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Como Escrever Histórias (Raoni Marqs) - 1

Este documento fornece orientações sobre como desenvolver uma história, abordando tópicos como conceito, gênero, trama, personagens e estrutura narrativa. Na Parte I, discute-se a importância de definir o conceito da história e encontrar o gênero apropriado. A Parte II trata de elementos estruturais como a lei dos três atos e o monomito. A Parte III indica que o documento chega ao fim.

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Como Escrever Histórias (Raoni Marqs) - 1

Este documento fornece orientações sobre como desenvolver uma história, abordando tópicos como conceito, gênero, trama, personagens e estrutura narrativa. Na Parte I, discute-se a importância de definir o conceito da história e encontrar o gênero apropriado. A Parte II trata de elementos estruturais como a lei dos três atos e o monomito. A Parte III indica que o documento chega ao fim.

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1

índice
parte I: várias coisas
1 •
conceito...........................
.. 12 2 •
trama................................
. 34 3 •
logline..............................
. 49 4 •
tema.................................
.. 61 5 •
herói.................................
. 78 6 •
vilão.................................
.. 108

parte II: estrutura


7 • a
lei...................................
127 8 •
monomito........................
140 9 • segredo dos
ninjas......... 151

parte III: epílogo


10 • pronto...........................
163
3
intro 4

Por quê você quer escrever uma história?

Porque sim!
5

Histórias são legais: elas contam sobre o drama da nossa existência, sobre
a procura interminável pelo amor, sobre a tragédia da mortalidade e sobre
robôs lutando kung fu no espaço!
6

Você provavelmente já tentou escrever uma história: você teve uma grande
ideia, imaginou o que acontecia na sua história, criou um herói e um vilão,
pegou papel e caneta, e se sentou pra escrever tudo aquilo. Você estava a
alguns minutos de dividir a sua grande visão com o mundo!
7

Mas depois de 3 horas o seu papel estava mais ou menos assim:


E você, mais ou menos assim:

Se você tivesse desistido, você provavelmente teria sido bem mais feliz...
Mas você sabia que conseguia vencer aquele desafio, então ficou tentando
escrever aquilo pra sempre até ficar maluco.

Fique tranquilo, acontece com todos.


O motivo pra você achar que você consegue escrever uma história é
porque você consegue mesmo.

Nós ouvimos histórias desde que a gente nasceu. Histórias são tipo um
burgui: você pode não saber como se faz um, mas você já comeu vários e
sabe quando comeu um burgui ruim e quando comeu um burgui do bão.

10

“Mas se eu sei tanto assim sobre histórias, porque eu falhei


miseravelmente quando tentei escrever uma?”

Isso é porque você sabe ouvir histórias, mas pra escrever histórias, você
precisa conhecer os segredos dos ninjas: segredos milenares e mitológicos
que destrancam as portas da sabedoria e te permitem escrever como um
verdadeiro campeão.
11

Então pegue aquele papel e caneta de novo e tente esquecer do fracasso


que você sentiu quando tentou escrever pela última vez: dessa vez a coisa
vai ser séria e você vai chegar no fim da sua história, e aí vai escrever
outra história e outra e mais uma – porque vai descobrir que os segredos
dos ninjas são bem fáceis e o que te impediu de escrever da última vez era
alguma coisa estúpida que você só não sabia ainda.
12

PARTE I:
VÁRIAS COISAS

1
conceito 13
O primeiro passo da sua história é uma ideia.

