Esquema de resolução de um caso prático de Direito Administrativo II
Passo 1- classificar os órgãos em questão e integrá-los na Teoria Geral da Organização
Administrativa (por exemplo, no caso de estar perante um caso que envolva uma câmara
Municipal, classificá-la como órgão da pessoa coletiva município, que é uma autarquia local e que
pertence à Administração Autónoma do Estado);
Passo 2- na presença de um ato administrativo (148º), defini-lo (ato jurídico unilateral praticado,
no exercício do poder administrativo, por um órgãos da Administração ou por outra entidade
pública ou privada para tal habilitada por lei, e que traduz a decisão de um caso considerado pela
Administração, visando produzir efeitos jurídicos numa situação individual e concreta);
seguidamente, enquadrá-lo, primeiramente, na categoria de atos primário ou secundário; sendo
primário, se se trata de um ato permissivo ou impositivo; por fim, inseri-lo na categoria respetiva
(ato de subvenção, licença, autorização, etc.);
Passo 3- no caso de delegação de poderes, analisar os três pressupostos desta: delegante,
delegado e lei habilitante para a delegação;
Passo 4- Analisar o procedimento administrativo:
CRP – 267º/5 – “O processamento da atividade administrativa será objeto de lei especial, que
assegurará a racionalização dos meios a utilizar pelos serviços e a participação dos cidadãos na
formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito. A lei que fala é o CPA –
racionalização dos meios e participação dos cidadãos
CRP – 268º/1 - perspetiva restritiva de informações, mas ainda assim uma informação ampla.
CRP - 268º/3 - notificação (visto que os atos da administração estão sujeitos a autotutela executiva
e declarativa) e fundamentação (obriga a administração a tomar uma decisão racional e a os
particulares poderem perceber e caso seja necessário impugnar) são essenciais na nossa relação
com a administração.
Art.º 1º CPA – disciplina jurídica de todo o processo decisório da administração.
Porque é que as decisões da administração estão sujeitas a regras que disciplinam a forma como
esta chega às decisões?
A existência do procedimento administrativo é em primeiro lugar uma manifestação do próprio
principio da legalidade – natural que seja a lei a disciplinar a manifestação da administração e as
diferentes formas da atividade administrativa.
Dever de boa administração: não interessa que apenas a decisão seja legal, mas também a melhor
solução de modo a prosseguir o interesse publico – isto remete-nos para a margem de livre decisão
administrativa: a administração tem a possibilidade de optar entre varias opções legais, sendo que
uma é a melhor para a prossecução do interesse publico – que não é controlável pelos tribunais,
mas ainda assim a administração não pode escolher ao calhas.
O procedimento é também uma forma de disciplinar pela administração a aquisição dos vários
interesses relevantes (principio da imparcialidade) e a sua ponderação (tendo em conta o
princípio da proporcionalidade) para chegar a uma solução legal e a melhor.
Para além disso, subjacente ao procedimento, há um propósito da legitimação das decisões no
discurso.
Por ultimo, o procedimento administrativo é também o palco onde se dá lugar às garantias dos
administrados: falamos em notificação, fundamentação dos atos, participação dos interessados.
Estas garantias no procedimento administrativo têm também influencia do processo do
contencioso, nomeadamente com normas de exigência do contraditório. O contencioso, o processo
civil e administrativo, é mais antigo do que a disciplina do procedimento, têm em comum com a
administração o facto de ser disciplinada e as garantias que existem no contencioso foram em
alguns casos transportas para o procedimento administrativo.
O procedimento administrativo pode advir de uma iniciativa pública (oficiosa) ou de uma
iniciativa privada, sendo que na iniciativa pública quem o desencadeia é a administração
pública, ao passo que o procedimento administrativo privado é desencadeado por um
particular. A construção de uma estrada e uma licença para construção de uma habitação,
podem figurar cada um dos procedimentos, respetivamente.
As fases do procedimento administrativo:
1. Fase inicial/iniciativa;
2. Fase de instrução;
3. Fase da audiência dos interessados;
4. Fase de preparação da decisão;
5. Fase de decisão;
6. Fase complementar.
Fase inicial/iniciativa:
A fase inicial é aquela que desencadeará o procedimento administrativo, podendo advir de
iniciativa pública (oficiosa) ou privada, como foi devidamente explicado no inicio do post. Artigos
relevantes: 53º; 65º; 68º; 89º; 102º; 108º; 109º; 110/1CPA.
