Departamento de Ciências Sociais e do Comportamento
Doutoramento em Psicologia Clínica
Formulação Clínica e Plano de Intervenção
Perturbação de Ansiedade Social/ Fobia social
Priscila Dantas Osório
Discente 37809
Trabalho prático na Unidade Curricular Tópicos Avançados em Terapia
Cognitivo-comportamental com Adultos, Doutoramento em Psicologia Clínica
2020/2021:
Docente: Profª Doutora Isabel Basto
Março de 2021
2
ÍNDICE
Introdução…………………………………………………………………………… 03
Formulação Clínica…………………………………………………………………. 06
Plano de Intervenção………………………………………………………………... 10
Reflexão Crítica……………………………………………………………………... 14
Referências Bibliográficas………………………………………………………….. 15
3
INTRODUÇÃO
A Terapia Cognitivo-Comportamental (TCC) surgiu nos anos 60 de século XX
(Beck, 1963), até os dias atuais surgiram diferentes tradições e atualizações do modelo
terapêutico a partir deste referencial. A TCC abrange intervenções terapêuticas que têm
como objetivos produzir mudanças nos pensamentos, nos sistemas de significados, além
de uma transformação emocional e comportamental mais duradoura; e proporcionar
autonomia ao cliente, alcançando assim o alívio ou a remissão total dos sintomas (A.
Beck, 1993). A TCC se propõe a ser uma forma empiricamente validada de intervenção,
cuja eficácia já foi testada para uma grande quantidade de transtornos psiquiátricos (A.
Beck & Weishaar, 2000).
A TCC, de acordo com Sá & Baptista (2018) enfatiza o papel central dos
processos cognitivos e acontecimentos como mediadores da mudança comportamental,
tendo três pressupostos básicos:
1. A atividade cognitiva afeta o comportamento.
2. A atividade cognitiva pode ser monitorizada e alterada.
3. As mudanças de comportamento desejadas podem ocorrer através da
modificação da cognição.
A cognição, função da consciência que diz respeito às deduções feitas sobre as
experiências da vida, é considerada pela Teoria cognitiva de psicopatologia e
psicoterapia como o elemento fundamentalmente envolvido na manutenção dos
transtornos psicológicos (Knapp& Rocha, 2003).
Deste modo, Beck, Rush, Shaw & Emery (1997) referem que pessoas com
perturbações do foro psicológico apresentam pensamentos disfuncionais ou distorcidos.
Sendo, o foco de trabalho da TCC obter mudanças cognitivas / mudanças no
pensamento, através de uma avaliação realista das situações de vida das pessoas, tendo
como consequências alterações positivas no humor e no comportamento das pessoas.
Beck et al. (1997) identificam três níveis de cognições na TCC:
1) Os Pensamentos automáticos (PAs), as crenças intermediárias e as crenças
centrais. Os PAs são parte de um fluxo de processamento cognitivo subjacente ao
processamento consciente dos eventos, costumam ser particulares ao indivíduo e
ocorrem de maneira muito rápida, na avaliação e interpretação do significado de
espisódios de sua vida.
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2) As crenças centrais ou nucleares, de acordo com Beck et al (1997), são “ideias/
tida como absolutamente verdadeiras” desenvolvidas na infância através das interações
do indivíduo com outras pessoas significativas e da vivência de muitas situações que
fortaleçam esta ideia. As crenças centrais são sobre o próprio indivíduo, às outras
pessoas e/ou o mundo. Essas crenças costumam ser globais, excessivamente
generalizáveis e absolutistas, Beck et al. (1997) referem que as crenças centrais são
como mecanismos desenvolvidos pelas pessoas para lidar com as situações cotidianas,
são a maneira como as pessoas percebem a si próprias, aos outros/ ao mundo e ao
futuro, esta percepção é chamada de tríada cognitiva.
3) As crenças intermediárias ou condicionais, afirma Leahy (2006), são regras,
atitudes ou suposições, são afirmações: “se… então…” ou “deveria…”, que se
apresentam de maneira inflexível e imperativa. Tais crenças apoiam às crenças centrais,
com as quais estão estreitamente relacionadas. White (2003) afirma que, com a
finalidade de dar significado ao mundo, as pessoas constroem um conjunto de crenças
condicionais que foram aprendidas e vão sendo acrescentadas umas às outras ao longo
da vida.
