Conceitos e Definições
resposta farmacológica ou clínica à
administração concomitante de dois ou
mais medicamento, diferente dos efeitos
esperados quando administrados
individualmente.
A interação medicamentosa é definida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(ANVISA) como resposta farmacológica, toxicológica, clínica ou laboratorial causada
pela combinação do medicamento com outros medicamentos, administrados
concomitantemente. Também pode decorrer da interação do medicamento com
alimentos, substâncias químicas ou doenças. Os resultados de exames laboratoriais
podem ter sua confiabilidade afetada por sua interação com medicamentos. A
interação medicamentosa pode resultar em um aumento (potencialização) ou
diminuição/redução da efetividade terapêutica ou ainda no aparecimento de novos
efeitos adversos.. Por mais que existam exemplos de efeito benéfico na interação
entre medicamentos, a maioria é prejudicial ao paciente. (BARBOSA, 2014).
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Qual o impacto das IM na farmacoterapia?
• Intoxicação medicamentosa;
• Inefetividade terapêutica;
30% das RAM são causadas por
Interações Medicamentosas
• Potencialização de efeitos adversos;
• Sinergismo medicamentoso...
58% de
risco de
RAM
13% de risco
82% de risco
de RAM
de RAM
As interações medicamentosas podem provocar efeitos prejudiciais à saúde do
paciente, como intoxicação medicamentosa, redução ou até anulação do efeito do
medicamento, não tratamento da doença, potencialização dos efeitos adversos
daqueles medicamentos. Mas existem interações desejáveis, quando utilizamos dois
medicamentos que agem sinergicamente e potencializam o efeito terapêutico de um
ou de ambos os medicamentos, um bom exemplo são os anti-hipertensivos, que
geralmente, são usados de forma associada.
O risco de reações adversas quando são administrados dois medicamentos é de 13%,
cinco medicamentos, é de 58% e sete medicamentos ou mais é de 82% (OLIVEIRA,
2013). Aproximadamente 30% das reações adversas a medicamentos são causadas
por interações medicamentosas (USSAI, 2015).
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Fatores de risco Paciente Oncológico
• Idade avançada;
• Múltiplas comorbidades / disfunção orgânica;
• Automedicação;
• Polifarmácia;
• Uso de medicamentos alternativos / fitoterápicos /
plantas medicinais;
• Falta de orientação/educação em saúde.
Sabemos que o tratamento medicamentoso antineoplásico varia conforme o tipo do
câncer, e por ser uma doença não seletiva, ela pode se manifestar em qualquer
pessoa (INCA, 2019). E justamente por essa característica não seletiva da doença,
novos desafios surgem, uma vez que pode acometer pacientes já em tratamentos de
outras comorbidades, adicionando mais um tratamento paralelo, dando espaço para
ocorrência das interações medicamentosas.
Sabemos também que pacientes oncológicos podem, muitas das vezes, apresentar
disfunção orgânica (que poderão comprometer a farmacocinética e dinâmica dos
medicamentos, fator esse também comum em idosos, os quais representam a maior
parcela dos pacientes com neoplasias), além disso podem existir fatores
complicadores adicionais como a automedicação e uso de medicamentos
alternativos/fitoterápicos/plantas medicinais, que atrelado a utilização de drogas de
suporte potencializarão ainda mais o acontecimento dessas IM, podendo inclusive
culminar em hospitalização e morte (RODRIGUES, 2016; SCHAEFER, 2018).
Nessa perspectiva, a presença de polifarmácia em pacientes com câncer e idosos é
comum. Ela é definida como o uso concomitante de cinco ou mais medicamentos e
surgiu como um importante problema de saúde pública, uma vez que há o
envelhecimento crescente da população (HONG, 2020). No mais, a polifarmácia exige
a triagem de medicamentos prescritos visando a prevenção ou minimização de
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quaisquer consequências negativas relacionadas a farmacoterapia, visto que é uma
condição inevitável entre esses pacientes (ISMAIL, 2020).
Um estudo de 2021, que fez uma revisão integrativa sobre IM em pacientes com
câncer apontou que o número médio de medicamentos administrados nos pacientes
variou de 7-12 medicamentos (LOBO et al., 2021). Em outro trabalho realizado por
Guthrie et al., onde foi avaliada o perfil da polifarmácia na comunidade escocesa
durante um período de 15, foi descrito um risco 5 vezes maior de interação
medicamentosa clinicamente relevante com o uso concomitante de pelo menos 5
medicamentos e um risco 12 vezes maior quando dobramos a quantidade de
medicamentos administrados concomitantemente.
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Tipos de IM
Ocorre quando um fármaco promove a modificação da absorção, distribuição,
ligação às proteínas, biotransformação o excreção de outro fármaco.
