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Maconha-Prevencao-Tratamento-e-Politicas-Publicas Outro Autor

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Renato Nogueira
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Nota: A medicina é uma ciéncia em constante evolugio. A medida que novas pesquisas ea propria experiéncia clinica ampliam 0 nosso conhecimento, sio necessérias modificagées na terapéutica, onde também se insere o uso de medicamentos. Os autores desta obra consultaram as fontes consideradas confidveis, num esforgo para oferecer informagdes completas e, geralmente, de acordo com os padrdes aceitos & época da publicagao. Entretanto, tendo em vista a possibilidade de falha humana ou de alteragdes nas ciéncias médicas, os leitores devem confirmar estas informagdes com outras fontes. Por exemplo, e em particular, os leitores so aconselhados a conferir a bula completa de qualquer medicamento que pretendam administrar, para se certificar de que a informagao contida neste livro esta correta e de que nao houve alterago na dose recomendada nem nas precaugées e contraindicagées para 0 seu uso. Essa © Grupo A Educagdo S.A., 2021, Gerente editorial Leticia Bispo de Lima Colaboraram nesta edigo: Coordenadora editorial Cléudia Bittencourt Capa Paola Manica | Brand&Book Preparagio de originais Lisandra Cissia Pedruzzi Picon e Marcos Viola Cardoso Leitura final Paola Araijo de Oliveira Projeto grafico e editoragao edu Servigos Editoriais Ltda Produgdo digital HM Digital Design M171 Maconha : prevencao, tratamento e politicas puiblicas [recurso eletrénico] | Organizadoras, Alessandra Diehl, Sandra Cristina Pillon. ~ Porto Alegre : Artmed, 2021 E-pub. Editado também como livro impresso em 2021 ISBN 978-65-81335-23-6 1. Maconha. 2. Psiquiatria ~ Dependéncia quimica 3. Satide mental. |. Diehl, Alessandra. !I, Pilon, Sandra Cristina. CDU 616.89 Catalogagao na publicagéo: Karin Lorien Menoncin— CRB 10/2147 Reservados todos os direitos de publicagdo ao GRUPO A EDUCAGAO S.A. (Artmed é um selo editorial do GRUPO A EDUCAGAO S.A.) Av. Jerénimo de Ornelas, 670 - Santana AUTORES Alessandra Diehl (org.) Psiquiatre ¢ educadora sexual. Especialista em Dependéncia Quimica pela Universidade Federal de Sao Paulo (Unifesp) e em Sexualidade Humana pela Universidade de Sa Paulo (USP). Mestra e Doutora pela Unifesp. Pos-doutorado em andamento na Escola de Enfermagem de Ribeirio Preto (ERP) da USP. Colaboradora do Grupo de Estudo sobre Prevengao do Uso Nocivo do Alcool e ou Drogas (GRUPAD) da EERP, USP de Ribeirdo Preto, Centro Colaborador da Organizacao Pan-Americana da Satide (OPAS) /Organizacao Mundial da Satide (OMS) para 0 Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem. Vice-presidente da Associacao Brasileira de Estudos do Alcool e outras Drogas (ABEAD) (gestoes 2017-2019 e 2019-2021). Sandra Cristina Pillon (org.) Enfermeira. Professora titular do Departamento de Enfermagem Psiquidtsica e Ciéncias Humanas (DEPCH) da FERP/USP. Professora visitante da University of Birmingham, Inglaterra (CAPES/PRINT). Especialista. em Dependéncia Quimica pela Unidade de Pesquisa em Alcool e Drogas (Uniad/Unifesp). Mestra e Doutora em Ciéncias pela Unifesp. Pés-doutorado na Faculty of Nursing, University of Alberta, Canada. Bolsiste produtividade em pesquisa do CNPq. Adaene Alves Machado de Moura Enfermeira. Especialista em Prevengao do Uso Indevido de Drogas pela Unifesp. Mestra em Ciéncias pela Universidade Federal de Sio Carlos (UFSCar). Doutoranda do Programa de Pés-graduacao em Enfermagem Psiquidtrica da EERP/USP. Alexandre Kieslich da Silva Psiquiatra. Docente do Curso de Medicina na Universidade do Vale do Taquari (Univates). Residéncia em Psiquiatria Geral pelo Hospital