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Pesquisa Formação e Prática Docente Marli André

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cepcesmurane ila eer ‘Rovako Margret Sh do OP" one emt att) aaa Sapaeeantemeormneeres a! Sepesragi ta“ Goxmce tases a eee 1. Peng 2, Peni acucasonal 3. Fitcn de enna {Agee Fama bso A eT a cvoarare Inde pare caliogo ito: 1. ee pean: Ena 7072 2 Remassweno:Emenpse 7072 Sa ‘xia rors Lingo Pong Eom Relmpressio ~~~ 2017 aT aeS OTF Ghatie oo son oom a 21008 ‘Eo eta snoop Brats (or Svanon erotics (R60 Dinero8 RESERVADOS PARA ALINGUA PORTUGUESA: Stir conan ra ceca tin Porn ‘Rosca Pret a0 CoP ots toe ora (os oo ~ Canora S80 Pao ~ Bat fut estompanrus com = www papi som \ | \ ‘ SUMARIO APRESENTAGAO ({) DILEMAS E PERSPECTIVAS NA RELAGAO, ENTRE ENSINOE PESQUISA . .. . . - - Lucfola LCP. Santos A COMPLEXA RELAGAO ENTREO PROFESSOR E A PESQUISA Menga Lldke PESQUISA, FORMACAO E PRATICA DOCENTE . . Marli André A“PESQUISA": ESBOCO DE UMA ANALISE . . J. Beillerot AS PESQUISAS NAS AREAS ESPECIFICAS INFLUENCIANDO 0 CURSO DE FORMAGAO DE PROFESSORES . . Mogda Soares a ard 35 n <9 3 PESQUISA, FORMAGAO E PRATICA DOCENTE Marli André Existe um consenso na literatura educacional de que a pesquisa é ‘um elemento essencial na formagiio profissional do professor. Existe também uma ideia, que vem sendo defendida nos tiltimos anos, de que a pesquisa deve ser parte integrante do trabalho do professor, ov seja, que 0 professor deve se envolver em projetos de pesquisaglo nas escolas ou salas de aula. Entfetanto, muitas questdes tm sido formuladas quanto & forma de insergao da pesquisa na formagio e na prética docente: deve-se '-— usar a expressio professor pesquisador/reflexivo? De que professor & de que pesquisa se est tratando, quando se fala em professor pesqui- sador? Que condig6es tem o professor que atua nas escolas, para fazer ~~ pesquisas? Que pesquisas vem sendo produzidas pelos professores nas escolas? Esses questionamentos tém feito parte dos debates da frea de educagio e ora se inclinam para uma defesa apaixonada, ora para uma ‘visio amarga do papel da pesquisa na formagio e na prética docente. ~+| 55 ‘Tentar explicitar os pontos de vista favordveis ou contrérios é um dos objetivos deste texto. Mas pretende-se ir além, visando a analisar como essa ideia vem sendo traduzida tanto nos cursos ou programas de forma- 40 docente quanto na literatura académica e nos textos oficiais. Formar o professor... pesquisador (O movimento que valoriza a pesquisa na formagao do professor 6 ‘bastante recente. Ganha forga no final dos anos 80 e cresce substancial- ‘mente na década de 1990, acompanhando os avangos que a pesquisa do tipo etnogréfico e a investigagao-agdo tiveram nesse mesmo perfodo. ‘No Brasil, assim como no exterior, esse movimento caminhou em miltiplas diregbes: Demo (1994) defende a pesquisa como principio cientifico e educativo; Liidke (1993) argumenta em favor da combinagao de pesquisa e pritica no trabalho e na formagio de professores; André (1994) discute o papel didético que pode ter a pesquisa na articulaco centre saber € pritica docente; Geraldi, Fiorentini e Pereira (1998) enfa- tizam a importincia da pesquisa como instrumento de reflexao coletiva sobre a pritica; Passos (1997) e Garrido (2000) mostram evidéncias, resultantes de seus trabalhos, sobre as possibilidades de trabalho conjun- to da universidade com as escolas piblicas, por meio da pesquisa colaborativa. ‘Na literatura internacional também so bastante variadas a8 pro- postas, destacando-se, entre as. norte-ameri ‘colaboragdo da universidade com os protissionais da escola para desen- volver uma investigagio sobre a prética (Zeichner 1993). Do Reino Unido, as propostas mais divulgadas sto as de Stenhouse (1984) que, no contexto das reformas curriculares, concebem