Ocorre quando um fármaco modifica a sensibilidade ou a resposta dos tecidos
a outro fármaco (agonismo, antagonismo).
Nas interações farmacocinéticas, geralmente, um fármaco modifica a absorção, a
distribuição, a ligação às proteínas, a biotransformação ou a excreção de outro
fármaco. Assim, ocorre a modificação da quantidade e a persistência do fármaco
disponível nos locais dos receptores. As interações farmacocinéticas alteram a
magnitude e a duração do efeito, porém não o tipo do efeito. Isto é mais comumente
mensurado por mudança em um ou mais parâmetros cinéticos, tais como
concentração sérica máxima, área sob a curva, concentração-tempo, meia-vida,
quantidade total do fármaco excretado na urina etc. Esse tipo de interação é, com
frequência, previsível com base no conhecimento dos fármacos individuais ou
detectado pelo monitoramento das concentrações dos fármacos ou dos sinais
clínicos.
Nas interações farmacodinâmicas, um fármaco modifica a sensibilidade ou a resposta
dos tecidos a outro fármaco, por ter o mesmo efeito (agonista) ou efeito bloqueador
(antagonista). Habitualmente, esses efeitos ocorrem no nível do receptor, no sitio de
ação dos fármacos, mas podem ocorrer no nível intracelular, ou seja, o efeito resulta
da ação dos fármacos envolvidos no mesmo receptor ou enzima. Um fármaco pode
aumentar o efeito do agonista por estimular a receptividade de seu receptor celular
ou inibir enzimas que o inativam no local de ação. A diminuição de efeito pode dever-
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se à competição pelo mesmo receptor, tendo o antagonista puro maior afinidade e
nenhuma atividade intrínseca.
Sinergismo ou interação aditiva - quando um medicamento intensifica os efeitos de
outro. Para simplificar: o medicamento “A” intensifica os efeitos do medicamento “B”.
“A” = efeito de intensidade 1 “A” + “B”= efeito de intensidade maior do que 1 No
sinergismo pode ocorrer uma potencialização do efeito, ou seja, a presença
simultânea dos dois medicamentos no organismo provoca efeito maior do que a
soma de seus efeitos isolados. Assim: “A” = efeito de intensidade 1 “B” = efeito de
intensidade 1 “A” + “B” = efeito de intensidade maior que 2.
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Exemplos de mecanismos de interações farmacocinéticas
Alterações no pH gastrintestinal.
Quelação, adsorção e outros mecanismos de formação de complexos
Absorção
Alteração na motilidade gastrintestinal
Má absorção causada por fármacos
Competição na ligação a proteínas plasmáticas.
Distribuição
Hemodiluição com diminuição de proteínas plasmáticas.
Biotransformação/ Indução enzimática (por exemplo por barbitúricos, fenitoína, rifampicina)
Metabolização Inibição enzimática (por exemplo por isoniazida, ciprofloxacino, azóis, fluoxetina)
Alterações no pH urinário.
Alteração no fluxo sanguíneo renal
Excreção
Alteração em excreção biliar e ciclo êntero-hepático
Alteração na secreção tubular renal
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Classificação das IM quanto ao risco, gravidade e qualidade da
documentação
Risco: Gravidade: Documentação:
= Contraindicado Excelente
= Maior/Grave
Boa
= Moderada Fraca
= Menor/Leve Desconhecida
As classificações da interações medicamentosas podem variar de acordo com o
banco de dados utilizado. Por exemplo, no UptoDate e no Lexi-comp, a classificação
apresentada é a de risco, mas ao clicar na interação para ler a descrição você
encontrará também a gravidade e o nível de qualidade da documentação. Já no
Micromedex, você encontra a interação classificada diretamente pela gravidade.
Basicamente são equivalentes. Interações que apresentam excelente documentação,
são IM que já foram amplamente estudadas e, provavelmente, tem maiores chances
de acontecer. Quando os relatos ainda são incipientes, considera-se a documentação
fraca. Considerar essa qualidade do dado na tomada de decisão também é
importante, especialmente quando não existe possibilidade de manejo da IM e entre
o risco/benefício, o vale a pena manter a associação dos medicamentos e monitorar
o paciente.
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Como rastrear e identificar as IM?
Para rastrear possíveis interações medicamentosas é necessário a utilização dos
bancos de dados eletrônicos.
Como não há um único banco de dados com 100% de sensibilidade ou especificidade
para avaliar as interações medicamentosas há disparidades na classificação da
gravidade, isso representa um grande desafio para os profissionais de saúde (KIM,
2019). Bossaer et al. exploraram a sensibilidade para detectar interação
medicamentosa de alguns bancos de dados. Lexi-comp, Epocrates e Micromedex
tiveram sensibilidade de 95%, 90% e 70%, respectivamente, para os 20 pares de
interação medicamentosa testados.
