DOIS TIPOS DE c
tuam praticados pelo regime no Brasil. Um far ncot'%® © imprensa
via, outro, autocensura, Ambos os rétulos eram ennnt> conSUra Pré-
sora prévia, exercida apenas contra um punhado deere A cen
taminava que tudo o que fosse preparado por um een tee de
ninado pela policia antes da divulgacdo, A autocens nt Set exe
ibigdes de noticiar certos fatos que eram idieatiig Tana tone
dal ts publicagdes antes de sua investigacao e divulgartos aa ke
deseu conhecimento, no caso de muitos eventos ache De aa
ma, a censura prévia nao intervinha num estagio tao micas ay
ae pene a autocensura, e a autocensura certamente nao era pa
Gatcrmms, Ambac ora logs Cacao games cae
's do publico tanto quan-
pene Ambas eram executadas de acordo com uma série de pro-
ee otizades c repetidos no pais inteiro. Uma importante
ae pecs: Porém, era o fato de que a autocensura decorria
aie oa assinadas, enquanto a censura prévia con-
lis Patera gente identificdvel imediato, na figura do censor da Po-
mo a Parte por causa disso, a censura prévia também pro-
Pease atingide Teacao e muito maior resistencia por parte da ae
desatig ee 4, inclusive atos didrios de sabotagem e maquinagées de
i Teagdes da imprensa A censura prévia nao conse-
TA censura, que acabou somente quando o regime assim 0Mw AcoRDO FORGADO ———
25 cae
as reagdes eram mais elaboradas, criativas e eng;,
nsura. a
nsura prévia 6 possivel deixar passar 0 fats 4
le
‘ara,
anti.
decidiu. Mas
do que com a autoce
9 analisar a ce \
que pe modalidade de censura do Estado era ilegal, secreta e
mveiro era inconstitucional. O Brasil tinha legisla
process permitiam a censura “moral” dos espeticulos e recreagio, on
Especial do cinema e televisdo, Em 1970, Alfredo Buzaid, ministry q,
Seatica, baixou o Decreto-lei n? 1.077, aue autorizava a censura mora
de livros e revistas recreativas, mas nao a censura politica de noticiag
Gu informagao. Nos termos do crucial Ato Institucional n® 5, de 1969, ,
AI-5, a liberdade de imprensa (bem como outros direitos assegurados
na Constituicdo) podia ser suspensa em caso de estado de sitio, mas
nunca foi declarado estado de sitio durante @ 6poca da censura prévia,
e foi a esse ponto que as contestagées juridicas 4 censura prévia se re-
foriam. A eensura politica da imprensa era ilegal nos termos das pré.
prias normas do regime.
Nao é de surpreender, pois, tendo em vista a preocupagao do re-
gime, muitas vezes contraditoria embora recorrente, quanto & sua le-
gitimidade, os esforgos empreendidos para fazer um grande segredo da
censura. Estar sujeito 4 censura prévia nao implicava qualquer aco ofi-
cial publica. Nao havia notificagao por parte de um juiz, tampouco nor-
mas publicas sobre os procedimentos & jimites da censura. Os jornais
simplesmente eram avisados pela Policia Federal de que tinham de
apresentar todas as matérias. As publicagbes nao podiam avisar que es-
tavam sendo censuradas e, de fato, a censura em si era um dos temas
mais censurados. Nao havia nada parecido com 0 imprimatur que todos
os jornais traziam junto ao seu logotipo na Espanha com Franco ou em
Portugal com Salazar, declarando que as matérias do jornal tinham
sido examinadas e aprovadas pelas autoridades. A consternagao ¢ ira
demonstradas pelo regime brasileiro por causa dos processos judiciais
movidos pelas publicagdes censuradas decorriam em parte do fato de ter
de admitir a existéncia da censura.
Era esse um. aspecto da peculiar dualidade resultante do carater
repressivo do regime e do concomitante desejo de legitimidade. O re-
gime precisava de que a censura prévia fosse um segredo relativa-
mente piiblico (quer dizer, puiblico pelo mi i sa)
a fim de poder rechagar Lae Pp enos na esfera da imprensa
blicacdes, azmente possiveis desafios de outras pu
. Por outro lado, em itimi
ee », em nome da legitimidade fundamentada no
ituig6es e direitos formais tradicionais, o regime tinha de
esconder essa viol i ,
onal violagio ilegal de uma liberdade assegurada constitu-
Uma observacao indi
eae
to a0 numero muito pel peruse, Sobre a censura prévia diz respei-
‘queno de publicagoes por ela afetadas no Brasil_CENSURA PREVIA 97
jnteiro, P 7
freqiiéneia como tendo sido sujeitas a bone ;
Bor da censura) ag) Pasquim, avers Goa oie
yado de S: ee eo aa a janeiro de 1975; O Sao Paulo, junho
tadigi9_a junho de 1978; Opinido, janciro de 1973 a abril de 1977,
oe, 1974 a junho do ‘6; Movimento, abril de 1975 a junho de 1978:
WFribuna da Imprensa, vez por outra entre 1968 e 1978, Na verdade,
paisterhavido varios outros mais, talver entre os de vida mais breve
ju menos conhecidos jornais regionais. 1 menos importante estabe-
our numero exato do que reconhecer que a propor¢ao de publica-
ect sujeitas & censura prévia era mindscula em comparagéio com 0
total de mais de mil publicagdes produzidas no pais inteiro.2
Essas sete publicagdes representavam de maneira geral o jorna-
mo no Brasil: um jornal da grande imprensa com uma longa e no-
Brg, is
al historia, dois semanérios noyos de oposicao politica, um jornal
be. diocesano, um semandrio ilustrado da grande imprensa, uma publi-
le. facto iconoclastica alternativa e um didrio urbano. Nao parece ter ha-
da tido um padrao de escolha de determinado tipo de publicagao como
off. alvo do regime. A censura prévia foi exercida contra publicagdes da
a ande imprensa assim como da alternativa, de circulagao nacional
ais assim como paroquial, atacava Jove o humor quanto a critica das no-
de ticias. Cada caso era um caso.
‘A gama dos alvos leva a crer que sua escolha deveria ser dificil de
as prever, e 0 arbitrio pode ser mais dificil de combater do que uma po-
08 Iitiea bem definida. A variedade de publicagées sujeitas & censura pré-
via significava que uma identidade comum a todas nao surgiria au-
tomaticamente mas teria de ser inventada. Nao bastava estar sujeita
acensura prévia. Existia potencial para solidariedade, mas ficava nis-
so: potencial.
Além disso, 0 numero limitado de publicagses sujeitas & censura
prévia nao significa que o regime estivesse pouco disposto a impor esse
tipo de controle rigoroso. Muitas outras publicagées eram ameacadas
com ela ou mesmo ordenadas a submeter-se a ela, mas preferiam fe-
char a continuar sob a estrita fiscalizacdo do governo, sé publicando
matérias aprovadas e sem contar com uma maneira ©
nhecimento ou sequer de avisar os lei
40.4 Entre elas contavam-se Politica, Extra, Em Tempo e Argumento
Embora poucos em ntimero, 0s cas
Mesmo possuiam grande importancia sim!
tava-se de destacados pontos de referéncia para
Sead cen4rios de casos extremos de elaborada interv
lo.
erta de dar co-
tores de que havia essa situa-
os de censura prévia assim
bdlica para a imprensa. Tra-
todos os envolvidos,
encao do98 uM ACORDO FORGADO
‘A consura prévia acabou para cada publicagao assim comy
comecado, de forma abrupta com uma simples notificagao ¢ 4,004
comogades mente, om ver de decorrer de uma dnica decisao conqr
EeipeHeave ‘algumas tentativas da imprensa de negociar com aol
zat e revo apresentar queixas aos drg0s judiciais, que na iy
parte das vezes foram esmagadas ou menosprezadas pelo regime (y
Pifemos ao assunto mais adiante). O término da censura prévig
jecorreu de uma campanha vitoriosa da imprensa mas se encaixoy 1,
quadro mais amplo da abertura do regime e podera ter servidg .),
propésitos do Estado de se mostrar como realmente interessado 1,
transicdo gradual rumo & democracia.
0 Estado de S. Paulo foi liberado da censura prévia em comego,
de 1975. Foi o longamente esperado “presente” de Geisel por motivg
do centenrio do jornal. A liberagéo de Veja ocorreu em meados de
1976. Opinido nunca viu o fim, pois fechou em protesto quando ainda
sujeito & censura prévia em abril de 1977. Em seu ultimo editorial
(n2 230, 1-4-1977), historiava a censura da publicagao e declarava
© compromisso de reabrir a publicagdo somente quando completa-
mente livre de tais restrigdes. Esse ntimero nunca foi apresentado ao
censor e foi imediatamente confiscado. Movimento, O Sao Paulo e
Tribuna da Imprensa foram os ultimos a ser liberados da censura
prévia, em junho de 1978. A notificagao chegou para cada um de re-
pente com um telefonema que nao dava explicagdes nem garantias.