o professor como inves- tigador de sua pritica, e as de Elliott (1996), que sugere a investigagao-agflo como espiral de reflexio para melhorar a pritica, Muito proxima dessas € a proposta de Carr ¢ Kemmis (1988) que, 56 nas, a_que valoriza a__|__ fundamentando-se na teoria critica, defende a autorreflexio coletiva¢ a investigago-agAo no sentido emancipatério. Embora enfatizem pontos diferentes, essas proposigdes tem ratzes comuns, pois todas elas valorizam a articulagao entre teoria ¢ pratica na formagéo docente, reconhecem a importancia dos saberes da experiéncia ¢ da reflexiio critica na methoria da prética, atribuem ao professor um papel ativo no proprio processo de désenvolvimento profissional, defendem a criaglo de espagos coletivos na escola para desenvolver comunidades reflexivas. Essas concepg6es tém sido amplamente divulgadas no Brasil, a0 fazerem parte dos contetidos ¢ da bibliografia dos cursos de formagio inicial e continuada do professor, ao serem incluidas nos programas de ‘concurso para diretores e para ingresso na carreira docente, e ao virem a integrar recentemente as diretrizes curriculares para formagio de profes- sores elaboradas pelo Conselho Nacional de Educagio. Se essas concepgGes sinalizam a busca de objetivos vélidos & relevantes, se esto voltadas ao alcance de metas extremamente positi- -vas, por que vém sendo objeto de critica e de questionamento? Porque deixaram de ser simples proposigdes ¢ passaram a constituir um verda- deiro movimento, que nos tiltimos anos vem crescendo rapidamente ‘yer assumindo as mais diversas configuragées. Como bem nos alertam Cochran-Smith ¢ Lytle (1999), um conceito tio aberto como 0 do professor pesquisador pode servir virtualmente para qualquer agenda ‘educacional. De fato, as interpretagdes desse,conceito tém sido as mais, variadas: pura alguns, formar © professor pesquisador significa levar 0 futuro docente a realizar um trabalho prético ou uma atividade de estégio, que envolve tarefas de coleta ede andlise de dados. Para outros, significa evar 0s futuros professores a desenvolver e implementar projetos ou ages nas escolas. E hé ainda os que se valem do prestigio comumente associado a pesquisa para divulgar essa ideia como um novo selo, um ‘modismno ou uma marca de propaganda, Ao ser usado para propésitos to variados, esse conceito corre um. sério risco de esvaziar-se, banalizando a propria ideia do papel da pesquisa na formacao, pois algo que serve para tudo acaba nfo servindo para nada. Daf a necessidade de examinar com cuidado a proposta ¢ as implicagdes do conceito de professor pesquisador, Antes de mais nada, € preciso esclarecer de que professor de que pesquisa se esté tratando, ‘como faz Liidke (2000) quando analisa dados de sua investigago sobre ‘aimportincia da pesquisa na vida do professor. Se estamos nos referindo a0 professor que atua ou que esté sendo formado para atuar nos ensinos fundamental e médio, temos que considerar quais so suas reais possibi- lidades de desenvolver pesquisa e a0 mesmo tempo atender aos intimeros desafios do seu trabalho docente cotidiano. © que se espera dos professores da escola basica? Que eles ‘assumam de forma competente e responsavel a sua tarefa de ensinar, a fim de que a grande maioria de seus alunos desenvolva uma atividade intelectual significativa, apropriando-se de conhecimentos fundamentais para uma insergo comprometida ¢ ativa na sociedade. Essa , sem diivida, uma tarefa extremamente dificil, desafiadora, exigente. Reco- nhecer sua importincia ¢ complexidade, no entanto, no significa confundi-la com a pesquisa, nem igualé-la a ela. Assim como ensino e pesquisa se articulam em varios sentidos, ‘em outros, se diferenciam. Assumir essas diferencas € essencial para que nfo se gerem expectativas nem prop6sitos irreais ou até equivocados. A