Sao Pedro de Porto Alegre ¢ em Psiquiatria da Adigao no Hospital de Clinicas de Porto Alegre (HCPA). Especialista em Terapia Dislética pelo Behavioral Tech. Mestre em Ciéncias da Satide pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Aline Cristina de Faria Enfermeira da Atencdo Basica. Professora de Etica e Legislagdo em Enfermagem da Prefeitura Municipal de Araraquara e Universidade de Araraquara (Uniara). Especialista em Satide da Familia e Gestdo dos Servigos de Satide pela Unifesp/Ministério da Saiide/Sirio-Libanés. Mestra em Ciéncias pelo Programa de Pés-graduacio em Enfermagem Psiquidtrica da EERP/USP. Amanda Heloisa Santana da Silva Enfermeira. Mestra em Ciéncias pela EERP/USP. Doutoranda em Ciéncies no Programa de Pés-graduagio em Enfermagem Psiquidtrica na EERP/USP. ‘Ana Beatriz Rizzo Zanardo Enfermeira. Mestranda no Programa de Enfermagem Psiquidtrica da EERP/USP. Ana Carolina Guidorizzi Zanetti Enfermeira. Professora doutora do DEPCH/EERP/USP. Ana Cecilia Petta Roselli Marques Psiquiatra. Especialista em Satide Piiblica e Mental pela Universidade Estadual Paulista (Unesp). Doutora em Ciéncias pela Unifesp. Membro do Conselho Consultivo da ABEAD. Belisa Vieira da Silveira Enfermeira. Mestra em Enfermagem pela Escola de Enfermagem da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Doutoranda no Programa de Pés-graduacio em Enfermagem Psiquidtrica da EERP/USP. Carla Aparecida Arena Ventura Professora titular do Departamento de Enfermagem Psiquidtrica da EERP/USP. Diretora do Centro Colaborador da Organizacdo Pan-americana da Satide/Organizagao Mundial da Saiide (OPAS/OMS) para o Desenvolvimento da Pesquisa em Enfermagem-Brasil. Carla Dalbosco Psicdloga. Assessora de direcio ¢ coordenadora adjunta do Mestrado Profissional em Satide Mental e Transtornos Aditivos no HCPA. Especialista em Atendimento Clinico: Terapia Familiar Sistémica pela UFRGS. Mestra em Psicologia Clinica pela Universidade de Brasilia (UnB). Doutora em Psicologia Clinica e Cultura pela UnB. Christopher Wagstaff Enfermeiro. Professor sénior da University of Birmingham, Inglaterra. Especialista em Sade Mental, Mestre e Doutor em Filosofia pela University of Birmingham, Inglaterra. Clarissa Mendonca Corradi-Webster Psicéloga. Professora doutora do Departamento de Psicologia da USP. Mestre em Ciéncias pelo Programa de P6: sgraduacao em Saiide na Comunidade da Faculdade de Medicina de Ribeirao Preto (FMRP/USP). Doutora em Psicologia pela Faculdade de Filosofia, Ciéncias e Letras de Ribeiro Preto (FFCLRP/USP). Fabio Scorsolini-Comin Psicdlogo. Professor doutor do DEPCH/EERP/USP. Mestre e Doutor em Psicologia pela USP. Pés-doutorado em ‘Tratamento e Prevengao Psicologica na USP. Felipe Ornell Psicélogo clinico. Professor titular do Curso de Psicologia da Faculdade Instituto Brasileiro de Gestao de Negécios (IBGEN), Grupo UniFtec. Pesquisador do Centro de Pesquisa em Alcool e Drogas do HCPA/UFRGS. Especialista em Dependéncia Quimica pela Faculdade de Administracio, Ciéncias, Educacao e Letras (Facel). Mestre em Psiquiatria ¢ Ciéncias do Comportamento pela UFRGS. Doutorando em Psiquiatria e Ciéncias do Comportamento na UFRGS. Editor da Revista Brasileira de Psicoterapia. José Manoel Bertolote Psiquiatra. Médico perito em Psiquiatria da Unesp. Professor voluntario da Faculdade de Medicina de Botucatu/Unesp. Especialista em Psiquiatria pela Associacdo Brasileira de Psiquiatria (ABP). Master of Science em Transcultural (Social) Psychiatry pela McGill University, Canada. Doutor em Medicina: Clinica Médica pela UFRGS. Membro do Conselho Consultivo da ABEAD. Jacqueline de Souza Enfermeira. Professora doutora do DEPCH/EERP/USP. Especialista em Gestao em Enfermagem pela Unifesp e em Andlise de Redes