Artigo DOI: 10.51497/rfc.
v20n26-008
Receipt of originals: 08.05.2024 | Acceptance for publication: 08.21.2024
FILOSOFIA E PSICANÁLISE EM JUNG
PHILOSOPHY AND PSYCHOANALYSIS IN JUNG
FILOSOFÍA Y PSICOANÁLISIS EN JUNG
1 1
Stigar, Robson1
Ruthes, Vanessa Roberta Massambani2
RESUMO
O presente artigo busca analisar a relação de elementos presentes na teoria de Jung sobre a psiqué
humana com teorias de filósofos que lhe eram contemporâneos. No início de seu desenvolvimento a
filosofia unia em seu cômputo reflexivo uma série de outras áreas do conhecimento, que na modernidade
passaram, paulatinamente, a terem autonomia epistemológica. A psicologia é uma dessas. Jung sofre
influencias de vários pensadores. Em Freud, vamos encontrar os elementos que fundamentam a
existência de outras estruturas da psiqué que convivem com a consciência. Com essas análises,
pretendemos demonstrar que a psicologia analítica, como ficou conhecida a corrente de psicologia de
Jung, foi profundamente influenciada pela filosofia. Em Kant vamos encontrar as referências sobre
categorias a priori, que compõem a psiqué humana e a forma como essa percebe a realidade. Em
Nietzsche vamos encontrar os elementos relacionados a uma natureza comportamental de caráter
comunitário, a partir da qual, os indivíduos realizam suas escolhas a partir de categorias presentes em
determinado grupo social. Em Darwin, vamos encontrar elementos que nos permitem compreender a
existência de formas genéticas basilares, que não são modificadas pelo processo de adaptação da
realidade.
Palavra-chave: Filosofia. Psicologia. Teoria Junguiana.
ABSTRACT
This article seeks to analyze the relationship between elements present in Jung's theory on the human
psyche with theories from philosophers who were his contemporaries. At the beginning of its
development, philosophy united in its reflective calculation a series of other areas of knowledge, which
in modernity gradually began to have epistemological autonomy. Psychology is one of those. Jung is
influenced by several thinkers. In Freud, we will find the elements that underlie the existence of other
structures of the psyche that coexist with consciousness. With these analyses, we intend to demonstrate
that analytical psychology, as Jung's current of psychology became known, was deeply influenced by
philosophy. In Kant we will find references to a priori categories, which make up the human psyche and
the way it perceives reality. In Nietzsche we will find elements related to a behavioral nature of a
1
Doutor em Ciência da Religião, Faculdade Herrero. Curitiba, Paraná, Brasil. E-mail: [email protected]
2
Doutora em Teologia, Faculdade Unina. Curitiba, Paraná, Brasil. E-mail: [email protected]
Revista Filosofia Capital. Brasília, Vol. 20, n. 26, p. 01-10, 2024.
community nature, from which individuals make their choices based on categories present in a given
social group. In Darwin, we will find elements that allow us to understand the existence of basic genetic
forms, which are not modified by the process of adaptation to reality.
Keywords: Philosophy. Psychology. Jungian Theory.
RESUMEN
Este artículo busca analizar la relación entre elementos presentes en la teoría de Jung sobre la psique
humana con teorías de filósofos que fueron sus contemporáneos. Al inicio de su desarrollo, la filosofía
unió en su cálculo reflexivo una serie de otras áreas del conocimiento, que en la modernidad
paulatinamente comenzaron a tener autonomía epistemológica. La psicología es una de ellas. Jung está
influenciado por varios pensadores. En Freud encontraremos los elementos que subyacen a la
existencia de otras estructuras de la psique que coexisten con la conciencia. Con estos análisis 2 2
pretendemos demostrar que la psicología analítica, como se conoció a la corriente de psicología de Jung,
estuvo profundamente influenciada por la filosofía. En Kant encontraremos referencias a categorías a
priori, que configuran la psique humana y la forma en que ésta percibe la realidad. En Nietzsche
encontraremos elementos relacionados con un carácter conductual de carácter comunitario, a partir del
cual los individuos toman sus decisiones en función de categorías presentes en un determinado grupo
social. En Darwin encontraremos elementos que nos permiten comprender la existencia de formas
genéticas básicas, que no son modificadas por el proceso de adaptación a la realidad.
Palabra clave: Filosofía. Psicología. Teoría junguiana.
