Geografia Metodologia Do Ensino
Geografia Metodologia Do Ensino
Metodologia do Ensino
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EQUIPE TÉCNICA
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Edneire Franciscon Jacob
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Artes Gráficas: Luciano Wilian da Silva
Marcos Roberto Andreussi
Marketing: Marcos Cipriano da Silva
Comercialização: Norberto Pereira da Silva
Paulo Bento da Silva
Solange Marly Oshima
Formação de Professores - EAD
Geografia:
Metodologia do Ensino
54
Maringá
2012
Coleção Formação de Professores - EAD
ISBN 978-85-7628-450-5
Capítulo 2
O trabalho do professor na organização > 41
de práticas de educação geográficas
Claudivan Sanches Lopes
Capítulo 3
As propostas curriculares oficiais para o ensino da > 47
geografia nas séries/anos iniciais
Cleres do nascimento mansano
Capítulo 4
Representações: a linguagem cartográfica
Cleres do Nascimento Mansano
> 53
Capítulo 5
Livro didático de geografia: análise e avaliação > 65
Cleres do Nascimento Mansano
5
Geografia: Capítulo 6
Metodologia do ensino
Os estudos do meio: uma estratégia > 71
metodológica para o ensino de geografia
Cleres do Nascimento Mansano
Capítulo 7
Escalas geográficas: algumas considerações > 79
Cleres do Nascimento Mansano
Capítulo 8
As cidades, o território a paisagem > 87
e o planejamento urbano
Jorge Ulises Guerra Villalobos
Capítulo 9
Fotografia, território e literatura > 103
Jorge Ulises Guerra Villalobos
Capítulo 10
A estação rodoviária Américo DiasFerraz. > 119
Maringá - Paraná
Jorge Ulises Guerra Villalobos / Valter Tadeu Dubiela
6
S obre os autores
CLAUDIVAN SANCHES LOPES
Professor de Prática de Ensino em Geografia e Metodologia de Ensino em
grafia – UEM – Maringá - PR e do Ensino Básico- Col. Est. João de Faria Pioli
7
A presentação da Coleção
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Geografia: Em função disto, agradecemos sinceramente aos colegas da UEM e das demais
Metodologia do ensino
instituições que organizaram livros ou escreveram capítulos para os diversos livros
desta coleção.
Agradecemos, ainda, à administração central da UEM, que por meio da atuação di-
reta da Reitoria e de diversas Pró-Reitorias, não mediu esforços para que os trabalhos
pudessem ser desenvolvidos da melhor maneira possível. De modo bastante especifico,
destacamos aqui o esforço da Reitoria para que os recursos para o financiamento desta
coleção pudessem ser liberados de acordo com os trâmites burocráticos e os prazos
exíguos estabelecidos pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
Internamente destacamos, ainda, o envolvimento direito dos professores do De-
partamento de Fundamentos da Educação (DFE), vinculado ao Centro de Ciências
Humanas, Letras e Artes (DFE), que no decorrer dos últimos anos empreenderam
esforços para que o curso de Pedagogia, na modalidade de educação a distância, pu-
desse ser criado oficialmente, o que exigiu um repensar no trabalho acadêmico e uma
modificação significativa da sistemática das atividades docentes.
No que se refere ao Ministério da Educação, ressaltamos o esforço empreendido
pela Diretoria da Educação a Distância (DED) da Coordenação de Aperfeiçoamento
de Pessoal do Ensino Superior (CAPES) e pela Secretaria de Educação de Educação a
Distância (SEED/MEC), que em parceria com as Instituições de Ensino Superior (IES)
conseguiram romper barreiras temporais e espaciais para que os convênios para libe-
ração dos recursos fossem assinados e encaminhados aos órgãos competentes para
aprovação, tendo em vista a ação direta e eficiente de um número muito pequeno de
pessoas que integram a Coordenação Geral de Supervisão e Fomento e a Coordenação
Geral de Articulação.
Esperamos que a segunda edição da Coleção Formação de Professores – EAD
possa contribuir para a formação dos alunos matriculados no curso de Pedagogia, bem
como de outros cursos superiores a distância de todas as instituições públicas de en-
sino superior que integram e possam integrar em um futuro próximo o Sistema UAB.
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A presentação do livro
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Geografia: No quinto capítulo, Livro didático de geografi a: análise e avaliação são realiza-
Metodologia do ensino
das uma discussão sobre a importância do livro didático para o processo de ensino/
aprendizagem, bem como os problemas que vão desde a escolha até a sua utilização
em sala de aula. Como proposta de atividade é solicitada que seja realizada uma
análise de coleção de livro didático, voltado para as séries inicia. O objetivo é pos-
sibilitar o contato do futuro professor com este recurso e possibilitá-lo a avaliação,
bem como a escolha na sua futura prática profissional.
No sexto capítulo, intitulado Os estudos do meio: uma estratégia metodológica
para o ensino de geografi a a autora aborda a importância deste recurso que possibi-
lita a construção do conhecimento pela observação orientada, pela ótica realidade,
possibilitando a aprimoração do olhar geográfico do educando e do educador. São
apresentadas algumas propostas que possibilitam ao professor a práxis.
No sétimo capítulo, Escalas geográfi cas: algumas considerações é a distinção
entre a escala geográfica e cartográfica, sendo que na Geografia as duas são funda-
mentais e complementares. Assim, entender os seus significados e aplicações faz
parte da educação geográfica e essencial para a apreensão do fenômeno geográfico.
As cidades experimentaram ao longo de seu processo de expansão e consolida-
ção inúmeras inovações, tais como as provenientes da inclusão das áreas verdes den-
tro de um marco de política higenista, quanto das inovações em vias de circulação,
provocadas pela mudança dos meios. No entanto sempre mantiveram uma constan-
te qual foi a de regrar os usos do solo, particularmente intensas foram as ações dos
planejadores quando disciplinaram as atividades industriais que pretendiam ocupar
o perímetro urbano. No oitavo capítulo, As cidades, o território a paisagem e o pla-
nejamento urbano, o professor Jorge G. Villalobos analisa com detalhes a questão
urbana contemporânea que resulta dos novos processos tecnológicos.
A qualquer geógrafo ou professor de geografia que perguntássemos pelo nome
de Alexander von Humboldt (1769-1859) diria no mínimo que está associado direta-
mente à história da geografia científica. No entanto esse naturalista alemão, está tam-
bém vinculado com a apresentação do invento de Louis Jacques Mande Daguerre
(1787-1851) o Daguerrotipo, à Academia de Ciências de Paris e sua participação não
parece ter sido secundária, haja vista, que desde essa época a Fotografia passou a ser
incorporada em todos os trabalhos geográficos. Porém, nunca fora deixado de lado
o caráter descritivo e de certa forma literário quando analisado o território desde os
personagens que o integram. No nono capítulo denominado Fotografi a, território e
literatura, o professor Jorge G. Villalobos explora esses temas.
No décimo capítulo, destinado à análise da paisagem, desde o ponto de vista
da preservação, Jorge G. Villalobos e Valter Tadeu Dubiela revisão em detalhes, a
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Estação rodoviária américo dias ferraz, na cidade de Maringá. Objetivando expor apresentação do livro
13
1 nos Oanosensino de geografia
iniciais do ensino
fundamental
Claudivan Sanches Lopes
introdUÇÃo
O objetivo deste livro, como ressaltamos na apresentação, é oferecer reflexões a
respeito da metodologia do ensino de Geografia para os anos iniciais do Ensino Fun-
damental. Cientes de que a Geografia deve colaborar no esforço global do currículo
escolar em formar integralmente, colocamos à disposição dos futuros professores ins-
trumentos teóricos e práticos para a organização de práticas de educação geográfi cas
que consideramos adequadas ao grau de desenvolvimento cognitivo dos alunos que
frequentam esse nível de ensino. Em consonância com outros autores, pressupomos
que os conteúdos geográficos presentes nos currículos escolares podem contribuir
efetivamente na alfabetização das crianças e na promoção de seu desenvolvimento,
pois desencadeiam processos que permitem à criança iniciar a compreensão do mun-
do de forma sistematizada e, ao mesmo tempo, fornecem os alicerces para as aprendi-
zagens futuras da Geografia na Educação Básica (CALLAI, 2005).
Ao enfatizarmos o aspecto metodológico, entretanto, não descuidamos dos princi-
pais conceitos e procedimentos que fazem parte dos modos de pensar e de operar da
ciência geográfica e que definem sua especificidade. É impossível, na verdade, separar
os conteúdos de ensino dos procedimentos metodológicos que se adotam para ensiná-
-los. Assim, é necessário esclarecer aspectos relacionados à natureza e à especificidade
da Geografia enquanto ciência no quadro geral do conhecimento humano para depois
examinarmos sua possível contribuição no currículo escolar e, particularmente, no
currículo das séries iniciais do Ensino Fundamental.
Com efeito, salientamos, inicialmente, o papel da Geografia no campo das ciências
humanas para, em seguida, avançarmos na compreensão dos possíveis significados
atribuídos à “educação geográfica” – função da Geografia no currículo escolar – e sua
importância para a formação dos indivíduos de maneira geral e especialmente das
crianças que frequentam as séries iniciais do Ensino Fundamental, alvo indireto deste
material pedagógico.
15
Geografia: a GeoGrafia aCadÊMiCa e seU lUGar no CaMPo das CiÊnCias so-
Metodologia do ensino
Ciais: UMa referÊnCia fUndaMental
A reflexão acerca do lugar da Geografia no currículo escolar e as tentativas de se
compreender melhor o sentido do que estamos chamando de educação geográfi ca
passam, como já pontuamos, pela consideração do lugar da Geografia no campo das
ciências sociais.
A compreensão da Geografia como ciência social parte da premissa de que a expli-
cação da sociedade pode ser realizada por meio de inúmeras “entradas” ou “pontos de
vista”, como explica Moraes (2000, p. 23):
Sob esse prisma, não existe uma realidade exclusivamente geográfica. Como a
realidade social não é totalmente geográfica, a teoria geográfica, como qualquer outra,
é insuficiente para explicá-la em sua totalidade, e, é bom recordar, está sempre em
movimento. A Geografia permite, em sua epistemologia, captar a realidade mediante
uma determinada perspectiva e, dessa forma, explicá-la. A função da Geografia, como
defende Escolar (1996), é produzir teorias para interpretar a espacialização da reali-
dade social. O repertório de teorias que compõem a ciência geográfica se constitui,
assim, em uma “janela” da qual o geógrafo e o estudante de Geografia (ainda que em
diferentes níveis de compreensão) podem observar e analisar a sociedade.
Ao valorizar a dimensão espacial da sociedade, a Geografia não nega a existência
de outras dimensões possíveis de análise; ao contrário, procura estabelecer um diá-
logo com elas e entre elas. Não se trata de tentar constituir, como nos alerta Moraes
(2000), uma superciência capaz de trabalhar empiricamente com a totalidade social.
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Concomitantemente, se aceita a existência de outras perspectivas e se busca estabele- o ensino de geografia
nos anos iniciais do
cer pontes entre elas. Toma-se por prerrogativa que a realidade social é multidimen- ensino fundamental
figura 1: A observação do espaço mediada pela teoria geográfica possibilita o desenvolvimento do olhar
geográfico sobre o mundo. Ilustração de Paulo Henrique Lopes e Estevão Pastori Garbin.
17
Geografia: o conhecimento geográfico pode ser um fator propiciador de maior consciência sobre
Metodologia do ensino
a organização da vida humana, visto que, à medida que permite a “desnaturalização
das construções espaciais”, abre possibilidades para a investigação do conteúdo (as
relações sociais) que dá forma às paisagens. Em uma perspectiva crítica, a invenção da
Geografia pelos seres humanos decorre da constatação de que a sociedade humana
não pode prescindir da compreensão do espaço em seu caminhar histórico, por ser
ele um fator que condiciona essa caminhada.
Estudar geograficamente o mundo torna-se, sob tal vertente, um exercício cogni-
tivo muito relevante que supõe o deslindamento da lógica que rege a realidade social
por intermédio da observação e do estudo metódico do espaço. Trata-se do desenvol-
vimento sistemático do raciocínio espacial, que estabelece, como produto mental, a
formação de uma consciência espacial ou geográfi ca. Revela-se, por essa via, de acor-
do com os propósitos deste tópico, o sentido ou a importância da ciência geográfica
na vida do estudante de Geografia e de indivíduos que compõem a sociedade. Cabe
ao professor, como veremos mais detalhadamente adiante, organizar atividades peda-
gógicas que, iluminadas pela teoria geográfica, proporcionem aos alunos o desenvol-
vimento do modo de pensar geográfico. Em outras palavras, que possam desenvolver,
gradativamente, seu raciocínio geográfico.
o raCioCÍnio GeoGrÁfiCo
Considerando que já tenhamos alcançado a clareza suficiente sobre a especificida-
de da Geografia no campo das ciências sociais, podemos avançar na caracterização do
processo de construção do raciocínio geográfi co. Este se refere à capacidade cognitiva
de compreender como as diversas sociedades organizam o seu espaço e, por outro,
mas inseparavelmente, as implicações dos diversos arranjos espaciais na vida social e,
em particular, na vida pessoal de seus membros. Em outros termos, como os diversos
arranjos espaciais que compõem o território influenciam e até qualificam o dia a dia
dos seres humanos. Como, por exemplo, a localização do indivíduo no espaço e as
características geográficas do lugar onde mora podem facilitar ou dificultar o exercício
da cidadania? Sobre essa questão, Santos (1993, p. 81) observa:
Cada homem vale pelo lugar onde está: o seu valor como produtor, consumi-
dor, cidadão, depende de sua localização no território. Seu valor vai mudando,
incessantemente, para melhor ou para pior, em função das diferenças de aces-
sibilidade (tempo, freqüência, preço), independentes de sua própria condição.
Pessoas, com as mesmas virtualidades, a mesma formação, até mesmo o mesmo
salário têm valor diferente segundo o lugar em que vivem: as oportunidades
não são as mesmas. Por isso a possibilidade de ser mais ou menos cidadão de-
pende, em larga proporção, do ponto do território onde se está. Enquanto um
lugar vem a ser condição de sua pobreza, um outro lugar poderia, no mesmo
momento histórico, facilitar o acesso àqueles bens e serviços que lhe são teori-
camente devidos, mas que, de fato, lhe faltam.
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O mesmo autor argumenta, entretanto, que “[...] o estudo da pobreza não pode o ensino de geografia
nos anos iniciais do
limitar-se à simples localização da pobreza no espaço” e nos adverte que “optar por ensino fundamental
uma ótica espacista pode levar-nos a perder de vista as verdadeiras causas da pobreza,
e impedir a compreensão das razões de sua localização e, finalmente, retirar-nos as
possibilidades de indicar caminhos alternativos” (p. 85). As injustiças identificadas no
espaço não se explicam por elas mesmas. As causas reais devem ser buscadas no pro-
cesso sócio histórico que produziu o espaço, nesse caso, sua causa real. Para Moraes
(2000, p. 31), “[...] o fato de o espaço influir no curso dos processos sociais, não sig-
nifica que tal dimensão possa determiná-los”. E acrescenta que não é o espaço, como
ser ontológico, que determina a vida humana em um determinado lugar, mas sim são
as próprias relações sociais, observáveis espacialmente, que a condicionam e que per-
mitem sua reprodução. Observemos, por exemplo, a charge a seguir:
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Geografia: Uma educação dessa natureza poderia contribuir significativamente para afrouxar
Metodologia do ensino
as amarras da ideologia hegemônica que naturaliza os processos de construção do es-
paço geográfico. Negando explicações simplistas baseadas no “senso comum” (em seu
sentido mais banal), poderia, simultaneamente, instrumentalizar uma possível ação po-
lítica que vise a uma transformação. Ultrapassando uma simples constatação e descrição
de fatos isolados, estar-se-ia, nessa circunstância, diante de uma educação das consciên-
cias de caráter prospectivo, ou seja, favorecedora de uma práxis. Ao expor as injustiças
sociais reveladas pela análise da dimensão espacial da sociedade, a Geografia ofere-
ce instrumentos valiosos para a compreensão e superação daquelas injustiças que, de
acordo com Santos (1993, p. 112), “[...] devem ser corrigidas em nome da cidadania”.
O próprio domínio da representação espacial torna-se um elemento importante
nesse processo, visto que o protagonismo na representação do lugar e do território
onde se vive e a negação de assimilar ou “engolir” representações distantes e des-
vinculadas dos próprios interesses são um fator de superação da alienação imposta
pela ideologia hegemônica que nos configura. Assumir a autoria da representação do
espaço onde se vive é um fator importante para as lutas enraizadas no lugar. Em suma,
é outro fator importante para o estabelecimento de uma “consciência geográfica”1.
Os alunos da Educação Básica ou quaisquer outros indivíduos, independentemen-
te de já terem estudado Geografia ou não, possuem uma determinada “consciência”
espacial. Nesse âmbito, o papel do geógrafo/professor, como representante do co-
nhecimento científico do espaço, não deve estar pautado na negação da consciência
subjetiva do espaço presente nos alunos ou em qualquer outra pessoa. Pelo contrário,
considerando que a teoria e as práticas geográficas podem “iluminar” a “consciência
individual”, devemos valorizá-la como ponto de partida para o desenvolvimento de
práticas pedagógicas significativas. Para além da sala de aula, o conhecimento geográ-
fico pode permitir ao indivíduo planejar ações e reações sobre o espaço com o intuito
de transformá-lo de acordo com suas necessidades ou interesses. Como afirma Moraes
(1986, p. 43):
Na medida em que se aceita que os homens agem movidos por suas consciên-
cias (sem negar toda a carga de determinações histórico-sociais presentes nessa
ação), a questão da subjetividade emerge com importância na explicação do
movimento das sociedades. A produção da história, poder-se-ia dizer, passa pe-
las formas pelas quais os homens se vêem no mundo, pelos seus valores, suas
crenças e concepções. Enfim, também pelo fluído mundo das representações.
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O fluir da história se manifesta enquanto cotidianidade para seus agentes Políticas públicas para
concretos. Por isso o fator subjetivo não pode ser desprezado. Claro que sua o ensino superior a
distância e a legislação
apreensão não se dará na ótica do subjetivismo. educacional vigente
21
Geografia: aos alunos a oportunidade de se apropriarem dos conteúdos, procedimentos e das
Metodologia do ensino
habilidades sui generis, próprios ou específicos dessa área do currículo escolar.