distingdo entre um ato pedagégico ¢ um ato de pesquisa, entre uma atividade de ensino e de pesquisa, foi tratada recentemente por Bernard Charlot (2001) numa conferéncia proferida em So Paulo sobre “Forma- fo de professores, pesquisa e politica na educacdo”. Ao discutir as razes que dificultam a entrada da pesquisa na sala de aula, ele argumen- tava que 0 ensino & um ato muito mais complexo do que a pesquisa. Em suas palavras, “a pesquisa nfo pode dar inteligibilidade a todas as reagBes de um professor na sala de aula, Pode focalizar certos aspectos do ensino, ‘mas jamais dard conta de sua totalidade”. O ensino, comentava Charlot, tem uma dimensiio axiol6gica e politica: ocorre num contexto especifico tem metas a atingir. A pesquisa € analitica, usa procedimentos rigorosos ¢ sisteméticos para produzir conhecimento, dar inteligibilidade aquilo que € desconhecido e que € necessério conhecer. Nao cabe, portanto, atribuir & pesquisa um poder que ela ndo tem, 0 de ditar regras para a pritica docente. Concordando com as ponderagGes de Charlot de que ensino pesquisa so atividades que exigem conhecimentos, habilidades e atitu- des diferentes, concluo que as tarefas delas decorrentes também tém graus de exigéncia e implicagdes diferentes. A tarefa do professor no dia a dia de sala de aula é extremamente complexa, exigindo decisdes imediatas e ages, muitas vezes, imprevi- siveis, Nem sempre ha tempo para distanciamento e para uma atitude analitica como na atividade de pesquisa. Isso no significa que o profes- sor no deva ter um espfrito de investigagdo. E extremamente importante que ele aprenda a observar a formular quest6es ¢ hip6teses ea selecionar instrumentos ¢ dados que o ajudem a elucidar seus problemas ¢ a encontrar caminhos alternatives na sua prética docente. E nesse particu- lar 08 cursos de formacdo tém um importante papel: o de desenvolver, com os professores, essa atitude vigilante e indagativa, que os leve a tomar decisdes sobre 0 que fazer e como fazer nas suas situagées de ensino, marcadas pela urgéncia e pela incerteza. Se fazer pesquisa significa produzir conhecimentos, baseados em ccoleta ¢ anélise de dados, de forma sistemitiga e rigorosa, o que requer do pesquisador um trabalho com um corpus te6rico, vocabulério préprio, cconceitos e hipéteses especificos, tendo para isso que dispor de tempo, de material e de espaco, nilo seria esperar demais que o professor, além de seu exigente trabalho didrio, cumprisse também todos esses requisitos dda pesquisa? Mesmo se considerarmos a pesquisa voltada para a melhoria da prética, que nao necessariamente precisa cumprir todas as exigéncias acima apontadas, pois pode se preocupar mais com a ago do que com a 59 produgio de conhecimento, temos que pensar nas condigées minimas necessérias para sua efetivagdo. Querer que o professor se tome um. profissional investigador de sua pratica exige que se pense nas exigencias ‘mfnimas para sua efetivacdo, ou seja: € preciso que haja uma disposi¢a0 pessoal do professor para investigar, um desejo de questionar,; é preciso ‘que ele tenha formagio adequada para formular problemas, selecionar métodos e instrumentos de observagdo e de andlise; que atue em um ambiente institucional favordvel & constituigdo de grupos de estudo; que tenha oportunidade de receber assessoria técnico-pedagégicw; que tenha tempo e disponha de espaco para fazer pesquisa; que tenha possibilidade ‘de acesso a materiais, fontes de consulta e bibliografia especializada. Esperar que os professores se tomem pesquisadores, sem oferecer as necessérias condigdes ambientais, materiais, institucionais implica, por ‘um lado, subestimar o peso das demandas do trabalho docente cotidiano ¢, por outro, 0s requisitos para um trabalho cientifico de qualidade. Se o movimento em prol do professor pesquisador tem o