CUIDADOS DE ENFERMAGEM EM TERAPIA NUTRICIONAL
Estudos demonstram que a prevalência de pacientes desnutridos no âmbito hospitalar
encontra-se entre 40 a 50%, sendo maior durante a internação. O Inquérito Brasileiro de
Avaliação Nutricional - IBRANUTRI , realizado, em 1996, pela Sociedade Brasileira de
Nutrição Parenteral e Enteral (SBNPE) em hospitais do SUS foi o primeiro estudo brasileiro
a mapear a desnutrição hospitalar no Brasil e representou alerta e indício de que pacientes
não eram avaliados da maneira como deveriam.
E sendo a desnutrição considerada o distúrbio da saúde de maior prevalência no
hospital, justificam-se seu diagnóstico e tratamento por meio de uma Terapia Nutricional, que
é o conjunto de procedimentos terapêuticos para a manutenção ou recuperação do estado
nutricional do paciente por meio da Nutrição Parenteral, por cateteres intravenosos ou
Enteral, por sondas enterais, de gastrostomias ou jejunostomias.
A atuação multidisciplinar na Terapia Nutricional (TN) é uma necessidade para o
tratamento do paciente e foi sentida, de início, nos Estados Unidos. Frente aos altos índices
de desnutrição, em 1975, a Sociedade Norte-Americana de Nutrição Parenteral e Enteral
(ASPEN) criou um comitê científico multiprofissional voltado para a melhoria no atendimento,
educação e pesquisa em terapia nutricional, procurando nortear a formação de equipes com
diferentes profissionais. No Brasil, em pesquisa realizada pela SBNPE, verificou-se maior
existência de equipes formadas em São Paulo e no Rio de Janeiro desde 1978.
Mas foi somente em 1998 que o Ministério da Saúde, por meio de Portarias,
determinou que instituições hospitalares tivessem uma Equipe Multidisciplinar de Terapia
Nutricional (EMTN), constituída de, pelo menos, um profissional das áreas médica,
enfermagem, nutrição e farmácia.
O Portal da Enfermagem conversou com a enfermeira Cláudia Matsuba, especialista
em Nutrição Parenteral e Enteral e em UTI, coordenadora técnico-administrativa da EMTN
do Hospital do Coração, de São Paulo, e atual presidente do Comitê de Enfermagem da
SBNPE. Neste bate-papo, ela descreve a atuação da enfermagem enquanto membro da
EMTN, fala dos avanços na terapia nutricional, dos cuidados e responsabilidades que a
equipe multidisciplinar tem frente ao paciente, como é a especialização em enfermagem na
área, dentre outros assuntos relacionados ao tema.
Quem são os pacientes mais propensos à desnutrição hospitalar?
As principais situações que podem expor o paciente em risco de desnutrição estão
relacionadas à: redução na ingestão de alimentos (anorexia, náusea, vômitos, disfagia, dor,
obstrução gastrointestinal, problemas psicológicos), gasto energético aumentado
(neoplasias, HIV, doenças inflamatórias, cirurgias, sepse, queimaduras, úlceras e fístulas),
alterações no metabolismo dos nutrientes (falência orgânica, traumatismos), perda de
nutrientes (doenças que evoluem com má absorção, hemorragias, diarréia, síndrome
nefrótica, enteropatias, síndromes consuptivas como o câncer) e fatores iatrogênicos (falha
em diagnosticar a desnutrição ou pacientes em risco, escasso controle e anotação de peso
dos pacientes na admissão e no decorrer da internação, medicamentos, terapia nutricional
inadequada para a situação clínica do paciente, jejum prolongado e injustificado como para
cirurgias e exames etc.). Alguns autores também destacam o baixo nível sócio-econômico,
nível educacional, carência de informações sobre nutrição, nível funcional físico para
satisfazer às atividades da vida diária, dentição e até mesmo, isolamento.
Quais foram os principais avanços da terapia nutricional?