Sociais pela ARSChile. Mestra ¢ Doutora em Ciéncias pela FERP/USP. Pés-doutorado pelo Programa de P63-graduagio em Enfermagem Psiquidtrica da EERP/USP e Centre for Addiction and Mental Health de Toronto, Canada, Jodo Mazzoncini de Azevedo Marques Psiquiatra. Professor doutor do Departamento de Medicina Social da FMRP/USP. Especialista em Estrategia ce Satide da Familia pela FMRP/USP. Doutor em Satide Mental pela FMRP/USP. Larissa Horte Esper Professora universitaria, Professora doutora, Mestra e Doutora em Ciéncias pelo Programa de Pés-graduacio em Satide ‘Mental da FMRP/USP. Leonardo Afonso dos Santos Psiquiatra assistente do Instituto Bairral de Psiquiatria (IBP). Psiquiatra do Projeto de Epilepsia e Psiquiatria (PROJEPSD edo Departamento de Eletrofisiologia do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clinicas da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo (IPq-HCFMUSP). Colaborador do Programa de Doengas Afetivas (PRODAP) da Unifesp pelo IBP/IPq-HCFMUSP/Unifesp. Leonardo Ricco Medeiros Bacharel e licenciado em Filosofia. Especialista em Filosofia Clinica pelo Instituto Packter. Mestrando em Ciéncias na EERP/USP. Leticia Yamawaka de Almeida Enfermeira, Doutora em Ciencias pelo Programa de Pés-graduagao em Enfermagem Psiquiatrica da BERP/USP. Lisia von Diemen Psiquiatra. Professora adjunta de Psiquiatria da UFRGS. Mestra e Doutora em Psiquiatria pela UFRGS. Lacilene Cardoso Enfermeira e advogada. Professora associada do DEPCH da EERP/USP. Especialista em Satide Mental pela EERP/USP e em Enfermagem Forense pela Sociedade Brasileira de Enfermagem Forense (Sobef). Mestra e Doutora em Ciéncias pelo Programa de P6s-graduacao em Enfermagem Psiquidtriea da EERP/USP. Doutora em Ciéncias pela EERP/USP. P6s-doutorado na Faculty of Nursing, University of Alberta, Canada. Ludmila Goncalves Perruci ‘Terapeuta ocupacional. Especialista em Prevencao do Uso Indevido de Drogas pela Unifesp. Mestra em Ciéncias pelo Programa de Pés-graduagio em Enfermagem Psiquitrica da ERP/USP. Doutoranda no Programa de Pés-graduagio em Enfermagem Psiquidtrica da EESP/USP. Manoel Anténio dos Santos Psicdlogo. Professor titular da FFCLRP/USP. Especialista em Psicologia Clinica e Psicologia Hospitalar pela USP. ‘Mestre e Doutor em Psicologia Clinica pela USP. Livre-docente em Psicoterapie Psicanalitica pela USP. Maycon Rogério Seleghim Enfermeiro. Pesquisador em Satide Mental da EERP/USP. Mestre em Enfermagem pela Universidade Estadual de Maringd (UEM). Doutor em Ciéncias pelo Programa de Pés-graduagaio em Enfermagem Psiquidtrica da EERP/USP. ‘Nathalia Janovik Paiquiatra com atuagio em dependéncia quimica pelo HCPA/UFRGS. Psicoterapeuta de orientagio analftica pelo Centro de Estudos Lufs Guedes (CELG)/HCPA. Formacio em Terapia Comportamental Dialética pelo Behavioral ‘Tech/Linehan Institute. Doutora em Psiquiatria e Ciéncias do Comportamento pela UFRGS. Nicole L. Henderson Antropéloga. Mestra em Antropologia pela University of Alabama, Estados Unidos. Doutoranda (dupla titulagao) no Programa de Pés-graduagio em Antropologia (UA) e Enfermagem Psiquidtrica da EERP/USP. Patricia Leila dos Santos Psicéloga. Professora doutora do Departamento de Neurociéncias © Ciéncias do Comportamento da FMRP/USP. Especialista em Psicologia Clinica pelo HCFMRP/USP. Mestra em Educacio pela UFSCar. Doutora em Psicologia pela FECLRP/USP. Paula Becker Terapeuta ocupacional com formagao em Entrevista Motivacional. Especialista em Reabilitagdo pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Mestra em Saiide, Interdisciplinaridade e Reabilitagdo pela Unicamp. Doutora em Psiquiatria e Psicologia Médica pelo Centro de Economia em Saiide Mental (CESM) da Unitesp. Renata Brasil Araujo Psicéloga. Coordenadora e