BRAZIL PRd-HITORIO
Memorial Encyelographico oF
A PEOPOSITO DO
4 CENTENARIO D0 SEU DESCOBRIMENTO
PLO CONEGO
Bannundo Wlusses te Pntafoct
Naturil da Cidade do Jardim no Araripe), Fundador » Roitor ds
Arcadia Americana n’Am wonia, Mombro da Academia Coa-
rong, Socio Curresponden 0 do l'Union des Associations do
-La Presse ILero-Ameriqua:ne, Membro Cooperador de La =
Union Catholiea del Peri. Miembro Cooporador Salosiano
do Institute D, Boseo de Tur
tr ter Ordinis Pracdicatoram vo. SS.gtoxarii de Roma, Socio
correspondente da Arcadia Romana, Membro da Academia
Polygiotta da Italia, do La Societ‘ Asiatiquo des Langues
Oriontales Vivantes de Peris, da M.na Litteraria do Para,
da Iracema Litteraria do Caari ¢ do Istituto historivo, gog-
graphiee @ othuographico Paraense, ot:.
Trp, -Srupant—Rua Fortosa, n° 46.
1900BRAZIL PRE-HISTORICO
Memorial Eneyclographico
A PROPOSITO
DO 4’ CENTENARIO DO SEU DESCOBRIMENTO
PELO CONEGO
Favmunls tysses tle Pemafort
Natural da Cidado do Jardim (no Araripo), Fundador © Reitor da
«Arcadia Americana» n'Amazonia, Membro da cAcademia
Cearenso», Socio Correspondents do «l'Union des Asso-
ciations de La Presse Ibero-Ameriquaine>, Membro Coopera-
dor de La Union Catholiea del P Membro Cuoperador
Salesiano do Instituto D, Bosco de Turin o Nihtovoy, Socius
ot Confrater Ordinis Pracdicatorum vel SS. Rosarii de Roma,
spondente da «Arcadia igmana», Membro da «Aca-
lotta da Ital do «La Soci atique des
Langues Orientales Vivantes de Paris, da «Ming Littgrarime—
to Pard, ote., ete, Fe al
gon ECONG
-Ds— o
SHoEs v
Eduardo Failache
Trav. Campos Sales, a4
FORTALEZA 4 J
ALEZA We pes
Typ,—Stupart—Kua Formosa, n.” 46,
1900Dedicatoria
EANTE,das grandes econquistas do pro-
#resso e da civilisagio, filhas do conjun-
cto de circumstancias que promanam uma
das outras, nfo ha homens indispensa-
veis, disse um illustre publicista; porque
a verdade sobrenada aos homens como
ds ondas a nau que as domina@mas ha certamente ho-
mens indispensaveis pelos dotes da intelligencia, pela
nobilitude das idéas, pela audacia da execugio, pela fé
nos commettimentos-—scbretudo quando se appropinqua
o momento em que as circumstancias exigem a activi-
dade de um braco de ferro ou o talento de uma indivi-
dualidade acima do vulgar.
Faltando homens taes, as grandes emprezas, umas
vezes se retardariam, outras nem chegariam a realizar-se.
Entre os homens do ambiente’ politico em que vi-
vemos, um existe e tem-se tornado sociologicamente in-
dispensavel —é 0 eminente e preclarissimo cidadao:
AntToNIO José pz LEMos.Parece facilima a vida social, porém, 4 proporc¢io
que a gente a conhece ¢ yvae comprehendendo as suas
responsabilidades, torna-se difficil, gravosa, e cada um
vale, por sua experiencia propria, sentindoo que ella im-
p6e, querendo cumprir bem as suas obrigagdes.
A sociedade foi, he, e sord sempre caprichosa, sem-
pre a mesma, @ composta de bons e maus.
E sendo assim, 0 homem, principalmente 0 homem
publico, nio poderd jamais agradar a todos como -pensa
Malherbe; ou elle cumpre os scus deveres' ce cahe eo ipso,
no desagrado dos malevolentes, ou nio os cumpre een-
téo desagrada os bons.
Mas uma s6 cousa fica manifesta como eterna licc4o
aos que sabem cumprir bem com os seus deveres no
seio da sociedade.
Communas, congressos, partidos, influencias, corri-
lhos, tudo morre, e se afunda na onda agitada das
revolugdes e dos acontecimentos sociaes! O que sobre-
viveré 4 tudo isto?
Sobrevivem as idéas justas, grandes 6 generosas;
sobrevivem as creagées d’aquelles, que, emdespeito muita
yez da sua vontade, contribuem fortemente, brilhautemen-
te para os adeantos dos povos, e firmam por meio d’um
Jabutar insano e constante as feigdes caracteristicas, que
devem transmittir mais tarde a physionomia d’esta gera-
Mo 4s paginas immorredouras da historia.FE? cedo ainda, e'a occasifo nifio he azada, para fa-
zermos completa justiga aos herculeos ¢ inegualaveis ser-
vigos gue o emerito ¢ benefico patriota—AnTonio José
DE Lemos—tem prestado 4 gloriosa terra de Baptista Cam-
pos, Siqueira Mendes, Julio Cesar e Paes de Carvalho.
Nada obstante, 0 conceito philosophico que see
fazer-se da sublimeza do caracter de um homem pu-
blico collocato em face da sociedade, nos garante as-
severar, desarmado de preconceitos,’ que o conspicuo
chefe do actual Governo Executivo do Estado do Par4-—
€ um homem de verdadeiro merecimento, e tem sabido
cumprir admiravelmente com os seus deveres.
Eis 0 motivo unico pelo qual, nés, como prova ine
quivoca de gratidio, como justo e bem merecido preito,
ousamos OFFERECER, DEDICAR E @ONSAGRAR o presen-
te Livro sobre o—Braxil Pre-historico—ao
Exm. Sr, Senador—ANTONIO de LEMOS—
© MECENAS PARAENSE.
Ceara, 8 de Maio de 1900.
@ Quctor.BRAZIL PRE-HISTORICO
PRIMEIRA SECCAO
Questies Preliminares
Pontos de vista scientificos.—Dados positivus sobre a Ethnologia,
Ethnographia ¢ a Scieneia Glottica em geral.— Um momentoso
a anthropologieo. —A quem ineumbe presentemente a
?—O nosso deyer para com a Patria glorificada. no
sen 1." centenario.
AB OCCIDE
cia ethnologica 6 um poema su-
a base esti na propria humanida-
de sempre em lueta com os phenomenos telluricos.
