GAROTA
GG
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Título: Garota GG
Autor: Manu Costa
Revisão: Gabriela Servo
Capa e Diagramação: Queen Designer | Hadassa M.
Vaz
Re-diagramação e alterações: QueenG Design | Ge
Benjamim
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Capítulo 1
Eu não sei o que acontece comigo, toda vez que
vejo o Vagner acho ele tão... charmoso... lindo... tudo.
Olho para a frente quando ele olha na minha
direção, Vagner tem sido a minha paixão platônica a
mais ou menos um ano, isso aconteceu porque o antigo
padeiro, Ivo, vendeu a padaria e se mudou para Itália,
Ivo era a minha paixão platônica antes do Vagner, e
antes do Ivo foi aquele cara que eu via sempre no meu
prédio, mas não conta, nunca soube o nome dele, e
também desisti quando vi ele desmunhecando com um
outro do prédio, antes disso acho que mais ninguém.
Eu mato toda e qualquer chance de alguém se
apegar a mim, e vice e versa. Para que? Para eu ser
ridicularizada por conta disso? Ser gorda não é ruim, o
problema é que isso dificulta a vida em determinadas
coisas
Vagner é uma delas.
Não consigo me imaginar com ele também, ele é
daquele tipo de cara que sai todo fim de semana para
correr, tem ombros largos, olhos incrivelmente
castanhos, 1.77 de altura—altura ideal pois eu tenho
1.75, monstra— braços fortes — os quais vejo
amassando a massa de pão todas as quintas quando
preciso comprar café na padaria—rosto e corpo de
homem, eu imagino que por baixo daquele uniforme
haja um tanquinho perfeito...
Suspiro ao virar a esquina, e continuo correndo.
Sem chance Ana, esse cara não é para você.
Penso comigo mesma.
Talvez nem ele, nem nenhum. Apesar de eu viver
sendo atormentada pela ideia de alguém me olhar—
coisa que não acontece nunca, desde sempre—ou ao
menos me notar—coisa que acontece sempre quando
chego nos lugares—realmente, sem ver todo o meu
peso e tamanho, eu ainda acredito que em algum lugar
da galáxia existe sim, alguém disposto a me suportar.
Avalio meus míseros atributos físicos.
Sou morena, olhos azuis, lábios carnudos, um
rosto até dentro do possível bonito, cabelos castanhos
longos e lisos, mas meio rebeldes quando querem, e eu
tecnicamente sou até bonita... de rosto.
Agora vem a melhor parte: Eu sou gorda, gorda
não, bem gorda.
Da última vez que me pesei, a balança me traiu,
vinha fazendo uma dieta bem rigorosa, mas estou
lamentavelmente presa aos 97 quilos e trezentas
gramas, isso com 1.75 de altura, coxas grossas, bunda
enorme, peitos grandes, quadris largos, tudo em mim é
GG.
GG para outras garotas= grande, grande.
GG para mim= gorda gritante!
O responsável: meu pai, que Deus o tenha.
Papai morreu de infarto fulminante quando eu
tinha dez anos, ele herdou a obesidade da minha avó
que também morreu cedo de diabetes. Enfim, no mar de
murmuração, metade da minha família é gorda por
parte de pai, e por parte de mãe todos são lindos,
maravilhosos, garotas P, PP e EP (extremamente
Pequeno), acho que a minha prima mais gorda por
parte de mãe deve pesar uns 48 quilos, mas as línguas
pesam dez.
Me lembro dos nossos natais, mamãe me arrasta
para o Texas para ficar com aquele bando de traíras,
que adoram comentar coisas do tipo "Nossa Ana, você
engordou", "poxa Ana, parece que você engordou um
pouquinho"...
Minha cota estoura quando o meu tio Jerry —
sempre tem um tio sem noção, incrível—aparece e fala
algo do tipo "Ana querida, você emagreceu uns
quilinhos hein?" Ou ele fica me paparicando, e
tentando meio que se redimir por todos sempre me
encherem de comentários sobre meu peso.
Já apelei para tudo, e nada funciona.
Ultimamente tenho praticado corridas no bairro
mesmo, ou tentado não morrer quando tento me
exercitar, não nasci para isso.
Dou a volta no quarteirão e novamente vejo
Vagner, meu coração está dando uns pulinhos a mais
por conta dele, eu sei que sim, ele me nota—de novo—
e acena.
—Hei Ana, tudo bem? — Ele berra com um
sorriso enorme, que me deixa fascinada.
Aceno para o Vagner, e as minhas pernas
parecem gelatinas, fico sorrindo enquanto tento correr,
gosto de parecer fitness quando ele está por perto.
Ainda que eu seja, ou tente ser com todas as minhas
forças.
Acelero o passo acenando mais uma vez, e vejo
o Vagner fazendo não com as mãos, e com a cabeça,
mas nem dá tempo de nada, simplesmente esbarro em
algo duro. A trombada faz com que o meu corpo seja
jogado para trás com violência, e caio estatelada no
chão.
Escuto os meus gemidos, minhas costas doem,
pois, o impacto foi violento, tudo se multiplica por
três, e parece que o meu corpo levou um baque total. O
choque me deixa paralisada, pisco diversas vezes
tentando recuperar o ar, mas não funciona, fecho os
olhos e parece que o chão está me jogando para os
lados, a sensação de tontura é forte, tenho dificuldade
para ver logo de cara, mas escuto uma voz preocupada,
e ela ecoa na minha cabeça.
—Moça... moça...
Abro os olhos, estou tonta, e vejo mais de três
por alguns segundos, depois eu fico paralisada olhando
para o par de olhos azuis diante de mim.
Os olhos dele são redondos, e ele tem uma barba
mais cheia, cabelos meio lisos e sobrancelhas da cor
dos cabelos, um nariz reto e fino, sua face está tão
próxima da minha que posso sentir sua respiração, é
ofegante, meu coração parece voltar a bater em um
ritmo acelerado demais, e o sangue no meu corpo volta
a circular, me sinto totalmente desnorteada.
Ao mesmo tempo, um par de olhos castanhos está
se inclinando para o meu rumo.
—Ana!
Vagner segura a minha mão e olho para ele
totalmente paralisada, olho para o outro que está
inclinado, e depois do Vagner, e escuto o som de
buzinas me dando conta que estou estatelada no chão a
muito mais tempo do que devo estar, o som do vibrador
do meu celular é como um tilintar na minha cabeça...
Trabalho... Handerson... Empresa... Atraso!
—Droga!
Me sento, tentando recuperar todos os sentidos,
meu corpo recebe uma injeção de adrenalina enquanto
Vagner me segura os cotovelos, e me põe de pé sem
muito esforço, olho para ele embaraçada, e ele puxa
minha camiseta para baixo.
—Tudo bem, Ana? — Vagner pergunta, e seu
olhar castanho denuncia preocupação. — Machucou?
—Não — digo tentando me recuperar da tontura.
— Está tudo bem Vagner!
—Tudo bem mesmo? — questiona ele, e toca
minha cabeça. — Você parece meio tonta.
—Eu estou bem, preciso ir — falo um pouco
nervosa. — desculpe, até mais.
Não consigo olhar nem na cara do outro homem,
imagino que ele deva estar pensando que eu sou uma
completa desajeitada, contudo, preciso correr ou vou
me atrasar, olho para os lados e parece que eu parei a
vizinhança.
Que mico!
Tento sorrir para todos, e retorno a minha corrida
de forma mais lenta. No bolso da frente da minha
calça, meu celular volta a tocar e recoloco os fones nas
orelhas. Com um leve suspiro, eu afasto a tontura. É
como mamãe sempre diz "eu sou dura na queda".
—Rainha B!
—Sêmora!
Sêmora — Sim, este é o nome da minha melhor
amiga de todos os tempos — Ri do outro lado da linha,
ela também parece estar correndo, deve imaginar que
estou colocando os bofes para fora, ou algo além disso.
Ainda me sinto meio zonza devido à queda.
— E aí estranha? — pergunto tentando me soltar,
meu corpo está duro devido ao impacto, não quero nem
imaginar como deve estar o corpo daquele pobre
homem no qual esbarrei.
— Estou na esteira. — Sêmora fala, e percebo
que está arfante. — Você já está indo para a
Handerson?
— Sim — digo apressada, e olho para os lados
antes de atravessar a pista da avenida 1. — E você?
— Já vou entrar no banho, soube que o Senhor
Handerson passou essa filial para o filho, vão mudar o
quadro de funcionários!
—Tinha ouvido um boato há alguns dias —
confesso confusa. — Poxa, será que vão nos mandar
embora?
—Espero que sim, preciso do acerto para minha
redução de pele.
Sêmora fez redução de estômago há alguns
meses, tínhamos combinado de fazer juntas, mas eu
desisti de última hora, eu morro de medo de qualquer
coisa que me lembre agulhas ou sangue, porém, acho
que não aceitaria mesmo, nem por causa da cirurgia,
ainda que hoje, cinco meses depois ela pese apenas 60
quilos, e eu ainda 97,300, ou algo parecido. Sêmora é
também mais vaidosa, diria que eu já sou uma infeliz
por ser gorda, mas ela era bem mais que eu, também
ela tem mais vaidade e todas essas coisas que eu nunca
vou ter nem se nascer de novo.
—Preciso do emprego — admito.
Estou na Handerson há quase cinco anos.
Comecei trabalhando como estagiaria, logo que
terminei a faculdade, e hoje cuido das finanças com
mais vinte funcionários da empresa, incluindo a
Sêmora. Sou meio apegada ao meu cargo, sou a Chefe
do setor dos contadores junto com Roni, e cada um tem
sua equipe. Ganho bem, tenho convênio médico, dental,
e mamãe está inclusa, sair da Handerson seria péssimo
agora, eu teria que começar tudo do zero em outra
empresa, sem falar que nós estamos juntos há muito
tempo, quase ninguém saiu de lá nesse período, poucos
vieram remanejados.
—Você precisa sair da zona de comodismo,
Rainha B.
Adoro quando ela me chama de Rainha B, me
sinto uma Beyonce da vida... ai, ai, tá, Parei!
—Eu não sou acomodada!
— Mas tipo, você pensa em ficar na Handerson
igual o Senhor Gomes? A múmia dos Contadores da
empresa?
Senhor Gomes é o nosso Chefe, o meu
coordenador em especial. Ele é um velho mal-amado
de uns setenta anos que trabalha na empresa a quase
quarenta, claro que não quero ser como ele, mas no
momento eu estou satisfeita com o meu cargo, preciso
me estabilizar financeiramente para poder sair de lá.
Também acho que a Sêmora esqueceu que eu comprei
meu apartamento há seis meses e que vou me mudar
para Manhattan em apenas duas semanas, isso é um
gasto que exige planejamento.
—Rainha B?
—Estou chegando no meu prédio Super legal,
nos falamos na Handerson.
—Beleza!
Eu sei que Sêmora odeia quando eu corto ela, e
essa é a principal diferença entre nós duas. Eu sempre
sou a boazinha, gentil, e humilde da relação, ela é
sempre a impaciente, impulsiva, paranoica, e
principalmente orgulhosa, eu queria ser assim fora do
meu círculo de amizades, assim como sou com ela, que
é minha melhor amiga desde o colegial, mas eu não
sou. Na Handerson eu coloco a minha fantasia, e me
torno "A Chefe Malcomida E Amarga" detalhe "eu
nunca fui comida na minha vida".
Tive dificuldade em assumir o cargo, sou
contadora Chefe há três anos, logo que assumi muitas
pessoas ficaram bem irritadas. Gomes me indicou e
passei no processo seletivo, então, logo me tornei um
pouco mais firme, mais fria com alguns tipos de
situações, mais na minha, não que já não fosse, mas
quando se assume um cargo de liderança tem que
mostrar que precisa de respeito, e eu consegui. Minha
equipe é até unida, nos meus últimos dois aniversários
eles comemoraram, as vezes me dão flores, e quando
querem folga me bajulam, enfim, minha equipe..
Suspiro passando pela portaria do meu prédio.
Moro perto do Central Park atualmente, aqui
ainda pago aluguel, vim para cá desde que sai da
faculdade, mamãe me ajudou com a pensão do papai,
então fui comprando tudo aos poucos, agora que
consegui comprar um imóvel melhor e mais perto do
meu trabalho estou mais satisfeita. A localização é
excelente, e eu fiz um bom negócio, também juntei
todas as minhas economias para comprar, foi caro, mas
é meu.
Entro no banho e percebo uma marca roxa na
minha nádega direita, suspiro chateada, eu branca que
nem uma vela, qualquer coisa já mancha a minha pele,
mas continuo meu banho apressada.
Logo que termino, pego uma muda de roupa das
poucas que deixei no guarda roupa e visto, jeans,
camiseta social, all star branco, cabelos presos num
rabo de cavalo...
— Já estou novamente com cara de sapatão! —
Eu brinco olhando para o espelho, pois, sei que roupa
não determina a personalidade de ninguém. Arrumo a
gola da minha camiseta social e dobro as mangas.
Vou para cozinha e como metade de um mamão
papaia — dizem que é ótimo para emagrecer — com
granola, pego o meu jornal, minha bolsa e vou para
Handerson. Com sorte, hoje o meu dia será bem
diferente do meu começo da manhã.
—E eu não vou tentar matar ninguém atropelado até lá.
Capítulo 2
— O que eu quero é que vocês se organizem...
— Impossível, Ana.
— Para você tudo é impossível, Jason.
Estou estressada, cansada, descabelada, e acho
que acabei de menstruar.
Soube que o dono está na empresa, ele veio mais
cedo no nosso setor e o pessoal estava jogando
conversa fora, quando eu cheguei Gomes me deu uma
comida de rabo — me chamou de incompetente em
outras palavras — e chamou minha atenção porque o
pessoal do Roni estava trabalhando e o meu não.
Aproveitei depois disso, engoli o ódio que sinto
do Roni—ele as vezes faz isso para mostrar serviço—
e pedi desculpas para o Senhor Gomes, logo em
seguida fui para minha mesa e me sentei, com a metade
da minha bunda dolorida e o meu corpo que dava
sinais sérios de que eu ficaria entrevada pelo final da
semana.
Trabalhamos o resto do dia sem implicações,
mas eu estava Super chateada, e nervosa com a
situação. Infelizmente, eu tenho um sério problema, não
consigo disfarçar minha cara de bosta quando estou
com raiva, e isso é um saco. A Sêmora nem me beirou,
pois, ela me conhece muito bem, e sabe como eu sou
quando estou irritada. Hoje eu estava tão injuriada por
ter que olhar na cara do Roni depois do que aconteceu
pela manhã, que não almocei.
Eu odeio que chamem minha atenção, porque me
esforço ao máximo para não dar motivos, e me sinto
péssima quando acontece.
Às vezes me sinto cercada por crianças, as quais
eu tenho que ficar chamando a atenção — outra coisa
que odeio — e explicar como as coisas funcionam. O
cargo é ótimo, tenho meus privilégios — que se resume
em salário e convênio, apenas — mas tem hora que é
quase impossível lidar com essas pessoas.
Em minha sala, meus nove contadores estão
sentados envolta da minha mesa, eles me olham com
atenção e suas expressões são sérias. Sêmora é a única
que está menos tensa, e isso se dá ao fato dela já
conhecer meu sistema, ela sempre é uma das que fazem
o trabalho certo. Na verdade, todos eles fazem, mas
tem hora que não dá para fingir que é um robô, e ficar
olhando direto para o monitor sem ao menos olhar para
os lados, ou então bancarmos os mudos, e não falar
uma só palavra.
Hoje ainda é terça, o pessoal gosta de conversar,
todos nos conhecemos muito bem, e também não
poderiam adivinhar que o dono faria um passeio pela
empresa, fomos pegos de surpresa por essa visita
repentina.
—Ele nem falou nada — explica Allan, fazendo
pouco caso. — Não foi, Sêmora?
—Ele não falou nada para vocês — esclareço e
coço a minha testa, porque dá agonia só de pensar. —
Preciso ficar falando para todos trabalharem? Não é
possível!
—É culpa do Roni, ele é sempre um fofoqueiro,
o pessoal da equipe dele estava brincando de jogar
bolinhas de papel antes disso...
—Não importa, Eve — reclamo ainda que saiba
que ela tem razão, Eve é uma das mais novas. — Ele
não viu a equipe do Roni, viu a minha equipe, e eu não
estava aqui para defender nenhum de vocês, nem a mim
mesma.
Tento me ajeitar sentando de lado na minha
poltrona, minha nádega arde só de eu pensar em me
encostar, o dia todo foi assim, meu corpo ainda dói por
causa do pequeno acidente que aconteceu de manhã,
também, quem manda ser gorda? Como diria minha avó
"quanto maior, maior a queda".
—Foi mal, Chefe.
—Foi péssimo, espero que adotem outro tipo de
comportamento amanhã, por hoje é só.
Eles sabem quando eu fico puta com algo. Todos
se levantam e saem da minha sala, Sêmora vai também,
nós duas não misturamos as coisas aqui na Handerson.
Sempre almoçamos juntas, mas nada além disso.
Quando ela quer fofocar, ou jogar conversa fora,
batemos papo pelo chat.
Me ajeito na minha cadeira outra vez, minha
bunda dói, minhas pernas doem, meus braços doem, e o
meu pescoço está duro... o Leva Ombro me destruiu,
estou um pico de estresse, eu realmente não sei como
esbarrei naquele cara e ele ficou intacto, e eu que sou
umas duas vezes mais gorda que ele, cai no chão feito
uma saca jogada num canto, não me lembro direito do
tipo físico dele, mas não era assim tão forte nem nada.
Leva Ombro tem um porte bem forte, como não
sei o nome dele vou chamar de Leva Ombro mesmo.
Solto os meus cabelos do coque, mexo neles
mais que inquieta, acumulei serviço, não rendeu por
conta da minha preocupação, me inclino sob a mesa
sentindo vontade de chorar, mais por raiva que tudo, eu
realmente faço sempre por onde deixar tudo perfeito,
eu sou uma pessoa muito bem planejada em todas as
áreas da minha vida, sinto raiva só de pensar que estou
meio que refém da situação por conta do que o Roni
falou dos meus contadores para o Senhor Gomes. Os
boatos de que realmente haverá cortes são bem fortes,
ouvi em todos os corredores enquanto levava alguns
papéis para o RH, e para outros setores.
Prendo meus cabelos num coque de qualquer
jeito, abro o fecho do meu jeans. Fico olhando para o
meu par de tênis, a cabeça afundada entre os braços,
sinto muito medo, não posso perder o emprego agora
que comprei meu apartamento.
—Ana Beatrice Preston?
É a voz do Senhor Gomes.
Ergo minha cabeça imediatamente, nesse instante
meu corpo recebe um choque imenso e o meu coração
se acelera, o Senhor Gomes está parado diante da
minha mesa apoiado em sua bengala, e ao seu lado, um
homem alto de olhos azuis bem familiares.
Leva Ombro!
—Tudo bem, minha jovem? — pergunta o Senhor
Gomes, com toda a calma do mundo.
Ah meu Deus... Ah meu Deus... ele vai me
mandar embora!
—S...sim! — respondo muito mais que surpresa.
— Em que posso ajudar, Senhor Gomes? Sentem-se!
Eu não faço a mínima ideia do que o Leva
Ombro faz aqui na minha sala, mas agora olhando-o
assim percebo que ele é francamente lindo.
Os olhos azuis dele estão em mim, ele usa um
terno que o deixa ainda mais bonito, é alto, bem mais
alto do que eu pensei, tem ombros largos, mais do que
eu havia percebido e não é tão magro assim, diria que
ele é até meio malhado, ele mantém uma postura
impecável, usa uma gravata azul escura, e o corte de
cabelo agora o deixa com cara de um real executivo,
não sei se é porque hoje cedo eu estava zonza, deveria
estar, o homem é lindo, absolutamente lindo.
—Imagino que tenha conversado com os seus
funcionários, eu espero que não se repita Ana. —
Gomes fala, e se senta na cadeira de frente para minha
mesa. — Você é uma excelente funcionária, eu vim
comunicar que fiz umas mudanças no quadro dos
contadores, e que a partir de hoje, eu me aposentarei.
Fico boquiaberta com a revelação, me mantenho
meio de lado na poltrona, olho para o Senhor Gomes e
não acredito que ele realmente queira se aposentar. O
Leva Ombro permanece em pé ao lado dele, me
olhando, não gosto disso. Por que ele está me olhando?
Para que?
—Bem, mudanças sempre são bem-vindas,
ficarei apenas com o cargo de consultor do Senhor
Handerson...
—Mas é uma falta de consideração, o Senhor
está aqui há quase quarenta anos —interrompo, e o
Senhor Gomes me olha com um tipo de orgulho
embutido, ou sei lá. — O Senhor é um excelente
contador e matemático.
—Obrigado Ana, mas os meus dias na
Handerson já deram, meus netos precisam muito mais
de mim do que eu da Handerson — fala o Senhor
Gomes, e pela primeira vez em quase seis anos de
empresa, ele esboça um sorriso. — Serei bisavô!
—Nossa, que bom! —Sou sincera— Talvez
precise descansar também, não é mesmo, Senhor
Gomes?
—Sim, conversei com o Senhor Handerson,
nestas mudanças faremos alguns desligamentos, Ana.
Meu estômago começa a gelar, e as pontas dos
meus dedos começam a formigar, fico olhando nos
olhos do Senhor Gomes sem saber exatamente o que
falar, ele veio para me mandar embora... Porcaria.
—E algumas promoções! — completa o Senhor
Gomes, pensativo. — Ele me pediu que indicasse
alguém para o meu cargo, não pensei em ninguém além
do Roni, ele tem mais tempo de empresa, é um bom
funcionário...
Nossa, vão promover a besta fera e me desligar!
Isso é tão... tão... injusto!
—Mas, eu pensei que apenas isso não era o
suficiente para promovê-lo a braço direito do Senhor
Handerson na área financeira, Roni faz o trabalho
direito, e não é isso o que precisamos, então, eu pensei
em colocar você no meu cargo, Ana!
Franzo a testa totalmente chocada.
Meu telefone toca, uma, duas, três vezes... atendo
na quarta, minha mão treme.
—Ana Beatrice!
—Ana, preciso que venha aqui, meu computador
deu problema, preciso encerrar duas contas
importantes.
Roni!
—Pode chamar o pessoal.
—Ana, eu preciso que você venha aqui agora.
—Espera!
E desligo na cara dele, conto dois segundos e o
telefone começa a tocar, tiro do gancho e olho para o
Senhor Gomes fingindo que nada aconteceu.
—Como o Senhor dizia mesmo...
—Você é a minha substituta, Roni ficará por
conta de todo o setor, você pode reformular da forma
que desejar.
—Não tenho palavras para agrade...
—Ana! —Escuto batidas na porta. — Preciso de
você!
—Roni eu estou em reunião! —Esclareço
chateada. — Espera um momento.
—Ah. — Roni fala do lado de fora. — Desculpe,
é que o seu pessoal foi embora, foi mal.
—Eu já vou!
Foi péssimo.
Olho para o Senhor Gomes e sorrio.
—Viu? Ele faz o trabalho, mas quem sabe como
cuidar de tudo é você, posso ser velho, Ana, mas eu
vejo as coisas.
—Que bom que vê, Senhor Gomes.
Ufa, não vou perder o meu emprego.
—Já deve conhecer o Mosés!
Mosés... Leva Ombro.
—Ele é o....
—Ana!
Fecho os olhos, respiro fundo, depois me levanto
sentindo-me toda entrevada.
—Eu vou ajudar o Roni, agradeço pela a
oportunidade, Senhor Gomes, de verdade.
—Está bem minha jovem.
—Muito prazer, Mosés.
Vou fazer de conta que não lembro de nada, se eu
fizer a egípcia ele talvez nem se lembre de mim
também.
Mas conforme vou me afastando da minha mesa,
meu corpo começa a doer de novo, e minha perna
esquerda começa a dar umas fisgadas. Vou mancando
para a sala do Roni, mas também sorrindo e
comemorando.
—Você demorou demais, agora já consertei.
—Não tem problema, Roni— falo e pisco para
ele sorrindo. — Algo mais?
—Nada!
Acho que ele ainda não sabe da promoção, não
vou falar nada, quero que ele saiba da melhor forma,
sendo o último a saber.
— Você foi demitida? — pergunta ele enquanto
saio de sua sala.
— Ainda não — respondo fingindo não saber de
nada.
Quando saio da sala dele mostro o dedo do meio
para a porta, depois de alguns segundos escuto uma
risadinha, e quando olho para o fim do corredor, o
Leva Ombro está me olhando e sorrindo, meu coração
fica disparando enquanto ele se afasta, o sorriso dele é
absolutamente lindo, talvez mais do que o do Vagner.
Capítulo 3
Com novos cargos... Novas Responsabilidades.
Mas fiquei na minha ontem, não comentei nada
nem com a Sêmora, primeiro tenho que esperar uma
sinalização do Senhor Gomes, para depois comemorar,
eu sempre tenho muito receio pois acho que aquele
velho ditado da minha mãe reina sob a vida de
qualquer pessoa: Felicidade de Pobre Dura Pouco.
Então me mantenho neutra.
Acordei toda quebrada hoje, tomei dois
analgésicos e nada, não consegui nem levantar para
minha corridinha fitness, e hoje eu não vi o Vagner.
O Leva Ombro me quebrou.
Quase não queria sair da cama, o roxo na minha
bunda está mais preto. Passei uma daquelas pomadas
para dores musculares, que a minha mãe sempre deixa
na minha caixinha de primeiros socorros da cozinha,
ela sempre muda algumas coisas no meu apartamento
quando vem me visitar, ela mora no Texas já faz um
tempo, mas pelo menos uma vez no mês vem me ver,
depois que vim para faculdade adquiri mais
independência, também, não acho que ela queira vir
morar definitivamente comigo, mamãe tem toda a
família dela e a do meu pai lá, meus avós moram em
Remo, e tenho mais parentes nessas bandas.
Peguei um metrô tenso há pouco, e acabo de
entrar na Handerson, estou meio atrasada. Puxo um
pouco a perna, pois, ainda dói muito. Acabou que
ontem, Sêmora havia ido embora, e eu depois de muito
respeitosamente, mostrar o dedo para a porta do Roni,
peguei as minhas coisas e fui para casa. Só tomei um
banho e apaguei depois dos remédios.
Entro no elevador e ainda sinto todo o meu corpo
dolorido, respondo alguns e-mails pelo celular,
mensagens da Sêmora também. Combinamos que hoje
sairíamos para jantar, ela quase não come, come mais
com os olhos, mas sempre saímos pelo menos uma vez
por semana.
Foi estranho ver a minha melhor amiga, também
GG, emagrecer tão rápido. Hoje quando eu a olho, me
sinto assim meio deslocada em dezenas de coisas, mas
acho que a Sêmora não mudou muito, contudo, eu ainda
a achava muito mais bonita quando era gordinha, ela
parecia tão mais feliz!
Agora ela está presa a uma dieta na qual come
muito pouco, vive tomando vitaminas, e quase mora na
academia. Claro que a cinta esconde o excesso de pele
e tudo mais, porém, o rosto dela está muito chupado,
ela aparenta uma certa fragilidade com essa magreza
excessiva.
O elevador para e vou para o canto, olho para o
painel e vejo que ele desceu para o estacionamento.
Me volto para o celular, Sêmora questiona sobre o que
o Senhor Gomes queria comigo ontem.
"nada"
"para de ser mentirosa Rainha B"
"ele só queria dizer que eu sou Super linda e
gostosa, que não vive sem mim"
":)"
Sorrio, ao mesmo tempo que sinto o cheiro de um
perfume masculino maravilhoso, e forte.
—Bom dia, Ana Beatrice!
Ergo a cabeça e dou de cara com Leva Ombro,
sinto que o meu coração começa a disparar quando
vejo um pequeno sorriso nos lábios dele, algo que
estranhamente me faz querer suspirar, fico dura, meu
celular vibrando na mão.
Fala algo Ana... fala algo... fala... fala!
—E aí? —questiono, pois isso é o que eu
consigo falar, pigarreio desviando o olhar da boca do
Leva Ombro. — Bom dia!
—Não te vi correndo hoje, tudo bem?
Ele lembra de ontem! Meu Deus, que vergonha!
—Ah, claro — respondo um pouco em dúvida.
Acho que ele age muito naturalmente a tudo,
claro, ele não morreu de vergonha na frente do "Crush"
dele, e também não está sentindo nem metade das dores
que eu sinto no corpo pela queda, no entanto, ao menos
parece educado.
—Tudo bem mesmo? Ontem você não parecia
muito bem...
—Estou sim, obrigada.
O elevador para, estou coberta de vergonha.
—Esse é o meu...— indico a porta enquanto ela
se abre. — Até... mais...
Tento não mancar, algo bem difícil, cada músculo
da minha coxa dói, o osso do meu joelho, minha bunda
então..., mas consigo sair intacta do elevador, não olho
para trás, francamente, achei que o Leva Ombro jamais
fosse se lembrar de mim, muito menos do meu nome,
principalmente do meu segundo nome.
Entro no meu setor e todos estão parecendo
estátuas, olhando para a frente, passo direto para minha
sala, tenho muito a fazer, não sei nem se vou conseguir
sentar direito. Para facilitar, hoje eu vim com um
vestido comprido de mangas, com uma sandália de
dedos, coisa que eu não uso nunca, me sinto como um
pequeno botijão de gás embalado naqueles panos feios
que a minha mãe usa na cozinha dela. Escolhi um
vestido preto, para ao menos disfarçar as banhas
extras, mas isso parece impossível.
Me sento de lado cruzando a perna, e vejo logo
em seguida a porta da minha sala sendo aberta,
justamente, por quem eu havia acabado de deixar para
trás.
Leva Ombro entra na minha sala como se nada
tivesse acontecido e se aproxima da minha mesa com
as mãos dentro dos bolsos, me questiono sobre seu
cargo na Handerson, acho que deve ser algum novo
empregado do Senhor Gomes, mas não faço a mínima
ideia de quem realmente seja.
—Você está me evitando?
Nossa.
—Não! — respondo tentando parecer natural. —
Eu tenho muita coisa a fazer.
—Eu sei, você é a minha nova contadora Chefe.
— Ele fala com muita tranquilidade, e estende a mão.
— Mosés Handerson, ao seu dispor.
Minhas faces ficam quentes e fico dura sentada
na minha cadeira.
Demoro um pouco para absorver as palavras, e
estendo a mão retribuir o cumprimento. A mão dele é
suave e lisinha, dentro de mim parece que o meu
coração vai sair pela boca, não apenas por estar diante
do dono da empresa, mas também pela intensidade na
qual ele me olha.
—Não gosto de ser ignorado. — Ele solta a
minha mão e enfia a mão no bolso. — Tão pouco, que
fiquem me evitando.
Não tenho resposta.
Estou paralisada com o fato de que o Leva
Ombro é ninguém menos, ninguém mais que meu novo
Chefe, ou o Chefe de sempre, mas que eu nunca
conheci pessoalmente.
— Quero um relatório dos dois setores,
informando os nomes de todos os funcionários desse
departamento.
Ele vira os calcanhares e sai da minha sala em
silêncio.
Meu coração fica disparando ao mesmo tempo
que minha porta se fecha.
—Droga! — exclamo olhando para a porta. —
Estou tão... tão... ferrada!
—E aí?
—E aí que ele foi tirar satisfação comigo, você
acredita?
Sêmora está tão chocada quanto eu fiquei,
quando Mosés Handerson entrou na minha sala, cheio
de marra e exigências.
Após ele ter se retirado da minha sala, fiz todos
os relatórios, preparei todos os arquivos e enviei para
o e-mail corporativo da Handerson, também pedi que
Lara levasse os arquivos impressos com alguns
resultados para a mesa do Chefe, feliz ou infelizmente
não pude, tive uma reunião com o pessoal do ADM,
algo do qual o dono não participa, mas a todo momento
minha cabeça ficou focada em Mosés Handerson.
Ainda chocada com o fato do Leva Ombro ser o
meu novo patrão, algo que nem em mil anos eu iria
supor. Falei para Sêmora sobre o ocorrido, mas não
disse que fui promovida, ela está me olhando com os
olhos arregalados, muito surpresa.
Agora viemos almoçar num restaurante perto da
empresa. Me incomodo com o fato de reencontrar o
Leva Ombro, me sinto constrangida com a situação que
aconteceu hoje cedo, achei tão... desnecessário,
principalmente porque não foi algo relacionado a
empresa, contudo, entendo que talvez ele tenha se
sentido chateado pelo fato de eu não ter falado nada
sobre a trombada de ontem.
—Ah meu Deus, ele está entrando no restaurante
com uma ruiva... Não olha agora!
Não me movo, olho para minha salada sem um
pingo de fome, os acontecimentos de hoje cedo me
tiram da esfera de calmaria, algo que fora as
excepcionalidades sempre me acompanham, não sou do
tipo agitada nem nada, não na empresa.
—Ela usa crachá, é empregada também!
Sêmora está sussurrando, que legal, como se eu
precisasse disso, talvez se eu fingir que não está aqui
ele não nos perceba, também não acho que Mosés vá
agir como um completo arrogante sempre que me ver
fora da empresa. Sêmora e eu estamos no nosso horário
de almoço, e não na Handerson.
—Olá, minha deusa!
Meus ombros sobem quando escuto essa voz.
Depois Trevor Gilmore se senta a nossa
esquerda com um sorriso enorme nos lábios, ele é o
irmão da Sêmora, nos conhecemos há anos, estreito os
olhos para ela quando ele me abraça com força, acho
que faz exatamente cinco anos que conheço o Trevor, e
ele da em cima de mim por todo esse tempo. A Sêmora
tenta jogar ele para o meu colo desde que nos
apresentou, e não tenho nada contra, mas eu jamais
pensaria em me envolver com alguém que vejo como
irmão.
—Para você, minha deusa do meio oeste! — Ele
sorri e me estende uma flor.
Sorrio e dou um beijinho na face dele em
retribuição. O Trevor é alto, meio calvo, olhos como
os da Sêmora, castanhos claros, e trabalha na Ford,
uma revendedora de seguros, é gerente do setor e tal.
Ele é bonito, gentil, educado, é realmente um bom
homem, vai à igreja, daqueles tipos de cara que a
minha mãe, literalmente, quer que eu case, mas sei lá...
quando olho para ele eu só consigo pensar irmão,
irmão, irmão, isso soa como um alarme na minha
cabeça.
—Obrigada! — digo, e sorrio sincera, porque as
vezes a gentileza dele me comove de verdade.
—Estava por aqui e vi vocês. —Trevor fala e
beija a mão de Sêmora. — Irmãzinha!
— Eles são tão obedientes as vezes. — Sêmora
fala bem-humorada.
Ela é uns dois anos mais velha que o Trevor, eu
acho.
—Ana, quer jantar comigo hoje à noite?
Não consigo nem pensar direito em comer minha
própria salada, quanto mais jantar com alguém, mas
não sei como dizer não. Sêmora da um pequeno
beliscão na minha cocha e faço que sim, as vezes eu
odeio quando ela tenta fazer essas coisas.
—Bom. — Trevor sorri de forma simpática. —
Trago a Sêmora de brinde.
—É bom mesmo. — Sêmora fala.
Ufa.
Da última vez que ele e eu jantamos juntos,
Trevor ficou me bajulando, dando em cima de mim,
falando coisas Super românticas, mas eu não conseguia
me sentir confortável com o momento, nunca gostei de
situações forçadas, mas é o que vem acontecendo
frequentemente na minha vida, todo mundo tenta
sempre me empurrar para alguém.
Mamãe é assim quando vou visitá-la, minhas
tias, Sêmora, as pessoas acham que eu devo viver
namorando, sempre tentam justificar o fato de eu estar
só com minha personalidade, elas acham que eu sou
infeliz, que eu não gosto da minha vida, que eu sou
solitária, bem, algumas coisas sim, mas outras não.
Apenas não acho que deva ter alguém, porque
não estou pronta para assumir algum tipo de
relacionamento, também, porque eu nunca encontrei e
acho que nunca vou encontrar alguém que realmente
goste da minha aparência, isso é alvo de muitas
discussões entre eu e a Sêmora.
Nosso almoço é cercado das piadas do Trevor,
acabo por me interessar um pouquinho pela salada,
mas meu apetite não volta, porém, eu até sorrio com
algumas piadas. Depois disso ele se despede de nós
duas, e deixamos combinado de nos encontrarmos às
20:00 num restaurante que Sêmora e eu adoramos.
— O que foi? — pergunta Sêmora, assim que ele
se afasta.
— Nada!
Sorrio, mas é algo forçado, Sêmora chama o
garçom e pego algumas notas na minha carteira, assim
que ele traz a conta. Não me sinto bem, meu corpo está
todo dolorido depois de ontem, e levar um rala do
dono da empresa logo cedo, não ajudou nem um pouco.
Acho que no fundo, ele não foi com a minha cara.
— O que foi, Bea? — Sêmora torna a questionar,
e só ela me chama assim.
Tento sorrir, mas ela me conhece. Abro a boca
para falar, porém, sinto um puxão leve no braço, olho
para o lado da minha mão e vejo que Mosés Handerson
almoça com uma garota ruiva e conversam algo, ele
sorri para moça e ambos parecem muito à vontade
enquanto comem. Meu coração começa a disparar
quando vejo o sorriso lindo de Mosés, e escuto alguns
suspiros a minha volta, basicamente todas as mulheres
daqui suspiram e olham para a mesa dele, claro, ele é
realmente lindo.
— Ele é um sonho!
— Isso é muito clichê, Sêmora.
Seria clichê achar que um homem desses olharia
para mim por minha aparência? Mas não de uma forma
negativa, coisa que todo mundo cansa de fazer e sim a
forma como olha para uma garota... comum?! Me viro
para frente, e deixo as notas em cima da mesa, me
levanto, sorrio para Sêmora.
— Tenho reunião com o pessoal do marketing,
nos vemos hoje à noite?
— O que foi?
— Não estou muito bem!
— Eu não pedi para ele vir, dessa vez.
— Eu sei, nossa!
Sorrio e beijo as faces dela, Sêmora fecha a
cara, ela sabe que eu não estou bem, mas também sabe
respeitar o meu espaço. Pego minha bolsa e saio do
restaurante, tento não pensar em mais nada, não é o
momento para dúvidas nem questionamentos internos,
vou deixar para fazer isso quando estiver em casa.
Capítulo 4
Fim de reunião, e também do dia.
Hora de ir para casa, e descansar.
Levanto arrumando as minhas coisas, escuto
Jorge e Addison conversando sobre tomadas de
decisão enquanto o pessoal sai da sala de reunião, o
meu dia hoje foi basicamente assim, Roni está ao meu
lado, pois o dele também foi assim, me senti meio
chateada por ele sempre parecer um grande
inconveniente e tudo mais, porém, tentei ficar na minha
o máximo que eu pude, não falei muito também, as
dores da queda causada pelo Leva Ombro não me
abandonam, e meu estado de espirito também não é dos
melhores.
— Você está triste por que, hein, Ana? Alguma
ameaça do Senhor Gomes?
— Não, só cansada mesmo.
— Você deveria ir à academia, isso ajudaria
você a ficar mais disposta.
Eu sei muito bem entender as mensagens nas
entrelinhas, Roni quer dizer que estou cansada por
causa do meu peso, tento sorrir e apenas faço um breve
"sim" com a cabeça, mas por dentro me sinto bem mal.
O meu peso ainda é o maior motivo das pessoas me
julgarem sempre, às vezes me sinto tão perdedora!
Não sou feliz por ser acima do peso, e ninguém
sabe o quanto já me esforcei para perder peso, mas as
pessoas pensam que eu sou gorda porque quero, porque
sou gulosa e preguiçosa. Bem, as coisas não tem sido
assim desde que eu nasci, eu nunca fui magra, eu nunca
consegui perder peso, eu sempre estou assim... Gorda.
Passo na minha sala e envio uns e-mails, e
protocolo alguns arquivos. Depois que organizo tudo,
pego a minha bolsa e vou para o elevador, meu
departamento já está vazio, só me dou conta que já são
18:30 quando entro no elevador. Leio as mensagens da
Sêmora avisando que o jantar fora cancelado, ela diz
que cancelou porque percebeu que eu não estou bem, e
de fato eu não estou mesmo.
Percebo que estou chorando logo que o elevador
começa a subir, seco as faces e fungo, ela insiste que
devo ao menos ligar para ela, aviso que irei ligar logo
que chegar em casa e ligo o meu reprodutor, colocando
os fones nas orelhas, nos meus ouvidos Bee Gees
inicia I Started A Joke.
— Que legal!
Lentamente me vejo cantando a música, fecho os
olhos deixando a dor sair, mas não choro, fico quieta
concentrada na música, as vezes eu escuto estas
músicas melancólicas para me sentir melhor, nesses
momentos penso que minha vida é uma droga, mas
depois lembro que ao menos estou viva e tenho um
emprego.
Porém, sempre sinto como se faltasse realmente
algo.
Ainda que não seja um relacionamento, tenho 27
anos, um emprego, serei promovida, comprei meu
apartamento, recebo um bom salário, apesar de tudo
sou saudável, e como papai dizia "o importante é ter
saúde".
Papai, que saudade você deixou, acho que você é
o único homem na face da terra que me achava bonita,
que me notava por minhas qualidades e personalidade,
e não pelo meu tamanho, que me chamava de linda
sempre que eu chorava ou me machucava. Sinto tanto
sua falta!
Sinto que o elevador desce lentamente nesse
momento, ergo a cabeça secando as lágrimas que caem
nas minhas faces e aperto os olhos afastando os meus
receios. Meu celular para de reproduzir "a minha
música" e quando abro os olhos, vejo diante de mim a
última pessoa que esperava encontrar nesse momento,
ou seja, Mosés Handerson. Ele está com seu terno
preto impecável dobrado em seu braço, uma pasta
preta pendurada no ombro e com dois botões da camisa
branca desabotoados, a gravata frouxa, e o semblante
totalmente sério.
Meu celular torna a vibrar, decido atender ao
olhar no visor, e ver que é o Trevor.
— Oi, Ana!
— Oi, Trev!
— Tudo bem? A Sêmora disse que você não está
muito bem.
—É, mais ou menos, um pouco cansada.
Viro paro lado e olho para o painel, falta apenas
dois andares para chegar no térreo, estou totalmente
tensa nesse momento.
— Trouxemos pizza e cerveja, estamos te
esperando aqui na portaria.
Sabia que a Sêmora não deixaria por menos.
— Está bem.
— Calma deusa, tudo vai se resolver.
—Eu espero que sim.
— Te esperamos.
— Ok, já estou indo.
Desligo, e lembro que deixei meu casaco na
minha sala, mas só de pensar que não vou ter que pegar
metrô já me sinto bem melhor.
— Agradeço por ter enviado os arquivos, Ana
Beatrice.
Ergo meu olhar e me deparo com a íris azul mais
escura, à noite parece que os olhos de Mosés
Handerson são mais opacos ou algo assim, ou talvez eu
só esteja viajando.
— Só cumpri com minha função, Senhor
Handerson.
Tento parecer o mais profissional possível, não
sou do tipo que mistura as coisas.
As portas do elevador se abrem, nesse momento
ele me olha uma última vez e fala:
— O cargo não é mais seu, é do Ericson, a partir
de amanhã você tomara conta de outro departamento.
O que!?
— Chegue às 7:00, em ponto.
Mas... mas...
Depois ele sai do elevador, e enquanto as portas
se fecham eu o vejo se afastando para o estacionamento
sem olhar para trás, meu coração começa a se encolher.
— Droga!
São 7:00! Já estou na minha sala há um tempo,
cheguei às 6:30. Tive que literalmente madrugar para
estar aqui essa hora, olho em volta e me sinto estranha,
o pessoal começa a chegar as oito em ponto, não tem
ninguém no meu setor.
Estou ansiosa, curiosa e nervosa. Qual o
propósito do Senhor Handerson com isso? Por que ele
fez isso? Qual o problema dele comigo?
Ontem não conseguia me concentrar nas
conversas e brincadeiras de Trevor e Sêmora, eu
estava muito longe, bebi um pouco e consegui beliscar
a pizza que eles compraram, Sêmora alegou que
precisávamos comemorar a compra do meu novo
apartamento.
Minha mudança será em apenas alguns dias, ela
inclusive vai me ajudar, Trevor ficou a todo momento
me enchendo de elogios, mas eu estava muito longe,
estava pensando na ordem que Mosés Handerson me
deu, e tentando aceitar — em silêncio — que ele deu
meu cargo ao Roni, Roni Ericson. Eu basicamente
chorei por metade da madrugada depois que Sêmora e
Trevor foram embora, e na outra metade eu me
martirizei pensando que, talvez, essa decisão do Chefe
seja minha culpa, talvez ele tenha me interpretado mal
por eu ter meio que feito de conta que não o conhecia.
Mas o que eu deveria fazer? Chegar e dizer: Oi
Chefe! Ontem trombamos na rua e eu caí no chão feito
uma pata choca! Sem condições disso acontecer.
Não sei mais de Mosés Handerson do que devo
saber, é o filho do dono e assume a empresa, nada além
disso.
Meu telefone toca me tirando dos pensamentos e
atendo imediatamente.
— Ana Beatrice!
— Pode subir para minha sala, Ana Beatrice, é
no último andar, na presidência.
Que?
— Senhor...
— Estou esperando para conversarmos, bom dia!
— Ele desliga sem me deixar falar nada.
Retiro o que eu pensei sobre ao menos ser
educado, a arrogância de Mosés Handerson começa a
me incomodar. Me levanto pegando minha bolsa, meu
corpo ainda está dolorido, minha perna principalmente,
e ainda estou mancando. Saio da sala na qual trabalho
há algum tempo e sinto vontade de chorar, já sabia que
seria bem difícil.
Meu futuro é incerto a partir de agora, acho que
vou pedir para Sêmora pegar as minhas coisas,
conforme for a decisão do Senhor Henderson.
Entro no elevador e aperto o botão da
presidência, desde que entrei na empresa nunca tive a
oportunidade de realmente subir para sala do dono,
estou tremendo enquanto o elevador sobe. Quando ele
para, meu coração está aos saltos, a ante sala é toda
parecida com uma recepção, só que um pouco mais
espaçosa e com sofás confortáveis, meus dedos
formigam enquanto uma recepcionista alta e loira se
aproxima com um sorriso lindo, marcado por lábios
vermelhos.
— Bom dia, me acompanhe, por favor, Senhorita
Beatrice.
Vim com uma roupa mais formal, calça social,
camisete social e um casaco preto por cima, sapatilhas
com um pequeno salto e deixei meus cabelos presos
num coque comportado, tento não me sentir tão
insegura quanto estou, o máximo que pode me
acontecer é ser demitida, em algum momento se isso
acontecer a única coisa que poderei fazer é agradecer
pela oportunidade e sair da empresa com a minha
dignidade intacta.
Ela abre a porta de acesso à sala da presidência,
e vejo um homem imponente sentado diante de uma
grande mesa de mogno, o dia transparece através das
janelas de vidros transparentes, seu olhar está fixo no
computador, mas logo que me vê, Mosés Handerson se
vira para mim e seu olhar penetrante me atravessa.
Questiono mentalmente como alguém tão jovem
pode ser dono de todo esse império, com tanta
facilidade. Mosés Handerson deve ter uns 25 ou 26
anos no máximo, apesar da barba o tornar um pouco
mais velho ou coisa assim. Ele me olha com seriedade,
a recepcionista fecha a porta atrás de mim, e me
aproximo lentamente da mesa dele, parece que as
minhas pernas estão pesando toneladas enquanto ando.
Não o fito, porque isso faz com que o meu coração
fique disparando, me sinto idiota.
— Bom dia, Ana Beatrice.
— Bom dia, Senhor Handerson.
Me sento na cadeira de cor marrom diante da
mesa dele, coloco a minha bolsa no colo e fico
esperando que ele fale algo. Mosés me analisa em
silêncio, ele usa um terno de cor meio clara, cinza, com
uma camisa quase que do mesmo tom, seu olhar é mais
claro pela manhã.
—Preciso de alguém de confiança para cuidar
das minhas pessoalidades e administrar as coisas por
aqui. — Mosés fala muito baixo, num tom muito calmo.
— Minha secretária se demitiu ontem, então quero que
você assuma a função dela.
Secretária? Franzo a testa, muito mais que
surpresa, dentro de mim uma pequena ponta de raiva
começa a crescer, mas me detenho, ele não acabou de
falar.
— É claro que receberá muito bem para isso,
você cuidará das funções de uma secretária e da minha
agenda, me acompanhará nas viagens, e também terá
todos os seus benefícios já garantidos na empresa, te
darei um aumento.
— Gostaria de saber uma coisa — O interrompo.
— Por que o Senhor me tirou o cargo de Chefe do
setor?
— Para ser franco, não vi em você a mesma
competência que o Roni tem.
Engulo a seco a resposta que recebo, estou me
sentindo muito mais do que ofendida.
— Acredito que terá um proveito melhor, sendo
minha secretária.
—Acontece que eu não estudei cinco anos, para
chegar agora e ter que me tornar sua secretária, eu não
cursei secretariado executivo, eu fiz contabilidade. Se
olhasse minha ficha...
—Eu não estou interessado na sua ficha, e
também não perguntei nada para você, Ana Beatrice.
Essa é uma exigência adotada por mim, eu sou o dono
da empresa e emprego quem eu quero, no lugar que
quero — Ele me corta de maneira estupida e cheia de
arrogância.
— Ótimo, então empregue outra pessoa. —
Resolvo não me calar, e me levanto. — Muito obrigada
pela oportunidade.
— Você...
—Eu também não perguntei nada, Senhor
Handerson, nem pedi. Com licença.
Giro os calcanhares e saio pisando duro da sala,
meu corpo todo dói, e dentro da minha garganta se cria
uma angústia tão dolorosa, que chega a queimar. A
vontade que tenho é de gritar até que a dor saia, a dor
da humilhação e ofensa, mas principalmente do
desaforo desse homem arrogante e cheio de si.
—Ana Beatrice, eu ainda não terminei de falar
com você!
Não olho para trás, estou cheia das exigências
desse homem, eu não quero ser sua secretária, eu quero
meu cargo, o que o Senhor Gomes me prometeu, me
sinto enganada. Passo pela recepcionista, ela está
falando ao telefone, depois ela arregala os olhos, e
acelero escutando os passos do Senhor Handerson
atrás de mim, eu tenho absoluta certeza que ele não
aceita muito bem o fato da minha recusa.
—Ana Beatrice, eu falei com você!
Ele está falando comigo como se fosse o meu
pai, mas que absurdo!
Me viro para ele, estamos apenas alguns
centímetros de distância. Enquanto o fito, vejo um
olhar zangado e cheio de raiva, mas mascarado por
uma frieza que Mosés Handerson adora aparentar
diante de tudo e todos, ele fica me olhando em silêncio
e seu maxilar se contorce enquanto eu o encaro de
cabeça erguida.
—Para o Senhor, é Senhorita Preston, e não, eu
não vou ser sua secretária, eu sou contadora.
— As coisas não se resolvem assim!
— Eu já disse não, eu me demito.
—Poderia, por favor, voltar a sala para
conversarmos?
—Não!
—Por que não? Você não conhece o cargo, como
pode concluir que é ruim?
—Eu não vou ser secretária de ninguém, o
Senhor não sabe o duro que eu dei na faculdade, eu sou
contadora.
Mosés respira fundo, como se precisasse muito
de paciência. Ele deve ser um mimado que não sabe
lidar com negativas, um riquinho mimado.
— Podemos conversar com calma?
— Não.
— Mas você...
—Não!
Me afasto e vou para o elevador. Acho que posso
tentar algum cargo na área de contabilidade em alguma
outra empresa. Vou trabalhar no meu ramo, eu não nasci
para ficar o dia todo atendendo telefone para ninguém,
nem resolvendo coisas de uma agenda. Eu estudei
muito para poder alcançar o cargo que tenho na
Handerson LTDA, não vou me tornar uma secretária.
Entro no elevador assim que as portas se abrem,
aperto o painel e as portas começam a se fechar, mas
as mãos firmes de Mosés segura a porta, ele me encara
ainda mais sério.
— Escute, eu escolhi você para o cargo por sua
competência, justamente por isso, você não será uma
simples secretária, você será o meu braço direito,
alguém que estará comigo em todas as decisões, você
acha que isso é algo fácil?
—Eu não sou secretária!
—Eu estou te dando um voto de confiança,
Gomes me disse que poderia confiar em você, está se
deixando levar pelo orgulho. Poderia ao menos pensar
com calma na minha proposta?
Fecho a cara, não quero pensar em proposta
alguma.
— Tire o resto da semana de folga, no sábado
você me dá sua resposta, estarei esperando.
Ele se afasta um pouco, e escuto o som das
portas se fechando. Outra vez, a última coisa que vejo
é Mosés Handerson, mas dessa vez ele não me dá as
costas, seus olhos azuis estão absolutamente focados
em mim, e isso não é tão bom quanto eu imaginaria em
toda a minha vida.
— Isso não me parece justo.
— Porque não é!
Estou tão cheia. Sêmora veio assim que liguei,
avisei que não fui trabalhar ontem, bem eu fui, mas
francamente não queria ver ninguém, quando eu estava
saindo da empresa ninguém do setor havia chegado,
minha conversa com o Senhor "você é minha
secretária" foi bem mais rápida que o esperado.
Ontem foi um dia emocionalmente cansativo para
mim, fiquei o dia todo me martirizando pela minha
decisão de sair, mas ao mesmo tempo estava
convencida de que não iria conseguir continuar na
Handerson sob as condições impostas pelo dono,
estava insegura sobre tudo.
Preciso do trabalho, muito mais do que muitas
pessoas pensam, porém, sei da minha competência, e
minha capacidade. Eu sei o quanto me esforcei para
estar no meu cargo na Handerson, eu sei o quanto foi
complicado chegar onde estou, na época da faculdade,
eu não nasci para ser secretária, é um cargo que eu não
quero, pois, não me identifico.
— O Roni está estufando o peito, comunicaram à
promoção dele hoje, o Senhor Gomes não estava feliz
em anuncia-lo como novo Chefe de todo o financeiro,
eu muito menos.
Sêmora acabou de sair da Handerson, ontem o
meu dia foi cheio de inquietação, o de hoje foi lotado
de impaciência, angústia, frustação, nunca me senti tão
magoada com algo em quase seis anos de empresa.
Ela veio direto para cá, e eu contei
absolutamente tudo, desde a proposta do Senhor
Gomes, até a proposta indecente do Senhor Handerson.
—Você não está bem, não é, amiga?
—Sinceramente, estou cansada de pensar, eu
acho que vou mesmo pedir demissão.
— Você precisa do emprego.
—Eu não sou secretária!
—Daquele homem eu seria tudo! — Sêmora
suspira.
Fecho a cara para ela, que ri à beça e me abraça.
Chorei à tarde toda pensando no meu emprego, nas
contas— que não são poucas — em dezenas de coisas.
O fato de Mosés ter feito isso, me faz acreditar que eu
não tenha competência para chefiar um departamento
sozinha, no caso, logo agora que eu acreditava que eu
era boa, que daria o maior passo da minha vida, ele
quer me diminuir a um simples cargo de secretária.
—Vou preparar um café, você está com cara de
trapo.
—Obrigada pelo apoio.
—Que tal comida japonesa?
Faço que sim com a cabeça e Sêmora levanta
indicando o rumo do meu quarto, uso moletom, uma
camiseta comprida, pantufas, acho que não penteio o
cabelo desde ontem, me sinto péssima com a situação,
estou menstruada também e isso não me ajuda. Levanto
quando escuto o som da campainha, e reviro os olhos.
Aposto que ela chamou o Trevor, como se eu
precisasse rir de alguma piada ou me animar.
Me arrasto até a porta e a abro tentando pensar
que acima de tudo, Trev não tem culpa de não ter
sentimentos não correspondidos, francamente, não sei o
porquê ele se interessa por mim, não tenho atributos
físicos, eu sou exagerada e o meu corpo é GG, bem
grande.
—Ana Beatrice!
Ninguém pronuncia o meu nome de um jeito tão
sutil.
Ergo o olhar e vejo um par de sapatos escuros, a
calça social escura, e as pontas de um terno social
escuro também, depois meu olhar alcança o imenso
buquê de rosas vermelhas, acima do buquê vejo um
queixo barbudo, uma boca cerrada e bonita, eu o fito, e
novamente sou atravessada por esse olhar escuro, um
olhar vazio e intenso...
—Senhor Handerson!
—São para você.
E eu tenho a nítida impressão de que ele está
nervoso. Não sei o porquê.
—Acho que o Senhor se enganou de prédio.
—Não me enganei, são para você.
—Obrigada.
Pego o enorme buquê, essa é a primeira vez na
vida que ganho rosas vermelhas de alguém, mas as
circunstâncias não são das melhores.
Fico parada por alguns momentos sem saber
como agir, não faço a mínima ideia de quem falou me
endereço para ele, e porque Mosés Handerson veio
atrás de mim com flores, mas enfim.
—Obrigada pelas flores, até amanhã, Senhor
Handerson.
Seguro a maçaneta e fecho a porta na cara dele
logo em seguida, meu coração parece que vai sair pela
boca, acredito que ele tenha feito isso apenas para
demonstrar que está arrependido, ou talvez para
parecer gentil.
—Mas isso não me convence!
Vou a sala e deixo o buquê em cima do sofá
encapado, ainda não sei o que decidir, mas com certeza
isso não vai mexer comigo, eu não sei quem é Mosés
Handerson e não sou uma secretária. Tirando o fato de
que ele é o meu Chefe, eu não lhe devo satisfação
nenhuma quanto as decisões que tomo na minha vida.
—Melhor tomar um banho.
Capítulo 5
—Um brinde ao novo cargo!
—Ao novo cargo!
Acho que essa já é a terceira dose que eu tomo
em seguida, Sêmora bate com o copinho no meu e
rimos, acho que a última vez que bebemos assim foi no
dia da nossa formatura. Não tivemos festa, nem baile,
eu não tinha dinheiro para pagar a festa, então, a
Sêmora se solidarizou e também não participou, ela e
eu sempre fizemos tudo juntas, até nas desgraças ela se
junta a mim, liguei mais cedo dando a grande notícia, a
minha grande promoção do ano.
—A Secretária do Ano!
—A você, uma mulher forte e profissional,
amiga.
Mais uma.
A tequila não causa mais tanta repulsa assim,
minha garganta queima, viemos para um bar no centro
mesmo, Sêmora sorri enquanto fica se insinuando para
o barman, um cara canta no palco afastado das mesas,
não me sinto tão tonta, eu nunca fui de cair de boca na
bebida por causa de algum tipo de mágoa ou coisa
assim, eu não sou assim, mas depois do porre,
literalmente falando, que foi a minha discussão com o
Senhor Handerson hoje de manhã, preciso esquecer um
pouco os problemas.
Outro cara tira a Sêmora para dançar, acho que
esse já é o quarto desde que chegamos, olho em volta e
percebo que não há ninguém me olhando ou coisa
assim, já estou acostumada, antes nós duas éramos
rejeitadas, agora eu sou a rejeitada, não que seja muito
diferente do que sempre me senti, eu sei que nenhum
cara aqui me tiraria para dançar em sã consciência, e
tento mesmo deixar isso de lado, mas é muito chato
sempre ficar só, ninguém se aproxima o suficiente para
querer ao menos uma dança.
Eu sei dançar.
Aprendi com o melhor: papai.
Ele era um pé de valsa, me ensinou a dançar
salsa, e músicas Castelhanas, algo que lembra tango.
Papai sempre foi gordinho, mas ele tinha uma fama de
galinha antes de casar com a mamãe, na nossa antiga
cidade ele era um cara Super simpático e todas as
mulheres da cidade o conheciam por sua simpatia e
alegria, seu jeito engraçado de ser.
Mamãe por sua vez, sempre foi um pouco
mandona e apática, mas soube como conquistar o velho
Tito, papai era filho de mexicanos, mas foi adotado
muito pequeno por um casal de Remo, os pais dele não
tinham condição de cria-lo e deram ele, ao menos foi
isso o que ele soube, depois que cresceu ele conheceu
mamãe e se casou, infelizmente não sou filha prodiga,
mas prefiro não lembrar das minhas bem-sucedidas
irmãs. Eu sou a mais velha, então, nasci na época das
vacas magras, também não sei se posso chamar a
Brigeth e a Fiance de irmãs, elas não participam da
minha vida há anos, desde que fui para faculdade não
temos contato, também não são realmente biológicas,
ambas foram criadas pelos meus pais, pois, uma das
minhas tias teve sete filhos na época, e não tinha
condições de cria-las, então as deu para os meus pais.
Ambas já se casaram, apesar de nossas diferenças de
idade serem de mais ou menos dois anos para cada
uma. Elas também parecem ter esquecido que mamãe
existe.
— Me concede essa dança, minha deusa?
Começo a querer rir.
Olho para Trevor, mordo o lábio inferior com
cara de choro, sorrio e lhe dou a mão, ele sorri muito
naturalmente, e me puxa para perto do palco, onde
casais apaixonados dançam juntos.
Seguro seu ombro me sentindo monstruosamente
alta pois eu o alcanço facilmente, o abraço e encontro
um pouquinho de conforto, me sinto um pouco fora de
órbita devido a bebida, mas acompanho ele na dança
lenta, já deveria imaginar que a Sêmora diria para ele
que não estou bem. Pelo menos dessa vez, eu não vou
ficar como uma vela daquelas grossas, apagada em um
canto esperando ela terminar de pegar o telefone de
alguém para irmos embora.
—Parabéns pela promoção, deusa!
—Obrigada, Trev.
Sorrio para ele, depois continuamos a dança
lenta, alguns momentos depois ele me dá um beijo na
cabeça e voltamos para o bar, porém, bem antes que
ele fale alguma coisa uma garota o chama para uma
dança, acho que já se conhecem, nesse bar sempre
encontramos pessoas das empresas em que
trabalhamos.
—Se importa?
—Não, vai lá.
Suspiro quando ele me dá um beijo respeitoso na
cabeça, me sinto estranha e por alguns momentos
desconfortável, pago a minha parte da conta e saio sem
me despedir, não estou mesmo bem, talvez encher a
cara não seja a solução mais viável nesse momento.
Decido ir para o meu novo apartamento, o que
me custará dias de ódio intenso na Handerson, ele já
está mobiliado e só me esperando com os meus
pertences pessoais, as miudezas, será no máximo na
sexta que vem.
Pago o taxi, quando chego ao novo prédio
comprimento o porteiro e subo, além da segurança,
tudo o que esse lugar me oferece é mais conforto e algo
mais perto do que posso chamar de uma idealização,
meu novo canto é maior, mais espaçoso, e o melhor, na
cobertura.
Quando entro respiro fundo, gostando do cheiro
de móveis novos, meus olhos comtemplam todo o
apartamento decorado e arrumado ao meu gosto, e o
mais importante, meu.
Ascendo as luzes da sala e abro as persianas
comtemplando a vista maravilhosa de Nova York, a
sala tem blindex em volta de toda ela, o vento sopra
uma brisa mais forte e fria quando abro a porta da
sacada — agora tenho uma sacada —, não sinto fome,
mas acho que posso pedir algo para comer, não comi
nada o dia todo, meu estômago já está protestando.
Volto para dentro fechando o blindex da sacada,
e vou para cozinha, a geladeira está ligada há alguns
dias, da última vez que estive aqui foi quando a
decoradora disse que estava tudo pronto, eu estava tão
feliz que mal quis sair, dormi um fim de semana todo
aqui, a Sêmora também veio.
Ligo na pizzaria local, preparo um suco, tiro o
jeans, a blusa, e vou para o meu novo quarto. Quero
tomar um banho na minha nova banheira, mas acho que
como a pizza chegará antes, não tem como. Volto para
cozinha vestindo um camisão que guardo há anos, é do
meu pai, pego um vinho que a Sêmora deixou aqui da
última vez, e também a primeira taça que ganhei dela
depois que comprei o apartamento.
Ligo o som, e encho minha taça, fico por alguns
momentos na sala esperando o porteiro, eles mandam
avisar quando o pessoal da pizzaria chega ou eles
mesmos trazem, como passei os dados do meu cartão
por telefone, não precisarei pagar.
Fico por alguns momentos prendendo o choro na
garganta, compelindo a vontade de chorar, mas não
consigo, depois disso meu choro é livre e baixo,
soluço me sentindo tão fraca!
Bebo toda a taça de uma vez e escuto o som da
campainha, o badalar me traz de volta para a realidade,
seco as faces, pego a pizza e volto para a sala, aumento
o volume do som e vou para a sacada com a minha
caixa de pizza, meu vinho e minha taça, Me sento na
cadeira, estou grata por estar bem longe de todo o resto
do mundo, não que não venha sendo assim ultimamente,
mas é bom as vezes estar só e se sentir só.
Isolada!
Eu sempre fui, sempre fiquei na minha, nunca me
encaixei em nenhuma turma da escola, nessa época eu
ainda não conhecia a Sêmora, tinha duas irmãs
adotivas que nunca se sentiram minhas irmãs, uma mãe
que precisava de meu apoio, pois, havia perdido meu
pai recentemente, as minhas irmãs pediam a atenção
que a minha mãe não podia dar, e eu me concentrava
em não beber o primeiro litro de alvejante que via pela
frente, porque sabia que minha mãe precisava muito
mais da minha vida, do que eu de um suicídio.
Acho que é isso o que muitas garotas sentem e
vivem quando estão no colegial, e elas não se sentem
encaixadas em algum tipo de turma, ou não se dedicam
a algo no qual se identificam, mas acho que não mudei
tanto assim com o decorrer desses anos. Olho para o
prédio ao lado e vejo os apartamentos com luzes
acesas, eles são apartamentos de um condomínio de
luxo, comprei o meu um pouco mais barato por não ser
tão luxuoso.
Escuto agora, Fun We Are Young ft. Janelle
Monáe, sempre amei essa música, ela me faz querer
gritar as vezes.
Queria ter sido jovem alguma vez na vida, ao
menos uma jovem que não se preocupasse tanto com
problemas como aparência, medos, incertezas e
dúvidas, eu acho que ainda me sinto mais ou menos
assim, ou não mudei, algumas inseguranças como sair
da pequena cidade onde nasci, e encarar a vida adulta,
se foram quando fui para faculdade, mas quanto ao meu
peso e aparência... Zero X Zero.
Escuto o som do meu celular, acabei de dar
minha primeira mordida na pizza... palhaçada.
Corro para dentro e pego, não vejo o nome no
visor, estou um pouquinho tonta devido à bebida,
mastigo rápido e atendo, deve ser a Sêmora de algum
telefone me caçando, me sento na cadeira e bebo um
pouco de vinho para engolir.
—Ana Beatrice.
Me arrepio toda ao ouvir a voz dele.
Mosés Handerson.
—Boa noite, Ana Beatrice.
—Boa noite, Senhor Handerson.
—Você está bem?
—Sim.
—Poderia por gentileza, abaixar o volume do
seu som?
Bebo um pouco mais de vinho, claro, o som está
auto, mas acho que dá para ele me ouvir muito bem, e
vice e versa.
—Em que posso ajudar, Senhor Handerson?
—Poderia começar abaixando o som, por
gentileza?
Essa educação é tão falsa, até parece que eu não
sei que você é um lobo em pele de cordeiro.
—Acho que dá para o Senhor ouvir
perfeitamente o que eu falo.
—Ah não, eu gostaria que você abaixasse porque
eu quero dormir.
Congelo, e escuto uma risadinha muito cínica,
depois de alguns segundos, olho novamente para o
condomínio ao lado e vejo a alguns metros de distância
de mim, Mosés Handerson usando uma camisa social
desabotoada até a altura do peito com uma calça
social, uma mão dentro de um bolso, e a outra
segurando o celular, os cabelos dele parecem
desarrumados, a barba como sempre intocável, desvio
o olhar e desligo a ligação.
—Demônio — xingo baixinho. — Satanás,
perseguidor.
Pego a minha pizza, meu vinho, e a taça. Fecho a
cara para ele e mostro o dedo do meio — Totalmente
justificável, porque estou muito puta. — Mosés me
olha com uma cara de deboche e sorri, novamente meu
celular toca, ele mantém o dele na orelha.
— O que eu estou fazendo? Essa cobertura é
minha!
Coloco tudo de novo na mesinha de vidro e viro
minha cadeira, dando as costas para ele, depois mordo
a pizza e atendo a ligação de boca cheia.
—Sim? — mastigo.
—Não vai desligar?
—O Senhor pode — mastigo mais. — Pode
reclamar com o Síndico.
Ele dá uma risadinha maldosa do outro lado da
linha, novamente me irrito, mas engulo a raiva, eu não
faço a mínima ideia do que o meu Chefe — demoníaco
— faz no prédio ao lado, mas já odeio o fato dele estar
apenas a alguns metros de distância de mim.
—Vamos, por favor, amanhã terei que acordar
cedo!
—Ninguém acorda cedo no domingo, Senhor
Handerson.
—Eu acordo, por favor, abaixe o volume do seu
som, eu costumo dormir cedo.
Odeio essa gentileza disfarçada na voz dele, mas
acho que realmente o som está alto, escuto o eco
retornando na ligação.
—Ok.
Encerro a ligação, me levanto, e pego minha
caixa de pizza, coloco minha taça em cima dela, depois
pego o vinho com o celular, mas não olho para trás,
não quero olhar na cara desse homem tão cedo, ainda
que saiba que esse cedo será na segunda feira.
Capítulo 6
Demoro para levantar.
Minha cabeça doí, mas não me sinto totalmente
mal por conta da bebedeira de ontem, estou jogada no
sofá da minha sala, a claridade no apartamento é
evidente, acho que acabei pegando no sono de tanto
que chorei.
Bebi a garrafa de vinho toda, consegui comer
quase metade da pizza, e fiquei ouvindo os clássicos
dos anos 80 e 90 até que as minhas lágrimas
inundassem meu travesseiro.
Mas acho que agora estou um pouco melhor do
que no começo da semana, acho que o melhor mesmo é
aceitar que agora não serei mais a contadora Chefe da
Handerson LDTA, que serei apenas a secretária do
dono.
Secretária!
Secretária...Secretária...Secretária...
A palavra ecoa em minha cabeça dezenas de
dezenas de vezes enquanto olho paro o teto da minha
sala, um teto de gesso pleno e bonito, com cor branco
gelo e cantoneiras lindas e desenhadas...
Preciso pagar esse apartamento, preciso
continuar a pagar as minhas contas e enviar dinheiro
para minha mãe pagar algumas despesas dela, ao
menos até eu conseguir arrumar um emprego melhor,
vou começar a procurar semana que vem em qualquer
lugar como contadora simples, ainda que eu comece
ganhando um pouco menos que na Handerson LTDA.
Me ergo e ligo o som, The Police, minha cabeça
badala, mas o volume do som está incrivelmente baixo,
não quero nem lembrar que foi por causa daquele
enxerido, na verdade eu decidi que vou deletar aquele
homem da minha vida, ele só será alguém a quem devo
suportar até achar algo melhor.
As janelas estão sem as persianas, e daqui bem
do lado eu vejo o prédio de luxo onde o demônio
estava ontem, também com blindex transparentes, e
logo de cara vejo que neste lugar do apartamento
funciona uma sala, daqui vejo todo o apartamento, os
móveis, e todo o resto, meio embaçado mas vejo, sofás
de cor cinza, uma luminária, o que parece ser uma
mesa de jantar mais afastada.
Logo em seguida eu vejo uma garota morena
entrar na sala usando uma camisa branca masculina,
daquelas tão magras que a camisa fica folgada no
corpo dela, ela tem cabelos compridos e lisos, estão
desarrumados, minhas bochechas queimam quando
vejo Mosés Handerson entrando logo em seguida na
sala usando apenas o que parece ser um short de
dormir, acho que ele não me viu, e tomara que não
veja, pego o controle e rapidamente o aciono me
deitando basicamente no chão para não ser vista.
Ele tem uma namorada!
Mas o que eu esperava? Alguém como ele deve
ter pelo ou menos dez mulheres juntando sapatos na
porta da casa onde ele mora.
Porém, me irrito, se ele disse que ia dormir e me
mandou baixar o volume do som, por que estava com
uma mulher? Ele dormiu com ela... Na verdade, transou
com ela à noite toda, me mandou baixar o volume do
som apenas para brincar com a minha cara.
Respiro fundo, engulo a irritação, hoje é o meu
último dia de liberdade, eu não quero pensar nesse
imbecil, de fato nem sei se ele mora aí, talvez seja a
mulher que more, espero que sim, assim não terei que o
ver com frequência fora do trabalho.
Vou para o meu banheiro, tomo um banho bem
demorado afastando a ressaca, depois que termino,
coloco um vestidinho de ficar em casa mesmo, trouxe
poucas roupas para cá, seco os meus cabelos, depois
faço uma maquiagem mais simples, vou para casa da
Sêmora também, não sou obrigada a ficar aqui vendo
meu novo Chefe com sua namorada seca no
apartamento do prédio ao lado.
Ligo para Sêmora logo que saio do banheiro.
—Onde você está?
—No meu apartamento novo, desculpe, não me
sentia bem.
—Sei, o Trev e eu ficamos mortos de
preocupação.
—Desculpe, você está livre hoje?
—Sempre.
—Estou indo para a sua casa, mas será apenas
nós, sem o Trev. Ok?
—Ok, deixa que eu te pego, e vamos paro o seu
apartamento velho. Vou na minha bebezinha, mas você
pilota pelo centro.
Sêmora tem uma moto, mas ela morre de medo
de pilotar, não sei por quê. Tirei a minha carteira de
moto e carro há alguns anos, a moto veio depois, mas
condições para comprar um dos dois nunca tive, ainda
mais que priorizei juntar dinheiro para dar a entrada no
meu apartamento, não sinto como se fosse uma grande
necessidade na minha vida.
Nos despedimos e organizo tudo, acabo trocando
o vestidinho por um jeans cós alto, uma blusa de cor
cinza e um casaco de mangas que costumo usar por
cima, analiso meu semblante e não estou das piores,
acho que posso preparar algo legal para o almoço,
também quero deixar algumas coisas prontas para a
mudança, agora que meu futuro como "secretária" é
incerto, tenho que me preparar para que ocorra tudo
bem.
Calço meu tênis, e escuto o som do interfone,
pego minha bolsa e atendo.
—Desce logo.
O apartamento da Sêmora fica dez minutos de
carro daqui, meu outro apartamento fica a meia hora,
saio do meu apartamento e pego elevador, menos de
cinco minutos depois eu estou encontrando minha
melhor amiga no estacionamento, ela está com a cara
de quem não dormiu a noite toda.
—Deu igual chuchu na cerca.
