0% acharam este documento útil (0 voto)
38 visualizações9 páginas

Streck - Movimento Do Direito Livre - JUIZ NÃO É DEUS

O documento discute a produção de textos jurídicos no Brasil, destacando a obra 'Juiz não é Deus', que reflete criticamente sobre o decisionismo e as práticas jurídicas contemporâneas. O autor critica a falta de clareza e organicidade nas discussões sobre hermenêutica e interpretação do direito, além de questionar a relevância de métodos tradicionais de interpretação. A obra busca proporcionar uma visão retrospectiva das práticas jurídicas, enfatizando a complexidade do sistema legal brasileiro.

Enviado por

f4m
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
0% acharam este documento útil (0 voto)
38 visualizações9 páginas

Streck - Movimento Do Direito Livre - JUIZ NÃO É DEUS

O documento discute a produção de textos jurídicos no Brasil, destacando a obra 'Juiz não é Deus', que reflete criticamente sobre o decisionismo e as práticas jurídicas contemporâneas. O autor critica a falta de clareza e organicidade nas discussões sobre hermenêutica e interpretação do direito, além de questionar a relevância de métodos tradicionais de interpretação. A obra busca proporcionar uma visão retrospectiva das práticas jurídicas, enfatizando a complexidade do sistema legal brasileiro.

Enviado por

f4m
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
Formatos disponíveis
Baixe no formato PDF, TXT ou leia on-line no Scribd
Você está na página 1/ 9

Uma produção sernar ial contínua gera textos que buscam fazer

o retrato daquele momento. É assim que estes textos foram pro-


duzidos no decorrer de um ano Artigo; e colunas no CONJUR
foram organizados e repaginados com o objetivo de proporcio-
nar ao leitor um olhar retrospectivo dos diversos aspectos que
circundam as práticas jurídicas do Brasil.

Assim, o título da obra - Juiz não é Deus, com seu equivalente


em francês - busca, simbolicamente, abarcar as diversas temáti-
cas sob o palio de unia frdse. As pcildvrrin no refletem a essência
das coisas. É ripossível um título mostrar toda a complexidade
retratada por um conjunto de reflexões sobre a cotidianidade ju-
rídica de um país compleYn p gigantesco como o nosso.

Criliclutilu, vil' um "Iiltpmn"ji irírlicn que ainda U_TPriita nn instrti-


mentalismo processual e que crê que sentença vem de sentire -
dssHhI cürno em outros mitos como i verdade real - pareceu-me
que n títi iln poderia dizer muito mais do que sua pequena ex-
tensão. Trata-se de um fio condutor que atravessa, em maior ou
menor escala, os diversos temas tratados na obra. Isto porque se
trata de uma obra crítica. Seu alvo principal é o decisionismo. E
3Ua3 derivações, que iniciam nn snlipsismo de Oskar Büllow e che-

gam ale a resistência demonstrada por setores da comunidade


jurídica ao novo paradigma de fundamentação constante nn
digo de Processo Civil que entrou em vigor em 2016.

Tenho a certeza que o leitor saberá encontrar esse fio condutor.


Boa leallt a.

O Autor

198.1978-85-362 6158-

unC.C. i aj J 3 '

UTILIZE O LEITOR DE QR CODE DO SEU CELULAR E CONHEÇA NOSSOS OUTROS TÍTULOS.


Leniu Luiz Streck

Visite nossos sites na Internet


www jurua.com.br e
www.editorialjurua.com

JUIZ
e-mail: [email protected]

ISBN: 978-85-362-6158-4
NÃO É
vuRuil
EDITORA
Brasil — Av. Munhoz da Rocha, 143 — Juveve Fone: (41) 4009-3900
Fax: (41) 3252-1311 — CEP: 80.030-475 — Curitiba — Paraná — Brasil
Europa —Rua General Torres, 1.220— Lojas 15 e 16— Fone: (351) 223 710 600 —
DEUS
Centro Comercial D'Ouro — 4400-096 — Vila Nova de Gaia/Porto— Portugal

Editor: José Ernani de Carvalho Pacheco Juge n'est pas Dieu


Streck, Lenio Luiz.
S914 Juiz não é Deus: juge n'est pas Dieu./ Lenio Luiz
Streck — Curitiba: Juruá, 2016.
154 p.