Pasquim, liberado em 1975 de anos de censura prévia, teve uma
experiéncia caracteristica. Milldr Fernandes, um de seus principais co-
laboradores, observou que o fim da censura prévia foi tao misterioso
quanto seu comego. A publicagaéo apenas recebeu um aviso de que “or-
dens superiores” tinham determinado o fim da censura. Mas a ameaga
de sua retomada permanecia, pois a suspensao foi comunicada junto
com esta frase: “agora, a responsabilidade é de vocés”.®
ay,
aio
0 processo da censura prévia
A censura prévia pode ter sido ilegal i
te tt do ilegal, pode ter sido ocultada, pode
sido negada, mas também foi muito padronizada, com pessoal en-
carregado, i i i
e ee arnt estabelecidos, equipamentos, cronogramas e
Era co) i i
jeita a0 ee Pe Policia Federal em Brasilia, a qual estava su-
Tanti lagoe eae civil mas era chefiada por um militar ¢
ee As ordens e as Forgas Armadas e os Orgaos de se-
u orientaga / .
ee dadas através do a¢a0 politica geral com respeito A cen-
Ministéri
Prestadas pelog orgaios Pe oe e maiores infor-eaca
el CENSURA PREVIA 99
‘A execucao da censura prévia f
prévia ficava inteiramente a
4 eae e nas méos da
Policia ae . Um assessor especial foi indicado para essa tarefa,
cargo ocupado na maior parte do perfodo de censura por Hélio Romac,
antigo oficial da polfcia. RomAo comecou com trés assistentes em Braz
» alguns funcionarios om Sao P:
filia e al em So Paulo e Rio de Janeiro, A equipe
mentava conforme a necessidade, fs tnailcos A. eats
au
A Policia Federal insistia em que todos os censores fosse
dadosamente treinados. No comego da censura prévin, pelo menos no
caso de O Estado de S. Paulo © Opinido, parece que o pessoal foi tra.
zido do Servigo de Censura que examinava publicagses espetaculos
do ponto de vista da “moral © bons costumes”, Mais tarde, h medida
que a censura prévia se tornou praxe, tiveram de ser contratados cen-
gores 86 para tratar do volume didrio de trabalho gerado, por exem-
plo, por O Estado de S. Paulo. Seu diretor, Oliveiros Ferreira, se en-
farecia com a incompeténcia deles, que lembrava a de choferes de
énibus e funcionarios bébedos fazendo biscate. Quanto a O Sao Paulo,
o cardeal Arns manifestou profunda ira ao ser censurado por um te
ceiranista de medicina: “Eo cimulo, nao? Nem o papa me censura’
‘Até agora a censura foi tratada neste trabalho como repressao no
ambito das relagées entre imprensa e Estado. Era, também, apenas uma
tarefa rotineira. Os censores de Opinido e Movimento trabalnavam nos
escritérios da Policia Federal em Brasilia, e os de O Estado de S. Paulo
passavam pelas mesmas portas usadas pelos jornalistas que eles cen-
suravam. Chegavam todo dia equipados com os instrumentos de seu tra-
balho: uma lista de ordens emanadas da Policia Federal, canetas de
tinta vermelha ou marcadores de tinta preta e uma colegao de carimbos
com dizeres como “vetado”, “com cortes” e “liberado”. Alguns fabricantes
estavam produzindo lotes regulares de tais carimbos, e os censores os
utilizavam todo dia, numa atividade ilegal porém padronizada.
Os censores examinavam tudo: reportagens, manchetes, edito-
riais, publicidade, obitudrios, legendas, charges, anuncios. Deve ter
sido mesmo um ramerrao, vista a velocidade com a qual eles liam
uma quantidade considerdvel de material. Enquanto trabalhavam,
iam marcando todo o material, quer fossem provas tipograficas de
0 Estado de S. Paulo ow artigos datilografados ou escritos a mao para
Movimento e Opinido. Podiam riscar de vermelho a mengao de uma
quantia roubada, colocar entre colchetes uma frase ou um nome, cer-
car um paragrafo transgressor ou tragar um X sobre um editorial in-
teiro, Conforme yerificavam artigo por artigo, semana aps semana,
lam passando um marca-texto preto e cortando uma passagem cur-
ta, pardgrafos, paginas inteiras ou toda uma reportagem. E em geral
‘arimbavam seu trabalho, Podiam ser carimbadas com “vetado” pa-
8inas e paginas de um artigo de 20 paginas. “Liberado com cortes”ym ACORDO FORCADO Saaens
Wye CRECURO Kok
100
imbado em um artigo com varias linhas riscadag 4,
Lea data e, por vezes, ii te.
tas vezes acrescentavam a Pe ) S48 inicigiy ©
pod
to. Muit
cearimbo. feat
Paroce um trabalho magante, A minscia de algumas day pray,
ads leva a erer que 08 censores por vezes estavam pencirando 6 yay
com cuidado & procura de certos nomes ou somas. Era um yoiyi
enorme de material, tanto 0 que era lido Serpe aber protbide.a ge
Teco devia ser enfadonha, mas eram consideragoes de seguranca ¢
cional em vez. de quosties de gramética ou ortografia que decidiam *,
casos duvidosos.
Depois de feitos os cortes, as paginas eram devolvidas aos seus qy,
nos, As publicagdes usavam entao 0 que sobrava, As vezes 86 a metay,.
do que fora apresentado, no caso de Opinido e Movimento, para fara,
um mimero, Podiam aproveitar apenas 0 que fora aprovado. Tambe.,
tinham a op¢ao de nao incluir algo que fora liberado, como nay p..
blicar um artigo do qual tinham sido extraidas algumas partes os.
senciais. Mas nao podiam acrescentar nem substituir texto. E uma ye,
montado um numero, o material seria examinado de novo pela policia
a fim de comprovar a observancia.®
Um aspecto muito importante da experiéneia cotidiana de qual.
quer publicagfio sujeita A censura prévia era a localizacdo dos censo-
res, na redacao, no escritério local da Policia Federal ou, pior, na sede
da Policia Federal em Brasilia. Os custos de administracao e produ-
¢40 relacionados com o cumprimento das ordens, fora a perda do ma.
terial em si, podiam ser enormes, sendo arcados inteiramente pelos
Jornais censurados. Se o material tivesse de ser transportado até a po-
licia, tais custos incluiam tanto 0 tempo perdido quanto as despesas
da entrega do material.
O caso de Opinio ilustra esse onus. O Semanirio devia estar nas
bancas na sexta-feira, mas a censura prévia exigia que todo seu ma-
terial fosse levado de avidio desde sua redagao no Rio de Janeiro até
Brasilia na noite da segunda-feira anterior, para estar no escritorio da
Policia Federal na terea-feira de manha cedinho. As matérias ficavain
em Brasilia sendo censuradas até quarta-feira de noito, quando entio
voltavam de aviao para 0 Rio de Janeiro. Para ficar sabendo dos cor-
tes com antecedéncia e acelerar um pouco 0 Processo, a equipe de Opi-ar has
0 ale
ode
ya
td
Yt
CENSURA PREVIA 197
to, a oportunidade das noticias.
ois dias da semana e, porta
ae fo alternativa que desejava certa liberdade em re-
Sendo ee Oe sua sobrevivéncia dependia de grande vonda.
lage 8 ia oportunidade era crucial.®
gem. ees cronogramas, pessoal © procedimentos constituiam a cen-
prévia que a imprensa afetada sofria com cada edigéo. Embora
sure Precrota e usada contra apenas algumas publicagées, as praticas
ilegely Sra aqui.examinadas eram elstemdticas @ esto profusamente
da ctpontadas om arquivos de materiais censurados
doc
As provas documentais
As provas documentais da censura prévia suscitam dois pontos
importantes. Em primeiro lugar, a censura forgosamente transforma 0
jornalismo de atividade de comunicagao em agao estratégica. Se o jor-
halismo somente As vezes chega perto das normas da comunicacao, a
imposigdo de censura certamente transfere essa pritica para a esfera
da estratégia, adivinhagao e conflito. Declaragées que nao pareceriam
possuir significados ocultos numa publicacéo livre poderao assumir
noyo sentido quando consideradas da perspectiva de terem sido sub-
metidas & censura.
Um segundo ponto 6 0 de que a censura prévia sé podia cortar 0
que Ihe tivesse sido apresentado. As provas documentais que subsis-
tem nao sao nunca 0 resultado das agées do censor da Policia Federal
apenas, embora ele parecesse ocupar a posigao de maior poder. Mas o
registro resulta da interagao assimétrica entre 0 censor e o jornal.
O registro é um retrato parcial sob a forma de original datilogra-
fado, lapis vermelho e marcador preto de cada publicagao e do regime
Esse retrato foi tracado nao por motivo de corre¢ao ou beleza, mas de
estratégia, por diferentes artistas com motivos opostos, trabalhando um
contra o outro. Nao 6 facil interpretar esse retrato, nem se pode aferir
grande coisa. Nao obstante, constitui um retrato revelador do regime
militar e das publicagées sujeitas A censura prévia por aquele regime.
O Estado de S. Paulo e Movimento oferecem exemplos contras-
tantes da censura prévia. O primeiro era um diario prestigioso da
grande imprensa; o outro, um semanario alternativo de oposi¢ao, de
Propriedade de jornalistas. Eles operavam com padroes e objetivos di-
ferentes, segundo projetos diferentes. Suas Perspectivas politicas eram
tao diferentes como sua aparelhagem técnica e seu formato. Mas ti-
nham em comum, junto com um punhado de outras publicagées, a ex-
Periéncia da censura prévia. E cada um produziu um arquivo duplo:
uma série de ntimeros publicados e uma quantidade imensa de ma-
terial vetado.1902 uM AcoRDO roncapo .
| =
A censura de O Estado de 5. Paulo
servou as provas originais suly
Q Bstado de BE staal de marcas do lapis vermethg gts :
censura. Tais . melhor arquivo da censura prévia do omar q{%
sores, constituem janeiro de 1975. Existem milhares de artigos
tembro de La censurados, em geral varios todo dia.!1 41° Par,
cial ou totalme! referem-se a temas que foram censurados Sistemas
dessas materi se ano, enquanto outros foram censurados on dee
« anocae de crise © outros mais cobriam alvos no repim’ e
veto, fosse qual fosse 0 contexto oy:
mpre provocava um veto, ese 0 cont =
msnete sempre 2 Quaisquer noticias ou referencias a prépria cena.”
eco rigorosamente censuradas. Alguns assuntos cen.
ms ea uma pista para as praticas dos censores ¢ jornalistas . .
os ofe
cament 0
minadas épocas de crise
volvidos. ; :
Eram temas constantemente censurados as brigas entre o regir,,
5 lica, as condigoes de vida e o tratamento dado pelo ¢.,
Ea ae bem como protestos de estudantes, a
predominancia desses temas talvez indique uma sensibilidade espe.
cial por parte do regime a respeito deles ou a grande ateng&o por parts
de O Estado de S. Paulo. Entre outros assuntos censurados com fre.
qiiéncia encontram-se as condigdes das prises, corrupeo no governo,
greves de trabalhadores, problemas nos transportes ¢ criticas ao ro.
gime no exterior,
Além desses temas comuns, a cobertura de crises especificas era
amplamente censurada. Nesses casos, absolutamente qualquer cobes.
tura era censurada, fosse noticidrio, analise, fotografia, declaragao.
