Vigotski: a relagio entre afetividade, desenvolvimento e
aprendizagem e suas implicagées na pratica docente
(Vygotsky: the relationship between development and learning,
affectivity and implications for teaching practice)
Joyce Monteiro Emiliano'; Débora Nogueira Tomas
'Graduanda em Pedagogia — Centro Universitario UNIFAFIBE ~ Bebedouro SP
[email protected]
*(O) Docente ~ Centro Universitério UNIFAFIBE ~ Bebedouro SP
[email protected]
Abstract. This work analyzes the teaching-learning and development process though
the concept of Zone of Proximal Development, having the theoretical reference the
studies of Vigotski and the historical-cultural psychology. After verifving of the
importance of the role of the teacher mediation in the student development are
pointed aspects in the teacher-student-object relationship. In this sense, it intention
10 show the relevance of this theory to the know teaching, directing the practice of
the teacher and contributing to the continuator education. As considerations, it can
be noticed that the vigotskianos purposes offer to the teacher means of leveraging
their actions and offer meaningful learning, focusing on the global development of
the student, because the teacher is conscious about mediator role and acts in a
critic-reflective way
Keywords. Vygotsky; affection; development and learning: mediation
Resumo. Este trabalho analisa 0 processo ensino-aprendizagem e desenvolvimento
a partir do conceito de Zona de Desenvolvimento Proximal, tendo como referencial
tebrico os estudos de Vigotski e a psicologia histérico-cultural. Apés constatacao da
importéncia do papel mediador do professor no desenvolvimento do educando sao
apontados aspectos afetives na relacdéo professor-aluno-objeto, Nesse sentido
pretende-se mostrar a relevéncia desta teoria para o saber docente, norteando a
pratica do professor e contribuindo para sua formacao continuada, Como
consideracaes, pode-se perceber que os pressupostos vigotskianos oferecem ao
docente meios de potencializar suas agdes e proporcionar aprendizagens
significativas, visando 0 desenvolvimento global do aluno, isto porque 0 professor
tem consciéncia do seu papel mediador e atua de modo critico-reflexivo.
Patavras-chave: Vigotski; afetividade; desenvolvimento e aprendizagem: mediagao
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1. Introdugao
© presente estudo foi realizado por meio de pesquisa bibliogrifica que, segundo
Marconi e Lakatos (2001) e Gil (2009), permite o contato com os escritos acerca do tema
escolhido, favorecendo a pesquisa e a andlise das informagdes. Como tema, investiga a
contribuigao das teses de Vigotski (1896-1934) para a pratica escolar, discutindo em especial
© papel da afetividade no processo ensino-aprendizagem e como a teoria histérico-cultural
pode ser norteadora para a pritica docente.
Desse modo, na primeira secio apresentam-se os pressupostos teéricos de Vigotski
com analise da mediagao interligada a pritica docente, a construgio da linguagem e do
peisamento e o processo de intemalizacao no desenvolvimento do individuo.
Na segunda segio o objetivo € investigar sobre a afetividade na relagao professor
aluno, no que se refere ao proceso de ensino-aprendizagem.
A terceiza segdo traz as contribuigdes da teoria histérico-cultural para a formacio e
pritica docente, com o intuito de que 0 professor possa refletir sobre sua atuaglo em sala de
aula e oferecer recursos a fim de potencializar o proceso ensino-aprendizagem.
2. Pressupostos tedricos
Vigotski procurou construir uma nova abordagem tedrica, pautada em estudos
complexos e abrangentes sobre o desenvolvimento humano, € como os aspects histérico-
culturais so apropriados pelos individuos nos processos de aprendizagem. Deste modo,
diversos conceitos de sua teoria sio amplamente estudados na formacio de professores
contribuem na pritica pedagogica.