Enquanto sorrio ela me estende o capacete,
mostrando o dedo do meio, conheço a Sêmora, depois
que ela emagreceu a listinha de contatos vem só
crescendo, antes disso ela tinha um namorado que vivia
chamando ela de gorda e ignorando ela.
Adoro a moto da Sêmora, é uma Ducati
Hypermotard 1100, corre muito, na verdade a moto é
mais do Trevor que dela, mas eles vivem trocando,
quando ele está com o carro dela ela acaba pegando a
moto dele, porém, como fica mais com ela, a moto vive
basicamente com a minha amiga.
Subo e coloco o capacete, ela sobe logo atrás
colocando o dela, nem vai ter graça, meu antigo
apartamento não é tão longe, e de moto não pegaremos
tanto engarrafamento.
Ligo a moto, o som do motor me empolga,
arrumo meus fones nas orelhas e aumento o volume, a
Sêmora se agarra a mim colocando os óculos escuros
dela, enquanto acelero escuto o som ecoando por todo
estacionamento, então subo a rampa acelerando, o
portão da garagem sobe e saio do sub solo, Sêmora me
estende um chiclete e abro a viseira esperando mais um
carro passar, ela coloca o chiclete na minha boca e
outro na boca dela, acelero e entro dando seta, então
paro no sinaleiro logo adiante.
—Que ressaca do cão! — Sêmora reclama me
abraçando. —Aí amiga, me protege dos caras do
Queens!
— Você está subindo de nível a cada dia que
passa — falo e sorrio, Sêmora me belisca dando uma
risadinha malvada.
—Nem foi lá essas coisas!
—Imagino que não.
Um Bugatti preto para ao lado, escuto o som
baixo do motor do carro de luxo em silêncio. Olho
para frente atenta ao sinaleiro, abaixo a viseira e
mantenho aceleração, o sinal da esquerda abre.
—Disfarça agora, mas o Chefe está no carro ao
lado olhando para gente.
Enfureço, fico totalmente contrariada e tensa,
muito tensa com a inquietação da Sêmora na moto.
—Fica quieta Sêmora.
—Ele está olhando!
—Quem se importa?
—Os pedais são muito baixos para as minhas
pernas.
—Imagine se você tivesse 1.75 de altura, como
eu.
Fixo o apoio nos pés e impaciente puxo as
pernas dela para cima, Sêmora solta um berro alto
assustado e se agarra a mim, francamente, tem dia que
eu sou a pessoa mais ignorante do mundo.
—Firma as coxas — aconselho e puxo ela pelo
quadril com força. —Assim!
—Ok. — Sêmora se agarra a mim.
Olho para direita e tem uma mulher numa
caminhonete boquiaberta nos olhando, o sinal abre,
acelero e disparo, Sêmora da uma gargalhada alta, ela
sabe que eu estou realmente chateada com a situação, a
velocidade é muito extasiante, muito boa, mas nessa
via não dá para correr muito, abro a viseira e dou seta
para esquerda enquanto me inclino conduzindo a moto.
—Toma essa, Senhor Handerson!
É, toma essa!
— Bom dia, Ana!
Roni me olha assim vanglorioso, mas não me
irrito, na verdade eu já consigo até engolir o fato de
que ele é o novo substituto do Senhor Gomes, ao menos
não serei sua subordinada, tenho certeza de que ele
faria da minha vida um inferno se eu ocupasse o mesmo
cargo de antes.
—Bom dia, Roni, parabéns pela promoção.
—Obrigado.
Ele até veio de terno, aposto que deve estar com
um rei na barriga, decidi que hoje vou me despedir dos
meus contadores, ontem a Sêmora me ajudou a fazer
umas lembrancinhas com recados impressos,
chocolates caseiros, me distraí muito com o nosso dia
juntas em meu apartamento, e com a história de sexo
mais hilária que ela me contou de todos os tempos.
Vesti o mesmo de sempre para vir trabalhar,
jeans, camisete e calcei um par de sapatilhas de cor
preta, deixei meus cabelos presos num rabo de cavalo
e disse para eu mesma que se o Senhor Handerson me
quer como secretária, ele que se adeque ao meu jeito
de me vestir.
—Você foi remanejada, não é mesmo?
— É.
Roni me dá um sorriso cheio de maldade, mas
ignoro, logo em seguida saímos do elevador, entro no
meu setor e vejo os rostos dos meus contadores com
cara de choro, eu tenho exata certeza de que apesar de
eu não ter sido a melhor Chefe do mundo eles até
gostam de mim, se apegaram a mim.
Rapidamente eu vou de mesa em mesa dando um
abraço e entregando as lembrancinhas que trouxe numa
sacola de papel, ao mesmo tempo que me despeço me
lembro de várias coisas que aprendi nesse setor, do
primeiro dia que assumi como coordenadora, e de
quando cheguei na Handerson como estagiária.
A última que abraço é a Sêmora, não falo nada,
mas ela também faz cara de choro, não sei quem vai
assumir no meu lugar tão pouco no de Roni, mas enfim,
espero que quem quer que seja cuide direito das duas
equipes.
Acabo por ganhar um buquê de flores da equipe
e quando saio do setor estou sendo aplaudida por
todos, sinto que fiz um bom trabalho, ao menos como
contadora, aceno e vou para o elevador, não consigo
mais chorar, ontem foi um dia muito bom para refletir e
aceitar, agora é prosseguir, coisa que faço muito bem.
Me sinto deslocada quando chego à presidência,
a recepcionista me recebe com um sorriso largo e me
acompanha até a sala do Senhor Handerson, logo que
entro eu o vejo com o mesmo semblante de sempre,
sério, frio, a moça fecha a porta atrás de mim, e me
aproximo da mesa do Chefe em silêncio, não tenho
papo com ele, a única coisa que decidi fazer foi ser no
mínimo profissional.
—Bom dia, Ana Beatrice.
—Bom dia, Senhor Handerson.
Tenho que ser indiferente e fria.
—Você está atrasada.
—Estava no meu antigo setor, me despedindo
dos meus contadores.
—Entendo.
Ele olha para o buquê no meu colo e pego um
saco com as lembrancinhas na sacola de papel, estendo
e coloco sobre a mesa dele, Mosés olha para o
saquinho e depois para mim, bem mais que surpreso.
— Obrigado, mas eu não como chocolate.
—Ah, ok.
Pego o pacotinho de volta e coloco na sacola,
que desfeita.
—Quero que acompanhe Marcy por esses dias,
ela quem está cuidando da minha agenda e tudo mais,
ela irá te treinar.
—Sim, Senhor.
—Nenhuma reclamação ou exigência?
—Estou aqui para trabalhar, Senhor Handerson,
apenas isso.
—Ótimo, pode ir e acompanhar a Marcy,
qualquer dúvida pode consultá-la, quando der o seu
horário de ir embora pode ir, e também pode tirar os
horários de almoço nos mesmos que tirava antes.
—Obrigada, Senhor Handerson, com licença.
Me afasto em silêncio.
—Bela moto, a da sua namorada!
Meus ombros sobem e descem, mas engulo o
comentário, não sei se ele faz por maldade,
francamente acho que não, e isso me machuca ainda
mais, ele está me chamando de lésbica!
—Obrigada, com licença.
Saio da sala, vou para mesa da Marcy, qualquer
coisa é melhor do que ficar perto desse idiota.
Capítulo 7
Os dias se passam rapidamente.
Marcy é uma excelente assistente, observa-la
trabalhando é curiosamente interessante.
Durante essas duas últimas semanas tenho
chegado cedo, tomado café com ela e subido para
presidência, todos os dias tenho visto a mesma rotina e
seguido todos os passos de Marcy, o pequeno
treinamento foi bem extenso, e aprendi muitas coisas.
Ser secretária é totalmente diferente de ser
contadora, uma coisa não tem nada a ver com a outra,
talvez por isso eu esteja meio que apanhando, confundo
as linhas ao atender os telefonemas, mexer com as
tabelas e os e-mails é o de menos, difícil é encaixar
tanta gente na agenda do Senhor Handerson.
Marcy também comentou comigo sobre os
compromissos e as viagens do demônio, graças a Deus
ele sumiu das nossas vistas há cinco dias, e se Deus
quiser vai ficar por mais três longos e lentos dias longe
de nós.
Fiz minha mudança nesses dias.
Sêmora me ajudou com a mudança no fim de
semana passado, me estressei bastante, mas levei tudo,
hoje, definitivamente vou dormir na minha nova casa,
não me despedi de ninguém quando sai de lá hoje cedo,
já é segunda e faz quinze dias que assumi o posto de
secretária do Senhor Handerson.
Ou mais ou menos isso.
Lembro que quando contei sobre o Senhor
Handerson ter comentado sobre eu ser "namorada"
dela, Sêmora riu muito, simplesmente o pensamento é
descabido e sem noção alguma, mas foi até bom, assim
consegui entender algumas coisas, a principal delas é a
forma que o Senhor Handerson me vê: uma lésbica.
Não que com os outros funcionários da empresa
não seja assim, eu sei a fama que tenho, todo mundo
acha que eu sou lésbica porque nunca apareci com um
homem, que não gosto de homens, mas no meu caso
acho que não é bem isso.
Hoje já é segunda novamente, como me livrei de
ter que ficar vendo a cara do Senhor Handerson
semana passada, me sinto aliviada e mais relaxada,
depois que ele viajou eu fiquei meio assombrada em
lembrar que todos os dias desde que começou o meu
pequeno treinamento, ele fazia questão de entrar na
recepção da presidência e falar:
"Bom dia, Ana Beatrice, Bom dia, Marcy"
Tomei tanto trauma, que a todo momento depois
que ele viajou a negócios, fiquei olhando para porta de
entrada nos horários que ele costumava chegar e ir
para o almoço, depois quando ele voltava.
Mosés é muito frio, ele é um iceberg, mas eu
também não ligo, se ele é um iceberg eu sou uma
geleira da Antártida. Das vezes que levei papeis a
pedido da Marcy a sala dele, mal olhava na sua cara,
quando olhava lhe dava meu melhor sorriso, mas nada
além disso, as palavras que troquei com ele foram:
"Sim, Senhor, não, Senhor, ainda não, Senhor,
não sei, Senhor, posso verificar para o Senhor, farei o
possível, Senhor".
E só.
Mas não acho que eu esteja sendo das piores,
enquanto tento afastar os meus receios e incertezas
para o lado, vejo que Mosés também se esforça para
ser o profissional o máximo possível comigo, ele não
puxa mais assunto, não faz comentários de mal gosto,
ele se quer é cínico comigo ou debochado, a
arrogância é presente em suas ordens, mas nada além
disso, acho que entendeu que vou cumprir com as
minhas funções e só.
Marcy é sempre gentil, bondosa e muito
atenciosa comigo, mas não fala nada além do
necessário, me ensina com muita paciência algo que eu
nunca pensei que exerceria na vida, não me sinto mais
minimizada por conta do cargo, só me sinto meio mal
por pensar que eu realmente estaria muito melhor no
cargo do Roni, que segundo a Sêmora já começou a
colocar as asinhas de fora colando o pessoal dele para
ficar vigiando o meu antigo pessoal, dois novos
coordenadores subiram de cargos administrativos,
parece que houveram alguns cortes, mas nenhum do
financeiro foi desligado.
—Bom dia, Ana.
—Bom dia, Marcy.
Acho que ela percebeu que o meu humor anda
melhor depois que Satanás viajou.
Eu não sou uma azeda mal-humorada todos os
dias da minha vida, eu apenas odeio o meu atual Chefe
pelo inferno que ele vem fazendo na minha vida, é
pedir demais que o avião dele caia e ele morra?
—Estamos com sorte, o Chefe volta só na sexta.
—O avião dele caiu?
Estava perdida em pensamentos.
Marcy começa a rir, ela sabe que eu odeio ele,
inclusive já me viu dando umas olhadas nos
classificados do jornal durante esses dias, fico
vermelha.
—Não! Graças a Deus não, ele pegou um
resfriado, mas já está na cidade, está de molho.
Que pena.
—Será que não existe a possibilidade dele
morrer de gripe?
—Ana!
Começo a rir da minha pergunta, realmente,
minha vida anda meio amarga depois que conheci o
Senhor Mosés Handerson, mais amarga do que a
aversão que ele tem por chocolates.
Sábado.
Glorias Deus nas Alturas, folga.
Minha primeira folga no meu novo lar.
Tantas coisas para colocar no lugar, preciso me
organizar, minhas malas, meus enfeites, material de
escritório, pastas, meus diplomas, eu terei até o meu
escritório no meu novo apartamento, apesar de tudo,
me sinto até satisfeita de pensar que estou aqui.
Ao menos isso, um pouquinho de felicidade.
Satanás não retornou ontem, graças a Deus eu me
livrei dele por mais essa semana, e francamente, até
esqueci de sua existência, estava muito ocupada me
dedicando ao serviço, as ligações, definitivamente ser
secretária não é nada fácil, e não tem nada a ver com
atender telefones ou ficar só sentada fingindo que está
tudo bem como sempre vemos nos filmes.
Não tem nada glamoroso por trás da profissão.
Durante todos esses dias que estive treinando
com a Marcy tudo o que eu mais fiz foi trabalhar com
planilhas, horários, agendamentos, ligações, e-mails,
mensagens, arquivos, impressões, papéis, muitas
correspondências, medi toda a Handerson durante a
semana levando e trazendo papéis de setores
importantes, eu até fui todos os dias de tênis, os
primeiros quinze dias foram um teste drive, mas essa
semana foi um exame bem cansativo.
Real e definitivamente tem que se ter muita
competência para ser contadora, mas para ser
secretária, é como nascer de novo, ir para o inferno e
comer o pão que o diabo amassou, literalmente.
Saio da cama e escovo os dentes, depois vou
preparar o café, quando entro na sala aperto o controle
e as persianas se abrem, ligo o som, Romeo Santos soa
pela minha sala, gosto das músicas dele, é uma salsa
sensual com tango ou coisa assim. Uso um vestido leve
cor de rosa de alcinhas, eu mal acreditava quando vim
direto para cá da Handerson, acho que nem mesmo o
fato de que satanás voltará na segunda feira vai me
desanimar.
Pego minha caneca de café já pronta e danço a
salsa pela sala em silêncio e sorrio feito boba, a
geladeira não está totalmente vazia, trouxe algumas
coisas do meu antigo apartamento.
Me aproximo do blindex para ver os carros
andando lá embaixo, o sol no céu está mais radiante...
Ou será algum tipo de impressão minha?
Me vejo sorrindo ao perceber meu reflexo no
vidro reluzente, e só depois de alguns minutos é que eu
enxergo a figura alta no prédio ao lado, ele mantém um
cobertor nos ombros e os cabelos estão em total
desalinho, muito diferente do homem a quem desprezei
até três semanas atrás — e ainda continuo desprezando
em pensamento, porque só pessoalmente não basta—
Mosés Handerson está abatido, pálido, tenho a
impressão que ele tosse bastante, usa um conjunto de
moletom preto, os olhos azuis estão opacos, em volta
deles olheiras profundas, fico parada vendo-o me olhar
em silêncio, me questiono mentalmente sobre sua
namorada, ela deve estar em algum lugar do
apartamento com ele, mas ficamos nos olhando assim
por vários minutos e nada dela, ela não aparece.
Desvio o olhar primeiro e me afasto do blindex,
acho que em alguns minutos a namorada dele deve
aparecer para cuidar dele, talvez ele nem estivesse me
vendo — impossível — de verdade, ainda que diga
para eu mesma que isso é uma baita de uma mentira,
prefiro me manter onde estou, com as minhas
possibilidades, Mosés Handerson mora no prédio ao
lado, mas ele também é o meu Chefe detestável e só
isso.
—Nada além disso, Beatrice!
Como a sopa em silêncio.
Ao mesmo tempo que tento ver TV, olho através
do blindex e vejo no prédio ao lado cortinas que
impedem que eu veja o que acontece no apartamento de
Mosés. Satanás não merecia, mas sou cristã, fiquei com
pena e acabei preparando uma sopa com fatias de
frango para ele, não entreguei pessoalmente, mas
deixei na portaria do prédio dele alegando que fora
Marcy quem enviara, e pelo visto ele gostou da sopa.
Acho que ele está mesmo muito ruim, pois, não
fez desfeita, não mandou devolver.
Claro que me sinto um pouquinho curiosa quanto
a ele, mas decidi fazer as minhas coisas durante o dia e
deixar o fato do Chefe morar ao lado para lá, sabia que
eu só ficaria contrariada com tudo e que me chatearia
de imaginar que apenas alguns metros de mim, o
demônio mantém residência fixa.
Me ocupei bastante, comecei a desfazer as
malas, não tenho tantas roupas assim, como está tudo
dobradinho não deu trabalho, logo em seguida fui
abrindo as minhas caixas com porta retratos e enfeites
melhores, deu para desocupar algumas caixas, mas
ainda tenho muito trabalho pela frente.
Escuto o som da campainha, dou um pulo e já me
encho de entusiasmo, concluo que talvez seja a
Sêmora, hoje ela mandou mensagem dizendo que me
visitaria a qualquer hora do dia, já vou toda empolgada
atender a porta, quero comemorar a minha mudança em
alto estilo.
Quando abro a porta, o sangue nas minhas veias
gela e o meu coração fica disparando.
—Ana Beatrice!
Mosés Handerson usa um conjunto de moletom
cinza e tênis, seu nariz está avermelhado assim como
suas faces, ele tem olheiras profundas e usa boné, ele
segura a pequena panela que eu mandei com o
ensopado para ele, automaticamente fico travada com o
desaforo.
A dias que não vejo esse idiota, no primeiro dia
que tento ajuda-lo, ainda que o demônio não mereça
sou tratada assim? De novo?
—Você é um ingrato! — Eu pego as alças da
minha panela e tomo da mão dele.
—Desculpe, eu não como ensopado...
—É mesmo? Chocolate não é ensopado.
—Intolerância a cacau, alergia.
Parece que tem uma desculpa muito boa para
tudo, mas fico calada, vendo-o me olhar em silêncio,
Mosés Handerson não está constrangido, e de longe
está chateado, ele está apenas... doente.
—Como descobriu que era eu?
—Marcy não sabe onde eu moro.
Ele funga, e não sei porque ainda continua aqui,
fecho a cara, realmente, não parece bem.
—Já foi ao médico?
—Não, eu estou bem.
—Não parece bem.
—Mas eu estou!
—Mas não parece!
—Você é sempre insuportável.
—Vindo do diabo é aceitável, não acha?
—Não quer bater à porta na minha cara de novo?
—Estou muito tentada.
—Por que? Sua namorada não gosta que as
pessoas se aproximem de você?
—Do que está falando? Sêmora é a minha amiga!
Como você é sem noção!
Mosés me encara muito mais que surpreso,
depois tosse e parece meio fraco ou coisa assim, pega
um lenço no bolso da calça e continua a tossir, parece
uma crise interminável, abro espaço para que ele entre,
mas ele não se move.
—Anda logo, precisa beber uma água, tomar um
remédio!
—Você não é médica.
—Ok.
Faço menção de fechar a porta e ele me impede
segurando, depois me afasto e ele entra ainda tossindo
muito, fecho a porta e indico o sofá da sala para que se
sente, levo a panelinha de sopa para o fogão, me sinto
uma grande idiota, acho que peco pela humildade, só
queria ajudar, e mais uma vez sou menosprezada pelo
meu Chefe, lhe dei motivos.
Pego a caixinha de primeiros socorros e coloco a
chaleira no fogo, depois vou para sala pegando o meu
termômetro, fico diante do Chefe que se sentou no sofá
da minha sala com cara de quem comeu e não gostou,
seguro o braço dele para cima e enfio o termômetro
dentro do moletom dele, mais precisamente embaixo
do braço evitando ao máximo tocar a pele dele.
— O que...
— Cala a boca!
— Você é uma grossa!
— Olha quem fala, cadê a sua namorada quando
precisa dela?
—Que namorada? Você ficou louca?
Cínico.
—Esquece!
Não tenho nada a ver com isso, mas é que as
vezes eu fico inconformada com esse tipo de coisa, um
cara como esses deveria namorar com alguém que
tivesse ao menos um pouco de piedade por ele e
cuidasse de seu estado de saúde, com certeza aquela
garota vara pau só quer o dinheiro dele, aposto que
sim!
—Quer tirar seu moletom para eu aferir sua
pressão?
Mosés faz que sim, ainda que pareça não gostar,
pego o aparelho elétrico que comprei há algum tempo,
ele me entrega o termômetro e arregalo os olhos
espantada com a temperatura.
—Quarenta graus!
Poxa isso é demais.
Mosés tira o boné e o moletom, ele usa uma
camisa fina de cor bege por baixo, coloco o aparelho
adequadamente em seu braço e ligo a máquina, ele fica
calado enquanto a máquina afere sua pressão.
—Está normal, 12 por 8.
—Você fez algum curso?
—Minha mãe é enfermeira aposentada.
Ou foi em alguma fase da vida dela, depois que
conheceu papai mamãe abandonou a carreira para se
dedicar a nossa família, me ensinou várias coisas
durante a infância e adolescência, principalmente como
cuidar das minhas irmãs para quando ela fosse
trabalhar.
—Sente dor de cabeça?
—Bastante.
—Então vou te dar uns remédios, o Senhor pode
tomar um chá de hortelã com mel?
—Chá eu tomo.
Ele parece tão... tão... fresco!
—Está bem.
Me levanto e volto para a cozinha separando os
remédios, preparo o chá, depois volto para a sala com
uma bandeja com meio copo de água, a caneca de chá e
os comprimidos.
—Antitérmico, analgésico, e este é um remédio
para te ajudar a dormir melhor.
—Obrigado.
—O Senhor sente dor na garganta?
—Nas costas, meus pulmões ardem.
—É pelo esforço da tosse, quer beber um xarope
depois para melhorar a tosse?
—Seria bom.
—Tem que beber bastante água para hidratar.
—Obrigado.
Ele parece um robô programado, seco, frio, não
me importo também, ele bebe os remédios sem
protestar, depois pega o chá.
—Aceita um suco de laranja com biscoitos de
aveia?
—Não quero comer, obrigado.
—O Senhor parece fraco.
—Eu estou bem.
—Mal consegue ficar de pé direito!
—Como você é chata.
—Quer que eu o acompanhe até a porta?
Ele funga e se ergue cheio de orgulho, mas vejo
que mal consegue ficar em pé direito, se esforça muito,
logo em seguida parece meio tonto e cambaleia, eu o
seguro pelos ombros e me assusto ajudando-o a se
sentar novamente, está muito pálido, deve ser a
fraqueza.
—Bem — enfatizo. — Acho que vou chamar a
minha namorada para me ajudar a te levar para sua
casa.
—Pensei que o macho fosse você! — Ele insinua
cheio de deboche.
Ai que vontade de dar um soco na cara desse
imbecil...
—Ok— falo ignorando-o completamente. —
Faça como quiser.
—Vou ficar aqui só até a tontura passar, já estou
indo.
—Ok.
Volto para o meu outro sofá, mexo no controle da
TV e pego o meu prato de ensopado, se ele realmente
continuar a me tratar assim eu acho que vou chamar o
porteiro para levar ele de volta para o apartamento
dele, junto com os funcionários do zoológico.
Capítulo 8
Me estico.
Escuto o som de chuva, depois me encolho
adorando meu cobertor. Adoro dias de chuva, ainda
mais em pleno domingo. Demoro um pouco para
realmente querer levantar, logo em seguida bocejo me
esticando.
—Bom dia, Ana Beatrice.
Demônio!
Dou um pulo.
Ergo o olhar vendo Satanás deitado no sofá bem
ao lado do meu, ele está embaixo de dois cobertores,
lentamente me recobro que ontem ele acabou
adormecendo no sofá e peguei alguns cobertores para
ele, uns para mim, depois me deitei no sofá ao lado e
fiquei vendo TV enquanto ele dormia, pensei que
acabaria acordando para ir embora, mas acabei
dormindo também.
O Tempo lá fora está absolutamente fechado e
cai um temporal, me sento e mexo no controle da TV,
coloco no CNN, acho que vou continuar ignorando ele,
contudo, não posso ignorar o fato de que está realmente
doente.
—Bom dia, Senhor Handerson.
—Meu corpo dói. — Ele fala muito baixo.
—Vamos ver se melhorou da febre...
—Vomitei no seu banheiro.
Suspiro.
Acho que isso não acontece há alguns anos, da
última vez que aconteceu a Sêmora tinha tomado um
porre daqueles, foi logo que ela terminou com o ex
dela.
—Estou ruim do estômago também.
—Precisa ir a um médico.
—Odeio médicos.
Seus olhos azuis estão descaídos, fico meio
assim, ele parece até tremer de frio, a febre deve estar
muito alta.
—Vou ligar para a Sêmora...
—Ninguém deve saber que eu estou aqui.
—Por que?
—Porque eu não misturo as coisas.
—Misturar o que?
—Você é a minha secretária!
—Quer ir para casa?
—Você adora a situação, não é mesmo?
Acho Mosés Handerson um grande teimoso, e
muito mais que orgulhoso, ele odeia depender das
pessoas, já vi, mas assim, olhando-o tão pálido e
adoentado ele parece não mais que um jovem que
precisa de algum cuidado.
—Sua mãe mora na cidade?
—Não.
—Seu pai?
—Ainda não, Ana Beatrice.
—Então, acho que só tem a mim!
—É o que parece.
—É o que tem para hoje!
Ele não responde.
—Acho que precisa de um banho frio, vou ligar
para o meu médico, ver o que ele fala.
Mosés não diz nada, depois de alguns momentos
me aproximo dele e puxo os cobertores, ele bate o
queixo, parece uma criança desamparada, mas me
recuso a sentir pena do diabo, depois de alguns
momentos vejo uma marca alaranjada no meu sofá—
novinho—e a calça dele está molhada. Suspiro, mas
não falo nada.
—Eu pago um novo.
—Eu não pedi um novo, vem!
Ele parece relutar enquanto tenta se erguer
sozinho, o corpo todo treme, e quando se ergue ele
geme baixo, passo meu braço envolta dele e o ajudo a
se erguer, Mosés mal consegue ficar em pé sozinho,
além de fraco parece sentir dor por todo corpo, ele
sente.
—Calma! — Eu aviso tentando segura-lo, mas
ele é bem pesado.
Ele faz que sim com a cabeça, e vamos
lentamente para o meu quarto, eu nem olho o estado do
banheiro da sala, mas só daqui sinto o odor, acho que
além dele até eu canso de ajuda-lo a caminhar para o
meu quarto.
Logo que chegamos ao banheiro eu o ajudo a se
sentar no meu vaso, depois começo a puxar o moletom
para cima, Mosés protesta, mas apenas de dor,
Handerson é teimoso, mas seu orgulho parece ter sido
abandonado em algum lugar bem longe de mim, ele está
muito, muito doente, acabou por urinar no meu sofá,
mal consegue andar direito sem ajuda ou ficar de pé.
—Acho que vai ter que tirar a calça e...
—Me ajuda?
Ele não se importa!
Ainda que morra de vergonha faço que sim, ele
se ergue, as pernas tremem bastante assim como os
braços e eu puxo a calça para baixo juntamente com a
cueca, olho para o lado enquanto tiro as meias dos pés
dele, depois me ergo olhando para o chão, essa
situação é a mais constrangedora que eu já passei tem
toda a minha vida.
—Espere aqui, vou buscar uma cadeira para o
Senhor sentar.
Recolho as roupas e saio depressa do banheiro,
eu as levo para minha lavanderia juntamente com os
cobertores que ele usou, não sinto nojo, em parte
durante a infância eu cuidei muito das minhas irmãs
quando elas adoeciam, mamãe teve que trabalhar um
tempo após a morte de papai, na verdade eu mesma
cheguei a trocar muitas fraudas delas, de algumas
primas, e até dar banho, como eu sempre fui a mais
velha, eu quem cuidava a penca toda.
Retorno ao banheiro e logo de cara vejo uma
poça de vômito no chão, desvio engolindo a
preocupação, ele está encolhido e sentado no vaso com
a cabeça apoiada nas mãos e os cotovelos nas coxas,
ainda que nu eu não consigo ver nada além de pura
preocupação na cena, coloco a cadeira no box e me
aproximo, eu o puxo pelos cotovelos e ele parece se
dar conta de que eu voltei, se ergue com dificuldade,
eu o ajudo a caminhar para o box e quando ele se senta,
ligo o chuveiro.
—Eu vou te pagar por isso.
Algo me ocorre.
—Onde esteve?
—No Brasil.
—Onde exatamente?
—No Rio, fui visitar as instituições que tenho lá.
Mosés caridoso?
Coloco o chuveiro no frio, mas ele não protesta,
ainda que trema muito, sei que é devido a febre, toco
sua cabeça e sinto que a temperatura está muito mais
que alta.
—Vou te levar a um hospital.
—Eu não quero ir.
—O Senhor tem que ir.
—E se eu não quiser?
—O Senhor vai!
Saio do box, mas não escuto protestos, eu sei o
que devo fazer e pelos sintomas já imagino o que o
Senhor "autonomia" deve ter. Só espero que ele não dê
muito trabalho para ir ao hospital.
Dengue!
Bingo!
Já desconfiava, pesquisei bastante na internet
hoje cedo depois que demos entrada no hospital,
acabei conduzindo-o para um dos hospitais que
atendem o convênio da Handerson, mas sem os
documentos dele.
Observo o homem adormecido em cima da maca,
ele está coberto até a altura da cintura ligado a alguns
aparelhos, parece realmente melhor, segundo a
enfermeira a febre baixou e ele está se recuperando da
desidratação devido a doença.
Mantenho distância lembrando do sufoco que foi
o dia de ontem, depois de basicamente ter dado banho
no meu Chefe eu liguei para Sêmora e pedi que ela
trouxesse umas roupas do Trev, ela vive pegando as
roupas dele, Sêmora mal acreditou quando eu disse
para que queria as roupas, ou melhor, quem as usaria.
Mantive o Senhor Handerson deitado na minha
cama embaixo de cobertores, enquanto a Sêmora me
ajudava a limpar a baderna que ele fez no meu
banheiro, no banheiro da sala, mas não reclamamos,
apesar de ela fazer umas caretas feias enquanto lavava
o banheiro.
Achei as chaves do Senhor Handerson jogadas
num canto do meu sofá — mijado — e enquanto eu o
vestia Sêmora chamava um táxi, ela me ajudou a descer
com ele, e quando entrei no táxi lhe entreguei as chaves
do apartamento dele para que ela fosse lá e pegasse os
documentos, ou ao menos tentasse acha-los.
Ela finalmente apareceu ontem à noite com os
documentos pessoais do Senhor Handerson, tive que
dar entrada no hospital com o meu convênio, mas
expliquei de quem se tratava, acredito que o dinheiro
não seja o problema dele, é claro que não é.
Sêmora me disse que o apartamento dele estava
uma baderna, tudo bagunçado, comida estragada,
vômito no banheiro, ela disse que ficou tão assustada
com o estado do lugar que teve que limpar, é outra
obcecada por limpeza, mas sei que eu não suportaria
ficar lá em casa com a ideia de que havia sujeira, eu
odeio desordem onde moro.
Imagino que a doença tenha impossibilitado ele
de manter tudo organizado, mas me questionei bastante
sobre o fato dele não ter chamado uma faxineira ou
algo assim, alguém para auxilia-lo durante a doença.
Desde que ele se internou tenho ficado como
acompanhante, eu não consegui pensar em ligar para
Marcy ou pedir a ajuda de ninguém além da Sêmora, eu
sei que ele ficaria furioso se sonhasse com o fato de
que alguém além de nós duas sabíamos de seu estado
de saúde.
Me questionei sobre tantas coisas relacionadas a
Mosés Handerson, mas apenas uma pergunta me vinha
a cabeça:
Quem é você?
Trabalho para Mosés Handerson, trabalho em
sua empresa a mais ou menos seis anos, faço a
contabilidade de seus funcionários e de sua empresa,
mas me dou conta de que realmente não sei nada,
absolutamente nada sobre ele, quem ele é? De onde
veio?
Agora eu serei sua secretária, sinto calafrios só
de pensar!
Estou sentada na poltrona perto da cama dele,
Mosés agora parece muito inofensivo, longe de todo
aquele muro de grosseria, frieza e ordens. No momento
ele é apenas um homem comum e adoentado que
precisa de ajuda, algo que percebo que ele odeia.
Ele é muito autossuficiente para isso... para
admitir que precisa das pessoas.
Deixei sua carteira com documentos pessoais na
minha bolsa, tomei banho mais cedo, pois, Sêmora
trouxe algumas roupas e comida para mim — comida
de verdade — este leito tem banheiro para o
acompanhante e tudo.
—Ana Beatrice.
Eu tenho certeza de que se nesse momento você
estivesse morrendo, faria o favor de terminar de te
matar, só para não ter o desprazer de te ouvir falar o
meu nome com tanta arrogância!
—O Senhor quer que eu chame a enfermeira?
—Não.
Ele está bem acordado, acho que deve ter
acordado há algum tempo e eu não percebi, ele me olha
assim em silêncio, tem olheiras, a boca está ressecada,
os olhos dele estão muito fundos, mas o azul
permanece opaco... sem brilho.
—Se quiser pode ir embora, Ana Beatrice.
—Está bem...
Me ergo dando de ombros, parece que ele gosta
de ser tratado mal ou algo assim, também não me
importo, ainda que saiba que ele precisa de
acompanhante, contudo, quando faço menção de me
afastar sinto a mão firme no meu pulso, uma mão
quente e suave, olho para trás e ele mantém o olhar
duro e frio de sempre.
—Me deixaria aqui para morrer, Ana Beatrice?
—Se continuar me chamando com tanta
arrogância, eu mesma matarei o Senhor.
Mosés Handerson me olha meio confuso, e solta
a minha mão, torno a me sentar me sentindo uma real
vilã, mas que culpa tenho eu se o odeio? Ele provocou
isso em mim, nem pena— de verdade — consigo sentir
pelo homem, Mosés Handerson me faz odiá-lo só pelo
fato de respirar perto de mim.
—Está melhor? —pergunto, mas apenas por
educação.
—Minha cabeça ainda dói muito — reclama
baixinho —E o meu corpo.
—Ainda bem que eu te dei só paracetamol. —
Me senti mais tranquila depois que o médico me disse
que era dengue.
—Pegou o meu celular?
—Não faço ideia de onde esteja, o Senhor não
levou o celular para o meu apartamento.
—Acho que esqueci no meu quarto, você foi ao
meu apartamento?
—Sim, só peguei seus documentos e dei uma
limpada no lugar. — Não vou falar que foi a Sêmora se
não ele vai começar a brigar de novo comigo.
—Obrigado — fala mais parece cansado. —
Avise para Marcy cancelar tudo dessa semana, você
vai cuidar de mim!
Que?
—Ou vai se recusar a fazer o seu trabalho? —
pergunta com uma ponta de cinismo na voz e me fita—
Afinal, você é a minha garota de confiança.
—Tanto faz— digo fazendo pouco — Desde que
me mantenha empregada.
Não falamos mais, uma enfermeira entra
carregando a refeição do Senhor "você é a minha
garota de confiança" e faço menção de levantar, porém,
mais uma vez Mosés Handerson segura a minha mão,
ele me olha muito sério.
—Você está sendo paga para isso, Ana Beatrice.
Com certeza eu não sou paga para cuidar de
ninguém nesse sentido, mas não respondo, parece em
vão discutir com Mosés Handerson, ainda mais com
ele doente.
Dia de Alta.
Até que enfim saímos do hospital, já estava
quase, enlouquecendo de ter de ficar o dia todo
trancada num quarto vendo Mosés Handerson dormir,
acordar, e voltar a dormir, a noite gemer de dor, depois
me obrigar a ficar do lado da cama dele olhando para
cara dele em silêncio.
Não me senti constrangida com os banhos, por
ser acompanhante eu ajudei a enfermeira a banhar ele
em alguns dias da semana, eles colocaram uma Senhora
gorda e rabugenta para cuidar do Senhor Handerson,
mas a mulher é muito experiente, pelo o que ouvia nos
corredores e na lanchonete do hospital ela era uma das
melhores enfermeiras de todo o hospital, enfermeira
Chefe, na verdade.
Mosés Handerson me surpreendeu com calmaria
e poucas palavras no decorrer dessa semana, ele não
ficou me tratando mal e também não me tratou com
grosseria, apenas tudo o que me deu foi um silêncio
estranho e pacifico, coisa que eu nunca esperei que
acontecesse, cheguei à conclusão que ele precisava
demais de mim para recusar ajuda.
Depois do terceiro dia eu e ele estávamos nos
entendendo melhor com o muro de silêncio que
estabelecemos, não falamos muito — e ainda não
falamos — apenas o necessário, coisas do tipo
"obrigado, com licença, vou arrumar seu travesseiro,
precisa de novas cobertas? Hora do banho" entre
outras, cortesia foi o que não faltou entre nós dois, mas
percebia que era algo apenas necessário.
Mosés Handerson ainda parece meio baqueado,
mas está bem melhor, menos pálido, as dores de
cabeça ainda são presentes, mas já peguei a receita que
o médico me deu, a conta será enviada direto para a
empresa, a diarreia e os vômitos acabaram assim como
algumas manchas de pele que surgiram na segunda, ou
se vão aos poucos, a febre passou.
Sêmora veio todas as noites e conversamos
bastante sobre a empresa. Segundo ela, Roni está
tornando a convivência do pessoal um pequeno inferno,
ela trouxe roupas para mim e me ouviu chorar algumas
vezes pela forma como me sentia sufocada a ter que
suportar a situação, simplesmente não queria ficar no
hospital com o meu novo Chefe.
Não sentia que era por odiá-lo, mas era porque
odeio fazer as coisas obrigada, quase toda a minha
adolescência foi assim, eu basicamente carreguei as
responsabilidades da minha mãe nas costas, cuidar de
um lar, das minhas irmãs, depois quando eu fui para a
faculdade me sentia enfim livre de tudo, claro, não
culpo mamãe, mas realmente foi muito ruim para mim
fazer tudo aquilo e quando decidi ir para a faculdade
ela se quer me falar um “obrigado“.
Mas acho também que pelo fato de Mosés
Handerson ser um completo estranho, e por tudo o que
temos passado nesses últimos dias, segundo o médico
também o quadro de saúde de Mosés ainda é meio
frágil, a doença estava bem avançada quando ele deu
entrada no hospital, ficamos ali dez dias, e enquanto o
taxista avança para longe do hospital sinto como se
tirasse um peso das coisas, eu mal me mudei para o
meu novo apartamento e mais fiquei fora dele do que
lá, propriamente dizendo.
Também liguei para Marcy todos os dias, avisei
sobre o quadro de saúde do Senhor Handerson, disse
que ele me dissera tudo, mas não justifiquei a minha
ausência, como ele não quer que ninguém saiba que
estou cuidando dele — obviamente por orgulho — eu
apenas disse que estava de licença e que o Chefe sabia
dos motivos, e que ele me ligara sempre dizendo que
estava mal e que não iria trabalhar, Marcy disse que
estava trabalhando como podia, e que cuidava de tudo
ainda que eu estivesse fora, mas que sentia minha falta,
porém, nossas conversas foram rápidas e curtas, Marcy
estava lotada de compromissos.
—Vou ficar no seu apartamento!
Merda!
—Ok! Fazer o que, não é mesmo.
Melhor desprezar, quem sabe assim se toca?
—Ao menos até eu melhorar completamente, me
sinto ainda fraco.
Disso eu tenho certeza, ele veio para o taxi numa
cadeira de rodas, sei que vai dar trabalho, ainda vai
demorar até que se recupere completamente, e sei que
o Senhor Handerson não mente, eu vejo e acompanho
tudo desde que ele apareceu doente há alguns dias na
porta do meu apartamento, sei que ele não gosta da
situação tanto quanto eu.
—O Senhor não quer que eu ligue para sua
família?
Mosés Handerson me olha com a mesma frieza
de sempre, depois olha para o lado bastante sério.
—Não tenho família.
Nossa.
—Todo mundo tem uma família.
—Eu não. — Mosés esclarece ainda muito
áspero. —Minha tia morreu há alguns meses, você não
soube?
—Não soube de que? — Não faço ideia do que
ele esteja falando.
—Minha tia era a dona da Handerson, ela
faleceu há alguns meses e eu herdei as empresas.
Estou chocada.
—Não deixou herdeiros além de minha irmã,
Safira e eu.
—E... e... Os... os...
—Meus pais? — completa questionando, faço
que sim com a cabeça. — Não sei, devem estar em
algum lugar do mundo fazendo filhos para abandonar
num lar adotivo.
Fico dura no acento, Mosés não me olha, ele
parece também estar muito desconfortável em falar
isso, ainda que sua face denuncie apenas uma frieza
muito evidente quando ele fala, eu jamais em minha
vida imaginaria que Mosés Handerson é um filho
adotivo... abandonado... como eu não soube? Ele não
era o filho do dono?
Não consigo imaginar nem pensar em nada para
falar, isso apenas não me choca tanto quanto me deixa
extasiada.
Mosés Handerson é adotado!
Mosés Handerson não tem pais.
Nosso percurso só não é mais silencioso devido
ao som dos carros e o trânsito caótico da cidade
grande, mentalmente ainda presa as palavras duras
dele, fico tentando imaginar um mundo onde Mosés
Handerson, um multimilionário é um filho vindo de um
lar adotivo, sozinho no mundo. Eu sempre pensei em
crianças ricas cercadas de amor numa família grande e
cheia de fartura, felicidade, pais ricos que lhes davam
bicicletas nos aniversários e presentes caros... ele, no
entanto me joga um balde de água fria na cabeça e
arruína todo o conceito que tenho sobre pessoas com
dinheiro, ao menos o que eu sempre tive.
Logo que chegamos ao meu prédio, eu o ajudo a
sair do táxi, pago para o taxista e vamos muito devagar
para a recepção, não peço a ajuda do porteiro, pois,
sei que Mosés Handerson hoje não está bem, mas não
apenas fisicamente, acho que as minhas perguntas
fizeram algum mal para ele, talvez tenham tocado
algumas feridas... só que não dá para adivinhar,
contudo, a seriedade em seu semblante denuncia algo
que não está ligado a raiva e sim... mágoa... não sei.
Seguro ele pelo tronco enquanto o elevador sobe,
ao mesmo tempo deixo a minha pequena bolsa de lado,
Mosés fica cabisbaixo, calado, ele geme quando
saímos do elevador e parece realmente aliviado
quando chegamos no apartamento e encontra o sofá
para dormir, Sêmora pediu que viessem lava-lo a seco
na quarta, ajudo Mosés a colocar as pernas no sofá e
tiro o tênis dos pés dele.
—Minhas juntas doem.
—Vou pedir os remédios, o Senhor tem que
beber muita água.
Mosés faz que sim em silêncio. Vou ao meu
quarto para pegar travesseiros e lençóis, logo que
retorno tento acomoda-lo da melhor forma, ligo a TV e
sinto como se tivesse que cuidar de uma criança que
não reclama, mas fica gemendo o dia todo. Ligo para
farmácia enquanto coloco a chaleira no fogo, deixo
uma garrafinha com água no centro da sala e eu o olho.
—Quando a chaleira ferver ela desliga sozinha,
fique atento a porta.
—Está bem.
Ao menos é obediente quando está à beira da
morte.
Não imagino Mosés Handerson sendo diferente
comigo em nenhuma outra situação.
Contudo, espero que não tenha que passar por
isso de novo tão cedo, as próximas aventuras que
pretendo ter com esse homem serão num escritório
onde ele será o meu Chefe arrogante e mandão, e eu
sua secretária rebelde.
—Daria um filme ou um Best Seller do New
York Times... A Secretária Rebelde!
Me vejo rindo da situação, mas não estou assim
tão contrariada... ainda não.
Capítulo 9
Sai para correr, acho que essa é a primeira vez
em anos que me sinto realmente bem em fazer uma
caminhada, desci duas ruas para aproveitar e passar na
rua do meu Crush, Vagner. E lá estava ele lindo,
gostoso, Super bonito, tudo o que eu mais desejo num
homem, assim um pouco gentil e sorridente com as
velhinhas que moram duas ruas para baixo de onde eu
morava, aqui não é tão longe, não para mim, daqui lá
para o meu novo apartamento são quarenta minutos a
pé, mas não me sinto mal.
Vagner não me notou em nenhuma das vezes que
passei em frente à padaria, fiquei um pouco
desgostosa, mas não foi novidade, muito raramente as
pessoas me percebem realmente, parece que só me
veem quando querem ou quando propositalmente
desejam ver alguém gorda, notar a figura de alguém
monstruosamente grande.
Passei na farmácia e me pesei, perdi 3 quilos, e
eu mal acreditei que isso realmente aconteceu, contudo,
com tantas coisas que ocorreram nessas últimas
semanas não era para esperar menos, não conseguia
comer direito no hospital, nem antes disso.
Mas fiquei até animada de pensar que emagreci,
é muito difícil perder peso, agora eu tenho 94 quilos
fechados, sem gramas, passei no mercado, depois desci
para casa.
Acabo de sair do banho, quando cheguei o
Senhor Handerson ainda estava dormindo no sofá da
sala, acho que vou ver se consigo guinchar ele para o
quarto desocupado, ele se apossou do meu sofá desde
que chegou ontem, não é o lugar correto para dormir.
Coloco uma calça de moletom e uma blusa de
mangas, hoje chuviscou bastante, mas não choveu, o
tempo está nublado, logo que chego a sala a TV já está
ligada, e o meu Chefe está sentado em silêncio, ele não
é muito de falar, continuamos no mesmo ritmo do
hospital, apenas palavras necessárias, mas nada de
ofensas.
—Bom dia, Senhor Handerson —falo primeiro,
mas apenas para não dar o gosto de que fale o meu
nome e segundo nome com arrogância primeiro.
—Bom dia, Ana Beatrice — responde e me olha
de cima a baixo.
Não gosto quando ele me olha assim, na verdade,
não curto quando os homens ficam me olhando demais,
eu sei que cada um deles ficam pensando coisas do
tipo "que garota gorda", ou algo como "jamais vou me
envolver com alguém assim".
—Você saiu?
—Sim, fui caminhar!
Ainda que não seja da sua conta é claro.
—Bom — Mosés fala baixo. — Preciso tomar
algum remédio agora?
—Sente dor de cabeça?
—Um pouco, e também nas juntas.
—Vou verificar sua temperatura e pegar os
remédios.
—Ok.
A doença é devastadora.
Não consigo me imaginar sentindo dor, sempre
fui muito saudável, a última vez que peguei um
resfriado faz uns dois anos, eu sempre tive uma saúde
de ferro, e fora as dores de cabeça devido ao estresse
do dia a dia eu vivo até bem.
—O Senhor quer tomar banho agora?
—Seria bom.
—Posso encher a minha banheira.
—Por favor.
Acho que dá menos trabalho do que levar alguma
cadeira para o chuveiro, ontem acompanhei o Senhor
Handerson ao banheiro algumas vezes e não foi uma
missão fácil, ainda que fechasse a porta para que ele
fizesse suas necessidades, eu ouvia os gemidos de dor
que ele fazia para se esforçar ao menos para andar, eu
sei que para ele acima de tudo essa é a pior parte. Pego
minha caixinha de pronto socorro, levo um copo com
água e os remédios, ele os toma e coloco o termômetro
embaixo de seu braço, afiro sua pressão com a
máquina, está boa e baixa.
—Sua namorada não se importa?
Ergo o olhar e o fito, Mosés me olha
absolutamente sério, a vontade que tenho é de rir, mas
não sei se de raiva ou tristeza, o que leva ele a pensar
que eu e Sêmora somos namoradas? E que algum
homem não seja? Só porque eu sou gorda e não tenho
tanta vaidade assim? Aposto que se eu fosse magra e
não tivesse um pingo de vaidade ele não pensaria isso
de mim.
—A Sêmora é a minha melhor amiga.
—É que parecem íntimas.
—Somos, mas eu não sou lésbica.
Guardo tudo na minha caixinha de primeiros
socorros, estou morta de vergonha, até cheguei a
pensar que ele falava isso para me provocar, mas ele
realmente acredita que eu e Sêmora estamos juntas...
coitada de mim, nem os homens querem, quanto mais
uma mulher.
—Isso é constrangedor! —Mosés diz e eu o fito,
ele está duro e as faces vermelhas. —Eu...fico...
pelado na sua frente.
Minhas bochechas queimam, e desvio o olhar
para o lado.
—Quer dizer que o Senhor só se sujeita porque
pensa que eu sou lésbica?
—É claro, você é, a minha secretária.
—Não tem nada aí que eu não tenha visto antes.
Dou de ombros tentando parecer natural, Mosés
me encara ainda mais constrangido.
—Vou te dar um aumento.
—Precisa entender uma coisa, Senhor
Handerson.
—O que? —Ele parece curioso.
Acho que essa é a primeira vez na vida que
Mosés Handerson realmente começa a me escutar, fico
surpresa e alarmada.
—Tem coisas que não se pagam nesse mundo, e
essa é uma delas—falo e me levanto. —Não quero seu
dinheiro.
—Não? —pergunta muito espantado.
—Não! —reafirmo e dou de ombros. — Vou
preparar o banho do Senhor, já quer vir?
—Sim.
Eu o ajudo a levantar, não falamos mais depois
disso, quando entramos no banheiro ajudo-o a tirar as
roupas e Mosés não parece se importar em ficar nu
diante de mim, apesar de que ele mal consegue ficar
em pé direito, fica se encolhendo enquanto preparo o
banho, sentado no vaso.
Ligo o botão do automático enquanto o ajudo a
entrar na banheira, eu realmente não acho a situação a
pior de todas, acho que é porque não fico observando
ele, nem devo, não gosto dessas coisas, não sou dessas
que ficam tirando vantagem da fragilidade de ninguém,
quando ele melhorar eu volto a quebrar o pau com ele.
—Obrigado, Ana Beatrice.
—De nada, Senhor Handerson.
—Pode me chamar de Mosés.
Estou saindo do banheiro.
—Só se parar de ser arrogante enquanto fala meu
segundo nome.
—Eu não sou arrogante.
— Uhum, e eu sou a Rainha da Inglaterra.
Enquanto me afasto, escuto uma risadinha baixa,
mas não parece cínica, na verdade está longe disso.
—Oi, Ana.
—Oi, Vagner.
—Quanto tempo não te vejo.
—Pois é, eu mudei para Manhattan.
Estou no caixa já.
Pensei que o Vagner não me veria de novo,
quando entrei na padaria ele estava atendendo uma
cliente, já faz três dias que voltei a correr e ele nunca
me notava, ou ao menos acenava para mim como vinha
fazendo há um tempo desde que nos conhecemos, eu
sempre fico meio nervosa quando se trata dele e hoje
não seria diferente, estou completamente sem jeito.
—Que pena que saiu dessa área.
—Pois é, eu comprei o meu apartamento.
—Meus parabéns.
Vagner sorri, dentes perfeitinhos, lábios carnudos
e lindos, prendo o suspiro e sorrio.
—Obrigada.
—Bom.
—É... bom.
Não tenho muito assunto, eu sou uma grande
lesada quando se trata de homens, ao menos os que eu
acho lindos, da um friozinho na barriga, pego as
rosquinhas com a moça do balcão e me afasto até o
caixa para pagar.
—Vem outras vezes, Ana, sentimos sua falta. —
Ele fala, e pula por cima do balcão indo para cozinha.
—Vou voltar.
Aceno para o Vagner e depois que recebo o
troco, volto para casa, me vejo sorrindo de orelha a
orelha, das outras vezes foram apenas pequenas
palavras como "oi, tudo bem?", "olá Ana", ou sorrisos
pequenos, não via ele há quase um mês, desde que o
demônio me atropelou, parece que faz tanto tempo que
eu e o Vagner não nos vemos.
—Bom dia, Ana Beatrice.
Acho que o Senhor Handerson treina muito para
não soar um completo arrogante quando fala meu nome,
ele até usa um tom parecido com cordialidade, mas não
sei... parece algo ligado ao sotaque ou coisa assim,
porém, não ligo, ele está sentado no sofá vendo TV
com uma caneca de café na mão, deixei café pronto e
os remédios com a garrafinha de água no centro.
—Melhorou? —pergunta ele me olhando
fixamente.
—Aham— respondo sem graça. —Bom dia,
Senhor Handerson.
—Mosés eu disse — replica calmamente.
—Mosés — parece que estou xingando alguém,
não gosto da pessoalidade, mas enfim, ele já está aqui
mesmo. — Acha que consegue comer sólidos?
—Meu estômago está melhor — fala e coça a
barba. — Como foi a corrida?
—Boa — Vou para a cozinha, sinto que o olhar
azul me acompanha a cada passo, não sei porquê
Mosés Handerson fica me olhando assim. — O Senhor
se sente melhor hoje?
—Dor no corpo ainda, mas melhorei da dor de
barriga — responde — Não sujei nada esses dias.
—Um orgulho — comento, enchendo minha
caneca de café.
—Você adora me ver por baixo, não é mesmo?
— questiona com uma ponta de riso na voz.
—Claro que não, se o Senhor morrer, quem mais
vai arruinar os meus dias? — questiono em resposta.
— E tão gentilmente irá me promover a secretária?
—Você ainda nem cuidou das minhas cuecas e já
está pedindo para sair?
—Eu não queria nem ter entrado!
Lavo as mãos e vou para sala com o meu pacote
de rosquinhas, me sento no sofá perto dos pés dele, e
aumento o volume da TV colocando no canal de
notícias.
—Você não deveria comer essas porcarias, não
vão te ajudar a perder peso.
—E quem te disse que eu quero perder peso?
Mordo uma de chocolate com vontade, mas
engulo a sinceridade do Senhor Handerson, é que eu
começo a perceber que este é o jeito dele, ele fala as
coisas de forma direta e sincera, algo que a maioria
das pessoas que me cercaram nunca fizeram, parece
que sempre arrumamos um jeitinho de falar algo para
as pessoas, adquirimos formas de nos interpretar, ele
não, ele é direto e seco, contudo, não sinto que seja
porque quer, ele apenas fala assim porque é o seu tom
habitual.
—Não é bom para a saúde.
—Eu sei o que é bom para minha saúde, Senhor
Handerson.
Falo de boca cheia, bebo um pouco de café,
também estou sendo um poço de ignorância, parece que
o clima amistoso está sendo destruído novamente.
—Vai engordar...
—Aí cala a boca, eu sei que eu sou uma baleia,
gorda, grande, número 52, que eu sou uma orca—berro
chateada. — Não precisa ficar me lembrando.
Mosés fica me encarando bastante supresso, acho
que se espantou pela minha grosseria, até perdi o
apetite por conta disso, pego o saco de rosquinhas e
levo para o lixo da cozinha, jogo dentro do saco e
derramo o café, engulo o choro, eu não preciso de mais
alguém na minha vida me falando que eu sou gorda,
principalmente se essa pessoa for o meu Chefe
detestável.
Vou para o meu quarto sem olhar na cara dele e
me tranco, e só depois de algum tempo me permito
chorar.
Parece que a minha vida toda será assim, um
círculo sem fim de críticas quanto ao meu peso e a
minha aparência, parece que quando eu enfim estou
começando a ter alguma estabilidade emocional, esse
fantasma — que é o meu tamanho — vem e me joga
para longe como uma onda violenta e forte.
Sempre tive medo do meu peso, dos olhares das
pessoas, do jeito como todos me viam, mas eu sempre
me odiei muito mais por isso, por ser acima do peso,
por nunca encontrar jeans que me servissem, por usar
roupas duas vezes maiores que as roupas das minhas
irmãs, até mesmo da minha mãe.
Eu poderia passar um mês sem comer — eu já fiz
isso — e ainda sim, depois de todo esse tempo não
teria perdido mais que meio quilo, posso me exercitar
todos os dias e ainda sim a balança não diminui, eu sou
gorda, isso é um fato, e não tem nada que possa ser
feito sobre isso.
Afinal de contas o que é 3 quilos perto de 30
quilos acima do peso há anos?
Fico a manhã toda deitada na minha cama, choro
bastante, depois quando consigo parar vou para o
banheiro e tomo banho, me recupero depois de alguns
momentos e me preparo para ter que olhar na cara do
Senhor "você é gorda" de novo.
Preciso — ironicamente — preparar o almoço.
Apesar de que o Senhor Handerson mais come
saladas e frutas durante o dia, ele não consegue comer
nada direito.
Volto para a sala e sou tomada por um choque
extremo ao encontrar alguns vasos de flores espalhados
por todo o lugar, tem um vazo de flor em cada canto da
sala.
São vasos pequenos espalhados por minha mesa
de jantar, a pedra de refeições da cozinha, o centro da
sala, e a mesa na sala de visitas, assim como o centro
dos sofás da sala de visitas, na pequena mesa da
cozinha também tem um vaso, fico paralisada com a
cena.
Flores cor de rosa.
Rosa mais escuro.
Tulipas.
Arranjos de flores brancas com lilás, lindos.
Outros vasos menores, mas lindos e decorados.
Até que enxergo sentado no sofá em seu silêncio
sem fim, o meu Chefe bastante sério.
Abaixo a cabeça e vou para a cozinha em
silêncio, não tenho nada a falar.
—Tem um bilhete para você em cima da mesa,
Ana Beatrice.
Pego o bilhete escrito num guardanapo — que
criativo — e a letra parece meio torta, turva, acho que
ele não tem nem força para segurar uma caneta.
"Não te chamei de gorda, você é muito bonita,
Ana Beatrice".
Fungo e quero jogar isso no lixo, não acho que
precisava de tanto, mas olho envolta e as flores me
enchem de um sentimento de paz.
Não sei o que falar.
—Vou mandar colocar fogo em tudo — digo por
impulso.
—Tanto faz.
E novamente estamos na estaca zero... ou mais ou
menos isso.
Capítulo
10
Volto a organizar as minhas coisas.
Não acordei com humor para ir correr hoje, a
sensibilidade de ontem é até justificável, vou menstruar
dentro de alguns dias. Suspiro guardando as roupas em
meu guarda roupa, se tem algo que posso fazer durante
esses dias que cuido de satanás é arrumar minha
mudança.
Ainda que saiba que algumas vezes terei que
olhar na cara dele, ignoro o desconforto com a situação
de ontem, Mosés Handerson não sabe falar, ele é um
bruto, ainda que tenha comprado metade de uma
floricultura e colado na minha casa toda, não sei se
consigo engolir o pedido de "desculpas".
Nem preciso entrar na sala para saber que ele já
acordou.
—Bom dia, Ana Beatrice.
—Bom dia, Senhor Handerson.
—Tem um bilhete para você em cima da mesa da
cozinha.
—Ah, obrigada.
Mosés fica me observa enquanto sigo para a
cozinha e pego o bilhete, ele acompanha cada passo
meu, estou meio sem graça com esses bilhetes, será que
ele não consegue falar? É bem mais prático.
"Bom dia, Ana... posso te chamar de Ana?"
Quero rir... tosco!
—Claro, diga ao fantasminha que pode me
chamar de Ana.
—Está bem.
—O Senhor se sente melhor?
—Sim, mas acho que ainda sinto tontura.
—Vou dar uma organizada no apartamento, o
Senhor acha que pode ir para o seu?
—Não.
Não entendi porque ele está bravo ou coisa
assim dou de ombros.
—Está bem, é que eu gosto de ligar o som.
—Alto, por sinal.
—Minha casa, minhas regras, o Senhor quer uma
torrada?
—Eu não como torrada.
Seu tom repreensivo me chateia.
—Poderia fazer uma lista das coisas que come?
—Claro, torrada é uma das que eu não como.
—O que come de manhã?
—Linhaça com banana, eu pratico box, preciso
estar em forma.
Não consigo imaginar o Senhor Handerson
lutando box, mas imagino que seja bem isso, agora ele
está magro, mas seu porte antes da dengue é até
definido, acho que nunca parei para reparar realmente.
—Come ovo?
—Cozido.
—Então, vou cozinhar ovos para o Senhor comer
bebendo café.
—Obrigado, Ana.
—De nada!
Preparo o café.
Para mim, ovos com gemas mais moles e
torradas, para o Senhor Handerson, ovos cozidos,
acabo por colocar os fones do reprodutor do meu
celular e me distraio enquanto lavo a louça do jantar de
ontem. Havia feito salada com tomates secos, mal
consegui comer, tenho feito minhas refeições na sala,
no sofá ao lado do que o Senhor Handerson fica, não
conversamos, mas faço companhia, tem sido assim
desde que ele ganhou alta, no hospital eu ficava vendo
a enfermeira dar comida para ele e as vezes eu dava,
não acho que tenha sido a pior coisa que fiz por ele...
não é pior do que dar banho.
Acho que é porque eu não vejo maldade nas
coisas, não fico olhando demais, na verdade eu mal
olho para ele quando o ajudo a se despir, quando o
ajudo a entrar na banheira —ele se apossou da minha
banheira — ou a sair, ele tomou posse de um dos meus
roupões e de algumas mudas de roupas do Trevor,
Sêmora havia deixado aqui porque sabia que eu iria
precisar.
Coloco tudo em uma bandeja separada por pratos
e canecas e vou para a sala, ele assiste o canal de
notícias, mas acho um pouco enfadonho ver isso
sempre, coloco no canal de desenhos, acho que faz
meio século que não vejo desenho de manhã.
Entrego o prato com ovos cozidos e descascados
para ele, não coloquei muito sal, mas um pouco de
manteiga no canto do prato, lhe estendo a caneca de
café e pego o meu juntando as pernas.
—Obrigado, Ana.
Ainda parece meio sutil, mas...
—De nada.
Como os meus ovos em silêncio assistindo Tom
& Jerry, faz anos que não tenho uma oportunidade
dessas, e o mais interessante é que por mais que as
peripécias pregadas pelo rato ao gato sejam repetidas,
sempre me faz sorrir, é como ver um episódio repetido
de Chaves dez mil vezes e não enjoar.
—Não acha melhor assistir aqui nesse sofá? —
Mosés pergunta.
—O Senhor quer trocar?
—Não, pode sentar aqui ao meu lado, eu não vou
te morder, Ana.
—Ok.
Não quero parecer que estou de pirraça por
conta de ontem, quanto mais rápido ele se recuperar,
mais cedo ele poderá voltar para o apartamento dele.
Está é outra coisa que eu não entendo.
—O Senhor não tem alguém que limpa o
apartamento para o Senhor?
—Tenho, mas eu dispensei logo que voltei de
viajem, não me sentia bem, não queria ser incomodado.
—Ah.
—Eu sei, estava uma baderna, Safira esteve
comigo por duas semanas, ela deixou meu apartamento
um lixão.
Safira... a irmã.
—Ela é jovem?
—Cinco anos mais nova que eu.
—O Senhor também parece jovem.
—Tenho 29.
Ele é mais velho que eu e nem parece.
—E você?
—Eu? —questiono e ele faz que sim com a
cabeça. — Tenho 27, apesar de eu aparentar ser bem
mais velha.
—Alguém te disse isso?
—Não preciso que me digam.
Suspiro.
—Você é uma moça muito bonita, Ana, apenas é
meio... masculinizada.
Que motivador!
Ele fala comigo como se tivesse cem anos de
idade, as vezes eu acho o Senhor Handerson tão
travado... principalmente para conversar.
—E respondona...
—O Senhor está esquecendo de desastrada e
pessimista.
—E também atrevida.
—Mas isso se encaixa no quesito respondona.
Finjo uma falsa modéstia, mas fico realmente
chateada em ouvir isso de alguém que não é a Sêmora
ou a minha mãe, sempre vou passar feriados e férias
com ela, e sempre escuto esse tipo de comentário
quando faço algo que a desagrada.
—O Senhor também não é flor que se cheire.
—Eu nunca disse que era bonzinho.
—O pior nem é ser um satânico, é só que o
Senhor é a arrogância e prepotência em pessoa.
Mosés me encara, mas não está surpreso,
contudo, acredito que nunca alguém teve realmente
coragem de falar isso cara a cara para ele, deve ser
daqueles que intimidam até o próprio demônio em
pessoa, se bem que essa parte eu já até conheço
bastante, desde que ele entrou na minha vida — quando
era o antigo leva ombro — eu vivo um poço de
estresse.
—Eu sou cristão.
Ele parece recuar, e percebo que eu o intimidei,
da vontade de dar uma cambalhota para trás de tanta
felicidade. Eu intimidando Mosés Handerson, isso
deveria ser comemorado com fogos de artifício, o
bloco de gelo está rachando?
—Por que quer rir?
—Consegui pular o muro de indiferença que o
Senhor e eu estabelecemos durante esses dias.
—Não entendi.
Será que ele está fazendo isso para tirar uma com
a minha cara? Como assim não entendeu?
—O Senhor vive me tratando mal, obviamente
que não esperava que eu fosse viver adulando o
Senhor.
—Eu não te trato mal Ana, eu apenas respondo
da forma que sei.
Franzo a testa bem mais que surpresa com a
sinceridade nos olhos azuis, ele mexe os ovos no prato
sem interesse, fico tentando imaginar pessoas normais
tratando umas às outras desse jeito... Basicamente,
dezenas de milhares de pessoas já teriam se matado, o
que parece ser normal para ele, para mim é uma poça
de arrogância e grosseria.
—O Senhor não gosta de mim porque eu esbarrei
no Senhor naquele dia na rua?
—Apenas não gosto de manter amizades com os
funcionários da empresa. —Mosés diz com bastante
firmeza.
—Não tem amigos na empresa?
—Não tenho amigos em lugar algum.
—Por que?
A pergunta saiu no impulso, Mosés ergue o olhar
e me fita, a íris de cor azul está opaca mais uma vez, e
percebo que ele não quer falar.
—Não sei ter amigos — responde franco. — Eu
sou muito direto e isso soa como você mesmo disse,
alguma espécie de arrogância, você pelo contrário é
cercada deles.
—Só tenho uma amiga, é a Sêmora, os outros me
toleravam por eu ser Chefe deles —respondo — Não
sou muito de viver fazendo amizades com ninguém, não
gostava de sentir que favorecia ninguém pelo fato de
serem próximos de mim, assim não dei motivos para
que falassem da minha coordenação.
—Ainda sim, mantinha algum tipo de
coleguismo. — Ele fala muito calmamente. — Não sei
ter amigos, não tenho paciência nem tempo, e quando
se tem muito dinheiro a maioria das pessoas se
aproximam de você com outras intenções.
—Entendo.
Nesse sentido sinceramente concordo.
—O Senhor sempre trabalhou na Handerson
LTDA?
—Sim, mas eu não era desta filial, era da filial
na Inglaterra, fui criado lá.
—A Senhora Handerson não morava aqui?
—Sim, mas eu fui criado lá por alguns
empregados dela, Safira e eu.
Nossa! Alguém que entrega os sobrinhos a
funcionários! Que frieza!
—Gostava de lá, não tinha tantas secretárias
respondonas, depois que cheguei aqui só dei azar, a
que era desta filial se apaixonou por mim e decidiu
pedir conta.
Pisco deliberadamente, sufocando com a
revelação.
—Dormiu com ela?
—Eu não saio com funcionárias, eu não dormi
com ela, ela se apaixonou por mim e não foi algo que
eu cultivei, então, ela achou melhor mudar de filial.
—Coitada.
Ele me fita e está de novo fechado.
—Talvez, se tivesse me dito isso no começo não
havíamos brigado, Senhor Handerson.
—Não teria um pingo de graça, adoro que me
odeiem.
Mas isso soa muito vazio.
Mordo minha torrada e me volto para TV, acho
que o assunto acaba aqui, e eu estou muito mais que
incrédula com as revelações do Senhor Handerson,
quais mais segredos acercam sua família? Sua vida?
Me sinto terrivelmente curiosa.
—Terminou o banho?
—Sim.
Ele já está com o roupão, mas está sentado no
vaso, acho que não consegue ficar mesmo muito tempo
em pé, quanto queria. Me aproximo e ajudo ele a
levantar, vamos lentamente para o meu quarto, Mosés
teve uma crise de vômito agora a pouco, mas a febre
não retornou, como vomitou na roupa tive que despi-lo
às pressas e trazê-lo para o banheiro, deixei ele na
banheira e limpei a sala, ao menos não vomitou no
sofá, ele estava basicamente deitado quando vomitou
nos cobertores, também reclamou bastante de dor de
cabeça.
—Se sente melhor?
—Sim, mas minha cabeça lateja bastante.
—Fique na minha cama.
—Não quero incomodar mais do que já faço.
—Besteira, trouxe até um baldinho para o seu
vômito!
Mostro o balde que costumo usar para lavar o
banheiro e sorrio abertamente como se fizesse
propaganda de algum produto de TV, Mosés sorri meio
de lado, um sorriso pequeno, mas bonito, pego a toalha
de rosto e seco os cabelos dele com cuidado, ele me
olha em silêncio, e pego a cueca que Sêmora trouxe no
horário de almoço.
Ela passou no centro ao meu pedido e comprou
cuecas e camisetas, não quis ir no apartamento do
Senhor Handerson sem pedir, e pedir também pareceu
meio invasivo depois da conversa que tivemos pela
manhã sobre amizades, me mantive meio afastada
também, acho que é o melhor mesmo para nós dois, não
podemos tornar isso muito mais pessoal do que já está.
—No que está pensando, Ana? —pergunta ele
enquanto enfio seus pés na cueca. — Está magoada
pelo o que eu disse mais cedo?
—Não — respondo sem jeito. — O Senhor mal
tocou na salada.
—Não tinha fome. — Ele fala me olhando,
depois desvia o olhar.
—Aposto que se tivesse comido o ensopado que
eu fiz para mim, teria criado apetite.
—Tenho trauma de ensopado — responde e
ainda me olha em silêncio. — Você gosta de conversar,
não é mesmo?
—Às vezes sim. — Eu dou de ombros.
—Quer ficar aqui e ouvir a minha história triste!
—Com essa cara de cachorro doente você
convence até o papa.
Ele sorri agora bem cínico, subo a cueca por
baixo do roupão e depois tiro o roupão do corpo dele
pegando a camisa.
—Não?
—O que poderia ser pior do que perder o pai
com onze anos? Pesar quase cem quilos a vida toda?
Ele me olha depois que enfio a camisa em seu
corpo, pego o roupão, não preciso que ninguém tente
justificar as ações devido ao seu passado, ainda que
isso seja bem comum, não entra na minha cabeça que
ele seja assim por ser adotivo ou algo assim.
—Então me dê sua companhia.
—Para que?
—Talvez eu morra dessa doença.
—Que drama.
Agora está realmente ofendido com a minha
resposta.
Reviro os olhos, esse homem me irrita e me faz
sentir como se fosse uma ogra por conta disso.
—Está bem, deite-se, eu vou trancar as janelas e
pegar uma pipoca, o Senhor quer comer o que?
—Pipoca serve.
Milagre.
—Ok, já volto.
Organizo meu banheiro, depois levo tudo para
lavanderia, coloco as roupas na máquina juntamente
com os cobertores, uso o banheiro do corredor paro
meu banho do fim de tarde, não me demoro, não estou
assim das mais empolgadas para fazer companhia para
ninguém, esses dias estou mais para dragão que para
mocinha chorona, eu fico assim quando estou perto de
menstruar.
Meu dia hoje foi cansativo, ainda desmontando
as caixas, procurando lugar para enfiar minhas coisas,
decidi jogar fora algumas, e outras estou acumulando
para dar para Sêmora levar para igreja que ela
frequenta.
Visto uma calça de malha e uma blusa de mangas
folgada, deixo meus cabelos presos num coque mal
feito e vou preparar a pipoca, logo que termino pego
uma lata de suco diet e volto para o meu quarto, nunca
pensei que viveria para ver um homem deitado na
minha cama de cueca, queria tirar uma foto e enviar
para Sêmora, seria impagável, daria tudo para ver a
reação dela ao ver o Chefe assim, sentando-se na
minha cama só de cueca e camiseta.
Me sento ao seu lado na cama e coloco a vasilha
de pipoca entre nós, não tenho TV nesse quarto, quando
eu tiver algum dinheiro quero colocar uma bem grande
na parede de frente para cama, para eu assistir as
minhas séries favoritas, também quero colocar uma
estante com os meus melhores romances na parede da
esquerda.
—Eu fui adotado com 3 anos, antes disso eu
morava num lar de adoção em Londres.
—Não é americano?
—Não.
Nossa.
—Na verdade essa foi a minha primeira adoção,
meus primeiros pais eram americanos, logo que
adotaram a mim me trouxeram para cá. — Ele diz
olhando fixamente para parede da frente. —O meu
primeiro pai era médico, e a minha primeira mãe
enfermeira, ela não podia ter filhos, no primeiro ano
tudo ainda era um pequeno mar de flores...
—Até que ele te bateu e você fugiu de casa! —
completo e enfio um punhado de pipocas na minha
boca.
Mosés me olha, mastigo a pipoca depressa,
minha mente está bem fértil, na verdade sempre foi, eu
leio muito.
—Não — fala seco como se me repreendesse —
Ele era um necrófilo, os dois eram.
Meu Deus Do Céu.
—Eles me levavam para o hospital e me
colocavam sentado numa banca enquanto ela arrumava
os corpos que ele iria violentar. — Ele diz e me
arrepio da cabeça aos pés. —Isso foi só durante o
segundo ano, quando eu fiz cinco anos eles começaram
a querer me ensinar a gostar daquilo.
Enfio mais um punhado de pipoca na boca, não
sei se sinto nojo ou mais interesse pela história, parece
que roda um filme estranho e sinistro na minha cabeça,
um casal de médicos do mal, uma criança abandonada,
e práticas satânicas num necrotério.
—Certo dia, eu estava com muito medo de tudo
aquilo, e enquanto se distraíram eu fugi, chamei o
guarda e entreguei ambos, eles foram pegos em
flagrante.
Isso explica o medo intensivo dele de médicos,
também porque ele não queria ficar só no hospital,
estou incrédula.
—Por isso tem medo de médicos e hospitais.
Ele não responde, pega uma pipoca e enfia na
boca, o jeito como mastiga parece mais cheio de classe
do que qualquer pessoa que eu conheça mastigando
apenas uma pipoca, devagar, boca fechada, algo ligado
a uma educação extrema.
—Voltei ao lar mais próximo e neste eu fui
adotado por uma mulher que era viúva, professora,
acho que foram os dois anos mais felizes da minha
vida, no primeiro ano a minha chegada ela conheceu
um homem bom e eles se envolveram, mas ela
engravidou e ao dar à luz, a criança faleceu, o homem
tomou desgosto e abandonou-me com Safira numa
rodovia, eu tinha apenas oito anos e safira um ano e
meio.
Meu Deus!
Fico dura em meu canto, parece que todos os
nervos do meu corpo estão enrijecendo, fico
mentalmente presa a imagem de uma criança de oito
anos muito pequena segurando outra, jogadas a sorte
numa rodovia, à mercê de bandidos, animais, carros,
de serem mortos, abusados, violentados por qualquer
um.
