Herman Dooyeweerd
Ronald Nash
Traduo: Felipe Sabino de Arajo Neto1
Uma das reaparies mais surpreendentes do Hiato de Hume (Humes
Gap) no pensamento recente encontrada na filosofia do calvinista holands,
Herman Dooyeweerd. O sistema de Dooyeweerd2 central para o
pensamento de um pequeno grupo de pensadores calvinistas que formam a
faculdade do Instituto para Estudos Cristos em Toronto, Canad.3 No
necessrio entrar nos detalhes da filosofia de Dooyeweerd.4 O que
importante para o nosso propsito presente a teoria da Barreira de
Dooyeweerd. A doutrina da Barreira a forma mais importante dos
seguidores de Dooyeweerd enfatizarem a soberania e a transcendncia de
Deus. Toda a criao de Deus est sujeita a vrias leis, tais como as leis da
fsica, biologia, matemtica, pensamento, economia, e assim por diante.
Porque Deus o Legislador, ele mesmo no est sujeito s leis que governam
sua criao. A lei ento constitui uma barreira entre Deus e o cosmos. As leis
que se aplicam sob a Barreira no se aplicam a Deus, que est cima de toda Lei.
Poucos cristos, antes do seu reconhecimento das implicaes da
teoria, disputariam a sugesto que uma barreira existe entre Deus e sua
criao. A doutrina parece bem inocente at que percebemos como os
Dooyeweerdianos aplicam a teoria razo humana. Em suas mos, o que
deveria ser uma metfora til interpretada nos termos mais literais, a ponto
de excluir totalmente a doutrina do Logos. Para os seguidores de
Dooyeweerd, as leis da lgica, de inferncia vlida, existem somente no lado
humano da Barreira. L. Kalsbeek deixa claro o hiato ou parede que os
Dooyeweerdianos pensam existir ente a mente de Deus e a mente humana:
Com nosso pensamento humano e as leis estabelecidas por ele, nos
encontramos no lado criatural dessa barreira, incapazes de cruz-la
por causa da prpria natureza, o prprio significado do nosso
1
E-mail para contato: [email protected]. Traduzido em agosto/2007.
2
O sistema de Dooyeweerd conhecido por vrios nomes, incluindo A Filosofia da Idia Cosmonmica e A
Filosofia de Amsterd.
3
O Instituto para Estudos Cristos (Institute for Christian Studies), com base em Toronto, no deve ser
confundido com o Instituto para Estudos Cristos Avanados (Institute for Advanced Christian Studies),
uma comisso rotativa de oito acadmicos evanglicos que apiam a erudio crist. Em momentos
diversos, essa comisso teve a participao de Carl F. Henry, Kenneth Kantzer, John Snyder, Arthur
Holmes, John Scanzoni, V. Elving Anderson, Charles Hatfield, Robert Frykenberg, Ronald Nash, James
Packer, C. Everett Koop e outros.
4
Fiz isso em certa extenso num livro intitulado Dooyeweerd and the Amsterdam Philosophy (Grand
Rapids: Zondervan, 1962). Esse livro uma obra de um homem muito jovem e se ele fosse escrever sobre
o assunto agora, seu tratamento seria muito mais crtico. Um tratamento mais recente e simptico da
filosofia de Dooyeweerd o livro de L. Kalsbeek, Contours of a Christian Philosophy (Toronto: Wedge,
1975). Os dois livros contm bibliografias teis.
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pensamento. Podemos apenas pensar significativamente sobre o que
reside no nosso lado dessa barreira. Devido s limitaes do nosso
pensamento de criaturas, como um resultado de sua sujeio lei,
podemos engajar somente em especulao sem sentido quando diz
respeito a questes e pronunciamentos sobre o que reside no outro
lado da barreira.5
Tomada sozinha, essa citao poderia facilmente ter procedido da pena
de Immanuel Kant. Somente aquilo que existe abaixo da Barreira pode estar
sujeito investigao humana. A Barreira marca os limites do que os humanos
podem conhecer.
A menos que seja qualificada, a teoria dos Dooyeweerdianos da Barreira
equivale a afirmar que impossvel para qualquer ser humano pensar
significativamente sobre Deus. Sem dvida, Kalsbeek adiciona que podemos
pensar significativamente sobre Deus conquanto percebamos que
deveramos nos limitar ao que Deus revelou sobre ele aos homens.6 Mas o
problema que os Dooyeweerdianos levantam para si mesmos se eles fizeram
ou no uma distino to grande entre a mente humana e a divina, que
qualquer revelao da verdade se torna impossvel. Como veremos mais tarde,
vrios pensadores do Instituto para Estudos Cristos aparentemente abraam
essa posio.
