l r io lgico : a e mp r e s a p r iv ada,
a act uar n o mun do glo b al, s e r o n ico s uje it o cap az de r e s p o n de r a um
mo de lo de ac o s o cial un iv e r s al7. A de mo n s t r a o de s s a t e s e fe it a de
div e r s o s mo do s e p r e s t a- s e a v r ias ab o r dage n s co n s o an t e a lo caliza o do s
p r o b le mas . Po r uma que s t o de e co n o mia dis cur s iv a, p ar t ir e mo s aqui das
s e guin t e s p r o p o s i e s :
( 1 ) o Es t ado S o cial o t ip o de Es t ado que co lo ca e n t r e o s s e us p r in
c p io s fun dan t e s e e s t r ut ur an t e s o p r in c p io da s o cialidade ;
( 2 ) o p r in c p io da s o cialidade p o s t ula o r e co n h e cime n t o e a gar an t ia
do s dir e it o s s o ciais ; e
( 3 ) a gar an t ia do s dir e it o s s o ciais p r e s s up e uma ar t icula o do dir e i
t o ( de t o do o dir e it o , a co me ar p e lo dir e it o co n s t it ucio n al) co m a e co n o mia
in t e r v e n cio n is t a p r o gr e s s iv ame n t e n e ut r alizada p e la e x p r e s s o do me r cado
glo b al.
Ve jamo s , e n t o , co m mais p o r me n o r , a s e qn cia de s t as p r o p o s i e s .
To do s e s t ar e mo s de aco r do que o Es t ado S o cial o u, me lh o r , o mo de lo
s o cial t al co mo e le , de fo r ma div e r s a, gan h o u s ub s t n cia n a Eur o p a Oci
de n t al e r gue u o s dir e it o s s o ciais a dime n s o e s t r ut ur an t e da jur idicida-
de e da de mo cr acia. Po r um lado , p as s adas que fo r am as dis p ut as s o b r e a
7 Cfr . 0 p e r t ur b ado r liv r o de Pie t r o B ar ce llo n a, Lo Spazio delia politica, Roma. Edit o r a Riun it i, 1 9 9 8 ,
p . 1 1 .
18
in co mp at ib ilidade e n t r e Es t ado de D ir e it o e Es t ado S o cial o u, s e p r e fe r ir
mo s e n t r e o p r in c p io da jur idicidade e o p r in c p io da s o cialidade , gan h o u
r e lat iv a e s t ab ilidade a co mp r e e n s o co n s t it ucio n al do Es t ado co mo Estado
de direito social. Po r o ut r o lado , o r e co n h e cime n t o e a gar an t ia do s dir e it o s
s o ciais p as s ar am a dime n s o e s t r ut ur an t e do p r p r io p r in c p io de mo cr t i
co . Co m e fe it o , a ide ia de liberdade igual e s t r ut ur a o p r in c p io de mo cr t ico ,
dado que : ( i) ar r an ca do p o s t ulado in que s t io n v e l ( de s de as p r ime ir as de
clar a e s de dir e it o ) de que o s h o me n s n as ce m liv r e s e iguais e m dir e it o s ;
( ii) a lib e r dade e a igualdade co me am p e la gar an t ia do s dir e it o s de lib e r
dade , e , de n t r e e s t e s , do s dir e it o s fun dame n t ais da p e s s o a h uman a ( dir e i
t o v ida, in t e gr idade f s ica e p e s s o al, ao de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n ali
dade , fam lia) ; e ( iii) a lib e r dade igual p as s a p e la p r o gr e s s iv a r adica o de
uma igualdade r e al o u s ub s t an cial e n t r e as p e s s o as .
A ar t icula o da s o cialidade co m de mo cr at icidade t o r n a- s e , as s im,
clar a: s h v e r dade ir a de mo cr acia quan do t o do s t m iguais p o s s ib ilidade s
de p ar t icip ar n o go v e r n o da p o lis 8. Uma de mo cr acia n o s e co n s t r i co m
fo me , mis r ia, ign o r n cia, an alfab e t is mo e e x clus o . A de mo cr acia s um
processo o u procedimento justo de participao poltica s e existir uma justia
distributiva n o p lan o do s b e n s s o ciais . A jur idicidade , a s o ciab ilidade e a
de mo cr acia p r e s s up e m, as s im, uma b as e jus fun dame n t al in co n t o r n v e l,
que co me a n o s dir e it o s fun dame n t ais da p e s s o a e acab a n o s dir e it o s s o ciais .
2. Os pressupostos econmico-financeiros do Estado Social
Os dir e it o s s o ciais s o car o s , j o dis s e mo s . A lgumas p r e s t a e s in
dis p e n s v e is e fe ct iv a o de s s e s dir e it o s de v e m s e r as s e gur adas p e lo s
p o de r e s p b lico s de fo r ma gr at uit a o u t e n de n cialme n t e gr at uit a. Or a, o
Es t ado S o cial s p o de de s e mp e n h ar p o s it iv ame n t e as s uas t ar e fas de s o -
c alidade s e s e v e r ificar e m quat r o co n di e s b s icas :
( 1 ) p r o v is e s fin an ce ir as n e ce s s r ias e s uficie n t e s , p o r p ar t e do s co fr e s
p b lico s , o que imp lica um s is t e ma fis cal e ficie n t e e cap az de as s e gur ar e
e x e r ce r r e le v an t e cap acidade de co ac o t r ib ut r ia;
( 2 ) e s t r ut ur a da de s p e s a p b lica o r ie n t ada p ar a o fin an ciame n t o do s
s e r v i o s s o ciais ( de s p e s a s o cial) e p ar a in v e s t ime n t o s p r o dut iv o s ( de s p e s a
p r o dut iv a) ;
8 A in dis s o ciab il dade de de mo cr acia e o s dir e it o s s o ciais t m s ido p o s t o s e m r e le v o p o r v r io s au
t o r e s . Cit ar e mo s ap e n as A . B aldas s ar e , Diritti deliapersona e valori costituzionali, To r in o : Giap p ie h e lli,
1 9 9 7 .
19
( 3 ) o r ame n t o p b lico e quilib r ado de fo r ma a as s e gur ar o co n t r o lo do
d fice das de s p e s as p b licas e a e v it ar que um d fice e le v ado t e n h a r e fle
x o s n e gat iv o s n a in fla o e n o v alo r da mo e da; e
( 4 ) t ax a de cr e s cime n t o do r e n dime n t o n acio n al de v alo r m dio o u
e le v ado ( 3 % p e lo me n o s ao an o ) .
A v e r ifica o de t o das as co n di e s e n ume r adas co lo ca o Es t ado
S o cial e m r e ais dificuldade s . Em p r ime ir o lugar , o mo de lo s o cial s ub jace n
t e s p r e mis s as in dicadas , dize m algun s , um mo de lo do s p a s e s r ico s . Em
s e gun do lugar , me s mo n o s p a s e s r ico s e la p o de s e r p o s t a e m caus a p o r
v r io s mo t iv o s ( de s de o cr e s cime n t o in co n t r o l v e l das de s p e s as co m algun s
s e r v i o s , co mo o de s ade , p as s an do p e lo de s e quil b r io das o b r as p b licas
r e gio n ais e lo cais , e t e r min an do n a e x is t n cia de d fice s e s t r ut ur ais , co mo
p o l t icas de co e s o e co n mica e t e r r it o r ial, co mo aco n t e ce co m a in t e gr a o
da e x - D D R n a A le man h a fe de r al) . p o r is s o que de s de o s an o s 1 9 7 0 s e
in s is t e n a crise fiscal do Estado e a p ar t ir da d cada de 9 0 do s culo p as s a
do o t e ma o b s idian t e o da sustentabilidade do modelo social. A s cr t icas ao
Es t ado S o cial e s co n s t it ui e s p r o gr am t ico - s o ciais in s e r e m- s e n e s t e
co n t e x t o , in s is t in do uma s ign ificat iv a p ar t e do s p o l t ico s e e co n o mis t as
in flue n t e s n a r e o r ie n t a o das p o l t icas das fin an as e de s p e s as p b licas .
N o b an co do s r us e s t a c le b r e p o l t ica do dficit spending: e n div idame n
t o do Es t ado co m a fin alidade de fin an ciar a de s p e s a p b lica, s o b r e t udo a
de s p e s a s o cial.
3. O Estado Social como instrumento da incluso social
A cr is e do Es t ado S o cial t o r n o u- s e , p ar a muit o s , um p r o b le ma do
o cas o da s o cialidade . N as s o cie dade s fun cio n alme n t e dife r e n ciadas n o h
lugar p ar a p o l t icas de in clus o . A ch amada individualizao da sociedade
s ign ifica p r e cis ame n t e o in de clin v e l dir e it o e o de v e r de cada in div duo
co lo car n o s e u p lan o de v ida e co n du o da e x is t n cia as r e s p o n s ab ilidade s
que lh e cab e m n a lut a p e la s o b r e v iv n cia. D it o p o r o ut r as p alav r as : o risco
da v ida t amb m, e s o b r e t udo , um r is co in div idual9. A in da de o ut r o mo do ,
cada um de v e as s umir um p ap e l act iv o p ar a as s e gur ar a s ua in clus o n o s
n o v o s s is t e mas dife r e n ciado s da s o cie dade 10. O p r o b le ma o de que a di
9 Ve jam- s e as co n s ide r a e s de Ulr ich . B e ck n a s ua co n h e cida o b r a s o b r e a s o cie dade de r is co :
Risikogeselkchaft, F r an kfur t , 1 9 8 6 , p . 1 1 5 .
10 D e uma fo r ma in cis iv a, cfr . B e ck/ B e ck- Ge r n s h e im ( o r g.) , Riskante Freiheiten, F r an kfur t / M, 1 9 9 4 ,
p . 12 s.
20
fe r e n cia o fun cio n al in div idualizado r a co n duz a uma de p e n dn cia o r ga-
n izat iv a mais fo r t e . In div idualme n t e r e s p o n s v e l de n t r o do s v r io s s is t e mas
fun cio n alme n t e dife r e n ciado s fam lia, t r ab alh o , fo r ma o e qualifica o ,
t r an s p o r t e , s ade , co n s umo , a p e s s o a co r r e s e mp r e o r is co de n o t e r
p o s s ib ilidade de in clus o n o s e s que mas p r e s t acio n ais do s v r io s s is t e mas 11.
Is s o t an t o mais quan t o ce r t o que a n e ce s s idade de in clus o n o s s is t e mas
fun cio n ais dife r e n ciado s co me a muit o ce do : o dir e it o de n as ce r n o s e
e x e r ce e m cas a, mas n a mat e r n idade in clu da n o s is t e ma de s ade ; o
de s e n v o lv ime n t o da cr ian a n o um p r o b le ma de cr e s ce r n o s b r a o s da
ama, mas de s o cializa o n o s jar din s de in fn cia in clu do s n o s is t e ma de
e n s in o p r - e s co lar ; o co n h e cime n t o e a in fo r ma o co me am n a e s co la e
is t o p ar t e in t e gr an t e do s is t e ma de e n s in o .
A liberdade igual in t e r p r e t ada n e s t e co n t e x t o co mo a igual p o s s ib i
lidade de in clus o e m um s is t e ma s o cial dife r e n ciado . A r e aliza o de s t e
p r in c p io de igualdade de incluso co n t in ua a co lo car o n gr dio da s o cia
lidade : a in clus iv idade p r e s s up e justia quan t o s p o s s ib ilidade s iguais de
ace s s o . Co mo gar an t ir e s t a jus t i a? A r e s p o s t a p ar a muit o s ( n o s quais n o s
in clu mo s ) a r e in v e n o do Es t ado S o cial. Os dir e it o s s o ciais e o s p r in
c p io s s o cialme n t e co n fo r mado r e s s ign ificam, n o act ual co n t e x t o , a le git i
ma o de me didas p b licas de s t in adas a gar an t ir a incluso do in div duo
n o s e s que mas p r e s t acio n ais do s s is t e mas s o ciais fun cio n alme n t e dife r e n
ciado s 12. Me s mo que e s t e Es t ado S o cial n o s e ja mais , h o je , do que um
s imp le s p e n dan t fun cio n al de r e la e s s ub je ct iv as in t e r p e s s o ais , e le
co n t in ua a t e r a in de clin v e l t ar e fa da incluso s o cial p o lit icame n t e p o n
de r ada. Mas co mo p o de r o Es t ado S o cial co n t in uar a de s e mp e n h ar e s s a
fun o de in clus o e m um co n t e x t o glo b al de p r o gr e s s iv a car n cia de me io s
fin an ce ir o s ? Co mo alice r ar e x p e ct at iv as s ab e n do - s e , p ar t ida, que
muit o dif cil p r e e n ch e r o s p r e s s up o s t o s da s ua r e aliza o ? N a v e r dade ,
algumas das cr t icas mais p e r s is t e n t e s co n t r a o Es t ado S o cial e a co n s t it ui
o do s dir e it o s s o ciais r e co n duze m- s e a e s t a ide ia b s ica: e le s alice r am
e x p e ct at iv as n o r mat iv as que n o mais e s t o e m co n di e s de gar an t ir . Is s o
p o de ilus t r ar - s e facilme n t e p o r me io de t r s t p ico s , h o je co r r e n t e s n a li
t e r at ur a "glo b alizado r a:
11 o p r p r io N iklas L uh man n a s alie n t ar e s s e p r o b le ma de in clus o . Cfr . Politischen Theorie im
Wohlfahrstaat, Mt in ch e n , 1 9 8 1 , p . 2 5 .
12 N e s s e s e n t ido , cfr ., p o r lt imo , Th o r s t e n Kin gr e e n , D a Soziahtaatsprinzip im europischen Vetfas-
sungsverbund, Tb in ge n , 2 0 0 3 , p . 2 0 7 : "a aut o r iza o jur dico - co n s t it ucio n al p ar a a in clus o de v r io s
s is t e mas p ar ciais s o ciais e n co n t r a- s e n o p r in c p io do Es t ado S o cial".
21
1 ) 0 mercado global e a concorrncia
N o h p act o de e s t ab ilidade e cr e s cime n t o que e s cap e lgica da
cap t a o de in v e s t ime n t o s dir e ct o s , n acio n ais e e s t r an ge ir o s . Mas o Es t ado
que o s at r ai t e m de s e r um Estado garantido da co n co r r n cia. A s e mp r e s as
p r iv adas ado p t am e s t r at gias de de s lo caliza o , de p o l t ica de in v e s t ime n
t o e de mo de o b r a t e n de n t e s a r e du o do s cus t o s de e x e r c cio e max i-
miza o de lucr o s . O Es t ado , p o r s ua v e z, as s ume cump licidade co m e s t as
e s t r at gias me dian t e a cr ia o de in fr ae s t r ut ur as , b e n e f cio s fis cais e le gis
la o lab o r ai. A s p o l t icas p b licas o p t am p o r e n camin h ar o s din h e ir o s
p b lico s p ar a gr an de s in v e s t ime n t o s in fr ae s t r ut ur an t e s ( ae r o p o r t o s , v ias
f r r e as , aut o e s t r adas ) e m v e z de o s de s o n e r ar p ar a o s s e r v i o s gar an t ido r e s
da e fe ct iv a o de dir e it o s s o ciais . Em quas e t o do s o s p a s e s as s is t e - s e
s ub s t it ui o de s e r v i o s p b lico s p o r e mp r e s as de in t e r e s s e e co n mico
ge r al, muit as de las p r iv at izadas .
2) A reduo das despesas pblicas
A r e du o das de s p e s as p b licas o b r iga a co r t e s o r ame n t ais e ao
dr s t ico e magr e cime n t o do ap ar e lh o o r gan izat iv o do Es t ado . A lgun s , e m
t e r mo s p ur ame n t e ide o lgico s , co mb at e m o Es t ado , e mp ur r an do - o p ar a
um Es t ado m n imo e s ub s idi r io . Out r o s s alie n t am a lgica e co n mica: o
e quil b r io do de ficit e o r ame n t ai in dis p e n s v e l cr ia o de um clima
at r act iv o p ar a in v e s t ime n t o s n o co mp at v e l co m uma admin is t r a o
p b lica h e r dada do Es t ado m x imo .
3 ) 0 comercio electrnico e as transaces telemticas
O imp act o s o b r e o s co fr e s do Es t ado do in cr e me n t o do co m r cio
e le ct r n ico e das t r an s ac e s t e le m t icas p e r mit e uma fuga fis cal p ar a o s
camin h o s da an acio n alidade in t e r n t ica r e lat iv ame n t e qual o s is t e ma
t r ib ut r io n acio n al p o uco p o de faze r . Co mo s e s ab e , a e v as o fis cal an da
de mo s dadas , muit as v e ze s , co m a fr aude fis cal e a lav age m de din h e ir o .
A l m de imp o t e n t e n o co mb at e s act iv idade s il cit as , o Es t ado S o cial v
o s s e us r e cur s o s fis cais e m p e r man e n t e r e t r o ce s s o .
D e s afio s me t dico s e me t o do lgico s
s us t e n t ab ilidade n o r mat iv a do Es t ado S o cial
Um jo v e m co n s t t ucio n alis t a b r as ile ir o e s cr e v e u que n o h mais
e s p a o p ar a o p t imis mo me t o do lgico , is t o , p ar a a cr e n a de que o r e s ul-
22
t ado da in t e r p r e t a o co n s t it ucio n al de p e n de p ur a e s imp le s me n t e do
m t o do ut ilizado 13. Es t amo s de aco r do . Mas o que s e e x ige , h o je , do jur is
t a que , s e m de ix ar de s e r um p e s s imis t a me t o do lgico , d p o s it iv idade
s ua r e t r ica e ab r a camin h o s h e r me n ut ico s cap aze s de aux iliar e m a e x -
t r in s e ca o do dir e it o co n s t it ucio n al. Or a, a n o s s o v e r , a flo r e s t a t e m ca
min h o s . n e ce s s r io de s co b r ir o s camin h o s da flo r e s t a.
I A direco atravs do direito
O p r ime ir o p o n t o que me r e ce n o v a s us p e n s o r e fle x iv a r e lacio n a- s e
co m o p r o b le ma da ca-pacidade de direco do dir e it o co n s t it ucio n al. S e a
lgica dir ige n t e e s t h o je p o s t a e m caus a, is s o n o s ign ifica que o dir e it o
t e n h a de ix ado de s e as s umir co mo in s t r ume n t o de direco de uma co mu
n idade jur idicame n t e o r gan izada. A co n s t it ui o p o de t e r de ix ado de s e r
uma norma dirigente, mas n o e s t de mo n s t r ado que n o t e n h a cap acidade
p ar a s e r uma norma directora. Me s mo t e n do e m co n t a as cr t icas dir igidas
co n t r a o n o r mat iv is mo co n s t it ucio n al ( a que at r s fize mo s r e fe r n cia) ,
cr e mo s que o dir e it o co n t in ua a s e r um in s t r ume n t o fi v e l e n co n t o r n v e l
de co man do e m uma s o cie dade 14. Es t e p o n t o de p ar t ida jus t ifica, de s de
lo go , a clar ifica o do co n ce it o de direco. A s imp le s co n v o ca o do gm
t ica de s t e co n ce it o p ar a as s umir um p ap e l r e le v an t e n a p r o b le m t ica me
t o do lgica de co n cr e t iza o do dir e it o s ign ifica que n o e s t amo s e m s in t o
n ia co m as co n h e cidas t e o r ias aut o r r e fe r e n ciais do dir e it o . Co mo s e s ab e ,
v r ias ab o r dage n s t e r icas t m t e n t ado de mo n s t r ar a mudan a de p ar adig
mas n a co mp r e e n s o do dir e it o e da e s t ab ilidade . A s fr mulas lin g s t icas
e s co lh idas s o s uge s t iv as , e mb o r a n e m s e mp r e co n t e n h am r igo r e x p licat i
v o : dir e it o p s - in t e r v e n cio n is t a, "dir e it o r e gulat r io , dir e it o p r o ce dur al
e t c. Em co mum, t m t o das e las o ch av o da in s uficin cia, da in e ficin cia
e da imp r o dut iv idade do dir e it o in t e r v e n cio n is t a. A is s o acr e s ce n t a- s e a
ch amada dcalage" regulativa do n o r mat iv is mo : a cr e s ce n t e dis cr e p n cia
e n t r e o s fin s das n o r mas e o s r e s ult ado s f ct ico s e jur dico s . Emb o r a is s o
n o s e ja s e mp r e s alie n t ado , o co man do n o r mat iv o t amb m co n s ide r ado
13 Cfr . Vir g lio A fo n s o da S ilv a, In t e r p r e t a o co n s t it ucio n al e s in cr e t is mo me t o do lgico ", in Vir
g lio A fo n s o da S ilv a ( co o r d.) , Interpretao constitucional^ S o Paulo , 2 0 0 5 , p . 1 4 3 .
14 Cfr ., p o r lt imo , D ie t mar B r aun , Die Politische Steuerung der Wissenschaji, 1 9 9 7 , p . 2 9 s .; Gun n ar
F o lke S h up p e r t , S e lb s t v e r walt un g, S e lb s t s t e ue r un g, S e lb s t o r gan izat io n , in Archiv des offentlichen
liechts, 1 1 4 ( 1 9 8 9 ) , p . 1 2 7 ; e F lo r ian B e cke r , Kooperative undKonsenstiale Stnikturen in der Normsetzung,
Tb in ge n , 2 0 0 5 , p . 1 3 s .
23
co mo um modo decisionista de r e s o lv e r p r o b le mas a p ar t ir de um s ign ifica
do mo n o caus al. A cr e s ce que o mo do n o r mat iv o - in t e r v e n cio n is t a de s cur a a
n e ce s s idade de informao que r n o mo me n t o do imp uls o r e gulat iv o que r
n a fas e de co n t r o lo . Mas h mais . N o que r e s p e it a s fo r mas de in t e r ac o
e n t r e o e s t ado e a s o cie dade , s ub s is t e a do min n cia da razo hierrquica,
co m co mp le t a in dife r e n a e at ign o r n cia r e lat iv ame n t e ao s de s t in at r io s .
N o admir a, as s im, que e m muit o s s e ct o r e s ( in cluin do o camp o do s p r o
fis s io n ais do dir e it o ) s e v e n h am acumulan do imp o n e n t e s fun dame n t a e s
t e o r t icas e t e r icas da p e r da de cap acidade de dir e c o e de co man do p o r
p ar t e do Es t ado e do dir e it o .
Emb o r a as t e o r ias aut o r r e fe r e n ciais t e n h am o b r igado a r e v is o ( p o r
v e ze s dr am t ica) do s e s que mas de dir e c o do e s t ado e do dir e it o , e n t e n
de mo s que p o s s v e l man t e r t e n de n cialme n t e a ide ia de direco: co man
do dir igido co n fo r ma o , r e gula o , alt e r a o in t e n cio n al e fin al s t ica de
s it ua e s p o l t icas , e co n micas , s o ciais e cult ur ais p o r me io do s in s t r ume n
t o s jur dico s . s e me lh an a das t e o r ias s is t micas , a dir e c o n o de v e
co n ce b e r - s e co mo o r de m aut o cr t ica do Es t ado s o b e r an o jur idicame n t e
imp o s t a, an t e s de v e co mp r e e n de r e s que mas mlt ip lo s de me can is mo s
accio n ado s p o r v r io s act o r e s s o ciais . E n e s t a p e r s p e ct iv a que s e o r ie n t a a
anlise neoinstitucionalista ce n t r ada n o s v r io s act o r e s s o ciais e n o s v r io s
in s t r ume n t o s de dir e c o . O co n ce it o de dir e c o , as s im, um co n ce it o
an al t ico que e n glo b a vrios meios de direco ao lado do dir e it o ( me r cado ,
fin an as , o r gan iza e s ) . D a que s e ja imp o r t an t e s alie n t ar a ce n t r alidade
dir e ct o r a do dir e it o e m um Es t ado de dir e it o de mo cr t ico , mas n o a s ua
e x clus iv idade , imp o n do - s e me s mo a co n juga o de v r io s in s t r ume n t o s de
dir e c o p ar a que s e jam o b t ido s o s fin s de s e jado s . Em s e gun do lugar , a
dir e c o p r e s s up e actores sociais me s mo que s e r e co n h e a co mo s a
lie n t am as t e o r ias aut o p o i t icas a e x is t n cia de s is t e mas dife r e n ciado s
do t ado s de uma din mica p r p r ia15. D iv e r s ame n t e , p o r m, da aut o r r e fe n -
cialidade s is t mica, o in s t it ucio n alis mo ce n t r ado n o s act o r e s de p e n de de
uma direco poltico-social e n t e n dida co mo um s is t e ma in t e n cio n al e co
mun icat iv o de ac o in flue n ciado r a da co n fo r ma o de r e la e s s o ciais
o r ie n t adas p ar a o b e m co mum. O que ab s o lut ame n t e n e ce s s r io , n e s t e
mo do de v e r as co is as , dar ce n t r alidade r e gulat iv a ao s s is t e mas de in t e
r ac o s o ciais p o r me io do s s e us act o r e s in div iduais o u co le ct iv o s . A p ar t ir
de s s e co n ce it o an al t ico de dir e c o , o in s t it ucio n alis mo ce n t r ado n o s
15 Cfr ., p o r t o do s , F r it z S ch ar p f, Interaktiojisformen. Akteurzentrierter Institutionalismus in der Politik-
forschung, Op lade n , 2 0 0 0 .
act o r e s de fe n de uma n o v a e s t at alidade , uma n o v a ar quit e ct ur a de Es t a
do , e m que s e r e co r t e m n o v as fo r mas in s t it ucio n alizadas de cooperao e
de comunicao e n t r e : ( i) o s act o r e s s o ciais mais imp o r t an t e s e o s in t e r e s
s e s p o lit icame n t e o r gan izado s ; e ( ii) o Es t ado e as o r gan iza e s p o l t icas .
II Refraces metdico-metodolgicas
Ch e gamo s ao mo me n t o de p e r gun t ar p e lo imp act o p r ax e o lgico
de s s e e s que ma de dir e c o n o camp o da in t e r p r e t a o e da co n cr e t iza o
do direito directivo-constitucional. A n t e s de p r o ce de r mo s e x e mp lifica o
p r t ica da me t dica ap licado r a, t e n t e mo s s in t e t izar algumas das dime n s e s
a t e r e m co n t a:
( 1 ) as gr an de zas de r e fe r n cia s o as in s t it ui e s ( s is t e mas ) ao lado
do s e s que mas t r adicio n ais das r e la e s jur dicas e do s me can is mo s jur di-
co - p r o ce s s uais e p r o ce dime n t ais ;
( 2 ) r e le v n cia do s n o v o s modelos de direco, de s ign adame n t e o s
mo de lo s de management de s e n v o lv ido s p e la cin cia e co n mica n o mb it o
do me r cado e da e co n o mia p r iv ada ( p ar t icular me n t e imp o r t an t e s p ar a as
que s t e s da mo de r n iza o e e ficin cia do s me can is mo s de dir e c o ) ;
( 3 ) pluralidade das regulaes jurdicas, t e n do , s o b r e t udo , at e n o que
a r e gula o dir e ct o r a p o de co n v o car co mp le x o s n o r mat iv o s div e r s o s co mo
o dir e it o do s co n t r at o s , o dir e it o da le i, o dir e it o da co n s t it ui o , o direito
europeu, o direito internacional; e
( 4 ) mecanismos de n s ificado r e s ( b o as p r t icas , e x ce ln cia de s e r v i o s ,
standards) de n o r mas de dir e c o co n s t it ucio n ais .
1. A determinao dos nveis essenciais de prestaes sociais
Os e s que mas de r acio n aliza o de p r e s t a e s s o ciais , n o mb it o do s
dir e it o s s o ciais ( s ade , s e gur an a s o cial, e n s in o ) , s o o e x e mp lo t p ico de
que a co n s t it ui o s o cial dir e ct o r a p r e cis a de n o v o s ar r imo s jur dico - do g-
m t ico s . A s ua an lis e do mo do co mo o s jur is t as t m dis cut ido o p r o b le ma
das p r e s t a e s s o ciais le v a- n o s a algumas co n clus e s de s co n s o lado r as . Em
p r ime ir o lugar , o s an s e io s da co n s t it ui o s o cial v in culado s s p r e mis s as
t p icas do p o s it iv is mo le galis t a mais n o faze m do que r e p e t ir at e x aus
t o o c r culo v icio s o de qualque r p o s it iv is mo . Em t e r mo s s imp le s , o c r cu
lo p o de de s cr e v e r - s e as s im: ( i) as n o r mas co n s agr ado r as do s dir e it o s s o ciais ,
e co n mico s e cult ur ais co n s agr am o dir e it o s ade , s e gur an a s o cial, ao
25
e n s in o ; ( ii) lo go , t o do s t e mo s dir e it o s p o r v ia da co n s t it ui o a t o das as
p r e s t a e s da s ade , da s e gur an a s o cial e do e n s in o ; e ( iii) e n t o , a p o l
t ica do dir e it o co n s t it ucio n alme n t e co n fo r me n o camp o de s t e s dir e it o s a
que co n s agr a a gr at uit idade de t o das as p r e s t a e s r e clamadas p e la n e ce s
s idade de r e aliza o de s s e s dir e it o s .
Em s e n t ido diame t r alme n t e in v e r s o , o s ide lo go s lib e r ais p ar t e m das
s e guin t e s p r e mis s as : ( i) o s dir e it o s s o ciais n o s o v e r dade ir o s dir e it o s ,
p o r que n o p o s s ue m a dign idade de dir e it o s s ub je ct iv o s ; ( ii) as n o r mas
co n s t it ucio n ais co n s agr ado r as de s s e s dir e it o s s o n o r mas p r o gr am t icas
que , e m r igo r , n o de v e r iam e s t ar n o t e x t o co n s t it ucio n al, p o is as s uas
co n cr e t iza e s de p e n de m das p o l t icas p b licas do s r go s p o l t ico s le gi
t imado s p ar a de s e n v o lv - las ; e ( iii) o s b e n s p r o t e gido s p o r e s s as n o r mas
s o , e m p r ime ir a lin h a, bens -privados, cuja p r o t e c o s e x ce p cio n alme n t e
de v e s e r co n fiada s e n t idade s p b licas . b o m de v e r que n o p o r s e r mo s
p o s it iv is t as co n s t it ucio n ais que o s dir e it o s s o ciais s o r e alizado s p e lo s p o
de r e s p b lico s e n o p o r in s is t ir mo s n a mo in v is v e l que o s p r o b le mas
s o ciais de ix am de e x is t ir , e , mais do que is s o , s o s at is fat o r iame n t e s o lu
cio n ado s p ar a t o das as camadas da p o p ula o . D e qualque r mo do , imp e - s e
dis cut ir o mo do co mo s e as s e gur a a direco jur dica p o l t ica da co n cr e
t iza o do s dir e it o s co n s t it ucio n ais s o ciais . E j v imo s que as r e ce n t e s
le it ur as jur is p r ude n ciais p o r t ugue s as , a p r e t e x t o de r e co n h e ce r e m o m n i
mo s o cial co mp at v e l co m o m n imo de dign idade , e s t o a r e fo r ar in di-
r e ct ame n t e o r e t r o ce s s o s o cial do Es t ado . Vamo s t e n t ar uma r e ce n t r a o
do p r o b le ma co m b as e n a ide ia ce n t r al de direco co n s t it ucio n al s o cial. A
ide ia do dir e it o co mo in s t r ume n t o de dir e c o ao lado de o ut r o s in s t r ume n
t o s ( fin an ce ir o s , o r gan izat r io s ) , h o je , co mo dis s e mo s , uma das p r e mis s as
me t o do lgicas de in s t it ucio n alis mo jur dico . Es s a p e r s p e ct iv a n e o in s t it u-
cio n alis t a man t m as t r adicio n ais cat e go r ias jur dicas e h e r me n ut icas mas
in t r o duz o ut r as v aln cias n o r mat iv as . Te s t e mo s a s ua o p e r acio n alidade
p r t ica.
a) A ideia de "ncleo essencial"
Tr at a- s e de uma cat e go r ia ce n t r al da do gm t ica jur dico - co n s t it ucio -
n al do lt imo me io s culo . O r e co r t e de um n cle o e s s e n cial de dir e it o s ,
lib e r dade s e gar an t ias p e r filav a- s e co mo o lt imo r e dut o de gar an t ia co n t r a
as le is e as me didas agr e s s iv ame n t e r e s t r it iv as de s s e s dir e it o s . Ho je , p ar e
ce r e co n h e ce r - s e que a de t e r min a o da e s s n cia de um dir e it o n o t a
r e fa f cil, s o b r e t udo quan do e le s s e co lo cam p e r an t e o s ju zo s de balance
amento de b e n s e dir e it o s e m cas o de co n flit o . Po r o ut r o lado , de fe n de - s e ,
e m algun s t r ab alh o s , que a s ua aut o n o mia do gm t ica acab a p o r s e r r e s idu
26
al, dado que s e t r at a ap e n as de um co n ce it o - limit e de p o is da o p e r acio n a-
liza o h e r me n ut ica do principio da justa medida e da razoabilidade. Em
t e r ce ir o lugar , co n t e s t a- s e a p r p r ia b o n dade jur dico - do gm t ica de s t e
co n ce it o , dize n do - s e que , co mo p o s t ulado n as cido n o p s - gue r r a, p r e t e n dia
ap e n as r e fo r ar n o p lan o ge r al a gar an t ia da lib e r dade e do s dir e it o s p e s s o
ais . N o e s t e o lugar p ar a r e t o mar a gn e s e da e s s n cia das e s s n cias do s
dir e it o s , mas damo s co mo jur dica e co n s t it ucio n alme n t e adquir ido que o
n cle o e s s e n cial de s e mp e n h a um p ap e l r e le v an t e n a gar an t ia do s dir e it o s .
Mas de que dir e it o s ? Es t e o p o n t o ce n t r al da p r e s e n t e n o t a.
A do ut r in a do n cle o e s s e n cial fo i de s e n v o lv ida t e n do e m v is t a o r e gi
me de p r o t e c o de dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias ( cfr . ar t . 1 8 7 a da Co n s t i
t ui o p o r t ugue s a) . Or a, o p r o b le ma que s e co lo ca o de s ab e r s e e la n o
de v e s e r alar gada ao s dir e it o s e co n mico s , s o ciais e cult ur ais , p e lo me n o s e m
as p e ct o s e m que e le s t m uma n at ur e za an lo ga ao s dir e it o s de lib e r dade .
S e n do as s im, o punctum saliens da que s t o e s t e : co mo de t e r min ar o n cle o
e s s e n cial do dir e it o s ade ? Co mo o dir e it o s ade imp lica um fe ix e de
p r e s t a e s , co mo de t e r min ar o n v e l e s s e n cial de p r e s t a e s s o ciais ?
b) Os nveis essenciais de prestaes sociais
Em r e ce n t e t r ab alh o , t e n t am- s e fo r n e ce r algumas p is t as in o v ado r as
a e s t e r e s p e it o 16. Os p o n t o s de p ar t ida p ar a a co mp r e e n s o do ch amado
L e p (Livelli essenziali delle prestazioni), co n s agr ado n o ar t . 1 1 7-/2 da Co n s
t it ui o it alian a ( r e v is t a) , p ar e ce m fo r mulado s e m um lin guajar cl s s ico :
( i) o n v e l e s s e n cial de uma p r e s t a o r e fe r e n t e a um dir e it o s o cial co n
s ub s t an cia um aut n t ico dir e it o in div idual ir r e s t r in g v e l fun dado n as n o r mas
co n s t it ucio n ais ; ( ii) a co n s t it ucio n aliza o de um dir e it o e s s e n cial de p r e s
t a o co n s t it ui uma h e t e r o de t e r min a o co n s t it ucio n al aut o n o mia n o r
mat iv a e admin is t r at iv a de t o do s o s n v e is de go v e r n o , co me an do n o go
v e r n o ce n t r al e acab an do n o s go v e r n o s r e gio n ais e lo cais ; e ( iii) o n v e l
e s s e n cial de p r e s t a o co n dicio n a as p o l t icas e co n micas e fin an ce ir as .
N o e n t an t o , o s aut o r e s s uje it am um mo de lo un idime n s io n al as s e n t e n a
de fin i o de p r e s t a e s e p r o p e m uma ap r o x ima o mult idime n s io n al n a
de t e r min a o do s n v e is e s s e n ciais das p r e s t a e s que t e m co mo p o n t o de
p ar t ida a co n s ide r a o de que as p r e s t a e s t r an s p o r t am de t e r min adas
dime n s e s co n s ide r adas essenciais e m r e la o a e s s as me s mas p r e s t a e s .
Em o ut r as p alav r as que p e r t e n ce m ao s aut o r e s da o b r a: p o r cada p r e s t a o
16 Re fe r imo - n o s o b r a Welfare e federalismo, B o lo gn a, 2 0 0 5 , e lab o r ada p o r um gr up o de p e r it o s
r e un ido n a as s o cia o A s t r d e co o r de n ado p o r L . To r ch ia.
27
s o e s p e cificadas e p o r me n o r izadas as dime n s e s que as s e gur am a s ua
ade qua o . S e b e m in t e r p r e t amo s as p r o p o s t as mult idime n s io n ais , e las
p r e t e n de m co n s e guir aquilo que as in t e r p r e t a e s co n cr e t iza e s do u
t r in r ias e jur is p r ude n ciais cl s s icas n o co n s e guir am at ago r a: as s e
gur ar a e fe ct iv idade da dis cip lin a co n s t it ucio n al ao n v e l das p r e s t a e s
s o ciais . A e fe ct iv a o p as s a p e lo r e cur s o ao s e s que mas t r adicio n ais de le
gis la o e r e gula o p o r que s e co n s ide r a in dis p e n s v e l uma le i e um r e gu
lame n t o de e x e cu o . A que la dis cip lin ar ia as p r e s t a e s , o s de s t in at r io s ,
o s in dicado r e s , o s is t e ma in fo r mat iv o , o s r e cur s o s fin an ce ir o s , as ac e s
e s t aduais de s up o r t e , o s p r o gr amas de in t e r v e n o e x t r ao r din r ia e o r e m
dio p ar a a in o b s e r v n cia de standards. O r e gulame n t o , p o r s ua v e z, de v ia
e s p e cificar a lis t a do s in dicado r e s , in div idualizan do , p ar a cada um de le s , o
v alo r o b je ct iv o que as admin is t r a e s de v e m r e s p e it ar .
O que h de n o v o a t e n t at iv a de in t r o duzir guide-lines de b o as p r
t icas o u de standards p o s s ib ilit ado r e s de co n t r o lo e que , p r imar iame n t e ,
dir o r e s p e it o ao s me can is mo s de governance e de accountability, mas que
p o de r o co n s t it uir t amb m e le me n t o s de fact o p ar a a e v e n t ual jur is dicio -
n aliza o do s co n flit o s p r e s t acio n ais . Mas n o s is s o : p e r an t e a in co n -
t o r n v e l p r e s s o do s cus t o s do s s e r v i o s de s ade e co n s e qe n t e s p o l t icas
de r acio n aliza o , a me t o do lo gia mais s e gur a p ar a a gar an t ia do s dir e it o s
n o a da s ub s un o p o s it iv is t a- co n s t it ucio n al, mas a de r e co r t ar o n cle o
dur o da s ub je ct iv iza o do s dir e it o s s o ciais 17.
c) Do direito sade aos direitos dos doentes
Out r a fo r ma de dar e fe ct iv idade dir e c o n o r mat iv o - co n s t it ucio n al
do dir e it o fun dame n t al s ade a de a me t dica co n s t it ucio n al e s t ar
at e n t a ao s o ut r o s in s t r ume n t o s de dir e c o , de s ign adame n t e o s in s t r ume n
t o s r e gulado r e s e a car t a de dir e it o s do s ut e n t e s . Me s mo que s e ace it e a
lgica s is t mica da dife r e n cia o e aut o n o miza o de s is t e mas s is t e mas
de s ade , s is t e mas de s e gur an a s o cial , a dir e c o p o r me io do dir e it o
co n s t it ucio n al p o de co n cr e t izar - s e me dian t e boas prticas18 e me r ge n t e s da
17 A e fe ct iv idade da r e gula o do L e p as s e n t a n a in div idualiza o das dime n s e s b s icas : i) macr o -
r e a de in t e r v e n o ; ii) p r e s t a e s ; iii) de s cr i o s in t t ica; iv ) de s t in at r io s ; v ) in dicado r e s ; v i) v alo r
o b je ct iv o . Ex e mp lo : i) macrorea de interveno as s is t n cia s an it r ia; ii) prestao t o mo gr afia
ax ial co mp ut ado r izada; iii) descrio sinttica ut iliza o de ap ar e lh o de alt a p r e cis o n o diagn s
t ico t umo r al; iv ) destinatrios p e s s o as a que m p as s ada uma p r e s cr i o m dica e x p r e s s a p ar a o
cas o ; v ) indicadores t e mp o que o co r r e e n t r e a p r e s t a o e a e fe ct iv a o da p r e s t a o ; v i) valor
objectivo at ao fim de 2 0 0 6 ( x dias ) .
18 Par a o co n ce it o de boas prticas, cfr . Ro s ale t h Mo s s Kan t e r ( co o r d.), Bestpractice handbook, L o n do n ,
2 0 0 3 , p . 1: "b e s t p r act ice is a s imp le co n ce p t : me as ur ab le s t an dar ds ".
28
clinicai governance. A qualidade do s s e r v i o s de s ade que r s o b o p o n t o
de v is t a cl n ico que r do p n t o de v is t a as s is t e n cial , co m a co n s e qe n t e
gar an t ia do s dir e it o s do s ut e n t e s , s o b r e t udo do s do e n t e s , p o de r e s ult ar da
o b s e r v n cia do s p adr e s t cn ico s e h uman o s de fin ido s e m cdigo s de b o as
p r t icas do que n a e x e cu o h ie r r quica de r e gulame n t o s e p r o ce dime n t o s
admin is t r at iv o s . N o fo i a e x e ge s e da co n s t it ui o e o p lat o n is mo s ub s un -
t iv o que p e r mit ir am in div idualizar o s direitos dos utentes ( aut o n o mia, in fo r
ma o , v o n t ade p r e v iame n t e man ife s t ada, lib e r dade de e s co lh a, p r iv acida
de , ace s s o in fo r ma o da s ade , n o dis cr imin a o e n o e s t igmat iza o ,
aco mp an h ame n t o e s p ir it ual, p r imado da p e s s o a s o b r e a cin cia e a s o cie
dade , dir e it o de que ix a e r e clama o , e quidade n o ace s s o , ace s s ib ilidade
e m t e mp o t il) 19. S e o dir e it o co n s t it ucio n al quis e r co n t in uar a s e r um
in s t r ume n t o de dir e c o e , ao me s mo t e mp o , r e clamar a in de clin v e l fun
o de o r de n a o mat e r ial, s t e m a gan h ar s e in t r o duzir n o s s e us p r o ce
dime n t o s me t dico s de co n cr e t iza o o s e s que mas r e gulado r e s e de dir e c
o o r iun do s de o ut r o s camp o s do s ab e r ( e co n o mia, t e o r ia da r e gula o ) .
E a co n clus o p ar e ce - n o s clar a: a go v e ma o cl n ica ( clinicai governance)
um e s que ma de b o as p r t icas co n cr e t izado r do dir e it o s ade .
d) Direco constitucional e metdica de concretizao dos direitos sociais
A me t dica de co n cr e t iza o p o r me io de in s t r ume n t o s n o r mat iv o s e
de in s t r ume n t o s r e gulado r e s de b o as p r t icas n o s ign ifica que p o n h amo s
de lado a me t dica de co n cr e t iza o judicial. O que o s an t e r io r e s e x e mp lo s
p r e t e n de m de mo n s t r ar que o dir e it o co n s t it ucio n al co mo cin cia de di
r e c o n o p o de ficar alh e io a e s que mas n o v o s de co n cr e t iza o . E n o
de ix a de s e r um b o m t e s t e me t o do lo gia jur dico - co n s t it ucio n al a car ac
t e r iza o , e m s e de judicial, do n v e l e s s e n cial de p r e s t a e s s o ciais .
O s imp le s r e co n h e cime n t o de um n cle o e s s e n cial de p r e s t a e s
s o ciais , e quiv ale n t e ao n cle o e s s e n cial do s dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias ,
imp e uma r e v is o do car ct e r p r e s t acio n alme n t e de p e n de n t e do s dir e it o s
s o ciais . Is s o n o t an t o p o r que n o s e ja jur idicame n t e co r r e ct o , mas p o r que ,
de uma fo r ma o u de o ut r a, t o do s o s dir e it o s de s de o s dir e it o s , lib e r dade s
e gar an t ias p e s s o ais ao s dir e it o s ap r e s e n t am dime n s e s car act e r izada-
me n t e r e gulat iv o - p r e s t acio n ais . L e mb r amo s t o s o me n t e o dir e it o de ace s
s o ao dir e it o e t ut e la jur is dicio n al e fe ct iv a, o dir e it o de p ar t icip a o n a v ida
p o l t ica ( fin an ce ir ame n t e , p o r e x e mp lo , do s p ar t ido s e das camp an h as e le i
t o r ais ) , da lib e r dade de e n s in o da r e ligio ( co m p r o fe s s o r e s p ago s p e lo Es
19 Cfr . Rui N un e s , Regulao da sade, Po r t o , 2 0 0 5 , p . 14-2 s.
29
t ado ) , Em .s e gun do lugar , s e h um n cle o e s s e n cial de p r e s t a o , e n t o
de v e co lo car - s e o p r o b le ma da aplicabilidade dir e ct a das n o r mas co n s t it u
cio n ais gar an t ido r as das p r e s t a e s e s s e n ciais co n s t it ut iv as de s s e n ucle o 20.
Es gr imir aqui co m as t r adicio n ais r e s e r v as r e s e r v a de le i co n s t it ut iv a
idas p r e s t a e s e r e s e r v a do p o s s v e l e m t e r mo s e co n mico s e fin an ce ir o s
- J- s ign ificar ia que b as t ar ia o le gis lado r e t o do s o s r go s r e s p o n s v e is p e la
co n cr e t iza o ficar e m s ile n t e s , p ar a s e n e gar a e x is t n cia de um n cle o
e s s e n cial de p r e s t a e s s o ciais . A fin al, a direco da co n s t it ui o , o u me lh o r ,
da direco, do s dir e it o s s o ciais co n s t it ucio n alme n t e gar an t ido r ficar ia n e u-
t r alizada.p e las o mis s e s le gis lat iv as e e x e cut iv as . A r e s e r v a- de Je i t r an s mu-
t a- s e e m in imigo do s dir e it o s s o ciais que , n o fun do , s o dime n s e s co n s t i
t ut iv as da igual dignidade social e da justia distributiva.
b v io que o s t r ib un ais n o p o de m ficar alh e io s co n cr e t iza o
judicial das n o r mas dir e ct o r as da co n s t it ui o s o cial. N o p o de imp o r - s e
me t dica co n s t it ucio n al a cr ia o de pressupostos de fact o e de dir e it o s
clar ame n t e fo r a da s ua co mp e t n cia o u e x t r av azan do o s s e us limit e s jur -
dico - fun cio n ais . Os t r ib un ais n o p o de m n e ut r alizar a lib e r dade de co n fo r
ma o do le gis lado r 21, me s mo e m um s e n t ido r e gr e s s iv o e m p o cas de
e s cas s e z e de aus t e r idade fin an ce ir a. Is s o s ign ifica que a ch amada t e s e da
ir r e v e r s ib ilidade de dir e it o s s o ciais adquir ido s de v e e n t e n de r - s e co m r a-
zo ab ilidade e r acio n alidade , p o is p o de r s e r n e ce s s r io , ade quado e p r o
p o r cio n al b aix ar o s n v e is de p r e s t a e s e s s e n ciais p ar a man t e r o n cle o
e s s e n cial do p r p r io dir e it o s o cial22.
e ) E o que dizem os juizes quanto ao nvel essencial de prestaes sociais ?
A s jur is p r udn cias co mun s e co n s t it ucio n ais , ao s e r co n fr o n t adas co m
o dir e it o ao m n imo e x is t e n cial23, o r ie n t ar am a s ua e s t r at gia h e r me n u
t ica n o s e guin t e s e n t ido : ( i) o dir e it o ao m n imo p r e s t acio n al p ar a uma
e x is t n cia co n dign a um dir e it o p r e s t acio n al o r igin r io fun dado e m um
20 A do ut r in a it alian a t e m ap r o fun dado o t e ma e m t r ab alh o s r e ce n t e s : A . Gio r gis , La costitulaziona-
lizzazione dei diritti alVequaglianza sostanziale, N ap o li, 1 9 9 9 , p . 8 7 s .; C. S alazar , Dal riconosdmento
alia garanzia dei diritti sociali. Or ie n t ame n t i e t e cn ich e de cis o r ie de lia Co r t e Co s t it uzio n ale it alian a,
Milan o , 1 9 9 9 .
21 Cfr . Vir g lio A fo n s o da S ilv a, Grundrechte und gesetzgeberische Spelrume, B ade n - B ade n , 2 0 0 3 , p .
1 1 3 s .
22 Cfr ., p o r lt imo , I. Mas s a Pin t o , Co n t e n ut o min imo e s s e n ziale de i dir it t i co s t it uzio n ale e co n ce -
zio n e e s p an s iv a de lia Co s t it uzio n e ", in Diritti Pubblico, 2001, p . 1 0 9 5 s.
23 Cfr ., p ar a o cas o p o r t ugus , Jo r ge Re is N o v ais , Os princpios estruturantes, cit ., p . 2 9 1 s .; Jo s Car lo s
Vie ir a de A n dr ade , Os direitos fundamentais na Constituio Portuguesa de 1976, 2 . e d., 2001, p . 3 7 1 s.
30
dir e it o fun dame n t al da dign idade da p e s s o a; e ( ii) o s dir e it o s , lib e r dade s e
gar an t ias t r an s p o r t am uma dime n s o objectiva co n duce n t e r e s s ub je ct iv i-
za o de p o s i e s p r e s t acio n ais , co n figur an do - s e , as s im, e le s p r p r io s e m
e s que mas de gar an t ia do s dir e it o s s o ciais 24. Te mo s dv idas quan t o a e s t e
p o n t o de p ar t ida. Em p r ime ir o lugar , co m o us o e ab us o do r e cur s o dig
n idade da p e s s o a h uman a ( de r e s t o s e n do p r o b le m t ica a s ua e s t r ut ur a
co mo dir e it o aut n o mo ) co r r e - s e o r is co de de s s ub s t an t iv ar t o do s o s
o ut r o s dir e it o s , que r o s de lib e r dade , que r o s s o ciais . Em s e gun do lugar ,
me s mo quan do n o s e co n v o ca ap e n as a dign idade da p e s s o a h uman a e s e
ap e la p ar a o ut r o s dir e it o s e lib e r dade s ( e x .: dir e it o v ida, dir e it o ao de s e n
v o lv ime n t o de p e r s o n alidade ) in s in ua- s e que h uma funo prestacional
geral in e r e n t e a t o do s o s dir e it o s n e gat iv o s de lib e r dade . Em t e r ce ir o lugar ,
uma jur is p r udn cia ap ar e n t e me n t e amiga da dign idade h uman a e das s uas
r e fr ac e s s o ciais p o de , afin al, s e r uma jur is p r udn cia que e n cap u ada-
me n t e s e r e cus a a o lh ar de fr e n t e p ar a o dir e it o igual dignidade social (e
n o ap e n as dign idade da p e s s o a h uman a) , o dir e it o igualdade distrihutiva,
o dir e it o ao desenvolvimento da personalidade, o dir e it o a nveis essenciais de
prestaes sociais in e r e n t e s ao s dir e it o s s o ciais . O p r o b le ma , afin al, n e s s e
co n t e x t o o de s ab e r s e o s juize s t m in s t r ume n t o s me t dico s e me t o do l
gico s p ar a co n cr e t izar e m a direco co n s t it ucio n al de dir e it o s s o ciais 25. O
limit e que o s t r ib un ais co n s t it ucio n ais in v o cam, e m ge r al, o de que n o
lh e s p e r t e n ce in t e r fe r ir n as polticas pblicas. Re s t a s ab e r s e o ecological
approach da fun o judicial n o v ai e n t r ar de cis iv ame n t e n a e x t r in s e ca o
do s dir e it o s s o ciais . A qui a r e s p o s t a clar a: o juiz p ar t icip a n a p o l t ica
p o r que de s e mp e n h a um p ap e l co n s ide r ado ade quado p ar a as s umir a cum
p licidade de p ar t ilh ar o s v alo r e s e in t e r e s s e s do s gr up o s e in div duo s que
p e r an t e e le r e iv in dicam dir e it o s e p o s i e s p r e s t acio n ais n e gado s o u b lo
que ado s p e lo s de cis o r e s p o l t ico - r e p r e s e n t at iv o s 26. Is s o o b r igar a de s e n
v o lv ime n t o s do ut r in ais que e s t o fo r a da e co n o mia de s t e t r ab alh o .
24 Cfr . o s t r ab alh o s de W N e uman n s o b r e a p r o b le m t ica do m n imo gar an t ido de e x is t n cia a
p ar t ir da dign idade da p e s s o a h uman a: "Me n s ch e n w r de un d p s y ch is ch e r Kr an ke it , in NVWZ,
1 9 9 5 , p . 4 2 6 s .; S o zials t aat un d Gr un dr e ch t s do gmat ik", in DVBL, 1 9 9 7 , p . 9 2 s .
25 A do ut r in a mo s t r a- s e r e t ice n t e . Cfr ., p o r e x e mp lo , C. S alazar , Dal riconosdmento alia garanzia dei
diritti soziali, cit ., p . 1 5 0 ; Wo lfr am Cr e me n , Freiheitsgrundrechte, Tb in ge n , 2 0 0 3 , p . 3 6 0 s.
26 Ve ja- s e e s t e ecological approach e m H. Jaco b , Th e go v e r n an ce o f t r ial judge s , in Law and sodety
review, 3 1 , 1, p . 3 s.
JUS TICIA B IL ID A D E D OS D IREITOS
S OCIA IS E ECON MICOS :
D ES A F IOS E PERS PECTIVA S
Flvia Piovesan*
I Introduo
O o b je t iv o de s t e ar t igo e n fo car a e x p e r in cia b r as ile ir a n o que s e
r e fe r e jus t iciab ilidade do s dir e it o s s o ciais e e co n mico s , s e us de s afio s e
p e r s p e ct iv as .
In icialme n t e , s e r e x amin ada a p r o t e o do s dir e it o s s o ciais e e co n
mico s luz da Co n s t it ui o b r as ile ir a de 1 9 8 8 , co m de s t aque s in o v a e s
e ao s av an o s de la de co r r e n t e s , ao in e dit ame n t e co n t e mp lar e s t e s dir e it o s
n o un iv e r s o do s dir e it o s fun dame n t ais .
A p ar t ir da an lis e co n s t it ucio n al, s e r e x amin ada a jus t iciab ilidade
do s dir e it o s s o ciais e e co n mico s p e r an t e as Co r t e s n acio n ais , co m o e s t u
do de cas o s r e lat iv o s ao s dir e it o s s ade e e duca o , av alian do - s e a
r e s p o s t a das Co r t e s n acio n ais quan t o in t e r p r e t a o e imp le me n t a o
do s dir e it o s s o ciais e e co n mico s .
Po r fim, s e r o lan adas co n clus e s a r e s p e it o da jus t iciab ilidade do s
dir e it o s s o ciais e e co n mico s n o B r as il, co m n fas e e m s e us de s afio s e
p e r s p e ct iv as .
II Proteo dos direitos sociais e econmicos na
Constituio brasileira de 1988
A Co n s t it ui o b r as ile ir a de 1 9 8 8 s imb o liza o mar co jur dico da
t r an s i o de mo cr t ica e da in s t it ucio n aliza o do s dir e it o s h uman o s n o
*Pr o fe s s o r a do ut o r a e m D ir e it o Co n s t it ucio n al e D ir e it o s Human o s da PUCS P. Pr o fe s s o r a de D i
r e it o s Human o s do s Pr o gr amas de Ps - Gr adua o da Po n t if cia Un iv e r s idade Cat lica de S o
Paulo , da PUCPR.e da Un iv e r s idade Pab lo de Olav de ( S e v ilh a, Es p an h a) . Visitingfellow do Hutnan
Rigkts Program da Harvard Law School ( 1 9 9 5 e 2000) . Visitingfellow do Centre for Brazilian Studies
da Universityof Oxford (2005). Visitingfellow do Max Planck Institute for Comparative Public Law and
53
Pa s . O t e x t o co n s t it ucio n al de mar ca a r up t ur a co m o r e gime aut o r it r io
milit ar in s t alado e m 1 9 6 4 e r e fle t e o co n s e n s o de mo cr t ico p s - dit adur a.
A p s p o uco mais de duas d cadas de r e gime aut o r it r io , o b je t iv a a Co n s
t it ui o r e s gat ar o Es t ado de D ir e it o , a s e p ar a o do s p o de r e s , a F e de r a o ,
a de mo cr acia e o s Jir e jt o s fun dame n t ais , luz do p r in x n p io da dign idade
h uman a. Q v alo r da dign idade da p e s s o a h uman a, co mo fun dame n t o do
Ms t ado D e mo cr t ico de D ir e it o ( ar t . I9, 111, da Co n s t it ui o ) , imp e - s e
.co mo n cle o b s ico e in fo r mado r de t o do o r de n ame n t o jur dico , co mo
cr it r io e p ar me t r o de v alo r a o a o r ie n t ar a in t e r p r e t a o do s is t e ma
co n s t it ucio n al.
In t r o duz a Car t a de 1 9 8 8 um av an o e x t r ao r din r io n a co n s o lida o
do s dir e it o s e gar an t ias fun dame n t ais , s it uan do - s e co mo o do cume n t o mais
av an ado , ab r an ge n t e e p o r me n o r izado s o b r e a mat r ia n a h is t r ia co n s t i
t ucio n al do Pa s . E a p r ime ir a Co n s t it ui o b r as ile ir a a in iciar com cap t u
lo s de dicado s ao s dir e it o s e gar an t ias p ar a, e n t o , t r at ar do Es t ado , da s ua
o r gan iza o e do e x e r c cio do s p o de r e s . De . fo r ma in dit a, o s dir e it o s e as
gar an t ias in div iduais s o e le v ado s a cl us ulas p t r e as , e p as s am a co mp o r
o n cle o mat e r ial in t an g v e l da Co n s t it ui o ( ar t . 6 0 , 4 a) . H a p r e v is o
de n o v o s dir e it o s e gar an t ias co n s t it ucio n ais , b e m co mo o r e co n h e cime n t o
da t it ular idade co le t iv a de dir e it o s , co m alus o le git imidade de s in dicat o s ,
as s o cia e s e e n t idade s de clas s e p ar a a de fe s a de dir e it o s .
D e t o das as Co n s t it ui e s b r as ile ir as , fo i a Car t a de 1 9 8 8 a que mais
as s e gur o u a p ar t icip a o p o p ular e m s e u p r o ce s s o de e lab o r a o , a p ar t ir
do r e ce b ime n t o de e le v ado n me r o de e me n das p o p ular e s . E, as s im, a
Co n s t it ui o que ap r e s e n t a o maio r gr au de le git imidade p o p ular .
A Co n s t it ui o de 1 9 8 8 aco lh e a ide ia da un iv e r s alidade do s dir e it o s
h uman o s , n a me dida e m que co n s agr a o v alo r da dign idade h uman a co mo
p r in c p io fun dame n t al do co n s t it ucio n alis mo in augur ado e m 1 9 8 8 . O
t e x t o co n s t it ucio n al ain da r e al a que o s dir e it o s h uman o s s o t e ma de le
g t imo in t e r e s s e da co mun idade in t e r n acio n al, ao p r e v e r , p e la p r ime ir a v e z,
de n t r e o s p r in c p io s a r e ge r o B r as il n as r e la e s in t e r n acio n ais , o da p r e
v aln cia do s dir e it o s h uman o s . Tr at a- s e , ade mais , da p r ime ir a Co n s t it ui o
b r as ile ir a a in cluir o s dir e it o s in t e r n acio n ais n o e le n co do s dir e it o s co n s t i-
t ucio n alme n t e gar an t ido s .
InternationalLaw( He ide lb e r g 2 0 0 7 ) . Pr o cur ado r a do Es t ado de S o Paulo . Me mb r o do CL A D EM
( Co mit L at in o - A me r ican o e do Car ib e p ar a a D e fe s a do s D ir e it o s da Mulh e r ) . Me mb r o do Co n s e
lh o N acio n al de D e fe s a do s D ir e it o s da Pe s s o a Human a e me mb r o da S UR Human Rights Uni-
versity Network.
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Quan t o in div is ib ilidade do s dir e it o s h uman o s , faz- s e n e ce s s r io
e n fat izaL que a Car t a de 1 9 8 8 c a p r ime ir a CL o n s t it ui o que in t e gr a ao
e le n cculfis dir e it o s iun dame n t ais o s dir e it o s s o ciais e e co n mico s , que n as
Car t as an t e r io r e s r e s t av am p ulv e r izado s n o cap t ulo p e r t in e n t e o r de m
e co n mica e s o cial. Ob s e r v e - s e que , n o dir e it o b r as ile ir o , de s de 1 9 3 4 , as
Co n s t it ui e s p as s ar am a in co r p o r ar o s dir e it o s s o ciais e e co n mico s .
Co n t udo , a Co n s t it ui o de 1 9 8 8 a p r ime ir a a afir mar que o s dir e it o s
s o ciais s o dir e it o s fun dame n t ais , t e n do ap licab ilidade ime diat a.
N e s s e p as s o , a Co n s t it ui o de 1 9 8 8 , al m de e s t ab e le ce r n o ar t . 6-
que s o dir e it o s s o ciais a e duca o , a s ade , o t r ab alh o , a mo r adia, o laze r ,
a s e gur an a, a p r e v idn cia s o cial, a p r o t e o mat e r n idade e in fn cia, a
as s is t n cia ao s de s amp ar ado s , ain da ap r e s e n t a uma o r de m s o cial co m um
amp lo un iv e r s o de n o r mas que e n un ciam p r o gr amas , t ar e fas , dir e t r ize s e
fin s a s e r p e r s e guido s p e lo Es t ado e p e la s o cie dade . A t t ulo de e x e mp lo ,
de s t acam- s e dis p o s it iv o s co n s t it ucio n ais co n s t an t e s da o r de m s o cial, que
fix am co mo dir e it o s de t o do s e de v e r e s do Es t ado a s ade ( ar t . 1 9 6 ) , a
e duca o ( ar t . 2 0 5 ) , as p r t icas de s p o r t iv as ( ar t . 2 1 7 ) , de n t r e o ut r o s . N o s
t e r mo s do ar t . 1 9 6 , a s ade dir e it o de t o do s e de v e r do Es t ado , gar an t ido
me dian t e p o l t icas s o ciais e e co n micas que v is e m r e du o do r is co de
do e n a e o ut r o s agr av o s e ao ace s s o un iv e r s al igualit r io s a e s e s e r v i o s
p ar a s ua p r o mo o , p r o t e o e r e cup e r a o 1. N o camp o da e duca o , a
Co n s t it ui o de t e r min a que o ace s s o ao e n s in o o b r igat r io e gr at uit o
dir e it o p b lico s ub je t iv o , e acr e s ce n t a que o n o o fe r e cime n t o do e n s in o
o b r igat r io p e lo Po de r Pb lico , o u s ua o fe r t a ir r e gular , imp o r t a r e s p o n s a
b ilidade da aut o r idade co mp e t e n t e . Par a o s dir e it o s s o ciais s ade e
e duca o , a Co n s t it ui o dis cip lin a uma do t a o o r ame n t r ia e s p e c fica2,
1 A r e s p e it o , o b s e r v a Var un Gaur i: 'A r e v ie w co n duct e d fo r t h is p ap e r as s e s s e d co n s t it ut io n al r igh t s
t o e ducat io n an d h e alt h car e in 1 8 7 co un t r ie s . Of t h e 1 6 5 co un t r ie s wit h av ailab le wr it t e n co n s t i-
t ut io n s , 1 1 6 made r e fe r e n ce t o a r igh t t o e ducat io n an d 7 3 t o a r igh t t o h e alt h car e . N in e t y - fiv e ,
mo r e o v e r , s t ip ulat e d fr e e e ducat io n an d 2 9 fr e e h e alt h car e fo r at le as t s o me p o p ulat io n s ub gr o up s
an d s e r v ice s . B r azil o ffe r s a co mp e llin g e x amp le o f t h e fo r ce o f h uman r igh t s lan guage . Th e B r a-
zilian Co n s t it ut io n o f 1 9 8 8 guar an t e e s e ach cit ize n t h e r igh t t o fr e e h e alt h car e . A lt h o ugh t h e
co n s t it ut io n al guar an t e e h as n o t e limin at e d s h o r t age s an d in e qualit ie s in t h e s e ct o r , t h at p r o v is io n
h ad r e al bite in 1 9 9 6 , wh e n a n at o n al law in it iat e d a p r o gr am o f un iv e r s al acce s s t o h igh ly act iv e
an t i- r e t r o v ir al t h e r ap y ( HA A RT) fo r A ids p at ie n t s , fr e e o f ch ar ge " ( Var un Gaur i, S o cial Righ t s an d
Eco n o mics : Claims t o He alt h Car e an d Educat io n in D e v e lo p in g Co un t r ie s , World Development, v o l.
32, n . 3 , 2 0 0 4 , p . 4 6 5 ) .
2 Quan t o ao dir e it o e duca o , dis p e o ar t . 212 da Co n s t it ui o : A Un io ap licar , an ualme n t e ,
n un ca me n o s de 1 8 , e o s Es t ado s , o D is t r it o F e de r al e o s Mun ic p io s 2 5 %, n o m n imo , da r e ce it a
r e s ult an t e de imp o s t o s , co mp r e e n dida a p r o v e n ie n t e de t r an s fe r n cias , n a man ut e n o e n o de s e n
v o lv ime n t o do e n s in o . Quan t o ao dir e it o s ade , o s r e cur s o s o r ame n t r io s s e r o dis p o s t o s e m
co n fo r midade co m o s cr it r io s e s t ab e le cido s n o ar t . 1 9 8 da Co n s t it ui o .
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adicio n an do a p o s s ib ilidade de in t e r v e n o fe de r al n o s Es t ado s e m que n o
h o uv e r a o b s e r v n cia da ap lica o do m n imo e x igido da r e ce it a r e s ult an t e
de imp o s t o s e s t aduais n a man ut e n o e de s e n v o lv ime n t o do e n s in o e n as
a e s e s e r v i o s p b lico s de s ade ( ar t . 3 4 , VII, e ) .
A o r de m co n s t it ucio n al de 1 9 8 8 acab o u p o r alar gar as t ar e fas do Es
t ado , in co r p o r an do fin s e co n mico - s o ciais p o s it iv ame n t e v in culan t e s das
in s t n cias de r e gula o jur dica. A p o l t ica de ix a de s e r co n ce b ida co mo um
do m n io jur idicame n t e liv r e e co n s t it ucio n alme n t e de s v in culado . Os do m
n io s da p o l t ica p as s am a s o fr e r limit e s , mas t amb m imp o s i e s , p o r me io
de um p r o je t o mat e r ial v in culat iv o . S ur ge v e r dade ir a co n figur a o n o r ma
t iv a da at iv idade p o l t ica. Co mo afir ma J. J. Go me s Can o t ilh o : A Co n s t i
t ui o t e m s e mp r e co mo t ar e fa a r e alidade : jur idif car co n s t it ucio n alme n t e
e s t a t ar e fa o u ab an do n - la p o l t ica o gr an de de s afio . To das as Co n s t it ui
e s p r e t e n de m, imp l cit a o u e x p licit ame n t e , co n fo r mar o p o l t ico 3.
Cab e ain da me n cio n ar que a Car t a de 1 9 8 8 , n o in t uit o de p r o t e ge r
max imame n t e o s dir e it o s fun dame n t ais , co n s agr a de n t r e as cl us ulas p
t r e as a cl us ula dir e it o s e gar an t ias in div iduais . Co n s ide r an do a un iv e r
s alidade e a in div is ib ilidade do s dir e it o s h uman o s , a cl us ula de p r o ib i o
do r e t r o ce s s o s o cial4, o v alo r da dign idade h uman a e de mais p r in c p io s
fun dame n t ais da Car t a de 1 9 8 8 , co n clui- s e que e s s a cl us ula alcan a o s
dir e it o s s o ciais . Par a Paulo B o n av ide .s : o s dir e it o s s o ciais n o s o ap e n as
jus t ici v e is , mas s o p r o v ido s , n o o r de n ame n t o co n s t it ucio n al da gar an t ia
da s up r e ma r igide z do p ar gr afo 4 " do ar t . 6 0 5. S o , p o r t an t o , dir e it o s in -
lan g v e is , dir e it o s ir r e dut v e is , de fo r ma que t an t o a le i o r din r ia co mo ji
.e me n da Co n s t it ui o que afe t ar e m, ab o lir e m o u s up r imir e m o s dir e it o s ,
s o ciais p adcce r ao do v icio dc in co n s t it ucio n al idade .
D e s de o p r o ce s s o de de mo cr at iza o do Pa s e e m p ar t icular a p ar t ir
da Co n s t it ui o F e de r al de 1 9 8 8 , o s mais imp o r t an t e s t r at ado s in t e r n acio
n ais de p r o t e o do s dir e it o s h uman o s fo r am r at ificado s p e lo B r as il6, de s
3 Jo s Jo aquim Go me s Can o t ilh o , Direito constitucional e teoria da Constituio, Co imb r a: L iv r ar ia
A lme din a, 1 9 9 8 .
4 A r e s p e it o da n e ce s s r ia ap lica o p r o gr e s s iv a do s dir e it o s s o ciais e e co n mico s e da co n s e qe n t e
cl us ula da p r o ib i o do r e t r o ce s s o s o cial, v e r ar t . 2 S, l fi, do Pact o In t e r n acio n al do s D ir e it o s
Eco n mico s , S o ciais e Cult ur ais , b e m co mo o Ge n e r al Co mme n t n . 3 do Co mit s o b r e D ir e it o s
Eco n mico s , S o ciais e Cult ur ais ( Ge n e r al Co mme n t n . 3 , UN do c. E / 1 9 9 1 / 2 3 ) .
5 Paulo B o n av ide s , Curso de direito constitucional, S o Paulo : Malh e ir o s , 2000.
6 D e n t r e e le s , de s t acam- s e : a) a Co n v e n o In t e r ame r ican a p ar a Pr e v e n ir e Pun ir a To r t ur a, e m
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t acan do - s e , n o mb it o do s dir e it o s s o ciais e e co n mico s , a r at ifica o do
Pact o In t e r n acio n al do s D ir e it o s Eco n mico s , S o ciais e Cult ur ais e m 1 9 9 2
e do Pr o t o co lo de S an S alv ado r e m mat r ia de dir e it o s e co n mico s , s o ciais
e cult ur ais , e m 1 9 9 6 ,
A l m do s s ign ificat iv o s av an o s de co r r e n t e s da in co r p o r a o , p e lo
Es t ado b r as ile ir o , da n o r mat iv idade in t e r n acio n al de p r o t e o do s dir e it o s
h uman o s , o p s - 1 9 8 8 ap r e s e n t a a mais v as t a p r o du o n o r mat iv a de dir e i
t o s h uman o s de t o da a h is t r ia le gis lat iv a b r as ile ir a. A maio r p ar t e das
n o r mas de p r o t e o ao s dir e it o s h uman o s fo i e lab o r ada ap s a Co n s t it ui o
- de 1 9 8 8 , e m s ua de co r r n cia e s o b a s ua in s p ir a o .
A Co n s t it ui o F e de r al de 1 9 8 8 ce le b r a, de s s e mo do , a r e in v e n o
do mar co jur dico - n o r mat iv o b r as ile ir o n o camp o da p r o t e o do s dir e it o s
h uman o s , e m e s p e cial do s dir e it o s s o ciais e e co n mico s .
III Justiciabilidade dos direitos sociais e econmicos nas
Cortes brasileiras
Co n s ide r an do o alcan ce da p r o t e o co n s t it ucio n al do s dir e it o s s o ciais
e e co n mico s , imp o r t a av aliar o gr au de jus t iciab ilidade de s s e s dir e it o s n as
Co r t e s b r as ile ir as .
A an lis e jur is p r ude n cial s e r co n ce n t r ada n o s cas o s r e fe r e n t e s ao s
dir e it o s s ade e e duca o s ub me t ido s s Co r t e s s up e r io r e s , e m p ar t i
cular o S up r e mo Tr ib un al F e de r al ( S TF ) e o S up e r io r Tr ib un al de Jus t i a
( S TJ) .
2 0 de julh o de 1 9 8 9 ; b ) a Co n v e n o co n t r a a To r t ur a e Out r o s Tr at ame n t o s Cr u is , D e s uman o s o u
D e gr adan t e s , e m 28 de s e t e mb r o de 1 9 8 9 ; c) a Co n v e n o s o b r e o s D ir e it o s da Cr ian a, e m 24- de
s e t e mb r o de 1 9 9 0 ; d) o Pact o In t e r n acio n al do s D ir e it o s Civ is e Po l t ico s , e m 2 4 de jan e ir o de 1 9 9 2 ;
e ) o Pact o In t e r n acio n al do s D ir e it o s Eco n mico s , S o ciais e Cult ur ais , e m 2 4 de jan e ir o de 1 9 9 2 ; f)
a Co n v e n o A me r ican a de D ir e it o s Human o s , e m 2 5 de s e t e mb r o de 1 9 9 2 ; g) a Co n v e n o In t e r a-
me r ican ap ar a Pr e v e n ir , Pun ir e Er r adicar a Vio ln cia co n t r a a Mulh e r , e m 2 7 de n o v e mb r o de 1 9 9 5 ;
h ) o Pr o t o co lo Co n v e n o A me r ican a r e fe r e n t e A b o li o da Pe n a de Mo r t e , e m 1 3 de ago s t o de
1 9 9 6 ; i) o Pr o t o co lo Co n v e n o A me r ican a e m mat r ia de D ir e it o s Eco n mico s , S o ciais e Cult ur ais
( Pr o t o co lo de S an S alv ado r ) , e m 2 1 de ago s t o de 1 9 9 6 ; j) o Es t at ut o de Ro ma, que cr ia o Tr ib un al
Pe n al In t e r n acio n al, e m 2 0 de jun h o de 2002; k) o Pr o t o co lo F acult at iv o Co n v e n o s o b r e a Eli
min a o de To das as F o r mas de D is cr imin a o co n t r a a Mulh e r , e m 2 8 de jun h o de 2002; e 1) o s
do is Pr o t o co lo s F acult at iv o s Co n v e n o s o b r e o s D ir e it o s da Cr ian a, r e fe r e n t e s ao e n v o lv ime n t o
de cr ian as e m co n flit o s ar mado s e v e n da de cr ian as e p r o s t it ui o e p o r n o gr afia in fan t is , e m 2 4
de jan e ir o de 2 0 0 4 . A e s t e s av an o s , s o ma- s e o r e co n h e cime n t o da jur is di o da Co r t e In t e r ame r i-
can a de D ir e it o s Human o s , e m de ze mb r o de 1 9 9 8 .
57
1. Casos relativos ao direito sade
1.1. Casos relativos ao fornecimento de medicamentos e ao
acesso assistncia mdico-hospitalar
Re it e r adas de cis e s p r o fe r idas p e lo S up r e mo Tr ib un al F e de r al co n
s agr am o dir e it o s ade co mo de co r r n cia do dir e it o v ida, e - de t e r min am
o fo r n e cime n t o gr at uit o de me dicame n t o s a p e s s o as car e n t e s , p o r t ado r as
do v r us HIV e a p o r t ado r as de o ut r as do e n as gr av e s .
A t t ulo e x e mp lificat iv o , de s t aca- s e de cis o do S TF n o RE 2 7 1 .2 8 6
A gR/ RS , n a qual afir mo u o dir e it o s ade co mo co n s e qn cia co n s t it u
cio n al in dis s o ci v e l do dir e it o v ida. A de cis o adicio n o u que o dir e it o
p b lico s ub je t iv o s ade r e p r e s e n t a p r e r r o gat iv a jur dica in dis p o n v e l,
cab e n do ao Es t ado fo r mular e imp le me n t ar p o l t icas que v is e m gar an t ir a
t o do s , in clus iv e ao s p o r t ado r e s do v r us HIV, o ace s s o un iv e r s al e igualit
r io as s is t n cia far macut ica e m dico - h o s p it alar . Re s s alt o u que "o p o de r
p b lico n o p o de t r an s fo r mar n o r ma p r o gr am t ica em p r o me s s a co n s t it u-
Qn aL iQCQn s qn gii e . N e s s e s e n t ido , a dis t r ib ui o gr at uit a de me dica
me n t o s p e r mit ir ia co n fe r ir e fe t iv idade ao s p r e ce it o s co n s t it ucio n ais , r e
p r e s e n t an do um ge s t o r e v e r e n t e e s o lid r io de ap r e o v ida e s ade das
p e s s o as , e s p e cialme n t e daque las que n ada t m e n ada p o s s ue m, a n o s e r
a co n s cin cia de s ua p r p r ia h uman idade e s ua e s s e n cial dign idade 7.
A cr e s ce n t o u ain da o S TF que o s e n t ido de fun dame n t alidade do dir e it o
s ade que r e p r e s e n t a, n o co n t e x t o da e v o lu o h is t r ica do s dir e it o s
b s ico s da p e s s o a h uman a, uma das e x p r e s s e s mais r e le v an t e s das lib e r
dade s r e ais o u co n cr e t as imp e ao Po de r Pb lico um de v e r de p r e s t a o '
p o s it iv a, que s o me n t e s e t e r p o r cump r ido , p e las in s t n cias go v e r n ame n
t ais , quan do e s t as ado t ar e m p r o v idn cias d s t in adas a p r o mo v e r , e m p le
n it ude , a s at is fa o e fe t iv a da de t e r min a o o r de n ada p e lo t e x t o co n s t it u
cio n al. Em o ut r o cas o , afir mo u o S TF que e n t r e p r o t e ge r a in v io lab ilida- ,
de do dir e it o v ida, que s e qualifica co mo dir e it o s ub je t iv o in alie n v e l
as s e gur ado p e la p r p r ia Co n s t it ui o da Re p b lica ( ar t igo 5 a, caput), o u
faze r p r e v ale ce r , co n t r a e s s a e x p r e s s a p r e r r o gat iv a fun dame n t al, um in t e
r e s s e fin an ce ir o e s e cun d r io do Es t ado , e n t e n de - s e que r aze s de o r de m
7 N o me s mo s e n t ido , de s t acam- s e as de cis e s p r o fe r idas p e lo S TF n o s cas o s RE 2 3 2 .3 3 5 , A I 2 3 2 .4 6 9 ,
RE 2 3 6 .2 0 0 , A I 2 3 6 .6 4 4 , A I 2 3 8 .3 2 8 - A gR, RE 2 4 2 .8 5 9 , RE- 2 4 7 .9 0 0 , RE- 2 6 4 .2 6 9 , RE 2 6 7 .6 1 2 , RE
2 7 3 .0 4 *2 , RE 2 7 3 .8 3 4 , RE 2 5 5 .6 2 7 A gR, A I 2 3 8 .3 2 8 A gR, S S 7 0 2 A gR, A I 4 8 6 .8 1 6 A gR, de n t r e
o ut r o s . N o RE 1 9 5 .1 9 2 / RS , e m gr au de man dado de s e gur an a p ar a aquis i o e fo r n e cime n t o de
me dicame n t o p ar a do e n a r ar a, e n v o lv e n do cr ian a e ado le s ce n t e , a de cis o do S TF de t e r min o u ao
Po de r Pb lico p r o p o r cio n ar me io s p ar a alcan ar a s ade e fr is o u a r e s p o n s ab ilidade lin e ar da Un io ,
do s Es t ado s e do s Mun ic p io s , de v ido ao S is t e ma n ico de S ade .
t ico - jur dica imp e m ao julgado r uma s p o s s v e l o p o : o r e s p e it o in de
clin v e l v ida"8.
N o me s mo s e n t ido , as de cis e s do S up e r io r Tr ib un al de Jus t i a e n
do s s am o dir e it o s ade co mo de v e r do Es t ado , que de v e r p r o p iciar ao s
n e ce s s it ado s n o qualque r t r at ame n t o , mas o t r at ame n t o mais ade quado e
e ficaz, cap az de o fe r t ar ao e n fe r mo maio r dign idade e me n o r s o fr ime n t o .
D e s t e mo do , de v e s e r as s e gur ado o me dicame n t o mais e ficaz e ade quado
ao t r at ame n t o , me s mo que n o p r e v is t o e m p o r t ar ia do Min is t r io da S a
de , co m fun dame n t o n o s dir e it o s s ade e v ida9.
O S TJ t e m ain da r o mp ido co m uma t ica fo r malis t a p r o ce dime n t al,
a fim de as s e gur ar o dir e it o s ade . A t t ulo de e x e mp lo , cit a- s e me dida
judicial co n ce dida e m a o civ il p b lica p ar a p r o t e ge r o dir e it o v ida e
s ade de cr ian a p o r t ado r a de do e n a gr av e , r e fo r man do de cis o de Tr ib u
n al e s t adual que t e r ia e x t in t o o p r o ce s s o s e m julgame n t o de m r it o p o r
co n s ide r ar que o Min is t r io Pb lico n o t e r ia le git imidade p ar a a de fe s a
de in t e r e s s e in div idual in dis p o n v e l. O ar gume n t o ce n t r al da de cis o fo i
que "a b us ca p e la e n t r e ga da p r e s t a o jur is dicio n al de v e s e r p r e s t igiada
p e lo juiz, de mo do que o cidado t e n h a, cada v e z mais facilit ada, co m a
co n t r ib ui o do Po de r Judici r io , a s ua at ua o e m s o cie dade , que r n as
r e la e s jur dicas de dir e it o p r iv ado , que r n as de dir e it o p b lico 10.
Em o ut r o cas o , t amb m r o mp e n do co m uma t ica fo r malis t a, e m p r o l
da imp le me n t a o do dir e it o s ade , o S TJ de cidiu de s t r an car r e cur s o ,
e s p e ial, s o b o ar gume n t o de que a s ade de v e r do Es t ado , s e n do que a
falt a de me dicame n t o s p o de r ia acar r e t ar mo r t e p r e mat ur a de cr ian a co m
do e n a gr av e e at r o fia mus cular e s p in h al11.
N o me s mo s e n t ido , e m r e it e r adas de cis e s , o S TJ t e m aut o r izado
le v an t ame n t o de s aldo de F un do de Gar an t ia p o r Te mp o de S e r v i o
8 S TF , DJ, S e o l , d e 1 3 - 2 - 1 9 9 7 , n . 2 9 , p . 1 8 3 0 .
9 Ve r RMS 1 7 .9 0 3 . N a me s ma dir e o , de s t acam- s e de cis e s que de t e r min am s e r o fo r n e cime n t o de
me dicame n t o s um de v e r do Es t ado : REs p 6 8 4 .6 4 6 , REs p 6 5 8 .3 2 3 , A gRg n a S TA ( s us p e n s o de
t ut e la an t e cip ada) 5 9 , A GS S 1 .4 0 8 , A gRg n a S TA 8 3 , RMS 1 7 .4 2 5 , REs p 6 2 5 , 3 2 9 , REs p 5 0 7 .2 0 5 ,
REs p 4 3 0 .5 2 6 , RMS 1 3 .4 5 2 , RMS 1 1 .1 2 9 , REs p 2 1 2 .3 4 6 , REs p 3 2 5 .3 3 7 , RMS 5 .9 8 6 , RMS 1 1 .1 8 3 ,
REs p 5 7 .6 0 8 . N o REs p 6 5 8 .3 2 3 , afir mo u o S TJ: "O S is t e ma n ico de S ade ( S US ) v is a a in t e gr ali-
dade da as s is t n cia s ade , s e ja in div idual o u co le t iv a, de v e n do at e n de r ao s que de la n e ce s s it e m e m
qualque r gr au de co mp le x idade . N o REs p 6 5 6 .9 7 9 r e co n h e ce u que o fo r n e cime n t o gr at uit o de
me dicame n t o s r e s p o n s ab ilidade s o lid r ia da Un io , do s Es t ado s e do s Mun ic p io s .
10 S TJ, REs p 6 6 2 .0 3 3 .
11 S TJ, MC 7 .2 4 0 .
59
( F GTS ) p ar a t r at ame n t o de mo l s t ia gr av e , me s mo que n o p r e v is t o e m
n o r m i12.
Co n t udo , co n s t at am- s e , ain da, de cis e s que , co m fun dame n t o e m
uma t ica lib e r al cl s s ica e n a cl us ula da s e p ar a o do s p o de r e s , afas t am
a jus t iciab ilidade do dir e it o s ade . A r e s p e it o , cit a- s e de cis o p r o fe r ida
n o RE 2 5 9 .5 0 8 A gR/ RS , e m que s e dis cut ia a ap lica o de le i e s t adual do
Es t ado do Rio Gr an de do S ul, que p r e v ia dis t r ib ui o gr at uit a de me dica
me n t o s a p e s s o as car e n t e s e a p o r t ado r e s de HIV/ A ID S , me dian t e aco r do
e n t r e o Es t ado e o Mun ic p io de Po r t o A le gr e . O S TF e n t e n de u que n o
lh e cab ia e x amin ar a- e fe t iv a o do aco r do , n a me dida e m que n o lh e cab e
co n t r o lar cr it r io s de co n v e n in cia e o p o r t un idade da A dmin is t r a o p ar a
at e n de r de man da da p o p ula o n a r e a da s ade , s o b a jus t ificat iv a de que
s e r ia o fe n s a ao p r in c p io da s e p ar a o de p o de r e s . H t amb m de cis e s
que n e gam a jus t iciab ilidade ao s dir e it o s s o ciais co m fun dame n t o n a in s u
ficin cia de r e cur s o s o r ame n t r io s . A r e s p e it o , de s t aca- s e de cis o do S TJ,
n o MS 6 .5 6 4 / RS , e m que s e s us t e n t o u: n o s is t e ma jur dico - co n s t it ucio n al
b r as ile ir o , a n e n h um r go o u aut o r idade dado r e alizar de s p e s as s e m a
de v ida p r e v is o o r ame n t r ia. A do t a o co n s ign ada n o o r ame n t o , p ar a o
fim da e fe t iv a o da de s p e s a, s e ja de qual n at ur e za fo r , o b r iga ao s r go s
da A dmin is t r a o , s o b p e n a de in co r r e r n o de s v io de v e r b as 13.
1.2. Casos relativos a tratamento diferenciado
H ain da de cis e s do S TF 14 que , luz de um r e co r t e de clas s e , p e r
mit e m in t e r n a o h o s p it alar n a mo dalidade dife r e n a de clas s e , me dian
t e o p agame n t o da dife r e n a p e lo p acie n t e . O ar gume n t o que a Co n s t i
t ui o F e de r al e s t ab e le ce o dir e it o s ade e o ace s s o un iv e r s al e igualit r io
ao s s e r v i o s e a e s p ar a p r o mo o , p r o t e o e r e cup e r a o . Co n s e que n
t e me n t e , o dir e it o s ade n o de v e s o fr e r e mb ar a o s imp o s t o s p o r aut o r i
dade s admin is t r at iv as , n o s e n t ido de r e duzir o u dificult ar o s e u ace s s o . Par a
a de cis o , n o h que b r a de is t in o mia, p o is n o s e e s t ab e le ce u t r at ame n t o
de s igual e n t r e p e s s o as e m uma me s ma s it ua o , mas facult o u- s e at e n di
me n t o dife r e n ciado e m s it ua o dife r e n ciada, s e m n us e x t r a ao s is t e ma
p b lico .
13 D e n t r e o ut r as de cis e s , de s t acam- s e S TJ, REs p 6 4 4 .5 5 7 ; e S TJ, REs p 6 8 6 .5 0 0 .
13 S o b r e o t e ma, v e r A le s s an dr a Go t t i B o n t e mp o , Direitos sociais: eficcia e acionabilidade luz da
Constituio de 1988, Cur it ib a: Jur u , 2 0 0 5 , p . 2 7 4 .
14 Ve r S TF , RE 2 2 6 .8 S 5 / RS ; RE 2 6 1 .2 6 8 / RS .
60
H de cis e s do S TF e do S TJ que r e s s alt am a ab s o lut a p r io r idade da
cr ian a e do ado le s ce n t e n a e fe t iv a o do dir e it o s ade , as s e gur an do a
in t e r n a o e o t r at ame n t o dife r e n ciado p ar a cr ian a e ado le s ce n t e s n o
S is t e ma n ico de S ade 15.
Tamb m h de cis e s do S TJ16 que , a fim de gar an t ir o dir e it o s a
de de p r e s o s , aut o r izam a p r is o do miciliar , co n s ide r an do o e s t ado cr t ico
de s ade ( p o r e x e mp lo , n a h ip t e s e de do e n a gr av e e de p s - o p e r at r io
co m quimio t e r ap ia e me dicame n t o s ) e a falt a de e s t r ut ur a b s ica do s is t e
ma p e n it e n ci r io .
1.3. Casos relativos responsabilidade por dano sade e
ao alcance de contratos de seguros de sade
H um n me r o s ign ificat iv o de de cis e s judiciais a r e s p e it o do alcan
ce e da co b e r t ur a de s e gur o s e m p lan o s p r iv ado s de s ade , co m b as e n o
Cdigo de D e fe s a do Co n s umido r . N e s s e s e n t ido , h de cis e s que aco lh e m
p e dido s de dan o mo r al e m cas o de r e cus a de s e gur o - s ade e m cus t e ar o
t r at ame n t o de s e gur ado r e gular me n t e co n t r at ado co m s us p e it a de cn ce r 17.
H , ain da, de cis e s que r e co n h e ce m a ab us iv idade de cl us ula que , e m
co n t r at o de s e gur o - s ade , afas t a t r at ame n t o de mo l s t ias in fe ct o co n t agio s as
de n o t ifica o co mp uls r ia, co mo o cas o da A ID S 18. Es s as de cis e s in s p i
r am- s e n o p r in c p io da in t e r p r e t a o fav o r v e l ao co n s umido r , t e n do e m
v is t a a r e la o de s igual e as s im t r ica e n t r e o co n s umido r e o fo r n e ce do r .
H de cis e s judiciais p r o fe r idas p e lo S TJ que fix am in de n iza o p o r
r e s p o n s ab ilidade civ il, e m r azo do n o fo r n e cime n t o de r e m dio s que
t e r ia le v ado o p acie n t e p e r da de r im, co m b as e n o ar gume n t o de que a
o mis s o n o fo r n e cime n t o de r e m dio ce r t ame n t e co n figur a in e qu v o ca
r e s p o n s ab ilidade ap t a a p r o duzir o de v e r de in de n izar 19, b e m co mo h
15 N e s t e s e n t ido , v e r S TJ, REs p , 5 7 7 .8 3 6 , REs p , 9 5 .1 6 8 , REs p , 1 2 8 .9 0 9 , e REs p , 8 9 .6 1 2 .
16 S TJ, HC 1 9 .9 1 3 / S P.
17 S TJ, A gRg n o A G 5 2 0 .3 9 0 .
1 8 S T J , A gRg n o REs p 2 6 5 .8 7 2 , A gRg n o REs p 2 5 1 .7 2 2 , REs p 2 5 5 .0 6 4 - , REs p 3 1 1 .5 0 9 , REs p 2 4 4 .8 4 1 ,
REs p 2 4 .0 9 7 , REs p 3 0 4 .3 2 6 , REs p 2 5 5 .0 6 5 ( e m r e la o cir r o s e ) . N o me s mo s e n t ido , co n s ide r a- s e
ab us iv a a cl us ula que de t e r min a a limit a o t e mp o r al ao t r at ame n t o e in t e r n a o , co n fo r me de cis e s
n o s REs p 2 5 1 .0 2 4 e REs p 1 5 8 .7 2 8 . Po r o ut r o lado , h uma t e n dn cia min o r it r ia de julgado s que
co n s ide r a v lida a e x clus o de A ID S de fin ida n o co n t r at o do co n v n io ( REs p 1 6 0 .3 0 7 ) .
19 N e s s e cas o , o S TJ co n de n o u o Es t ado do Rio de Jan e ir o a in de n izar o p acie n t e e m 5 0 0 s al r io s
m n imo s a t t ulo de dan o s mo r ais e uma p e n s o v it al cia co r r e s p o n de n t e me t ade do que r e ce b e r ia
quan do p e r de u o r im ( S TJ co n de n a o Rio p o r n o dar r e m dio a t r an s p lan t ado , Folha de S. Paulo,
61
de cis e s que fix am in de n iza o p o r r e s p o n s ab ilidade civ il, e m r azo de
de ficin cia f s ica de co r r e n t e de ge s t an t e que fe z us o de t alido mida20.
Po r fim, h de cis e s judiciais que r e lacio n am o dir e it o in fo r ma o
e o dir e it o s ade , e n do s s an do e x is t ir um man ife s t o r is co s ade p b lica
quan do o b s t aculizada a in fo r ma o p o p ula o s o b r e a p ar alis a o de o b r as
e m h o s p it ais e a s us p e n s o de aquis i o de me dicame n t o s p e la admin is
t r a o 21.
2. Casos relativos ao direito educao
2.1. Casos relativos ao ensino fundamental
D iv e r s o s julgado s r e co n h e ce m a ab s o lut a r e le v n cia do dir e it o ao
e n s in o fun dame n t al, co m de s t aque de cis o do S TF que as s im afir mo u:
Co n fo r me p r e ce it ua o ar t igo 2 0 8 , in cis o IV, da Car t a F e de r al, co n s ub s t an
cia de v e r do Es t ado a e duca o , gar an t in do o at e n dime n t o e m cr e ch e e
p r - e s co la s cr ian as de ze r o a s e is an o s de idade . O Es t ado Un io ,
Es t ado s p r o p r iame n t e dit o s , o u s e ja, un idade s fe de r adas , e Mun ic p io s
de v e ap ar e lh ar - s e p ar a a o b s e r v n cia ir r e s t r it a do s dit ame s co n s t it ucio
n ais , n o cab e n do t e r giv e r s ar me dian t e e s cus as r e lacio n adas co m a de fici
n cia de caix a22.
N a me s ma dir e o , h de cis e s que r e fo r am de v e r do Es t ado de
gar an t ir v aga e m cr e ch e p ar a cr ian as de 0 a 6 an o s , e m e s p e cial co m a
e di o da Eme n da Co n s t it ucio n al n . 1 4 , de 1 9 9 6 , que e s t ab e le ce que o s
Mun ic p io s at uar o p r io r it ar iame n t e n o e n s in o fun dame n t al e n a e duca o
in fan t il ( Co n s t it ui o F e de r al, ar t . 2 1 1 , 2 a, co m a r e da o dada p e la
Eme n da Co n s t it ucio n al n . 1 4 / 9 6 ) 23. ;
O S TJ t e m co mp ar t ilh ado do me s mo e n t e n dime n t o a r e s p e it o do
dir e it o ao ace s s o ao e n s in o fun dame n t al. A t t ulo de e x e mp lo , de s t aca- s e ,
de cis o e m a o civ il p b lica co m o o b je t iv o de as s e gur ar cr e ch e p ar a
28 de jun h o de 2 0 0 5 , p. C6 ; Rio t e r que in de n izar t r an s p lan t ado que p e r de u r im, O Estado de
S. Paulo, 2 8 de jun h o de 2 0 0 5 , p . A 1 8 ) .
2 0 S T J , REs p 6 0 .1 2 9 .
21 S TJ, A gRg n a S TA 2 9 .
22 S TF , RE 4 1 1 .5 1 8 / S P.
23 N o me s mo s e n t ido : RE 3 9 8 .7 2 2 / S P, RE 3 7 7 .9 5 7 / S P, RE 4 1 1 .3 3 2 , RE 4 0 2 .0 2 4 , A I 4 1 0 .6 4 6 A gR,
RE 4 1 1 .5 1 8 , RE 3 5 2 .6 8 6 / S P, de n t r e o ut r o s .
62
cr ian as de 0 a 6 an o s , co m fun dame n t o do de v e r co n s t it ucio n al do Es t ado
e n o dir e it o s ub je t iv o da cr ian a. A dicio n o u ain da o S TJ: "N o s e p o de
r e le gar dir e it o e duca o de cr ian a a p lan o div e r s o da gar an t ia co n s t it u
cio n al. O Es t ado t e m o de v e r de e duca o me dian t e o fe r e cime n t o de
cr e ch e p ar a cr ian as de 0 a 6 an o s . O que n o s o a l cit o r e p as s ar e s t e
de v e r p ar a in s t it ui e s p ar t icular e s e de ix ar cr ian as e m 'fila de e s p e r a24.
2.2. Casos relativos matrcula em instituies de ensino
superior e cobrana de mensalidades escolares
H , ain da, um s ign ificat iv o un iv e r s o de cas o s r e lat iv o s mat r cula e m
Un iv e r s idade s e co b r an a de me n s alidade s e s co lar e s . A t e n dn cia majo
r it r ia das de cis e s , e m s e t r at an do de e s t udan t e s in adimp le n t e s do e n s in o
s up e r io r , t e m s ido n o s e n t ido de que n o s e p o de co n dicio n ar a r e n o v a o
de mat r cula ao p agame n t o de me n s alidade at r as ada, r e s t an do co n s agr ado
o dir e it o r e n o v a o de mat r cula25.
S o mam- s e , t amb m, div e r s o s julgado s s o b r e o t e ma da t r an s fe r n cia
de o f cio de age n t e p b lico e mat r cula e m Un iv e r s idade , b e m co mo a
mat r cula de s e us de p e n de n t e s n o e n s in o fun dame n t al. Quan t o ao dir e it o
mat r cula e m Un iv e r s idade , de co r r e n t e de t r an s fe r n cia de s e r v ido r p
b lico civ il o u milit ar p o r in t e r e s s e da A dmin is t r a o , de s t acam- s e do is
e n t e n dime n t o s dis t in t o s : a) o s s e r v ido r e s p b lico s e s e us de p e n de n t e s t m
dir e it o mat r cula e m in s t it ui o de e n s in o do lo cal de de s t in o , o b s e r v ado
o r e quis it o da co n ge n e r idade e m r e la o in s t it ui o de o r ige m26; e b ) o s
s e r v ido r e s p b lico s e s e us de p e n de n t e s t m dir e it o mat r cula e m e s t ab e
le cime n t o s up e r io r e m s e u n o v o do mic lio , e m qualque r p o ca do an o , e
e m qualque r in s t it ui o de e n s in o , p b lico o u p r iv ado , n o imp o r t an do s e
a un iv e r s idade de o r ige m fo r um e s t ab e le cime n t o p ar t icular 27. H de cis e s
r e s t r it iv as que e n t e n de m que o s de p e n de n t e s de s e r v ido r p b lico r e mo v ido
24 REs p 5 7 5 .2 8 0 / S R No me s mo s e n t ido , de s t aca- s e o REs p 5 0 3 .0 2 8 , r e co n h e ce n do a le git imidade
do Min is t r io Pb lico p ar a p le it e ar v aga e m cr e ch e .
25 Ve r de cis e s do S TJ, REs p 6 11, 3 9 4 / RN , REs p 3 1 1 .3 9 4 , REs p 3 6 5 .7 7 1 , REs p 3 8 4 .4 9 1 , A gRg REs p
4 9 1 .2 0 2 .
26 S TJ, REs p 7 3 2 .7 2 7 / PE, A G REs p 6 2 6 .9 8 9 / RS , A G REs p , 5 2 9 .3 5 2 / PR, REs p 7 1 0 .3 8 2 / RJ, REs p
7 0 7 .9 4 4 / RN , REs p 6 8 9 .6 0 8 , A gRg n o REs p 6 2 1 .5 5 5 , REs p 7 3 2 .7 2 7 , A GREs p 6 2 1 .5 5 5 / RJ, REs p
6 6 7 .6 3 9 / RJ, de n t r e o ut r o s .
27 S TJ, A EREs p 3 9 1 .0 4 8 / D F , A GA 4 2 6 .4 8 4 / D F , REs p 602.820/ PE, REs p 6 1 1 .0 7 3 / RN , REs p
4 3 6 .1 6 3 / D F , EREs p S 8 8 .9 4 2 / D F , REs p 5 5 0 .2 8 7 / RN , REs p 6 4 3 .7 4 6 / RJ, A GREs p 5 3 8 .0 8 0 / RJ,
REs p 4 3 3 , 7 7 7 / PE, REs p 6 0 0 .3 6 5 / RJ, de n t r e o ut r o s .
63
de o f cio n o t m dir e it o mat r cula e m in s t it ui o de e n s in o fun dame n t al
p b lico 28. H t amb m de cis e s que e n t e n de m que , s e o v n culo co m a
A dmin is t r a o n o fo r p e r man e n t e ( mas t r an s it r io ) , o s de p e n de n t e s n o
t m dir e it o t r an s fe r n cia29, div e r s ame n t e de de cis e s que , ap e s ar da
falt a de p r e v is o le gal, co m o o b je t iv o de e v it ar p r e ju zo o u r e t r o ce s s o
s it ua o do e ducan do , man t m a t r an s fe r n cia da mat r cula n a h ip t e s e
de car go e m co mis s o 30.
IV Justiciabilidade dos direitos-sociais e econmicos nas
Cortes brasileiras: desafios e perspectivas
Co n s ide r an do o s cas o s r e lat iv o s jus t iciab ilidade do s dir e it o s s a
de e e duca o n as Co r t e s s up e r io r e s b r as ile ir as , co n clui- s e ain da s e r
r e duzido o gr au de p r o v o ca o do Po de r Judici r io p ar a de man das r e lacio
n adas imp le me n t a o do s dir e it o s s o ciais e e co n mico s . Ob s e r v a- s e
t amb m que as de man das judiciais s o , e m s ua v as t a maio r ia, de cun h o
in div idual e n o co le t iv o .
Quan t o ao dir e it o s ade , as de cis e s judiciais p r o fe r idas as s e gur am
e s t e dir e it o co mo uma p r e r r o gat iv a co n s t it ucio n al in alie n v e l e in dis p o n v e l,
de co r r e n t e do dir e it o v ida. A e s s e dir e it o as de cis e s co r r e lacio n am o
de v e r de o Es t ado fo r mular e imp le me n t ar p o l t icas que v is e m gar an t ir a
t o do s , in clus iv e ao s p o r t ado r e s do v r us HIV, o ace s s o un iv e r s al e igualit
r io as s is t n cia far macut ica e m dico - h o s p it alar . A o e fe t uar a p o n de r a o
de b e n s e n v o lv ido s , as de cis e s t e ce m e x p r e s s a o p o p e lo r e s p e it o v ida,
co mo dir e it o s ub je t iv o in alie n v e l as s e gur ado p e la p r p r ia Co n s t it ui o ,
e m de t r ime n t o de in t e r e s s e fin an ce ir o e s e cun d r io do Es t ado . O o b je t iv o
as s e gur ar o t r at ame n t o , mais ade quado e e ficaz, cap az de o fe r t ar ao e n
fe r mo maio r dign idade e me n o r s o fr ime n t o .
N e s s e s e n t ido , h uma t e n dn cia jur is p r ude n cial que r o mp e co m
uma v is o fo r malis t a e p r o ce dime n t al do dir e it o , e m p r o l da r e le v n cia do
dir e it o v ida.
88 S TJ, REs p 6 4 8 .18 0 / RJ, REs p 4 8 7 .7 9 5 / RJ.
29 S TJ, REs p 3 6 3 .9 8 6 / MG, REs p 5 4 8 .2 4 6 / PB , MC 1.S OO/ RN .
30 S TJ, EREs p 1 4 3 .9 9 1 / RN , EREs p 2 3 9 .4 0 2 / RN , EREs p 1 0 9 .7 2 1 / PR, REs p 5 5 S .6 6 1 / RN , A GA
5 1 5 .4 9 7 / RJ, REs p 2 6 7 .6 2 6 / D F , REs p S 1 6 .7 2 7 / PR, REs p 1 4 S .9 9 2 / RN , REs p 1 5 S .0 5 2 / RN , REs p
1 4 2 .4 3 8 / CE.
64
N o t o can t e e s p e cifica o do s uje it o de dir e it o , s ur ge o r e co r t e de
clas s e p ar a aut o r izar o t r at ame n t o dife r e n ciado , que p e r mit e in t e r n a o
h o s p it alar n a mo dalidade dife r e n a de clas s e , me dian t e o p agame n t o da
dife r e n a p e lo p acie n t e . To dav ia, o r e co r t e ge r acio n al que s e faz mais
e x p r e s s o e co r r e n t e , me dian t e de cis e s judiciais que r e s s alt am a ab s o lut a
p r io r idade da cr ian a e do ado le s ce n t e n a e fe t iv a o do dir e it o s ade ,
as s e gur an do - lh e s a in t e r n a o e o t r at ame n t o dife r e n ciado p ar a cr ian as e
ado le s ce n t e s n o S is t e ma n ico de S ade .
Emb o r a a t e n dn cia majo r it r ia das de cis e s s e ja n o s e n t ido de
e fe t iv ar a p r o t e o co n s t it ucio n al do dir e it o s ade , h uma t e n dn cia
min o r it r ia que , co m fun dame n t o e m uma t ica lib e r al cl s s ica e n a cl u
s ula da s e p ar a o do s p o de r e s , afas t a a jus t iciab ilidade do dir e it o s ade .
O ar gume n t o ce n t r al que n o cab e ao Po de r Judici r io co n t r o lar cr it r io s
de co n v e n in cia e o p o r t un idade da A dmin is t r a o p ar a at e n de r de man da
da p o p ula o n a r e a da s ade , s o b jus t ificat iv a da o fe n s a ao p r in c p io da
s e p ar a o de p o de r e s , b e m co mo da o fe n s a a cr it r io s de do t a o o r ame n
t r ia, co m b as e ain da n o p r in c p io da r e s e r v a do p o s s v e l.
N o s o b a t ica de dir e it o s (human rights approach), mas s o b a t ica
das r e la e s de co n s umo , v is lumb r a- s e um un iv e r s o s ign ificat iv o de de cis e s
a r e s p e it o do alcan ce e da co b e r t ur a de s e gur o s e m p lan o s p r iv ado s de
s ade , co m b as e n o Cdigo de D e fe s a do Co n s umido r . A t e n dn cia jur is -
p r ude n cial p r e do min an t e afas t ar cl us ulas ab us iv as de co n t r at o s de s e
gur o - s ade , que n e gam t r at ame n t o de mo l s t ias in fe ct o co n t agio s as , co mo
o cas o da A ID S . Es s as de cis e s in s p ir am- s e n o p r in c p io da in t e r p r e t a o
|fav o r v e l ao co n s umido r , t e n do e m v is t a a r e la o as s im t r ica e n t r e e s t e e
Io fo r n e ce do r .
Po r t an t o , n o mb it o do dir e it o s ade , p e r ce b e - s e que a jur is p r udn
cia o s cila, p o r um lado , a as s e gur ar o ace s s o s ade , me dian t e o fo r n e ci
me n t o de me dicame n t o s , co mo um dir e it o co n s t it ucio n al in v io l v e l, e , p o r
o ut r o , a t r at ar a s ade co mo uma r e la o de co n s umo , e n t r e co n s umido r e
fo r n e ce do r , me r e ce n do o p r ime ir o , co mo p ar t e v uln e r v e l, maio r p r o t e o
jur dica. N o s e dis cut e a qualidade do s s e r v i o s de s ade p r e s t ado s , mas ,
s o b r e t udo , o ace s s o a e s s e s s e r v i o s , s e u alcan ce e s ua co b e r t ur a.
A s de man das s o , s o b r e t udo , in div iduais . Imp o r t a r e al ar , e s p e cial
me n t e n o cas o das de man das in div iduais a r e s p e it o de fo r n e cime n t o de
me dicame n t o s p ar a p o r t ado r e s do v r us HIV, que e s s a fo i, in clus iv e , uma
e s t r at gia de lit ign cia. Is t o , o p t o u- s e p o r de man das in div iduais e m de
t r ime n t o das co le t iv as , s o b o r is co de as lt imas s e r e m afas t adas p e lo Po de r
Judici r io , ain da co m e las p o uco familiar izado , t e me n do , in clus iv e , o amp lo
imp act o s o cial de uma de cis o de alcan ce co le t iv o . Os gan h o s judiciais
in div iduais que p r o p iciar am a r e s p o s t a le gis lat iv a un iv e r s al, me dian t e a
ado o de le i que de t e r min o u o fo r n e cime n t o o b r igat r io e gr at uit o de
me dicame n t o s a t o do s o s p o r t ado r e s do v r us HIV. Ou s e ja, e m r azo da
lar ga jur is p r udn cia que co n de n av a o Po de r Pb lico a o fe r e ce r gr at uit a
me n t e me dicame n t o s s p e s s o as p o r t ado r as do v r us HIV, fo i ap r o v ada a
L e i n . 9 .3 1 3 , de 1 3 de n o v e mb r o de 1 9 9 6 , que dis p e s o b r e a dis t r ib ui o
gr at uit a de me dicame n t o s ao s p o r t ado r e s do HIV e do e n t e s de A ID S , ca
b e n do ao S is t e ma n ico de - S ade fo r n e ce r t o da me dica o n e ce s s r ia a
s e u t r at ame n t o .
Co n s ide r an do a ur gn cia das que s t e s que e n v o lv iam a e p ide mia de
A ID S , o mo v ime n t o de de fe s a do s dir e it o s das p e s s o as p o r t ado r as do v r us
HIV p r iv ile gio u a judicializa o das r e iv in dica e s , e s us t e n t o u a aut o ap li-
cab ilidade do s dis p o s it iv o s co n s t it ucio n ais e a at ua o jun t o ao Po de r
Ex e cut iv o , me dian t e a p ar t icip a o e m v r io s p r o je t o s , co n s e lh o s e co mis
s e s , o que v e m p e r mit in do uma e x t e n s a r e gulame n t a o s o b r e o t e ma n o
mb it o do S is t e ma n ico de S ade , p o r me io de Po r t ar ias Min is t e r iais e
In t e r min is t e r iais 31. e lab o r a o le gis lat iv a co n juga- s e a ado o de p o l t i
cas p b licas co n s ide r adas , at ualme n t e , e x e mp lar e s n o t r at ame n t o da A ID S 32,
co mp r e e n de n do o p r o t ago n is mo do B r as il n a e s fe r a in t e r n acio n al, co m
de s t aque in iciat iv a n o mb it o da Co mis s o de D ir e it o s Human o s da ON U
de p r o p o r uma r e s o lu o , ao fin al ap r o v ada, co n s ide r an do o ace s s o a me
dicame n t o s p ar a o s p o r t ado r e s de A ID S , mal r ia e t ub e r culo s e co mo um
dir e it o h uman o fun dame n t al, o que acab o u p o r co n t r ib uir p ar a o p le it o da
que b r a de p at e n t e s da p r o du o de me dicame n t o s p ar a a A ID S , n o mb i
t o da Or gan iza o Mun dial do Co m r cio 33.
Quan t o ao dir e it o e duca o , t al co mo o co r r e co m o dir e it o s ade ,
de um lado h de cis e s judiciais que as s e gur am a e fe t iv a o do dir e it o ao
3 1A co n s o lida o de s s as n o r mas e n co n t r a- s e n a p ub lica o do Min is t r io da S ade S e cr e t ar ia de
Po l t icas de S ade Co o r de n a o N acio n al de D S T e A ID S , o r gan izada p o r Mir iam Ve n t ur a,
Legislao sobre DST e AIDS no Brasil, 2 . e d., o ut ub r o / 2000.
32 Var un Gaur i, ao e n fo car o imp act o da L e i n . 9 .3 1 3 , de 1 3 de n o v e mb r o de 1 9 9 6 , ap o n t a: Par t ly
as a r e s ult , in majo r B r azilian cit ie s A ID S de at h s h av e dr o p p e d s h ar p ly , fallin g o v e r 4 0 % dur in g
1 9 9 7 - 0 2 " ( o p . cit . p . 4 6 5 ) ,
33 Em 2 4 de jun h o de 2 0 0 5 , o Go v e r n o b r as ile ir o an un cio u que que b r ar a p at e n t e do me dicame n t o
Kale t r a, do lab o r at r io n o r t e - ame r ican o A b b o t t , us ado n o t r at ame n t o de p o r t ado r e s do v r us da
A ID S ( Go v e r n o d de z dias p ar a que b r ar p at e n t e , Folha de S.Paulo, 2 5 de jun h o de 2 0 0 5 , p . Cl;
Co s t a as s ume Un aids e r e fo r a p r e s s o p o r que b r a de p at e n t e s , O Estado de S. Paulo, 28 de jun h o de
2 0 0 5 , p . A 1 8 ) .
e n s in o fun dame n t al. Uma v e z mais , a e s s e dir e it o co n s t it ucio n al co r r e la
cio n a- s e o de v e r do Es t ado r e lat iv ame n t e e duca o , de fo r ma a gar an t ir ,
p o r e x e mp lo , o at e n dime n t o e m cr e ch e e p r - e s co la s cr ian as de 0 a 6
an o s de idade . Tal co mo ap o n t am julgado s n a r e a da s ude , as de cis e s
afe t as ao dir e it o e duca o r e al am a imp o r t n cia de co n fe r ir o b s e r v n cia
ir r e s t r it a ao s dit ame s co n s t it ucio n ais , n o cab e n do afas t - lo s s o b o ar gu
me n t o de in s uficin cia o r ame n t r ia.
Po r o ut r o lado , t al co mo o co r r e n o camp o da s ade , h um un iv e r s o
de de man das fun dame n t adas n o s o b a t ica do s dir e it o s (human rights
approach), mas s o b a t ica das r e la e s de co n s umo . N e s s e s e n t ido , de s
t acam- s e o s cas o s r e lat iv o s mat r cula e m Un iv e r s idade s e co b r an a de
me n s alidade s e s co lar e s . Re it e r e - s e que a t e n dn cia majo r it r ia das de cis e s ,
e m s e t r at an do de e s t udan t e s in adimp le n t e s do e n s in o s up e r io r , t e m s ido
n o s e n t ido de que n o s e p o de co n dicio n ar a r e n o v a o de mat r cula ao
p agame n t o de me n s alidade at r as ada, r e s t an do co n s agr ado o dir e it o r e n o
v a o de mat r cula. N o v ame n t e , co n fe r e - s e maio r p r o t e o jur dica
p ar t e mais v uln e r v e l de uma r e la o v is t a co mo de co n s umo .
N o mb it o do dir e it o e duca o , t amb m s e co n s t at am de man das
de n at ur e za in div idual e n o , co le t iv a. N o s e dis cut e a qualidade da e du
ca o p r e s t ada, mas , s o b r e t udo , o ace s s o e duca o e s e u alcah ce .
A s de cis e s judiciais e s t udadas , s e ja n a r e a da s ade o u da e duca o ,
n o me n cio n am o s t r at ado s in t e r n acio n ais de p r o t e o do s dir e it o s h uma
n o s , n e m t amp o uco as o b s e r v a e s ge r ais do s Co mit s da ON U. O s iln cio
quan t o in co r p o r a o do s p ar me t r o s p r o t e t iv o s m n imo s da o r de m in t e r
n acio n al r e v e la t an t o o de s co n h e cime n t o do Po de r Judici r io a r e s p e it o da
mat r ia e s ua v o ca o r e fr at r ia ao dir e it o in t e r n acio n al co mo t amb m a
n o ut iliza o de t ais in s t r ume n t o s in t e r n acio n ais de dir e it o s h uman o s
p e lo s p r p r io s lit igan t e s .
O in cip ie n t e gr au de p r o v o ca o do Po de r Judici r io p ar a de man das
que e n v o lv e m a t ut e la do s dir e it o s s o ciais e e co n mico s r e v e la a ap r o
p r ia o ain da t mida p e la s o cie dade civ il do s dir e it o s e co n mico s , s o ciais
e cult ur ais co mo v e r dade ir o s dir e it o s le gais , acio n v e is e jus t ici v e is .
Co mo alude m A s b jo r n Eide e A llan Ro s as : L e v ar o s dir e it o s e co n mico s ,
s o ciais e cult ur ais a s r io imp lica, ao me s mo t e mp o , um co mp r o mis s o
co m a in t e gr a o s o cial, a s o lidar ie dade e a igualdade , in cluin do a que s
t o da dis t r ib ui o de r e n da. Os dir e it o s s o ciais , e co n mico s e cult ur ais
in clue m co mo p r e o cup a o ce n t r al a p r o t e o ao s gr up o s v uln e r v e is .
( ...) A s n e ce s s idade s fun dame n t ais n o de v e m ficar co n dicio n adas
car idade de p r o gr amas e p o l t icas e s t at ais , mas de v e m s e r de fin idas co mo
67
dir e it o s 34. N o B r as il, ap e n as 3 0 % do s in div duo s e n v o lv ido s e m dis p ut as
p r o cur am a Jus t i a e s t at al35, e x is t in do uma clar a r e la o e n t r e n dice de
de s e n v o lv ime n t o h uman o e lit ign cia, o u s e ja, ace n t uadame n t e maio r
a ut iliza o do Judici r io n as r e gie s que ap r e s e n t am n dice s mais alt o s
de de s e n v o lv ime n t o h uman o 36.
O in cip ie n t e gr au de p r o v o ca o do Po de r Judici r io p ar a de man das
que e n v o lv e m a t ut e la do s dir e it o s s o ciais e e co n mico s n o B r as il r e fle t e
ain da um e s t r an h ame n t o r e c p r o co e n t r e a p o p ula o e o Po de r Judici
r io , t e n do e m v is t a que amb o s ap o n t am o dis t an ciame n t o co mo um do s
maio r e s o b s t culo s p ar a a p r e s t a o jur is dicio n al. D e aco r do co m p e s quis a
r e alizada p e la IUPERJ/ A B M, 7 9 , 5 % do s juize s e n t e n de m que uma dificul
dade do Judici r io co n s ide r ada e s s e n cial e s t r adicada n o fat o de e le s e
e n co n t r ar dis t an t e da maio r ia da p o p ula o . N o me s mo s e n t ido , p e s quis as
co n duzidas n o ap e n as n o B r as il, mas n a A r ge n t in a, Pe r u e Equado r , e v i
de n ciam que 5 5 % a 7 5 % da p o p ula o ap o n t am p ar a o p r o b le ma da in a
ce s s ib ilidade do Judici r io 37.
31 A s b jo r n Eide e A llan Ro s as , Eco n o mic, s o cial an d cult ur al r igh t s : a un iv e r s al ch alle n ge , in : A s b -
jo r n Eide , Cat ar in a Kr aus e e A llan Ro s as , Economic, social and cultural rights, D o r dr e ch t , B o s t o n e
L o n dr e s : Mar t in us N ijh o fF Pub lis h e r s , 1 9 9 5 , p . 1 7 - 1 8 . Par a Paul F ar me r : "Th e co n ce p t o f h uman
r igh t s may at t ime s b e b r an dis h e d as an all- p ur p o s e an d un iv e r s al t o n ic, b ut it was de v e lo p e d t o
p r o t e ct t h e v uln e r ab le . Th e t r ue v alue o f h uman r igh t s mo v e me n fs ce n t r al do cume n t s is r e v e ale d
o n ly wh e n t h e y s e r v e t o p r o t e ct t h e r igh t s o f t h o s e wh o ar e mo s t like ly t o h av e t h e ir r igh t s v io lat e d.
Th e p r o p e r b e n e ficiar ie s o f t h e Un iv e r s al D e clar at io n o f Human Righ t s ( ...) ar e t h e p o o r an d
o t h e r wis e dis e mp o we r e d" ( Paul F ar me r , Pathologies o f power, B e r ke le y : Un iv e r s it y o f Califr n ia
Pr e s s , 2 0 0 3 , p . 212).
35 Co mo e x p lica Mar ia Te r e za S ade k, "as r aze s p ar a is s o s o in me r as , in do de s de a de s cr e n a n a
le i e n as in s t it ui e s at a b an aliza o da v io ln cia. ( ...) Po r o ut r o lado , ain da que e m me n o r gr au
que n o p as s ado , b aix a a co n s cie n t iza o da p o p ula o t an t o s o b r e s e us dir e it o s , co mo s o b r e o s
can ais in s t it ucio n ais dis p o n v e is p ar a a s o lu o de s e us lit gio s . ( Mar ia Te r e za S ade k ( o r g.) , Acesso
justia, S o Paulo : F un da o Ko n r ad A de n aue r , 2 0 0 1 , p . 7 ) .
56 Par a Mar ia Te r e za S ade k, "N o que s e r e fe r e s r e gie s , o ID H p e r mit e afir mar que o N o r de s t e e
o N o r t e r e n e m o s mais b aix o s in dicado r e s s o cio e co n mico s do p a s , dur an t e t o do o p e r o do . Em
co n t r as t e , o S ul, o S ude s t e e o Ce n t r o - Oe s t e ap r e s e n t am as me lh o r e s co n di e s n o que diz r e s p e it o
s dime n s e s cap t adas p e lo ID H. n o t v e l co mo quan t o mais alt o o ID H me lh o r a r e la o e n t r e
p r o ce s s o s e n t r ado s e p o p ula o . Ou s e ja, ace n t uadame n t e maio r a ut iliza o do Judici r io n as
r e gie s que ap r e s e n t am n dice s mais alt o s de de s e n v o lv ime n t o h uman o " ( Mar ia Te r e za S ade k,
F e r n o D ias de L ima e Jo s Re n at o de Camp o s A r ajo , O Judici r io e a p r e s t a o da jus t i a, In :
Mar ia Te r e za S ade k ( o r g.) , Acesso justia, S o Paulo : F un da o Ko n r ad A de n aue r , 2 0 0 1 , p . 20- 21) .
37 Ve r A le jan dr o M. Gar r o , A cce s s t o Jus t ice fo r t h e p o o r in L at in A me r ica, in : Juan E. M n de z,
Guille r mo 0 'D o n n e l e Paulo S r gio Pin h e ir o ( o r gs .) , The (un)rule of law the underprivileged in
Latin America, N o t r e D ame : Un iv e r s it y o f N o t r e D ame Pr e s s , 1 9 9 9 , p . 2 9 3 . Ve r t amb m F lav ia
Pio v e s an , A lit ign cia de dir e it o s h uman o s n o b r as il: de s afio s e p e r s p e ct iv as n o us o do s s is t e mas
n acio n al e in t e r n acio n al de p r o t e o , in : F lav ia Pio v e s an , Temas de direitos humanos, 2 . e d. 2 0 0 3 ,
p . 4 1 0 .
68
Es s e e s t r an h ame n t o r e c p r o co t e m imp licado um r e duzido un iv e r s o
de de man das s ub me t idas ao Po de r Judici r io a r e s p e it o do s dir e it o s h uma
n o s . Par a a fo r ma o de uma jur is p r udn cia p r o t e t o r a do s dir e it o s h uman o s ,
b e m co mo p ar a a co n s o lida o do Po de r Judici r io co mo um locus de afir
ma o de dir e it o s , fun dame n t al que a s o cie dade civ il, me dian t e s uas
mlt ip las o r gan iza e s e mo v ime n t o s , acio n e de fo r ma cr e s ce n t e o Po de r
Judici r io , o t imizan do o p o t e n cial e man cip at r io e t r an s fo r mado r que o
dir e it o p o de t e r . S as s im h av e r um Judici r io mais ab e r t o , p r x imo e co m
maio r r e s p o n s ab ilidade s o cial e p o l t ica. S as s im h av e r maio r t r an s p ar n -
cia e-accountability-Aos de v e r e s do Es t ado n o t o can t e imp le me n t a o do s
dir e it o s s ade e e duca o 38.
A in da que in cip ie n t e , a jus t iciab ilidade do s dir e it o s s o ciais e e co n
mico s n a e x p e r in cia b r as ile ir a cap az de in v o car um le gado t r an s fo r mado r
e e man cip at r io , co m a r up t ur a gr adat iv a de uma v is o co n s e r v ado r a e
fo r malis t a do Po de r Judici r io . A s s in ala- s e , co mo cas o e mb le m t ico , as
de cis e s judiciais ace r ca do fo r n e cime n t o gr at uit o de me dicame n t o s , que ,
s o madas a ar t iculadas e co mp e t e n t e s e s t r at gias de lit ign cia, fo me n t ar am
t r an s fo r ma e s le gis lat iv as e a ado o de p o l t icas p b licas co n s ide r adas
e x e mp lar e s n a r e a. .
E n e ce s s r io , co n t udo , av an ar e m e s t r at gias de lit ign cia n o , mb i
t o n acio n al, que o t imize m a jus t iciab ilidade e a e x igib ilidade do s dir e it o s
e co n mico s e s o ciais , co mo v e r dade ir o s dir e it o s p b lico s s ub je t iv o s 39, p o r
me io do empowerment da s o cie dade civ il e de s e u at iv o e cr iat iv o p r o t ago -
n is mo .
H que s e r e in v e n t ar a r e la o co m o Po de r Judici r io , amp lian do
s e us in t e r lo cut o r e s e alar gan do o un iv e r s o de de man das , p ar a co n v e r t e r
e s t e Po de r e m um locus de afir ma o de dir e it o s , que dign ifique a r acio n a
lidade e man cip at r ia do s dir e it o s s o ciais e e co n mico s co mo dir e it o s h u
man o s n acio n al e in t e r n acio n alme n t e gar an t ido s .
38 Par a Var un Gaur i: F r o m t h e p e r s p e ct iv e o f s o cial r igh t s , p ar t icip at io n , e mp o we r me n t , t r an s p ar -
e n cy , an d acco un t ab ilit y in S e r v ice de liv e r y ar e imp o r t an t fo r e n s ur in g h e alt h car e an d e ducat io n
qualit y " ( Var un Gaur i, o p . cit ., p . 4 7 0 ) .
39 N o t e - s e que , e m r azo da in div is ib ilidade do s dir e it o s h uman o s , a v io la o ao s dir e it o s e co n mi
co s , s o ciais e cult ur ais p r o p icia a v io la o ao s dir e it o s civ is e p o l t ico s , v is t o que a v uln e r ab ilidade
e co n mico - s o cial le v a v uln e r ab ilidade do s dir e it o s civ is e p o l t ico s . Par a A mar t y a S e n : 'A n e ga o
da lib e r dade e co n mica, s o b a fo r ma da p o b r e za e x t r e ma, t o r n a a p e s s o a v uln e r v e l a v io la e s de
o ut r as fo r mas de lib e r dade . ( ...) A n e ga o da lib e r dade e co n mica imp lica a n e ga o da lib e r dade
s o cial e p o l t ica" ( A mar t y a S e n , Development asfreedom, N e w Yo r k: A lfr e d A . Kn o p f, 1 9 9 9 , p . 8 ) .
69
*1
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V
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S EGURA N A S OCIA L , D IGN ID A D E
D A PES S OA HUMA N A E
PROIB I O D E RETROCES S O:
REVIS ITA N D O O PROB L EMA
D A PROTE O D OS D IREITOS
F UN D A MEN TA IS S OCIA IS
Ingo Wolfgang Sarlet*
' " v ' " ..........'V'
I Consideraes introdutrias
A dis cus s o de quan t o jur idicame n t e ! s e gur a a s e gur an a
s o cial, e m o ut r as p alav r as , a co n t r o v r s ia a r e s p e it o de quais s o o s limit e s
e as p o s s ib ilidade s de uma t ut e la jur dico - co n s t it ucio n al do s dir e it o s s o ciais
e m face do imp act o do s p r o ce s s o s s o ciais , e co n mico s e p o l t ico s , que
in flue n ciam p r o fun dame n t e as r e fo r mas le gis lat iv as e as p o l t icas p b licas ,
co lo can do co n s t an t e me n t e e m x e que t an t o o s s is t e mas de p r o t e o s o cial
quan t o o s co r r e lat o s dir e it o s h uman o s e fun dame n t ais , lo n ge e s t de
p e r de r e m at ualidade e r e le v n cia. Me s mo que a in s t ab ilidade das r e la e s
e co n micas e s o ciais p o s s a s e r co n s ide r ada co mo um e s t ado p e r man e n t e ,
o que , e mb o r a n o co m a me s ma in t e n s idade , at in ge at me s mo s o cie da
de s mar cadas p o r n v e is r e lat iv ame n t e e le v ado s de s ade e co n mica e de
s e gur an a s o cial, p e lo me n o s quan do s e co n s ide r a o p r o b le ma do de s e m
p r e go ( o u da in s t ab ilidade lab o r ai) , da r e du o gr adat iv a do s b e n e f cio s
s o ciais , e n t r e o ut r o s as p e ct o s , s e gue co r r e t a a p e r ce p o de que o clamo r
das p e s s o as p o r s e gur an a ( aqui co mp r e e n dida e m um s e n t ido amp lo ) , e ,
n o que diz co m as mudan as e x p e r ime n t adas n a e s fe r a jur dico - n o r mat iv a,
o an s e io p o r uma e s t ab ilidade p e lo me n o s r e lat iv a das r e la e s jur dicas
* D o ut o r e Ps - D o ut o r e m D ir e it o ( Un iv e r s idade de Mun ique e In s t it ut o Max - Plan ck de D ir e it o
S o cial Es t r an ge ir o e In t e r n acio n al, A le man h a) . Pr o fe s s o r Tit ular de D ir e it o Co n s t it ucio n al n a F a
culdade e n o Pr o gr ama de Ps - Gr adua o e m D ir e it o ( Me s t r ado e D o ut o r ado ) da PUCRS e n a
Es co la S up e r io r da Magis t r at ur a do Rio Gr an de do S ul. Me mb r o da D ir e t o r ia do IB EC In s t it u
t o B r as ile ir o de Es t udo s Co n s t it ucio n ais . Juiz de D ir e it o n o Rio Gr an de do S ul.
71
m
f l '
[ v co n s t it ui um v alo r fun dame n t al de t o do e qualque r Es t ado que t e n h a a
[ ; p r e t e n s o de me r e ce r o t t ulo de Es t ado de D ir e it o . A s s im, r e s ult a e v i-
; de n t e a co n e x o e n t r e as cat e go r ias da s e gur an a jur dica e da s e gur an a
l s o cial, n o t adame n t e n o mar co do Es t ado de D ir e it o , as p e ct o que aqui v ai
r ap e n as r e fe r ido , s e m a p r e o cup a o de maio r de s e n v o lv ime n t o .
Po r o ut r o lado , e mb o r a s e t r at e de mais uma cat e go r ia imp o r t ada de
o ut r as e x p e r in cias jur dicas , t amb m e n t r e n s acab o u s e n do r e ce p cio
n ada a n o o de que , e s p e cialme n t e n a e s fe r a do s dir e it o s s o ciais , p r e ci
s ame n t e n o que diz r e s p e it o s ua t ut e la co n t r a me didas que t e n h am p o r
e s co p o a r e du o e / o u s up r e s s o de p o s i e s jur dicas ( aqui t o madas e m
s e n t ido amp lo ) j imp lan t adas , a o r de m jur dico - co n s t it ucio n al b r as ile ir a,
p e lo me n o s de aco r do co m s e t o r e s da do ut r in a e alguma jur is p r udn cia,
agas alh o u o que s e t e m de s ign ado de p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o ,
t e m t ica que , de r e s t o , n o s t e m s ido p ar t icular me n t e car a e a r e s p e it o da
qual p o s s iv e lme n t e t e n h amo s p ub licado o p r ime ir o ar t igo e x clus iv ame n t e
de dicado ao t e ma n o B r as il, muit o e mb o r a a e x is t n cia de algumas co n
t r ib ui e s an t e r io r e s e mb ut idas e m o b r as de maio r amp lit ude , in clus iv e
de n o s s a aut o r ia1.
D e s de e n t o , e s p e cialme n t e n o s lt imo s an o s , co n s t at a- s e que , al m
de t o da uma p r o du o do ut r in r ia mais r e ce n t e que v e r s e s o b r e o t e ma
n o B r as il2, t amb m n a e s fe r a jur is p r ude n cial, e mb o r a de mo do ain da
1 In go Wo lfgan g S ar le t , O e s t ado s o cial de dir e it o , a p r o ib i o de r e t r o ce s s o e a gar an t ia fun dame n
t al da p r o p r ie dade ", Revista da Faculdade de Direito da UFRGS, n . 1 7 , 1 9 9 9 , p . 1 1 1 - 1 3 2 . N o s e n t ido
do n e ce s s r io r e co n h e cime n t o de uma p r o t e o co n t r a o r e t r o ce s s o e m mat r ia de dir e it o s s o ciais ,
v . t amb m o n o s s o A eficcia dos direitos fundamentais, 9 . e d., Po r t o A le gr e : L iv r ar ia do A dv o gado ,
2 0 0 8 , p . 4 3 6 e s ., co m it e m e s p e c fico s o b r e o t e ma in s e r ido j n a p r ime ir a e di o , de 1 9 9 8 , p e r io di
came n t e r e v is t o e at ualizado , p o r s ua v e z r e s ult an t e da ade qua o de cap t ulo da n o s s a t e s e do ut o r ai
s o b r e o s dir e it o s s o ciais n o B r as il e n a A le man h a, ap r e s e n t ada e m julh o de 1 9 9 6 e p ub licada e m
1 9 9 7 , n a A le man h a, s o b o t t ulo Die Problematik dersozialen Grundrechte inder brasilianischen Verfas-
sung und im deutschen Grundgesetz eine rechtsvergleichende Untersuchung, Pe t e r L an g: F r an kfur t am
Main , 1 9 9 7 , 6 2 9 p . D a me s ma p o ca do n o s s o ar t igo dat a a p r ime ir a e di o da j cl s s ica o b r a de
L e n io L uiz S t r e ck, Hermenutica jurdica e(m) crise, Po r t o A le gr e : L iv r ar ia do A dv o gado , 1 9 9 9 , p . 3 9 ,
co m r e fe r n cia de cis o do Tr ib un al Co n s t it ucio n al de Po r t ugal s o b r e o t e ma, in v o can do a n o o
de uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o s o cial.
2 Cf., p o r lt imo , al m de uma s r ie de ar t igo s j p ub licado s , b e m co mo in me r as r e fe r n cias ao t e ma
e m cur s o s , man uais e o b r as que n o v e r s am e x clus iv ame n t e s o b r e a que s t o , a imp o r t an t e o b r a
mo n o gr fica de F e lip e D e r b li, O princpio da proibio de retrocesso social na constituio de 1988, Rio
de Jan e ir o : Re n o v ar , 2 0 0 7 , e m que t amb m s e e n co n t r a uma e x ce le n t e s in o p s e do r e co n h e cime n t o
da n o o de p r o ib i o de r e t r o ce s s o n a e v o lu o do ut r in r ia e jur is p r ude n cial e s t r an ge ir a e b r as i
le ir a, e m e s p e cial p . 1 6 6 e s.
72
muit o t mido , s o e n co n t r adas r e fe r n cias n o o de p r o ib i o de r e t r o
ce s s o 3. J p o r e s s a r azo , co n s ide r amo s o p o r t un o , ain da que co m b as e e m
n o s s o s e s cr it o s an t e r io r e s , r e t o mar a dis cus s o , p e lo me n o s p ar a o e fe it o
de r e n de r h o me n age m ao s n o v o s ap o r t e s do ut r in r io s , amp lian do o de b a
t e quan t o a algun s as p e ct o s e m p ar t icular , b e m co mo r e fle t in do s o b r e a
co r r e o das n o s s as p r p r ias p o s i e s . D e s s a fo r ma, p o s s v e l afir mar que
o p r e s e n t e e s t udo t e m p o r o b je t iv o p r in cip al, a p ar t ir de t e x t o s an t e r io r e s ,
e me dian t e o di lo go co m n o v as co n t r ib ui e s , r e v is it ar o t e ma da as s im
de s ign ada p r o ib i o de r e t r o ce s s o n a e s fe r a do s dir e it o s s o ciais , e s p e cial
me n t e r e t o man do a dis cus s o e m t o r n o do s limit e s e das p o s s ib ilidade s
de t al in s t it ut o p ar a a p r o t e o de dir e it o s s o ciais , co m de s t aque p ar a o
p ap e l do p r in c p io da dign idade da p e s s o a h uman a n e s t e co n t e x t o . Co m
e fe it o , e mb o r a o n cle o e s s e n cial do s dir e it o s fun dame n t ais s o ciais n o
p o s s a, n o n o s s o s e n t ir , s e r ide n t ificado ( p e lo me n o s e m t o da a e x t e n s o )
co m o s e u co n t e do e m dign idade da p e s s o a h uman a e n e m co m a n o o
de um m n imo e x is t e n cial, amb as as cat e go r ias ( dign idade e m n imo e x is
t e n cial) t m s ido h ab it ualme n t e in v o cadas t amb m n a e s fe r a da p r o ib i o
de r e t r o ce s s o , de s ign adame n t e co mo p ar me t r o mat e r ial p ar a co n t r o lar a
le git imidade co n s t it ucio n al de me didas que t e n h am p o r e s co p o a s up r e s
s o o u a r e du o de dir e it o s s o ciais . A s s umida co mo co r r e t a a p r e mis s a
de que um Es t ado D e mo cr t ico ( e S o cial) de D ir e it o t e m co mo t ar e fa
as s e gur ar a t o do s uma e x is t n cia dign a ( p e lo me n o s o que de flui do ar t .
1 7 0 , caput, da n o s s a CF ) , co lo ca- s e o p r o b le ma de s ab e r at que p o n t o
p o de e s t e me s mo Es t ado , p o r me io de r e fo r mas n a e s fe r a da s e gur an a
s o cial, s up r imir p r e s t a e s ( b e n e f cio s ) o u p io r ar o s n v e is de p r o t e o
s o cial at in gido s , ain da mais s e co m is s o acab ar fican do aqu m do as s im
de s ign ado m n imo e x is t e n cial e , p o r t an t o , daquilo que e x ige o p r in c p io
da dign idade da p e s s o a h uman a. A n t e s , t o dav ia, de e n fr e n t ar a co n e x o
e n t r e a dign idade da p e s s o a h uman a e a as s im de s ign ada p r o ib i o de
r e t r o ce s s o , imp o r t a r e t o mar a an lis e de algumas p r e mis s as de o r de m
t e r min o lgica e co n ce it uai s o b r e a p r o ib i o de r e t r o ce s s o , as s im co mo a
r e s p e it o de s e u co n t e do jur dico - n o r mat iv o n o s is t e ma co n s t it ucio n al
b r as ile ir o .
3 Cf., p o r e x e mp lo , o acr do n o Re cur s o Es p e cial n . 5 6 7 .8 7 3 - MG, Re i. Min . L uiz F ux (DJ, 2 5 - 2 -
2 0 0 4 ) , que v e r s a s o b r e a ile git imidade da s up r e s s o da is e n o do IPI p ar a a aquis i o de aut o mv e is
p o r p ar t e de p o r t ado r e s de n e ce s s idade s e s p e ciais . A p r e s e n t an do um in v e n t r io de de cis e s o n de
h o uv e r e fe r n cia n o o de p r o ib i o de r e t r o ce s s o , v., e m e s p e cial, F e lip e D e r b li, O princpio da
proibio de retrocesso social, cit ., p . 1 8 6 e s.
73
II Fundamentao e contedo da assim chamada proibio
de retrocesso na ordem jurdico-constitucional brasileira
1. Aspectos terminolgicos e conceituais: em busca e um
consenso possvel
S e t o mar mo s a ide ia da p r o ib i o de r e t r o ce s s o e m um s e n t ido amp lo ,
que s ign ifica t o da e qualque r fo r ma de p r o t e o de dir e it o s fun dame n t ais
e m face de me didas do Po de r Pb lico , co m de s t aque p ar a o le gis lado r e o
admin is t r ado r que t e n h am p o r e s co p o a s up r e s s o o u me s mo a r e s t r i o
de dir e it o s fun dame n t ais ( s e jam e le s s o ciais o u n o ) , co n s t at a- s e que a
n o s s a o r de m jur dica, ain da que n o s o b e s t e r t ulo , de h muit o j co n s a
gr o u a n o o , p e lo me n o s e m algumas de s uas p o s s v e is dime n s e s . Co m
e fe it o , de s de lo go s e v e r ifica que a gar an t ia co n s t it ucio n al do s dir e it o s
adquir ido s , do s at o s jur dico s p e r fe it o s e da co is a julgada, as s im co mo as
de mais v e da e s co n s t it ucio n ais de at o s r e t r o at iv o s ( e v ide n cian do o j
r e fe r ido liame co m a s e gur an a jur dica) o u me s mo e de mo do t o do
e s p e cial a co n s t r u o do ut r in r ia e jur is p r ude n cial de um s is t e ma de
co n t r o le das r e s t r i e s de dir e it o s fun dame n t ais j do co n t a do quan t o ,
t amb m e n t r e n s , a que s t o da p r o t e o de dir e it o s co n t r a a a o s up r e s
s iv a e me s mo e r o s iv a p o r p ar t e do s r go s e s t at ais e n co n t r o u r e s s o n n cia.
