0% acharam este documento útil (0 voto)
434 visualizações126 páginas

Terapia Cognitivo-Comportamental Na Prática

Este capítulo apresenta o desenvolvimento histórico da Terapia Cognitivo-Comportamental, desde sua origem até os dias atuais. Aborda os principais conceitos das teorias cognitivas e comportamentais e como essas abordagens se relacionam na Terapia Cognitivo-Comportamental, que busca vincular cognições e comportamentos. Aponta Aaron Beck como um dos fundadores da Terapia Cognitivo-Comportamental, tendo desenvolvido inicialmente a abordagem para o tratamento da depressão.
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
0% acharam este documento útil (0 voto)
434 visualizações126 páginas

Terapia Cognitivo-Comportamental Na Prática

Este capítulo apresenta o desenvolvimento histórico da Terapia Cognitivo-Comportamental, desde sua origem até os dias atuais. Aborda os principais conceitos das teorias cognitivas e comportamentais e como essas abordagens se relacionam na Terapia Cognitivo-Comportamental, que busca vincular cognições e comportamentos. Aponta Aaron Beck como um dos fundadores da Terapia Cognitivo-Comportamental, tendo desenvolvido inicialmente a abordagem para o tratamento da depressão.
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
Você está na página 1/ 126

TERAPIA COGNITIVO-

COMPORTAMENTAL
NA PRÁTICA

Autoria: Profa. Dra. Juliana Zantut Nutti

1ª Edição
Indaial - 2023
UNIASSELVI-PÓS
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Janes Fidelis Tomelin

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Tiago Lorenzo Stachon

Equipe Multidisciplinar da Pós-Graduação EAD:


Tiago Lorenzo Stachon
Ilana Gunilda Gerber Cavichioli
Norberto Siegel
Julia dos Santos
Ariana Monique Dalri
Jairo Martins
Marcio Kisner
Marcelo Bucci

Revisão Gramatical: Desenvolvimento de Conteúdos EdTech

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada pela equipe Conteúdos EdTech


UNIASSELVI

C397

Nutti, Juliana Zantut

Terapia Cognitivo-Comportamental na Prática. / Juliana Zantut


Nutti. - Indaial: UNIASSELVI, 2023.

126 p.; il.

ISBN Digital
1. Terapia. - Brasil. 2. Comportamental. - Brasil. II. Centro
Universitário Leonardo da Vinci.

CDD 616,89

Impresso por:
Sumário

APRESENTAÇÃO.............................................................................5

CAPÍTULO 1
INTRODUÇÃO À TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL
E SEUS PRINCÍPIOS GERAIS......................................................... 7

CAPÍTULO 2
PLANEJAMENTO DO TRATAMENTO E ESTRUTURA
DAS SESSÕES............................................................................... 45

CAPÍTULO 3
O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC..................... 89
APRESENTAÇÃO
Caro e cara estudante! Seja muito bem-vindo e bem-vinda à disciplina Tera-
pia Cognitivo-Comportamental na Prática. Iremos apresentar as características do
livro e dos objetivos elencados para esta disciplina. O livro de estudos da discipli-
na está organizado em três capítulos:

- Capítulo I, denominado Introdução à Terapia Cognitivo-Comportamental


e seus princípios gerais, que aborda o desenvolvimento das Terapias Cogniti-
vo-Comportamentais – TCCs ao longo do tempo, os principais fundamentos das
Teorias Cognitivas, da TCC em sua proposta inicial e em suas tendências contem-
porâneas e as cognições disfuncionais.

- Capítulo II, intitulado Planejamento do tratamento e da estrutura das


sessões, que apresenta e realiza a discussão do modelo cognitivo e compor-
tamental dentro do campo da TCC, da chamada conceitualização cognitiva de
caso, dos fundamentos da estruturação das sessões e do uso de técnicas de in-
tervenção ou tratamento em TCC e suas aplicações no atendimento de crianças,
adolescentes e famílias.

- Capítulo III, denominado O uso de intervenções cognitivas na TCC, que


analisa os conceitos e os tipos de pensamentos automáticos e como atuam no
modelo cognitivo, a função das crenças intermediárias e nucleares no modelo
cognitivo, os principais modelos cognitivos de transtornos mentais e as principais
técnicas cognitivas e comportamentais usadas para cada modelo cognitivo.

Ao final dessa disciplina espera-se que você seja capaz de conhecer, com-
preender, identificar analisar e refletir sobre os seguintes aspectos da Terapia
Cognitivo-Comportamental:

• O desenvolvimento histórico da TCC;


• Os princípios gerais as tendências contemporâneas da Terapia Cogniti-
vo Comportamental;
• O papel das disfunções cognitivas no comportamento do indivíduo;
• Os processos de avaliação diagnóstica em Terapia Cognitivo Comporta-
mental;
• A estrutura de sessões em Terapia Cognitivo-Comportamental;
• As principais técnicas de intervenção em Terapia Cognitivo-Comporta-
mental;
• Os modelos cognitivos em Terapia Cognitivo Comportamental;
• A conceitualização cognitiva em Terapia Cognitivo-Comportamental;
• A estruturar de sessões e uso de técnicas em Terapia Cognitivo-Com-
portamental.
Os temas abordados em cada capítulo foram escolhidos para que você pos-
sa aprender os conceitos fundamentais e atuais sobre a Terapia Cognitiva Com-
portamental em suas aplicações no cotidiano profissional.
Aliado ao conteúdo disponibilizado, está o seu protagonismo como estudante
de pós-graduação, a sua dedicação ao estudo e à realização das atividades so-
licitadas, os quais são fundamentais para o pleno alcance dos objetivos estabe-
lecidos para a disciplina. Assim, desejamos que você tenha bons estudos e uma
excelente jornada de aprendizagem!
C APÍTULO 1
INTRODUÇÃO À TERAPIA
COGNITIVO-COMPORTAMENTAL E
SEUS PRINCÍPIOS GERAIS
O presente capítulo destina-se ao estudo dos seguintes tópicos:

 Histórico do desenvolvimento das Terapias Cogitivo-Comportamentais – TCCs;


 Teorias cognitivas;
 Princípios gerais da TCC e tendências contemporâneas;
 Principais cognições disfuncionais.

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Compreender o desenvolvimento histórico da Te-


rapia Cognitivo-Comportamental;
 Entender os princípios gerais as tendências contempo-
râneas da Terapia Cognitivo Comportamental;
 Analisar o papel das disfunções cognitivas no comportamento;
 Estabelecer as bases históricas da Terapia Cognitivo-Comportamental;
 Expor os princípios fundamentais da Terapia Cognitivo-Comportamental;
 Identificar as principais disfunções cognitivas no cotidiano.

A Terapia Cogni�vo-Comportamental, como as demais abordagens


psicoterápicas, é marcada por formulações e reformulações nos âmbitos teóricos
e metodológicos, o que leva à necessidade de apresentar os marcos mais
importantes do seu desenvolvimento histórico, para entendermos de onde ela
parte e para onde ela se encaminha nos dias atuais. Ademais, é fundamental
conhecer os princípios gerais, conceitos fundamentais desafios contemporâneos
para essa abordagem.
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

8
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
O presente capítulo busca analisar a trajetória de criação e desenvolvimento
das chamadas Terapias Cognitivo Comportamentais – TCCs, desde sua origem
até os dias atuais.

Conhecer a história do surgimento das TCCs e analisar as influências mais


significativas para desenvolvimento das abordagens, auxilia na compreensão
como os seus princípios foram construídos e como foram se modificando ao lon-
go do tempo, além de promover a socialização desses princípios na comunidade
acadêmica.

As TCCs surgem e se desenvolvem a partir da inter-relação de conceitos de


teorias e de terapias cognitivas e comportamentais, as quais buscam a vinculação
entre cognições (pensamentos e os sentimentos associados aos pensamentos) e
comportamentos, de natureza observável e quantificável, dos indivíduos.

Consideram-se fundadores da TCC os psicólogos norte-americanos Aaron


Temkin Beck e Judith Beck, pai e filha, respectivamente. Aaron fundou a TCC,
com a formulação do modelo cognitivo/teórico e, posteriormente, Judith desenvol-
veu as técnicas.

Aaron Beck (1921-2021) foi um estudioso do comportamento humano que


elaborou um método psicoterápico, a partir da década de 1960, que chamou de
terapia cognitiva. O termo ainda é utilizado na área de Psicologia para se fazer
referência à Terapia Cognitivo-Comportamental.

Aaron Beck desenvolveu a sua abordagem psicoterapêutica, a princípio, di-


recionada ao tratamento da depressão, e como uma proposta de terapia de breve
duração, focada na resolução de problemas do momento “aqui e agora”, ou seja,
do presente, e voltada para os seguintes objetivos: modificar pensamentos e com-
portamentos disfuncionais, inadequados e/ou improdutivos para a vida funcional
dos indivíduos.

9
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

2 HISTÓRICO DO
DESENVOLVIMENTO DAS TERAPIAS
COGNITIVO-COMPORTAMENTAIS –
TCCS
Para Morris e Maisto (2004) as terapias cognitivas estão fundamentadas na
ideia de que é a modificação das ideias distorcidas das pessoas sobre si mesmas
e sobre o mundo que levam à alteração dos comportamentos disfuncionais, tor-
nando as suas vidas mais ajustadas e funcionais e promovendo o sentimento de
bem-estar e felicidade.

O desafio que é destinado aos terapeutas cognitivistas é o de identificar as


distorções de pensamentos das pessoas e corrigi-las através de técnicas especí-
ficas. Isso leva ao fato de que terapeutas comportamentais-cognitivos aplicam no
seu trabalho tanto técnicas das terapias cognitivas quanto de terapias comporta-
mentais (MORRIS; MAISTO, 2004).

Assim, considera-se que as TCCs se constituem em um conjunto de terapias


que unem fundamentos e preceitos das abordagens cognitivas e comportamen-
tais. Você conhece os fundamentos das abordagens comportamental e cognitiva?

Papalia e Feldman (2013), afirmam que a abordagem comportamental se re-


laciona a um conjunto de teorias da aprendizagem.

Perspectiva da aprendizagem é “a visão do desenvolvimento hu-


mano segundo a qual as mudanças no comportamento resultam
da experiência ou da adaptação ao ambiente. Duas importantes
teorias da aprendizagem são o behaviorismo e a teoria da apren-
dizagem social (PAPALIA; FELDMAN, 2013, p. 62).

Portanto, a perspectiva da aprendizagem que está envolvida nos conjuntos


das teorias de aprendizagem, especialmente, as abordagens behavioristas, cog-
nitivas e da aprendizagem social afirma que o desenvolvimento global é originado

10
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

da aprendizagem, que é considerada como uma mudança significativa e duradou-


ra nos comportamentos das pessoas, a partir de suas experiências e/ou adapta-
ções aos seus contextos de vida.

As teorias de aprendizagem, como o Behaviorismo e a Aprendizagem Social,


buscam compreender as leis que fundamentam as mudanças em comportamen-
tos mensuráveis e observáveis no decorrer de um desenvolvimento que ocorre de
forma contínua.

Iremos, a partir de agora, analisar os principais aspectos das abordagens


comportamentais e cognitivas, como o Behaviorismo, a Teoria da Aprendizagem
Social ou Sociocognitiva.

O Behaviorismo, também conhecido como Comportamentalismo, abordagem


ou Teoria Comportamental é uma linha teórica de pensamento da Psicologia, fun-
dada por John B. Watson (1878-1958), a partir de 1913.

A escola ou linha teórica de Watson propunha que o comportamento deve-


ria ser o objeto de estudos da Psicologia e a adoção de métodos de investigação
como a observação e a experimentação, utilizados pelas ciências naturais (TOU-
RINHO, 2011). O Behaviorismo é considerado a “teoria da aprendizagem que en-
fatiza o papel previsível do ambiente como causa do comportamento observável
(PAPALIA; FELDMAN, 2013, p. 63).

Leia um trecho do texto “O comportamentismo” de John Wat-


son, é considerado como o manifesto de fundação do Behavio-
rismo, acessando o link a seguir:
https://www.ufrgs.br/psicoeduc/behaviorismo/o-comportamen-
tismo-watson/.

A abordagem comportamental desenvolveu-se a partir do estudo e experi-


mentos relacionados à aprendizagem por associação de estímulos, chamados de
Condicionamento Clássico ou Respondente e Condicionamento Operante.

O fisiologista russo Ivan Pavlov (1849-1936), estudou o Condicionamento


Clássico ou Respondente a partir de experimentos de associação de estímulos e
comportamentos com cães, os quais desenvolveram o comportamento de salivar
ao ouvirem o toque de um sino no momento da alimentação.
11
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Ao perceber que os cães passaram a salivar antes mesmo que a carne fosse
apresentada, fez a sua descoberta inovadora. Pavlov estudava as enzimas sali-
vares dos cães ao colocar um prato com carne em sua frente e coletar as suas
salivas. Após repetidas associações entre o comportamento de salivar dos cães e
o estímulo (toque do sino), o estímulo passou a eliciar a resposta (ato de salivar)
mesmo sem a apresentação da comida aos cães (PAPALIA; FELDMAN, 2013).

Figura 1 – Ivan Pavlov, discípulos e um dos cães de seus experimentos

Fonte: https://bit.ly/46PrdMC. Acesso em: 19 jan. 2022.

Portanto, o Condicionamento Clássico ou Respondente se refere a um tipo


de aprendizagem baseado na associação entre um estímulo neutro, que não ge-
rava resposta anterior (toque do sino) a outro estímulo que gera uma resposta es-
pecífica (salivação dos cães ao serem alimentados) (PAPALIA; FELDMAN, 2013).

O norte-americano John Watson (1878-1958) desenvolveu um outro marco


importante das experimentações behavioristas ao aplicar teorias de estímulo-res-
posta em crianças, a fim de moldar o comportamento do bebê de determinadas
maneiras.

O experimento mais conhecido de Watson é do “Pequeno Albert”, um bebê


de 11 meses, que foi ensinado por Watson a ter medo de animais brancos e pe-
ludos, como ratos e coelhos. A experiência consistia na associação de um ruído
intenso (bater de um martelo em uma bigorna) à exposição a um rato e que levava
Albert a chorar; após várias exposições a esta associação (barulho – rato), o bebê
passou a chorar sempre que via algo branco e peludo, como coelhos e gatos
brancos, e até mesmo, a barba branca de um idoso, sem a necessidade de ouvir
o barulho alto.

12
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

Figura 2 – O caso do pequeno Albert

Fonte: https://bit.ly/3D2Dqjd. Acesso em: 19 jun. 2022.

Nos dias de hoje, diante das diretrizes da Bioética, o experimento do Peque-


no Albert certamente não seria bem avaliado eticamente, porém, no contexto em
que foi desenvolvido, foi capaz de demonstrar a possibilidade de condicionamento
e modelagem do comportamento de bebês (PAPALIA; FELDMAN, 2013).

Os experimentos de Pavlov e de Watson auxiliam a compreender quanto es-


tamos sujeitos a situações de condicionamento durante a nossa vida. Por exem-
plo, as nossas preferências e aversões por certos objetos e/ou situações do coti-
diano podem ser originadas da exposição a eventos adversos em nosso dia a dia,
como no caso das fobias.

Assista ao vídeo sobre o Behaviorismo Radical a e a visão de


Skinner sobre a condição humana, acessando o link do canal
Didatics:
https://www.youtube.com/watch?v=nYuHMobXwnE].

O modelo de aprendizagem por Condicionamento Operante foi desenvolvido


pelo psicólogo norte-americano Bhurrus Frederick Skinner (1904-1990).

13
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Figura 3 – B. F. Skinner

Fonte: https://bit.ly/44xTTYn. Acesso em: 15 dez. 2022.

No Condicionamento Clássico, o sujeito irá associar diferentes estímulos a


comportamentos não controláveis enquanto, no Condicionamento Operante o su-
jeito pode associar o comportamento as suas consequências diretas.

Skinner afirma que a maioria dos comportamentos manifestados pelo ser hu-
mano são aprendidos através do Condicionamento Operante. Um exemplo é a
aprendizagem da fala, pois, ao emitirmos os sons das palavras somos incentiva-
dos (reforçados) pelas pessoas ao nosso meio a emitir novamente esses mesmos
sons.

Os reforçadores são todos os estímulos que aumentam a frequência de


ocorrência de um comportamento, como no caso de recompensas e elogios. Por
exemplo, se toda vez que um bebê chora a sua mãe pegá-lo no colo, há a possi-
bilidade de a frequência desse comportamento aumentar, pois a associação que o
bebê realiza se dá entre ato de chorar – receber colo da mãe.

Assim, os eventos capazes de elevar ou de reduzir a frequência de compor-


tamentos emitidos são denominados de reforços ou reforçadores que são dividi-
dos em positivos e negativos.

Os reforços positivos são os estímulos que aumentam a frequência de emis-


são de uma resposta/comportamento após a sua apresentação como dar elogios
e atenção, dar recompensas materiais como doces, dinheiro, aumento de salário,

14
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

entre outros. Os reforços negativos são os eventos que reduzem ou retiram um


estímulo aversivo ou desconfortável após a emissão de um comportamento. Um
exemplo, é o ato do filho de tapar os ouvidos para não escutar as reprimendas
da mãe após a constatação de que ele filho fez algo indevido ou o ato de retirar a
criança de uma situação de castigo, após a emissão de comportamentos adequa-
dos.

Portanto, os comportamentos de evitação ou de retirada de estimulações


aversivas são considerados como reforçadores negativos. Há, ainda, o conceito
de punição, muitas vezes, confundido com o conceito de reforçamento negativo,
mas esses termos não são sinônimos, já que os efeitos da punição são opostos
aos efeitos do reforçamento.

O reforçamento negativo aumenta a frequência de um comportamento espe-


cífico, ao finalizar a estimulação aversiva. A punição, por sua vez, atua de forma
inversa, pois é a aplicação de consequência aversiva a fim de diminuir ou extin-
guir a frequência do comportamento inadequado que é manifesto. Um exemplo
seria o da mãe que bate na mão da criança todas as vezes que ela tenta pegar
uma bolacha antes das refeições, o que é considerado um comportamento não
desejado. Se o objetivo da punição é a diminuição ou extinção do comportamento
que é alvo do processo podemos afirmar que, se houver a redução ou extinção
do comportamento de pegar a bolacha, houve aprendizagem do comportamento
adequado por parte da criança e a punição aplicada pela mãe foi bem-sucedida.

Podemos afirmar que a terapia comportamental de modificação de comporta-


mento é a utilização planejada de tipos de Condicionamento Operante para a eli-
minação de comportamentos indesejáveis, como as “birras” das crianças, ou para
aumentar a frequência de comportamentos desejáveis, como aumentar o compor-
tamento de estudar pois, quando uma criança realizar as atividades escolares e
após esse comportamento, receber uma recompensa como elogios ou brinque-
dos, haverá a associação de que algo agradável ocorrerá depois que ela estudar.

Em síntese, podemos afirmar que, o reforço positivo e negativo são os pro-


cessos pelos quais um comportamento tem a sua probabilidade de repetição ele-
vada, pois é fortalecido. A punição é o processo pelo qual um comportamento é
enfraquecido ou extinto, já que se diminui a probabilidade de sua repetição (PA-
PALIA; FELDMAN, 2013).

15
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Algumas críticas às abordagens de Skinner se dão devido à crença de que


o Behaviorismo entende o ser humano como um organismo passivo diante das
estimulações do meio e de que a proposta de modificação do comportamento não
contempla os processos cognitivos, afetivos e não requer uma análise ampla do
contexto social. Além disso, nem sempre um determinado organismo apresenta
maior probabilidade de agir de uma determinada maneira e não de outra, mesmo
diante de reforçadores e da punição.

Skinner foi uma das figuras intelectuais do século XX mais controvertidas


por remexer em um “ninho de vespas” quando insistiu que são as influências ex-
ternas, e não os pensamentos e sentimentos, que modificam o comportamento.
A resposta de Skinner para essas críticas foi afirmar que o comportamento das
pessoas pode ser controlado por meio de aplicação do sistema de influências e
recompensas externas, mas que haveria dificuldades para se planejar as conse-
quências desse controle.

Outra abordagem de aprendizagem comportamental que está envolvida nos


pressupostos das TCCs, é a chamada Teoria da Aprendizagem Social ou Socio-
cognitiva, proposta pelo psicólogo norte-americano Albert Bandura (1925-2021).

Figura 4 – Albert Bandura

Fonte: https://sites.google.com/site/psicologiadaeducacaofadeup/_/rsrc/1256039797297/
historia/albert-bandura/Albert%20Bandu.jpg. Acesso em: 15 dez. 2022.

16
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

A Teoria da Aprendizagem Social ou Sociocognitiva de Bandura afirma que a


motivação ou necessidade de se desenvolver está no indivíduo que irá aprender
os comportamentos adequados através da observação e da imitação de modelos
sociais, sejam os seus pais, familiares, professores e outras pessoas significati-
vas do seu contexto.

Esse processo de observação/imitação foi chamado de modelagem ou de


aprendizagem observacional. A observação e a imitação de comportamentos a
partir de modelos sociais é o processo mais importante para uma criança apren-
der a realizar várias ações no desenvolvimento como, por exemplo, se comunicar,
lidar com sentimentos, construir senso moral e outras aprendizagens de compor-
tamentos apropriados e esperados em seu contexto.

Em outras palavras, crianças aprendem observando e imitando as outras


pessoas que atuam como treinadores e mentores (PAPALIA; FELDMAN, 2013).

A abordagem de Bandura, por ser sociocognitiva, dá ênfase aos processos


cognitivos fundamentais no desenvolvimento humano. Os processos cognitivos
estão presentes no processo de observação e imitação de modelos, pois as pes-
soas aprendem elementos fragmentados de comportamentos para, posteriormen-
te, unir os fragmentos e formular novos padrões de comportamento (PAPALIA;
FELDMAN, 2013).

Mas, é necessário reforçar a ideia de que a imitação difere da mímica, pois


na mímica há a reprodução exata do comportamento e, na imitação, há a utili-
zação de elementos de comportamentos observados no outro que irão moldar o
comportamento, mas no caso da mímica, o indivíduo sempre irá colocar algo de
pessoal em seu modo de agir.

Podemos dizer que a Teoria da Aprendizagem Social ou Sociocognitiva é a


proposta que afirma que os comportamentos são aprendidos através da observa-
ção e imitação de modelos sociais (PAPALIA; FELDMAN, 2013).

No próximo tópico, iremos abordar as teorias cognitivas e sua influência no


surgimento e desenvolvimento das TCCs.

17
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

O psicólogo norte-americano Bhurrus Frederick Skinner afirmou


que a maioria dos comportamentos manifestados pelo ser huma-
no são aprendidos através do Condicionamento Operante. Sobre
os fundamentos do Condicionamento Operante, assinale a alter-
nativa correta:
a) No Condicionamento Operante, o estímulo reforçador se refere a
qualquer fator que diminua a frequência de emissão de um com-
portamento.
b) Reforçadores são os estímulos que aumentam a frequência de
ocorrência de um comportamento, como as recompensas e os
elogios.
c) Os reforços positivos são os estímulos que aumentam a frequên-
cia de emissão de um comportamento antes de sua apresenta-
ção.
d) Os reforços negativos são os eventos que aumentam os estímu-
los aversivos antes da emissão de um comportamento.
e) O processo de punição ocorre quando há a evitação ou a retirada
de estimulações aversivas em uma determinada situação.

Resolução: Considera-se como estímulo reforçador qualquer


evento que aumenta a frequência de emissão de um comporta-
mento e deve ser empregado após a sua ocorrência. Reforçado-
res são os estímulos que aumentam a frequência de ocorrência
de um comportamento, como no caso de recompensas e elogios.
Os eventos que elevam ou reduzem a frequência de comporta-
mentos são denominados como reforços e são divididos em po-
sitivos e negativos. Os reforços positivos são estímulos que au-
mentam a frequência de emissão de um comportamento após a
sua apresentação. Os reforços negativos são eventos que redu-
zem ou retiram estímulos aversivos ou desconfortáveis após a
emissão de um comportamento. A punição é a aplicação de uma
consequência aversiva que diminui ou extingue a frequência de
um comportamento inadequado.

18
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

3 TEORIAS COGNITIVAS
As teorias cognitivas surgem um pouco antes do surgimento das TCCs, ou
seja, do início até a metade do Século XX, na Europa e nos Estados Unidos da
América. As teorias cognitivas estão ligadas à Psicologia Cognitiva, que é a
área da Psicologia que estuda os processos internos que conferem sentidos ou
significados ao ambiente e auxiliam na tomada de decisões sobre as ações mais
apropriadas diante das demandas do contexto. Os processos ou funções cogni-
tivas são as que envolvem as atividades de atenção, percepção, aprendizagem,
memória, linguagem, resolução de problemas, raciocínio e pensamento.

A Psicologia Cognitiva procura compreender os processos de cognição atra-


vés da observação do comportamento no decorrer da execução de atividades
cognitivas (EYSENCK; KEANE, 2017). Matlin (2004) afirma que o ato de pensar
vem intrigando filósofos e pesquisadores há, pelo menos, dois mil anos.

Aristóteles, filósofo grego, foi um dos que elaborou formulações sobre a


aprendizagem e a memória, destacando que o conhecimento é adquirido a partir
da experiência e observação humana, preparando o terreno que possibilitou a
realização de debates filosóficos sobre as maneiras de se conhecer e aprender.

Mas, o desenvolvimento da Psicologia como área de conhecimento surgiu


apenas no final do século XIX, mais precisamente em 1879, no Instituto Experi-
mental de Psicologia da Universidade de Leipzig, Alemanha, a partir dos estudos
de Wilhelm Wundt.

Figura 5 – Wilhelm Wundt

Fonte: https://bit.ly/3JN4tmr. Acesso em: 15 dez. 2022.

19
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Wundt estudou os processos mentais em seus experimentos através do uso


da introspecção, na qual observadores treinados analisavam, de maneira siste-
mática, as suas sensações diante de estímulos apresentados e as relatavam de
maneira objetiva. A técnica de introspecção era considerada científica naquele
momento, mas é considerada extremamente subjetiva pelos pesquisadores atu-
ais.

Ainda, segundo Matlin (2004), posteriormente, os estudiosos do processo


de memória passaram a utilizar outras técnicas de experimentação que possuí-
am maior grau de credibilidade científica, como no caso de William James (1842-
1910), psicólogo norte-americano que teve influência significativa para o surgi-
mento da área de Psicologia Cognitiva ao final do século XIX.

James publicou a obra Princípios da Psicologia em 1890, na qual apresen-


tava descrições de suas experiências cotidianas com os sujeitos de pesquisa e
a afirmava que a mente humana é ativa e questionadora por natureza. A obra
ainda apresenta assuntos de importância para a Psicologia Cognitiva, como ex-
perimentos sobre percepção, atenção, raciocínio e o chamado fenômeno “ponta
da língua”, que é a ideia que temos sobre uma lembrança que está quase vindo à
consciência. As contribuições mais significativas de James para a Psicologia Cog-
nitiva são as teorias sobre a memória, já que ele propunha dois tipos diferentes de
memória: uma de curto prazo e outra duradoura. Posteriormente, a memória se
tornou a função cognitiva mais estudada em todo o mundo, com inúmeras pesqui-
sas sobre seus diferentes aspectos (MATLIN, 2004).

O início da Psicologia Cognitiva se dá em 11 de setembro de 1956, quan-


do importantes pesquisadores participaram de um simpósio no Massachussets
Institute of Technology – MIT, quando Noam Chomsky (1928), linguista, filósofo
e cientista cognitivo norte-americano, fez uma exposição sobre a sua teoria da
linguagem (MATLIN, 2004).

Outro marco do desenvolvimento da Psicologia Cognitiva foi a publicação do


livro Cognitive Psychology, de Uric Neisser, em 1967, quando a Psicologia como
área maior já estava mais consolidada e utilizava métodos de pesquisa próprios
(MATLIN, 2004). A Psicologia Cognitiva foi conquistando cada vez mais espaço
na área de Psicologia, ampliando suas pesquisas e estudos sobre processos cog-
nitivos e influenciando o surgimento da Gestalt, os estudos sobre linguagem de
Chomsky que considera que a única forma de entender o aprendizado de uma
língua é através das estruturas gramaticais inatas comuns a toda a humanidade,

20
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

as pesquisas sobre estágios do desenvolvimento cognitivo de Jean Piaget, que


determina que a inteligência se estrutura através de fases, as análises de Vy-
gotsky para a compreensão das funções psicológicas complexas (pensamento e
linguagem), que envolvem a interação do sujeito com o seu grupo sociocultural.

No decorrer da segunda metade do Século XX, as ideias da Psicologia Cog-


nitiva foram aplicadas à Abordagem do Processamento de Informações e, ainda,
deram origem aos estudos da Neurociência Cognitiva, que investiga a os pro-
cessos cerebrais relacionados à cognição, à Inteligência Artificial e à Metáfora do
Computador (MATLIN, 2004).

Após o estudo sobre as teorias que antecederam e influenciaram o surgi-


mento das TCCs agora iremos analisar os princípios básicos e das ideias centrais
dos principais criadores das TCCs.

1) As Terapias Cognitivo-Comportamentais fundamentam-se em um


conjunto de teorias que reúnem os fundamentos das abordagens
cognitivas e comportamentais. Sobre as teorias que fundamen-
tam as TCCs, assinale a alternativa correta:
a) ( ) São a Psicanálise, a Gestalt e o Humanismo.
b) ( ) São a Psicanálise, o Behaviorismo e as teorias cognitivas.
c) ( ) São o Behaviorismo, as teorias cognitivas e a teoria da apren-
dizagem social.
d) ( ) São a Gestalt, a Fenomenologia e a Psicopatologia.
e) ( ) São o Behaviorismo, a Psicopatologia e a Psicanálise.