Tais crises irrompiam de meses em meses. Em 1973/74, por exemplo,
incluiram a demissao do ministro da Agricultura Cirne Lima, em maio
de 1973; o golpe do general Pinochet no Chile, em setembro de 1973; ais, 0 recebimento de um dipl
wardeais, © iploma honorario ou sim °
femente, outro alvo favorito, mesmo muito depuis de seu igo nen,
in 1974. A eliminacao dos nomes dessas coonatues
¢ Pessoas nos artigos,
Mando elas ndo eram o assunto principal, indies « ‘i
guattjeria chamar de lista negra existéncia do que
Afora seu contetido tematico, 0 arquivo documental da censura
via também contém alguns testemunhos da pratica e das relagdes
no tocante a censura. Algumas das limitagoes e estratégias tanto dos
gensores quanto dos jornalistas sfo reveladas no registro
Os censores da Polfcia Federal com freqiiéncia eram acusados de
grosseira incompeténcia e ignorancia ou de medo de seus préprios su-
periores. O arquivo contém algum material surpreendente que apa-
rentemente resulta da obediéncia, por parte de censores pouco escla-
recidos ou nervosos, A letra mas nao ao espirito de suas ordens. Nas
cleicdes de 1974, por exemplo, é claro que os censores tinham ordens
de tirar tudo sobre a controversa politica salarial do governo. Por es
motivo, um discurso do candidato governista que defendia tal politica
foi vetado inteirinho, enquanto o discurso do candidato oposicionista,
cheio de criticas a todos os outros aspectos do governo exceto A poli-
tica salarial, foi autorizado por completo. Tal obediéncia as regras ia
contra a finalidade das ordens da censura.
Outros exemplos, todavia, revelam certo cuidado e habilidade por
parte dos censores. O modo pelo qual os cortes eram feitos podia pro-
duzir resultados diferentes: a auséncia ou a distorcdo de informagao.
Em julho de 1974, por exemplo, O Estado de S. Paulo tentou divulgar
as observagées do economista norte-americano Werner Baer (a parte
censurada esta entre colchetes). Baer declarou que as atividades da
Petrobras, estatal brasileira de petréleo, “lembravam a expansao dos
servigos estatais de gas e petréleo da Itélia [sob a lideranga do fale-
cido Enrico Mattei. O mundo considerava Mattei um pirata socialis-
ta]”. A versao depois de censurada deixava a impressao de que, na opi-
niao de um renomado economista, o Brasil se juntava as fileiras do
mundo desenvolvido, eliminando a sugestdo de excessivo estatismo.*
O censor também fez um trabalho cuidadoso num discurso do lider do
MDB, Ulysses Guimaraes, em 1974. Segundo Ulysses, citado pelo Es-
tad@o (a parte censurada esta entre colchetes): “Primeiro, eles usaram
‘manutengao do regime democratico’, depois ‘normalidade democra’olitiea’ [(embora houvesse apertura, g,
a frase 6 ‘modelo polities’, talyao™.
Guimaraes estava fazendo \yq,"8
280
AS Sey
dentin,
Many,
i iéncia ou i Muitag
do talvez da inexperiéncia ou inseguranca 4,
de seu cuidado e habilidade. 8
rde ‘abertura P
isfio ete.)); agora
be?” Ulysses
ido de que abertura era de fato apertura, m,
deria entender que ele estava ;
razoavel ou, na pior das hipéteses,
Se ee 15 Bmbora existam no arquivo documenta}
3 is tal
cat, mais tarde
ri
ra, tortura, P
Sxportagao, quem $4
seipalavras, no sentido de que
mee censurada alguém p
ia -ogressaio
a uo.
tencao do status 7
coisas estranhas, resulta
fensores, também hé provas
diretores também deixaram sua marca nos qy,
Evidentemente eles eram capazes de prever aj,
gumas das agées dos censores, Os jornalistas See que fizeram
fomentdrios a respeito desse perfodo asseveram (0 que o arquivo dy
cumental comprova) que eles nao reescreviam material para ser acoj.
to pelo censor. Talvez 0 caso mais claro, porém com certeza no o tinicg
da sua abordagem, 6 um editorial que foi totalmente censurado em co.
mecos de marco de 1974, quando Geisel estava prestes a assumir 0 go.
verno. Foi de uma série de O Estado de S. Paulo que avaliava 0 go.
yerno de Médici e se referia ao Ministério da Justica sob Alfredo
Buzaid. Afirmava, em parte, que “legitimara procedimentos que tor-
navam rotineiro o desrespeito a lei. Buzaid tripudiou os mais elemen-
tares direitos humanos, violados diariamente pelas autoridades poli-
iais afetas ao seu ministério. Negou a existéncia da tortura quando
todo mundo sabia que ela se tornara pratica habitual. E defendeu
como nenhum outro a necessidade da censura, embora mais tarde pre-
tendesse nao perceber as conseqiiéncias praticas de sua aplicagao”. 0
editorial prosseguia dizendo que, conquanto tivesse sido verdadcira a
ameaca de terrorismo, a ameaga se restringira ao perfodo de 1967-70.
Beli ann meeeyimentan extremistas tivessem sido des-
agains ieee ra la como bicho-papao para justificar 0
Peale pelos que deveriam defendé-la”. O edi-
Os jornalistas ¢
cumentos censurados.peereen ee CENSURA PREVIA 105
ystico. Parecem, antes,
refletir um esforgo de escapar & censura, na
presuncao de que os no
mes sempre repetidos acabariam passando
0 arquivo documental revela que 0 disfarce da pista era outro es-
tratagema pare se esquivar da censura. Era comum um artigo com a
doscri¢a0 detalhada de ceriménias da Igreja Catélica e, muitos para-
grafos depois, as palavras “em outras noticias sobre a Igreja”, segui-
das de uma referéncia a dom Helder. Um dos exemplos mais mar-
cantes foi um artigo intitulado “dom Helder poder ir para o Sacro
Colégio” (6rg8o que escolhe o papa), censurado em julho de 1974. O ar-
tigo inteiro foi vetado. No dia seguinte apareceu um artigo intitulado
“papa escolhe dom Avelar” (para chefiar um conselho educacional ca-
tolico), do qual apenas um pequeno pardgrafo foi climinado. Mas a
parte cortada dizia que dom Helder poderia tornar-se membro do
Sacro Colégio. Nesse caso, parece que o jornalista de O Estado de S.
Paulo sabia do veto ocorrido na véspera mas tentava disfarcar a no-
ticia sobre dom Helder num artigo vagamente relacionado com ele, o
qual passaria pelo censor, 0 que aconteceu, exceto por aquela parte 17
A censura da propria censura merece atengéo. A censura da im-
prensa era, de fato, um dos temas mais censurados, aparecendo no ar-
quivo constantemente ao longo de todo o perfodo da censura prévia. As
vezes também merecia atengao critica, por exemplo, durante 0 encon-
tro da Sociedade Interamericana de Imprensa. Julio de Mesquita
Neto, dono do Estaddo, era presidente da SIP, ¢ seus discursos no en-
contro tinham cobertura total, juntamente com material correlato.
Tais reportagens, no entanto, sofriam cortes muito severos. A mencio
a censura também era um alvo especifico. Muitas matérias censura-
das sao encontradas, como o discurso de campanha do candidato Ores-
tes Quércia, do MDB, em 1974 (a parte censurada esta entre colche-
tes). Quércia condenava “o transporte publico insuficiente, [a consura
da imprensa], eleigdes indiretas e o Decreto-lei n? 477”,18
A censura da censura também deixou indicios das fraquezas dos
censores, Um deles, que obviamente estava obedientemente seguindo
§ ordens, vetou um discurso do senador Eurico Resende, da Arena, de-
fendendo a censura, inclusive a censura de O Estado de §. Paulo.9
Também aparecem indicios das estratégias dos jornalistas, revelando
muitas tentativas de fazer passar um tema proibido. Um amplo artigo
sobre a lei do divéreio, por exemplo, falava em “outras noticias sobre
leis” com observagdes de um advogado que condenava a censura de im-
Prensa.20
O Estado de S. Paulo deu ampla cobertura a censura de impren-
ES a geral mas em particular A sua propria. Em 1974, por exemplo,
cel
eu 0 troféu de ouro da SIP. Essa cobertura nunca parou. Du-
‘ante meses continuaram os artigos sobre o prémio, que sistematica-106 uM AcORDO
ie ais comum de artigo era
mente eram sonsurades, © TT simontando O Estado de", ata,
de alguma figura Pr com a liberdade de imprensa ¢ condenan, Por
zeu firme compre impostas a0 sou trabalho. A quase absurg.? a
restrigdes arbitrat™om parto arrogancia © em parte autoproma,®
bertura peas parte estratégia contra A censura, pois mens
mas também wm maior probabilidade de passar Pela censura, fy.
gine 8 emiiado de 8. Paulo nfo poderia ter imprimide S805 I
ralmen' im primeizo lugar, nao os tivesse recebido He congressist
vfros politicos e lideres do empresariado. O proprio amplo arquin
das congratulagdes censuradas em 1974 mostra que muitas oe
estavam ansiosas pela oportunidade de consignar seu apoio ag jors
Os comentarios sobre O Hstado de 8. Paulo encontrados ny
quivo também deixam claro quo, embora a censura prévia fosse um <
gredo, era também um segredo bastante conhecido do publico. 0
tado de S. Paulo tornou-se um simbolo, de tal forma que referénci.,
obliquas & censura podiam ser feitas (ainda que clas freqtiontemes.,
fossem vetadas). Os dois exemplos seguintes referem-se ao costum.
que tinha O Estadéo de publicar versos, especialmente de Camoes, em
lugar de matérias censuradas. Um politico do MDB foi censurado ..
declarar que: “Haverd liberdade quando O Estado de S. Paulo deixar
de publicar poesia fora de scu suplemento literério”. E na véspera aa
eleigdo de 1974, apenas uma frase foi censurada de um ultimo artic,
(@ parte censurada esta entre colchetes): “Quércia terminou seu dis.
curso [com um verso de Camées]”.?!
