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O Enquadramento Do Bolsonarismo Pelo Programa Greg News: Oposição e Ironia

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https://doi.org/10.23925/1982-6672.

2024v17i49p221-251

O enquadramento do bolsonarismo pelo programa Greg


News: oposição e ironia
Vera Lucia Michalany Chaia1
ORCID: 0000-0001-5089-6720

Silvana Gobbi Martinho2


ORCID: 0000-0002-7052-7460

Arthur Gonçalves Spada3


ORCID: 0009-0006-3008-8455

Resumo: O presente artigo tem uma dupla preocupação: estudar e debater as


teorias que fundamentam o humor na política e, também, analisar a produção
221
brasileira recente do humor e compreender um tipo específico de ativismo
político que permite o aguçamento do conhecimento crítico. Para tanto iremos
analisar os programas Greg News veiculados no YouTube e no canal HBO pelo
ator, escritor e ativista Gregório Duvivier. Pretendemos compreender a agenda
setting, ou seja, quais temas estão presentes no contexto de produção de seus
programas e da reflexão, bem como o enquadramento das representações.

Palavras chaves: Greg News. humor. política. bolsonarismo. ativismo.

1
Professora do Departamento de Ciências Sociais, do Programa de Pós-Graduação em Ciências
Sociais, pesquisadora do Neamp (Núcleo de Estudos em Arte, Mídia e Política) da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo e do CNPq (Conselho Nacional de Pesquisa do Ministério de
Ciência e Tecnologia). [email protected]. http://lattes.cnpq.br/2351981436811918.
2
Doutora e Mestre em Ciência Política na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Pesqui-
sadora do Núcleo de estudos pós graduados em arte, mídia e política (NEAMP). silgmartinho@
gmail.com. http://lattes.cnpq.br/7143685356987408.
3
Graduação em Direito pela Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo (2012). Especializa-
ção em Direito Constitucional e Administrativo pela Escola Paulista de Direito (2018) e Ciência
Política pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (2020). Mestre em Ciências
Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2023), e pesquisador do Núcleo de
Estudos de Arte, Mídia e Política da PUC-SP. [email protected]. http://lattes.cnpq.
br/0006346629079183.

Aurora: revista de arte, mídia e política, São Paulo, v.17, n.49, p. 221-251, janeiro a junho 2024
O ENQUADRAMENTO DO BOLSONARISMO PELO PROGRAMA GREG NEWS (...) VERA LUCIA M. CHAIA, SILVANA G. MARTINHO E ARTHUR G. SPADA

Abstract: This article has a double concern: studying and debating the theories
that underlie humor in politics and, also, analyzing recent Brazilian humor
production and understanding a specific type of political activism that allows
the sharpening of critical knowledge. To do so, we will analyze the Greg News
programs broadcast on YouTube and the HBO channel by actor, writer and
activist Gregório Duvivier. We intend to understand the agenda setting, that 222
is, which themes are present in the context of production of its programs and
reflection, as well as the framing of representations.

Keywords: Greg News. humor. policy. Bolsonarism. activism.

Aurora: revista de arte, mídia e política, São Paulo, v.17, n.49, p. 221-251, janeiro a junho 2024
O ENQUADRAMENTO DO BOLSONARISMO PELO PROGRAMA GREG NEWS (...) VERA LUCIA M. CHAIA, SILVANA G. MARTINHO E ARTHUR G. SPADA

Resumen: El presente artículo tiene una doble preocupación: estudiar y debatir las
teorías que fundamentan el humor en la política y, también, analizar la reciente
producción brasileña de humor y comprender un tipo específico de activismo
político que permite agudizar el conocimiento crítico. Para ello, analizaremos
los programas Greg News transmitidos en YouTube y en el canal HBO por el
actor, escritor y activista Gregorio Duvivier. Pretendemos comprender la agenda
setting, es decir, qué temas están presentes en el contexto de producción de sus 223
programas y de la reflexión, así como el encuadre de las representaciones.

Palabras-clave : Greg News. humor. política. bolsonarismo. ativismo.

Aurora: revista de arte, mídia e política, São Paulo, v.17, n.49, p. 221-251, janeiro a junho 2024
O ENQUADRAMENTO DO BOLSONARISMO PELO PROGRAMA GREG NEWS (...) VERA LUCIA M. CHAIA, SILVANA G. MARTINHO E ARTHUR G. SPADA

O artigo tem como preocupação estudar e debater as teorias que fundamentam o


humor na política, e analisar a produção brasileira recente do humor apresentada
na televisão e na Internet. Pretende-se, desta forma, dar significação a um tipo
específico de ativismo político que permite o aguçamento do conhecimento crítico.
Tal interesse nesta área é oriundo da incipiente produção na Ciência Política. Para
tanto iremos analisar os programas veiculados no YouTube e na Televisão, pelo
ator, escritor e ativista Gregório Duvivier, intitulados: Greg News. Ao analisar
este ator, humorista, pretendemos compreender a agenda setting, ou seja, quais
temas estão presentes no contexto de produção de seus programas e da reflexão,
bem como o enquadramento das representações. O artigo analisará os programas
que envolvem o ex-presidente Jair Bolsonaro, e alguns de seus apoiadores: Ricardo
Salles, ex-ministro do Meio Ambiente, Carla Zambelli, deputada Federal, Bia
kicis, deputada federal, Aline Sleutjes, ex-deputada federal, Roberto Jefferson,
ex-deputado federal, Sérgio Moro, ex-ministro da Justiça e reconhecido pela
atuação na Operação Lava-Jato.
Recuperando a discussão sobre a Comunicação Política, podemos afirmar
que é uma área em fortalecimento e expansão dentro das Ciências Sociais,
envolvendo estudos interdisciplinares, que têm como preocupação analisar, os 224
processos políticos e as pesquisas sobre as eleições, objetivando compreender a
criação das imagens de realidades políticas e/ou candidatos, partidos políticos.
Visam também estudar as ações de comunicação que podem adotar distintas
mensagens, como os debates políticos, a publicidade política, as mensagens
informativas e as que envolvam o humor político e os talk-shows.
Maria José Cánel (1999: 230) aborda e enfatiza no seu livro sobre
Comunicação Política as várias áreas de trabalhos desta temática: estudos que
se centram nas ações de comunicação, isto é, nas distintas formas que pode
adotar a mensagem da Comunicação Política: debates políticos – organização,
desenvolvimento e efeitos dos debates políticos; publicidade política, que inclui
os conteúdos (aspectos visuais e textuais), as questões jurídicas e os efeitos da
mensagem publicitária nos cidadãos; mensagens informativas dos eventos
político-comunicativos que remete a rodas de imprensa ou resumos de imprensa
das instituições; mensagens de ficção que remete ao humor político ou os
talk shows; além de analisar a cobertura que os meios de comunicação dão às
instituições políticas ligadas ao Poder Executivo, como também ao Legislativo e
ao Poder Judiciário.

Aurora: revista de arte, mídia e política, São Paulo, v.17, n.49, p. 221-251, janeiro a junho 2024
O ENQUADRAMENTO DO BOLSONARISMO PELO PROGRAMA GREG NEWS (...) VERA LUCIA M. CHAIA, SILVANA G. MARTINHO E ARTHUR G. SPADA

A abordagem teórico-metodológica a ser adotada para analisar esta forma


de humor, será o que Shaw afirma sobre a hipótese do agenda-setting:
em consequência da ação dos jornais, da televisão e dos outros meios
de informação, o público sabe ou ignora, presta atenção ou descura,
realça ou negligência elementos específicos dos cenários públicos.
As pessoas têm tendência para incluir ou excluir dos seus próprios
conhecimentos aquilo que os mass media incluem ou excluem do seu
próprio conteúdo. Além disso, o público tende a atribuir àquilo que
esse conteúdo inclui uma importância que reflete de perto a ênfase
atribuída pelos mass media aos acontecimentos, aos problemas, às
pessoas. (SHAW apud WOLF, 1994: 130).
Wolf analisa a hipótese da agenda-setting e aponta quatro fases nos
meios de comunicação: (1) fase de focalização, que colocam em 1º plano um
acontecimento, uma ação, um grupo, uma personalidade; (2) fase do framing onde
o objeto focalizado pela mídia possui um determinado enquadramento, e deve ser
analisado a partir de um quadro interpretativo; (3) fase em que a mídia associa
acontecimentos a uma vivência constante e, no caso, o objeto se torna parte de
um panorama social e político reconhecido; (4) fase em que o tema adquire peso
e indivíduos se tornam seus porta-vozes e comandam a atenção da mídia (WOLF,
225
1996). Portanto, o pressuposto básico do agenda-setting é que, se os indivíduos
não possuem um repertório próprio sobre um determinado tema, recebem esses
conhecimentos e assimilam a realidade social por meio do prisma dos mass media.
Na avaliação de Fernando Antonio Azevedo (2002):
ideia-força implícita na noção de agenda-setting é a de que: (1) a
mídia ao selecionar determinados assuntos e ignorar outros define
quais são os temas, acontecimentos e atores (objetos) relevantes
para a notícia; (2) ao enfatizar determinados temas, acontecimentos
e atores sobre outros estabelece uma escala de proeminência entre
esses objetos; (3) ao adotar enquadramentos positivos e negativos
sobre temas, acontecimentos e atores constrói atributos (positivos ou
negativos) sobre esses objetos: (4) há uma relação direta e causal entre
as proeminências dos tópicos da mídia e a percepção pública de quais
são os temas (issues) importantes num determinado período histórico.
(AZEVEDO, 2002:11)
Portanto, além de definir o que se deve pensar, envolvendo uma
“construção social da realidade”, define-se como pensar, com a incorporação da
noção de enquadramento. Esta noção pressupõe uma ênfase no tom da notícia e
um determinado enfoque preferencial estabelecido pela seleção das fontes e pelo
aspecto privilegiado da matéria.

