Modelo de Plano de Aula ou Sequência Didática, no contexto do Estágio não
Presencial, devido a Pandemia Covid-19
(De acordo com a BNCC)
TEMA: ÉTICA NO ENSINO TECNOLÓGICO
ESTAGIÁRIO: LEONARDO SOUZA DOS SANTOS
ESCOLA / INSTITUIÇÃO: Claretiano – Colégio São José de Batatais
DATA DA ELABORAÇÃO: 05/Novembro/2020.
1. Título da aula: O IMPERATIVO CATEGÓRICO OU O ETERNO RETORNO?
2.Tempo necessário: Quatro aulas de 45 minutos.
3. Etapa de ensino
Ensino Médio ou Educação de Jovens e Adultos
4.Ano ou série da etapa de ensino
Ensino Médio: 2º ano.
5. Objetivos da aula e Competências e Habilidades que serão trabalhadas na
aula:
5.1. Objetivos da aula:
Com a explicação expositiva e as questões respondidas a cada aula, como mostrará os
procedimentos, o curso tende a cumprir parcialmente as habilidades e competências programas na
Base Comum Curricular (BNCC). A reflexão proposta em conjunto com as respostas que os
alunos escrevem podem (dentro de um trabalho progressivo) estimulá-los a tomar decisões com
base em valores para resolver demandas mais complexas da vida cotidiana. As duas posturas
éticas, de Immanuel Kant e de Friedrich Nietzsche, são posturas diferentemente críticas dentro de
um cenário político e social que fundamentam uma atitude de condução da própria vida e de
interação com a vida do outro com responsabilidade. Da mesma maneira, essas perspectivas são
importantes para interpretar a concatenação histórica da cultura ocidental e reconhecer os rastros
de outros momentos no presente. O conteúdo visa refletir sobre a importância do sentimento que
os alunos tem em relação às emoções próprias e alheias, assim sobre a participação da razão e,
dizendo de outra maneira, desencadear decisões sobre o impacto dos outros em cada atitude
própria bem como o impacto de cada atitude própria nos outros.
5.2. Competências Específicas
Participar do debate público de forma crítica, respeitando diferentes posições e fazendo
escolhas alinhadas ao exercício da cidadania e ao seu projeto de vida, com liberdade, autonomia,
consciência crítica e responsabilidade.
5.3.Habilidades a serem desenvolvidas:
Analisar situações da vida cotidiana, estilos de vida, valores, condutas etc.,
desnaturalizando e problematizando formas de desigualdade, preconceito, intolerância e
discriminação, e identificar ações que promovam os Direitos Humanos, a solidariedade e o
respeito às diferenças e às liberdades individuais.
6. Área do Conhecimento (indicado pelos números e Componente
Curricular (entre parênteses)
Ensino Médio: Ciências Humanas e Sociais Aplicadas (Filosofia).
7. Conteúdo:
Unidades Temáticas/ Objetos do Conhecimento (Conteúdos).
A ciência ética de Immanuel Kant (o imperativo categórico) e a doutrina da vida de
Friedrich Nietzsche (o eterno retorno do mesmo) contribuem com [habilidade] a conduta ética
no debate público fornecendo conteúdo para a crítica ao comportamento exercido socialmente
através da postura universalmente válida ou da repetição infinita do instante, fundamentando
escolhas de cada aluno para conduzir a si mesmo ou a coletivos e respeitando outras posições
através do conhecimento sobre o que motivou outra conduta. As escolhas demonstram a postura
cidadã dos indivíduos (sua relação com os outros) no exercício do dever com os outros de
maneira a agir (imperativo categórico) para todos agirem igualmente (responsabilidade), e no
projeto de vida, de maneira a (eterno retorno do mesmo) escolher uma vida que tenha valor com a
repetição infinita (liberdade e autonomia).
