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9 o Papel Da Escola e o Trabalho Pedagógico

O artigo discute o papel da escola e do trabalho pedagógico sob a perspectiva da Pedagogia Histórico-Crítica, enfatizando a importância da educação na emancipação social e na transformação das relações sociais. A autora argumenta que a escola deve integrar o conhecimento científico com as experiências dos alunos para promover um aprendizado significativo e crítico. O objetivo é contribuir para reflexões sobre a formação de indivíduos com uma visão crítica e emancipadora, capaz de atuar na sociedade de forma mais justa e igualitária.
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9 o Papel Da Escola e o Trabalho Pedagógico

O artigo discute o papel da escola e do trabalho pedagógico sob a perspectiva da Pedagogia Histórico-Crítica, enfatizando a importância da educação na emancipação social e na transformação das relações sociais. A autora argumenta que a escola deve integrar o conhecimento científico com as experiências dos alunos para promover um aprendizado significativo e crítico. O objetivo é contribuir para reflexões sobre a formação de indivíduos com uma visão crítica e emancipadora, capaz de atuar na sociedade de forma mais justa e igualitária.
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O PAPEL DA ESCOLA E O TRABALHO PEDAGÓGICO: apontamentos pela

Tendência Histórico-Crítica

Dayane Rita da Silveira 1

RESUMO

O homem necessita de bens culturais para ser capaz de modificar o meio em que vive
e desfazer as amarras com a desigualdade e a alienação que comprometem seu
desenvolvimento humano. Com base nos pressupostos da Pedagogia Histórico-
Crítica, evidenciamos que a escola e o trabalho pedagógico realizado pelo professor
têm papel fundamental na emancipação do ser social e na promoção de possibilidades
para a transformação das relações sociais vigentes. Faz-se necessário, portanto,
pensar em um didática que dê sentido aos conhecimentos oferecidos pela escola e
que possibilite aos alunos aprenderem, de fato, para a vida. Isso se torna possível
integrando o conhecimento científico com o que o aluno já traz da sua vivência de
mundo, resultando, assim, em uma nova elaboração. Este artigo, resultado de uma
revisão bibliográfica, tem o objetivo de explicitar o papel da escola e do fazer
pedagógico realizado pelo professor à luz da Pedagogia Histórico-Crítica a fim de
contribuir para a transformação da sociedade em um espaço mais justo e igualitário.
Espera-se poder contribuir para reflexões acerca das relações vigentes na sociedade
e refletir sobre as contribuições da tendência Histórico-Crítica para a formação de um
sujeito com uma visão mais crítica e emancipadora.

Palavras-chave: Pedagogia Histórico-Crítica. Escola. Trabalho pedagógico.


Emancipação.

THE ROLE OF SCHOOL AND PEDAGOGICAL WORK: notes by the Historical-

Critical Tendency

ABSTRACT

The man needs cultural goods to be able to change the environment in which he lives
and undo the bonds with the inequality and alienation that compromise his human
development. Based on the assumptions of Historical-Critical Pedagogy, we show that
the school and the pedagogical work carried out by the teacher play a fundamental
role in the emancipation of the social being and in the promotion of possibilities for the
transformation of the current social relations. It is necessary, therefore, to think of a
didactic that gives meaning to the knowledge offered by the school and that allows
students to learn, in fact, for life. This is made possible by integrating scientific
knowledge with what the student already brings from his experience of the world, thus
resulting in a new elaboration. This article, the result of a bibliographic review, aims to
explain the role of the school and the pedagogical practice carried out by the teacher
1
Mestra em Ensino na Educação Básica (CEPAE/UFG)). Especialista em Educação Infantil (PUC/GO) e em
Linguagem, Cultura e Ensino (UEG/Inhumas). Graduada em Letras/Inglês (UFG). E-mail:
[email protected]
RCE, v. 9, 2024, ISSN 2526-4257, e24064
in the light of Historical-Critical Pedagogy in order to contribute to the transformation
of society in a fairer and egalitarian space. It is expected to be able to contribute to
reflections on the current relationships in society and reflect on the contributions of the
Historical-Critical tendency to the formation of a subject with a more critical and
emancipatory view.