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O que observamos é que existe um vínculo entre a sequência das conjunturas


políticas e da agenda política brasileira, gerando novos temas de pesquisas na área
de Comunicação Política. Com a criação de novas ferramentas a serem utilizadas
na Internet é que a disseminação das informações, a mobilização e a participação
política ganham outras formas de ação, agora amplificadas com os blogs, com o
Twitter e com o Instagram e Facebook. Os processos de transformação tecnológica
e de comunicação provocam novas formas de participação, de convocação política
e de mobilizações populares.
Os autores Zepeda, Franco e Preciado, professores da Universidade de
Guadalajara, analisaram “o uso do humor como parte das estratégias de persuasão
na liderança e na política, em geral, e nas campanhas eleitorais em particular.
Aborda-se também o estudo das funções desempenhadas pelo humor nas
campanhas eleitorais e as razões pelas quais este é usado como parte de estratégias
para convencer os eleitores”4
Buscando traçar um mapeamento da produção de pesquisas sobre a relação
humor e política, estes três autores destacam que:
Dentro da arena política, não é necessário dizer que há poucos estudos
226
sobre o uso do humor como estratégia de persuasão em campanhas
eleitorais ou como recurso para alcançar o poder. Sobressai o trabalho
de Lopez (2008), que encontrou no humor um recurso simbólico de
poder, que faz parte do capital cultural e gera um empoderamento
da pessoa que o utiliza corretamente. Enquanto isso, Tsakona (2009)
estudou o uso do humor no discurso parlamentar, analisando o caso
da Grécia, lembrando que ele tem sido utilizado como parte das
estratégias para atacar o inimigo, para garantir informalidade aos
processos parlamentares ou para criar uma identidade única para os
seus promotores. Finalmente, há as obras de Vasil Evich (2005) sobre
humor político e a análise da sua utilização ao longo da história como
parte do processo político e a de Bippus (2007) sobre a eficácia do uso
do humor como parte do debate político e sobre o uso de humor nas
campanhas eleitorais e seus efeitos sobre o público.” (2014: 03)

Na concepção de Zepeda, Franco e Preciado:


O humor sempre acompanhou a política. Desde os tempos antigos,
o humor foi usado como parte das estratégias satíricas e irônicas do
povo para criticar os maus governos. Assim, por um longo tempo,

4
Andrés Valdez Zepeda; Delia A. Huerta Franco; Octavio Adolfo Perez Preciado - O humor
na estratégia de persuasão durante as campanhas eleitorais, Revista Brasileira de Ciência Políti-
ca, no.13 Brasília Apr. 2014, - página 1.

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os comediantes foram perseguidos pelo poder político estabelecido.


Depois, o humor foi usado como parte das estratégias das elites
dominantes para entreter e agradar as pessoas ou dissuadi-las de
criticar o poder estabelecido (2014: 02)5.

Elias Saliba, um dos mais significativos pesquisadores sobre o humor,


problematiza o humor como parte essencial da natureza humana, instrumento
a serviço da perpetuação da espécie ou um produto cultural mutável no tempo,
fluido e historicamente gerado. E afirma que apesar da amplitude do debate,
tornar o humor objeto de estudo passou a percorrer a agenda de várias disciplinas
com cruzamentos interdisciplinares tão inusitados e surpreendentes quanto o
próprio tema do riso e do humor.” (SALIBA, 2017: 3)
Neste sentido, Saliba realça as relações entre natureza humana e dimensão
sociocultural que estão na base de uma perspectiva interdisciplinar para abordar
o humor. E, assim, continua o autor:
O humor, ainda que assuma muitas formas diferentes, não pode ser
reduzido a uma única regra ou fórmula. Em vez disso, devemos vê-lo
como um processo de resolução de conflitos. Neste sentido, o humor é
um processo, não uma visão ou um comportamento. É o resultado de
uma batalha em nosso cérebro entre os sentimentos e os pensamentos, 227
uma batalha que só pode ser compreendida ao se reconhecer o que
causou o conflito. Noutros termos, o humor às vezes é a única forma
de lidar com o turbilhão da vida.” (SALIBA. 2017:.9) ...o humor é
um produto cultural mutável no tempo, fluido e historicamente
gerado? (SALIBA, 2017:10).

O humor pode ser classificado em determinadas categorias: paródia,


crítico, político, satírico, grotesco e banalizador. A dissertação de mestrado de
Silvana Gobbi Martinho6, que estudou as novas formas de humor presentes na
Internet nas eleições de 2006. Para tanto, acompanhou os candidatos Geraldo
Alckmin, Heloisa Helena e Luiz Inácio Lula da Silva nas animações criadas por
Maurício Ricardo Quirino no site Charges.com. A autora analisa o que define
como “Paródias Animadas”, visto que, no campo do áudio visual apropria-
se de elementos das charges e das tirinhas para se apresentar como algo novo,

5
Andrés Valdez Zepeda; Delia A. Huerta Franco; Octavio Adolfo Perez Preciado - O humor
na estratégia de persuasão durante as campanhas eleitorais, Revista Brasileira de Ciência Políti-
ca, no.13 Brasília Apr. 2014, - página 2.
6
Silvana Gobbi Martinho. Humor e Política: na dinâmica das novas tecnologias. 2010. Disser-
tação (Mestrado em Ciências Sociais) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Conselho
Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

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recuperando os temas presentes naquelas eleições e o enquadramento, além de


reproduzir e analisar alguns diálogos criados pelo Maurício Quirino.
A paródia corresponde à recriação de um texto no qual se colocam
novos movimento nas formas definidas. Ela não é a imitação de
algo, uma vez que ocorre uma repetição alargada de consciência
crítica, uma abordagem criativa com intencionalidade. (Martinho,
2010: 74)

Para a autora, o humor político/crítico visa denunciar ou desqualificar


determinadas atitudes e atores políticos, atuando como arma de ataque e não de
defesa com relação ao tema da política. O humor satírico, segundo Martinho,
“subverte uma visão dominante por meio da ironia”. Ele faz a representação de
uma ideia, atitude ou opinião, para em seguida, desmontá-lo pelo absurdo ou pelo
ridículo (Martinho, 2010: 82).
Ainda na linha da representação das lideranças políticas pela linguagem
humorística, Silvana Martinho (2021), na tese de doutorado7, analisou as
charges publicadas nas páginas A2 do jornal Folha de S. Paulo, entre 1994 e
2016 durante um período de certa estabilidade democrática, dos respectivos
presidentes eleitos, foram: Fernando Henrique Cardoso (1994 – 2002), 228
Luiz Inácio Lula da Silva (2003 – 2010) e Dilma Rousseff (2011 – 2016),
representaram as características de liderança política, as principais metáforas
utilizadas e o que elas podem indicar sobre o mais alto cargo em uma República,
mesmo que em diferentes conjunturas políticas.
De acordo com a autora, em um contexto da democracia de público,
alicerçado pelas tecnologias de comunicação e informação, a forma como a
imagem da liderança aparece para o eleitor é um elemento fundamental para a
manutenção do poder, e o resultado é a busca por uma visibilidade que garanta
ao governante uma construção positiva de sua atuação política. Na contramão
do controle dessa visibilidade, as charges do jornal Folha S. Paulo, entre 1995 e
2016, atuaram conforme afirmações de Lima (1963), escarnecendo, desmascarando
e desacreditando as pretensões das lideranças políticas. Por sua vez, o humor
banalizador goza de si mesmo e podemos afirmar que domina o “riso pelo riso”.