Meu coração começa a doer.
—Depois de três dias perdidos numa mata, eu
consegui achar a estrada de novo, um caminhoneiro nos
achou, mas ele tinha pena de nós dois e não nos
devolveu, ele cuidou de nós, mas não tinha condições,
decidiu nos dar para alguém que tinha bastante
dinheiro, esta pessoa era uma das empregadas da
mansão dos Handerson.
Não tenho o que falar, as palavras não saem.
—A mulher era funcionária dos Handerson há
anos, ela nos levou para Bonnie e logo que viu Safira e
a mim, Bonnie se apaixonou, ela nos adotou juntamente
com o seu marido Harman, mas Harman já estava bem
velho e haviam as empresas a serem administradas,
Bonnie precisava tomar a frente dos negócios, então
ela nos mandou para Inglaterra onde a empregada
cuidou de nós dois até seus últimos dias.
Agora ele parece tão amargo.
Acho que está lembrando de tudo enquanto fala,
e isso talvez o machuque muito mais do que eu
imagino.
—Ao menos Safira parece ser feliz com a vida
que tem, me sinto grato a Deus por ela ter sido adotada
muito pequena, não gostaria que ela tivesse passado
metade das coisas que passei na vida antes dos
Handerson me adotarem—fala ele bastante
concentrado—eu sofria muito abuso no lar sabe,
cheguei lá um bebê, mas os cuidadores me batiam
muito, Bonnie mandou fechar o lugar quando contei
para ela há alguns anos, que eles molestavam as
crianças.
Preciso de um gole de suco.
Mosés ergue a cabeça e me fita, seu olhar tem
algo relacionado a dor, e um misto de angústia e
tristeza, mas ele abafa, ele não demonstra.
— Imagino que o seu passado não tenha sido tão
legal quanto o meu, Ana Beatrice.
— Acho que não, Senhor Handerson.
— Você é a primeira pessoa para quem falo isso
em toda a minha vida, não faço ideia do porquê, mas
confio plenamente em você.
Bebo mais um pouco de suco.
— Acho que não justifica o Senhor ser um grosso
pelo fato de ser adotivo.
—Eu não sou grosso, Ana!
—É sim, e gosta de obrigar as pessoas as coisas,
vive querendo me obrigar.
—Isso é porque você é uma garota indomável.
—Eu não sou garota — reclamo. — Muito menos
indomável.
Ele me dá um meio sorriso, ainda meio descaído,
depois se estica na cama devagar, me dou conta do real
tamanho do Senhor Handerson quando vejo seus pés
quase saindo para fora da cama, ele geme.
—Me conte a sua história.
—Não tenho um grande passado, meu pai
morreu, minha mãe não se casou, as minhas irmãs são
duas vadias frívolas, é, eu acho que é isso, minha vida
é perfeita!
Novamente ele ri, mas dessa vez ri de verdade,
algo sem cinismo e deboche, muito pelo contrário.
—E os namorados?
—Que namorados? Eu não tenho namorados! Eu
não preciso de um homem para fazer com que eu me
sinta bonita ou autossuficiente, nem para me sustentar.
—Esse discurso feminista já está ultrapassado.
—Olha quem fala, o homem que tem medo de
médico!
Ele fecha a cara, falei demais, nossa, eu não
deveria ter falado isso.
—Me desculpe, Senhor Handerson.
—Você é mesmo uma estúpida insensível.
—Eu não quis dizer isso!
—Não, claro que não.
Fico olhando para ele por alguns momentos,
sinto vontade de chorar pela merda que fiz, saio da
cama levando a vasilha e o suco.
—Boa noite, Senhor Handerson.
Mas enquanto saio do quarto tudo o que escuto é
o seu silêncio.
Capítulo
11
—Você disse isso para ele, Ana?
—É, eu disse!
Encolho os ombros.
Acho que o fato de estar 24 horas na mesma casa
que o meu Chefe está me deixando doida, nervosa e
meio estressada, também penso que seja porque me
acostumei a viver sozinha, o que é algo muito fácil.
Sem preocupações, sem medo de ser julgada a
cada passo que dou, sem ter que ficar pensando no que
as pessoas pensam ao meu respeito, mas
principalmente, porque ter alguém dentro de casa tira
toda a liberdade que se adquire quando se é
independente.
Não posso nem mais andar de calcinha dentro de
casa e isso me enlouquece.
Que mulher que mora sozinha e gosta de ficar de
jeans ou calça o dia todo dentro de casa?
Então decidi sair hoje cedo para tomar café com
a Sêmora.
Depois da discussão de ontem, tudo o que eu
quero é me manter bem longe do Senhor Handerson,
acho que é porque eu fiz merda— para variar — e
acabei magoando ele de alguma forma, aquela foi a
nossa primeira conversa sem ofensas reais e no
momento em que o meu Chefe começa a falar da vida
dele para mim eu estrago tudo falando algo insensível.
É isso o que eu sou: insensível.
E na verdade, me senti e, ainda me sinto péssima
com as palavras dele.
Sêmora me olha meio brava, ela não sabe que
aquela cobrinha também me dá uns coices dolorosos de
vez em quando, mas reconheço que falei sem pensar e
foi algo muito pesado.
—Não é à toa que brigam tanto, ele não cede e
você fica com sua cúpula de "ai, não me toquem" te
revestindo como uma bolha de superproteção.
Odeio quando ela fica falando como aqueles
psicólogos do programa da Oprah.
—Alguém tem que ceder, Ana! —Sêmora fala
para mim com cara de quem comeu e não gostou.
—Esse alguém não serei eu— respondo
chateada. — Você que não sabe o quanto ele é grosso.
—Olha, depois disso tudo o que você me falou
sobre o passado dele, é até justificável que ele seja
assim, o homem sofreu abusos, foi abandonado, cadê o
seu coração? O seu pai também foi abandonado!
Isso é verdade.
Pensei muito nisso hoje, quando vim para o café
na rua de baixo do apartamento da Sêmora, me sentia
péssima em pensar por esse lado, mas então me vinha
na cabeça todas as grosserias que ele fez comigo e eu
ficava engolindo a piedade que sentia por Mosés
Handerson, e dizendo para eu mesma que ainda assim,
não justificava, papai era adotivo e nunca foi assim
com ninguém desde que me lembro.
—Ele confia em você Ana, algo bem mais que o
trabalho.
—Ah é claro, secretária!
—Ana, não passou pela sua cabeça que talvez
ele esteja fazendo isso porque se interessa por você?
—Que? — Estou boquiaberta com a pergunta.
Sêmora me olha fazendo cara de tédio, dou uma
crise de riso tão grande que algumas pessoas em volta
de nossa mesa ficam nos olhando curiosas, rio alto,
gargalho, a ideia é tão absurda que quando tento
realmente pensar, ou parar para pensar, quando começo
a reformular uma resposta em minha mente as palavras
dela me veem e me fazem rir e rir mais ainda.
—Já acabou, Ana? —Sêmora se irritou.
—Ele não se interessa por mim, ele precisa de
mim, é muito diferente — respondo secando os cantos
dos olhos. — Francamente Sêmora, você tem cada
ideia depois que emagreceu, acha que os homens vão
me querer da mesma forma que eles te querem?
—Isso não tem a ver com o peso Ana, talvez ele
goste de você...
—Não vem com esse papo de que "ele gosta de
você por quem você é", acho que você não percebeu
que eu peso quase 100 quilos e tenho 1.75 de altura,
não, obrigado!
Sêmora respira fundo, ela sabe que eu tenho
razão, que ideia mais absurda.
Um homem daqueles jamais me olharia de forma
diferente.
—Você precisa de amor próprio.
—Eu preciso que ele vá embora para o
apartamento dele.
Sei que estou sendo uma vadia insensível, mas
nunca passei por isso na vida, a única pessoa que ainda
consigo conviver sob o mesmo teto é a Sêmora, isso
porque quando nos conhecemos na faculdade ela e eu
quase nos matamos por conta do beliche, depois do
período de adaptação, ficamos inseparáveis.
—Ele não vai, ele encontrou em você uma amiga
verdadeira, alguém em quem confiar.
—Eu não quero ele morando na minha casa.
—Você está muito estressada.
—Claro, eu estou arrumando a casa, lavando,
passando, cuidando de um doente o dia todo enquanto o
Roni está se apossando do meu cargo por direito.
Retiro o que eu disse um dia sobre mulheres do
lar, elas são as mulheres mais guerreiras na face da
terra.
—Por que não conversa sobre isso com ele? Não
o convence a voltar para o apartamento dele?
—Não tenho jeito Sêmora, ele é um grande...
—Teimoso como você, parece que quando se
refere a ele estão de frente a um espelho, vocês são
iguaizinhos. — Sêmora junta as mãos com um sorriso
mal nos lábios. — Exceto, pelo fato de que ele parece
ser mais objetivo e direto, você é um pouquinho mais
doce e bondosa... ou era.
Estreito os olhos.
—Seja franca com ele, explique que precisa que
ele vá, para que tenha liberdade, você precisa do
emprego, ele é o Chefe, mais cedo ou mais tarde ele
voltará para o apartamento dele.
Respiro fundo, apenas não sei como falarei isso
para ele sem que ele me diga um "não" de cara.
—Ou pode aproveitar esses dias para descansar
e se aproximar do Chefe, afinal de contas, quem me
prova que ele realmente está dormindo na sua cama?
Mostro o dedo do meio para ela, Sêmora segura
meus ombros e me sacode.
—Relaxa Ana, se entrega a essa amizade, quem
sabe isso não é o primeiro passo para um
relacionamento bom no escritório?
Eu duvido.
—Você saiu?
—Sim.
—Foi para onde?
Não é da sua conta.
—Fui no centro ver a Sêmora.
—Tem um bilhete na mesa para você.
Lá vamos nós de volta aos bilhetes.
Vou para a cozinha e largo as compras sobre a
mesa, pego o guardanapo e abro, leio o recado.
"Ana, gostaria que você não ficasse brava por
ontem. Consegui tomar banho sozinho, me vesti
sozinho. Não deve sair sem me avisar, fiquei
preocupado"
Suspiro e dobro o bilhete.
Meu Chefe me observa sentado de lado no sofá,
os cabelos úmidos, a barba por fazer, um olhar cheio
de algo misterioso.
—Ok, não saio sem avisar da próxima vez.
—Me preocupo com você.
—Eu sei que sim!
E estou muito envergonhada por você falar isso
me olhando dessa forma.
—Parabéns pelo banho, Senhor Handerson.
—Obrigado.
—Tomou os remédios?
—Sim, e já enchi minha garrafinha.
—Deixei café e ovos cozidos.
—Eu comi.
Bom garoto.
—Eu trouxe os ingredientes de um bolo, o
Senhor come?
—Sim, desde que não tenha cacau e glúten.
Preciso me adequar as exigências do Senhor
Handerson?
Preciso!
Sêmora me diz que preciso ceder, entendo que
para ele que é homem seja algo que é quase
impossível, e sei que eu não sou alguém assim tão
impossível, mas é que depois de tudo, só me sinto
calejada de todos os acontecimentos que vieram para
minha vida depois que ele apareceu.
—Ana?
—Vou buscar a massa sem glúten.
Pego minha bolsinha de mão e começo a me
afastar para a porta da cozinha.
—Ana!
—Sim, Senhor.
Me viro para ele, ele me analisa com cautela.
—Tudo bem, eu não estou bravo por ontem.
— Me desculpe, também fui grossa.
—Está bem.
Faço que sim e saio do meu apartamento, respiro
fundo.
—Sem glúten, Ana — falo para mim mesma. —
Sem glúten!
Capítulo 12
Meu bolo não cresceu, mas ficou fofinho até.
Nunca fiz bolo sem glúten, mas para o primeiro
até que está comestível. Separei em duas partes, a
parte dos alérgicos — sem cobertura de chocolate — e
a minha parte. Comprei uma barra de chocolate meio
amargo, quando cheguei cuidei do almoço, que foi
salada e fiz também risoto, para minha surpresa o
Chefe — assim como prefiro pensar em relação a ele
— comeu até um pouco, ele não consegue comer muito,
o estômago ainda está muito fraco.
Ele come muito pouco, e não sei se gosto disso,
mas também não questionei.
Aproveitei o resto da tarde para continuar
organizando minhas coisas em seus devidos lugares, o
Chefe ficou o dia todo deitado vendo TV, das vezes que
precisei organizar alguma coisa na sala sentia seu olhar
sobre mim, mas ele não disse nada, como de praxe
apenas ficou na dele.
Acho que assustei o homem com a minha reação
a tudo o que me falou, mas também pensei bastante em
tudo, e cheguei à conclusão que Sêmora talvez tenha
um pouco de razão quanto a ele, talvez só veja em mim
alguém que confie já que eu cuido dele desde que
adoeceu, eu quem o levei para o hospital e venho
cuidando dele desde então, deve ser por isso que ele
vem conversando e se abrindo comigo, ou vinha.
Quando terminei de colocar as últimas peças de
roupas no meu closet — novo closet —comemorei, e
decidi que era hora de fazer o bolo.
Preparei a massa e coloquei para assar, enquanto
assava acompanhei o Chefe no banho, dessa vez ele
conseguiu se despir sozinho, apenas coloquei a
banheira para encher e o ajudei a entrar, ele entrou de
cueca — ok, entendi o recado — e sai do banheiro
deixando o roupão no lavatório.
Usei o banheiro da sala para tomar banho,
coloquei uma calça de malha fria e uma blusa de
mangas, sai do meu banheiro e fui ajudar ele a se
vestir, fiquei muito surpresa quando o vi sentado na
minha cama já com uma calça comprida de moletom,
mas ele estava sem camisa, fiquei meio parada quando
o vi se esforçar para tentar vestir a camisa, mas escutei
os gemidos baixos de dor.
Me aproximei da cama.
—Hei, eu ainda estou aqui — disse e tomei a
camisa da mão dele.
—Desculpe, queria fazer outra surpresa!
—Pois não tente, o Senhor precisa melhorar.
Ajudei ele a vestir a camisa e a voltar para a
sala, há pouco o coloquei sentado no sofá e levei um
chá, agora divido o bolo em dois pedaços, fica difícil
não beliscar, a massa está muito boa apesar de não ter
crescido tanto.
—O bolo está cheirando.
—É, não queimou!
Levo os pedaços em pratos separados com
garfos de sobremesa, meus utensílios de cozinha não
são lá essas coisas, pensando bem, vou ter que
comprar bastante coisa quando eu tiver menos
apertada. Entrego o prato para ele, e me sento no sofá
ao lado dobrando as pernas, o Chefe assiste a um jogo
de basquete.
—Por que não se senta aqui ao meu lado, Ana?
—Ah, ok!
Me sento perto dos pés dele, é muito estranho
pensar que daqui há alguns dias, verei Mosés só na
empresa, ele está comendo o bolo comportadamente
calado, olha fixamente para TV, como um pouco do
meu bolo e bebo um gole do chá.
—Você tem falado com a Marcy?
—Não.
Deveria?
—Telefonei para ela hoje, e me inteirou de
algumas coisas da empresa, pedi que sua amiga a ajude
durante sua ausência na empresa.
—Sêmora? —Estou surpresa.
—Sim, vou pagar por fora, ela não se opôs, falei
com ela hoje à tarde quando você estava arrumando a
casa. — Mosés diz muito calmo. — Não se preocupe,
ela só vai atender ligações e mandar e-mails, não se
sinta ameaçada.
—Pelo contrário, a Sêmora é muito prestativa —
fico contente que ele tenha escolhido ela, a Sêmora
merece também um extra.
—Safira estava desesperada de preocupação. —
Ele fala e vejo que seus olhos tem um brilho diferente.
—Tive que ligar para ela e falar que estou bem, Marcy
disse que há dias ela telefona direto para tentar me
achar.
—O Senhor quer que eu te leve para vê-la no seu
apartamento?
—Não, ela virá no domingo para me ver aqui,
está cuidando dos negócios em Londres.
Que chique!
—O seu bolo ficou delicioso, Ana.
—Obrigada, Senhor Handerson.
Sorrio, sinceramente, nunca pensei que alguém
além da Sêmora fosse ficar tão contente em comer um
bolo meu, se bem que ultimamente ela só come umas
migalhas.
Ele se senta e estende a mão, e toca a minha
bochecha com a ponta do dedo, fico paralisada e sem
ação com o toque.
—Obrigado por cuidar de mim tão bem, Ana.
Nesse momento ele me lança um olhar
inesperadamente... terno.
—De nada.
—Insisto que aceite ao menos uma quantia...
—Não quebre o clima, Senhor Handerson—
repreendo sincera, e ele sorri do nada, meu coração
começa a disparar.
Levanto, e nem sei porque fico nervosa.
—Vou buscar mais bolo.
E me afasto.
Melhor ficar bem longe do Chefe e de seus
sorrisos.
Desci para uma caminhada hoje cedo.
Estou caçando qualquer motivo para ficar fora de
casa por algum tempo, quando estou fico mais no meu
quarto, tento não ficar na cozinha, evito olhar para o
Chefe, tem sido assim desde que ele tocou o meu rosto,
não tenho medo disso, eu apenas não quero me sentir
assim sempre que ele fizer algo parecido, também não
quero sentir o que eu senti quando ele sorriu para mim.
Me sinto à beira do abismo.
Apenas dois dias muito lentos se passaram desde
que isso aconteceu, me ocupo também em cuidar dos
vasos de flores que ganhei dele, de qualquer coisa que
me deixe bem longe de Mosés Handerson. Eu não
posso, e não devo me sentir assim. Não posso
confundir as coisas, e muito menos, mistura-las
Na verdade, não estou confusa, eu só estou
alarmada com a rapidez no qual começo a sentir as
mesmas coisas de quando vejo, o Vagner.
Nestes dois dias eu fui a padaria, fiquei olhando
bem para ele, mas já não sentia como se o meu coração
disparasse, nem como se minhas mãos soassem ou
como se o meu estômago ficasse borbulhando, eu
estava tentando mesmo sentir aquilo, mas não
conseguia, hoje nem animei em ir, por mais que ele
estivesse lá as sensações se esvaíram do meu corpo,
foi como se abrissem uma garrafa de refrigerante e
todo o gás houvesse saído de lá.
Não havia empolgação em mim, tudo o que havia
eram pensamentos, lembranças, sensações que tinha
quando me lembrava do jeito como o Chefe ficava me
olhando, do jeito como ele sorriu para mim e tocou
minha face, e eu sei que não posso jamais agir assim,
porque ele é o meu Chefe, e eu serei sua secretária.
Nada Além de uma secretária.
Me demoro ainda mais na caminhada de hoje,
tanto que me esgotei, e quando me dou conta de que já
passa das dez da manhã decido volta para casa.
Gostaria de voltar e que ele não estivesse lá,
assim não teria que olhar para os seus sorrisos, não me
sentiria tão nervosa perto dele, eu mato toda e qualquer
chance de me sentir assim quando ele está por perto, ou
tento. Sei que os rumos dos meus pensamentos me
levaram para um caminho sem volta.
Nem sei porque me sinto assim, até alguns dias
atrás eu o odiava, o detestava, desejava que morresse,
e bastou que ele me falasse de seu passado e sorrisse
para mim e já fico assim? Toda mole?
Entro no meu apartamento, respiro fundo.
—Bom dia, Ana!
Não vejo empolgação, mas percebo gentileza, e a
arrogância sumiu com o meu sobrenome.
—Bom dia, Senhor Handerson.
—Tem um bilhete para você na mesa.
Tento sorrir, acho que não consigo mesmo
disfarçar quando não estou bem, me sinto uma grande
idiota por pensar que esse homem faz algo por mim
além de me tratar com educação, mal olho na cara dele,
vou para a cozinha e me sento à mesa pegando o
guardanapo, fico surpresa em ver uma pequena
caixinha de chocolates importado, abro o guardanapo,
o "bilhete" de hoje está um pouco maior, leio.
"Por que você está estranha comigo?"
Ao ler a primeira frase quero dar um berro,
porque eu achei que ele não perceberia?
"Eu fiz algo que não gostou? Desrespeitei você?
Me desculpe, pois, não foi minha intenção. Ana, você é
a minha primeira amiga de verdade..."
Que legal! Valeu Sêmora, por jogar a praga na
minha vida.
"... e quero que saiba que sou muito grato por
estar me ajudando, na empresa e fora dela, você é uma
funcionária de ouro, confio em você Ana, me desculpe
se falei algo para te magoar, sinceramente, Moisés".
Moisés... não era Mosés? Claro! É o mesmo
nome, mas com sentidos diferentes.
—Você já leu? —Ele parece meio ansioso.
—Sim— digo desanimada, dobro o "bilhete" e
guardo no meu bolso. — Estou cansada, mudei
recentemente, me desculpe, Senhor Handerson.
—Quer que eu vá para o meu apartamento, não
é?
Coço a testa, francamente...
—Sim, mas não pelo Senhor, é que eu me
acostumei a viver sozinha, é meio complicado ter um
homem dentro de casa.
—Eu entendo, você quer ir ficar cuidando de
mim no meu apartamento?
Isso seria uma missão bem complicada.
—Não sei.
—Acho melhor aqui pois está no conforto do seu
lar.
—Poderia contratar uma enfermeira.
—Acho que já sabe dos meus traumas de
infância, Ana.
Coitado, tem medo de médico, hospital e
enfermeira, é isso, ele não quer ninguém a quem não
confia por perto, por puro medo.
—Desculpe, é que me esqueço.
—Tudo bem, você poderia vir aqui? Podemos
ver TV juntos, está passando o seu desenho predileto.
Tom e Jerry.
—Preciso preparar o almoço, Senhor Handerson.
—Podemos ver TV agora, pode pedir algo para
comermos, eu gosto de comida japonesa.
Me sinto um pouco nervosa pela forma como ele
me olha e inquieta.
—Você está brava com alguma coisa... diga, eu
sei quando não gosta de algo.
—Não quero misturar as coisas— digo sincera e
me sinto nervosa. —Não sei se posso ser amiga do
Senhor fora da empresa.
—Somos amigos, Ana — fala ele, e está
surpreso com a minha resposta — Não podemos ser
amigos? Não vejo problema nisso!
—O Senhor tem namorada, talvez ela não goste
disso.
—Que namorada, Ana?
Agora eu realmente o contrariei.
—Uma que eu vi esses dias com o Senhor, no
apartamento, tem cabelos pretos e usava uma camisa
do Senhor.
—Safira? — Uma sobrancelha dele se ergue. —
Ela vive vestindo as minhas roupas.
—A moça magrela era sua irmã?
—Sim!
—Mas... mas parecia outra coisa.
—Claro, ela acha que está em casa e faz da
minha vida um pequeno inferno, mexe nos meus
armários e pega as minhas coisas.
—Mas o Senhor estava de cueca.
—Ana, ela é a minha irmã!
Seu tom franco soa meio rude, me sinto
deslocada por alguns momentos, tola, idiota, mas
principalmente uma completa tonta por usar isso como
argumento para defender a tese de que não podemos
ser amigos, o que ele não sabe é que os meus motivos
são bem parecidos com os motivos da secretária, e se
eu continuar a me sentir assim vou acabar me
demitindo como foi com ela ou algo parecido.
—Acho que vou embora então...
—É que não pode ser, o meu crush é o Vagner!
Depois que falo percebo que o semblante de
Mosés muda, de calmo ele fecha a cara.
—Crush? — questiona — O que é isso? Uma
forma delicada de dizer que está transando com ele?
Fico dura.
Mosés me fuzila com o olhar, com certeza ele
não entendeu o termo, a ofensa é intensa e forte.
—Ana? —Sua voz soa ameaçadora.
—Eu não estou transando com ele, para o Senhor
que não sabe, "crush" e quando você está afim de
alguém e a pessoa não sabe— digo muito magoada. —
Seu grosso, estúpido.
—Ana eu...
Não dou ouvidos, agora nem que me dê uma
floricultura não vou desculpar, me tranco no meu
quarto, muito mais com medo do que sinto, do que das
palavras do meu chefe.
Começou a chover.
Preciso comer alguma coisa.
Não posso ficar a vida inteira trancada no meu
quarto, até porque estou na minha casa, e se o Chefe
não gosta da situação o problema não é meu, é muito
mais dele. Passei o dia todo trancada aqui não somente
magoada, mas irritada também, com a forma como o
Senhor Handerson me tratou, não acho que merecia ter
sido chamada de "vadia" em outras palavras pelo meu
Chefe.
Saio do quarto e o vejo de relance me olhando
logo que entro na sala, não fala nada nem eu, vejo o
guardanapo dobrado sob e mesa, mas não o pego, acho
que ele também não comeu nada durante o dia, isso não
é legal, nem para mim nem para ele, principalmente
para ele que está doente.
Acho que no fundo, no fundo eu meio que
assustei o Senhor Handerson com a ideia de me afastar
dele, talvez seja como a Sêmora fala realmente, talvez
eu seja a única pessoa que ele realmente considera
amiga de verdade, eu nem quero imaginar como as
coisas serão daqui para a frente, mas é só que não me
sinto pronta para ser amiga dele.
Ligo a chaleira, tomo um remédio para dor de
cabeça, e pego pão e queijo na geladeira.
—Ana!
Me viro, e muito perto de mim está o Senhor
Handerson, meu coração dispara com sua proximidade,
e tento abafar mais uma vez as sensações dentro de
mim.
—Eu ainda sou homem Ana, mas você faz com
que eu me sinta um moleque, estar perto de você é
como estar numa montanha russa, hora brigamos, hora
estamos perto de estarmos bem.
—Sinto muito se passo essa impressão ao
Senhor...
Ele se apoia na pedra da pia, depois se inclina
em minha direção e fecho os olhos recebendo um beijo
na boca, perco a respiração ainda que seja apenas um
selinho, o contato é rápido e faz um estalo, depois
ganhou outro beijinho e outro, e a boca dele me toma
num beijo lento.
Não sei beijar... eu nunca beijei ninguém na vida.
Fico sem fôlego logo que o beijo fica intenso e
eu me inclino para trás tentando recuperar o ar, Mosés
está com os olhos fechados, ele me puxa com um braço
e me abraça, mas está fraco, ofegante.
—Você vai me expulsar da sua vida Ana?
Estou cansada disso.
—Melhor o Senhor descansar.
—Eu não quero me afastar de você.
—Eu não posso ser isso o que o Senhor quer.
—Você pode sim, pode ser minha.
—Acho que o Senhor está com febre alta,
alucinando.
—Não estou não, eu até escovei os dentes
sozinho.
Deixei uma escova no banheiro da sala para ele
com um creme dental, quero rir da resposta.
—Acho que estou caído por você Ana.
Meu coração se acelera e pula no peito feito
louco, ergo a cabeça e eu o fito, Mosés está com os
olhos azuis pousados nos meus, olhos que mudam de
cor quando as emoções dele se afloram, a íris está
mais intensa que nunca.
—O que é estar "caído" para o Senhor?
—É a mesma coisa do que ser seu "crush".
Nossa.
—Você não pode me rejeitar Ana, não você.
Acho que ele não sabe bem como lidar com isso
tanto quanto eu, percebo que é algo conflitante para o
meu Chefe, tanto quanto é para mim perceber que sinto
essas coisas mais fortes quando ele está por perto.
Ele se inclina e recebo outro selinho, me sinto
meio derretida com isso, Mosés Handerson faz o que
eu nunca permiti que ninguém fizesse em toda a minha
vida, ele me beija, ele me toca, sua mão espalma o
meio das minhas costas lentamente, e o seu corpo está
colado ao meu enquanto me abraça, me sinto tonta,
parece que vou desmaiar a qualquer momento.
—Talvez você aprenda a gostar de mim não
acha? —pergunta baixinho. — Eu prometo que vou ser
um bom Chefe.
—Isso tem a ver com o trabalho? —Estou
confusa. — Senhor Handerson, eu não...
—Não, não tem a ver, nem eu mesmo sei o
porquê faço isso, Ana, acho que enlouqueci. — Ele
corta nervosamente. — Apenas te quero por perto,
você é alguém a quem admiro e tenho confiança,
apreço.
—Não é o certo.
—Por que não?
—O Senhor disse que não tem casos com suas
secretárias.
—Você ainda não é, a minha secretária oficial.
Fecho a cara.
Ele me olha meio zombeteiro e me beija a face,
me abraça, desconheço esse estranho que me trata com
carinho a quem venho chamando de Chefe no último
mês, ou deveria chamar.
—Meu corpo está doendo, Ana.
—Vamos para o sofá.
Eu o ajudo a caminhar até o sofá, quando se senta
eu o acomodo entre os travesseiros, Mosés respira
arfante, ainda fraco, muito fraco, acho que só está
assim porque não se cuidou desde o começo da
doença.
—Leia o bilhete e venha cuidar de mim, Ana.
E faz cara de cachorro desamparado, mas ele
soa, realmente arfante pelo pequeno percurso, me
levanto e vou buscar o guardanapo, leio enquanto
retorno à sala.
"Ana você quer ser a minha secretária, amiga e
namorada?"
Capítulo 13
Olho para o bilhete.
Olho para ele.
Olho para o bilhete.
E mais uma vez olho para ele.
Minha respiração está presa, e eu me sinto
pregada ao chão, não consigo me mover, lentamente
leio e releio as palavras escritas em letra cursiva e
meio tortas.
"Ana você quer ser a minha secretária, amiga e
namorada?"
Meus dedos começam a umedecer o guardanapo,
e fico parada recebendo o choque do pedido, meu
corpo se enche de tensão, uma tensão dolorosa e
ríspida.
—Ana?
Isso soa como: por favor, fale alguma coisa.
Sua voz ecoa em meus ouvidos, e por alguns
instantes percebo que fiquei fora do ar ao ler o bilhete,
ergo o olhar e mais uma vez o azul esplêndido me
analisa, sério, e preocupado, sempre que olho para
Mosés Handerson quando ele me deixa ver, percebo
suas reações por trás do muro de frieza que ele é, e
agora vejo, tanto medo no olhar dele, não sei
exatamente o porquê, talvez se sinta preocupado..., mas
medo?
—Pode responder agora, Ana? —pergunta baixo,
os olhos me analisando muito cautelosamente.
—B-Bom — gaguejo, meu estômago está gelado.
— Eu... eu... eu...
Tenho dificuldade com esse tipo de coisa,
simplesmente nunca me beijaram, nunca me pediram
em namoro, e tão pouco a pessoa era o meu Chefe.
—Você aceita? —pergunta ele novamente muito
baixo. — Não?
—Calma, Senhor Handerson. — Eu consigo
falar, ainda estou tentando controlar as batidas rápidas
do meu coração, poxa, isso está mesmo acontecendo?
—Eu não posso ficar calmo —responde em seu
absoluto tom de sinceridade. — Você me faria muito
contente se aceitasse.
—Eu já sou sua secretária— esclareço
nervosamente.
—A parte em que você aceita ser a minha
mulher.
Mulher?
Minhas pernas ficam bambas, e meus braços
caem.
—Digo, namorada, é que para mim é a mesma
coisa, Ana— corrige apressadamente —Você aceita?
— Ele questiona ansioso.
—Senhor Handerson, Eu... eu... eu...
—Eu quero uma chance — exige, agora mais
sério. — Você não pode me negar uma chance de
provar que posso ser uma pessoa boa para você!
—Está me cobrando isso? —pergunto bem mais
que surpresa—Você não pode chegar assim e exigir
que eu namore com você!
—Com você só funciona na marra, Ana, você vai
me namorar ou não?
Nossa, que grosseiro!
Agora o impacto inicial de surpresa se
transforma em raiva, mas me detenho, eu sei que não
posso estragar tudo assim antes de ao menos saber
quais são as reais intenções por trás do pedido.
—Está bem. —Ele fala bem antes de mim. —
Ana você aceita ser a minha namorada?
Mordo o lábio com receio, logo em seguida dou
um passo para o rumo do sofá e minhas pernas tremem
um pouco, eu não sei se o que vou fazer é o certo, ele
não me dá tempo para pensar.
—S-enhor. Handerson — gaguejo, e ele
interrompe.
—Mosés!
Me sento ao seu lado no sofá, abro a boca para
falar umas três vezes e não consigo, quando tomo
fôlego, desisto, a palavra "não" está na ponta da língua.
Mas ao invés disso só uma pergunta sai da minha boca:
—Por que quer namorar comigo?
Mosés me olha e parece nervoso.
—Você é bonita, inteligente, corajosa e sincera,
gosto disso em você, apesar de ser uma atrevida!
Acho comovente sua sinceridade e me sinto
constrangida, estou vermelha, e mal acredito que um
homem usa o termo "bonita" primeiro, ao invés de
"inteligente" em relação a mim, Mosés me olha calado,
algo que não muito comum, depois ele ergue a mão e
devagar toca a minha face, seu toque me causa bons
arrepios pelo corpo, e o carinho faz com que eu sinta
algo se derretendo dentro de mim.
—Me interesso por você, Ana.
Olho para baixo e algo me vem à cabeça, e isso
mata qualquer coisa que venha a sentir, simplesmente
porque entendo bem como as coisas funcionam.
—Se me quer como secretária não precisa fazer
isso, Senhor...
—Ana não, não faz isso, eu nunca pedi ninguém
em namoro antes, acha que eu me prestaria ao papel de
namorar alguém porque preciso de mão de obra? —
questiona com o semblante sério. — Sabia que
pensaria isso.
—Por que não? O Senhor precisa de mim!
—Mas eu também quero você, e precisar e
querer são duas coisas completamente diferentes.
—Entendo, mas talvez esteja confundido as
coisas, acho que o Senhor está febril.
Como posso acreditar que um homem desses se
interessa por mim? Que me quer? Isso é tão
impossível!
—Eu estou completamente são Ana, eu quero te
namorar.
—Por que?
—Não tem como eu explicar Ana, sou homem.
—O que está insinuando? —questiono confusa.
—Me agrada te ver—responde e desvia o olhar
para o lado—Te acho muito gostosa.
Eu? Gostosa?
Começo a rir, a crise de riso se espalha pela sala
e gargalho ainda mais alto, é uma daquelas crises que
eu dou quando Sêmora fala algo muito ridículo.
Rio tanto que minha barriga dói, quando me
esforço para parar do nada ele se inclina na minha
direção e me beija, sua mão está fria e trêmula quando
me segura a nuca, e quando sua boca se move na minha
paro de rir tomada por um frio na barriga intenso, logo
em seguida ele me beija lentamente, sua boca é macia,
carinhosa, mas eu não sei como beijar...
Ele persiste, sua língua é quente e carinhosa,
lenta, invade minha boca com vagareza, minha mão
toca o ombro dele, e eu viro por outro lado tentando
corresponder, meu coração dispara com violência, e
minha respiração está entrecortada, minha língua toca a
dele com calma, e por mais que eu esteja
absolutamente nervosa tento não aparentar muito.
Este é o meu primeiro beijo.
A barba me arranha o rosto quando viramos para
o outro lado, meu estômago gela mais e mais com a
expectativa, e a mão dele se enfia na minha nuca, e eu
faço o mesmo, correspondendo-o da melhor forma,
minha língua explora a boca dele assim como a dele
provoca a minha boca, meu corpo reage ao seu toque, e
sinto arrepios bons pelo corpo enquanto seus dedos
tocam os pelinhos da minha nuca.
Ele deixa os meus lábios e fico com os olhos
fechados guardando isso dentro da memória, meu
corpo todo mole, me sinto... me sinto... ótima!
—Por favor, pense com cuidado, Ana!
Abaixo a cabeça e me inclino, eu o abraço
prendendo dentro de mim a ponta de emoção que sinto
por tudo isso, aperto tanto ele que ele geme de dor,
quando me dou conta eu o solto.
—Você aceita?
—Como é insistente, meu Deus!
Me afasto um pouco, olho para baixo sem jeito,
esperei a minha vida toda por isso, por um beijo e
ainda não sei como me sinto em relação a isso —
exatamente — e ele quer que eu seja sua namorada...
pensei que me odiasse, no entanto ele alega que gosta
de mim.
—Ana Beatrice?
—Se eu disser que sim, me promete que vai
parar de ficar repetindo o meu nome a cada dois
segundos?
Mosés Handerson me dá um sorriso aberto,
sincero e tão... Feliz! Nem parece ele sorrindo, meu
coração salta com mais força, sou tão tola!
—Então a resposta...
Não espero ele completar.
—É sim!
Sim!
Capítulo
14
—Sim?
Sorrio e faço que sim com a cabeça, Mosés me
olha um pouco mais que surpreso, logo em seguida ele
sorri e toca a minha face com carinho, sua mão treme
bastante, percebo seu nervosismo através dos gestos
ainda que seu olhar não denuncie algo além da surpresa
pela minha resposta.
Acredito que ele não pensou que eu fosse dizer
um " sim" logo assim de cara, eu também não sei
porque disse, mas me sinto tão... feliz!
Não quero pensar em mais nada ele me pediu, eu
aceitei e pronto, sendo ou não meu Chefe, sendo ou não
meu amigo, Mosés Handerson é o meu namorado ou
acaba de se tornar, e eu sua namorada.
—Sério? —questiona ainda disfarçando a
incerteza, me fita esperançoso. —Ana... não tenho
palavras para expressar meu contentamento.
Nossa... que palavra antiga!
Ele segura a minha mão com cuidado e a ergue,
depois a beija com carinho, o toque de seus lábios nas
costas das minhas mãos me provocam arrepios que
começam dos braços e se espalham por todo o meu
corpo.
Seus olhos azuis me fitam e sinto que as minhas
bochechas queimam terrivelmente de vergonha por
esse olhar, é muito diferente do olhar no qual estou
acostumada.
—Você realmente quer ser minha namorada?
—O Senhor não me pediu em namoro?
Parece que ele não quer acreditar e não faço a
menor ideia do porquê... Mosés Handerson parece
meio descrente ou coisa assim, acho que eu deveria me
sentir muito mais assim do que ele, porque para mim
ainda me parece algo muito impossível de acontecer,
que um homem como ele me peça em namoro.
Depois de alguns instantes vejo um pequeno
sorriso brotar em seus lábios, ele toca novamente a
minha face com carinho e me beija de leve, mais um
selinho, parece que o meu coração vai pular direto
pela minha garganta para fora da boca.
—Pedi— responde e se afasta um pouco— É que
parece difícil que tenha aceitado.
—É, realmente — confesso, e desvio o olhar
para baixo.
Não sei como agir, em minha mente tudo está
revirado, simples: não esperava que isso fosse
acontecer, algo improvável e inacreditável. O meu
Chefe acabou de me pedir em namoro e logo de cara
falei "Sim", e dentro de mim, ainda tenho invicta a
certeza de que quero, mas não sei como serão as coisas
agora, sinto que devo conversar com ele sobre isso.
—Ana...
—O Senhor disse que nunca pediu uma mulher
em namoro antes... então, como era? —Estou curiosa.
—Sou homem. — Mosés responde, acho que
posso pensar nele pelo primeiro nome. —Tive alguns
casos durante um tempo, mas não deram certo.
—Alguma delas quis matar você na primeira
chance? —pergunto perdida em pensamentos.
—Acredito que não Ana, você é que é uma
rebelde revoltada — retruca, mas está calmo. —Eu
também não esperava que isso fosse acontecer.
—Isso o que? —Estou confusa.
—Me sinto atraído por você, Ana—Mosés olha
para minha mão junta da dele—me desculpe falar, mas
eu não queria isso.
—Não gosta de se envolver com secretárias —
concluo vermelha.
Ele disse atraído? Foi isso o que eu ouvi? Devo
estar surda!
—Sim, são pessoas do trabalho. — Ele pisca e
me olha. — Eu não gosto de me envolver com ninguém
da empresa mais do que o necessário.
—É o certo — reconheço, eu também jamais me
envolveria com alguém da Handerson.
—Mas eu não a conheci profundamente na
Handerson, eu quero ficar com você fora da empresa.
Não consigo compreender bem porque o
interesse, eu ainda não me compreendo direito quanto a
ele, estou nervosa, disse que aceito namorar com o meu
Chefe, mas ele para mim não passa de um pequeno
desconhecido no qual sei poucas coisas.
—Você ainda está brava pelo mal-entendido?
Não foi minha intenção que houvesse entendido aquilo,
eu apenas falei pois pensei que como você corre quer
perder peso.
—Ah...— falo e me sinto constrangida. — Bom...
eu...
—Sou indiferente a isso.
—Ao meu peso?
—É.
Acho que ele evita as palavras para não me
magoar.
Abaixo a cabeça, um problema... na verdade o
maior deles, não sei bem se as coisas fluíram tão
naturalmente entre ele e eu, preciso ser cautelosa, não
posso aceitar um pedido de namoro do meu Chefe que
está adoentado na minha casa apenas porque ele alega
que se sente atraído, e se ele se sentir grato? Isso seria
a pior coisa que aconteceria comigo nesse momento.
—Seria muito ruim se fizesse isso apenas por
gratidão...
—Ana, não! —exclama absolutamente sério. —
Não é por isso.
Posso acreditar? Devo acreditar?
—Eu realmente quero ficar com você, Ana. —
Ele insiste ainda bastante firme — Você não acredita
nas minhas intenções?
—É que até alguns dias atrás nos detestávamos
— respondo um pouco balançada—Eu mesma o
odiava, você é tão duro e inflexível.
—Dentro da empresa sim, Ana.
—Aqui em casa também...
—Não a conhecia fora da empresa, Ana eu não
tive a chance de realmente conviver com você sem que
tivéssemos um dia de paz, você é muito encrenqueira.
Me sinto envergonhada em ouvir isso, um sermão
do meu Chefe, mas como... namorado.
—Eu acho que devemos nos conhecer melhor,
deixar de briga, tudo bem defender seu ponto de vista
na Handerson, mas aqui, eu não quero falar de
negócios, quero que sejamos apenas nós dois como tem
sido.
Realmente, eu mal me lembro da empresa desde
que ele ficou internado, bem, lembro, mas não do
trabalho em si, estive tão ocupada cuidando de Mosés
que esqueci de muitas coisas.
—Não vamos falar disso agora, realmente,
ficaremos juntos fora da empresa, você será a minha
namorada, certo?
—Sim — digo concreta, porque isso apesar de
confuso é algo inerte dentro de mim, eu quero ele como
namorado, ainda que não saiba bem o porquê disso.
Ele se inclina e me beija com carinho, enquanto a
língua toma a minha boca sua mão segura a minha e
entrelaça os dedos nos meus, tento corresponder como
aprendo, meu coração fica disparando demais, e meu
estômago fica frio, a sensação é tão boa e intensa, as
minhas pernas amolecem novamente e sinto dentro do
peito, uma vontade imensa de soltar um berro feliz.
—Sua boca é fantástica Ana—ele me fita com os
lábios muito próximos dos meus, sinto o calor de sua
boca junto a minha— Você é linda.
—Obrigada. — Realmente me sinto bem com o
elogio.
—O que é?
—Você não vai contar para ninguém na empresa,
certo?
Ele pisca, assim bem surpreso com a minha
pergunta.
—Naturalmente, não acho que seja do interesse
das pessoas da empresa, mas se eu precisar ir a algum
compromisso social, quero que me acompanhe.
—Tipo... Namorados?
—Sim?
—Não se importa com o que as pessoas
pensaram?
—Sobre o que?
Não é possível que ele esteja falando sério! Que
seja verdadeiro comigo nesse ponto!
—Sobre a minha aparência, Mosés.
Acho que essa é a primeira vez que eu falo o
nome dele sem parecer um xingamento ou coisa assim.
—O que tem sua aparência Ana? Para mim você
é normal e perfeita, apenas um pouco cabeça dura, é
claro.
Mosés Handerson me acha perfeita!
—Acho que não me encaixo nos padrões do
Senhor... quer dizer, seus padrões — pigarreio
incomodada.
—Padrões? —Mosés me analisa e fecha a cara.
— Pois estes são os meus padrões, você é o meu
padrão.
Poxa.
Fico por alguns momentos sem saber o que falar,
cada coisa que ele fala me deixa realmente
impressionada, acho que enfiaram o meu Chefe
arrogante e prepotente num lugar bem longe deste,
contudo, crio coragem e falo o que penso.
—Mosés eu sou uma garota GG.
—Você é tudo o que eu quero Ana, GG ou não,
eu não me importo com a opinião de ninguém além da
sua, e o seu bem-estar.
—Não quero te expor...
—Não quero falar disso agora Ana, acabo de te
pedir em namoro e você já está arrumando desculpa
para nós discutirmos?
Fico vermelha.
—Desculpe, não foi a intenção.
Mosés me olha e aperta os dedos entre os meus,
observo as nossas mãos juntas.
—Não quero me preocupar com nada, quero
apenas viver esses dias em paz com você Ana.
Concordo com um breve balançar de cabeça, eu
o puxo e o abraço com cuidado, ele ergue minha
cabeça e me beija a pontinha do nariz com um olhar
muito sereno.
—Vai dar tudo certo, Ana.
—Espero que sim.
Francamente, espero mesmo que dê tudo certo.
Capítulo
15
Fiz salada de espinafre pro para o almoço.
Me senti observada a todo momento, tinha a impressão que a todo
momento da sala havia um olhar sério acompanhando os meus passos, mas
tentei dizer p a ra eu mesma que talvez fosse coisa da minha cabeça, pois
sempre que eu o olhava, Mosés estava sentado e virado p a ra frente, por
fim, um pouco antes do almoço ficar pronto ele estava dormingo dormindo
no meu sofá, envolvido por um lençol, havia um homem que eu mal
conhecia adormecido num sono tranquilo, tornando minha organização toda
mais uma vez uma pequena baderna.
Garrafinha no chão, xícaras no centro da minha sala, um cobertor
jogado num canto... enfim, bagunçado, mas arrumei tudo sem fazer
barulho, acabei por perder um pouco da fome e fui organizar os banheiros,
minha cama, tive que colocar as roupas na máquina, nada que eu já não
faça há a um tempo, mas sempre costumava fazer essas coisas aos fins
de semana.
Sempre que passava pela sala eu o olhava e sentia vontade de
sorrir, pois estava ainda incrédula com seu pedido— ainda estou —e
ficava me recordando da nossa conversa de mais cedo, dos beijos... O o s
beijos!
Os beijos de Mosés, a boca dele na minha, ainda que sua barba me
arranhasse os lábios dele nos meus... suspiro só de lembrar.
Organizei mais algumas coisas da mudança mudança, mas não
muitas, tomei um banho e agora estou deitada pensando um pouco em tudo
isso, a loucura que se tornou meus dias com Mosés por perto, mas
principalmente por seu pedido realizado mais cedo de mais cedo .
Sou sua namorada e mal acredito nisso, pois tudo é muito
improvável, impossível!
Claro que seria hipócrita dizer que nunca sonhei com um "Mosés
Handerson" da vida querendo algo comigo, mas eu realmente tive que me
beliscar pelo ou menos umas dez vezes pra para ter certeza de que isso
tudo é muito real.
Não parece real, e ainda é bem difícil que eu acredite que ele se
interessa realmente por mim.
Me viro na cama abraçada ao meu travesseiro e fico quieta
analisando tantas coisas, o mais curioso é que não me sinto precipitada,
nem como se fizesse algo errado, ainda que eu saiba que tenha que ter
cautela, me sinto boba , coisa que nunca fui, bo b c a e como uma
adolescênte adolescente em seu primeiro namoro... bem, é mais ou menos
isso mesmo, este foi o meu primeiro beijo, este é o meu primeiro namoro, e
além de surpresa me sinto muito feliz.
Realmente difícil imaginar como seria, eu já tinha deixado de
acreditar no amor há a muito tempo, talvez nunca de fato eu realmente
houvesse acreditado no amor, não sei se isso pode chegar a ser algo
diferente de algum namorico , mas acho que pra para ele é algo bem
sério.
—Ana!
Sua voz é baixa, sonolenta, me ergo me sentindo completamente
constrangida, estou de short jeans, um desses que uso pra para ficar em
casa, uma blusa de mangas e meias, meus cabelos úmidos devido ao
banho, levanto da cama indo ajuda-lo, ele se segura nas paredes, meio
pálido, eu o ajudo a vir pra para a cama, Mosés ainda tem crises de
fraqueza intensa.
— desculpe Desculpe , é que você não estava lá, acho que dormi
muito.
Olho pelo vidro da janela e vejo que o sol já se pôs, eu mesma não
me dei conta de que o dia acabou, me sento ao seu lado na cama.
— quer Quer que eu prepare o seu banho?
— seria Seria ótimo.
— Ok ta .
Me levanto, mas antes que me afaste sinto a mão segurando-me o
pulso e ele me puxa gentilmente pra para baixo, me beija levemente
fazendo um estalo com o beijo, a outra mão dele toca a minha face e sua
língua toma a minha boca com lentidão, me inclino gostando do beijo, beijar
Mosés é muito gostoso, ainda que me sinta muito nervosa.
— você Você comeu alguma coisa?— coisa? — pergunta me
fitando muito bastante sério.
— comi Comi — falo sem graça . — Fi fi z salada de
espinafre e batatas no forno.
— está Está bem . — E e le me beija mais uma vez, um selinho
leve, depois me fita e sorri . — V v ocê é linda , minha Ana.
Minha Ana!
— obrigad Obrigada , o Mosés —falo constrangida . —
V amos!
Eu o ajudo a se erguer, depois o ajudo a ir pro para o banheiro, ele se
senta no vaso e eu o ajudo a se despir, logo em seguida o ajudo a entrar na
banheira e ligo a torneira de água morna, pego o sabonete líquido e a
minha esponja, não tenho outros olhos pra para ele, Mosés parece tão...
fragilizado, ele realmente precisa de cuidados, não quero pensar como teria
sido se naquele dia não tivesse vindo pra para cá.
Acho que toda a raiva que eu sentia por ele abafou qualquer tipo de
preocupação que eu viesse a sentir, o que hoje não é o caso, me ajoelho
perto da banheira e despejo o sabonete nas costas dele, começo a lavar
com paciência as costas de Mosés, ele não consegue se esticar, está
sentado com as pernas dobradas, os pés apoiados na banheira, ele parece
cansado.
— não Não gosto de precisar das pessoas .—Ee le confessa
baixinho e me olha de lado . — V v ocê também é assim , certo?
— não Não muito —respondo enquanto vejo o sabonete fazer
espuma nas costas dele . — E e u sou mais humilde.
— não Não é questão de ser humilde . — E e le passa os
braços envolta das pernas e faz uma careta . — S s into que fico
devendo quando me fazem algo de favor es .
— pois Pois não deveria, um favor não é uma obrigação
remunerada . — E e stou atenta as costas dele.
São largas, alvas alvas, mas não muito, tem braços compridos, ainda
que magro e abatido um porte incrível, acho que não parei pra para notar
realmente todos os atributos físicos de Mosés Handerson com cuidado.
— acho Acho que é questão de costume mesmo, Safira é diferente
de mim, ela também é mais nova, tem uma visão muito bonita da vida.
Isso é muito amargo, mais amargo que eu própria.
— você Você não?
— acho Acho que não posso dizer que sou romântico, certo?
Sorrio e faço que sim com a cabeça, definitivamente não ... ..., mas
aquelas flores me deixam na dúvida.
— eu Eu sou muito seco — admite sincero — , M m as
quando me sinto afeiçoado a alguém quero estar com a pessoa , sabe?
Isso é tão ... sincero!
— eu Eu tive dois relacionamentos mais sérios sérios, mas não
derão deram em nada , e você?
Zero X Zero , ...
m M as não me sinto no direito de mentir.
— nunca Nunca me pediram em namoro — confesso , e ele
me olha totalmente concentrado.
Fico desconsertada.
— de De verdade , Ana?— Ana? — questiona bem mais que
surpreso.
— sim Sim —falo completamente vermelha . — P p or que?
eu Eu pareço namoradeira?
— não Não , pelo contrário . — E e le abaixa o olhar . — V v
ocê é uma mulher muito independente.
— é É meio complicado achar alguém que queira algo sério nos
dias de hoje hoje em dia .
— eu Eu quero algo bem sério com você , Ana.
Da vontade de sorrir com a sinceridade dele, toco sua testa, ele está
com a temperatura normal, mas não resisto.
— deve Deve estar mesmo muito doente.
Ele me dá um sorriso meio torto e segura a minha mão, meu coração
dispara com seu olhar.
— deve Deve ser, algo relacionado ao coração , Ana.
Sorrio , nervosa , e apenas completo:
— é É , deve ser!
Termino de lavar louça.
Vou pra para a sala e me sento ao lado dele.
Ele assiste um documentário no Nat ional Geo grafic , logo que
me sento seu olhar se volta pra para mim, acabamos de comer agora há a
pouco, nosso jantar foi silencioso, mas trocamos vários olhares, desde o
banho não falamos nada, o ajudei a voltar pro para o sofá e fui organizar a
cozinha, acabou que o nosso almoço ficou mesmo pra para jantar, até que
não ficou dos piores.
— tomou Tomou os remédios pra para dor?
— sim Sim .
Não tem uma tratamento específico um tratamento específico pra
para dengue, ouvi falar dessa doença quando uma das meninas da
empresa viajou pra para um dos países da América do Sul, ela voltou com
a doença, ficou dias afastada, sarou apenas das dores pois remédio pra
para curar a doença não tem.
— você Você quer dormir?
— estou Estou um pouco cansada , sinceramente.
Ele me olha , e vagarosament e estende a mão e repousa na
minha, acho que tem bastante receio, e não faço ideia do "por que".
— poderia Poderia dormir comigo aqui na sala?— sala? — Mosés
me olha ainda sem jeito.
— claro Claro —concordo . — Q q uer ver um filme?
— seria Seria bom . — E e le sorri meio de lado.
— quer Quer que eu ajude você a se deitar?
— quero Quero que fique comigo , Ana.
— eu Eu já estou com você.
— abraçada Abraçada a mim, quero sentir o seu calor.
Acho que posso me acostumar com todo esse jeito direto dele ,
sem morrer de vergonha antes por isso.
Faço que sim e me ergo, afasto o centro pro para o canto e o
outro sofá, vou até o quarto e pego um colchão de casal, é de espuma,
sempre usava no outro apartamento quando queria dormir na sala, o coloco
no meio da sala de forma que f ique ica de frente p a ra TV tv e vou
ao quarto pegar o forro, quando retorno Mosés está me olhando em
silêncio, ele gosta de fazer isso, de ficar me observando.
Depois que coloco o forro, arrumo o travesseiro dele no colchão e o
ajudo a deitar no colchão no chão , as vezes sinto seu esforço esforço, mas
o cansaço é involuntário, eu sei que nesse momento ele está sentindo dores
por todo o corpo.
Me deito junto com ele, ao seu lado e fico de lado vendo-o se
remexer, Mosés me olha de relance lado e sua mão segura a minha
com o mesmo zelo que aprendo a identificar nele , em seu jeito, eu o
beijo, meu corpo se aconchegando ao seu, me sinto mais confortável
assim, ainda que envergonhada. Me afasto um pouco dele, percebo que
ele cansa com muita facilidade, quero que se sinta confortável, quero que
se sinta bem.
— o O que faz nos dias de folga?— folga? — ele Ele pergunta
e fica deitado de costas olhando pro para o teto, a posição parece
confortável pra para ele.
— costumo Costumo organizar meu apartamento, Sêmora
praticamente vive comigo vive no meu apartamento , mas não
aqui este , me mudei há a alguns dias pra para cá— respondo — E
e você?
— não Não tenho tido tantas folgas quanto gostaria .—Ee le
fala olhando pro para o teto . — D d epois que vim pra para cá apenas
trabalho, essa doença está me atrasando.
— sei Sei que a Handerson é muito grande, nossa filial tem quase
dez mil funcionários — digo confesso pensativa— I i magino que as
outras cinco devem ser até maiores. .
— não Não são apenas esses negócios, tenho ações na bolsa,
tantas coisas .— Mosés entrelaça os dedos nos meus , e leva a minha
mão aos lábios depositando aqui um beijinho . , coro — N n ão sei o que
teria feito sem você.
— não Não precisa falar como se isso fosse grande coisa.
— estou Estou acostumado a ter pessoas que fazem as coisas pra
para mim , apenas em troca de algo, isso meio que me deixa com o pé
atrás, mas você Ana , ... você me intriga.
Não consigo compreender o motivo por que .
— você Você é desafiadora, parece não se importar com o que eu
quero ou penso, acho que faz muito tempo que não encontro alguém tão
teimosa quanto você.
— é É mesmo?— mesmo? — minhas Minhas bochechas
ardem de vergonha.
— sim Sim . — ele Ele fala e sorri , ainda olhando pro para
o teto , parece perdido em pensamentos . — Eu gosto disso.
— apenas Apenas achei que conseguiria a outra vaga.
— não Não precisa de ser contadora , Ana, quem me ajudará
em tudo será você, você quer receber ordens do dono , ou quer dar
ordens ao lado dele?
— não Não faço muito o tipo : sou ambiciosa.
— eu Eu já percebi isso.
Ele sorri, e vira o rosto pro para o meu rumo.
— gosto Gosto disso em você, você não quer só o meu dinheiro.
— pra Para começar , eu nem queria você.
— ah Ah é, desprezado pela minha secretária.
— sabe Sabe que depois que eu conheci você , eu pensei em
vários títulos pro para o nosso filme.
— não Não gosto de filmes, prefiro livros.
Mosés Handerson gosta de ler!
— então Então , me fale um t ítulo. — Ee le fala com
gentileza na voz . — Q q ual seria o título do nosso livro?
— a A Secretária Rebelde —falo de maneira
espontânea, mas totalmente sem jeito.
E logo, assim M m uito naturalmente , Mosés Handerson
começa a rir , rir muito, eu nunca pensei que o veria rir na minha vida ,
agor e a no entanto , ele ri alto . , S s ua mão continua entrelaçada
a minha mão , estou meio de lado , com o corpo bem próximo ao do
dele, e acabo por rir também.
—Meu chefe?— Chefe ? — questiono e ele faz que não ,
ainda rindo a à beça, penso por mais alguns momentos . — M m eu
chefe Chefe indomável?
— nada Nada de chefe Chefe s — reclama risonho — P
p oxa Ana, que imaginação.
— pode Pode ser meu chefe Chefe estupidamente arrogante...
— chega Chega de chefe Chefe !
— a A secretária dos meus sonhos?
— A a inda não!
— então Então sugira.
—Apaixonado pela minha secretária?
Meu coração dispara, Mosés puxa minha mão e me aconchego,
tento ficar de uma forma que não o machuque, ele não protesta, me deito
com a cabeça em seu peito, meus olhos focados nos dele, ele tem olhos
fixos no teto, me beija a cabeça e me sinto aquecida, ele solta a minha
mão, e eu o abraço com esse braço com medo de que sinta dor.
— minha Minha Ana?
Esse título seria perfeito pra para um romance muito "chiclete".
Faço uma careta.
— que Que tal , meu chefe Chefe pavoroso?
— que Que tal tal, minha secretária rebelde arrogante?
— eu Eu não sou arrogante , Mosés.
Ele sorri mais uma vez como se fosse muito engraçado, seus olhos
estão fechados, observo a bela face dele em silêncio.
— você Você é só a minha namorada teimosa.
— é É verdade, eu sou mesmo teimosa.
— e E minha.
Sorrio e beijo-o de leve.
— minha Minha Ana.
Não tenho por que discordar.
—Sua Ana.
Capítulo
16
Acordo.
Tem uma mão suave acariciando minha cabeça, estou com o
cobertor até a altura do pescoço, estou abraçada a Mosés, aninhada ao
seu corpo de forma que a minha cabeça está um pouco abaixo de seu
corpo, me sinto envergonhada quando ergo o olhar e ele me analisa.
— B b om dia , Ana.
— B b om dia , Mosés.
Seus olhos estão me analisando, e ele parece tão ... pensativo.
Me ergo e ele se inclina , e subo o corpo encontrando seus lábios,
parece meio impossível que consiga ficar sem beija-lo sempre que me olha
assim . ,E e u o beijo e toco sua barba, sua face, ontem foi uma noite
muito boa, engraçada, nunca me senti tão confortável e bem com alguém,
é algo novo conversar com Mosés, ele é ao mesmo tempo que muito
fechado, alguém um pouco engraçado. Ele me toca o pescoço, o meu
ombro, e exploro sua boca com carinho, nossas bocas se entendem muito
bem.
Me afasto um pouco, relaxada e feliz.
— vou Vou preparar o nosso café, como se sente essa manhã?
— melhor Melhor , meu corpo dói um pouco e a cabeça lateja.
— vou Vou buscar os remédios pra para dor.
— obrigado Obrigado .
Ele me beija mais uma vez antes que eu me levante, ao mesmo
tempo que me sento no colchão escuto o som do meu celular, uma
notificação, com certeza certeza é Sêmora . Saio do colchão e vou
até a cozinha onde deixei meu celular, coloco a água pra para ferver
enquanto leio as mensagens.
"Ana, me atende"
Essas são de ontem, duas seguidas, logo em seguida várias
mensagens de carinhas irritadas e rostinhos furiosos, vou direto pras para
as de hoje.
"Ana, bom dia, só me diz que ainda estão vivos"
Sorrio, se ela soubesse...
" S s im, estamos"
" Aa té que enfim, hei, fiquei sabendo de muitas coisas do C c
hefe, qual delas quer saber primeiro?"
Sêmora não aguenta, ela é uma fofoqueira de plantão, mas não
resisto, Mosés Handerson ainda é um pequeno mistério.
" F f ala logo"
"Mosés Handerson é muito gostoso"
Mando carinhas rindo, na verdade rindo a à beça, me detenho em rir,
por que simplesmente acho muito absurda a ideia de saber que um
homem desses é o meu namorado e não da Sêmora, ok, quando ela era
gordinha ela já era bonita, mas agora que emagreceu ela está muito mais
linda, arrumada, vaidosa, e é muito estranho vê-la se referindo assim a um
cara que é lindo e que não é dela... ele é meu!
Ela está digitando, olho pro para o rumo da sala e vejo daqui,
Mosés deitado no colchão da sala , meus olhos pousam no homem quieto e
calado . , G g ostoso?
Sim! Muito! Admito, estava cega pela raiva, pelo ódio, não consegui
enchergar enxergar mais do que a beleza dele, me volto pro para o celular.
"a A segunda coisa é que ele é muito só, descobri que você está
cuidando do quinto homem mais rico da cidade, e o décimo do mundo"
Franzo a testa, isso realmente me surpreende.
"Mosés Handerson é um multimilionário, ele e sua irmã Safira
Handerson, mas ao que me parece ela é um pouquinho arrogante, ela ligou
ontem atrás dele, foi muito áspera super áspera "
Não sei o que digitar, eu definitivamente não pensei nisso, estava
tão envolvida na parte "obedecer ao satânico" que mal me dei conta de que
realmente , Mosés Handerson é muito mais poderoso do que eu
imaginava.
Dez a zero pro para o meu senso de percepção de merda!
" O o segundo segredo é que ele já teve um caso com uma
mulherzinha chamada Viviane Bianc, ela é Francesa e eles dois tiveram
um caso de dois anos, descobri com a Marcy, ao que me parece eles não
deram certo."
" P p or que?"
" E e la é casada"
Nos-sa Nossa !
Nossa!
Fico parada na minha cadeira, meus músculos de todo o corpo estão
travados nesse momento.
"Marcy disse que eles dois eram amantes daqueles bem
fervorosos, sabe tipo amante de aluguel? Ana, você está t a ai aí ?"
" S s im"
" P p ois é, nosso chefe Chefe já teve esse caso e um outro ,
mas parece que o outro foi mais tranquilo, esse com essa tal francesa foi
barra pesada, dizem que até tentar se matar por conta dele ela tentou."
Dentro de mim, parece que uma tempesta de se move, mas
me detenho, por que sei que não posso falar sobre isso por
mensagem com a Sêmora.
" H h oje a à tarde quero te ver, precisamos falar sobre algo ,
Sêmora"
" V v ixi, quando fala desse jeito sei que é bomba"
Não era, acabou de se tornar.
" T t e disse que o meu irmão quer te ver?"
" E e sse é um outro assunto que quero tratar com você"
"Trev quer te namorar"
Eu sei disso.
" E e u já te disse que o Trevor pra mim é como um irmão
para mim "
" ai A í isso é tão você, cortar as chances antes de se permitir..."
"Sêmora, eu já tenho namorado"
Cinco... Quatro... Três...Dois...
"ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh ! Bb
erro aqui"
Não consigo não sorrir, francamente, ela insiste tanto pra para que
eu fique com o Trev que não sei mais o que fazer, talvez agora isso seja a
solução.
" D d eixei meu celular cair , Ana"
" S s ério?"
" É é o crush"
" A a i meu Deus , meu coração está a disparado"
"Vagner?"
" P p oxa, quero saber tudo"
Contei até dois e já dispara com as mensagens.
" P p or isso quero te ver , Aninha, já beijaram? Como foi o
primeiro beijo? ele Ele é carinhoso? o O Vagner é gente fina"
" T t e conto tudo hoje, as 17:00 cinco no café?"
" A a té lá , vou tentar não morrer de curiosidade"
Olho pra para a sala, respiro fundo, mas eu tenho certeza que
quando ela souber , ela vai cair do cavalo, ou talvez ela não acredite em
mim, eu mesma não acreditaria se alguém dissesse se alguém me falasse
que aquel Mosés e homem é o meu namorado.
" N n ão vai , Sêmora"
— tudo Tudo bem?
Ele me olha como se me analisasse muito, faço que sim. Mosés toca
a minha face.
— disse Disse algo que não gostou , Ana? fiz Fiz algo que não
gostou?
— não Não !
— então Então , por que está triste?
— não Não estou triste.
Tento sorrir.
Definitivamente não nasci pra para saber esconder os sentimentos
quando não estou bem. Não sou frágil, não sou sucetível suscetível , mas
esconder quando não estou bem ... esse é um segredo que eu ainda vou
aprender a descobri , a praticar , não é comigo. eu Eu não sei
disfarçar quando não gosto de algo, parece que saber aquelas coisas sobre
ele mais cedo , me deixaram extremamente decepcionada.
Algo que eu sei que nem deveria.
— está Está cansada?— cansada? — ele Ele ergue minha
cabeça fazendo com que eu o fite . — D d iga Ana, o que eu fiz?
— é É verdade que já se envolveu com uma mulher casada?—
casada? — pergunto sem saber de onde tirei coragem. incerta.
Acho que não posso esconder isso, nem devo, Mosés me olha
como se estivesse profundamente sido pego de surpresa e fica calado
me olhando, seus olhos se tornam tão intensos quanto uma noite escura,
desvio o olhar primeiro e , abaixo a cabeça, isso é a minha resposta.
— ela Ela não era casada . — E e le responde depois de um
silêncio infinito e tenso . — E e la estava separada na época.
— entendo Entendo . — M m e sinto aliviada, ao menos um
pouco em ouvir isso.
—Ana — E e le faz com que eu o fite segura minha face com
carinho . — E e u disse que tive dois outros relacionamentos.
— eu Eu sei . — E e ntendo sua franquesa franqueza . —
apenas F f oi uma dúvida , apenas. .
— ficou Ficou no meu passado .—Ee le diz e acaricia minha
bochecha com o polegar . — V v ocê é o meu presente.
Faço que sim com a cabeça e coloco a mão so bre b a dele,
mas ainda estou incerta. me sinto ainda contudo incerta.
— tem Tem certeza que quer prosseguir com isso?— isso? —
pergunto . — T t alvez esteja confundindo gratidão com afeição.
—Ana , ... desde que eu te vi na empresa eu já me sinto atraído
por você desde que te vi na empresa — r r evela com cuidado
—apenas não tinha liberdade, e por que eu acreditava que você não
gostava de homens.
Estou realmente chocada com a revelação.
— não Não era m os outros homens, era você!— você! —
respondo e Mosés começa a sorrir contrariado . — D d esculpe.
— é É , eu sei, eu sou amargo e mandão — confessa e me
abraça com vagareza . — C c omo eu odeio estar doente, mal
consigo abraçar a minha mulher direito.
— vai Vai com calma ai aí — reclamo num fingimento só .
— namorada V v ocê disse namorada !
Ele de forma bem ri agora sincerament descontraída e
divertido . , E e stamos no colchão, tomamos café e viemos pra para cá,
me sinto preguiçosa e feliz, não quero ficar longe dele, não quero
desgrudar dele, eu adoro estar com ele, ainda que não conversemos tanto,
ainda que ele não fique puxando assunto, ter sua companhia é muito bom.
— você Você vai me deixar ficar vindo dormir aqui com você ,
não vai? ou Ou isso ou ir pro para o meu apartamento. —E e le
determina, mal parece uma pergunta.
— B b em — E e stou vermelha . — T t alvez!
— talvez?— Talvez? — Mosés repete e toca a minha face com
carinho . —Ana você toma algum contraceptivo?
— ah Ah ... bem... Vai com calma, começamos a
namorar há a um dia!— dia! — brinco Brinco tentando desviar o
assunto.
— podemos Podemos ir a um médico . — Ee le fala fala, mas
não parece constrangido . — Q q uero fazer exames de sangue.
— por Por que?
— é É mais seguro, pra para nós, mim e você não acha?
— cla- C c laro!
Ele me beija, não sei o que falar, Mosés já quer uma vida assim, algo
mais sério, acho que pra para ele deve ser muito banal transar com uma
mulher, pra para ele deve ser como trocar de roupa, claro, é homem,
bonito, bem sucedido bem-sucedido , rico, deve ser mesmo desses que não
fica sem uma mulher por mais de uma semana.
— te Te quero . — E e le fala .— — M m as posso
esperar se não estiver pronta.
—Mosés , começamos a namorar ontem —esclareço
constrangida — A a cho que é o melhor.
— tudo Tudo bem . — E e le toca os meus cabelos me
observando . — V v ocê teve outros namorados?
— disse Disse que não . — E e stou realmente constrangida em
falar isso . — E e u nunca ... nunca namorei de verdade.
— nem Nem o seu crush padeiro?— padeiro? — questiona
com uma ponta de deboche.
— não Não !
Ele começa a rir como se isso fosse muito engraçado, começo a me
sentir incomodada com isso, por que faz parecer que ri de mim.
— vamos Vamos Ana, não precisa mentir!— mentir! — Ele
pede e me solta . — Q q uantos foram?
— como?— Como? — p p ergunto sem graça.
— não Não precisa se envergonhar, alguém como você deve ter
tido vários relacionamentos . — E e le fala com naturalidade.
— não Não tive — respondo e me desvencilho de seus
braços, meu coração começa a ficar apertado . — N n ão sei
por que pensa isso.
— bem Bem , você é uma mulher e tanto . — Ele fala e não
consigo olhar na cara dele . — I i magino que tenha tido alguns
namorados , ... certo?
Mulher e tanto?
"Tanto " = " Gorda"?
Me ergo e saio do colchão, Mosés me olha e parece confuso.
— eu Eu não sou uma qualquer — respondo querendo chorar
.— só Só por que eu sou uma garota gorda , não quer dizer que saio
dando pra para cães, gatos e cachorros!
Mosés fica me encarando como se isso o que acabei de falar fosse
algo... estranho.
— francamente Francamente , achei que fosse um pouco mais
maduro —respondo e nego com a cabeça . — A a cho que você me
entendeu mal.
—Ana , do que você está falando?
— eu Eu não quero ter um relacionamento que só envolve sexo
— falo.
—Ana eu apenas...
— acho Acho que realmente confudimos confundimos as coisas,
acho que isso não pode ser — interrompo —por favor, esqueça tudo
isso.
— Ana!— Ana! — berra berra e dou um pulo — O o que
está acontecendo?
Eu olho pra para ele e faço que não com a cabeça, me sinto
envergonhada, coberta de tristeza, depois abaixo a cabeça e crio coragem.
— eu Eu sou virgem, eu nunca namorei, nem eu se quer beijei um
homem antes de você, você é oa primeir o homem que me deu a
pessoa que me da flores , e que me beija na boca . — A a perto os
olhos, minhas mãos soam . — E e u não estou pronta pra para ter
relações, e acho que nos equivocamos, acho que se confundiu.
— eu Eu não me confundi — fala duramente.
— acho Acho que sim, acabou de debochar de mim!
— debochar Debochar ?
— sim Sim , falou "mulher e tanto tanto, " ou seja, gorda!
Ele não responde, eu o olho e sinto que talvez eu tenha me
precipitado em minha resposta, em crer em tudo isso, talvez eu esteja
sonhando demais com tudo, longe do mundo real onde um homem desses
jamais se interessaria realmente por mim.
—Ana...
— eu Eu vou ser sua funcionária, por favor, esqueça tudo isso...
— você Você me entendeu mal, me desculpe se a brincadeira não te
agradou.
Seu tom é ponderado ponderado, porém ainda muito duro.
— eu Eu não quis falar neste sentido Ana, nem quis insinuar nada do
tipo, apenas achei que...
— eu Eu entendi — corto incerta.
—Ana me escuta, te acho uma mulher e tanto, um mulherão, você
não entendeu realmente, apenas pensei que pelo fato de você ser alguém
com esse corpo , talvez os homens a quisessem —explica .—Ee u
gosto de você assim.
— acho Acho que não sou a pessoa certa pra para você —
digo e sinto como se espremessem meu coração.
— pois Pois eu acho o contrário — retruca bastante sério .
— M m e desculpe, eu não quis dizer isso.
— está Está bem, eu espero que isso não se repita.
— não Não vai se repetir.
— eu Eu vou fazer o almoço.
Ele não responde.
Vou pra para a cozinha muito mais que envergonhada, magoada,
acho que eu me equivoquei em basicamente tudo, melhor ocupar a cabeça,
melhor ficar longe, é o melhor que posso fazer agora .
Capítulo
17
Desmarquei com Sêmora por mensagem, dei qualquer desculpa,
fiquei o resto da tarde no meu quarto, minha amiga nem reclamou, segundo
ela tem muito trabalho pra para colocar em dia com Marcy.
Depois que preparei o almoço , deixei servido num prato coberto
na mesa e vim pro para o quarto, tomei um banho e fiquei quieta, na
minha, deitada . ,A a lgumas vezes senti vontade de voltar pra para a
sala sala, mas me controlei, por que a manhã parecia não passar
enquanto eu fazia a comida, e Mosés estava lá , no sofá sentado vendo
TV tv , eu não olhei na cara dele, me sentia constrangida e magoada,
bem mais que isso na verdade .
Falei coisas sobre mim pra para ele, coisas que só a Sêmora sabe,
eu nunca diria em sã consciência pra para um homem "sou virgem" assim,
alunguns alguns dias despois de conhecê-lo, muito menos que perdi o "BV"
com ele, me sinto tão idiota, mas no momento estava muito magoada com
ele, com as insinuações.
Eu não sou assim, eu não sou este tipo de mulher, se ele pensa que
vai me levar pra para a cama logo assim de cara , está muito enganado,
mal nos conhecemos!
