Escola de Direito UNIALFA/FADISP
Atualidades em Direito Constitucional e Administrativo
Prof. Me. Helen Rose Guimarães
Controvérsias da nova Lei de Improbidade Administrativa 14.230/21
Fonte: https://www.camara.leg.br/noticias/820702-mudancas-na-lei-de-improbidade-
administrativa-entram-em-vigor/
Primeira controvérsia
Redação do art. 1º, §§1º, 2º e 3º e art. 10:
Art. 1º O sistema de responsabilização por atos de improbidade administrativa tutelará a
probidade na organização do Estado e no exercício de suas funções, como forma de assegurar
a integridade do patrimônio público e social, nos termos desta Lei. (Redação dada pela Lei
nº 14.230, de 2021)
§ 1º Consideram-se atos de improbidade administrativa as condutas dolosas tipificadas nos
arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, ressalvados tipos previstos em leis especiais. (Incluído pela Lei
nº 14.230, de 2021)
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§ 2º Considera-se dolo a vontade livre e consciente de alcançar o resultado ilícito tipificado nos
arts. 9º, 10 e 11 desta Lei, não bastando a voluntariedade do agente. (Incluído pela Lei nº
14.230, de 2021)
§ 3º O mero exercício da função ou desempenho de competências públicas, sem comprovação
de ato doloso com fim ilícito, afasta a responsabilidade por ato de improbidade
administrativa. (Incluído pela Lei nº 14.230, de 2021)
Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação
ou omissão dolosa, que enseje, efetiva e comprovadamente, perda patrimonial, desvio,
apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art.
1º desta Lei, e notadamente: (Redação dada pela Lei nº 14.230, de 2021)
Aspectos gerais (dolo & culpa)
O dolo ocorre quando o agente pratica uma conduta com intenção de violar a norma jurídica,
ou seja, ele age com vontade consciente de cometer o ilícito. A culpa ocorre quando o agente
pratica o ilícito sem intenção, mas age com negligência, imperícia ou imprudência. Ou seja,
o resultado danoso não foi desejado, mas poderia ter sido evitado se o agente tivesse agido
com cuidado.
Negligência: Age com descuido, indiferença ou desatenção, não adotando as devidas
precauções. Um pai de família que deixa uma arma carregada em local inseguro ou de fácil
acesso a crianças, por exemplo, pode causar a morte de alguém por essa atitude negligente.
Imprudência: A imprudência, por sua vez, pressupõe uma ação precipitada e sem cautela. A
pessoa não deixa de fazer algo, não é uma conduta omissiva como a negligência. Na
imprudência, ela age, mas toma uma atitude diversa da esperada. Um motorista que dirige em
velocidade acima da permitida e não consegue parar no sinal vermelho, invadindo a faixa de
pedestres e atropelando alguém, por exemplo, age com imprudência.
Imperícia: Para que seja configurada a imperícia, é necessário constatar a inaptidão,
ignorância, falta de qualificação técnica, teórica ou prática ou ausência de conhecimentos
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elementares e básicos para a ação realizada. Um médico que realize uma cirurgia plástica em
alguém e cause deformidade pode ser acusado de imperícia.
Dolo: há intenção de cometer o ilícito ou assumir o risco de produzi-lo.
Culpa: não há intenção, mas o agente age de forma descuidada, causando o dano.
Julgamento do ARE 843.989 (Tema 1199 de Repercussão Geral):
1) É necessária a comprovação de responsabilidade subjetiva para a tipificação dos atos
de improbidade administrativa, exigindo-se - nos artigos 9º, 10 e 11 da LIA - a presença do
elemento subjetivo - DOLO;
A alteração promovida pelo legislador no texto original da Lei 8.429/1992, no sentido de
suprimir a modalidade culposa do ato de improbidade administrativa, é clara e plenamente
válida, pois a própria Constituição Federal delega à legislação ordinária a forma e tipificação
dos atos ímprobos, assim como a gradação das sanções constitucionalmente estabelecidas
(CF/1988, art. 37, § 4º).
Não responderá por improbidade, mas pode responder civil e administrativamente pelo
ato ilícito.
2) A norma benéfica da Lei 14.230/2021 - revogação da modalidade culposa do ato de
improbidade administrativa -, é IRRETROATIVA, em virtude do artigo 5º, inciso XXXVI, da
Constituição Federal, não tendo incidência em relação à eficácia da coisa julgada; nem
tampouco durante o processo de execução das penas e seus incidentes;
Art. 5º, XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa
julgada;
O princípio da retroatividade da lei penal mais benéfica não tem aplicação automática para a
responsabilidade por atos ilícitos civis de improbidade administrativa, por ausência de
expressa previsão legal.
Improbidade tem natureza civil e prevalece o princípio tempus regit actum.
3) A nova Lei 14.230/2021 aplica-se aos atos de improbidade administrativa culposos
praticados na vigência do texto anterior da lei, porém sem condenação transitada em julgado,
em virtude da revogação expressa do texto anterior; devendo o juízo competente analisar
eventual dolo por parte do agente;
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Incide a Lei 14.230/2021 em relação aos atos de improbidade administrativa culposos
praticados na vigência da Lei 8.429/1992, desde que não exista condenação transitada em
julgado, cabendo ao juízo competente o exame da ocorrência de eventual dolo por parte do
agente.