1. Decisão judicial. 2. Hermenêutica. 3. Juizes —


Decisões. I. Titulo.
Curitiba
CDD 347.015 (22. ed.) Juruá Editora
CDU 342.56 2016
0079 6
112 Lenio Luiz Streck

tremamente relevante, uma vez muitos desses casos surgirão


(cada vez mais) de acusados não enquadrados como hipossu-
ficientes. É melhor que passemos a nos preocupar com isso.
Sob pena de aceitarmos, simplesmente, que a Constituição
pode ser violada, com deslocamento de caros recursos públi-
cos em favor de pessoas que podem pagar advogados em um
país que tem mais de meio milhão deles. Assistência judiciá- CONCURSO MISTURA SAVIGNY
ria não é SUS. Aquela é restrita aos pobres; esta não impede
aos não pobres que tenham acesso. Por quê? Porque está na COM GENY E JOGA PEDRA
Constituição. E a CF estabelece um modelo de welfare state
e nele, quem tem recursos paga a sua assistência jurídica. NA TEORIA DO DIREITO!
Não aceito que meus impostos sejam desviados para fazer a
felicidade de pessoas que podem arcar com suas defesas em
juízo. Caso contrário, aceitando-se o precedente do diretor
Carlos Alberto (caso da "lava jato"), por que razão alguém vai Quem acompanha meus artigos e meus livros sabe da minha
contratar advogado, se pode dispor de excelente defesa feita preocupação com o uso indiscriminado de teorias e posturas no direito.
por defensor público e ainda ter a seu favor prazo em dobro? Sabe também de minha crítica à falta de rigor no trato da teoria do direito,
Não é maravilhoso? Além de não pagar, ainda tem um advo- mormente naquilo que venho denominando de mixagens teóricas. Em
Verdade e Consenso, nas primeiras 30 páginas explicito as diversas re-
gado diferenciado, inclusive no que tange aog prazos..
cepçoes lei)! icas equivocadas feitas pela dogmática juiídiva de Pitidota.
8. Sim, sei das dificuldades para interpretar o sentido do que seja ma. De forma assistemática, foram sendo importadas e produzindo, por
hipossuficiente. Assim como é difícil dizer o que é insignifican- aqui, estragos dos mais variados, como a transformação dos princípios
te. Ou o que seja periculum in mora, etc. Vaguezas e ambigui- em valores (importação indevida da jurisprudência dos valores — Wer-
dades fazem parte do direito. Aliás, quando os alunos me per- tungsjurisprudenz alemã), o ativismo norte-americano transplantado sem
guntam "por que a lei não é clara", digo-lhe duas coisas: pri- critérios e a vulgata feita da e a partir da teoria da argumentação jurídica
meiro, porque ela não é escura; segundo, porque toda lei neces- alexiana, fazendo com que a ponderação fosse transformada em uma
sita de interpretação e isso nos dará emprego nos próximos 50 espécie de "pedra filosofal da interpretação".
anos. Portanto, mãos à obra: podemos até ter dificuldade em
determinados casos para dizer o que é um hipossuficiente e um Pois parece que o réu não se ajuda muito. E aqui o problema
não hipossuficiente. que quero abordar tem um valor simbólico, uma vez que o problema vem
de dentro da Universidade (no caso, a Universidade Federal de Pelotas-
RS). Com efeito, leio que concurso público para professor efetivo (Proc.
Gadamer tem uma frase genial: "se queres dizer algo sobre um 23110.010096/2014-86 Direito Público, Hermenêutica Jurídica e Serviço
texto, deixe que o texto te diga algo". Portanto, deixemos que a Constitui- de Assistência Judiciária (SAI) 01 vaga — Doutorado em Direito), o pro-
ção nos diga algo: art. 50, =IV — o Estado prestará assistência jurídica grama exigia: 1. A hermenêutica jurídica — definição, razão de ser, fmali-
integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos. Não dade e importância. 2. Os métodos da interpretação jurídica (gramatical,
precisamos chamar o filólogo do conto A Sereníssima República, de Ma- exegético, histórico-evolutivo, sistemático, teleológico, a livre pesquisa
chado de Assis, para tentar nos convencer de que "comprovar" não é cient(fica); a interpretação no positivismo de Herbert Hart; a interpretação
igual "a ter que provar, demonstrar"; e que "insuficiência" não é igual à no realismo jurídico; a interpretação na teoria de direito como integridade
"não ter recursos para" ou "ser alguém necessitado economicamente". de Ronald Dworkin; Interpretação e teoria da argumentação; a interpreta-
Nem o filólogo da Sereníssima nos prova que necessitado não quer dizer ção e os princípios jurídicos; direito constitucional econômico e princí-
"necessitado por falta de recursos". E sabem por que? Porque na Consti- pios explicitos e implícitos da ordem econômica; garantias e privilégios
tuição consta a palavra "recursos".
114 Lenio Luiz Streck Juiz não é Deus 115