Histórias tem começo, meio e fim, personagens, cenários, sequências de


lutinha com explosões e a sua ideia pode ser qualquer uma dessas coisas –
a sua ideia pode ser o fim da sua história ao invés do começo. Não tem
problema: você pode começar por qualquer lugar.
14

Mas não importa por onde você comece, o que você precisa pra se lançar
nessa incrível jornada de escrevimento (???) é uma...

~~~visão ~~~
15

Histórias caem do céu: elas aparecem do nada na sua cabeça porque o seu
cérebro viu um punhado de coisas e juntou tudo e, por um segundo, ele
criou essa imagem incrível de um universo fantástico em que heróis vivem
grandes aventuras onde coisas que você nunca tinha imaginado antes
acontecem.
16

Agora, eu sei o que você deve estar pensando: “Histórias caem do céu?!
Como assim? Eu achei que você ia me contar como eu faço pra escrever!
Cadê os segredos dos ninjas?!”
Mas
esse é o primeiro segredo dos ninjas: histórias vem de uma imagem
estranha na sua cabeça. Guarde essa imagem. Tudo o que você precisa está
nela.
17

A imagem na sua cabeça é o Conceito da sua história: é o aspecto geral de


tudo o que você quer contar.
Se você olhar a sua história de longe, o que você vê é o seu conceito.
Por exemplo: se você estivesse escrevendo Alien o seu conceito seria
“várias pessoas presas numa nave com um monstro assassino.”
18

Se você estivesse escrevendo Metal Gear, seria “um homem tímido


tenta deter um robô gigante.”
Se você estivesse escrevendo Transformers, seria “robôs que se
transformam em carros.”
19

Se estivesse escrevendo Pokémon seria “tráfico de animais & rinha de


galo.
E se
você estivesse escrevendo Tartarugas Ninjas, seria “tartarugas
ninjas.”
20

Então pense na sua ideia: o que você enxerga quando imagina a sua
história? E como você escreveria isso em pouquíssimas palavras?
Não, não, não! Não conte quem está fazendo o quê! Aqui a gente quer só o
conceito: a ideia geral da sua história, o universo em que ela se passa, o
que ela tem de diferente de todas as outras histórias, uma coisa bem curta
e grossa que conte sobre o seu projeto, tipo...

21

Star Wars pode ser sobre qualquer coisa: dá pra contar qualquer história
com o conceito “tretas no espaço”, mas isso já diz muito sobre o que essa
história não é – e é mais ou menos isso que você quer quando definir o
conceito da sua história.

O mesmo vale pra Dragon Ball: tem 7 coisas espalhadas pelo mundo que,
quando reunidas, invocam um dragão que realiza qualquer desejo. A
história podia ser sobre qualquer um – nada no conceito fala sobre o Goku
ou a Bulma ou sobre Deus ser um E.T. morando numa torre...
22

Conceitos são uma imagem que conta como é a história sem dizer qual é a
história.
Por exemplo, o pôster de Era Uma Vez no Oeste:
São 3 caras armados virados pra um outro cara armado e todo mundo usa
chapéu e bota: é um western e tem treta! Eu não sei sobre quem é ou o que
acontece, mas o conceito da história tá todo ali.
23
Você também pode definir o conceito da sua história como uma mistura de
duas histórias. Isso é bem útil porque fica muito mais fácil de entenderem
o que você está imaginando e também porque provavelmente foi assim
que você teve a ideia (o pessoal da Pixar tem ideias assim o tempo todo!
Eles olham pros brinquedos e pros carros e pros ratos e pros peixes e
pensam “o que essas coisas devem estar pensando agora?” e aí eles
escrevem um filme).
Ideias são um remix de outras coisas que você já viu, então não fique com
vergonha, vai lá e fala logo de onde você tirou essa ideia!
24

Por exemplo, Avatar nada mais é que...


(ou “Dança com Lobos no espaço.”)
E Mr. Robot é...

E Velozes & Furiosos é...


25
O mais importante sobre o seu conceito é que ele precisa ser:
Você quer que ele seja interessante porque você quer explodir a cabeça das