Resolução: a abordagem comportamental se relaciona a um con-


junto de teorias da aprendizagem e na perspectiva da aprendi-
zagem, que está envolvida nas abordagens behavioristas, nas
teorias cognitivas e na teoria da aprendizagem social e afirmam
que a aprendizagem é uma mudança significativa e duradoura
nos comportamentos das pessoas, a partir de suas experiências
e/ou adaptações aos seus contextos de vida. As teorias de apren-
dizagem, como o Behaviorismo e a Aprendizagem Social buscam
entender as leis que fundamentam as mudanças em comporta-
mentos mensuráveis e observáveis no desenvolvimento de uma
pessoa.

21
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

4 PRINCÍPIOS GERAIS DA TCC E


TENDÊNCIAS CONTEMPORÂNEAS

Vimos, que Aaron Beck desenvolveu, no início da década de 1960, um mode-


lo de psicoterapia direcionado ao tratamento da depressão, o qual ficou conhecida
como “terapia cognitiva de Beck”, diferenciando-a de outros tipos de terapias cog-
nitivas (MORRIS; MAISTO, 2004). Dessa maneira, Terapia Cognitiva (TC) é con-
siderado o termo genérico para Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) e esses
dois termos vêm sendo usados como sinônimos para a se referir às psicoterapias
fundamentadas no modelo cognitivo.

Quem foi Aaron Temkin Beck? Para saber mais sobre esse
médico e psicólogo, acesse o link: https://blog.cognitivo.com/aaron-
-temkin-beck/.

Ainda, o termo TCC vem sendo utilizado para se referir a um conjunto de téc-
nicas que combinam a abordagem cognitiva a procedimentos comportamentais.
O termo TCC é considerado mais amplo ao incluir a Terapia Cognitiva formal e as
combinações das estratégias cognitivas e comportamentais.

Aaron T. Beck (1921-2022), médico psiquiatra norte-americano, é o fundador


da Terapia Cognitiva (TC) e responsável pela formulação do modelo teórico da
abordagem, mas não propriamente o desenvolvimento das estratégias terapêuti-
cas, que fica a cargo de sua filha Judith.

Ao lecionar sobre psiquiatria na University of Pennsylvania (EUA), Beck es-


tabeleceu uma linha de pesquisa sobre o tratamento da depressão e passou a
questionar o tratamento exclusivo dessa condição apenas com medicações. Pas-
sa, assim, a desenvolver a sua proposta teórica e verificou sucesso no tratamento
psicoterápico para os pacientes com depressão, expandindo a sua teoria e utili-
zando técnicas semelhantes para o tratamento de outras enfermidades como a
ansiedade e os transtornos de personalidade.

22
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

Ao criar o Beck Institute, juntamente com a sua filha Judith Beck, passa a
estudar as doenças psíquicas e oferecer treinamentos sobre a Terapia Cogniti-
vo-Comportamental para profissionais da área de saúde mental. As abordagens
da TCC que surgem ao longo das décadas posteriores à formulação da teoria de
Beck, apresentam graus diversificados de sucesso.

Sobre o modelo cognitivo, relacionado às Terapias Cognitivas, A. Beck argu-


menta que o pensamento distorcido que é aquele que influencia o estado afetivo
e a compreensão do mundo pelo paciente, é comum em todos os indivíduos que
possuem transtornos psicológicos (BECK, 2013).

O modelo cognitivo de acordo com A. Beck (2007), é composto por níveis,


como podemos ver no Quadro 1, a seguir:

Quadro 1 – Descrição dos níveis do modelo cognitivo

Fonte: adaptado de Beck (2021)

A forma como o modelo cognitivo se apresenta no dia a dia pode ser visuali-
zada na imagem a seguir:

23
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Figura 6 – Modelo cognitivo em ação

Fonte: https://s3.sanar.online/images/b/new-blog/Beck.png. Acesso em: 12 fev. 2023.

Todos os processos apresentados representam mecanismos para se lidar


com situações cotidianas e se referem à forma como as pessoas percebem a si,
os outros, o mundo e o futuro. Essa maneira de perceber a si mesmo, aos outros
e ao mundo é denominada de tríade cognitiva (BECK, 2021).

O terapeuta traça o modelo cognitivo e comportamental, ou seja, o enten-


dimento do conjunto das crenças disfuncionais, fragilidades individuais e estra-
tégias comportamentais utilizadas para que os pacientes possam lidar com as
crenças nucleares ao analisar os denominadores cognitivos comuns às diversas
situações de vida e na avaliação feita sobre o cliente (RANGÉ, 2011).

Em síntese, podemos afirmar que a maneira como as pessoas se sentem


e se comportam está relacionada à forma como interpretam as situações e, que
os pensamentos podem modificar e manter as emoções disfuncionais e afetar os
comportamentos (RANGÉ, 2011).

Segundo Beck (2013, p. 23): “Quando as pessoas conseguem avaliar seu


pensamento de forma mais realista e adaptativa, elas obtêm uma melhora em seu
estado emocional e no comportamento”.

24
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

A terapia cognitiva desenvolvida por Aaron T. Beck, na Universidade da Pen-


silvânia, é idealizada como forma de psicoterapia breve e orientada ao momento
presente, para o tratamento da depressão, para resolução dos problemas existen-
tes no momento da terapia e, principalmente, para a modificação de pensamentos
e comportamentos disfuncionais (BECK, 2013).

Dessa maneira, considera-se que Aaron Beck deu início ao que foi considera-
do como uma revolução no tratamento em saúde mental. Por ser psicanalista com
formação completa e um cientista, A. Beck acreditava que a psicanálise seria me-
lhor aceita pela comunidade médica e as suas proposições teriam maior validação
empírica. Entre 1960 e 1970, A. Beck realizou experimentos para a comprovação
e validação das ideias da Psicanálise. Mas, ao contrário do que pensava, os resul-
tados de seus experimentos não foram conclusivos e o levaram à investigação de
outras formas de compreender a depressão.

Dessa forma, A. Beck passa a identificar as cognições negativas e distorci-


das (relacionadas às ideias e às crenças) como a principal característica da de-
pressão e desenvolve a sua proposta de tratamento de breve duração, com o
objetivo de realizar o teste de realidade do pensamento depressivo do paciente
(BECK, 2021).

Para A. Beck a depressão seria o resultado da ação de padrões autocríticos


e disfuncionais de pensamento sobre o seu self. As pessoas depressivas seriam
aquelas que apresentavam expectativas irrealistas sobre si e o mundo, superva-
lorizando fracassos, generalizando experiências negativas e valorizando apenas
os feedbacks negativos recebidos do mundo externo, além de interpretarem situa-
ções de sucessos como situações de fracassos.

A reação negativa de pensamentos ocorre frequentemente e é seguida de


uma chamada “espiral para baixo”, que deriva de vivências de pequenos contra-
tempos, mas que leva a que a pessoa a entender que não tem valor algum e de
forma definitiva. A espiral de pensamentos negativos e distorcidos é o princípio
fundamental da depressão (MORRIS; MAISTO, 2004).

25
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Figura 7 – Aaron e Judith Beck

Fonte: https://iptc.net.br/aaron-beck/. Acesso em: 21 jan. 2022

O Beck Institute, criado por Aaron Beck e sua filha Judith Beck,
em 1994, é uma organização sem fins lucrativos na Filadélfia, Esta-
dos Unidos. Destina-se a divulgar os conceitos da Terapia Cogniti-
vo-Comportamental através de várias estratégias como workshops
presenciais, e treinamentos para empresas e capacitações on-line. A
equipe do Beck Institute, conta com 23 profissionais e, atualmente, a
presidente e líder do Instituto é Judith Beck.

Em 1977, Beck e colaboradores divulgaram os resultados de um estudo clíni-


co realizado com pacientes deprimidos, no qual constataram que a terapia cogni-
tiva era tão efetiva quanto a imipramina, um antidepressivo comum. Foi uma das
primeiras vezes em que os efeitos de uma psicoterapia foi comparada aos resulta-
dos de uma medicação. Em 1979, Beck, Rush, Shaw e Emery lançam o primeiro
manual de Terapia Cognitivo-Comportamental (BECK, 2021).

Iremos abordar, a partir de agora, princípios básicos da TCC de acordo com


Beck (2007; 2021) a fim de compreendermos os seus postulados e, analisar al-
guns mitos e verdades sobre a TCC, de acordo com Knapp (2004).

O modelo de psicoterapia proposta pela TCC veio a romper com os paradig-


mas anteriores e as psicoterapias baseadas em teorias psicológicas até então
utilizadas, como o Behaviorismo e a Psicanálise e o Humanismo.

26
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

No Behaviorismo, uma proposta teórico e prática de teor comportamental, o


processo de modificação de comportamentos é realizado através das técnicas de
Condicionamento Clássico e Operante, a fim de modelar ou moldar o comporta-
mento manifesto do sujeito de modo que sejam apresentados os comportamentos
desejados.

Já na abordagem psicanalítica, há a proposta de reestruturação da personali-


dade e de modificação de comportamentos através do acesso e da compreensão
dos conflitos inconscientes do sujeito, em uma perspectiva de tratamento a longo
prazo.

A abordagem humanista ou Humanismo procura focalizar os aspectos mais


saudáveis da personalidade da pessoa, em uma perspectiva psicoterapêutica de
construção e desenvolvimento que parte das potencialidades humanas.

As propostas da abordagem cognitivo-comportamental presumem que a mu-


dança de comportamentos se dá através do descarte dos pensamentos disfuncio-
nais e sua substituição por pensamentos adequados à realidade e dos sentimen-
tos associados, o que levou à ruptura na maneira de se compreender o processo
psicoterapêutico.

A partir do esquema contido na figura a seguir, vemos como se dá a inter-


-relação da ação ou comportamento, dos pensamentos e sentimentos de acordo
com a TCC.

Figura 8 – Ação/comportamento, pensamento e sentimento

Fonte: https://bit.ly/3r9HFXu. Acesso em: 15 fev. 2023.

Vamos analisar alguns dos princípios básicos da TCC descritos por Beck
(2013), a fim de esclarecer os objetivos e formas de intervenção da abordagem
e os resultados esperados, usando um estudo de caso da paciente Sally, uma

27
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

paciente com depressão, a fim de exemplificar os princípios centrais da TCC e


para mostrar como deve ser usada a terapia cognitivo-comportamental para com-
preender as dificuldades dos pacientes e para o planejamento do tratamento e da
condução das sessões de terapia.

Sally é considerada uma paciente ideal para a apresentação da aplicação


dos princípios da a Terapia Cognitivo-Comportamental de forma simples. Sobre o
perfil de Sally, Beck (2013, p. 27) a define como:

[...] uma moça solteira de 18 anos quando procurou tratamento


comigo durante seu segundo semestre na universidade. Vinha
se sentindo deprimida e ansiosa nos últimos quatro meses e
estava tendo dificuldades com suas atividades diárias. Ela pre-
enchia os critérios de um episódio de transtorno depressivo
maior moderado, de acordo com o Manual Diagnóstico e Esta-
tístico de Transtornos Mentais.

Vamos conhecer agora os 10 princípios básicos da Terapias Cognitivo-Com-


portamental de Judith S. Beck (2013), descritos em sua obra Terapia Cognitivo-
-Comportamental: teoria e prática, cuja capa está na figura a seguir.

Figura 9 – Terapia cognitivo-comportamental: teoria e prática de Judith S. Beck

Fonte: https://bit.ly/43g2Ggo. Acesso em: 15 dez. 2022.

- A Terapia Cognitivo-Comportamental fundamenta-se na Conceitualiza-


ção ou Conceituação Cognitiva de Caso

As dificuldades de Sally foram consideradas a partir de três estruturas. A pri-


meira estrutura foram os seus pensamentos atuais ↓ “Eu sou um fracasso, eu não
consigo fazer nada direito, eu nunca vou ser feliz” ↓, que contribuíram para o apa-

28
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

recimento de sentimentos de tristeza e de os comportamentos disfuncionais de


isolamento, falta de produtividade, ao passar muito tempo em seu quarto, e evitar
pedir ajuda. Assim, os comportamentos disfuncionais reforçavam mais ainda os
pensamentos distorcidos de Sally.

Em segundo lugar, foram identificados os fatores iniciais que influenciaram


as percepções de Sally logo ao início do desenvolvimento de sua depressão que
foram estar longe de casa pela primeira vez e dificuldade nos estudos, contribuin-
do para que ela acreditasse que era incompetente.

Em terceiro lugar, o levantamento de hipóteses acerca de eventos fundamen-


tais para o desenvolvimento dos padrões de interpretação desses eventos e a
levaram a ser mais predisposta à depressão, já que Sally tinha uma tendência a
atribuir à sorte, e não aos seus esforços, os seus pontos fortes e as suas conquis-
tas, mas encarava os seus pontos fracos como um reflexo do seu verdadeiro “eu”,
ou seja, uma pessoa incompetente e incapaz.

J. Beck (2013) formulou a conceituação de caso de Sally no contexto de for-


mulação cognitiva de casos de transtorno depressivo e nas informações que a
paciente forneceu durante a sessão de avaliação.

Aprimorando a conceituação do caso a cada sessão, através da obtenção de


novos dados, em alguns momentos, Beck compartilhava a sua conceituação com
Sally para analisar se as suas ideias lhe pareciam verdadeiras e, ainda durante
o processo de terapia, levou Sally a avaliar a sua experiência no tratamento por
meio desse modelo cognitivo. Ela aprendeu, por exemplo, a identificar os pensa-
mentos associados ao seu afeto ansioso e a avaliar e formular respostas mais
adaptativas ao seu pensamento. Fazer isso melhorou a forma como se sentia e
geralmente fazia ela se comportar de um modo mais funcional.

- A Terapia Cognitivo-Comportamental necessita uma aliança terapêuti-


ca sólida

A paciente Sally, do estudo de caso relatado apresentava um quadro de de-


pressão e sintomas de transtornos de ansiedade.

O Princípio nº 2 da TCC de J. Beck enfatiza a importância de estabelecer


uma aliança terapêutica sólida entre terapeuta e paciente. O vínculo terapêutico
adequado é garantia da realização do trabalho colaborativo e a TCC não pode
nem deve estabelecer uma terapêutica distante e/ou mecânica.

29
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Um dos objetivos da Terapeuta Cognitivo-Comportamental é manter o vínculo


positivo entre terapeuta e paciente por meio dos sentimentos de empatia e outras
atitudes. J. Beck (2013), relata que Sally tinha dificuldade em confiar e trabalhar
com a terapeuta, mas que a capacidade de confiar demonstrava a Sally os fato-
res necessários, como afeto, empatia, atenção, interesse genuíno e competência,
para desenvolver uma situação de aconselhamento. Mostrava interesse por Sally
ao fazendo comentários empáticos, escutando com atenção os seus relatos e sin-
tetizando adequadamente os pensamentos e sentimentos que ela relatava.

A terapeuta, no caso J. Beck, assinalava os sucessos de Sally, fossem me-


nores ou maiores, mantendo um ponto de vista otimista e bem-humorado, mas
realista. Ao final de cada sessão, solicitava que Sally desse um feedback sobre o
processo para assegurar que ela se sentisse positiva em relação ao trabalho.

- A Terapia Cognitivo-Comportamental focaliza a colaboração e a parti-


cipação

J. Beck encorajou Sally a compreender a terapia como um trabalho em equi-


pe, em que elas decidiam juntas qual assunto abordar a cada sessão, a frequên-
cia das sessões e o que ela poderia fazer entre as sessões como “exercício de
casa”.

No início do processo, a terapeuta direcionava de maneira ativa a estrutura


das sessões e resumia sozinha o conteúdo dos encontros, mas, à medida que a
depressão de Sally foi diminuindo e ela se tornou mais adaptada ao tratamento, J.
Beck a encorajou a ser mais ativa nas sessões, decidindo com ela quais assuntos
tratar, identificando com ela as distorções de pensamento, sintetizando os pontos
mais importantes e planejando os exercícios de casa junto com Sally.

Assim, de acordo o Princípio nº 3, é necessário que o terapeuta estimule


uma atitude colaborativa, de modo que o terapeuta e paciente poderão construir
de forma conjunta os objetivos a serem alcançados. O terapeuta toma a frente do
processo no início do tratamento, mas, paulatinamente, o paciente deve ser enga-
jado para obter mais autonomia e colaboração na psicoterapia.

- A Terapia Cognitivo-Comportamental é orientada para objetivos e foca-


da nos problemas

Já na primeira sessão, J. Beck (2013) solicitou que Sally enumerasse os


seus problemas e estabelecesse objetivos específicos, para o entendimento con-
junto de qual direção o processo deveria tomar.

30
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

Na sessão de avaliação, Sally disse que se sentia isolada em relação aos


outros, como os amigos. A partir das orientações de J. Beck, Sally definiu compor-
tamentos que ela queria desenvolver como fazer novas amizades e passar mais
tempo com os amigos.

Após essa etapa, ela e a terapeuta discutiram como poderiam melhorar o seu
dia a dia e a terapeuta a ajudou a entender, avaliar e a reagir aos pensamentos
distorcidos que interferiam no alcance de seus objetivos, como pensar que os
seus amigos não queriam sair com ela ou que ela estava muito cansada para sair
com eles.

J. Beck auxiliou Sally a constatar a validade dos pensamentos através da


avaliação das evidências objetivas e Sally pode “testar” os seus pensamentos por
meio de experimentos comportamentais, tomando a iniciativa de fazer planos com
os amigos. Após reconhecer e corrigir as distorções de pensamento, Sally se be-
neficiou com soluções objetivas para a redução de seu isolamento social.

A aplicação desse princípio é a orientação do tratamento para o alcance de


objetivos, verifica-se que, no caso de Sally, a sua terapia partirá da definição de
objetivos de vida, focados na e na modificação dos comportamentos disfuncionais
a partir da análise de pensamentos e sentimentos relacionados a esses compor-
tamentos. A modificação do comportamento é realizada de forma consciente, atra-
vés da definição de objetivos claros, o que irá promover a melhora no sentimento
de bem-estar do paciente.

- A Terapia Cognitivo-Comportamental enfatiza o momento presente

J. Beck (2013) afirma que na TCC, o tratamento da maior parte dos pacientes
envolve grande ênfase na compreensão dos problemas e situações mais angus-
tiantes do momento atual.

No caso de Sally, ela passou a se sentir melhor após conseguir reagir aos
seus pensamentos distorcidos e a tomar atitudes positivas para melhorar a sua
qualidade de vida. A terapia de Sally iniciou-se pelo exame dos problemas presen-
tes e independe de um diagnóstico.

O foco de atenção da psicoterapia somente se direciona para os momentos


passados em duas situações: quando o paciente expressa o desejo de analisar
o passado e se o entendimento das experiências infantis sobre as suas crenças
puder ajudar na modificação de pensamentos rígidos.

31
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

No tratamento de Sally, J. Beck (2013), voltou-se, de forma breve, para a


análise do passado a fim de identificar as crenças intermediárias que ela apren-
deu quando era criança, refletindo sobre as falas como “Se eu tiver grandes con-
quistas, isso significa que eu tenho valor. Se eu não tiver grandes conquistas, isso
significa que eu sou um fracasso”.

A terapeuta auxiliou Sally na avaliação da validade das crenças do passado


e do presente, o que a levou a desenvolver crenças funcionais e razoáveis. Se a
paciente tivesse um transtorno de personalidade, J. Beck (2013) iria utilizar mais
tempo para discutir o seu desenvolvimento e a origem infantil de crenças e com-
portamentos de enfrentamento diante de situações negativas. A TCC se focaliza,
inicialmente, na avaliação do momento presente e o passado pode e deve ser
analisado em algumas circunstâncias, de acordo com o histórico e a psicopatolo-
gia do paciente.

- A Terapia Cognitivo-Comportamental tem duração limitada

J. Beck (2013) afirma que a maioria dos pacientes com depressão e transtor-
nos de ansiedade podem ser tratados em de 6 a 14 sessões. Isso ocorre porque
os objetivos da TCC são levar ao alívio dos sintomas, promover o desaparecimen-
to ou remissão do transtorno, auxiliar o paciente na resolução de seus problemas
mais imediatos e a ensinar habilidades e técnicas para evitar recaídas.

No caso de Sally, o tratamento iniciou-se com sessões semanais, mas se a


sua depressão fosse mais grave ou ela corresse risco de suicídio, seriam marcadas
mais sessões semanais. Após o período de dois meses, J. Beck e Sally decidiram
conjuntamente utilizar sessões quinzenais e, posteriormente, sessões mensais.
Após o término do tratamento, foram marcadas sessões de “reforço” a cada três
meses, por pelo menos, um ano, porém, o sucesso do tratamento em poucos me-
ses não ocorre com todos os pacientes em TCC, o que leva alguns a precisarem
de um ou dois anos de psicoterapia a fim de modificarem as crenças disfuncionais
mais rígidas e os padrões comportamentais que levam ao sofrimento.

Pacientes com transtornos psicológicos mais graves provavelmente preci-


sarão de tratamento por tempo bem longo para se estabilizarem. Esse princípio
pressupõe que a TCC deve ser mais breve do que outros tipos de psicoterapias,
pelo menos, inicialmente. Mas, o tempo de TCC que é necessário varia de acordo
com as condições e objetivos psicoterapêuticos do paciente e do terapeuta.

32
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

- A Terapia Cognitivo-Comportamental ajuda o paciente a identificar,


avaliar e responder aos pensamentos e crenças disfuncionais

Beck (2013) afirma que os pacientes podem ter inúmeros pensamentos dis-
torcidos que irão afetar o seu humor, comportamento e até mesmo, a fisiologia,
especialmente em casos de ansiedade.

O terapeuta deve ajudar o paciente a identificar os principais pensamentos


distorcidos e o ensinar na adoção de visões mais realistas e adaptativas que o
levem a se sentir emocionalmente melhor, a se comportar de modo mais funcional
e/ou diminuir a excitação psicológica.

Todos esses processos podem ser realizados através da descoberta direcio-


nada e do questionamento (frequentemente chamado de “questionamento socrá-
tico”) a fim de avaliar os pensamentos, evitando-se o uso do método de persua-
são, do debate ou do mero convencimento.

De acordo com J. Beck (2013), o terapeuta deve criar experiências, os cha-


mados “experimentos comportamentais”, para levar o paciente a testar diretamen-
te os pensamentos. Dá o seguinte exemplo: no caso de um paciente com medo
de aranhas, bastaria apenas a visão da imagem de uma aranha para ele ficar
ansioso a ponto de não conseguir pensar sobre a situação.

Ao agir dessa forma, o terapeuta pode ativar o processo de “empirismo cola-


borativo”, que significa a testagem da validade do pensamento de forma conjunta
com o sujeito, para desenvolver respostas mais úteis e funcionais aos seus pen-
samentos.

No caso de Sally, quando ainda estava bem deprimida, ela relatava espon-
taneamente ter alguns pensamentos disfuncionais e automáticos no seu dia, e
outros pensamentos, eram revelados a J. Beck quando ela perguntava a Sally o
que se passava em sua mente quando se sentia perturbada ou se comportava de
maneira disfuncional.

Pensamentos automáticos fazem parte do nosso dia a dia mes-


mo que sejam percebidos nitidamente, em alguns casos. A maioria
desses pensamentos não causam problemas, mas isso irá ocorrer
quando os pensamentos automáticos não correspondem à realidade
e provocam sofrimento mental.

33
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

J. Beck e Sally descobriram pensamentos automáticos enquanto discutiam


problemas específicos e investigaram a sua validade e utilidade. Isso se dava
através da análise dos pontos de vista de Sally, registrados por escrito, para que
ela pudesse ler as respostas adaptativas durante a semana e se preparar para
lidar com esses ou outros pensamentos semelhantes. Diante dos pensamentos
automáticos, até mesmo os mais positivos, havia a exploração colaborativa das
evidências para validação.

O terapeuta deve levar o paciente a aprender as estratégias a fim de analisar


comportamentos, pensamentos e sentimentos, tornando-o mais autônomo.

- A Terapia Cognitivo-Comportamental usa técnicas variadas para a mo-


dificação de pensamentos, sentimentos e comportamentos

As estratégias cognitivas como o questionamento socrático e a descoberta


guiada são recursos fundamentais para a realização da Terapia Cognitivo-Com-
portamental, mas técnicas comportamentais e de solução de problemas também
são importantes, assim como as outras orientações implementadas dentro de
uma estrutura cognitiva.

Beck (2013) relatou o uso de técnicas da Gestalt Terapia, como o uso do experi-
mento que é a compreensão conjunta em relação a uma situação que emerge na
prática, para auxiliar Sally a entender como a sua família contribuiu para a constru-
ção da crença de que ela era incompetente.

Também utilizou técnicas baseadas na terapia psicodinâmica com alguns


pacientes que apresentaram ideias distorcidas na relação terapêutica. As técni-
cas selecionadas pelo terapeuta são determinadas pela conceituação cognitiva
de caso, pelos problemas que estão sendo discutidos e pelos seus objetivos para
cada sessão.

A Terapia Cognitivo-Comportamental pode fazer uso de várias técnicas, de


acordo com as particularidades de cada caso. As técnicas aplicadas podem variar
ainda de acordo com a formação do psicoterapeuta.

O uso de diferentes técnicas não deve seguir uma postura mecânica e sim,
devem se relacionar ao um processo psicoterapêutico planejado e das propostas
de exercícios, identificação e modificação de pensamentos e crenças.

34
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

Beck (2013), enfatiza que os princípios básicos se aplicam a todos os pacien-


tes, mas que a psicoterapia pode variar de acordo as dificuldades apresentadas,
do momento de vida, do nível intelectual e de desenvolvimento, gênero e origem
cultural do paciente.

O tratamento varia em relação aos objetivos, da capacidade para o desen-


volvimento de vínculo terapêutico consistente, da motivação para a mudança, da
experiência prévia com psicoterapias, de preferências de tratamento e de trans-
tornos específicos de cada paciente.

Por ter surgido após a consolidação da Psicologia Comportamental, da Psi-


canálise, da Psicologia Humanista e da Psicologia Cognitiva, a Terapia Cogniti-
vo-Comportamental gerou e ainda gera dúvidas e questionamentos e é fonte de
admiração e críticas, o que leva ao surgimento de mitos e verdades que serão
analisados de acordo com Knapp et al. (2004).

Para saber mais sobre a Psicopatologia e a TCC, leia o artigo


“A Terapia Cognitivo-Comportamental no tratamento dos transtornos
mentais”, de Cordioli e Knapp, publicado em 2008.

A Terapia Cognitivo-Comportamental é o conjunto de técnicas re-


alizadas pela combinação da abordagem cognitiva a um conjunto
de procedimentos comportamentais. Com base nas informações
apresentadas, assinale a alternativa correta:

a) ( ) A principal ideia dessa abordagem é que os pensamentos


distorcidos causam comportamentos disfuncionais.
b) ( ) É uma abordagem focada nos comportamentos do passado e
a relação com as causas do transtorno do cliente.
c) ( ) Busca resolver conflitos inconscientes decorrentes das rela-
ções com os pais na infância.
d) ( ) O seu objetivo é a reeducação dos clientes para a manuten-
ção dos pensamentos e comportamentos inconscientes.
e) ( ) O seu foco está nas relações de transferência e contratrans-
ferência entre terapeuta e cliente.

35
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Resolução: O principal pressuposto da Terapia Cognitivo-Com-


portamental: as distorções dos pensamentos do indivíduo deter-
minam a ocorrência dos comportamentos disfuncionais ou mal
adaptativos. A Terapia Cognitivo-Comportamental é uma abor-
dagem orientada para o presente, para os pensamentos e sen-
timentos conscientes do indivíduo e seus objetivos são buscar
soluções para os problemas do “aqui e agora”, a reeducação dos
clientes para a modificação dos pensamentos e comportamentos
disfuncionais e não se baseia na relação transferencial e con-
tratransferencial entre psicoterapeuta e cliente, como ocorre na
abordagem psicanalítica.

Eysenck e Keane (2017) afirmam que é na contemporaneidade que a TCC


se desenvolve muito e se torna relevante na área de Psicologia Clínica, e que
passa por diversas alterações desde o seu surgimento, mas que a teoria criada
por Aaron e aperfeiçoada por Judith Beck influencia o desenvolvimento de ou-
tras modalidades e de tendências de psicoterapias cognitivo-comportamentais, as
quais são chamadas de terapias da terceira onda.

As terapias da primeira, segunda e terceira onda identificam o desenvolvi-


mento histórico das TCCs:

Primeira onda ou geração – ocorreu nas décadas de 1950 e 1960 com a


terapia comportamental, fundamentada em processos de aprendizagem fun-
damentados na modificação de comportamentos manifestos ou observáveis e a
partir das técnicas de Condicionamento Clássico e Operante, que são inerentes
ao Behaviorismo. Essas abordagens focalizam como se dá a aprendizagem de
comportamentos desejados e indesejados.

Segunda onda ou geração – ocorreu nas décadas de 1970, quando a tera-


pia comportamental foi substituída pela Teoria de Aprendizagem Social, de Ban-
dura, que enfatizava a importância da observação e imitação para a aprendiza-
gem de comportamentos, desde a infância. Em torno de 1970 aparecem as TCCs,
que estudam padrões de comportamentos disfuncionais e como influenciam em
emoções e comportamentos. Dentre essas, destacam-se a Terapia Cognitiva, de
Aaron Beck e a Terapia Racional-Emotiva Comportamental, de Albert Ellis. A partir
de então fica mais evidente a união das técnicas cognitivas e comportamentais,
o que leva ao surgimento da TCC, especialmente, a partir do trabalho de Judith
Beck, que se fundamenta em princípios da aprendizagem e no processamento
cognitivo dos estímulos.