O impacto negativo da desnutrição hospitalar é atualmente considerado um dos problemas
mais graves da área da saúde, com conseqüente aumento nas taxas de morbidade,
mortalidade, tempo de internação e custos hospitalares.
Existem inúmeros avanços desde as primeiras aplicações desta terapia. A terapia nutricional
enteral precoce poderia ser um dos grandes avanços, sendo entendido como a introdução
da dieta nas primeiras 24 a 48 horas após admissão hospitalar. Este conceito nasce a partir
de estudos experimentais com objetivo de diminuir a resposta inflamatória isquêmica,
evitando liberação exagerada de citocinas, melhorar a função imunitária intestinal, reduzir a
produção de hormônios catabólicos e preservar o estado nutricional. Outro avanço está
relacionado aos imunonutrientes encontrados em determinados alimentos, responsáveis
pela modulação da atividade do sistema imunológico ou das conseqüências de sua ativação,
como a arginina, a glutamina, os ácidos graxos (ômega 3), os nucleotídeos e os
antioxidantes (vitamina C, zinco e selênio). As fórmulas enterais e parenterais enriquecidas
com estes nutrientes específicos têm a propriedade de atenuar a resposta inflamatória
aguda, aumentar a proliferação de células de defesa e reduzir o estresse oxidativo celular,
com efeitos benéficos em diversas situações clínicas. Graças a estes avanços, a dieta
enteral e a nutrição parenteral passaram a ser denominadas de terapia nutricional, sendo
específica para cada condição clínica, como nas situações de sepse, pneumopatia, úlceras
por pressão, nefropatia, dentre outros. Concomitante a estas mudanças, observamos
também os avanços tecnológicos relacionados aos dispositivos e equipamentos, como as
sondas gastrojejunais para pacientes com alto refluxo permitindo alimentação pós-pilórica e
bombas infusoras, garantindo acurácia e segurança na administração.
Em qual legislação está embasada a obrigatoriedade de uma Equipe Multidisciplinar
de Terapia Nutricional (EMTN) nos hospitais brasileiros?
As legislações vigentes para a prática multiprofissional são descritas nas portarias do
Ministério da Saúde: Portaria nº. 272 de 08/04/1998 e Resolução da Diretoria Colegiada nº.
63 de 06/07/2000. Segundo as legislações, EMTN é um grupo formal e obrigatoriamente
constituído de, pelo menos um profissional médico, enfermeiro, nutricionista, farmacêutico,
habilitados e com treinamento específico para a prática da Terapia Nutricional (TN), podendo
ainda incluir profissionais de outras categorias a critério da unidade hospitalar.
“Graças a estes avanços, a dieta enteral e a nutrição parenteral passaram a ser
denominadas de terapia nutricional, sendo específica para cada condição clínica”
Quais são as atribuições da EMTN?
Por tratar-se de um grupo de apoio especializado e regido por normatizações, a EMTN
possui várias atribuições, dentre elas:
- Estabelecer as diretrizes técnico-administrativas que devem nortear as atividades da
equipe e suas relações com a instituição;
- Criar mecanismos para o desenvolvimento das etapas de triagem e vigilância nutricional
em regime hospitalar, ambulatorial e domiciliar, sistematizando uma metodologia capaz de
identificar pacientes que necessitam de terapia nutricional, a serem encaminhados aos
cuidados da EMTN;
- Atender às solicitações de avaliação do estado nutricional do paciente, indicando,
acompanhando e modificando a TN, quando necessário, em comum acordo com o médico
responsável pelo paciente, até que sejam atingidos os critérios de reabilitação nutricional
pré-estabelecidos;
- Assegurar condições adequadas de indicação, prescrição, preparação, conservação,
transporte e administração, controle clínico e laboratorial e avaliação final da terapia
nutricional enteral (TNE) e ou terapia nutricional parenteral (TNP), visando obter os
benefícios máximos do procedimento e evitar riscos;
- Capacitar os profissionais envolvidos, direta ou indiretamente, com a aplicação do
procedimento, por meio de programas de educação continuada, devidamente registrados;
- Estabelecer protocolos de avaliação nutricional, indicação, prescrição e acompanhamento
da TNE e TNP;
- Documentar todos os resultados do controle e da avaliação da TNE e TNP visando a
garantia de sua qualidade;
- Estabelecer auditorias periódicas a serem realizadas por um dos membros da EMTN, para
verificar o cumprimento e o registro dos controles e avaliação da TNE e TNP;
- Analisar o custo e o benefício no processo de decisão que envolve a indicação, a
manutenção ou a suspensão da TNE e TNP.