A humanidade depois de haver caminhado bastante
e lentamente em busca sempre de novos horisontes geo-
A historia da. seiel
blime e indefinido, cuj
gnosticos, a longe ef a iaterc, lobrigou ainda com a vista
embaciada-—um ponto luminoso, primitivamente fraco, e que
augmentando pouco a pouco,tornou-se fulgente como o sol,
cujos raios vio se espargindo profusamente?por entre
todos 08 in os da especie humana,ie
Ora este phoco resplandecente, este ponto cycloidal,
onde se concentra toda a synthese das grandiosas epo-
peas relativas as nossas epochas pre-historicas 6 a—Ethno-
genia, que, sendo admiravelmente collocada no apice da
pyramide social, tem hoje como seu pedestal, como centro
ethnico ou georama de todas as outras sciencias—a Ethno-
graphia.
A Ethnographia ¢ uma sciencia nova, cenontologica,
por assim dizer, niio pelos. factos que expde, mas pelo
interesse que desperta ao espirito humano, fazendo-nos
observar as cousas ¢ os. homens féra dos preconceitos ¢
dos moldes acanhados da raga.
Por seu intermedio se consegue assistir ao primeiro
passo titubeante que deu o homem na senda do progresso,
ea philosophar sobre as civilisagdes autochtonas ou me-
ramente embryonarias, sobre os costumes, logares habita-
dos pelas gentes e nagdes nas differentes phases ou epd-
chas da sua historia,
Fazendo abstraccéo das formas politicas, a Ethnogra-
phia, como sciencia geographica, estuda especialmente a
natureza dos habitantes (’um paiz, sua conformagie phy-
sica, seus caracteres morphicos, exteriores ou particulares,
seu gencro de vida, seu habitat, e notadamente sua ma-
neira de vestir-se ¢ de metrir-se, etc., depois seus uzos e€ cos-
tumes, sua cultura intellectual e moral, sua lingua e sua
religitio.
E’ pela Ethnographia, que se distinguem perfeitamen-
te, exactamente todas as ragas e suas familias de povos,
suas relagdes e suas filiagdes; é ella, que apds as emi-
gragdes as mais longinquas,e as mais variadas e multiplas
fusdes e métissages, procura ainda determinar-lhes a ori-
gem ou o ultimo ponto de partida.
Certamente os costumes das racas civilisadas d’Asia
e da Europa sio tambem do dominio da Ethnographic ;
mas sobre este terreno, a geographia, a historia, a legisla-
gio e a philologia comparadas precederam-na j4 de ha
muito tempo.
Hoje as questdes pre-historicas avolumam-se e tomam
novo aspecto,=
Os estudos ethnographicos sobre as ragas selvagens
e semi-civilisadas d°Africa, d’America columbiana e da
Oceania formam wn complexo especial, homogeneo, e a
wn fe imitado € vrea)
sinoa @ Hlossoloyia ou a, que juntanrente
com o adminiculo das bio-ontologieas, isto é, a
Ethnogenia ¢ a Ethnographia, muito tem concorrido para
a evolucdio da Sociologia moderna.
Estamos bem convencidos de que nio haverd meste
doce albor do seculo XX, problema mais sublime e mais
Inportante para se destringar:—-que o provare eviden-
iciar a communhio social dos pores e dos individuos
atravez de todas as edades e tempo.
A quem incumbe pois a resolu,do deste mysterioso
preblema anthropologico, the ner World is a great mys-
dery-——senio 4 sciencia cthnographica e 4 glottica?
Sendo esta questio para nds de transcendente alcance,
encarada mesmo soh o ponto de vista theologico, cumpre-
nos imprimir-ihe o cunho verdadeiramente scientifico.
Nessa obra pia de vulgarisagio é dever nosso jamais
afastar-nos da trilha ‘luminosa, que arrotearam nossos
mestres na sciencia, mormente quando os factos que yamos
desenrolar e apresentar 4 contemp dos nossos coevos,
mais ¢ mais nos descortinam novos herisontes e nos fazem
comprehender melhor os nossos deveres para com esta
patria querida, que presentemente glorificamos, commemo-
rando o 4.° eentenario (la sua posterior descoberta, con-
quista e colonisagio européa.
seteCAPITULO I
ETHNOGRAPHIA
SUMMARIO. — Conheeimentos geographicos dos anti-
gos. — Sens grandes erros, suas conjecturas
e@ presentimentos. —Chave do grande proble-
ma das nossas origens.—A civilisagio. an-
tiga provada pela Archeologia.— Bergo da
nossa civilisagdo..-A Atlantida de Platon,
sua revelacio, historia de sew cataclysmo, —
Os Egypeios, Gregos ¢ Phenicios, factores
ineluctarets da antiga tvivilisagio, seus hierc-
glyphos e -monumentos.—Retrogradagio dos
povos.—Exemplos de decadencia social.—Os
Carthagtinexes.—Corollarios e conclusdes em
nosso prot.
Sabemos que os coxhecimentos geographicos e@ scien-
tificos dos antigos, attento o estado de quasi infancia em
que se achava a arte da navegagiio, bem longe estio de
ser equiparados aos estudos scientificos modernos, como
os de Paul Maury, Levasseur, M. Glasson, Zaborouski, e
aos grandes e profundos trabelhos encyclographieos do il-
lustre auctor de La Terre, Mr. Elisée Reclus.E de feito, Ptolomeu immobilisava a terra no centro
do universo.. Hipparcho apregoava 0 systema funesto das
bacias cerradas dos mares, da contiguidade d’Africa e das
regides na embocadura do Ganges; opinides essas que
mais ou menos influiram no cerebro de Mareo Polo, Man-
deville, Toscanelli e Christofcro Colcmbo, que partilhou do
erro cosmographico de Toscanelli,que ¢Cmittia a idéa can-
mum da proximidade das costas d’'Asia com as costas oc-
cidentaes d’Africa. O proprio Alexandre Magno, que havia
feito amplos estudos geographicos, confundia, segundo o
testemunho de Strabon, as. aguas do Hydaspe com as nas-
centes do Nilo, e n’este pensar apparelhava uma frota para
subir ao Egypto pelo primeiro curso d’estas aguas. Ptolo-
meu collocava o grande brago do Ganges a 760.° em vez
de 1050* do meridiano das Ihas Canar Polybio sus-
tentava fortemente com Eratosthenes que sob o Equador
a massa terrestre era mais engrossada do que nas outras
partes, e opinava que a zona torrida era sescepiirel de
habitagio; ao enyez Strabon, Parmenides, Cicero, Plinio,
Seneca consideravam esta zona como a séde d’um calor
insupportavel; erros que sé cederam o passo deante a
abertura a0 commercio de algumas partes da India si-
tuadas entre os tropicos, e depois do conhecimento ou
descoberta da Lingua primitiva (1) ainda viva, e dos
limites do Parddécas terreal e das viagens triennaes das
frotas d’Hiram e de Salomon aos paizes d’Ophir, Tars-
chisch, Partiaim, Haiti ¢ Cipango.