pessoas com o quão incrível é a sua história!
26

E você quer que seja fácil de explicar, porque se não, ninguém vai
entender nada...
27

Se você souber qual o conceito da sua história, pense em qual gênero ela
se encaixa melhor.

Se for sobre cowboys roubando um banco, ela é um western.


Se for sobre piratas espaciais tentando roubar o clone de uma princesa, é
uma ópera espacial.
28
Se for sobre dois jovens descolados encontrando o amor, é uma comédia
romântica.
Mas se for sobre esses jovens em busca do amor num universo paralelo, aí
pode ser uma ficção científica.
29
Quando encontrar o gênero da sua história, vá atrás de todas as obras desse
gênero que você gosta (filmes, livros, jogos) e encontre os pontos em
comum neles. Você quer que a sua história seja diferente, mas que tenha
características em comum com aquele gênero – pra que o seu público
reconheça a sua história como uma ficção científica, uma fantasia ou seja
lá qual for o gênero que você esteja escrevendo.
30

Por exemplo: Se você está escrevendo uma história de terror, você precisa
de muitas vítimas e um “monstro”.
Se você está escrevendo um mistério, sua história precisa de um crime e
um monte de suspeitos.

E se estiver escrevendo uma história infantil, não pode ter palavrões ou


sangue.
31

Claro que esse é um ótimo momento pra ser criativo: você precisa
encontrar os clichês do seu gênero, mas a sua história pode romper as
barreiras dele.

Nada impede um slasher (Sexta-Feira 13)...

de acontecer no espaço (Alien).


32

Dragon Ball, por exemplo, é a história de um menino com rabo de macaco


voando numa nuvem (baseado no personagem de A Viagem ao Oeste) que
encontra uma menina com um radar e cápsulas que se transformam em
motos, carros e aviões.
Desde o primeiro momento, Dragon Ball mistura elementos de ficção
científica (viagens espaciais, robôs, androides, viagens no tempo,
alienígenas) com elementos mitológicos (dragões, múmias, bruxas,
desejos, feiticeiros, Deus).

33

Faça o que quiser com a sua história, mas certifique-se de que tudo
funciona em conjunto.
E na dúvida, lembre-se:
34

PARTE I:
VÁRIAS COISAS

2
trama 35
Você tem um conceito: uma imagem de coisas acontecendo. Esse conceito
pode contar infinitas histórias: “juntar 7 esferas mágicas para fazer um
pedido” pode ser o pano de fundo pra qualquer história (ao invés de ser
sobre alienígenas com rabo lutando pra defender o universo, esse conceito
podia ser aquele filme do Nicolas Cage caçando tesouros nos Estados
Unidos).

Mas pra esse conceito virar uma história, você precisa de uma trama –
você precisa de conflito.

A trama é feita de duas partes:


36

A trama começa com a intenção: ela é a missão do protagonista na sua


história.

A intenção costuma combinar com o gênero da sua história: se você


estiver escrevendo um western, a intenção do protagonista pode ser livrar
a cidade de um xerife corrupto.
Mas se você estiver escrevendo uma ficção científica, é melhor você
arrumar uma intenção um pouco mais de acordo com o seu cenário...

37

Então não precisa pensar no que o seu personagem quer, pense na história
que você quer contar: quando você imaginou o seu conceito, você
enxergou pessoas lutando, carros correndo, cachorros fugindo, jovens
matando aula...

Use essa imagem pra criar a intenção do seu personagem, porque é isso
que vai levar a sua história até onde você imaginou.
38

Sua história conta sobre alguém lutando pra conseguir alguma coisa, ou
você não contou uma história. A gente quer emoção, bombas, chutes na
cara, decepções, corações partidos! Ninguém assiste um jogo de futebol
com um time só – a gente quer conflito!
Lembra de como o seu conceito explodiu a cabeça daquele cara? A sua
história tem que provar que aquele conceito era realmente um explodidor
de cabeças – a sua trama tem que extrair dele tudo o que a frase “pudim