do crédito tributário e administração tributária; ilícitos e sanções tributá- Por outro lado, esse direito que encontra sua autoridade na his-
rias; princípios tributários e limites ao poder de tributar. tória — ou no "espírito do povo" — não pode ser encarado como simples
No conjunto, caberia registrar a falta de organicidade do edital, produto de um legislador racional. Por exemplo — embora o Edital não
porque junta teoria do direito, direito constitucional econômico, tributário especifique essa problemática —, é equivocado pensar que a escola histórica
(indo, inclusive, no específico: garantias e privilégios do crédito tributá- era um positivismo do tipo exegético, assim como é errado pensar que
rio, além dos limites ao poder de tributar). Mas não quero discutir essa Savigny era um legalista (entendendo por legalista o tipo de experiência
estranha mistura de temas e os inúmeros GAPS. Interessa-me perguntar: que se tem no ambiente francês). Mas isso tem um custo: quando se fala
que a banca examinadora queria dizer com "os métodos da interpreta- em "seus métodos" (dele, Savigny), assume-se um ônus argumentativo.
ção jurídica — gramatical, exegético, histórico-evolutivo, livre investiga- Por isso, muito cuidado quando se fala em método gramatical e,
ção cient(fica"? Uma perfeita mistura de Savigny com Geny? O que eles ao mesmo tempo, no exegético (o Edital faz isso). Mais ainda: muito
têm em comum além dos nomes terminarem em "y"? Trata-se de uma cuidado, porque tudo isso se passou no contexto de um direito que tinha
visão rasa acerca do que seja hermenêutica e interpretação do direito, como objeto de estudo algo maior que um simples código estatuído por
mormente se o Edital exige o título de doutor, o que não é pouca coisa, um parlamento. Era da história que se falava. Quanto ao método teleoló-
convenhamos. Ou seja, já que é dinheiro público — tão escasso na Repú- gico, mais cuidado ainda, porque aí já estamos tratando de algo que vai
blica — que está em jogo, gostaria que o Edital fosse mais sofisticado e além, como no caso da formulação do segundo Ihering, aquele que aban-
menos contraditório. Ora, sabemos — pelo menos a partir de teorias mais dona a sistematicidade da escola histórica para ir em direção à finalidade
sofisticadas e contemporâneas e não do século XIX — que essa visão do direito.
"classificatória" sobre métodos é ultrapassada. O que o Edital quereria dizer com os métodos gramatical e exe-
De há muito que se sabe que, sob a aparência de unia iellexãu gótico? Estaria falando de semântica? De sintálit,a? Oia, essa questao (da
científica, criaram-se fórmulas interpretativas que permitiram: a) veicular semântica, assim como a sintática) é bem discutida, mais tarde, no neopo-
uma representação imaginária sobre o papel do direito na sociedade; b) sitivismo lógico, no plano da semiótica, quando a sintaxe e a semântica
ocultar as relações entre as decisões jurisprudenciais e a problemática eram a condição para um enunciado ser cientifico (a pragmática ficava de
dominante; c) apresentar como verdades derivadas dos fatos, ou das nor- fora). Sintaxe é análise dos signos com os signos. Isso é método gramati-
mas, as diretrizes éticas que condicionam o pensamento jurídico; d) legi- cal. Semântica é algo além disso. Aliás, para ser bem claro, Kelsen foi um
timar a neutralidade dos juristas e conferir-lhes um estatuto de cientistas. positivista semântico (interessante que o Edital fala apenas no positivis-
De há muito Warat desmi(s)tificou isso. Tais métodos e tantos outros que mo de Hart, esquecendo, totalmente, por exemplo, do jurista mais polê-
podem ser inventados são, na prática, quase sempre aplicados como ar- mico do século XX, Hans Kelsen — e, assim, o Edital põe tudo por terra).
gumentos retóricos para justificação da decisão. A propósito, para não esquecer, já que o Edital reproduz, quase totalmen-
Venho insistindo que não é necessário ir muito fundo na discus- te, os "famosos métodos" propostos por Savigny: tais métodos são arra-
são dos métodos. Parece que a teoria do direito em terrae brasilis não sados pelo pai do pós-positivismo, Friedrich Müller, que nem de longe
consegue avançar, em determinados casos, para além do século XIX. O aparece no certame.
que Savigny (falo nele, porque é nele que a dogmática jurídica aposta Sem esquecer, é claro, que Savigny não foi um jurista com pre-
quando trata desse tipo de "metodologia" — e parece que o Edital do con- ocupações democráticas. Sua teoria está inserida num período em que a
curso também, de que outros métodos estariam falando?) tem a ver com produção do direito era uma tarefa exclusiva de professores oriundos da
isso? Sobre os métodos de interpretação é importante registrar alguns aristocracia. O Estado alemão ainda não existia e, portanto, as preocupa-
pontos na perspectiva de retirar o debate do lugar comum e tentar lançar ções metodológicas dos juristas aristocratas — como era Savigny —, con-
um pouco mais de luz nessa discussão. Por exemplo, o "x" da questão centravam-se exclusivamente no campo do direito privado. Por isso, tudo
para a escola histórica não estava na interpretação do direito legislado, que nós acumulamos em termos de normatividade constitucional, fun-
mas sim na afirmação de um direito que fosse concebido radicalmente damental para a construção do Estado Democrático de Direito, nunca se
como produto da história e que não buscasse aparar a sua autoridade em apresentou como um problema para eles.
alguma realidade transcendente. Só aí já temos um problema.
116 Lenio Luiz Streck