O ultimo langamento no arquivo de material censurado de O Es.
tado de 8. Paulo, evidentemente 0 tiltimo item censurado, dizia res.
peito @ censura. O artigo referia-se a uma ceriménia na Academia
Brasileira de Letras (a parte censurada esta entre colchetes): “Bar.
bosa Lima Sobrinho leu um trecho de um artigo publicado em 1875
sobre a liberdade de imprensa [que, devido ao seu contetido, segundo
ele, poderia ter sido escrito hoje ou substituido por versos de Ca-
mées]”.22
A censura de Movimento
numero daqu 23
ia eae hee Outra fonte sao os breves boletins que
ina ee Pee segomanias Para informar 0 Pessoal a respeito
As avaliagdes do Préprio Movimento sobreCENSURA PREVIA 107
necem importantes informacées. Blas apareciam nos jor-
consura fo n ‘ ce :
a cdas organizacées € sindicatos de jornalistas durante a censure
is
jos nimeros do Movimento apés o fim da censura prévia em
je 1978. A sua posigao consciente de si proprio nesse contexts
em var
oebo.d
Be comparada com a abordagem de O Estado de S, Paulo. O Mo.
nto estava bem ednscio de seu projeto histérieo como publicacas
jp propriedade de jornalistas, bem como da oxperiéncia da censura
wrévia, gastou bastante tempo documentando @ prépria existéncia,
friste, pois, um considerdvel registro histérico nas paginas da pro-
publicagao.
No periodo de censura de abril de 1975 até junho de 1978 (153
edigdes censuradas), 0 Movimento contou corca de 6 mil artigos ¢ ilus-
5 ial ou integralmente.? Além disso, trés nui 3
tragoes vetadas parcial 6 ni ‘0, trés nuimeros
inteiros foram impedidos de circular. Um, sobre contratos de riseo
para a exploragao de petréleo por companhias estrangeiras (13-10-
1975), simplesmente foi proibido de circular na revisdo final pela Po-
licia Federal, depois de ja ter sido censurado. Uma edigao especial
sobre a situagao das mulheres e seu trabalho no Brasil (10-5-1976)
teve a quantidade sem precedentes de 80% de seu material rejeitados
pelo censor, Nao sobrou o suficiente para publicar um numero naque-
la semana.”” O terceiro mimero proibido de circular tratava da ne-
cessidade de uma assembléia constituinte para claborar uma nova
constituigao (19-9-1977). Ele passou pela censura e exame final mas
entao foi confiscado.?*
vim
pria
Movimento também fez um grafico dos padrées de intensidade da
censura (ver figura 2) e concluiu que a tensao politica e a censura an-
davam de mos dadas e que as vendas caiam quando a censura au-
mentava. Os trés picos de censura em 1976, por exemplo, coincidiram
com a abertura do Congresso em marco e a imediata cassagao de trés
representantes, um escandalo de corrupcao que veio A luz em julho e
as eleigdes de novembro. Para Movimento, 0 padrio comprova “uma
certa l6gica geral da censura que, embora aparentemente tenha cri-
terios nebulosos, sempre sabia onde cortar a fim de impedir que Mo-
uimento cobrisse de maneira adequada os acontecimentos importantes
da nagao”.’° Impedido de fazer sua cobertura desses acontecimentos,
Movimento perdia consideraveis vendas nas bancas.
Embora a intensidade da censura variasse ao longo do tempo, a
mensagem subjacente da massa de material censurado do Movimento,
fosse qual fosse o assunto, mantinha-se coerente: a realidade corrente
nao tinha de ser como era. Movimento proporcionava cobertura de al-
ternativas vidveis disponiveis, de outros modos de organizar a produ-
S40, @ governanga, a seguranga e a sociedade. O contetido dessa pu-
cacao relativizava quase todos os aspectos da experiéncia brasileira108
gap
um acorpo FOR
a viabilidade e pertinéncia de altemativas, © arguing
ja ossas mesmas preocupayées, bem como uma erie”
quer se tratasse de poder politico ou econamie,
quanto nacional ou internacional, 5
e comprovava
5
censurado rev‘
Gas pessoas no poder,
nos niveis tanto local
Figura 2
Artigos vetados ¢ vendas nas bancas.
Movimento, 1976
‘Artigos vetados
35
30
25
20
15
Niimero de artigos vetados por edigio
Vendas
Abr. Jul.
Jan.
Fonte: Adaptado de Movimento n® 154, 12-6-1978, p. 14.
Tal como no caso de O Estado de S. Paulo, o material censurado
do Movimento correspondia a categorias de assuntos ou temas. Além
disso, 0 material censurado oferece indicios sobre as fontes e 0 estilo
do Movimento bem como das relagées entre a publicagao e o regime.
__Um tema destacado era a desnacionalizagao da economia ¢ as ati
vidades de empresas transnacionais no Brasil. O conluio de empresas
Privadas e governo com companhias transnacionais por interesse pré-
prio recebia atengao sistematica. Os artigos vetados analisavam as
taxas de lucro, as Asengoes fiscais e os padroes de investimento das
empresas internacionais ¢ seus
troes era posta em contraste coCENSURA PREVIA
mento também tratava da malversagio dos dinheiros Publi-
Mowartigo intitulado “O prego da fama te da publicidade que o
6 tah Recife usa para fazer propaganda de suas obras)” foi cen-
parcialmente."! O prefeito de Ree inha mandado construir
gada na encosta de uma favela, divulgandon com grande fan-
uma dando especificagdes detalhadas de sen custo, comprimento ¢
farmpro exato do degraus ete, Depois, dois jornaie locais, 0 Didrio de
Be buied e 0 Jornal do Comércio, publicaram como reportagem
Porm matérias. pagas contendo as Mesmas informagies. Movimento
duvfou o preco de um antincio pago nesses jornais e os pregos mais
tos cobrados quando antincios eram Publicados como se fossem re.
prefeit
Firado
A incompeténcia e corrupeao do governo federal ¢ a ineficiéncia
das politicas publicas também cram assuntos comuns do Movimento
© governo era responsabilizado por calamidades que podiam ver acy
tadas, como a escassez de alimentos basicos ou as crises provocadas
pelas perenes secas no Nordeste, Nesse caso, 0 tom era de ironia: de-
pois de quatro séculos, por que as secas sempre pegavam o governo de
surpresa? As politicas agrarias, inclusive 0 fomento de culturas de
subsisténcia e 0 cultivo excessivo dos solos, eram apontadas como
casos em que a politica oficial agravava calamidades naturals, As po-
Iiticas de satide publica também eram questionadas em artigos sobre
itos conflitos sociais receberam grande atengao do Movimento
Mui
; Entre eles, og conflitos de terra entre Posseiros, colonos e fazendeiros,
revelando violéncia, trabalho escravo, indiferenca do Judicidrio e o
Pod
er dos latifundidrios ¢ de companhias estrangeiras na bacia ama-
Sa¢do feita pelo governo de que 0 povo nao estava psicologicamente
Preparado para votar em seus préprios representantes).?°110 UM AcCORDO FORCADO
Noticias do exterior também eram cortadas do Movimento,
cialmente tudo que so roferia a eriticas a ditaduras militares oy, t
sigdes de regimes autoritarios para a democracia. A cobertura ae
putas entre 08 militares no Chile de Pinochet foi vetada, assirn
muitos artigos que analisavam a transig&io de Franco para o re, a
Carlos na Espanha, Outras noticias estrangeiras censuradas tratal
vam de temas considerados delicados no Brasil. Por exemplo, 34,
mento nao podia publicar comentarios sobre reforma agraria, pro
tos estudantis, organizagio dos trabalhadores ou processos por estuy
em outros paises. Um artigo sem data se referia a soldados holand.s.
autorizados a recusar-se a participar de agdes com as quais nig on.
cordavam, como um ataque militar a ativistas molucanos que tinham|
seqiestrado um trem.
Algumas matérias preparadas para publicagéo pelo Moviment,
nAo eram noticias atuais, mas artigos de andlise e estudos histéricos.
i Uma avaliacao da historia do trabalho no Brasil abordava grove,
pouco conhecidas mas importantes e questionava a posicao de que ay
leis trabalhistas tinham sido um presente do papai Vargas, em vez de
fruto das lutas dos trabalhadores. Outro artigo histérico arrasador
! tratava da divida externa do Brasil desde os primeiros empréstimos
/ internacionais em 1824, da constante incapacidade do Brasil de pagar
suas dividas, da conseqtiente necessidade de novos empréstimos, do
padrao de buscar novos empréstimos para pagar os antigos e do onus,
acumulado por geragses e geragoes, do pagamento dos juros. Tais pre.
cursores da crise fiscal brasileira contemporanea foram apresentados
como uma série de ligdes ainda nao aprendidas.**
A desnacionalizagao da economia, a incompeténcia e corrupeao do
governo, a ineficiéncia da politica publica, a diversidade de conflitos
sociais ¢ as alternativas sociais, econémicas e politicas que podiam ser
encontradas no noticiario estrangeiro e na histéria do Brasil eram
temas sistematicos no arquivo documental da censura do Movimento.
