UNIVERSIDADE FEDERAL DE VIÇOSA
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE DIREITO
A ALTERAÇÃO NA LEGISLAÇÃO DE EXECUÇÃO PENAL OCASIONADA PELA LEI
N° 14.843/24 QUE (RE) TORNOU OBRIGATÓRIA A REALIZAÇÃO DE EXAME
CRIMINOLÓGICO PARA PROGRESSÃO DE REGIME
IESSA LAIANE JAHEL BREMER - ES105845
PROJETO DE PESQUISA PARA TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
Orientador(a): Fernando Laércio Alves da Silva
VIÇOSA, MINAS GERAIS
2025
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1. APRESENTAÇÃO DO TEMA
Em estrita observância ao princípio da legalidade, a Execução Penal brasileira é
regulada pela Lei n° 7.210, publicada em 1984. Essa legislação ao instituir a execução penal
estabelece, enquanto objetivo, “efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e
proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado”, a
partir de um cenário de direitos e obrigações numa relação indivíduo/Estado/sociedade que,
em 1988, também ganha amparo dos direitos e garantias constitucionais.
É em face do objetivo de garantir a integração ou reintegração social da pessoa
condenada que a legislação citada, de nome Lei de Execução Penal (ou mesmo LEP),
assegura a classificação de cada apenado quando do seu ingresso em uma Unidade Prisional,
quanto aos aspectos relativos a seus antecedentes e personalidade, com o fim de desenvolver
um cumprimento de pena de modo individualizado. Para além do texto infraconstitucional,
trata-se também de imperativo constitucional, conforme o dispositivo do art. 5º, XLVI, da
CF/88, em especial sua alínea “a” (Marcão, 2023, pg. 22).
Assim, o indivíduo que é submetido a pena em regime inicial fechado, sendo também
facultado aqueles em regime inicial semiaberto, será então submetido a exame criminológico,
sendo este o meio para traçar essa pena individualizada, aqui garantida como direito do preso.
É nesse contexto que a LEP prevê pela primeira vez o exame de personalidade, sendo
essa disposição mantida em todos os anos desde sua publicação. É necessário destacar
previamente que tal imposição é amparada pelo próprio dispositivo ao tratar de aspectos
procedimentais, atribuindo sua realização a Comissão Técnica de Classificação, idealizada
para este fim.
Nesse cenário estruturado formalmente e em consideração às formas de assistência ao
preso, seria então possível garantir uma execução de pena individualizada, com
estabelecimentos de parâmetros de fácil aferição em cada fase da execução da pena, de modo
a conduzir o preso a reintegração social, retirando-o do “meio da delinquência”.
Individualizar, traduz-se na oferta de melhores condições para o cumprimento da pena,
concedendo-lhe oportunidades e elementos para o alcance de sua reinserção social
(Bittencourt, 1988).
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Mesmo em conhecimento de toda explanação acima, após 40 anos de publicação, as
disposições da Lei de Execução Penal, ainda que de teor muito prático e procedimental,
dificilmente se materializam na realidade das Unidades Prisionais do país. As prisões, desse
modo, se quer possuem uma Comissão Técnica de Classificação em seu quadro, os ingressos
não passam por qualquer exame de personalidade e por consequência não há qualquer plano
de execução individualizado para que se possa acompanhar durante seu cumprimento em
regime fechado ou semiaberto.
Vive-se, na atualidade, o estado de coisas inconstitucional no
sistema carcerário brasileiro, com a violação de direitos fundamentais dos
detentos, situação reconhecida, expressamente, pelo Supremo Tribunal
Federal (ADPF 347-DF, Pleno, rel. Roberto Barroso, 04.10.2023). Busca-se
soluções e a cooperação de diversas autoridades, instituições e da
comunidade em geral para tanto. Em jogo, estão princípios relevantes, como
a individualização executória da pena, a proporcionalidade das punições, a
duração razoável do processo de execução e, acima de tudo, a dignidade da
pessoa humana (Nucci, 2024).