De maneira semelhante [competência] esses critérios estimulam a criação de estilos de
vida e a análise de situações cotidianas. Os critérios explicam a importância da igualdade das
ações de cada um (imperativo categórico: ações universalmente válidas) e da diferença das ações
de cada um (eterno retorno do mesmo: instantes repetidos infinitamente). Ambas as éticas
fomentam tanto a reflexão sobre as liberdades individuais quanto sobre a liberdade coletiva e, da
mesma maneira, fornece uma análise sobre a intolerância nas posturas éticas e a discriminação
serve como exemplo nas situações.
8. Estratégia de Ensino
1. Gravar vídeos ou agendar encontros virtuais.
2. Ensinar os alunos a ensinarem os outros alunos.
3. Dispor uma folha para impressão na escola pelo aluno.
4. Comunicar os pais das estratégias de ensino.
9. Detalhamento da Aula
Aula 1.
Aula expositiva sobre o “imperativo categórico” no Fundamento da metafísica dos
costumes (aproximadamente 15 minutos).
Responder à questão “Qual ação você tornaria um dever com validade universal? Qual
ação você proibiria universalmente?” (aproximadamente 15 minutos).
Aula 2.
Aula expositiva sobre a “doutrina do eterno retorno do mesmo” (no aforismo 341 de Gaia
ciência) (aproximadamente 15 minutos).
Responder as questões “Qual momento da vida você repetiria infinitas vezes? Qual
momento da vida você não repetiria infinitas vezes?” (aproximadamente 15 minutos).
Aula 3.
Aula expositiva contrastando o imperativo categórico e o eterno retorno do mesmo
(aproximadamente 15 minutos).
Responder as questões “Qual o impacto coletivo em assumir como conduta o eterno
retorno do mesmo? As pessoas se importam umas com as outras agindo conforme a própria
vontade no instante?” e “Qual o impacto individual em assumir como conduta o imperativo
categórico? É importante considerar todas as pessoas devem agir na mesma situação para
escolher uma conduta?” (aproximadamente 15 minutos).
Envio de perguntas para a prova (respondida individualmente, em dupla ou em trio) para a
discussão na aula seguinte.
Aula 4.
Aula com discussão sobre a aplicação de prova (aproximadamente 20 minutos).
10. Recursos/materiais
(Professor)
Notebook ou computador com webcam.
Sala de Aula Virtual.
Lousa e caneta.
Editor de texto para ler as respostas dos alunos.
(Aluno)
Notebook ou computador com webcam.
Editor de texto para responder às questões.
11.Sugestão de trabalho interdisciplinar
Português, matemática, história, geografia, sociologia, química, física, biologia, religião,
artes (entre outros cursos possíveis).
12. Avaliação
Avaliação: Formativa.
Formativa: Escrita dissertativa sobre as perguntas referentes ao imperativo categórico e
ao eterno retorno. Abertura para decisão coletiva sobre a composição da prova em
respostas individuais, duplas ou trios.
1. O que é o imperativo categórico? Qual a importância e o problema em Immanuel Kant
criar uma ética universalmente válida? Exemplifique uma situação em que todos devem
agir de maneira idêntica.
2. O que é o eterno retorno do mesmo? Qual a importância e o problema em Friedrich
Nietzsche criar uma ética instantaneamente válida? Você identifica um momento em sua
vida que transforma todos os outros? A exemplificação é optativa é poderá ser discutida
coletivamente.
Debate coletivo com a sala sobre as respostas elaboradas.
13. Referências
AGAMBEN, Giorgio. Meios sem fim: Notas sobre política. Tradução por: Davi Pessoa. Belo
Horizonte: Autêntica, 2015.
CASTRO, Eduardo Viveiros de. Metafísicas canibais: Elementos para uma antropologia pós-
estrutural. São Paulo: N-1 Edições, 2015.
DELEUZE, Gilles. Espinosa e o problema da expressão. Tradução por: GT Deleuze 12. São
Paulo: Editora 34, 2017.
DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? Tradução por: Bento Prado Jr. e
Alberto Alonso Muñoz. 3a ed. São Paulo: Editora 34, 2010.
DERRIDA, Jacques. Voyous: deux essais sur la raison. Paris: Gallimard, 2003.
FOUCAULT, Michel. O corpo utópico, as heterotopias. Tradução por: Salma Tannus Muchail.
São Paulo: N-1 Edições, 2013.
______. A hermenêutica do sujeito (Curso no Collège de France 1981-1982). Tradução por:
Márcio Alves da Fonseca e Salma Tannus Muchail. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2010.
______. A coragem da verdade: o governo de si e dos outros II (Curso no Collège de France
1983-1984). Tradução por: Eduardo Brandão. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2011
GANDINI JUNIOR, Antônio. Fundamentos e método do ensino de filosofia I. Batatais:
Claretiano, 2013.
HARAWAY, Donna. Antropologia do ciborgue: as virgens do pós-humano. 2a ed. Belo
Horizonte: Autêntica, 2009.
KANT, Immanuel. A metafísica dos costumes. Tradução por: Edson Bini. Bauru: EDIPRO, 2003.
NIETZSCHE, Friedrich. A gaia ciência. Tradução por: Paulo Cesar de Souza. São Paulo:
Companhia das letras, 2012.
OLIVEIRA, Cláudio de; MOURA, Samuel Pedrosa; SOUSA, Edinaldo Ribeiro de. “TIC’S na
educação: a utilização das tecnologias da informação e comunicação na aprendizagem do aluno”.
Pedagogia em ação, v. 7, n. 1 (2015).
PIERRE, Levy. “Introdução: face à técnica” em As tecnologias da inteligência: o futuro do
pensamento na era da informática. Tradução por: Carlos Irineu da Costa. Rio de Janeiro: Editora
34, 1993.
SAFATLE, Vladimir. “Crítica da autonomia: liberdade como heteronomia sem servidão” em
Revista Discurso, v. 49, n. 2 (2019), p. 21-41.
SLOTERDIJK, Peter. Crítica da razão cínica. Tradução por: Marco Casanova; Paulo Soethe;
Pedro Costa Rego; Mauricio Mendonça Cardozo; Ricardo Hiendlmayer. 2a ed. São Paulo:
Estação Liberdade, 2012a.
SPINOZA, Benedictus. Obra completa III: Tratado teológico-político. Tradução por J.
Guinsburg, Newton Cunha e Roberto Romano. São Paulo: Perspectiva, 2014.
VIRÍLIO, Paul. A bomba informática. Tradução por: Luciano Vieira Machado. São Paulo:
Estação Liberdade, 1999.
______. “A cidade superexposta” em O espaço crítico: a as perspectivas do tempo real. 2a ed.
São Paulo: Editora 34, 2014.
14. Etapas para preparar a aula não presencial.
Duas etapas para preparar a aula não presencial estão já esclarecidas: a preparação da
aula com a Base Nacional Curricular Comum e a preparação do uso do tempo (cronopolítica)
nas aulas simultâneas ou gravadas para usufruto posterior. No entanto, como escrevi para a
professora Alessandra Farago em outra atividade (ciclo 2), a democracia é um objetivo da
gestão educacional. Derrida analisa como o poder na democracia é um poder de autonomia,
de dirigir a si mesmo, de fornecer a si mesmo as próprias leis a serem cumpridas e, assim, o
demos é composto pela força de autolegislação em que os indivíduos convivem, da mesma
maneira, dirigindo a si mesmos. A democracia é pensada como a força dos indivíduos de
legislarem a si mesmos uns ao lado dos outros.
Por ‘ipseidade’, eu subentendo pois algum ‘eu posso’ ou ao menos o poder que se dá a si
mesmo sua própria lei, sua força de lei, sua representação de si, o coletivo soberano e
reapropriador de si na simultaneidade da assembleia ou do estar em assembleia, do estar-
junto, do ‘viver junto’ como se diz também (Derrida, 2003, p. 30).