A incidência dos efeitos da nova lei aos fatos pretéritos não implica a extinção automática
das demandas, pois deve ser precedida da verificação, pelo juízo competente, do exato
elemento subjetivo do tipo: se houver culpa, não se prosseguirá com o feito; se houver dolo,
prosseguir-se-á. Essa medida é necessária porque, na vigência da Lei 8.429/1992, como não
se exigia a definição de dolo ou culpa, muitas vezes a imputação era feita de modo genérico,
sem especificar qual era o elemento subjetivo do tipo.
4) O novo regime prescricional previsto na Lei 14.230/2021 é IRRETROATIVO, aplicando-se
os novos marcos temporais a partir da publicação da lei.
Os prazos prescricionais previstos na Lei 14.230/2021 não retroagem, sendo aplicáveis a
partir da publicação do novo texto legal (26.10.2021).
RE 852475 (Tema 897)
São imprescritíveis as ações de ressarcimento ao erário fundadas na prática de ato
doloso tipificado na Lei de Improbidade Administrativa.
OUTRAS CONTROVÉRSIAS
Houve a propositura de 3 ADIs que versam sobre a temática.
ADI 7236
Liminar concedida para suspender:
Art. 1º, § 8º: Art. 1º […] § 8º – Não configura improbidade a ação ou omissão decorrente de
divergência interpretativa da lei, baseada em jurisprudência, ainda que não pacificada, mesmo
que não venha a ser posteriormente prevalecente nas decisões dos órgãos de controle ou dos
tribunais do Poder Judiciário.
(...) De fato, embora o propósito do legislador tenha sido proteger a boafé do gestor público
que confia e adota orientações exaradas pelo Poder Judiciário a respeito da aplicação da lei,
preservando-o de eventuais oscilações jurisprudenciais, deve ser reconhecido que o critério
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estabelecido no art. 1º, § 8º, da LIA, é excessivamente amplo e resulta em insegurança
jurídica apta a esvaziar a efetividade da ação de improbidade administrativa.
Art. 12. […] § 1º A sanção de perda da função pública, nas hipóteses dos incisos I e II do caput
deste artigo, atinge apenas o vínculo de mesma qualidade e natureza que o agente público ou
político detinha com o poder público na época do cometimento da infração, podendo o
magistrado, na hipótese do inciso I do caput deste artigo, e em caráter excepcional, estendê-la
aos demais vínculos, consideradas as circunstâncias do caso e a gravidade da infração.
(...) Consideradas essas premissas, ao estabelecer que a aplicação da sanção de perda da
função pública atinge apenas o vínculo de mesma qualidade e natureza que o agente detinha
com o poder público no momento da prática do ato de improbidade, o art. 12, § 1º, da nova
LIA, traça uma severa restrição ao mandamento constitucional de defesa da probidade
administrativa, que impõe a perda de função pública como sanção pela prática de atos
ímprobos independentemente da função ocupada no momento da condenação com trânsito
em julgado. Trata-se, além disso, de previsão desarrazoada, na medida em que sua incidência
concreta pode eximir determinados agentes dos efeitos da sanção constitucionalmente devida
simplesmente em razão da troca de função ou da eventual demora no julgamento da causa, o
que pode decorrer, inclusive, do pleno e regular exercício do direito de defesa por parte do
acusado.
Art. 12. […] § 10 Para efeitos de contagem do prazo da sanção de suspensão dos direitos
políticos, computar-se-á retroativamente o intervalo de tempo entre a decisão colegiada e o
trânsito em julgado da sentença condenatória.
Art. 17-B. […] § 3º Para fins de apuração do valor do dano a ser ressarcido, deverá ser realizada
a oitiva do Tribunal de Contas competente, que se manifestará, com indicação dos parâmetros
utilizados, no prazo de 90 (noventa) dias.
(...) a norma aparenta condicionar o exercício da atividade-fim do Ministério Público à
atuação da Corte de Contas, transmudando-a em uma espécie de ato complexo apto a
interferir indevidamente na autonomia funcional constitucionalmente assegurada ao órgão
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ministerial. Eventual desrespeito à plena autonomia do Ministério Público, em análise
sumária, consiste em inconstitucionalidade perante a independência funcional consagrada
nos artigos 127 e 128 da Constituição Federal.
Art. 21. […] § 4º A absolvição criminal em ação que discuta os mesmos fatos, confirmada por
decisão colegiada, impede o trâmite da ação da qual trata esta Lei, havendo comunicação com
todos os fundamentos de absolvição previstos no art. 386 do Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de
outubro de 1941 (Código de Processo Penal).
Consagrada no § 4º do art. 37 da Constituição Federal, segundo o qual “os atos de
improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função
pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação
previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”, a independência de instâncias exige
tratamentos sancionatórios diferenciados entre os atos ilícitos em geral (civis, penais e
político-administrativos) e os atos de improbidade administrativa.