Vale destacar que para Vigotski (1998, 2001, 2004) o desenvolvimento do individuo é
uum proceso construido nas e pelas interagdes que o individuo estabelece no contexto
historico e cultural em que esté inserido. A construgdo do conhecimento ocorre a partir de um
intenso processo de interagdo social, e, portanto, & a partir da insergao na cultura que a
* Apesar de se encontrar Vigotski grafado de diversas formas, tais como: Vygotsky, Vygotski, Vigotski,
Vigostkii, Vigotsky, seré adotado para este trabalho 9 grafia Vigotski. Nas referéncias bibliograficas
‘manteremos a grafia adotada pelos autores.
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crianca, vai se desenvolvendo (TASSONI, 2000), uma vez que as interacées sociais sio
responsiveis pela aquisigao do conhecimento construido ao longo da hist6ria.
E 6 a partir das relagdes sociais, da insergao da crianga na cultura que esta vai se
apropriando de novas aprendizagens e assim se desenvolvendo, fundamental que o professor
consiga relacionar alguns conceitos vigostkianos com a pritica docente.
2.1 A mediagao e a pratica docente
Na concepeao vigotskiana, a mediagao 6 0 processo que caractariza a relagio do
homem com o mundo e com interagio social (BERNI, 2006). A mediacao acontece por meio
de instrumentos e signos que se interpdem entre o sujeito e o objeto de sua atividade em busca
de novas aprendizagens e consequente desenvolvimento (FACCT, 2004).
Nesse aspecto, Facci (2004, p. 64) ressalta que os processos mediados atuam junto as
fungdes psicolégicas superiores, que sfo tipicamente humanas, tais como a atengio
voluntiria, meméria, abstragio, comportamento intencional, dentre outros,
io produtos da
atividade cerebral, tém uma base biolégica, mas, fiundamentalmente, sio resultados da
interagao do individuo com o mundo, interagao mediada pelos objetos construidos pelos seres
bumanos”
Apropriando-se das praticas culturalmente estabelecidas, 0 individuo vai evoluindo
das formas elementares de pensamento para formas mais abstratas, que o ajudartio a conhecer
e controlar a realidade, Portanto, os processos mediacionais esto presentes também na
constituigio do proprio sujeito e suas formas de agir (TASSONI, 2000).
Vigotski (1998) divide 0 desenvolvimento em dois niveis. O primeiro & 0 nivel de
desenvolvimento real, ¢ tudo aquilo que a crianga consegue fazer sozinha, O segundo seria 0
nivel de desenvolvimento potencial, ou seja, o que a crianca no realiza sozinha, porém com a
ajuda de um adulto ou um parceiro mais capaz ela consegue realizar.
© professor precisa conhecer seu aluno, para atuar entre estes dois niveis de
desenvolvimento, que é chamado zona de desenvolvimento proximal.
A zona de desenvolvimento proximal é um importante instrumento nas mos dos
educadores, pois identifica nao sé o desenvolvimento real (aquilo que a crianca ja aprendeu),
como também o desenvolvimento potencial (aquilo que ela & capaz de realizar com auxilio).
O docente, ao saber o que a criauga jé € capaz de fazer sozinha, atua na segunda situagao,
Cadernos de Educagao: Ensino e Sociedade, Bebedouro-SP, 2 (1): 59-72, 2015.“assim, a nocio de zona de desenvolvimento proximal capacita-nos a propor uma nova
formula, a que o “bom aprendizado” é somente aquele que se adianta ao desenvolvimento”
(VIGOTSKI, 1998, p. 117).
Diante disso, Vigotski (1998) conclui que o processo de desenvolvimento nio coincide
com a aprendizagem. O desenvolvimento & mais lento que os processos de aprendizagem e
‘que apesar de estarem intimamente ligados, néo ocorrem paralelamente
Quando a crianca alcanga um nivel no aprendizado escolar, como por exemplo, as
‘quatro operagdes matematicas, isso nfo significa um estigio completo e sim que ela adquiriu
bases para um desenvolvimento posterior de operacdes mais complexas. Nesse sentido:
Através da consideracio da zona de desenvolvimento proximal. & possivel
vetificar nao somente os ciclos jé completados, como também os que esto
em via de formacao, 0 que permite o delineamento da competéncia da
crianga e de suas fururas conquistas, assim como a elaboracto de estratégias
pedagégicas que auxiliem nesse processo. (REGO, 2002, p. 134)
Océ
ebro do ser humano 6 dotado de uma capacidade conhecida como plasticidade,
que é definida como a capacidade do cérebro de adaptar-se diate das “influéncias ambientais
durante o desenvolvimento infantil, ou na fase adulta, restabelecendo e restaurando fungdes
desorganizadas por condigdes patolégicas.” (MORALES, 2005, p. 2).