1 INTRODUÇÃO
Vivendo em um período de efervescências no campo da intelectualidade, podemos afirmar que
Jung condensou de forma magistral óticas teóricas antagônicas, percebendo o que as mesmas
possibilitavam na compreensão acerca do humano. Dentre essas diversas perspectivas, temos a
colaboração filosófica de Immanuel Kant, de Friedrich Nietzsche, Charles Darwin e Sigmund Freud na
construção do pensamento Junguiano construindo um encontro intelectual de Jung com a Filosofia e a
Psicanalise. Para a formação de sua teoria acerca da psiqué, Jung passou, por experiências pessoais.
Contudo, à essas se somam outras tantas influências que direta ou indiretamente estão presentes em sua
abordagem psicológica.
Jung trilhou a individuação, pois havia a necessidade imperiosa nele de ir ao inferno e voltar para
poder mostrar o caminho da volta àqueles que ficaram perdidos pelo caminho da vida. Tornou-se, ele,
uma resposta sincera e corajosa ao nosso tempo. Na psicologia analítica poderia se dizer que leva o
individuo a descobrir, o se “eu” colocado ao mundo, sendo assim cada um deve descobrir suas respostas;
caso contrário, estará reduzido à resposta que o mundo me der".
Revista Filosofia Capital. Brasília, Vol. 20, n. 26, p. 01-10, 2024.
Na terapia junguiana, analisa-se os sonhos e fantasias, uma ligação estabelecida entre a mente
consciente e os conteúdos do inconsciente. A doença psíquica é considerada o resultado do rompimento
entre elas. Os pacientes são orientados a ficar atentos aos significados pessoal e coletivo. Descobrir os
sinais do inconsciente, descobrir o “como” os “porquês” e os “para que” de cada situação vivida, ou seja,
estudar a totalidade do ser.
2 CARL GUSTAV JUNG
“Minha vida é a história de um inconsciente que se realizou” (Jung, P.5) esta é a introdução
da autobiografia de Carl Gustav Jung, registrada no livro Memórias Sonhos Reflexões. 3 3
Jung nasceu em 26 de julho de 1875, em Kesswil, Suíça, mudou-se para a cidade da Basileia, na
época um dos maiores centros de cultura da Europa. Lá realizou seus primeiros estudos. Filho de um
pastor protestante que deixou-lhe, como herança, uma fé cega que se mantinha a muito custo com o
sacrifício da compreensão. Jung viria a usar as escrituras como referência para a experiência interior de
Deus.
Ele lamentava que, à religião, faltasse o empirismo, o que alimentaria a sede da personalidade, e
que, às ciências naturais, que também tanto o fascinavam devido ao envolvimento com a realidade
concreta, faltasse o significado, que saciaria a personalidade. Os dois aspectos, religião e ciência, não se
tocavam daí sua constante insatisfação, devido ao desencontro das duas instâncias interiores.
E foi dessa tentativa de saciar tanto um aspecto quanto o outro, de fazer justiça ao ser como um
todo, que decidiu formar-se em psiquiatria: foi pensando nisto e nesta cede de se completar fazer a
experiência dos dados biológicos e dados espirituais, que até então buscara inutilmente. Tratava-se,
enfim, do lugar em que o encontro da natureza e do espírito se torna realidade.
Por muitos anos, Jung sentiu possuir duas personalidades separadas: um ego público, exterior,
que era envolvido com o mundo familiar, e um eu interno, secreto, que tinha uma proximidade especial
para com Deus. Ele reconhecia ter herdado isso de sua mãe, que tinha a notável capacidade de "ver
homens e coisas tais como são".
Formou-se em medicina pela Universidade da Basileia, no ano de 1900. Em 1903 casou-se com
Emma Rauschenbach. O casal teve cinco filhos: Agathe, Anna, Franz, Marianne, Emma. A esposa, fiel
seguidora de Jung, foi analisada por ele próprio.
Aos 38 anos (1913) Jung havia cumprido largamente todas as tarefas da primeira metade da vida,
tinha constituído família; afirmara-se no campo profissional, sendo procurado por enorme clientela que
Revista Filosofia Capital. Brasília, Vol. 20, n. 26, p. 01-10, 2024.
acorria de toda a Europa e da América; conquistara renome científico mundial, sendo requisitado em
palestras, seminários, congressos, dentre outros. (Silveira, 1981)
3 AS PRINCIPAIS OBRAS
Em 1903 publicou sua primeira obra, "Psicologia e Patologia dos Fenômenos ditos Ocultos",
fruto de sua tese de doutorado. Publicou nos anos seguintes mais três trabalhos, relacionadas à descoberta
dos complexos afetivos e das significações nos sintomas das psicoses. Em 1905 tornou-se livre docente
na Universidade de Zurique.