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Gerenciamento de IM: o que fazer?
• Revisão da farmacoterapia
• Avaliação detalhada do esquema terapêutico;
• Considerar plantas medicinais, alimentos;
• Propor ajustes de dose e substituições, quando indicados;
• Atentar para via e frequência de administração dos medicamentos;
• Monitoramento clínico e laboratorial do paciente
• Vigilância ativa quanto a sinais de toxicidade ou inefetividade terapêutica;
• Monitoramento de função hepática, renal, INR, entre outros parâmetros de
resposta e segurança.
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Vamos praticar:
Caso 1
• Paciente sexo masculino, aposentado, 72 anos, com história de HAS, DM2, DAC (IAM há 7
meses com colocação de stent) e ICC, em uso continuo de:
• Enalapril 20mg, 2x ao dia
K= 5,8 mEq/L
• Espironolactona 25mg, 1x ao dia
• AAS 100mg, 1x ao dia
Refere mialgia
• Clopidogrel 75mg, 1x ao dia
• Carvedilol 6,25mg, 2x ao dia FE = 38%
• Sinvastatina 40mg, 1x ao dia
• Anlodipino 10mg, 1x ao dia
• Furosemida 20mg, 1x ao dia
• Metformina 850mg, 2x ao dia
• Omeprazol 20mg, 1x ao dia
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Gerenciamento de IM: o que fazer?
Modificação de terapia indicada?
Associação contraindicada?
Risco intermediário?
• A interação está acontecendo?
• SIM: Contatar o médio, sugerir descontinuação do medicamento e
se possível indicar substituição. Em caso de automedicação o
farmacêutico pode indicar a suspensão do medicamento.
• NÃO:
• Existe alguma alternativa terapêutica mais segura e viável?
• Paciente pode ficar sem um dos medicamentos?
• Se a resposta for não, MONITORE o paciente.
Identificada IM de risco X/ associação contraindicada:
A interação medicamentosa está acontecendo? Contate o médico, sugira suspensão
do medicamento que está desencadeando a IM, se possível indique uma alternativa
terapêutica. Ex.: Anlodipino com Sinvastatina, aumentando a concentração
plasmática da Sinvastatina, potencializando risco de miopatia e rabdomiólise, pode
ser substituído por Rosuvastatina que é menos lipossolúvel, não sofrendo tanta
metabolização.
A interação não aconteceu ainda? Enalapril com Espironolactona, aumenta o efeito
poupador de potássio da Espiro pode levar a hipercalemia. Não tem alternativa
terapêutica, pois os BRA, como a Losartana, apresentam a mesma interação com a
Espiro. Paciente pode ficar sem usar um dos medicamentos? Sim, suspende. Não?
Monitora.
No tratamento oncológico é importante ressaltar que algumas interações são
esperadas e podem ser desejadas, como as interações entre alguns quimioterápicos,
entre os quais há um sinergismo de ação, por exemplo, entre o Fluorouracil e
Leucovorin em que há aumento da toxicidade dos medicamentos devido ao efeito do
sinergismo farmacodinâmico (MONTEIRO, 2019). O mesmo se aplica a Ciclofosfamida
e Doxorrubicina. Nesse caso usa-se o Dexrazoxano para diminuir a cardiotoxicidade
potencializada por essa interação. Outra interação desejável é o uso de Bicarbonato
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de Sódio concomitante ao Metotrexato para evitar a precipitação do fármaco nos
túbulos renais, diminuir a chance de lesão renal e aumentar sua excreção.
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Vamos praticar:
Caso 2
• Paciente sexo feminino, cozinheira, 68 anos, com história de HAS, DLP e Cardiopatia
(estenose mitral - fez troca de válvula há 2 anos).
• Losartana 50mg, 2x ao dia
• Hidroclorotiazida 25mg, 1x ao dia
• Sinvastatina 40mg, 1x ao dia
• Varfarina 5mg, 1x ao dia
• Ibuprofeno 400mg, 3x ao dia (automedicação. Em uso há 5 dias para dor nas costas)
PA= 160/90mmHg INR = 3,8
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Vamos praticar:
Caso 3
• Paciente sexo masculino, produtor de hortaliças, 69 anos, com história de HAS, DLP e FA
(exames laboratoriais seriados indicando labilidade no INR).
• Anlodipino 5mg, 1x ao dia
• Carvedilol 12,5mg, 2x ao dia INR= 2,2; 2,6; 2,1; 3,2; 1,8; 2;9
• Sinvastatina 20mg, 1x ao dia
• Amiodarona 200mg, 1x ao dia
• Varfarina 5mg, 1x ao dia FC = 43bpm
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