36
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

Terceira onda ou geração – ocorreu a partir do século XXI, mais precisa-


mente em 2005, quando Steven Hayes passou a utilizar o termo terceira onda
para se referir às novas abordagens fundamentadas na TCC. A justificativa para o
surgimento dessa 3ª onda foi a mudança de foco que estava ocorrendo nos pres-
supostos da TCC. A crença da existência de uma 3ª onda de TCC levou a contro-
vérsias já que essa metáfora da chegada de uma “onda” alude à ideia de que o
trabalho das gerações passadas haveria acabado o que não ocorreu. Observa-se
o desenvolvimento de técnicas e métodos de pesquisa mais avançados que es-
clarecem mais ainda os fatores que possibilitam mudanças terapêuticas. Na 3ª
onda surgem as práticas de atenção plena, da aceitação experiencial, do descen-
tramento, da identificação de valores e dos métodos de ampliação da flexibilidade
psicológica que ocorrem diante de evidências que confirmam que essas eficazes.

A Terapia Racional-Emotiva Comportamental de Ellis é definida como:

uma das vertentes da Terapia Cognitivo Comportamental. Des-


contente com o desenvolvimento de seus pacientes em tera-
pia, Ellis observou que estes melhoravam mais rapidamente,
independente do número de sessões semanais, quando o te-
rapeuta tinha um papel mais ativo. [...] De acordo com a TREC,
ao longo da vida as pessoas tendem a desenvolver formas irra-
cionais e extremamente demandantes de pensar sobre si mes-
mas, sobre os outros e sobre a vida, construindo uma forma
disfuncional de viver, vindo a constituir os diversos transtornos
e disfunções que podem acometer o ser humano (PIVETTA et
al., 2019, p. 1).

As pesquisas realizadas identificam métodos que agem melhor em diferentes


populações e sugerem que os terapeutas devem conhecer os métodos das três
gerações de TCC para selecionar as práticas que levem ao tratamento dos pa-
cientes com maior eficácia.

Há maior foco em processos psicológicos, com a abordagem contextual,


que analisa uma gama ampla de abordagens, como as tradições humanísticas,
existenciais, analíticas e espirituais. Há uma redução de escolas de pensamento
científico mais rígidas fechadas através da interdisciplinaridade de saberes que
levem à busca de processos de mudanças mais coerentes e direcionadas para o
desenvolvimento de pessoas e não de portadores de patologias, fundamentados
na crença que a saúde mental é saúde e não a ausência de distúrbio.

Novas abordagens cognitivas e comportamentais emergiram, baseadas em


conceitos contextuais, isto é, focalizadas na relação das pessoas com os seus
pensamentos e emoções, mais do que no conteúdo desses processos.

37
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

As abordagens contextuais estudam fatores como o cultivo da atenção plena,


a metacognição, a aceitação experiencial, o desenvolvimento da compaixão, de
valores e metas. Os novos modelos de intervenção são a Terapia de Aceitação
e Compromisso (ACT), a Terapia Comportamental Dialética (DBT), a Terapia do
Esquema, a Terapia Baseada na Compaixão (CFT), dentre outras.

Terapia Comportamental Dialética


A Terapia Comportamental Dialética (DBT) é um protocolo desenvolvido para
o tratamento de comportamentos suicidas e condutas autolesivas, mas sem inten-
cionalidade suicida, estendido para algumas psicopatologias, como o Transtorno
Da Personalidade Borderline. O seu objetivo é auxiliar pacientes no gerenciamen-
to de suas emoções e no aperfeiçoamento de habilidades comportamentais em
diversos contextos. A Terapia Comportamental Dialética é igualmente utilizada
para o tratamento de outros tipos de problemas, como os distúrbios alimentares e
o abuso de substâncias (LINEHAN, 2017).

Terapia da Aceitação e Compromisso


A Terapia da Aceitação e Compromisso (ACT) é uma abordagem psicotera-
pêutica eficaz para o tratamento de depressão, ansiedade, Transtorno Obsessi-
vo-Compulsivo, dor crônica e quadros psicóticos. Essas estratégias terapêuticas
auxiliam os pacientes a aceitarem as suas experiências emocionais e serem mais
conscientes da função do pensamento em relação ao sofrimento, desenvolvendo
uma clareza acerca de valores pessoais e se comprometendo para realizar as
mudanças comportamentais para se aproximar desses valores, desenvolvendo
assim uma flexibilidade psicológica.

Terapia Focada na Compaixão


A Terapia Focada na Compaixão (TFC), desenvolvida pelo Professor Paul
Gilbert, na Inglaterra, se deu partir de seus estudos sobre a depressão em sua
Tese de Doutoramento, defendida na Universidade de Edinburgh em 1980 (RIZO,
2016).

Paul Gilbert percebeu a existência de um padrão de autocriticismo em pen-


samentos e relatos de pacientes com Depressão Maior e que, quanto mais severo
fosse o padrão de autocriticismo, maiores seriam os índices de vergonha e de
dificuldade de melhora da psicopatologia.

A TFC pretende que os pacientes sejam menos hostis em relação a si mes-


mos e que desenvolvam um Eu Compassivo a partir do processo de Atenção Ple-
na, que auxilia na escolha de comportamentos mais adaptativos diante da percep-
ção de ameaças.

38
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

A Terapia Focada na Compaixão tem como objetivo a compreensão das fun-


ções dos sintomas do paciente e as dificuldades relacionadas as suas estratégias
de segurança, ajudando a compreender melhor como as pessoas processam e
reagem a ameaças.

A formulação de caso envolve a exploração de eventos ocorridos no desen-


volvimento que podem ter sensibilizado os sistemas de ameaça e de proteção e
que contribuíram para o desenvolvimento de estratégias de proteção que agem
automaticamente.

Assim, a Terapia Focada na Compaixão é uma abordagem para atuar com


pacientes com elevados níveis de criticismo, vergonha e com uma regulação
emocional desarmoniosa.

Terapia do Esquema
A Terapia do Esquema, modelo de psicoterapia desenvolvido por Jeffrey You-
ng, direciona-se ao tratamento de Transtornos de Personalidade, depressão crô-
nica e relacionamento de casais e objetiva a identificação e mudança dos esque-
mas iniciais disfuncionais que foram estabelecidos na infância.

Os resultados positivos se aplicam a estudos realizados com pessoas de todas


as idades e com amostras de pacientes depressivos e com sintomas psicóticos.

Esses resultados obtidos com a TCC com diferentes públicos, contextos e


situações vêm tornando as TCCs mais populares e objeto de mais estudos e ob-
servações na atualidade.

Para conhecer mais sobre a terceira onda das TCCs, recomen-


da-se a leitura do livro organizado por Wilson Vieira Melo, intitulado
Estratégias psicoterápicas e a terceira onda em terapia cogniti-
va, da Editora Sinopsys, publicado em 2014.

39
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

5 PRINCIPAIS COGNIÇÕES
DISFUNCIONAIS
Vejamos as características das principais distorções cognitivas, com base
em Knapp e Beck (2008):

Personalização: a pessoa tende a atribuir culpa a si mesma nas mais diver-


sas situações em que vive. É comum que peça desculpas constantemente, ainda
que não tenha toda a responsabilidade ou que o fato não seja diretamente com
ela. Exemplo: alguém que considera que um amigo não conquistou um emprego
porque ele não ajudou o suficiente.

Filtro mental: visão predominantemente negativa sobre a vida. Exemplo: o


aluno que não conseguiu a nota que queria em uma avaliação pode achar que
nunca foi bem nos estudos, ignorando os outros resultados positivos que já obte-
ve antes.

Generalização: estereótipo de pensamento que transforma um caso espe-


cífico em uma regra para a vida. Exemplo: a pessoa citada na distorção acima
considera que sempre se deu mal nas provas e que nunca terá bons resultados
nos estudos.

Maximização e minimização: minimizar conquistas ou aspectos positivos,


maximizar erros e situações negativas que ocorrem. Dá ênfase às falhas e as
considera de sua total responsabilidade, enquanto as realizações são desconsi-
deradas e tratadas como obra da sorte ou da ajuda de outros.

Pensamento dicotômico ou polarizado: a pessoa enxerga a vida a partir


de duas ideias polarizadas (tudo ou nada), ou seja, é um padrão de pensamento
inflexível. Exemplo: dizer que se não ganhar uma promoção no trabalho é porque
é um péssimo funcionário.

Raciocínio emocional: transformação das emoções em fatos sobre a vida.


Exemplo: a pessoa com baixa autoestima pode considerar que ninguém gosta
dela e que ela é péssima em tudo o que faz.

Leitura da mente: Acreditar que sabe o que os outros estão pensando e,


sem qualquer dado concreto ou evidência, inferir o que alguém pensa ou sente a
seu respeito. Esse pensamento disfuncional está ligado à crença central da ne-
cessidade de aprovação. Exemplo: um profissional que não conseguiu uma pro-
moção pode acreditar que isso não ocorreu porque o seu chefe o odeia e ignora
as outras hipóteses prováveis para o acontecimento.

40
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

Catastrofização: esperar, frequentemente, o pior de cada situação de vida.


Apresenta-se associado a alto nível de ansiedade, que leva à evitação de ativida-
des. Exemplo: não andar de avião porque ele vai cair.

Conclusões precipitadas: também chamada de premonição, adivinhação


ou predição do futuro. São as ideias infundadas sobre os acontecimentos que es-
tão por vir. Conclusões irracionais sobre nós mesmos ou outras pessoas. Exem-
plos: “As pessoas não vão gostar de mim”; “não vou me sentir à vontade naquele
ambiente”.

Afirmações “deveria” e “tenho que”: a pessoa faz intensas autocobran-


ças e não aceita as coisas como são. Apresenta pensamento inflexível de como
“deveria ser” o seu comportamento e o dos outros. Está relacionado à baixa au-
toestima, expectativas irreais e intolerância à frustração. Há as demandas abso-
lutistas (“eu tenho que dormir agora”; “eu tenho que brincar com meus filhos”). As
afirmações suscitam um sentimento desprazeroso de obrigação.

Rotulação: em vez de avaliar um erro – próprio ou dos outros –, como even-


tual e aceitável, parte-se para a definição de rótulos pejorativos, como: “Ele é um
inútil, incompetente”; “Ela é falsa e mentirosa”; “Eu sou um fracassado”.

Figura 10 – Rotulação

Fonte: https://bit.ly/3PManYX. Acesso em: 15 dez. 2022.

Atribuição de culpa: na atribuição de culpa ocorre o contrário da personali-


zação. A tendência é procurar por culpados externos e considerar as falhas como
responsabilidade dos outros. Pensamento de que se sente vítima das circuns-
tâncias e não se orienta para mudança. Exemplo: “Meus pais causaram todos
os meus problemas”; “As coisas dão errado para mim, porque tem muita gente
torcendo contra”.

41
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Comparações injustas: fazer comparações irreais entre sua vida e as con-


quistas dos outros, sem avaliar os caminhos trilhados para o outro chegar a tal
ponto. Isso causa um sentimento de inferioridade e insatisfação com os próprios
resultados. Exemplo: “ele é mais bem-sucedido que eu”, “ela conseguiu fazer
aquela viagem, e eu não”. As distorções cognitivas sistemáticas, como a catas-
trofização e o raciocínio emocional ocorrem à medida que esquemas disfuncio-
nais são ativados. As estratégias de enfrentamento para evitar o contato com as
crenças nucleares e subjacentes são as estratégias compensatórias que aliviam o
sofrimento emocional por um breve tempo, mas a longo prazo, podem reforçar e
piorar crenças disfuncionais.

Fórum de discussão

Revise os princípios da TCC descritos por J. Beck (2013) e os análise, junto


com os seus colegas, para verificar a pertinência e coerência desses princípios a
partir dos conceitos e exemplos apresentados na unidade e das ideias anteriores
que você já conhecia sobre essa abordagem.

6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Neste capítulo, tivemos a intenção de apresentar a TCC como uma aborda-
gem psicoterápica que se desenvolveu a partir de formulações e reformulações
teóricas e metodológicas, como as demais abordagens da área de psicoterapia.

O fato de ter se desenvolvido em um contexto dinâmico de formulação, refor-


ça a necessidade de se compreender os pilares desse movimento no decorrer de
sua história, a fim de se estabelecer o seu ponto de partida e de encaminhamento
atual.

Além disso, apresentamos os princípios gerais, conceitos fundamentais e de-


safios contemporâneos da teoria e prática relacionado à TCC.

Analisamos o contexto de surgimento das TCCs, ao tratarmos da Psicologia


Cognitiva, cuja meta é compreender como os processos cognitivos estão envolvi-
dos no comportamento humano. Vimos como as teorias cognitivas foram funda-
mentais para o desenvolvimento do pressuposto da relação entre pensamentos,
sentimentos e comportamentos disfuncionais que trazem prejuízos para a vivên-
cia das pessoas.

Foram estudadas as influências para a elaboração das TCCs e como Aaron


e Judith Beck estabeleceram os fundamentos da abordagem, especialmente, a

42
Capítulo 1 INTRODUÇÃOÀTERAPIACOGNITIVO-COMPORTAMENTALESEUSPRINCÍPIOSGERAIS

partir do tratamento da depressão, com o desenvolvimento de uma abordagem


terapêutica que passa a ser aplicada a outros tipos de transtornos psicológicos.

Foi realizada a apresentação dos itens que compõem o modelo cognitivo


e sua dinâmica, conforme elaborado por Aaron e Judith Beck: crenças básicas/
nucleares, crenças intermediárias, situação/evento, pensamentos automáticos e
reações.

Foram descritas e analisadas as principais disfunções cognitivas como a


personalização, o filtro mental, a generalização, a maximização e minimização, o
pensamento dicotômico ou polarizado, o raciocínio emocional, a leitura da mente,
a catastrofização, as conclusões precipitadas, as afirmações “deveria” e “tenho
que” e a rotulação.

Analisamos alguns dos princípios das TCCs e, ao final, foram discutidas as


três ondas das TCCs e as modalidades mais presentes na atualidade: a chamada
3ª onda, como a Terapia do Esquema, a Terapia Comportamental Dialética, a Te-
rapia da Aceitação e do Compromisso e Terapia Focada na Compaixão.

A intenção da apresentação do conteúdo explicitado acima é alcançar os


objetivos inicialmente propostos para este capítulo, ou seja, ter a compreensão
sobre o desenvolvimento histórico da Terapia Cognitivo-Comportamental; possi-
bilitar o entendimento dos princípios gerais das tendências contemporâneas da
Terapia Cognitivo Comportamental; ser capaz de analisar o papel das disfunções
cognitivas no comportamento; ser capaz de compreender as históricas da Tera-
pia Cognitivo-Comportamental; apresentar os princípios fundamentais da Terapia
Cognitivo-Comportamental e ser capaz de identificar as principais disfunções cog-
nitivas no cotidiano.

REFERÊNCIAS
BECK, J. S. Terapia cognitiva: teoria e prática. Porto Alegre: Artmed, 2021.

BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental. Porto Alegre: Artmed, 2013.

CORDIOLI, A. V.; KNAPP, P. A terapia cognitivo-comportamental no tratamento dos


transtornos mentais. Braz. J. Psychiatry 30 (suppl 2). Out. 2008. Disponível em:
https://doi.org/10.1590/S1516-44462008000600001. Acesso em: 25 jan. 2021.

EYSENCK, M. W.; KEANE, M. T. Manual de psicologia cognitiva. Porto Alegre:


Artmed, 2017. (E-book)

43
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

HAYES, S. C.; HOFMANN, S. G. Terapia cognitivo-comportamental baseada


em processos: ciência e competências clínicas. Porto Alegre: Artmed, 2020.

KNAPP, P. et al. Terapia cognitivo-comportamental na prática psiquiátrica.


Porto Alegre: Artmed, 2004.

LINEHAN, M. Treinamento de habilidades em DBT: manual de terapia


comportamental dialética para o terapeuta. Porto Alegre: ArtMed, 2017.

MATLIN, M. W. Psicologia cognitiva. Rio de Janeiro: LTC, 2004.

MELLO, W. V. Estratégias psicoterápicas e a terceira onda em psicologia


cognitiva. Novo Hamburgo: Sinopsys, 2014.

MORRIS, C. G.; MAISTO, A. A. Introdução à psicologia. São Paulo: Prentice


Hall, 2004.

OLIVEIRA, A. C. Eficácia da terapia cognitivo-comportamental no tratamento


da depressão: revisão integrativa. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas,
15(1), pp.29-27, 2019.

PAPALIA, D. E.; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento humano. Porto Alegre:


AMGH, 2013.

PEARSON CLINICAL BRASIL. História e avanços da terapia cognitivo


comportamental. Youtube, 2 abr. 2018. Disponível em: https://www.youtube.
com/watch?v=9ELNMdaliVI. Acesso em: 25 jan. 2022.

PIVETTA, C. de F. P.; EMMANUEL NOVAES LIPP, M.; FABBRO SPADARI, G.


(orgs.). Terapia racional-emotiva comportamental na teoria e na prática, Novo
Hamburgo, Sinopsys Editora, 2019. Bol. – Acad. Paul. Psicol., São Paulo, v.
39, n. 96, p. 141, jun. 2019. Disponível em: https://bit.ly/3XF9F1o. Acesso em: 6
fev. 2023.

RANGÉ, B. P. Psicoterapias cognitivo-comportamentais: um diálogo com a


psiquiatria. Porto Alegre: Artes Médicas, 2011.

RIZO, L. Terapia focada na compaixão: uma ferramenta potente para a


regulação emocional. 2016. Disponível em: https://bit.ly/3XEZOZm. Acesso em:
25 jan. 2021.

TOURINHO, E. Z. Notas sobre o behaviorismo de ontem e de hoje. Psicologia:


reflexão e crítica, 24(1), 186-194, 2011.

44
C APÍTULO 2
PLANEJAMENTO DO TRATAMENTO
E ESTRUTURA DAS SESSÕES

O presente capítulo tem como objetivo discutir e exemplificar aspectos


relativos ao planejamento das modalidades de tratamento de alguns tipos
de transtornos mentais e da estruturação das sessões de atendimento no
âmbito da psicoterapia cognitivo-comportamental. Dessa maneira, esse
capítulo tratará dos seguintes tópicos:

 Modelo cognitivo e comportamental;


 Conceitualização Cognitiva de Caso;
 Sessões e técnicas em TCC;
 A TCC no atendimento de crianças, adolescentes e /famílias.

Os objetivos de aprendizagem pretendidos neste capítulo são:

 Compreender os processos de avaliação diagnósti-


ca em Terapia Cognitivo Comportamental.
 Analisar a estrutura de sessões em Terapia Cognitivo-Comportamental.
 Identificar as principais técnicas de interveção em Te-
rapia Cognitivo-Comportamental.
 Analisar os modelos cognitivos e comportamen-
tais em Terapia Cognitivo Comportamental.
 Elaborar uma conceitualização cognitiva em Teapia Cognitivo-Comportamental.
 Estruturar sessões e utilizar técnicas em Terapia Cognitivo-Comportamental.

Serão apresentados conceitos teóricos e estudos de caso para abordar os


conteúdos especificados.
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
É importante iniciarmos esse capítulo retomando conceitos vistos no capítulo
I, como por exemplo, que a Terapia Cognitivo-Comportamental – TCC é o ter-
mo que se refere às técnicas que combinam a abordagem cognitiva aos procedi-
mentos comportamentais incluindo a Terapia Cognitiva e combinações de práticas
cognitivas e comportamentais (KNAPP; BECK, 2008).

Aaron T. Beck (1921-2021), o fundador da Terapia Cognitiva (TC), foi o res-


ponsável por formular os princípios de sua proposta, antes do desenvolvimen-
to dos procedimentos terapêuticos. Como docente de psiquiatria na University of
Pennsylvania (EUA), A. Beck traçou diretrizes para o tratamento da depressão,
propondo alternativas além do tratamento dessa condição apenas com medica-
ções. Dessa forma, A. Beck desenvolveu um tratamento psicoterápico para os
pacientes com depressão, expandindo a teoria cognitiva, mas ainda utilizando as
técnicas usuais para o tratamento de outras enfermidades psiquiátricas, como a
ansiedade e os transtornos de personalidade (KNAPP; BECK, 2008).

Ao criar o Beck Institute com a filha e psicóloga Judith Beck, amplia a pesqui-
sa sobre o tratamento de transtornos psiquiátricos e passa a formar psicoterapeu-
tas nos ditames da Terapia Cognitivo-Comportamental na área de saúde mental.

Sobre as abordagens em TCC que se desenvolvem nos anos posteriores à


formulação inicial da teoria por A. Beck, essas se mostram bem-sucedidas. Todas
as formas de TCCs podem ser agrupadas em três categorias:

1) Terapias de habilidades de enfrentamento: levam ao desenvolvimento


de repertórios de habilidades para que o paciente construa os recursos
necessários para lidar com as situações problemáticas do seu cotidiano.
2) Terapia de solução de problemas: enfatizam o desenvolvimento de es-
tratégias para que o paciente seja capaz de lidar com as dificuldades de
caráter pessoal.
3) Terapias de reestruturação: partem do pressuposto de que as dificulda-
des emocionais decorrem de pensamentos desadaptativos e tem como
objetivo a reformulação desses pensamentos.

A principal premissa de todos os tipos de TCC é a ideia de que pensamentos


distorcidos causam comportamentos disfuncionais.

As TCCs são orientadas para o momento atual, com caráter empático e es-
truturado e têm como objetivos:

46
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

• Buscar soluções para os problemas atuais.


• Reeducar pacientes para que sejam capazes de modificar pensamentos
conscientes e os comportamentos disfuncionais.
• Possibilitar mudança cognitiva e comportamental para a melhoria dos
sintomas e do funcionamento pessoal.

2 MODELOS COGNITIVO E
COMPORTAMENTAL
Vamos tratar dos modelos cognitivo e comportamental, os quais são base
para a compreensão da elaboração do processo de conceitualização cognitiva
de caso, que é um procedimento básico no planejamento do tratamento em TCC.

Judith Beck (2021) declara que a Terapia Cognitivo-Comportamental é ela-


borada pelos modelos cognitivo e comportamental, os quais, se fundamentam
na seguinte proposição: emoções, comportamentos e a própria fisiologia de um
indivíduo são influenciados e direcionados pelas percepções do indivíduo sobre
os acontecimentos ao seu redor.

Por sua vez, A. Beck (1997), afirma que cada tipo de transtorno mental tem o
modelo cognitivo específico dependendo da maneira como cada pessoa compre-
ende a sua realidade.

O modelo cognitivo de cada pessoa, de acordo com J. Beck (2021), é com-


posto por três níveis: pensamentos automáticos (PAs); crenças intermediárias e
crenças centrais ou nucleares.

QUADRO 1 – NÍVEIS DE UM MODELO COGNITIVO

FONTE: adaptado de Beck (2021)

47
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Os componentes do modelo cognitivo representam tipos de mecanismos de


enfrentamento das situações reais e da forma de perceber a si, aos outros, o
mundo e o futuro, o que é chamado de tríade cognitiva.

Ao terapeuta cabe elaborar o modelo cognitivo e comportamental, o que irá


levar ao entendimento dos tipos de crenças disfuncionais, de peculiaridades indi-
viduais e de procedimentos e comportamentos utilizados para lidar com as cren-
ças nucleares. Ademais, também cabe ao terapeuta analisar os denominadores
cognitivos em relação às situações de vida, na avaliação feita sobre o paciente.
Em outras palavras, modelos cognitivo e comportamental são apoiados na ideia
de que os transtornos psicológicos são o resultado de distorções de pensamen-
tos e de crenças no processo de compreensão das situações da vida, pois esses
modelos influenciam o desenvolvimento afetivo e comportamental dos indivíduos.

2.1 EXEMPLO DE MODELO


COGNITIVO E COMPORTAMENTAL
DO USO DE SUBSTÂNCIAS COMO
ÁLCOOL E OUTRAS DROGAS
De acordo com Rangé e Marllat (2008), os transtornos associados ao uso de
substâncias podem levar ao surgimento de prejuízos relevantes e graves com-
plicações que são ocasionam a deterioração da saúde global da pessoa, assim
como produzir efeitos negativos nos âmbitos de interação pessoal, social e profis-
sional.

Devido ao grande número de transtornos relacionados ao abuso de substân-


cias que levam à dependência, iremos tratar do transtorno por uso de substâncias
(TUS) pela TCC.

Por exemplo, o consumo de doses altas de álcool de forma regular pode afe-
tar o trato gastrointestinal, os sistemas cardiovascular e nervoso, mediante déficits
cognitivos, de alteração de memória e degeneração do cerebelo. A dependência
de álcool é um grande problema de saúde pública e, mesmo os tratamentos mais
atualizados, apresentam prognósticos desfavoráveis para o alcoolismo e, com um
prognóstico menos favorável para os casos com uso crônico (RANGÉ; MARLATT,
2008). Ainda de acordo com Rangé e Marlatt (2008), a Terapia Cognitivo-Com-
portamental para o tratamento do Transtorno por Uso de Substâncias é bastante
tradicional e utiliza modelos diversificados para a abordagem desses problemas.

48
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

Assim, podemos dizer que a abordagem cognitivo-comportamental para o


Transtorno por Uso de Substâncias não apresenta um padrão fixo, pois são re-
comendados planejamentos flexíveis para abordar esses transtornos (RANGÉ;
MARLATT, 2008).

Os principais efeitos comportamentais trazidos pelas alterações cerebrais no


uso de substâncias podem ser manifestados em recaídas constantes e na fissura
por drogas. A abordagem de longo prazo pode ser vantajosa para o tratamento
desses efeitos da droga (RANGÉ; MARLATT, 2008).

A Terapia Cognitivo-Comportamental utiliza o conceito de dependência quí-


mica como um transtorno relacionado ao tipo de relação estabelecida, de forma
inadequada, por uma pessoa com o uso ou consumo de substâncias específicas,
que podem ir da cafeína até as drogas ilícitas, conforme afirmar Rangé e Marllat
(2008).

O Manual Estatístico e Diagnóstico dos Transtornos Mentais – DSM – V – TR


(APA, 2022) estabelece os critérios diagnósticos para o Transtorno por Uso de
Substâncias. Para o diagnóstico, deve haver um padrão problemático de uso de
substâncias, que comprometa ou leve a sofrimento significativo, por pelo menos
dois dos critérios a seguir, em um período de mínimo de 12 meses:

O diagnóstico do Transtorno por Uso de Substâncias se funda-


menta na identificação de padrão de comportamentos de caráter pa-
tológico nos quais o paciente mantém o uso de uma substância mes-
mo que essas causem problemas significativos (CORDEIRO, 2018).
Fonte: CORDEIRO, D. C. Transtornos por uso de substâncias – con-
ceituação e modelos teóricos. In: ZANELATTO, N. A.; LARANJEIRA,
R. (orgs.). O tratamento da dependência química e as terapias
cognitivo-comportamentais. Porto Alegre: Artes Médicas, 2018.

49
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

QUADRO 2 – CRITÉRIOS PARA ESTABELECIMENTO DE


TRANSTORNO POR USO DE SUBSTÂNCIAS

FONTE: adaptado de APA (2022)

Ainda, outros critérios relativos ao uso de substâncias são o desenvolvimento


de:

QUADRO 3 – OUTROS CRITÉRIOS PARA DIAGNÓSTICO


DE TRANSTORNO POR USO DE SUBSTÂNCIAS

FONTE: adaptado de APA (2022)

De maneira semelhante ao tratamento de outros transtornos psiquiátricos,


como a depressão e a ansiedade, o modelo cognitivo do uso de substâncias
baseia-se na ideia de que as experiências nas fases iniciais da vida são funda-

50
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

mentais para o desenvolvimento desses problemas (RANGÉ; MARLATT, 2008).


Entende-se que essas experiências são grandes influenciadores para o favoreci-
mento de construção das crenças centrais ou nucleares e crenças intermediárias
sobre o uso de substâncias. Um exemplo é a exposição à experiência com uso
de drogas, pois o desenvolvimento de crenças relacionadas ao uso dessas subs-
tâncias é mais facilmente desenvolvido com essas experiências, que se tornam
facilitadoras de uso.

O uso de drogas inicia-se de forma associada à presença de estímulos inter-


nos/externos que favorecem o risco de uso como a visita a bares, cansaço excessi-
vo, tédio ou tristeza após meses de abstinência de uso (RANGÉ; MARLATT, 2008).

Essas situações, segundo Rangé e Marlatt (2008), poderão ativar as crenças


nucleares e intermediárias do indivíduo quanto aos efeitos de uso da substância
como “eu sou mais sociável quando bebo” e de pensamentos automáticos como
“vou beber só um pouquinho” e “todos estão se divertindo e eu também mereço
me divertir”. A consequência diante dessas crenças e pensamentos é ativar a fis-
sura acompanhada da necessidade de ir ao banheiro no ritual de obter “uma car-
reira” de cocaína, o que levará à ativação das crenças facilitadoras como “todos
estão usando; vai ser só uma carreira” e, assim, poderá haver a busca ativa pela
substância.

FIGURA 1 – EXEMPLO DE MODELO COGNITIVO E


COMPORTAMENTO DE UMA PESSOA COM TUS

FONTE: a autora

Em síntese, podemos afirmar que o modelo cognitivo e comportamental é a


maneira como as pessoas se sentem e se comportam e está relacionada à for-
ma como cada indivíduo interpreta as situações, de modo que os pensamentos
alterem ou mantenham as emoções disfuncionais, afetando os comportamentos
emitidos.

51
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

As crenças básicas ou nucleares influenciam o desenvolvimento


de outro tipo de crenças, que estão envolvidas nos pressupostos,
comportamentos e regras e que influenciam afetos e comporta-
mentos.