Os fenômenos ocultos (1902), A libido: símbolos e transformações (1912), O inconsciente 4 4
(1914-1917) ,Dicionário de psicologia clínica (1921), Energética psíquica (1928), Análise de sonhos.
Seminário. (1928-1930), Psicologia e Alquimia (1935, Eranos Jarbuch), A criança e o núcleo: dois
arquétipos (1940-1941), Psicologia e educação (1942-1946), Psicologia e poesia (1922-1950),
Sincronicidade (1952), Resposta ao trabalho (1952), Presente e futuro (1957), Esquizofrenia (1958), Um
mito moderno. Coisas que são vistas no céu (1958), A psique da criança. (1909-1961), Bem e mal em
psicologia analítica. (1943-1961), Consciência, inconsciente e individuação, O ego e o inconsciente, A
árvore filosófica, Análise de sonhos, tipos psicológicos, A psicologia do inconsciente, Lembre-se sonhos
reflexões, O homem e seus símbolos.
Carl Gustav Jung, foi um psiquiatra e psicoterapeuta, fundou a psicologia analítica. Jung propôs
e desenvolveu os conceitos de personalidade extrovertida e introvertida, arquétipo e inconsciente
coletivo. Seu trabalho tem sido influente na psiquiatria, psicologia, ciência da religião, literatura e áreas
afins. Ficou célebre a controvertida resposta que Jung deu, em 1959, a um entrevistador da BBC que lhe
perguntou: "O senhor acredita em Deus?" A resposta foi: "Não tenho necessidade de crer em Deus. Eu
o conheço".
O confrontar-se com o inconsciente e o defrontar-se com a própria sombra parece ser o exemplo
maior de coragem pessoal e honestidade intelectual que Freud e Jung legaram às gerações de estudiosos
da alma humana que os sucederam.
Carl Gustav Jung morreu dia 6 de junho de 1961, aos 86 anos, em sua casa, à beira do lago de
Zurique, onde residiu desde seus 4 anos, em Küsnacht após uma longa vida produtiva, que marcou e
tudo leva a crer que ainda marcará mais a antropologia, a sociologia e a psicologia., ele foi um dos mais
influentes pensadores do século XX.
Revista Filosofia Capital. Brasília, Vol. 20, n. 26, p. 01-10, 2024.
4 O ENCONTRO DE JUNG COM SIGMUND FREUD E COM A FILOSOFIA
Em 1902, Jung foi a Paris, onde estudou com Pierre Janet, regressando no ano seguinte
ao hospital de Burgholzli, onde assumiu um cargo de chefia e onde, em 1904, montou
um laboratório experimental em que implementou o seu célebre teste de associação de palavras para
o diagnóstico psiquiátrico. Foi neste contexto entra em contato com as obras de Sigmund Freud (1856-
1939). Jung viu, em Freud, um companheiro para desbravar os caminhos da mente. Enviou-lhe cópias
de seus trabalhos sobre a existência do inconsciente, confirmando concepções freudianas de recalque e
repressão. Ambos se encantaram um com o outro, principalmente porque os dois desenvolviam
trabalhos inéditos em medicina e psiquiatria. 5 5
O primeiro encontro entre eles, em 27 de fevereiro de 1907, transformou-se numa conversa de
treze horas ininterruptas. Depois desse encontro, estabeleceram uma amizade de aproximadamente sete
anos, período em que trocavam informações sobre seus sonhos, análises, trocavam confidências e
discutiam casos clínicos. Os dois viajaram juntos aos Estados Unidos em 1909, proferindo palestras num
centro de pesquisas. Em 1910 foi fundada a Associação Psicanalítica Internacional, da qual Jung foi
eleito presidente.
Porém, ao lado de tamanha identidade de pensamento, havia também algumas diferenças
fundamentais. Jung jamais conseguiu aceitar a insistência de Freud de que as causas dos conflitos
psíquicos sempre envolveriam algum trauma de natureza sexual, e Freud não admitia o interesse de Jung
pelos fenômenos espirituais como fontes de estudo válidas em si.