A democracia conceituada por Derrida e estabelecida socialmente como a crença de que
“a multiplicidade das perspectivas pode se incorporar em um demos, em um povo, nem
que seja expulsando parte da população da condição de povo” para não ser que não haja a
obrigação de sair das condições mesmas (SAFATLE, 2019, p. 27). Essa maneira de poder
sobre si mesmo que só é exercido se não existe outro que o retire de si mesmo
(imunidade), ou seja, trata-se de uma condução por exclusão daquilo que retira dos
agentes o domínio de si. Trata-se então de pensar uma democracia a partir do que nos
despossui de nós mesmos.
Conforme o conceito de participação apresentado por Deleuze (2017, p. 187), existe a
participação na escola em que os agentes operam em processos disjuntivos: ou o princípio
na escola força o agente a uma ação dentro das regras (emanação: o agente imita o
funcionamento escolar e age), ou a escola e o agente se esforçam univocamente gerando
um agente escolar e uma escola agenciada (imanência). Essas são duas maneiras de
participação na escola por todos os agentes integrantes da comunidade.
Após essa introdução sobre a preparação da aula não presencial, se há com a instituição
tecnológica de ensino a intenção de conduzir a aprendizagem do aluno, de sobrepor à
escola uma nova virtualidade (como pensa Foucault com o conceito de heterotopia) é
preciso que a aula se inicie com o professor e os alunos mostrando o rosto (cf.
AGAMBEN, 2015, p. 87-94). Mostrar o rosto é mostrar o lugar na comunidade onde o
humano aparece e se oculta politicamente para encontrar uma solução ao problema
exposto. O problema exposto pode ser uma reflexão que inicia a aula de filosofia ou um
ato de coragem sobre a verdade a respeito de como a cidade está organizada deixando
ressoar se há algo que pode ser feito ou se não há algo que pode ser feito (conforme a
organização democrática da escola). Sabendo que esse gesto de falar francamente em aula
é desagregador, é preciso ter em mente que a missão do professor é a união. A pedagogia
do conceito insiste em ensinar a virtude e como dar aos jovens qualidades e os
conhecimentos necessários, seja para viver, seja também para governar direito a cidade. A
atitude discursiva do filósofo visa unir (na figura do professor) o discurso parresiástico e
o discurso sábio e, da mesma maneira, ensinar o aluno o discurso parresiástico e sábio
(cf. FOUCAULT, 2011, p. 28). O filósofo (desde a antiguidade) oscilou entre a
intervenção pública na cidade e o ensino a um grupo seleto de alunos que interveriam, por
sua vez, na cidade (cf. VERNANT). O discurso filosófico em aula que contém a parrésia
(verdade que coloca a si mesmo em risco para a transformação da cidade) e a sabedoria
(aquela que decide entre o silêncio e a fala sobre a verdade de si) ensina a transformação,
não do outro, mas da ação do outro. Nesse sentido é a filosofia que se pergunta o que faz
com que haja verdadeiro e falso, o que permite o sujeito ter acesso à verdade, o
“pensamento que determina as condições e os limites do acesso do sujeito à verdade”
enquanto age com espiritualidade, ou seja, experiências tais como as purificações, as
asceses, as renúncias, as conversões do olhar [do outro sobre si mesmo e de si mesmo
sobre o outro], as modificações de existência”, o preço a se pagar para ter acesso à
verdade (FOUCAULT, 2010, p. 15). O professor ensina assim as condições que
fundamentam a verdade e a falsidade no cuidado de si com os outros e dos outros consigo.
Após uma reflexão sobre a condução da aula de filosofia, nos dediquemos a como os
encontros tecnológicos operam.
As máquinas do final do século XX tornaram completamente ambígua a diferença entre o natural e
o artifical, entre a mente e o corpo, entre aquilo que se autocria e aquilo que é externamente criado,
podendo-se dizer o mesmo de muitas outras distinções que se costumavam aplicar aos organismos e às
máquinas. Nossas máquinas são perturbadoramente vivas e nós mesmos assustadoramente inertes
(HARAWAY, 2009, p. 42).