7
Martinho, Silvana Gobbi. Sorrisos Desconfortáveis: a representação da liderança política por
meio de charges do jornal Folha de S. Paulo. 2021. Tese (Doutorado em Ciências Sociais) – Pro-
grama de Estudos Pós Graduados em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, SP

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Patrícia Cristina de Lima8, defendeu sua dissertação em 2017 sobre a


“Porta dos Fundos: humor e política nas webséries brasileiras”. A autora analisou
os conteúdos desta websérie no período do mandato da presidente Dilma Rousseff
– 2013 a 2016. Além de estudar os temas presentes neste período, a autora
selecionou alguns episódios e transcreveu as cenas e os diálogos.
No contexto das Novas Tecnologias de Informação e Comunicação
(NTICs), a pesquisa desenvolvida pelo professor Viktor Chagas (2020), afirma
que os Memes, compreendidos em sua dimensão teórica, aparecem como um
elemento chave para o entendimento do processo político contemporâneo, que
por sua capacidade de utilizar a retórica e a persuasão, lidam com questões
multifacetadas do debate político.
Por fim, mas distante de encerrar o assunto, cabe destacar o trabalho
de João Paulo Capelotti sobre o humor em diálogo com as questões jurídicas.
No livro “O humor e os limites da liberdade de expressão” (2021), o autor
sistematiza a jurisprudência sobre casos que envolvem a questão do humor, com
a sistematização das diretrizes emanadas dos julgamentos, assim como a crítica
ao mesmo. 229
Nesse sentido, a partir dessa revisão bibliográfica das temáticas que
atravessam as questões em torno do humor, considera-se importante ampliar o
debate em torno das questões da Agenda Setting e do enquadramento em diálogo
com o humor a partir do programa Greg News.

Programa GREG NEWS

O programa Greg News de Gregório Duvivier, foi criado na HBO em 2017


sendo finalizado em 2024, e trabalha com temas sensíveis para a política nacional
e pode ser classificado como um late-show satírico. Um tipo de programa de
variedades de origem estadunidense, na qual o apresentador que ocupa a bancada
e faz monólogos de temas do cotidiano de forma crítica a partir do uso do humor.
Pode conter entrevistas, atrações musicais ou esquetes humorísticos. Um exemplo
bem-sucedido no Brasil é o caso de Jô Soares que, por anos, apresentou esse tipo
de programa em duas das maiores emissoras do país, SBT e Rede Globo. No

8
Patrícia Cristina de Lima. Porta dos Fundos: Humor e polítca nas webséries brasileiras. 2017.
Dissertação (Mestrado em Comunicação) - Universidade Paulista.

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caso do Greg News, a inspiração direta é o programa Last Week Tonight with John
Oliver, que também é exibido pela emissora de televisão por assinatura HBO.
Além da apresentação de Gregório Duviver, o programa tinha nos postos chave
de sua equipe profissionais cuja atuação extrapolava os limites do audiovisual e da
comunicação, revelando um verdadeiro engajamento em questões sociais. Assim,
ao contrário de se apresentar como um programa jornalístico que se pretende
isento de opiniões, por vezes demarca de maneira bastante evidente quais são as
posições defendidas.
A direção geral do programa era de Alessandra Orofino. Cientista política
e economista, Orofino é uma das fundadoras, junto com o também cientista
político Miguel Lago, da organização social Nossas, voltada para a promoção de
tecnologias, táticas e estratégias de mobilização ligadas à promoção da democracia
e da solidariedade. Ao longo de sua carreira, dirigiu diversos vídeos para o The
New York Times, dentre estes a entrevista dada pelo youtuber Felipe Neto para o
jornal estadunidense. Como ativista, também está ligada a diversas organizações
internacionais, como a Meliore Foundation e Purpose. Em 2019 passou a fazer
parte da Obama Foundation Fellows, e em 2022 integrou a equipe de transição
do governo federal, ligada ao Ministério das Comunicações do Brasil. 230
A editoria chefe do programa se dividia entre Bruno Torturra e Denis Russo
Burgierman. Torturra tem sua trajetória destacada na comunicação e no ativismo
político e, um dos grandes projetos que teve a sua participação foi o Mídia Ninja.
O grupo, cujo nome é um acrônimo de “Narrativas Independentes, Jornalismo e
Ação” se autodenominava uma rede de comunicação livre e surgiu nos protestos
de junho de 2013, devido a cobertura em tempo real dos protestos feitas por
cinegrafistas independentes e disponibilizadas na internet (DINIZ, 2013). Munidos
de um celular com câmera, a Mídia Ninja realizava a cobertura das manifestações
e apresentava pautas que eram ignoradas pela mídia tradicional. As transmissões
chegaram a contar com picos de 150 mil acessos diários (DINIZ, 2013).
Torturra desempenhava ao lado de Pablo Capilé a articulação da iniciativa.
Este último, conhecido por ser o idealizador do coletivo Fora do Eixo, coletivo
artístico que possuía diversas casas de cultura ao redor do país, realizava festivais
de música independentes e chegou a manter diversas unidades pelo Brasil que
serviam ao mesmo tempo de residência para profissionais e espaços multiculturais.
Em 05 de agosto de 2013 ambos foram entrevistados no programa Roda
Vida da TV Cultura. Na ocasião, um dos debates que se fazia sobre o trabalho

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desenvolvido pelo grupo era se ele poderia, de fato, ser considerado como
jornalismo, na medida em que o foco era transmissão de narrativas subjetivas sem
qualquer tipo de edição e de checagem das informações, com muitos dos ninjas
sendo participantes e protagonistas dos fatos veiculados e não apenas os expondo
(ALMEIDA, 2013). Ao longo da entrevista, Torturra defendeu que, por ser fruto
de um trabalho organizado e com compromisso diário, que se apresentava como
um veículo de informação, o trabalho do Mídia Ninja deveria ser considerado
como jornalístico (TORTURRA, 2013).
Já Denis Russo Burgierman foi diretor de redação da revista
Superinteressante da Editora Abril e colunista de diversos outros veículos, como
Nexo Jornal, Veja.com e Época, Burgiermann é autor dos Livros “O Fim da Guerra”,
que trata da questão da batalha contra as drogas ao redor do mundo e “Piratas
no Fim do Mundo”, que relata uma expedição à Antártica junto com ativistas. O
jornalista também possui uma atuação ativista, tendo, por exemplo, participado
em 2009 da fundação do projeto Webcitizen, que pretende o engajamento
cidadão por meio da internet, feito parte da rede “Pense Livre São Paulo” – ligada
à promoção de uma nova política de drogas - e do conselho da organização “Minha
Sampa”, também voltada para o engajamento social9. Em 2020 foi processado 231
por Luciano Hang após declarações no Programa Morning Show da Jovem Pan,
no qual comentou a condenação judicial sofrida por Gregorio Duvivier em razão
de um tweet feito por este contrário a Hang10. Na ação, sua defesa demonstrou
a atuação do empresário contra diversos jornalistas e meios de comunicação, o
que, inclusive, foi noticiado pela ABRAJI e outras entidades de classe ligadas
ao jornalismo. Buergierman também participou do Curso Online de Filosofia de
Olavo de Carvalho e escreveu sobre a experiência na Revista Época11. Carvalho e
Hang são personagens citados com frequência no programa Greg News, dada a
sua atuação política e próxima ao governo Bolsonaro.
Ainda que o programa toque em temas controversos e retrate a atuação
de diversos atores da vida política nacional, foram poucas as vezes que este foi

9
REDAÇÃO. Denis Russo Burgiermann. Portal dos Jornalistas, 2017. Disponível em: https://
www.portaldosjornalistas.com.br/jornalista/denis-russo-burgierman/ Acesso em 14 de fevereiro
de 2024.
10
Processo n.º 1109930-29.2020.8.26.0100 em trâmite perante a 3ª Câmara de Direito Privado
do Tribunal de Justiça de São Paulo.
11
BUERGIRMAN, Denis Russo. O curso de Olavo de Carvalho, o artista da ofensa. Época,
2019. Disponível em: https://oglobo.globo.com/epoca/o-curso-de-olavo-de-carvalho-artista-da-
-ofensa-23521208, acesso em 14 de fevereiro de 2024.