Também so reveladas algumas pistas interessantes sobre as fontes
da publicacéo. Muitas delas nao eram convencionais. Como publica-
¢do experimental, Movimento pouco dependia do press release. No ar-
quive do material censurado existem alguns exemplos surpreenden-
tes do recurso a fontes noticiosas alternativas que langam luz sobre as
relacées entre esse periddico © o publico, o regime e o restante da im-
prensa.
‘Om
por exemplo,
tirad; ieee ate
meee oe °8 quatro principais jornais brasileiros da grande im-
Brasil, Entre ecy oO Estado de S. Paulo, Folha de S. Paulo e Jornal do
Sas matérias encontram-se editoriais e crénicas assimtarde presidente do Brasil),
2 a ee —SENSURA PREViA 444
reportagens. A equipe simplesmente co
reproduzir ¢ colava na folha de provas
¢.a.citacao da fonte indicavam ao eo
edusee, Noutras vozes, Movimento incluta longas citagbee ene
rep] ja publicado em scus proprios artigos @ acrescentava comenté-
fora gndlises, Alguns dessae materials Citados, como os que se re.
am a eschndalos ou corrupgao, eram intrinsecamente controversos
ee at een ; ergos wragas a0 acréscimo dos comoren,
out Embora ja tivesse sido Publicado,
ey de material frequientemente era cortado no Movimento pelo
ip
sores.
© outren toutes que aparece! nas partes censuradas do Mou
ceriam de fécil acesso se 0 Brasil cont,
dissidéncia. Entre os documentos cen
tigdes e declaragdes enviadas a0 Mo
tudantes, sindicatos, médicos, trabal
sioneiros. Cépias das cartas enviad:
rtava um artigo que de-
do Movimento. Esse for.
cy nsor que esses artigos eram
mat
esse
imento
‘88e com um foro puiblico paraa
Surados encontram-se muitas pe-
vimento por organizacées de e
hadores rurais e parentes de
las as autoridades também e
jue fossem tornadas piblicas
pri-
ram
, em-
Os materiais fornecidos por outros
so piiblico. Movimento contava com u
jornalistas tinham menor aces-
=
aceita por seus chefes da grande
6m provas tipograficas de quase
itanos e regionais do Brasil. Esse
imprensa. Por isso, 0 arquivo cont
todos os principais jornais metropol;
material nao era sigiloso, mas nao teria sido divulgado se Movimento
240 proporcionasse um foro alternativo, embora censurado 25
Sem duvida, a fonte de material censurado mais estranha e
menos publica é a fotocépia de uma nota do SNI, 0 érgio de seguranga
mais importante. A nota trazia varios carimbos, inclusive “urgente”,
“secreto” e “proibida a reproducao deste documento”. Estava endere-
gada ao general Fontoura, antigo chefe do SNI e na época embaixador
do Brasil em Portugal. Fontoura era objeto de protestos ptiblicos de-
vido & generalizada suspeita de que ele estava mandando vigiar exi-
lados brasileiros naquele pafs.>” A nota, datada de 24-9-1975, parecia
confirmar tal Suspeita. Joao Figueiredo, entao chefe do SNI (e mais
estava enviando para Fontoura um apa-
um militar e um adyogado, ambos consi-
a seguranca nacional do Brasil, contra os
‘ado sobre dois exilados,
erados “sériog riscos” paraye scone roncan’
11. ee”
ry a digo 12”. A
ing faperagao' C6 rte n
devia ser armada Wirto telex sigiloso do SNI com 23 page.
‘9 a publico, pelo menos n&o no Movimeny,: rest
ais
ar para confirmar U
ca veio a pul i ‘i ‘ea,
0 nun ira chegou aos registros desse som," inate
O assunti je man
imaginando de 4
Fae ayo consurado revela algumas das fontes BO-Conve,,
O arquivo ce! som diivida, um ponto de vazame,
0 al
ue era,
Tistas e para 0 povo frustrado com a falta a
nais do Movimento,
indicios tantalizantes dg 41%
: jornalist
ternative para joel oferecem s °
foro public. gmnado conhecido sobre 0 regime s¢ nfo tivesse p.
deria terse irronsa, A censura até de material ja publicady
consura da a emerense também mostra que o conterido em gj,"
cree cera fator determinante do exereicio da consura. O trata
Seeeaisits apresentagao e o contexto da matéria também erar, fin.
re 3 de publicagao alternativa, Movimento se engajay
eee eee tT UATE Nc tiligar fontes Dio-con,
om ais, tamnbémn buseava novos estilos de redagZo, temas ¢ mar”
eee eram tao prontamente censurados como o simples conteria,
hotieioso. O arquivo dos materiais censurados do Movimento abrang,
nao apenas dados mas também anélises, metaforas e vozes.
Dados simples eram censurados com freqiiéneia, como cifras sobre
a tuberculose no Brasil, por exemplo, ou sobre a participacdo da mu.
Iher na forga de trabalho. Outras vezes os dados ficavam mas a ex
plicagdo de apoio era retirada. No exemplo seguinte de uma reporta-
gem sobre 0 crescimento econémico, as partes entre colchetes foram
riscadas pelo censor: “Em 1959, a participacao do capital na receita in.
dustrial foi de 0,571, enquanto em 1970 essa participacao subiu para
0,623 (dados do censo industrial de 1960 e 1970, Fibge). [Ou seja, na
mesma época em que o salario real do trabalhador estava deterioran-
do, 0 lucro do capital aumentava.] (...) Um fenémeno 6 provocado pelo
outro, e vice-versa. O estilo de crescimento do pais nos ultimos anos
obteve enormes vantagens da acumulacao da riqueza [naqueles gru-
Pos que controlam os meios de producao]”.29
70, desde a ajuda financei
; Nceira a isencao de; :
artigo abordava o imenso ene iar Posto. Mas, além disso
‘eae
‘ario das Teportagens Politicas o|
|
ido cortados, a metéfora humithante do By,
gem 810° foudo de uma companhia transnacional, toe
itt ando eu digo “vozes” me refiro ag opinides de Bi
vapareciain Da imprensa alternativa © que tambe
Pe mm freqtiéncia. Um dos temas mais tratados ¢ a é
stig Movimento era o das condlicies cote? de teapognsura
des fojros comuns. Quase todas as roportayens indufam re atho dos
prasilee que também eram o tema cle Uma segio especi ncias as
: Tais trabalhos, bastante inovadores tl chamada
acres na época, anali-
yam a i . sempr a ;
savi’das pessoas envolvidas. Muitas vores cram a8 voaas sais
i o ‘ ; S A owvi-
Ge na grande imprensa: de prostitutas, favelados, indigenas, aces
Esse tipo de texto legitimava as &xperiéncias daqueles diretay :
je fetados por aquilo que estava sendo tratado, atsihenee aaa
jaras peso igual a0 colocé-las Iado a lado das panes ae etre.
jistas, formuladores de politicas ¢ outras autoridades. Também
rettatavam grupos sociais eonstitufdos de individuos em si e meen
uma massa indiferenciada. Tal abordagem deixava claro que as pes-
soas falavam de acordo com suas cireunstdncias. Como elas err: de-
terminadas para 08 pobres e indefesos, também 0 eram para ne po-
derosos. Eles também eram colocados em suas cireunstancias, de tal
forma que suas palavras nao eram apresentadas como uma verdade
singular e perene, mas como uma yerdade Particular e interessada,
Outro aspecto da inclusao dessas vozes era 0 fato de permitir que
osubalterno falasse ao poderoso, embora apenas retoricamente e até
mesmo censurado. Num artigo censurado um pai de familia observa-
va: “Gostaria de ver o presidente da Republica anhar 0 que ganha-
" P & que g
mos € conseguir comprar comida ou pagar escola”! Em outro, colo-
Bi
nos lamentavam ter deixado o Parana pela Amazonia. Atrafdos por
falsa publicidade e Promessas nao-cumpridas do governo, e depois
abandonados, queriam que fossem prestadas contas.4?
O que todas essas vozes buscavam transmitir era tanto desespero
quanto determinagao. A desolagdo se confundia com a raiva. Mas nao
aPenas os tradicionalmente emudecidos eram representados. Afora os
Sem-terra, sem moradia e sem emprego, Movimento entrevistava os
Profissionais alternativos e os especialistas alternativos. Suas pagi-
nas censuradas traziam os depoimentos de economistas, arquitetos e
“ngenheiros que nao falavam pelo governo nem por uma empresa.
Ae 5 iam cri-
~sde seu ponto de vista de profissionais bem-informados, faziam
“Marlboro
aS que rara.
eram censy.
“143
teas a Politica do governo e a outros aspectos da realidade social.
** paginas do Movimento ficava-se sabendo dos debates que podiam
* ‘ nm java a
Scorer entre Profissionais instruidos, revelagao que contraria
Es i i SA0
Sem da unanimidade tecnocratica que caracterizava a discus:114 um ACORDO FORCADO
cial. Meso a idéia de que podia aver debate ¢ disconys
ecialistas nfo cra generalizada, pois a tecnocracin °
p politico, Pambém essas voz, we
™
politica off
ia entre es}
tamente devia suplantar 0 debate
censuradas. . '
Um ailtimo exemplo do arquivo censurado capta muitas das
i ntos. Trata-se de um artigo sem dat,
a ca v aecalcie de Porto Alegre om folhas de prova do ee
oan ord Evidentemente, o jornalista conclutra que © material ni,
seria publicado naquele jornal, ou pelo menos nao do jeito comy 4...
tratado, e entao o ofereceu ao Movimento, mas foi totalmente cortady,
pelos censores da Policia Federal. es }
O artigo abordava alguns dos temas essenciais do Movimento cue
acima apontamos: incompeténcia oficial, cobiga empresarial, satide py,
blica desnecessariamente precéria. O texto comegava: “Cinco crianea,
ressuscitaram em Porto Alegre — pelo menos é 0 que se depreende da
informacao liberada pela Secretaria de Satide”. Explicava que o ga
binete da secretaria do Rio Grande do Sul tinha divulgado 0 6bito de
19 criancas de desidratacao na primeira semana de janciro. Algumas
semanas depois a secretaria divulgava apenas 14 desses dbitos em
todo o més de janeiro. O artigo prosseguia apresentando dados oficiais
comparativos de varias outras cidades e de anos anteriores, mostran,
do que os dados eram incompletos. Todos os ntimeros foram analisa-
dos criticamente.