Mal nos conhecemos e eu já estou assim...
Chorei bastante mais cedo, tinha vontade de sumir, de não ter que
olhar na cara dele depois de tudo, me sentia cheia lotada de defeitos, de
problemas, como há a algum tempo não me sentia, me olhei no espelho e
queria poder ser muito diferente disso, alguém monstruosamente grande
com tantas imperfeições, meus seios são grandes, moles, minha barriga
flácida e eu ainda nem tive um bebê, meus braços são grotescos e as
minhas coxas grossas demais, minha bunda então...
Fiquei horas e horas pensando em tudo e não cheguei a à conclusão
nenhuma, hora me sentia exagerada, hora ofendida, começo a sentir
cólica, meu ciclo já está no dia mesmo, coloquei um absorvente mais cedo.
—Ana!
Ele está me chamando.
Percebo que já anoiteceu.
Me ergo e vou até a porta, quando abro me vejo diante de um
pequeno buquê de flores, tem um formato de coração,e coração, e são
flores cor de rosa escuras, fico analisando o pequeno bilhete enfiado nas
flores, e demoro um pouco pra para aceita-las, me pergunto se sempre que
eu e ele brigarmos, Mosés agirá assim, se ele me dará flores.
— leia Leia o bilhete Ana.
Faço que sim, eu o olho e pego o bilheite bilhete deixando o buquê
em meu ant e i braço com cuidado, eu o leio.
Querida Ana, eu francamente não tinha a intenção de magoá-la
de nenhuma forma, eu peço desculpas se f i e z parecer isto , pois , esta
está nunca foi a minha intenção,gosto intenção, gosto mesmo de você,
pedi comida italiana para o nosso jantar, poderia aceitar jantar comigo?
Ps: M m e perdoe.
Sinceramente , seu Mosés.
Ele se considera meu, estou sem palavras.
Olho pro para o cartão e depois ergo o olhar pra para ele, Mosés me
olha muito sério, ele se segura na soleira da porta com uma mão, não
parece tão pior quanto antes antes, mas ainda pálido.
— deveria Deveria ficar de repouso!
— eu Eu não quero ficar de repouso, eu quero que você fique
comigo , minha Ana.
Ele está realmente sério, acho que não quero ter mais atritos, por
hoje me bastou, fiquei péssima o dia todo, por que eu pensei que seria
diferente pra para ele? Ele também deve ter algum sentimento, se não
tivesse nem se daria ao trabalho de me pedir perdão, não diria que gosta
de mim , ... e que é meu gosta mesmo de mim !
— obrigado!— Obrigada! — falo , e guardo o cartão novamente
no buquê . — V v amos, eu te ajudo.
— você Você não comeu nada o dia todo!— todo! — ele Ele
fala e passa o braço e m n volta de mim . — T t ambém não consegui
comer nada.
— deixei Deixei o seu almoço na mesa.
— eu Eu vi, mas realmente não senti fome.
Vamos devagar até a sala, a mesa da sala de jantar está colocada
pra para dois logo que entramos, vejo castiçais, velas acesas, e um clima
um pouco mais romântico do que estou acostumada, a luz da sala de TV
tv está apagada assim como as demais, o que ilumina o lugar são as luzes
da cidade, a mesa posta com taças, pratos, meus talheres, tem um vinho no
canto da mesa, estou surpresa em ver isso tudo.
— fez Fez tudo isso só?— só? — pergunto incrédula.
— sim Sim , o restaurante só trouxe a massa . — E e le diz . —
S s ão seus castiçais, achei eles no armário , e as velas, os pratos.
— não Não deveria se esforçar tanto — replico, sei que são
as minhas coisas.
Eu ganhei esses castiçais da minha mãe quando ela veio nas minhas
últimas férias, mamãe acha que preciso estar pronta pra para quando o
cara certo aparecer, pra para recebê-lo em um jantar romântico, essas
coisas.
— eu Eu quero que você fique bem , Ana.
— eu Eu estou bem.
— sabemos Sabemos que não.
Suspiro.
Ele se inclina e me abraça, tem um pouco de força, mas com o
esforço vejo que sente dor, contudo não quero sair de seu abraço, não
quero me afastar, acho que me apego muito rápido ao meu enigmático C c
hefe . , Mosés Handerson é um homem tão diferente do que eu pensei,
por um lado silencioso, por outro carinhoso em alguns aspectos, isso me
confunde um pouco.
— eu Eu não sei como demonstrar sentimentos Ana, eu nunca
namorei uma pessoa como você antes.
— gorda Gorda .
— cheinha Cheinha !
— essa Essa é a forma mais sútil de chamar uma garota GG gg
de gorda, daqui a pouco vai me chamar de fofa.
Mosés me olha bastante sério, toca as minhas faces com carinho,
depois se inclina e me beija lentamente, não me afasto, mantenho o meio
abraço enquanto nos beijamos, ele é apenas um pouco mais alto que eu,
mas sei que devido a doença se curva bastante.
— me Me desculpe, eu a ofendi!
— acho Acho que foi mesmo um grande mal entendido mal-
entendido .
— não Não era a minha intenção.
— eu Eu li o cartão.
— mas Mas estou falando, eu não queria te ofender Ana, você pra
para mim é uma mulher linda e perfeitamente normal.
— tem Tem certeza?
— absoluta Absoluta .
Levo meu buquê com uma mão e o ajudo a caminhar com o outro
braço, Mosés se senta na cadeira de frente a que colocou os pratos, num
canto da mesa as refeições estão em vasilhas descartáveis de tampa,
também tem uma garrafa de água dentro do balde de vinho.
— pedi Pedi macarrão com dois molhos, sua amiga Sêmora me
disse que é o seu prato predileto.
— disse Disse pra para ela sobre nós dois?
— não Não , eu apenas liguei pra para ela e perguntei o que você
gosta de comer, queria te dar uma noite agradável.
Ufa!
Eu mesma quero falar isso p a ra Sêmora , ... se ainda
continuarmos com isso , é claro.
— ela Ela não deve saber , Ana?— Ana? — pergunta ele logo
que me sento diante dele . — Q q ual o problema?
— eu Eu mesma vou falar pra para ela, ainda não tive tempo, se
claro se não se importar, é claro. Sêmora é como uma irmã pra para
mim.
— eu Eu não me importo, inclusive falei de você pra para a Safira
hoje a à tarde, ela quer conhecer você.
Nossa!
— quero Quero que você saiba , que não quero manter segredo
do nosso relacionamento.
— talvez Talvez as pessoas estranhem.
— talvez Talvez eu não dê a mínima pro para o que as pessoas
falam.
Isso é meio arrogante, mas eu sei que ele faz bem esse tipo,
Mosés Handerson não parece ser do tipo que ouve ninguém . Eu estou
feliz agora , contudo estou contentada , pois , percebo que ele
realmente não tem vergonha de mim, ele não se importa com o que os
outros irão falar.
— na Na empresa não — deixo claro . — L l á é local de
trabalho.
— concordo Concordo plenamente, mas Safira é a minha irmã,
podemos conhecer os seus pais, eles são daqui?
— meu Meu pai morreu, como já disse, mamãe mora em outro
estado, mas ainda acho meio cedo.
— não Não quero que pense que sou um mal carater caráter ,
Ana.
Ele está se referindo a minha virgindade... fico terrívelmente
terrivelmente vermelha.
— vamos Vamos jantar Ana , quero algo agradável , Ana. .
Acabo por concordar.
— sim Sim , com certeza.
Eu o sirvo.
Mas ao invés de lhe servir vinho, lhe sirvo a agua na taça, coloco
vinho pra para mim, depois pego o macarrão espaguetti espaguete , ele até
teve o cuidado de colocar pegadores, as conchas, colheres maiores, acho
que Mosés já conhece suficientemente minha casa, ou deve ter conhecido
hoje a à tarde enquanto eu estava trancada em meu quarto.
Me sirvo sirvo, mas não coloco muito, ele também não anda com o
apetite lá essa coisas essas coisas .
— quer Quer qual molho?
— um Um pouco de cada um, se sirva de mais Ana, é muito pouca
sua comida.
— eu Eu estou realmente sem apetite.
—Não me faça me sentir culpado está bem? Não mais do que já me
sinto.
Suspiro e coloco um pouco mais de espaguetti espaguete pra para
mim, sirvo os molhos pra para ele, as mãos dele estão sob re a mesa,
Mosés me olha atentamente, trocamos olhares olhares, mas não falo nada,
acho que não temos tanto a falar.
— você Você havia me dito hoje cedo que nunca namorou...—
Mosés pigarreia , e eu o fito totalmente nervosa . — Q q uero algo
mais sério com você Ana.
— eu Eu sei disso, já falou antes — replico meio que
apressada . — N n ão quero...
— devemos Devemos falar disso , Ana . — M m e interrompe
. — E e u não queria ofender você, é que eu nunca namorei ninguém, tão
pouco alguém tão inesperiente inexperiente .
— imagino Imagin o — falo por que sei que nem todos os
homens do mundo são virgens . ... H h omens virgens praticamente
não existem, ele tão pouco , seria um cara sem experiência.
— não Não imaginei que você fosse tão inocente .— retruca
bem sério.
— eu Eu não sou inocente—replico sem graça — Aa penas
estou esperando o cara certo.
Pego a colher e o garfo, bebo um pouco de vinho, não sou boa em
falar sobre isso nem com a Sêmora, ela sabe como eu sou, mas enfim, ele
é o meu namorado , ... certo?
— o O que posso fazer pra para ser esse cara?— cara? — ele Ele
pergunta e começa a enrolar muito lentamente o macarrão no garfo com o
auxílio da colher.
Como você é direto!
— não Não sei . — Eu dou de ombro ombro, mas a tensão me
inquieta tanto que eles parecem mais duros . — V v ocê quer ser esse
cara?
— se Se você permitir , sim .— Mosés diz com certa timidez
. — V v ocê quer casar , Ana?
Acho que já pode me levar , Deus... M m e tira daqui, por favor,
nunca te pedi nada , nada !
— eu Eu não penso muito nisso .—S s ou franca — E e
você?— você? — não Não resisto em perguntar.
— não Não é a minha prioridade nesse momento .— Mosés
leva o garfo a boca com muita educação.
Como minha primeira garfada de macarrão.
— então Então , perder a virgindade pra para você antes do
casamento não é algo importante?— importante? — ele Ele limpa os
cantos da boca com lentidão, se esforça bastante pra para isso.
— acho Acho que perdeu a graça depois que eu percebi que os
homens não dão valor a essas cois as, eu procuro me preservar
por que como nunca namorei, nunca senti desejo carnal por ninguém .
— E e u o observo mastigar lentamente o macarrão que acaba de colocar
na boca . — E e ntão , acho que não é tão importante se casar virgem.
— hum Hum ...— Ee le limpa os cantos da boca com cautela
novamente . — E e u não penso assim, Safira não é mais virgem, ela
perdeu com dezesseis anos.
Não acredito que você sabe sobre a vida sexual de sua irmã e age
como se isso fosse normal.
— fiquei Fiquei furioso quando ela me falou, mas como não temos
pais , eu e ela e eu sempre tentamos nos cuidar , ou cuidar um do
outro . , E e la por ser mais nova , as vezes é meio inconsequente . —
E e le diz e bebe um pouco de água . — M m e desculpe , Ana, acho
que te assusto com o assunto assunto, mas é que eu sou o único pai que a
minha irmã conhece desde que nasceu.
— parece Parece uma carga um pouco pesada , não acha?—
acha? — questiono um pouco triste em ouvir isso.
— já Já passei por muitas coisas na vida, algumas coisas eu
procurei, mas muitas dela simplesmente aconteceram — revela ele
mexendo no macarrão sem interesse . — Le le mbro de uma vez quando
eu era pequeno... se importa se eu falar sobre mim?
— não Não , claro que não .—M m elhor mudar o rumo do
assunto.
Não, não quero falar da minha virgindade, obrigad a o .
— lembra Lembra dos meus primeiros pais?
— os Os ... necrófilos?
— sim Sim , esses mesmos . ,E e les muitas vezes me
castigavam muito quando pequeno, me deixavam com fome por horas
quando tinham plantão, e eles tinham dois cachorros .—E e le fala e
percebo um enorme receio em seu olhar... medo .—C c erto dia, me
esqueceram de me dar comida por dois dias inteiros, quando brigavam
eles descontavam em mim.
Pisco completamente fora de órbita.
— eu Eu já sofri muito Ana, não gostaria que Safira sofresse.
— eles Eles batiam muito em você?
— não Não , eles me deixavam com fome trancado num quarto
escuro, e quando eu chorava de fome eles...—Mosés faz uma pequena
pausa, seus olhos azuis focados no prato de comida, ele está muito, muito
distante daqui —... m m e davam a ração do cachorro pra para comer.
Fico em meu choque olhando pro para o homem diante de mim,
seu olhar é fechado, distante, focado, parece perdido em lembranças, e eu
estou perdida numa dor intensa no peito, dentro de minha mente começa a
rodar um filme novamente, uma criança pequena e indefesa chorando de
fome, passando fome, tracado trancado num quarto escuro pedindo
comida, um pouco de amor , ... e tudo o que tem é fome, e quando lhe dão
comida o tratam como a um animal lhe dando ração.
— eles Eles cuidaram de mim como se cuidassem de um animal,
na frente dos amigos e da família eram excelentes pais, mas quando
estavamos estávamos apenas nós em casa , eles não cuidavam de mim,
me negligenciavam , ... ao menos depois que eu fiz um ano . — Mosés
fala e depois lentamente ergue a cabeça, me fita .—Ee u não tenho a
intenção de que fique com pena de mim Ana, apenas estou contando um
pouco da minha vida.
— eu Eu sei que não .—Tt ento disfarçar a compaixão que
tenho se dissipa dentro de mim, jamais imaginei que ele houvesse
passado por isso . — E e les não merecem ser chamados de pais.
— estão Estão presos, este é o meu conforto . — Mosés
estende a mão.
Ele ergue meu pulso, e puxa a minha mão, depois a beija com
gentileza.
— eu Eu espero Ana, o tempo que for, sou paciente!
O assunto "pais adotivos Monstros" acabou.
— mas Mas você v ai em pro para o meu apartamento , ... ou
eu venho pro para o seu , está bem?
— tem Tem que ser todos os dias?
Ele me olha e parece decepcionado.
— é É que eu gosto de estar com você, conversar com você.
Algo dentro de mim se derrete.
— sempre Sempre fui só Ana , eu nunca tive alguém ao meu
lado, confio em você e quero você sempre por perto , Ana. .
— ficaremos Ficaremos juntos o dia todo no escritório.
— não Não será a mesma coisa.
— você Você está sendo muito dramático.
— acho Acho que não me sinto tão bem pra para voltar, a dengue
está me deixando meio tonto, meu coração fica disparando, olha .—Ee
le puxa a minha mão e me inclino pra para a frente de repente.
Mosés coloca a palma da minha mão em seu peito, aqui bate um
coração muito rapidamente, as batidas são tão fortes que me espanto.
— viu Viu ? preciso Preciso que venha todos os dias pro para o
meu apartamento , minha Ana .—Ee le fala e beija a minha mão com
carinho . — P p or favor, não vai te arrancar pedaço.
—Mosés...
— eu Eu venho!— venho! — determina d etermina teimoso
—Ana a resposta ainda é não .
Nem tenho da tempo de reclamar, volto a comer o meu
macarrão, Mosés Handerson é um cabeça dura, e eu sei que se rebater
sempre ao que ele fala , vamos ter dezenas de brigas diariamente, ao
menos por agora vou deixar que ele pense que venceu a discussão, logo
que ele melhorar conversaremos novamente sobre isso.
— podemos Podemos ir mês que vem conversar com a sua mãe,
quero conhecê-la, pedir sua mão pra para ela.
Arregalo os olhos.
—Mosés isso é muito antiquado.
— que Que eu te peça em namoro pra para sua mãe?
— sim Sim ?
— besteira Besteira , tenho certeza de que ela vai gostar de mim,
como ela se chama?
— Helena Helena, mas...
— o O nome da minha nova sogra, Helena!
Largo os talheres no prato e cruzo os braços emburrada, ele não
está me ouvindo.
— por Por favor , Ana , me deixa ... me deixa ser ao menos um
pouco normal na vida, para com isso.
— você Você é normal, normal e chato.
— melhor Melhor se acostumar com o seu namorado , Ana.
Acho meio difícil, mas nem me dou ao trabalho de responder,
agora ele está agindo como realmente é, quem ele é, Mosés Handerson, o
meu C c hefe.
— coma Coma , minha Ana.
Pego os talheres e respondo a contra gosto:
— sim Sim , senhor Senhor !
Capítulo
18
Estamos abraçados.
Lá fora chove e acabo de acordar.
Dispertei Despertei com o toque dele em minha nuca, isso é muito
relaxante, quero ficar quietinha, esta está mais frio hoje, ainda bem que
peguei cobertores pra para que possamos nos proteger. Mosés me beija a
cabeça e se inclina colocando a boca na minha, quero sorrir, ele me beija
com carinho, tão lentamente, meu coração se acelera um pouco e o
correspondo da mesma forma.
Eu o abraço e Mosés solta meu cabelo do coque, sua mão se enfia
neles com naturalidade, sua boca explora a minha com essa experiência
que me deixa fora do ar, por alguns momentos meu estômago esfria e me
sinto totalmente bem, tranquila, estar com ele é ... inexplicavel
inexplicável .
Minha mão toca sua face, a barba pinica as ponta dos meus dedos,
ele arranha os cantos da minha boca enquanto me beija beija, mas não me
importo, a sensação me causa arrepios por todo o corpo.
— B b om dia , minha Ana.
— B b om dia , Mosés.
Nos beijamos mais uma vez.
— fica Fica mais um pouco comigo aqui . — Ele pede baixinho.
— sente Sente muita dor no corpo ainda?— ainda? — pergunto
me acomodando de lado.
— U u m pouco, minha cabeça já não dói tanto.
Beijo sua face, seu pescoço, gosto disso, gosto muito disso.
Mosés fica de lado e m e a abraça me puxando pra para junto
dele, apoio a cabeça no travesseiro, nossas faces ficam bem próximas, ele
me olha afastando meus cabelos pra para trás da face , tenho a sensação
de que ele me admira muito ou coisa assim, Mosés esta está tão ...
sereno.
— ainda Ainda está brava por ontem?
— não Não .
A raiva passou quando viemos p ara o colchão e ele ficou me
abraçando, Mosés me beijou e me abraçou feito uma criança que
precisava de um pouco de atenção . , T t entei compreendê-lo, por que
afinal, conversamos sobre seu passado, sua infância triste, depois tivemos
uma pequena DR sobre nós, e acabou que comemos o resto do macarrão
e bebi mais duas taças de vinho, por pura ignorância, é claro . , E e stava
brava por que ele quer determinar as coisas na minha vida, eu também
nunca estive com alguém p a ra saber exatamente como as coisas
funcionam, acho que me acostumei a estar sempre só e fazer das minhas
regras tipos de leis impenetráveis por ninguém. É difícil deixar alguém
literalmente entrar na minha vida , e querer mudar isso, principalmente se
essa pessoa é o meu C c hefe, mas acho que uma coisa não tem nada a
ver com a outra.
— você Você é muito bonita .—Ee le fala me fitando .—S
s eus olhos são lindos , Ana.
— os Os seus também . — E e les são de um azul lindo, Mosés
é o conjunto completo . — N n ão pensei que fosse Inglês fosse inglês .
— hum Hum ...— E e le toca o meu pescoço e sinto um
friozinho na barriga, depois sua mão desce pra para baixo do cobertor e
lentamente ele começa a acariciar minhas costas . — E e u sou.
— era Era bom morar em Londres?— Londres? — gosto
Gosto do toque, me deixa relaxada.
— sim Sim .— Mosés pisca devagar . — Vv ocê vai me
deixar conhecer sua mãe?
— que Que drama , meu Deus— reclamo reclamo, mas estou
tão calma que duvido que ele se sinta mal por isso . — Mosés...
—Ana , ... eu quero um compromisso que envolve algo mais com
você, não quero que pense que eu quero me aproveitar de você.
— conhecer Conhecer a minha mãe não vai mudar as suas
intenções iniciais de se relacionar sexualmente comigo , Mosés.
— Olha, eu queria q ueria mesmo que as minhas
intenções se baseassem apenas em sexo , Ana, assim eu não ficaria
pensando em você 24 vinte quatro horas por dia, como vem sendo
desde que te conheci.
Olho p a ra baixo e mais uma vez fico sem palavras, acho que
não me permiti conhecer Mosés profundamente na empresa, nem ele
deixou, ele se esconde por trás de um muro de indiferença e arrogância ,
que não permite que ninguém o veja como realmente é, ele é romântico,
sincero e verdadeiro, ao menos comigo .,S s into como se dentro de
mim ele rompesse com isso , uma dezena de conceitos ao seu respeito, e
fico me perguntando até quando ele me surpreenderá com sua forma de
ser comigo.
— isso Isso não tem a ver com sexo Ana, isso tem a ver com o que
eu sinto, e eu não sou assim, você mexe muito comigo.
— por Por que eu o desprezei? por Por que não cai aos seus pés no
primeiro olhar?
— acho Acho que por que você é muito diferente de todas as
mulheres que conheci.
— diferente Diferente como?
— você Você é generosa e bondosa Ana, você não precisava
cuidar de mim quando adoeci , nem mandar sopa pra para mim, ainda
mais depois da forma como te tratei.
— as As mulheres com quem se relaciona não são assim? não Não
ajudam as pessoas?
— não Não .
Penso por alguns momentos.
— então Então isso não é culpa delas, é sua culpa por escolher
permitir que elas entrem na sua vida.
— não Não podemos escolher de quem devemos gostar , Ana, você
me ensinou isso.
— não Não quero que goste de mim apenas por gratidão.
— poderia Poderia ser não acha? assim Assim eu não ficaria feito
um retardado esperando que olhasse ao menos na minha cara no
escritório.
Ele se irrita, quero sorrir, faz mensão menção de se afastar e eu o
puxo de novo pra para mim, o beijo, e Mosés faz cara feia enquanto me
beija, os olhos azuis na minha boca, me beija de novo e mais uma vez, ele
vem meio sem jeito pra para cima de mim, e seu peso me afunda no
colchão, me beija e toco suas costas correspondendo-o, seu beijo é lacivo
lascivo , intenso, me rouba o ar dos pulmões agora.
— você Você é uma teimosa , Ana Beatrice.
— já Já falamos sobre o meu sobrenome , certo? não Não
haviamos havíamos superado isso?
— então Então você quer um apelido carinhoso , é isso , Ana
Beatrice?
Sorrio contrariada, ele me ignora completamente, Mosés sabe como
me dar um gelo muito bem quando quer.
— qual Qual prefere?
— apenas Apenas Ana.
— estava Estava falando aos nossos apelidos , Ana.
— precisamos Precisamos de apelidos?
— claro Claro que precisamos.
Ele não está brincando, mas enfim, devo discutir? comepensa
Compensa ? adianta Adianta ?
— me Me deixe pensar , então — sugiro e toco os ombros
dele, algo me ocorre e sorrio.
— não Não gostei desse sorriso — fala desconfiado.
—Mosés... Momo!— Momo! — sugiro , e imagino o veneno que
escorre dos lados da minha boca.
—Momo — repete e as sobrancelhas dele se erguem .—S
s ério?
— Cc laro, apelido carinhoso, namorados, toda essa coisa , ora
— respondo e faço caracóis com a barba dele . — N n ão?
— ok Ok —Mosés me fita com a mesma maldade que costumo
perceber quando ele está chateado . — Beatrice... Bebê!
Paro de sorrir nesse momento, e ele quem começa a sorrir, assim
muito cheio de si.
—Bebê é latino...
—é É o seu apelido , minha Bebê — corta — V v ocê
começou , minha bebê.
Ai que raiva.
Ai que ódio.
Esse homem tem solução p a ra tudo? Pensa em tudo?
— Aa doro te ver brava , minha Bê . — E e le sorri e me
abraça , beijando meu pescoço.
—Mosés , ... eu es to u brava , ... para com isso...
Estou tentando me manter brava, mas ele beija o meu pescoço e o
meu estômago gela, meu corpo todo se arrepia, ele me ignora e continua a
beijar meu pescoço, sobe e beija o cantinho atrás da minha orelha, depois
desce p a ra minha garganta, e sobe p ara o lado esquerdo . beijando
meu pescoço aqui também.
— N n ão funciona ficar brava comigo , minha Bebê —retruca
sussurrando bem próximo da minha orelha, o calor de suas palavras
deixam o calor de suas palavras deixa meu corpo arrepiado de
ponta a ponta.
— não?— Não? — repito tão mole quanto uma gelatina . —
P p ara de me seduzir!
Tento ter força de persuasão persuasão, mas meu corpo não
obedece.
— querida Querida , você não sabe o que é sedução . — E e
le sussurra novamente muito próximo da minha orelha . — V v ocê não
me conhece , Bebê.
Ele fala a útima última palavra com um pouco mais de
intensidade, Mosés se abaixa lentamente e puxa a minha perna pro para
o lado, depois vagarosamente ele se esfrega em mim, nossos corpos
grudados, e ainda que ambos estejamos usando moletom sinto sua rigidez
no meio das pernas, afundo n o colchão a cama com a sensação, isso
é bom.
Me encolho e ele fica parado enquanto me beija, meus quadris vão
p a ra baixo enquanto ele pressiona a pelvis pélvis contra minha com
força, seus beijos são mais ardentes, uma mão se mantém acariciando
minha coxa enquanto a outra aperta a minha orelha suavemente e faz
carinho na minha nuca, Mosés deixa a minha boca e desce pro para o
meu pescoço novamente , minhas mãos estão perdidas em suas costas,
quero tocá-lo, quero ... senti-lo.
— quero Quero brincar um pouquinho com você , minha Bebê
. — E e le sussura sussurra no meu ouvido . — E e quando eu
melhorar completamente , faremos isso.
— sim Sim — falo quase sem voz, estou com um calor
insuportável correndo meu corpo, até os cabelos da cabeça estão
ouriçados.
— você Você não faz ideia do quanto eu te quero .—Ee le
morde minha orelha lentamente . — T t e quero.
—Mosés...— E e stou sem folêgo fôlego , meus quadris
sobem devagar . — P p ara...
— não Não estou fazendo nada , querida — protesta
malicioso — você quem está se movendo , Ana.
Me dou conta do que realmente acontece e paro, estava me
esfregando involuntariamente nele, e isso foi tão ... gostoso.
— safado Safado — acuso paralisada .— você Você
está doente mesmo?
— claro Claro que estou doente . — Mosés reclama e me
fita . — S s ó que eu sou homem , Ana.
Estou muito vermelha, coberta de vergonha.
— não Não precisa ficar envergonhada — replica — Vv
ocê é a minha mulher.
— eu Eu jamais faria...
—Ana, Não!— Não! — interrompemuito sério . — E
e stamos juntos, isso é normal, estou excitado, você também, é normal que
fiquemos nos sintamos assim e...
— ok Ok — corto constrangida— constrangida. — V v
ocê gosta de ficar explicando as coisas , não é mesmo?
— pra Para mim é comum falar sobre sexo com todas as
minhas parceiras.
— sei Sei .
Ele teve várias parceiras... isso me irrita.
— você Você está com ciúmes?
— não Não pode sentir ciúmes também não ?
—é É que você é sempre tão ... distante.
— assim Assim como você.
—Ana Beatrice!
Isso soa como: Pare agora.
Acabo por rir da surpresa dele, tento deixar o constrangimento de
lado.
— está Está bem, mas agora não tem outras parceiras.
— tenho Tenho você.
Ele é tão bonitinho quando é fofo...
Aperto suas bochechas, isso é automático, Mosés sorri de lado e me
abraça.
— minha Minha Bebê.
— tomara Tomara que dê dengue outras vezes.
Mosés ri colocando a cabeça em meu ombro, enfio a mão em seus
cabelos e beijo sua cabeça.
— desde Desde que cuide de mim, tudo bem.
— espero Espero que eu seja a única que que cuida de você
, senhor Senhor Handerson.
— acredite Acredite , você é.
Eu sei que sim.
Capítulo
19
Escuto o som da porta da cozinha e dois segundos depois Sêmora
está entrando no meu apartamento, olho p a ra ela e vejo as sacolas de
mercado em suas mãos, ela olha e m n volta espantada com o tanto
de flores. , claro, flores, não Não é do meu feitio manter a casa assim
tão decorada com plantas, como não tenho tempo no meio da semana p a
ra manter e organizar , eu não compro muitos vazos vasos , a única
planta que trouxe do antigo apartamento é um cactus cactos .
Sêmora olha na direção da sala e Mosés olha p a ra ela
mastigando seu misto quente, acabamos de levantar, vim p a ra cozinha p
a ra preparar o nosso café, estou fazendo ovos p a ra mim e café, dei um
copo de leite p a ra ele.
— B b om dia ,e E stranha! — Sêmora fala e sorri
constrangida.
Ambas não estamos acostumadas a ter um homem por perto que
não seja Trevor , ou alguns rapazes do escritório em alguma
eventualidade.
— B b om dia —digo desconcertada e lhe dou um meio abraço,
sei que ele nos observa.
— B b om dia , senhor Senhor Handerson . — Sêmora fala
deixando as sacolas na mesa.
— B b om dia , senhor Senhor ita Sêmora . — E e le fala de
onde está.
— F f olga . — Sêmora diz abrindo as sacolas . — T t rouxe
os ingredientes p a ra uma lasanha.
Nem me dei conta de que hoje é sábado.
— bom Bom — afirmo.
— a A massa é sem glutén glúten , a Marcy disse que o
senhor Senhor Handerson é alérgico a uma porção de coisas— E e la
explica e vem pra para perto do fogão . — Q q uer uma ajudinha com
a casa?
— seria Seria ótimo, ainda não terminei de organizar a mudança
— falo com franquesa franqueza .
Sêmora parece bem humorada bem-humorada e feliz, aposto
que é pelo pelo fato de que não est ar á mais sob a coordenação e
ordens de Roni.
— V v ocê está bem? — questiona Sêmora ao meu lado . —
A a cho que esses dias em casa te fazem bem, sua pele está até melhor ,
Bea.
— bom Bom — digo e desligo a chama do fogão .—C c
omo está sendo o meu quase cargo?
— E e u gosto do trabalh o. o — E e la diz muito discretamente
. — N n ossa, ele acorda todas as manhãs assim , tão lindo?
Não queira saber como é acordar ao lado dele , ... juntinha dele
, Sêmora...
— E e ssas flores , ... ele mandou p a ra você?
— É é , brigamos algumas vezes.
—Marcy quem pediu, queriamos queríamos muito saber quem
era a sortuda.
— foram Foi pra para mim.
Sêmora franze a testa enquanto tira o casaco, ela usa um vestido
de malha mais justo, sapatinhos de salto, os cabelos ruivos estão soltos e
seus olhos azuis mais redondos que nunca, ela se maquiou e está como
sempre muito bonita , como sempre. .
— ele Ele me ligou ontem perguntando qual seu prato predileto.
—é É , ele me disse.
— então Então. — Sêmora fala meio estranha . — Mme
fala do beijo ... com o Vagner.
Olho pro para o rumo da sala, ele assiste TV tv
tranquilamente.
— N n ão beijei o Vagner —digo nervosa .— e u e o senhor
Senhor Handerson e eu, estamos namorando.
Sêmora pisca de repente, depois ela puxa a cadeira e se senta
parecendo em choque, acho que ela não esperava receber uma notícia
assim tão cedo, ou tão rápi do, mas acho que muito mais
por que ela sabe que antes de tudo acontecer eu odiava Mosés, Sêmora
me conhece.
—é É muito feio mentir . — Sêmora fala depois de um tempo.
— eu Eu não estou mentindo —respondo incerta .— Mosés
e eu estamos namorando.
— francamente Francamente , amiga ... acho que você
deve ter confundido as coisas .— Sêmora fala espantando a surpresa .
— A a miga , talvez esteja meio que iludida.
— não Não estou . — S s abia que ela diria algo assim . — D
d everia ficar feliz por mim.
Por que eu pensei que ela ficaria feliz por mim? que Que
acreditaria? E isso realmente me magoa, com uma proporção bem maior
do que Sêmora imagina. Me sirvo e termino de fazer o café, encho duas
canecas sem olhar na cara dela, Sêmora começa a desfazer as sacolas
das compras toda sem graça, coloco as canecas e o prato com ovos
mexidos e vou pra para a sala.
Por que é tão impossível que acredite que ele me queira? talvez
Talvez eu não seja a garota mais magra e linda do mundo mundo,
mas eu não sou das piores.
Me sento no sofá ao lado de Mosés e lhe estendo a caneca, junto
as pernas, e apoio o prato deixando a bandeja com a minha caneca na
ponta do sofá, começo a comer e estou tão contrariada que mal sinto o
gosto dos ovos direito , observo a Sêmora entrando entrando n n o
meu apartamento como se estivesse arrependida ou coisa assim, deve
estar, sabe que me magoou.
— o O que foi bebê?
— nada Nada !
— discutiram Discutiram ?
— não Não .
Mosés suspira e passa o braço envolta dos m eus ombros,
soluço, e não é por que eu quero, depois começo a chorar em
silêncio, só de imaginar que havia pensado que ela ficaria surpresa —
de uma forma boa é claro — eu me sinto uma grande idiota, não havia
outra forma de dizer p a ra Sêmora que estou namorando, contudo, ela
meio que fez piada sobre isso e estou magoada com ela.
— o O que foi minha bebê?
— nada Nada , eu só estou meio sensível, TPM.
— ah Ah .
Mas ele não está muito convencido, Mosés me beija a face e a
cabeça, me inclino e fico encostada nele, me sinto tão ... tão... inadequada
pra para ele.
—Sêmora disse algo que te magoou , tenho certeza.
—Mosés , ... você tem certeza de que quer ficar comigo? de De
verdade?
— claro Claro que tenho, e o meu apelido não é Mosés.
Reviro os olhos e limpo as faces, ele se inclina e me beija de leve,
correspondo aos beijinhos levemente.
— não Não fala essas besteiras , minha bebê — pede
baixinho.
— Ok. ta — Eu beijo ele mais uma vez . — M m eu Momo.
Ele sorri, fico sem jeito e me viro p a ra TV tv , volto a comer
meus ovos mexidos, não preciso provar p a ra Sêmora que eu e Mosés
e eu estamos juntos, se ela não quer acreditar o problema dela.
— gostei Gostei desse apelido . — Mosés fala com um
sorriso doce nos lábios.
—é É , são feios feios, mas são nossos — concordo e ele
me beija mais uma vez . — M m eu M m omo.
— E e u me sinto um panaca bobo, louco por você , bebê . —
ele Ele sorri e isso é muito sincero . — G g osto de você Ana, de
verdade . , não pensei que não é por que é.
— eu Eu também gosto de você — digo e seguro sua mão .
— T t em , ... tem certeza que não é compaixão , Mosés.
— compaixão?— Compaixão? — pergunta e seu
semblante se fecha . — D d e que?
— por Por mim . — Eu t t ento sorrir sorrir, mas não
consigo . — T t alvez tenha ficado com pena de mim.
— pena?— Pena? — pergunta incrédulo . — Ana não sinto
pena de você, gratidão sim, mas sei separar as coisas.
— T t em certeza...
—Ana , eu sou homem , e não uma criança, por favor , pare
com isso . , eu Eu não ficaria com você por nenhum outro motivo além
dos que eu te disse, você se menospreza demais.
— desculpe Desculpe , é que eu nunca namorei ninguém,
ainda mais alguém tão importante e diferente de mim.
— eu Eu sei sei, mas eu já disse que gosto de você, isso não
tem a ver apenas com aparência Ana, eu não sou tão superficial assim
como você pensa.
— não Não pensei isso de você...
— então Então , por que esses questionamentos?
Não respondo, Sêmora entra na sala usando um mini shorte
short jeans e uma regata apertada, os cabelos presos num coque, não
gostei do tamanho desse short...
— por nada Por nada — respondo sinceramente ,
decepcionada com Sêmora.
Mosés me puxa pela face e do nada me beija, assim muito ríspido,
me beija com força, me sinto novamente fora de órbita, meu coração
começa a pular no peito, ele é intenso, tanto que quando se afasta estou
sem fôlego e nossa bocas nossas bocas estão absolutamente
vermelhas.
— pronto Pronto —fala e toca a minha face .—Aa gora ela
já sabe que namoramos, algo mais que não tem coragem de falar pra
para sua amiga?
Estou fora do ar, meio tonta.
— hum Hum ...— pigarreio . — A a cho que não.
— Ó ó timo . — E e le me beija mais uma vez , mas bem
devagar.
Cada beijo com ele é fascinante e gostoso, diferente.
— A a gora come — ordena se afastando um pouco .—T
t udo.
Faço que sim com a cabeça, bebo um pouco do meu café e volto a
comer, acho que não preciso provar mais nada p a ra Sêmora,
por que afinal de contas, eu peso 94 quilos e não preciso usar um short
jeans do tamanho de uma calcinha p a ra me exibir, e o meu namorado
gosta de mim assim, uma garota GG. Se ela não acredita , esse não é um
problema meu.
— M m e sinto estúpida.
— não Não me dirija a palavra , Sêmora.
— me Me desculpe Bea, eu... eu... ai aí eu fui tão burra!
Estamos no quarto de hóspedes organizando algumas caixas,
Sêmora me analisa e cobre as faces completamente vermelha.
— me Me desculpe Bea, poxa eu... eu me sinto uma grande
idiota.
Eu sei que ela é sincera.
— ele Ele me mandou trocar de short!
Daquele jeitinho especial dele , ... nem quero imaginar.
Mas sinto vontade de rir, Mosés é muito direto, e isso incomoda
muitas pessoas com certeza, mas quando se trata de pessoas que não
estão acostumadas provavelmente devem morrer de vergonha mesmo.
— disse Disse que talvez não fosse adequado eu ficar com algo
assim pois ele era homem e vocês dois estão namorando, que talvez você
se sentisse incomodada com isso.
Ela já andou com muito menos no meu apartamento
apartamento, mas francamente, acho que hoje ela passou todas as
fases do bom senso usando algo tão justo, e no fundo me sinto orgulhosa
dele ter dito isso.
— você Você vai m n e descupar desculpar ?
— talvez Talvez mais tarde .
Ela sabe que não vou ceder tão rápido, e não quero nb e mn
pensar e m n q uan ua b do estiver com a cabeça mais fria.
Acho que o almoço de hoje foi o mais constrangedor da vida da
Semora Sêmora , ela definitivamente travou depois que viemos pra
para a cozinha, estava totalmente deslocada e envergonhada por tudo,
percebia em seu olhar uma vergonha profunda.
Moses Mosés foi apenas muito educado com ela, não tratou
nem destratou ela, também não senti como se ele a a oprimisse, mas
acredito que pra para rla ela tenha sido muito infeliz receber um
sermão por conta de roupa curta , e justo de um homem. Semora
Sêmora foi embora logo depois do almoço, Não almoço, não
trocamos mais que duas palavras .,
Isso meio que me fez pensar numa centena de coisas.
A primeira delas é: existem mesmo homens que gostam de
gordinhas?
Fique i me questionando indagando sobre isso por toda a
tarde, não me sinto equivocada quanto as minhas dúvidas em relação ao
Mosés mas tenho minhas dúvidas quanto a tudo em si.
Eu sempre acreditei que um relacionamento entre um homem lindo
e uma mulher envolvessem apenas a aparência, o aparência, o
status, o status, o que as pessoas queriam aparentar ser e não o que
elas realmente são. Tive medo de me envolver com alguém por conta
disso, e esses são conceitos meus, pois , vivi cercada toda a minha vida
por pessoas magras, bonitas e magras, pobres e magras, ricas e magras,
feias e magras... enfim.
Tiro pela minha mãe, ela é de um todo alguém bonita de corpo, é
uma mulher completa, em forma, e nunca precisou se embelezar demais p
a ra ficar bem, simplesmente é magra, tem seios pequenos e durinhos—
os seios da minha mãe são perfeitos — e uma estatura mais baixa que
a minha, minhas irmãs nem se falam, são mulheres magras, tem pele de
pêssego e são vaidosas, elas são tudo o que eu nunca fui.
Acho que a única obesa da família sempre fui eu.
Minha única amiga GG de verdade foi a Sêmora, mas ela cansou
da batalha, sempre tendo que ir a lojas de números maiores, cansada de
procurar modelitos—modegordos como costumo falar — parecidos
com os das garotas que vemos nos comercial nos comerciais da TV
tv , sempre sendo a piadinha da sala por ser gorda, depois quando a
faculdade acabou , objeto de fofoca d e várias pessoas da
Handerson. É , cansa, isso cansa.
Não me sinto como se fosse o centro do mundo, nem meus
problemas problemas, mas o meu peso ele me torna sempre — ainda
que eu não queira — alguém que chama atenção, também pelo fato de eu
ser mais alta que as mulheres da minha idade.
Também não me sinto como se o preconceito estivesse em mim,
eu apenas gostaria que as pessoas não me visse as pessoas não me
vissem como algum tipo de preguiçosa — como já cansei de ouvir
minhas irmãs falarem — ou alg uém acomodada, não posso dizer que
sou feliz com o meu peso e que me aceito , por que isso será pura
hipocrisia , mas queria mesmo ao menos uma vez na vida conseguir me
sentir bem com a minha aparência.
O que me levou a outros questionamentos como: Garotas GG podem
ser felizes? Elas podem se aceitar? O que conta realmente o tamanho ou a
personalidade?
Tantas perguntas, já fazia um tempo que eu havia parado de me
questionar sobre essas coisas, mas com a chegada de Mosés na minha
vida é como se tudo realmente viesse a à tona.
Quero muito acreditar nele, quero muito que tudo seja verdade,
que nosso relacionamento dê certo , mas tenho os pés enfiados no chão.
Nesse momento, concluí que agora só posso contar com a confiança
que deposito nele, eu acredito em Mosés, se ele realmente não for
verdadeiro comigo imagino que seja o melhor mentiroso da face da terra.
A mudança tão rápida dele também me deixa com o pé atrás,
como ele pode dizer que se sentia atraído logo que me viu na empresa e
ter me tratado tão mal? Apesar de tudo ele ainda é um completo
desconhecido pra para mim.
Acabo de vir pro para o meu quarto, ele dorme desde a hora do
almoço, decidi ficar um pouco só, pensar com calma, avaliar esses
conceitos, acabei por tomar um banho, acho que vamos jantar a lasanha
que sobrou do almoço.
Também pensei sobre Sêmora e suas atitudes, claro que ainda
estou magoada magoada, mas tudo pra para mim funcionou muito
rapidamente, percebi que a Sêmora talvez não tenha acreditado em mim ,
por que isso realmente parece impossível — sim, eu sei que é, não
alguém tão lindo e rico — e segundo , por que acho que como ela
não sabia que eu e ele e eu estamos namorando , ela queria ficar se
exibindo p a r a o Mosés, só que o tiro saiu pela culatra.
Não é o meu ego , mas ... imaginar ele falando algo do tipo "se
cubra" p a ra Sêmora , é algo muito ... bom.
Simplesmente nunca Nunca pensei que um homem como Mosés
fosse realmente dar um fora em uma mulher magra de alguma forma, eu
sei que as vezes ele pode ser bem grosso — eu mais que qualquer
pessoa — mas não ao ponto de insinuar que a "mulher" em questão
estava se oferecendo p a ra ele na cara dura, imagino que p a ra Sêmora
tenha sido algo muito, muito co nstrangedor, ainda mais por que
conheço ela, e imagino também que ela não esperava por isso de nenhuma
forma.
Ela também não sabia que estavamos estávamos juntos, talvez
houvesse pensado que o fato de Mosés estar aqui daria algum tipo de
liberdade p a ra ela se insinuar p a ra ele, ainda que eu nunca a tenha
visto agindo assim com ninguém, mesmo que eu a conheça e sai ba da de
sua índole, acho que ... ela deve ter se deixado levar, em compensasão
compensação acho bem feito , pois , se ti hou vesse me ouvido ,
não teria dado de cara com uma má resposta.
Um homem lindo dando um fora em uma garota m M agra— e
bonita —por conta de uma garota GG... quem diria que eu viveria p a ra
presenciar algo assim?
Espero que ela aprenda também , pois , me feriu na mesma
proporção ou até mais do que se sentiu envergonhada por suas atitudes, p
a ra começar essa não deveria ser a postura dela, por que
afinal, tecnicamente Mosés é o nosso chefe Chefe , ele não está na
minha casa por qualquer motivo , e bom ou ruim, ele não vai deixar de ser
nosso chefe Chefe na empresa.
Acima das minhas dúvidas , vem também o medo, o receio, um
pouco de vergonha, estou tendo dias muito diferentes dos quais estou
acostumada, alguém que aprendo a conhecer todos os dias, que me
surpreende, que me irrita irrita, mas que me trata muitas vezes bem.
Dúvidas como: quem é ele? De onde vem? Como era sua vida
antes de mim? do Do que ele gosta?
São dúvidas que me rondam frequentemente, ainda que me contente
com os pequenos detalhes que ele vem me dando de sua vida, pequenos
tristes detalhes, não gosto de lembrar das coisas que ele me diz que passou
na mão dos primeiros pais adotivos.
Mosés Handerson ainda é como uma caixa de Pandora, e eu
pretendo abri-la e decifra-la.
Não posso entregar o meu coração e a minha confiança a um
completo estranho, ainda que me sinta muito tentada , esse é o meu
primeiro namoro — de verdade — p a ra valer e não quero sair
ferida se algo não d er ê certo, sempre lido u com expectativas, mas isso
gera muitas frustações se não realizadas, e eu não quero ter que chegar lá
na frente e depois de tudo , pensar: poderia ter feito isso? por Por que eu
fiz isso? deveria Deveria ?
Quero poder ir devagar, como ele mesmo disse , vai me esperar,
então ele vai aprender a saber o meu tempo, eu não sou como as outras
garotas, acho que nunca vou ser, por mais que me esforçe esforce ,
esse é o meu corpo, essa é a minha condição, já fui em várias
nutricionistas que falam que devo perder apenas dez a quinze quilos , mas
isso parece muito pouco perto do que eu realmente sinto que devo perder,
já fiz tantas dietas loucas e nada, jejum, fome total, no máximo que sempre
perco são cinco a sete quilos, até a dieta recomendada pelos médicos eu
fiz e nada.
Nada de nada!
Isso é muito desanimador, claro, teria sido um bilhão de vezes mais
fácil se eu tivesse optado pela redução como a Sêmora fez , mas ... mas
não queria ter que apelar p a ra esse tipo de coisa, acho que apesar de eu
não ser um poço de felicidade com o meu peso , eu ainda não estou
preparada p a ra isso, ainda que seja o atalho mais fácil p a ra perda de
peso, ao menos a Sêmora parece mais feliz depois que fez, eu já não sei se
estaria tão feliz tendo que viver a base de vitaminas, academia diária, dieta
e comendo a quantidade que um passarinho come.
Se bem que isso não é realmente ligado a felicidade...
Assim do nada , Mosés sobe na cama e me tira dos pensamentos,
me abraçando, o corpo quente, os cabelos em total desalinho, sonolento,
ele beija o canto do meu pescoço e eu o abraço.
Gosto de estar com o Mosés, gosto do jeito carinhoso que ele
demonstra ter em relação a mim, ele faz com que eu queira retribuir
também aos seus carinhos, ao seu afeto.
— você Você deveria ficar comigo no colchão , minha bebê.
— tomei Tomei banho, não quis incomodar.
— Hummm ...
Mosés respira fundo , me beija a bochecha e vai p a r a o lado ,
se esticando e fazendo um pouco de esforço.
— está Está com dor?
— não Não , estou bem melhor.
— bebeu Bebeu toda a água da garrafinha?
— sim Sim , senhor Senhor a.
— foi Foi dengue hemorrágica, tem que se cuidar bastante.
— eu Eu sei, não sei o que teria feito se não fosse você.
— nem Nem eu.
Não quero pensar nisso...
— ainda Ainda chateada com a Sêmora?
Mosés sabe que ela e eu, eu e ela não estávamos bem durante
o almoço.
— pode Pode falar , Ana— pede num tom mais sério .—
P p or que brigaram?
Suspiro, decido não mentir.
—Contei p a ra Sêmora que estamos juntos , e ela ficou fazendo
pouco de mim... resumindo, ela quis dizer que eu era uma alucinada em
pensar que um cara como você poderia me querer.
As sobrancelhas escuras sobem e fico olhando p ara o teto,
penso n isso o que Sêmora falou, em como me sinto ferida com as
insinuações dela, em tudo.
— A a cho que ela não fez por mal, eu mesma sei que não
acreditaria se alguém me dissesse — confesso sem graça . — Pp
or que afinal de contas , somos bem diferentes.
— S s omo s ? — Mosés questiona me olhando.
— Ss im, somos — falo e tento sorrir . — V v ocê é
bonito Mosés, bem sucedido bem-sucedido , alguém que pode ter a
mulher que quiser aos pés, eu não, ainda que eu acredite que o mais
importante não seja a aparência, é tudo no qual as pessoas mais acreditam.
— E e u não entendo onde quer chegar , Ana...
— M m e diz, francamente, o que pensa quando vê alguém
acima do peso? — pergunto e olho p p a ra ele, Mosés me encara ,
mostrando certa dúvida no olhar. bastante incerto — P p ode
ser sincero.
— E e u não sei , Ana — responde sem graça . — O o que
eu deveria pensar? não Não é o meu semelhante?
Eu o fito por alguns segundos momentos e depois olho pro
para o teto de novo , sentindo uma pontinha de dor dentro de mim, eu
sei que ele não quer falar a verdade.
— as Às vezes eu acho que as pessoas pensam que a minha
felicidade é um prato de comida , sabe — digo sendo sincera .—
E e que eu não tenho o direito de ter algum tipo de vida normal , e
felicidade como as outras pessoas.
Ele fica em silêncio.
— M m uitas pessoas não sabem que a minha vida não se
resume em comer, em ter preguiça, elas associam a minha aparência a pre
conceitos pré-conceitos que elas tem elas têm ao meu respeito.
— alguém Alguém disse isso pra para você , Ana?
— não Não preciso que digam, a sociedade diz, os livros contam,
as pessoas falam.
— não Não vejo necessidade que se menospreze e se vitimize
vitime, Ana, para mim você é você pra mim é como uma mulher
comum, apenas tem mais curvas do que as outras, e eu particularmente
gosto muito disso.
— por Por que?
Eu não consigo entender, é isso, talvez nem aceitar por que é
algo muito complicado até pra para minha compreensão.
—Ana , posso te falar uma coisa muito pessoal?
Tenho medo desse tom, eu o fito, e lentamente faço que sim com a
cabeça.
— os Os conceitos que tem sobre si , própria jamais mudaram o
que as pessoas pensam sobre você, e você nada pode ser feito fazer
se elas as pessoas a julgam assim , pois , não é sua culpa, mas e se
decidir se importar , não é culpa delas, é sua culpa.
Eu o encaro de forma mais bastante séria.
— I i sso é plágio! — Eu acuso , lembrando do sermão que
lhe dei sobre garotas fúteis.
— É é a verdade . — E e le retruca e pisca coçando a nuca .
— Q q uando esbarramos na rua a alguns dias pensei: caralho, que garota
Grande!
Fico sem fala.
Garota Grande?
— depois Depois eu te vi na sala do Gomes e pense i : poxa
vida, ela é linda .— Mosés fala com muita tranquilidad muito
tranquilament e e sinto vontade de chorar , mas me controlo.
detenho — A a melhor parte de te conhecer é claro foi o jeito como você
quis me ajudar, por que pensei: além de linda ela é generosa, ainda que
por cima de toda essa crosta sua de arrogância houvesse um orgulho
impenetrável , e muita teimosia.
Mordo o lábio inferior com força e empurro o ombro dele, algumas
lágrimas começam a cair na minha face, meu coração se enche de um
sentimento puro e bom.
— Ee u jamais olhei p a ra nenhuma garota como olhei p a ra
você , Ana, eu nunca me permiti gostar de ninguém como gosto de você .
— E e le me olha concentrado . — E e u gosto de você assim como é
, Ana, não queria que se sentisse tão incerta quanto a sua aparência , pois
, p a ra mim você é uma mulher linda.
— mesmo Mesmo GG?
— mesmo Mesmo !
— tem Tem certeza?
— absoluta Absoluta .
— absoluta Absoluta ?
— absoluta Absoluta !
Mosés se inclina na minha direção e me beija, eu o correspondo
com a mesma força, a mesma intensidade, nesse momento não quero
pensar em nada, seja como for . O que tiver que ser, será , seja o
que for será . , S s endo eu, gorda ou não, bonita ou não, nos padrões ou
não, eu serei de Mosés Handerson.
Capítulo 20
~ Mosés Handerson ~
Ela dorme ao meu lado.
Me aconchego e a abraço beijando-lhe a boca, quero que Ana
saiba e sinta o quanto eu gosto dela, o quanto me sinto bem ao seu lado, as
vezes eu acho que não demonstro o suficiente para que ela perceba que
estou caído por ela. Tenho meus receios, tantos medos, gostar de alguém
não estava incluído nos meus planos, ainda mais alguém como ela,
que é tão diferente de mim. tão diferente de mim como ela.
Percebo que as pessoas tem sido muito más com Ana, o quanto
ela está machucada com sua própria condição de vida , e sinto uma
vontade enorme de protegê-la , mas tem coisas que eu não posso fazer
por ela, amor próprio é algo que nem eu , nem ninguém podemos dar ,
mas pelo ou menos ela entende que não vou me afastar.
Eu não quero.
Já faz um tempo na minha vida que eu venho seguindo r R egras,
quando Bonnie era viva eu fazia tudo para agradá-la, para agradar Phell,
mas hoje eu francamente não sei se é realmente isso o que quero ser ,e
não me sinto ingrato por isso.
Sei que estar com Ana pode influênciar influenciar para que
uma série de fatores na minha vida não deem certo, principalmente quanto
a minha vida social a minha vida social, porém , eu prefiro não
pensar nisso.
Perto dela me sinto a à vontade, próximo de ser alguém normal e
bem, ela me mostra t odos os dias desde que cheguei o quanto as pessoas
podem ser diferentes, generosas, bondosas, boas, e inclusive , puras...
A a lgo que deixe de acreditar há já a algum tempo, algo que na verdade
nunca acreditei.
Ela desperta do sono vindo p a ra mim, me abraçando, seu corpo
é quente, seus cabelos são lisos e finos, me sinto próximo de algo
inexplicável e intenso, ao mesmo tempo tão doce que mal sei explicar,
nunca me senti assim com mulher alguma na face da terra.
Ainda que não fosse exatamente o que eu sempre procurasse, já
sai com muitas mulheres que fisicamente eram muito diferentes de Ana,
contudo , por dentro elas não passavam apenas de algo oco, um vazio sem
fim, mas é como ela diz: eu escolhi , então não era culpa delas.
Porém , agora eu escolhi ser de Ana, e esta é a minha nova
responsabilidade, mas acho que prefiro pagar o preço...
Ainda que meu passado me condene, ainda que os meus segredos
sejam sórdidos e eu não seja merecedor de nenhuma felicidade , eu quero
tentar, eu quero estar com ela, e eu ficarei, custe o que custar, doa quem
doer, Ana s erá minha!
Capítulo 21
Fecho os olhos, me entrego aos beijos quente de Mosés, sinto que
ele está mais revigorado a cada dia. Mal amanheceu e ele já está me
apertando, me observando, mas nenhuma palavra foi dita, nenhuma
promessa feita, e eu prefiro assim, eu acho, estamos namorando.
Sorrio quando ele se afasta e me sinto meio boba quando ele toca
a minha fac e e e me da ndo mais um beijo, eu realmente gosto de estar
com ele, por que estar com Mosés significa não ter que pensar em mais
nada, estou longe do meu emprego, da minha vida, ainda que seja algo que
almejo, voltar a minha rotina, também é muito bom estar com ele.
— melhorou!— Melhorou! — exclamo , e coloco a mão sob
re a dele.
— sim Sim , me sinto bem melhor.
Ontem ficamos na minha cama, trouxe a lasanha de jantar e
comemos aqui mesmo, mas eu não sentia tanta fome assim, os
acontecimentos de ontem me tiraram novamente o apetite, Mosés também
se esforçou p a ra comer, não parecia muito chegado . , Depois então ,
eu o acompanhei até o banheiro e ele tomou banho sozinho, quando
terminou me chamou, e quando cheguei ao banheiro, ele já usava o roupão
. e Ele estava com a aparência um pouco melhor depois do banho, eu o
trouxe p a ra cama e o vesti, então nos deitamos e ficamos namorando
juntinhos até que adormecemos.
Não sinto vontade de sair daqui, é muito bom estar junto de quem se
gosta ... e eu gosto muito do Mosés, aprendo a conhecer esse lado
carinhoso dele pouco a pouco.
— você Você se sente melhor , minha bebê?
— S s im , meu momo.
Ele sorri, seus lábios vermelhos um pouco sedutores, meu estômago
gela com esse sorriso.
— quero Quero que venha passar uns dias no meu apartamento
. comigo — Mosés diz e enfia a mão nos meus cabelos .—Aa inda
mais nos dias que Safira estará na cidade.
—Mosés talvez seja rápido demais...
— não Não é, Safira sabe que eu e você estamos juntos, não
quero que fique longe de mim, acho que ainda teremos mais uma semana
até que eu consiga me recuperar por completo.
— Q q uer que eu fique lá p a ra eu ficar cuidando de você ,
não é né ? — Eu insinuo com uma falsa mágoa, sei que não é por
isso.
— claro Claro que sim , querida, você cuida de mim tão bem,
mas acima de tudo , adoro estar com você , minha Ana . — E e le fala
e se aconchega me abraçando . — M m eu amor.
Meu Amor!
Sorrio e beijo-lhe a testa, Mosés me aperta e abraço ele de volta
tão feliz, logo depois disso me ergo, ele parece melhor a cada dia, na
verdade ele está! E e me sinto realmente bem melhor em vê-lo
assim.
— V v ou preparar o nosso café — falo e começo a prender
os meus cabelos . — N n ão demoro.
— está Está bem . — Mosés toca o me io u das minhas
costas por baixo da minha camis eta. a — N n ão demora.
— eu Eu não vou demorar — prometo sentindo-me toda
arrepiada com seu toque quente.
Saio da cama, vou primeiro ao banheiro, lavo o rosto, faço as
necessidades e novamente passo pelo quarto p a ra poder sair . , Mosés
já voltou a dormir assim muito rapidamente abraçando um travesseiro,
sorrio, passo sem fazer barulho e vou p a ra cozinha, preparo
nosso café. Estou tão cheia lotada de ssa feli cidade z que mal
consigo descrever.
Estou montando a bandeja de café da manhã quando escuto o som
do telefone, não demoro e atendo.
— O o i, bom dia!
Sê-mo-ra Sêmora !
Fico sem reação por alguns instantes instantes, mas logo me
recupero.
— B b om dia , Sêmora.
— V v ocê está bem?
— S s im, e você?
— E e stou bem.
Não sei bem o que falar, apesar de não querer destratar a Sêmora,
eu não sou assim, ainda que eu s aiba que ela mereça ser tratada
com indiferença , eu não posso ser assim com ela, o que não desejo p a
ra mim não faço p a ra ninguém.
— P p odemos nos ver logo em breve?
— Claro, Sêmora.
— Está bem . — A incerteza está estampada na voz
dela . — Ana , tudo bem mesmo?
— S im . — E u não lembrei sob r e ontem pelo resto do dia .
— F ique tranquila , Sêmora.
— A ssim que eu tiver um tempinho te chamo , amiga.
— Tudo bem, Sêmora.
— U m beijo , Ana.
— O utro, tchau.
Não me sinto fria, não me sinto errada, ainda que eu não seja
dessas mais vingativas eu não consigo agir tão naturalmente, acredito que
a Sêmo ra vai ter que aprender a lidar com a nova fase da minha
vida sem sentir invej a, sem tentar se exibir para o
meu namorado , mas principalmente , aprendendo a entender isso, que
Mosés gosta de mim da forma que sou.
Me vejo sorrindo e voltando para o meu quarto com uma
bandeja na mão, tenho fé de que as coisas melhorem quanto a isso, mas
por enquanto tudo o que me resta é aguar dar para ver como será ,
tentarei ser feliz com Mosés de todas as formas .
— Bem-vinda ?
Sorrio.
Ajudo Mosés a entrar em seu apartamento, acho que faz um mês
desde que ele veio pro para o meu, olho em volta e admiro toda a
mobilia mobília cara e sofisticada, sofás de couro escuro, uma cozinha
americana linda com armários em tons de preto, duas salas com ambientes
distintos, e todo o requinte que o meu apartamento jamais irá possuir um
dia, claro, ele tem dinheiro.
Ele já não está tão fraco, me pediu que o trouxesse ao seu
apartamento logo depois do almoço, ficamos o dia todo vendo TV tv
juntos, Mosés a todo momento me fazendo carinho e eu nele, depois
levantei e preparei algo rápido pra para nós almoçarmos, na verdade
nem foi um almoço, fiz sanquíches sanduíches e suco, ele não
reclamou.
O percurso até aqui não doi fo i dos mais complicados, segurei
sua mão e viemos mais devagar, a doença foi bem mais forte no organismo
dele, a recuperação também não está sendo tão rápida.
Vamos pro para o sofá maior e nos sentamos, Mosés olha
envolta parecendo meio sem jeito.
— está Está limpo.
— é É ! a A Sêmora veio aqui organizar logo que ficou
internado.
— vou Vou dar uma bonificação pra para ela.
Ai eu já não posso falar nada, Sêmora apesar de tudo me
ajuda muito quanto a Mosés, principalmente quando ele se internou .
Foi e la quem me deu todo auxílio, nada mais que merecido, posso ser
tudo tudo, mas injusta eu não sou.
Mosés entrelaça os dedos nos meus, não sei bem o que falar, mas
acho que ele espera que eu fale alguma coisa sobre seu lar.
— gostei Gostei — digo sincera . — G osta daqui?
— comprei Comprei há algumas semanas , antes de
adoecer. — Mosés diz e coça a nuca . — N ão sabia que você
morava aqui por perto.
E u também não fazia a menor ideia que de fossemos que
fossemos vizinhos, em pensar que até alguns dias atrás
odiava isso, melhor nem lembrar .
— disse Disse q ue comprei meu apartamento há
alguns meses? eu Eu estava esperando decorar e fazerem alguns
pequenos reparos — confesso.
— você Você pode vir aqui sempre, esse apartamento também
será seu lugar , Ana . — ele sorrio E le sorri meio de lado .
— C erto?
— claro Claro — digo digo, ma s me sinto nervosa,
nunca estive no apartamento de homem algum.
— acho Acho que vou pedir p a ra Marcy providenciar as
compras . —Mosés ergue a minha mão e a beija . — As suas também,
já lhe dei muito trabalho, podemos dormir aqui hoje?
— Podemos, claro — concordo constrangida.
Não sei por que, que diferença faz dormir aqui ou lá? Já
não dormimos juntos há alguns dias? Não trocamos carinhos?
Beijos ? Toques ? A única diferença será que hoje é no
apartamento dele.
— Eu vou lá em casa, fazer uma mala para mim ou algo
assim . — Eu me levanto . — A cha que consegue ficar só?
— C laro . — Mosés sorri e parece realmente gostar da ideia .
— P odemos pedir comida chinesa.
— Por mim não tem problema, eu já volto.
Me inclino e o beijo de leve.
Mosés me prende num beijo carinhoso, e tenho a impressão de
que ele se sente grato, mas me afasto, por que gosto muito dos
seus beijos , ainda que deseje que ele pare de querer demonstrar
gratidão por mim por qualquer coisa que eu faça por ele.
— Já volto.
Estou feliz com nosso relacionamento.
Mosés é fechado, mas ele é carinhoso comigo, sem sombra de
dúvidas alguém que eu aprendo a conhecer todos os dias desde que entrou
na minha vida.
— Gosto muito de você , Mosés.
Ele sorri, algo tão sincero e sereno.
— Também gosto muito de você , Ana.
Sorrio e me afasto acenando, me sinto uma boba cheia de
felicidade em ouvir isso, saio do apartamento tentando disfarçar minha
alegria, sei que isso pode parecer muito medíocre, mas estar com ele
é como ter uma pequena chance de ser adolescente mais uma vez e se
permitir ter um primeiro amor, uma paixonite.
As portas do elevador se abrem e uma mulher passa por mim, são
dois apartamentos por andar, entro e vou direto nos botões do painel, quero
ir rápido e voltar rápido, quero poder aproveitar esses últimos dias com
Mosés, quero ficar com ele a todo momento, sempre que pudermos, e
apesar de eu não dever me sentir assim, e querer isso, é assim que me
sinto e isso é o que eu mais quero.
Mosés está caído por mim, e eu estou no chão por ele.
Me apresso ao atravessar o sinaleiro, coloquei um jeans e uma
camiseta mais simples para levar ele para o seu apartamento, e logo
que entrou no meu estou pulando e me abraçando, hoje passaremos a noite
no apartamento dele, já quero poder preparar um jantar bem
gostoso para compensar o almoço, quero poder lhe fazer surpresas,
quero poder ter muitos outros momentos bons com Mosés , tanto aqui
quanto lá.
Preparo uma mochila com um pijama, uma muda de roupa e
roupas íntimas, logo em seguida eu pego minha necessaire e coloco
produtos de higiene pessoal, escova de dente, escova de cabelo, e p ego
meu celular. Tranco meu apartamento e me vejo novamente no
meu elevador , pronta para ir para o apartamento do Mosés.
Logo que chego ao prédio dele , o porteiro
me cumprimenta novamente, vou para o elevador me sentindo
ansiosa, meu coração está disparando, e me vejo sorrindo logo que as
portas do elevador se abrem, aperto o botão de seu andar e me olho no
espelho do elevador, solto meus cabelos do rabo de cavalo e o puxo
para o lado, sorrio empolgada, o elevador para em seu andar e saio toda
contente.
A porta está entre aberta, acho que estava tão feliz que mal
notei que deixei a porta aberta, sorrio e entro, escuto uma voz feminina
baixa e fico meio paralisada com isso, ainda segu ro a maçaneta,
sem saber se entro ou não .
— ..., mas Mosés isso é muito injusto!
Escuto uns passos e eles se cessam, ainda não consigo me mover.
—...Safira , não! — Mosés fala com firmeza.
— Mas..., mas...
— Safira! —Ele repete com firmeza.
Mosés está falando com a irmã.
Por alguns momentos não sei se entro ou se volto para trás, não
quero ficar ouvindo, mas também acho que se eu entrar e interromper
a conversa talvez pareça mal-educada .
— Achei que não gostasse desse tipo de mulher, vi ela no
elevador, quase ocupa o espaço todo... Phell já sabe?
Me arrepio toda depois disso.
— Não preciso da aprovação dele . — Mosés responde e sua
voz está muito dura, próxi ma da voz do homem que conheci
há alguns dias.
— Já treparam?
Nossa!
— Não , Ana é diferente.
— Claro , tem que tomar uns dez viagras para comer aquela
baleia.
Aperto a mão na maçaneta e sinto vontade de sair correndo, mas ao
ouvir isso não consigo me mover, meu coração está tão apertado que dói,
minha garganta queima com a vontade de chorar.
— Eu gosto dela.
— Por que não para de enganar sua contadora , Mosés?
Você só quer comer ela, depois ela será como as outras.
— Gostaria que não se referisse a ela assim, Ana é uma
mulher muito bondosa...
— Agora vai pagar de santo , não é mesmo? Até parece que
não vai enjoar dela daqui a alguns dias e dar um pé naquele troço.
—Safira.
— Aí , nossa, você está dando valor demais a essa garota.
— Ela é importante para mim.
— Todas são, foi assim com a Beth, a London a..
—Ana é diferente.
—Ela é GORDA! G-O-R-D-A!
Soluço, e depois puxo a maçaneta sentindo-me ofendida, enojada,
magoada, ferida, puxo a porta e a fecho, não consigo se quer pensar em
entrar mais nesse apartamento, minha mão treme enquanto aperto o botão
do elevador, fungo chorosa, o choro é doloroso e estou nervosa, as portas
do elevador se abrem e entro, nesse instante aperto o botão do painel
rápido, a última coisa que vejo é ele no meio do corredor olhando na minha
direção.
Capítulo 22
—Ana!
E escuto o som da campainha , mas não me movo, estou
trancada no meu apartamento, sentada no sofá da sala ainda em choque
por todas as coisas que ouvi da irmã dele, do lado de fora Mosés
Handerson me cham a e começa a quase socar a porta, mas
não me movo.
— Ana, por favor, abre a porta.
Ele chegou a alguns minutos, mas não consigo pensar direito, tudo o
que sei fazer é chorar, as lágrimas caem, meu choro é baixo, meu peito dói
tanto com as palavras de Safira que eu mal sei descrever isso, é uma dor
que se alastra por meu coração que parece não ter fim.
—Ana! — Ele chama e sua voz ainda é um
tanto baixa . — Por favor, abre essa porta!
Não consigo me mover.
Ele para de tocar a campainha e concluo que desiste, mas
prefiro que seja assim, fico parada olhando para o centro da minha sala,
me sentindo um lixo, a mulher mais feia e gorda do mundo, alguém enorme
e feia.
Soluço alto e choro.
As palavras de Safira e coam em minha cabeça, e a cada
ecoar meu coração se aperta mais e mais, cubro as faces com as mãos e
faço que não com a cabeça, me sinto a mulher mais gorda e horrível do
mundo ao lembrar de suas palavras, baleia, gorda, enorme...
Baleia, gorda, enorme!
A cad a palavra a dor no peito cresce , meu coração
fica pequeno, apertado, e fico angustiada.
—An a, por favor, abre a porta!
Mosés pede mais uma vez, sua voz está longe de parecer tão calma
como ele aparenta ser.
Prefiro não abrir , me poupa mais a dor de ter que
encarar ele , de ter que olhar em se us olhos e saber que tudo
isso é verdade.
Acordei cedo .
Sai pela porta dos fundos.
Ainda tenho medo de dar de cara com Mosés no prédio,
não estou pronta para vê- lo, não quero vê- lo, me sinto
péssima já faz uns dias.
Parece que a dor da humilhação não irá passar nunca.
Já faz alg uns dias que eu resolvi tomar algumas decisões
em relação a tudo na minha vida é acho que está foi a melhor delas.
Acabo de me demitir da Handerson.
Tinha isso fixo em mente, e pensei no que fazer
durante essa semana , e é isso o que eu deveria fazer e fiz.
Não quero ter que passar por uma situação como aquelas nunca
mais na minha vida, nem com Safira Handerson , nem com
ninguém , nem por Mosés , nem por nada . Eu sei que não e culpa
dele , contudo , não posso me sujeitar a algo tão baixo assim.
Me sinto um nada, mas chegar à conclusão que outras
pessoas pensam isso quando olham para mim , é o pior de tudo.
Safira não só me destruiu, mas também matou toda e qualquer
chance de eu me sentir merecedora de estar com Mosés, ela se referiu a
mim como se eu não fosse gente, como se eu não tivesse valor, como se
eu não fosse suficiente para ele pela minha aparência.
Chego mais rápido que o planejado ao meu prédio, não consigo
olhar para o prédio dele, acho que desistiu do que poderíamos ter, acho
que Mosés percebeu que nós dois não devemos ficar juntos,
acredito que agora mais que nunca , ele perceba que não sou p a ra
ele , assim como ele não é p a ra mim.
Depois daquele dia ele ainda veio algumas vezes , mas falei para
o porteiro no terceiro dia que não queria que ele subisse, acho que ele foi
barrado na terceira vez, sempre que vinha tocava a campainha diversas
vezes, como ficava em silêncio ele chamava, chamava e depois de alguns
momentos ia embora.
Melhor assim, melhor que ele saiba seu canto, eu acabo de
descobrir o meu, tudo o que tivemos ou algo parecido vai ficar na minha
memória para sempre, mas não passaram de lembranças,
apenas isso.
Já fez duas semanas que eu não o vejo, e q ue não saia
p ara fora. Me fechei completamente p a ra tudo e todos, não
ate ndi o t elefone, desliguei o celular, não ligo a Internet, também não
consigo comer, me esforcei muito p a ra ir na Handerson hoje e
pedir demissão, as meninas do Rh demoraram para acreditar que de
fato eu estava pedindo desligamento, mas enfim, agora é tentar prosseguir
da minha forma, segunda começo a procurar emprego, um novo
recomeço.
Me troco, vou para a cama e fico quieta.
Algumas lágrimas começam a cair lentamente , pois , sinto que
muito pior que o menosprezo da Safira , é a falta que sinto do Mosés , e
é algo que preciso banir da minha vida.
É muito ruim ter me acostumado com ele, com seu jeito, sempre
que vou p a ra sala é como se faltasse algo no sofá, não sinto
vontade de fazer nada, e eu sei que não deveria estar assim. M e apaguei
a Mosés Handerson com muita facilidade , muito mais do que eu
podia, mais do que deveria , e muito maior que a dor causada
pelas palavras de Safira, é a falta que ele me faz.
Estou quase cochilando quando escuto o som da campainha, logo
de início penso em não atender , mas imag ino que não seja ele,
acho que Mosés entendeu o recado.
Me levando e vou atender.
— Quem é? —pergunto já próxima da porta.
— Sou eu , Bea!
Suspir o, me aproximo da porta engolindo um pouco da
dor, a Sêmora com certeza não deve ter vindo antes por causa do
nosso mal-entendido , não deve saber que me afastei por alguém que
foi muito pior comigo do que ela.
Abro a porta e vejo minha amiga parada diante de mim com um
pequeno sorriso, tento sorrir, mas a tentativa falha quando vejo ao seu
lado Mosés Handerson usando terno e gravata, desvio o olhar e recuo um
passo apressado, contudo , minha tentativa é em vão , pois , ele segura a
porta com firmeza, fico apavorada.
— Pode ir Sêmora, muito obrigado.
Não!
Sêmora se afasta enquanto recuo mais dois passos e Mosés
entra no meu apartamento, ele parece um pouco melhor do que quando
estava doente, mas ainda sim meio abatido, seus cabelos es tão
úmidos e penteados de lado, o termo impecável como sempre
com uma gravata preta — muito bem-feita por sinal—
em volta do pescoço elegante.
Ele fecha a porta e em seguida me fita de uma forma
muito estranha, mas depois isso vai tomando seu semblante
rapidamente , dando lugar a um tipo de raiva ou algo assim.
— Achou que eu não veria que tentou se demitir?
— pergunta ele me fitando muito sério.
— Eu não tentei , Mosés , por favor , vai embora — respondo
magoada.