Podemos observar, ao examinar a literatura preocupada voltada para o ensino de
Geografia, a preocupação latente dos pesquisadores dessa área em delimitar e expli-
citar os objetivos e o papel que essa disciplina deve exercer no currículo escolar. Na
análise dessa literatura, sobretudo a mais recente, que trata do ensino de Geografia, é
comum a utilização de expressões correlatas como: “educação geográfica”, “consciên-
cia espacial”, “alfabetização espacial”, “olhar espacial”, “alfabetização geográfica”, “lei-
tura geográfica do mundo”, “raciocínio geográfico”, “pensar geográfico”, “pensamento
lógico espacial”, “imaginação geográfica”, entre outras. Ao utilizar tais expressões, seus
autores estão buscando, exatamente, concretizar a identidade e a função da disciplina
de Geografia na Educação Básica. Atentam, com muita propriedade, para a necessida-
de e importância de se considerar o domínio da dimensão espacial na organização
da vida humana e do potencial educativo, político e estratégico da Geografi a no
dia-a-dia dos alunos, dos professores e da sociedade de maneira geral. A ideia da
necessidade e relevância de uma educação geográfi ca permite, no interior de uma
lógica conceitualmente incorporadora, unir, sem o estabelecimento de hierarquias de
importância, o conteúdo geográfico e seu sentido pedagógico.
Leiamos com atenção, por exemplo, um pequeno excerto da professora Lana Souza
Cavalcanti. A autora, como poderemos observar, está preocupada em reafirmar e explicar
a importância do ensino de Geografia para a formação geral de cidadãos. Ela enuncia:
22
perspectiva crítica, a Geografia pode garantir sua legitimidade e relevância social. Em Políticas públicas para
o ensino superior a
decorrência, é possível evitar a “naturalização” da disciplina e dos temas selecionados distância e a legislação
educacional vigente
para ensinar mostrando, em cada tempo e lugar, para além de interesses corporativos,
seu valor e importância social.
A própria reflexão sociológica e histórica a respeito das disciplinas ou dos saberes
escolares coloca em evidência esse fato (FORQUIN, 1992; CHERVEL, 1990; GOOD-
SON, 1990). Ensinar e aprender, argumenta Forquin (1992, p. 44, grifo do autor)
“[...] supõe esforços, custos, sacrifícios de toda a natureza. Por isso é preciso que,
no sentido próprio da palavra, aquilo que se ensina valha a pena”. O professor deve
relacionar-se, de maneira autônoma, com os conteúdos que ministra, incluindo aí a
visão de Geografia presente no livro didático que utiliza, tendo sempre em mente a
importância do conhecimento geográfico para a formação integral e cidadã do aluno.
Nesse sentido, é importante considerar que a Geografia escolar, ou seja, aquela
ensinada na escola, não é uma mera simplificação didática da ciência que lhe serve de
referência, a Geografia acadêmica. Trata-se de um saber transformado e organizado
tendo em vista os objetivos educacionais a que se destina. Como registra Marechal
(apud PONTUSCHKA, 2001b, p. 132, grifo nosso), é importante que se considere:
[...] o saber que se torna objeto de ensino na escola não é o saber universitá-
rio simplificado, é um saber transformado, recomposto, segundo um processo
que trata de dominar ao máximo, evitando simplificações que deformam os
conhecimentos ou que provocam desvios.
É este, portanto, o grande desafio dos professores de modo geral e que queremos seja
também seu, caro leitor, ao longo desse curso que estamos iniciando: o de transformar,
considerando as características dos alunos de cada nível de ensino, os conhecimentos
científi cos selecionados pelo currículo escolar em conhecimentos a ser ensinados.
O cumprimento dessa tarefa exige que o professor adquira e mobilize uma série de
saberes com destaque, evidentemente, para o domínio dos conteúdos curriculares e
das formas mais apropriadas de, em um determinado contexto, ensinar seus alunos. A
maneira de ensinar, ou seja, seu aspecto metodológico está condicionado, como já sa-
lientamos, à natureza do conhecimento a ser ensinado. Há, assim, uma íntima conexão
entre os conteúdos de uma disciplina e os métodos que são utilizados em seu ensino.
Para que o raciocínio geográfico do aluno possa ser gradativamente desenvolvido,
é mister que o professor se aproprie dos referenciais teórico-metodológicos produzi-
dos pela ciência geográfica e que seja capaz de, em uma vertente didática e pedagó-
gica, mobilizá-los ao longo de suas aulas. A adequada mobilização desses referenciais
pelo professor propiciará ao aluno compreender a realidade e o mundo em uma pers-
pectiva geográfica.
23
Geografia: a leitUra do esPaÇo GeoGrÁfiCo: ConCeitos e ProCediMentos
Metodologia do ensino
Geradores do raCioCÍnio GeoGrÁfiCo
A leitura do espaço e a possibilidade do desenvolvimento de modos de pensar geo-
gráfi cos requerem que os alunos internalizem, por meio de um trabalho pedagógico
bem definido, os conceitos e os procedimentos estruturadores dessa forma particular
de pensar. Para além de dados e informações geográficas sobre diferentes lugares do
país e do mundo (que sem dúvida são importantes), é necessário que os alunos cons-
truam, gradativamente e a partir dos conhecimentos que já possuem (os conceitos
cotidianos), o raciocínio geográfi co. A esse respeito, lemos nos PCNs:
24
Políticas públicas para
UMA QUADRA DE FUTSAL o ensino superior a
distância e a legislação
educacional vigente
O espaço geográfico pode ser concebido por intermédio de uma metáfora.
Se observarmos uma quadra de futsal, o antigo futebol de salão, notaremos que
o arranjo do terreno reproduz as regras desse esporte. Basta aproveitarmos a
mesma quadra e nela superpormos o arranjo espacial de outras modalidades
de esporte, como o vôlei, o basquete e o handball, cada qual com “leis”
próprias, para notarmos que o arranjo espacial diferirá para cada uma. Diferirá
porque o arranjo espacial reproduz as regras do jogo, e essas regras diferem
para cada modalidade de esporte considerado. Se fossem as mesmas “leis”
para todas, o arranjo seria um só. Assim também é o espaço geográfico com
relação à sociedade.
O arranjo do espaço geográfico exprime o “modo de socialização” da
natureza. Tal o modo de produção, tal será o espaço geográfico. O processo
de socialização da natureza pelo trabalho social, ou seja, a transformação da
história natural em história dos homens (ou da história dos homens em história
natural) implica uma estrutura de relações sob determinação do social. E é
essa estrutura complexa e em perpétuo movimento dialético que conhecemos
sob a designação de espaço geográfico.
O “lugar” da Geografia nas séries iniciais está relacionado, como já discutimos an-
teriormente, à necessidade de aprender a pensar o espaço geográfico. E isso significa,
como alega Callai (2005, p. 229) “[...] criar condições para que a criança leia o espaço
vivido”. Ou seja, que compreenda, por meio do trabalho geográfico-pedagógico do
professor, a lógica da produção do espaço em que se move e vive.
É no trabalho simultâneo de conteúdos, categorias e procedimentos que o profes-
sor pode favorecer a formação, nos alunos, de maneiras geográficas de observar, de
compreender e de agir no mundo.
O trecho da obra de Callai (2010, p. 32-33), transcrito a seguir, nos permite apro-
fundar a compreensão do significado do espaço geográfico para a Geografia escolar
e, ao mesmo tempo, a importância das categorias lugar, território e paisagem no
desenvolvimento do raciocínio geográfico dos alunos das séries iniciais do Ensino
Fundamental. Tratam-se de conceitos que devem ser apropriados e mobilizados pelo
professor em seu trabalho cotidiano.
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Geografia: sua passividade, sua não ação. O espaço é o palco que serve de sustentáculo
Metodologia do ensino para as ações, mas, ao mesmo tempo, interfere, possibilitando, impedindo ou
facilitando estas ações. Quer dizer, o espaço é um território vivo. E é pela pai-
sagem que podemos fazer a leitura desse território. A paisagem é o retrato de
um determinado lugar em um tempo específico. Isto quer dizer que pode se
apresentar de formas variadas ao longo do tempo. Além disso, nossa apreen-
são pode não abarcar a visão de tudo, pois somos seletivos e, portanto, nossa
percepção da paisagem é sempre um processo seletivo de apreensão. Sendo
a paisagem o que vemos, é preciso olhar para além do visível; é importante
buscar as motivações que deram origem à forma com que se apresenta em
determinados momentos.
Em resumo pode-se dizer que a paisagem de um lugar é resultado de dados
físicos que decorrem da natureza, como a vegetação, o relevo, a hidrografia,
o clima; mas também de outros, que são os edificados: os prédios, as ruas, os
caminhos, as praças, os monumentos, os símbolos. E há também a história e
as diversas histórias particularizadas, a memória, a simbologia que expressam
os sentimentos, a cultura do lugar. Essa (cultura) é a síntese; é o que dá iden-
tidade. É preciso conhecer este lugar e, para isso, há que se considerar que
cada sujeito vai trabalhar com seu cotidiano; ali ele “conhece tudo”, sabe o que
existe e o que falta, como são as pessoas, como estão organizadas as atividades,
como é o lugar, enfim. Este é um saber do senso comum, aquele que faz parte
da rotina diária de vivência (sabe-se de ver, de ouvir, de contar etc.). Exatamente
neste ponto reside o aspecto fundamental deste tipo de trabalho – como traba-
lhar o lugar, sem considerá-lo o “único”, sem pensar que as explicações estão
todas ali e sem cair no risco de isolá-lo no espaço e no tempo (Grifos nossos).
Tudo aquilo que nós vemos, o que a nossa visão alcança, é a paisagem. Esta
pode ser definida como o domínio do visível, aquilo que a vista abarca. Não é
formada apenas de volumes, mas também de cores, movimentos, odores, sons,
etc. (SANTOS, 1988, p. 61).
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paisagens são constituídas de dois tipos de elementos ou formas: as naturais e as so- Políticas públicas para
o ensino superior a
ciais ou culturais. As formas naturais são resultado da dinâmica da própria natureza, distância e a legislação
educacional vigente
tais como as montanhas, os vales, os solos, os rios, os oceanos, etc. As formas sociais
ou culturais são resultado do trabalho humano, tais como praças, edificações, pontes,
viadutos, rodovias, etc.
Quando uma paisagem ainda não foi alterada pela ação humana, dizemos tratar-se
de uma paisagem natural. Quando já sofreu um processo de transformação, dizemos
tratar-se uma de paisagem humanizada ou cultural. Nas paisagens humanizadas, por-
tanto, temos, necessariamente, uma integração entre formas naturais e humanas.
O estudo da paisagem é, deste modo, um ponto de partida importante para a
análise e compreensão do espaço geográfico. Para além de sua materialidade, ou seja,
suas formas, a paisagem revela o conteúdo social que a produziu, inclusive com suas
contradições. É no estudo da relação existente entre as formas (a materialidade que
pode ser visualizada, observada e descrita) e seu conteúdo (a dinâmica social que a
produziu e às faz suscetível às constantes transformações) que podemos compreender
o espaço geográfico.
O estudo da paisagem não pode, portanto, restringir-se à descrição das formas – na-
turais ou culturais – visualmente observáveis na paisagem. É preciso que a análise avan-
ce considerando a dinâmica natural e social que as engendraram. No ensino de Geo-
grafia, é necessário, por conseguinte, partir da “[...] a concepção de que os espaços têm
uma forma que expressa seu conteúdo (o movimento social), de que a paisagem revela
as relações de produção da sociedade, seu imaginário social, suas crenças, seus valores,
seus sentimentos” (CAVALCANTI, 2006b, p. 39). A mediação didático-pedagógica do
professor é, nesse caso, fundamental. O esquema, abaixo representado, busca ilustrar
o que estamos mostrando e pode ser muito útil ao trabalho pedagógico do professor.
PAISAGEM
Conteúdo espacial
Movimento
espacial
Aparência
FORMA CONTEÚDO
Dinâmica
Social
Expressões de
Captada tempos diferentes Contradições
pelos sendos
Aspectos Aspectos
objevos Subjevos
FORMA CONTEÚDO
27
LUGAR
Localização
Geografia: O estudo da paisagem deve começar pela observação e descrição das formas que
Metodologia do ensino
podem visualmente ser identificadas para, em um segundo momento, analisar-se a
dinâmica social/natural que a produziu. É preciso evitar, então, que esse processo
se reduza apenas à observação e descrição; é necessário mostrar que embora nem
todos os processos sociais possam ser visualmente observados na paisagem, são
fundamentais em sua compreensão.
É essencial considerar, também, que a observação da paisagem comporta ele-
mentos objetivos e subjetivos. As diferentes percepções dos alunos sobre a mesma
paisagem devem ser consideradas pelos professores. O caminho para uma com-
preensão objetiva da paisagem, função do trabalho pedagógico do professor, não
nega a subjetividade dos alunos; ao contrário, é um importante ponto de partida.
As paisagens não são imutáveis. Elas se transformam constantemente para aten-
der às demandas da sociedade (ou de parte dela), que podem ser de ordem econô-
mica, cultural, política etc. Como os grupos ou classes que compõem uma determi-
nada sociedade, no passado, presente ou no futuro não têm os mesmos interesses,
muitas dessas transformações ocorrem a favor de alguns grupos ou classes e em
detrimento de outros/outras. A política, assim, é um aspecto relevante na evolução
e transformação das paisagens.
A título de exemplo, podemos citar a recente (2010) derrubada do prédio da
antiga estação rodoviária da cidade de Maringá, Paraná, edificada na década de 1960.
Sua demolição foi alvo de intensa discussão pública e disputa judicial que envolveu
o poder público, os concessionários das antigas lojas que lá funcionavam, os em-
preendedores imobiliários, pessoas ligadas à preservação do patrimônio histórico e
a sociedade em geral. No final, predominou o interesse do atual governo municipal
e o prédio foi demolido. Sua retirada mudou sensivelmente a paisagem do centro da
cidade. Atualmente, no lugar do antigo edifício há um estacionamento e, no futuro,
deve ser construído um edifício de grande porte. Para alguns, a ausência do prédio
provoca um sentimento de saudade, “de perda”, e para outros, uma oportunidade
de lucros baseados em empreendimentos imobiliários.
Os seres humanos são, nos dias atuais, os principais agentes da transformação
das paisagens, mas a dinâmica da natureza também produz sensíveis modificações.
Todavia, normalmente, salvo eventos de grande dimensão como terremotos, mare-
motos, atividade vulcânica, etc., as transformações provocadas pela própria natureza
são mais lentas e menos perceptíveis na paisagem.
O conceito de lugar, como podemos verificar na Figura 4, está relacionado à ideia
de local e refere-se àquelas porções do espaço com as quais temos familiaridade,
com os quais estabelecemos, em diversos níveis, uma relação de afetividade. É a
28
Aspectos Aspectos
objevos Subjevos
FORMA CONTEÚDO
porção do espaço onde se travam, portanto, nossas relações cotidianas. O lugar é, na Políticas públicas para
o ensino superior a
acepção de Carlos (1996, p. 20), “a porção do espaço apropriável para a vida”, a rua distância e a legislação
educacional vigente
onde moramos, nosso bairro, a praça de convivência e lazer, nosso quintal.
LUGAR
Localização
Processo e
relações
Orientação
Codiano
LOCAL GLOBAL
Escala
Afevidade Familiaridade
Diferenciação
Idendade
LOCAL GLOBAL
[...] o habitual da vida cotidiana mas, por outro lado, também é por onde se
concretizam relações e processos globais. O lugar produz-se na relação do
mundial com o local, que é, ao mesmo tempo a possibilidade de manifestação
do global e de realização de resistências à globalização (CAVALCANTI, 2006b,
p. 36).
29
Geografia:
Metodologia do ensino O LUGAR E OS ATOS INDIVIDUAIS
30
O território relaciona-se, também, à semelhança do conceito de lugar, à ideia de Políticas públicas para
o ensino superior a
identidade e, nesse sentido, indica a porção do espaço ao qual uma pessoa ou um distância e a legislação
educacional vigente
grupo social tem a sensação de pertencer. O território define-se, então, pela posse e
pelo sentimento de pertença a um determinado espaço.
TERRITÓRIO
Estáveis/
Poderes Instáveis
do Estado,
de grupos e Regular/
Individuais Periódicos
PODER CAMPO DE
FORÇAS
Nós IDENTIDADE
e redes
Flexíveis/
Conflitos Inflexíveis
Limites/ Sociedades Territoriais
Fronteiras Mul
culturais
Vizinhança
FORMA CONTEÚDO
IDENTIDADE
31
0 50 100 150Km
Geografia: observação, descrição, análise, síntese, explicação/levantamento de hipóteses e repre-
Metodologia do ensino
sentação. É fundamental, assim,
[...] que o professor crie e planeje situações nas quais os alunos possam conhe-
cer e utilizar esses procedimentos. A observação, descrição, experimentação,
analogia e síntese devem ser ensinadas para que os alunos possam aprender a
explicar, compreender e até mesmo representar os processos de construção do
espaço e dos diferentes tipos de paisagens e territórios. Isso não significa que
os procedimentos tenham um fim em si mesmos: observar, descrever, experi-
mentar e comparar servem para construir noções, espacializar os fenômenos,
levantar problemas e compreender as soluções propostas, enfim, para conhe-
cer e começar a operar com os procedimentos e as explicações que a Geografia
como ciência produz (BRASIL, 1998, p.115-116).
32
teXto CoMPleMentar Políticas públicas para
o ensino superior a
distância e a legislação
educacional vigente
UMA NECESSIDADE EPISTEMOLÓGICA:
A DISTINÇÃO ENTRE PAISAGEM E ESPAÇO
33
Geografia:
Metodologia do ensino
Referências
______. A Geografia e a escola: muda a Geografia? Muda o ensino? Terra Livre, São
Paulo, n. 16, p. 133-152, 2001a.
CARVALHO, M. I. Fim de século: a escola e a Geografia. 2. ed. Ijuí-RS: Ed. Unijuí, 2004.
34
CAVALCANTI, L. S. Bases teórico-metodológicas da Geografia: uma referência para a Políticas públicas para
o ensino superior a
formação e a prática de ensino. In: CAVALCANTI, L. S. (Org.). Formação de profes- distância e a legislação
educacional vigente
sores: concepções e práticas em Geografia. Goiânia: Vieira, 2006b. p. 27-49.
35
Geografia: MOREIRA, R. Repensando a Geografia. In: SANTOS, Milton. Novos rumos da Geo-
Metodologia do ensino
grafia brasileira. São Paulo: Hucitec, 1982.
MOREIRA, J. C.; SENE, E. Geografia para o ensino médio. São Paulo: Scipione, 2002.
______. Geografia, representações sociais e escola pública. Terra Livre, São Paulo,
n. 15, p. 145-154, 2000.
Proposta de Atividades
Cada homem vale pelo lugar onde está: o seu valor como produtor, consumi-
dor, cidadão, depende de sua localização no território. Seu valor vai mudando,
incessantemente, para melhor ou para pior, em função das diferenças de aces-
sibilidade (tempo, freqüência, preço), independentes de sua própria condição.