Observemos a seguir como Paul Virílio destaca a interação entre o homem e a máquina no
espaço. Em O espaço crítico Paul Virílio constata que a tecnologia força a introversão na cidade.
Comecemos com a seguinte pergunta: “em que momento a cidade nos faz face?” para nos
perguntarmos “em que momento a escola nos faz face?” Essa pergunta permite compreender que
a cidade apresenta uma superfície, um limite, um contorno do território. A cidade, que já se abriu
a partir da materialidade das portas que colocam uma oposição entre dentro e fora, passou a ter
limites internos. Com a construção dos aeroportos pelos Estados no globo terrestre por volta de
1970, o ar se tornou uma fronteira de transição urbana. Porém, com a disseminação das
tecnologias de comunicação e da informação (que é o nosso objeto de interesse), a cidade passa a
apresentar uma superfície eletrônica. A interface da tela é a distinção atual entre o público e o
privado, o próximo e o distante, o veloz e o lento, o concentrado e o disperso. A distinção entre
centro e periferia ocorre não mais no espaço urbano, mas o virtual é o centro enquanto o real é a
periferia. Para muitos serviços, o acesso é oportuno não mais pela proximidade entre o meu corpo
e o outro espaço físico da cidade, mas pela proximidade informática. No entanto, a essa tradição
podemos objetar outro conceito de vida em comunidade que experiencia um intelecto sensível e
uma sensibilidade inteligente.
A comunicação através da tecnologia da informação cria um espaço-tempo superexposto:
a multiplicidade de telas com que através da internet nos aproximamos sobre o espaço
informático apresenta um número de perspectivas do espaço real superior à multiplicidade de
olhos que examinam o espaço real. Com os aparelhos tecnológicos, também o tempo astronômico
solar é sucedido por um falso dia eletrônico, em que a oposição entre dia e noite para o
funcionamento dos serviços transforma-se em na comutação de informações; de maneira mais
direta, o tempo se transforma em um dígito comunicável em tempo integral. Essa é a condição em
que o professor e os alunos se encontram em aulas dissincrônicas.
As máquinas não são apenas o suporte de transmissão de informações, mas interferências
audiovisuais instantâneas em outro espaço geográfico. A casa do professor interfere na casa do
aluno. O atual imperativo ético é “impor seu ‘meio’ à contemplação de uma multidão de
telespectadores” (VIRÍLIO, 1999, p. 23). Outra frase de Haraway nos fornece um paralelo do que
é explicado por Virílio: “a economia do trabalho caseiro, considerada como uma estrutura
organizacional capitalista mundial, torna-se possível por meio das novas tecnologias, embora não
seja causada por ela” (HARAWAY, 2009, p. 70), bem como a frase “as estratégias de controle
irão se concentrar nas condições e nas interfaces de fronteira, bem como nas taxas de fluxo entre
fronteiras, e não na suposta integridade dos objetos supostamente naturais” (HARAWAY, 2009,
p. 62). Inversamente, “a maior ameaça a esse poder é constituída pela interrupção da
comunicação” (idem, p. 65). Ou seja, Haraway explicita assim como Virílio que a economia da
sociedade torna-se tecnológica, o controle tem por objeto os fluxos de comunicação entre as
fronteiras e o avesso da sociedade é a interrupção na comunicação – porque a cidade se dissolve.
As tecnologias da informação e da comunicação, então, formam a cidade.