Ao lado, porém, d’estes erros scientificos e popula-
res sobre a forma da terva, a relacio de suas partes
entre si, sua configuragio, seu clinia, seus habitantes,
quantas verdades, quantos presentimentos destinados a
derramar torrentes de luzes sobre o intrieado e¢ obscuro
problema das nossis origens!.. Quem sabe si esse con-
juncto de conhecimentos antigos onde ha indicios neces-
rios da revelacdo nao venha ser chaye deexplicacio do gran-
(1) EB’ a Lingua Tupy, oriunda do hebrou e atiim do. sanskrito
© do grego, como provaremos.eee
de enigma pre-historico que vamos decifrar pela sciencia
glottica? Os archeologos e ethnographos em numerosis-
simos trabalhos j4 nos indicaram com maxima clareza e
exacgio os monumentos dos tempos os mais remotos; 0s
quaes d’uma maneira admirayel constatam a existencia
duma antiquissima civilisagio americana, que veio a ex-
tinguir-se mil annos depois. Esta civilisagao teve seu
bergo na propria America, entre os povos cuja raga é
caracterisada pela pelle fulvo-escura, bronzeada,e im-
berbe de seus homens. Esta raga, que parece dedtinada
a desapparecer, existe ainda hoje, mas em parte disse-
minada e em completo estado de barbaria, devido quigd
aos fructos das xovas civilisacdes que lhe tem succedido,
e vao conquistando-a altruisticamente, philantropicamente,
por meio dla fome, do veneno, da peste e do canhdo! (1)
A esta mesma familia de homens imberbes e de
(1) Este phenomeno & assds digno de nota. 0 distincto anthro-
pologista lusitano, Dr. Oliveira Martins, observou que nfo so as
luctas, 4 mio armada, a primordial causa da extinecio des nossos
aborigines. Veneido nas guerras, dizimado pela cscraviddo, expulso
e ropellido dos seus territorios, o indio soffre ainda por outra for-
ma, menos depondente da vontade dos sous concorrentes, as con-
sequencias da lei natural que condomna ‘ao desapparecimerfito, nio
sé as especies humanas inferiores, eqgno todas as outras especies
animaes, perante um inimigo mais forte e susceptivel de aclims
tacao local. «Essa causa mysteriosa, para muitos, ¢ a opidemia.
Os europeus, diz esse sabio pensador, levam comsigo a destruigio,
e por toda a parte onde vao além da polvora com quo ma-
tam voluntariamente {isto 6, civilisadamente) além do alcool com
que sem pensamento reservado, sé por ganso, envenenam os indi-
gonas, deixam rasto de mortifera influencia. As molestias, para
nos as mais innocentes,como © sarampo, (nixuarana) produziram de-
vastagdes horriveis. As bexigas (cefapora) mataram mais d
30:000!'! tupinambaes no Rio 6 em 8. Paulo no seculo XVI; do
o estabelecimentos Jesnitas,seis desappareceram deziamados pela
variola,esta por sua vez destruin no fim do seenlo passado as tribus
do Port-Jakson (Sydney).» Eximios naturalistas como Humboldt @
Darwin affirmam que ao contacto do euvopeu com os indios so
desonvolvam sempre grandes epidemias @ doengas eutanoas @ bubo-
nicas, come as que so tem desenvelvido. aqui uo Brazil, ue Pana-
ma. Perd © Chile. ygies
pelle vermelha pertenciam tambem os antigos Egypcios,
pelo menos assim nol-os apresentam suas pinturas, es-
culpturas, gravuras,e picthographias. Remy and Brenkley,
em o seu illustrado—A Journey to great Salt Lake de-
moustram que as rochas que cingem o grande Lago junto
d'Utah, actual capital norte-americana dos Mormons, estado
cobertas de esculpturas em tudo semelhantes as do Egy-
pto. Hoje admittimos, com os Srs. Brasseur de Bourbourg,
Alcyde d‘Orbigny, Hamard e 0 insigne indianologo Don
Henrique de Thoron—que os proprios egypeios foram,
egualmente como os nosons homens americanos, uma
colonia provinda da
social, superior ao que ali se
tem observado ultcriormeata na America equatorial.
As terras Oceania estio repletas de soberbos edi-
ficios em rainas qae os S25 haibitaates seriam ineapazes
de erigir $6 com os gross ios que possuem actual-
mente. Os primeiros navegadores, que visitaram 0 archi-
pelago das’ has Marque: o das Sandwich, a ilha de
Paschoa e a de. Tahiti, fiearam mos do contraste que
apresentavam com a rudimentar industria dos indigenas
certos monumentos notayeis por suas proporgdes descom-
munaes ou pelo acabido do trabalho. (James Southall,
The recent origin of inan, |. 399)
Em geral a linguagem complexa das populagdes
selvagens, algumas (de suas instituigées, que dir-se-hia
emprestadas as na(ées civilisadas de rossos fempos, pro-
cessos industriaes que ndo mais se relacionam com o seu12—
estado social, even pli gratiee—ouzo e a fabricacio doferro,
metal tio conhecido e espalhado entre os negros africa-
canos, tudo indica que a mér parte das tribus hoje en-
golphadas na mais hedionda selvageria, jazendo em per-
feito estado Je immobilismo, gozaram outr’ora dua civi-
lisacdo relativa, que possuiam em commum com outros
agrupamentos humanos.
Sabemos, alids, quantos monumentos grandiosos, fev-
ires tumulares, dolmens, moruds, idolos, sepulturas, cai-
caras e fortificazdes diversas os primeiros exploradores es-
panhées que penetraram na America, nio encontraram aqui,
ali, acolé, em toda a parte emfim do Nove Mundo! Tudo
isto nao podia absolutanente ser erigido por uma ra¢a
misera e mesquinha que elles destruirain em pouco tempo.
Evidentemente era a obra de sociedades melkor organi-
sadas e mais policiadas,o que prova ja haviam chegado ao
seu periodo de decadencia. O eximio ce sabio americanista
padre Brasseur de Bourbourg em quatro grossos volaines
desereve sublimemente o gréo de civilisagdo que aitingi-
ram o Mexico e toda a America Central durante 0 esta-
dio o mais obscuro da edade media,
As recentes exploragdes que tem feifo n’estas regides
um illustre transformista inglez, Sr. Richard Wallace,
suas interessantes e sgbias observa;des, cada vez mais
vio confirmando os factos que expomos e aclarando o
objecto dos presentes artigos que escrevemos. Aqui ¢€
ali superabundam as ruinas, cobertas, matizadas de ins-
cripgées e de esculpturas, e, 0 que mais he, ellas comecam
a revelar supernamente, theosophicamente os seus infindos
e profundissimos arcanos!. . .