Em desconhecimento da realidade da Execução de pena, os responsáveis pelo texto
original da LEP ainda previam, considerando sua perspectiva individualizadora e fundados
sobre a influência do positivismo, a adoção ao texto original quanto a necessidade de
realização de exame criminológico, uma vez que a análise de seus resultados comporiam o
requisito subjetivo para concessão do benefício a progressão de regime.
Tal exigência nesta fase da pena tinha a preocupação de buscar compreender, a partir
de aspectos psicológicos, a possibilidade daquele agente cometer novas práticas criminosas.
Foi somente em 2003, com a Lei 10.792, que a realização do exame deixou de ser uma
exigência para aqueles que cumpriam o lapso temporal necessário para progressão.
Sepultou-se, assim, tardiamente, o sonho positivista de detecção
precisa da periculosidade, tanto pelas limitações técnicas e
epistemológicas da tarefa, quanto pelas sérias reservas de natureza
ético-jurídicas que marcam o exercício de tal pretensão, que vão
desde sua inconsistência científica até sua natureza claramente
atentatória à intimidade e dignidade humanas (Neto, 2010, p. 7).
Tal contextualização é mister para compreensão da delimitação do presente projeto,
pois em 11 de abril de 2024 foi publicada a Lei n. 14.843 que altera significativamente a Lei
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de Execução Penal e traz de volta a exigência afastada em 2003. Novamente, torna-se
necessária a observação dos resultados do exame criminológico para aferição do requisito
subjetivo para todos os pedidos de progressão de regime.
Nesse contexto, a obrigatoriedade imposta nos direciona a retornar ao cenário de 2003
quanto aos motivos que ensejaram a extinção de seu caráter obrigatório, em consideração a
realidade atual da Execução Penal no Brasil e todas as novas discussões no campo jurídico e
da psicologia quanto ao próprio exame e seu caráter de auxiliar nas decisões judiciais relativas
a direitos inerentes a toda pessoa em cumprimento de pena.
2. PROBLEMA DE PESQUISA
Diante do contexto apresentado, a pesquisa pretende sanar o seguinte questionamento:
estaria a exigência de realização de exame criminológico para aferição do alcance do requisito
subjetivo para progressão de regime apta a assegurar uma execução de penal regular
formalmente, em respeito aos Direitos Humanos da pessoa em cumprimento de pena
assegurados constitucionalmente e no plano internacional e em conformidade com os
objetivos da legislação penal brasileira?
Destaca-se que o problema central surge tanto numa perspectiva teórica e formal, da
introdução dessa forma de exame com os objetivos idealizados, como prática, em
consideração a execução penal brasileira em detrimento daquilo que é previsto e
supostamente assegurado pela legislação.
3. HIPÓTESE DE PESQUISA
Ao problema de pesquisa proposto, lança-se como hipótese provisória - a ser
confirmada ou refutada ao final da investigação, a de que, (em consideração aos motivos que
ensejaram a extinção dessa exigência em 2003, a análise de dados do INFOPEN que
escancaram um cenário de superlotação e baixo investimento ao sistema prisional, bem como
em atenção aos estudos no campo da psicologia sobre o exame), essa alteração legislativa
ocasionada pela Lei n° 14.843/24 ocasiona um retrocesso no sistema de execução penal
nacional, estando contrária aos objetivos da legislação penal e às garantias constitucionais
uma vez que resulta no cerceamento do direito a progressão de regime e outros direitos, em
razão de suas consequências.
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Referências:
BRASIL. L7210. LEI Nº 7.210, DE 11 DE JULHO DE 1984.
BRASIL. LEI Nº 14.843, DE 11 DE ABRIL DE 2024.
BITENCOURT, Cezar Roberto. Regimes penais e exame criminológico. Revista dos
Tribunais, São Paulo, v. 77, n. 638, p. 260-269, dez. 1988.
NETTO, Alexandre Orsi e FRASSETO, Flávio Américo. Um engodo chamado exame
criminológico. Boletim IBCCRIM n. 209, abril. 2010, p 07-08.
MARCÃO, Renato. Curso de execução penal. 20. São Paulo: Saraiva Jur, 2023. 1 recurso
online.
NUCCI, Guilherme de Souza. Individualização da pena e exame criminológico: análise da
Lei 14.843/24. Consultor Jurídico: São Paulo, maio de 2024.
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