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acionado judicialmente e, quando isso se deu, foi por ações de particulares daqueles
que se sentiram ofendidos pelas falas no programa. Nunca houve qualquer tipo de
atuação direta estatal, via Ministério Público, por exemplo, contrária ao conteúdo
exibido no programa. São três os processos que envolvem o programa, tendo sido
acionado tanto o apresentador Gregório Duvivier, quanto a emissora, HBO Brasil.
Todas as ações tramitaram perante o Poder Judiciário de São Paulo. A primeira
ação, foi movida pelo investidor Rafael Ferri, em razão do episódio “Day Trade”
de 21 de agosto de 2020, na qual pretendia a reparação de danos de ordem moral,
bem como a retratação por falas feitas no programa. Em sentença, o pedido foi
julgado improcedente, tendo sido reconhecido não ter havido extrapolação dos
limites de liberdade de expressão pelo programa e seu apresentador12.
O segundo processo foi movido pela Rádio Jovem Pan13, buscando
o direito de resposta contra o programa, em razão do episódio número 24 da
temporada de 2021, na qual a rádio foi o tema central. Em primeira instância,
o juiz identificou que o tom satírico e crítico do programa não eram suficientes
para se deduzirem afrontas à imagem da Rádio Jovem Pan. Entretanto, em razão
de um recurso da emissora, o Tribunal de Justiça de São Paulo compreendeu que 232
o pedido era cabível e determinou que o programa apresentasse o texto resposta
da rádio, num prazo de 10 dias. O entendimento que prevaleceu foi no sentido
de que o episódio apresentou críticas bastante duras à emissora de rádio e, além
disso, parte das informações ventiladas - como o encontro do dono da emissora
com o então Ministro das Comunicações, Fábio Faria - não foram comprovadas
como verídicas pelo programa. Também corroborou para o entendimento
proferido pelos desembargadores o fato de que o direito de resposta não impediria
a manutenção da veiculação do episódio, ou representaria qualquer restrição
ao seu conteúdo, mas apenas garantiria o direito de manifestação da emissora
retratada (SÃO PAULO, 2022). Antes do fim do prazo, contudo, e em virtude de
recurso ao Supremo Tribunal Federal por parte de Duvivier e da HBO Brasil, a
determinação quanto à resposta foi suspensa e o processo ainda não foi encerrado.

12
Processo n.º 1094229-28.2020.8.26.0100 tramitou perante a 38ª Vara Cível do Foro Central de
São Paulo e perante a 8ª Câmara de Direito privado do Tribunal de Justiça de São Paulo, já tendo
transitado em julgado.
13
Processo n.º 1127414-23.2021.8.26.0100 em trâmite perante a 10ª Câmara de Direito Privado
de São Paulo.

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O ENQUADRAMENTO DO BOLSONARISMO PELO PROGRAMA GREG NEWS (...) VERA LUCIA M. CHAIA, SILVANA G. MARTINHO E ARTHUR G. SPADA

A terceira ação judicial14 foi movida pelo pecuarista Antônio José Junqueira
Vilela Filho, pelas informações ventiladas no episódio “Em Defesa do Agro”,
segundo programa da temporada de 2022. O programa trouxe a tona acusações
contra Vilela Filho, relativas ao seu suposto envolvimento com a grilagem de terras
públicas e desmatamento ilegal. Em sentença, a emissora e o apresentador foram
condenados a pagar indenização no importe de R$100.000,00, sob o fundamento
de que a livre manifestação do pensamento não eximia a responsabilidade de
reparar os danos causados, mormente quando não dado direito de manifestação
ou resposta ao acusado (SÃO PAULO, 2023). Todavia, em recurso, o Tribunal
de Justiça de São Paulo reformou a sentença e afastou a condenação. Um dos
principais fundamentos adotados no Acórdão foi o de reconhecer que não se trata
de um programa jornalístico propriamente dito, apenas de cunho informativo,
mas que este possui um humor crítico, cujo traço satírico permite maior
elasticidade da liberdade de expressão. Além disso, as acusações de fato existiam
e foram ventiladas na mídia em geral, como eram objeto de processos em trâmite
(SÃO PAULO, 2023). Ainda pende a apreciação de recursos para os tribunais
superiores, de modo que o processo ainda não foi encerrado. Em suma, até o 233
presente momento nenhum episódio do programa foi retirado oficialmente do ar
por questões legais, ou teve seu conteúdo restringido de qualquer maneira.
Ao analisar Gregório Duvivier, pretendemos compreender a agenda
setting, ou seja, quais temas estão presentes no contexto de produção de seus
programas e da reflexão, bem como o enquadramento das representações. Para
Gregório Duvivier, um dos criadores do Porta dos Fundos, o direito de rir da
política e dos políticos do Brasil está bastante restrito. “A elite [do Brasil] não
tem esse hábito de rir de si mesma. Se você ri de quem tá no poder, a pessoa tem
o poder de te processar. Se vai rir de um político, você tem que trocar o nome do
político para brincar com ele”, afirma (Tá rindo do quê? As histórias cruzadas do
humor e da ..política em um país que se assumiu chato - https://tab.uol.com.br/
edicao/humor-politica/#page1.
A partir de uma análise preliminar dos programas constata-se que abordam
temas estruturais da realidade da política brasileira, sob a capa do humor. É válido
ressaltar que o estudo proposto compreende o humor a partir do sentimento do

14
Processo n.º 1087330-43.2022.8.26.0100 em trâmite perante a 1ª Câmara de Direito Privado
do Tribunal de Justiça de São Paulo.

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O ENQUADRAMENTO DO BOLSONARISMO PELO PROGRAMA GREG NEWS (...) VERA LUCIA M. CHAIA, SILVANA G. MARTINHO E ARTHUR G. SPADA

contrário, em consonância com a definição de Pirandello (1996), que afirma ser o


humor a própria reflexão.
Na concepção de toda obra humorística, a reflexão não se esconde,
não permanece invisível, isto é, não permanece quase uma forma do
sentimento, quase um espelho no qual o sentimento se mira; mas
se lhe põe diante, como um juiz; a analisa-o desligando-se dele;
descompõe sua imagem; desta análise, desta decomposição, porém,
surge e emana um outro sentimento: aquele que poderia chamar-se,
e que eu de fato chamo o sentimento do contrário. (PIRANDELLO,
1996:132)

A partir das reflexões de Pirandello (1996), compreende-se o humor como


um processo de resolução de conflito, como uma disputa em nossas mentes entre
sentimentos e pensamentos. Para entender essa disputa no programa Greg News,
é preciso identificar as categorias, foram analisados, entre 2017 e 2023, cento e
setenta e dois (172) programas, que podem ser classificados em temáticas políticas,
atravessando dez (10) categorias. São elas: (1) meio ambiente; (2) violência policial;
(3) formação de opinião pública; (4) ator político; (5) Pandemia – quarentena,
rebanho, subnotificação, profissionais de saúde, (6) Ciência; (7) comportamento
político; (8) corrupção; (9) cotidiano, (10) políticas públicas. 234

Dentre essas categorias, buscou-se identificar quais atores políticos foram


temática central do programa e percebeu-se que Michel Temer, Renan Calheiros,
Rodrigo Maia, Marcelo Crivella, Gilmar Mendes, Jair Bolsonaro, Marielle Franco,
Luiz Inácio Lula da Silva, Sérgio Moro, Wilson Witzel, Damares, Ricardo Salles,
Carla Zambelli, Arthur Lira, Roberto Jefferson, Geraldo Alckmin e Javier Milei.
A análise se centrou nos programas que envolvem o ex-presidente
Jair Bolsonaro e parte de seus apoiadores, daquilo que se convencionou como
movimento bolsonarista. A escolha dos episódios se deu para contemplar o
político que era tido como antissistema e que alcançou a chefia do Executivo,
enquanto liderança dessa onda conservadora e crítica do sistema democrático (Jair
Bolsonaro); um apoiador do campo político e que aderiu a sua agenda e forma
de fazer política (Roberto Jefferson), ainda que não estivesse exercendo qualquer
cargo institucional no período; um ministro de estado, cuja atuação encampava
a agenda bolsonarista ligada ao desmonte das políticas ambientais e ao avanço
do agronegócio (Ricardo Salles); figuras chaves para que essa agenda bolsonarista
pudesse avançar perante o Congresso Nacional (Carla Zambelli, Bia Kicis e

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O ENQUADRAMENTO DO BOLSONARISMO PELO PROGRAMA GREG NEWS (...) VERA LUCIA M. CHAIA, SILVANA G. MARTINHO E ARTHUR G. SPADA

Aline Sleutjes) e, por último, um apoiador que se voltou contra o movimento


bolsonarista, ao mesmo tempo que passou a ser atacado por este (Sérgio Moro).
No formato adotado pelo programa, ao lado do apresentador sentado na
bancada jornalística são frequentemente exibidas imagens com fontes de onde as
informações veiculadas foram extraídas, sejam da mídia impressa ou eletrônica, o
que revela que o roteiro possui base fática que sustenta a argumentação trazida.
Embora personalidades já tenham acusado o programa de dar informações
inverídicas15, este frequentemente se baseia em matérias e fontes citadas ao longo
dos episódios. Assim, as trajetórias – atuais ou passadas – das lideranças citadas
são retratadas, sobremaneira, à luz daquilo que a imprensa já trouxe acerca de
determinada figura política.