Um illustrado viajor francez, Mr. Chanay, que. por di-
versas vezes,explorou aparte mais remota do Mexico desde
1854, nos mostrou nos Toltecas um povosabio, litterato,
constructor e edificalor notavel. porque empregava os
materiaes os mais diversos nos seus nobres editicios.
4 D’esta cultura intellectual, desta industria prospera
e assombrosa, 0 que restava no tempo da conquista his-
panica ?
Somente as suas preciosas reliquias, Exemplos muitoS13
mais pasmosos de decadencia social apresenta-nos 0 ¢e-
lebre Prichard em algumas tribus africanas,’que,_rouba-
das pelos yisinhos e obrigadas a fugir para o deserto,
passaram da vida pastoril ao puro estado de selvage-
ra.
Em presenca defactos desta ratureza, o que pensar
da pretensa imypessibilidade cm que se acharia um povo
de perder as conquistas da civilisacio uma vez n’ella
empossada? Responda-nos victoriosamente 9 Sr. Lu-
bock com os seus cannibalissimos Tahicianos e cynthiacos
Bachopins!!!
O que é certo, a0 envez, nds o repetimos, e Mr. Renan
o copfima na sua admiravel Historia Cas Linguas Se-
miticas (pg. 4%), & que jamais se \iu tm povo sahir
por si mesmo do estado selyagcm, @ passar evidentemen-
te da barbaria ccmpleta para uma real civilisagio. E mais
ainda, nio somente o genuino selyagem é incapaz de
Pogredir por esforccs proprios, mas tambem elle nao
pede soflrer, sem yerigo para sua existencia, @ contacto
dum estado social superior. A civilisajao, moimente se
ella é vasada nos moldespenlalines, o mata, como hemos
de prevar ccm a scriagio de cutres artigos que pre-
tendemos dar a estainpa na Historia Sociologica das duas
Americas. O homem s6 progride quando chega a certo (ré0
de elevacdo mental; ainda assim para conseguil-o espi
tual e materialinente myster oeacesso ou a miscibili-
lade dum povo mais theosophicamente adeantado ein ci-
vilisagao einstruccdo. «La crrilisation, disse-o com toda
elegancia e veracidade o pranteado e famoso publicista
Mr. de Broglie. est we flambeau qui ne s'allume qua
contact Wun foyer préextstant. ( Origine de Uhom-
ame—1879.) »
Voltando, pois, ao nosso primeiro artigo sobre a
submersao da Atlantida, é crivel que os nossos advenientes
Phenicios, uma vez senhores dos mares, n&o quizeram
aventurar-se a travessia d’um Oceano que hayia devora-
do a Atlantida e que até entio era considerado tnnave-
gavel! Todavia resa uma pia tradi¢fio que elles navega-
yam seguindo a direcgio do littoral das Gallias para sead
transportar 4 Irlanda, aonde tinham uma colonia; d’ahi
passaram 4 America e fundaram uma_ nova civilisacio,
Jevantaram soberbos monumentos, cujas ruinas véo-se
descobrindo paulatinamente, taes como as svas torres co-
nicas que existem na Irlanda e tambem no continente
americano. Ha tambem aqui e alli 'tracos inextinetos dos
Mongols, dos Celtus, dos dudeus, dos Pnnicos, que im-
plantavam tainbem um mixto de seus typos, costumes
religides.
Os Carthaginezes, herdeiros da supremacia mariti-
ma, bloquearam o Mediterraneo para impedir, sob pena
de morte, a ida a quem quer que se atrevesse passar 4
sua colonia d’Ameriea que emescava cbumbrar a Me-
tropole Punica. E’ de todo ponto digno defé um decreto
(lo tenebroso senado de Carthago acerca deste artigo.
Ao partir desta epocha de delenda Phoenicia foi-se obli-
terando a existencia e a mesma esteira que as esguias
falias indoaryanas deixavam ao singrar as aguas do con-
tinente transantlantico, até no dia em que navegadores
partidos da Islandia (1) e da Scandinavia desembarca-
ram ao norte d’America centenas d’annos.. , antes muito
do almirante e nauta genovez Christophoro Colombo;
facto admittido hoje como historicamente incontroverso;
cabendo porém a este ultimo navegador a inauferivel
gloria de ter sido o primeiro europeu que nos diernos
tempos conseguiu reafar o neptunio fio d’America e re-
comecar atravez do Oceano a derrofa dos povos da an-
tiguidade.
A historia dos povos antigos d’America esté sob as
ruinas das suas cidades e nos monumentos, como a
dos Assyrios ¢ dos Egypeios esté nos seus mounds, tu-
muli, obeliscos, pyramides, mumias e hieroglyphos. Aos
egyptologos, archeologos e amevicanistas incumbe elucidar
(i) E’ esta a grande ilha Zeeland, que quer dizer terva do gelo,
sita no o¢eano glacial Aretico, a 270 kils. da Groelandia (a terra
verde) a famosa eo ultima Thule de Pythoar, de Priseien, de Moy-
sés de Khoren, a Tyle de Scneca, Plinio e Jordanes, onde esteve
tambem o immortal Christofvro Colombo,—ib—
estas importantes questées pre-historicas que tio legiti
mos interesses nos despertam. Agora que 0 mundo scien
tifico nos contempla, cumpre levar as nossas investiga-
codes até o Centro-Americo, a Bolivia, ao Perti, Equador,
Colombia e Venezuela e a varias outras localidades, por
que hoje quer ascenda-se ds alturas vertiginosas dos An-
des, quer se desca ac centro das emmaranhadas flores-
tas equatorianas depara-se com os monumentos dos ha-
bitantes destes continentes separados pelo Oceano, se-
parados por desertos apparentemente inultrapassaveis, e
que ja uzufructuaram uma civilisagto identica 4 do ve-
Tho continente.
Nés, mereé de Deus, temos feito alguns estudos es-
peciaes sobre a origem e civilisagio dos antigos ameri-
canos e sobre as suas relagdes com os povos ultra-
marinos, trabalho que pretendemos editar depois da
publicagéo deste Memorial sobre o nosso Brazil Pre-
historico.
O presente estudo, esperamos, muita Juz derramara
sobre essa importante questao transformando ao alvorecer
do seculo XX muitas conjecturas e muitos sonhos em
muitas realidades.CA Nar, © ees
do easino manoyenico.— Classi-
ficacdes.—- As novas descobertas pateonto-
logicas @ America do Sul.--O grande con-
dinente antaretico.--O mar glacial eo perio-
do glactul na America do Sul.—As origens
da formacao pampeana.—Os reeentes e im-
portaintes achados paleoutologicos conprovan.
a existencia e a desapparic¢ao da tradicional
Atlantida, —Raca privilegiada catlocada jun-
lo aos limites do para
o terreal,—Conelu-
sdes geraes e elucidativas da materia ene
questfio,
So assis conhecidas as ensinagdes da anthropelo-
gia positiva sobre as origens da humanidade.