assassino” (ou o que quer que seja o seu conceito) prometeu.
O seu conceito é um trailer. A sua trama é o filme: não decepcione os seus
fãs.

39

O jeito mais curto de definir a sua trama é:


“Alguém quer alguma coisa,
mas algo o impede”
Nessa frase a gente tem tudo o que o Aristóteles e o Aaron Sorkin acham
necessário pra uma história:
40
O seu protagonista é o seu herói – é ele que nós estamos assistindo – e ele
quer muito alguma coisa. Mas ele precisa ser impedido. Sabe por que?
Porque a gente tá assistindo. E a gente acredita no herói. Mas a gente sabe
que nada na vida vem de graça. Então esse cara não pode conseguir o que
ele quer sem nenhum esforço!
Se o Pudim Assassino conseguir matar todo mundo e for pras Bahamas
sem ninguém correr atrás dele, a história é péssima! Ele precisa escapar
pras Bahamas.
41
Se você tiver um protagonista, uma intenção e um obstáculo, você tem um
conflito: o conflito é a sua história.

Se a história é sobre um piloto (protagonista) que quer vencer um grand


prix (intenção) mas precisa ser mais rápido que todos os outros pilotos
(obstáculo), nós queremos ver a corrida (conflito) – e o conflito só existe
se o protagonista tiver um obstáculo.
42

Se você estivesse escrevendo Duro de Matar, o obstáculo seriam os


terroristas alemães (vilão arquetípico)...

...se estivesse escrevendo Romeu & Julieta, o obstáculo seria o quanto as


famílias deles se odeiam (amor proibido)...
...e se você estivesse escrevendo A Viagem de Chihiro, o obstáculo seria a
indústria hoteleira.

43

O obstáculo tem que ser tão grande quanto a intenção: se o seu


protagonista quer tomar banho, o obstáculo pode ser a falta de luz ou
água...
Se o seu protagonista quer salvar o mundo, o obstáculo tem que ser um
meteoro gigante que vai extinguir a raça humana. O importante é que o
protagonista PRECISE vencer os obstáculos – ele não pode desistir de
tomar banho!
44

Enquanto a sua intenção e obstáculo tem que ser proporcionais, o seu


protagonista pode ser o que você quiser!

Se o seu conflito for “salvar o mundo”, o seu protagonista pode ser tanto o
super-homem...
...quanto o Frodo.

45
O que muda de acordo com a escolha do seu protagonista são as
táticas. As táticas são as opções que o seu herói tem à disposição para
vencer o obstáculo.
O Super-Homem é super forte, super resistente, ele voa, tem visão de raio
x, visão de calor, sopro gelado e pode ficar sem camisa no espaço.
O Frodo tem um anel que deixa ele invisível, mas que ele não pode usar
porque deixa ele gripado e atrai os piores inimigos.
46

Se o Super-Homem tivesse que levar o anel pra Mordor, essa seria uma
história com nenhum conflito, porque nada na Terra Média consegue bater
nele.
E seria um problema se o Frodo tivesse que lutar com o Apocalypse...

47

“Mas você disse que o protagonista não precisa ser proporcional ao


obstáculo! O Super-Homem é totalmente proporcional ao Apocalypse! Por
que o Frodo não pode lutar com o Apocalypse?”
Porque o Super-Homem não tem que “derrotar o Apocalypse” ele tem que
“salvar o mundo” – a mesma missão que o Frodo tem. Se o Frodo tivesse
que salvar o mundo do Apocalypse, ele faria isso de um jeito que não
incluiria bater nele até a morte, porque as táticas do Frodo são outras.
48

Escreva um protagonista com táticas capazes de vencer o obstáculo; e


um obstáculo proporcional à intenção.
49

PARTE I:
VÁRIAS COISAS
3
logline 50
A internet está cheia de vídeos de gatinhos. Cheia. Tipo, entupida deles. Se
você dedicasse a sua vida toda a assistir vídeos de gatinhos, eu duvido que
você conseguisse ver todos antes de morrer.
A pergunta é: por que é que alguém ia querer ouvir a sua história se já
existem tantas coisas incríveis pra ver? Coisas que eu já sei que vou
gostar!
51