Jair Bolsonaro

O programa com título referência direta ao ex-presidente Jair Bolsonaro, foi


publicado no dia 06 de julho de 2018, mas é válido ressaltar que a críticas e
problematizações ao mesmo em outros programas foram presentes, principalmente
235
durante o mandato, com títulos como “Vagabundo”, “Rebanho”, “Covardia” ou
“Chora Mais” apareceram com frequência.
Em “Vagabundo”, por exemplo, Greg começa o programa com a definição
da palavra e seu paradoxo de acepção que como delinquente e bandido ficou muito
forte nos dias de hoje no Brasil, nesse sentido ficou onipresente no repertório
dos conservadores e no de Bolsonaro, nesse episódio ainda, as questões em torno
do patrimonialismo e a indicação de funcionários vinculados a família como
assessores, como a primeira ex-cunhada. “Chora Mais”, programa em referência
à vitória de Lula na eleição de 2022, a problematização central perpassava a
continuidade do programa que cobriu os seis anos de Brasil (2017 – 2022) entre
Temer e Bolsonaro, ao lado da dificuldade em lidar com a vitória.
Mas, a escolha desse artigo compreendeu em descrever aqueles que fazem
referência no título. O vídeo, intitulado Bolsonaro, inicia-se com a seguinte frase:
“O programa de hoje foi feito para alguém muito específico, foi

15
Durante as eleições gerais de 2022, Ciro Gomes foi tema de um dos programas e este, por sua
vez, respondeu com um vídeo em seu próprio canal de Youtube, onde acusou o Greg News de
veicular notificas falsas sobre sua carreira e trajetória política. Especialmente porque havia sido
informado que Gomes foi afastado do governo do presidente Itamar Franco, quando este perma-
neceu até o final da gestão, o que foi corrigido posteriormente por Duvivier.

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feito para você eleitor de Bolsonaro. Sim, eu sei que você me odeia,
quem eu quero enganar? Sim, você me odeia porque eu sou um
maconheiro socialista de iphone, financiado pela Lei Rouanet e que
se gosta tanto de Cuba deveria morar lá. Mas, temos uma coisa em
comum: eu também odeio você.” (GregNews, 06.07.2018)
A comicidade que parte do recurso de linguagem irônico é presente no
episódio desde o primeiro segundo e acompanhada, ao longo da fala de Greg,
pelas pausas próprias ao programa que ressaltam os risos da plateia. O objetivo
desse episódio, que foi ao ar quando a campanha eleitoral estava começando a
ser desenhada, era problematizar o voto do eleitor do Bolsonaro e para isso o
roteiro demarca os pontos divergentes de compreensão moral entre o apresentador
e o eleitor e reafirma a impossibilidade de mudança de opinião frente a alguma
informação nova, mas sim devido as suas compreensões morais. Assim, conclui
que o eleitor de Bolsonaro fará isso pois busca dar um jeito no Brasil e retoma a
conjuntura brasileira como os investimentos na Copa do Mundo, a derrota de 7x1,
a crise econômica, as reformas de Temer, entre outros. E que tem quatro pontos
centrais que incomodam o eleitor de Bolsonaro quando o assunto é o Brasil, são
eles: (1) corrupção; (2) segurança; (3) economia liberal e (4) franqueza.
236
Quando a preocupação com corrupção é determinante para o eleitor e
que o Bolsonaro parece ser o mais diferente dos políticos em disputa entre PT
e PSDB, Greg destaca que nos últimos trinta anos ele esteve no partido mais
envolvido em casos de corrupção. Quando a principal questão é a segurança e,
portanto, a crença de que Bolsonaro é a autoridade ideal para solucionar esse
problema no Brasil, devido ao discurso favorável a pena de morte e a defesa ao
porte de armas, Greg retoma dados da violência nos EUA, assim como as ações
da intervenção do exército no Rio de Janeiro e como o índice de violência não
foi reduzido. Quando a escolha política está relacionada à economia, Greg afirma
que Bolsonaro está longe de ser um liberal, e que para provar resgata um discurso
pró Chaves e Maduro, além de querer aumentar o número de Ministros, ao lado
do resgate de um vídeo no qual Bolsonaro afirmar sua descrença ao plano Real.
Quando o voto em Bolsonaro está relacionado à franqueza do mesmo e como essa
qualidade poderia ser um bom representante para o Brasil, resgata novamente
falas e vídeos com discursos homofóbicos, misóginos e racistas, além de defender
a tortura.
No último quadro, ele clama pelo eleitor do Bolsonaro refletindo sobre a
impossibilidade de todos os eleitores de Bolsonaro serem homofóbicos, misóginos

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e racistas e por isso a cada motivo possível para votar em Bolsonaro deveria ter um
outro candidato. Ilibado: Marina Silva; Linha Dura: Ciro Gomes ou Pró Mercado:
Geraldo Alckmin. Para finalizar, Greg retoma mais uma fala do Bolsonaro
e conclui que caso nada disso ajude a refletir sobre votar no Bolsonaro, sigo o
Bolsonaro e fique em casa pois ele não acredita no voto.

Ricardo Salles

O episódio que retrata Ricardo Salles, titular do Ministério do Meio Ambiente


na gestão de Jair Bolsonaro, foi ao ar no dia 11 de junho de 2021. O programa
tem por objetivo denunciar sua atuação à frente da pasta ministerial e as ações
realizadas por ele na exportação de madeiras da Amazônia, enviadas ilegalmente
e sem parecer do IBAMA para os EUA. A descoberta desta irregularidade e/ou
crime foi apresentada pelo Serviço de Pesca e Vida Selvagem (FWS) dos Estados
Unidos. Em virtude da denúncia, Salles exonerou vários funcionários do IBAMA e
nomeou como diretor o advogado Eduardo Bim, filho de Carlos Eduardo Moreira
Ferreira, ex-diretor da FIESP. A proposta deste novo diretor, segundo Duvivier
237
seria a de “desburocratizar o crime”.
Como fonte, o programa exibe as manchetes da Folha de S. Paulo de 28/2/19
– “Ricardo Salles exonera 21 dos 27 supervisores regionais do IBAMA”; da DW
Brasil de 28/9/20 – “Salles revoga regras que protegem restingas e manguezais”.
Segundo estas matérias, a revogação destas regras decorria da intenção de construir
resorts e hotéis para implementar e/ou incentivar o turismo nestas regiões. Também
são mostradas fotos de Salles em cima de madeiras e troncos retirados para
exportações. Do Jornal Nacional, do dia 7/4/21, é mostrada a notícia de que: “São
mais de 200 mil metros cúbicos, área de 65 mil árvores derrubadas.”
O episódio também demonstra que Salles é malvisto fora do Brasil, e
exibe uma notícia do jornal O Globo na qual consta que “Nos EUA, Ricardo
Salles ganhou o apelido de Sr. Motoserra.” A maior preocupação do então ministro
seria com o agronegócio e não, necessariamente, com o meio ambiente. Segundo
o programa, Salles era um “menino do Clube Paulistano” (clube frequentado pela
elite paulista), o que é ironizado em mais de uma oportunidade, especialmente em
razão do sotaque paulista carregado. Também é ventilada uma fala da Senadora
Kátia Abreu, parlamentar notoriamente ligada com o agronegócio na qual afirma,

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em evento transmitido pela internet que “Em primeiríssimo lugar, Ricardo Salles,
hoje ele é o nosso problema na questão ambiental no desmatamento”.
Ao reconstruir a trajetória política de Salles, o programa recorda ter
sido este presidente do Movimento Endireita Brasil – MEB. Numa propaganda
eleitoral, em que realizava uma campanha para deputado federal em 2014, ele
comentou: “A nossa luta em prol da causa liberal, contra o PT e o aparelhamento
de Estado, começou doze anos atrás, quando fundamos o MEB em 2006”. Na
ocasião, ele se filiou ao PP e ganhou 10 mil votos. Como acordo político entre o
apoio do PP à candidatura de João Dória ao Governo do Estado de São Paulo do
PSDB, Salles foi indicado para ser Secretário do Meio Ambiente. Nesta secretaria,
atuou favorecendo empresas de mineração e filiadas da FESP, alterando mapas de
zoneamento do Plano de Manejo da Área de Proteção Ambiental (CAPA) do rio
Tietê (APAVRT).
Por essa atuação, Salles foi condenado por uma série de irregularidades.
Segundo Gregório Duvivier: “Ele é o herói mesmo da bandidagem, da safadeza,
da pilantragem” e termina o programa afirmando: “(...) mesmo que Salles cair,
essa novela não vai acabar por aqui, infelizmente, ela só vai acabar quando todo o
governo Bolsonaro cair junto com ele” (DUVIVIER, 2021). 238
Tendo como pano de fundo a questão ambiental e, também, tangenciando
o Ministro Ricardo Salles, na semana anterior, em 04 de junho de 2021 foi ao ar
o 9º episódio da temporada daquele ano, intitulado “Salles´ Angels”, em alusão
ao seriado norte-americano da década de 70 “Charlie´s Angles” (As Panteras, no
Brasil). O foco foi o de retratar a atuação parlamentar das parlamentares que
passaram a comandar Comissões Parlamentares por onde passariam projetos de
interesse do Ministro Ricardo Salles.
O programa compara o interesse da população em acompanhar o dia a dia
do Congresso Nacional e suas CPIs com a mesma disposição para assistir a reality
shows e novelas: “População assiste Realities, como BBB e CPI. Política é isso, é
uma espécie de novela com atores piores e mais bem pagos”. (DUVIVIER, 2021).
Além disso, compara as pautas políticas que emergiam com o tema de algumas
novelas famosas. Ricardo Salles, seria o novo “Rei do Gado” e políticos há muito
tempo no cargo seriam como a novela destinada ao público jovem “Malhação” que
permaneceu por quase 30 anos no ar.
A partir desse mote para construir a narrativa, o episódio recupera a fala
de Salles na reunião de 22 de abril de 2020 com o Presidente Jair Bolsonaro e

