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1 - Cadernos Cris-Fiocruz - Informe 03-02-2025 - Sobre Saúde Global e Diplomacia Da Saúde Final

O Caderno CRIS/FIOCRUZ 01/2025 aborda a geopolítica e a saúde global em um contexto de crises multidimensionais, destacando a retirada dos EUA da OMS e suas implicações. O documento reúne reflexões de diversos autores sobre temas críticos como a governança da saúde, direitos humanos, segurança alimentar e o papel das instituições multilaterais. Além disso, enfatiza a importância da colaboração internacional e o fortalecimento das redes de saúde no Sul Global.
Direitos autorais
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1 - Cadernos Cris-Fiocruz - Informe 03-02-2025 - Sobre Saúde Global e Diplomacia Da Saúde Final

O Caderno CRIS/FIOCRUZ 01/2025 aborda a geopolítica e a saúde global em um contexto de crises multidimensionais, destacando a retirada dos EUA da OMS e suas implicações. O documento reúne reflexões de diversos autores sobre temas críticos como a governança da saúde, direitos humanos, segurança alimentar e o papel das instituições multilaterais. Além disso, enfatiza a importância da colaboração internacional e o fortalecimento das redes de saúde no Sul Global.
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Fundação Oswaldo Cruz

Centro de Relações Internacionais em Saúde (CRIS)


CADERNOS CRIS/FIOCRUZ 01/2025
05 de dezembro de 2024 a 03 de fevereiro de 2025

Publicação Digital
Produção coletiva dos trabalhadores do CRIS-FIOCRUZ
Rio de Janeiro, 06 de fevereiro de 2025

1
SUMÁRIO

04 - Apresentação - Paulo M. Buss, Erica Kastrup e Pedro Burger

Sistema Nações Unidas

13 - Geopolítica 2024 -2025 e a saúde global: um mundo em ebulição e em frangalhos - Paulo


M. Buss

29 - As Nações Unidas que precisamos - Santiago Alcázar

45 - O ano começou com grandes movimentos na Governança da Saúde Global - Paula Reges,
Luana Bermudez e Guto Galvão

54 - O sentido e o impacto da retirada dos Estados Unidos da OMS - Deisy Ventura

57 - O que esperar de um ano que começou com tanta insegurança? - Sonia Fleury

63 - Sobre o Direito Humano à Saúde em 2025: Do descredito do presente à reivindicação


sistêmica de uma transformação das políticas e sistemas de saúde - Armando De Negri
Filho

78 - Ethical equity redistribution/contribution to global good - Juan Garay

92 - Acordos multilaterais ambientais: panorama global e acontecimentos de janeiro de 2025 -


Danielly de P. Magalhães e Luiz Augusto Galvão

100 - Deportações na Era Trump 2.0, seus impactos e as respostas da comunidade internacional
- Rafael Gomes França, Caio Murta, Giacomo Gianell, Giulia Mariano Machado, Júlia
Moraes, Marina Sujkowski e Deisy de Freitas Lima Ventura

107 - Saúde das mulheres, crianças e adolescentes: perspectivas e desafios globais no cenário
atual - Priscilla Paiva Gê Vilella dos Santos, Maria Teresa Rossetti Massari e Maria
Auxiliadora Mendes Gomes

113 - Quais são as perspectivas da segurança alimentar e nutricional global para 2025? - Eduardo
Nilson e Denise Oliveira e Silva

126 - Perspectivas 2025 para a UNESCO: Iniciativas para um futuro mais sustentável - Fabiane
Gaspar, Gisele Sanglard, Heliton Barros e Vitor Rodrigues

137 - As Instituições Financeiras Multilaterais (BID, Banco Mundial e FMI) - Isis Pillar Cazumbá

145 - O Banco Africano de Desenvolvimento (AfDB) e a Fome na África - Laura Tavares

157 - Tarifas, Multilateralismo e Transformação Econômica para o Desenvolvimento Sustentável


e Inclusivo - Claudia Chamas e Bernardo Bahia Cesário

Movimentos sociais globais e saúde

173 - A urgência da ação global diante das crises humanitárias, climáticas e de saúde - Patrícia
Lewis Carpio, Matheus dos Santos da Silveira, Tatiana Cerqueira Machado Medrado, Jesús
Enrique Patiño Escarcina, Diana Zeballos, Renan Amaral Oliveira, Laurenice Pires, Ana
Carol Aldapi Vaquera e Luis Eugênio de Souza