A unidade da especie humana, nao obstante a con-
tradicta (alguns sabios materialistas, é uma das primei-
ras verdades que adquirimos pela revelacio.
Os agrupamentos humanos, por mais variades que
sejam, nao sio mais do que ragas d'uma sé e mesma—18—
especie, e-ndo de especies distinctas; pelo menos assim
pensam e affirmam sabios como Linneo, Buffon, Lamark,
Cuvier, Geotiroy, Flourens, Humboldt, Muller, Agassiz e
mil outros, Em conclusdo, diz Mr. de Quatrefages, todos
os homens sio a mesma especie, ou por outra sé existe
uma especie de homens, @/ r’existe q’une scvle espece
@hommes.
Uma outra certeza adquirida.é a differenca essencial
que separa o homem do animal.
Nés jé demonstramos esta verdade fundamental em
nossos recentes escriptos cenontologicos (1.¢ 2." parte) (1)
nos quaes apresentamos factos e phenomenos rigorosa-
mente determinados, sem jamais afastarmo-nos do metho-
do scientifico.
Um intermediario entre os dous reinos nunea exis-
tiu, nem poude existir; e nao pode mesmo ser concebido,
porque a razio, faculdade caracteristica, indivisivel, esse
et non esse, non dats mediwn,
Logo, desde o seu ponto de partida, a especie hu-
mana, reconhecida uma pela seiencia,era tudoo que ella
devia e podia ser em si e por sua natureza propria.
Houve, portanto, um primeiro homem, um primeiro par
essencialmente distincto dos demais seres irracionaes.
Em summa: as conclusdes da verdadeira sciencia se
aecordam com os ensiifos theosophicos. no tocante 4 exis-
tencia d'um primeiro homem verdadeiramente homem
E, desde que se trata de determinar as condigées em
que este primeiro par humano appareceu, a seiencia im-
mudece. Logo sobre este ponto particular e capital, nado
ha, e nem pode havyer conflicto.
Passemos agora a desenvolver o segundo capitulo
da primeira seccdo do problema . pre-historico — depois
do primeiro homem, os primeiros homens. Eis uma im-
(1) A 1° parte do nosso trabalho sobre a Cenontologia sahiu es-
tampada na Revista da Acadia Cearense de 1899, onde vamos pu-
blicar & sequencia ou 2.* parte.— oa
portante distincc&io; nao somente ella contem a grave
solucdo do enigma das nossas origens, mas tambem per-
mitte estabeleeer reaes e perfeitas harmonias entre as
narragaes biblicas e osfactos scientificamente constatados.
Si de feito nds consideramos nao ja aquelle primeiro
homem tal qual sahiu das mos do supremo Creador,
porém, os primeiros homens,a humanidade depois de sua
queda, a humanidade primitiva multiplicando-se e derra-
mando-se sobre a superficie inteira' do ‘globo terrestre,
uma sciencia completamente nova s2 nos offerece, exhi-
bindo sobre a historia primitiva do geaero humano re-
velagdes importantissimas e de summa gravidade.
Serd, pois, com o adminiculo das suas descobertas,
com o enunciado das suas conclusdes, que hemos de co-
nhecer e esclarecer o até hoje insoluvel problema das
origens do nosso Brazil Pre-historico.
Seja ou nio a archeologia pre-historica, a pleoeth-
nologia on 0 pre-historique, na phrase concisa Je Mr.
de Mortillet, uma sciengia, no sentido rigoroso da pala-
vra, 0 certo é, que os thesouros dos seus documentos se
accumulam, os materiaes sio immensos; as suas grandes
linhas estio. traeejadas, as suas bazeS quasi assentes,
apesar das theorias aventurosas, dos systemus preconce-
vidos, das affirmagdes polygenicas,que se Ihe ajuntam em
derredor, °
A sciencia pre-historica’ é vastissima; ella abrange
em seu maravilhoso complexo a anthropologia, a geologia,
a neontologia e a paleontologia, a linguistica, 0 estudo
dos mineraes e o dos seres organisados vivos e fosseis.
A pre-historia €, na brilhante phrase de Mr. Douillé de
Saint-Projet—uma especie de «”
Os paleontologistas americanos com certeza tem re-
novadu a face da paleoethonogia; basta relancear a vista
sobre o cunho particular do movimento contemporaneo da
sciencia archeologica, que lhe imprimiram os sabios da
America do Norte para ficarmos convencidos do que tenes
expendido.
Nao queremos dizer com isto que as pesquizas pa-
leontologicas (la America do Sul, por serem mai
tes ou mais familiares, apresentam menos interesse. Ao
contrario, ellas sobem de ponto, e mais do que nunea,
apresentam-nos problemas d'uma grandeza attrahente e
mysteriosa, que vio eada vez mais tornando experimnen-
tal e inductiva a sciencia do progresso. O magnifico tra-
balho do egregio scientista Mr. Trouessart, exarado na
Recue Scientifique de 10 de Novembro de 1883, demons-
tra admiravelmente 0 nosso asserto.
As faunas desapparecidas da America do Sul sio
conhecidas especialmente pelas excavayées ‘las cavernas do
Brazilem trabalhos que immortalisaram o professor Lund,
@ pelas exploragdes dos terrenos pampeanos do Prata e
da Republica Argentina a que se prendem nomes de—26—
eximios naturalistas como os de Aleide d’Orbigny, Bravard,
Burmeister, Ameglino, Hartt, Lacerda e Ladislau Netto.
A Patagonia nio tinha sido até entio completamen-
te estudada. Mas, depois d’algumas observagées de Dar-
win e de Burmeister, suppunha-se toda ella formada de
deposito marinho terciario.
D'ahi 0 nome de patagoneo dado ao terreno sub-
jascente do pampano.
O sabio naturalista Charles Darwin foi o primeira
que, em 1834, subin o rio Santa Cruz até 220 kilome-
tros de sna foz. Em 1876 e em 1880, Mr. Francesco
Moreno,: director do Museu anthropologico e archcologico
de Buenos-Ayres. quiz renovar essa tentativa.
Renovou-a com bastante fructo e proveito para a
sciencia paleoethnologica. Sua expedigao compunha-se
apenas de cinco pessoas e Walguns animaes apropriados
aos transportes das suas bagagens e de varios utensi
lios de sua profissio.