Keywords: Historical-Critical Pedagogy. School. Pedagogical work. Emancipation.

Introdução

Ao pensarmos na contemporaneidade, inúmeros são os desafios postos à


sociedade para garantir melhores condições de vida às pessoas. A educação, assim
como as demais esferas sociais, também vem se deparando com esses desafios, e
nos chama a atenção para o papel da escola na sociedade, o trabalho educativo
realizado pelo professor e o processo de formação do educando.
Muitas críticas também são feitas à escola tradicional, transmissora de
conhecimentos desconectados de suas finalidades sociais. No entanto, devemos
lembrar que “a escola, em cada momento histórico, constitui uma expressão e uma
resposta à sociedade na qual está inserida. Nesse sentido, ela nunca é neutra, mas
sempre ideológica e politicamente comprometida” (Gasparin, 2012, p. 1-2).
A educação brasileira vem passando por diversas transformações. Nesse
contexto, faz-se necessário reflexões constantes sobre o papel do ensino que se
deseja ofertar e que tipo de formação propiciar aos alunos a fim de contribuir para
mudanças na sociedade.
Na Pedagogia Histórico-Crítica, o conhecimento escolar se constitui como um
elemento fundamental na compreensão e na transformação da sociedade. O que
pressupõe que o conteúdo deve ser trabalhado de forma contextualizada em todas as
áreas do conhecimento humano.
A tendência Histórico-Crítica visa uma educação crítica, contextualizada e de
caráter emancipador. Ademais, nesse contexto, ser um professor crítico é estar aberto
para a reflexão em relação a posições tidas como naturalizadas e legitimadas na
sociedade.
O presente artigo tem como finalidade explicitar o papel da escola e do trabalho
pedagógico realizado pelo professor à luz da Pedagogia Histórico-Crítica. Cabe
explicar que essa teoria possui uma base filosófica e metodológica marxista, que
pressupõe uma transformação da sociedade. As reflexões aqui tecidas baseiam-se
nas contribuições teóricas de Cortella (2001), Freire (2018), Gasparin (2012), hooks
(2017) e Saviani (2013).
O texto está organizado em duas sessões, além desta introdução e das
considerações finais. Na primeira sessão, buscamos, em termos breves, fazer uma
exposição acerca dos fundamentos da Pedagogia Histórico-Crítica, bem como
procurando pautar as principais ideias que caracterizam essa teoria. Na segunda
sessão, abordamos o papel da escola e do fazer pedagógico do professor na luta
contra a eliminação das desigualdades sociais vigentes.
Esperamos que este trabalho possa contribuir para reflexões que resgatem a
importância da escola e do trabalho pedagógico realizado pelo professor, visto que,
ao ensinar o saber historicamente produzido, o professor atua na condução da
transformação social.