Fase de instrução:
A fase que se segue é a fase de instrução que se rege pelo principio do inquisitório, isto é,
fase em que a administração pública, sem a dependência da vontade dos interessados,
requer factos e esclarecimentos que mais facilmente levem à tomada da melhor decisão.
(artigo 58ºCPA).
Art.º 41º, CPA - na pratica não é assim tão simples. Pode ocorrer que o órgão que recebe o
requerimento não faça ideia de quem seja o órgão competente para decidir o mesmo, o que
provoca que o primeiro faça uma pesquisa sobre qual o órgão com a efetiva competência -
para MAFALDA CARMONA a solução passaria por devolver o requerimento ao
particular indicado que não sabe qual o órgão competente. Há aqui sempre uma fase que é
a fase do controlo de competências - o órgão da AP antes de tomar qualquer decisão deve
sempre certificar-se que é o órgão competente, sendo que se for incompetente essa
competência pode ser suscitada oficiosamente pelo órgão - art.º 40º.
Iniciado o procedimento a administração tem o dever de decidir - art.º 13º/1 - se não for da
sua competência aplica-se o 41º/1 In fine e 13º/2 - norma importante, ora basta o particular
mudar os fundamentos para que a administração tenha novamente o dever de decidir.
Art.º 55º - responsável pela direção do procedimento: temos que distinguir dois órgãos: o
órgão competente para a decisão final - aquele que nos termos da lei é competente para
praticar e no final assinar o ato administrativo, ao qual se dirige o requerimento -, e o órgão
responsável pela direção do procedimento - é aquele órgão que vai fazer praticamente
tudo até à decisão final. Procura -se reequacionar a distribuição das tarefas de direção do
procedimento (e não apenas da instrução) e de decisão. A mera faculdade de delegação da
competência de direção do procedimento, por parte do órgão competente para decidir, tal
como se encontrava estabelecida no n.º 2 do artigo 86.º do anterior Código, converte- se
agora num dever de delegação, embora rodeado de prudentes cláusulas de salvaguarda
(n.º 2 do artigo 55.º). Fundamento desta mudança: apresenta-se como mais idónea para
assegurar a imparcialidade do decisor – MAFALDA CARMONA tem algumas dúvidas
sobre a existência desta imparcialidade, visto que o ato de delegação é um ato pessoal ma
questão da escolha do delegado.
Problemas do 55º: 55º/1 diz que cabe ao órgão competente da decisão final, o que não é
verdade porque no nº2 diz que ele é obrigado a delegar ao inferior hierárquico. Depois do
“salvo” vem as cláusulas de salvaguarda.
O que é que o órgão responsável pela direção do procedimento vai fazer, porque não está
em causa só a instrução? 55º/4, 56º, 58º, 59º, 61º/2 e 110º/3, 115º e ss. 92º, 82º/1, 100º, 121º
e ss. Tudo isto combinado com o art.º 126º - é com base neste relatório que o órgão
competente para a decisão final vai tomar a mesma.
Na fase de instrução o particular deverá ser ouvido, devendo provar os factos que tenha
alegado, porém esta fase não deve ser confundida com a fase seguinte onde está patente o
principio da democracia participativa. Esta fase é apenas uma diligência instrutória.
Fase de audiência dos interessados:
Nesta fase, algo importante a notar é que caso tenha sido o particular a desencadear o
procedimento administrativo e portanto seja uma iniciativa particular, este tem o ónus de
demonstrar os factos que alegou, não o podendo fazer a administração publica, na medida em
que caso isso aconteça está-se perante uma situação de desvio de poder, uma vez que a AP
prossegue fins públicos e não privados (artigos relevantes: 115º/1 e 2; 116º/1; 119º/2; 12º CRP;
267º/5 CRP). Assim sendo, esta fase é caracterizada pelo principio da democracia participativa,
bem como aquela fase em que haverá uma colaboração entre o particular e a AP (111º/1 CPA).