Em seguida, o artigo discutia a politica de sauide publica ¢ a cam-
panha da seeretaria para evitar a desidratacao infantil. Os cartazes da
secretaria mostrando criangas gordinhas, contendo consclhos para di.
minuir as refeigées de cinco para trés ao dia e beber bastante leite cram
“simplesmente cruéis”, considerando as condi¢des econémicas da maio-
ria dos brasileiros. Incluindo as vozes dos envolvidos, 0 jornalista en-
trevistara uma enfermeira, que queria saber: “Como eu vou dizer isso
Para uma pessoa que alimenta seus filhos uma vez por dia, se tanto?”
© artigo voltava sua atengao para os lucros auferidos de remédios
para desidratagao. Os precos dessas medicagées tendiam a subir enor-
pee Tee end verso, Apesar de os custos de produgao
aixos. Um dos remédios tinha 10 ingredientes, dos quais
inte eram aromas ou corantes. Embora 0
dios, as companhias farma-lista en.
izer iss
tanto?”
médias
r enor
odugio
qual
por?
yma
=
_SENSURA PREVA 115
do para Movimento como um ver
a v fculo alternati ‘bi
mplicasas ekistedal da Policia Federal cortaram sy eae
uyeas, reduzindo ainda mais os foros disponiveis parg at’ ados ¢
erieSpartilha de tal informagi ¢ Perspectivas, ""'" * @Presenta-
. : . :
aviadas muitas andllises ¢ eriticas. ‘Tuudy
a
Shas, quer fossem AS pessoas em si, come
Censuradas. Também for
a ‘am,
© due provinha de certas pes.
dom Helder em O Kstado de
8, NO caso do Mouim,
ento, po-
deria ser vetado, Qualquer debate sobre certn: Assuntos, inclusive a
prépria censura, ou toda consideracdo sobre altematrn” sociais,
itieas ¢ eeondmicas, podia ser cortado ou eliminade de, Soro pan
co. A censura oxercia enorme impacto sobre a matéria da mee
assim como sobre as relagdes cotidianas daqueles que estavant envol-
yidos com 0 meio jornalistico,
Relacdes cotidianas
Nos anos em que durou a censura prévia, meia dizia de publi-
cagoes produziram um registro concreto consideravel. Além desse ar.
quivo documental, a censura prévia também suscitou uma colegao de
relagdes pessoais bem diferente das que caracterizavam a autocensu-
ra, muito mais comuns. Os jornalistas interagiam entre si, reforcando
as experiéncias uns dos outros e inventando estratégias para enfren-
tar a censura prévia ou expressar sua frustracio. As publicagées su-
Jeitas @ censura prévia também se relacionavam com seus leitores,
procurando alerta-los a respeito das restrigées que sempre eram ne.
gadas publicamente pelo regime. Os jornalistas censurados também
interagiam com os censores da policia, que viam ou com os quais se co-
municavam todo dia. Finalmente, eles confrontavam o regime militar,
arquitetando expressdes de raiva ou planejando cuidadosamente de-
safios no plano judicial A censura prévia. Nenhuma dessas relagdes
era simples. Os membros da imprensa sujeitos a censura prévia apli-
caram esforco e imaginagdo as tarefas de achar cabimento nessa pré-
tica ilegal e secreta ou até resistir a ela.
Relacoes entre os atores da imprensa
ra a évi: il vam
Os atores da imprensa sujeitos a censura prévia ame aa
de uma experiéncia minoritaria. E compreensivel, entéo, qu
aPrep cmonne
Sf a a aa ee
ini a afirmar uma realidad
‘ocas eram cruciais par: le
Jagées gree egativas surrealistas do governo e da censura da oe
eoepara interpretar os fatos e para validar a experiéncia, jg.
ra), i
artitbavam a tensfo, a ira 0 a frustragdo decorrentes da sujet ™
Pe
basic,
cepsura prévia. ; Ree ho),
Em mais de um caso, essa partilha da experiéncia subjetiyg evo.
Iuin para tornar-se um ritual. Marcos Sa Corréa recorda a “cerimoy:
do cha” na Veja: “O que comegou como um hébito, uma prética pay
ajudar a manter-nos acordados em tantas madrugadas de espera pj,
volta do material censurado, transformou-se na ceriménia do chi,
rante tantas semanas, ficavamos acordados de quinta-feira até o ,_
bado. Naquela época podiam ser comprados finos chas importados,
Acrescentamos tagas de porcelana, toalhas de mesa de linho, cha in.
glés. Era um jeito de ficar acordados, uma brincadeira, um jogo, um r;,
tual, um encontro no meio da noite, compartilhando”,
Com a ceriménia do cha, os jornalistas da Veja sustentavam-se
mutuamente com cafeina e camaradagem, essenciais para suas vigi.
lias da madrugada. Mas 0 ritual teve outras conseqiiéncias, como Mar.
cos entendeu mais tarde: “Na Veja havia muita participacio, tant
assim que eu acho que isso acabaria nos tornando insensiveis ao pro-
blema que enfrentavamos. Acho que acabou nos prejudicando. Havia
raiva, mas nao a levavamos a sério como deverfamos. Acabou sendo
um jogo, uma brincadeira. Por isso, cometemos alguns erros” 4
Na sua ceriménia do cha, os jornalistas da Veja se perderam em
detalhes sem ver a cena maior. Nao lhes faltava criatividade, mas ca-
nalizaram sua criatividade e energia na elaboragéio da prépria ceri-
mOnia como uma coisa separada. Talvez isso tenha reforcado suas
amizades, mas tornou-os insensiveis a outras finalidades que pode-
Tiam ter buscado, se tivessem refletido, guardando-os até de sua prd-
pria raiva,
Um ritual diferente, segundo Raimundo Pereira, entao diretor de
Opinido, era cumprido no encerramento de cada edig&o semanal na re-
dagao do Rio de Janeiro: “Ficévamos juntos o tempo inteiro e, no do-
mingo, quando o numero seguinte ja estava Pronto, famos todos tomar
café na minha casa, Depois, iamos todos para a praia, todos juntos...
na brincadeira que costumavamos fazer na Praia, muitissimo simbé-
are fazfamos de conta que empurravamos as
yma catarse”“® Emourrar ag ondas,
haver para os ¢
sforcos de Opiniao? E u, 4 eee
m i i ma
ente apropriada de sua situagéo: metafora extraordinaria
ania * empenhados num esforco conjunto
Politica, mas insistindo em en-__CENSURA PREVA
17
té-la. Pelo menos na recorda
fret do que entorpecedor.
art
ec PCRS og trad sta vex
polagoes com os leitores
censura tivesse prejudicado a legitimidade do Estado O regime, evi-
dentemente, pelas medidas que tomou, procedia de acordo com essa
premissa.
As vezes 0 conteido de um artigo censurado nao dava qualquer
indieagdo de censura. Por exemplo, houve muitos casos parecidos com
a cobertura de um encontro secreto na Argentina de guerrilheiros de
esquerda “da Argentina, [Brasil,] Chile, Bolivia e Uruguai’. Apenas a
meneao a0 Brasil foi censurada (como indicam os colchetes) nesse ar-
essdo de que todos os assuntos es-
sa, até encontros secretos dos guer-
rilheiros.#° Assim, a imprensa aplicava certa criatividade em alertar
os leitores para a censura prévia. Tais esforcos alcangavam sucesso
apenas limitado, sendo frustrados pela persisténcia tanto do desco-
nhecimento dos leitores quanto da intervencao do Estado.
cativo de censura prévia. Era um proceso desalentador para o di-
retor Oliveiros Ferreira, que acabou se dando conta de quao limita-
da podia ser a ligacao do jornal com seus leitores,
Primeiro os dirctores tentaram mudar 0 que era para eles a sa-
crossanta localizagao dos assuntos cobertos em cada edig&o, passando
© noticiério internacional para uma pagina de dentro e pondo as no-
ticias locais na primeira pagina, por exemplo. Quando isso nao pro-
vocou qualquer Tea¢ao, os diretores tentaram colocar poesia brasileira
no lugar da matéria censurada, Obras de Gongalves Dias, Machado de
‘ssis e Manuel Bandeira comecaram a aparecer nas paginas de no-
Ueigtio.4” Nao era nada parecido com a matéria habitual do jornal,
mas novamente a rea¢ao foi pouca. Ferreira entao inventou e publi-
wu na primeira pagina algumas parédias ridiculas de cartas para a
Tedac&o sobre, por exemplo, a jardinagem em Sao Paulo. As cartasum AcoRDO FORCADO Some
118
‘i i . ho
nto.48 Da mesma forma, receitas de pratos intragaveis Provocay
reapoates de cozinheiros insatisfeitos, mas ninguém parecey Perec
s Chey
intengao era outra. : .
We A tatica final foi escolher um texto © sistematicamente pup,
ar
foram rospondidas com sineeridade por leitores interessadog
ram
mesmo sempre que 0 jornal quisesse indicar eae
ee esis foi.o poema épico classico do poeta do século more
Vaz de Cambes, Os Lusfadas. Cantos do poema apareciam resyit”
mente por toda parte no jornal, na pagina do noticidrio intemnaciyat
ou no lugar de um editorial, as vezes com a nota entre parent.