I) ii n ws ma fo r ma, u p r o t e o co n t r a a n e o do n o de r co n s t it uin t e r clo r ma
Jo r , n o t n dame n t e n o co n ce r n e n t e p r e v is o dc limit e s mat e r iais r e fo r ma, '
igualme n t e n o de ix a dc co n s t it uir uma r e le v an t e man ife s t a o cm fav o r
da man ut e n o de de t e r min ado s co n t e do s da Co n s t it ui o , e m p ar t icular
de t o do s aque le s que in t e gr am o ce r n e mat e r ial da o r de m co n s t it ucio n al
o u....p ar a o s que ain da t e imam e m r e fut ar a e x is t n cia de limit e s imp l ci
t o s p e lo me n o s daque le s dis p o s it iv o s ( e r e s p e ct iv o s co n t e do s n o r ma
t iv o s ) e x p r e s s ame n t e t ido s co mo n o in s us ce t v e is de ab o li o e le t iv a o u
t e n dcn cial, a t e o r do que dis p e o r MS D .~^ 4 JTJT^^it ao 'lV( lcr al de
1 9 8 8 '1. D e o ut r a p ar t e , o r e co n h e cime n t o , an t e s me s mo do adv e n t o da
4 S o b r e o t e ma, v. o n o s s o A eficcia dos direitos fundamentais, 9 . e d., Po r t o A le gr e : L iv r ar ia do
A dv o gado , p . 404* e s .; a t t ulo de co n t r ap o n t o , p r o p o n do uma e x e ge s e mais r e s t r it iv a n o que diz
co m quais o s co n t e do s p r o t e gido s co m b as e n o ar t . 6 0 , 4 da Co n s t it ui o F e de r al, v ., p o r l
t imo , Ro dr igo B r an do , Direitosfundamentais, democracia e clusulas ptreas, Rio de Jan e ir o : Re n o v ar ,
2 0 0 8 . Em amb o s o s t t ulo s cit ado s p o s s v e l e n co n t r ar uma av alia o de t ida das p r in cip ais p o s i
e s do ut r in r ias a r e s p e it o do t e ma, as s im co mo da o r ie n t a o p r e v ale n t e n o S up r e mo Tr ib un al
F e de r al.
at ual Co n s t it ui o , p o r p ar t e de um n me r o e x p r e s s iv o de aut o r e s , de um
dir e it o s ub je t iv o n e gat iv o , o u s e ja, da p o s s ib ilidade de imp ugn a o de
qualque r me dida co n t r r ia ao s p ar me t r o s e s t ab e le cido s p e la n o r mat iv a
co n s t it ucio n al, me s mo n a s e ar a das as s im de s ign adas n o r mas co n s t it ucio
n ais p r o gr am t icas ( imp o s it iv as de p r o gr amas , fin s e t ar e fas ) o u n o r mas
imp o s it iv as de le gis la o , t amb m ap o n t a p ar a a n o o de uma p r o ib i o
de at ua o co n t r r ia s imp o s i e s co n s t it ucio n ais , t al qual ado t ada n o
mb it o da p r o ib i o de r e t r o ce s s o ^1. Nesse, sentido, o r e r n n h cr imp n ln r e
Uma^e r o fo il^e x e t r o ce jjfl: s it ^^
A p ar t ir do e x p o s t o , j s e p e r ce b e que n o p o de m s o ar t o mal o s ar
gume n t o s daque le s que , co mo o cas o de To r ge Re is N o v ais . s us t e n t am que
a p r o b le m t ica da p r o ib i o de r e t r o ce s s o s o cial co n s t it ui, n a v e r dade , ap e
n as uma fo r ma e s p e cial de de s ign ar a Que s t o do s limit e s e r e s t r i e s ao s
clir dt Q&Jimdax n filit ais s o ciais n o s e u mb it o mais amp lo , v is t o que o s dir e i
t o s s o ciais , p r e cis ame n t e p o r s e r e m t amb m dir e it o s fun dame n t ais ., e n co n -
t r ain - s c s uicn o s . e m t e r mo s ge r ais , ao me s mo r e gime iur fdico - co n s t it ucip n al
Co m
e fe it o , admit ir que ap e n as o s dir e it o s s o ciais e s t o s uje it o s a uma t ut e la
co n t r a um r e t r o ce s s o p o de r ia, in clus iv e , le git imar o e n t e n dime n t o de que
e x is t e uma dife r e n a r e le v an t e co m r e la o ao r e gime jur dico ( n o cas o , a
t ut e la) co n s t it ucio n al do s dir e it o s s o ciais e do s de mais dir e it o s fun dame n t ais ,
v is t o que a e s t e s s e ap licar iam o s cr it r io s co n v e n cio n ais ut ilizado s p ar a
le git imar ( limit e s ) e co n t r o lar ( limit e s do s limit e s ) a co n s t it ucio n alidade de
me didas r e s t r it iv as , r e fo r an do , in clus iv e , a ide ia que s e gue e n co n t r an do
5 B as t a aqui r e co r dar as co n t r ib ui e s in dis p e n s v e is , in clus iv e p o r t e r e m in flue n ciado fo r t e me n t e
o dis cur s o da e fe t iv idade co n s t it ucio n al que t e m car act e r izado e s p e cialme n t e o mo me n t o co n s t it u
cio n al p o s t e r io r a 1 9 8 8 , de Jo s A fo n s o da S ilv a, Aplicabilidade das normas constitucionais, 7 . e d., S o
Paulo : Malh e ir o s , 2 0 0 7 , p . 1 1 7 e s ., n e s t e p ar t icular , e mb o r a a s ign ificat iv a at ualiza o da o b r a,
man t e n do - s e fie l, e m t e r mo s ge r ais , ao e n t e n dime n t o s us t e n t ado n as e di e s p ub licadas ain da s o b
a gide da Co n s t it ui o de 1 9 6 7 - 6 9 . Tr ilh an do a me s ma lin h a ar gume n t at iv a, v. L u s Ro b e r t o B ar
r o s o , O direito constitucional e a efetividade de suas normas, Rio de Jan e ir o : Re n o v ar , 1 9 9 0 , p . 106 e s .
( e m e di e s mais r e ce n t e s , o aut o r t amb m s e r e fe r e p r o ib i o de r e t r o ce s s o co mo p r in c p io im
p l cit o do dir e it o co n s t it ucio n al b r as ile ir o ) . Igualme n t e as s o cian do a p r o ib i o de r e t r o ce s s o n o o
de e fic cia n e gat iv a do s p r in c p io s co n s t it ucio n ais , v . t amb m A n a Paula de B ar ce llo s , A eficcia j u
rdica dos princpios constitucionais, o principio da dignidade da pessoa humana, Rio de Jan e ir o : Re n o v ar ,
2 0 0 1 , p . 7 0 e s .
6 Cf. Jo r ge Re is N o v ais , Direitos fundamentais: t r un fo s co n t r a a maio r ia, Co imb r a: Co imb r a Edit o r a,
2 0 0 6 , p . 2 0 0 .
75
ade p t o s de que o s dir e it o s s o ciais , e s p e cialme n t e e m r e la o ao s dir e it o s
de lib e r dade , o u n o s o s e que r fun dame n t ais o u e s t o s uje it o s a um r e gime
jur dico me n o s r e fo r ado .
Jus t ame n t e p e lo fat o de que imp o r t a r e co n h e ce r a fo r a do s ar gu
me n t o s r e fe r ido s , r e it e r a- s e a n o s s a p o s i o e m p r o l da, , p QS S iMMads - ds _'
uma ap lica o da n o o de p r o ib i o de r e t r o ce s s o , de s de que t o mada e m
XStrtiVQ,..a.tQ.d0SQS dir .e it o ^JEun damn t ais . D e s s a fo r ma, v e r ifica~s e que a
de s ign a o p r o ib i o de r e t r o ce s s o s o cial, que o p e r a p r e cis ame n t e n a e s
fe r a do s dir e it o s s o ciais , e s p e cialme n t e n o que diz co m a p r o t e o n e ga
t iv a ( v e da o d s up r e s s o o u dimin ui o ) de dir e it o s a p r e s t a e s s o ciais ,
al m de uma ide ia- fo r a imp o r t an t e ( a ilumin ar a ide ia de que e x is t e de
fat o um r e t r o ce s s o e n o um s imp le s v o lt ar at r s , p o r t an t o , uma me r a
me dida de cun h o r e gr e s s iv o ) , p o de r ia s e r jus t ificada a p ar t ir de algumas
p e culiar idade s do s dir e it o s s o ciais , o que , imp o r t a s e mp r e fr is ar , n o s e
r e v e la in co mp at v e l co m a s ub s t an cial e quiv aln cia r e fe r e n t e a s ua r e
le v n cia p ar a a o r de m co n s t it ucio n al e n t r e o s dir e it o s s o ciais ( p o s it iv o s
e n e gat iv o s ) e o s de mais dir e it o s fun dame n t ais . Em p r ime ir o lugar , o r e p
dio da o r de m jur dica a me didas que , de algum mo do , in s t aur e m um e s t a
do de r e t r o ce s s o ( e x p r e s s o que p o r s i s j v e icula uma car ga n e gat iv a)
s in aliza que n e m t o do ajus t e , ain da que je s ult e e m e v e n t ual r e s t r i o de
da r e v e r s o ( ain da mals quan do p ar cial) de p o lit icct s ^jjub licas , r n as que
h av e r r e t r o ce s s o , p o r t an t o , de lima s it ua o co n s t it ucio n alme n t e ile g t ima,
quan do fo r e m, t r an s p Qls t as ^lt as ^air je ga ^ _ - ~ '
N o camp o do s dir e it o s s o ciais , t al fe n me n o t alv e z s e ja ain da mais
p e r ce p t v e l, e s p e cialme n t e quan do s e t r at a de alt e r a e s le gis lat iv as que
afe t am um de t e r min ado n v e l de co n cr e t izagjio jde Jais dkfii QS - A in da que
s e dig que n o camp o das r e s t r i e s ao s dir e it o s fun dame n t ais s o ciais a
n o o de limit e s do s limit e s do s dir e it o s fun dame n t ais ( gn e r o ao qual
p e r t e n ce m o s dir e it o s S o ciais ) s ub s t it ui p o r co mp le t o e co m v an t age n s a de
p r o ib i o de r e t r o ce s s o , p e r ce b e - s e que a n o o de p r o ib i o de r e t r o ce s s o
( aqui afin ada co m a ide ia de p r o ib i o de r e gr e s s iv idade , t al qual difun dida
n o dir e it o in t e r n acio n al) , e s p e cialme n t e quan do e mp r e gada p ar a b alizar a
t ut e la do s dir e it o s s o ciais , as s ume uma imp o r t n cia t o da e s p e cial, me s mo
que , co mo j fr is ado , at ue co mo um e le me n t o ar gume n t at iv o adicio n al, a
r e fo r ar a n e ce s s idade de t ut e la do s dir e it o s s o ciais co n t r a t o da c qualque r
me dida que imp lique s up r e s s o o u r e s t r i o ile g t ima do s n v e is v ige n t e s
^de jiQt & ajs acial- Tamb m p e las r aze s o r a co lacio n adas , jus t ifica- s e a
76
n o s s a o p o e m s e guir p r iv ile gian do , n o p lan o t e r min o lgico , a e x p r e s s o
p r o ib i o de r e t r o ce s s o , jus t ame n t e p e lo fat o de que n o s e r qualque r ..
r e s t r i o ) que e n s e jar a un iu ccn s ur a p o r 1o r a da v io la ao da p r o ib i o dc
x S ffifiSSO, co n s o an t e , ali s , s e r e x amin ado mais adian t e "
O que j r e s ult a do e x p o s t o que t amb m a p r o ib i o de r e t r o ce s s o ,
co mo cat e go r ia jur dico - n o r mat iv a de mat r iz co n s t it ucio n al, r e clama uma
de fin i o jur dica, p ar a que p o s s a alcan ar uma ade quada ap lica o e n o
s e t r an s fo r mar co mo , de r e s t o , s e s us p e it a j e s t e ja s e n do o cas o e m
mais um r t ulo que s e p r e s t a a t o da a s o r t e de ar b it r ar ie dade s e que , e m
n o s e n do de v idame n t e co mp r e e n dido e de limit ado , acab a p o r in s e r ir de
fo r ma p ar ado x al mais in s e gur an a n o s is t e ma, jus t ame n t e aquilo que
p r e t e n de t amb m e e m ce r t a me dida! co mb at e r .
D e o ut r a p ar t e , p r e cis o e n fat izar que , me s mo e m s e r e co n h e ce n do
uma fun o aut n o ma p ar a a p r o ib i o de r e t r o ce s s o , e s p e cialme n t e n a
s e ar a do s dir e it o s s o ciais , t al aut o n o mia s e mp r e s e r p ar cial e r e lat iv a. Co m
e fe it o , s e v e r dade que a n o o de p r o ib i o de r e t r o ce s s o n o s e co n fun
de co m a de s e gur an a jur dica e s uas r e s p e ct iv as man ife s t a e s , o que
s e mp r e fize mo s que s t o de s ub lin h ar 7, t amb m r e s ult a e v ide n t e que s e
r e gis t r a uma in ce n s ur v e l co n e x o e n t r e amb as as figur as ( p r o ib i o de
r e t r o ce s s o e s e gur an a jur dica) , as s im co mo in co n t o r n v e l o liame e n t r e
a p r o ib i o de r e t r o ce s s o e o ut r o s p r in c p io s e in s t it ut o s jur dico - co n s t it u-
cio n ais . A in da que t al p e r s p e ct iv a v e n h a a s e r co n fir mada p e lo s de s e n v o l
v ime n t o s p o s t e r io r e s , v ale in v e s t ir alguma ar gume n t a o adicio n al, de mo do
e s p e cial e m face das cr t icas r e ce b idas .
Em p r ime ir o lugar , e mb o r a co r r e t o o ar gume n t o adv o gado p o r F e lip e t
D e r b li, n o s e n t ido de que a p r o ib i o de r e t r o ce s s o , a s e gur an a jur dica
( in cluin do a p r o t e o da co n fian a) e a dign idade da p e s s o a h uman a n o
s e co n fun de m8 as p e ct o que s e mp r e fo i o b je t o de n o s s o r e co n h e cime n
t o ! , de t al s o r t e que o p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o as s ume
co n t o r n o s aut n o mo s , n o s e p o de r afir mar que t al aut o n o mia imp lica
uma ap lica o is o lada e s e m qualque r r e la o co m o ut r o s in s t it ut o s , co mo ,
7 Co n fir a- s e o n o s s o A eficcia dos direitos fundamentais, cit ., p . 4 3 6 e s . N o , t o dav ia, o que p ar e ce
afir mar F e lip e D e r b li, O princpio da proibio de retrocesso social, cit ., p . 2 2 0 - 2 2 1 , e m r e la o ao n o s
s o p e n s ame n t o , e s p e cialme n t e quan do de mo do e v ide n t e me n t e e quiv o cado s uge r e que e m
p r e s t amo s ao p r in c p io um car t e r me r ame n t e in s t r ume n t al.
8 Cf. F e lip e D e r b li, 0 princpio da proibio de retrocesso social, cit ., p . 2 1 3 e s.
77
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de r e s t o , de mo n s t r am ab s o lut ame n t e t o do s o s e x e mp lo s e n co n t r ado s n a
do ut r in a e n a jur is p r udn cia, in clus iv e o s cas o s co lacio n ado s p e lo r e fe r ido
aut o r . Co m is s o , ao co n t r r io do que s uge r e F e lip e D e r b li9, n o s e e s t
r e co n h e ce n do car t e r me r ame n t e in s t r ume n t al ao p r in cip io da p r o ib i o
de r e t r o ce s s o ( o que , de r c.s t o , n o s e r ia cm s i algo gr av e , v is t o que o o b je
t iv o c o de as s e gur ar a maio r p r o t e o p o s s v e l ao s dir e it o s fun dame n t ais ),
ce s s o .s c e n co n t r ar e fe r ida ao s is t e ma co n s t it ucio n al co mo um t o do , in~
cluin do o s is t e ma in t e r n acio n al de p r o t e o do s dir e it o s h uman o s , co mo
b e m at e s t a o de v e r de p r o gr e s s iv idade n a p r o mo o do s dir e it o s s o ciais .
A s s im, p e r ce p t v e l que a p r o ib i o de r e t r o ce s s o at ua, s im, co mo b aliza
p ar a a imp ugn a o de me didas que imp lique m s up r e s s o o u r e s t r i o de
dir e it o s s o ciais e que p o s s am s e r co mp r e e n didas co mo e fe t iv a v io la o de
t ais dir e it o s , o s quais , p o r s ua v e z, t amb m n o dis p e m de uma aut o n o mia
ab s o lut a n o s is t e ma co n s t it ucio n al, s e n do , e m b o a p ar t e e e m n v e is dife
r e n ciado s , co n cr e t iza e s da p r p r ia dign idade da p e s s o a h uman a. A s s im, ^
n a s ua ap lica o co n cr e t a, is t o , n a afe r i o da e x is t n cia, o u n o , de uma
v io la o da p r o ib i o de r e t r o ce s s o , n o s e p o de r iam co mo , de r e s t o ,
t e m e v ide n ciado t o da a p r o du o jur is p r ude n cial s o b r e o t e ma dis p e n s ar
cr it r io s adicio n ais , co mo o cas o da p r o t e o da co n fian a ( a de p e n de r
da s it ua o , clar o ) , da dign idade da p e s s o a h uman a e do co r r e lat o m n i
mo e x is t e n cial, do n cle o e s s e n cial do s dir e it o s fun dame n t ais s o ciais , da
p r o p o r cio n alidade , ap e n as p ar a cit ar o s mais r e le v an t e s .,
Po r o ut r o lado , ap r o p r ia s e gur an a jur dica e o s in s t it ut o s que lh e s o
in e r e n t e s , co m de s t aque aqui p ar a o dir e it o adquir ido , e x ige m uma co m
p r e e n s o que dialo gue co m as p e culiar idade s do s dir e it o s s o ciais , in clus iv e
n o que diz co m a p r p r ia p r o ib i o de r e t r o ce s s o , ab an do n an do - s e uma
p e r s p e ct iv a in div idualis t a e p r iv ile gian do - s e , s e m p r e ju zo da t ut e la do s
dir e it o s in div iduais , .uma e x e ge s e afin ada co m a n o o de jus t i a s o cial.
r azo p e la qual, co mo o cas o de Mar cus Or io n e Go n alv e s Co r r e ia10, h
que m s us t e n t e a n e ce s s idade de s e r e co n h e ce r um dir e it o adquir ido s o cial,
as fis cip ^qu e j a dav ia, aqui n o t e mo s co n di e s de de s e n v o lv e r . 7~
N e s t e me s mo co n t e x t o , afir mar ( co mo o fize mo s e m e s cr it o an t e r io r
e aqui r e afir mamo s ) que a p r o ib i o de r e t r o ce s s o e n co n t r a fun dame n t o
y- 9 Cf. F e lip e D e r b li, O princpio da proibio de retrocesso social, cit ., p . 221.
10 Cf. Mar cus Or io n e Go n alv e s Co r r e ia, "D ir e it o adquir ido s o cial, in : r ica Paula B ar ch a Co r r e ia
J e Mar cus Or io n e Go n alv e s Co r r e ia, Curso de direito da seguridade social, 4 . e d., S o Paulo : S ar aiv a,
2 0 0 8 , p . 1 e s .
II 78
t amb m ( mas jamais e x clus iv ame n t e ) n a s e gur an a jur dica e n a dign idade
da p e s s o a h uman a, co m as quais , e mb o r a guar de r e la o , n o s e co n fun de ,
t amb m.n QjflffiI a- r e co n h e ce r . p mib S 3 Q_de ' r e t r o ce s s o car t e r me r a
me n t e in s t r ume n t al. Co m e fe it o , al m da cir cun s t n cia de que a p r o ib i o
de r e t r o ce s s o n o p r o t e ge ap e n as a dign idade da p e s s o a h uman a e o m n i
mo e x is t e n cial ( o que igualme n t e s e mp r e de s t acamo s ) , o que s e afir ma
que a p r p r ia n o o de s e gur an a jur dica, n o mb it o de uma co n s t it ui o
que co n s agr a dir e it o s s o ciais , n o p o de ficar r e duzida s t r adicio n ais figur as
da t ut e la do s dir e it o s adquir ido s o u da ir r e t r o at iv idade de ce r t as me didas
do Po de r Pb lico , e x igin do , p o r t an t o , uma ap lica o e m s in t o n ia co m a
p le n a t ut e la e p r o mo o do s dir e it o s fun dame n t ais e m ge r al, in cluin do o s
dir e it o s s o ciais . A li s , p r e cis ame n t e quan do ap o n t amo s p ar a a p o s s ib ilida
de de uma n o o de p r o ib i o de r e t r o ce s s o e m s e n t ido amp lo ( que dialo
ga aqui s im co m maio r n fas e co m a s e gur an a jur dica e a n o o de
limit e s e r e s t r i e s do s dir e it o s fun dame n t as ) , ab r an ge n do as de s ign adas
cl us ulas p t r e as , a gar an t ia do s dir e it o s adquir ido s , da co is a julgada e do
at o jur dico p e r fe it o , as s im co mo a v e da o de le is r e t r o at iv as , r e co n h e ce n
do , p o r t an t o , co mo j r e s ult a do n o s s o p r ime ir o t e x t o s o b r e o t e ma, que t ais
figur as n o dis p e n s am, e s p e cialme n t e n o camp o do s dir e it o s s o ciais , o
r e co n h e cime n t o de uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o s o cial ( e m s e n t ido mais
e s t r it o , p o r t an t o ) co mo p r in c p io ( ? ) imp l cit o n a o r de m co n s t it ucio n al
b r as ile ir a11, que s e e v ide n cia o quan t o v alo r izamo s a p r o ib i o de r e t r o
ce s s o , p o is , do co n t r r io , e s t a s e r ia r e alme n t e de s n e ce s s r ia e cair ia n o
v azio , uma v e z que ide n t ificada co m in s t it ut o s j co n h e cido s e que n o do
co n t a, n a e x t e n s o de v ida, da t ut e la do s dir e it o s s o ciais . Co m e fe it o , o
r e co n h e cime n t o , t amb m e de mo do e s p e cial n o mb it o da o r de m jur dico -
- co n s t it ucio n al b r as ile ir a, de uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o r e v e la- s e co mo
n e ce s s r io ( e is s o t amb m o afir mamo s de s de a n o s s a p r ime ir a man ife s t a
o a r e s p e it o do t e ma) , p o is b o a p ar t e das me didas que r e s ult am e m s u
p r e s s o e dimin ui o de dir e it o s s o ciais o co r r e s e m que h aja uma alt e r a o
11 Emb o r a a amp la r e fe r n cia a um p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o , que e m t e r mo s ge r ais as
s umimo s co mo p o s s v e l, n o s e p o de s imp le s me n t e de s co n s ide r ar a n e ce s s idade de maio r in v e s t i
me n t o ar gume n t at iv o n o que diz co m a p r p r ia co n di o p r in cip io lgica ( o u me s mo e x clus iv ame n
t e p r in cip io lgica) da p r o ib i o de r e t r o ce s s o . A li s , o t e r mo proibio ( as s im co mo vedao) , e mb o
r a t al as p e ct o p o r s i s n o s e ja s uficie n t e p ar a de s car act e r izar a co n di o de p r in c p io , a p ar t ir de
de t e r min ado e n un ciado s e mn t ico , guar da maio r p r o x imidade co m a e s t r ut ur a das r e gr as , que s o
n o r mas que p r o b e m o u imp e m ce r t as co n dut as . D e qualque r s o r t e , n o n o s s o p r o p s it o ade n t r ar
mais n e s t a dime n s o do p r o b le ma, ain da mais e m face do s e s t r e it o s limit e s do p r e s e n t e e s t udo ,
v is t o que n o s s a in t e n o a de p r o b le mat izar algo que t alv e z me r e a maio r r e fle x o do que t e m
r e ce b ido , in clus iv e p o r n s me s mo s .
79
do t e x t o co n s t it ucio n al, s e m que s e v e r ifique a v io la o de dir e it o s adqui
r ido s o u me s mo s e m que s e t r at e de me didas t ip icame n t e r e t r o at iv as e que
p o s s am s e r r e s o lv idas co m b as e n a t ut e la da co n fian a. N o s e co mp r e e n
de , p o r t an t o , o p r o p s it o de uma cr t ica ( p e lo me n o s n o que co n ce r n e ao
p o n t o o r a t r at ado ) , v is t o que t al cr t ica s e dir e cio n a a algo que n o afir ma
mo s p e lo me n o s e s e gur ame n t e n o da fo r ma co mo s uge r ido e
ap e n as co n fir ma, e m gr an de p ar t e , o n o s s o p r p r io p e n s ame n t o .
D an do s e qn cia t e n t at iv a de de fin ir o s co n t o r n o s da p r o ib i o de
r e t r o ce s s o , p r e cis o le mb r ar aqui da h ip t e s e t alv e z a mais co mum
co n s ide r adas as r e fe r n cias fe it as n a do ut r in a e n a jur is p r udn cia da
co n cr e t iza o p e lo le gis lado r in fr aco n s t it ucio n al do co n t e do e da p r o t e o
do s dir e it o s s o ciais , e s p e cialme n t e ( mas n o e x clus iv ame n t e ) n a s ua di
me n s o p o s it iv a, o que n o s r e me t e dir e t ame n t e n o o de que o co n t e do
e s s e n cial do s dir e it o s s o ciais de v e r s e r in t e r p r e t ado t amb m! n o
s e n t ido do s e le me n t o s n ucle ar e s do n v e l p r e s t acio n al le gis lat iv ame n t e
de fin ido , o que , p o r s ua v e z, de s e mb o ca in e v it av e lme n t e n o j an un ciado
p r o b le ma da p r o ib i o de um r e t r o ce s s o s o cial. Em s uma, a que s t o ce n t r al
que s e co lo ca n e s t e co n t e x t o e s p e c fico da p r o ib i o de r e t r o ce s s o a de
s ab e r s e e at que p o n t o p o de o le gis lado r in fr aco n s t it ucio n al ( as s im co mo
o s de mais r go s e s t at ais , quan do fo r o cas o ) v o lt ar at r s n o que diz co m a
co n cr e t iza o do s dir e it o s fun dame n t ais s o ciais , as s im co mo do s o b je t iv o s
e s t ab e le cido s p e lo Co n s t it uin t e p o r e x e mp lo , n o ar t . 3 a da Co n s t it ui o
de 1 9 8 8 n o mb it o das n o r mas imp o s it iv as de p r o gr amas , fin s e t ar e fas
n a e s fe r a s o cial, ain da que n o o fa a co m e fe it o s r e t r o at iv o s e que n o
e s t e ja e m caus a uma alt e r a o do t e x t o co n s t it ucio n al.
D e s de lo go , v is t a do que fo i co lo cado , p ar e ce - n o s dis p e n s ar maio r e s
co n s ide r a e s o quan t o me didas t o madas co m e fe it o s p r o s p e ct iv o s p o de m
r e p r e s e n t ar um gr av e r e t r o ce s s o , n o ap e n as ( e mb o r a t amb m) s o b a t ica
do s dir e it o s de cada p e s s o a co n s ide r ada n a s ua in div idualidade , quan t o
p ar a a o r de m jur dica e s o cial co mo um t o do . A l m dis s o , p e r ce b e - s e n it i
dame n t e a j le mb r ada amp lit ude e co mp le x idade da t e m t ica12, e s p e cial
me n t e n o mb it o daquilo que p o de s e r de s ign ado co mo co n s t it uin do uma
12 S o b r e o p o n t o , v . a co n t r ib ui o de Jo s Vice n t e do s S an t o s Me n do n a, "Ve da o do r e t r o ce s s o : o
que e co mo p e r de r o me do , in : Gus t av o B in e n b o jm ( co o r d.) , Direitos Fundamentais Revista de
Direito da Associao dos Procuradores do Novo Estado do Rio de Janeiro, v. XII, Rio de Jan e ir o : L ume n
Jur is , 2 0 0 3 , p . 2 0 5 e s ., ao r e fe r ir t an t o a aus n cia de un ifo r midade t e r min o lgica n o mb it o da
do ut r in a quan t o ao de s t acar , ain da que co m b as e e m o ut r o cr it r io do que o aqui ado t ado , algumas
das div e r s as e p o s s v e is ace p e s da p r o b le m t ica ( e s p e cialme n t e p . 2 1 8 e s .) .
e fic cia p r o t e t iv a do s dir e it o s fun dame n t ais . Po r t an t o , mais uma v e z v ale
r e p is ar que e s t amo s dian t e de um fe n me n o que , co mp r e e n dido e m s e n
t ido amp lo , fe i o , p o r e x e mp lo , da p r o p o s t a de aco r do co m a qual s e
t r at a de um p r o b le ma de limit e s do s limit e s p r p r io de t o do s o s dir e it o s
fun dame n t ais , n o s e man ife s t a ap e n as n a s e ar a do s dir e it o s fun dame n t ais
s o ciais , p e lo me n o s s e t o mado s e m s e n t ido e s t r it o , co mo dir e it o s a p r e s t a
e s s o ciais 13. A s s im, p o r e x e mp lo , de n t r e as div e r s as p o s s ib ilidade s que
e n v o lv e m uma n o o ab r an ge n t e de p r o ib i o de r e t r o ce s s o , de s ign ada
me n t e e m face das p e culiar idade s do dir e it o amb ie n t al, p o s s v e l, co mo
b e m ap o n t a Car lo s A lb e r t o Mo lin ar o , falar de um p r in c p io de v e da o da
r e t r o gr ada o , j que o dir e it o amb ie n t al cuida jus t ame n t e da p r o t e o e
p r o mo o do s b e n s amb ie n t ais , e s p e cialme n t e n o s e n t ido de imp e dir a
de gr ada o do me io amb ie n t e , o que co r r e s p o n de , p o r s ua v e z, a uma
p e r s p e ct iv a e v o lucio n is t a ( e n o in v o lucio n is t a) da v ida14.
Ve r ifica- s e , p o r t an t o , que in s is t ir n o fat o de que a b lin dage m do s
dir e it o s fun dame n t ais co n t r a me didas r e t r o ce s s iv as ( o u r e gr e s s iv as , s e
p r e fe r ir mo s ) s e ja um p r iv il gio do s dir e it o s s o ciais , co mo s e ap e n as n e s
t a e s fe r a s e co lo cas s e o p r o b le ma ( p o r mais que h aja p e culiar idade s a s e r
co n s ide r adas e que jus t ificam o r e co n h e cime n t o de uma p r o ib i o de r e
t r o ce s s o s o cial) , s ign ificar ia, ao fim e ao cab o , o u a e x clus o do s de mais
dir e it o s fun dame n t ais de t al p r o t e o ( co mo s e aqui a p r o t e o co m b as e
n a s e gur an a jur dica fo s s e s uficie n t e ) o u a co n s t at a o e v ide n t e me n t e
e quiv o cada de que o s is t e ma de limit a e s s r e s t r i e s de dir e it o s ,
de s ign adame n t e a p r o p o r cio n alidade e a gar an t ia do n cle o e s s e n cial,
ap e n as p ar a cit ar o s mais imp o r t an t e s , n ada t e r ia que v e r co m a p r o ib i o
de r e t r o ce s s o e m mat r ia de dir e it o s s o ciais .
S e m que s e p r e t e n da, t o dav ia, av an ar n o de b at e s o b r e o quo aut n o
ma ( o u n o ) a gar an t ia co n s t it ucio n al co n t r a um r e t r o ce s s o e m r e la o a
o ut r o s in s t it ut o s jur dico - co n s t it ucio n ais , p ar t ir e mo s aqui do p r e s s up o s t o de
que o p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o , e m di lo go p e r man e n t e co m
o ut r o s p r in c p io s e r e gr as , t e m as s umido uma p o s i o de de s t aque , s e ja n a
e s fe r a co n s t it ucio n al, s e ja n a e s fe r a do dir e it o in t e r n acio n al do s dir e it o s
h uman o s , co mo imp o r t an t e fe r r ame n t a ( n o co mo me r o in s t r ume n t o )
13 N e s s e s e n t ido , v . t amb m L uis F e r n an do Calil de F r e it as , Direitos fundamentais: limites e restries,
Po r t o A le gr e : L iv r ar ia do A dv o gado , 2 0 0 6 , p . 2 1 6 .
14 Cf. Car lo s A lb e r t o Mo lin ar o , Direito ambiental Proibio de retrocesso, Po r t o A le gr e : L iv r ar ia do
A dv o gado , 2 0 0 7 , e s p e cialme n t e p . 9 1 e s .
81
co n t r a uma e v o lu o r e gr e s s iv a ( r e t r o ce s s iv a) e m mat r ia de dir e it o s s o ciais ,
e co n mico s , cult ur ais e amb ie n t ais . A li s , ap e n as p ar a que fique co n s ign ado ,
a p o s s ib ilidade de s e co n t r o lar me didas de cun h o r e t r o ce s s iv o , co m b as e e m
uma p r o ib i o jur dica de r e t r o ce s s o , p r e s s up e av alia o s e mp r e e m car t e r
r e lacio n ai, p p is um r e t r o ce s s o ( n o s e n t ido de uma s up r e s s o , dimin ui o ,
um v o lt ar at r s , um r e gr e s s o ) s o me n t e s e p o de dar e m r e la o a um e s t ado
an t e r io r , que s ir v a de r e fe r n cia p ar a t al av alia o . A s s im, fim ( o b je t iv o )
co n s t it ucio n al e r r adicar a p o b r e za e a de s igualdade , p r o mo v e r uma e x is t n cia
dign a, co n cr e t izar o s dir e it o s s o ciais e t c., mas n o p o de r s e r um fim e m s i
me s mo ( n o s e n t ido de de s lo cado de o ut r o s p ar me t r o s ) a p r o ib i o de um
r e t r o ce s s o e m r e la o r e aliza o do s fin s r e fe r ido s e m car t e r e x e mp lifica-
t iv o . Que co m is s o o p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o n o r e s t a dimin u
do e m imp o r t n cia, p ar e ce - me t o e le me n t ar quan t o r e co n h e ce r que a
p r o p o r cio n alidade n o p e r de e m r e le v n cia n a co n di o de p ar me t r o p ar a
o co n t r o le de co n s t it ucio n alidade de me didas r e s t r it iv as de dir e it o s . D e o ut r a
p ar t e , e n fat izan do a n o s s a o p o ( s umar iame n t e jus t ificada acima) p e lo
t e r mo p r o ib i o de r e t r o ce s s o , r e n un ciamo s p r e t e n s o de ap r o fun dar a
que r e la e m t o r n o da t e r min o lo gia mais ap r o p r iada, e s p e cialme n t e n o que diz
co m a p o s s ib ilidade de at r ib ui o de um co n t e do e um s ign ificado dis t in t o s
ao s de mais r t ulo s co n v e n cio n ais , n o cas o , p r o ib i o de r e gr e s s iv idade ,
p r o ib i o de e v o lu o r e acio n r ia, p r in c p io da n o r e v e r s ib ilidade , o u me s
mo o ut r o s que p o s s am s e r ut ilizado s . Tais e x p r e s s e s , p ar a e fe it o s de s t e
t r ab alh o , s e r o t idas co mo e quiv ale n t e s p r o ib i o de r e t r o ce s s o , n o ap e n as
p e lo fat o de a co n s ide r ar mo s mais ap r o p r iada, mas t amb m e m fun o de
um n e ce s s r io aco r do s e mn t ico .
Po r de r r ade ir o , an t e s de ade n t r ar mo s a que s t o da fun dame n t a o
co n s t it ucio n al e do co n t e do do p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o e a
de s p e it o do s de s e n v o lv ime n t o s an t e r io r e s , t amb m h que r e co n h e ce r
at me s mo e m face do s e x e mp lo s cit ado s e m car t e r e s p e culat iv o n o p ar
gr afo an t e r io r que n a s e ar a das n o r mas que e s t ab e le ce m o b je t iv o s n a
e s fe r a da jus t i a s o cial e , acima de t udo , do s dir e it o s fun dame n t ais s o ciais ,
que a p r o b le m t ica t e m alcan ado a s ua maio r r e p e r cus s o e o n de t amb m
n s t al co mo an un ciado e r e afir mado aqui n o n o s s o p r p r io dis cur s o
s e guir e mo s ce n t r an do a n o s s a at e n o .
2. Elementos para uma fundamentao jurdico-constitucional
de uma proibio de retrocesso, especialmente em
matria de direitos sociais
D e p ar t ida, ade r in do ao jus t ificado ce t icis mo e m r e la o imp o r t a o
acr t ica e muit as v e ze s in ade quada de in s t it ut o s o r iun do s de o ut r as e x p e
82
r in cias jur dicas 15, co n v m r e le mb r ar o le it o r 16 de que , ao me s mo t e mp o
e m que a dis cus s o e m t o r n o da r e du o ( e at me s mo do de s mo n t e ) do
Es t ado S o cial de D ir e it o e do s dir e it o s s o ciais que lh e s o in e r e n t e s ap r e
s e n t a p r o p o r e s mun diais , n o h co mo de s co n s ide r ar que as dime n s e s
da cr is e e as r e s p o s t as r e clamadas e m cada Es t ado in div idualme n t e co n s i
de r ado s o in e x o r av e lme n t e div e r s as , ain da que s e p o s s am co n s t at ar p o n t o s
co mun s . D ife r e n ciadas s o , p o r o ut r o lado , as s o lu e s e n co n t r adas p o r
cada o r de m jur dica p ar a e n fr e n t ar o p r o b le ma, dife r e n as que n o s e li
mit am e s fe r a da n at ur e za do s in s t r ume n t o s , mas que , de mo do e s p e cial,
ab r an ge m a in t e n s idade da p r o t e o o ut o r gada p o r aque le s ao s s is t e mas de
s e gur idade s o cial, o que , e v idn cia, n o p o de r de ix ar de s e r co n s ide r ado
n as lin h as que s e gue m, de t al s o r t e que t amb m a t e m t ica da p r o ib i o
de r e t r o ce s s o r e clama um t r at ame n t o co n s t it ucio n alme n t e ade quado . Tal
e n fo que n e ce s s ar iame n t e dife r e n ciado e co n t e x t ualizado as s ume
fe i e s ain da mais e me r ge n ciais quan do n o s damo s co n t a de que a Co n s
t it ui o b r as ile ir a in s e r e - s e e m um amb ie n t e s ign ificat iv ame n t e div e r s o ,
p o r e x e mp lo , do e x p e r ime n t ado p e lo co n s t it ucio n alis mo e ur o p e u, al m de
t e r ( ain da) um car t e r mar cadame n t e co mp r o mis s r io e dir ige n t e , o que ,
s o mado ao fat o b e m le mb r ado p o r L e n io S t r e ck de que as p r o me s s as
da mo de r n idade e n t r e n s s e que r fo r am min imame n t e cump r idas e de que
o Es t ado D e mo cr t ico ( e S o cial) de D ir e it o b r as ile ir o , n a co n di o de
Es t ado da jus t i a mat e r ial, n o p as s a de um s imulacr o 17, t r an s fo r ma a
15 Cf., e s p e cialme n t e n a s e ar a do s dir e it o s s o ciais , A n dr e as Kr e ll, Direitos sociais e controle judicial no
Brasil e na Alemanha: os (des)caminhos de um direito constitucionalcomparado", Po r t o A le gr e : S e r gio
A n t o n io F ab r is , Edit o r , 2002, p . 4 2 .
16 Re p o r t amo - n o s aqui s co n s ide r a e s t e cidas e m n o s s o e s t udo an t e r io r s o b r e o t e ma ( O e s t ado
s o cial de dir e it o , a p r o ib i o de r e t r o ce s s o e a gar an t ia fun dame n t al da p r o p r ie dade , Revista da
Faculdade de Direito da UFRGS, n . 1 7 , 1 9 9 9 , p . 1 1 1 e s .) , n o qual, co n t udo , ce n t r amo s a n o s s a at e n o
n a ap r e s e n t a o da s o lu o ge r mn ica, co m algumas co n s ide r a e s jus co mp ar at iv as , in clus iv e
ap o n t an do p ar a a in ade qua o ( p e lo me n o s e m t e r mo s ge r ais ) do mo de lo ale mo ao s is t e ma co n s
t it ucio n al b r as ile ir o .
17 N e s s e co n t e x t o in s e r e - s e a ( e n t r e n s ) c le b r e dis cus s o a r e s p e it o da s o b r e v iv n cia" do co n s t i
t ucio n alis mo dir ige n t e , t al qual s us t e n t ado , o r igin ar iame n t e , p o r Jo s Jo aquim Go me s Can o t ilh o n a
s ua o b r a Constituio dirigente e vinculao do legislador, Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 1 9 8 2 , jus t ame n
t e e m fun o da r e v is o cr t ica le v ada a e fe it o p e lo p r p r io Go me s Can o t ilh o e m div e r s o s t r ab alh o s
mais r e ce n t e s , e s p e cialme n t e a co n t ar da d cada de 1 9 9 0 , n o que diz co m as p r e mis s as b as ilar e s de
s ua an t iga t e s e , b as t an do aqui r e me t e r o le it o r ao p r e f cio r e digido p ar a a s e gun da e di o da o b r a
o r a cit ada. N o s e n do o cas o de ade n t r ar aqui t al co n t r o v r s ia, o que s e v e r ifica que as mudan as
n o mb it o do p e n s ame n t o do Pr o fe s s o r Go me s Can o t ilh o , s e m dv ida, de v e m s e r e n quadr adas n o
s e u de v ido co n t e x t o , j que n e m o t e x t o da Co n s t it ui o p o r t ugue s a de 1 9 7 6 guar da o me s mo
p e r fil r e v o lucio n r io e dir ige n t e que lh e fo i o r igin ar iame n t e at r ib u do , j que o b je t o de v r ias e r e
lat iv ame n t e p r o fun das r e v is e s , n o t adame n t e e m face da in s e r o de Po r t ugal n a Un io Eur o p ia e,
83
dis cus s o e r a t o r n o da p r o ib i o de r e t r o ce s s o n a e s fe r a do s dir e it o s s o ciais
e m t ar e fa p e r man e n t e . Tamb m p o r e s s a r azo , r e s ult a e v ide n t e que e n t r e
n s o p r o b le ma maio r ain da o de dar cump r ime n t o e ficie n t e e e ficaz ao
de v e r de p r o gr e s s iv a co n cr e t iza o do s o b je t iv o s s o ciais e do s dir e it o s s o ciais
co n s t it ucio n alme n t e r e co n h e cido s e as s e gur ado s , do que p r o p r iame n t e o
de co ib ir r e t r o ce s s o s , o que n o afas t a a n e ce s s idade de s e le v ar ( muit o ) a
s r io a p r o ib i o de r e t r o ce s s o , n aquilo o n de me s mo o p o uco que fo i al
can ado p o s s a e s t ar e m r is co . Pe lo co n t r r io , o n de a amp la maio r ia da
p o p ula o s e s it ua n a faix a do as s im de s ign ado m n imo e x is t e n cial o u
me s mo aqu m de s t e p at amar , maio r v igiln cia s e imp e e m r e la o a t o da
e qualque r me dida p o t e n cialme n t e r e s t r it iv a o u me s mo s up r e s s iv a de p r o
t e o s o cial. O de v e r de p r o gr e s s iv idade e a p r o ib i o de r e t r o ce s s o ( de
uma e v o lu o r e gr e s s iv a) co n s t it ue m, p o r t an t o , dime n s e s in t e r ligadas e
que r e clamam uma p r o dut iv a e din mica co mp r e e n s o e ap lica o .
Emb o r a s e t r at e de in s t it ut o que r e ce b e u amp la aco lh ida n a co mu
n idade in t e r n acio n al ( p e lo me n o s , n o mb it o do s dir e it o s s o ciais , e co n
mico s e cult ur ais ) , n o s e p o de afir mar que a p r o ib i o de r e t r o ce s s o ,
e s p e cialme n t e n a p e r s p e ct iv a aqui p r iv ile giada, o cup e h o je , e m div e r s o s
o r de n ame n t o s jur dico s , uma p o s i o de de s t aque s imilar a que lh e t e m
s ido o ut o r gada e n t r e n s , n e m me s mo que r e p r e s e n t e um amp lo co n s e n
s o n o dir e it o co mp ar ado 18. Pe lo me n o s , faz- s e n e ce s s r io r e co n h e ce r que
e m muit o s p a s e s a p r o ib i o de r e t r o ce s s o t e m s ido ap licada o u co m
o ut r o r t ulo o u me dian t e r e cur s o a o ut r as figur as jur dicas . D e o ut r a
p o r t an t o , s e u e n quadr ame n t o e m uma o r de m jur dica s up r an acio n al. Po r is s o t amb m, n s e m
b o r a n o de mo do n e ce s s ar iame n t e co in cide n t e co m o de o ut r o s aut o r e s s e guimo s s us t e n t an do
que o p ar adigma da Co n s t it ui o dir ige n t e ain da cump r e um r e le v an t e p ap e l n o mb it o do co n s t i-
t ucio n alis mo p t r io e ap r e s e n t a me s mo h o je ( e t alv e z p o r is s o me s mo ) t o do um p o t e n cial a
s e r e x p lo r ado . A r e s p e it o de s s a t e m t ica, v ., ain da, al m do in dis p e n s v e l co n t r ib ut o de L e n io L uiz
S t r e ck, Jurisdio constitucional e hermenutica, Po r t o A le gr e : L iv r ar ia do A dv o gado , e s p e cialme n t e
p . 1 0 6 e s ., t amb m as li e s de Gilb e r t o B e r co v ici, A p r o b le m t ica da Co n s t it ui o dir ige n t e : al
gumas co n s ide r a e s s o b r e o cas o b r as ile ir o , Revista de Informao Legislativa, n . 1 4 2 , B r as lia:
S e n ado F e de r al, ab r il/ jun h o de 1 9 9 9 , p . 3 5 - 5 1 , as s im co mo a o p o r t un a co le t n e a o r gan izada p o r
Jacin t o N e ls o n de Mir an da Co ut in h o , Canotilho e a Constituio dirigente, Rio de Jan e ir o : Re n o v ar ,
2 0 0 2 , que r e n e ap o r t e s de div e r s o s aut o r e s n acio n ais e r e t r at a uma dis cus s o s o b r e o t e ma t r av ada
co m o p r p r io Go me s Can o t ilh o .
18 S o b r e a p r o ib i o de r e t r o ce s s o n o s is t e ma in t e r n acio n al de p r o t e o do s dir e it o s h uman o s e n o
dir e it o co n s t it ucio n al co mp ar ado , v . a in dis p e n s v e l co le t n e a de Ch r is t ian Co ur t is ( co mp .) , N i un
paso atrs. L a p r o h ib icin de r e gr e s iv idad e n mat r ia de de r e ch o s s o ciale s , B ue n o s A ir e s : Edit o r e s
D e l Pue r t o , 2 0 0 6 , co m de s t aque p ar a o e n s aio in t r o dut r io do p r p r io o r gan izado r , Ch r is t ian Co ur
t is , "L a p r o h ib icin de r e gr e s iv idad e n mat r ia de de r e ch o s s o ciale s : ap un t e s in t r o duct o r io s , in : Ni
unpaso atrs, cit , p. 3 - 5 2 .
84
p ar t e , n o s e p o de n e glige n ciar p ur a e s imp le s me n t e a e x is t n cia de ar
gume n t o s co n t r a o r e co n h e cime n t o , e m p r in c p io , de uma p r o ib i o de
r e t r o ce s s o n a e s fe r a das co n quis t as s o ciais . A s s im, e n t r e o ut r o s , co s t uma
e s gr imir - s e o ar gume n t o de que uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o e s b ar r a n o
fat o de que o o b je t o do s dir e it o s fun dame n t ais s o ciais n o s e e n co n t r a,
de r e gr a, de fin ido n o n v e l da Co n s t it ui o , s e n do , al m dis s o , in de t e r -
min v e l s e m a in t e r v e n o do le gis lado r , de t al s o r t e que e s t e de v e r
dis p o r de uma quas e ab s o lut a lib e r dade de co n fo r ma o n e s t a s e ar a, que ,
p o r s ua v e z, e n glo b a a aut o n o mia p ar a v o lt ar at r s n o que diz co m as
p r p r ias de cis e s , lib e r dade e s t a que , n o e n t an t o , s e e n co n t r a limit ada
p e lo p r in c p io da p r o t e o da co n fian a e p e la n e ce s s idade de jus t ifica o
das me didas r e ducio n is t as 19.
Tal co n ce p o , ao me n o s n o n o s s o s e n t ir , n o p o de me r e ce r aco lh ida,
s o b p e n a de s e o ut o r gar ao le gis lado r o p o de r de dis p o r do co n t e do e s s e n
cial do s dir e it o s fun dame n t ais s o ciais , n o t adame n t e n o que diz co m a s ua
co n cr e t iza o le gis lat iv a, v is t o que n o p lan o da mudan a co n s t it ucio n al
fo r mal j s e dis p e da p r o t e o ( igualme n t e n o ab s o lut a, e mb o r a r e fo r a
da) as s e gur ada p e lo s limit e s r e fo r ma da Co n s t it ui o , t e m t ica que t al
co mo an un ciado aqui n o s e r de s e n v o lv ida. A l m dis s o , s e p ar e ce
co r r e t o afir mar que n o s e p o de r o ut o r gar ao s dir e it o s s o ciais , co m b as e
n o p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o , uma p r o t e o maio r daque la as s e
gur ada ao s de mais dir e it o s fun dame n t ais n o mb it o do s is t e ma co n s t it u
cio n al de limit a o das r e s t r i e s de dir e it o s , t amb m n o s e p o de r admi
t ir , ain da mais quan do s e cuida de o r de m co n s t it ucio n al que r e co n h e ce ao s
dir e it o s s o ciais a s ua co n di o de dir e it o s fun dame n t ais , uma t ut e la e m
p r in c p io me n o r de t ais dir e it o s 20.
19 Es t e o p e n s ame n t o de Migue l A fo n s o Vaz, Lei e reserva de lei. A caus a da le i n a Co n s t it ui o
p o r t ugue s a de 1 9 7 6 , Po r t o , 1 9 9 2 , p . 3 8 3 e s ., co n s ign an do - s e , t o dav ia, que o aut o r n o ch e ga a
co n s ide r ar in e x is t e n t e qualque r man ife s t a o de uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o , j que faz me n o
p r o t e o da co n fian a e n e ce s s idade de uma jus t ifica o p ar a a e di o de me didas r e t r o ce s s iv as n o
mb it o da le gis la o in fr aco n s t it ucio n al. En t r e n s , s e guin do p r e cis ame n t e e s t a lin h a de e n t e n di
me n t o , v. S uzan a de To le do B ar r o s , O principio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade
das leis restritivas de direitos fundamentais, B r as lia: B r as lia Jur dica, 1 9 9 6 , p . 1 6 3 , p ar a que m a ad
mis s o de um p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o s o cial, e n t e n dido co mo uma gar an t ia do s dir e it o s
s o ciais p e r an t e a le i co n flit a co m o p r in c p io da aut o n o mia do le gis lado r , uma v e z que o n v e l de
de t e r min a o co n s t it ucio n al de s s e s dir e it o s p ar e ce s e r n e n h um''.
20 N o s e n t ido de uma t ut e la e m r e gr a me n o r do s dir e it o s s o ciais e m r e la o ao s dir e it o s , lib e r dade s
e gar an t ias , p e lo me n o s n o mb it o do dir e it o co n s t it ucio n al p o s it iv o de Po r t ugal, v ., p o r t o do s , Jo s
Car lo s Vie ir a de A n dr ade , Os direitos fundamentais na Constituio portuguesa de 1976,3 . e d., Co imb r a:
A lme din a, 2 0 0 4 , p . 4 0 6 e s.
85
D a me s ma fo r ma, n o h co mo aco lh e r p e lo me n o s n o in t e gr al
me n t e ( de mo do e s p e cial n o que diz co m a e x clus o da p o s s ib ilidade de s e
in v o car uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o ) a t e s e s us t e n t ada e n t r e n s p o r
Ro ge r S t ie fe lman n L e al, que ch e ga a admit ir e m face da in cap acidade
de o Po de r Pb lico at e n de r s de man das n a e s fe r a s o cial, is t o , n o mb it o
do s limit e s p o s t o s p e la r e s e r v a do p o s s v e l a p o s s ib ilidade de uma t o t al
s up r e s s o de uma de t e r min ada le gis la o co n cr e t izado r a de dir e it o s s o ciais
o u a s us p e n s o de p o l t icas p b licas n a e s fe r a da p r o t e o s o cial21. Tal
as p e ct o , p o r guar dar r e la o t amb m co m o p r o b le ma do s limit e s de uma
p r o ib i o de r e t r o ce s s o , v o lt ar a s e r ab o r dado mais adian t e , e s p e cificada-
me n t e n o que diz co m a r e le v n cia do as s im de s ign ado m n imo e x is t e n cial
e da dign idade da p e s s o a h uman a co mo cr it r io s mat e r iais p ar a a afe r i o
da le git imidade de me didas r e t r o ce s s iv as .
Co m e fe it o , e m s e admit in do uma aus n cia de v in cula o m n ima do
le gis lado r ( as s im co mo do s r go s e s t at ais e m ge r al) ao n cle o e s s e n cial j
co n cr e t izado n a e s fe r a do s dir e it o s s o ciais e das imp o s i e s co n s t it ucio n ais
e m mat r ia de jus t i a s o cial, e s t ar - s e - ia ch an ce lan do uma fr aude Co n s
t it ui o , p o is o le gis lado r que , ao le gis lar e m mat r ia de p r o t e o s o cial,
ap e n as e s t a cump r ir um man dame n t o do co n s t it uin t e p o de r ia p ur a e
s imp le s me n t e de s faze r o que fe z n o e s t r it o cump r ime n t o da Co n s t it ui o .
Vale n do - n o s aqui da li o de Jo r ge Mir an da ( que , t o dav ia, admit e uma
p r o ib i o ap e n as r e lat iv a de r e t r o ce s s o ) , o le gis lado r n o p o de s imp le s me n
t e e limin ar as n o r mas ( le gais ) que co n cr e t izam o s dir e it o s s o ciais , p o is is s o
e qiv ale r ia a s ub t r air s n o r mas co n s t it ucio n ais a s ua e fic cia jur dica, j
que o cump r ime n t o de um co man do co n s t it ucio n al acab a p o r co n v e r t e r - s e
e m uma p r o ib i o de de s t r uir a s it ua o in s t aur ada p e lo le gis lado r 22. Em
o ut r as p alav r as , me s mo t e n do e m co n t a que o e s p a o de p r o gn o s e e de ci
s o le gis lat iv o s e ja v ar i v e l, ain da mais n o mar co do s dir e it o s s o ciais e das
co r r e lat as p o l t icas p b licas p ar a a s ua r e aliza o 23, n o s e p o de admit ir
que , e m n o me da lib e r dade de co n fo r ma o do le gis lado r , o v alo r jur dico
21 Cf. Ro ge r S t ie fe lman n L e al, "D ir e it o s s o ciais e a v ulgar iza o da n o o de dir e it o s fun dame n t ais ",
ar t igo e x t r a do da p gin a do Pr o gr ama de Ps - Gr adua o e m D ir e it o da Un iv e r s idade F e de r al do
Rio Gr an de do S ul, ace s s v e l e m <h t t p : / / o r io n .ufr gs .b r / me s t r e dir / do ut r in a/ le al2 .h t m>.
22 Cf. Jo r ge Mir an da, Manual de direito constitucional, Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2000, v. IV, p . 3 9 7
e s .
23 Cf. Cr is t in a Que ir o z, Direitos fundamentais sociais, Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2006, p . 7 5 . D e s e n
v o lv e n do o t p ico n o mb it o da p r o ib i o de r e t r o ce s s o , v., da me s ma aut o r a, O princpio da no re-
versibilidade dos direitosfundamentais sociais, Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 6 , p . 8 3 e s ., cuidan do da
v in cula o do le gis lado r ao s dir e it o s s o ciais .
do s dir e it o s s o ciais as s im co mo a s ua p r p r ia fun dame n t alidade acab e m
s e n do e s v aziado s 24. Tudo s o mado , co n s t at a- s e que t amb m a p r o b le m t ica
da p r o ib i o de r e t r o ce s s o acab a s e n do r e co n duzida ao t e ma da lib e r dade
de co n fo r ma o do le gis lado r ( e m o ut r as p alav r as , da mar ge m de a o le
gis lat iv a) e as p o s s ib ilidade s e o s limit e s de s e u co n t r o le , e m e s p e cial p o r
p ar t e da as s im ch amada jur is di o co n s t it ucio n al, n o mar co do Es t ado
D e mo cr t ico de D ir e it o . ^
^ A l m dis s o , me dian t e a s up r e s s o p ur a e s imp le s do p r p r io n cle o !
s e s s e n cial le gis lat iv ame n t e co n cr e t izado de de t e r min ado dir e it o s o cial ( e s -1
p e cialme n t e do s dir e it o s s o ciais v in culado s ao m n imo e x is t e n cial) , s e r f
v io lada, a de p e n de r da h ip t e s e , a p r p r ia dign idade da p e s s o a, o que de s
de lo go s e r e v e la co mo s e n do e m ge r al in admis s v e l. D e qualque r s o r t e ,
cuida- s e de as p e ct o que v o lt ar a s e r de s e n v o lv ido lo go adian t e , v is t o que
co n s t it ui p o n t o ce n t r al do p r e s e n t e e s t udo e que diz r e s p e it o ao alcan ce
( limit e s e p o s s ib ilidade s ) da p r o ib i o de r e t r o ce s s o .
S e n do p o s s v e l, v is t a do e x p o s t o , co n s ide r ar co mo in co n s is t e n t e s as
t e s e s que n e gam a p o s s ib ilidade de r e co n h e cime n t o de um p r in c p io da
p r o ib i o de r e t r o ce s s o , p e lo me n o s n o s e n t ido da n e gat iv a de uma v in cu
la o do le gis lado r que o imp e a de s up r imir o u e s v aziar uma p r v ia co n
cr e t iza o de dir e it o s s o ciais , da n o r e s ult a aut o mat icame n t e uma de t e r
min ada jus t ificat iv a ( fun dame n t a o ) jur dico - co n s t it ucio n al de um p r in
c p io ( o u gar an t ia) da p r o ib i o de r e t r o ce s s o . Re t o man do aqui a t e n t at iv a
de co n s t r uir uma ar gume n t a o s uficie n t e me n t e r o b us t a e co n s t it ucio n al
me n t e ade quada p ar a o r e co n h e cime n t o de um p r in c p io de p r o ib i o do
r e t r o ce s s o t amb m n a o r de m jur dico - co n s t it ucio n al b r as ile ir a, co lh e - s e a
li o de L u s Ro b e r t o B ar r o s o , que , ade r in do e v o lu o do ut r in r ia p r e ce
de n t e , r e p r e s e n t a o e n t e n dime n t o que h o je ap ar e n t e me n t e do min a o
n o s s o ce n r io jur dico . Co mo b e m av e r b a o co n s t it ucio n alis t a car io ca, p o r
e s t e p r in c p io , que n o e x p r e s s o , mas de co r r e do s is t e ma jur dico - co n s -
t it ucio n al, e n t e n de - s e que s e uma le i, ao r e gulame n t ar um man dame n t o
co n s t it ucio n al, in s t it uir de t e r min ado dir e it o , e le s e in co r p o r a ao p at r imn io
jur dico da cidadan ia e n o p o de s e r ab s o lut ame n t e s up r imido 25. Em lin h as
ge r ais , o que s e p e r ce b e que a n o o de p r o ib i o de r e t r o ce s s o s e gue
s e n do e m p ar t e r e co n duzida, co mo j fr is ado acima, n o o que Jo s
24 Cf. Jo r ge Re is N o v ais , Direitosfundamentais: t r un fo s co n t r a a maio r ia, cit , p . 1 9 0 .
25 Cf L u s Ro b e r t o B ar r o s o , O direito constitucional e a efetividade de suas normas, 5 . e d., Rio de Jan e i
r o : Re n o v ar , 2 0 0 1 , p . 1 5 8 .
87
A fo n s o da S ilv a ap r e s e n t a co mo s e n do de um dir e it o s ub je t iv o n e gat iv o , n o
s e n t ido de que p o s s v e l imp ugn ar judicialme n t e t o da e qualque r me dida
que s e e n co n t r e e m co n flit o co m o t e o r da Co n s t it ui o ( in clus iv e co m o s
o b je t iv o s e s t ab e le cido s n as n o r mas de cun h o p r o gr am t ico ) , b e m co mo
r e ch a ar me didas le gis lat iv as que v e n h am, p ur a e s imp le s me n t e , s ub t r air
s up e r v e n ie n t e me n t e a uma n o r ma co n s t it ucio n al o gr au de co n cr e t iza o
an t e r io r que lh e fo i o ut o r gado p e lo le gis lado r 26. Em s uma, r e it e r an do aqui
a li o de Go me s Can o t ilh o e Vit al Mo r e ir a, as n o r mas co n s t it ucio n ais que
reconhecem direitos sociais de carter |>usii iu> implicam Lima proibi^au de
retrocesso. |;i que~"um vez dada saTisla ao direito, esle se iranslorma.
<( ) nessa medida, em direito negativo, ou direito de delesa, isto , niirn direi-
pC / to a que o r.slado se abslenlia de atentar ctmira ele ~.
A p ar t ir de s s a p e r s p e ct iv a e r e n un cian do de s de lo go ao e s go t ame n t o
e ap r o fun dame n t o in div idualizado de t o do o le que de r aze s p as s v e is de
s e r r e fe r idas , v e r ifica- s e que , n o mb it o do dir e it o co n s t it ucio n al b r as ile ir o ,
o p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o ( n a s ua dime n s o mais e s t r it a aqui
v e r s ada) de co r r e co mo j s in alizado de mo do imp l cit o do s is t e ma
co n s t it ucio n al28, de s ign adame n t e do s s e guin t e s p r in c p io s e ar gume n t o s de
mat r iz jur dico - co n s t it ucio n al, o que n o v ale dize r in s is t a- s e ! que a
p r o ib i o de r e t r o ce s s o s e co n fun da co m t ais in s t it ut o s o u me s mo que
de le s de co r r a e x clus iv ame n t e , ain da mais quan do co n s ide r ado s de mo do
is o lado .
a) D o p r in c p io do Es t ado D e mo cr t ico e S o cial de D ir e it o , que imp e
a man ut e n o de um p at amar m n imo t an t o e m t e r mo s de p r o t e o s o cial
quan t o e m t e r mo s de s e gur an a jur dica, o que n e ce s s ar iame n t e , e n t r e
o ut r o s as p e ct o s , ab r an ge a gar an t ia do m n imo e x is t e n cial, as s im co mo a
p r o t e o da co n fian a e a man ut e n o de ce r t a co n t in uidade da o r de m
26 N e s s e s e n t ido , ap o n t a- s e , e n t r e o ut r o s , al m do j r e fe r ido e n t e n dime n t o de L u s Ro b e r t o B ar r o
s o , a li o j cl s s ica ( man t ida e m e di e s mais r e ce n t e s de s ua o b r a) de Jo s A fo n s o da S ilv a, Apli
cabilidade das normas constitucionais, cit , p . 1 4 7 e 1 5 6 e s .; Jo r ge Mir an da, Manual de direito constitu
cional, cit ., v. IV, p . 391-399; L e n io L uiz S t r e ck, Hermenutica jurdica e(m) crise, cit ., p . 8 1 e s .; as s im
co mo A n a Paula de B ar ce llo s , A eficcia dos princpios constitucionais, cit , p . 6 8 e s ., que s us t e n t a
t r at ar - s e de um de s do b r ame n t o de uma e fic cia n e gat iv a do s p r in c p io s co n s t it ucio n ais . Jo s Vice n
t e do s S . Me n do n a, Vedao do retrocesso, cit ., p . 2 1 8 e s ., muit o e mb o r a s in alan do que n o s e t r at a
de uma que s t o ap e n as at r e lada e fic cia n e gat iv a das n o r mas co n s t it ucio n ais .
27 Cf. Jo s Jo aquim Go me s Can o t ilh o e Vit al Mo r e ir a, Fundajnentos da Constituio, Co imb r a: Co im
b r a Edit o r a, 1 9 9 1 , p . 1 3 1 .
28 N e s s e s e n t ido t amb m F e lip e D e r b li} O princpio da proibio de retrocesso social, cit ., p . 1 9 9 e s .,
igualme n t e ado t an do a co n ce p o de que s e cuida de um p r in c p io imp l cit o e b e m de s e n v o lv e n do o
p o n t o .
88
jur dica, al m de uma s e gur an a co n t r a me didas r e t r o at iv as e , p e lo me n o s ,
de t al fo r ma, co n t r a at o s de cun h o r e t r o ce s s iv o ain da que de e fe it o s
p r o s p e ct iv o s de mo do ge r al.
b ) D o p r in c p io da dign idade da p e s s o a h uman a que , e x igin do a
s at is fa o p o r me io de p r e s t a e s p o s it iv as ( e , p o r t an t o , de dir e it o s
fun dame n t ais s o ciais ) de uma e x is t n cia co n dign a p ar a t o do s , t e m
co mo e fe it o , n a s ua p e r s p e ct iv a n e gat iv a, a in v iab ilidade de me didas que
fique m aqu m de s s e p at amar 29. Emb o r a o co n t e do da dign idade da p e s s o a
h uman a do s dir e it o s fun dame n t ais n o p o s s a, ain da mais n o cas o b r as ile i
r o ( e mfun o da amp lit ude e h e t e r o ge n e idade do cat lo go co n s t it ucio n al
de dir e it o s e gar an t ias ) , s e r p ur a e s imp le s me n t e e quip ar ada ao co n t e do
e s s e n cial do s dir e it o s fun dame n t ais , ce r t o que t an t o a dign idade da p e s
s o a h uman a quan t o o n cle o e s s e n cial o p e r am co mo limit e do s limit e s ao s
dir e it o s fun dame n t ais , b lin dan do t ais co n t e do s ( dign idade e / o u n cle o
e s s e n cial) e m face de me didas r e s t r it iv as , o que s e ap lica, e m t e r mo s ge r ais ,
t an t o ao s dir e it o s s o ciais quan t o ao s de mais dir e it o s fun dame n t ais .
c) D o p r in c p io ( e de v e r ) da m x ima e fic cia e e fe t iv idade das n o r mas
de fin ido r as de dir e it o s fun dame n t ais , r e fo r ado p e la n o r ma co n t ida n o ar t .
5 ", l 2 , da CF / 8 8 e que n e ce s s ar iame n t e ab r an ge t amb m a max imiza o
da p r o t e o do s dir e it o s fun dame n t ais , e x igin do um s is t e ma de t ut e la
is e n t o de lacun as .
d) A s man ife s t a e s e s p e c ficas e e x p r e s s ame n t e p r e v is t as n a Co n s
t it ui o , n o que diz co m a p r o t e o co n t r a me didas de cun h o r e t r o at iv o ( n a
qual s e e n quadr a a p r o t e o do s dir e it o s adquir ido s , da co is a julgada e do
at o jur dico p e r fe it o ) , n o do co n t a do un iv e r s o de s it ua e s que in t e gr am
a n o o mais amp la de s e gur an a jur dica, que , de r e s t o , e n co n t r a fun da
me n t o dir e t o n o ar t . 5, caput, da n o s s a L e i F un dame n t al e n o p r in c p io do
Es t ado S o cial e D e mo cr t ico de D ir e it o .
e ) O p r in c p io da p r o t e o da co n fian a, n a co n di o de e le me n t o
n ucle ar do Es t ado de D ir e it o ( j e m fun o de s ua n t ima co n e x o co m a
p r p r ia s e gur an a jur dica) , imp e ao s r go s e s t at ais in clus iv e ( mas n o
e x clus iv ame n t e ) co mo e x ign cia da b o a- f n as r e la e s co m o s p ar t icular e s
o r e s p e it o p e la co n fian a de p o s it ada p e lo s in div duo s e m r e la o a um
29 A de r in do a t al e n t e n dime n t o e e n fat izan do a r e la o e n t r e o p r in c p io da dign idade da p e s s o a
h uman a e o da p r o ib i o de r e t r o ce s s o s o cial, v., mais r e ce n t e me n t e , D ay s e Co e lh o de A lme ida, A
fun dame n t alidade do s dir e it o s s o ciais e o p r in cip io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o , in : Incluso social, n .
1 , o ut . 2 0 0 6 / mar . 2 0 0 7 , v . 2 , p . 1 1 8 - 1 2 4 ,
89
de t e r min ado n v e l de e s t ab ilidade e co n t in uidade da o r de m jur dico - o b je t i-
v a, as s im co mo do s dir e it o s s ub je t iv o s at r ib u do s s p e s s o as . A p r o t e o da
co n fian a, p o r t an t o , at ua me n o s n o s e n t ido de um fun dame n t o da p r o ib i o
de r e t r o ce s s o do que co mo cr it r io aux iliar p ar a s ua ade quada ap lica o .
Co m e fe it o , p ar e ce e v ide n t e que o s r go s e s t at ais , in clus iv e ( mas n o s ! )
p o r fo r a da s e gur an a jur dica e da p r o t e o co n fian a, e n co n t r am- s e
v in culado s n o ap e n as s imp o s i e s co n s t it ucio n ais n o mb it o da s ua
co n cr e t iza o n o p lan o in fr aco n s t it ucio n al, mas de v e m o b s e r v ar ce r t o gr au
de v in cula o e m r e la o ao s p r p r io s at o s j p r at icado s 30. Tal o b r iga o ,
p o r s ua v e z, alcan a t an t o o le gis lado r quan t o o s at o s da admin is t r a o e ,
e m ce r t a me dida, o s r go s jur is dicio n ais , as p e ct o que , t o dav ia, car e ce de
maio r de s e n v o lv ime n t o do que o p e r mit ido p e lo s limit e s do p r e s e n t e e s t udo .
f) A l m do e x p o s t o , co n s t at a- s e que n e gar r e co n h e cime n t o ao p r in
c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o s ign ificar ia, e m lt ima an lis e , admit ir que
o s r go s le gis lat iv o s ( as s im co mo o Po de r Pb lico de mo do ge r al) , a de s
p e it o de e s t ar e m in que s t io n av e lme n t e v in culado s ao s dir e it o s fun dame n t ais
e s n o r mas co n s t it ucio n ais e m ge r al, dis p e m do p o de r de t o mar liv r e me n
t e s uas de cis e s me s mo e m flagr an t e de s r e s p e it o v o n t ade e x p r e s s a do
co n s t it uin t e 31. Co m e fe it o , co mo b e m le mb r a L u s Ro b e r t o B ar r o s o , me
dian t e o r e co n h e cime n t o de uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o e s t a s e imp e dir
a fr us t r a o da e fe t iv idade co n s t it ucio n al, j que , n a h ip t e s e de o le gis la
do r r e v o gar o at o que de u co n cr e t ude a uma n o r ma p r o gr am t ica o u t o mo u
v i v e l o e x e r c cio de um dir e it o , e s t ar ia acar r e t an do um r e t o mo s it ua o
30 Cf., de n t r e o ut r o s , Har mut Maur e r , Ko n t in uit t s ge wh r un d Ve r t r aue n s s ch ut z, in : Jo s e f Is e n s e e /
Paul Kir ch h o f ( o r g.) , Handbuch des Staatsrechts derBundesrepublik Deutschland, v. III, p . 2 4 4 e s ., n o
o b s t an t e o aut o r as s im co mo a do ut r in a e a jur is p r udn cia e m ge r al s e ja b as t an t e r e s t r it iv o
n o que diz co m a admis s o de uma aut o v in cula o do le gis lado r , t e m t ica que aqui n o de s e n v o lv e
r e mo s , mas que t e m s ido o b je t o de ce r t a dis cus s o n a A le man h a, s o b a r ub r ica de uma v in cula o
s is t mica do le gis lado r , de s e n v o lv ida e s s e n cialme n t e luz do p r in c p io da igualdade . N e s s e s e n t ido ,
v ., e n t r e o ut r o s , Uwe Kis ch e l, "S y s t e mb in dun g de s Ge s e t zge b e r s un d Gle ich h e it s s at z , in : Archiv
des iiffentlichen Rechts, 1 9 9 9 , v . 1 2 4 , p . 1 7 4 - 2 11. En t r e n s , co n fir a- s e , s o b r e a p r o t e o da co n fian a
n o D ir e it o Pb lico , o p ar adigm t ico co n t r ib ut o de A lmir o do Co ut o e S ilv a, "O p r in c p io da s e gu
r an a jur dica ( p r o t e o co n fian a) n o dir e it o p b lico b r as ile ir o e o dir e it o da admin is t r a o p
b lica de an ular o s s e us p r p r io s at o s admin is t r at iv o s : o p r azo de cade n cial do ar t . 5 4 da le i do p r o
ce s s o admin is t r at iv o da Un io ( L e i n . 9 .7 8 4 / 9 9 ) , Revista de Direito Administrativo, n . 2 3 7 , Rio de
Jan e ir o , jul./ s e t . 2 0 0 4 ; mais r e ce n t e me n t e , v., t amb m, a mo n o gr afia de Rafae l Maffin i, Princpio da
proteo substancial da confiana no direito administrativo brasileiro, Po r t o A le gr e : Ve r b o Jur dico , 2 0 0 6 .
31 Tal p o n t o de v is t a ap e n as p o de r ia s e r s us t e n t ado , e m t e s e , e m s e p ar t in do da p r e mis s a de que o s
dir e it o s s o ciais n o p o de m ( me s mo n o que diz co m s e u co n t e do e s s e n cial) s e r de fin ido s e m n v e l
co n s t it ucio n al, a e x e mp lo do que p ar e ce p r o p o r Man ue l A fo n s o Vaz, hei e reserva de lei, cit ., p . 3 8 3 - 4 ,
mas que co n t r ar ia at me s mo a lgica do s is t e ma jur dico - co n s t it ucio n al, n o t adame n t e co m r e la o
fun o co n cr e t izado r a e x e r cida p e lo le gis lado r e de mais r go s e s t at ais .
90
de o mis s o ( in co n s t it ucio n al, co mo p o de r amo s acr e s ce n t ar ) an t e r io r 32.
Pr e cis ame n t e n e s t e co n t e x t o in s e r e - s e a t amb m ar gume n t a o de duzida
p e lo s v o t o s co n dut o r e s ( e s p e cialme n t e do e n t o Co n s e lh e ir o Vit al Mo r e i
r a) do j r e fe r ido leading case do Tr ib un al Co n s t it ucio n al de Po r t ugal, que
v e r s a s o b r e o S e r v i o N acio n al de S ade , e s us t e n t a que as t ar e fas co n s
t it ucio n ais imp o s t as ao Es t ado , e m s e de de dir e it o s fun dame n t ais n o
s e n t ido de cr iar ce r t as in s t it ui e s o u s e r v i o s , n o o o b r igam ap e n as a
cr i - lo s , o b r igam t amb m a n o ab o li- lo s uma v e z cr iado s ", aduzin do que
ap s t e r e man ado uma le i r e que r ida p e la Co n s t it ui o p ar a r e alizar um
dir e it o fun dame n t al, in t e r dit o ao le gis lado r r e v o gar e s t a le i, r e p o n do o
e s t ado de co is as an t e r io r . D a s e e x t r ai, n a lin h a de p e n s ame n t o do aut o r ,
que as in s t it ui e s , o s s e r v i o s o u o s in s t it ut o s jur dico s , uma v e z cr iado s
p e la le i o u p o r at o da admin is t r a o p b lica, co m o in t uit o de co n cr e t izar a
p r o t e o e a p r o mo o de dir e it o fun dame n t al o u fin alidade co n s t it ucio n al,
p as s am a t e r a s ua e x is t n cia co n s t it ucio n alme n t e gar an t ida, de t al s o r t e que
uma n o v a le i p o de v ir a alt e r - lo s o u r e fo r m - lo s n o s limit e s co n s t it ucio n al
me n t e admit ido s , mas n o p o de , p ur a e s imp le s me n t e , r e v o g - lo s .
g) Os ar gume n t o s e s gr imido s r e s t am e n r o b us t e cido s p o r um fun da
me n t o adicio n al e x t r a do do dir e it o in t e r n acio n al, n o t adame n t e n o p lan o
do s dir e it o s e co n mico s s o ciais e cult ur ais . Co m e fe it o , de aco r do co m
ar gut a o b s e r v a o de Vict o r A b r amo v ich e Ch r is t ian Co ur t is 33, b e m r e t o
mada, e n t r e n s , p o r A n dr de Car v alh o Ramo s 34, que s us t e n t a que o s is
33 Cf. L u s Ro b e r t o B ar r o s o , O direito constitucional e a efetividade de suas normas, cit ., p . 1 5 8 - 1 5 9 .
N e s s e co n t e x t o , as s ume r e le v n cia a co n t r o v r s ia a r e s p e it o do s limit e s do co n t r o le da at iv idade
le gis lat iv a p e lo Po de r Judici r io , v in culada, p o r s ua v e z, que s t o da le git imidade do s r go s jur is -
dicio n ais p ar a t al co n t r o le , t e m t ica que e v ide n t e me n t e aqui n o p o de r ia s e r de s e n v o lv ida e s o b r e a
qual e x is t e v as t a e qualificada do ut r in a n acio n al e e s t r an ge ir a.
33 Cf. Vict o r A b r amo v ich e Ch r is t ian Co ur t is , Los derechos sociales como derechos exigibles, Madr id:
Tr o t t a, 2 0 0 2 , p . 9 2 e s . A p r o fun dan do o t e ma, co m de s t aque p ar a o dir e it o in t e r n acio n al e co mp a
r ado , v ., ain da, Ch r is t ian Co ur t is , "L a p r o h ib icin de r e gr e s iv idad e n mat r ia de de r e ch o s s o ciale s :
ap un t e s in t r o duct o r io s ", in : Ch r is t ian Co ur t is ( e d.) , Ni unpaso atrs, cit ., p . 5 - 5 2 , al m do s de mais
e n s aio s co n s t an t e s da co le t n e a, de s t acan do - s e o s t r ab alh o s de Julie t a Ro s s i ( p . 7 9 - 1 1 6 ) e Magdale -
n a S e p lv e da ( p . 1 1 7 - 1 5 2 ) , amb o s v e r s an do s o b r e a jur is p r udn cia do Co mit de D ir e it o s S o ciais ,
Eco n mico s e Cult ur ais , e de Magdale n a S e p lv e da, p o r t an t o , co m e s p e cial at e n o p ar a a p e r s p e c
t iv a in t e r n acio n al.
34 Cf. A n dr de Car v alh o Ramo s , Teoria geral dos direitos humanos na ordem internacional, Rio de Ja
n e ir o : Re n o v ar , 2 0 0 5 , p . 2 4 3 e s.; t amb m A le s s an dr a Go t t i B o n t e mp o , Direitos sociais: eficcia e
acionabilidade luz da Constituio de 1988, Cur it ib a: Jur u , 2 0 0 5 , e s p e cialme n t e p . 2 2 5 e s . b e m
s us t e n t a uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o s o cial igualme n t e in v o can do as li e s de A b r amo v ich e Co ur
t is , n o t adame n t e n o que diz co m o ar gume n t o ligado ao de v e r ( in t e r n acio n al e co n s t it ucio n al) de
imp lan t a o p r o gr e s s iv a do s dir e it o s s o ciais . Po r lt imo , e n fat izan do t amb m e s t e fun dame n t o , v.
Pab lo Cas t r o Mio zzo , O princpio da proibio de retrocesso social e a dupla vinculao do estado ao dever
91
t e ma de p r o t e o in t e r n acio n al imp e a p r o gr e s s iv a co n cr e t iza o da p r o
t e o s o cial p o r p ar t e do s Es t ado s , e n co n t r a- s e imp licit ame n t e v e dado o
r e t r o ce s s o e m r e la o ao s dir e it o s s o ciais j co n cr e t izado s .
h j) A l m do s fun dame n t o s p o s s v e is j e x p o s t o s , h que m p r e t e n da
e x t r air a p r o ib i o de r e t r o ce s s o , n o p lan o de s ua fun dame n t a o jur dico -
- co n s t it ucio n al, do s o b je t iv o s fun dame n t ais da Re p b lica, e n un ciado s n o
ar t . 3- da Co n s t it ui o de 1 9 8 8 35. Tal p r o p o s t a, e mb o r a co r r e t ame n t e , co mo
t amb m n s j ap o n t amo s , v in cule a p r o ib i o de r e t r o ce s s o n o ap e n as
ao s dir e it o s fun dame n t ais s o ciais , mas t amb m a t o das as n o r mas co n s t i
t ucio n ais imp o s it iv as de o b je t iv o s , p r o gr amas e t ar e fas r e le v an t e s p ar a a
co n s e cu o da jus t i a s o cial e de uma e x is t n cia dign a p ar a o s cidado s
( aqui t amb m a r e le v n cia do ar t . 1 7 0 da Co n s t it ui o ) , r e v e la- s e falh a
cas o p r e t e n da o fe r e ce r um fun dame n t o co n s t it ucio n al e x clus iv o o u me s mo
p r e p o n de r an t e p r o ib i o de r e t r o ce s s o s o cial. D o co n t r r io , p o de r ia le v ar
co n clus o de que o s dir e it o s s o ciais ( que n o p o de m s e r e quip ar ado s ,
ain da mais n o s is t e ma co n s t it ucio n al b r as ile ir o , s n o r mas co n s t it ucio n ais
imp o s it iv as de p r o gr amas e t ar e fas ) e n co n t r am s ua t ut e la as s e gur ada de
o ut r a man e ir a, n o e s t an do s e que r s uje it o s a uma p r o t e o me dian t e a
p r o ib i o de r e t r o ce s s o , p o r e x e mp lo , p o r me io da ap lica o do r e gime de
co n t r o le de r e s t r i e s p r at icado p ar a o s de mais dir e it o s fun dame n t ais , n a
lin h a do que s uge r e Jo r ge Re is N o v ais , r e fe r ido acima.
A p ar t ir do e x p o s t o , v e r ifica- s e que a p r o ib i o de r e t r o ce s s o , me s mo
n a ace p o mais e s t r it a aqui e n fo cada, t amb m r e s ult a dir e t ame n t e do
p r in c p io ( e do de v e r ) de max imiza o da e fic cia e e fe t iv idade de ( t o das )
as n o r mas de dir e it o s fun dame n t ais . Po r v ia de co n s e qn cia, o ar t . 5 ,
l 2, da n o s s a Co n s t it ui o , e mb o r a e m p r ime ir a lin h a co n t e n h a uma n o r ma
imp o s it iv a de um de v e r de ap lica o dir e t a das n o r mas de dir e it o s fun da
me n t ais , s e r v e t amb m de fun dame n t o p ar a um de v e r de max imiza o do
que t amb m de s ign amo s de uma e fic cia p r o t e t iv a do s dir e it o s fun da
me n t ais . Is s o s e r e fle t e n o ap e n as n o camp o da p r o t e o co n t r a a at ua o
do p o de r de r e fo r ma co n s t it ucio n al ( n e s t e cas o dir e t ame n t e r e fe r ido ao ar t .
6 0 da Co n s t it ui o F e de r al, que dis p e a r e s p e it o do s limit e s fo r mais e
mat e r iais s e me n das co n s t it ucio n ais ) , mas t amb m n o que diz r e s p e it o ao
de concretizar os direitos fundamentais: uma an lis e h e r me n ut ica, mo n o gr afia ap r e s e n t ada n o mb it o
da e s p e cializa o e m dir e it o s h uman o s , UF RGS , 10- 8- 2008, p . 7 4 e s ,
3,3 N e s s e s e n t ido , p o r e x e mp lo , Pab lo Cas t r o Mio zzo , princpio da proibio de retrocesso social, cit .,
p . 5 2 e s ., e mb o r a s e m de ix ar de r e fe r ir o ut r o s fun dame n t o s r e le v an t e s e ade quado s do p r in c p io n a
o r de m co n s t it ucio n al b r as ile ir a.
le gis lado r o r din r io e ao s de mais r go s e s t at ais , que , p o r t an t o , al m de
e s t ar e m in cumb ido s de um de v e r p e r man e n t e de de s e n v o lv ime n t o e co n
cr e t iza o e ficie n t e do s dir e it o s fun dame n t ais ( in clus iv e e , n o mb it o da
t e m t ica v e r s ada, de mo do p ar t icular o s dir e it o s s o ciais ) , n o p o de m e m
qualque r h ip t e s e s up r imir o u me s mo r e s t r in gir de mo do de mas iada
me n t e in v as iv o ( n o t adame n t e , p o r in v adir o n cle o e s s e n cial) o dir e it o
fun dame n t al, o u me s mo at e n t ar co n t r a as e x ign cias da p r o p o r cio n alidade .
S e e m fav o r do r e co n h e cime n t o de uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o e m
mat r ia de dir e it o s fun dame n t ais n o p ar e ce m s ub s is t ir maio r e s dv idas ,
e mb o r a a r e fe r ida dis cus s o s o b r e a t e r min o lo gia36 e a maio r o u me n o r au
t o n o mia de um p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o e m mat r ia de dir e it o s
s o ciais , j que cada v e z mais is o ladas as v o ze s que s e p o s icio n am co n t r ar ia
me n t e ao in s t it ut o ( ain da mais e m face do e le n co n o e x aus t iv o de
ar gume n t o s co lacio n ado s ) , t amb m v e r dade que h , ain da, co n s ide r v e l
e s p a o p ar a co n t r o v r s ia e m t o r n o da amp lit ude da p r o t e o o ut o r gada p e lo
p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o s o cial. Es t e , co n t udo , o t e ma do p r x i
mo s e gme n t o , n o mb it o do qual v e r s ar e mo s a que s t o da dign idade da
p e s s o a h uman a e do m n imo e x is t e n cial p ar a a s ua gar an t ia mat e r ial.
III Parmetros para aferio do alcance do princpio da
proibio de retrocesso em matria de direitos sociais,
com destaque para a dignidade da pessoa humana e o
assim chamado mnimo existencial
S e p ar e ce co r r e t o ap o n t ar a e x is t n cia de e le v ado gr au de co n s e n s o
( p e lo me n o s n o B r as il, e m algun s Es t ado s , as s im co mo , de mo do ge r al, n a
e s fe r a do dir e it o in t e r n acio n al) quan t o e x is t n cia de uma p r o t e o co n t r a
o r e t r o ce s s o s o cial, igualme n t e ce r t o que t al co n s e n s o ( co mo j fo i le m
b r ado ) ab r an ge o r e co n h e cime n t o de que t al p r o t e o n o p o de as s umir
um car t e r ab s o lut o , n o t adame n t e n o que diz co m a co n cr e t iza o do s
dir e it o s s o ciais a p r e s t a e s . Par a al m de s s e co n s e n s o ( n o s e n t ido de que
e x is t e uma p r o ib i o r e lat iv a de r e t r o ce s s o e m mat r ia de dir e it o s s o ciais ) ,
co n s t at a- s e in t e n s a dis cus s o e m t o r n o da amp lit ude da p r o t e o co n t r a o
r e t r o ce s s o , s e n do s ign ificat iv as as dife r e n as de e n t e n dime n t o r e gis t r adas
36 Cf., p o r e x e mp lo , co n t r o v e r t e Cr is t in a Que ir o z, Direitos fundamentais sociais, cit ., p . 1 0 5 , ao r e fe r ir
que "a e x p r e s s o p r o ib i o do r e t r o ce s s o s o cial n o fe liz.
93
n o mb it o do ut r in r io e jur is p r ude n cial, mas t amb m n a s e ar a das s o lu e s
ado t adas p e lo dir e it o p o s it iv o de cada o r de m jur dica in div idualme n t e
co n s ide r ada. A s s im, ilus t r an do as p r in cip ais t e n dn cias n o que diz co m o
r e co n h e cime n t o de um v alo r jur dico p r o ib i o de r e t r o ce s s o , p o de - s e
p ar t ilh ar do e n t e n dime n t o de que e n t r e uma n e gat iv a t o t al da e fic cia ju
r dica do p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o ( que , ao fim e ao cab o , t e r ia
a fun o de me r a dir e t r iz p ar a o s age n t e s p o l t ico s ) e o o ut r o e x t r e mo , o
que p r o p ugn a uma v e da o cat e gr ica de t o do e qualque r ajus t e e m t e r mo s
de dir e it o s s o ciais , t amb m aqui o me lh o r camin h o o do me io , o u s e ja, o
que imp lica uma t ut e la fo r t e , mas n o ce ga e de s co n t e x t ualizada do s dir e i
t o s fun dame n t ais s o ciais 37.
Que o r e co n h e cime n t o de uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o n o p o de
r e s ult ar n a t r an s fo r ma o do le gis lado r e m r go de me r a e x e cu o das
de cis e s co n s t it ucio n ais e n e m as s e gur ar ( cas o co mp r e e n dida co mo ab s o
lut a v e da o de qualque r alt e r a o o u ajus t e ) ao s dir e it o s fun dame n t ais
s o ciais a p r e s t a e s le gis lat iv ame n t e co n cr e t izado s uma e fic cia mais r e
fo r ada do que a at r ib u da ao s dir e it o s de de fe s a e m ge r al, v is t o que e s t e s
p o de m s e r r e s t r in gido s p e lo le gis lado r , de s de que p r e s e r v ado s e u n cle o
e s s e n cial, j fo i o b je t o de r e fe r n cia, n a e s t e ir a das li e s de Vie ir a de
A n dr ade 38. Co m e fe it o , co mo b e m av e r b a A n dr e as Kr e ll, a ap lica o de
uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o , p o r s i s , n o v e da uma dimin ui o do s dir e i
t o s s o ciais in div iduais p ar a as s e gur ar in t e r e s s e s p b lico s ur ge n t e s e r e le
v an t e s , p o is do co n t r r io p o de r ia le v ar a uma p r o t e o maio r do s dir e it o s
s o ciais e m r e la o ao s dir e it o s de lib e r dade , o u dir e it o s de de fe s a de um
mo do ge r al39. Em s n t e s e , s e uma p o s i o p r e fe r e n cial das lib e r dade s
( Rawls ) h de s e r afas t ada, p e lo me n o s n o s e n t ido de um car t e r me r ame n
t e s e cun d r io do s dir e it o s s o ciais , n o Es t ado D e mo cr t ico de D ir e it o t amb m
n o s e p o de r ia jus t ificar uma p o s i o p r e fe r e n cial do s dir e it o s s o ciais , t e ma
que , e v idn cia, me r e ce maio r r e fle x o do que aqui s e p o de o fe r e ce r .
A li s , b as t ar ia e s t a lin h a ar gume n t at iv a p ar a r e co n h e ce r ( ain da que
n o B r as il n o s e p o s s a aco lh e r a t e s e de um r e gime jur dico dife r e n ciado e
r e fo r ado do s dir e it o s de de fe s a) que n o s e p o de e n car ar a p r o ib i o de
37 N e s s e s e n t ido , v. Ro dr igo Up r imn y e D ian a Guar n izo , "Es p o s ib le un a do gm t ica ade cuada s o b r e
Ia p r o h ib icin de r e gr e s iv idad? Un e n fo que de s de la jur is p r udn cia co n s t it ucio n al co lo mb ian a", in :
Direitos Fundamentais & Justia, n . 3 , an o 2 , ab r ./ jun . 2 0 0 8 , e s p e cialme n t e p . 4 0 e s .
38 Cf. Jo s Car lo s Vie ir a de A n dr ade , Os direitos fundamentais, cit ., p . 3 9 1 e s .
39 Cf. A n dr e as Kr e ll, Direitos sociais e controle judicial no Brasil e na Alemanha, cit ., p . 4 0 .
94
retrocesso como tendo a natureza de uma regra de cunho absoluto40, j que,
consoante apontado, no apenas a reduo da arivirladp Wklativa pyp-
cuo pura e simples da (Jonstituio se revela insustentvel, mas tambm
pelo fato de que esta soluo radical, caso tida como aceitvel, acabaria por
conduzir a uma espcie de transmutao das normas infraconstitucionais
em direito constitucional, alm de inviabilizar o prprio desenvolvimento
deste41. Ademais, resulta evidente que a admisso de uma vedao absolu
ta de retrocesso especialmente no sentido estrito aqui versado ine
xoravelmente culminaria com a procedncia das crticas formuladas pelos
seus adversrios.
F e it o e s t e r e gis t r o , n o s e n t ido da afir ma o de que a p r o ib i o de
r e t r o ce s s o as s ume ( co mo p ar e ce t e r s ido s uficie n t e me n t e fun dame n t ado )
fe i e s de v e r dade ir o p r in c p io co n s t it ucio n al fun dame n t al imp l cit o , que
p o de s e r r e co n duzido t an t o ao p r in c p io do Es t ado de D ir e it o ( p o r e x e mp lo ,
dada a s ua v in cula o co m a p r o p o r cio n alidade e a p r o t e o da co n fian a
e da e s t ab ilidade das r e la e s jur dicas in e r e n t e s s e gur an a jur dica)
quan t o ao p r in c p io do Es t ado S o cial, n a co n di o de gar an t ia da man u
t e n o do s gr aus m n imo s de s e gur an a s o cial alcan ado s , s e n do , afin al de
co n t as , co r o l r io da m x ima e fic cia e e fe t iv idade das n o r mas de dir e it o s
fun dame n t ais s o ciais e do dir e it o s e gur an a jur dica, as s im co mo da
p r p r ia dign idade da p e s s o a h uman a. C4
vP
Re s t a, co n t udo , av aliar o mais dif cil, qual s e ja, co mo de v e o co r r e r o
co n t r o le da limit a o da ap lica o da p r o ib i o de r e t r o ce s s o . Po r o ut r o
laao 7 co mo t al as p e ct o diz r e s p e it o a um co n jun t o s ign ificat iv o de que s t e s
d alt a r e le v n cia, que , p o r s ua v e z, dialo gam muit o fo r t e me n t e co m o s
e le me n t o s do s is t e ma jur dico - co n s t it ucio n al ge r al de p r o t e o do s dir e it o s
fun dame n t ais , s e r a dada p n t r r idade ao p ap e l da dign idade da p e s s o a h u
man a e do as s im de s ign ado dir e it o ( e gar an t ia) de um m n imo e x is t e n cial
p ar a uma v ida dign a, n a co n di o de cr it r io s mat e r iais p ar a afe r i o da
in cidn cia, o u n o , da p r o ib i o de r e t r o ce s s o ^
Em p r ime ir a lin h a, an t e s de ade n t r ar mo s o e x ame da dign idade da
p e s s o a h uman a, imp e n de de s t acar a o r ie n t a o do ut r in r ia e jur is p r ude n -
40 N e s s e s e n t ido , v. t amb m, e n t r e n s , a r e fle x o de Pat r cia do Co ut o Ville la A b b ud Mar t in s , A
p r o ib i o do r e t r o ce s s o s o cial co mo fe n me n o jur dico , in : Eme r s o n Gar cia ( co o r d.) , A efetividade
dos direitos sociais, Rio de Jan e ir o : L ume n Jur is , 2 0 0 4 , p . 4 0 8 e s .
41 N e s s e s e n t ido , v. t amb m Jo o Caup e r s , Os direitosfundamentais dos trabalhadores e a Constituio,
Co imb r a: A lme din a, 1 9 8 5 , p . 4 4 , que , ap e s ar de fav o r v e l p r o ib i o de r e t r o ce s s o s o cial, co mun ga
o e n t e n dime n t o de que a p r o t e o do s s is t e mas p r e s t acio n ais e x is t e n t e s n o p o de s e r maio r do que
a co n ce dida ao s dir e it o s de lib e r dade ( dir e it o s de de fe s a) .

r
Q,
95
ciai, de aco r do co m a qual qualque r r e du o do alcan ce de um dir e it o s o cial
de v e r , p e lo me n o s prima facie, s e r co n s ide r ada co mo co n s t it uin do uma
v io la o do de v e r de p r o gr e s s iv a r e aliza o do s dir e it o s s o ciais e , p o r t an t o ,
t ida co mo o fe n s a p r o ib i o de r e t r o ce s s o , de t al s o r t e que a r e s t r i o do
co n t e do p r o t e gido de um dir e it o s o cial ap e n as s e r e v e la co n s t it ucio n al
me n t e le g t ima quan do cuidado s ame n t e av aliada p e lo r go e s t at al ( n o mais
das v e ze s , o le gis lado r ) que a p r o mo v e e que s e r e v e la co mo r azo v e l e
p r o p o r cio n al, s e n do me s mo n e ce s s r ia p ar a alcan ar p r o p s it o s co n s t it u
cio n ais r e le v an t e s o u at co ge n t e s 42. Tal o r ie n t a o , co mo s e p e r ce b e s m
e s fo r o , guar da r e la o co m- a- do gm t ica de h - muit o p r at icada n o p lan o
do co n t r o le das r e s t r i e s do s dir e it o s fun dame n t ais e m ge r al, v is t o que
co n dicio n a a lib e r dade de co n fo r ma o do le gis lado r e a dis cr icio n ar ie dade
admin is t r at iv a ao s cr it r io s da p r o p o r cio n alidade e r azo ab ilidade , que b a
lizam t o da e qualque r r e s t r i o de dir e it o fun dame n t al. N e s s e s e n t ido ,
v e r ifica- s e que ( aqui s e m maio r p r e o cup a o n o que diz co m a p r e cis o
t e r min o lgica) a p r o ib i o de r e t r o ce s s o o p e r a co mo e s p cie de limit e do s
limit e s do s dir e it o s fun dame n t ais s o ciais . Po r o ut r o lado o que in clus iv e
ap o n t ado co mo uma das p r in cip ais v an t age n s de s s a me t dica de co n t r o
le das me didas s up r e s s iv as o u r e s t r it iv as de dir e it o s s o ciais , p r e s e r v a- s e
a n e ce s s r ia mar ge m de a o e ade qua o do Po de r Pb lico e m face do s
cmb io s s o ciais e e co n mico s e me s mo n o que diz co m a man ut e n o do
e quil b r io e co e r n cia in t e r n a do s is t e ma jur dico - co n s t it ucio n al, al m de
s e fo me n t ar uma amp la e r e s p o n s v e l de lib e r a o p b lica n o s e n t ido de
jus t ificar a n e ce s s idade do s ajus t e s n o camp o do s dir e it o s s o ciais 43.
Emb o r a n o s e p r e t e n da de s e n v o lv e r aqui, co m a n e ce s s r ia p r o fun
didade , o s as p e ct o s v e n t ilado s , v in culado s ao s cr it r io s da p r o p o r cio n ali
dade e r azo ab ilidade e ao de v e r de jus t ifica o das me didas r e s t r it iv as ,
as s ume - s e co mo co r r e t a, p e lo me n o s e m t e r mo s ge r ais , t al lin h a de e n t e n
dime n t o , at me s mo p e lo fat o de que , co mo j ap o n t amo s n o s n o s s o s e s
cr it o s an t e r io r e s , e m s e cuidan do de co n t r o lar a at ua o do Po de r Pb lico
r e s ult an t e e m r e s t r i e s de dir e it o s fun dame n t ais s o ciais , n o s e p o de r ia
aqui de ix ar de o p e r ar co m o s co r r e lat o s cr it r io s p ar a o co n t r o le de t ais
r e s t r i e s , ain da que co m a e v e n t ualme n t e n e ce s s r ia ade qua o ao r e gime
e p e culiar idade s do s dir e it o s s o ciais .
42 Cf., p o r t o do s , Ro dr igo Up r imn y e D ian a Guar n izo , Direitos fundamentais&justia, cit ., p . 4 4 e s.
43 S o b r e o t p ico , v. t amb m Ro dr igo Up r imn y e D ian a Guar izo , Direitosfundamentais&justia, cit .,
p . 55 e s ., luz de div e r s o s e x e mp lo s e x t r a do s da r ica jur is p r udn cia co n s t it ucio n al co lo mb ian a.
96
D e o ut r a p ar t e , t amb m p e r ce p t v e l que r e duzir a p r o ib i o de r e
t r o ce s s o a um co n t r o le da r azo ab ilidade e p r o p o r cio n alidade , as s im co mo
de uma ade quada jus t ifica o das me didas r e s t r it iv as , p o de r n o s e r o
s uficie n t e , ain da mais s e ao co n t r o le da p r o p o r cio n alidade n o fo r agr e ga
da a n o o de que qualque r me dida r e s t r it iv a de v e r p r e s e r v ar o n cle o ( o u
co n t e do e s s e n cial) do dir e it o fun dame n t al afe t ado . E p r e cis ame n t e aqui
que a dign idade da p e s s o a h uman a e o de s ign ado m n imo e x is t e n cial ( as s im
co mo a gar an t ia do n cle o e s s e n cial do s dir e it o s ) as s ume m p ar t icular r e
le v n cia, t al co mo t e m ap o n t ado r e le v an t e do ut r in a e jur is p r udn cia.
Co m e fe it o , ade n t r an do a p r o b le m t ica ce n t r al de s t e t e x t o , co lacio n a- s e
li o de Go me s Can o t ilh o , a s us t e n t ar que o n cle o e s s e n cial do s dir e it o s
s o ciais que fo i r e alizado e e fe t iv ado p e lo le gis lado r e n co n t r a- s e co n s t it u
cio n alme n t e gar an t ido co n t r a me didas e s t at ais que , n a p r t ica, r e s ult e m
n a an ula o , r e v o ga o o u an iquila o p ur a e s imp le s de s s e n cle o e s s e n
cial, de t al s o r t e que a lib e r dade de co n fo r ma o do le gis lado r e a in e r e n t e
aut o r r e v e r s ib ilidade e n co n t r am limit a o n o n cle o e s s e n cial j r e alizado 44.
O le gis lado r ( as s im co mo o Po de r Pb lico e m ge r al) n o p o de , p o r t an t o ,
uma v e z co n cr e t izado de t e r min ado dir e it o s o cial n o p lan o da le gis la o
in fr aco n s t it ucio n al, me s mo co m e fe it o s me r ame n t e p r o s p e ct iv o s , v o lt ar
at r s e , me dian t e uma s up r e s s o o u me s mo r e lat v iza o ( n o s e n t ido de
uma r e s t r i o ) , afe t ar o n cle o e s s e n cial le gis lat iv ame n t e co n cr e t izado de
de t e r min ado dir e it o s o cial co n s t it ucio n alme n t e as s e gur ado . A s s im, e m
p r ime ir a lin h a o n cle o e s s e n cial do s dir e it o s s o ciais que v in cula o Po de r
Pb lico n o mb it o de uma p r o t e o co n t r a o r e t r o ce s s o e que , p o r t an t o ,
r e p r e s e n t a aquilo que e fe t iv ame n t e s e e n co n t r a p r o t e gido 45.
Muit o e mb o r a t al co n ce p o p o s s a s e r v ir co mo p o n t o de p ar t ida p ar a
a an lis e da p r o b le m t ica do alcan ce da p r o t e o co n t r a o r e t r o ce s s o e m
mat r ia de dir e it o s s o ciais , n o n o s p ar e ce dis p e n s v e l algum t ip o de ap r o
fun dame n t o , n o t adame n t e n o que diz co m a v in cula o do p r o b le ma s
n o e s de dign idade da p e s s o a e da gar an t ia das co n di e s mat e r iais m
n imas p ar a uma v ida dign a, que , p o r s ua v e z, guar dam r e la o co m a n o o
de n cle o e s s e n cial do s dir e it o s s o ciais , e mb o r a n o s e co n fun dam n e ce s
s ar iame n t e . A l m dis s o , a n o o de m n imo e x is t e n cial, co mp r e e n dida, p o r
s ua v e z, co mo a que ab r an ge o co n jun t o de p r e s t a e s mat e r iais que as s e
44 Cf. Jo s Jo aquim Go me s Can o t ilh o , Direito constitucional e teoria da Constituio, 7 . e d., Co imb r a:
A lme din a, 2 0 0 7 , p . 3 3 8 e s .
45 N e s t e s e n t ido v. t amb m Cr is t in a Que ir o z, Direitos fundamentais sociais, cit ., p . 8 1 e s . e p . 101 e s.
97
gur am a cada in div duo uma v ida co m dign idade , n o s e n t ido de uma v ida
s aud v e l46, o u s e ja, de uma v ida que co r r e s p o n da a p adr e s qualit at iv o s
m n imo s , r e v e la- n o s que a dign idade da p e s s o a at ua co mo dir e t r iz jur dico -
- mat e r ial t an t o p ar a a de fin i o do n cle o e s s e n cial ( e mb o r a n o n e ce s s a
r iame n t e e m t o do s o s cas o s e da me s ma fo r ma) quan t o p ar a a de fin i o do
que co n s t it ui a gar an t ia do m n imo e x is t e n cial, que , n a e s t e ir a de far t a
do ut r in a, ab r an ge b e m mais do que a gar an t ia da me r a s o b r e v iv n cia f s ica,
n o p o de n do s e r r e s t r in gido , p o r t an t o , n o o de um m n imo v it al o u a
uma n o o e s t r it ame n t e lib e r al de um m n imo s uficie n t e p ar a as s e gur ar o
e x e r c cio das lib e r dade s fun dame n t ais 47.
Co m e fe it o , p ar t in do do p r e s s up o s t o de que as p r e s t a e s e s t at ais
b s icas de s t in adas gar an t ia de uma v ida dign a p ar a cada p e s s o a co n s t it ue m
( t al co mo j fo i le mb r ado ) , in clus iv e , p ar me t r o n e ce s s r io p ar a a jus t icia
b ilidade do s dir e it o s s o ciais p r e s t acio n ais , n o s e n t ido de dir e it o s s ub je t iv o s
de fin it iv o s que p r e v ale ce m at me s mo e m face de o ut r o s p r in c p io s co n s
t it ucio n ais ( co mo o cas o da r e s e r v a do p o s s v e l [e da co n e x a r e s e r v a
p ar lame n t ar e m mat r ia o r ame n t r ia] e da s e p ar a o do s p o de r e s , ap e n as
p ar a r e fe r ir o s que t m s ido mais cit ado s n a do ut r in a) , r e s ult a e v ide n t e
ain da mais e m s e cuidan do de uma dime n s o n e gat iv a ( o u de fe n s iv a)
do s dir e it o s s o ciais ( e n e s t e s e n t ido n o ap e n as do s dir e it o s a p r e s t a e s 48)
45 S o b r e o p o n t o , v. o n o s s o Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituio Federal
de 1988, 6 . e d., Po r t o A le gr e : L iv r ar ia do A dv o gado , 2008, p . 6 3 .
47 A r e s p e it o da n o o de m n imo e x is t e n cial, r e me t e mo s ao in dis p e n s v e l e p io n e ir o e s t udo at u
alizado e ap r o fun dado e m co n t r ib ui e s mais r e ce n t e s de Ricar do L o b o To r r e s , O m n imo
e x is t e n cial e o s dir e it o s fun dame n t ais , Revista de Direito Administrativo, n . 1 7 7 , 1 9 8 9 , p . 2 9 e s .,
muit o e mb o r a o aut o r a p ar t ir de uma p r o fun da an lis e e s p e cialme n t e da do ut r in a n o r t e - ame r i
can a e ge r mn ica e s t e ja ap ar e n t e me n t e a s e in clin ar e m p r o l de uma n o o lib e r al ( e mb o r a n o
n e ce s s ar iame n t e r e ducio n is t a) de m n imo e x is t e n cial, j que b e m de s t aca o p ap e l da dign idade da
p e s s o a n a co n s t r u o do co n ce it o de m n imo e x is t e n cial. D e n t r e as co n t r ib ui e s mais r e ce n t e s ,
imp o r t a r e fe r ir , al m do n o s s o A eficcia dos direitos fundamentais, cit ., p . 3 3 0 e s ., o j cit ado e s t udo
de A n a Paula de B ar ce llo s , A eficcia jurdica dos princpios constitucionais, e s p e cialme n t e p . 2 4 7 e s .,
as s im co mo Paulo Gilb e r t o Co go L e iv as , Teoria dos direitos fundamentais sociais, Po r t o A le gr e : L i
v r ar ia do A dv o gado , 2006,
48 Re gis t r e - s e aqui que , a de s p e it o das cr t icas in cis iv as fo r muladas p o r F l v io Galdin o , "O cus t o do s
dir e it o s , in : Ricar do L o b o To r r e s ( o r g.) , Legitimao dos direitos humanos, Rio de Jan e ir o : Re n o v ar ,
p . 1 3 9 e s . ( e s p e cialme n t e a p ar t ir da p . 1 7 3 ) , s e mp r e r e co n h e ce mo s ( e mb o r a t alv e z n o co m s ufi
cie n t e n fas e ) a in t e r liga o e n t r e dir e it o s n e gat iv o s e p o s it iv o s , as s im co mo o fat o de que o s dir e it o s
p o s it iv o s p o s s ue m uma dime n s o n e gat iv a ( e a p r o ib i o de r e t r o ce s s o um do s as p e ct o s que me lh o r
d co n t a de s s a cir cun s t n cia) . D e o ut r a p ar t e , co n v m n o e s que ce r que , ao p r io r izar mo s o cr it r io
da e fic cia jur dica ( e n o p r o p r iame n t e o da e fe t iv idade , a de s p e it o de e s t ar in t imame n t e r e lacio n a
do co m o p r ime ir o ) , acab amo s s us t e n t an do e as s im s e guimo s e n t e n de n do que o fat o de t o do s
o s dir e it o s t e r e m uma dime n s o p o s it iv a ( co mo b e m e n fat iza F l v io Galdin o , n a e s t e ir a de Ho lme s
98
que e s t e co n jun t o de p r e s t a e s b s icas n o p o de r s e r s up r imido o u
r e duzido ( p ar a aqu m do s e u co n t e do e m dign idade da p e s s o a) n e m
me s mo me dian t e r e s s alv a do s dir e it o s adquir ido s , j que afe t ar o ce r n e
mat e r ial da dign idade da p e s s o a ( n a s ua dup la dime n s o p o s it iv a e n e gat i
v a) co n t in uar s e mp r e s e n do uma v io la o in jus t ific v e l do v alo r ( e p r in c
p io ) m x imo da o r de m jur dica e s o cial. Co m is s o , t amb m s e p e r ce b e
n it idame n t e que a p r o ib i o de r e t r o ce s s o n o s e n t ido aqui v e r s ado r e p r e
s e n t a, e m v e r dade , uma p r o t e o que v ai al m da t r adicio n alme n t e imp r i
mida p e las figur as do dir e it o adquir ido , da co is a julgada, b e m co mo das
de mais v e da e s e s p e c ficas de me didas r e t r o at iv as . A s s im, at me s mo e m
h o me n age m s e v ide n t e s e igualme n t e j r e fe r idas dife r e n as e n t r e at o s de
cun h o r e t r o at iv o e me didas p r o s p e ct iv as , n o s e p o de r ia imp r imir , ao me n o s
e m p r in c p io , t r at ame n t o s imilar a amb as as s it ua e s .
In de p e n de n t e me n t e da dis cus s o e m t o mo da maio r o u me n o r au
t o n o mia ( s e que t al aut o n o mia n o s e n t ido de aut o n o mia ab s o lut a
de fat o e x is t e , v is t o que s e mp r e ap o n t amo s a co n e x o da p r o ib i o de
r e t r o ce s s o co m o ut r as cat e go r ias , co mo a s e gur an a jur dica e a p r o p o r cio
n alidade , p o r e x e mp lo ) da p r o ib i o de r e t r o ce s s o e m r e la o ao r e gime
jur dico do s limit e s do s dir e it o s fun dame n t ais n o co n t e x t o do qual a
p r o ib i o de r e t r o ce s s o at uar ia, s e gun do j s e ap o n t o u, co mo limit e do s
limit e s , me r e ce aco lh ida a j le mb r ada t e s e de que uma me dida r e s t r i
t iv a e m mat r ia de dir e it o s s o ciais e m p r in c p io de v e s e r e n car ada co m
r e s e r v as , is t o , co mo uma me dida s us p e it ae s ub me t ida a uma p r e s un o
( s e mp r e r e lat iv a) de in co n s t it ucio n alidade , de t al s o r t e que s uje it a a co n
t r o le n o que co n ce r n e s ua p r o p o r cio n alidade o u me s mo n o que diz co m
a o b s e r v n cia de o ut r as e x ign cias 49. D e n t r e t ais e x ign cias , s it ua- s e p r e ci
s ame n t e a s alv aguar da do n cle o e s s e n cial e , de mo do e s p e cial, do co n t e
do e m dign idade h uman a do dir e it o s o cial o b je t o de r e s t r i o . A s s im, s e
uma me dida r e s t r it iv a de dir e it o s o cial de v e p as s ar p e lo s t e s t e s da r azo ab i
lidade e da p r o p o r cio n alidade , de s afian do a de clar a o da s ua ile git imidade
co n s t it ucio n al s e n o fo r ade quada e n e ce s s r ia, t amb m de v e r ain da
e S un s t e in ) , n o s e n t ido de que t amb m p ar a p r o t e ge r o dir e it o de p r o p r ie dade e a lib e r dade de e x
p r e s s o o Po de r Pb lico n e ce s s it a dis p o n ib ilizar t o do um ap ar at o judici r io , p o licial e t c., que imp li
ca in v e s t ime n t o s de o r de m e co n mica ( as p e ct o que n un ca n e gamo s , p o is s e r ia n e gar o b v io ) , n o
afas t a a p o s s ib ilidade de qualque r Juiz ( in de p e n de n t e me n t e de uma dime n s o p o s it iv a e e co n o mica
me n t e r e le v an t e ) , de s de lo go e s e m qualque r in t e r me dia o do le gis lado r , as s e gur ar e m qualque r
p r o ce s s o a fr ui o e / o u p r o t e o do s dir e it o s de s ign ado s ( p o r e s s a r azo ) de n e gat iv o s o u de fe n
s iv o s .
49 Cf. t amb m Jo r ge Re is N o v ais , Direitos fundamentais: t r un fo s co n t r a a maio r ia, cit ., p . 2 0 1 .
99
que ade quada e n e ce s s r ia r e s p e it ar a b ar r e ir a do n cle o e s s e n cial e da
dign idade da p e s s o a h uman a.
Tais p r e mis s as , e mb o r a n o me n cio n adas da me s ma fo r ma n a fun da
me n t a o , e n co n t r am- s e n a b as e do A cr do do Tr ib un al Co n s t it ucio n al
de Po r t ugal ( A cr do n . 5 0 9 / 2 0 0 2 ) , a r e s p e it o da in co n s t it ucio n alidade ( p o r
v io la o do p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o ) do D e cr e t o da A s s e mb le ia
da Re p b lica que , ao s ub s t it uir o an t igo r e n dime n t o m n imo gar an t ido p o r
um n o v o r e n dime n t o s o cial de in s e r o , e x cluiu da fr ui o do b e n e f cio
( ain da que me dian t e a r e s s alv a do s dir e it o s adquir ido s ) p e s s o as co m idade
e n t r e 1 8 e 2 5 an o s . Em t e r mo s ge r ais e p ar a o que imp o r t a n e s t e mo me n
t o , a de cis o , ap e s ar de n o un n ime , e n t e n de u que a le gis la o r e v o gada,
at in e n t e ao r e n dime n t o m n imo gar an t ido , co n cr e t izo u o dir e it o s e gur an
a s o cial do s cidado s mais car e n t e s ( in cluin do o s jo v e n s e n t r e 1 8 e 2 5
an o s ) , de t al s o r t e que a le gis la o mais r e ce n t e , ao e x cluir do n o v o r e n di
me n t o s o cial de in s e r o as p e s s o as n e s s a faix a e t r ia, s e m a p r e v is o e / o u
man ut e n o de algum t ip o de p r o t e o s o cial s imilar , e s t ar ia a r e t r o ce de r
n o gr au de r e aliza o j alcan ado do dir e it o s e gur an a s o cial a p o n t o de
v io lar o co n t e do m n imo de s s e dir e it o , j que at in gido o co n t e do n ucle ar
do dir e it o a um m n imo de e x is t n cia co n dign a, n o h av e n do o ut r o s in s
t r ume n t o s jur dico s que o p o s s am as s e gur ar co m um m n imo de e fic cia.
D e s t aque - s e , ain da, que o Tr ib un al Co n s t it ucio n al p o r t ugus r e it e r o u
p r o n un ciame n t o s an t e r io r e s , r e co n h e ce n do que , n o mb it o da co n cr e t iza
o do s dir e it o s s o ciais , o le gis lado r dis p e de amp la lib e r dade de co n fo r
ma o , p o de n do de cidir a r e s p e it o do s in s t r ume n t o s e s o b r e o mo n t an t e
do s b e n e f cio s s o ciais a s e r e m p r e s t ado s , sob o pressuposto de que, em qual
quer caso, a e s co lh a le gis lat iv a as s e gur e , co m um m n imo de e fic cia jur
dica, a gar an t ia do dir e it o a um m n imo de e x is t n cia co n dign a p ar a t o do s
o s cas o s 50.
Par a al m do e x p o s t o , co n v m fr is ar que , n a fun dame n t a o do p e
dido de fis caliza o da co n s t it ucio n alidade e m s e de p r e v e n t iv a, afo r ado
p e lo Pr e s ide n t e da Re p b lica, r e s t o u as s e n t ado que me s mo quan do s e
s us t e n t e n uma jus t ifica o o b je ct iv ame n t e co mp r o v v e l e de b as e co n s t i
t ucio n al, o Es t ado n o p o de afe t ar o u s up r imir p r e s t a e s e x is t e n t e s de
uma fo r ma ar b it r r ia, dis cr imin at r ia, co m e v e n t ual v io la o de p r in c p io s
co n s t it ucio n alme n t e co n s agr ado s , co mo s e jam o p r in c p io da co n fian a
50 Par a que m de s e ja ap r o fun dar a an lis e , v ale a p e n a co n fe r ir n a n t e gr a a fun dame n t a o do j
cit ado A cr do n . 5 0 9 / 2 0 0 2 , Pr o ce s s o n . 7 6 8 / 2 0 0 2 , ap r e ciado p e lo Tr ib un al Co n s t it ucio n al de
Po r t ugal e m 1 9 - 1 2 - 2 0 0 2 .
100
p r p r ia do Es t ado de D ir e it o o u, mais e s p e cificame n t e , n o cas o , o p r in c p io
da igualdade o u o p r in c p io da un iv e r s alidade n a t it ular idade e e x e r c cio
do s dir e it o s fun dame n t ais .
D a an lis e da p ar adigm t ica de cis o o r a cit ada, que h ar mo n iza co m
a ar gume n t a o de s e n v o lv ida ao lo n go do p r e s e n t e t e x t o , r e s ult a que uma
me dida de cun h o r e t r o ce s s iv o , p ar a que n o v e n h a a v io lar o p r in c p io da
p r o ib i o de r e t r o ce s s o , de v e , al m de co n t ar co m uma jus t ificat iv a de
p o r t e co n s t it ucio n al, s alv aguar dar e m qualque r h ip t e s e o n cle o
e s s e n cial do s dir e it o s s o ciais , n o t adame n t e n aquilo e m que co r r e s p o n de s
p r e s t a e s mat e r iais in dis p e n s v e is p ar a uma v ida co m dign idade p ar a
t o das as p e s s o as 51, j que co mo b e m r e v e la o cas o o r a e x amin ado
t amb m h av e r de s e r r e s p e it ado o p r in c p io da un iv e r s alidade n o que diz
co m a t it ular idade do s dir e it o s fun dame n t ais 52, p e lo me n o s daque le s que
p o s s ue m um co n t e do e m dign idade da p e s s o a h uman a. D e t al s o r t e , n o
h , de fat o , co mo s us t e n t ar que o r e co n h e cime n t o de uma p r o ib i o de
r e t r o ce s s o e m mat r ia de dir e it o s s o ciais ( n o s t e r mo s e x p o s t o s ) r e s ult ar ia
e m uma an iquila o da lib e r dade de co n fo r ma o do le gis lado r , que , de
r e s t o e imp o r t a r e le mb r ar t al cir cun s t n cia n un ca fo i e n e m p o de r ia
s e r ilimit ada n o co n t e x t o de um Es t ado co n s t it ucio n al de D ir e it o , co mo
b e m r e v e lam o s s ign ificat iv o s limit e s imp o s t o s n a s e ar a das r e s t r i e s le
gis lat iv as ao e x e r c cio do s dir e it o s fun dame n t ais .
Co n s ide r an do que o n cle o e s s e n cial do s dir e it o s fun dame n t ais ,
in clus iv e s o ciais , n e m s e mp r e co r r e s p o n de ao s e u co n t e do e m dign idade
( que p o de r s e r v ar i v e l, a de p e n de r do dir e it o fun dame n t al e m caus a) ,
de s e admit ir at me s mo a e v e n t ual in co n s t it ucio n alidade de me didas que
me s mo n o afe t an do dir e t ame n t e a dign idade da p e s s o a h uman a
in e quiv o came n t e e s t e jam a in v adir o n cle o e s s e n cial. Que t amb m n o
mb it o da p r o ib i o de r e t r o ce s s o imp o r t a que s e t e n h a s e mp r e p r e s e n t e
a cir cun s t n cia de que o co n t e do do m n imo e x is t e n cial p ar a uma v ida
dign a e n co n t r a- s e co n dicio n ado p e las cir cun s t n cias h is t r icas , ge o gr ficas ,
s o ciais , e co n micas e cult ur ais e m cada lugar e mo me n t o e m que e s t iv e r
e m caus a, mas v ar ia t amb m co n fo r me a n at ur e za do dir e it o s o cial e m
51 En t r e n s , v., n e s s e s e n t ido e n a e s t e ir a da li o de Go me s Can o t ilh o , a e n f t ica p o s i o t amb m
de A ldacy Rach id Co ut in h o , 1 5 an o s de Co n s t it ui o de dir e it o s do s t r ab alh ado r e s , in : F e r n an do
F acur y S caff ( o r g.) , Constitucionalizando direitos, Rio de Jan e ir o : Re n o v ar , 2 0 0 3 , p . 3 7 9 - 3 8 0 .
52 A r e s p e it o da t it ular idade do s dir e it o s fun dame n t ais , e m uma p e r s p e ct iv a t amb m b as e ada n a
dign idade e un iv e r s alidade , v., p o r lt imo e de n t r e t an t o s , o n o s s o A eficcia dos direitosfundamentais,
cit ., p . 2 2 7 e s .
101
p ar t icular ( mo r adia, s ade , as s is t n cia s o cial, ap e n as p ar a me n cio n ar algun s
e x e mp lo s ) , r e s ult a e v ide n t e e v ai aqui as s umido co mo p r e s s up o s t o de n o s
s a an lis e .
Co m r e la o o b je o j r e fe r ida de que e m fun o da in ci
dn cia da as s im de s ign ada r e s e r v a do p o s s v e l, is t o , de uma jus t ificat i
v a calcada n a falt a de r e cur s o s e , p o r t an t o , fun dada n a n e ce s s idade de
p r o mo v e r ajus t e s p ar a me n o s o u me s mo a s up r e s s o de ce r t as p r e s t a e s
s o ciais , n o h av e r ia co mo in v o car , co m s uce s s o , a p r o ib i o de r e t r o ce s s o ,
imp o r t a t e r p r e s e n t e algun s fat o r e s que , n o m n imo , n o - de v e r iam s e r
n e glige n ciado s . Em p r ime ir o lugar , s e t e m s ido ge r alme n t e admit ido que ,
n a e s fe r a da gar an t ia do m n imo e x is t e n cial, h um dir e it o s ub je t iv o de fi
n it iv o s p r e s t a e s que lh e s o in e r e n t e s , o u s e ja, que e v e n t ual o b s t culo
de o r de m fin an ce ir a e o r ame n t r ia de v e r ce de r o u s e r r e mo v ido , in clu
s iv e me dian t e a r e alo ca o de r e cur s o s , fix a o de p r io r idade s , o u me s mo
o ut r as me didas , t amb m e n e s t e cas o co m mais r azo ain da n o s e
p o de r p r e t e n de r s up r imir o u e s v aziar , p e lo me n o s n o aqu m do m n imo
e x is t e n cial, a co n cr e t iza o j le v ada a e fe it o do s dir e it o s s o ciais . Co mo
e x e mp lo de s s a t ut e la n e gat iv a do m n imo e x is t e n cial, co lacio n a- s e a s ua
fun o co mo limit e mat e r ial ao p o de r de t r ib ut ar do Es t ado , j que e s t e ,
e m r e gr a, n o p o de t r ib ut ar o m n imo e x is t e n cial ( n o mb it o do imp o s t o
s o b r e a r e n da, p o r e x e mp lo ) , ain da que me dian t e a ale ga o da n e ce s s ida
de de r e fo r ar a ar r e cada o p ar a p r o mo v e r o s dir e it o s s o ciais 53. A li s , at
me s mo a e x ign cia de de t e r min adas co n t r ib ui e s , t r ib ut o s e t ax as p o de r ,
dadas as cir cun s t n cias , s e r que s t io n ada n o co n ce r n e n t e s ua le git imida
de co n s t it ucio n al, s e t iv e r co mo e fe it o a co mp r e s s o de s p r o p o r cio n al de
dir e it o s s o ciais , e m e s p e cial co mp r o me t e n do o m n imo e x is t e n cial54, que s
t e s que de fin it iv ame n t e n o t e mo s co n di e s de aqui de s e n v o lv e r . O que
s e p e r ce b e , v is t a do e x p o s t o , que o m n imo e x is t e n cial e a dign idade da
p e s s o a h uman a o p e r am t an t o co mo fun dame n t o s p ar a a limit a o de dir e it o s 55,
53 S o b r e o m n imo e x is t e n cial e a dign idade da p e s s o a h uman a co mo limit e s ao p o de r de t r ib ut ar , v.,
e n t r e n s e p o r t o do s , Ricar do L o b o To r r e s , Tratado de direito constitucional financeiro e tributrio: o s
dir e it o s h uman o s e a t r ib ut a o - imun idade s e is o n o mia, Rio de Jan e ir o : Re n o v ar , 1 9 9 9 , p . 1 4 4 e s.,
b e m co mo , mais r e ce n t e me n t e , Humb e r t o v ila, Sistema constitucional tributrio, 3 . e d., S o Paulo :
S ar aiv a, 2 0 0 8 , p . 3 3 1 e s.
54 Cf., e n t r e o ut r o s , b us ca de mo n s t r ar Gus t av o Po de s t S e dr a, "A in co n s t it ucio n alidade da in cidn
cia de co n t r ib ui e s p r e v ide n ci r ias ( co t a p at r o n al) s o b r e o fo r n e cime n t o gr at uit o de ut ilidade s
de s t in adas a me lh o r ar as co n di e s s o ciais do s t r ab alh ado r e s ( s e gur o - s ade , b o ls a- e duca o , cur s o s
de cap acit a o p r o fis s io n al e t c.) ", Revista Dialtica de Direito Tributrio, n . 1 4 4 ', s e t . 2 0 0 7 , p . 1 6 e s.
55 Cf. o n o s s o Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituio Federal de 1988, cit .,
p . 1 2 3 e s.
102
quan do t al s e r e v e lar in dis p e n s v e l s alv aguar da da dign idade , quan t o
at uam co mo limit e do s limit e s , p o is co n s t it ue m, ao me s mo t e mp o , o mar
co a s e r r e s p e it ado p e las me didas r e s t r it iv as .
Po r o ut r o lado , o que imp o r t a, n e s t a quadr a, e n fat izar que , e mb o r a
a ale ga o da falt a de r e cur s o s p ar a a man ut e n o de de t e r min ado s b e n e
f cio s s o ciais o u, o que mais co mum, p ar a a p r e s e r v a o de de t e r min ado
p at amar de p r o t e o s o cial, s e ja um p o s s v e l fun dame n t o p ar a jus t ificar uma
me dida r e s t r it iv a, n o p o de r s e r v ir de jus t ificat iv a p ar a a afe t a o do n cle o
e s s e n cial do s dir e it o s s o ciais , ain da mais quan do e m caus a as e x ign cias
m n imas p ar a uma v ida co m dign idade . Co m e fe it o , s e o m n imo e x is t e n cial
aquilo que o Es t ado , e m t o do o cas o , de v e as s e gur ar p o s it iv ame n t e , t am
b m aquilo que o e s t ado de v e r e s p e it ar p o r fo r a de um de v e r de n o in
t e r v e n o . Pr e cis ame n t e n e s s a p e r s p e ct iv a ( ain da que n o idn t ica a ar gu
me n t a o ) , v ale r e fe r ir julgado do Tr ib un al Co n s t it ucio n al da Co lmb ia, de
aco r do co m o qual a de cis o de r e duzir o s r e cur s o s de s t in ado s a s ub s idiar
h ab it a e s p ar a a p o p ula o de b aix a r e n da, p r o mo v ida p e lo Po de r Pb lico
mun icip al, e mb o r a e m ab s t r at o jus t ificada p e la n e ce s s idade de co n t e n o
de de s p e s as ( p e la car n cia de r e cur s o s ) e at e n dime n t o a o ut r as de man das
de cun h o s o cial, n o r e s ult o u co n v in ce n t e n o cas o co n cr e t o , e s p e cialme n t e
quan do as dificuldade s fin an ce ir as ap o n t adas p o de m s e r at r ib u das falt a
de p lan e jame n t o e ge s t o de ficie n t e do p r p r io Po de r Pb lico 56.
Em face do e x p o s t o , imp o r t a r e afir mar , n o co n t e x t o da p r o t e o do s
dir e it o s s o ciais n a e s fe r a de uma p r o ib i o de r e t r o ce s s o , que uma v io la o
do m n imo e x is t e n cial ( me s mo e m s e cuidan do do n cle o e s s e n cial le gis
lat iv ame n t e co n cr e t izado do s dir e it o s s o ciais ) s ign ificar s e mp r e uma v io
la o da dign idade da p e s s o a h uman a e , p o r e s t a r azo , s e r s e mp r e de s
p r o p o r cio n al e t amb m in co n s t it ucio n al, o que , e v idn cia, n o afas t a a
dis cus s o s o b r e qual o co n t e do do m n imo e x is t e n cial e m cada cas o e n o
co n t e x t o de cada dir e it o s o cial57.
A in da n o que diz co m r e le v n cia ao p r in c p io da p r o p o r cio n alidade
n a e s fe r a da as s im de s ign ada p r o ib i o de r e t r o ce s s o e da s alv aguar da do s
56 Cf. s e n t e n a T- 1 5 1 8 de 2 0 0 5 , r e fe r ida e co me n t ada p o r Ro dr igo Up r imn y e D ian a Guar izo , Di
reitosfundamentais & justia, o p . cit , p . 4 8 - 4 9 .
57 A r e s p e it o da dign idade da p e s s o a h uman a co mo limit e das r e s t r i e s a dir e it o s fun dame n t ais v.
o n o s s o A dignidade da pessoa humana, p . 1 1 9 e s .; s o b r e o p r in c p io da p r o p o r cio n alidade e a fun o
da dign idade da p e s s o a h uman a n e s t e co n t e x t o , v., e n t r e o ut r o s , He in r ich S ch o lle r , "O p r in c p io da
p r o p o r cio n alidade n o dir e it o co n s t it ucio n al e admin is t r at iv o da A le man h a", Revista Interesse Pblico,
n . 2 , 1 9 9 9 , p . 9 3 - 1 0 7 .
103
dir e it o s s o ciais v in culado s ao m n imo e x is t e n cial, imp o r t a le mb r ar que a
p r o p o r cio n alidade o p e r a t an t o co mo uma p r o ib i o de e x ce s s o quan t o
n aquilo e m que , v in culada ao s de v e r e s de p r o t e o co m o s quais n o s e
co n fun de , p r o b e uma p r o t e o in s uficie n t e de man dan do , p e lo co n
t r r io , uma p r o t e o s o cial co mp at v e l co m as e x ign cias da dign idade da
p e s s o a h uman a n o mar co de um Es t ado D e mo cr t ico e S o cial de D ir e it o 58.
A co n e x o e n t r e a p r o ib i o de r e t r o ce s s o s o cial e a as s im de s ign ada p r o i
b i o de p r o t e o in s uficie n t e o u de ficie n t e ( o que ab r an ge , n o cas o , a
p r o t e o s o cial, e m ge r al r e p r e s e n t ada p e la co n cr e t iza o do s dir e it o s s o
ciais ) r e s ult a e v ide n t e , p o is at ua t an t o co mo p ar me t r o p ar a o co n t r o le _das
o mis s e s e a e s in s uficie n t e s do Po de r Pb lico quan t o s e r v e de cr it r io
p ar a o co n t r o le de me didas que v e n h am a r e s ult ar n a s up r e s s o o u dimi
n ui o de dir e it o s s o ciais an t e s co n cr e t izado s e m n v e l s at is fat r io , o u s e ja,
e m p at amar e s co r r e s p o n de n t e s s e x ign cias do m n imo e x is t e n cial.
D a p ar a e x t r air da p r o ib i o de r e t r o ce s s o , que o p e r a co mo s alv a
guar da ( n a p e r s p e ct iv a n e gat iv a) do s dir e it o s s o ciais e m r e la o a r e s t r i e s
e s t ab e le cidas p e lo Po de r Pb lico , uma o b r iga o p o s it iv a de at ua o n o
s e n t ido de imp lan t a o , p o r me io de a e s e s t at ais , de n v e is ade quado s
de p r o t e o s o cial, p ar e ce - n o s me t o do lo gicame n t e in ap r o p r iado e do gma
t icame n t e e quiv o cado 59. Co m e fe it o , n o s e r a p r o ib i o de v o lt ar at r s
n o que diz co m o s n v e is de co n cr e t iza o do s dir e it o s s o ciais o fun dame n
t o do de v e r de p r o gr e s s iv a imp lan t a o e r e aliza o de t ais dir e it o s , mas
de t al de v e r que , ao r e v s , s e de duz ( as s im co mo t e m s ido ap o n t ado e s p e
cialme n t e n a r e a do dir e it o in t e r n acio n al do s dir e it o s h uman o s ) a p r o ib i
o de r e gr e s s iv idade . D o co n t r r io , s e que r h av e r ia n e ce s s idade de n o r mas
co n s t it ucio n ais imp o s it iv as de p r o gr amas e t ar e fas n a Co n s t it ui o , o u
me s mo do s dir e it o s s o ciais , j n o de co r r e r ia dir e t ame n t e um de v e r de
p r o t e o e p r o mo o p o r p ar t e do s r go s e s t at ais .
Par a al m do e x p o s t o e t e n do e m co n t a que a dign idade da p e s s o a
h uman a e a co r r e lat a n o o de m n imo e x is t e n cial, a de s p e it o de s ua t r an s
ce n de n t al e de cis iv a r e le v n cia, n o s o o s n ico s cr it r io s a s e r co n s ide
r ado s n o mb it o da ap lica o do p r in c p io da p r o ib i o de r e t r o ce s s o , im
58 Cf. b e m ap o n t ado p o r Cr is t in a Que ir o z, Direitosfundamentais sociais, cit ., p . 1 1 7 . D a me s ma aut o
r a, co m maio r de s e n v o lv ime n t o , O princpio da no reversibilidade dos direitos fundamentais sociais, cit .,
p . 7 6 e p . 1 0 0 e s.
59 Es s e , t o dav ia, p ar e ce s e r o e n t e n dime n t o de Pab lo Cas t r o Mio zzo , O princpio da proibio do re
trocesso social, cit ., p . 8 1 e s ., que b us ca fun dame n t ar uma dup la dime n s o ( fun o ) da p r o ib i o de
r e t r o ce s s o .
104
p o r t a r e le mb r ar aqui as n o e s de s e gur an a jur dica e p r o t e o da co n
fian a, igualme n t e r e fe r idas n a de cis o co lacio n ada. A s s im me s mo que
n o s e p r e t e n da de s e n v o lv e r e s s e s as p e ct o s , ce r t o que , t amb m n a
e s fe r a da p r o ib i o de r e t r o ce s s o t al co mo v e r s ada, a n o o de s e gur an a
jur dica p r e s s up e a co n fian a n a e s t ab ilidade de uma s it ua o le gal at ual60.
Co m e fe it o , a p ar t ir do p r in c p io da p r o t e o da co n fian a, e v e n t ual in t e r
v e n o r e s t r it iv a n o mb it o de p o s i e s jur dicas s o ciais e x ige , p o r t an t o ,
uma p o n de r a o ( h ie r ar quiza o ) e n t r e a agr e s s o ( dan o ) p r o v o cada p e la
le i r e s t r it iv a co n fian a in div idual e a imp o r t n cia do o b je t iv o alme jado
p e lo le gis lado r p ar a o b e m da co le t iv idade 61. Que t ais que s t e s co n s o
an t e j fr is ado r e me t e m- n o s n o v ame n t e ao p r in c p io da p r o p o r cio n ali
dade , mas t amb m dize m co m o p r in c p io da is o n o mia, o s quais igualme n
t e de v e m s e r o b s e r v ado s n e s t e co n t e x t o , s alt a ao s o lh o s , e mb o r a aqui n o
v e n h a a s e r mais de s e n v o lv ido . Par a o n o s s o p r o p s it o , b as t a aqui que s e
fa a r e fe r n cia, co m p ar t icular n fas e , ao fat o de que t an t o o p r in c p io da
p r o t e o da co n fian a quan t o o s p r in c p io s da p r o p o r cio n alidade e da
is o n o mia de s afiam a ado o n o ap e n as de r e gr as r azo v e is de t r an s i o ,
mas t amb m a imp o s i o de s o lu e s s uficie n t e me n t e dife r e n ciadas e
p r o p o r cio n ais me s mo n o mb it o in t e r n o das r e gr as de t r an s i o .
D e o ut r a p ar t e , mas ain da n a e s fe r a das p o s s v e is r e la e s e n t r e a
p r o ib i o de r e t r o ce s s o e a s e gur an a jur dica, r e le mb r e - s e aqui a j cit ada
li o de Har t mut Maur e r ( muit o e mb o r a e s t e n o t e n h a e x p lo r ado co m
maio r n fas e a que s t o da p r o ib i o de r e t r o ce s s o n o s e n t ido aqui p r o p o s
t o ) , que afir ma que s e gur an a jur dica acab a p o r s ign ificar igualme n t e
60 Cf. Win fr ie d B o e cke n , Der verfassungsrechtliche Schutz von Altersrentenanspruche und Anwartschaften
in Italien und in der Bundesrepublik Deutschland sowie deren Schutz im Rahmen der Europischen
Menschenrechtskonvention, B e r lin : D un cke r 8c Humb lo t , 1 9 8 7 , p . 8 0 .
61 Cf., de n t r e t an t o s , D ie t r ich Kat ze n s t e in , D e b is h e r ige Re ch t s p r e ch un g de s B un de s v e r fas s un -
gs ge r ich t s zum Eige n t ums s ch ut z s o zialr e ch t lich e r Po s it io n e n , in : Festschrift f u r Helmut Simon,
B ade n - B ade n : N o mo s , 1 9 8 7 , p . 8 6 2 , co m ap o io n a jur is p r udn cia do Tr ib un al Co n s t it ucio n al F e de
r al. N e s t e co n t e x t o , Han s - Jr ge n Pap ie r , D e r Ein flus s de s Ve r fas s un gs r e ch t s auf das S o zialr e ch t ,
in : B e r n d B ar o n v o n May de ll/ F r an z Rulan d ( o r g.) , Sozialrechtshandbuch, 3 . e d., B ade n - B ade n : N o mo s ,
2 0 0 3 , p . 1 2 0 , le mb r a que n o mb it o da p o n de r a o de b e n s e in t e r e s s e s a s e r p r o ce dida e m cada cas o ,
a r e gula o le gis lat iv a s e r in co n s t it ucio n al ap e n as quan do s e v e r ificar que a co n fian a do in div duo
n a co n t in uidade da s it ua o le gal at ual p o de s e r t ida co mo p r e v ale n t e e m face do s o b je t iv o s alme
jado s p e lo le gis lado r co m as alt e r a e s p r o p o s t as , de s t acan do , t o dav ia, que t ais cr it r io s as s ume m
um p ap e l s e cun d r io n a afe r i o da co n s t it ucio n alidade de me didas r e t r o at iv as . Tal fr mula t e m s ido
lar game n t e ado t ada p e lo Tr ib un al Co n s t it ucio n al F e de r al da A le man h a ( e s p e cialme n t e de s de
BVerfGE 2 4 , p . 2 2 0 , 2 3 0 e s .) , n o s e n t ido de que imp o r t a p o n de r ar , e m cada cas o , e n t r e a e x t e n s o
do dan o co n fian a do in div duo e o s ign ificado da me dida ado t ada p e lo Po de r Pb lico p ar a a co
mun idade .
105
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GERSON T BOSA PiNTO
B o c h o t e l e m D l i e i l o p e l a U F C
B a c h a r e l e l i c e n c i a d o e m L n g u a s N e o l a l i n a s p e l o U F C
M e s t r e e m C i n c i a P o l t i c o p e l o I U P E R J
D o u t o r e m D i r e i t o p e l o U S P
SOCIOLOGIA
Geral e jurdica
Fortaleza
2005
Copyright 2005 Agerson Tabosa Pinto
Impresso no Brasil / Printed in Brazil
P rojeto G rfico e Capa
Carios Alberto Alexandre Dantas
E-mail: [email protected]
Diaoramaq
Roberta de Oliveira
I mp r e s s o e A c a b a m e n t o
Qualygraf - Editora e Grfica
E-mail; [email protected]
F icha C atalogrfica elaborada por
P erptua S ocorro T avares G uimares
E e g . C. R. B. 3/ 801-98
P 659s Pinto, Agerson lbosa
Sociologia geral e jurdica. /Agerson bosa Pinto.
Fortaleza: Qualygraf Editora e Grfica, 2005.
600p. .
1. Sociologia (geral e jurdica) I. Ttulo
CDD 300
SU M RIO
PRIMEIRA PA RTE - S o cio lo gia Jur dica
I IN TROD U O................. ....................... 2 1
1 D EF IN I O .................................................................. ................2 1
1 .1 Elimo lglca..................... ...................... .................. ........... 2 1
1 .2 Cie n t fica ........ ................................. ................................ ....... ..................... 2 2
2 D IVIS O..................................................................................... ...................... 2 3
2 - 1 .1 Mo r fo lo gia....... ...... ....... ................................................... ......................... 2 5
2 .1 .2 Es p acio lo gia..................................... .............................. 2 6
2 .1 .3 H s lo lo gia................................................................... ...... ............. ...........2 6
2 .1 .4 D in mica ............................................. ..................... ...... ...................... ...2 6
3 CL A S S IF ICA O N O QUA D RO GERA L D A S CI N CIA S ...... 2 7
3 .1 .1 A b s t r at as .......... .................. ....... ............. ................................. . 2 8
3 .1 .2 Co n cr e t as .................. ..................................................... ...... . 2 9
3 .2 Jo aquim Pime n t a......... .............................. ............................................. 2 9
3 .2 .1 F un dame n t ais .................................................................. .................... 3 0
3 .2 .2 In s t r ume n t ais .................. ............................................... ........ . 3 0
3 .2 .3 Co n cr e t as ....... ........................ ................................... ....... ................ . 3 1
4 IMPORTN CIA ....... ................... ......................................................................3 1
4 .1 Ge r al .................... ............................. .................................................. ...... 3 1
4 .2 E s p e c i a l .................... .............. ................ ...... .................... ..........................3 3
II METOD OL OGIA ................ ............................................... ............. ............. 4 3
1 MTOD O................... ................... ............................ ...................... ...... . 4 3
1 .2 Clas s ifica o ........................ .................... . 4 4
1 .2 .1 D e dut iv o ............ ................................................................................ 4 4
1 .2 .2 In dut iv o , ....... .................... .......................................... 4 5
2 MTOD OS S OCIOL GICOS ........................................... ........ . 4 6
2 .1 Mct do S o cio lgico G e r a l ........................... ................... 4 6
2 .1 .1 N at ur e za......... ............................................................. ................... 4 6
2.1.2 E t a p a s ....................... ................... ......................................... 4 7
2 .1 .2 .1 Ob s e r v a o .................................................................. 4 8
2 .1 .2 .2 Co mp ar a o ..................... .................................. . 4 9
2 .1 .2 .3 Hip t e s e ...... ................................................................................. . 5 0
2 .1 .2 .4 L e i............... .................................... ................. .............................. ..... 5 0
2 .1 .2 .5 Te o r ia............................. ....... ..................... ................................... 5 1
2 .2 E s p e c i a i s .................... ............................. ........................... . ....... ............ 5 2
2 .2 .1 Mo n o gr fico ................. ........................................................... ....... . 5 3
2 .2 .2 Et n o gr fico .................................................... ........................................ 5 4
2 .2 .3 His t r ico - co mp ar ado ......................................................... ..................... 5 5
2 .2 .4 Tip o fgico ................... ................................................................. ............ 5 5
2 .2 .5 In t e gr al ......................................................... ..............................................5 6
3 TCN ICA S METOD OL GICA S ............. ............ .................... . 5 6
3 .1 In qu r it o S o cial ..................................... ................................... ....... . 5 7
3 .1 .1 Que s t io n r io ....................................................... . 5 7
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C * III
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FATO SOCIAL JU R DICO
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^ Vamo s e s t udar , do fat o s o cial jur dico , o s e u co n ce -
j ? t o , o s e le me n t o s in t e gr at iv o s de s s e co n ce it o , e , p o r lt i-
y j mo , o s fat o r e s e x p licat iv o s de s ua gn e s e e co n s t it ui o .