Nesse sentido, o Edital da UFPEL deixou de lado as discussões


mais atuais a respeito do Direito Público, realizadas por juristas que já se
encontram inseridos num contexto democrático — e existem muitos —,
para retornar aos velhos métodos de quem nunca se interessou pela lei,
como nós a conhecemos. E não esqueçamos que o século XIX se caracte-
rizou por três formas diferentes de positivismo (na França, sim, tratava-se
de lei; Alemanha, com a jurisprudência dos conceitos [conceitos e não UM MILHÃO DE ADVOGADOS + DEZENAS
leis, e a jurisprudência analítica na Inglaterra [direito feito por juizes]).
Portanto, lamentavelmente o Edital da UFPEL dá um passo DE CARREIRAS. E FRACASSAMOS!
atrás na teoria do direito (sem falar no inusitado afunilamento temático no
restante dos itens, a partir de uma inusitada seleção de matérias, que vão
de seca à Meca). Direto ao ponto: o Edital não tem a mínima consistência
(formal e substancial). Contemporaneamente se sabe que esse tipo de Vivemos em tempos de um Projeto de Emenda Constitucional
"metodologia" requerida no Edital é absolutamente irrelevante para o (PEC 443) em que uma de suas justificativas se refere ao fato de que a
deslinde de uma aplicação do direito. Tais métodos, neste caso, podem Advocacia-Geral da União deveria ganhar equiparação salarial porque
ser considerados álibis retóricos para suprir a falta de integridade e coe- arrecada e dá lucro ao Estado (seguindo esse raciocínio, o cobrador do
rência na fundamentação da decisão. Isso para dizer o menos. ônibus deveria ganhar mais do que os gestores da empresa de transporte)
Para não deixar passar: se o Edital (também) é para prática jurídica e do conflito de uma presidente autista com um presidente da Câmara que
e assistência jurídica, por que não se exige processo civil, penal e direito de se comporta de modo a provocar uma crise sem precedentes (além de
família? Ou as pessoas que procuram a assistência judiciária estão envolvi- acabar com Pindorama, vai acabar com o Exame de Ordem; aliás, ele não
das com problemas tributários, crimes do colarinho branco? Pelo visto a se contentará se não ajudar a quebrar o que resta deste pobre país que
Universidade deixou de lado temas centrais para a avaliação daqueles que parece não querer sair do terceiro mundo).
pretendem atuar na disciplina de prática jurídica. Por exemplo: um professor- Esquecem os protagonistas e todos aqueles que acham que po-
-doutor sabe tudo de processo civil, o que é ótimo para o escritório de prática dem tirar vantagem da crise, de uma coisa: no caos, não há direito a nada.
judiciária, mas não sabe nada de direito tributário. Está fora do certame! Há, Não adianta tetos, subtetos, garantias, prerrogativas, autonomias -orça-
pois, unia organização confusa, com relação ao programa do Edital, pelo mentárias. Quem tem dúvida, consulte o que aconteceu na Itália recente-
menos para quem examina isso de forma exógena. Qual a razão para esse mente. Retira-se o direito e o Tribunal Constitucional simplesmente dirá:
tipo de escolha de temas? Querem percorrer um longo caminho — algo pare- com base no Principio da Crise. Perguntem qual foi a resposta do Tribu-
cido com a extensão de Gênesis ao Apocalipse — numa única área? E impor- nal Constitucional português às retiradas de direitos. Vai este alerta à
tante destacar que quando se pede tudo não se pede nada. comunidade jurídica. No caos, o direito é o "do caos". No caos, tudo é e
Mas., o que importa aqui nem é o "edital em si". O que é impor- nada é.
tante é o simbólico, porque demonstra o nível do que estamos estudando De todo modo, penso que a PEC 443 tem algo a ver com essa
nas Universidades. Por isso é que o império do solipsismo se formou nas parte do livro. Indiretamente, mas tem. Em um país com tantos contrastes
práticas judiciárias, em que o "mais sofisticado" que os professores ensi-
nam nas salas de aula da graduação @ara não falar da pós) é dizer que e com um grau de violação de direitos fundamentais incomensurável,
"regras é no tudo ou nada", "princípios é na ponderação", Kelsen e seu com todas carreiras jurídicas e com tetos e subtetos, auxílios disso e da-
positivismo exegético e coisas desse nível. Por isso ninguém se surpreen- quilo, não conseguimos até hoje sequer construir uma estrada que leve
de mais com a inversão do ônus da prova no crime, com a "invenção dos um direito à liberdade de qualquer comarca até os tribunais superiores
princípios feitos no atacado" (coloquialidade, simplicidade, rotatividade, (ST.I e STF) ou, melhor dizendo, um caminho para possibilitar que al-
afetividade, etc.), com decisões que intervém em municípios e com em- guém preso equivocadamente possa responder um processo em liberdade
bargos declaratórios rejeitados com expressões do tipo "nada há a escla- ou tenha a sua ação penal trancada por falta de justa causa.
recer". Nada mais surpreende ninguém.
120 Lenio Luiz Streck

Eis o cerne da questão: afora tudo isso, uma coisa é dramática.