Assim sendo, existe uma ligagio intensa entre os fendmenos plisticos do cérebro e 0
desenvolvimento do sistema nervoso no contexto sécio- histérico- educative. Desse modo, é
possivel relacionar as condicdes fisiolégicas das conexdes neurais e 0 conceito de zona de
desenvolvimento proximal, sendo esta tiltima, a fonte das conexdes neurais, por meio da
aprendizagem em forma de mediagdo na construgao do conhecimento.
2.2 A construgdo da linguagem e do pensamento
Quando a crianga nasce necessita do adulto para sua sobrevivéncia e para mediar a sua
relacio com o meio. Nesse sentido, Vigotski (2004) aponta que a fala/ linguagem é o principal
mediador na construgio das fungSes psicolégicas superiores, uma vez que a linguagem tem
duas caracteristicas fundamentais que so a comunicacio e a construcao do pensamento.
Rego (2002) afirma que a principal funcao da linguagem é o contato social, a qual se
desenvolve a partir da necessidade de comunicacio do individuo. Portanto, a crianga aprende
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nesse momento que a linguagem e pensamento se encontram, o pensamento se torna verbal e
a linguagem racional.
O pensamento verbal é predominante nas atividades psicolégicas, sendo o dominio da
linguagem importante para que ocorram mudangas relevantes na forma da crianga se
relacionar com o meio onde esti inserida, possibilitando, assim, novas formas de
‘comunicacao e na organizacao do pensar e agir (VIGOTSKI, 2004).
Ainda em relacao @ linguagem, Oliveira (1997) ressalta que Vigotski diferencia
significado e sentido, sendo que o significado refere-se ao sistema de relagées objetivas que se
formam no processo de desenvolvimento da palavra ¢ o sentido refere-se ao valor afetivo da
palavra para cada pessoa, ou seja, neste ultimo, conta as experiéncias individuais eas
vivéncias afetivas, evidenciando a perspectiva de que cognigo ¢ afeto sto aspectos
indissociaveis na constituico do ser humane.
2.3 O processo de
ternalizacio no desenvolvimento
ie de
De acordo com Tassoni (2000) 0 processo de internalizacto envolve uma sé
transformacdes que colocam em relacdo o social e o individual
Para Vigotski (1998, p. 75) “[...] todas as fungdes no desenvolvimento da crianca
aparecem duias vezes: primeiro, no nivel social, e, depois no nivel individual; primeiro entre
pessoas (interpsicolégica), e, depois, no interior da crianga (intrapsicolégica) [...]”
Quando falamos de intemalizacao temos que falar da utilizagio dos instrumentos e
signos tanto na esfera filoggnica (a0 longo da evolugto da espécie humana) como na
ontogénica (evolugio individual da espécie).
Esses dois elementos sio marcas externas que fomecem suporte para a agao do
homem. Nesse sentido, Oliveira (1997, p. 34) afirma que “a utilizagao de marcas externas vai
se transformar em processos internos de mediagdo: esse mecanismo é chamado por Vigotski,
de processo de intemalizagao”.