Caso não haja, mas fosse legalmente obrigatória, ponderar a existência de uma nulidade
ou de uma anulabilidade (problematizar a consagração de um direito fundamental no art.º 267º/5
da CRP; se sim, nulidade (art.º 161º/2/d) CPA), se não, anulabilidade (art.º 162º CPA));
Desta forma e tendo em conta o principio da democracia participativa, a decisão final
deverá ser acompanhada de uma fundamentação adequada, pelo que existe sempre a
possibilidade de recurso da decisão no caso desta na ser satisfatória para os interessado.
Questão do dever de fundamentação (art.º 152º); caso seja necessário problematizar, uma
vez mais o vício em questão por via do art.º 268º/3; se considerarmos direito fundamental, será
nulo; se não, anulável por violação de lei;
Caso o interessado recorra da decisão, está-se no âmbito do procedimento administrativo
decisório de 2º grau.
Fase de preparação da decisão:
Nesta fase todo procedimento será analisado, desde documentos, provas, argumentos e
outras informações relevantes. Posteriormente, o procedimento é levado ao órgão decisório que
pode ser, singular ou colegial, caso seja singular emite um despacho, caso seja colegial emite uma
deliberação. (artigo 125º CPA).
Fase de decisão:
Esta é a fase que põe fim a todo o procedimento administrativo, isto é, a tomada de decisão.
(artigos 93º CPA; 126º CPA). Nesta fase é necessário ter em conta as divergências entre o órgão
decisor e o órgão instrutor, na medida em que as decisões de ambos podem divergir. Se for este o
caso, deverá ter-se em conta se no processo de instrução, o órgão instrutor ouviu os interessados,
caso não tenha ouvido, deverá marcar-se uma nova audiência, de âmbito meramente instrutório.
(artigos 123º CPA).
Prazos para decidir – art.º 128º, para MAFALDA CARMONA aquilo que também tem de se fazer
no início do procedimento é contar o prazo em que o procedimento deve ser realizado e que deva
ser tomada a decisão final.
A regra geral é a de que o procedimento deve ser concluído em 90 dias, salvo se outro
prazo decorrer da lei, podendo o prazo, em circunstâncias excecionais, ser prorrogado pelo
responsável pela direção do procedimento, por um ou mais períodos, até ao limite máximo
de 90 dias – prorrogação – art.º 128º CPA
128º/1 - como se conta o prazo de 90 dias? art.º 87º - e a partir de que momento? 128º/3,
onde há varias hipóteses:
data do requerimento do serviço competente - existindo uma diferença em relação ao
41º/2, benesse dada ao particular, mas também não se pode prejudicar o órgão
competente a decidir ao ponto de acabar por receber a remessa do requerimento do
outro órgão perto do final do prazo para decidir;
ou depois das formalidades especiais - essas formalidades são sobretudo os pareceres,
que no silêncio são obrigatórios, e só quando os pareceres chegam ou que termine o
prazo para emitir o parecer é que começa a contar o prazo de 90 dias.
Depois convém ainda ter presente o facto de audiência dos interessados suspender o
prazo - 121º/3.
Pode colocar-se a questão de que, se no decurso do procedimento o prazo para decidir só
conta a partir ou da emissão do parecer por outro órgão ou de acabar o prazo para esse órgão
emitir o parecer. O que acontece se o órgão que tem de tomar a decisão final não chegar a solicitar
o parecer a outra entidade?
Possibilidade de caso de (in)deferimento – 130º CPA
Fase complementar:
Esta fase define-se como aquela onde são praticadas determinadas formalidades, tais como:
registos, arquivos, notificação da decisão, publicação no diário da republica, entre outras (artigo
114ºCPA). Tem que ver com eficácia, execução e garantias.
Passo 5- competência:
Analisar a competência do órgão que pratica o ato;
Se não for competente, analisar se se trata de incompetência relativa (mesma pessoa
coletiva) ou absoluta (pessoa coletiva distinta); se for a primeira, anulabilidade; se for a segunda,
nulidade (art.º 161º e 162º CPA);
Na delegação de poderes, analisar com pormenor se pode ou não existir delegação, sob
pena das invalidades acima referidas;
Passo 6 - Maiorias
Analisar as maiorias de deliberação, pois se o quórum não estiver reunido, o ato é nulo (art.º
161º/2/h));
Analisar as maiorias de deliberação e de votação, pela mesma razão de acima.