Explico:- em todas as instâncias os causídicos sempre pagarão pedágio
para esse fantasma da modernidade: o poder discricionário, espécie do
gênero "livre apreciação-livre convencimento". Isto é: mesmo que cons-
truamos um caminho objetivo da Cidade das Pedras até Brasília na busca
da liberdade de um patuleu, ainda assim teremos que parar nos postos de O BRASIL REVIVE A ESCOLA DO
pedágio do subjetivismo dos julgadores. Aliás, está no CPP: o poder de DIREITO LIVRE! E DÁ-LHE
livre apreciação (contra o qual a dogmática jurídica nunca se insurgiu e
hoje sente o calo apertar). De que modo se pode exigir, objetivamente, o PEDALADA NA LEI!
cumprimento de um direito fundamental à liberdade?
E para quem pensa que o processo civil é diferente, ingresse
com uma ação em alguma vara cível. Nem preciso falar disso, certo?
Afinal, o que fizemos com o direito brasileiro? Eis a pergunta sem res- Notícia de grande sucesso na internet dá conta de decisão da
posta. Mas a cada dia mais e mais gente quer fazer concurso. Na macha- Turma Regional de Uniformização (TRU) dos Juizados Especiais Fede-
diana Sereníssima República dos Bacharéis. rais da 4' Região — em que ficou afirmada jurisprudência no sentido de
Mas, e então? Escrevemos milhares de livros, fazemos milhares que em casos de coexistência de relação conjugal e extraconjugal, tanto
de congressos e não conseguimos construir um caminho para o pobre a mulher como a companheira devem receber a pensão, determinando
aoucado de Ttarini levar SÇU pleito à instância que lhe dê a liberdade sem que a pensão por morte de um homem seja dividida entre sua mulher e
depender de um juízo discricionário. Sim. A todo o moinem° o 3TJ invo- sua amante. No caso, a parte pediu pensão pnr morte de segurado com
ca o livre convencimento para justificar um julgamento antecipado sem quem mantinha uma relação extraconjugal. A autora alega que o "concu-
exame da prova. E, o pior de tudo: os professores ensinam isso nas Fa- binato impuro" não tira dela o direito ao benefício. Ao analisar o pedido,
a TRU deu razão à amante, prevalecendo o entendimento da 2' Turma
culdades. E a doutrina repete ad nauseam justamente aquilo que viola os Recursal de Santa Catarina, que concedeu pensão em caso semelhante.
direitos dos causídicos na atualidade. Verbis:
Ora, a dogmática jurídica sempre apostou no protagonismo ju-
dicial. Por que lhe era conveniente. E nunca se insurgiu contra a livre Quando se verificam presentes alguns pressupostos tais como a afeti-
apreciação da prova ou o livre convencimento. É só folhear as centenas vidade, a estabilidade e a ostentabilidade, é possível presumir a boa-
de livros de processo produzidos nas últimas décadas. Pois é. O poder de -fé da requerente, de maneira que em tais casos não há obstáculo ao
livre convencimento é uma espécie de "peemedebismo do direito", ex- reconhecimento de entidade familiar, no modelo estruturado sob a
pressão de um candente conservadorismo, porque é o modo pelo qual a forma de concubinato.
convicção pessoal (portanto, um juízo de classe) do juiz se expressa nas Desnecessário dizer que nem o Código Civil e nem a Constitui-
decisões. Parafraseando Marcos Nobre39, esse "peemedebismo epistêmi- ção autorizam esse entendimento. O caso, na verdade, trata de concubina-
co" — o discricionarismo — é um paquiderme ideologicamente indefinido. to adulterino, que não dá direito a nada. Mas, então, se a lei não permite e
Pode ser qualquer coisa. Apenas é. Está aí. Eduardo Cunha, aliás, está tampouco a Constituição dá maiores pistas acerca do que foi decidido,
usando de seu poder discricionário. O nosso Unabomber. Mas, enfim, em por que o Judiciário acredita que pode decidir desse modo? De pronto, é
Pindorama sempre foi assim, não é? necessário dizer que não estão informados os casos que geraram a cadeia
de DNA do "enunciado" pelo Tribunal de Santa Catarina. Mas "presumir
boa fé" dá a entender que a "amante" desconhece a existência da relação
"oficial", é isso? De fato, conheço precedentes que tratam das chamadas
"uniões paralelas", cujo reconhecimento jurídico depende, dentre outras
39 NOBRE, Marcos. Imobilismo em Movimento: da redemocratização ao governo coisas, de publicidade e estabilidade. É sim possível que o sujeito mante-
Dilma. São Paulo: Companhia das Letras, 2013.
122 Lenio Luiz Streck Juiz não é Deus 123