1 5
" 1 CONCEITO
$ .<
^ iz Vimo s j que t o da man e ir a e agir , fix ada o u n o , ca-
p az de e x e r ce r s o b r e o s in div duo s uma co e r go e x t e r io r ,
cTqu cl amamo s fat o s o cial. li o de D UB KHEIM,
aco lh ida p o r t o do s . S e e s s a man e ir a de agir fix ada, p r e -
v is t a o u imp o s t a p e lo dir e it o , t e mo s , e n t .o , o fat o s o cial
0 jur dico . Es t e e s t udado , e m p r o fun didade , p e la cin cia
"j do dir e it o , e , e m s uas ge n e r alidade s , p e la S o cio lo gia Jur -
J.L dica. Ex e mp lo : o h o mic dio uma man e ir a de agir fix ada,
is t o , p r e v is t a e de s cr it a e m le i {ar t . 1 2 1 do Cdigo Pe
n al) , que v e m de fo r a e s e imp e ao s me mb r o s do gr up o .
Par a o h o micida, a co e r o a imp o s i o p e n a; p ar a a
fam lia da v t ima e de mais p ar t icip an t e s do gr up o , a co e r
o o s imp le s r e co n h e cime n t o do fat o cr imin o s o ( a mo r
t e ) e de s uas co n s e qn cias .
2 EL EMENTOS 1 ^ M v>
Os e le me n t o s do s fat o s s o ciais jur dico s s o o s me s
mo s do s fat o s s o ciais . Un s s o in t e r n o s ; o ut r o s , e x t e r n o s ,
co mo t amb m j e s t udamo s .
2,1 Internos
Os in t e r n o s s o a in t e r a o e o s e n t ido .
S o c i o l o g i a Ce r o l e J u r d i c a
4 2 4
SfOUKBi P l f - S ocioiol JRiDia
2 .1 .1 In t e r a o
N o fat o s o cial - cr ime - , h o uv e in t e r a o e n t r e aut o r
e v t ima. N a co mp r a e v e n da, a in t e r a o de u- s e e n t r e
co mp r ado r e v e n de do r . Em amb o s o s e x e mp lo s , as a e s
e r e a e s s e de r am e m r azo do s e s t mulo s que p r o v o ca
r am o p s iquis mo do s p lo s in t e r age n t e s .
2 .1 .2 S e n t ido
Os mo do s de agir , n o p r ime ir o e x e mp lo , fo r am o r i
e n t ado s p e lo s e n t ido das a e s e x e cut adas , S e o aut o r
t in h a o animus occidendi, o do lo o u a in t e n o de mat ar , o
h o mic dio do lo s o ; s e n o que r ia, mas caus o u o r e s ult a
do , o cr ime culp o s o . Tamb m n a co mp r a e v e n da, o co n
t r a t o p o d e r t e r s ido r e al izado de b o a f o u m f ,
p r o duzin do e fe it o s dife r e n t e s e m r azo do s e n t ido que o s
co n t r at an t e s e mp r e s t ar am ao n e gcio ,
2.2 Externos
A co e r o e a ge n e r alidade s o , co mo j v imo s , e le
me n t o s e x t e r n o s do fat o s o cial, e , t amb m, do fat o s o cial
jur dico , D e s t e , p o diamo s acr e s ce n t ar ain da um t e r ce ir o
e le me n t o e x t e r n o , que ch amamo s de s up o r t e mat e r ial.
2 , 2 .1 Coero
A co e r o e le me n t o e x t e r n o p o r que v e m de fo r a.
Ve m do co s t ume , d a le i, das agn cias de co n t r o le , o r gan i
zadas o u n o , mas s e mp r e e x t e r n as , co mo j fo i dit o . A
co e r o , ali s , p o de s e r e m at o , o u at ual e e m p o t n cia o u
p o t e n cial o u v ir t ual, co mo s e d z e m lin guage m filo s fica.
A l m dis s o , co e r o n o s ign ifica s o me n t e co a o , p r e s -
s o f s icTmas t amb m ace it a o , r e co n h e cime n t o . A o s
Ag e r s o n l o b o s o P i n t o
Fse Socii iusioio
4 2 5
do is que s e cas ar am t e mo s de t r at - lo s co mo mar ido e
mulh e i, e a cas a e m que mo r am t e mo s de r e co n h e c- la
co mo do r mc h o do cas al.
2 .2 .2 Ge n e r alidade
Os fat o s jur id co s do n as cime n t o e da mo r t e s o
. - - -- - - - -- - - - - - - - --- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -- - - - - -- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - -r, - -- - - - - - - - - ' V ' - -
do t ado s de ge n e r alidade p o r que s e difun dir am p e lo gr u
p o . N o n e ce s s r io que , p ar a a ge n e r alidade do fat o ,
t o do s o s in div duo s s e jam r e alme n t e at in gido s , B as t a que
0 s e jam v ir t ualme n t e ,
2 .2 .3 S up o r t e Mat e r ial
A s co is as , o s in s t r ume n t o s , as in s t it ui e s jur dicas
t m, e m ge r al, fo r mas co m que ap ar e ce m e s o p e r ce p t
v e is p e lo s s e n t ido s . A fo r ma s e r ia, as s jm._Q.&up o r t e mat e -
n e d do dir e it o . A p r o p o r o que o dir e it o s e de s e n v o lv e ,
'iua t o r ma_v e m p e r de n do imp o r t n cia. Mas ai n da n o fo i
p o a v e l s up r imi- la, que t udo que n o s ce r ca, n a v ida
s o cio cult ur al, t e m s ub s t n cia e fo r ma, t e m e s s n cia e aci
de n t e s . Pe lo ar t . 1 6 6 do at ual Cdigo Civ il, n ulo o n e g
cio jur dico q u a n d o : "... IV - n o r e v e s t ir a fo r ma p r e s cr it a
e m le i; V - fo r p r e t e r ida alguma s o le n idade que a le i co n
s ide r a e s s e n cial p ar a s ua v alidade " . 1
3 D IS TIN ES
Vamo s , ago r a, faze r algumas dis t in e s co n ce it uais ,
in dis p e n s v e is ao do m n io do as s un t o e m e s t udo . Co me
ce mo s p e lo s fat o s , at o s e n e gcio s jur dico s . Po r lt imo ,
t r at ar e mo s de algun s t ip o s de fe n me n o s jur dico s da clas
s ifica o de CA EB ON N IER.
1 B RA S IL . Novo Cdigo Civil. B r as lia; S e n ado F e de r al. 2 0 0 3 ,
So c i o l o g i a Ge m i e J u r d i c o
4 2 6
S mvkm P h - S ociotofii J ur di ca
3.1 Fatos Jurdicos
O liv r o III e ult imo do Cdigo Civ il de 2 0 0 2 t r a t a do s
fat o s jur dico s , de dican do - lh e s 5 t t ulo s . N o I a, t r a t a do
n e gcio jur dico ; n o s e gun do , do s at o s jur dico s l cit o s ; e ,
n o t e r ce ir o , do s at o s il cit o s . Pe la dis p o s i o da mat r ia,
p o de - s e co n cluir que a e x p r e s s o fat o s jur dico s _ge n r i
ca, co mp r e e n de n do n o s o s fat o s jur dico s v o lun t r io s ,
co m s uas e s p cie s - n e gcio s jur dico s e at o s jur dico s -
mas t amb m o s ch amado s fat o s jur dico s n at ur ais .2
3 .1 .1 F at o Jur dico n o - v o lun t r io
O fat o n at ur al o u n o v o lun t r io , s e gun do PL CID O
e S IL VA o que o co r r e in de p e n de n t e da v o n t ade do h o
me m, ap r e s e n t an do co n di e s mat e r iais e jur dicas p ar a
e s t ab e le ce r uma r e la o jur dica. E, as s im, o n as cime n t o ,
que mar ca o in cio da p e r s o n alidade h uman a; a mo r t e ,
que ^e t e r mm^ ' s t x f m ,l'? r~~
3 .1 .2 F at o Jur dico Vo lun t r io
Par a PL CID O e S IL VA , fat o jur dico v o lun t r io o
p r p r io at o jur dico , e x e cut ado p e la v o n t ade do h o me m,
t ido co mo at o l cit o . E co mp r e e n de t amb m o at o il cit o ,
que at o v o lun t r io ge r ado r de dir e it o s e o b r iga e s . A t o
l cit o e il cit o s o e fe it o s d a v o n t ade do h o me m. E n e s t a
r azo e n t r am n a cat e go r ia do s fat o s v o lun t r io s ".4
2Ibidem, arts. 104-229.
3SILVA, De Plcido e. Vocabulrio Jurdico. 15. ed. Rio e Janeiro; Fo
rense, 1998, p. 349,
4 idem, Ibidem. p. 349.
Ag e r s o n T a b o s o P i t f f
Fmo Sscu Jurdico
427
3.2 Negcio Jurdico
N e gcio jur dico t o do at o licit o d a v o n t ade h uma
n a cap az de ge r ar e fe it o s n a r b it a do dir e it o ,6 co mo a
do a o e o t e s t ame n t o , E a m an ife s t a o d a v o n t ade v o l
t ad a p r o du o de e fe it o s jur dico s ,6 de que s o e x e m-
p lo s o man dat o , a co mp r a e v e n da e a lo ca o .
3.3 Ato Jurdico
S e gun do a de fin i o do Cdigo Civ il de 1 9 1 6 , _at o
jur dico t o d ^ t l l c l t ^ u e t e n h a p o r fim ime diat o ad
quir ir , _r e s guar dar , t r an s fe r ir , mo dificar o u e x t in guir dir e i-
t o s .7 Os e ab o r ado r e s do n o v o cdigo n o _r e ce p cio n ar am
a de fin i o s up r a p ar a n o e x cluir _o at o il cit o co mo mo
dalidade de at o jur dico . E, n a v e r dade , o at o il cit o p r o
duz e fe it o s jur dico s e ge r a o b r iga e s t an t o quan t o o s
at o s l cit o s .
3.4 Fenmenos Jurdicos
CA RB ON N 1 ER e n fr e n t a a h e t e r o ge n e idade do s fa
t o s o u fe n me n o s jur dico s , clas s ifican do - o s s o b v r io s
cr it r io s .8 Vamo s r e s t r n gir - n o s , aqui, ao e x ame de ap e
n as do is de le s .
3 .4 .1 Pr im r io s e S e cun d r io s
Pr im r io s s o o s fe n me n o s h ie r ar quicame n t e s u-
p e r io r e s , s o o s p r ime ir o s , "o s caus ado r e s . D o s p r im r io s
5RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. v. I. Parte Geral. So Paulo: Sarai
va, 2002, p. 178.
6SILVA, De Plcido e. Op. cit., p. 554.
7BRASIL . Cdigo Civ de 1916, art. 81.
8Veja art s. 186-188 do Cdigo Civil de 2002.
S o t i o i o g i o Ge r o ! e J u r d i c o
428
S m , ; Pahe - S aooiooi Jurdica
de r iv am o s s e cun d r io s , que e s t o a b aix o . A s s im, jogar
e x e mp lo , uma s e n t e n a fe n me n o p r im r io , e n quan t o a
co n de n a o , d e co r r e n t e de la, fe n me n o s e cun d r io . Os
fe n me n o s p r im r io s s o co mo que co n t in e n t e s , e s t o jo s ,
e n quan t o o s s e cun d r io s s o o co n t e do .9
3 , 4 .2 Co n t e n cio s o s e n o Co n t e n cio s o s
O de s e n t e n dime n t o e n t r e e mp r e gado e e mp r e gado r ,
caus ado p o r um p r o b le majs alar ial, um fe n me n o s o cial e
jur dico , ch amado ge n e r icame n t e de co n flit o . 0_cn t n o p _ar a
dis t in guir s e e s s e fe n me n o co n t e n cio s o o mao b as e ia-
s e n a in t e r v e n o o u n o d e u m tercius, de um t e r ce ir o ,
p ar a s ua s o lu o , S e o s do is de s e n t e n dido s , e le s p r p r io s ,
s e m o co n cur s o de adv o gado s , do j u i z e do p r o ce s s o , e n -
t r am e m aco r do , e n ce r r an do a co n t e n da, o fe n me n o n o
co n t e n cio s o . S e , p o r m, v o a ju zo , in s t aur am ump r o ce s -
s o e o juiz de cide , o fe n me n o co n t e n cio s o . O me s mo p o
de r dize r de uma s e p ar a o e n t r e cn juge s . S e p r o mo v ida
amigav e lme n t e , fe n me n o n o co n t e n cio s o ; s e judicial
me n t e , t r at a- s e de fe n me n o co n t e n cio s o ,
4 FATORES
A v ida s o cial de p e n de , ao me s mo t e mp o , de muit o s
fat o r e s . E as s i m t a m b m o dir e it o , co mo p r o d u o
s o c o cult ur al. D e n t r e o s que mais s e de s t acam, e s t o o s
fat o r e s f s ico s o u amb ie n t ais , o s b io lgico s , o s p s ico lgico s
e o s e co n mico s . Te amo s r p idas co n s ide r a e s s o b r e
cas a um de le s , v ale n do r e v e r o que j fo i dit u n o cap it ulo
III, p r ime ir a p ar t e , e s t e co mp n dio .
9 CA RB ON N IER, Je an , Sociologia Jurdica. Op . c t ., p , 1 6 3 ,
Ag e r s o n l a b o s o P i n t o
Fato Som Juidico
429
4 .1 F s c o s : - - =
J n o mais s e diz, h o je ^que o h o me m o p r o dut o
do me io , p o is s e r e co n h e ce que o s fat o r e s f s ico s v m p e r
de n do In flun cia s o b r e a s o cie dade , e . e s p e cialme n t e ,
s o b r e a p r o du o jur dica, p r o p o r o que as s o cie dade s
s e d e s e n v o lv e m, e . co m e las , s uas t e cn o lo gias .. A s s im, p o r
e x e mp lo , o dir e it o jap o n s at ual e m n ada de p e n de da p r e
car ie dade cio s r e cur s o s n at ur ais n ip n ico s . Mas , a v e r da
de que n e m a s o cie dade , e m ge r al, n e m o dir e it o , e m
p ar t icular , p o de m n e ut r alizar a in flun cia cs mica o u g e
o gr fica, N A RD I- GREGO dizia que o 'dir e it o "s r g iTp r a
p r o t e ge r a p r o du o h uman a e p ar a que e s t a s e de s e n
v o lv a s o in dis p e n s v e is o aume n t o p o p ulacio n al e o cr e s
cime n t o da p r o du o e co n mica, o que s p o de r o co r r e r
n uma mb in c a f s ica fav o r v e l.10
4.2 Biolgicos
A v ar i v e l b io lgica co n t n ua man t e n do s ua in flu
n cia, s e mp r e , p o r m, e m co n cur s o co m o ut r as v ar i v e is .
Emb o r a n o s e acr e dit e mais e m r a a s up e r io r , v an s e js
b io lgicas , co mo a idade e o s e x o , co n t in uam p aut an do a
dife r e n cia o s o cial, co m in lucn cia mais dir e t a s o b r e o
t ip o _de t r ab alh o e da at iv idade e co n mica, s o b r e o e s t ilo
e co n ce p e s de v ida, p r e cis an do o dir e it o p r o t e ge r dife
r e n t e me n t e , a cr ian a, a mulh e r e o ido s o . Po r is s o , o dir e i
t o s e r e n o v a p ar a de fin ir a mat e r n idade , n o cas o da b ar r iga
de alugue l, o co me o da p e r s o n alidade civ il, a p o s s ib ili
dade do ab o r t o do an e n c falo , do cas ame n t o de h o mo s
s e x uais e da e ut an s ia.
50 N A RD I- GREGO, Car io . "s Caus as Ge r ais do D ir e it o ". In : MA CHA
D O N ETO, A . L , e MA CHA D O N ETO, Z ah id . O Direito e a Vida Social,
S o Paulo * N acio n al/ Edus p , 1 9 6 6 . p . 9 6 - 1 0 1 .
430
S suw P t - S o i o i o s i J i R m
4,3 Psicolgicos
N o h v ida s o cial h uman a s e m p s ico lo gia, N o h
t amb m r e la e s s o ciais , r e gu l a das p e lo dir e it o , s e m
in t e r a o s ign ificat iv a. N o h d ir e it o s e m v o n t ade . D o lo ,
culp a, b o a f o u m f , e mo e s , s e n t ime n t o s , imp uls o s ,
t e n dn cias , que s o fe n me n o s p s ico lgico s , e s t o a afe -
t a r p e r mr o e n t e me n t e o D ir e it o ,
4 ECON MICOS
D a p r o du o h uman a, r azo de s e r do s ur gime n t o
do dir e it o , a que mais s e d e s t a c a a p r o du o e co n mi
ca, de b e n s e s e r v i o s e s cas s o s . A t e n de e la a n e ce s s ida
de s v it ais , t an t o da v ida p ur ame n t e b io lgica, quan t o da
v ida s o cial. S e m algun s b e n s , mo r r e - s e de in an i o . S e m
de t e r min ado s s e r v i o s , co mo o s de co mun ica o , n o h
v ida s o cial. Po r is s o s e gun do o s mar x is t as , o e co n mico
que e s t r at ifica a s o cie dade , O dir e it o e a r e ligio , p o r e x e m-
p lo , de p e n de r iam da e co n o mia e e s t ar iam a s e r v i o do s
go v e r n an t e s , in t e r e s s ado s n a man ut e n o da e x p lo r a o
s o cial. O ale r t a de Mar x s e r v iu p a r a mo s t r ar quan t o o e co
n mico , co m s e u de t e r min is mo h is t r ico , in flui s o b r e o
s o cial, e , p ar t icular me n t e , s o b r e a p r o du o jun dica.
g e t s o n T o b o s o P i n t o
fito Socit JeIbko
431
ESQU EMA
1 DE FI NI O
2 E L E M E N T O S
2 .1 In f e r n o s
2 . 1 . 1 In t e r a yi
2 . 1 . 2 Se n t i d o
2 . 2 Ext e r n o s
2 .2 .1 Co e r o
2 .2 .2 Ge n e r a l i d a d e
2 .2 .3 Su po r t e Ma t e r i a l
3 DIST INES
3.1 Fa t o s J u r d i c o s
3 . 1 . 1 Na t u r a l
3 . 1 . 2 Vo l u n t r i o
3.2 Ne g c i o J u r d i c o
3.3 At o J u r d i c o
3.3.1 L c i t o
3.3.2 Il c i t o
3.4 Fe n m e n o s J u r d i c o s
3.4 .1 P r i m r i o s e s e c u n d r i o s
3.4 .2 Co n t e n c i o s o s e n o c o n t e n c i o s o s
4 FAT ORES
4 .1 F s i c o s
4 .2 Bi o l g i c o s
4 .3 P s i c o l g i c o s
^ . 4 Ec o n m i c o s
Socoiogo Ge-oI c Juidico
4 3 2 S t a i i c P i t s - S m o i o c u 1m : u
QU ESTION RIO
1 . Po r que o h o mic dio um fat o s o cial jur dico ?
2 . Os fat o s s o ciais jur dico s s o , e m ge r al, man e ir as de
agir fix adas o u n o fix adas ?
3 . Que co e r o o co n t r at o , co mo fat o s o cial, e x e r ce s o b r e
o s co n t r at an t e s ?
4 . Em que co n s is t e a an t e r io r idade h is t r ica do fat o s o cial
jur dico ?
5 . Po r que a ge n e r alidade do fat o jur dico n o s ign ifica
un iv e r s alidade ?
6. Po r que n e m s e mp r e - mat ar algu m - h o mic dio ?
7 . A o f s ico , de u- s e o t e r mme t r o . A o o p e r ado r do D ir e i
t o , o que lh e de v e s e r dado ?
8. N a cin cia do dir e it o , co mo n as cin cias n at ur ais , p o de
h av e r de s co b r ido r o u in v e n t o r ? .
9 . Co mo r e la e s jur dicas , que s o ab s t r at as , p o de m s e r
r e alidade s s o ciais , o b je t o da S o cio lo gia Jur dica?
1 0 . Po r que , t o do fat o jur dico n o n e go cio jun au o v
1 1 . Po r que o at o il cit o p o de s e r at o jur dico ?
1 2 . Po r que o at o ilic t o e s t p r e v is t o n o cdigo civ il e n o
n o p e n al?
1 3 . Po r que , n a r e la o do min an t e / do min ado , h s e mp r e
um "t o ma l , d c ", co m v an t age n s p ar a amb o s o s
lado s ?
1 4 . D is t n ga p o s s e de p r o p r ie dade , co mo fat o s do dir e it o .
1 5 . Po r que , p ar a Eh r lich , a r e la o de p o s s e mais im
p o r t an t e do que a de p r o p r ie dade ?
1 6 . O dir e it o h e r e dit r io r e v e la que a p r o p r ie dade dir e i
t o r r e s o iv e l, o u s e ja, n o s e e x t in gue . Ex p lique .
1 7 . L o mb r o s o dis s e que o h o me m t r az e s t amp ada, e m s ua
co mp le i o f s ica, a mar ca do cr ime . Ex p lique .
Ag e r s o n l o b o s o P i n t o
FmoSoo Jtirico
433
1 8 . Co mo Mo n t e s qu e u r e lacio n o u o t e mp e r ame n t o do
h o me m co m o me io amb ie n t e ?
1 9 . F a a algum r e lacio n ame n t o e n t r e o p o de r e co n mico
e o cr ime .
2 0 . Co mo q do lo , a culp a, a e mo o in flue m n o s fat o s
jur dico s .
BIBL IOGRAFIA
1 . Car b b n n ie r , Je an , Sociologia Jurdica, o p . cit .
2 . D ur kh e im, mile - Regras do Mtodo Sociolgico, o p . cit .
3 . Eh r lich , Euge n - Fundamentos da Sociologia do Direito,op, cit.
4 . Ro s a, F. A . de Mir an da, Sociologia do direito: o Fenmeno
Jurdico como Fato Social, o p , cit .
5 . S o r o km, Pit ir im A , , Sociedade, Cultura e Personalidade, o p . cit .
So c i o So g i o Ge m i e j u r d i c a
434
Segunm Parte - S ociotosi* Ju oi
L EITU RAS
1, Naturalidade do Fenmeno Jurdico (Pontes de Mir an da)
1, Jurista e cientista. S e m dis cip lin a r acio n al, s e m fun da
me n t o filo s fico , de s liza, e s co r r e ga, que mal s e co mp r ime e n t r e
o s de do s , o b ar r o das p e s quis as n o mun do jur dico , E quan do as
cir cun s t n cias in s p ir am algo de n o v o , falt a ao s jur is t as a in icia
o n e ce s s r ia ao t r at o cie n t ifico da mat r ia. A p o n t am o s fat o s ,
o p in am, dis cut e m, cr it icam, p r o p e m e r e fut am; mas n o s ab e m,
n o s o cap aze s de co lh e r a fo lh a do ar b us t o e e x p licar a fam lia
b o t n ica, a r azo do p r e co ce amar e le cime n t o o u da e s cas s e z de
flo r e s . S o co mo o s ligado r e s de co r r e n t e s e l t r icas , que , s o me n t e
p o r lig - las , s e cr e m e le t r icis t as ,
o N o b as t a ao jur is t a o ch amado s e n s o jur dico , que am-
Cf* p io s ur r o p ar a t o das as fr aque zas de e quidade e t o do s o s de s a-
j ; ^ ce r t o s In s e r ido s e m t e x t o s , N o cie n t is t a que m s e co n t e n t a
0 co m o e x e r cit ar e s p o n t n e o e in gn uo da v o ca o , mais o u me -
5 < n o s cult iv ada, p ar a acar e ar ar t igo s e p ar gr afo s , E p r e cis o p
5 - r a t o do , a o b s e r v a o e a e x p e r in cia a e duca o p s ico lgica
pi in dis p e n s v e l p ar a p e s quis ar a v e r dade , ain da de p o is de fir ma-
o da a o p in io , e alime n t ar a dv ida, s e mp r e que s e t r at a de s o lu-
o adquir ida s e m o s s e gur o s guias da an lis e cie n t fica,
Que m que r o p in ar r e co r r e an t t e s e ; a b o a e _a m o p i-
4 ^ n i o . a v e lh a me t af s ica do b e m e do mal. A o f s ico que p r e -
5 t e n de s ab e r ja t e mp e r at ur a de um co r p o _d - s e o _t e r mme t r o .
- A o jur is t a^ n o . H de s ab e r p o r s i, s ub je t iv ame n t e . E da o s
,~1' e r r o s Jfe m o t e r mme t r o p o de r ia aque le _e n gan ar - s e e r e p ut ar
X \ p o r mais que n t e o mais fr io e p o r mais fr io o mais que n t e . A s
o imp r e s s e s h uman as s o fal v e is , co mo a r azo . E p r e cjs o jt e -
" me r as p e r f dias daque ia_e as de s s a, que t o das p o de m dan ar a
t -2 e v o lu o da cult ur a e a r e aliza o da flicidade h uman a. O fi-
s ico de u cin cia o ir is t mm n t qe de m ao JMr e it o _o js o ci-
y Iggo e o cie n t is t a do D ir e it o .
jy 2 . Opinio e Cincia. Po r mais r ija e b e m dir igida que "
s e ja a e lab o r a o da o p in io ", s e m a fr ie za, que s a Cin p a
t r az, o jur is t a n o p o de fiar - s e do m t o do e mp r ico : aqui, in -
faio Soo# jutinco
435
co n s cie n t e me n t e , o t o mam p e la mo in s d o s as de du e s ; al ,
ce s s a o p ar ale lis mo e n t r e o s e u r acio c n io e a lgica das r e ali
dade s , N o p o de m s e r r e duzidas ao s dado s ime diat o s do s s e n -
t ido s as r e gr as jur dicas , 'que s o p r e s i h as _do _e quil b r io s o cial
e , e mb o r a n t imas ao s e s p ir it o h uman o , n o p e r de m n un ca a
n at ur e za r e al que lh e s as s e gur a a e x is t n cia o b je t iv a e a co n t -
n ua_at ua_ Qjs e m a v o n t ade do s in div duo s . N o v o lun t ar ia
me n t e que o b e de ce mo s r e gr a- mo r al, ain da quan do de b o m
gr ado n o s s uje it amo s a e la. A p ur adas as co n t as , p r o fun da
me n t e in v o lun t r ia a p r p r ia v o n t ade de a r e s p e it ar . Or a, s e
as s im quan t o ao p r in c p io mo r al, mais r azo h p ar a o afir mar
mo s quan t o r e gr a jur dica.
N o v amo s at n e ga o de qualque r de s co b r ime n t o
do do m n io jur dico , de mo do que s e dis s e s s e , co mo OTTO
MA YER, n a Jur is t ich e Ge s e lls ch aft de Vie n a, e m 1 9 0 7 : " A ale -
gr a do h o me m que de s co b r iu a p lv o r a o u a t e le gr afia s e m fio
n ao n a t e m o jur is t a; n a cin cia do dir e it o n o h in v e n o , o u,
p e lo me n o s , de v ia n o h av e r . S o me n t e mo s t r a e de s cr e v e o que
j s e co n t m n a v ida, e ficaz e cr iado n a mat r ia jur dica. Or a
de s co b r ir n o cr iar : o cie n t is t a n o cr io u o s fe n me n o s n at u
r ais que p r o duze m a t e le gr afia s e m fio - ap e n as o s ap r o v e it o u,
co n fo r me s is t e ma p r t ico de r e aliza o ; e n o h r e cus ar ao
D ir e it o a me s ma p o s s ib ilidade , que a de s imp le s ut iliza o
do s co n h e cime n t o s adquir ido s . Quan do s e s ab e qual o e fe it o
da r e gr a jur dica A e quais o s e fe it o s ah das duas n o r mas A e
B , t e m- s e a de s co b e r t a cie n t ifica, co m a qual p o de o h o me m
t ir ar o s r e s ult ado s me diat o s o u ime diat o s , co mo do s p r in c p io s
an t e r io r me n t e de s co b e r t o s s e e x t r aiu a t e le gr afia s e m fio . Q
que de v e mo s co n de n ar o _e mp ir is mo ign o r an t e , a me dicin a
das le is v o t adas p o r p e s s o as s e m n e n h um cab e dal de Cin cia
p o s it iv a do D ir e it o , uma das lt imas e das mais jp e n gs s s o -
b r e v iy n c as d~t Wacf7in c mp at v e il^m o fut ur o , p o r que
an t agn ica ~a"t o d id i'de "s o cializa o " d adap t a o do
h o me m v ir ia s o cial, s gn dcT m x imo at ualme n t e p o s s -
3 . Sociologia e Cincia do Direito. F e n me n o s o cial, o D i
r e it o p r e s s up e n o jur is t a o S o cilo go que fun dame n t alme n t e
de v e s e r , L e gis lado r , in t r p r e t e o u juiz, n o s e co mp r e e n de que
S ociol ogia G eiol e jur d r a
4 3 6
SsusmParte- SocioiosiJurdica
J O
v (< us e de o ut r o s m t o do s an t e s de e mp r e gar o da Cin cia p r in ci-
l p ai, que a S o cio lo gia. Co mo Cin cia, e la a gar an t ia o b je t iv a
- <3 ^ do j^e it o _- ^ab r e n o v o s camin h o s a o r gan iza o jur dica e
J fe licidade h uman a, de p e r gun t ar - s e qual o mat e r ial co m aue
f v ai t r ab alh ar o cie n t is t a^ do jiir e it o . A s r e la e s s o ciais , que
s l o s ^fe n o n ie n o s s j^ce p t iv e is da s ua in v e s t iga o . A s r e la-
f t e s e co n micas , r e iigio s ajs , jmo n iis ^s t cas e as de mais de -
-j; j v e m_e r ^s luda 3 .as j) Qr _e le , _S o e le me n t o s r e ais , de que p o de
in duzir e co m o s guais o co n h e cime n t o i gan h a e m o b je t iv idade
. X e e m e fic cia.
<1 ^ Quan do s e t ach am as r e la e s jur dicas e as de mais r e la
e s s o ciais de s e r e m ab s t r at as , e n o co n cr e t as , d - s e ao t e r
mo ab s t r at o " v alo r muit o p o uco filo s fico ; ab s t r at as s o t o das ,
mas o ab s t r at o t ar o b mjmgt e , e p o de s e r o b je t o de Cin cia,
de s de que t al s e ch ame a t udo que r e s t a, s e ja co n cr e t o fo r ap e
n as o que co n s is t e e m mat r ia, o u algo que a e la co mp ar amo s .
A in da as s im, r e lat iv o o co n cr e t o , p o r que n o s ab e mo s p r e ci
s ame n t e o que e o que n o mat r ia. A s r e la e s jur dicas s o
r e alidade s , s us ce p t v e is , p o r t an t o , de p e s quis a cie n t fica.
A adap t a o e o s mo v ime n t o s ( r e gr as , jur dicas ) p ar a
co r r igir o s de fe it o s co n t m t o do o D ir e it o . Tudo que e s cap a a
t al e s fe r a, t udo que e x ce de a t ais de l n e ame n t o s e r aias n o
D ir e it o , n o fe n me n o jur dico , e de v e s e r e s t udado n o ut r o
do m n io das Cin cias S o ciais . D e mo do que um do s p r ime ir o s
mis t e r e s da Cin cia do D ir e it o 'W~S r cn s cr v F o 'cmp o das
in v e s t iga e s que lh e In cumb e m, - p r e cis ar o p r p r io o b je t o
dis t in guir , me t o dicame n t e , o que p e r t e n ce ao s e u e s t udo e o
que co n ce r n e ao de o ut r as dis cip lin as . N o h n e gar o v alo r
p r t ico ime diat o de t al cr it r io : p o is do s imp le s dis ce r n ime n t o
do que e do que n o fe n me n o jur dico r e s ult a, e n t r e mui
t o s o ut r o s dado s e x at o s , a dis cr imin a o do que p o dia e do
que n o p o dia s e r imp o s t o p e lo le gis lado r , p e lo Es t ado , do que ,
de n t r e o dir e it o e s cr it o , de v e e do que n o de v e s e r at e n dido
o u ap licado , b e m co mo do que , ain da que n o e s cr it o , v o t ado e
n o p r o mulgado , de v e s e r t ido p o r dir e it o e , p o r t an t o , o b s e r v a
do n a p r t ica jur dica. Po r me r c de n t al m t o do , de s v e s t e - s e
do s t r aje s t e o lgico s , me t af s ico s e de maggico s o D ir e it o ; e
getml o f c o s o P i n t o
4
.5, F w S o t i A t J u r d i c o 4 3 7
I
d
-*+
ap r e s e n t a- s e - n o s , h umilde , mas v e r dade ir o , co mo dado p o s it iv o
p at a o co n h e cime n t o cie n t ifico , O D ir e it o o D ir e it o do Ho
me m; co mo o b e m e o mal, o b e lo e o fe io s o co n ce it o s r e lat i-
i A ,
j i v o s - o b e m e o mal do Ho me m, o b e lo e o fe io do Ho me m, S
""f e x is t e de ab s o lut o n o D ir e it o o que co r r e s p o n de , n o Ho me m,
'j a r e lat iv o cias le is in fin it as do un iv e r s o ; s e m s e co n h e ce r e m
} e s s as e o que n o Ho me m p r o duze m de in v ar i v e l n o s e p o de -
/ r co n h e ce r aque la p ar t icuIa. A s s im, p o is , de s in t e r e s s a- n o s ,
i *$ ^p r at icame n t e , ^in v e s t iga o me t af s ica do dir e it o n at ur al,
j ' Po n t e s de Mir an da, in S o ut o Cl udio e F alco , Jo aquim - So
ciologia e Direito; Leituras Bsicas de Sociologia Jurdica, S ,
Paulo , Pio n e ir a, 1 9 8 0 , p . 1 5 5 - 1 5 7 ,
2, Os Fatos do Direito (Eugen Ehrlcli)
O jur is t a in cap az de co n ce b e r a co n v iv n cia h uman a
s e m dir e it o s e m co a o jun di e N a s ua man e ir a de p e n
s ar , o r de m jur dica, t r ib un al, co e r o jur dica fo r mam uma un i
dade e e le falar de dir e it o e de co n di e s jur dicas s o me n t e
o n de e n co n t r ar um t r ib un al e co e r o jur dica o u, n o m n imo ,
r go s admin is t r at iv o s e co e r o admin is t r at iv a, ...
n e s t e mun do r e s t r it o que n as ce o co n ce it o p ur ame n t e
jur dico das fo n t e s do dir e it o , ... A jur is p r udn cia do min an t e
;) ch e go u, p o r e s t a v ia, co n h e cida t e o r ia das duas fo n t e s , a qual
r e duz t o do o dir e it o le i e ao co s t ume . Es s a t e o r ia ap ar e n t e -
.) me n t e r e p o us a s o b r e o s p r e ce it o s do corpus jurs civilis e do
co r p us jur / s can o n ci, o s quais , al m das Je ge s , s admit e m ain -
~! da a consuetudo co mo fo n t e do dir e it o , ... O dir e it o n o co n s is t e
, , 4'- C n as dis p o s i e s jur dicas , mas n as _in , ^ t iuco gs jur dicas ; cr ue m
< j Qt ^_de t e r mmar quais s o as fo n t e s do dir e it o de v e s ab e r e x p li-
t i; car co mo s ur gir am Es t ado , - Igr e ja, fam lia.- p r o D r ie dadTco n t r a- '
t g h e r an a e co mo e le s s e ln o dificam.e e v o lue m n o de co ge r jdo
f t e mp o . ... N o h av e r ia dir e it o s e n o e x is t is s e m p e s s o as que
,.--i , si fo s s e jn p o r t ado r as da co n ce p o de dir e it o , , , .. N a b as e das co n
ce p e s s e mp r e e s t o fat o s o b s e r v v e is . ... Quais as in s t it ui
e s r e ais que n o de co r r e r do de s e n v o lv ime n t o h is t r ico s e
t r an s fo r mam e m r e la e s jur dicas e quais o s p r o ce s s o s s o ciais
So c i o l o g i a Ge r a ! e J u r d i c o
438
Sf e i HOi P ! f - So o o i o s i i Jurdica
que co n duze m a is t o ? Es s e s fat o s , ap ar e n t e me n t e muit o di
v e r s o s , p o de m s e r r e duzido s a algun s p o uco s , S o o s s e guin t e s :
o h b it o , a do min a o , a p o s s e e a de clar a o de v o n t ade .
H b it o - O h b it o n o de v e s e r co n fun dido co m o "dir e i
t o co n s ue t udin r io ", N o s e t r at a de h ab it uar - s e a dis p o s i e s
jur dicas . H b it o s ign ifica aqui: a p r t ica ut ilizada at o mo
me n t o de v e r t r an s fo r mar - s e e m n o r ma p ar a o fut ur o , ... o
h b it o que cr ia a o r de m e m t o das as as s o cia e s p r imit iv as :
n a p ar e n t e la, n a fam liaj n a fam lia cr r e at h o je , ... A maio -
r ia das as s o cia e s at uais p o s s ui uma o r de m que r e p o us a s o
b r e co n t r at o s , e s t at ut o s , dis p o s i e s jur dicas ^o u co n s t it ui e s .
A p e s ar dis s o , o h b it o n o p e r de u de t o do s ua v alidade , O
h b it o , s e gun do e x p r e s s o de JEL L IN EK, ap r e s e n t a s ua e fici
n cia at r av s da "fo r a n o r mat iv a do fat o dado ". S ua fo r a
o r de n ado r a e r e gulado r a de n t r o da as s o cia o r e p o us a n o fat o
de e x p r e s s ar o e quil b r io das fo r as da as s o cia o .
D o min a o - A s co n di e s de do min a o e de s ub mis
s o de v e m s e r clar ame n t e dis t in guidas da do min a o e s ub o r
din a o e x is t e n t e s e m qualque r o r gan iza o e que e x p r e s s a a
o r de m in t e r n a da as s o cia o , ... amp lame n t e ace it a a id ia
de que uma dis p o s i o jur dica que s ub me t e a mulh e r ao
h o me m, as cr ian as aut o r idade p at e r n a, o t ut e lado ao t ut o r ,
o e s cr av o e t i^s e v ao s e n h o r , Mas e m t o do s o s lugar e s o fat o
da do min a o e da s ub mis s o an t e ce de u dis p o s i o jur dica
que as r e gulame n t a. Qualque r do min a o ap e n as o r e v e r s o
da n e ce s s idade do do min ado p o r p r o t e o e ajuda. Ele do mi
n ado p o r que n o t e m p r o t e o jur dica; e e le n o t e m p r o t e o
p o r que n o p e r t e n ce a uma as s o cia o que p ude s s e p r o t e g-
lo , To das e s t as r e la e s de p r o t e o p r e s s up e m que o p r o
t e gido t e n h a a o fe r e ce r alguma v an t age m a s e u p r o t e t o r , A
do min a o o co r r e p e las v an t age n s que d ao do min ado r , n o
p o r amo r ao do min ado . E n a p r o dut iv idade e co n mica do
t r ab alh o , que e s t fun dame n t ado o fat o da s ub mis s o p e s s o al;
a s ub mis s o t o r n a- s e p ar t e in t e gr an t e da o r de m jur dica, p o r
que o t r ab alh o do s ub mis s o as s ume um s ign ificado de cis iv o
p ar a a o r de m e co n mica da s o cie dade . ...
Po s s e - Po s s iv e lme n t e t o da do min a o o r igin alme n t e
co n s is t ia n a p o s s e jur dica do do min ado ... A n ica co is a que
Ag e r s o n T o b o s o P 1 o
Fito SocwJiitiro
439
in t e r e s s a de n t r o do p r o ce s s o de ut iliza o e co n mica a p o s
s e , ... A p o s s e um fat o do dir e it o n o s e n t ido de que o p o s s ui
do r do o b je t o ut iliza de aco r do co m s ua de s t in a o e co n mica.
Qualque r dir e it o p r o t e ge o p o s s uido r n o us o do o b je t o , ... A
co n t r ap ar t ida da p o s s e - ur n a r e la o p ur ame n t e e co n mica
co m o o b je t o - a p r o p r ie dade e o s de mais dir e it o s e fe t iv o s , ....
Os dir e it o s mo de r n o s do co n t in e n t e e ur o p e u e m ge r al ado t a
r am e s t as id ias fun dame n t ais do dir e it o de p o s s e r o man o . ...O
dir e it o de p o s s e , p o r t an t o , o v e r dade ir o dir e it o da o r de m e co
n mica e o mais in t imame n t e ligado ao dir e it o v iv o das e co
n o mias n acio n ais , Em co n s e qn cia um do s mais din mico s
p o n t o s do dir e it o .... A p r o p r ie dade r o man a uma p r o p r ie dade
ar r an cada de s e u co n t e x t o s o cial e e co n mico at r av s de um
t r ab alh o me n t al do s jur is t as , Mas e s t a p r o p r ie dade n o o u
t r a co is a que um t ip o de fic o jur dica, A do ut r in a da do min a
o co mp le t a s o b r e o o b je t o e m ge r al ain da h o je ap r e s e n t ada
co mo s e n e la s e e s go t as s e t o do o co n t e do da p r o p r ie dade , .
A p o s s e s e t r an s fo r ma n uma r e la o jur dica e m fun o
de s e u e n quadr ame n t o n a o r de m e co n mica. E at r av s da at i
v idade e co n mica que o h o me m s ub o r din a a n at ur e za que o
ce r ca, s ua v o n t ade ; n e s t e s e n t ido a p o s s e ap e n as o as p e c
t o r e al da e co n o mia.., . D e t udo is t o s e de p r e e n de que p ar a a
s o cio lo gia do dir e it o o s co n ce it o s de p o s s e e p r o p r ie dade s o
at ce r t o p o n t o in t e r camb i v e is , A e quip ar a o do s co n ce it o s
s e t o r n a t an t o mais n e ce s s r ia quan t o t amb m as le is e a ju
r is p r udn cia e m r e gr a n o faze m dis t in o e n t r e amb as .
Contrato - Ch e gamo s ago r a ao p o n t o de de s cr e v e r a de
clar a o de v o n t ade co mo un i fat o do dir e it o . N o p o s s v e l
n e m n e ce s s r io e x amin ar n e s t e p o n t o o s fun dame n t o s r e ais da
de clar a o jur dica de v o n t ade e m t o das as s uas r amifica e s .
A p e n as e x is t e m do is t ip o s que t m um s ign ificado un iv e r s al; o
co n t r at o e a de clar a o de lt ima v o n t ade .... Uma das r a ze s do
dir e it o co n t r at ual a t r o ca... O in t e r cmb io de b e n s s e r e aliza
n a fo r ma de p r e s a o u da t r o ca de p r e s e n t e s p o r co r t e s ia... da
r ap in age m que de r iv am as mais an t igas fo r mas de co m r cio ., .,
O co n t r at o mais an t igo o co n t r at o r e fe r e n t e t r o ca de b e n s ;
e le p o de s e r ce le b r ado s e m uma r e la o p e s s o al que e n v o lv a
t r o ca de p alav r as .... A s e gun da r aiz do dir e it o co n t r at ual a s ub -
S o e o k g o Ge m i e J u r d i c o
4 4 0
S t G U N b P M ~ S o t l O l O G I * J u t i D I C
mis s o do min a o alh e ia. O e x e mp lo mais t p ico a v e n da de
s i p r p r io .., . To da e v o lu o p o s t e r io r da gar an t ia co n t r at ual r e
p o us a n uma p r o gr e s s iv a s e p ar a o da gar an t ia dian t e da p o s s e
do o b je t o da gar an t ia, co m uma p r o gr e s s iv a in co r p o r a o do
co n t e do da d v ida n a gar an t ia. Em lugar da ime diat a s ub mis
s o p e s s o al e do ap r is io n ame n t o co mo r e f m t e mo s a s ub mis
s o co n dicio n ada e a fian a; o de v e do r v e n de - s e ao cr e do r
s o me n t e n o cas o de a div ida n o s e s aldada ( o jur ame n t o de
fide lidade e n t r e o s r o man o s , o nexum e n t r e o s r o man o s e in
me r o s cas o s que e n co n t r amo s n o an t igo dir e it o r us s o ) o u lh e d
um fiado r p ar a o cas o de is t o o co r r e r ... :
Tudo is t o s ign ifica que a gar an t ia n o s e liga mais p o s
s e e s im ao co n t r at o , D e v e - s e dis t in guir o s s e guin t e s e s t gi
o s n o de s e n v o lv ime n t o do aco r do at s ua t r an s fo r ma o e m
fat o do dir e it o : o co n t r at o v is t a, o co n t r at o de d v ida, o co n
t r at o de gar an t ia, o co n t r at o de cr dit o , ... de v e - s e ace n t uar
co m t an t o t o ais n fas e que p ar a a v ida e co n mica a r e le v n cia
maio r r e cai s o b r e a d v ida, n o t an t o s o b r e a gar an t ia, que n a
maio r ia do s cas o s quas e in dife r e n t e s e um co n t r at o p o de s e r
le v ado a ju zo o u n o , p o is s o me n t e s e p o de e s p e r ar que s e ja
cump r ido , co m b as e n a r e gr a do agir que do min a a v ida.
Te s t ame n t o - O dir e it o h e r e dit r io t e m s uas r aize s n a
cas a ... Os me mb r o s da co mun idade familiar man t m o s b e n s
e co n t in uam a t r ab alh ar co mo at ago r a; n o mudo u muit a co i
s a, ap e n as h uma p e s s o a a me n o s n a cas a, O fat o do dir e it o
p o r t an t o , a p o s s e . O dir e it o h e r e dit r io , p o r t an t o , t amb m
aqui t e m t r a o s p r p r io s , s e guin do a o r de m de p o s s e e ut ili
zan do o co n t r at o , O aco lh ime n t o n a cas a ( ado o , e t c.) t e m
co mo co n s e qn cia o ap o s s ar - s e do s b e n s do fale cido at r av s
do aco lh ime n t o ; a do a o an t e r io r mo r t e fun cio n a co mo co n
t r at o e n t r e v iv o s , co mb in an do muit as v e ze s co m t r an s fe r n cia
de p o s s e . S o me n t e n o t e s t ame n t o a dis p o s i o t o r n a- s e um
fat o aut n o mo do dir e it o h e r e dit r io . ... N o cas o de um dir e it o
h e r e dit r io e s p e cialme n t e n o - e co n mico , co mo o r o man o o u
o mo de r n o dir e it o do co n t in e n t e e m que a de clar a o de lt i
ma v o n t ade co n s ide r ada um de v e r , a mo r t e o co r r ida s e m e la
ap ar e ce co mo t r ag dia. Tamb m n as de clar a e s de lt ima
Ag e r s o n T a b o s o P m
Fse SocimJuoico
441
v o n t ade , in flun cias n o - e co n micas t m co n s ide r v e l in flu
n cia;, h p r e o cup a o co m a fam lia que , at r av s da de clar a
o da lt ima v o n t ade , p r o t e gida da e v e n t ual p e r da do
e s p lio , h p r e o cup a o co m a igr e ja, as in s t it ui e s b e n e fi
ce n t e s e fin alme n t e a p ie dade do mo r t o . Es t as s o ap e n as fo r
as s o ciais , mas e las gar an t ir am a o b s e r v n cia das lt imas
o r de n s do mo r t o , me s mo an t e s que t iv e s s e m, s ido fo r malme n
t e r e co n h e cidas p e las aut o iidad e s ,
* Eh r l ch , Euge n , Fundamentos da Sociologia do Direio
(Gmndlegung der Soziologie des Rechts), B r as lia, Edit o r a
Un B , 1 9 8 6 , p . 6 9 - 9 5 ,
3 , N e gcio s J u r d i c o s ( S ilv io Ro dr igue s )
D e fin i o - N o Tit ulo I do liv r o III, Do Negocio Jurdico,
t r at a o le gis lado r do negocio jurdico, is t o , daque le at o licit o
da v o n t ade h uman a, cap az de ge r ar e fe it o s n a r b it a do dir e it o ,
O Cdigo de 1 9 1 6 , e m s e u p r ime ir o dis p o s it iv o ( ar t . 8 1 ) ,
fo r n e cia o co n ce it o de at o jur dico , p o r e le de fin ido co mo o at o
l cit o que t e n h a p o r fim ime diat o adquir ir , r e s guar dar , t r an s fe
r ir , mo dificar o u e x t in gu r dir e it o s . :
O at o jur dico fun dame n t alme n t e um at o de v o n t ade ,
v is an do um fim. Es s e ar t . 8 1 do Cdigo de 1 9 1 6 ia mais lo n ge
p o r que , ao car act e r izar o at o jur dico , de clar av a t e r e le p o r fim
imediato alcan ar um e fe it o jur dico . ime diat e z aqui r e fe r ida
e fe t iv ame n t e um car act e r s t ico r e le v an t e . O e fe it o jur dico
alme jado de lib e r adame n t e p r o cur ado , p o r in t e r m dio do n e
go cio de que s e lan o u mo . O v e n de do r alie n a s e u b e m p o r
que de s e ja o p r e o , e o at o a que r e co r r e ade quado p ar a
co n duz - lo a o b t e r s e u de s ide r at um. N o h n e ce s s idade de
me io - t e r mo n e m de s ub t e r fgio . Co mo o e s co p o alme jado
l cit o , p e r mit e que e le s e ja ime diat ame n t e alcan ado , at r av s
do n e go cio jur dico .
D e fat o . O n e go cio jur dico r e p r e s e n t a uma p r e r r o gat iv a
que o o r de n ame n t o jur dico co n fe r e ao in div duo cap az de , p o r
s ua v o n t ade , cr iar r e la e s a que o dir e it o e mp r e s t a v alidade ,
uma v e z que s e co n fo r me m co m a o r de m s o cial. A v o n t ade p r o -
So c i o l o g i o G e i c i e J u r d i c a
442
SlOUNDA PH - SoCIOtOBIJUfiitiCA
cur a um fim que n o de s t o a da le i e que , p o r e s s e mo t iv o , o b
t m de la a e fic cia n e ce s s r ia,
O fim da de clar a o p r o duzir e fe it o s jur dico s ime dia
t o s , e , dada a lice idade do p r o p s it o , t ais e fe it o s s o e fe t iv a
me n t e ge r ado s , A e s s e p r in c p io s e ch ama autonomia da vontade.
Re p r e s e n t a a me dida n a qual o dir e it o p o s it iv o r e co n h e ce ao s
in div duo s a p o s s ib ilidade de p r at icar at o s jur dico s , p r o duzin
do s e us e fe it o s ,
Uma v e z e s t ab e le cida uma r e la o jur dica, p o r co n v e n
o e n t r e o s p ar t icular e s , le galme n t e co n s t it u da, a le i lh e e m
p r e s t a s ua fo r a co e r cit iv a e e la s e t o ma o b r igat r ia. A lgun s
cdigo s dize m que t al co n v e n o t e m fo r a de le i, o p r in cip io
de que pacta sunt servanda, o qual, e mb o r a muit o at acado n o s
lt imo s t e mp o s , e a de s p e it o das e x ce e s que n e le s e in s in u
am, co n t in ua a r e ge r as r e la e s p r iv adas , p o is , e fe t iv ame n t e
e co mo p o n t o de p ar t ida, as co n v e n e s e n t r e o s p ar t icular e s
s o v lidas e ge r am e fe it o s , s e mp r e que n o co lidir e m co m a
le i de o r de m p b lica, ...co s t umam o s e s cr it o r e s , ao t r at ar de s
s a mat r ia, p r o ce de r clas s ifica o do s n e gcio s jur dico s .
Es t e s s e div ide m e m; a) Negcios unilaterais e bilaterais. Un i
lat e r ais s o aque le s at o s e m que b as t a a de clar a o de v o n t a
de de uma das p ar t e s p ar a que o n e go cio jur dico s e ap e r fe i o e .
B ilat e r ais s o aque le s e m que s e r e que r a man ife s t a o de v o n
t ade de amb as as p ar t e s , p r a que o n e go cio s e co mp le t e . A s
s im, o t e s t ame n t o n e go cio un ilat e r al p o r que de p e n de t o - s
da v o n t ade do t e s t ado r , e n quan t o o s co n t r at o s s o b ilat e r ais ,
p o is s s e ult imam quan do h an un cia de amb o s o s co n t r a
t an t e s . b }Negcios onerosos e gratuitos. N e gcio s o n e r o s o s s o
aque le s e m que v an t age m o b t ida co r r e s p o n de um s acr if cio .
Ex is t e uma r e cip r o cidade de p r e s t a e s e n t r e as p ar t e s , co mo
n a co mp r a e v e n da, n a lo ca o e t c. n e gcio s gr at uit o s s o o s
que e n v o lv e m s acr if cio ap e n as de uma das p ar t e s p o is a o ut r a
ap e n as de le s s e b e n e ficia, O e x e mp lo t p ico de n e go cio gr at ui
t o a do a o . To do n e go cio o n e r o s o b ilat e r al, p o r que a p r e s
t a o de uma das p ar t e s e n v o lv e uma p r e s t a o da o ut r a. Mas
n e m t o do at o b ilat e r al o n e r o s o . Co n t r at o s ( p o r t an t o , at o s
b lat e r ais jh que s o gr at uit o s , co mo o co r r e co m a do a o , o
g e i s o n l o b o s o P i n t o
F m S s c i t t j t u i m
443
co mo dat o e o man dat o , c)Negocio "causa mortis" e inter vivos".
Co n s ide r an do o t e mp o e m que de v am p r o duzir e fe it o s p o de - s e
p r o ce de r dis t in o acima, Causa mortis so os at o s que de
v e m p r o duzir e fe it o s ap s a mo r t e de s e u gr an de , as s im co mo
o t e s t ame n t o , o u a do a o causa mortis, a que s e r e fe r e o ar t ,
3 1 4 do Cdigo Civ il, Inter vivos s o o s n e gcio s cujo s e fe it o s
s e de v e m p r o duzir dur an t e - a v ida de s in t e r e s s ado s , as s im co mo
o man dat o , o de p s it o , , o r e co n h e cime n t o de filh o s e t c, d) Ne
gcios solenes eno solenes. S o le n e s o u fo r mais s o o s n e gcio s
que de man dam, p ar a s e ap e r fe i o ar , al m de o ut r o s r e quis i
t o s , a o b e din cia a uma fo r ma p r e s cr it a e m le i. N o s o le n e s o u
n o fo r mais s o o s n e gcio s que n o de p e n de m de fo r ma de
t e r min ada, p o de n do as p ar t e s r e co r r e r a qualque r de las . N e
go cio s o le n e o t e s t ame n t o , o u a ado o ( e s cr it ur a p b lica ),
o u o p e n h o r agr co la ( fo r ma e s cr it a, in s t r ume n t o p ub lico , o u
p ar t icular ) ; n o s o le n e a co mp r a e v e n da de b e n s mv e is , , a
qual s e ult ima e ap e r fe i o a at quan do fe it a v e r b alme n t e .
* Ro dr igue s , S lv io - Direito Civil - Parte Geral, v o l, 1, 3 2 a e d, ,
S . Paulo , S ar aiv a, 2 0 0 2 , p . 1 6 9 - 1 7 9 .
4-rD' o Delito Privado ao Ato ct ( A ge r s o n Tab o s a Pin t o )
Vamo s , p o r lt imo , mo s t r ar , e s t udan do a e v o lu o do
D ir e it o Ro man o , a t r an s i o do de lit o p r iv ado , de s an o r e
p r e s s iv a, p ar a o at o il cit o , de s an o r e s t it ut iv a, fe n me n o fa
v o r v e l t e s e de D ur kh e im, e m de b at e , D iz e le : O de lit o
p r iv ado do dir e it o r o man o r e p r e s e n t a uma e s p cie de in t e r me -
di r io e n t r e o cr ime p r o p r iame n t e dit o e a le s o p ur ame n t e ci
v il. Ele p o s s ui t r a o s de amb o s e flut ua e n t r e o s co n fin s do s
do is do m n io s , um de lit o n o s e n t ido de que a s an o fix ada
p e la le i n o co n s is t e s imp le s me n t e e m r e s t aur ar as co is as ; o
de lin qe n t e n o ap e n as o b r igado a r e p ar ar o p r e ju zo que
caus o u, mas de v e algo mais , uma e x p a o , N o e n t an t o , n o
e x at ame n t e um de lit o , p o is s e a s o cie dade que p r o n un cia a
p e n a, n o e la que de v e ap lic - la. um dir e it o que e la co n fe r e
p ar t e le s ada, que a n ica a dis p o r liv r e me n t e de le *'.<39f
o que o b s e r v a t amb m S IL VIO MEIRA , quan do diz que
o dir e it o p e n al p r iv ado co n s t it ui o e mb r io de um cap t ulo do
So c i o l o g i a Ce r o l e J u r d i c a
444
S t r n & A P arte - S o i o m c - i j i m i m
D ir e it o Civ il: o das o b r iga e s . Ob s e r v a- s e uma in t e r p e n e t r a o
n o s camp o s do s dir e it o s p e n al e civ il. Os de lit o s p r iv ado s , co m a
e v o lu o s o cial, p as s ar am a in t e gr ar o dir e it o p b lico , e n quan t o
muit o s in s t it ut o s do dir e it o civ il ... que , n as o r ige n s , e r am de
car t e r p b lico , p as s ar am a s e r in co r p o r ado s ao dir e it o p r iv ado
" , (40) Os r o man o s n o t e o r izar am s o b r e d at o il cit o , co mo t am
b m n o o fize r am s o b r e o de lit o *(n 5 , mas , s e gun do C s ar Ras cn
, " fue la jur is p r udn cia la que in t e r p r e t an do la lex Aquila, a
p ar t ir de la id ia de la culp a, p us o las b as e s de la n o cin de
caus alidad e imp ut ab it idad, que p r e s ide lo s mo de r n o s
o r de n amie n t o s e n mat r ia de r e s p o n s ab ilidad
e x t r aco n t r at ual", (42i Mas , o que o il cit o civ il o u at o il cit o e o
que o faz dife r e n t e do de lit o p r iv ado o u il cit o p e n al? O cr it r io
p ar a r e s p o n de r , e n s in a S A N TIA GO D A N TA S , p ur ame n t e fo r
mal: F o i e s s e at o de s cr it o n a le i p e n al co mo cr ime ? O il cit o
p e n al N o fo i de s cr it o , o il cit o civ il. <43SE p r o s s e gue ." o at o
il cit o a t r an s gr e s s o de um de v e r jur dico imp o s t o p e la le i"
( 4 4 ) . a o b r iga o ge r ada p e lo il cit o civ il e x t r aco n t r at ual e x at a
me n t e p o r que de co r r e de imp o s i o da le i e n o de aco r do de
v o n t ade s fir mado n o s co n t r at o s . D iz- s e t amb m r e s p o n s ab ili
dade aquil an a, p o r que p r e v is t a n a LexAquilia, que r e gulame n
t o u o de lit o p r iv ado in t it ulado damnum injuria datum mi A t e s s a
le i, p r o mulgada p o r v o lt a de 2 8 7 a.C., p ar a algu m s e r r e s p o n s a
b ilizado p e lo r e fe r ido de lit o , mis t e r s e fazia p r o v ar - lh e a in t e n
o do lo s a e p r o v ar t amb m que o dan o t iv e s s e s ido caus ado
dir e t ame n t e p e t o - age n t e . Ob s e r v a S A N TIA GO D A N TA S que ,
e n quan t o o D ir e it o Pe n al, cada dia, s e afe r r a mais p e r s o n alida
de do age n t e p ar a faze r r e alme n t e do age n t e n o s o p o n t o de
imp ut a o do de lit o , co mo o p o n t o de imp ut a o da p e n a, o D i
r e it o Civ il, p e lo co n t r r io , t e m um in t e r e s s e cap it al e m alar gar a
imp ut a o da ilicit ude ... Es s a n e ce s s idade de dilat ar a r e s p o n
s ab ilidade , al m do s limit e s do age n t e do at o dan o s o , j o s r o
man o s o s e n t iam, e mb o r a n o co m a n it ide z e co m a fle x ib ilidade
da do gm t ica mo de r n a, e , p o r is s o , t alv e z, que s ur giu, n o D i
r e it o Ro man o , aque la at o r me n t ada figur a do s quasi-delicta. N o
s e s ab e , ao ce r t o , qual e r a o cr it r io que o s jur is co n s ult o s r o ma
n o s t o mav am p ar a co n s ide r ar ce r t as a e s co mo delicta, o ut r as ,
Ag e r s o n T a b o s a P i n t o
FatoSocimJuedico
co mo quasi-delicta, Mas , o que p ar e ce mais ce r t o , que n o s ,j
quasi-delicta iam p r in cip alme n t e o s cas o s de r e s p o n s ab ilidade jj
in dir e t a, o s cas o s e m que s e que r ia r e s p o n s ab ilizar , n o o cau- I
s ado r do male f cio , mas algu m que e s t iv e s s e p o r t r s do cau- I
s ado r do male f cio , 546^Po r fim, ain da S A N TIA GO D A N TA S I
que m e n s in a; o s cdigo s mo de r n o s que ain da ut ilizam, co mo o |
Cdigo de N ap o le o , a n o me n clat ur a r o man a - delicta e quasi- 1
delcia - n a v e r dade j e s t o t r at an do do at o ilicit o , " Ele s con- I
servam os nomes: delitos e quase-delitos, mas em v e z de i]
co n ce it uar e m ur i nmero determinado de delitos do um co n - j
ceito ge n r ico que j , de algum modo, um co n ce it o de at o ilci- ;|
to,"47)A partir da Lex Aquilia, a jur is p r udn cia r o man a fix o u o s ;
co n ce it o s de culpa e dan o , indispensveis co r r e t a interpreta- u
o do de lit o , ch amado dan o in jus t ame n t e caus ado , e de s ua le i i |
r e gulame n t ado r a, o s quais ch e gar am at n s , in alt e r v e is , s e n - j j
do ut ilizado s n a co n figur a o do at o ilicit o , Eis co mo o Cdigo j|
Civ il da Es p an h a e m s e u ar t igo 1 , 9 0 2 de s cr e v e o at o ilicit o : " El
que p o r accin o omisin caus a dano a Outro, interviniendo cul
p a o n e glige n cia, e s t obligado a r e p ar ar e l dan o caus ado ", l48)
0 n o v o Cdigo C v l B r as ile ir o , que de 2 0 0 2 , as s im de fin iu o
at o il cit o , e m s e u ar t igo 1 8 6 : A que le que , p o r a o o u o mis s o
v o lun t r ia, n e glign cia, v io lar dir e it o e caus ar dan o a o ut r e m,
ain da que e x clus iv ame n t e mo r al, co me t e at o il cit o ; e acr e s
ce n t o u, n o ar t igo 1 8 7 : Tamb m co me t e at o il cit o o t it ular de
um dir e it o que , o e x e r c- lo , e x ce de man ife s t ame n t e o s limit e s
imp o s t o s p e lo s e u fim e co n mico o u s o cial, p e la b o a f o u p e lo s
b o n s co s t ume s ", <49) Co m o acr s cimo de s s e ar t igo , s e m co r r e s
p o n de n t e n o cdigo an t e r io r , o le gis lado r de cidiu in cluir , co mo
at o ilicit o , o ch amado ab us o de dir e it o . Quan t o r e s p o n s ab ili
dade civ il de r e p ar ar o dan o , e la e s t p r e v is t a n o ar t igo 9 2 7 : "
A que le que , p o r at o ilicit o ( ar t s , 1 8 6 e 1 8 7 ) , caus ar dan o a o u
t r e m, fica o b r igado a r e p ar a- lo .
1 "D o D e lit o Pr iv ado ao A t o Il cit o , A ge r s o n Tab o s a Pin t o , in
D ir e it o Pe n al e Mo de r n iza o ; D a Re p r e s s o Re s t it ui o n a
Ev o lu o do D ir e it o Ro man o , co mun ica o ap r e s e n t ada ao
VII Co n gr e s o In t e r n acio n al y X Ib e r o ame r icao de D e r e ch o
Ro man o , e m A li can t e / Elch e , Es p an h a, 2 0 0 4 ,
e d o l o g i o Ge r a l e J u r d i c o
PROCESSOS SOCIAIS E DIREITO
IV
N o v amo s r e p e t ir , aqui, o que j fo i e s t udado n o ca
p t ulo IV, p r ime ir a- p ar t e , de s t e liv r o , s o b r e o s p r o ce s s o s
s o ciais . A r e v is o , p o r m, d a mat r ia, facilit ar , p o r ce r t o ,
a ap r e n dizage m do que v amo s , ago r a, e s t udar . Em S o cio lo
gia Ge r al, o s p r o ce s s o s s o ciais fo r am e s t u dado s co mo t ip o s
de r e la e s s o ciais , in t e r ligan do p e s s o as n as mais dife r e n
t e s s it ua e s , e m fat o s s o ciais o s mais ^dife r e n t e s . A go r a,
e m S cilgiTJur dica, v amo s e s t udar o s me s mo s p r o ce s
s o s , r e s t r it o s , p o r m, e s fe r a do dir e it o . A n t e s , p o r e x e m
p lo , o co n flit o e m que duas p e s s o as e s t iv e s s e m e n v o lv idas ,
p o dia s e r ide o lgico , e co n mico o u r e ligio s o ; ago r a, t e r de
s e r de n at ur e za jur dica. A s s im, ab o r dar e mo s o s mais im
p o r t an t e s p r o ce s s o s s o ciais , clas s ificado s e m do is gr up o s :
0 do s p r o ce s s o s co e s iv o s e o do s p r o ce s s o s dis p e r s iv o s .
1 PROCESSOS COESIVOS
En t r e o s p r in cip ais p r o ce s s o s co e s iv o s , e s t o a co o
p e r a o , a :aco mo da o e a as s imila o .
1,1 Cooperao s
Quan do o p e r r io s s o c o n t r at ado s p a r a _p r o duzir
de t e r min ado ar t e fat o , v o e n t r ar e m p r o ce s s o de co o p e
r a o . Co mo a e t imo lo gia da p alav r a s uge r e _{cum = co m
+ operatonem ~ t r ab alh o ) , un s v o t r ab alh ar co m o s o u
t r o s , b us can do o me s mo o b je t iv o , Muit o de s s e fat o e co
n mico , de que o s o p e r r io s p ar t icip am, e s t r e gulado p e lo
dir e it o , p e lo que , t amb m, fat o jur dico . Ofat o de .t r ab a
lh ar e m jun t o s , o b je t iv an do um r e s ult ado co mum, in cut e
So c o l o g i o Ge r o l e j u r d i c o
4 4 8
S t c u o t P i - S o o o o s i i ktmh
n e le s a co n s cin cia da un idade gr up ai, que . p r e cis o >s e r
man t ida e que n o o ut r a co is a s e n o a p ip jr ia s o lidar i- '
e dade JEs s a s o lidar ie dade t o imp o r t an t e p ar a o _dir e it o
que D URKHEIM a ch amo u de smbolo v is v e l do dir e it o ,1
F ICHTER dis s e , co m muit a p r e cis o e gr a a, que a co o p e
r a o a s o lidar ie dade e n j a p .2 S e n do a co o p e r a o um
p r o ce s s o ap r o x imat iv o , muit o mais co mum, quan do de -
s e n t e n dime n t o s ur ge , s e us p ar t icip an t e s v o lt ar e m s it ua
o an t e r io r de co n cr dia o u s e aco mo dar e m do que js e u
r e lacio n ame n t o e v o luir p ar a a co mp e t i o e o co iiit o ^que
s o p r o ce s s o s dis p e r s iv o s . E t udo p o de s e r co n s e guido
por aco r do o u co n cilia o , q ue s o fe n me n o s n o
co n t e n cio s o s , s e m o ap e lo p a r a o ajuizame n t o de a e s ,
que c e x p e die n t e co n t e n cio s o . E que , s e gun do "CL D IO
S OUTO, n a co o p e r a o , o s p lo s de iit ie r a o ap r e s e n t ain
s e me lh an a do s e le me n t o s i ( id ias ) , co m n fas e n o s e le
me n t o s i, s e n do ~cm~^^Emn t s "v"( v o n t ade X, t e m_um
s e n t ido p o s it iv o o u afir mat iv o da s e me lh an a - s e n t ido
de o n duz F s e de aco r do co m a( s ) id ia( s ) s e me llian t e Xs ^3
1.2 Acomodao
A co mo da o o p r o ce s s o p e lo qu_al, co n iQ_dis s e mo s ,
in div duo s o u gr up o s s e ajus t am e x t e r n ame n t e a s it ua
e s n o v as , e v it an do o u s up e r an do co n flit o s . o cas o , p o r
e x e mp lo , da.o p e r r io in s at is fe it o co m o p at r o p e lgjmo
p agame n t o d_e uma gr at ifica o a que fazia jus . D ian t e da
imin n cia do co n fli i t o ^ r i s c i t ^ ,
G. o p e r ar ia jo r o cur a um adv o gado que ro^~cnsIK,
1 DURKHEIM, mile . Da Diviso do Trabalho Social Op . cit ., p . 3 1 .
2 F ICHTER, Jo s e p h H. Sociologia. Op . cit ., p . 2 7 4 .
3 S OUTO, CL ud o e S OUTO, S o lan ge . Sociologia do Direito, Op .
c t ., p . 1 2 5 .
kmm fnboss Pi
P t o C SSOS So c i i i s E D i h i i o
449
p o r v r ias r aze s , a n o acio n ar o p at r o . A dmit ido o co n s e
lh o , o co n flit o fo i e v it ado . N o ut r a s it ua o , p r o cur ado p e lo
c l i e n t e , a d v o g a d o fo r maliza a r e clama o t r ab alh is t a e
o co n flit o fo i in augur ado . L o go n a p r ime ir a audin cia, as
p ar t e s _e n t r am e r n aco r do e e x t in gue m o co n flE r N ma
t e r ce ir a s it ua o , p at r o e o p e r r io , de s e n t e n dido s , r e co r
r e m jus t i a e o co n flit o p e r dur a a t a s e n t e n aL_Co m
e s t a, o p e r de do r de s is t iu de r e co r r e r e aco mo do u- s e . Ou-
t r a s o p o r t un idade s de co n flit o p o de r o s ur gir , co mo t am
b m p o s s v e l que o s do is , da aco mo da o p a s s e m
as s imila o , quan do co n flit o n un ca mais h av e r . t am
b m e x e mp lo de aco jn o da o cas o de cn juge s que , e m
de s e n t e n dime n t Oj, t o mam p r o v idn cias p ar a a s e p ar a o
judicial. D e p o is ^ aco mo dam- s e e o p t am p e la s e p ar a o
amig v e l, p o de n do , at , mais adian t e , de s is t ir e m da s e p a
r a o . N o B r as il, an t e s da in s t it ui o do div r cio , o .de s gui-
t e fo i uma s o lu o de aco mo da o . Mar ido e mulh e r , que
n o s up o r t av am mais v jv e r jun t o s , p o diam o p t ar p e la s e -
p ar a o a thoro et m ensa p e la qua , e x n b o r acn t in uas s e m
cas ado s , de ix av am de s e n t ar - s e jn e s a e de do r mir jun t o s .
1.3 Assimilao
Vimo s que _a jaco mo da o um p r o ce s s o , p _ar i_al,
co n s cie n t e e p r o v is r io , p o is as p e s s o as aco mo dadas s
mudam e x t e r n ame n t e e t m co n s cin cia da in s t ab ilidade
de s ua n v a p o s i o . C m ^ r o c e s s de as s imila o , a
co is a dife r e n t e . Co mo r e v e la a e t imo lo gia, p e s s o as as s i
miladas ch e gr gm, p e la s e me lh an a e n t r e e las , a uma s it ua
o co mo que de ide n t idade . A p r o x imam- s e t an t o que
p as s am a o cup ar o me s mo e s p a o . O e s t r an ge ir o imigr an t e
n o B r as il, que s e as s imilo u, j n o mais e s t r an ge ir o ,
ab r s ile ir o u- s e . S e gun do F ICHTER, . a mat r iz do co mp o r
t ame n t o do s as s imilado s , n o camp o s gci~e jn dic7"n o
So c i o l o g i a G e r a l e J u r d i c a
450
S i 6 0 N iS p A R T f - S o C i a t S C l J l l l D I t t
mais a jus t i a n e m a e qidade , mas o alt r u s mo , p ar a
n o dize r o amo r ,4 N o h co mo e s s a s p e s s o as s e . de s v ia
r e m do s p adr e s jur dico s de co mp o r t ame n t o e s e e n v o l-
v e r e m e m co n flit o s . Po r is s o , n o co me t e m cr ime s n e m
at o s Il cit o s . CL UD IO S OUTO e x p iica: !lQuan .t a, maio g-
s e me lh an a h o uv e r e n t r e o s p lo s in t e r at iv o s , t an t o mai
o r alip r x u o . E" quan t o maio r ap r o x ima fl_o _.e n t r e J3 s
p lo s it an t o maio r fav o r ab iMade , ao dir e it o ^5
2 PROCESSOS DISPERSIVOS
Co mo h muit as p e s s o as , b u s can do b e n s e _ s e r v i
o s , p ar a a s at is fa o d e s uas n e ce s s idade s , e b e n s e s e r
v i o s s o e s cas s o s , n o e x is t e m e m s up e r ab un dn cia,
n t ur T que , p o r e le s , s e t r av e a lut a co mp e t it iv a. En
quan t o - co mp e t i o , e s s a l u t a in co n s cie n t e _e n o acar
r e t a s p r e ju zo s ao s co mp e t ido r e s , S e a lut a co mp e t it iv a,
p o r um lado , imp o r t a d s p n dio de e n e r gia, p o r o ut r o , e le -
v a a cap acidade p r o dut iv a do s p ar t icip an t e s . S e gun do
F ICHTER, a co mp e t i o co n s ide r ada co mo uma e s p cie
de jo go ... e que s e de v e jo gar limp ame n t e ". Co mo e m t o do
jo go , ' '"x is t e mTr e gr as , e x p l cit as o u imp l cit as , o b s e r v a-
dl s ~p e lc ^ m c o m p it i o *' ,B N a co m
p e t i o e co n mica, le is a n t i t r u s t e o b je t iv am e v it ar o
mo n o p lio ; n a co mp e t i o e s p o r t iv a, o adv e r s r io s ujo , que
v io la as r e gr as , cas t igado p e lo s juize s e de s p r e zado p e lo
p b lico , , , Co m o fim de gar an t ir a lis ur a das e le i e s , p r o
mulgam- s e le is p ar a co n t r o lar o s gas t o s de camp an h a e le i
t o r al e a ap ur a o o s v o t o s .7
4 FICHTER, Joseph H. Op, cit., p 281-282.
6 SOUTO, Cludio e SOUTO, Solange. Op. cit., p. 124.
6 FICHTER, Joseph H. Op, cit., p, 279.
7 Idem, Ibidem. p. 284-285,
g e f s o n l o b o s o - f i n t o
Procssqs Sociais Dimii o
451
2,2 Conflito
Q co n flit o , co mo p r o ce s s o s o cial, n o o ut r a co is a
s e n o a co mp e t i o co n s cie n t izada e v o lt ada co n t r a as
p e s s o a s , Quan do , e m b us c a .e r e cur s o s mat e r iais .o p o s i
e s s o ciais , p e r ce b e mo s a ap r o x ima o de o ut r o s e n o s
v o lt amo s co n t r a e le s , t e n t an do o b s t ar s e us p as s o s , de i
x amo s de co mp e t ir p ar aTn o s e n v o lv e r e m co n flit o s . Es t o
e n v o lv ido s e m p r o ce s s o s de co n flit o s : p a r t e s de u m a lide
judici r ia; p at r o e o p e r r io e r x i_de man da t r ab alh is t a: j k -
v o gado s que jlut am e m fav o r de s e us clie n t e s ; e Es t ado s
que de clar am gue r r a. S e a co mp e t i o , que e in co n s cie n
t e e imp e s s o al, s e jo ga co m fair p l ay , r e gulada p e lo
dir e it o , co m mais r azo o co n flit o ~de v e ~s 4 o , o co n flit o que ,
al m de co n s cie n t e e p e s s o al, v io le n t o . A s n icas ar
mas p e r mit idas n o s co n flit o s s o ciais s o as da in t e lign
cia. A s ar mas co n v e n cio n ais , co mo t amb m^man ife s t a e s
d e v io ln cia, t ip ificadas co mo cr ime s , s o p r o ib idas / .? ,i
de fin i o , s e p ar a as p e s s o as , e o s v alo r e s que o an imam -
e go s mo , dio , e t n o ce n t r is mo - s e jam n e gat iv o s , n e m t o
do s ^ o s s e u s e fe it o s s o n e gat iv o s o u d e s in t e qr ado r e s ,
HORTON e HUN T ap o n t am, e n t r e o s e fe it o s in t e gr at iv o s
do s co n flit o s , o aume n t o d a co e s o gr up ai, a in du o a
alian as co m o ut r o s gr up o s , a man ut e n o do gr up o at e n t o
ao s in t e r e s s e s do s _s gus ._me mb r o s .8
8 HORTON , PaulB , e HUN T, Ch e s t e r L , Sociologia. Op . cit . p . 2 6 0 . p e n
s ame n t o de s s e s s o cilo go s ame r ican o s e s t alin h ado co m o de
Maquiav e l, Mar x , Co s e r e D ah r e n do r f, de n t r e o ut r o s . Ve ja, n o cap t u
lo VIII, a le it ur a Co n flit o e Mudan a", de Ralf D ah r e n do r f.
So c i o l o g i a Ge i a l e J u i d i c s
452
SegundaPmte - Sociotoat Juiota
ESQU EMA
1 COESIVOS
1.1 Co o pe r a r o
1.2 Acomodao
1.3 Assimilao
2 DISPERSIVOS
2 .1 Co m pe t i o
2 .2 Co n f l i t o
QU ESTION RIO
1 . O que , n a lin guage m de Cl udio S o ut o , o co mp o s t o
S IV?
2 . Que r e la o t e m o co mp o s t o SIV co m a fr mula P Cx S ?
3 . Co mo o dir e it o e v it a q u e a co mp e t i o e n t r e e mp r e
s r io s , p e la co n quis t a do me r cado , s e t r an s fo r me e m
co n flit o ?
4 . Quan t o mais ap r o x ima o e n t r e p lo s de in t e r a o s o
cial, t an t o maio r a fav o r ab ilidade ao dir e it o . Ex p lique .
5 . O que e x p lica a p e r m a n n c i a d a co mp e t i o e a
in t e r mit n cia do co n flit o ?
6. Po r que , n o s co n flit o s jur dico s , n e m s e mp r e h a in
t e r v e n o de t e r ce ir o s ?
7 . Cit e e x e mp lo s d e c o n fl i t o s jur d ic o s , e m r e a s d i
f e r e n t e s ,
8. Quan do o co n flit o s imp le s lit gio ?
9 . Imagin e um t ip o de co n flit o p as s an do de lit gio p ar a
co n t e n cio s o , #
1 0 . Po r que a S o cio lo gia Jur dica p r e fe r e o s fe n me n o s ju
r dico s n o co n t e n cio s o s ao s co n t e n cio s o s ?
g e f s o n T o b o s o P b
ho tt ss ss Soais f DiE itO
453
1 1 . Co mo s e p r o ce s s a o ajus t ame n t o do s h o me n s e m S o
cie dade ?
1 2 . O D ir e it o s e e n co n t r a e s t at icame n t e n a le gis la o e
din amicame n t e n a s o cie dade . Ex p lique ,
1 3 . Que m le v a p ar a a le i o que e s t n a S o cie dade ?
1 4 . E o in v e r s o : que m le v a p ar a a s o cie dade o que e s t
n a le i?
1 5 . N o mb it o do s gr up o s s o ciais , aflo r amn dir e it o s in fo r
mais . Ex p lique .
1 6 . A co mp e t i o um e s t ado de e s p r it o . Ex p lique .
1 7 . N o s p r o ce s s o s s o ciais , h man ife s t a e s e x t e r n as e
in t e r n as do co mp o r t ame n t o . Em que co n s is t e m e s t as ?
1 8 . Po r que que m v io la le is e mores e s t s e n do .in jus t o ?
1 9 . Po r que e m t o da s o cie dade h r e la e s de jus t i a?
2 0 . Co mo s e dife r e n ciam, s e gun do F ich t e r , as r e la e s de
jus t i a e as r e la e s de e quidade ?
BIBL IOGRAFIA
1, Souto, Cludio e Souto, Solange - Sociologia do Direito, op, cit.
2, Martins, J. M. Ramos - Programa de Sociologia Jurdica, op, cit.
3, Durkhem, mile - Da Diviso do Trabalho Social, op, cit.
4, Carbonnier, JeanSociologia Jurdica, op, cit,
5, Machado Neto, A. L . -Sociologia Jurdica, op. cit.
So c i o l o g i a Ge r a l e J u r d i c a
454
SiGUHM pARTt - S 0 (I 0 1 0 6I JV R iB iti
L EITU RAS
. 1. Processos Sociais e Direito (Cludio Souto e Solmge Souto)
H uma p r o p o s i o muit o alt ame n t e ge n r ica - um p o s
t ulado - que s e r ia v lida p ar a qualque r t ip o de in t e r a o s o cial
- o u v lida p ar a a in t e r a o s o cial e m ge r al, o que o me s mo .
Es s a p r o p o s i o a s e guin t e : quan t o maio r a s e me lh an a e n
t r e um p lo de in t e r a o s o cial ( t al co mo de fin ida p o r e le ) e
ut r o s ( s ) p lo ( s ) s cio - in t e r at iv o ( s )7 me n o r a d i s t n cia
e x t e r io r izada ( dada a co n h e ce r ) do p r ime ir o e m r e la o ao ( s )
o ut r o ( s ) . ...
D e p o s s e do p o s t ulado que s e me n cio n o u, r e s t ar ia que
s e t e n h a uma de fin i o s o cio lgica do dir e it o , t an t o quan t o
p o s s v e l p r e cis a, p ar a que s e p o s s a e n fr e n t ar t e o r icame n t e o
t e ma p r o ce s s o s s o ciais e dir e it o . Or a, co mo s _e v iuA direito e m
qualque r cult ur a, " p r imit iv a" o u civ ilizada, o que e s t iv e r de
aco r do co m o s e n t ime n t o h uman o de de v e r s e r , in fo r mado de
co n h e cime n t o ge r al e mp ir icame n t e co mp r o v v e l, n a jiir e it o
o ~que n o e s t iv e r de aco r do . ...
D e s s e , mo do , co mo princpio geral p ar a o r e lacio n ame n
t o e n t r e o p r o ce s s o s o cial que o dir e it o e o s o ut r o s p r o ce s s o s
s o ciais , p o de r e mo s t e r : quan t o maio r a ap r o x ima o ( o u me n o r
a dis t n cia s o cial, o que o me s mo ) e n t r e p lo s d e in t e r a o
s o cial, L m a i Q r , aJav jD r b i idad_e ao dir e it o . B as t a n o t ar que , e s -
s e n cialme n t e , um gr up o s o cial s o n a me dida e m que s e us
in div duo s s e co n s ide r am de s s e me lh an t e s e s e afas t am.
E is s o v ale p ar a qualque r gr up o que s e ja, in clus iv e p ar a
gr up o s e s s e n ciais s ub s is t n cia e de s e n v o lv ime n t o do h o me m,
co mo o s familiar e s e e co n mico s . ...
S e _a co n s ide r a o de de s s e me lh an a p r e p o n de r a^s o b r e a
de s e me lh an a, j n o h p r p r io gr up o , qualque r que s e ja, p o is
) n o e x is t e m p adr e s p r e p o n de r an t e me n t e p ar t ilh ado s . Ou, de
um mo d r iiis ge r al, s e p r e p n de r a a id ia de de s s e me lh an a
s o b r e a d s "e me lB n a e n t r e p lo s s cio jn t e r age n t e s , o r e s p e c
t iv o s js t e ma de in t e r a o e n t r a e m de s e quil b r io e s e de s in t e gr a.
Ib r amo s , de fat o , a s e guin t e gr ada o de p r o p o s i e s li
gadas ao s p o s t ulado s que se fo r mular am: ( 1) s e p r e p n de r a a
P s o a s s o s Sociais e O mito
455

.V
Q
id ia de s e me lh an a s o b r e a de de s s e me lh an a e n t r e p lo s s :
cio - in t e r age n t e s , o r e s p e ct iv o s is t e ma de in t e r a o s o cial e s t
e m e guiUb r io ( co n t r ab alan ado ", "co mp e n s ado ") ; ( 2) s e h
\{ (, e quil b r io p e r man e n t e do s is t e ma de in t e r a o s o cial, o p r o ce s -
v ' ' 1 s o s o cial ( r e s ult an t e ) A as _s o ciat iv o ( = gr up al= co o p e r at iv o ; e ( 3 )
quan t o maio r a s e me lh an a ( p r e p o n de r an t e ) e n t r e p lo s s cio -
fr d in t e r age i t e s ( t al co mo de fin ida p o r um o u v r io s de le s ) , maio r o
f " v e guilib r io do s is t e ma de jn t e r a o _s p cj_al__cqn : e s p o n de n t e ,
, N a v e r dade , o s p r o ce s s o s b s ico s do p o n t o de v is t a da
dis t an cia s o cial s o o s de ap r o x ima o ( que p o de m v ir a s e r
4^ ^ co o p e r at iv o s o u as s o ciat iv o s ) e o s de afas t ame n t o o u de
' an t o go n is mo ( o u d s s o ciat iv o s ) , Os p r ime ir o s s e e x p licam p e la
^ s e me lh an a e o s s e gun do s p e la de s s e me lh an a do s co mp o s
t o s s e n t ime n t o ide ia e v o n t ade ( co mp o s t o s siv), in div iduais
o u gr up ais , ^cio - mt e r age n t e s ."
h N a co o p e r a o , o s p lo s de in t e r a o ap r e s e n t am s e me -
lh an a do s e le me n t o s i( id ia) , co m n fas e n o s e le me n t o s , s e n
do que o e le me n t o v ( v o n t ade ) t e m um s e n t ido p o s it iv o o u
afir mat iv o da s e me lh an a - s e n t ido de co n duzir - s e de aco r do
co m a( s ) id a js ) s me lh ah t e ( s ) r ~
J _n o .an t ago n |s mo , o s jr lqs de jn t e m o ap r e s e n t am
de s e me lh an a do s e le me n t o s i, co m n fas e n e s s e s _e le me n t o s ,
t e n do r io p r o ce s s o o e le me n t o v um s e n t ido n e gat iv o da s e me
lh an a^- s e n t ido de n o co n duzir - s e de aco r do co m id ias ( s )
s e me lh an t e ( s j, ...
A r e alidade s o cial co mb in a s e mp r e o s p r o ce s s o s de ap r o -
x ima o e o s de afas t ame n t o , p o de n do o co r r e r uma maio r o u
me n o r p r e p o n de r n cia de um de le s n a r e la o de que s e t r at e .
Co mo o s h o me n s o u gr up o s in t e r age n t e s n un ca s e as s e me lh am
o u de s as s e me lh am de mo do ab s o lut o , p o r maio r que s e ja o afas
t ame n t o , h s e mp r e alguma ap r o x ima o e v ice - v e r s a.
N o h o b v iame n t e co mo co n fun dir a s e me lh an a, que
a alma do gr up o s o cial, co m ide n t idade e m s e us e le me n t o s
o r gn ico s siv. Po r is s o mo dalidade b s ica da co o p e r a o a
div is o de t r ab alh o , que s e fun da n a de s ide n t dade do s que
p ar t ilh am o lab o r , mas imp lica a s e me lh an a - s o cial, is t o
n o r mat iv a - fun dame n t al de le s .
So c i o l o g i a Ge r a l e J u r d i c o
456
S rewo* P n - S odoio i* ju fl B i a
Re p ar a- s e que a s e me lh an a social o u s e me lh an a intersiv
e x t e r io r izada., que a que n o s imp o r t a, p o de o co r r e r e m me io a
de s s e me lh an as o r gn icas o u me s mo p s quicas ( dife r e n as de
in t e lign cia- e t e mp e r ame n t o ) do s in div duo s in t e r age n t e s ,
D ur kh e im n o t ar a: "To do mun do s ab e que amamo s que m
co n o s co s e p ar e ce , que m que r que p e n s e e s in t a co mo n s ,
Mas o fe n me n o co n t r r io n o s e e n co n t r a me n o s fr e qe n
t e me n t e . A co n t e ce muit o amide - que n o s s in t amo s le v ado s
p ar a p e s s o as que n o p ar e ce m co n o s co , p r e cis ame n t e p o r que
n o p ar e ce m co n o s co . ...
Po de r iam s e r e x p licit adas , al m das t r s j v is t as , o u
t r as p r o p o s i e s t e r icas ge r ais que s e ligam ao s p o s t ulado s
e x p o s t o s e que s e r iam do in t e r e s s e e s p e cifico de s t e cap t ulo :
( 4 ) quan t o maio r o e quil b r io de um s is t e ma de in t e r at o s s o ci
ais , t an t o mais p r o n t ame n t e e le co n t r o la qualque r o co r r n cia
que p e r t ub e a s e me lh an a in t e gr ado r a do s is t e ma; ( 5 ) quan t o
me n o r a dis t n cia s o cial do p lo in t e r age n t e ( in div idual o u
gr up ai) de o ut r o p lo in t e r age n t e ( in div idual o u gr up ai) , me
n o s e n e r gia s e r n e ce s s r ia p ar a a r e ce p t iv idade de s ua co
mun ica o e p ar a o e x e r c cio do co n t r o le s o cial; ( 6) quan t o mais
a s o cializa o s e fa a n o s e n t ido da s e me lh an a e n t r e p lo s
de in t e r a o s o cial, t an t o maio r e quil b r io t e r o s is t e ma de
in t e r at o s s o ciais co r r e s p o n de n t e a e s s e s p lo s ; ( 7 ) n a me dida
e m que a s o cializa o s e faz e m t e r mo s de de s s e me lh an a e n t r e
p lo s de in t e r a o s o cial, n e s s a me dida t e n de r o o p lo o u
p lo s as s im s o cializado s a co n dut a de s e quilib r an t e do s is t e
ma de in t e r at o s s o ciais co r r e s p o n de a e s s e s p lo s .
E fin alme n t e : (8) quan t o maio r a p adr o n iza o ( un ifo r
miza o ) do e le me n t o "id ia" ( co n h e cime n t o ) de p lo s
in t e r age n t e s , t an t o maio r a s e me lh an a e n t r e e s s e s p lo s e ,
co n s e qe n t e me n t e , t an t o maio r o e quil b r io do s is t e ma de
in t e r a o s o cial co r r e s p o n de n t e ; ( 9 ) s e p lo s in t e r age n t e s t m
o s e u e le me n t o 'id ia1' p adr o n izado de mo do cie n t ifico -
e mp r ico , ( n e s s a me dida) h a m x ima p o s s ib ilidade de co n
v ic o de ade qua o r e alidade de s s e e le me n t o "id ia e , p o is ,
a m x ima p o s s ib ilidade de p adr o n iza o de s s e e le me n t o
id ia1 e , co n s e qe n t e me n t e , h a m x ima p o s s ib ilidade de
e quil b r io do s is t e ma de in t e r a o s o cial co r r e s p o n de n t e ; ( 10)
ge-B on l obesa P into
Pocbsos Sociais Dimuo
457
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3
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s
s e um co mp o s t o siv ( co mp o s t o sentimento e idia e vontade)
t e m o s e u e le me n t o / ( id ia) aco r de co m a cin cia e mp r ica at ual
( m x ima p o s s v e l de p r e cis o e ce r t e za) , ace it o , o u t e n de a
s e r ace it o , co mo o b r igat r io , e m um s is t e ma de in t e r at o s me n
t ais o u s o ciais ; e ( 11) s e um s is t e ma de in t e r at o s s o ciais co n
s ide r ado e s s e n cialme n t e ( p r in cip alme n t e ) jus t o p o r um p lo
o u p lo s in t e r age n t e s ( e , p o is , e s s e n cialme n t e s e me lh an t e a
e le s me s mo s ) , e s s e s p lo s e x p e r ime n t am ( s e n t e m) uma s it ua
o de r e lat iv a e s aud v e l s uav idade ( t r an qilidade ) afe t iv a.
Cas o co n t r ar io , as s it ua e s o s cilan t e s de agr adab ilidade e
de s agr adab il dade , s o b r e t udo as de de s agr adib ilidade , n o
s e n do s it ua e s r e lat iv ame n t e s uav e s , p r o p iciam co n di e s
p at o lgicas n o in div duo e , p o is n o s is t e ma in t e r at iv o - s o cial.
N o t e - s e que se chamamos de "dir e it o " o co mp o s t o siv
( co mp o s t o sentimento e idia n vontade) cujo e le me n t o s s e n
t ime n t o de de v e r s e r ( = agr adab ilidade = s .+ = jus t i a) e cujo
e le me n t o co n h e cime n t o de aco r do co m a cin cia e mp r ica,
as p r o p o s i e s 9 , 1 0 e 1 1 , h p o uco me n cio n adas , s e r iam
t e o r e mas j ligado s a uma Te o r ia S o cio lgica Ge r al do D ir e it o ,
* S o ut o , Cl udio e S o ut o , S o lan ge , Sociologia do Direito, Rio de
Jan e ir o / S o Paulo , L TC/ ED S fi 1 9 8 1 , p , 1 2 4 - 1 2 7 ,
2, 0 Direito como um dos Processos Sociais (J.M. Ramos Martins)
A s leis sociolgicas ( dizia Po n t e s de Mir an da e m 1 9 2 2 )
s aquis i e s r e ce n t s s imas , A p e s quis a cientfica n o do m
n io jurdico dat a de p o uco s de cn io s . A t o co me o do s culo
an t e r io r ao n o s s o , no houve,-rigorosamente, cincia jurdica, e
co mp r e e n de - s e b e m, p o r que t amb m n o e x is t iu sociologia
(Sistema, III, p . 4 ) ,
O cientista do ..dir e it o vmssuoBo socilogo, que s e e s
p e cializo u" ( Po n t e s de Mir an da, ib ide m) . , n a v e r dade , o D -
r e l t ^ u m p r o ce s s o s o cial de adap t a o , uma t cn ica
e s p e cializada de e q^b n 'H5 iT5 r c"s "i^ is 7 '<^e ~p r t e m do
indivduo, da sociedade e do s crculos sociais n t e r co r r e n t e s "
( E) jac r Me n e ze s , Introduo cincia do diriiPpTSB)^'
Co n v iv e n do n e ce s s ar iame n t e , o s h o me n s s e ajus t am p o r
processos ( r e la e s din micas ) naturais ( s o ciais ) de adap t a o ,
S o t i o l o g i o Ge m i e J u r d i c a
458 Sk u n i Pare - Socioiosi Jusdic*
do me s mo mo do co mo s e ajus t am n at ur e za f s ica, adap t an do -
s e a e la, o u adap t an do - a a s i, Es s e ajus t ame n t o s o cial s e faz
s e gun do normas, regras, preceitos das mais v ar iadas e s p cie s
( r e ligio s o s , mo r ais , jur dico s , p o l t ico s , e co n mico s e t c.) , que
s ur ge m amalgamado s e m v e r dade ir a n e b ulo s a r e gulado r a do
co mp o r t ame n t o h uman o , fix an do - s e n o s usos e costumes t r adi
cio n ais . Tkis n o r mas ap ar e ce m espontaneamente, co mo as ln
guas que falamo s ( n o s o cr ia o in div idual de n in gu m) . S o
um imp e r at iv o da p r p r ia co n v iv n cia, e s t o a s e r v i o da co e
s o do grupo. Re it e r ada me n t e cump r idas , adquir e m, p o r is s o
me s mo , o co n s e n s o geral, de mo do que cada e le me n t o do gr up o
t e m a convico ( as p e ct o s ub je t iv o ) de s ua o b r igat o r ie dade .
Po r is s o fo i que dis s e Po n t e de Mir an da: "O D ir e it o e x p r i
me a forma de existncia de n t r o do s c r culo s " (Sistema, III, p ,
2 7 ) , On de s e fo r ma um c r culo , a ap ar e ce o D ir e it o , co mo s ua
fo r ma in t e r io r . On de , p o r t an t o , h convivncia, h direito, O D i
r e it o s e e n co n t r a ( quan do s e e n co n t r a) estaticamente n a le gis
la o e , dinamicamente, co mo processo, n a s o cie dade . O t r ab alh o
e ficaz do legislador e do intrprete , quan t o ao p r ime ir o , le v ar
p ar a a. lei o que e s t n a sociedade ( o u o que a s o cie dade p e de ) ;
quan t o ao s e gun do , faze r v o lt ar s o cie dade , p e la ap lica o , as
n o r mas co n ge ladas n a le i, t e n do s e mp r e co mo r e fe r e n cial o lu
gar, o tempo e a conjuntura social a s e r dis cip lin ada.
A p r in cip io , e s t ab e le ce - s e o e quil b r io s o cial, a o r de m
jur dica, despoticamente, p e la fo r a do p o de r . Mais t ar de , co m
a p r p r ia e v o lu o s o cial, p e la b us ca de cr e s ce n t e harmonia,
p e la dimin ui o do s conflitos de classes e do despotismo pol
tico, ao t e mp o e m que s e v o , co n co mit an t e me n t e , co r r igin
do o s defeitos de adaptao, aume n t a co n t in uame n t e a
adap t a o e n t r e o s indivduos, e n t r e e s t e s e o s grupos entre
si ( in clus iv e n o p lan o in t e r n acio n al) e , afin al, co m o c r culo
m x imo - a humanidade,
Que r e mo s co n cluir e s t a Un idade dize n do que "o e s p a o
jurdico n o p r e e x s t e e x t e n s o das relaes jurdicas, p o s t o
que p r e e x is t a da le i" (Sistema, 1, p , 4 4 ) . Is t o p o s t o , n o h
lacun as n o Direito, mas n a lei, n o sistema de legalidade, uma
v e z que imp o s s v e l, s o cialme n t e , o v cuo jur dico . Po de r fa
lh ar , v e r dade , o dir e it o estatal, o dir e it o oficial, e x p r e s s o n a
Ag e r s o n T o b o s a - f i n t o
Processos So c i t i s e O m i t o
459
le i, mas , e m co mp e n s a o , n o mb it o da p lur alidade do s gr u
p o s s o ciais , que do co n s is t n cia ao que ge n e r icame n t e ch a
mamo s s o cie dade , aflo r amn-direitos in fo r mais , cujo s p r e ce it o s
s o ace it o s e ap licado s p e la co mun idade e que ap e n as , aguar -
dam s e n s ib ilidade do julgado r p ar a s e in co r p o r ar jur is p m-
5 ^ < de n c a do Po de r Judici r io , a que m in cumb e dir imir o s co n flit o s
de Jn t e r e s s e s n o ap e n as co mo fun dame n t o n as le is ab s t r a
t as , mas , r e alis t came n t e , ao calo r da s e iv a v iv a da r e s didade
s cil^ s >] c n t e .
RA MOS MA RTIN S , J. M. Um programa de Sociologia Jurdi
ca. V, I. S o L uis ; Edice uma, 1 9 9 8 , p . 8 8 - 9 0 .
3. Os fenmenos jurdicos contenciosos e no contenciosos
(Jean Carbonnier)
O co n t e n cio s o , e m v e r dade , n o s e dis t in gue do p r o ce s
s o , A s duas p alav r as p o de m s e r co n s ide r adas e quiv ale n t e s ,
e mb o r a a p r ime ir a s e ja mais e x p r e s s iv a, e v o can do me lh o r o
e s fo r o co mb at iv o de s e n cade ado p e lo co n flit o . Os fe n me n o s
co n t e n cio s o s s o , e n t o , o s que s e p r o duze m n um p r o ce s s o o u
p o r o cas io de um p r o ce s s o . O que mais p r e cis ame n t e s e p ar a
o p r o ce s s o das o ut r as r e la e s de co n flit o o mo do de s o lu o
a que r e co r r e ; a in t e r v e n o , e n t r e as duas p ar t e s an t agn ico a;
de um t e r ce ir o p e r s o n age m, o juiz, co m mis s o de de cidir , a
p as s age m da d ade t r ade co n s agr ada.
A s s im car act e r izado o co n t e n cio s o , p r e cis o co mp r e e n
de r b e m o s e n t ido da clas s ifica o que o t o ma p o r cr it r io . N o
s e t r at a de o p o r o p r o ce s s o ( e o co n jun t o do s at o r p r o ce s s uais
do s quais a s o ma: que ix a, co n t e s t a o , julgame n t o , r e cur s o ,
e t c.) a t o do s o s o ut r o s fe n me n o s jur dico s , mas , an t e s , de o p o r
dois estados possveis de qualque r fe n me n o jur dico . D e s co
b r imo s aqui um p o uco da an t t e s e , familiar ao s civ ilis t as , e n t r e
o dir e it o e m r e p o us o e o dir e it o e m p de gue r r a, que a a o
e m ju zo , Um me s mo fe n me n o jur dico , p o r e x e mp lo , a r e s -
'p o n s ab ilidade p o r um acide n t e de t r n s it o , a v alidade de um
co n t r at o , p o de s e r ap r e e n dido an t e s de um p r o ce s s o o u n um
p r o ce s s o . Quan do e le p as s a do e s t ado n o co n t e n cio s o ( ami-
So c i o l o g i o Ge r a i e J u r d i c o
460
S ku sm P me - SoaoioG i kma
g v e l, p o r as s im dize r ) ao e s t ado co n t e n cio s o , s ua e s t r ut ur a
n o muda; adquir e , co n t ado , n uma e s p cie de mo b ilidade que
a s o cio lo gia de v e le v ar e m co n t a.
A s o cio lo gia do dir e it o n o p o de r ia, s o b p e n a de ir r e a-
l s mo , de s co n h e ce r a imp o r t n cia do e s t ado co n t e n cio s o n o s
fe n me n o s que e s t uda. Vimo s , ali s , que e la ch e go u a o b s e r
v ar a p o s s ib ilidade da p as s age m ao p r o ce s s o e ao julgame n t o
( a jus t ic alidade ) , co mo s in al e s p e cifico do fe n me n o jur dico ,
e m an t t e s e ao fe n me n o co s t ume ir o . D e fat o , a t e n dn cia
in v e r s a - e x age r ar a p ar t e do co n t e n cio s o - que , n o mo me n t o ,
a mais av an ada. A o b s t r u o do dir e it o p b lico o u p r iv ado
p e la jur is p r udn cia n o o co r r e u s e m co n t amin ar a s o cio lo gia
jur dica n a me dida e m que e s t a t r ab alh ada p o r jur is t as . E o
e qu v o co da p alav r as pratica le v o u a t o mar p o r dir e it o v iv o e
quo t idian o , a p r t ica do s p r t ico s , a p r t ica judici r ia, que n o
n o fun do mais do que uma p at o lo gia. S e m dv ida , a o b s e r
v a o do s cas o s cl n ico s co n t r ib ui p ar a o p r o ce s s o da b io lo gia;
mas , de s de que e s s a o b s e r v a o s e ja r e lacio n ada co m o e s t udo
da v ida n o r mal.
Po s t ulan do ; I o que o co n t e n cio s o de fo r ma a r e alidade
do dir e it o ; 2o que o dir e it o in fin it ame n t e mais v as t o do que o
co n t e n cio s o - a s o cio lo gia jur dica, e m r e a o s at it ude s que
p r e do min am e m dir e it o do gm t ico ( do n de e las t ir am s ua le gi
t imidade ) p r e fe r e , e m p r in c p io , o s fe n me n o s jur dico s n o
co n t e n cio s o s , ao s co n t e n cio s o s .
Car b o n n ie r , Je an , Sociologia Jurdica,o p . cit . p 1 7 4 - 1 7 7 .
> 4. Justia, Equidade e Amor, como Matrizes dos Processos
Associativos 0 - H. Fichter)
J v imo s que o s co n t e do s das r e la e s s o ciais s o p a
dr e s man ife s t o s e lat e n t e s de co mp o r t ame n t o . Em o ut r as p a
lav r as , quan do an alis amo s a co o p e r a o o u o co n flit o , n o
e s t udamo s me r ame n t e as man ife s t a e s e x t e r n as de co mp o r
t ame n t o que aco mp an h am o p r o ce s s o , mas t amb m as at it u
de s in t e r n as , as id ias , o s ju zo s e as t e n dn cias r e lacio n adas
a s s e co mp o r t ame n t o . A co mp e t i o um "e s t ado de e s p r -
g e i s o n T o b o s o P i n t o
..JL
Pocssos So c u i s Oiieito 4 6 1

y t o * co mp ar t ilh ado s p o r muit as p e s s o as , co mo t amb m um
^ , p adr o de co mp o r t ame n t o e x t e r o r izado n a a o r e c p r o ca. O
J ^ me s mo s e p o de dize r da an lis e do s o ut r o s p r o ce s s o s de aco -
(/
mo da o , co o p e r a o , co n flit o , as s imila o e o p o s i o .
5 /> : H , t amb m, e m t o da s o cie dade , p adr e s co n ce p t uais
de co mp o r t ame n t o mais ge n e r alizado s , que at uam co mo uma
~v e s p cie de mat r iz co n ce p t ual, o u s up o r t e , o u b as e , do s
p r o ce s s o s as s o ciat iv o s e dis s o ciat v o s de que acab amo s de
<<
% falar . A s p r in cip ais mat r ize s _c^jace - p t uaia, do s p r o ce gjS .o s
- +, | as s o ciat iv s o a e qidade , a jus t i a e , o amo r . S o t amb m
jr 0 iy r e la e s s o ciais , ma v e z que imp licam co mp o r t ame n t o s
co n ce p t uais r e c p r o co s e n o s o me r as v ir t ude s " o u b o n s
h b it o s que e x is t am n a me n t e do in div iduo . D e fat o , n o s e
p o de co n ce b e r de o r ma r e alis t a s e n o co mo p adr e s de co m
p o r t ame n t o e n t r e duas o u mais p e s s o as e qit at iv as , jus t as ,
car it at iv as umas co m as o ut r as .
a) A jus t i a um p r o ce s s o s o cial n o qual as p e s s o as que
e s t o e m r e la o cump r e m as o b r iga e s mt uas . A r e la o
de jus t i a uma r e la o co n t r at ual, fo r mal o u in fo r mal, e m que
o s dir e it o s de uma p e s s o a o u gr up o s o a co n t r ap ar t ida do s
de v e r e s de o ut r a p e s s o a o u gr up o . O co n ce it o de jus t i a e a
e x p r e s s o e fe t iv a do p r o ce s s o s o cial de jus t i a e n co n t r am- s e
^ e m t da s o cie dade , me s mo quan do s ua fo r ma de at uar difir a
gr an de me n t e de uma s o cie dade a o ut r a.
J v imo s que o s mores s o o s p adr e s de co mp o r t ame n t o
mais imp e r at iv o s n uma dada s o cie dade . Is t o s ign ifica que a
o b r iga o de r e aliz - lo s e de p e r mit ir e e s t imular s ua r e aliza o
e x is t e ao n v e l do que as p e s s o as n a s o cie dade co n s ide r am b o m
o u mau. Quan do algu m v io la in t e n cio n alme n t e o s mores, p e
5 ' e m p e r igo o b e m- e s t ar co mum, "caus a dan o " s de mais p e s s o
as e p r o ce de de fo r ma in jus t a, N o ut r as p alav r as , a s o cie dade
ar r o ga- s e o dir e it o de e x igir co n fo r midade ao s s e us mais imp o r
t an t e p adr e s de co mp o r t ame n t o , e as p e s s o as e gr up o s que
age m de s s a man e ir a r e alizam o p r o ce s s o s o cial de jus t i a.
b ) A e qidade p r o ce s s o s o cial que at ua n as e s fe r as e m
que o s p adr e s de co mp o r t ame n t o n o e s t o de fin ido s mo r al
me n t e o u n o s e p o de m e x igir co m t o do r igo r . Os in div duo s que
faze m aquilo que p e de uma mo r al co mum" mais que o que e x -
d
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Ui.y
:
X/ > t o
So c i o l o g i a Ge i a l e j u i d c o
t o W - W
462
SSUWA P i t t - SOCIOIOI* i U P I tt
ge m a le t r a e s cr it a da le i e o r igo r das s an e s s o ciais fo r mais ,
de s e n v o lv e m r e la e s s o ciais e qit at v as , E o gn e r o de r e la o
que b r o t a da e x p e r in cia s o cial do que co r r e t o e co n v e n ie n t e
e m cada cas o . F r e qe n t e me n t e , a r e la o de e qidade s ur ge
e m s it ua e s que n o s o r e p r o du e s e x at as de s it ua e s an
t e r io r e s , co mo n o cas o de um acide n t e o u de um de s as t r e .
N o o b s t an t e , co m mais fr e qn cia, ide n t ifica- s e a r e la
o de e qidade n o amp lo camp o do s co s t ume s e do s us o s quan
do s e v r e alizar s t e s p adr e s co n cr e t ame n t e . Uma v e z mais ,
co n s ide r amo s as p e s s o as que t r at am umas co m o ut r as s o b o
as p e ct o do s o b je t iv o s s o ciais ge r ais e do b e m- e s t ar co mum,
me s mo quan do a r e la o de e qidade n o co n t e n h a s e mp r e
co n s cie n t e me n t e s t e s o b je t iv o s , O s uav e fluir dain t e r a o co
t idian a co mum p o s s v e l gr a as e qid T mais que jus t i a,
c) O amo r s o cial um amp lo p r o ce s s o ge r al e m que as
p ar t e s que in t e r age m de s e jam e faze m o que v an t ajo s o p ar a
un s e o ut r o s . D e v e - s e dis t in guir do amo r r o mn t ico e do amo r
co n jugal, Os s o cilo go ^s o me ar am a us ar o t r mo alt r u s mo "
p ar a de s ign ar s s e p r o ce s s o s o cial b s i ^ que imp lica ce r t o gr au
de s cr ificip e s s o ai e imp e , s ..p e s s o as e ao s gr up o s e x ign ci-
as m s alt as que as de j u s t i o u e ^dade , ._Em ce r t o s e n t idc^
a r e T o s gallmia s ' fun dame n t al, b s ica, s e m acat ai o s gr up o s
e as js r o ^Qde s _h uman as js e n amJn co n s e h iifiis .
O amo r s o cial n o at ua s o b p r e s s o n e m e s t ligada a
o b r iga e s e s t r it as que p o s s am s e r e x igidas p e la s o cie dade ,
Po de - s e e x e mp lificar de muit as man e ir as , e t das as v ir t ude s
ap r e ciadas s o cialme n t e , co mo a amab ilidade , a b o a- v izin h an -
a, a ge n e r o s idade e a b o a- v o n t ade , s o , s e m dv ida, man ife s
t a e s do amo r s o cial, Es t e p r o ce s s o , s o cial o an t do t o do
e go s mo , do _e t n o ce n t r is mo _fi. do - dio , e , e v ide n t e me n t e t t o do
in div duo o - de s e n v o lv e e m dife r e n t e s ^gr gus , .p s lo _ me n o s e m
algum do s p ap is que de s e mp e n h a.
Co n v m le mb r ar que aqui co n s ide r amo s s s e s p r o ce s s o s
de jus t i a, de e qidade e de amo r do p o n t o de v is t a s o cio lgico ,
e n o e m s e u as p e ct o p s ico lgico , N o n o s o cup amo s de co mo
s e de s e n v o lv e m n o co mp o r t ame n t o p e s s o al, n e m de co mo afe
t am s t e co mp o r t ame n t o . A n alis amo - lo s do p o n t o de v is t a das
Ag e t s o n l o b o s a P i n t o
h a c E s s o s S otuis e O ueiio
463
r e la e s e n t r e as p e s s o as e o s gr up o s e e m me io dle s , e n e s t e
s e n t ido e v ide n t e que o s t r s p r o ce s s o s e s t o imp licado s n as
r e la e s p o s it iv as e as s o ciat iv as de co o p e r a o , aco mo da o e
as s imila o . Quan do s o p r o fun dame n t e ar r aigadas n a cult ur a,
t e n de m a r e s t r in gir e mo de r ar o s as p e ct o s n e gat iv o s do s p r o
ce s s o s dis s o ciat iv o s de co n flit o , o p o s i o e co mp e t i o ,
F ICHTER, Jo s e p h H. Sociologia (SocioJogy). S o Paulo : He r de r ,
1 9 6 7 . p , 2 8 1 - 2 8 3 ,
GRU POS SOCIAIS E DIREITO
V
Par a a ab o r dage m do t e ma - Gr up o s S o ciais e D ir e i
t o - v amo s faze r r e mis s o ao cap t ulo V, p r ime ir a p ar t e ,
de s t e liv r o , o n de co me n t amo s de fin i e s de gr up o s s o ci
ais e de s uas car act e r s t icas . Vamo s acr e s ce n t ar mais al
gun s co me n t r io s car act e r s t ica - s o lidar ie dade -
t ip o lo gia e s fun e s do s gr up o s s o ciais , co n cluin do co m
uma r e fe r n cia ao s gr up o s in o r gan izado s .
1 DEFINI ES E CARACER STICAS
Vale , ago r a, r e v e r as duas de fin i e s , t an t o a de
PIERS ON quan t o a de Z IPPEL IUS . Emb o r a muit o s in t t i
cas , r e v e lam e las t o das as car act e r s t icas do gr up o s o ci
al: p lur alidade , in t e ia ao fin alidade e s o lidar ie dade .
2 SOL IDARIEDADE
Es s a car act e r s t ica do gr up o s o cial t e m um r e lacio
n a m e n t o mu it o e s t r e i t o co m o d i r e i t o , d a p o r q u e
D URKHEIM a ch amo u de s mb o lo v is v e l do dir e it o .1 A
co n s cin cia que o s me mb r o s de um gr up o p r imit iv o t m
de - gy e .in t e gr m ur m"un Qade .gr o Ealo s p r e dis p e a r e
p r imir , e m ge r al, co m v io ln cia, t o da t r an s gr e s s o ao di
r e it o do gr up o . Es s a s o lidar ie dade , s e gun do D URKHEIM,
me cn ica, p o r que n at ur al e e s p o n t n e a. A o fe n s a, p o r
s ua v e z, co me t ida p e la de s o b e din cia s n o r mas n o at in
gia s o me n t e a v t ima do cas o , mas o gr up o in t e ir o , que ,
t o cado p e lo s e n t ime n t o de de fe s a, aut o r izav a a p un i o .
1DURKHEIM, mile. Da Diviso Social do TYabalho Social. Op. cit., p, 31
So c i o l o g i a Ge m i e J u r d i c a
4 6 6
S s u m Pare - Socioiogia J u t o i a
D a p o r que o dir e it o p r imit iv o r e p r e s s iv o e p r e do min an t e
me n t e p e n al, Quan do os grupos s o ciais t o r n am- s e mais
co mp le x o s o u s e m o d e r n i z a m , s e u s m e m b r o s s e
co n s cie n t izam da imp o r t n cia da un idade grupEil e s e r e s
p o n s ab ilizam p o r s ua man ut e n o , A s o lidar ie dade p a s
sa a s e r o r gn ica, e o dir e it o , a s e r at r ib ut iv o , mais civ il do
que p e n al,2 E o n de que s e v e s s e dir e it o ? N a s o lidar ie
dade grupai, que s e u s mb o lo v is v e l, E o n de que v
e s s a s o lidar ie dade ? N a co o p e r a o do s h o me n s , r e s p o n
de F ICHTER, p ar a que m a s o lidar ie dade a co o p e r a o
e m a o .3
3 TIPOL OGIA
Pe lo e x ame que fize mo s , n a. p r ime ir a p a r t e , d a
t ip o lo gia do s gr up o s , j p o de mo s co n cluir p e la p r e s e n a
do dir e it o , e m s ua v ida e co n s t it ui o .
3,1 Toenntes
Co mun idade e S o cie dade - Ve jamo s 0 q u e diz
RA MN S ORIA N O, c o m e n t an d o a c la s s if i c a o do s
gur p o s de TOEN N IES :
A s co mun idade s ! .] s e car act e r izam p o r e s cas
s a mat r ia jur dica. A s co mun idade s an t igas
ain da n o s e fize r am co mp le x as p ar a n e ce s s i
t ar uma amp la r e gula o jur dica, A s co mun i
dade s at uais de n v am de s o cie dade s co mp le x as
fo r t e me n t e co n figur adas p e lo dir e it o , e p r e t e n
de m um mo de lo de v ida s imp le s e m que o di
r e it o t e n h a, e s cas s a p r e s e n a, O dir e it o , p e lo
2Ide m, Ib ide m, p , 3 9 - 1 0 9 .
3 F ICHTER, J, H, Sociologia, Op , cit ., p . 2 7 4 ,
gerson lobosq.Pii
Gl t UP OS SOCIAIS r IH I T O
467
co n t r r io , o t ip o de r e gr a p r p r io das s o cie da
de s ; a ab un dn cia de mat r ia jur dica n e s t e s
agr up ame n t o s um s in al de co mp le x idade e
imp o r t n cia. Quan t o maio r e s s o as s o cie da
de s , mais co n t r at uais s o s uas r e la e s a n v e l
in t e r s ub je t iv o e mais r e gulame n t adas p e lo di
r e it o a n v e l o b je t iv o , N as gr an de s s o cie dade s ,
a r e gul h i n t a o jur dica alcan a as quo t as
mais alt as da b ur o cr at iza o N e s s e t ip o de
s o cie dade o p r in c p io b s ico de o r gan iza o e
at ua o a r acio n aliza o e e s t a le v ada a
cab o at r av s do dir e it o : dir e it o que s e t r aduz
e m n o r mas ge r ais e p r e e s t ab e le cidas .4
Es s as s o cie dade s , e m s ua gr an de maio r ia, go zam, e m
dir e it o b r as ile ir o , de p e r s o n alidade jur dica e ab r an ge m n o
s as p e s s o as jur dicas de dir e it o p b lico in t e r n o , mas t am
b m as as s o cia e s e fun da e s de dir e it o p r iv ado .6
3.2 Coolcy
Gr up o s Pr im r io s e Gr up o s S e cun d r io s - S o me n t e
fam lia, gr up o p r im r io p o r e x ce ln cia, mas que n o
p e s s o a jur dica, a co n s t it ui o fe de r al de dica t o do um
cap t ulo , e o n o v o cdigo civ il, quas e t r e ze n t o s ar t igo s , o
que r e v e la, de man e ir a e lo qe n t e a amp lit ude da r e gula
me n t a o jur dica.6
3 3 Parsons
S is t e ma S o cial e S ub s is t e mas - S e gun do PA RS ON S
e o s fun cio n alis t as , e m ge r al, a e x p r e s s o s is t e ma s o cial
4 S ORIA N O, Ramn . Sociologia dei Derecho. Op . cit ., p . 2 6 4 .
5 S o Cdigo Civ il de dica 2 9 ar t igo s mai r ia, do 4 0 ao 6 9 .
6 Co n s t it ui o F e de r al, cap t ulo VI do t t ulo VIII, do ar t . 2 2 6 ao 2 3 0 .
Cdigo Civ il, do ar t . 1 5 1 1 ao 1 7 8 3 .
S o t i o l o g i o Ge i o l e J u r d i c o
468
S GUND P i l f - SOCIOIOGI J i i l t t
co r r e s p o n de s o cie dade glo b al, e o s s ub s is t e mas , ao s
gr up o s p ar t icular e s . Os co mp o n e n t e s do s is t e m a s o cial
s o as co le t iv idade s , o s p ap is , as n o r mas e v alo r e s . E,
quan t o PA RS ON S diz que "o n cle o de uma s o cie dade ( o u
s is t e ma s o cial) a o r de m n o r mat iv a p adr o n izada"7 que r
e le r e al ar a p ar t icip a o do dir e it o , ao lado d e o ut r o s s is
t e mas n o r mat iv o s , n a v ida do s gr up o s s o ciais .
4 FU N ES
D iz- s e que o s is t e ma s o cial, co mo s o cie dade glo b al,
s up r afun cio n al, e s t acima das fun e s , das fun e s e s
p e c ficas p r p r ias do s s ub s is t e mas . A s o cie dade b r as ile i
r a, p o r e x e mp lo , n o r e s p o n s v e l p e la fun o e ducacio n al,
mas s im o s gr up o s s o ciais in t e gr an t e s do s ub s is t e ma e du
cacio n al. Par a de s t acar a p r e s e n a do dir e it o e m t o do o s is
t e ma s o cial, b as t a mo s t r ar que t o do s o s gr up o s p ar t icular e s ,
r e s p o n s v e is p e las fun e s s o ciais b s icas , s o r e gulado s
p o r n o r mas jur dicas . A lgun s d e s s e s gr up o s , co mo as igr e
jas , e x is t e m a r e g- lo s do is dir e it o s , o civ il e o can n ico .
5 GRU POS INORGANIZ ADOS E DIREITO
D o s gr up o s in o r gan izado s , co mo mult ido , p b lico e
mas s a, p o r s ua imp o r t n cia me n o r , o dir e it o n o cuida, n e m
t amb m a S o cio lo gia Jur dica Que m v ai r e s p o n s ab ilizar - s e
p e lo que uma mult ido fize r ? N o s e r o as p e s s o as is o ladas ,
in t e gr an t e s de la, p o is n a mult ido , e las s e de s p e r s o n alizam
e s o ir r e s p o n s v e is . N e m a mult ido , e la p r p r ia, j que
n o t e m p e r s o n alidade jur dica. D iz CL UD IO S OUTO;
7 PA RS ON S , Talco t t , Sociedades: Pe r s p e ct iv as Ev o lut iv as e Co mp ar a
t iv as (Societies; Ev o lut io n &r y an d Co mp ar at iv e Pe r s p e ct iv e s ) , S o
Paulo : Pio n e ir a, 1 9 6 9 . p , 2 0 .
getson TobosaPnfo
G turos Sociais Di k i i o
469
Em face _dag car act e r s t icas da mult ido - j^n s -
t ab ilidade , r adicalis mo e co n t r adit o r ie dade e m
s uas ide ias 'dmun s , que s o ap e h as lr ucmn -
t ar e s , e , e s p e cialme n t e uma t o n alidade
alt is s imame n t e afe t iv a e n e r v o s a que p e r t ur b a
co n s ide r a e s r acio n ais - n o t a- s e que n o e la,
e m ge r al, fav o r v e l ao dir e it o , s e n do s o b r e t udo
de s fav o r v e l ao dir e it o r e fle t ido ,8
ESQU EMA
1 DEFINIES E CARACTERSTICAS
2 SOLIDARIEDADE
3 T I P O L O G I A
3.1 T o e n n i e s
3 . 1 . 1 Co m u n i d a d e
3 . 1 . 2 So c i e d a d e
3.2 Cooley
3.2 .1 Gr u po s pr i m r i o s
3.2 .2 Gr u po s s e c u n d r i o s
3.3 P a r s o n s
3.3.1 Si s t e m a s o c i a l
3.3.2 Su b s i s t e m a s
4 FUNES
5 GRUPOS INQRGANIZAGOSE DIREITO
8 S OUTO, Cl udio e S OUTO, S o lan ge . Op . cit ., p . 1 3 1 .
Sociologio Geial e jurdico
4 7 0
Schjhoa Paif - SoctoioeuM ica
QU ESTION RIO
1. S e gun do Pie r s o n , o que p r e dis p e o s me mb r o s do gr u
p o a o co n jugada?
2 . Par a Z ip p e lius , o que in cut e n o s in div duo s as s o cia
do s a co n s cin cia d a un idade gr up ai?
3 . Quais s o as 4 p r in cip ais car act e r s t icas do gr up o s o cial?
4. Que r e la o t e m s o lidar ie dade co m o dir e it o ? i
5. qual das car act e r s t icas do gr up o s e v in culam a 3
n o r mas e o s v alo r e s ?
6. Po r que n e m t o do gr up o t e m p e r s o n alidade jur dica?
7. O que s o o s p ap is , n a e s t r u t ur a do s gr up o s s o ciais ?
8. Po r que s e diz in t e gr ado r a a fun o e x e r cida p e lo s r
go s de jus t i a? 2 '2 'J ".1 t~-
9. p o r que as co mun idade s us am me n o s n o r mas jur di
cas do que as s o cie dade s ? 4 k b l- f- b T
1 0 . D is t in ga gr up o p ar t icular de s o cie dade glo b al.
1 1 . Par s o n s dis s e que n cle o de uma s o cie dade a o r de m
n o r mat iv a p adr o n izada. Ex p lique .
1 2 . Qual o p ap e l do s is t e ma le gal n as co mun idade s e
s o cie dade s de To e n n ie s ? 4 fe fc> f
1 3 . Mo s t r e a e x is t n cia, n a F A 7 , das 4 cat e go r ias e s t r u t u
r ais do s is t e ma s o cial.
1 4 . Mo s t r e que as p e s s o as f s icas t m mais dir e it o s do que
as p e s s o as jur dicas . 1
1 5 . Par a D ur kh e im, que r e la o t e m a s o lidar ie dade s o cial
co mo dir e it o ?
1 6 . D is t in ga s o lidar ie dade me cn ica de s o lidar ie dade o r
gn ica. ; i : V ' , ; -1 1 - '
1 7 . Que r e la o t e m s o lidar ie dade me cn ica co m o dir e it o
r e p r e s s iv o ? i, / ^ "7 ]c., 4 ( j
A gerson l obosa
GU OS So ci ai s Dl K I O
471
1 8 . A p o n t e e x e mp lo h is t r ico do dir e it o de Pas r gada. 1
1 9 . Mo s t r e a fun o p o l t ica s e n do e x e r cida p o r cada um
do s 3 p o de r e s do Es t ado . -
2 0 . Co mo S an , Tiago D an t as de fin iu a s o lidar ie dade ?
BIBL IOGRAFIA
1. Co t t e r r e ll, Ro ge r , Introduccin a ia Sociologia delDerecho,
(Sociology of Law: an Introduction),op.cit.
2 . D ur kh e im, mile , Diviso do Trabalho Social,op. cit . .
3 . S me ls e r , N e il J, Sociologia da Vida Econmica, ( Sociology of
Economic Life) o p . cit .
4 . S o r an o , Ramn , Sociologia dei Derecho, o p . cit
5 . S o ut o , Cl udio e S o ut o , S o lo n ge , Sociologia do D ir e it o , o p .cit .
So c i o l o g i a Ge r a l e J u i d i c a
4 7 2
Sl CUXDA P t i l i - S0(l 0t 06i jutiCIH
L EITU RAS
1. Sociedades, Solidariedade Grupai e Direito em Durkheim
( A ge r s o n Tab o s a Pin t o )
A le it ur a do liv r o Da Diviso do Trabalho Social le v o u-
me a r e fle t ir s o b r e s e D ur kh e im, que figur a e n t r e o s fun dado -
r e s - da S o cio lo gia Jur dica, t in h a r azo quan do de fe n de u, co mo
e v o lu o n at ur al do D ir e it o , a_que la que v ai do dir e it o r e p r e s s i
v o ao dir e it o r e s t it ut iv o . Par a D ur kh e im, o D ir e it o s mb o lo
v is v e l da s o lidar ie dade s o cial. ... O D ir e it o , n as s o cie dade s
p r imit iv as , r e v e ia- s e de fo r ma r e p r e s s iv a, p r o duzin do a s o lida
r ie dade me cn ica, , de fo r ma r e s t it ut iv a, n as s o cie dade s mais
e v o lu das , ge r an do s o lidar ie dade o r gn ica.
A p alav r a s o lidar ie dade v e m do lat im -solidum - que s ig
n ifica in t e ir o ^iidar ie dade s o cial o u gr up ai a co n s cin cia que
cada in div iduo t e m de que in t gr a un idade gr up e 3 |A co n s ci-
n cia, verbi gratia, que t m o s filh o s de in t e gr ar e m, co m o s p ais ,
o gr up o fam lia; que t m o s alun o s de in t e gr ar e m, co m o s p r o
fe s s o r e s e fun cio n r io s , o gr up o e s co la;|jue t m o s cidado s de
in t e gr ar e m, co m o s go v e r n an t e s , o gr up o Es t adi Quan t o mais
v iv a fo r e s s a co n s cin cia, mli~iffiii^ cgs o _ o gr up o . O
dir e it o , co mo r e gr a de co n dut a s an cio n ada", t e m p o r fun o a
man ut e n o de s s a s o lidar ie dade . Po r is s o e le o s e u s mb o lo
v is v e l. A s o lidar ie dade da s o cie dade s imp le s , p r imit iv a, h o mo
gn e a, D ur kh e im ch amo u- a de me cn ica, p o r que n at ur al, e s
p o n t n e a, in fo r mal, in co n s ce n t e , A __mdife r e n cia o fun cio n al
t o ma o s in div duo s , de n t r o do gr up o , s e me lh an t e s . A de r e m e le s
t o t alme n t e a gr up o , p e r de n do co mo que s ua in div idualidade ,
o u s ua p e r s o n alidade , A p adr o n iza o do co mp o r t ame n t o r e
fle x o de s s a h o mo ge n e idade , que faz o dir e it o man ife s t ar - s e s e m
p r e e m fo r ma de co s t ume , e co n fun de o dir e it o h uman o (jus)
co m o dir e it o div in o (fas). Po r is s o , a n o r ma jur dica e r a s an t a,
e la p r e cis av a de s an o - Quan do algu m co me t e um cr ime , al m
do p r e ju zo caus ado v t ima, t r an s gr ide uma n o r ma jur dica, "
me lin dr a o s s e n t ime n t o s que s e e n co n t r am e m t o das as co n s ci
n cias s adias do me s mo t ip o s o cial" e p r o v o ca at a ir a do s de u-
A g e i s o n l a b o s o P i n t o
Grupos Sociais e D u m o
473
s e s , A h ar mo n ia do gr up o , afe t ada p e lo cr ime , t e m liga o co m
a p ax deorum, da p o r que a r e p r e s s o n o s e faz e s p e r ar . A s
p e n as , in s t r ume n t o s de s s a r e p r e s s o , p r imam p e la s e v e r idade ,
s e m que s ua in t e n s idade co r r e s p o n da s e mp r e gr av idade do
male f cio ... S e gun do a t e o r ia n e o - e v o lucio n is t a de D ur kh e im, o
que fe z a t r an s fo r ma o da s o cie dade r o man a ar caica r umo
mo de r n iza o fo i s ua cr e s ce n t e dife r e n cia o . D ife r e n cia o de
s uas e s t r ut ur as e fun e s , n a lin guage m fun cio n alis t a. E, co m a
s o cie dade , mo de mizo u- s e t amb m o s e u dir e it o , e , mais e s p e ci
ficame n t e , o s e u dir e it o p e n al. Ex amin e mo s , co m D ur kh e im, e s s e
fe n me n o , o b s e r v an do o s ur gime n t o de n o v o t ip o de s o lidar ie
dade s o cial, a s o lidar ie dade o r gn ica, co m o p r o gr e s s o do dir e i
t o r e s t it ut iv o , e o s p r o ce s s o s de s e cular iza o e p ub liciza o do
dir e it o , e , p o r fim, aco mp an h an do a t r an s i o do s de lit o s p r iv a
do s e quas e - de lit o s p ar a o s at o s il cit o s .
A s o cie dade h o mo gn e a p r imit iv a, imp uls io n ada p e la di
fe r e n cia o , co me a a div idir - s e e m s o cie dade s s e gme n t r ias .
Em Ro ma, e s s e p r o ce s s o co me o u muit o ce do . A s t r s t r ib o s
do n cle o p r imit iv o p r o duzir am, cada uma, 10 ge n t e s , cada uma
das quais o r igin o u 1 0 fam lias . A s s im, e r am 3 0 0 familias p at r i
ar cais , t o das iguais , co m de ze n as e ce n t e n as de personae, qua
s e t o das iguais , aliem juris, p o is s e r as ui juris que m n o t iv e s s e
as ce n de n t e v ar o v iv o . Er a um s t ip o de o r gan iza o familiar
co m s o me n t e duas fun e s : a de ch e fia, do pater e a de s ub o r
din a o , do s p ar e n t e s . A o lado da fam lia p at r iar cal, h av ia a
o r gan iza o p o l t ica da civitas mo n r quica, in t e gr ada p e lo s
eives e ch e fiada p e lo r e x , que co n ce n t r av a e m s uas mo s t o
das as fun e s go v e r n ame n t ais . O e x clus iv s mo o u
p ar t icular is mo t an t o do gr up o familiar , quan t o da s o cie dade
p o l t ica e r a s in al de at r as o , p o is s e o p un h a ao un iv e r s alis mo ,
v ar i v e l car act e r izado r a de mo de r n iza o -
A e x is t n cia de s t as duas r e alidade s dis t in t as - a fam
lia e o Es t ado r e guladas amb as p o r n o r mas jur dicas , de v e
t e r in s p ir ado a Ulp ian o aque la clas s ifica o b ip ar t ida ( d u a e
positiones) do dir e it o , ain da h o je ut ilizada. S e r publicum jus
aque le dir e it o cujo in t e r e s s e maio r fo r do Es t ado o u do p o v o
( guo d ad statum rei Eomanae spectat) e prvatum jus, aque le
S oc ol og o G ero! e Jur d co
474
Segvnm Pa i - Sooooou J w i m
que r e gular mat r ia de in t e r e s s e p r e v ale ce n t e do p ar t icular
(quod ad singulorum utilitatem), Es s a dualidade de v e t e r in s
p ir ado t amb m a D ur kh e im a co n ce p o do dir e it o r e p r e s s iv o
e do dir e it o r e s t it ut iv o , e mb as an do aque le a s o lidar ie dade
me cn ica, e e s t e , a s o lidar ie dade o r gn ica, Par a D ur kh e im, o
dir e it o r e s t it ut iv o aque le que **n o imp lica n e ce s s ar iame n t e
um s o fn me n t o do age n t e " ( co mo o dir e it o r e p r e s s iv o ) , " - mas
co n s is t e ap e n as n a r e p ar a o das co is as t n o r e s t ab e le cime n t o
das r e la e s p e r t ur b adas s o b s ua fo r ma n o r mal, que r o jajo
in cr imin ado s e ja r e co n duzido fo r a ao t ip o de que de s v io u,
que r s e ja an ulado , is t o , p r iv ado de t o do e qualque r v alo r s o
cial". Co mp r e e n de e le "o dir e it o civ il, : o dir e it o co me r cial, o di
r e it o p r o ce s s ual, o dir e it o admin is t r at iv o e co n s t it ucio n al,
faze n do - s e ab s t r a o das r e gr as p e n ais que s e p o de m e n co n
t r ar ai , Co mo e s s e dir e it o p r p r io das s o cie dade s dife r e n ci
adas , e le p r p r io s e dife r e n cia e *' cr ia r go s cada v e z mais
e s p e ciais : t r ib un ais co n s ular e s , t r ib un ais t r ab alh is t as , t r ib u
n ais admin is t r at iv o s de t o da s o r t e . Me s mo e m s ua p ar t e mais
ge r al, a s ab e r , o dir e it o civ il, e le s e n t r a e m e x e r c cio gr a as a
fun cio n r io s p ar t icular e s : magis t r ado s , adv o gado s , e t c, , que
s e t o r n ar am ap t o s a e s s e p ap e l gr a as a uma cult ur a t o da e s
p e cial". A s o lidar ie dade s o cial, s imb o lizada p e lo dir e it o co o
p e r at iv o , "s e as s e me lh a, e x p lica D ur kh e im, que e n co n t r amo s
n o s an imais s up e r io r e s . D e fat o , cada r go a t e m s ua
fis io n o mia e s p e cial, s ua aut o n o mia, e co n t udo a un idade do
o r gan is mo t an t o maio r quan t o mais a c e n t ua da e s s a
in div idua o das p ar t e s . D e v ido a e s s a an alo gia, p r o p o mo s
ch amar de o r gn ica a s o lidar ie dade de v ida div is o do t r ab a
lh o ". Po r e s s a s o lidar ie dade , de fat o , p o r um lado , cada um
de p e n de t an t o mais e s t r e it ame n t e da s o cie dade , quan t o mais
div idido fo r o t r ab alh o n e la e , de o ut r o , a at iv idade de cada um
t an t o mais p e s s o al quan t o mais fo r e s p e cializada".
8Tab o s a, A ge r s o n , in Direito Penal e Modernizao: da Repres
so Restituio na Eevoluo do Direito Romano; Co mun i
ca o ap r e s e n t ada n o VII Co n gr e s o In t e r n acio n al y X
Ib e r o ame r ican o de D e r e ch o Ro man o , A l can t e - Elch e ,
Es p an a, 2 0 0 4 , p p . 5 - 1 8 ,
Ag e r s o n loboso P i n t o
4
~4-
Gucos' Sociais D e i i o
475
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C!
" 3
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1
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1
O
; S
2, Grupos Sociais e Personalidade Jurdica (San Tiago Dantas)
Que m j e s t udo u s o cio lo gia, s ab e o que v e m a s e r gr up o
s o cial, as s uas car act e r s t icas , e n t r e as quais av ult a a que o s
s o cilo go s ch amam a conscincia de ns prprios.
O gr up o s o cial s e n t e que uma co le t iv idade ; e n t r e o s
s e us me mb r o s h uma co mun h o co n s cie n t e de v ida e de in t e
r e s s e s . A fam lia, as co r p o r a e s , o s s in dicat o s , o s mun ic p io s ,
o p r p r io Es t ado , as as s o cia e s de t o do gn e r o , p ar a fin s co
me r ciais o u civ is , s o gr up o s s o ciais , cuja n at ur e za v ar ia co n
fo r me s e t r at e de um gr up o fo r mado p e la in flun cia de fat o r e s
n at ur ais , co n fo r me s e t r at e de um gr up o fo r mado p e la s imp le s
v o n t ade do s s e us me mb r o s , e t c.; mas t o do s e s s e s e x e mp lar e s
e s t o de n t r o da cat e go r ia.
Is t o que o s o cilo go o b s e r v a, co n s ide r an do a s o cie dade
co mo um o b je t o n at ur al, co mo uma p ar t e da n at ur e za, a s ab e r ,
a e x is t n cia do s gr up o s s o ciais , n o p o d^e ix ar jie jr adu^ir r s e
n a v ida jur dica, p o is que e s s e s gr up o s s o ciais t m uma at iv i
dade dir igida s at is fa o do s s e us - in t e r e s s e s e e s s as at iv ida-
de s n o p o de m de ix ar de e s t ar r e guladas p e lo D ir e it o . t
Te m- s e , p o r t an t o , que de s co b r ir a que co r r e s p o n de , n a
o r de m jur dica, o gr up o s o cial que s e o b s e r v a quan do s e e s t u- .f
da a s o cie dade , n at ur alis t icame n t e , O gr up o s o cial co r r e s p o n de , ^
n a o r de m jur dica, quilo que ch amamo s uma Pessoa Jurdica.
A p e s s o a jur dica co n t r ap e - s e , p o r co n s e guin t e , p e s
s o a f s ica o u n at ur al, p o r que e n quan t o a p e s s o a n at ur al o
p r p r io h o me m, n o e x e r c cio de s uas at iv idade s in div iduais , a
p e s s o a jur dica um gr up o s o cial, um aglo me r ado de h o me n s ,
e n t r e o s quais s e e s t ab e le ce um v n culo de n at ur e za div e r s a,
co n fo r me as fin alidade s a que o gr up o s e p r o p e .
N o D ir e it o mo de r n o , o co n ce it o de p e s s o a jur dica uma
cat e go r ia co mp le t ame n t e e lab o r ada. Te m- s e uma n o o p e r
fe it a do que s e ja a p e s s o a jur dica e e s s a n o o s e co n s t r i
e s p e cialme n t e , gr a as ao p ar ale lo co m a p e s s o a n at ur al; a p e s
s o al n at ur al, que faz de la um s uje it o un o de dir e it o s e de o b r i
ga e s , v e r ifica- s e e m r e la o p e s s o a jur dica e o p ar ale lo
v ai lo n ge , p o r que , as s im co mo e s t udamo s o p r in c p io e o fim
da p e r s o n alidade n at ur al, faze n do - o da dat a do n as cime n t o
So c i o l o g i a Ge r a l e J u r d i c a
476
SreuNOA Parie - Socioosia Ju i I i u
at mo r t e , e s t udamo s o p r in c p io e o fim da p e s s o a jur dica;
e s t udam- s e t o das as s uas p e culiar idade s , t al co mo s e a p e s
s o a jur dica dis p us e s s e de um v e r dade ir o status.
O D ir e it o r o man o n o t e v e uma n o o p e r fe it a da p e s
s o a jur dica. Es t a co n s t r u o a que ch e gamo s n o e r a p at e n
t e da p e s s o a ao s r o man is t as . O que n o que r dize r que , n a
v ida jur dica daque le t e mp o , n o e x is t is s e m o s gr up o s s o ci
ais cuja at iv idade p r e cis av a s e r de v idame n t e co n s o lidada p e lo
dir e it o . Mas , o s r o man o s ap e n as r e co n h e ce r am a e s s e s e r v i
o ce r t o s at r ib ut o s da p e s s o a, s e m jamais afir mar que e le s
fo s s e m uma p e s s o a.
A fir mar , p o r e x e mp lo , que um collegium, que uma
sodalitas e r a uma p e s s o a, fo i co is a que o D ir e it o r o man o ja
mais fe z; ap e n as o D ir e it o Ro man o co n fe r ia a e s s e s gr up o s ce r
t o s at r ib ut o s p e s s o ais , p r in cip alme n t e do is : a faculdade de s e
r e p r e s e n t ar e m e m ju zo p o r uma n ica p e s s o a - um actor o u
sundicus - e a faculdade de p o s s uir um p at r imn io - ar ca; de
t e r uma ar ca p r p r ia, is t o , t e r a s ua e co n o mia dis t in t a de
p at r imn io de t o do s o s s e us me mb r o s .
D e v e - s e o co n ce it o de p e s s o a jur dica ao D ir e it o can n ico ,
G D ir e it o can n ico t e v e s e mp r e um p r o b le ma: de fin ir a n at ur e
za da ecclesia.
Que a igr e ja? A igr e ja n o , de mo do algum a co le t iv i
dade do s fi is ; a igr e ja n o e r a, co mo uma co r p o r a o de o fici
ais do me s mo o f cio n o mun do r o man o u, n o mun do me die v al:
uma o r gan iza o co r p o r at iv a.
Os fie is e s t av amn a Igr e ja, mas n o e r am a Igr e ja: a Igr e
ja e r a um corpus m s t ico ; e r a uma e n t idade e s p ir it ual e , e n t r e
t an t o , do t ada de uma e x is t n cia mat e r ial s e n s v e l.