grande mérito de valorizar o papel social do professor como agente de mudanga produtor de conhecimentos, hé também o grande risco de se voltar contra ele, colocando apenas sobre suas costas a culpa de todas as mazelas da educagio, Na medida em que essa ideia de professor pesqui- sador se torna uma panaceia, cria-se uma expectativa de que v4 resolver todos.os problemas da educagio e, se isso no acontece, ele, o professor, que passa a ser 0 culpado. [Um outro risco associado ao movimento em defesa do pesquisador 6 0 de acentuar 0 proceso de desvalorizagiio di docente, pois formar o protessor pesquisador pode significar a busca de ‘um status mais alto, j4 que a pesquisa tem muito mais prestigio que o ‘ensino. Reforgar 0 papel do professor como pesquisador pode muito simplesmente ser uma forma camuflada de evitar o enfrentamento das reais dificuldades pelas quais passa a escola hoje, entre as quais, a falta de condigdes concretas para um trabalho docente de qualidade, Precisamos, portanto, examinar com cuidado essa proposta tio atraente de formar o professor pesquisador para ndo cair nas suas ‘rmadithas; nem atribuir-lhe um papel redentor, de resolugao magica dos graves problemas educacionais, nem simplificé-Iademasiadamente, di- xando de considerar as exigéncias mfnimas para sua efetivagio. Para evitar esse risco, talvez seja melhor deixar de falar em professor pesquisador de forma genérca e passar a tratar das diferentes maneiras de articular ensino e pesquisa na formago é na pritica docent. Possibilidades de articulagéio entre ensino e pesquisa na formagio docente Hi vérias formas de trabalhar a articulaglo entre ensino e pesquisa na formagio docente, Uma delas € que a pesquisa se tome um eixo ou ‘um niicleo do curso, ou seja, que ela integre o projeto de formagao inicial ‘econtinuada da instituigao, construido pelos seus participantes, levando ‘em conta os recursos e ts condigdes disponiveis. Nessa perspectiva pode traduzir-se numa organizagSo curricular, em que disciplinas e atividades sejam planejadas coletivamente, com 0 objetivo de desenvolver habili- dades € altitudes de investigagdio nos futuros professores. Pode, além ‘disso, traduzir-se no uso da pesquisa como mediagio, ou seja, que as disciplinas ¢ atividades do curso incluam a andlise de pesquisas que retratem o cotidiano escolar, visando aproximar os futuros docentes da realidade das escolas, levando-os a refazer 0 processo da pesquisa ¢ a discutir sua metodologia e seus resultados: Hi ainda a possibilidade de os docentes do curso de formacao inserirem seus pr6prios temas e projetos de pesquisa nos programas das disciplinas, dando a seus alunos, futuros professores, oportunidade de discutir os resultados de suas pesquisas, os dados analisados, a metodo- Toga utilizada para que, a partir daf, possam propor € gerar novos temas «problemas. 61 7 Outra alternativa que busca articular ensino ¢ pesquisa nfo s6 na formagio inicial, mas nas diversas fases do desenvolvimento profissio- nal dos docentes, € a pesquisa em colaboragdo. Usando diferentes metodologias, como o resgate da meméria educativa (Lima 1995), a autobiografia (Bueno 2000), a combinagao da etnografia com a pesqui- sagio (Passos 1997), o diério reflexivo (André e Darsie 1999), a leitura critica da prética (Dietzsch 1999) e a pesquisagao (Garrido 2000), varias iniciativas vém sendo divulgadas como exemplos bastante promissores da realizagao de trabalhos conjuntos'dos professores da universidade com os profissionais das escolas. Seu reconhecimento ja ultrapassou o Ambito académico, pois desde 1996 a Fundago de Amparo A Pesquisa do Estado de Sao Paulo vem dando apoio financeiro a varios grupos que retinem professores da universidade ¢ da escola ptiblica paulista para realizar investigag#o conjunta visando & melhoria do ensino. Os