Na continuidade de seus estudos Beck (2005) propõe a “teoria dos modos”, onde
afirma que as crenças centrais pressupõem, necessariamente, a tríade cognitiva e que
não são em si mesmas disfuncionais, e sim, a sua forma de ativação é que pode ser
disfuncional. A ativação disfuncional ocorre quando esta não condiz com o contexto e
as evidências. De acordo com a teoria dos modos as crenças não são disfuncionais, até o
momento em que sua ativação se torne disfuncional, quando o contexto e as evidências
forem mal interpretados ou percecionados por um indivíduo.
O trabalho terapêutico em TCC se inicia com a apresentação e compreensão do
pedido de ajuda, motivo da consulta, a realização de uma anamnese, exame do estado
mental e avaliação psicológica ou nosológica. Em TCC, este processo, no qual o
terapeuta e o cliente participam, tendo como objetivo inicialmente descrever e explicar
as dificuldades apresentadas pelo cliente, que tem como função orientar a intervenção,
para suavizar o sofrimento e desenvolver a resiliência do cliente, é denominado de
conceitualização de caso (Kuyken, Padesky e Dudley, 2010).
Neste trabalho utilizaremos a expressão “formulação clínica”, que funciona como
um mapa para orientar a intervenção do terapeuta durante o processo terapêutico, a
formulação clínica estrutura a informação sobre o entendimento da subjetividade do
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cliente e auxilia no planeamento das estratégias terapêuticas a serem utilizadas (Person
et al., 2006).
Diversos autores entendem que uma formulação clínica eficaz deve investigar os
seguintes aspetos com os clientes (Knapp, 2004; Knapp & Rocha, 2003; Wright et al.,
2008, Kuyken et al 2008, 2010): 1) Diagnóstico clínico; 2) Problemas atuais; 3) Fatores
precipitantes; 4) Predisposições genéticas e familiares; 4) Identificação de Pensamentos
Automáticos; 5) Crenças intermediárias, 6) Crenças centrais; 7) Recursos, fatores
protetores e pontos fortes do cliente.
Neste trabalho a Formulação Clínica, obedecerá a seguinte estrutura:
I – Dados Pessoais, onde os dados de identificação foram alterados para preservar
a confidencialidade do cliente.
II – Lista de Problemas.
III – Diagnóstico, segundo o DSM V.
IV – Narrativa através da eleição do modelo cognitivo explicativo da perturbação
da ansiedade social de Rapee e Heimberg (1997) e de Clark e Wells (1995), onde serão
integrados dados sobre a origem, mecanismos de manutenção da problemática no caso,
fatores precipitantes e a sua relação com os problemas, bem como a identificação de
recursos atuais potencialmente facilitadores do processo de intervenção terapêutica e de
mudança.
Posteriormente será apresentado um Plano de Intervenção, onde constará:
I – Os objetivos gerais e estrutura geral da intervenção
II –A organização da intervenção em módulos terapêuticos, com objetivos e
estratégias específicas.
Por fim, haverá uma reflexão crítica acerca deste trabalho e a contribuição para a
prática clínica.
6
FORMULAÇÃO CLÍNICA
I – Dados pessoais:
José, é um jovem músico, 32 anos, universitário e solteiro. A história clínica
descrita é omissa quanto à sua fratria, relata a existência de uma forte relação afetiva
com a mãe e de um relacionamento mais distante e frio com o pai. José partilha a casa
com um colega de faculdade.
II – Lista de problemas:
1. José sente intensa ansiedade quando se expõe publicamente e está sob a
avaliação dos outros.
2. Nas situações de exposição pública apresenta sintomas fisiológicos, tais como
aceleração dos batimentos cardíacos, dificuldades respiratórias e suores.
3. Na esfera social tem poucos amigos e relacionamentos amorosos superficiais
4. Evita o contato social
5. Sente-se pouco motivado para as suas atividades diárias, sensação de cansaço e
falta de energia.
6. Irritabilidade.
III – Diagnóstico, segundo o DSM-V (American Psychiatric Association, 2013):
Perturbação de Ansiedade Social (Fobia Social), com especificador de ansiedade
de desempenho - DSM-V: 300.23.
José satisfaz os seguintes critérios diagnósticos para Perturbação de Ansiedade
Socia (PAS):
A. Medo ou ansiedade acentuados acerca de uma ou mais situações sociais em
que o indivíduo é exposto a possível avaliação por outras pessoas.