‘Vigotski (1998) chama de intemnalizagao a transformagao de processos externos em
processos internos e cita como exemplo “o gesto de apontar”, feito pela crianca. A crianca
tenta pegar um objeto que esta fora do seu aleance, nesse momento a agao é entre o individuo
© 0 objeto na tentativa de pegar. Esse gesto visto pelo adulto € interpretado como o ato de
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apontar 0 objeto, como se a crianga estivesse “pedindo” 0 objeto e quando o adulto fornece 0
objeto a crianga, esta passa a interpretar seu gesto, no mais como a relagdo dela com o objeto
e sim dela com o outro, dessa forma houve a alteragao do processo extemo, para o intemo,
por meio da interagio social
A interagdo face a face entre individuos particulares desempenha um papel
fundamental na construcao do ser humano: é através da relacto interpessoal,
conereta com outros homens que 0 individuo vai chegar a interiorizar as
formas culturalmente estabelecidas de funcionamento psicolbgico [
(OLIVEIRA, 1997, p. 38).
Dessa forma, a interac2o social tanto com o individuo ou com os elementos culturais,
fomecem meios para o desenvolvimento das fungdes psicol6gicas superiores que, segundo
Vigotski (1998) & a modificacao da atividade psicolégica a partir da atividade mediada por
signos e instrumentos,
Nessa perspectiva, 0 proceso de intemalizagdo ndo ocorre passivamente, mas de
maneira dinémica havendo uma interac2o entre o meio cultural e a subjetividade de cada um.
3. A mediagao através da afetividade
Vigotski (2001) afirma que a emogio € a reagio reflexa de certos estimulos que sto
mediados a partir do meio sociocultural. As emocdes influenciam e diversificam o
comportamento, portanto, quando as palavras sio ditas com sentimentos agem sobre 0
individuo de forma diferente de quando isto nao acontece.
As emogées so divididas em dois grupos, sendo um relacionado aos sentimentos
positivos (forca, satisfacZo, etc.) e outro relacionado aos sentimentos negativos (depressio,
softimento, etc.). Cada cor, cheiro ¢ sabor despertam um sentimento de prazer ou desprazer e
as emogbes despertas relacionadas a vi
interno das reagdes, estimulando ou inibindo-as (VIGOTSKY, 2001).
ncia tém cariter ativo, servindo como organizador
Se fazemos alguma coisa com alegria as reagdes emocionais de alegria no
significam nada seno que vamos contintiar tentando fazer a mesma coisa.
Se fazemos algo com repulsa isso significa que no futuro procuraremos por
todos os meios interromper essas ocupacdes. Por outras palavras. 0 novo
momento que as emocdes inserem no comportamento consiste inteiramente
na regulagem das reacdes pelo organismo. (VIGOTSKI, 2001. p. 139).
Cadernos de Educagao: Ensino e Sociedade, Bebedouro-SP, 2 (1): 59-72, 2015.Desse modo, se o professor pretende realizar mediagdes junto ao aluno, & preciso
relacionar seu comportamento com uma emogao positiva, para obter 0 sucesso pretendide no
processo de ensino-aprendizagem.
Ao professor € necessiirio que faga no s6 com que o aluno apreenda e assimile 0
contetido, mas que além de tudo seja capaz de sentir 0 conteiide relacionando-o as emogdes.
Nesse sentido, Vigotski (2001) afirma que 0 professor deve preocupar-se em relacionar 0
novo conhecimento com a emogao, caso contrario o saber torna-se orto.
Tassoni (2000) buscou evidenciar aspectos afetivos na interacio em sala de aula,
analisando a postura do professor e os seus contetidos verbais e concluiu que os aspectos
afetivos esto presentes na dindmica da sala de aula e influenciam diretamente o processo
ensino-aprendizagem. Para esta autora a mediagtio da professora ¢ fundamental para
determinar a relago do aluno com o contetido ensinado.
Quando se assume que o processo de aprendizagem é social, o foco desloca-
se para as interagbes e os procedimentos de ensino tomam-se fundamentais
As relagdes entre as professoras e alunos apresentadas nesta pesquisa,
evidenciaram expressio da afetividade como parte ativa do processo de
aprendizagem. As interagdes em sala de aula sto carregadas de sentimentos
e emogdes constituindo-se como trocas afetivas, (Tassoni, 2000, p. 150)
A partir das consideragdes aqui pontuadas, & possivel verificar que © papel do
professor, € fundamental no processo de internalizacdo de conceitos e desenvolvimento dos
alunos, e isto ocorre na mediagao e na qualidade das relagdes estabelecidas entre professor-
aluno.