resulta- dos desses trabalhos, que tém sido apresentados em congressos seminérios (por exemplo: Anais do IX Endipe 1998) e em publicagdes (Por exemplo: Marin 2000), demonstram seu potencial para a formagio 0 aperfeigoamento dos professores e dos pesquisadores. Fica, assim, evidente que 0 papel da pesquisa na formago docente ‘vai muito além da questo do professor pesquisador/reflexivo, que ora é vista como panaceia, ora como impossibilidade. Requer, por um lado, que se considere a existéncia de varias modalidades de articulago entre ensino e pesquisa na formagao docente e, por outro lado, que se reconhe- ‘ga anecessidade de condigdes mfnimas para que o professor possa aliar a investigagdo a seu trabalho docenite cotidiano, > Pesquisa académica x Pesquisa dos professores: Para além das dicotomias Uma questo que tem estado subjacente as discusses sobre 0 papel da pesquisa na formagdo docente € a que contrapde pesquisa académica € pesquisa dos profissionais das escolas, conhecimentos Cientificos e conhecimentos tteis & prética @ Nao ¢ incomum ouvir supervisores, diretores de escola, coordenado- res pedagégicos e professores dizerem que as pesquisas nio refletem a realidade das escolas, so muito sofisticadas, ndo oferecem resposta aos problemas da prética e so, portanto, pouco titeis. Dolado dos pesquisadores hé também muitas reclamagées, seja pela dificuldade de conseguirem cess0 As escolas, seja pelas presses que sofrem, quando estio coletando dados, para dar receitas ou para dar sugestOes sobre como solucionar problemas imediatos do cotidiano escolar, seja pelo pouco interesse de muitas escolas na devolugdo dos resultados das pesquisas. Haverd razGes para tantas insatisfagdes de ambos os lados? Pro- * vayelmente, Os pesquisadores muitas vezes assumem uma atitude de juiz das préticas escolares ¢ dos professores, atribuem & pesquisa um papel prescritivo, fazem dentincias pouco fundamentadas, ditam a verdade, criando, com isso, indisposigdes e resisténcias perfeitamente compreen- siveis. Muitos professores ¢ demais profissionais das escolas, por sua ‘vez, desenvolvem uma grande expectativa em relacdo & pesquisa, acre- ditando que ela pode dar respostas imediatas ou apontar solugdes aos intricados problemas da prética escolar cotidiana e, como isso nfo acontece, mostram-se céticos quanto a seu valor e sua utilidade. Passam, entdo, a fazer sérias eriticas aos resultados das pesquisas, acusando-os ora de simplistas demais, ora de complexos demais, ora de muito vagos, ora de contradit6rios. Muitas das razdes funcionais ou estruturais que levam tanto pes- quisadores quanto profissionais das escolas a essas percepg0es jé foram estudadas, afirma Huberman (1999), assim emo hé varios exemplos na literatura que mostram as possibilidades de interaglo e de trabalho conjunto entre eles. E é justamente Huberman que, servindo-se da experiéncia de realizagdo de dois projetos de pesquisa, relata os efeitos que a interagao sustentada com 0s profissionais das escolas pode trazer para os pesquisadores. Pode haver ganhos conceituais e metodol6gicos para os pesquisadores, diz ele. E explica: “os pesquisadores podem refinar ¢ até rever seus conceitos, suas metodologias, seu ensino e seu 8 ‘modo de estabelecer trocas com os n&o especialistas” (op. cit. p. 316). ‘A interagdo nfo nasce de uma tinica reunifio, mas vai se consolidando 20 ongo de varios encontros, quando vai sendo conquistada uma simetria de poder e de influéncia entre pesquisadores ¢ professores, condigfio fundamental para o sucesso da atividade coletiva. O objetivonioé chegar ater percepgdes comuns, acrescenta ele, mas que cada parte se aproprie daquilo que esteja mais de acordo com suas representagSes. E continua: “As trocas so sociais; as coisas importantes stio negociadas ¢ entio internalizadas em diferentes graus pelas