Depois de 25 dias de navegacdo, attingiu ao ponto
donde Darwin teve de retroceder, D’ahia cinco dias de
marcha, descobriu afinal um lago que denominoa Lago
Argentine. Na visinhanga deste fago, Franc, Moreno,
tando uma pequena gruta, encontrou um corpo humano
mumificado, inteiramente coberto de piutwas encarnadas
e segurando nos sefis bragos crusados uma penna
de condor, signal visivel de que n’estas regides rei-
nou outr’ora uma civilisacio correlactiva, Porém hoje
offerecem o espectaculo de uma estranha desolagio. O
solo est cheio de calhaus rolados, de lapedos, dareias
e Wargilas que formam campinas mais ou menos safaras,
que mal acenturna 4s pobres azemulas 0 nio morrer de
fome.
Os animaes sclvagens sdo raros: apenas alguns /ua-
nacos, abestru de tres longos dedos (ithea Darwinti)
€ pequenos roedores: eis a presa que se offerece de vez
em quando ao eupido olhar do afamado cacador.
Com o Lago Argentino, a paisagem muda de face,
A’ esteril nudez do baixo-rio vem prender- se 0 pittorese
e o horrido sublime (essa natureza!a ae)
La estio os mesmissimos massigos, que se encon-
tram nas manvaises terres do Nebrazca e do Novo-Me-
xitli, massigos carcomidds e retalhados pelas aguas mas
apresentando a Jonge o imponents aspecto de uma gran-
de cidade em ruinas com os seus palacios e castellos
de formas bizarras e phantasticas ! La estéo as fauces
hiantes de suas cavernas profundissimas que separam
estes socaleos a prumo (camerityba) apenas lentejados
por tenues fios d’agua ; mas atravez d’estes flancos ara-
ripicos (abruptos) pode-se ler a olho nt toda a vasta
successao das camadas geologicas que ali se formaram
successivamente. Enormes ossadas fosseis alastram-se
empilhadas em seus contornos. Ali esti contida como
que toda a historia paleontologica da antiga Patagonia ;
neste ponto foi que Mr. Fr. Moreno fez as suas mais
proficuas deseobertas. Nas paginas d’aquelle grandioso
livro aberto 4 meditagio dos sabios é que tambem he-
mos de refundir a historia paleoethnologica da nossa
submersa Atlantida.
E’ a meio caminho entre a embocadura do rio
Santa-Cruz e a Cadeia dos Andes que se acha, 4 mar-
gem esquerda, o terra-pleno (iownd) que contém a mais
fica jazida, O grande naturalista Charles Darwin, que
por ali passou a bordo do vapor Beagle em 26 de Abril
de 1834, dssim descreve na sna J’ayem em roda do
mundo a estructura geologica dos basaltos cellulares
que bordam as planicies d’aquelle rio:
« O basalto é pura e simplesmente formado da la-
va que se escéa sob o mar ; porém as erupedes devem
se produzir em maior escala. Effectivamente, no pon-
to em que observamos esta formacio, conta ella 120
pés de espessura ; a proporgdéo que se remonta o rio,
a superficie da camada do basalto cleva-se impercepti-
velmente e a massa torna-se cada vez mais espessa, de
tal sorte que 40 milhas mais longe ella attinge uma es-
pessura de 320 pés. Qual deveria ser a espessurad’es-
ta camada junto a Cordilheira ?
Nao sabemos ; mas o que podemos affirmar 6 que
a plata-forma attinga ali uma altura de cerca de 3.000—28—
pés acima do nivel do mar. E’ pois nas montanhas
desta grande Cadeia que se deve procurar a fonte d’es-
ta camada ; e sido bem dignas d’uma tal origem estas
torrentes de lavas que correm em distancia de 109 mi-
lhas sobre o leito téo pouco inclinado do mar. Basta
lancar-se um olhar sobre as rochas de basalto dos dous
lados oppostos do valle para se concluir que ellas ou-
tr’ora deviam formar um sé bloco. Qual é pois 0 agen-
te que elevou, sobre uma distancia exvessivamente lon-
ga, uma massa solida de rochedos durissimos, tendo
uma espessura média de 20) pés e sobre uma largura
que varia pouco mais ou menos de 2 a 4 milhas ?
Teria por ventura o rio a forca sufficiente para car-
rear fragmentos consideraveis a ponto de exercer no
percurso dos tempos uma erosdo gradual? No caso que
nos preoccupa seria de pouca monta e muito difficil ad-
mittir semelhante hypothese ou agente. Aqui sé ha um
facto que poderiamios mui bem verificar : < UM BRAgO
DO MAR OUTR'ORA ATRAVESSOU ESTE VALLE. >
Para nés, accrescenta Darwin, serd superfluo deta-
Thar argumentos que nos levem a esta conclusio, argu-
mentos da férma.e da natureza dos sownds (socaleos),
que affectam a disposigio de giyantescas escadarias e
que occupam os dous lados do valle a proporeiio que
o fundo do valle vae se estendendo em planicie, forman-
do uma especie de bahia junto aos Andes, planicie toda
entrecortada de collinas de areias, e de varias conchas
que o mar foi precipitando no leito do rio. Estamos
perfeitamente convencidos e poderiamos provar que um
estreito, semelhante ao estreito de Magalhans e unindo
como elle o Oceano Atlantico ao Oceano Pacifico, afra-
vessava a America Meridional neste logar onde nos acha-
mos. Alguem poderia objectar-nos :—ecomo se ergueu
o hasalto solido ?—-Os antigos geologos chamariam em
seu abone a acciio violenta de uma temerosa catastro-
phe ; mas n’este caso, semelhante supposigdo seria in-
admissivel, porque as mesmas planicies dispostas em de-
gréos e portanto 4 superficie mesma das incrustagdes
das conchas actualmente ali existentes, planicies que bor-—29—
dam a longa extensio das costas da Patagonia, tambem
contornam o valle de Santa-Cruz. Nenhuma inundagio
poderia dar absolutamente este relevo & terra, quer no
valle, quer ao longo da costa, portanto, é certo que o
valle se formou depois da formagdo d'esses sarraplence
suceessivas — inownds suecessively after formed. »
Na sumidade d’estes mounds que attingem perto
de 250 metros, sobre uma largura de 150, encontra-se,
abaixo do manto de detrictos glaciarios que os circum-
dam, muitas camadas /ocistres e marinhas que alternam,
indicandy egualmente phenomenos de immersdes succes-
sivas. Os periodos eocenco, iniocenco e pliocenco infe-
rior ali estSo representados, como na America do Norte,
por uma dezena de typos ma:nimalogicos bem distinctos,
correspondendo aos marsupiaes, aos pachydermes, aos
desdentados ffoothkless). aos gnareers, aos carnivoros
actuaes, ov pelo menos ds formas, que os precederam
nas edades geologicas anterioies.