Vamos dizer que alguém pense em ouvir a sua história. Você tem uns 3
segundos pra convencer aquela pessoa de que a sua história vale a
pena.
A sua história é um filme ou uma animação ou um quadrinho ou um
livro – você provavelmente vai ter uma capa ou desenhos ou um
trailer pra mostrar pras pessoas e te ajudar a vender essa ideia. Mas
vamos imaginar que você só possa usar as suas palavras – porque
imagens são promessas vazias.

52

Coisas que você não vai


(em hipótese alguma)
falar nessa hora:
Ninguém liga se você escreveu sobre você mesmo, porque ninguém liga
pra você! A gente não vai achar que uma história sobre a sua vida é uma
boa história se a gente não sabe nada sobre a sua vida.
Se a sua história é baseada em outra coisa mais famosa, eu vou querer ler
essa outra coisa!
53

Ninguém liga pro making of de uma história que não importa – o processo
não quer dizer nada! Se eu gostar muito da história, só aí eu vou querer
saber como foi feito.
Se eu ainda não ligo pra sua história, eu ligo menos ainda pras ideias de
onde ela surgiu.
54

Mas então o quê você diz?

Você diz qual o conceito, qual o protagonista, qual a intenção e qual o


obstáculo.
Mas não desse jeito...
O que você quer é uma frase que resuma toda a sua história – uma frase
que conte “quem está fazendo o quê, e o quê a impede.”
Essa é a ...
55

A logline é uma frase que diz qual é a história que você quer contar: pra
você ela é um mapa do seu projeto – ela conta o eixo da sua história; para
o resto do mundo, ela é a resposta para a pergunta “será que eu vou gostar
disso?”
Você quer que a sua logline seja mais ou menos assim:

“Ao ter a sua honra questionada, o robô RX-02 desafia o príncipe dos
robôs, SS-14 para um duelo, mas sua fama de alcoólatra coloca todos
contra ele na estação espacial”.
56
Bom, vamos ver o que rolou aqui...
“Ao ter a sua honra questionada” é o evento que leva ao conflito, mas ele
também conta qual é a intenção do protagonista: reaver a sua honra.

“Robô” conta quem é o protagonista, assim como “príncipe dos robôs”


conta quem é o adversário e um pouco da relação de poder entre os dois –
afinal, um deles é um príncipe e o outro não.
57

“Duelo” sugere um conflito, mas enquanto essa seja a forma na qual o


conflito vai ser representado, existe outro drama rolando nessa logline:

O que causa o conflito é terem questionado a honra do RX-02, mas depois


nós descobrimos que ele tem uma “fama de alcoólatra” e que isso colocou
“todos contra ele” – isso é uma revelação para nós, mas também para o
RX-02, afinal o adjetivo do protagonista não era “alcoólatra”, era “robô”.
Por isso o “mas” no meio da frase é tão importante: é o momento em que
tanto o RX-02 quanto nós (o público) descobrimos que ele tem um
problema com álcool – o meio da história.
58
O conceito da história era “robôs lutando no espaço”, mas o que a logline
conta é que a trama é de um robô perdido na vida, que acha que conflitos
são resolvidos na porrada.
O fato de ‘todos estarem contra o RX-02’ estar na logline, mostra o quanto
esse momento é importante para a história: o protagonista pensava que
reconquistaria a sua honra vencendo um duelo, mas descobrir que todos
estão contra ele por ele ser um bêbado infame, mostra que a resolução do
conflito não está no mundo lá fora... mas dentro de si mesmo...

Ah, é: “na estação espacial” conta onde a história se passa...


59
Essa é a história de um robô desandado que tenta reconquistar as rédeas da
sua vida. O começo da história é ele sendo ofendido pelo príncipe, o
segundo ato começa quando ele desafia o príncipe para um duelo, o meio
da história é quando ele descobre que ninguém gosta dele e a segunda
parte do segundo ato é quando ele assume que tem um problema – nós
sabemos quase toda a história só pela logline.