nha uma união no RS e outra no RN, sem que uma saiba da outra, ambas Qual é a diferença do que se vê hoje por aí? Cada um decide
públicas, estáveis e, até, admitamos, com intuito de constituir família como quer. Cada um busca o seu justo. Inventam-se "princípios" como o
(filhos etc.). Isso é união estável paralela (ao casamento ou a outra união da conexão para poder encontrar o Santo Graal da justiça: o "principio da
estável). Disso podem, de fato, advir direitos, não apenas civis em sentido verdade virtual", vasculhando no mundo virtual o que não foi demonstra-
estrito, mas também decorrentes da constituição de família. Mas, atenção: do no mundo real. Ao demais, concede-se usucapião de terras públicas,
dar isso tudo de barato, como estou dando, é diferente de reconhecer di- em flagrante violação dos limites semânticos da Constituição. Concedem-
reitos igualitários, decorrentes da constituição de uma unidade familiar -se meses a mais de licença maternidade. Em nome de sentimentos de
(que, vá lá, para além dos aspectos institucionais e contratuais, pode sim afeto, amor, entre outros — e não de princípios ou regras — faz-se uma
ser entendida como o tal "núcleo de afeto", tanto que esse afeto seja de livre investigação do direito. Poderia elencar um enfiada de decisões con-
algum modo qualificado juridicamente), entre a esposa do defunto e a tra-legem, resultantes dessa revificação desse tipo de doutrina interpreta-
amante. Vejamos bem: o homem ou a mulher podem ter 50 amantes, que tiva ("tipo" Escola do Direito Livre, Realismo Jurídico, Livre Investiga-
nem eu, nem o direito (no sentido de que, para ser legítimo, o direito deve ção, entre outros). E assim também se ensina. Nos cursos preparatórios, é
preservar, na linha de Dworkin, um direito individual à independência ética comum que os professores digam: se for concurso para o 1VIP, diga isso;
do indivíduo, uma responsabilidade inalienável pelas suas escolhas se for para a Defensoria, aquilo; e, se for para a Magistratura, bem, aí
pessoais, por eleger aquilo que entenda por valioso, ou que o faça feliz), tanto faz, contanto que você "fundamente" (sic).
temos nada com isso. Entretanto, a situação muda de figura quando eu não A questão é: por que livrar o direito da lei e da Constituição? A
quero discutir se eu tenho ou não o direito de fazer isso ou aquilo mas, isso Constituição não é boa? Não é ela que estabelece, inclusive, o poder do
sim, se eu, por fazer isso ou aquilo, me torno sujeito de determinados direi- Poder Judiciário? Mas não é ela que obriga o Judiciário a fundamentar? E
tos até então inexistentes. Aliás, um mal sério e comum ao direito brasilei- não é nela que está escrito que o Legislativo legisla e o Judiciário julga,
ro. Que o diga a apropriaçcio indébita do conhecido right to pursue your aplicando a lei feita pelo legislativo? Aliás, como disse dia desses o mi-
own happiness, entendido no direito americano como um direito natural e nistro Marco Aurélio: a CF coloca o Legislativo e o Executivo antes do
inalienável, que na cabeça de alguns juristas brasileiros gera um direito Judiciário. Correta a posição do Ministro.
prestacional ao sujeito, como se a comunidade política, o Estado, fosse(m) No caso concreto decidido pela TRU da 4' Região, alguém pen-
responsáveis por disponibilizar-lhe os meios de se tornar feliz sou na situação da mulher do defunto-amante? Mas, por que o direito para
Há vários modos de responder a isso. Em Verdade e Consenso, em favor da amante? Amante integra, então, a família? É um novo con-
explico nas primeiras 30 páginas as cinco recepções equivocadas que ceito de família, agregando este a tantos outros que inventam todos os dias?
fizemos pós-Constituição de 1988, para onde remeto o leitor interessado Seria a familia a concubitu adultera? Perguntaram para a esposa (de "papel
no aprofundamento do assunto. Aqui, nos limites de um artigo, tentarei passado") o que ela sente ou pensa disso? O afeto em que está assentado
explicar por outro caminho. princípio da afetividade é em relação a quem? Com certeza, não diz
Todos sabem que o século XIX foi o século da razão. A razão respeito à esposa legitima, certo? O afeto, neste caso, é de mão única?
que foi "aprisionada" na lei. Daí três tipos de positivismo: o francês (exe- Ora, não há sustentação paradigmática em dizer que existe "di-
getismo), o alemão (jurisprudência dos conceitos) e o inglês (jurisprudên- reito de exigir afeto" ou "que o afeto gera direitos". Isso é o mesmo que
cia analítica). A esses tipos de positivismo houve reações das mais varia- dizer que "princípios são valores". Por intermédio do "direito" (Consti-
das (explico isso em Hermenêutica Jurídica em Crise). Aqui, fico com tuição, leis) podemos exigir indenização por descumprimento de deveres
uma delas, a Escola do Direito Livre, do início do século XX. de obrigações jurídicas, mas não de sentimentos. Pretender forçar al-
Fundada por Hermann Kantorowicz, essa doutrina defende a guém a gostar ou deixar de gostar de alguém ou mesmo pretender exigir
plena liberdade do juiz no momento de decidir os litígios, podendo, até juridicamente (leia-se, coercitivamente) esse ou aquele sentimento seja
mesmo, confrontar o que reza a lei. O juiz não estaria lançando mão ape- em face de alguém, de uma instituição ou mesmo do próprio direito, é
nas do seu poder decisório, mas, mais do que isso, a sua função de legis- autoritarismo. Aliás, por que será que a Constituição de 1988, a Consti-
lador, seu poder legiferante para encontrar aquilo que ele, juiz, percebe tuição cidadã, que guarda em seu texto o ideal de vida boa (a eudaimonia
como "o justo". Dizia-se da Escola do Direito Livre (da lei). de que falavam os gregos) não tratou disso? Simples: Porque a Constitui-
Lenio Luiz Streck Juiz não é Deus 125
124