Par t in do de s t e s dado s , o s e an o n is t as imagin ar am e s t a
p e r s o n alidade ab s t r at a que p o de m t e r ce r t as o r gan iza e s
co le t iv as e que s e n o co n fun de co m o s me mb r o s que n e la
mo me n t an e ame n t e s e e n co n t r am. Po de m mudar t o do s o s fie s ,
p o de m me s mo de s ap ar e ce r e n e m p o r is s o a Igr e ja de ix a de
s e r uma p e s s o a que n o s o fr e u n a s ua e x is t n cia n e n h uma
mut ila o , p o r que e la uma o r gan iza o ide al que s e mat e r ia
liza n aque le s o b je t o s , n aque le s b e n s mv e is o u imv e is de que
e la p r e cis a p ar a a r e aliza o das s uas fun e s .
Ag e t s o n T o b o s o P i n t o
Grupos Sociais e Direito
477
Es t a co n ce p o do s can o n is t as , que n o co r p o m s t ico
v ir am uma e n t idade jur dica, p e r mit iu que s e in s in uas s e n o
dir e it o a n o o que h o je e m dia flo r e s ce r ia co m a n o o de p e s
s o a jur dica,
D A N TA S , S an Tiago , Programa de Direito Civil, 2 . e d., 1, Par t e
Ge r al. Rio de Jan e ir o : Edit o r a Rio , 1 9 7 9 . p . 2 0 6 - 2 0 8 ,
3. Direito de Pasrgada (Boaventura de Sousa Santos)
A p r o life r a o do s b air r o s mar gin ais n o s gr an de s ce n
t r o s ur b an o s do s p a s e s do ch amado t e r ce ir o mun do co n s t it ui
uma das car act e r s t icas mais s alie n t e s do p r o ce s s o de r e p r o
du o s o cial do o p e r ar iado in dus t r ial ( e do e x r cit o de r e s e r
v a) n o cap it alis mo p e r if r ico ,1 S e gun do o s me lh o r e s , c lculo s *
e m fin ais da d cada de 6 0 a p o p ula o t o t al das ce r ca de du-
ze n t as fav e las do Rio de Jan e ir o o s cilav a e n t r e 8 0 0 0 0 0 a 1 0 0 0
0 0 0 , is t o , ce r t a de 'A da p o p ula o t o t al da cidade . Pas r gada
uma das maio r e s e mais an t igas fav e las do Rio , t e n do act ul-
me n t e uma p o p ula o s up e r io r a 6 0 000 p e s s o as e o cup an do
uma v as t a r e a n uma das zo n as in dus t r iais da cidade , Co mo
aco n t e ce e m ge r al n as fav e las , e s t a o cup a o ile gal e , n o
cas o de Pas r gada, in icio u- s e n o p r in c p io da d cada de 3 0 n um
t e r r e n o , s it uado e n t o n o s ar r e do r e s da cidade , que e r a n a al
t ur a p r o p r ie dade p r iv ada, p as s an do mais t ar de a p r o p r ie dade
do e s t ado .
Em Pas r gada a as s o cia o de mo r ado r e s ce do p as s o u
a s e r co n h e cida p e la s ua in t e r v e n o n as r e la e s s o ciais e n
t r e v izin h o s , s o b r e t udo n aque las que e n v o lv e s s e m dir e it o s s o
b r e a h ab it a o o u a t e r r a, uma in t e r v e n o qt ie , ali s , n o e r a,
e m t e r mo s ge r ais , in dit a n a co mun idade , uma v e z que
co n t in uav a de mo do mais s is t e m t ico e me n o s p r e c r io a in
t e r v e n o an t e r io r me n t e as s umida p o r o ut r as in s t it ui e s co
mun it r ias e n o me adame n t e p e lo s leaders lo cais ,2
O dir e it o de Pas r gada um dir e it o p ar ale lo n o
o ficial, co b r in do uma in t e r a o jur dica muit o in t e n s a mar
ge m do s is t e ma jur dico e s t at al ( o dir e it o do as falt o , co mo lh e
ch amam o s mo r ado r e s das fav e las , p o r s e r o dir e it o que v igo r a
So c i o l o g i a Ge r a l e J u r d i c a
478
S f G U H D / t P s C t t - S o C I O t O B J u l O I C A
ap e n as n as zo n as ur b an izadas e , p o r t an t o , co m p av ime n t o s
as falt ado s ) . Ob v iame n t e , o dir e it o de Pas r gada ap e n as v li
do n o s e io da co mun idade e a s ua e s t r ut ur a n o r mat iv a as s e zit a
n a inverso da norma bsica (grundnorm) da p r o p r ie dade , at r a
v s da qual o e s t at ut o jur dico da t e r r a de Pas r gada co n s e
qe n t e me n t e in v e r t ido : a o cup a o ile gal ( s e gun do o dir e it o
do as falt o ) t r an s fo r ma- s e e m p o s s e e p r o p r ie dade le gais ( s e
gun do o dir e it o de Pas r gada) .
A act iv idade da as s o cia o de mo r ado r e s , e n quan t o
forum jur dico , r e p ar t e - s e p o r duas r e as dis t in t as : a r at ifica
o de r e la e s jur dicas e . a r e s glu q_das dis p ut as o u lit gio s
de las e me r ge n t e s , Quan do do is o u mais mo r ado r e s de s e jam
ce le b r ar um co n t r at o ( o u e s t ab e le ce r e n t r e s i qualque r o ut r a
r e la o jur dica) , p o de m v ir av is t ar - s e co m o p r e s ide n t e da as
s o cia o de mo r ado r e s . Vm n o r malme n t e aco mp an h ado s p o r
familiar e s , v izin h o s o u amigo s , algun s do s quais s e r v ir o de
t e s t e mun h as . A s p ar t e s e x p licam o s s e us p r o p s it o s ao p r e s i
de n t e e e s t e , de p o is de as o uv ir , in t e r r o ga- as at s e co n s ide r ar
e s clar e cido s o b r e a n at ur e za e le git imidade da r e la o jur di
ca, o s e u o b je ct o , a fir me za e aut o n o mia da v o n t ade das p ar
t e s , e s o b r e t udo a s e r ie dade do co mp r o mis s o p ar a cump r ir as
o b r iga e s r e cip r o came n t e as s umidas . O t e o r do co n t r at o
e n t o e lab o r ado p e lo p r e s ide n t e , p o r v e ze s co m b as e n um t e x
t o p r e p ar ado p e las p ar t e s . Em ce r t o t ip o de co n t r at o s ( p o r e x e m
p lo , co n t r at o s de ar r e n dame n t o ) , co mum o r e cur s o s a fr mulas
de r o t in a s e me lh an t e s s us adas n o s co n t r at o s do me s mo t ip o
ce le b r ado s p e r an t e o dir e it o o ficial.
Quan do um co n flit o s ur ge e n t r e v izin h o s , a as s o cia o
p o de s e r ch amada a r e s o lv - lo e n e s s e cas o accio n ado um
p r o ce s s o ( fle x v e l) , que t ip icame n t e t e m o s s e guin t e s t r mi
t e s . A p ar t e que ix o s a ap r e s e n t a o cas o n a as s o cia o p e r an t e
o p r e s ide n t e que , de s e guida, a in t e r r o gar de mo do a ce r t ifi-
car - s e da n at ur e za e s e r ie dade do co n flit o e da co mp e t n cia
da as s o cia o p ar a o r e s o lv e r , que r da co mp e t n cia e m r azo
da mat r ia - o co n flit o diz r e s p e it o a dir e it o s s o b r e t e r r e n o s o u
h ab it a e s - que r da co mp e t n cia t e r r it o r ial - o t e r r e n o o u a
h ab it a o , o b je ct o do co n flit o , s it ua- s e n o in t e r io r de
Ag e r s o n T a b o a s P i n t o
Gufos Sociais e Direito
479
Pas r gada.O cas o s e r ace it e s e o p r e s ide n t e , p ar a al m da
fix a o da jur is di o da as s o cia o , s e ce r t ificar , p e las p e r gun
t as e p e lo co n h e cime n t o dir e ct o que muit as v e ze s t e m do cas o ,
que a p e t i o do que ix o s o t e m um m n imo de r azo ab ilidade e
n o t e m p r o p s it o s de s o n e s t o s . A o ut r a p ar t e e n t o co n v i
dada p o r e s cr it o a v ir as s o cia o , n uma dat a fix ada, "p ar a
t r at ar as s un t o s do s e u in t e r e s s e ". D e p e n de n do do co n h e cime n
t o dir e ct o que t iv e r do cas o , o p r e s ide n t e p o de e n t r e t an t o v is i
t ar o lo cal o n de s e ge r o u o co n flit o , A co mp ar n cia das p ar t e s
n a r e un io p ar a dis cus s o e julgame n t o da caus a p o r v e ze s
p r o b le m t ica e v r ias me didas p o de m s e r t o madas p ar a
as s e gur - la. A s p ar t e s v m n o r malme n t e aco mp an h adas p o r
amigo s , p ar e n t e s o u v izin h o s , que p o de m o u n o p ar t icip ar n a
dis cus s o , A dis cus s o , p o r v e ze s an imada, o r ie n t ada p e lo
p r e s ide n t e que , n o fin al p r o fe r e a de cis o ,
A p r e v e n o do s co n flit o s e a r e s o lu o do s co n flit o s
co n s t it ue m o s do is p lo s da p r t ica jur dica ce n t r ada n a as s o
cia o de mo r ado r e s e , mais e m ge r al, do dir e it o de Pas r gada.3
S A N TOS , B o av e n t ur a de S o us a. D ir e it o de Pas r gada", In :
O Discurso e o Poder: e n s aio s o b r e a s o cio lo gia da r e t r ica
jur dica. Po r t o A le gr e ; F ab r is Edit o r , 1 9 8 8 . p . 9 - 1 7 .
4. s Funes dos Poderes do Estado (Montesqueu)
Ijx is t e m, e m cada Es t ado , t r s e s p cie s de p o de r ; o p o
de r le gis lat iv o , o p o de r e x e cut iv o das co is as que de p e n de m do
dir e it o das ge n t e s , e o p o de r e x e cut iv o daque las que de p e n
de m do dir e it o civ ilT
Pe la p r ime ir a, o p r n cip e o u o magis t r ado cr ia as le is p ar a
um t e mp o de t e r min ado , o u p ar a s e mp r e , e co r r ige o u r e v o ga
aque las que j s e ach am fe it as . Pe la s e gun da, de t e r min a a p az
o u a gue r r a, e n v ia o u r e ce b e e mb aix adas , e s t ab e le ce a s e gu
r an a, e v it a as in v as e s . Pe la t e r ce ir a, p un e o s cr ime s o u julga
as que s t e s do s p ar t icular e s , Ch amar - s e - e s t a lt ima, p o de r
de julgar e a o ut r a, s imp le s me n t e , o p o de r e x e cut iv o do e s t ado .
A lib e r dade p o l t ica, n um cidado , e s s a t r an qilidade
de e s p r it o que p r o v m da o p in io que cada um p o s s ui de s ua
So c i o l o g i a Ge r a l e J u i i d i t a
480
StGUNtMt Paru - Sociioei iusa&ia
p r p r ia s e gur an a; e p ar a que s e p o s s ua e s s a lib e r dade , p r e
cis o que o go v e r n o s e ja t al que um cidado n o p o s s a t e me r a
um o ut r o .
fS uan do n uma s p e s s o a, o u n um p ie jmo , co r p o de ma
gis t r at ur a, o p o de r le gis lat iv o s e ach a r e umdo ao p o de r e x e cu
t iv o , n o p o de r e x is t ir a lib e r dade , p o r que s e p o de r t e me r
que o me s mo mo n ar ca o u o me s mo s e n ado cr ie m le is t ir n icas
p ar a e x e cut - las t ir an icame n t e T|r
N o e x is t ir t amb m lib e r dade quan do o p o de r de jul
gar n o s e act i r s e p ar ado do p o de r le gis lat iv o e do e x e cut iv o ,
S e o p o de r e x e cut iv o e s t iv e r mudo o p o de r le gis lat iv o , o p o
de r s o b r lTv id e _a_lib 5$r dade do s cidado s s e r ia ar b it r r io ,
p o r que o juiz s e r ia o le gis lado r , E, s e e s t iv e r un ido ao p o de r
e x e cut iv o , o juizjp o de r t e r a fo r a de um o p r e s s o r ,
Tudo e n t o p e r e ce r ia, s e o me s mo h o me m , o u o me s mo
co r p o do s p r in cip ais , o do s n o b r e s , u o do p o v o , e x e r ce s s e e s
t e s t r s p o de r e s : o de cr iar as le is , o de e x e cut ar as r e s o lu e s
p b licas e o de julgar o s cr ime s e as que s t e s do s p ar t icular e s ,
*Mo n t e s quie u, Do Esprito das Leis, ( D e 1 Es p t it de s L o is ) ,
e dit o r a Te cn o p r in t , Rio de Jan e ir o , s / d, p p , 4 1 - 1 3 3 .
A g e r s o n T o t o s o P i n t o
ESTRATIFICA O SOCIAL E DIREITO
Vamo s mo s t r ar , n e s t e cap t ulo , a in flun cia do dir e i
t o n o s fe n me n o s e s t udado s ao cap t ulo VI, p r ime ir a p ar
t e , de s t e liv r o , p e la Es p acio lo gx a S o cial. Co me ar e mo s
t e n t an do co mp at ib ilizar a n o o da e s t r at ifica o co m a
de igualdade do s h o me n s ; e x amin ar e mo s , e m s e guida, o s
p ar me t r o s que n o r t e iam a e s t r at ifica o , o s t ip o s de e s
t r at o s o u camadas , co m de s t aque p ar a as clas s e s s o c ia i s ,
e a mo b ilidade s o cial. Po r lt imo , de s cr e v e r e mo s o p e r fil
de algun s o p e r ado r e s do dir e it o , n a t e n t at iv a de ide n t ifi
car s e us szatus s o ciais .
1 ESTRATIFICA O VERSUSIGU AL DADE
Ib do s s o iguais p e r an t e a le i, mas t amb m t o do s ,
e m t o das as s o cie dade s , o cup am p o s i e s dife r e n t e s n o
e s p a o s o cial. Es s e p o s icio n ame n t o do s in div duo s n o
s n a lin h a h o r izo n t al ( un s e s t o ao lado do s o ut r o s ) , mas
t amb m n a lin h a v e r t ical, p o is un s e s t o e m cima, co man
dam, e o ut r o s , e mb aix o , o b e de ce m. Par e ce , e n t o , h av e r
uma co n t r a di o e n t r e o co n ce it o d e e s t r at i fi ca o ,
s up e r p o s i o de e s t r at o s de s iguais , e o co n ce it o de dir e i
t o , que t r at a, co mo iguais , o s co mp o n e n t e s de s s e s e s t r a
t o s . Es s a co n t r adi o , p o r m, mais ap ar e n t e do que r e al.
Os r o man o s , p o r e x e mp lo , an t e s me s mo d a in flun cia do
cr is t ian is mo , h av iam ap r e n dido do s gr e go s gue , "p o r di
r e it o n at ur al, liv r e s e e s cr av o s n o e r am dife r e n t e s , s e n do
a e s cr av at ur a um in s t it ut o de dir e it o civ il o u do dir e it o
das ge n t e s o u in t e r n acio n al.1 igualdade do s h o me n s
1Digesto,!, 5, 4, 1, Florentino,
VI
So c i o l o g i a G e i c l e J u r d i c o
482
Secumba P e - Socioiosi J u ti e i u
um a ab s t r a o , n o t e m co n cr e t ude , n o e x is t e n a r e ali
dade . um t ip o ide al, p ur o , ab s t r at o , e m e s s n cia, s e m
o s acide n t e s que faze m o h o me m co n cr e t o e r e al. E o di-
r e it o r ds de Ro ma at h o je , muit o t e m fe it o n o s e n t ido de
dis p e n s ar ao s h o me n s e s s e t r at ame n t o de igualdade , o
que n o o s t e m imp e dido de co mp o r e s t r at o s dife r e n t e s ,
de e x e r ce r o cup a e s dife r e n t e s , e mb o r a co m lib e r dade
de mo b ilizar - s e h o r izo n t al e v e r t icalme n t e , e m b us ca de
me lh o r e s p o s i e s s o ciais .
2 DETERMINANTES
Po de mo s r e duzir a t r s o s p ar me t r o s que o s s o ci
lo go s us am p ar a ide n t ificar a p o s i o d as p e s s o as n a p i
r mide s o cial: o e co n mico , o o cup acio n al e o p o l t ico . N a
r e alidade , e s s e p o s icio n ame n t o de p e n de de v r io s fat o
r e s e n o ap e n as de t r s .
2.1 Econmico
Os h o me n s mais r ico s de uma cidade o cup am, n a
t ur alme n t e , s ua clas s e alt a, e mb o r a s e u n v e l e ducacio
n al n o s e ja alt o , n e m s ua p r o fis s o t e n h a muit o p r e s t gio .
Pr e s ume - s e que s ua r ique za t e n h a r e s ult ado de n e gcio s
e e mp r e e n dime n t o s l cit o s b e m s uce dido s . Cas o co n t r r io ,
p o de r o , s o b co n t r o le do dir e it o , s e r p un ido s e p r o je t ado s
p ir mide ab aix o ,
2.2 Ocupacional
A s o cup a e s h o je s o r e gulame n t adas e o s e u e x e r
c cio , fis calizado e o n e r ado co m imp o s t o s , Po r is s o , m di
co s e adv o gado s , que o cup am p o s i o de de s t aque gr a as
s ua qualifica o p r o fis s io n al e s ua e s t ima s o cial, n o
s e p r e o cup am co m a co n co r r n cia de s le al do s ch ar lat e s
Ag e r s o n l a b o s o P i n
ESMWI O S0(1*1 Ol f IT O
483
e do s r b ulas . E o juiz e o v ig r io , n uma cidade in t e r io r an a,
me s mo gan h an do p o uco e n o s e de s t acan do , e s t o n o
p ice da p ir mide , F o i a o cup a o que o s p r o je t o u,
2 .3 Po l t ica
Tkmb m h o je , mais do que an t e s , o dir e it o co n t r o la
o s que p r e t e n de m p r o mo v e r - s e s o cialme n t e p e la car r e ir a
p o l t ica. S uas can didat ur as p o de m s e r imp ugn adas p o r
s e r e m, p o r e x e mp lo , an alfab e t o s . N o v ai s e r t o f cil co m
p r ar v o t o s ab e r t ame n t e n e m faze r de fun t o v o t ar . D e p o is de
e le it o s , s e e x e r ce r e m car go s e x e cut iv o s , p o de r o t e r s uas
co n t as de s ap r o v adas e at p e r de r o man dat o . Mas , p e lo
s e u co man do p o l t ico , faze m p ar t e d a e lit e da cidade , in de
p e n de n t e me n t e d a r ique za e do p r e s t gio p r o fis s io n al.
3 ESTRATOS
A in flun cia do dir e it o n a e s t r at ifica o de p e n de do
t ip o de e s t r at o . N as cas t as an t igas , e la n o a me s ma do s
e s t ame n t o s me die v ais , n e m das clas s e s s o ciais mo de r n as ,
3,1 Castas
A s c a s t a s s o r e guladas ^ e m g e r a l , p o r r gido s is t e
ma de dir e it o co s t ume ir o , co m p r iv il gio s , dis cr imin a e s
e e t n o ce n t r is mo . Me s mo n a s o cie dade r o man a, o n de o
dir e it o e v o luiu r ap idame n t e e a le i ( ie x ) v e io a fun cio n ar ,
ao lado do s us o s ( consuetudo) e do s co s t ume s ( mo r e s ) , a
le i n o fo i s e mp r e a me s ma p ar a o p at r iciado e p ar a a p le
b e , p e lo que n o h o uv e igualdade p e r an t e a le i, Qs dir e i
t o s p o l t ico s de v o t ar e de s e v o t ado fo r am e x e r cido s
de s igualme n t e p e las cas t as . N o mb it o do dir e it o p r iv a
do , p at r cio s e p le b e us p o diam cas ar - s e , mas o cas ame n
t o fo i, p o r muit o t e mp o , e n do gmico ( p e r mit ido s o me n t e
So c i o l o g i a Ge m i e J u r d i c o
484
S m n m P w t - S o i o i o s i * J u i i c i c *
a p e s s o as d a me s ma cas t a) , Ho uv e , at , man ife s t a o de
p lur alis mo jur dico , quan do d a v o t a o da Jx s p ar t ici
p av am p at r cio s , A n o r ma d a p le b e e r a o plesbiscitum,
3.2 Estamentos
Os e s t ame n t o s me die v ais - n o b r e za, cle r o e b ur gue -
s ia - e r am r e gulado s p o r le is p r p r ias , t in h am o s s e us
cdigo s e t r ib un ais . S e u h e r me t is mo fo i man t ido , mas n o
t an t o quan t o n as cas t as . Emb o r a fo s s e dif cil, n o e r a im
p o s s v e l um cidado ch e gar ao s e s t ame n t o s s up e r io r e s .
3.3 Classes
Co m a s o cie dade mo de ma, o fe ch ame n t o do s e s t r a
t o s de s ap ar e ce u, a p ir mide s o cial s e p e r me b ilizo u e o
liv r e t r n s it o p e las clas s e s s e t o r n o u a r e gr a. O t r n s it o
q/l liv r e , mas n o ab s o lut ame n t e liv r e . O dir e it o co n t in ua e x e r
ce n do ce r t o co n t r o le , co mo mo s t r amo s p o uco an t e s , quan
do fal v amo s das v ar i v e is da e s t r at ifica o , n o it e m 2.
Emb o r a h aja muit a mo b ilidade s o cial, t an t o n o s e n t ido
h o r izo n t al quan t o n o v e r t ical, a maio r ia das p e s s o as p e r
man e ce e m s ua clas s e de o r ige m. A lgumas , p o r m, o r igi
n r ias de e s t r at o s in fe r io r e s , p o de m s ub ir , p ir mide acima,
s e ja p e la r ique za que ame alh ar am, s e ja p e lo p r e s t gio p r o
fis s io n al que co n quis t ar am, s e ja p e lo d e s t aq ue da lide
r an a p o l t ica e x e r cida.
4 MOBIL IDADE SOCIAL
D e n t r e as n o e s ap r e n didas e m S o cio lo gia Ge r al, /
que r e mo s r e al ar aque la r e fe r e n t e ao co n t r o le da mo b ili
dade s o cial p o r me io de in s t it ui e s e agn cias , co mo a
fam lia, a e s co la, Igr e ja, as o r gan iza e s p r o fis s io n ais ,
e , s o b r e t udo , o Es t ado , imp o n do o r de m e co n t r o le , at r a
v s de le is , ao din amis mo s o cial.
g e t s o f l T o b o s a P i n t o
E siMiritA O Social e Di k i i o
485
5 STATUSSOCIAL DOS OPERADORES DO DIREITO
A ap r e cia o que v amo s faze r de algumas cat e go r i
as de o p e r ado r e s do dir e it o t e m p o uco v alo r cie n t fico , p o is
n o s e b as e ia e m p e s quis as , mas e m o b s e r v a e s p e s s o
ais e r e fe r n cias de t e r ce ir o s ,
. 1 j u t z y ^ v - wv -
A o que n o s p ar e ce , o juiz o o p e r ado r do dir e it o que
o cup a a mais e le v ada p o s i o , que e s t e m p r ime ir o lugar
n o ranking,
Emb o r a s e ja b e m r e mun e r ado , e m t e r mo s o imp a-
r at iv o s , n o o n v e l de r e mun e r a o que o p r o je t a s o
c ia l m e n t e , E s t a t e r m i n a n o lh e s e n d o v a n t a g e m .
Pr ime ir o , p o r que t r a b a l h a co m de dica o e x clus iv a;
de p o is , p o r que t r a b a lh a mais do que s e r ia r azo v e l; e ,
p o r lt imo , p o r que p o de r ia g a n h a r mais e x e r ce n do o u
t r a p r o fis s o . O que o p r o je t a a fun o p o l t ica da
magis t r at ur a, do p o de r judici r io , que p o de r do E s t a
do . o p o de r de co man dar o p r o ce s s o , o p o de r de de ci
dir . Os d e m a i s o p e r a d o r e s do dir e it o - adv o gado s ,
p r o mo t o r e s s e r v e n t u r io s d a j u s t i a - p a r t i c i p a m do p r o
ce s s o , mas n o t m p o de r de cis r io , E n e le , s o zin h o , o u
n o co le giado , que s e co n ce n t r a t o do o m r it o da s e n
t e n a o u do acr do . E a s e n t e n a, co mo diziam o s r o
man o s , de v e s e r t i d a co mo a v e r d a d e .2
D e s ua fun o jur is dicio n al e man ar am, co mo diz
TERES A HEL EN A PIS CITEL L O de PA VN , al m de dir e i
t o s e o b r iga e s in e r e n t e s ao car go , de v e r e s p a r a co m o s
jur is dicio n ado s , in dis p e n s v e is ao b o m de s e mp e n h o do
2 Res Judcata pro veritate habetur. Digesto, 50,17, 207, U lpiano.
So c i o l o g i a Ge t a l e J u r d i c o
486
StGUMDA hm - S otioiosii JRDiCA
s e u mis t e r , co mo a le aldade , a dilign cia, a in de p e n dn
cia, o de co r o , a cin cia e a imp ar cialidade ,3
5.2 Advogado
O adv o gado aque le o p e r ado r do dir e it o que ch a
mado , co mo a e t imo lo gia s uge r e ( ad + vocatus = ch ama
do p ar a) p ar a ajudar a p ar t e . S e u s t a t u s p o de r s e r mais
o u me n o s e le v ado , de p e n de n do d a s o cie dade a que s e r
v e , e , t alv e z, t amb m do s is t e ma jur dico ap licado . N uma
s o cie dade de s e n v o lv ida, o cidado , p o r ce r t o , p r e fe r e p a
g a r a um adv o gado p ar a r e p r e s e n t - lo e de fe n d- lo , a p e r
de r t e mp o , dis cut in do co n ^a" p ar t e co n t r r ia p o r me n o r e s
do cas o e m que s e e n v o lv e u, A s s im, p o r que muit o p r o
cur ado , e , e m ge r al, s e de s e mp e n h a co m e ficin cia, o p r o
fis s io n al d a adv o cacia muit o p r e s t igiado e o cup a uma
d as p r ime ir as p o s i e s n o ranking das o cup a e s de n
v e l un iv e r s it r io . N a A r ge n t in a, como no B r as il, o p r e s t
gio do adv o gado b e m me n o r , e , e m co n s e qn cia, s e u
s t a t u s s o c i a l m e n o s e le v a d o , d i s s o r e s u l t a n d o a
p r o le t ar iza o d a adv o cacia, Par a e s s a p r o le t ar iza o ,
s e gun do TERES A EL EN A , do is fat o r e s co n co r r e r am p r e
p o n de r an t e me n t e : um, quan t it at iv o , o e x ce s s o de adv o
gado s ; o o ut r o , qualit at iv o , que a m fo r ma o r e ce b ida.4
5.3 Promotor
A s o cie dade b r as ile ir a ain da n o r e co n h e ce u a im
p o r t n cia do s que t r ab alh am co m o dir e it o co mo in t e gr an t e
do min is t r io p b lico , e , p o r is s o , ain da n o p r e s t igio u,
3 PAVN, Teresa Elena Piscitelio de. Sociologia: General y Jurdica,
Crdoba, Argentina; Alveroni, 1996, p, 198,
4 Idem, fadem, p, 196.
A gerson o . h s o P nfo
E s m w i u o S o c i a i e D i e h o
487
co mo de v ia, o p ap e l do p r o mo t o r . S ua r e mun e r a o muit o
s e ap r o x ima daque la do juiz, o que r e v e la o r e co n h e ci
me n t o de s e u v alo r , p o r p a r t e do Es t ado , Pe r dur a, ain da,
aque le e s t e r e t ip o de de fe n s o r do Es t ado , quan do s e
p o s icio n a n o jr i, p o r e x e mp lo , do lado d e acus a o , quan
do , n a v e r dade , o p r o mo t o r , co mo de fe n s o r da le i, p o de
s e r fav o r v e l t an t o ao aut o r quan t o ao r u.
5.4 Defensor Pblico
Talv e z p o r que o Es t ado ain da n o p r o v ide n cio u o
fun cio n ame n t o da de fe n s o r ia p b lica, co mo de v e r ia, a
s o cie dade n o t e m p r e s t igiado e s s a cat e go r ia de o p e r ado r
do dir e it o , co m mis s o t o r e le v an t e . S ur giu p ar a p o s s ib i
lit ar o ace s s o jus t i a daque le s que , p o r falt a de r e cur s o s
o u p o r ign o r n cia, e s t o imp o s s ib ilit ado s de faz- lo .
5.5 Policial
O s ta t u s de um p ap e l s o cial s e mp r e r e que r p r e s t i
gio , e s t ima, co n s ide r a o e r e co n h e cime n t o da s o cie dade .
O p o licial, me s mo o de n v e l un iv e r s it r io , co m r e mun e r a
o n iv e lada de o ut r o s o p e r ado r e s do dir e it o , n o t e r ia,
ao n o s s o v e r , o me s mo sta t u s s o cial do p r o mo t o r o u do
de fe n s o r p b lico . que a image m, que s e faz de le , n o
co r r e s p o n de r e alidade , Ele e x is t e p ar a as s is t ir e ajudar
o cidado co mum a e x e r ce r s ua cidadan ia, mas e s s e o
co n s ide r a co mo algu m ar b it r r io e v io le n t o , que p r e n de ,
b at e e e s p an ca.
5.6 Tabelio
Co m b as e n o n v e l de r e n da, o stat u s s o cial do t a b e
lio o u n o t r o muit o mais e le v ado do que do s de mais
o p e r ado r e s do dir e it o . ce r t o , co mo j fo i dit o , que a v ar i-
S cdgl ogia G emi e jur di ca
488
SEGUNDA P M l - So Ot OSi J Si Oi CA
v e l e co n mica p e s a, mas n o diz t udo . Ce r t a v e z, um
n o t r io e s p an h o l n o s di s s e que s u a cat e go r ia go za, e m
s e u p a s , de gr an de p r e s t gio s o cial, mas que e s s e p r e s t
gio de v ido mais s o lide z de s u a fo r ma o jur dica, s e m
a qual n o t e r ia co n quis t ado o car go , do que ao s e u p a
dr o de r e n da.
ESQU EMA
1 EST RAT IFICAO 1^ 5 1/ 5 I G U A L D A D E
2 DE T ERMINANT ES
2 .1 Ec o n m i c a
2 .2 Oc u pa c i o n a l
2 .3 P o l t i c o
3 EST RAT OS
3.1 Go s t o
3.2 Es t a m e n t o
3.3 Cl a s s e s o c i a l
4 MOBIL IDA DE SOCIAL
5 STATUS SOCIAL DOS OP E RA D O R E S DO DI REI T O
5 .1 J u i z
5 .2 Ad vo g a d o
5 .3 P r o m o t o r
5 .4 De f e n s o r P b l i c o
5 .5 P o l i c i a l
5 .6 T a b e l i o
"v.
g e i s o n l o b o s a P i n t o
E s M!inu<io Socit f O i e i o
4 8 9
QU ESTION RIO
1 . Q u a i s s o a s p r i n c i p a i s d e t e r m i n a n t e s d a
e s t r at ifica o ? !
2 . Co mo o stat us fun cio n al in flui n a e s t r at ifica o ?
3 . Qual a dife r e n a e n t r e c as t a e e s t ame n t o ?
4 . Que p r o ce s s o s o cial de t e r min a a i n s t ab ilidade do
s ta t u s s o cial?
5 . Co mo o Es t ado co n t r o la a mo b ilidade s o cial?
6. Po r que , n o s p a s e s de s e n v o lv ido s , o s t a t u s s o cial
do adv o gado mais imp o r t an t e do que n o s p a s e s
a t r as ado s ?
7 . Em que o p r o mo t o r de jus t i a s e dis t in gue do de fe n
s o r p b lico ?
8. Po r que o juiz go za, e m ge r al, de gr an de p r e s t gio ?
9 . D as cat e go r ias de o p e r ado r e s do D ir e it o qual a que
t e m mais esprit de corps" ?
1 0 . Qual o s tatus s o cial do de le gado de p o l cia n o B r as il?
1 1 . Po r que o D ir e it o n o uma mo e da de idn t ico v alo r
p a r a t o das as clas s e s s o ciais ?
12-, Po r que o de le gado de p o l cia n o alcan a o p r e s t igio
do p r o mo t o r de jus t i a?
1 3 . Po r que as clas s e s mais h umilde s s o as que me n o s
s e ut ilizam do D ir e it o ?
1 4 . Po r que s o as clas s e s mais p o b r e s as que mais s e
p r e judicam co m o D ir e it o ?
1 5 . A que clas s e s p e r t e n ce m, n o B r as il o s adv o gado s e o s
juize s ?
1 6 . Que r e la o t e m a jus t i a alt e r n at iv a co m o p r o t e cio
n is mo clas s is t a?
1 7 . Que co n t r adi o p ar e ce e x is t ir e n t r e dir e it o e dife r e n cia o ?
1 8 . Co mp ar e o s tatus s o cial do juiz de I a in s t an cia co mo o
t ab e lio .
So c i o l o g i a Ge r o l e J u t d c a
4 9 0
Siemu P t i - Sc o o i c s i a M m
1 9 . D e que p r e s t igio go za h o je , e m n o s s a s o cie dade , a p r o
fis s o jur dica?
2 0 , Quais s o as cau s as da p r o le t ar iza o d a adv o cacia?
BIBL IOGRAFIA
1 , Co t t e r r e ll, Ro ge r - Introduccin a Ja Sociologia dei Derecho,
o p . cit .
2 , Pav n , Te r e s a Ele n a P s cit e llo de - Sociologia General y Ju
rdica, o p . cit ,
3 , Ro s a, F e lip e Mir an da - Sociologia do Direito, o p . cit ,
4 , S ab ade l, A n a L cia - Manual de Sociologia Jurdica, o p . cit ,
5 , S o r ian o , Ramn - Sociologia dei Derecho,o p , cit .
E s m u n u i o Socii s Di kito
4 9 1
L EITU RAS
1. Diferenciao Social e Direito (Gregorio Robles)
A dife r e n cia o s o cial co n s is t e n a de limit a o das e s fe
r as de a o co r r e s p o n de n t e s ao s in div duo s e ao s gr up o s s o ciais
( is t o , ao s s uje it o s s o ciais ) . Tal dife r e n cia o s e o p e r a at r av s
do s status e p ap is s o ciaig._
Emb o r a t o do s o s s t at us e p ap is n o s e jam e s t ab e le cido s
n e m de limit ado s p e lo dir e it o , p o de - s e afir mar que co n s t it ui um
fe n me n o ge r al o fat o de que o s is t e ma jur dico co n figur a a mai
o r p ar t e do s status e p ap is s o ciais r e le v an t e s , is t o , de e s p e ci
al imp o r t n cia p ar a o fun cio n ame n t o da s o cie dade , Co m r e la o
ao status o u p o s i o das p e s s o as , o dir e it o co n figur a o ch amado
status civ il de p e s s o a, que t e m imp o r t n cia de n t r o da fam lia e
t amb m fo r a; e igualme n t e co n figur a a e s fe r a de a o do s in di
v duo s r e lat iv ame n t e ao mun do e x t e r io r ( s e ja e m r e la o co m
as co is as , s e ja e m r e la o co m o s de mais ) , p o r me io do s dir e it o s
s ub je t iv o s . Es t e s dir e it o s co n s t it ue m aut n t icas p ar ce las de
p o de r s o cial gar an t ido s p e la s acr aliza o que p r o p o r cio n am as
n o r mas jur dicas . S t at us familiar e dir e it o s s ub je t iv o s , r e fe r e n
t e s a uma p e s s o a co n cr e t a, s o e le me n t o s que co n figur am mui
t o b e m a s it ua o s o cial de s s a p e s s o a n o co n t e x t o s o cial.
S e acr e s ce n t ar mo s que o s dir e it o s s ub je t iv o s n o s s e
r e fe r e m v ida p r iv ada e co me r cial ( r e fe r e n t e s , p o r t an t o , ao
s ub s is t e ma da v ida p r iv ada e ao da e co n o mia) , mas t amb m a
s ua p ar t icip a o n a v ida p o l t ica do gr up o ( dir e it o s s ub je t iv o s
p b lico s ) , s e p o de r e n t e n de r p e r fe it ame n t e a v ir t ualidade
o r gan izado r a do co n ce it o jur dico de dir e it o s ub je t iv o . A o e s
t e n de r - s e de s de a p r o p r ie dade , p as s an do p e lo r e s t o do s dir e i
t o s r e ais ( p o s s e , us ufr ut o , h ip o t e ca e t c) e o s dir e it o s de cr dit o
o u r e lat iv o s ( b as e ado s n um v n culo o b r igacio n al o u e m s e r s u
je it o p as s iv o de um at o il cit o , fr e n t e ao de v e r o b r igacio n al do
de v e do r o u a in de n iza o do s uje it o at iv o do il cit o , r e s p e ct i
v ame n t e ) , ch e gan do ao s dir e it o s p o l t ico s ( o n de s e in clue m o s
dir e it o s fun dame n t ais e as lib e r dade s p b licas , jun t o ao s de
mais dir e it o s r e co n h e cido s p e las n o r mas co n s t it ucio n ais e le -
S oc ol og o G erei e Jur dico
492
S i O i s * P a r t e - S o c o i o s i a J u r d i c a
gais ) , o co n ce it o de dir e it o s ub je t iv o t r aduz, e m t e r mo s jur di
co s , a de limit a o e dife r e n cia o s o cial co m uma clar idade
fo r o ializado r a que dificilme n t e qualque r o ut r o in s t r ume n t o
p o de r ia co n s e guir ,
N o s e p o de n e gar , p o r t an t o , a e n o r me t r an s ce n dn cia
da s o cio lo gia do s dir e it o s s ub je t iv o s p ar a co mp r e e n de r a e s
t r ut ur a s o cial r e al de uma de t e r min ada s o cie dade . IYat a- s e ,
e m de fin it iv o , de um cap t ulo de cis iv o - da s o cio io gia- do p o de r
s o cial, p o is o p o de r s e e x p r e s s a p ar a o s in div duo s at r av s da
fo r ma jur dica do s dir e it o s s ub je t iv o s , cujo r e v e r s o , o s de v e r e s
jur dico s , co n s t it u a o ut r a face t a do p o de r , a da s uje it a o .
To do s o s in div duo s s o , ao me s mo t e mp o , s uje it o s de dir e it o s
e de de v e r e s ; t o s o me n t e a de limit a o co n cr e t a do p at r imn io
de un s e de o ut r o s , ads t r it o s p e s s o as , n o s p o de dar a ima
ge m co r r e t a de s ua s it ua o s o cial de n t r o do gr up o s o cial,
... A dife r e n cia o do s dir e it o s e co mp e t n cias , co m a
co n s e qe n t e dife r e n cia o do s p ap is p r o ce dime n t ais r e s p e c
t iv o s , a b as e do fun cio n ame n t o e ficaz o co n t e x t o de um mun
do s o cial co mp le x o . Os s uje it o s , ime r s o s n a co mp le x idade , s e
s e n t ir iam p e r dido s s e n o dis p us e s s e m de me can is mo s e s t a
b e le cido s de a o . O dir e it o s e co n s t it ui, as s im, e m can al da
a o h ab it ual do s in div duo s e do s gr up o s s o ciais e e m mar co
de r e fe r n cia o b r igat r io p ar a e n t e n de r o mun do s o cial, O di
r e it o mo de r n o , lo n ge de s e r uma s up e r e s t r ut ur a, a r e gr a do
jo go s o cial. N in gu m p o de p ar t icip ar do jo go , s e m co n h e ce r
s uas r e gr as , o u s e m e s t ar as s e s s o r ado p ar a r e alizar s uas a e s ,
A dife r e n cia o s o cial t amb m s e r e lacio n a co m o co n ce i
t o de p o s i o s o cial, que p o s i o que o in div duo o cup a n a
s o cie dade . S e e m t e mp o s p a s s a d o s , a p o s i o e s t av a
e s t ab e le cida quas e s e mp r e , p o r um s is t e ma jur dico e s t t ico ,
que a de t e r min av a de uma v e z p o r t o das ( n o r malme n t e at r av s
da h e r an a) , n a s o cie dade in dus t r ial h o die r n a a p o s i o s o cial
do in div duo s o me n t e p o de s e r o b t ida calculan do - s e s e us div e r
s o s co mp o n e n t e s , is t o , s e us div e r s o s status e p ap is , o que ,
e m t e r mo s jur dico s , s ign ifica faze r o c lculo do s dir e it o s s ub je
t iv o s e do s p ap is jur dico s co r r e s p o n de n t e s ao dit o in div duo .
* ROB L ES , Gr e gr io , Sociologia dei Derecho. 2. e d, , Madr id:
Civ it as , 1 9 9 7 . p . 1 5 9 - 1 6 3 .
Ag e r s o n T o b o s o P i n l o
Es i i i i f i C i o So e m t Di u r n o
493

2. Profisso Jurdica (Teresa Elena Pisetcllo de Pavn)


A p r o fis s o jur dica e o de s e mp e n h o de s e u e x e r c cio fo i
o b je t o de e s t udo , p o r dife r e n t e s v e r t e n t e s o u e s co las , co mo ,
p o r e x e mp lo , a v e r t e n t e fun c o n alis t a, a v e r t e n t e cr it ica e t c.
Em lin h as ge r ais , e las t r at am do s s e guin t e s t e mas ;
a) Es t r at ifica o da p r o fis s o e r e la e s e n t r e o n v e l s o
cial do adv o gado e o n v e l s o cial do s clie n t e s .
b ) Co n flit o p r o fis s io n al de p ap e is ( de fe s a do s clie n t e s o u
de fe s a da jus t i a, p r o fis s o t ica o u n e gcio p r iv ado ) .
c) Pr o b le mas de co r r e n t e s da r e la o p r o fis s io n al e n t r e o
adv o gado e o clie n t e .
d) Re la e s e n t r e adv o gado s e juize s .
e ) A n lis e e co n mico da p r o fis s o , co m n fas e e m s ua
p r o le t ar iza o ,
f) Ev o lu o , das in s cr i e s , p r o p o r o p o r s e x o s e r e la
o e n t r e n me r o de adv o gado s e n me r o de cas o s ; o
que le v a an lis e das div e r s as fo r mas do e x e r c cio
p r o fis s io n al( in div idual, co le t iv o , p b lico , p r iv ado , , .) ,
g) D is t r ib ui o do s e x e r c cio s le gais e e fe t iv idade das
de fe n s o r ias de p o b r e s .
Em 1 9 2 1 , Pigr o Calaman dr e i dis s e : a adv o cacia s e t r ar t s -
fo r mo u n um p e r igo s o s e s t mulo da lit io io s idade e da m f p r o -
ce s s ual_L e m_ r azo do e x ce s s iv o n me r o de adv o gado s .
A t ualme n t e , e m muit o s p a s e s , n o s mo s t r a fucit o , e s t e quadr o
t e n de a p io r ar . E n o s r e co r da que Calaman dr e i adv o gado ,
p r o ce s s ualis t a e p e n s a daque la man e ir a. Po r is s o faz uma dur a
cr t ica a e s t udan t e s e adv o gado s s o b r e a n e ce s s idade do co
n h e cime n t o e s p e cializado da t cn ica jur dica.
Po de mo s t amb m mo s t r ar que uma an al s e r e t r o s p e ct i
v a do e x e r c cio p r iv ado da p r o fis s o , n o s diz que o s p r ime ir o s
t t ulo s p r o fis s io n ais que e x is t ir am fo r am o s de adv o gado s ,
m dico s e cl r igo s . N e s t as t r s r e as , o p r o fis s io n al p o s s u a o
s ab e r t e r ico do s e u r amo de co n h e cime n t o e ajus t av a s - e u t r a
b alh o a um cdigo de t ica p r p fis s o n aL S ua at iv idade p r t ica
e r a in de p e n de n t e e s e u o b je t iv o s e ce n t r av a n o s e r v i o e at e n
o do s s e us clie n t e s , Co m o co r r e r do s t e mp o s , mudan as
So c i o l o g i a Ge r a i e J u i h i t c a
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494
SSUSO P i M - Socimdh J u il m a
s ur gir am e at ualme n t e as t ar e fas do s adv o gado s s o muit o
v ar iadas . Ma A r ge n t in a, q t it ulo de adv o gado h ab ilit a a o cup ar
p r at icame n t e qualque r fun o . CQt n F iS mp lo s , p o de mo s mo s
t r ar do is *t ip o s de at iv idade s r e lacio n adas co m o s adv o gado s .
1) Par a o que s e faz n o mb it o da p o l t ica, o adv o gado s e
co n s ide r a de v idame n t e h ab ilit ado , Es s e fat o n o o co r r e s o me n
t e n a A r ge n t in a, mas e m muit o s o ut r o s p a s e s . o cas o t am
b m do s Es t ado s Un ido s . D o s 5 2 s ig n a t r i o s de s ua
co n s t it ui o , 2 5 e r am adv o gado s ; e do t o t al de 9 9 5 go v e r n ado
r e s de Es t ado , e n t r e 1 8 7 0 e 1 9 5 0 , 4 6 % fo r am adv o gado s . N a
Re p ub lica A r ge n t in a, do co me o do s culo XX at 1 9 4 6 , t o do s
o s min is t r o s da F aze n da, A gr icult ur a e Ob r as Pub licas , fo r am
adv o gado s . N o que diz r e s p e it o p r o le t ar iza o da adv o cacia,
muit as caus as p o de r iam s e r de s t acadas , mas , duas s o de im
p o r t n cia p r e p o n de r an t e :
a) Quan t it at iv a, o e x ce s s o de adv o gado s .
b ) Qualit at iv a, a fr aca fo r ma o ., co m.que s ae m das
F aculdade s ,
Pav n , Te r e s a Ele n a Pis c t e llo de , Sociologia General y ju
rdica: Elementos y Propuestas, Co r do b a, A lv e r o n i, 1 9 9 6 ,
p . 1 9 4 - 1 9 6 ,
3. Classes Sociais e Direito (Rainn Soriano)
Tip o s de Es t r at o s
O dir e it o e s t mais p r e s e n t e n o s e s t ame n t o s do que n as
clas s e s s o ciais . N o s e s t ame n t o s , o e le me n t o p r in cip al a h ie
r ar quia, at r av s d qual s a s imb o lizado s o p r e s t gio e a h o n
r a; e s s a h e r ar qui e s t r ut ur ada p o r me io do dir e it o ; o dir e it o
um e le me n t o de co n figur a o in t e r n a do s e s t ame n t o s ; p e lo
q , n o s e s t ame n t o s , imp o r t an t e o quadr o do s dir e it s de -
v e r e s do s s e us me mb r o s .
Par e ce r ia, p r ime ir a v is t a, que o dir e it o fat o r b s ico das
cas t as , t an t o o u mais do que do s e s t me n t o s .N o as s im, p o is
Ts s lmp lican a co n fun dir o dir e it o co m a t r adi o . E v e r dade que ,
n as cas t as , h amp la e fe ch ada r e gula o de s ua o r gan iza o e
da co n dut a do s s e us me mb r o s . Mas e s s a r e gula o n o s e faz
g e i s o n l o t w s o P i n t o
Es m t i r i M t o S qci m D i k i t o
495
p o r r e gr as e gr e s s as de dir e it o , mas p o r n o r mas n o _e s cr it as da
t r adi o , que t e m umio r t k car t e r .r e ligio s o , :
N as clas s e s s o ciais , o dir e it o n o e le me n t o in t e r n o e
de fin ido r das me s mas , dir e it o um e le me n t o e x t e r n o de que
s e v ale m e s p e cialme n t e , co mo j dis s e , as clas s e s p r iv ile gia
das , A s clas s e s s o ab e r t as e m s ua e s t r ut ur a e n o s_o de fin i
das p e io _dir e it o . Em t o do cas o , s o o ut r as n o r mas as que
r e gulam s e u fun cio n ame n t o , o s us o s s o ciais r s : v e ze s , co m fo r
t e co e r o s o cial. S o o s us o s s o ciais que r e gulam as r e la e s
e n t r e as clas s e s e o co mp o r t ame n t o de s e us me mb r o s : o e s t ilo
co mum de v ida, a e n do gamia mat r imo n ial, e t c, as p e ct o s h o je
mais at e n uado s do que e m t e mp o s an t e r io r e s s s o cie dade s
av an adas . A s s im, cada clas s e r e co n h e cida e ide n t ificada
p o r s e us us o s e h b it o s s o ciais .
C V - 0 $ . |
Clas s e s S o ciais 1 * v ' / V 4
O dir e it o n o uma mo e da de cun h o n ico e de idn t ico
v alo r p ar lo das as clas s e s s ci is . Po is e e j um in dicado r
da clas s e s o cial; o dir e it o um b o n it o t r aje que muit o s n o
p o de m co mp r ar , e , p o r is s o , um s mal de dis t in o s cil. Po r
duas r aze s : p o r que t r adicio n alme n t e o dir e it o t e m s ido r e p r e
s e n t ado p o r de t e r min adas clas s e s e p o r que s o me n t e algumas
clas s e s t m fe it o us o fr ut fe r o de le .
Po r um lado , faze m e ap licam o dir e it o as clas s e s s o ciais
p r iv ile giadas , ap e s ar da e duca o n o s p a s e s av an ado s , co mo
s e t e m de mo n s t r ado , p o r que a e duca o , an t e s de t udo , um
p r o b le ma e co n mico e as clas s e s h umilde s n o e s t o e m co n
di e s de ap r o v e it ar - s e do b e m da e duca o , p o r mais ge n e r o
s o que s e ja o e s t ado n a p r o mo o do s dir e it o s s o ciais . A
mo r t alidade in fan t il e n o r me n as clas s e s h umilde s , ap e s ar do s
p r o gr amas de ace s s o e duca o .
Que m s o o s le gis lado r e s e o s juize s ? A que clas s e s p e r
t e n ce m? Me s mo uma p e que n a fr a o de le gis lado r e s que di
ze m r e p r e s e n t ar o s in t e r e s s e s das clas s e s h umilde s , p e r t e n ce m
s clas s e s m dias e alt as . Quan t o ao s juize s e adv o gado s p e s
quis as de camp o co mp r o v am que p e r t e n ce m s clas s e s m dias
e alt as . ...
o g a Ge r a l e j u r d i c a
496
S e o .w P akti - So c i e -i o Gi A J u n m
JPo r o ut r o lado , as clas s e s s o ciais b aix as faze m e s cas s o
us o do dir e it o co mp ar adas co m a s d a s s e s s o ciais a t a^ Es s a
t e s e ge r al, co m e x ce e s p o s s v e is , de p e n de de duas imp o r -
t an t e s v ar i v e is .jr Tgr au de s e n t ido clas s is t a do dir e it o e o gr au
de e s t r at ifica o s o e iaffo n de o dir e it o s e ap lica, O dir e it o e s t
muit o dis t an ciado das clas s e s s o ciais quan do t e m um. fo r t e
cmp n e r iWcl s s is t a, co mo s e r ia o dir e it o do s s is t e mas p o l t i
co s n e o iib e r ais , o u quan do a s o cie dade e s t fo r t e me n t e
e s t r at ificada. A mb as as v ar i v e is co s t umam an dar un idas ,
O ace s s o das clas s e s b aix as ao dir e it o dificult ado n o
s o me n t e p o r s e r um p r o b le ma e co n mico , p o r que a jus t i a
le n t a e car a ( e , quan do gr at uit a, de ix a muit o a de s e jar ) Jmas
t amb m de co n h e cime n t o ^ p o r que e s s as clas s e s n o co n h e
ce m o dir e it o , e* o ~co n B e c4 o , t e me m que , faze n do us o de le ,
p o de r iamv o lt ar - s e co n t r a e las p r p r io s , A car e s t ia da jus t i
a e s p e cialme n t e p e s ada, p o r que o v alr do s p r o ce s s o s au
me n t a in v e r s ame n t e ao v alo r do lit gio ,
Ve n ficar - s e o fat o p ar ado x al de que as s im co mo n as clas
s e s s o ciais b aix as s o as que me n o s us am do dir e it o , is t o ,
me n o s s e fav o r e ce m co m o us o do s b e n e f cio s do dir e it o , jp o r
o ut r o lado "co s t umam s e r as que mais r e ce b e m s ua in flun cia
n e gat iv a, o lado o p r e s s o r do dir e it o ... O dir e it o mais ace s s
v e l s clas s e s alt s que p o de m t ir ar de le maio r b e n e ficio ....
Atitudes das clas s e s
A at it ude das clas s e s dian t e do dir e it o de n o t a o p r e s t gio
do dir e it o , v ar i v e l de p e n de n t e de uma s r ie de cr it r io s s ub je -
t iv o s - idade , fo r ma o , o cup a o , ... - e o b je t iv o s - r e gime p o l
t ico , s it ua o p o l t ica, cr e dib ilidade do s p r o fis s io n ais jur dico s ,
... Co m ap o io e m p e s quis as , p o de - s e s us t e n t ar , e m t e r mo s ge -
r ais , que t an t o o dir e it o co mo o s p r o fis s io n ais do dir e it o car e ce m
de o p in io p b lica fav o r v e l n as s o cie dade s de s e n v o lv idas , ~
. O p r e s t gio do dir e it o p r e s s up e a ace it a o e o r e co
n h e cime n t o v o lun t r io s do dir e it o , n o s ua imp o s i o . N o
n e ce s s ar iame n t e uma co n s e qn cia da e fic cia do dir e it o . O
dir e it o p o de s e r muit o e ficaz e m r azo de s ua in e x o r v e l imp o
s i o p e lo p o de r , car e ce n do , n o o b s t an t e , de p r e s t gio , ao n o
Ag e r s o n l o b o s o
ESKMlfCAiO S otl M i Ditfl I O
497
s e r ace it o p e la s o cie dade . N o s e de v e co n fun dir p r e s t gio ,
de r iv ado da at it ude , co m a e fic cia, fat o n at ur al que admit e
o ut r as caus as , ...
O p r e s t igio do dir e it o p o de e s t ar div e r s ificado e n t r e as
clas s e s s o ciais p o s t o que cada clas s e man t e m uma at it ude
p e culiar dian t e do dir e it o . Es s a de p e n de do que a clas s e e s p e
r a o b t e r do dir e it o o u do que e s t e p o de b e n e fici - la, Um dir e it o
clas s is t a e n co n t r ar uma at it ude p o s it iv a da clas s e a que fa
v o r e ce , Co s t uma s e r o cas o do s s is t e mas aut o r it r io s , Um di
r e it o in t e r clas s is t a e n co n t r ar at it ude s div e r s as n as clas s e s
s o ciais , de p e n de n do do s e t o r jur dico co n cr e t o e de co mo e s t e
r e p e r cut e n o s in t e r e s s e s de cada clas s e . Co s t uma s e r t amb m
o cas o do s s is t e mas de mo cr t ico s .
s clas s e s sociais trabalhadoras t m r e n un ciado ao s
v e lh o s iS e aTs mv o lucio n r io s , s ub s t it ui o do_ dir e it o v ige n t e
p o r o ut r o dir e it o , o dir e it o da r e v o lu o t r iun fan t e , Es s as clas
s e s n o co mb at e m- o dir e it o n a me dida e m que . o dir e it o jdo
Es t ado s o cial lh e s co n ce de salrios_gue melhoram pouco- e
p o uco s uas co n di e s de v ida. N e m s e o p e m ao s b e n e f cio s
das clas s e s p r iv ile gidas r s S t S mb r n y ^ias .r n e iQr amp r o gr e s -
sivamente sua situao,
Po r o ut r o lado , e s t s ur gin do uma n o v a clas s g s g ial.
Cada v e z mais n ume r o s a, a clas s e s do s de s e mp r e gado s , que
p o de p o uco a.p o uco aume n t ar s ua cap acidade de lut a, co n fo r
me de s ap ar e am s uas e x p e ct at iv as de e mp r e go , Po de r iam o cu
p ar o lugar do s p r o le t r io s do s culo XIX e o p o r - s e fr o n t alme n t e
au dir e it o que as de ix a fo r a das m n imas co n di e s de ur n a
v ida dign a,
Co m e s s a s it ua o , a t e n dn cia s e r ia p ar a uma lin h a de
dup lo ' s e n t ido , t r a ada p e las clas s e s s o ciais : as cjas s e s _co m
t r ab alh o , a fav o r do dir e it o e as clas s e s s e m t r ab alh o , co n t r a
e e r , , 7 r o t r ab a h o , a gr an de p r o p r ie
dade d n o s s a p o ca, co mo e r am o s me io s de p r o du o n o s
culo p as s ado . E o t r ab alh o o fie l que s e p ar a as at it ude s das
clas s e s s o ciais fr e n t e ao dir e it o .
* S o r ian o , Ramn , Sociologia Del Derecho, B ar ce lo n a, A r ie l,
1 9 9 7 , p . 2 8 2 8 - 2 8 4 ,
Sodologio Geiol e Juidka
4. 0 Perfil dos Operadores do Direito (Ana L cia Sabadel)
A s p e s quis as das lt imas d cadas s o b r e o p e r fil s o cial
do s o p e r ado r e s jur dico s co n co r dam p le n ame n t e e m um p o n
t o : n a cr e s ce n t e e , s v e ze s , p ar t icular me n t e r p ida p ar t icip a
o fe min in a n as p r o fis s e s jur dicas . ....
A p e s ar do s p r o b le mas ain da e x is t e n t e s , n o p o s s v e l
n e gar que h o uv e um gr an de av an o n o que s e r e fe r e p ar t ici
p a o das mulh e r e s n a s o cie dade , E is t o s e r e fle t e n o s e t o r
t r ab alh is t a. Em muit as p r o fis s e s t r adicio n alme n t e mas culi
n as , o co n t in ge n t e de mulh e r e s j s up e r a o mas culin o .
Co m r e la o s p r o fis s e s jur dicas , as e s t at s t icas n o
in dicam, p o r m, ' qe e s t a cr e s ce n t e fe mimza o t e n h a alt e r ado ,
de fo r ma s ign ificat iv a, o mo do de e x e r c cio de s t as p r o fis s e s .
A s mulh e r e s "co n quit ar am" o mun do jur dico , s e m mud - lo .
Magistratura
Os juize s n o s o me n t e s o e n car r e gado s da ap lica o
do dir e it o , mas t amb m p o s s ue m a co mp e t n cia de dize r a
"lt ima p alav r a" s o b r e um co n flit o jur dico , at r av s de uma
de cis o t r an s it ada e m julgado .
Po r t al r azo s o in v e s t ido s de uma s r ie de gar an t ias
p e s s o ais e fun cio n ais , t e n do uma p o s i o e s p e cial de n t r o do
Es t ado . N o p o r acas o que a Co n s t it ui o F e de r al de 1 9 8 8 p r e
v um s is t e ma de alt a r e mun e r a o p ar a o s magis t r ado s , de v e n
do o s ub s dio do s Min is t r o s do S up r e mo Tr ib un al F e de r al s e r o
mais alt o e n t r e t o do s o s s e r v ido r e s p b lico s e de t e n t o r e s de
man dat o e le t iv o ( ar t s . 3 7 , in cis o XI, e 9 3 in cis o V, da Co n s t it ui o ) .
A s car act e r s t icas da p o s i o do s juize s n o s is t e ma co n s
t it ucio n al b r as ile ir o ( e , p r at icame n t e , e m t o do s o s p a s e s do
mun do ) p o de m s e r r e s umidas n o s s e guin t e s t e r mo s :
a) in de p e n dn cia p e s s o al e fun cio n al p ar a e v it ar j>r e s -
s e s e gar n t r a^n it r l dide da de cis o ( v lt alicie da-
de , in ar n o v ib ilidade , alt a r e mun e r a o ) ;
b ) de p e n dn cia ab s o lut as da co n s t it ui o e das n o r mas
in fe r io r e s co n fo r me s co n s t it ui o , n o in t uit o de ga
r an t ir a ap lica o fie l do dir e it o ;
Ag e t s o r t -It i b o s a P i n t o
Esotifkao Socim{ OlEIlS
499
c) p r in cip io da in de clin ab ilidade da fun o de julgar que
p r o b e a de n e ga o de Jus t i a; o juiz t e m a o b r iga o
de dar uma r e s p o s t a gb ~p e di'do das p ir t e s , ^e r mit in -
do a r e s o lu o de fin it iv a de t o do s _o s co n flit o s jur di-
co s , me s mo quan do le i s ile n cia o u v aga.
S ign ificam e s t as gar an t ias e s p e c ficas <yue p s juize s n ada
mais s o .do que aut mat o s " e v o ze s v iv as do le gis lado r "? Es t a
e r a uma r e iv in dica o do umln is mo jur dico , que n o s e r e alizo u
n a p r at ica das in s t it ui e s , A p e s ar de s ua de p e n dn cia da le i, o
juiz n un ca fo i., s o me n t e , o fi e x S ct o r dlPHS t r a da le i".
s o cio lo gia jur dica, fie l ao s e u in t e r e s s e co gn it iv o "r e
alis t a", e x p o s t o n o s cap t ulo s p r e ce de n t e s , in t e r e s s a- s e p o r
duas que s t e s , Pr ime ir o , an alis a a fr e qn cia e a in t e n s idade
do p o de r dis cr icio n r io e o mo do co mo o s juize s r e alme n t e o
e x e r ce m. E e m s e gun do lugar , e x amin a as caus as da lib e r da
de " o ue o s iu ze s t o mam dian t e da le i;...
Uma r e ce n t e p e s quis a do p e r fil da magis t r at ur a b r as i
le ir a, que ado t o u o m t o do do que s t io n r io , co n fir mo u a
s e le t iv idade s o cial n a co mp o s i o da me s ma. En t r e o s s e us
me mb r o s o n s t at a- s e umTie ^e s e n t a p ar t icular me n t e fo r -
t e de h o me n s , me mb r o s das clas s e s alt a e m di, filh o s de fun
cio n r io s p b lico s e de s ce n de n t e s de "magis t r ado s . A p e s ar da
t e n dn cia de "ab e r t ur a" e ,Td mo c at iza S "~do ace s s o ma
gis t r at ur a n as lt imas d cadas , o p o de r judici r io b r as ile ir o
co n t in ua s e n do s e le t iv o n a s ua co mp o s i o ( We r n n e ck Vian n a
e o ut r o s , 1 9 9 7 ) .
Ob v iame n t e , is t o n o s ign ifica que as s e n t e n as do s
magis t r ado s s e jam o b r igat o r iame n t e de clas s e . Po r m, in di
ca que n o p o de s e r jix clu da a e v e n t ualidade cie uma at ua o
p quco co n fo r me co m a image m do juiz n e ut r o dian t e do s co n
flit o s s o ciais . ....
A p e s quis a e mp r ica in dica, e m t o do cas o , que a at iv ida
de p r o fis s io n al da magis t r at ur a in flue n ciada p o r uma s r ie
de v r i v fs . Tr at a- s e de f t r ii ^e s o s us ce t v e is a alt e r a
e s de p e n de n do do p a s , da s it ua o p o l t ica, da fo r ma o e
da p o s i o n a h ie r ar quia s o cial e p r o fis s io n al, n a qual s e s it ua
cada gr up o de juize s . A s v ar i v e is mais imp o r t an t e s s o :
So c i o l o g i a Ge r a l e J u r d i c a
500
S iguno ?mi S ectoio i* Jurdica
a) a p o s i o de clas s e ( e m ge r al s up e r io r ) ;
b ) a o p in icL Po l t ica ( e m ge r al co n s e r v ado r a o u lib e r al-
consetvaota);
- c) a s o cializa o e s p e ficame n t e jur dica . p r o v e n ie n t e da
fo r ma o jur dica, do mo do de s e le o e da at ua o
p r o fis s io n al, que do ao juiz e m je r al, uma v is o
le galis t a e aut o r it r ia da r e alidade s o cial, in flue n cian
do , as s im, s ua p o s i o dian t e ao s co n flit o s s o ciais ,
' Os e s t udo s s o b r e as v ar i v e is s ub je t iv as da at ua o da
magis t r at ur a r e alizado s e m v r io s p a s e s co n s t at am a r e lat iv a
h o mo ge n idade do s juize s ( co r p o da magis t r at ur a). Is t o n o
p o de de ix ar de in flue n ciar o p r o ce s s o de c s r io . A in t e n s idade
do in flux o das v ar i v e is s ub je t iv as s o b r e as de cis e s dife r e de
cas o a cas o , s e m s e r p o s s v e l e s t ab e le ce r uma le i s o cio lgica.
S up e - s e , p o r m, que a at iv idade judici r ia car act e r iza-
s e p o r uma dupla seletividade. Pr ime ir o , seletividade na aplica
o da lei majTp r o b ab ilidade e m p un ir o s mais fr aco s e
fav o r e ce r o s me mb r o s das cla s s e s s up e r io r e s ^ S e gun do ,
seletividade na interpmta d lei o juiz t e n de a ut ilizar as
mar ge n s de d s cr icio n ar ie dade s e gun do s uas o p e s p o l t icas
e ide o lgicas . ...
Min is t r io Pb lico
Cab e dize r que n o s e e n co n t r am muit as p e s quis as
de dicadas an lis e da at ua o do Min is t r io Pb lico . N o cas o
b r as ile ir o , r e s ult ar ia muit o in t e r e s s an t e r e alizar uma lo n ga p e s - '
quis a s o b r e e s t a clas s e de o p e r ado r e s jur dico s . Co mp ar an do
o s r e s ult ado s s o b r e a o r ige m s o cial, as me n t al dade s e a at ua
o do min is t r io p b lico co m as do s juize s , s e r ia p o s s v e l co m
p r e e n de r a fun o s o cial do p o de r judici r io co mo um t o do , ...
Advocacia
Pe s quis a e mp r icas s e me lh an t e s que las co n duzidas
co m a magis t r at ur a fo r am e fe t uadas co m o ut r o s p r o fis s io n ais
do dir e it o , co mo o s adv o gado s e o s t ab e lie s , O mat e r ial
Ag e r s o n T a b o s a P i n i o
Es m i i r t C g o Sa e m t B i t m o
501
e mp r ico dis p o n v e l mais r e duzido , s e n do que o p ap e l de cis i
v o n a ap lica o do dir e it o me ai s o b r e o s ju ze s ^qe de t m, _o
p o de r da "lt ima p alav r a"__
O cas o da adv o cacia ap r e s e n t a muit as e s p e cificidade s .
Tr at a- s e de uma at iv idade de in t e r e s s e p b lico e , ao me s mo
t e mp o , de uma p r o fis s o lib e r al, v o lt ada ao lucr o , A l m de s e r
p ar t icular me n t e e x ige n t e , a adv o cacia dis t in gue - s e de o ut r as
p r o fis s e s lib e r ais de "e lit e " ( m dico s , e n ge n h e ir o s ) p e io fat o
de que _o _adv o gado e n co n t r a- s e e m co n t n uo _co n flit o co m p e s
s o as e ar up o s e . in clus iv e , co m s e us co le gas . s t e de v e at uar
e m s it ua e s de co n t n ua t e n s o , n e ce s s it an do co n v e n ce r t e r
ce ir o s s o b r e a licit ude do s in t e r e s s e s que de fe n de ,
A adv o cacia uma p r o fis s o p ar t icular me n t e "p e r me
v e l" ao s in t e r e s s e s e co n mico s e s e s t r ut ur as da v ida p b li
ca, co n s t it uin do , as s im, um in dicado r das mudan as s o ciais .
A dv o gado co mp e t it iv o o u co r p o r at iv is t a? A dv o gado e s p e ci
alizado e as s o ciado o u ge n e r alis t a e aut n o mo ? A dv o gado
"co me r cializado " o u v o lt ado de fe s a do s fr aco s " e do in t e
r e s s e p b lico "? A dv o gado as s alar iado o u "liv r e "? A dv o gado
de e x p e r in cia p r t ica o u "cie n t ifico "? To do s e s t e s mo de lo s
co e x is t e m. D e p e n de n do do mo me n t o h is t r ico , t e mo s mudan
as quan t it at iv as n o p e r fil da adv o cacia que in dicam alt e r a
e s n o fun cio n ame n t o do s is t e ma jur dico .
Em t o do cas o , as p e s quis as in dicam que o adv o gado , n a
p r t ica, co r r e s p o n de p o uco image m do lit igan t e e do gr an de
o r ado r n o t r ib un al do jr i. A maio r p ar t e do t r ab aih o da adv o
cacia r e p e t it iv o , mais v o lt ado ar b it r age m, co n cilia o e
ge s t o de in t e r e s s e s e co n m co s do que de fe s a co n t r adit
r ia de gr an de s caus as .
A o r ige m s o cial e a r e n da de s t e s p r o fis s io n ais e x t r e
mame n t e v ar iada ( S o r ian o , 1 9 9 7 , p p . 4 2 5 e s s .) . uma p ar t e do s
adv o gado s p e r t e n ce clas s e m dia alt a. En co n t r am- s e , t am
b m, adv o gado s p o b r e s , fr e qe n t e me n t e fo r mado s "e m facul
dade s me n o s p lr s t igi ds Tq as s is t m p o p ula o mais
car e n t e , t r ab alh an do e m caus as cujo v alo r n p e r mit e uma
alt o r e mun e r a o . s it ua o "de s t e gr up o r e fle t e a limit a o
do ace s s o Jus t i a das clas s e s de s fav o r e cidas .
So c i o l o g i a Ge m i e J u r d i c a
502
Segunda P t m - S o o o t m Juoic
Uma cat e go r ia in t e r me di r ia fo r mam o s adv o gado s que
t r ab alh am: e m _p _o s i e s . in fe r i o r e s e m gr an de s e s cr it r io s de
adv o cacia, r e alizan do um t r ab alh o b ur o cr t ico e s ub o r din ado ,
co m r e mun e r a o s e me lh an t e que la de um fun cio n r io do
s e t o r p r iv ado , S e me lh an t e a s it ua o s o cial de adv o gado s
que t r ab alh am e m de p ar t ame n t o s jur dico s de e mp r e s as o u
e m s e r v i o s jur dico s e s t at ais .
Po l cia
A p o l cia p ar t icip a da ap lica o do dir e it o e n quan t o co r
p o o r gan izado que s e e n car r e ga do co n t r o le s o cial n o s s e us
as p e ct o s mais "fo r t e s " ( r e p r e s s iv o s ) . Ela__e fe t ua a p r ime ir a
filt r age m do s fut ur o s "clie n t e s " do s is t e ma jur dico , D e s ua
at ua o de p e n de o mo do e" a'dir e o da "co n cr e t iza o " do
dir e it o , s o b r e t udo n a r e a p e n al.
Ex ce t uan do a p ar ce la de in t e gr an t e s da p o licia co m o r -
ma o jur dica ( de le gado s de p o l cia) , o s p o liciais n o ap r e
s e n t am s e me lh an as co m o s gr up o s ~de o 'p e r ado r e s jur dico s
s up r acit do s r p n v e i d^e c , a o r ige m s o cial e a r e mu
n e r a o e quip ar a ^miln aB s ^p h cims as fun cio n r io s p b li
co s do e s calo m dio - b aix o .
A s co n di e s de t r ab alh o s o dif ce is e , muit as v e ze s ,
in clue m gr an de s p e r igo s . Os co mp o r t ame n t o s do s p o liciais
e n co n t r am- s e , s v e ze s , e m co n flit o co m as o b r iga e s t icas
e me s mo le gais da co r p o r a o ( co r r up o , v io ln cia ile gal) .
D e co r r n cia de s t e s fat o s a e x t r e ma v ar ia o do p e r fil
do s p o liciais s e gun do o p ais e a s it ua o s o cial e p o l t ica. Is t o
n o p e r mit e falar e m uma "Hit e ^t t an s n acio n al e h o mo gn e a,
de t e n t o r a de p r e s t gio e de p o de r , co mo o cas o das magis t r a
t ur a e , e m p ar t e , da adv o cacia,
Em p a s e s e co n o micame n t e de s e n v o lv ido s , o p o licial
adquir iu n as lt imas d cadas o p e r fil de um t cn ico de s e gu
r an a", co m t r e in ame n t o e s p e cifico e cap acidade s de at ua o
n o s co n flit o s s o ciais . Em p a s e s do t e r ce ir o mun do , o jp o licial
at ua de fo r ma r e p r e s s iv a e fr e qe n t e me n t e b r ut al, t e n do , at
h o je , a in cumb n cia de t r at ar o s p r o b le mas s o ciais co mo cas o s
de p o l cia. Is t o in dicado p o r muit as p e s quis as e de p o ime n t o s
g e i s o n -T o b o s o P i n t o
E stmifiCA o S oo i i Di hi io
503
s o b r e a at ua o das p o licias b r as ile ir as . A s de n n cias s o b r e a
v io ln cias , as ile galidade s e a co r r up o de in t e gr an t e s da p o l
cia s o , p o r m, fr e qe n t e s e m t o das o s p a s e s do mun do .
A s p e s quis as e mp r icas ap o n t am que a p o l cia p o s s ui, n a
p r t ica, uma gr an de mar ge m de dis cr icio n ar ie dade n a ap lica
o do dir e it o . Is t o lh e o fe r e ce um p o de r p ar t icular me n t e gr an
de . D e p e n de n do da s it ua o , e s t e p o de r p o de s e r e x e r cido de
fo r ma d s cr imin an t e e v io le n t a o u, ao co n t r ar io , p o de s e r v ir p ar a
adap t ar as p r e v is e s . le gais s s it ua e s co n cr e t as ( p o r e x e m
p lo , de ix an do de r e gis t r ar uma qux Te s o lucio n an do o co n flit o
e n t r e v izin h o s de fo r ma amig v e l) , 'me s mo s e is t o imp lica o
de s o imp r n e n t de fo r malidade s le galme n t e e x igidas .
Um o ut r o e le me n t o ap o n t ado e m p e s quis as que o s
ap ar e lh o s p o liciais at uam co m muit o p r e co n ce it o e m face da
p o p ula o d b aix a r e n da. D is t o r e s uIt aTr t e s e le t iv idade do
t r ab alh o p o licial, lar game n t e fun dame n t ado n o s e s t e r e t ip o s
das clas s e s p e r igo s as " e do s "h ab it uais s us p e it o s ".
Po r lt imo , e x is t e a que s t o da s ub cult ur a que s e de s e n
v o lv e n o mb it o da co r p o r a o p o licial. Tr at a- s e de uma e s p
cie de ide o lo gia p r o fis s io n al, de s e n v o lv ida co mo fo r ma de
r e a o s dificuldade s do t r ab alh o . A s ua car act e r s t icajo r in gi-
p ai a s o lidar ie dade e n t r e p o liciais , o u s e ja, o ch amado e s p
r it o de co r p o ", que le v a limit a o do s co n t at o s jp ia s de n t r o
do c r culo p o licial. A lgumas p e s quis as in dicam, co mo car act e
r s t icas p ar t icular e s da p r o fis s o p o licial, a a s t cia, o
co n s e r v ado r is mo , o e x t r e mo mo r alis mo e a p r o x imidade cult u-
r al co m a mar gin alidade . image m n e gat iv a da o p in io p b li
ca co n r e la o ao s p i c s , ao me s mo t e mp o , caus a e e fe it o
da s ub cult ur a p o licial,
S ab ade l, A n a L cia - Manual de Sociologia Jurdica, S. Paulo ,
RTL , 2 0 0 0 , p . 1 6 7 - 1 7 7 ,
S o c i o l o g i a Ge r a l e J u r d i c a
r ....... 1.... .................................................. .............
X X) :
|
;;
f n ) I
CONTROL E SOCIAL JU R DICO j
Vamo s t r at ar , n e s t e cap it ulo , da p r e s e n a do dir e it o
n o co n t r o le s o cial, o u do co n t r o le s o cial fe it o p e lo dir e it o , ;|
o u ain da do co n t r o le s o cial jur dico . Emb o r a o as s un t a t e - ]|
n h a ficado mais r e s t r it o , v amo s s e guir o r o t e ir o da e x p o s i- t
o ut ilizada quan do da ab o r dage m do co n t r o le s o cial, n o
cap t ulo VI da S o cio lo gia Ge r al, \
A s s im, co me ar e mo s co m a fix a o do co n ce it o , a II
an lis e do s e le me n t o s e car act e r s t icas , p ar a ch e gar mo s I
ao e s t udo das fun e s e d a s an o , e , p o r lt imo , de s uas |
agn cias , . ||
1 CONCEITO :
Co m r e la o ao co n ce it o , co n t in uamo s r e al an do I
que co n t r o le s o cial um p r o ce s s o e n o um in s t r ume n - I
t o . S e p r o ce s s o , h at o r e s n o p alco , e m in t e r a o s ign i- I
ficat iv a, b us can do a s at is fa o de s uas n e ce s s i d ad e s I
mat e r iais e e s p ir it uais , r azo de s e r do p r p r io co n v v io |
s o cial. A s n o r mas jur dicas a s e r e m, aqui, u s ad as que |
s o o s in s t r ume n t o s p adr o n izado r e s de co mp o r t ame n t o
do s p e r s o n age n s . |
2 EL EMENTOS
D e s t aque mo s , co mo e le me n t o s do que s e p as s a n e s - I
s e t e at r o o u n e s s a e n ce n a o , ap e n as t r s : o s at o r e s ( que
s o o s p lo s d a in t e r a o p r o ce s s ual, o s que age m e o s
que r e age m" o s que co n t r o lam e o s que s o co n t r o lado s ) ;
o fim o u o b je t iv o b us cado e o s in s t r ume n t o s o u me io s |
dis p o s i o do s at o r e s , j
So c i o l o g i a Ge r a l e J u r d i c o
506
S i S M M P J f - S O O O I O G H J W P B
2.1 Atores
A t o r e s do co n t r o le s o cial s o t o do s o s que e s t o n o
p alco , in div duo s e gr up o s p ar t icip an t e s do s p r o ce s s o s
s o ciais que s e de s e n v o lv e m e m de t e r min ada s o cie dade
glo b al o u n o s gr up o s p ar t icular e s que a in t fr am, cujo co m
p o r t ame n t o r e gulado p o r n o r mas jur dicas . A s s im, s o
at o r e s as p e s s o as f s icas , o s gr up o s , gr an de s o u p e que
n o s , p e s s o as jur dicas o u n o . N a v ida r e al, que muit o
co mp le x a e din mica, cada at o r de s e mp e n h a t an t o s p a
p is quan t o s fo r e m o s gr up o s p ar t icular e s a que p e r t e n
a* E co mo n o r mas jur dicas n o s o ap e n as aque las
dit adas p e lo Es t ado , mas t amb m aque las p r o duzidas
p e lo s n e gcio s jur dico s p r iv ado s , n o s e p o de dize r que ,
n o co n t r o le s o cial jur dico , s o me n t e o Es t ado que m co n
t r o la, e que o s de mais at o r e s s o co n t r o lado s . Par t e s de
um co n t r at o de lo ca o , p o r e x e mp lo , s o , ao me s mo t e m
p o , s uje it o s at iv o s e p as s iv o s do co n t r o le jur dico ,
2.2 Finalidade
Es s e co n t r o le e x e r cido p a r a que o dir e it o cump r a
a s ua fun o de gar an t ir a co n v iv n cia h uman a p r o dut i
v a e fe liz. S e m n o r mas jur dicas o u ap e n as co m n o r mas
mo r ais e r e ligio s as , o co n v v io s o cial co r r e r ia o r is co de
de ge n e r ar e at de s e t r an s fo r mar n uma gue r r a de t o do s
co n t r a t o do s . 1
2.3 Instrumentos
Co mo t r at amo s de co n t r o le r e alizado p e lo dir e it o , o
$ n ico in s t r ume n t o ut iliz v e l o in s t r ume n t o jur dico , p r o
1 Esse risco teria justificado a monarquia absoluta, defendida por
Bobbes em Leviathan.
Agersbloboso P i n i o
C o n t o u So c i t t iEBKO
507
v e n h a do Es t ado o u de s e us r go s co mo a le i, de cr e t o ,
p o r t ar ia, a jur is p r udn cia, o u t e n h a o r ige m p r iv ada, co mo
o s e s t at ut o s e o s co n t r at o s , e man e de dir e it o e s cr it o , co mo
as le is , o u de dir e it o n o e s cr it o , co mo o s co s t ume s .
Os at r ib ut o s co m que RA MN S ORIA N Q car act e r i
zo u o dir e it o , co mo fo r ma de co n t r o le s o cial, p r e fe r imo s
t r an s fe r i- lo s p ar a a s n o r mas jur dicas , co mo s e u in s t r u
me n t al. S o o s s e guin t e s :
a) Ce r t e za - A n o r ma ce r t a p o r que e s t n o cdigo ,
co n h e cida. F o i p r o p o s t a, v o t ada e p r o mulgada.
b ) Ex igib ilidade - A n o r ma e x ig v e l p o r que s e u
cump r ime n t o co mp uls r io .
c) Ge n e r alidade - A le i, co mo n o r ma, ge r al p o r que
p ar a t o do s . p b lica p o r que de v e s e r ap licada
a t o do s o s que s e in clue m n a s it ua o - t ip o p ar a a
qual s ur giu._
d) %cp an s r v idade , t : A ^n o r ma e x p an s v e l p o r que
t e n de a alar gar o un iv e r s o de s ua ap lica o , e v i
t an do lacun as e an o mia.
e ) Un ifo r midade - A n o r ma un ifo r me p o r que , ao
e x p an dir - s e p e la acult ur a o , man t m o s e n t ido
e a fe i o o r igin ais .2
3 CARACTER STICAS
O co n t r o le jur dico dis t in gue - s e do s de mais t ip o s de
co n t r o le s o cial p o r s e r e x t e r n o , fo r mal e co e r cit iv o ,
3,1 Externo
O co n t r o le jur dico , co mo o co n t r o le s o cial, e m ge r al,
e x t e r n o p o r que a fo r a co m que p r e s s io n a as p e s s o as
2 SORIANO, Ramn. Sociologia de! Derecho, Op, cit., p. 339-342.
So c i o l o g i a Ge r o l e J u r d i c o
508
S k b h d P m - So c i o i o s i A J m m
sob s ua in flun cia, v e m de fo r a de s s as p e s s o as . A co e r -
o e x e r cida s o b r e n s p e las n o r mas jur dicas n o fo i p r o
duzida p o r n s , co mo as n o r mas n o fo r am fe it as p o r n s
e at n o s an t e ce de r aOm.^
3.2 Formal
O co n t r o le jur dico fo r mal p o r que e x e r cido p o r
n o r mas , dis p e de r it uais e de agn cias e s p e cializadas
de ap lica o de s an e s . Po r e s s e fo r malis mo , que t am
b m s e p o de at r ib uir ao co n t r o le r e ligio s o , co s t uma- s e
dize r que o co n t r o le jur dico fo r mal.3
3.3 Coercitivo
Po r que dis p e de um s is t e ma de s an e s co m que
ap r o v a e de s ap r o v a o co mp o r t ame n t o in div idual o u gr up ai,
o co n t r o le jur dico co n s ide r ado co e r cit iv o . Um p o uco mais
s o b r e e s s e car t e r falar e mo s mais t ar de ,
4 FU N O ;
A l m das fun e s que t o do co n t r o le s o cial cump r e ,
que , co mo v imo s , s o , e m t e r mo s ge n r ico s , a o r de m, a
s e gur an a, e a e ficin cia, o co n t r o le jur dico , s e gun do D E
L A TORRE, ain da e x e r ce e s t a s duas fun e s e s p e c ficas :
a de gar an t ir o e quil b r io e n t r e as e x ign cias do in s t in t o
de an t i- afir ma o do s in div duo s e as e x ign cias r e co n h e -
cidas n e ce s s r ias do r e lacio n ame n t o do s in div duo s _n a
v ida e m s o cie dade ; e a de man t e r a e s t ab ilidade das r e la
e s in t e r s ub je t iv as de n t r o do s is t e ma. p r e cis o que e s
s a s a e s s e jam un ifo r me s e d u r a d o u r a s p a r a que
3MACHADO NETO, A. L. Sociologia Jurdica. Op. cit,, p. 466,
Ag e r s o n o b o s o P i n t o
C o m o i S o c w J i ! 8 8 s (o
509
p o s s ib ilit e m as e x p e ct at iv as de co mp o r t ame n t o e n t r e o s
at o r e s s o ciais ,4
5 SAN O
A r aiz da p alav r a s an o a me s ma da p alav r a s an
t o , A mb as as p alav r as v m do lat im sancire = s an t ificar ,
s acr alizar . Po r is s o , CUVIL L IER e x p lica que a s an o
que faz a n o r ma s an t a o u s agr ada, e , co mo t al, n o p o de
s e r de s cump r ida,5 S o b r e s an o jur dica, v e jamo s um p o u
co mais do que j fo i e s t udado n o cap t ulo VII da p ar t e
ge r al, r e lat iv ame n t e ao s e u co n ce it o e s fun e s .
5.1 Conceito
S an o r e p r e s e n t a r e a o a o do s at o r e s . Co mo
s e r e age , ap r o v an do o u r e p r o v an do , as s an e s p o de m
s e r p o s it iv as o u ap r o v at iv as , e n e gat iv as o u r e p r o v at iv as ,
N o s e p o de , co n t udo , n o mb it o do co n t r o le jur dico , as
s o ciar s an o id ia de p e n a, de s an o n e gat iv a, co mo
s e faz n o D ir e it o Pe n al. N o D ir e it o Co n s t it ucio n al, p o r e x e m-
p lo , a s an o d a le i p e lo Pr e s ide n t e , s an o ap r o v at iv a.
S ua co r r e s p o n de n t e n e gat iv a, ch am- s e , : t e cn icame n t e ,
v e t o , O me s mo o co r r e co m dir e it o p r e mial, da e s fe r a do
D ir e it o A dmin is t r at iv o e Tr ab alh is t a.
S e s an o r e a o , e la de v ia s e guir s e mp r e a a o ,
o u v ir gB gp 5 a"a 7 "H', '' p Mn T^it ce o e s , co mo mo s t r a
F ERRA RI: o in ce n t iv o fis cal, co n ce dido a e mp r e s r io , p o r
e x e mp lo , s an o p o s it iv a q ^ _ ^ t o r n a _e fe t iv a_ an t e s
me s mo d a imp le me n t a o _do in v e s t ime n t o .6
4 DE L A TORRE, Angel Sanchez, Curso d e Sociologia d e Derecho,
Madrid: Ed. Revista de Derecho Privado, 1965, p. 35-236.
5 CUVILLIER, Armand, Sociologia , Op. ct., p. 392-393
6 FERRARI, Vincenzo, Accin Jurdica y Sistema Normativo:
Introduccin a ia Sociologia dei Derecho (Azione Jurdica e Sistema
S ociol og o G erai c- jur di co
5.2 Funes
D e s de o D ir e it o Ro man o at o dir e it o at ual, a s a n
o n e gat iv a o u a p e n a t e m s ido Re p r e s s iv a, p r e v e n t iv a
e co r r e t iv a!7
5.2.1 Repressiva
Es s a fun o , e x e mp lifica ROB L ES , imp lica o at o de
cas t igar e m s i, dir igida ao t r an s gr e s s o r e s up e a id ia de
que que m faz o mal p aga co m o mal, s e n do o cas t igo a
co n s e qn cia n at ur al da in fr a o .8
5.2.2 Preventiva
Uma p e n a e x e mp lar s e v e r a, p o r e x e mp lo , p o de e v i
t a r t amb m mais cr ime s , ao in t imidar o s que p r e t e n de m
imit ar o cr imin o s o , e , e m co n s e qn cia, ch amada t am
b m n t imidat r a. S e gun do ROB L ES , o j im mt imidat r io
dir igido a t o do s e p r o je t ado p ar a o fut ur o .9
5.2.3 Corretiva
O cr imin o s o , e m at o o u p o t n cia, n o p r e cis a ap e
n as s e r cas t igado o u in t imidado , mas co n v m que ;s e ja
co r r igido , e me n dado , r e e ducado o u r e s s o ializado e s e
r e in t e gr e ao co n v v io s o cial, s e m mais p e car o u de lin qir .
En alt e ce r e s s a fun o da p e n a e s t muit o e m mo da. Re s
t a s ab e r s e s ua p r t ica t e m r e v e lado e fic cia.
Normativo: L ineamenti di Sociologia d Diritto). Madrid: U niversdad
Carlos Ill/Dyknson, 2000. p. 208-211.
1Veja PINTO, Agerson Tabosa. Direito Romano. 2. ed. Fortaleza: Fa7,
2003, p. 311-312.
8 ROBL ES, Gregrio. Sociologia dei Derecho. Op, cit,, p. 166.
9Idem, ibdem, p. 166.
Co Ni i o i c Sc i Jurdico
5 1 1
5,3 Requisitos
RA MN S ORIA N O ap o n t a, co mo p r in cip ais r e quis i
t o s da s an o , a ge n e r alidade , a p r o p o r cio n alidade e _a
imp ar cialidade .10
5 .3 .1 - Ge n e r alidade
Es t e r e quis it o e n v o lv e , ao me s mo t e mp o , o s p r in c
p io s d a le galidade e da p ub licidade . A _s an o de v e s e r
p r e v is t a e n o de p e n de r , co mo r e gr a, do ar b t r io do juiz:
nulla poena sine praevialege. E de v e s e r co n h e cida o u t e r
s ido p ub licada e div ulgada. Clar o que a ign o r n cia da p e n a
p e lo cr imin o s o n o o e x ime da s an o , co mo a ign o r n cia
do cr ime p e lo cr imin o s o n o o e x ime de in cr imin a o ,
5 .3 .2 Pr o p o r cio n alidade
Po r p r o p o r cio n alidade , co mo r e quis it o da s an o ,
e n t e n de - s e a co r r e s p o n dn cia, que de v e e x is t ir , e n t r e o
de lit o e a p e n a, o u o alcan ce da de s o b e din cia n o r ma e
a s an o imp o s t a. A s s im, a gr adua o da p e n a de v e le
v ar e m co n s ide r a o e n at ur e za e o alcan ce do cr ime . 11
5 .3 .3 Imp ar cialidade
N e s t e r e quis it o , e s t n s it a a id ia de co n t e n cio s o
o u de alt e r idade . A ap lica o da p e n a r e que r um tercius,
o julgado r h ab ilit ado . N o p o de e n v o lv e r ap e n as o s at o
r e s p ar t icip an t e s do fat o ge r ado r da p e n a: nulla poena sine
judicio. O dir e it o fe r ido p r e cis a de uma t ut e la judicial n e u-
t r a L o que n o aco n t e cia n a Idade M dia, quan do cada
e s t ame n t o t in h a o s s e us p r p r io s juize s e t r ib un ais ,
10 SORIANO, Ramn, Op. cit., p. 346-347.
11Idem, ibidem, p. 346.
So c i o l o g i o Ge r a l e J u r d i c o
5 1 2
Sf SUf f M P . ! t - So Cl Qi Kl k J l t Bi a
6 AGNCIAS
Co mo n o s s o as s un t o , ago r a 2 co n t r o le jur dico , v a
mo s ap o n t ar ap e n as , e de fo r ma e s que m t ca, as agn cias
o r gan izadas e p r p r ias p ar a dir imir fat o s co n t e n cio s o s .
6 . 1 - J usti a Estadual
N a jus t i a e s t adual, t e mo s :
Os juizado s e l e gr au o u e l in s t n cia;
* Os t r ib un ais , que julgam p r o ce s s o s de s ua co m
p e t n cia o r igin al, o u p r o ce s s o s e m gr au de r e
cur s o , o r igin r io s o I a gr au,
6 . 2 -J u s t i a Federal
A e s t r ut ur a da jus t i a fe de r al co mp r e e n de :
6 .2 .1 - Juizado s fe de r ais de p r ime ir o gr au, lo caliza
do s n as cap it ais do s Es t ado s , n o D is t r it o F e de r al e n as
p r in cip ais cidade s in t e r io r an as . On de n o h o uv e r jus t i a
fe de r al e s p e c i a l i z a d a ( e le it o r al e t r a b a l h i s t a ) , e la
e x e r cida p o r juizado s e s t aduais ,
6 . 2 , 2 - Tr ib un ais F e de r ais Re gio n ais , co mp o s t o s p o r ,
n o m n imo , 7 juize s , ch amado s t amb m de de s e mb ar ga
do r e s fe de r ais / co mp e t e n t e s , e m ge r al, p ar a p r o ce s s ar e
julgar caus as v in das , e m gr au de r e cur s o do s juizado s fe
de r al de I a in s t n cia.
6 .2 .3 - Tr ib un ais fe de r ais s up e r io r e s , co m s e de n a
cap it al da Re p b lica e jur is di o p o r t o do t e r r it r io n acio
n al. S o e le s :
6 .2 .3 .1 - S up e r io r Tr ib un al de Jus t i a ( S TJ) , co mp o s t o
de , n o m n imo , 3 3 min is t r o s ,
6 .2 .3 .2 - S up e r io r Tr ib un al Ele it o r al ( S TE) , co mp o s t o
de n o m n imo , 7 min is t r o s .
Ag e r s o n i o b e s o P i n t o
6 .2 .3 .3 - S up e r io r Tr ib un al do TVab alh o , co mp o s t o de ,
n o m n imo , 2? min is t r o s .
.2 .3 .4 - S up e r io r D r ib un ai Milit ar ( S TM) , co m a co m
p o s i o de , n o m n imo , 1 5 min is t r o s .
6 .2 .4 - S up r e mo I t ib un al F e de r al ( S TF ) - Co m s e de
n a cap it al e jur is di o p o r t o do t e r r it r io n acio n al, o S TF
co mp o s t o de 11 min is t r o s .12
12 S o b r e co mp e t n cia e o ut r o s in fo r me s da Jus t i a F e de r al v e ja a co n s
t it ui o fe de r al do ar t . 9 2 ao 1 2 6 .
5 1 4
S e vKB f m i - So c i o i s u J vt i o i a
ESQU EMA
1 CONCEIT O
2 E LE M E N T O S
2 . 1 _ At o r e s
2 .2 Fi n a l i d a d e
2 73 n s f r m e rt to s
3 CARACT ER ST ICAS
3.1 Ext e r n o
3.2 Fo r m a l V o e ; , , \
3.3 Co e r c i t i vo . - t *
4 FUNO
5 SANO
5 .1 Co n c e i t o
5 .2 Fu n e s
5 .2 .1 Re pr e s s i va - - 1 i : \ ; c -
5 .2 .2 P r e ve n t i va
5 .2 .3 Co r r e t i va
5 .3 Re qu i s i t o s
5 .3.1 Ge n e r a l i d a d e
5 .3.2 P r o po r c i o n a l i d a d e . ,
5 .3.3 Im pa r c i a l i d a d e r _ ,
6 AGNCIAS
6.1 J u s t i o e s t a d u a l
6.2 J u s t i a f e d e r a l
C omecu S f i t i t i k r i t o
5 1 5
QU ESTION RIO
1 . Po r que o co n t r o le s o cial at r av s do dir e it o um co n
t r o le fo r mal?
2 . Co mo o co n t r o le s o cial p o de s e r fe it o s e m a i n t e r v e n
o do dir e it o ?
3 . : Mo s t r e uma gr ada o da co n dut a an t i- s o cial, da de s
co r t e s ia ao cr ime .
4 . Mo s t r e o ut r as in s t an cias de s o cializa o o p e r an do o
co n t r o le s o cial an t e s d a in s t an cia jur dica,
5 . Po r que , p ar a v iv e r e m s o cie dade , um cidado co mum
n o p r e cis a s ab e r o cdigo p e n al?
6. Co mo in s t r ume n t o s de co n t r o le , o que s o o s mores e
o s folkways?
7 . Que t ip o de t r an s gr e s s o o cdigo p e n al co s t ume p un ir ?
8. Po r que s e diz que o co n t r o le s o cial s e r v e p ar a le git i
mar o p o de r p o l t ico ?
9 . Co mo co n t r ap o r co n t r o le jur dico a p lur alis mo cult ur al?
1 0 . A r e s s o cializa o ain da o b je t iv o da p un i o ?
1 1 . Que m mais co me t e cr ime ? ( X , '
1 2 . Qual a fin alidade da e x is t n cia do co n t r o le s o cial?
1 3 . A le i agn cia o u in s t r ume n t o do co n t r o le s o cial?
1 4 . Que t ip o de s an o s e mp r e o r gan izada?
1 5 . To da s an o jur dica r e p r o v at iv a?
BIBL IOGRAFIA
1 , F e r r ar i, Vin ce n zo -Accin Jurdica y Sistema Normativo, o p , cit ,
2 , Mach ado N e t o , A , L . - Sociologia Jurdica, o p , cit ,
3 , Ro b le s , Gr e go r o - Sociologia dei Derecho, o p . cit ,
4 , S o r ian o , Ramn - Sociologia dei Derecho, o p . cit .
5 , To r r e , A n ge l S n ch e z de la - Sociologia dei Derecho, o p , cit .
S ociol oqia G eial e Jur dico
5 1 6
St GUNDA P ASU - SOCIOIOOI* JUR DICA
L EITU RAS
s
< (T ^ Co n t r o l c Social e Direito ( A . L Mach ado N e t o )
O dir e it o , ce n t r o de n o s s a at e n o n e s s e t r ab alh o | , p o is .
o mo do r aais Jan n aL do ..co n t r o la, s o cial fo r mai S ua fr r n o .a
de s o cializar e m lt ima in s t n cia, p o is s ua p r e s e n a e s ua at u-
i a o s s e faz n e ce s s r ia quan do j _as an t e r io r e s b ar r e ir as que
a s o cie dade e r gue co n t r a a co n dut a an t i- s o cial fo r am ult r ap as -
^ s adas , quan do a co n dut a s o cial j s e ap ar t o u da t r adi o cul-
^ t ur al, ap r e n dida p e la e duca o p ar a , s up e r an do as co n di e s
de me r a de s co r t e s ia, s imp le s imo r alidade o u me s mo , p e cado ,
alcan ar o n v e l mais gr aVe do Mcto ou, t an t o p io r , do crime.
Po r e s t ar e m aco r do co m o in t e ir o me can is mo do co n t r o
le s o cial que s e lh e an t e cip a ( t o do e le mais e x ige n t e e m e x t e n
s o , mas , me n o s e x ige n t e e m p r o fun didade o u e m s an o que
o dir e it o ) o dir e it o p o de r e s e r v ar s ua at ua o p ar a a lt ima
"ch an ce ", aguar dan do que an t e s de le o s n v e is an t e r io r e s e
mais co mp r e e n s iv o s do co n t r o le s o cial fa am a s ua p ar t e co mo
in s t n cias p r ime ir as da s o cializa o , ~
S alv o s e uma s o cie dade e s t e m fr an ca dis s o lu o o u
cr is e , co n co r dam e n t r e s i o s v r io s camin h o s da s o cializa o ,
e , s e as s im , o in div iduo que adap t a s ua co n dut a ao s p r in c p i
o s da t r adi o cult ur al h e r dado s 'da co n v iv n cia o u s n o r mas
do t r at o o u s n o r mas mo r ais e r e ligio s as , e m r igo r n o p r e cis a
co n h e ce r o co digo p e n al, uma v e z que o que n e s t e s e e x ige
um m n imo daquilo que " o s . s is t e mas n o r mat iv o s acima r e fe r i
do s imp e m. A p e n as , co mo o mo do de imp o r das Mkway s e
das n o r mas mo r ais mais b r an do , p ar a is s o e x is t e o cdigo
p e n al: p ar a p un ir de man e ir a in e x o r v e l a t r an s gr e s s o ao m
n imo de 'n r n ias ' t icas "e lmp o s i e s = s o ciais p r o ib it iv as , aque
las de que , s o b h ip t e s e alguma, p o de a s o cie dade ab r ir mo .
A s s im, co mo in s t r ume n t o de s o cializa o e m lt ima in s
t n cia, o . dir e it o cump r e um p p e l co n s e r v ado r do s t at us guo ,
t amb m s e r v in do a legitimar o p o de r p o l t ico e a fav o r e ce r o
s e u do m n io s o b r e a o p in i p b lica.
* Mach ado N e t o , A . L ., - Sociologia Jurdica, 3 a e d., S . Paulo ,
S ar aiv a, 1 9 7 4 , p 1 6 6 - 1 6 7 .
C o Hi t o t t So e m J us bco
5 1 7
2, Direito e Controle Social (Pedro Scuro Neto)
To das as s o cie dade s , s e m e x ce o , s o go v e r n adas p o r
n o r mas . N as s imp le s o u p r imit iv as , co s t ume s , mo r alidade e
D ir e it o , ar t iculav am- s e e m n uma un idade B jt iv a, fo r mav am
um s co n t e x t o h o mo gn e o . K Jus t i a "e r a imp r e gn ada de
mo r alidade e co s t ume s e do D ir e it o ap licado co mo s e fo s s e uma
v o n t ade gr up ai - e r a um e s t ado da co n s cin cia co le t iv a", e m
quas e n ada div e r gin do ll co n jun t o de cr e n as e s e n t ime n t o s
co mun s a m dia do s me mb r o s de ur n iTme s it y s o S HHl N e s
s e co n t e x t o t r adicio n al a co n dut a h uman a e r a co agida_p o r n o r -
mas que "n o ge r l e p o r de fin i o " co r r e s p o n diam "man e ir a
de p e n s ar e dl e n t ir " de cadiTr n I~as lr gr as ^^Td5 s ~s t -
v ar n jt acgs t umado s a o b e de ce r " e co m as quadi n as fn m,
p r at igame n t e do me s m ln dF q^^n To fr e ms cn Tcr t as
co e r e s jB s icas ", co mo as daje i daljr mda. T*"
Po r s ua v e z, e m s o cie dade s co mo a n o s s a]- o D ir e it o p as
s o u a s e r .co dificado v is an do a aut o n o mia in div idual que n o
e n t an t o s e mo v e de n t r o de limit e s e s t r e it o s , p r e cis ame n t e p ar a
dar n fas e lib e r dade in div idual, igualdade jur dica e p r o
p r ie dade p r iv ada. D e s s a man e ir a, n o mun do mo de r n o a n o o
t r adicio n al de codificao adquir iu o car t e r de r e a o co n t r a
mult ip licidade , o b s cur idade e dub ie z - a in t e n o facilit ar o
co n h e e ime n t "e a ap Uca o p r t ica do s is t e ma n o r mat iv o , ga
r an t in do a s i de s e jadas co n v ic o do D ir e it o e a s e gur an a
da Justia; um D ir e it o que s e e s t e n de r e lat iv ame n t e imp e r me
v e l a mo v ime n t o s e mudan as p e lo s div e r s o s r e can t o s da v ida
s o cial t o imp o r t an t e quan t o uma mo e da fo r t e , uma v e z que
aume n t a a co e s o s o cial e t o r n a o s in div duo s e as in s t it ui e s
mais in t e r de p e n de n t e s .2
N o admir a que , malgr ado s e u din amis mo , o s quadr o s
s o ciais do mun do mo de r n o p ar e am s e o p o r a qualque r s o lu
o o r igin al, a qualque r in o v a o imp o r t an t e ", de limit an do a
aut o n o mia in div idual.3 Co m e fe it o , quan t o mais o D ir e it o e o
s is t e ma de jus t i a s e t r an s fo r mam e m r go s de in t e gr a o
s o cial, ge r an do s ub o r din a o r e c p r o ca e o p o n do - s e alt e r a
o das r e gr as , mais gr av e e ge n e r alizado t e n de a s e r o imp ac
t o das p e r t ur b a e s e do s de s lo came n t o s de in t e r e s s e s que as
So c i o l o g i a Ge m i e J u r d i c a
mudan as co s t umam t r aze r e m s e u mago . O o b je t iv o p r imo r
dial a p r e s e r v a o da o r de m n um co n t e x t o t o amp lo e v ar i
ado " que n o p o de s e r in t e ir ame n t e co n t r o lado ( n e m me s mo
p e la dit adur a mais s is t e m t ica e v io le n t a) o u s ub v e r t ido ( n e m
me s mo p e la r e v o lu o mais r adical) .
Raze s de o r de m p r t ica e me t o do lgica, p o r m, imp e m
r e s t r i o ( o u co n dicio n ame n t o ) da p e r s p e ct iv a e s t r it a ( jur di
ca) e r e fe r n cia dir e t a ao s is t e ma de go v e r n o . O co n t r o le s o cial
as s ume p o r t an t o a fis io n o mia de um s ub s is t e ma de n o r mas ( o
D ir e it o ) s us t e n t ado p e la aut o r idade de o ut r o ( o Es t ado ) , cujo s
age n t e s e e quip ame n t o s ap licam a le i, e , ao faz- lo , cr iam D i
r e it o - as fun e s de in v e s t igar e acus ar , p o r e x e mp lo , ficam a
car go de p e s s o as e s p e cializadas , fun cio n r io s p b lico s , do t a
do s de r e cur s o s e aut o r idade p ar a t an t o . D e p e n de n do das
cir cun s t n cias , a t r adi o jur dica p o de : admit ir - e a le gis la
o co n fir mar ~ o p r iv il gio do cidado o u co r p o p r iv ado de
s e gur an a de dar v o z de p r is o , in v e s t igar uma in fr a o e ap r e
s e n t ar o cas o dian t e de um t r ib un al, t e n do p o r b as e s uas p r
p r ias e v idn cias . Pe r s o n age n s famo s as , co mo o de t e t iv e
S h e r lo ck Ho lme s , s ur gir am gr a as a uma t al o r de m jur dica.
Em t e r mo s ge r ais , n o e n t an t o , a maio r p ar t a_das j3 t is -
t e s r e lat iv as ao D ir e it o co dificado jamais ch e ga ao co n h e p i-
me n t o do s t r ib un ais - e m uma b r iga de v izin h o s s o b r e a p o s i o
de um mur o , e m uma r e clama o s o b r e a co mp r a de uma m
quin a de lav ar co m de fe it o , o u e m uma de man da de p agame n
t o p o r dan o s caus ado s n o in t e r io r de un i e s t acio n ame n t o , as
p ar t e s p o de m ch e gar a um aco r do t e n do e m v is t a o que p ar e ce
jus t o ", s e m t e r qualque r n o o ace r ca do que e s t ip ula, p o r
e x e mp lo , b Cdjgo ^do Co n s umido r . A dv o gado s e juize s
fr e que n t e me n t e do p r e fe r n c lTiis afo r macfe e n t e n dime n t o .
Po r o ut r o lado , n a co mp r a de um e le t r o do m s t ico de fe i
t uo s o , dian t e de uma o co r r n cia de h o micidio o u n a dis cus s o
do s e s t at ut o s de um club e o u de um co n do m n io , o s atores ten
dem a t o mar co mo referncia o sistema de regras que a aut o r i
dade do Estado s us t e n t a. Uma das s ub div is e s de s s e s is t e ma
de r e gulame n t a e s o D ir e it o Pe n al, que e s p e cifica co m gr au
de p r e cis o maio r - o u me n o r o s t ip o s de co n dut a que de v e m
s e r clas s ificado s co mo cr ime s e p r e s cr e v e , p ar a cada cas o , as
CoNjsctt SecsAt Jueieico
5 1 9
s an e s a s e r e m ap licadas p e lo s age n t e s da le i e m n o me da
co mun idade p o lit icame n t e o r gan izada.
Out r a s ub div is o do me s mo s is t e ma o D ir e it o Civ il, n o
qual e s t o p r e v is t o s t ip o s de co mp e n s a o , r e p ar a e s p o r
dan o s caus ado s p ar t e p r e judicada - n e s s e s cas o s , o Es t ado
at ua como r b it r o , s up e r v is io n a, admin is t r a e ap lica p r o ce di
me n t o s v is an do um aco r do . Po r s ua v e z, de t e r min ado s t ip o s
de co n dut a p o de m s e r , ao me s mo t e mp o , o b je t o do D ir e it o Pe
n al e do D ir e it o Civ il, ao p as s o que o ut r o s p o de m s e r co n s ide r a
do s p e la s o cie dade r uin s o u n o civ o s , mas n o n e ce s s ar iame n t e
cr ime s o u in fr a e s , do p o n t o de v is t a jur dico .
* S CURO N ETO, Pe dr o . Sociologia Geral e Jurdica, 5 . e d, , S o
Paulo : S ar aiv a, 2 0 0 4 . p . 2 0 0 - 2 0 2 .
3. 0 Direito e os Controles Sociais (Adelino Brando)
| N o dir e it o an t igo o n o das s o cie dade s ch amadas p r imi
t iv as ", as n o r mas jur dicas n o s e dis t in gue m do s p r e ce it o s e
man dame n t o s r e ligio s o s n e m das r e qr as mo r ais l. A s s im n o di
r e it o judaico , cuja fo n t e a Bblia, o u mais p r e cis ame n t e , a
Torah ( a L e i) , co n s t it u da do s cin co liv r o s at r ib u do s a Mo is s
(Pentat e uco ) jA o r ige m: de s s e dir e it o div in a/ D e s s a fo r ma, p ax a
o p o v o h e b r e u no havia...a xMgtinguir fffltrg o dir e it o s agr ado e
o p r o fan o ; "Uma r e ligio s idade igual e n v o lv e t o do s o s as p e ct o s
e o s at o s da v ida e t o do s o s p r e ce it o s que go v e r n am o h o me m,
e , p o is , t amb m o s que in cide m n a e s fe r a do dir e it o ".4 Pagar o
s al r io do o p e r r io , e m dia, e o b s e r v ar o de s can s o s ab t ico ,
t an t o p r e ce it o r e ligio s o cr uar r t o de dir e it o p o s it iv o , co mo n o
fur t ar n e m co me t e THiJt e r iQZ fo n t e a me s ma - as Es cr it u
r as S agr adas , O dir e it o is lmico t e m o me s mo e s p r it o , S ua fo n t e
o Coro, o liv r o s agr ado do s mul uman o s , dit ado p o r A l ao
s e u me n s age ir o , Muh amad ( Mao m ) . Es s e s p r e ce it o s e o r me o s ,
de o r ige m div in a, in fo r mar am o dir e it o co dificado , p o s it iv o ,
p r o fan o , das n s is lmicas mo de r n as , N a an t iga Ro ma, co n
fo r me n o s r e lat a Pus t e l de CB n ge s T" h o me m que n o t o
mas s e p ar t e n o s at o s r e ligio s o s co le t iv o s , o ficiais , que n o
h o uv e s s e s ido p ur ificado , e m cujo p r o v e it o n o s e r e cit ar a a
o r a o , n e m s e imo lar a a v t ima, quan do da in s cr i o n o ce n -
520
Sisuid Parte - Sociologia Ju toia
s o , o u p o r t e r falt ado ao me s mo , n o p o de r ia s e r me mb r o da
cidade , p e r dia o dir e it o da cidadan ia e p o de r s e r v e r gas t ado
o u v e n dido co mo e s cr av o (A Cidade Antiga), N o an t igo dir e it o
p o r t ugus , as Ordenaes Afonsinas v e dav am ao s jude us , h o
me n s , co n v e r s ar e m co m mulh e r e s cr is t s o u e n t r ar e m n as ca
s as e m que e las mo r av am, as s im co mo e r a de fe s o a mulh e r
cr is t e n t r ar e m cada de jude u. A s p e n as e r am s e v e r as . N a
y s o cie dade h in du cl s s ica, a mo r al, o dir e it o e a r e ligio ap ar e -
' ) ce m, da me s ma fo r ma, fun dido s , Co m a e v o lu o da civ iliza-
; o e do . D ir e it o , as dis t in e s e n t r e e s t , mr alVa r e ligio
s e t o r n ar am cada v e z mais clar as ^Q^ r id s ign ifica que n o s -
( s o s s is t e mas ^ de D ir e it o 7 ~at uis,~ n o co n t e n h am le gis la e s
.. 5 de r iv adas de do ut r in as e id ias s o ciais B as e adas e m cn ce p -
^ e s r e ligio s as e n o e s de mo r aff Is t o s e v e r ifica" n o s "fun da
me n t o s das s e n t e n as "e ^dS cis o e s judiciais , n as quais s o
co n s t an t e s as r e fe r n cias ao s ide ais mo r ais da s o cie dade ,
e qidade ", r azo ", ao s co s t ume s "t r adicio n ais " e p r in c p i
o s me t af s ico s , D e v e - s e , t o dav ia, o b s e r v ar que muit o s r e gula
me n t o s le gais s e p r e n de m a mat r ia de co n v e n in cia, co mo n o
D ir e it o A dmin is t r at iv o , e n o mo r alidade p r o p r iame n t e dit a,
co mo p o de p ar e ce r . Po r o ut r o lado , h muit as at it ude s mo r al
me n t e de s e j v e is que de s e jar amo s v e r co n t r o ladas p e la le i,
mas , s e as s im aco n t e ce s s e e las p e r de r iam s e u car t e r mo r al.
Po r e x e mp lo , o co n t r o le do n me r o de filh o s jun t o s fam lias .
B RA N D O, A de lin o . Iniciao Socioiogi do Direito. S o
Paulo : Ed. Juar e z de Oliv e ir a, 2 0 0 3 . p . 1 7 7 - 1 7 8 .
( ? ) Sanes Negativas e Sanes Positivas (Vincenzo Ferrari)
o n s ide r an do . que as a e s h uman as p o de m s us cit ar
de s ap r o v a o o u ap r e o r e lat iv ame n t e , a div e r s o s mo de lo s
n o r mat iv o s , p o s s v e l at r ib uir v an t age n s e de s v an t age n s p ar a
a p e s s o a que as r e aliza: n o p r ime ir o cas o , e n co n t r amo - n o s di
an t e de s an e s positivas, e n quan t o que , n o s e gun do , dian t e
de sanes negativas. Is s o t e m s ido s e mp r e as s im. Co n t udo ,
s r e ce n t e me n t e e s s as duas mo dalidade s de r e a o t m s ido
p o s t as n um me s mo p lan o e t m s ido co n ce it ualizadas co m a
p alav r a s an e s , que , t an t o n a lin guage m jur dica t r adicio n al,
Aye i s o n T o b o i a P n o
CoNT&oif S oti i Jueibito
5 2 1
I
ij
co mo , e s o b r e t udo , n a lin guage m co mum, s e r a us ada t r adici- j
o n alme n t e p ar a r e fe r ir - s e s de s v an t age n s , Um e x e mp lo cl s - I
s co e n co n t r amo s , de n o v o , e m Han s Ke ls e n , que , co mo j s e
dis s e , co n s t r uiu uma t e o r ia do D ir e it o ce n t r ada s o b r e o co n ce i- I
t o de n o r ma, co mo ju zo h ip o t t ico e m que s e co n e ct am uma |
p r e mis s a e uma co n s e qn cia, mas s it uan do n a p r e mis s a e x - |
clus iv ame n t e o il cit o , e , n a co n s e qn cia e x clus iv ame n t e a j
s an o n e gat iv a, F o i N o b e r t o B o b b io , b o m ke ls o n ia.n o , que m 1|
"at ualizo u" e s s e p o n t o da t e o r ia do gr an de jur is t a de Pr aga, jfl
o b s e r v an do que n o e s que ma h ip o t t ico me n cio n ado p o de m s e r
in t r o duzido s co n t e do s t an t o p o s it iv o s quan t o n e gat iv o s . J
A t ip o lo gia das s an e s n e gat iv as _ .- amp l s s lma^ab ar -
can do uma, gama que v ai de s de a - p r iv a o - .de Jj^n s f dqs p e : 1
que n o s e m dio , at ~a"e limin a o f s ica do t r an s gr e s s o r , que |
p o de ap r e s e n t ar - s e famb m e m fo r mas agr av adas p e la ap lica- ij
o de t o r t ur as , o u, e m o ut r o p lan o , p e la an ula o s imb lica |
do t r an s gr e s s o r "da me mr ia do s s o b r e v iv e n t e s , at r av s da dis - 3
p e r s o do s s e us r e s t o s . A s s an e s p o s it iv as t amb m s a di- |
v e r s as e , igualme n t e co mo is *n e gt iv as , p dm"s it uar - s e e m jl
dis p lan o s , imr s imb l co e o ut r o , mat e r ial, t alv e z co n e ct ado s i|
e n t r e s i: uma me dalh a ao m r it o civ il o u milit ar p o de s e r aco m- 1
p an h ada de um p r mio e co n mico p ar a a p e s s o a que r e ce b e a |
dis t in o o u p ar a s e us h e r de ir o s , 3
Co mo s e dis s e an t e r io r me n t e , o e s que ma t e r ico j v r ias |
v e ze s r e co r dado "S e X / (entoj / Y" p o de le v ar a p e n s ar que a ij
s an o s imb o lizada p e lo s in al Y, de v e s e r n e ce s s ar iame n t e j
p o s t e r io r co n dut a s an cio n ada, s imb o lizada p e lo s in al X, is s o |
n e m s e mp r e as s im e p o de o co r r e r - t amb m que a sartojse i
p r o duza, n um mo me n t o an t e r io r a o , En t r e as s an e s p o s - ;|
t iv as , t an t o h prmios que , p o r de fin i o , s o p o s t e r io r e s 1
a o , co mo h incentivos, que p o de m s e r t an t o an t e r io r e s quan - J
t o p o s t e r io r e s , Uma le i que , p o r e x e mp lo , p r e t e n da in cn t iv r i
o e mp r e go n uma r e a de s fav o r e cida, p o de co n ce de r fin an cia- 1
me n t o p r e fe r e n cial a e mp r e s r io s que de s e jam ab r ir e mp r e s as : |
n e s s a r e a, at uan do an t e s da ab e r t ur a da e mp r e s a ( s e b e m, A
h ab it ualme n t e , depois do in cio de de t e r min ado s t r mit e s b u
r o cr t ico s que imp licam j a ace it a o de o b r iga e s ) o u p r o - jj
me t e r de s o n e r a e s fis cais s o b r e a r e t r ib ui o do s
522
S s t m P m i - So t i o i e s i t J u o i a
t r ab alh ado r e s que s e r o co n t r at ado s depois da ab e r t ur a da
e mp r e s a, N o que diz r e s p e it o s jjan e s n e gat iv as , que p o r
lgica, de v e r iam s e r s e mp r e p o s t e r io r e s a o t r an s gr e s s o r a,
p r e cis o dize r t amb m que , n a r e alidade , muit o
fr e qe n t e me n t e s o ap licadas , p o r uma p e r v e r s o lgica que
co s t uma s e r jus t ificada o u dis far ada, co m o ar gume n t o r e t r ico
da n e ce s s idade de p r e v e n ir a e s fut ur as : is s o aco n t e ce co m o
r e cur s o , t o fr e qe n t e n a It lia, ch amado custodia caut e Jar ",
s o b r e t udo quan do e s t mo t iv ada p e la n e ce s s idade de imp e dir
a r e it e r a o do co mp o r t ame n t o cr imin o s o .
A imp o r t n cia das s an e s p o s it iv as - que algumas t e o
r ias co mo as de car t e r t ie o - r e ligio s o , n un ca ch e gar am a de s
v alo r izar - t o r n o u- s e ace n t uada n as t e o r ias jur dicas e
s cio - jur id cas e m e s t r e it a co n e x o co m as e s t r at gias
in t e r v e n cio n is t as do Es t ado do b e m- e s t ar ( We lfar e - S t at e ) , n as
quais e s s e t ip o de s an e s co n s ide r ado e le me n t o de fin ido r .
D o is aut o r e s , N o b e r t o B o b b io e Vilh e lm A ub e r t , t r ab alh am e m
co n t e x t o s cult ur ais do dife r e n t e s , co mo It lia e N o r ue ga, de s
t acar am e s s e p o n t o , r e lacio n an do - o co m a ut iliza o do in s
t r ume n t o jur dico e m fun o p r o mo cio n al, o r ie n t ado a mo dificar ,
at r av s do s e s t mulo s , e s t r ut ur as e h b it o s s o ciais que s e jam
n e ce s s r io s . Mas o t e ma das s an e s t cn icas de in ce n t iv o ,
n o s e m fo r ma de v an t age n s , mas t amb m de r e du o o u
e limin a o de de s v an t age n s ( p o r e x e mp lo , de s co n t o s o u is e n
e s e m mat r ia de s an e s p e n ais ) fo r am in t r o duzidas co mo
in s t r ume n t o s de in t e r v e n o co n t r a o cr ime o r gan izado , e m
fav o r daque le s de lin qe n t e s que s e afas t am das as s o cia e s
cr imin ais , co o p e r an do , at r av s de la e s , co m a at iv idade r e
p r e s s iv a das in s t it ui e s e s t at ais , m fe n me n o p ar t icular me n
t e falado , mais uma v e z, n a It lia, o n de s e co s t uma ut ilizar a
e x p r e s s o r e t r ica do s ar r e p e n dido s (pentit).
* F e r r ar i, Vin ce n zo - A cc n Jurdica y Sistema Normativo:
Introducin a ia Sociologia dei Derecho (Lineamenti di Socio
logia dei Diritto 1. Azione Giuridica e Sitema Normativo),
Madr id, Un iv e r s idad Car lo s III/ D y kin s o n , 2 0 0 0 , p 2 0 8 - 2 1 1 .
g e i s n T o b o s o P n !
^ S > g . o o & .
^ VIII
MU D1N A SOCIAL E DIREITO
h OL Wt N ^. N f\ Ov JT - ^ VfV&V^
N e s t e cap t ulo , e m que e s t udar e mo s a mudan a
s o cial r e lacio n ada co m o dir e it o , v amo s co me ar r e v e n do
a n o o de mudan a s o cial, p as s an do , de p o is , a dis cut ir
s e o dir e it o c au s a o u e fe it o da mudan a, ch e gan do , p o r
lt imo , a co n s ide r ar as v ar ia e s co m que as mudan as
s e o p e r am, p r e s e n t e o fe n me n o jur dico . p
1 DEFINI O v
Vimo s j , n a p ar t e ge r al, que mudan a s o cial t o da t
alt e r a o que afe t a as p e s s o as e o s gr up o s , n o e x e r c cio
de s e us p ap is s o ciais . A s p e s s o as , e x e r ce n do s e us p a
p is , in t e gr am o s gr up o s s o ciais e p aut am o s e u co mp o r t a
me n t o at r av s de n o r mas e v alo r e s . Es s e co mp o r t ame n t o
s ub me t ido , p o r s ua v e z, ao co n t r o le s o cial. A s s im, t o da
alt e r a o , que afe t e um p ap e l, uma n o r ma o u um v alo r
s o cial, afe t a e s s e co mp o r t ame n t o e ~mudan a s o cial.
Quan do , p o r e x e mp lo , o p at r io p o de r , que e r a e x e r cido s o
me n t e p e lo p ai, p as s o u r e s p o n s ab ilidade do s cn juge s ,
h o uv e mudan a n o s p ap is do p ai e da me . Quan do fo i
alt e r ada a n o r ma que man t in h a a in dis s o ciab ilidade do
v n culo mat r imo n ial, o co r r e u t amb m imp o r t an t e mudan
a n a fam lia. Quan do co me o u a v igo r ar o p r in c p io da
igualdade e n t r e o s h o me n s , a mo b ilidade s o cial p r o v o co u
mudan as que lo go s e r e fle t ir am n a e s t r at ifica o s o cial,
CL UD IO S OUTO, s ub lin h an do o n t imo r e lacio n a
me n t o e n t r e mudan a e dir e it o , diz:
2
mudan a s o cial alt e r a o do s o cial e e s t e ,
s e n do igual n o r ma s o cial, mudan a s o cial
So c i o l o g i a Ge r a i e J u i d c o
524
S c w a Pa i i - So c i o i e m M i m
mudan a n o r mat v o - s o cial. Or a, qualque r que
s e ja a co n ce p o que s e t e n h a do dir e it o , n o
s e n e ga o s e u car t e r de n o r ma s o cial e de
n o r ma s o cial co n s ide r ada a mais fun dame n
t al p e lo s gr up o s que a ace it am. Mudan a s o
cial , de s s e mo do , e s s e n ciaime n t S TS t e r a o
do dir e it o , 1
2 DIREITO E MU DAN A
D e lo go , le v an t a- s e a que s t o : o dir e it o e fe it o o u
p r o dut o da mudan a s o cial, , n a lin guage m fun cio n alis t a,
v ar i v e l de p e n de n t e , o u o dir e it o c aus a ulat F dlr m-
d an a s o cllo u v ar i v e l in de p e n d e n t e ^ ~~~
- L a .
2.1 Direito 1
Var i v e l D e p e n de n t e A N A L CIA S A B A D EL , n a
e s t e ir a de RA MN S ORIA N O, afir ma que n in gu m co lo -
ca e m dv ida que o dir e it o muda n a e v o lu o h is t r ica,
s e guin do as t r a n s f o r m a i s ^ e s o cie dade , 2 E cit a, co m
imiTEir p r cis o , n r u H n a s l u r i d i c a s d e c o r r e n t e s do
s ur gime n t o de n o v as t e cn o lo gias , de n o v o s v alo r e s e de
n o v o s p ap is . A n s n o s p ar e ce n at ur al que o dir e it o s iga
o s fat o s e aco mp an h e as mudan as s o ciais , co mo r e v e la a
s a~b e dn p o p uIifB is t i~p r o v r b i e x factis rtur jus, o u
s e ja, o dir iE ~e m'fg- 3 s l t s , EH L ICH, co m s ua aut o
r idade , as s e v e r o u que : a) o dir e it o muda p o r que mudam
as p e s s o as e as co is as ; b ) t o da e v o lu le gai r e p o us a n a
v o li ^is b ciil que c o n s is t e n lat o d que o s h o me n s e
s us x e la e s s e mo dificam r io de co r r e r do t e mp o ; e c) as
1SOUTO, Cludio e SOUTO, Solange, Sociologia do Direito. Op, cit .,
p. 172.
2 SABADEL , Ana L cia. Manual de Sociologia Jurdica. Op. cit., p. 83.
M o S i S ocial t D i s t n o
525
gr an de s t r an s fo r ma e s do dir e it o n o o co r r e m n as p r e s
cr i e s jur dicas , mas n as r e la e s _s _p ci_ais .3
Tamb m ce r t o que n o h uma r e la o mo n o caus al
e n t r e de t e r min ado dir e it o , co mo e fe it o de de t e r min ada
caus a, H , s im, um co n cur s o de caus as , de n t r e as quais
D E L A TORRE de s t aca as s cio - p o l t icas , cult ur ais e as
filo s ficas , 4
2.2 Direito
Var i v e l In de p e n de n t e - Emb o r a s e ja, quas e s e m
p r e e fe it o e n o "caus a das mudan as , o dir e it o , r e co n h e ce
S A B A B EL , p o s s ui uma aut o n o mia r e lat iv a e , e m co n s e q
n cia, p o de in duzir a mudan as s o ciS IS e t e m mo t iv ado
muit as t r an s fo ima e s n as s o cx e ct aae ^mgmas .5-
3 DIREITO E VARIA ES DE MU DAN A
N o r e lacio n ame n t o e n t r e dir e it o e mudan a, v e jamo s ,
s e guin do a li o de RA MN S ORIA N O, gue fat o r e s p o
de m in fluir n a fr e qn cia da mudan a, e m s ua in t e n iida- '
de e n o s e u ritma6"- *- " 1~
3,1 Sistema Jurdico c Mudana
S e _o s is t e ma jur dico ab e r t o , t o r n a- s e mais f cil
p r o mo v e r mudan as , p e lo que e s t as s e faze m mais fr e
qe n t e s , O s is t e ma jur dico ame r ican o , p o r e x e mp lo , ilu
min ado p e lo s p r in c p io s da igualdade e da lib e r dade ,
3 EHRL1CH, Eugen, Fundamentos da Sociologia Jurdica, Op. cit., p.
300, 303 e 306.
4DE L A TORRE. Sociologia dei Derecho. 2. ed. Madrd: Tecnos, 1987.
p. 206.
5 SABADEL , Ana L cia. Op. cit., p. 87,
6 SORIANO, Ramn. Op. cit,, p. 313
S o c i o l o g i a Ge r a l e J u r d i c a
526
Sk u k m P ti - S ciototo j u e i m
ab s o r v e u mais facilme n t e as mudan as , afe t an do o s t a t u s
do n e gr o o u o p ap e l do s cn juge s , S e , p o r m, o s is t e ma
r gido e fe ch ado , mais dif cil co m e le o p e r ar mudan as .
3.2 Poder Poltico e Mudana
Quan do o p o de r p o l t ico fo r t e , as mudan as s e do
co mmais in t e n s IdHe TlS ^e mp r e o co r r e co m o s r e gime s
aut o r it r io s , de co r r e n t e s o u n o de r e v o lu e s ,
l l l H ;
3.3 Influncia Externa
s- ; A s mudan as que e n v o lv e m as p e ct o s mat e r iais da
i cult ur a, co mo s e co n micas , s o fr e m mais facilme n t e a
* in flun cia~ix t e m s o _ acu lt ur adas s e m r e s is t n cia.
( a|i: 4 ! que las , p o r m, ligadas a as p e ct o s v alo r t iv o s , co mo as
mudan as n a r e ligio e n a fam lia, s o r e fr at r ias oure-
> s is t e n t e s a fat o r e s e x t e r n o s .
I 3.4 Direito e Ritmo de Mudana
I . O r it mo de mudan a p o de r s e r ^r p do o u le n t o , de -
p e n de n do da e s fe r a cult ur al at in gida. S e a cult ur a afe t ada
I fo r mat e r ial, co mo , p o r e x e mp lo , a e co n mica, a mudan a
JUE/ t i! r p ida. Uma r e fo r ma camb ial, p ar a s e r imp le me n t ada,
b a s t a a v o n t ade do le gis lado r , e x p r e s s a n uma le i e n ada
I mais '. A mudan a t r azida co m o div r cio , que b r an do o v n -
| : culo mat r imo n ial, que e r a in dis s o lv e l p o r le i o r din r ia e
g )} p e la co n s t it ui o , e ain da co n t r a a v o n t ade da igr e ja cat -
] lica, fo i, e n t r e n s , muit o le n t a.
; K) L T UUA ' ^ t \ TC 1 \L
A g e r n n l o b o s o P i n f o
M u b s S o c w t i s m a
527
ESQU EMA
1 DE FI NI O
2 DIREIT O E MUDANA ^ ' U s ' ' ? ^
2 .1 Di r e i l o ~ va r i ve l d e pe n d e n t e '
2 .2 Di r e i t o ~ vo r i ve l i n d e pe n d e n t e , A a
3 D I R E I T O - V A R I A E S DA MUDANA ,
3.1 Si s t e m a j u r d i c o e m u d a n a
3.2 P o d e r po l t i c o e m u d a n a ^ A ^ ^ ^ ; ^ . f T V / )
3.3 In f l u e n c i a e xt e r n a u > ^V J -
3.4 Di r e i t o e r i t m o d e m u d a n a
QU ESTION RIO
0 1 . Que m u d an a o co r r e u n o camp o do dir e it o de
p r o p r ie dade ? v -
0 2 . A igualdade do s gn e r o s t e m mo dificado o dir e it o ?
0 3 . Co mo falam o s que r e co n h e ce m o p ap e l co n s e r v ado r
do dir e it o ?
0 4 . Quan do o dir e it o co n s ide r ado - v ar i v e l de p e n de n t e ?
0 5 . Co mo at ua o dir e it o quan do v ar i v e l in de p e n de n t e
o u fat o r de p r o p uls o das mudan as ? V- VJ, c-
0 6 . D e que de p e n de a in t e n s idade das mudan as ?
0 7 . Que r e la o t e m o dir e it o alt e r n at iv o co m a mudan a
s o cial?
0 8 . Que dife r e n a h e n t r e o dir e it o alt e r n at iv o da It lia e
o alt e r n at iv o da A m r ica L at in a?
0 9 . Que r e la o t m o s e s p a o s in t e r n o e e x t e r n o do dir e i
t o co m as mudan as s o ciais ?
S o t i o l o g i o Ge r o ! e J u i d i c a
528
S m m P t e - Socioim k t i m
1 0 . Que co mp o n e n t e s do s is t e ma co s t umam s e r afe t ado s
p e las mudan as s o ciais ?
1 1 . O que lh e p ar e ce mais o b v io ; a e v o lu o s o cial mais
amp la p r o duzir mudan a n o dir e it o o u a mudan a jur
dica p r o duzir mudan as s o ciais ?
1 2 . Po de h av e r mudan a s o cial s e m mudan a do dir e it o ?
1 3 . Po r que , n o s s is t e mas p o l t ico s aut o r it r io s * as mudan as
s o ciais , a p ar t ir do dir e it o , s e do co m mais in t e n s idade ?
1 4 . Mo s t r e que as mudan as s o ciais , at r av s da acult ur a o
jur dica, afe t am mais umas r e as do que o ut r as ?
1 5 . Mo s t r e algumas mudan as jur dicas o co r r idas n o B r a
s il ao lo n go do s culo XX, ap o n t an do - lh e s as caus as .
BIBL IOGRAFIA
1 . Co t t e r r e ll, Ro ge r - Introduccin a ia Sociologia dei Derecho,
o p , cit ,
2 . Eh r lich , Euge n -Fundamentos da Sociologia Jurdica, o p . cit .
3 . S ab ade l, A n a L cia - Man ual de S o cio lo gia Jurdica, o p , cit .
4 . S o r ian o , Ramn - Sociologia dei Derecho,o p . cit ,
5 . S o ut o , Cl udio e S o ut o , S o lan ge - Sociologia do Direito, o p . cit .
^ i s J \ \ U C f \ ? l TXJwd f - x ^ v e ^ o B T>'
H m j KW c K ' - t i i f cL .
Ag e r s o n l o b o s o P t n l o
M u d a n a S o c i m e O ihiio
5 2 9
l eitur as
1) As Mudanas Sociais e o Direito (Adelino Brando)
G >
Que q D ir e it o um in s t r ume n t o cr it ico das mudan as j
s o ciais , n o r e s t am dv idas , A dv ida quan t o ao gr au de 1
ir o p o r t iic! a~ds e in s t r ume n t o n o s p r o ce s s o de mo b ilidade e I
t r an s fo r ma e s s o ciais , Par a algun s aut o r e s , a fun o do D ir e i- fl
t o co mo in s t r ume n t o de co n t r o le _s o cial. muit o mais. r e le v an t e I
do que co mo fo me n t ado r das mudan as s o ciais o u do p r o gr e s - 1
s g. Is t o que r dize r cme o p lr e it o ~t e n a'm p ap e lmassiatic do
que dinmico. S e gun do L awr e n ce Rie dman e Jck L adin s kv 1
adv o gado s e jur is t as t e r iam co n t r ib u do p o uco p ar a a mo difi- j
c gg~a~cx ^T$n d~c5 TH! v a7 e m co n di e s de l e v ar a mu- 1
dn gF s o ciais , iTo e s t amo s muit o de aco r do co m e s t e p o n t o I
de v is t a. Pe lo me n o s e m r e la o s o cie dade b r as ile ir a, B as t a 1
le mb r ar as lut as de Jo aquim N ab uco , Rui B ar b o s a, L uis Gama,
co mo adv o gado s , n a co n du o da camp an h a ab o licio n is t a, jun
t o ao s t r ib un ais , n a de fe s a de e s cr av o s , r us de p r o ce s s o s - p e - I
n ais , e n o t r ab alh o de in t e r p r e t a o do dir e it o p o s it iv o do I
Imp r io , e s p e cialme n t e a L e i de 1 8 3 1 , que ab o liu o t r fico n e - i
gmko, e n o que dizia r e s p e it o ao dir e it o de p r o p r ie dade e s cr a- |
v a, ao s dir e it o s h uman o s do s "n e gr o s e cat iv o s e s
e x p e ct at iv as de dir e it o cls s e n h o r e s p r o p r ie t r io s de escm-
v o s , que s e s e n t ir am p r ijudic5 s ~im s e u p at r imn io , p e la I
ab o li s im in de r n iago . L e mb r e m- s e , ain da, o s t r ab alh o do I
gr an de jur is t a Oliv e ir a Vian a, r e s p o n s v e l p e la le gis la o t r a- j
b alh is t a e s o cial n o go v e r n o de Ge t lio Var gas ( dit adur a do I
Es t ado N o v o ) , aut o Rda CL T, ain da v ige n t e ; e a do adv o gado I
A fo n s o A r in o s , e x - s e n ado r da Re p b lica, aut o r da L e i que Tv a |
o s e u n o me ( Is B TJ^^n n Mr ^^r icf p as s o e fe t iv o n o co mb a- |
t e ao p r e co n ce it o e dis cr imin a o r acial n o B r as il. I
S o , ain da, e x e mp lo s n o t v e is das mo difica e s s o ciais
imp o s t as a p aft lr B Tg Hdr TaB we F Hi'le is e n o r mas do
Es t 3 5 To <3 e cr t d m l ^ que e v B r s l cat e go r ia
dTr e ln JlHTB Tr p e r n d^ mE ddi^cllTv ft icir as -
ce n dgn t e ^do gr up o n acio n al o u s o cie dade b r as IIlfTliicF e -
t o do Go v e r n o Pr o v is r io da Re p ub lica, e m 1 8 8 9 , que e s t e n de u
So c i o l o g i o Ge r o l e J u r d i c o
530
S GUSO P t - SOGS OOI J t i k i o i a
a cidadan ia b r as ile ir a a t o do s o s p o r t ugue s e s r e s de n t e s _n o
6 r as iI7 d5 s dum ce it t e mp o , aut o mat icame n t e e ~in de p e n de n -
t dqualqr p r o ce s s o o u fo r maimo , 'iTlv o p ar a aque le s que
r e cus as s e m*e x p licit ame n t e o b e n e f cio *( mo b ilidade e t r an s fo r -
m a~s cil ~qe fav o r e ce u um"S t n ia) r a'L l de A n is t ia", "que
fav o r e ce u o s acus ids lTco n de n do s fx lado s p o l t ico s , "r us "
do cr ime de s ub v e r s o , t e r r o r is mo , v io la o da L e i de S e gu
r an a N acio n al, dur an t e a aut o cr acia milit ar de 1 9 6 4 ( in iciat i
v a p o l t ica que r e co n duziu de t e r min ado gr up o ao e s t ado s o cial
an t e r io r , is t o , de lib e r dade e gar an t ias in div iduais , s up e r io r
ao at ual, de p e r s e guido da Jus t i a) ; e t c. Em t o do s e s s e s cas o s
t e mo s mudan as s o ciais e p r o gr e s s o , _t an t o in div idual quan t o
co le t iv o . D a me s ma man e ir a, o s A t o s In s t it ucio n ais , _e s p e cial-
me n t e o A I- 5 , que s e s up e r p us e r am Co n s t it ui o , dur an t e o
r e gime "~i5 r r at lc~d"6 4 , o p e r azam p r o fun das mct if ca e s
s o ciais de o r de m in s t it ucio n al, n a e s cala de v alo r e s s o ciais ,
p Ht co s 'e - jr dico s na* e t ica do s gr up o s civ is e milit ar e s . A
r e de mo cr at iza o do B iiiHlx Hn a- r e co Mp ft To Es t ado "do
D ir e it o , s o b a gide da at ual Co n s t it ui o , s it ua- s e n o me s mo
p r o ce s s o de mo b ilidade e t r an s fo r ma e s s o ciais , de s e n cade
ado s a p ar t ir de n o v as le is , a co me ar da L e i Mar io . N e s t e e x e m
p lo t e mo s mudana institucional. Te n s e s , co n flit o s ,
mo difica e s n o s p adr e s cult ur ais e de co mp o r t ame n t o , p r o
b le mas s cli^affe r a o s s ub s t an ciais n o s is t e ma de v alo r e s .
e t cTs lilgmas das cius aF qilh flue m fo r t e me n t e n a e s t r u-
t ur a s o cialTp r v o can do mudan as . N o mo me n t o , v e mo s is s o
e mT la cTad a^de iis t e mas de cotas n as Un iv e r s idade ,e
car go s p B IIcs p ar a"can didat o s que s e co n s ide r e m n e ar o s ,
p ar do s ", mulat o ff;b u''d5 co r ^ "
B RA N D O, A de lin o . Iniciao Sociologia do Direito. S o
Paulo : Ed. Juar e z de Oliv e ir a, 2 0 0 3 . p . 2 0 9 - 2 1 0 .
2. 0 impacto da Mudana Social sobre o Direito (Roger Coiterrell)
N a lit e r at ur a s o b r e Mudan a S o cial e D ir e it o , gr an de
p ar t e da an lis e r e fe r e - s e in flun cia n uma dir e o : o s e fe it o s
da mudan a jur dica s o b r e o s o cial; que a e v o lu o do D ir e it o
g e r s n l o b o s o P i n t o
M b w i S q c i h D u m o
5 3 1
r e fle t e uma e v o lu o s o cial mais amp la p ar e ce co m fr e qn cia
de mas iado B v a p r a ^ar _s ub me t ida dis cus s o . Po r e x e m
p lo , uma mudan a t e cn o lgica caus a imp o r t an t e do jur dico :
a p r o p aga o do mo t o r de co mb us t o in t e r n a, o aut o mv e j^e
de p o is , o t r an s p o r t e ae r 7 9 e fr h Kigar a n o v aar e as de do u
t r in a jur dica p ar a r e gular as n o v as co n di e s s o ciais , co m s uas
p o s s ib ilidade s , p e n o o s e n s co s ; o p r o ce s s o de ajus t ame n t o e ,
s v e ze s , dif cil e n g, co mo t m de mo n s t r ado o s t ui s l r o -
b le mas de adaip t i o s r e v o jcr o n ar s ~t cn o lgTl' da
in fr mat ica e da co mun ica aTD e fat cy co n o s uge r iu Eh r lich .o
mo do co mo o s fe n me n o s s o a a s s e r e fle t e m n a le gis la o
t ao p r o b le m t ico a dir e o in v e r s a de in flun cia.
A de mais , o D ir e it o p o de adap t ar - s e mudan a e m fo r
mas n o ime diat ame n t e ap ar e n t e s , O jur is t a mar x is t a aus t r a
co Kar l Re n n e j^ t e n t o u ilus t r ar e s s a as s e r t iv a n um cl s s ico
e s t udo s o b r e a r e la o e n t r e o s cn ce it o s jur dico s de p r o p r ie
dade e co n t r at o e as p aut as de mudn s o cial do de s e n v o lv i
me n t o cap it alis t a n as s o cie dade s o cide n t ais ( Re n n e r 1 9 4 9 ) ; s e u
ar gume n t o ge r al que o D ir e it o p o de adap t ar - s e s co mb ian t e s ,
cir cun s t n cias s o ciais , 's im'mudar n e ce s s ar iame n t e s ua fo r ma \
o u e s t r ut ur a; s " co n ce it o s jur dico s p o de m p e r man e ce r n a (
me s mlTf5 n n 7 aIn da quan do mudam fun dame n t alme n t e ls uas )
fun e s s o ciais .