supervisora dos Programas de Dependéncia Quimica e Terapia Cognitivo-comportamental do Hospital Psiquidtrico Sao Pedro/RS. Presidente da ABEAD (gestéo 2019-2021). Diretora do Modus Cognitivo - Niicleo de Terapia Cognitivo-Comportamental. Aperfeigoamento Especializado em Dependéncia Quimica pela Cruz Vermelha Brasileira. Mestra em Psicologia Clinica pela Pontificia Universidade Catolica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Doutora em Psicologia pela PUCRS. Richard Salkeld Enfermeiro do Birmingham and Solihull Mental Health Foundation Trust, National Health System (NHS). Especialista em Satide Mental e Mestre em Ciéncias Sociais pela University of Birmingham, Inglaterra. Ronaldo Laranjeira Psiquiatra. Professor titular do Departamento de Psiquiatria da Unifesp. Coordenador do Instituto Nacional de Ciéncis e Tecnologia para Politicas Publicas do Alcool e Outras Drogas (INPAD). PhD em Psiquiatria pela University of London, Inglaterra. Ronaldo Rodrigues de Oliveira ‘Médico. Residente em Psiquiatria da Rede de Satide Divina Providéncia/Hospital So José. Mestrando em Biotecnologia na Univates. Ronildo A. Santos Professor de Filosofia/Etica éa USP. Professor doutor do Departamento de Enfermagem Psiquidtrica da EERP/USP. Especialista, Mestre e Doutor em Filosofia pela Unicamp. Sabrina Presman Psic6loga. Diretora da Clinica Espaco CLIF. Especialista em Dependéncia Quimica pela Uniad/Unifesp. Especielista em Psicoterapia Breve pela Santa Casa de Misericérdia do Rio de Janeiro. Segunda vice-presidente da ABEAD (gestao 2019-2021). Sonia Regina Zerbetto Enfermeira psiquidtrica. Professora associada do Departamento de Enfermagem da UFSCar. Especialista em Dependéncia Quimica pela Unifesp. Mestra e Doutora em Ciéncias pelo Programa de Enfermagem Psiquiétrica da EERP/USP. Pés-doutorado na EERP/USP. ‘Sueli Aparecida Frari Galera Enfermeira. Professora associada do Departamento de Enfermagem Psiquidtrica e Cigncias Humanas da EERP/USP. Especialista pelo Programme Conjoint da Doctorat En Sciences Infirmi, Université de Montreal, Canada. Pés- doutorado na Faculty of Nursing, University of Alberta, Canada. Bolsista produtividade em pesquisa do CNPq AGRADECIMENTOS Agradecemos imensamente gos autores que participaram desta obra! Pessoas amigas que aceitaram prontamente nosso convitee dedicaram seu tempo para esezever capitulos com preciosismoe empenho. Nossos estimados € sinceros agradecimentos também aos diretores da Escola de Enfermagem de Ribeirio Pretc (EERP) e as chefes do Departamento de Enfermagem Psiquidtrica e Ciéncias Humanas (DEPCH), da Universidade de Sao Paulo (USP), bem como a todos os docentes ¢ pos-graduandos pela colaboracao e participacdo na presente obra, bem como por sua constante busca pela inovacio, pelo aprimoramento do conhecimento e pelo desenvolvimento tecnolégico do cuidar. A University of Birmingham, na Inglaterra, em especial a0 professor Christopher Wagstaff, por contribuir com espago de crescimento cientifico e parcerias construtivas enquanto escreviamos e revisivamos 0s capitulos deste livro. Ainda, nao podemos deixar de agradecer 4 Artmed, selo editorial do Grupo A Fducagio, pela oportunidade de escrever uma obra sobre um tema to atual e urgente para o contexto mundial. Nossos sinceros agradecimentos a sua equipe de produgéo editorial, pela dedicacio e pelo profissionalismo na conducdo da presente obra. Finalmente, aos colegas e associados da Associagao Brasileira de Estudos do Alcool e outras Droges (ABEAD), em especial 4 sua atual presidente, Renata Brasil Araujo, a Sabrina Presman e a toda sua diretoria. A ABEAD tem se destacado como uma associagao independente que integra questdes cientificas, de satide, politicas e sociais, empenhando-se