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seus ministros, que ficou famosa por este ter dito: “(...) Ter um esforço nosso aqui
enquanto estamos nesse momento de tranquilidade no aspecto de cobertura de
imprensa, porque só falam de Covid e ir passando a boiada. Ir mudando todo
regramento”.
Ainda aproximando o desenrolar da política brasileira com a
teledramaturgia, Duvivier faz uma diferenciação e afirma que:
“Mas a novela da política nacional tem uma equipe de produção.
E boa parte dessa produção acontece num lugar obscuro do
Congresso: as chamadas comissões da Câmara dos deputados. São as
salas de roteiro dessa novela. Sim existem 25 comissões temáticas na
Câmara.” (DUVIVIER, 2021).

E com isso explica as funções e o funcionamento das Comissões temáticas,


e o percurso de um projeto de lei até a sua aprovação. Duvivier ressalta que as
escolhas para a presidência das comissões ocorrem a cada dois anos, mas estas são
sempre negociadas e também sofrem bastante influència do “Centrão”, que são “o
conjunto de deputados de partidos fisiológicos que apoiam ou não o presidente,
de acordo com o que ele tem para oferecer” (DUVIVIVER, 2021).
O episódio vai mostrar que para três comissões de relevância – Constituição 239
e Justiça, Meio Ambiente e Agricultura e Pecuária – foram escolhidas três aliadas
de Bolsonaro, Bia Kicis (PSL/DF), Carla Zambelli PSL/SP) e Aline Sleutjes (PSL/
PR), respectivamente. Estas, estariam “escrevendo boa parte da novela brasileira:
O ABC de Bolsonaro” (DUVIVIER, 2021), em alusão às iniciais de cada uma.
Ainda, “Os bolsonaristas enxergam esse trio como as Charlie’s Angels deles” –
“Bolsonaro’s Angels.” (DUVIVIER, 2021). Segundo Duvivier, todavia, elas se
apresentariam mais como “Salles´ Angels”, na realidade, pois todos os projetos
que interessariam ao Ministro do Meio Ambiente passariam por estas comissões.
A atuação política pregressa de cada uma é ressaltada, especialmente de
Zambelli e Kicis, que passaram a ganhar destaque quando das manifestações em
prol do impeachment de Dilma Rousseff. Carla Zambelli, que iniciou sua militância
no movimento feminista Femen, organização que surgiu em 2008 na Ucrania, foi
a fundadora do movimento “Nas Ruas”, que protestava contra a corrupção e pela
saída de Rousseff. Duvivier recupera uma fala da parlamentar, na qual já dava
sinais da aproximação com o que viria a ser o bolsonarismo, em 2015:
A balança tava tão pendida para um lado que aí vem um Bolsonaro
e ajuda a pender a balança para o outro lado, e mostrar algo que

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o brasileiro tava precisando escutar, entendeu? De certa forma,


eu respeito o papel que ele tá prestando e também acho que nos
últimos 20 anos ele não tava fazendo nada, mas (...)OESP 22/05/20)

E revela a disputa que esta teve com Joice Hasselmann, na época também
bolsonarista: “Bolsonaro ficou quatro meses sem falar comigo na campanha por
causa da Joice (Hasselmann), que inventou mentiras de que eu usava drogas e teria
feito um aborto” (OESP 4/12/19). E também que, quando assumiu a Comissão de
Meio Ambiente, sequer sabia o que significava o termo “grilagem”.
Kicis era Procuradora do Distrito Federal antes de atuar politicamente no
movimento “Revoltados Online”. Também foi uma das autoras do PL “Escola sem
Partido” – nº 246/2019: Miguel Nagib, fundador do movimento, é seu cunhado.
A parlamentar também defende pautas de costume no Congresso Nacional e faz
parte da Frente Parlamentar Conservadora. Ainda, foi autora da PEC 159/19, que
buscava retomar para 70 anos a aposentadoria compulsória dos ministros do STF, o
que permitiria que o então presidente Jair Bolsonaro indicasse mais dois ministros
para a corte. A PEC teve o parecer favorável aprovado pela CCJ, em 2021.
Aline Sleutjes, que já havia sido vereadora no município de Castro/PR, foi
240
eleita deputada federal em 2018. À frente da comissão de Agricultura e Pecuária,
o programa de Gregório Duvivier mostra o objetivo de sua atuação: “Aline já
deixou claro que uma de suas prioridades será passar um projeto de lei apelidada
de PL da Grilagem. Que concede nada menos do que anistia aos invasores de
terras públicas” (DUVIVIER, 2021).
O roteiro do episódio deixa clara a preocupação em ter três parlamentares
desse perfil ocupando comissões de grande impacto para a agenda legislativa
brasileira, em especial porque decidiam sobre temas ligados ao meio ambiente:
(...) essas deputadas não estão decidindo sobre uma obra de ficção,
elas estão decidindo sobre a nossa vida, o nosso futuro e o futuro
do Planeta. Como elas controlam a CCJ, C. de Meio Ambiente e
da Agricultura, elas se ocupam sobretudo dos chamados projetos
de lei da boiada. São projetos que visam facilitar o acesso de terras
a grileiros, relaxar a legislação ambiental ou tirar direitos de povos
indígenas. (DUVIVIER, 2021)
Por isso é que o programa ressalta que elas seriam as três mosqueteiras
de Ricardo Salles, o ministro do Meio Ambiente que atuou contra a agenda de
conservação ambiental.

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Roberto Jefferson

Ao retratar Roberto Jefferson, o programa de 17 de setembro de 2021, trata da


lealdade deste ao aderir ao bolsonarismo. O episódio começa com uma referência ao
apresentador de programas sensacionalistas João Kleber, afirmando que Jefferson
deveria participar do quadro “Fidelidade Partidária”, uma vez que esteve em nove
partidos ao longo de sua trajetória de mais de 30 anos de vida política.
O episódio vai mostrar que não existe lealdade no bolsonarismo e, no
início, faz uma diferença desta com o conceito de fidelidade:
Fidelidade é uma coisa horizontal que a gente tem uns com os
outros: lealdade é mais vertical. Faltar com a lealdade é a falta mais
graves que um mafioso pode cometer, punida geralmente com uma
morte horrível para ele e os parente (...) lealdade parece também ser
a virtude mais valorizada no bolsonarismo. O teste de fidelidade
supremo do bolsonarismo agora não é mais João Kléber, é ser preso
defendendo aquilo que o Bolsonaro diz. É ir para a cadeia em apoio
ao mito (...) (DUVIVIER, 2021)
Ao acompanhar a carreira política de Roberto Jefferson, o episódio mostra
que este já apoiou diferentes governos: Fernando Collor de Melo, Itamar Franco, 241
Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff, Michel
Temer e Jair Messias Bolsonaro. Segundo Duvivier, “Ele é conservador no sentido
de querer conservar a própria pele” (DUVIVIER, 2021). São exibidos fatos da
história de Jefferson e como este atuou em busca de interesses e fazendo parte
de governos de diferentes colorações ideológicas para, finalmente, aderir ao
bolsonarismo em 2018.
Roberto Jefferson passou a dar declarações homofóbicas, em defesa de
uma suposta família tradicional e a adotar um discurso pró-armamentista. Foi
batizado pela igreja evangélica Assembleia de Deus e a relacionar a luta contra
o “comunismo” com a esfera religiosa. Em vídeo exibido no programa, declarou
que “O satanás quer fechar a Igreja para impor o comunismo no Brasil!”, também
exibindo uma balaclava “para se proteger do Satanás”. O político também passou
a atacar ministros do STF e a defender o voto impresso e a contagem pública,
afirmando que “não haverá eleição ano que vem. O Barroso pode até zangar, bater
pezinho. Não é, Barroso?” O vídeo o levou à prisão, na época, por ordem do
Ministro Alexandre de Moraes, a quem deu a alcunha de “Xandão”, largamente
utilizada por bolsonaristas desde então.