duas partes” (idem, p. 317). E termina seu artigo com a seguinte conclusfo: “é a intersego entre as preocupacées dos pesquisadores € os dilemas dos profissionais das ‘escolas ao se cruzarem sobre os mesmos questionamentos, no mesmo periodo de tempo, € que estabelece o estégio para relagdes mais durado- ras” (idem, ibidem). As reflexdes e consideragbes de Huberman nos ajudam a ponderar ‘que a relagdo entre a pesquisa académica ¢ a pesquisa dos profissionais daescola'nio deve ser vista de forma dicot6mica, mas como uma possivel combinagaio, com beneficios para ambos os lados. Os exemplos jécitados de pesquisa em colaboracéo, realizados nos tltimos anos no Brasil (entre outros: Geraldi, Fiorentini e Pereira 1998; Garrido 2000; Marin 2000; ‘André e Darsie 1999; Passos 1997), sfo testemmunhos dessa possibilidade. Outra dicotomia que est presente, as vezes de forma mais expli- cita, outras de forma subjacente, nas discussées que tratam dos fins da investigagdo e da natureza dos conhecimentos produzidos € a que con- trapoe conhecimentos’cientificos e onliecimento’ da prética. 14, por tum lado, 0s que consideram como principal objetivo da pesquisa a produgdo de conhecimentos novos, obtidos através de procedimentos sisteméticos e rigoroso§ de coleta e anélise de dados (Beillerot 1991; Foster 1999). Hé, por outro lado, os que julgam a pesquisa educacional inrelevante para trabalho do professor e criticam-na por oferecer poucas contribuigdes & melhoria da pritica, Os argumentos de ambos os grupos precisam ser examinados com cuidado, Por exemplo, quando se aceita a ideia de que a pesquisa busca gerar novos conhecimentos, deve-se explicitar quem define 0 que so conhecimentos novos. Beillerot (1991) sugere que € a comunidade da ‘rea a mais abalizada para definir 0 que é (ou nfo) conhecimento novo. Para isso, segundo ele, a pesquisa precisa ser divulgada, pois s6 assim a comunidade poderd julgar o que € original ou no. Quanto ao requisito de que a pesquisa exige rigor e sistematizagio na coleta e andlise de dados, parece no haver qualquer diivida sobre essa necessidade, qual- quer que seja a tendéncia do grupo. Para examinar o argumento de que a pesquisa deve estar voltada para a melhoria da pritica, ¢ interessante recorrer &s ponderagdes de Hammersley (1993), num artigo intitulado “Sobre o professor pesquisa~ dor”, Segundo ele, os defensores da pesquisa do professor criticam a pesquisa convencional por vérias razdes, entre elas, a de que seus resultados sf irrelevantes para o trabalho do professor. Apoiam-se, para isso, no argumento de que 0s professores em geral nfo leem pesquisas e, quando o fazem, consideram-nas de pouco interesse. De fato, afirma Hammersley, a maioria dos professores pode no ler pesquisa, mas nfo se pode concluir dai que € porque a julgam inrelevante ou pouco interessante, Depende muito do que eles esperam dde uma pesquisa, Se eles buscam encontrar solugdes para os problemas que enfrentam na sala de aula, € provavel que se decepeionem, pois dificilmente se pode extrair de uma pesquisa um conjunto de regras a serem seguidas. A pesquisa nao pode resolver us problemas dos profes- sores, primeiramente porque, quando se investiga um problema, nada garante que se chegue a uma soluglo, diz ele. As vezes leva-se um tempo enorme pesquisando, pesquisando e no se chega a resultados muito claros, Em segundo lugar, acrescenta ele, as circunstncias que cercam ‘trabalho do professor sio muito diversas ¢ variaveis. Nenhum conjunto de regras ov preceitos seré suficiente para orientar a ago. Além disso, conclui Hammersley, a prética nfo se reduz & estrita aplicagio de 6 conhecimentos te6ricos, mas € uma atividade que envolve necessaria- mente julgamento © se apoia muito na experiéncia, e nfo sé em conhecimento cientifico, A pesquisa e a formagdo do professor