Pessoas, com as mesmas virtualidades, a mesma formação, até mesmo o mesmo
salário têm valor diferente segundo o lugar em que vivem: as oportunidades
não são as mesmas. Por isso a possibilidade de ser mais ou menos cidadão de-
pende, em larga proporção, do ponto do território onde se está. Enquanto um
lugar vem a ser condição de sua pobreza, um outro lugar poderia, no mesmo
momento histórico, facilitar o acesso àqueles bens e serviços que lhe são teori-
camente devidos, mas que, de fato, lhe faltam.
37
Geografia:
Metodologia do ensino
A RUA DIFERENTE
Na minha rua estão cortando árvores
botando trilhos
construindo casas.
Minha rua acordou mudada
os vizinhos não se conformam.
[...]
Só minha filha goza o espetáculo
e se diverte com os andaimes,
à luz da solda autógena
e o cimento escorrendo nas formas.
38
a) O que significa dizer, em linguagem geográfica, “Na minha rua estão cortando árvores Políticas públicas para
o ensino superior a
botando trilhos construindo casas”? distância e a legislação
b) Quais os conceitos geográficos que devemos mobilizar para interpretar geograficamen- educacional vigente
te o poema?
c) Por que, em contraposição à desolação dos vizinhos, a filha do poeta “goza o espetácu-
lo”? Situações como a retratada no poema são estranhas ao lugar onde você mora?
Anotações
39
Geografia:
Metodologia do ensino
Anotações
40
2 professor naoorganização
trabalho do
de práticas de educação
geográficas1
1 Este texto é uma versão adaptada de parte da tese de doutorado do autor, intitulada: O profes-
sor de Geografia e os saberes profissionais: o processo formativo e o desenvolvimento da profissionali-
dade, defendida junto à FFLCH/USP em 2010.
41
Geografia: Ao considerar, no âmbito de um projeto educativo maior, a importância de uma
Metodologia do ensino
educação geográfi ca, é mister que o professor detenha um determinado saber que lhe
permita mostrar aos alunos o contributo científico e educacional da teoria geográfica
no esforço dos seres humanos em compreender o mundo e de forjar instrumentos
para nele poder agir. Conclusivamente, a resposta para a pergunta “para que ensinar
Geografia?” deve estar suficientemente bem resolvida pelo professor.
O conteúdo seria, assim, um meio e não um fim, uma lente para fornecer aos
alunos a possibilidade de, por meio dos conceitos-chave (espaço, natureza, sociedade,
paisagem, lugar, território, região) e procedimentos (localização, observação, registro,
descrição, análise, síntese etc.) trabalhados pela Geografia, realizar uma leitura crítica
do mundo e nele poder atuar com autonomia. É muito oportuna e ilustrativa a refle-
xão de Saviani (2007, p. 62):
[...] um geógrafo, uma vez que tem por objetivo o esclarecimento do fenômeno
geográfico, encara a Geografia como um fim. Para o professor de Geografia,
entretanto, o objetivo é outro: é a promoção do homem, no caso, o aluno. A
Geografia é apenas um meio para chegar àquele objetivo. Desta forma, o con-
teúdo será selecionado e organizado de modo a atingir o resultado pretendido.
Isto explica porque nem sempre o melhor professor de Geografia é o geógrafo,
o que pode ser generalizado nos seguintes termos: nem sempre o melhor pro-
fessor de determinada ciência é o cientista respectivo.
Pedimos desculpas pela obviedade da afirmação: para que o aluno possa exercitar
o raciocínio espacial e alcançar, gradativamente, certa consciência espacial – uma edu-
cação geográfi ca –, é necessário que, primeiro, esse processo ocorra no professor, ou
seja, é preciso que o professor disponha dos meios para realizá-la. É forçoso que, para
além do conteúdo em si mesmo, o professor domine um conhecimento geográfi co
para ensinar. Vislumbramos, aqui, o saber especial ou distintivo da atividade profissio-
nal docente: o domínio de um conhecimento transformado e “preparado” para ser en-
sinado. Logo, como observa Marechal (apud PONTUSCHKA, 2001b, p. 132), é preciso:
42
processo formativo. São esses alicerces – as categorias de base da Geografia – que
TERRITÓRIO o trabalho do
professor na organização
propiciam o desenvolvimento do raciocínio geográfico e não o simples acesso aos
Estáveis/ de práticas de educação
Poderes Instáveis geográficas
noticiários ou aos resultados das últimas pesquisas da academia.Regular/
do Estado,
de grupos e
Individuais Periódicos
Qual seria, então, a função do professor durante as aulas de Geografia? Poderíamos
dizer, em uma breve formulação, que sua função mais específiCAMPO ca é, considerando
DE
o
PODER
nível de desenvolvimento cognitivo de seus alunos, organizar práticas FORÇAS de educação
que possibilitem ao educando
geográfi case redes
Nós IDENTIDADE
desenvolver raciocínios geográfi cos visan-
do à construção de uma determinada consciência geográfi ca. Busca-se,
Conflitos
Flexíveis/mais ampla-
Inflexíveis
Limites/ Sociedades Territoriais
mente, contribuir para o desenvolvimento
Fronteiras do pensamento autônomo do educando e
Mul
culturais
Conhecimento
disciplinar Conhecimento
geográfico e pedagógico
disciplinas geral
afins
Conhecimento
do contexto da
ação educa
va
43
Geografia: O conhecimento pedagógico geral envolve os conhecimentos produzidos pelas
Metodologia do ensino
ciências da educação, fundamentos e valores éticos da educação que transcendem o
domínio de um campo disciplinar, adquiridos, semelhantemente ao conhecimento
disciplinar, pelo contato e exame crítico com a/da literatura especializada.
O conhecimento do contexto da ação educativa reporta-se ao conhecimento das
características dos alunos e do contexto sociogeográfico em que desenvolve seu trabalho:
comunidade escolar, bairro, cidade, estado, país – de suas vivências e experiências geográ-
ficas – em sua necessária interdependência com o espaço global. É adquirido pelo contato
com a literatura especializada e pelo exame do contexto onde realiza seu trabalho.
O conhecimento pedagógico geográfi co (CPG) é uma criação dos próprios profes-
sores no âmbito de sua prática profissional (SHULMAN, 2005a; 2005b; LOPES, 2010;
LOPES; PONTUSCHKA, 2011). A elaboração e o desenvolvimento do CPG se realizam
por meio de um processo complexo, que consiste na qualifi cação do conhecimento
geográfico e de ciências afins que o professor possui. É esse domínio qualifi cado do
conhecimento geográfico – um conhecimento preparado para o ensino – que podería-
mos definir como o conhecimento profi ssional de excelência do professor.
O CPG é um tipo saber que é configurado e reconfigurado na experiência profis-
sional, porquanto sua elaboração leva em conta, necessariamente, as características
daqueles que estão aprendendo, bem como as condições particulares da escola e dos
alunos que a frequentam. Trata-se de um tipo de
44
distintivo do ofício docente: a capacidade, sempre em contínuo processo de desenvol- o trabalho do
professor na organização
vimento, de tornar acessível a todos os alunos o conhecimento geográfico historica- de práticas de educação
geográficas
mente acumulado pela sociedade humana.
Referências
45
Geografia:
Metodologia do ensino
Proposta de Atividades
46
3 As propostas
curriculares oficiais
para o ensino da geografia
nas séries/anos iniciais
Cleres do Nascimento Mansano
Nos anos de 1980, instaura-se no Brasil um novo período político, ou seja, o retor-
no da democracia, e no campo educacional, iniciam-se discussões sobre novas práticas
pedagógicas. Em especial no ensino de Geografia, ocorre a discussão sobre o conteú-
do e a forma de ensino escolar, pois a prática pedagógica geográfica realizada de forma
tradicional de memorização não satisfazia as necessidades educacionais e os anseios
da sociedade. Era necessária uma Geografia que desse conta não só da observação,
descrição e nomenclaturas, mas também crítica, que buscasse soluções e que fosse ao
encontro das situações-problemas vivenciadas na atualidade.
No contexto da redemocratização do país, a Constituição Federal (BRASIL, 1988)
abre espaço para que as reflexões relativas à educação saíssem do papel e se tornassem
aplicáveis. Já nos anos de 1990, no Brasil, apresentam-se novas propostas pedagógicas
oficiais, como a Lei 9.394/96 (BRASIL, 1996) e os Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCNs). No campo educacional do Paraná, é elaborado o Currículo Básico para as Es-
colas Públicas do Estado do Paraná em 1990 e no ano de 2006 o Estado apresenta seu
novo documento, as Diretrizes Curriculares da Educação Básica do Paraná (DCEs), o
qual foi reformulado em 2008.
47
Geografia: questões sociais relativas à Ética, Saúde, Orientação Sexual, Meio Ambiente, Trabalho
Metodologia do ensino
e Consumo e Pluralidade Cultural. O 5º volume corresponde à História e Geografia, e
sua capa é reproduzida abaixo.
A coleção contempla as ciências escolares e contém um parâmetro para o ensino,
ou seja, não é uma camisa de força, a qual o professor é obrigado a nortear toda sua
ação docente, mas são caminhos que auxiliam as práticas pedagógicas, oferecendo
“instrumentos essenciais para a compreensão e intervenção na realidade social” (BRA-
SIL, 1997, p. 99). Seu objetivo principal é auxiliar os professores na execução de seus
trabalhos pedagógicos, servindo de estímulo e apoio à reflexão sobre a prática diária,
ao planejamento de aulas e, sobretudo, ao desenvolvimento do currículo da escola,
contribuindo ainda para a atualização profissional.
Segundo os PCNs, o papel da escola deve levar em consideração a realidade dos
alunos, ou seja, compreender o meio em que eles vivem. Desta forma, a escola cria
condições que garantam a todos o desenvolvimento de capacidades e a aprendiza-
gem de conteúdos necessários à vida em sociedade, oferecendo instrumentos de com-
preensão da realidade e também favorecendo a participação dos alunos em relações
sociais e políticas diversificadas e cada vez mais amplas.
Nesse sentido, os PCNs trouxeram mudança de enfoque em relação aos conteúdos
curriculares, pois o conteúdo é visto como meio para os alunos desenvolverem capaci-
dades que lhes permitam produzir e usufruir os bens culturais, sociais e econômicos.
Quanto os objetivos gerais de Geografia propostos para os ciclos inicias, os PCNs
(BRASIL, 1997, p. 121) ressaltam que: “Espera-se que, ao longo dos oito anos do en-
sino fundamental, os alunos construam um conjunto de conhecimentos referentes a
conceitos, procedimentos e atitudes relacionados à Geografia [...]”.
Vejamos no quadro a seguir o resumo dos objetivos do Ensino de Geografia, ou
seja, o que o aluno, ao final dos ciclos iniciais do Ensino Fundamental, deve ser capaz:
48
as propostas
PCNS E OS OBJETIVOS PARA O ENSINO DE GEOGRAFIA curriculares oficiais
para o ensino da
geografia nas séries/anos
Objetivos de Geografia para o Primeiro Ci- Objetivos de Geografia para o Segundo Ci- iniciais
clo: clo:
• reconhecer, na paisagem local e no lugar • reconhecer e comparar o papel da socie-
em que se encontram inseridos [...]; dade e da natureza na construção de dife-
rentes paisagens urbanas e rurais brasilei-
• conhecer e comparar a presença da na-
ras;
tureza, expressa na paisagem local [...];
• reconhecer semelhanças e diferenças
• reconhecer semelhanças e diferenças nos
entre os modos de vida das cidades e do
modos que diferentes grupos sociais se ap-
campo [...];
ropriam da natureza e a transformam [...];
• reconhecer, no lugar no qual se encontram
• conhecer e começar a utilizar fontes de
inseridos, as relações existentes entre o
informação escritas e imagéticas utilizando,
mundo urbano e o mundo rural [...];
para tanto, alguns procedimentos básicos;
• conhecer e compreender algumas das
• saber utilizar a observação e a descrição
conseqüências das transformações da na-
na leitura direta ou indireta da paisagem [...];
tureza causadas pelas ações humanas [...];
• reconhecer, no seu cotidiano, os referen-
• reconhecer o papel das tecnologias, da
ciais espaciais de localização, orientação e
informação, da comunicação e dos trans-
distância [...];
portes na configuração de paisagens urba-
• reconhecer a importância de uma atitude nas e rurais e na estruturação da vida em
responsável de cuidado com o meio em que sociedade;
vivem [...].
• saber utilizar os procedimentos básicos de
observação, descrição, registro, compara-
ção, análise e síntese [...];
• utilizar a linguagem cartográfica para rep-
resentar e interpretar informações [...];
• valorizar o uso refletido da técnica e da
tecnologia em prol da preservação e con-
servação do meio ambiente [...];
• adotar uma atitude responsável em rela-
ção ao meio ambiente [...];
• conhecer e valorizar os modos de vida de
diferentes grupos sociais [...].
49
Geografia: Seria impossível esgotar as relações existentes entre as ciências; contudo, vislum-
Metodologia do ensino
bramos a possibilidade de lançar um novo olhar sobre as nossas práticas pedagógicas,
descobrindo e sendo capazes de proporcionar novos encontros entre as áreas do co-
nhecimento. Fazenda (2001, p. 24-25) assevera que a interdisciplinaridade ultrapassa
a fragmentação do conhecimento produzido no mundo dos humanos:
Referências
50
PARANÁ. Currículo Básico para a Escola Pública do Estado do Paraná. Curitiba: as propostas
curriculares oficiais
SEED, 1990. para o ensino da
geografia nas séries/anos
iniciais
Proposta de Atividades
1) Com base na análise dos documentos oficiais, reproduza e preencha o quadro-síntese com-
parativo dos PCNs, CBEP-PR, Documento Oficial do seu Município e DCEs-PR de acordo
com o que se pede:
DOCUMENTO Encaminhamentos
Objetivos Conteúdos Avaliação
OFICIAL metodológicos
1º Ciclo
PCNs
2º Ciclo
1ª série
2ª série
CBPR
(1990)
3ª série
4ª série
1ª série
2ª série
Documento
Municipal
3ª série
4ª série
DCEs - PR (2008).
51
Geografia:
Metodologia do ensino
Anotações
52
4 Representações:
a linguagem
cartográfica
Cleres do Nascimento Mansano
53
Geografia: leitUra da ProdUÇÃo CartoGrÁfiCa
Metodologia do ensino
Assim, torna-se necessário que as crianças experienciem o espaço vivido, o que pos-
sibilita a apreensão e posteriormente a representação. Os trabalhos da linguagem
cartográfica devem ir ao encontro dos interesses que fazem sentido para as crianças,
pois muitas vezes para elas o concreto pode fazer menos sentido do que o abstrato.
Souza e Katuta (2001, p. 133) assinalam que na interpretação da linguagem es-
tão inseridos elementos que ajudam a compreender a realidade de forma clarifica-
da. Contudo, os autores enfatizam que a leitura dos mapas é um processo muito
complexo:
Ser leitor de mapas significa, a nosso ver, que o sujeito é capaz de ler esse ma-
terial tal como um texto escrito. Em outras palavras, significa que o leitor de
mapas deve extrair significados do texto cartográficos que está representado.
Por isso, não se pode chamar de leitura de mapas o ato de decodificar o que
está representado no mapa por meio de legenda. A leitura de mapas é um
processo muito complexo, implica decodificação de símbolos e elaboração
de significados a partir de representações que foram previamente elaboradas.
54
Conhecimento
disciplinar Conhecimento
geográfico e pedagógico
disciplinas geral
afins
a esCala CartoGrÁfiCa representações:
a linguagem
tipos de escala cartográfica
0 50 100 150Km
Para representar um grande espaço real (ma- Para representar um espaço real menor
pear), como o planeta Terra, utiliza-se uma pe- (mapear), como uma cidade, utiliza-se uma
quena escala, ou seja, o tamanho dos objetos grande escala (maior do que a utilizada para
representados é pequeno e com poucos deta- representar a Terra), ou seja, o tamanho dos
lhes, pois ao contrário, seria impossível sua re- objetos representados serão maiores e com
presentação no papel. mais detalhes.
Escala pequena: representa poucos detalhes. Escala grande: representa muitos detalhes.
Ex.: 1: 500.000.000 Ex.: 1: 5.000
55
Geografia: CoMo transforMar esCalas?
Metodologia do ensino
escalas gráficas em numéricas:
Devemos pegar o valor do km, multiplicar por 1000 e teremos os metros; multipli-
cando mais uma vez por 100, teremos o valor em cm. Devemos colocar o resultado em
centímetros após “1:” (um por) e teremos uma escala numérica.
Outro exemplo, se em um mapa de escala gráfica cada centímetro no mapa
(papel) equivale a 1.000 km na realidade; utilizando o quadro das medidas de compri-
mento, podemos realizar convergência da escala gráfica para a escala numérica.
Km Hm Dam M DM Cm Mm
° ° ° ° ° ° °
Km Hm Dam M DM Cm Mm
56
EM SALA DE AULA representações:
a linguagem
atividade 1 – o desenho cartográfica
Por meio do suporte da linguagem pré-verbal do desenho é possível representar as infor-
mações do espaço e a percepção da criança em relação ao meio vivido. Nos primeiros passos
da alfabetização cartográfica incentiva-se o aluno ao desenho espontâneo e posteriormente à
representação do que entendem por paisagem (Figura 3). Posteriormente, podemos incluir
orientações relativas ao desenho da família, da escola e assim por diante.
Com crianças maiores, podemos realizar a brincadeira da “câmera fotográfica”, que pos-
sibilita a percepção de que os objetos podem ser representados, consistindo na produção de
croqui, que é uma representação do espaço real, mas sem a necessidade de rigor cartográfico.
A atividade foi adaptada de Leme (2003, p. 21-28), que apresenta o método idealizado por
Joseph Cornell (1996 e 1997), chamado de “Aprendizagem Sequencial”.
atividade 2 - a fotografia
Oliveira (1996, p. 190), analisando Bunge (1966), enuncia que como recurso para
a representação do espaço real existem os mapas, os pré-mapas, e nessa categoria,
58
lateralidade e a orientação cartográfica; em um primeiro momento, anotar se o representações:
a linguagem
local está à direita ou à esquerda/frente ou atrás. Posteriormente, avança-se para cartográfica
O professor com esses elementos para debates, poderá inserir o aluno na dis-
cussão espacial, levando em conta a importância que tem o conhecimento local
do espaço para o entendimento deste com o todo. É valorizado as experiências
de vida do cidadão-aluno com o espaço [...] Os mapas mentais servem como
estratégia para os professores perceberem como os alunos estão representando
o seu mundo.
59
Geografia:
Metodologia do ensino FUNÇÕES DOS MAPAS MENTAIS:
60
educação geográfica, que é o de propiciar ao aluno produzir conhecimento a partir representações:
a linguagem
da sua realidade, construindo, decodificando e percebendo o espaço a partir de vários cartográfica
instrumentos.