Com base nas informações apresentadas, assinale a alternativa


correta sobre as crenças nucleares:

a) ( ) As crenças nucleares do modelo cognitivo são os aspectos


cognitivos que ocorrem de maneira individualizada e automática.
b) ( ) Crenças nucleares são compostas pelas ideias, regras, atitu-
des, pressupostos e afirmações “se... então”.
c) ( ) As crenças nucleares do modelo cognitivo estão relacionadas
aos pensamentos automáticos e às crenças intermediárias.
d) ( ) As crenças nucleares formam um conjunto de ideias indepen-
dentemente umas das outras que dão sentido ou significado ao
mundo do cliente.
e) ( ) Crenças nucleares também são chamadas de pressupostos
subjacentes ou condicionais e de crenças associadas.

Resolução: Define-se como as crenças centrais ou nucleares, as


ideias e pressupostos que são elaboradas no decorrer da infân-
cia através das interações sociais de cada pessoa e da vivência
de experiências que as fortalecem e estão relacionadas ao indi-
víduo, às pessoas ou ao mundo ao redor. Têm caráter global, ge-
neralizável e rígido e, no modelo cognitivo, estão associadas aos
pensamentos automáticos e às crenças intermediárias. As cren-
ças intermediárias e não as nucleares são compostas por ideias,
regras, atitudes, pressupostos e afirmações “se... então” e ainda
são as que compõem o conjunto de ideias associadas umas às
outras e que atribuem sentido ou significado ao mundo e são cha-
madas de pressupostos subjacentes ou de crenças associadas.

52
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

3 CONCEITUALIZAÇÃO COGNITIVA
DE CASO
A avaliação na TCC é iniciada através da realização da chamada anamnese
do cliente.

A anamnese é uma entrevista com os pais ou represen-


tantes legais de uma criança ou com o indivíduo adulto em
atendimento sobre a história de vida do cliente e é realizada
para a coleta de dados sobre a gestação até os dias atuais,
iniciando a busca por hipóteses que serão confirmadas ou des-
cartadas durante todo o processo de diagnóstico.

Após a realização da anamnese, realiza-se a conceitualização ou conceitua-


ção cognitiva de caso, que é uma espécie de “mapa” que orienta o trabalho a ser
realizado com o cliente (BECK, 2013).

A conceitualização cognitiva de caso é uma metodologia usada pelo terapeu-


ta para descrever e explicar as dificuldades do paciente e deve ser desenvolvida
de forma colaborativa.

Esse processo acontece porque cada cliente constrói, através dos seus
aprendizados e de experiências vividas, uma forma de pensar, de sentir e de se
comportar, que são a combinação das ideias, interpretações e pressuposições
feitas acerca das pessoas e do mundo (KNAPP, 2004).

A conceitualização cognitiva envolve, inicialmente, a coleta de dados sobre


as queixas e demandas do cliente. Por exemplo, deve-se buscar com o cliente a
sua explicação sobre os motivos atribuídos para o desenvolvimento das dificulda-
des que está vivenciando, porque ele acha que essas dificuldades se mantêm e
a possibilidade de se prever alterações sobre o comportamento em determinadas
condições.

Nessa coleta de dados pode ser realizada uma listagem dos problemas do
cliente, organizada a partir das mais importantes, as quais devem ser abordadas
prioritariamente na terapia ou ainda, nível de ameaça que possuem sobre a inte-

53
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

gridade física e psicológica do cliente, complexidade e centralidade dos proble-


mas na vida do indivíduo.

J. Beck (2021) afirma que cabe ao terapeuta decidir quando, como e quanto
sobre a conceitualização cognitiva elaborada por ele será compartilhada com o
cliente, pois deve-se considerar se esses dados farão sentido e se serão úteis
para ele, porém, há autores que enfatizam a importância de que o processo todo
seja desenvolvido de modo colaborativo com o cliente (KNAPP; BECK, 2008).

Através da conceitualização cognitiva aumenta-se a adesão do cliente à te-


rapia, pois, após a sua concretização é possível observar aumento da motivação
e da compreensão do processo psicoterápico por parte do cliente e do terapeuta.
Judith Beck (2021) afirma que a conceitualização cognitiva é o elemento vital da
TCC.

De acordo com J. Beck (2013, p. 54), para dar início ao processo de con-
ceitualização cognitiva, o psicoterapeuta deverá formular os seguintes questiona-
mentos:

Qual é o diagnóstico do paciente?


Quais são seus problemas atuais? Como esses problemas se
desenvolveram e como são mantidos?
Que pensamentos disfuncionais e crenças estão associados
aos problemas? Que reações (emocionais, fisiológicas e com-
portamentais) estão associadas a esses pensamentos?

Em seguida, deve-se formular as hipóteses de como o cliente desenvolveu o


transtorno psicológico:

Como o paciente vê a si mesmo, os outros, seu mundo pessoal


e o seu futuro?
Quais são as crenças subjacentes do paciente (incluindo atitu-
des, expectativas e regras) e pensamentos?
Como o paciente está enfrentando suas cognições disfuncio-
nais?
Que estressores (precipitantes) contribuíram para o desenvol-
vimento dos seus problemas psicológicos atuais ou interferem
na resolução desses problemas?
Se relevante, que experiências anteriores podem ter contribu-
ído para os problemas atuais do paciente? Que significado o
paciente extraiu dessas experiências e que crenças se origina-
ram delas ou foram fortalecidas por essas experiências?
Se relevante, que mecanismos cognitivos, afetivos e comporta-
mentais (adaptativos ou desadaptativos) o paciente desenvol-
veu para enfrentar essas crenças disfuncionais? (BECK, 2013,
p. 54).

54
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

O terapeuta utiliza a conceitualização cognitiva para obter uma estrutura de


compreensão de caso de cada cliente, o que irá auxiliar no planejamento das es-
tratégias terapêuticas que serão utilizadas ao longo do tratamento.

A conceitualização cognitiva do cliente é essencial para a determinação do


trajeto mais eficiente para a realização do tratamento terapêutico, já que esse au-
xilia na escolha de quais metas serão trabalhadas e através de quais intervenções
terapêuticas (KNAPP; BECK, 2008).

A ausência da compreensão cognitiva do cliente leva o tratamento a se con-


figurar simplesmente como uma aplicação de técnicas cognitivas e comportamen-
tais, o que não resulta em benefícios. Ainda, a elaboração da conceitualização
cognitiva individual irá ajudar a reforçar um trabalho mais produtivo entre terapeu-
ta e cliente e deve ser usada para a compreensão dos problemas eventuais que
ocorrem no tratamento (KNAPP; BECK, 2008).

A conceitualização cognitiva começa logo no primeiro contato com o paciente


e é aperfeiçoada em cada sessão. De acordo com J. Beck (2021), há o levanta-
mento de hipóteses sobre o cliente, fundamentado não apenas na conceitualiza-
ção cognitiva do caso, mas também nos dados específicos que são apresentados.
A partir daí o terapeuta poderá confirmar, rejeitar ou modificar as hipóteses no
decorrer da apresentação de novos dados.

Dessa maneira, a conceitualização cognitiva (ou de caso) é um trabalho re-


alizado constantemente em um tratamento, pois a psicoterapia é dinâmica e os
novos dados clínicos vão surgindo, levando à necessidade de alteração e atuali-
zação do processo.

O processo de elaboração da conceitualização cognitiva se inicia pela fase


de avaliação, que é o momento de descrição das dificuldades atuais, em termos
cognitivos e comportamentais.

A Terapia Cognitivo-Comportamental realiza uma avaliação global, para for-


mular o caso adequadamente, conceituar o cliente e estabelecer o planejamento
do tratamento.

O processo de avaliação não está delimitado ao primeiro encontro com o


cliente, pois a coleta de dados para se confirmar, alterar ou acrescentar elemen-
tos ao diagnóstico e conceituação é constante.

Os objetivos da sessão de avaliação, de acordo com J. Beck (2013, p. 71),


são:

55
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Formular o caso e criar uma conceituação cognitiva inicial do


paciente.
Definir se você é o terapeuta apropriado.
Definir se você pode oferecer a “dose” apropriada de terapia (p.
ex., se você só pode oferecer terapia semanal, mas o paciente
precisa de um programa diário).
Definir se há indicação de tratamentos concomitantes (como
medicação).
Dar início a uma aliança terapêutica com o paciente (e com
familiares, se for relevante).
Começar a familiarizar o paciente na estrutura e no processo
da terapia.
Identificar problemas importantes e definir objetivos amplos.

Na avaliação, pergunta-se ao cliente como passa o seu tempo, descrevendo


um dia típico para oferecer uma visão da sua experiência diária e facilitar o esta-
belecimento dos objetivos específicos na primeira sessão do tratamento.

Deve-se ainda ficar atento a variações no humor, se há interação com a fa-


mília, amigos e pessoas no contexto profissional, como é o seu comportamento
em casa, no trabalho e em outros locais de convívio e como passa o tempo livre.

Ainda na fase de avaliação, o terapeuta deverá conhecer as áreas da experi-


ência atual e passada do cliente para o desenvolvimento do planejamento de tra-
tamento, planejar as sessões de tratamento, desenvolver um bom relacionamento
terapêutico e guiar o cliente na definição dos objetivos para que o trabalho seja
efetivo.

Outra questão que se apresenta na avaliação é que, além de determinar os


motivos pelos quais o cliente não consegue resolver alguns problemas, o terapeu-
ta deve conduzir o processo terapêutico e os objetivos a serem atingidos.

De forma geral, as três principais diretrizes sobre a conceitualização cogniti-


va são:

1. Os níveis de conceitualização;
2. O empirismo colaborativo;
3. A incorporação dos pontos fortes do cliente e sua resiliência.

Os níveis de conceitualização se dividem em nível descritivo, quando os


problemas são detalhados; nível explanatório, em que se busca a compreensão
sobre a manutenção dos sintomas; e o nível inferencial, em que se busca a expli-
cação dos fatores históricos predisponentes e protetores no desenvolvimento das
dificuldades do indivíduo.

56
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

O empirismo colaborativo é o método que aciona o processo de conceitua-


lização; há a combinação das perspectivas do terapeuta e do cliente para o de-
senvolvimento de uma compreensão compartilhada do cliente, o que favorece a
obtenção de informações que irão auxiliar na resolução dos problemas apresenta-
dos. O terapeuta apresenta as informações teórico-práticas e resultados de pes-
quisa em TCC e o cliente apresenta o conhecimento sobre as suas demandas e
os fatores que contribuem para sua vulnerabilidade e resiliência. É baseado em
experiências de tomada de decisões clínicas e as hipóteses formuladas pelo te-
rapeuta e cliente são analisadas e adaptadas por meio do feedback das interven-
ções terapêuticas realizadas (KUYKEN; PADESKY; DUDLEY, 2008).

A terceira diretriz é a incorporação dos pontos fortes do cliente e de resiliên-


cia, os quais devem ser trabalhados nos estágios de elaboração da conceituali-
zação. Embora, tradicionalmente, os problemas do cliente já tenham sido enfati-
zados, o modelo da conceitualização de casos colaborativa incorpora os pontos
fortes do cliente a essa prática (NEUFELD; CAVENAGE, 2010).

Resiliência ou resilência é um termo emprestado da Física e


se refere à propriedade de que são dotados alguns materiais de re-
sistirem aos choques ou outros tipos de pressão e depois voltarem
ao estado normal, como o aço inoxidável. Na Psicologia, significa a
capacidade que uma pessoa tem de, ao passar por uma situação
muito grave e dolorosa, conseguir se sair bem e retornar ao seu es-
tado anterior sem muita dificuldade. Pessoas resilientes conseguem
superar as dificuldades da vida sem se desesperar e buscar solu-
ções de maneira ativa para as suas dificuldades, mesmo sob enorme
pressão psicológica.

Nesse momento, o terapeuta observa os recursos do cliente e o auxilia a for-


talecer e usar esses mecanismos no enfrentamento de suas dificuldades. Enfatiza
os pontos fortes do cliente, ampliando os resultados da terapia e constrói um traje-
to mais seguro para uma reabilitação mais duradoura, favorecendo a retomada do
funcionamento adequado, o aumento da qualidade de vida e o fortalecimento da
resiliência (KUYKEN; PADESKY; DUDLEY, 2008).

57
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

FIGURA 2 – METÁFORA DA RESILIÊNCIA

FONTE: https://bit.ly/3XFtu8O. Acesso em: 9 jan. 2023.

3.1 TIPOS DE CONCEITUALIZAÇÃO


COGNITIVA DE CASO
Para cada cliente e transtorno psicológico deve ser realizada uma conceitua-
lização cognitiva específica, pois essa se relaciona a determinados pensamentos
automáticos (PAs), crenças intermediárias e crenças centrais.

Segundo J. Beck (2021), pessoas com crenças centrais negativas sobre si


mesmas podem apresentar conceitualizações nas categorias de desamparo (com
intenso sentimento de incompetência), desamor (intensa percepção de desmere-
cimento de amor das outras pessoas) e desvalorização (intenso significado nega-
tivo da sua natureza). Essas crenças também são chamadas de desadaptativas
ou disfuncionais.

As crenças centrais negativas aparecem ativadas quando o cliente inicia a


terapia, mas é importante que o terapeuta esteja ciente de que existem crenças
centrais que expressam ideias contrárias às expostas nas categorias acima.

O entendimento adequado do sistema de crenças é feito pelo conceito de


estratégias compensatórias, que são os comportamentos que nós apresenta-
mos, eventualmente, em nosso cotidiano e que nos causam sofrimento quando
são executadas excessivamente em detrimento de outros comportamentos mais
funcionais. Atuam como uma forma de reforçar o sistema de crenças e quando
são disfuncionais acabam por auxiliar na manutenção dos sintomas e no sofri-
mento dos clientes (KNAPP; BECK, 2008). Portanto, é necessário avaliar a forma
como as estratégias compensatórias são utilizadas e sua rigidez no cotidiano do
cliente para que sejam criadas expectativas realistas na orientação do tratamento
(BECK, 2013).

58
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

A conceitualização cognitiva deve ser baseada na sintomatologia, no históri-


co e no funcionamento neurocognitivo do cliente, pois esses aspectos influenciam
no desenvolvimento do tratamento já que os clientes com bom histórico pré-mór-
bido (antes do início dos sintomas) e um nível mais elevado de funcionamento psi-
cológico podem ser tratados através de algumas técnicas cognitivas mais simples
(NEUFELD; CAVENAGE, 2010).

No entanto, no caso de clientes que apresentarem comprometimento neuro-


cognitivo significativo, como no caso de transtornos neurológicos, a terapia deve-
rá ser mais diretiva, com mais sessões individuais e oferecimento de explicações
em termos mais simples, a fim de que o cliente seja capaz de compreender e
relembrar (KNAPP; BECK, 2008).

3.2 DELINEAMENTO DA
CONCEITUALIZAÇÃO COGNITIVA E
PLANEJAMENTO DE TRATAMENTO
O passo inicial para o delineamento da conceitualização cognitiva é a síntese
das informações coletadas na avaliação, as quais devem ser analisadas junta-
mente com os dados da formulação cognitiva, que é a identificação das crenças
básicas e dos padrões de comportamento e da hipótese diagnóstica do cliente
(BECK, 2013).

A partir daí o terapeuta levanta as hipóteses acerca dos motivos do desen-


volvimento do transtorno psicológico do cliente, através dos seguintes questiona-
mentos:

• Quais os eventos do início da vida podem ter contribuído para o desen-


volvimento das crenças nucleares negativas do cliente?
• Quais são as crenças nucleares do cliente?
• O que precipitou o aparecimento do transtorno psicológico?
• De que maneira o pensamento e comportamento do cliente vêm contri-
buindo para a manutenção do seu transtorno psicológico?

Posteriormente, faz-se a conceitualização cognitiva, identificando-se o mo-


delo cognitivo (as crenças nucleares, crenças secundárias, os pensamentos au-
tomáticos e como essas se relacionam), para o desenvolvimento do plano de tra-
tamento.

59
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Iremos apresentar, a seguir, uma proposta de sistematização de conceitua-


lização cognitiva baseada na obra de Neufeld e Cavenage (2010). A proposta foi
formulada como recurso para a formação de terapeutas cognitivo-comportamen-
tais.

Não é uma formulação de caso, mas sim orientações que auxiliam os tera-
peutas iniciantes a desenvolverem habilidades de conceitualização cognitiva de
casos, fundamentadas em literatura especializada em TCC.

A sistematização é apresentada em etapas, apesar de sabermos que o pro-


cesso de conceitualização cognitiva não ocorre de forma separada pois cada
cliente tem um período para assimilar os conceitos que são discutidos no proces-
so terapêutico, assim como cada terapeuta possui a sua forma própria de condu-
ção do tratamento.

Etapa 1: Antes da conceitualização

Antes de iniciar a conceitualização, o terapeuta deve realizar a psicoeduca-


ção.

A psicoeducação é uma das técnicas mais utilizadas pela TCC e tem como
função orientar o cliente em relação às consequências de um determinado com-
portamento, a construção de crenças, os valores e sentimentos e como todos es-
ses elementos influenciam a sua vida e a dos outros (BECK, 2021).

A seguir, deve-se apresentar o modelo cognitivo do cliente que é o primeiro


passo de uma conceitualização cognitiva eficiente. Porém, é essencial que o tera-
peuta verifique se o cliente compreendeu o modelo cognitivo e as relações entre
pensamento – emoção – comportamento, para dar início ao processo de conceitu-
alização do sistema de crenças.

Uma forma de apresentar o modelo cognitivo ao cliente se dá através de


diagramas, os quais irão ilustrar a inter-relação entre sentimentos, pensamentos e
comportamentos, partindo-se da exemplificação sobre como um comportamento
disfuncional se conecta ao sofrimento do cliente.

O Diagrama de Conceitualização Cognitiva (DCC) é um recurso bastante


usado na TCC e tem como objetivo elucidar pensamentos automáticos, crenças
centrais e intermediárias (quando possível) relativos aos comportamentos, a fim
de que o cliente possa visualizar os seus padrões comportamentais.

60
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

Antes de iniciar o processo de conceitualização cognitiva com o cliente, o


terapeuta deverá preencher o diagrama de conceitualização com as informações
coletadas na(s) sessão(ões).

A conceitualização avalia a habilidade de se propor mudanças para o cliente,


o qual tem a oportunidade de conhecer, de forma clara e objetiva, a compreensão
que a TCC obtém sobre o seu funcionamento psicológico, agindo como uma for-
ma de psicoeducação e de intervenção sobre seu modelo cognitivo.

Etapa 2: Levantamento de situações

A etapa 2 se refere não somente ao levantamento de situações, mas dos


pensamentos, emoções, comportamentos e das reações fisiológicas no dia a dia
do cliente (NEUFELD; CAVENAGE, 2010).

A etapa inicial da conceitualização cognitiva envolve um corte transversal (ao


longo da vida) dos pensamentos, emoções e comportamentos do cliente em algu-
mas situações. Nesse momento, é importante explicar para o cliente o significado
de uma situação, pensamento, comportamento, emoção ou sentimento e reação
fisiológica.

Como existem muitos tipos diferentes de cognições (pensamentos) que po-


dem ser trabalhadas neste momento, caberá ao terapeuta atentar para algumas
cognições como, por exemplo, as expectativas sobre si mesmo, os outros, o mun-
do e o futuro.

As emoções e sentimentos devem ser explicadas e exemplificadas, tanto os


sentimentos mais subjetivos quanto as reações fisiológicas que estão vinculadas
a esses sentimentos.

Em relação aos comportamentos, estes contemplam todas as ações (ou au-


sência de ação) que o cliente apresenta. Pode ser relevante analisar, nesse mo-
mento, o significado das expressões “eu não fiz nada” ou “eu deixei pra lá”, pois
essas podem ser interpretadas como falta de ação quando, efetivamente, podem
expressar estratégias de evitação (NEUFELD; CAVENAGE, 2010).

Uma das primeiras intervenções a serem feitas com o cliente é ensiná-lo a


identificar os PAs que aparecem nos momentos das maiores dificuldades, as suas
consequências nas emoções, e comportamentos e como o cliente responde a es-
ses pensamentos, da forma mais eficaz.

O ensino feito pelo terapeuta se dá através da chamada “descoberta guia-


da”, que é a utilização de uma situação vivida pelo cliente para se identificarem

61
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

os componentes iniciais da conceitualização. Se ainda for necessário explicar de


maneira mais didática, pode-se utilizar uma situação observada pelo terapeuta
em alguma das sessões como um exemplo ou ainda utilizar situações cotidianas.

Ao utilizar exemplos cotidianos do cliente no funcionamento do modelo cog-


nitivo, deve-se repetir a mesma atividade como tarefa de casa.

A tarefa de casa é a solicitação ao cliente para identificar as situações da


vida que lhe causam incômodo, dúvidas, incertezas, frustrações, tristeza, raiva e
outros sentimentos desconfortáveis.

As situações listadas devem abranger diversas áreas da vida; no início, o


cliente deve identificar situações mais genéricas, até o momento em que entenda
bem a atividade, passando a indicar situações mais específicas.

Knapp (2004) propõe que, durante o processo continuado de conceitualiza-


ção cognitiva, inicialmente, o terapeuta dirija mais a atividade até quando perce-
ber que o cliente está aprendendo a se conhecer cognitivamente.

Na elaboração da conceitualização cognitiva, deve-se solicitar que o cliente


aponte três situações características de seu funcionamento psicológico no dia a
dia. Após essa indicação, deve-se pedir ao cliente que descreva as suas expe-
riências infantis mais significativas com familiares ou outras pessoas. Tal levan-
tamento é recomendado porque, segundo a proposta cognitivo-comportamental,
foram essas experiências que fortaleceram as crenças do cliente sobre si mes-
mo e o mundo e ainda, porque segundo J. Beck (1997), a TCC tem como uma
de suas características fundamentais utilizar dados oferecidos diretamente pelo
cliente para a elaboração da conceitualização.

Após a coleta de um montante de informações significativas sobre o cliente


pelo terapeuta, que servem para auxiliá-lo a identificar os pensamentos, emoções
e comportamentos nas situações, dá-se início ao processo de construção colabo-
rativa da conceitualização propriamente dita, porém Neufeld e Cavenage (2010,
p. 24) alertam que

[...] não se deve apresentar o cliente para ele mesmo, como


se o terapeuta soubesse tudo a seu respeito e não lhe desse
a oportunidade de pensar acerca de si mesmo. A ideia é que
cada um dos passos seja feito com o cliente, para que ele pos-
sa identificar sua maneira de pensar, sentir e agir. Por isso,
essa primeira fase da conceitualização cognitiva é tão impor-
tante.

62
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

Assim, é o cliente quem deve redigir o seu Diagrama de Conceitualização


durante a sessão e excepcionalmente, quando o cliente não sabe escrever ou tem
dificuldades para fazê-lo, o terapeuta o fará.

Outra advertência feita por Neufeld e Cavenage (2010) é sobre o uso de mui-
tas palavras técnicas pelo terapeuta, especialmente, os iniciantes, para explicar o
modelo cognitivo e o sistema de crenças ao cliente. A orientação por supervisores
e a prática farão com que esses terapeutas busquem novas maneiras mais ade-
quadas e significativas para explicar os termos para os clientes.

Um dos maiores desafios para o terapeuta é auxiliar o cliente a identificar os


PAs, e isso depende da clareza do terapeuta na explicação para o cliente sobre o
significado de PAs. A ideia deve ser sempre de auxiliar na compreensão da função
dos PAs no funcionamento psicológico e gerar mais interpretações para cada si-
tuação analisada.

Etapa 3: O registro no Diagrama de Conceitualização Cognitiva

Como vimos acima, o Diagrama de Conceitualização Cognitiva (DCC) de J.


Beck (1997) é utilizado para o levantamento de situações da vida do cliente.

Para J. Beck (2021) esse recurso auxilia a organizar as informações coleta-


das com o cliente, a identificação das crenças, das estratégias compensatórias,
a compreensão dos fatores que levaram ao desenvolvimento das crenças e de
como as estratégias compensatórias se vincularam às crenças centrais, assim
como ajudam na organização das metas da terapia.

Knapp e Rocha (2003) afirmam que o DCC pode ser utilizado tanto na ses-
são com o cliente quanto como exercício para o terapeuta, sempre a fim de se
realizar a avaliação cognitiva do cliente, e ainda como tarefa de casa. Para reali-
zar o preenchimento do DCC é necessário que o terapeuta e cliente selecionem
os problemas mais característicos, que ilustram os temas dos PAs e o modo de
funcionamento do cliente. Isso evita que as crenças mais importantes sejam igno-
radas e que a conceitualização seja realizada de forma errada.

O Diagrama deve conter três classes de crenças centrais: a) uma classe re-
ferente ao próprio cliente (sobre si mesmo); b) uma classe de crenças em relação
aos outros (sobre os outros) e/ou o mundo (sobre o mundo); c) uma classe de
crenças quanto ao futuro (sobre o futuro).

63
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Etapa 4: Identificação dos significados dos Pas

Posteriormente ao registro de situações no Diagrama de Conceitualização


Cognitiva, solicita-se ao cliente que indique o que essas situações apontadas têm
em comum (BECK, 1995).

Inicialmente é usual que os clientes identifiquem as suas reações como fre-


quentes e essa percepção deve ser enfatizada pelo terapeuta, para que o cliente
perceba os padrões comportamentais, emocionais e cognitivos.

Então, o foco do terapeuta deve ser direcionado para a análise das seme-
lhanças dos significados dos PAs. Deve-se explicar ao cliente que os pensamen-
tos automáticos revelam o que “ele acredita sobre si, e que se ele pensa de uma
determinada maneira a seu respeito” (NEUFELD; CAVENAGE, 2010, p. 24).

Ao se indagar “o que isso significa sobre mim?”, o cliente inicia indiretamente


a identificação das suas crenças centrais. Essa atividade pode “gastar” bastante
tempo de trabalho do terapeuta com o cliente, mas a partir da análise dos signifi-
cados dos PAs, o processo de identificação das crenças centrais é facilitado.

É fundamental avaliar, de forma sistemática, com o cliente se os significados


fazem sentido para ele, se é possível generalizá-los em sua vida ou são restritos a
uma determinada área (NEUFELD; CAVENAGE, 2010).

A identificação entre as semelhanças e diferenças dos registros irá ajudar na


elaboração do cliente sobre as informações trazidas pelo psicoterapeuta e na per-
cepção de quantas vezes as crenças têm determinado a sua vida.

Etapa 5: Crenças centrais, intermediárias e estratégias compensatórias

Essa etapa diz respeito à identificação das crenças centrais e intermediárias.


Nesse momento, explica-se ao cliente que as interpretações que ele faz das situ-
ações são as formas de compreender o mundo e que esses modos de pensar são
construídos “a partir das experiências de cada indivíduo e estão relacionados com
a maneira como cada pessoa se sente e se comporta” (NEUFELD; CAVENAGE,
2010, p. 24).

J. Beck (2021) orienta que, após as PAs e seus significados serem identifica-
dos, deve-se iniciar o trabalho sobre as crenças centrais, crenças intermediárias e
estratégias compensatórias no Diagrama de Conceitualização Cognitiva.

Para isso utilizam-se técnicas específicas para ajudar o cliente na identifica-


ção do que ele pensa sobre si mesmo, dos outros, do mundo e do futuro.

64
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

A atividade propõe que cada cliente complete as frases “eu sou...”, “os outros
são...”,“o mundo é...” e “o futuro é...” a partir dos significados dos PAs identifica-
dos anteriormente (NEUFELD; CAVENAGE, 2010).

Não há necessidade de que o cliente use termos técnicos nem palavras com-
plicadas para identificar as suas crenças centrais como vulnerável, inadequado;
persecutórios, entre outras.

Mas, é importante que ele identifique como se dá o funcionamento do seu


sistema de crenças, com o uso de sinônimos dos termos usados e que sejam co-
erentes para entender a sua realidade, como, para a crença de vulnerabilidade é
“estou em perigo” ou “sou inseguro” (NEUFELD; CAVENAGE, 2010).

Finalizada a identificação das crenças centrais, inicia-se o mesmo processo


com as crenças intermediárias. Uma maneira simples de realizar essa identifi-
cação é solicitar ao cliente que altere as frases das crenças centrais para “se...
então...”.

O cliente deve completar o exercício com o maior número de frase possíveis,


capazes de expressar o que ele pensa sobre a relação com as crenças interme-
diárias. Uma observação importante é que as crenças intermediárias podem ser
diferentes e, até mesmo, antagônicas, de um cliente para o outro.

Por exemplo, as crenças como “se eu sou incapaz, então eu preciso me es-
forçar mais para ser perfeito para que ninguém note a minha incapacidade” ou
“se eu sou incapaz, então nada que eu faça vai fazer diferença, portanto, não vou
nem tentar” (NEUFELD; CAVENAGE, 2010, p. 25).

Ao final, o mesmo trabalho deve ser feito sobre as estratégias compensató-


rias (EC). Sobre estas estratégias, deve-se entender que há reações diversas que
podem funcionar como estratégias compensatórias (EC), em relação a cada caso.

Nessa etapa de conceitualização cognitiva, é importante que o cliente perce-


ba quais reações são emitidas mais frequentemente e as que permitem a ativação
de um ciclo disfuncional de crenças.

O processo de identificação e repetição dos padrões comportamentais pode


ser retomado, pois auxilia na identificação das ECs; terapeuta e cliente devem se
centrar nas ECs mais típicas e prejudiciais e que determinam a retroalimentação
do ciclo disfuncional de crenças.

Encerra-se essa etapa com um processo de checagem e de reflexão com o


cliente, solicitando-se a ele que analise os aspectos levantados e avalie quanto e

65
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

como esses aspectos são representativos no seu funcionamento psicológico, em


outras palavras o quanto ele se percebe na conceitualização (NEUFELD; CAVE-
NAGE, 2010).

Este momento tende a ser produtivo e permite vários insights; o cliente cos-
tuma relatar que esse processo o faz entender de suas várias reações em seu
cotidiano. Com isso, um dos objetivos da conceitualização cognitiva é atingido, ou
seja, auxiliar o cliente a compreender o seu modo de funcionamento psicológico.