na missao de divulgar e motivar 0 debate informado em relapao as politicas e as tendéncias relativas As questdes que envolvem o uso de drogas, bem como na identificagdo de desafios no campo da dependéncia quimics em nosso pais. Alessandra Diehl Sandra Cristina Pillon APRESENTACAO Nao tivesse havido a pandemia por covid-19, provavelmente o Pais estaria agora discutindo a legalizagéo da maconha. Alguns paises jé aimplantaram, assim como cerca da metade dos estados norte-americanos. O debate tem sido grande, com s6lidos argumentos de parte a parte. Os que sio favoriveis & legalizacio prognosticam alivio no sistema carcerario € enfiaquecimento do trifico. Os que lhe sio contrérios mostram ntimeros emanados dos locais onde houve a legalizagao, evidenciando 0 aumento do consumo ¢ dos problemas dele decorrentes, além da nao redugio da criminalidade. Nesse debate, é importante considerar os aspectos socioculturais do nosso pais, onde sempre foi ‘marcante nossa deficiéncia em fiscalizar © cumprimento das leis. Desse modo, aqui, tanto o sucesso quanto o fracasso de eventual legalizagao alhures nao pode ser agodadamente sinalizado como um resultado dbrio. 114 2 necessidade de estudos sérios nacionais, com levantamentos epidemiol6gicos recentes para balizar a discussao e a tomada de decisao. E6 ai que se insere a grande contribuigdo deste livro organizado pelas doutoras Alessandra Diehl e Sandra Cristina Pillon. A doutora Diehl! 6, sem favor algum, a mais qualificada editora relativa a assuntos sobre dependéncia quimica na atualidade entre nés e reiine nesta obra uma pléiade de autores que conseguem, no conjunto, perpassar todo o tema com profundidade e atualidade. Para tanto, contribuiu a sabia mescla de autores consagrados na érea com jovens telentos, que produziram um livro rico, denso e escrito de modo leve e de facil assimilagdo. Seu conteido inclui desde 08 aspectos histéricos da Cannabis, passando pelos t6picos socioculturais, farmacoldgicos, bem como o possivel percurso que vai da experimentagio 4 dependéncia, os efeitos em distintos grupos etarios, em gestantes e pessoas que se encontram em situagao de rua. Ademais, examina as diferentes legislagdes sobre a maconha ¢ as experiéacias de legalizacdo/descriminalizacao que podem contribuir para o debate, ficando ao largo de reducionismos mais ditados pelas diferentes ideologias, esianco alicercada em dados coletados dentro do rigor cientifico. Tenho certeza de que o(a) prezado(a) leitor(a) gostara desta obra, como eu gostei, e que se enriqueceré com ela. Boaleitura! ‘Sérgio de Paula Ramos Psiquiatra, psicanalista. Doutor em Medicina. Membro titular da ‘Academia Sul-Rio-Grandense de Medicina Membro do Conselho Consultivo da ABEAD PREFACIO ‘Ontimero de pessoas que usam maconha diariamente e que a consomem em quantidades crescentes vem aumentando em varios lugares do mundo. Nos Estados Unidos, por exemplo, em 2006, cerca de3 milhdes de pessoas relataram usar algum produto com a substancia pelo menos 300 vezes por ano. Em 2017, esse nimero jé havia pasado para 8 ‘milhdes. Esse imenso contingente de usuarios esta consumindo uma maconha muito mais potente do que a que se tinha tempos atrés. Na década de 1970, a maior parte da maconha continha menos de 2% de tetraidrocanabinol (THO), © principio ativo da planta. Nos dias atuais, gracas ao impacto do desenvolvimento tecnol6gico na agricultura, 3 clonagem e demanda dos usuarios por uma substancia com uma “brisa” mais potente, contém de 20 a 25% de THC Hoje, jé ha alguma evidéncia de que 0 uso cronico de Cannabis est associado a diferencas estruturais tanto na substincia branca como na substincias cinzenta do eérebro, sendo mais proeminentes nas areas do pré-ctineo ° na substincia branca