Nos mapas mentais, deve ser considerada a totalidade das informações registradas
e definidos parâmetros como:
61
Geografia:
Metodologia do ensino
Referências
OLIVEIRA, Lívia de. Percepção e representação do espaço geográfico. In: DEL RIO,
Vicente; OLIVEIRA, Lívia de. Percepção ambiental: a experiência brasileira. São
Paulo: Ed. da UFSCar, 1996. p. 187–212.
62
PASSINI, E. Y. Alfabetização cartográfica e o livro didático: uma análise crítica. representações:
a linguagem
Belo Horizonte: Editora Lê, 1994. cartográfica
63
Geografia:
Metodologia do ensino
Proposta de Atividades
1) Agora, vamos brincar de câmera fotográfica? Nos quadros abaixo, faça a representação da
paisagem bonita e feia do bairro em que mora:
64
5 Livro didático de
geografia: análise e
avaliação
Cleres do Nascimento Mansano
65
Geografia: O ensino geográfico tem sido trabalhado na maioria das vezes tendo o livro didá-
Metodologia do ensino
tico como um manual seguido à risca. Mesmo criticado pelos próprios professores,
estes utilizam o material como um recurso inquestionável, uma vez que nem sempre
dispõem de tempo para preparar aulas e desenvolver pesquisas. Sendo assim, mui-
tas vezes trabalham conteúdos sem sentido, que não proporcionam a construção do
conhecimento geográfico.
Não podemos negar o papel do livro didático na preparação das aulas, mas da
forma como é utilizado não oferece oportunidades para o professor ampliar a sua
visão e tampouco o aluno desenvolver uma aprendizagem significativa. Deste modo,
a maneira de utilização e a escolha do livro didático são aspectos importantes na
alfabetização geográfica.
66
Quanto ao espaço e sua territorialidade, Passini (1994) verificou a necessida- livro didático de
geografia: análise e
de de haver a “noção de continuidade e da dinâmica do espaço geográfico”, consi- avaliação
Salientamos que quem deve fazer a escolha e a avaliação do livro didático é o pró-
prio professor.
Observemos a figura abaixo, que representa os elementos envolvidos na escolha
do livro didático:
67
Geografia:
Metodologia do ensino
A Figura 1 expressa o ciclo que envolve a escolha do livro didático, e como pode-
mos observar, a escolha não é tão simples, porque envolve a prática pedagógica e a
realidade da escola e o aluno.
Se o aluno é o objetivo da existência da escola e do professor, deve ser levado em
conta, primeiramente, para quem o livro será destinado; ou seja, o professor, ao
fazer a escolha do livro didático, principalmente na escola pública, deve considerar
que este é um material de apoio de suas aulas para seus alunos, tanto em sala de aula
quanto em casa. Dessa maneira, é preciso entender a realidade do alunado, bem como
a concepção pedagógica adotada pela escola.
Quanto à preocupação metodológica com relação à alfabetização cartográ-
fica, as atividades propostas são extremamente importantes no processo. O quadro
abaixo sintetiza a análise e a classificação das atividades encontradas nos livros didáti-
cos conforme a pesquisa de Passini (1994).
Referências
MALYSZ, Sandra T. Estudo do meio. In: PASSINI, Elza Y.; PASSINI Romão; MALYSZ,
Sandra T. Prática de ensino de Geografia e estágio supervisionado. São Paulo:
Contexto, 2007. p. 171-177.
68
PASSINI, E. Y. Alfabetização cartográfica e o livro didático: uma análise crítica. livro didático de
geografia: análise e
Belo Horizonte: Editora Lê, 1994. avaliação
Proposta de Atividades
1) Nos itens a seguir, avalie a coleção de livro didático escolhida segundo os parâmetros do
edital do PNLD 2010. Marque com X, sendo que: N corresponde a Não; SS corresponde a
Sim, Satisfatoriamente; e SP corresponde à Sim, Plenamente:
AVALIAÇÃO N SS SP
69
Geografia:
13. Oferece propostas de atividades individuais ou em grupo, que propi-
Metodologia do ensino
ciem a leitura do espaço geográfico e os estudos do meio?
2) Com base na análise realizada, faça uma análise crítica, realçando as qualidades e limitações
da obra, os aspectos positivos (pontos altos) e os negativos (vulnerabilidades/ problemas):
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Anotações
70
6 os estudos do meio:
uma estratégia
metodológica para
o ensino de geografia
71
Geografia: intervenção do homem na natureza, e a Geografia tem um papel importantíssimo para
Metodologia do ensino
a compreensão dessa transformação. É relevante salientar que, assim como a reorga-
nização do espaço pelo trabalho do homem e a sua comunicação com o meio exigem
uma relação de aprendizagem e vivência, a forma como ele o interpreta envolve uma
relação de aprendizagem. Nas palavras do autor, “O processo de trabalho exige um
aprendizado prévio, o homem necessita aprender a natureza a fim de poder apreendê-
-la” (SANTOS, 1988, p. 88).
Sabemos que é na formação inicial das crianças que são construídas as principais
noções de espaço e, consequentemente, a leitura do lugar e a construção de conceitos
geográficos, que é um subsídio imprescindível para a prática da cidadania, tornando-
-se primordial nesse processo. Assim, o papel da ciência geográfica e da Geografia
enquanto disciplina escolar também é o de alfabetizar o homem em todos os sentidos.
É possibilitar a leitura do mundo, de seus lugares e paisagens e das ações do próprio
homem, sendo que os estudos do meio configuram-se como um recurso que aprimora
o olhar geográfico do aluno. Lopes e Pontuschka (2010, p. 9) alegam que “O Estudo
do Meio pode ser compreendido como um método de ensino interdisciplinar que visa
proporcionar para alunos e professores o contato direto com determinada realidade,
um meio qualquer, rural ou urbano, que se decida estudar”.
Segundo Malysz (2007, p. 172), “O estudo do meio propicia o contato direto do
educando do educando com o objeto do conhecimento, facilitando o resgate do conhe-
cimento prévio e da transposição didática para o conhecimento cientifico”. Assim, possi-
bilita um olhar geográfico nas relações dos seres humanos com a sociedade e natureza.
72
O laboratório de pesquisa para o ensino também é amplo, depende somente da os estudos do meio:
uma estratégia
percepção que o professor apresenta, porque “O meio é a sala de aula, o pátio da metodológica para
o ensino de geografia
escola, o refeitório, o corredor, a rua do colégio, a casa do aluno, o bairro, a cidade, o
município, o parque florestal, o fundo de vale etc.” (MALYSZ, 2007, p. 172). A mesma
autora também chama a atenção para a desfragmentação que ocorre com a utilização
desse recurso didático, visto que o professor tem que planejar suas aulas de acordo
com a realidade e conseguir fazer um ensino interativo e não estático, como o que é
realizado somente por meio do livro didático.
Ressaltamos que os estudos do meio compõem-se de etapas que devem ser res-
peitadas. Para que ocorra a construção do conhecimento, é preciso que o professor
planeje adequadamente a sua aula a fim de possibilitar a aprendizagem do educando,
seguindo essas etapas: planejamento, a aula de campo e o retorno para a sala de aula
(FANTIN; TAUSCHECK, 2005, p. 380).
aula de Campo
É imprescindível que a escola possibilite aos alunos a apropriação das múltiplas lin-
guagens que facilitarão seu diálogo com o mundo, pois no processo do ensino/apren-
dizagem geográfico é necessário mais do que informações e conceitos, à medida que
a construção do conhecimento vai se desenvolvendo ao longo da vida escolar. Assim,
tanto o conteúdo quanto a forma devem ser sistematizados para garantir a construção
do conhecimento geográfico.
Na relação que existe entre a forma e a aprendizagem, os recursos didáticos ade-
quados servem para viabilizar melhorias qualitativas educacionais. Vale a pena pontuar
que “os recursos didáticos deverão ser provenientes do conhecimento” (LIMA, 2007,
p. 93). E os estudos do meio, especialmente os locais, possibilitam ao aluno com-
preender o seu espaço geográfico, se verem como parte e como agentes transforma-
dores da paisagem e da construção do conhecimento.
Quanto ao conhecimento geográfico, citamos autoras que assinalam que: “Quere-
mos chamar a atenção para a ideia de que, na Geografia, o ‘estudo do local’, do en-
torno pode ter relevância na construção/formação de conceitos geográficos (FANTIN;
TAUSCHECK, 2005, p. 380). Nessa acepção, a terminologia utilizada para os estudos
do meio diferem dependendo das concepções; a História, por exemplo, utiliza o ter-
mo “guia de percurso”, e a escola pode e deve contribuir para que o aluno amplie sua
visão de mundo e perceba com clareza as relações desenvolvidas em seu meio.
O trabalho de campo é um exemplo de atividade que desenvolve a capacidade de
raciocínio geográfico, como a observação e a descrição da paisagem, e leva a pensar
criticamente a realidade na qual os alunos estão inseridos.
73
Geografia: A Geografia possui estreita relação com a observação da realidade, e o trabalho de
Metodologia do ensino
campo está relacionado com o local, desenvolvendo a observação direta com o espaço
vivenciado e possibilitando a relação entre os conceitos teóricos. Sabemos que o espa-
ço geográfico apresenta marcas peculiares, e torna-se necessário, então, compreender
todo o processo da transformação para entender a disposição atual.
No documento Paraná (2006, p. 46), consta que “a aula de campo é um rico encami-
nhamento metodológico”, mas que deve ser realizada com um planejamento adequado.
Desta maneira, julgamos que as aulas de campo servem como experiência prática
do conhecimento geográfico, tornando mais rica a aula em que os alunos podem in-
teragir com o conhecimento. Lembramos que existem várias formas de aprendizagem,
entre elas a visual, a auditiva e a sinestésica.
74
Esses projetos foram idealizados diante do contexto educacional da atualidade, em os estudos do meio:
uma estratégia
que mudanças começam a solicitar a reestruturação de todo o sistema de aprendiza- metodológica para
o ensino de geografia
gem, exigindo novas performances não só do aluno, mas também do professor, que
deve mudar suas práticas pedagógicas de maneira que o aluno possa construir sua
aprendizagem integrando as várias áreas do conhecimento.
REFLETINDO
A escola tem o papel de encaminhar as questões ambientais, produzindo conheci-
mento que leve o aluno a perceber o significado dos objetos que o cercam. Para tanto,
é necessário que esteja conectada com a sociedade e consciente de seus desafios. É im-
portante que a escola assuma esse papel, porque a formação de um cidadão consciente
passa a significar a afirmação da possibilidade de exercício da cidadania democrática,
condição indispensável para a inserção social do indivíduo.
Considerando que em todas as novas propostas sobre a educação é preciso levar
em conta que a aprendizagem deve promover situações em que os alunos possam
construir seu conhecimento de forma que tenha sentido para suas vidas, entendemos
que uma das maneiras de se buscar esse novo diálogo da escola com o mundo é de-
senvolver projetos educacionais que envolvam os temas contemporâneos, objetivando
ainda que tais projetos possam ser trabalhados de maneira lúdica, prazerosa, crítica,
criativa e interdisciplinar.
Ressaltamos, ainda, que os estudos do meio podem representar um dos instrumen-
tos indispensáveis para a apreensão das relações entre o ser humano e a natureza no
ensino formal.
Proposta de Atividades
75
Geografia: 4 - Cronograma geral
Metodologia do ensino
5 - Resultados esperados
6 - Referências
Referências
MALYSZ, Sandra T. Estudo do meio. In: PASSINI, Elza Y.; PASSINI Romão; MALYSZ,
Sandra T. Prática de ensino de Geografia e estágio supervisionado. São Paulo:
Contexto, 2007. 224p.
76
SANSOLO, Davis G.; CAVALHEIRO, Felisberto. Geografia e Educação ambiental. In: os estudos do meio:
uma estratégia
SANTOS, José E. dos; SATO Michele. A contribuição da Educação ambiental à metodológica para
o ensino de geografia
esperança de pandora. São Carlos: RIMA, 2001. p. 109-131.
Anotações
77
Geografia:
Metodologia do ensino
Anotações
78
7 Escalas geográficas:
algumas considerações
Na Geografia, para que haja análise do fenômeno, deve ser esclarecida a escala
geográfica adotada, tanto a espacial como a temporal, ou seja, é impossível analisar um
fenômeno geográfico sem considerar o tempo e a extensão espacial, fatores primor-
diais na manifestação do fenômeno e em sua interpretação.
Marques e Galo (2008, 2009) preconizam que o conceito de escala é abrangente, e
como não há consenso sobre o conceito de escala geográfica ou escala útil para análise
do fenômeno geográfico, muitas vezes a escala geográfica acaba sendo confundida
com escala cartográfica.
É necessário fazer distinção entre a escala cartográfica, que é fração matemática e se
refere à codificação e decodificação, leitura das produções cartográficas, sendo inver-
samente proporcional, ou seja, representação de uma área pequena, correspondendo
a uma grande escala e vice-versa. Já escala geográfica é diretamente proporcional, ou
seja, um fenômeno que ocorre em uma área de extensão pequena, como a problemá-
tica de um bairro, correspondendo a uma escala geográfica pequena. Para a análise
geográfica, as duas escalas são necessárias, mas a categoria de análise baseada na escala
geográfica corresponde à área real de abrangência do fenômeno, enquanto que a esca-
la cartográfica corresponde à representação da área real.
Para deixar clara a distinção de escala geográfica e cartográfica, Marques e Galo
(2008, 2009) citam o exemplo de Castro (1996), que explica que um fenômeno geo-
gráfico como uma voçoroca não pode ser analisado como de grande escala, pois em
relação ao espaço físico acontece em uma pequena porção da Terra, enquanto que o
afastamento das placas tectônicas é um fenômeno geográfico que acontece em uma
grande porção da Terra. Assim, a representação da voçoroca na cartografia é de grande
escala, mas na geográfica é de pequena escala.
o reCorte teMPoral/esPaCial
As transformações ocorrem no planeta desde a sua formação, independentemen-
te da ação humana, e muitas dessas transformações levaram bilhões de ocorrência e
79
Geografia: continuam em atividade, considerando que o planeta é vivo. Analisar o tempo geo-
Metodologia do ensino
lógico também faz parte da educação geográfica, porque esses fenômenos também
interferem na vida das pessoas.
Alguns fenômenos ocorrem em uma escala geográfica e temporal pequena, como
um tsunami, mas não devemos esquecer que as multirrelações existentes entre os
recortes espaciais acabam por influenciar outros lugares.
Quanto à questão das transformações do espaço geográfico, os seres humanos
constroem seu meio a partir das múltiplas relações e só se torna geográfico pelo olhar
geográfico lançado pelo indivíduo sobre o objeto. Santos (1988, p. 61) informa que o
estudo do espaço é um tema intrínseco às diversas áreas do conhecimento. Segundo
o autor, há muito tempo diversos profissionais analisam o espaço como um produto e
processo histórico. Contudo, Santos (1988, p.61) acredita que:
Assim, devemos pensar que não existe espaço sem tempo nem tempo sem es-
paço. O espaço geográfico atual é o espaço onde a vida humana tem um papel
fundamental e onde os seres humanos se relacionam; por isso torna-se necessário
percebê-lo e interpretá-lo com a finalidade de melhor compreender as relações que
nele se desenvolvem.
80
GloBaliZaÇÃo escalas geográficas:
algumas considerações
Na contemporaneidade do mundo globalizado, a educação geográfica deve ser
realizada por meio da complexidade das relações existentes entre os espaços e os
agentes transformadores do espaço. Nesse contexto, a análise da escala geográfica e
as relações existentes ganha relevância em razão das multirrelações existentes, uma
vez que um fenômeno localizado em determinado espaço apresenta interferências e
consequências de/em outros espaços devido à relação do poder da natureza ou ins-
titucional existente. Santos (1988, p. 61), analisando S. Amin (1980), postula que a
globalização da sociedade e da economia gera a mundialização do espaço geográfico
e carrega um novo significado, acrescentando que “Na evolução da sociedade, cada
um de seus componentes tem um papel diferente no movimento da totalidade, e o
papel de cada uma é diferente a cada momento”.
Assim, a globalização é uma nova forma de análise da Geografia e sem ela não é
possível realizar um olhar geográfico. A análise de qualquer recorte espacial não
pode ser realizada desconsiderando a hierarquia espacial, seja de forma linear ou
não. Os recortes espaciais são complementares e interligados e fazem parte de um
mesmo processo de integração, porque “O mundo é hoje globalizado em todas as
dimensões espaciais, sejam elas o bairro ou o país, o local e o global se encontram
numa íntima relação de proximidade” (STTRAFORINI, 2001, p. 56).
Os fenômenos geográficos apresentam localização espacial e temporal, multirre-
lações entre lugares e escalas (geográficas e/ou cartográficas), ou seja, geograficida-
de, que pode ser definida como:
81
Geografia: [...] é por meio do diálogo entre as geograficiades ou as maneiras como os fe-
Metodologia do ensino nômenos se organizam espacialmente, em diferentes escalas (local, estadual,
regional, nacional, planetária, entre outras), que os estudantes podem me-
lhor compreender as determinações dos mesmos, tornando-se desta maneira,
capazes de influenciar na produção de lugares mais democráticos (KATUTA,
2009, p. 16).
82
CorrelaÇÃo do esPaÇo e teMPo escalas geográficas:
algumas considerações
Para a prática pedagógica no ensino de Geografia, propomos que o professor
trabalhe com seus alunos no sentido de:
• Observar o entorno, identificando a relação dos fenômenos locais com os
globais e a relação do tempo nas transformações do espaço geográfico;
• Localizar os fenômenos tendo como referência a sua espacialidade e a ana-
logia com outros locais, bem como localizar o tempo de ocorrência do
fenômeno;
• Desenvolver habilidades e noções de localização e orientação;
• Codificar e decodificar mapas a fim de sistematizar a localização e a orien-
tação dos fenômenos, assim como para compreender a diferença de escala
cartográfica e geográfica;
• Correlacionar as informações sobre localização e orientação dos fenômenos
em diferentes escalas temporais e espaciais;
• Compreender como as expressões espaciais locais articulam-se com os arran-
jos espaciais pretéritos e globais.
refletindo
Entender as escalas de espaço e tempo e correlacionar as multirrelações que
envolvem esses conceitos é primordial na compreensão do conceito-chave da Geo-
grafia, que é o espaço geográfico, pois é nele que se realizam as manifestações da
natureza e as atividades humanas. Por isso, compreender a organização e as transfor-
mações sofridas por esse espaço é imprescindível para a educação geográfica.
Deste modo, à Geografia escolar cabe fornecer subsídios que permitam aos edu-
candos compreenderem a realidade que os cerca em sua dimensão espacial, em sua
complexidade e em sua velocidade, e o espaço deve ser entendido como o produto
das relações reais que a sociedade estabelece entre si e com a natureza.