Fundamentos da Pedagogia Histórico-Crítica

A Pedagogia Histórico-Crítica, considerada um marco na educação brasileira,


porém ainda pouco praticada no cotidiano escolar, caracteriza-se como uma teoria
preconizada por Demerval Saviani, na década de 1980, com o intuito de superar a
teoria crítico-reprodutivista, que entende a educação como instrumento de
discriminação social.
Para a teoria crítico-reprodutivista, a marginalidade é vista como própria da
estrutura social capitalista e, portanto, concebe que a educação tem a função de
reproduzir as relações sociais vigentes, concluindo que, “qualquer tentativa na área
de educação é necessariamente reprodutora das condições vigentes e das relações
de dominação – características próprias da sociedade capitalista” (Saviani, 2013, p.
78-79). Para esta teoria, a escola é um aparelho ideológico do Estado e, portanto, a
educação vai sempre reproduzir os interesses do capital.
De caráter mecanicista e, portanto, não dialético, a teoria crítico-reprodutivista
considerava a sociedade capitalista como algo não suscetível a transformações. No
entanto, esta teoria criticou, mas não apresentou proposta para solucionar os
problemas apresentados e, nesse contexto, surgiu uma outra crítica, que
abordaremos a seguir, no intuito de explicar que a educação pode sim interferir na
sociedade, contribuindo para a sua transformação.
Visto que, até então, não existiam alternativas para os educadores que
buscavam uma atuação crítica, Saviani (2013) propôs, então, uma teoria, denominada
Pedagogia Histórico-Crítica, que entende que a escola tem uma função social e que
o conhecimento científico é capaz de instrumentalizar as camadas populares na
superação de sua condição de alienados e explorados.
Para Saviani, a pedagogia tradicional deixa o educando em uma zona de
passividade, tornando-o submisso e capaz de reproduzir as relações sociais. A
Pedagogia Histórico-Crítica propõe, então, superar essa passividade, que entende a
educação como instrumento de discriminação social.
A Pedagogia Histórico-Crítica, que busca “compreender a questão educacional
com base no desenvolvimento histórico objetivo” (Saviani, 2013, p. 76), diferencia-se
da visão crítico-reprodutivista, uma vez que procura articular um tipo de orientação
pedagógica que seja crítica sem ser reprodutivista. Saviani (2013) ao falar da teoria
crítico-reprodutivista, formula comentários acerca da contribuição dessa teoria no que
concerne à resistência ao autoritarismo.
Essa corrente pedagógica surge no sentido de confrontar outras tendências
tradicionais de ensino, pois oportuniza uma prática docente comprometida com a
promoção humana dos educandos e pressupõe que a escola não se configure mais
como lugar de condutas alienadas.

Essa visão crítico-reprodutivista desempenhou um papel importante em


nosso país, porque de alguma forma impulsionou a crítica ao regime
autoritário e à pedagogia autoritária desse regime, a pedagógica tecnicista.
De certa forma, essas teorias alimentaram reflexões e análises daqueles que
em nosso país se colocavam na oposição a pedagogia oficial e à política
educacional dominante. (Saviani, 2013, p. 58)

Vejamos que, apesar do reconhecimento da relevante contribuição da visão


crítico-reprodutivista, o autor aponta suas limitações, no que diz respeito a proposição
de caminhos no fazer pedagógico. Essa concepção não apresenta proposta
pedagógica.

Progressivamente, no entanto, foram-se tornando cada vez mais evidentes


os limites da teoria crítico-reprodutivista. Ela revela-se capaz de fazer a crítica
do existente, de explicitar os mecanismos do existente, mas não tem proposta
de intervenção prática [...]. O problema, no entanto, que os educadores
enfrentavam extrapolava esse âmbito, porque a questão central era
justamente como atuar de modo crítico no campo pedagógico, como ser um
professor que, ao agir, desenvolve uma prática de caráter crítico. (Saviani,
2013, p. 58-59)
A Pedagogia Histórico-Crítica surge, então, na crença de poder viabilizar uma
educação adequada aos interesses do grande contingente da sociedade brasileira e
que não fosse, necessariamente, reprodutora das relações de dominação. Fica
evidenciado, então, que o objetivo era a transformação da sociedade, não a sua
manutenção; ou seja, uma proposta educacional transformadora.
A Pedagogia Histórico-Crítica envolve, então, “a possibilidade de se
compreender a educação escolar tal como se manifesta no presente, mas entendida
essa manifestação presente como resultado de um longo processo de transformação
social” (Saviani, 2013, p. 80), o que significa que a educação é, sim, determinada pela
sociedade, mas essa determinação é relativa e na forma de ação recíproca, ou seja,
a educação também interfere sobre a sociedade, podendo contribuir para a sua
própria transformação.