no texto oficial ‘A Proposta de Diretrizes para a Formagio Inicial de Professores da Educagio Bésica em Cursos de Nivel Superior (2001), elaborada pelo Conselho Nacional de Educa¢do inclui a pesquisa como elemento essen- cial na formagao profissional do professor. Destaca a importincia de uma atitude reflexiva no trabalho docente; ‘© dominio, pelo professor, de procedimentos de investigagao cientifica ‘como o registro, asistematizagio de informagées, a andlise e comparago de dados, o levantamento de hipsteses e verificagdo, por meio dos quais poderd produzir e socializar conhecimento pedagégico. Ressalta ainda que faz parte do papel do professor desenvolver uma postura investigativa em seus alunos. O documento explica que “a pesquisa constitui um instrumento de ensino e um contetido de aprendi- zagem na formagio, especialmente importante para a anilise dos ontextos em que se inserem as situagGes cotidianas da escola, para construgio de conhecimentos que ela demanda e para compreenso da prépria implicaydo na tarefa de educar” (op. cit, p. 19). © documento tambéar pix eit destiyue a importancia de que 0 futuro professor tenha “nogées bésicas dos contextos e dos métodos de investigagio usados pelas diferentes ciéncias, para que néo se tormem ‘meros repassadores de informagiies” (id, ibid.) e que “tenha acesso aos conhecimentos produzidos pela investigacio académica” (id, ibid.). Ao abordar esses aspectos, o documento parece estar em sintonia ‘com 0s pontos enfatizados pelas literaturas nacional e estrangeira.e pelos debates da Area, No entanto, ha nessa parte do documento, que trata do papel da pesquisa na formagio profissional do professor, uma questo que deixa muitas dividas sobre a concepgdo de pesquisa que esté sendo focalizada. O texto diz que: a pesquisa (ou investgngo) que se defenvoive no mbit do tabelho do professor nko pode ser confundida com a pesquisa acedémica ot pesquisa cienica, Referee, anes de mais naa, ina attde cotiia- na de busca de compreensto dos processos de aprendizagem desenvolvimento de seus alunos e 8 atonomin na interpetajgo da realidad e dos coahecimentos que consituem seas objets de esto, (Op. cit. p.19) O texto faz uma separagio bem nitida entre a pesquisa académica oucientifica e a pesquisa do professor. Pode-se levantar pelo menos duas objeges a esse posicionamento, Uma delas é a seguinte: nfo se pode definir a priori que o professor ndo poderd desenvolver pesquisa acadé- ‘mica ou cientffica. O que € a pesquisa académica ou cientifica? A investigago de Ltidke (2000) sobre a pesquisa do professor da escola bésica mostra que hé alguns professores que desenvolvem pesquisas ‘dentro dos modelos mais convencionais. Se essa uma pesquisa acadé- ‘mica e é importante para o desenvolvimento profissional do professor, por que ele deixaria de faz8-Ia? Outra questo que se pode fazer & 0 seguinte: de que dados dispomos para concluir que essa (ou aquela) pesquisa € a mais (ou menos) adequada para a melhoria do trabalho docente? ‘Se 0 documento tinha a boa intengdo de valorizar a pesquisa na formacao docente, acabou provocando uma reagio oposta ao reduzir 0 papel da ciéncia na formagio docente, criando uma dicotomia entre pesquisa académica e pesquisa do professor e vedando a possibilidade de que o professor possa fazer pesquisa académica ou cientifica. Referéncias bibliogréficas ANAIS DO IX ENDIPE. Aguas de Lindoia, SP, 1998. ANDRE, MEDA. “O papel da pesquisa na articulagiio entre saber e pritica docente”. in: CLAVES, S M.e TIBALLL E.F. (orgs). Anais do VII Endipe, vol. I, Goifinia, GO, 1994, pp. 291-296. ANDRE, A. e DARSIF, M.M.P. “Novas priticas de avaliaglo e a escrita do difrio”. In: ANDRE, M. (org,). Pedagogia das diferengas na sala de aula. Campi- nas: Papirus, 1999, pp. 27-45. 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