—Pois , eu não vou — fala e me sinto apavorada . — V ocê
está abatida , Ana...
— Não pedi que viesse...
— Você não pode fazer isso comigo — reclama me
interrompendo . — I sso é injusto!
Nego com a cabeça , por que olhar para ele me machuca
profundamente, desvio o olhar, ele se aproxima e me afasto, vou para a
sala cruzando os braços.
— Melhor você ir embora , Mosés — sugiro.
— Você não pode desistir do nosso namoro.
— Eu já desisti—falar isso me machuca.
—Pois , eu não desisti . —Mosés fala com autoridade . — Eu
gosto de você , Ana.
— Sua irmã não pensa isso , não é mesmo?
— Infelizmente não, mas eu não me importo com o que ela
quer ou pensa.
Eu o fito, e crio forças.
—Mosés , eu não quero ficar com você!
Vejo que Mosés faz que não com a cabeça , e olha para o
lado, seu olhar está ferido e machucado.
— Eu não vou embora , Ana— determina e se aproxima
novamente.
Não me movo, Mosés está apenas a alguns centímetros de distância
de mim, fecho os punhos engolindo a vontade de chorar, lentamente ele
ergue a mão e toca minha face, seu toque me fez tanta falta, sua mão está
quente e macia...
— Eu não posso deixar que se afaste de mim , Ana.
—Não é certo que fiquemos juntos , Mosés.
— Eu sei o que é certo para minha vida.
Não respondo.
— Você é minha , Ana.
Fecho os olhos por que as lágrimas são inevitáveis, no
instante seguinte , Mosés Handerson me beija.
Capítulo 23
Mosés me beija com força, ele me puxa p a ra um abraço mais
forte e o calor de seu corpo me f az sentir algo intenso, é como se um
choque me atingisse dos pés à cabeça, perco o ar , mas ele não se afasta,
suas mã os sobem p a r a os meus cabelos e ele desfaz o
coque enfiando os dedos neles, me arrepio dos pés à cabeça, ainda que as
lágrimas caíam , meu corpo recebe um impacto forte.
Ele deixa os meus lábios e seca as minhas faces com as palmas
das mãos, parece tão torturado em m e ver chorando que me
sinto vilã, acho que as coisas p a ra Mosés são bem mais lentas
que para mim em muitos sentidos, eu sou assim, ainda que me sinta mais
sentimental , percebo que ele é muito mais que eu, mesmo que
não demonstre.
— Não chora! — pede torturado.
Faço que sim com a cabeça , mas a s lágrimas são
inevitáveis, por que repetidamente em minha cabeça m e vem as
palavras de Safira. T alvez nada consiga apagar o que ela me
disse , afinal, nada justifica!
Mosés me puxa para o rumo do meu sofá, ele se senta e me
sento ao seu lado, ele beija toda a minha face com carinho, beija minhas
lágrimas, meus olhos, meu nariz, minha boca, os soluços se detém na
minha garganta.
Nenhuma palavra é dita.
Depois da humilhação, a dor de tudo, só consigo chorar, tê-l o
aqui comigo só me faz sentir um pouco mais de dor, pe nsar em
tudo me deixa suscetível . Fico encostada por minutos em seu
ombro, Mosés me puxa pelos braços e me deito com a cabeça em sua
coxa, e encontro aqui por alguns minutos um pouco de consolo.
Choro bastante por alguns momentos, Mosés toca minha cabeça
com carinho, mexe nos meus cabelos, suspiro e soluço algumas vezes,
quando escuto o silêncio em meu apartamento , sinto-me novamente um
po uco capaz de raciocinar , Mosés se inclina e me beija a
bochecha, os cabelos.
— Você vai ficar bem , Ana, eu irei cuidar de tudo, não se
preocupe.
— Não podemos ficar juntos , Mosés.
— O que nos impede?
— Você não ouviu a sua irmã?
— Não , Safira para mim e nada são a mesma coisa.
Fecho os olhos por alguns momentos, eu sei que ele não vai
desistir, eu sei que ele não v ai embora, mas estou magoada com
tudo o que houve, não é culpa dele , mas estar com ele significaria
sempre ver a culpada.
— Ainda tem roupas minhas aqui , certo? Você se
tranca aqui há dez dias.
Não quero me mover, mas Mosés faz menção de levantar, me
ergo, logo que me sento eu o vejo levantando, ele tira o terno e olho para
o lado, depois ele se aproxima afrouxando a gravata, ergue a minha face
com cuidado.
— Você quer um café? Posso preparar algo para nós dois...
—Mosés , não faça de conta que nada aconteceu.
— Não estou fazendo de conta que nada aconteceu, mas te
ver assim é péssimo Ana, eu odeio te ver tão p a ra baixo.
— Não é para menos.
— Esquece a Safira, o que importa é que eu te adoro.
Mosés Handerson Me Adora.
— Ninguém nunca irá nos aceitar , Mosés.
— Nós dois temos que nos aceitar e só, ninguém além de nós
dois.
Não penso assim...
Sou surpreendida com um beijo leve, seus lábios me beijam com
carinho, zelo, me sinto muito bem c om seu beijo, o correspondo
por que é quase impossível para mim não o beijas , não o
corresponder , senti tanta falta disso. Sua mão toca minha nuca e os
dedos se enfiam nos meus cabelos, Mosés me puxa para cima e fico em
pé beijando-o com lentidão, nossas bocas se unem e Mosés me abraça ,
descendo as mãos pelas minhas costas, toco seus ombros e me afasto um
pouco.
—Mosés...
— Não, Ana, chega com esse assunto, eu e você vamos ficar
juntos, você precisa entender isso Ana, precisa aceitar que sempre
estaremos cercados de pessoas como a minha irmã.
— É muito difícil.
Quase impossível eu diria.
— Eu não disse que seria fácil para nós dois, mas você precisa
ter mais calma, saber enfrentar essas coisas com mais frieza.
— Não dá para isolar algo desse tipo.
— Você é tudo o que ela falou , Ana?
— Algumas coisas sim!
Mosés toca a minha face mais uma vez, seu olhar está tão... triste.
— Pois, eu não penso assim, para mim você é uma mulher
linda , Ana, e eu não me importo com o que falem, não vão mudar o fato
de que te quero ao meu lado, de que te adoro.
Acredito em Mosés, mas na prática não é tão fácil, nos
beijamos mais uma vez e me sinto protegida.
— Te adoro , Ana, eu quero ficar com você, precisa se
aceitar , precisa ter amor próprio e ver que mulher linda você é!
Não s ei o que responder, Mosés beija o topo da minha
cabeça e me encosto nele.
— Vou cuidar de você , Bê.
No fundo quero rir, mas abafo, abraço ele com força.
Mosés volta a me beijar e acho que não preciso de mais nada nesse
momento, nem das más lembranças, nem dos insultos, nem do ódio de
Safira Handerson, tenho Mosés bem aqui e isso é o que importa.
Mosés trocou o terno por um conjunto de moletom que lhe dei,
enquanto ele se trocava eu fiquei na sala tentando me concentrar na tv
TV ligada, não quero mais pensar em Safira, não quero mais lembrar de
suas acusações sobre meu corpo, porque isso me
machuca. Mosés pede para entrar na minha vida, e eu quero
muito que ele fique, como antes queria , e não quero pensar que as
pessoas que o cercam são assim, não agora.
Me aco vardei num poço de dor, de pessimismo, de
medo s, mágoas, tristeza s, e ele não tem culpa disso.
Sempre soube, mas como poderia continuar ali depois de
ouvir tudo? Querer fazer parte de sua vida sabendo que sua única
família — irmã — pensa isso sobre mim?
Mosés está na cozinha agora, descalço, ele parece se entender
bem com o fogão, sinto o cheiro de café e ovos mexidos, mas ainda
não tenho tanto apetite, analiso o homem em pé a certa distância na minha
cozinha , e mal acredito que esteja aqui de fato, não pensei que ele viria
também, achei que Mosés desistiria de mim, que ele havia parado de tentar
voltar para minha vida.
Mas não foi assim, não será assim.
Me conforto e me sinto feliz com isso, Mosés quer mesmo ficar
comigo, ele quer mesmo estar comigo, ele gosta de mim de verdade e não
se importa com o que a irmã fala, ele não é superficial como ela.
Me viro para a frente quando ele faz menção de se virar,
depois de alguns instantes ele vem para a sala com um prato com ovos
mexidos e torradas, uma caneca de café, se senta ao meu lado e me
entrega a caneca.
— Eu não sou muito bom na cozinha—fala e me dá um selinho
— , mas acho que ficaram bons.
Sorrio, faço que sim e bebo um pouco do café, está meio amargo e
forte, Mosés ergue o garfo com ovos para mim, fico um pouco
constrangida, mas aceito, está bom, como em silêncio, ele faz com que me
sinta um pouquinho mimada, e o jeito como ele me observa realmente faz
com que tenha lembranças daqueles primeiros dias dele aqui em casa, era
desse jeito que ele me olhava.
— Vamos ver a sua mãe essa semana . — Mosés determina
do nada . — Q uero conhecê-la.
— Minha mãe? — repito surpresa, achei que ele
iria deixar essa história de lado.
— Sim , quero conhecê-la, e toda sua família.
Sempre que Mosés fala algo assim, fico sem resposta, acho que
nunca pensei que fosse realmente conhecer alguém que quisesse
um relacionamento sério comigo, isso é algo que ele fez questão de
deixar claro desde que começamos a nos envolver.
— Talvez ...
— Eu quero , Ana, e isso você não pode proibir, quero conhecer
sua família, estamos namorando, é o mais certo.
Suspiro, olho para ele e concordo, eu não sei ainda se isso será
o melhor , mas quero deixar algo bem claro para ele também.
— Eu não quero mais trabalhar na Handerson , Mosés, pensei
muito, não quero me expor, não quero que as pessoas fiquem
fofocando sobre nós , eu também acho que só seria motivo para
que fiquem falando de mim, e de você — digo sincera . — A cho
que isso seria ruim para nós dois.
— Não devo satisfação da minha vida para ninguém . —
Mosés reclama , e mostra que está muito sério.
— Eu sei, mas não quero me expor.
— Sendo ou não minha secretária , acima de tudo você é a
minha mulher , Ana.
Ele é tão convicto disso... e tudo começou há tão
pouco tempo .
— A cho que não posso ser as duas coisas , Mosés.
— Eu te acho muito capaz de saber separar as coisas, te
dei o cargo é por que você é uma mulher inteligente e capaz p a ra
isso.
Me sinto orgulhosa de ouvir isso e feliz ainda que não deva.
— Você será sim minha secretária, quero você ao meu la do
na empresa, confio em você , Ana, precisa entender que sempre
existirão pessoas assim.
— E u entendo , Mosés , mas...
— Você não deve ter medo das fofocas e nem d os
comentários, sempre existirão pessoas in vejosas,
acredite, trabalho há anos nesse ramo e sei o quanto podem ser
maldosos com comentários em todos os sentidos.
— Imagino que não seja fácil.
— Eu quero você ao meu lado, quando me ligaram do RH
estava em uma reunião, não pude atender, desci imediatamente e pedi que
cancelassem a demissão, eu estou tentando recuperar o tempo que fiquei
afastado, não está sendo fácil.
Ele ficou fora da empresa muitos dias.
— Você vai ficar comigo , Ana, não teime.
— Não quero ir para o seu apartamento.
Tem bastante dureza no olhar dele.
— Não vai, não quero que faça nada contra sua vontade, Safira
foi p a ra Londres, acho que ela não vai voltar por um bom tempo.
Espero que não.
— Você se importa de morarmos aqui ?
Morarmos?
— Morarmos? — repitoe o meu coração começa a
disparar . — Por que?
— Por que em alguns meses, você e eu estaremos
casados !
Capítulo 24
— Está me comunicando isso?
Não estou brava, nem magoada, apenas estou incrédula diante do
que Mosés fal ou há pouco, demorou um pouco p ara eu
retomasse minha co nsciência, ele falou a
palavra "morarmos" depois "casados".
Ou eu fiquei louca ou ele pirou de vez.
— Não. — Mosés fala e inclina a cabeça para o lado.
— Apenas estou dizendo que vamos nos casar, pedir, eu
peço para sua mãe , querida.
Nossa.
— Mas acho que deveria pedir para mim , não acha?
— Você quer casar comigo , Ana?
Tão simples assim?
Fico apavorada com o pedido, me inquieto e levanto, cruzo os braços
me sentindo contrariada.
—Mosés , você enlouqueceu?
Não se i por que , mas ele parece magoado com a pergunta,
minhas mãos tremem tanto que deixo a caneca no centro, ele também
coloca o prato no centro e fica me olhando em silêncio, espero que fale
alguma coisa , mas ele não responde.
— Mal nos conhecemos.
— Pois, sinto o contrário, você me conhece como nenhuma
outra , Ana. Fique calma, eu disse em alguns meses, não disse
amanhã.
A proposta ainda me deixa tensa , Mosés quer casar?
Por que? Para que?
— Eu prometo que não vai arrancar pedaço se morar
comigo, Ana, não sou baderneiro . — E le parece querer me
convencer disso . — T ambém vou trazer a minha funcionária p a ra
fazer tudo aqui.
—Mosés , isso é... é...
— É o certo — completa—eu não acho justo te levar para a
cama de qualquer jeito.
— Está sendo machista! — acuso engolindo a resposta.
— Estou fazendo o certo, eu quero fazer tudo certo com você ,
Ana.
Isso soa meio sombrio, quer dizer que fez errado com
outras mulheres?
—Mosés , casamento é coisa que envolve algo muito superior a
um simples "gostar".
— E o que envolve?
Minha garganta se fecha, ele quer mesmo continuar com essa
conversa, ele está realmente falando sério!
— Amor! —A palavra sai a força.
— A lguma vez eu disse que não a amo? — perguntabastante
sério . — S e fiz parecer que não, sinto muito, por que não era
isso o que eu queria dizer.
Ficamos nos olhando por alguns momentos, o azul de seus olhos está
mais intenso, e ele fala muito sério, mas estou tão apavorada com a
hipótese que não sei o que falar, como agir, meu corpo está duro, meu
coração acelerado.
— Não vai me perguntar também se eu a amo? Vai me achar
tolo por isso , Ana? Medíocre? — pergunta e abaixaa cabeça
olhando para as mãos.
— Não foi isso o que eu quis dizer —digo imediatamente .
— Só acho rápido.
— Eu não quero perder tempo . —Mosés fala e desvia o olhar .
— S e não puder aceitar isso , eu não sou homem para você.
— Você está me pressionando—falo ainda que sinta que de
alguma forma o magoo com isso.
— Não estou , Ana, apenas disse as minhas intenções, para que
não pense que não quero algo sério com você como aconteceu das outras
vezes . — E le se ergue . — Termine de comer , eu vou no meu
apartamento buscar meu note book e a lgumas coisas, por
favor, não tente me afastar , está bem?
Faço que sim com a cabeça, Mosés faz menção de se afastar, me
sinto mal, não queria acabar discutindo ou brigando por isso, me aproximo
e seguro seu braço.
— Eu gosto muito de você , Mosés, não é que eu não queira, eu
quero sim ficar com você, só não quero me precipitar .
— Não é precipitação , Ana, acho que você não entende que
estou apaixonado por você, não é possível que não tenha percebido.
— Eu ...
— Você o que? Me acha idiota por isso? Acha rápido?
— Você está muito na defensiva.
— Claro , acabei de pedir em casamento a mulher com quem
quero passar o resto dos meus dias e ela me chamou de louco por isso,
como quer que eu me sinta? Bem ? Feliz ?
— Não era a minha intenção.
Sinto vontade de chorar, seguro seu pescoço e o puxo para
baixo, beijo sua face e o agarro, Mosés me aperta com força, dentro de
mim tudo transborda.
Mosés me ama!
Ele me ama!
Ele não disse com essas palavras, mas ele me ama!
Ele quer passar tod os os dias de sua vida comigo, e
eu quero passar todos os dias da minha vida com ele.
— Vamos com calma — peço . — P or favor!
— Está be m, mas não pode se opor ao meu pedido de
noivado.
Ele beija o meu pescoço e o meu corpo se enche de sensações
boas.
— Que pedido?
—Ana , você está me provocando!
Sorrio, seguro sua face e o fito, Mosés cola a testa na minha e
percebo que ele sorri lentamente.
— Vai aceitar , Ana Beatrice?
— Você tem certeza que quer me chamar nesse tom tão
arrogante?
— Aceita ?
— Eu posso pensar?
Mosés faz que sim com a cabeça, lhe dou um beijinho no queixo.
— Te dou até o dia em que pedir para sua mãe!
— E quando seria isso?
— Amanhã embarcamos!
Ele me dá um selinho e se afasta para o rumo do qua rto,
mas estou sorrindo de orelha a orelha com isso.
—Mosés Handerson me pediu em casamento!
Termino o banho.
Acho que ele já voltou do apartamento dele, escutei o som da porta
do meu quarto a pouco.
Fecho a torneira e saio do box vestindo meu roupão, depois que
me seco , visto uma bata folgada e um short jeans mais comportado, seco
os cabelos, me olh o no espelho e estou sorrindo, há dias não
sorria.
Prendo meu cabelo já seco num rabo de cavalo e passo um pouco
de creme nas pernas , nos braços, eu nunca fui das mais
vaidosas, acho que por que eu realmente nunca tive motivos reais
p a ra ser vaidosa. Passo um pouco do meu perfume e brilho labial , eu
realmente estou mais pálida, não sinto que emagreci, mas estou
abatida, com olheiras, desde aquele dia eu não consigo d ormir
direito, chorei muitas vezes, só queria esquecer.
Saio do banheiro e dou de cara com Mosés diante de
mim, ele recua um passo um pouco sem jeito.
— Ia te chamar.
— Tomei banho.
— Aguei os vasos.
Sempre coloco água nos vasos , cuido das flores, por
incrível que pareça elas duram bastante , algumas vezes até
choro quando analiso o significado delas.
— Obrigada .
Mosés se inclina e me beija a cabeça respeitosamente.
— Deixaram um bilhete para você na mesa da cozinha!
De volta aos bilhetes!
Mas sorrio, faço que sim, ele me enlaça a cintura e saímos do
quarto juntos, logo que entro na sala , avisto em cima da mesa da cozinha
um lindo buquê de flores cor de rosa, sorrio novamente e beijo Mosés
levemente , me desvencilho de seus braços e vou para a co zinha,
tem uma carta da mesma cor das flores ao lado do buquê, fico
maravilhada co m a delicadeza de tudo .
Cheiro a s flores e abraço o buquê enquanto abro o
bilhete, estou muito ansiosa.
"Minha Ana, senti muito sua falta, pense no m eu pedido
com cuidado. Pedi nosso jantar, espero que goste de comida
francesa.
Ps: Eu não estou louco!
Mosés Hallan Handerson. "
— Vou pensar — afirmo baixinho e sorrio pela milésima vez ,
estou encantada com o romantismo que tem estampado nos
gestos de Mosés . — E u vou colocar a mesa p a r a o nosso jantar.
Já entardeceu, Mosés abriu a porta da sacada e as persianas, ele se
aproxima, novamente descalço, parece mais tranquilo agora, deixo a flor
de lado e o abraço, eu o beijo, acho tão fofo que me dê flores, que escreva
esses bilhetes idiotas.
— Obrigada ! — digo , e dou mais um selinho nele .
— S ão perfeitas.
— E u pedi p a ra Guadalupe fazer uma mala p a ra mim, trouxe
p a ra nossa viajem, Sêmora me disse que sua mãe mora em San
Antônio. J á reservei o jato.
Você tem um Jato?
— Ok! — Eu acabo por falar, Mosés tem um jato!
— Acho mais rápido.
— Posso ligar para minha mãe nos buscar no aeroporto , se
quiser.
— A seguradora vai me alugar um carro.
— Está bem, então eu vou ligar para minha mãe e avisar que
estamos indo.
— Acha que ela vai gostar de mim?
Olho p a ra Mosés e não faço ideia d o porquê ele está
com essa insegurança , qualquer mulher na face da
terra gostaria de um homem como ele , inclusive a minha mãe.
— É claro que vai, m inha mãe não é enjoada .
Me afasto e pego um vazo na e stante, ligo a torneira
enquanto desfaço o nó e tiro os plásticos do buquê, Mosés começa a pegar
os pratos nos armários, isso p ara ele parece muito
comum. Mosés parece ser daqueles homens que sabem se virar
sozinhos, e deve saber mesmo , já que é solteiro, ou era, ah!
Nem sei mais.
— No seu registro da empresa fala que nasceu em Reno.
— É , eu nasci e cresci em Reno, toda a família da minha mãe
mora lá, mas metade da família do meu pai mora no Texas, então eu cresci
indo e voltando, quando meu pai morreu, mamãe se mudou
totalmente para o Texas.
— Você tem irmãos?
— duas Irmãs , as duas são casadas, uma com um advogado e
a outra com um engenheiro.
Coloco as flores no vazo e deixo no centro da mesa, Mosés
começa a colocar os pratos, pego os talheres e as taças, me sinto bem pelo
fato dele estar aqui. Logo que terminamos ele me estende a mão e vamos
p a ra sala, nos sentamos no sofá e Mosés vai p a r a o out ro canto
recostando-se , ele me puxa e me beija, fico de joelhos tentando
encontrar algum jeito para que fiquemos assim , mas não encontro.
— Vem aqui , Ana, pode deitar ao meu lado.
— Acho que não cabe nós dois aqui.
— Claro que cabe, vem aqui p a r a o canto.
Obedeço, ele vai mais para o lado e me acomodo também de
lado, Mosés enfia as pernas nas minhas e passa o braço envolta de mim, a
mão é suave e acaricia minhas costas enquanto novamente nos beijamos, é
muito bom beija-lo, meu corpo todo se arrepia quando sua língua pede por
mais.
— Eu sinto muito por tudo o que houve , Ana . — Mosés fala
logo que se afasta, e toca a minha bochecha com a ponta dos dedos .
— S into tanto...
— Eu sei que sente , Mosés . — Eu entendo muito bem a
posição dele em tudo isso.
— Não importa o que digam, ainda vou continuar gostando de
você.
Eu também sei que me sinto assim em relação a ele.
— Eu também continuarei gostando de você , Mosés.
Ele sorri e me beija. Não quero pensar em nada mais,
apenas no aqui e o agora, amanhã será um outro dia.
O Restaurante entregou sacolas de cor preta p a ra Mosés.
Ascendi as velas e apaguei as luzes, enquanto ele se aproxima
com as sacolas organizo os pratos na mesa com mais cuidado. Logo ele
vai retirando os pratos prontos com louças de cor branca, vai deixando
tudo num canto da mesa, a comida cheira muito bem e parece ter sido
feita agora mesmo.
Me aproximo da minha cadeira , e rapidamente ele est á ao
meu lado puxando-a para que eu me sente. Acho gesto
fofo e acabo corando, ele me beija a bochecha e pega o
primeiro prato para nos servir.
—Nossa entrada é uma Sopa de cebola francesa
gratinada .
Observo o pequeno pote de porcelan a com a sopa, a
casquinha gratinada me faz e salivar, é a primeira vez em dias
que eu sinto apetite .
Ele se senta diante de mim e afasta o vazo de flores p a ra um
outro canto, pega o vinho de uma das sacolas que deixou numa outra
cadeira e abre, nos serve enquanto fala:
— A sopa de cebola francesa tem um sabor único e diferente, é
preparada com vinho branco, pão torrado e pode ser coberta por diversos
tipos de queijo, em especial o tradicional gruyère, uma especiaria
Francesa.
Mosés tem um excelente gosto por culinária, acho que fui muito
leiga no s dias em que ele esteve aqui, por lhe servir coisas
tão simples.
— Sem glúten —completa ele— O meu , é claro.
— Deveria ter me dito que era alérgico a glúten também
— pego a taça e bebo um pouco do vinho.
— Sou alérgico a glúten , cacau e abelhas . — Mosés fala
com naturalidade . —Eh bien cher appétit!
Acho que isso quer dizer bom apetite , e é muito chique vindo
dele!
Pego a colher e furo a casca de queijo, percebo a elegância e
educação estampados nos gestos de Mosés, ele com certeza deve ter tido
muitas oportunidades na vida com os Handerson, quando provo da
primeira colherada, arregalo os olhos.
Isso é uma delícia.
— Muito bom , não é mesmo? — questionae faço que
sim , mastigando os pedaços de creme de cebola com queijo .
— P odemos pedir mais vezes.
— Com certeza —concordo maravilhada com o sabor da
sopa . — É uma delícia.
— A culinária francesa é uma das minhas prediletas, do que
você gosta?
— Macarrão. — Eu sopro a sopa pois está muito quente .
— P ensei que não gostasse de ensopado.
— Tinha glúten no seu ensopado — argumenta ele . — Eu
não como nada sem saber a procedência.
— Deve ser difícil ficar escolhendo o que comer.
— Da última vez que eu comi uma massa comum por engano ,
eu fiquei dois dias me coçando.
E eu que achava que era frescura, isso deve ser como a alergia da
minha mãe a amendoim , ela fica toda empelotada e inchada s e
provar qualquer coisa derivada do amendoim .
— Eu tenho um cozinheiro que me acompanha sempre.
— Viaja muito?
— Quase sempre, a Handerson cresce.
— Deve ser bom conhecer tantos lugares.
— E você?
— Só nas férias, costumo ver a minha mãe, e já participei
de dois treinamentos fora , pela Handerson , mas não viajo muito.
— Tem algum lugar que gostaria de conhecer?
— Eu sou bem caseira, na verdade nunca fui além de Remo, San
Antônio e Dallas, já estive em Jersey para dois treinamentos , como te
disse.
— Você já foi na praia?
— Nunca —sorrio — Por acaso, vale um pequeno
lago ?
Ele sorri assim muito natural, e esse sorriso é lindo.
— Não , não vale — esclarece.
Sorrio e como o resto da minha sopa em silêncio, Mosés
também. Logo que terminamos , ele se levanta e recolhe
tudo o que sujamos, levando para pia. Então, pega duas
vasilhas de plástico transparente e nos s erve o que parece ser,
duas torta s salgadas pequenas. De outra vasilha, com o
pegador ele serv e salada de peito de peru .
— Quiche L orraine, é tradicional da regi ão da
Alsácia, tem recheio preparado com bacon, creme de leite, manteiga e
noz-moscada —fala enquanto nos serve.
Poxa, que chique!
A pequena torta é bonita e também quentinha, sorrio e pego o
garfo, todo o ambiente é romântico e agradável, mas muit o melhor é a
gentileza nos gestos de Mosés, ele é muito atencioso comigo, educado,
ele se senta e estendo a mão segurando a sua, me olha parecendo
surpreso.
— Obrigada, Mosés.
— De nada, querida!
E le ergue a minha mão e beija, acho que estou
namorando alguém secretamente romântico, um homem que eu pensei
que não exist ia mais na face da terra, educado e reservado
demais, e eu não sinto como se fizesse isso só p ara me
agradar. Mosés é assim, e descobrir que ele sempre s e esconde
por trás da arrogância e frieza que conheci na empr esa é
maravilhosamente bom, por que tira da minha cabeça e do meu
coração , os pensamentos ruins que tive ao seu respeito.
Sei que ele sofreu muito na infância, do abandono, do med o, de
tantas coisas. T alvez , seja como Mosés realmente falou,
ele nunca se abriu realmente p a ra alguém, por isso acho que ele
quer logo vive r todos os momentos comigo, porque
pensa que encontrou a pessoa certa . A cho que encontrei no meu
chefe Chefe demoníaco , alguém p a r a passar o resto da minha
vida também.
Quero ficar com Mosés.
A tortinha estava tão deliciosa que eu mal vi que terminei,
a salada era mais simples, mas os cubinhos de peito de
peru tinham um gosto diferente, e eram crocantes.
Dessa vez eu retiro os pratos, bebo um pouco de vinho, e acho que
não consigo comer mais nada, mas ainda tem outras vasilhas no canto da
mesa.
— Quer sobremesa?
— Acho que não aguento mais nada.
— Mas eu pedi especialmente para você , Bê.
Bê!
Da vontade de apertar as bochechas dele.
Sorrio retornando à mesa, faço que sim, Mosés abre as vasilhas e
retira delas duas sobremesas em plaquinhas brancas de porcelana, ele me
dá uma e fica com a outra, observo as cerejas e frutas vermelhas dentro
do doce pequeno, umedeço os lábios.
— Clafoutis. — E le fala.
Mosés se senta na cadeira ao lado da minha, pega a colher e enfia
em sua sobremesa depois ergue diante de mim, sorrio e aceito, nesse
momento ele me beija, sua língua me toma o doce, e me arrepio toda com
a sensação de compartilharmos o mesmo gosto, toco sua nuca
correspondendo-o, é muito gostoso beijar assim.
— S em glúten! — completo entre o beijo.
Mosés sorri e mordisca os meus lábios com carinho, ele me puxa e
me aperta num abraço forte.
— V ocê gostou do jantar , Bê?
— Sim, obrigada , estava tudo perfeito.
Nos beijamos, toco sua barba, e Mosés solta os meus cabelos, enfia
a mão neles fazendo carinho, ele gosta disso.
— T e adoro , Ana, quero que você fique bem.
— Eu estou bem.
— Não quero que você me tranque do lado de fora da sua casa
nunca mais.
Seu olhar diz mais algo como: não me expulse da sua vida nunca
mais Ana!
— Não vou fazer isso.
— Vou lavar os pratos, você quer ir arrumar a sua mala?
Ainda nem liguei para m inha mãe avisando que eu
iria, ainda mais acompanhada!
— T em certeza que você não está com febre?
— V ocê ainda não sabe metade dos meus dotes domésticos ,
senhor Senhor ita Preston.
Eu também não te achava engraçado até quase dois meses atrás.
— Deixa a louça que eu lavo...
— Eu vou lavar, eu já melhorei graças aos seus cuidados, agora
eu cuido de você , minha Bebê!
Ele levanta.
— Vou guardar a sobremesa na geladeira.
—Mosés...
—Ana , não comece com as suas teimosias, eu estou bem, eu
sei me virar na cozinha, faça sua mala, partiremos amanhã cedo.
Acho que não adianta bater boca com Mosés, quando ele estava
doente ainda dependia de mim, mas agora ele está curado e volta
lentamente a sua forma de ser, também não acho que ele tenha mudado,
agora é só que ele não precisa mais tanto de mim como antes.
— Está bem.
Beijo-lhe a face e me afasto , mas não estou brava, vou p a r ao
meu quarto e pego uma das minhas malas no closet, logo em seguida ligo o
meu celular e pego o telefone no criado.
— Hora de avisar para a família monstro que eu chego
logo... e acompanhada.
— Oi !
— Mãe , sou eu, Bea.
Claro que ela sabe que sou eu, mas estou meio nervosa.
—"B"—mamãe fala e sua voz se alegra . — V ocê está bem ,
filha? T e liguei essa semana e não atendeu, Sêmora disse que andava
ocupada na empresa.
Ela ligou p a ra m im, como não a tendi ligou p a ra Sêmora,
ela sempre faz isso quando não consegue falar comigo, minha mãe é
meio paranoica as vezes.
— Tudo bem , B?
— Sim , então, como vão as coisas aí ?
— Fazendo torta para suas irmãs, você está bem , querida?
Às vezes eu sinto que a minha mãe ama mais as minhas irmãs do
que eu, e olha que—nada contra— eu saide dentro dela, as outras duas
são sobrinhas, mas enfim, não posso comparar , Brigeth e Fiance
sempre serão as filhas perfeitas de mamãe, tudo o que não sou, lindas,
magras, fizeram cursos em San Antônio e se casaram muito bem, elas e
mamãe gostam das mesmas coisas.
— Sim , hei, mãe, eu... conheci alguém!
— Conheceu? — M amãe repete e parece estar procurando
algo nos armários.
Crio coragem.
— Sim , e estamos namorando! — revelo.
— Ah, querida , que bom . — M amãe fala com
naturalidade . — C adê
o açúcar refinado... açúcar Refinado... açúcar ... ah, achei!
Suspiro, não sei por que achei que p a ra ela seria grande
coisa, deve imaginar que já namoro e nunca falo, quando na verdade, esse
é o meu primeiro namoro sério, bem sério.
— Mãe , eu quero te visitar, ganhei uma folga do trabalho esses
dias, vou amanhã, a senhor Senhor a prepara o meu quarto?
— Sim , claro.
— Ele vai comigo.
— Ele quem , querida?
Nossa!
— M ãe, está me ouvindo ou me ignorando só de propósito?
— perguntoirritada . — O meu namorado , ora s .
— Ok , namorado, calma . — M amãe repete parecendo cair
em si — , mas amanhã?
— Não pode? —Me irritei também com seu pouco caso.
— Claro que pode, é que eu não posso errar a mão .
— M amãe justifica do outro lado da linha. — Traz ele p a ra que
nós conheçamos, é o irmão da Sêmora?
— Ai mãe, tchau!
— Mas B...
Desligo.
Odeio quando ela faz isso, se fosse a Breh ou a Fiance ela estaria
vomitando um arco-íris , foi bem assim quando elas ficaram
noivas, eu sei, eu estava lá acompanhando tudo de camarote.
Olho p a ra mala e suspiro.
— H ora de fazer as malas!
Capítulo 25
Acordo.
Mosés está fazendo carinho na minha barriga, beijando a curva do
meu pescoço. Me viro na cama e o abraço sentindo preguiça, ele me
aperta com carinho, depois se ergue, abro os olhos vendo-o sair da cama,
ele está com o pijama que eu o vi usando ontem quando veio para
a cama, acho que eu estava tão cansada que quando terminei de arrumar
a mala me deitei aqui e comecei a cochilar, d espertei com ele se
deitando ao meu lado , me aconcheguei ao seu corpo e voltei a
dormir. Me ergo, me estico e vou para o banheiro, ele vem logo atrás de
mim passando o braço envolta da minha cintura.
— Dormiu bem? — pergunta.
— Dormi — respondo e bocejo . — N ossa capotei.
— Isso é muito bom. — Mosés me dá um beijo na
cabeça . — Fico feliz em saber que descansou.
— E você? — Nós entramos no banheiro.
— Senti falta de dormir com você, acho que dormi muito bem
— fala e vai para o vazo — Vou usar o outro banheiro! —
Ele se mostra sem graça, e eu disfarço.
— Ok !
Ele sai do banheiro, e fecha a porta para mim. Eu faço
minha higiene matinal e vou p a r a o closet, visto um jeans escuro, uma
blusa branca de manguinhas e coloco um casaco rosa por cima, calço um
par de sapatilhas baixas, volto ao banheiro e penteio os meus cabelo s,
deixo de lado, passo um brilho labial transparente e me
olho no espelho.
Pego minha bolsa, a minha mala, e depois vou para a
sala. Mosés já está na cozinha mexendo no fogão, de costas percebo
sua real altura, claro, sou mais alta que a maioria das mulheres comuns,
mas acho que não reparei tanto em Mosés desde que ele chegou ontem,
ele tomou banho, usa uma camisa branca social e uma calça preta mais
justa, sapatos de cor marrom, preciso admitir que ele sabe realmente como
se vestir.
Eu meio que isolo o "lindo, tesão, bonito e gostosã o" sempre
que vejo o Mosés, por que sei, que as possibilidades de um
cara desses me querer são nulas, e se eu ficar pens ando
muito nessas coisas, me sentirei muito mais ridícula do que já
sou , então, melhor não ficar fantasiando muito com isso,
independentemente da beleza exterior — que não é pouca —
Mosés é um perfeito cavalheiro comigo.
Acho que não seria eu s e desse tanto valor a um
estereótipo , claro, mentiria se dissesse que eu não gostaria de ter um
cara assim ao meu lado, mas sei lá, seria estranho estar com Mosés
apenas pela a parência dele, seria como estar com
alguém apenas por interesse. Eu não sou nenhum pouco
interesseira, e eu não sou tão fútil também.
Ele colocou a mesa para nós , deixo minha mala num canto e
vou de fininho até ele, o abraço por trás e Mosés me olha meio de lado ,
depois me dá um pequeno sorriso.
— Você está linda!
— Obrigada .
Ele m e dá um selinho e fico ao seu lado, Mosés está
preparando café, a torradeira já está ligada, ele dobrou as mangas da
camisa social , resolvo ajudar e busco a geleia na
geladeira.
— Saímos em meia hora — diz ele.
— Tudo bem. — Eu falo tentando não demonstrar
meu nervosismo
Só espero que essa viag em p a ra casa da minha mãe
seja dentro do possível agradável, e que até lá, eu consiga sobreviver a
estadia em sua casa.
Após nosso rápido café, descemos rapidamente e um
táxi nos esperava na porta do meu prédio, o que me deixou um
pouco surpresa também, mas nem se o motivo para
falar a verdade. Nesse momento, estamos chegando ao aeroporto,
nosso percurso até aqui também foi silencioso, ele passou o braço envolta
de mim durante todo o caminho e ficamos com nossas mãos entrelaçadas.
O táxi nos deixa na entrada do aeroporto.
— Não havia quem voltasse com o meu carro, eu dispensei meu
motorista.
Você tem um motorista? Questiono mentalmente, mas a
pergunta é um tanto idiota. É claro que Mosés
Handerson tem motorista! Se ele tem até um jato
particular. Às vezes eu me esqueço que estou
namorando um multimilionário, justamente pelo fato de
não me importar com essas coisas.
— Claro. — Eu tento disfarçar meus
pensamentos com um sorriso, mas não sei se me sai
muito bem.
O taxista nos ajuda a pegar as malas, a dele é uma mala de mão
pequena, a minha é a comum de rodinhas, coloco minha bolsa no ombro e
Mosés paga ao taxista, subimos na calçada e ele segura a minha mão,
entramos no aeroporto de mãos dadas.
Mosés entrelaça os dedos nos meus e vamos juntos fazer o
check - in, espero perto da fila enquanto ele fala com a atendente,
também não gosto do jeito como a mulher sorri para ele, nem da forma
como ela olha para ele, nem disfarça , só falta comer ele.
—Bê , traz seus documentos.
Estou vermelha enquanto me aproximo, pego minha carteira e
Mosés também pega a dele.
— Aluguei de última hora . — Mosés entrega seus
documentos.
— Reservou a da sua irmã também? — pergunta a
atendente mexendo no computador.
— M inha noiva . — Mosés esclarece.
Entrego minha documentação para a moça, ela fica vermelha
como um pimentão, o que ser á que fez ela achar que somos
irmãos? Nós somos completamente diferentes, ainda assim não gostei.
Também pensei que iríamos no jato que ele disse ter, de
qualquer forma, não quero pensar nisso. A moça nos entrega
os bilhetes e Mosés pega de uma forma muito indif erente, e
entrega a minha mala. E le mal olha na cara da atendente quando
pega as etiquetas das malas, e vamos para as plataformas de
embarque. Ficamos em silêncio por todo o percurso at é nosso avião,
logo que entramos, uma aeromoça nos recebe com um sorriso
enorme, olho para todos os bancos, estão vazios.
— Bem-vindo, Senhor Senhor Handerson.
— Obrigado, Maggie.
— Bem-vinda, senhor Senhor ita Preston.
— Obrigada .
Não é um avião tão grande, mas suficiente para umas vinte
pessoas, este é o jatinho de Mosés? Um avião de pequeno porte?
— Por favor , me acompanhem!
Seguimos Maggie, ela nos mostra nossos assentos ,
Mosés agradece e me sento na poltrona da janela, ele ao meu lado.
Colocamos os cintos e Maggie some nas cortinas no começo do avião,
alguém trancou a porta, o comandante se apresenta e duas tv TV s
p equenas descem do teto.
— Desculpe pelo contratempo .
Estou sem graça.
— Sem problemas.
— Não fique emburrada!
— Eu não estou.
Ele segura a minha mão e a beija com carinho.
— Logo estaremos no seu lar , Ana.
— É— concordo surpresa , mas sem empolgação .
— Logo .
Dormi durante o voo.
Quando acordei já estávamos quase aterrissando .
Meus olhos contemplaram a pouco um dia ensolarado e muito
diferente dos meus dias em Nova York, San Antônio é uma cidade grande,
mas ao menos não fede a fumaça, e o sol aqui é mais quente, mais
gostoso, no fundo, no fundo eu sinto um pouco de falta desse lugar.
Fomos para o estacionamento logo que nos despedimos de
Maggie, fui muito b em tratada durante o voo, ela deu um chá e
cobertas, p a ra mim e Mosés, havia um rapaz nos esperando com as
chaves do carro na mão, o carro é simples, um modelo comum, o rapaz da
seguradora nos ajudou a guardar as malas e logo Mosés estava nos
levando p a ra longe do aeroporto.
Coloquei o destino no gps, abri o vidro da janela e estou mais uma
vez observando o movimento na rodovia, Mosés dirige em silêncio, ele está
concentrado, acima de tudo como sempre muito sério, calado.
Mexo no painel do carro e procuro o cabo do meu celular na bolsa,
acho que ele não irá se incomodar se eu ouvir uma musiquinha no caminho
até a casa de mamãe, será quase uma hora e meia até lá.
— O que quer ouvir? — Mosés pergunta e enfia o celular
del e num suporte no painel, é um I phone de cor preta e mexe
atento ao caminho.
—Chris Isaak , Wicked Game — falo su r presa.
Rapidamente a música começa a soar dentro do carro, o
volume é mais alto , porém , muito agradável, Mosés aperta um botão e a
minha janela começa a se fechar, mas ele abre o teto solar do carro, o
vento entra livremente.
— Acha que sua mãe vai gostar de mim?
— Por que ela não gostaria de você , Mosés? Você é bonito!
Mosés me olha com um sorriso meio estranho e nega com a
cabeça , atento ao caminho.
— Às vezes ser bonito não é o suficiente , Ana.
— É rico! — argumentoe dou de ombros— E bonito.
— É por isso que você aceitou namorar comigo? —
pergunta, e não sei por que está magoado.
Sei perceber quando Mosés está magoado, mas não era minha
intenção, eu só estava brincando.
— Não, acho que é por que você é muito diferente do que
eu pensei, alguém carinhoso e atencioso.
— Eu não sou tão vazio quanto pareço , Ana!
— Eu sei disso, só estava brincando.
— Ah .
Ele não fala mais depois disso, nem eu, acho que estraguei o clima
amistoso entre nós com a minha brincadeira desnecessária.
Começou a chover muito forte logo que tomamos a via principal
até o bairro onde a minha mãe mora, Monte Vista, m as logo que
reconheci através do vidro embaçado , a rua que fica dois quarteirões
p a ra baixo da casa da minha mãe , ouvimos o som do pneu
estourando, Mosés encostou perto da calçada e suspirou,
percebia sua irritação de longe.
Já faz uns vinte minutos que estamos parados no acostamento
com os para-brisas ligados , e a chuva ca i com força total , ele
deixou o ar ligado e mexe no celular em silêncio, percebo
que realmente o irritei com o meu come ntário. Mosés me paga da
pior forma, ele fica apenas calado, não gosto disso, queria ao menos que
me dirigisse a palavra.
Ficamos assim por mais alguns momentos e dentro de mim
começa a surgir a frustração
—Mosés...
— Estou resolvendo algo agora , Ana, um momento.
Ele se quer olha na minha cara enquanto fala, me irrito, acho que
não era para tanto, francamente, não precisava apelar desse jeito. Tiro o
cinto, abro a porta do carro e saio sem me importar também, sei o
caminho para casa.
Enquanto me afasto do carro a chuva cai incessante em minha
cabeça, começo a fica r ensopada quando tento me orientar, já vou
subindo a rua pela calçada, o tempo em San Antônio muda bastante
nessas épocas do ano, em alguns bairros chove bastante no verão, o que é
o caso.
—Ana , por que saiu do carro?
Sinto um puxão firme no braço, eu o olho, Mosés está ensopado, os
cabelos caem dos lados do rosto, sua camisa grudada no corpo, ele me
encara absolutamente confuso.
— Nem adianta fazer essa cara de coitado — reclamo
— E u disse que estava brincando.
— E u sei — responde impaciente . — Vamos voltar para
o carro, o guincho chega em meia hora.
— A casa da minha mãe fica a dois quarteirões — falo
nervosa . — Pode esperar no carro, depois eu venho te buscar.
— Vou com você , então — responde.
Viro e vou andando pela calçada sem conseguir olhar na cara dele,
me precipitei, n ovamente estou sendo infantil, eu acho. Não
tinha intenção de magoar o Mosés com o meu comentário, eu não queria
também que ele ficasse bravo.
— Está chovendo muito . — Ele fala meio alto e segura a
minha mão—vamos esperar cessar.
— Já estamos quase chegando! — falo.
— Para de ser orgulhosa , Ana!
— Eu não estou sendo orgulhosa, apenas brinquei.
— Não sou obrigado a gostar das suas brincadeiras.
— Eu sei, me desculpe.
Mosés me puxa com força e o solavanco me faz ir para junto
dele, depois disso a boca dele está na minha, exigente, forte, quente, as
gotas de chuva caem queimando meus ombros e braços, mas me
vejo enlaçando-o pelo pescoço, correspondendo-o, sentindo seu gosto, o
gosto das gotas d'água, a água é gelada, mas o beijo esquenta meu
estômago.
Exploro sua boca com a mesma intensidade, seu peito é quente de
encontro aos meus seios, e suas mãos se enfiam por baixo do meu casaco
tocando as minhas costas, são suaves e me provocam arrepios, sensações
maravilhosas, Mosés me aperta mais agressivo e me inclino p a ra trás
recebendo sua língua quente e voraz, minhas mãos sobem e se enfiam em
seus cabelos, sua barba arranha os cantos da minha boca, se passa um
momento intenso em que meu corpo recebe as ondas mais quentes
resultantes da excitação de seu beijo, e quando ele se afasta percebo que
perdi a cabeça por alguns minutos.
— Eu não vou brigar com você — fala baixinho .
— Entendeu ?
— Sim .
Lentamente se inclina e mordisca meu queixo, a boca quente
novamente espalha ondas de prazer pelo meu corpo, eu o abraço meio
zonza ainda com o beijo.
— Desculpe, Mosés, eu não quis insinuar que você só
tem beleza e dinheiro .
— Eu sei que não , meu amor.
Meu Amor!
Nos beijamos mais uma vez e Mosés passa o braço envolta da
minha cintura, indico o caminho e vamos mais rápido pela calçada,
descemos a rua da senhor Senhor a Bender — a mais velha e antiga e
fofoqueira da cidade — e atravessamos para a casa da minha mãe,
subimos no passeio e vamos correndo para a fachada de entrada, que
não é lá essas coisas, estamos encharcados quando subimos os
degraus.
Não tenho as chaves da casa da minha mãe, toco a campainha,
Mosés tira a camisa para fora da calça parecendo meio incomodado, ele
puxa os cabelos para trás e puxa as mangas da camisa para cima,
arrumo a gola de sua camisa e ele me beija, percebo seu nervosismo.
— Calma , minha mãe não é um bicho de sete cabeças.
— É que eu nunca conheci nenhuma das mães das minhas ex!
Franzo a testa, Mosés sorri meio de lado, tira o relógio do bolso e
coloca no pulso rapidamente, escuto os passos de mamãe, olho envolta e
mal acredito no que ele acabou de me falar.
Mamãe abre a porta, e vejo, o par de olhos azuis que conheço se
arregalarem em espanto, ela primeiro me olha de cima abaixo, depois
olha para o Mosés e percebo sua incredulidade.
— B! —Mamãe fala chocada . — F ilha, você está
ensopada!
Isso é tão a minha mãe!
— É —respondo sem graça . — Mãe esse é o Mosés, o meu
namorado, Mosés essa é a minha mãe, Helena Preston.
— Muito prazer . — Mosés estende a mão para minha
mãe.
Ela fica parada segurando a porta como se estivesse vendo um
fantasma, a demora me deixa constrangida, mamãe está literalmente
boquiaberta.
— Mãe ?
— Ah , é claro . — Mamãe ergue a mão e segur a a de
Mosés em um cumprimento rápido . — E ntrem.
— O pneu do carro furou a duas ruas para cima . — Aviso
enquanto entro na casa que cresci, ou mais ou menos isso—vem Mosés.
— Com licença—ele fala bastante educado.
— Pensei que viria só, chamei suas...
Nem precisa dela falar, logo que entramos na sala vejo minhas duas
irmãs muito bem sentadas nos sofás da sala, Bree usa um vestido, azul de
alcinhas e Fiance um amarelo mais longo, os rapazes jogam cartas no chão
perto da lareira, Petter e Brood meus cunhados, Petter casado com
Bregeth—ou Bree—e Brood casado com a Fiance.
Todos ficam nos olhando assim muito incrédulos.
— Vou buscar toalhas . — Mamãe fala quebrando o silêncio
que se estabeleceu na sala depois que entramos , e some para o rumo
da cozinha.
—Mosés essas são as minhas irmãs, Brigeth e Fiance, Petter e
Brood são seus esposos— explico, mas não estou das mais
constrangidas . — E sse é o Mosés Handerson, meu namorado.
Fiance olha p a ra Bree e per cebo esse olhar que já
conheço há anos, mas acho que não devo explicações da minha vida
p a ra nenhuma das duas ingratas.
— P ronto . — Mamãe fala voltando para a sala com uma
pilha de toalhas . — Tem roupas secas para você no seu quarto.
— Eu me viro — aceito as toalhas e entrego uma p a ra
Mosés . — V em Mosés.
Eu não acredito que mamãe esqueceu que eu traria ele, ou melhor,
eu não acredito que ela não me escutou quand o liguei ontem
avisando que viria com ele, as vezes parece que ela faz todo esse
pouco caso de propósito. Ele me segue em silêncio, subimos para o
andar de cima e vou direto para o meu quarto . Foi a pior ideia
de todo o mundo, sair do carro com uma chuva forte dessas, as
vezes eu sou tão impulsiva.
Entramos no meu quarto e tranco a porta, indico o banheiro para
ele e vou no meu armário.
— Deve ter alguma roupa minha que te serve . — Isso é
muito provável — , mas acho que ficarão meio grandes.
— Sem problema . — Mosés está secando os cabelos .
— V ou pedir que tragam o carro p a ra cá.
— Tudo bem.
— Você está bem , Ana?
— Estou , só estou chateada por que ela esqueceu,
mamãe é rainha em fazer esse tipo de coisa comigo.
— Esqueceu o que?
— Que eu te traria, ela ignorou, não acreditou em mim, você
não viu a cara dela? Das minhas irmãs?
— Posso entender, talvez ela estivesse muito ocupada.
Suspiro, uma torta é mais importante que eu!
— Ela estava fazendo uma torta.
Pego a muda de roupas e me viro para ele, Mosés está abrindo o
cinto, minhas bochechas queimam, ele parece muito pensativo, obviamente
que é muito natural para ele se despir assim na minha frente, até algumas
semanas atrás eu quem estava dando banho nele, mas agora... agora é
diferente.
—Não fique assim . — Mosés diz e me olha bastante sério.
— Ok — consigo falar e pego um vestido qualquer que mamãe
sempre deixa dobrado p a ra eu ficar em casa . — S uas roupas.
Mosés se aproxima e pega a muda de roupas, depois ele abre o
zíper da calça e puxa para baixo exibindo uma cueca box preta.
— Vou ... ali... já volto.
Me sinto quente, me sinto envergonhada, me sinto... nem sei como
me sinto.
Vou para o meu banheiro e quando fecho a porta sinto como se
o meu coração fosse sair pela boca. Depois de alguns momentos me dispo
e me seco bem, depois que abro o vestido me lembro que não trouxe
roupas íntimas.
— Que besteira , Ana, até parece que ele vai perceber que está
olhando.
Me enrolo na toalha e coloco uma outra nos cabelos, respiro
fundo, depois abro a p orta do banheiro, e logo dou um pulo.
Mosés está diante de mim usando a minha camisa preta de dormir enorme,
sinto vontade de rir, ficou na altura dos quadris dele.
— Muito engraçado , não é mesmo? —questiona ele, mas
está sorrindo.
— Desculpe. — Eu coloco a mão na boca, Mosés se
aproxima e me abraça beijando meu pescoço . — Mosés...
— Chega com essa vergonha Ana, já disse que você é uma
mulher linda, para com isso.
— Isso é inevitável — falo sem jeito e fecho os olhos — O
que quer?
— De verdade? — perguntae inclino a cabeça para trás,
minha respiração se acelera . — T e quero.
Ele me beija, ergo as mãos e toco sua face beijando-o também,
meu coração novamente está aos saltos, acho que para ele as coisas são
um pouco mais... difíceis, mas esses beijos eu confesso que estão me
deixando realmente fora de mim, Mosés me deseja, eu sei que sim, ele me
quer.
— Até que nos casemos podemos falar mais sobre isso? —
pergunta e sua boca está na minha orelha, ele morde e me encolho toda
cheia de arrepios.
— Sobre o que? — pergunto toda mole.
Mosés segura a minha mão e leva até seu corpo, a
coloca sob re sua ereção e sinto a dureza por cima da cueca molhada.
— Isso — fala baixinho e mordisca o lóbulo da minha orelha .
— F az mais de seis meses que eu não faço sexo e isso não ajuda.
— P osso entender — engulo a seco , mas não consigo tirar a
mão . — V ocê está pronto p a ra algo além disso , Mosés?
— Estou pronto para você , Ana . — E le segura as minhas
faces e me olha no fundo dos olhos . — V ocê está pronta para mim?
— S im! — respondosincera . — A pesar de tudo , eu estou
pronta para o nosso relacionamento.
— Então não tem que se preocupar com isso, o que vem além,
eu não vou te desvirginar de qualquer jeito, já disse que sei esperar.
— Está sendo contraditório.
— Acho que até lá podemos brincar... um pouco.
Brincar?
— Em que sentido?
Mosés toca os meus ombros com delicadeza, depois ele desce as
mãos até a toalha que me envolve, eu seguro as suas mãos quando ele
toca o tecido grosso, e o fito bastante séria.
— Me deixe mostrar o quanto isso pode ser bom , Ana?
— Na casa da minha mãe?
— Na sua cama!
Capítulo 26
—Mosés...
—Eu prometo que se não gostar eu nunca mais
tento nada.
Suspiro.
Olho para baixo e me afasto, vou até a janela do
meu quarto, mamãe deixou as cortinas abertas, eu não
posso negar que estou tão... tentada, mas ao mesmo
tempo um senso de pudor imenso me atinge, não só de
pudor, mas também de medo, acho que é isso, me sinto
ridícula em pensar que terei que ficar nua na frente de
um homem, e se ele me achar ridícula? E se ele achar
meu corpo feio? E se ele rir de mim?
Nada em mim é normal, nada em mim é assim
muito bonito ou no lugar.
—Tudo bem, Ana...
—Eu tenho muita vergonha —interrompo. —
Não é você.
—Não precisa ter vergonha de mim, Ana. —
Mosés fala e sei que está atrás de mim, sinto sua
proximidade, ele toca os meus ombros com suavidade.
—Meu corpo não é como o das outras mulheres
—falo sincera.
—Quero falar por mim mesmo. — Suas mãos
acariciam meus ombros numa massagem gostosa. —
Você precisa relaxar querida.
Isso está funcionando, ele está me seduzindo, e
eu tenho ciência disso, seu toque é tão gostoso.
Mosés me toca os ombros com força e um
choque bom percorre o local, a massagem é realmente
deliciosa, estou paralisada tentando encontrar motivos
para me afastar, meu cérebro funciona, mas meu
corpo... meu corpo não reage.
Lentamente suas mãos descem para as minhas
costas e sobem, e meu corpo todo se arrepia com a
sensação de ser tocada assim, aperto a parte da frente
da toalha com força e as mãos dele vem para a frente
do meu corpo tocando meu pescoço com zelo, cuidado,
um carinho extremo em seus gestos.
Suas mãos descem pelos meus braços e sinto um
beijo molhado na nuca, dessa vez, até os cabelos da
minha cabeça ficam ouriçados, Mosés beija meu
pescoço enquanto suas mãos sobem e descem nos meus
braços, minhas pernas tremem quando ele me beija o
ombro e mordisca do nada minha orelha, um gemido
involuntário se forma na minha garganta.
—Minha — diz baixinho e mordisca meu
pescoço. — Somente minha!
Lentamente Mosés me abraça e me cobre as
costas de beijos, me apoio no batente da janela, sua
barba arranha minhas costas enquanto suas mãos sobem
para os meus seios, ele se curva e abre a toalha, abro
os olhos segurando as pontas da toalha que cai até a
altura da minha cintura, ele mordisca meu ombro com
força e arfo, porque sua mão agora sem impedimento
algum, apertam meus seios com força, e isso é
delicioso, um friozinho gostoso atinge meu estômago.
Cada batida do meu coração faz meu corpo
tremer, e o sangue nas minhas veias esquenta todo, ele
me puxa para trás e meu corpo sobe, uma mão aperta
meu seio, e com a outra aperta meu pescoço, de uma
forma que me faz sentir desorientada, porque ele
também roça em mim, na minha bunda, e isso é muito
gostoso.
—Você é linda meu amor — fala baixinho e beija
o cantinho atrás da minha orelha.
—Obrigada. — Minha voz está derretida, baixa.
Mosés aperta esse seio com força e prendo a
vontade de gemer, ele esfrega o bico entre os dois
dedos com uma experiência fora do comum, sua boca
mordisca meu pescoço e ele chupa minha pele com
força me arrancando o ar dos pulmões, enquanto faz
isso vai me puxando para a cama.
—Deite-se —fala baixinho. — Por favor.
Minhas pernas parecem gelatinas, apesar de me
sentir totalmente envergonhada faço que sim com a
cabeça, puxo os cobertores e me deito segurando a
toalha no meu corpo como a uma toga da cintura para
baixo, Mosés sobe na cama atirando a camisa para fora
do corpo.
—Preciso que tire a toalha do corpo, Ana —fala
e começa a beijar minha canela. — Por favor, querida.
—Mosés, acho que devemos parar por aqui...
—Você não está se ouvindo, Ana. — Ele me
interrompe subindo os beijos para minha coxa. — Abra
as pernas para mim querida.
—Mosés...
—Ana! — fala com mais firmeza. — Por favor,
abra as pernas para mim.
Mordo o lábio inferior com força detendo o
receio que tenho dentro de mim, Mosés respira fundo e
olha para o lado, depois ele me puxa pelas pernas,
solto um berro assustada porque caio para trás. Ele
puxa os cobertores se enfiando embaixo deles,
cobrindo-me da cintura para baixo, ele está ajoelhado
na cama.
—Agora pode, por favor, abrir as pernas?
Arrogante.
Quero rir de seu sotaque mandão.
Me sinto nervosa, Mosés se move e rapidamente
eu o vejo erguer pelo lado da coberta a cueca como se
fosse um troféu.
—Te dou de brinde, senhor Senhor ita Preston.
Me ergo e pego a cueca da mão dele, depois jogo
para longe, respiro fundo, ele toca as minhas pernas e
as afasta, me acomodo entre os meus travesseiros e
olho para o teto apertando os olhos, vou abrindo as
pernas devagar.
Mosés beija minhas coxas devagar, ele respira
muito lentamente, enquanto faz isso parece que o meu
coração vai sair pela boca, suas mãos sobem para os
lados do meu corpo e ele me toca a cintura afastando a
toalha para longe. Quando sua boca beija a parte de
dentro de minhas coxas, respiro fundo, depois ele
começa a beijar o canto da minha virilha afastando uma
perna para cima enquanto beija, dobro essa perna toda
tensa, e ao mesmo tempo a sensação é tão gostosa.
Sim, muito gostosa.
—Tudo bem até aqui, querida? —pergunta
baixinho.
— S... sim! — respondo.
Mosés volta a beijar minha virilha, depois
lentamente ele me beija a intimidade... com a língua.
Subo com a sensação quente e meu corpo todo treme
com as ondas que me arrepiam dos pés à cabeça, ele
beija de novo, e de novo, e me seguro na cabeceira da
cama subindo e descendo com seus beijos, meu corpo
todo invadido por essa sensação maravilhosa e nova.
Me contorço quando ele me beija com mais força e
arfo, Mosés me beija como se fosse na boca, sua língua
me proporciona sensações tão fortes e intensas que em
alguns momentos quero gritar.
Suas mãos sobem e me apertam os seios, minhas
pernas já estão completamente abertas e sua boca me
domina de um jeito único e delicioso, me contraio
subindo e descendo com a carícia, ele me beija com
mais força e estremeço engolindo o gemido, o prazer
agora é tão intenso que perco o ar.
Meu corpo treme com força e minhas coxas
tremem com o esforço, arqueio os ombros presa ao
frenesi, Mosés desce as mãos para as minhas coxas e
me puxa para baixo, meus quadris se movem sozinhos
no vai e vem com sua boca, ele não me solta, e meu
corpo todo estremece, me sinto sufocada, algo queima
no meu centro, queima muito, até as solas dos meus pés
queimam.
Minha intimidade começa a doer pelo esforço,
me encolho toda a cada segundo, algo que queima e dói
enquanto me contraio, mas que ao mesmo tempo me
deixa louca, Mosés afasta os cobertores para trás e
segura as minhas pernas para cima segurando meus
pés, ele me olha enquanto me beija, aperto as grades da
minha cama completamente fora de mim, meu corpo
todo entra no frenesi e me entrego as ondas de prazer
que sua boca me proporcionam.
Acabo chegando ao que as mulheres chamam de
orgasmo, mas que até há pouco, eu não sabia o que era.
Todo o meu corpo parece se libertar da tensão,
da pequena ardência e das dores, e é como se um raio
me atingisse no meio das pernas, nesse momento
Mosés sobe beijando todo o meu corpo e me beija
puxando a minha mão para dele, sinto o líquido quente
dele jorrar na minha barriga, mas tudo o que vejo são
estrelas, estrelas intensas e fortes.
Silêncio.
Olho para o teto do meu quarto cor de rosa chá,
por alguns anos da minha vida esse quarto foi tudo o
que eu tive, em alguns momentos bons, outros, os
piores momentos da minha vida, como quando meu pai
morreu e eu fiquei dias trancada aqui com a minha dor,
ou quando passei por aqueles três piores anos da minha
vida durante o colegial, achei que teria tantas marcas
em meu corpo naquela época, mas acho que piores são
as marcas do coração, enfim, passou.
Lentamente olho para o lado, Mosés está deitado
de lado com metade do corpo em cima do meu, se
apoia num dos cotovelos, ele me fita, sua mão toca a
minha face e ganho um selinho, sinto que as minhas
bochechas mais uma vez queimam, ele vem para cima
de mim de novo e me aperta com força. Depois ele
cheira o meu pescoço, eu o aperto com força, sinto
vontade de chorar, tento me deter, isso seria tolice.
Estou completamente apaixonada por Mosés
Handerson.
Chegar a essa constatação me assusta tanto que o
meu coração se enche de algo desconhecido, algo que
nunca senti por ninguém... Amor!
As lágrimas se tornam inevitáveis.
Mosés vai para o lado, ele se deita de costas
para mim, e eu não consigo entender de repente o
porquê disso, acho que ele pensa que eu não gostei.
—Me sinto envergonhado por isso, Ana —fala
baixinho. — Eu não deveria ter feito isso com você.
Ele se arrependeu!
—Não queria que você se arrependesse por isso,
eu adoro estar com você, santo eu não sou, mas
confesso que venho me sentindo novamente alguém
capaz de ser feliz, tenho novas esperanças, você faz
com que eu sinta isso.
Ele parece tão amargurado.
Faço menção de tocar suas costas, mas desisto,
talvez não seja isso o que precisa nesse momento, não
estou machucada com o que ele disse.
—Meu coração está envolvido, Ana. — Mosés
diz e se vira para mim, fico paralisada. —Acha rápido,
eu sei, mas eu também nunca me apaixonei por
ninguém, isso é novo para mim, gostaria que me
desculpasse por não ter esperado, me desculpe por dar
uma justificativa tão banal, mas eu te desejo muito e é
difícil para mim ficar sem sexo.
Às vezes Mosés fala umas coisas que me deixam
sem ação, essa é uma delas.
—Eu adoro o seu corpo, ele é perfeito para mim,
eu não quero que se afaste de mim por isso. — Ele fala
me fitando, parece torturado. — Você é tudo o que eu
mais quero, Ana, nunca gostei tanto de alguém, não me
diz que está arrependida.
—Eu não estou, só estou envergonhada. — Estou
emborcada e ainda sim morta de vergonha, ainda que
incerta quanto a dezenas de coisas e concreta sobre
milhares delas. — Foi perfeito, Mosés, eu gostei
muito.
—Não precisa se envergonhar, você é linda,
Ana. — Ele se aconchega e beija o meu ombro. — É
linda.
—Obrigada — digo e tento sorrir. — Estou
muito feliz de ter sido com você.
Ele me beija, e me puxa. Mosés se deita de
costas e vou para cima de seu corpo, me apoiando nos
joelhos, ele aperta os meus seios com carinho e suas
mãos descem para os meus quadris.
—Você é minha. — Ele fala baixinho. — Em
alguns meses, será em todos os sentidos.
Sorrio, estou tão feliz de ouvir isso.
—Não disse que aceitava...
—Não estrague o clima, Ana!
Acabamos por rir, Mosés beija toda a minha face
e me sinto pela primeira vez na vida, verdadeiramente
feliz, a vontade, bem.
—Ana!
Mamãe!
Dou um pulo, Mosés puxa os cobertores de uma
forma instintiva, mas me tranquilizo quando ela mexe
na maçaneta e não consegue abrir a porta.
—Ah. — Mamãe fala do outro lado. — Um
rapaz deixou um carro aqui no acostamento, acho que é
o carro do seu namorado, ele trouxe tudo o que havia
no carro.
—Tudo bem —falo de volta — Pode deixar aí,
eu já pego.
—Tudo bem aí? —Mamãe questiona. — Vocês
estão cansados, não é? O jantar sai em alguns minutos.
—Nós já descemos — aviso.
—Está bem, não demorem.
Curiosa, acha que eu não sei que está louca para
entrar no meu quarto e ver o que eu estou fazendo.
Conheço a minha mãe, sei que ela adora
bisbilhotar, nem quero pensar no escândalo que ela
faria em me ver na cama com Mosés, se fosse a Bree
ela teria deixado dormir quantas vezes quisesse no
quarto com o Petter.
—Acho que temos que tomar um banho. — Ele
fala me beijando o pescoço. —Antes desse jantar.
—Você vai me seduzir de novo? — pergunto
toda derretida. —Está me corrompendo.
—Adoro seu corpo. — Ele desce e toma um dos
meus seios entre os lábios.
—Mosés — chamo fechando os olhos, ele morde
o biquinho e arfo. — Isso dói.
—É muito rosadinho. — Ele vai para o outro. —
Você é toda rosadinha, meu amor.
Coro.
—Mosés!
—O que? O que foi? Eu não fiz nada! — replica
todo fingido. — O que?
—Nada — repito fechando a cara. — Melhor
tomar logo banho.
—Você vem comigo...
—Eu vou pegar as malas, depois me junto a
você.
Dizendo isso me sento de costas para ele, tiro a
toalha dos meus cabelos e me enrolo nela rapidamente,
acho que vou precisar trocar as minhas roupas de
cama, estou meio suada também, ele se levanta e vai
para o banheiro, fico observando a bundinha dele.
Quando ele entra no banheiro caio para trás deitada na
cama, me sinto tão leviana!
—Ana, você está demorando! —avisa e escuto o
som do chuveiro.
Sorrio de orelha a orelha quando abro a porta e
pego nossas malas, minha bolsa, coloco tudo
rapidamente para dentro do quarto e passo a chave,
depois vou para o banheiro, Mosés já está no box
tomando banho, respiro fundo, tiro a toalha, e entro no
box, abraço ele por trás.
—Você é muito apressado.
—Pensei que daria um jeito de fugir.
—De você?
—Ah é, eu havia me esquecido que é uma
desaforada.
—Não quer me chamar de Ana Beatrice? —
repito imitando o sotaque dele.
Mosés se vira com um sorriso enorme, me puxa e
me dá um beijo de tirar o fôlego.
—Um dia, se você tiver coragem de ter um bebê
comigo, se for menina ela se chamará Beatrice, só pelo
seu atrevimento de imitar o meu sotaque.
Mosés quer ter bebês comigo!
—Pensa em ser pai? —pergunto maravilhada.
—Sim — fala, mas parece ao mesmo tempo se
fechar ou algo assim. — Se você quiser, um tempo
depois que nos casarmos podemos tentar.
—Sem problemas. — Eu o abraço com força. —
Eu vou até emagrecer para poder ter um bebê.
—Isso quer dizer que aceita? —pergunta e ergue
a minha face.
Acho que não tenho mais dúvidas.
—Sim.
Capítulo 27
Tomamos banho juntinhos, abraçados, depois de
alguns momentos ele começa a lavar os cabelos e me
lavo de costas para ele, acho que preciso mesmo de um
tempinho para me acostumar. Saio primeiro do box,
pego toalhas secas nas gavetas do meu armário e deixo
uma para ele, me enrolo rápido na minha, vou para o
quarto e já tiro a roupa de cama, fico vermelha só de
lembrar do que fizemos há pouco, levo tudo para o meu
sexto de roupa suja e pego roupas de cama limpas no
meu armário do quarto, depois que coloco a cama,
abro minha mala e pego uma muda composta por um
jeans e uma blusa mais colada, e as minhas chinelas.
Me visto e recolho as roupas que ele deixou num canto
do meu quarto, a cueca, quero rir quando me lembro da
cena.
Levo tudo para o banheiro, Mosés já está
envolvido numa toalha quando entro, ele seca o cabelo
com uma toalha de rosto, recolho minhas roupas
molhadas, começo a estender tudo nos vidros do box.
Ele vai para o quarto e fico tentando dizer para
mim mesma que tudo isso é muito real, que não estou
sonhando, que o que acabamos de fazer há poucos
minutos foi bom, que não foi errado, eu amo Mosés, ele
me ama, por que seria? Ele realmente quer algo sério
comigo, namoramos, vamos nos casar, por que seria
errado? Por que devo pensar que é errado? Sou maior!
Sou uma mulher! Também tenho direito de sentir
desejo! Também tenho o direito de amar e ser amada
por um homem lindo e legal!
—Não pilha, Ana —digo para mim mesma.
Vou para o lavatório e pego minha escova de
cabelo na gaveta, penteio os cabelos, poucos minutos
depois Mosés entra no banheiro carregando uma bolsa
preta pequena.
—Posso?
—Claro, já estava saindo.
Ele se inclina e me beija depois sorri meio de
lado, acho que quer usar desodorante ou algo assim, já
usa uma calça de moletom cinza escura.
—Vou descendo. — Preciso falar com a minha
mãe antes que ela espante o Mosés. — Te espero lá
embaixo.
—Tudo bem —afirma.
Saio do banheiro, e me apresso em descer. Os
outros quatro estão na sala, ficam me olhando como se
nunca tivessem me visto na vida, mas não ligo, vou
para cozinha, mamãe está como sempre, no fogão
mexendo nas panelas.
—Deveria ter me avisado que traria seu
namorado, Ana...
—Eu avisei — corto, vendo-a fechar a cara para
mim. — Você estava caçando o açúcar refinado na hora
e me ignorou completamente.
Mamãe se cala, 1 a 0 para mim.
—Filha —começa depois do silêncio. — Esse
rapaz é mesmo seu namorado?
Sabia!
—Por que não seria? —questiono tentando
parecer indiferente. — Na verdade, Mosés me pediu
em noivado.
Ela arregala os olhos, sorrio e dou de ombros,
acho que essa cena é impagável.
—Há quanto tempo estão namorando, Ana?
Conhece mesmo esse homem? Quem é ele? Como se
conheceram? —Ela começou.
—Faz um tempo que estamos juntos, e sim, eu
conheço ele. Mosés trabalha na Handerson comigo —
esclareço. — Sêmora conhece.
—Filha, tem certeza que esse rapaz quer algo
sério com você? — Mamãe pergunta incerta. —
Talvez... talvez, ele só queira brincar com você, Ana.
—Por que, mamãe? —Essa insinuação me
magoa. — Por que ele é bonito?
—Filha, não é isso, apenas estou falando que
homens assim não costumam querer algo sério com
moças como você...
Ou Seja Gorda!
—Mosés não é assim — falo por fim. — Ele me
ama.
Mamãe percebe que me magoou com sua
insinuação.
—Olha, não precisa gostar de mim, ok? Nem
dele, ele só quer me pedir em noivado, só isso, basta
fingir apenas uma vez na vida que gosta de mim e dizer
um simples "tudo bem"...
—B, eu não queria...
—A senhor Senhor a nunca quer — interrompo e
prendo o choro na minha garganta. — Ele é importante
para mim.
—Está bem.
—Obrigada mãe.
Não tenho mais o que falar, saio da cozinha e vou
para a sala, mas não fico com as minhas irmãs e
cunhados, ligo a tv TV e fico sentada no sofá
ignorando-os completamente.
—Sabe, Bree...— Fiance fala assim do nada. —
Eu te disse que perdi 3 quilos com aquela dieta do
chá?
—E eu perdi dois. —Brigeth fala com o mesmo
deboche na voz. — E você, Ana? Quantos quilos
perdeu para conquistar aquele gato?
Oprimo a vontade de chorar, minhas irmãs riem e
posso escutar as risadas dos meus cunhados, elas
adoram me minimizar por causa do meu peso, na
verdade todos da família gostam, se não fazem
comentários de mal gosto pela frente, fazem por trás,
elas fazem isso quando mamãe não está por perto, e eu
sempre acabo como errada quando respondo.
Ana a arisca, Ana a gordinha briguenta, Ana a
encrenqueira...
Tive tantos apelidos na infância que mal consigo
contar nos dedos.
—Na verdade, ela não precisou perder nenhum
quilo para me conquistar. — Eu me arrepio toda ao
ouvir essa voz. — E não vejo graça nesse tipo de
postura infantil e medíocre da parte de quatro adultos
formados, esperava mais das suas irmãs, Ana, você me
falou tão bem delas, mas parecem duas meninas
invejosas fazendo tricô.
Meu Deus! Que fora!
Não consigo olhar para o rumo da outra sala,
posso sentir a vergonha alheia daqui. Mosés se senta
ao meu lado no sofá e passa o braço envolta de mim,
ele está tão tranquilo que mal parece ter sido o cavalo
que acabou de dar um coice nas minhas irmãs e nos
meus cunhados, as risadas cessaram na hora.
—Tudo bem? — pergunta muito calmamente.
—Sim — respondo porque não quero que haja
nenhum desentendimento entre ele e ninguém da minha
família, apesar de me sentir muito tentada.
—Havia pensado em ficarmos mais dias, mas
depois dessa. — Ele fala baixinho. — Acho que é
melhor irmos depois de amanhã.
—Concordo. — Eu odiaria ficar aqui, e ser
motivo de chacota das minhas irmãs.