A escola e o trabalho pedagógico

A escola existe para propiciar a aquisição dos instrumentos que possibilitam o


acesso ao saber elaborado (ciência), pois é essa necessidade de transmissão-
assimilação do saber elaborado que torna necessária a existência da escola. Para
Saviani (2013, p. 66) “a escola tem o papel de possibilitar o acesso das novas
gerações ao mundo do saber sistematizado, do saber metódico, científico”.
Uma das críticas que se faz ao ensino tradicional, diz respeito ao fato de que
este tornou os conteúdos transmitidos pela escola mecânicos e vazios de sentido. A
partir dessa visão, tende-se a classificar toda transmissão de conteúdo como
mecânica e todo automatismo como negação da liberdade.
A Pedagogia Histórico-Crítica, porém, compreende que o automatismo “é
condição da liberdade e que não é possível ser criativo sem dominar determinados
mecanismos” (Saviani, 2013, p. 17). A liberdade só é atingida a partir do momento em
que os atos são dominados, e passam a ser exercidos automaticamente. É preciso
instrumentalizar, elevar o nível cultural das camadas exploradas.
Isso nos leva a compreensão de que no processo de aprendizagem, “só se
aprende, de fato, quando se adquire um habitus, isto é, uma disposição permanente,
ou, dito de outra forma, quando o objeto da aprendizagem se converte numa espécie
de segunda natureza” (Saviani, 2013, p. 19). Para se adquirir um habitus, faz-se
necessário repetir muitas vezes determinados atos até que eles se fixem, exigindo
concentração e esforço por parte do sujeito, até atingir a liberdade. É somente quando
se atinge o nível em que os atos são praticados automaticamente que é possível
afirmar que o processo de aprendizagem se completou.

Note-se que se libertar, aqui, não tem o sentido de se livrar, quer dizer,
abandonar, deixar de lado os ditos aspectos mecânicos. A libertação só se
dá porque tais aspectos foram apropriados, dominados e internalizados,
passando, em consequência, a operar no interior de nossa própria estrutura
orgânica. Poder-se-ia dizer que o que ocorre, nesse caso, é uma superação
no sentido dialético da palavra. Os aspectos mecânicos foram negados por
incorporação e não por exclusão. Foram superados porque negados
enquanto elementos externos e afirmados como elementos internos.
(Saviani, 2013, p. 18)

É papel da escola mediar a passagem do saber espontâneo ao saber


sistematizado. Vale ressaltar que esse deve ser um processo dialético, isto é, o saber
espontâneo não é excluído, mas o que há é uma apropriação de novos saberes pelo
sujeito, tornando-o capaz de expressar de forma elaborada os saberes da cultura
popular que correspondem aos seus interesses.
Para a Pedagogia Histórico-Crítica, o saber é o objeto específico do trabalho
educativo, e os diferentes tipos de saberes (conhecimento intuitivo, afetivo, intelectual,
lógico, racional, prático, teórico, etc.) necessitam ser assimilados pelos indivíduos
para que se tornem humanos.

Isto por que o homem não se faz homem naturalmente; ele não nasce
sabendo ser homem, vale dizer, ele não nasce sabendo sentir, pensar,
avaliar, agir. Para saber pensar e sentir; para saber querer, agir ou avaliar é
preciso aprender, o que implica o trabalho educativo. Assim, o saber que
diretamente interessa à educação é aquele que emerge como resultado do
processo de aprendizagem, como resultado do trabalho educativo.
Entretanto, para chegar a esse resultado a educação tem que partir, tem que
tomar como referência, como matéria-prima de sua atividade, o saber objetivo
produzido historicamente. (Saviani, 2013, p. 7)

Compreende-se, portanto, que o homem não nasce homem, mas torna-se


homem por meio da assimilação do saber já produzido. Corroborando com essa ideia,
Freire (2000, p. 602) afirma que nós somos seres éticos, históricos, políticos e sociais,
e que a nossa presença no mundo “não é a de quem se adapta, mas a de quem nele
se insere. É a posição de quem luta para não ser apenas objeto, mas sujeito também
da História”.
A prática pedagógica deve oferecer uma formação com consciência política. O
trabalho educativo deve ser, portanto, o ato de produzir, em cada indivíduo, a
humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens.
Portanto, segundo Saviani (2013), o trabalho educativo deve resultar de uma práxis
pedagógica consciente.