Assim, a escolha da escala geográfica, a localização temporal, bem como sua in-
terpretação e correlação é parte da análise geográfica e da apreensão da própria
realidade.
Proposta de Atividades
1) Com base na figura a seguir, faça uma análise da escala geográfica do fenômeno e correla-
cione com as diferentes escalas geográficas:
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Geografia:
Metodologia do ensino
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Referências
CASTRO, Iná Elias de. O problema da escala. In: CASTRO, I. E. et al. (Org.).
Geografia: conceitos e temas. São Paulo: Bertrand, 1995.
CASTRO, I.; GOMES, P. C. C.; CORRÊA R. L. (Org.). Geografia: conceitos e temas. Rio
de Janeiro: Bertrand do Brasil, 1996.
84
MARQUES A. J.; GALO M. L. B. T. Escala geográfica e escala cartográfica: distinção escalas geográficas:
algumas considerações
necessária. Boletim de Geografia, Maringá, v. 26/27, n. 1, p. 44-55, 2008/2009.
RACINE, J. B.; RAFFESTIN, C.; RUFFY, V. Escala e ação: contribuições para uma
interpretação de mecanismo de escala prática da Geografia. Revista Brasileira de
Geografia, Rio de Janeiro, v. 45, n. 1, p. 123-135, jan./mar. 1983.
RAFFESTIN, Claude. Por uma Geografia do poder. São Paulo: Ática, 1993.
85
Geografia:
Metodologia do ensino
Anotações
86
8 As cidades, o território
a paisagem e o
planejamento
urbano
Jorge Ulises Guerra Villalobos
as Cidades
As cidades experimentaram, ao longo de seu processo de expansão e consolidação,
inúmeras inovações, tais como as provenientes da inclusão das áreas verdes dentro
de um marco de política higienista quanto das inovações nas vias de circulação, pro-
vocadas pela mudança dos meios. No entanto, sempre mantiveram uma constante, a
de regrar os usos do solo, e destacamos que foram particularmente intensas as ações
do legislador e dos planejadores quando disciplinaram as atividades industriais que
pretendiam ocupar o perímetro urbano.
Nesse regramento, a ênfase sempre foi no sentido de disciplinar a instalação e o fun-
cionamento das indústrias com base nas consequências conhecidas decorrentes da po-
luição atmosférica e das águas, constatadas desde a Revolução Industrial. No Brasil, cer-
tamente o caso emblemático de contaminação urbana seja Cubatão, no litoral paulista.
Nesse contexto, inúmeras análises de caráter macro foram realizadas, ressaltando-se
os conflitos de usos de solo, poluição e doenças. Porém, desde que Carson, em 1962,
escreveu ‘Primavera Silenciosa’, o território urbano também passou a ser foco de novos
problemas advindos desde o seu entorno. O livro de Carson iniciava com a seguinte
assertiva:
Houve outrora uma cidade, no coração da América, onde a vida toda parecia viver
em harmonia com o ambiente circunstante1.
Esse paradigma postula que os habitantes das cidades passam a “assumir os riscos
que os controladores dos insetos calculam2”, passando a suportar também os danos. Isto
significa assinalar que o território não somente pode ser dicotomizado como urbano
87
Geografia: ou rural, uma vez que existe uma profunda implicação quanto ao dinamismo de fluxos
Metodologia do ensino
que os integram.
Nessa perspectiva, é possível apontar três eixos de análise da paisagem urbana, a
saber:
1 - A deriva de poluentes advindos das indústrias;
2 - A contaminação do solo, da água e do ar;
3 - O meio ambiente de trabalho.
A respeito do primeiro eixo, vale lembrar que, em 2009, a Agência Nacional de Vigi-
lância Sanitária (Anvisa) constatou que mais de 64% das amostras de pimentão analisa-
das pelo P.A.R.A (Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos) indicou quantidade
de resíduo tóxico acima do permitido. A Anvisa também encontrou, em alimentos
analisados, resíduos de agrotóxicos que não são permitidos no Brasil, como o caso do
leite materno contaminado por agrotóxicos em Lucas do Rio Verde.
No tocante ao segundo e terceiro temas, o caso mais notório foi o que envolveu o
Shopping Center Norte, em São Paulo, o qual foi construído em 1984 em cima de uma
área que fora depósito de resíduos urbanos (lixão). Vamos aos fatos:
A área era um brejo às margens do Rio Tietê que havia sido utilizado como depósito
pelas indústrias e desativado em 1975. Nesse ano, houve o primeiro aterro sobre o
lixão, depositaram-se no local os entulhos do prédio Mendes Caldeira, que fora implo-
dido em São Paulo; logo depois, vieram os restos das escavações das obras do metrô.
O shopping foi interditado, uma vez que havia evidente risco de explosão, expondo-se
assim ao perigo centenas de trabalhadores que ali laboravam.
Entretanto, o problema não parou ali. Nas proximidades do citado shopping foi
construído o projeto Cingapura, em 1994, na gestão do prefeito Paulo Maluf, e no con-
junto habitavam 2.787 pessoas, todas elas ocupando apartamentos em área de “risco
potencial de explosão” em razão do acúmulo de gás metano, proveniente do lixão que
se encontra debaixo das construções.
88
instrumento específico que é o planejamento e a gestão3 do território, o qual, por seu as cidades, o território
a paisagem e o
turno, envolve tanto os debates puramente técnicos como implica necessariamente na planejamento
urbano
participação da comunidade local em todas as esferas desse processo.
Isso significa um diálogo permanente ao longo da elaboração das propostas bem
como nos debates referentes aos critérios que fundamentam as decisões, sendo tam-
bém desejável que a participação popular adentre no processo de implantação e ava-
liação das ações de planejamento.
o PlaneJaMento territorial
O planejamento territorial não é meramente um levantamento de demandas ou de
possibilidades associadas com um cronograma de custos e execução; o planejamento
configura-se como um processo que de fato pode iniciar-se com as demandas, porém
não termina com a elaboração do projeto. É amplamente aceito hoje que o planeja-
mento é um processo de andar para a frente, portanto, é permanente e contínuo,
salientando-se que esse andar está norteado por diretrizes que lhe dão fundamento.
Entendemos que o planejamento não se realiza no terreno dos espaços abstratos,
mas ele se materializa no território. Assim, como o território tem um papel de cata-
lizador das ações humanas, que resultaram das dinâmicas históricas tanto de média
quanto de curta duração, o planejamento constitui-se como um instrumento que deve
contribuir para construir e garantir a harmonia e o equilíbrio em longo prazo a todos
os moradores do território.
Logo, o planejamento centra-se na articulação das potencialidades e limitações
existentes no território de modo a garantir às futuras gerações uma existência com
qualidade de vida.
Vejamos o caso do recuo frontal, que é exigido nas construções. Além de estar
associado à ventilação, está relacionado com a paisagem urbana, ou seja, com a mor-
fologia da paisagem urbana e não simplesmente com uma questão de insolação, como
previsto inicialmente no urbanismo higienista.
É claro em toda a literatura científica que os recuos não são tema novo no Bra-
sil. Estes, por exemplo, podem ser encontrados em 1967, quando o arquiteto Jorge
89
Geografia: Wilheim4 coordenou o plano SERETE em Natal e que sobre a famosa ocupação na
Metodologia do ensino
borda Brasília Teimosa indicou a sua remoção, com a justificativa de que
Observemos ainda que o referido plano desenvolvido por Wilheim foi responsável
pela:
Nesse mesmo sentido estão os estudos de Eduardo Alberto Cuscé Nobre, que no
artigo5 intitulado “O ideário urbanístico e a legislação na cidade de São Paulo: do Códi-
go de Posturas ao estatuto da Cidade” destaca que a legislação urbanística do período
de 1886 já previa a valorização da área central, e que para isso haviam contribuído
as determinações relacionadas com os parâmetros urbanísticos como “as alturas dos
pavimentos, os recuos e as aberturas das construções”.
Nessa mesma direção está o trabalho de Rudnei Ferreira Campos6, que tratou da
“Análise da Influência da Orientação da Testada dos Lotes na Ocupação do Setor Estru-
tural de Curitiba”, e que afirma:
4 Lílian Pantoja. Parâmetros urbanísticos para habitação de interesse social: uma analise
crítica para as rocas em Natal/RN. Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo.
Natal 2006, p. 50.
5 IX Seminário de história da cidade e do urbanismo São Paulo, 4 a 6 de setembro de 2006, p. 4.
6 Rudnei Ferreira Campos. Análise da Influência da Orientação da Testada dos Lotes na Ocu-
pação do Setor Estrutural de Curitiba. Dissertação de Mestrado em Construção Civil do Pro-
grama de Pós-Graduação em Construção civil, Setor de Tecnologia, Universidade Federal do
Paraná. Curitiba, 2005.
7 Nabil Georges Bonduki, em “Origens da habitação social no Brasil”, publicada na Revista de
Análise social, vol. XXIX (127), 1994 ( 3°), p. 711-732.
90
soluções habitacionais, a maior parte das quais buscando economizar terrenos as cidades, o território
e materiais através da geminação e da inexistência de recuos frontais e laterais, a paisagem e o
planejamento
cada qual destinado a uma capacidade de pagamento de aluguel (BONDUKI, urbano
1994, p. 713, grifos nossos).
91
Geografia: 4) Utilização múltipla: forma distinta de intensificação que combina vários usos
Metodologia do ensino
sobre o mesmo território e que demanda zonas especiais para “preservar e res-
taurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das es-
pécies e ecossistemas”11 de bens tais como o abastecimento de água, cenários
turísticos, fontes minerais e biodiversidade12, dentre outros;
5) Extensificação: combina-se com a intensificação e a utilização múltipla. Seu es-
tabelecimento pode reduzir erros provocados em fases do desenvolvimento do
território;
6) Alteração do uso do solo: é geralmente provocada pela ampliação dos núcleos
urbanos, infraestrutura do tráfego, exploração mineral, dentre outros. Deman-
dam estudos integrados para evitar efeitos indesejados;
7) Construção de novos territórios: estudos ambientais13 relativos à construção
de novos territórios, como são a recuperação de áreas que foram imersas pela
implantação de represas, recuperação ou restauração de áreas de mineração
dentre outros.14
92
McHarg (2000) reconhece que os desafios no processo de planejamento são múlti- as cidades, o território
a paisagem e o
plos a ponto de que não se trata de planejamento de território, mas de planejar com o planejamento
urbano
território, questão que coloca o caráter cooperativo da relação do homem com o lugar
no qual este realiza sua vida.
Nas metodologias de análise16 territorial depois de McHarg (2000), se adotaram os
estudos integrados do território, disciplinando-se rigorosamente a realização de diag-
nose, prognose, síntese, implantação, correção de impactos e a avaliação do processo
a fim de que todas as ações do planejamento tivessem suficiente substância analítica
bem como fossem projetadas com a natureza. Além disso, hoje é consenso que o pla-
nejamento territorial também depende fortemente de como se distribui o poder, ou
seja, de como a população se integra no processo.
Devemos ter sempre presente que o território municipal pode ser conceituado
como um conjunto de terras materializadas em um processo de fracionamento e usos
do solo. Nesse sentido, o fracionamento do solo é um meio que disciplina a organi-
zação funcional, estética, ambiental, social e econômica do território municipal. As-
sim, quando existe carência de planejamento no uso e ocupação do solo, é comum o
surgimento de vários conflitos, como, por exemplo, os resultantes da implantação de
indústria nas proximidades das residências, fragmentação da malha urbana e conges-
tionamento de fluxos, entre outros, sendo que todas essas situações afetam significati-
vamente a qualidade da cidade como um todo.
É fundamental, então, considerar que o estabelecimento de políticas e diretrizes
de planejamento territorial do município incluam necessariamente o planejamento
físico, a estruturação urbana, o parcelamento, o uso e a ocupação do solo tanto urbano
quanto rural, não negligenciando o desenvolvimento econômico e social, com ênfase
na produção, na geração e na distribuição de renda e na participação popular durante
todo o processo.
PartiCiPaÇÃo CidadÃ
No planejamento está previsto um quadro normativo que deve garantir a execução
das ações; para isso, existe um plano de investimentos públicos que objetivam vincular
as ações com um recurso necessário para concretizar as propostas. No entanto, para tal
é necessária a existência de uma articulação territorial dos diferentes interesses; assim
16 Análise ambiental: Exame detalhado de um sistema ambiental, por meio do estudo da qua-
lidade dos seus fatores, componentes ou elementos, assim como dos processos e interações que
nele possam ocorrer, com a finalidade de entender sua natureza e determinar suas características
essenciais. (Avaliação ambiental estratégica. MMA. 92p).
93
Geografia: um momento importante da relação entre o orçamento participativo e o planejamento
Metodologia do ensino
territorial se estabelece através dos próprios projetos aos quais se prioriza durante o
processo17.
Essa articulação se realiza através das denominadas plenárias territoriais, que por
regra geral incidem mais sobre uma dimensão local (bairro) e as plenárias temáticas;
estas últimas incidindo intensamente sobre o conjunto da cidade18.
A discussão do orçamento em (bairros) implica no fato de apresentar certas de-
mandas limitadas em escala de abrangência territorial, e que correspondem exclusi-
vamente ao bairro, como são, por exemplo, as melhorias das calçadas, dos centros
comunitários e praças. Essa ação local aparece em conflito com as reivindicações que
interessem à cidade como um todo e que têm uma dimensão territorial de ordem es-
trutural. Para equacionar esse risco, as assembleias temáticas são estratégicas, uma vez
que permitem tratar temas de abrangência global como são a saúde e o meio ambiente,
os quais certamente interessam à cidade como um todo.
No debate da construção dos critérios, exerce um papel essencial a formação dos
delegados, dos conselheiros e da cidadania em geral19, haja vista que este é um dos ele-
mentos centrais para o êxito do processo de articulação política do planejamento da
cidade. A princípio, todos participam do Orçamento Participativo e dos processos de
planejamento territorial, de modo que se estabelece um vínculo forte entre orçamento
e planejamento participativo, porém esse liame somente será duradouro se entende-
mos que o orçamento e o planejamento configuram-se em um processo que envolve
a efetivação dos projetos ao mesmo tempo em que seu acompanhamento e avaliação,
devendo ser realizado com critérios capazes de indicar com clareza os avanços ou
retrocessos em relação às metas estabelecidas.
Disto decorre um princípio já enunciado, no qual o planejamento é visto como
processo integral realizado de forma coerente em um sistema dialético participação/
planejamento.
95
Geografia: ‘meios’ e das ‘situações’ em que estes ou aqueles direitos possam ser realizados22.
Metodologia do ensino
O desafio do planejador quanto à dignidade da pessoa humana é entender que
participa da construção de alternativas em um processo no qual a sociedade “negocia”
23
certo consenso, o qual termina sendo traduzido em uma ‘fórmula genérica’ que é
aplicada no planejamento. E mesmo se de fato pode não resolver todas as contradi-
ções, pode terminar sendo aplicada24 através do exercício da liberdade.
O professor Bandeira de Mello (2001)25 reconhece que é importante considerar
as especificidades das ações e principalmente saber quais são os argumentos para
programá-las. Assim, é possível imaginar uma primeira substância negativa na constru-
ção da igualdade trazendo às luzes do debate no planejamento fatores que poderiam
ser erguidos como desacato ao princípio da isonomia. No entanto, esses “elementos
residentes nas coisas, pessoas ou situações” podem ser beneficiados como exclusivos
diferenciadores, sem, contudo, desacatar “ao princípio isonômico”. Para tal, as discri-
minações legais devem estar fundamentadas e não serem obtidas de forma arbitrária.
As normas gerais referentes ao direito urbanístico antes da Constituição de 1988
são essencialmente o Decreto Lei n. 58, de 11 de março de 1937, que “disciplinava
os loteamentos urbanos e rurais” e questões de ordem civil, em particular as relações
entre o loteador e os adquirentes de lotes”.
Posteriormente está a Lei 6.766/79, que dispõe do parcelamento do solo, e que
especificamente veio a “resguardar o interesse público contido no ato de parcelar o
solo urbano”26.
Observemos que essa lei, ao tratar dos requisitos urbanísticos para loteamento,
“inova em relação á legislação anterior, posto que introduz sobre a matéria, a nível
nacional normas gerais de direito urbanístico, tão reclamadas pela doutrina” 27.
Em 1980, entra em vigor a Lei 6.803/80, que trata do zoneamento industrial nas
áreas urbanas críticas de poluição; e em 1981, através da Lei n. 6.938, se institui a
22 José Francisco de Assis Dias. Capítulo II. A Categoria Direitos do Homem. 2005, páginas
13-14.
23 Bobbio, Norberto. “Sul fondamento dei diritti dell’uomo”, in ED, 5. Apud José Francisco
de Assis Dias. Capítulo II. A Categoria Direitos do Homem. 2005.
24 José Francisco de Assis Dias. Capítulo II. A Categoria Direitos do Homem. 2005.
25 Celso Antônio Bandeira de Mello. Conteúdo Jurídico do Princípio da Igualdade. São
Paulo. Malheiros editores Ltda., 2001.
26 Loteamentos e desmembramentos urbanos. Comentários à nova lei de parcelamento do
solo urbano lei. N. 6.766 de 20.10.1979 (Toshio Mukai, Alaôr Caffé Alves e Paulo José Villela
Lomar. São Paulo, Sugestões Literárias, 1980).
27 Toshio Mukai, Alaôr Caffé Alves e Paulo José Villela Lomar. São Paulo.
96
Política Nacional do Meio Ambiente, a qual incide diretamente na questão urbanística as cidades, o território
a paisagem e o
quando determina que a política nacional de meio ambiente visará: Art. 4. inc. I. à com- planejamento
urbano
patibilização do desenvolvimento econômico-social com a preservação da qualidade
do meio ambiente e do equilíbrio ecológico.
Salientamos também o caráter planejador da ação governamental, uma vez que o
Art. 5 da referida norma determina que:
97
Geografia: princípios gerais e abstratos próprios da lei nacional – sem invasão, portanto,
Metodologia do ensino das esferas específicas e privativas das leis federais, estaduais e municipais –
para prevenir possíveis conflitos ocorríveis nos pontos de atrito previsíveis ou
nas áreas não definidas, não atribuídas explícita ou implicitamente a qualquer
pessoa pública política, pelo instrumento apropriado, que é a Constituição30
(ATALIBA apud SILVA, 2010, p. 64).
Entendemos, então, que as normas gerais traçam diretrizes, balizas, quadros à atua-
ção legislativa da União, dos estados e dos municípios. O autor continua, com igual
entendimento ao nosso enfoque:
ConsideraÇÕes finais
Cabe compreender, desde logo, que o tipo de organização política vigente no país
é fundamental à afirmação das competências no planejamento dos usos e da ocupação
do solo do município.