Com essas informações, podemos compreender com a disseminação das tecnologias da
informação e da comunicação (TICs) determinam a filosofia a um novo lugar na
contemporaneidade. Em primeiro lugar, a filosofia passa a conceituar esse novo espaço em que se
situa. Como vimos no tópico anterior, a filosofia passa pela reflexão a respeito do que é a vida
constituída na relação entre as tecnologias da informação e da comunicação e o homem – em que
a proximidade pela superfície eletrônica supera a proximidade da carne. Em segundo lugar, ao
contrário do que escreve Haraway, a filosofia trata de recuperar no espaço tecnológico a história
que a precede, como veremos brevemente a seguir. A questão que nos guia é: “como as
tecnologias da informação e da comunicação transformam da filosofia?”.
Como aponta Virílio no tópico anterior, a tecnologia não é apenas um sistema de
transmissão de informações, mas uma interferência em outro espaço geográfico. A filosofia, com
as tecnologias de comunicação e informação, passa a interferir em múltiplos espaços com
imagens, textos e vídeos. A filosofia não é mais discutida apenas em instituições físicas de
ensino, mas também em espaços informáticos, tanto por professores e alunos quanto por
quaisquer usuários interessados no tema, o que transforma o ensino. O campo da filosofia não
está mais restrito a um currículo obrigatório em uma instituição.
O espaço informático passa a ser usado pelas instituições físicas de ensino e as instituições
de ensino passam a se inserir constitutivamente no espaço informático. As aulas de filosofia tanto
usam o espaço informático como ambiente de comunicação (com a exibição de textos e vídeos
como suporte da transmissão de conteúdo) quanto usam o espaço informático como referência de
pesquisa para a comunicação no espaço real. Os materiais de apoio dos estudantes são
distribuídos tanto em livros físicos quanto em arquivos virtuais.
As escolas físicas integram progressivamente em si locais com acesso à internet e mesmo
os alunos e professores carregam consigo celulares e outros aparelhos tecnológicos. A mobilidade
dos aparelhos que o professor e os alunos podem dispor cria outras possibilidades de interação na
aula. O professor pode solicitar aos alunos que pesquisem temas instantaneamente e os alunos
podem pesquisar temas instantaneamente para solicitar uma explicação mais cuidada pelo
professor.
O professor e o aluno se comunicam filosoficamente tanto pela produção de um discurso
online (texto e vídeo) quanto de um discurso offline que contenha em si conteúdos virtuais. Na
filosofia, o professor e o aluno podem transmitir um conteúdo que lhe foi incutido através da
superfície informática (sem que a diferença entre a consulta do material físico ou virtual seja
percebida). O professor pode tanto de sua casa transmitir o material de ensino para o aluno virtual
quanto se dirigir a uma instituição física de ensino recuperando o material virtual preparado em
casa para a aula, assim como o aluno pode tanto da sua casa recuperar o material virtual de ensino
transmitido pelo professor quanto se dirigir a uma instituição física de ensino e consultar um
material de estudo virtual pré-disposto em casa. O estudo pode ter uma continuidade entre a aula
em uma instituição física e a casa.
Uma coisa é certa: a tecnologia embaralhou os processos educativos e impulsionou o
sujeito, como queria Haraway, a uma subjetividade híbrida. Infelizmente, o que esse diagnóstico
não ignora é que quem não possui acesso à internet por condições econômicas é
progressivamente empurrado à margem da sociedade – o que merece tanto uma reflexão ética dos
cidadãos quanto uma atitude política e democrática pelos governantes da sociedade. A realidade
tecnoeconômica incide cada vez mais sobre a educação dos sujeitos, o que merece um debate
coletivo. Para atingirmos, como definimos com Derrida, uma tecnodemocracia, ou seja, uma
democracia a partir dos despossuídos tecnológicamente que nos despossui de nós mesmos é
preciso pensar estratégias políticas para o pensamento. A escola imprimir uma folha com o
conteúdo a ser ensinado pelo professor é uma estratégia. Outra estratégia é que os próprios alunos
com acesso à rede informática e às aulas lecionadas ensinem os outros alunos despossuídos da
condição de aprender (sem ultrapassar-lhes o limite da vida psíquica). É preciso não apenas
ensinar a aprender, mas ensinar a ensinar. Trata-se, como quer Pierre Levy, de uma ecologia
cognitiva (cf. LEVY, ano, p. 10) ou uma verdadeira comunidade em que o impróprio move os
sujeitos: uns se dirigem à casa dos outros com máscaras para explicar-lhes conceitos, enviam-lhes
cartas. Outra maneira é o contato do professor com os pais para supervisionar se o aluno está
aprendendo via instrumentos tecnológicos.