associada. Regides com alta expresso de lipase de monoacilglicerol, e, portanto, com sinalizacao de canabinoide endgeno potencialmente restrta em ambito fisioldgico, podem ser mais vulneréveis acs efeitos do uso cxénico de Cannabis na espessura cortical. Nesse cenétio, tém surgido especial interesse e muitas preocupagdes em relagio, principalmente, a0 uso de maconhs entre adolescentes e gestantes, bem como a outros impacts para a saiide publica, sobretudo no tocante A satide mental. Ente adolescentes, por exemplo, o uso de maconha ¢ um problema significativo devido aos efeitos prejudicial js bem-conhecidos da substincia no cérebro ainda em desenvolvimento. O consumo de maconha na adolescéncia ou em idade precoce afeta a meméria, o desempenho escolar, a atengio e o aprendizado, bem como aumenta o risco de desencadeamento de transtornos psic6ticos, depressao e ansiedade, envolvendo alteracoes no sistema de recompensa, rejuizos cognitivos @ potencial de mudancas estruturais no eérebro. Além disso, fumar maconha tem impacto negativo no sistema pulmonar, porque se trata de um componente irritante ao trato respiratério. Os adolescentes esta cada vez mais usando cigarros eletr6nicos, ou vaping, para administrar Cannabis, 0 que gera maior concentragao de suas propriedades psicoativas. E nao reconhecem os riscos para sua saiide e sua integridade fisica associados a0 consumo de maconha (p. ex., expor-se a acidentes de transito ao dirigir sob efeito da substincia).24 Em relagdo as gestantes, estudos transversais indicam uma prevaléncia elevada de uso pré-natal de maconha em mulheres com néuseae vémito na gravidez.*"* A maconha também ja é uma das substancias ilicitas mais amplamente ‘usadas por mulheres que amamentam, havendo, no entante, poucos estudos sobre os efeitos, em lactentes, de sua presenga no leite materno. No contexto juridico atual, que vern sofrendo alteragdes em varios paises, com mudanca de crengas culturais e auséncia de diretrizes laras, os profissionais da satide sto confrontados com questées éticas sobre a melhor forma de apoiar gestantes e mies que amamentam seus bebés quando o uso da maconha é um fator presente.2 0 consumo didrio de maconha por pessoas com problemas psicolégices graves mestra-se significativamente mais comum, sendo crescente nesse grupo. Considerando esse aumento e a alta prevaléncia do uso de Cannabis em individuos com ciagnéstico de quadros psiquidtricos graves, ¢ importante atentar para as possiveis consequéncias desse consumo para aqueles em maior vuinerabilidade relativa a satide mental.® As complicagoes psiquiatricas do uso de Cannabis esto relacionadas a idade de inicio, duracio da exposigao e fatores de risco relativos & satide mental, bem como ao contexto psicossocial no qual o individuo esta inserido. As associagdes mais importantes sdo observadas quando ha combinacao de fatores individuais constitucionais e potenciais efeitos da substancia. Uma relacio de dase e efeito do uso de Cannabis tem side considerada para sintomas psicéticos, sendo identificada maior vulnerabilidade em individuos que fazem uso da droga durante a adolescéncia, bem como naqueles com sintomas psicéticos prévios e em pessoas com risco genético elevado para esquizofrenia> Os canabinoides sintéticos também tém sido responsaveis por um grande numero dos pacientes que chegam as salas de emergéncia dos hospitais spresentando intoxieago, com eventos cardiovasculares adversos, incluindo numerosas ‘mortes, particularmente para os andlogos mais potentes que atuam no receptor canabinoide tipo 1 (CB1).2 Nesse cendrio, ha preocupagdes especificas em relagdo a populayéo pediatrica e a ingestao de alimentos contendo a substancia, pois esses casos seguem aumentandot! © uso