Assim, o trato normativo de cunho específico das questões de interesse urbano fica
para os municípios e seus munícipes. O município, dessa maneira, está incumbido
de desempenhar de forma satisfatória todas as suas competências, sejam de ordem
material ou legislativa, para o adequado controle na utilização do uso do solo em sua
30 José Afonso da Silva. Direito urbanístico brasileiro. 6ª ed. Revista e atualizada, Malheiros,
2010.
31 Ibidem.
98
circunscrição territorial. O município cuida do interesse local, que direta ou indireta- as cidades, o território
a paisagem e o
mente atinge a comunidade que vive o problema. planejamento
urbano
Lembremos que a Constituição Federal de 1988 determina ser o município o res-
ponsável pela definição e ordenação do solo urbano para a definição e implementação
dos instrumentos urbanísticos.
O respaldo constitucional emana dos Artigos 30 e 182, e sua finalidade está na
limitação do poder de disposição por parte do Poder Público sobre a esfera privada
da propriedade, direcionando o desenvolvimento urbano e social em um marco do
desenvolvimento local sustentável.
A gestão do território municipal, assim, é fruto de um planejamento local que
significa o estabelecimento de diretrizes, índices urbanísticos, parâmetros, objetivos,
análises técnicos, estudo de programas e a escolha dos meios mais adequados para se
alcançar os objetivos traçados democraticamente com a participação popular.
Segundo Meirelles (2009)32, a gestão territorial objetiva garantir o desenvolvimento
municipal, considerando-se para isso as especificidades geológicas, sociais, econômi-
cas e de interesse público que devem conduzir as decisões do Poder Público e de
particulares no que se refere ao uso e ocupação do solo.
Esse dispositivo também mostra com bastante coerência o caráter específico e téc-
nico do uso e ocupação do solo, uma vez que toda intervenção necessita de respaldo
especializado, considerando as consequências negativas à qualidade de vida urbana,
decorrentes de intervenções não estudadas e planejadas.
A legislação não é mero instrumento, mas instrumento essencial e específico ao
parcelamento e ocupação do solo, já que disciplina o ordenamento e planejamento do
território municipal, de modo a evitar uma situação caótica que resulta da carência de
planejamento. José Alfonso da Silva (2010, p. 204), entende que a: “ ordenação não é
apenas a definição de um regime jurídico qualquer, mas de um regime coerente, capaz
de produzir a ordem, e não a desordem (SILVA, 2010, p. 204).
Assim, o planejamento do território orientado por princípios constitucionais e de-
senvolvido detalhadamente na legislação municipal garante o atendimento dos inte-
resses coletivos 33
32 Direito Municipal Brasileiro. 3ª ed. São Paulo, ED. RT, 1977; 16ª ed. São Paulo, Malheiros
Editores, 2009.
33 Se de um lado a Constituição insere no interior do regime da propriedade a obrigação do
atendimento de interesses públicos, de outro ela impede que a concretização desses interesses
fique ao sabor da arbitrariedade política.
99
Geografia: Constatamos, por último, que a discricionariedade, vista como a liberdade do go-
Metodologia do ensino
vernante, está limitada, pois existe vinculação na gestão do território à norma, a qual
deve garantir a qualidade de vida dos que vivem nas cidades.
Proposta de Atividades
Referências
BOBBIO, Norberto. Sul fondamento dei diritti dell’uomo. In: DIAS, José Francisco de
Assis. A categoria direitos do homem. [S. l.:s. n.],2005. Cap. 2.
100
em Construção Civil)-Programa de Pós-Graduação em Construção Civil, Setor de as cidades, o território
a paisagem e o
Tecnologia, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, 2005. planejamento
urbano
DIAS, José Francisco de Assis Dias. A categoria direitos do homem. In: ______.
Consensus ommnium gentium. Sarandi, PR, Humanitas Vivens, 2005. Cap. 2.
p. 13-14.
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito municipal brasileiro. 3. ed. São Paulo: RT,1977.
______. Direito municipal brasileiro. 16. ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
MUKAI, Toshio; ALVES, Alaôr Caffé; LOMAR, Paulo José Villela. Loteamentos e
desmembramentos urbanos: comentários à nova lei de parcelamento do solo
urbano lei. N. 6.766 de 20.10.1979. São Paulo: Sugestões Literárias, 1980. p. 24.
101
Geografia: PANTOJA, Lílian. Parâmetros urbanísticos para habitação de interesse social: uma
Metodologia do ensino
analise crítica para as rocas em Natal/RN. Natal, RN: Programa de Pós-Graduação em
Arquitetura e Urbanismo, 2006. p. 50.
Anotações
102
9 Fotografia,
Território e Literatura
Jorge Ulises Guerra Villalobos
a fotoGrafia
A qualquer geógrafo ou professor de Geografia que perguntássemos pelo nome
de Alexander von Humboldt (1769-1859), responderia no mínimo que está associado
diretamente à história da geografia científica. Esse naturalista alemão está também
vinculado à apresentação do invento de Louis Jacques Mande Daguerre (1787-1851),
o Daguerrotipo, à Academia de Ciências de Paris, e sua participação não parece ter
sido secundária.
Humboldt viveu durante anos em Paris como um conceituado homem de ciência, e
mantinha estreita amizade com François Arago1 (1786-1853). Este último era, em 1839,
deputado republicano pelo partido Pirinueus Orientais Franceses, e fora designado
pela Academia de Ciências de Paris não somente por ser um político, mas também um
cientista aberto aos novos descobrimentos, para que, juntamente com Humboldt e
Biot, emitisse um parecer sobre a invenção de Daguerre, parecer este que considerava
a relevância de seu invento.
Na visita que esses cientistas fizeram à casa de Daguerre, coube a Arago tornar
públicos os informes da Comissão: O señor Daguerre há descoberto umas pantalhas
especiais nas quais a imagem ótica deixa uma perfeita imagem.2
Humbodlt não se restringiu a participar somente da Comissão, mas certamente
influenciou a intervenção de Arago na Academia de Ciências de Paris, pois o invento
revolucionaria todo o mundo.
Em 7 de janeiro de 1839, se fizeram públicos os primeiros reconhecimentos da
técnica diabólica,3 depois de a Comissão ter emitido parecer favorável, e em 19 de
agosto desse mesmo ano, na sessão da Academia, Arago tornou definitivamente públi-
co o processo que revolucionaria e substituiria os desenhistas que seriam necessários
103
Geografia: para copiar os jeroglífi cos existentes, seja em Tevas, Menfi s, Karnak, etc..,4 pois como
Metodologia do ensino
afirmava Arago: Com o Daguerrotipo, um só homem poderia desenvolver esse tra-
balho [...] Há de esperar-se [também] que seja possível obter mapas fotográfi cos de
nosso satélite...5
A sala da reunião da Academia ficou lotada, nela estavam os homens mais impor-
tantes das ciências, tais como Watt, Morse, Humboldt, todos atentos à comunicação
de Arago.
No Brasil, a primeira notícia do invento de Daguerre foi publicada no dia 1 de maio
de 1839, no Jornal do Commercio do Rio de Janeiro, e referia-se às notícias publicadas
na França pelo jornal O Seculo, divulgando a primeira apresentação do invento, em
janeiro desse mesmo ano.
4 SOUGEZ, M. p. 57.
5 SOUGEZ, M. p. 58.
6 Jornal do Commercio, n. 98, p. 2 1/5/1836. in: KOSSOY, B. Hercules Florence: 1833 a
descoberta isolada da Fotografia no Brasil. São Paulo: Duas Cidades, 1980, p. 43 - 45
7 Segundo Boris Kossoy a palavra fotografia fora utilizada pela primeira vez por Hercules Flo-
rence em 1833.
8 KOSSOY, B. op. Cit . p, 76 - 77.
104
O real passava a estar presente em uma relação estabelecida entre o espírito da natu- fotografia,
território e literatura
reza e o espírito do homem, e do romanticismo são expoentes clássicos Francisco
Goya (1746-1828) e William Blake (1757-1877), entre outros. Os trabalhos pictóricos
do realismo apresentavam-se como contraproposta ao romanticismo e ao classicismo,
mostrando cenas dos trabalhadores, a vida cotidiana e as paisagens comuns, como são,
por exemplo, os trabalhos de Jean-François Miuet (1814-1875).
A relação com as correntes pictóricas dominantes, em meados do século XIX, mar-
cou e influenciou os fotógrafos, que antes de serem técnicos, eram artistas.
Existe consenso entre os historiadores da fotografia em denominar o período que
vai desde a divulgação em Paris do Daguerrotipo até início do século XX de período
artístico da fotografia, porque ali estavam imbricados os trabalhos dos pintores e fotó-
grafos, muitas vezes coincidindo em apenas uma ou ambas as artes.
A sociedade anônima dos artistas, pintores escultores e gravadores, que seria co-
nhecida mais tarde como a base do Impressionismo (Monet, Renoir, Dega, Cézanne,
entre outros) teve sua primeira exposição no salão de Gaspar Felix Tournachom (Nadar)
(1820-1910), um conhecido fotógrafo retratista parisiense, entre abril e maio de 1874.
Certamente, foi Nadar quem representou melhor a relação fotografia-pintura, não
somente pela sua participação na Sociedade, mas por sua delicada elaboração dos
retratos, contando, entre eles, os de Delacroix e Manet.
O estudo dos irmãos Tournachom era o mais concorrido de Paris, chegando a co-
nhecer-se o número 113 da Rua Saint-Lazare como Saint-Nadar. Nadar era caricaturis-
ta, atividade que lhe permitiu desenvolver a capacidade de obter caráteres sínteses dos
personagens, habilidade que aplicou com êxito na fotografia de retratos.
A relação entre a pintura e fotografia estava dada, no início, pela tentativa de ambas
as artes para elaborar a cópia fiel da realidade, capacidade que desde os primeiros mo-
mentos a fotografia demostrou possuir. Susan Sontag pontua ser essa a característica
que liberou o pintor para se dedicar à fi guração abstrata.
Voltemos um momento à reunião da Academia de Ciências e observemos como foi
descrito o processo do Daguerrotipo.
Daguerre tomou a placa de cobre prateada e frotou sua superfície suavemente
com um algodão molhado numa mistura de pedra pomes e azeite de oliva. Cobriu
toda a superfície e observei que fazia isto de modo circular e depois em movimentos
paralelos. Logo lavou a placa com um líquido composto de uma parte de acido nítrico
por 16 partes de água destilada. Depois aqueceu, levemente, a placa pondo a parte
revestida de cobre diretamente na lamparina. Novamente, deu um banho de acido.
Assim preparada a placa podia expor-se aos vapores de iodo. Nesse momento a escuri-
dão se precipitou na sala. A placa foi posta numa tabuinha e o conjunto foi colocado
105
Geografia: numa caixa provida de uma tampa e o iodo, que estava no fundo, se distribuiu de
Metodologia do ensino
modo uniforme através de um pano esticado numa moldura de madeira.
Os vapores de iodo que sobem distribuíam-se, uniformemente, na superfície pra-
teada, formando-se uma capa de ioduro de prata de cor amarelo cobre.
Nesse momento chegou uma câmara escura, previamente, enfocada em direção
ao exterior, a placa preparada foi colocada na câmara escura. [Permaneceu enfo-
cando o exterior] um quarto de hora. Ao sacar a placa o desânimo foi geral, aparen-
temente, nada acontecera e duvidava-se do êxito. O senhor Daguerre ensinou a pla-
ca durante 30 segundos, com a cara prateada em direção ao solo, três espectadores
abriam muito os olhos e afi rmavam: ‘não há nada’.
Assim Daguerre a colocou dentro de uma caixa. No fundo da qual estava uma
vasilha de barro contendo duas libras de mercúrio, acalentado por uma lâmpada
até 62 graus. Com o mercúrio quente a essa temperatura, as partículas de mercúrio se
evaporam e sobem para fi xar-se na superfície da placa, o que fazia aparecer a imagem.
Na parte superior da caixa, uma janela permitia vigiar a operação. Quando tudo
esteve pronto, a placa foi retirada e lavada com água destilada, quase fervendo,
saturada de sal marinho. Tudo estava terminado, e foi possível admirar a obra.
Nunca vi nada tão perfeito. Cada objeto aparecia fi namente gravado. Com uma
lupa era possível diferenciar os grãos e ainda determinar a matéria e essência de
cada objeto [fixado]9.
O trabalho de imprimir de forma direta uma imagem em algum tipo de suporte,
placa de cobre, vidro, pedra ou papel era procurado por cientistas amadores e profis-
sionais desde quando afoi reconhecida a influência da ação dos raios solares em certos
materiais, basicamente os sais de prata.
É importante assinalarmos que o trabalho de Daguerre não foi um descobrimento
isolado, como durante anos se pensou. A construção da nova técnica não foi indivi-
dual; apareceu simultaneamente em vários outros lugares.
Pelo que tudo indica, a intervenção de Arago junto à Academia de Ciências foi bási-
ca, não somente ao silenciar o trabalho de Bayard, mas também pela obtenção da pu-
blicidade do governo francês ao invento. A contribuição direta ao novo processo, feita
por Joseph-Nicéphore Niépce (1765-1833), quem desenvolveu o Daguerrotipo, tam-
bém foi silenciada ao manter-se como único inventor Louis-Jacques Mandé Daguerre.
A importância de Daguerre é inquestionável em todo esse processo, mesmo que
seja relativizada pelas novas contribuições à história da fotografia, porém a presença
106
de Fox Talbot talvez não fosse ainda reconhecida plenamente, porque foi sua contri- fotografia,
território e literatura
buição que permitiu passar da cópia única à popularização do número indeterminado
de cópias fotográficas.
No entanto, o processo de Talbot foi superado pelo trabalho de Archer, que em 1851
desenvolvia a fotografia através de uma chapa umedecida, previamente preparada com
nitrato de celulose e sensibilizada com nitrato de prata. Mas em 1871 Maddox abriu as
portas para os chasis intercambiáveis de chapas fotográficas, que por volta de 1877 já
eram comercializados, liberando o fotógrafo de ter que revelar imediatamente as chapas.
As modificações do suporte da imagem fotográfica foram também acompanhadas
pelas transformações da câmara fotográfica, que de dimensões intransportáveis foi ce-
dendo espaço às pequenas e manipuláveis.
Essas rápidas transformações, que seguiram diferentes formatos, obrigaram a que
em 1889 fosse efetuado em Paris o Primeiro Congresso Internacional de fabricantes e
técnicos e em 1891 o segundo em Bruxelas, onde foram determinados os padrões de
luminosidade dos objetivos, e o formato e espessor das placas de cristal.10
O ritmo das modificações técnicas, tanto no que se refere ao suporte como às
máquinas fotográficas, foram surpreendentes entre 1877 e 1900, permitindo a foto-
grafia popularizar-se de forma definitiva. O melhor exemplo dessa popularização foi a
criação da máquina Brownie, da empresa de Eastman a Kodak, que custava um dólar.
George Eastman chegou à fotografia através de suas experiências domésticas, nas
quais pretendia modificar a situação dos fotógrafos que deviam carregar tanto quanto
uma mula de carga.11 Em 1880, começou a comercializar um papel sensibilizado para
fotografia. Mas a associação com Wiuiam Walker, em 1884, para formar uma empresa
que produzisse e comercializasse suas próprias máquinas e papel fotográfico modifi-
cou substancialmente todo o processo fotográfico conhecido até o momento.
Essa empresa, em 1886, se transformou na Kodak, nome que parece ter direta rela-
ção com o som emitido pela máquina ... Ko ... Dak. O slogan utilizado pela Kodak era
Seu uso dispensa estudos preliminares, laboratórios ou produtos químicos,12 e Você
aperta o botão, nós fazemos o resto.13
Até 1839, os desenhos litográficos dominavam a apresentação das imagens utili-
zadas nos trabalhos geográficos; desenhos de linhas contínuas e segmentadas, que
107
Geografia: permitiam apresentar as paisagens as quais os geógrafos descreviam. É pertinente
Metodologia do ensino
lembrar que esses desenhos eram como uma cópia da realidade interpretada pelo
desenhista, considerados como muito próximos da situação copiada. Dessa data em
diante, a fotografia viria a substituir o eu estive aqui, eu vi, frases características da
descrição in loco.
Isto quando a imagem produzida pela máquina fotográfica assumiu a evidência, como
afirma Sontag. Algo que conhecemos de escutar, mas que duvidamos, parece irrefutável
quando nos mostram uma fotografi a daquilo14, a imagem transforma-se na linguagem
do dado incontestável que substitui a descrição. A imagem vale mais que mil palavras.
Mas essas imagens, para serem produzidas do modo como são atualmente, tiveram
um complexo desenvolvimento tecnológico. Apontamos alguns em particular: a im-
pressão das fotografias em revistas, processo que teve grande impacto na publicação
das revistas geográficas.
A utilização das fotografias obtidas através do procedimento do Daguerrotipo não
era útil para a impressão, em papel, daí a intenção de transformar a placa metálica em
uma prancha de gravação.
O primeiro livro publicado com fotografias e texto foi La Photographie zoologique,
editado na França em 1853. Eram reproduções mediante o procedimento de impreg-
nar com tinta o relevo da figura talhada no metal.
Em 1856, a Societé Française de Photographie decidiu premiar quem obtivesse um
procedimento direto de impressão, através do qual fosse evitado o sistema de recons-
trução da imagem na placa metálica.
Em 1867, Alphonse Poitevin (1819-1882) criou o sistema fotolitográfico tendo
como suporte a pedra, o qual anos mais tarde daria origem à fototipia que possuía
como suporte o vidro.
Através dessas técnicas foram publicadas as primeiras revistas científicas de Geo-
grafia, que incluíam fotografias como parte da descrição de campo. Essa estratégia foi
incorporada definitivamente na Geografia.
o territÓrio
O termo território possui um significado geográfico, além de uma relação com a
história econômica e política do lugar. Certamente, a palavra território não é de uso
exclusivo dos geógrafos, pois os debates atuais mostram que é utilizada também por
outros cientistas, como, por exemplo, os antropólogos.
108
Na Geografia, o conceito de território possui o sentido de espaço ou lugar que fotografia,
território e literatura
contém uma localização e um conflito de recursos naturais que tem sido apropriado e
transformado pelo homem mediante o trabalho.
A apropriação e a transformação de um lugar são realizadas de forma imediata, vinculadas
ao grau de desenvolvimento tecnológico e político que o grupo social possui, compreenden-
do o grupo social de forma ampla: desde uma comunidade silvícola até um Estado.
Nesse sentido, o espaço é transformado em território somente depois que são realiza-
das modificações nele. Assim, a apropriação não implica o domínio real de um território,
isto é possível somente quando se constrói sobre ele uma estrutura organizacional econô-
mica e política.
A estrutura organizacional econômica e política do grupo social está geralmente de
acordo com o programa ou projeto de administração que ele propala, e isto certamente
influencia a forma da exploração do território.