2
197 - A estrada perigosa a frente: ameaças que não cabem numa lista - Rafaela Venturella De
Negri e Armando De Negri Filho

Territórios, multilateralismos regionais e grupos de países

210 - Sul Global sob nova direção - Regina Ungerer, Erica Kastrup e Tiago Nery

245 - Começa a presidência da África do Sul no G20. Canadá assume a presidência do G7 com
grandes desafios internos e na conjuntura internacional. A resiliência e os desafios da
economia no horizonte da OCDE - Pedro Burger, João Miguel Estephanio, Vitória
Kavanami, Thaiany Medeiros Cury, Nina Bouqvar e Paulo Esteves

258 - Prioridades do Brasil ao assumir a presidência de turno do BRICS em 2025 - Claudia Hoirisch

272 - Portas fechadas, algemas apertadas e “América para os Americanos”: novos (ou velhos?)
desafios para a migração latino-americana no continente - Sebastian Tobar, Samia de
Brito e Miryam Minayo

289 - África - Augusto Paulo Silva, Tomé Cá, Manuel Mahoche, Dala Djop e Felix Rosenberg

309 - Um mundo mais dividido, mais desigual e mais violento. E isso não é uma surpresa - Lúcia
Marques

318 - Atualização EUA - Guto Galvão

323 - Trumpolinagem e outros desvios de conduta - Adhemar Bahadian

325 - Memórias póstumas dos passos perdidos - Adhemar Bahadian

Autores deste Caderno - 327

**Eventos do CRIS e acessos a materiais do CRIS - 330

***Para citações, ver ‘Ficha catalográfica’ - 331

3
CADERNOS CRIS/FIOCRUZ
Informe sobre Saúde Global e Diplomacia da Saúde
No. 01/2025 – 06 de fevereiro de 2025

Apresentação

Em primeiro lugar, desejamos aos nossos queridos leitores e leitoras um excelente ano
de 2005, em suas vidas pessoais e profissionais. Queremos estar juntos para manter este
contato quinzenal sobre o fascinante e complexo campo da saúde global e diplomacia da saúde.

Completaremos, em 2025, o quinto ano ininterrupto de publicações quinzenais dos


Cadernos. Junto com os Seminários Avançados em Saúde Global e Diplomacia da Saúde, são o
produto do Observatório de Saúde Global e Diplomacia da Saúde do CRIS/Fiocruz, que também
comemora 5 anos de existência em 2025, efeméride para a qual criamos o selo comemorativo
abaixo.

No final do ano passado, chegamos ao total de 106 fascículos dos Cadernos, com uma
média de 220 páginas por número, o que significa quase 25 mil páginas de reflexões sobre saúde
global e diplomacia da saúde ao longo dos últimos 5 anos. São, em média, 50 autores para os
cerca de 25 capítulos, cobrindo temas e territórios prioritários nesta área de políticas e práticas
que tanta influência têm sobre a saúde humana e planetária, nas esferas global, regionais,
nacionais e, mesmo, locais.

Para 2025, estão programados 24 fascículos, enviados para mais de 8 mil destinatários
do Brasil e do exterior: profissionais e estudantes das profissões da saúde; da diplomacia e das
relações internacionais; ativistas e líderes de movimentos sociais; autoridades governamentais,
políticos e público geral.

Neste ano os Cadernos adquirem uma função inédita que é servir de celeiro de textos
para a disciplina de “Leituras Selecionadas” do Curso de Atualidades em Saúde Global e
Diplomacia da Saúde 2025 do CRIS. Este primeiro fascículo, em particular, contém artigos de
leitura obrigatória sobre áreas e temas críticos de nivelamento para os participantes do Curso,
disponibilizados nos três idiomas utilizados (português, espanhol e inglês) disponibilizados no
Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA).

Destes alunos e de nossos leitores habituais, esperamos contar com sua assídua leitura,
comentários e observações que possam nos ajudar a melhorar cada vez maias estes Cadernos.