E quais os principais benefícios desta implantação?
Na literatura e na prática clínica são descritos inúmeros trabalhos demonstrando os
benefícios e resultados da atuação das EMTNs. As principais vantagens encontradas são:
normatização de condutas, cumprimento ao acompanhamento de protocolos; redução de
complicações mecânicas, infecciosas, gastrointestinais e metabólicas; redução de custos
com o controle do desperdício na preparação, padronização de prescrições, solicitação de
exames laboratoriais e uso de equipamentos específicos; melhor adequação nutricional
atingindo aporte calórico-proteico desejado e maior segurança e efetividade por meio do
gerenciamento de riscos por profissionais especialistas e capacitados.
Como se dá a escolha do profissional de enfermagem que atuará na Equipe?
A escolha ocorre geralmente por meio de indicação do coordenador clínico ou do
gerente/diretor de enfermagem do respectivo serviço, em consenso com os demais
membros da EMTN. Pela especificidade da área, recomenda-se que o enfermeiro possua
especialização em TN ou desenvolva atividades correlacionadas para então atuar
juntamente ao grupo.
Há alguma legislação específica que norteia a atuação da enfermagem?
Sim, as portarias do Ministério da Saúde (RCD 63 de 06/07/2000 e Portaria 272 de
08/04/1998 direcionam para as Boas Práticas de Administração da Terapia Nutricional
Enteral e Parenteral pela equipe de enfermagem sob supervisão do enfermeiro. A
Resolução do Cofen nº 277 (16/06/2003) também aprova as normas de procedimentos a
serem utilizadas pela equipe de Enfermagem na Terapia Nutricional. É importante destacar
que além de assumir o acesso ao trato-gastrointestinal, o enfermeiro também possui a
competência de sistematizar a assistência na Nutrição Oral Especializada.
Os hospitais contam com uma EMTN ou há equipes distintas em determinadas áreas?
Atualmente observam-se hospitais com EMTNs atuantes na área adulta e pediátrica
concomitantemente e àquelas, com equipes distintas. Apesar desta distinção, na prática uma
atuação conjunta parece ser mais favorável em decorrência da uniformidade na elaboração
de diretrizes e normatizações. No entanto, a atuação conjunta dependerá da política
institucional e do contrato de trabalho das equipes.
“recomenda-se que o enfermeiro possua especialização em TN ou desenvolva
atividades correlacionadas para então atuar juntamente ao grupo”
Em que momento começa a participação da enfermagem na terapia nutricional?
A participação da enfermagem encontra-se em todos os níveis de assistência, seja na área
hospitalar, como ambulatorial ou domiciliar. O enfermeiro exerce um papel fundamental, visto
que é o profissional que freqüentemente estabelece o primeiro contato com o paciente
durante a hospitalização. Este profissional pode detectar precocemente pacientes com perfil
para terapia nutricional especializada por meio de uma avaliação objetiva simples (Triagem
Nutricional). As primeiras observações podem ocorrer durante a própria admissão hospitalar,
a partir do momento que o enfermeiro por meio dos instrumentos, como o Histórico de
Enfermagem e a Triagem Nutricional detecta algum sinal de desnutrição ou risco de
desnutrição. A Triagem faz parte da terapia nutricional e envolve o uso de técnicas simples
de avaliação como exame físico e questionamento sobre hábitos alimentares, variações de
peso recente de peso, sintomas gastrointestinais e capacidade funcional; independente do
diagnóstico ou faixa etária e tem como base o uso de intervenções nutricionais específicas
para prevenir ou tratar uma doença, lesão ou condição.