—Eles vão trazer o avião de Londres, Safira foi
e não pediu manutenção, por isso eu tive que alugar
aquele às pressas, a volta será mais tranquila —
explica ele e me olha sem jeito. —Tudo bem mesmo?
Ele se refere ao outro assunto, fico vermelha e
faço que sim com a cabeça.
—Conversou com a sua mãe?
—Sim.
—Podemos conversar com ela a sós?
Fico nervosa.
—Claro, vem, ela está na cozinha.
Nos levantamos, Mosés segura a minha mão e
passamos pela outra sala em silêncio, posso sentir de
longe o constrangimento dos meus cunhados, e das
minhas irmãs. Entramos na cozinha, mamãe fica nos
olhando como que se não acreditasse, eu não gosto
disso tanto quanto ela, Mosés está muito sério.
—Posso conversar com a senhor Senhora? —
Mosés pergunta bastante educado.
—Claro. — Mamãe indica a mesa da cozinha. —
Vou lhes servir um café.
Estou envergonhada, me sinto como se tivesse
dezessete anos, um primeiro namorado—que nunca
existiu—vindo a minha casa me pedir em namoro para
minha mãe, meu estômago fica gelando a todo
momento, nos sentamos na pequena mesa e mamãe se
senta de frente para nós, nos servindo café em suas
xícaras decoradas.
—Eu quero pedir a mão da Ana em casamento
para a senhor Senhor a, não sou um homem de fazer
rodeios. — Mosés fala num tom bem franco. — Ela e
eu estamos namorando há alguns meses, tenho intenção
de me casar com ela.
Direto...
Mamãe fica nos olhando como se tivesse
acabado de receber um choque ou algo assim. A tensão
está me consumindo, e o nervosismo, e um pouco de
medo.
—Ana é maior, Mosés, ela sabe o que faz. —
responde mamãe depois de alguns segundos.
—Eu sei, mas quero realmente contar com a sua
aprovação. — Mosés diz convicto. —Vamos morar
juntos até que assinemos os papéis, por mim, assino até
o final do mês que vem.
—Não vejo problema nisso. — Mamãe me olha.
— Você realmente quer isso, Ana?
—Sim—respondo sentindo a mão dele apertar a
minha embaixo da mesa.
—Então, não vejo problema nenhum que se
casem. — Mamãe diz, para minha completa surpresa.
—Vão celebrar o casamento?
—Quero que Ana tenha tudo. — Ele responde e
me olha. —Por mim tudo bem.
—Então, acho que poderia ser aqui, na mesma
capela onde as minhas outras filhas se casaram.
—Não quero nada grande, mamãe. — Não
acredito que ela aceitou numa boa, tão pouco que ela
está querendo organizar meu casamento.
—Seu pai ficaria muito feliz, Ana, ele sempre
quis ver você casada. — Mamãe esclarece concreta.
— Ao menos que tenha uma cerimônia simples somente
com a família.
—Acho que não, mãe. — Não gosto quando ela
fala do meu pai. — Prefiro apenas no civil.
—Sabe de uma coisa, você é uma teimosa —
reclama ela. — Você ainda é virgem?
—Mãe! — berro alarmada.
—Tudo bem, calma! — Mamãe ergue as mãos
num sinal de pare e respira fundo —Respira, calma...
— E fecha os olhos. — A Ana vai se casar, a Ana vai
se casar, Helena...
Mosés me olha sufocando um sorriso, dou uma
cotovelada nele e ele abaixa a cabeça colocando as
mãos nas faces, é que ela não sabe como lidar com
pressão as vezes, eu já sabia que ela ficaria assim, por
que pensei que seria diferente?
—Tudo bem. — Mamãe fala e nos olha. —
Desculpe Mosés, é que Ana é a minha mais velha, eu
nunca pensei que ela se casaria, ou não tão rápido.
Obrigado mãe, por me chamar de encalhada na
frente do meu namorado... Noivo.
—Tudo bem. —Mosés fala e sorri, mamãe
suspira toda boba. — Eu... eu...
Ele pega algo no bolso e depois coloca a
caixinha preta sob a mesa, arregalo os olhos, mamãe
coloca as mãos na boca alarmada.
—Pode abrir, Ana —Mosés fala e aperta a minha
mão embaixo da mesa—eu mesmo escolhi pra... você.
Minhas mãos tremem enquanto pego a caixinha.
Mosés me beija a bochecha, percebo que ele
também está nervoso.
—Na verdade, eu falei com Sêmora, ela quem
me deu a numeração do seu dedo.
Antes dela emagrecer usávamos a mesma
numeração em quase tudo.
—Espero que goste.
Eu sei que vou gostar.
Abro a caixinha e fico olhando fixamente para o
anel de brilhantes, a joia é linda cravada por uma
pedra amarelada no centro maior, envolta desta tem
várias pedrinhas menores emoldurando a joia, e dos
lados do anel tem mais pedrinhas cravejadas em torno
de toda ela.
Mosés pega o anel e segura a minha mão, depois
muito gentilmente coloca no meu anelar direito, então
beija o lugar e me dá um sorriso incerto.
—Gostou?
—Sim, é perfeito, obrigada.
Sinto vontade de chorar.
Eu o abraço e beijo sua face me sentindo uma
completa sensível, ele me aperta com carinho, quando
ele se afasta, olho para minha mão sem acreditar,
visivelmente emocionada, ele seca as minhas faces
com as mãos e me dá um selinho.
Olho para mamãe e a vejo emocionada, faz uma
cara de choro que só ela, sorrio e cubro as faces me
entregando a um choro silencioso, ele me abraça
colocando um beijo doce na cabeça, eu nunca pensei
que alguém me pediria em casamento na vida, eu havia
perdido todas as esperanças de que algum dia alguém
realmente se interessasse por mim, pelo que sou, que
alguém me quisesse.
Tudo isso parece um pequeno sonho, o qual não
tinha tido a chance de ter, nunca tive a oportunidade de
viver...
—Ela vai ficar bem. — Eu escuto Mosés falando
para minha mãe.
—Eu tenho certeza que sim! —mamãe responde
baixinho.
Eu também.
Mamãe serviu o jantar.
E tudo o que eu ouvia era o silêncio das minhas
irmãs, os meus cunhados pareciam realmente
incomodados, mas eu não me importei, Mosés estava
ao meu lado, ele estava onde deveria estar, e eu não
liguei muito para o fato de que Fiance e Brigeth
ficavam encarando a gente com cara feia.
Minhas irmãs são bem parecidas, até no corte de
cabelo, Fiance e Brigeth tem cabelos castanhos lisos,
olhos castanhos, lábios pequenos, até no nariz delas
são parecidas, o formato do rosto de ambas é
quadrado, elas também são parecidas na apatia, mas
fisicamente comigo não se parecem nada,
evidentemente que por serem franzinas e mais baixas,
magras, contudo, foi a primeira vez que não me
incomodei com seus olhares.
Mamãe estava sorrindo e em alguns momentos
fez algumas perguntas sobre a comida, mas nada além
disso, acho que as minhas irmãs ficaram mais
indignadas quando viram o anel de noivado no meu
dedo, nunca pensei que fosse ser objeto da inveja de
ninguém, muito menos das minhas irmãs.
Mas hoje eu fui.
Não me importo também, ainda que estar por
cima ao menos uma vez na vida me deixe realmente um
pouco feliz, contudo, eu estava muito mais feliz pelo
significado de tudo, do que pela beleza do incrível anel
no meu dedo — ainda olho para o anel e fico sorrindo
feito boba —, porque eu sei que isso significa que em
alguns dias Mosés e eu estaremos casados.
Depois do jantar —bife bem passado e legumes
— mamãe serviu sua torta de morangos com açúcar
refinado, Mosés não pôde comer, a massa continha
glúten, mas ele agradeceu mamãe pela gentileza, fui na
geladeira e peguei uma maçã e dividi com ele, lhe fiz
companhia porque sei que esses momentos para ele
devem chatos.
Quando terminamos de comer, eu me levantei e
sai puxando ele. Subimos para o meu quarto e aqui
estamos, não me importo com o que as minhas irmãs
falam, com o que elas pensam, eu sei que já devem ter
ido embora a essas alturas, escutei a pouco o som dos
carros partindo.
Mosés faz carinho nos meus cabelos e eu o
abraço, estou deitada com metade do corpo em cima
dele, puxei os cobertores, a noite será meio fria devido
à chuva, apesar de já ter cessado bastante, ainda chove
lá fora.
—Está feliz, Ana? — pergunta baixinho, desde
que entramos no quarto não conversamos.
—Sim, muito — falo apertando ele.
—Eu também. —Ele beija a minha testa.
Nos beijamos, sorrio, Mosés me puxa e tenho um
pouco de vergonha.
—Ana?
—Assim, estamos bem.
Ele franze a testa e reconheço esse olhar
reprovador.
—Ana, você vai começar de novo?
Eu realmente me envergonho de falar isso para
um homem.
—Eu sou muito pesada!
—Deixa disso, não é não, vem.
Estou vermelha, me estico e vou para cima dele,
tenho receio disso, estou longe de me sentir
confortável, Mosés me abraça como se fosse algo
natural e irrelevante, me encosto em seu peito e abraço
ele.
—É muito bonito —falo erguendo a mão de lado.
— Quanto custou? Deve ter sido os olhos da cara.
—Era para eu ter te dado quando você me deixou
entrar em seu apartamento há dois dias atrás, mas você
estava muito mal—Mosés explica e fico surpresa. —
Pensei em pedir na hora do jantar, mas acho que você
iria ficar muito constrangida.
—Acho que seria um golpe no ego das minhas
irmãs. — confesso e isso seria realmente impagável.
—Elas sempre foram assim? —Mosés segura a
minha mão e entrelaça os dedos nos meus.
—Sim, elas não aprendem, em parte porque
mimamos muito elas — digo sincera — Elas são
adotivas.
—Percebi que são muito diferentes de você!
—Sim, literalmente, Fiance e Bree são infantis.
—Eu não gostei do que elas falaram para você,
acho que assustei elas.
—Pode assustar quantas vezes quiser!
Mosés começa a rir, beijo seu queixo e apoio a
cabeça no travesseiro fitando-o.
—Eu sou a sangue ruim da família.
—Por que?
—Acho que já percebeu que eu sou muito
diferente até da minha mãe.
—Claro que é, você é normal!
Começo a rir e ele faz um gesto de silêncio com
o indicador, mas não consigo parar. Mosés é leviano, e
percebo que ele aos poucos, volta ao seu tom sério
habitual, e tem um humor negro, que só reconheci
naqueles primeiros dias em que o conheci na empresa,
antes dele viajar para o Brasil.
—Mamãe teve depressão depois da morte do
meu pai, ela trabalhou anos no hospital municipal, eu
cuidava das minhas irmãs e da casa.
—Deve ter sido muito difícil para você.
—Ao menos eu aprendi a lavar os pratos sem ter
medo de quebrar as unhas.
—Não acredito que sua mãe foi conivente com
uma criação dessas para suas irmãs e com você, parece
que ela é tão dura.
—Ela não queria que eu fosse para a faculdade.
—Por que?
—Porque não havia ninguém além de mim aqui,
Mosés, logo que fui para a faculdade mamãe se fechou
num mundo onde existiam apenas ela e as minhas
irmãs, acho que isso a magoou muito, e a forma que ela
encontra de descontar em mim é me desprezando, não
que antes não fosse assim, mas não era tanto.
—Ainda bem que você não deu ouvidos a ela,
Ana, você é uma mulher inteligente, andei dando uma
olhada no seu trabalho no financeiro, tudo muito bem
executado.
Ele fala tão tecnicamente que até me sinto
orgulhosa.
—Vejo grande potencial em você como a dona
da minha agenda.
—Huhhh...
Mosés ri, começo a fazer caracóis em sua barba.
—Quero você em todos os lugares comigo
sempre.
—Claro, claro, eu preciso ser controladora e
mandona? Eu já sei fazer isso!
—Obviamente.
—É mesmo, meu amor? —pergunto e cubro ele
de beijos.
—Poderia repetir de novo? Acho que escutei
errado! —responde me apertando com força. — Por
favor, repete!
—Meu amor — repito toda boba. — Meu amor...
meu amor... Mô!
Cubro ele de beijos a cada palavra, Mosés sorri
me correspondendo cheio de carinho.
—Acho que vou te dar mais joias de hoje em
diante!
Sorrio, e não me importo com o comentário.
—Vamos nos casar! —digo e mais uma vez eu o
beijo.
—Sim— afirma com um sorriso.
Sim!
Capítulo 28
Acordo primeiro.
Não paro de olhar para o meu anel de noivado,
Mosés dorme de costas para mim, muito alheio a minha
felicidade, ele parece muito tranquilo, calmo, eu o
abraço com carinho e beijo sua nuca, adorando seu
calor. Ele se move na cama, beijo sua cabeça e ele se
vira para mim ainda sonolento.
Me puxa pelo braço e vou para cima dele
puxando os cobertores, eu o beijo e cheiro seu
pescoço, estou adorando estar com ele nesse momento,
meu corpo todo se enchendo de boas sensações, meu
coração está tão envolvido quanto o dele.
Ficamos assim por um tempo, até que escuto o
som das batidas na minha porta.
—Ana, o café está na mesa, estou te esperando,
fiz panquecas com mel, as suas prediletas.
Vou para o lado morrendo de preguiça, Mosés
vem para mim enquanto me estico.
—Não vai não — fala baixinho. — Você é
minha!
Ele me beija com carinho e me aperta.
—Bom dia, Bê—fala entre o beijo.
—Bom dia, Mô!
Mosés se ajoelha na cama, ficando de frente para
mim, ele tira a camisa de malha e joga para longe.
Umedeço os lábios ao ver o corpo dele.
—Quer um bom dia? — pergunta baixinho e
percebo que ele me olha de um jeito diferente.
—Não acabou de me dar um bom dia? —
questiono confusa.
—Ah Ana, você é muito inocente.
Ele segura as pontas da minha blusa e sobe ela
para cima, me ergo levantando os braços, Mosés tira o
sutiã sem um pingo de trabalho, depois lentamente
beija o meu pescoço e vai descendo, estou corada, ele
aperta os meus seios com força, me beija com a mesma
intensidade, todo o meu corpo começa a esquentar com
seu toque, com seus beijos.
— Ana!
Me irrito, realmente.
Mosés para e me dá mais um beijo leve.
—Em casa terminamos isso.
Estou constrangida, ele vai para o lado e fico
observando-o pegar sua pequena mala de mão e ir para
o banheiro, suspiro e coloco o sutiã novamente, eu não
sei porque estou tão tensa de repente... as sensações de
ontem são tão atraentes agora.
Eu o quero, realmente, me sinto atraída por
Mosés Handerson.
Emocionalmente e fisicamente, totalmente atraída
e apaixonada por ele.
Visto a blusa rapidamente, prendo meus cabelos
num coque e arrumo a minha cama.
—B! — Mamãe chama do andar de baixo.
Arfo irritada, eu imagino que ela pense que eu
estou fazendo "coisas que não devo", saio do quarto e
desço pisando forte, mamãe já colocou a mesa, ela fica
me olhando muito tranquila sentada em seu canto na
mesa.
—Nem pensar, mocinha — fala e fico vermelha.
—Nem pensar o que mãe, não estávamos fazendo
nada além de dormir, até parece que não me conhece—
reclamo e me sento a mesa.
—Sei, sei — Mamãe fala.
Me sirvo, mamãe fica me olhando em silêncio,
parece que quer me falar alguma coisa.
—Já pensou sobre o casamento?
—Mãe, não vai ter casamento!
—Nem uma festinha?
—Nada!
Mamãe adora se exibir para os vizinhos, não sei
porque, Bree deu até o que não tinha antes de casar
assim como Fiance, então não, obrigada, eu não quero
ser a filha gorda encalhada que se casa com quase 30
anos, se brincar ainda falam que estou grávida e só por
isso ele quer casar.
—Mas ao menos vai me convidar? Suas irmãs?
—Que drama, meu Deus.
Helena Preston é uma boa mãe, ou dentro do
possível uma mãe normal, o único problema dela é que
não existe mais Gustav Preston, meu pai.
Acho que ele era a voz na consciência dela, acho
que ele era a pessoa que fazia com que mamãe tivesse
um pouco de sanidade.
—Vamos fazer assim, durante esse tempo você
pensa um pouco B, pensa com cuidado.
—Está bem, mãe.
Não quero discutir.
—Suas irmãs planejaram um dia em família,
querem conhecer o Mosés a fundo e...
A não, não, não e não! Não!
—... e como eu dizia vamos almoçar fora nós
sete, que tal?
Que tal? Que... Tal!?
—Mãe...
—Ah, olha, aí está ele, bom dia Mosés! —
Mamãe fala toda sorridente — Estava comentando com
a Ana que almoçaremos fora, como não está chovendo
queremos te mostrar um pouco de San Antônio.
Não mãe, para!
—Então nós vamos no Parque, Na Torre das
Américas, ao Botanical Garden e ao Álamo...
Tudo isso em um dia?
Mosés se senta ao meu lado na mesa, depois
mamãe começa a servi-lo com café, ovos com bacon, e
biscoitos integrais, tiro os biscoitos do prato dele
assim que ela me dá as costas, ele sorri e pega os
talheres.
—Mamãe —interrompo ela. — Acho que não
vai dar tempo de ir a tantos lugares.
—Mas vocês não vão ficar esse fim de semana
todo? Hoje ainda é sexta!
—Mosés tem muitos compromissos...
—Posso verificar na minha agenda. — Ele fala
muito calmo. — Será ótimo conhecer a cidade com
vocês, Helena.
Você está comigo ou contra mim?
Eu o encaro com o cenho franzido, Mosés se
inclina e me beija de leve.
— Come. — Ele indica o meu prato de
panquecas. — Agora!
Eu não sei se gosto disso, e como a minha
panqueca ouvindo mamãe tagarelar sobre o passeio, eu
só espero sobreviver a esse fim de semana.
O carro passa em frente à escola de ensino
fundamental do bairro e desvio o olhar, as vezes é
muito complicado olhar para esses lugares e conseguir
apagar de minha mente as velhas lembranças.
—Você está brava?
—Não.
Não é o Mosés, eu sei que ele faz isso justamente
porque quer tirar a primeira impressão que deixou
ontem, não me importo muito com isso, eu só não gosto
de passar em alguns lugares que me trazem lembranças
ruins, a prova disso é que sempre que venho a San
Antônio eu evito sair de casa, fico mais dentro do meu
quarto ou na sala, ajudo mamãe com alguma torta, as
vezes ela faz tortas para fora.
No carro da frente Petter vai dirigindo com todos
dentro, mamãe e as minhas irmãs atrás e Broode no
banco da frente, quando descemos após o café, eles já
estavam na sala nos esperando para o passeio, eu tenho
certeza que essa ideia foi das minhas irmãs, eu sei que
elas fazem isso para ficar bisbilhotando a minha vida
com a minha mãe, mas sou indiferente, pois quero que
mamãe conheça o real caráter de Mosés, ela é craque
em jogar as coisas na minha cara quando quer, depois,
ainda poderia me ligar me chamando de bicho do mato
e reclamando por eu não ter ficado mais dias.
—O que é bebê? Você não quer que eu conheça
sua família?
—Quero.
—Então, por que está triste?
Suspiro, olho para as minhas mãos, me sinto de
repente frustrada em ter que falar sobre isso, eu não
gosto nem de lembrar, mas estar em San Antônio me
traz muitas recordações boas, porém, as outras são as
piores da minha vida.
—Quando eu estudava naquela escola, algumas
meninas se juntavam todos os dias depois da aula e me
batiam atrás da mureta. — revelo e me sinto nervosa.
— Apanhei muito.
Escuto um silêncio estranho dentro do carro.
—E está triste por causa da briga? — Mosés
pergunta parecendo confuso.
Ergo o olhar, ele está atento ao caminho, nossa
primeira parada será o Álamo, o carro de Petter para
no sinaleiro.
—Eu nunca briguei com ninguém, Mosés!
—E por que elas te bateriam?
—Porque eu sou gorda!
Mosés me olha completamente surpreso, na
verdade diria incrédulo, e eu ainda nem falei do resto,
não sei porque ele está assim também, é comum que
muitas garotas sofram bullying na escola todos os dias.
—Isso... isso é...
—Sim, é verdade, juntavam três e me batiam, no
começo elas só me xingavam, coisas como: gorda,
baleia, orca, Free Willy, pneu. — Eu olho através da
janela. — Depois uma começou a me dar empurrões,
seu nome era Rianna, suas amigas Summer e Queen
aprenderam com ela a me baterem depois da aula, acho
que começou na quinta série.
Ele fica calado, parece que quando começo a
falar vou tirando o peso do meu coração, a dor.
—Quando fui para sétima série, elas me batiam
atrás do muro da escola, me chutavam e me xingavam,
as terças e quintas, tinha medo de contar para minha
mãe, porque foi nessa época que o meu pai morreu.
O carro volta a se mover.
—Eu já nem me importava mais, no colegial as
três me batiam, me chutavam, me cuspiam, e me
falavam coisas como: "você é tão nojenta que nem o
seu pai morto gosta de você", "você é tão gorda que
nem sua mãe te achou bonita quando nasceu".
—Falou isso para sua mãe? —Mosés questiona
intrigado.
—Mamãe precisava trabalhar, e eu só precisava
das notas, o melhor dia da minha vida foi quando
peguei meu diploma de conclusão do ensino médio, e
quando eu consegui uma bolsa para Nova York, eu
sabia que havia me livrado de tudo isso, voltar para cá
as vezes é uma tortura, sabe, por isso eu fico meio
triste.
—Essas meninas deveriam pagar!
—Vi Rianna algumas vezes no mercado, ela
virou gerente do lugar, é bem casada e tem dois filhos,
mas não sei das outras duas, acho que foram embora,
não importa, isso ficou no passado.
—Ana, isso é muito grave!
Eu mais que qualquer um sei que isso é muito
grave.
—Eu tento não pensar nisso, sabe.
—Já conversou com alguém sobre isso?
—Você!
—Ótimo. — Mosés fecha a cara e não sei o
porquê. — Vou dar um jeito nisso.
Parece uma ameaça, mas não ligo muito, não sei
que jeito ele vai dar, o passado ficou no passado, e não
quero ficar lembrando disso pois me machuca, o
melhor que faço sempre é prosseguir e ficar na minha,
tem dado certo nos últimos anos.
Uma fila enorme se forma para entrar no museu.
Acabamos de conseguir estacionamento, Mosés
sai do carro e abre a porta para mim, ele nem esperou
eu tirar o cinto, sorrio em agradecimento e pego a
minha bolsa, vim de jeans e uma blusa branca de
mangas, como estava um pouquinho mais frio coloquei
um casaquinho rosa por cima, calcei tênis—não
imagino minha vida indo para qualquer lugar sem ser
de tênis—, mas não me maquiei muito.
Mosés veio de jeans e uma camisa branca, ele
também colocou tênis, os cabelos estão úmidos e meio
bagunçados, depois de nossa conversa no carro ele
passou a mão no cabelo umas dez vezes, visivelmente
chateado, mas ainda que não fosse a minha intenção, eu
sei que jamais mentiria para ele sobre qualquer coisa
que fosse, eu não sou assim.
Temos um relacionamento, e mais cedo ou mais
tarde eu teria que falar, mesmo que não imaginasse que
com tanta facilidade, Sêmora tentou me arrancar esse
segredo durante anos e eu nunca consegui realmente me
abrir com ela, então daí aparece esse estranho que eu
aprendo a chamar de noivo, de olhos incríveis de cor
azul, e eu falo tudo tão... facilmente.
Acho que estou em decadência.
Eu o olho e sinto meu coração meio acelerado,
ele está tão lindo, olha em volta e coça as costas,
depois me olha.
—O que foi?
Parece que até quando não tenta ele é charmoso.
—Nada — digo sem jeito. —Então, bem-vindo
ao Álamo.
Álamo.
Acho que faz uns dez anos que não venho aqui,
vinha bastante quando papai era vivo, depois ficou sem
graça, acho que porque ele me contava histórias
incríveis sobre esse lugar, sobre a batalha, as vezes ele
até encenava para me fazer rir, eu adorava passear com
meu pai.
Pegamos a fila, atrás de nós está mamãe, e mais
atrás minhas irmãs com os meus cunhados, tento
ignorar a forma como elas ficam me olhando, acho
muito pior o jeito como olham para o Mosés as vezes,
acham que sou cega, parece que querem comer ele com
os olhos, mas ignoro, funciona bem quando se trata das
minhas irmãs.
Mamãe está usando jeans e camiseta, óculos
escuros, os cabelos presos num curto rabo de cavalo.
Fiance, para variar veio com uma saia de dois palmos
que exibe as pernas dela de seriema e uma blusa
cropped azul com rendas, e ao seu lado, a garota que
forma dupla com ela, Bree, com uma saia estampada
longa, mas também uma cropped azul, quase igual a
dela, ambas usam óculos de sol e chapéus, sandálias
altas, e algumas joias... é, eu tenho invejinha delas, eu
posso, eu sou irmã, a ogra da família.
Meus cunhados vieram até arrumados demais,
Petter com uma calça de brim escura e camisa polo,
sapato fechado e Broode com um jeans e uma camisa
social de cor branca, sapatos também, Petter é loiro,
olhos azuis, cabelos cortados de forma reta e ele é
magro, meio alto, mas um pouco mais baixo que eu—
fato, sou mais alta que os meus dois cunhados — já
Broode, eu acho ele realmente muito bonito para
Fiance, na verdade acho até que combinam, ele é
moreno de olhos azuis claros, cabelos mais compridos,
sorriso bonito e alinhado, o nariz dele é retinho e
bonito, mas acho que o maxilar dele é o que dá um
charme a mais, as sobrancelhas são escuras e dão um
ar mais sério a ele, ele é o advogado, Petter é o
engenheiro.
O que chama atenção em Petter é o sorriso, ele
faz bem o tipo "cara do interior", e o que chama
atenção em Brood é o olhar, que diz claramente "não
mexa comigo", não sou muito íntima de ambos, mas
acho que eles gostam muito da minha mãe, quando vão
para Reno, onde ambos têm moradia fixa também,
sempre mandão algum dinheiro para mamãe, apesar de
Fiance e Bree não serem das mais próximas, mamãe
vive bem dentro do possível.
—Perdeu alguma coisa, Ana? —Mosés pergunta.
Eu o fito e percebo que ele está me olhando já
faz alguns instantes, e ele está tão, mas tão sério que
começo a realmente a ficar constrangida.
Mosés está com ciúmes?
—Não! — falo a força.
—Foi o que eu pensei. — Ele fala com cara de
poucos amigos e me puxa de forma que fico de costas
para todos, ele me abraça e me beija o pescoço. —
Aqui, comigo!
Não precisa me tratar como se eu fosse um
cachorro sem vontade.
Mas não respondo, a fila começa a andar, e eu
não acredito que ele esteja mesmo com ciúmes de mim.
—Acho bom mesmo — pragueja e me aperta
com força.
Sua resposta ao meu silêncio soa como um
desaforo, mas aprendo aos poucos a lidar com Mosés,
com sua personalidade, afinal de contas, só estamos no
começo de tudo.
Capítulo 29
—Eu não sei o que ele viu em você!
Olho para Bree, depois olho para Mosés, mamãe
mostra uns lados das paredes desbotadas do lugar, já
conheço muito bem aqui, Mosés parece realmente
encantado, meus cunhados e ele parecem atentos a
mamãe, ela conta a história da Grande Batalha de
1836, conta sobre a Revolução Texana.
—É mesmo? —pergunto ignorando-a
completamente.
—Você não se enxerga, Bea? — Bree pergunta
revoltada. — Esse cara só quer te usar.
Encaro Bree, e me lembro, das muitas vezes que
cuidei dela, eu era apenas uma criança de sete anos
ajudando mamãe cuidar dela e de sua irmã, ambas
abandonadas por uma mãe negligente, Fiance está ao
lado dela como sempre fiel a irmã, também lembro de
ter dado muitos banhos nelas e alimentado as duas,
agora ambas cresceram e não entendo, o motivo pelo
qual me odeiam tanto.
—Pois, que ele me use — respondo chegando a
uma conclusão. — Qual é o problema de vocês?
—Nosso problema? — Fiance pergunta. — Você
adora chamar atenção, não é mesmo?
—Eu? — repito e sinto uma vontade estranha de
rir. — Me poupem.
— Você se sente tão superior porque foi para
faculdade, mas não passa de uma gorda decadente, com
um trabalho medíocre numa empresa que te paga uma
miséria! —Bree fala com raiva. — Agora aparece
fingindo que se importa com alguém mais além de você
no mundo...
Ergo a mão, e sem um pingo de paciência acerto
bem no meio da cara dela, o tapa faz um estalo, depois
dou um tapa na cara de Fiance também, ambas me
encaram horrorizadas, Bree com uma mão segurando
uma bochecha, e Fiance com a mão na sua própria.
—Ingratas, invejosas, estúpidas—berro furiosa.
— Eu cuidei de vocês quando ninguém as quiseram,
nem a minha mãe, eu as levei para a escola e eu as
busquei, e quando vocês choraram eu estava lá dando
um pouco de atenção e remédio para vocês, até suas
fraldas eu troquei Fiance, eu, não foi a minha mãe e
nem ninguém!
Elas ficam paralisadas me olhando com horror,
minha mão treme.
—Chega com essas piadinhas sobre meu peso,
vocês não sabem o que eu passei por todos esses anos
para ter ido embora.
—Você nos rejeita sua...
E antes que ela complete ergo a mão e acerto
outra bofetada em sua outra face, Bree vai para trás
cambaleando e Fiance a segura pelo braço.
—Eu já disse para parar —aviso magoada. —
Eu não abandonei ninguém, suas mimadas.
—Tem inveja da gente. — Fiance acusa
magoada.
—Vocês têm raiva de mim porque sai de casa e
ganhei uma bolsa integral, porque eu enfrentei a vida
sozinha e consegui um bom emprego, porque eu não
precisei casar com alguém para me sentir feliz ou
completa, e por fim, tem inveja de mim porque mesmo
eu sendo uma "gorda" como vocês falam, eu sou muito
mais bonita que as duas juntas.
Ambas fazem gestos de horror, limpo as mãos no
meu casaco e ergo o indicador, ambas recuam com
medo.
—Suas feias—falo chateada.
Fiance faz bico de choro e Bree a abraça, me
sinto como uma mãe que acaba de dar uma bronca nas
filhas por algo grave, giro e me afasto levando comigo
a coragem que tive e mantendo-a dentro de mim.
—Não vou mais deixar ninguém dessa família
me chamar de gorda! — Eu arrumo o meu casaco e
sorrio para mamãe e os rapazes de longe. — Nem eu
mesma!
Saímos do Álamo.
Mamãe grudada em seus genros, mais
precisamente em seu novo futuro genro, não me sinto
das mais constrangidas, até agora sobrevivendo as
perguntas dela sobre como será nossa vida em Nova
York, ela perguntou umas cinco vezes —
aleatoriamente — sobre um possível casamento no
religioso, neguei apenas em silêncio, Mosés sorriu
muito gentilmente e respondeu a mesma coisa as cinco
vezes.
—Vamos pensar em algo.
Minhas irmãs entenderam o recado, nem
chegaram perto, e quando mamãe lhes perguntou qual
foi o problema com a marca avermelhada nas faces,
Bree disse que era sua alergia a poeira, e Fiance
alegou que um mosquito a picou ou coisa assim, me
mantive longe delas, mamãe parecia muito distraída
para poder falar o que quer que fosse.
Agora Mosés ocupa uma vaga no estacionamento
bem atrás do carro onde minha família veio, vamos
almoçar no centro, logo em seguida vamos para o
Botanical Garden para um passeio ao ar livre, o dia
está ficando mais ensolarado conforme vai se
passando.
O percurso até aqui foi novamente silencioso, ele
não é muito de conversa, mas confesso que Mosés tem
muito mais paciência do que eu imaginei que teria com
mamãe, vi ele trocando uma ou duas palavras com os
meus cunhados, ele é muito reservado.
—Acho que suas irmãs estão com medo de mim.
— Ele fala desligando o carro.
—Elas são assim mesmo.
Acho que elas estão com medo da minha mão.
Não consigo entender, parece que tem gente que
só aprende pela dor, e percebi que Fiance e Bree são
assim, parece que elas só aprendem quando se dão
mal, como quando eram pequenas e eu falava para não
fazerem as coisas e lá estavam elas fazendo tudo de
errado, de novo e de novo, e enquanto não se
machucavam não aprendiam.
Ele sai do carro e da a volta, acho que não estou
assim tão acostumada, mas espero que abra a porta do
carro para mim, ele também fez isso quando saímos do
museu, abriu a porta para que eu entrasse, Mosés é
realmente um homem muito gentil.
Logo que saio ele passa o braço envolta da
minha cintura, mamãe vai na frente, como sempre
falando pelos cotovelos, Fiance e Bree de braços
dados enquanto Petter e Broode vão logo atrás, somos
recebidos por um funcionário, o restaurante não é dos
mais caros, mas é bem arrumado, é de comida local e
tradicional, papai me trazia muito aqui quando criança,
eles servem uma costela perfeita com molho de
pimenta.
O Lugar cheira, mamãe me disse uma vez que ela
e papai sempre vinham aqui quando vinham passar as
férias na casa dos meus avós adotivos, e acho, que esse
lugar ainda é um dos prediletos dela, o funcionário do
lugar nos mostra uma mesa grande e um garçom entrega
cardápios, está lotado como sempre, dezenas de
famílias almoçando comida gordurosa.
—Eu vou querer uma salada. —Bree fala sem ao
menos olhar o cardápio.
Olho para a mamãe, ela coloca os óculos e deixa
a bolsa de lado, começa a escolher o que quer, Mosés
olha em volta parecendo meio encantado, o garçom
está esperando.
—O que você vai pedir? — Mosés pergunta
analisando o meu cardápio.
—Se importa de experimentar o que eu gosto? —
pergunto em contra resposta.
—Claro que não.
—Então eu vou querer a costela da casa com
molho de pimenta, também quero anéis de cebola e
molho à parte, pode trazer uns empanados de entrada e
cerveja para os rapazes, pode trazer um Colleja, soda
com rodelas de limão e gelo. — Enquanto falo ele
anota rapidamente. — Poderia também trazer duas
porções de tacos, com pouco alho?
—Sim, senhor Senhor a. — O rapaz fala. —
Algo mais?
—Duas águas com gás — completo — É só,
muito obrigada, José.
—De nada, senhor Senhor a. —O rapaz sorri e
se afasta depressa.
Mosés segura a minha mão e entrelaça os dedos
nos meus, sorrio e lhe dou um beijo na face.
—Pedi o vinho que você gosta, já que não pode
beber cerveja. — Eu cheguei a essa conclusão.
—Eu vi — responde meio tímido. — Obrigado.
—De nada — falo sem jeito.
Mosés me dá um selinho e solta a minha mão, ele
passa o braço envolta de mim, percebo os olhares a
nossa volta, da minha família, de algumas mulheres,
mas tento ignorar, eu francamente não quero ficar
pensando nisso.
O meu dia não está sendo o melhor, não quero
acabar de estragar pensando no que as pessoas pensam
ao meu respeito.
—Então. — Fiance pigarreia. — Como se
conheceram?
—Conheci Ana na empresa. — Mosés fala com
naturalidade. — Ela e eu trabalhamos juntos.
—Na Handerson? — Fiance se espanta. — Você
é contador?
—Não, eu sou formado em Administração.
—Ouvi dizer que pagam bem na Handerson. —
Petter comenta vagamente. — Você gosta, Mosés?
—É um bom cargo. — Ele coça o canto do rosto.
Acho que Mosés não quer falar disso, eu também
não.
—Onde vão morar quando se casarem? — Bree
muda de assunto. — Tem casa própria, Mosés?
Só odeio esse interesse dela porque sei que quer
arrumar pretexto para tentar me atingir de alguma
forma.
—Tenho, mas a Ana quer morar no apartamento
dela, ela acabou de comprar, acho injusto tira-la de seu
conforto.
—É muito cômodo não acha? —insinua Broode
como se não quisesse nada.
Te odeio a partir de agora Broode, perdeu a
beleza, caiu na minha escala dez pontos negativos.
—Não é cômodo, Broode, eu que não quis ir
para o apartamento dele — respondo e soo mais seca.
—Por que não? —Mamãe pergunta. — Não é
mais certo que more numa casa do seu marido?
—Eu gosto do meu novo apartamento, mãe —
respondo sincera. — Vamos chegar a um acordo e ver
como fazemos, também é mais perto da Handerson.
—Sua família te ajuda, Mosés...
—Mãe! —exclamo e fico vermelha, minhas
irmãs começam a rir assim como os meus cunhados,
olho para Mosés lotada, ele sorri também.
Como ela é sem noção, meu Deus!
—Minha mãe faleceu há algum tempo, apenas
meu pai é vivo, e tenho uma irmã, mas sim senhor
Senhor a Preston, meus pais sempre me ajudaram,
contudo, hoje eu tenho meu próprio sustento — afirma
ele. — Não se preocupe.
—É que esse mundo é cheio de oportunistas...
—Acredite, senhor Senhor a Preston, eu seria o
último homem na face da terra a querer um apartamento
em Nova York.
—É mesmo? — Petter fala com deboche. — Diz
ai, Mosés, o que você faz exatamente na Handerson?
—Eu tenho um bom cargo, Petter. — Mosés
ainda continua sendo muito humilde enquanto fala.
—Tem que ser muito homem para morar na casa
da mulher depois que casar — insinua Petter ainda
todo cheio de graça.
O garçom chega com a entrada, as cebolas, outro
traz as cervejas e as águas, as saladas das minhas
irmãs, e por último colocam na mesa as costelas.
Me alivio, pelo rumo da conversa isso não
acabaria bem.
Distribuo o que pertence a cada um e indico o
vinho para Mosés, o garçom o serve, os meus cunhados
abrem suas cervejas e mamãe esfrega as mãos ao ver
seus tacos prediletos.
—Quer provar a costela? — pergunto para
Mosés.
—Claro — afirma sincero. — Sempre como
costela mais cozida.
—Essa é assada, é excelente, o tempero é muito
bom, mas com pimenta é perfeita —Indico os molhos e
estendo o cestinho de entrada para os meus cunhados—
comam! —Cachorros.
Acho que sei do que todos gostam, durante os
natais em família sempre vejo meus cunhados bebendo
cerveja, as enjoadas gostam de água com gás e limão,
mamãe adora tacos, pego uma costela e coloco no
prato, espalho o molho por cima e entrego para Mosés,
depois pego a minha e mergulho no molho, então
mordo com vontade, há anos eu não venho aqui, mas o
sabor nunca muda.
Mosés me olha, depois ele pega a dele e faz o
mesmo, nunca pensei que fosse viver para ver alguém
comendo como eu, sem frescura.
—Parecem tão... boas. — Fiance acusa e
umedece os lábios olhando para as costelas.
—Fih. — Bree fala olhando para as costelas. —
Estamos de dieta!
—Só uma. — Fiance pega uma costela e
mergulha no molho, depois morde cheia de vontade. —
Ah meu Deus, que delícia!
—As meninas do clube não podem saber disso.
— Bree replica pegando a sua, ela morde e geme
mastigando. — Meu Deus!
—Gostei do molho. — Mosés fala olhando para
a costela depois ele me olha e se inclina, me dá um
selinho. — Pronto, agora parece uma bebêzona.
Sorrio sem me importar, que graça tem comer
costela e não se sujar? Como papai mesmo dizia, a
graça está nisso.
—Você gosta da minha irmã, Mosés? —Bree
pergunta, mas não sinto como se isso fosse proposital
ou algo assim.
—Eu não gosto dela, Brigeth. — Mosés
responde pensativo. — Eu a amo!
Vontade de chorar...
Prendo!
Sorrio e voltamos a comer, ignoro os olhares de
mamãe e do resto da família, eu não precisava ouvir
isso para ter algum tipo de certeza, eu já sabia disso,
Mosés Handerson me ama!
Ouvir isso da boca dele não tem preço.
Capítulo 30
Ontem chegamos exaustos, mamãe nos fez dar
uma caminhada de quase duas horas no Garden, eu só
queria poder tomar um banho e ficar quieta, já havia
anoitecido, mamãe não fez nem jantar, ela própria
reconheceu que fora longe demais com sua
empolgação, tirou tantas fotos nossas juntos que eu
estava cansada de tentar sorrir. Mosés basicamente me
obrigou a tomar banho com ele — fiquei a maior parte
de costas —e depois que saímos do chuveiro viemos
para cama, nem pijama não vesti, muito menos ele,
estamos cobertos até o pescoço, hoje amanheceu
chovendo — graças a Deus —, mas apenas uma chuva
mais leve.
Ele dorme de costas para mim, Mosés abraça um
travesseiro, na verdade o meu travesseiro, toco seu
ombro e me aconchego me lembrando do que ele falou
ontem durante o almoço para minha família.
"eu não gosto dela... eu a amo"
Queria explodir de felicidade e ainda me sinto
muito tentada, depois disso não conversamos nem
ficamos a sós, meus cunhados e as minhas irmãs
estavam até mais participativos no passeio, por fim,
Mosés estava falando sobre o Mercado de importação
comercial e a bolsa com os meus cunhados e Fiance
dando melhores sugestões de como ele deveria manter
o corte de cabelo dele.
Tinha certeza que ele só sorria para ser educado,
ele é muito sério na maioria das vezes, ou quase
sempre, também percebia que ele se sentia mais à
vontade com eles, ao menos dentro do possível.
Beijo sua nuca e ele se vira me abraçando.
—Dorme mais um pouquinho, Bê.
Estende o braço e me puxa para junto dele, beijo
seu pescoço, seu peito.
—Amor, me deixa dormir um pouco!
Ele está cansado.
Sorrio, depois me desvencilho de seus braços e
me ergo, me sento na cama puxando os cobertores,
sinto um toque leve nas costas depois.
—Está feliz, Ana?
Faço que sim e detenho outro sorriso.
—Eu te amo. — Ele fala baixinho. — De
verdade.
Sua mão sobe até a minha nuca e desce, fico
parada recebendo os arrepios por todo o corpo, a força
de suas palavras, a intensidade de seu toque.
—Você é diferente de tudo o que eu já conheci.
— Mosés fala e se move na cama, depois ele se senta
ao meu lado. — Às vezes me sinto meio idiota, sabe,
eu nunca fui carinhoso com ninguém.
—Eu também não. — revelo sem graça. — Só
com a Sêmora.
—Eu gostei de ontem, sua mãe é meio sem
noção, mas foi um bom passeio, queria ter tido mais
passeios assim durante a minha infância.
—Imagino que tenha sido difícil.
Mosés me abraça de lado e vou me deitando na
cama, ele vem para cima de mim, acho que não quer
falar disso, ainda não sei muitas coisas sobre ele,
sobre o que viveu, deve ter sofrido tantos traumas de
infância que não sabe se expressar, as vezes sinto que
ele é meio assim por conta disso, Mosés não sabia
como se expressar naqueles primeiros dias na minha
casa, ele ao mesmo tempo que se demonstra muito
carinhoso comigo, também é muito fechado.
—Viajei para muitos lugares em minha vida
adulta, mas não é a mesma coisa. — Ele se apoia no
cotovelo e me olha, seu corpo em cima de mim. — Eu
nunca quis ter ninguém ao meu lado, porque parecia um
enorme problema me envolver com alguém.
—Não foi assim com as suas outras amantes? —
pergunto mesmo que ainda tenha receio de falar sobre
isso.
—Não era uma relação que envolvia
sentimentos, Ana. — Mosés me olha muito pensativo.
— Eu não conseguia me envolver com ninguém
emocionalmente, ainda que tentasse, eu não me
apegava a ninguém.
—Então era uma relação apenas sexual?
—Sim, ao menos para mim foi, não me orgulho
disso, mas ambas sabiam que eu não poderia
corresponder aos sentimentos nas épocas em que estive
com elas. — Mosés toca minha bochecha com o
indicador. — Eu não sei ser romântico nem nada.
—Mas você é! —respondo sincera.
—Antes de te conhecer, eu nunca havia mandado
flores para uma mulher, Ana, eu sou tão estranho que
quando estou constrangido não consigo falar, te mando
bilhetes. — Ele suspira atento a minha boca.
Estou chocada.
Mosés tem vergonha de mim? Ele nunca deu
flores a uma mulher antes de mim?
—Você arrancou as minhas escamas tão rápido,
que quando não está comigo parece que está faltando
algo, Ana — diz e me fita. — Sabe o que é se sentir
doente longe de alguém?
—É certo que se sinta assim? — Eu estou
impactada com a veracidade em suas palavras, com
sua sinceridade.
—Não, mas é assim que eu me sinto longe de
você, ainda que eu não queira, Ana. — Ele me fita. —
É muito bom se sentir amado.
—Nunca foi amado? — franzo a testa.
—Acho que sim, mas não sentia que fosse por eu
mesmo, era mais por quem eu representava, por quem
eu era.
Pelo seu dinheiro.
—Imagino que seja muito ruim ter uma relação
dessas.
—É bom, mas não é verdadeiro.
—Você é muito melancólico!
—Você não sabe o poço de melancolia que se
esconde por trás desse rostinho bonito, senhor Senhor
ita Preston .
Ele fala tão provocante que sinto vontade de rir,
ainda que me detenha, Mosés percebe, ele realmente se
magoou com o comentário que eu fiz no carro sobre sua
aparência, e agora faço uma ideia do "por que", as
mulheres que se envolveram com ele o fizeram apenas
por quererem sua aparência, seu dinheiro, elas não o
amavam por quem ele era, elas o amavam por quem ele
aparentava ser, por um status.
—Eu sei que você me ama! — fala me olhando
com seriedade. — Só que você ainda é pior que eu em
demonstrar sentimentos.
—Mas é claro que eu te amo, Mosés —afirmo
sincera.
—É que você não fala —reclama num tom
franco.
—Eu sou vergonhosa.
—Pois, não seja.
—Como você é mandão, meu Deus!
—Você é mais mandona que eu quando quer!
Ele toca o meu pescoço, depois me beija com
força, me sinto novamente presa aos seus lábios, basta
que me beije assim que eu esqueço de tudo, esqueço
absolutamente do resto do mundo. Abraço ele e as
minhas mãos tocam suas costas, quero tocá-lo, quero
senti-lo. Mosés me beija o pescoço e desce para os
meus seios, ele mordisca o direito com leveza e sua
mão aperta o esquerdo com cuidado, ele abre as
minhas pernas e vai para o outro seio me ajeitando na
cama, está de joelhos, mas nossos olhos não saem um
do outro.
—Posso te dar um bom dia?
—Bom dia?
Ainda confusa.
—Cacete, Bê, como você é inocente!
Mosés puxa os cobertores para cima da cabeça e
se inclina no meu rumo, me abocanhando com força,
subo sem ar, e me seguro nas grades da cama
recebendo isso com bastante surpresa, mas uma
surpresa gostosa.
Apoio meus pés na cama com as pernas abertas e
arfo me apoiando nos cotovelos, uma mão dele sobe e
aperta o meu seio enquanto a outra aperta a lateral da
minha coxa, a boca dele é voraz e maldosa, me
contorço toda com o prazer que me proporciona.
Sua boca é malvada, me provoca tantas
sensações que mal sei descrever.
Subo quando me lambe o centro com força, e
sorrio com a ponta de prazer que em invade o local.
—Parece que encontramos um cantinho secreto e
prazeroso, senhor Senhor ita Preston! — Sua voz está
abafada, mas tem um tom malvado também.
Sorrio, Mosés me puxa pelas coxas e fico
deitada, depois ele se estica na cama de forma que
vejo seus pés e abre minhas pernas de um jeito que as
coxas saem para fora do cobertor, depois lentamente
ele começa a lamber esse cantinho, pequenas lambidas
que me fazem perder o ar, me causam arrepios.
Aperto os travesseiros oprimindo a vontade que
sinto de gemer.
Não posso gemer, não posso gemer, o quarto da
minha mãe fica um pouco mais adiante.
Minha mente se fecha, e meu corpo se entrega as
sensações, me seguro nas grades da cama percebendo
que os meus quadris se movem sozinhos conforme a
boca dele me toma, a língua faz movimentos circulares
deliciosos me deixando mais e mais sensível.
Aperto a colcha de cama tentando me controlar,
mas já não consigo, os gritos se frustram na minha
garganta, meus seios latejam e estão duros, minhas
virilhas ardem com a sensação de prazer e os meus pés
queimam.
Ele brinca com o meu ponto sensível e parece
gostar tanto disso que quando começo a arquear ele
chupa mais, beija mais, lambe mais, Mosés Handerson
está me enlouquecendo, o orgasmo está tomando conta
de mim tão rapidamente que queima o meu corpo todo,
meu corpo todo arde, e fico agoniada prendendo o
gemido na garganta, o grito sufocado na boca.
Nada se compara a isso.
Nenhuma sensação, nenhum beijo, nenhum toque!
É torturante e maravilhoso, intenso e muito
delicioso.
As fagulhas tomam de conta do meu ponto
sensível e estremeço dos pés à cabeça, ele sobe
beijando minha barriga, meus seios, segura a minha
mão e leva até seu membro duro, me beija e eu o
seguro tocando-o nesse momento.
Sua outra mão continua a me acariciar lentamente
o meu ponto, de joelhos na cama Mosés Handerson me
masturba e eu o masturbo enquanto nos beijamos
ferozmente, a sensação provocada por seu toque não
poderia ser melhor, mais excitante.
Ele ergue a mão e lambe as pontas dos dedos
colocando-os entre nossos lábios, o gesto obsceno me
excita e também faço isso, lambo a ponta de seus dedos
provando do meu próprio gosto, ele fecha os olhos,
beijo seu pescoço, seu peito, quero que ele se sinta
como fez com que me sentisse agora a pouco, quero lhe
dar prazer da mesma forma.
Meu corpo ainda sente os reflexos do prazer,
estou entorpecida.
Ele volta a me beijar intensamente, e apenas a
carícia de seu beijo me faz sentir novamente a volúpia
do desejo, Mosés sente prazer com o meu toque, ele
gosta, ele geme baixinho e lentamente libera o líquido
quente e viscoso na minha mão, enquanto nos beijamos
seus quadris sobem e descem e suas mãos suspendem
seu corpo para cima mantendo seus braços como
pilares fortes dos lados do meu.
Ele morde o meu lábio inferior com suavidade, e
olha no fundo dos meus olhos.
—Te amo—fala baixinho.
Meu coração está completamente acelerado,
entregue, eu sou dele também.
— Amo você! — falo arfante.
Eu o abraço, Mosés se deita em cima de mim, e
eu o aperto com força.
—Eu te amo, Mosés Handerson!
Mosés me abraça.
Sua mão entrelaçada a minha, seu corpo junto do
meu, ele está me beijando o pescoço e o ombro, sorrio,
sua outra mão me toca a barriga levemente fazendo
círculos, estou com a cabeça em seu braço, me sinto
tão bem, é muito bom estar assim com ele.
—Precisa tomar café!
—Depois desse "bom dia" eu preciso almoçar,
senhor Senhor Handerson.
Ele ri, me aperta, estou vermelha, claro, ainda
meio que envergonhada, mas devo me sentir assim? Ele
já demonstra que gosta do meu corpo, ele se sente
atraído por mim, Mosés gosta de mim como eu sou.
Mesmo gorda, mesmo com tantos defeitos
físicos, ainda que eu não esteja dentro do que se pode
chamar de "garota normal" ele me quer, e já deu muitos
sinais disso.
Safira Handerson me enganou, ela me denegriu e
me ofendeu, mas é muito bom saber que ela estava
completamente errada quanto ao que Mosés sente por
mim, ele se interessa sim por mim desse jeito, ele me
ama sim desse jeito, e eu sei que ele jamais me pediria
para ser diferente do que sou para agradar ninguém.
Ele me ama.
—B! — Mamãe bate na porta e gira a maçaneta,
tranquei. — Ah!
Como ela não se toca? Ou será que faz isso sem
intenção mesmo?
—O café está na mesa. — Mamãe comunica. —
Desçam logo, suas irmãs já chegaram.
Reviro os olhos.
—E não faça essa cara mocinha — ordena e
escuto o som dos passos se afastando.
Mosés me aperta e se ergue, ele coça a barba e
pula para fora da cama, olho para bunda dele e me
estico, ai que vontade de morder...
—Ai! —Mosés berra dando um pulo.
Mordi!
—Ana? —indaga e se vira para mim, tocando o
local com cara feia. — Por que fez isso?
—Porque estava com vontade — respondo
dando de ombros. —Sua bundinha é muito bonitinha.
Ele estreita os olhos para mim, e me sinto
terrivelmente envergonhada.
—Desculpe — falo sincera. — Não queria te
constranger.
—Não estou constrangido. — Ele se inclina e me
dá um beijinho. — Não tenho vergonha de você, meu
amor.
—É que a sua bundinha é meio grandinha, sabe
— falo ficando de joelhos na cama. —Você está bravo
meu amor?
—Não Ana, poxa, só me assustei — responde me
envolvendo num abraço gostoso. — Você faz esse bico
para que eu me sinta como uma banana de propósito,
não é mesmo?
Estou fazendo bico?
—Está funcionando? — pergunto beijando-lhe o
pescoço.
—Sim. — Mosés estica as mãos e aperta a minha
bunda com força. — Você não sabe o que desperta em
mim, Ana, tenho até medo da nossa primeira noite.
Coro, Mosés morde meu ombro e respira fundo.
—Quero te dar uma primeira vez especial, Bê.
—Você já está me dando momentos especiais,
amor.
—Você é tão linda!
—Você é tão fofo!
Nos beijamos.
—Ana! — Mamãe berra do andar de baixo.
Suspiro criando paciência.
—Vamos logo, não quero decepcionar a sua mãe,
daqui a pouco ela me proíbe de te levar para o altar
por me achar um mal caráter.
—Eu ainda não concordei com o "altar".
Mosés ri e se afasta, observo o belo homem de
costas para mim, toda a sua altura e virilidade.
—Isso é só uma questão de tempo, meu amor.
Deveria ficar brava, mas enquanto saio da cama
estou sorrindo.
— Veremos !
Capítulo 31
Fico na varanda dos fundos vendo a chuva cair.
Acho que eles estão vendo futebol com as minhas
irmãs, mamãe lava a louça do almoço.
Não me sinto exatamente mal, minhas irmãs não
me encheram de provocações hoje, mas não me sinto
encaixada em tudo isso, Bree descobriu que Mosés
gosta de futebol americano — ou acho que ele
comentou depois do café — e ela ligou a tv TV , então
elas estão com ele e os meus cunhados vendo tv TV .
Fico contente que Mosés esteja se integrando a minha
família estranha, não acho ruim, mas estou muito longe
disso, muito longe de tudo o que eles gostam.
Observando Fiance e Bree me senti meio
estranha mais uma vez, ambas usam shorts jeans leves
e blusa justas, estão maquiadas e os cabelos delas
nunca pareceram tão bonitos, enquanto eu estou de
calça de moletom e camiseta—roupa que uso para ficar
em casa—chinelas.
A bem da verdade minhas irmãs podem ser duas
bruxas comigo, fazerem da minha vida um pequeno
inferno durante as minhas visitas, mas elas são muito
mais sociáveis, engraçadas, elas são tudo o que eu
nunca fui para a mamãe, elas são daqueles tipos de
garotas que os caras facilmente se interessam
simplesmente por serem bonitas, magras, simpáticas,
não é à toa—e reconheço—que se casaram com caras
lindos e bem-sucedidos.
Eu não estou tão longe do sol assim, certo?
Também noiva de um cara lindo e bem-sucedido,
mas eu não sou como elas, nesse sentido, a mil
quilômetros do sol e dez mil anos luz de tudo.
Sou isolada, não sei interagir, o que posso fazer?
Este é o meu jeito.
Não sei ficar rindo de qualquer coisa, não sei
fingir que gosto dessas coisas, eu detesto futebol
americano, não gosto de esportes, o máximo que chego
perto de algo assim é ver um jogo de basquete ou
MMA com Sêmora aos fins de semana, ela é bem
parecida comigo nesse sentido.
Não estou triste, estou apenas como sempre me
sinto em eventos de família: deslocada.
Sempre arrumo um jeito de sair fora nos
momentos em que todos estão na sala reunidos, e hoje
não foi muito diferente, não dou mais que meia hora, é
o máximo de tempo que mamãe leva para me achar em
algum lugar da casa e me arrastar de novo para lá.
Abraço minhas pernas e olho para os varais que
papai colocou nesse quintal há anos, para a pequena
horta da minha mãe, para os caixotes com pés de
cebolinha num canto, e para as árvores que ficam
envolta da nossa casa, aqui não tem cerca, as casas são
todas construídas umas a certa distância das outras.
Ouço Lykke Li Possibility, é uma música na qual
sempre escuto quando estou só, e é bem parecida com
o meu estado de espírito nos últimos anos.
Possibilidades.
Analiso todas as possibilidades que tive, que
tenho, foram tão poucas, possibilidades de ter uma
vida financeira dentro do possível boa eu sempre tive,
eu corri atrás de tudo o que tenho, e graças a Deus eu
consigo me manter muito bem nos últimos seis anos,
mas quanto a vida pessoal e amorosa, sem
possibilidades.
Eu me isolei da vida nos últimos anos, eu isolei
tudo e todos sempre porque isso é muito mais fácil que
lidar com os reais problemas de ter alguém por perto,
percebo que Mosés e eu somos meio assim.
Com a única diferença de que ele é bem mais
sociável que eu, não sei se teria tanta paciência com
mamãe, francamente, ela repete uma coisa dez mil
vezes a cada meia hora, apesar de ser calado Mosés
sabe como lidar com eles, mas eu acho que nunca vou
saber lidar com a minha família. Mas agora é diferente,
agora sou diferente, agora começa uma nova fase da
minha vida, e eu nunca estive tão situada, tão certa, só
de pensar nele eu já me vejo sorrindo.
Mosés!
Acho que durante um bom tempo da minha vida,
ao menos quanto as possibilidades de ter alguém ao
meu lado não terei que me preocupar, eu terei Mosés.
—B!
Mamãe!
Reviro os olhos e me levanto do degrau, ela está
com as mãos na cintura, desde que me lembro mamãe
faz isso quando se irrita, os cabelos saindo do rabo de
cavalo, mas depois ela sorri, e sinto que tudo ficará
bem.
—Eu só estava...
—Se isolando um pouco, é eu sei.
Mamãe sorri, não parece brava.
—Eu falei com as suas irmãs, amanhã vamos te
levar ao shopping...
—A não, mãe, não começa...
—Você agora está noiva filha, tem que ser um
pouco mais vaidosa, vamos fazer compras e te levar no
cabelereiro, já conversei com o Mosés, ele e os
rapazes vão passear pela cidade enquanto nós teremos
um dia só nosso!
Eu acho que dessa vez não sairei viva.
—Compras!
Eu não sei qual é o problema mental de Bree e
Fiance.
Elas duas vão na frente, ambas usam vestidos
coloridos, mamãe colocou um chapéu que ocupou a
frente do carro dela todo enquanto eu dirigia, elas
falaram tanto que deu vontade de jogar o carro no
primeiro penhasco da rodovia.
Não estou de bom humor.
Quando acordei Mosés não estava na cama,
quando desci para o café, mamãe avisou que os
"meninos"— meus cunhados— haviam levado ele para
um jogo de futebol americano local, o time da casa iria
jogar na cidade, mas eu francamente não fiquei tão
azeda por conta disso.
Estou azeda por conta do passeio, sempre odiei
sair com mamãe e as minhas irmãs.
Elas são terríveis, na maioria das vezes ficam o
dia todo andando por horas e horas e levam pouca
coisa para casa, Fiance adora amostras grátis de
perfumes e batons enquanto Bree experimenta dez mil
roupas para pegar uma peça, que ela na maioria das
vezes deixa guardada mofando no guarda roupa.
Francamente, que consumismo desenfreado.
Compro roupas duas vezes no ano, tenho mais
roupas de ir ao trabalho, jeans, camisetas e roupas de
baixo, naturalmente que eu não vivo me enfeitando
feito uma palhaça para ir trabalhar, acho que tudo em
excesso não fica legal, e eu já sou gorda, com coisas
do tipo só vou chamar mais atenção.
Não gosto de nada colorido demais, nem
chamativo demais, então minhas compras com a
Sêmora costumam ser bem rápidas, já vou sempre nas
lojas de moda grande no centro, pego o que quero
depois nós duas costumamos pegar um cinema ou coisa
assim.
Da vontade de sair correndo logo que estaciono
o carro, acho que elas fazem de propósito, essa
empolgação, esses sorrisos, essa alegria, mamãe as
criou assim, dando sempre do bom e do melhor,
quando eu fui embora ela já estava numa situação
melhor, a pensão de papai dava para os gastos e como
ela trabalhava no hospital tinha um dinheiro no final do
mês.
—Vamos B, se anime!
Odeio compras, odeio Shopping, odeio, odeio,
pior que isso só comer alfafa.
Me arrepio toda só de pensar.
Com certeza ainda que odeie esportes, preferiria
estar numa banca ouvindo gritos durante um jogo do
que isso, é tortura psicológica.
—Vamos primeiro no salão. — Bree determina
arrumando os sapatos altos nos pés. —Minhas unhas
precisam de um trato.
Você precisa nascer de novo!
—Vamos comprar umas coisinhas básicas para
você já que o seu namorado pobre não tem dinheiro
para pagar. — Fiance faz pouco caso.
Não sei nem o que dizer, elas vão na frente e
estendo as mãos querendo arrancar os olhos delas fora,
mamãe me abraça com um sorriso vasto.
—Família feliz B, hoje é dia das meninas.
Dia das meninas...
Acho que faz uns dez anos que mamãe não faz
isso comigo, mas nem respondo, acho que ela se
empolgou com o Mosés, ela não para de elogiar ele
por sua educação, ontem após o jantar ele se ofereceu
para lavar a louça, haviam suspiros de todos os lados.
Claro, ele ficou bastante comigo na sala, mas não
me interessava por aqueles assuntos, meus cunhados só
sabiam falar de jogo, negócios, cada um falando de
suas empresas, Petter é dono de uma empreiteira em
Nevada e Brood de um escritório de advocacia
também em Reno, minhas irmãs são recém-formadas,
mas nenhuma exerce em sua área, ambas trabalham
com seus maridos.
Depois de uma tarde entediante ouvindo eles
falando de negócios e vendo minhas irmãs fazendo
bordado com a mamãe—sim, elas também bordam e
tricotam—na sala, decidi eu mesma preparar o jantar,
assim me ocupei, em dado momento Mosés foi a
cozinha saber se estava tudo bem, ele me abraçou e me
beijou, mas eu percebia uma pequena empolgação em
seu olhar. Tarde demais, a entidade que eu chamo de
família já estava encantando ele.
Apena disse um simples "sim", nos beijamos e
ele voltou para sala, depois do jantar ele se ofereceu
para lavar a louça, percebia os olhares de minhas
irmãs para ele, mas ignorei, depois disso nós dois
subimos e tomamos um banho juntos, não falamos nada
durante o banho, saí primeiro, depois que me sequei
coloquei um pijama e fui para cama, alguns momentos
depois ele se juntou a mim, a última coisa que me
lembro foi dele me abraçando na cama e falando um
simples:
"boa noite bebê"
Estava feliz, derretida e relaxada.
—O que faremos no seu cabelo?
Entramos no salão, minhas irmãs conhecem esse
lugar quase todo, o shopping é grande, mas elas vivem
vindo aqui para passear com mamãe nos dias de tédio
ou quando querem torrar os cartões dos maridos delas.
—Nada mãe...
—Ana, por favor, deixa disso, você precisa se
cuidar mais minha filha.
—Para o Mosés?
Estou realmente irritada.
—Para você, Ana, para que se sinta bonita, ele é
um homem bonito, você tem 27 anos filha, não será
jovem para sempre, já se olhou no espelho? Viu o
quanto é bonita, Ana? Mas você não se arruma, não se
cuida.
—Para que? Para a senhor Senhor a me mandar
fazer dieta e me chamar de gorda?
Mamãe me olha assim meio espantada, depois
abaixa a cabeça e nega, eu sei que com essa pergunta a
magoei bastante.
—Não Ana, essa não era a minha intenção,
apenas não queria que você crescesse e adoecesse
como foi com o seu pai, ele morreu muito jovem, você
sabe que muitos parentes do seu pai morreram de
enfarto.
Estou surpresa com a resposta.
—Gordura é sinônimo de doença na família do
seu pai, Ana.
—Eu não sou doente.
—Só estou explicando o que eu penso, ou
pensava, sou enfermeira e sei os riscos de ter um obeso
na família, não quero acordar amanhã e receber um
telefonema falando que você morreu de um ataque
cardíaco.
Ela faz cara de choro, e realmente me sinto mal.
—Calma mãe, não precisa chorar.
—Sejam bem-vindas a La Beele, Cherry. — Uma
moça usando um uniforme preto se aproxima, ela é
realmente linda.
—Onde tudo é perfeito! — Mamãe cantarola, se
mostrando eufórica.
Respiro fundo e a sigo, depois vou para cadeira
que a moça loira me indica, mamãe está ao lado
olhando um folheto.
—Podemos pintar — sugere a moça.
Arregalo os olhos.
—E cortar. — Mamãe completa alegrinha.
Fico boquiaberta.
—Eu não vou cortar nem pintar...
—Relaxe Cherry, na La Belle todas as nossas
clientes saem satisfeitas, ou o seu dinheiro de volta —
fala a moça.
Ela parece uma daquelas dubladoras de novelas
mexicanas.
Suspiro.
—Então? — questiona mamãe empolgada. —
Pronta para sua transformação La Belle?
—Eh! — falo fazendo uma cara de bosta que dá
para ver a dez quilômetros.
—Ao menos ela não morde — insinua Bree na
cadeira ao lado já com a capa preta.
Mostro o dedo do meio para ela e a vejo
cruzando as pernas ao lado de Fiance, o dia hoje será
muito, muito longo.
Chegamos.
Enfim em casa.
Longe do barulho, longe da escuridão dos
provadores, longe da dor nos pés, em casa.
—Viva!
Depois que digo isso caio no sofá.
Mamãe me obrigou a colocar esse vestido
florido, o decote mostra parte de seios que parecem
mais que não são meus, é um vestido longo e florido
com um decote mais profundo, quando saímos do salão
Bree nos levou para uma loja de roupas grandes,
depois me obrigou a comprar diversas peças de cores
que eu detesto, laranja—que me deixa com um formato
lindo de botijão de gás — por exemplo, foram na
maioria vestidos, saias, essas coisas que eu vou enfiar
no meu guarda roupa e tentar usar só no dia da minha
morte.
As miseráveis me deixaram comer um sorvete no
fim da tarde, e me deram algodão doce, preciso admitir
que Fiance é meio que boazinha, ela me deu o dela
quando Bree foi no banheiro, mamãe como sempre
estava tagarelando sobre as tortas, sobre como eu devo
me arrumar e blá, blá, blá, e mais uns dez blá seguidos.
Tenho medo dessas mulheres, elas me obrigaram
a fazer depilação a laser.
Morri de vergonha, e doeu muito, fiquei andando
um tempão de perna aberta, minhas axilas ainda ardem.
Como se eu fosse peluda, eu me depilo
regularmente, mas acho que elas fizeram isso porque
mamãe tem planos de irmos para casa da Bree amanhã,
para um dia na piscina, como se eu fosse usar um
biquíni estranho que ela comprou para mim.
Só mais um dia, Ana, só mais um e você estará
livre delas por um bom tempo.
Tomara que o natal demore mais para chegar
esse ano.
Não sinto que mudei assim tão radicalmente, mas
mudei.
Confesso que não ficou tão ruim assim...
—B!?
—Só um momento, mãe, me deixa só voltar para
o meu corpo.
Abraço o sofá, meus pés latejam, minhas
panturrilhas doem, e as minhas virilhas ardem por
causa da sessão a laser, fiquei tão constrangida que a
moça ficou nervosa, mas é, muito melhor que lamina
confesso.
—Os rapazes chegaram, precisamos fazer o
jantar...
—Os rapazes chegaram, precisamos fazer o
jantar! —repito com voz fina, irritada, Bree e Fiance
colocam as sacolas num canto da sala, eu acho que
joguei as que eu trouxe em algum lugar. — Precisa
estar linda para o seu noivo B, precisa cortar o cabelo
e pintar as unhas, arrancar suas sobrancelhas...
—Vamos, não foi tão ruim. — Fiance se joga no
outro sofá ao lado de Bree. — Ao menos suas unhas
ficaram lindas.
Olho para as minhas unhas da mão, pintei de um
vermelho mais discreto, as dos pés também, a moça
disse que tenho pés bonitos e elogiou minhas unhas,
achei meio estranho, eu calço 39, meus pés são
grandes, mas enfim, deixei, acho que fazia uns três
meses que não fazia a unha assim.
—Querida, eu sou linda — falo com tanto
deboche que as minhas irmãs gargalham.
—Eu gostei da cor do cabelo e do corte.
Eu quase chorei quando aquela loira com voz de
tele sexo começou a cortar, mantenho o mesmo tamanho
de cabelo há quase dez anos, ele era longo e nunca
achei ele feio, mas a moça falou que para dar volume e
um formato melhor ao meu rosto eu tinha que cortar,
cortei, na altura dos ombros, agora, além de curto ele
está loiro.
Loiro.
Eu nem quero ver a cara da Sêmora quando ela
ver o meu cabelo Loiro.
Loiro!
—Eu gostei da sobrancelha dela, é grossa,
escura, se ela mantiver sempre bonita e bem-feita quem
sabe um dia não chegue aos pés da minha.
—Para de ser ridícula — ordeno —
sobrancelhas não tem pés, sua burra.
—Mal-amada — acusa Bree, mas está rindo à
beça. — Aí Ana, impagável quando ela começou a
tirar sua cava.
Eu gemi alto, mas doeu, oras.
—Ridículas as duas. — Eu sei que convenceram
mamãe de propósito. — Me pagam, vou destruir o
quarto de vocês.
—Ela vai começar com as ameaças, Fih. — Bree
gargalha. — Lembra que ela queimou minha boneca
quando eu tinha treze anos?
Mostro o dedo do meio para ambas e elas riem
mais, ignoro, porque brigar não funciona.
—Agora temos duas loirinhas em casa, amor. —
Fiance fala. — Olha como ela ficou bonita loira.
Me ergo chateada e aponto para ela, depois faço
um sinal com o polegar em uma linha reta no meu
pescoço, Broode está sentado no braço desse sofá ao
lado de Fiance, e Petter ao lado de Bree, os quatro
riem à beça.
—Você e eu, qualquer hora, Fiance, qualquer
lugar...
—Ela está brava porque a mamãe obrigou ela a
se depilar...
—Como você é infantil — fico vermelha. —
Não fala mais comigo.
—Ana, Ana, Ana...
Odiava quando ela fazia isso, afasto meus
cabelos para o lado, a moça escovou e deixou eles
ondulados.
—Morre, Bree...
—Chega, Ana. — Mamãe fala voltando da
cozinha com uma bandeja lotada de quitutes e sua
louça. — Bregeth você também, pare de implicar com
sua irmã.
—Quando você morrer você vai para o inferno,
B. — Bree fala, mas ainda ri à beça de mim.
—Não se preocupe, eu te levo junto — reclamo
chateada.
—Mosés eu fiz bolinhos sem glúten para você.
— Mamãe fala olhando para o rumo do outro sofá.
Endureço, depois de alguns instantes me sento
novamente nesse sofá, a vontade que eu sinto é de que
um buraco me engula, o mais rápido possível, estava
tão entretida ou irritada com as minhas irmãs que mal
me lembrei que com a chegada dos meus cunhados,
Mosés estaria aqui também.
—Eu gostei desse novo visual. — Mamãe fala e
se senta ao meu lado. — Ana é uma moça muito bonita.
Ela me entrega uma xícara de café e aceito, bebo
dois goles consecutivos, já estou completamente
nervosa.
—Concordo. — Mosés fala num tom cordial.
Ergo o olhar e o fito.
Nesse momento fico totalmente dura no meu
canto.
—Eu trouxe um bilhete.
Sorrio.
Mosés se senta ao meu lado nos degraus, pego o
bilhete, e abro, me sinto um pouco ansiosa, mamãe e as
minhas irmãs saíram para comprar comida pronta, os
meus cunhados foram juntos, ela me avisou há pouco,
não esperava que Mosés fosse ficar, ele é bem
daqueles que parece fazer tudo para agradar a sogra.
Abro o bilhete.
Leio.
"Ana, você ficou linda com os cabelos loiros,
tudo em você está perfeito.
Ps. Fiz a barba, você gostou?
Mosés Hallan Handerson"
Eu o olho, e mal consigo reconhecer o homem
que vi ontem à noite na cama.
Mosés tirou a barba, tudo, e ele também cortou o
cabelo, ele está muito mais jovem do que é realmente
sem barba, os cabelos estão penteados para o lado, e
como se não bastasse, ele está completamente lindo de
calça e camisa de malha, usa um casaco preto por
cima, tênis. Meu coração se acelera quando ele faz
menção de sorrir.
Ele me olha assim tão concentrado, mas acho que
não fiquei tão diferente, certo? Analiso o bilhete
escrito em papel toalha e sorrio, depois dobro, olho
para o canteiro da minha mãe.
—Ficou bonito, Mosés, bem mais jovem.
—Não tiro a barba há uns oito anos.
—Te deixou com cara de moleque.
—Sério?
Sorrio me sentindo meio tímida, ele passa o
braço em volta da minha cintura e me aconchego, ele
beija o meu pescoço com delicadeza, não sentir os
pelos da barba é até agradável, fecho os olhos e deixo
que me toque os cabelos, Mosés os cheira e olha para
os fios dourados, depois afasta um punhado deles para
trás da minha orelha, ergue a minha face e eu o fito.
—Você é linda, Ana Beatrice.
Toco sua face e eu o beijo com carinho, Mosés
enfia os dedos nos meus cabelos e seu polegar toca
minha bochecha com carinho, sua língua explora a
minha boca com lentidão e me sinto de repente nas
nuvens, feliz, estar com ele é sempre tão bom, e ao
mesmo tempo muito diferente de tudo o que já senti na
vida por qualquer pessoa que já conheci.
—Comprei algo para você, Bê. — Mosés fala e
se afasta um pouco. — Mas só vai saber quando
chegarmos em casa.
—Não precisava comprar nada — respondo e o
abraço. — Como foi o jogo?
—Foi bom, depois passamos na barbearia. —
Mosés toca a face. — Oito anos para parecer um
homem, jogados fora por uma navalha.
—Para mim ainda vai continuar lindo, meu amor.