[...] O trabalho educativo é o ato de produzir, direta e intencionalmente, em


cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e
coletivamente, pelo conjunto dos homens. Assim, o objeto da educação diz
respeito, de um lado, à identificação dos elementos culturais que precisam
ser assimilados pelos indivíduos da espécie humana para que eles se tornem
humanos e, de outro lado e concomitantemente, à descoberta das formas
mais adequadas para atingir esse objetivo. (Saviani, 2013, p. 13)

Percebe-se que o objeto da educação diz respeito, de um lado, em selecionar


os elementos culturais que precisam ser assimilados pelos indivíduos para que eles
se tornem humanos e, de outro lado e simultaneamente, a descoberta das formas
adequadas de desenvolvimento do trabalho pedagógico.
A escola precisa, então, permitir o acesso aos instrumentos de elaboração e
sistematização do saber, para possibilitar a emancipação humana, que acontece por
meio da educação e da compreensão do movimento do processo histórico e dialético.
Segundo hooks (2017, p. 25), o trabalho do professor “não é o de simplesmente
partilhar informação, mas sim o de participar do crescimento intelectual e espiritual
dos nossos alunos”. Portanto, não basta a existência do saber sistematizado, é
necessário que a escola viabilize as condições de transmissão-assimilação deste
saber, o saber escolar que, ao ser colocado em prática pelo sujeito, torna-o capaz de
refletir e agir sobre o mundo, a fim de modificá-lo.

O processo pedagógico deve possibilitar aos educandos, através do processo


de abstração, a compreensão da essência dos conteúdos a serem estudados,
a fim de que sejam estabelecidas as ligações internas específicas desses
conteúdos com a realidade global, com a totalidade da prática social e
histórica. Este é o caminho por meio do qual os educandos passam do
conhecimento empírico ao conhecimento teórico-científico, desvelando os
elementos essenciais da prática imediata do conteúdo e situando-o no
contexto da totalidade social (Gasparin, 2012, p. 6)