A peea mais euriosa, que Fr. Moreno recolheu em
sua recente viagem 4 Patagenia depois de Darwin, foi
wm crapeo ao qual deu o nome de Mesewbriotherium
Broce, em honra do grande sabio Broca.
Este animal representava une de ses formes ge-
nevalisés qui se jouent pour atnsi dire de nos classifica-
Hons modernes, par un melange de caractercs qui ne se
trouvent plus que ches des animaux bien distincts, et
qui se rencontraicnt dans un seul d cette époque recu-
Ive. St ces restes wewvistatent pas ow si, nows basant sur
eux, wous enumerions leurs earactéres, on croirait gue
nous tiniginons quelque moustre fabuleue, »
Com os caracteres de marsupiaes, 0 Mesembrioihe-
rium Groce, participa egualmente da natureza dos ear-
nivoros terrestres e das phocas ou dos morsos, ou cé-
rirds amphibios. O cerebro deste animal eslava bas-
tante reduzido.
Pertenece, sem duvida, ao terciario inferior, ao eoce-
neo, e tina provavelmente costumes aquaticos. Mar,—30—
Burmeister considerou este animal como visinho d'uma
especie miocenea da America do Norte—o Brontothe-
rium ; @ nio se enganou, porque a fauna meridional da
America na épocha terciaria inferior e superior mante-
ve relagées certas com a do Norte. A prova, vemol-a no
Homatodontherium Cunninghamii, do terciario inferior
do rio Gallejos, que, é um ungulado, visinho dos horses
vel cavarti-dase e do Hyracodon nort’americano. O sa-
bio Darwin nas pesquizas que fez em sua viagem aos
ricos paizes do Prata, no Parande no Uruguay, compro-
you este facto paleontologico com o achado de varios
dentes do Toxodon, do Mastodonte e um dente d’um hor-
se (eavallo), todos apresentando a cor do sedimento dos
Pampas, junto ao Bajada, ¢ no mesmo logar, onde en-
controu © carapacgo osseo (bark « cap) Vum animal gi-
gantesco muito parecido com o Yate! « Este dente de
cavallo (a horse tooth) muito me interessou e tomei o
maior cuidado de averiguar se elle foi realmente inhu-
mado na mesma épocha que os outros restos fosseis ;
ji na ganga fossil da Bahia-Branca havia tambem encon-
trado um dente semelhante ; e note-se que até entio
ignorava que muitos restos cavallares ou fosscis horsi-
nos se podia encontrar em toda a parte dos Estados-
Unidos Nort’americanos » (1)
7, illustre bar&o gir Chales Lyell, membro da socie-
dade real de Londres, trouxe nfo ha muito dos Estados-
Unidos um. dente cavallar ; o professor Owen desejando
especificar este dente comparou-o com oachado de Dar-
win, e deua este horse-fossile americano o nome d’ Equus
cuRvIDENS. Nao é um facto maravilhoso na_ historia
dos mammiferos que um cayallo indigena tenha habitado
a America meridional’? Com certeza elle desappareceu,
como desappareceria a Aflantida sonhada e prevista por
Platon e por todos os geographos e sabios da antiguidade.
Desappareceu, conclue Darwin, para ser mais tarde sub:
(1) Convem saber que quando Christophoro Colombo aportou
& America ja nfo existia ospecic alguma de cavallos excepto os
que trouxera sua caravangard ou comitante caterva.—s1—
stituido pelas hordas innumeraveis descendentes d’alguns’
animaes introduzidos pelos colonos europeos.
A existencia, pois, na America do Sul, d’um caval-
lo fossil (das-aneerican), do mastodonte, talvez d’'um ele-
phante, e dum ruminante a horns-hollow, descoberto
pelo Prof. Lund e Clausen nas cavernas do Brazil, con-
stitue um facto geologico muito interessante no ponto
de vista da disposigio geographica dos animaes e ma-
aime no artigo que vamos explanando referentemente 4
formacio e desapparecimento da nossa Atlantida, quicd
‘0 mysterioso Der-Boden limitrophe da Cuvier
affirma que se encontra a kinkajou nas grandes Antilhas ; Paul
Gorvais diz que se encontra ali o Didelphis cancrivora. Logo 6
corto que as Indias Occidentaes ou Atlantidaneanas possuiam seng
mammiferos, que lhe eram proprigs.—d9—
A America Meridional possue ao invez muitos. roe-
dores particulares, uma familia inteira de Simtomaraca,
o Lama, o Peecari, 0 Tapir, 0 Ituré, 0 Opossum, e s0-
bretudo muitos generos U'Edent ordem que compre-
hende os A’yys-paresseits, os Tactau-Fourmiliers e os
Tuti-puam, ao passo que a America Meridional além
de possuir numerosas especies peculiares de roedores,
possue quatro generos de ruminantes harned-hallow (o
hoi, o carneiro, acabra, o antilope), grupo de que a Ame-
rica do Sul n&io possue uma especie siquer.
Antigamente, porém, durante o periodo em que vi-
viam a maior-parte dos embrechados actualmente exis-
tentes, a America Septentrional possuia, além dos rumi-
nantes horned-hollow,—o Elephante, o Mastodonte, o
Horso e tres generos. of toothless, 1p Est, 0 Megalathe-
rium, 0 Megalonyx e 0 Myladow. Durante o mesmo
perindo ou pouco mais ou menos, como o demonstram
as larirys (coquillages) da Bahia-Blanea, a America Me-
ridional possuia, como vimos, um imastodonte, o cavaru
(cheval), um ruminante aca-inenro (a cornes creuses), &
Os mesinissimos tres generos (le dlesdentados, e mil ou-
tros.
D'onde desume-se que a America do Norte e a Ame-
merica do Sul, possuindo em uma épocha geologica es-
ses diversos generos em ¢ommum, se assemelhayam en-
tio muito mais do que hoje pelo.caracter dos seus ha-
bitantes terrestres.
Quanto mais eu reflicto n’este facto, disse Darwin,
mais, me compenetro da sua importancia e interesse. »
Nao estardo por. ventura estes factos geologicos, como
que nos demonstrando a existencia d'essa ATLANDIDA
DESAPPARECIDA, que Tieton descreveu, ¢ que Colombo
tambem, imaginou,e chegou por.este intermundio a deseo-
brir, esse. continente americano que ja se tinha separado
Wella por cataclysmos cosmicos ou por o meio de estu-
pendos é mysteriosos phenomenos geognosticos, que. a
seiengia,tenta, debald2 nozar ? E* 0 que nos parece
contivmar.a.paleontologia por bocea: de Darwin e dooe
preprio Hernest Hickel, embora em proveito do seu
monismo transformistico.