A rejeio dos Dooyeweerdianos da doutrina do Logos tornada clara
num recente ensaio de Al Wolters, professor do Instituto para Estudos
Cristos.7 Wolters prontamente reconhece o comprometimento de calvinistas
holandeses antigos, como Abraham Kuyper e Herman Bavinck, doutrina do
Logos. Na epistemologia deles, a capacidade de conhecer era claramente
dependente da relao do Logos entre a mente divina e a mente humana.
Wolters ofendido por esse comprometimento antigo doutrina do Logos, e
se regozija no fato que a Filosofia Amsterd de Dooyeweerd rejeita a mesma.
Para Wolters, a racionalidade est totalmente abaixo da Barreira. A
lgica, os princpios de inferncia vlida, no se aplicam alm da Barreira; do
que se segue que no existe nenhuma continuidade entre o Criador e a
criatura. Nas palavras de Wolters: No existe nenhuma ordem racional que
abranja Criador e criao no porque o Criador seja irracional, mas porque a
racionalidade criatura.8 O comentrio de Wolters levanta duas perguntas: a
sua posio no uma clara negao da imagem de Deus nos humanos? E
como algum sustentando a posio de Wolters pode ser confiante que Deus
no irracional? A declarao que Deus no irracional objetiva ser um
pouco de conhecimento sobre Deus. Mas a doutrina de Wolters da Barreira
5
L. Kalsbeek, Contours of a Christian Philosophy, pp. 74-75.
6
Ibid., p.75.
7
O ensino de Wolters, ainda no publicado, com o ttulo Dutch Neocalvinism: Worldview, Philosophy
and Rationality, foi entregue em Agosto de 1981, numa conferncia em Toronto sobre Racionalidade
na Tradio Calvinista.
8
Ibid., Wolters, p. 12.
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exclui qualquer conhecimento do tipo que ele tem em mente quando busca
assegurar seu leitor que Deus no irracional.
A viso dos Dooyeweerdianos, ento, que no existe nenhuma
continuidade racional entre Deus e a humanidade. O motivo de desejar
preservar a soberania e a transcendncia de Deus louvvel, mas a doutrina
carrega um preo muito alto. Ela defende a transcendncia divina fazendo
Deus totalmente incognoscvel. Qualquer cristo que creia na transcendncia
de Deus ter chegado a essa concluso como um resultado de algum
raciocnio. O seguinte argumento representa uma rota pela qual muitos
cristos chegam a essa concluso:
Se a Bblia declara que Deus transcendente, ento Deus
transcendente.
A Bblia diz que Deus transcendente.
Portanto, Deus transcendente.
Mas de acordo com Wolters e outros Dooyeweerdianos, o raciocnio
humano pode ser vlido somente sobre o lado criatural da Barreira. Nenhum
raciocnio humano pode nos trazer um conhecimento do que verdadeiro
alm da Barreira. Se a razo humana vlida somente nesse lado da Barreira,
ento qualquer inferncia que Deus transcendente deve ser uma aplicao
ilegtima da razo humana. O que Alvin Plantinga escreveu em conexo com
outro tipo de agnosticismo teolgico aplica-se muito bem Filosofia de
Amsterd; esse tipo de pensamento sobre Deus
comea com uma preocupao piedosa e louvvel pela
grandeza, majestade e magnificncia de Deus; mas termina em
agnosticismo e incoerncia. Pois se nenhum dos nossos
conceitos se aplica a Deus [ou se nenhuma das nossas
inferncias se estende a Deus], ento no existe nada que
possamos conhecer ou verdadeiramente crer sobre ele nem
mesmo o que afirmado nos credos ou revelado nas
Escrituras. E se no h nada que podemos conhecer ou
verdadeiramente crer sobre ele, ento, sem dvida, no
podemos conhecer ou verdadeiramente crer que nenhum dos
nossos conceitos se aplica a ele. A viso est fatalmente
emaranhada em absurdo auto-referencial. 9
Direi mais sobre a viso das Escrituras que os Dooyeweerdianos de
Toronto tm no captulo 12.
Fonte: The Word of God and The Mind of Man,
Ronald Nash, p. 96-99.
9
Alvin Plantinga, Does God Have A Nature? (Milwaukee: Marquette University Press, 1980), p. 26.
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