REVISTA DO DIREITO DO COMÉRCIO INTERNACIONAL Nº 7
G 20 – DE ONDE VEIO; ONDE VAI1
Renato Baumann2
Este ano o Brasil assume a presidência do G20, trazendo uma série de
implicações e curiosidade. A nal, o que é e o que faz o G20?
1. Contexto da criação
À medida que o Brasil se insere no debate internacional, cresce o
questionamento a respeito da sua posição na hierarquia global e fóruns
multilaterais. Para melhor compreender a atuação do G20, é necessário
conhecer o grupo que fomentou a sua criação, o G7.
Diante da necessidade de uma nova ´arquitetura nanceira
internacional`3, os países cujas economias vinham apresentando taxas
de crescimento superiores às das economias de alta renda entraram
no cenário econômico como “emergentes”. Naquele contexto, a
contribuição destes países para o crescimento da produção global
superava a dos países do G7.
Isso levou à criação do G20 incluindo, além dos países do G7,
a África do Sul, Arábia Saudita, Argentina, Austrália, Brasil, China,
Índia, Indonésia, México, Coreia, Rússia e Turquia. A União Europeia
é o vigésimo membro.
O G20 é um fórum ´informal`, sem estrutura institucional xa
e corpo técnico, com sistema de presidência rotativa de periodicidade
anual, cando os trabalhos de organização a cargo do país que detém
a presidência. Assim, demanda apoio técnico a outros organismos
internacionais, como a OCDE, o Banco Mundial e o FMI.
É auto-referenciado desde 2012 como o fórum de maior destaque
para a cooperação internacional sobre temas econômicos e nanceiros,
e é peculiar por colocar ao mesmo nível no debate economias de alta
renda e economias emergentes. Adota como objetivos a coordenação
1
Esse texto foi baseado em Publicação Expressa no Instituto de Pesquisa Eco-
nômica Aplicada (Ipea), em 2024. Ver em: https://repositorio.ipea.gov.br/bitstre-
am/11058/14087/1/NT_Dinte_70_G20_de_onde_veio_onde_vai_Publicacao_
Expressa.pdf
2
Coordenador de Relações Econômicas Externas, DINTE/IPEA.
3
Ver a respeito, Eichengreen (2013), Cintra/Martins (2013), Ocampo (2017),
Grif th-Jones (2003).
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G 20 – DE ONDE VEIO; ONDE VAI
política para promover estabilidade econômica e crescimento
sustentado, assim como regulação nanceira para reduzir riscos e
prevenir crises, contribuindo para a criação de uma nova arquitetura
nanceira internacional4.
Os membros do grupo correspondem a 85% do PIB global, 75%
do comércio mundial e a 2/3 da população mundial (G20, 2022), daí
sua importância enquanto propositor de enfoques de políticas. Até o
momento houve 18 edições do G20, a contar pelas reuniões de Cúpula,
com a 19ª. tendo lugar no Brasil, em 2024.
2. Histórico de atuação
Os primeiros movimentos do G20 estiveram vinculados
estritamente à área nanceira e, como resultado, existem duas trilhas
que são subdivididas internamente: a trilha nanceira, com sete grupos
técnicos e três forças-tarefa, e a trilha dos ´sherpas`5 mais ampla e
diversi cada6, com quinze grupos de trabalho, duas forças-tarefa e uma
iniciativa.
Os países membros do G20 são divididos em cinco grupos, cada
qual com cinco países: Grupo 1: Austrália, Canadá, Arábia Saudita e
Estados Unidos; Grupo 2: Índia, Rússia, África do Sul e Turquia; Grupo
3: Argentina, Brasil e México; Grupo 4: França, Alemanha, Itália e
Reino Unido e Grupo 5: China, Indonésia, Japão e Coreia do Sul.
Há uma relativa concentração geográ ca na composição de cada
grupo, com a presidência ´pro tempore` a um dos membros dos grupos
a cada ano. Procura-se uma continuidade com a ´troika`, juntando o país
que presidiu no ano anterior, o atual presidente e o país do próximo ano.
Os trabalhos de identi cação dos temas das reuniões de cúpula
devem re etir as preocupações da sociedade dos países participantes.
Para isso foram constituídos os chamados ´grupos de engajamento`, que
preparam recomendações a serem apresentadas à presidência do grupo
e são formados por representantes de grupos dos países membros.
São onze grupos: Empresarial (B20), Sociedade Civil (C20),
Trabalhista (L20), Parlamentar (P20), Ciência (S20), Instituições de
Auditoria (SAI 20), Empresas recém-criadas (Startup20), Instituições de
4
Ver a respeito Hajnal (2019)
5
Denominação associada ao trabalho dos guias nas montanhas do Himalaia.
6
Ver https://www.g20.org/pt-br/trilhas/trilha-de-sherpas
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Pesquisa (T20), Questões urbanas (U20), Mulheres (W20) e Juventude
(Y20).
Do ponto de vista interno aos países, se espera que os trabalhos
dos grupos de engajamento operem como uma ferramenta de ´lobby`
dos setores da sociedade junto às altas autoridades.
3. Presidência
Pela primeira vez o grupo está sendo presidido em sequência
temporal por quatro economias emergentes - Indonésia, Índia, Brasil
e África do Sul - uma oportunidade única para se incluir temas de
interesse direto das economias não-desenvolvidas.
O modelo de presidência rotativa é provavelmente o mais
democrático, possibilitando aos membros a oportunidade de in uenciar
a agenda e estimulando que cada país presidente acrescente tópicos
especí cos na agenda. Contudo, há dispersão de objetivos, pelo fato
de que o país-sede não pode apenas priorizar os temas de seu interesse.
Há questões de fácil identi cação, como as necessidades de
nanciamento, acesso a tecnologia, redução de barreiras comerciais e
outras. Mas há, também, uma área cinza, sobre a reforma da governança
global.
A abrangência notável de temas traz implícito um custo: é preciso
que os diversos setores da sociedade conheçam e acompanhem as
discussões no âmbito do G20, e se identi quem com o que é acordado
nesse âmbito.
Caricaturando, havia um político sagaz brasileiro que sempre dizia
que ´não se marca reunião antes de que tudo já esteja acertado`. Nesse
sentido, o G20 é candidato a ser o local para ´conversas de corredor`
para amadurecer posições a serem discutidas no âmbito decisório dos
organismos multilaterais.
A legitimidade do G20 é questionada por não-membros em
função de que as decisões acordadas podem ter efeitos generalizados,
sendo questionável a representatividade destes 20 países para adotarem
medidas de ampla abrangência. Uma das particularidades criticadas
é o baixo grau de transparência, sendo que as informações são mais
acessíveis no país que detém a presidência.
No cenário atual, não há perspectiva do G20 comprometer a
existência do G7. A convivência entre os dois grupos é um dado, e se
espera que possa haver compatibilidade quanto aos problemas globais.
Existe a possibilidade de o G20 vir a desempenhar um papel
relevante noredesenhodosmandatos eformade atuação das organizações
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multilaterais. Isso será tanto mais factível quanto suas deliberações
ecoarem as demandas das sociedades dos países representados, que suas
decisões não violem os propósitos dos países não-membros, e que sua
atuação não se veja tolhida por pressões de parte de grandes potências.
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