ção trata de direitos. Por isso ela trás em seu bojo um capítulo de "Direi- respeito aos limites semânticos da legislação. Já disse muito sobre isso.
tos" Fundamentais e não de outra coisa. Direito é uma "coisa deontológi- Remeto, de novo, a quem interessar possa, ao meu texto Aplicar a letra
ca". E para um princípio ser jurídico, tem de ser igualmente deontológico. da lei é uma atitude positivista?". Já não tenho paciência para explicar
Deve funcionar no código lícito-ilícito. Se não for assim, não passa de tudo isso de novo.
mera retórica. Quero apenas dizer que, em tempos de democracia — não sei até
A propósito, como ficam os casos em que a amante sabe que o quando, porque temo que a leniência para com a lei e as Instituições pos-
sujeito é casado (na verdade, quando é que não sabe?)? Neste caso, usaria sa gerar sístoles e diástoles e que sejamos apanhados em uma delas de
a decisão da TRU contra ela mesma, contrapondo o consolidado caso forma inapelável (e os juristas terão uma culpa enorme se isso acontecer,
porque ajudaram a fragilizar o direito) — não há mais sentido em falar de
Riggs versus Palmer de 1889 — pelo qual Dworkin construiu a sua teoria coisas que lembram uma espécie de Woodstock do direito, como direito
dos princípios citada mundo a fora —, de que ninguém deve se beneficiar
achado na rua, direito alternativo, livre investigação científica, realismo
de sua própria torpeza, indagando: nos casos de a amante saber, não é
uma forma de obter beneficio indevidamente? Como fica uma decisão jurídico e Escola do Direito Livre. Uma Constituição democrática espanta
desse jaez em relação à coerência e à integridade do direito? Essa decisão voluntarismos e ativismos do tipo "livre interpretação-criação". Por isso,
unificada servirá para os casos em que a amante sabe que o sujeito- insisto: "livrar-se da lei" era uma necessidade quando esta representava o
-amante é casado? Ainda: por que razão as esposas legítimas devem arbítrio; mas quando a lei representa a democracia, devemos aplicá-la.
transferir recursos para fazer a felicidade das amantes? Quando dela não gostamos, não a torturemos. Não se faz justiça a golpe
de caneta. E nem se dá pedalada na lei. E Pindorama é pródigo nisso.
Em outro artigo abordei a questão da criação, por parte de al-
guns membros do judiciário, do tal "princípio da conexão". Muitos juízes Vou dizer de novo aos meus críticos: Sou um dos mais ardoro-
se solidarizaram comigo, dizendo qiie, de fato, o tal "princípio" é um sos defensores da jurisdição constitucional. Basta lerem meus livros e
textos. Em Li que é isto — decido conforme minha consciência?' faço
exagero. Mas sei que outros ficaram do lado de quem criou o tal standard uma verdadeira ode à jurisdição. Mas isso não quer dizer que o Judiciário
conectivo. Dizem que o futuro está aí. E que quase todo o Judiciário ade- possa criar direito ou legislar, como se pode ver todos os dias e, especi-
rirá a essa busca da cyber-verdade. Para ser mais simples: fui trucidado almente, na decisão ora sob comento.
por parcela da magistratura nacional por ousar criticar mais essa inventi-
vidade judiciária. Imagine-se criticar o Judiciário. De todo modo, direi pela enésima vez: é claro que a interpreta-
ção judicial é criativa em certo sentido, já que resolve um caso inédito,
Sei que é antipático ficar criticando o ativismo judicial. Sim, sei
que nas salas de aula o ativismo é festejado pela maioria dos professores irrepetível, e não um caso passado. Mas a criação/construção feita pelo
(principalmente por aqueles que nem sabem do que estão falando e que, juiz tem limites. E, em tempos de direito e democracia, é a respeito destes
que temos de nos debruçar. Pensem sempre na feliz metáfora do romance
sem PowerPoint, não conseguem falar cinco minutos sobre a matéria) e em cadeia: o juiz não é um tradutor e nem um contista: é, isso sim, o
dos alunos. Mas não faz mal. Depois de 28 anos de Ministério Público, criador de um capítulo novo num livro que já existe (e que é longo e, lido
em que sempre fui um Promotor-Procurador de direito e examinei as sob a sua melhor luz, virtuoso). Essa é a responsabilidade do intérprete,
causas com imparcialidade — na medida em que grande parte de minhas do juiz. Ninguém quer saber se ele acha isso ou aquilo mais justo ou mais
peças foram favoráveis aos acusados (isso não é bom, nem ruim; é que proporcional se este argumento não puder ser reconduzido, de forma não
existiu inépcia em acentuadíssimo percentual de denúncias e a formação arbitrária, à integridade do direito.
da prova mostrou-se frágil) e ter escrito mais de 40 livros, publicado mais
de 400 artigos e capítulos de livros e ter feito mais de 600 conferências E, para encerrar, digo: sim, um juiz pode deixar de aplicar uma
lei (uma regra jurídica). Sempre sustentei isso. Mas só em seis hipóteses.
no Brasil e no exterior — penso que não só posso, como devo, fazer esse
tipo de critica.É um dever, digamos assim, cívico. Republicano.
Minhas críticas são em favor do direito. São pela preservação 4° STRECK, Lenio Luiz. Aplicar a letra da lei é uma atitude positivista? Novos Estudos
da Constituição. Estranhamente, isso tem me rendido críticas no sentido Jurídicos, Rajá, v. 15, n. 1, p. 158-173, abr. 2010.
41 STRECK, Lenio Luiz. O que é isto — decido conforme minha consciência? 5. ed.
de que eu seria um positivista, porque estaria propondo, diuturnamente, o Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2015.
126 Lenio Luiz Streck