Po r e x e mp lo , a fo r ma jur dica da p r o p r ie dade , que co m
p r e e n dia o r igin alme n t e 'o p at r imo n o do do n o de "cas a, h o gar
e t o do s e u_de r r e do r ' ( "Re n n e F 1 .9 4 9 : 8 4 ) , s e us a n a s o cie dade
cap it al_is t ajp ar a_ e x p r e s s ar o t t ulo ao b e n e f cio , in t e r e s s e o u
r e n da, Mas o cap it al co n s t it ui um p o de r : o p o de r de man do
que o p r o p r ie t r io t e m s o b r e o ut r o s in div duo s ; e s t a a v e r da
de ir a b as e do s is t e ma_ ap _it _aiis t a_de r e la _e s s o ciais . Tudo ls s o ,
co me n t a Re n n e r , r e s ult a in v is v e l p ar a o dir e it o , que o p e r a s o
me n t e co m o s ^cn c it s Tas ico s de p r o p r ie dade , p o s s e e s uas
e lab o r a e s do ut r in r ias , qu ign o r a a mudan a o co r r ida n o
co n t e x t o s o cial que ab ar ca e s s as fo r mas jur dicas . mdame n -
t alme n t e 7 as n o r mas que imp e o D ir e it o t m p e r man e cido e m
ab s o lut o co n s t an t e s , t e n do h av ido , as s im, uma e n o r me r e v o
lu o s e m n e mh uma mudan a n as n o r mas ( 1 9 4 9 , p . 8 8 - 9 ) .
So c i o l o g i a G e i o i e J u d d i c a
532
Secunda P a h e - So c i o t o s u J t i i i m
Muit as o ut r as in v e s t iga e s r e fle t e m as in quie t ude s do s
le gis lado r e s e r e fo r mado r e s s o ciais , que co n fiam n a s ua cap aci-
dade de in flue n ciar n o n o v o D ir e it o : p o r is s o a S o cio lo gia do D i
r e it o p e cada v e z mais n fas e n as que s t e s de ~fe v idade
jur dica ( cap acidade do D ir e it o de in fluir s o b r e a mudan a) , mais
do que e m que s t e s s o b r e a o r ige m da le gis la o o u o dir e it o
jucB ci n o e a e x p lo r a o do s fat o r e s que cr iam o D ir e it o , , , .
Co t t e r r e ll, Ro ge r , Introduccin a ia Sociologia Del Derecho
(Sociology of Law: an Introduction), B ar ce lo n a, A r ie l, 1 9 9 1
p . 5 7
3. 0 Direito como Fator de Mudana jtocial (Ramn Soriano)
A s que s t e s mais at r at iv as do e s t udo do dir e it o co mo
fat o r de mudan a s o cial s o as s e guin t e s : a) a in t e n s idade da
mudan a; b ) as zo n as o u e s fe r as de at ua o da mudan a e c) o
r it mo da mudan a,
A ) - A n t e n s dade o u alcan ce da mudan a s o cial a p ar -
t ir do dir e it o de p e n diTda n at ur e za do p r p r io dir e it o fat o r de
mudan a e do s is t e ma p o l t ico a que p e r t e n ce o dir e it o .
um dir e it o fle x v e l e m mat r ia de fo n t e s jur dicas e m -
t o do s in t jn 3 r e t 5 v o _f v ie c~ mu5 n gTat r av s das de ci-
s e s "3 o s "o p e r ado r e s jur dico s . Uma in t e r p r e t a o e ap lica o
b e r r as ~e ^r gr iis is t as ~do dir e it o o ficial p r o duze m uma mu-
dan a~l mifgS T' dife It ~5 lt e r n at iv o , mas co mp le me n t ar do
dir e it o o Hc al e do min an t e , p o de p r o duzir uma mudan a im-
p o r t an t e e m s ua e x clus iv a e s fe r a s o cial de in flun cia. O n o v o
dir e it o r e v o lucio n r io , co n t r r io ao o ficial, p r o duz uma mudan -
a dr s t ica e in t e n s a.
N a It lia, n o s an o s s e t e n t a, v e io mo da, n o mb it o da
in t e r p r e t a o do dir e it o o que algun s de s t acado s jur is t as e
magis t r ado s ch amar am us o a|t e mat iy p .do _D ir e it o _j que co n
s is t ia n uma in t e r p r e t a o e ap lica o do dir e it o co m' fin alida
de e man cip ado r a e e m iv o r de clas s e s s o ciais de s fav o r e cidas ,
co m um s e n t ido de s o lidar ie dade s o cial, ap r o v e it an do as fo r mu
la e s ge r ais e amb guas da "Co n s t it ui o e das le is , Ob je t iv av a,
co m gr an de s limit a e s e de n t r o da o r de m jur dica, t e n t ar a
M w S o c i i D i t t i i o
533
mudan a n a s o cie dade a p ar t ir das e s t r ut ur as fo r mais do di
r e it a Co n ce b e r o dir it o co mo fat o r de mudan a s o cial.
N a Es p an o am r ica, e s t a co n ce p o da alt e r n n ciajur i-
dica ch e ga a um p o n t o mais jalt o , j: o n figur an do - s e L al m de ^
as s umir o s me fcls alt e r n at iv o s e ur o p e us , co mo dir e it o alt e r
n at iv o ao _d|r e it o e s t at al, co m uma v o n t ade _de r e s p o n de r s
v e r dade ir as n e ce s s idade s s o ciais e de co n s e guir uma mudan
a n a s o cie dade 'at r av s '~da ap lica o d o ut r o dir e it o , ge r ado
n a s o cie dade e s p o n t an e ame n t e , n o s e io j io s mo v ime n t o s
s o ciais fr e n t e ao dir e it o o p r e s s o r do Es t ado .
Eis aqui do is mo de lo s da co n ce p o de dir e it o co mo fa
t o r de mudan a s o cial, co m div e r s o s gr aus de in t e n s idade . Us o
alt e r n at iv o do dir e it o e dir e it o alt e r n at iv o alime n t am a co n v ic-
o de que , a p ar t ir do dir e it o , s e p o de faze r av an ar a mudan
a n a s o cie dade . Es t a co n v ic o n as p o s s ib ilidade s da
mudan a ajaar t ir do dir e it o n o co n t r r ia _ co n v ic o mar
x is t a de que o dir e it o co mo in s t it ui o um r e fle x o do s fat o r e s
e co n mico s e do s in t e r e s s e s das clas s e s do min an t e s . O
de t e r min is mo da e co n o mia e o s in t e r e s s e s de clas s e s s o o
mar co ge r al <t e n t r ~H~qS p o s s v iTcn ce B Wr ce r t a aut o n o
mia do dir e it o p ar a p r o duzir a mudan a que s e mp r e s e r n a
n iudmi ali_mit ada: ~
Tkmb m a in t e n s idade da mudan a e s t co n dicio n ada
p e la n at ur e za do s s is t e mas p o l t ico s . Quan do o p o de r p o l t ico
fo r t e e e s t b e m co n ce n t r ado , p o de - s e p r v cr Uma muEh -
ca s o cial ..in t e n s a, p ar t in do do dir e it o . A h is t r ia n o s mo s t r a
que , co m r e v o lu e s e mo v ime n t o s de t r an s i o p o l t ica, t e m
s ur gido um p o de r p o l t ico fo r t e , a p r o duzir mudan a in t e n s a
n a s o cie dade , at r av s do n o v o dir e it a Cm fr e qn cia, a mu
dan a me n o r liQ"c e p r e t e n diam o s l de r e s mais av an ado s
da r e v o lu o o u t r an s i o p o l t ica.
B ) H duas zo n as e m que at ualme n t e s e man ife s t a a ca
p acidade "dTS mHn i" a p ar t ir "dcTd r e t o : o p r o ce s s o de
acult ur a o jur dica"e a p r o mo o do s dir e it o s s o ciais ( zo n as
. e x t e r n a e in t e m do " dir e it o e s t at al) . "
N a e s fe r a in t e r n acio n al, o dir e it o in s t r ume n t o ap t o a
p r o duzir imp o r t an t e s mudan as s o ciais n o s p a s e s do t e r ce ir o
O Qr ., , H
.1 1.: v v v - ; : r i
l u i m i t o
So c i o l o g i a Ge r o l e J u n V " " " - - ^ ; ... v . " . . , w . v \
5 3 4
Segunda Parte - Sociologia Jurdica
mundo, mediante o processo de aculturao. A capacidade de
mudana do direito nesta esfera depende do apoio das elites
o governantes destes pases; freqente o antagonismo entre o
Q novo direito e o velho direito histrico, ficando com este os gru
pos contrrios ao processo de aculturao. O direito, como fa
tor de mudana, tem influncia maior nos aspectos materiais
dos pases receptores, que costumam preservar da mudana
> os aspectos ideolgicos e de mentalidade. Por isso, um erro
pretender servir-se da aculturao como se fosse um bloco ni-
co em todas as dimenses, ou condicionar o apoio e colabora-
^ o recepo de todos os aspectos das culturas transmissoras.
A cultura ocidental pode exportar com facilidade s u a
tecnologia, mas no seus valores ou princpio de atuao. O
r direito, como ator cie mudariTest chamado a discernir e
i atuar por etapas, porque a aculturao deve ser voluntria e
assumida, masnffeTnipoBTg: '
Na esfera interna estatal, a rea do direito em que se
percebe melhor sua capacidade de mudana a referente aos
direito isocias, econmicos i~cEris, em cujo contexto o di
reito pode desenvolver a funo promotora dos interesses so-
ciais gerais. Para a consecuo deste objetivo, o direito enfrenta
dois obstculos: a) o valor de suas normas, se no meramente
0 orientadas para os "poderes pblicos ou verdadeiramente
1/1 vinculantes, e b) a crise do Estado social e de sua funo
intervencionist.a diante das~nvas concepcesneoliberais.
C) U ma questo atrativa a d~grduao da mudana
proveniente do direito; se, a partir do direito, se quer mudar a
sociedade, como faze-lo, que critrio seguir, como passar de
uma etapa para outra? J vimos que, nos processos de
aculturao, mais fcil a mudana econmica do que a soci-
o al j g esta mais fcil do oue a religiosa. O ritmo de mudana
^ ^ q provocada pelo direito depende da zona de sua atuao. E f-
'i 9 'tf c peto direito mudar a economia de um pas, se este se bene-
y ficia e se as classes dirigentes do mesmo concordam com a
-- <mudana; o direito um bom instrumento de mudana econ-
a ^ micrnicTcontrrio, o direito no pode mudar as estruturas
^ ^ sociais, no~srmediante^ a revoluo qtem gestao len-
IKO'. cL
Ag e r s o n T o b o s o P i n f o
M udana Social e Direito
5 3 5
ta. Mas difcil ainda conceber o direito como fator demudan-
/ a religiosa porque a religio a ideologia mais resistente
influncia externa.
Tema transcendental dos sistemas sociais em sua evo
luo precisar a graduao da mudana jurdica, da mudan
a do prprio direito, que se manifesta no ponto de
compartilhamento do novo com o velho direito: o que que se
deve conservar do antigo regime jurdico, se que algo deve
ser salvo, e que dinmica deve seguir a implantao de novas
regras jundicas. Numa perspectiva histrica, a mudana jur
dica segue uma cadncia que vai desde um primeiro momento
de radicalizao a outro em que se templan as atitudes e se
acomodam certas normas e instituies antigas implanta-
o do novo direito. Da poltica de tabula rosa e da criao de
m direito ex novo a pohtica da contemporalizao entre o ver
lho e o novo direita "
Soriano, Ramn, Sociologia Del Derecho, op. cit., p. 313 - 315
4. 0 Direito como Agente de Mudana Social (F. A de Miranda Rosa)
As normas jurdicas possuem uma funo transformadora
do meio. Quando editadas atendendo a necessidades senti
das pelos rgos legiferantes, ou em resposta ao consenso de
grupos que se antecipam ao processo histrico, elas resultam
enindificaoesct^ ociedideTltifnd-ihe^ o sistema dcn-
trole social e, diretamente, a relao de influncias recprocas
dos diversos elementos condicionantes da vida grupai. Por ou-
troladTcntribum indiretamente paja a frmao de novas
manifestaes de consenso, nisso confundidas as funes
transformadora e educativa do Direito.
Este precisa, na verdade, ser bem estudado como agen
te da mudana social. E essa uma importante manifestao da
funo transformadora, exercida pelas normas jurdicas, cuja
utilizao planejada, visando alterar determinado contexto
sociocultural, comea a ser objeto de estudos e de primeiras
aplicaes. No se perca de vista que, no prprio momento em
que o legislador edita a norma legal, ou quando o Juiz a aplica
So c i o l o a i o Ge r a l e J u r d i c a
5 3 6
Segunda Parte - Socioiogia J urIdica
ao caso concreto, ou ainda, quando o administrador executa
os seus mandamentos, um e outro esto modificando, em al
guma parcela, maior ou menor, a realidade social. Esse fato
especialmente sensvel e fcil de constatar no primeiro caso,
pois a edio da norma legal , sempre, invariavelmente, um
fato de mudana da estrutura social. >
tambm visvel, em um exame simples, essa funo
de mudana social, quando os tribunais firmam orientao
jurisprudencial em questes de grandeTepercusso e queen-
vbvam grandnmero de casos concretos, fixando interpreta-
acTnova sfnovas legais imprecisas, ou quand. tambm
interpretando as leis, a administrao adota orientao deter
minada para a sua execu7Tas"sftuaces, modificando em
alguma coisa a ordem jurdica, se projetam sobre a realidade
social nela regulada, mudando-a.
ROSA, Felipe Augusto de Miranda. Sociologia do Direito.4.
ed., Rio de Janeiro: Z ahar, 1975, p. 68-69.
Ag e r s o n T o b o s o P i n t o
e \io mi\ \ ) f
C)
SOCIOL OGIA DO DIREITO BRASIL EIRO
Vamos estudar, nesta unidade, um pouco da Socio
logia do Direito brasileiro, seguindo o roteiro de Machado
Neto, em sua Sociologia Jurdica. Comearemos com a
aculturao do Direito Romano, em Portugal, e a rece p
o, entri~ns, do direito lusitano. Aps o processo de
n ossa emancipao jurdica, mostraremos, por ltimo, a
feio do nosso direiton atualidadeT~~
1 DIREITO PORTUGUS
O direito luso, em sua evoluo, viveu trs momen
tos ou perodos: primeiramente, o romano; depois, o godo;
e, por ltimo, o perodo nacional.
1 .1 Pe r o do Ro man o
Portugal foi, desde o comeo do imprio romano, uma
provncia diTRoma, que, na poca, ainda era Estado uni
t rio centralizado. Seu governo era o mesmo de Roma, o
seu direito era o j us civile Romanorum. Sob Constantino,
no sculo EI d.C., a L usitnia passou a integrar a prefeitu
ra das Glias. Como edito de Caracala (212 d.C.), os habi
tantes livres de Portugal, como de todas as provncias,
tomaram-se cidados romanos (eives Romani efectisunt).1
1 .2 Pe r o do Go do
Da mistura do direito romano da L usitnia com o
direito consuetudinrio germnico dos invasores, e, ain-
1 DIGESTO, 1, 5, 17, U lpiano.
So c i o l o g i a Ge r a l e J u r d i c a
} 2 0 1 2 b y Edit o r a A t las S .A .
)
Capa: Z e n r io A . de Oliv e ir a
! Composio: L in o - Jat o Edit o r a o Gr fica
Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)
(Cmara Brasileira do Livro, S Brasil)
D ir e it o s da p e r s o n alidade / Jo r ge Mir an da, Ot v io L uiz Ro dr igue s Jun io r , Gus t av o B o n at o
i F r ue t , o r gan izado r e s . - - S o Paulo : A t las , 2 0 1 2 .
V r io s aut o r e s .
) B ib lio gr afia.
IS B N 9 7 8 - 8 5 - 2 2 4 - 7 1 3 4 - 8
3 1 . D ir e it o - F ilo s o fia 2 . Pe r s o n alidade ( D ir e it o ) 3 . Pe r s o n alidade ( D ir e it o ) - B r as il I. Mir an da,
Jo r ge . II. Ro dr igue s Jun io r , Ot v io L uiz. III. F r ue t , Gus t av o B o n at o .
1 2 - 0 3 9 0 2 CD U- 3 4 7 .1 5 2
ndice para catlogo sistemtico:
, 1 . D ir e it o s da p e r s o n alidade : D ir e it o civ il 3 4 7 .1 5 2
TOD OS OS D IREITOS RES ERVA D OS - p r o ib ida a r e p r o du o t o t al o u p ar cial, de qualque r
i fo r ma o u p o r qualque r me io . A v io la o do s dir e it o s de aut o r ( L e i n Q9 .6 1 0 / 9 8 ) cr ime
e s t ab e le cido p e lo ar t igo 1 8 4 do Cdigo Pe n al.
D e p s it o le gal n a B ib lio t e ca N acio n al co n fo r me D e cr e t o n a 1 .8 2 5 , de 2 0 de de ze mb r o de 1 9 0 7 .
Imp r e s s o n o B r as il/Printed in Brazil
1 Edit o r a A t las S .A .
Rua Co n s e lh e ir o N b ias , 1 3 8 4 ( Camp o s El s io s )
0 1 2 0 3 - 9 0 4 S o Paulo ( S P)
Te l, : ( 0 1 1 ) 3 3 5 7 - 9 1 4 4
www.Edit o r aA t las .co m.b r
Sumrio
Sobre os autores, vii
Apresentao, ix
Prefcio (Min. Paulo de Tarso Vieira Sanseverino), xiii
Principais problemas dos direitos da personalidade e estado-da-arte da matria
no direito comparado (Jorge Miranda, Otvio Luiz Rodrigues Junior e Gustavo Bonato
Fruet), 1
1 A dicotomia entre os direitos de personalidade e os direitos fundamentais
(Maurcio Mazur), 25 s
1 O direito ao livre desenvolvimento da personalidade - perspectiva do direito
portugus (Kellyne Las Labur Alencar de Almeida), 65
3 A coliso entre os direitos de personalidade e o direito de informao (Marcelo
Malizia Cabral), 108
4 L iberdade de expresso e controle de propaganda de medicamentos e das ad
vertncias na ordem jurdica pela Agncia Nacional de Vigilncia Sanitria -
ANVISA (parecer) (Otvio Luiz Rodrigues Junior), 153
5 Direito informao: limites entre informao, comunicao e democracia
(Gustavo Bonato Fruet), 171
6 L ibertad de expresin: declaraciones, derechos y garantias - deberes y derechos
individuales (Ana Laura Ossola), 197
Principais problemas dos direitos da
personalidade e estado-da-arte da
matria no direito comparado
Jorge Miranda
Otvio Luiz Rodrigues Junior
Gustavo Bonato Fruet
S UMRIO: 1 In t r o du o . 2 Es t ado - da- ar t e do s dir e it o s da p e r s o n ali
dade e s e us p r in cip ais p r o b le mas n o dir e it o co mp ar ado . 2 .1 Es t ado - da-
- ar t e n a do gm t ica de l n gua p o r t ugue s a ( p e r s p e ct iv a lus o - b r as ile ir a) .
2 .2 Es t ado - da- ar t e n a do gm t ica de l n guas e s p an h o la, fr an ce s a e it alian a.
2 .3 Es t ado - da- ar t e n a do gm t ica de l n gua in gle s a ( p e r s p e ct iv a b r it n ica
e n o r t e - ame r ican a) . 2 .4 Es t ado - da- ar t e n a do gm t ica de l n gua ale m.
2 .5 Ex ame co mp ar at s t ico . 3 Pr o b le mas p r in cip ais t e r ico s s o b r e dir e it o s
da p e r s o n alidade . 3 .1 Or ige n s e co n ce it o do s dir e it o s da p e r s o n alidade .
3 .2 Pr o b le mas de qualifica o , p ar ale lis mo co m o s dir e it o s fun dame n t ais
e co n t e do do s dir e it o s da p e r s o n alidade . 3 .3 D ir e it o s da p e r s o n alidade
e dign idade h uman a. 4 Co n clus e s .
1 Introduo
Os direitos da personalidade so objeto de controvrsias as mais variadas. A pri
meira delas est na polmica sobre sua impossibilidade conceituai, dado que no seria
admissvel haver direitos a recair sobre o centro de imputaes jurdicas de um ser, a
personalidade. H o problema da nomenclatura, pois se alude a direitos da personalidade,
como uso no Brasil, ou a direitos de personalidade, como se tem empregado em Portu
gal. Diverge-se sobre a adequao terica dos termos direito geral da personalidade ou
tutela geral da personalidade. H polmica sobre existirem - ou serem teis - os direitos
da personalidade em espcie. No ltimo caso, ter-se-ia de resolver a questo de se tratar
de um rol taxativo ou meramente exemplificativo de direitos da personalidade. Pe-se
em causa, ainda, a qualificao desses direitos como fundamentais e, nessa hiptese, se
haveria superposio de regimes jurdicos de Direito Privado ou de Direito Pblico ou
2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
sua absoro pura e simples pelo Direito Constitucional. A titularidade desses direitos
por pessoas coletivas outro ponto de significativa divergncia. Seriam apenas as pes
soas de e x i s t n c i a real as detentoras dessas prerrogativas? Pode-se tambem destacar o
problema da utilidade de se enunciar as "caractersticas" dos direitos da personalidade.
Com tantas excees e casos particulares, e possvel dizer que esses direitos sao impres
critveis e intransmissyeis, por exemplo?
Todos esses problemas so reveladores da fecundidade terica do tema escolhido
como objeto deste livro. Essa perspectiva corroborada por outros elementos como a ri
q u s s i m a produo bibliogrfica sobre direitos da personalidade no incio do sculo XXI.
Este captulo, que tem natureza introdutria, inicia com uma seo dedicada a
expor pesquisa quantitativa de publicaes sobre o tema, seguindo-se esses parme
tros: (a) idiomas de publicao: portugus, espanhol, francs, italiano, ingls e alemo;
(b) perodo de dez anos (2001-2011); (c) restrio a obras monogrficas, miscelneas,
ensaios e teses. Somente textos publicados por editoras comerciais ou universitrias
foram considerados. Excluram-se manuais, tratados e lies, bem como trabalhos es
tampados em peridicos; (d) base de dados: bibliotecas do Max-Planck-Institut fr ausln-
disches und internationales Privatrecht (Hamburgo, Alemanha), da Faculdade de Direito da
U niversidade de L isboa e da Rede de Bibliotecas do Congresso Nacional (Brasil). Essa
investigao revela alguns aspectos de interesse sobre o desenvolvimento dos estudos
contemporneos que se dedicam aos direitos da personalidade.
Em seo seguinte, expem-se trs dos principais problemas ligados aos direitos da
personalidade: (a) seu objeto e seu carter unitrio ou numerus apertus; (b) seu paralelis
mo com os direitos fundamentais; (c) o mbito de proteo dos direitos fundamentais
e dos direitos da personalidade.
2 Estado-da-arte dos direitos da personalidade e seus principais
problemas no direito comparado
2.2 Estado-da-arte na dogmtica de lngua portuguesa (perspectiva
luso-brasileira)
Os trabalhos de lngua portuguesa demonstram o interesse contnuo sobre os
direitos da personalidade, com trs objetivos marcantes:1
1 A GOS TIN I, L e o n ar do Ce s ar de . A in t imidade e a v ida p r iv ada co mo e x p r e s s e s da lib e r dade h uman a.
Po r t o A le gr e : N r ia F ab r is , 2 0 1 1 ; S CHREIB ER, A n de r s o n . D ir e it o s da p e r s o n alidade . S o Paulo : A t las ,
2 0 1 1; REIS , Clay t o n ( Co o r d.) . Re s p o n s ab ilidade civ il e m face da v io la o ao s dir e it o s da p e r s o n alidade :
uma p e s quis a mult idis dp lin ar . Cur it ib a: Jur u , 2 0 1 1 ; B EZ ERRA D E MEN EZ ES , Jo y ce an e ( Or g.) . D ime n s e s
jur dicas da p e r s o n alidade n a o r de m co n s t it ucio n al b r as ile ir a. F lo r ian p o lis : Co n ce it o , 2 0 1 0 ; HIRA TA ,
A le s s an dr o . A p e s s o a n at ur al e a r e lat iv iza o do s dir e it o s da p e r s o n alidade . In : B E A K, Rub e n s ; POVED A
VEL A S CO, Ign acio Mar ia ( Or g.) . O dir e it o e o fut ur o da p e s s o a: e s t udo s e m h o me n age m ao Pr o fe s s o r
A n t o n io Jun que ir a de A ze v e do . S o Paulo : A t las , 2 0 1 1 ; PA GA N IN 1 , Julian o Mar co n de s . A dup la cr is e do
mo de lo r e gulat r io do s dir e it o s da p e r s o n alidade . In : TEPED IN O, Gus t av o ; F A CHIN , L uiz Eds o n ( Or g.) .
Pr in cip ais p r o b le mas do s dir e it o s da p e r s o n alidade e e s t ado - da- ar t e da mat r ia n o dir e it o co mp ar ado 3
Pe n s ame n t o cr t ico do dir e it o civ il b r as ile ir o . Cur it ib a: Jur u , 2 0 1 1 ; CHEQUER, Cl udio . A lib e r dade
de e x p r e s s o co mo dir e it o fun dame n t al p r e fe r e n cial prima fade: ( an lis e cr t ica e p r o p o s t a de r e v is o ao
p adr o jur is p r udn cia! b r as ile ir o ) . Rio de Jan e ir o : L ume n Jur is , 2 0 1 1 ; GA L A N TE, F t ima. D a t ut e la da p e r
s o n alidade , do n o me e da co r r e s p o n dn cia co n fide n cial. L is b o a: Quid Jur is , 2 0 1 0 ; B OD IN D E MORA ES ,
Mar ia Ce lin a. N a me dida da p e s s o a h uman a: e s t udo s de dir e it o civ il- co n s t it ucio n al. Rio de Jan e ir o : Re n o v ar ,
2 0 1 0 ; S TA N CIOL I, B r un e llo . Re n n cia ao e x e r c cio de dir e it o s da p e r s o n alidade , o u, Co mo algu m s e
t o ma o que quis e r . B e lo Ho r izo n t e : D e l Re y , 2 0 1 0 ; CHOERI, Raul Cle b e r da S ilv a. O dir e it o ide n t idade
n a p e r s p e ct iv a civ il- co n s t it ucio n al. Rio de Jan e ir o : Re n o v ar , 2 0 1 0 ; GUN THER, L uiz Eduar do ; S A N TOS ,
Willian s F r an klin L ir a do s e t al. ( Co o r d.) . Hit e la do s dir e it o s da p e r s o n alidade n a at iv idade e mp r e s ar ial.
Cur it ib a: Jur u , 2 0 1 0 ; MA N TOVA N I JUN IOR, L ae r t . O dir e it o co n s t it ucio n al in t imidade e v ida p r iv a
da do e mp r e gado e o p o de r dir e t iv o do e mp r e gado r . S o Paulo : LTr, 2 0 1 0 ; A MORIM, Jo s Ro b e r t o N e v e s ;
A MORIM, Van da. D ir e it o ao n o me da p e s s o a f s ica. Rio de Jan e ir o : Camp us , 2 0 1 0 ; L A CERD A , D e n n is
Ot t e . D ir e it o s da p e r s o n alidade n a co n t e mp o r an e idade : a r e p act ua o s e mn t ica. Po r t o A le gr e : F ab r is ,
2 0 1 0 ; CORR A , A dr ian a Es p n do la. O co r p o digit alizado . F lo r ian p o lis : Co n ce it o Edit o r ial, 2 0 1 0 ; GA L VA -
N I, L e o n ar do Galv an i. Pe r s o n alidade jur dica da p e s s o a h uman a: uma n o v a v is o do co n ce it o de p e s s o a n o
dir e it o p b lico e p r iv ado . Cur it ib a: Jur u , 2 0 1 0 ; KEL CH, Rit a Tit le . D ir e it o s da p e r s o n alidade e clo n age m
h uman a. S o Paulo : M t o do , 2 0 0 9 ; F ES TA S , D av id de Oliv e ir a. O co n t e do p at r imo n ial do dir e it o ima
ge m. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 9 ; A Z EVED O, lv ar o Villa a; CA MPOS , D io go L e it e de ; CHIN EL L A TO,
S ilmar a Jun y de A b r e u ( Co o r d.) . Pe s s o a h uman a e dir e it o . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 9 ; CA N TA L I, F e r n an
da B o r gh e t t i. D ir e it o s da p e r s o n alidade : dis p o n ib ilidade r e lat iv a, aut o n o mia p r iv ada e dign idade h uman a.
Po r t o A le gr e : L iv r ar ia do A dv o gado , 2 0 0 9 ; KEL CH, Rit a. D ir e it o s da p e r s o n alidade e clo n age m h uman a.
S o Paulo : M t o do , 2 0 0 9 ; MIGL IORE, A lfr e do D o min gue s B ar b o s a. D ir e it o al m da v ida: um e n s aio s o b r e
o s dir e it o s da p e r s o n alidade post mortem. S o Paulo : LTr, 2 0 0 9 ; A MA RO, Elis ab e t h A lia. Re s p o n s ab ilidade
civ il p o r o fe n s a ao s dir e it o s da p e r s o n alidade . In : N ERY, Ro s a Mar ia de A n dr ade ; D ON N IN I, Ro g r io F e r r az.
Es t udo s e m h o me n age m ao p r o fe s s o r Ruy Ge r aldo Camar go Vian a. S o Paulo : Re v is t a do s Tr ib un ais ,
2 0 0 9 ; GON A L VES , D io go Co s t a. Pe s s o a e dir e it o s de p e r s o n alidade : fun dame n t a o o n t o lgica da t ut e la.
Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 8 ; VA L E E REIS , Rafae l L u s . O dir e it o ao co n h e cime n t o das o r ige n s ge n t icas .
Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 8 ; UMA N ETO, F r an cis co Vie ir a. O dir e it o de n o s o fr e r dis cr imin a o
ge n t ica: uma n o v a e x p r e s s o do s dir e it o s da p e r s o n alidade . Rio de Jan e ir o : L ume n Jur is , 2 0 0 8 ; B A RB A S ,
S t e la Mar co s de A lme ida N e v e s . D ir e it o do ge n o ma h uman o . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 7 ; MORA TO, A n -
t o n io Car lo s . D ir e it o de aut o r e m o b r a co le t iv a. S o Paulo : S ar aiv a, 2 0 0 7 ; TA VA RES D A S IL VA , Re gin a
B e at r iz; S A N TOS , Man o e l J. Pe r e ir a do s ; Z UL IA N I, n io S an t ar e lli. Re s p o n s ab ilidade civ il n a In t e r n e t
e n o s de mais me io s de co mun ica o . S o Paulo : S ar aiv a, 2 0 0 7 ; DRA Y, Guilh e r me Mach ado . D ir e it o s de
p e r s o n alidade : an o t a e s ao Cdigo Civ il e ao Cdigo de Tr ab alh o . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 6 ; B OTA R,
Car lo s A lb e r t o . Os dir e it o s da p e r s o n alidade . 7 . e d. r e v ., at ual, e amp l., 1 . r e imp r . Rio de Jan e ir o : F o r e n s e
Un iv e r s it r ia, 2 0 0 6 ; VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . D ir e it o de p e r s o n alidade . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 6 ;
VA S CON CEL OS , Pe dr o Pa s de . D e s t it ui o de admin is t r ado r , dir e it o de p e r s o n alidade e p r o v idn cia de e s
clar e cime n t o p b lico . Co me n t r io ao A cr do do Tr ib un al da Re la o de L is b o a de 1 5 de Mar o de 2 0 0 1 . A A .
W. Es t udo s e m h o n r a de Ruy de A lb uque r que . L is b o a: F aculdade de D ir e it o da Un iv e r s idade de L is b o a,
2 0 0 6 ; EZ A B EL L A , F e lip e L e gr azie . O dir e it o de s p o r t iv o e a image m do at le t a. S o Paulo : Th o ms o n IOB ,
2 0 0 6 ; F A CHIN , L uiz Eds o n . Es t at ut o jur dico do p at r imn io m n imo : luz do n o v o cdigo civ il b r as ile ir o e
da co n s t it ui o fe de r al. 2 . e d., at ual. Rio de Jan e ir o : Re n o v ar , 2 0 0 6 ; D ON ED A , D an ilo . D a p r iv acidade p r o
t e o de dado s p e s s o ais . Rio de Jan e ir o : Re n o v ar , 2 0 0 6 ; S Z A N IA WS KI, Elimar . D ir e it o s de p e r s o n alidade
e s ua t ut e la. 2 . e d. r e v ., at ualiz. e amp l. S o Paulo : Re v is t a do s Tr ib un ais , 2 0 0 5 ; B EL TRO, S ilv io Ro me r o .
D ir e it o s da p e r s o n alidade : de aco r do co m o n o v o Cdigo Civ il. S o Paulo : A t las , 2 0 0 5 ; CUN HA , A le x an dr e
do s S an t o s . A n o r mat iv idade da p e s s o a h uman a: o e s t at ut o jur dico da p e r s o n alidade e o Cdigo Civ il de
2 0 0 2 . Rio de Jan e ir o : F o r e n s e , F GV, 2 0 0 5 ; S OUS A , Rab in dr an at h Cap e lo de . D ir e it o das p e s s o as : r e lat r io
s o b r e o p r o gr ama, o co n t e do e o s m t o do s de e n s in o de t al dis cip lin a. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 5 ;
B ORGES , Ro x an a Car do s o B r as ile ir o . D is p o n ib ilidade do s dir e it o s de p e r s o n alidade e aut o n o mia p r iv a
da. S o Paulo : S ar aiv a, 2 0 0 5 ; CA MPOS , D io go L e it e de . N s : e s t udo s s o b r e o dir e it o das p e s s o as . Co imb r a:
A lme din a, 2 0 0 4 ; D A B US MA L UF , A dr ian a Caldas do Re go F r e it as . D ir e it o da p e r s o n alidade n o n o v o cdigo
civ il e o s e le me n t o s ge n t ico s p ar a a ide n t idade da p e s s o a h uman a. In : D EL GA D O, M r io L uiz; A L VES , Jo n e s
F igue ir do . Que s t e s co n t r o v e r t idas n o n o v o Cdigo Civ il. S o Paulo : M t o do , 2 0 0 4 ; A N CON A L OPEZ ,
Te r e s a. O dan o e s t t ico : r e s p o n s ab ilidade civ il. 3 . e d. r e v ., amp l. e at ual. S o Paulo : Re v is t a do s Tr ib un ais ,
4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
a) Explorar as possibilidades interpretativas dos artigos 11-21, do Cdigo Civil
de 2002, o que ocorreu especialmente nos anos imediatamente posteriores
vigncia da nova legislao e diz respeito mais proximamente realidade
brasileira.
b) D esenvolver questes tericas, como o enquadramento dos direitos da per
sonalidade (ou do direito geral da personalidade) nas Cincias Jurdicas, o
que representa: (i) o d e s d o b r a m e n t o da importante c o n t r i b u i o de teortica
de R a b i n d r a n a t h Valentino Aleixo Capelo de Sousa, dos anos 1990;2 ( i i ) a
problematizao da influncia dos direitos fundamentais no Direito Privado
e tudo o que disso decorre no campo de suas relaes com o Direito Consti
tucional; (iii) a tentativa de solucionar conflitos entre direitos da personali
dade (ou entre direitos fundamentais).
c) In v e s t igar o s p r in cip ais p r o b le mas co n t e mp o r n e o s da in cidn cia do s dir e i
t o s da p e r s o n alidade n as r e la e s h uman as , co mo as man ip ula e s ge n t i
cas o dir e it o de ace s s o in fo r ma o ge n t ica, a lib e r dade de e x p r e s s o , o
co n t r o le das adv e r t n cias admin is t r at iv as , a p r o t e o da image m, o s reality
shows, a s it ua o jur dica das ce le b r idade s e o carter ( n o ) dis p o n v e l do s
dir e it o s da p e r s o n alidade .
Em larga medida, essa produo jurdica em lngua portuguesa est a revelar os
pontos de distanciamento entre as concepes de Brasil e Portugal nesse campo. Me
nos por seus resultados, os quais, muita vez, se revelam similares, e mais por questes
(muito relevantes) de natureza metodolgica. A necessidade de um dilogo mais inten
so faz-se sentir, especialmente porque alguns problemas j se encontram solucionados
em Portugal, ao exemplo da adequada departio de espaos entre os direitos da perso
nalidade e os direitos fundamentais, o que toma desnecessria sua reiterao, tal como
ocorre na doutrina brasileira. E, por outro lado, a experincia jurisprudencial brasileira
nesse mbito tem-se mostrado riqussima nos ltimos dez anos e pode interessar e
muito dogmtica portuguesa.
2 0 0 4 - CA N OTIL HO, ]. ]. Go me s ; MA CHA D O, Jn at as E. M. Re alit y s h o ws e lib e r dade de p r o gr ama o .
Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 3 ; VEL L OS O, Car lo s M r io da S ilv a. Os dir e it o s da p e r s o n alidade n o Cdigo
Civ il p o r t ugus e n o n o v o cdigo civ il b r as ile ir o . In : A L VIM, A r r uda; CERQUEIRA CS A R, Jo aquim Po r t e s
de - ROS A S Ro b e r t o . A s p e ct o s co n t r o v e r t ido s do n o v o Cdigo Civ il: e s cr it o s e m h o me n age m ao Min is t r o
Jo s Car lo s Mo r e ir a A lv e s . S o Paulo : Re v is t a do s Tr ib un ais , 2 0 0 3 ; A B REU, L u s Vas co n ce lo s . A v io la o de
dir e it o s de p e r s o n alidade p e la co mun ica o s o cial e as fun e s da r e s p o n s ab ilidade civ il. Re ce n t e s de s e n v o lv i
me n t o s jur is p r ude n dais . Uma b r e v e co mp ar a o lus o - ale m. A A . W. Es t udo s e m h o me n age m Pr o fe s s o
r a D o ut o r a Is ab e l de Magalh e s Co lla o . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 2 . v . 2 ; MEN EZ ES CORD EIRO, A n t n io .
Os dir e it o s de p e r s o n alidade n a dv il s t ica p o r t ugue s a. A A . W. Es t udo s e m h o me n age m ao Pr o fe s s o r
D o ut o r In o cn cio Galv o Te lle s . L is b o a: A lme din a, 2 0 0 2 . v . 1 ; OL IVEIRA , N un o Man ue l Pin t o . O dir e it o
ge r al de p e r s o n alidade e a "s o lu o do dis s e n t ime n t o : e n s aio s o b r e um cas o de co n s t it ucio n aliza o do
dir e it o civ il. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 2 ; MA CHA D O, Jn at as E. M. L ib e r dade de e x p r e s s o : dime n
s e s co n s t it ucio n ais da e s fe r a p b lica n o s is t e ma s o cial. S t v dia Iv r idica - B o le t im da F aculdade de D ir e it o da
Un iv e r s idade de Co imb r a, 6 5 . Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 2 ; GOD OY, Cl udio L uiz B ue n o de . A lib e r da
de de imp r e n s a e o s dir e it o s da p e r s o n alidade . S o Paulo : A t las , 2 0 0 1 .
2 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o . O dir e it o ge r al de p e r s o n alidade . Co imb r a: Co im
b r a Edit o r a, 1 9 9 5 .
Pr in cip ais p r o b le mas do s dir e it o s da p e r s o n alidade e e s t ado - da- ar t e da mat r ia n o dir e it o co mp ar ado 5
2.2 Estado-da-arte na dogmtica de lnguas espanhola,
francesa e italiana
Nas lnguas espanhola3e francesa,4as publicaes centram-se na temtica da pro
teo da intimidade, da liberdade de expresso e do direito ao corpo. A influncia te
rica de L ouis Favoreu, no Direito Constitucional francs, ntida quando se observa a
problematizao dos direitos da personalidade sob a ptica dos direitos fundamentais.5
Os italianos/que contam em sua literatura com a obra clssica de Adriano de Cupis,6
de grande influncia na doutrina portuguesa e brasileira, dedicam-se hoje ao exame de
problemas como: (a) autodeterminao teraputica; (b) os limites do direito vida e ao
corpo, sob o enfoque de sua disponibilidade pelo prprio titular; (c) o direito informa
o gentica. Os conflitos judiciais ligados s celebridades tambm fizeram com que a
doutrina se redirecionasse para esse campo. A "esfera de iluminabilidade" de polticos,
artistas, jogadores de futebol e de membros de famlias nobres ou da alta burguesia
um ponto em permanente (re)discusso no Direito italiano, especialmente em face de
iniciativas legislativas em ordem a aumentar o controle sobre os meios de comunicao.
A difuso do resultado de investigaes criminais, como o vazamento de dados de inqu
ritos, ainda alcanada por essa nova fase dos direitos da personalidade naquele pas.7
3 B OIX REIG ( D ir .) . L a p r o t e ccin jur dica de la in t imidad. Madr id: Ius t e l, 2 0 1 0 ; B ON IL L A S N CHEZ ,
Juan Jo s . Pe r s o n as y de r e ch o s de la p e r s o n alidad. Madr id: Re us , 2 0 1 0 ; MA RT N EZ VZ QUEZ D E CA S
TRO, L uis . EI p r in cip io de lib r e de s ar r o llo de la p e r s o n alidad e n e l mb it o p r iv ado . Cizur Me n o r : Civ it as
Th o ms o n Re ut e r s , 2 0 1 0 ; A L VA REZ , Rub io , Juan Jo s ; A GOUS MEN D IZ B A L , Car me n ( D ir .) . D ifamacin
y p r o t e ccin de lo s de r e ch o s de la p e r s o n alidad. Cizur Me n o r : Th o ms o n A r an zadi, 2 0 0 9 ; S UREZ ES PI-
N O, Mar ia L idia. El de r e ch o a la in t imidad ge n t ica. Madr id: Mar cial Po n s , 2 0 0 8 ; A L CA N TA RA , Jo s e F r an
cis co . L a s o cie dad de co n t r o l: p r iv acidad, p r o p ie dad in t e le ct ual y e l fut ur o de Ia lib e r t ad. B ar ce lo n a: ElCo b r e ,
2 0 0 8 ; A L EGRE MA RT N EZ , Migue l A n g l; MA GO B EN D A HA N , Os car . L o s de r e ch o s de la p e r s o n alidad y
e l de r e ch o de lo s dan o s mo r ale s : un a v is in de de r e ch o co mp ar ado de s de la t r an s dis r ip iin ar ie dad, lo s de r e
ch o s h uman o s y e l de r e ch o co n s t it ucio n al. Car acas : Co n s t it ucin A ct iv a, 2 0 0 7 ; GR1 MA L T S ERVERA , Pe dr o .
L a p r o t e ccin civ il de lo s de r e ch o s al h o n o r , a la in t imidad y a la p r o p ia image n . Madr id: Jus t e i, 2 0 0 7 ;
L A MA S , Mar io D an ie l. D e r e ch o s de la p e r s o n alidad y e x p lo t acin de Ia ap ar ie n cia h uman a: e s t dio s o b r e
e l n o mb r e , la image n , la in t imidad, la ide n t idad, e l h o n o r y la r e p ut acin co mo de r e ch o s p e r s o n ale s y co mo
de r e ch o s p at r imo n iale s . Mo n t e v ide o : Cikat o A b o gado s , 2 0 0 4 ; GA RC A GA RCIA , Cle me n t e . El de r e ch o a la
in t imidad y dign idad e n la do ct r in a de i Tr ib un al Co n s t it ucio n al. Mur cia: Un iv e r s idad de Mur cia, S e r v ido
de Pub licacio n e s , 2 0 0 3 .
4 B ORRIL L O, D an ie l. L e dr o it de s s e x ualit s . Par is : Pr e s s e s Un iv e r s it de F r an ce , 2 0 0 9 ; D ERIEUX, Em-
man ue l; GRA N CHET, A gn s . L e dr o it de s m dias . D r o it fr an ais , e ur o p e n e t in t e mat io n al. 5 . e d. Par is :
L GD J, 2 0 0 8 ; VOGEL , L o uis ( D ir .) . D e s dr o it s au dr o it : le s dr o it s de la p e r s o n n e , fo n de me n t du dr o it . Par is :
Pan t h o n - A s s as , 2 0 0 6 ; B ERG, Oliv e r . L a p r o t e ct io n de s in t r e t s in co r p o r e ls e n dr o it de la r p ar at io n de s
do mmage s : e s s ai d'un e t h o r ie e n dr o it fr an ais e t alle man de . B r ux e lle s : B r uy lan t , 2 0 0 6 ; B ORD , M lan ie .
L e dr o it la co n n ais s an ce de s e s o r igin s . Ge n v e ; Z ur ich ; B le : S ch ult h e s s , 2 0 0 6 ; A L B IF S , Ch r is t o p h e .
L ib e r t s e t dr o it s fo n dame n t aux . 1 1 . e d. r e v . e t augm. Par is : D allo z, 2 0 0 5 .
5 N o B r as il, o imp act o do p e n s ame n t o de L o uis F av o r e u fo i n o t av e lme n t e s e n t ido n a fun dame n t a o ut ili
zada n o julgame n t o da A D I n 9 5 9 5 / ES , r e lat o r Min . Ce ls o de Me llo , que fe z us o de s ua t e o r ia do "b lo co de
co n s t it udo n alidade ".
6 CUPIS , A dr ian o de . I dir it t i de lia p e r s o n alit . Milan o : Giuffr , 1 9 5 0 .
7 Z EPPEGN O, Gius e p p e . L a v it a e i s uo i limit i: que s t io n i b io e t ich e . To r in o : Camillian e , 2 0 1 1 ; PA S QUI-
N O, Te r e s a. A ut o de t e r min azio n e e dign it de lia mo r t e : s aggio di dir it t o dv ile . Pado v a: CED A M, 2 0 0 9 ;
6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
)2.3 Estado-da-arte na dogmtica de lngua inglesa (perspectiva britnica
. , e norte-americana)
.) Em lngua inglesa, sempre houve muitas publicaes e (mais ainda) julgados so
bre captulos dos direitos da personalidade. Direito vida, aborto, eutansia, liberdade
de expresso, liberdade de crena, limites da autodeterminao, proteo do Estado s
:chamadas liberdades civis so apenas alguns exemplos dessa tradicional vinculao dos
juristas anglfonos ao problema dos direitos da personalidade. A ltima dcada, porm,
deu ensejo-a algumas mudanas nesse enfoque tradicional, sob a forma de dois movi
mentos distintos.
O primeiro, mais perceptvel no Reino U nido, est na tomada em considerao dos
julgados da Corte Europia de Direitos Humanos. E cada vez mais sensvel a influncia
. desse Tribunal sobre as Cortes da Inglaterra, Esccia (relativamente independentes),
Irlanda do Norte e do Pas de Gales. No somente porque o Reino U nido se h vincula-
. 1do, por fora dos tratados da U nio Europia, a essa instncia jurisdicional, Mas, e isso
.. i muito interessante, pela assimilao de categorias jurdicas, mtodos de trabalho e
pressupostos tericos que se revelam nas decises sobre direitos humanos. O fracasso
V::) da importao do mtodo tcnico-jurdico para as Ilhas Britnicas, ocorrido no final do
- sculo XIX, parece no se repetir no incio do sculo XXI, ao menos no que se refere
aos direitos fundamentais. A criao da Suprema Corte do Reino U nido, como instncia
) mxima de seu Poder Judicirio, tambm outro elemento decisivo para essa viragem,
mormente porque se nota uma forte tendncia para sua afirmao como um autntico
tribunal constitucional, a despeito de fortes crticas sobre sua instaurao. A esse pro-
: psito, chegou-se a afirmar que o Reino perdeu um tribunal supremo de primeira classe
(a Cmara dos L ordes) e ganhou uma Suprema Corte de segunda classe.8
F IN OCCHIA RO, Gius e lla ( Cur a) . D ir it t o alVan o n imat o : an o n imat o , n o me e ide n t it p e r s o n ale . Pado v a:
, Ce dam, 2 0 0 8 ; MA RA S , G. Os s e r v azio n i s u co n t r o lli e p ub b licit de gli e n t i de i L ib r o I co d. civ . n e l quadr o
at t uale e n e lle p r o s p e t t iv e di r ifo r ma. In : A A .VV. S t udi in o n o r e di Gius e p p e B e n e de t t i. N ap o li: Ed. S cie n -
t ifich e It alian e , 2 0 0 8 . v . 1 ; MA Z Z ON I, C. M. L a t ut e la de lVe mb r io n e e de i fe t o n e l dir it t o p r iv at o . Rap p o r t o
s uir it alia. In : A A .W. S t udi in o n o r e di Gius e p p e B e n e de t t i. N ap o li: Ed. S cie n t ifich e It alian e , 2 0 0 8 . v . 1 ;
PA S CUZ Z I, G. D ir it t o alia r is e r v at e zza n e lVe r a di in t e r n e t . A A .W S t udi in o n o r e di Gius e p p e B e n e de t t i.
N ap o li: Ed. S cie n t ifich e It alian e , 2 0 0 8 . v . 1 ; Z A TT1 , P. S p un t i in t e ma di lib e r t di cur a: t r a s p e r ime n t azio n e
e t e r ap ia in n o v at iv a. A A .W. S t udi in o n o r e di Gius e p p e B e n e de t t i. N ap o li: Ed. S cie n t ifich e It alian e , 2 0 0 8 .
') v . 1; UN IVERS IT D EGL I S TUD I D I PA D OVA , F A COL T D I S CIEN Z E POL ITICHE, D IPA RTIMEN TO D I
D IRITTO COMPA RA TO. Uide n t it n e lTo r izzo n t e de i dir it t o p r iv at o : s e min r io di s t udi. Pado v a: Ce dam,
; 2 0 0 7 ; S A L A RIS , M. Gius e p p in a. Co r p o uman o e dir it t o civ ile . Milan o : Giuffr , 2 0 0 7 ; B A L D IN I, Gian n i
( Cur a) . Te cn o lo gie r ip r o dut t iv e e t ut e la de lia p e r s o n a. F ir e n ze : F ir e n ze Un iv e r s it y Pr e s s , 2 0 0 7 ; A L PA ,
J Guido ; RES TA , Gio r gio . L e p e r s o n e fis ich e e i dir it t i de lia p e r s o n alit . To r in o : UTET, 2 0 0 6 ; CA S UCCI,
F e lice ( Cur a) . Tt e la de lia p r iv acy e mis ur e di s icur e zza de i dat i p e r s o n ali. N ap o li: Ed. S cie n t ifich e It alia-
/ n e , 2 0 0 6 ; RES TA , Gio r gio . A ut o n o mia p r iv at a e dir it t i de lia p e r s o n alit . N ap o li: Jo v e n e , 2 0 0 5 ; UCEL L A ,
F ulv io . Pe r s o n a uman a e dir it t o . S ale mo : Edis ud, 2 0 0 4 ; MA N TEL ERO, A le s s an dr o . A t t iv it di imp r e s a in
) in t e r n e t e t ut e la de lia p e r s o n a. Pado v a: Ce dam, 2 0 0 4 .
, 8 D e v e - s e e n fat izar que a n o v a S up r e ma Co r t e n o t e r a n at ur e za da maio r ia das o ut r as s up r e mas co r t e s ,
p o is n o s e r uma co r t e co n s t it ucio n al co mo e las e n o t e r p o de r e s p ar a in v alidar le is . Em co n s e qn cia,
\ e mb o r a as alt e r a e s p r o p o s t as clar ame n t e aume n t e m a ap ar n cia de s e p ar a o do s p o de r e s , a t e o r ia de s o
b e r an ia p ar lame n t ar p e r man e ce in t o cada. Pr e s ume - s e que fo i a falt a de t al p o de r que le v o u o L o r de Wo o lf a
Pr in cip ais p r o b le mas do s dir e it o s da p e r s o n alidade e e s t ado - da- ar t e da mat r ia n o dir e it o co mp ar ado 7
O segundo movimento perceptvel na universalizao do conceito de direitos fun
damentais e de sua centralidade na ordem jurdica. O referencial terico europeu che
gou aos anglfonos, particularmente aos norte-americanos, por intermdio de grandes
juristas alemes, e seus discpulos, que divulgam seu pensamento em lngua inglesa ou
que se transferiram para universidades nos Estados U nidos ou no Reino U nido. Esse
um fenmeno muito perceptvel no Direito Constitucional, na Teoria do Direito e na Fi
losofia do Direito, como so exemplos Robert Alexy9 (no primeiro caso) e, no segundo
caso, Martin Borowski10 (seu discpulo, atualmente na U niversidade de Birmingham)
e Dieter Grimm (antigo juiz do Tribunal Constitucional Federal e atualmente profes
sor da U niversidade de Yale). Mas, esse dilogo tambm notvel no Direito Priva
do, tendo-se como exemplo Reinhard Z immermman,11atual presidente da prestigiosa
Zivilrechtslehrervereinigung [Associao de Professores de Direito Civil da Alemanha],
que (ou foi) docente em diversas instituies anglfonas e tem respeitvel produo
em lngua inglesa. Esse processo tambm se evidencia nas publicaes em ingls sobre
temas como eficcia dos direitos fundamentais em relao aos particulares e interven
o judicial na vida privada, que sempre mereceram a ateno das academias britnica
e norte-americana, mas sem levar em considerao, como hoje o fazem, o modelo e as
categorias do sistema continental.12Como resultado do esforo de aproximao levado
co me n t ar que a n o v a co r t e ir ia de fat o r e p r e s e n t ar a t r o ca de um t r ib un al de p r ime ir a clas s e ( a Cmar a do s
L o r de s ) p o r uma S up r e ma Co r t e de s e gun da clas s e " ( S L A PPER, Gar y ; KEL L Y, D av id. O s is t e ma jur dico
in gls .Tr adu o de Mar c lio Mo r e ir a de Cas t r o . Re v is o t cn ica de F r an cis co B ilac M. Pin t o F ilh o e Mo n ique
Ge lle r Mo s zko wicz. Rio de Jan e ir o : F o r e n s e , 2 0 1 1 . p . 1 9 1 ) .
9 S o e x e mp lo s de s s a p r e s e n a de Ro b e r t A le x y um n me r o s ign ificat iv o de ar t igo s p ub licado s e m in gls , p o r
e le me s mo e s cr it o s n e s s a l n gua o u p o r t r adu e s : A L EXY, Ro b e r t . B alan dn g, co n s t it ut io n al r e v ie w, an d r e p r e -
s e n t at io n . In t e r n at io n al Jo ur n al o f Co n s t it ut io n al L aw, v . 3 , n . 4 , p . 5 7 2 - 5 8 1 , Oct . 2 0 0 5 ; A L EXY, Ro b e r t . On
t h e t h e s is o f a n e ce s s ar y co n n e ct io n b e t we e n law an d mo r alit y : b uly gin s cr it ique , Rat io Jur is , v . 1 3 , n . 2 , p .
1 3 8 - 1 4 7 , Jun e 2 0 0 0 ; A L EXY, Ro b e r t . On t h e s t r uct ur e o f le gal p r in cip ie s . Rat io Jur is , v . 1 3 , n . 3 , p . 2 9 4 - 3 0 4 ,
S e p t . 2 0 0 0 ; A L EXY, Ro b e r t . Th e s p e cial cas e t h e s is . Rat io Jur is , v . 1 2 , n . 4 , p . 3 7 4 - 3 8 4 , D e c. 1 9 9 9 ; A L EXY,
Ro b e r t . On t h e co n ce p t an d t h e n at ur e o f L aw. Rat io Jur is , v . 2 1 , n . 3 p . 2 8 1 - 2 9 9 , S e p t , 2 0 0 8 ; A L EXY, Ro b e r t .
Co n s t it ut io n al r igh t s , b alan dn g, an d r at io n alit y . Rat io Jur is , v. 1 6 , n . 2 , p . 1 3 1 - 1 4 0 , Jun e 2 0 0 3 ; A L EXY, Ro b e r t .
Effe ct s o f de fe ct s - act io n o r ar gume n t ? Th o ugh t s ab o ut D e r y ck B e y le v e ld an d Ro ge r B r o wn s wo r ds L aw as a
Mo r al judgme n t . Rat io Jur is , v . 1 9 , n . 2 , p . 1 6 9 - 1 7 9 , Jun e 2 0 0 6 ; A L EXY, Ro b e r t . On t wo jux t ap o s it io n s : co n
ce p t an d n at ur e , law an d p h ilo s o p h y . S o me co mme n t s o n Jo s e p h Raz's "can t h e r e b e aTh e o r y o fL aw? . Rat io
Jur is , v . 2 0 , n . 2 , p . 1 6 2 - 1 6 9 , Jun e 2 0 0 7 ; A L EXY, Ro b e r t . Th e n at ur e o f le gal p h ilo s o p h y . Rat io Jur is , v. 1 7 , n . 2 ,
p . 1 5 6 - 1 6 7 , Jun e 2 0 0 4 ; A L EXY, Ro b e r t . On b alan dn g an d s ub s ump t io n . A s t r uct ur al co mp ar is o n . Rat io Jur is ,
v . 1 6 , n . 4 , p . 4 3 3 - 4 4 9 , D e c. 2 0 0 3 . Re ce n t e me n t e , p ub lico u- s e n o Re in o Un ido uma imp o r t an t e o b r a co le t iv a de
an lis e cr t ica da t e o r ia de Ro b e r t A le x y : KL A TT, Mat t h ias ( Ed.) . In s t it ut io n alize d r e as o n : t h e jur is p r ude n ce
o f r o b e r t ale x y . Ox fo r d: Ox fo r d, 2 0 1 2 .
10 A ut o r de uma o b r a que j co n s ide r ada uma r e fe r n cia o b r igat r ia n a t e o r ia do s dir e it o s fun dame n t ais :
B OROWS KI, Mar t in . Gr un dr e ch t e ais p r in zip ie n . 2 . A uflage . B ade n - B ade n : N o mo s , 2 0 0 7 . Cit e - s e ain da:
B OROWS KI, Mar t in . Th e B e gin n in gs o f Ge r man y s F e de r al Co n s t it ut io n al Co ur t . Rat io Jur is , v . 1 6 , n . 2 ,
p . 1 5 5 - 1 8 6 , Jun e 2 0 0 3 ; B OROWS KI, Mar t in ( Ed.) . On t h e N at ur e o f L e gal Pr in dp le s . S t ut t gar t : S t e in e r , 2 0 1 0 .
11 S ua o b r a mais imp o r t an t e : Z IMMERMA N N , Re in h ar d. Th e L aw o f Ob ligat io n s : Ro man F o un dat io n s o f
t h e Civ ilian Tr adit io n . Ox fo r d: Ox fo r d Un iv e r s it y Pr e s s , 2 0 0 6 . Cit e - s e ain da: Z IMMERMA N N , Re in h ar d. Th e
N e w Ge r man L aw o f Ob ligat io n s : h is t o r ical an d co mp ar at iv e p e r s p e ct iv e s , Ox fo r d Un iv e r s it y Pr e s s , 2 0 0 5 .
12 Co mo o de mo n s t r am o s liv r o s e ar t igo s s e guin t e s : CA MPB EL L , To m; EWIN G, K. D .; TOMKIN , A dam
( Ed.) . S ce p t ical e s s ay s o n h uman r igh t s . Ox fo r d: Ox fo r d Un iv e r s it y Pr e s s , 2 0 0 1 ; OUVER, D awn . Co n s t i
t ut io n al Re fo r m in t h e Un it e d Kin gdo m. Ox fo r d: Ox fo r d Un iv e r s it y Pr e s s , 2 0 0 3 ; CORRIN , Je n n ife r . F r o m
8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
a efeito por juristas como Z immermmann, no Direito Privado, encontram-se tambm
obras que comprovam essa nova interao.13
Como resultado disso, a produo em lngua inglesa sobre direitos da personalida
de tem-se mostrado aberta a temas e a mtodos de trabalho anteriormente encontrveis
apenas n Direito continental. So questes de grande interesse contemporneo nessa
dogmtica: (a) explorao comercial da imagem; (b) direito privacidade e propagan
da; (c) manipulao da imagem; (d) divulgao de dados pessoais ou seu acesso pelos
meios de comunicao e empresas de telecomunicaes para atender exigncias gover
namentais de segurana nacional; (e) direito ao prprio corpo e os direitos post-mortem;
(0 liberdade de expresso e limites entre a informao, o boato e a divulgao de rumo
res ou histrias sem comprovao sobre a vida privada de celebridades.14Essa viragem
tem provocado discusses doutrinrias tanto nos Estados U nidos quanto no Reino U ni
do sobre as vantagens de se adotar a nomenclatura e os mtodos de trabalho continen
tais, a despeito de haver antiga jurisprudncia sobre os direitos da personalidade.
2.4 Estado-da-arte na dogmtica de lngua alem
A literatura em lngua alem impressionante por sua quantidade (a maior em
comparao com todas as outras investigadas) e pela diversificao de temas abordados.
Diferentemente do que se tornou tradionos estudos dogmticos alemes, tem-se per
cebido a abertura para o exame comparatista dos direitos da personalidade. So muitas
h o r izo n t al an d v e r t ical t o lat e r al: e x t e n din g t h e e ffe ct o f h uman r igh t s in p o s t co lo n ial le gal s y s t e ms o f t h e
S o ut h Pacific. In t e r n at io n al an d Co mp ar at iv e l a w Quar t e r ly , v . 5 8 , p ar t 1 , p . 3 1 - 7 1 , 2 0 0 9 ; EN GL E, Er ic.
Th ir d p ar t y e ffe ct o f fun dame n t al r igh t s (Drittwirkung) . Han s e L aw Re v ie w, v . 5 , n . 2 , p . 1 6 5 - 1 7 3 , 2 0 0 9 ;
GEIGER, Ch r is t o p h e . F un dame n t al r igh t s , a s afe guar d fo r t h e co h e r e n ce o f in t e lle ct ual p r o p e r t y law? HC -
In t e r n at io n al Re v ie w o f In t e lle ct ual Pr o p e r t y an d Co mp e t it io n L aw, 3 5 ( 3 ) , p . 2 6 8 - 2 8 0 , 2 0 0 4 ; KL A TT,
Mat t h ias . Takin g r igh t s le s s s e r io us ly . A s t r uct ur al an aly s is o f judicial dis cr e t io n . Rat io Jur is . v . 2 0 , n . 4 ,
p . 5 0 6 - 5 2 9 , D e c. 2 0 0 7 ; L EIGH, Ian . Ho r izo n t al r igh t s , t h e h uman r igh t s act an d p r iv acy : le s s o n s fr o r n t h e
co mmo n we alt h . In t e r n at io n al an d Co mp ar at iv e L aw Quar t e r ly , v . 4 8 , p ar t I, p . 5 7 - 8 7 , Jan . 1 9 9 9 ; McGOL -
D RICK, D o min ic. Th e Un it e d Kin gdo m's Human Righ t s A ct 1 9 9 8 in t h e o r y an d p r act ice . In t e r n at io n al an d
Co mp ar at iv e L aw Quar t e r ly , v . 5 0 , p ar t 4 , p . 9 0 1 - 9 5 3 , Oct . 2 0 0 1 ; MICHEL MA N , F r an k I. Human r igh t s an d
t h e limit s o f co n s t it ut io n al t h e o r y . Rat io Jur is , v . 1 3 , n . 1 , p . 6 3 - 7 6 , Mar . 2 0 0 0 .
13 MA RKES IN IS , ( S ir ) B as il S .; UN B ERA TH, Han n e s ; JOHN S TON , A n gus . Th e Ge r man L aw o f Co n t r at :
a co mp ar at iv e t r e at is e . 2 . e d. e n t ir e ly r e v is e d an d up dat e d. Ox fo r d; Po r t lan d: Har t , 2 0 0 6 ; MA RKES IN IS , ( S ir )
B as il S . Co mp e n s at io n fo r p e r s o n a! in jur y in En glis h , Ge r man an d It alian law: a co mp ar at iv e o ut lin e .
Camb r idge : Camb r idge Un iv e r s it y Pr e s s , 2 0 0 5 .
14 S MA RTT, Ur s ula. Me dia an d e n t e r t ain me n t law. L o n do n : Ro ut le dge , 2 0 1 1 ; B RGGEMEIER, Ge r t
( Ed.) . Pe r s o n alit y r igh t s in Eur o p e an t o r t law. Camb r idge : Camb r idge Un iv e r s it y Pr e s s , 2 0 1 0 ; S PERL IN G,
D an ie l. Po s t h umo us in t e r e s t s : le gal an d e t h ical p e r s p e ct iv e s . Camb r idge : Camb r idge Un iv e r s it y Pr e s s ,
2 0 1 0 ; WH1 TTY, N iall R.; Z IMMERMA N N , Re in h ar d ( Ed.) . Righ t s o f p e r s o n alit y in S co t s law: a co mp a
r at iv e p e r s p e ct iv e . D un de e : D un de e Un iv e r s it y Pr e s s , 2 0 0 9 ; S OL OVE, D an ie l J. Th e fut ur e o f r e p ut at io n :
go s s ip , r umo r , an d p r iv acy o n t h e In t e r n e t . N e w Hav e n : Yale Un iv e r s it y Pr e s s , 2 0 0 7 ; HA RD CA S TL E, Ro h an .
L aw an d t h e h uman b o dy : p r o p e r t y r igh t s , o wn e r s h ip an d co n t r o l. Ox fo r d: Har t , 2 0 0 7 ; HEN RY, Mich ae l
( Ed.) . In t e r n at io n al p r iv acy , p ub licit y an d p e r s o n alit y laws . L o n do n : B ut t e r wo r t h s , 2 0 0 1 ; GIL L IOM, Jo h n .
Ov e r s e e r s o f t h e p o o r : s ur v e illan ce , r e s is t an ce an d t h e limit s o f p r iv acy . Ch icago : Th e Un iv e r s it y o f Ch icago
Pr e s s , 2 0 0 1 .
Pr in cip ais p r o b le mas do s dir e it o s da p e r s o n alidade e e s t ado - da- ar t e da mat r ia n o dir e it o co mp ar ado 9
as obras que se ocupam de confrontar as solues internas com aquelas desenvolvidas
em direitos de tradio continental ou no continental.
Os mais relevantes temas da bibliografia alem podem ser assim indicados: (1)
direito de imagem dos atletas: (a) divulgao de exames antidopping e a proteo de
dados; (b) explorao e uso comercial de sua imagem; (2) direito ao nome: (a) situao
jurdica das crianas em face do prprio nome; (b) o nome e a mudana de sexo; (c) o
direito de terceiros ante a mudana de nome de um indivduo; (d) proteo do nome
aps a morte; (3) proteo ao nascituro e aos embries: (a) limites pesquisa gentica
em clulas-tronco embrionrias; (b) situao jurdica do nascituro; (4) direito infor
mao gentica; (5) direito honra e privacidade das pessoas coletivas; (6) direito da
mdia: (a) limites liberdade de expresso; (b) direito informao; (c) contedo in
formativo e manipulao de notcias; (d) liberdade jornalstica; (7) direitos da persona
lidade e propriedade intelectual; (8) direitos da personalidade e direito societrio; (9)
transplante de rgos post-mortem e limites autonomia privada; (10) conflitos entre a
jurisdio do Tribunal Constitucional alemo e o Tribunal Europeu de Direitos Huma
nos em casos de direitos da personalidade; (11) celebridades e seus direitos persona
lssimos; (12) direitos da personalidade e liberdade de criao artstica; (13) Internet e
violao dos direitos da personalidade: questes de competncia jurisdicional e limite
ao acesso de dados; (14) disponibilidade dos direitos da personalidade e consentimen
to para sua violao; (15) reparao de danos e direitos da personalidade: (a) limites
econmicos; (b) mbitos de reparao; (16) direitos da personalidade e publicao de
biografias ou de referncias pessoais em livros ficcionais; (17) transmissibilidade dos
efeitos econmicos dos direitos da personalidade; (18) liberdade testamentria e pro
teo dos direitos da personalidade.15
15 S PIN D L ER, Ge r ald; S CHUS TER, F ab ian S ch us t e r ( Hr s g) . Re ch t de r e le kt r o n is ch e n me die n . Ko mme n -
t ar . 2 . A uflage . Mn ch e n : B e ck, 2 0 1 1 ; CHROMIK, Mar a. D ie En t s ch e idun gs kr it e r ie n de s Z iv ilr ich t e r s b e i
de r A b wgun g v o n Pr iv at s p h r e n s ch ut z un d ffe n t lich e m In fo r mat io n s in t e r e s s e : e in e r e ch t s v e r gle i-
ch e n de Un t e r s uch un g zum de ut s ch e n , fr an zs is ch e n un d s p an is ch e n Re ch t . Mn ch e n : Ut z, 2 0 1 1 ; N IEWA L -
D A , Jo h an n e s . D o p in gko n t r o lle n im Ko n flikt mit allge me in e m Pe r s n lich ke it s r e ch t un d D at e n s ch ut z.
B e r lin : D un cke r & Humb lo t , 2 0 1 1 ; VEN T, Ulr ike . D ie N ame n s fh r un g de s Kin de s in It alie n e in s ch lie fili-
ch e in e r v e r gle ich e n de n D ar s t e llun g de s Kin de s n ame n s r e ch t s . Hamb ur g: Ko v ac, 2 0 1 1 ; B RGIN , Mat -
t h ias Till. We n o de r was s ch t zt de r Emb r y o n e n s ch ut z? ( e in e kr it is ch e A n aly s e de s s t r afb e we h r t e n Ve r -
b o t s de r F o r s ch un g an me n s ch lfch e n Emb r y o n e n im s ch we ize r is ch e n S t ammze lle n fo r s ch un gs ge s e t z) . B as e i:
He lb in g L ich t e n h ah n , 2 0 1 1 ; WERTHWEIN , S imo n . D as Pe r s n lich ke it s r e ch t im Pr iv at r e ch t de r VR Ch i
n a ( e in e S t udie un t e r b e s o n de r e r B e r cks ich t igun g de r jur is t is ch e n Pe r s o n e n ) . B e r lin : D e Gr uy t e r Re ch t ,
2 0 0 9 ; L UTHER, Ch r is t o p h . Po s t mo r t ale r S ch ut z n ich t v e r mge n s we r t e r Pe r s n lich ke it s r e ch t e . Gt t in -
ge n : V&R Un ip r e s s , 2 0 0 9 ; KRA F T, Ch r is t e lla. Human kap it al ( die ko mme r zie lle Ve r we r t un g v o n B e s t an dt e i-
le n de s Pe r s n lich ke it s r e ch t s am B e is p ie l v o n L ize n zfuCb alls p ie le r n ) . F r an kfur t am Main ; B e r lin ; B e r n ; Wle n :
L an g Ye ar , 2 0 0 9 ; L OEF , Ro b e r t . Z um S p an n un gs fe ld zwis ch e n Me die n fr e ih e it un d Pe r s n lich ke it s s -
ch ut z: Un t e r h alt un gs ffe n t lich ke it un d p r iv at e s Me die n r e ch t . B ade n - B ade n : N o mo s , 2 0 0 9 ; KREMER, Ralf
B o do . D as Pe r s n lich ke it s r e ch t - ge s t ige s Eige n t um im S in n e de s A r t . 4 2 CIS G? Je n a: Je n ae r Wis s .- Ve r l.-
- Ge s , 2 0 0 9 ; EIN EM, A s t r id v o n . D e r p r iv at r e ch t lich e S ch ut z v o r ge n e t is ch e r D is kr imin ie r un g - e in e
Un t e r s uch un g un t e r b e s o n de r e r B e r cks ich t igun g v lke r - un d e ur o p ar e ch t iich e r Vo r gab e n s o wie de s s t e r -
r e ich is ch e n un d e n glis ch e n Re ch t s . Hamb ur g: Ko v ac, 2 0 0 9 ; L EHR, Mat t h ias . A n s t ze zur Har mo n is ie r un g
de s Pe r s n lich ke it s r e ch t s in Eur o p a - e in e r e ch t s v e r gle ich e n de Un t e r s uch un g zu de n A us wir kun ge n de s
EGMR- Ur t e ils Car o lin e v o n Han n o v e r auf de n B ildn is - un d Pr iv at h e it s s ch ut z im de ut s ch e n un d e n glis ch e n .
1 . A ufl. B ade n - B ade n : N o mo s , 2 0 0 9 ; A N , Py n g- h a. D e r v e r mge n s r e ch t lich e Z uwe is un gs ge h alt de s Pe r -
1 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
s n lich ke it s r e ch t s - e in e gr un dlage n o r ie n t ie r t e S t udie . B e r lin : D un cke r & Humb lo t , 2 0 0 9 ; B UCHER, A n -
dr e as Tide . N at r lich e Pe r s o n e n un d Pe r s n lich ke it s s ch ut z. 4 . A ufl. B as e l: He lb in g L ich t e n h ah n , 2 0 0 9 ;
G TTIN G, Ho r s t - Pe t e r ; S CHERTZ , Ch r is t ian ; S EITZ , Wa t e r ( Hr s g.) . Han db uch de s Pe r s n lich ke it s r e
ch t s . Mn ch e n : B e ck, 2 0 0 8 ; B A S S EWITZ , Kat h ar in a v o n . Pr o min e n z un d ce le b r it y - die Ve r mar kt un g
b e kan n t e r Pe r s n lich ke it e n in D e ut s ch lan d, En glan d un d de n US A aus mar ke n - un d p e r s n lich ke it s r e ch t li-
ch e r S ich t . Kln ; Mn ch e n : He y man n , 2 0 0 8 ; MEYER, Car o lin e B . Pr iv at r e ch t lich e Pe r s n lich ke it s r e ch t e
im ko mme r zie lle n Re ch t s v e r ke h r - e in e r e ch t s v e r gle ich e n de Un t e r s uch un g zur t at s ch lich e n un d r e ch di-
ch e n Ko mme r zialis ie r un g v o n Pe r s n lich ke it s r e ch t e n . B as e l: He lb in g L ich t e n h ah n , 2 0 0 8 ; HEL TH, Ulr ich .
D e r S ch ut z de r ko mme r zie lle n A s p e kt e de r Pe r s n lich ke it im aus t r alis ch e n Re ch t . 1 . A ufl. B ade n - B a
de n : N o mo s , 2 0 0 7 ; L EN S KI, S o p h ie - Ch ar lo t t e . Pe r s o n e n b e zo ge n e Mas s e n ko mmun ikat io n ais v e r fas s un -
gs r e ch t lich e s Pr o b le m: das allge me in e Pe r s n lich ke it s r e ch t in Ko n flikt mit Me die n , Kun s t un d Wis s e n s -
ch aft . B e r lin : D un cke r & Humb lo t , 2 0 0 7 ; B OTS CH, S e b as t ian . D ie Z wan gs v o lls t r e ckun g in das allge me in e
Pe r s n lich ke it s r e ch t . Hamb ur g: Ko v ac, 2 0 0 7 ; L A D EUR, Kar l- He in z. D as Me die n r e ch t un d die ko n o mie
de r A ufin e r ks amke it . Kln : Hale m, 2 0 0 7 ; S CHEN K, S t e p h an . D ie To t e n s o r ge - e in Pe r s n lich ke it s r e ch t :
ziv ilr e ch t ich e Un t e r s uch un g de r Ve r fiigun gs b e fugn is am t o t e n me n s ch lich e n Kr p e r . Hamb ur g: Ko v ac, 2 0 0 7 ;
N A M, Ki- Ye o n . Pe r s n lich ke it s r e ch t s s ch ut z in Un gle ich ge wich t s lage n - am B e is p ie l de s S p o r t s . F r an kfur t
am Main ; B e r lin ; B e m; Wie n : L an g, 2 0 0 7 ; KL B ER, Rdige r . Pe r s n lich ke it s s ch ut z un d Ko mme r zialis ie
r un g Ot h e r t it le in fo r m. D ie jur is t is ch - ko n o mis ch e n Gr un dlage n de s S ch ut ze s de r v e r mge n s we r t e n
B e s t an dt e ile de s allge me in e n Pe r s n lich ke it s r e ch t s . Tb in ge n : Mo h r S ie b e ck, 2 0 0 7 ; ROTH, Is ab e l. D ie
in t e mat io n ale Z us t n digke it de ut s ch e r Ge r ich t e b e i Pe r s n lich ke it s r e ch t s v e r le t zimge n im In t e r n e t .
F r an kfur t am Main ; B e r lin ; B e r n ; Wie n : L an g, 2 0 0 7 ; S TURMH F EL , Jack. D e r N ame im In - un d A us lan d:
e in e r e ch t s v e r gle ich e n de Un t e r s uch un g de s N ame n s s ach r e ch t s un d s e in e r n e ue r e n En t wicklun ge n . Ham
b ur g: Ko v a , 2 0 0 7 ; HA A S , Rap h a l. D ie Ein willigun g in e in e Pe r s n lich ke it s v e r le t zun g n ach A r t . 2 8
A b s . 2 Z GB . Z iir ich ; B as e l; Ge n f: S ch ult h e s s , 2 0 0 7 ; MUN D HEHKE, D an ie l. Re ch t s do gmat is ch e un d r e -
ch t s p o lit is ch e B e de ut un g de r S ch me r ze n s ge ldr e ch t s p r e ch un g b e i Ve r le t zun ge n de s allge me in e n Pe r
s n lich ke it s r e ch t s dur ch Pr e s s e o r gan e . 1 . A ufl. Gt t in ge n : Cuv illie r , 2 0 0 6 ; S CHWEERS , S t e fan Ch r is t ian .
D ie v e r mge n s we r t e n un d ide e lle n B e s t an dt e ile de s Pe r s n lich ke it s r e ch t s n ach de m To d de s Tr ge r s .
B e r lin : Un i- Ed., 2 0 0 6 ; F REUD EN B ERG, N ils , Z wan gs v o lls t r e ckun g i n Pe r s n lich ke it s r e ch t e . 1 . A ufl.
B ade n - B ade n : N o mo s , 2006; KL IN GE, Malt e Mat t h ias . Po s t mo r t ale r Pe r s n lich ke it s s ch ut z ge ge n B u-
ch v e r o ffe n t lich un ge n im S y s t e m de s fr an zs is ch e n D e likt s r e ch t s : e in e r e ch t s v e r gle ich e n de A n aly s e
an h an d kas s at io n s ge r ich ich e r Ur t e ile . F r an kfur t am Main ; B e r lin ; B e m; Wie n : L an g, 2 0 0 6 ; WL L RICH,
Ph ilip . D as Pe r s n lich ke it s r e ch t de s Ein ze ln e n im In t e r n e t : das Pe r s n lich ke it s r e ch t in D e ut s ch lan d un t e r
B e r cks ich t igun g de s in t e r n at io n ale n Pr iv at - un d Ve r fah r e n s r e ch t s s o wie de r n at io n ale n Haft un gs v o r s ch r if-
t e n . Je n a: Je n ae r Wis s e n s ch aft lich e Ve r lags ge s e lls ch aft , 2 0 0 6 ; HCKEL , Jan . Pe r s n lich ke it s s ch ut z un d
Ge lde r s at z im de ut s ch e n un d s p an is ch e n Z iv ilr e ch t . F r an kfur t am Main ; B e r lin ; B e r n : L an g, 2 0 0 6 ; S CHU-
BERT, F r ie de r ike . D e r We r t de s In div iduums im de ut s ch e n un d fr an zs is ch e n Pr iv at r e ch t : S ch ut z un d
N ut zun g de s wir t s ch aft lich e n We r t e s de r Pe r s n lich ke it im Re ch t s v e r gle ich . F r an kfur t am Main : Ve r lag Re ch t
un d Wir t s ch aft , 2 0 0 6 ; B A L THA S A R, S t e p h an . D e r S ch ut z de r Pr iv at s p h r e im Z iv ilr e ch t : e in e h is t o r is ch -
- v e r gle ich e n de Un t e r s uch un g zum de ut s ch e n , fr an zs is ch e n un d e n glis ch e n Re ch t v o m ius co mmun e b is
h e ut e . Tb in ge n : Mo h r S ie b e ck, 2 0 0 6 ; B ERGER, Cat h ar in a. Pe r s n lich ke it s s ch ut z v o r de r Ve r ffe n t li-
ch un g p r iv at e r Tat s ach e n : e in e Un t e r s uch un g de s de ut s ch e n , e n glis ch e n un d s dafr ikan is ch e n Re ch t s im
Hin b lick auf die Pr iv at r e ch t s v e r e in h e it lich un g in Eur o p a. 1 . A ufl. B ade n - B ade n : N o mo s , 2 0 0 6 ; RIED ER, He i-
ke . Ge n e t is ch e Un t e r s uch un ge n un d Pe r s n lich ke it s r e ch t : e in e A us e in an de r s e t zun g mit de m B un de s ge -
s e t z b e r ge n e t is ch e Un t e r s uch un ge n b e im Me n s ch e n im me dizin is ch e n B e r e ich . B as e l; Ge n f; Mn ch e n :
He lb in g & L ich t e n h ah n , 2 0 0 6 ; S CHWETZ L ER, A n ge lika. Pe r s n lich ke it s s ch ut z dur ch Pr e s s e s e lb s t ko n -
t r o lle : un t e r b e s o n de r e r B e r cks ich t igun g de s Eh r e n s ch ut ze s . B e r lin : D un cke r & Humb lo t , 2 0 0 5 ; L OOCK,
A le x an dr a. D as allge me in e Pe r s n lich ke it s r e ch t de r ffe n t lich e n Pe r s o n in de n Me die n : e in e B e t r a-
ch t un g mit in t e r dis zip lin r e n B e zge n . F r an kfur t am Main : L an g, 2 0 0 5 ; WORTMA N N , F lo r ian . D ie Vr e r -
b lich ke it v e r mge n s r e ch t lich e r B e s t an dt e ile de s Pe r s n lich ke it s r e ch t s . B e r lin : D un cke r & Humb lo t ,
2 0 0 5 ; KOZ IOL , He lmut ; WA RZ IL EK, A le x an de r ( Hr s g) . Pe r s n lich ke it s s ch ut z ge ge n b e r Mas s e n me -
die n . Vie n n a/ N e w Yo r k: S p r in ge r 2 0 0 5 ; A EB I- ML L ER, Re gin a Elis ab e t h . Pe r s o n e n b e zo ge n e In fo r mat io -
n e n im S y s t e m de s ziv ilr e ch t lich e n Pe r s o n lich ke it s s ch ut ze s : un t e r b e s o n de r e r B e r cks ich t igun g de r Re -
ch t s lage in de r S ch we iz un d in D e ut s ch lan d. B e m: S t mp fli, 2 0 0 5 ; GA UB , Ho lge r . D e r Me n s ch ais Mar ke :
L ize n zie r un g v o n N ame , B ild, S t imme un d Image im de ut s ch e n un d US - ame r ikan is ch e n Re ch t . B ade n - B ade n :
Pr in cip ais p r o b le mas do s dir e it o s da p e r s o n alidade e e s t ado - da- ar t e da mat r ia n o dir e it o co mp ar ado 1 1
O particular desenvolvimento da doutrina alem conectado com a histria do
Tribunal Constitucional Federal, que se notabilizou pelo julgamento de casos emble
mticos sobre liberdade de expresso, direitos sobre o prprio corpo, liberdade de culto
e de religio e proteo intimidade e privacidade. So muito conhecidos e citados
julgamentos relativos a esses tpicos: (a) limites da liberdade de expresso e ofensa
ao direito geral de personalidade (caso Cientologia);16 (b) direito informao gen
tica Vaterschaftsauskunft);17 (c) no abrangncia do direito geral da personalidade a um
suposto Recht zum Rausch" [direito intoxicao] (caso Cannabis), o que atualmente
um dos pontos da plataforma poltica do Piratenpartei [Partido Pirata];18(d) natureza de
expresses ofensivas contra grupos determinados em face de seu contexto, linguagem
e veculo de comunicao (caso Soldados so assassinos");19(e) direito liberdade de
expresso, liberdade de imprensa e ao sigilo de fonte, mesmo quando (supostamente)
em jogo questes de segurana nacional (caso der Spiegel);20 (f) direito privacidade de
pessoas pblicas (celebridades) em diferentes contextos de exposio da imagem (caso
Caroline von Hannover 2).21
N o mo s , 2 0 0 5 ; F IS CHER, A n n e t t e . D ie En t v v icklun g de s p o s t mo r t ale n Pe r s n lich ke it s s ch ut ze s : v o n B is -
mar ck b is Mar le n e D ie t r ich . F r an kfur t am Main ; B e r lin ; B e m; Wie n : L an g, 2 0 0 4 ; CL A US , S ab in e . Po s t mo r t a-
le r Pe r s n lich ke it s s ch ut z im Z e ich e n aUge me in e r Ko mme r zialis ie n mg. 1 . A ufl. B ade n - B ade n : N o mo s ,
2 0 0 4 ; GOEB EL , Jo ach im. Te s t ie r fr e ih e it ais Pe r s n lich ke it s r e ch t : zugle ich e in B e it r ag zur D o gmat ik de s
allge me in e n Pe r s n lich ke it s r e ch t s . B e r lin : D un cke r & Humb lo t , 2 0 0 4 ; B A RTN IK, Mar e e i Tit le . D e r B ildn is s -
ch ut z im de ut s ch e n un d fr an zs is ch e n Z iv ilr e ch t . Tb in ge n : Mo h r S ie b e ck, 2 0 0 4 ; HOOTZ , Car o lin N in a.
D ur ch s e t zun g v o n Pe r s n lich ke it s - un d Immat e r ialgt e r r e ch t e n b e i gr e n zb e r s ch r e it e n de n Ve r le t -
zun ge n in Eur o p a: un t e r b e s o n de r e r B e r cks ich t igun g de s de ut s ch - b r it is ch e n Ve r h lmis s e s . F r an kfur t am
Main ; B e r lin ; B e m; Wie n : L an g, 2 0 0 4 ; KOCH, Gudr un . Pe r s n lich ke it s r e ch t s s ch ut z b e i de r p o s t mo r t ale n
Or gan e n t n ah me zu Tr an s p lan t at io n s zwe cke n in D e ut s ch lan d un d F r an kr e ich . Mn ch e n : Ut z, 2 0 0 4 ;
Z ERR, Ch r is t ian . A b ge t r e n n t e Kr p e r s ub s t an ze n im S p an n un gs fe ld zwis ch e n Pe r s n lich ke it s r e ch t
un d Ve r mo ge n s r e ch t : de ut s ch - fr an zs is ch e r Re ch t s v e r gle ich b e r die Z uls s igke it de r Ko mme r zialis ie n mg
v o n Kr p e r s ub s t an ze n . F r an kfur t am Main ; B e r lin ; B e r n ; Wie n : L an g, 2 0 0 4 ; F RICKE, Ve r e n a. D e r Un t e r las -
s un gs an s p r uch ge ge n Pr e s s e un t e me h me n zum S ch ut ze de s Pe r s n lich ke it s r e ch t s im in t e r n at io n ale n
Pr iv at r e ch t . Tb in ge n : Mo h r S ie b e ck, 2 0 0 3 ; GRON A U, Ke r s t in . D as Pe r s n lich ke it s r e ch t v o n Pe r s o n e n
de r Z e it ge s ch ich t e un d die Me die n fr e ih e it . 1 . A ufl. B ade n - B ade n : N o mo s , 2 0 0 2 ; WITZ L EB , N o r man n .
Ge ldan s p r ch e b e i Pe r s n lich ke it s v e r le t zun ge n dur ch Me die n . Tb in ge n : Mo h r S ie b e ck, 2 0 0 2 ; TREB ES ,
A n ja. Z iv ilr e ch t lich e r S ch ut z de r Pe r s n lich ke it v o r Pr e s s e v e r ffe n t lich un ge n in D e ut s ch lan d,
F r an kr e ich un d S p an ie n : e in e r e ch t s v e r gle ich e n de Un t e r s uch un g un t e r b e s o n de r e r B e r cks ich t igun g de s
e in s t we ilige n Re ch t s s ch ut ze s . B e r lin : B e r lin - Ve r l. S p it z, 2 0 0 2 ; A MEL UN G, UIr ich . D e r S ch ut z de r Pr iv a-
t h e it im Z iv ilr e ch t . S ch ade n e r s at z un d Ge win n ab s ch p fun g b e i Ve r le t zun g de s Re ch t s auf S e lb s t b e s t im-
mun g b e r p e r s o n e n b e zo ge n e In fo r mat io n e n im de ut s ch e n , e n glis ch e n un d US - ame r ikan is ch e n Re ch t . T
b in ge n : Mo h r S ie b e ck, 2 0 0 2 ; PEIF ER, Kar l- N iko laus . In div idualit t im Z iv ilr e ch t : de r S ch ut z p e r s n lich e r ,
ge ge n s t n dlich e r un d we t t b e we r b lich e r In div idualit t im Pe r s n lich ke it s r e ch t , Immat e r ialgt e r r e ch t un d
Re ch t de r Un t e me h me n . Tb in ge n : Mo h r S ie b e ck, 2 0 0 1 .
15 B Ve r fGE 9 9 , 1 8 5 .
17 B Ve r fGE 9 6 , 5 6 .
18 B Ve r fGE 9 0 , 1 4 5 .
19 B Ve r fGE 9 3 , 2 6 6
10 B Ve r fGE 2 0 , 1 6 2 .
21 B Ve r fGE 1 1 1 , 3 0 7 .
1 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
2.5 Exame comparatstico
possvel estabelecer um quadro do desenvolvimento doutrinrio dos direitos da
personalidade, considerada a perspectiva temporal de dez anos e tomando-se por limite
da investigao as principais produes bibliogrficas de monografias (ou equivalentes)
em lngua portuguesa, espanhola, francesa, italiana, inglesa e alem. Esse estado-da-
-arte doutrinrio permite algumas concluses:
a) Os trs campos mais correntes de pesquisa acadmica nos direitos da per
sonalidade so o direito imagem, o direito vida (e seus limites iniciais e
finais) e a liberdade de expresso. Em todos os idiomas, independentemente
da tradio jurdica, esses temas ho ganhado significativa importncia, o
que compreensvel pelo amplo desenvolvimento da engenharia gentica,
dos meios de comunicao social e da mudana de eixo econmico, com a
valorizao cada vez maior do setor de servios e a capitalizao das ativida
des ligadas ao entretenimento.
b) Os problemas tericos tendem a convergir para o que se poderia denominar
de uma certa tradio continental, no que se refere ao uso de categorias
jurdicas, mtodos de trabalho e enquadramento de situaes fticas. Os di
reitos da personalidade passam a ser tambm compreendidos sob a ptica
dos direitos fundamentais, embora j fossem, no que respeita liberdade
de expresso, estudados como manifestao das "liberdades civis (Estados
U nidos) e das liberdades pblicas (Frana). Esse novo mtodo traz para o
Direito Privado uma srie de problemas tericos, que no podem ser resol
vidos por simplificaes ou pela reduo de conceitos a uma terminologia
constitucional pura e simples. So antpodas, nesse sentido, os caminhos
adotados pela dogmtica alem (a despeito da clssica e pioneira abertura do
mundo privado para os direitos fundamentais, com a deciso Lth, do Bundes-
verfassungsgericht) e pela dogmtica brasileira, que se tem notabilizado mais
recentemente por essa via constitudonalizante, sem atentar para a neces
sidade de buscar previamente solues dentro do prprio Direito Privado.
c) Algumas certezas, que dominaram o campo terico dos direitos da persona
lidade, tanto no sistema anglo-americano, quanto no sistema romano-ger-
mnico, comeam a ser abaladas e reclamam por novos marcos, o que algo
interessante, de modo especial para o Direito Privado. Comea-se a ques
tionar o fundamento exclusivamente econmico da interpretao do uso do
direito da imagem ou da necessidade de se suportar os riscos de sua indevida
utilizao por se ter auferido vantagens decorrentes da condio de celebri
dade. Os limites da manipulao gentica de alimentos, clulas-tronco e da
prpria extenso da vida no mais correspondem a referenciais comuns entre
ordenamentos de mesma tradio jurdica. H, nesse aspecto, uma perigosa
variao de posies dentro de um mesmo tribunal nacional ou, no caso eu
ropeu, entre tribunais nacionais e a Corte Europia de Direitos Humanos. A
liberdade de expresso tambm rediscutida, desta vez no por uma realida
Pr in cip ais p r o b le mas do s dir e it o s da p e r s o n alidade e e s t ado - da- ar t e da mat r ia n o dir e it o co mp ar ado 1 3
de decorrente do fim dos regimes democrticos, aps atos de fora, mas por
governos democraticamente eleitos e que desejam submeter os meios de co
municao social a instrumentos de controle social. No h garantias de que
essas solues terminem por restringir a liberdade de expresso por meios
indiretos. Finalmente, abrem-se discusses sobre o enquadramento jurdico
da (a) criao' artstica, (b) publicitria e do (c) direito autodeterminao
(no que se refere s advertncias administrativas em produtos de consumo
regulado ou regulamentado, como lcool, tabaco e medicamentos). A to
mada de posio sobre serem manifestaes, respectivamente, da liberdade
de expresso (a e b) e do direito ao livre desenvolvimento da personalidade
(c) cada vez mais necessria;- E, nesse sentido, solues complexas, fun
dadas na lgica no monotnica, muita1vez, terminam por servir de base para
a pr-excluso de direitos fundamentais ou sua derrotabilidade, quando, de
fato, se trata de pura e simplesmente restringir seu mbito de aplicao sob
pretextos polticos mal disfarados como uma espcie de "gongorismo ps-
-modemo" (a suma contradictio in terminis de certas terminologias).
3 Problemas principais tericos sobre direitos d personalidade
3.1 Origens e conceito dos direitos da personalidade
A doutrina jurdica portuguesa contempornea define os direitos da personalidade
como posies jurdicas fundamentais do homem, decorrentes de sua prpria condio,
a saber, o nascimento e a vida (Cabral de Moncada). Consideram-se, desse modo, como:
(a) aspectos imediatos da exigncia de integrao do homem (Gomes da Silva); (b) con
dies essenciais a seu ser e devir (Orlando de Carvalho); (c) reveladores do contedo
necessrio da personalidade (Paulo Cunha); (d) emanaes da personalidade humana
em si (Oliveira Ascenso); (e) direitos sobre outrem de exigir o respeito da prpria
personalidade (Adriano Vaz Serra); (f) direitos que tm por objeto no um elemento
exterior ao sujeito, mas modos de ser da pessoa (Carlos Mota Pinto) ou bens da perso
nalidade fsica, moral e1jurdica (Carvalho Fernandes) ou manifestaes parcelares da
personalidade humana (Rabindranath Capelo de Sousa ou a defesa da prpria dignidade
(Pedro Pais de Vasconcelos).22
As origens histricas da doutrina dos direitos da personalidade remontam a Hugo
Donellus, um dos maiores representantes do mos galicus, em seus Commentarii de iure
civili, quando props a distino entre domnio in persona cuiusque" e in externis rebus,
tendo colocado na primeira classe a liberdade, a incolumidade corporal e a reputao.23
22 MIRA N D A , Jo r ge . Man ual de dir e it o co n s t it ucio n al: dir e it o s fun dame n t ais . 4 . e d. Co imb r a: Co imb r a
Edit o r a, 2 0 0 8 . t . 4 , p . 6 6 ( r e co me n da- s e a le it ur a do o r igin al p ar a ide n t ifica o co mp le t a das r e fe r n cias s
o b r as cujo s aut o r e s fo r am aqui ap e n as in dicado s ) .
23 WEICK, Gn t e r . D ie Pe r s n lich ke it s r e ch t e . In : S TA UD IN GERS , J. v o n . Ko mme n t ar zum B r ge r lich e n
Ge s e t zb uch mit Ein fiih r un gs ge s e t z un d N e b e n ge s e t ze n . N e ub e ar b e it un g 2 0 0 4 v o n N o r b e r t Hab e r man n ,
He in r ich Ho n s e ll un d Gn t e r We ick. B e r lin : S e llie r , de Gr uy t e r , 2 0 0 4 .1 .1 , p . 1 7 1 .
1 4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade ; Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Essa nova viso, que deitava razes no nominalismo de Guilherme de Ockham e na. pol
mica dos universais, era sobretudo revolucionria porque individualista, antropomrfica e
voluntarista.24No deixa de ser irnico que muitos dos defensores da ideia dos direitos
da personalidade como meros direitos fundamentais no recordem que a constituio
dessa categoria deu-se em franca oposio ao sentido de hierarquia e de estatalismo.
No sculo XIX, Friedrich Carl von Savigny, em System des heutigen Rmischen Rechts
[Sistema de direito romano atual], negou estatuto cientfico categoria sob exame, por con
sider-la uma contradictio in terminis: o homem no poderia dispor de seu prprio corpo
ou alienar direitos sobre sua vida ou sua existncia. No se pode, contudo, negar que as
objees de Savigny eram de carter metodolgico e, em certa medida, compreendem-
-se pelas dificuldades inerentes ao direito alemo pr-codificado, como ressalta Antnio
Menezes Cordeiro.25A posio de Savigny, contudo, no foi acompanhada pela maior
parte dos juristas alemes do final do sculo XIX, inclusive por seu discpulo Puchta,26
a despeito da no incluso dos direitos da personalidade como categoria autnoma no
anteprojeto do BGB, cujos trabalhos eram liderados por Windscheid e outros pandec-
tistas. O principal defensor da tese da existncia de um direito geral da personalidade
era, quele tempo, Otto von Gierke, para quem havia direitos que garantem o domnio
sobre uma esfera subjetiva correspondente personalidade.27Ele usou a expresso Per-
snlichkeitssphre gewhrleisten, cujos reflexos se fazem sentir at hoje, de modo especial
na jurisprudncia alem, que desenvolveu a "teoria das esferas (Sphrentheorie), tendo
como exemplo clssico o julgado do Tribunal Federal de Justia da Alemanha (Bundes-
gerichtshof) de 1954, conhecido como caso da carta do leitor".28
O BGB reconheceu o direito ao nome ( 12) ,29Mas geralmente aceito que essa
abertura para o exerccio de tutela judicial em defesa do nome no pode ser compreen
dida como a admisso da existncia da doutrina dos direitos da personalidade.30
A mudana de orientao veio a se dar em dois nveis: infraconstitucional e consti
tucional, o que j permite entrever as delicadas relaes do Direito Privado e do Direito
Constitucional nesse aspecto.
21 S o b r e a p o lmica do s un iv e r s ais e a que s t o da aut o n o mia da v o n t ade : ROD RIGUES JUN IOR, Ot v io
L uiz. Re v is o judicial do s co n t r at o s : aut o n o mia da v o n t ade e t e o r ia da imp r e v is o . 2 . e d. S o Paulo : A t las ,
2 0 0 6 . p . 1 3 - 1 4 .
25 MEN EZ ES CORD EIRO, A n t n io . TVat ado ... p . 3 4 - 3 5 .
2 WEICK, Gn t e r . D ie Pe r s n lich ke it s r e ch t e . In : S TA UD IN GERS , J. v o n . Op . cit . lo c. cit .
27 WEICK, Gn t e r . D ie Pe r s n lich ke it s r e ch t e . In : S TA UD IN GERS , J. v o n . Op . cit . lo c. cit .
2< B GH, 2 5 .5 .1 9 5 4 - 1 Z R 2 1 1 / 5 3 .
25 S e o dir e it o ao us o de um n o me co n t e s t ado p o r o ut r a p e s s o a, o u s e o in t e r e s s e da p e s s o a t it ular do
n o me o fe n dido p e lo us o n o aut o r izado do me s mo n o me p o r o ut r a p e s s o a, o t it ular p o de r e que r que a o u
t r a ce s s e a p e r t ur b a o . S e s o t e midas o ut r as p e r t ur b a e s , o t it ular p o de ajuizar uma a o p ar a in ib i- las ."
Tr adu o liv r e de : "Wird das Recht zum Gebrauch eines Namens dem Berechtigten von einem anderen bestritten oder
wird das Interesse des Berechtigten dadurch verletzt, dass ein anderer unbefugt den gleichen Namen gebraucht, so kann der
Eerechtigte von dem anderen Beseitigung der Beeintrchtigung verlangen. Sind weitere Beeintrchtigungen zu besorgen, so
kann er auf Unterlassung klagen."
30 WEICK, Gn t e r . D ie Pe r s n lich ke it s r e ch t e . In : S TA UD IN GERS , J. v o n , Op . cit . p . 1 7 3 - 1 7 4 .
Pr in cip ais p r o b le mas do s dir e it o s da p e r s o n alidade e e s t ado - da- ar t e da mat r ia n o dir e it o co mp ar ado 1 5
A jurisprudncia alem, ainda no sculo XIX, apresentou um caso emblemtico,
que envolveu a proteo da imagem do ex-chanceler Otto von Bismarck.31
Ele faleceu em 1898 e dois jornalistas conseguiram entrar em seu quarto, aps
terem subornado alguns criados, e fotografar seu cadver, com o objetivo de vender
as imagens. Como se descreve com mais detalhe na nota de rodap, Bismarck pode
ser considerado como uma das primeiras celebridades modernas. Desse modo, a ne
gociao da imagem de seu corpo implicaria ganhos muito significativos para esses
profissionais extremamente ousados, uma espcie de paparazzi do sculo XIX. Os her
deiros de Bismarck processaram os fotgrafos e obtiveram umainjuno para impedir a
divulgao das imagens, alm da apreenso das chapas, dos negativos e das impresses.
A deciso do Tribunal do Reich [.Rekhsgerichtshofl, que foi de 28.12.1899,32s vsperas
da entrada em vigor do novo Cdigo Civil alemo,33usou como fundamento a entrada
ilegal dos autores das imagens na propriedade particular de Bismarck.34
H, ainda, diversos outros casos envolvendo os direitos da personalidade na juris
prudncia alem do final do sculo XIX e incio do sculo XX, a despeito de o julgamen
to Bismarck permanecer como um marco na dogmtica jurdica.35
O desenvolvimento dos direitos autorais e do direito industrial teve grande im
portncia para a aceitao dos direitos da personalidade como categoria autnoma. Em
1907, a Dieta alem aprovou uma L ei relativa aos Direitos Autorais sobre Belas Artes e
Fotografias (KWG), na qual se exige o consentimento do titular da imagem para que sua
31 Ot t o Eduar d L e o p o ld v o n B is mar ck- S ch n h aus e n ( F r s t [prncipe] v o n B is mar ck e He r zo g [duque] zu
L aue n b ur g ( 1 8 1 5 - 1 8 9 8 ) fo i o mais imp o r t an t e e s t adis t a ale mo do s culo XIX. Ele fo i r e s p o n s v e l p e la un ifi
ca o ale m, ap s t r s gue r r as ( co n t r a a D in amar ca, a us t r ia e a F r an a) , s o b a din as t ia do s r e is da Pr s s ia,
s e u p a s de o r ige m. F o i r e s p o n s v e l p e la ap r o v a o das p r ime ir as le is t r ab alh is t as e p r e v ide n d r ias n a Eu
r o p a. A p s as ce n s o ao t r o n o do kaiser Guilh e r me II, B is mar ck fo i de mit ido e m 1 8 9 0 . Muit o s h is t o r iado r e s
at r ib ue m a o co r r n cia da Pr ime ir a Gue r r a Mun dial mudan a de r umo s n a p o l t ica ale m, ap s a s a da de
ce n a do p r n cip e v o n B is mar ck, que h av ia p r e v is t o a o co r r n cia de um co n flit o e n v o lv e n do t o da a Eur o p a p o r
alguma "t o lice co me t ida n o s B alcs ", o que e fe t iv ame n t e v e io a s e v e r ificar . B is mar ck co n v e r t e u- s e e m uma
figur a e x t r e mame n t e p o p ular n a A le man h a, co m a ar r e cada o de fun do s e m t o do o p a s p ar a co n s t r u o de
e s t t uas e m s ua h o me n age m. S ua mo r t e , p o r t an t o , caus o u co mo o n acio n al e t udo o que lh e dizia r e s p e it o
ge r av a in t e r e s s e s e me lh an t e s gr an de s ce le b r idade s de n o s s o t e mp o . A t ualme n t e , h uma fun da o fe de r al
- Ot t o - v o n - B is mar ck- S t ift un g - cr iada e m s ua h o me n age m, cujo co n s e lh o cur ado r in t e gr ado p e lo min is t r o
fe de r al D r . Rudo lf S e it e r s e p o r de s ce n de n t e s do gr an de e s t adis t a, co mo F e r din an d F r s t [prncipe] v o n B is
mar ck e L e o p o ld Gr af [conde] v o n B is mar ck. Maio r e s in fo r ma e s e m: <h t t p : / / www.b is mar ck- s t ift un g.de /
in de x .p h p / s t ar t s e it e > .
32 RGZ 4 5 , 1 7 0 ( cas o B is mar ck) .
33 KL IPPEL , D ie t h e lm; L IES - B EN A CHIB , Gudr un . D e r S ch ut z v o n Pe r s n lich ke it s r e ch t e n um 1 9 0 0 . In :
F A L K, Ulr ich ; MOHN HA UPT, He in z ( Hr s g) . D as B r ge r lich e Ge s e t zb uch un d s e in e Rich t e r . Z ur Re -
akt io n de r Re ch t s p r e ch un g auf die Ko difikat io n de s de ut s ch e n Pr iv at r e ch t s ( 1 8 9 6 - 1 9 1 4 ) . F r an kfur t am Main :
Klo s t e r man n 2 0 0 0 , p . 3 7 2 .
34 S CHWA RTZ , Paul M.; PEIF ER, Kar l- N iko laus . Pr o s s e r 's Pr iv acy an d t h e Ge r man Righ t o f Pe r s o n alit y : A r e
F o ur Pr iv acy To r t s B e t t e r t h an On e Un it ar y Co n ce p t ? Califr n ia L aw Re v ie w, v . 9 8 , 2 0 1 0 . p . 1 9 2 5 .
35 RGZ 4 1 , 4 3 ( cas o Wagn e r b r ie fe ) ; RGZ 5 1 , 3 6 9 ; RGZ 6 9 , 4 0 1 ; RGZ 7 4 , 3 0 8 ( cas o Gr af Z e p p e ) ; RGZ 7 9 ,
3 9 7 ( cas o F e ls e n e ilan d mit S ir e n e n ) ; RGZ 1 2 5 , 8 0 ( cas o TuII Har de r ) .
1 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
reproduo fosse lcita.36'37Algumas excees so apontadas ( 23), como a participao
em eventos histricos, o que d margem a muitas controvrsias sobre o limite dessa
situao excepcional:38a imagem ser um mero acessrio de uma paisagem ou de grupos
de pessoas; a participao em procisses, cortejos, passeatas, greves e outros eventos
de natureza multitudinria. H, no entanto, ressalvas se, ainda assim, houver violao
ao direito do titular da imagem ou de seus familiares, se ele j tiver morado. Em seu
22, a lei determina que, aps a morte da pessoa cuja imagem houver sido reproduzida,
seu uso depender de autorizao dos parentes, fixando-se o prazo de dez anos para
essa proteo post-mortem. Em larga medida, h aqui o reconhecimento da tutela de um
direito da personalidade em relao a algum falecido, o que no deixa de ser digno de
registro, por se tratar de uma previso legal.
3.2 Problemas de qualificao, paralelismo com os direitos fundamentais
e contedo dos direitos da personalidade
Em relao aos problemas de qualificao, "no obstante largas zonas de coincidn
cia", correto dizer que no so, contudo, assimilveis direitos fundamentais e di
reitos de personalidade".39Essa departio conceituai bem aceita pela dogmtica em
Portugal, com maiores ou menores aproximaes,40especialmente quando se entende
que h direitos da personalidade que no se qualificam como direitos fundamentais e
que existem direitos fundamentais no necessariamente identificveis como direitos
da personalidade.41Esse parece ser o caminho seguido pela dogmtica alem, que reco
nhece esse paralelismo dos direitos da personalidade com os direitos fundamentais de
natureza constitucional (Parallele zu den Grundrechten des Verfassungsrechts) .42
Os direitos da personalidade, tanto no Brasil (artigos 11-21, CCB/2002), quanto
em Portugal (artigos 70-81, CCP), encontram no Direito Civil seu mbito normativo
36 Gesetz betreffend das Urheberrecht an Werken der bildendetx Knste und der Photographie. A e x p r e s s o der bilden-
den Knste p o de s e r t r aduzida p o r A r t e s Pl s t icas , e mb o r a s e t e n h a o p t ado p o r B e las A r t e s , dada s ua maio r
ab r an gn cia, a de s p e it o de s e r t e r min o lo gia mais an t iquada. A n t e gr a de s s a le i e s t dis p o n v e l e m: <h t t p : / /
www.ge s e t ze - im- in t e me t .de / kun s t ur h g/ >. A ce s s o e m: 1 8 .1 1 .2 0 1 1 .
37 O cas o B is mar ck t e v e s e gur a in flun cia n a e lab o r a o e n a ap r o v a o de s s a le i, co n s ide r ado p o r algun s
co mo s ua caus a ime diat a: "In D e ut s ch lan d war e s we n ig spter de r Fali B is mar ck, der 1898 - ais zwei Pressereporter
illegal aufgenommene Fotografien des toten Reichskatizlers auf dem Sterbebett in einer Zeitung verffentlichen wollten
- den unmittelbaren Anlass gab, 1907 wenigstens das Recht am eigenen Bild gesetzlich unter Schutz zu stellen ( GER-
L A CH, Jr ge n v o n . D e r Pe r s n lich ke it s s ch ut z ge ge n b e r Mas s e n me die n aus de r S ich t e in e s Hch s t r ich t e r s .
KOZ IOL , He lmut ; WA RZ L EK, A le x an de r ( Hr s g) . Op . cit . p . 4 5 2 ) .
38 HEIN RICH, B e md. D ie s t r afr e ch t lich e Ve r an t wo r t lich ke it v o n Pr e s s e mit ar b e it e m b e i de r un b e fugt e n
He r s t e llun g un d Ve r b r e it un g fo t o gr afis ch e r D ar s t e llun ge n v o n Pe r s o n e n . Z IS - Z e it s ch r ift fiir In t e r n at io n ale
S t r afr e ch t s do gmat ik. 6 . Jah r gan g, A us gab e 5 / 2 0 1 1 , S . 4 1 6 - 4 3 0 . S . 4 1 7 .
39 MIRA N D A , Jo r ge . Op . cit . p . 6 9 .
40 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . Tr at ado de dir e it o civ il p o r t ugus . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 1 . v . 1 , t .
3 , p . 2 7 .
41 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o . Op . cit . p . 5 8 1 - 5 8 2 .
42 WEICK, Gn t e r . D ie Pe r s n lich ke it s r e ch t e . In : S TA UD IN GERS , J. v o n . Op . cit . S .1 7 2 .
Pr in cip ais p r o b le mas do s dir e it o s da p e r s o n alidade e e s t ado - da- ar t e da mat r ia n o dir e it o co mp ar ado 1 7
primrio. Essa afirmao implica o reconhecimento de que as normas do Cdigo
Civil fornecem os meios primrios de vinculao dos particulares, sem necessidade
de recorrncia permanente ao texto constitucional para sua concretizao. O recurso
imediato dignidade humana como fundamento dos direitos da personalidade justi
fica-se no contexto da ordem jurdica alem, dadas suas peculiaridades histricas.43
No caso brasileiro, porm, o Direito Privado possui os elementos adequados con
formao normativa dos principais casos.44A Constituio brasileira de 1988, especial
mente no que se respeita intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas
(artigo 5S, inciso X), permite o reconhecimento desse paralelismo, sem necessidade de
invocao imediata da dignidade humana, e por meio dos filtros da legislao privada.
A existncia de um direito geral da personalidade defendida sob o fundamento de que,
dada a variedade de tipos de leses aos direitos da personalidade, necessria a prote
o ampla dos indivduos, por meio de uma espcie de direito-quadro (Rahmenrecht), de
carter aberto, que permita aambarcar hipteses no previamente reguladas em tipos
legais especficos, algo que se torna ainda mais evidente quando se observam proble
mas ligados privacidade e s liberdades comunicativas.45O direito alemo combinou
dispositivos do BGB, como o 12 (direito ao nome) e 823 (dever de ressarcimento do
dano), e, posteriormente, com a Grundgesetz -GG, a dignidade humana e o livre desen
volvimento da personalidade, chegou-se ao conceito definitivo, cuja aplicao se daria
a partir de um mtodo: (a) qualificar a leso e tentar enquadr-la em alguma previso
normativa especfica; (b) falta dessa ltima, recorrer-se-ia ao direito geral da per
sonalidade como um direito-quadro (Rahmenrecht) ou um direito-fonte (Quellrecht) ,46
Em certa medida, o direito geral permitiria que, com o passar do tempo e por efeito da
experincia humana ou da apreciao de casos especficos pelos tribunais, pudesse o
43 WEICK, Gn t e r . D ie Pe r s n lich ke it s r e ch t e . In : S TA UD IN GERS , J. v o n . Op . cit . S .1 7 3 .
44 A lgun s aut o r e s ap r e s e n t am uma fun dame n t a o jus n at ur alis t a do p r o b le ma da r e la o do s dir e it o s fun da
me n t ais e do s dir e it o s da p e r s o n alidade , n o s t e r mo s s e guin t e s : 'A t ut e la do s dir e it o s fun dame n t ais da p e s s o a
n a Co n s t it ui o t e m o r ige m e fin alidade n a n e ce s s idade de cr iar limit e s ao p o de r p o l t ico n a s ua cap acidade
p ar a o fe n de r a p e s s o a, co mo in div duo e cidado . A t ut e la jur dica fun da- s e n a le i e de p e n de de la. Os dir e i
t o s da p e r s o n alidade s o um r e co n h e cime n t o da dign idade da p e s s o a, ap e s ar e al m das r e la e s de p o de r ,
e de v e m s e r r e s p e it ado s , in de p e n de n t e me n t e de qualque r fo r malis mo , p o s it iv idade o u t ip icidade . A s s im,
afas t amo s a p ur e za p ir amidal de uma h ie r ar quia p o s it iv a de n o r mas que t m n o t o p o a Co n s t it ui o , p ar a, n o
co n fr o n t o do s r e gime s jur dico s e m p r e s e n a, n o de gr adar mo s a p o s i o da p e s s o a h uman a e a de fe s a jur dica
do s dir e it o s da p e r s o n alidade . A s e x p e r in cias p o l t icas de co n s t it ucio n aliza o do s dir e it o s da p e r s o n alidade
n o de v e m e s que ce r que a de fe s a da p e s s o a p e lo D ir e it o muit o an t e r io r a qualque r ide ia de Co n s t it ui o .
Os dir e it o s da p e r s o n alidade n o s e co n fun de m co m o s dir e it o s p e s s o ais ( o s dir e it o s da p e r s o n alidade s o
dir e it o s da p e s s o a, mas a maio r ia do s dir e it o s p e s s o ais n o s o dir e it o s da p e r s o n alidade ) e , co mo cat e go r ia
v aga, amp la e de e s s n cia s o b r e t udo n e gat iv a e s e m fun dame n t o mo r al n e ce s s r io , s o e le s o s que me lh o r
s e co n t r ap e m ao s dir e it o s p at r imo n ais " ( VERA - CRUZ PIN TO, Eduar do . Co n s ide r a e s ge n r icas s o b r e o s
dir e it o s da p e r s o n alidade . Re v is t a CEJ, B r as lia, n a 2 5 , p . 7 0 - 7 3 , ab r ./ jun . 2 0 0 4 , p . 7 1 - 7 2 ) . Caio M r io da
S ilv a Pe r e ir a ( D ir e it o Civ il: algun s as p e ct o s da s ua e v o lu o . Rio de Jan e ir o , 2 0 0 1 . p . 1 9 ) , an t e s da v ign cia
do CCB / 2 0 0 2 , t amb m co mp r e e n dia que o s dir e it o s da p e r s o n alidade v o s e in s cr e v e r , o r igin ar iame n t e ,
co mo p r o je o do dir e it o n at ur al ( R. L imo n gi F r an a, Car lo s A lb e r t o B it t ar ) .
45 S P1 N D L ER, Ge r ald; S CHUS TER, F ab ian S ch us t e r ( Hr s g) . Re ch t de r e le kt r o n is ch e n Me die n . Ko mme n -
t ar . 2 . A uflage . Mn ch e n : B e ck, 2 0 1 1 .
46 WEICK, Gn t e r . D ie Pe r s n lich ke it s r e ch t e . In . S TA UD IN GERS , J. v o n . Op . cit . S ...
1 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
legislador instituir novos direitos em espcie, decalcando-os do direito geral da per
sonalidade.47
Em Portugal, h forte dissenso quanto aceitao da ideia de direito geral da per
sonalidade, com a notvel divergncia entre a Escola de Direito de Coimbra, que lhe
favorvel,48 e a Escola de Direito de L isboa, que majoritariamente contrria ao seu
reconhecimento como uma categoria autnoma ou necessria.49
As crticas so divididas em dois grupos: (a) haveria impossibilidade lgica de um
sujeito de direito ser objeto da situao jurdica por ele titularizada; (b) o direito da per
sonalidade categoria desnecessria, com amplitude exagerada e que pode resultar em
abusos, especialmente quando se tem mo a ideia de que esses direitos subordinam-se
ao regime de numerus apertus. Chega-se frmula de que esse um direito "concebvel,
porm, dispensvel.50
A impossibilidade lgica no mais defendida, porque ela se reconduz ao argu
mento central de Savigny quanto prpria inexistncia dos direitos da personalidade.51
Remanesce a forte crtica quanto ao abuso na invocao do direito geral da personalida
de e na alternativa de se recorrer aos direitos em espcie. Alm disso, a necessidade de
criao de um direito geral na Alemanha decorreu das lacunas de legislao civil sobre
o tema, o que levou a jurisprudncia a extrair o direito geral da Grundgesetz e formul-
-lo em termos judiciais. A existncia de direitos da personalidade em espcie, como se
d em Portugal e tambm no Brasil, dispensaria esse recurso tcnico. Jos de Oliveira
Ascenso acentua, ainda, o risco do que chama de "empolamento constante dos direitos da
personalidade, cuja ampliao demasiada representaria seu enfraquecimento, converten
do-os em meras proclamaes vazias de sentido. Por outro lado, a fundamentalizao de
todos os direitos implicaria sua restrio recproca, o que colocaria em um mesmo plano
direitos que no gozariam dessa similaridade ou importncia.52
47 A co n s agr a o de s t a p r o t e c o ge r al da p e r s o n alidade - de o n de s e r e t ir a, al m de s t e s dir e it o s especiais,
t amb m um direito geral de personalidade - p e r mit e co n ce de r t ut e la a b e n s p e s s o ais n o t ip ificado s , de s ign ada
me n t e p r o t e ge n do as p e ct o s da p e r s o n alidade cuja le s o o u ame a a de v io la o s co m a e v o lu o do s t e mp o s
as s umam um s ign ificado il cit o ( p . e x ., a ide n t idade ge n t ica, o u a 'aut o de t e r min a o in fo r mat iv a' o u o co n
t r o lo s o b r e o s dado s p e s s o ais ) " ( PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Te o r ia ge r al do D ir e it o Civ il. A t ualizada
p o r A n t n io Pin t o Mo n t e ir o e Paulo Mo t a Pin t o . 4 . e d. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 5 . p . 2 1 0 ) .
48 Pe dr o Pais de Vas co n ce lo s ( D ir e it o de p e r s o n alidade ... p . 6 2 ) afir ma que a do ut r in a do dir e it o ge r al da
p e r s o n alidade fo i r e ce b ida e m Po r t ugal p o r Or lan do de Car v alh o , A n t un e s Var e la, S in de Mo n t e ir o , Cap e lo de
S o us a, Car v alh o F e r n an de s , Car lo s A lb e r t o da Mo t a Pin t o , He in r ich Edwald Hr s t e r , Paulo Mo t a Pin t o , Pin t o
Oliv e ir a e L u s a N e t o , co m fo r t e aco lh ida p e lo Tr ib un al Co n s t it ucio n al e p e lo S up r e mo Tr ib un al de Jus t i a.
49 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o Civ il: t e o r ia ge r al. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 1 9 9 8 . v . 1 , p . 7 8 - 7 9 .
50 GON A L VES , D io go Co s t a. Op . cit . p . 8 9 .
51 Emb o r a p e r s is t am p o s i e s negativistas, co mo a s e guin t e t r an s cr it a: 'A o t r at ar do s direitos da personalidade,
cab e r e s s alt ar que n o co n s t it ui e s t a 'um dir e it o ', de s o r t e que s e r ia e r r o dize r - s e que o h o me m t e m dir e it o
p e r s o n alidade . D e la, p o r m, ir r adiam- s e direitos, s e n do ce r t a a afir mat iv a de que a p e r s o n alidade o ponto
de ap o io de t o do s o s dir e it o s e o b r iga e s ( PEREIRA , Caio M r io da S ilv a. In s t it ui e s de dir e it o civ il:
in t r o du o ao dir e it o civ il e t e o r ia ge r al do dir e it o civ il. A t ualizado p o r Mar ia Ce lin a B o din de Mo r ae s . 2 4 . e d.
Rio de Jan e ir o : F o r e n s e , 2 0 1 1 . p . 2 0 1 - 2 0 2 ) .
52 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. Os dir e it o s de p e r s o n alidade n o Cdigo Civ il b r as ile ir o . Re v is t a F o r e n s e ,
v . 9 4 , n e 3 4 2 , p . 1 2 1 - 1 2 9 , ab r ./ jun . 1 9 9 8 . p . 1 2 6 .
Pr in cip ais p r o b le mas do s dir e it o s da p e r s o n alidade e e s t ado - da- ar t e da mat r ia n o dir e it o co mp ar ado 1 9
Na dogmtica brasileira, a aceitao do direito geral da personalidade significati
va, com nmero considervel de autores que defendem sua existncia, at por influncia
da obra de Adiando de Cupis.53
Importa, contudo, destacar algumas variantes na linha dos que defendem a catego
ria do direito geral da personalidade no ordenamento brasileiro:
a) H posies que admitem se extrair diretamente do art. l s, inciso III (digni
dade da pessoa humana), CF/1988, o fundamento para uma clusula geral
de tutela da pessoa humana", sendo desimportante qualquer recurso cate
goria dos direitos subjetivos da personalidade.54
b) A despeito de no enfrentarem diretamente o problema da existncia de um
direito geral, h os que admitem que o Cdigo Civil de 2002 optou por tratar
dos direitos em espcie, sem, contudo, impedir que haja o desenvolvimento
da matria pela jurisprudncia e pela doutrina, em ordem ao reconhecimen
to de outros direitos", com base na dignidade humana,55 ou por efeito da
atuao dos tecnlogos".56Em contrrio, pode-se citar a posio de Orlando
Gomes, para quem "a teoria dos direitos da personalidade somente se liberta
de incertezas e imprecises se a sua construo se apoia no Direito Positivo e
reconhece o pluralismo desses direitos ante a diversidade dos bens jurdicos
sobre que recaem, tanto mais quanto so reconhecidamente heterogneos".
Para ele, um direito geral daria margem para que se admitisse que essa cate
goria no tem limites.57
c) O art. 12, CCB/2002,58ainda segundo outros autores, a sedes materiae do
direito geral da personalidade.59
53 S IQUEIRA CA S TRO, Car lo s Ro b e r t o de . A Co n s t it ui o ab e r t a e o s dir e it o s fun dame n t ais : e n s aio s
s o b r e o co n s t it ucio n alis mo p s - mo de mo e co mun it r io . 2 . e d. Rio de Jan e ir o : F o r e n s e , 2 0 1 0 . p . 5 0 6 ; B A RROS
MON TEIRO F IL HO, Rap h ae l e t al. Co me n t r io s ao n o v o Cdigo Civ il: ar t s . I 9 ao 7 8 , das p e s s o as . Rio de
Jan e ir o : F o r e n s e , 2 0 1 0 . v . I, p . 8 2 4 - 8 2 5 ( co m fun dame n t o n o p r in c p io da. dign idade h uman a) 1, CA MB L ER,
Ev e r aldo A ugus t o ; PA UL A B A RRETO, Wan de r ie i de ; D A N TA S , Mar ce lo N av ar r o Rib e ir o ; TERRA , Mar ce lo .
Co me n t r io s ao Cdigo Civ il B r as ile ir o : ar t igo s l fi a 1 0 3 . Rio de Jan e ir o : F o r e n s e , 2 0 0 5 . p . 1 6 5 .
54 TEPED IN O, Gus t av o ; B A RB OZ A , He lo is a He le n a; B OD IN D E MORA ES , Mar ia Ce lin a. Cdigo Civ il
in t e r p r e t ado co n fo r me a Co n s t it ui o da Re p b lica. Rio de Jan e ir o : Re n o v ar , 2 0 0 4 . v . 1 , p . 3 3 .
55 VEL L OS O, Car lo s M r io da S ilv a. Os dir e it o s da p e r s o n alidade n o Cdigo Civ il p o r t ugus e n o n o v o
Cdigo Civ il b r as ile ir o . In : A L VIM, A r r uda; CERQUE1 RA CS A R, Jo aquim Po r t e s de ; ROS A S , Ro b e r t o . Op .
cit . p . 1 2 3 ,
se js ja v e r dade , o s dir e it o s da p e r s o n alidade s o um catlogo de faculdade s jur dicas cuja e x t e n s o v ar ia de
aco r do co m o t e cn lo go e s uas p r e fe r n cias ( p ar e ce , p o r v e ze s , que algun s co mp e t e m n a b us ca de n o v o s it e n s
p ar a o car d p io ) " ( COEL HO, F b io Ulh a. Cur s o de dir e it o civ il. 4 . e d. S o Paulo : S ar aiv a, 2 0 1 0 . p . 1 9 8 ) .
57 GOMES , Or lan do . In t r o du o ao dir e it o civ il. 4 . e d. Rio de Jan e ir o : F o r e n s e , 1 9 7 4 . p . 1 7 2 . Em idn t ico
s e n t ido : VIA N A , Mar co A ur lio S . Cur s o de dir e it o civ il: p ar t e ge r al. Rio de Jan e ir o : F o r e n s e , 2 0 0 4 . p . 1 5 2 .
58 'A r t . 1 2 . Po de - s e e x igir que ce s s e a ame a a, o u a le s o , a dir e it o da p e r s o n alidade , e r e clamar p e r das e
dan o s , s e m p r e ju zo de o ut r as s an e s p r e v is t as e m le i."
59 D E MA TTIA , F ab io Mar ia de . D ir e it o s da p e r s o n alidade : as p e ct o s ge r ais . Re v is t a F o r e n s e , v . 2 6 2 , n .
8 9 8 / 9 0 0 , p . 7 9 - 8 8 , ab r ./ jun . 1 9 7 8 . N e s s e s e n t ido : O Cdigo Civ il, e mb o r a s e o cup e do r e gr ame n t o de ap e n as
, ^t o n alidade Mir an da. Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
2 0 D ir e it o s da person*
3.3 Direitos da personalidade e dignidade humana
As noes sobre um direito geral da personalidade, ou de uma tutela geral, como
pretendem outros, bem assim sua vinculao estrita dignidade humana, devem ser
examinadas sem grandes apelos retricos, o que, infelizmente, tem sido comum.
T o m a n d o - s e como base a jurisprudncia e a dogmtica da Alemanha, fonte de ins
pirao do desenvolvimento da doutrina dos direitos da personalidade, correto dizer
que a dignidade humana inviolvel e que a todos os poderes estatais impe sua t>ro-
t e o ( l , I e l , I 2 , G G ) . p P
A conceituao da. dignidade humana objeto de grande controvrsia, como se nota,
partida, da leitura dos fundamentos do Bundesverfassungsgericht no caso das Escutas
Telefnicas (Abhorurteilcom a forte divergncia identificada no voto minoritrio do
juiz Geller.61Elaborou-se, por conseguinte, um conceito de dignidade humana por meio
da tpica e com a preordenao de situaes nas quais se deu sua violao e, por isso,
se reclama a interveno judicial. necessrio, ainda, desenvolver o processo de "con
cretizao dos direitos da personalidade, o que se conecta com o estabelecimento de
limites metodolgicos ao que se pretende denominar de dignidade humana". Na dog
mtica brasileira e portuguesa, alguns autores j se manifestam nesse sentido62alm
de ter o Suprem o Tribunal Federal, no caso do direito de acesso s informaes genticas,
algun s dir e it o s da p e r s o n alidade , t e m n o s e u ar t . 11 uma e s p cie de cl us ula ge r al que aco lh e e m s e u s e io
t o do s o s dir e it o s de s s a n at ur e za p r e v is t o s n o o r de n ame n t o jur dico v ige n t e Re o r e s e n t a a
t iv a, n o p lan o ^ p n n c/ p io s e p o s t uiadis que a
o dir e it o p o s it iv o co mo dir e it o s fun dame n t ais . Po de - s e dize r , p o is , que t o do s o s dir e it o s dn a
e n co n t r am- s e an in h ado s n a ciaus uia ge r al do ar t . 1 1 do Cdigo Civ il ( OL IVEIRA Jame s Eduar do c L v 6
C i v i l c o m e n t a d o e an o t ado . 2 . e d. Rio de Jan e ir o : F o r e n s e , 2 0 1 0 . p . 6 4 ) . d ' CO<g
so m ' s D r u d n d a ale m, o de s e n v o lv ime n t o do t e ma ap r e s e n t a in t e r e s s an t e s n uan ce s , que ult r ap as s am
aJ daaue le dir e it o e s e r v e m de imp o r t an t e mar co p ar a a e x p e r in cia jur dica lus o - b r as ile ir a. Em p o r
o s imit e s n j am.s e o s r e ce n t e s t r ab alh o s de Wan de r le y de Paula B ar r e t o ( Os dir e it o s da p e r s o n alidade
t o gue s , r e co ^ ^ a|e mg co n t e mp o r n e a. Re v is t a Tr ime s t r al de D ir e it o Civ il, v . 4 1 , p . 1 3 5 - 1 5 9 , 2 0 1 0 ) , que
. J*n r i lculci cumcmjjuKmca. iv t v io ia x x uiicaucu uw v iv u, v. t i , jp. j j -i j j , iv iwy , H
n a jur is p r u e s t udio s o do t e ma n o B r as il, e Vir g lio A fo n s o da S ilv a ( Co lis e s de dir e it o s fun dame n t ais
h o je o p n n ^ - o n a| e o r de m t r an s n acio n al. In : N EVES , Mar ce lo . Tr an s n acio n alidade do dir e it o : n o v as
e n t r e o r de m^ co n gjt o s e n t r e o r de n s jur dicas . S o Paulo : Quar t ie r L at in , 2 0 1 0 . p . 1 0 1 - 1 1 2 ) , o s quais o fe r e -
Pe r s Pe ct lv a^.v ame n t e , a le it ur a do D ir e it o Civ il e do D ir e it o Co n s t it ucio n al s o b r e o s dir e it o s da p e r s o n alidade
ce m, r e s p e c aie mg Mm do Tribunal Eur o p e u de D ir e it o s Human o s , no ltimo caso).
e a jur is p r udn cia
si B Ve r fGE 3 0 , 1 -
t i i HO j. J. Go me s ; MA CHA D O, Jn at as E. M. Reality s h o ws ... p . 4 8 ; ROD RIGUES JUN IOR,
. : o n alis mo e do s p r in c p io s . O D ir e it o ( L is b o a) , v . 1 4 3 , p . 4 3 - 6 6 , 2 0 1 1 ; VIL L EL A , Jo o B at is t a,
n e o co n s t i a]xes s o b r e a dign idade da p e s s o a h uman a. S up e r io r Tr ib un al de Jus t i a: do ut r in a. Edi o
S mp r _ __ cco c q i o n n o A .n .
* Esttto e p is t e mo lgico do D ir e it o Civ il co n t e mp o r n e o n a t r adi o de civ il law e m face do
Ot v io LUIZ. ^ rs \A.X ao. cg m i . v i r r c i a
n e o co n s
Var ia e s an0S i D is t r it o F e de r al, p , 5 5 9 - 5 8 1 , 2 0 0 9 . Pe dr o A ugus t in A damy ( Re n n cia a dir e it o fun -
co me mo r ^ p 3U^0 ; p alh e ir o s , 2 0 1 1 . p . 1 5 0 ) an o t a co m p r e cis o que : 'A lus e s e ar gume n t o s que clamam
dame n 0b s e r v n da e gar an t ia da dign idade ', que ale r t am p ar a a ut iliza o da p e s s o a co mo me io e n o
p e lo r ^s Pe^ii' s j me s mo ', o u a fr mula de que a dign idade n o p o de s e r de s r e s p e it ada p o r me didas e s t at ais ,
co mo n m s e n ddo e de p o uco v alo r quan do co n fr o n t adas co m o s p r o b le mas r e ais que s e ap r e s e n t am e ,
t o mam- s e esp edfica, co m a n e ce s s idade de r e s p e it o s e s co lh as in div iduais e ao s p lan o s , t amb m in div i-
de . r i^a ^e s e n v 0 iv ime n t o da p e r s o n alidade e de s ua at iv idade e co n mica."
Pr in cip ais p r o b le mas do s dir e it o s da p e r s o n alidade e e s t ado - da- ar t e da mat r ia n o dir e it o co mp ar ado 2 1
apresentado idntica preocupao quanto aos excessos na qualificao e no uso retrico
da dignidade humana.63
Esse problema da maior ou menor abrangncia do direito geral de personalidade
tambm identificvel no Tribunal Constitucional Federal alemo. O caso Reiten im Walde
[cavalgadas na floresta]64permite compreender bem essa matria. O julgamento dizia
respeito L ei Federal Florestal (BWaldG), cujo 14, 1, declara que o acesso floresta
para fins recreativos permitido, mas andar de bicicleta, cavalgar ou usar cadeiras de
rodas s seria possvel em estradas e trilhas. O indivduo assume os riscos pelo ingresso
na rea florestal.65No 14, 2, admite-se que os Lnder estabeleam normas peculiares
para casos especficos, como a restrio de ingresso na floresta por justa causa, como
evitar danos ou para a proteo dos visitantes, da fauna ou da flora.66Essa lei im
portante, como destaca o julgamento do Tribunal, dada a histrica preocupao em se
regular o uso e a fruio, de carter ldico, dos bens florestais alemes. Recorde-se que,
por muitos sculos, as florestas eram parte integrante de propriedades feudais, cujos
titulares eram muito ciosos quanto entrada de estranhos.
No exerccio de sua competncia legislativa, a Rennia do Norte-Vestflia estabe
leceu restries maiores que a norma federal, como a distino entre trilhas para ca
minhada e trilhas para cavalgada. Contra essa lei, ingressou-se com uma reclamao
constitucional sob fundamento de que se teria violado o 2 , 1, GG, considerando que
o livre desenvolvimento da personalidade no pode ser objeto de cerceamento em seus
mais variegados campos, exceto quando se pe em causa o ncleo essencial da vida
privada e sua proteo.
O Bundesverfassungsgericht, por votao majoritria, admitiu a reclamao, o que,
em tese, implica aceitao de que havia matria constitucional relevante a ser aprecia
da, ainda que, como se definiu no julgamento, a Rennia do Norte-Vestflia houvesse
exercido adequadamente sua competncia legislativa. Na fundamentao, a Corte reco
nheceu as crticas doutrinrias existentes, citando Konrad Hesse, contra sua jurispru
dncia, a qual poderia redundar em uma proteo exagerada. Entretanto, o direito do
reclamante no poderia ser apreciado favoravelmente porque a atividade de cavalgar, a
despeito de compreendida no mbito de proteo do 2 , 1, GG, no poderia ser imune
a restries legislativas do estilo da constante da lei renana. O Tribunal foi taxativo: "A
disposio da lei, como norma estadual, no entra em conflito com as normas federais
do 14 BWaldG e do 27 BNatSchG."67
63 S TF . RE 3 6 3 8 8 9 , Re lat o r Min . D ias To ffo li, Tr ib un al Ple n o , julgado e m 2 .6 .2 0 1 1 , D / e - 2 3 8 1 6 .1 2 .2 0 1 1 .
64 B Ve r fGE 8 0 , 1 3 7 .
65 Das Betreten des Waldes zum Zwecke der Erholung ist gestattet. Das Radfahren, das Fahren mit Krankenfahrsthlen
und das Reiten im Walde ist nur auf Straften und Wegen gestattet. Die Benutzung geschieht auf eigene Gefahr. Dies gilt
insbesondere fiir waldtypische Gefahren.
66 "Die Lnder regeln die Einzelheiten. Sie knnen das Betreten des Waldes aus wichtigem Grund, insbesondere des Forsts-
chutzes, der Wald- oder Wildbewirtschaftung, zum Schutz der Waldbesucher oderzur Vermeidung erheblicher Schden oder
zur Wahrung anderer schutzwrdiger Interessen des Waldbesitzers, einschrnken und andere Benutzungsarten ganz oder
teilweise dem Betreten gleichstellen.
67 Die Vorschrift steht ais landesrechtliche Norm nicht in Widerspruch zu den bundesrechtlichen Vorschriften des 14
BWaldG sowie des 27 BNatSchG.
2 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
O voto dissidente do juiz Dieter Grimm que contm elementos de interesse para a
crtica do modelo amplo de proteo envolvendo a personalidade. Segundo ele, o ato de
cavalgar no protegido pelos direitos fundamentais. Estes so distintos dos demais di
reitos precisamente por terem como objeto a proteo da autonomia, da comunicao e
da integridade dos indivduos em suas relaes de base. Essa especificidade justificaria a
vinculao do legislador aos direitos fundamentais e se conectaria com a noo de digni
dade humana. Conquanto se possa variar circunstancialmente, por efeito do momento
histrico ou de questes funcionais, qual ser o objeto mais ou menos protegido pelos
direitos fundamentais, no se pode imaginar que toda e qualquer conduta humana seja
submetida a esse nvel especial de proteo.68
Para Dieter Grimm, o 2 , 1, GG, tem um mbito de proteo muito amplo, porm,
no a ponto de aambarcar todo e qualquer ato humano. Ademais, o 2 , 1, GG, tem por
finalidade primria proteger o livre desenvolvimento da personalidade e no a liberdade
individual para se fazer ou deixar de fazer algo. Em suma, sem relevncia no haver
proteo de direito fundamental. Grimm entende que o 2 , 1, GG, continente de um
autntico Auffanggrundrecht, capaz de defender os elementos constitutivos da personali
dade, que no receberam o amparo jurdico em direitos especiais.
A crtica de Dieter Grimm digna de maiores reflexes pela dogmtica e pelo Su
premo Tribunal Federal, de modo imediato, sem embarao de servir aos tribunais ordi
nrios, muito susceptveis de se impressionar pela beleza de um mundo jurdico funda-
mentalizado, mas que se pode desviar para um totalitarismo jmfundamental, sem qualquer
proveito e com grandes prejuzos a todos.
4 Concluses
O presente captulo, que se destina a introduzir este livro sobre direitos da persona
lidade, apresentou o estado-da-arte dessa importante provncia do Direito Privado, que
tambm objeto de exame pelo Direito Constitucional, sob a ptica dos direitos funda
mentais. A perspectiva comparatista, da qual se ocupou sua primeira parte, reveladora
dos avanos e de quais so os pontos de interesse doutrinrio em torno dos direitos da
personalidade em diversos pases. Alm da indicao de referncias bibliogrficas, um
convite a que se ultrapassem debates j exauridos e historicamente defasados, tendo-se
um amplo horizonte de temas contemporneos carecedores de investigadores. Esses
termos esto alhures e esto apresentados, ainda que sucintamente.
68 "D as Reiten im Walde geniefit keinen Grundrechtsschutz. Die Grundrechte unterscheiden sich von der Vielzahl sons-
tiger Rechte dadurch, daji sie Integritt, Autonomie und Kommunikation des Einzelnen in ihren grundlegenden Bezgen
schtzen. Eben wegen dieser fundamentalen Bedeutung ihres Schutzobjekts jur eine auf die Menschenwrde gegrndete
Ordnung werden sie aus der Menge der Rechte hervorgehoben und verfassungsrechtlich mit erhhten arantien gegenber
der ffentlichen Gewalt, insbesondere mit Bindungswirkung fiir den Gesetzgeber, ausgestattet. Dabei knnen die Auffas-
sungen darber, was den gesteigerten Schutz der Grundrechte im einzelnen verdient, nach den historischen Umstnden
wechseln. Es ist aber weder historisch noch funktional der Sinn der Grundrechte, jedes erdenkliche menschliche Verhalten
unter ihren besonderen Schutz zu stellen
Pr in cip ais p r o b le mas do s dir e it o s da p e r s o n alidade e e s t ado - da- ar t e da mat r ia n o dir e it o co mp ar ado 2 3
Os trs problemas centrais ds direitos da personalidade - (a) sua unidade ou sua
pluralidade, (b) seu paralelismo com os direitos fundamentais e (c) sua banalizao
como categoria jurdico-histrica69- foram objeto da segunda parte do captulo. Nesse
campo, o dilogo da dogmtica portuguesa e brasileira por demais til, como se pode
observar das fontes citadas. Alm disso, a experincia da jurisdio alem nesse campo
de ser constantemente realada, sem embargo de se evitar, como adverte Marcelo
Neves, a subservincia metdica e o exerccio de sindicncia da paternidade de ideias
importadas por doutrinadores nacionais, algumas vezes incompatveis com a cincia
jurdica portuguesa ou brasileira, o que se d com o risco de se reduzir a atividade do
estudioso a um exame da fidelidade a certas correntes teorticas.70
65 A lgo que t o ca de p e r t o o p r o b le ma da fundamentalizao e x ce s s iv a do s dir e it o s , co mo b e m adv e r t e Paulo
Ot e r o ( A de mo cr acia t o t alit r ia. Cas cais : p r in cip ia, 2 0 0 1 . p . 1 5 3 ) .
70 N EVES , Mar ce lo . En t r e Hidr a e H r cule s : p r in c p io s e r e gr as co n s t it ucio n ais co mo dife r e n a p ar ado x al
do s is t e ma jur dico . Te s e de Tit ular idade - Un iv e r s idade de B r as lia, 2 0 1 0 . p . 1 8 5 .
- y -
1
A dico t o mia e n t r e o s
direitos de personalidade
e os direitos fundamentais
Maurcio Mazur
SU M RIO: 1 Introduo. 2 A dimenso concreta de isolamento entre os
direitos de personalidade e os direitos fundamentais. 2.1 As principais
caractersticas dos direitos de personalidade e dos direitos fundamentais.
2.2 Os direitos de personalidade e o direito geral de personalidade. 2.3
Os direitos fundamentais. 2.4 O contraste das caractersticas. 2.5 Dois
aspectos de incompatibilizao entre os regimes materiais dos direitos
de personalidade e dos direitos fundamentais. 2.6 Aplicao dos direitos
fundamentais nas relaes privadas. 2.6.1 Eficcia direta. 2.6.2 Eficcia
indireta. 2.6.3 Deveres de proteo social. 2.6.4 Convergncia estatista.
2.6.5 Tratamento jurisprudencial. 2.7 Resoluo de conflitos entre di
reitos de personalidade. 3 A dimenso conceituai de conexo entre os
direitos de personalidade e os direitos fundamentais. 3.1 A qualificao
dos direitos de personalidade como direitos fundamentais. 3.1.1 A via
seletiva. 3.1.2 A via universal. 3.1.3 O regime dos direitos fundamentais
anlogos. 3.2 A possibilidade de conteno dos direitos fundamentais
aos direitos de personalidade. 4 Concluso. 5 Bibliografia.