Outro momento importante ocorre durante a própria hospitalização, onde a equipe deve
acompanhar a aceitação alimentar, assim como sintomas associados à intolerância do trato
digestório (náuseas, vômitos e diarréia), perda de peso corpóreo, disfagia e risco de
broncoaspiração, e a própria condição clínica, como nos pacientes internados em unidades
de terapia intensiva, oncologia ou com riscos para formação de úlceras por pressão.
Quais são os procedimentos a serem seguidos pela equipe de enfermagem?
Considerando a TN como terapia de alta complexidade, é fundamental o conhecimento
científico e colaboração da equipe, promovendo uma assistência segura e de qualidade.
Esse cuidado envolve prover e manter a via de acesso escolhida; instalar e administrar a
terapia prescrita em doses plenas (seja na forma gravitacional como em bombas infusoras),
controlar efetivamente os volumes infundidos em comparação com os volumes prescritos,
monitorar os efeitos das terapias e detectar e atuar precocemente, diante das intercorrências
que os pacientes possam apresentar. Outro ponto fundamental é acompanhar a efetividade/
tolerância às terapias por meio de controles clínicos como controle da glicemia capilar,
evolução do peso corpóreo, eliminação intestinal.
Quais os principais cuidados que a enfermagem deve ter frente à terapia nutricional?
A experiência como enfermeira exclusiva de EMTN e como docente de um curso de pós-
graduação em Terapia Nutricional enriqueceram muito a prática profissional, permitindo
implantar um serviço diferenciado e de qualidade no HCor.
Os principais cuidados de enfermagem estendem além das descritas nas legislações. A
assistência ao paciente em uso desta terapia é ampla e deve ser sistematizada, permitindo
visualizar/acompanhar todo o processo, desde a realização da prescrição médica até a
finalização da terapia.
De forma resumida, a sistematização do Plano de Cuidados pode ser dividida em etapas:
1) Cuidados que precedem a instalação da TN;
2)Cuidados na instalação da TN;
3)Cuidados durante a infusão da TN;
4) Cuidados na finalização da TN.
Na etapa 1, o cuidado inicia-se durante a realização das visitas da equipe e elaboração das
prescrições médicas. Pela responsabilidade na administração, é imprescindível que
enfermeiros tenham conhecimento sobre as indicações e efeitos secundários das diferentes
fórmulas parenterais e enterais disponíveis no mercado, permitindo detectar precocemente
algum risco para intolerância.
A avaliação dos dispositivos e equipamentos para administração da TN no momento que
precede a instalação é atividade inerente do enfermeiro, procurando garantir segurança na
manipulação das vias, menor desperdício e risco de complicações e efetividade na infusão.
Com auxílio do Serviço de Controle e Epidemiologia Hospitalar (SCIEH), protocolos deverão
ser elaborados quanto à periodicidade da troca dos dispositivos e dos frascos da dieta
enteral e nutrição parenteral, minimizando riscos de contaminação. Ainda nesta etapa, o
enfermeiro deverá proceder na colocação da sonda enteral ou auxiliar na seleção da via de
acesso.
A etapa 2 inicia-se com o recebimento da dieta enteral e ou frasco da nutrição parenteral dos
Setores de Nutrição e ou Farmácia. Nesta fase, em várias instituições, inicia-se a dupla
checagem das prescrições e das soluções garantindo uso seguro e correto, envolvendo
controle de temperatura dos frascos de nutrição parenteral e instalação com técnica
asséptica.
Durante a administração da TN (fase 3), o monitoramento deverá ser mais amplo. A
assistência será realizada com o paciente pela observação de sinais de intolerância às
fórmulas e prevenção do risco de complicações; com os dispositivos, pelo cumprimento de
protocolos para prevenção de interações droga-nutrientes e complicações mecânicas, troca
de curativos peri-cateter ou sondas de gastrostomias minimizando riscos de contaminação e
com a infusão correta das soluções prescritas em doses plenas procurando atingir o aporte
calórico-proteico calculado pela EMTN. O planejamento educacional ao paciente e sua
família deve se iniciar nesta etapa, sendo considerado importante estratégia na prevenção
de complicações.