==*==

4
A história de 2025 começou vertiginosamente. Sobre o mundo que vivia há alguns anos
a endêmica crise multidimensional (política, social, econômica, ambiental, sanitária e ética),
agravada pela Covid-19 em 2020 e pelas guerras da Ucrânia e Gaza que aproximaram
perigosamente o relógio nuclear da meia-noite, abateu-se um quase apocalipse político: a
enxurrada de decretos de Donald Trump, na sua primeira semana de volta à poderosa Casa
Branca, sede do executivo do país mais rico e mais armado da Terra, lançando o mundo num
torvelinho político de consequências imprevisíveis.

A aversão do novo governo dos EUA ao multilateralismo, a saída do país da Organização


Mundial da Saúde, do Acordo de Paris sobre o Clima, do Conselho de Direitos Humanos das
Nações Unidas e da ajuda humanitária global (pela eliminação de diversas de suas agências),
além das ameaças que fez contra seus vizinhos continentais, a China e sua tradicional aliada
Europa, enchem de ineditismo negativo as relações internacionais e projetam um sombrio 2025
para o mundo.

No artigo de abertura destes Cadernos, Buss apresenta uma interpretação da


Geopolítica 2024-2025 e a saúde global, na qual se refere a esta crise multidimensional
contemporânea, nas suas dimensões política, social, econômica, ambiental e sanitária. Para o
autor, o multilateralismo se encontra enfraquecido, mas tampouco nenhum país ou blocos
plurilaterais existentes consegue se impor como hegemônico. Percorre a agenda da saúde global
sob o mandato da OMS, os próximos passos em relação ao que resta de expectativas para a
Agenda 2030 e seus ODS e analisa as graves implicações dos primeiros atos da nova
administração dos EUA sobre a geopolítica em geral e a saúde global.

De outro lado, Santiago Alcázar apresenta-nos uma preciosa reflexão sobre As Nações
Unidas que precisamos nesta complexa conjuntura. Recupera as ideias fundadoras da grande
organização do pós-guerra, analisa a complexidade de sua estrutura e governança, oferecendo
um rico acervo de acessos a suas principais agências, programas e fundos. Reflete sobre as
debilidades e fortalezas da ONU nos tempos atuais e discute alternativas para torná-la tão
relevantes quanto em tempos de maior esperança do que estes que estamos vivendo. Texto
imprescindível, de leitura obrigatória por todos os interessados na diplomacia da saúde global.

Para Reges, Galvão e Bermudez, a saída dos Estados Unidos da Organização Mundial
da Saúde (OMS) por decisão do presidente Trump representa um ataque ao multilateralismo e
à ciência. A decisão pode refletir o avanço de políticas nacionalistas e negacionistas,
desacreditando evidências científicas e minando a governança da saúde global. Nesse contexto,
o Brasil e o Sul Global têm um papel essencial na defesa da saúde pública internacional. Os
mecanismos de cooperação em redes e fortalecimentos dos laços Sul-Sul podem ser estratégias
de reestruturação. Diante das crescentes ameaças sanitárias, o fortalecimento da OMS e das
redes de colaboração global são fundamentais. Entendem os autores que o Brasil pode liderar
essa agenda, promovendo uma arquitetura de saúde mais equitativa, resiliente e comprometida
com os direitos humanos. Neste meandro, acontece em Genebra a 156ª reunião do Conselho
Executivo da OMS, em um momento crítico da governança global da saúde, marcado por
desafios como financiamento, preparação pandêmica, ameaças emergentes, mudanças
climáticas e a necessidade de cooperação multilateral reforçada. As decisões tomadas nesta
reunião influenciarão a Assembleia Mundial da Saúde e definirão prioridades para 2025,
consolidando a OMS como peça central na resposta a emergências e fortalecimento dos
sistemas de saúde globais.

5
Em artigo publicado originalmente no Jornal da USP, Deisy Ventura analisa o sentido e
o impacto da retirada dos Estados Unidos da OMS.

Sônia Fleury, em artigo publicado originalmente no blog do Centro de Estudos


Estratégicos da Fiocruz (CEE Fiocruz), enumera diversos aspectos da conjuntura internacional e,
ao fim, indaga o que esperar de um ano que começou com tanta insegurança?

Armando De Negri apresenta a robusta agenda definida para o Conselho de Direitos


Humanos da ONU para 2025, ainda que severamente golpeado pela saída dos EUA do órgão,
em mais uma atitude hostil do país ao sistema multilateral.