B. Teme agir de forma a demonstrar sintomas de ansiedade que serão avaliados
negativamente.
C. As situações sociais quase sempre provocam medo ou ansiedade.
D. As situações sociais são evitadas ou suportadas com intenso medo ou
ansiedade.
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E. O medo ou ansiedade é desproporcional à ameaça real apresentada pela
situação social e o contexto sociocultural.
F. O medo, ansiedade ou esquiva é persistente, geralmente durando mais de seis
meses.
G. O medo, ansiedade ou esquiva causa sofrimento clinicamente significativo ou
prejuízo no funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da vida
do indivíduo.
IV- Narrativa através da eleição do modelo cognitivo explicativo da perturbação da
ansiedade social/ fobia social de Rapee e Heimberg (1997) e de Clark e Wells (1995).
O modelo de Rapeee & Heimberg (1997) baseia-se no princípio de que as pessoas
com perturbação da ansiedade social mantêm crenças negativas arraigadas em relação à
autoavaliação de seu desempenho social à opinião que os outros terão sobre elas nas
situações sociais. O fóbico social é perfeccionista e desenvolve padrões muito elevados
em relação ao que seria um comportamento social adequado. Costuma acreditar que
será rejeitado se não agir de forma socialmente perfeita ou demonstrar ansiedade e que
será julgado diferente, estúpido ou incompetente (Clark & Wells, 1995)
As dificuldades de interação social de José tiveram origem, quando entrou na
escola primária, embora relate que sempre foi uma criança tímida. Nos primeiros meses
de aulas chorava imenso sempre que tinha de ir à escola e muitas vezes pedia para que
telefonassem à mãe para que o viesse buscar mais cedo, a mãe do José tentava
salvaguardá-lo desta situação incómoda e por muitas vezes cedia aos seus pedidos para
ficar em casa. O pai de José não aceitava a situação, embora permitisse que a mãe
tomasse as decisões relativas à educação do filho. Mas, tinha uma atitude muito crítica e
dura com José, que desenvolveu a perceção de nada do que fizesse era suficiente para o
agradar, chegando a afirmar: “Acho que meu pai nunca achou que eu fosse capaz de
fazer alguma coisa de jeito, sempre tentei provar o contrário… Com a música eu
conseguia, mas agora, depois que falhei no recital já não sei de nada!”
De acordo com Clark & Wells (1995) os fóbicos sociais têm sobre apresentam
critérios próprios e exageradamente elevados de adequação do desempenho social,
como “preciso agradar a todos sempre”, crenças condicionadas sobre a avaliação social,
como “se eu cometer erros, vou ser rejeitado”, crenças centrais de “ser incapaz,
inaceitável, anormal ou inferior”. Na base dessas crenças está o intenso desejo de ser
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aceito devido a um bom desempenho social e uma marcada insegurança na própria
capacidade de fazê-lo. Esses clientes superestimam a possibilidade de eventos negativos
ocorrem e se sentem constantemente criticados. Quando encontram uma situação social
temida que ative a crença central, é como se fosse acionado um “programa de
ansiedade” que se inicia com a ativação das crenças de incapacidade e inadequação e à
perceção da situação social como perigosa. O que desencadeia sintomas cognitivos,
somáticos e comportamentais e provoca o desvio da atenção do ambiente para dentro de
si mesmo em uma monitoração detalhada de seus comportamentos, sentimentos e
sensações corporais, o que se denomina atenção autofocada.
Neste caso, José, desenvolveu as crenças centrais de que é incapaz, não é bom o
suficiente, os outros são demasiadamente severos na avaliação e crítico sobre a maneira
dele ser e realizar as atividades, na infância, nas experiências que teve com uma mãe
extremamente protetora que com esta atitude muitas vezes o poupou das tentativas e
erros no desenvolvimento da sua autonomia, criando em José, a crença de que se outros
precisam agir por em meu lugar é porque eu não tenho capacidade para resolver os
meus problemas, por outro lado, o pai, muito severo e crítico, reforça esta crença, além
de criar um forte desejo de provar que é capaz para receber atenção e aproximar-se do
pai, satisfazendo as suas expectativas de bom desempenho para se sentir amado e
apreciado por este. Sendo a crença de que tem de provar que é capaz, a crença
condicional neste esquema cognitivo.