A etapa final ocorrerá na transição da dieta enteral para via oral, após avaliação da
efetividade da terapia, com obtenção de resultados esperados ou no preparo do paciente
para alta domiciliar, com a continuidade do processo educacional. No preparo para alta
domiciliar, o enfermeiro e sua equipe devem elaborar um plano de acordo com as
necessidades do paciente, garantindo que as orientações sejam cumpridas efetivamente no
domicílio.
O Gerenciamento do cuidado também faz parte das etapas do processo porque permite
avaliar o desempenho de todas as atividades de enfermagem. Nesta etapa são coletados
indicadores de qualidade, procurando verificar o cumprimento das atividades clínicas e
administrativas, identificar melhorias necessárias, elevar os níveis de segurança dos
pacientes, equipe de saúde e familiares e aumentar o nível da qualidade assistencial.
Quais são as modalidades de terapia nutricional e do que trata cada uma?
A TN pode ser dividida em Terapia Nutricional Enteral e Terapia Nutricional Parenteral.
A TNE é um conjunto de procedimentos terapêuticos para manutenção ou recuperação do
estado nutricional do paciente por meio da nutrição enteral. A dieta enteral é definida como
alimento para fins especiais, com ingestão controlada de nutrientes, na forma isolada ou
combinada, de composição definida ou estimada, especialmente formulada e elaborada,
industrializada (sistema fechado) ou não (sistema aberto), utilizada exclusiva ou
parcialmente para substituir ou complementar a alimentação em pacientes desnutridos ou
não, conforme suas necessidades nutricionais, em regime hospitalar, ambulatorial ou
domiciliar, visando a síntese ou manutenção dos tecidos, órgãos ou sistemas. Este tipo de
terapia pode ser administrada para uso por sondas enterais, sondas de gastrostomias ou
sondas de jejunostomias ou por via oral por meio de suplementos.
A TNP é um conjunto de procedimentos terapêuticos para manutenção ou recuperação do
estado nutricional do paciente por meio da nutrição parenteral, sendo uma solução ou
emulsão, composta basicamente de carboidratos, aminoácidos, lipídios, vitaminas e
minerais, estéril e apirogênica, acondicionada em recipiente de vidro ou plástico, destinada à
administração intravenosa em pacientes desnutridos ou não, em regime hospitalar,
ambulatorial ou domiciliar visando a síntese ou manutenção dos tecidos, órgãos ou
sistemas. Atualmente são classificadas em dois tipos de sistemas: o sistema individualizado
(quando prescrita formulação específica para cada paciente) e formulações padrão
(padronizadas para cada grupo de patologias ou pacientes). Outra denominação
amplamente utilizada é a nutrição parenteral industrializada (pronta para uso- “read-to-use”).
A nutrição parenteral pode ser administrada por meio de cateteres intravenosos de curta
permanência (inserção periférica ou centrais de inserção periférica) ou de longa
permanência (tuneilizados ou implantáveis), conforme a rotina institucional.
A enfermagem também orienta o paciente e seus familiares?
O plano educacional é outra atribuição essencial do enfermeiro porque através da
comunicação é possível minimizar complicações e garantir maior segurança ao paciente,
familiar e ou cuidador. Este processo é bastante enriquecedor porque permite avaliar as
necessidades do paciente e os riscos potenciais para que o cuidado não seja cumprido
efetivamente no domicílio. Como rotina das atividades de enfermeira da EMTN, a
abordagem educacional ocorre desde o momento em que inicia-se a terapia sendo uma
estratégia para maior entendimento e colaboração do paciente e familiar, estabelecendo
também um vínculo com o grupo pois as visitas do grupo no HCor ocorrem diariamente.
A senhora escreveu a obra “Enfermagem em Terapia Nutricional”. Conte-nos um
pouco sobre esta experiência e a importância desta leitura para os colegas que atuam
em terapia nutricional.