Tudo o que resta saber é o fim – e é pra isso que as pessoas vão querer ler
a sua história.
60
Então pense em tudo o que você sabe sobre a sua história (intenção,
obstáculo, conflito) e escreva essa história em uma frase que conte tudo –
guarde só o final.
61

PARTE I:
VÁRIAS COISAS

4
tema
62
Se você já está cansado de regras que não envolvem “sentar e escrever a
sua história” e não aguenta mais essa coisa de “conflito”, “trama” e outras
palavras idiotas, se prepare, porque esse capítulo vai ser especialmente
horrível pra você.

Se tem uma coisa que a história do RX-02 pode provar, é que mesmo
quando você parte de um conceito imbecil tipo “robôs lutando no espaço”,
você pode escrever uma história dramática, séria e profunda. Não na
superfície – a superfície ainda tem robôs lutando no espaço – mas no
subtexto.
63
O trailer e o pôster do RX-02 prometem robôs lutando no espaço – esse é
o conceito e dele nós podemos escrever qualquer história. No caso, a
história do RX-02 era a de um alcoólatra que descobria que perdeu o rumo
da vida e que todos o odiavam.

Isso é falsidade ideológica? Não – desde que o RX-02 acabe lutando com
algum robô no espaço sempre que alguma coisa importante acontece.
64

Por sorte, nós sabemos exatamente onde as coisas importantes

acontecem.
Então em todos esses momentos, robôs vão lutar no espaço – é só fazer
com que a sua trama te guie até esses momentos e está tudo certo. O que
você precisa agora é que esses momentos signifiquem algo além de ‘robôs
lutando no espaço’.

Imagina que ao invés de robôs são carros e que ao invés de lutarem, eles
batem um no outro.
65

Carros batendo, coisas explodindo e robôs lutando são incríveis mesmo


quando você não sabe quem é quem ou o quê está em jogo.

E, que fique bem claro: a sua história pode ser só uma sucessão de carros
batendo – a sua história pode ser sobre o que você quiser!
Mas se a sua história for só um monte de carros batendo, ela vai ser um
lixo e você vai ser um péssimo escritor.

66
Histórias não são vídeos de gatinhos fofos. Esses são ótimos vídeos, mas
eles não duram 2 horas por um motivo: ninguém se impressiona com o
quanto um gatinho é fofo por tanto tempo.
Se você quiser prender a atenção de alguém por todo esse tempo, você
precisa fazer as pessoas acreditarem nos personagens, torcer por eles e crer
que a vida daquelas pessoas fictícias importa.
67

Histórias são feitas de texto e subtexto: eu vejo uma luta entre duas
pessoas – mas o que aquilo significa?
SIM! Ninguém viu Dragon Ball pra ver se eles iam pedir a paz
mundial quando reunissem as esferas do dragão, ou pra ver se o Goku
era um bom pai, ou pra torcer pro Gohan realizar o sonho de virar um
cientista. Mas essas coisas eram importantíssimas quando eles
estavam lutando!
68
Sua história tem um número de cenas e todas elas precisam de um
significado, para que o seu público invista as próprias emoções nos seus
personagens.
Em cada cena, o seu personagem deve estar em algum momento diferente
da jornada, de forma que, no final, o significado de todas as cenas juntas,
seja um só.
69
No fim das contas, sua história é só um veículo carregando o seu ponto de
vista sobre alguma coisa. Se você estiver de bom humor, sua história vai
ter um ponto de vista otimista; se você estiver puto da vida, sua história
vai ter um ponto de vista trágico e tenebroso.
Mas não importa como você esteja, a sua história é sempre o seu ponto de
vista. Então aceite essa condição e use isso pra deixar a sua história ainda
mais forte – se você acreditar no que os seus personagens dizem, eles
serão intensos e inquestionáveis!
70
A visão de mundo que você coloca na sua história (através do significado
por trás das suas cenas e personagens) é o seu tema.

O tema é a mensagem na sua história – você contou sobre os robôs


lutando, mas o que você quis dizer com isso?