Etapa 6: Fundamentar a ideia cíclica do sistema de crenças e estabele-


cer metas para a intervenção

Esta etapa tem como objetivo analisar quanto o cliente compreendeu sobre
o funcionamento cíclico do seu sistema de crenças. Sugere-se solicitar a este que
identifique essa natureza cíclica em sua vida.

Para o encerramento desse momento da conceitualização, deve-se retomar


a “visão normalizadora dos conteúdos identificados, pois muitos clientes podem
experienciar um misto de alívio e culpa ao tomar conhecimento destes aspectos
de sua cognição” (NEUFELD; CAVENAGE, 2010, p. 27).

Deve-se reforçar para o cliente que este é somente um “recorte” de seu fun-
cionamento e que é necessário que ele tenha consciência sobre isso para que
essa compreensão atue como um recurso em seu processo terapêutico contra a
ativação disfuncional de crenças, o que costuma ser reconfortante para o cliente.

Após o fechamento parcial da conceitualização cognitiva realizada, deve-se


pontuar que essa será realizada continuamente no tratamento e que, terapeuta e
cliente, deverão discutir e selecionar os aspectos a serem priorizados para o pla-
nejamento das intervenções.

Para concluir ressaltamos que a conceitualização cognitiva é um recurso fun-


damental para a identificação das dificuldades dos clientes e na sua organização
no contexto do modelo cognitivo. Ainda, a conceitualização cognitiva favorece que
terapeuta e cliente percebam como os conteúdos estão sendo expressos e as
técnicas são utilizadas na TCC.

66
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

3.3 A CONCEITUAÇÃO COGNITIVA


DO CASO DE UM PACIENTE
COM TRANSTORNO POR USO
DE SUBSTÂNCIAS E EPISÓDIO
DEPRESSIVO
Iremos apresentar um caso fictício, de um paciente que receberá o nome de
Paulo (SILVA; SERRA, 2004).

Paulo relata que, desde a infância, o seu pai era muito crítico e desvalorizava
tudo o que ele fazia, comparando-o ao irmão mais velho. Paulo passou a formu-
lar, ainda de forma pouco consciente, hipóteses sobre a sua autoeficácia desen-
volvendo crenças básicas como “não sei fazer nada certo”, “meu pai não gosta
de mim” e, ainda, “não sou uma pessoa querida”. Partindo das crenças, Paulo
passou então a realizar suposições como “não sou querido porque não faço nada
certo, mas, se acertar e nunca errar, meu pai gostará de mim”. Essas crenças e
suposições influenciaram o comportamento de Paulo; em situações específicas,
eram ativadas e levaram ao desenvolvimento de estratégias compensatórias. O
papel das estratégias compensatórias é de aliviar as crenças básicas ativadas em
diversas situações de vida; porém, em cada situação, o comportamento ativado
pelas crenças poderá variar.

Vamos analisar uma situação a que o Paulo foi exposto e que o levou a ativar
um esquema de incapacidade, o qual foi construído durante a sua vida.

Ao estudar um texto sobre gramática, Paulo acha o conteúdo do texto muito


difícil e entende que precisará reler, o que gera o pensamento de que “vou perder
a tarde por culpa deste professor que me exigiu estudar gramática” e, ainda, de
que “não sou inteligente o suficiente para aprender isso”.

A situação e os pensamentos evocam sentimentos de irritação e tristeza e


sendo assim, resolve fechar o livro e ir beber.

A situação descrita ativou os esquemas de vulnerabilidade e de incapacidade


em Paulo e o seu comportamento de fechar o livro e ir beber acaba sendo uma
estratégia compensatória que o ajuda a lidar com esses esquemas que foram
ativados.

67
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

QUADRO 4 – MODELO DE CONCEITUAÇÃO COGNITIVA DE


CASO DO CASO DO PACIENTE FICTÍCIO, PAULO
História infantil relevante: Pai rígido e crítico; comparação com irmão; des-
valorização do que Paulo faz.
Esquema / Crença básica: Inadequação e não-estima: “Não sei fazer as cois-
as direito e não posso ser amado”.
Suposição / Crenças: “Se eu me esforçar muito, farei algo bem feito”.
Estratégias Compensatórias: Alto padrão de exigência, fuga e uso de bebida.
Situação: Estudar gramática.
Pensamento automático: “Eu nunca vou entender.”
Emoções: Frustração, raiva e tristeza.
Comportamentos: Fechar o livro e ir beber.
FONTE: adaptado de Silva e Serra (2004)

O caso fictício de Paulo nos leva a compreender que o modelo cognitivo do


uso de substâncias indica que a dependência é decorrente de uma interação en-
tre o contato com a droga e os pensamentos (cognições) que são desenvolvidas
através das crenças básicas.

As crenças relacionadas ao uso das drogas são as facilitadoras e as expec-


tativas positivas. Paulo, ao avaliar a sua situação de estudos como árdua, passa
a pensar que pode descontrair e que o ato de ingerir droga alivia o estresse. Es-
tas crenças eliciam pensamentos automáticos (“vou beber”) e desencadeiam a
fissura pelo álcool. As crenças facilitadoras são a de “eu não consigo suportar a
vontade” ou “para melhorar essa vontade eu devo beber!”

O conjunto de cognições apresentado na conceituação de caso irá impul-


sionar Paulo ao uso do álcool e, então, finalizar um ciclo cognitivo para o uso da
substância.

4 SESSÕES E TÉCNICAS EM TCC


Sobre a estrutura das sessões em TCC, a primeira sessão é destinada à rea-
lização do agendamento dos assuntos a serem abordados, de modo colaborativo.
Os temas são abordados e o último assunto costuma ser a análise das metas a
serem alcançadas até a próxima sessão.

Na primeira sessão deve-se ajudar o paciente a entender como o seu pen-


samento afeta as suas reações, usando exemplos e afirmações espontâneas do

68
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

paciente usadas durante as sessões. E, ainda, caso o terapeuta note alteração no


afeto, questionar o cliente sobre o que ele está pensando naquele momento.

Entretanto, será mais fácil para o terapeuta iniciante dedicar uma parte da
primeira sessão à psicoeducação sobre as relações entre as situações desenca-
deantes, as imagens e/ou pensamentos automáticos e as reações emocionais,
comportamentais e fisiológicas.

Dessa forma, estrutura-se um processo terapêutico que pode reduzir a an-


siedade, estimulando a organização do paciente e o trabalho produtivo. Também
deve-se orientar o paciente sobre as suas expectativas sobre a terapia. Entretan-
to, essa estrutura é flexível e pode ser modificada para cada paciente ou situação
em particular.

Nas demais sessões, inicia-se com a recapitulação dos eventos da sessão


anterior e das tarefas realizadas em casa. As tarefas de casa têm como objetivo
ampliar a aprendizagem entre sessões e podem levar a melhores resultados. So-
bre a revisão dos exercícios de casa, deve-se verificar como o paciente os reali-
zou e como foi o processo. Essa revisão é fundamental e, se não for realizada, a
tendência é que o paciente pare de fazê-los.

O exame dos exercícios de casa pode ser realizado rapidamente e, outras


vezes, pode se tomar a maior parte da sessão, especialmente se estes estiverem
relacionados aos problemas elencados na pauta. De acordo com J. Beck (2021),
uma das funções da terapia é a determinação do tempo que se utiliza para exa-
minar os exercícios de casa em detrimento da discussão de outros problemas
que o paciente precisa solucionar, deve-se pedir ao paciente que leia em voz alta
as prescrições dos Exercícios de Casa e que classifique quanto ele acredita “nas
afirmações adaptativas, nas respostas aos seus pensamentos automáticos e nas
crenças que vocês discutiram na(s) sessão(ões) anterior(es)” (BECK, 2013, p.
130). Após a análise das tarefas de casa que o paciente desenvolveu desde o
último encontro, pode-se discutir determinados problemas que foram colocados
na pauta da sessão.

Para definir as pautas de cada sessão, devem-se apresentar os tópicos pro-


postos para serem abordados no encontro e, nas sessões futuras, ambos definem
a pauta (em algum momento do início dos encontros). Na primeira parte dos en-
contros, J. Beck (2021) afirma ainda que é necessário restabelecer a aliança tera-
pêutica, avaliar o humor, sintomas e experiências do paciente durante a semana.
Para J. Beck (2021) a verificação ou avaliação do humor é rápida e auxilia o tera-
peuta e o paciente a acompanhar o progresso do processo. Através da verificação
do humor, o terapeuta:

69
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

• Demonstra interesse em como o paciente se sentiu na última semana;


• Pode monitorar o progresso ao longo do tratamento junto ao paciente;
• Identifica (reforça ou modifica) a explicação do paciente para o progres-
so ou falta de progresso.
• Reforça o modelo cognitivo, ou seja, como o paciente tem encarado os
problemas e como esses influenciam o seu humor.

Nesse momento, caso o paciente esteja usando medicação para o tratamen-


to das dificuldades psicológicas, deve-se verificar de forma breve, a adesão, os
problemas, existência de efeitos colaterais e/ou dúvidas.

Depois da verificação do humor, deve-se solicitar que o paciente identifique


os problemas para os quais mais precisa de ajuda. Esses problemas podem ser
os que surgiram na semana e/ou podem ser as que são esperadas na(s) próxi-
ma(s) semana(s) (BECK, 2013).

Após a definição da pauta e do exercício de casa, deve-se resumir os tópi-


cos. Se houver muitos itens na pauta, terapeuta e paciente irão priorizá-los cola-
borativamente e passar a discussão de problemas menos importantes para uma
sessão futura. Nessa discussão, o terapeuta poderá coletar dados sobre o(s) pro-
blema(s), conceituar cognitivamente as dificuldades do paciente através de ques-
tões sobre seus pensamentos, emoções e comportamentos associados a essas
situações e realizar um planejamento colaborativamente de estratégias, o que in-
clui a busca de soluções objetivas e diretas para o(s) problema(s), além da ava-
liação dos pensamentos negativos associados e/ou necessidade de mudanças de
comportamento (BECK, 2013).

Assim, a estrutura da primeira parte de uma sessão deve se fundamentar


nos seguintes aspectos, de acordo com J. Beck (2013, p. 125):

• Restabelecer o rapport;
• Nomear os problemas em que o paciente deseja ajuda na
solução;
• Coletar dados que possam indicar outras áreas de proble-
ma importantes a serem discutidas. Revisar o exercício
de casa;
• Priorizar os problemas na pauta.

A autora ainda afirma que o alcance dos objetivos listados acima é facilitado
quando o paciente examina a Ficha de Preparação da Sessão antes da sessão
(mentalmente ou por escrito).

70
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

QUADRO 5 – FICHA DE PREPARAÇÃO DA SESSÃO

1. Sobre o que falamos de importante na sessão passada?

2. O que dizem as minhas anotações da terapia?

3. Como esteve o meu humor em comparação às outras semanas?

4. O que aconteceu (de positivo e negativo) nesta semana que o meu tera-
peuta deveria saber?

5. Para quais problemas eu desejo ajuda?

6. Que nome dar a cada um desses problemas?

7. Que exercício de casa eu fiz? (Se eu não fiz, o que atrapalhou?)

8. O que eu aprendi?
FONTE: Beck (2013, p. 125)

As etapas de tratamento da TCC são discutidas a seguir.

a) Avaliação diagnóstica

A TCC tem uma estrutura longitudinal, ou seja, tem começo, meio e fim. É ini-
ciada com o processo de avaliação e, posteriormente, da formulação diagnóstica,
da conceitualização cognitiva e da socialização do modelo cognitivo.

A conceitualização cognitiva, que é um processo central para o bom resultado


da terapia, é desenvolvida de forma colaborativa e compartilhada com o paciente.

O objetivo da conceitualização é integrar as diferentes técnicas empregadas


pois, a maioria dos pacientes, quer saber se o terapeuta avalia os seus sintomas
como estranhos ou anormais; deve-se evitar o uso de afirmações que reforcem
essa expectativa.

Deve-se evitar o uso de rótulos no diagnóstico de transtornos da personali-


dade. É preferível dizer algo mais abrangente e não usar jargões. Por exemplo:
“Parece que você tem estado deprimido(a) durante o último ano e teve problemas
com relacionamentos e no trabalho”.

É recomendável oferecer ao paciente informações sobre a sua situação, de


modo que ele possa atribuir alguns dos seus problemas ao seu transtorno, em vez
de ao seu caráter como no exemplo: Tem alguma coisa errada comigo. Eu sou
defeituoso(a). Após a avaliação diagnóstica, os objetivos ou metas da terapia são
estabelecidas pelo terapeuta e o paciente (KNAPP; BECK, 2008).

71
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

b) Reestruturação cognitiva

A segunda fase da terapia é direcionada para o processo de reestruturação


cognitiva e de mudança de padrões comportamentais que funcionam como fa-
tores de manutenção dos transtornos. Essa é a fase mais longa do processo de
terapia e na qual o paciente assume cada vez mais a participação nos seus rumos
(KNAPP; BECK, 2008).

c) Intervenção com os esquemas

A terceira parte da TCC é específica para as intervenções com os chamados


esquemas, que são as estruturas cognitivas mais profundas do nosso psiquismo.
Esquemas se estabelecem na primeira infância e irão orientar a forma como as
experiências e emoções vividas serão percebidas, organizadas e memorizadas
(KNAPP; BECK, 2008).

Esquemas também podem ser denominados como crenças nucleares. As-


sim, a partir da formação de uma crença básica, essa influenciará a formação de
novas crenças relacionadas à primeira que, se persistirem, serão incorporadas no
esquema.

Os esquemas ou crenças nucleares incorporadas nas estruturas cognitivas


designam o modelo de pensamento de uma pessoa e podem levar a erros cogni-
tivos encontrados nos diversos transtornos psicopatológicos. Os esquemas mais
relevantes para a TCC são aqueles que processam as representações sobre o
self e os outros.

SELF é um conceito que inclui o corpo físico, os processos de


pensamento e uma experiência consciente de que se é único e dife-
rente dos outros, suscitada pela representação mental de experiên-
cias pessoais.

Todos nós construímos esquemas, mas alguns desses podem ser excessiva-
mente rígidos, muito abrangentes e associados a cargas negativas, sendo ativa-
dos em situações-problema, desencadeando transtornos emocionais. Uma TCC
bem realizada trará à tona os sintomas específicos e os problemas de longa du-
ração.

72
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

Os esquemas têm uma variedade de propriedades que podem deter-


minar as dificuldades ou facilidades do processo de tratamento. Mesmo
que latentes e/ou inativos, os esquemas são ativados por situações aná-
logas às vividas precocemente e que envolvem o seu desenvolvimento.

As crenças condicionais subjacentes associadas ao esquema ou crença nucle-


ar acima são fundamentadas com os pressupostos “Se eu não tiver um parceiro
que me ame, não serei nada” e a regra “Uma pessoa não pode viver sem um
parceiro”. Ao ser ativado, esse esquema pode interferir na capacidade de avaliar
objetivamente os eventos e o raciocínio da pessoa, que é prejudicado.

Na última sessão da terapia, deve-se estabelecer os planos de enfrentamen-


to das situações estressantes e que representam risco de recaídas. Também de-
vem ser combinados o intervalo e a frequência das sessões seguintes.

4.1 PRINCIPAIS TÉCNICAS DA TCC


A TCC concentra-se primordialmente no “aqui-e-agora”, mas é essencial con-
siderar como se dá o desenvolvimento global na primeira infância, do histórico
familiar, das experiências evolutivas positivas e negativas, do histórico escolar e
profissional e das influências sociais a fim de entender o paciente e planejar o tra-
tamento (WRIGHT; BASCO; THASE, 2009).

A relação terapêutica adequada é importante para a TCC e inclui a atitude de


compreensão, gentileza e empatia por parte do terapeuta. Por isso, os terapeutas
devem ser capazes de estimular a confiança e mostrar serenidade em situações
de pressão. Em comparação a outras abordagens, a relação terapêutica na TCC
é diferente por ser baseada em um alto grau de colaboração, pelo foco empírico
e pelo uso de intervenções direcionadas para a ação do paciente (WRIGHT; BAS-
CO; THASE, 2009):

O empirismo colaborativo é usado para a descrição da relação terapêutica na


TCC. Segundo Wright, Basco e Thase (2009, p. 14):

Paciente e terapeuta trabalham juntos como uma equipe inves-


tigativa, desenvolvendo hipóteses sobre a acurácia ou o valor
de enfrentamento de uma série de cognições e comportamen-
tos. Eles então colaboram no desenvolvimento de um estilo
mais saudável de pensamento e de habilidades de enfrenta-
mento e na reversão de padrões improdutivos de comporta-
mento. Os terapeutas cognitivo-comportamentais são normal-
mente mais ativos do que os terapeutas de outras formas de
terapia.

73
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Durante a sessão, o terapeuta irá orientar o paciente a usar a agenda para


analisar produtivamente os tópicos importantes e evitar os assuntos que têm
pouca chance de atingir os objetivos do tratamento (WRIGHT; BASCO; THASE,
2009).

A TCC não é um conjunto de técnicas ou intervenções; os terapeutas inician-


tes não devem partir diretamente para a utilização de técnicas sem antes desen-
volver uma conceitualização cognitiva individualizada para associar a teoria cogni-
tivo-comportamental à estrutura psicológica do paciente e de sua constelação de
problemas.

Listamos a seguir os principais métodos e técnicas da TCC.

QUADRO 6 – MÉTODOS PRINCIPAIS DE TERAPIA


COGNITIVO-COMPORTAMENTAL (TCC)

• Foco voltado para o problema.

• Conceitualização de caso individualizada.

• Relacionamento terapêutico empírico colaborativo.

• Questionamento socrático.

• Uso de estruturação, psicoeducação e ensaio para melhorar a aprendiza-


gem.

• Evocação e modificação de pensamentos automáticos.

• Descoberta e modificação de esquemas.

• Métodos comportamentais para reverter padrões de desamparo, compor-


tamento autodestrutivo e evitação.

• Desenvolvimento de habilidades de TCC para ajudar a evitar recaídas.


FONTE: adaptado de Wright, Basco e Thase (2008)

O estilo de questionamento mais usado na TCC se fundamenta no empirismo


colaborativo, cujo objetivo é ajudar os pacientes a reconhecerem e mudarem o
pensamento desadaptativo. O questionamento socrático é a realização de ques-
tões ao paciente que estimulam sua curiosidade e o desejo de investigar. Os mé-
todos psicoeducativos são muito utilizados na TCC e envolvem utilizar situações
da vida do paciente para exemplificar os conceitos.

O terapeuta oferece explicações e envolve o paciente em um processo de


aprendizagem. As ferramentas disponíveis para promover a psicoeducação são a
leitura de livros recomendados pelo terapeuta, de apostilas, aplicação de questio-

74
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

nários de avaliação e de programas de computador. Sobre os métodos de estru-


turação, como a agenda e o feedback, esses maximizam a eficiência das sessões
e auxiliam os pacientes a direcionarem esforços para a recuperação e intensifica-
ção do aprendizado.

Vamos apresentar uma descrição de outras técnicas utilizadas na TCC de


acordo com J. Beck (2021):

QUADRO 7 – ALGUMAS TÉCNICAS UTILIZADAS EM TCC

FONTE: adaptado de APA (2022)

4.2 TÉCNICAS UTILIZADAS NA TCC


PARA TRANSTORNOS POR USO DE
SUBSTÂNCIAS (TUS)

As técnicas mais usadas na TCC para o abuso de álcool e outras drogas são
as que necessitam do fortalecimento de uma aliança terapêutica por meio uma
compreensão empática sobre o transtorno do paciente. A relação terapêutica e
a conceituação cognitiva de caso têm um importante papel no tratamento pois, é
através desses recursos, que o terapeuta poderá compreender os sentimentos de
dor e medo que estão “escondidos” pelas atitudes de hostilidade e resistência do
paciente (SILVA; SERRA, 2004).

É importante a exploração do significado das atitudes oposicionistas e de ca-


ráter autodestrutivo manifestados pelo paciente, e isso é feito a partir da avaliação
das crenças do paciente sobre a terapia e das crenças do terapeuta em relação
ao paciente. Deve-se compreender como usar os sentimentos desagradáveis na
relação terapêutica de forma útil.

75
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

As técnicas de resolução de problemas são muito utilizadas a fim de que


o paciente saiba como atuar em situações de risco de uso de álcool/drogas. Os
registros diários dos pensamentos podem auxiliar no manejo das fissuras para o
uso de álcool/drogas (SILVA; SERRA, 2004).

Uma estratégia para o enfrentamento das fissuras é adiá-las por pequenos


espaços de tempo (5 a 10 minutos, 1 hora), modificando o foco do impulso como
ao assistir à TV, usar o computador, realizar relaxamentos, conversar com alguém,
limpar a casa, trabalhar etc. É muito relevante manter o foco no alcance de metas
de longo prazo assim como é importante buscar as recompensas mais imediatas
(SILVA; SERRA, 2004).

Acerca do treinamento de habilidades, esse é baseado nas teorias comporta-


mentais e focalizam o desenvolvimento das habilidades para lidar com situações
específicas, já que a falta dessas habilidades está associada ao maior consumo
de drogas (SILVA; SERRA, 2004).

De acordo com Silva e Serra (2004), as dificuldades mais significativas se


apresentam através das seguintes situações:

• Presença de sentimentos negativos;


• Situações que necessitam de uso de assertividade;
• Realizar e/ou receber críticas;
• Recusar o uso da droga;
• Lidar com as frustrações do cotidiano;
• Reconhecer e enfrentar as situações de risco de uso de drogas como a
fissura.

É no decorrer do processo terapêutico que o paciente aprenderá a usar as


técnicas ensinadas pelo terapeuta, a fim de:

• Estabelecer conexões entre a cognição, o afeto e o comportamento;


• Desenvolver reestruturação cognitiva, mediante análise dos pensamen-
tos automáticos disfuncionais e atuando sobre eles através da busca de
evidências a favor e contra esses pensamentos, via teste de realidade
e de desafiá-los com questionamentos como “quais são recursos reais
para lidar com isso?” e avaliar a importância desses pensamentos;
• Mapear as cognições mais tendenciosas e busca de alternativas de ava-
liação para a realidade;
• Enfrentar e modificar os pensamentos disfuncionais.

76
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

De modo geral, as técnicas mais utilizadas para o tratamento do uso de subs-


tâncias são aquelas capazes de levar à testagem da realidade e de corrigir as
conceituações cognitivas distorcidas do paciente (SILVA; SERRA, 2004).

O consumo de drogas está relacionado à presença de estímulos


internos/externos que irão favorecer o risco de uso como a visita
a bares, cansaço excessivo, tédio ou tristeza após meses de abs-
tinência de uso. Sobre os estímulos que favorecem o consumo de
drogas de acordo com a TCC, assinale a alternativa correta:

a) ( ) A exposição às experiências com drogas auxiliam o desenvol-


vimento de crenças facilitadoras de uso.
b) ( ) As experiências com drogas podem ativar crenças sobre o
uso de substância como “Eu sou menos sociável quando bebo”.
c) ( ) O desenvolvimento das crenças e pensamentos automáticos
sobre as drogas diminui a fissura para a busca da substância.
d) ( ) As experiências são pouco determinantes para o favoreci-
mento de esquemas e crenças sobre o uso de drogas.
e) ( ) As experiências com drogas são neutras em relação ao de-
senvolvimento de transtornos de abuso de substâncias.

Resolução: O modelo cognitivo do uso de substâncias baseia-se


na ideia de que as experiências nas fases iniciais da vida são fun-
damentais para o desenvolvimento desse transtorno e essas ex-
periências são consideradas determinantes para o favorecimento
de esquemas, crenças centrais ou nucleares e crenças interme-
diárias sobre drogas. As experiências com uso de drogas auxi-
liam no desenvolvimento de crenças relacionadas ao uso dessas
substâncias e se tornam facilitadoras de uso. As experiências
podem ativar as crenças sobre uso de substância como “Eu sou
mais sociável quando bebo”. A consequência das crenças e pen-
samentos é ativar a fissura e a busca pela substância.

77
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

5 A TCC NO ATENDIMENTO DE
CRIANÇAS, ADOLESCENTES E
FAMÍLIAS
5.1 CRIANÇAS E ADOLESCENTES
Os psicoterapeutas cognitivo-comportamentais infantis devem considerar as
circunstâncias específicas na avaliação e tratamento da criança/adolescente e in-
tervir em um nível cognitivo-comportamental para influenciar os padrões de pen-
samento, ação, sentimentos e reações corporais desses pacientes (FREIDBERG;
MCCLURE, 2007).

No que diz respeito ao atendimento de crianças e adolescentes, vejamos o


seguinte exemplo citado por Freidberg e MCclure (2007, p. 13):

Alice é uma menina branca de 16 anos que vive com sua mãe
biológica e seu padrasto em um bairro pobre com escolas ina-
dequadas. Fruto de uma gravidez indesejada, é abertamente
rejeitada e bode expiatório de seus pais. Nesse contexto, ela
está experimentando sintomas fisiológicos (dores de estôma-
go, sono excessivo), de humor (depressão, sentimentos de
inutilidade), comportamentais (passividade, evitação, retrai-
mento) e cognitivos (“Eu não valho nada”.).

Os sintomas apresentados por Alice precisam ser analisados em um contex-


to ambiental e de acordo com as predisposições pessoais que dão início, aumen-
tam e mantêm o sofrimento apresentado por ela.

A maneira como as crianças e adolescentes interpretam as suas experiên-


cias de vida irá moldar o seu funcionamento emocional e a sua visão sobre essas
experiencias é o ponto central do tratamento.

Essa maneira de construção de “embalagens mentais” sobre si mesmo, so-


bre os relacionamentos com as outras pessoas, as experiências e o futuro deter-
minam as suas reações emocionais (FREIDBERG; MCCLURE, 2007).

Crianças e adolescentes recebem e respondem de forma ativa aos estímulos


ambientais e elaboram as informações, selecionando-as, codificando-as e formu-
lando hipóteses sobre o que ocorre a si mesmas e aos outros.

O sistema de processamento de informações é organizado em níveis, com-


postos por estruturas cognitivas que irão compor o seu modelo cognitivo.

78
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

Um exemplo de pensamento automático pode ser visto na seguinte situação


que envolve a menina Bárbara:

Bárbara pode convidar uma amiga para brincar durante o re-


creio e a amiga pode recusar, dizendo que quer brincar com
outra criança (situação). Bárbara fica triste (emoção) e inter-
preta a situação dizendo a si mesma: “Judy não é mais minha
amiga. Ela não gosta de mim” (pensamento automático) (FREI-
DBERG; MCCLURE, 2007, p. 13).

Os fundamentos da terapia cognitivo-comportamental fornecem uma base


sólida para o trabalho com crianças e ao uso de intervenções baseadas na con-
ceitualização cognitiva de caso. O centro do processo é a análise do processa-
mento de informação da criança a fim de identificação dos pensamentos automá-
ticos e as outras estruturas cognitivas.

Deve-se reconhecer os pensamentos automáticos, como são mantidos e


como determinam e perpetuam os esquemas mal adaptativos, e estabelecer um
método para analisar a sua relação com a estimulação afetiva negativa da crian-
ça.

A compreensão da TCC, dos processos e das estratégias de intervenção é


a base de conhecimento e de habilidades necessárias para a condução de uma
psicoterapia efetiva.

Embora a TCC tenha sido adaptada para se adequar às características infan-


tis, os princípios estabelecidos inicialmente no trabalho direcionado a adultos se
aplicam (KNELL, 1993 apud FREIDBERG; MCCLURE, 2007).

Um exemplo é o uso do empirismo colaborativo, que é o método que acio-


na o processo de conceitualização cognitiva e que favorece a obtenção de infor-
mações que irão auxiliar na resolução dos problemas apresentados.

Vejamos, a seguir, um exemplo do empirismo colaborativo entre o psicotera-


peuta e um cliente infantil (Jake):

TERAPEUTA: Seria de muita ajuda se você escrevesse uma


lista de coisas que gostaria de trabalhar quando estivéssemos
juntos. O que isto lhe parece?
JAKE: Por que precisamos de uma lista?
TERAPEUTA: Uma lista pode ajudar-nos a manter o rumo das
coisas para que não nos esqueçamos de alguma coisa que
poderia ser importante mais tarde
JAKE: Não tenho certeza sobre esta lista.
TERAPEUTA: Então vamos conversar sobre isto. O que lhe
incomoda em relação a fazer essa lista? (FREIDBERG e MC-
CLURE, 2007, p. 36).

79
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

O empirismo é desenvolvido por meio da prática clínica, que estimula a ob-


servação e a análise objetiva dos autorrelatos do cliente. O psicoterapeuta pro-
cura entender o motivo pelo qual o cliente não querer agir de uma determinada
forma, demostrando respeito por ele e por suas opiniões.

O uso da tarefa de casa da TCC com adultos é aplicado com as crianças,


para que elas possam experienciar as suas habilidades nos contextos da vida
real.

Segundo Freidberg e MCclure (2007, p. 128):

A tarefa de casa promove a aquisição de habilidades e sua


aplicação em contextos do mundo real [...] as crianças preci-
sam ensaiar as novas habilidades fora da terapia. Além disso,
a tarefa de casa é tanto uma prática quanto um processo. É
preciso ser cuidadoso em relação a quais tarefas são atribuí-
das e a como são prescritas.

Ao se prescrever uma tarefa de casa é necessário usar termos mais criativos


como “Mostro que posso” ou “atividades de autoajuda”, a fim de motivar as crian-
ças para a sua realização. Além disso, a tarefa de casa deve ser desenvolvida de
forma colaborativa para se tornarem propriedades das crianças, aumentando o
seu nível de responsabilidade (BECK, 2021).

A TCC com crianças é focalizada nos problemas de forma ativa e orientada


ao objetivo, assim como ocorre na terapia com adultos. A criança e o terapeuta
atuam de forma colaborativa e direcionada ao alcance de metas que são identifi-
cadas na conceitualização cognitiva.