“(continua)”. Outras vezes aparecia uma manchete comum de not,
mas 0 texto era substitufdo por uma poesia, como “Conflito na ts
versidade Mackenzie” em cima de versos no Canto Nono
..as fermosas
Ninfas cos seus amados navegantes,
Os ornam de capelas deleitosas
De louro e de ouro ¢ flores abundantes...
Se prometem eterna companhia,
Em vida e morte, de honra e alegria...4°
A cobertura das reunides da SIP sempre era fortemente censu.
tada, inclusive os discursos do dono do jornal, Julio de Mesquita, que
também era presidente da SIP. A edicao de 5 de abril de 1974 traria
uma fotografia sem legendas de Mesquita, facilimo de reconhecer, com
“Canto Nono” em caixa alta em vez de manchete.
© texto inteiro do artigo censurado foi substituido por versos:
Porque dos feitos grandes, de ousadia
Forte e famosa, o mundo esta guardando
© prémio ld no fim, bem merecido,
Com fama grande ¢ nome alto e subido...,
«Melhor 6 merecé-los sem og ter,
Que possui-los sem os merecer.50
de usar og a
; mesmos recursos (O Sao
2 © pai-nosso; Opinj-, . a
Wantersal dos Direitos do Hoe, CP"ia0, de imprimir a Declaragao
Yeings Ferreira afirmoy eee das Nagies Unidas). O diretor Oli-
- Paulo de usar Se 0 regime tivesse proihid
_ rn
Camées, 9 jornal teria nen ap oibido O Estado de
‘ado outra coisa e con-Semeeeseeaes
USENSURAEVA 445
goa tentar. Sem drivida, isso 6 verdado, considerando a isc
uinuatral, Mas também 6 vordnde que o rogime nao protic ooo
do ne concedendo ao Hstaddo uma facilidade que nao dex a peed
Gam poesia de Cambes parece ter sido amplamente reconhecid;
um subterfuigio para apontar a censura, No Congreseo, refers
aramt enteniidas como refertneiss & censura (en,
;
come Camo
gai, elas também censuradns). Todo mundo agora esta ose Sr
(anim's historia elassica da censura naquele perfodo, Tornau.. tio fa,
BS hts que agora ¢ dificil ficar sabendo com que facilidade o te
Me foi reconhecido pelo leitor comum de O Estado de 8. Paris ois
ue Cxiste um indicio isolado a esse respeite > aoe
ni
Qs leitores de Opinido ou Movimento, por outro lado, talvez es-
tivessem mais capacitados a suspeitar ou ouvir dizer que havia con
sura prévia nessas publicagdes. Vani Moreira Kenski fez um inte.
ressante estudo dos leitores de Opinido intitulado “O fascinio ae
Qpiniao”. Tla conta que os ntimeros passavam de mao em mao, que
as pessoas tinham medo de fazer assinatura pois nao queriam seus
nomes em listas que poderiam cair nas maos da policia e que os lei.
tores tinham cuidado em comprar exemplares om bancas diferentes
ara nao ser reconhecidos. Alguns leitores lembram-se do sentimen.
fis eng, to de engajamento ¢ identificacdo indiretos com uma oposicao ativa
cute, Que simplesmente por ler a publicagao. Alguns lembraram de que se
74 sentiam audaciosos quando, por exemplo, liam Opinido em publico,
Peer como no dnibus ou na barca.
A histéria do Movimento também inclui casos semelhantes, o que
leva a crer que a leitura e assinatura da publicacio eram ates com.
Versos.
plicados. Um funcion4rio foi arranjar assinaturas no instituto de pes-
quisas econdmicas do governo, Ipea. Cinglienta pessoas desejavam as-
sinar, mas apenas uma queria que seu nome constasse na lista de
assinantes. Entao, durante anos, 50 assinaturas foram entregues para
esse nico assinante, que depois distribuia os exemplares entre seus
colegas.°8 Tais eram as pessoas que, nesse ambiente, provavelmente
estariam alertas para sinais de censura prévia ou outras restrigdes.
Elas presumiriam que havia muita coisa oculta por baixo do que apa-
ase recia em cada numero.
opria Essa predisposigao por parte dos leitores talvez desse margem as
cias. Publicagdes alternativas para indicar quando acontecia censura pré-
Sio via. Por sua vez, Opinido e Movimento também enfrentavam restri-
spd Ses mais rigidas do regime em suas tentativas de fazé-lo. Ademais,
ali: representantes de ambas as publicagdes deram seu depoimento no
de Sentido de que o sentimento de solidariedade nao bastava para fazer
9S leitores comprarem uma edicdo mutilada.120 uM AcoRDO FORGADO
8
Movimento ee a Siente da relagio de afets, de “fascinio” que
muitos leitores tinham por essas publicagses, Mag também era evi-
gente que isso nao bastava para leva-los adquirir com regularidade
publicagdes tao desfalcadas de seu contetido Pelos censores. Para ga
rantir as vendas, era preciso oferecer contetido real Como observou
Argemiro Ferreira: “Ninguém vai Comprar um jornal esquelético. Nao
6 bom para ninguém que as pessoas sintam pena de vocé, pois nin-
guém vai comprar semana apés semana s6 de pena de voce” Raimun-
do Pereira, diretor do Movimento, afirmou, nos mesmos termos:
Ges, contudo, era fazer Opo-
vez de se o
S ar em exerc{-
Decide umundo Pereira, diretor de
o mitow dolcar uma’ masse pe
intengao da publi-
980, fazer um bom
am suas vendas,
© pessoal de Opiniao ¢
Na tentativa de alertar o:
let usava algumas das estratégi:
terial censurado, no comeco
mecou a pér salmos e outras
antincios proprios. Mas,
rimentado, cada ui
to
s leitores & censura prévia, O Sdo Paulo
as de outras publicagdes. No lugar do ma-
deixava 0 espacgo em branco, depois co-
Passagens da Biblia ou o pai-nosso, ou
tal como as outras publicages tinham expe-
ma dessas praticas foi proibida. O jornal entao ado-
uuma abordagem mais direta. t
O Boletim Ciec, um boletim mimeografado da Igreja Catélica, era
Produzido pelo O Sao Paulo e vinha encartado em cada exemplar do
Jornal. Como se tratava de um material mimeografado interno, as ae
toridades nao Prestavam atengéo a ele. E foi nele que O Sao Paulo
I Pee m im-
Punha o material censurado. Primeiro, os artigos censurados eraHes “ihvaconnorroncAbe
Ae
totalidade, com uma explicacao de que
ressas de nya aparecer om O Sao Paulo. Mais tarde, omen
sido piordemais para ser reproduzido, 0 Boletim Ciee simplesm,
material i ido resumo dos artigos censurados naquela Semana
Janie ta quo of leitores de O Sao Paulo nao lessem nenhune a
* is 0 ae diz respeito A censura cles provavelmente eneane
Jornal re os leitores mais bem informados de qualquer jorna, do pat,
De fato, os arquivos de O So Paulo contém cartas A redagio pec
Gpies dos artigos eensurados. Numa pesquisa com leitores, gr; %®
que responderam queixaram-se da falta de acesso 20 material cena
rado (além de pedirem uma linguagem mais acessivel, pois nao «..
riam ficar excluidos).5? Hoh
Estar sujeito & censura prévia era uma experiéncia perturbado,,
Grande esforgo era aplicado s6 om transmitir 0 fato da censura ¢
tomar conhecimento da experiéncia. Desde a ceriménia do cha de Veja
até a luta contra as ondas de Opinido, os atores da imprensa tinham
de desenvolver maneiras de expressar suas experiencias e transmiti.
las uns aos outros. Ao tentar alcangar os leitores, podiam ser alta
mente criativos embora nem sempre bem-sucedidos. Mas pareciam
nunca desistir. Cada nova proibicao do regime suscitava uma nova ts.
tica da imprensa. Essas novas taticas terao absorvido excessiva cnr.
gia e nao terao sido muito eficientes, mas apontam para o compro.
misso desses atores da imprensa em perseverar na luta contra a
censura prévia, ao contrario do comportamento daqueles que estavam
sujeitos A autocensura (ver capitulo 7).
pressos de no
dog
Relagoes da imprensa com os censores
As interagdes diretas com os censores da Policia Federal pode-
riam ser cruciais quando uma matéria estava sendo considerada para
proibigdo. As decisées de alguns censores eram discriciondrias, até ar-
bitrarias, e nesses casos as relagdes pessoais podiam fazer diferenca,
assim como truques para esquivar-se do censor, cans4-lo ou engana-lo.
Como os agentes ébyios ¢ imediatos da censura, 0s censores em si tor-
naram-se alvos de muitos desses esforgos.
is ie eae Ms um Pecan despropositadamente estrei-
dela em foros Babee in licamente negada eo debate a respeito
uum modo de abner ie a anto, era impraticavel, por conseguinte,
tramitagées judicns a angar mao de relagdes pessoais em vez de
S ou burocraticas, Taig ataques representavam es-CENSURA PREVIA 123
sr. Ri
stip de TaPOragem. observous “Dara care Kota, chee da
de S. Paulo, nfo havia autocensura, Vocé escrevia 0 ti abel in
parm yeed es OA BSA aolsecfon tasdig dele Gore
trabalho do censor”.®" Carlos Alberto Sardeniny repGrter e-redator di
noticias, concordou: “Em O Estado de §. Paulo, a redagao e rea
dovfeita devidamente, como se fosse co Tee
inte duvidava disso. Vocé sabia que sen, Cees
Myrocess0 inteiro”. O diretor Oliveiros
Geviamos a noticia, toda ela. Cortar
i ) Padrao do jornalismo, col
lide (nariz-de-cera) 14 pelo décimo paragrafy” © Seria aati eee
rece no arquivo censurado em seguida a frases chamativas como “em
outras noticias da Igreja” ou “em outras noticias da policia”. Sua pre-
senga no arquivo de material censurado, porém, revela que Kotscho
seus colegas nem sempre venciam com essa taticn
Alem das estratégias aplicadas a propria redacao, havia também os
constantes esforgos de negociacao a respeito de determinados temas ou
artigos. As negociacées ocorriam em muitos niveis, desde o reporter que
lidava com o censor de plantao até o diretor que travava discussdes com
autoridades policiais. Os atores da imprensa usavam tudo 0 que podiam
(contatos pessoais, argumentos quanto a falta de tempo e extensio dos
cortes) para tentar aliviar a censura. Parece que uma dificuldade que
todos enfrentavam era a subjacente relutancia do censor em agir com in-
dependéncia mesmo em questées desimportantes e a tendéncia a trans-
ferir a responsabilidade aos poderes superiores centralizados.