1 Introduo
A lit e r alidade do t t ulo de s t e cap t ulo j de n o t a uma dis t in o e s t r ut ur al e n t r e o s
dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais , e s t ab e le ce n do o p r e s s up o s t o do g
m t ico da in v e s t iga o cie n t fica. Tal as s e r t iv a co r r e n t e n a do ut r in a p o r t ugue s a, que
s e mp r e r e s e r v a e s p a o n as o b r as de dir e it o civ il e de dir e it o co n s t it ucio n al p ar a a dife r e n
cia o e n t r e o s dir e it o s p r iv ado s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s p b lico s fun dame n t ais .
2 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
O isolamento dessas espcies de direitos uma dimenso concreta da sua di-
cotomia, que ser abordada na primeira parte do captulo, onde sero analisadas as
principais caractersticas dos direitos de personalidade e dos direitos fundamentais que
elucidam sua distino e tambm dois aspectos relevantes de incompatibilizo dos
seus regimes materiais, nomeadamente a aplicao dos direitos fundamentais nas rela
es privadas e a resoluo de conflitos entre direitos de personalidade.
Mas a dicotomia entre os direitos de personalidade e os direitos fundamentais
enseja tambm uma dimenso conceituai de conexo no mbito do relacionamento
entre as suas esferas normativas, que ser tratada na segunda parte do captulo. Sem
violar a distino estrutural entre as espcies de direitos, a unidade da ordem jurdica
autoriza que alguns ou todos os direitos de personalidade sejam qualificados como
direitos fundamentais e possibilita que os direitos fundamentais sejam contidos aos
direitos de personalidade, numa operao de transposio (e no de sobreposio) de
uma espcie a outra.
No se tem a inteno de demonstrar a predominncia de uma espcie de direito
sobre a outra, ao invs, prestigia uma dogmtica incentivadora de relacionamento
entre os direitos de personalidade e os direitos fundamentais,1como um valioso instru
mento de reforo tutela geral da personalidade em diferentes ramos do Direito.
As constataes doutrinrias de que a defesa da pessoa foi promovida mais efi
cazmente pela Constituio da Repblica Portuguesa de 1976, dentro da vanguarda do
seu virtuoso catlogo de direitos fundamentais, do que pelo Cdigo Civil Portugus de
1966, que foi acusado at de retrocesso em relao aos direitos originrios do antigo
Cdigo de Seabra, e de que os direitos de personalidade da lei civil tiveram sua aceita
o jurisprudencial assegurada pela fora normativa constitucional,2demonstram que
os direitos de personalidade e os direitos fundamentais devem ser complementarmente
estudados e aplicados.
Mas a inegvel atribuio histrica da tutela geral da personalidade ao direito civil
no pode ser ignorada nem menosprezada numa investigao cientfica que se pretenda
fivel. A origem dos direitos civis de personalidade remonta ao direito antigo grego e
romano,3 enquanto que os direitos fundamentais tutelares de bens da personalidade
1 S o b r e a r e la o e n t r e D ir e it o p r iv ado e D ir e it o p b lico , que co n gr e gam o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s
dir e it o s fun dame n t ais , p r e s cr e v e - s e que : O p r o gr e s s o n o e s t n a ab s o r o de um p e lo o ut r o , mas n a s ua
co o r de n a o e m fr mulas s uce s s iv ame n t e mais p e r fe it as ( A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. O D ir e it o : i n t r o
du o e t e o r ia ge r al: uma p e r s p e ct iv a lus o - b r as le ir a. L is b o a: F un da o Calo us t e Gulb e n kian , 1 9 7 7 . p . 2 8 5 ) .
2 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s Co r de ir o . Os dir e it o s de p e r s o n alidade n a civ il s t ica p o r t ugue s a. In : COR
D EIRO, A n t n io Me n e ze s ; L EITO, L uiz Me n e ze s ; COS TA GOMES , Jan u r io da ( Or g.) . Es t udo s e m h o me
n age m ao p r o f. do ut o r In o cn cio Galv o Te le s . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 2 , v . 1 , p . 3 3 - 3 4 .
3 A kybris gr e ga e a iniuria r o man a s o ge r alme n t e ap o n t adas p e la do ut r in a civ ilis t a co mo o s e mb r ie s do
dir e it o ge r al de p e r s o n alidade . N e s s e s e n t ido , F r an cis co A mar al ( A MA RA L , F r an cis co . D ir e it o civ il: in t r o du
o . 3 . e d. Rio de Jan e ir o : Re n o v ar , 2 0 0 0 , p . 2 4 5 - 2 5 6 ) . J a t e o r ia do s dir e it o s de p e r s o n alidade co n ce b ida
b e m mais t ar de , p e la do ut r in a civ ilis t a do s culo XIX, at r ib uin do - s e a Ot t o Gie r ke a p at e r n idade da de n o mi
n a o . N e s s e s e n t ido , Car lo s A lb e r t o B it t ar ( B 1T A R, Car lo s A lb e r t o . Cur s o de dir e it o civ il. Rio de Jan e ir o :
F o r e n s e Un iv e r s it r ia, 1 9 9 4 . v . 1 , p . 2 0 9 ) .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 2 7
so figuras jurdicas modernas.4A tutela da personalidade pelo direito constitucional
aproveita-se, nesse contexto, da longa evoluo do direito civil. A fonte imediata dos
direitos de personalidade , inegavelmente, o Cdigo Civil, no a Constituio.
essa ideia de legitimao ordinria do direito civil para a tutela geral da persona
lidade que deve orientar o tratamento da dicotomia entre os direitos de personalidade
e os direitos fundamentais, tanto na sua dimenso bsica e concreta de isolamento das
espcies, quanto na sua dimenso refinada e conceituai de conexo entre elas.
O mtodo cientfico utilizado nessa investigao o tcnico-jurdico, de exege
se, dogmtica e crtica de textos normativos, doutrina e jurisprudncia selecionados.
O mbito da investigao o direito interno portugus, embora haja utilizao
pontual de doutrinas civilistas brasileira, italiana e espanhola. Este captulo de
senvolvido em duas partes, cada uma com duas sees, e concludo pela sntese dos
principais argumentos.
2 A dimenso concreta de isolamento entre os direitos de
personalidade e os direitos fundamentais
2.1 As principais caractersticas dos direitos de personalidade e dos
direitos fundamentais
A abordagem das principais caractersticas dos direitos de personalidade e dos di
reitos fundamentais permite uma compreenso mais apurada da sua dicotomia, mas
deve evitar, simultaneamente, um exagerado distanciamento que negue o relaciona
mento intemormativo e uma aproximao artificial quejacabe. por sobrep-los.
A dicotomia entre direitos de personalidade e direitos fundamentais origina-se pe
los distintos ramos do Direito aonde esto positivadas suas normas. Os direitos de
personalidade inserem-se no Direito privado, enquanto os direitos fundamentais, no
Direito pblico.
A distino entre direitos privados e pblicos mais bem concebida pelo critrio
da posio dos sujeitos. O Direito pblico constitui e organiza o Estado e outros entes
pblicos e reeula a soa atividade em posio de supremacia fus nwer). enquanto
o Direito privado regula as si tuaes envolventes de sujeitos em posio de paridade
(incluindo q Estado). Mas vale a ressalva de que tanto o Direito privado no pode ser
considerado o "direito dos egosmos individuais", quanto o Direito pblico no pode
4 Os mar co s jur dico s fun dado r e s do s dir e it o s fun dame n t ais s o o Habeas Corpus Act de 1 6 7 9 , o Bill ofRigths
in gls de 1 6 8 9 , a D e clar a o de D ir e it o s da Vir g n ia de 1 7 7 6 e a D e clar a o do s D ir e it o s do Ho me m e do Ci
dado de 1 7 8 9 ( A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . D ir e it o s fun dame n t ais : in t r o du o ge r al. Es t o r il: Pr in cip ia,
2 0 0 7 . p . 1 3 - 1 4 ) . J o s dir e it o s fun dame n t ais t ut e lar e s de b e n s da p e r s o n alidade fo r am co n s o lidado s e difun
dido s p e la Co n s t it ui o de We imar , de 1 9 1 9 , que p r e cur s o r a das co n s t it ui e s in t e r v e n t iv as e m mat r ias
s o ciais , in clus iv e at in e n t e s s r e la e s jur dico - p r iv adas . N e s s e s e n t ido , Rib e ir o ( RIB EIRO, Jo aquim de S o us a.
D ir e it o do s co n t r at o s : e s t udo s . Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 7 . p . 9 ) .
2 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
ser considerado o "direito das foras de dominao", sendo ambos indispensveis e
complementares entre si, como corolrio da unidade da ordem jurdica.5
Se as diferentes esferas normativas isolam essas duas espcies de direitos, o que
os reaproxima , sem dvida, o seu objeto: bens da personalidade, nas vrias relaes
jurdicas.
A fundo, a personalidade constitui-se como objeto de todas as espcies de direito.
Se no se identifica com os direitos e com as obrigaes jurdicas, a personalidade cons
titui a pr-condio dele, ou seja, o seu fundamento e pressuposto.6
Mas, no caso dos direitos de personalidade e dos direitos fundamentais tutelares
da personalidade, os bens da personalidade so seu objeto imediato; daqueles nas
relaes jurdicas em posio de paridade e destes com alguma posio de supremacia.
2.2 Os direitos de personalidade e o direito geral de personalidade
Os direitos de personalidade do contedo essencial personalidade e por isso
so qualificados como direitos essenciais. Sem eles, a personalidade restaria uma "sus-
cetibilidade irrealizada, destituda de valor concreto. So direitos sem os quais todos
os outros direitos subjetivos perderiam todo o interesse para o indivduo - o que eqi
vale a dizer que, se eles no existissem, a pessoa no existiria como tal.7
A essencialidade dos direitos de personalidade deriva de seu objeto, que mantm
um nexo orgnico com a pessoa e se identifica com bens de maior valor suscetveis de
domnio jurdico: os modos de ser, fsicos ou morais, da pessoa. A vida, a integridade
fsica, a liberdade etc. constituem aquilo que a pessoa . Ao contrrio dos outros bens
tutelados juridicamente, o objeto dos direitos da personalidade no exterior ao sujei
to. Mas essa no exterioridade do objeto no implica sua identidade com o sujeito,
visto que o modo de ser da pessoa no a mesma coisa que a pessoa.8
A preeminncia dos direitos de personalidade relativamente aos outros direitos
subjetivos decorre da sua mais direta projeo de pressupostos fundantes da ordem ju
rdica. A dignidade da pessoa humana, que no criatura dessa ordem jurdica, implica
5 Os o ut r o s do is cr it r io s mais r e le v an t e s de clas s ifica o de dir e it o s p r iv ado s e p b lico s s o o do in t e r e s s e e
o da qualidade do s s uje it o s . S e gun do o cr it r io do in t e r e s s e , o D ir e it o p b lico v is ar ia s at is fa o de in t e r e s s e s
p b lico s , e n quan t o o D ir e it o p r iv ado , a s at is fa o de in t e r e s s e s p ar t icular e s . O cr it r io in s us t e n t v e l p o r que
o in t e r e s s e p b lico t r aduz- s e e m in t e r e s s e s p r iv ado s e o s in t e r e s s e s p ar t icular e s s o p r o t e gido s p o r que h
um in t e r e s s e p b lico n e s s e s e n t ido . J o cr it r io da qualidade do s s uje it o s t o ma p b lico o dir e it o que r e gula
s it ua e s e m que in t e r v e n h a o Es t ado o u qualque r e n t e p b lico e p r iv ado , _o dir e it o que r e gula s it ua e s do s
p ar t icular e s . O cr it r io in ace it v e l p o r que o Es t ado e o s de mais e n t e s p b lico s p o de m at uar co mo qualque r
o ut r o p ar t icular quan do de s p ido do p o de r de imp r io . N o co n jun t o da cit a o do t e x t o e de s t a e n t r ada, Jo s
de Oliv e ir a A s ce n s o ( A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. O D ir e it o , cit ., p . 2 8 3 - 2 8 5 ) .
6 CUPIS , A dr ian o de . Os dir e it o s da p e r s o n alidade . Tr adu o de A dr ian o Ve r a Jar dim e A n t o n io Migue l
Cae ir o . L is b o a: L iv r ar ia Mo r ais Edit o r a, 1 9 6 1 . p . 1 5 .
7 CUPIS , A dr ian o de . Op . cit . p . 1 7 .
a CUPIS , A dr ian o de . Op . cit . p . 2 2 - 2 5 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 2 9
a atribuio de direitos que assegurem uma vida social digna pessoa humana. Esses
direitos criam um espao mnimo para o livre desenvolvimento da personalidade e de
mandam a mxima intensidade de tutela jurdica.9
Nesse contexto elementar, os direitos de personalidade podem, ento, ser concei
tuados como direitos subjetivos que tm por objeto bens da personalidade. Tal con
ceito demanda a compreenso de direitos subjetivos como permisses normativas de
aproveitamento de bens determinados e de bens de personalidade como figuraes au
tnomas relativas aos seguintes aspectos diretamente ligados ao ser humano: (1) bio
lgicos: vida, integridade fsica, sade, necessidades vitais (sono, repouso, alimentao,
vesturio) etc.; (2) morais: integridade moral, identidade, nome, imagem, intimidade
etc.; (3) sociais: famlia, bom nome, reputao, respeito etc.10
A existncia de um direito geral de personalidade controvertida na doutrina
portuguesa.11
A negativa da sua condio de autntico direito subjetivo por falta de caractersticas
tcnicas suficientes o argumento corrente da tese de inadmissibilidade. uma per
misso genrica que no tem objeto especfico, muito embora tenha utilidade como
expediente dogmtico. A jurisprudncia portuguesa refere com frequncia ao art. 70s do
Cdigo Civil para retirar dele "direitos especiais" a proteger, como os direitos ao sono,
ao descanso, integridade fsica, sade, ao bem-estar.12
O direito geral de personalidade uma figura germnica, concebida a partir de
norma do Cdigo Civil que dispe sobre a responsabilidade civil por leso a bens de
personalidade arrolados e de "outros direitos, situada na fundao constitucional da
ordem jurdica sobre a dignidade humana. Ocorre que mesmo na Alemanha ele no
entendido como um direito de personalidade a mais, o que o reconduz a um princpio
orientador na formulao de direitos singulares, concretizando posies consolidadas
pela prtica.13
A admisso de um direito geral de personalidade tambm implicaria algumas des
vantagens. Como conseqncia da desmesurada extenso de seu contedo, esse direito
pode acabar surpreendendo terceiros pelas conseqncias que podem dele ser extra
das num caso concreto. Alm disso, a possibilidade de aplicao concreta diretamente
9 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o civ il: t e o r ia ge r al. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 1 9 9 7 . v . 1 , p . 6 4 .
10 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . Tr at ado de dir e it o civ il p o r t ugus . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 1 . v . 1 ,
t . 3 , p . 2 6 .
11 A t me s mo as p o s i e s ado t adas p e las duas mais imp o r t an t e s acade mias jur dicas p o r t ugue s as s o in
co n cili v e is . A ce it ado p e la F aculdade de D ir e it o de Co imb r a, o dir e it o ge r al de p e r s o n alidade n e gado p e la
F aculdade de D ir e it o de L is b o a. Es s a cr it e r io s a e e s t imulan t e div e r gn cia acadmica p o de s e r co n fe r ida n as
o b r as do s Pr o fe s s o r e s Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o Cap e lo de S o us a ( O dir e it o ge r al de p e r s o n alidade ) ,
da Es co la de Co imb r a, e Jo s de Oliv e ir a A s ce n s o ( D ir e it o civ il: t e o r ia ge r al) , da Es co la de L is b o a.
12 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . Tr at ado de dir e it o civ il p o r t ugus , cit ., p . 3 3 .
13 N e s s e s e n t ido , cit an do Kar l L ar e n z e He in z Hub h e r , Jo s de Oliv e ir a A s ce n s o ( A S CEN S O, Jo s de Oli
v e ir a. D ir e it o civ il: t e o r ia ge r al, cit ., p . 7 9 - 8 1 ) .
3 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
a partir da figura geral, cobrindo os casos no expressamente previstos em lei, no
favorece a tipificao de modalidades de interveno e abala a segurana jurdica.14
O modelo alternativo a um direito geral de personalidade portugus consiste na
delineao de novos direitos parcelares de personalidade, em regime de numerus apertus.
O fundamento para esse processo est no artigo 70a, n21, do Cdigo Civil, que deman
da a tutela de todas as manifestaes da dignidade humana. Os concretos direitos de
personalidade seriam derivados do direito geral de personalidade, que atuaria como
princpio e no como "superdireito. A vantagem em termos de segurana jurdica
inegvel, na medida em que permite a formao de categorias socialmente reconhec
veis que evita o efeito surpresa e permite uma meditao generalizadora isenta (ou ao
menos distanciada) das influncias emotivas do caso concreto. No h inveno de
direitos, mas o reconhecimento de que cada uma das manifestaes de personalidade
est contemplada dentro do princpio da tutela da dignidade humana, o que permite a
afirmao de um direito singular que a proteja.15
Mas a tutela parcelar das expresses de personalidade, a pretexto de conceder ao
indivduo um bem especfico que carece ou julga carecer, pode acabar por limit-la.
A consagrao de um direito geral de personalidade atende aos modernos anseios de
unidade e expansividade da personalidade humana, atuando simultaneamente como
matriz, referncia e complemento dos direitos especiais de personalidade.16
O direito geral de personalidade um autntico direito subjetivo17porque confere
ao indivduo o poder de exigir dos demais uma conduta normativa positiva ou negativa
e a possibilidade de recurso aos tribunais em caso de recusa dessa conduta. O objeto
de tal direito que deve ser compreendido como uma clusula geral, a personalidade
humana, juridicamente tutelada. Os elementos de indefinio e de incerteza prelimi
nares prprios das clusulas gerais, ao invs de retirarem sua subjetividade, permitem,
em sistemas jurisprudenciais valorativos,18conferir ao direito geral de personalidade
maleabilidade e versatilidade de aplicao a situaes novas e complexas.19
h A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o civ il: t e o r ia ge r al, cit ., p . 7 8 - 7 9 .
is A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o civ il: t e o r ia ge r al, dt ., p . 8 0 .
is CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o . O dir e it o ge r al de p e r s o n alidade . Co imb r a:
Co imb r a Edit o r a, 1 9 9 5 . p . 8 4 - 8 5 .
17 N e s s e co n t e x t o , o dir e it o s ub je t iv o de v e s e r e n t e n dido co mo uma gar an t ia de ce r t a p o s i o fav o r v e l a
um dado s uje it o . N o s e t r at a, p o is , de dir e it o o b je t iv o , que p r e o r de n a a v ida s o cial co mo uma r e alidade que
n lo s e e n ce r r a n a t it ular idade de n in gu m. N e s s e s e n t ido , Jo s de Oliv e ir a A s ce n s o ( A S CEN S O, Jo s de
Oliv e ir a. O D ir e it o , cit ., p . 3 5 ) .
18 A p as s age m a uma jur is p r udn cia de v alo r a o e n co n t r a s e n t ido n o r e co n h e cime n t o de v alo r e s o u cr i
t r io s de v alo r a o s up r ale gais o u 'p r - p o s it iv o s ' que s ub jaze m s n o r mas le gais e p ar a cuja in t e r p r e t a o
e co mp le me n t a o le g t imo o us o , e m de t e r min adas co n di e s . Par a e s s a fin alidade p o s s v e l in v o car o s
valores positivados nos direitos fundamentais, r e co r r e r a uma lo n ga tradio jusfilosfica, a argumentos lingsticos o u
ao e n t e n dime n t o de que a maio r p ar t e do s juize s t e m de que s ua mis s o ch e gar a decises 'justas ( L A REN Z ,
Karl. Me t o do lo gia da cin cia do D ir e it o . Tr adu o de Jo s L ame go . 4 .e d. L is b o a: F un da o Calo us t e Gul-
b e n kian , 2 0 0 5 , p . 1 7 1 ) .
9 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o . Op . cit . p . 9 3 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 3 1
O direito geral de personalidade deve ser concebido como um direito de autode
terminao tico-existencial, que no pode ser restringido, no seu contedo de dig
nidade humana, por intermdio da autodeterminao tico-poltica da comunidade. O
primado da autodeterminao tico-existencial sobre a autodeterminao tico-poltica
pode significar a enunciao de um princpio geral de resoluo dos casos de conflito en
tre direitos e interesses constitucionalmente protegidos ou a prpria indisponibilidade
do contedo essencial do direito geral de personalidade.20
A consagrao de um direito geral de personalidade decisiva para a atribuio da
tutela geral da personalidade ao Direito privado e reala a dicotomia entre os direitos
de personalidade e os direitos fundamentais at mesmo em relao aos bens tutelados.
Isso porque no existe no mbito do direito constitucional um similar direito funda
mental geral de personalidade, como expressamente previsto no artigo 70 do Cdigo
Civil.21A proteo de bens da personalidade jd e i x a claro que ao direito constitucional
interessa apenas a tutela parcelar de algumasi expresses jdapersonalidade humana
mais intensamente iafS^ s"u' ' kmeaaaas nas relaSes de supremacia do Estado. Por
outro lado, ao direito civil interessa ututela integral da personalidade humana, o gue
se faz pela clusula aberta do direito geral de personalidade.
2.3 Os direitos fundamentais
Os direitos fundamentais so situaes jurdicas das pessoas perante os poderes
pblicos consagrada na Constituio,' visam proteger poderes , eesferas de.liberdade
das pessoas na sua relao com o Estado, por meio do impedimento de ingerncias,
dalmpsiao de deveres de proteo e da configurao da prpria ordem jurdica.22Na
especificidade, asseguram essa proteo tambm a alguns bens da personalidade.
Muito embora seja possvel, desde logo, diferenciar os direitos de personalidade
dos direitos fundamentais pelas relaes originariamente tuteladas, inegvel sua afini
dade por uma parcial sobreposio ao nvel da pessoa humana de dois planos jurdico-
-gnoseolgicos: o de direito civil e o de direito constitucional. A Constituio da Rep
blica Portuguesa no apenas preordenou todo o ordenamento jurdico-constitucional
ao respeito e ao desenvolvimento da dignidade da pessoa humana, como tambm
alargou a constitucionalizao dos direitos de personalidade. Mas nem todos os direitos
de personalidade constituem direitos fundamentais e, da mesma forma, nem todos os
direitos fundamentais so direitos de personalidade.23
20 N e s s e s e n t ido , cit an do Mar t in Ko p p e mo ck, Pin t o Oliv e ir a ( PIN TO OL IVEIRA , N un o Man ue l. O dir e it o
ge r al de p e r s o n alidade e a s o lu o do dis s e n t ime n t o : e n s aio s o b r e um cas o de "co n s t it ucio n aliza o "
do dir e it o civ il. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 2 . p . 9 3 - 9 4 ) .
21 S it uan do a t ut e la ge r al de p e r s o n alidade : "O dir e it o ge r al de p e r s o n alidade s o b r e t udo uma in s t it ui o
de D ir e it o Civ il, e mb o r a in t imame n t e co n e x io n ada co m o ut r o s r amo s da n o me n clat ur a jur dica, p ar t icular
me n t e co m o dir e it o p e n al e o D ir e it o Co n s t it ucio n al" ( CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o .
Op . cit . p . 9 2 ) .
22 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . Op . cit . p . 2 1 - 2 2 .
23 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o . Op . cit . p . 5 8 1 - 5 8 2 .
3 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Ainda que tenham por objeto bens de personalidade, os direitos fundamentais
distinguem-se formalmente dos direitos civis pelo critrio da fonte, como direitos
positivados na Constituio com uma tutela jurdica bastante reforada. A distino
importante para esclarecer os competentes regimes. Os direitos semelhantes ou afins
aos direitos de personalidade traduzem, muitas vezes, meras sobreposies concei
tuais. Por exemplo, o direito vida um direito de personalidade e, simultaneamente,
um direito originrio (de aquisio pr-positiva), do homem (de titularidade univer
sal), personalssimo (por intransmissibilidade), pessoal (por no patrimonialidade) e
fundamental.24
Mas que-fique-bem claro: os direitos fundamentais tutelares da personalidade no
sio simplesmente direitos civis 3e~prenHda.de positivados na Constituio. Ainda
que o direito constitucional sirva-se da evoluo de institutos civis de personalidade, a
questo no se restringe a uma mera transposio de normas do Direito privado para o
pblico. Os direitos de personalidade so concebidos pelo direito civil para as relaes
entre partictriare^ enquantci os direitos fundamentais so concebidos para as relaes
entre particulares e o ustado, embora uns e outros possam vincular sujeitos U iversos
conforme s a ^ p s i de' paridade ou supremacia. Mesmo que os enunciados norma-
tivs sjam idnticos, as normas de direito civil e direito constitucional jamais tero o
mesmo contedo porque regulam situaes jurdicas diversas.
Apesar do risco de vulgarizar o relacionamento normativo, a positivao constitu
cional de direitos de personalidade um fenmeno que sempre deve ser destacado,
j que ocasiona intensas conseqncias jurdicas, que so comuns a todos os direitos
fundamentais: (1) tornam-se realidades jurdicas operativas e deixam de ser meras
proclamaes morais ou polticas; (2) tomam-se garantias jurdicas (trunfos) contra
o legislador, proibido de afetar inconstitucionalmente o seu contedo; (3) vinculam
diretamente todos os poderes pblicos (incluindo o poder de reviso constitucio
nal), constituindo, alm disso, parmetro material das decises dos rgos legislativos,
administrativos e jurisdicionais; (4) passam a dispor de um conjunto de instrumentos
sancionatrios, que vo desde os mecanismos de fiscalizao de constitucionalidade
at a presena de meios especficos de tutela25 (direito de resistncia, queixa constitu
cional, recursos e peties constitucionais, medidas cautelares etc.).26
O ingresso de direitos de personalidade no normativo constitucional gera imedia
tamente o reforo de sua tutela, que supera o mbito das relaes particulares e passa a
24 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . Tr at ado de dir e it o civ il p o r t ugus , cit ., p . 2 7 .
25 Os dir e it o s de p e r s o n alidade j dis p e m de uma t ut e la e s p e cial, acr e s cida me s mo s e m a e v e n t ual p o s it iv a
o co n s t it ucio n al que o s qualifique co mo dir e it o s fun dame n t ais . Po r fo r a do s me io s ge r ais de t ut e la, a le s o
e a ame a a de le s o a e s s e s dir e it o s s o il cit as e acar r e t am a r e s p o n s ab ilidade civ il do o fe n s o r ( CC, 7 0 a, n a 1 ) .
J p o r co n t a da t ut e la e s p e c fica, o le s ado p o de r e que r e r as p r o v idn cias ade quadas p ar a e v it ar a co n s uma o
da ame a a o u at e n uar o s e fe it o s da o fe n s a j co me t ida ( CC, 7 0 , n " 2 ) . S o p r o v idn cias aut n o mas e n o
e s p e cificadas que de v e r o s e r ade quadas n o cas o co n cr e t o . Par a faze r ce s s ar uma o fe n s a at ual p e r man e n t e , o
le s ado t e m ain da s ua dis p o s i o a me dida caut e lar de p e n de n t e de um p r o ce s s o p r in cip al que e n v o lv a o di
r e it o acaut e lado ( CPC, 1 4 7 4 a e 1 4 7 5 ) . N e s s e s e n t ido , Jo s de Oliv e ir a ( A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o
civ il: t e o r ia ge r al, cit ., p . 8 7 - 8 8 ) .
26 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . Op . cit . p . 2 2 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 3 3
atuar tambm contra ofensas ou ameaas provindas dos entes pblicos. A vinculao do
legislador aos direitos fundamentais impede-o de criar normas lesivas s posies sub
jetivas dos correspondentes direitos de personalidade. A vinculao judicial demanda
que o alcance normativo dos preceitos constitucionais seja levado em conta nos litgios
de direitos de personalidade, que agora devem receber uma interpretao conforme
Constituio. Para alm disso, os direitos de personalidade assumem a posio de di
reitos de defesa contra a ingerncia estatal lesiva, acarretando a responsabilidade civil
do agente pblico em caso de violao (CRB 22a).27
2.4 O contraste das caractersticas
Numa sntese das caractersticas mais referidas por importantes obras de direito
civil,28os direitos de personalidade so: (1) subjetivos, enquanto normas jurdicas
que permitem ao indivduo o aproveitamento imediato de determinados bens;29(2) pri
vados, na medida em que satisfazem aspiraes e necessidades prprias do indivduo
e compreendidas nas suas relaes particulares;30(3) universais, por serem atribudos
a todos os indivduos, sem condicionantes, bastando-lhes a qualidade de pessoa jurdi
ca; (4) absolutos, porque estabelecem uma relao entre o indivduo e a generalidade
de sujeitos, que assume a obrigao jurdica de no les-los;31 (5) no patrimoniais,
porque nunca contm em si uma utilidade imediata de ordem econmica;32 (6) ina
27 RIB EIRO, Jo aquim de S o us a. Op . cit . p . 1 4 - 1 7 .
28 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . Tfcat ado de dir e it o civ il p o r t ugus , cit ., p . 3 3 - 3 4 ; CUPIS , A dr ian o de .
Op . cit . p . 2 6 - 3 1 e 5 0 - 5 3 ; PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Te o r ia ge r al do dir e it o civ il. 3 .e d. Co imb r a:
Co imb r a Edit o r a, 1 9 9 6 . p . 8 7 e 2 1 1 - 2 1 3 .
29 "Os dir e it o s de p e r s o n alidade co n s t it ue m uma cat e go r ia aut n o ma n o s is t e ma do s dir e it o s s ub je t iv o s ,
que de r iv a do car t e r de essencialidade, da configurao particular do objeto e do carter especial de sua fisionomia. S
n as mais v as t as cat e go r ias do s dir e it o s s ub je t iv o s ( dir e it o s p r iv ado s , n o p at r imo n iais , ab s o lut o s ) p o de mo s
in t e gr ar o s dir e it o s da p e r s o n alidade " ( CUPIS , A dr ian o de . Op . cit . p . 3 1 ) .
30 "A lgun s dir e it o s da p e r s o n alidade s o direitos subjetivos pblicos, p ar t icular me n t e o s ch amado s dir e it o s da
lib e r dade civ il. F aze n do p ar t e da co le t iv idade e s t at al, o in div duo t e m uma p ar t icular e x ign cia de lib e r dade .
E p o r que aque la co le t iv idade p o de r ia o p r imi- lo co m o s e u p o de r , e le s e n t e a n e ce s s idade co n t r r ia. En t o
in t e r v m n o r mas de dir e it o p b lico p ar a t ut e lar a s at is fa o daque la as p ir a o co lo cada e m face do Es t ado "
( CUPIS , A dr ian o de . Op . cit . p . 2 7 - 2 8 ) .
31 "S ab e mo s p o r m que o car t e r ab s o lut o n o s ign ifica que e s t e s dir e it o s n o s e jam s us ce t v e is de limi
t a e s . N e s t e s e n t ido n o h n e n h um dir e it o ab s o lut o , p o is t o do dir e it o n e ce s s ar iame n t e limit ado . Os
dir e it o s de p e r s o n alidade , que s o o s mais imp o r t an t e s dir e it o s s ub je t iv o s , n o e s cap am r e gr a [...] Os limi
t e s in t r n s e co s s o o s de mar cado s p o r le i ao e s t ab e le ce r o co n t e do do s dir e it o s [...] Os limit e s e x t r n s e co s
r e s ult am da n e ce s s idade de co n juga o co m o ut r as s it ua e s p r o t e gidas . N o h dir e it o de p e r s o n alidade , p o r
mais r e le v an t e , que n o t e n h a p e lo me n o s de s e r co n jugado co m o s dir e it o s de p e r s o n alidade alh e io s . Par t i
cular me n t e , imp o r t an t e ace n t uar que o car t e r absoluto do dir e it o de p e r s o n alidade n o p o de s ign ificar uma
ar b it r ar ie dade r e co n h e cida ao t it ular . A t p o r e s t ar mo s e m do m n io e m que o fun do t ico uma co n s t an t e , a
ar b it r ar ie dade de v e e s t ar mais afas t ada que e m qualque r o ut r o s e t o r do D ir e it o ( A S CEN S O, Jo s de Oliv e i
r a. D ir e it o civ il: t e o r ia ge r al, cit , p . 8 3 - 8 4 ) .
32 Uma das co n s e qn cias jur dicas da car act e r s t ica n o p at r imo n ial do s dir e it o s da p e r s o n alidade que e m
s i n o s o p as s v e is de e x e cu o fo r ada. S o me n t e o dir e it o de r iv ado in de n iza o do dan o , que aut n o mo
e m r e la o ao s co r r e s p o n de n t e s dir e it o s de p e r s o n alidade v io lado s , p at r imo n ial e t r an s mis s v e l e , p o r t an t o ,
p as s v e l de e x e cu o fo r ada. N e s s e s e n t ido , CUPIS , A dr ian o de . Op . cit . p . 5 9 .
3 4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
t o s , e m ge r al, n o s e n t ido de o r igin r io s , 33 p o r que e s s e n ciais e m r e la o p e s s o a;34 ( 7 )
p e r p t uo s , p o r que s e co n s t it ue m co m o n as cime n t o da p e s s o a, s o in e r e n t e s dur an t e
s ua v ida35 e e x t in gue m- s e ap e n as co m a s ua mo r t e ;36 ( 8 ) in dis p o n v e is , 37 p o r fo r a da
e s s e n cialidade de s e u o b je t o , un ido ao s uje it o o r igin r io p o r um n e x o o r gn ico , que o s
t o r n a in s e p ar v e is .38
In ician do p e las afin idade s n e s s as car act e r s t icas ar r o ladas , o s dir e it o s fun dame n
t ais , co mo o s de p e r s o n alidade , s o : ( 1 ) n o p at r imo n iais ; ( 2 ) p e r p t uo s ; ( 3 ) in dis
p o n v e is .
A un iv e r s alidade , ap e s ar de r e fe r ida co mo uma das car act e r s t icas do s dir e it o s
fun dame n t ais e m imp o r t an t e s o b r as de dir e it o co n s t it ucio n al, 39 de v e s e r r e s s alv ada.
Is s o p o r que n e m t o das as p e s s o as s o t it ular e s de t o do s o s dir e it o s fun dame n t ais . H
33 Mais b e m co mp r e e n dido s como um c r culo de dir e it o s n e ce s s r io s ; um co n t e do m n imo e imp r e s cin
d v e l da e s fe r a jur dica de cada p e s s o a. N e s s e s e n t ido , Mo t a Pin t o ( PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Op . cit .
p . 8 7 ) .
34 To do s o s dir e it o s in at o s s o dir e it o s da p e r s o n alidade , mas h dir e it o s que n o t m p o r b as e o s imp le s
p r e s s up o s t o da p e r s o n alidade e que t o dav ia, uma vez revelados, adquir e m car t e r de e s s e n cialidade . To me - s e
co mo e x e mp lo o dir e it o mo r al de aut o r , que t e m e s s e n cialidade at e n uada, n a me dida e m que o fim de as s e
gur ar um v alo r co n cr e t o p e r s o n alidade n o ch e ga a e x igir n e ce s s ar iame n t e e s p o r s i a s ua e x is t n cia, mas
s imp le s me n t e a continuao de s t a, uma v e z que e le s s o revelados p e la e v e n t ual e x is t n cia de uma figur a que
acr e s ce ao p r e s s up o s t o da p e r s o n alidade ( CUPIS , A dr ian o de . Op . cit . p . 2 0 - 2 1 ) .
35 S o b r e p e r p e t ua o versus in r cia: "O o b je t o de algun s dir e it o s da p e r s o n alidade de t al n at ur e za que n o
s e p o de co n ce b e r a inrcia de s e u t it ular . A v ida, p o r e x e mp lo , um mo do de s e r da p e s s o a, o qual, e n quan t o
e la s ub s is t e , s up e n e ce s s ar iame n t e um go zo da p r p r ia p e s s o a. Mas h o ut r o s cujo o b je t o e x ige uma at iv ida
de de go zo que s e p o de e x e r ce r o u n o , co mo o dir e it o ao n o me " ( CUPIS , A dr ian o de . Op . cit . p . 5 9 ) .
36 ace r t ada a co n s t at a o de que a t ut e la da p e r s o n alidade do in div duo ap s s ua mo r t e t e m a v e r co m a
p r o t e o da s e n s ib ilidade do s v iv o s . N e s s e s e n t ido , Me n e ze s Co r de ir o ( CORD EIRO, A n t n io de Me n e ze s .
'Rat ado de dir e it o civ il p o r t ugus , cit ., p . 3 4 ) .
37 A in dis p o n ib ilidade imp lica t r s as p e ct o s : 1 ) S o intransmissveis. N o p o de m s e r o b je t o de ce s s o [...] n o
p o de m t amb m s e r o b je t o de s uce s s o ; 2 ) S o irrenundveis. O t it ular p o de r e n un ciar ao e x e r c cio de um dir e i
t o de p e r s o n alidade , mas n o p o de r e n un ciar ao dir e it o e m s i; 3 ) S o s e s cas s ame n t e restrngveis at r av s do
n e gcio jur dico [...] Po de h av e r limit e s co n v e n cio n ais ao s dir e it o s de p e r s o n alidade , al m do s limit e s le gais .
Mas e s t e s limit e s e s t o s uje it o s a r e s e r v as ap e r t adas ." O limit e das r e s t r i e s n e go ciais e s t co n t ido e de v e
s e r afe r ido n a cl us ula ge r al da o r de m p b lica ( CC, 8 1 a, n a 1 ) . Me s mo a aut o r iza o l cit a p ar a a limit a o de
um dir e it o de p e r s o n alidade s e mp r e r e v o g v e l, s e m p r e ju zo da in de n iza o p e lo dan o caus ado s le g t imas
e x p e ct at iv as da o ut r a p ar t e , n um do s p o uco s cas o s de r e s p o n s ab ilidade civ il p o r at o s l cit o s . N o co n jun t o da
cit a o do t e x t o e de s t a e n t r ada, Jo s de Oliv e ir a A s ce n s o ( A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o civ il: t e o r ia
ge r al, cit ., p . 8 5 - 8 6 ) .
38 "A in dis p o n ib ilidade imp e de o de s p o jame n t o do s dir e it o s de p e r s o n alidade e s s e n ciais a uma p e s s o a, mas
n o r e t ir a a faculdade de co n s e n t ime n t o e m uma le s o de t e r min ada, que n o e x t in gue o dir e it o e b e n e ficia um
de s t in at r io . Mas a limit a o v o lun t r ia de v e s e r co n fo r me ao s p r in c p io s da o r de m p b lica ( ar t igo s 8 1 s e 2 8 0 s
do Cdigo Civ il) , o que v e da o co n s e n t ime n t o n a le s o do dir e it o v ida, e mb o r a p e r mit a, e m p r in c p io , uma
limit a o v o lun t r ia ao dir e it o in t e gr idade f s ica, co mo n as cir ur gias e s t t icas o u n o s jo go s v io le n t o s , b e m
co mo ao dir e it o lib e r dade n a s ua e s p cie de at iv idade s p r o fis s io n ais , mat e r iais o u jur dicas , e ao s dir e it o s
h o n r a, r e s e r v a s o b r e a in t imidade e image m. O co n s e n t ime n t o do le s ado n o afas t a a ilicit ude n e m is e n t a
a r e s p o n s ab ilidade civ il, mas p e r t in e n t e a in v o ca o do ar t . 5 7 0 s do Cdigo Civ il p ar a r e duzir o u me s mo
e x cluir a in de n iza o , s e m p r e ju zo da r e s p o n s ab ilidade cr imin al ( PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Op . cit .
p . 2 1 1 - 2 1 3 ) .
39 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . Op . cit . p . 3 2 ; MEN D ES , Gilmar F e r r e ir a; COEL HO, In o cn cio M r t ir e s ;
B RA N CO, Paulo Gus t av o Go n e t . Cur s o de dir e it o co n s t it ucio n al. 4 . e d. S o Paulo : S ar aiv a, 2 0 0 9 . p . 2 7 3 - 2 7 4 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 3 5
vrios direitos fundamentais atribudos somente a algumas categorias de pessoas. Os
direitos dos trabalhadores, por exemplo. A afirmao da universalidade como caracte
rstica dos direitos fundamentais correta somente quando refere especialidade das
normas protetoras de bens da personalidade. Todos os direitos fundamentais tutelares
da personalidade so universais, na medida em que basta a qualidade de pessoa para
que sejam atribudos ao seu titular.
J sem maior hesitao doutrinria, os direitos fundamentais diferenciam-se dos
direitos de personalidade porque no so: (1) subjetivos; (2) privados; (3) inatos;
(4) absolutos.
Os direitos fundamentais no so todos nem so sempre direitos subjetivos.
Alm da dvida de partida quanto qualificao de alguns direitos fundamentais como
subjetivos,40a existncia de um direito subjetivo, tutelvel judicialmente, sempre de
pendente da aferio no caso concreto de sua necessidade para a realizao do contedo
essencial do direito fundamental de certo indivduo, na proporo da sua importncia
para a salvaguarda da dignidade da pessoa humana.41
Os direitos fundamentais no so privados, pertencendo ao ramo do Direito p
blico, regulando essencialmente a relao dos particulares com o Estado em posio de
supremacia.
Os direitos fundamentais no so todos direitos inatos, a exemplo das garantias
processuais. Mas todos os direitos fundamentais tutelares da personalidade so essen
ciais, portanto inatos.
Os direitos fundamentais no so direitos absolutos porque, primordialmente,
opem-se ao Estado. So direitos relativos, ainda que de forma diversa da estabelecida
no Direito privado, porque no pressupem uma relao certa e determinada entre
dois sujeitos, mas uma relao entre cada indivduo da comunidade jurdico-poltica e
o Estado.42
Como visto, a aproximao e o distanciamento entre os direitos de personalidade e
os direitos fundamentais dependem basicamente do objeto destes ltimos. Isso porque
os bens estabelecem as caractersticas dos direitos que os tutelam. Quando os direitos
fundamentais so tutelares de bens da personalidade, aproximam-se dos direitos de
personalidade; ao invs, quando so tutelares de outros bens, distanciam-se. E so mui
tos os direitos fundamentais com objetos diferentes de bens da personalidade, ainda
que tambm sejam direitos pessoais, como, em geral, os direitos processuais, os direi
tos polticos, os direitos dos trabalhadores, os direitos econmicos, sociais e culturais e
os direitos fundamentais dos administrados.
Mesmo quando aproximados pela tutela de bens da personalidade, uns e outros se
distinguem quanto ao sentido, projeo e perspectiva. Os direitos fundamentais
pressupem relaes de poder, os direitos de personalidade, relaes de iguHcf.
40 N e s s e s e n t ido , Jo r ge Mir an da ( MIRA N D A , Jo r ge . Op . cit . p . 6 5 ) .
41 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a. Os dir e it o s fun dame n t ais n a Co n s t it ui o p o r t ugue s a de 1 9 7 6 . 4 . e d.
Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 9 . p . 1 4 4 - 1 4 9 .
42 MIRA N D A , Jo r ge . Op . cit . p . 1 1 7 .
3 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade 1 Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Os direitos fundamentais tm uma incidncia publicstica imediata, os direitos de
personalidade, uma incidncia privatstica. Os direitos fundamentais pertencem ao
domnio do direito constitucional, os direitos de personalidade, ao do direito civil.43
Na essncia, a concepo dos direitos fundamentais insere-se no mbito da relao
de poder travada entre o Estado e o indivduo ou o cidado (como pessoas qualifica
das), enquanto os direitos de personalidade so gerados a partir de emanaes da
personalidade humana em si, valorativamente prvias a preocupaes de estrutura
o poltica.44
2.5 Dois aspectos de incompatibilizao entre os regimes materiais dos
direitos de personalidade e dos direitos fundamentais
A dicotomia entre os direitos de personalidade e os direitos fundamentais irradia-
-se para seus regimes materiais, incompatibilizando-os em diversos aspectos, num fe
nmeno jurdico que apenas confirma o isolamento j denotado pelo contraste de suas
caractersticas.
A incompatibilidade entre os regimes materiais dos direitos de personalidade e
dos direitos fundamentais ser tratada aqui somente no mbito das relaes privadas,
entre sujeitos em posio de paridade, sob as questes problemticas de aplicao dos
direitos fundamentais e de:reQ H Q-^ _^ jiflitosl entre direitos de persondidadeT-
As duas questes so centrais para o debate em tomo da prenunciada constitu
cionalizao do direito civil e sua abordagem no mbito da tutela da personalidade
oportuniza a melhor compreenso e o equacionamento luz de uma dogmtica civilista
apropriada, livre da interferncia de um constitucionalismo desorientado.
No primeiro aspecto de incompatibilizao entre os regimes materiais, destacam-
-se os percalos, riscos e precaues dogmticos envolvidos na aplicao dos direitos
fundamentais nas relaes privadas, que no podem simplesmente ser transplantados
de seu ambiente pblico sem que violem a autodeterminao individual.
No segundo aspecto de incompatibilizao entre os regimes materiais, interessam
as razes da especificidade do mtodo de resoluo de conflitos entre direitos de per
sonalidade em contraposio ao mtodo de resoluo de conflitos entre direitos consti
tucionais e os critrios mais relevantes para sua correta operao.
2.6 Aplicao dos direitos fundamentais nas relaes privadas
A problemtica de aplicao dos direitos fundamentais nas relaes privadas deve
ser precedida pela advertncia de que no h direitos fundamentais destinados ex
43 MIRA N D A , Jo r ge . Op . cit . p . 6 9 .
44 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o Civ il: t e o r ia ge r al, cit ., p . 6 7 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 3 7
clusivamente aos particulares. No so concebidos para regular as relaes privadas.
A vinculacctde..entidades privadas aos direitos fundamentais , sempre, derivada e
acessria da originria e principal das entidades pblicas. Os direitos fundamentais
constituem garantias jurdicas dirigidas contra o Estado ou principalmente contra o
Estado. Essa regra tem justificao histrica e filosfica, sem verdadeira exceo, s
"adoamentos".45U m direito fundamental que tenha como nico sujeito passivo enti
dades privadas no um verdadeiro direito fundamental ou ento no pode deixar de
ter como destinatrio principalo Estado. O direito de antena (CRP, 409, n*3)eo direito
greve (CRR 57s), usualmente citados como antteses, tm como destinatrio o Estado,
no as empresas privadas de rdio e televiso nem os patres.46
Outro refinamento compreensivo nessa problemtica a substancial diferena entre
a vinculao do Estado e a vinculao da sociedade ao programa de garantia dos direi
tos fundamentais: enquanto os poderes pblicos esto total, direta e imediatamente
(salvo perante normas constitucionais no exeqveis) vinculados aos direitos, liberda
des e garantias fundamentais, os particulares gozam de liberdade e autonomia.47
A liberdade e a autonomia so princpios internos do direito civil que no podem ser
desconsiderados nas relaes privadas, sob pena de lhes suprimir a essncia. O princ-
pio da liberdade contratual tem enunciado normativo no Cdigo Civil portugus (CC,
405s) e conformidade pressuposta claramente pela norma constitucional (CRP, 612). O
princpio da autonomia privada subjacente a todo o Direito privado.48 o poder de
autorregulamentao de interesses pelos particulares, ordenando suas relaes jurdi
cas, constituindo-as, modificando-as, extinguindo-as e determinando seu contedo.49
45 O ar gume n t o , que co r r e n t e n a do ut r in a co n s t it ucio n alis t a, me r e ce r e s s alv a quan t o ao s dir e it o s fun da
me n t ais an lo go s co m p o s it iv a o n o r mat iv a n o D ir e it o p r iv ado , ao n de s o co n ce b ido s p aia as r e la e s jur di
cas e n t r e p ar t icular e s , que s o me n t e n a h ip t e s e de qualifica o jus fun dame n t al que p as s am a s e r o p o n v e is
t amb m n as r e la e s jur dicas e n t r e o s cidado s e o Es t ado , de mo do r e fle x o e n o dir e t o .
46 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . Op . cit . p . 9 6 - 9 7 .
47 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . Op . cit . p . 9 6 .
48 O p r in c p io da aut o n o mia p r iv ada , n a v e r dade , um s ub p r in c p io , co r o l r io do p r in c p io do p e r s o n alis mo
t ico , que s up r ale gal e s up r ap o s it iv o , que "as s e n t a n a co n s ide r a o da p e s s o a h uman a co mo s e r liv r e , aut
n o mo e igual, ce n t r o de gr av idade de t o da a o r gan iza o s o cial, do t ado de uma dign idade o r igin r ia e p r p r ia
que lh e in e r e n t e p o r n as cime n t o , que n o p o de s e r r e duzida n e m alie n ada n e m e x t in t a, e que co mum a
t o das e a cada uma das p e s s o as s e m dis t in o de e s p cie alguma n o mb it o de uma Humanitas un iv e r s al co s
mo p o lit a, que n o s e p ar v e l o u dife r e n ci v e l p o r e s t at ut o s e co n mico s o u s o ciais , p o r r a as o u s e x o s , p o r
p t r ias o u n acio n alidade s , p o r r e ligie s o u cult ur as [...]. N o D ir e it o Civ il, o p e r s o n alis mo t ico fun da a t ut e la
da p e r s o n alidade , a aut o n o mia p r iv ada, a r e s p o n s ab ilidade civ il, a p r o p r ie dade , o r e s p e it o da fam lia e a s u
ce s s o p o r mo r t e [...]. A p r in cip al co n s e qn cia do p e r s o n alis mo t ico o r e co n h e cime n t o da p e r s o n alidade
jur dica e a t ut e la do s dir e it o s da p e r s o n alidade ". N e s s e co n t e x t o , a aut o n o mia p r iv ada de v e s e r co n ce b ida
co mo uma co n s e qn cia dir e t a da dign idade h uman a. "N o t e m dign idade h uman a que m n o fo r aut n o mo
e r e s p o n s v e l." E, ao in v s , n o h que s e falar e m aut o n o mia p r iv ada quan do a dign idade da p e s s o a h uman a
de s afiada n uma r e la o jur dica. N o co n jun t o da cit a o do t e x t o e de s t a e n t r ada: VA S CON CEL OS , Pe dr o
Pais de . Te o r ia ge r al do dir e it o civ il: r e lat r io . Re v is t a da F aculdade de D ir e it o da Un iv e r s idade de L is b o a,
S up le me n t o , p . 5 - 1 2 4 . Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 0 . p . 5 7 - 5 9 . Co mo s e p e r ce b e , a limit a o da aut o
n o mia p r iv ada p e la dign idade da p e s s o a h uman a que aut o r iza a ap lica o dir e t a de dir e it o s fun dame n t ais n as
r e la e s p r iv adas .
49 H t amb m aut o n o mia n o D ir e it o p b lico , co m a dis cr icio n ar ie dade admin is t r at iv a. Po r m, at r ib u da
p ar a fin s que s o dir e t a o u in dir e t ame n t e v in culado s . J a aut o n o mia p r iv ada co n ce b ida p ar a a o b t e n o
. 3 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Manifesta-se tambm no poder de livre exerccio dos seus direitos ou de livre gozo dos
seus bens pelos particulares - no imprio da vontade - que caracteriza o direito subjeti
vo. Tanto exerccio da autonomia da vida privada a concluso de uma compra e venda
; ) em determinadas condies (negcio jurdico), quanto o consumo ou a destruio de um
bem de que se proprietrio (direito subjetivo). So veculos de realizao da autono-
' mia privada os direitos subjetivos e os negcios jurdicos.50
) certo que os direitos fundamentais so, essencialmente, posies das pessoas contra
o Estado e toda sua evoluo se fundou no controle do poder estatal. Mas o avano de sua
1concepo como valores constitucionais supera a ideia do Estado como mero inimigo p-
j blico e acresce seu dever de fazer respeit-los como interesses pblicos fundamentais.51
j Some-se a isso a percepo de que o Estado pode violar os direitos fundamen
tais atingindo pessoal e diretamente os valores por eles protegidos ou, por carncia de
) medidas adequadas, permitindo que terceiros perpetrem essa violao, notadamente
entidades coletivas que agregam elevado poder jurdico, social ou econmico, como
. >associaes, igrejas, grupos de empresas e partidos polticos. A tutela estatal dos direi-
. tos fundamentais passa a impor aos terceiros um dever de respeito, perante posies
garantidas pelas leis fundamentais, que pode manifestar-se de vrios modos e, designa-
) damente, promovendo delimitaes particulares no exerccio de posies jurdicas de
autonomia e liberdade.52
Outro aspecto dessa concorrncia entre direitos civis e direitos constitucionais
1est no inter-relacionamento normativo, decorrente da unidade do sistema jurdico,
, que conduz ilao de que o acervo de normas aplicveis s relaes privadas no est
limitado s normas do Cdigo Civil e de alguma legislao ordinria avulsa. Problemas
,) de direito civil podem ser solucionados por uma norma que no de direito civil, mas
de direito constitucional. A fora normativa da Constituio irradia-se tambm ao Di
reito privado. A Constituio , na atual hermenutica, fonte imediata de direitos e no
} mais apenas fonte das fontes de direitos. As suas normas no so meras diretivas .pro-
gramticas de carter indicativo, mas normas vinculativas que devem ser acatadas pelo
^ legislador, pelo juiz e demais rgos estaduais.53
) Nesse ambiente de choque entre as vantagens civis (autonomia e liberdade) e a
. adstrio constitucional (dever de respeito), a questo da incidncia dos direitos funda
mentais nas relaes jurdicas privadas deve ser tratada com aproximao de trs pontos
) essenciais: (1) a autonomia da vontade - o efeito dos direitos fundamentais perante
. s terceiros e a limitao autonomia da vontade so a mesma coisa; (2) a supremacia
r' da Constituio e o mbito dos direitos fundamentais - so o ponto nevrlgico da
de fin s lt imo s da liv r e v o n t ade do s s uje it o s . Po r co n t a dis s o , n o e x is t e de v e r de fun dame n t a o n o D ir e it o
p r iv ado , mas e s t at u do n o D ir e it o p b lico ( A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o civ il: t e o r ia ge r al, cit .,
p . 1 3 - 1 4 ) .
50 PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Op . cit . p . 8 8 - 9 0 .
51 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a de . Op . cit . p . 2 3 4 - 2 3 5 .
52 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . Tr at ado de dir e it o civ il p o r t ugus , cit , p . 2 7 - 2 8 .
53 PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Op . cit . p . 7 2 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 3 9
discusso e se confundem com o mrito do efeito perante terceiros, que depende do
alcance das normas de direitos fundamentais; (3) a interpretao da Constituio -
cada um dos direitos fundamentais obedece a motivos muito diferentes e no h neces
sidade de se lhes atribuir um mesmo nvel de eficcia horizontal, que deve ser aferida
em concreto para a obteno de resultados mais fiveis.54
A aplicao dos direitos fundamentais nas relaes entre particulares, originria
e usualmente tratada como eficcia horizontal ou perante terceiros (Drttwirkung),
decorre, na ordem jurdica portuguesa, da norma do artigo 18a, n91, da CRI) que esta
belece a vinculao tambm das entidades privadas aos direitos, liberdades e garantias.
Em Portugal, a eficcia civil ou reflexa dos direitos fundamentais debatida, pri
mordialmente, quanto aos direitos, liberdades e garantias e no tanto aos direitos
sociais, econmicos e culturais, cuja tendncia jurisprudencial de reconhec-los como
programticos, ou como legitimadores de restries a outros direitos, e no como direi
tos subjetivos dos indivduos que amparem diretamente a exigncia de prestaes ao
Estado. So eles limitados pelas opes polticas e possibilidades financeiras governa
mentais, dentro da reserva do possvel. Alm disso, h referncia expressa somente a
direitos, liberdades e garantias como diretamente aplicveis e vinculadores das entida
des pblicas e privadas pelo artigo 18=, na1, da CRP55Acresa-se ainda que os virtuosos
objetos dos direitos econmicos, sociais e culturais extrapolam a essencialidade da
pessoa e, portanto, so estranhos tutela da personalidade.
Apesar da inequvoca concesso do efeito horizontal aos direitos, liberdades e ga
rantias, a norma constitucional no estabelece o mbito de sua aplicao, se todas as
entidades privadas esto vinculadas ou somente algumas, nem se a vinculao a mes
ma das entidades pblicas ou se h distines de intensidade. O problema suscitado
pela prpria diferena entre a situao das entidades pblicas e a das entidades privadas,
j que geralmente, nas relaes entre sujeitos de Direito privado, a quem invoca um
direito fundamental contrape-se uma pessoa que igualmente titular de um direito
fundamental. A prpria atuao do titular dos direitos fundamentais numa relao
jurdica privada decorre de uma parcela de liberdade dos direitos fundamentais porque
a autonomia privada, ao menos indiretamente, objeto de uma garantia fundamental.
Como a relao se estabelece entre titulares de direitos fmdamntais, crr j aqui
uma coliso de direitos fundamentais, o que no acontece numa relao particular-
-Estado, em que este no titular de direitos fundamentais.56
Ocorre que, se bem compreendida, a eficcia dos direitos, liberdades e garantias em
relao s entidades privadas concebida pela Constituio portuguesa no fulmina a au
54 TORRES , Je s s Gar cia; JIMN EZ - B L A N CO, A n t o n io . D e r e ch o s fun dame n t ale s y r e lacio n e s e n t r e
p ar t icular e s : la dr it t wir kun g e n la jur is p r udn cia de i t r ib un al co n s t it ucio n al. Madr id: Edit o r ial Civ it as , 1 9 8 6 .
p . 1 3 - 1 8 .
55 N e s s e s e n t ido , PIN TO, Paulo Mo t a. A in flun cia do s dir e it o s fun dame n t ais s o b r e o D ir e it o p r iv ado p o r
t ugus . In : MON TEIRO, A n t n io Pin t o ; N EUN ER, Jr g; S A RL ET, In go ( Or g.) . D ir e it o s fun dame n t ais e
dir e it o p r iv ado : uma p e r s p e ct iv a de dir e it o co mp ar ado . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 7 . p . 1 4 7 - 1 4 8 .
56 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 4 9 - 1 5 0 e 1 5 2 .
4 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
todeterminao, ao invs, deixa aos particulares uma margem de autonomia adequada
expresso de suas opes pessoais de vida. Isso porque subjaz Constituio uma con
cepo de homem como sujeito livre e responsvel, capaz de autodeterminao, senhor
do seu destino e gestor dos seus interesses na convivncia social, que exige direitos fun
damentais como competncias para a ao, para o livre empreendimento de iniciativas e
a livre manifestao de preferncias pessoais. Ao homem dependente de poderes fticos
e exposto a riscos que no controla individualmente, simultaneamente concebido pela
Constituio, que os direitos fundamentais atuam como mecanismos de salvaguarda,
de conteno de abusos e de compensao.57
-Mas- justamente no espao disponvel de autonomia contratual, nos interstcios
da liberdade subjetiva contida nas relaes igualitrias iurdico-ivis, que algumajdas
partes pode assumir uma poqiSp de pqder que a torne capaz de inter^ dr ng,esfera-de
proteo dos direltosfundamentais da parte hipossuficiente. Tal situao determinan
te para a qualificao da eficcia dos dirts' fundamentais nas relaes privadas.58
Surge, nesse contexto, o primeiro condicionamento eficcia reflexa dos direitos
fundamentais, relativo ao mbito vinculativo das entidades privadas, que demanda
uma distino prvia entre relaes jurdicas privadas tpicas e de poder, segundo o
critrio de poder jurdico, social ou econmico ostentado pelos sujeitos. Nas relaes
jurdicas privadas tpicas, os sujeitos esto em p de igualdade, ou seja, no h um
contingenciamento da vontade de um pelo poder exercido pelo outro. J as relaes
jurdicas privadas de poder so estabelecidas entre desiguais e a supremacia de partida
de um deles pode afetar substancialmente as condies de liberdade e autonomia do
outro. Aqui, constatada a desigualdade material, justifica-se um tratamento diferente de
aplicao imediata de certos preceitos constitucionais de direitos, liberdades e garan
tias e de realidades a eles anlogos (como o princpio da igualdade). Mas, entre iguais,
as relaes jurdicas privadas so regidas pelo princpio da autonomia e da liberdade,
que no deve ser afastado pela aplicao direta das normas de direitos fundamentais.
Mesmo as colises normativas, como se ver oportunamente, devem ser resolvidas
atravs da aplicao das regras de Direito privado (e, falta de outras, atravs de clu
sulas como as de ordem pblica ou dos bons costumes) ,59
Ordinariamente, a vontade do interessado no pode simplesmente ser adjudica
da pelo ordenamento jurdico. Quando se est em causa um bem da personalidade, o
mnimo de tutela constitucionalmente garantido pode no exigir a ineficcia radical de
um negcio jurdico que desafia um direito fundamental do interessado, contentando-
-se com a revogabilidade do compromisso assumido. O direito fundamental aplica-se
ento para evitar a execuo em espcie, que alm de significar uma agresso para a
personalidade do obrigado, implica tambm numa participao estatal ativa na leso de
um bem constitucionalmente protegido. Conjugada com o dever de indenizar os pre
57 RIB EIRO, Jo aquim de S o us a. Op . cit . p . 2 4 .
58 CA N OTIL HO, Jo s Jo aquim Go me s . Es t udo s s o b r e dir e it o s fun dame n t ais . 2 . e d. Co imb r a*. Co imb r a
Edit o r a, 2 0 0 8 . p . 86.
59 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . Op . cit . p . 88, 9 8 e 9 9 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 4 1
juzos causados s legtimas expectativas da outra parte, essa revogabilidade compe
o regime civil para as limitaes voluntrias dos direitos de personalidade que no
sejam nulas por violao da ordem pblica (CCPort., 81, n8 2). Mas a situao comple
tamente diversa quando no h condies de autotutela, por ambos os contraentes, dos
interesses protegidos. Isso porque os direitos fundamentais so ameaados no s por
fatos ilcitos extracontratuais, como tambm por situaes de inferioridade negociai no
mBito da autonomia privada. Nessa situao, inexiste manifestao autntica de auto
determinao da parte submetida e a limitao a um direitojundamental que resulte
desse negcio jurdico no' pode ser^ legitimada poresse valor constitucionalizado. A
revogabilidade do negcio jurdico e o dever de indenizao da parte contrria na so
suficientes para a proteo da personalidade da parte subjugada e sua "vontade", nessa
situao extraordinria, suplantada pela tutela da ordem pblica. A conseqncia ju
rdica adequada , portanto, a nulidade do ato celebrado.
O segundo condicionamento eficcia civil dos direitos fundamentais, agora rela
tivo intensidade vinculativa das entidades privadas, demanda urna cautelosa reflexo
dogmtica. A aceitao de uma simples equiparao de entidades pblicas e particulares
na aplicao imediata dos direitos fundamentais implicaria a transformao global da
Constituio no estatuto imediato das relaes entre particulares. Tal situao leva
ria produo imediata de conseqncias jurdicas filiadas na Constituio e sem a me
diao (ou com a substituio) dos diplomas jurdico-privados (como o Cdigo Civil),
saltando-se, designadamente, na cominao de nulidade, por inconstitucionalidade,
de todos os atos e negcios jurdicos privados celebrados contra direitos, liberdades e
garantias, e na ilicitude, para efeitos civis (designadamente, a responsabilidade civil),
dos atos que ofendessem esses direitos. Ocorre que essas concluses so dependentes
de juzos com recurso s especficas categorias jurdico-privadas, para tanto elabora
das no decurso de uma longa evoluo, como na tutela geral da personalidade ,__A
desconsiderao dessas particularidades ameaa uma substituio global do direito
civil pelo direito constitucional, com o risco de conduzir a regulamentao das rela
es privadas a uma excessiva rigidez e ao irrealismo resultantes da aplicao direta de
preceitos com grau de generalidade e abstrao muito maior do gue os instrumentos
apurados, para cada areaTclo Direito privado, ao longo de sculos, que visam re
solver especificamente aqueles problemas dos limites da validade e da licitude de atos
jurdico-privados.61
A constitucionalizao do direito civil uma grave e recorrente ameaa liber
dade e autonomia das relaes privadas que se ampara na ideia equivocada de uma
grande proximidade entre o direito civil e a Constituio.62Ora, as garantias constitu
60 RIB EIRO, Jo aquim de S o us a. Op . cit . p . 2 5 - 2 6 .
61 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 5 1 - 1 5 2 .
62 H o me s mo dis t an ciame n t o e n t r e o D ir e it o Civ il e o D ir e it o Co n s t it ucio n al. N e s t e s o co n ce b ido s o s
p r in c p io s fun dame n t ais de p r at icame n t e t o do s o s r amo s do D ir e it o , e n quan t o n aque le co n ce b ida a r e gula
o das r e la e s de p ar idade s e gun do o s co man do s p o l t ico s do p a s . N e s s e s e n t ido , Jo s de Oliv e ir a A s ce n s o
( A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. O dir e it o , cit ., p . 2 9 0 ) .
4 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
cionais apenas traduzem o reconhedmento estatal de uma ordem jurdico-privada, sem
causar impacto autnomo em seu contedo. Nem mesmo o detalhado catlogo dos direitos
fundamentais capaz de criar uma ordem acabada e fechada que permita inferir a regulao
civil. O primado material das relaes privadas todo do direito civil, que se distancia da
constituio poltica e atua como um desenho da constituio social.63
A definio e o regime dos direitos de personalidade no esto rigidamente consti-
tucionalizados. O fundamento comum de ambos os direitos na tutela da personalidade
no retira do legislador ordinrio um espao de manobra na harmonizao e na concre
tizao de orientaes constitucionais, regulando as relaes privadas.64E verdade que a
positivao constitucional de alguns direitos de personalidade tenciona justamente sal
vaguard-los de sua livre disponibilidade infraconstitucional. Mas isso no significa
que desde logo os direitos fundamentais esto aptos a regular as relaes privadas e que
so intocveis pelo legislador ordinrio, muito menos que este atue sistematicamente
como seu inimigo. Ao invs, atua como indispensvel concretizador, harmonizador e
ponderador dentro de uma ordem jurdica unitria, na busca por concordncia, den-
sificao e ponderao otimizadoras de direitos, no raro em rota de coliso com a
autodeterminao individual.65
O nvel reflexo da eficcia constitucional no Direito privado demanda srias pre
venes dogmticas, na medida em que no se resume a uma mera operao jurdica
de transplantao de normas pblicas para relaes privadas sem clivagem alguma. O
recurso indiscriminado que se faz Constituio na regulao das relaes privadas
um fenmeno que em nada contribui para um modelo de efetiva relevncia jurdica
das normas de tutela da personalidade, constitucionais ou civis. Isso porque acaba por
banalizar preceitos fundamentais, enfraquecendo a fora jurdica de intervenes cons
titucionais que se faam verdadeiramente necessrias, sobretudo para conter posies
de suprefnc ~g'pHr capazes de interferir na esfera de livre vontadejdo indivduo
subjugado. Mas tambmljor^ e tnde a ^ pblicizar o Direito privado, impondo aos
particulares adstrices originalmente concebidas para o Estado que acabam por sub-
trair-lhes a autodeterminao negociai.
Por conta desses riscos imediatos, deve-se captar e extrapolar a verdadeira teleo-
logia subjacente ao direito fundamental envolvido na relao privada. A adequao va-
lorativa e a limitao funcional so elementos de ajuste dessa eficcia constitucional
reflexa. A adequao valorativa demanda uma relao axiolgica bastante entre o di
reito fundamental e o bem que se pretende tutelar na relao privada. A no celebrao
de um contrato de trabalho, por exemplo, no implica um atentado vida do possvel
trabalhador pelo remoto risco de perecimento material. A celebrao de um contrato
de compra e venda de uma motocicleta no resulta, autnoma, direta e imediatamente,
num atentado integridade fsica do comprador. A limitao funcional recorda que os
63 RIB EIRO, Jo aquim de S o us a. Op . cit . p . 8 - 9 e 3 2 .
64 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o civ il: t e o r ia ge r al, cit ., p . 7 5 .
65 N e s s e s e n t ido , Can o t ilh o ( CA N OTIL HO, Jo s Jo aquim Go me s . Es t udo s s o b r e dir e it o s fun dame n t ais ,
cit ., p. 210) .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 4 3
direitos fundamentais so suscetveis de concretizao num ou noutro domnio, com
uma conseqente restrio, desde que em certos limites. O titular que aceite restringir
um seu direito numa relao privada no pode, depois, apelar norma constitucional
para sobreposio de sua livre vontade. O maestro que aceite dirigir a orquestra da
pera, por exemplo, no pode, ao abrigo da liberdade artstica, modificar sem mais a
ndole do agrupamento. Tambm o indivduo que aceite participar de um reality show de
confinamento no pode, ao abrigo da reserva da intimidade ou do direito liberdade,
requerer indenizao.66
Para alm dessa calibragem dos direitos fundamentais que antecede sua aplica
o nas relaes privadas, as normas de direito constitucional devem harmonizar-se
com as de Direito privado. Aqui a operao jurdica externa, de conexo normativa.
Quando necessrio, alguns princpios constitucionais devem ceder perante outros de
Direito privado, que tambm so conformes Constituio - alguns com expressa con
sagrao e outros nitidamente pressupostos por normas constitucionais.67So exemplos
de conteno da fora normativa constitucional: (1) o princpio da igualdgFHFcIda-
dos tem de ceder ante a liberdade contratual (CCPort., 405); (2) o direito de liberdade
deexpresso no pode prevalecer sobre o dever de_segredoou fidelidade quando resulta
para as partes da cooperao, segundo aboa-f, jiara se atingir o interesse na prestalo
ou no contrato (CCPort., 7629, na2). Sem essa atenuao, a vida iurdico-privada._para
alm das incertezas derivadas do carter muito genrico dos preceitos constitucionais,
conheceria uma extrema rigidez, inautenticidade e irrealismo.68
Analisados os condicionamentos aplicativos dos direitos fundamentais nas relaes
jurdicas privadas, passa-se a tratar das concepes doutrinrias sobre sua operao.
A eficcia externa dos direitos fundamentais pautada em duas direes concor
rentes: (1) pelo princpio da unidade do ordenamento jurdico, afirma-se que os direitos
fundamentais devem aplicar-se em toda ordem jurdica, inclusive no Direito privado; (2)
destaca-se a necessidade de proteo dos particulares no apenas contra o Estado, mas
tambm, atravs do Estado, contra outros particulares, ao menos perante indivduos ou
entidades privadas que exeram ou sejam capazes de exercer verdadeiros poderes jurdi
cos ou de fato.69A qualificao de cada um desses fundamentos que produz as variantes
aplicativas dos direitos fundamentais nas relaes privadas.
Os modelos aplicativos dos direitos fundamentais nas relaes privadas so o da
eficcia direta, o da eficcia indireta, o dos deveres de proteo social e o da con
vergncia estatista.
66 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . Tr at ado de dir e it o civ il p o r t ugus , cit ., p . 2 8 - 2 9 .
67 Po de mo s co n s ide r ar s e t e ide ias que fun dame n t am, p e n e t r am e s o de s e n v o lv idas p e lo D ir e it o Civ il:
( i) o r e co n h e cime n t o da p e s s o a e do s dir e it o s de p e r s o n alidade ; ( ii) o p r in c p io da lib e r dade co n t r at ual; ( iii)
a r e s p o n s ab ilidade civ il; ( iv ) a co n ce s s o da p e r s o n alidade jur dica s p e s s o as co le t iv as ; ( v ) a p r o p r ie dade
p r iv ada; ( v i) a fam lia; ( v ii) o fe n me n o s uce s s r io . Cada um de s s e s p r in c p io s e x p r ime uma r e alidade jur dica
e s p e c fica. Mas ao lo n go de t o do o D ir e it o Civ il s e man ife s t am duas ide ias car act e r izado r as do s e u s e n t ido
at ual: a autonomia e a igualdade ( PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Op . cit . p. 8 2 - 8 3 ) .
es p i n t O, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Op . cit . p . 7 2 - 7 5 .
69 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a de . Op . cit , p . 2 3 5 .
4 4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
2.6.1 Eficcia direta
A sntese do argumento da doutrina da eficcia direta de que Os direitos funda
mentais vinculam direta e imediatamente os particulares, dentro de um dever geral de
respeitar e no infringir os direitos alheios, que nela concebido como o primeiro dever
fundamental, o que garante uma eficcia erga omnes aos direitos fundamentais.70
O modelo deriva de concepes monistas germnicas que identificavam no poder
social e econmico dos grupos sociais um poder real que gerava riscos a zonas e as
pectos relevantes da vida e da personalidade dos indivduos e concebiam os direitos
fundamentais como normas de valor que deviam valer para toda a ordem jurdica,
inclusive para o Direito privado. Contra indivduos ou entidades privadas em posio
de supremacia de poder, os direitos fundamentais deveriam valer como direitos sub
jetivos. Entre indivduos iguais, a aplicao direta dos direitos fundamentais se daria
como valores comunitrios, no seriam apenas regras de interpretao normativa ou
de preenchimento de clusulas gerais concebidas pelo Direito privado.71
A teoria da eficcia direta direciona os direitos fundamentais no apenas contra o
Estado, mas tambm contra sujeitos de Direito privado, individualizveis no caso de
aplicao. No h necessidade de transformao alguma dos direitos fundamentais para
o sistema de regras de Direito privado, acarretando de imediato proibies legais de
interveno no trfico jurdico-privado e direitos subjetivos de defesa em face de ou
tros sujeitos de Direito privado, cuja violao obriga indenizao.72
A rejeio a esse modelo de aplicao dos direitos fundamentais decorre justamen
te de sua incompatibilidade com a autodeterminao negociai subjacente ao Direito
privado. A eficcia direta subjuga as relaes privadas aos direitos, liberdades e garan
tias individuais sem qualquer prvia harmonizao normativa, servindo como efetivo
instrumento da perigosa constitucionalizao do Direito privado. A nulidade indiscri
minada dos negcios jurdicos restritivos de direitos fundamentais, como conseqn
cia jurdica principal e imediata da eficcia direta, hostiliza a liberdade e a autonomia,
incompatibilizando-se contra a essncia do Direito privado.
2.6.2 Eficcia indireta
A sntese do argumento da doutrina da eficcia indireta de que os direitos funda
mentais no se aplicam diretamente nas relaes privadas, mas apenas de forma media-
ta, atravs da regulao normativa do Direito privado, que j concebido conforme aos
princpios da liberdade, da autonomia e do desenvolvimento d personalidade, evitando
70 S o ade p t o s de s s a t e s e : Jo s Jo aquim Go me s Can o t ilh o e Vit al Mo r e ir a ( A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo .
Op . cit . p . 9 3 - 9 4 ) .
71 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a de . Op . cit . p . 2 3 8 .
72 CA N A RIS , Claus - Wilh e lm. D ir e it o s fun dame n t ais e dir e it o p r iv ado . Tr adu o de In go Wo lfgan g S ar le t
e Paulo Mo t a Pin t o . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 9 . p . 5 3 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 4 5
assim que os direitos transformem-se em deveres fundamentais quando se incompati-
bilizam com a autodeterminao do sujeito.73
O modelo deriva de concepes dualistas germnicas que concebiam os direitos
fundamentais primariamente como direitos de defesa da liberdade contra o Estado
para negar-lhes aplicabilidade imediata nas relaes privadas, advertindo que a trans
ferncia dessa vinculao do Estado para os particulares transformaria direitos em de
veres. A invaso do domnio da atividade privada destruiria a sua autonomia. O dever
de proteo dos direitos fundamentais pelo Estado contra ataques de indivduos e enti
dades privadas era exercido atravs do Direito privado. A fora jurdica dos preceitos
constitucionais em relao a terceiros ocorreria mediatamente, atravs dos princpios e
normas do Direito privado. Os direitos fundamentais poderiam ser utilizados subsidia-
riamente como princpios de interpretao das clusulas-gerais e dos conceitos inde-
terminados suscetveis de concretizao no Direito privado, clarificando-os, acentuando
ou desacentuando deterrninds elementos do 'seu contedo, ou. em rsn fflrtrgmng,
colmatando as lacunas, mas sempre dentro do espirito do Direito privado.74
A aplicao dos direitos fundamentais nas relaes privadas faz-se: (1) atravs de
normas de Direito privado que reproduzem seu contedo - por exemplo, o direito
reserva sobre a intimidade da vida privada (CRR 26a, X, CCPort., 80s, n21); (2) atravs
de clusulas gerais e conceitos indeterminados, cujo contedo preenchido com os
valores constitucionais - por exemplo, a nulidade de clusula contrria ordem pblica
(CCPort., 280a) e a tutela geral da personalidade (CCPort., 70a); (3) diretamente, sem
intermediao de norma privada, na excepcionalidade de inocorrncia das duas primeiras
hipteses - por exemplo, proteo contra o uso incorreto da informtica (CRP 35a).75
A aplicao mediata demanda apenas uma normatizao infraconstitucional e no
contedo indito, ainda que seja mera reproduo do teor das normas constitucionais.
At mesmo os conceitos indeterminados ou as clusulas gerais, a preencher e con
cretizar segundo os valores constitucionalmente consagrados, so normativamente su
ficientes, numa atividade de interpretao conforme aos direitos fundamentais, na
busca de resultados congruentes entre o direito constitucional e o Direito privado.76
Nessa linha de argumentao, so reproduzidas trs situaes de proteo ao particular
no mbito do direito civil segundo a qualificao da intermediao normativa: (1) atravs
da norma do artigo 80a, na1, do Cdigo Civil portugus, que nada inova quanto ao enun
ciado normativo do artigo 26a da Constituio portuguesa, que assegura direitos pessoais,
numa situao de invaso da esfera ntima da vida privada por disposio contratual; (2)
atravs da clusula geral de ordem pblica do artigo 280a, na2, do Cdigo Civil portugus,
que desencadeia a conseqncia jurdica de falta de idoneidade do objeto negociai aps o
73 S o ade p t o s de s s a t e s e : Mar ce lo Re b e lo de S o us a e Jo s de Me lo A le x an dr in o ( A L EXA N D RIN O, Jo s de
Me lo . Op . cit . p . 9 3 - 9 4 ) .
74 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a de . Op . cit . p . 2 3 7 .
75 PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Op . cit . p . 7 2 - 7 5
76 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 5 5 .
4 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
preenchimento de seu contedo pela norma do artigo 41a, na1, da Constituio portuguesa,
numa situao de violao da liberdade religiosa por disposio contratual; (3) atravs da
norma do artigo 25ada Constituio portuguesa, sem intermediao infraconstitucional,
numa situao de violao da integridade moral de uma pessoa que teve seu atendimento
recusado num hospital, num restaurante ou num txi em virtude de sua raa.77
No mbito do direito do trabalho, a intermediao normativa opera da mesma for
ma. Saber se ou no lcito a uma entidade patronal exigir aos candidatos a um lugar
que se submetam a determinados exames mdicos no deve ser resolvido por fora da
aplicao direta do direito reserva da intimidade da vida privada (CRP 26a, na1), mas
sim por recurso s solues desenhadas pelo legislador (Cdigo do Trabalho de Portu
gal, 19) ou, na sua ausncia, por recurso aos princpios gerais do Direito comum.78
A intermediao normativa s no cabvel quando envolvido o contedo essen
cial dos direitos fundamentais. O ncleo mnimo do direito, extrado pelo princpio valo-
rativo da dignidade da pessoa humana, imediatamente aplicvel mesmo nas relaes
jurdicas privadas, sem que seja necessrio recurso a alguma norma de transposio.
Para alm da medida de poder jurdico, social ou econmico dos particulares rela
cionados, que deve ser considerada no caso concreto, a intensidade extrema de apli
cao dos direitos fundamentais nas relaes jurdicas privadas legitimada pela con
siderao de um mbito nuclear dos direitos fundamentais. Nesse contedo essencial,
que se prende com a dignidade da pessoa humana, so destinatrios dos direitos
fundamentais tambm os particulares, e na mesma medida das entidades pblicas,
tomando-se irrelevante a qualificao do agente e da contraparte, bem como a pretensa
atuao de outras faculdades ou direitos (pense-se, por exemplo, na proteo do direito
vida, na discriminao racial ou na contratao de trabalho escravo) .79
Mas se a aplicao dos direitos fundamentais nas relaes privadas pode, ainda
que extraordinariamente, prescindir de normas de transposio de Direito privado, a
tutela dos direitos fundamentais aplicveis nas relaes privadas efetiva-se sempre - e
exclusivamente - atravs dos instrumentos de proteo do Direito privado. As dispo
sies que violem direitos fundamentais aplicados nas relaes privadas sero sancio
nadas com a nulidade por contrariedade ordem pblica, que vicia o objeto negociai
(CCPort., 280a). Os danos por violaes de direitos fundamentais so objeto da tutela
geral de personalidade (CCPort., 70a), que reprime a ofensa materializada atravs da
responsabilidade civil (CCPort., 483a ss), previne a ameaa por cominao de deveres
de omisso ou atenua os efeitos de uma ofensa j consumada ou j iniciada por meio de
procedimento cautelar especial (CPCPort., 381a ss, e 1474ae 1475a).80
77 PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Op . cit . p . 7 5 - 7 6 .
73 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . Op . cit . p . 9 6 .
79 p i n t o , Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 5 5 - 1 5 7 .
80 DRA Y, Guilh e r me Mach ado . D ir e it o s de p e r s o n alidade : an o t a e s ao Cdigo Civ il e ao Cdigo de
Tr ab alh o . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 6 . p . 3 5 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 4 7
2.6.3 Deveres de proteo social
A sntese do argumento da doutrina dos deveres de proteo social de que os
poderes pblicos so onerados, para alm dos tradicionais deveres de respeito e de
implementao dos direitos fundamentais, pelo dever avanado de proteo contra
ameaas, incluindo as resultantes da atuao de outros particulares. Aqui, em termos
prximos, os direitos fundamentais so entendidos como imperativos de tutela.81
O Estado, na sua funo legislativa de consecuo das normas jurdicas regula
doras das relaes privadas e na sua funo jurisdicional de resoluo dos conflitos
nelas consubstanciados, est vinculado pelos direitos fundamentais e tem o dever geral
de aplicar os respectivos preceitos constitucionais. um alargamento em relao ao
tradicional preenchimento das clusulas gerais do Direito privado da teoria da eficcia
indireta, impondo aos poderes pblicos a obrigao de velarem efetivamente para que
no existam ofensas aos direitos fundamentais por parte de entidades privadas.82
O dever de proteo est sempre associado a um imperativo de proteo suficien
te, formulado negativamente como princpio de proibio do dficit, entendido pela
maioria da doutrina como um princpio orientador, que no deve ser visto como uma
proteo mnima, mas que tambm no impe uma proteo mxima, em respeito ao
princpio da proporcionalidade e liberdade constitutiva do legislador, que pode e
deve graduar a proteo conforme os valores ou bem jurdicos em causa, a intensidade
da ameaa e a possibilidade de autodefesa do particular.83
A funo dos direitos fundamentais como imperativos de tutela providencia uma
explicao dogmtica convincente para a eficcia indireta dos direitos fundamentais,
da qual a teoria dos deveres de proteo social pode ser qualificada uma vertente evo
lutiva. A posio de que apenas o Estado destinatrio dos direitos fundamentais
preservada pela ideia de que sobre ele. que recai a obrigao deproteg-los. E a razo
pela qual os, particulares so atingidos pelos direitos fundamentais fica clara pelo fato
de que o Estado, ou a ordem jurdica, tambm no campo iurfdico-privado, esto vincu
lados a proteger um cidado perante outro.8 / v \ t
" - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - H > - 1 v %- fJut V>A o v ~TA -
2.6.4 Convergncia estatista
A teoria da convergncia estatista extrapola o dever de proteo estatal para im
putar aos poderes pblicos uma responsabilidade objetiva por qualquer agresso de
particulares contra os direitos fundamentais, que aqui deduzida do monoplio estatal
da autoridade.85
81 S o ade p t o s de s s a t e s e : Jo s Car lo s Vie ir a de A n dr ade e Claus - Wilh e lm Can ar is ( A L EXA N D RIN O, Jo s
de Me lo . Op . cit . p . 9 3 - 9 4 ) .
82 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a de . Op . cit . p . 2 4 1 - 2 4 2 .
83 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a de . Op . cit . p . 2 4 2 .
84 CA N A RIS , Claus - Wllh e lm. Op . cit . p . 5 8 .
85 Os r e p r e s e n t an t e s p r in cip ais de s s a t e o r ia s o S ch wab e e Mur s wie k ( CA N A RIS , Claus - Wilh e lm. Op . cit .
p . 6 2 ) .
4 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
A sntese do argumento dessa doutrina de que uma agresso particular sempre
imputvel aos poderes pblicos que, por ao ou omisso legislativa, administrativa ou
judicial permite, no previne ou no repreende o atentado. A dificuldade de aceitao
dessa ideia reside na inexistncia de uma norma de delegao estatal para a atuao
dos particulares, que so individual ou coletivamente responsveis por seus atos. Alm
disso, o Estado s poderia ser responsabilizado pelo descumprimento de um dever
especfico de proteo do legislador - e no pelo dever geral de legislar - ou de cumpri
mento da lei pelo administrador ou juiz.86
Ao pressupor que toda leso ,em ltima instncia, coordenada por uma delega
o estatal ao sujeito agente ou por um dever de tolerncia imposto ao sujeito afeta
do, e que toda atuao humana est em regra subordinada a uma proibio com reser
va de autorizao, a concepo terica da convergncia estatista nega propriamente a
liberdade e, por conta disso, toma-se inaceitvel como modelo geral de pensamento.87
2.6.5 Tratamento jurisprudencial
A jurisprudncia portuguesa atual utiliza o modelo de eficcia indireta dos direitos
fundamentais nas relaes privadas, com a ressalva da eficcia direta quando est em
jogo o contedo essencial do direito fundamental orientado pela dignidade humana.
O Tribunal Constitucional portugus reconhece a eficcia privada de certos direi
tos fundamentais que, por sua prpria natureza e contedo, necessariamente implicam
um efeito vinculativo para as entidades privadas, como o segredo da correspondncia
(Acrdo 198/85). Na mesma frmula, os Acrdos 1/84 e 93/92. No surgem muitos
casos de efeito horizontal em razo do sistema portugus de controle concentrado de
constitucionalidade de normas e no de decises. Mas o controle de normas tem de
monstrado que pela via de vinculao aos direitos fundamentais do "legislador de Direi
to privado e da jurisdio se pode tambm conseguir resultados que em grande medida
se aproximam daqueles visados por uma soluo de "eficcia imediata em relao a ter
ceiros" dos direitos fundamentais. So exemplos o Acrdo 275/02, que aplicou o prin
cpio da proteo da famlia na inconstitucionalidade da excluso do companheiro de
fato na reclamao por danos morais por morte de um parente, e os Acrdos 318/99 e
62/02, que consideraram inconstitucional a penhora de crditos de penses sociais do
devedor que no ultrapassavam o salrio-mnimo ou o "rendimento mnimo garantido,
colocando-os como limite mximo para a penhorabilidade e invocando a dignidade da
pessoa humana como valor fundador do Estado.88
O Tribunal da Relao de L isboa, por exemplo, no Acrdo 7527/04.3YXL SB.L 1-1,
publicado em 23.3.2010, aplicou os direitos fundamentais numa relao jurdica priva
da estabelecida entre duas pessoas coletivas. O caso tratava de uma pretenso reparat-
35 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a de . Op . cit . p . 2 4 3 .
87 CA N A RIS , Claus - Wilh e lm. Op . cit . p . 6 2 .
88 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 5 8 - 1 6 3 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 4 9
ria de danos morais de uma sociedade comercial contra outra, da qual era cliente, que
afixou cartazes divulgando sua pequena dvida de 1.408,78 euros. O tribunal conside
rou que toda a pessoa goza dos direitos fundamentais integridade moral e fsica (CRR
25a), e ao bom nome, reputao e imagem (CREJ 26a), e que essa proteo abrange
tambm as pessoas coletivas (CRP, 12a, na 2). Mas no os aplicou diretamente, utili
zando a eficcia reflexa dos artigos 70ae 483ado Cdigo Civil portugus, que impem
um dever geral de respeito e de absteno de ofensas ou ameaas de ofensas honra de
qualquer pessoa, combinados com o artigo 484ado mesmo diploma legal, que estabele
ce a responsabilidade civil pelos danos causados. Ao final, reconheceu a ilicitude do ato
e a responsabilidade civil do requerido e concedeu indenizao ao requerente no valor
de 2.000,00 euros.89
Noutro exemplo, o Tribunal da Relao de Coimbra, no Acrdo 920/05, publicado
em 3.5.2005, aplicou os direitos fundamentais numa relao jurdica privada estabe
lecida entre duas pessoas singulares. O caso tratava de uma pretenso cautelar entre
vizinhos para a retirada de duas cmeras de vigilncia instaladas pelos requeridos que
gravam imagens e sons do ptio de acesso casa dos requerentes, onde costumam cir
cular vestidos de pijamas. A questo alcana o direito fundamental reserva da intimi
dade da vida privada e familiar (CRP, 26a, na1), mas sob regulamentao do artigo 80a,
n2 1, do Cdigo Civil portugus. O tribunal ponderou que, na hiptese, a utilidade da
norma ordinria de concretizao do preceito constitucional, explicitando conceitos,
interpretando-os e repetindo mais claramente o seu contedo originrio. O direito foi
analisado com amparo exclusivo na doutrina civilista, especialmente pela "teoria das
trs esferas", que identifica na personalidade humana e de relao trs dimenses de
vida ntima, privada e pblica, utilizada com frequncia para densificao normativa do
artigo 80ado Cdigo Civil portugus.90Ao final, entendeu que no houve investigao
da vida ntima dos requerentes e absolveu os requeridos.91
2.7 Resoluo de conflitos entre direitos de personalidade
O exerccio simultneo de direitos subjetivos, como so os direitos de personalida
de, por vrias pessoas pode ensejar situaes de conflito. Isso ocorre quando o exerc
cio do direito de uma das pessoas, isoladamente considerado, no compatvel com o
exerccio do direito de outra pessoa, tambm isoladamente considerado. So situaes
em que a satisfao de um direito implica na ofensa do outro.92
Em sentido amplo, haver coliso de direitos quando um direito subjetivo, na sua
configurao (legislativa) ou no seu exerccio (judicial), deva ser harmonizado com
89 D is p o n v e l e m: <h t t p : / / www.dgs i.p t / jt r l.n s f/ e 6 e lfl7 fa8 2 7 1 2 ff8 0 2 5 7 5 8 3 0 0 4 e 3 ddc/ 7 fcf9 b 8 7 0 9 5 5 2 1 3 f8 0
2 5 7 6 ff ) 0 3 1 2 6 9 b ? Op e n D o cume n t >. A ce s s o e m: 1 0 ab r . 2 0 1 0 .
90 DRA Y, Guilh e r me Mach ado . Op . cit . p . 5 6 - 5 7 .
91 D is p o n v e l e m: < h t t p : / / www.dgs i.p t / jt r c.n s f/ c3 fb 5 3 0 0 3 0 e alc6 1 8 0 2 5 6 8 d9 0 0 5 cd5 b b / le 2 8 f8 4 a5 7 8 5 0 4 5 f
8 0 2 5 7 0 0 5 0 0 3 5 e 6 4 c? Op e n D o cume n t >. A ce s s o e m: 1 2 ab r . 2 0 1 0 .
92 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Te o r ia ge r al do dir e it o civ il. 5 . e d. Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 8 . p . 2 9 1 .
5 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
outro ou com outros direitos. Num sentido estrito, a coliso ocorre sempre que dois
ou mais direitos subjetivos assegurem, aos seus titulares, permisses incompatveis
entre si.93
O modelo predominante na doutrina constitucionalista para a soluo de conflitos
entre direitos fundamentais constitucionais os concebe como princpios e estes como
mandados de otimizao, que so mais ou menos satisfeitos conforme o peso que
tm no caso concreto, aferido por intermdio do mtodo da ponderao de bens e
interesses.94
Ocorre que os direitos de personalidade, enquanto subjetivos, so regras e no
princpios, o que os incompatibiliza logo de sada com o modelo constitucional, impe
dindo a soluo de seus conflitos por recurso bsico ao mtodo da ponderao de bens
e interesses.95
Isso no significa que a ordem jurdico-civil esteja isenta de colises normativas
nem que prescinda de um mtodo alternativo para solucion-las, mas sim que no
deve ceder tentao de qualificar as regras do Cdigo Civil como princpios. A concre-
tizalcle princpios aberta ponderao e ao balanceamento segundo o peso especfico
dos direitos nas circunstncias concretas leva ao risco de uma relativizao da fora
vinculativa dos prprios direitos envolvidos. Alm disso, a acentuao principalista dos
direitos no permite que sejam garantidos imediatamente pela mediao concretizado-
ra do legislador democrtico, reservando-a aos tribunais.96
Para alm do bice gerado pela diferente estruturao normativa dos direitos funda
mentais, h ainda uma interdio normativa ao uso do mtodo da ponderao de bens
e interesses na resoluo de conflitos entre direitos de personalidade, j que a norma do
artigo 335a, n1 e 2, do Cdigo Civil portugus estabelece um regime diferenciado e
especfico para o tratamento da coliso de direitos civis em geral. Na hiptese de coli
so de direitos iguais ou da mesma espcie, os titulares de cada um deles devem ceder
na medida do necessrio para que todos produzam igualmente o seu efeito, sem maior
13 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s Co r de ir o . D a co lis o de dir e it o s . Re v is t a o D ir e it o , an o 1 3 7 a ( 2 0 0 5 ) , 1 ,
p . 3 7 - 5 5 . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 8 . p . 3 8 .
94 A t e o r ia do s p r in c p io s o s co n t r ap e s r e gr as . N e la, o s p r in c p io s jur dico s e x p r e s s am a ide ia de o t imi
za o , que e s t ab e le ce m de v e r e s prima fade, ao co n t r r io das r e gr as , que s o man dame n t o s de fin it iv o s . Os
p r in c p io s jur dico s de t e r min am que algo s e ja r e alizado n a maio r me dida p o s s v e l de n t r o das co n di e s f t icas
e jur dicas e x is t e n t e s , e , p o r is s o , p o de m s e r cump r ido s e m dife r e n t e s gr aus , ao co n t r r io das r e gr as que s o
v lidas e s e ap licam o u s o in v lidas e n o s e ap licam. A s co lis e s de p r in c p io s r e s o lv e m- s e n a dime n s o do
p e s o o u imp o r t n cia, e n quan t o a co lis o de r e gr as r e s o lv e - s e s imp le s me n t e n a s ua v alidade . A s r e gr as s o
ap licadas p e lo p r o ce dime n t o da s ub s un o e o s p r in c p io s s o ap licado s at r av s da p o n de r a o de b e n s e in
t e r e s s e s . Po r t o do s , n a o b r a o r igin al, A le x y ( A L EXY, Ro b e r t . Te o r ia do s dir e it o s fun dame n t ais . Tr adu o de
Vir g lio A fo n s o da S ilv a. S o Paulo : Malh e ir o s , 2 0 0 8 ) .
95 S e gun do a do ut r in a co n s t it ucio n alis t a do min an t e , que co n ce b e as r e gr as co mo man dado s de co n dut a",
n a lgica do t udo o u n ada", r adicalme n t e ap lic v e is o u n o ". Co n t r a, p r e ce it uan do a ut ilidade do m t o do
da p o n de r a o me s mo n a s o lu o de co n flit o s de r e gr as , p o r t o do s , e m o b r a de r e fe r n cia: VIL A , Humb e r t o .
Te o r ia do s p r in c p io s : da de fin i o ap lica o do s p r in c p io s jur dico s . 9 . e d. S o Paulo : Malh e ir o s , 2 0 0 9 .
96 CA N OTIL HO, Jo s Jo aquim Go me s . Es t udo s s o b r e dir e it o s fun dame n t ais , cit ., p . 2 1 3 - 2 1 4 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 5 1
detrimento para qualquer das partes. J na hiptese de direitos colidentes desiguais ou
de espcie diferente, prevalece o que deva considerar-se superior.
O sentido do regime civil o de distinguir situaes em que os direitos em con
flito podem ser hierarquizados e situaes em que existe entre eles uma relao de
paridade.97
Na acepo normativa do artigo 355e, CCPort., direitos iguais so os que derivam
das mesmas normas - como ambos os direitos reserva da intimidade da vida priva
da - e direitos da mesma espcie so os provenientes de normas que contemplem o
mesmo tipo de bens - como os direitos de personalidade. Na hiptese de coliso entre
direitos iguais ou de mesma espcie, h um comando normativo de cedncias mtuas,
guiado por um princpio de igual tratamento: seja nas vantagens, seja nos prejuzos.
Na segunda hiptese, de conflito entre direitos desiguais, h uma delimitao negativa
das cedncias mtuas da primeira hiptese.98
Antes mesmo de recorrer ao rol de critrios para dirimir as colises de direitos,
impe-se sempre uma prvia sindicncia do conflito, luz do sistema jurdico. A_po-
sio da pessoa que, de modo reprovvel, colocou-se em situao de coliso deve ser
desfavorecida. O Direito no obriga as pessoas a abdicar previamente de direitos s para
prevenir colises, mas ir desamparar aquele sujeito que o faa censuravelmente, isto :
(1) violando regras de conduta; (2) ignorando princpios que ao caso caibam. Por exem
plo, a coliso de direitos entre representante e representado que pudesse ser evitada,
previamente, pelo representante.99
Superada a hiptese prejudicial de coliso por abuso de direito, passa-se sua
resoluo pautada nos critrios especificamente concebidos para os conflitos de direi
tos civis.
No caso de coliso de direitos desiguais ou de espcies diferentes, a soluo
dada pela prevalncia daquele que se deva considerar superior. A desigualdade entre
os direitos colidentes deve ser constatada em abstrato. J o juzo de superioridade
deve ser formulado em concreto. So vrios os critrios que operaram o regime de co
liso entre direitos diferentes. A primeira categoria deles dos critrios normais, que
usualmente prevalecem uns sobre os outros na ordem enunciada: (1) a antiguidade
relativa - o direito primeiro constitudo tender a prevalecer, no seu exerccio, sobre os
direitos igualmente vlidos, mas s depois formados; (2) os danos pelo no exerccio
- ter preferncia o direito cujo no exerccio acarrete maiores danos sociais e humanos,
alm de econmicos; (3) os lucros do exerccio - prevalecer o direito lucrativo numa
dimenso social ampla sobre o que no tem essa conseqncia. A segunda categoria
dos critrios de recurso, que so aplicveis quando os critrios normais no permitam
qualquer concluso, bastando o primeiro que seja til: (4) a prevalncia em abstrato -
os direitos de personalidade prevalecem sobre os direitos reais, e os indisponveis, sobre
97 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais . Te o r ia ge r al de dir e it o civ il, p . 2 9 2 .
98 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . D a co lis o de dir e it o s , cit ., p . 4 6 .
99 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . D a co lis o de dir e it o s , cit ., p . 4 7 .
5 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
os disponveis; (5) o igual sacrifcio - no caso de empate pelo critrio anterior, deve
haver cedncia mtua, mas s entre direitos que comportem exerccios parcelares; (6) a
composio aleatria equilibrada - para evitar que ambos os direitos se anulem, en
cerrados os critrios cientficos, aplicam-se regras de cortesia ou de trato social, que so
essenciais, mas no jurdicas; (7) a composio aleatria - pura e no equilibrada.100
No caso de direitos iguais ou da mesma espcie, a lei determina a prevalncia do
princpio do igual tratamento. A igualdade ou a pertena mesma espcie so cons-
tatveis em abstrato. Mas, para que a cedncia mtua seja cabvel, os direitos devem
ser suscetveis de exerccios parcelares por sua prpria natureza. Alm disso, tem de ser
possvel uma repartio, por igual, das vantagens e-detrimentos-gerados pelo direito.
Na hiptese de a coliso no poder ser resolvida com recurso ao princpio do igual tra
tamento, surge uma lacuna. Tanto pela proximidade sistemtica, quanto pela analogia
manifesta, deve-se nesse caso apelar aos critrios dos direitos diferentes, verificando,
em concreto, se algum dos direitos iguais ou da mesma espcie deve considerar-se
superior, ao menos no mbito do seu exerccio. Aplicam-se os trs critrios normais:
da antiguidade relativa, do menor dano e do maior prejuzo. Se nenhum desses critrios
resultar, no se pode apelar prevalncia em abstrato porque so direitos iguais, nem
ao igual sacrifcio, que j se viu ser impossvel. Restam apenas, nessa altura, as compo
sies aleatrias: ou com equilbrio ou puras.101
importante destacar que as permisses de uso pontual da ponderao no so ca
pazes de autonomiz-la como mtodo na resoluo de conflitos normativos civis. Tanto
a ponderao abstrata, permitida como critrio cientfico de recurso (prevalncia em
abstrato), como a ponderao em concreto, autorizada como critrio no cientfico
de recurso (composies aleatrias), simplesmente integram o mtodo civilista como
elementos concorrentes, subsidirios e por regra no determinantes. Ante a especiali
dade da metodologia fundada em padres de prevalncia para os direitos diferentes e
de cedncia mtua para os direitos iguais ou da mesma espcie, no h utilidade nem
espaopra o uso do mtodo constitucional de ponderao de bens e interesses para a
resoluo de conflitos normativos entre direitos de personalidade.102
Mais do que isso: os conflitos entre direitos de personalidade e direitos fundamen
tais tambm so resolveis pelo mtodo civilista e no pelo mtodo constitucional,
medida que tal situao jurdica s possvel quando os direitos fundamentais so
aplicados nas relaes privadas e geralmente como direitos subjetivos, na qualidade de
regras, o que impede o recurso ponderao publicista e principalista.
A jurisprudncia portuguesa tem-se concentrado nas colises entre direitos de per
sonalidade e direitos fundamentais que envolvem: (1) o direito sade e ao repouso
100 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . D a co lis o de dir e it o s , cit ., p . 4 7 - 5 1 .
101 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . D a co lis o de dir e it o s , p . 5 1 .
102 Co n t r a, afir man do que a p o n de r a o de b e n s e in t e r e s s e s de v e s e r co n s ide r ada co mo m t o do p ar a a r e
s o lu o de co n flit o s e n t r e dir e it o s de p e r s o n alidade : VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Te o r ia ge r al de dir e it o
civ il, cit ., p . 2 9 3 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 5 3
e os direitos de propriedade e iniciativa econmica;103e (2) o direito ao bom nome e
intimidade da vida privada e a liberdade de expresso.104No primeiro caso, prevalece o
direito sade e ao repouso; no segundo, o direito ao bom nome e intimidade. uma
opo bastante clara, que corresponde sensibilidade atual e consensualmente do
minante, devidamente interpretada pelos tribunais. Algumas decises recorrem pon
derao em concreto para compatibilizar os direitos em presena, at como instrumento
de combate ao abuso do direito.105A primazia dos direitos mais antigos est subjacente
primazia dos direitos mais diretamente ligados dignidade humana.106O critrio do
menor prejuzo aplicado por "compatibilizao" razovel.107
A evoluo jurisprudencial toda no sentido de acentuar a tutela geral de per
sonalidade quando colidente com direitos de outra espcie. O Tribunal da Relao de
Coimbra, por exemplo, no Acrdo 462/06.2TBTNV.C1, publicado em 16.3.2010, fez
prevalecer o direito geral de personalidade, previsto no artigo 70 do Cdigo Civil
portugus, sobre os direitos fundamentais de natureza econmica - livre iniciativa e
propriedade privada - previstos nos artigos 61= e 62= da CRR O regime utilizado na
soluo da coliso entre os direitos de personalidade e os direitos fundamentais envol
vidos na lide foi o especfico do artigo 355a, CCPort. A superioridade jurdica do direito
de personalidade ao repouso em relao aos direitos fundamentais de livre iniciativa e
propriedade pode ser aferida, no caso concreto, por sua maior antiguidade relativa,
considerado o estabelecimento de residncia anterior ao empreendimento, e por seu
maior potencial danoso pelo no exerccio, considerada sua essencialidade pessoa.
103 RBv 8-fev-2001: me r c da ut iliza o de uma m quin a de as s us t ar p s s ar o s , s ur ge um co n flit o e n t r e dir e i
t o s de p e r s o n alidade ( dir e it o ao r e p o us o e ao de s can s o ) e dir e it o s p at r imo n iais ( dir e it o de p r o p r ie dade e de
t r ab alh o ) : p r e v ale ce m o s p r ime ir o s , "at e n t a a n at ur e za do s in t e r e s s e s t ut e lado s " [CJ CCVI ( 2 0 0 1 ) 1 , p . 2 6 7 -
2 7 1 ( p . 2 6 9 ) ap ud CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . D a co lis o de dir e it o s , cit ., p . 5 2 - 5 4 ].
104 RLx 5-abr-2 0 0 1 ; uma co lis o e n t r e a lib e r dade de e x p r e s s o e o dir e it o ao b o m n o me ; p e r an t e o ar t . 3 5 5 a,
h av e r ia que ap licar o s p r in c p io s da h ar mo n iza o o u da co n co r dn cia p r t ica; n o s e n do p o s s v e l, p r e v ale ce
o dir e it o h o n r a [CJ CCVI ( 2 0 0 1 ) 2 , p . 1 0 3 - 1 1 4 ( p . 1 0 6 , II) ap ud CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . D a co lis o
de dir e it o s , cit ., p . 5 2 - 5 4 ].
105 ST} 15jan. 2004: n uma co lis o e n t r e o dir e it o ao r e p o us o e ao amb ie n t e de v ida h uman a, s adio e e quili
b r ado e o dir e it o at iv idade e co n mica in e r e n t e ao fun cio n ame n t o de uma v acar ia, o dir e it o ao r e p o us o s air
p r iv ile giado , n o s e p o de n do , t o dav ia, s acr ificar r adicalme n t e o s dir e it o s mat e r iais ; ado t o u- s e , as s im, uma
s o lu o co mp le x a, co m s us p e n s o de at iv idade at o b r as ade quadas de is o lame n t o n a v acar ia, r e du o do
n me r o de cab e as de gado , n o e x e cu o de t r ab alh o s r uido s o s de n o it e e at as 7 h o r as da madr ugada e p a
game n t o de uma in de n iza o [CJ/ S UPREMO XII ( 2 0 0 4 ) I, p . 2 3 - 2 6 ( p . 2 4 / 1 e II e p . 2 5 / 1 ) ap ud CORD EIRO,
A n t n io Me n e ze s . D a co lis o de dir e it o s , cit ., p . 5 2 - 5 4 ].
106 STJ 26fev. 2004: um co n flit o e n t r e lib e r dade de in fo r ma o e o dir e it o h o n r a, ao b o m n o me e r e s e r v a
de in t imidade p r iv ada, caus ada p o r n o t cias fals as alus iv as a adult r io : a dign idade h uman a le v a p r e v aln cia
do dir e it o h o n r a, n o h av e n do cir cun s t n cia que le git imas s e t al co n dut a; fo i ar b it r ada uma in de n iza o de
2 4 .9 3 9 , 9 9 e ur o s [CJ/ S UPREMO XII ( 2 0 0 4 ) 1 , p . 7 4 - 8 0 ( p . 7 8 / 1 e II e p . 8 0 ) ap ud CORD EIRO, A n t n io Me
n e ze s , D a co lis o de dir e it o s , cit ., p . 5 2 - 5 4 ].
107 RCb 7jul. 2004: n um co n flit o e n t r e dir e it o s de p e r s o n alidade e dir e it o de p r o p r ie dade e de t r ab alh o , r e s ul
t an t e da in s t ala o de uma v acar ia: ap e n as e m ultima ratio h av e r ia que p r o ce de r o s acr if cio de um de le s , h a
v e n do que r e s p e it ar a "p r o p o r cio n alidade " e a "r azo ab ilidade "; o r a uma v e z que o s p r o p r ie t r io s ap e n as p as
s am, p o r an o , duas a t r s s e man as n a cas a, n o s e jus t ificar ia a me dida dr s t ica de fe ch ar a v acar ia [CJ XXIX
( 2 0 0 4 ) 3 , p . 3 8 - 4 0 ( p . 3 9 - 4 0 ) ap ud CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . D a co lis o de dir e it o s , cit ., p . 5 2 - 5 4 ].
*; Aa Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
5 4 D ir e it o *
Ao final o tribunal concedeu a tutela pessoal, mas restringiu a limitao do direito hie
r a r q u i c a m e n t e inferior n e c e s s r i a tutela da personalidade.108
c o n c l u s o neste tpico, retm-se as seguintes ideias centrais: ( 1 ) os conflitos
normativos entre direitos de personalidade no devem ser resolvidos atravs do m
todo co n s t i t u c i o n a l de ponderao, tanto por fora da estruturao normativa diversa
dos d i r e i t o s fundamentais, quanto pela interdio normativa de um modelo especfico;
. . m0delo civilista de resoluo de conflitos normativos baseia-se na hierarquizao
n o r m a t i v a e opera-se basicamente pela prevalncia do direito superior ou pela cedncia
ontre direitos paritrios; (3) os conflitos entre direitos de personalidade e direi-
mutuaenu , , . .
f u nd a m en t a is sao r e s o luv e is p e lo me t o do civ ilis t a, dada s ua o co r r n cia s o me n t e n as
r e l a e s p rivadas, ge r alme n t e e n t r e n o r mas - r e gr as .
3 A dimens^ conceituaI de conexo entre os direitos de
p e r s o n a l i d a d e e os direitos fundamentais
3 1 A qualifica dos direitos de personalidade como direitos
3.1.1 A via seletiva
Na dimenso conceituai de conexo resultante da dicotomia entre os direitos de per
sonalidade e os direitos fundamentais, a primeira via disponvel para que alguns direitos
, ersonalidade sejamqualificados como direitos fundamentais amparada na funda-
m e n t a l i d a d e mat eri al de direitos extraconstitucionais, verificados individualmente.
0 artigo 16s, n"1, da CRP aponta para um sentido material de direitos fundamen
tais que n so apenas os contidos nos enunciados constitucionais, mas tambm os
venientes de outras fontes, na perspectiva mais ampla de uma Constituio material.
O catlogo constitucional de direitos fundamentais no taxativo, mas de enumerao
aberta suscetvel de preenchimento atravs de novos direitos. Da seu apelido de clu
sula aberta ou de no tipicidade de direitos fundamentais.109
A e s s e n c i a l i d a d e pessoa humana e o nexo orgnico de seu objeto com a pessoa
humana aparenta que todos os direitos extraconstitucionais de personalidade devem ser
c o n s i d e r a d o s direitos fundamentais. Ocorre que a preocupao constitucional, diferen
te e mais restrita do que a das leis ordinrias, exige uma anlise casual. Para que seja
alificado como direito fundamental, no basta ao direito de personalidade seu natural
^ordinriorelevo extraconstitucional, mas tambm que contenha algum aspecto funda
mental que merea a reforada tutela constitucional.110
<h t t p : / / www.dgs i.p t / jt r c.n s f/ 8 fe 0 e 6 0 6 d8 f5 6 b 2 2 8 0 2 5 7 6 c0 0 0 5 6 3 7 dc/ 7 a8 9 b 9 2 9 f4 ae 5 f4 0
gQ2g7gQ0545628? Op e n Do cume n t >. A ce s s o e m: 1 3 ab r . 2 0 1 0 .
, MIRANDA. Jorge. Op. d t p . 176.
no ASCENSO, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o civ il: t e o r ia ge r al, cit ., p . 9 3 ,
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 5 5
O problema est justamente em como distinguir entre os inmeros direitos extra
constitucionais, inclusive os de personalidade, quais tm dignidade suficiente para se
rem qualificados como fundamentais. Numa abordagem inicial, a tendncia atribuir a
fundamentalidade material aos direitos extraconstitucionais que sejam equiparveis aos
direitos formalmente fundamentais em relao ao seu objeto e sua importncia.111
A fundamentalidade material um critrio jurdico extrado da clusula aberta
que revela direitos com potencial de situao jurdica fundamental (CRR 16a, na1).
Os direitos no enumerados" ou extravagantes, que so consagrados apenas em leis
ou em regras de costume ou de tratados internacionais, podem alcanar o status de di
reitos fundamentais, desde que tenham substncia fundamental, ainda que lhes falte o
assento formal.112
Algumas noes elementares de fundamentalidade material: (1) so fundamen
tais os direitos que garantam um bem, valor ou interesse implicado na combinao do
princpio da dignidade da pessoa humana (ou do Estado de Direito) com os princpios
da liberdade e da igualdade (ou da solidariedade); (2) a fundamentalidade deve ser ex
presso da igual dignidade de todas as pessoas; (3) deve haver uma equivalncia de
fundo relativamente aos direitos formalmente constitucionais, bem como uma radica-
o comunitria, que o direito esteja suficientemente radicado na conscincia jurdica
coletiva como elemento fundamental do ordenamento.113
O refinamento substancial da fundamentalidade atinge tambm os direitos de per
sonalidade, interditando a muitos deles a qualidade de direitos fundamentais. Apesar
de ordinariamente essenciais para a pessoa humana, h certos elementos, zonas ou
manifestaes perifricos dos bens tutelados pelos direitos de personalidade quTno
se revestem dessa qualidade e que no correspondem a direitos fundamentais.114
Pense-se na proteo das cartas-missivas, memrias familiares e outros escritos con
fidenciais (Cdigo Civil portugus, artigos 75a ao 77a) ou mesmo na proteo dos dados
pessoais do candidato ao emprego ou do trabalhador (Cdigo do Trabalho de Portugal, ar
tigo 17a), ambas nitidamente derivadas da garantia fundamental de reserva da intimidade
da vida privada, porm afastadas de seu contedo essencial para a tutela da personalidade.
No contraponto, so exemplos usuais de direitos de personalidade com fundamen
talidade material o direito geral de personalidade (artigo 702) e o direito ao nome (ar
tigo 72a), mas tambm h referncias ao direito reparao de danos (artigo 483a) e
aos direitos de audincia e de defesa oponveis em sano pessoal, penal, contraordena-
cional ou administrativa,115e ainda ao direito de visita dos progenitores relativamente
aos filhos menores, cuja guarda no lhes tenha sido confiada (CCPort., 1905a, na3).116
111 CA N OTIL HO, Jo s Jo aquim Go me s . D ir e it o co n s t it ucio n al e t e o r ia da co n s t it ui o . 6 . e d. Co imb r a:
A lme din a, 2 0 0 2 . p . 4 0 3 .
112 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . Op . cit . p . 4 8 - 4 9 e 5 2 - 5 3 .
113 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . Op . cit . p . 5 4 .
114 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o . Op . cit . p . 5 8 4 - 5 8 5 .
115 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a de . Op . cit . p . 8 3 .'
116 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o . Op . cit . p . 5 8 3 - 5 8 4 .
5 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
3.1.2 A via universal
A segunda via disponvel para a qualificao dos direitos de personalidade como
direitos fundamentais de irradiao do princpio estruturante da dignidade da pessoa
humana.
A pessoa humana o bem supremo da ordem jurdica portuguesa, o seu funda
mento e o seu fim. A Constituio preordena todo o sistema jurdico ao respeito e ao
desenvolvimento da dignidade da pessoa humana, explicitando e constitucionalizan-
do direitos pessoais e reforando a tutela jurdica dos mesmos direitos (1) ao estabe
lecer como limite material das leis de reviso constitucional o respeito pelos direitos,
liberdades e garantias dos cidados (artigo 2882, al. d), (2) ao admitir largamente a
vigncia na ordem interna de direito internacional referente aos direitos fundamentais
(artigos 16a, n8 1, e 8a) e (3) ao determinar que os preceitos constitucionais e legais
relativos aos direitos fundamentais devem ser interpretados e integrados de harmonia
com a Declarao U niversal dos Direitos do Homem (artigo 16a, na 2), que no seu
Prembulo e nos seus artigos 6a e 29a, na 1, supe um direito geral ao livre e pleno
desenvolvimento da personalidade, para alm de prever especificamente direitos fun
damentais de personalidade.117
A dignidade da pessoa humana um princpio de valor que est na base do es
tatuto jurdico dos indivduos e confere unidade de sentido ao conjunto dos preceitos
relativos aos direitos fundamentais, que no se justificam isoladamente pela proteo
de bens jurdicos avulsos, mas s ganham sentido enquanto ordem que manifesta res
peito pela unidade existencial de sentido que cada homem para alm de seus atos e
atributos. Pode ser diferente o grau de vinculao dos direitos quele princpio. Assim,
alguns direitos constituem explicitaes de primeiro grau da ideia de dignidade, que
modela todo o contedo deles, tal como a generalidade dos direitos pessoais, que so
atributos jurdicos essenciais da dignidade dos homens concretos.118
A concentrao da sociedade, do Estado e do Direito em tomo da pessoa humana
fenmeno constitucional capaz mesmo de fazer evoluir o atual Estado de direitos funda
mentais ao conceituai Estado de direitos humanos, que concentra o estatuto da pessoa
humana como protagonista do Estado, do Direito e da Histria. Nele, a legitimao e
a validade dos direitos fundamentais no reside no fato de serem criados pelo Estado
e nos termos da Constituio, antes sua fundamentalidade material reside na conexo
com a natureza do ser humano e a sua dignidade inviolvel.119
A ordem constitucional dos direitos fundamentais ,. desde logo, uma ordem plu
ralista e aberta e, por isso, no hierrquica. A definio constitucional do estatuto
jurdico dos indivduos atravs do reconhecimento ou da concesso de direitos funda
mentais visa proteger a dignidade essencial da pessoa humana. A unidade dos direitos
117 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o . Op . cit . p . 9 6 - 9 8 .
118 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a. Op . cit . p . 9 6 - 9 8 .
119 OTERO, Paulo . In s t it ui e s p o l t icas e co n s t it ucio n ais . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 9 . v . 1 , p . 5 2 7 - 5 3 4 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 5 7
fundamentais concebida e alcanada dialeticamente, mediante a atuao da dignidade
da pessoa humana como um princpio regulativo e no como princpio unicitrio de
uma ordem hierrquica e fechada.120
E nesse ambiente jurdico que os direitos fundamentais anlogos so permitidos e
que a fundamentalidade material dos direitos de personalidade generalizada por sua
relao elementar com a dignidade humana.
A dignidade da pessoa humana atua simultaneamente nessa dialtica como vetor
interprettv e concretizador dos direitos fundamentais, assumindo a capacidade
de atribuir a fundamentalidade material a todos os direitos de personalidade dada sua
essencialidade e o nexo orgnico de seu objeto com a pessoa humana.
3.1.3 O regime dos direitos fundamentais anlogos
Mas sejam alguns direitos de personalidade qualificados como direitos fundamen
tais por sua individual fundamentalidade material ou todos eles por irradiao da dig
nidade da pessoa humana, comungam o mesmo regime que os direitos constitucionais?
A norma do artigo 17Qda CRP assegura aos direitos fundamentais de natureza
anloga o mesmo regime dos direitos, liberdades e garantias constitucionais.
Apesar da inequvoca extenso do regime especial dos direitos fundamentais po
sitivados constitucionalmente aos direitos fundamentais extraconstitucionais, a norma
enunciada no deixa claro seu mbito de aplicao nem a amplitude do regime estendido.
H um profundo dissenso doutrinrio quanto ao mbito de aplicao da norma
extensiva do regime especial dos direitos fundamentais tpicos aos anlogos. Para al
guns, aplica-se apenas a direitos anlogos extraconstitucionais (Jos de Oliveira Ascen
so); para outros, aplica-se apenas a direitos anlogos constitucionais (Carlos Blanco
de Morais e Tribunal Constitucional Portugus); para outros, ainda, aplica-se essencial
mente aos direitos constitucionais, mas eventualmente aos extraconstitucionais que
se mostrem equivalentes aos direitos, liberdades e garantias - dupla analogia" ( Jo r ge
Miranda, Jos Carlos Vieira de Andrade e Jos Manuel Srvulo Correia).121
A tomada de posio nessa questo decisiva para a problemtica do regime dos
direitos de personalidade qualificados como direitos fundamentais, portanto assume-se
que a extenso do regime dos direitos, liberdades e garantias serve apenas aos direitos
extraconstitucionais, de leis e regras internacionais. Os argumentos para a adoo
desse modelo so simples e contundentes. Os direitos, liberdades e garantias esto
claramente delimitados no catlogo de direitos constitucionais e um regime especfico
est definido e relacionado a esse ncleo. A colocao de uns direitos no captulo dos
direitos, liberdades e garantias ou no captulo dos direitos e deveres econmicos, sociais
e culturais uma franca opo do legislador constitucional pelo regime que lhes ser
aplicvel. Tal escolha poltica e suplanta at mesmo a estrutura do direito afetado.
120 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a de . Op . cit . p . 1 0 - 1 - 1 0 3 .
121 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . Op . cit . p . 4 4 - 4 5 .
5 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Prova disso que os direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores poderiam ter
sido includos no rol dos direitos sociais, mas no o foram para que se lhes aplicasse o
regime dos direitos, liberdades e garantias, o que tambm pode ser constatado com as
liberdades de expresso e de informao, que poderiam muito bem ser arroladas como
direitos culturais. Portanto, se os direitos fundamentais j foram assentados constitu
cionalmente por vinculao ou no ao regime especfico, no faz sentido que isso seja
hermeneuticamente revertido. Os direitos fundamentais de natureza anloga que me
recem o regime dos direitos liberdades e garantias so apenas os extraconstitucionais.122
Qualificados como direitos fundamentais, os direitos extraconstitucionais devem
beneficiar-se do regime correspondente. A nica exigncia de natureza anloga aos
direitos, liberdades e garantias, sendo excludos os direitos extraconstitucionais de
natureza anloga a direitos econmicos, sociais e culturais.123
Colocada essa baliza, surge outra questo, relativa amplitude do regime esten
dido aos direitos anlogos. O argumento mais permissivo de extenso do regime
integral dos direitos, liberdades e garantias aos direitos extravagantes, fundado apenas
na analogia de substncia entre uns e outros direitos. A fundamentalidade material da
clusula aberta aqui o critrio bastante definio do regime.124
Mais restritiva a corrente doutrinria que estende aos direitos extraconstitucionais
apenas o regime material dos direitos, liberdades e garantias, que lhes confere aplicao
direta (CRFJ 18s, na 1) e exerccio reforado (CRP 19a). A analogia de substncia no
garante aos direitos extraconstitucionais com fundamentalidade material o regime or
gnico dos direitos constitucionais, que dispe sobre os limites s restries legislativas
(CRfi 18a, n25 2 e 3), a reserva parlamentar de competncia legislativa (CRR 165s, na1,
alnea b), a declarao de inconstitucionalidade por ao ou omisso (CRP 2772 ss) e o
limite material de reviso constitucional (CRP 288, alnea d).125
Na particularidade da reserva parlamentar de competncia legislativa (CRP, 165a,
na1, alnea b), a negativa de extenso do regime orgnico aos direitos fundamentais de
natureza anloga encontra mesmo uma justificativa tcnica pela enunciao da com
petncia exclusiva da Assembleia da Repblica para legislar sobre "direitos, liberdades
e garantias". A preciso do objeto normativo impede a equiparao de conceitos fludos,
como o de "direitos fundamentais de natureza anloga". A interpretao extensiva ma
nipularia a certeza que a Constituio optou por preservar.126
A dificuldade de se pensar numa tutela organicamente reforada de direitos extra
constitucionais deve-se a uma excessiva valorizao da Constituio formal. Ocorre que
122 N e s s e s e n t ido , Jo s de Oliv e ir a A s ce n s o ( A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o s de aut o r e dir e it o s
fun dame n t ais . In : MIRA N D A , Jo r ge ( Co o r d.) . Pe r s p e ct iv as co n s t it ucio n ais : n o s 2 0 an o s da Co n s t it ui o
de 1 9 7 6 . Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 1 9 9 7 . p . 1 9 0 - 1 9 1 ) .
123 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o civ il: t e o r ia ge r al, cit ., p . 9 5 .
124 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o . Op . cit . p . 5 8 2 .
125 MIRA N D A , Jo r ge . Op . cit . p . 1 6 0 - 1 6 3 .
125 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o civ il: t e o r ia ge r al, cit ., p . 9 6 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 5 9
no h uma efetiva fundamentalidade material de direitos que estejam desprotegidos
de uma investida legislativa desqualificada. preciso lembrar da concepo dos direitos
fundamentais como trunfos contra a maioria para no exp-los a uma ampla margem
de conformao legislativa. Nada adianta a aplicabilidade imediata do regime material
dos direitos, liberdades e garantias se os direitos extraconstitucionais estiverem merc
de uma restrio ou supresso normativa ordinria. A fundamentalidade material de
manda, assim, a proteo orgnica dos direitos extraconstitucionais.
A aplicao do regime integral dos direitos, liberdades e garantias possvel, ainda
que sejam necessrias algumas adaptaes. Quanto reserva parlamentar, no absur
do que um decreto-lei, como o Cdigo Civil, no possa ser alterado por outro decreto-
-lei. Quanto aos limites impostos s restries legislativas e a conseqente vinculao
do legislador a normas legais, por imposio ou indicao de preceitos constitucionais
portugueses, isso j ocorre com as leis reforadas (artigo 112s, ns 3; artigos 280e, nQ2,
b, e 281a, n21, b), alm do que so legitimados pela ideia de Constituio material que
lhes confere, no plano de validade, autoridade superior das leis ordinrias. Quanto
garantia contra o poder de reviso, pode ser entendida como proibio de introduo no
texto constitucional de um preceito que diminua o alcance do contedo desses direitos
fundamentais anlogos, em termos de faz-los desaparecer ou de desfigur-los.127
3.2 A possibilidade de conteno dos direitos fundamentais aos direitos
de personalidade
Outro aspecto da dimenso conceituai de conexo resultante da dicotomia entre
os direitos de personalidade e os direitos fundamentais de conteno destes queles
por fora de uma tendncia restritiva do objeto jusfundamental aos bens da perso
nalidade, com eliminao gradativa de bens no essenciais pessoa humana da tutela
constitucional.
Os direitos fundamentais polticos e os direitos a prestaes eram tradicionalmente
diferenciados dos direitos de personalidade porque no se referiam ao ser como pessoa.
Mas a atual interdependncia entre o estatuto positivo e o estatuto negativo do cidado
e a concepo de um direito geral de personalidade como "direito pessoa ser e pessoa
devir implicam cada vez mais a compreenso de direitos fundamentais como direitos
de personalidade e vice-versa.128
Tal fenmeno, constatado por importantes obras tanto de direito civil quanto de
direito constitucional, origina-se no antropocentrismo da ordem jurdica contempor
nea e da sua clara fundao no princpio da dignidade da pessoa humana.129
127 A N D RA D E, Jo s Car lo s Vie ir a de . Op . cit . p . 1 8 7 - 1 8 9 .
128 CA N OTIL HO, Jo s Jo aquim Go me s . D ir e it o co n s t it ucio n al e t e o r ia da Co n s t it ui o , cit ., p . 3 9 6 .
129 A t e n dn cia at ual do o r de n ame n t o jur dico , co mum ao D ir e it o Co n s t it ucio n al e ao D ir e it o Civ il, de
um maio r at e n dime n t o ao s v alo r e s e x is t e n ciais da p e s s o a do que a v alo r e s p at r imo n iais . N e s s e s e n t ido , a
jur is p r udn cia lide r an t e do Tr ib un al Co n s t it ucio n al A le mo , que n um cas o julgado e m 1 9 / 1 0 / 1 9 9 3 de cidiu
6 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
A dinamizao da tutela geral da personalidade no plano constitucional progres
siva e irreversvel e teve seu mais recente acontecimento na decisiva incluso de um
direito ao desenvolvimento da personalidade no catlogo de direitos pessoais (CR!
26a, n21).130' 131
A existncia de vrios direitos fundamentais com objetos distanciados da perso
nalidade humana, como o caso da garantia de acesso ao direito e aos tribunais (CRP
20a), das garantias contra a retroatividade da lei criminal (CRP, 29a), da maioria das
garantias de processo criminal (CRP, 32, nsi 1 a 5, 7 e 8), do direito de antena, CRP,
40a), do direito de propriedade privada (CRF) 62a), do direito retribuio do trabalho
(CRU 59a, na1, n) e dos direitos fundamentais dos administrados (CRP, 2682),132parece
infirmar essa tendncia restritiva de tutela de bens de personalidade, mas na verdade
apenas denota que se trata de um processo em desenvolvimento.
O certo que a afirmao da pessoa humana como centro de todas as relaes jurdi
cas, inclusive entre os particulares e o Estado, numa dimenso relacionai eu"-mundo da
personalidade, conduz inegavelmente a uma tutela sobreposta dos direitos de persona
lidade no plano constitucional, mas, sobretudo, numa tendncia restritiva do objeto dos
direitos fundamentais aos bens de personalidade, dada sua essencialidade para o livre
desenvolvimento da pessoa humana.133
O contemporneo Estado de direitos fundamentais, alm de ser um modelo poltico
apostado na garantia de efetivao dos direitos e liberdades fundamentais do homem,
alicera-se no respeito pela dignidade da pessoa humana e serve de garantia de invio
labilidade dessa mesma dignidade, que inerente a cada pessoa individual e concreta.134
O grande problema que o ncleo gentico desse modelo tem sido esvaziado pau
latinamente por seu distanciamento da natureza humana, num alargamento impr
prio do seu conceito de direitos fundamentais que atenta contra sua fundamentalidade
material. O sintoma dessa debilitao a despersonalizao de certos direitos fun
damentais, seja pela tutela de meros interesses difusos ou interesses coletivos (v. g.,
direito ao ambiente, direito ao patrimnio cultural), que surgem sem qualquer suporte
subjetivo individualizvel, seja pela tentativa de direitos fundamentais contrrios dig
que a fian a p r e s t ada p o r uma filh a de 2 1 an o s p ar a a gar an t ia de uma d v ida b an c r ia de s e u p ai e m v alo r
de s p r o p o r cio n ado ao s s e us r e n dime n t o s , que ce r t ame n t e imp o r t ar ia s ua as fix ia e co n mica p ar a t o da a v ida,
v io lav a s e u dir e it o fun dame n t al ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade , co n s ide r an do o n e gcio jur dico
in e ficaz ( RIB EIRO, Jo aquim de S o us a. Op . cit . p . 2 8 - 2 9 ) .
m Re da o alt e r ada p e la L C 1 / 9 7 .
1,1 S e co mp r e e n dida mat e r ialme n t e , a gar an t ia co n s t it ucio n al do de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade t e m o
p o t e n cial de r e fo r ar a t ut e la de p o s i e s de in fe r io r idade das r e la e s civ is . N e s s e s e n t ido , Rib e ir o ( RIB EIRO,
Jo aquim de S o us a. Op . cit . p . 2 7 - 2 8 ) .
132 CA PEL O DE S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o . Op . cit . p . 5 8 5 .
1,3 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h Vale n t in o A le ix o . Op . cit . p . 5 8 5 - 5 8 6 .
114 OTERO, Paulo . Op . cit . p . 5 2 5 .
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 6 1
nidade da pessoa humana (v. g., direito ao aborto, direito a se prostituir), que revelam
uma grave desorientao axiolgica sobre fundamentalidade.135
A investida contra o modelo estatal fundado na dignidade da pessoa humana acaba
por substituir uma necessria dimenso substantiva e qualitativa dos direitos fun
damentais por uma mera viso formal e quantitativa que propicia ao Estado o asse-
nhoramento dos direitos fundamentais, numa criao legislativa ilimitada de novos
direitos suscetveis de debilitao ou at destruio dos existentes. A manipulao da
clusula aberta dos direitos anlogos como instrumento de criao desqualificada de
novos direitos fundamentais, como um "cavalo de Troia", acaba por retirar-lhes a legiti
midade e a validade, que no se identificam com a criao estatal, m a s n a sua r n n p v S n
com a natureza do ser humano e a sua dignidade inviolvel.136
A reconciliao dos direitos fundamentais com a essncia da pessoa humana para
a retomada do Estado de direitos fundamentais - ou at mesmo o avano ao Estado de
direitos humanos - passa, necessariamente, pela personalizao dos direitos fundamen
tais, estreitando seu objeto aos bens da personalidade mais elementares, numa grande
afinao com os direitos de personalidade, em tutela parcialmente sobreposta.
concluso neste tpico, retm-se as seguintes ideias centrais: (1) h uma nti
da tendncia restritiva da tutela jusfundamental aos bens de personalidade, sinalizada
pela recente positivao constitucional do direito ao desenvolvimento da personalidade;
(2) tal fenmeno pode levar conteno de grande parte dos direitos fundamentais
nos direitos de personalidade, que sero alados ao catlogo constitucional, retendo na
esfera juscivilstica a proteo dos bens de personalidade sem dignidade fundamental.
4 Concluso
A investigao demonstrou que a dicotomia entre os direitos de personalidade e os
direitos fundamentais no os opem definitivamente, ao invs, enseja uma dogmtica
ncentiyadora de relacionamento internormativo capaz de reforar a tutela da perso
nalidade.
No h predominncia nem sobreposio de uns direitos aos outros, tendo cada
qual origem, estrutura e aplicao distintas, dentro do ramo do Direito em que foram
idealizados. Os direitos da personalidade, concebidos no Direito privado como regras,
prestam-se tutela da personalidade nas relaes jurdicas entre sujeitos em posio
de paridade, enquanto os direitos fundamentais, concebidos pelo Direito pblico como
princpios, prestam-se tutela da personalidade nas relaes jurdicas em que algum
sujeito assume a posio de supremacia sobre os demais, primordialmente o Estado,
mas reflexamente particulares com variados poderes de fato.
135 OTERO, Paulo . Op . cit . p . 5 2 6 - 5 3 2 .
136 OTERO, Paulo . Op . cit . p . 5 3 3 - 5 3 4 .
6 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
A proteo concorrente da personalidade humana operada pelos direitos de per
sonalidade atravs do regime de Direito privado, com instrumentos e institutos de di
reito civil, e pelos direitos fundamentais atravs do regime de Direito pblico, com
instrumentos e institutos do direito constitucional, que s podem ser acedidos pelos
direitos de personalidade se qualificados como direitos fundamentais por analogia de
substncia.
A investigao demonstrou tambm que a dicotomia entre os direitos de persona
lidade e os direitos fundamentais resulta em mais do que uma dimenso elementar de
isolamento, sendo possvel divisar outra ideal de conexo entre as duas espcies, no ao
nvel estrutural, mas to somente ao nvel de transposio normativa.
Sistematizando os principais argumentos utilizados, enunciam-se os seguintes po
sicionamentos para as problemticas suscitadas neste captulo: (1) a aproximao entre
os direitos de personalidade e os direitos fundamentais pela parcial sobreposio de
seus bens tutelados no elide o distanciamento estrutural que acaba por distingui-los
quanto ao sentido, projeo e perspectiva; (2) o direito geral de personalidade atua
como matriz, referncia e complemento dos direitos parcelares de personalidade e atri
bui ao direito civil a tutela geral de personalidade, restando ao direito constitucional
a tutela de alguns bens de personalidade que desfrutem de alta radicao comunitria
quanto sua fundamentalidade; (3) os particulares esto envolvidos no mbito de vin
culao dos direitos fundamentais por um dever geral de respeito, mas por fora de
sua autodeterminao individual, que lhes garante liberdade e autonomia negociais,
a intensidade dessa vinculao mitigada em comparao do Estado, que direta e
imediata; (4) a aplicao dos direitos fundamentais nas relaes privadas opera-se, por
regra, atravs de normas intermediadoras de Direito privado, exceto quando se tra
ta do contedo essencial dos direitos fundamentais, extrado pela dignidade humana,
que dispensa qualquer intermediao normativa e tem aplicabilidade imediata; (5) os
conflitos normativos entre as normas-regras dos direitos de personalidade no devem
ser resolvidos pelo mtodo constitucional de ponderao de bens e interesses porque
concebido para normas-princpios e porque h mtodo especfico; (6) o modelo civilista
concentra a soluo de conflitos normativos na hierarquizao das normas e opera-se
basicamente pela prevalncia do direito superior ou pela cedncia mtua entre direitos
paritrios; (7) os conflitos entre direitos de personalidade e direitos fundamentais de
vem ser resolvidos pelo mtodo civilista porque s podem ocorrer nas relaes privadas,
geralmente quando os direitos so aplicados como regras; (8) os direitos de personali
dade podem ser qualificados como direitos fundamentais pela via seletiva da fundamen
talidade material aferida caso a caso ou pela via universal que corresponde os direitos
de personalidade aos direitos fundamentais por irradiao direta da dignidade humana;
(9) os direitos de personalidade alados a direitos fundamentais partilham os mesmos
regimes material e orgnico que os direitos, liberdades e garantias aos quais so subs
tancialmente anlogos; (10) existe uma tendncia restritiva da tutela jusfundamental
aos bens de personalidade, clarificada recentemente pela positivao constitucional do
direito matriz ao desenvolvimento da personalidade, capaz de levar conteno dos
direitos fundamentais aos direitos de personalidade assentados constitucionalmente.
A dico t o mia e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s fun dame n t ais 6 3
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2
O direito ao livre desenvolvimento
da personalidade - perspectiva do
direito portugus
Kellyne Las Labur Alencar de Almeida
SU M RIO: 1 Introduo. 2 A pessoa, a personalidade e a dignidade hu
mana. 2.1 O conceito de pessoa. 2.2 O conceito de personalidade: dinmi
ca e proteo. 2.3 O valor da dignidade humana. 3 O livre desenvolvimen
to da personalidade. 3.1 O conceito de desenvolvimento da personalidade.
3.2 O direito ao livre desenvolvimento da personalidade: contribuio da
doutrina e da jurisprudncia alem. 3.2.1 A liberdade geral de ao. 3.2.2
O direito geral de personalidade. 4 O direito ao livre desenvolvimento da
personalidade no ordenamento jurdico portugus. 4.1 O livre desenvolvi
mento da personalidade no artigo 26a, n" 1, da Constituio da Repblica
Portuguesa de 1976. 4.2 O livre desenvolvimento da personalidade no
artigo 70a, na 1, do Cdigo Civil portugus: direito geral de personalidade
ou tutela geral de personalidade? 4.3 O livre desenvolvimento da perso
nalidade na jurisprudncia portuguesa: seleo de casos. 4.3.1 A autono
mia dos menores em face de seus responsveis. 4.3.2 O casamento entre
pessoas do mesmo sexo. 4.3.3 A autodeterminao de funcionrios sobre
a prpria aparncia. 5 Concluses. 6 Bibliografia.
1 Introduo
L iberdade, essa palavra que o sonho humano alimenta, que no h
ningum que explique e ningum que no entenda.
Ceclia Meireles
6 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Que o ser humano necessita de liberdade para desenvolver a prpria personalidade
de forma plena e autntica, no h quem duvide. A Filosofia ocupa-se largamente e de
h muito do tema e a tendncia dos ordenamentos jurdicos modernos foi a de tomar
para si a responsabilidade pela tutela da liberdade e da personalidade humana nos seus
mais diversos aspectos.
A evoluo do tempo e a constante modificao da sociedade, porm, fazem com
que novos anseios humanos surjam e clamem por proteo jurdica. Os menores de
idade, cada vez mais independentes e informados, pedem maior autonomia em face
dos pais para definir os rumos da prpria vida. Os empregados desejam a garantia legal
da autodeterminao da prpria aparncia, com a possibilidade de rejeitar o uso de
uniformes que entendam desprestigiantes ou inadequados. Qual seria, entretanto, o
fundamento jurdico apto a justificar a tutela de anseios humanos to diversificados,
relacionados a aspectos da vida to diversos entre si? Eis que se apresenta o moderno e
controverso direito ao livre desenvolvimento da personalidade.
A realizao de uma pesquisa sobre o direito ao livre desenvolvimento da perso
nalidade no ordenamento jurdico portugus justifica-se diante da escassez de estudos
dedicados especificamente ao tema, situao que ressalta a desproporo entre sua
elevada importncia para a proteo ainda mais efetiva da pessoa e da personalidade
humana em todas as suas nuances e a real subutilizao que dele tem feito a genera
lidade da doutrina e da jurisprudncia. Afinal, com a louvvel exceo dos trabalhos e
decises mencionados ao longo do texto, j se vo mais de dez anos da reviso consti
tucional de 1997 que expressamente introduziu o direito ao livre desenvolvimento da
personalidade no ordenamento jurdico portugus sem que a maior parte dos juristas
empenhe-se em trat-lo como mais do que um simples valor vago e etreo de pouca
utilidade jurdica.
O objetivo deste captulo, portanto, contribuir, seno com respostas, ao menos
com o levante das questes mais intrigantes e importantes que permeiam o estudo do
direito ao livre desenvolvimento da personalidade e que devem ser enfrentadas pelos
estudiosos e pelos aplicadores do Direito na tentativa de sua concretizao, densifica-
o e aproveitamento adequado, propiciando a efetivao da especial tutela da pessoa
e da personalidade humana a que ele se destina. Nesse sentido, contribui tambm o
repositrio doutrinrio e jurisprudencial do tratamento do tema que se buscou realizar
ao longo do trabalho, obviamente restrito quilo que os limites de tempo e de espao
possibilitaram fazer.
A metodologia de pesquisa adotada foi a tcnico-jurdica, uma vez que a anlise que
desde o princpio se pretendeu realizar tem que ver eminentemente com o contedo e
as conformaes doutrinria e jurisprudencial do direito ao livre desenvolvimento da
personalidade no ordenamento jurdico portugus. No estudo dos direitos da personali
dade, entretanto, a figurao da pessoa e da personalidade humana como pressupostos
torna inevitvel o contato de certos temas com outras cincias humanas, especialmente
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 6 7
com a Filosofia. Por isso se ressalva que, embora no se tenha ambicionado a realizao
de um estudo transdisciplinar, no se fugiu incurso na Filosofia quando necessria
compreenso adequada do tema.
Ao fim da introduo, a primeira seo deste captulo dedica-se analise de trs
assuntos preliminares ao tema central e de tratamento imprescindvel para um ajustado
estudo do direito ao livre desenvolvimento da personalidade. Trata-se da definio dos
conceitos de pessoa e de personalidade e de breve configurao da dignidade humana
no ordenamento jurdico portugus. Embora esse ponto do trabalho perpasse inevi
tavelmente por questes filosficas ligadas existncia, utilidade e ao valor da vida
humana, o objetivo do primeiro captulo foi alcanar uma representao jurdica da pes
soa, da personalidade e da dignidade humana no ordenamento jurdico portugus que
auxiliassem a anlise da estrutura e do contedo do direito ao livre desenvolvimento da
personalidade.
A seo seguinte inicia o aprofundamento no cerne do estudo, dedicando-se, pri
meiramente, ao posicionamento e definio geral daquilo que se deve entender por
desenvolvimento da personalidade humana. Prossegue, logo aps, com a referncia s
origens da tutela do livre desenvolvimento da personalidade no ordenamento jurdico
alemo, analisando sua estrutura como direito fundamental consagrado na Constituio
tedesca e, especialmente, suas dimenses - construdas na jurisprudncia do Tribunal
Constitucional Federal alemo e largamente adotadas pela doutrina - de liberdade geral
de ao e de direito geral de personalidade.