Nos anos 1930, essa divergência atingiria seu auge, e o rompimento entre eles foi inevitável. De
qualquer sorte, talvez seja necessário àqueles que se propõe seguir as orientações teóricas de Freud ou
de Jung ou, ainda, de Freud e Jung mergulhar na história dessa turbulenta amizade e extrair as suas
próprias conclusões. É possível que esse mergulho termine por ser um encontro pessoal de cada um com
a sua própria verdade. Um confronto rico e saudável com o seu inconsciente. Então, quem sabe, talvez
tenhamos aprendido a lição maior desses mestres segundo a qual pessoa alguma pode acompanhar ou
orientar uma jornada que ela mesma não a tenha feito.
5 AS INFLUÊNCIAS TEÓRICAS DA TEORIA JUNGUIANA NA PSICANÁLISE E NA
FILOSOFIA
Para a formação de sua teoria acerca da psiqué, Jung passou, por experiências pessoais. Contudo,
à essas se somam outras tantas influências que direta ou indiretamente estão presentes em sua abordagem
Revista Filosofia Capital. Brasília, Vol. 20, n. 26, p. 01-10, 2024.
psicológica. Vivendo em um período de efervescências no campo da intelectualidade, podemos afirmar
que Jung condensou de forma magistral óticas teóricas antagônicas, percebendo o que as mesmas
possibilitavam na compreensão acerca do humano. Dentre essas diversas perspectivas, citamos a
reflexão de Immanuel Kant, de Friedrich Nietzsche, Charles Darwin e Sigmund Freud.
O primeiro pensador, Kant, foi um filósofo do século XVIII que analisou a forma pela qual o
conhecimento era produzido. Para tanto, verificou que a razão humana abstrai as informações
produzindo o conhecimento. Um primeiro aspecto, que esse pensador destaca, é a relação que o sujeito
tem com o mundo a ser conhecido: o fenômeno. Afirmando que o pensamento somente consegue
abstrair aquilo que possui em si uma materialidade, Kant pontua que o conhecimento é proveniente 6 6
de uma análise das realidades abstraídas pelos cindo sentidos.
Entretanto, o que é que nos garante que essa análise seja verdadeira? Para o autor, a existência
de categorias denominadas por ele de a priori doam o aspecto de veracidade para o que é abstraído pelo
ser humano. Essas categorias são realidades mentais, não verificáveis, mas que são universais, ou seja,
que todos os seres humanos possuem. Essa estruturação epistemológica permite inferir a existência de
uma realidade implícita no ser humano, enquanto espécie, da qual não podemos versar de forma direta.
Em outras palavras as categorias a priori são elementos dos quais não podemos versar, mas apenas
intuir.
Nietzsche, o segundo pensador, fez uma releitura do pensamento filosófico vigente, buscando
demonstrar a forma como as concepções ocidentais de percepção do ser humano eram deveras
fragmentadas. Refutando a existência de uma realidade metafísica (como as categorias a priori de Kant),
esse filósofo afirma que a afirmação da existência, que a unificação da pessoa perpassa por um profundo
conhecimento de suas potencialidades interiores.
Esse conhecimento não se relaciona somente com a percepção consciente de seus atos, mas na
compreensão das pulsões que fomentam o agir humano, que podem ser antagônicas e estarem em luta.
Como ele mesmo afirma: “se treinarmos nossa consciência, ela beija enquanto nos morde” (Nietzsche,
2001, 98).
De outro, em Nietzsche também encontramos a concepção de que as ações humanas não são
regidas, muitas vezes apenas pela escolha autônoma ou individual, mas que há um nível de influência
externa. Essa influência não se relaciona com a cultura ou ainda com as transformações sociais, mas sim
com do que ele chama de natureza comunitária, que molda aspectos da individualidade humana.
Revista Filosofia Capital. Brasília, Vol. 20, n. 26, p. 01-10, 2024.
Nessa análise da filosofia nietzschiana, encontramos dois elementos fundamentais para a
percepção da reflexão junguiana: a ideia de que a pessoa precisa se entender e ser entendida como um
todo, para tanto perpassa por um profundo conhecimento de si, que se relaciona com o processo de
individuação; e a compreensão de existe uma natureza comunitária que perpassa todos os seres humanos,
formatando o comportamento dos mesmos, que se relaciona com o inconsciente coletivo.
Outro pensador que influenciou a teoria junguiana foi Darwin. Com sua análise sobre a evolução
das espécies, houve a descrição de que de maneira ampla, todos os seres continham características dos
que o precederam. O que ocorreu nesse processo de transformação das espécies foi a adaptação de
algumas características, entretanto formas genéticas e hereditárias perpassaram as gerações, nos 7 7
permitindo encontrar uma base da ciência empírica para a compreensão do inconsciente coletivo.