Passo 7- ato secundário:
Possibilidade de existência de um ato confirmativo, de uma revogação ou da previsão de um
parecer;
No caso de revogação, ter em atenção aos art. 138º a 148º do CPA;
No caso de parecer, analisar a sua obrigatoriedade e vinculatividade, sabendo que a regra geral
do art.º 98º/2 do CPA é a de que os pareceres são obrigatórios, mas não vinculativos.
Exemplo problemático: no caso de ser referido "exige parecer favorável da entidade X", o parecer,
a ser obrigatório, apenas será vinculativo caso for negativo, pois se for positivo, a Administração
pode praticar o ato ou não;
Posteriormente, em termos de impugnação, problematizar acerca da natureza unitária do parecer
e do ato final; se ambos forem iguais, ou seja, se o ato final tiver o mesmo conteúdo que o parecer,
deve o particular impugnar os dois como se de um se tratasse; caso a matéria de ambos seja
diferente, impugnação dos dois em separado;
Passo 9- decisão da Administração:
Caso a Administração conceda a pretensão do particular, ou seja, caso haja deferimento, termina-
se todo o procedimento administrativo;
Caso haja indeferimento expresso por parte da Administração, tem o particular um prazo de 30
dias para impugnar o ato, caso queira junto dos tribunais (art.º 182º e 184º e ss. CPA e art.º 69º/2
do CPTA);
Passo 10 - garantias dos particulares (268º CRP e 182º e ss. CPA):
O particular tem ao seu algumas garantias administrativas a fim de solicitar a modificação
ou a revogação de um ato administrativo, isto é, posições jurídicas de vantagem que os
particulares têm em relação à administração que a obrigam a algo, podendo, nesta hipótese, ter
como objetivos: defender os seus interesses (vertente subjetiva da garantia) e/ou a legalidade
(vertente objetiva da garantia).
268º CRP
Políticas: partindo do estatuto do particular enquanto cidadão, isto no sentido de ser
membro da comunidade política, e segundo as coordenadas de um Estado de Direito
Democrático, as garantias expressam efetivamente uma dimensão política do controlo
administrativo, o que pode ser resumido nestas 5 principais figuras - (1) direito de sufrágio,
(2) de participação política e na vida pública, (3) de iniciativa popular, (4) direito de petição,
(5) de resistência, (6) direito de petição junto do provedor de justiça (art.º 23º e 268º/4
CRP);
Administrativas (graciosas): historicamente, correspondiam a uma graça/vontade do
soberano. Trata-se de garantias que os particulares têm face à administração. Garantias de
natureza petitória, que se traduzem num pedido de primeira decisão; e garantias de
natureza impugnatórias (182º 3e 184º e ss. CPA e 50º e ss. CPA), que pressupõe que já
exista uma decisão (Ex: impugnar a nota atribuída à prova avaliada pelo professor; direito
de queixa junto do provedor de justiça).
Judiciais: garantias perante os tribunais. Podem ser garantias que tenham a ver com a
resolução definitiva do litígio, uma ação onde se visa que o tribunal diga qual é o direito
aplicável ao caso concreto. No fundo, saber se quem tem razão é a administração ou o
particular; providências cautelares - são garantias judiciais que visam uma tutela imediata
da posição jurídica do particular, visa que não se tenha de esperar por uma decisão
definitiva; execução das sentenças - obrigar a administração a acatar a decisão dos
tribunais, nomeadamente a decisão transitada em julgado.
CPA:
Se o particular quiser pode impugnar o ato administrativamente junto do órgão que
produziu o ato, fá-lo pela via da reclamação, ou por via contenciosa - art.º 182º e 184º e ss. CPA.
Se o ato a impugnar provier de um órgão administrativo no exercício da delegação de
poderes ou se esse órgão for subalterno de um outro órgão, pode o particular socorrer-se do
recurso hierárquico (art.º 193º e ss. CPA). Com relevância ainda para os casos de recurso
administrativo especial
Possível providência cautelar – 182º/3 CPA:
Meio processual ao disposto do particular para que, na pendência do processo principal
(por exemplo, impugnação do ato), o particular possa garantir ou preservar a sua pretensão, daí
que possam ser conservatórias ou antecipatórias; ou seja, para prevenir a adoção de operações
materiais de execução ou promover a remoção das respetivas consequências, quando tais
operações sejam ilegais.