do canabidiol também est se popularizando em varios locais do mundo. Alguns canabinoides da planta ‘maconha podem ter efeitos terapéuticos em certos pacientes, mas so necessarias mais pesquisas sobre a seguranca e a eficdcia de determinados canabinoides como tratamento mécico de diversas outras condigdes para as quais tem sido apregoada, uma vez que hé muitos problemas relacionados ao uso dessa substincia.!2 Em todos esses contextos, percebe-se que, nos tiltimos 30 anos, uma campanha de lobby pré-maconha ~ bastante astuta e envolvendo muito dinheito - tem transformado a visao cultural da populagio, tornando muitos paises mais tolerantes ao seu uso.! Por isso, ¢ importante que a opiniao pitblica e os profissionais da saiide sejam devidamente informados, por meio de um debate téenico e cientifico de literatura didatica e de boa qualidade, conduzido por profissionais que ndo tém conflito de interesse comercial em relacio a substancia, sobre os varios aspectos dessa droga. As organizadoras |L Berenson A. Marijuana ismore dangerous than you think. Mo Med. 2019:116(2):88-9. 2 ManzaP, Yuan K, Shokri-Kojori E, Tomasi D, Volkow ND. Brain structaral changes in cannabis dependence: association with MAGL. Mol Psychiatry. 2019 Nov 6. (Eoub ahead of print] 2 TaM, Greto L, Bolt K. Trendsand characteristics in marijuana use among publie school students - King County, Washington, 2004-2016, MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2019:68(39):845-50, 4 Worley J. Teenagers and cannabis use: why it’s a problem and what can be done about it. Psychosoc Nurs Ment Health Serv. 2019;57(3):11-5 5 Alshaarawy O, Anthony JC. Cannabis use among women of reproductive age in the United States: 2002-2017. Addict Behav. 2019;99:106082. 6 Young Wolff KC, Sarovar V, Tucker LY, Avalos LA, Alexeeff S, Conway A, et al. Trends in marijuana use among pregnant ‘women with and without nausea and vomiting in pregnancy, 2009-2016. Drug Alcohol Depend. 2019:196:66-70. {J Miller J. Ethical issues arising from marijuana use by nursing mothers in a changing legal and cultural context. HEC Forum. 2019:31(1)-11-27. {8 Weinberger AH, Pacck LR, Sheffer CE, Budney AJ, Lee J, Goodwin RD. Serious psychological distress and daily Cannabis use 2008 to 2016: potential implications for mental health? Drug Alcohol Depend. 2019:197:134-40. 9 Semple DM, MeIntash AM, Lawrie SM. Cannabis as a risk factor for psychosis: systematic review. J Peychopharmacal 2005;19(2):187-94. ‘10 Drummer OH, Gerostamoulos D, Woodford NW. Cannabis as a cause of death: a review. Forensic Sci Int. 2019;298:298-306. LL Wang, Banerji S, Contreras AF, Hall KE. Marijuana exposures in Colorado, reported to regional poison centre, 2000-2018, Inj Prev. 2019. pii:injuryprev-2019-043360. 112 Capriotti 7. Medical marijuana. Home Healthc Now. 2016;34(1):10-5. SUMARIO Aspectos historicos e sociais do uso de maconha no Brasil e no mundo José Manoel Bertolote Epidemiologia do uso de maconha no Brasil e no mundo Carla Dalbosco Felipe Ornell lisiavon Diemen Neurobiologia, farmacologia, efeitos agudos, crdnicos e neuropsicolégicos do uso de maconha Leonardo Afonso dos Santos Da experimentagao ao uso recreativo e a dependéncia ‘Amanda Heloisa Santana da silva Jodo Mazzoncini de Azevedo Marques ‘Ana Carolina Guidorizzi Zanetti Maconha, saude mental e transtornos psiquiatricos Alessandra Diehl Sandra Cristina Pillon Manoel Anténio dos Santos Maconha e adolescentes Patricia Leila dos Santos Belisa Vieira da Silveira Fabio Scorsolini-Comin Uso de maconha em idosos: um velho novo problema 10 1 12 13 14 15 16 17 Christopher Wagstaff Richard Salkeld Manoel Anténio dos Santos Sandra Cristina Pillon Consumo de maconha durante a gestacdo e 0 puerpério Adaene Alves