Nessa perspectiva, os conflitos no território são resultados das tensões de diferentes
grupos sociais ou de tensões existentes no interior dos grupos sociais, os quais devem ser
enfrentados pela apropriação de um espaço no qual procuram determinar uma forma de
administração e exploração.
Os homens, apoiados em suas instituições e estruturas sociais, se enfrentam para
determinar uma forma de utilização econômica e social, seja ela particular ou geral.
Entendemos por particular quando se trata de formas de exploração que não são
as dominantes do processo de acumulação mundial do capital, e geral quando é a
forma dominante, podendo ser a da formação social específica e ou da forma mundial
de acumulação.
O método de apropriação do território se desenvolve de forma tal que os conflitos se
dinamizam no sentido de resistência, adequação ou imposição. Todos eles se configuram
como processos violentos, pois não se medem os esforços para a ocupação de um espaço.
Resistência, adequação e imposição não são três momentos isolados no tempo do
processo de constituição do espaço em território. Eles se associam e constituem refe-
rencias para as capacidades de organização e nível de desenvolvimento que os grupos
envolvidos no conflito possuem.
Na resistência está implícita a noção de capacidade de defesa e a manutenção da
referência do elemento estruturante do grupo, que nos conflitos agrários é a perma-
nência ou acesso à terra.
No entanto, o que pode parecer a princípio uma situação de domínio está permea-
do por constantes aparecimentos de focos de resistência, sendo estes cada vez mais
intensos, como demonstram as atuais mobilizações sociais; principalmente à medida
que as capacidades de intervenção do governo se voltam para ações preocupadas com
109
Geografia: os grupos de poder como condição básica para manter o processo de dominação e
Metodologia do ensino
exclusão dos trabalhadores a uma escala mundial.
Os grupos sociais envolvidos em um processo de ocupação de um espaço para
convertê-lo em território, através da sua transformação, estão preocupados com a so-
brevivência ou com a acumulação de riquezas. Com essas perspectivas opostas, os
grupos procuram estabelecer e construir justificativas para suas ações.
Os conflitos territoriais no Estado do Paraná podem ser datados desde quando os
grupos silvícolas se deslocavam à procura de locais adequados para sua sobrevivência,
há dezenas de séculos. No entanto, quando a problemática do espaço passa a envolver
o título de propriedade, ou seja, quando a dimensão jurídico-social adquire hegemo-
nia, os conflitos adquirem uma dimensão ampliada, tendo como referência única os
limites jurídicos do Estado.
Essa referência à presença do Estado é pertinente, pois nos permite considerar
que com a construção do Estado moderno – destacamos que entre os séculos XIII
e XIX se processa a configuração do Estado moderno, primeiro na Europa e poste-
riormente amplia-se para todo o mundo – que o fenômeno da afirmação do espaço a
uma territorialidade é definitivamente associado a um poder centralizador e organi-
zador das relações sociais.
O sentido dado ao território na constituição do Estado é basicamente de ser o es-
paço de ação e influência do seu ordenamento econômico e político. Essa concepção
implica entender a noção de Estado como impositora de um ordenamento derivado
do seu domínio, como aparelho de uma dada classe social. Assim, os conflitos nos
territórios tenderiam a estar articulados com processos maiores, como o das lutas de
classes.
Não se trata de constituir uma tipologia qualquer dos conflitos. Considerando
somente se existe presença direta ou indireta do Estado, trata-se de afirmar, em um
grau mais geral, quais são os objetivos envolvidos e poder entender os conflitos como
relacionados a confrontos de classes.
Essa perspectiva de análise possui maior poder analítico quando pensamos nos
conflitos com o Governo de Estado, o bem, a luta concreta para conquistar uma terra
para a implantação de um assentamento da Reforma Agrária.
Isto nos permite reconhecer, então, dois níveis fundamentais que alcançam o confli-
to. Um, denominado conflito de interesses de classes locais, e outro o conflito de inte-
resses de Estado claramente nacional e internacional. Devemos entender que os deno-
minados conflitos de interesses de Estado trabalham com a leitura dos conflitos regio-
nais como possibilidade de constituir alianças para se expandir para novos territórios.
A importância que os conflitos locais sejam vistos como desarticulados das realidades
110
nacional e internacional – pensemos, por exemplo, na ocupação de Wall Street – resi- fotografia,
território e literatura
de no fato de que através disso apresentam-se como desconectados dos processos de
exploração desenvolvidos pelo poder econômico contra os trabalhadores.
Essa visão de desarticulação e de pontualidade e localidade, transmitida pelos meios
de comunicação de massa, televisão e jornais, insiste no isolamento das lutas de resis-
tência contra o Estado e termina privilegiando os interesses de grupos sociais hegemô-
nicos, os quais procuram impor padrões de exploração econômica em escala global.
As ideias assinaladas nos permitem conduzir a leitura dos conflitos no Paraná sob
uma perspectiva dos conflitos de interesses de classes e da construção de territórios.
Seguindo as referências anteriores, construímos uma cartografia dos conflitos que
pode ser vista no mapa 1.
111
Geografia: A região do Contestado era considerada como de ninguém, um espaço a ser apro-
Metodologia do ensino
priado e transformado pelos mais fortes. Em uma das primeiras ações importantes de
resistência contra a ocupação das empresas capitalistas, Chico Alonso, um dos líderes
da mobilização social do Contestado, depois de queimar a serraria da Lumber Corpo-
ration, afirma, em um bilhete deixado no local:
nós tratava de nossas devoções e nem matava e nem roubava, mas veio o gover-
no da Republica e tocou os filho brasilêro dos terrenos que pertencia à Nação e
vendeu tudo para os estrangeiros. Nóis agora estamos dispostos a fazer prevale-
cer nossos direitos... (Cf. ALONSO, apud DERENGOSKI, 1986, p. 66).
112
expulsos, o mesmo aconteceu na faixa de 15 qui1ômetros laterais a estrada, conce- fotografia,
território e literatura
dida á Brazil Railway”.17
Essas ações foram realizadas por “pistoleiros” trazidos de Texas, Estados Unidos,
como ilustra a fotografia abaixo, reproduzida do arquivo da Guerra do Contestado.
Os posseiros eram tratados como intrusos e expulsos das áreas. Monteiro enuncia
que: a expulsão [... ] é executada e a moderna exploração madeireira instalada
arruína os pequenos produtores locais (Cf. MONTEIRO, 2011, p.31) .
No Contestado, os conflitos estão centrados na questão da terra, entre quem quer
mantê-la para seu sustento, sejam índios ou posseiros, e quem deseja explorá-la integran-
do-a em um sistema de exploração de dependência internacional. Estes últimos não re-
conhecem e ignoram completamente a presença de outros sujeitos que não se adaptam
as suas imposições e regras de um novo modelo de transformação e exploração da terra.
A utilização especulativa das terras na região do Contestado marca um longo pro-
cesso na ocupação do território que ainda continua presente.
literatUra
Contos da realidade. Uma estratégia para relatar a história do território
A Geografia há muito tempo descreve os lugares, as pessoas e seus cotidianos, não
sendo diferente quando utilizamos a literatura para buscar em suas formas de repre-
sentação uma fonte para o estudo do território. Vejamos um conto da realidade, que a
seguir desenvolvemos...
113
Geografia: Pedro ouve atento as palavras que João lê para ele. Emerge um mundo de sonhos,
Metodologia do ensino
onde as paisagens de floresta e as áreas desérticas são cenários de jogos humanos;
onde a dor e a miséria configuram formas de vida normais, engraçadas.
João é o pai de Pedro, um homem que trabalha numa indústria têxtil durante
sessenta horas semanais, somando as horas extras. Pedro pensa que seu pai gosta de
fábrica e, às vezes, pergunta como está o patrão. A criança tem a impressão de que
ambos, amigos, ficam conversando e, por essa razão, o pai demora a voltar para casa.
João tem consciência de que a situação não é essa, mas não explica a seu filho,
pois ele não tem idade para .. entender.
Maria, mãe de Pedro, observa como seu filho graciosamente se delicia com as
histórias que João lê para ele todas as noites. Ela recorda “Cangaceiros”, “O Quinze”,
“Usina” e outros. Maria comenta com suas vizinhas que a criança conheceu a vida na
floresta com Ferreira de Castro, autor de “A Selva”:
– Ele sabe quanto tempo demora um barco de Selam a Manaus; como é o trabalho
do homem nas terras da seringa.
Pedro vive de seus heróis, que sofriam, assassinavam índios e animais selvagens.
Esses heróis são livres para percorrer a selva, passear e desfrutar a vida. Pedro gostaria
de ser um daqueles e sentir-se herói também.
O tempo transcorre, trazendo novas experiências a Pedro.
Um dia ...
– Que acontece, pai? Algo está errado? É por minha causa, por não ter feito as tarefas?
– As tarefas da escola são sua obrigação e o controle que mamãe e eu fazemos a
respeito é para que você aprenda a obedecer às ordens que os outros lhe dão. Obede-
cer é uma questão fundamental para quem precisa trabalhar a fim de sobreviver, para
quem tem que vender sua força de trabalho como única alternativa para reproduzir-
-se, do mesmo modo que o seringueiro em “A Selva”.
– Mas, pai, você ainda não me disse qual a sua preocupação.
– Filho, para sobreviver há que se trabalhar, e é um luta conseguir, ainda mais para
mim, que não sou tão jovem.
– Mas você não tem esse problema. Gosta da fabrica, o patrão é seu amigo...
Como?
– As relações entre os homens se sustentam por contratos. Por exemplo, o matri-
mônio é um deles. Existe um contrato também entre mim e o dono da indústria. Ele
possui os meios de produção, e eu vendo para ele minha força de trabalho para poder
manter-nos, pois não tenho mais nada para sobreviver. Terminando o prazo desse ...
– Huummm!
– Cumprido o prazo de tal contrato, pode ou não haver renovação.
114
– Compreendo, pai, para você não existiu renovação, pois não é mais forte. Então, fotografia,
território e literatura
o que eu pensava da fábrica não é verdade? A realidade é outra?
– A realidade não é outra, a realidade é um processo do qual você estava compreen-
dendo uma parte. A imaginação e os valores que a escola lhe proporciona ajudam
a perceber somente uma parte dos acontecimentos. A outra, que lhe permite com-
preender o todo, você só chega a conhecer quando passa a fazer parte do mercado
de trabalho e, para isso, há necessidade de pensar o que você significa dentro de todo
esse processo.
– Nossa alternativa é sair daqui, assim como aconteceu por ocasião da seca do
Nordeste; lembra-se de “o Quinze”?
– Sim, como esquecê-lo? Então, pai, nós estamos obrigados a ir em busca de novas
possibilidades. Nós devemos sair também!
Quando João, Maria e Pedro preparavam as coisas para a viagem, Pedro e João...
– A história de nosso mundo aparece narrada nos livros que eu li para você, faz
tempo. As formas de convivência de nossa classe, os pobres com os ricos, como você
diz, não são distintas das apresentadas naquelas obras. A história, em consequência, é
revivida na literatura. Na “Usina”, podiam se ver algumas formas de concorrência pró-
prias desse sistema em que vivemos, um sistema onde a força do dinheiro mobiliza todo
um processo. Os interesses de classes em conflito mostram os usineiros expandindo o
seu domínio na região. Aqui, todos os métodos são válidos para a conquista do poder.
João continua falando para Pedro, enquanto Maria observa a cena com ternura, na
esperança de que Pedro pudesse compreender, pois ela só sentiu contos e heróis na
sua vida, e o que João falava causava-lhe grande confusão na cabeça.
– Filho, a classe dominante passa a influenciar o Estado, e este exerce sobre nós
o direcionamento de nossas vidas. Observe como nós, os dominados, somos vistos e
tratados como os seringueiros, ou os escravos. Somos a mão de obra que tem que ser
barata, para a usina, para o usineiro. Deste modo, ele obterá mais dinheiro e aumen-
tará seu poder.
– Filho, João narra algo que, para mim, é difícil de entender - diz a mãe -,mas ga-
ranto a você que as histórias de heróis são belas quando acreditamos serem contos,
porem cruéis quando percebemos que são reais.
– Viver pelo mundo com sonhos de heróis - interveio o pai - e viver num conto de
fadas. A terra nova que nos espera poderá ser cheia de aventuras, que necessitaremos
compreender. Será muito bom para nós três sairmos deste lugar, tentar uma nova vida
e, quiçá, realizar os sonhos de vocês dois.
Depois das palavras de João, os três começaram a avançar para sair do espaço que
lhes consumiu todas as forças e esperanças.
115
Geografia: – Olhem para todo esse verde, diz o filho. Ali há uma fábrica, está saindo fumaça
Metodologia do ensino
daquela chaminé de tijolos. Os trabalhadores, só pelo fato de estarem trabalhando,
certamente se sentem felizes. Podemos ficar? Gostaria de conhecer tudo. Isso ate se
parece com...
– A usina do Senhor Juca, lembra-se disso?
– Pai, não sabia que aquilo era cana-de-açúcar e esta, uma usina.
– Depois podemos voltar, vamos ter tempo.
– Sim, pai, com certeza, podemos voltar depois.
Que pensava aquele jovem para concordar assim tão facilmente com seu pai? Sen-
tir-se-ia como aquelas crianças castigadas por chuparem cana da usina? Estaria pensan-
do que o mundo dos contos com que sonhava não existe?
A viagem durou uns dias. Durante o trajeto, Pedro perguntou a João e Maria muitas
coisas de forma tímida, quiçá para não sentir-se desiludido ou contrariado. Haviam
chegado e...
– Onde está nossa casa?, pergunta Maria.
– Teremos que construí-la?, indaga Pedro.
– Rogaremos um pedaço de terra para plantar e, com as arvores derrubadas, edifi-
caremos nosso rancho - responde o pai.
– Será como estar num seringal!, exclama Pedro. O trabalho foi duro e prolongou-
-se por vários dias até que tudo ficou pronto. Durante algumas semanas, João e Pedro
ausentavam-se, caminhavam vários quilômetros para trabalhar no corte de cana e, as-
sim, poderem comprar os alimentos de que precisavam. Nesse ir e vir, cortar e cortar,
Pedro percebeu que a vida daqueles cortadores de cana, que tinha visto desde o trem,
não era fantástica, e que o processo de antagonismo das classes sociais a que se referira
seu pai voltava a se repetir. Ele não gostava de ficar por longos períodos naquele lugar.
Preferia voltar prontamente a sua terra, a sua casa, onde ninguém interviria na sua vida.
Pedro tinha aprendido que o trabalho era imprescindível para poder sobreviver.
Aprendeu a observar, em todo o processo, quem era ele, o que significava. À medida
que ia entendendo a sociedade, mais a rejeitava.
João continuou explicando como funcionava todo o sistema, onde os antagonis-
mos faziam parte da sua dinâmica.
O único lugar onde os heróis de Pedro ainda se sentiam seguros era a sua terra...
Sua terra?
– Quando o sistema se expande, filho, ele não conhece limites; observe como a
história do Senhor Juca reflete isso.
– Na verdade, papai, sempre tento fugir, esconder-me das situações, dos fatos. Vejo
como os homens percorrem longas distâncias para irem ao trabalho na usina. Como a
116
cana, na verdade, é um produto que dá mais dinheiro para o dono da terra do que o feijão, fotografia,
território e literatura
ele planta mais cana e paga uma miséria aos trabalhadores; com isso, o ganho é grande.
– Certo, filho, e você e eu cooperamos nisso, e não somos os heróis que pensáva-
mos que seríamos quando estivéssemos aqui.
– Papai, as relações entre as pessoas são complicadas, mas nunca imaginei que
pudessem nos acontecer todas essas coisas narradas por aqueles contos.
– Lembra as palavras de sua mãe a respeito de contos e realidade?
– As obras que eu li não são contos; são realidades.
– Acontece que as pessoas que escreveram aquilo viveram essas realidades. Os
leitores, em geral, vivem os personagens e não os processos, e pensam que tudo e
produto da fértil imaginação do autor. A falta de chuva que tivemos agora lembra-nos
“O Quinze”, onde a seca havia prejudicado os animais e o cultivo. Quando saímos da
cidade, você não pensou naquele conto?
– Certo, pai. Agora, veja: a situação física descrita é diferente da realidade? A fumaça
da chaminé da usina que já imaginou na obra de Rego, por acaso, não é exata? Quero
que compreenda que o homem possui imaginação fértil, mas tudo tem uma dose de
realidade. Somente temos que aprender a discernir o que é aparente do que é real, e
isso é produto da experiência e de leituras de outros livros.
– Papai, então tudo o que o homem imagina e tem escrito está acontecendo, acon-
tecerá ou aconteceu?
– Maria, lembra que foi em 1968 que o homem colocou o pé na Lua?
– Certo! Lembro, Pedro, que nesse tempo eu lia Julio Verne, que escreveu um livro
sobre fantasias de viagens à lua. Esse Senhor é bem antigo, e não podia ver coisas como
aquelas, pois eram do século passado. Acontece que ele acertou quase tudo.
– Filho, compreende que o escrito não é alheio a nossa realidade? Voltar a viver
as experiências daqueles livros nos permite compreender e relacionar todos aqueles
fatos e processos como pertencentes a uma etapa da história. Também e possível que
somente nós, como leitores, possamos compreender o que sucede nos textos, pois os
personagens dos livros são instrumentos do autor para vivenciar a história de forma
novelesca.
Quando Pedro terminou de ouvir seus pais, pensou que havia coisas que não
aconteceriam.
– Ei, os de dentro! Saiam desta terra, pois pertence ao senhor todo poderoso! - gri-
tou uma voz estranha, provavelmente a de um capanga.
Não foi possível fugir aos contos. Pedro, ao escutar aquelas palavras, sentiu que não
podia escapar a um sistema que dominava o espaço. Compreendeu ainda mais não ser
117
Geografia: possível manter a fantasia que tentou construir sobre sua terra. Tudo acontecia como
Metodologia do ensino
nos contos, com uma única diferença de que, neles, os personagens são fictícios, mas
lá estava a realidade... “Os personagens são instrumentos do autor para vivenciar a
história de forma novelesca.” Algo se moveu, porém, continuamos sem entender!
Proposta de Atividades
Referências
BENCOSTTA, Marcus Levy Albino; PEREIRA, Ana Paula Martins. História, cultura e
sociabilidades: representações e imagens das festas escolares (Curitiba, 1903-1971).
[Curitiba]: Universidade Federal do Paraná, [20--]. Disponível em: <http://www.
faced.ufu.br/colubhe06/anais/arquivos/346Marcus%20Levy_e_AnaPaulaPereira.pdf>.
VEGAS, Cíntia. A História contada pela arte da fotografia: Paraná. [S. l.: s. n.,
20--]. Disponível em: <http://www.parana-online.com.br/editoria/almanaque/news/
419584/?noticia=A+HISTORIA+CONTADA+PELA+ARTE+DA+FOTOGRAFIA>.