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Fazendo uma crítica tanto a Roberto Jefferson, quanto a Bolsonaro, o


programa mostra que o primeiro é “camaleão não leal a ninguém’, um “mercenário
da política”. Por outro lado, aqueles que teriam aderido aos intentos de Bolsonaro,
por vezes foram abandonados em algum momento por estes. Afirma:
“A lealdade que Bolsonaro exige dos seus apoiadores não é fidelidade.
O contrato não é mútuo. Bolsonaro não parece ter lealdade por
ninguém. Ele abandona os fiéis pelo caminho com uma facilidade
enorme. Desde que seu governo começou, sua lista de amigos
patriotas que viraram inimigos comunistas não parou de crescer.
Em menos de 3 anos, já caíram em desgraça Bebianco, Bivar, Joyce,
Moro, Alexandre Frota, general Santos Cruz e outros generais. Todo
mundo foi cancelado pelo bolsonarismo, todos foram expulsos do
panteão de heróis (...) Sobraram os cães de aluguel, aqueles que
negociam lealdade” (DUVIVIER, 2021).

Sérgio Moro

O episódio a respeito do ex-juiz federal, responsável pela Operação Lava-Jato


foi ao ar em 21 de junho de 2019, correspondendo ao 13º programa da terceira
temporada. Exibido após o vazamento das mensagens pelo jornal The Intercept 242
Brasil trocadas no âmbito da Lava Jato, que demonstraram o conluio havido entre
o Poder Judiciário e o Ministério Público na condução da operação, o programa
transcorre a partir da defesa de Moro acerca do conteúdo tornado público: As
mensagens não seriam verdadeiras e, ainda que o fossem, não revelariam nenhuma
atuação equivocada:
Moro às vezes diz que as mensagens não são autênticas e às vezes
defende que mesmo se forem autênticas não revelam nada de errado.
Ele está dizendo basicamente que uma organização criminosa
contratou um hacker para quebrar pela primeira vez a segurança
do Telegram e produzir evidências falsas de que o juiz Sérgio Moro
não fez nada de errado. Isso não faz nenhum sentido. (DUVIVIER,
2021)
Antes disso, o programa se inicia com o próprio Gregório mostrando que
viajou para Curitiba e, ao discursar perante a sede da Polícia Federal naquele
estado, xingou o juiz de diversas formas. No programa, se disse arrependido do
episódio “O objetivo do humorista não é dizer que alguém é um merda, é provar
que ele é um merda, colocando piadas no meio para parecer que a pessoa chegou
a essa conclusão sozinho” (DUVIVIER, 2019). Essa fala é significativa a respeito
da forma de atuação do programa.

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O ENQUADRAMENTO DO BOLSONARISMO PELO PROGRAMA GREG NEWS (...) VERA LUCIA M. CHAIA, SILVANA G. MARTINHO E ARTHUR G. SPADA

Partindo da premissa da defesa de Moro sobre as mensagens, Gregório


primeiro vai mostrar que o conteúdo delas não seria incompatível com o histórico
de atuação daquele. Para isso, recupera a atuação de Moro em alguns casos que se
tornaram célebres, como o caso do Banestado, no qual o doleiro Alberto Youssef
também foi personagem central e firmou um dos primeiros acordos de delação
premiada do país, no ano de 2004. O programa também recupera a operação
Agrofantasma, na qual beneficiários de programa de agricultura familiar foram
investigados e Moro determinou que fosse procurado um Iate, no interior do
Paraná e longe do mar, portanto.
(...) um iate no interior do Paraná... ele não tem problema apenas
para obedecer as normas jurídicas, mas tem problema para obedecer
a lógica do mundo mesmo, do planeta. é tipo quando ele postou
uma foto dele segurando um calendário para provar que ele era ele
mesmo. O que me deixa muito preocupado, porque mostra que ele
não sabe nem como funciona um calendário, nem como funciona
uma prova. (DUVIVIER, 2019).
Ao longo do episódio, é mostrada que a atuação de Moro foi equivocada ou
contrária à lei em muitos casos, mas que, até então, as cortes superiores corrigiam
243
os equívocos e reviam suas decisões. Foi com a Lava-Jato que o descumprimento
das regras passou a ser relativizado:
(...) foi na lava jato que Moro descobriu a fórmula para que seus
atropelos da lei não fossem mais revogados pelas instâncias
superiores: a opinião pública (...) em pouco tempo ele não era só
o representante do judiciário, era o sujeito que estava livrando o
Brasil da corrupção, o herói, o ungido por deus e, pior, ungido pela
imprensa. (Duvivier, 2019).

O programa mostra, inclusive, um vídeo no qual o médium e acusado de


diversos casos de estupro João de Deus diz que Sérgio Moro teria uma missão divina,
com o intuito de satirizar os apoiadores da Lava-Jato e do então juiz: “se deus tem
orientado Moro, eu espero que não seja pelo telegrama” (DUVIVIER, 2019).
Quanto ao fato de Sérgio Moro afirmar que não havia nada de errado no
conteúdo das mensagens, o programa recupera o Código de Ética da Magistratura,
o qual rege a atuação judicial e deixa claro que o juiz deve manter uma equidistância
das partes, tratando-as da mesma forma. O episódio recupera mensagens, dentre
as quais Moro teria dito que “a defesa já fez o showzinho dela” para evidenciar o
quanto o conteúdo vazado era, de fato, problemático.
O que acontece quando o juiz não obedece ao código de ética?

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o processo todo pode ser anulado. Imagina que seu time está
ganhando por três a zero. Se for comprovado que o juiz roubou para
o seu time, o jogo é anulado, mesmo que comprovado que seu time
não precisasse desse juiz ladrão pra ganhar. (DUVIVIER, 2019).

O programa encerra com uma ligação fictícia de um imitador de Sérgio


Moro, no qual atribui toda e qualquer ação a um suposto hacker: “Moro, nada do
que você está dizendo está fazendo sentido” É que aqui não é o Moro, é um hacker.”
Os programas analisados demonstram que, ao escolher tratar de temas
que estão presentes na agenda pública do momento, este o faz por meio da
reconstrução da trajetória dos envolvidos, enfatizando suas contradições ou dando
ênfase aos possíveis motivos de suas ações, contribuindo para situar e aprofundar
a percepção do público acerca de determinado ator político. Ao retratar Ricardo
Salles, por exemplo, se recupera sua atuação anterior perante a secretaria do Meio
Ambiente do governo de São Paulo e os problemas que este já havia causado na
área. Com Roberto Jefferson, o programa é claro em utilizá-lo como um exemplo
da faceta mais radical do bolsonarismo, mas cujo defensor do movimento pode
ser abandonado quando suas atitudes passavam a trazer problemas à sustentação
política de Bolsonaro e seu grupo político. O mesmo acontece com Sérgio Moro, 244

que, partindo da defesa deste acerca do conteúdo das mensagens vazadas pelo
jornal The Intercept, mostra que a atuação pretérita de Moro já era questionável
no que diz respeito à utilização dos instrumentos jurídicos e de sua parcialidade.

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Considerações Finais

A estrutura social e política brasileira, em permanente instabilidade, marcada por


incoerências, desigualdades e conflitos, serviu de matéria-prima para a produção
de humor no país.
As teorias clássicas do riso: superioridade; alívio e a incongruência. Mesmo
que se referiam mais às técnicas da produção do riso e menos às questões em torno
do humor, essas teorias estão presentes na maior parte dos estudos sobre o tema
e aparecem entrelaçadas na forma de representar a liderança política brasileira.
Apesar de seus limites, frente à complexidade dos processos que envolvem
o recurso do humor, podem abrir interessantes caminhos de reflexão para ampliar
a compreensão sobre as características da linguagem humorística na representação
das lideranças políticas.
O inglês Thomas Hobbes, contratualista, concebe o Estado a partir da
tríade Estado de Natureza, Contrato e Estado Civil. O último é o Estado Soberano,
aquele que mais aparece nos estudos sobre humor, situado como integrante da
teoria da superioridade. Essa teoria está relacionada aos motivos que levam ao
245
riso, que seriam a concepção de sucesso frente à fraqueza.
Hobbes examinou o riso do ponto de vista psicológico, social e moral em
duas de suas obras, Sobre a natureza humana (1987) e Leviatã (2003), nas quais
aproximou esse riso ao poder, em um jogo de relações de força que aparece como
resultado de uma superioridade inesperada: aquele que tem mais poder, ri, e ao
fazer isso, aparece como superior ao objeto de seu riso. Visto sob a óptica da teoria
da superioridade, o humor é considerado como uma vantagem competitiva, ou
seja, uma forma de se colocar em um mesmo patamar de força com relação ao
oponente.
Hobbes (2003) aponta para a relação de superioridade entre os cidadãos
na disputa pela honra, e pondera que o humor pode ser uma arma dos cidadãos
contra o governante. Por isso, considera que aqueles que têm o poder devem tê-
lo atrelado aos humoristas, que servem como um ótimo termômetro de perda de
prestígio, de acordo com o lado em que estiverem.
Na avaliação de Saliba (2017), apesar de haver limites e parcialidades na
teoria da superioridade, pode-se notar a constante presença de três características:
“agressão, subjugação do alvo e exploração das diferenças” (SALIBA, 2017:14)