Portanto, & nas relagdes com 0 outro que os objetos tomam um sentido afetive e
determinam a qualidade desse objeto intemnalizado, supondo que os processos de
intemalizagao envolvam tanto aspectos cognitivos como aspectos afetivos. A linguagem oral,
© contato fisico ¢ a proximidade so elementos indissocidveis, um leva ao outro ¢ todos
implicam nas relagdes afetivas um significado maior no proceso ensino-aprendizagem
(TASSONI, 2010).
Tassoni (2008) afirma que a intensidade das relacdes estabelecidas no contexto
escolar, € capaz de aproximar on afastar o aluno do objeto de conhecimento e que a relacao do
professor com 0 proprio objeto ¢ sua relagdo com a atividade docente influencia da mesma
forma, afetando os processos cognitivos e as relagdes afetivas envolvidas neles.
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Souza (2011) ressalta que a afetividade esta ligada 4 singularidade, ao subjetivo no
sujeito e é na palavra, ou seja, na linguagem, que a afetividade encontra a inteligéncia, ou
seja, na construgio de significado que & compartilhado por um grupo cultural
Leite (2012) busca fornecer um modelo te6rico que possibilite o entendimento do
homem como ser tinico, ¢ traz agdes relacionadas & postura do professor que podem
influenciar no processo de ensino aprendizagem, em que: os objetives devem estar
relacionados & relevancia para o aluno; 0 processo de ensino deve considerar 0 conhecimento
prévio do educando; os contetidos devem respeitar uma sequencia logica; e que é no momento
do desenvolvimento das atividades que consiste as maiores demonstragdes afetiva em sala de
aula, portanto suas escolhas devem ser adequadas; a avaliagao deve ser utilizada em favor do
aluno, na busca reflexiva do processo ensino-aprendizagem.
Leite (2012) conclui que a afetividade ¢ fator essencial nas relagdes em sala de aula e
por meio dela a mediagdo pedagégica estabelece a qualidade do vinculo aluno-objeto-
professor.
Diante do exposto, ¢ possivel afirmar que a mediacio pedagégica realizada pelo
professor influencia © processo ensino-aprendizagem sendo que a qualidade dessa relagio é
determinante para o sucesso na aprendizagem do aluno,
‘No entanto, é necessirio ao professor ter consciéncia da importéncia das relacdes entre
aluno-professor, aluno-objeto e professor-objeto e a necessidade de uma pritica pedagégica
reflexiva que faca uso das boas relagdes afetivas, tornando o processo ensino-aprendizagem
mais eficaz e significativo. Portanto, a psicologia histérico-cultural contribui para repensar a
pritica docente, a partir de uma concepgio de desenvolvimento humano construido nas e
pelas relagdes sociais.
4. Contribuigdes para a formacio de professores,
A formagao docente tem sido objeto de muitas pesquisas ao longo das titimas décadas
(LIBANEO, 2004; CASTANHO e COSTA, 1999; BASSO, 1998; TUNES, TACCA e
BARTHOLO JUNIOR. 2005), porém, a perspectiva tedrica da psicologia histérico-cultural.
destaca-se por pontuar que o desenvolvimento do set humano acontece por meio da
apropriagaio dos elementos socioculturais, 0 que contribui de maneira significativa para a
formacio de professores ¢ a compreensio do contexto escolar.
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Diante dessa visio, o homem é analisado como ser histérico, social, dinimico e sua
relagdo com o meio transforma-o ao mesmo tempo em que transforma o proprio homem, “De
acordo com a perspectiva dialética, sujeito e objeto de conhecimento se relacionam de modo
reciproco (um depende do outro) € se constituem pelo proceso histérico-social.” (Rego.
2002, p 98).