— Sorrio sincera.
—Como você é linda minha, Bê. — Mosés me
aperta com força.
—B, Mosés! — Mamãe chama e abre a porta da
varanda. — Trouxemos massas...
—Sem glúten. — Bree berra do lado de dentro.
Olho para Mosés e ele sorri, bem, acho que a
família monstro não é das piores, não é mesmo?
Capítulo 32
—O que foi?
—Acho que perdi o sono.
Ligo o abajur, Mosés volta para a cama, quando
acordei ele já não estava aqui na cama, acho que ainda
nem amanheceu, ele me abraça e beija meu ombro,
Mosés está frio, seu rosto e cabelos molhados ou algo
assim.
—Tudo bem, é só um mal-estar, vai passar,
querida.
—Você está frio.
—Estou bem, foi só um mal-estar.
Não estou tão convencida disso, ele me dá um
beijo na cabeça e me aperta.
—Amo você, Ana, acima de tudo.
Eu sei que não é apenas um mal-estar, ele está
tão soado, parece que escovou os dentes, abraço
Mosés e me sinto preocupada, contudo, o sono não
demora e chega, estou realmente cansada, estou
abraçando ele bem forte quando novamente adormeço.
—Bom dia, flor do Dia!
Dou um pulo na cama.
Nesse momento, mamãe abre as cortinas da
janela do meu quarto, me estico e Mosés se encolhe
cobrindo os olhos do sol que invade o meu quarto.
Ah não, esqueci de trancar a porta.
—Que bom que estão vestidos. — Mamãe fala
com um sorriso imenso, depois pega a bandeja de café
da manhã e coloca diante de nós dois. — Bree está
enjoada, vou acompanhar ela ao médico, Fiance vem
junto, acho que ela não anda comendo direito.
Me sento, mamãe olha para mim, depois para
Mosés, estou de pijama, Mosés também, graças a Deus.
—Vocês embarcam que horas?
—depois Do almoço. — Mosés fala, mas não
parece constrangido.
—Ótimo, então, boa viajem, vamos nos falando
por telefone para combinar tudo do casamento. —
Mamãe me dá um beijo na testa. —Te amo B, use
camisinha!
—Mãe! — reclamo.
Ela se estica e dá um beijo na cabeça de Mosés
também, depois sai do quarto como se tudo isso fosse
muito natural, analiso o as xícaras com café quentinho,
enquanto Mosés me beija a bochecha e toca a minha
barriga — ele gosta de ficar tocando a minha barriga
— lhe estendo uma tira de bacon frito, ele aceita e
pega a outra xícara.
—Tudo bem? —pergunto, tendo a vaga
lembrança de seu mal-estar de ontem.
—Sim. — Mosés fala e mastiga indicando a
boca.
Sorrio, beijo sua face e seu pescoço.
Pego uma torrada com geleia e começo a comer,
Mosés pega a salada de frutas, bem, vamos falar a
verdade, a comida da minha mãe é muito boa, preciso
admitir que acima de tudo ela sabe muito bem como
cuidar para que eu fique ao menos viva quando venho
vê-la.
—Acho que vou pedir para arrumarem o avião.
— Ele fala depois de alguns momentos. — Bom, que
chegamos mais cedo.
—Tudo bem —falo, também prefiro.
— Podemos aproveitar o resto do nosso dia em
casa.
—Sim, senhor Senhor !
Mosés me dá um beijo no pescoço, e me dá um
sorriso lindo.
—Minha Ana.
Sua.
Casa!
Enfim, casa.
Senti tanta falta desse lugar que parece que faz
uns dez anos que eu estive fora.
Fomos recebidos pela mesma comissária de
bordo, foi o mesmo piloto que nos trouxe para casa.
Minhas flores, meus vasos, meu sofá, meu
apartamento.
Longe do caos que foi lidar com a minha família.
Longe das memórias ruins.
Enfim, lar doce lar.
Mosés puxa a minha mala, tive que comprar uma
segunda mala para trazer as coisas que mamãe e
minhas irmãs compraram para mim, mas a volta foi
muito, muito melhor que a ida. Nada de check-in, nada
de atendentes bisbilhoteiras, apenas eu e Mosés
entrando em seu jatinho no aeroporto sem nenhuma
burocracia.
O Piloto nos aguardava ao lado da comissária de
bordo, acho que a verei com mais frequência, mas
acredito que também sejam particulares, Mosés
entregou o carro para o moço do seguro, ele nos
esperava no estacionamento do aeroporto, então depois
pegamos as nossas malas, colocamos em um carrinho e
fomos direto para a pista, para o lugar onde seu jatinho
estava nos esperando.
Não me senti tão diferente do que sou, mas
realmente é muito melhor ter o conforto e a
privacidade de viajar sem barulho, sem berros, sem
pessoas conversando na classe econômica, esse jatinho
era um pouco maior que o outro avião, com umas trinta
ou quarenta poltronas eu acho e compartimento para
malas maiores, mas nem ficamos onde ficam os bancos,
Mosés tem uma cabine só dele.
Havia uma cama, tv TV , um balcão e toda a
comodidade e conforto que um quarto normal poderia
oferecer, fiquei maravilhada, nunca pensei na vida que
alguém teria um quarto dentro de um jatinho, nunca
parei para pensar nisso de fato, tudo é bem distante do
que sempre tive.
Quando saímos de San Antônio me sentia até
bem, um pouco melhor do que cheguei, Mosés e eu
dormimos a viajem toda basicamente, acho que os
passeios e os dias com a família nos cansaram, mas
também porque é muito mais confortável dormir numa
cama do que numa poltrona de avião dura.
No aeroporto pegamos um taxi e aqui estamos.
Lar, doce e incrível lar.
Acho que Sêmora esteve aqui aguando e
cuidando das minhas flores, trocando os vasos, tudo
parece impecável, também acredito que alguém
limpou, pois, tudo está mais bem cuidado, nada de
poeira, nada de baderna, não que houvéssemos
deixado, mas eu sei quando alguém mexe nas minhas
coisas.
—Pedi a Guadalupe que viesse organizar tudo, e
Sêmora molhar as plantas. —Mosés diz muito
tranquilamente. — Tudo bem?
—Sem problemas. — sorrio. — Quer comer
alguma coisa?
—Devemos — esclarece. — Vou levar as nossas
malas para o quarto.
—Ok.
Vou para cozinha, acabei por colocar o mesmo
vestido que tinha comprado ontem, é confortável,
calcei sandálias, quando chegamos ao aeroporto tudo o
que eu queria era chegar logo em casa, sou
extremamente caseira, odeio sair, e viagens me cansam
com frequência, principalmente para casa da minha
mãe, mas admito, dessa vez não foi a pior viajem do
mundo.
Abro a geladeira e a vejo lotada de coisas
verdes, leite, ovos, no freezer alguns pacotes de frango,
tem queijo cheddar e peito de peru, estou surpresa com
a quantidade de variedade na minha geladeira, lembro
que ele havia dito que faria compras, mas não tantas
coisas.
Ele volta mexendo no celular, acho que retornar
para Nova York é como dizer: Caí na Real.
Amanhã voltaremos para nossa rotina, amanhã eu
começo como secretária de Mosés Handerson, ainda
que agora eu seja sua noiva, amanhã será um novo
começo para nós dois, ainda não falamos direito sobre
isso, quero tirar muitas dúvidas com ele, sobre o cargo
já tenho uma base, Marcy me ensinou nos dias que ele
esteve fora, sei mexer com planilhas, com e-mails,
acho que a minha dificuldade surgirá com o dia a dia,
porque não conheço Mosés como chefe Chefe ,
conheço apenas como meu noivo.
Ele liga a tv TV e se senta tirando a camisa, olho
para frente e não sei porque me sinto tão nervosa,
ainda hoje tomamos banho juntos, acho que é questão
de hábito.
—Bê!
Adoro quando ele me chama de Bê.
—Sim?
—Deixa isso aí, vou pedir comida francesa para
nós dois.
Já me empolgo.
—Aquela sopa?
—Claro, o que quiser amor.
É muito fácil gostar de Mosés Handerson,
simplesmente porque ele faz de tudo para cativar a
gente.
Percebi isso no jantar de ontem com a minha
família, ainda que Mosés parecesse mais inteirado
quando os rapazes começavam a falar de algo ele logo
estava explicando sobre o assunto, Mosés também é
chegado em política — quem diria, eu namorando
alguém que gosta de política? —e economia — esse
assunto eu já domino bem melhor—
Mas ligo a cafeteira, preciso de um pouco de
café para ficar mais situada, vou para sala, Mosés está
deitado no meu sofá, me sento perto de seus pés, ele se
ergue e inverte as posições colocando a cabeça em
minhas coxas, joga o celular para longe.
—Eu já pedi que arrumassem sua mesa na minha
sala. — Ele diz e beija a minha barriga.
—Bom, você vai pegar leve comigo, certo? —
pergunto observando a barriga retinha, o peito largo
com cabelinhos escassos, e os ombros dele, umedeço
os lábios.
—Sem pressão, já disse que você está linda com
essa cor de cabelo?
—Sim— Eu estou sorrindo agora.
—E que os seus seios são lindos nesse decote?
Fico vermelha.
—E que eu não gosto que use esse vestido para
mais ninguém.
—Ciumento!
—Eu já disse que não divido o que é meu, Bê.
—Isso você não falou.
—Acabei de falar agora.
—Eu não sei para que, até parece que alguém
mais vai me querer assim do nada.
—Eu quero Ana, e acredite, muitos outros caras
querem, você realmente não enxerga o quanto é linda.
—É mesmo?
—É mesmo, vai começar a teimosia?
Não acredito que ele está com ciúmes do meu
decote.
—Não — reclamo. — Seu chato.
—E não faz esse bico.
Olho para tv TV , Mosés me puxa de repente
pelo pescoço e me beija, de início não correspondo,
mas depois estou derretendo com seus beijos, ele se
ergue e sobe em cima das minhas pernas ficando de
joelhos no sofá, me beija com mais intensidade, toco
suas costas, seu peito, Mosés se afasta quando fico sem
fôlego.
—Não quero brigar, Ana, eu sei que sou um
doente de ciúmes.
—Ninguém nem percebeu.
—Você não percebeu, você não vê maldade nos
olhares dos homens para você, mas eu sou homem e sei
do que falo, seus seios são lindos querida, e eu não
quero nenhum homem olhando para eles.
Suspiro.
—Mas eu deixo você usar esse vestido em casa.
—Você não tem que deixar nada, eu não te
proíbo de nada, oras!
Mosés sorri e me beija de novo.
—Mosés, para... eu estou falando com você...
—Eu não quero brigar.
—Não estamos brigando.
—Você adora brigar comigo, Bê.
—Que manha, meu Deus.
Mas ele não responde, e eu não ligo, estou
beijando-o também, também não quero brigar, minha
força de persuasão sumiu, Mosés Handerson a capturou
e a levou para algum lugar bem longe de mim.
Capítulo 33
Me estico na cama, mas o lado esquerdo está
vazio.
Mosés não está ao meu lado, mas logo me vejo
sorrindo, tem uma flor vermelha e um bilhete escrito
por ele.
"Bom dia meu amor, sai mais cedo pois tenho
treino, nos encontramos na empresa, um ótimo primeiro
dia para você.
Ps. você é linda.
Mosés Hallan Handerson"
Beijo o bilhete dezenas de vezes e me levanto
abraçando a minha rosa.
Não sabia que ele treinava assim tão cedo,
coloquei o celular para despertar, mas acordei bem
antes, olho para o visor e ainda são sete e quinze,
contudo, nunca estive tão feliz em ler um de seus
bilhetinhos, eu o guardo na caixinha dos bilhetes, é uma
das minhas caixinhas que guardo fotos minhas da
infância, nessa caixinha venho colocando todos os
bilhetes que Mosés me dá.
Ontem nós dois pedimos comida francesa, depois
do assunto "decote" decidi não discutir mais,
almoçamos na sala mesmo e bebemos vinho, Mosés
não pode beber cerveja—que é o que eu costumo beber
quando estou com Sêmora—, mas não vejo muita
diferença, esse restaurante de onde ele pede o pessoal
manda vinhos de cortesia, e descobri que esses vinhos
são os olhos da cara.
Mosés é acostumado ao bom e do melhor, para
ele beber um vinho desses é como beber um copo de
suco de uva, quando lhe questionei—brincando—
quanto valia a garrafa ele deu de ombros e disse um
simples:
"não sei, é cortesia"
Só que eu fiquei curiosa, quando pesquisei no
meu celular — claro sem ele ver — e vi que a garrafa
custa em média de dois a três mil dólares me senti
meio fora do ar, também me espantei com o valor dos
pratos que ele pediu para nós dois, isso meio que me
travou pelo resto da noite.
Mosés Handerson é um homem rico.
E eu por incrível que pareça não parei para
pensar nenhum segundo nessas coisas, bem, parei, já
pensei centenas de vezes nisso, mas não com tanta
cautela.
Depois que apreciamos o jantar—que custa em
média 30 dólares o prato—, além da salada e da sopa,
comemos também Petit gâteau, com bolas de sorvete
que veio separado somente para nós dois, o sorvete era
tão gostoso que me senti no atrevimento—não chamo
minhas exceções de direitos—de comer um pouco
mais, o do Mosés não era um tradicional, era um feito
apenas de massa folheada recheado com morango e
com calda, fiquei me questionando quantas mais coisas
eu não sabia sobre ele.
Mas deixei isso de lado, levei a louça para a pia
e quando voltei para a sala ele já estava colocando o
meu colchão no lugar, pegando cobertores, vimos um
filme juntos, mas eu mais cochilei que tudo, depois
viemos para a cama e dormimos juntinhos.
A convivência com ele é tão natural.
Gosto disso, gosto de estar com ele, acho que eu
e Mosés não teremos grandes problemas de
convivência, apesar das discussões e das crises de
ciúmes dele por algumas coisas, nós dois até
convivemos bem.
Entro no banho, acho que ele deve ter passado no
apartamento dele para se trocar e se vestir, quase não
tem roupas propriamente dele aqui, mas só de pensar
que daqui a alguns momentos eu e ele estaremos juntos,
já me sinto contente.
Lavo meus cabelos e depois que saio do banho
me olho no espelho, eu gostei desse loiro, não foi bem
o cabelo inteiro, a garota com voz de tele sexo puxou
mexas loiras e douradas, deixando meu cabelo muito
bonito, não uso a escova para secar, segundo ela meu
cabelo agora com esse corte ficará definido, e
realmente fica, quando termino o vejo mais ondulado,
as camadas destacadas.
Até me animo para me maquiar, quero chegar no
meu primeiro dia como secretária do Mosés muito
bem, ok, não é como ser contadora chefe Chefe, mas eu
sei discernir na minha cabeça que não é algo inferior
agora, como ele já explicou, se me quer no cargo é
porque tenho competência.
Passo uma base leve, blush, mas não muito,
máscaras para cílios, delineador e batom, um batom
rosa claro que destaca pouco a minha boca, tenho
lábios grandes e mais cheios, isso herdei do meu pai,
os olhos herdei de mamãe, são azuis, visto um conjunto
composto por calcinha e sutiã de cor de pele e escolho
a minha roupa do primeiro dia, mas não parece tão à
altura das roupas que a Marcy usa para ir trabalhar, ela
vai sempre tão impecável, imagino que Sêmora por
estar no meu lugar também esteja indo linda, eles não
exigem assim um padrão muito certo, mas nessa área a
maioria das pessoas são de social.
Escolho uma básica social branca com um
casaco de cor cinza para usar por cima e um jeans dos
meus mais novos, até pego um par de sapatos para usar,
mesmo que eu saiba que meus pés estarão destruídos
no final do dia.
Depois que termino, me olho no espelho e me
sinto realmente muito bem.
—Você consegue, Ana!
Suspiro e vou para o meu quarto, pego minha
bolsa, verifico se está tudo aqui e vou para a cozinha
levando comigo a bolsa e a rosa, eu a coloco em um
copo com água e deixo sob a mesa, como uma maça e
bebo um pouco de café, Mosés deixou café pronto...
Me encho de suspiros, porque vejo, pendurado
num primeiro imã de geladeira —eu não gosto de imas
— um pequeno bilhete.
"Te amo, não demora, Mosés"
Mais um para minha caixinha, mas não dá tempo,
saio do meu apartamento guardando o bilhetinho na
bolsa, logo, logo estarei com o meu novo chefe c hefe
na Handerson.
Saio do Elevador.
Eu nem sabia onde havia colocado meu crachá,
mas achei no fundo da minha bolsa, antes de subir para
a sala do Mosés decidi passar no meu antigo setor para
dar um "oi" para o pessoal, parece que faz uma
eternidade que eu não os vejo, logo que entro no
departamento todos me olham espantados.
Sorrio.
—Oi!
—Ana!
Eve levanta de sua mesa e se aproxima me
olhando de cima abaixo, ergo os braços e nos
abraçamos, logo Allan vem atrás de Gus, recebo
abraços de todos, sinto falta do pessoal, ainda que a
relação entre eu e eles tenha sido apenas de trabalho
durante esse tempo.
—Você está tão...
—Diferente, Eve? — Eu toco meus cabelos me
sentindo meio boba.
—Feliz! — Eve fala de um jeito engraçado. —
Opa!
E tapa a boca com as mãos, acabo por rir, eu não
esperava ouvir isso de alguém, acho que porque eu
sempre fui bem na minha com eles, devem estranhar
minha postura agora, mas achei meio injusto subir sem
ao menos passar para cumprimentar.
—Que barulho é esse aí, hein?
Vejo Roni se aproximando, ele empurra o
pessoal sem um pingo de educação, ele sempre foi
assim, e pelo visto, não mudou e nem vai mudar, logo
que fica diante de mim ele me olha de cima abaixo
assim bem surpreso.
—Ana?
—Oi, Roni — aceno para ele.
—Oh meu Deus isso é um anel de noivado? —
Eve segura a minha mão do nada—quem é a sortuda?
Quer dizer, sortudo?
Eve tirou o dia hoje.
Ela analisa o meu anel de noivado
criteriosamente como se não acreditasse, mas não acho
que seja a hora nem o local para falar disso.
—Meu namorado, estamos noivos — respondo e
sorrio, todos parecem surpresos. —Então, eu preciso
ir.
—Foi demitida? — Roni pergunta com um ar de
superioridade gritante.
—Não, agora eu estou em outro setor —
respondo sincera.
—Sêmora também. — Nael responde de longe.
—Para onde te mandaram?
—Sou secretária!
Roni parece se controlar muito para não rir,
ninguém além dele ri, acho que ele pensa que isso é ser
rebaixada, como eu também imaginei que fosse logo
que Mosés me obrigou a assumir o cargo, mas não ligo,
só que eu não resisto.
—Do dono! —sugiro.
E Roni para de sorrir na hora, arrumo minha
bolsa embaixo do braço e me afasto acenando para o
pessoal, me sinto orgulhosa por meu novo cargo,
apesar de todos os pesares, Mosés conseguiu me
convencer de que o cargo é de confiança, porque não
seria? Ele é o dono da empresa, ele precisa muito mais
de alguém de confiança que o setor de contabilidade,
sendo sua secretária poderei ajuda-lo em todos os
momentos, eu não me importo, no final das contas,
desde que eu receba meu salário, farei o trabalho a
mim empregado da melhor forma.
Eu tenho competência para isso, e eu vou
conseguir!
Entro na recepção.
Encontro Marcy e Sêmora falando em seus
Heads fones.
Sêmora usa um vestido vermelho de manguinhas
e um cachecol chique no pescoço, seu crachá
pendurado no cordão preto da Handerson, Marcy usa
um vestido preto de alcinhas mais grosso, quando me
encosto no balcão ambas me olham boquiabertas,
Sêmora gesticula com os lábios:
"que porra é essa..."
Mas nem dá tempo, dou a volta no balcão e pulo
em cima dela.
—Ok, senhor Senhor , tudo bem, deixarei
agendado, um ótimo dia!
E desliga, ela me aperta, e eu a aperto, estava
morrendo de saudades.
—Meu Deus. — Sêmora me afasta e me olha
como se não acreditasse. — Meu Deus!
Sorrio.
—Quero saber de tudo—exige muito antes que
eu fale. — Hoje à noite você é minha.
—Ok, você pode ir jantar comigo e o Mosés.
—Você está vendo, Marcy? Brigamos uma vez e
ela já arrumou um namorado rico Super gostoso e me
abandonou. — Sêmora reclama dando uma de vítima.
—Só porque eu queria ele para mim!
—Aí, cala essa boca —sorrio. — Então, como
estamos?
—Bem. — Marcy encerra a ligação e sorri. —
Você está linda Ana, amei seu cabelo.
—Obrigada. — Eu sorrio de ponta a ponta. —
Posso entrar?
—Deve, ele está Super ansioso com a sua
chegada. — Marcy fala com uma pontinha de irritação.
— Já ligou aqui umas dez vezes.
Não sabia que Mosés era ansioso, mas sei que
quando ele tira o dia para irritar alguém, ele realmente
consegue.
Sorrio e respiro fundo, depois me afasto até a
porta, aceno para Sêmora e para Marcy, ambas cruzam
os dedos, sorrio, respiro fundo e entro na sala. Olho
para o rumo da mesa e escondo um sorriso, sentado por
trás dessa imensa mesa está Mosés Handerson, um
homem jovem, lindo, e rico, ele usa um terno escuro e
uma gravata azul que combina com o terno, ele tem um
relógio caro no pulso e os cabelos estão penteados
para trás em seu novo corte de cabelo, é meio estranho
as vezes olhar para ele e não ver a barba, mas ele fica
bem assim, na verdade ele fica bem de qualquer jeito.
—Bom dia! — fala e me olha de cima abaixo.
—Bom dia. — Eu sorrio, sei que estou vermelha.
—Você leu os meus bilhetes? — pergunta, mas se
mantém apenas neutro.
—Sim, obrigada. — Parece que o meu coração
vai explodir. — Então, podemos começar?
—Sua mesa. — Mosés indica uma mesa de cor
preta ao lado direito da sua, mas um pouco afastada.
A mesa contém um note e um telefone, algumas
pastas, caminho até a mesa me sentindo observada, eu
nem sei porque estou tão nervosa, acho que devido ao
fato de ser o meu primeiro dia, não quero fazer feio,
não quero misturar as coisas, dentro da empresa é outra
coisa.
—Deixei as primeiras pastas para você analisar,
nada demais, apenas alguns relatórios, Ana Beatrice.
Me sento na cadeira confortável e a puxo me
arrumando diante da minha nova mesa de trabalho, ligo
o note, já está desbloqueado e com várias pastas salvas
na área de trabalho.
—Já foi criado um e-mail para você, e vamos
usar o canal interno para nos comunicarmos, se tiver
dúvidas chame Marcy, eu gosto de silêncio.
—Sim, senhor Senhor .
—Almoçaremos juntos todos os dias, costumo
fazer o meu planejamento e marcar algumas reuniões
no meu horário de almoço.
—Sim, claro.
—Não gosto de atrasos.
—Algo mais que eu deva saber?
—Amanhã você deve vir de roupas mais
adequadas, vou pedir a Marcy que providencie roupas
para você...
—Eu posso comprar...
—Minhas exigências, então eu cubro os gastos.
Ele está tão sério que sinto até medo.
Apenas concordo com um breve assentir com a
cabeça.
—Bom trabalho, Ana.
—Obrigada senhor Senhor Handerson, para você
também.
Para quem estava tão ansioso com a minha
chegada, Mosés não parece mais tão interessado assim
em mim, mas engulo o seu tom seco e arrogante e
começo a trabalhar, sei mais ou menos como analisar
essas pastas, Marcy me ensinou, abro meus atalhos do
dia e começo o trabalho.
Mas logo que abro o chat interno de mensagens
da empresa já vejo logo uma mensagem.
M. H. Handerson.
Abro imediatamente e leio.
"te amo, bom trabalho"
Engulo o sorriso e não olho para ele, depois
apenas respondo sua mensagem.
"também te amo, bom trabalho"
Hoje será, um primeiro longo dia.
Capítulo 34
Fecho o meu note.
Mosés foi para uma reunião, Marcy o
acompanhou, essa foi a segunda reunião do dia.
O dia passou muito rápido e eu estava só
começando a pegar o ritmo quando ele avisou que iria
para uma reunião de duas horas com a diretoria. Nosso
almoço foi silencioso, curto, por volta do meio dia
Marcy apareceu com pratos de salada temperada,
Mosés retornou da reunião em silêncio, muito sério, e
eu realmente entendi o que havia por trás de seu
silêncio.
Durante alguns momentos do dia mais me
concentrei no trabalho que tudo, em outros, eu estava
sempre tentando entender como as coisas funcionavam
aqui, no meu novo cargo, analisei as pastas, verifiquei
dezenas de e-mails —muitos, muitos e-mails — e
também alguns relatórios que Marcy me enviou em
arquivos.
Costumo ser bem organizada, mas dei o grito
depois do terceiro arquivo, em humanas eu sou
realmente nada, eu sempre fui tão boa com números
que me adequar a "esses tipos" de resultados realmente
é um pouco complicado.
Em partes, já sei de muitos procedimentos quanto
aos relatórios que Mosés costuma analisar, aprendi
com Marcy nas semanas em que ele esteve fora, mas
realmente preciso relembrar algumas coisas, e
aprender outras.
E para quem acha que ser secretária é apenas
atender um telefone e mexer num computador está
completamente enganado.
Na Handerson tentamos não usar papel, política
do setor ambiental da empresa, mas temos uma sala
gigantesca com arquivos que não podem ser somente
digitalizados para segurança da empresa.
Ir numa sala gigantesca como o "Arquivo" cansa,
ainda mais eu, que quando Mosés saiu para as reuniões
fui lá diversas vezes, acho que o carinha Robert —
acho que esse é o nome dele — até cansou de ver
minha cara, pois fui e voltei umas dez vezes, coisa que
a Marcy me explicou que a secretária antiga do Mosés
fazia diariamente quando necessário.
Trouxe umas pilhas de antigos clientes da
Handerson que estão na lista que Marcy me mandou,
mas foi um dia tecnicamente produtivo.
Durante o dia, algumas vezes quando eu olhava
para sua mesa, eu o via muito distante, ouvi Mosés
falando no celular diversas vezes, no telefone, atento
ao seu computador, seu terno impecável, seu jeito
muito sério e sistemático, me senti longe do homem que
ontem deu uma crise de ciúmes por mim, ele não é
assim.
Também sei que ele foi o máximo profissional
possível, porque somos adultos e sabemos que aqui é
ambiente de trabalho, Mosés é o dono da empresa, mas
isso não significa que ele pode ou deve ficar me
tratando de uma forma diferente.
Achei um pouco frio no começo, mas não cheguei
a ficar preocupada ou incomodada, apenas sentia que
deveria respeitar isso e ponto. Eu também sei respeitar
os limites no local de trabalho, o maior exemplo que
tive—e fui—foi em minha relação com a Sêmora,
somos amigas há anos, mas nós nunca transparecemos
isso para a empresa, para ninguém, para que não
pensassem que eu estava lhe dando vantagens nem
benefícios, então acho que ele já me conhece o
suficiente para saber que não quero que nos veja assim
na empresa.
Sêmora e Marcy já sabem, eu não quero ser
conhecida como a noiva do chefe Chefe , tão pouco que
tira alguma vantagem, eu quero ser reconhecida pelo
meu trabalho, pelo meu esforço, porque eu não sou
dessas que tira proveito de nada nem de ninguém,
trabalho aqui há mais de cinco anos, e desde os meus
estágios não precisei puxar saco de ninguém, nem
trapacear e nem agir de má fé com ninguém para subir
na vida... acho que Mosés percebeu isso.
Também não quero ser alvo de fofoca,
conversinha, eu sei que os casais que são formados na
empresa sempre são alvo de fofoca, principalmente
quando são casos que não duram muito.
Ainda mais pela posição do Mosés, por mim...
não quero ter que chegar na empresa e ficar sendo
observada muito mais do que já fui, do que sou, ocupar
espaço mais do que já ocupo, tudo o que quero agora é
me adequar a tudo e resolver a questão do nosso
casamento, quando tudo tiver dado certo, se ele e eu
chegarmos a um consenso, então falaremos, mas não
como se déssemos algum tipo de explicação e sim
porque mais cedo ou mais tarde alguém saberá.
Termino de desligar minha máquina, as meninas
não me transferiram nenhuma ligação, acho que ele
deixará a Sêmora agora no começo como secretária
também, tem muita coisa para colocar em dia, Marcy
me falou via chat que a ausência do senhor Senhor
Handerson esse tempo meio que atrasou tudo, Mosés é
realmente alguém muito, muito ocupado.
Não é à toa que ele ficou quase o dia todo em
reuniões.
—Já podemos ir, Ana?
Essa voz... assim tão séria... esse sotaque tão
forte...
Me arrepio toda, mas não falo nada, apenas faço
que sim com a cabeça e pego a minha bolsa, minha
mesa está em ordem, sempre procuro deixar tudo no
lugar para o dia seguinte, preguei uns lembretes nos
cantos da tela do meu note, em pastas, gosto de manter
tudo pronto para que eu não tenha problemas
posteriores, nesse quesito 10, se conseguirei terminar
tudo amanhã aí serão outros quinhentos.
Me levanto, me sinto um pouco sem jeito com a
forma como ele me olha, Mosés está do mesmo jeito
que eu vi cedo, ainda impecável, ainda lindo, ainda
tudo o que um dia eu não pensei que teria por perto,
nem como chefe Chefe , nem como noivo, nem como
nada.
É só que é meio difícil acreditar que talvez um
cara desses me queira, e sempre que paro para pensar
nisso me sinto tão duvidosa.
Não me enxergo assim com tantos atributos em
tantos sentidos, eu sou realmente bem difícil de lidar,
não sou um poço de doçura, quando me olho no
espelho—isso não acontece todos os dias—eu não
consigo me sentir Super linda, nem Super positiva, nem
Super para cima nem nada, tudo o que vejo é alguém
que tenta viver com o que tem e almeja coisa que nunca
teve.
Eu sei que eu não posso mudar o mundo em
relação a isso, mas acho tão injusto que as pessoas
sempre julguem pela aparência, eu me julgo pela minha
aparência, eu me sinto mal com isso, ainda que exista
um cara lindo me dizendo "Ana, você é linda assim"
"Ana, eu te quero assim", ainda é meio complicado
acreditar.
Simplesmente passei metade da minha vida
ouvindo o contrário, da minha mãe, das minhas irmãs,
da Rianna, das meninas da escola, dos meus familiares,
e por fim das minhas colegas de trabalho, não cedi a
pressão de um emagrecimento rápido por medo, porque
por todas elas hoje eu seria uma Sêmora da vida.
Magra, "saudável", alguém que vai para a academia
todos os dias, que hoje não é chamada de preguiçosa
justamente por ter feito uma cirurgia que a obriga a
malhar.
Levanto e eu o sigo em silêncio pensando em
algo.
Ninguém vê o lado positivo em ser gordinha,
ninguém vê a beleza por trás disso, simplesmente
porque ser gordo significa ser preguiçoso, ser a garota
rejeitada, ser tudo aquilo o que a sociedade não quer
de você.
Acho que por isso muitas vezes eu quis me
isolar, por isso que eu evitei o amor, evitei ter chances
de amar alguém, até que um dia alguém bateu na minha
porta como um tipo de obrigação e me forçou a
conviver com ele, com seus defeitos, com seu passado,
e me disse através de um bilhete um "você é linda",
ainda que eu não me sentisse assim, ainda que me
sentisse longe disso.
Às vezes acho a sociedade tão hipócrita...
—Você está muito calada.
Percebo que já saímos do elevador, andamos
pela recepção lado a lado, mas Mosés mantém certa
distância, ele anda com as mãos nos bolsos da calça,
me olha em silêncio, fico constrangida, estava de novo
voando, as vezes eu voo tanto que parece que me fecho
em pensamentos, esqueço tudo à minha volta.
— Só pensando.
—Em que? Posso saber?
—Nada em especial.
Passamos pelas catracas, não pensei que Mosés
entrasse e saísse pela porta da frente da Handerson
como os outros empregados, mas ao mesmo tempo que
passamos vejo que as garotas daqui —inclusive as
duas recepcionistas —não tiram os olhos dele, não
param de olha-lo, umas nem disfarçam, e eu realmente
começo a detestar isso.
— Fale — pede ele em seu tom baixo e educado.
Não sei se devo falar, quando começo esses
assuntos com Sêmora ou qualquer pessoa, sempre vira
uma briga, falar sobre minhas complexidades é difícil,
mas sobre diferenças é conflitante.
—Vamos. — Mosés incentiva. — Não deve ser
tão ruim, certo?
Ele abre espaço e passo pela porta giratória, o
porteiro até me cumprimenta—coisa que nunca faz com
ninguém, falso—e quando Mosés sai, estende a mão
para um cumprimento rápido, Mosés indica o carro
diante de nós na calçada, é um carro esporte preto, um
homem alto e negro segura a porta de trás para que eu
entre, fico sem graça, arrumo minha bolsa de lado e
entro me acomodando. Logo que me sento, Mosés entra
e o homem fecha a porta, ele dá a volta no carro e puxo
meu cinto, o carro é mais espaçoso e confortável de
dentro, diria até chique, mas não tanto.
—Era algo sobre o trabalho?
—Estava pensando sobre a posição das garotas
GG na sociedade.
—Hum...
O homem liga o carro, e logo estamos nos
afastando da empresa, olho pela janela, o tempo está
fechado, depois de alguns momentos sinto a mão quente
e suave sobre a minha, eu o olho, e Mosés ergue a
minha mão e a beija com toda gentileza do mundo,
coro.
—E a que conclusão chegou?
—Rejeitadas—falo e soo tão séria que percebo
que ele quer sorrir. — Todas elas. — Eu completo com
maldade.
—Que drama, meu Deus—fala agora diferente
do chefe Chefe que conheci hoje o dia todo na
empresa.
—Viu? Por isso se chama "pensamentos"—
respondo sincera. — As pessoas não gostam de falar
dessas coisas.
—Eu quero que me fale —exige num tom
bastante tranquilo. — Você é pessimista demais, Ana.
Acho que uma vantagem enorme de namorar
alguém tão sincero é isso, Mosés é sempre bem
transparente comigo em todos os sentidos, entendo
agora que seu senso de direção é apenas parte de sua
personalidade, por isso soa como algum tipo de
arrogância como já havia pensado, contudo, é muito
melhor que seja um cavalo sincero que algum tipo de
galã mentiroso.
Odeio mentira.
—Talvez, mas a vida não me deu tantas chances
de pensar diferente, eu por exemplo, sempre fui
oprimida por meu peso, por minha aparência, com dez
anos eu já tinha quase 1.50 de altura, pesava 45 quilos,
coisas que meninas da minha idade não eram.
—Entendo que tenha sido inferiorizada, Bê, mas
nem todas as garotas GG do mundo são infelizes com o
peso.
Gosto do otimismo em sua voz.
—Claro que não, mas isso não dá o direito de
outras pessoas humilha-las, diminuí-las nem as julgas
por serem acima do peso.
—Preciso concordar com você, excelente
colocação. — E beija a minha mão de novo. —Como
foi o seu dia, meu amor?
Meu Amor!
—Foi bem produtivo e o seu?
—Chato, mas já estou começando a colocar tudo
em ordem, a nova secretária ajuda bastante.
Sorrio, Mosés entrelaça os dedos nos meus com
um pequeno sorriso nos lábios, acho tão lindo quando
ele é tímido, derrete tudo dentro de mim.
—Como dizia... mundo injusto, você disse?
—É, injusto e cruel.
—Ah, e você não parou para pensar que o mundo
é composto por pessoas com o mesmo pensamento que
o seu sobre si mesma?
—Sim, mas não me sinto culpada, me sinto
responsável, ainda que não incentive ninguém a pensar
dessa forma, eu apenas não consigo "caber" em muitas
situações...
—Como por exemplo...
—Roupas, comerciais de tv TV ...
—Ah Ana, por favor...
Agora me irrito.
—Quantos comerciais de tv TV você vê garotas
GG? Você viu aquele boicote da marca Plus Size das
redes de tv TV ? Eles proibiram a marca de exibir o
comercial só porque eram roupas para garotas de
tamanho maior — interrompo e Mosés não tem
resposta. — E quanto a comerciais de cerveja? Você
vê garotas tamanho 50? Ah eu acho que não, já tentou ir
a uma loja e comprar um jeans? O constrangimento que
é uma vendedora te falar algo como "não temos o seu
número”? Não dite o que devo pensar, senhor Senhor
Handerson, eu sei o que eu passo todos os dias da
minha vida por conta do meu peso.
Ele fica calado, e eu sei que ele não tem
resposta, Sêmora nem tenta me responder, parece que
depois da redução ela fechou os olhos para a classe.
—Quantas mulheres você vê em comerciais de
fraudas?
—Ana, fraudas são para bebês!
—Claro, mas e as mães? Você acha que as mães
são magras ao dar à luz? Você pensa que uma mulher
fica com o corpo igual depois do parto? Que todas as
grávidas ficam Super esbeltas e lindas depois de terem
bebês? Não Mosés, isso não acontece.
Fico empolgada, Mosés passa a mão no rosto,
mas ele sorri, me viro para ele.
—Tenho algo para te contar!
—Não me diga.
—Garotas GG são sim excluídas de muitos
lugares, da tv TV , do mundo da moda, de tudo.
—Eu disse para não me dizer.
—Por que não tem argumentos, oras.
Ele realmente não parece contrariado, pelo
contrário, parece querer rir.
—Não é de rir.
—É que você é tão corajosa falando sobre esses
assuntos, e ao mesmo tempo não parece querer lutar
por si mesma, Ana, por sua vaidade, e isso é um pouco
irônico!
Abro a boca para falar mas engulo o que ele diz
sufocando a minha voz, não sei o que falar, o que devo
falar.
—Você não gosta do seu corpo, certo? Então isso
não é culpa da sociedade, é sua culpa, por mim poderia
pesar 200 quilos que eu ainda gostaria de você, eu
amaria você, mas o problema é que você não se ama,
VOCÊ! E isso a sociedade não pode mudar, Ana, ainda
que perca 40, sei lá 30 quilos, se você se olhar no
espelho e não gostar de si mesma, ninguém poderá
fazer isso por você.
Nossa.
NOSSA.
—A culpa não é apenas da sociedade, sim, claro,
por impor padrões que eu acho que não devem ser
seguidos por quem não quer, mas no seu caso, em parte
é dos dois lados, então você deve colocar na balança
as suas prioridades.
—Eu já fiz muitas dietas...
—Eu não disse que você não se esforçou, eu
apenas estou falando que se quiser mudar algo em
relação a tudo, mude sua forma de pensar, sua forma de
se ver, você ficou tão mais linda depois que foi ao
salão, fez as unhas, mas para mim, ainda que não
houvesse mudado nada, você ainda seria a mulher mais
linda do mundo. Eu te falo, mas você não percebe,
você não vê, Ana, o quanto é bonita, o quanto você é
linda quando sorri, ou o quanto é linda apenas por ser
você mesma, GG, Ana Beatrice.
Fico calada.
—Se quiser mudar algo, mude sua forma de se
ver, porque não adiantará que eu te fale mil vezes que
você é linda, que você é o meu tudo, e ainda sim, você
não me ouvir, entendo você, Ana, acredite, eu já passei
por muitas coisas na minha vida, muitas mesmo...—
Ele deixa a frase morrer.
Não sei o que falar... eu sempre sei o que falar...,
mas de repente o carro está no estacionamento do meu
prédio e eu estou calada, meu coração embargado, e as
palavras ecoando em minha cabeça.
O motorista abre a porta para mim, tiro o cinto e
saímos do carro, e permaneço calada, no momento, os
meus sentimentos por ele são tão intensamente fortes
que não consigo falar.
Mosés Handerson me deixou sem resposta.
Mosés Handerson me deixou sem reação.
E eu o amo por isso.
Capítulo 35
Coloquei uns legumes na panela a vapor, ovos
para cozinhar, e decidi fazer bife bem passado, já tirei
aqueles sapatos pavorosos e coloquei o avental, minha
mente está tão... vazia.
Acho que foi o choque pelas palavras duras e
gentis de Mosés, nunca falaram comigo de uma forma
tão clara, nunca disseram um "eu te amo, mas você tem
que mudar para se amar", a maioria das vezes que
conversei com Sêmora sobre isso, ela falava sobre
amor próprio, mas eu realmente nunca pensei em tudo
dessa forma, por esse ponto de vista.
Tenho medo eu acho que é isso, porque reclamar
é tão fácil, é muito confortável culpar a tudo e a todos,
ainda que eu tenha engolido a dor das humilhações na
infância, a dor das humilhações na vida adulta, o fato é
que eu preciso admitir que eu mesma não me amo, eu
mesma não tenho certeza do que sinto quando me olho
no espelho.
Como me sinto? Por que devo me sentir bonita se
ninguém me acha bonita? Devo? Preciso viver num
salão e me arrumando só para me olhar no espelho e
me sentir bem?
Admito que ter ido ao salão com a minha mãe e
as minhas irmãs, foi bom dentro da medida do
possível. Gostei do corte, da cor dos meus cabelos,
das minhas unhas, ok, eu gostei de tudo, mas preciso
viver assim para ser feliz?
Minha cabeça da voltas e voltas e não chego a
nenhuma conclusão, nem do que devo nem do que sou,
eu apenas nunca fui criticada tão positivamente na
minha vida, de uma forma dura, mas que parece me
mostrar uma percepção diferente de como encaro tudo,
a minha vida, a eu mesma, e isso é meio... impactante.
Mosés me acha linda, mas eu não me acho linda,
então, adiantaria ele me falar 10.001 vezes que sou
linda se sempre vou me sentir "ah, sim", e ignorar suas
palavras? Isso não seria como ele falar "eu te amo" e
eu dizer um "ok", e pronto?
Me nego a tantas coisas, não me permito, e
admito sim, que por medo, medo de ser rejeitada,
porque foi isso o que sempre aconteceu comigo desde
que o meu pai morreu, antes, ainda havia ele ali, me
falando tantas coisas que me faziam me sentir especial,
uma garota diferente e querida, amada, então ele
morreu e fiquei, com essa cratera dentro de mim que
nada e nem ninguém, conseguiu fechar.
Mas não é isso, eu apenas não me permiti mais
ser bonita porque todos me diziam que isso estava
vinculada ao meu peso, ao meu tamanho, e ninguém
nunca me perguntou como eu me sentia sobre isso,
ninguém nunca chegou em mim e me perguntou se eu
estava bem comigo mesma, ninguém chegou e me disse
"eu te amo desse jeito", talvez fosse isso o que faltasse
para eu ter algum tipo de incentivo...
Não, também não é isso, motivação vem de nós
mesmos, influência vem de qualquer um.
Eu sou desmotivada, e sou influenciada, e isso
não ajuda.
Estar com Mosés não é como começar uma dieta
que vai funcionar por alguns dias e não dar resultado,
estar com ele não é como dizer "ah sim", estar com ele
não significa ser feliz para sempre por ele ser quem ele
é, estar com Mosés é ele me amar por eu ser quem eu
sou, uma mulher de 27 anos com 94 quilos, 1,75 de
altura, dezenas de defeitos e complexidades que talvez
nenhuma mulher que ele conheceu na vida tenha.
Eu o amo, e isso é tão frustrante.
Como posso amar alguém e não me amar? Como
posso estar com alguém que me ama muito mais do que
eu me amo? Que amor é esse? Ou melhor, que ausência
de amor própria é essa?
—Você está brava?
Ergo o olhar, Mosés tirou o terno e a gravata, ele
lava as mãos na pia, as mangas da camisa dobradas, já
tirou o relógio, a camisa desabotoada até a altura do
peito, e ele está descalço, faço que não com a cabeça,
jogo o bife na frigideira.
—Desculpe. — Ele fala e seca as mãos num
pano de prato. — Eu pensei em pedir para Lupe vir a
partir de amanhã, assim não teremos tantos problemas
com comida e casa, mas como você é dona da casa...
—Claro. — Eu tento sorrir. — Pode ser.
—Ana, eu não queria te assustar com o assunto,
mas é que eu percebo que você tem muito baixa
autoestima — revela ele bastante sério. — Eu não
quero que se sinta assim, eu quero você bem.
Eu sei disso, na maioria das vezes é isso o que a
minha mãe me falou sobre o meu peso, contudo, não
sinto que vindo dele, seja algo negativo.
—Pensei em te levar a um psicólogo, para você
aprender a lidar melhor com esses problemas, nós
dois. — Ele fala com muita naturalidade.
Suspiro.
Definitivamente nunca pensei em ir a um
psicólogo, tudo o que ocorreu na minha infância me
traumatizou, mas parecia tão comum na época, eu me
acostumei, quanto a minha aparência me acostumei
mal, muito mal, Sêmora sempre me aconselhou a
procurar um para conversar, ela tem um terapeuta por
causa da redução e tal, mas eu nunca pensei nisso.
—Ok —respondo sincera, porque realmente
depois do que aconteceu no carro, eu me enchi de
dúvidas.
—E antes que eu esqueça. — Mosés enfia a mão
no bolso e retira de lá uma pequena caixinha preta. —
Seu presente.
Presente?
—Comprei para você. — Mosés me olha meio
que com receio.
—O que é? — pergunto, sem fazer a mínima
ideia do que seja.
—Abra.
Olho para pequena caixa, depois de alguns
instantes aceito, Mosés enfia as mãos dentro da calça,
fico desconfiada, e quando abro a caixinha preta me
deparo com uma chave de carro, fico olhando
totalmente paralisada, e quando consigo olhar para
Mosés eu vejo seu semblante totalmente na expectativa.
—Eu não vou aceitar devoluções —determina na
defensiva.
Olho para as chaves e tem um brasão de cor
prata no canto da chave.
Range Rover.
Arregalo os olhos, Olho para Mosés e depois
para a chave de novo, abro a boca para falar e ele faz
que não com a cabeça, e me calo.
Estou incrédula, boquiaberta... Caralho!
—Não! — fala secamente.
—Mas...
—Não é não, Ana — corta novamente. — É seu,
eu comprei para você.
—Mas é um carro! — reclamo nervosa, minha
mão começa a tremer. — Mosés é um carro!
—Eu sei que é um carro, eu comprei! — fala
muito sucinto. — Quero que você tenha conforto.
—A empresa fica a vinte minutos daqui e a pé,
foi por isso que eu mudei para cá.
—Não quero que ande a pé, como minha
secretária tem que estar muito bem-disposta e segura, o
conforto do carro irá...
—Você está me dando por que sou sua secretária
ou por que sou sua noiva?
—Os dois.
—Eu não posso aceitar!
—Mas vai aceitar.
Já conheço esse tom arrogante e mandão.
—Pois, eu vou deixar as chaves aqui, eu não
quero seu carro.
—O carro não é meu, por acaso nem te perguntei,
você tem habilitação?
—Sim, mas...
—Ótimo, eu vou transferir para o seu nome.
Depois que fala isso, Mosés pega o celular no
bolso e se afasta atendendo uma ligação, fecho a cara,
analiso a chave e a coloco dentro da caixinha, depois
deposito em cima da geladeira, eu não quero um carro,
que tipo de pessoa aceita um presente desses logo de
cara? Volto a preparar o jantar, não quero mais discutir
por nenhum tipo de assunto com Mosés, para mim, já
foi o suficiente, aprendi a lição do dia.
—Amar a si própria!
Colocar em prática é o que eu acho que será
difícil.
—Estava ótimo.
— Obrigada.
Fiz salada também para acompanhar, Mosés
estende a mão e toca a minha em cima da mesa.
—Você ainda continua brava por causa do carro?
Da discussão?
—Não discutimos Mosés, mas não acho que
possa aceitar o seu presente.
Ele suspira.
—Quero te dar o melhor.
—Eu já tenho você, não preciso do "melhor".
Mosés sorri, seus olhos azuis me analisam com
cuidado.
—Eu fico com a louça, por que não prepara a
banheira para nós?
Minhas bochechas queimam, ele continua a me
olhar desvio, apenas concordo.
—Mas eu ajudo com a louça.
—Está bem.
Ele me ajuda a tirar a mesa, jamais pensei que
um homem como Mosés fosse ser desse tipo de homem
que ajuda alguém em atividades domésticas, mas ele é,
nesse sentido percebo seu companheirismo, sua forma
mais compreensiva de ser, ele sabe lavar pratos.
Fiz poucos legumes, dois bifes, a salada apenas
para nós dois com ovos cozidos, mas ele comeu tudo,
não reclamou, acho que ficou bom dentro do possível,
não é comida francesa, mas as vezes eu até capricho.
Depois que guardo as sobras, vou para pia, ele já
tirou a mesa, bebemos um vinho—estou começando a
amar vinho— que havia na geladeira, o resto daquele
jantar de ontem, me sinto melhor depois de beber
vinho, comer algo leve, claro que eu nunca fui de
comer porcaria todos os dias, mas sei que se estivesse
sozinha comeria qualquer coisa, bolachas com chá
talvez, biscoitos com leite, eu tento comer muito pouco
a noite para não engordar.
Não funciona, mas eu tento, ao menos o peso na
consciência eu não tenho.
Começo a lavar a louça, Mosés me abraça por
trás nesse momento, prendo o sorriso, gosto de sua
companhia, gosto muito de estar com ele, ele é tão
diferente de mim, ele é carinhoso, atencioso, ele
realmente se importa comigo, e ainda que isso não seja
algo do qual esteja acostumada, amo isso nele também.
—Quero que se sinta linda, Ana, do jeito que
você é, me desculpe se pareço invasivo.
—Não é — afirmo sincera —, mas é muito
difícil quando todos dizem o contrário.
—Eu sei que não é fácil, Bê. — Ele diz e beija o
meu pescoço. — Não te julgo, eu sei que você é
esforçada Ana, e que isso não é sua culpa, mas não
deve encarar o seu peso como um fardo, se quiser te
pago um nutricionista, algum médico, podemos ver sua
alimentação, desde que você se sinta bem, por mim não
vejo problema nisso.
Lavo os copos, mas minha mente está em suas
palavras, algo me vem à mente.
—Você não quer que eu emagreça?
—Querida, se você for feliz magra, então sim.
Agora, se não for, então não, só quero que você pare de
pensar que não é linda, porque é.
Sorrio, olho para o lado, Mosés me dá um
selinho.
—Te amo — falo e beijo sua face.
Ele me aperta com força, perco o ar por alguns
momentos.
—É muito bom te abraçar meu amor, eu gosto
tanto disso em você.
—Me abraçar?
—Também, mas eu gosto das suas curvas, da sua
bunda.
—Tem mais celulite na bunda do que bunda na
celulite.
—Pois, para mim tem muita bunda e eu adoro
isso.
—Não acha feio um corpo marcado por tantas
coisas? Estrias, celulite, flacidez...
—Eu não acho o seu corpo feio, pelo contrário,
eu gosto dele assim, eu mal vejo a hora de te ver
grávida, com um bebê crescendo aqui. — Mosés toca a
minha barriga com carinho. — Um filho meu dentro de
você, Ana, uma família, tudo o que eu nunca tive, quero
realizar ao seu lado, quero que esteja pronta para isso.
Minha garganta se fecha, e me dá vontade de
chorar.
—Sempre quis um filho, uma família grande, eu
nunca falei isso para ninguém, nunca quis isso com
ninguém, Bê. — Ele continua a me apertar. — Eu...
eu... porra, tenho tantos sonhos idiotas de formar uma
família, de ser um cara normal e que todos vão gostar,
gostei muito da visita na casa da sua mãe, apesar de no
começo eu ter odiado suas irmãs, imagino que se um
dia tivermos filhos, eles ficariam muito felizes de ir
para lá, a casa dela é muito aconchegante.
É a minha mãe pode até ser chata comigo, mas
com as visitas ela sempre é um amor, apesar de
tagarela e meio sem noção.
—Quando nos casarmos vamos nos planejar. —
Ele fala com bastante calma. — Quero filhos em um
ano Bê, o que acha?
—Bem, vamos ver—respondo.
—Claro, se você quiser né? Eu pensei muito em
ter filhos antes dos trinta, mas acho que não será
possível, quero pelo ou menos três.
Três?
—Por que o espanto?
—Três é muito, Mosés.
—Para quem nunca teve nada, três é muito
pouco.
Mais uma vez sem resposta.
Mosés me beija a face e se afasta.
—Vou preparar o nosso banho, mas amanhã eu
fico com a louça, ok?
Me restrinjo em falar um breve:
—Ok!
Entro no banheiro.
Seguro meu roupão no corpo, Mosés já está
dentro da minha banheira, e ele parece muito relaxado,
calmo, seus olhos estão fechados e os braços de fora
escorrendo a água pelos dedos, os cabelos úmidos, e
seu peito largo exposto e firme.
Me aproximo, ele permanece quieto, com os
olhos fechados, mas não confio muito, acho que não dá
para fingir que aceito tudo logo de cara, ainda tenho
receio e complexidades, vergonha, por isso lhe dou as
costas e tiro o roupão, diante de mim, mais à frente eu
vejo o meu reflexo da cintura para cima.
Não gosto de ficar me vendo muito nua, mas fico
parada olhando os meus seios de lado, a cor
esbranquiçada envolta deles, e o real tamanho deles, é,
são grandes, não são tão firmes nem durinhos, os bicos
são medianos, e tem algumas estrias neles, abaixo o
olhar e vejo a minha barriga, observo que ela não é
reta e meu umbigo não é bonito.
Se eu pudesse circular tudo o que há de errado
em mim faria isso agora, no final das contas estaria
toda riscada, mas pensar isso é errado, porque talvez
eu tenha essa percepção tão feia sobre eu mesma e
hajam pessoas que me acham muito bonita com esse
corpo.
Com essas estrias na barriga, nos lados da
barriga, nas coxas, e a celulite que tenho na bunda, em
minhas coxas, e o tamanho das minhas coxas, elas são
roliças assim como os meus braços, toco meus quadris
e eles parecem bem mais largos, tudo em mim é grande
e é isso o que eu realmente odeio.
Não sou PP, nem P, tão pouco M, muito menos
sou G, eu sou uma Garota GG.
Gigantes, grande, grotesca.
Sinto vontade de chorar, porque ainda que as
palavras dele estejam dentro de mim, meu coração me
fala o contrário, como posso me amar sendo tão
grande? Como posso provar para mim mesma que sou
bonita se não me sinto bonita?
Fecho os olhos e algumas lágrimas caem.
Como devo me sentir normal se tudo isso não é
normal? Como devo me sentir linda se o espelho diz
justamente o contrário? Uma balança?
Ergo o olhar e eu o vejo atrás de mim, ele olha o
reflexo dessa imensa mulher diante de um espelho, meu
corpo tomando todo o espaço que não deveria ocupar,
Mosés coloca as mãos nos meus ombros, e continua me
olhando através do espelho... me olhando através da
minha alma.
A vontade que tenho é de despedaçar esse
pedaço de vidro, que por muitos anos tem me dito
coisas feias como: Você é gorda, você não merece isso,
você não merece aquilo, você é larga, você é nojenta,
ninguém jamais vai te amar, ninguém jamais te levará
para a cama...
Tantas coisas que me sinto farta.
—Veja. — Ele fala olhando para o espelho. —
Veja como ela é linda, como suas curvas são lindas.
—Isso não é verdade! — afirmo entre lágrimas.
— Para com isso...
—É a mais pura verdade, Ana—responde e seu
olhar me atravessa com seriedade... amor. — Está
mulher é a mais linda que já vi na minha vida, seus
seios, sua bunda, suas pernas, ela é tão fantasticamente
linda que eu...
—Por favor, para de mentir! — peço e cubro as
minhas faces, parece que algo bloqueia dentro de mim,
isso isola toda e qualquer chance de me sentir bem,
feliz... Eu mesma!
Choro, e percebo que não importa o que
aconteça, eu talvez nunca consiga olhar realmente no
espelho e me sentir bonita, eu só me olho e me sinto
como sou, Gorda.
—Ana, olha para o espelho —ordena num tom
muito sutil. — Agora, por favor, olha para o espelho!
Soluço, e sinto que as minhas mãos são
arrancadas das minhas faces, Mosés ergue minha
cabeça e eu olho o meu reflexo no espelho.
—Está é você, e você é linda, você é perfeita,
você é tudo o que eu mais quero, Ana, nada além disso.
—Alguém gorda! — repito entre soluços,
lágrimas.
—Sim, alguém gorda! —Mosés me olha tão
irritado. — Desse jeito, linda.
Choro olhando o meu reflexo no espelho, ainda
que sinta vontade de sair correndo não consigo, pois
estou presa à está imagem, A MINHA IMAGEM!
Não consigo parar de chorar, é torturante ficar
olhando, mas a dor vai passando, e tudo o que vejo é
uma mulher completamente derrotada diante de mim,
alguém magoada e ferida com o passar dos anos por
tudo o que sempre representou para todos, mas que
para si mesma nunca foi ou representou nada.
Mosés mantém-se atrás de mim muito sério, seus
olhos sempre no reflexo, nos meus olhos, depois de
alguns momentos, ele me beija o pescoço e me segura a
mão.
Ele me leva para o chuveiro, solta os meus
cabelos do rabo de cavalo e me abraça com força, e
choro mais alto porque a dor não passa, simplesmente
ela não me abandona um segundo, ele me aperta como
se eu fosse uma criança indefesa, e eu não me sinto
muito diferente disso.
E fico assim durante um bom tempo com ele
embaixo do chuveiro, a dor começa a sair com as
lágrimas, com o choro excessivo, quando digo adeus a
ela já estou na cama, Mosés abraçado a mim com tudo
o que pode me oferecer nesse momento, seu amor, o
que já me parece, um primeiro passo para que eu
busque o meu próprio.
Acordo com um beijo.
Demoro um pouco para conseguir abrir os olhos
realmente, diante de mim uma íris azul tem uma
vivacidade incrível, não me movo, Mosés está juntinho
de mim, suas mãos tocando as minhas costas com
suavidade, estamos nus em minha cama, cobertos
apenas por lençóis finos.
—Bom dia, meu amor.
Ele está tão relaxado, está absolutamente lindo
nessa manhã, acho que poderia acordar todos os outros
dias da minha vida com Mosés assim do meu lado e
ainda mesmo vendo-o todas as manhãs desse jeito, eu
me impressionaria.
—Bom dia.
Sorrio porque ele sorri para mim, e seu sorriso
me dá tanta esperança.
—Acho que a Lupe já chegou. — Ele fala
baixinho.
—Eu amo você, Mosés — digo e toco sua face.
— Obrigada por ontem.
—Não precisa agradecer. — Ele fala. — Eu
também te amo, Bê, muito.
Eu me inclino e o abraço com força, Mosés me
abraça também me espremendo, ele me dá forças, ele
quer realmente que eu fique bem, Mosés quer que eu
melhore.
E eu quero melhorar.
Ontem foi uma das piores noites da minha vida,
chorei tanto que pensei que não conseguiria nem
levantar hoje, apenas tudo o que sentia e pensava
explodia dentro de mim, tantas coisas, sentimentos, e
ele ficou ao meu lado a todo tempo, me abraçando,
falando palavras de consolo, me lembro que quando
dormi ele me apertava como se quisesse cessar a
minha dor com isso.
—Pedi a Marcy que providenciasse suas roupas,
ela já arrumou alguém que cuida disso, inclusive já
enviaram algumas para você experimentar. — Mosés
me puxa e me deito em cima dele.
—Está bem. — Acho que não quero mais
discutir com o Mosés, eu só quero me situar, depois
quando eu estiver realmente bem, quero falar com ele
sobre essas coisas, as roupas e o carro.
Me ergo e toco sua face, ele me beija a pontinha
do nariz com carinho, sorrio, minhas mãos se enfiam
em seus cabelos e eu o beijo, eu o amo tanto, Mosés
está realmente me mostrando cada dia mais e mais o
meu valor, o quanto gosta de mim, o quanto ele me
ama.
—Eu quero sim uma psicóloga Mosés, acho que
preciso conversar com alguém sobre os meus
problemas — confesso sincera. — Quero melhorar
esse meu lado.
—Percebo que em todos os aspectos da sua vida
você é muito bem resolvida e controlada, Ana, também
nesse. Você não transparece tanto quando a gente não te
conhece, mas quando eu pulei o muro e vi o que havia
atrás dele, percebi que tem uma garota linda que tem
medo de si mesma.
—Você é tão profundo.
—São os anos de terapia.
Sorrio, bem surpresa, ele faz terapia!? Claro,
com a infância que teve deve ter muitos traumas.
—Entendo.
—É comum, Ana.
—Eu sei que é comum.
E percebo que ele não quer falar disso, eu não
gosto de sentir que forço ninguém a me falar nada,
Mosés é assim, ele é fechado, e fala quando quer e se
sente bem para falar, então quero que as coisas entre
nós dois sejam assim também, quero que ele se abra
comigo aos poucos, porque eu também sou assim, eu
tenho tantas marcas escondidas dentro de mim que a
primeira vez que abri—essa vez foi ontem—me senti
completamente em choque.
Acho que tive medo de encarar isso, mascarei,
porque é muito mais fácil conviver com a dor do que
expulsar ela, é muito mais fácil viver com isso do que
viver tentando e falhando, mas as pessoas não sabem, a
proporção do que as tentativas podem ter nas nossas
vidas, viver tentando é muito ruim, mas talvez seja
muito melhor do que viver parado, vendo algo ruim e
obscuro e afundando, e é assim que eu tenho vivido
anos da minha vida.
Isso ter a ver com as dietas fracassadas, com os
meses nas academias desperdiçados, com os meus dias
de fome... vomito, tantas coisas fora do comum eu
tentei e nada, e justamente isso me fez parar de tentar,
mas não parar de pensar em emagrecer, o que me fez
desanimar e não querer mais tentar, contudo, nunca
parei para pensar: E se eu não emagrecer?
Claro, pensei, mas não tão profundamente, eu não
via chances de tentar ser feliz, que pessoa gorda é
feliz? A sociedade o recrimina, ele se recrimina, sua
família não o apoia, e parece que cada passo que a
pessoa dá na vida circula envolta de seu tamanho.
Visto 52, peso 94, calço 39/40, e me sinto
péssima por isso, quando tento ignorar o que dizem, me
sinto mais mal por pensar que estou errada, as pessoas
acham que sou sedentária, que eu não tento, que eu sou
acomodada e preguiçosa—repito isso diariamente as
vezes porque é a verdade—só que acho que chegou um
momento em que eu tenho que parar de pensar no que
as pessoas querem, quero pensar no que eu quero.
Esquecer os anos difíceis da infância,
adolescência, faculdade, e por fim, minha vida adulta,
que se resume em eu trabalhando feito uma condenada
para conseguir comprar as minhas coisas desde que me
formei.
—Eu estarei aqui, Ana.
Eu o fito saindo dos meus pensamentos.
E sou tomada por todo o amor que sinto por esse
homem.
—Para sempre!
Sorrio, prendo a vontade de chorar e cubro ele
de beijos, mas novamente as lágrimas caem de forma
natural, mas são lágrimas de felicidade.
—Essa palavra está ecoando muito obscura nos
meus ouvidos — falo e lhe dou um selinho.
—É para parecer isso mesmo, eu gosto de
impressionar as pessoas com o meu jeito sutil e
arrogante—responde meio irônico.
—Me disseram uma vez que o para sempre não
existe, mas acho que vindo de você, vai durar mesmo
muito tempo.
—Claro que vai, você será a dona do meu lar.
Me derreto toda.
—Eu te amo, Mosés.
—Eu também te amo, minha Bebê.
Sorrio e Mosés me abraça com tanta força que
perco o ar.
—Hora de levantar querida, teremos um longo
dia na empresa.
—Sim.
Hora de levantar para vida.
Capítulo 36
Lupe é uma mulher de cinquenta e poucos anos,
de olhos negros assim como os cabelos, fios brancos
nos cantos das orelhas emolduram uma face morena
com poucas expressões e rugas, ela é baixinha, estatura
pequena e franzina, os cabelos estão presos num coque
perfeito e ela usa jeans e uma camiseta branca comum
de algodão, tênis, ela sorri logo que se vira e nos vê,
eu e Mosés vestimos nossos pijamas para sair da cama,
logo de cara gosto de Lupe.
—Bom dia, senhor Senhor Handerson.
—Bom dia, Lupe.
Mosés parece manter uma boa relação com seus
funcionários, ao menos os do avião eram pessoas
gentis e educadas conosco sempre, Lupe sorri
abertamente, ele puxa a cadeira para que eu me sente,
ela já colocou a mesa para dois, e tem frutas picadas
em potes diferentes do meu conjuntinho de louça,
queijo branco, bolachas, acho que nunca em minha vida
serviram tanta coisa num café da manhã para mim, até
suco ela fez, tudo parece ótimo.
—Lupe esta é a Ana, Ana está é a Lupe, a minha
funcionária.
—Muito prazer, Lupe — sorrio e estendo a mão
para ela.
—O prazer é todo meu. — Lupe aperta a minha
mão com um sorriso enorme. — Então a senhor Senhor
ita é a menina que tanto o senhor Senhor Handerson
fala.
Mosés fala de mim para alguém!
Eu o olho, mas ele está se servindo com cubos de
maçã e mamão, melão, minhas bochechas queimam.
—Tem um belo apartamento, senhor Senhor ita.
—Obrigada Lupe, pode me chamar de Ana.
—Tudo bem.
Lupe volta para o fogão, sinto o cheiro de bacon
e ovos, manteiga, tem bastante coisa, eu nem sei por
onde começar, é estranho ter alguém me servindo,
nunca tive ninguém servindo nada para mim.
—Eu tenho treino as 8:00. — Mosés fala com
naturalidade.
—Treino de que?
—Box!
—Ah.
Mosés faz box.
Eu não sei porque fico repetindo tudo isso feito
uma retardada para mim mesma sempre que ele me fala
algo, deve ser porque nunca namorei alguém, isso é tão
tosco e fascinante—é eu sou estranha.
—Estou retomando os treinos, havia parado por
causa da mudança para cá, estava viajando muito. —
Ele fatia em pedaços menores as frutas com paciência.
Mosés come igual a um passarinho, ele fica
fatiando a comida em pedaços pequenos, e pequenos
até que fiquem miúdos, já havia reparado isso antes,
ele também come bem mais devagar que a maioria das
pessoas—inclusive eu—que eu conheço.
—Está bem.
—Lupe já colocou sua roupa no closet, só
escolher entre as que a dona da loja enviou, pedirei
que Ali venha te buscar já que não quer ir no seu
carro...
—O carro não é meu!
—Enfim. — Ele me ignora completamente e
começa a comer, devagar, muito devagar.
Acho ele tão educado e enigmático, descobrir
sobre Mosés Handerson é como aprender uma tabuada
de dez, você aprende as multiplicações mais
complexas de uma forma estranha, daí quando parece
difícil, você lembra do resultado dessa mesma
multiplicação—ainda continuo sendo estranha ao
comparar meu noivo a uma tabuada.
Lupe me serve café, ovos com gemas moles,
torradas integrais quentinhas, sorrio e agradeço, logo
que começo a comer, Mosés levanta limpando os
cantos da boca, olho para o seu prato, parece que ele
comeu tão pouco.
—Te vejo na Handerson—fala e me dá um beijo
na cabeça.
Depois que fala isso ele se afasta mexendo no
celular, suspiro, nem deu tempo de ficarmos juntos, de
estarmos juntos ou conversamos, mas acho que preciso
realmente entender que Mosés tem a empresa, ele
precisa cumprir com horários assim como eu.
Lupe fica parada perto da pia me olhando, já
colocou um avental, eu fico um pouco constrangida,
depois quando começo a comer indico a cadeira diante
da minha, ela sorri, vem e se senta, minutos depois
Mosés atravessa a sala usando uma calça de malha,
tênis e camisa folgada.
—Não se atrase! —avisa colocando a mochila
nas costas. — Seu chefe Chefe odeia atrasos.
—Ok —falo quase perdendo o fôlego com seu
sorriso. — Bom trabalho!
—Não demore! — Ele sai pela porta da sala,
novamente mexendo no celular.
Até parece que ele não é o meu chefe Chefe e eu
não sou sua secretária, da vontade de rir, mas enfim...
—Prove as frutas—Lupe fala indicando os potes
com frutas coloridas.
Melão, mamão, maçã!
Também tem granola num canto com mel, mas
acho que não consigo comer tantas coisas.
—Obrigada, os ovos com bacon estão ótimos —
falo sincera. — Pode se sentir à vontade Lupe.
—Sim, senhor Senhor ita—ela sorri—eu farei o
máximo para não atrapalhar em nada, venho sempre
que o menino pede.
Faço que sim com a cabeça e olho para o prato
dele.
—Ele comeu tão pouco! —Eu estou suspirando.
—Ele não é de comer muito logo cedo, na
verdade ele não come muito.
Mosés realmente não come muito, mas daí comer
quatro blocos de frutas e ir treinar?
—A senhor Senhor ita fará alguma coisa hoje?
Franzo a testa e bebo um pouco do meu café.
Devo fazer alguma coisa hoje?
—Ah, ele não te falou. — Lupe parece meio
decepcionada. — O senhor Senhor Handerson está
aniversariando hoje.
Que?
Deixo os talheres caírem sob os pratos.
Acho que ouvi errado, Mosés está fazendo
aniversário hoje?
—Acho que nem eu deveria ter falado, ele não
comemora aniversário. — Lupe explica e suas
bochechas ficam vermelhas. — O senhor Senhor
Handerson é um homem muito fechado, mas depois que
ele a conheceu, acho que você ajuda ele a melhorar,
sabe, menina.
—Hoje? — indago a força. — É aniversário de
Mosés?
—Sim, eu soube por conta da menina Safira, ela
telefonou mais cedo querendo falar com o senhor
Senhor Handerson, eles dois sempre almoçam juntos
nos aniversários de ambos, mas ao que me parece,
estão brigados.
—E avisou para ele da ligação dela?
—Não, ele havia dito que se ela ligasse que não
lhe transferisse as ligações.
Lupe parece tão sincera.
—Desculpe parecer intrometida, mas é que eu
nunca o vi tão... feliz.
—Quem? Mosés?
Claro, quem mais séria? O Papa? Afff Ana!
—Sim, claro, ele anda tão diferente depois que
veio para América, acredito que por sua causa.
Coro.
—Ele me disse que vão se casar, ele está tão
feliz...
—Eu também estou!
Lupe sorri novamente, e percebo que já posso
contar com ela para o que quer que seja.
—Ele não me disse sobre o aniversário.
—É que ele não gosta, mas eu sei que é, sempre
nessa data ele e a senhor Senhor ita Safira se reúnem
para almoçarem juntos, costumam ir para alguma
viajem, acho que este ano eles dois não irão.
—Mosés e ela discutiram?
—Parece que sim, e feio, a senhor Senhor ita
sabe, a menina é meio descabeçada, é muito boazinha,
mas ao mesmo tempo inconsequente.
Boazinha... sei.
Me endireito, estou incomodada por Mosés não
ter me dito sobre seu aniversário, por que ele não me
disse? Será que é porque brigou com Safira?
—O que acha que ele poderia gostar de ganhar
de presente?
—É difícil dar um presente para alguém que já
tem tudo, senhor Senhor ita.
Suspiro, olho para o meu prato já desanimada,
ontem mesmo me lembro dele falando sobre bebês...
algo sobre não poder ser pai antes dos 30, então deve
ser por isso, porque ele faz trinta anos exatamente hoje.
Olho para Lupe, e depois algo me ocorre.
—Acho que eu já sei o que posso fazer, Lupe...
Mosés Handerson hoje é o seu aniversário, você
não me falou, mas comemoraremos em grande estilo...
assim espero.
Não esperei pelo motorista do Mosés.
Tive que resolver algumas dezenas de coisas
para que hoje à noite tudo dê certo.
Combinei com Lupe. Falei com Sêmora.
E ela foi de grande ajuda, ambas foram na
verdade, Sêmora desceu para o meu apartamento assim
que falei as palavras "preciso de ajuda". Ela chegou e
fizemos milhares de planos, como é secretária de
Mosés ao lado de Marcy ela tem acesso ao cronograma
dele completo.
Fiquei um pouco constrangida em falar sobre
alguns "assuntos" com ela, em menos de uma hora
havia resumido tudo sobre meus dias na casa de
mamãe, alguns detalhes do meu relacionamento com
Mosés, mas enfim, decidimos que faremos isso um
outro dia, hoje é o dia em que eu passarei o primeiro
aniversário com o meu primeiro namorado.
Eu diria primeiro homem, mas sei lá, prefiro
pensar assim.
Entro na Handerson e percebo que as pessoas me
olham, acho que nunca realmente fui notada, contudo
hoje quero estar bem, Sêmora me ajudou a escolher
entre os cinco pares de roupas que a dona da loja
mandou para o Mosés, estávamos chocadas com as
marcas, contudo nossas duas horas foram curtas.
Acabei por vestir um conjunto composto por uma
calça boca larga, mas de cor marrom uma camiseta
social branca de mangas, e coloquei um cinto para
combinar, sandálias plataforma altas—e eu não sei
como ainda não quebrei o pé usando isso—e Sêmora
me maquiou, saímos juntas mas tomei um destino
diferente do seu, passei onde tinha que passar, resolvi
o que tinha de resolver, e chego, com quase duas horas
de atraso na empresa.
Imagino que Mosés esteja nervoso, meu celular
descarregou no caminho.
Entro no elevador e aperto a andar da
presidência, me afasto para que um grupo de
executivos entrem, me sinto meio que espremida, o
segundo horário do dia começa às 10:00, quando
alguns de cargo mais altos e da diretoria começam a
chegar, por isso os elevadores lotam, e por isso eu
sempre chegava 07:30, odeio aglomerações.
Alguns vão descendo e o percurso se torna
realmente chato, mais lento, quando por fim para no
andar da presidência, os quatro que ficaram estão me
olhando em silêncio.
—Bom dia! —Um deles falam quando a porta do
elevador abre.
Sorrio, e falo:
—Bom dia, bom trabalho.
Eles abrem espaço para que eu passe, e enquanto
me afasto me sinto meio dura, logo que entro na
recepção vejo Marcy e Sêmora com caras feias, com
caras de quem comeram e não gostaram.
—Se prepare—Sêmora fala colocando no mute.
— Você desligou o celular?
—A bateria acabou — explico sem graça.
—Poxa, você está realmente bonita, amei esse
batom. — Marcy fala me olhando de cima abaixo. —
Blanca caprichou.
Blanca eu suponho que seja dona da loja.
—Obrigada, ele está na sala?
—Ele está furioso!
Imagino que sim, mas nem respondo, deixo a
minha bolsa de lado e me preparo, respiro fundo antes
de entrar, logo em seguida eu entro, e vejo Mosés
Handerson, em mais um de seus ternos, sentado à sua
mesa escura mexendo em seu notebook concentrado, o
semblante tão fechado que eu até sinto medo.