Foi uma experiência bastante enriquecedora, pois contou com o apoio e colaboração dos
enfermeiros do Comitê de Enfermagem da SBNPE e de enfermeiras da Federação Latino-
Americana de Nutrição Parenteral e Enteral (FELANPE). A necessidade surgiu da procura
de um livro específico e direcionado à equipe de enfermagem. Participei como co-autora em
inúmeras obras da área multiprofissional, mas observava carência de literatura quando o
tema era voltado à enfermagem e terapia nutricional, escrito por profissionais especialistas.
Minha preocupação inicial foi elaborar um livro abrangente e de fácil compreensão e, na
finalização desta obra tive uma grande surpresa, deparei-me com um conteúdo altamente
rico, pois constava desde as primeiras práticas até sua evolução na América Latina. Esta
obra pode proporcionar ao leitor uma viagem pela história da enfermagem na TN, procura
esclarecer dúvidas sobre as atuais legislações, descreve o papel das fórmulas enterais e
parenterais utilizadas na prática clínica, apresenta os avanços tecnológicos quanto aos
dispositivos mais utilizados e também discute sobre o gerenciamento de riscos. Atualmente
o livro está sendo utilizado como referência para várias faculdades em cursos de graduação
e pós-graduação, para EMTNs de diversos hospitais e até mesmo para público
multiprofissional que desconhecia a atuação do enfermeiro na Terapia Nutricional.
Como é a especialização nesta área?
Há duas formas para obtenção do título de especialista em terapia nutricional. A primeira
pode ser obtida por meio de prova de título de especialista em Nutrição Parenteral e Enteral
pela Sociedade Brasileira de Nutrição Parenteral e Enteral (SBNPE). A obtenção do título
pela Sociedade ocorre por meio de nota em prova aplicada por esta associação, análise
curricular e comprovante de atuação na área por no mínimo dois anos. Outra forma é a pós-
graduação multiprofissional em Terapia Nutricional em cursos reconhecidos pelo Ministério
da Educação e Cultura (MEC), com carga horária acima de 360 horas promovidos por
instituições reconhecidas em nosso meio, como, por exemplo, o Instituto de Metabolismo e
Nutrição (IMeN) e o Grupo de Apoio à Nutrição Enteral e Parenteral (GANEP). Nos cursos
de pós-graduação, a estrutura curricular engloba fundamentos de nutrição; terapia
nutricional especializada nas diferentes situações clínicas, farmacologia, assistência de
enfermagem, dentre outros.
A senhora sabe nos dizer quantos enfermeiros são especialistas em nutrição enteral e
parenteral no Brasil?
Segundo publicação realizada por Santos & Ceribelli, em 2006, foi verificado que havia 47
enfermeiros especialistas em Terapia Nutricional, com titulação obtida pela SBNPE. Nos
levantamentos atuais da respectiva sociedade, temos percebido que anualmente vários
profissionais realizam prova para título de especialista. No momento, acreditamos que
existam cerca de 60 especialistas em todo o Brasil.
Como presidente do Comitê de Enfermagem da SBNPE, o que pode nos contar sobre
a atuação deste departamento dentro da Sociedade?
É um departamento que surgiu concomitante à criação da SBNPE na década de 70, com as
enfermeiras Maria Isabel Pedreira de Freitas, Ymiracy Nascimento de Souza Polak e Suely
Itsuko Ciosak. O espaço obtido na área hospitalar com atuação exclusiva foi também graças
à atuação das respectivas enfermeiras, pela elaboração de protocolos de enfermagem,
normatização de produtos para administração das terapias e realização de inúmeras
pesquisas com resultados satisfatórios. Com objetivo de fortalecer o comitê, a atual gestão
tem procurado realizar uma ampla divulgação desta especialidade durante os congressos
promovidos pela sociedade, nos workshops práticos para enfermeiros, nos cursos
promovidos em diversos hospitais enfocando a prática deste profissional e recentemente,
otimizado com o lançamento do primeiro livro especializado para enfermagem.