A falha no recital na Escola Superior de Música e as críticas que recebeu, foram o
fator precipitante que ativou as crenças centrais e acionou o “programa de ansiedade”
descrito por Clark & Wells (1995), o medo de falhar novamente, faz com que José
vislumbre um futuro terrível, de fracasso, completando assim a tríade cognitiva da
Perturbação da ansiedade social: “Acredito que não sou capaz, os outros são críticos
severos e meu futuro será terrível, agora já não sei nada, estou acabado, porque não
conseguirei estar à altura de desempenhar adequadamente os desafios básicos a que
estarei sujeitos na profissão que escolhi.”.
De acordo com J. Beck (2007), para além da identificação das crenças é
necessários identificar as estratégias compensatórias, como estas se ligam às crenças
centrais, para a organização da intervenção e estabelecimento das metas da terapia. As
estratégias compensatórias são comportamentos causam sofrimento quando são
executadas em excesso, em detrimento de outras estratégias mais funcionais. É
importante avaliar a influência das estratégias compensatória na vida dos clientes, bem
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como da rigidez das mesmas, pois, dessa forma, torna-se possível criar expectativas
realistas na orientação do tratamento. As estratégias compensatórias atuam como uma
forma de retroalimentar o sistema de crenças, sendo que quando as mesmas são
disfuncionais acabam por reforçar e auxiliar a manutenção dos sintomas e o sofrimento
dos clientes.
José tem convivido com a perturbação da ansiedade social utilizando várias
estratégias compensatórias, tais como: durante o curso não se inscreveu em unidades
curriculares cuja participação fosse um requisito de avaliação, não entra sozinho em
cafés, refugia-se no quarto quando o seu colega traz outras pessoas para casa. Evita
tocar a solo e entrou para uma orquestra para evitar estar no centro das atenções.
Entretanto, esta estratégia já não tem sido eficiente, pois José começa a sentir-se muito
ansioso também para participar dos ensaios e concertos da orquestra, neste momento,
ele toma consciência do prejuízo ocupacional e sofrimento que a perturbação da
ansiedade social traz à vida e decide então procurar a ajuda da psicoterapia.
Quanto aos recursos potencialmente facilitadores do processo de intervenção
terapêutica e de mudança apresentados pelo cliente é a sua própria motivação e
expectativa de receber ajuda num processo terapêutico. De acordo com Wampold &
Imel, (2015), a criação de expectativas, relacionadas com um racional convincente sobre
os problemas que o cliente traz para a psicoterapia e com ações terapêuticas consistente
com esse racional, mostram a importância de estabelecer um nível elevado de
colaboração quanto aos objetivos e às tarefas terapêuticas. (Norcross, J, 2011) as
expectativas do cliente contribuem com cerca de 15% dos resultados terapêuticos.
No caso de José, a própria crença condicional de “ter de mostrar que é capaz”
poderá a ser um recurso, uma vez que ele não desiste de tentar superar a sua dificuldade,
o apoio e suporte que tem da mãe, com quem tem uma relação muito próxima, para
além do suporte interpares com os companheiros de orquestra, uma vez que tocar em
conjunto é uma tarefa que para ser bem-sucedida envolve uma boa sintomia e coesão de
grupo, o facto de José possuir um bom nível educacional também é preditor de um bom
prognóstico.
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PLANO DE INTERVENÇÃO
Rosenbaun (1995) em uma revisão não sistemática de diversos estudos, encontrou
os seguintes resultados:
1) Superioridade consistente daTCC comparada a placebo ou intervenções não
específicas;
2) Manutenção das melhoras obtidas com o tratamento por um período de até
cinco anos; e
3) Baixas taxas de recaídas, sendo estas de 5% a 7%
Em duas meta-análises, de Feske e Chambless (1995), incluindo 21 ensaios
clínicos, e de Federoff e Taylor (2001), incluindo 108 ensaios clínicos, verificou-se que:
1) A exposição, a reestruturação cognitiva, exposição associada à reestruturação
cognitiva e Treinamento de Habilidades Sociais (THS) produzem reduções dos sintomas
dos clientes semelhantes;
2) Após a alta (variando de dois a seis meses), a eficácia da exposição associada à
reestruturação cognitiva foi maior do que a do grupo placebo;
3) As taxas de abandono nas diferentes técnicas cognitivas e comportamentais
foram baixas (10% a 20%); 4) o efeito da farmacoterapia (benzodiazepínicos e
inibidores seletivos de recaptacão de serotonina) foi superior a da TCC no seguimento
imediatamente após a alta; e
5) Não houve diferenças entre tratamento em grupo ou individual.