Segundo Rego (2002) os trabalhos de Vigotski trouxeram grande contribuigio. no
campo da educacdo, principalmente no que se refere as reflexdes e “a formulagio de
alternativas no plano pedagégico.” (p. 100-101).
Vigotski (1998) acredita ser possivel 0 ensino da leitura e escrita a crianga em idade
pré-escolar, no entanto, enfatiza que a escrita nfo pode ser ensinada como uma habilidade
‘motora e, sim como uma atividade cultural complexa, de forma que sejam relevantes & vida
do aluno, ou seja, a crianga precisa perceber sua necessidade,
Nesse sentido, Vigotski (1998, p. 157) afirma que
[..] Os educadores devem organizar todas essas agdes e todo 0 complexo
processo através de seus momentos criticos, até o ponto da descoberta de que
se pode desenhar ndo somente objetos, mas também a fala. Se quiséssemos
resumir todas essas demandas priticas e expressé-las de uma forma
‘unificada, poderiamos dizer que o que se deve fazer & ensinar as criangas a
linguagem escrita e nao apenas a escrita de letras.
‘As letras devem ser elementos na vida da crianga mediados pelo professor. Baquero
(2001) também afirma que a intervengio docente é de grande importancia e promove
mudangas cognitivas 4 medida que fornece pistas a0 aluno, guia-o, convence e corrige
pensamentos ¢ estratégias.
Nessa perspectiva, a escola € vista como sendo fundamental ¢ insubstituivel na “[..]
apropriagao pelo sujeito da experiéncia culturalmente acumulada.” (REGO, 2002, p 103-104).
A formagao dos conceitos, por exemplo, ocorre a partir das condigdes intemas e
extemas, na forma como acontece a aprendizagem dentro ou fora da sala de aula, durante as
experigncias das criangas.
Na escola, os processos de aquisig2o dos conhecimentos ocorrem de forma
sistematica, e, dessa forma, a escolarizagio dos individuos permite a construgio de fungdes
psicolégicas complexas, possibilitando a atuacao e transformacao do meio, construindo assim
novos conhecimentos. No entanto o simples fato de a crianga frequentar a escola no garante
a aquisigao do conhecimento.
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‘A aprendizagem precede o desenvolvimento, sendo que o ensino é aquele que se
antecipa ao desenvolvimento. Desse modo, 0 professor deve direcionar seu trabalho “as
2002, p. 107).
Nessa diregaio, os postulados de Vigotski (1998, 2001, 2004) apontam para a
fungdes psicoldgicas que estao em vias de se completarem.” (REGO.
necessidade de se pensar uma nova escola, local esse que deve oferecer espago para a
interagio, aos debates, as reflexdes acerca dos conhecimentos, trocas de experiéncias que
devem se valorizadas. Construgao de uma escola em que, o aprender, venha acompanhado de
significados.
papel do professor vem sofrendo alteragées a0 longo do tempo, Vigotski (2001) 0
define como “organizador do meio social” ¢ afirma que o professor liberto da obrigacdo de
ensinar, deve saber ainda mais, pois para ensinar & necessério saber pouco com clareza e
precisdo, j4 ocupando seu novo papel, de guiar o aluno em seu conhecimento, é necessério um
saber ainda maior.
Quanto 4 formagio dos professores Vigotski (2001) reflete que € necessirio ao
pedagogo conhecer os conceitos, as metodologias, bem como proceso de desenvolvimento
e ensino-aprendizagem do aluno, a fim de estimula-lo a0 aprendizado.
Vigotski (2001) fala da relagdo aluno-professor relacionado a afetividade em que “o
mestre deve viver na comunidade escolar como parte inalienavel dela e, nesse sentido, as suas
ralagdes com o aluno podem atingir tal forca, transparéncia e elevacao que no encontrario
nada igual na escola social das relagdes hnmanas” (p. 455).
Segundo Basso (1998) 0 trabalho docente deve ser visto como um todo, pois as
situagdes em sala de aula dependem principalmente das condicdes subjetivas da formagtio do
professor, da compreensto por parte dele do significado de sua atividade e posteriormente
entendimento sobre o sentido dessa atividade, o que motiva o edueador.