A atual distribuição desigual de recursos entre países resulta na perda de 10% do


potencial de vida humana que poderia ser viável para todos e sustentável dentro dos ciclos da
natureza. Neste artigo, Garay apresentamos uma abordagem gradual para a redistribuição
lógica e ética de recursos entre países que ajudaria a preservar a vida humana, manter os ciclos
naturais e promover o avanço do conhecimento para um melhor bem-estar em harmonia com
a natureza. Esta abordagem envolve primeiro a realocação de recursos acima do limiar de
acumulação e, em seguida, abordar aqueles que estão acima do limiar de excesso, libertando
assim aproximadamente 30% do PIB mundial que está desligado do bem-estar humano e
contribui para a degradação ambiental e prejudica as perspectivas para as gerações futuras. A
etapa final é suavizar a distribuição em uma curva normal baseada na equidade, colaboração e
equilíbrio ecológico.

O informe de Magalhães e Galvão contextualiza a interseção entre saúde e meio


ambiente. Apresenta conceitos-chave sobre a área e destacam os acordos multilaterais mais
relevantes. Além disso, abordam os principais acontecimentos do último mês, incluindo as
implicações da saída dos EUA do Acordo de Paris e a publicação do Relatório sobre Mudanças
Climáticas no Brasil, que apresenta uma síntese dos impactos atuais e recomendações para o
país.

Neste primeiro informe de 2025, o GT sobre Migrações, Refúgio e Saúde explora as


políticas anti-imigração do novo governo Trump e as respostas dos países no acolhimento de
seus cidadãos deportados.

Para as autoras do GT sobre Saúde da Mulher, Criança e Adolescentes, o retorno de


Donald Trump à presidência dos Estados Unidos traz desafios para a diplomacia global e a saúde
pública, considerando o histórico de seu primeiro mandato (2017-2021). Sua política externa,
marcada pela abordagem "América Primeiro" (America First), é caracterizada por priorizar
interesses nacionais, resultando na retirada ou redução de apoio a organizações multilaterais,
como o UNFPA e a OMS. Entre os principais impactos estão a politização da cooperação
internacional em saúde, o corte de financiamento para programas de saúde materna e infantil
e a restrição de direitos sexuais e reprodutivos. A continuidade dessas políticas tende a
aprofundar desigualdades e comprometer avanços conquistados nas últimas décadas. As
autoras contextualizam este cenário de crise do multilateralismo, dando ênfase aos impactos na
saúde materna e infantil. O informe também traz a tradução de editorial da revista The Lancet,
que discute o tema. Ao final, um breve informe do Dia Internacional das Mulheres 2025 da ONU
Mulheres.

Nilson e Silva refletem sobre a agenda global de segurança alimentar e nutricional


global em 2025, considerando a continuidade dos compromissos internacionais e suas
potencialidades e riscos diante das mudanças na conjuntura geopolítica mundial e como isso se

6
reflete no Brasil e suas políticas. Nesse ano, teremos oportunidades como a Cúpula de Sistemas
Alimentares +4 na Etiópia e a COP 30 no Brasil, mas também diferentes riscos, como o aumento
dos fenômenos climáticos extremos e a nova administração Trump, que ameaçam a segurança
alimentar e nutricional global.

A Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) tem
como um de seus pilares de atuação a promoção de cooperação internacional nas áreas de
educação, ciência, cultura, comunicação e informação para alcançar o compartilhamento de
conhecimento e o livre fluxo de ideias para acelerar a compreensão mútua e um conhecimento
melhor sobre a vida de cada um. Assim, os programas da UNESCO buscam contribuir para a
realização dos ODS definidos na Agenda 2030, adotada pela AGNU em 2015. Se, por um lado, os
desafios enfrentados para o cumprimento de seu mandato são ilimitados e contínuos, por outro,
geram grandes perspectivas de atuação. Gaspar, Sanglard, Barros e Rodrigues explicam que,
para 2025, as perspectivas das ações da UNESCO estão vinculadas à inteligência artificial; à
transformação digital; aos sistemas educacionais sustentáveis no continente africano; e às
mudanças climáticas, destacando, neste fascículo, as perspectivas da UNESCO para a inteligência
artificial e as mudanças climáticas.