A Pedagogia Histórico-Crítica se empenha na defesa da especificidade da


escola ao defender que “a escola tem uma função especificamente educativa,
propriamente pedagógica, ligada a questão do conhecimento; é preciso, pois, resgatar
a importância da escola e reorganizar o trabalho educativo” (Saviani, 2013, p. 84).
Considerando-se que o saber, objeto específico do trabalho escolar, é um meio
de produção, expandir a oferta de escolas consistentes que atendam a toda população
significa socializar o saber que é considerado propriedade privada da elite. Daí
explica-se, então, a tendência a secundarizar a escola, “esvaziando-a de sua função
específica, que se liga à socialização do saber elaborado, convertendo-a numa
agência de assistência social, destinada a atenuar as contradições da sociedade
capitalista” (Saviani, 2013, p. 85).
O saber sistematizado precisa deixar de ser propriedade da elite; precisa deixar
de ser propriedade privada para ser socializado. A escola precisa recuperar o seu
lugar de socialização do saber sistematizado, pois sem esse acesso o sujeito fica
limitado e o saber elaborado, que pode contribuir para a transformação da sociedade,
continua sendo propriedade apenas dos grupos dominantes. Recuperando a função
específica da escola, é possível pensar em superar a sociedade vigente e caminhar
em direção a uma sociedade sem classes, a uma sociedade socialista, caracterizada
pela igualdade de oportunidades.
Para Freire (2018, p. 28) “nas condições de verdadeira aprendizagem os
educandos vão se transformando em reais sujeitos da construção e da reconstrução
do saber ensinado, ao lado do educador, igualmente sujeito do processo”. É
necessária uma educação que considere a participação efetiva dos alunos na
construção da sua aprendizagem.
Cabe a escola viabilizar o acesso ao saber sistematizado, por meio de uma
ação pedagógica intencional, às novas gerações, que por sua vez, tornam-se agentes
ativos na transformação e desenvolvimento do que foi apreendido. Ao proporcionar
esse acesso, o aluno transpõe o saber espontâneo e se apropria do saber
sistematizado. O papel do professor, neste contexto, é o de mediador desse processo.
Em uma sociedade que “nos ensina a crer que a dominação é ‘natural’, que os
fortes e poderosos têm direito de governar os fracos e impotentes” (hooks, 2017, p.
43), o professor precisa, então, compreender as contradições da sociedade e
“posicionar-se diante dessas contradições e desenredar a educação das visões
ambíguas, para perceber claramente qual é a direção que cabe imprimir à questão
educacional” (Saviani, 2013, p. 86).
Dessa forma, cabe ao professor converter o saber produzido historicamente em
saber escolar, o que ocorre por meio da mediação entre aluno e conhecimento. A
mediação do professor é fundamental, pois durante esse processo, os alunos se
apropriam dos instrumentos teóricos e culturais que são transformados em elementos
ativos de transformação social.
Cabe aqui, no entanto, fazermos alguns questionamentos: Como a escola deve
organizar processos a fim de alcançar sua finalidade? Como tornar o saber
sistematizado assimilável pelas novas gerações?
A partir da pedagogia educacional de Saviani (2013) anteriormente discutida,
Gasparin (2012) criou uma didática para a Pedagogia Histórico-Crítica, em cinco
passos, com o objetivo de envolver o educando na aprendizagem significativa dos
conteúdos.
O primeiro passo é a prática social inicial, que é o nível de desenvolvimento
atual do aluno. Consiste em partir dos conhecimentos prévios dos alunos acerca do
conteúdo curricular proposto, a fim de perceber qual é a vivência cotidiana que os
educandos têm desses conteúdos antes que sejam ensinados em sala de aula,
buscando aguçar a curiosidade para que queiram saber mais sobre o conteúdo
proposto.
Segundo Cortella (2001, p. 116), “não há conhecimento que possa ser
aprendido e recriado se não se mexer, inicialmente, nas preocupações que as
pessoas detêm; é um contrassenso supor que se possa ensinar crianças e jovens,
principalmente, sem partir das preocupações que eles têm [...]”. Portanto, o ensino
deve considerar a leitura de mundo do aluno, isto é, respeitar os diferentes níveis de
conhecimento que este traz consigo para a escola.
O segundo passo é a problematização, ou seja, a criação de uma necessidade,
a busca de questões que precisam ser resolvidas no âmbito da prática social. É o
momento em que se inicia o trabalho com o conteúdo sistematizado. Procura-se,
nesta etapa, explicar as razões pelas quais determinados conteúdos devem ser
aprendidos, transformando-os em questões problematizadoras.

A problematização é também o questionamento do conteúdo escolar


confrontado com a prática social, em razão dos problemas que precisam ser
resolvidos no cotidiano das pessoas ou da sociedade. Ao relacionar o
conteúdo com a prática social, definem-se as questões que podem ser
encaminhadas e resolvidas por meios desse conteúdo específico. (Gasparin,
2012, p. 35).