Machado de Moura Ludmila Goncalves Perruci Larissa Horta Esper Sandra Cristina Pillon Uso de maconha por pessoas em situagao de rua e populagao carceraria Sandra Cristina Pillon Adaene Alves Machado de Moura Alessandra Diehl Canabidiol e seus efeitos terapéuticos Alexandre Kieslich da Silva Nathélia Janovik Ronaldo Rodrigues de Oliveira Experiéncias nacionais e internacionais da descriminalizagao e legalizagao do consumo de maconha Carla Aparecida Arena Ventura ‘Ana Beatriz Rizzo Zanardo Nicole L. Henderson Lucilene Cardoso Maconha sintética: a “maconha” que n&o é Cannabis Sandra Cristina Pillon Richard Salkeld Christopher Wagstaff Economia, “novos mercados” e maconha Paula Becker Tratamentos farmacolégicos e psicossociais para a sindrome de dependéncia de maconha Renata Brasil Araujo Sabrina Presman Alessandra Diehl Uso de maconha e abordagem familiar Sueli Aparecida Frari Galera Sonia Regina Zerbetto Maycon Rogério Seleghim A interface da ética e dos direitos humanos com 0 uso da Cannabis e seus derivados canabinoides Ronildo A. Santos Aline Cristina de Faria Leonardo Ricco Medeiros Maconha e sade sexual Manoel Anténio dos Santos Sandra Cristina Pillon Ronaldo Laranjeira Alessandra Diehl 18 Preveng&o do uso de maconha: melhores praticas Ana Cecilia Petta Roselli Marques 49 Politicas publicas voltadas para o consumo de maconha Jacqueline de Souza Leticia Yamawaka de Almeida Clarissa Mendonca Corradi-Webster 1 ASPECTOS HISTORICOS E SOCIAIS DO USO DE MACONHA NO BRASIL E NO MUNDO José Manoel Bertolote ORIGENS Origem da palavra Aplanta Cannabissativa e seus derivados estao registrados na lingua portuguesa hd séculos, seja como canhamo (desde oséculo XV), seja como maeonha (desde o século XVII). A primeira verso surgiti como um derivado do latim cannabis Ginho ou canhamo), e a segunda, como um dos resultados do trafico negreiro, entrou para o portugués com a chegads dos africanos de lingua quimbundo, sendo oriunda de ma’taria. Apesar da origem distinta dessas duas palavras, ligadas conceitualmente, Carlini observou que, de modo curioso, 2 palavra maconha é um anagrama de canhamo.2 Diante da origem gramatical e da diferenciagéo seméntica que cénhamo e maconha adquiriram ao longo dos ultimos trés ‘séculos, proponho aqui o uso de canabis para designar a planta em seu uso psicoativo, exclusivamente. Certamente alguérm continuaré a produzic canhamo como fibra téxtil, e usuarios, traficantes e a policia continuardo correndo atras da maconha. Todavia, para evitar imprecisdes e usos léxicos indevidos, ¢ como derivacao por via erudita, cdnabis serve melhor para ouso cientifico e académico, ao menos na area das ciéncias da satide. Origem da planta Cannabis designa um género de plantas angiospermas com trés subespécies (ou variedades): C. sativa, C. indica e C. ruderalis' (esta origindria da Asia Central),4 que contém mais de cem canabinoides ja identificados. 0 cinhamo chegou a América em 1492, com Cristévao Colombo, uma vez que as velas e o cordame de suas naus eram feitos desse material. Da mesma forma, chegou 2o Brasil em 1500, com a frota de Pedro Alvares Cabral. Todavia, sementes para serem cultivadas alegadamente como fonte de fibra, segundo documentos hist6ricos, foram levadas ac Chile pelos espanhdis em 1545 trazidas para o Brasil pelos escravos africanos no século XVIL® Origem dos usos De acordo com registros arqueol6gicos ¢ historicos, 0 uso da planta Cannabis sativa € seus derivados esta bem- documentado como fonte de fibra téxtil para a confeccao sobretude de cordas, eabos navais e tecidos ha cerca de 12 mil anos.“ Em comparacao, ha documentacao do uso do alcool hé cerca de 8 mil anos,® do épio, hd cerca de 6 mil anos,2¢

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