O artigo de Cazumbá mostra as ações mais relevantes realizadas nos últimos dois meses
pelas Instituições Financeiras Multilaterais (IFMs). O Banco Interamericano de
Desenvolvimento (BID) obteve destaque em lançar estudos a respeito da economia da América
Latina e do Caribe (ALC). O Banco Mundial (BM) celebrou o financiamento recorde do seu Fundo
direcionado aos países mais pobres e a terceira rodada do Fundo Pandêmico. O Fundo
Monetário Internacional (FMI) promoveu o lançamento das perspectivas econômicas globais
atualizadas.

Nossa analista Laura Tavares faz uma retrospectiva da atuação do Banco Africano de
Desenvolvimento (AfDB) no combate à fome, à desnutrição e à insegurança alimentar na África.
O ponto de partida da análise é dezembro de 2022, quando se anuncia a Cúpula Africana sobre
Alimentação, realizada em Dacar. Foram levantadas (em diversos documentos nacionais,
regionais e internacionais) as ações do AfDB até dezembro de 2024. Analisando as várias
iniciativas do Banco, pode-se afirmar que elas ainda são fragmentadas e sobretudo insuficientes,
diante das dramáticas condições em que se encontra a maioria dos povos em África. Essas
condições são agravadas nos países com profundos conflitos internos, crônicos e agudos, que
deixam suas populações em situações de insegurança social e alimentar, dependentes da cada
vez mais escassa e igualmente insuficiente ajuda internacional.

O Ministério do Comércio da China criticou a decisão do presidente Trump de impor


tarifas de 10% sobre as exportações chinesas, declarando que entraria com um processo na
OMC e, ao mesmo tempo, ameaçando "contramedidas" para proteger seus interesses. A
Comissão Europeia levantou consultas à OMC para desafiar o que designou de “práticas
comerciais desleais e ilegais” de propriedade intelectual da China. No Fórum Econômico
Mundial, em Davos, a Diretora-Geral da OMC, Ngozi Okonjo-Iweala, pediu aos líderes mundiais
que "relaxem" e adotem abordagem comedida às tensões comerciais. Presidente do Paraguai
defende multilateralismo em Palestra Presidencial da OMC. O Banco Asiático de
Desenvolvimento e a Organização Mundial do Comércio lançaram banco de dados sobre
comércio de minerais críticos, visando apoiar a transição para energia limpa. O mais recente
relatório da UNCTAD ressalta os desafios urgentes que impactam o desenvolvimento global,
destacando o lento progresso rumo aos ODS. Desigualdades estruturais, conflitos geopolíticos e
instabilidade financeira ampliaram a lacuna do desenvolvimento, afetando particularmente

7
países de baixa renda e populações vulneráveis. Tendências-chave que moldam o futuro incluem
a transição para uma economia multipolar, avanços tecnológicos rápidos, mudanças climáticas,
transformações demográficas e urbanização. O relatório clama por ações urgentes para acelerar
a diversificação econômica, fortalecer a resiliência e impulsionar a cooperação multilateral para
garantir uma economia global equitativa e sustentável. São os conteúdos abordados por
Chamas e Cesário para este Caderno 1/2025.

O informe do GT sobre Sociedade Civil Global e Saúde aborda as manifestações feitas


entre 10 de dezembro de 2024 e 10 de fevereiro de 2025. Quarenta-e-oito das 62 organizações
da sociedade civil monitoradas, tanto de interesse público quanto privado, fizeram
manifestações dignas de nota. A crise humanitária mundial continua a se intensificar, com
conflitos prolongados e mudanças climáticas, exacerbando desigualdades na saúde e
aumentando a vulnerabilidade social. Regiões como Kivu do Norte, na República do Congo, e
Gaza enfrentam emergências humanitárias graves, enquanto na Síria, iniciativas de apoio
psicossocial buscam mitigar os impactos da guerra. Nos EUA, a extinção do aplicativo “CBP One”
expôs migrantes a riscos maiores. A censura em Israel e os ataques na Cisjordânia são exemplos
da violação de direitos e da crescente necessidade de proteção aos profissionais de saúde.
Organizações globais, como os MSF e a ActionAid, exigem acesso irrestrito à ajuda humanitária,
enquanto ONGs apelam por cessar-fogo, políticas eficazes e responsabilidade no cumprimento
das leis internacionais. A crise climática também agrava os problemas de saúde pública, como
evidenciam os protestos do Greenpeace e Oxfam contra as grandes corporações, notadamente
pelos elevados níveis de emissão de carbono. Em resposta, ações de saúde pública como a
tributação de produtos prejudiciais à saúde e as campanhas de enfrentamento do HIV/AIDS
estão ganhando força, mas desafios como monopólios farmacêuticos e a hesitação vacinal
continuam. Iniciativas como a do Global Fund e da Gates Foundation, além de investimentos
para combater doenças tropicais e melhorar a resiliência dos sistemas de saúde, buscam mitigar
o impacto de crises sanitárias e ambientais.