A ltima seo dedica-se ao exame do direito ao livre desenvolvimento da persona
lidade em sua conformao lusitana. A anlise parte do texto consagrado no artigo 26fl,
ns 1, da Constituio da Repblica Portuguesa de 1976 e passa pelo debate doutrinrio
sobre a definio mais adequada do direito ao livre desenvolvimento da personalidade:
se semelhante ou diversa daquela predominante no ordenamento jurdico alemo, que
inspirou o ordenamento jurdico portugus. O tpico seguinte destina-se ao estudo das
repercusses da consagrao do direito ao livre desenvolvimento da personalidade no
Direito Privado, notadamente na substituio da tutela geral de personalidade prevista
no artigo 70a, nQ1, do Cdigo Civil Portugus por um direito geral de personalidade. Fi
nalmente, observa-se e comenta-se o posicionamento dos Tribunais portugueses diante
do novo direito fundamental de personalidade.
Por fim, apresentam-se as concluses do captulo.
2 A pessoa, a personalidade e a dignidade humana
O estudo dos direitos da personalidade coloca como questes preliminares os pr
prios conceitos de pessoa e de personalidade, pois somente a partir deles possvel
identificar com preciso os titulares e o objeto que compem a categoria jurdica. No
, porm, empresa fcil.
6 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
As buscas sobre o significado e o sentido da pessoa e da personalidade acompa
nham o ser humano atravs dos sculos e nas mais diversas cincias humanas.1A Fi
losofia e a Antropologia, procurando na ontologia as respostas para as mais basilares
perguntas que inquietam a alma humana, afirmam que a pessoa ente que se diferencia
dos demais sujeitos existentes no mundo porque com maior intensidade, porque o
ser humano senhor de sua prpria realidade ontolgica.2A pessoa, portanto, definir-
-se-ia como ente em que se manifestam trs notas especficas: ipseidade, alteridade e
dimenso relizacional.3
preciso entender, porm, que embora no haja dvida de que a pessoa uma
realidade ontolgica, no h coincidncia necessria entre aquilo que o ser humano e
aquilo que o ordenamento jurdico define como pessoa; no fosse assim, a escravido
jamais poderia ter encontrado respaldo no Direito.4
Assim, o objetivo aqui o de perscrutar as definies atribudas pessoa e perso
nalidade pelas Cincias Jurdicas, embora isso no signifique desconsiderar a realidade
humana.5A elaborao de conceitos tcnico-jurdicos de pessoa e personalidade ade
quados dever sempre levar em considerao as caractersticas que compem a essncia
do ser humano, sem descurar os limites que os objetivos do ordenamento jurdico de
tutela dos interesses pessoais e sociais e de promoo da pacificao social impem.
2.1 O conceito de pessoa
A definio de pessoa era tradicionalmente associada no contexto jurdico quali
dade de ser sujeito de direitos e obrigaes. O conceito, apesar de muito simples, eivado
estava de significado, pois demonstrava que, para o ordenamento jurdico, pessoa era
apenas quem o legislador desejasse que fosse, atribuindo-lhe direitos e obrigaes. E
a essa interpretao no se pode atribuir a pecha de disparatada; basta observar que o
prprio Hans Kelsen chegou a afirmar que a pessoa representa figurativamente a unida
de de um complexo de deveres jurdicos e direitos subjetivos, to somente a personi
ficao dessa unidade.6
1 Par a uma e v o lu o do s e s t udo s filo s fico s e an t r o p o lgico s ace r ca do co n ce it o de p e s s o a, v e r GON
A L VES , D io go Co s t a. Pe s s o a e dir e it o s de p e r s o n alidade : fun dame n t a o o n t o lgica da t ut e la. Co imb r a:
A lme din a, 2 0 0 8 . p . 2 0 s s .
2 GON A L VES , D io go Co s t a. Op . cit . p . 4 1 - 4 2 .
3 Co n fo r me GON A L VES , D io go Co s t a. Op . cit . p . 6 3 .
4 PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Te o r ia ge r al de D ir e it o Civ il. 3 . e d. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 1 9 9 6 .
p . 8 6 .
5 A p o n t an do a e x is t n cia de ao me n o s do is s ign o s p ar a o v o c b ulo pessoa, um v ulgar - r e p o r t an do - s e ao
s e r h uman o - e o ut r o jur dico - mais amp lo p ar a agas alh ar p e s s o as h uman as e p e s s o as jur dicas - , F A RIA S ,
Cr is t ian o Ch av e s de ; ROS EN VA L D , N e ls o n . D ir e it o Civ il - t e o r ia ge r al. 6 . e d. Rio de Jan e ir o : L ume n Jur is ,
2 0 0 7 . p . 1 0 2 .
6 KEL S EN , Han s . Te o r ia p ur a do D ir e it o . Tr adu o de Jo o B ap t is t a Mach ado . 7 . e d. Co imb r a: A lme din a,
2 0 0 8 . p . 1 9 4 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 6 9
Os tratamentos formalistas, porm, encontram-se atualmente na contramo da
evoluo jurdica. A tendncia do Direito caminhar ramo efetivao da proteo
da pessoa, buscar o equilbrio entre a formalidade necessria segurana jurdica e os
juzos ponderados que a materializao de direitos requer.7Por isso, uma definio de
pessoa que se restrinja a equiparar a considerao do ser humano a uma conseqncia
da atribuio de direitos e obrigaes pelo ordenamento jurdico no mais pode ser
considerada adequada.
A pessoa, embora no seja realidade pr-jurdica, realidade pr-legal, de sorte que
o prprio ser humano dever iluminar a noo de pessoa consagrada pelo ordenamento
jurdico e no o contrrio. Afinal, a pessoa no se resume a ser a conseqncia de uma
construo jurdica; a pessoa o prprio fim do Direito e essa considerao deve ser im-
prescindivelmente tomada e associada sua posio de sujeito de situaes jurdicas.8
Toda pessoa, pelo simples fato de ser pessoa, de ser humana, titular de certo
nmero de direitos que tutelam os aspectos mais basilares de sua existncia fsica e
psquica e garantem-lhe a essencial dignidade - os direitos de personalidade.9O Direito
deve, portanto, destinar-se proteo da estrutura biopsicolgica10que compe a pes
soa, no lhe cabendo a escolha arbitrria de a quais seres humanos e em quais situaes
conceder a proteo de sua espada e a justia de sua balana.
No , porm, tarefa fcil elaborar um conceito adequado de pessoa. A ideia de ser
humano remete naturalmente diversidade, existncia de entes nicos e irrepetveis,
com caractersticas fsicas e biolgicas prprias. Essa ipseidade que individualiza cada
pessoa das demais faz necessrio que o conceito de pessoa seja suficientemente amplo
para abarcar essa fantstica diversidade caracterstica dos entes humanos.
Mas no s. Nenhum homem uma ilha,11 nenhuma pessoa encerra-se em si
mesma. O ser humano forma-se e conforma-se em seu relacionamento com os demais,
no seio da sociedade que o abriga. A alteridade parte da realidade humana, j que o
homem s alcana a plenitude de sua existncia por meio das relaes que estabelece.
A concepo do ser humano individual, portanto, no chega para defini-lo comple
tamente, sendo imprescindvel a considerao da componente social que forma a reali
dade humana. Sua autonomia e liberdade no podem, todavia, ser diludas no processo
social por concepes puramente coletivistas.12A pessoa deve ser tomada pelo ordena
7 Es s a t e n dn da s ub s t an cialis t a do D ir e it o p o de s e r o b s e r v ada, p o r e x e mp lo , n a co n s agr a o de dir e it o s
s o ciais , ao lado do s t r adicio n ais dir e it o s civ is e p o l t ico s , n a e v o lu o do p r in c p io da igualdade p ar a a in clus o
e m s e u co n t e do de uma v e r t e n t e mat e r ial, o u at me s mo p e lo de s e n v o lv ime n t o da t cn ica de p o n de r a o
p ar a r e s o lu o de co n flit o s n o r mat iv o s n o in t uit o de p o s s ib ilit ar a an lis e das n e ce s s idade s co n cr e t ame n t e
e n v o lv idas e m cada cas o .
8 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o Civ il - t e o r ia ge r al. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 1 9 9 7 . v . 1 , p . 3 8 .
5 PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Op . cit . p . 8 7 .
10 Par a ut ilizar uma e x p r e s s o de F A RIA S , Cr is t ian o Ch av e s de ; ROS EN VA L D , N e ls o n . Op . cit . p . 1 0 3 .
11 A famo s a fr as e do p o e t a in gls Jo h n D o n n e n a o b r a Me dit at io n XVII.
12 S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Cap e lo de . A Co n s t it ui o e o s dir e it o s de p e r s o n alidade . Im MIRA N D A ,
Jo r ge ( Co o r d.) . Es t udo s s o b r e a Co n s t it ui o . L is b o a: Pe t r o n y , 1 9 7 8 . v . 2 , p . 1 8 2 .
mento jurdico tanto naquilo que a individualiza dentre os seres humanos quanto na
quilo que a aproxima dos demais, no bastando uma ou outra concepo isoladamente.
A dignidade da pessoa, porm, no resta completamente tutelada pelo ordenamen
to jurdico por meio do respeito aos aspectos individuais e relacionais do ser huma
no. As exigncias negativas, excludentes de ataques externos que neguem ou violem a
dignidade humana, embora importantes, so insuficientes; a dignidade humana exige
tambm o reconhecimento jurdico de todas as potencialidades humanas, de todo o seu
dinamismo de afirmao e desenvolvimento, pois pessoa somente aquela que realiza
positivamente a sua personalidade.13
Afinal, a realizao do ser humano no se encerra em um conjunto de aes e reaes
como exterior; a pessoa tem seus objetivos e, ao busc-los, cresce, modifica-se, evolui. O
ser humano o responsvel pelo seu destino, altera-se, adapta-se, ele prprio um pro
jeto a realizar.14Essa dimenso realizacional, que caracteriza a pessoa como ser dinmico,
tambm imprescindvel para a apreenso completa do ser humano.
Assim, resta claro que uma definio tcnico-jurdica de pessoa adequada, embora
se relacione necessariamente com a suscetibilidade para titularizar direitos e obriga
es, no pode descurar o ser humano que existe por trs da formalizao jurdica e
a dignidade que lhe nsita. Deve ainda ser um conceito suficientemente aberto para
abarcar tanto a ideia de humanidade - entendida como repositrio das caractersticas
comuns a qualquer ser humano - como a originalidade de cada pessoa.15No seria pos
svel, portanto, ao legislador pretender um conceito restrito que fabrique o arqutipo
da pessoa normal ou dominante; as semelhanas e diferenas entre os seres humanos,
conquanto que compatveis com um padro mnimo de tica exigido pelo ordenamento
jurdico, devem ser todas abrangidas pela definio ideal de pessoa.16
Nesse sentido, poder-se-ia ento sugerir uma definio de pessoa como o ente do
tado de conscincia, transcendncia e dignidade, com existncia no s biolgica, mas
tambm intelectual, e no s individual, mas tambm coletiva, caracterizando-se ainda
pela dinmica de evoluo por que passa durante toda a vida. E esse ente, em seus
aspectos biolgico e intelectual, em sua individualidade e em suas relaes sociais, e
em constante processo de desenvolvimento, que o direito deve tutelar e a quem deve
conferir direitos e obrigaes.
2.2 O conceito de personalidade: dinmica e proteo
Pessoa e personalidade so vocbulos muitas vezes utilizados de forma intercambi-
vel, como se tivessem significados equivalentes. Entretanto, no tm. Para fixar de
7 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
11 N EVES , A . Cas t an h e ir a, L i e s de in t r o du o ao e s t udo do D ir e it o . Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 1 9 6 8 -
1 9 6 9 . p , 1 3 4 .
14 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. Op . cit . p . 4 0 - 4 1 .
15 S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Cap e lo de . O dir e it o ge r al de p e r s o n alidade . Co imb r a: Co imb r a Edit o r a,
1 9 9 5 . p . 1 1 2 .
16 S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Cap e lo de . Op . cit . p . 1 1 6 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 7 1
forma geral a separao entre os conceitos, pode-se iniciar dizendo que a pessoa
o ente e a personalidade o modo de ser do ente; a pessoa o sujeito que existe e a
personalidade a disposio do sujeito em agir de determinada maneira na conduo
de sua existncia.17
A personalidade humana pode ser muito bem definida, com Capelo de Sousa, como
a unidade fsico-psquico-ambiental que coordena e assume as suas funes e que
composta por uma grande multiplicidade e diversidade de elementos, internos e am
bientais, que integradamente se fundem em um conjunto que os ultrapassa, referencia-
-os e projeta-os em si mesmo em uma dinmica prpria.18
Assim, pode-se dizer que o ser humano, levando em si um conjunto prprio de
aptides ou disposies e influenciado pelas experincias que adquire em seus relacio
namentos sociais, acaba desenvolvendo um jeito nico e progressivamente evolutivo
de lidar com os fatos da vida.19Esse modus essendi individual, que permite a cada pessoa
alimentai seus trs apetites - as exigncias naturais (viver, conservar-se e desenvolver-
-se), o apetite sensitivo (relacionado realizao da personalidade, como so a inviola
bilidade da dignidade e intimidade e a aspirao de amar e ser amado) e o apetite inte
lectual ou vontade (dirige-se ao bem em si mesmo, sendo adequado s potencialidades
humanas mais elevadas)20-, o que se pode chamar de personalidade.
Tal como a pessoa, a personalidade tambm uma realidade e sua essncia deve ser
considerada pelo ordenamento jurdico no momento da tutela, sob pena do indesejvel
anacronismo jurdico a que j se fez referncia anteriormente. A personalidade humana
um prius da personalidade jurdica do homem; um prus lgico, ontolgico e axiol-
gico, embora no seja um prius cronolgico.11Por isso, a personalidade humana que
deve servir de alicerce para a personalidade jurdica e no o contrrio; a personalidade
deve ser considerada como a causa da titularidade de direitos e obrigaes e no conse
qncia dela.22
17 GON A L VES , D io go Co s t a. Op . cit . p . 6 4 . O aut o r e x p lica a dis t in o p o r me io de in daga e s . A p r ime ir a
de las s e r ia: o que o Ho me m? E a r e s p o s t a: o Ho me m a p e s s o a. Em s e guida, a s e gun da in daga o s e r ia: s e
o Ho me m a p e s s o a, e n t o que m o Ho me m? A r e s p o s t a a e s s a s e gun da p e r gun t a , s e gun do e le , o co n ce it o
de p e r s o n alidade .
Ia S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Cap e lo de . Op . cit . p . 2 0 0 .
19 D io go Co s t a Go n alv e s ( Op . cit . p . 6 3 - 6 8 ) fala e m p e r s o n alidade p s quica e p e r s o n alidade n t ica. A p r i
me ir a, ide n t ifican do - s e co m o co n jun t o de dis p o s i e s de car t e r o u mo do s de at ua o t ip ificado s , o u s e ja,
co m as qualidade s e de fe it o s da p e s s o a, r e dut o r a, s e co n s ide r ada s o zin h a. A s qualidade s do e n t e , n at ur ais
o u adquir idas , de v e m s e r co mp le me n t adas p e las r e la e s h uman as p ar a s e t e r um co n ce it o co mp le t o de p e r
s o n alidade . Par a o aut o r , p o r t an t o , p e r s o n alidade s e r ia "o co n jun t o das qualidade s e r e la e s que de t e r min am
a p e s s o a e m s i me s ma e e m fun o da p ar t icip a o n a o r de m do s e r , de fo r ma n ica e s in gular ".
20 S IL VA , Man ue l D uar t e Go me s da. Es b o o de uma co n ce p o p e r s o n alis t a do D ir e it o . L is b o a: F aculda
de de D ir e it o da Un iv e r s idade de L is b o a, 1 9 6 5 . p . 6 2 - 6 3 .
21 CA RVA L HO, Or lan do de . Os dir e it o s do h o me m n o D ir e it o Civ il p o r t ugus . Co imb r a: Edi o do
A ut o r , 1 9 7 3 . p . 1 8 .
22 VA S CON CEL OS , Pe dr o Man ue l de Me lo Pais de . Te o r ia do D ir e it o Civ il. 5 . e d. Co imb r a: A lme din a,
2 0 0 8 . p . 3 8 . N o me s mo s e n t ido , co n s ide r an do a p e r s o n alidade co mo o p o n t o de p ar t ida de t o do s o s dir e it o s e
7 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
O reconhecimento da personalidade pelo ordenamento jurdico , portanto, nsito
prpria ideia de Direito,23se se pretender legtimo regulador das relaes jurdicas enta-
buladas entre as pessoas no exerccio de seus direitos e deveres. E que a personalidade
jurdica uma qualidade jurdica ou estatuto onde se vaza diretamente a dignidade do
homem, de todos os homens.24
Dessa sorte, a personalidade jurdica j no pode ser modernamente considerada
como equiparada ao conceito de sujeito de direito.25Deve, sim, ser compreendida como
o atributo reconhecido a uma pessoa para que possa atuar no plano jurdico, titularizan-
do relaes e reclamando direitos e deveres, mas sem olvidar que sua ntima conexo
com o ser humano real torna seu reconhecimento conseqncia do princpio da digni
dade humana.26A personalidade humana um valor jurdico que no pode ser reduzido
a uma "situao jurdica-tipo ou a um elenco de direitos subjetivos tpicos se se quiser
garantir uma proteo eficaz e efetiva s mltiplas e variadas situaes em que a pessoa
venha a se encontrar, envolta em suas prprias e variadas circunstncias.27
Com tudo isso, porm, no se quer dizer que a personalidade, que naturalmente
ilimitvel e dinmica em si mesma, seja tambm juridicamente ilimitvel - e aqui sur
gem os problemas interpretativos quanto extenso de sua tutela.28A relao entre a
personalidade real e a personalidade jurdica deve dar-se de forma circular, com o orde
namento jurdico atribuindo juridicidade personalidade humana e estabelecendo-lhe
limites pela considerao de outros bens jurdicos, mas sendo tambm por ela limitado
no sentido de garantir a dignidade humana.29
A proteo personalidade humana, portanto, deve ser ampla e apta a garantir as
condies essenciais para que a pessoa possa desenvolver-se verdadeiramente no ser
e no devir30 sem descurar os demais bens juridicamente relevantes.31 E, embora no
o b r iga e s , v e r PEREIRA , Caio Mar io da S ilv a. In s t it ui e s de D ir e it o Civ il. 1 9 . e d. r e v . e act . Rio de Jan e ir o :
F o r e n s e , 2 0 0 1 . v. 1 , p . 1 5 4 .
23 PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Op . cit . p . 8 4 .
24 PIN TO, Car lo s A lb e r t o da Mo t a. Op . cit . p . 8 6 .
25 Em s e n t ido co n t r r io , ide n t ifican do a p e r s o n alidade co m a cap acidade jur dica, v e r VEN OS A , S lv io de
S alv o . D ir e it o civ il - p ar t e ge r al. 8 . e d. S o Paulo : A t las , 2 0 0 8 . v . 1 , p . 1 3 2 .
26 F A RIA S , Cr is t ian o Ch av e s de ; ROS EN VA L D , N e ls o n . Op . cit . p . 1 0 4 .
27 TEPED IN O, Gus t av o . Cr is e de fo n t e s n o r mat iv as e t cn ica le gis lat iv a n a p ar t e ge r al do Cdigo Civ il de
2 0 0 2 . In : TEPED 1 N O, Gus t av o ( Co o r d.) . A p ar t e ge r al do n o v o Cdigo Civ il - e s t udo s n a p e r s p e ct iv a civ il-
- co n s t it udo n al. Rio de Jan e ir o : Re n o v ar , 2 0 0 2 . p . XXffl.
21 S OUS A , Rab in dr an at h V A . Cap e lo de . A Co n s t it ui o e o s dir e it o s de p e r s o n alidade , cit ., p . 1 7 5 .
29 N e s s e s e n t ido , CUPIS , A dr ian o de . Os dir e it o s da p e r s o n alidade . Tr adu o de A dr ian o Ve r a Jar dim e
A n t n io Migue l Cae ir o . L is b o a: L iv r ar ia Mo r ais , 1 9 6 1 . p . 1 3 .
30 CA RVA L HO, Or lan do de . Op . cit . p . 2 4 - 2 5 .
31 En t e n de n do n ula qualque r limit a o da p e r s o n alidade que n o v is e ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r
s o n alidade s e gun do v alo r e s t ico s , v e r CA MPOS , D io go L e it e de . A r e la o da p e s s o a co n s igo me s ma. In :
V r io s A ut o r e s . Co me mo r a o do s 3 5 an o s do Cdigo Civ il e do s 2 5 an o s da r e fo r ma de 1 9 7 7 . Co imb r a:
Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 6 . v . 2 , p . 1 4 5 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 7 3
se negue que as ideias e conceitos em torno da personalidade humana tenham uma
indefinibilidade caracterstica, no h como ser preciso demais nessas definies sem
ocasionar restries indevidas. A vagueza, nesse contexto, propositada no intuito de
respeitar a individualidade e a evolutividade da personalidade humana.
No Direito Privado, a tutela da personalidade especialmente conferida pelos di
reitos de personalidade,32 que podem ser definidos como os direitos subjetivos que
incidem sobre a prpria pessoa ou sobre a personalidade humana, tutelando aspectos
inerentes a cada indivduo.33O nexo estreitssimo com a pessoa e a identificao com
os bens de maior valor tutelados pelo ordenamento jurdico justificam uma situao
de proeminncia dos direitos da personalidade no mbito civilstico34e conferem-lhes
caractersticas especiais tais como a essencialidade - imprescindveis tutela da per
sonalidade jurdica generalidade - so de titularidade de todos os seres humanos -,
carter absoluto - devem ser universalmente respeitados -, pessoalidade - no gozam
de carter patrimonial, embora tenham por vezes reflexos patrimoniais -, intransmis-
sibilidade - no podem ser passados de uma pessoa para a outra - e indisponibilidade
- no podem ser renunciados, embora o titular no fique despojado do direito de oca
sionalmente limit-los de acordo com seus interesses.
Ademais, pode-se dizer que os direitos de personalidade tutelam a pessoa tanto
por uma vertente objetiva quanto por uma vertente subjetiva, representando o dilogo
entre o bem comum e o bem prprio, entre a coletividade e a individualidade;35o direito
objetivo o direito visto pela inteligncia, ao passo que o direito subjetivo o direito
vivido pela conscincia, so o cncavo e o convexo de uma mesma realidade.36A ver
tente objetiva do direito de personalidade relaciona-se, portanto, com o dever geral de
respeito pessoa e personalidade humana fundado em razes de ordem pblica e de
bem comum. A vertente subjetiva do direito de personalidade, de outra banda, tem que
ver com a possibilidade que cada ser humano tem de agir em defesa da prpria dignida
de.37E na juno das duas vertentes que o Direito Civil pode cumprir sua funo de ser,
32 Re fe r in do - s e ao s dir e it o s de p e r s o n alidade co mo as v e r dade ir as mur alh as an t e p o s t as p e lo D ir e it o co mo
de fe s a da p e s s o a fr e n t e a in v as e s de qualque r o ut r o co mp o n e n t e da co le t iv idade , B ITTA R, Car lo s A lb e r t o .
Os dir e it o s da p e r s o n alidade . 6 . e d. Rio de Jan e ir o : F o r e n s e Un iv e r s it r ia, 2 0 0 3 . p . 6 5 .
33 PIN TO, Paulo Mo t a. Os dir e it o s de p e r s o n alidade n o Cdigo Civ il p o r t ugus e n o n o v o Cdigo Civ il
b r as ile ir o . Re v is t a da A jur is , n " 3 1 , 9 6 , p . 4 0 7 - 4 3 7 , Po r t o A le gr e : A jur is , 2 0 0 4 . p . 4 0 7 .
34 CUPIS , A dr ian o de . Op . cit . p . 2 2 .
35 VA S CON CEL OS , Pe dr o Man ue l de Me lo Pais de . D ir e it o da p e r s o n alidade - r e lat r io s o b r e o p r o gr ama
e o m t o do n o e n s in o de uma dis cip lin a de me s t r ado e m D ir e it o Civ il. L is b o a: F aculdade de D ir e it o , 2 0 0 6 .
p . 5 7 .
36 MON CA D A , L u s Cab r al de . L i e s de dir e it o civ il - p ar t e ge r al. 4 . e d. r e v is t a. Co imb r a: A lme din a,
1 9 9 5 . p . 5 8 .
37 D io go L e it e de Camp o s r e le mb r a que a v is o do dir e it o s ub je t iv o que s e r e s t r in ge a um p o de r de v o n t ade
do t it ular un ilat e r al e in co mp le t a, p o is e s que ce que a face do dir e it o o de v e r , O dir e it o s ub je t iv o , p o r t an t o ,
de v e s e r in t e r n ame n t e co mp o s t o p e lo de v e r t ico - jur dico p e r an t e a o ut r a p ar t e , t r an s fo r man do - s e e m p o de r -
- de v e r , v e culo de co lab o r a o e n t r e o s in div duo s ( CA MPOS , D io go L e it e de . Os dir e it o s de p e r s o n alidade :
cat e go r ia e m r e ap r e cia o . B o le t im do Min is t r io da Jus t i a, 4 0 3 , p . 5 - 1 6 . L is b o a: Gab in e t e de D o cume n t a
o e D ir e it o Co mp ar ado da Pr o cur ado r ia Ge r al da Re p b lica, 1 9 9 1 ) .
7 4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
a um s tempo, garantidor jurdico dos princpios e valores fundamentais da sociedade
e protetor da individualidade de cada pessoa.38
Por fim, observa-se que os direitos de personalidade so o correspectivo privatsti-
co dos direitos fundamentais que incidem sobre bens de personalidade,39mas isso no
os transforma em direitos menos importantes do que estes ou em direitos de segundo
escalo. Assim como os direitos fundamentais so essenciais na tutela da pessoa em
suas relaes com o Estado, os direitos de personalidade so fundamentais na proteo
da pessoa em suas relaes privadas, mormente quando se considera a existncia de
estruturas de direito privado com poder e influncia quase equiparveis s dos prprios
rgos do Estado.40Os direitos de personalidade, incidindo sobre idnticos bens sobre
os quais incidem diversos direitos fundamentais, destinam-se a fornecer proteo aos
aspectos mais essenciais do ser humano sob olhar diverso, complementando a tutela
jurdica da pessoa para que alcance tanto as relaes pblicas quanto as privadas. Afinal,
no foi ao Estado que se costumou denominar o lobo do homem.41
2.3 O valor da dignidade humana
A dignidade humana o ditoso fruto de sculos de evoluo do pensamento hu
mano acerca da natureza e dos fins do prprio ser humano. Com Jnatas Machado,
pode-se dizer que a dignidade humana representa "uma sntese, dotada de elevado grau
de generalidade e abstrao, dos principais desenvolvimentos teleolgicos, filosficos,
ideolgicos e teortico-polticos resultantes da reflexo multi-secular em tomo da pes
soa e do significado que as suas capacidades, exigncias e objetivos espirituais, morais,
racionais, emocionais, fsicos e sociais, juntamente com as suas limitaes e necessida
des, devem assumir na conformao da comunidade poltica" .42
A dignidade humana, radicada que est na capacidade e no encargo do ser humano
em sua autoconstruo, aquilo que o distingue e superioriza em relao s demais
criaturas viventes.43, portanto, o motivo e o fundamento da especial tutela da pessoa
38 OL IVEIRA , N un o Pin t o . D ir e it o s de p e r s o n alidade : co n t r ib ut o p ar a a r e v is o das dis p o s i e s do Cdigo
Civ il. Th e mis - Re v is t a da F aculdade de D ir e it o da UN L , Cdigo Civ il p o r t ugus - e v o lu o e p e r s p e c
t iv as , e di o e s p e cial, p . 2 0 9 - 2 2 7 , L is b o a: F aculdade de D ir e it o da Un iv e r s idade N o v a de L is b o a, maio 2 0 0 8 .
PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 4 0 7 .
10 S o b r e as s e me lh an as e dife r e n as e n t r e dir e it o s fun dame n t ais e dir e it o s de p e r s o n alidade , v e r MIRA N
DA , Jo r ge . Man ual de dir e it o co n s t it ucio n al. 4 . e d. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 8 . p . 6 7 - 6 9 . t . IV; A L E
XA N D RIN O, Jo s de Me lo . D ir e it o s fun dame n t ais - in t r o du o ge r al. Es t o r il: Pr in cip ia, 2 0 0 7 . p . 3 2 ; CA
N OTIL HO, J. J. Go me s . D ir e it o co n s t it ucio n al e t e o r ia da co n s t it ui o . 7 . e d. Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 3 .
p . 3 9 6 .
41 VID E Car lo s Ro ge l. B ie n e s de la p e r s o n alidad, de r e ch o s fun dame n t ale s y lib e r t ade s p b licas . B o lo -
n ia: Pub licacio n e s de i Re al Co l gio de Es p an a, 1 9 8 5 . p . 1 2 1 .
41 MA CHA D O, Jn at as E. M. L ib e r dade de e x p r e s s o - dime n s e s co n s t it ucio n ais da e s fe r a p b lica n o
s is t e ma s o cial. S t v dia Iv r idica - B o le t im da F aculdade de D ir e it o da Un iv e r s idade de Co imb r a, 6 5 , Co imb r a:
Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 2 . p . 3 5 8 - 3 5 9 .
43 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. A dign idade da p e s s o a e o fun dame n t o do s dir e it o s h uman o s . Re v is t a da
Or de m do s A dv o gado s , 6 8 , 1 , p . 9 7 - 1 2 4 . L is b o a: Or de m do s A dv o gado s Po r t ugue s a, 2 0 0 8 . p . 1 1 7 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 7 5
e da personalidade pelo Direito, assim como a base em que se aliceram os Estados de
Direito contemporneos.
Diante do necessrio respeito essncia da personalidade humana, o Estado s
goza de legitimidade em sua atuao na medida em que limita a si prprio para garantir
ao indivduo um espao de razovel autonomia livre da interferncia de qualquer poder
externo.44E o modelo de Estado mais apropriado tutela da pessoa e de sua dignidade
todo aquele que se possa denominar de Estado de Direito humano, por ressaltar a
individualidade de cada ser humano e possibilitar a construo de uma sociedade mais
humana e solidria.45
E evidente que a dignidade humana, se se pretender a representao da individua
lidade e da autonomia da pessoa, no pode ser formada por conceitos absolutos que
delimitem as maneiras de exerc-la e defend-la, pois isso implicaria a criao de um
espectro estatal de homem digno. O conceito de dignidade humana deve permanecer
sempre aberto, "desvinculado de qualquer concepo mundividencial fechada e heter-
noma acerca do sentido existencial e tico da vida, no podendo servir para a imposio
constitucional de um qualquer absolutismo valorativo.46
O que deve sempre caracterizar a dignidade humana a autonomia de todo ser
humano na produo do sentido de sua prpria dignidade, remetendo s ideias de auto
determinao, livre desenvolvimento da personalidade e livre eleio e adoo de planos
e formas de vida.47No se trata, portanto, de uma dignidade meramente descritiva,
mensurvel e comparvel, mas de dignidade material, com uma adscrio moral perso
nalidade individual,48pois na individualidade e autonomia de cada pessoa que reside
a prpria dignidade humana.49Essa proteo individualizada da dignidade humana, ao
contrrio de prejudicar a integrao entre as pessoas e os bens e interesses na sociedade,
anda mesmo a favor da mais moderna concepo de liberdade individual, que supe
deveres de preveno, proteo e promoo adicionados ao dever de no afetao, e em
direo s condies necessrias ao livre desenvolvimento da personalidade.50
44 OTERO, Paulo . In s t it ui e s p o l t icas e co n s t it ucio n ais . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 9 . v . 1 , p . 4 8 6 .
45 OTERO, Paulo . Op . dt . p . 4 7 9 - 4 8 0 . D e aco r do co m Paulo Ot e r o , o Es t ado h uman o o r e s ult ado jur dico
de t r s p r in cip ais co n t r ib ut o s filo s fico s : a o r de m ax io lgica judaico - cr is t - co m a v alo r iza o da n at ur e za s a
gr ada da dign idade h uman a, da lib e r dade in div idual e da igualdade de t o do s o s h o me n s e a b us ca da limit a o
do p o de r e da jus t i a s o cial - , o p e n s ame n t o kan t ian o - co m o co mb at e in s t r ume n t aliza o do s e r h uman o
e a difus o da ide ia de que o h o me m s e mp r e um fim e m s i me s mo , n un ca p o de n do s e r t r an s fo r mado e m o u
t r at ado co mo me io , r e s idin do n is s o s ua dign idade - e a filo s o fia e x is t e n cialis t a - co m o r e fo r o das ide ias de
dign idade de cada p e s s o a v iv a e co n cr e t a, de lib e r dade p lur alis t a, de igualdade , de r e lat iv is mo de o p in ie s e
de t o le r n cia e h umildade .
46 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 3 5 8 - 3 5 9 .
47 N OVA IS , Jo r ge Re is . Os p r in c p io s co n s t it ucio n ais e s t r ut ur an t e s da Re p b lica Po r t ugue s a. Co im
b r a: Co imb r a, 2 0 0 4 . p . 5 8 .
4a MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 3 5 8 - 3 5 9 .
49 OTERO, Paulo . Op . dt . p . 4 8 4 .
50 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . A e s t r ut ur a o do s is t e ma de dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias n a
Co n s t it ui o Po r t ugue s a - a co n s t r u o do gm t ica. Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 6 . v . 2 , p . 3 1 4 - 3 1 5 .
7 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Na Constituio da Repblica Portuguesa de 1976, a dignidade humana deve ser
vista como um conceito aberto e mnimo,51que, transcendendo o domnio dos direitos
fundamentais, constitui um elemento de base de toda a ordem constitucional.52Sua aco
lhida no texto constitucional, porm, no pode ser entendida como seu desaparecimen
to como valor; a dignidade humana reconhecida constitucionalmente continua valor
moral autnomo, agregando-se-lhe a faceta de dever-ser jurdico53que desempenha pri
mordialmente funo simblica, funo instrumental - de parmetro de interpretao e
integrao de normas, bem como de reforo e de fundamento para a reduo dos efeitos
de proteo - e funo de proteo - servindo como eventual critrio de ltimo recurso
ou como fundamento de especiais deveres de proteo e de promoo.54
Embora sejam de rdua resoluo as questes que envolvem a identificao do m
bito concreto e autnomo de atuao da dignidade humana no ordenamento jurdico,55
certo que ela veda por inconstitucional qualquer tratamento que reduza a pessoa
situao de objeto. Assim, conforme ensina Jorge Reis Novais, afetando o Estado pes
soa de maneira desnecessria, futil ou desproporcional ou ainda quando queira instru
mentalizar a autonomia individual ou reduzir objetivamente as oportunidades de livre
desenvolvimento da personalidade, sem que haja justificao pela estrita necessidade de
realizao de fins, valores ou interesses dignos de proteo jurdica e efetuados segundo
procedimentos e com sentido e alcance constitucionalmente conformes, h indubitvel
ofensa dignidade humana.56
de se ver, portanto, a ntima ligao entre dignidade humana e livre desenvol
vimento da personalidade, j que ambas - o valor jurdico constitucional e o direito
fundamental de personalidade - tm como fim ltimo a garantia da autonomia de cada
indivduo na definio de como realiza os prprios fins, no podendo o Estado tolher-
-lhe essa liberdade ainda que a pretexto da busca de outros valores jurdicos. A restrio
autonomia individual, para ser legtima, exige ao menos a garantia de participao do
indivduo na formao da vontade democrtica, a manuteno da adequao, da neces
sidade e da proporcionalidade na medida e a conservao de um "ncleo mnimo de
51 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . D ir e it o s fun dame n t ais - in t r o du o ge r al, cit ., p . 6 0 .
52 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . A e s t r ut ur a o do s is t e ma de dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias n a
Co n s t it ui o Po r t ugue s a - a co n s t r u o do gm t ica, cit ., p . 3 1 2 .
53 N OVA IS , Jo r ge Re is . Op . cit . p . 5 1 .
H A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . D ir e it o s fun dame n t ais - in t r o du o ge r al, cit ., p . 6 2 .
55 N e s s e s e n t ido , Jo s de Me lo A le x an dr in o ( A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . A e s t r ut ur a o do s is t e
ma de dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias n a Co n s t it ui o Po r t ugue s a - a co n s t r u o do gm t ica, o p . cit .
p . 3 1 0 - 3 1 1 ) ressalta que, t e n do e m co n t a a "co e x is t n cia n o s e io de uma me s ma co mun idade p o l t ica de uma
div e r s idade de mun div idn cias e de co n ce p e s ace r ca da image m do h o me m e da s ua dign idade , dificilme n t e
o co n ce it o co n s t it ucio n alme n t e r e le v an t e a at r ib uir ao p r in c p io da dign idade da p e s s o a h uman a p o de r ia de i
x ar de s e r afe t ado p e lo co mp r o mis s o e n t r e as e x ign cias de s e gur an a, ce r t e za e co n t r o lab ilidade r e que r idas
p e la o r de m jur dica, de um lado , e aque le e s p e ct r o de div e r gn cias , p o r o ut r o . O que s ign ifica que o co n ce it o
jur dico ain da um co n ce it o m n imo , ap r o x imado , r e lat iv o , in co mp le t o e e s s e n cialme n t e p r agm t ico ".
56 N OVA IS , Jo r ge Re is . Op . cit . p . 5 7 - 5 8 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 7 7
possibilidades de levar uma vida digna em condies de liberdade e de autoconformao
que vm implicadas na necessria considerao do indivduo como sujeito".57
3 O livre desenvolvimento da personalidade
O livre desenvolvimento da personalidade, de par com a dignidade humana, so
as pedras de toque de um Direito Civil legtimo no interior de um Estado de Direito
humano.58
O desenvolvimento da personalidade evoca as ideias de liberdade, de autonomia,
de autodeterminao do ser humano nas escolhas importantes da vida para que possa
ser aquilo que ; remete ao livre-arbtrio que acompanha o ser humano desde seus
primrdios e termina por ser entendida e sentida por cada pessoa de seu modo parti
cular e nisso no resta dificuldade alguma.59O problema, porm, est no transporte do
conceito para o mbito jurdico, no entendimento de como o Direito pode tutelar esse
desenvolvimento humano de forma a garantir-lhe a liberdade sem interferir nos resul
tados que cada pessoa alcana.
A busca de uma possvel definio tcnico-jurdica de livre desenvolvimento da per
sonalidade, bem como os meios de que dispe o ordenamento jurdico para assegur-lo,
so, portanto, algumas das preocupaes iniciais deste captulo.
Superada essa fase, o caminho natural a ser seguido passa por perscratar as origens
de um direito ao livre desenvolvimento da personalidade no Direito Constitucional ale
mo e por compreender suas relaes com os direitos de liberdade e com um eventual
direito geral de personalidade.
57 N OVA IS , Jo r ge Re is . Op . dt . p . 5 7 - 5 8 .
58 CA RVA L HO, Or lan do de . A t e o r ia ge r al da r e la o jur dica - s e us s e n t ido s e limit e s . 2 . e d. Co imb r a:
Ce n t e lh a, 1 9 8 1 . p . 9 3 .
59 N e s s e s e n t ido , v ale cit ar t r e ch o do in s p ir ado Mir an do la ( MIRA N D OL A , Picco D e lia. D is cur s o s o b r e a
dign idade do h o me m. Tr adu o de Mar ia de L o ur de s S ir gado Gan h o . L is b o a: Edi e s 7 0 , 2 0 0 8 . p . 5 7 - 5 9 ) :
"Es t ab e le ce u, p o r t an t o , o t imo ar t fice que que le a que m n ada de e s p e cificame n t e p r p r io p o dia co n ce de r ,
fo s s e co mum t udo o que t in h a s ido dado p ar ce ladame n t e ao s o ut r o s . A s s im, t o mo u o h o me m co mo o b r a de
n at ur e za in de fin ida e , co lo can do - o n o me io do mun do , falo u- lh e de s t e mo do : ' A do , n o t e de mo s n e m um
lugar de t e r min ado , n e m um as p e ct o que t e s e ja p r p r io , n e m t ar e fa alguma e s p e c fica, a fim de que o b t e n h as
e p o s s uas aque le lugar , aque le as p e ct o , aque la t ar e fa que t u s e gur ame n t e de s e jar e s , t udo s e gun do o t e u p ar e
ce r e a t ua de cis o . A n at ur e za b e m de fin ida do s o ut r o s s e r e s r e fr e ada p o r le is p o r n s p r e s cr it as . Tu, p e lo
co n t r r io , n o co n s t r an gido p o r n e n h uma limit a o , de t e r min a- las - p ar a t i, s e gun do o t e u ar b t r io , a cujo
p o de r t e e n t r e gue i. Co lo que i- t e n o me io do mun do p ar a que dai p o s s as o lh ar me lh o r t udo o que h n o mun do .
N o t e fize mo s ce le s t e n e m t e r r e n o , n e m mo r t al n e m imo r t al, a fim de que t u, r b it r o e s o b e r an o ar t fice de
s i me s mo , t e p las mas s e s e t e in fo r mas s e s , n a fo r ma que t iv e s s e s s e gur ame n t e e s co lh ido . Po de r s de ge n e r ar
at ao s s e r e s que s o as b e s t as , p o de r s r e ge n e r ar - t e at s r e alidade s s up e r io r e s que s o div in as , p o r de cis o
do t e u n imo '. O s uma lib e r dade de D e us p ai, s uma' e admir v e l fe licidade do h o me m! A o qual co n ce dido
o b t e r o que de s e ja, s e r aquilo que que r . [...] Que m n o admir ar e s t e n o s s o camale o ?
7 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
3.1 O conceito de desenvolvimento da personalidade
Tendo como premissa os conceitos abertos e dinmicos de pessoa e de personali
dade expostos no item anterior, no resta muita dificuldade para compreender o que
se quer dizer com desenvolvimento da personalidade. A ideia do desenvolvimento da
personalidade permitir que a pessoa se desenvolva naquilo que , naquilo que vai
sendo e naquilo que vir a ser;60significa, portanto, o respeito pelas escolhas de cada
ser humano para a prpria formao durante toda a vida como forma de preservar suas
nsitas individualidade e dignidade.
Ao real e original desenvolvimento da personalidade intrnseca a ideia de liber
dade, pois a dignidade humana exige do Estado a tutela do "indivduo conformador de
si prprio e de sua vida segundo o seu prprio projeto espiritual, vedando qualquer
forma de construo ou instituio de personalidade que no seja aquela livremente
estabelecida pela prpria pessoa.61Afinal, o ser humano no se realizaria verdadeira
mente se o fizesse da maneira previamente determinada pelo Estado ou por outrem; o
desenvolvimento da personalidade humana tem que ser livre e voluntrio, de forma to
nica, singular e irrepetvel quanto cada pessoa.62
Nesse ponto, preciso dar uma importante palavra sobre a liberdade. A liberdade
um anseio to presente no esprito humano que aquele que no a tem desafia todos os
limites para reav-la; pela busca da liberdade levantaram-se revolues, pela defesa da
liberdade fizeram-se as modernas Constituies, pela manuteno da liberdade iniciou-
-se uma nova era de consagrao de direitos com fora jurdica nos mais diversos ramos
do Direito. Tudo isso, porm, no pode querer representar a atribuio de uma liberda
de sem limites a cada pessoa, sob pena de significar ou a imploso da prpria estrutura
social, ou a criao de um sistema de direitos que no passem de placebos para aquietar
o esprito humano sem fomecer-lhe efetiva tutela.63
Embora conhecimento, vontade e autodeterminao dependam diretamente da
liberdade,64a liberdade no eqivale arbitrariedade das escolhas humanas. A reali
zao do ser humano certamente eivada de alta carga de subjetivismo, mas to s a
concesso de espao de movimento entre as escolhas humanas no eqivale garantia
60 VA S CON CEL OS , Pe dr o Man ue l de Me lo Pais de . Op . cit . p . 9 2 .
61 PIN TO, Paulo Mo t a. O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade . In : A A . W. Po r t ugal- B r as il
an o 2 0 0 0 - Te ma D ir e it o . Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 1 9 9 9 . p . 1 4 9 - 2 6 1 .
62 GON A L VES , D io go Co s t a. Op . dt . p . 5 6 .
63 N e s s e s e n t ido , Oliv e ir a A s ce n s o ( A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. Op . cit . p . 9 7 - 1 0 0 ) afir ma que o s culo
XXI a fas e do ap o ge u do s dir e it o s , da v it r ia da civ iliza o do s dir e it o s . S ua mult ip lica o n o s mais div e r s o s
r amo s das Cin cias Jur dicas n o imp e diu, p o r m, a v io la o do s dir e it o s de s s e h o me m, car r e gado de dir e it o s ,
mas a que m s s e o fe r e ce , n a v e r dade , adula o . E que , ain da s e gun do o Pr o fe s s o r de L is b o a, a co n co r dn cia
un iv e r s al s o b r e a e x is t n cia de dir e it o s h uman o s e s co n de um r is co : de t an t o r e p e t idas , as afir ma e s gas t am
o s e n t ido , t o r n an do - s e fr mulas v azias , s e m co n t e do , j que e s s e s e fo i e s b at e n do ao lo n go do s t e mp o s , das
b o cas e do s o uv ido s .
64 KA UF MA N N , A r t h ur . F ilo s o fia do D ir e it o . Tr adu o de A n t n io Ulis s e s Co r t s . 3 . e d. L is b o a: F un da o
Calo us t e Gulb e n kian , 2 0 0 9 . p . 3 6 2 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 7 9
do livre desenvolvimento da personalidade por pelo menos dois motivos que se pode
aqui enumerar.
O ser humano um ente a quem no basta simplesmente existir; para que seja
pleno, necessrio ser e isso implica realizao, implica dar um sentido prpria exis
tncia.65Dessa forma, o desenvolvimento da personalidade humana no depende tanto
do tamanho do espao de movimentao que se lhe confere, seno da qualidade das
opes que lhe so oferecidas.66Assim, o livre desenvolvimento da personalidade pro
porcionado no s pela ausncia de interferncia nas escolhas humanas, mas tambm
pela concesso de variadas e qualificadas opes de escolha.
Ademais, para o ser humano, ser aquilo que importa mais do que ter liberdade
para fazer o que quiser.67O anseio da pessoa rumo ao livre desenvolvimento da perso
nalidade est relacionado a sua capacidade de autodeterminao espiritual, a sua neces
sidade de poder ser a pessoa que .68
Por fim, uma ltima ressalva cabvel no que tange ao desenvolvimento da perso
nalidade: embora a realizao do homem tenha larga parte de subjetivismo, h sempre
uma dimenso objetiva da realizao humana, pois, como evidente, nem todas as for
mas de desenvolvimento pessoal dirigem-se ao ser mais - inclusive possvel a opo
pelo no ser. Assim, a tutela da liberdade necessria ao desenvolvimento voluntrio da
personalidade humana deve ser assegurada pelo ordenamento jurdico.69Isso, porm,
no significa que o ordenamento jurdico deva incentivar ou possibilitar todo e qualquer
tipo de comportamento humano, pois mesmo liberdade para a realizao dos aspectos
mais ntimos de cada pessoa devem se impor, no momento de sua exteriorizao, os
limites do eticamente razovel.
3.2 O direito ao livre desenvolvimento da personalidade: contribuio da
doutrina e da jurisprudncia alem
O livre desenvolvimento da personalidade, implcita ou expressamente menciona
do, valor inerente a qualquer Estado que constitua a pessoa, sua personalidade e sua
dignidade como centro do ordenamento jurdico. Funciona, em verdade, como uma es
pecificao da dignidade humana para conduo dos assuntos que envolvam a proteo
da personalidade em sua dinmica de constante evoluo.
65 GON A L VES , D io go Co s t a. Op . dt . p . 5 1 .
66 KA UF MA N N , A r t h ur . Op . dt . p . 3 6 1 . In s p ir ado e m Pe t e r Ko lo ws ky , o aut o r me n do n a o s e guin t e e x e m
p lo : "quan do e x amin amo s a e me n t a de um b o m r e s t aur an t e , h ge r alme n t e p o uco s e b o n s p r at o s , mas s e
fo r mo s a um mal r e s t aur an t e h ime n s o s p r at o s maus que , ap e s ar do s dife r e n t e s n o me s , n o s e dis t in gue m
e s s e n dalme n t e un s do s o ut r o s . A lgo s e me lh an t e s e p as s a co m a e me n t a s o cial que ap r e s e n t ada p e la at ual
t e o r ia do s s is t e mas : uma gr an de p an p lia de p o s s ib ilidade s co n t in ge n t e s , que p e r man e ce m e x t e r io r e s ao
s uje it o , que at in ge m o ce n t r o da s ua p e s s o a e a s ua ide n t idade ".
67 GON A L VES , D io go Co s t a. Op . dt . p . 4 4 .
68 KA UF MA N N , A r t h ur . Op . dt . p . 3 6 2 .
69 GON A L VES , D io go Co s t a. Op . cit . p . 5 6 .
8 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Como valor do ordenamento jurdico, porm, o livre desenvolvimento da personali
dade apto a desempenhar funo instrumental de dirigir a interpretao das normas e
tambm funo de proteo como ltimo recurso para o necessrio mparo da pessoa,70
garantindo-lhe certos comportamentos eventualmente questionados ou vedando outros
comportamentos apriori autorizados em lei, mas no logra conferir-lhe posio jurdica
subjetiva vantajosa. Somente se for consagrado tambm como um direito que o livre
desenvolvimento da personalidade pode efetivamente atribuir pessoa uma proteo
mais concreta em face do Estado e dos particulares, facultando-lhe um campo de mo
vimentao mais estruturado e que possa ser exigido judicialmente por determinao
constitucional.
O direito ao livre desenvolvimento da personalidade, portanto, tem propenso a
ofertar proteo muito mais efetiva pessoa, mas essa potencialidade somente se con
cretiza se for possvel estabelecer quais posies jurdicas se pode retirar desse direito.
E foi justamente no ordenamento jurdico alemo que o direito ao livre desenvolvimen
to da personalidade alcanou seus mais notveis e relevantes desenvolvimentos.
O direito ao livre desenvolvimento da personalidade aparece consagrado no artigo
2 , 1, da Constituio alem,71na toada da reconstruo germnica no perodo posterior
Segunda Guerra Mundial.
A dignidade humana foi elevada condio de estandarte da Constituio alem
e vem seguida muito de perto pelo livre desenvolvimento da personalidade, direito de
carter muito amplo e subsidirio em relao aos direitos mais especficos, funcionando
como ltimo limite da proteo da pessoa nos casos no expressamente previstos no
ordenamento jurdico.72Entretanto, a boa inteno do constituinte ao prever um direi
to ao livre desenvolvimento da personalidade apto a conferir tutela o mais alargada e
abrangente possvel pessoa e personalidade humana no foi aclamada por conside
rvel parte da doutrina germnica.
O direito ao livre desenvolvimento da personalidade foi frequentemente acusado
de ser uma frmula vazia que, ao mesmo tempo em que abrangia tudo, no protegia
nada.73Afinal, se se pretendesse conferir, por seu intermdio, a tutela de toda atuao
humana e o direito pessoa de no ser onerada seno com base nas normas formal e
materialmente acordantes com a Constituio, tornar-se-ia o livre desenvolvimento da
70 N o me s mo s e n t ido das fun e s da dign idade h uman a ap o n t adas p o r A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . D i
r e it o s fun dame n t ais - in t r o du o ge r al, dt ., p . 6 2 .
71 Grundgesetz, que s e o p t o u p o r de n o min ar de Co n s t it ui o ale m p ar a e v it ar o us o de e x p r e s s e s e s t r an ge i
r as e co n fe r ir maio r flun cia n a le it ur a do t e x t o .
n S CHWA B E, Jt ir ge n . Cin qe n t a an o s de jur is p r udn cia do Tr ib un al Co n s t it ucio n al F e de r al ale mo ,
'fr adu o de L e o n ar do Mar t in s e t al. Mo n t e v ide o : F un dacin Ko n r ad- A de n aue r , 2 0 0 5 . p . 1 8 7 .
73 A L EXY, Ro b e r t . Te o r ia do s dir e it o s fun dame n t ais . Tr adu o de Vir g lio A fo n s o da S ilv a. S o Paulo :
Malh e ir o s , 2 0 0 8 . p . 3 4 2 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 8 1
personalidade um direito insustentvel;74de outro lado, se no se lhe conferisse mbito
de proteo algum, no passaria de uma retrica constitucional.
O Tribunal Constitucional Federal alemo no acompanhou a doutrina da frmula
vazia e tampouco seguiu teorias objetivas ou restritivas,75ocupando-se logo em desen
volver o contedo do novo direito partindo no s do texto, mas tambm do contexto
constitucional. Assim, do artigo 2 , 1, da Constituio alem, o Tribunal Constitucional
Federal alemo abstraiu a liberdade geral de ao, e da conjugao daquele dispositivo
com o artigo 1,1, que veicula a dignidade humana, a Corte retirou ainda o direito geral de
personalidade. So essas especificaes que merecem tratamento nos tpicos seguintes.
3.2.1 A liberdade geral de ao
No famoso caso Slfes,76de 16 de janeiro de 1957, o Tribunal Constitucional Federal
alemo analisou a reclamao constitucional apresentada por W. Elfes, um poltico que,
aps ganhar alguma notoriedade na dcada de 1950 pelo combate s polticas de reunifi
cao alem e de defesa do governo federal, tanto dentro como fora do territrio alemo,
teve a prorrogao da validade de seu passaporte denegada pela autoridade competente
com base em dispositivo que autorizava a denegao em caso de ameaa segurana ou
interesse relevante de Estado-membro ou do prprio pas. Na ocasio, a Corte julgou
improcedente a reclamao por entender que, embora o artigo 2, I, da Constituio
alem fundamente uma liberdade geral de ao, so legtimos os limites eventualmente
impostos a essa liberdade pela ordem constitucional.77A partir dessa deciso iniciou-
-se o desenvolvimento, pelo Tribunal Constitucional alemo, de uma liberdade geral de
ao fundamentada no livre desenvolvimento da personalidade veiculado no artigo 22,
I, da Constituio alem.
A liberdade geral de ao a liberdade de se fazer ou deixar de fazer o que se quer,
implicando a cada pessoa o direito, em face do Estado, de que no haja embarao s
aes e abstenes humanas voluntrias.78Alm das aes, seriam ainda tuteladas as
situaes ou posies jurdicas do cidado, de sorte que restam protegidos pelo Direi
to tanto seu fazer quanto seu ser ftico e jurdico.79Para equilibrar o reconhecimento
74 PIEROTH, B o do ; S CHL 1 N K, B e r n h ar d. D ir e it o s fun dame n t ais - dir e it o e s t adual II. Tr adu o de A n t
n io C. F r an co e A n t n io F r an cis co S o us a. L is b o a: Un iv e r s idade L us ada, 2 0 0 8 . p . 1 1 1 .
75 A L EXY, Ro b e r t . Op . cit . p . 3 4 2 . A in da s e gun do o p r o fe s s o r de Kie l, p o de - s e r e fe r ir co mo t e o r ias o b je t iv as
aque las que r e je it am a ide ia de que o ar t igo 2 , 1, gar an t a um dir e it o s ub je t iv o que p o s s a s e r e x igido p o r s e u
t it ular , e co mo t e o r ias r e s t r it iv as aque las que b us cam de limit ar um s up o r t e f t ico do dir e it o ao liv r e de s e n v o l
v ime n t o da p e r s o n alidade , co mo o e x p r e s s iv o cas o da t e o r ia do n cle o de p e r s o n alidade de Pe t e r s a de fe n de r
que o dir e it o p r o t e ge as e x p r e s s e s da v e r dade ir a n at ur e za h uman a e m camadas que v ar iar iam e n t r e a e s fe r a
n t ima e a e s fe r a s o cial.
76 B Ve r fGE 6 , 3 2 .
77 A s in fo r ma e s s o b r e o cas o Elfes fo r am r e t ir adas de S CHWA B E, Jr ge n . Op . cit . p . 1 9 0 - 1 9 5 .
78 A L EXY, Ro b e r t . Op . cit . p . 3 4 3 .
79 A L EXY, Ro b e r t . Op . cit . p . 3 4 4 .
8 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
de um direito com substrato to alargado, o Tribunal Constitucional Federal alemo
reconheceu-lhe tambm mbito de restrio muito amplo que passa por trs limites:
direitos de outrem, ordem constitucional e lei dos bons costumes.80
de se ver que as primeiras notas do livre desenvolvimento da personalidade como
liberdade geral de ao deram-se no mbito dos direitos fundamentais, com o intuito
de assegurar a proteo do cidado contra ingerncias pblicas. Mais recentemente,
porm, o Tribunal Constitucional Federal alemo tem-se voltado para casos que, envol
vendo o direito ao livre desenvolvimento da personalidade, tocam mais incisivamente as
relaes privadas e, consequentemente, o Direito Privado. Esse tipo de situao ocorre
com considervel frequncia no campo do Direito dos Contratos.
Em sentena proferida em 19 de outubro de 1993,81o Tribunal Constitucional Fe
deral alemo analisou a validade de fiana prestada por uma filha de 21 anos para garan
tir dvida de elevado valor contrada pelo pai dela junto a instituio bancria. L evando
em conta que a fiadora no possua patrimnio de relevo ademais de um pequeno sal
rio mensal que aferia como operria, a Corte entendeu que o endividamento de pessoa
jovem, sem grau acadmico ou preparao profissional, por longos anos, nas circuns
tncias particulares em que se deu, afetaria desproporcionalmente sua situao econ
mica e, consequentemente, limitaria o livre desenvolvimento de sua personalidade. A
partir da, o Tribunal abriu precedente para que fosse possvel a ponderao no conflito
interno da liberdade em mbito contratual e deu incio a uma viragem jurisprudencial
de maior atendimento de valores existenciais da pessoa em detrimento dos tradicional
mente tutelados valores patrimoniais.82
A celebrao de contratos entre particulares inegvel manifestao da liberdade
individual, algumas vezes reconhecida em direitos especficos e outras vezes enquadra
da simplesmente no mbito geral do livre desenvolvimento da personalidade. O exerc
cio da autodeterminao contratual constitui a um s tempo manifestao e pressupos
to do livre desenvolvimento da personalidade, de sorte que a vlida produo de efeitos
jurdicos dos negcios travados essencial para o respeito da liberdade geral de ao das
partes. E que, no mbito privado, aquilo que se d a uma parte tira-se outra e por esse
motivo a interferncia estatal na soluo de negcios jurdicos vlidos deve ter sempre
atuao muito restrita.83
80 PIEROTH, B o do ; S CHL IN K, B e r n h ar d. Op . d t . p . 1 1 0 . N a li o do s me s mo s jur is t as ale me s , a o r de m
co n s t it ucio n al de v e s e r e n t e n dida co mo o co n jun t o das n o r mas que s e e n co n t r am fo r mal e mat e r ialme n t e
aco r dan t e s co m a Co n s t it ui o , s it ua o que p o de s e r av aliada me dian t e a ut iliza o do p r in c p io da p r o p o r
cio n alidade de fo r ma t an t o mais in cis iv a quan t o maio r fo r a in ge r n cia e m fo r mas de man ife s t a o e le me n
t ar e s da lib e r dade de at ua o h uman a. Os dir e it o s de o ut r e m, p o r s ua v e z, de v e m ab ar car t o do s o s dir e it o s
s ub je t iv o s co n t ido s n a o r de m co n s t it udo n al, ao p as s o que a le i do s b o n s co s t ume s , dian t e da p o s it iv a o do s
co n ce it o s de b o n s co s t ume s e de b o a- f , n o p o de at r ib uir qualque r limit e div e r s o daque le s j in s t it u do s p e la
o r de m co n s t it ucio n al ( Op . cit . p . 1 1 6 - 1 1 7 ) .
81 Juristenzeitung, 1 9 9 4 , 4 0 8 s s .
82 A s in fo r ma e s s o b r e o cas o fo r am r e t ir adas de Jo aquim de S o us a Rib e ir o ( RIB EIRO, Jo aquim de S o us a.
D ir e it o do s co n t r at o s - e s t udo s . Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 7 . p . 2 8 - 2 9 ) .
83 RIB EIRO, Jo aquim de S o us a. Op . cit . p . 2 1 - 2 2 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 8 3
No campo dos contratos, porm, a liberdade termina por conflitar consigo mesma
porque a manifestao da liberdade negociai que voluntariamente limita algum outro
mbito da liberdade individual. A interferncia estatal na escolha de qual das liberda
des merece maior proteo, ademais de injustificada no ordenamento jurdico, tende a
ferir gravemente a segurana jurdica que imprescindvel na atividade negociai;84de
outra banda, a total ausncia de controle do Estado sobre os negcios jurdicos refora a
prevalncia dos mais fortes sobre os mais fracos e afeta gravemente a liberdade de ao
desses ltimos.
por isso que o Direito Civil segue a tendncia dos demais ramos das Cincias Jur
dicas e caminha para o meio. Assegura pessoa um amplo espao livre de interferncia
estatal para que possa desenvolver-se, negociar e voluntariamente titularizar direitos
e obrigaes que entender vantajosos para a prpria vida. No descura, entretanto, de
"todos os riscos que o viver social engendra" e faz-se presente sempre que o cumpri
mento de determinadas obrigaes afetar de forma to grave o desenvolvimento da
personalidade de uma das partes que nem mesmo um mnimo de liberdade lhe reste, na
prtica, assegurado.85Assim, para alguns, o moderno Direito Civil, em busca da efetiva
tutela da pessoa e da personalidade humana, tomou para si as tarefas de possibilitar
(imabling) e proteger (protecting),86garantindo, em um primeiro momento, o exerccio
da autonomia da pessoa na conduo dos fatos da vida e intervindo, em um segundo
momento e apenas se imprescindvel, para garantir que a limitao da prpria liberdade
pela pessoa no ultrapasse os limites da proporcionalidade.
3.2.2 O direito geral de personalidade
No caso Tonband,B7 de 31 de janeiro de 1973, o Tribunal Constitucional Federal
alemo enfrentou reclamao constitucional em que se pretendia o reconhecimento da
violao ao artigo 2 , 1, da Constituio alem pela utilizao de uma fita fonogrfica, na
qual se gravou conversa sem o conhecimento e consentimento do acusado, como prova
da acusao em processo penal. A Corte, reconhecendo a procedncia da reclamao
constitucional, declarou que as posies jurdicas necessrias para o desenvolvimento
da personalidade esto tuteladas no artigo 2, I, da Constituio alem, respeitados os
limites da prpria ordem constitucional.88
O direito geral de personalidade, surgido na jurisprudncia criativa do Tribunal
Constitucional Federal alemo, fruto da conjugao do artigo 1,1, com o artigo 2, I,
da Constituio alem, que veiculam respectivamente a dignidade humana e o livre
14 RIB EIRO, Jo aquim de S o us a. Op . dt . p . 2 4 .
85 RIB EIRO, Jo aquim de S o us a. Op . dt . p . 3 3 .
15 N as e x p r e s s e s ut ilizadas p o r : RIB EIRO, Jo aquim de S o us a. Op . dt . p . 3 3 .
87 B Ve r fGE 3 4 , 2 3 8 .
88 A s in fo r ma e s s o b r e o cas o Tonban fo r am r e t ir adas de Jr ge n S ch wab e ( Op . cit . p . 1 9 5 - 1 9 7 ) .
8 4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
desenvolvimento da personalidade.89A afinidade do direito geral de personalidade com
a dignidade humana radica no fato de que tambm aquela est direcionada a proteger
a pessoa no em decorrncia de sua atuao ou modo de ser, mas simplesmente pela
sua qualidade de sujeito. O livre desenvolvimento da personalidade, por sua vez, funda
menta a existncia de um direito geral de personalidade na medida em que ambos esto
relacionados a todos os domnios da vida humana, e no apenas a algumas situaes
pontualmente referidas no ordenamento jurdico.90
A tarefa do direito geral de personalidade, portanto, garantir a manuteno das
condies bsicas para a existncia da pessoa, impedindo que a ausncia de previso
normativa de direitos especficos termine por relegar ao limbo jurdico determinados
aspectos da personalidade que no tenham sido tutelados pelo legislador. Assim, o di
reito geral de personalidade protege tanto um elemento ativo (fazer) quanto um ele
mento passivo (ser) do direito ao desenvolvimento da personalidade.91
A questo que surge nesse ponto a de saber por que o Tribunal Constitucional
Federal alemo, cuja funo primordial a atuao em sede de controle de constitucio-
nalidade, ter-se-ia preocupado em desenvolver, a partir do direito constitucional ao livre
desenvolvimento da personalidade, a figura do direito geral de personalidade, muito
mais afeta ao direito privado do que ao direito pblico. E a anlise do teor do Cdigo
Civil alemo92que responde a questo.
A proteo da personalidade humana no Cdigo Civil alemo limita-se ao reconhe
cimento, no 823,1, da responsabilidade civil em caso de leso aos bens vida, corpo,
sade e liberdade,93restando os demais bens e aspectos da pessoa e da personalidade
completamente desamparados pelo Direito Privado germnico. Ao passo que a Cons
tituio alem do perodo posterior Segunda Guerra Mundial reconheceu o primado
da pessoa e elevou a dignidade humana a valor mximo de todo o ordenamento jurdi
co. Nesse sentido, a Corte Constitucional alem elaborou a figura do direito geral de
personalidade, sob a justificativa de que o primado da pessoa impunha que todos os
aspectos da personalidade gozassem de proteo.94 O direito geral de personalidade
foi, portanto, uma necessidade scio-jurdica historicamente justificada no contexto do
Direito alemo.
89 Par a um b r e v e ap an h ado h is t r ico s o b r e a e v o lu o do dir e it o ge r al de p e r s o n alidade n a A le man h a, v e r
L UD WIG, Mar co s de Camp o s . O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade n a A le man h a. Re v is t a da
A jur is , 2 6 , 8 , p . 1 4 3 - 1 7 4 , Po r t o A le gr e : A jur is , 2 0 0 1 ,
90 PIEROTH, B o do ; S CHL IN K, B e r n h ar d. Op . cit . p . 1 1 2 .
91 A L EXY, Ro b e r t . Op . cit . p . 3 6 7 .
92 Biirgerliches Gesetzbuch, t amb m r e fe r ido p e lo acr n imo B GB , que s e o p t o u p o r de n o min ar de Cdigo Civ il
ale mo p ar a e v it ar o us o de e x p r e s s e s e s t r an ge ir as e co n fe r ir maio r flun cia n a le it ur a do t e x t o .
93 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. Os dir e it o s de p e r s o n alidade n o Cdigo Civ il b r as ile ir o . D is p o n v e l e m:
<www.fdMlpt/Portals/0/Docs/..JIJ/.../AscensaoJoseOliveiral0.pdf>, p . 4 , A ce s s o e m: 2 0 fe v . 2 0 1 0 .
94 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. Op . d t . p . 1 0 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 8 5
O direito geral de personalidade produzido pela jurisprudncia do Tribunal Consti
tucional Federal alemo tem por objetivo tutelar os diversos modos de desenvolvimento
de seu titular95e seu mbito vem adquirindo preciso por meio da especificao de um
conjunto de direitos concretos96comumente repartidos em direitos de autodetermina
o, de autopreservao e de autoapresentao.97
O direito autodeterminao caracteriza-se como o poder de determinar por si pr
prio a sua identidade e no ser onerado de maneira que afete massivamente a formao
e a afirmao da identidade98. Com base nesse direito, o Tribunal Constitucional Federal
alemo j decidiu diversas vezes sobre a existncia do direito de autodeterminao in
formativa, que seria imprescindvel formao da identidade e livre deciso sobre os
rumos da prpria vida.99
O direito autopreservao, por sua vez, garante pessoa o poder de retirar-se,
proteger-se e ficar por sua conta, tanto do ponto de vista social quanto do ponto de vista
espacial.100Esse direito veio baila no caso Mikrozensus,101de 16 de julho de 1969, no
qual o Tribunal Constitucional Federal alemo, em sede de controle concreto, analisou
a constitucionalidade de norma da lei de microcenso de 1957 que previa multa de at
10 mil marcos alemes para todo cidado que se recusasse a responder o questionrio
sobre "viagens de frias e "viagens de repouso". Embora tenha decidido que no caso
concreto no havia ofensa ao direito ao livre desenvolvimento da personalidade, a Corte
reconheceu a dignidade humana como valor mais elevado do ordenamento jurdico e
afirmou que a existncia de um espao interior e ntimo da pessoa insuscetvel de inva
so estatal parte do direito ao livre desenvolvimento da personalidade.102
O direito autoapresentao, por fim, garante ao particular a possibilidade de se
defender no s contra apresentaes pblicas desprestigiantes, falseadoras, desfigu-
rantes e indesejadas, mas tambm de observaes secretas e indesejadas da sua pes
soa.103Pode-se observar a configurao de um tal direito no caso Scientology,104de 10
de novembro de 1998, por meio do qual o reclamante pretendia a proibio de que seu
95 S CHWA B E, Jr ge n . Op . dt . p . 1 8 9 .
85 A L EXY, Ro b e r t . Op . dt . p . 3 6 7 .
97 PIEROTH, B o do ; S CHL IN K, B e r n h ar d. Op . d t . p . 1 1 2 .
PIEROTH, B o do ; S CHL IN K, B e r n h ar d. Op . d t . p . 1 1 2 .
99 Par a mais de t alh e s s o b r e o in t e r e s s an t e dir e it o de aut o de t e r min a o in fo r mat iv a n o dir e it o ale mo , v e r
D EN N IN GER, Er h ar d. El de r e ch o de Ia aut o de t e r min adn in fo r mat iv a. In : L U O, A n t o n io P r e z ( D ir e o ) .
Pr o b le mas act uale s de la do cume n t adn y la in fo r mat ica jur dica. Madr id: Te cn o s , 1 9 8 7 . p . 2 7 2 s s .
100 PIEROTH, B o do ; S CHL IN K, B e r n h ar d. Op . cit . p . 1 1 4 .
101 B VERF GE 2 7 , 1 .
102 A s in fo r ma e s s o b r e o cas o Mikrozensus fo r am r e t ir adas de : S CHWA B E, Jr ge n . Op . cit . p . 2 1 5 - 2 1 8 .
103 PIEROTH, B o do ; S CHL IN K, B e r n h ar d. Op . cit . p ..l 1 4 .
104 B Ve r fGE 9 9 , 1 8 5 .
8 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
nome continuasse vinculado seita religiosa Scientology Church, pois a ligao causava-
-lhe incmodos no somente pessoais, mas tambm profissionais, como perda de re
putao e, consequentemente, de diversos contratos para desempenhar seu trabalho de
artista plstico. O Tribunal Constitucional Federal alemo reconheceu como incompa
tvel com o direito geral de personalidade que a pessoa no se possa defender e livrar
de afirmaes falsas que lhe prejudicam a imagem, especialmente em sendo pessoa
pblica. Ademais, concluiu que afirmaes que afetam a reputao social do indivduo
prejudicam o livre desenvolvimento de sua personalidade, j que lhe diminuem o pres
tgio, enfraquecem seus contratos sociais e destroem sua autoestima.105
Assim, pode-se perceber que o direito geral de personalidade surgiu no ordena
mento jurdico alemo para suprir a ausncia de proteo da personalidade humana, em
seus aspectos dinmico e evolutivo, e das especificidades de cada ser humano. Recebeu
importante densificao da jurisprudncia em abono da segurana jurdica que deve
pautar as relaes sociais, mas no perdeu seu carter aberto e amplo tendente a abarcar
todas as semelhanas e diferenas que as relaes humanas esto propensas a ter.
4 O direito ao livre desenvolvimento da personalidade no
ordenamento jurdico portugus
O direito ao livre desenvolvimento da personalidade, em todas as suas formas e
sob todos os aspectos, ao passo que possibilita ao ser humano o desempenho de suas
atividades e a satisfao de suas necessidades, certamente um dos mais importantes
direitos da personalidade106 em todo e qualquer ordenamento jurdico pautado pela
dignidade humana.
No ordenamento jurdico portugus, o direito ao livre desenvolvimento da perso
nalidade de consagrao ainda muito recente, uma vez que includo no texto consti
tucional to somente por ocasio da IV Reviso Constitucional de 1997. Isso, porm,
no quer dizer que anteriormente a 1997 o direito ao livre desenvolvimento da perso
nalidade fosse completamente ausente do mundo jurdico lusitano; sendo decorrncia
necessria do princpio da dignidade humana, o direito ao livre desenvolvimento da
personalidade j existia mesmo antes da reforma ao menos para constituir o ncleo
irredutvel de individualidade da pessoa em sede de direitos, liberdades e garantias. A
consagrao expressa do direito ao livre desenvolvimento da personalidade na Cons
tituio da Repblica Portuguesa de 1976 (Constituio portuguesa) prestou-se, no
entanto, a evidenciar as diferenas entre a pessoa abstrata e indivduo concreto, pois "
universalidade da pessoa contrape-se o atomismo dos indivduos".107
105 A s in fo r ma e s s o b r e o cas o Scientology fo r am r e t ir adas de : S CHWA B E, Jr ge n . Op . dt . p . 1 9 8 - 2 0 7 .
105 D EGN I, F r an ce s co . L e p e r s o n e fis ich e e i dir it t i de lia p e r s o n alit . To r in o : To r in e s e , 1 9 3 9 . p . 2 1 0 .
107 PIN HEIRO, A le x an dr e S o us a; F ERN A N D ES , M r io B r it o . Co me n t r io s IV r e v is o co n s t it ucio n al.
L is b o a: A s s o cia o A cadmica da F aculdade de D ir e it o da Un iv e r s idade de L is b o a, 1 9 9 9 . p . 1 1 1 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 8 7
H algo de muito importante, porm, que preciso notar no estudo dessa matria.
Diante da preocupao do legislador reconstituinte em incluir na Constituio portu
guesa, junto ao rol dos direitos fundamentais da personalidade, um direito ao livre de
senvolvimento da personalidade, no possvel crer que a nova norma no incorpora ao
ordenamento jurdico nada de novo, nada que j no se pudesse abstrair do valor consti
tucional da dignidade humana. Ao consagrar o livre desenvolvimento da personalidade
como um direito fundamental, obviamente que quis o revisor da Constituio portu
guesa incrementar a proteo da personalidade humana, conferindo pessoa novas po
sies jurdicas aptas a proteg-la contra o Estado. O que se precisa investigar - e essa
a questo central do estudo - a configurao do novo direito: concederia ao cidado
portugus uma proteo to ampla quanto a conferida na Alemanha, englobando uma
liberdade geral de ao e um direito geral de personalidade, ou mereceria interpretao
tanto diversa e mais restrita tendo em conta as peculiaridades do sistema constitucional
portugus e o diverso contexto histrico da insero do direito no texto constitucional?
Os prximos tpicos dedicam-se ao repositrio doutrinrio e jurisprudencial sobre o
tema - lamentavelmente ainda no muito rico de vozes - e finais reflexes acerca da
questo central e suas decorrncias.
4.1 O livre desenvolvimento da personalidade no artigo 26-, n21, da
Constituio da Repblica Portuguesa de 1976
O direito ao livre desenvolvimento da personalidade encontra-se expressamente
previsto no artigo 26a, na 1, da Constituio portuguesa. Apesar da evidente inspirao
no artigo 2, I, da Constituio alem, no ordenamento jurdico lusitano o direito ao
desenvolvimento da personalidade possui configurao legal um tanto diversa de seu
predecessor: ao passo que naquele texto constitucional a prpria norma que veicula o
direito traz tambm sua limitao pelos direitos de outrem, pela ordem constitucional
ou pela lei moral,108nesse caso o direito ao livre desenvolvimento da personalidade
vem com ares de ilimitado, sem qualquer restrio expressamente mencionada pela
Constituio portuguesa.109Como bvio, porm, no se pode pretender a criao de
um direito fundamental ilimitado, de sorte que o direito ao livre desenvolvimento da
personalidade deve estar sujeito s regras gerais de restries aplicveis aos direitos
fundamentais.
O direito ao livre desenvolvimento da personalidade, no ordenamento jurdico por
tugus, sem dvida um direito fundamental. No deixa de ser, porm, um direito de
personalidade, j que seu principal objetivo proteger o aspecto dinmico e evolutivo
108 A r t igo 2 , I, Co n s t it ui o ale m: To do s t m o dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o de s ua p e r s o n alidade ,
de s de que n o v io le m dir e it o s de o ut r e m e n o s e ch o que m co n t r a a o r de m co n s t it ucio n al o u a le i mo r al."
109 A r t igo 2 6 2, n B 1 , Co n s t it ui o p o r t ugue s a: "A t o do s s o r e co n h e cido s o s dir e it o s ide n t idade p e s s o al,
ao de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade , cap acidade civ il, cidadan ia, ao b o m n o me e r e p ut a o , image m,
p alav r a, r e s e r v a da in t imidade da v ida p r iv ada e familiar e p r o t e c o le gal co n t r a quais que r fo r mas de
dis cr imin a o ."
8 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
da personalidade humana. , portanto, um direito fundamental de personalidade,110de-
dicando-se proteo primordial dos aspectos mais essenciais da pessoa e gozando de
todas as especiais prerrogativas garantidas por fora do artigo 18 da Constituio por
tuguesa aos direitos fundamentalizados, como a aplicao direta a entidades pblicas
e privadas e a impossibilidade de revogao ou limitao genrica pela lei ordinria.111
A previso do direito ao livre desenvolvimento da personalidade representa um
marcado avano da Constituio portuguesa no domnio dos direitos de personalidade,
consagrado que foi como um direito de cpula do ordenamento jurdico.112Afinal, o
desenvolvimento da personalidade abarca tanto o plano do ser quanto o plano social,
protegendo a personalidade no apenas em seus aspectos mais ntimos, mas tambm
e especialmente no momento de sua exteriorizao social.113A partir dessas primei
ras concluses, pode-se perceber que os dois elementos que se sobressaem na anlise
do direito so a liberdade - a toda pessoa permitido desenvolver-se e desenvolver a
prpria personalidade da maneira como queira, sem interferncias exteriores114 - e
a personalidade humana.
Analisando a novidade da Constituio portuguesa, Jos de Oliveira Ascenso ob
serva que sob a tica dos direitos de personalidade que a previso do artigo 26a, 1, po
deria revestir-se de contedo mais relevante. A realizao da personalidade pressuporia
a liberdade, mas a liberdade j objeto de diversas previses constitucionais especficas
e no pode, portanto, preencher tambm o contedo desse direito. O desenvolvimen
to da personalidade teria como suposto a autodeterminao, permitindo ao homem
formar-se a si mesmo, desenvolver suas prprias potencialidades, no como resultado
de arbtrio ou descaso, mas como o seguimento de um fito condutor a realizar.115
As reflexes de Jos de Oliveira Ascenso, embora sejam de todo irretocveis, fun
cionam brilhantemente como uma introduo ao tema, mas se encerram antes de en
frentar o real problema que coloca o direito ao livre desenvolvimento da personalidade,
que o de saber qual a sua real configurao no ordenamento jurdico portugus, tanto
no Direito Pblico quanto no Direito Privado, e que posies jurdicas estaria apto a
conceder aos seus titulares.
A investigao mais profunda e completa sobre essas questes no ordenamento
jurdico portugus encontra-se indubitavelmente no ensaio O direito ao livre desenvol
vimento da personalidade, da lavra de Paulo Mota Pinto. Nesse estudo, o professor de
110 Par a ut ilizar a e x p r e s s o de Cap e lo de S o us a ( S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Cap e lo de . O dir e it o ge r al de
p e r s o n alidade , cit ., p . 9 7 ) .
111 DRA Y, Guilh e r me Mach ado . D ir e it o s de p e r s o n alidade - an o t a e s ao Cdigo Civ il e ao Cdigo do
Tr ab alh o . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 6 . p . 3 2 - 3 3 .
112 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. A dign idade da p e s s o a e o fun dame n t o do s dir e it o s h uman o s , cit .,
p . 1 1 3 .
113 PIN HEIRO, A le x an dr e S o us a; F ERN A N D ES , M r io B r it o . Op . cit . p . 1 1 1 .
A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. Op . cit . p . 1 1 3 .
115 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. A dign idade da p e s s o a e o fun dame n t o do s dir e it o s h uman o s , cit .
p . 1 1 4 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 8 9
Coimbra opta pela aproximao (quase que) integral concepo do direito ao livre
desenvolvimento da personalidade desenvolvida pelo Tribunal Constitucional Federal
alemo e defende que tambm no contexto da Constituio portuguesa aquele direito
possui duas dimenses-, liberdade geral de ao e proteo geral da personalidade.116
A consagrao do direito ao livre desenvolvimento da personalidade na Constitui
o portuguesa, para Paulo Mota Pinto, teve em vista a tutela da individualidade e, em
particular, das suas diferenas e da sua autonomia. Sagrou-se o direito diferena e a
proteo contra a discriminao, permitindo que cada um eleja seu modo de vida, desde
que no cause prejuzos a terceiros.117Ademais, garantiu-se ao indivduo a libertao
contra a prescrio estatal de paradigma de personalidade ou de personalidade-modelo
que lhe pudesse ser imposta.118
Assim, por intermdio do direito ao livre desenvolvimento da personalidade, as
sistiria ao cidado uma liberdade geral de ao configurada em dimenso social - j
que as possibilidades de realizao do indivduo isoladamente so deveras limitadas
-, pressupondo ainda um quadro jurdico-normativo dessas relaes, com condies
de desenvolvimento da personalidade, reconhecimento de capacidades, atribuio de
poderes jurdicos e determinao de exigncias de comportamento.119Para que o direito
ao desenvolvimento da personalidade seja efetivamente assegurado, no basta a ausn
cia de interferncia estatal na liberdade do indivduo no estabelecimento do seu modo
de vida; imprescindvel tambm a atuao legislativa e jurisprudencial na proteo e
promoo do desenvolvimento da personalidade humana.110
Alm da clara ligao com a liberdade, o direito ao livre desenvolvimento da per
sonalidade encontrar-se-ia conectado aos direitos de personalidade - o que se pode
comprovar pela localizao topogrfica do novo direito juntamente aos demais direitos
que protegem aspectos da personalidade ou pelo prprio tema envolvido de sorte que
seu contedo formar-se-ia por dupla dimenso: tutela da personalidade (proteo da
integridade, de estados ou do substrato da atividade livre (proteo contra a leso por
terceiros)) e tutela da liberdade geral de ao da pessoa humana (proteo de atividade
ou do comportamento (liberdade comportamental, livre deciso sobre a ao), preen
chendo as lacunas deixadas pelos direitos especiais de liberdade).121
Em relao dimenso da tutela da liberdade geral de ao, Paulo Mota Pinto
reconhece-a como estrutura fundamental do direito ao livre desenvolvimento da per
sonalidade, funcionando com uma clusula geral, consagrada como direito pessoal,
que preenche as lacunas do ordenamento jurdico e protege a autonomia e autodeter
minao individual nas escolhas da vida. E essa liberdade seria ainda uma liberdade
lis PIN TO, Paulo Mo t a. Op . dt . p . 1 6 3 .
117 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 5 7 .
n PIN TO, Paulo Mo t a. Op . dt . p . 1 6 7 .
119 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 5 9 .
120 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . dt . p . 1 9 6 .
121 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 6 3 .
9 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
ampla, independentemente de caractersticas qualitativas e de direta ligao com o
des envolvimento da personalidade, pois o que se tutela a liberdade, de forma geral e
abrangente.122
No tratamento da dimenso da tutela da personalidade, por sua vez, Paulo Mota
Pinto levanta logo de incio a questo de saber como devem ser concebidos os direitos
da personalidade: pluralidade taxativa de direitos (cada um incidindo sobre um aspecto
particular da personalidade) ou complexivo direito de personalidade referido perso
nalidade no seu todo. Para o professor de Coimbra, o direito geral de personalidade
teria como objeto a personalidade humana em todas as suas manifestaes e tutelaria
sua livre realizao e desenvolvimento. Poderia ainda funcionar como proteo subsi
diria para a personalidade quando no fosse possvel a proteo por meio de direitos
especficos.123
O direito geral de personalidade, concebido daquela forma, estaria apto a conferir
uma melhor tutela irredutvel complexidade da personalidade humana, que s pode
ser considerada de maneira adequada quando considerada em uma perspectiva globa-
lizante, incluindo no mesmo grupo tanto os bens de personalidade tipificados em lei
quanto aqueles nela no tipificados. E foi a consagrao expressa do direito ao livre
desenvolvimento da personalidade no texto constitucional que trouxe o fundamento
constitucional para o reconhecimento do direito geral de personalidade no ordenamen
to jurdico portugus.124
A viso ampla e abrangente de Paulo Mota Pinto, porm, contrape-se o posiciona
mento muito mais restritivo de Jos de Melo Alexandrino. Na viso do professor de L is
boa, inaceitvel a importao da construo alem sobre o direito ao livre desenvolvi
mento da personalidade sem a demonstrao da compatibilidade daquela estrutura com
a Constituio portuguesa; a princpio, apenas com grande arrojo e abstrao poder-se-ia
transpor o modelo alemo para um ordenamento jurdico que se pauta pelo afastamento
das clusulas gerais, como o caso portugus na gide da Constituio de 1976.125
Excluindo, portanto, a existncia de uma liberdade geral de ao derivada do direi
to ao livre desenvolvimento da personalidade, Jos de Melo Alexandrino enumera trs
possibilidades para a delimitao do contedo do direito: (a) princpio jusfundamental,
prestando-se a enfatizar o valor da autonomia e da autodeterminao pessoal; (b) nova
garantia jusfundamental, destinando-se a proteger os ncleos mais estreitos da persona
lidade cuja proteo no efetuada adequadamente por nenhum direito, liberdade ou ga
rantia expressamente reconhecido no texto constitucional; e (c) nova garantia jusfunda
mental, servindo proteo alargada de ncleo da personalidade mais ou menos vasto.126
122 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 2 0 1 .
123 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 7 1 - 1 7 2 .
121 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . dt . p . 1 7 3 .
125 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . A e s t r ut ur a o do s is t e ma de dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias n a
Co n s t it ui o Po r t ugue s a a construo do gm t ica, cit ., p . 4 9 4 .
126 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . A e s t r ut ur a o do s is t e ma de dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias n a
Co n s t it ui o Po r t ugue s a a co n s t r u o do gm t ica, cit ., p . 4 9 6 - 4 9 7 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 9 1
Da ponderao entre os benefcios e malefcios de cada uma das trs possibilidades
e tendo sempre em conta o contexto histrico e poltico e a estrutura e sistemtica da
Constituio portuguesa, o professor de L isboa termina por conceber a segunda possi
bilidade como a mais acertada. Assim, a destinao do direito ao livre desenvolvimento
da personalidade para a proteo de mbitos estreitos e relevantes da personalidade que
ainda no mereceram - por olvido ou por desdia - a tutela fundamentalizante da Cons
tituio portuguesa apresentar-se-ia em maior consonncia com a particular ateno
concedida pelo texto constitucional ao desenvolvimento existencial da personalidade,
especialmente naqueles casos em que a pessoa no tem acesso facilitado s condies de
dignidade humana (a dimenso positiva da dignidade humana e a igualdade equitativa
de oportunidades prestariam o apoio de que necessita a pessoa para ver garantido o livre
desenvolvimento da personalidade, ao passo que o reconhecimento de uma liberdade
geral de ao, objetivamente inigualitria, tenderia a reforar a desigualdade e prejudi
car o desenvolvimento da personalidade daqueles que se encontram em posio social
subalterna).127
No que toca ao direito geral de personalidade, Jos de Melo Alexandrino afirma
que a tradio jurdica portuguesa de especificar os bens e aspectos defendidos da
personalidade, evitando-se o recurso s clusulas gerais. Ademais, se se considerar os
direitos includos no mbito do direito geral de personalidade nos modelos doutrinrios
desenvolvidos por juristas alemes e realizar-se exerccio de sobreposio desses mode
los com os direitos especificamente tutelados no ordenamento portugus, apenas dois
ncleos de direito geral de personalidade no sero inteiramente cobertos pelas garan
tias jusfundamentais da Constituio portuguesa, a saber, certas dimenses da autor-
representao pessoal e a proteo do desenvolvimento de crianas e jovens. Rejeita o
professor de L isboa, portanto, tambm a existncia de um direito geral de personalidade
fundamentado no direito ao livre desenvolvimento da personalidade.128
O que se pode perceber, enfim, que em Portugal, semelhana do que ocorre na
Alemanha, no h consenso doutrinrio sobre o contedo do direito ao livre desenvol
vimento da personalidade nem sobre a fundamentao, a partir dele, de uma liberdade
geral de ao e de um direito geral de personalidade a protegerem o cidado de forma
muito ampla e quase irrestrita. A diferena marcante reside na atuao dos tribunais de
um e de outro pas: ao passo que o Tribunal Constitucional Federal alemo manifestou-
-se em diversos julgados ao longo de vrias dcadas sobre a configurao do direito ao
livre desenvolvimento da personalidade e formou opinio clara sobre o tema, o Tribu
nal Constitucional do Palcio de Ratton ainda no demonstrou muita disposio em
enfrentar o assunto. Os escassos julgados das Cortes portuguesas disponveis sobre o
tema limitam-se a fazer referncia a um direito geral de personalidade ou a uma tutela
127 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . A e s t r ut ur a o do s is t e ma de dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias n a
Co n s t it ui o Po r t ugue s a - a co n s t r u o do gm t ica, cit ., p . 4 9 9 .
128 A L EXA N D RIN O, Jo s de Me lo . A e s t r ut ur a o do s is t e ma de dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias n a
Co n s t it ui o Po r t ugue s a - a co n s t r u o do gm t ica, cit ., p . 5 1 9 - 5 2 0 . Par a mais in fo r ma e s s o b r e o s mo de
lo s do ut r in r io s cr iado s p e lo s jur is t as ale me s n a t e n t at iv a de co n cr e t izar o dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o
da p e r s o n alidade , v e r ain da p . 5 0 7 - 5 0 8 ( PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 7 1 s s ) .
9 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
geral de personalidade, sem maiores discusses acerca de qual construo seria a mais
adequada ou qual seria o seu respectivo contedo.129
evidente que o desenrolar dessas questes acerca do eventual reconhecimento de
um direito geral de personalidade tem influncia direta sobre o Direito Privado e que,
por isso, a definio do contedo do direito ao desenvolvimento da personalidade - seja
ele qual for - deve ser compatibilizada tambm naquele mbito. Feita essa necessria
ressalva, e com ela justificado porque a exposio do tpico seguinte deve preceder a to
mada de qualquer posio, passa-se anlise do tema luz do Cdigo Civil portugus.
4.2 O livre desenvolvimento da personalidade no artigo 70-, n- 1,
do Cdigo Civil portugus: direito geral de personalidade ou
tutela geral da personalidade?
No mbito do Direito Privado, a tutela da personalidade humana d-se por meio
dos direitos de personalidade consagrados no Cdigo Civil. No ordenamento jurdi
co portugus, ademais dos direitos de personalidade em espcie dispostos nos artigos
71s a 81, sempre gozou de elevada importncia o artigo 70s, ns 1, do Cdigo Civil
portugus,130que, sob a epgrafe tutela geral da personalidade, funcionava como clusu
la geral de proteo da personalidade humana nos aspectos no tutelados pelos direitos
em espcie.
A consagrao constitucional do direito ao livre desenvolvimento da personalida
de, porm, repercutiu fortemente no Direito Privado e recaiu toda sobre o artigo 70-,
n21, do Cdigo Civil portugus. Teria o dispositivo do Cdigo Civil portugus que tra
dicionalmente assegurava a tutela geral da personalidade cambiado para se tomar fun
damento do direito geral da personalidade? Teria sido essa a influncia constitucional
sobre o Direito Privado por meio da consagrao do direito ao livre desenvolvimento da
personalidade?
A ideia do direito geral de personalidade muito sedutora. E extremamente seduto
ra e muito propcia, pois cria um direito que engloba toda a personalidade humana, em
todas as perspectivas e em todas as suas chances de desenvolvimento, no ser e no devir.
Paulo Mota Pinto ressalta, inclusive, que a consagrao de um direito geral de per
sonalidade, ademais da ateno ao sentido de desenvolvimentos dogmticos noutras
ordens jurdicas, teria revelado uma preocupao personalista do legislador que de
louvar. Entretanto, Paulo Mota Pinto reconhece que, em uma frmula como a do Cdigo
Civil portugus, to somente a consagrao de um direito geral de personalidade no
apta a resolver os complexos problemas de aplicao e delimitao prticas. O direito
geral de personalidade imprescinde do estabelecimento de seu contedo e de seus limi
129 A t t ulo e x e mp lificat iv o da v e r acidade de s s a co n clus o , in dica- s e a le it ur a da de cis o n o p r o ce s s o n e
0 0 1 4 7 2 do Tr ib un al da Re la o de L is b o a, julgado e m 1 3 / 3 / 1 9 9 7 .
130 A r t igo 7 0 a, n s 1 , Cdigo Civ il p o r t ugus : "A le i p r o t e ge o s in div duo s co n t r a qualque r o fe n s a il cit a o u
ame a a de o fe n s a s ua p e r s o n alidade f s ica o u mo r al."
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 9 3
tes, especialmente se se tomar em conta que a proteo da personalidade de uma pessoa
pode concretamente entrar em conflito com o livre desenvolvimento da personalidade
de outra pessoa.131
Na tentativa de conferir ao direito geral de personalidade a necessria concreti
zao, Paulo Mota Pinto sugere que deve ser entendido como um direito-quadro,132
"englobando um conjunto variado e potencialmente ilimitado de bens da pessoa. A
aceitao desse ponto de vista, porm, no eliminaria a necessidade da realizao de
juzos casusticos dependentes das circunstncias do caso concreto. Assim, a caracte
rizao de uma atuao como eventual interferncia no direito geral de personalidade
no seria suficiente para-reconhecer sua ilicitude; para que se pudesse chegar a essa
concluso, um juzo valorativo e ponderativo dos interesses e bens conflitantes no caso
concreto deveria ser feito a priori, com a formao, se possvel, de grupos de casos re
levantes. Assim, conclui o professor de Coimbra que o direito geral de personalidade
teria o mbito formado por uma srie de comportamentos essenciais para a pessoa e
para o desenvolvimento da personalidade humana que fica a cargo dos Tribunais definir,
por meio de valorao e ponderao dos casos concretos que lhe cheguem para anlise.
Somente aps esse processo que se poder definir uma determinada atividade como
lcita ou ilcita diante do teor do artigo 7Q2, ns 1, do Cdigo Civil portugus.133
A abordagem apresentada por Paulo Mota Pinto, embora tenha inegvel interesse,
contm um problema central que reconhecido pelo prprio jurista, que o de remeter
a definio do mbito de proteo do direito geral de personalidade integralmente para
a ponderao judicial. Nesses moldes, o direito geral de personalidade, podendo ser
definido apenas casuisticamente e muito volvel aos entendimentos jurisprudenciais,
estaria mais exposto s crticas de que no passaria de uma frmula vazia. O professor
de Coimbra, ento, menciona alguns dos esforos doutrinrios para a construo de
modelos que aprioristicamente pudessem preencher o contedo do direito geral de per
sonalidade, independentemente da posterior e sempre possvel concretizao judicial,
que intentariam resolver essa questo. Diante de toda essa situao e guisa de conclu
so, porm, ele prprio no chega a construir um modelo doutrinrio para preencher
o contedo do direito geral de personalidade em Portugal e tampouco adere a algum
dos modelos doutrinrios alemes que menciona, mas afirma que, independentemente
de todas essas questes que ainda parecem remanescer no limbo jurdico, o reconhe
cimento do direito geral de personalidade, fundado na garantia da dignidade humana
e servindo como linha de interpretao para densificao da fora protetora do direito
fundamental contra medidas estatais, no deve mais ser posto em dvida diante da
fundamentao constitucional especfica que o direito ao livre desenvolvimento da per
sonalidade lhe proporciona.134
131 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 7 7 .
132 Par a mais de t alh e s s o b r e o que um dir e it o - quadr o , v e r : PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 7 8 , e s p e cial
me n t e a n o t a de r o dap 7 9 .
133 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 7 8 .
134 PIN TO, Paulo Mo t a. Op . cit . p . 1 8 0 - 1 8 3 .
9 4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Tomando-se esse quadro como ponto de partida, a primeira pergunta inarredvel
: como se pode falar em densificao sem contedo minimamente estabelecido e sem
que possa conferir pessoa algo de concretamente tutelado pelo ordenamento jurdi
co? E a ela se segue: seria mesmo vlida a defesa de uma densificao que s ocorresse
jurisprudencialmente, mediante a anlise das condies do caso concreto? Ser que
esse modelo consegue retirar do direito ao livre desenvolvimento da personalidade suas
maiores potencialidades para a proteo da pessoa?
A construo do direito geral de personalidade a partir do direito ao livre desenvol
vimento da personalidade, funcionando como uma de suas principais dimenses, no
parece responder adequadamente aos questionamentos que lhe fazem aqueles que o
acusam de ser uma frmula vazia. No se nega sua propenso defesa ampla e integral
da pessoa e da personalidade humana em todos os seus aspectos, tanto mais gerais
quanto mais especficos, mas tambm no h como no ver que um direito que pretenda
a um s tempo dentro dele tudo conter termina por no proteger nada prima fade, e ao
passo que depende sempre de ponderao no caso concreto para definio de seu m
bito de proteo termina por no conceder ao cidado a segurana jurdica que deveria
advir de um direito dessa magnitude.
A soluo opcional de construo de modelos doutrinrios que previamente indicas
sem o contedo do direito geral de personalidade, de outra banda, trabalha arduamente
para afastar a crtica da ausncia de densificao do direito previamente ao trabalho ju
risprudencial, mas termina por indicar como contedo apriorstico do direito geral de
personalidade a tutela de aspectos que, no caso do Direito Portugus, j so devidamen
te tutelados de maneira muito mais segura e substancial por direitos de personalidade
especficos, no sobrando muito espao que justifique sua incluso em um pretenso
direito geral de personalidade. Assim, parece certeiro Jos de Oliveira Ascenso quando,
ao tratar da dualidade entre direito geral de personalidade ou direitos especficos de per
sonalidade, afirma categoricamente como desnecessrio o direito geral de personalidade
no ordenamento jurdico portugus.135Afinal, a tutela geral da personalidade, tradicio
nalmente utilizada para a proteo da personalidade humana com fundamento no artigo
70Q, na 1, do Cdigo Civil portugus, muito mais adequada e confere muito mais segu
rana jurdica, na medida em que constitui clusula aberta que, ao mesmo tempo em que
permite a entrada de novos direitos da personalidade no ordenamento jurdico, demanda
a prvia concretizao de seus mbitos pela construo jurisprudencial.136
Nessa senda, substituir a tutela geral de personalidade pela construo do direito
geral de personalidade, ademais de no acrescer proteo pessoa e personalidade
humana, poderia mesmo favorecer a existncia de confuso entre o direito da personali
dade com a prpria personalidade, bem como favorecer a sustentao de que a categoria
no tem limites, conforme observa Orlando Gomes.137
135 A S CEN S O, Jo s de Oliv e ir a. D ir e it o Civ il - t e o r ia ge r al, o p . cit . p . 1 2 2 .
135 N o me s mo s e n t ido , man ife s t an do - s e co n t r ar iame n t e e x is t n cia de um dir e it o ge r al de p e r s o n alidade e
p e r ce b e n do n o ar t igo 7 0 a co n s agr a o da t ut e la ge r al de p e r s o n alidade , Guilh e r me D r ay ( DRA Y, Guilh e r me
Mach ado . Op . cit . p . 3 4 ) .
137 GOMES , Or lan do . D ir e it o s da p e r s o n alidade . Re v is t a F o r e n s e , 2 1 6 , 6 2 , p . 5 - 1 0 , Rio de Jan e ir o : F o r e n s e ,
1 9 6 6 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 9 5
Para evitar, porm, entendimentos equivocados das afirmaes sustentadas nessa
sede, imprescindvel ressaltar que a rejeio ideia do direito geral da personalidade
concebido como um direito-quadro no pretende impingir situao de demrito pro
teo da pessoa e da personalidade humana. O que se pretende, em verdade, rigoro
samente o contrrio.
O afastamento da construo do direito geral de personalidade em substituio
tutela geral de personalidade no Direito portugus pretende evitar que a concepo de
um direito fustico termine por no trazer nenhum acrscimo substancial proteo
da personalidade, poi^ um lado, e acabe mesmo por enfraquecer os direitos especiais
que tutelam fortemente aspectos relevantes da personalidade, por outro lado. Afinal, j
ensina a sabedoria popular que afirmar que todos so especiais o mesmo que afirmar
que, em realidade, ningum o .
O artigo 70, ns 1, do Cdigo Civil portugus, no exerccio do papel de clusula
de tutela geral da personalidade, garante a efetiva proteo da personalidade e de toda
a sua dinmica de desenvolvimento, permitindo que os Tribunais acompanhem a evo
luo social e as novas demandas que tm as pessoas de proteo da personalidade
humana. Esto protegidos os elementos fsicos e morais da pessoa. So devidamente
tuteladas sua humanidade, sua individualidade e sua pessoalidade.138A clusula de tu
tela geral da personalidade, e no s o direito geral de personalidade, apta a proteger
a personalidade humana em todos os seus bens, foras e potencialidades, presentes ou
futuras, conhecidas ou desconhecidas, mas aquela tem um benefcio em relao a essa:
enquanto que no reconhecimento do direito geral de personalidade pode-se passar da
total abstrao para uma concretizao especfica em nico caso, com o risco de que seja
fruto de pouca reflexo ou at mesmo de opinio unilateral do julgador, na tutela geral
da personalidade um novo direito de personalidade vem para o ordenamento jurdico
como fruto de uma evoluo social que demonstra a necessidade de sua consagrao,
como aconteceu, por exemplo, com o direito sade ou o direito ao sossego.
4.3 O livre desenvolvimento da personalidade na jurisprudncia
portuguesa: seleo de casos
Em matria de direitos da personalidade, da tradio dos Tribunais portugueses
um trabalho de concretizao lento e progressivo, muito mais tendente a seguir do que
a ditar o ritmo da modificao das estruturas sociais. Em interessante estudo sobre o
tema, Antnio Menezes Cordeiro representa a trajetria da concretizao dos direitos
de personalidade pelos Tribunais portugueses por meio das seguintes fases:
a) fase prvia ao Cdigo Civil portugus (1967), em que a referncia aos di
reitos de personalidade era marcada pela escassez e equivocidade, embora
j fosse possvel a meno de algumas poucas decises judiciais dedicadas
real proteo da personalidade humana;
138 Par a ut ilizar a e x p r e s s o de Cap e lo de S o us a ( Op . cit . p . 1 1 6 ) .
9 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
b) fase de reconhecimento pontual (1967-1982), caracterizada pela aplicao
lenta dos direitos de personalidade, sendo necessrios cerca de 15 anos para
progressiva modelao da escala de valores da personalidade merecedores
de tutela;
c) fase de implantao dos direitos de personalidade (1983-1992), em que
ocorreu a efetiva delineao dos esquemas de defesa dos direitos de persona
lidade; e
d) fase de aplicao corrente dos direitos de personalidade (a partir de 1993),
na qual finalmente se apresenta a aplicao corrente da matria atinente aos
direitos de personalidade, possibilitando inclusive a formao de uma linha
jurisdicional aprecivel e constante.139
O direito ao livre desenvolvimento da personalidade, embora consagrado na Cons
tituio portuguesa j no decorrer da ltima fase de concretizao dos direitos de per
sonalidade pelos Tribunais, no parece, por isso, ter tido melhor sorte do que seus pre-
decessores na rapidez e prontido de sua aplicao judicial. Afinal, passados j mais de
dez anos de seu expresso reconhecimento no ordenamento jurdico portugus, o direito
ao livre desenvolvimento da personalidade ainda no logrou adquirir a repercusso e at
mesmo o incremento de tutela da personalidade humana que talvez dele se esperasse.
Essas concluses podem ser facilmente alcanadas aps uma pesquisa sobre a uti
lizao do direito ao livre desenvolvimento da personalidade pelos Tribunais portugue
ses desde 1997. Infelizmente, o que se constata a ausncia de meno ao direito em
diversos casos em que ele poderia ter sido utilizado com manifesta vantagem na tutela
da personalidade humana, bem como sua meno de forma muita vaga e pouco funda
mentada em outros casos, como se fosse um mero valor sem maiores conseqncias
jurdicas.
Apesar dessas circunstncias, a evidente importncia que a atuao jurisprudencial
tem na concretizao dos direitos de personalidade, uma vez que a atuao judicial
que na generalidade dos casos confere alguma densidade aos textos tipicamente vagos
que preveem direitos de personalidade,140justifica - e mesmo torna imprescindvel - a
anlise de alguns dos principais julgados dos Tribunais portugueses relacionados ao
direito ao livre desenvolvimento da personalidade.
4.3.1 A autonomia dos menores em face de seus responsveis
Na deciso do Processo n97958/2003-1, de 17 de fevereiro de 2004, o Tribunal da
Relao de L isboa analisou caso em que se discutia a existncia do direito de visita dos
139 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . Os dir e it o s da p e r s o n alidade n a civ il s t ica p o r t ugue s a. In : CORD EIRO,
A n t n io Me n e ze s ; L EITO, L u s Me n e ze s ; GOMES , Jan u r io Co s t a ( Or g.) . Es t udo s e m h o me n age m ao
Pr o fe s s o r D o ut o r In o cn cio Galv o Te lle s . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 2 . v . 1 , p . 3 6 - 4 2 .
140 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . Op . cit . p . 3 5 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 9 7
avs aos netos menores. Segundo consta dos autos, os avs maternos de dois menores
de idade, aps o falecimento da filha daqueles e me destes, teriam sido impedidos
pelo pai das crianas de manter contato com os netos com a mesma frequncia em que
ocorria no perodo em que a me dos menores ainda era viva. Por isso, na qualidade de
avs maternos, desejavam o reconhecimento judicial do direito de visita aos infantes,
bem como do direito de serem informados da situao dos netos e de serem ouvidos na
tomada das decises mais importantes da vida dos menores. O pai das crianas, por sua
vez, procurou demonstrar nos autos que a reduo do contato dos filhos com os avs
maternos no foi despropositada, mas se justificou porque as prprias crianas passa
ram a se queixar das visitas aos avs e das constantes e incmodas menes falecida
me deles.
Na deciso desse caso, o Tribunal da Relao de L isboa iniciou a discusso sobre
a existncia de um direito de visita dos ascendentes e irmos aos parentes menores de
idade, independentemente do assentimento dos pais das crianas. Ao longo da reflexo
jurdica, os magistrados terminaram por concluir que os avs e irmos no so titulares
de um direito de visita aos parentes menores e tampouco os pais dos menores tm auto
nomia para proibir injustificadamente a convivncia dos filhos com os demais parentes
ou com quem quer que seja.
O que h, segundo o Tribunal da Relao de L isboa, o reconhecimento da autono
mia dos filhos menores na organizao da prpria vida de acordo com sua maturidade,
direito que ficou ainda mais claro aps a consagrao constitucional expressa do direito
ao livre desenvolvimento da personalidade. Assim, os menores de idade no so objetos
de um direito de visita titularizado por terceiros, mas titulares do direito ao livre desen
volvimento da personalidade que lhes permite conviver com as pessoas que desejarem,
exceto nos casos em que o convvio lhes seja fundadamente nocivo.
Em deciso muito recente no Processo 1604/08.9TML SB-A.L 1-7, de 2 de dezembro
de 2009, o Tribunal da Relao de L isboa analisou caso em que se pleiteava o restabeleci
mento do direito de visita de parentes a menor de idade, em face do descumprimento de
acordo de visitas pela me da criana. O menor em questo rfo de pai e a irm e os
avs paternos da criana desejavam que lhes fosse restabelecido o direito de visita, que,
apesar de previamente acordado em juzo, no foi nunca cumprido pela me da criana.
Embora nessa oportunidade o Tribunal da Relao de L isboa tenha reconhecido a
possibilidade de contato dos parentes com o menor, seguiu linha de raciocnio muito
semelhante esposada na deciso anterior para enfatizar no a existncia de um direito
de visita - ainda que no presente caso haja reconhecido a existncia tambm de um di
reito dos avs convivncia com os netos -, mas da autonomia do menor em estabelecer
os convvios que entender vlidos para sua vida. Os magistrados novamente utilizam o
direito ao livre desenvolvimento da personalidade como fundamento da autonomia do
menor no estabelecimento dos seus relacionamentos, conectado ao dispositivo do Cdi
go Civil portugus que probe os pais de injustificadamente privar os filhos do convvio
com irmos ou ascendentes (artigo 1.887-A). E, analisando as particularidades do caso, o
Tribunal menciona a importncia do relacionamento dos menores com os avs para sua
9 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
formao moral e para o desenvolvimento de sua personalidade em contato com suas
razes familiares.
Assim, o Tribunal da Relao de L isboa reconhece, em nova oportunidade, a auto
nomia do menor de idade, de acordo com a sua maturidade, nas escolhas que estabelece
para a prpria vida, inclusive na escolha dos amigos e parentes com quem estabelece
relacionamento mais estreito.
De fato, as questes que envolvem o mbito de autonomia da pessoa menor de ida
de em face de seus genitores ou responsveis so das mais interessantes dentre aquelas
que perpassanL pelo direito ao livre desenvolvimento da personalidade. Afinal, o menor
de idade encontra-se em situao verdadeiramente peculiar no interior do ordenamen
to jurdico: inegavelmente uma pessoa, autnoma, individualizada e diversa de seus
pais, ostentado personalidade prpria, mas, em razo de sua circunstancial fragilidade
e insapincia diante dos mais complexos fatos da vida, sua personalidade recebe do or
denamento jurdico proteo especial que se d por intermdio da reduo e limitao
de sua autonomia pelo direito dos pais de educar os filhos e pelo dever dos filhos de
respeito e obedincia aos pais. O caso do menor de idade aquele em que tipicamente
h ciso entre o sujeito do direito e o sujeito do comportamento, podendo-se falar em
heteroavaliao da vontade.141
O que parece importante ressaltar para iniciar o tratamento desse problema
que o menor de idade, sendo pessoa, titular de todos os direitos fundamentais e de
personalidade que o ordenamento jurdico reconhece aos seus cidados. Sendo as
sim, titular tambm do direito ao livre desenvolvimento da prpria personalidade e
deve ser o decisor central nas escolhas que so importantes para sua vida, sejam elas
pessoais, culturais ou mesmo profissionais. No se pode olvidar, porm, que o menor
pode enredar-se em situaes ou em relacionamentos que lhe sejam potencialmente
nocivos em virtude de sua inexperincia, sendo dever dos pais auxiliar-lhe e proteger-
-lhe nesses casos. Ento emerge a pergunta: quando que a deciso a prevalecer deve
ser a dos pais ou responsveis e quando, de outro lado, deve ser aquela tomada pelo
prprio menor de idade? A chave para a resposta dessa questo parece ser a capacidade
de discernimento do menor.142
Como parece bvio se se tomar em conta a natureza das coisas, o menor de idade
que acaba de nascer ostenta personalidade, mas no goza de autonomia, sendo as de
cises importantes de sua vida integralmente tomadas pelos pais ou responsveis, em
situaes de normalidade, ou pelo juiz, nas situaes patolgicas. Ao passo que adquire
mais idade e acumula mais experincias e conhecimentos, a pessoa vai gradativamente
tomando para si a responsabilidade pela conduo da prpria vida at que, finalmente,
alcana a fase adulta e passa a ser senhora da prpria vontade. Diante desse quadro, no
seria razovel que, perante o ordenamento jurdico, um adolescente fosse tratado da
141 TEIXEIRA , A n a Car o lin a B r o ch ado . Po de r familiar e p r o ce s s o e ducacio n al: a p o lmica da gr adualidade
do s e u e x e r c cio . In : HIRON A KA , Gis e lda Mar ia F e r n an de s N o v ae s e t ai. ( Co o r d.) , D ir e it o de fam lia e das
s uce s s e s - t e mas at uais . S o Paulo : M t o do , 2 0 0 9 . p . 3 3 7 .
142 TEIXEIRA , A n a Car o lin a B r o ch ado . Op . cit . p . 3 3 6 .
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 9 9
mesma maneira que uma criana em tenra idade, pois a diferena entre a capacidade de
discernimento de um e de outro deveras marcante.
Ao menor de idade, portanto, deve ser assegurado o exerccio de seus direitos de
personalidade e a medida da autonomia nas suas decises deve ser proporcional me
dida de sua capacidade de discernimento, com aumento gradual daquela pari passu ao
incremento desta at o alcance da maioridade. Ao que parece, dessa maneira possvel
compatibilizar o exerccio do direito ao livre desenvolvimento da personalidade pela
pessoa menor de idade com a especial proteo que o ordenamento jurdico confere a
sua personalidade ao coloc-la sob a responsabilidade jurdica dos genitores. Tambm
nesse sentido caminha o Tribunal da Relao de L isboa nas decises apresentadas no
incio deste tpico.
4.3.2 O casamento entre pessoas do mesmo sexo
No Acrdo 121/2010, prolatado no Processo 192/2010, o Tribunal Constitucio
nal do Palcio de Ratton procedeu ao controle preventivo de constitucionalidade de lei
que altera o texto do Cdigo Civil portugus para, eliminando do instituto do casamen
to o requisito de que seja celebrado apenas entre um homem e uma mulher, possibili
tar o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
O Tribunal Constitucional portugus iniciou sua apreciao ressalvando que a
questo de permitir ou no permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo no
passa pela apreciao do princpio da igualdade, embora a referncia a esse princpio
constitucional seja freqente quando o assunto tange os insurgentes direitos de liber
dade sexual. De acordo com o entendimento que prevaleceu na Corte Constitucional, o
que realmente est em pauta na discusso da constitucionalidade do casamento entre
pessoas do mesmo sexo a liberdade individual de casar ou no casar, bem como a
exigncia de que o Estado disponibilize e mantenha as estruturas oficiais necessrias
realizao do casamento entre pessoas do mesmo sexo e regule adequadamente a cons
tituio, a extino e os efeitos pessoais e patrimoniais da situao jurdica decorrente
dessa modalidade de unio civil.
O casamento como instituio reconhecida constitucionalmente constitui uma re
presentao jurdica de uma tradio de origem religiosa que terminou por se tornar a
base de formao das estruturas sociais modernas. No caso portugus, conforme repara
o Tribunal Constitucional, o casamento j se encontrava previamente regulado no artigo
1.577ado Cdigo Civil - o qual traz como requisito para sua validade a celebrao entre
duas pessoas de sexo diferente - quando do advento da Constituio portuguesa de
1976; considerando que esta entregou a disciplina dos requisitos e efeitos do casamento
lei ordinria, entendeu-se como vlida a soluo que j constava do Cdigo Civil para
a regulamentao do instituto.
Diante dessa situao, no se pode desconsiderar a interpretao de que o casa
mento previsto pela Constituio encaixava-se no molde previamente criado pelo Direi
1 0 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
to Civil e, portanto, destinava-se unio de pessoas de sexos diversos. H, porm, uma
outra circunstncia histrica que no desprezada pela Corte Constitucional, que o
fato de que, poca da elaborao da Constituio portuguesa, o anseio pelo casamento
entre pessoas do mesmo sexo no era socialmente relevante e por isso no poderia ter
sido considerado pelo legislador constituinte; entretanto, se no foi representada essa
modalidade de unio civil no texto constitucional, tambm no foi expressamente proi
bida a evoluo da instituio matrimonial nessa direo. Assim, em uma considerao
apriorstica, no seria possvel alegar a inconstitucionalidade da alterao do Cdigo
Civil com a pretenso de permitir o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Ademais, o Tribunal Constitucional segue observando que no existe um direito
manuteno da instituio do casamento tal como prevista no Cdigo Civil, pois a
proteo que a Constituio portuguesa fornece destina-se a evitar apenas as atuaes
do legislador violadoras de direitos fundamentais - o que no ocorreria no caso da alte
rao do requisito do casamento de exigncia de diversidade de sexo dos contraentes.
Por outro lado, o reconhecimento oficial do casamento entre pessoas do mesmo sexo
no altera a proteo da famlia na Constituio portuguesa, que j foi prevista de forma
deveras ampla com o fim de abarcar as mudanas na estrutura social e proporcionar o
respeito ao livre desenvolvimento da personalidade dos membros das famlias.
Diante de todas essas circunstncias, o Tribunal Constitucional declarou a cons
titucionalidade da lei que pretendia alterar o Cdigo Civil portugus para dele retirar
o requisito de diversidade de sexo entre os contraentes do casamento. Dentre as de
claraes de voto proferidas em separado, vale destacar a manifestao da conselheira
Catarina Sarmento e Castro pela meno da relao entre o casamento e diversos valo
res, princpios e direitos constitucionais, tais como a dignidade humana, a igualdade,
a liberdade ou o direito identidade pessoal e o livre e coerente desenvolvimento da
personalidade, de que resultaria a liberdade de opo quanto forma de constituir a
famlia nuclear.
longa e bem fundamentada deciso do Tribunal Constitucional portugus fez
falta a utilizao mais intensa do direito ao livre desenvolvimento da personalidade,
que tem relao profunda no s com o anseio pelo reconhecimento do casamento
entre pessoas do mesmo sexo, mas tambm com a imensa maioria dos mais modernos
direitos de liberdade sexual.
Como evidente, a possibilidade de oficializar uma unio afetiva e desfrutar de
todos os direitos e deveres decorrentes do reconhecimento estatal da unio civil repre
senta um importante passo na vida de um casal e, sem dvida, pode auxiliar a pessoa
na busca de sua felicidade e plena realizao pessoal. Assim, a Corte Constitucional
limitou-se a sugerir a existncia de uma liberdade individual de casar ou no casar.143
143 A p e n as a t t ulo in fo r mat iv o , cab e me n cio n ar que a de cis o do Tt ib un al Co n s t it ucio n al p o r t ugus aco m
p an h a a me s ma lin h a de e n t e n dime n t o e s b o ada p o r algumas Co r t e s Co n s t it ucio n ais quan do o as s un
t o a un io civ il e n t r e p e s s o as de me s mo s e x o . N o me s mo s e n t ido , e e m de cis o ain da mais r e ce n t e , ma
n ife s t o u- s e o S up r e mo Tr ib un al F e de r al do B r as il p ar a, e m de cis o co n jun t a da A D PF 1 3 2 / RJ e da A D I
4 2 7 7 / D F , r e co n h e ce r ao s cas ais h o mo afe t iv o s o me s mo r e gime jur dico p r o t e t iv o co n fe r ido ao s cas ais
h e t e r o afe t iv o s que e m s ua un io p r e e n ch am o s r e quis it o s e x igido s p ar a co n figur a o da un io e s t v e l.
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 1 0 1
4.3.3 A autodeterminao de funcionrios sobre a prpria aparncia
No Acrdo 436/00, prolatado no Processo 309/95, o Tribunal Constitucional por
tugus procedeu anlise, dentre outros assuntos, da constitucionalidade do artigo
82s, alnea c, parte final, da L ei do Jogo. A questo que se colocava em pauta era a da
constitucionalidade da disposio legal que previa, dentre os deveres dos empregados
que prestam servios nas salas de jogos, o de cuidar da boa apresentao pessoal e
o de vestir-se, quando em servio, apenas com uniforme determinado pela empresa
concessionria que no contenha nenhum outro bolso ademais de um pequeno bolso
exterior no peito. O ponto questionado justamente a parte final do dispositivo, que,
ao determinar a utilizao de um uniforme sem bolsos, ofenderia o direito ao livre de
senvolvimento da personalidade dos funcionrios destinatrios da norma, assim como
ao seu bom nome e sua imagem.
A Corte Constitucional logo de incio reconhece que a questo representa um des
dobramento do direito geral de personalidade, uma vez que discute o direito dos traba
lhadores conformao de sua aparncia externa. Para o Tribunal, o caso no se destina
a questionar o uso do uniforme profissional ou mesmo o asseio com que os funcionrios
se devem apresentar nas salas de jogos dos cassinos, mas a equacionar o direito con
formao da aparncia pessoal externa de que so titulares os trabalhadores em geral.
O Tribunal Constitucional, ento, reconhece a existncia de um direito deter
minao da aparncia externa a partir do direito geral de personalidade, o qual estaria
relacionado com a garantia de um mnimo de dignidade humana, respeito suscetibi-
lidade e ao decoro da pessoa, e com o prprio direito de no ser afrontado com situa
es que perturbem a maneira de estar na vida e de conviver em sociedade. Assim,
deve restar sempre garantido um espao interno de liberdade individual, a ser definido
unicamente pela prpria pessoa, respeitados os limites impostos pelo prprio ordena
mento jurdico.
Perante esses argumentos, o Tribunal Constitucional portugus decidiu que o uso
obrigatrio de traje profissional, uma vez que exigncia que se estende a todos os
funcionrios que se encontram em servio, tem a funo de resguard-los contra poss
veis suspeies dos presentes no local e, tambm por isso, no constitui desarrazoada
limitao autonomia da aparncia exterior.
De qualquer sorte, possvel vislumbrar a propenso da Corte portuguesa em re
conhecer a existncia de um direito autodeterminao da aparncia exterior, o qual
disporia de limites mais incisivos nas relaes trabalhistas pelas circunstncias peculiares
O cas o b r as ile ir o um t an t o div e r s o do cas o p o r t ugus p e lo gr au de at iv is mo man ife s t ado n a at ua o da Co r t e
- j que n e s t e o Tr ib un al Co n s t it ucio n al fo i ch amado a r e alizar um co n t r o le p r v io de co n s t it ucio n alidade de
alt e r a o le gis lat iv a do Cdigo Civ il p ar a p o s s ib ilit ar o cas ame n t o e n t r e p e s s o as do me s mo s e x o dian t e da au
s n cia de e x p r e s s a v e da o co n s t it ucio n al, ao p as s o que n aque le o co r r e u o r e co n h e cime n t o judicial da un io
e s t v e l e n t r e p e s s o as do me s mo s e x o , an t e r io r in t e r v e n o do le gis lado r e e m co n t r adi o co m o r e quis it o
da div e r s idade de s e x o s e x p r e s s ame n t e e n ume r ado t an t o n a Co n s t it ui o F e de r al ( ar t igo 2 2 6 , 3 a) quan t o n o
Cdigo Civ il b r as ile ir o ( ar t igo 1 .7 2 3 ) .
1 0 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
de subordinao a que se encontram sujeitos os empregados, e de limites muito mais
alargados nas situaes normais da vida, de modo a garantir o livre desenvolvimento da
personalidade em um momento deveras importante de sua exteriorizao.
5 Concluses
I. A tendncia do Direito contemporneo de caminhar rumo efetivao da prote
o da pessoa exige o equilbrio entre a formalidade necessria segurana jurdica e os
juzos ponderados que a materializao de direitos requer. Nesse quadro, uma definio
tcnico-jurdica adequada de pessoa no se pode limitar suscetibilidade para titulari-
zar direitos e obrigaes, pois a considerao do ser humano digno que se encontra por
trs da formalizao jurdica hoje imprescindvel. Ademais, o conceito de pessoa deve
ser suficientemente aberto para abarcar tanto as caractersticas comuns a todos os seres
humanos quanto a originalidade inerente a cada pessoa considerada individualmente,
abstendo-se de criar um arqutipo de pessoa normal ou dominante. Tendo em conta
essas premissas, sugere-se a definio de pessoa como o ente dotado de conscincia,
transcendncia e dignidade, com existncia no s biolgica, mas tambm intelectual,
e no s individual, mas tambm coletiva, caracterizando-se ainda pela dinmica de
evoluo por que passa durante toda a vida.
II. Pessoa e personalidade no so vocbulos intercambiveis; aquele representa o
ente, ao passo que esse faz referncia ao modo de ser do ente. Assim como a pessoa, a
personalidade uma realidade que deve ter sua essncia considerada no momento da
transposio para o mundo jurdico. atributo reconhecido a uma pessoa para que pos
sa atuar no plano jurdico, titularizando relaes e reclamando direitos e deveres, mas
sua ntima conexo com o ser humano real e todos os elementos internos e ambientais
que a integram no podem ser olvidados. A relao entre a personalidade real - natu
ralmente dinmica e ilimitvel - e a personalidade jurdica, portanto, deve ser circular,
com o ordenamento jurdico atribuindo juridicidade personalidade humana e estabe-
lecendo-lhe limites pela considerao de outros bens jurdicos, mas sendo tambm por
ela limitado no sentido de garantir a dignidade humana.
III. Na Constituio da Repblica Portuguesa de 1976, a dignidade humana um
elemento de base de toda a ordem constitucional, exercendo funes simblica, ins
trumental e de proteo. A dignidade humana relaciona-se profundamente com o li
vre desenvolvimento da personalidade, uma vez que ambas as normas constitucionais
destinam-se garantia da autonomia e da individualidade da pessoa no momento da
realizao dos prprios fins.
IV. O desenvolvimento da personalidade remete ideia de respeito pelas escolhas
de cada ser humano para a prpria formao durante toda a vida como forma de preser
var suas nsitas individualidade e dignidade. Ao desenvolvimento da personalidade
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 1 0 3
intrnseca a ideia de liberdade, j que o ser humano no se realizaria se o fizesse de
maneira previamente determinada pelo Estado ou por outrem, mas isso no significa
a arbitrariedade da pessoa nas escolhas que faz. O desenvolvimento da personalidade,
portanto, embora se constitua de larga parte de subjetivismo, no deixa de possuir
uma dimenso objetiva que limita a tutela das aes humanas exteriorizadas ao eti
camente razovel.
V O livre desenvolvimento da personalidade valor inerente a todo e qualquer Es
tado que constitua a pessoa como centro do ordenamento jurdico, mas somente quan
do consagrado como direito apto a atribuir pessoa uma posio jurdica vantajosa e
uma proteo mais concreta em face do Estado e dos particulares. Foi no Direito alemo
que o livre desenvolvimento da personalidade, consagrado como direito fundamental,
alcanou seus mais notveis desenvolvimentos, dispondo inclusive de duas dimenses
produzidas na jurisprudncia do Tribunal Constitucional Federal alemo: a liberdade
geral de ao e o direito geral de personalidade.
VI. A liberdade geral de ao a liberdade de se fazer ou deixar de fazer o que se
quer, conferindo pessoa o direito de que no haja embarao s aes e abstenes
humanas voluntrias e assegurando-lhe certas posies jurdicas em face do Estado.
Tambm no mbito do Direito Privado, a liberdade geral de ao tem suas incidncias,
propiciando o equilbrio entre a segurana jurdica, imprescindvel ao bom andamen
to das relaes estabelecidas entre os particulares, e a manuteno de um mnimo de
proteo s liberdades bsicas das partes, independentemente dos termos do negcio
celebrado entre elas.
VII. O direito geral de personalidade destina-se a proteger a pessoa no pela sua
atuao, mas simplesmente pelo fato de ser pessoa - caracterstica que a conecta com
a dignidade humana -, abrangendo ainda todos os domnios da vida humana - ponto
em que se liga ao direito ao livre desenvolvimento da personalidade. Destina-se, assim,
manuteno das condies bsicas para a existncia da pessoa, independentemen
te da existncia de previso normativa especfica que tutele um ou outro aspecto da
personalidade humana. No ordenamento jurdico alemo, a criao do direito geral de
personalidade foi uma necessidade sociojurdica no sentido de compatibilizar o prima
do da pessoa estabelecido pela nova ordem constitucional com a insuficiente proteo
conferida personalidade pelo Cdigo Civil alemo de 1900.
VIII. O direito ao livre desenvolvimento da personalidade encontra-se expressamen
te consagrado no artigo 26e, na 1, da Constituio da Repblica Portuguesa de 1976. O
seu reconhecimento como um direito fundamental de personalidade, tornando-o objeto
de especial proteo pelas prerrogativas do artigo 18 da Constituio portuguesa, de
monstra a importncia de que goza a personalidade humana, em todos os seus aspectos
ntimos e sociais, no ordenamento jurdico lusitano. O grande problema que envolve o
direito, porm, o delineamento de seu contedo e a definio das posies jurdicas
que estaria apto a conceder aos cidados, tanto na esfera do Direito Pblico quanto na
esfera do Direito Privado. A doutrina portuguesa, porm, no apresenta posicionamen
1 0 4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
tos consensuais e o Tribunal Constitucional do Palcio de Ratton ainda no demonstrou
muita disposio em enfrentar o tema de forma contundente.
IX. Paulo Mota Pinto, defensor de uma concepo mais ampla do contedo do di
reito ao livre desenvolvimento da personalidade, v no direito ao livre desenvolvimento
da personalidade portugus as mesmas dimenses que compem o seu correspondente
no direito alemo: liberdade geral de ao e proteo geral da personalidade. Em relao
dimenso da liberdade geral de ao, o direito ao livre desenvolvimento da personali
dade funcionaria como clusula geral a preencher as lacunas do ordenamento jurdico e
proteger a autonomia e autodeterminao da pessoa nas mais diversas escolhas da vida.
J no que tange proteo geral da personalidade, o direito ao livre desenvolvimento da
personalidade serviria de fundamento ao direito geral de personalidade, destinando-se
proteo da personalidade em uma perspectiva idealmente globalizante.
X. Jos de Melo Alexandrino, por sua vez, apresenta concepo tanto mais restrita
e, diante da anlise do contexto histrico e poltico lusitano, bem como da estrutura da
Constituio portuguesa, afasta a existncia tanto de um direito geral de liberdade quan
to de um direito geral de personalidade fundados no direito ao livre desenvolvimento da
personalidade. Para Jos de Melo Alexandrino, o direito ao livre desenvolvimento da per
sonalidade destinar-se-ia proteo de mbitos estreitos e relevantes da personalidade
que ainda no tenham merecido consagrao constitucional.
XI. No mbito do Direito Privado, pode-se identificar a repercusso do direito ao
livre desenvolvimento da personalidade no teor do artigo 70a, na 1, do Cdigo Civil por
tugus. Tradicionalmente entendido como consagrador da tutela geral de personalidade,
o dispositivo passou a ser apontado como o possvel fundamento do direito geral de
personalidade em mbito privado. Essa tentativa de cmbio do teor do artigo 70a, na 1,
do Cdigo Civil, embora claramente bem intencionada, no deve prevalecer.
XII. O direito geral de personalidade se enaltece pela proteo globalizante que
confere personalidade humana, pretensamente aambarcando toda a sua dinmica e
os seus desenvolvimentos no ser e no devir. O seu grande problema, porm, que ainda
nenhuma doutrina conseguiu resolver, o fato de que no dispe de um contedo que
possa ser previamente estabelecido para conferir ao cidado qualquer posio jurdica
vantajosa apriorsticamente garantida, dependendo a definio de seu mbito de prote
o da utilizao da tcnica ponderativa luz do caso concreto. Em sua situao atual,
portanto, o direito geral de personalidade no apto a conferir personalidade proteo
mais vantajosa do que aquela que j conferida pela tutela geral de personalidade e, de
outro lado, apresenta ainda a desvantagem de colocar em risco a segurana jurdica pela
potencialidade de reconhecimento de posies protetoras da personalidade que podem,
pela falta de aceitao social, no obter a consagrao como direito apto a assistir outros
cidados que se encontrem em situao semelhante.
XIII. Na sistemtica do ordenamento jurdico portugus, a tutela geral da personali
dade apresenta-se ideal proteo efetiva da personalidade, em todas as suas nuances e
dinmicas de desenvolvimento, e com a segurana de trazer ao ordenamento jurdico um
novo direito de personalidade apenas quando fruto de uma evoluo social que demons
tre a sua necessidade e com reconhecimento jurisdicional razoavelmente pacificado.
O dir e it o ao liv r e de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade 1 0 5
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3
A coliso entre os direitos de
personalidade e o direito de
informao
Marcelo Malizia Cabral
SU M RIO: 1 Introduo. 2 Apontamentos sobre os direitos de persona
lidade. 2.1 A dignidade da pessoa humana e os direitos de personalidade.
2.2 Generalidades sobre os direitos de personalidade. 2.3 O direito re
serva do ser particular e da vida privada. 2.4 O direito honra. 2.5 Res
tries aos direitos de personalidade. 3 Apontamentos sobre a liberdade
de expessao. 3.1 Generalidades. 3.2 O direito de informao. 3.3 Restri
es s liberdades comunicativas. 4 A coliso de direitos. 4.1 mbito de
proteo e coliso de direitos. 4.2 Os regimes de resoluo da coliso de
direitos. 4.3 Juzo de adequao. 5 A coliso entre os direitos de perso
nalidade e o direito de informao. 5.1 Generalidades. 5.2 A resoluo da
coliso entre os direitos de personalidade e o direito de informao. 5.2.1
Circunstncias relevantes. Situaes particulares. As pessoas pblicas e
notrias. O direito de crtica. 5.2.2 A ponderao de bens. 6 Concluses.
7 Bibliografia.
1 Introduo
Os direitos de personalidade e de informao, que sempre motivaram reflexes
profundas, assumem especial relevo com a inaugurao da sociedade da informao e
do risco neste novo milnio.
A massificao das relaes sociais e de consumo, a consagrao dos direitos de per
sonalidade e das liberdades comunicativas, o surgimento de novas tecnologias de infor
mao e de armazenamento de dados tm ocasionado o aparecimento das mais variadas
situaes em que se impe a discusso do contedo e dos limites desses direitos.
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 0 9
A expanso das atividades comunicativas deu lugar ao nascimento de uma indstria
da comunicao, integrada no apenas por jornalistas e tipgrafos, mas por sofisticadas
empresas de comunicao social que veiculam os mais diferenciados contedos informa
tivos: econmicos, comerciais, publicitrios, administrativos, cientficos, pessoais.1
Acresce-se a essas circunstncias uma outra: a mediatizao da vid poltica, social
e cultural, produzindo alteraes qualitativas no sentido e no contedo dos direitos de
personalidade, bem como nas concepes de violao a esses direitos.2
Tambm o valor da transparncia dos poderes e das pessoas pblicas e as exigncias
crescentes de visibilidade nas democracias atuais redundam em fronteiras cada vez mais
reduzidas entre o direito de informao e os direitos de personalidade, em especial do
direito reserva.
Essas circunstncias bem demonstram a relevncia e a atualidade do tema deste
estudo.
No se pode deixar de apontar, igualmente, a dificuldade de se estabelecerem, com
preciso, o mbito de proteo e os limites dos direitos de personalidade e do direito de
informao, porquanto dotados de contedos imprecisos e variveis.
Justamente a delimitao dos bens da vida protegidos por esses direitos, os limites
de seu exerccio, a possibilidade de se intersectarem ocasionando situaes de conflito e
as regras disponveis soluo da coliso entre os direitos de personalidade e do direito
de informao constituem o objeto desta investigao.
Com esse propsito, sempre com foco no ordenamento jurdico portugus, estabe-
lecer-se-o, por princpio, apontamentos sobre o contedo e o mbito de proteo dos
direitos de personalidade, em especial do direito reserva do ser particular e da vida
privada - no qual se insere o direito imagem - e do direito honra.
Esse mesmo enquadramento merecer o direito de informao, espcie do gnero
liberdade de expresso, ocasio em que se estabelecero seu contedo e limites.
L ogo aps a realizao desse necessrio delineamento, examinar-se- o fenmeno da
coliso de direitos, nomeadamente sua caracterizao e os regimes de resoluo dispo
nveis na ordem jurdica portuguesa, oportunidade em que se tomar posio quanto ao
sistema aplicvel coliso entre os direitos de personalidade e o direito de informao.
A seo final centrar-se-, ento, no exame das circunstncias relevantes resolu
o dos conflitos entre os direitos em epgrafe e no mtodo utilizado para a soluo das
situaes de coliso entre os direitos de personalidade e o direito de informao.
Registre-se, por derradeiro, que se realizou a investigao com amparo no mtodo
tcnico-jurdico, utilizando-se, como recursos, textos legais, doutrina e jurisprudncia.
1 S OUS A , N un o de . L ib e r dade de in fo r ma o , v e r dade jo r n al s t ica e p r o t e c o do s dir e it o s do s cidado s .
S e min r io co mun ica o s o cial e dir e it o s in div iduais . Po r t o : Edi o da A lt a A ut o r idade p ar a a Co mun ica
o S o cial, 1 9 9 7 . p . 2 7 .
2 MA CHA D O, Jn at as E. M. L ib e r dade de e x p r e s s o : dime n s e s co n s t it ucio n ais da e s fe r a p b lica n o s is
t e ma s o cial. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 2 , p . 7 4 6 .
1 1 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
2 Apontamentos sobre os direitos de personalidade
2.1 A dignidade da pessoa humana e os direitos de personalidade
0 ser humano e sua dignidade fundamentam justificam a existncia do Estado e da
ordemjurdica.
0 fim primordial do Estado a garantia da existncia digna do ser humano, asse-
gurando-lhe direitos e regulando seu exerccio de modo a criar condies adequadas ao
seu desenvolvimento.
Emrealidade, um Estado que no se desincumba dessa funo nega-se a si mesmo:
um Estado que recusa ao indivduo centralidade referencial no seu poder poltico e no
seu Direito no tem razo de existir.3
Ao discorrer sobre as conseqncias da adoo da ideia de centralidade do ser hu
mano, Paulo Otero destaca envolver a dignidade da pessoa humana, sempre, um pri
mado do ser sobre o ter, prevalecendo a pessoa sobre as coisas e a liberdade sobre a
propriedade, realidade que se projeta sobre toda a ordem jurdica: todo o ordenamento
jurdico infraconstitucional, desde o Direito Civil at o Direito Penal, sem esquecer o
Direito Administrativo e os Direitos Processuais, deve expressar essa prevalncia da
pessoa e da liberdade sobre as coisas e a propriedade".4
Justamente em decorrncia dessa centralidade do ser humano e da prevalncia de
sua dignidade sobre outros bens e valores, a ordem jurdica dedica um lugar prprio
para o estabelecimento e a regulamentao dos direitos que asseguram, de modo direto
e imediato, a dignidade do ser humano: os direitos de personalidade.
Jos Lus Bonifcio Ramos apontou com acuidade, a esse respeito, encontrar-se
ameaada a prpria dignidade humana quando haja ofensa ao direito intimidade.5
Pode-se afirmar que os direitos de personalidade integram a dignidade humana e
dessa ntima relao resultam conseqncias relevantes para seu estudo.
Com efeito, vrias das conseqncias jurdicas do princpio da dignidade da pessoa
humana dizem respeito diretamente com os direitos de personalidade.6
A primeira, a excluso da possibilidade de o ser humano ser tratado com indigni
dade, pois todos os seres humanos tm a mesma dignidade, trate-se do homem mais
poderoso da terra ou do mais miservel ou criminoso".7
3 OTERO, Paulo . In s t it ui e s p o l t icas e co n s t it ucio n ais . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 9 , p . 4 8 7 .
< OTERO, Paulo . Op . cit . p . 5 5 7 - 5 5 8 .
s RAMOS, Jo s L u s B o n if cio . O dir e it o fun dame n t al da r e s e r v a da in t imidade da v ida p r iv ada e
familiar . L is b o a: B F DUL , 1 9 8 8 . p . 3 3 .
6 A s is t e mat iza o das co n s e qn cias jur dicas do p r in c p io da dign idade do s e r h uman o de Paulo Ot e r o
(OTERO, Paulo . Op . cit . p . 5 5 2 - 5 5 9 ) .
7 OTERO, Paulo . Op . cit . p . 5 5 3 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 1 1
Em outras palavras, o imperativo de respeito pela dignidade humana independe
do grau de conscincia ou de compreenso de cada ser humano sobre sua existncia
ou dignidade: Quem no tem conscincia da prpria existncia ou da dignidade dessa
existncia nunca pode deixar de ser tratado com dignidade.8
O respeito dignidade da pessoa humana tambm exclui qualquer possibilidade
de sujeio do ser humano a humilhaes e estigmatizaes arbitrrias, tratamentos
degradantes, ofensas sua honra e integridade: ao contrrio, impe um pleno e livre
desenvolvimento da personalidade de cada indivduo e determina, ainda, "a reserva da
intimidade da vida pessoal e familiar, insusceptvel de questionamento, conhecimento
ou divulgao no consentida.9
2.2 Generalidades sobre os direitos de personalidade
A centralidade da pessoa humana e a conseqente primazia conferida dignidade
do ser humano originaram a preocupao fundamental de todas as ordens jurdicas com
os direitos de personalidade.
Os esforos de conceituao dos direitos de personalidade destacam, sempre, sua
qualidade de direitos decorrentes da personalidade fsica, moral e jurdica da pessoa
humana.
Efetivamente, o regime de proteo da personalidade abrange tanto os elementos
fsicos agrupados na ideia do homo phoenomenon como os componentes espirituais ou
morais decorrentes da racionalidade e da liberdade refletidas na concepo do homo
noumenon, tutelando, a lei civil, em cada homem, sua humanidade e individualidade.10
Condensando as lies da doutrina privatista, Jorge Miranda assinala que os direi
tos de personalidade so posies jurdicas fundamentais do homem que ele tem pelo
simples fato de nascer e viver; aspectos imediatos da exigncia de integrao do homem;
condies essenciais ao seu ser e devir; revelam o contedo necessrio da personalida
de; direitos de exigir de outrem o respeito da prpria personalidade; integrados pelos
bens da personalidade fsica, moral e jurdica da pessoa humana.11
Importa registrar, outrossim, que a doutrina costuma dividir a proteo da perso
nalidade em: (a) uma tutela especfica dos direitos de personalidade, prevista nos arts.
72a a 80do Cdigo Civil portugus, e (b) uma tutela geral, decorrente do texto do art.
70ado mesmo diploma,12que abrangeria todos os bens de personalidade no elencados
no sistema de proteo especfica.
8 OTERO, Paulo . Op . cit . lo c. dt .
9 OTERO, Paulo . Op . cit . p . 5 5 5 - 5 5 7 .
10 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . O dir e it o ge r al de p e r s o n alidade . Co imb r a: Co imb r a Edit o r a,
1 9 9 5 . p . 1 5 2 .
11 MIRA N D A , Jo r ge . Man ual de dir e it o co n s t it ucio n al. 4 . e d. Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 8 . v . 4 , p . 6 6 - 6 7 .
12 'A r t . 7 0 s Tut e la ge r al da p e r s o n alidade - 1 . A le i p r o t e ge o s in d v iduo s co n t r a qualque r o fe n s a il cit a o u
ame a a de o fe n s a s ua p e r s o n alidade f s ica o u mo r al. 2 . In de p e n de n t e me n t e da r e s p o n s ab ilidade civ il a que
1 1 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
A esse respeito, Capelo de Sousa esclarece que o direito geral de personalidade,
tendo como objeto a personalidade humana no seu todo, fundamenta e serve de prin
cpio geral mesmo aos prprios direitos especiais de personalidade legais que, embora
dotados de relativa autonomia, tm por objecto determinadas manifestaes parcelares
daquela personalidade".13
Dessa forma, o direito geral de personalidade abrange todas as manifestaes da
personalidade humana, no deixando de reconhecer os direitos especiais de personali
dade, dentre os quais se encontram o direito ao nome, reserva sobre escritos pessoais,
imagem, privacidade.