Se você não tinha nada pra dizer (primeiro que a sua história deve estar
uma chatice, porque todo mundo tava falando coisas, mas ninguém falava
sobre o mesmo tema, então todas as conversas eram só conversas, sem
nenhum propósito; depois que) a sua história é, na melhor das hipóteses,
um longo vídeo de gatinhos fofos...
71
...(quem são esses gatinhos? por que eles estão aí? quais são
as consequências deles serem tão fofinhos?)

...ou um longo vídeo de carros batendo (quem estava nos carros? quem
sobreviveu? o que levou os carros a bater?)
...ou um filme dos Transformers (???????)
72
Para deixar claro (tanto pra você quanto) pro seu público qual é o tema da
sua história, use o começo da sua história para plantar esse tema no
diálogo dos seus personagens.

Gladiador é sobre um ex-general que volta para vingar a mulher e o filho,


mas só consegue vencer seu inimigo quando aceita lutar para transformar
Roma numa república novamente, ao invés de só conseguir vingança.

O tema de Gladiador é “legado” – a gente sabe, não só porque ele vence


ao deixar de lado a vingança pessoal e lutar pelo futuro de Roma, mas
porque no início do filme ele dá um discurso pro exército que diz...
73
Interstellar é um filme sobre a vida após a morte – é a história de um
homem que parte rumo ao desconhecido e se comunica com a própria filha
lá do mundo dos mortos.

Eles chamaram todo astrofísico no planeta pra contar sobre como a ciência
no filme é perfeita, mas Interstellar é sobre o que há depois da morte – é o
filme mais espírita desde Amor Além da Vida. Tem até aquela sequência
em que eles continuam jovens, mas os vivos (a galera que ficou na Terra)
envelhece.

Tudo naquele filme tem forma (astronautas, física, espaço) e conteúdo


(morte, fantasmas, paraíso): tudo parece uma coisa, mas é outra.
74
Histórias são um conjunto de cenas e personagens unidos por um tema – a
sobreposição do texto e do subtexto é que cria a história.
É como um sorvete de Flocos: as suas cenas são o chocolate e o seu
subtexto é o sorvete de creme – sem a trama, é só um sorvete bem sem
graça; mas sem tema, não é mais um sorvete.

75
Chapeuzinho Vermelho, por exemplo, conta a história de uma menina com
uma roupa exótica, tomando decisões questionáveis que a levam a um
vilão terrível que destrói tudo o que ela ama – mas aí aparece um cara que
salva todo mundo.

A protagonista frágil, a roupa vermelha, o lobo mau, a avó, os doces, a


floresta, o caçador... tudo isso é só o marketing da história. Esses
elementos da história estão aí pra entreter as crianças, quando na verdade
o que os pais estão dizendo é:
76
Sem o tema, a sua história é só um monte de personagens que falam e
fazem coisas que não tem significado nenhum...
...mas sem a trama, a sua história é só você gritando sermões igual um
maluco.
77
A trama e o tema precisam trabalhar juntos e em doses iguais, de um jeito
que você entretenha o seu público ao mesmo tempo em que transmite o
seu ponto de vista.

assim você tem uma história – uma que as pessoas vão gostar de ouvir.
78

PARTE I:
VÁRIAS COISAS

5
herói 79
O protagonista de uma história, é aquele que leva a história a diante; o
herói; aquele que realiza grandes feitos e transforma o mundo ao seu
redor. Ele é assim:

O problema é que nós estamos assistindo e nós só vamos investir as nossas


emoções em alguém com quem a gente se identifique, alguém como a
gente... alguém assim:
80
Então vamos rever esse conceito: quem é o protagonista da história?

O protagonista da história
somos nós.

A história serve para nos contar alguma coisa, mas nós só vamos ouvir se,
num nível subconsciente, aquilo estiver acontecendo com nós mesmos.
O
que quer dizer que o seu protagonista tem que ser... um total perdedor.

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