Por fim, a influência de Freud com a estruturação do inconsciente foi fundamental para Jung.
Entretanto, essa teoria foi transformada por Jung que atribuiu à mesma outro significado. Para Freud o
inconsciente estava relacionado à libido que era definida em aspectos diretamente relacionados à
sexualidade. Já para Jung o inconsciente é uma energia vital da qual a sexualidade apenas faz parte.
Segundo Schultz e Schultz (1999), “a energia libidinal básica se exprime no crescimento e na
reprodução, e também em outras atividades, depende do que é mais importante para um individuo em
um momento particular”.
No que tange à formação da personalidade humana, Jung não percebia esse como um
desdobramento das experiências da infância, mas sim, afirmava que o comportamento humano é
engendrado por meio de metas, esperanças, aspirações em relação ao futuro. Uma terceira divergência
com Freud é a compreensão da importância do inconsciente. Para Jung, essa dimensão humana é
fundamental para a compreensão de si e para o desenvolvimento do processo de individuação.
Essas influências narradas são deveras importantes, pois permitem compreender que o
desenvolvimento da teoria junguiana não está desconectada de toda a reflexão de seu tempo, mas que o
desenvolvimento intelectual contribuiu para a mesma.
6 O DESENVOLVIMENTO DA TEORIA JUNGUIANA NA PSICANÁLISE E NA FILOSOFIA
Para Jung a psiqué humana é compreendida por meio de três níveis: a consciência, o inconsciente
individual e o inconsciente coletivo. Para o autor o ego, refere-se ao nível consciente da pessoa. Esse
nos dá uma compreensão de quem nós somos, incluindo em si lembranças, percepções e nos permite
realizar uma adaptação ao ambiente no qual nos inserimos. Entretanto, para Jung a consciência é um
Revista Filosofia Capital. Brasília, Vol. 20, n. 26, p. 01-10, 2024.
nível secundário da existência, tendo em vista que é uma pequena porção de nossa psiqué. O foco
principal do autor está em uma realidade oculta: o inconsciente.
Na teoria junguiana o inconsciente é considerado como uma porção ampla e profunda do ser
humano. O primeiro formato pelo qual se apresenta é o individual, que está logo abaixo da consciência,
e consistem em “todas as lembranças impulsos, desejos percepções fugidias e outras experiências da
vida da pessoa que foram suprimidas ou esquecidas” (Schultz, D; Schultz, S. 1999). Essas influenciam
direta ou indiretamente o comportamento da pessoa.
Na perspectiva de análise do inconsciente Jung afirma a existência de um nível que ele
considera como coletivo. Esse é um conjunto de experiências evolutiva e universais que formam a 8 8
base da personalidade, constituindo-se a força mais presente na personalidade. Como afirma Schultz e
Schultz (1999).
Sendo influenciado pela teoria da evolução e a filosofia kantiana, Jung acreditava que esses
elementos que compõem o inconsciente coletivo eram explicáveis pelas semelhanças das estruturas
mentais entre os humanos. Essas heranças presentes no inconsciente são fundamentais para o
desenvolvimento da psiqué e denomina tais de arquétipos.
Os arquétipos são realidades inatas, preexistentes na pessoa, que acabam por influenciar de forma
enfática o comportamento das pessoas, frente a situações vivenciadas pelos ancestrais. Sendo
vivenciados por meio de diversos eventos mentais, estão relacionados, de forma tipológica, por meio de
experiências significativas da existência: o início e o fim da mesma, como também situações de risco
(Jung. 2002, p. 53).
Empreendendo uma investigação apurada acerca da estruturação de mitos e simbologias
artísticas, de diversas civilizações, Jung perceve elementos comuns entre essas, mesmo que estejam
separadas pelo tempo e espaço (Jung. 2002, p. 88). Considerados como sistemas distintos de
personalidade, os principais descritos por Jung são: persona, anima, animus, sombra e self.
Persona: se constitui a ‘máscara’ que usamos nas relações interpessoais, que representa aquilo
que queremos aparentar ser. Ela não é a verdadeira personalidade do indivíduo, mas relaciona-se à
compreensão do papel social que assumimos par agir nas diversas situações.
Anima e Animus: constitui-se as características femininas presentes no homem, como as
características masculinas presentes na mulher. Como afirma Schultz e Schultz (1999): esses
“arquétipos, advêm do passado primitivo da espécie humana, em que os homens e mulheres absorveram
algumas tendências comportamentais e emocionais do outro sexo”.
