“Quando era criança” (análise do poema)
>> Bom dia a todos, hoje vou analisar o poema “Quando era criança” de Fernando
Pessoa, pretendo analisar de forma a ser mais acessível de entender”
>> Vou começar a análise pela estrutura externa do poema
Este poema de Fernando Pessoa possui as seguintes características estruturais:
● 3 estrofes
● Cada estrofe é uma quadra, ou seja, é composta por 4 versos.
● Apresenta a métrica da redondilha menor (versos com 5 sílabas métricas).
● Apresenta rimas interpoladas (ABBA) e emparelhadas (EE)
>> Agora que analisámos a estrutura externa, vamos passar para a estrutura
interna do poema
>> Irei começar por falar da temática do poema e, em seguida, farei uma análise
detalhada estrofe por estrofe
A temática deste poema é a nostalgia da infância, que Fernando Pessoa
apresenta como um tempo especial e irrepetível. O poeta reflete sobre:
● A infância como algo eterno na memória, um momento que nunca se
esquece, mesmo com o passar dos anos;
● Um período de inocência e felicidade, em que não havia preocupações
nem as complicações da vida adulta, vivia-se na infância uma vida tranquila;
● Um tempo de alegria pura, que já não pode voltar, mas que permanece
como uma recordação valiosa;
● Uma fase em que não pensava no futuro ou em questões difíceis,
vivendo apenas o presente, o que o tornava naturalmente feliz.
O poema transmite assim a saudade de um passado simples e feliz, contrastando
com a complexidade da vida adulta.
>> Agora, irei fazer uma análise detalhada, estrofe por estrofe
Na primeira estrofe, o sujeito poético recorda que, na infância, não tinha
consciência da realidade. Tal como qualquer criança, vivia de forma tranquila e sem
preocupações, o que é evidenciado no verso 2: “Vivi, sem saber”. No entanto,
agora, na vida adulta, possui uma consciência plena da realidade e do tempo.
Mesmo que insista em relembrar esses tempos antigos, sabe que eles nunca irão
regressar, como expressam os versos 3 e 4: “Só para hoje ter/ Aquela lembrança.”
Na segunda estrofe, Fernando Pessoa revela que, ao contrário da infância,
marcada pelo “viver” inconsciente, a vida adulta é feita de “pensar” e “sentir”, como
se lê nos versos 5 e 6 “E hoje sinto/ Aquilo que fui”. Agora, o sujeito poético
compreende o valor do passado, mas considera a sua vida presente uma mentira,
como indicado nos versos 7 e 8 “Minha vida flui,/ Feita do que minto”. Este
sentimento reflete a sua incapacidade de transformar o passado em presente, o que
o faz sentir-se perdido e afastado do seu verdadeiro caminho. Este conflito entre o
que foi e o que é gera uma sensação de dúvida e insatisfação, deixando-o
desconectado da sua essência.
Na última quadra, o sujeito poético conclui que, como não pode escapar da vida
que tem, da "mentira" que acredita viver ,como é referido no verso 9 (“Mas nesta
prisão”), resta-lhe apenas as memórias do passado (“Livro único, leio”). Embora
essas lembranças tragam uma sensação de felicidade, elas já não lhe pertencem,
pois ele já não é o mesmo, como é mencionado nos versos 11 e 12 (“O sorriso
alheio/ De quem fui então”). Fernando Pessoa sente-se preso a uma vida onde não
encontra verdadeira felicidade, e o "livro" das memórias da infância traz-lhe um
"sorriso alheio" — o sorriso do passado, agora distante da sua realidade atual.
Essas recordações confortam-no, mas também o sufocam, lembrando-lhe a
felicidade que nunca poderá recuperar.
>> Agora, irei falar sobre a divisão do poema. Organizei-o em três partes,
atribuindo a cada uma um título, ou seja, cada estrofe é uma parte
1ª parte – Infância: o tempo da inconsciência: O sujeito poético recorda a sua
infância, um período de inocência em que vivia sem se preocupar com a realidade
2ª parte – A vida adulta: a consciência dolorosa: Ao passar para a vida adulta, o
sujeito ganha consciência da realidade e do tempo, o que o faz sentir a dor do
afastamento do passado. Ele agora percebe o que foi, mas essa consciência
traz-lhe sofrimento e a sensação de que a sua vida adulta é marcada por uma certa
falsidade ou insatisfação
3ª parte – Memória: o consolo e o sofrimento: O sujeito poético recorre à
memória da infância como uma forma de consolo, mas também como um
sofrimento, já que essas recordações trazem-lhe um “sorriso alheio”, ou seja, uma
felicidade distante que ele não pode mais reviver.
>> Por último, irei fazer uma referência aos recursos expressivos, apenas
encontrei dois: a metáfora e a ironia. A metáfora está presente no versos 10 e 11
enquanto que a ironia está presente nos versos 7 e 8
● “Livro único”: Esta metáfora simboliza as memórias da infância, sugerindo
que as lembranças do passado são a única forma de acesso ao tempo de
felicidade que o sujeito poético viveu. O "livro" é uma forma de recordar e
reviver, mas é algo limitado e inalcançável.
● “O sorriso alheio”: Esta metáfora destaca que a felicidade do passado já
não pertence ao sujeito. O sorriso não é mais dele, sendo uma lembrança
distante e fora do seu alcance, o que reforça a ideia de perda e afastamento
do que foi.
● “Minha vida flui/ Feita do que minto”: A ironia aqui está na sugestão de
que a vida adulta do sujeito é construída a partir de mentiras, ou seja, ele
sente que a sua realidade não é autêntica. O sujeito poético expressa uma
insatisfação com o seu presente, sugerindo que o que ele vive não é
verdadeiro, como se estivesse a falsificar a sua própria vida.