Sobre as diferenças entre a TCC com adultos e crianças/adolescentes, em


primeiro, lugar há a questão da aderência das crianças à psicoterapia pois essas
vêm para a terapia pela vontade dos pais ou responsáveis devido às dificuldades
que elas podem ou não admitir que possuem, ou mesmo possuir.

A experiência sugere que, em geral, as crianças são encaminhadas para te-


rapia porque apresentam dificuldades psicológicas e problemas em seu funciona-
mento em uma ou mais instituição como a família e a escola.

As crianças assim como não iniciam o tratamento, também não escolhem o


seu final e em alguns casos, podem gostar da terapia e fazer progressos impor-
tantes, porém, em muitos casos, os pais encerram o seu tratamento e, em outros
casos, as crianças podem recusar o processo e temer a psicoterapia, mas a de-
terminação de juizados de menores, as exigências da escola e dos pais acabam
levando-as a continuá-lo.

80
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

Para Freidberg e MCclure (2007), a TCC com crianças se baseia em uma


abordagem empírica, ou seja, do aqui-e-agora, pois elas são orientadas à ação e
aprendem fazendo. Ao se associarem as habilidades de controle às ações concre-
tas da criança contribui-se para que elas prestem atenção, memorizem e realizem
os comportamentos desejados. A ação na psicoterapia é estimulante e a motiva-
ção das crianças aumenta se elas estiverem se divertindo.

Os psicoterapeutas devem avaliar as questões sistêmicas que estão relacio-


nados aos problemas das crianças e elaborar planejamentos adequados as suas
necessidades.

Envolver a família e a escola são fundamentais para iniciar, manter e gene-


ralizar os ganhos terapêuticos, já que a TCC com crianças e adolescentes depen-
de do envolvimento dos pais, sendo normalmente realizada uma sessão por mês
com os pais. Nos primeiros meses de tratamento as sessões com os pais podem
ser mais espaçadas, a depender da gravidade do caso. Há necessidade de uma
boa relação com os pais, mas ao mesmo tempo sem criar conluios, que podem
prejudicar o processo terapêutico.

A TCC infantil se baseia nas capacidades verbais e cognitivas, portanto, de-


ve-se considerar as idades das crianças e em alguns casos adaptar o nível da in-
tervenção às capacidades de desenvolvimento (FREIDBERG; MCCLURE, 2007).

As crianças mais novas se beneficiam de técnicas cognitivas simples como


autoinstrução e as intervenções comportamentais, enquanto os adolescentes se
beneficiam mais das técnicas mais complexas e que exigem análises racionais
(RONEN, 1998 apud FREIDBERG; MCCLURE, 2007).

As habilidades de linguagem influenciam as intervenções verbais com as


crianças; com as que possuem menos fluência verbal, devem-se utilizar dese-
nhos, fantoches, brinquedos, jogos e trabalhos manuais, que exigem menor me-
diação verbal (FREIDBERG; MCCLURE, 2007).

A leitura e contação de histórias, o uso de filmes e vídeos também são indi-


cadas e podem aumentar sua fluência verbal. De forma geral, a adaptação das
tarefas à capacidade de linguagem das crianças é um desafio clínico crucial. O
primeiro passo ao trabalhar com uma criança é desenvolver uma conceitualização
cognitiva de caso.

81
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

5.2 FAMÍLIAS
A Terapia Familiar baseada na abordagem da Terapia Cognitivo-Compor-
tamental (TCC) leva em consideração os aspectos cognitivos relevantes para a
compreensão dos problemas familiares (DATTILIO, 2011).

A parte fundamental da Terapia Cognitivo-Comportamental com Famílias são


os elementos ligados ao comportamento e ao pensamento dos componentes da
família, com ênfase para as distorções cognitivas (DATTILIO, 2011).

A família é o primeiro contexto de socialização para o desenvolvimento hu-


mano, as relações familiares têm grande influência sobre o bem-estar de todos os
que compõem o núcleo familiar. As relações deterioradas são fatores de risco co-
muns e as relações interpessoais positivas são considerados fatores de proteção
para uma variedade de doenças mentais, desde a infância até a velhice.

Assim, a família é uma área de atuação de grande importância para o tera-


peuta cognitivo-comportamental. Os erros de interpretação dos eventos determi-
nam crises familiares que erros afetam os aspectos do relacionamento familiar,
como no caso das crenças como “os filhos nunca devem discordar dos pais”, “as
esposas não devem aborrecer os maridos com problemas domésticos” ou “a mu-
lher deve manter a casa organizada”.

Essas crenças se originaram a partir de aprendizagens precoces e são cha-


mados de “esquemas familiares”, já que envolvem as cognições sobre a vida fa-
miliar ideal (DATTILIO, 2004). A terapia familiar é indicada quando as demandas
emocionais e comportamentais das pessoas estão relacionadas à dinâmica fami-
liar.

Pode ocorrer com todos os membros da família na mesma sessão, configu-


rando um processo familiar, no qual são compartilhadas as vivências e em que
há mediação do psicoterapeuta. É importante estar claro que os atendimentos
não visam às demandas específicas de cada pessoa da família, mas à dinâmica
familiar.

Alguns dos focos de discussão são a comunicação entre os membros e o de-


senvolvimento de relações cotidianas mais saudáveis (DATTILIO, 2011). A Terapia
Cognitivo-Comportamental oferece contribuições ao possibilitar o trabalho com as
crenças e os padrões comportamentais disfuncionais e do treinamento de habili-
dades sociais.

82
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

As sessões são semanais e podem durar de uma hora e meia a duas horas.
A sua condução exige sensibilidade do psicoterapeuta e as intervenções auxiliam
na comunicação, na mediação de conflitos, na redução da ansiedade, no favo-
recimento da empatia, no esclarecimento sobre os papéis de cada membro e no
fortalecimento das relações.

As vantagens dessa modalidade são o aumento dos resultados psicoterá-


picos por se propor que a terapia inclua os membros da família e a contribuição
para que os relacionamentos se tornem mais positivos entre todos, auxiliando a
melhorar a dinâmica do grupo e do padrão de pensamentos e comportamentos
disfuncionais individuais.

A terapia familiar é indicada quando o paciente ou o psicoterapeuta percebe-


rem dificuldades profundas na interação entre os familiares e quando as deman-
das emocionais e comportamentais exijam a ajuda de um profissional (COGNITI-
VO, 2022).

São exemplos de demandas, os casais que possuem filhos adolescentes e


que enfrentam obstáculos no relacionamento familiar, como no caso do “choque
de gerações”, auxiliando a mudança de padrões e a conquista de vida mais sau-
dável e integrada.

É recomendável que todos os membros da família participem do processo de


psicoterapia, mas nem sempre isso ocorre, por recusa da pessoa ou por dificulda-
des objetivas em comparecer.

O atendimento a famílias exige atenção e a disponibilidade do psicoterapeuta


e a análise das experiências de todos em relação à dinâmica familiar (COGNITI-
VO, 2022).

Indicamos a leitura da obra de Robert L. Leahy, intitulada Técni-


cas de terapia cognitiva: manual do terapeuta, publicada em 2018
pela Artmed.

83
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

A Terapia Cognitivo-Comportamental realizada com adultos e


crianças possuem a seguinte diferença: o terapeuta comporta-
mental infantil procura constantemente por procedimentos não
tradicionais para a comunicação e a obtenção de dados sobre
as variáveis que controlam o comportamento da criança. Sobre a
Terapia Cognitivo-Comportamental Infantil pode-se afirmar que:

a) ( ) O brinquedo e outras atividades lúdicas são estimuladoras


desde que a criança use o brincar como única resposta diante
dessa classe de estímulos.
b) ( ) O repertório verbal da criança para descrever seus sentimen-
tos é amplo e facilita a ação do terapeuta para atuar com as vari-
áveis que interferem em seus comportamentos e sentimentos.
c) ( ) Crianças precisam mais da expressão verbal para a expres-
são de seus sentimentos no desenvolvimento da terapia.
d) ( ) Desenhar, contar histórias e usar bonecos e jogos podem
ser utilizados, mas sem ser direcionados pelo terapeuta compor-
tamental para a expressão dos sentimentos.
e) ( ) O terapeuta comportamental infantil deve somente utilizar as
formas convencionais para identificar as variáveis que controlam
o comportamento da criança.

Resolução: Na TCC infantil, o uso do brinquedo e outras ativida-


des lúdicas como desenhar, contar histórias e jogar se transfor-
mam em classes de intervenções psicoterapêuticos que levam a
criança a ser capaz de brincar. O repertório verbal da criança para
a descrição do que sente é restrito e a ação do terapeuta deve
ser direcionado para a atuação com variáveis que sejam capazes
de interferir nos comportamentos e sentimentos infantis. As crian-
ças utilizam menos a expressão verbal para a expressão de seus
sentimentos no desenvolvimento da terapia. O ato de desenhar,
de contar histórias e de usar bonecos e jogos devem e podem ser
utilizados de forma livre e que devem e podem ser utilizados. A
utilização pode ser livre ou direcionada para a expressão dos pen-
samentos e sentimentos da criança. O terapeuta comportamental
infantil deve utilizar as formas não convencionais para identificar
as variáveis que controlam o comportamento da criança.

84
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
O presente capítulo procurou discutir, analisar e exemplificar os fatores rela-
cionados ao planejamento dos tipos de tratamento de diversos transtornos men-
tais e como se dá a estruturação das sessões de atendimento na psicoterapia
cognitivo-comportamental.

Os tópicos desenvolvidos dizem respeito ao modelo cognitivo e comporta-


mental dos transtornos mentais em geral; ao desenvolvimento da Conceitualiza-
ção Cognitiva de Caso; à forma de estruturação de sessões e tipos de técnicas
em TCC; ao atendimento de crianças, adolescentes e /famílias na TCC.

O capítulo buscou alcançar os seguintes objetivos de aprendizagem: pos-


sibilitar a compreensão da avaliação diagnóstica e suas etapas; discutir a estru-
turação das sessões e o uso de técnicas de intervenção; promover a análise de
modelos cognitivos e comportamentais em e apresentar os aspectos referentes
à Conceitualização Cognitiva de Caso em TCC. Além disso, apresentaram-se os
modelos cognitivo e comportamental em TCC a partir de um sobre o caso de uma
pessoa com Transtorno de Uso de Substâncias (TUS).

Buscou-se discutir as principais orientações para a TCC aplicada a crianças,


adolescentes e famílias.

Sobre a TCC no tratamento de crianças e adolescentes, o encaminhamento


desses clientes se dá devido, em geral, a presença de dificuldades psicológicas e
de comportamentos na família e a escola.

A TCC aplicada às famílias é necessária se houver dificuldades emocionais


e comportamentais dos familiares e dentro da dinâmica familiar, sendo que o tra-
tamento pode ser realizado com todos os membros da família visando atender às
demandas de atendimento e melhoria da dinâmica familiar.

Alguns dos focos de discussão são a comunicação entre os membros e o de-


senvolvimento de relações cotidianas mais saudáveis (DATTILIO, 2011).

REFERÊNCIAS
ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA – APA. Manual Diagnóstico e
Estatístico de Transtornos Mentais – DSM – V – TR. Porto Alegre: Artmed,
2022.

85
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

BECK, A. T. Para além do amor. Rio de Janeiro: Record. 1995.

BECK, J. S. Terapia cognitiva: teoria e prática. Porto Alegre: Artmed, 2007.

BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental. Porto Alegre: Artmed, 2013.

BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental: teoria e prática. (2. ed. Porto


Alegre: Artmed, 2021.

COGNITIVO. (2022). Terapia cognitivo-comportamental para casais e


famílias. Disponível em: https://blog.cognitivo.com/terapia-familiar-para-quem-e-
indicada-e-como-trabalhar/. Acesso em: 3 fev. 2022.

DATTILIO, F. M. Manual de terapia cognitivo-comportamental para casais e


famílias. Porto Alegre: Artmed, 2011.

DATILLIO, F. M. Casais e família. In: KNAPP, P. (org.). Terapia cognitivo-


comportamental na prática clínica psiquiátrica. Porto Alegre. Artmed, 2004.

FRIEDBERG, R. D.; McCLURE, J. M. A prática clínica de terapia cognitiva


com crianças e adolescentes [recurso eletrônico]. Porto Alegre: Artmed, 2007.

KNAPP, P.; BECK. A. T. Fundamentos, modelos conceituais, aplicações e


pesquisa da terapia cognitiva. Revista Brasileira de Psiquiatria. vol. 30. Supl. II,
2008, p. 54-64.

Knapp, P.; Rocha, D. B. Conceitualização cognitiva: Modelo de Beck.


In: CAMINHA, R. M.; WEINER, R.; OLIVEIRA, M.; PICCOLOTO, N. M.
(orgs.). Psicoterapias cognitivo-comportamentais: teoria e prática (pp. 39-46).
São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003.

KNAPP, P. Terapia cognitivo-comportamental na prática psiquiátrica. Porto


Alegre: Artmed, 2004.

KUYKEN, W.; PADESKY, C. A.; DUDLEY, R. (2008). The science and practice
of case conceptualization. Behavioural and Cognitive Psychotherapy, 36(6),
757-768.

NEUFELD, C. B.; CAVENAGE, C. C. Conceitualização cognitiva de caso:


uma proposta de sistematização a partir da prática clínica e da formação
de terapeutas cognitivo-comportamentais. Revista Brasileira de Terapias
Cognitivas, vol. 6, n° 2, 2010. Disponível em: http://pepsic.bvsalud.org/pdf/rbtc/
v6n2/v6n2a02.pdf. Acesso em: 9 jan. 2023.

86
Capítulo 2 PLANEJAMENTODOTRATAMENTOEESTRUTURADASSESSÕES

RANGÉ, B. P.; MARLATT, G. A. Terapia cognitivo-comportamental de


transtornos de abuso de álcool e drogas. Revista Brasileira de Psiquiatria,
2008; 30(Supl II): S88-95. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbp/a/
Ht4t7VqdH3BwnQTVHywhSfD/abstract/?lang=pt. Acesso em: 9 jan. 2023.

SCRIBEL, M. C. Terapia Cognitivo-Comportamental com Casais: Integrando


Abordagens In: CARDOSO, B. L. A.; PAIM, K. Terapias cognitivo-
comportamentais para casais e famílias: bases teóricas, pesquisas e
intervenções. Curitiba: Sinopsys, 2020.

SILVA, C. J.; SERRA, A. M. Terapias cognitiva e cognitivo – comportamental


em dependência química. Revista Brasileira de Psiquiatria, 2004;
26 (Supl I) :33-39. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbp/a/
mZVcWyLvfjsWZDm4gYqqKhy/?lang=pt. Acesso em: 9 jan. 2023.

WRIGHT, J. H.; BASCO, M. R.; THASE, M. E. Aprendendo a terapia cognitivo-


comportamental. Porto Alegre: Artmed, 2009.

87
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

88
C APÍTULO 3
O USO DE INTERVENÇÕES
COGNITIVAS NA TCC

O presente capítulo analisa e discute o uso de intervenções cognitivas na


TCC para modelos cognitivos de diversos transtornos mentais, além de
apresentar tipos de pensamentos automáticos, de crenças intermediárias e
nucleares e como se apresentam na vida cotidiana. O capítulo abordará os
seguintes tópicos:

 Os pensamentos automáticos e sua atuação no modelo cognitivo;


 O papel das crenças intermediárias e nucleares no modelo cognitivo;
 Modelos cognitivos de transtornos mentais;
 Técnicas cognitivas e técnicas comportamentais.

Os objetivos de aprendizagem pretendidos para esse capítulo são:

 Conceituar pensamentos automáticos, crenças intermediárias e nucleares.


 Analisar o papel dos pensamentos automáticos, crenças in-
termediárias e nucleares no modelo cognitivo.
 Identificar os modelos cognitivos de diferentes tipos de transtornos mentais.
 Identificar as principais técnicas cognitivas e com-
portamentais utilizadas na TCC.
 Identificar a função de pensamentos automáticos, cren-
ças intermediárias e nucleares no modelo cognitivo.
 Identificar os componentes dos modelos cogniti-
vos de diferentes tipos de transtornos mentais.
 Relacionar técnicas cognitivas e sua aplicação nas intervenções em TCC.
 Relacionar as principais técnicas comportamentais e sua função na TCC.

Serão apresentados termos técnicos e modelos cognitivos de diversos


transtornos para analisar os tópicos acima listados.
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

1 CONTEXTUALIZAÇÃO
O presente capítulo visa à apresentação das relações entre pensamentos
automáticos, crenças nucleares e intermediárias na elaboração dos modelos cog-
nitivos, conceituando esses elementos e apresentando os tipos de crenças.

Vimos, no capítulo anterior, sobre o planejamento do tratamento e da estrutu-


ra das sessões em TCC, sobre as características do modelo cognitivo e compor-
tamental dos transtornos mentais, especialmente, no caso do TUS, os aspectos
referentes à Conceitualização Cognitiva de Caso e a estrutura de sessões e uso
de técnicas e como se dá o atendimento de crianças, adolescentes e famílias em
TCC.

Apresentam-se, no presente capítulo, algumas considerações gerais sobre


as relações entre o modelo cognitivo e os tratamentos dos transtornos mentais e
de personalidade mais frequentemente tratados na abordagem cognitivo-compor-
tamental, como as disfunções sexuais, Transtorno de Pânico e Transtorno Obses-
sivo-Compulsivo (TOC).

Cada um desses modelos cognitivos de transtornos mentais implica uma for-


ma de estruturação de sessões e seleção de técnicas de intervenções mais ade-
quadas para o tratamento no âmbito da TCC.

Há uma diversidade de técnicas cognitivas e comportamentais que podem


ser utilizadas na abordagem cognitiva-comportamental e, dessa forma, foram se-
lecionadas algumas dessas, as mais utilizadas na prática clínica, que forma rela-
cionadas aos objetivos e formas de aplicação em TCC.

2 OS PENSAMENTOS AUTOMÁTICOS
E SUA ATUAÇÃO NO MODELO
COGNITIVO
O que se denomina na abordagem cognitivo – comportamental como “pen-
samentos automáticos (PAs)” são as estruturas mentais apresentadas pelos in-
divíduos no dia a dia e durante toda a vida, mesmo que não sejam percebidas
no decorrer de seu uso. De modo geral, a maioria dos PAs não são capazes de
trazer graves alterações em nosso comportamento e nos auxiliam a ter agilidade
de raciocínio.

90
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

As alterações mais significativas no comportamento que podem ser consi-


deradas como um problema de conduta, irão surgir quando os PAs não estão
alinhados com a realidade, levando o indivíduo a se paralisar diante de uma de-
terminada situação e causando sofrimento psicológico. Diante disso, vemos como
é importante que o terapeuta saiba como identificar esses pensamentos a fim de
modificá-los e associá-los a comportamentos funcionais na vida do cliente.

Vamos relembrar o conceito de pensamentos automáticos. Segundo o mo-


delo cognitivo de A. Beck (2021), o pensamento automático relaciona-se às cha-
madas crenças centrais e as crenças intermediárias. A. Beck (2013) afirma que o
modelo cognitivo é composto por três níveis:

1. Crenças nucleares: nível mais básico do modelo cognitivo e que inclui


crenças globais e rígidas. Ao serem ativados por alguma experiência,
essas crenças passam a agir de com muita força sob o indivíduo, levan-
do-o a se distanciar e negar as informações contrárias a essa crença.
2. Crenças intermediárias: atitudes, suposições e regras que irão atuar
na forma como supostamente devem agir, a fim de proteger o indivíduo
das reações negativas relacionadas às crenças centrais de caráter dis-
funcional.
3. Pensamentos automáticos (PAs): modelos de pensamentos extre-
mamente rápidos e espontâneos que usamos para a representação de
cognições breves do dia a dia e que levam o indivíduo a perceber de
forma mais viável as emoções relacionadas a esses pensamentos, não
necessariamente acionando o conteúdo desses pensamentos de forma
aprofundada. Os PAs podem ser positivos ou negativos e, funcionam
para ativar crenças e esquemas de pensamentos mais profundos do in-
divíduo.

Em síntese, podemos afirmar que:

Os pensamentos automáticos são cognições breves e es-


pontâneas, de modo que o indivíduo percebe mais facilmen-
te a emoção relacionada ao pensamento do que o conteúdo
do pensamento em si. Eles podem ser tanto positivos quanto
negativos e, apesar de serem mais específicos a determina-
das situações do que os outros níveis cognitivos, se relacio-
nam funcionalmente à ativação de crenças e esquemas mais
profundos do indivíduo (FROESELER; SANTOS; TEODORO,
2013, p. 43).

Alguns autores sugerem que os “déficits nas cognições positivas são fatores
tão importantes quanto a presença excessiva de cognições negativas na compre-
ensão de psicopatologias” (FROESELER; SANTOS; TEODORO, 2013, p. 44).

91
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Existem instrumentos variados para a avaliação dos pensamentos e crenças


funcionais e que podem auxiliar a compreensão sobre o papel das cognições nos
transtornos psicológicos.

Os instrumentos de avaliação dos pensamentos e crenças funcionais possi-


bilitam a verificação organizada e sistematizada das cognições funcionais e dis-
funcionais, o que auxilia na compreensão de como esses pensamentos atuam no
processo de adoecimento e na condição de bem-estar psicológico (FROESELER;
SANTOS; TEODORO, 2013).

O primeiro instrumento desenvolvido com o objetivo de avaliar sistematica-


mente PAs positivos foi elaborado por Ingram e Wisnicki, em 1988 e era composto
por 30 itens e centrado na avaliação de adultos).

A utilização de instrumentos de avaliação contribui para analisar a eficácia


da abordagem terapêutica e oferece evidências reais sobre o processo de rees-
truturação cognitiva; os instrumentos de avaliação de cognições são divididos em
quatro categorias:

1. Instrumentos de produção: o indivíduo é solicitado a escrever, logo


após uma tarefa, todos os pensamentos que lhe ocorreram durante sua
realização;
2. Instrumentos de gravação: métodos de gravação avaliam as verbali-
zações espontâneas do indivíduo (“pensar alto”) durante a realização de
uma determinada tarefa ou atividade;
3. Amostragem (sampling): a partir de um dispositivo de alerta, o sujeito
indica os pensamentos em um determinado momento.
4. Endosso (endorsement): a pessoa indica a ocorrência de uma lista
pré-determinada de pensamentos, é o instrumento mais utilizado na
avaliação de cognições.

O uso desses instrumentos possibilita que o indivíduo seja capaz de, ao lon-
go do tempo, identificar os pensamentos automáticos que estão presentes no sis-
tema cognitivo e no seu repertório comportamental.

O processo de autoconhecimento é essencial no contexto de identificação


dos PAs do modelo cognitivo e para isso, o indivíduo precisa observar e analisar
os impactos positivos e negativos que são a base para esses pensamentos. A
análise dos comportamentos também é importante para se perceber os PAs, já
que as respostas comportamentais são imediatas. A identificação e análise dos
padrões comportamentais do cliente são assertivas para a reestruturação cogni-
tiva.

92
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

Os PAs fazem parte da vida cotidiana, pois são necessários para respon-
dermos às situações, porém, há comportamentos, sentimentos e emoções não
adequadas e eficientes nas quais os pensamentos automáticos e disfuncionais
atuam; esses são os aspectos nos quais deve haver maior observação e foco de
intervenção terapêutica.

A realização do registro dos pensamentos disfuncionais é fácil, mas, necessi-


ta de prática e envolve desafios, como a distinção de sentimentos e pensamentos
e a necessidade de se encontrar as palavras mais adequadas para expressá-los.

É necessário que haja honestidade do indivíduo para o registro dos pensa-


mentos disfuncionais, mas sem perfeccionismo. O mais importante é o reconhe-
cimento dos tipos de pensamentos disfuncionais que há sobre si mesmo, sobre o
futuro e sobre outras pessoas.

As etapas para o registro de pensamentos disfuncionais são:

• Desenhar uma tabela;


• Anotar na 1ª coluna os dias em que a situação ocorreu;
• Descrever como a situação gerou desconforto, com informações-
-chave como o local, momento, pessoas presentes, o que o cliente
estava fazendo, na 2ª coluna;
• Especificar sentimentos, emoções e sensações como medo e raiva
sentidas e avaliar a intensidade, em uma escala de 0 a 100 na 3ª
coluna;
• Listar os pensamentos automáticos e como surgiram na 4ª coluna;
• Refletir sobre respostas alternativas para os pensamentos que foram
registrados na 5ª coluna. Fazer análise racional sobre as respostas,
considerando as evidências sobre os pensamentos que ocorreram,
as possibilidades de compreensão sobre a situação, as consequên-
cias piores e melhores que poderiam resultar da situação, o efeito
obtido com mudanças de pensamento;
• Reavaliar, na 6ª coluna, o grau de convicção sobre cada pensamen-
to descrito na 4ª coluna. Pensar e anotar o que poderia ser feito em
cada uma das situações, depois de considerar interpretações e pos-
sibilidades diversas.

93
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

3 O PAPEL DAS CRENÇAS


INTERMEDIÁRIAS E NUCLEARES NO
MODELO COGNITIVO
3.1 CRENÇAS NUCLEARES ou
CENTRAIS
São formadas no decorrer da vida, a partir da infância, e se fortalecem ao
longo da vida. Constituem-se no nível cognitivo mais profundo e são formadas
por ideias globais, absolutistas e rígidas sobre a própria pessoa, os outros e/ou o
mundo, formando uma tríade cognitiva.

As crenças nucleares são ideias enraizadas e cristalizadas as quais moldam


o jeito de ser e agir das pessoas. As crenças centrais podem ser divididas em:

• Desamor: são sentimentos relacionados ao ato de ser rejeitado como


pensar que é indesejável, feio, defeituoso, que não se é amado nem
bom o suficiente para ser amado.
• Desamparo: são os sentimentos relacionados à incompetência como
pensar que se é incapaz, inadequado, fraco e inferior.
• Desvalor: sentimentos de não desvalia como que não se tem valor,
se é inaceitável ou louco.

3.2 CRENÇAS INTERMEDIÁRIAS


São o conjunto de regras, atitudes ou suposições relacionadas às crenças
nucleares e são mais facilmente identificadas através de afirmações do tipo “se...,
então”, ou “deveria”.

Essas crenças norteiam os comportamentos do sujeito, são muito imperati-


vas e estão diretamente ligadas as crenças centrais. Qual é o papel das crenças
no modelo cognitivo? As crenças são responsáveis pela forma como os indivíduos
respondem aos eventos nas dimensões cognitivas, emocionais e comportamen-
tais.

Como identificar crenças disfuncionais? A análise das crenças disfuncionais


se dá mediante a elaboração do modelo cognitivo e comportamental e na elabora-
ção da conceituação cognitiva de caso pelo terapeuta e paciente.

94
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

É importante a atenção do terapeuta nos discursos emitidos pelo cliente, pois


as crenças disfuncionais são ilustradas por eles, em grande parte dos casos. As-
sim, à medida que o terapeuta consegue perceber o padrão de alguns discursos,
é possível levantar a hipótese da existência de uma crença disfuncional.

A partir disso, é preciso analisar em conjunto todos os comportamentos e


sentimentos que estão envolvidos naquela crença, evidenciando para o cliente o
impacto negativo que ela está causando ao longo da vida.

Além disso, é recomendável que o cliente faça breves anotações e até uso
de símbolos para tentar identificar conexões entre os comportamentos e senti-
mentos. Assim, torna-se mais fácil vinculá-los às crenças limitantes que os ali-
mentam.

É possível perceber que as crenças disfuncionais exercem um papel extre-


mamente importante na vida dos clientes. O primeiro passo para conseguir dissol-
vê-las é realmente entender que elas existem e, assim, conseguir identificar quais
são os pensamentos e sentimentos que estão envolvidos para o enraizamento
delas (COGNITIVO, 2023; IPTNET, 2023).

Os pensamentos disfuncionais ou distorções cognitivas são os


pensamentos e crenças que precisam ser reestruturados no decorrer
da Terapia Cognitivo-Comportamental por serem considerados ele-
mentos centrais para o surgimento e a manutenção dos transtornos
psiquiátricos.

4 MODELOS COGNITIVOS DOS


TRANSTORNOS MENTAIS
4.1 MODELO COGNITIVO DAS
DISFUNÇÕES SEXUAIS
A disfunção sexual é a dificuldade existente em qualquer fase da atividade
sexual e inclui as perturbações do desejo, excitação e orgasmo. Essas disfunções
prejudicam, em graus diversos, a vida sexual de indivíduos e casais, e podem

95
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

afetar a qualidade de vida, relacionamentos sexuais e a saúde emocional (APA,


2022).

As disfunções sexuais podem estar presentes de forma isolada, porém, em


vários casos podem aparecer mais de uma na mesma pessoa, de forma concomi-
tante ou sequencial. A existência de disfunção sexual em uma pessoa pode levar
à disfunção no(a) parceiro(a). Há a prevalência de, pelo menos, uma disfunção
sexual em mulheres adultas em torno de 40% a 45%. E entre os homens adultos,
em torno de 20% a 30% (APA, 2022).

Os levantamentos demonstraram uma tendência de incidência das disfun-


ções sexuais aumentarem de acordo com a idade. Essa tendência manifestou-se
mais estre os homens (APA, 2022). A classificação das disfunções sexuais apre-
senta quatro tipos relativos ao exercício pleno da sexualidade humana.

No entanto, não é muito simples a realização dessa classificação devido ao


fato de que os estudos sobre as disfunções divergem sobre o sistema de classifi-
cação diagnóstica a ser utilizado, de acordo com as especialidades médicas (CID-
11) e psicológicas relacionadas aos tratamentos (DSM-5-TR). Mas, há concordân-
cia de que, em geral, as disfunções sexuais podem ser classificadas em grupos
que são comuns a homens e mulheres.