Fora disso, repristinará coisas serôdias como a Escola do Direito Livre e


outros quetais. Verbis, as seis hipóteses, que estão em Verdade e Consen-
so e Jurisdição Constitucional e Decisão Jurídica:

Quando se tratar de inconstitucionalidade, tanto no modelo


concentrado como no difuso;
Quando for o caso de aplicação dos critérios de resolução de PARA MINISTRO DO STF,
antinomias; JULGAMENTOS NÃO PODEM SER
Quando aplicar a interpretação conforme à Constituição
(verfassungskonforme Auslegung); PELA CABEÇA DO JUIZ!
Quando aplicar a nulidade parcial sem redução de texto (Tei-
lnichtigerkkirung ohne Normtextreduzierung);
Quando for o caso de declaração de inconstitucionalidade Tenho escrito que, em Pindorama, falta Creonte e sobra An-
com redução de texto; tígona, isto é, falta-nos uma visão acerca da preservação do direito da
Quando for o caso de deixar de aplicar uma regra em face de polis para todos e sobra o jeitinho, o individualismo, enfim, somos bons
um princípio, entendidos estes como normas (deontológi- em relações interpessoais. "Fala com Fulano que ele resolve". Aliás,
cos), aplicáveis no código lícito-ilícito e não como standards sabemos bem o que (e como) é isso, não? O que é isto o tráfico de in-
retóricos ou enunciados performativos "tipo princípio da co- fluência em Pindorama? Trânsito epistemicalz fathers rm, mais sofistica
nexão, da afetividade, da eventual ausência de plenário, da damente, expertise due to parental epistemic relations. Consciente ou
rotatividade", entre outros. inconscientemente, isso atravessa o imaginário (até) dos nossos presiden-
tes. Lula já havia dito, quando Presidente, que "antes do Ministério Pú-
No fundo, quando me chamam de positivista por sustentar a blico denunciar, deveria fazer uma análise do currículo da pessoa". Que
força normativa da Constituição e sustentar "limites semânticos da lei" tal? E quem não tem curriculum, Presidente? Está lascado?
(algo como o que diz Gadamer: "se queres dizer algo sobre um texto, Já a Presidente Dilma acaba de reforçar o nosso lado patrimonia-
deixe primeiro que o texto te diga algo), sinto-me como o sujeito da pro- lista ao salientar que "gostaria de maior fundamento para a prisão pre-
paganda da Amanco, que diz para o companheiro que agora está fazendo ventiva de pessoas conhecidas". Para contestar a Presidente, afirmo que
"edifício" e o outro entende "é difícil" e se instaura uma bela confusão eu gostaria de maior fundamentação para a prisão preventiva também das
semântica. pessoas "não conhecidas". Enfim, uma melhor fundamentação para to-
dos. Até porque um "não conhecido" (ou alguém sem currículo) sempre
leva desvantagem.
E por que trago à baila as frases de dois Presidentes da Repúbli-
ca? Porque ali está o retrato de certo imaginário que se forjou no país. E
foi incorporado pelo direito42.
Acabei reconfortado com excertos da palestra do ministro Mar-
co Aurélio em Coimbra. Ao mesmo tempo em que ele alertava para o fato
42
Danilo Pereira Lima, meu orientando de mestrado, publicou livro demonstrando a
relação do discricionarismo com o patrimonialismo. Leiam, LIMA, Danilo Pereira.
Constituição e poder: limites da Política no Estado de Direito. Livraria do Advoga-
do, 2014.

Você também pode gostar