Revista Filosofia Capital. Brasília, Vol. 20, n. 26, p. 01-10, 2024.
Sombra: constitui-se o lado mais sombrio do ser humano, na qual percebe-se o que há de mais
primitivo e animalesco na estruturação da personalidade. Esse arquétipo nos impele a realizar coisas que
são consideradas como inaceitáveis, que geralmente não nos permitiríamos fazer. Contudo, é na
‘sombra’ que se encontra a fonte da espontaneidade, da criatividade, da percepção e da emoção, deveras
importantes para o desenvolvimento humano.
Self: considerado como o mais importante arquétipo do sistema junguiano. Ele é responsável por
proporcionar à personalidade sua unidade e estabilidade. Promovendo a integração da personalidade e
pode ser comparado com o impulso para a autorrealização (Schultz, D; Schultz, S. 1999).
No contexto dessa análise arquetípica, se insere a teoria de Jung acerca dos tipos psicológicos. 9 9
Esses são considerados como um sistema de combinações de atitudes e energia libidinal que permitem
avaliar se as características comportamentais do indivíduo. Essas combinações são entendidas a partir
de duas referências: a extroversão e a introspecção.
A extroversão pode ser compreendida a partir da ótica relacional. O indivíduo extrovertido tende
a dirigir sua libido para questões relacionadas ao mundo exterior, tendo características comportamentais,
a sociabilidade e a autoconfiança são fortemente influenciadas pelas forças presentes no mundo exterior.
Já a introversão, por sua vez, dirige a libido para o interior da pessoa que tem características mais
contemplativas, é resistente às influências externas e nas relações interpessoais é menos sociável.
Destacamos que esses dois tipos psicológicos não estão presentes de forma plena na pessoa, sempre há
um que é mais pronunciado, o que possibilita flexibilidade de ação e comportamento (JUNG, 2000, p.
346).
No contexto da clínica, esses tipos psicológicos foram utilizados de diversas formas de Jung para
o processo diagnóstico. Dentre esses pontuamos o teste de associação de palavras que se constitui um
instrumento utilizado para descobrir complexos da personalidade em seus pacientes.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo procurou apresentar de forma rápida e objetiva o encontro de Jung com a
Filosofia ou da Filosofia com a Psicologia por meio de Jung propriamente, onde os pensamentos de
ambos se compõem. Apresentamos as influências de diversos filósofos na vida e no pensamento de Jung,
bem como como as consequências dessas influencias na Psicologia desenvolvida por Jung..
Revista Filosofia Capital. Brasília, Vol. 20, n. 26, p. 01-10, 2024.
Entendemos que o pensamento Junguiano foi uma construção múltipla, constituída de várias
fontes, sendo a filosofia uma delas, tendo relevante papel na construção e organização de raciocínio
lógico, empírico e racional de Jung perante a psicologia.
O presente artigo é de caráter introdutório, não tendo portanto a intenção de ser algo conclusivo,
trata se de um ensaio, onde apresentamos alguns apontamentos de ordem filosófica, entretanto não se
sobrepõe ao psicológico, pois não podemos mensurar até que ponto o filosófico estaria a frente do
pensamento psicológico e vice versa.
REFERÊNCIAS 10 10
JUNG, Carl Gustav. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Petrópolis, Vozes, 2002.
___. Tipos psicológicos. Petrópolis, Vozes, 2000.
___. Memórias, sonhos, reflexões. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986, prólogo, p. 19.
Manual de Cambridge Para Estudos Junguianos/Organizado por Polly Young-Eisendrath e
Terence Dawson, Trad. Daniel Bueno-Porto Alegre: Artmed Editora, 2002.
NIETZSCHE, Friedrich. Além de Bem e mal: prelúdio de uma Filosofia do Futuro. São Paulo:
Companhia das Letras, 2001.
PENNA, E. M. D. O Paradigma Junguiano no contexto da metodologia qualitativa de pesquisa.
2004. Artigo – III Congresso Latino-americano de Psicologia Junguiana, Universidade de São Paulo,
São Paulo, 2004.
SCHULTZ, Duane; SCHULTZ, Sydney. História da Psicologia Moderna. São Paulo: Cultrix, 1999.
VECHI, L. G. A Psicologia Analítica de Carl Gustav Jung no estudo de instituição: uma proposta
teórico-metodológica. 2008. 171 f. Tese (Doutorado) - Instituto de Psicologia, Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2008.
Revista Filosofia Capital. Brasília, Vol. 20, n. 26, p. 01-10, 2024.