A primeira classificação se refere ao grupo de disfunções relativas ao desejo


sexual, que são compostos pelas alterações quanto ao desejo sexual e manifes-
tadas pela alteração da libido; geralmente a sua redução e à ausência total de
interesse pelo sexo. No extremo, em ambos os sexos, pode haver a evitação de
qualquer relação a assuntos referentes à sexualidade. No segundo grupo, enqua-
dram-se as disfunções relativas à excitação sexual. Nas mulheres, essas disfun-
ções se apresentam pela incapacidade de a mulher ficar excitada ou até mesmo
de ser estimulada durante o ato sexual. O caso de homens se manifesta pela dis-
função erétil que é a dificuldade do homem de estabelecer ou de manter a ereção.

As perturbações do orgasmo são o terceiro grupo, se referem à dificuldade


de alcançar ou de haver ausência do clímax sexual em ambos os sexos. Em ho-
mens, há perturbação quando a ejaculação se torna lenta, inibida ou é totalmente
ausente (NOBRE, 2005).

A dor é o quarto grupo de disfunções relativas ao exercício do sexo. É a clas-


sificação em que se encontra mais divergência entre os especialistas. Nas mulhe-
res, há a dispareunia, que se manifesta como sensações dolorosas durante o ato
sexual. Há também o vaginismo, que se manifesta como a contração involuntária
de músculos anteriores à vagina e se apresenta ao se iniciar a relação. Tanto a
dispareunia como o vaginismo impossibilitam ou dificultam a realização do ato se-

96
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

xual. Nos homens, a dor se manifesta com graus diferentes de gravidade. Há ain-
da a ejaculação precoce que é a disfunção que ocasiona sofrimento psicológico. A
ejaculação precoce é a ocorrência extremamente rápida da ejaculação, levando à
interrupção do ato sexual.

Estudos, como o de Nobre (2003) sobre a prevalência das disfunções se-


xuais, mostram uma alta variação entre as taxas de incidência, em todo o mun-
do. Isso ocorre devido a essas investigações não utilizarem os mesmos critérios
e metodologias de investigação. Porém, é possível apresentar alguns resultados
medianos baseados em alguns estudos em nível mundial. A média de manifes-
tação em nível mundial de disfunção sexual em mulheres adultas foi de 40% a
45% e entre os homens adultos foi de 20% a 30%. O número de mulheres que
relataram a presença de dor nas atividades sexuais é significativamente menor do
que em homens. Há maior incidência das disfunções sexuais com o aumento da
idade, principalmente em homens. A prevalência de diminuição do desejo sexual
foi maior entre os homens com mais de 60 anos de idade, com média de 20%.

A disfunção erétil apresentou a prevalência de 18,5% e foi maior entre os ho-


mens com mais idade. A ejaculação precoce foi encontrada entre todas as idades,
com 19,5% de média geral. Os estudos sobre as variações epidemiológicas são
muito importantes, pois ajudam na elaboração de hipóteses sobre as causas e
fatores de modulação das disfunções sexuais.

Considerando a variedade de disfunções sexuais, iremos realizar um recorte


metodológico, apresentando ideias sobre a TCC e as disfunções eréteis e as dis-
funções sexuais de mulheres na menopausa (APA, 2022).

Em estudo realizado com 49 homens e 47 mulheres com disfunção sexu-


al, Nobre (2003) afirma que, na construção do modelo cognitivo das disfunções
sexuais existe a contribuição de aspectos cognitivos e emocionais. Sobre os es-
quemas cognitivos, o estudo mostrou que, homens e mulheres com disfunção
sexual tendem a perceber as situações de fracasso como um sinal de incompe-
tência pessoal. Os homens com disfunção sexual que participaram da pesquisa
tenderam a apresentar a crença de que devem estar aptos a desempenharem
as funções sexuais, e que sempre devem dar satisfação sexual ao parceiro. Já
as mulheres que participaram da pesquisa tendem a apresentar crenças sexuais
conservadoras e mais relacionadas com a imagem corporal e beleza física da
pessoa no funcionamento sexual.

97
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Os homens com disfunção sexual apresentaram mais pensamentos e emo-


ções negativas no curso da atividade sexual como pensamentos relacionados
com a ereção e a penetração sexual e menos pensamentos eróticos. As mulheres
apresentaram mais pensamentos de fracasso e desistência e escassez de pensa-
mentos eróticos (NOBRE, 2003).

A TCC voltada para o tratamento da disfunção erétil visa à redução da ansie-


dade e utiliza a técnica de psicoeducação sobre a sexualidade e as expectativas
que a pessoa apresenta em relação a si e a(o) parceira(o). Ademais, esclarece
sobre o papel dos estímulos sexuais, além da penetração, que podem ser utiliza-
dos na atividade sexual, como o sexo oral e outras práticas.

A TCC de casal também é uma modalidade que poderá ajudar na resolu-


ção de crenças de dominância, intimidade, confiança e trabalhar nas questões
relativas à perda da atração sexual entre os parceiros. No caso da TCC aplicada
a casais, A. Beck (2007) apontou que muitos problemas vivenciados dentro do
casamento também poderiam estar relacionados às cognições disfuncionais de
ambos os parceiros.

Alguns estudos realizados por A. Beck ratificaram essa hipótese sobre o pa-
pel negativo dos pensamentos, crenças, expectativas, atribuições, entre outros,
na qualidade dos relacionamentos maritais. Há, ainda, os pensamentos automá-
ticos, que são os fluxos de ideias instantâneas, que podem passar na mente de
um dos cônjuges e influenciar o estado emocional e as suas ações negativamente
(BECK, 2007). A leitura mental é um tipo de distorção de pensamento em que
uma pessoa acredita ser capaz de “ler” os pensamentos de outra. Por exemplo,
quando o marido estiver falando com a esposa e essa bocejar por estar cansada,
ele poderá pensar “ela está achando chato conversar comigo” (DATTILIO, 2011).

Scribel (2020) explica que os processos circulares da TCC com casais en-
volvem fatores cognitivos, afetivos e comportamentais e que fatores como inter-
câmbios comportamentais negativos e comunicação distorcida geram danos ao
relacionamento amoroso, pois se constituem como barreiras para a resolução de
problemas.

A TCC para o tratamento da disfunção erétil tem sido semelhante desde a


sua origem, tomando como base conceptual e interventiva os trabalhos dos psi-
cólogos Masters e Johnson, realizados nos anos 1960-1970. As técnicas desen-
volvidas por estes psicólogos ainda são as mais utilizadas na prática clínica e
as que mais se aproximam a um protocolo de intervenção para a generalidade
das disfunções sexuais. Como o esclarecimento sobre as etapas que compõem

98
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

o ciclo sexual: o desejo, a excitação, o platô, o orgasmo e a resolução. Também


apresentam quais os fatores podem prejudicar a realização adequada de todo o
ciclo de realização de atividade sexual.

Sobre as disfunções sexuais de mulheres na menopausa, é fato que a sexu-


alidade na idade madura envolve descobertas e várias transformações trazidas
pelas alterações hormonais e psicológicas. Há um desconforto e muita incompre-
ensão sobre como as alterações orgânicas e não orgânicas levam as mulheres à
recusa ou a apresentarem dificuldades com o sexo. Em torno de um terço da vida
feminina ocorre na pós-menopausa e o sexo faz parte das atividades que aumen-
tam a qualidade de vida, o que reforça a importância das estratégias de reabilita-
ção sexual (ALMEIDA et al., 2018).

A disfunção sexual feminina envolve transtornos relacionados ao interesse


sexual, excitação, orgasmo, dor genitopélvica e disfunções relacionadas ao uso
de substâncias ou medicamentos, além das não classificadas. A disfunção sexual
diminui o interesse por sexo e leva a dificuldades para a excitação subjetiva e/ou
genital, as quais irão afetar o relaxamento vaginal necessários para a penetração.
Na menopausa, a disfunção sexual gera sentimentos de inferioridade, angústia,
depressão, insegurança, baixa autoconfiança e crenças disfuncionais sobre a ca-
pacidade de provocar desejo no parceiro. O tratamento da disfunção envolve os
afetos femininos, pensamentos, comportamentos e informação sobre o corpo. Os
tabus morais são trabalhados para o desenvolvimento da atração, estimulação
adequada e função sexual, com maior compreensão e conhecimento sobre a rela-
ção íntima da mulher com seu corpo e parceiro (ALMEIDA et al., 2018).

Sabemos que crenças são entendimentos duradouros, fundamentais e pro-


fundos, não articuladas nem para o próprio indivíduo (RANGÉ, 2011). Portanto,
na disfunção sexual feminina, a TCC deve se centrar na positividade das crenças
individuais e na redução ou resolução dos fatores subjetivos. Quando norteadas
para atender a todas as vias de ação de relaxamento baseadas nas orientações
cognitivas, autonômicas, musculares e nos procedimentos terapêuticos adequa-
dos, as técnicas de TCC para transtornos sexuais contribuem para resultados
mais efetivos (ALMEIDA et al., 2018).

Há a oportunidade de se trabalhar com os PAs e as distorções cognitivas


em geral, para que a estrutura física e mental esteja em harmonia. Portanto, pro-
põem-se um trabalho integral para que as terapias sexuais sejam bem-sucedidas.

Sabe-se que os pensamentos não conscientes e espontâneos são capazes


de decodificar as circunstâncias e que as pessoas tendem a acolher os pensa-
mentos automáticos sem que estejam hábeis a realizar uma monitorização ade-
quada e, dessa forma, a terapia sexual pode contribuir para que o cliente seja

99
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

capaz de conhecer e monitorar pensamentos disfuncionais que os levam à disfun-


ção sexual. Neste processo, o terapeuta deve ter pleno conhecimento das aborda-
gens farmacológicas e psicoterápicas possíveis de serem utilizadas, devendo es-
tar sempre orientado para a fisiologia da resposta sexual (ALMEIDA et al., 2018).

A TCC se mostra eficaz para o tratamento das disfunções sexuais porque


pode ajudar a modificar as condutas inadequadas, centrando-se em questões
apresentadas pelo indivíduo quando procura a terapia, já que a finalidade da TCC
é contribuir para que a apreensão de novas maneiras de se viver e de se reagir,
desde que haja a promoção de alterações cognitivas e comportamentais. As técni-
cas adotadas nas terapias sexuais se estabelecem por meio da uma colaboração
entre o terapeuta e o cliente, as estratégias são orientadas para a superação de
problemas devendo ser projetadas conjuntamente (ALMEIDA et al., 2018). Por-
tanto, a base do tratamento proposto com a TCC é o sofrimento manifestado pelo
cliente, partindo das distorções que ocorrem nas autoavaliações e a avaliação da
realidade em que o indivíduo está inserido. O que se almeja é atuar na possibi-
lidade de a pessoa em tratamento atingir uma maneira de agir mais assertiva e
saudável em relação às condições existentes.

A disfunção sexual é a dificuldade existente em qualquer fase da


atividade sexual e inclui as perturbações do desejo, excitação e
orgasmo.

Sobre a TCC e o tratamento das disfunções sexuais, analise as


afirmações:

a) ( ) A TCC voltada para o tratamento da disfunção erétil visa o


aumento da ansiedade do cliente.
b) ( ) Na TCC voltada para o tratamento da disfunção erétil, são
esclarecidos o papel dos estímulos sexuais, além da penetração,
como o sexo oral e outras práticas.
c) ( ) Na TCC voltada para o tratamento das disfunções sexuais
na menopausa se trabalham os pensamentos, mas não os senti-
mentos sobre o corpo das mulheres.
d) ( ) A TCC para o tratamento da disfunção erétil abandonou a
base conceptual e interventiva dos psicólogos Masters e Johnson
na década de 1960.
e) ( ) A TCC de casal auxilia na resolução de crenças de dominân-
cia e confiança, mas é inadequada ao tratamento de questões
relacionadas às disfunções sexuais dos parceiros.

100
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

Resolução: a TCC voltada para o tratamento da disfunção erétil


visa à redução da ansiedade no paciente e usa a psicoeducação
para esclarecer sobre os estímulos sexuais, além da penetração,
como o sexo oral e outras práticas

4.2 MODELO COGNITIVO DO


TRANSTORNO DE PÂNICO
A ansiedade é um sentimento que ocorre comumente em todos os seres hu-
manos, trata-se de um mecanismo de resposta cerebral ativado quando vemos
a necessidade de enfrentar desafios ou quando estamos diante de situações de
estresse (MANFRO et. al., 2008).

O sentimento de ansiedade passa a ser considerado como um problema


quando passa a ser mais acentuado do que deveria e interfere negativamente na
vida das pessoas, passando a ser denominado como um transtorno de ansieda-
de. A ansiedade em excesso poderá levar o indivíduo a apresentar dificuldades de
interagir socialmente, de realizar as suas atividades profissionais e de estabelecer
ou manter relacionamentos afetivos, pois a sua ação no cérebro passa a ser um
incapacitante para o desempenho adequado dessas funções (MANFRO et. al.,
2008).

A grande diferença entre a ansiedade natural da vida cotidiana e o Trans-


torno de Pânico é a intensidade em que se apresentam, já que a ansiedade em
excesso poderá levar ao surgimento de ataques de pânico, os quais provocam
sintomas como a sensação de irrealidade e, até mesmo, medo da morte iminente.

Os transtornos de ansiedade são classificados em dois grandes grupos. Ob-


serve a Figura 1:

101
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Figura 1 – Classificação dos transtornos de ansiedade

Fonte: adaptada de APA (2022)

O Transtorno de Pânico está classificado no DSM – 5-TR na classificação


300.01 (APA, 2022). Os critérios diagnósticos para Transtorno de Pânico são a
ocorrência de ataques de pânico constantes e inesperados que são definidos
como um surto abrupto ou repentino de medo intenso ou desconforto intenso que
alcança um pico em poucos minutos (APA, 2022). Para ser caracterizado como
um ataque de pânico devem ocorrer pelo menos quatro do total de sintomas des-
critos a seguir (APA, 2022):

Figura 2 – Sintomas de ataques de pânico

Fonte: adaptada de APA (2022)

102
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

O DSM - 5-TR adverte ainda que podem ser verificados sintomas específicos
de uma cultura, como tinido, dor na nuca, cefaleia, gritos ou choro incontrolável
e que esses sintomas não precisam ser enumerados e sim, serem considerados
como um dos quatro sintomas típicos (APA, 2022). Outro critério é que um dos
ataques deve ocorrer entre um ou mais meses e ser acompanhado de uma ou
ambas das características a seguir:

Figura 3 – Características do ataque de pânico

Fonte: adaptada de APA (2022)

Outro critério é que a perturbação da ansiedade não deve ser considerada


consequência de efeitos psicológicos de substâncias como medicamento ou de
condições médicas como o hipertireoidismo e as doenças cardiopulmonares. E,
ainda, que a perturbação não deve ser mais bem explicada por outro transtorno
mental, como no caso de Transtorno de Ansiedade Social, nem como reação a
objetos ou situações fóbicas específicas nem, tampouco, como resposta caracte-
rística de outros tipos de transtorno de ansiedade (APA, 2022).

A ocorrência dos sintomas iniciais de Transtorno de Pânico se dá, geralmen-


te, em um período mais tardio, em torno dos 30 anos e, em média, afeta duas a
três vezes mais mulheres do que os homens, podendo atingir até 3,5% da popu-
lação durante a vida. O transtorno está relacionado ao alto custo social devido ao
fato dos clientes com esse diagnóstico apresentarem redução da produtividade e
alta frequência de utilização de serviços públicos de saúde, como os prontos de
atendimentos, as consultas e os exames médicos (MANFRO et. al., 2008).

O modelo cognitivo do Transtorno de Pânico se caracteriza pelos ataques de


medo intenso que se encontram relacionadas a “interpretações distorcidas e ca-
tastróficas dos sintomas corporais” (MANFRO et. al., 2008, p. 82). A tontura e as
palpitações cardíacas tendem a ser interpretadas como sintomas de um ataque

103
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

cardíaco ou de um infarto iminente. Essas interpretações específicas aumentam


ainda mais a excitação e levam ao aumento das sensações corporais o que con-
firma o sentimento de alarme ou de perigo iminente e estimulam mais ainda o
pensamento catastrófico e a ansiedade em espiral (MANFRO et. al., 2008).

Manfro et. al. (2008) afirmam que o ataque de pânico inicial se apresenta
como uma espécie de “alarme falso” em resposta, em geral, aos estressores na-
turais do cotidiano. Os estressores mais relatados pelos clientes com ataques de
pânico são os eventos de vida considerados como negativos, como perdas amea-
çadoras, doenças graves de si ou de pessoas queridas, separações afetivas e/ou
dificuldades interpessoais.

Existe a hipótese de que o alarme apareça com mais probabilidade nos indi-
víduos mais vulneráveis no âmbito biológico, em virtude de uma herança genética
ou no âmbito psicológico, como no caso de maior sensibilidade aos sintomas de
ansiedade.

Posteriormente ao primeiro ataque de pânico, a pessoa poderá ficar ansiosa


e apreensiva em relação a ocorrências de novos ataques, levando-a a desenvol-
ver o medo das sensações físicas que se relacionam à excitação da ansiedade
(MANFRO et al., 2008).

A hipótese de maior vulnerabilidade biológica é confirmada por experimentos


que apontam a existência de relações neuroquímicas no Transtorno de Pânico.
Essas pesquisas costumam ser realizadas com a testagem de medicações agem
nos neurotransmissores associados ao transtorno de pânico, em especial, à sero-
tonina e à noradrenalina (MANFRO et al., 2008).

104
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

Figura 4 – Etiologia do transtorno de pânico segundo o modelo de Barlow (1988)

Fonte: Manfro et al. (2008, p. 83)

As pesquisas realizadas sobre o Transtorno de Pânico levantam a hipóte-


se de que a repetição de ataques pode levar os indivíduos a se tornarem cada
vez mais sensíveis aos estímulos internos e às situações que desencadearam os
ataques anteriores. Também ocorre o aumento da hipervigilância (ampliação ex-
cessiva da atenção voluntária) em relação às sensações físicas, combinada à an-
siedade antecipatória (medo de sofrer novos ataques), e ao efeito do pensamento
catastrófico sobre os sintomas (MANFRO et al., 2008).

Os comportamentos acionados e condicionados devido ao medo, levam o


indivíduo a evitar a ocorrência dos sintomas somáticos, por exemplo, evitar a re-
alização de exercícios físicos e se distanciar de lugares associados a ataques de
pânico prévios, como acontece no caso da existência de agorafobia (MANFRO et
al., 2008).

105
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

A TCC para o Transtorno de Pânico apresenta boas respostas de curto e de


longo prazo em relação aos sintomas de pânico, de ansiedade antecipatória, da
evitação fóbica e da agorafobia. A TCC é utilizada para se eliminar ou se reduzir a
hipervigilância do cliente sobre os sintomas, na correção de interpretações e cren-
ças distorcidas e na redução/eliminação da agorafobia (MANFRO et al., 2008;
OLIVEIRA, 2011).

A TCC para o transtorno do pânico é, tipicamente, um tratamento breve, en-


tre 10 e 20 sessões estruturadas, com objetivos claros como a correção das in-
terpretações catastróficas, dos medos condicionados das sensações corporais e
das evitações. Pode ser introduzida em qualquer etapa do tratamento, desde a
prevenção primária até as intervenções em indivíduos que não tiveram sucesso
em outros tratamentos (OLIVEIRA, 2011).

As técnicas cognitivas utilizadas no tratamento do Transtorno de Pânico são


a psicoeducação, a reestruturação cognitiva e a resolução de problemas. As técni-
cas comportamentais são a exposição interoceptiva e in vivo. Há, ainda, o uso do
relaxamento muscular e da respiração abdominal ou diafragmática para aliviar a
ansiedade (MANFRO et. al., 2008).

A psicoeducação e a reestruturação cognitiva tem a função de ensinar o


cliente a identificar os pensamentos e as interpretações que ocorrem quando sur-
gem os sintomas de ansiedade. As técnicas de relaxamento muscular e de respi-
ração diafragmática são utilizadas para equilibrar o sistema nervoso autônomo.

A exposição interoceptiva tem como objetivo a correção da catastrofização


dos sintomas físicos decorrentes da ansiedade antecipatória e/ou do ataque de
pânico. Através dela, os clientes são treinados para se sentirem mais confortáveis
diante dos sintomas de ansiedade, através de uma exposição gradual e intencio-
nal a esses sintomas, utilizando exercícios físicos ou recursos como o rodar em
uma cadeira giratória ou da hiperventilação para a indução de tonturas. Essa ex-
posição permite que os clientes sejam capacitados a identificar os pensamentos
catastróficos relacionados às sensações físicas e, posteriormente, tentem corrigi-
-los (MANFRO et al., 2008).

Os exercícios realizados através da exposição interoceptiva agem como uma


preparação prévia para a exposição in vivo. A exposição in vivo é a intervenção
mais utilizada para a redução da evitação agorafóbica. A fim de realizar o plane-
jamento da exposição in vivo, o cliente deverá elencar os locais e/ou eventos que
evitou e registrar o nível de ansiedade e os tipos de pensamentos automáticos
que ocorreram nessas situações. Os itens da listagem devem ser apresentados
em forma de hierarquia e de acordo com a dificuldade de enfrentamento dos lo-
cais e dos eventos. Os exercícios de exposição in vivo devem ser usados, ini-

106
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

cialmente, nas situações menos ansiogênicas, ampliando-se o uso para as mais


ansiogênicas; devem ser repetidas até que o cliente se sinta confortável nas situ-
ações apresentadas e o nível de ansiedade deve ser avaliado e monitorado tanto
pelo cliente como pelo terapeuta (MANFRO et al., 2008).

O tratamento para o transtorno de pânico pode ser realizado de forma mais


intensa, com mais de uma sessão semanal nos primeiros meses, mas, posterior-
mente, o psicoterapeuta poderá atender ao cliente em sessões de reforço intermi-
tentes por períodos mais longos. Uma sessão de TCC tem, em média, de 45 a 50
minutos de duração, mas podem ser realizadas sessões mais longas para o trata-
mento de clientes com transtorno de pânico mais intenso (MANFRO et al., 2008).

Destaca-se ainda que, as formas breves de Terapia Cognitivo-Comportamen-


tal, em combinação com sessões virtuais, já foram descritas para o tratamento de
Transtorno de Pânico, e os psiquiatras capacitados podem combinar a psicotera-
pia com o uso de farmacoterapia (OLIVEIRA, 2011).

4.3 MODELO COGNITIVO DOS


TRANSTORNOS DA PERSONALIDADE
O DSM – 5-TR (2022) define o Transtorno de Personalidade como um pa-
drão persistente e inflexível e persistente de experiências subjetivas e de com-
portamentos que se apresentam desviados acentuadamente das expectativas da
cultura a que o indivíduo pertence. Esse padrão deve levar a alterações que pro-
voquem sofrimento significativo e prejuízo no funcionamento social, profissional
e/ou áreas relevantes da vivência individual, se apresentando de forma estável e
com longa duração, com surgimento a partir da adolescência ou início da idade
adulta.

O padrão descrito deve se manifestar pelo menos em duas das áreas a se-
guir:

107
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Figura 5 – Áreas de manifestação dos transtornos de personalidade

Fonte: adaptado de APA (2022)

Outros critérios são: a existência de padrão persistente não é explicada como


uma manifestação ou como consequência de outros transtornos mentais, ou que
pode ser atribuído a efeitos fisiológicos de substâncias como droga de abuso, me-
dicamentos e nem a outra condição médica como traumatismo cranioencefálico
(APA, 2022).

O DSM-5 – TR apresenta 10 transtornos de personalidade, que são classifi-


cados em três grupos de acordo com as suas semelhanças.

Figura 6 – Grupos de transtornos de personalidade

Fonte: adaptado de APA (2022)

108
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

Sobre o desenvolvimento e curso dos Transtornos de Personalidade, suas


características são observadas no decorrer da adolescência ou no início da vida
adulta, mas algumas características de transtornos da personalidade, espe-
cialmente, os transtornos da Personalidade Antissocial e Borderline podem ser
menos evidentes ou desaparecer com o envelhecimento do indivíduo. As clas-
sificações dos Transtornos de Personalidade podem ser utilizadas na infância e
adolescência em casos relativamente raros, nos quais os traços de má adaptação
da personalidade dos indivíduos são mais difusos, persistentes e menos limitados
a um estágio do desenvolvimento e/ou à existencia de outro transtorno mental
específico (APA, 2022).

O modelo de intervenção da Terapia Cognitivo-Comportamental para os


Transtornos de Personalidade deverá seguir o seguinte protocolo: avaliação clí-
nica, conceituação cognitiva de caso; intervenções técnicas e estabelecimento de
aliança terapêutica semelhante às desenvolvidas no tratamento para outros trans-
tornos (DAVID; FREEMAN, 2017).

A Conceituação Cognitiva de caso deve ser mais dinâmica no caso dos


Transtornos de Personalidade, com a discussão dos atuais problemas, dos pro-
blemas passados e dos problemas expressos na relação e no ambiente terapêuti-
co. O tratamento deve ser mais prolongado em comparação com outros transtor-
nos e as intervenções podem ser realizadas individualmente ou em grupo (DAVID;
FREEMAN, 2017). A TCC baseada em esquemas vem sendo a mais indicada e com
maiores evidências de eficácia para os transtornos de personalidade já que a TCC
tradicional não tem apresentado tanta eficácia e, ainda, existem algumas aborda-
gens especificas para determinados transtornos que devem ser analisadas caso a
caso.

4.4 MODELO COGNITIVO DO


TRANSTORNO DA PERSONALIDADE
OBSESSIVO-COMPULSIVA
O transtorno da personalidade obsessivo compulsiva é um transtorno mental
considerado grave e está classificado no DSM – 5-TR (2022) no grupo C da cate-
goria de transtornos de personalidade. Não deve ser confundido com o Transtorno
Obsessivo-Compulsivo (TOC), que está classificado em outra categoria nesses
manuais.

109
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

De acordo com o DSM – 5-TR (2022, p. 722), o indivíduo com esse transtor-
no apresenta “um padrão difuso de preocupação com ordem, perfeccionismo e
controle mental e interpessoal à custa de flexibilidade, abertura e eficiência que
surge no início da vida adulta e está presente em vários contextos”.

Os indivíduos com Transtorno de Personalidade Obsessivo-Compulsivo dão


atenção excessiva e cuidadosa a regras, detalhes, listas etc., a ponto disso se
tornar objetivo principal da sua atividade; são excessivamente perfeccionistas e
se impõem padrões de desempenho tão elevados que causam sofrimento signi-
ficativo e aos outros. Demonstram excessiva dedicação ao trabalho, mesmo sem
necessidade financeira e excluem as atividades de lazer e sociais (APA, 2022).

Podem ser excessivamente conscienciosos e inflexíveis sobre assuntos que


envolvem moralidade, ética ou valores. Podem ser incapazes de se desapegar
de objetos usados, mesmo os sem valor sentimental, com alto potencial para se
tornarem acumuladores. Relutam em delegar tarefas ou em trabalhar em equipe e
insistem que tudo seja realizado da sua maneira. Podem ser mesquinhos a ponto
de manterem um padrão de vida inferior ao que podem sustentar. São extrema-
mente rígidos e teimosos.

De acordo com o DSM – 5-TR (2022), as características essenciais são as


obsessões e/ou compulsões recorrentes que consomem tempo (em torno de mais
de uma hora por dia) e que causam sofrimento e prejuízo significativo ao indivíduo
e aos outros. Entende-se como obsessões as ideias, pensamentos e impulsos ou
intrusivos, irracionais, repetitivos e que causam ansiedade ou sofrimento, excessi-
vas e não realistas em relação ao que querem neutralizar ou evitar.

Para neutralizar as obsessões, os indivíduos apresentam compulsões que


são os comportamentos repetitivos. A realização das compulsões tem caráter de
prevenção ou de redução da ansiedade ou sofrimento. As principais compulsões
verificadas em clientes são as verificações, lavagens de mãos frequentes, conta-
gem ou conferência, rituais de simetria e acumulação (FORMIGA, 2012).

110
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

Figura 7 – Lavagem de mãos frequentes como ritual de limpeza

Fonte: https://encurtador.com.br/btAL9. Acesso em: 10 abr. 2023.

O conjunto de causas não é bem conhecido, mas se relaciona a fatores pecu-


liares (individuais), biológicos e genéticos, que possibilitam o aumento da susce-
tibilidade da pessoa para desenvolver o transtorno. Os fatores psicológicos como
as aprendizagens errôneas, as crenças distorcidas e pensamentos catastróficos
aparecem na maioria dos casos e desempenham um papel importante no apareci-
mento e manutenção dos sintomas (CORDIOLI, 2008).

Assim como nos demais transtornos de personalidade, os sintomas apare-


cem na infância ou no final da adolescência. Em vários casos, os sintomas podem
ser incapacitantes e comprometer a qualidade de vida de seus portadores (FOR-
MIGA, 2012).

O modelo cognitivo indica que os pensamentos automáticos negativos e in-


trusivos são normalmente ligados às crenças sobre a responsabilidade ou culpa
por danos a si mesmo, ou aos outros, essa forma de interpretar pensamentos e
crenças gera comportamentos de neutralização e contraestratégias improdutivas,
o que eleva a atenção seletiva e o humor negativo. Esses, por sua vez, mantêm
as crenças negativas e o transtorno (FORMIGA, 2012).

O tratamento envolve a utilização de medicamentos inibidores seletivos da


recaptação da serotonina (ISRS) combinados com a Terapia Cognitiva-Comporta-
mental (FORMIGA, 2012).

111
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Figura 8 – Aliança terapêutica

Fonte: https://encurtador.com.br/cGN24. Acesso em: 10 abr. 2023.