Acesso em: 12 jan. 2012.
118
10 A estação rodoviária
Américo Dias Ferraz.
Maringá - Paraná
Jorge Ulises Guerra Villalobos / Valter Tadeu Dubiela
introdUÇÃo
Neste capítulo, tem por objetivo discutir as questões relacionadas como o território
e a gestão democrática da cidade. Haja vistaque a cidade é um dos principais objetos
de estudo da Gegrafia. Esta reflexão foi desenvolovida mo marco das funções sociais
da cidade. Destacando-se a farantia do direio às cidades sustentáveis. Entendido como
direito à: terra urbana, moradia, saneamento ambiental, infraestrutura urbana e princi-
palmente à memória da paisagem urbana. Observando-se nisso, o princípio da gestão
democrática da cidade,m a qual no Estado Democrátcio de Direito se realiza através
da participação da população, das associações represtentativas dos vário segmentos da
comunidade, notadamente, na formulação, execução e acompanhamento de planos,
programas e projetos de desenvolvimento urbano.
Assim, aqui se expõem, utilizando-se de fontes diversas, as razões que justificam a
conservação, restauração e o tombamento da Estação Rodoviária Municipal de Marin-
gá como parte do patrimônio histórico, artístico e natural da cidade de Maringá e de
toda a região colonizada pela Companhia Melhoramentos Norte do Paraná1. Também
desenvolvemos uma análise sobre os atos praticados pela administração municipal da
cidade que culminaram com a demolição do prédio.
Em 2007, o edifício encontrava-se interditado pela Prefeitura de Maringá sob o
argumento de que sua estrutura estava condenada e de que o prédio não possuía
nenhum valor cultural. Apoiados em uma breve exposição do contexto histórico, ur-
banístico e cultural que envolve o edifício, expomos o quanto seria importante a con-
servação do prédio para a população atual e para as futuras gerações.
A função do antigo prédio da Estação Rodoviária Municipal de Maringá era estuda-
da desde a transferência das atividades da rodoviária para o novo terminal da Avenida
119
Geografia: Tuiuti. O rebaixamento da via férrea impôs a ampliação do estudo para toda a área
Metodologia do ensino
remanescente que se convencionou chamar de Novo Centro. Esta última, com enor-
mes potencialidades para a recuperação da qualidade de vida proposta pelo modelo
de cidade jardim, entregue à voracidade dos empreendedores imobiliários, a nosso ver
reproduz a lógica insustentável de degradação da cidade.
120
expulsos da zona rural pela erradicação do café que sucedeu à geada negra e ao grande a estação rodoviária
américo dias ferraz.
incêndio de 1975, pela expansão das pastagens e introdução da mecanização agrícola Maringá - Paraná
da soja. Pode ter sido por essa estação que boa parte dos novos migrantes partiu em
direção ao Mato Grosso e outros estados do norte do Brasil, na eterna busca do sem-
pre novo eldorado.
Enfim, esse edifício fazia justiça à sua forma de arco e portal de passagem, pois ele
carregava a lembrança festiva de reencontros e a memória saudosa de acenos de partida.
Independentemente de seu valor estético, esse espaço constitui uma referência para a
memória afetiva da grande maioria da população e somente esse fato bastaria para justi-
ficar seu tombamento como patrimônio histórico da região norte do Estado do Paraná.
A primeira rodoviária representa parte da história humana de busca do paraíso, onde
a aliança entre deus e os homens é reestabelecida, concretizada em uma cidade celestial
que resolva definitivamente a contradição entre o saber humano e as leis naturais, onde
o sonho utópico de uma vida sem sofrimento poderia ser definitivamente realizado.
A segunda rodoviária retrata a continuidade dessa pulsão ancestral, na história do
desenvolvimento da colonização do Estado do Paraná e do avanço demográfico em
direção às fronteiras com os outros países sul americanos. Ambos se enquadram nessa
busca antropológica da pindorama, do paraíso, do eldorado.
O tombamento e a restauração da Estação Rodoviária Municipal de Maringá e da
Praça Raposo Tavares seriam imprescindíveis, a nosso ver, para a manutenção da his-
tória e da identidade ligada ao modelo de cidade jardim, à conservação da memória
da evolução da ocupação do Estado do Paraná, bem como do papel desse Estado na
expansão do Brasil em direção ao interior do território.
a oriGinalidade da oBra
A originalidade do projeto era dada pela estrutura que suportava o trecho da mar-
quise sobre as entradas das duas fachadas do saguão. O engenheiro Gubert utilizou o
princípio estrutural das pontes de concreto, onde a via carroçável é atirantada em ar-
cos, para obter um vão livre superior a 25 metros. Esse vão, ainda hoje insuperado por
obras de arquitetura na região, era cortado por duas juntas de dilatação, prevenindo a
fadiga da estrutura pela ação da variação da temperatura.
A leveza da fina laje da marquise permitiu uma estrutura esbelta que apoiava ainda
uma casca em concreto armado. Essa casca servia de contraventamento da fachada,
proporcionando acabamento à cobertura metálica do saguão.
As largas colunas que ladeiam o saguão faziam pensar que o projeto previa a con-
tinuidade da casca de concreto sobre todo o espaço de espera e não apenas sobre os
mezaninos. No entanto, essa hipótese necessita ser verificada no projeto estrutural.
121
Geografia: Caso se confirme, a fundação e a estrutura da cobertura do saguão estavam superdi-
Metodologia do ensino
mensionadas, pois a carga aplicada pela estrutura metálica era muito mais leve do que
a carga de uma casca de concreto.
Gubert parece ter se inspirado em parte na antiga rodoviária de Apucarana, com
cobertura em arco de madeira e telhado de cimento amianto. Seu vão, comparável ao
obtido pelo arco de concreto, abrigava os ônibus, lojas e passageiros em um único
espaço, configurando uma rua coberta, escura e poluída, disputada pelas aves que
povoavam a estrutura da cobertura.
Para resolver o problema do fechamento da parte superior das fachadas do saguão
e da sustentação da marquise que cobria a passagem inferior, sem obstruí-la com pi-
lares, Gubert se valeu de sua experiência na construção de pontes. Utilizando o arco
de concreto e tirantes, Gubert conseguiu dar leveza à construção de concreto armado
e alvenaria autoportante, aliando claridade, limpeza, simplicidade e beleza em um
conjunto bem integrado à paisagem urbana, extremamente resistente às adversidades
locais, à falta de manutenção e às intervenções desastrosas que a enfeiraram e degra-
daram por um quarto de século.
Após a retirada dos anexos, podemos perceber as qualidades da sua arquitetura,
ainda não superada nessa cidade. Mesmo em meio ao abandono, é possível perceber
como os pavilhões, os arcos e o saguão conduzem o olhar do passante à vista da cate-
dral de um lado e da estação ferroviária de outro. A altura do saguão permitia focalizar
a torre do templo, símbolo da cidade, através do pano de vidro, por sobre a alameda
de frondosas tipuanas e palmeiras imperiais, sob o céu luminoso da região.
122
Por uma escada lateral chegava-se ao mezanino de onde era possível dominar ao a estação rodoviária
américo dias ferraz.
mesmo tempo a vista do interior do espaço de espera e da praça. Nesse nível, tinha- Maringá - Paraná
-se acesso às salas comerciais e ao restaurante. O restaurante, com seu terraço que se
prolonga sobre a marquise, possibilitava contemplar o movimento dos ônibus, a praça
e o eixo magnífico, tendo ao fundo a Catedral Nossa Senhora da Glória configurando
um belvedere privilegiado do centro da cidade.
Na antiga rodoviária, a Praça Raposo Tavares amenizava a monotonia da espera de
baldeação, oferecendo uma alternativa aos viajantes e o contato com os representantes
da sociedade e da cultura local. O percurso integrado com a cidade proporcionava
uma multiplicidade de sensações, de ruídos, cheiros, cores e texturas. Arquitetura e
fluxos urbanos integravam espaços contrastantes, estreitos e amplos, abertos e fecha-
dos, permitindo diferentes níveis de observação, oferecendo superfícies retangulares
e curvilíneas, equilibrando opacidade e transparência, obscuridade e claridade, aridez
e humidade, regularidade formal e acaso natural.
Na Praça Raposo Tavares, jornaleiros, vendedores ambulantes, prostitutas, desem-
pregados e pregadores oferecem seus serviços sob a proteção das frondosas árvores
que resistem nesse retângulo quase completamente pavimentado. Ainda hoje é sobre
o pavimento dessa praça que se organizam a maior parte das manifestações, passeatas
e comícios. É aí que se realiza boa parte dos espetáculos ao ar livre. Essa praça faz
parte do centro vital da dinâmica urbana e o seu tratamento não pode ser objeto de
transformação com base em estudos sumários, desligados do interesse público e sem
o consentimento expresso da população.
123
Geografia: degradação do centro de Maringá e um instrumento de recuperação do modelo de
Metodologia do ensino
cidade jardim do qual se inspirou seu planejamento inicial.
No estudo preliminar para a integração da Avenida Getúlio Vargas ao Estádio Wil-
lie Davids, adotado pela atual gestão sem consulta pública ou qualquer instrumento
de participação social, previa-se a completa destruição da Estação Rodoviária Muni-
cipal e da Praça Raposo Tavares para dar espaço à construção de estacionamentos
subterrâneos e para o rebaixamento do terminal urbano.
A destruição da praça para a construção do edifício-garagem demonstrou, a nos-
so ver, claramente a intenção de estimular o uso de transporte individual na área
central, absolutamente contrário à necessidade de conservação da qualidade do ar
nas áreas centrais e à urgência de diminuição dos gases de efeito estufa, imposta
pelo rápido aquecimento climático global (GIEC, 2001).
A demolição da Estação Rodoviária com o objetivo de interligar a Avenida Ge-
túlio Vargas e a Vila Olímpica, em nossa visão,era absolutamente dispensável, pois
esse edifício não impedia de forma alguma a continuidade viária. Pelo contrário, a
estação valorizava o percurso, oferecendo uma obra histórica que marcava o limite
entre o velho e o Novo Centro e que dividia a perspectiva da avenida em duas par-
tes distintas, proporcionando variedade e legibilidade à cidade (LYNCH; BANERJEE;
SOUTHWORTH, 1990). Destruí-lo, descaracterizá-lo ou abandoná-lo à deterioração
significa, em nossa acepção, privar a sociedade de sua memória e privar a posterida-
de de valores de referência que sirvam de base para a construção do futuro.
da desapropriação
Na lição de José Cretella Júnior, o grande princípio que informa o instituto
expropriatório é a preponderância do interesse público sobre o interesse privado3.
Ele se revela ao autorizar a apropriação do bem particular em nome do interesse
coletivo quando verificada a necessidade ou a utilidade pública, ou por interesse
124
social, mediante prévia e justa indenização em dinheiro nos termos do inciso XXIV a estação rodoviária
américo dias ferraz.
do Artigo 5º da Constituição Federal. Maringá - Paraná
125
Geografia: patrimônio como tal. Deveria, então, agir solidária e lealmente com o interesse go-
Metodologia do ensino
vernamental, ao mesmo tempo em que com o privado, pois com ele era coproprie-
tário. E não contra esses interesses, utilizando-se do seu poder. Vejamos: “A desapro-
priação [...] há de ser feita em prol de um interesse público. Não se desapropria em
favor de pessoa ou interesse privado9”
Salientamos que se o Estado não pode desapropriar para doar, também não pode com-
prar para doar, bem como não há razão de Estado para desapropriar e vender a terceiros.
Hodiernamente, o instituto da desapropriação somente tem razão jurídica de
existência quando combinadas necessariamente duas condições primordiais, quais
sejam: uma: a dos fins do Estado quanto à satisfação do interesse público;
duas: quando este, sem exceção, está combinado com a demanda por fazer
cumprir a função social da propriedade.
Lembramos, finalmente, que a Constituinte10 de 1988 definiu o Estado enquanto
atuante em suas finalidades essenciais, de modo a impedir que a administração pú-
blica se utilizasse de seus poderes próprios, do regime jurídico de direito público
para se sobrepor economicamente aos agentes particulares.
do interesse público11
A administração municipal, tanto no Decreto de Desapropriação nº 1343/2007,
quanto na petição de Depósito Judicial dos autos 2491/2009, alega o “interesse
público”, ou seja, fixa os limites do ato administrativo nessa seara.
No entanto, o interesse público, conforme podemos ler no Artigo 2º do decreto
desapropriatório municipal nº 1343/2007, está na “Reurbanização” da área onde se
localiza o imóvel, afirmando que nele serão edificados uma obra civil “monumen-
tal” e um centro cultural.
Porém, o que é monumental? Com tamanha amplitude, somente pode haver in-
certeza de conceito técnico, pois empregar o termo monumental para justificar uma
desapropriação, em nosso pensamento, é como argumentar o tudo pelo nada.
126
Agora, dizer “Reurbanização”, que é voltar a urbanizar o que já está urbaniza- a estação rodoviária
américo dias ferraz.
do a nosso ver não faz sentido técnico e jurídico. Portanto, a administração Municipal Maringá - Paraná
pretende fazer o que já está feito, em nosso entendimento, uma ação desnecessária.
Para caracterização integral do interesse público, no Estado democrático de direi-
to, fundamental é que exista equivalência entre os benefícios aspirados e os meios
utilizados para alcançá-los, que se evidencia pelos princípios da proporcionalidade,
razoabilidade e economicidade do ato.
Na mensagem de 231/2007, de 11 de dezembro de 2007, que pretende lei autoriza-
tiva para realizar Concessão Urbanística do imóvel da Antiga Rodoviária “Américo Dias
Ferraz”, a administração municipal afirma que tal empreendimento:
127
Geografia: Esse fato é constatável na Lei Complementar nº 1054, Anexo III, relacionada com
Metodologia do ensino
a lei complementar 331/99, conforme argumento apresentado na mensagem de lei
243/2007, de 26 de dezembro de 2007, que cria a Zona Especial ZE15 onde se lê que:
“permitirá a construção de um empreendimento que destacará o crescimento e o
desenvolvimento de Maringá” (grifo nosso).
Ressaltamos que a redação passa de não mais Monumental, como arguia no decre-
to de desapropriação, mas como um empreendimento que “destacará”.
Observamos que as expressões e argumentos ambíguos, trazidos pela administra-
ção municipal, a nosso ver não possuem o condão de sustentar a mais violenta das
ações estatais contra a propriedade privada, qual seja, a desapropriação.
Assim, o interesse que a administração municipal vai manifestando através das nor-
mas aparece também na análise retrospectiva da prática do administrador municipal,
ou seja, a dimensão subjetiva das ações realizadas pessoalmente pelo prefeito mu-
nicipal quando da discussão do tombamento do prédio, desenvolvida ao longo do
primeiro semestre de 2007.
Vejamos.
Em 25 de abril de 2007, o prefeito municipal participou da reunião da Comissão
Permanente de Preservação do Patrimônio Histórico e Artístico e Cultural de Maringá,
para “esclarecer a porcentagem da prefeitura e dos condôminos no consorcio da Esta-
ção Rodoviária Américo Dias Ferraz” (ATA nº 17 ,CEPPHAC).
Em 07 de maio de 2007, o prefeito municipal também participou da reunião da
Comissão Permanente de Preservação do Patrimônio Histórico e Artístico e Cultural de
Maringá. Dessa ata, transcrevemos o seguinte:
O Senhor Silvio Barros II, prefeito de Maringá, disse que cinco arquitetos já
estudaram e apresentaram propostas de preservação da rodoviária e que uma
delas contemplava a preservação somente do arco, não sendo considerada a
melhor proposta, pois havia uma preocupação quanto a sua estrutura. Tam-
bém expôs que nada teria a opor a preservação, caso o estado arcasse
com as despesas de restauro. Enfatizou ainda, que como gestor público
não pode aplicar dinheiro neste imóvel para restaurá-lo, pois a prefeitura
tem outras prioridades e urgências na área social que são bastante sérias
(ATA Nº 19 CEPPHAC, grifo nosso).
128
Ou seja, nesse documento oficial de 02 de maio de 2007 o argumento é a realiza- a estação rodoviária
américo dias ferraz.
ção de um projeto de estacionamento na Praça Raposo Tavares, que poderia afetar o Maringá - Paraná
12 Gabinete do Prefeito.
129
Geografia: É oportuno lembrarmos que o prefeito municipal já havia dito na reunião da Co-
Metodologia do ensino
missão Permanente de Preservação do Patrimônio Histórico e Artístico e Cultural de
Maringá que “nada teria a opor à preservação, caso o Estado arcasse com as des-
pesas de restauro”13.
No mesmo dia dessa reunião ordinária do Conselho Estadual do Patrimônio Histórico
e Artístico, realizada em 14 de maio de 2007, a Comissão Permanente de Preservação do
Patrimônio Histórico e Artístico e Cultural de Maringá deliberou por maioria “não tom-
bar o edifício da Estação Rodoviária “Américo Dias Ferraz” (Ata nº 20. Grifo nosso).
Porém, recomendava que:
130
Nesse contexto, estamos frente ao desenvolvimento prático da Teoria do Fato Con- a estação rodoviária
américo dias ferraz.
sumado, aplicado pela administração Municipal, buscando, com a demolição, a conso- Maringá - Paraná
lidação do fato. Assim, tanto empenho da administração nos parece estar sustentado
na irracional utilização dessa Teoria, objetivando tornar impossível qualquer defesa
dos direitos constitucionais.
ConsideraÇÕes finais
Neste texto, mostramos como a administração municipal de Maringá, em nossa
acepção, agiu como verdadeiro agente do mercado imobiliário no episódio da de-
sapropriação da Antiga Estação Rodoviária. Podemos observar que em nenhum dos
princípios constitucionais está contemplada a ação municipal fundada no interesse
imobiliário.
Portanto, julgamos incoerente o fato de atualmente poder público municipal ser
agente especial no mercado imobiliário, pois este utiliza seus poderes especiais para
atender a um mercado que possui capacidade de gestão independente e que pela sua
natureza é especulativo.
Lembramos que existem limitações constitucionais para a intervenção econômica
do Estado, como já citamos anteriormente, nas quais não cabe à administração muni-
cipal o papel de agente imobiliário.
Nesse caso por nós relatado, é evidente que princípios constitucionais foram feri-
dos com o ato da administração, uma vez que o administrador público, em nossa visão,
ao contrário de utilizar os instrumentos legais a sua disposição para o bem comum, fez
uso destes com desvio de poder.
Proposta de Atividades
131
Geografia:
Metodologia do ensino
Referências
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LYNCH, K., BANERJEE, T.; SOUTHWORTH, M. City sense and city design : writings
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132
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Anotações
133
Geografia:
Metodologia do ensino
Anotações
134