0 referido autor esclarece que a finalidade do trabalho docente ¢ mediar a apropriagaio
espontanea do conhecimento na vida cotidiana e a apropriagio sistematica de contetidos
escolares em esfera nao cotidiana e possibilitar ao aluno uma postura critica.
Procuramos mostrar que a articulacio dialética entre as condigdes subjetivas
@ as condigdes objetivas, expressa pelas categorias significado e sentido.
apresenta-se como um caminho para a compreensio do trabalho docente.
Essa compreenstio pode permitir 0 delineamento de possiveis intervengdes,
visando a reformulacdo da pritica do professor e de sua formagao inicial e
continuada. (BASSO, 1998, p. 6).
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Nessa direcaio, Tunes, Tacca e Bartholo Jinior (2005) ressaltam o papel mediador do
professor que deve atuar para que o préprio aluno busque sua autonomia no proceso
educativo. Nesse sentido, o professor ndo & um simples reprodutor de conhecimentos,
servindo de ligaco entre aluno e conhecimento sistematizado pelo contexto escolar, mas sim
alguém que valorize ainda a parceria junto ao aluno ¢ compreenda dentro de um processo de
ensino-aprendizagem.
Quanto a formacao de professores, Libaneo (2004) assevera que é necessirio ao
professor adquirir conhecimento te6rico ¢ reproduzir as compreensées teéricas, explicando
assim a relagio estrutural da matéria, sendo que 0 professor deve aprender na perspectiva que
ira ensinar, ou seja, partir da sua principal atividade que & desenvolver atividades de
aprendizagem. Defende também que o professor deve pensar sobre os contetidos e refletir
sobre a pratica enquanto vai apropriando-se das teorias, “[...] em que o professor é ajudado a
compreender 0 seu proprio pensamento, a refletir de modo critico sobre sua pritica e,
também, a aprimorar seu modo de agir, seu saber-fazer, & medida que internaliza novos
instrumentos de ago.” (p. 137).
Libaneo (2004) ressalta que a reflexio e a experiéucia refletida no so suficientes,
mas que “[...] sAo necessarias estratégias, procedimentos, modos de fazer, além de um sélido
conhecimento teérico, que ajudam a melhor realizar o trabalho e melhorar a capacidade
reflexiva sobre o que e como mudar” (p. 138).
Conclui-se entio, que somada as reflexdes e a apropriacao tedrica ¢ necessirio
considerar o contexto social, politico e institucional da escola.
5. Consideracoes finais
Constata-se nesse sentido que a teoria sécio-histérica traz significativas contribuicdes
1no Ambito da sala de aula e fomece suporte para a compreensao de como acontece 0 proceso
de aprendizagem a partir da apropriagao dos elementos culturais, bem como da importancia
da mediagao no percurso do desenvolvimento do ser humano.
Partindo do conceito de mediagao, observa-se que, dentro da perspectiva histérico-
cultural, a afetividade e a qualidade da relag2o professor-aluno-objeto so essenciais no
processo de internalizagio de conceitos e desenvolvimento dos alunos
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Libaneo (2004) lembra que a psicologia histérico-cultural leva ao entendimento do
trabalho do professor e, por consequéneia, sua formagdo profissional, uma vez que possibilita
refletir sobre a construgdo social do professor, e sobre aspectos de sua subjetividade.
Nessa direcio, vale dizer que € necessirio ao professor uma formagio inicial e
continuada que possibilite a compreensio do seu papel mediador e da importincia de uma
pritica reflexiva em sala de aula, Talvez esse seja o caminho para que se tenha uma educagio
de qualidade, na construcao de um pais, no sentido de contribuir para a formagao de pessoas
ctiticas, conscientes de seus atos ¢ nao alienadas em uma sociedade que procura manter-se
como esti, sendo essa educagio tio necesséria para a construgao de uma nova realidade
social,
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