No tratamento de indivíduos com transtornos agudos, os psicoterapeutas de-


vem exibir capacidade de aconselhamento, empatia, genuinidade, compreensão
e considerações positivas), além de promover uma relação colaborativa, adap-
tada ao estilo do cliente, respondendo aos seus feedbacks com generosidade,
aliviando o seu sofrimento e o tratando com respeito e humanidade.

Os clientes com transtornos agudos começam o tratamento com expectati-


vas positivas em relação ao terapeuta e do tratamento, com a expectativa de que
a terapia o ajudará a se sentir melhor.

Em geral, os clientes tendem a aceitar as orientações do terapeuta sem apre-


sentar conflitos ou ansiedade. A confiança no terapeuta e a ausência de dúvidas
ou preocupações sobre o seu comportamento ou percepção sobre ele auxiliam no
aumento da aderência ao tratamento e na compreensão e aceitação da respon-
sabilidade pelo seu trabalho durante as sessões e no esforço para melhorar. Há
exceções, como no caso de pacientes com transtorno Borderline.

A fim de responder à orientação do psicoterapeuta, o cliente com transtorno


de personalidade apresenta, com frequência, afeição e gratidão por prever o alívio
e, posteriormente, reconhecer a melhora do seu quadro.

O profissional deverá tratar os clientes com transtorno de personalidade


usando habilidades a fim de intensificar a aliança, sabendo que podem surgir difi-
culdades nesse relacionamento, já que é esperado que os clientes iniciem o trata-
mento com a expectativas de que o terapeuta irá controlá-lo ou julgá-lo.

112
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

Os clientes irão trazer crenças disfuncionais arraigadas, negativas e generali-


zadas sobre si e os outros, assim como estratégias disfuncionais de enfrentamen-
to interpessoal para o contexto terapêutico. Ao resolver as dificuldades na aliança
terapêutica, o psicoterapeuta poderá ajudar os clientes a generalizar as aprendi-
zagens para melhorar os seus relacionamentos fora do contexto de tratamento.

O caráter qualitativo da aliança terapêutica é importante e o terapeuta deve


tentar desenvolver um relacionamento afetuoso e de confiança com o cliente,
através da demonstração de um interesse genuíno no cliente e sua vida, além do
comprometimento no trabalho a ser desenvolvido com ele.

Pode ser necessário ajudar o cliente com transtorno da personalidade a ana-


lisar o que é melhor para ele sem imposições e respeitando a sua autonomia. O
psicoterapeuta deve prestar atenção as suas reações emocionais negativas as-
sim como as de seu cliente a fim de identificar e de modificar os pensamentos
distorcidos que levam a respostas improdutivas no processo psicoterápico.

O tratamento de cliente com transtorno de personalidade implica que o tera-


peuta dedique mais tempo para analisar a vida do cliente, indagando seus filhos,
cônjuge, amigos, família, trabalho e lazer de forma a demonstrar interesse e in-
dicar aos clientes que ele se importa com eles e entende a realidades de suas
vidas.

Os transtornos de personalidade são padrões persistentes e ge-


neralizados no modo de pensar, perceber, reagir e se relacionar que
causam sofrimento significativo à pessoa e/ou prejudicam sua capa-
cidade funcional.

A diferença entre a ansiedade natural e o transtorno de pânico se


dá em função da intensidade em que se apresenta. A ansiedade
excessiva pode levar ao surgimento de ataques de pânico. Sobre
a definição de ataques de pânico, assinale a alternativa correta:

a) ( ) Surto abrupto de medo intenso que dura alguns minutos.


b) ( ) Ansiedade constante, permanente, generalizada, livre e flutu-
ante.

113
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

c) ( ) Surto previsível de medo intenso que dura em torno de uma


hora.
d) ( ) Ansiedade pontual e focada em situações desconhecidas.
e) ( ) Ansiedade relacionada à altura e demais fobias.

Resolução: A alternativa correta é “Surto abrupto de medo intenso


que dura alguns minutos”. De acordo com o DSM -5-TR é a ocor-
rência de ataques de pânico constantes e inesperados que são de-
finidos como “um surto abrupto de medo intenso ou desconforto
intenso que alcança um pico em minutos” (APA, 2022, p. 252).

5 TÉCNICAS COGNITIVAS E
COMPORTAMENTAIS
Entre as abordagens existentes na psicoterapia, a TCC vem se destacan-
do pela eficácia das estratégias de intervenção direta em relação aos problemas
atendidos, no entanto, o aprofundamento clínico não se faz apenas com estudos
teóricos e há necessidade de buscar informações e aperfeiçoamento para a atu-
ação em TCC.

Sendo uma abordagem clínica com subsídios que fortalecem o atendimento


psicoterapêutico, a TCC tem base científica, pois seus precursores usaram méto-
dos científicos sobre comportamento e neurociências para a elaboração de suas
práticas.

O terapeuta cognitivo-comportamental deve compreender que a forma como


uma pessoa se comporta se baseia em seus pensamentos e sentimentos dian-
te das situações da vida. O trabalho do terapeuta é realizar a identificação dos
padrões de comportamento do seu cliente e conhecer os motivos pelos quais a
pessoa buscou a psicoterapia, assim como entender os pensamentos, emoções e
comportamentos envolvidos nas situações.

Dessa maneira, o foco da psicoterapia são as disfunções envolvidas na re-


lação entre emoções, pensamentos e comportamentos e nas intervenções rea-
lizadas para modificar os aspectos disfuncionais, substituindo-os por processos
funcionais.

114
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

Nesse contexto, técnicas de terapia cognitivo-comportamental são funda-


mentais para a atuação clínica. Após a realização da identificação dos problemas,
o terapeuta cognitivo-comportamental deverá utilizar técnicas de intervenção, con-
siderando as particularidades das necessidades e o grau de sofrimento do cliente.

As técnicas cognitivas e comportamentais levam à maior eficácia clínica e


auxiliam em casos complexos, avaliando e direcionando o cliente a se desen-
volver de forma funcional. O terapeuta deve utilizar técnicas adequadas diante
de emoções negativas apresentadas pelo cliente e ajudá-lo no reconhecimento e
modificação dos pensamentos, na avaliação da veracidade das afirmações e na
análise das evidências em contrário. O terapeuta não tem como objetivo estimular
processos de autodefesa e/ou de pensamento positivo, mas antes, exercer o pen-
samento realista.

Ao se estimular a compreensão das emoções, estimula-se a motivação atra-


vés das técnicas que irão ativar pensamentos e sentimentos que confrontem com
a realidade de forma racional. Os críticos da TCC afirmam que essa abordagem
é demasiadamente racionalista, mas a aplicação de técnicas empáticas e motiva-
cionais auxiliam o cliente a compreender o objetivo das intervenções.

5.1 ALGUMAS TÉCNICAS COGNITIVAS


E COMPORTAMENTAIS
Existe uma variedade bastante grande de técnicas cognitivas e comporta-
mentais e iremos apresentar algumas delas.

Psicoeducação

A psicoeducação é uma das técnicas mais utilizadas pela TCC e tem como
função orientar o cliente em relação às consequências de um determinado com-
portamento, a construção de crenças, os valores e sentimentos e como todos es-
ses elementos influenciam a sua vida e a dos outros (BECK, 2013). Essa técnica
se baseia na explicação de questões importantes do tratamento psicológico ao
cliente. Ela deve ser feita da forma mais simples e didática possível, de acordo
com a linguagem de cada pessoa. A psicoeducação trata tanto de dados sobre o
diagnóstico quanto de explicações sobre as atividades que são utilizadas durante
as sessões (BECK 2013).

Realizar a psicoeducação traz bons resultados na adesão da pessoa à te-


rapia, pois oferece informações relevantes para que ela se envolva no tratamen-
to ativamente. Além disso, a técnica contribui também para diminuir a ansiedade

115
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

do cliente diante de um diagnóstico difícil ou mesmo do desafio de fazer terapia.


Essa é uma estratégia muito utilizada também na Psicologia Hospitalar.

Algumas pessoas são encaminhadas ao psicólogo depois de serem identifi-


cadas com algum transtorno emocional, como a síndrome do pânico ou o TOC.
Muitas vezes, esses clientes chegam à terapia com poucas informações sobre o
problema que enfrentam. Assim, a postura do terapeuta cognitivo-comportamental
faz toda a diferença no acolhimento que eles recebem e na perspectiva de melho-
ra que podem ter (BECK, 2013).

Registro de Pensamentos Disfuncionais (RPD)

Essa é outra técnica muito comum na TCC. Como o foco da abordagem é a


relação entre pensamento e comportamento, é essencial identificar os elementos
disfuncionais. Ao utilizar essa técnica, o terapeuta pede que o cliente registre os
pensamentos desagradáveis que surgem em determinadas situações.

Por exemplo, se a pessoa tem fobia social, ela deve escrever o que pensa
quando está com medo ou ansiosa diante da possibilidade de se expor. Algumas
vezes, também é pedido que se registrem sentimentos, reações físicas e compor-
tamentos envolvidos na situação. Essa tarefa ajuda o cliente a tomar consciência
de si.

O RPD tem diversas utilidades na clínica. A primeira delas é para que o clien-
te se dê conta do que pensa e sente quando enfrenta um problema, já que, em
muitos casos, as pessoas reagem de forma automática e não conseguem enten-
der a situação. Além disso, o terapeuta faz uso desse registro para encaminhar as
sessões e utilizar outras técnicas que auxiliem no processo de modificação dos
padrões negativos (COGNITIVO, 2023).

Figura 9 – Registro de pensamentos disfuncionais

Fonte: https://encurtador.com.br/elpNY. Acesso em: 11 abr. 2023.

116
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

Questionamento socrático

Essa também é uma das técnicas de TCC mais utilizadas. A atuação clínica
da TCC se baseia bastante no questionamento socrático. Na prática, isso significa
que o terapeuta vai fazer uma série de perguntas com o objetivo de ajudar o clien-
te a aprofundar sua compreensão sobre os próprios pensamentos. Muitas pesso-
as se comportam de forma automática, sem perceber os pensamentos e emoções
que estão por trás disso. Na terapia, o cliente é colocado diante de perguntas que
aprofundam a reflexão e o fazem pensar sobre as relações complexas que a men-
te dele estabelece. Assim, é possível perceber e modificar distorções cognitivas.

A função do terapeuta não é oferecer respostas ou direcionar a forma como


as pessoas pensam e se comportam. Ao fazer perguntas, ele constrói possibili-
dades para que os clientes compreendam melhor seus pensamentos e tomem
suas próprias decisões. Com essa técnica, os elementos disfuncionais podem ser
questionados e colocados em xeque (COGNITIVO, 2023).

Exposição e Prevenção de Respostas (EPR)

A técnica de Exposição e Prevenção de Respostas (EPR) consiste em expor


o indivíduo às situações que estimulam respostas de ansiedade e à redução da
emissão de respostas compulsivas. Através da EPR, os clientes são estimulados
a se exporem às situações que causam o surgimento das obsessões e dos com-
portamentos compulsivos, buscando não utilizar as respostas de evitação (FOR-
MIGA, 2012).

Inicialmente, essa técnica irá aumentar a ansiedade e os pensamentos ob-


sessivos e a prevenção de respostas tende a funcionar melhor se a técnica for
utilizada de maneira colaborativa. Assim, cliente e terapeuta trabalham juntos em
relação aos objetivos de prevenção de respostas a fim de aumentar o engajamen-
to do cliente (WRIGHT; THASE, 2008).

A técnica de EPR inicia-se com a elaboração de uma lista de estímulos de-


sencadeadores de ansiedade, com a atribuição de notas para o grau de ansieda-
de que é manifestada (0 - 10). Após a elaboração dessa lista, o cliente precisa en-
frentar cada uma das situações listadas, iniciando pelas que promovem um menor
grau de ansiedade com objetivo de diminuir a frequência dos rituais.

Pode-se fazê-la, inicialmente, através da imaginação, até que haja a redução


do desconforto para posteriormente, o cliente ser exposto às situações de forma
presencial. A repetição dos exercícios ajuda a diminuir ou extinguir os sintomas atra-
vés do fenômeno conhecido como habituação. Ainda há a importância de se esta-
belecer boa relação terapêutica para a eficácia da psicoterapia (FORMIGA, 2012).

117
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

É importante identificar as dificuldades do cliente e determinar as razões pe-


las quais ele não consegue aplicar soluções para determinados problemas e o
terapeuta deverá trabalhar estrategicamente para organizar a condução do pro-
cesso terapêutico e estabelecer as metas a serem atingidas pela utilização da
conceitualização cognitiva e da técnica de EPR.

Dessensibilização sistemática

É uma técnica de exposição utilizada no tratamento de fobias e da síndrome


do pânico. Consiste em expor a pessoa aos elementos que causam medo, mas
de forma gradual e sistemática, sempre guiada pelo terapeuta a fim de que o
cliente substitua os sentimentos de medo e tensão por relaxamento.

A exposição não é física e o terapeuta conduz o cliente essa exposição na


imaginação do cliente. Ao pensar na fonte que causa a ansiedade, o terapeuta
exercita as técnicas de relaxamento aprendidas pelo cliente que poderá repetir os
exercícios fora da clínica (COGNITIVO, 2023).

Figura 10 – Dessensibilização sistemática

Fonte: https://encurtador.com.br/KUWY0. Acesso em: 11 abr. 2023.

Parada do pensamento e autoinstrução

O controle dos pensamentos e ações é difícil nos casos em que há depres-


são, ansiedade ou transtornos de personalidade.

Na técnica de parada do pensamento e autoinstrução, o cliente é orientado


a identificar os pensamentos disfuncionais e dar um comando de “pare” quando
essas surgem, a fim de intervir na relação entre pensamentos e comportamentos,
exercendo maior autocontrole sobre essa relação e diminuindo os efeitos negativos.

118
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

Ao se aumentar o nível de consciência da pessoa sobre o poder de interrom-


per e de modificar os pensamentos, a terapia passa a ser mais efetiva (COGNITI-
VO, 2023). Essa técnica é utilizada em casos de ansiedade e estresse pós-trau-
mático.

A mudança nas representações mentais leva à maior flexibilidade e realismo


das crenças e o cliente passa a ser menos controlado por pensamentos irracio-
nais, aumentando o equilíbrio emocional.

Solução de problemas

O objetivo da técnica é incentivar o cliente a identificar os problemas que


causaram sofrimento, prever os que podem vir a aparecer nas semanas seguintes
e colocá-los em listas. O terapeuta deverá incentivar o cliente a pensar em solu-
ções para esses problemas, a fim de criar alternativas disponíveis (BECK, 2021).

As etapas para realizar a resolução são:

1. Orientação para o problema;


2. Definição e formulação do problema;
3. Levantamento de alternativas;
4. Tomada de decisões;
5. Prática da solução e verificação.

O terapeuta deverá perguntar ao cliente como ele resolveria um problema


parecido ou como aconselharia alguém a resolvê-lo. A aplicação pode ser utili-
zada em forma de planilhas para a solução de problemas, especificando-se um
problema e respondendo às cognições que estão interferindo nessa solução.

Pode-se realizar a análise do problema ao se identificar as suas vantagens e


desvantagens ou sobre o contexto em que está inserido. Auxilia na identificação
de problemas com maior ou menor probabilidade de ocorrência (BECK, 2013).

Tomando decisões

Alguns clientes apresentam muitas dificuldades para tomar decisões e o ob-


jetivo desta técnica é levar o cliente a agir de forma prática na tomada de decisões
(BECK, 2013). A aplicação consiste em solicitar ao cliente que escreva em uma
folha as vantagens e desvantagens de cada opção de decisão e auxiliá-lo a listar
através de perguntas; após é solicitado que o cliente classifique com números de
1 a 10 as decisões mais importantes. Depois que o cliente realizar essa etapa, o
terapeuta pode auxiliá-lo a resolver um determinado problema que impede a to-
mada de decisão (BECK, 2013).

119
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Lista de méritos

O objetivo da técnica é incentivar o cliente a realizar uma lista de méritos


mentais, ou seja, de comportamentos positivos realizado ao longo de um perío-
do, sinalizando os itens pelos quais ele acha que merece mais créditos. É mais
utilizada quando o cliente apresenta pensamentos autocríticos e não consegue
identificar o que fez algo de bom ou produtivo (BECK, 2021).

O terapeuta deverá perguntar ao cliente os motivos pelos quais ele fez a lis-
tagem e se consegue perceber que a técnica focaliza as coisas positivas realiza-
das no dia, sugerindo que faça a técnica todos os dias, ao lembrar de algo (BECK,
2021).

Figura 11 – Lista de méritos

Fonte: https://ufes.br/sites/default/files/styles/imagem_conteudo/public/field/
image/premio-all.png?itok=dM3KdNrc. Acesso em: 11 abr. 2023.

Treino de assertividade

Tem como objetivo auxiliar o cliente a agir de modo adequado quando ex-
pressa as emoções verbalmente ou de forma motora. O treino de assertividade
orienta na emissão de respostas adequadas a situações específicas e inclui a
psicoeducação sobre o conceito de comportamento assertivo, o treino de reco-
nhecimento de respostas assertivas, a identificação de situações nas quais há
inibição de respostas positivas de autoexpressão, treino de respostas adequadas
em procedimento de ensaio comportamental (role-playing).

120
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

Os aspectos mais importantes da técnica são o trabalho com a emissão da


demanda adequada a situação e o nível de intimidade, o uso de tom de voz apro-
priado, claro e calmo, a apresentação dos sentimentos nas situações, a descrição
do que deseja da outra pessoa, a evitação de suposições sobre formas de trata-
mento. Pode ser realizada a partir da gravação de treinos em vídeo ou em áudio
e, posteriormente oferecer feedback para o cliente de modo que ele possa anali-
sar os ensaios, assegurando que saberá escolher a melhor opção para manejar
as situações no ambiente natural, agindo de maneira mais assertiva.

Role-play racional-emocional

A técnica é utilizada com clientes que podem até entender racionalmente a


inutilidade de suas crenças, mas são emocionalmente conectados a elas. O role-
-playing o auxilia a representar a parte mais racional da mente, enquanto o tera-
peuta representa a parte emocional.

O cliente é solicitado a contra-argumentar para o pensamento negativo e se


realizam trocas de papéis na sessão, para que haja o distanciamento emocional e
a evitação de respostas não-emocionais.

Figura 12 – Role Play

Fonte: https://blog.solides.com.br/wp-content/uploads/2021/10/role-
play-como-aplicar-R-e-TD.jpg. Acesso em: 11 abr. 2023.

AUTOINSTRUÇÃO

A autoinstrução ensina o cliente a desenvolver pensamentos adequados às


situações temidas, como no caso de clientes com ansiedade social que têm medo
de perguntar o preço das coisas em estabelecimentos comerciais, para não se-
rem avaliados como inconvenientes.

121
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

Ao ser treinado a se autoinstruir vão desenvolver a ideia de que “se perguntar


o preço exercerei o papel de consumidor, e o vendedor, o papel de comerciante”.

São cinco as etapas para se usar a autoinstrução.

a. Reprodução do modelo: reproduzir o mesmo comportamento verbal


sob a orientação do terapeuta.
b. Treino em autoinstrução: desempenhar o mesmo comportamento en-
quanto orienta a si própria em voz alta.
c. Esvanecimento: repetir o passo anterior apenas sussurrando para si
própria a orientação que deve seguir.
d. Autoinstrução: desempenhar o comportamento, usando apenas au-
toinstrução silenciosa.

Agenda de relações: pensamento x sentimento

O sentimento do indivíduo está relacionado ao modo como ele pensa sobre


determinado evento, quando é possível promover uma mudança sobre a interpre-
tação do evento também é possível mudar o sentimento associado a ele. O objeti-
vo dessa técnica é fazer com que o cliente perceba as relações que existem entre
o que acontece com ele e os sentimentos atribuídos a cada evento, possibilitando
o reconhecimento dessa relação e a capacidade de mudar os sentimentos través
da reinterpretação dos acontecimentos.

O foco da técnica é que após uma explicação prévia desses processos du-
rante as psicoterapias, o cliente possa começar a distinguir essas relações no seu
dia a dia através de um auto acompanhamento.

É necessário que o cliente conheça o processo de relação entre os pensa-


mentos sobre os eventos da vida e os sentimentos relacionados a ele, durante as
psicoterapias o psicólogo deve ensinar sobre esse processo e buscar exemplos
durante a própria entrevista que mostre essa relação (CONCEIÇÃO; BUENO,
2020).

O tratamento do TOC na Terapia Cognitivo-Comportamental utili-


za técnicas cognitivas e comportamentais como a técnica de Ex-
posição e Prevenção de Respostas (EPR).
Sobre a técnica de Exposição e Prevenção de Respostas (EPR),
assinale a alternativa correta:

122
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

a) ( ) A técnica de Exposição e Prevenção de Respostas (EPR)


consiste em expor o indivíduo às situações que estimulam a an-
siedade para reduzir a emissão de sintomas.
b) ( ) A EPR estimula os pacientes a evitarem as situações que le-
vam ao surgimento das características do transtorno.
c) ( ) A EPR, inicialmente, diminui a ansiedade e os pensamentos
obsessivos e a prevenção de respostas tende a funcionar melhor
se a técnica for utilizada de maneira individualizada.
d) ( ) A EPR pode ser realizada sem uso da imaginação e com nível
alto de desconforto nas situações de forma presencial.
e) ( ) A EPR consiste em expor o indivíduo às situações que es-
timulam respostas de tranquilidade e ao aumento de respostas
compulsivas.

Resolução: a TCC prevê a utilização de técnicas psicoterápicas


cognitivas e comportamentais como a técnica de Exposição e
Prevenção de Respostas (EPR), cuja utilização tem sido eficaz
em mais de 70% de casos. A EPR consiste em expor o indivíduo
às situações que estimulam respostas de ansiedade e estimular a
redução da emissão de sintomas.

Fórum de discussão

Escolha duas das técnicas apresentadas no capítulo e discuta com seus co-
legas sobre as suas principais características e formas de utilização no contexto
da psicoterapia cognitivo-comportamental e de acordo com o que foi exposto no
Capítulo 3.

6 ALGUMAS CONSIDERAÇÕES
Concluindo, o objetivo da TCC é não somente reduzir/eliminar os sintomas
do cliente, mas de instrumentalizar o uso de técnicas para a mediação autôno-
ma dos processos mentais, o que aumenta o relaxamento, o questionamento dos
pensamentos e a comportamentos funcionais.

As técnicas da abordagem cognitivo-comportamental permitem a superação


dos problemas através da reestruturação da cognição e do comportamento. Ao
realizar as técnicas, o cliente poderá compreender a relação entre o que acredita,

123
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

como se sente e se comporta. Além disso, será possível identificar crenças distor-
cidas que são as responsáveis pela manutenção do sofrimento e o questionamen-
to dos pensamentos, substituindo-os por cognições funcionais.

Com a mudança nas representações mentais, as crenças se tornam mais fle-


xíveis e realistas. Dessa forma, o cliente deixa de ser controlado por pensamentos
irracionais e conquista mais equilíbrio emocional. Como resultado, ele integrará
com mais saúde sua cognição, comportamento e emoções (COGNITIVO, 2023).

As técnicas em TCC são variadas e a identificação de quais podem ser usa-


das pode ser um desafio para o terapeuta que necessita identificar a sua utilidade
em cada caso e em cada sessão. As técnicas podem perder a validade e atrapa-
lhar a psicoterapia se não forem utilizadas no momento adequado ou se o cliente
não souber como lidar com elas. Caberá ao terapeuta conhecer as técnicas para
saber quais as atividades são as mais indicadas para a situação, além das especi-
ficidades do atendimento no caso de adultos, crianças ou famílias.

No enfoque cognitivo-comportamental, as tarefas terapêuticas são atividades


de níveis diversos de complexidade, a serem realizadas ao longo do tempo entre
as sessões, para promover a sensibilização do cliente sobre uma temática, am-
pliar o repertório de comportamentos, organizar pensamentos e emoções e/ou
outras funções relacionada ao caso.

REFERÊNCIAS
ALMEIDA, M. J. S. A. et al. Terapia cognitivo-comportamental em grupo para a
disfunção sexual na pós-menopausa. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 68(4):
231-8, 2018.

ASSOCIAÇÃO AMERICANA DE PSIQUIATRIA – APA. Manual Diagnóstico e


Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-5-TR). Porto Alegre: Artmed; 2022.

BECK, J. S. Terapia cognitiva: teoria e prática. Porto Alegre: Artmed, 2007.

BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental. Porto Alegre: Artmed, 2013.

BECK, J. S. Terapia cognitivo-comportamental. Porto Alegre: Artmed, 2021.

COGNITIVO. (2023). Terapia cognitivo-comportamental para casais e


famílias. Disponível em: https://blog.cognitivo.com/terapia-familiar-para-quem-e-
indicada-e-como-trabalhar/. Acesso em: 3 fev. 2023.

124
Capítulo 3 O USO DE INTERVENÇÕES COGNITIVAS NA TCC

CONCEIÇÃO. J.; BUENO, G. Técnicas da terapia cognitivo-comportamental


[recurso eletrônico] Mafra, SC: Ed. da UnC, 2020.

CORDIOLI, A. V. A terapia cognitivo-comportamental no transtorno


obsessivo-compulsivo. Revista Brasileira de Psiquiatria, 2008;
30 (Supl II): S65-72. Disponível em https://www.scielo.br/j/rbp/a/
nQZtCJhJcFqfCQSfmdDNFgN/?format=pdf&lang=pt. Acesso em: 19 maio 2022.

CORDIOLI, A. V; KNAPP, P. A terapia cognitiva-comportamental no


tratamento dos transtornos mentais. Revista Brasileira de Psiquiatria.
2008; 30(Supl II): S51-3. Disponível em: https://www.scielo.br/j/rbp/a/
xZ6MGPFQJfqf4CysRQYByyh/?stop=previous&lang=pt&format=html Acesso em:
20 maio 2022.

DAVID, D. O.; FREEMAN, A. Visão geral da terapia cognitivo-comportamental


dos transtornos da personalidade. In: BECK, A. T. Terapia cognitiva dos
transtornos da personalidade. ArtMed: 2017. Disponível em: https://integrada.
minhabiblioteca.com.br/#/books/9788582714126/. Acesso em: 19 maio 2022.

DATTILIO, F. M. Manual de terapia cognitivo-comportamental para casais e


famílias. Porto Alegre: Artmed, 2011.

FORMIGA, M. B. et al. A conceitualização cognitiva no transtorno obsessivo


compulsivo: relato de caso. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas 2012,
8(1), pp. 61-6. Disponível em: https://cdn.publisher.gn1.link/rbtc.org.br/pdf/
v8n1a09.pdf. Acesso em: 19 maio 2022.

FROESELER, M. V. G; SANTOS, J. A, M.; TEODORO, M. L. M. Instrumentos


para avaliação de pensamentos automáticos: uma revisão narrativa. Revista
Brasileira de Terapias Cognitivas, 2013, 9(1), pp. 42-50. Disponível em: https://
cdn.publisher.gn1.link/rbtc.org.br/pdf/v9n1a07.pdf. Acesso em: 3 fev. 2023.

INGRAM, R. E.; WISNICKI, K. S. Assessment of positive automatic


cognition. Journal of Consulting and Clinical Psychology, 56(6), 898–902,
1988. Disponível em: https://doi.org/10.1037/0022-006X.56.6.898. Acesso em: 3
fev. 2023.

IPTNET. Crenças disfuncionais, o que são, quais são e como identificar.


(2023). Disponível em: https://iptc.net.br/crencas-disfuncionais/. Acesso em: 23
mar. 2023.

125
TErAPiA CoGNiTiVo-ComPorTAmENTAL NA PráTiCA

KNAPP, P.; BECK. A. T. Fundamentos, modelos conceituais, aplicações e


pesquisa da terapia cognitiva. Revista Brasileira de Psiquiatria. vol. 30. Supl. II,
2008, p. 54-64.

KNAPP, P. e cols. Terapia cognitivo-comportamental na prática psiquiátrica.


Porto Alegre: Artmed, 2004.

MANFRO, G. G.; HELDT, E.; CORDIOLI, A. V.; OTTO, M. W. Terapia cognitivo-


comportamental no transtorno de pânico. Revista Brasileira de Psiquiatria.
2008; 30 (Supl II): S81-7.

MASTERS, W.; JOHNSON, V. O vínculo do prazer. Rio de Janeiro: Record,


1975.

NOBRE, P. J. S. C. As disfunções sexuais. Ed. Climepsi. 2005.

NOBRE. P. J. S. C. Disfunções sexuais: contributos para a construção de um


modelo compreensivo baseado na teoria cognitiva. Tese de doutoramento em
Psicologia. Universidade de Coimbra (Portugal), 2003.

OLIVEIRA, M. C. Percepções dos/as psicoterapeutas sobre a influência


dos estereótipos de gênero e das relações íntimas, heterossexuais e não
heterossexuais, nas vivências da disfunção erétil. Tese de Doutorado.
Universidade do Minho, 2012.

OLIVEIRA, M. I. S. Intervenção cognitivo-comportamental em transtorno de


ansiedade: Relato de Caso. Revista Brasileira de Terapias Cognitivas. 2011.
Volume 7(1). pp. 30-34.

RANGÉ, B.P. Psicoterapias cognitivo-comportamentais: um diálogo com a


psiquiatria. Porto Alegre: Artes Médicas, 2011.

SCRIBEL, M. C. Terapia Cognitivo-Comportamental com Casais: Integrando


Abordagens. In: CARDOSO, B. L. A.; PAIM, K. Terapias cognitivo-
comportamentais para casais e famílias: bases teóricas, pesquisas e
intervenções. Curitiba: Sinopsys, 2020.

WRIGHT, J. H.; BASCO, M. R., THASE, M. E. Aprendendo a terapia cognitivo-


comportamental. Porto Alegre: Artmed, 2019.

126

Você também pode gostar