Recentemente, o grupo também participou na coordenação dos trabalhos para elaboração
das Diretrizes em Terapia Nutricional (DITEN), promovido pela SBNPE. O DITEN foi um
projeto multiprofissional que procurou estabelecer diretrizes e normatizações atualizadas,
seguindo as principais recomendações das sociedades norte-americana e europeia. O
departamento também tem sua representatividade, atuando ativamente na Federação
Latino-Americana de Nutrição Parenteral e Enteral (FELANPE) com grupos de enfermeiras
na América Latina, como Argentina, Colômbia, Peru, Uruguai, dentre outros. Em parceria
com este grupo, recentemente lançou um Guia de Estándares de Enfermagem, onde aborda
a prática assistencial e as principais recomendações.
“A obtenção do título pela Sociedade ocorre por meio de nota em prova aplicada por
esta associação, análise curricular e comprovante de atuação na área por no mínimo
dois anos”
Quais foram as conquistas para a enfermagem?
Tivemos várias conquistas graças ao pioneirismo das enfermeiras na SBNPE. Os resultados
foram o maior reconhecimento da atuação por demais profissionais da equipe; a importância
da exclusividade dos enfermeiros nas EMTNs, reconhecimento como profissionais
especialistas para tomada de decisões como na seleção e aquisição de materiais e
equipamentos em TN e atuação efetiva na minimização dos efeitos da desnutrição. Nós,
enfermeiras de EMTN começamos a ter um olhar criterioso quanto aos pacientes em risco
de desnutrição tanto no momento da admissão como durante a hospitalização; procuramos
sistematizar o cuidado com o objetivo de que pacientes tenham o aporte calórico-proteico
desejado e implantamos programas de educação continuada para que a equipe de
enfermagem tivesse maior adesão e segurança no cumprimento das rotinas de forma efetiva
e o paciente/família, maior aceitação dos propósitos da terapia. Outro ponto fundamental é o
gerenciamento de riscos em todas as etapas da Terapia Nutricional, seja avaliando as
prescrições médicas, seja durante a administração da terapia ou até mesmo na finalização,
implantando processos de melhoria e evitando uso inadequado por imprudência, imperícia
ou negligência.
Quais são as suas competências enquanto coordenadora técnico-administrativa da
EMTN do Hospital do Coração?
Para esta função, o enfermeiro deve, preferencialmente, possuir título de especialista
reconhecido em área relacionada à TN e, como coordenadora da equipe, conhecer as
atribuições de cada membro (médico, nutricionista, farmacêutico).
As atividades desenvolvidas como enfermeira especialista de área somam às competências
como coordenadora técnica da EMTN-HCor, sendo cumpridas efetivamente:
- Assegurar condições para o cumprimento das atribuições gerais da equipe e dos
profissionais, visando a qualidade e efetividade da Terapia Nutricional;
- Representar a equipe em assuntos relacionados com as atividades da EMTN;
- Promover e incentivar programas de educação continuada, para todos os profissionais
envolvidos na Terapia Nutricional, devidamente registrados;
- Padronizar indicadores de qualidade em Terapia Nutricional, para aplicação pela EMTN;
- Gerenciar aspectos técnico-administrativos das atividades da Terapia Nutricional;
- Gerenciar aspectos relacionados a custo-efetividade das terapias implantadas.
Estas competências se estendem além das normatizações do Ministério da Saúde, porque
também cumprimos as recomendações de um programa de acreditação internacional,
garantindo maior segurança aos nossos processos e aos colaboradores. Outro ponto
fundamental como enfermeira de EMTN foi também disseminar os resultados positivos desta
prática e formar novos colaboradores por meio de um grupo de estudos de enfermagem no
HCor.
Cláudia Matsuba é enfermeira especialista em Nutrição Parenteral e Enteral e em UTI,
coordenadora técnico-administrativa da Equipe Multidisciplinar em Terapia Nutricional do Hospital do
Coração, de São Paulo, e presidente do Comitê de Enfermagem da Sociedade Brasileira de Nutrição
Parenteral e Enteral (SBNPE)