« Eu nado conhego outro caso, diz Darwin, mais im-
portante para indicar a épocha e 0 modo de separacdo
(uma grande regiio em duas provincias bem distinetas
e caracterisadas do que o da existencia d’algum conti-
nente intermediario elevando-se e abatendo-se no per-
curso das edades paleontologicas para dar logar a sc-
paracgio de dous grandissimo: Estados geologico-natu-
aes,
« E de feito, 0 geologo que estuda as immensas os-
cillagdes do nivel que affectaram a codea terrestre, du-
rante os ultimos periodos, néo trepidard em avancar:
que o levantamento do planalto mexicano, ou mais pro-
vavelmente, 0 abatimento incontrastavel das terras no
Archipelago das Indias Ocvideitaes, (1) é sem conte:ta-
cao a causa unica (a separagio Zoologica (e mesmo an-
thropologiea) actual das duas Americas. »
Affirma Darwin e com elle o Dr. Richardson, que
o cararter sul-americano dos mammiferos das Indias Oc-
cidentacs est4 indicando que este archipelago fazia anti-
gamente parte (um conténente meridional e que subse-
quentemente tornou-se o cewto dum systema de alui-
mento, @ systene frome shaking.
Quando a America, e sobretudo a America Seplen-
trional, possuia seus clephantes, seus mastodontes, seu
horse e seus ruminantes horuedhoilow, ella se assemc-
Ihava muito mais do que hoje, no ponto de vista zoolo-
gico, (e mesmo anerologico), 48 partes temperadas da
Europa e da Asia. Como ainda se encontram fosseis
desses generos ide ambos os lados (lo estreito de Bering
e nas planicies da Siberia, somos forgados a considerar
a costa noroeste da America do Norte como o pristino
(1) EB bom notar
sempre as terras sep
elle denominou com mu propriedade —
as quaes Constituem exastamente o nosso Ophir, a Suffa on Su-
pata bracileao, o Fines-Indice de que adeante falaremos,Bigg
ponto de communicacdo entre o antigo mundo e o que
se chama o Novo-Mundo. Ora, como tantas especies,
vivas e extinctas, desses mesmos generos tem habitado
e habitam ainda o antigo mundo, 6 muito plausivel que
os elephantes, os mastodontes, 0 egaes caballus e a ou-
tra ordem de mammiferos quadrupedes ou runinantes
de chayelhos cavos d’America Septentrional penetraram
neste paiz passando sobre terras, abatidas depots, junto
ao estreito de Bering; ed’ahi, passando sobre terras, sub-
mergidas tambem depois, nos logares cireumvisinhos das
Indias Oceideniaes, estas especies por sua vez chegaram
a penetrar na America do Sul, onde, depois de mistu-
rar-se durante alguns tempos com as formas que cara-
cterisam este continente merédional, acabaram por ex~-
tinguir-se completamente.
O illustre naturalista Hickel em suas obras: « Sur
Vorigine et Varbre genealogique du genre humain et V His-
toire naturel de la creation » (1) pronuncia-se do mes-
mo modo sobre a férma, a épocha e o logar do nasci-
mento do genero humano. Falando este sabio monista
a proposito do seu homo primigenius, Pithecanthropus
ou Alabes, depois de haver provado que é um erro gros-
seiro, wre supposition tout & fart crronée, o dizer-se que
o homem americano provienne des singes (macaco) du
meme pays, TWiekel aftirma clara e positivamente que :
«cest de’ Asie et surement, pour une part, de la Poline-
ste, que les primiers habitants a’ Amerique ont tmmigré
dans ce continent. »
Falando depois da Asia meridional, d’essa grande
regifio theatre de grandes evolugdes metamorphicas, paiz
que mil indicios designam como a primitiva patria das
diversas especies humanas, elle exclama : « Peut-élre
west-ce pas I Asie amertdionale que a etd le berceaw de
Vhumanité, mais bien wn continent situd plus au sud et
submergé plus tard sous les flots de Vocean Indien. »
(1) Vid. estas obras traduzidas do allemio em francez pelo
Dr. Charles Letourneau, o illustre vulgarisador das obras do Dr,
Louis Biichner.—33—
Logo, conelue Hiickel, 0 primeiro homem ‘deveria ‘habitar
a Asia Meridional, a Africa Occidental, ou mesmo ‘wm
continente hoje submergido !.
Esse continente austrai, cnja existencia outr‘ora tor-
nou-se probabilissima por certos phenomenos’ da \geo-
graphia dos animaes e das plantas, foi denominado Le-
meria pelo inglez Sclater, por causa dos lemurios (1) ou
pithecoides, que habitavam as regides lenewrianas (2) a que
nég nfo trepidaremos em dara denominagio de aflanti-
dianas ou camerianas (3)pelas conclusdes geraes da seien-
cia paleontologica e sobretudo e principalmente'pelasma-
gnificas e importantes deseobertas feitas por Fr. Moreno
nas camadas pampeanas da Republica Argentina,
Para o illustre Moreno, sé a riquesa da ‘fauna ‘da
Patagonia prova que ella formou au debut da épocha
terciaria um vasto continente, que invadiu os oceanos
Atlantico e Pacifico.
E nao é tudo. Mr. Moreno vae longe,e muito além
das nosgas previsées. Elle julga que este Continente
desapparecido formou um centro de creacio, e que nds
suppomos ter sido exactamente aquelle centro de evolu-
gio distincta das duas Americas, a qual vamos estudar
(1) Na opiniio de Hiickel estes notaveis animaes seriam qu
¢4 08 pures ancétres do genero humano no grande grupo dos mam-
miferos com wma placenta am firma de diseo, que se chamam
« Diseoplacentalianos. >» Vid. Buchner eff.etournean dans—L'Homme
Selon la Science, pag, 168, ete.
2) Lemurios, do grego, ollwmi, matar, offender, o do chaldai-
co, or ur, luz que offusea, é a 2. ordem de animaes mammiferos,
quadrupedes, que comprehendem os genoros—Indri, Madri, Loris,
Ni obo, Galayo, Carsias, que habitam a ilha Madagascar e outras
proximas a terra ; cm goral di-se oste nome a todos aquelles
‘animaes vulgarmento eonhecidos per macacos falsos, mdcéca-rana,
por causa das suas numerosas relagdes com a primeira familia da
ordem, ow a dos genuinos e puros bugios,
(3) Cameria ou Lameria_é 0 rio de que fallamos no Qua-
dro Synoptico dos Nomes Indo-Brazilenos que publicamos como um
appendice a0 Qpuseulo sobre o Centenario do Padre Antonig
Vieira,