I – Objetivos gerais
Segundo Sá & Baptista (2018), os processos de intervenção cognitivo-
comportamental destinam-se a ajudar os clientes a tomar consciência dos seus processos
cognitivos disfuncionais e ensiná-los a detetar , captar, monitorizar e interromper ciclos
cognitivo-emocionais disfuncionais e a produzir respostas de enfrentamento mais
adaptativas. Também ajudam os clientes a identificarem situações de risco que poderão
encontrar no futuro e a prepararem-se para lidar com fracassos, se estes ocorrerem.
II – Objetivos Específicos
1. Diminuir a sintomatologia da ansiedade
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2. Fornecer estratégias para a gestão da ansiedade e autocontrolo emocional
3. Modificar as crenças centrais e promover a restruturação cognitiva;
4. Incentivar a Exposição
5. Realizar o treino de habilidades sociais
III – Estrutura geral da intervenção:
1. Vinte e cinco a trinta sessões de aproximadamente, 60 minutos
2. Uma sessão de follow-up após 1 mês.
3. Uma sessão de follow-up após 6 meses.
III –A organização da intervenção em módulos terapêuticos, com objetivos e estratégias
específicas.
1. Módulo I (4 a 5 sessões semanais): estabelecimento da aliança terapêutica,
avaliação, elaboração da formulação, psicoeducação e estabelecimento das
metas terapêuticas.
2. Módulo II (20 sessões quinzenais): utilização de técnicas de relaxamento
muscular progressivo, reestruturação cognitiva, exposição, treino de
habilidades sociais
3. Módulo III (5 sessões, sendo as três primeiras quinzenais, a quarta passado
um mês e a quinta passados seis meses): Consolidação da mudança e
prevenção de recaída
No módulo I, em primeiro lugar é fundamental estabelecer uma relação
terapêutica de colaboração ativa entre terapeuta e cliente, que conduza a um acordo
sobre os objetivos e tarefas terapêuticas e aumentem a expectativa do cliente (Sousa,
2017). Realizar a formulação clínica em termos cognitivos auxiliará na escolha das
metas que serão trabalhadas e das intervenções terapêuticas a serem realizadas (Knapp
& A. Beck, 2008).
A formulação clínica serve de base para a psicoeducação, é muito importante a
compreensão cognitiva do cliente, pois sem esta todo o tratamento se resumirá à
aplicação de várias técnicas cognitivas e comportamentais, que não resultarão em um
trabalho eficaz. Diferentemente disso, os terapeutas cognitivo-comportamentais
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elaboram um plano de tratamento adequado ao cliente, levando em conta o
entendimento cognitivo do mesmo, com um planeamento estratégico para garantir um
resultado eficaz. A elaboração da conceitualização cognitiva individual favorece o
reforço do trabalho produtivo da relação terapêutica, que ajudará o cliente a
compreender possíveis problemas que surjam durante o tratamento (Knapp & Beck,
2008; Rangé, 2004). Nesse sentido, Waller (2009) ressalta que toda vez que o clínico
perceber que o cliente diminuiu sua adesão ao tratamento, a conceitualização cognitiva
deverá ser retomada para que a díade compreenda o problema que se impõe e o que
pode ser feito em relação a isso.
No módulo II, onde já temos o entendimento e o racional que guiará o processo
estabelecido serão aplicadas técnicas empiricamente validadas, no caso do José, são
elas:
a) Técnicas de relaxamento muscular progressivo para controlo de sintomas
fisiológicos.
b) Modificação do autoprocessamento: o autoprocessamento pode ser trabalhado
com intervenções que visem a mudar o foco de atenção do cliente sobre si
mesmo para o ambiente ou para o interlocutor a quem se dirige, buscando
sinais sociais realistas de aprovação ou eventual desaprovação de seu
desempenho social (Clark & Wells, 1995).