O informe de De Negri e De Negri Filho utiliza o Relatório de Riscos Globais 24-25 como
linha condutora, colocando a sua classificação e conceitos de risco no escrutínio das opiniões e
propostas das organizações da sociedade civil (OSC). Analisam um total de 17 documentos com
divisão de três partes: primeiro, analisando os riscos na categoria de “conflito armado baseado
no Estado”; depois, “eventos climáticos extremos” e “mudanças críticas nos sistemas
terrestres”; e uma seção final compilando os outros 7 documentos: “Confronto geoeconômico”,
“Desinformação”, “Polarização social”, “Desaceleração económica”, “Falta de oportunidades
econômicas ou desemprego”, “Erosão dos direitos humanos e/ou liberdades civis” e
“Desigualdade”. Fazem também uma breve análise do risco número 20 “Declínio da Saúde e
Bem-Estar”.

Sobre o Sul Global, o principal evento do UNOSSC em 2025 será a 22ª sessão do Comitê
de Alto Nível sobre Cooperação Sul-Sul, que será realizada entre 27 a 30 de maio de 2025. Este
é o principal órgão de formulação de políticas sobre Cooperação Sul-Sul no sistema das Nações
Unidas e se reúne a cada dois anos para revisar o progresso do BAPA, BAPA+40, a nova estratégia
de Cooperação Sul-Sul e o documento final de Nairóbi da Conferência de Alto Nível das Nações
Unidas sobre Cooperação Sul-Sul. Quanto à cooperação do Brasil, o informe se aprofundou nos
projetos de cooperação Sul-Sul em torno do algodão, já que o Brasil é um dos maiores
produtores de algodão sustentável do mundo, ocupando uma posição de destaque no mercado
global e esta cooperação se estende à África e América Latina. No dia 13 de janeiro de 2025, a
República do Iraque assumiu a presidência pró-tempore do G-77 + China, destacando 9

8
prioridades desde a Agenda 2030, mudanças climáticas, questões econômicas e financeiras dos
países em desenvolvimento, transferência de tecnologia, até a segurança mundial e o
fortalecimento do multilateralismo. Em sua primeira participação, manifestaram-se na reunião
informal da AGNU sobre as prioridades do Presidente da Assembleia Geral para 2025. Sob o
tema “Unidade na Diversidade”, o Presidente da AGNU destacou os principais eventos do ano
para enfrentar os desafios mais urgentes e que serão momentos importantes para criar um
impulso para mudança. O Movimento dos Não-alinhados (MNA) segue sob comando de
Uganda e comemora 70 anos em 2025, enquanto o Movimento Jovem dos Não-alinhados
continua divulgando a história do movimento. O Centro Sul publicou quatro artigos com temas
desde o acesso a medicamentos essenciais, enfatizando o papel dos direitos de propriedade
intelectual; o acordo TRIPS à luz do direito da União Europeia e as medidas coercitivas unilaterais
em empresas multinacionais e instituições financeiras.

No G20, dando continuidade à sucessão de lideranças do Sul Global, a África do Sul inicia
o seu mandato no bloco. Sob o tema “Solidariedade, Igualdade e Sustentabilidade”, ainda em
fase inicial, a presidência define suas agendas e prioridades para o ano. Sobre o G7, os autores
do GT discutem um pouco do histórico do Canadá em presidências anteriores do bloco e as
expectativas para 2025. O país atravessa uma crise política histórica, ao mesmo tempo em que
está à beira de uma guerra comercial com os Estados Unidos. Há, ainda, a tensão sobre o futuro
do multilateralismo e o papel de um G7 que passará por uma intensa dança das cadeiras. Os
destaques da OCDE se dividem entre a publicação de dois estudos sobre a economia da região
latino-americana, outro sobre a perspectiva econômica global e um quarto sobre orçamentação
de gênero no Brasil. Também são destaques dois artigos sobre saúde publicados pela OCDE.