No nivel inferior de negociagées ficava 0 jornalista mais graduado
eo censor de plantao na redagao do jornal. Kotscho lembra-se de mui-
tas horas tarde da noite passadas com o censor:
Estdvamos sempre tentando negociar com o censor na redagao de
O Estado de S. Paulo. Quanto mais tarde, tanto melhores nossas chances.
Haveria cinco ou seis de nés do jornal tentando ganhar tempo. Pelas trés
da madrugada o censor estaria tao exausto que a gente tinha uma see.
ce melhor de fazer passar alguma coisa. Conseguiamos bem mais dessa
maneira. Ou se podia dizer para censor; “Olha, cortamos uma anes
inteira. Nao podemos publicar uma pégina inteira de Cam@es’, ¢ @
posta seria “Espere, vou telefonar para Brasilia”.124 um AcoRDO FoRCADO
inteira de Camées? O regim: 2
Por que ee fe etas esquisito, 0 ae “oe,
ura de imprensa afetaria su legitimidade, essa e
Jornal devia explorar. Transferencia pa ‘a
una raat es sua acontecia quando 0 diretor Ferreira
ridade® Policia Federal em Sao Paulo a respeito de determinady yn
Hama, As veres ole também ouvia a resposta, “espera, vou falar «o)
Brunia’, o que Ferreira interpretava como 0 reeeio do subordinag”
inedo de represdlias se eles usassom seu préprio discernimenty ,”
aimorimento das normas nfo muito claras sobre censura, Nout,
vezes a resposta seria; “Ta bem, por causa das relagies pessoais, yoo:
esta autorizado”.©4 ,
i De vez em quando as relagdes pessoais entre os membros da elit,
1A facilitavam as restrigdes a O Estado de S. Paulo. Mas também, om o.,_
tras ocasides, eles devem ter reduzido a margem de acao do jornal. g
fato de nao querer prejudicar relagdes pessoais que por vezes cram
proveitosas podia eliminar certas estratégias da faixa de agao de 0 E,.
| tado de S. Paulo. Evidentemente, havia uma ténue linha diviséria
} uma ambigiiidade crucial que decorria do histérico prestigio do jornal
de seu lugar na elite, apesar de sua posigao temporariamente oposi.
cionista.
Opinido e Movimento também tentavam liberar material censu-
rado sabotando indiretamente os censores ou negociando diretamente
com eles. Devido a distancia de Brasilia (onde era feita a censura pré-
via dessas duas publicagdes), bem como a sua relativa falta de amigos
em postos de poder, suas oportunidades de negociagao cram limita-
das, mas existiam. Ao contrario das publicagdes sujeitas A autocen-
sura, eles nunca deixaram de inventar métodos para sabotai
fe a fe caso de O Estado de S. Paulo, a meta era eae
iberasio de determinado artigo, e ndo a derrota d
si. Essas publicagdes alternativas també mene an
. diam tentar ti -
tagem do espago criado pela busca de le; tim Sees de sent
P gitimidade poi i
me e conseqiiente deseji i Peigeaes cu Tet
Beate ds aon ele i ay ae a censura. Como Pereira,
fer of eae snes a eas ‘ovimento nunca negociou, nunca
mais suave. A abertura era o desi i Fare eee eet
ejo de legitimidade por parte do go-
verno. Aproveitavamos j
4 vamos isso, Nunc iam
‘s . ca nego m. ‘
gio, eles fizessem 9 que ena Ose amos. amos fazer a publi-
querer evitar 0
Revelar a cen!Mal Cons,
Tetamenie
Msura prg.
de amigns
4M limita.
1 autocen.
tar a cen-
sempre a
prévia em
rar van-
» do regi-
| Pereits,
g, nunc
a previe
CENSURA PREVIA 125
imondo Pereira sait para fundar Movimento, lembra-se de haver
aim’ tado artigos com tanta freqiéncia que as vezes vinha uma
reser! i
apretyg censor com um rabisco na margem, “Olha, nao manda este de
tratava apenas de uma ma-
nota dt fas ele considerava que isso niio s¢
pave’ para fazer passat o material mas também de uma expressao de
nob agao, uma recusa a cooperar. Pelo menos, disse Ferreira dando
ge ombros: “Podiamos obrigé-los a ler a matéria de novo" &
outra pratica semelhante na mesma linha era a de fazer ligei-
qiteracdes graficas no material depois que cle passara pela eon-
ree fam um cago, uma fotografia aprovada de um politico da opo-
sulfp era rasgada pelo meio antes de ser reproduzida na capa. Um
fico aprovado em um tamanho era ampliado. Ferreira também se
Giybra de ter pingado tinta vermelha em cima do desenho aprovado
je ama pomba, Estava obedecendo a letra da “lei” do censor, publi-
cando apenas 0 que tinha sido aprovado, ao mesmo tempo que sa-
fotava o controle do censor.
Outra estratégia habitual em Opinio se destinava nao A libera-
ao de um artigo especifico mas do material referente a uma edig&o in-
teira. Com a metade ou mais de seu material censurado cada semana,
2 publicagdo tinha sérios problemas s6 para encher suas paginas. Em
vez de reduzir 0 numero das paginas e aparecer fininho e fraco nas
bancas, o pessoal apresentava material extra estrangeiro para os cen-
sores, o qual era menos passivel de ser cortado e assim ajudava Opi-
nido a oferecer 0 mesmo volume em semanas que de outra forma pa-
receriam meio fracas.°°
‘Ao contrdrio do que acontecia com a autocensura, as oportunida-
des de negociagao eram poucas mas existiam de fato. Alguns dos jor-
nalistas respons4veis pelo recebimento do material na Policia Federal
em Brasilia lembram-se das negociagdes a respeito de certos artigos,
especialmente quando tao pouco era deixado que teria sido dificil mon-
tar uma edicdo naquela semana. Jaime Sautchuk recorda-se de um
censor ter concordado em dar uma segunda olhada “sé porque eu es-
tava com uma cara tao triste”. Devido a tais experiéncias ele concluiu
que o regime n&o queria fechar as publicagées alternativas censura-
das, mas queria manté-las sob estrito controle.°°
_. Os esforgos para enganar os censores pelo cansago parecem ter
sido a tatica elementar mais facilmente disponivel As publicagées su-
Jeitas 4 censura prévia, mas era uma jogada que podia ser usada por
ambos os lados. Os censores da Policia Federal podiam recusar-se a li-
‘Tar 0 material até o ultimo momento, obrigando o pessoal das pu-
licagdes, censuradas a trabalhar até de madrugada para cumprir os
Prazos, Marcos S4 Corréa se lembra de ficar acordado todos os fins de se-uu ACORDO FORCADO
126
ipe da revista © sey
anos, enquanto a equipe d conto
eens Ee
io ‘Sa Corréa também acredita que 0s jornalistas da ve
tavamnerdendo de vista seus leitoros © cada vez mais gag’ {i e,
avi
‘i itoidistora an Teen,
a enganar 0 censor, 0 que produzia um efeito distorcidg. do
par:
Talves de certo modo estivéssemos excrevendo para 6 censor,
do vood escreve para burlar 0 censor, 0 que sobra 6 incompreensive| . ra
Initor. Nosso relacionamento era com o censor, ele se tornou o fon?
ota, iludi-l, desafléto, Nao estévamos mais excrevendo para oleitgy °."
podiamos ver o leitor.
Foi_um erro fazer isso, disfargar coisas com metéforas ou to
coisas, E dbvio, se a gente conseguisse eserever de maneira que p;
pelo censor, entao 90% dos leitores nao iam entender, nio pod
tender. No entanto, ficdvamos tao orgulhosos, fosse qual fosse
tado, esquecendo aqueles 90%, esquecendo os resultados de no:
tratégias.”°
Cer ag
ARSass6
fam en,
© Tesul,
882s es.
Outros jornalistas da época recordam outra abordagem nas papi
nas da Veja que corresponde as observagées de Marcos, e que consis
tia em publicar caluinias ou repetir acusagdes contra certos individuos
(por exemplo, dom Helder) de forma que se falasse deles de uma m..
neira ou de outra. Contudo, cabia ao leitor distinguir entre a calinia
estratégica e a noticia pretendida, o tiro podia sair pela culatra
© préprio Marcos descobriu como tais enganos podiam sair pela
culatra quando ele teve de escrever um retrospecto da década de 1970
Para uma edigao especial de Veja, o que implicou meses de pesquisa ¢
a elaboragdo de dezenas de artigos. Ble iniciou a pesquisa por nme.
ros antigos de Veja, pois tinha sido por essa publicacao que ele tinha
experimentado a década. Descobriu, no entanto, que nao podia re-
constituir 0 periodo partindo desses ntimeros antigos, e se sentiu pro-
fundamente mortificado com essa constatacio:
iyo, aii um choque, Achava que nosso trabalho tinha sido tao significa.
tivo, mas nao podia reconstituir a década a partir da revista, So havis »