Em seguida, vem a instrumentalização, em que o professor apresenta aos


alunos ações adequadas ao conhecimento científico. Nessa etapa, ocorre a
apropriação dos instrumentos teóricos e práticos, “os educandos e o educador agem
no sentido da efetiva elaboração interpessoal da aprendizagem, através da
apresentação sistemática do conteúdo por parte do professor e por meio da ação
intencional dos alunos de se apropriarem desse conhecimento” (Gasparin, 2012, p.
51).
O quarto passo, a catarse, é a síntese feita do saber espontâneo e do saber
elaborado. O momento da expressão elaborada da nova forma de entendimento da
prática social a que os alunos ascenderam. “Na catarse, a operação fundamental é a
síntese” (Gasparin, 2012, p. 123); a síntese do cotidiano e do científico, a conclusão
do conteúdo aprendido. Expressa-se através da avaliação que o educador faz, a fim
de verificar o quanto o aluno apropriou-se do conteúdo.
Por fim, ocorre a prática social final, quando acontece a transposição dos
conteúdos e conceitos adquiridos para exercício social. São as novas disposições
levando-se o apreendido para fora da sala de aula. Efetiva-se pelas ações que o
educando utiliza ao executar em seu cotidiano o conteúdo científico adquirido. Para a
Pedagogia Histórico-Crítica, o ponto de chegada do processo pedagógico “é o retorno
à Prática Social. Essa fase representa a transposição do teórico para o prático, dos
objetivos da unidade de estudo, das dimensões do conteúdo e dos conceitos
adquiridos” (Gasparin, 2012, p. 139).
Esses cinco passos, apresentam-se como uma forma possível de traduzir os
princípios da Pedagogia Histórico-Crítica para o campo específico da didática, de uma
teoria da educação que visa a crítica e a transformação da sociedade.
A partir dessa alternativa de ação docente-discente, os conteúdos e os
procedimentos didáticos são estudados na interligação que mantém com a prática
social dos alunos, a fim de oferecer-lhes uma oportunidade de aprender criticamente
o conteúdo científico. É uma importante contribuição para aqueles que buscam
realizar uma prática educativa crítica e emancipadora.

Considerações finais

As reflexões aqui apresentadas, nos permitem compreender que a Pedagogia


Histórico-Crítica é uma pedagogia contra-hegemônica, inspirada no marxismo,
portanto, preocupa-se com os problemas educacionais decorrentes da exploração do
homem pelo homem.
A Pedagogia Histórico-Crítica tem como pressuposto a transmissão de
conteúdos científicos por parte da escola, porém, sem ser conteudista. Essa teoria
preza pelo acesso aos conhecimentos e sua compreensão por parte dos sujeitos para
que estes sejam capazes de transformar a sociedade.
A educação escolar, desse modo, tem o papel de garantir os conteúdos que
permitem aos sujeitos compreenderem e participarem da sociedade de forma crítica,
superando a visão do senso-comum. A escola precisa proporcionar as condições
necessárias para a transmissão e a assimilação do saber sistematizado
historicamente. Com relação ao papel do professor, a teoria defendida aqui, aponta
que este deve converter o saber científico em saber escolar e ensiná-lo aos
educandos, ou seja, transmitir o saber historicamente produzido por meio da
mediação.
A partir das reflexões tecidas no decorrer deste artigo, fica evidente a
necessidade de superação da ordem social vigente, pois em uma sociedade de
classes, as condições de humanização dos indivíduos são desiguais. Cabe à escola,
portanto, opor-se a essas desigualdades, oportunizando a apropriação do
conhecimento. Faz-se necessário, assim, uma retomada a valorização da escola e do
trabalho do professor.
Nesse contexto, a Pedagogia Histórico-Crítica sustenta que o indivíduo se torna
homem por meio da assimilação do saber já produzido, assim, compreende-se que o
mundo social não é algo estabelecido, mas construído. Dessa forma, a sociedade
pode ser questionada e transformada por meio de práticas docentes engajadas na
superação de problemas sociais.
Defendemos, portanto, a compreensão de que as ações docentes devem ser
pensadas no intuito de viabilizar a emancipação do homem, para que este possa
refletir e agir sobre o mundo, a fim de modificá-lo.

REFERENCIAS

CORTELLA, M. S. A escola e o conhecimento: fundamentos epistemológicos e


políticos. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2001.
FREIRE, P. A educação na cidade. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2000.

______. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 56. ed.


Rio de Janeiro/São Paulo: Paz e Terra, 2018.

GASPARIN, J. L. Uma didática para a pedagogia histórico-crítica. 5. Ed. Ver.


Campinas, SP: Autores Associados, 2012.

hooks, bell. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. 2.


ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2017.

SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica: primeiras aproximações. 11. ed. Ver.


Campinas, SP: Autores Associados, 2013.

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