Ele ergue o olhar e me olha de cima abaixo. Fico
congelada, porque seus olhos azuis pairam sobre mim
tão sérios que de repente sinto receio. Mas ele não fala
nada, e eu fico dura por alguns momentos longos sendo
alvo de seu olhar.
—Bom dia, senhor Senhor ...
—Eu disse sem atrasos, disse para vir com Ali,
onde você estava? Com quem estava? Você não atendeu
o celular! Eu te liguei umas vinte vezes.
Fico dura com as perguntas, e por alguns
momentos tudo o que sinto, ainda que seja apenas uma
impressão é que Mosés está muito mais frustrado do
que irritado com o meu atraso.
—Tive que resolver algumas coisas, Mosés...
—Que coisas? —corta secamente.
—Minhas coisas—respondo com um pouco de
medo de seu tom. — Não precisa ficar irritado com o
meu atraso, eu fico tempo a mais hoje à noite.
—Eu não estou com raiva do atraso Ana! —Ele
berra, dou um pulo, Mosés está bastante sério. — Que
isso não se repita, você não é paga para compensar
horas, é paga para chegar no horário!
O tom duro em sua voz me deixa um pouco triste,
mas apenas faço que sim com a cabeça e vou para
minha mesa, ligo o note engolindo a vontade de chorar,
esse não é o momento, e acho que não posso desanimar
por causa disso, tomara que no final da noite, ele esteja
mais calmo para aceitar a minha surpresa.
Ao menos isso.
Capítulo 37
Mosés foi embora na frente, ou acho que foi, ele
saiu da sala sem falar nada por volta das cinco, me
senti tão mal que acabei chorando um pouco depois
disso.
O dia foi um porre, meu segundo dia como sua
secretária foi péssimo, me vi basicamente trabalhando
feito um robô e sendo completamente invisível para
ele.
Mosés não me tratou mais mal, ele não berrou
comigo, ele não discutiu comigo, tudo o que havia na
sala era silêncio, as palavras necessárias para um
diálogo entre chefe Chefe e secretária, ele saiu para
almoçar fora, não falou nada pelo chat interno, Sêmora
me trouxe comida japonesa no almoço, mas não sentia
fome, acabei descendo e dando a comida para uns
moradores de rua que ficam sempre duas esquinas para
baixo do prédio.
Quando retornei fui avisada que ele já estava na
sala, porém ainda estava em meu horário de almoço,
fui para a copa e fiz um café para mim, levei minha
caneca e criei novamente coragem para saber lidar
com tudo, mas como não sou flor que se cheire...
Também não falei com ele, me restringi em lhe
dar curtas respostas como: Sim senhor Senhor , não
senhor Senhor , verei para o senhor Senhor , e só. Fui
seca assim como ele foi grosso comigo, ainda que eu
não quisesse que ele se sentisse assim no dia de seu
aniversário de 30 anos.
Não sei o que se passa na mente de Mosés, acho
que ele pensa que sou movida a pilhas e que tenho que
agir como ele espera, claro, eu sei que é o ambiente de
trabalho, eu sei que estou sendo paga por isso, mas
estou disposta a cumprir com a minha carga horária, e
se atrasei foi por bons motivos, não entendi também
porque tanto estresse por um pequeno atraso... de duas
horas!
Ok, foi um enorme atraso, mas eu precisava
mesmo resolver tudo.
Não queria que nosso dia fosse assim, esperava
por um dia mais agradável, eu tinha tantos planos para
o horário de almoço, eu havia preparado até
bilhetinhos para poder deixar em sua mesa, olho para
os bilhetes que fiz a caminho daqui no taxi, me sinto
ligeiramente idiota... acho que o meu atraso estragou a
surpresa.
—Ana.
Dou um pulo, e me encho de arrepios pelo corpo.
Depois analiso o homem diante de minha mesa
usando terno escuro, ele me olha profundamente
concentrado.
—Você vem comigo agora?
—Não, eu preciso cumprir com o meu horário
senhor Senhor Handerson!
Não pensei que ele fosse voltar, achei que havia
ido embora, de qualquer forma prefiro não discutir,
talvez não fosse para ser mesmo.
—Melhor que venha comigo...
—Eu não sou paga para sair mais cedo, senhor
Senhor Handerson.
Ele sorri contrariado, me volto para o meu note,
enfio os bilhetes na minha bolsa que está no chão.
—O que está escondendo de mim, Ana?
Franzo a testa realmente surpresa com a
pergunta.
—Como?
—Essas coisas que guardou na bolsa, não quer
que eu veja, o que é?
—Nada.
—Nada?
—Nada, foi o que eu disse.
Mas reconheço esse olhar desconfiado de longe.
—Então não se importaria de que eu olhasse esse
"nada".
Suspiro, pego minha bolsa, e lhe estendo os
papeizinhos que peguei no meu closet antes de sair de
casa, são desses adesivos cor de rosa, escrevi cinco
recados nos quais eu colaria durante o dia em seu note,
em sua mesa, talvez colocasse em algum lugar visível a
ele.
—Melhor—Mosés analisa o primeiro papel com
um sorriso estranho nos lábios. — Pode ler, Ana!
Olho para ele, não me sinto constrangida, mas
sim triste por isso. Leio da ordem dos bilhetes.
"Hoje é o seu aniversário meu amor, eu te amo e
espero que você tenha um ótimo dia, com amor, Bê"
"só passei para dizer que te amo e feliz
aniversário, estou muito feliz por estar ao seu lado,
obrigada por tudo meu amor, Sua Bê"
"Você é o meu maior presente, te amo, Ana"
"A noite Teremos uma pequena surpresa, ansiosa
por seu aniversário, com amor, Ana"
"Eu te amo Mosés, muito obrigada por existir,
você é o meu melhor presente, te amo, Ana"
Depois eu o fito, e o vejo muito lentamente parar
de sorrir.
Lhe estendo os bilhetes me sentindo idiota.
—Eu fiz para você, eu iria colocar na sua mesa
no decorrer do dia, mas acho que não deu certo —
justifico e lhe estendo os bilhetes. — Me desculpe pelo
atraso, eu realmente não queria prejudicar você em
nenhum sentido, isso não vai se repetir novamente.
Mosés olha fixamente para os bilhetinhos depois
ele pega todos, seu olhar azul que antes tinha uma ponta
de deboche não demonstra nada parecido, desvio o
olhar em começo a arrumar as minhas pastas, eu ainda
nem terminei o trabalho que deixei de ontem.
—Eu sinto muito. — Mosés fala num tom muito
baixo.
—Não sinta — falo em resposta. — Eu vou
cumprir com o meu horário, se quiser pode ir para
casa.
Diga não por favor, diga não, diga não!
—Eu não vou sem você— responde.
Ufa!
—Pode ir—falo fingindo que não me importo. —
Eu termino aqui e vou de táxi...
— Ana, deixe disso, já estou completamente
envergonhado por tudo, que porra! —reclama num tom
muito irritado.
Não entendi?
Por que ele ficou bravo? Não foi ele que me
pediu para ler os bilhetes em voz alta? Será que pensou
que iria me fazer sentir humilhação por isso?
Ah, mas você está pedindo, Mosés Handerson,
parece que não sossega enquanto não levar uma.
—Você é um estúpido.
—Eu sei disso — responde ainda zangado —
Quem te disse?
Ainda confusa.
—Disse o que? — pergunto tentando me
controlar.
—Do meu aniversário!
Acho que ele não queria que eu soubesse mesmo,
só não sei o porquê, aniversários não são datas
comemorativas?
—Foi a Safira? Isso é bem a cara dela...
—Eu não falo com a sua irmã, me devolve os
meus bilhetes, como você é grosso, Mosés, eu só
queria fazer uma surpresa.
—Para que? —Me pergunta indignado. — Para
comemorar quantos anos? Que dia? Ninguém nem sabe
o dia certo que eu nasci, Ana, para que vou
comemorar? Eu não tenho pais nem bolos, nem essa
merda toda! Eu odeio aniversários, odeio comemorar.
Ele despeja tudo assim de uma vez e sinto, de
repente como se pegassem o meu coração e jogassem
num poço e esquecessem ele lá, Mosés não gosta de
comemorar por que não sabe o dia certo de seu
nascimento?
—Mosés...
—Ninguém sabe que dia eu nasci, eles supõem
que tenha sido um dia próximo deste, fui abandonado
com meses no orfanato, e foi exatamente nesse dia que
eu fui abandonado, por isso eles falam que é o meu
aniversário, mas eu odeio este dia.
Tem tanta raiva no olhar dele que me machuca,
porque sei, que por debaixo de toda raiva tem, muita
mágoa e dor, e isso ele já não sabe mascarar tão bem
para mim.
—Deveria ter morrido, assim me pouparia o
desprazer de viver lembrando desse dia. —Ele fala, e
está me olhando fixamente, sua voz abafada, seus olhos
cobertos por uma camada fina de lágrimas. — E não
me olhe com pena, eu detesto que me olhem assim.
Eu não sinto pena, apenas ouvi-lo falar isso me
machuca, me machuca muito.
—Eu comprei um presente, e eu não me importo
se você quer ou não comemorar o seu aniversário —
respondo num berro, parece que ele vai explodir,
depois ele se afasta fazendo que não com a cabeça.
—eu não quero...
—E o que eu vou fazer com ele?
—Jogue fora!
—Mosés!
Ele passa as mãos nos cabelos e parece
realmente abalado, eu jamais pensei que uma data tão
feliz fosse ser tão torturante para ele em nenhum
sentido. Me levanto e vou até ele.
—Não me toque agora, por favor, isso não tem a
ver com você! —pede incerto.
Respiro fundo, e me decido.
—Está bem então, faça como quiser, prefiro ficar
com horas a dever, vou para o meu apartamento, onde o
seu ex presente e o seu ex aniversário me esperam —
digo e volto para pegar a minha bolsa. — Faça o que
quiser.
—Ana...
—Tchau, Mosés!
E saio pisando forte da sala da presidência.
Pronto, agora estraguei a festa de aniversário, se
é que iria mesmo existir uma.
Sai da sala sem olhar para trás, passei por
Sêmora fazendo que não com a cabeça, ela e Marcy me
olhavam preocupadas há pouco, mas eu não chorei,
estou tão zangada que parece que vou explodir de
raiva.
Entro no táxi.
Mas tão pouco fecho a porta e ela se abre
novamente, e vejo Mosés Handerson entrando no carro
e batendo a porta com força.
Falo o endereço para o taxista e fico calada, olho
para o lado oposto, Mosés também não diz nada, eu
tenho absoluta certeza que ele não quer discutir, eu não
pensei sinceramente que ele fosse vir atrás de mim, não
pensei em nada, apenas deixei ele falando sozinho e
sai.
Que desfeita, que desgosto, eu corri tanto para
organizar essa noite, eu me arrumei para estar bonita
hoje cedo, eu passei em vários lugares para escolher
meu pequeno presente e tudo o que eu ganhei foi um
berro, um dia de frieza, e agora um "jogue seu presente
fora".
Como eu poderia saber? Como eu poderia
adivinhar?
Me sinto uma idiota romântica, apesar de tudo do
dia péssimo ainda cheguei a pensar que as coisas
dariam certo no final da noite, e tudo o que temos é
Zero contra Zero.
O táxi estaciona diante do meu prédio, abro a
bolsa para pagar o taxista, mas muito antes de tudo
Mosés já sacou as notas de sua carteira, saio do carro
sem esperar por ele, acho que lamentavelmente
estraguei esse dia ao tentar torna-lo especial para ele,
queria muito que as coisas não houvessem tomado esse
rumo.
—Ana... Ana volta aqui...
—Eu não quero falar com você!
—Mas eu quero falar, me desculpe, eu apenas
não estou acostumado, está bem?
Não está acostumado com aniversários?
Eu o vejo e sei que Mosés não mente, ele
realmente não esperava por isso, mas como esperar?
Era para ser uma surpresa! A própria Lupe me disse
que ele não comemora o aniversário, só que eu não
pensei que fosse por algum trauma de infância, como
eu poderia saber?
Toco o interfone e o portão se abre, entro e ele
vem logo atrás de mim, não acho que eu poderia
adivinhar, e nem Mosés sabia, então não foi nem minha
culpa e nem culpa dele, ainda que ele não devesse
reagir assim tão mal ao que eu planejava para o seu
aniversário.
Mas se isso é um trauma, como ele reagiria bem?
Percebo que ainda não o conheço suficientemente
para saber qualquer coisa além do que vejo e isso me
assusta. Entramos no elevador e ele permanece calado,
sério, alguém parece distante de mim, ao mesmo tempo
tão incerto, um olhar torturado que eu me sinto mal em
tê-lo deixado triste.
—Eu não queria...
—Não Ana, eu estou errado, me perdoe, eu não
queria isso, me desculpe, isso não vai voltar a
acontecer.
Faço que sim com a cabeça, saímos do elevador,
pego as chaves um pouco nervosa, Mosés está ao meu
lado ainda em silêncio.
—O que era o presente? — pergunta logo que
abro a porta e entramos.
—Acho que já chegou e está com a Lupe —
respondo sincera.
Não percebo tanto interesse, mas ele está
curioso.
Entramos no meu apartamento, e vejo Lupe com
um sorriso enorme estampado lá na cozinha.
—Boa tarde, senhor Senhor Handerson. — Lupe
fala empolgada.
—Boa, Lupe. — Mosés fala apenas neutro.
Eu tinha um cronograma, eu tinha planos, mas
acho que o aniversário realmente foi por água abaixo.
Deixo minha bolsa no sofá e vou ao encontro de Lupe.
—Poderia trazer o presente do senhor Senhor
Handerson, Lupe?
—Sim, senhor Senhor ita.
Tento sorrir, quando na verdade quero chorar,
porque eu queria lhe entregar o presente após os
parabéns, acho que nem vou tirar do freezer o bolo que
pedi para Lupe fazer. Olho para ele, que permanece
ainda sério na sala, as mãos enfiadas nos bolsos da
calça, logo Lupe volta com a caixa de presente, ela
está tão empolgada que não quero estragar isso logo de
cara.
—Deixaram há pouco. — Lupe fala. — Eu
organizei tudo no quarto senhor Senhor ita.
Adeus noite romântica.
—Está bem, muito obrigada, Lupe.
—De nada. — Lupe sorri. — Boa noite,
Senhorita Preston. Boa noite, senhor Senhor
Handerson, eu já vou.
—Sim, claro Lupe, obrigado. — Mosés fala
pensativo.
Lupe se dirige até a lavanderia, é lá onde eu acho
que ela guarda as suas coisas e tem um banheiro,
quando fecha a porta que separa a cozinha da
lavanderia, suspiro e vou para a sala carregando a
caixinha de presente, é uma caixa meio grande, claro,
mas não acho que o tamanho tenha sido maior que a
intenção e o amor no qual escolhi esse presente.
Lhe estendo a caixa em silêncio, Mosés a pega e
se inclina, me dando um beijo na cabeça, ele se senta
no sofá, e me sento ao seu lado.
—Obrigado, Ana.
—De nada.
—O que é?
—Abra!
—É que eu nunca ganhei presentes de ninguém!
—Você me deu um carro, é justo que aceite ao
menos isso.
Ele faz que sim com a cabeça, coloca a caixa sob
o centro e tira o laço, depois puxa a tampa e enfia a
mão dentro da caixa, depois analiso sua reação ao
erguer o pequeno filhote de Lulu da Pomerânia que eu
comprei hoje cedo para ele. Mosés segura o animal
como se não acreditasse, ele fica olhando para o
cachorrinho em silêncio, depois coloca o pequeno
filhote sobre o sofá e o analisa.
Depois Mosés olha para mim, e vejo que seus
olhos estão marejados.
—Que cachorro mais feio, Ana, é cachorro de
mulher! —fala com a voz embargada. — Por que fez
isso comigo?
—Ele não tem nome —respondo, e eu o vejo
negar com a cabeça afastando algumas lágrimas das
faces, também quero chorar.
—Obrigado. — Ele fala com a voz ainda
abafada. — Ele é encantador.
—Não pensei no nome. — Eu olho para o
pequeno animal. — Ele tem dois meses.
—Percebe-se. — Mosés sorri e mais lágrimas
caem em suas faces. — Por que fez isso, Ana?
—Isso o que? —pergunto comovida.
—Me fez chorar, Ana —responde nervoso.
—Porque eu amo você e queria te dar algo do
qual nunca esquecesse dessa data, seu primeiro
aniversário comigo —falo sincera.
Mosés pega o cachorrinho e o ergue, me levanto
e ele segura a minha mão.
—Fique aqui comigo.
Eu não pretendia ir embora.
—Sim.
E me sento ao seu lado, vejo que suas lágrimas
caem e caem, mas ele não emite nenhum som, um dia
eu, outro dia você, e estamos aprendendo a viver nosso
relacionamento com os nossos defeitos, nosso passado,
e isso é tão doloroso, mas estamos aprendendo e isso é
o que importa.
—Ele é esperto.
—Sim.
O filhote corre pela minha sala, Mosés olha para
ele como se fosse um menino pequeno que acabou de
ganhar algo muito legal, ao mesmo tempo parece se
preocupar muito com o bichinho, ainda é bem pequeno,
frágil. Ele olha para o cachorrinho e sorri, depois fica
pegando ele e lhe fazendo carinho na cabeça, algo tão
normal, mas que para ele é um imenso motivo de
felicidade.
—Como devo chama-lo, Bê?
—Como quiser, ele é seu!
—Não sei escolher nomes.
—Deve ter algum que goste.
Mosés analisa o cachorro e depois me olha.
—Mike? —sugere incerto.
—Pode ser — concordo, também gostei do
nome.
—Ele tem cara de Mike. — Mosés sorri olhando
para o pequeno animal.
—com certeza —respondo um pouco de receio.
— Então, tem um bolo de aniversário sem glúten, você
quer comer?
—Fez um bolo?
Não sei porque a surpresa!
—Sim, é o seu aniversário.
—Está bem.
Ele gostou mesmo do Mike.
Sorrio, um pouco mais satisfeita, vou até o
freezer, Mosés vem atrás de mim com seu novo filhote,
vejo uma pontinha de brilho em seu olhar azul, algo
que me lembra um pouco de felicidade. Pego o
pequeno bolo, é redondo e de nozes, a massa sem
glúten, a pasta americana é decorada, o bolo é em
forma de uma camisa social com gravata azul, achei
muito parecido com ele, logo que coloco o bolo na
mesa, Mosés me dá um pequeno sorriso.
Pego a vela que pedi para Lupe comprar, e o
fósforo, Mosés analisa o bolo e olha para Mike em seu
colo, sinto um pouco de receio, mas bem, comecei
então vou terminar.
Ascendo a vela e me sento ao seu lado, mas não
consigo cantar ou falar nada, a vela começa a queimar
rapidamente, eu o olho e falo:
—Faz um pedido e sopra a vela.
—Ok.
Ele está novamente chorando, e está não era a
minha intenção, tudo o que eu queria era lhe dar um dia
feliz e especial, Mosés segura a minha mão mantendo
Mike na outra e entrelaça os dedos nos meus, ele olha
para o bolo e sopra a vela que deixa tudo à sua volta
lindo de se ver, a vela se apaga de vez, e eu tento sorrir
me sentindo um pouco mais calma, ao menos ele não
quis devolver nada de novo.
—Pedi...
—Shiu, não pode falar o que pediu, se não, não
se realiza.
Mosés parece espantado, e fico imaginando em
minha mente, todos os anos em que passou por essas
famílias e nenhuma delas lhe deu algo tão pequeno,
algo que toda criança merece ter ao menos uma vez na
vida, um bolo e um dia que lembrem dele, de sua
existência.
—Obrigado, Bê. —Ele fala baixinho. — Estou
muito envergonhado.
—Não precisa ficar. — Estou me segurando para
não chorar, vê-lo chorar me destrói.
Solto sua mão e limpo suas faces com cuidado,
acho que Mosés nunca quis isso porque deve sentir-se
mal com a ocasião como ele mesmo falou, ele não quis
comemorar porque isso o machucou muito ao longo dos
anos, e eu sei que ele não teve culpa disso, não
exatamente.
Acho que preciso ser um pouco mais
compreensiva.
Me levanto e pego os pratinhos de sobremesa no
armário, começo a lembrar de tudo o que nos espera no
meu quarto, e não sei como agir, havia pensado que
estaria pronta, que conseguiria ser mais ousada. Mas,
contudo, eu já não sei se teremos clima para fazer
qualquer tipo de coisa que seja.
Pego o suco na geladeira e as taças no armário,
coloco tudo na mesa e as vezes vejo de relance Mosés
olhando para Mike, ele não tem fé com o cachorro, ele
mal parece acreditar que Mike está aqui, tão feliz.
Mosés nunca teve aniversários, ele nunca teve
uma família de verdade, nunca ganhou presentes, e isso
deve ter machucado ele de todas as piores formas,
assim como tudo o que acontece na minha vida
referente ao meu peso me machuca ou até pior, bom ou
ruim tive um pai presente, uma mãe, e irmãs, e uma
família imensa dos dois lados, e tudo o que Mosés teve
na infância foram maus tratos, pais loucos, sofrimento,
fome, pessoas que judiavam dele, quanto tudo o que ele
merecia era amor.
Talvez, nem ele saiba como lidar com as
emoções, com o que sente por mim, talvez por isso ele
seja tão bruto e seco, grosso, como diz Lupe, "na dele",
ele nunca teve o principal: amor!
Me sento ao seu lado e parto o bolo, Mosés se
inclina em silêncio e me beija a face, acho que não
preciso que ele fale nada, seus atos já demonstram
tudo, claro que ele não queria o aniversário, claro que
ele ainda continua a odiar a data, mas enfim, já está
passando.
Coloco um pequeno pedaço do bolo para ele e
outro pequeno pedaço para mim, sua mão treme
enquanto segura o garfo, e mais uma vez ele chora
calado, eu jamais pensei que fosse ver um homem
chorando tanto em toda a minha vida, me sinto
machucada em pensar que talvez ele esteja lembrando
da infância, da dor de nunca poder ter tido uma festa,
alguém que o amasse e compartilhasse de um dia
especial para ele.
Por fim, termino de comer o meu bolo, não
queria ter comido com tanta pouca vontade, Mosés
come o dele ainda, suspiro, e eu o olho.
—Quero que venha ao quarto ver minha última
surpresa.
—Está bem.
Mosés levanta carregando Mike, guardo o bolo
no freezer, deixo tudo como está e seguro sua mão,
vamos até o meu quarto, lá de fora já está anoitecendo,
acredito que Lupe tenha deixado tudo como eu pedi.
Me sinto um pouco nervosa e tensa, queria muito
que esse momento fosse especial, mas tudo deu errado,
contudo, ainda acho que podemos recuperar nossa
noite especial, abro a porta logo que ficamos diante do
meu quarto, e então faço sinal para que ele entre.
Tem uma trilha composta por pétalas de rosas
vermelhas e dos lados um caminho com pequenas velas
acesas, Mosés entra olhando em volta, assim tão
incrédulo que até me surpreendo, puxo sua mão, pedi
que Lupe arrumasse tudo como Sêmora e eu
planejamos, tem pétalas de rosas na cama, as
luminárias estão acesas dos lados dando um ar ainda
mais romântico ao lugar, e um coração formado por
pétalas vermelhas.
Deixei meu último presente numa cesta no canto
da cama.
—Lupe me disse que você gosta de ler bons
livros, comprei alguns e estão nessa cesta...
—Ana! — Mosés fala olhando em volta. — Fez
tudo isso para mim?
—Sim, bem, a Lupe e a Sêmora me ajudaram.
Mosés me olha tão concentrado, depois do nada
ele me puxa e me aperta com força, tanta força que
perco o ar. E sem esperar me beija, um beijo intenso e
forte, me sinto arrepiada dos pés à cabeça. Fico até
tonta com o beijo.
Meu corpo se esquenta com seu toque e
correspondo ele com a mesma força, sua necessidade é
tão bruta que sinto através do beijo, a rispidez, mas
não apenas isso, o beijo é tão apaixonado que eu
realmente sinto-me fora do momento anterior de tensão
e brigas.
A força da atração nos queima nesse momento e
voltamos para o nosso pequeno mundo, quando me dou
conta estou desabotoando a camisa dele, a mão dele
apertando a minha bunda por cima do tecido da calça,
me afasto um pouco e eu o fito.
—Vem para a banheira comigo? — peço
baixinho, ainda sem ar.
— Sim — responde e toca a minha face. —Te
amo, Ana, te amo tanto que nem sei como demonstrar,
sou tão estúpido...
—Não quero brigar nem falar disso, já passou —
respondo e meus dedos se enfiam em sua nuca. — Leva
o Mike para caixinha dele, e deixa ele na cozinha.
—Está bem. — Mosés se afasta um pouco. — Eu
não demoro.
—Não demore mesmo—aviso sincera.
Ele me dá um selinho e se afasta, olho em volta e
vou para o banheiro, acho que agora sim, posso chamar
isso de surpresa, aniversário, bons motivos para
continuar, espero que a nossa noite seja muito mais
feliz do que foi o nosso dia.
Darei a ele uma "Boa Noite" de presente, e
espero que amanhã cedo eu não esteja arrependida de
nada disso.
Acho que não estarei.
Capítulo 38
Me dispo.
Fico de sutiã e calcinha enquanto preparo o
banho, Lupe deixou todos os sais e as pétalas num
canto do lavatório. Ligo o reprodutor de Mp3 do meu
celular num volume baixo e deito sobre a pedra do
lavatório, a banheira já encheu, despejo os sais e jogo
as pétalas, depois de alguns momentos sinto as duas
mãos firmes me agarrando, logo sou puxada para trás e
quando nossos corpos se tocam percebo que Mosés já
está absolutamente nu, mas não me importo, seus lábios
traçam pequenos beijos pelo meu ombro até o meu
pescoço, ele puxa o prendedor que mantém meu cabelo
preso e afaga com a mão, tão carinhoso, ele cheira os
meus cabelos.
Suas mãos puxam as alcinhas do sutiã para
baixo, e tento isolar o receio, depois de alguns
instantes Mosés abre a peça e a tira do meu corpo, joga
dentro do lavatório e me vira para ele, tento sorrir.
—Você é tão linda, Ana!
Agora né?
Sorrio sinceramente tocada, eu sei que ele não
fez por querer, bem, fez, mas não consciente da nossa
noite, da minha surpresa, estico os braços e enlaço ele
pelo pescoço, Mosés me puxa e aperta a minha bunda
me beijando de leve, depois de uma forma mais
agressiva.
Toco seus braços, e seus ombros, minhas mãos
sobem e descem lentamente por seu corpo enquanto nos
beijamos, e apenas beijar e tocar os braços se torna
algo impossível, Mosés enfia a mão na parte de trás da
minha calcinha e fica apertando minha bunda com
força, pressionando seu corpo com o meu, sinto na pele
a quentura do seu corpo, me arrepio toda com as
sensações.
Me afasto novamente sem ar, ele parece tão
desejoso, seus lábios estão vermelhos, e seus olhos
tem um tom mais escuro.
—Entre na banheira—peço.
—Você não vem?
—Apenas entre.
Ele obedece, mas eu não o olho, ainda tenho um
pouco de receio de ficar vendo o Mosés nu, claro que é
muito tentador, mas acho que o meu senso de pudor as
vezes ultrapassa qualquer outro tipo de coisa na minha
vida.
Vou até o lavatório ciente de seu olhar, pego o
meu celular e seleciono a música que quero, depois
abro a porta do armário e pego o baldinho.
—Ora, o que temos aqui, "cachaça”! —exclamo
a última palavra em português.
Papai adorava uma bela pinga, ele apreciava
essas coisas, ainda que preferisse cerveja.
Mosés sorri e estende a mão, quando se estica
ele toca a minha nádega, mas não é uma ligação
exatamente sexual, é apenas uma forma de me fazer
carinho, lhe estendo a garrafa de champanhe e Mosés
se põe a abri-lo, me inclino e pego a cestinha de
morangos—essa foi uma dica da Super amante dos
caras desesperados do Bronx, Sêmora—e tento ao
máximo filtrar o meu nervosismo.
—Posso abrir?
—Fique à vontade.
—Quer que espume?
—Você é o aniversariante, Mô.
Ele me olha e depois rapidamente começa a
sacodir o champanhe, encolho os ombros escutando o
estalo da tampa sendo arremessada para longe, depois
eu tiro a calcinha criando coragem e pego as duas
taças, coloco o baldinho no batente ao lado da
banheira, também coloco a cestinhas de morangos e
entro estendendo as taças para ele, a champanhe
transborda caindo na água, mas não ligo muito para
isso, fico meio de joelhos na banheira segurando as
taças, a água está morna e gostosa, cheira a rosas e
amêndoas.
—É sem glúten! —garanto vendo-o despejar
champanhe na segunda taça.
Mosés sorri, e coloca a garrafa ao lado da
cestinha, lhe estendo uma taça, ele aceita e me sento,
tentando me acomodar da melhor forma, beberico a
bebida espumante, obviamente que também é sem
álcool, ainda que não tenha tanta graça, eu não sei, bebi
muito raramente espumantes ao longo da minha vida,
nos anos novos na casa de mamãe, ou na empresa em
épocas comemorativas, eu não sei distinguir esse dos
outros.
—Posso ficar junto de você, Bê?
—Pode.
Me acomodo na banheira, Mosés vem e gira o
corpo de forma que fica sentado entre as minhas
pernas, ele se aconchega e encosta o corpo em mim,
assim, ele parece bem maior que o normal, até mais
que eu.
Seu corpo é tão quente, tão gostoso, suas costas
recostam-se nos meus seios, e os lados do seu corpo
estão encostando nos lados das minhas coxas, ele
encosta cabeça no meu ombro e se estica na banheira,
dobro as pernas observando as pétalas vermelhas na
água esbranquiçada, pego um morango e coloco diante
dele, Mosés morde, mas isso parece tão... sexy. Sua
mão desce pelo lado do meu corpo e toca embaixo da
água minha coxa, meu joelho, bebo mais dois goles do
espumante.
—Gostou? —pergunto tentando não me sentir
constrangida.
Mosés ergue a cabeça para o lado e me morde a
boca como se fosse dono dela, seus lábios tem o gosto
doce do morango, prendo sua boca num beijo lento e
gostoso novamente.
—Muito—fala ao deixar meus lábios. — Mais!
Lhe dou o morango, ele abocanha a fruta e a
mantém entre os dentes, e eu o olho assim, com o
morango na boca, sorrio e me inclino, quando tento
morder o morango, ele me beija e compartilhamos a
fruta deliciosa entre o beijo, me sinto quente, bem
quente. Ele se afasta e bate com a taça na minha.
Ele me olha intensamente por alguns momentos,
depois se vira e sinto-me afundando um pouco na água
quente, meu corpo está todo mole com seu olhar, a
intensidade estampada no seu olhar, Mosés pega a taça
da minha mão e coloca as duas no batente, depois ele
pega um morango e estende para mim, está de joelhos
na banheira entre as minhas pernas. Observo seu peito
subir e descer lentamente, seu abdome reto, seus
braços compridos, ele é tão... homem!
Mordo o morango, mas apenas sua pontinha,
mastigo, estou tensa, e entendo que a tensão seja muito
mais sexual que física, Mosés pega essa ponta mordida
e passa nos meus lábios, depois vai passando essa
pontinha pelo meu pescoço, e desce até o meu seio,
meu corpo reage, me arrepio muito mais com seus
olhares do que com seu gesto, ele passa o braço
envolta do meu corpo e me puxa pelas costas, me
seguro na banheira e ele passa a pontinha do morango
no meu seio, depois se inclina e chupa o biquinho com
força, me contraio toda, a sensação é deliciosa.
Toco os seus ombros porque ele chupa com mais
força o biquinho, ele me olha e coloca o morango em
minha boca novamente, aceito e ele me beija com a
mesma vontade de antes, me ergo sem conseguir
prender o desejo que percorre meu corpo, ele me puxa
indo para trás, se senta e me sento abrindo as pernas
para ele, Mosés aperta a minha bunda enquanto nossas
bocas se devoram loucamente.
Meu corpo se enche de fagulhas que me trazem
lembranças das sensações que sua boca sempre
provoca no meu corpo, minhas mãos se enfiam em sua
nuca e puxo os cabelos totalmente fora de mim, ele me
aperta com força e afasta os meus cabelos para longe
dos meus seios, deixa os meus lábios e começa a beijar
o meu pescoço, fecho os olhos, e me esfrego nele, sinto
no ventre a ereção dele, está duro e quente.
Suas mãos apertam meus quadris com força e
isso faz meu corpo todo esquentar muito mais do que já
estou, e suas mãos apertam minha bunda, minha boca
não sai da dele.
—Vamos para a cama—fala baixinho entre o
beijo.
—Não apresse nada—recrimino arfante e mordo
sua boca.
—Não dá para te chupar embaixo d'água, minha
bebê.
Coro.
Eu também não quero fazer nenhuma loucura
dentro da banheira... meu intuito era só esquentar o
momento, não acabar fazendo o que não devo aqui.
—Ana, você sabe que eu talvez não consiga te
dar apenas um "bom dia", certo?
Suspiro e por incrível que pareça não tenho
medo, sorrio e começo a me erguer.
Saio da banheira, me inclino e beijo-o com força
depois junto toda a minha força de vontade e coragem e
começo a me afastar para o rumo do meu quarto.
Não digo nada, Mosés vem atrás de mim, eu
tenho certeza do que quero, eu tenho certeza do que
sinto, e eu não terei medo desta noite, também não irei
me arrepender dela, eu acho que não!
Mosés me abraça por trás bem antes que eu
chegue a cama, ele me segura pelos ombros e me vira
para ele, ele segura as minhas faces entre as mãos e me
beija a cabeça, depois os meus olhos, sorrio, estou
tão... nervosa, não devo me sentir assim, mas estou,
abaixo a cabeça e eu o abraço com todo o amor que
possuo dentro de mim. Ele me beija novamente
secando os cantos das minhas faces, algumas lágrimas
caem involuntariamente.
Me toca as costas, e segura as minhas mãos
entrelaçando os dedos nos meus, nosso beijo se torna
mais lento, carinhoso, vamos assim para a cama, me
sento e Mosés vem me ajudando a subir na cama a me
deitar, me acomodo entre os travesseiros, me sinto
realmente tensa.
Ele começa a beijar meu pescoço e vai descendo
até os meus seios, suas mãos apertam os lados das
minhas coxas, ele está de joelhos na cama puxando
minhas pernas para os lados, Mosés vai descendo
beijando minha barriga, meu ventre, e desce mais e
mais.
Me olha, e me observa com tanto desejo
estampado no olhar que mal acredito que se sinta
realmente assim ao me ver totalmente nua, depois beija
os cantos das minhas virilhas, abrindo mais minhas
pernas, e sua boca me toma toda nesse momento,
afundo a cabeça em busca dos travesseiros, meu corpo
todo prega na cama.
—Mosés!
Soa mais como um gemido gostoso, e me estico
na cama encolhendo os dedos dos pés, sua língua
lentamente se apossa da minha sensibilidade, ele dobra
as minhas pernas mantendo-as abertas e continua a me
beijar intimamente, me apoio nos cotovelos e o
observo arfando com o prazer que me proporciona.
Sua boca me toma com força nesse instante e
oprimo o grito que se forma na minha garganta, aperto
a colcha da cama, meu corpo todo treme quando ele me
olha, e sua boca volta a se mover no meu centro, e vê-
lo tão intensamente fazendo isso me dá mais e mais
prazer.
Estendo a mão e enfio os dedos em seus cabelos,
ele me olha concentrado, e sua língua me toma com
lentidão em gestos circulares no meu ponto sensível,
meus dedos puxam seus cabelos como reflexo do
prazer que sinto se espalhando pelo meu corpo. Sua
língua desce para minha entrada e solto um grito alto,
porque é, muito gostoso quando ele me lambe lá.
Sua boca é deliciosa, e ele me chupa sem nenhum
receio, nenhum medo ou coisa assim, me sinto mais à
vontade e relaxo na cama me entregando as ondas de
prazer que me proporciona, sua língua toma minha
carne de um jeito gostoso me deixando quase louca por
alguns momentos, gemo, mas isso parece me sufocar
quando o prazer me toma realmente, Mosés me deixa
louca por alguns instantes, mas parece que quando
chego perto de sentir algo mais forte ele alivia a
carícia.
Chego ao meu limite, puxo seus cabelos com
força, me encolhendo toda, Ele se ergue e segue a
mesma trilha de beijos até os meus seios com mais
rapidez.
—Me alivia, bê—pede mordiscando os meus
seios. — Por favor, senão eu vou fazer uma grande
merda.
—E quem disse que eu não quero fazer uma
grande merda? — pergunto arfante. —Tem camisinha
na gaveta do criado.
—Ana...
—Eu quero, por favor!
—As coisas não são assim. — Mosés me fita
bastante sério. — Depois do casamento, esse foi o
combinado.
—Eu quero! — repito convicta.
Eu o toco.
Mosés fecha os olhos e respira fundo, ele vai
para o lado deitando-se de costas, se estica na cama
para pegar a camisinha na gaveta, proveito esse
momento para lhe dar um pequeno presente. Eu o
seguro e fecho os olhos me inclinando sob seu corpo,
meus cabelos caem dos lados e eu o coloco em minha
boca lembrando das dicas de Sêmora, me sinto idiota,
e ao mesmo tempo coberta de vergonha.
—Ah! —Ele geme baixinho.
Tento colocar o máximo que posso na boca, mas
não consigo, salivo, isso faz salivar, acho bem justo
que ele sinta prazer comigo também dessa forma,
porque ele também me dá muito prazer quando faz
comigo.
Ainda que tenha vergonha tento relaxar, eu o
chupo lentamente enquanto minha mão se enche em sua
ereção, Mosés aperta o meu seio e puxa o biquinho
com força, gemo, e ele afasta os meus cabelos para o
lado me olhando.
—Você é maravilhosa!
E me puxa pelo braço, umedeço os lábios
confusa, não estava bom?
—Mas eu nem...
—Shiu— ordena e me beija com carinho. — Tem
certeza mesmo?
—Sim — afirmo concreta.
—Não vou te machucar.
—Eu sei que não.
Seu olhar tem um significado diferente, e eu sei
que ele não se refere ao ato em si, Mosés não vai me
machucar emocionalmente. Nos beijamos e me deito,
ele abre o papel laminado, e se ergue, eu o observo de
costas para mim, toco suas costas.
Ele se vira, depois vem me beijando, começa
pelo pé, quando segura meu pé começo a rir, sempre
achei coisas assim tão bregas, mas confesso, que ele
tem realmente sido carinhoso comigo em todos os
sentidos, logo em seguida seus beijos sobem pelas
minhas canelas, joelhos, coxas, ele não tem pressa, e
eu ainda que esteja muito ansiosa tento conter minha
agitação.
Sorrio, quando ele chega aos meus seios se
demora, depois de alguns instantes me beija a boca,
minhas mãos estão tocando suas costas, seus braços,
Mosés beija o meu pescoço separando as minhas
pernas novamente.
—Relaxe!
Faço que sim com a cabeça, ele se ergue, encosta
a testa na minha e sinto seu corpo vindo para o meu
lentamente, fecho os olhos quando sinto a pontinha dele
na minha entrada, e vagarosamente meus quadris sobem
quando ele começa a me penetrar.
E dói. Dói, dói, dói. E eu acho que ele ainda nem
colocou tudo!
Aperto seus ombros totalmente tensa.
—Relaxe, meu amor.
—Isso queima.
—Eu sei, mas tem que tentar relaxar!
—Mas queima!
Eu o fito, e Mosés respira fundo, ele sai e depois
entra devagar, e mais de vez, ele me beija e o meu
corpo recebe o dele assim, toco sua face oprimindo os
gemidos de dor, a sensação é de ardência e dor,
desconforto, ainda que sinta a lubrificação da
camisinha.
Toco seus ombros com mais força, seus quadris
se movem para os meus lentamente, eu o abraço com
força, e fecho os olhos recebendo-o mais depressa,
Mosés puxa uma das minhas pernas para cima de seus
quadris e me beija com mais força, estamos banhados
de suor. Meu corpo todo está tenso, acompanhado da
ansiedade e do nervosismo que sinto, tento relaxar o
máximo que posso, mas as pontadas de dor não
deixam.
Observo seu corpo se movendo sobre o meu, ele
é tão grande, tão perfeito, estendo a mão e toco sua
bundinha, então ele vem de vez me causando uma dor
tão infeliz que solto um grito, dentro de mim faz um
estalo e me agarro a ele com força.
Mosés para e afasta as gotículas de suor que se
formam na minha testa, ele vai para o lado me levando
junto, puxa a minha perna e metade de seu corpo está
em cima da minha outra coxa, assim ele começa a se
mover novamente, me beija, assim é um pouco menos
desconfortável.
Meu corpo começa a se encher de fagulhas
apesar da tensão, toco seu peito observando-o me
penetrar vagarosamente, nos beijamos, e meu corpo
começa a relaxar nesse momento, meus quadris se
movem com os dele na dança lenta, assim é mais...
gostoso.
Aperto os olhos, e dentro de mim, algo se
esquenta com o ato, ele deixa a minha boca e desce
para o meu pescoço, sua língua começa com pequenas
lambidas, depois Mosés começa a dar mordidas no
meu pescoço, e isso se torna um pouco torturante,
entrelaçamos nossos dedos e procuro sua boca
movendo meus quadris com os dele mais e mais.
Ele vem para cima de mim e nos acomodamos
novamente na mesma posição, ele fica por cima, suas
lambidas descem para os meus seios, meu corpo todo
se enche de arrepios, porque apesar da dor já estou tão
lubrificada que ele desliza de dentro para fora em mim,
ainda que eu saiba que não coloca tudo.
—Mete comigo! —pede ele baixinho e enfia a
língua na minha orelha.
Subo com seu corpo, e meu corpo esquenta, me
arrepio toda com seu pedido, ele mordisca o lóbulo da
minha orelha e se ergue apoiando os joelhos na cama,
depois começa a meter com força, solto um grito
depois da primeira estocada, e na segunda coloco a
mão na boca abafando as pontadas de dor... e na
terceira meu corpo começa a reagir de um jeito
diferente, seu olhar está no meu, sua boca próxima da
minha, sinto as lufadas quando ele arfa em minha face.
E essas estocadas vão ficando mais rápidas me
despertando mais e mais pontadas de prazer, meus pés
começam a arder com a sensação de ser dele, nos
beijamos, mas me sinto tão estranha com isso.
Seu sexo pede mais, muito mais, nada de beijos,
nada de romantismo, apenas ele metendo dentro de
mim.
É pecado pensar isso?!
Deve ser, em algum lugar fora daqui, porque
estar aqui com Mosés está sendo algo maravilhoso e
prazeroso, revelador para mim.
Ele acelera mais e mais e os meus quadris se
movem em seu ritmo, me apoio nos cotovelos olhando
no fundo de seus olhos, e ele parece um bicho
enjaulado que está pronto para fugir da jaula...
Aperto seus ombros e fico parada recebendo o
prazer que me proporciona enquanto mete em mim mais
rápido, meus seios pulam com as estocadas, me seguro
em sua nuca olhando no fundo de seus olhos, minhas
pernas dobradas e abertas para ele, me sinto próxima
do céu.
Soluço, porque meu corpo agora começa a
entorpecer pelo prazer que me causa, ele desliza em
mim, minha carne está quente e trêmula, e o meu corpo
está totalmente entregue a ele. A sensibilidade é única
e nova, a sensação de ser penetrada já não é tão
dolorosa, ainda que incomode quando ele entra mais,
mas isso também é gostoso.
Fecho os olhos, me seguro na cabeceira da cama
que por sinal faz barulho, depois minhas pernas
começam a tremer e sou totalmente invadida por algo
bem mais forte do que apenas a sensação de prazer, eu
o olho nesse momento, e gemo me segurando em seu
pescoço, Mosés geme alto com a boca bem próxima da
minha.
Os orgasmos me tomam, meu corpo trepida com
as sensações, Mosés me beija nesse momento, e a
intensidade me faz querer gritar, seus gemidos se
misturam com o meu enquanto nos beijamos.
Abro os olhos estou vendo estrelas.
Seu clímax fica preso dentro da camisinha, mas
nos beijamos.
Não precisamos de palavras, nem de juras de
amor, tudo o que temos é o agora, e agora eu tenho
Mosés exatamente onde quero, na minha cama.
Capítulo 39
—Você está bem, meu amor?
—Sim.
Muito bem.
Consegui sair do transe a pouco, estava tão longe
de tudo que o meu corpo ainda parece mole, recebo um
beijo carinhoso no pescoço, me vejo sorrindo, ele me
aperta com força, carinho, me beija a face, e fecho os
olhos, é um pouco difícil ainda não pensar que tudo
isso é um sonho, um sonho perfeito e prazeroso.
Quero me cobrir, porque uma camada de
vergonha intensa me toma quando Mosés se ergue e me
olha, ele se apoia no cotovelo, e segura a minha mão
entrelaçando os dedos nos meus, passo meu braço por
debaixo do dele e toco suas costas, não sei como me
sinto exatamente em relação ao prazer, porque parece
que isso foi apenas a conclusão de algo bem maior, o
amor que sinto por ele.
Seus cabelos estão desarrumados, e ele estão tão
ou mais soado que eu, a boca vermelha, os olhos azuis
mais vívidos, sorri para mim assim tão diferente de
tudo o que eu já vi, tão diferente do que ele é, acho que
ele nunca sorriu assim para mim, acho não, tenho
certeza.
—Esse aniversário...—insinua ele detendo um
sorriso nos lábios finos. — Acho que posso deixar
você fazer mais aniversários para mim!
—É mesmo? — pergunto e as minhas bochechas
queimam. — Mas eu pensei que você não quisesse a
festa!
—É, de fato me enganei—concorda ainda num
tom muito brincalhão. — Acho que vou querer mais
festas assim, mas não precisa ser só no dia do meu
aniversário.
—Sei—afirmo estreitando os olhos. — Falso!
Mosés ri, um riso espontâneo e feliz, depois me
beija, e enfio as mãos nos seus cabelos me sentindo
totalmente presa a ele, eu nunca me senti tão presa a
alguém, de nenhuma forma, acho que só ao meu pai,
emocionalmente falando, com ele é tão... complexo.
Fico feliz quando ele fica feliz, e quero chorar
quando ele chora, e me sinto, realmente triste quando
percebo as coisas ruins que ele viveu desde o
abandono até os dias em que viveu com os pais ruins,
as famílias pelas quais ele passou, quanto mais sei de
Mosés Handerson, mais me surpreendo, e mais quero
saber.
De onde ele veio? Como foi sua real infância?
Teve mais traumas? Como foi ser adotado pelos
Handerson?
—Amo você! — fala e me fita com os olhos
marejados.
—Eu te amo—falo sincera e toco sua face.
Beijo-o e eu o abraço, Mosés respira fundo me
apertando, e eu sei que tudo isso é reflexo dos seus
sentimentos, ele não sabe se expressar exatamente
como quer, ele já me falou isso, e eu entendo
perfeitamente, ou tento entender.
Ficamos assim por um bom tempo, apenas
abraçados, quietos, e depois de alguns momentos, ele
se ergue, o celular dele está vibrando em cima do
criado, Mosés se senta na cama de costas para mim.
—Oi, Phell... sim, tudo bem e você? —Mosés
afasta os cabelos para trás da testa, e seu semblante de
repente fica muito sério. — Está bem... obrigado,
Phell... sim eu estou bem... não eu não falei com ela,
acho que viajou para Ibiza para resolver algumas
coisas... não... estou em casa! — Mosés me olha meio
de lado e sua mão toca a minha perna. —Tudo bem,
muito obrigado, Phell, eu farei o possível, tchau.
Phell... eu já ouvi esse nome em algum lugar!
Mosés encerra a ligação, me emborco, porque
ainda é meio constrangedor ficar nua diante dele,
Mosés fica sentado, ele se vira e fica de lado dobrando
a perna, ele me olha com um pequeno sorriso.
—Era o meu tio adotivo — responde incerto. —
Ele sempre me liga, me pergunta se eu estou bem, ainda
que saiba que eu não gosto.
Achei meio distante, ele parecia falar com
alguém comum, não havia emoção alguma enquanto ele
falava com Phell, mas imagino que ele seja alguém
muito importante na vida de Mosés, pois, foi ele que o
adotou ao lado de Bonnie Handerson, a mulher que ele
chama de "tia", ou chamava, ele já havia me dito que
Bonnie faleceu há alguns meses.
—Você está coberta de pétalas de flores!
—Beleza Americana!
Pego um punhado e jogo no rosto dele, Mosés
fecha os olhos recebendo a lufada de flores e depois ri,
me sinto infantil, mas eu realmente não sei como agir
agora, como devo agir? Eu nunca fiz sexo com
ninguém, nunca me entreguei completamente em
nenhum sentido a ninguém, nunca amei ninguém ao
ponto de querer lhe dar tantas coisas tão preciosas para
mim.
—Temos referências aqui, senhor Senhor ita
Preston?
—Talvez.
Ele se deita ao meu lado, seus olhos me analisam
de cima abaixo, e fico realmente constrangida com
isso, meus olhos estão em sua bela face, no sorriso
estampado em seus lábios.
—Eu já sei o que quero para nossa noite de
núpcias. — Mosés fala baixinho. — Você com pétalas
de rosas.
—Claro, claro, você adora uma flor!
—Realmente, eu adoro a sua flor!
—Mosés!
Ele ri à beça com o horror na minha voz, depois
vem para cima de mim, se deita em cima de mim
abraçando o meu corpo, me tornando pela milésima
vez a garota mais feliz do mundo.
—Quero seus documentos amanhã, Ana.
—Para que?
Fico confusa.
—Para eu dar entrada nos papéis do cartório.
—Mosés eu não quero casar tão rápido.
Ele vai para o lado e me viro para ele ficando
meio de lado, percebo uma ponta de incerteza em seu
olhar, incerteza e medo, acho que fui meio direta
demais, o que é bem irônico, porque ele sempre é
muito direto comigo e nem sempre fico tão ofendida
com isso, talvez no começo, mas agora não.
—Nós já íamos nos casar.
Bem, mais ou menos isso.
—Eu não quero que case comigo só porque eu
transei com você, Mosés — falo sincera. —Podemos
esperar.
—Não quero esperar, Ana—fala e segura a
minha mão, ele analisa o anel que me deu de noivado.
— Quero uma aliança dourada que diz claramente que
é minha, bem aqui.
Ele está fazendo de novo... está sendo
sinceramente romântico comigo, as vezes me pergunto
como alguém pode romantizar tudo de um jeito tão
franco, e percebo que não faz de propósito.
—Quero que seja minha esposa, acho que tenho
trinta anos e alguns meses, talvez dois, já estou velho,
Ana, quero uma família com você!
Quais são as chances de um homem falar isso na
vida?
Nulas!
Ou para qualquer mulher, porque hoje, nenhum
homem com uma posição social ou até inferior a dele
quer algo sério, família, filhos, acho que faz um tempo
que eu até desisti de pensar nisso, achei que
envelheceria sozinha, que um dia acabaria voltando
para San Antônio para cuidar da velhice de mamãe, ou
algo assim.
—Mosés, casamento é algo muito sério. — Meu
bom senso fala mais alto. — Eu realmente quero casar,
mas não quero me precipitar, estamos noivos há alguns
dias.
—Eu não quero ter que esperar, Ana, eu não sou
um irresponsável —responde e beija a minha mão, —
Aceite, até o final do mês nos casamos, ficamos bem
aqui onde estamos.
—Que diferença faria se...
—Ana, faria muita diferença, eu não te quero
como amante, eu te disse isso desde o começo, mas não
sou hipócrita, eu sou homem, eu tenho desejos e
vontades, eu tentei o máximo me controlar, mas com
você não funciona! — interrompe num tom bem sério.
—Quero estar com você, quero compartilhar a minha
vida com você, isso é pedir demais?
—Não, mas é que para mim casamento é para
sempre—falo sincera. — E eu não quero acordar
amanhã, e você me falar que se arrependeu, que foi um
erro.
— Eu não farei isso! —Mosés afirma com
segurança. — Você tem que parar de ter medo e viver
as coisas, Ana.
—Você vive as coisas? Casamento é sério! Se
casou com todas com quem se envolveu?
—Não, justamente por isso, porque eu não as
amava o suficiente para querer casar com elas!
—E como pode ter certeza de que eu sou a
mulher certa?
—Ana, eu amo você, eu quero estar com você!
Eu não consigo se quer parar de pensar em você, e só
de pensar que talvez você não aceite se casar comigo,
me sinto destruído, porque isso é tudo o que eu mais
quero em toda a minha vida.
Fico parada.
Mosés estende a mão e toca a minha face com
cuidado, suas palavras me atravessam de um modo tão
profundo que quero chorar.
Ele me quer, ele pensa em mim, ele quer casar
comigo de verdade!
—Eu já aceitei casar com você, eu apenas...—
cubro sua mão com a minha. — Apenas quero que
tenhamos certeza!
—Não tem certeza do que sente por mim, Ana?
— pergunta ele, e percebo seu olhar magoado. — Eu te
amo tanto, já disse, quer que eu repita quantas vezes
para que acredite? Me desculpe por hoje, eu sei que fui
um idiota, mas poxa vida, Ana, apenas diz sim.
Suspiro, eu não sei se isso é o certo, claro que
estamos noivos, claro que eu acredito em suas
palavras, mas quando ele falou para minha mãe "um
mês e meio" não pensei nas reais consequências desse
pedido, eu só quero poder ficar com ele, apenas isso,
que Mosés seja meu assim como me sinto dele.
—Amo você! —falo sincera.
—Eu sei que ama Ana, mas quero a minha
resposta e os documentos—responde num tom mais
sério.
Reviro os olhos, Mosés segura a minha face me
forçando a fitá-lo.
—Aceita?
—Eu já disse que sim!
Ele sorri e me beija, e me entrego aos seus
beijos me sentindo novamente em sua esfera, talvez
esse seja o maior erro da minha vida, mas estou tão
segura disso que mesmo que eu errar, tenho plena
certeza de que serei muito feliz.
Acordo.
Estou sozinha na cama, mas em meus lábios tem
um sorriso largo.
Estou coberta por um lençol fino e tem muitas
pétalas de rosas vermelhas em meu corpo, meus olhos
se fixam no meu lado esquerdo da cama, e eu me vejo
abraçando o travesseiro dele, cheirando, beijando.
Tudo foi tão fantástico.
Ficamos horas e horas abraçados, apenas em
nosso silêncio, trocamos carinhos, beijos, e por fim
dormimos abraçadinhos, me perguntava como alguém
me deixou tão extasiada e em outro momento me fez me
sentir como uma adolescente apaixonada.
Mosés me pediu em casamento—de novo—e eu
aceitei—de novo—, vamos nos casar em um mês no
máximo, acho que não demoraremos mais que isso.
Me sinto nas nuvens.
—Bom dia, minha Bê.
Me ergo, e eu o vejo, entrando no quarto, usa
apenas uma calça de pijama, assim, tão lindo logo pela
manhã, Mosés carrega uma bandeja cheia, ele sorri
logo que se aproxima da cama e fico vermelha com a
forma como ele me olha, puxo os lençóis cobrindo
meus seios e me ajeito no canto me sentando, ele se
senta de frente para mim e coloca a bandeja ao nosso
lado, depois se inclina e do nada me beija.
Nos beijamos devagar, não me preocupo, o meu
noivo enfia a mão no meu pescoço tocando-o com
carinho e cobre a minha mão com a dele me fazendo
soltar a barra do lençol, ergo as mãos e enfio em seus
cabelos beijando-o, tocando seus ombros, ele faz com
que eu me sinta tão bem, tão feliz.
Eu o amo.
—Bom dia, meu amor! —falo me afastando um
pouco.
Toco seu peito, sua face, Mosés me observa e
beija a minha testa com carinho.
—Te amo —fala com um pouco de timidez.
—Também te amo, meu Mô—respondo e ganho
outro selinho. — A Lupe já chegou?
—Sim, ela trouxe ração para o Mike! —Mosés
sorri meio de lado. — Ele não para quieto.
Ele ficou tão feliz de ter ganhado o Mike.
Seus olhos tem um brilho intenso na manhã de
hoje, ele pega a xícara e me entrega, depois pega a
dele e fica me olhando enquanto tomamos nossos cafés,
me sinto um pouco travada, acho que vai demorar um
pouco para que eu perca a vergonha, acho que nunca
perderei totalmente a vergonha dele, me sinto
constrangida em saber que ele vê os meus seios, estou
completamente nua embaixo desse lençol fino.
Ele estende a mão e toca a minha face com afinco
por diversas vezes, percebo a importância que tenho na
vida de Mosés agora, simplesmente fico imaginando o
quanto deve ter sido péssimo para ele viver todos
esses anos, sem uma família, sem amor verdadeiro, não
conhecendo seus pais, sofrendo com a rejeição e o
abandono, deve ser horrível crescer fora de um lar, e
muito pior, ter tido tantas coisas ruins na vida, ter
sentido tanta dor por conta disso ao ponto de não
querer um aniversário, presentes.
—Preciso dar um pulo na empresa, mas volto
mais cedo — fala e me estende um biscoito, mordo,
depois ele morde. — Sem glúten!
Sorrio, depois me dou conta de algo... A
empresa!
—Eu acho que já deve estar tarde.
—Sim, são onze horas!
Nossa! Dormimos isso tudo?
—Preciso só resolver algumas coisas e volto
antes das duas — fala bastante calmo. — Pode ficar,
chego para o almoço.
—Eu preferia ir...
—Ana, hoje é sábado!
Ah.
—Eu não trabalho no sábado! — exclamo menos
preocupada. — Mas posso te fazer companhia.
—Prefiro ir sozinho, tenho apenas que resolver
algumas coisas, quero que você descanse.
Faço que sim, Mosés me beija de leve, depois
ele bebe o resto do café e se ergue.
—Vou tomar uma ducha, come.
Fico um pouco desgostosa por ele não poder
ficar comigo, mas não falo nada, acho que Mosés
realmente já fez muitas concessões ao viajar para casa
de mamãe, ele também se atrasou todo por conta do
afastamento devido à dengue, ainda que eu queira que
ele fique um pouco mais comigo, sei que ele tem a
empresa e suas responsabilidades.
Ele me dá mais um selinho e vai para o banheiro.
Suspiro.
Mas depois me vejo sorrindo, me abraço, e volto
a tomar meu café, para minha surpresa quando olho
para a bandeja vejo, um pequeno bilhete dobrado num
canto, leio com o mesmo sorriso estampado nos lábios.
"Eu te amo meu amor, muito obrigado pelo
presente, espero em breve poder te chamar de esposa,
te amo mais que tudo.
PS. deixe os documentos separados para que eu
leve.
Te amo, Mosés Hallan Handerson."
Jogo o bilhete no canto, pulo para fora da cama e
corro para dentro do banheiro, entro no box, ele está
lavando os cabelos, mas nem me importo, eu o puxo
para baixo e o beijo, Mosés me abraça, depois afasta a
espuma para trás, mas não o largo, ele sorri e sua mão
desce para minha bunda.
—Fica comigo! —peço baixinho. — Por favor.
Ele me lança um olhar embargado de carinho,
depois sorri para mim e diz:
—Pensei que não iria pedir.
Não consigo parar de sorrir, enquanto nos
beijamos ele pega o sabonete e começa a me lavar,
lava os meus seios, minha barriga, e desce lavando o
meio das minhas coxas, toco seus ombros, seus braços,
é muito bom toca-lo, é muito bom senti-lo junto de
mim. Ele toca o meu centro enquanto me lava, mas não
acho ruim, toco seus lábios com a língua me sentindo
desejosa, quero mais... mais que beijos.
—Sente dor? —pergunta enquanto me lava com
muito cuidado.
—Não—respondo e me sinto envergonhada.
—Acho que te machuquei um pouco. — Mosés
desliza a mão para minha bunda. — Vi uma pequena
mancha de sangue na cama.
Acho que já posso morrer de vergonha agora.
Mosés ao contrário de mim, está sorrindo, assim
tão bobo... deve estar feliz, ele é homem, deve se sentir
honrado por eu ter perdido com ele ou coisa assim.
—Isso é normal, Mosés, para!
—Amor você é muito linda quando fica
envergonhada, fica toda rosada!
Fecho a cara, depois sorrio, ele toca o meu
corpo todo, lhe dou liberdade, ainda que tenha bastante
vergonha, estou vermelha, enlaço-o pelo pescoço.
—Mais tarde seremos apenas a senhor Senhor ita
e eu!
Mordo o lábio inferior tão tarada.
Deslizo a mão e aperto a bundinha dele, seus
lábios possuem um jeito travesso quando se curvam
para o sorriso.
—Posso saber o que fará comigo, senhor Senhor
Handerson?
— Será surpresa.
Mike é um animal adorável.
Viemos para a sala e ele já estava correndo para
todo lado.
Mosés não larga seu filhote por um segundo,
estamos vendo tv TV , ele deitado com Mike em sua
barriga e a cabeça dele em minhas pernas, Mike não
late, ainda é muito pequeno, frágil, mas tão peludo que
parece um pouquinho maior.
Me estico completamente relaxada, meus dedos
deslizam pelos cabelos úmidos de Mosés, coloquei um
short leve e uma camiseta de ficar em casa mesmo, ele
vestiu um short de malha e uma camisa de cor branca.
Depois do banho, Mosés foi para o meu quarto, e
eu percebi que estou com um pouco de sangramento,
acho que é normal, mas não comentei nada com ele,
coloquei absorvente e roupas íntimas, depois quando
fui para o quarto ele estava vestido olhando para o
rumo da cama enquanto segurava a bandeja, fiquei
muito constrangida e puxei os lençóis na hora.
Fiquei morta de vergonha, não era tanto sangue,
mas havia uma pequena mancha na cama, ele sorriu
para mim como se isso fosse algo muito natural, mas
ignorei—sou a rainha da ignorância até na vergonha—
e fui para a lavanderia onde bati os lençóis e os
coloquei na máquina, retornei à cozinha onde Lupe
mexia panelas, Mosés já estava na sala correndo atrás
de seu presente de aniversário.
Me sentei no sofá e em menos de dez minutos ele
já estava se deitando em cima das minhas pernas, gosto
disso, gosto muito da nossa intimidade, apesar de ter
descoberto ontem, esse novo lado dele.
Não sei qual é a surpresa da qual ele falou, mas
acho que não poderemos fazer amor hoje.
Coro e sinto um calor estranho me percorrer o
corpo só de lembrar.
Mosés me puxa do nada e me assusto, ele me
beija me trazendo para a realidade, sua boca é
carinhosa e lenta, eu adoro beija-lo, meu estômago se
enche de borbulhas.
—Ele é perfeito, obrigado pelos presentes!
Estou vermelha.
—De nada.
Estou feliz que ele tenha gostado do cachorrinho,
eu não sabia o que dar para Mosés exatamente—além
do que eu já tinha certeza que daria—, porque ele
parece sempre ter tudo, eu sei que ele é rico—muito
rico—, por isso pessoas assim se tornam muito
inacessíveis, quando me veio à mente da ideia de um
aniversário, só pensava: que presente devo dar a ele?
Queria uma surpresa e uma noite Super
romântica, momentos inesquecíveis para mim e ele,
mas também queria lhe dar algo do qual ele sempre
lembrasse de mim, algo do qual ele não tinha, e ele não
tinha um cachorro.
Nos beijamos mais uma vez, percebo um pouco
da carência em seu olhar, é como se ele me pedisse um
pouco mais de atenção, de cuidados, eu nunca fui
carinhosa com ninguém, bem, tem a Sêmora, mas não é
a mesma coisa. Com Mosés eu sinto realmente que ele
me pede atenção, com seu silêncio, com seus próprios
gestos de afeto, ele gosta de ser tratado com amor, ele
se abre cada dia mais comigo.
O celular dele começa a vibrar no centro, ele se
ergue, depois que viemos para a sala o celular dele
tocou algumas vezes, mas ele ignorou e deixou no
silencioso, dessa vez ele nem olha, acho que estou
fazendo Mosés se tornar um irresponsável.
—Amor, talvez seja importante.
—É a Safira, ela quer é me encher o saco.
Ele ainda não a perdoou por tudo, já tinha me
dito que não estavam se falando.
— Senhor Senhor Handerson, eu percebi que não
há roupas do senhor Senhor no closet da menina, quer
que eu busque?
É mesmo.
—Pode ser, Lupe, ficaria muito agradecido.
Olho para Lupe, ela parece tão gentil, acho que
ela precisa de uma mãozinha, beijo a testa de Mosés e
me levanto.
—Eu busco para você, o que quer que eu traga?
—Apenas roupas de ficar em casa, eu já
conversei com o cara que trará a minha mudança no
meio da semana.
Sorrio toda feliz e faço que sim.
—Mas pode ir colocar uma calça para poder ir.
Fecho a cara, Mosés sorri e me puxa, ele me
beija a barriga segurando Mike com uma mão.
—Está bem, mas vai sem sutiã?
—como você é indiscreto!
Me afasto ouvindo as risadas da Lupe, minhas
bochechas queimam tanto que mal consigo olhar na
cara dela, vou para o meu quarto, eu já estou de sutiã,
mas acabo vestindo uma calça jeans, porque tenho que
sair na rua, e eu não iria com algo tão curto, tenho bom
senso.
Volto a cozinha depois que calço minhas
sapatilhas e pego as chaves do apartamento dele com
Lupe, Mosés até afastou o centro da sala e está deitado
no tapete com Mike, é muito lindo vê-lo tão feliz assim
brincando com seu pequeno filhote.
—Eu nunca o vi sorrir na vida. — Lupe cochicha
baixinho. — E olha que eu já trabalho para ele há sete
anos.
—Achava que ele era banguela! —cochicho de
volta.
Lupe ri contida, eu a abraço.
—Obrigada por ajudar, Lupe.
—De nada menina, deixe disso.
Às vezes me chama de menina, outras me chama
de senhor Senhor ita, mas nem me importo, gostei da
Lupe logo de cara.
Saio do apartamento toda contente, da vontade de
dançar de tanta alegria, depois me vejo cantando
enquanto atravesso a rua, me sinto uma boba por
cumprimentar o porteiro do prédio dele.
Subo mexendo nos meus cabelos, me observo no
reflexo do espelho do elevador e meus olhos brilham,
Sêmora tinha razão que nos sentimos diferentes, eu
acho que ontem eu me sentia um pouco estranha, mas
hoje eu estou completamente feliz.
Entro em seu apartamento, acho que consigo
achar seu quarto, o lugar está limpo e Super
organizado, mas logo que atravesso a sala vejo parada
perto do blindex a figura alta e magra, com cabelos
negros, ela usa um conjunto composto por uma calça
cintura alta e uma cropped branca, congelo.
E ela se vira para mim, e seus olhos verdes estão
em mim nesse momento. Eu não faço a menor ideia de
quem seja essa mulher de olhos verdes que me olha
com um celular grudado na orelha, ainda que esses
cabelos escuros e longos não sejam muito estranhos...
—Olá, Ana.
Reconheço essa voz imediatamente.
Safira!
Fim?
Fico paralisada por alguns momentos.
O olhar de Safira Handerson se mostra
desconfiado, depois ela se move e indica o sofá para
que eu me sente, eu sinceramente não quero ter que
ficar, aperto a chave que trouxe na minha mão, e sinto
vontade de dar meia volta e ir para o meu apartamento,
para longe dela, porque dentro de mim, as palavras
queimam e voltam a ecoar na minha cabeça.
Baleia... enorme... Troço...
Quando elas ecoam em minha mente, o meu
coração começa a doer, mas isolo a dor, porque eu não
sei exatamente se devo ficar ou ir embora, ela dá a
impressão de que quer conversar comigo, e eu me sinto
realmente tentada a ir embora, mas e se ela talvez
quiser ter uma conversa pacifica comigo? Talvez esteja
preocupada com Mosés!
Vou até o sofá, mas parece que as minhas pernas
pesam toneladas, conforme me aproximo dela vejo seu
físico impressionante, ela é magra, bem magra, esguia,
cabelos negros e lisinhos, olhos verdes, boca pequena
e cheia, um nariz pequeno e afilado e maças do rosto
mais cheinhas, o rosto fino, Safira Handerson é uma
garota linda, perfeita, ela deve ser uns sete anos mais
nova que eu, acho.
Fico toda tensa quando Safira me olha de cima a
baixo.
—É, você não é feia!
Franzo a testa com a arrogância estampada em
sua voz, o sotaque forte que as vezes escuto na voz de
Mosés, e sufoco a vontade que tenho de ir embora,
Safira quer conversar comigo, e eu acho que já passou
da hora de conversamos pessoalmente, sem indiretas
para o Mosés, sem escutar atrás de portas e sem fugas,
até alguns dias atrás sai daqui destruída por causa das
palavras duras dela, isso ainda me machuca, mas eu
quero que as coisas fiquem bem claras entre nós,
porque bem ou mal ela é irmã do Mosés e iremos nos
casar em breve.
Terei que engolir Safira querendo ou não, nem
que suportar ela.
—Ah, ele te deu um anel! —Safira fala com tanto
deboche que começo a me irritar com o seu pouco
caso.
—Ele me pediu em casamento — respondo e
vejo que o sorriso se desfaz na boca dela. —Ele não te
falou que me pediu em casamento?
Ela se endireita no sofá preto, essa decoração até
combina com Safira, é etérea, chique, algo sofisticado
demais, olho para ela e só consigo quere muito estar
longe daqui, porque eu não combino com nada disso.
—Disse, mas achei que se tratasse de uma piada
—fala a última palavra com sequidão. —Afinal de
contas, Mosés é sempre bem imprevisível.
Eu não sei se concordo com ela ou se discordo,
sim, ele é um pouco imprevisível, mas não sei como é
o relacionamento de ambos para afirmar isso.
—Precisa saber algumas coisas sobre o meu
irmão, querida. — Ela fala e vou ficando dura no sofá.
— A primeira é que ele nunca se envolveu com uma
garota gorda antes.
Eu sei disso.
—A segunda é que ele não vai te levar tão a
sério quando enjoar de você, Mosés já enjoou de todas
as mulheres com quem se envolveu, e não foram
poucas.
Tenho desgosto ao ouvir isso, mas também não
poderia esperar que fosse diferente, porque ele disse
que havia tido dois relacionamentos mais sérios, mas
nunca chegou a dizer que não se envolveu sexualmente
com outras mulheres.
—O meu irmão gosta de mulheres bonitas e bem
arrumadas, confesso que o seu esforço para prender ele
nas suas garras está até surtindo efeito, mas acho que é
só até ele cansar de comer a mesma coisa sempre!
Safira tem cara de menina, mas a língua é afiada
como a língua— Senhor Senhor me perdoe pela
palavra— de uma puta.
—Ele já te comeu?
Ela é tão vulgar que se torna feia.
Sinto algo amargo na boca, e tenho, muita, muita
vontade de sair daqui, porque nunca me senti enojada
de alguém, e Safira é alguém que me faz experimentar
essa péssima sensação, ela me enoja com seu linguajar,
sua arrogância e seu preconceito.
—Isso não é da sua conta — falo com certeza
concreta.
—Você já deu o cú para ele?
Arregalo os olhos, Safira sorri com as pernas
cruzadas, os braços esticados no sofá, tão... relaxada!
Fico horrorizada com o que ela acabou de perguntar,
será que ela é louca? Não tem bom senso?
—Ele é comilão de rabo. — Seu sorriso é
branco e retinho, mas tão cheio de deboche e veneno
que ela ainda consegue ser feia aos meus olhos. — Ele
não te falou, não é verdade?
Meu coração começa a disparar, porque sinto,
que vou receber algum tipo de notícia muito ruim nesse
momento.
—Mosés nunca te contou o motivo de Bonnie ter
deixado toda a herança dela para ele? —pergunta ela e
passa a língua nos dentes de um jeito muito vulgar.
Nojenta!
Ela ri inclinando a cabeça para trás, sua risada é
cheia de maldade, me arrepio dos pés à cabeça, mas
Safira acha muita graça, parecendo tirar conclusões
hilárias sobre a minha reação.
—Impagável! — Safira soletra em seu ataque de
riso. — Ele não te contou mesmo?
Tenho medo de continuar a conversa, mas já
estou aqui, decidi ficar, vou conversar com ela.
—Não sei do que está falando, Bonnie não é a tia
adotiva de vocês? — pergunto realmente confusa.
Não é o mais natural que Bonnie Handerson
deixasse a fortuna para os dois sobrinhos adotivos ou
coisa assim?
— Ele não te contou, meu Deus! — Ela bate uma
palma seca e gargalha de forma descontrolada.
Me sinto ridicularizada, ainda que eu saiba que
ela não está rindo exatamente de mim, Safira se diverte
— macabramente — com a situação.
—Bonnie deixou a fortuna para o Mosés porque
ela era amante dele, porque ele comia ela desde que
ele tinha doze anos! — Safira despeja, ainda sorrindo,
ela limpa os cantos dos olhos tão feliz em falar isso. —
Ele comia ela enquanto Phell cuidava dos negócios
dela.
Fico dura, meu corpo todo endurece.
Meu coração vai ficando mais lento, e todo o
meu corpo vai entrando no transe das palavras, elas
ecoam em minha cabeça conforme foram ditas.
" porque ela era amante dele, porque ele comia
ela desde os doze anos".
E fico olhando para Safira, sentindo como se o
meu estômago desse uma volta enorme, tudo parece
sair do lugar enquanto meu corpo fica paralisado com
o choque da notícia.
Pisco depois de alguns momentos vendo a
diversão estampada no semblante de Safira.
—Ele comia ela! —repete ela com desprezo. —
Ele comia a própria mãe!
Não!
Não posso acreditar nisso!
Isso não é verdade!
Ele jamais faria isso.
Meu estômago esquenta e o meu coração dispara
com tanta força que fico tonta, me esforço para tentar
me mover, mas não consigo. O nojo é tão grande que
não consigo me conter, e coloco para fora tudo o que
comi.
Sinto nojo pelo o que ela falou.
—Eca! —Safira exclama fazendo uma careta de
nojo. — Sua nojenta!
Ela faz pouco de mim, crio forças e me levanto
do sofá.
E saio do apartamento sem olhar para trás, a
última coisa da qual me lembro quando entro no
elevador é de ouvir a risada de Safira Handerson
ecoando nos meus ouvidos, me encolho e solto um grito
de dor enquanto o elevador desce, e os meus gritos
podem ser ouvidos de longe.
A dor me toma por completo nesse momento.
Mosés mentiu para mim! Ele me enganou! Estou
destruída mais uma vez!