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Na teoria da superioridade o humor é visto pela tônica da comicidade e,


quando analisado na perspectiva da apropriação de seu uso por aqueles que detêm
o poder, o controle daquele que faz emergir o riso aparece como uma forma de
legitimar o poder do governante. Em outras palavras, o poder aliado ao fazer rir
pode ser um recurso para obter o consenso entre os membros de uma coletividade.
Se Hobbes é o nome da teoria da superioridade, coube à Freud o título célebre
da teoria do alívio. Freud (1905) compreende o chiste como uma formação psíquica
do inconsciente. Assim como o sonho, segue a condensação e o deslocamento,
expondo o inconsciente, podendo relacionar elementos distintos cujo resultado é
algo novo e desconhecido, mas que por vezes esconde algum sentido.
Para a teoria do alívio, válvula ou liberação, o humor aparece como um ato
que rompe o caminho previsto, e a percepção dessa ruptura é expressa pelo riso
que, assim como o sonho, pode libertar as repressões reprimidas.
Aristóteles, Cícero, Schopenhauer e Immanuel Kant fazem parte dos
autores da teoria da incongruência, que compreendem o humor como o resultado
da dualidade entre a percepção e a representação do mundo. Na obra “Crítica à
faculdade de julgar”, Kant, mais pela reflexão sobre o riso do que sobre o humor 246
propriamente dito, afirma ser o riso “[...] uma afecção proveniente da transformação
de uma expectativa tensionada em nada” (Kant, 1790, § 54). Nesse sentido, pensar
sobre o riso seria um exercício para pensar sobre o próprio pensamento.
Verena Alberti (1999), na obra “O Riso e o risível”, analisa a constante
relação entre o riso e o pensamento a partir de importantes e consagrados autores,
dentre eles, Kant, e afirma que ele diferencia o belo e o agradável com base no
olhar para a música e para o riso, sendo o agradável aquele que regozija e o belo
aquele que apraz. O primeiro diz respeito à sensação, e o segundo, ao julgamento.
O cômico para Kant, na leitura de Alberti (1999), tinha no elemento
surpresa o resultado da incongruência percebida por aquele que ri. A emergência
e a especificidade do riso estariam na impossibilidade de continuar a pensar. É
nesse ponto que Schopenhauer, apesar de também fazer parte dos autores que
compõem a teoria da incongruência, difere de Kant, pois compreende que o riso
permite um alargamento da faculdade do pensar na medida em que ele é resultado
da inesperada identificação da contradição entre representação e realidade.
Deve-se olhar para as charges partindo, não só das características que
compõem o arsenal do cartunista, mas também do diálogo com as teorias sobre o

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riso, menos para identificar essas teorias nas charges do que, talvez, para perceber
suas particularidades. Como exemplo, nas charges em torno da campanha eleitoral
não há a defesa de um candidato ou a exploração da superioridade de um em
relação ao outro; o que há nas charges sobre a eleição é o exercício constante de
demonstrar as semelhanças dos candidatos em oposição e de como seus interesses
estão voltados apenas para o desejo do poder. Nesse sentido, menos a superioridade
e mais a pequenez da sociedade política e dos cidadãos, incluindo aí o próprio
chargista, iludidos com uma escolha de candidatos que não desejam mais que
conquistar ou manter-se no poder, como há muito anunciou Maquiavel (2010).
Seria a incongruência a mais comum?
As teorias da superioridade e da incongruência são mais facilmente
identificadas quando se analisam os episódios de Greg News com relação à liderança
política, principalmente na desconstrução da liderança. O programa se destaca
pelo uso frequente do humor irônico, por vezes sendo o próprio apresentador
o objetivo da piada. Com isso, o trabalho de desconstrução da imagem dos
próceres do bolsonarismo é feito a partir da busca, sobretudo, por demonstrar
a incompetência destes, bem como que fogem daquilo que se espera de uma 247
atuação política dentro do estado democrático. Além disso, ao evidenciar ações
incompatíveis de uma liderança política, ora ironizando a fala, os trejeitos ou até
mesmo o histórico pregresso, torna-se claro que a superioridade e a incongruência
estão subjacentes na forma de humor apresentada pelo programa Greg News. A
incongruência também se revela ao aproximar fatos midiáticos corriqueiros com
a esfera política, como ao comparar a teledramaturgia brasileira com os trabalhos
do Congresso Nacional, por exemplo.
Quanto ao enquadramento, nos episódios analisados transparece que a
liderança política objeto do roteiro é por vezes desconstruída a partir daquilo que
ela própria já fez anteriormente: ao contrário de se opor ao ex-ministro do Meio
Ambiente e sua política contrária à preservação ambiental, por meio de enfatizar
a importância desta com estudos ou dados atualizados que colocam em xeque o
modo de atuação de Salles, o Greg News demonstra os interesses particulares do
político e a sua atuação em prol do agronegócio, evidenciando que a sua atuação é
incompatível com o cargo que ocupava. O mesmo se dá também ao retratar Sérgio
Moro, ao revelar que o descumprimento da lei era algo recorrente na carreira do
ex-ministro deixando claro que, ao contrário de ser uma liderança imbuída de

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uma missão e de uma autoridade heroica, seria um juiz despreparado e que nunca
teria demonstrado qualquer apresso no cumprimento da lei.
Ao recuperar o histórico das lideranças, o programa busca alimentar os
espectadores de informações que não são de conhecimento geral, na medida em que
por vezes contrariam aquilo que era reproduzido pelos meios de comunicação de
massa, ou porque se tratam de fatos passados ou que não tiveram grande repercussão
na esfera pública quando de sua ocorrência. As mudanças partidárias de Roberto
Jefferson ou o passado de Carla Zambelli junto do movimento feminista ucraniano
são formas de direcionar o público na desconstrução dessas figuras.
O Greg News se posicionou ativamente contra a eleição e o governo do
ex-presidente Jair Bolsonaro e buscou, não só desconstruir a figura deste enquanto
a liderança mítica de um movimento social – o bolsonarismo – mas também
enfatizou a oposição a partir da atuação das demais lideranças que o cercavam.
Pode se dizer que o programa teve como enfoque se opor uma agenda política
conservadora, desde a sua primeira temporada, enfatizando a contrariedade com
Bolsonaro e sua gestão a partir de sua eleição, trazendo temas que por vezes eram
negligenciados por este governo ou tratados de maneira incompatível com aquilo 248
que o programa defendia, ao se colocar expressamente em outro campo ideológico.
Mesmo após as eleições gerais de 2022 e a vitória de Lula, a última temporada
do programa exibida em 2023 tratou de diversos temas afetos ao bolsonarismo e
ao campo conservador, como a Academia Militar das Agulhas Negras - AMAN,
Projeto de lei de combate às Fake News e a ascensão do atual presidente da
Argentina, Javier Milei
O programa foi encerrado definitivamente em 2024, conforme anunciado
pelo próprio Gregório Duvivier em suas redes sociais. Um dos motivos que levou
ao encerramento da produção foi o de que esta não atendia às cotas de produção
nacional, exigidas pela lei brasileira, uma vez que as produtoras responsáveis pelo
programa teriam participação estrangeira, não recebendo o programa a classificação
de produção nacional. Gregório Duvivier, Bruno Torturra e Alessandra Orofino
agora fazem parte do programa “Calma Urgente!” transmitido no canal de Youtube
do Estúdio Fluxo, semanalmente às segundas-feiras.

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Duvivier e HBO Brasil LTDA. 10ª Câmara de Direito Privado de São Paulo.
Relator: José Aparício Coelho Prado Neto. 23 de agosto de 2022.
SÃO PAULO. Tribunal de Justiça. Apelação n.º 1127414-23.2021.8.26.01.
Apelante Gregório Byington Duvivier e HBO BRASIL LTDA. Apelado Antonio
José junqueira Vilela Filho. 1ª Câmara de Direito Privado de São Paulo. Relator:
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