Alm dos direitos especficos de personalidade elencados no Cdigo Civil, o direito
geral de personalidade alberga uma srie de bens da personalidade, dentre os quais a
vida, a integridade fsica, a liberdade, a honra, o bom nome,, a sade, o repouso essencial
existncia fsica, o prprio corpo, a disposio do prprio cadver, a reparao de toda
a leso, o livre desenvolvimento da personalidade.14
A doutrina ainda distingue os direitos objetivo e subjetivo de personalidade.15
O primeiro impe coletividade o dever de respeitar a dignidade de cada indivduo,
encontrando-se o Estado na qualidade de garante contra sua violao, com previso em
normas internacionais de proteo dos direitos humanos, no direito constitucional e na
legislao infraconstitucional.
Principiando pelo Cdigo Civil portugus que, como explicitado h pouco, confere
proteo especfica aos direitos de personalidade em seus arts. 70- a 819, passando pela
Constituio da Repblica, que dedica especial ateno aos direitos de personalidade
- seja pela consagrao do princpio da igualdade,16seja por meio da previso dos di
reitos vida,17 integridade pessoal18e a uma srie de outros direitos de personalidade
estatudos em seu art. 26a -, 19eles integram, tambm, todas as cartas internacionais de
proteo da pessoa humana.
h aja lugar , a p e s s o a ame a ada o u o fe n dida p o de r e que r e r as p r o v idn cias ade quadas s cir cun s t n cias do cas o ,
co m o fim de e v it ar a co n s uma o da ame a a o u at e n uar o s e fe it o s da o fe n s a j co me t ida.
13 OTERO, Paulo . Op . cit . p . 5 5 9 - 5 6 0 .
14 OTERO, Paulo . Op . cit . p . 5 6 1 .
15 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . D ir e it o de p e r s o n alidade . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 6 . p . 5 0 - 6 0 .
16 A r t . 1 3 Pr in c p io da igualdade - 1 . To do s o s cidado s t m a me s ma dign idade s o dal e s o iguais p e r an t e
a le i. 2 . N in gu m p o de s e r p r iv ile giado , b e n e ficiado , p r e judicado , p r iv ado de qualque r dir e it o o u is e n t o de
qualque r de v e r e m r azo de as ce n dn cia, s e x o , r a a, l n gua, t e r r it r io de o r ige m, r e ligio , co n v ic e s p o l t icas
o u ide o lgicas , in s t r u o , s it ua o e co n mica, co n di o s o cial o u o r ie n t a o s e x ual."
17 'A r t . 2 4 8 D ir e it o v ida - 1 . A v ida h uman a in v io l v e l. 2 . Em cas o algum h av e r p e n a de mo r t e .
11 'A r t . 2 5 D ir e it o in t e gr idade p e s s o al - 1 . A in t e gr idade mo r al e f s ica das p e s s o as in v io l v e l. 2 . N in
gu m p o de s e r s ub me t ido a t o r t ur a, n e m a t r at o s o u p e n as cr u is , de gr adan t e s o u de s uman o s ."
* 'A r t . 2 6 gOut r o s dir e it o s p e s s o ais - 1 . A t o do s s o r e co n h e cido s o s dir e it o s ide n t idade p e s s o al, ao de s e n
v o lv ime n t o da p e r s o n alidade , cap acidade civ il, cidadan ia, ao b o m n o me e r e p ut a o , image m, p alav r a,
r e s e r v a da in t imidade da v ida p r iv ada e familiar e p r o t e c o le gal co n t r a quais que r fo r mas de dis cr imin a o .
2 . A le i e s t ab e le ce r gar an t ias e fe ct iv as co n t r a a o b t e n o e ut iliza o ab us iv as , o u co n t r r ias dign idade
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 1 3
Nesse sentido, as previses constantes da Declarao U niversal dos Direitos do
Homem,20do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Polticos21e da Conveno Euro
pia dos Direitos do Homem.22
O direito subjetivo de personalidade, de outra parte, consubstancia-se na posio
jurdica do indivduo perante as demais pessoas, dotando cada ser humano de um apa
rato de meios jurdicos hbeis defesa de sua dignidade.23
Examinar-se-o, a seguir, o contedo, a extenso e a proteo conferidas a alguns
dos direitos de personalidade que integram a ordem jurdica portuguesa, nomeadamen
te aos direitos reserva do ser particular e da vida privada e honra.
2.3 O direito reserva do ser particular e da vida privada24
A reserva do indivduo sobre sua intimidade, imagem e privacidade encontra-se pro
tegida pela clusula geral do art. 70ada L ei Civil de Portugal, preocupao que tambm se
faz presente na Constituio da Repblica Portuguesa25e na ordem jurdica internacional.26
Essa proteo resulta da necessidade de se atribuir a cada indivduo, dotado de
dignidade e responsabilidade, autonomia para manter uma esfera privada de sua vida,
h uman a, de in fo r ma e s r e lat iv as s p e s s o as e fam lias . 3 . A le i gar an t ir a dign idade p e s s o al e a ide n t idade
ge n t ica do s e r h uman o , n o me adame n t e n a cr ia o , de s e n v o lv ime n t o e ut iliza o das t e cn o lo gias e n a e x p e
r ime n t a o cie n t fica. 4 . A p r iv a o da cidadan ia e as r e s t r i e s cap acidade civ il s p o de m e fe ct uar - s e n o s
cas o s e t e r mo s p r e v is t o s n a le i, n o p o de n do t e r co mo fun dame n t o mo t iv o s p o l t ico s ."
20 Art. 1 2 s N in gu m s e r s uje it o a in t e r fe r n cias n a s ua v ida p r iv ada, n a s ua fam lia, n o s e u lar o u n a s ua
co r r e s p o n dn cia, n e m a at aque s s ua h o n r a e r e p ut a o . To da p e s s o a t e m dir e it o p r o t e o da le i co n t r a t ais
in t e r fe r n cias o u at aque s . [...] A r t . 2 2 a - To da p e s s o a, co mo me mb r o da s o cie dade , t e m dir e it o s e gur an a
s o cial e r e aliza o , p e lo e s fo r o n acio n al, p e la co o p e r a o in t e r n acio n al e de aco r do co m a o r gan iza o e
r e cur s o s de cada Es t ado , do s dir e it o s e co n mico s , s o ciais e cult ur ais in dis p e n s v e is s ua dign idade e ao liv r e
de s e n v o lv ime n t o da s ua p e r s o n alidade ."
21 A r t . 1 7 2 1 . N in gu m s e r o b je ct o de in ge r n cias ar b it r r ias o u ile gais n a s ua v ida p r iv ada, n a s ua fam lia,
n o s e u do mic lio o u n a s ua co r r e s p o n dn cia, n e m de at aque s ile gais s ua h o n r a e r e p ut a o . 2 . To da a p e s s o a
t e m dir e it o a p r o t e c o da le i co n t r a e s s as in ge r n cias o u e s s e s at aque s .
22 'A r t , 8 a 1 . Qualque r p e s s o a t e m dir e it o ao r e s p e it o da s ua v ida p r iv ada e familiar , do s e u do mic lio e da s ua
co r r e s p o n dn cia. 2 . N o p o de h av e r in ge r n cia da aut o r idade p b lica n o e x e r c cio de s t e dir e it o s e n o quan do
e s t a in ge r n cia e s t iv e r p r e v is t a n a le i e co n s t it uir uma p r o v idn cia que , n uma s o cie dade de mo cr t ica, s e ja
n e ce s s r ia p ar a a s e gur an a n acio n al, p ar a a s e gur an a p b lica, p ar a o b e m e s t ar e co n mico do p a s , a de fe s a
da o r de m e a p r e v e n o das in fr ac e s p e n ais , a p r o t e c o da s ade o u da mo r al, o u a p r o t e c o do s dir e it o s
e das lib e r dade s de t e r ce ir o s ."
23 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . dt . p . 5 3 .
24 Es s a de n o min a o p r o p o s t a p o r Cap e lo de S o us a e n e la e s t o in s e r ido s o s dir e it o s r e s e r v a s o b r e a
in t imidade da v ida p r iv ada e image m ( CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 3 1 6 s s ) .
25 A r t . 2 6 a, n e 1 , fine, e n a 2 .
26 A r t . 1 2 a da D e clar a o Un iv e r s al do s D ir e it o s do Ho me m: "N in gu m s e r s uje it o a in t e r fe r n cias n a s ua
v ida p r iv ada, n a s ua fam lia, n o s e u lar o u n a s ua co r r e s p o n dn cia, n e m a at aque s s ua h o n r a e r e p ut a o .
To da p e s s o a t e m dir e it o p r o t e o da le i co n t r a t ais in t e r fe r n cias o u at aque s ." A r t . 1 7 a, n s 1 , do Pact o In
t e r n acio n al s o b r e D ir e it o s Civ is e Po l t ico s : "N in gu m p o de r s e r o b je t o de in ge r n cia ar b it r r ias o u ile gais
e m s ua v ida p r iv ada, e m s ua fam lia, e m s e u do mic lio o u e m s ua co r r e s p o n dn cia, n e m de o fe n s as ile gais s
s uas h o n r a e r e p ut a o ."
1 1 4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
onde possa recolher-se ("rigth to be alone), pensar-se a si mesmo, avaliar a sua con
duta, retemperar as suas foras e superar as suas fraquezas", esfera essa que as demais
pessoas, sob pena de ilicitude, no devem violar, v. g., intrometendo-se nela e instru
mentalizando ou divulgando os elementos que a compem.27
Segundo Jos Eduardo Figueiredo Dias, com a tutela dos bens jurdicos da intimi
dade e da privacidade est-se a proteger um direito de personalidade que deve ser con
siderado como densificao do princpio da dignidade da pessoa humana.28
O direito reserva do ser particular e da vida privada envolve uma srie de bens es
pecficos, como a intimidade da vida privada,29que abrange a intimidade da vida pessoal,
familiar, domstica, sentimental e sexual, o sigilo das cartas, memrias e outros escritos,30
a imagem,31o domiclio e lugares adjacentes,32a correspondncia e outros meios de co
municao privada,33os dados informatizveis,34os rendimentos patrimoniais, os lazeres,
a individualidade privada, o direito de estar s, os caracteres de acesso privado do seu
corpo, a sade, a sensibilildade, as estruturas intelectiva e volitiva, enfim tudo aquilo que
se refere somente pessoa em si mesma.35
Tambm tratado como direito privacidade, o direito reserva obsta a devassa da
vida privada e implica o reconhecimento de um espao de privacidade onde os indivduos
possam estar vontade, onde possam ser deixados em paz, ao abrigo da curiosidade dos
outros, sejam eles simplesmente os vizinhos, ou sejam autoridades pblicas ou os meios
de comunicao social, ou sejam quaisquer outras pessoas.36
A esse respeito, o art. 80ado Cdigo Civil portugus evidencia o dever de todo indi
vduo guardar em sigilo o que souber sobre a intimidade e a vida privada de outrem, ainda
que relativamente a fatos dos quais tenha tomado conhecimento licitamente; a contrario
17 CA PEL O D E S OUS A , Rabindranath V. A. Op . cit. p . 3 1 7 .
28 O aut o r ain da e s clar e ce que a fin alidade p r ime ir a da t ut e la jur dica da p r iv acidade a de "r e s e r v ar ao in
div duo o c r culo de v iv n cias , aco n t e cime n t o s e in fo r ma e s que e le p r e t e n de legitimamente guar dar p ar a s i e
s ub t r air ao s o lh o s do p b lico , p o r s e r e fe r ir e m a e x p e r in cias n t imas que de s e ja man t e r co mo t ais . Es t e m
caus a o s e u dir e it o de e s t ar s e co m as p e s s o as co m que m p r e t e n de p ar t ilh ar o s aco n t e cime n t o s da s ua v ida
p r iv ada, de v e n do o dir e it o in t imidade ab ar car pessoas ( e as s uas v iv n cias n t imas ) , locais ( de s ign adame n t e
a cas a de cada um) e de t e r min ado n me r o de in fo r ma e s p e s s o ais ( p o r e x e mp la as que t e n h am a v e r com
a s ade e v ida s e x ual) " ( D IA S , Jo s Eduar do F igue ir e do . D ir e it o in fo r ma o , p r o t e c o da in t imidade e au
t o r idade s admin is t r at iv as in de p e n de n t e s . A A . W Es t udo s e m h o me n age m ao Pr o fe s s o r D o ut o r Ro g r io
S o ar e s . S t udia Iur idica, n B 6 1 , p . 6 1 5 - 6 5 4 , Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 1 ) .
29 Cdigo Civ il, ar t . 80 "D ir e it o r e s e r v a s o b r e a in t imidade da v ida p r iv ada - 1 . To do s de v e m guar dar r e
s e r v a quan t o in t imidade da v ida p r iv ada de o ut r e m. 2 . A e x t e n s o da r e s e r v a de fin ida co n fo r me a n at ur e za
do cas o e a co n di o das p e s s o as ."
30 A r t s . 7 6 a a 7 8 a do Cdigo Civ il p o r t ugus .
31 A r t . 7 9 a do Cdigo Civ il p o r t ugus .
32 A r t . 3 4 9, n 9 1 , da Co n s t it ui o da Re p b lica Po r t ugue s a.
33 A r t s , 3 4 a, n e 1 , da Co n s t it ui o da Re p b lica Po r t ugue s a, e 7 5 s - 7 8 s do Cdigo Civ il.
34 A r t s . 2 6 s , n 2 2 e 3 5 2, n s 3 , da Co n s t it ui o da Re p b lica Po r t ugue s a.
35 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 3 1 8 - 3 2 6 .
36 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . cit . p . 7 9 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 1 5
sensu, no admite a intromisso de qualquer pessoa na intimidade e na vida privada de
outrem, desautorizadamente, mesmo que no se pretenda revelar o que se espreitou.37
A doutrina tem defendido que a proteo da intimidade da vida privada abrange
as relaes vivenciais de cada homem consigo mesmo, suas relaes convivenciais com
certas e determinadas pessoas, com a comunidade, sempre que tais relaes estejam
ligadas ao essencial do modus vivendi da personalidade individual e o seu titular no as
queira tomar pblicas.
Engloba, ainda, as convices filosficas, religiosas, polticas ou particulares reser
vadas; as pequenas acomodaes e transigncias da vida quotidiana; os flirts, namoros
ou esponsais no objeto de publicaes no processo preliminar do casamento; as pe
ripcias (v. g., renncias, sacrifcios, xitos, zangas e reconciliaes) da vida conjugal
e familiar; as causas e circunstncias de um divrcio; a vida amorosa fora e ao lado do
casamento (sem prejuzo, neste ltimo caso, dos direitos do cnjuge ofendido); a nudez
em zonas naturistas; a no reproduo da nudez fora dos fins consentidos pelo interes
sado; os comportamentos sexuais ntimos das pessoas; a revelao no autorizada da
adoo plena; os critrios educativos paternos; as desavenas entre pais e filhos, entre
parentes ou mesmo entre no familiares que no tenham decorrido publicamente ou
que os interessados queiram manter reservadas e o relacionamento pessoal domicilirio
no contrato de trabalho domstico.38
Constitui questo de relevo definir-se quais as relaes vivenciais do indivduo que
se encontram sob a proteo do direito de reserva ou de privacidade, no sem antes
anotar-se a relatividade do conceito de privacidade, resultante de seu carter cultural,
que varia com o tempo, o espao e o tipo de pessoas em causa.39
Alis, dessa realidade no se olvidou o legislador ao registrar, no n22 do art. 80s do
Cdigo Civil de Portugal, que "a extenso da reserva definida conforme a natureza do
caso e a condio das pessoas.
Assim, o grau do dever de resguardo sobre a vida privada ou a privacidade de um
indivduo depender de uma srie de circunstncias, dentre as quais da natureza do caso,
ou seja, da justa identificao, avaliao e ponderao do conjunto de bens ou interesses
juridicamente relevantes na concreta situao ou relao jurdica de personalidade; da
qualidade ou do grau de intensidade dos particulares bens ou reas da intimidade da vida
privada afetados; da natureza e da intensidade dos particulares bens ou reas da intimi
dade da vida privada afetados; da natureza e da intensidade dos interesses que concreta-
mente se lhe oponham (desde interesses histricos, artsticos, culturais e de participao
pblica at meros interesses de curiosidade ou inclusivamente de pura cascuvilhice); do
local (pblico ou privado) onde se deu o fato perturbador da intimidade da vida privada;
do comportamento do titular quanto exposio ou no da sua vida privada e do modo
e das circunstncias da interferncia na intimidade da vida privada.40
37 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . cit . p . 8 2 - 8 3 .
31 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 3 1 8 .
39 F IGUEIRED O D IA S , Jo s Eduar do . Op . cit . p . 6 2 7 .-
40 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 3 2 6 .
1 1 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Particularmente relevante afigura-se, ainda, a condio das pessoas intervenien-
tes na situao concreta, por exemplo, se a reserva tem por objeto personalidades
que, pela relevncia de seus atos, pertencem histria contempornea, tenham uma
funo ou um papel pblico, agindo em circunstncias da sua vida pblica ou prati
cando atos com repercusses nos interesses da coisa pblica (res publica), que sejam
candidatas a eleies pblicas, que busquem a publicidade ou que se encontrem im
plicadas na atualidade judiciria, bem como se os deveres de reserva tm ou no como
destinatrios pessoas portadoras de um dever de informao de interesse pblico ou
que exeram funes pblicas.41
Deste modo, o grau de proteo da intimidade em uma dada situao poder variar
de acordo com elementos objetivos casusticos, importando destacar-se que a proteo
da intimidade da vida privada no encontra definio com base em frmulas abstratas
apriorsticas ou em pretensa primazia ou hierarquia de alguns indivduos sobre outros.
Assim, o dever de resguardo da reserva varia na medida em que os fatos situem-se
no ciclo de sigilo, de resguardo ou de publicidade da vida do indivduo ou, em outras
palavras, o grau de privacidade depende da esfera concntrica da vida em que se situe:
na esfera da vida ntima, da vida privada ou da vida pblica.
Na esfera da vida ntima compreender-se-ia o que de mais secreto existe na vida
pessoal, o que "a pessoa nunca ou quase nunca partilha com outros, ou que comunga
apenas com pessoas muitssimo prximas, como a sexualidade, a afectvidade, a sade,
a nudez; na esfera da privacidade, que j mais ampla, incluir-se-iam aspectos da vida
pessoal, fora da intimidade, cujo acesso a pessoa permite a pessoas das suas relaes,
mas no a desconhecidos ou ao pblico; a esfera pblica abrangeria tudo o mais, aquilo
que, na vida de relao e na insero na sociedade, todos tm acesso".42
O grau do dever de reserva variar, ento, de acordo com o ciclo ou a esfera em que
os fatos se situem, pontuando-se, desde logo, ser menor a intensidade da tutela nos
casos em que a vida privada do indivduo adjacente esfera pblica, nomeadamente
quando o indivduo se movimenta em lugares pblicos, como estradas, restaurantes,
praias, cerimnias pblicas, recintos culturais, elevando-se a proteo quanto mais se
aproximem os acontecimentos das esferas privada e ntima da pessoa, como aqueles
em que exerce sua atividade profissional ou onde desenvolve sua vida familiar, senti
mental ou sexual.43
No se pode perder de vista, outrossim, que a polaridade entre o pblico e o priva
do corresponde a uma escala progressiva e gradual, sem quebras de continuidade entre
o que totalmente privado e vedado ao conhecimento dos outros e o que completa
mente aberto, que se partilha com todos.44
41 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V A . Op . dt . p . 3 2 6 - 3 2 7 .
42 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais . Op . dt . p . 8 0 .
41 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt . p . 3 2 7 - 3 2 8 .
44 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais . Op . dt . p . 8 1 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 1 7
Afigura-se, assim, difcil o estabelecimento de padres previamente definidos e
precisamente delimitados de nveis de privacidade: "Tudo depende de tudo. Das pes
soas, de cada pessoa, da sua sensibilidade e das suas circunstncias; das necessidades
e exigncias da sociedade relativas ao conhecimento e transparncia da vida em co
mum. a sempre presente dialtica entre o eu e os outros, entre o interesse pessoal e o
bem comum, entre o subjetivo e o objetivo, entre direito subjetivo e direito objetivo."45
Essas mesmas circunstncias so relevantes na definio das possibilidades de cap
tao e publicizao da imagem de uma pessoa.
Optou-se, tambm, por esse motivo, pela incluso do estudo do direito imagem
no exame da reserva do ser particular e da vida privada, pois os elementos que impor
tam definio do grau de reserva incidente sobre a imagem so idnticos queles uti
lizados quando se trabalham com outros elementos da personalidade e da privacidade
do indivduo.
De fato, a ordem jurdica portuguesa tipificou o direito imagem como direito es
pecial de personalidade,46subtraindo-o da tutela geral ao expressar, no na1 do art. 79a
do Cdigo Civil portugus, que "o retrato de uma pessoa no pode ser exposto, repro
duzido ou lanado no comrcio sem o consentimento dela; depois da morte da pessoa
retratada, a autorizao compete s pessoas designadas no na2 do artigo 71a, segundo
a ordem nele indicada.
O mbito de proteo desse direito deve ser entendido como abrangendo todas as
formas de representao visual dos traos fsicos da pessoa sobre um suporte qualquer,
seja por vdeo, fotografia, pintura, desenho, caricatura, silhueta, ou mesmo atravs de
um ssia ou do recurso a uma montagem.47
Proibiu-se, assim, a exposio, a reproduo ou a comercializao do retrato ou da
imagem de uma pessoa sem o seu consentimento, proteo realizada em articulao
com diversos valores: primeiro, com a privacidade ou a intimidade do visado; depois,
com o bom nome ou reputao, nomeadamente nos casos em que a imagem surge
associada a um evento com conotaes social ou moralmente discutveis; por fim, om
a capacidade lucrativa da prpria imagem e com a necessidade de evitar o seu aprovei
tamento abusivo por parte de terceiros.48
O consentimento, entretanto, resta dispensado, de acordo com a previso do ne 2 do
art. 79ado Cdigo Civil portugus, quando assim o justifiquem a sua notoriedade, o cargo
que desempenhe, exigncias de polcia ou de justia, finalidades cientficas, didcticas ou
45 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . d t . lo c. cit .
46 Re gis t r e - s e , a e s s e r e s p e it o , a r e fle x o de D av id de Oliv e ir a F e s t as , de fe n de n do a n at ur e za mis t a do dir e i
t o image m: " dir e it o de p e r s o n alidade e dir e it o p at r imo n ial". A l m da p o s s ib ilidade de co me r cializa o
da image m, o aut o r e s clar e ce que o co n t e do p at r imo n ial do dir e it o image m r e s ult a, t amb m, do dis p o s t o
n o ar t . 7 9 a, n 9 1 , do Cdigo Civ il p o r t ugus ( F ES TA S , D av id de Oliv e ir a. Op . cit . 4 1 8 ) .
47 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 7 5 3 .
48 DRA Y, Guilh e r me Mach ado . D ir e it o s de p e r s o n alidade . A n o t a e s ao Cdigo Civ il e ao Cdigo do
Tr ab alh o . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 6 . p . 5 0 .
1 1 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
culturais, ou quando a reproduo da imagem vier enquadrada na de lugares pblicos, ou
na de factos de interesse pblico ou que hajam decorrido publicamente", dispensa que ces
sa, todavia, quando "do facto resultar prejuzo para a honra, reputao ou simples decoro
da pessoa retratada.49
A doutrina distingue, igualmente, a imagem-retrato da imagem-atributo, ain
da que reconhea a proteo de ambas enquanto bens de personalidade: a primeira
encontra-se relacionada estritamente imagem como reflexo da identidade fsica e suas
caractersticas, como a fotografia, o desenho, o retrato, a filmagem,50enquanto a segun
da refere-se ao carter ou ao "retrato moral do indivduo,51ao conjunto de atributos
identificados no meio social relativamente a uma determinada pessoa.52
Importa registrar-se, por fim, que o direito em comento versa sobre a imagem de
pessoa singular, "cognoscvel e individual", de modo que a imagem de uma pessoa pode
aparecer, licitamente, em um grupo, desde que o local seja pblico e a presena das
pessoas seja meramente complementar ou acessria.53
2.4 O direito honra
A honra, entendida como projeo na conscincia social do conjunto de valores
pessoais de cada indivduo, desde os emergentes de sua mera pertena ao gnero hu
mano at aqueloutros que cada indivduo vai adquirindo atravs do seu esforo social,54
encontra-se protegida pela Carta Civil e pela Constituio portuguesas, ainda que gene
ricamente, em dispositivos prprios,55assim como pela ordem jurdica internacional.56
49 Cf. n 8 3 do ar t . 7 9 a do Cdigo Civ il de Po r t ugal.
50 Oduv aldo D o n n in i e Ro g r io F e r r az D o n n in i adv e r t e m que a ide ia de image m- r e t r at o n o s e r e fe r e ap e
n as fis io n o mia de algu m, mas t amb m s p ar t e s do co r p o , de s de que s e ja p o s s v e l a de v ida ide n t ifica o .
"E s ab ido que ce r t o s mo de lo s aut o r izam, n o r malme n t e me dian t e r e mun e r a o , p ar a e n s aio fo t o gr fico o u
filmage m, p ar t e de s e u co r p o ( mo s , p s , p e mas e t c.) , as s im co mo a v o z p ar a v e cula o da p ub licidade . H ,
as s im, p r o t e o da image m p ar a as p ar t e s do co r p o , de s de que ide n t ific v e is ( D ON N IN N I, Oduv aldo ; D ON -
N IN N I, Ro g r io F e r r az. Imp r e n s a liv r e , dan o mo r al, dan o image m, e s ua quan t ifica o luz do n o v o
Cdigo Civ il. S o Paulo : M t o do , 2 0 0 1 . p . 6 6 ) .
51 A RA JO, L uiz A lb e r t o D av id. A p r o t e o co n s t it ucio n al da p r p r ia image m. B e lo Ho r izo n t e : D e l Re y ,
1 9 9 6 . p . 1 1 8 .
52 D ON N IN I, Oduv aldo jD ON N IN I, Ro g r io F e r r az. Op . cit . p . 7 0 .
53 CA MPOS , D io go L e it e de . L i e s de dir e it o s da p e r s o n alidade . S e p ar at a do v o lume L XVT do B o le t im
da F aculdade de D ir e it o da Un iv e r s idade de Co imb r a, p . 7 3 - 7 8 e 9 6 - 9 9 , Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 1 9 9 2 .
54 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 3 0 1 .
55 Cdigo Civ il p o r t ugus , ar t . 7 0 s , n 2 1 : 'A le i p r o t e ge o s in d v iduo s co n t r a qualque r o fe n s a il cit a o u ame a a
de o fe n s a s ua p e r s o n alidade f s ica o u mo r al. Co n s t it ui o da Re p b lica Po r t ugue s a, ar t . 2 6 a, n s 1 : MA t o do s
s o r e co n h e cido s o s dir e it o s ide n t idade p e s s o al, ao de s e n v o lv ime n t o da p e r s o n alidade , cap acidade civ il,
cidadan ia, ao b o m n o me e r e p ut a o , image m, p alav r a, r e s e r v a da in t imidade da v ida p r iv ada e familiar
e p r o t e c o le gal co n t r a quais que r fo r mas de dis cr imin a o ."
56 A r t . 1 2 s da D e clar a o Un iv e r s al do s D ir e it o s do Ho me m: "N in gu m s e r s uje it o a in t e r fe r n cias n a s ua
v ida p r iv ada, n a s ua fam lia, n o s e u lar o u n a s ua co r r e s p o n dn cia, n e m a at aque s s ua h o n r a e r e p ut a o .
To da p e s s o a t e m dir e it o p r o t e o da le i co n t r a t ais in t e r fe r n cias o u at aque s ." A r t . 1 7 a, n fi 1 , do Pact o In
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 1 9
A honra juscivilisticamente tutelada abrange a projeo do valor da dignidade hu
mana, que inata, ofertada pela natureza igualmente a todos os seres humanos, insus
cetvel de ser perdida por qualquer homem em qualquer circunstncia.57
Em sentido amplo, inclui tambm o bom nome e a reputao, enquanto snteses do
apreo social pelas qualidades determinantes da unicidade de cada indivduo nos planos
moral, intelectual, sexual, familiar, profissional ou poltico.58
Engloba, ainda, o simples decoro, como projeo dos valores comportamentais do
indivduo no que se prende ao trato social e o crdito pessoal, como projeo social das
aptides e capacidades econmicas desenvolvidas por cada homem.59
A tutela desse direito de personalidade abrange tanto a honra pessoal, subjetiva,
quanto a honra social, objetiva.
A primeira traduz-se na considerao que cada pessoa tem por si prpria, enquanto
a segunda refere-se ao respeito e considerao que cada pessoa goza perante o grupo
social.
Desse modo, os valores ticos da prpria pessoa e da comunidade em que vive
podem ser diversos, o que possibilitar a divergncia do gravame honra nos nveis
pessoal e social.
A esse propsito, esclarece Pedro Pais de Vasconcelos que uma determinada pessoa
pode ser eticamente mais ou menos exigente do que a sociedade ou que certo setor
da sociedade, com o que, perante uma concreta vicissitude desonrosa, pode sentir-se
mais ou menos desonrada em termos pessoais e subjetivos do que em termos sociais
objetivos.60
Complementa, a seguir: "Quer isto dizer que, num caso concreto, pode a pessoa
sentir mais gravemente a perda de respeito e considerao que tem por si prpria do que
a medida em que a sociedade perde de respeito e considerao por ela. E vice-versa".61
Outra discusso que merece referncia diz com a possibilidade ou no de a honra
ser perdida.
Capelo de Sousa classifica a honra como algo inerente ao ser humano, decorrente
da dignidade humana, insuscetvel de ser perdida por qualquer homem em qualquer
circunstncia, "invarivel face a qualquer situao intelectual, moral (v. g. prostituio
ou vadiagem), econmica (v. g. desemprego) ou social (v. g. priso) da pessoa."62
t e r n acio n al s o b r e D ir e it o s Civ is e Po l t ico s : "N in gu m p o de r s e r o b je t o de in ge r n cia ar b it r r ias o u ile gais
e m s ua v ida p r iv ada, e m s ua fam lia, e m s e u do mic lio o u e m s ua co r r e s p o n dn cia, n e m de o fe n s as ile gais s
s uas h o n r a e r e p ut a o .
57 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 3 0 3 - 3 0 5 .
58 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . lo c. cit .
59 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . cit . lo c. cit .
60 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . cit . p . 7 7 .
61 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . cit . lo c. cit .
62 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 3 0 3 .
1 2 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Diversamente, Pedro Pais de Vasconcelos defende a possibilidade de uma pessoa
ter sua honra diminuda ou at mesmo perdida, esclarecendo que as causas de perda ou
detrimento da honra decorrem, em termos gerais, de "aces da autoria da prpria pes
soa ou que lhe sejam imputadas, e que sejam consideradas reprovveis na ordem tica
vigente, quer ao nvel da prpria pessoa, quer ao nvel da sociedade".63
Entende-se que a honra integra a dignidade do ser humano, no podendo, dessa
forma, ser perdida.
Do contrrio, legitimar-se-ia todo o tipo de agresso aos atributos morais de uma
pessoa que houvesse perdido a honra; inexistente esse bem de personalidade, no ha
veria objeto a se tutelar, situao que aviltaria, indubitavelmente, a dignidade humana.
Com efeito, a honra constitui uma das dimenses da dignidade humana, exigindo
esta respeito e considerao por cada ser humano individualmente entendido, o que
vincula a tudo e todos em qualquer lugar.64
Adverte Paulo Otero, a esse respeito, que o ser humano nunca pode ser tratado
com indignidade, tendo mesmo "um direito a no sofrer indignidades ou quaisquer
atentados sua dignidade, existindo uma obrigao universal de respeito, de garantia e
de proteco da dignidade humana".65
Questo no menos relevante aquela referente imputao de fatos verdadeiros
e notrios a uma pessoa: haveria ofensa honra na imputao de um fato capaz de
desprestigiar e macular os atributos morais de um indivduo, quando verdadeiras as
circunstncias fticas narradas?
Capelo de Sousa afirma no haver ofensa honra "quando se afirmem ou divul
guem factos verdadeiros e notrios, desde que t ais man ife s t a e s no representem, pela
sua forma ou suas circunstncias, um autnomo desrespeito da honra alheia".66
L ogo aps, o doutrinador distingue a divulgao de fatos verdadeiros e notrios da
manifestao de juzos sobre aes e comportamentos de outrem, esclarecendo que essa
conduta s ser lcita no seu prprio contedo "quando tambm no brigue com as re
gras decorrentes de adequao social, face particular necessidade de aqui se defender
a dignidade da pessoa humana, quaisquer que sejam os acidentes do seu percurso".67
Sobre a divulgao de fatos verdadeiros, Nuno de Sousa, aps classificar essa situa
o como uma causa de justificao "quase absoluta", refere que ainda assim pode haver
uma violao honra ou ao direito de reserva do indivduo, exigindo interesse pblico
a justificar sua divulgao.68
63 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . dt . p . 7 6 - 7 7 .
64 OTERO, Paulo . Op . dt . p . 5 5 2 .
65 OTERO, Paulo . Op , dt . lo c. dt .
66 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt . p . 3 0 9 .
67 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . lo c. dt .
68 S OUS A , N un o de . Op . cit . p . 3 2 - 3 5 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 2 1
Parece mais consentnea com a necessria proteo da dignidade do ser humano
esta ltima posio, pois somente um bem jurdico de valor igual ou superior honra
do indivduo pode autorizar sua ofensa, ainda que mediante a divulgao de fato ver
dadeiro, sob pena de se autorizar a execrao pblica de algum em razo de um ato
praticado, unicamente, v. g., pelo prazer do oprbrio alheio.
2.5 Restries aos direitos de personalidade
O estudo das restries aos direitos de personalidade exige, por primeiro, que se
estabelea o paradigma de que os direitos, sejam de personalidade, sejam fundamen
tais, no so ilimitados, devendo ser exercidos com a observncia a limites internos e
externos.69
Os primeiros decorrem da delimitao do mbito de proteo da cada direito, de
modo a definir-se seu objeto e contedo principal, determinando-se quais os bens e
esferas de ao protegidos por determinado preceito.70
Os segundos derivam da necessidade de se conciliar o exerccio de um direito com
imposies prprias da vida em sociedade, tais como o exerccio de outros direitos, a
ordem pblica, a segurana nacional, entre outros.71
Essas restries externas podem ser operadas pelo prprio legislador constitucional
- como o fez, v. g., no art. 27 da Constituio da Repblica Portuguesa - ou pela ordem
jurdica infraconstitucional, do que so exemplos, no que se refere aos direitos de per
sonalidade, os arts. 174s a 177- e 187aa 1908do Cdigo de Processo Penal portugus.
Podem, ainda, as restries externas aos direitos de personalidade decorrer de si
tuaes inevitveis em que os direitos conflituam originando as colises de direitos, hi
pteses que se resolvem por meio da aplicao de regras prprias que sero examinadas
em sees autnomas.72
3 Apontamentos sobre a liberdade e expresso
3.1 Generalidades
O direito de informao situa-se dentro do universo do direito liberdade de ex
presso, conceito este que compreende um conjunto de direitos fundamentais que a
doutrina reconduz categoria genrica de liberdades comunicativas ou liberdades de
comunicao.
69 VIEIRA D E A N D RA D E, Jo s Car lo s . Os dir e it o s fun dame n t ais n a Co n s t it ui o Po r t ugue s a de 1 9 7 6 .
4 . e d. Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 9 . p . 2 6 5 - 2 6 6 .
70 VIEIRA D E A N D RA D E, Jo s Car lo s . Op . cit . p . 2 6 7 .
71 VIEIRA D E A N D RA D E, Jo s Car lo s . Op . cit . lo c. cit .
72 Op . cit , lo c. cit . A r e s o lu o das s it ua e s de co lis o de dir e it o s s e r ab o r dada n as quar t a e quin t a s e e s
de s t e cap t ulo .
1 2 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Surge, assim, uma liberdade de expresso em sentido amplo, por alguns tambm de
signada de liberdade de comunicao, que abrange a liberdade de expresso em sentido
estrito, por vezes denominada liberdade de opinio, a liberdade de informao, a liber
dade de imprensa, os direitos dos jornalistas e a liberdade de radiodifuso, impondo-se
seu estudo na qualidade de direito me de todas as outras liberdades comunicativas.73
A liberdade de expresso em sentido amplo ou liberdade de comunicao encontra
assento na Declarao U niversal dos Direitos Humanos,74na Conveno Europia dos
Direitos do Homem,75assim como em uma srie de dispositivos da Constituio da Re
pblica Portuguesa, onde esto consagrados os direitos de informar e de ser informado
(art. 37a, ns 1), o direito de resposta (art. 37a, na 4), o direito de liberdade de imprensa
(art. 38a, na1), a liberdade dos rgos de comunicao social (art. 38a, na4), os direitos
de antena, de resposta e de rplica poltica (art. 40) ,76
As liberdades comunicativas abrangem, ainda, a liberdade de criao artstica
(art. 42a da Constituio da Repblica Portuguesa) e a liberdade de aprender e ensi
nar (art. 43ada Constituio da Repblica Portuguesa).77
Decorrncia da histrica aspirao dos povos por liberdade em face do Estado, a
liberdade de expresso integra a ordem jurdica portuguesa no catlogo dos direitos,
liberdades e garantias, podendo-se afirm-la - assim como os direitos de personalidade
- decorrente do princpio da dignidade da pessoa humana.
A esse propsito expressam Gomes Canotilho e Jnatas Machado que "o valor da
pessoa humana funciona como fundamento da liberdade de expresso, mas tambm
como limite. O exerccio desse direito fundamental deve fazer-se, na medida do poss
vel, no respeito pelos direitos de personalidade do indivduo".78
A liberdade de expresso comporta uma dimenso substantiva, que compreende as
atividades de pensar, formar a prpria opinio e exterioriz-la, bem como uma dimen
73 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . dt . p . 3 7 1 - 3 7 2 .
74 A r t . 1 9 e To da p e s s o a t e m dir e it o lib e r dade de o p in io e e x p r e s s o ; e s t e dir e it o in clui a lib e r dade de ,
s e m in t e r fe r n cia, t e r o p in ie s e de p r o cur ar , r e ce b e r e t r an s mit ir in fo r ma e s e ide ias p o r quais que r me io s e
in de p e n de n t e me n t e de fr o n t e ir as /
75 A r t . 1 0 9 1 "Qualque r p e s s o a t e m dir e it o a lib e r dade de e x p r e s s o . Es t e dir e it o co mp r e e n de a lib e r dade
de o p in io e a lib e r dade de r e ce b e r o u de t r an s mit ir in fo r ma e s o u ide ais s e m que p o s s a h av e r in ge r n cia
de quais que r aut o r idade s p b licas e s e m co n s ide r a e s de fr o n t e ir as , O p r e s e n t e ar t igo n o imp e de que o s
e s t ado s s ub me t am as e mp r e s as de r adio difus o , de cin e mat o gr afia o u de t e le v is o a um r e gime de aut o r iza o
p r v ia. 2 - 0 e x e r c cio de s t as lib e r dade s , p o r quan t o imp lica de v e r e s e r e s p o n s ab ilidade s , p o de s e r s ub me
t ido a ce r t as fo r malidade s , co n di e s , r e s t r i e s o u s an e s , p r e v is t as p e la le i, que co n s t it uam p r o v idn cias
n e ce s s r ias , n uma s o cie dade de mo cr t ica, p ar a a s e gur an a n acio n al, a in t e gr idade t e r r it o r ial o u a s e gur an a
p b lica, a de fe s a da o r de m e a p r e v e n o do cr ime , a p r o t e c o da s ade o u da mo r al, a p r o t e c o de h o n r a o u
do s dir e it o s de o ut r e m, p ar a imp e dir a div ulga o de in fo r ma e s co n fide n ciais , o u p ar a gar an t ir a aut o r idade
e a imp ar cialidade do Po de r Judicial."
76 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . dt . p . 3 7 2 .
77 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . lo c. cit .
78 CA N OTIL HO, J. J. Go me s ; MA CHA D O, Jn at as E, M. Re alit y s h o ws e lib e r dade de p r o gr ama o .
Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 3 . p . 4 7 - 4 8 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 2 3
so instrumental, consistente na possibilidade de utilizao dos mais diversos meios
adequados divulgao do pensamento.79
A dimenso substantiva da liberdade de expresso implica admitir-se: (a) que cada
um deve poder dizer o que pensa, mesmo quando no fornece nem pode fornecer funda
mentos controlveis para seu juzo e o reconhecimento de que em uma sociedade aberta
e pluralista, em que se pretende uma esfera de discurso pblico desinibida, robusta e
amplamente aberta, no h dvida de que a liberdade de expresso deve ser interpre
tada nesse sentido; (b) a pluralidade de contedos, formas e motivaes; (c) o direito
de discordar em coisas que tocam no corao da ordem existente; (d) a proteo de
condutas expressivas, independentemente da qualidade, realidade, significado, objetivo
ou efeito de seu contedo; (e) a rejeio de uma concepo construda com base numa
ideia de hierarquia de tipos de discurso protegido".80
A dimenso instrumental da liberdade de expresso, de outra parte, compreende
o direito de acesso ao pblico e o direito de audincia, ambos limitados pelos direitos
dos signatrios.81
No mbito da estrutura da liberdade de expresso, merece apontamento o princpio
fundante das liberdades fundamentais segundo o qual a liberdade a regra e a restri
o a exceo, o qual tem importantes implicaes, nomeadamente, na afirmao de
uma ampla proteo prima fade da liberdade individual e na exigncia de clareza e con-
trolabilidade no processo de ponderao de direitos e interesses constitucionalmente
protegidos".82
Importa anotar-se, por fim, que a importncia da liberdade de expresso tem sido
constantemente afirmada pelo Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, como registra
Francisco Fernandez Segado: La libertad de expresin tiene una especial relevancia por cuanto
es uno de los principales fundamentos de una sociedad democrtica y una de las condiciones ms
importantes para su progreso y el desarrollo individual, y por ello mismo, verdadera piedra angular
de los princpios de la democracia y de los derechos humanos protegidos por el Convento.83
79 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 4 1 7 .
80 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 4 1 7 - 4 2 4 . Em s e qn cia, o aut o r adv e r t e : "N o t e - s e , p o r m, que e s t e
e n t e n dime n t o n o imp e um me s mo t r at ame n t o jur dico ao s dife r e n t e s t ip o s de dis cur s o . A p e n as s e p r e t e n de
as s e gur ar que da n o r e s ult e , apriori, uma dife r e n t e dign idade jur dico - co n s t it ucio n al. A s dife r e n as de t r a
t ame n t o a co n fe r ir a cada um de le s de v e r e s ult ar aposteriori da p o n de r a o p r o p o r cio n al do s me s mo s co m o s
dife r e n t e s dir e it o s e in t e r e s s e s co m que o s me s mo s p o s s am e v e n t ualme n t e co lidir . A v ar i v e l fun dame n t al da
r e s t r i o das lib e r dade s da co mun ica o n o r e s ide n um ju zo s o b r e o v alo r in t r n s e co (high value; low value)
do s dife r e n t e s t ip o s de dis cur s o , mas n a p o n de r a o do e fe it o que o s me s mo s p o s s am v ir a t e r s o b r e o ut r o s
dir e it o s co n s t it ucio n alme n t e p r o t e gido s / Ib ide m.
81 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . dt . lo c. cit .
82 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 3 7 4 .
83 Es s a a s n t e s e do aut o r ap s r e alizar e x ame de de cis e s do Tr ib un al Eur o p e u de D ir e it o s Human o s .
S EGA D O, F r an cis co F e r n an de z. L a lib e r t ad de e x p r e s in e n la do ct r in a de i Tr ib un al Eur o p e o de D e r e ch o s
Human o s . Re v is t a de Es t dio s Po l t ico s , n 2 7 0 , 1 9 9 0 . D is p o n v e l e m: <h t t p : / / www.ce p c.e s / r ap / Pub lica-
do n e s / Re v is t as / 3 / EPN E_0 7 0 _0 9 4 .p df>. A ce s s o e m: 5 jan . 2 0 1 0 .
1 2 4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
3.2 O direito de informao
Consagrado na ordem constitucional,84o direito de informao, em sentido amplo,
est contido no direito liberdade de expresso e confunde-se, significativamente, com
as liberdades de imprensa e de comunicao social.
A doutrina uniforme em assentar que a distino entre a liberdade de expresso e
o direito de informao tem sido buscada com base na diferenciao entre a veiculao
de pensamentos, opinies e juzos de valor, de um lado, e de fatos, de outro.85
Segundo Ricardo L eite Pinto, a liberdade de expresso protege a livre divulgao de
pensamentos eopmies, enquanto o direito de informao refere-se apenas a informa
es, possuindo ambos a mesma regulao constitucional.86
Jnatas Machado aponta a dificuldade de se proceder a uma distino clara entre
juzos de valor e afirmaes de fato, pois essas categorias se confundem no mais das
vezes, impedindo uma diferenciao categorial estanque entre os conceitos de liberdade
de expresso e de informao.87
Dessa forma, em razo da proximidade dessas realidades jurdicas, adotar-se-,
para os fins deste estudo, um conceito amplo de direito informao, de modo a abran
ger informaes, ideias e opinies.
Releva sublinhar-se que esse direito informao abrange os direitos de informar,
de ser informado e de se informar.
O direito de informar respeita diretamente formao da opinio pblica, encon
trando-se intimamente relacionado com a liberdade de imprensa e de comunicao so
cial e com os direitos dos jornalistas, constituindo direito fundamental do stactus activus
do cidado.88
O direito de ser informado refere-se aos direitos do receptor no processo comunica
tivo, por meio dos quais tem-se procurado ampliar a autonomia individual nos proces
sos de formao de preferncias e opinies e reforar a posio dos cidados em face dos
meios de comunicao social, no sentido de garantir um servio informativo e formativo
84 Co n s t it ui o da Re p b lica Po r t ugue s a, ar t . 3 7 a, n 9 1 : To do s t m o dir e it o de e x p r imir e div ulgar liv r e
me n t e o s e u p e n s ame n t o p e la p alav r a, p e la image m o u p o r qualque r o ut r o me io , b e m co mo o dir e it o de
in fo r mar , de s e in fo r mar e de s e r in fo r mado s , s e m imp e dime n t o s n e m dis cr imin a e s ."
85 A e s s e r e s p e it o , lv ar o Ro dr igue s Jn io r e s clar e ce que "e n quan t o a lib e r dade de e x p r e s s o s ign ifica t o
s o me n t e a man ife s t a o de uma o p in io ( um ju zo de co n t e do v alo r at iv o ) , a lib e r dade de in fo r ma o r e fle t e a
co mun ica o s o b r e um fat o ( n o t cia) . To dav ia, n o t ar e fa f cil is o lar a e x p r e s s o e m r e la o a p e n s ame n t o s ,
ide ias e o p in ie s de uma r e s t r it a co mun ica o in fo r mat iv a, p o is a e x p r e s s o de p e n s ame n t o s n e ce s s ar iame n t e
s e ap o ia n a n ar r a o do s fat o s e , in v e r s ame n t e , a co mun ica o de fat o s e n o t cias n un ca s e d e m um e s t ado
'p ur o ', p o is quas e s e mp r e co n t m algum e le me n t o v alo r at iv o " ( ROD RIGUES J N IOR, lv ar o . L ib e r dade de
e x p r e s s o e lib e r dade de in fo r ma o - limit e s e fo r mas de co n t r o le . Cur it ib a: Jur u Edit o r a, 2 0 0 8 . p . 6 0 ) .
86 PIN TO, Ricar do L e it e . L ib e r dade de imp r e n s a e v ida p r iv ada. Re v is t a da Or de m do s A dv o gado s , an o
5 4 , p . 2 7 - 1 4 7 , L is b o a: B F D UL , 1 9 9 4 , t . 1 , p . 5 6 - 5 7 .
87 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 4 7 3 .
88 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 4 7 4 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 2 5
de qualidade; possui, ainda, uma dimenso poltica democrtica, porquanto somente o
cidado bem informado est em situao de construir o seu prprio juzo e de participar
do processo democrtico da maneira pretendida pela Constituio".89
O direito de se informar, por sua vez, protege, do ponto de vista ativo, a livre pro
cura da informao e, na vertente passiva, a possibilidade de recepo de informao
sobre qualquer tema".90' 91
Acrescenta a doutrina que o direito liberdade de expresso - no qual se insere o
direito de informao - prescinde da anlise das motivaes mais ou menos egostas ou
altrustas dos sujeitos em presena ou dos objetivos espirituais ou materiais da comuni
cao, estando em causa a proteco de condutas expressivas, independentemente da
qualidade, realidade, significado, objectivo ou efeito do seu contedo".9293
3.3 Restries s liberdades comunicativas
As liberdades comunicativas, assim como os direitos de personalidade e os demais
direitos fundamentais, no se apresentam ilimitadas.94
Encontram-se sujeitas a restries, seja em decorrncia da interao com outros
direitos, seja em razo da necessidade de respeito a certos bens da comunidade, preocu
pao que, alis, encontra assento no art. 3a da L ei de Imprensa de Portugal.95
89 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . dt . p . 4 7 5 - 4 7 7 .
90 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 4 7 9 - 4 8 6 .
91 Co m r aiz t e o r t ica n as n e ce s s idade s e s p ir it uais e le me n t ar e s do s e r h uman o e n o v alo r do liv r e de s e n
v o lv ime n t o da p e r s o n alidade , o dir e it o de s e in fo r mar p r e s s up e a gar an t ia das de mais lib e r dade s co mun i
cat iv as ; de t e r min a que a e s co lh a das fo n t e s de in fo r ma o cab e a cada cidado e m p ar t icular e n o ao p o de r
p o l t ico , s e r v in do co mo an t do t o co n t r a a in s t it ucio n aliza o de um guar dio das p o r t as (gatekeeper) de ace s s o
in fo r ma o e co n t r a a ado o de um s is t e ma de r e gulame n t a o e s t adual do ace s s o s fo n t e s de in fo r ma o ;
ab r an ge , ain da, o ace s s o a fo n t e s de in fo r ma o ( MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 4 7 8 - 4 7 9 ) .
92 CA N OTIL HO, J. J. Go me s ; MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 1 5 .
93 N o me s mo s e n t ido , F r an cis co F e r n an de z S e gado , r e alizan do ap an h ado das de cis e s do Tr ib un al Eur o p e u
de D ir e it o s Human o s , e s clar e ce : "Es p o r t o do e llo p o r lo que la lib e r t ad de e x p r e s in amp ar a n o s lo las in -
fo r macio n e s o ide as que s o n fav o r ab le me n t e r e cib idas o co n s ide r adas co mo in o fe n s iv as o in dife r e n t e s , s in o
t amb i n aque llas o t r as que ch o can , in quie t an u o fe n de n al Es t ado o a un a fr accin cualquie r a de s u p o b lacin .
Tale s s o n , a juicio de i Tr ib un al las de man das de i p lur alis mo , Ia t o le r an cia y e l e s p r it u de ap e r t ur a, s in las cua-
le s n o e x is t e un a s o cie dad de mo cr t ica. Y e s t o s ign ifica e s p e cialme n t e que t o da fo r malidad, co n dicin , r e s t r ic-
cin o s an cin imp ue s t a e n la mat r ia n o s lo v a a t e n e r que r e s p o n de r a un fin le g t imo , s in o que de b e r s e r
p r o p o r cio n ada al mis mo ( S EGA D O, F r an cis co F e r n an de z. L a lib e r t ad de e x p r e s in e n Ia do ct r in a de i Tr ib un al
Eur o p e o de D e r e ch o s Human o s . Re v is t a de Es t dio s Po l t ico s , n a 7 0 , 1 9 9 0 . D is p o n v e l e m: <h t t p : / / www.
ce p c.e s / r ap / Pub Hcacio n e s / Re v is t as / 3 / EPN E_0 7 0 J3 9 4 .p df>. A ce s s o e m: 5 jan . 2 0 1 0 ) .
94 A e s s e r e s p e it o , r e me t e - s e o le it o r ao que s e afir mo u n o it e m 2 .5 de s t e cap t ulo .
95 L e i n e 2 / 9 9 , ar t . 3 a: "L imit e s . A lib e r dade de imp r e n s a t e m co mo n ico s limit e s o s que de co r r e m da Co n s
t it ui o e da le i, de fo r ma a s alv aguar dar o r igo r e a o b je ct iv idade da in fo r ma o , a gar an t ir o s dir e it o s ao b o m
n o me , r e s e r v a da in t imidade da v ida p r iv ada, image m e p alav r a do s cidado s e a de fe n de r o in t e r e s s e
p b lico e a o r de m de mo cr t ica.
1 2 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Jnatas Machado esclarece que os fundamentos das restries s liberdades comu
nicativas residem na salvaguarda de direitos e interesses constitucionalmente protegi
dos, de natureza individual e coletiva.96
Refere, adiante, que o domnio de garantia das liberdades da comunicao, como
dos demais direitos, liberdades e garantias, determinado pela metdica de ponderao
das mesmas entre si e com os demais direitos e interesses dotados de dignidade cons
titucional, de modo que poder ser possvel a restrio das liberdades comunicativas
para fins de salvaguarda de bens individuais ou comunitrios decorrentes da dignidade
da pessoa humana.97
Importa anotar-se, todavia, que as restries s liberdades comunicativas podem
decorrer no apenas do conflito com outras normas constitucionais, mas tambm da
coliso com direitos de personalidade - mesmo aqueles que no encontram previso na
Carta Magna - e com outros bens protegidos pela ordem infraconstitucional.98
Aps registrar a existncia de limites aos direitos fundamentais de expresso e co
municao, Nuno de Sousa refere que em leis gerais protegem-se "valores sociais tidos
como juridicamente mais relevantes" do que as liberdades de expresso e informao,
dentre os quais a proteo da juventude, a preveno da pornografia, do dio racial, da
violncia.99,100
Merece registro, por fim, a advertncia de Jnatas Machado para a existncia de
uma relao de tenso entre as liberdades comunicativas e os direitos de personalidade,
na medida em que ambos se escoram no valor da dignidade da pessoa humana; escla
rece, aps, o doutrinador, que os conflitos decorrentes dessa relao havero de ser
resolvidos por meio de exerccios de ponderao quando da aplicao do direito, pon
tuando que a liberdade de expresso deve ser amplamente protegida, sem prejuzo da
existncia de sanes constitucionalmente adequadas para as violaes especialmente
claras e graves dos direitos de personalidade.101
A doutrina aponta, ainda, a indispensabilidade das liberdades comunicativas ma
nuteno dos regimes democrticos e pontua a possibilidade de se estabelecerem limi
tes ao seu exerccio sem o recurso censura.102
Nas prximas sees examinar-se-o as temticas da coliso de direitos generi
camente e, em especfico, da resoluo do conflito entre o direito de informao e os
direitos de personalidade.
85 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 7 4 3 .
97 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . dt . p . 7 4 4 .
* Re t o mar - s e - a e s t e t e ma n as p r x imas s e e s de s t e cap t ulo .
99 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . dt . p . 2 9 .
100 Talv e z fo s s e mais ap r o p r iado falar - s e n a p r o t e o de o ut r o s b e n s e v alo r e s co n s agr ado s p e la o r de m ju
r dica, s o b p e n a de s e r e alizar h ie r ar quiza o e m ab s t r at o de dir e it o s e b e n s jur dico s ligado s dign idade da
p e s s o a h uman a, o que n o r e co me n dado p e la do ut r in a.
101 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op .cit . p . 7 5 1 .
102 D ON N IN I, Oduv aldo ; D ON N IN I, Ro g r io F e r r az. Op . cit . p . 4 7 - 5 2 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 2 7
4 A coliso de direitos
4 .1 mbito de proteo e coliso de direitos
O primeiro postulado a se estabelecer nessa seara, reitera-se, consiste na afirmao
de que os direitos no so ilimitados.
Como observa Jorge Reis Novais, referindo-se aos direitos fundamentais, em ano
tao que serve generalidade dos direitos, a regra geral de que os direitos so limi-
tveis, dependendo das circunstncias concretas do caso e dos valores ebens dignos de
proteo que se lhes oponham.103
A identificao de uma situao de conflito ou coliso de direitos depende, todavia,
de uma compreenso prvia da delimitao ou do mbito de proteo do direito, permitin
do a identificao de seu objeto ou contedo principal.104
Definir-se o mbito de proteo de um direito determinar-se os bens ou esferas de
ao abrangidos e protegidos pelo preceito que prev o direito e os distinguir de figuras
e zonas adjacentes, para saber, em abstrato, se o preceito legal inclui, no inclui ou ex
clui, em termos absolutos, as vrias situaes, formas ou modos pensveis do exerccio
de um direito.105
H de se proceder, assim, por primeiro, interpretao de cada um dos preceitos
que estatuem os direitos em exame no contexto global da ordem jurdica, de modo a
definir-se seus respectivos mbitos de proteo.
Claus-Wilhelm Canaris, dissertando sobre as quebras do sistema, expressa a im
portncia de se definir o verdadeiro significado de um princpio - ou de um direito,
acrescenta-se -, para assim afastar-se a falsa impresso de ocorrncia de uma situao
de coliso.106
A coliso de direitos, na lio de Antnio Menezes Cordeiro, ocorrer quando um
direito subjetivo, na sua configurao ou no seu exerccio, deva ser harmonizado com
103 MOVA IS , Jo r ge Re is . A s r e s t r i e s ao s dir e it o s fun dame n t ais n o e x p r e s s ame n t e aut o r izadas p e la
Co n s t it ui o . Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 3 . p . 4 9 .
104 N OVA IS , Jo r ge Re is . A s r e s t r i e s ao s dir e it o s fun dame n t ais n o e x p r e s s ame n t e aut o r izadas p e la
Co n s t it ui o , cit ., p . 2 6 7 .
105 N OVA IS , Jo r ge Re is . A s r e s t r i e s ao s dir e it o s fun dame n t ais n o e x p r e s s ame n t e aut o r izadas p e la
Co n s t it ui o , o p . cit ., lo c. dt .
106 CA N A RIS , Claus - Wilh e lm. D ir e it o s fun dame n t ais e dir e it o p r iv ado . Tr adu o de In go Wo lfgan g
S ar le t e Paulo Mo t a Pin t o . Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 9 . p . 2 0 2 . A s e guir , o do ut r in ado r e s clar e ce : A s s im,
p o r e x e mp lo , s e r ia in co r r e ct o falar de uma 'co n t r adi o ' e n t r e o p r in c p io da aut o n o mia p r iv ada e a r e gr a
do r e s p e it o p e lo s b o n s co s t ume s , n o s t e r mo s do 1 3 8 do B GB . Po is co mo qualque r lib e r dade , a v e r dade ir a
lib e r dade in clui uma liga o t ica e n o ar b t r io ; as s im t amb m o s limit e s do s b o n s co s t ume s e x is t e m,
de an t e mo , de n t r o da aut o n o mia p r iv ada; falar aqui de uma 'co n t r adi o ' co n duz a uma ab s o lut iza o da
ide ia de aut o n o mia p r iv ada que co n fun de o s e u co n t e do t ico - jur dico e de s n at ur ar ia, as s im, o p r p r io
p r in c p io ".
1 2 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
outro ou outros direitos: "a coliso ocorre sempre que dois ou mais direitos subjectivos
assegurem, aos seus titulares, permisses incompatveis entre si.107
Noutras palavras, verificar-se- a coliso de direitos quando seus respectivos mbi
tos de proteo intersectarem-se.108
Capelo de Sousa, de igual modo, identifica a possibilidade de ocorrncia de coliso
de direitos quando sejam inconciliveis ou incompatveis o exerccio de um direito de
personalidade com outro direito de personalidade ou com outro direito subjetivo, no
pressuposto de existirem validamente ambos os direitos colidentes.109
Definidos, assim, o mbito de proteo de um direito e as situaes em que se
verifica a coliso de direitos, importa realizar-se o exame das possibilidades ofertadas
pela ordem jurdica portuguesa para a resoluo das situaes de coliso entre direitos.
4.2 Os regimes de resoluo da coliso de direitos
A ordem jurdica portuguesa oferece dois sistemas de resoluo de conflitos resul
tantes da coliso de direitos: um possui origem privatista, encontrando-se regulado no
art. 3359do Cdigo Civil; outro resulta do direito constitucional de resoluo de con
flitos, assentado na doutrina do direito pblico, no encontrando previso expressa na
Constituio portuguesa.
Sobre o regime da Carta Civil, Antnio Menezes Cordeiro esclarece que em se cui
dando de coliso de direitos iguais ou da mesma espcie, havero de ceder mutuamente,
o que denomina de "princpio do igual tratamento"; todavia, inexistente essa igualdade,
adverte - que deve ser aurada em abstrato -, deve prevalecer o direito que se deva con
siderar superior, juzo que se realiza em concreto, com recurso a "uma ponderao com
vista a compatibilizar, luz da proporcionalidade, os direitos em presena".110' 111
107 MEN EZ ES CORD EIRO, A n t n io . D a co lis o de dir e it o s . O D ir e it o , n 1 3 7 , v . 1 , p . 3 7 - 5 5 . Co imb r a:
A lme din a, 2 0 0 5 ,
los VIEIRA D E A N D RA D E, Jo s Car lo s . Op . cit . p . 2 7 5 - 2 7 6 . O do ut r in ado r e x e mp lifica o limit e e n t r e
o mb it o de p r o t e o e a co lis o de dir e it o s , in dagan do : "Te r s e n t ido in v o car a lib e r dade r e ligio s a p ar a
e fe ct uar s acr if cio s h uman o s o u, as s o ciada ao dir e it o de co n t r air cas ame n t o , p ar a jus t ificar a p o ligamia o u
p o lian dr ia? Ou in v o car a lib e r dade ar t s t ica p ar a le git imar a mo r t e de um act o r n o p alco o u p ar a r o ub ar o
mat e r ial n e ce s s r io e x e cu o de uma o b r a de ar t e ? A r e s p o s t a ap r e s e n t ada n o s e n t ido de que n e s s e s
cas o s n o s e e s t p e r an t e uma s it ua o de co n flit o e n t r e o dir e it o in v o cado e o ut r o s dir e it o s o u v alo r e s ,
p o is o p r p r io p r e ce it o co n s t it ucio n al que n o p r o t e ge e s s as fo r mas de e x e r c cio do dir e it o fun dame n t al;
a p r p r ia Co n s t it ui o , ao e n un ciar o s dir e it o s , e x clui do r e s p e ct iv o p r o gr ama n o r mat iv o a p r o t e o a e s s e
t ip o de s it ua e s ."
109 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 5 3 3 .
110 MEN EZ ES CORD EIRO, A n t n io . D a co lis o de dir e it o s , cit ., p . 4 6 - 4 7 e 5 4 .
111 O aut o r e x e mp lifica o as s e r t o da s e guin t e fo r ma: "n uma co lis o e n t r e um dir e it o de p e r s o n alidade e um
dir e it o de p r o p r ie dade , t e mo s dir e it o s de e s p cie dife r e n t e ; t e o r icame n t e , o dir e it o de p e r s o n alidade s e r ia
s e mp r e s up e r io r ; mas e m co n cr e t o , p o de r s e r 's up e r io r o de p r o p r ie dade : p e n s e - s e n uma un idade fab r il
lice n ciada e h muit o e m lab o r a o , que o r e c m- in s t alado co n s t r ut o r de uma cas a p r e t e n da faze r p ar ar , in v o
can do o dir e it o ao r e p o us o " ( CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . D a co lis o de dir e it o s , cit ., p . 4 7 - 4 8 ) .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 2 9
A resoluo da coliso de direitos com base na ordem constitucional, de outro lado,
est inserida na teoria das restries ao contedo dos direitos fundamentais.
Essas restries podem ser constitucionalmente expressas ou constitucionalmente
autorizadas: as primeiras so operadas diretamente no plano constitucional112e resul
tam de uma ponderao de bens realizada pelo prprio legislador constituinte para a
definio do mbito de proteo dos direitos fundamentais; as ltimas decorrem de
autorizao constituinte para que o legislador ordinrio113realize essa ponderao que
legitime uma restrio de direitos, liberdades e garantias.114
Somente aps a definio do mbito de proteo do direito ou de seus limites ima-
nentes que se passar verificao da existncia de conflito ou coliso entre direitos,
passando-se ao campo das restries no expressamente autorizadas pela Constituio
ou no expressamente previstas.115
Nesses casos, ento, recorrer-se- ponderao dos bens em disputa,116seja em
termos de prevalncia integral de um deles, seja por via de sua harmonizao.117
Examinados os sistemas de resoluo da coliso de direitos fornecidos pela L ei
Civil e pela ordem constitucional, ainda que em apertada sntese, pode-se identificar,
com facilidade, a similitude do tratamento conferido pelos regimes em anlise soluo
desses conflitos, utilizando-se ambos de juzos de ponderao e de proporcionalidade
dos bens em conflito para a definio de sua harmonizao ou prevalncia.
4.3 Juzo de adequao
Apresentados os regimes de resoluo da coliso de direitos, a questo que se pe
agora definir-se qual dos sistemas se afigura adequado resoluo das situaes de
coliso entre os direitos de personalidade e o direito de informao.
Anote-se, por primeiro, que nessas hipteses estar-se- diante de um conflito entre
um direito de personalidade e o direito de informao, revestindo-se este da qualidade
de direito fundamental.
n t Jo s Car lo s Vie ir a de A n dr ade e x e mp lifica e s s as h ip t e s e s co m a r e la o e n t r e a lib e r dade de e x p r e s
s o e o dir e it o de r e s p o s t a, co n s agr ado s n o s n2 1 e 4 do ar t . 37ada Co n s t it ui o da Re p b lica Po r t ugue s a
e co m a p r o t e o do s e gr e do de jus t i a e m face do dir e it o in fo r ma o do s cidado s e do s jo r n alis t as ,
n o s t e r mo s do ar t . 2 0 a, n s 3 , e 3 7 9, n 6 1 , e 3 8 a, n 9 2 , b, da Co n s t it ui o da Re p b lica Po r t ugue s a ( Op . cit .
p . 2 6 8 ) .
113 Ex e mp lo de r e s t r i o o p e r ada p e la le i o r din r ia p o de s e r o b s e r v ado n o ar t . 3 a da L e i n 2 / 9 9 .
114 MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit . p . 7 0 9 .
115 A s e x p r e s s e s s o de Jo r ge Re is N o v ais ( Op . cit . p . 6 9 6 ) .
116 S A RMEN TO, D an ie l. A p o n de r a o de in t e r e s s e s n a Co n s t it ui o F e de r al. Rio de Jan e ir o : L ume n
Jur is , 2 0 0 3 . p . 1 0 2 .
117 N OVA IS , Jo r ge Re is . Op . cit . p . 6 3 9 .
1 3 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
jsjo se pode olvidar, igualmente, a circunstncia de que alguns direitos de perso
nalidade so tambm direitos fundamentais, porque podem ser extrados diretamente
d a Co n s t it ui o .
gntretanto, ainda assim no se desnatura sua qualidade de direito de personalidade.
A s s e n t e - s e , outrossim, que mesmo em se qualificando o direito de personalidade
de d ire it o fundamental, o tratamento de sua coliso com outro direito fundamentai,
como o direito de informao, realizar-se- com recurso a normas de direito civil.
Com efeito, recomenda-se, nessas situaes, a utilizao das normas de direito
privado, porquanto evidenciar-se-o, em regra, interesses de particulares em conflito,
o que reclama a incidncia das normas de direito civil, deixando-se o sistema constitu
cio n al de resoluo de conflitos para aquelas situaes em que se pretenda proteger a
lib e r dade do indivduo em face do Estado.
Paulo Mota Pinto entende que as relaes entre particulares devem ser reguladas,
em primeiro plano, por normas de direito privado, resumindo-se a eficcia horizontal
dos direitos fundamentais a imperativos de tutela.118
Refira-se, outrossim, que o juzo de adequao relativo s normas pertinentes re
soluo dessas hipteses de coliso de direitos remete ao tema da constitucionalizao
d o direito privado.
A esse respeito, interessantes as concluses a que chegou Joaquim de Sousa Ri
beiro, admitindo que a posio cimeira das normas constitucionais no pode deixar de
influenciar a apreciao, em nvel legislativo e judicial, da matria civilstica.119
Contudo, o autor pontua a funo da Constituio de reforo de tutela relativa
mente aos bens e situaes j protegidas e reguladas por normas de direito privado, que
i n c i d e m primria e diretamente sobre as relaes jurdicas respectivas,120que devem ser,
ain da assim, lidas em conformidade com a Carta Magna, "o que leva, em primeira via, a
uma interpretao da lei ordinria em conformidade com a Constituio".121
Incidem, assim, resoluo das situaes de coliso em comento, as normas de di
reito privado as quais, como ja se assinalou, em nada. colidem com o regramento ofer
tado pcfo ordem constitucional para a resoluo das situaes de coliso de direitos ,
[^"p t fr o , 1)31110 Mo t a- A in flun cia do s dir e it o s fun dame n t ais s o b r e o dir e it o p r iv ado p o r t ugus . In : MON
TEIRO, A n t n io Pin t o ; N EUN ER, Jr g ; S A RL ET In go Wo lfgan g. D ir e it o s fun dame n t ais e dir e it o p r iv ado .
Co imb r a: A lme din a, 2 0 0 7 . p . 1 5 5 - 1 5 7 . S o b r e e s s a fun o de p r o t e o do s dir e it o s fun dame n t ais - imp e r at iv o s
de tutela" - 0 2ut o r e s dar e ce : "Co n s o an t e a s it ua o de p e r igo o u a le s o do b e m p r o t e gido e m caus a, a s ua p r o
b ab ilidade e ( s e fo r o cas o ) p r e v is v e l ilicit ude , a e s p cie de b e m e m que s t o e t c., o s de v e r e s de p r o t e c o de s t e s
dir eitos - e igualme n t e do s dir e it o s e co n mico s e s o ciais o b r igar o , p o is , as e n t idade s p b licas a in t e r v ir n as
r e la e s p ar t icular e s , e v it an do - s e a r igidifle a ao e in fle x ib ilidade da v ida jur d co - p r iv ada que r e s ult ar ia
se m dvida de uma v e r dade ir a 's ub s t it ui o do dir e it o civ il p e lo dir e it o co n s t it ucio n al' ( cuja p o s s ib ilidade , ali s ,
n o s parece em lt ima in s t n cia r e alis t a) , s e m de ix ar , p o r m, de o b t e r , co m uma co n cilia o de in t e r e s s e s di fe -
r e n dada n a s it ua o co n cr e t a, n v e is de p r o t e c o ade quado s s e x ign cias do s dir e it o s fun dame n t ais ".
in RIBEIRO. Jo aquim de S o us a. D ir e it o do s co n t r at o s . Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 7 . p. 8.
i m ribEIRO, Jo aquim de S o us a. Op . cit . p . 1 4 s s .
in RIBEIRO, Jo aquim de S o us a. Op . cit . p . 1 7 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 3 1
reservando-se a aplicao direta dos preceitos constitucionais para eventuais situaes de
lacuna da lei civil.122
Para o mesmo sentido aponta o magistrio de Claus-Wilhelm Canaris, cuja doutri
na assenta que o objeto dos direitos fundamentais , em princpio, apenas regulaes de
atos estatais, "mas no tambm actos de sujeitos de direito privado, ou seja, e sobretu
do, negcios jurdicos e actos ilticos, pois esses sujeitos no so sequer destinatrios
de direitos funtamentais.123
Desse modo, definida a adequao da atividade de resoluo da coliso dos direitos
de personalidade e do direito de informao com recurso s normas de direito privado,
examinar-se-, em seqncia, pormenorizadamente, esse mtodo de resoluo da coli
so de direitos.
5 A coliso entre os direitos de personalidade e o direito de
informao
5.1 Generalidades
A variedade e a conflitualidade das situaes da convivncia humana podero oca
sionar a existncia de mltiplos e complexos interesses ou fins jurdicos, circunstncias
que havero de ser consideradas e examinadas em um juzo de ponderao para fins de
soluo de conflitos ou coliso de direitos.
Dessa forma, como exemplifica Capelo de Sousa, a liberdade de expresso de um
jornalista poder servir, abstratamente, a interesses ou fins jurdicos to diferentes
como a revelao da verdade, o exerccio da crtica, a rentabilizao econmica da res
pectiva empresa, uma qualificada informao dos leitores, a sua informao geral e at
o prazer da sensao e a necessidade de entretenimento dos leitores, no podendo,
porm, violar valores superiores de terceiros, como elevados valores da identidade, da
honra e da intimidade da vida privada.124
Como adverte Jos Eduardo Figueiredo Dias, a inevitabilidade dos conflitos faz
desde logo emergir a ideia de que nenhum desses direitos - de personalidade e de infor
mao - gozam de uma tutela absoluta, devendo as tentativas para a sua harmonizao
considerar o duplo sentido - individual e societrio - dos valores que lhes so nsitos.125
Noutras palavras, quando se processa um conflito entre um direito de personali
dade e outro direito que no de personalidade, a posio jurdica do direito de persona
122 RIB EIRO, Jo aquim de S o us a. Op . dt . p . 2 7 .
123 RIB EIRO, Jo aquim de S o us a. Op . d t . p . 5 5 - 5 6 .
121 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt . p . 5 3 7 .
125 F IGUEIRED O D IA S , Jo s Eduar do Oliv e ir a. D ir e it o in fo r ma o , p r o t e c o da in t imidade e aut o r idade s
admin is t r at iv as in de p e n de n t e s . A A . W. Es t udo s e m h o me n age m ao Pr o fe s s o r D o ut o r Ro g r io S o ar e s .
S t udia Iur idica, n 9 6 1 , p . 6 1 5 - 6 5 4 , Co imb r a: Co imb r a Edit o r a, 2 0 0 1 .
1 3 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
lidade concretamente conflituante haver de ser aferida em face da posio jurdica do
outro direito ou valor em conflito, tudo examinado na perspectiva do conjunto de bens
e valores contemplados pelo ordenamento jurdico em sua totalidade e unidade.126
A esse respeito, aps acentuar a existncia de tenso entre o direito intimidade e
a liberdade de imprensa, Jos L us Bonifcio Ramos anota que essas situaes merecem
tratamento pela via das regras que regulam a coliso de direitos.127
Exatamente essa operao de ponderao de bens, as circunstncias fticas relevan
tes sua realizao e o mtodo utilizado para a resoluo dos conflitos entre os direitos
de personalidade e as liberdades comunicativas constituem o objeto das prximas refle
xes deste estudo.
5.2 A resoluo da coliso entre os direitos de personalidade e o direito
de informao
A resoluo das situaes de coliso ou de conflito entre os direitos de persona
lidade e o direito de informao deve ser procedida com base na regra do art. 335Bdo
Cdigo Civil portugus.128
Efetivamente, originando-se essas hipteses de coliso de direitos de relaes jur
dicas entre privados, devem incidir, de modo imediato, as regras de direito civil, reser
vando-se o direito constitucional para o preenchimento de eventuais lacunas do direito
privado e para a resoluo das situaes de coliso de direitos envolvendo particulares
emface do Estado.129
Ao examinar as relaes entre os direitos de personalidade e as liberdades comu
nicativas, Jnatas Machado afirma a impossibilidade de se estabelecer, abstratamente, a
superioridade ou o carter absoluto de quaisquer dos direitos em comento,130concluin
121 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V A . Op . dt . p . 5 3 9 .
127 RA MOS , Jo s L u s B o n if cio . Op . cit ., fls . 2 6 - 2 7 .
m 'A r t . 3 3 5 e 1 . Hav e n do co lis o de dir e it o s iguais o u da me s ma e s p cie , de v e m o s t it ular e s ce de r n a me dida
do n e ce s s r io p ar a que t o do s p r o duzam igualme n t e o s e u e fe it o , s e m maio r de t r ime n t o p ar a qualque r das
p ar t e s . 2 . S e o s dir e it o s fo r e m de s iguais o u de e s p cie dife r e n t e , p r e v ale ce o que de v a co n s ide r ar - s e s up e r io r ."
129 S o b r e e s s a que s t o r e me t e - s e o le it o r ao que s e as s e n t o u n o it e m 4 .3 de s t e cap t ulo .
130 DIA S , Jo r ge de F igue ir e do . Op . cit . p . 7 5 1 . A e s s e p r o p s it o , e s clar e ce o aut o r : "N a do ut r in a civ ilis t a,
o s dir e it o s de p e r s o n alidade , jun t ame n t e co m o s dir e it o s r e ais , s o fr e que n t e me n t e de s ign ado s p o r dir e it o s
ab s o lut o s . S e m p r e ju zo do m r it o do ut r in ai de s t a qualifica o , e n quan t o v is an do afir mar o car act e r erga omnes
da s ua v in cula o , do p o n t o de v is t a jur dico - co n s t it ucio n al a me s ma p o de in duzir e m e r r o , s uge r in do uma
ab s o lut a in s us ce p t ib ilidade de r e s t r i o . Or a, o s dir e it o s de p e r s o n alidade r e co n duze m- s e cat e go r ia ge n r ica
de dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias e o s s e gun do s , n a me dida e m que t r aduzam p o s i e s jur dicas r e co n duz -
veis e s t r ut ur a e t e le o lo gia do dir e it o de p r o p r ie dade , co n s t it ue m dir e it o s fun dame n t ais de n at ur e za an lo
ga ao s dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias . A p e s ar do car ct e r t e n de n cialme n t e un iv e r s al da s ua v in cula o , ali s
co mum ge n e r alidade do s dir e it o s , lib e r dade s e gar an t ias , que v in culam e n t idade s p b licas e p r iv adas , o s
dir e it o s de p e r s o n alidade e o s dir e it o s r e ais ap r e s e n t am uma e s t r ut ur a p r in cip iai, p o de n do e de v e n do s e r o p -
t imizado s , e mb o r a s e jam co mp at v e is co m dife r e n t e s gr aus de r e aliza o , de aco r do co m o quadr o de p o s s ib i
lidade s f ct icas e n o r mat iv as co n cr e t ame n t e e x is t e n t e s . A mb o s e s t o s uje it o s a uma me t dica de p o n de r a o
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 3 3
do que "os direitos de personalidade configuram-se como limites constitucionalmente
imanentes das liberdades de comunicao, sendo a inversa tambm verdadeira".131132
Noutras palavras, o doutrinador no estabelece hierarquia entre os direitos de per
sonalidade e de informao abstratamente, remetendo o juzo de harmonizao ou de
prevalncia de um direito sobre outro ao exame das circunstncias das realidades da
vida concretamente consideradas, tratamento que se tem por mais consentneo com o
regime de resoluo da coliso de direitos.
No mesmo sentido, preceitua Jorge de Figueiredo Dias constiturem o direito
honra e o direito de informao direitos em princpio de igual hierarquia".133
Desse modo, para se proceder resoluo de uma situao de conflito entre algum
direito de personalidade e o direito de informao haver de se realizar, sempre, nas
circunstncias fticas concretas, o exame de todos os seus elementos, em especial o
mbito de proteo e a graduao do contedo dos preceitos, a natureza do caso e a
condio e o comportamento das pessoas envolvidas para, ento, estabelecer-se a possi
bilidade de exerccio de ambos, com cedncia recproca (art. 335a, ns 1, do Cdigo Civil
portugus) ou qual deles haver de prevalecer total ou parcialmente sobre o outro (art.
335s, ng2, do Cdigo Civil portugus).
A essa soluo conduz, igualmente, a lio de Antnio Menezes Cordeiro ao co
mentar o precitado dispositivo do Cdigo Civil portugus.134
Para o civilista, em se cuidando de direitos desiguais - como o so os direitos de
personalidade e o direito de informao - e na impossibilidade de se assentar, apriori, o
que se deva considerar superior, "o juzo de superioridade, que nos dar a chave para a
prevalncia, deve ser formulado em concreto", por meio de ponderao, luz do princ
pio da proporcionalidade.135
U tilizando-se, dessa forma, critrios de necessidade, adequao e proporcionalida
de, verificar-se-o, mediante a realizao de um juzo de ponderao sobre as formas de
p r o p o r cio n al e de co n co r dn cia p r t ica n o cas o de co n flit o co m o ut r o s dir e it o s fun dame n t ais e b e n s jur dico s
co n s t it ucio n alme n t e p r o t e gido s da co mun idade e do Es t ado . Re fir a- s e , a e s t e p r o p s it o , e e s t e um s e gun do
mal- e n t e n dido , que uma p ar t e da do ut r in a co n s t it ucio n al n o r t e - ame r ican a t e m v in do a de fe n de r o cr ct e r
ab s o lut o das lib e r dade s de e x p r e s s o e de imp r e n s a. Po r m, t amb m e s t e e n t e n dime n t o in duz e m e r r o , j que
n e m me s mo e s s a do ut r in a s ign ifico u alguma v e z que e s s as lib e r dade s p r e v ale ce s s e m de fo r ma in co n dicio n al
s o b r e de t e r min ado s dir e it o s de p e r s o n alidade , co mo s e jam o dir e it o ao b o m n o me e r e p ut a o ".
131 D IA S , Jo r ge de F igue ir e do . Op . cit ., lo c. cit .
132 D e s s a fo r ma, n o as s is t e r azo a Pe dr o Pais de Vas co n ce lo s ao afir mar a s up e r io r idade do dir e it o h o n r a
e m r e la o lib e r dade de imp r e n s a ( VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . cit . p . 7 8 ) , n o me adame n t e p o r
que n e n h um man dame n t o s e e x t r ai da o r de m jur dica a e s s e r e s p e it o . A o co n t r r io , a imp o s s ib ilidade de
s e e s t ab e le ce r uma h ie r ar quia e m ab s t r at o de r iv a das cir cun s t n cias de que amb o s s e e n co n t r am ligado s ao
p r in c p io da dign idade da p e s s o a h uman a e p o s s ue m, de igual fo r ma, p r e v is o p ar a al m do dir e it o o r din r io ,
n a Co n s t it ui o .
133 D IA S , Jo r ge de F igue ir e do . Op . cit . p . 1 0 1 .
134 MEN EZ ES CORD EIRO, A n t n io . D a co lis o de dir e it o s , cit ., p . 4 7 - 5 4 .
135 MEN EZ ES CORD EIRO, A n t n io . D a co lis o de dir e it o s , o p . cit ., lo c. cit .
1 3 4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
exerccio dos direitos em disputa, as alternativas de soluo possveis, elegendo-se, por
critrios de preferncia ou prevalncia, o direito ou valor que deva prevalecer ou, ainda,
harmonizando-se seu exerccio.
5,2.1 Circunstncias relevantes
Afirmando a doutrina da resoluo da coliso de direitos a necessidade de se pro
ceder ao exame das situaes concretas para a realizao de um juzo de ponderao em
cada caso analisado, importa perquirir-se quais as circunstncias relevantes a essa tarefa.
Com esse propsito, Jos Carlos Vieira de Andrade relaciona algumas circunstn
cias fticas merecedoras de exame na atividade de ponderao para a resoluo de um
conflito entre o direito de informao, de um lado, e o direito reserva da intimidade da
vida privada e familiar, de outro.136
Deve-se observar nessas hipteses, segundo o autor, que a proteo jurdico-cons-
titucional da liberdade de expresso e do direito de informao varia conforme a uti
lidade pblica e social da divulgao do fato ou opinio - que, por sua vez, diferente
conforme se trate de informao ou opinio em matria poltica, econmica, social ou
cultural, relevante em termos de interesse pblico, ou vise apenas o entretenimento e
a satisfao da curiosidade, sem esquecer a possibilidade de ser motivada pelo sensa-
sionalismo ou pela explorao da morbidez; por outro lado, a intensidade da reserva da
intimidade varia conforme se trate de aspectos que constituam uma esfera de segredo,
de privacidade ou de mero resguardo do indvduo.137
Tambm h diferenas conforme esteja em causa apenas a divulgao (de fatos,
imagens ou palavras) ou tenha havido intromisso ativa na privacidade, tal como so
relevantes o modo como feita a divulgao e o seu alcance real; pode ser decisiva a
condio das pessoas (conforme se trate de polticos, figuras pblicas, rus ou pessoas
annimas) ou o seu comportamento (consentimento tolerante ou autorizante).138
Na mesma trilha, Gomes Canotilho e Jnatas Machado acentuam que a interpreta
o de expresses como privacidade ou intimidade deve ser realizada com a observncia
de sua dependncia contextual, ou seja, considerando-se "variveis to diversas como
a evoluo das mentalidades, a identidade, a situao, o papel social e o estilo de vida
dos visados.139
Aps destacar a importncia das circunstncias fticas para a soluo de um con
flito de direitos, Capelo de Sousa esclarece que determinadas circunstncias podem
aumentar ou diminuir o peso jurdico dos direitos de personalidade e de informao.140
VIEIRA D E A N D RA D E, Jo s Car lo s . Op . dt . p . 3 0 7 .
VIEIRA D E A N D RA D E, Jo s Car lo s . Op . dt ., lo c. cit .
131 VIEIRA D E A N D RA D E, Jo s Car lo s . Op . dt ., lo c. dt .
w CA N OTIL HO, J. J. Go me s ; MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . dt . p . 5 5 .
ho CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt . p . 5 4 2 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 3 5
Dentre os fatores que aumentam a relevncia jurdica dos direitos de personalida
de, destaca: (a) a natureza juscivilisticamente muito significativa do elemento concreto
da personalidade humana individual objeto de tutela do direito subjetivo de persona
lidade (v. g., a vida, a integridade fsica ou a liberdade); (b) a acumulao de bens de
personalidade tutelados (p. ex., a integridade fsica, a liberdade e a honra podem ser
simultaneamente defendidas pelo mesmo sujeito numa certa relao conflitual); (c) a
ampla extenso ou a elevada intensidade do bem de personalidade tutelado (v. g., largas
zonas da integridade fsica, rgos essenciais do corpo humano e faixas nucleares da li
berdade); (d) a prossecuo, mediante o concreto exerccio do direito de personalidade,
de relevantes finalidades subjetivas e sociais, juridicamente tuteladas; (e) a particular
adequao, justeza, proporcionalidade e inocuidade dos meios empregues pelo titular
do direito de personalidade no exerccio do seu direito e a congenitude ou a perdura-
bilidade no tempo da constituio do direito de personalidade ou do seu exerccio.141
No que respeita aos fatores que diminuem a relevncia jurdica dos direitos de
personalidade, o civilista relaciona: (a) a exiguidade do bem da personalidade juscivi
listicamente tutelado; (b) a prossecuo, mediante o concreto exerccio do direito de
personalidade, de discutveis finalidades subjetivas sem benefcios sociais; (c) o carter
perturbante ou desproporcionado dos meios dispostos pelo titular do direito de perso
nalidade para o exerccio do seu direito; (d) a ocorrncia de comportamentos tico-ju-
rdicos censurveis (v. g., dolo, coao ou inobservncia culposa de deveres de respeito
ou de ao) do titular do direito de personalidade face ao titular do direito conflitual,
quando tais comportamentos condicionem o conflito de direitos; (e) a colocao em
risco pelo titular do direito de personalidade dos seus prprios bens de personalidade.142
Relativamente s circunstncias que podem modificar a relevncia jurdica do di
reito de informao, o doutrinador exemplifica afirmando a existncia de um direito de
informao muito forte quando um jornalista noticia fidedignamente uma interveno
mdica inovadora, de largo alcance social e feita em hospital pblico, pois realiza va
lores jurdicos muito importantes como, v. g., a revelao da verdade, a liberdade de
expresso, a informao geral e qualificada dos leitores, o acesso sade, a divulgao
do progresso cientfico e a rentabilizao econmica do seu jornal.143
Diferentemente, prossegue o doutrinador, pequena relevncia no processo de pon
derao mereceria a situao do mesmo jornalista que pretendesse relatar as circunstn
cias do divrcio de uma personalidade muito conhecida no mundo, pois estaria realizan
do valores informativos menos importantes, como o prazer da sensao e a necessidade
de entretenimento dos leitores, que provavelmente iro ceder face necessidade de
defesa da intimidade da vida privada da pessoa em causa.144
Outras circunstncias importantes resoluo das situaes de coliso entre os
direitos de personalidade e o direito de informao, nomeadamente no que concerne s
141 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit ., lo c. dt .
142 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V A . Op . cit ., lo c. dt .
143 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit ;, lo c. cit .
144 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 5 4 2 - 5 4 3 .
1 3 6 D ir e it as da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
fronteiras entre o direito honra e a liberdade de expresso, so lembradas por Antnio
Menezes de Cordeiro, que destaca a relevncia de dois critrios: (a) o da absoluta vera
cidade, do qual decorre que nenhuma liberdade de comunicao convive com notcias
inverdicas, e (b) o do interesse poltico-social, segundo o qual a assero questionada
deve corresponder a um interesse poltico ou social.145' 146
Importa referir-se, outrossim, por relevante, as tendncias do Tribunal Europeu de
Direitos Humanos relativamente coliso entre direitos de personalidade e liberdades
comunicativas, sintetizadas por Francisco Fernandez Segado, dentre as quais destaca:
(a) a preocupao do Tribunal de assegurar a liberdade de comunicao e tambm o
direito dos indivduos ao recebimento de informao adequada; (b) serem mais amplas
as possibilidades de crticas aos polticos, dada a natureza do regime democrtico; (c) a
possibilidade de se divulgarem aspectos da vida privada de pessoas que ocupam cargos
polticos, dado o interesse da coletividade tambm na moralidad personal dessas pessoas;
(d) indurem-se na liberdade de expresso as possibilidades de comunicao de fatos e
de juzos de valor; (e) quanto aos juzos de valor, slo la falta de razonabilidad y la desme-
sura en el ejerrcio de la crtica pueden justificar una restriccin o una sancin".M7
Situaes particulares
Muito embora as circunstncias fticas de relevo efetivao do juzo de ponde
rao na resoluo do conflito entre direitos de personalidade e de informao, regra
geral, sejamas mesmas para todas as situaes que se possam examinar, h situaes
recorrentes que envolvem aspectos particulares e que, em razo de sua especialidade,
recebero exame especfico.
As pessoas pblicas e notrias
A divulgao de fatos e de imagens envolvendo pessoas que exercem funes pbli
cas ou mesmo pessoas que, embora no realizem atividades pblicas, afiguram-se como
pessoas dotadas de notoriedade em razo de variadas circunstncias, apresenta-se como
situao comumente geradora de hipteses de coliso de direitos.
Nesse particular, ao cuidar da divulgao e do aproveitamento de fatos relativos
vida privada das pessoas pblicas ou notrias, a doutrina tem apontado para a existn
cia de limites recprocos, ou seja, na esfera de proteo da privacidade e na amplitude do
1.5 MEN EZES CORD EIRO, A n t n io . Tr at ado de dir e it o civ il p o r t ugus , cit ., v . 1 , t . 3 , p . 1 8 7 .
1.6 S o b r e o s cr it r io s p r o p o s t o s , o aut o r ap r e s e n t a o s e guin t e e x e mp lo : As d v idas de um p o l t ico p ar a co m
uma e mp r e s a can didat a a um co n cur s o , que e le v ai de cidir , s o fact o r e le v an t e , que p o de s e r e lat ado ; as s uas
div idas do m s t icas , me s mo quan do n o e s t e jam a co b e r t o de s e gr e do b an c r io , n o r e le v am: a s e r e m r e v e la
das, p o de r o ap o uc - lo , s e m v an t age m p ar a n in gu m. H at e n t ado h o n r a." Op . cit ., lo c. cit .
ln S EGA DO, F r an cis co F e r n an de z. L a lib e r t ad de e x p r e s in e n la do ct r in a de i Tr ib un al Eur o p e o de D e r e ch o s
Human o s . Re v is t a de Es t dio s Po l t ico s , n 7 0 , p . 9 3 - 1 2 4 .1 9 9 0 . D is p o n v e l e m: <h t t p : / / www.ce p c.e s / r ap /
Pub licado n e s / Re v is t as / 3 / EPN E_0 7 0 _0 9 4 .p df>. A ce s s o e m: 5 jan . 2 0 1 0 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 3 7
direito de informao, limites esses variveis em funo de uma srie de circunstncias
que devem ser examinadas concretamente em cada caso.
Classificam-se, assim, por regra, como lcitas as divulgaes de fatos gerais e co
muns na vida de qualquer pessoa, como o nascimento, casamento, morte, promoes
e transferncias, desde que no divulgados pormenores ntimos, quando as circuns
tncias da vida privada sejam tornadas pblicas e livremente acessveis pelos prprios
interessados, ou quando o prprio titular do bem de personalidade no guarde sobre
ele segredo.148
Tambm se apresentam como lcitas a tomada de conhecimento e a divulgao-de
certos aspectos circunstanciais e acontecimentos da vida de pessoas que desempenhem
ou pretendam desempenhar funes pblicas ou de representatividade social, especial
mente quando os acontecimentos se passem no exerccio dessas funes ou por causa
delas, mas tambm quando os acontecimentos, embora de foro privado, so suscetveis
de se repercutir nos interesses pblicos ou sociais ligados a tais atividades.149
Assim, a doutrina relaciona como legtimas, por exemplo, a cobertura noticiosa de
cerimnias pblicas, decises de rgos pblicos, manifestaes, sesses pblicas, via
gens oficiais, recepes pblicas, tomadas de posse, conferncias de imprensa, qualida
de do atendimento nas reparties pblicas; igualmente lcitas as notcias sobre a sa
de fsica e mental de pessoas exercendo ou candidatando-se a funes pblicas muito
elevadas e com pesadas responsabilidades no destino da generalidade da populao.150
Relativamente tutela da honra pessoal e da reputao dos polticos, anota Nuno
de Sousa que, em democracia, menos intensa que a dos cidados comuns, mas no se
afastam os limites da verdade e da moderao do modo de expresso,151o que recomen
da uma maior tolerncia divulgao de fatos mais prximos das esferas de privacidade
e de intimidade dessas pessoas, desde que revestida sua divulgao de interesse pblico.
Prxima da regulao do mbito de proteo da privacidade das pessoas que exer
cem ou pretendem exercer funes pblicas est a relativa proteo da reserva sobre a
vida privada das pessoas com notoriedade social, muito embora se possa perceber uma
proteo maior a estes ltimos indivduos.
Ao examinar as mais diversas possibilidades de confronto entre o direito reserva
da intimidade da vida privada e o direito de informao relativamente a pessoas not
rias, Capelo de Sousa apresenta os limites das esferas de proteo de cada um desses
direitos.152
Como legtimo exerccio do direito de informao, descreve o registro e a divulga
o de fotografias de atores, desportistas, cantores e outras pessoas dotadas de notorie
>" CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt . p . 3 4 1 .
148 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt ., lo c. dt .
150 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V A . Op . dt . p . 3 4 2 .
151 S OUS A , N un o de . Op . dt . p . 3 2 .
152 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt . p . 3 4 3 .
1 3 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
dade, no decurso das suas atuaes pblicas; a reproduo do seu retrato a propsito de
notcias a seu respeito; o relato das suas condies de sade ligadas com as atividades
profissionais e da veracidade das causas de doenas relacionadas com as mesmas ativi
dades (v. g., infeco na garganta de uma cantora de pera que levou ao cancelamento
de umespetculo); a divulgao das reaes da assistncia e da pessoa dotada de noto
riedade antes, durante e aps sua atuao pblica e por causa desta, mesmo que revela-
doras do carter e de convices de foro ntimo da pessoa notria.153
Todavia, esclarece que j no sero lcitas a captao e a divulgao: (a) de notcias
respeitantes a zonas, ainda que menos reservadas, da vida privada das pessoas dotadas
de notoriedade quando estas, expressa ou tacitamente, no o permitam e tenham para
tanto um interesse socialmente compreensvel (v. g., a transmisso proibida de seu en
dereo ou telefone residenciais); (b) de notcias no consentidas referentes intimidade
da sua vida privada (v. g., relao extramatrimonial, conflitos conjugais, sentimentos
para com parentes prximos ou amigos ntimos e doena de um filho menor); (c) de
notcias que resultem prejuzos para a sua honra, reputao ou simples decoro (cf. art.
79 ne 3, Cdigo Civil, direta ou analogicamente).154
Como se pode perceber, a proteo da esfera da vida privada nesses casos varia
em funo do bem da vida privada em causa, de sua relao com outros bens de per
sonalidade (p. ex., a honra, o livre desenvolvimento da personalidade, a liberdade), da
intensidade dos interesses da coisa pblica, do interesse geral da informao em causa,
do nvel de responsabilidade da funo pblica desempenhada pela pessoa e do grau de
notoriedade das pessoas que desempenham atividades privadas de interesse geral.155
Embora no diferencie os regimes aplicados s pessoas pblicas e s pessoas que
gozamde notoriedade, tratando de umas e de outras como "figuras pblicas", Pedro
Pais de Vasconcelos adverte que a compresso da esfera de privacidade que eventual
mente possam essas pessoas sofrer poder fndar-se unicamente na relevncia do inte
resse da publicidade em questo, nunca podendo resultar simplesmente da notoriedade
da pessoa.156
Rita Amaral Cabral refere que nessas situaes M reduo na esfera de intimidade,
mas no supresso: "Aintimidade da vida privada existir sempre, compreendendo as
manifestaes essenciais de isolamento, isto , aquelas que no tm relao necessria
com a actividade por virtude da qual a pessoa se tomou notria".157
Merece registro, todavia, a observao de Gomes Canotilho e Jnatas Machado no
sentido de que existem vrias concepes de privacidade, no se podendo transformar
o direito privacidade num dever de privacidade, havendo possibilidade de os in
153 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit ., lo c. cit .
154 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op dt ., lo c. cit .
155 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt . p . 3 4 4 .
156 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . cit . p . 8 2 .
157 CA B RA L , Rit a A mar al. D ir e it o in t imidade da v ida p r iv ada. In : A A . W. Es t udo s e m me mr ia do Pr o
fe s s o r D o ut o r Paulo Cun h a. L is b o a: B F D UL , 1 9 8 9 . p . 3 9 6 -
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 3 9
divduos exercerem o direito privacidade de modos diversos, sem que isso implique
renncia ao direito.158
Explicitam os doutrinadores, a esse respeito, que do ponto de vista jurdico-cons-
titucional, uma pessoa que decide tornar pblicos comportamentos geralmente prote
gidos pela reserva da intimidade da vida privada no est, por esse motivo, a renunciar
a esse direito, mas sim a exerc-lo autonomamente de acordo com suas prprias pre
ferncias: "O direito intimidade compatvel com diferentes modos de utilizao.159
Esclarece, de outro lado, Miguel Veiga, que os indivduos que preferem uma vida
sem notoriedade pblica e que no exercem funo pblica possuem o direito inviolvel
a que no se invada a sua vida pessoal, mesmo que se proceda sem carter injurioso, di
famatrio e calunioso: A imprensa no tem o direito de tratar da vida privada e familiar
de pessoas particulares e annimas".160
Os limites captao e divulgao de imagens de pessoas, mesmo daquelas no
detentoras de notoriedade no meio social, em momentos de sua vida privada em locais
pblicos ou de acesso limitado, constitui matria que tem suscitado intensas discusses
jurisprudenciais.
Sobre o tema, o Supremo Tribunal de Justia portugus julgou caso interessante
envolvendo a imagem de uma senhora em prtica de topless em uma praia onde se pra
tica o nudismo costumeiramente; sem seu consentimento, um jornal dirio publicou
sua imagem.161
No aresto, a Corte Suprema pontuou que a circunstncia de uma pessoa optar por
expor sua imagem desnuda em uma praia no significa que tenha perdido o controle
sobre ela e no possa se opor sua divulgao jornalstica, especialmente diante da au
sncia de preocupao do peridico com a no identificao da pessoa.162
158 CA N OTIL HO, J.J. Go me s ; MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . dt . p . 5 6 .
159 CA N OTIL HO, J. J. Go me s ; MA CHA D O, Jn at as E. M. Op . cit ., lo c. cit .
160 VEIGA , Migue l. Co mun ica o p r o fe r ida n o s e min r io co mun ica o s o cial e dir e it o s in div iduais . S e min
r io co mun ica o s o daT e dir e it o s in div iduais . Po r t o : Edi o da A lt a A ut o r idade p ar a a Co mun ica o S o cial,
1 9 9 7 . p . 1 0 8 - 1 0 9 ;
161 O julgame n t o t e m a s e guin t e r e fe r n cia: S Tj, 24.V. 8 9 ( B MJ, 3 8 7 , 5 3 1 ) . En co n t r a- s e r e lat ado p o r Pe dr o
Pais de Vas co n ce lo s ( Op . cit . p . 8 4 ) .
162 Eis o t e o r da e me n t a do acr do : "I - A Co n s t it ui o da Re p b lica, n o s e u ar t igo 2 6 a, co n s agr a o dir e it o
de t o do s o s cidado s ' image m e r e s e r v a da in t imidade da v ida p r iv ada e familiar '. II - Po r s ua v e z, o ar t . 7 9 a
do Cdigo Civ il, in s e r ido n a s e c o II s o b r e dir e it o s de p e r s o n alidade , e s t ip ula, t amb m, n o s e u n a 1 que 'o
r e t r at o de uma p e s s o a n o p o de s e r e x p o s t o , r e p r o duzido o u lan ado n o co m r cio s e m o co n s e n t ime n t o de la',
e n o s e u n Q2 que 'n o n e ce s s r io o co n s e n t ime n t o da p e s s o a r e t r at ada quan do as s im o jus t ifique m a s ua
n o t o r ie dade , o car go que de s e mp e n h a, e x ign cias de p o l cia o u de jus t i a, fin alidade s cie n t ficas , didact icas o u
cult ur ais , o u quan do a r e p r o du o da image m v ie r e n quadr ada n a de lugar p b lico o u n a de fact o s de in t e r e s s e
p b lico o u que h ajam de co r r ido p ub licame n t e ' e ain da n o s e u n Q3 s e co n s ign a que o r e t r at o n o p o de , p o r m,
s e r r e p r o duzido , e x p o s t o o u lan ado n o co m r cio s e do fact o r e s ult ar p r e ju zo p ar a a h o n r a, r e p ut a o o u s im
p le s de co r o da p e s s o a r e t r at ada'. III - A ge co m culp a, p r at ican do fact o il cit o p as s v e l de r e s p o n s ab ilidade civ il
n o s t e r mo s do ar t . 70 e do ar t . 4 8 3 a s s do Cdigo Civ il, o jo r n al que , s e m o s e u co n s e n t ime n t o e n o s e n do
e la p e s s o a p b lica, fo t o gr afa de t e r min ada p e s s o a de s n udada e p ub lica e s s a fo t o gr afia n uma das e di e s , n o
o b s t an t e o fact o de a fo t o gr afia t e r s ido o b t ida quan do a p e s s o a e m caus a s e e n co n t r av a quas e co mp le t ame n t e
1 4 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Comentando a deciso, Antnio Menezes Cordeiro refere que "o Supremo enten
deu, e bem, que a situao caa sob a alada do art. 79Q/3, sendo sempre ilcita; assim
; podemos, todavia, ir mais longe; desde logo todas as praias pertencem ao domnio
pblico: da no se infere que as pessoas percam, a, a sua privacidade, podendo ser mo
lestadas ou fotografadas, sem o seu consentimento; de seguida, mesmo numa praia, o
topless mantm-se na esfera privada, no se presumindo que a visada pretenda ser vista
por todos",163
Relativamente divulgao de questes referentes vida privada das pessoas no
trias, Rita Amaral Cabral relata julgamento em que um Tribunal francs considerou
no violado o direito intimidade em razo da natureza do caso; na situao, um histo
riador se embrenhou de tal forma na vida particular de uma personagem, enumerando
suas amantes, sob o argumento de que a narrativa auxiliava na explicao de eventos
passados.164
De igual modo, interessante contribuio ao exame de situaes tais pode ser ex
trada da Sentena na197/91, proferida pelo Tribunal Constitucional Espanhol em sede
de recurso de amparo, comentada por Francisco Delgado Piqueras.165
No caso, o peridico Ya publicou notcia dando conta de que a adoo do filho de
Sara Motiel, conhecida atriz e cantora espanhola, deu-se por meio de uma rede de tr
fico de crianas.
O peridico realizou jornalismo investigativo, colhendo dados, especialmente junto
pessoa que intermediou os contatos entre a me biolgica e a atriz.
Em data anterior, os pais adotivos da criana haviam convocado a "prensa dei cora-
zn para relatar as circunstncias da adoo, que ocorrera em Santo Domingo.
Aps sofrer condenao, a empresa jornalstica que interps o recurso em comento
alegava violao ao art. 20, ns 1, d, da Constituio espanhola, aduzindo no haver o
juzo a quo considerado o valor preferente do direito informao, sua veracidade, a
circunstncia de envolver pessoa pblica e, por fim, a publicidade que os recorridos
haviam dado adoo.
Aps descartar a inexistncia de ofensa honra, o Tribunal assentou que "el cri
trio fundamental para determinar la legitimidad de las intromisiones en la intimidad de las
n ua n a 'p r aia do Me co ', co n s ide r ada um do s lo cais o n de o n udis mo s e p r at ica co m mais in t e n s idade , n me r o
e p r e fe r n cia, me s mo que admit a s e r e s s a p e s s o a fe r v o r o s a ade p t a do n udis mo . IV - fact o n o t r io que a
p ub lica o e m um jo r n al de gr an de div ulga o e e x p an s o de um r e t r at o da aut o r a e m 't o p le s s ' s e m o s e u
co n s e n t ime n t o s e t in h a de r e p e r cut ir fo r o s ame n t e n a r e p ut a o e h o n r a da r e t r at ada e , p o r s i, ge r ar p r e ju zo s
p ar a e la, t e n do , p o r is s o , dir e it o a s e r r e s s ar cida p e lo s me s mo s . Op . dt ., lo c. cit .
163 CORD EIRO, A n t n io Me n e ze s . Tr at ado de dir e it o civ il p o r t ugus , cit ., p . 2 4 3 .
164 CA B RA L , Rit a A mar al. Op . cit . p . 3 9 7 .
365 PIQUERA S , F r an cis co D e lgado . D e n ue v o s o b r e e l de r e ch o a la in t imidad p e r s o n al y familiar de lo s fa
mo s o s y la lib e r t ad de in fo r macin ( L a s e n t e n da de i TC 1 9 7 / 1 9 9 1 , de 1 7 de o ct ub r e ) . Re v is t a Es p an o la de
D e r e ch o Co n s t it ucio n al, n a 3 6 , p . 2 6 9 - 2 7 5 , 1 9 9 2 . D is p o n v e l e m: <h t t p : / / www.ce p c.e s / r ap / Pub Iicacio n e s /
Re v is t as / 6 / RED C_3 6 _2 6 9 .p df> . A ce s s o e m: 2 7 de z. 2 0 0 9 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 4 1
personas es [...] la relevancia pblica dei hecho divulgado, es decir, que, siendo verdadero, su
comunicacin a la opinin pblica resulte justificada en funcin dei inters pblico dei asunto
sobre el que se informa.166
Em seqncia, afirmou a inexistncia de interesse pblico na divulgao do ocor
rido, mas reconheceu que a conduta dos pais adotivos na divulgao da adoo auto
rizou a informao veiculada pela empresa, assentando dois importantes postulados
na equao da coliso entre o direito reserva de pessoas notrias e a liberdade de
comunicao: (a) quien por su propia voluntad da a conocer a la luz pblica unos determi
nados hechos concernientes a su vida familiar los excluye de la esfera de su intimidad y ha de
asumir el riesgo de que el periodista pueda contrastar la veracidad de esos hechos y rectificar
los errores ofalsedades de la informacin espontneamente suministradapor los afectados;(b)
"prevalecer el derecho a la informacin sobre la proteccin de la intimidad en relacin con los
hechos de la adopcin divulgados por los propios afectados por la misma.167
Entretanto, a Corte Suprema acabou por entender violado o direito reserva re
lativamente ao filho do casal - autor do pedido indenizatrio ao lado dos pais -, que
no contribuiu em nada para a divulgao dos fatos relativos sua adoo, mantendo a
condenao proferida pelo juzo a quo.16S
Outro caso paradigmtico foi objeto de julgamento proferido pelo Tribunal Euro
peu dos Direitos do Homem, em 24 de junho de 2004, conhecido como caso von Han-
nover v. Alemanha.169
O julgamento, conhecido como leading case relativamente aos limites e coliso
entre o direito privacidade e a liberdade de imprensa, teve como autora a princesa
Carolina de Mnaco, que alegava violao ao art. 8a da Conveno Europia dos Direitos
do Homem170em razo da publicao em revistas de diversas fotografias suas e de sua
famlia em momentos de lazer, realizadas etn variados locais.
No primeiro julgamento do caso, o Tribunal de Hamburgo proibiu a publicao das
imagens na Frana, mas no na Alemanha, porque a autora no demonstrou "interesse
juridicamente protegido", j que a privacidade das pessoas notrias acabaria na porta de
casa e todas as fotografias haviam se realizado em locais pblicos.
166 p i q j j E R A S , F r an cis co D e lgado . Op . cit ., lo c. cit .
167 PIQUERA S , F r an cis co D e lgado . Op , cit ., lo c. cit .
168 p x quERA S , F r an cis co D e lgado . Op . cit ., lo c. dt .
169 O cas o fo i r e lat ado e co me n t ado p o r Pe dr o Pais de Vas co n ce lo s ( Op . cit . p . 9 1 - 1 0 0 ) .
170 'A r t . 8 S 1 . Qualque r p e s s o a t e m dir e it o ao r e s p e it o da s ua v ida p r iv ada e familiar , do s e u do mic lio e da
s ua co r r e s p o n dn cia. 2 . N o p o de h av e r in ge r n cia da aut o r idade p b lica n o e x e r c cio de s t e dir e it o s e n o
quan do e s t a in ge r n cia e s t iv e r p r e v is t a n a le i e co n s t it uir uma p r o v idn cia que , n uma s o cie dade de mo cr t ica,
s e ja n e ce s s r ia p ar a a s e gur an a n acio n al, p ar a a s e gur an a p b lica, p ar a o b e m e s t ar e co n mico do p a s , a
de fe s a da o r de m e a p r e v e n o das in fr ac e s p e n ais , a p r o t e c o da s ade o u da mo r al, o u a p r o t e c o do s
dir e it o s e das lib e r dade s de t e r ce ir o s ."
1 4 2 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
Em julgamento de recurso, o Bundesgerichtshof proibiu nova circulao de algumas
das imagens na Alemanha e explicitou que as pessoas pblicas possuem direito priva
cidade em locais reservados, constituindo violao da privacidade imagens no autori
zadas e secretas; manteve as demais publicaes, referindo que pessoas pblicas devem
tolerar fotografias em locais pblicos, mesmo fora do exerccio de suas funes.
Apreciando novo recurso, o Tribunal Federal Constitucional alemo - Bundesverfas
sungsgericht - vedou a publicao de mais algumas fotografias, reafirmando que o direito
privacidade no confere s pessoas pblicas o poder de impedir publicao de fotogra
fias realizadas em locais pblicos, fora do exerccio de funes pblicas, ainda que para
fins de mero entretenimento.
A hiptese restou finalmente submetida ao Tribunal Europeu dos Direitos do Ho
mem, que proclamou a existncia de violao ao art. 8Sda Conveno Europia dos
Direitos do Homem, assentando, na fundamentao da deciso, que: (a) fatos pratica
dos por polticos, que contribuem para o debate na sociedade democrtica, so diversos
de outros que no revelem essa circunstncia; (b) em certas circunstncias, pode-se
divulgar aspectos da vida privada de pessoas pblicas, mas quando h interesse coisa
pblica; (c) as fotografias em questo serviram unicamente ao entretenimento; (d) a
proteo da vida privada importa ao livre desenvolvimento da personalidade e ultra
passa o crculo privado, atingindo uma dimenso social; (e) a autora um indivduo
privado e no exerce funo pblica.171
Em comentrio deciso do Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, Pedro Pais
de Vasconcelos, aps preconizar que o julgamento dever exercer uma funo de alinha
mento jurisprudencial em toda a Europa sobre a matria, refere haver o Tribunal escla
recido: (a) que importa a contribuio que as fotografias tragam ao debate de interesse
geral; (b) no ser legtimo o interesse do pblico de saber como a pessoa se comporta
em geral em sua vida privada, mesmo em locais no isolados; (c) que o interesse econ
mico dos jornais e revistas deve ceder ao direito de reserva.172
Anota, ainda, o doutrinador, que a deciso pode dar nova orientao jurisprudn
cia alem, que entendia encerrada a privacidade na porta da casa do indivduo, e fran
cesa, que sempre exigia o consentimento para a publicao de imagens quando a pessoa
no estivesse no exerccio de funes oficiais, afastando, tambm, a tese dos Tribunais
alemes de que a liberdade de imprensa prevalece sobre o direito privacidade.173
O direito de crtica
Situao que merece, igualmente, anlise particular aquela concernente ao direito
de crtica.
Pode ocorrer que o exerccio do direito de crtica - que est contido no direito de in
formao - colida com direitos de personalidade, nomeadamente com o direito honra.
171 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . dt . p . 9 1 - 1 0 0 .
172 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . cit ., lo c. dt .
173 VA S CON CEL OS , Pe dr o Pais de . Op . cit ., lo c. cit .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 4 3
Nessas situaes, haver de se proceder ao exame dos fins a que se destina a crtica
e se esta for motivada por interesses superiores, como a justia, poder-se- resolver pela
prevalncia do direito de crtica, modo a descaracterizar a ilicitude de uma eventual
ofensa honra de outrem.
Assim, por exemplo, aponta a doutrina, justifica-se que um crtico fiel sua filo
sofia de valores possa, no exerccio adequado da crtica, prejudicar a reputao de um
artista, mesmo que esta assente nos padres sociais mais correntes.174
Ter-se-, em princpio, como justificada, de igual forma, uma reportagem fiel nos
meios de comunicao social de uma reunio pblica em que um dos participantes dirija
a outro expresses injuriosas ou lhe impute fatos desonrosos, quando, pelas funes so
ciais dos intervenientes ou pela importncia social dos fatos imputados, haja interesse
social na divulgao, mesmo que esta em si traga prejuzos honra.175
Sublinha Nuno de Sousa que a crtica da imprensa lcita se corresponde verda
de; que o dever de cuidado obriga, antes da publicao, a uma ponderao dos valores e
interesses em presena; existir um dever, ainda, de se realizar a crtica com objetividade,
e adverte: Pode-se fazer stira ou parodiar uma situao sem lesar direitos da persona
lidade, desde que no se entre num plano de injria ou ofensa pessoal.176
Ainda nesse contexto, no que se refere utilizao de caricaturas e cartoons, es
pecialmente relativas a pessoas pblicas ou notrias, apresentam-se como legtimas,
mesmo acentuando certos traos da personalidade ou certas ocorrncias da vida, quan
do tais caricaturas tenham valor artstico, ainda que crticas ou satricas, mas no in
sultuosas ou difamatrias.177
O Tribunal da Relao de L isboa teve oportunidade de se manifestar sobre os limi
tes do direito de crtica em deciso proferida em 25 de outubro de 2007, nos autos do
Processo na 8108/07-9.178
Na hiptese, o arguido, em artigos veiculados por meio da comunicao social por
tuguesa, criticou fortemente o presidente de uma entidade futebolstica.179
174 CA PEL O D B S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 3 1 3 .
175 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 3 1 3 - 3 1 4 .
176 S OUS A , N un o de . Op . dt . p . 3 0 .
177 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V A . Op . dt . p . 3 4 2 .
178 O in t e ir o t e o r do acr do p o de s e r e n co n t r ado e m: <h t t p : / / www.dgs i.p t / jt r l.n s f/ 3 3 1 8 2 fc7 3 2 3 1 6 0 3 9 8 0 2
5 6 5 fa0 0 4 9 7 e e c/ b caaf8 cd3 2 1 5 faf2 8 0 2 5 7 3 9 1 0 0 4 b 6 b lc? Op e n D o cume n t >. A ce s s o e m: 4 fe v . 2 0 1 0 .
179 D e n t r e as cr t icas r e alizadas , e n co n t r am- s e as s e guin t e s p as s age n s : "S ., o p r e s ide n t e da F e de r a o , t e m
um t r ab alh o de m r it o e is s o n in gu m lh e t ir a. Mas j n o e s t amo s n o t e mp o do s d s p o t as ilumin ado s e j
n in gu m e s t p ar a at ur ar de cis e s de s t e calib r e a p o uco s me s e s de o p a s r e ce b e r o Mun dial da mo dalidade
[...] S . e x o r b it a do s s e us p o de r e s de fo r ma e v ide n t e . J n o h av e r n e s t e p a s n e n h uma aut o r idade acima do
p r e s ide n t e da F e de r a o Po r t ugue s a de ...". A in da n o ar t igo s ub o r din ado ao t t ulo "O de s t in o do s dit ado r e s ",
co n s t a: "O p r e s ide n t e da F e de r a o um p e que n o dit ado r que fe z o p e r cur s o cl s s ico : p r ime ir o co n s e guiu s e r
um fact o r de un io e de s e n v o lv ime n t o mas , co mo p e r ce b e u o s s n ais do s t e mp o s , p e lo me do de p e r de r t o do
o p o de r , v ai as s is t ir que da in e v it v e l do s e u imp r io [...] mas o s e u imp r io s p o de t e r o s dias co n t ado s "
( Op . cit ., lo c. cit .) .
1 4 4 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
O Tribunal entendeu no ter havido excesso no exerccio do direito de crtica, des
tacando que aquele que ocupa direo de entidade dessa natureza encontra-se sujeito
sindicncia popular, preceituando: "E inevitvel que quem desempenha determinadas
funes de interesse ou utilidade pblicos se sujeita a ver a sua actividade profissional
e/ou institucional sindicada pelos cidados, que tem de ter o direito de os escrutinar e
criticar porque tal pertence ao ncleo irredutvel do direito fundamental de expresso
do pensamento."180
A seguir, complementa o acrdo: "Em qualquer Estado de direito democrtico
constitucionalmente garantido a todo o cidado o direito de exprimir e divulgar li
vremente o seu pensamento por qualquer meio, bem como o direito de informar sem
impedimentos nem discriminaes, direitos que se traduzem na liberdade de criao,
discusso e crtica."181
Interessante anotar-se, nesse ponto, a sempre oportuna advertncia de Capelo de
Sousa no sentido de que deve haver uma proporcionalidade entre os juzos ou expres
ses crticas de qualquer espcie (v. g., literria, cientfica, artstica, poltica, profissio
nal, sindical, judiciria, sobre o carter e o comportamento humano e sobre a produo
industrial ou de servios) e os fatos e fundamentos expostos, nomeadamente, devem
ser averiguveis pelos destinatrios da crtica as circunstncias factuais e os critrios de
valores sobre os quais se apoia o juzo de censura crtica, donde resulta para o crtico o
dever de comunicar tais circunstncias e critrios de um modo suficientemente amplo,
que permita aos destinatrios formar uma opinio prpria.182
Por outro lado, prossegue, o direito crtica teni tambm seus limites, no poden
do incorrer, v. g., no insulto pessoal ou colectivo ou na difamao, mesmo no caso da
normal veemncia da linguagem poltica".183
5.2.2 A ponderao de bens
As circunstncias factuais respeitantes gnese e ao exerccio dos direitos de per
sonalidade e do direito de informao constituem elementos fundamentais realizao
do juzo de ponderao necessrio resoluo de uma dada situao de coliso ou con
flito entre direitos ou entre direitos e valores protegidos pela ordem jurdica.
Ao cuidar da resoluo das hipteses de coliso de direitos, Capelo de Sousa ad
verte para a necessidade de se verificar se os direitos colidentes tm uma estrutura for
mal e um fundamento axiolgico-normativo assentes quer em interesses juridicamente
tutelados de qualidade e grau idnticos, quer em interesses juridicamente tutelados
180 Op . dt ., lo c. cit .
181 Op . cit ., lo c. cit .
182 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V A . Op . dt . p . 3 1 3 .
183 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt ., lo c. cit .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 4 5
de peso equilibrado, embora diversos, ou, diferentemente, se na coliso de direitos h
predominncia de interesses juridicamente tutelados de uma das partes.184
Para tanto, importa proceder-se a uma criteriosa identificao e ponderao, quer
dos bens jurdicos tutelados pelas normas jurdicas estruturantes dos direitos coliden
tes, quer dos contedos dos poderes jurdicos resultantes desses direitos, quer ainda
dos fatos reais constitutivos ou modificativos de cada um dos direitos em coliso, das
modalidades de atividade material concretamente exercitadas ou exercitantes pelas par
tes e dos interesses efetivamente protegidos pelas partes.185
Complementa, a seguir, citando Hubmann, que a ponderao no pode ser exclusi
vamente feita mediante uma abstrata comparao de bens e valores jurdicos tutelados,
pois depende tambm largamente da situao concreta, e prope: "Em um dos pratos
da balana, aps verificarmos a existncia real de ambos os direitos subjectivados em
coliso e a inexistncia de regulao legal especfica para tal conflito, colocaremos todos
os factos reais juridicamente relevantes e todos os valores jurdicos respeitantes, uns
e outros, ao direito de personalidade concretamente conflituante [...] Sopesado isto,
colocaremos no outro prato da balana todos os factos reais juridicamente relevantes e
todos os valores jurdicos respeitantes, estes e aqueles, ao outro direito conflituante, in
dagando do seu peso especfico atravs da metodologia idntica acabada de referir."186
Conclui o civilista, aps, asseverando que prevalecero os interesses e valores ju
rdicos mais prximos daqueles consagrados pelo sistema jurdico aplicvel ao caso em
sua globalidade e unidade.187
Aps a realizao dessas consideraes de ordem genrica, o doutrinador mergulha
no campo da coliso dos direitos de personalidade com o direito de informao, rea
firmando a necessidade de se realizar uma criteriosa avaliao das circunstncias que
envolvem os direitos em questo para, ao fim dessa operao valorativa, definir-se qual
o grau de compresso que cada um dos direitos em comento sofrer, de modo que a
ordem jurdica em sua unidade e totalidade seja preservada.188
Segundo sua doutrina, em sntese, colocam-se todos os fatos juridicamente rele
vantes concernentes aos bens, direitos e valores em coliso nos pratos de uma balana,
sempre relacionando-os com os valores jurdicos consagrados pela ordem constitucio
nal relativamente s tutelas da personalidade e da liberdade de expresso e, ao fim,
verifica-se qual dos pratos mais se aproxima dos bens e valores jurdicos consagrados
pelo ordenamento jurdico em sua totalidade e unidade.189
Todavia, de acordo com o autor, "a balana aqui no dotada de um regulador au
tomtico. Saber, para efeitos do art. 335a do Cdigo Civil, numa determinada situao
1,4 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt . p . 5 3 4 .
185 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit ., lo c. cit .
1.6 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt . p . 5 3 4 - 5 4 3 .
1.7 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt . p . 5 4 3 .
181 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 5 4 3 s s .
189 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . lo c. cit .
1 4 6 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
concreta conflitual, se estamos perante direitos iguais ou desiguais, implica quer a inda
gao e a aferio axiolgico-jurdica dos diversos elementos de cada um dos conjuntos
dos factos reais relativos gnese e ao exerccio dos direitos em conflito, em si mesmos
e nas suas concretas circunstncias, tanto aumentativas como diminutivas do respectivo
peso jurdico, quer a prpria contraposio de tais direitos entre si, na globalidade das
respectivas matrias de facto e de direito, com vista avaliao da sua igualdade ou
desigualdade jurdica, inclusive mediante a aplicao de critrios normativos de prefe
rncia, identificadores dos interesses e valores jurdicos preponderantes, resultantes do
sistema jurdico na sua globalidade e unidade aplicveis ao caso".190
Oautor ressalta a importncia de se avaliar os direitos colidentes, quer em sua
estrutura formal, quer em seu fundamento axiolgico-normativo, e prossegue, esclare
cendo que o peso jurdico total das ponderaes e valoraes jurdicas respeitantes s
concretas circunstncias factuais de constituio e exerccio de um direito de liberdade
de informao de um jornalista, que integre relevantes interesses pblicos de infor
mao, pode, por vezes, ser igual ao peso jurdico total das ponderaes e valoraes
relativas s outras circunstncias factuais de constituio e exerccio de um colidente
direito de intimidade da vida privada, versando sobre elementos no essenciais de tal
intimidade, pelo que ambos os direitos conflituantes devero poder produzir os seus
efeitos em condies de igualdade, restringindo-se em igual medida (art. 335, na 1, do
Cdigo Civil)".191
Esclarece, a seguir, que para a hiptese de coliso de direitos iguais ou da mesma es
pcie, estipula o ns 1 do art. 335ado Cdigo Civil que devem os titulares ceder na medida
do necessrio para que todos (os direitos) produzam igualmente o seu efeito, sem maior
detrimento para qualquer das partes. Ou seja, a soluo do conflito passa pelo sacrif
cio no mnimo necessrio de qualquer dos direitos conflituantes e pelo no privilegiar
qualquer um desses direitos, suportando cada um dos titulares dos direitos, em igual
medida, os custos da resoluo da coliso, de modo a que os direitos conflituantes, nos
seus concretos modos de exerccio, possam coexistir um ao lado do outro e produzam os
seus efeitos prprios em situao de igualdade.192
Adverte o autor, aps, para a possibilidade de haver prevalncia de um dos direitos
ou valores em coliso, esclarecendo, na hiptese de conflito entre direitos de persona
lidade e o direito informao, que a prevalncia de um ou de outro desses direitos
depende do tipo e das intensidades dos interesses concretos juridicamente tutelados,
presentes em cada situao da vida real, determinando o na2 do art. 335fl do Cdigo
Civil que, na coliso de direitos desiguais ou de espcie diferente, prevalece o que deva
considerar-se superior: "as partes no esto agora em posies conflituais idnticas ou
equiparadas, pois a maior carga axiolgico-jurdica do direito superior postula uma cor
respondente e adequada eficcia jurdica, mais ampla ou mais intensa do que a do direi
to inferior e, se necessrio, com detrimento deste".193
CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 5 4 3 .
1.1 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V A . Op . dt . p . 5 4 4 .
1.2 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . dt . p . 5 4 7 - 5 4 8 .
1,1 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 5 4 6 e 5 4 8 - 5 4 9 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 4 7
A seguir, pontua que mesmo o direito inferior deve ser respeitado at onde for pos
svel e deve ser limitado na exata proporo em que isso necessrio para a tutela do
direito superior nas circunstncias.194
Sintetiza, ao fim, Capelo de Sousa, a atividade de resoluo da coliso de direitos
de personalidade com outros direitos: "Em suma, as regras de avaliao e de soluo
da coliso de direitos destinam-se a garantir um trnsito, portador do maior possvel
acrscimo axiolgico-jurdico, entre uma dada situao conflitual e uma situao futura
resultante dos modos finais do exerccio dos respectivos direitos ou de medidas de com
posio. Pelo que, tais regras podero impor, como vimos, limites ao exerccio do direito
geral de personalidade e de direitos especiais de personalidade para tutela do direito
geral de personalidade, de direitos especiais de personalidade e de direitos de outro tipo
pertencentes a uma outra pessoa, que, nas circunstncias concretas da sua subjectiva-
o, devam considerar-se iguais ou superiores, bem como podero limitar o exerccio de
iguais ou inferiores direitos de outro tipo para tutela de direitos de personalidade."195
Ainda na seara da doutrina civilista, Nuno de Sousa refere importar, igualmente,
na ponderao de interesses, se o prprio lesado contribuiu para o conflito, a espcie de
interesses prosseguidos e o mbito dos terceiros conhecedores, por exemplo, de uma
difamao; registra, a seguir, que na hiptese de resultar a primazia de um determinado
interesse em um caso concreto, deve-se comprovar a adequao e a proporcionalidade
da ingerncia no direito da personalidade.196
Importante anotar-se, de outra parte, que muito embora a resoluo dos conflitos
entre os direitos de personalidade e o direito de informao - por cuidar, como regra, de
uma relao jurdica entre particulares - seja regida pelas disposies do Cdigo Civil,
relevantes ensinamentos podem ser recolhidos da doutrina da resoluo de conflitos
entre direitos fundamentais, porque ambas se utilizam da metodologia da ponderao
de interesses para a soluo das respectivas hipteses de coliso.
Nessa esteira, ensina Jos Carlos Vieira de Andrade que a resoluo do conflito de
direitos ou valores exige que se realize uma ponderao dos modos de exerccio dos
direitos ou valores envolvidos numa dada situao concreta,197buscando-se encontrar a
situao mais conforme ordem jurdica.
Dessa forma, explica, "por um lado exige-se que o sacrifcio de cada um dos valores
constitucionais seja adequado salvaguarda dos outros. Se no o for, no chega sequer
194 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 5 4 9 - 5 5 0 . O aut o r ap r e s e n t a, ap s , e x e mp lificat i-
v ame n t e , uma h ip t e s e de s acr if cio m n imo do dir e it o in fe r io r : "N o s cas o s de p r e do min n cia do dir e it o de
lib e r dade de imp r e n s a de n o t iciar um e v e n t o de in t e r e s s e p b lico , mas co m r e p e r cus s e s n a e s fe r a p r iv ada
de ce r t as p e s s o as [...] o u at me s mo de n o t iciar um cr ime co m r e p e r cus s e s p b licas , o dir e it o in t imidade
da v ida p r iv ada o u as gar an t ias de de fe s a ligadas h o n r a das p e s s o as , e mb o r a s e cun dar iame n t e h ie r ar qui-
zado s , p o de r o le git imar o de v e r de o mis s o do n o me o u do s de mais e le me n t o s e s s e n ciais de ide n t ifica o ,
r e s p e ct iv ame n t e , do s uje it o daque le e v e n t o o u do p r e s um v e l aut o r do cr ime . Op . cit ., lo c. cit .
1,5 CA PEL O D E S OUS A , Rab in dr an at h V. A . Op . cit . p . 5 5 2 .
156 S OUS A , N un o de . Op . cit . p . 3 3 .
197 VIEIRA D E A N D RA D E, Jo s Car lo s . Op . cit . p . 3 0 3 .
1 4 8 D ir e it o s da Pe r s o n alidade * Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
a existir um verdadeiro conflito. Por outro lado, e aqui estamos perante as dimenses
interligadas de necessidade e proporcionalidade em sentido estrito, impe-se que a es
c o l h a entre as diversas maneiras de resolver a questo no caso (a 'preferncia concreta' )
se faa em termos de comprimir o menos possvel os valores em causa segundo o seu
peso nessa situao - segundo a intensidade e a extenso com que a sua compresso no
caso afecta a proteco que a cada um deles constitucionalmente concedida",198
Todavia, complementa, como raramente possvel manter-se ntegras as esferas
de proteo dos direitos ou valores em causa, torna-se necessrio estabelecer, "depois
de uma avaliao das alternativas, a preferncia ou prevalncia de um direito (ou de
um valor comunitrio) sobre o outro direito adequada situao - em termos que
podero mesmo eqivaler, na prtica, ao sacrifcio total do direito preterido: vale, en
to, o princpio da "prevalncia do interesse superior" ou da "prevalncia do interesse
preponderante"'.199
Logo aps pontuar a necessidade de realizao de um juzo de ponderao no caso
concreto para se solucionar o conflito ou a coliso de direitos ou de direitos e valores,
elegendo-se, no caso, o interesse preponderante ou superior, o autor apresenta trs fa
tores que, modo fundamental, devem merecer exame na atividade de ponderao: (a) o
mbito e a graduao do contedo dos preceitos, (b) a natureza do caso e (c) a condio
e o comportamento das pessoas envolvidas.200
Daniel Sarmento prope um mtodo realizao do juzo de ponderao com a
utilizao de duas variveis: (a) peso genrico: primeiro, o intrprete deve comparar
o peso dos direitos ou interesses em questo, tendo como norte os valores subjacentes
Constituio; (b) peso especfico: realiza-se, ento, a aferio do peso especfico de
cada direito ou interesse - intensidade com que so afetados -, de modo que a restrio
ser inversamente proporcional a esses valores.201
A seguir, destaca a necessidade de se utilizar o princpio da proporcionalidade na
realizao da ponderao, dizendo que ambos "pressupem-se reciprocamente, repre
sentando duas faces da mesma moeda, sublinhando ser propsito do princpio da pro
VIEIRA D E A N D RA D E, Jo s Car lo s . Op . cit . p . 3 0 5 .
1 VIEIRA D E A N D RA D E, Jo s Car lo s . Op . cit . p . 3 0 5 - 3 0 6 .
200 a e s s e p r o p s it o , e x p licit a Jo s Car lo s Vie ir a de A n dr ade ( Op . dt . p . 1 0 4 ) : D e v e at e n de r - s e , de s de
logo, ao mbito e graduao do contedo dos preceitos co n s t it ucio n ais e m co n flit o , p ar a av aliar e m que me dida e
com que p e s o cada um do s dir e it o s e s t p r e s e n t e n a s it ua o de co n flit o - t r at a- s e de uma av alia o fun da
me n t alme n t e jur dica, p ar a s ab e r s e e s t o e m caus a as p e ct o s n ucle ar e s de amb o s o s dir e it o s o u, de um o u de
amb o s , as p e ct o s de maio r o u me n o r in t e n s idade v alo r at iv a e m fun o d r e s p e ct iv a p r o t e c o co n s t it ucio n al.
De v e t e r - s e e m co n s ide r a o , o b v iame n t e , a natureza do cas o , ap r e cian do o t ip o , o co n t e do , a fo r ma e as de
mais cir cun s t n cias o b je ct iv as do fact o co n flit ual, is t o , o s as p e ct o s r e le v an t e s da s it ua o co n cr e t a e m que
s e t e m de t o mar uma de cis o jur dica - e m v is t a da fin alidade e da fun o de s s a me s ma de cis o . D e v e ain da
t e r - s e e m at e n o , p o r que e s t o e m jo go b e n s p e s s o ais , a condio e o comportamento das pessoas envolvidas, que
p o de m dit ar s o lu e s e s p e c ficas , s o b r e t udo quan do o co n flit o r e s p e it e a co n flit o s e n t r e dir e it o s s o b r e b e n s
e lib e r dade s ".
201 S A RMEN TO, D an ie l. Op . cit . p . 1 0 4 .
A co lis o e n t r e o s dir e it o s de p e r s o n alidade e o dir e it o de in fo r ma o 1 4 9
porcionalidade a resoluo de um conflito de bens jurdicos de modo a maximizar o
respeito a todos os interesses envolvidos no conflito.202
Refere, ainda, o autor, que haver de se impor "compresses recprocas sobre os
interesses protegidos pelos princpios em disputa, objetivando lograr um ponto ti
mo, onde a restrio a cada interesse seja a mnima indispensvel sua convivncia
com o outro".203
Prope, a tanto, que a ponderao observe trs critrios, a saber: (a) adequao:
a restrio a cada um dos interesses deve ser idnea para garantir a sobrevivncia do
outro; (b) necessidade: a restrio deve ser a menor possvel para a proteo do inte
resse contraposto; (c) proporcionalidade em sentido estrito: o benefcio logrado com
a restrio a um interesse tem de compensar o grau de sacrifcio imposto ao interesse
antagnico.204
Citando a jurisprudncia alem, refere que "o peso da liberdade de imprensa varia
conforme se trate da exposio de fato de interesse pblico ou de questo de interesse
privado. J a intensidade da tutela constitucional da intimidade osdla tambm, conforme
a questo se relacione esfera secreta do indivduo, ou sua esfera apenas privada".205
L us Roberto Barroso, por seu turno, refere que aps a identificao da hiptese de
coliso de direitos e da verificao das circunstncias relevantes ponderao, procede-
-se a esta de modo a apurar os pesos que devem ser atribudos aos diversos elementos
em disputa e, portanto, o grupo de normas que deve preponderar no caso".206
Em sntese, ser com recurso ponderao dos bens em conflito - utilizando-se de
critrios de proporcionalidade em face de todas as circunstncias e variveis examinadas
- que se estabelecer, sempre no exame do caso concreto, a possibilidade de harmoni
zao dos bens em disputa, sacrificando-se-os reciprocamente, ou a prevalncia total
ou parcial de uns sobre outros, comprimindo-se, ainda assim, da maneira mais tnue
possvel, o direito ou interesse contraposto.
6 Concluses
Os direitos de personalidade tm por mbito de proteo os bens que integram a
personalidade fsica e moral do ser humano.
O direito de informao integra as liberdades comunicativas e tem por mbito de
proteo as aes de informar, se informar e ser informado.
Os direitos de personalidade e o direito de informao tm por fundamento a dig
nidade do ser humano e no se afiguram como direitos ilimitados.
202 S A RMEN TO, D an ie l. Op . dt . p . 9 6 .
203 S A RMEN TO, D an ie l. Op . cit . p . 1 0 2 .
204 S A RMEN TO, D an ie l. Op . dt . p . 1 0 4 - 1 0 5 .
205 S A RMEN TO, D an ie l. Op . dt . p . 1 6 4 .
205 B A RROS O, L u s Ro b e r t o . In t e r p r e t a o e ap lica o da Co n s t it ui o . 6 . e d. S o Paulo : S ar aiv a, 2 0 0 4 . p . 3 6 0 .
1 5 0 D ir e it o s da Pe r s o n alidade Mir an da, Ro dr igue s Jun io r e F r ue t
A dificuldade de se delimitar com preciso os mbitos de proteo dos direitos de
personalidade e do direito de informao, assim como sua natureza por vezes dicotmi
ca, coloca esses direitos em constante tenso.
Evidencia-se a coliso entre os direitos de personalidade e o direito de informao
quando os mbitos de proteo respectivos intersectam-se.
No se pode afirmar, em abstrato, a existncia de superioridade entre os direitos
de personalidade e o direito de informao, que se afiguram, assim, como direitos de
mesma hierarquia.
A coliso entre os direitos de personalidade e o direito de informao deve ser
equacionada, desse modo, em concreto, por meio de ponderao entre os bens em con
flito, com recurso s regras de direito privado de resoluo de conflitos.
A atividade de ponderao de bens, com base em critrios de proporcionalidade
incidentes sobre o conjunto de circunstncias factuais relevantes, resolve as situaes
de coliso entre os direitos de personalidade e o direito de informao, seja por meio
de sua harmonizao, com a cedncia recproca dos bens e interesses em disputa, seja
pela prevalncia de um desses grupos em uma dada situao concreta, que haver de ser
aquele que mais se aproxima dos valores consagrados pelo sistema jurdico aplicvel ao
caso em sua globalidade e unidade.
A ponderao de bens, dessa forma, resolve a coliso entre os direitos de perso
nalidade e o direito de informao mediante a realizao de compresses recprocas
operadas sobre os respectivos bens, resultando em sua harmonizao ou na prevalncia
parcial ou total de um sobre outro.
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L iberdade de expresso e controle
de propaganda de medicamentos e
das advertncias na ordem jurdica
pela Agncia Nacional de Vigilncia
Sanitria - ANVISA (parecer) 1
Otvio Luiz Rodrigues Junior
SUMRIO: 1 Relatrio. 2 Fundamento. l 9Poder regulatrio da AN-
VISA. 2aA regulao da propaganda de medicamentos. 3a O mbito
1 Es t e t e x t o co r r e s p o n de ao in t e ir o t e o r da N OTA N 9 1 - ORJ/ GA B / A GU- 2 0 0 9 , de 8 .6 .2 0 0 9 , e lab o r ada p e lo j )
aut o r n a co n di o de adv o gado da Un io , o cup an t e do car go de adjun t o do A dv o gado - Ge r al da Un io , e
co n ce r n e n t e ao Pr o ce s s o n 9 0 0 4 0 0 .0 0 2 8 7 3 / 2 0 0 9 - 9 1 , cujo in t e r e s s ado fo i o CON A R - Co n s e lh o N acio n al de }
A ut o r r e gulame n t a o Pub licit r ia, e t e v e p o r o b je t o a Re s o lu o A N VIS A n 2 9 6 / 2 0 0 8 , r e lat iv a p ub licidade
de me dicame n t o s . Re alizar am- s e p e que n as alt e r a e s p ar a ajus t - lo ao s p adr e s de s t e liv r o . A n o t a fo i as s im )
r e s umida: "EMEN TA - A D MIN IS TRA TIVO - RES OL U O - POD ER REGUL A TRIO - PROPA GA N D A D E
MED ICA MEN TOS - CON TROL E D E L EGA L ID A D E E D E CON S TITUCION A L ID A D E. 1 . A e di o de n o r -
mas r e gulat r ias s o b r e dir e it o s fun dame n t ais e x ige , a de s p e it o do p r o ce s s o de de s le galiza o , a o b s e r v n cia
do co n t e do e s s e n cial. Co m is s o , o r e gulado r de v e s e p aut ar p e lo mar co da le i e n o in t e r fe r ir n a e s fe r a que i
co mp e t e ao le gis lado r . 2 . A s n o r mas le gais e x is t e n t e s n o co n fe r e m, co m fun dame n t o n o ar t . 2 2 0 , p ar gr afo
quar t o , CF / 1 9 8 8 , p o de r e s t o amp lo s de r e gula o de p r o p agan da de me dicame n t o s A N VIS A , ap e s ar da
fr an ca co n s e r v a o de s e u p o de r de p o l cia e de mais p r e r r o gat iv as le gais . 3 . N e ce s s idade de p r e s e r v a o do
camp o da licit ude e m de t r ime n t o da p r e s un o de e x e r c cio ab us iv o do dir e it o de in fo r mar . Ex t r ap o la o h r i- )
zo n t al do camp o r e gulat r io e m face de o ut r o s age n t e s . 4 . S ub s t it ui o da r e s o lu o o u e lab o r a o de p r o je t o
de le i s o b r e o as s un t o , co m ime diat a r e t ir ada da n o r ma do camp o de v ign cia. Es s a n o t a fo i ap r o v ada p e lo
adv o gado - ge r al da Un io Jo s A n t n io D ias To fF o li, co m o s e guin t e de s p ach o : 'A p r o v o o s t e r mo s da N OTA N a V
1 / 2 G0 9 / ORJ/ GA B / A GU, que an alis o u o co n t e do jur dico da Re s o lu o A N VIS A n a 9 6 / 2 0 0 8 e co n cluiu p e la
n e ce s s idade de e lab o r a o de n o v o mar co r e gulat r io , an t e a v e r ifica o de in co n s is t n cias e n t r e s o b r e dit a
n o r ma e as p aut as le gais e co n s t it ucio n ais . En camin h e m- s e cp ias de s t e de s p ach o e da me n cio n ada N o t a p ar a
o Co n s e lh o N acio n al de A ut o r r e gulame n t a o Pub licit r ia - CON A R, r go in t e r e s s ado . Re s t it uam- s e o s au
t o s Pr o cur ado r ia F e de r al da A gn cia N acio n al de Vigiln cia S an it r ia p ar a cin cia e ado o ' das p r o v idn cias ;
cab v e is , co m a m x ima ur gn cia. Em 1 5 de jun h o de 2 0 0 9 . Jo s A n t o n io D ias To fF o li.

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