Como escreve Oliveira, Moura e Sousa (2015) em um artigo sobre a inserção das
Tecnologias da informação e da comunicação na educação, a meta da inserção pode ser tornar os
estudantes ativos no processo de aprendizagem.
As novas tecnologias podem ter um significativo choque sobre o papel dos educadores, bem como
na vida dos educandos, influenciado assim em sua aprendizagem, a tecnologia, tem que ser apoiada por um
modelo geral de ensino que encara os estudantes como componentes ativos do processo de aprendizagem e
não como receptores passivos de informações ou conhecimento, incentivando-se os professores a utilizar
redes e começarem a reformular suas aulas e a estimular seus alunos a participarem de novas experiências
(OLIVEIRA et al., 2015, p. 84).
A estrutura educacional pode direcionar ao aluno um mundo tecnológico de informações,
mas deve (como um imperativo ético-afetivo contemporâneo) inserir na dinâmica das aulas a
transformação da postura frente ao aparelho tecnológico. As aulas devem fornecer critérios para a
seleção de conteúdos dispostos pela tecnologia, bem como, os alunos podem participar na
produção de conteúdos criteriosamente elaborados em conjunto pelo(s) aluno(s) e o(s)
professor(es): fazendo chegar até naqueles que não possuem acesso à informática, educando
alunos evasivos e pais abandonados no mercado de trabalho. Esse papel ativo em que o aluno e o
professor são aliados pode transformar as tecnologias da informação em tecnologias do
conhecimento. Essa parece ser, não a urgência, mas a emergência das instituições de ensino. Essa
postura deve ser adotada, não por alguns professores e alunos, mas pelas instituições de ensino
como um todo. Essa postura leva, não a nos perguntarmos “quem somos nós?” diante do outro
com uma atitude imunológica, mas a imprecisar as fronteiras entre nós e os outros em uma curva
infinitamente complexa – como em uma tribo indígena (cf. CASTRO, 2015, p. 28). Essa ação
move uma multiplicidade de tendências implicadas umas às outras para colaborar com os que,
além de não possuir acesso à internet, estão cansados pelas exigências do mercado de trabalho.
Por isso o conteúdo ensinado (conceitos, frases) pelos professores aos alunos e entre alunos
devem ser simples e intensos (para que ele se propague, como ocorreu com o texto da Nilma Lino
que a professora Raquel Arroxellas selecionou).
Nesse sentido, [como eu interpreto o ensinamento de Fernando Bonadia de Oliveira]
pensemos com uma frase de Spinoza que equivale direito e potência no estado de natureza: “o
direito de cada um[, inclusive sobre a educação] estende-se até onde se estende a potência
determinada que lhe pertence” (SPINOZA, 2014, p. 280), ou seja, dentro da dinâmica de ação
comum a potência comunicativa expressa o poder do agente como no estado de natureza descrito
por Spinoza. No entanto, esse mecanismo inteligível sem sensibilidade não parece ser o sentido
da política que descreve Spinoza descreve no Tratado teológico-político porque a interação em
sociedade modifica também a natureza dos indivíduos. Os indivíduos não abandonam a sua
natureza, mas a sociedade a transforma. Assim, em uma ação verdadeiramente comum, os
agentes escolares desenvolveriam sensibilidade para as diferenças capacitivas de comunicação
uns dos outros.
“O ciborgue é também o telos apocalíptico
dos crescentes processos de dominação ocidental
que postulam uma subjetivação abstrata [...]”
Manifesto ciborgue
Donna Haraway