c) A reestruturação cognitiva é um elemento central das intervenções em TCC,
para uma exploração mais sistemática do conteúdo dos pensamentos pode se
recorrer a algumas das seguintes questões: 1) Que provas tenho que apoiam e
que não apoiam esta ideia?; 2) Existe outra explicação ou ponto de vista
alternativo?; 3) Qual o pior cenário e como lidaria com ele?; 4) O que de
melhor pode acontecer? 5) Qual a possibilidade mais realista?; 6) Qual o
efeito de acreditar neste pensamento?/ Qual seria o se não acreditasse neste
pensamento?; 7) O que eu diria a um amigo se estivesse na minha situação?;
8) O que devo fazer? (Sá & Baptista, 2018).
d) Exposição: A exposição nos quadros de perturbação da ansiedade social tem
por objetivo levar o cliente ao enfrentamento das situações sociais temidas, de
tal forma que o processo natural de condicionamento do medo da situação
social reduza a ansiedade despertada por meio de sua habituação e extinção do
medo e da esquiva. A exposição promove a invalidação das crenças centrais
de autoimagem negativa ou de ser um objeto social inadequado. É usada como
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um mini- experimento, desenhado para provocar ansiedade social e ativar
pensamentos automáticos disfuncionais e crenças centrais que ficam, então,
disponíveis para modificação. Algumas técnicas podem ser usadas durante a
exposição para otimizá-la como experimento, como evitar o uso de
comportamentos de segurança, após se explicar ao cliente como eles mantêm
o círculo vicioso de perturbação da ansiedade social, pode se recorrer a técnica
imagéticas e role-play (Picon, 2011)
e) O Treino das habilidades sociais visa desenvolver habilidades que permitam
um convívio social mais adaptativo, diminuindo a ansiedade de desempenho e
promovendo uma interação verbal mais efetiva. Essa abordagem também pode
resultar em melhora do quadro por redirecionar a atenção autofocada do
cliente. O objetivo do THS é oferecer ao cliente um repertório
comportamental mais amplo e socialmente ajustado, devendo ser planejado de
forma específica para cada caso. O THS implica exposição repetida a
situações sociais temidas com reavaliação cognitiva subsequente, conforme a
ansiedade social diminua e a atuação social melhore (Butler & Wells, 1993).
No módulo III aproxima-se o final da psicoterapia, nesta fase, faz-se a revisão das
técnicas aprendidas e orienta-se para a prática contínua das mesmas, visando-se, assim,
a manutenção da melhora clínica. Deve-se, também, atentar para recaídas e seus
potenciais precipitantes. Finalmente, as consultas podem ser espaçadas ao longo de um
período, até a alta propriamente dita. (Ito, L.M et al, 2008).
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REFLEXÃO CRÍTICA
A realização deste trabalho em formato prático, onde recebemos um caso,
encenamos e filmamos uma consulta, após a formulação clínica e elaboração do plano
terapêutico proporcionou-nos uma apropriação mais integrada dos conteúdos teóricos
ministrados durante as aulas, revelando-se uma ferramenta didática muito eficaz neste
contexto de aprendizagem.
Embora houvesse um conhecimento prévio dos pressupostos teóricos da Terapia
Cognitivo-comportamental não havia a integração dos mesmos, de maneira organizada
na minha prática clínica, apercebi-me que utilizava por vezes técnicas da TCC de
maneira aleatória e os efeitos das mesmas eram subaproveitados por não haver a
informação sobre a problemática dos utentes do meu serviço, integrada e organizada no
sistema lógico-compreensivo da formulação clínica da TCC.
Considero um desafio dominar as técnicas específicas deste modelo teórico, que
reconheço utilizar de maneira ainda muito incipiente, como é possível observar na parte
audiovisual deste trabalho. Foi muito útil poder observar-me no lugar de terapeuta e
identificar a altura onde perdi a oportunidade de iniciar uma intervenção em
reestruturação cognitiva.
O vídeo foi propositadamente produzido sem um guião, sem perguntas e respostas
programadas, embora eu tivesse planeado que iria realizar uma determinada intervenção
(reestruturação cognitiva), na oportunidade gerada pelo improviso foi realizada a
recolha de informação sobre as origens das crenças centrais e intermediárias, a
psicoeducação, o relaxamento muscular progressivo e a monitorização dos pensamentos
automáticos, resultando numa sessão de 41 minutos, onde o vídeo foi dividida em três
partes, para que apenas um fosse entregue para cumprir os requisitos de duração de 20
minutos solicitados nesta avaliação.
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