Sob o lema “Fortalecendo a Cooperação do Sul Global por uma Governança mais
Inclusiva e Sustentável”, a presidência brasileira de BRICS se propõe a atuar nesse ano em dois
eixos principais: Cooperação do Sul Global e a Reforma da Governança Global. Entre os objetivos
do bloco está o de fortalecer a cooperação econômica, política e social entre seus membros e o
aumento da influência dos países do Sul Global na governança internacional, bem como
impulsionar o desenvolvimento socioeconômico sustentável e promover a inclusão social nessas
nações. As agendas do Brasil estão refletidas em cinco prioridades: facilitação do comércio e
investimentos entre os países do grupo, via desenvolvimento de meios de pagamento;
promoção da governança inclusiva e responsável da Inteligência Artificial para o
desenvolvimento; aprimoramento das estruturas de financiamento para enfrentar as mudanças
climáticas, em diálogo com a COP 30; estímulo aos projetos de cooperação entre países do Sul
Global, com foco em saúde pública; e fortalecimento institucional do BRICS. Hoirisch desenvolve
cada um desses pontos, inclusive a cooperação entre países do Sul Global, com foco em saúde
pública. Nessa área, a Fiocruz organizará reuniões da Rede de Institutos de Saúde Pública do
BRICS, do Centro de P&D de Vacinas do BRICS e a Conferência de Institutos Nacionais de Saúde
Pública do BRICS.

Tobar, Brito e Minayo no informe sobre América Latina e Caribe discutem como as
medidas do novo governo Trump afetaram imigrantes latino-americanos nos EUA e
reverberaram nas relações com países na região. Além disso, enumera, sem serem conclusivos,
seis potenciais desafios regionais para 2025, que podem contribuir para novas ondas de
migração e o acirramento dos conflitos políticos e até mesmo securitários no continente
americano. Entre esses desafios, destacam-se: novos padrões de envolvimento dos EUA com a
América Latina; as eleições presidenciais no Caribe e América do Sul; o fraco crescimento
econômico; a persistência das iniquidades e desigualdades sociais; o clima de terror instaurado

9
pelo crime organizado; o efeito das mudanças climáticas e o impacto nas populações; e o maior
engajamento da China na América Latina.

No informe sobre África, os autores abordam diversos aspectos cruciais para o


desenvolvimento da África, desde a agricultura e segurança alimentar, até à saúde, meio
ambiente, a importância de dados e estatísticas e à cooperação internacional. A União Africana
adotou uma nova Estratégia e Plano de Ação (2026-2035) para o Programa Abrangente de
Desenvolvimento da Agricultura Africana (CAADP). Desafios econômicos e financeiros
demandam mobilização de recursos domésticos, do combate aos fluxos financeiros ilícitos e da
participação da África na construção de um sistema financeiro global mais justo e inclusivo.
Relatório da OMS-AFRO destaca a necessidade de mais esforços para garantir que as pessoas
tenham acesso a serviços de saúde de qualidade sem enfrentar dificuldades financeiras. Nos
Grandes Lagos, o grupo armado M23, apoiado por tropas ruandesas, tomou a cidade de Goma,
no leste da República Democrática do Congo (RDC). A União Africana condenou os ataques do
M23 e exigiu a retirada de forças estrangeiras. A situação humanitária em Goma é grave, com
hospitais lotados, corpos nas ruas e serviços básicos interrompidos. O Papa Francisco também
pediu o fim da violência. A guerra civil no Sudão agravou a crise humanitária, com aumento de
vítimas civis, deslocamentos e fome. Ambos os conflitos destacam crises humanitárias graves,
com violência, deslocamentos e fome, exigindo ação internacional urgente para paz e
assistência.

As guerras políticas, ideológicas, religiosas, étnicas, econômicas e tecnológicas que


aconteceram em 2024, não dão sinal de arrefecimento em 2025, pelo contrário. O que se
avizinha é um mundo mais dividido, mais desigual e mais violento. E isso não é uma surpresa.
Considerando que o mundo vive o agravamento da desigualdade em tempos de crises múltiplas
e sobrepostas, o impacto das decisões do novo governo americano, o aumento de governos de
extrema direita, que são segregacionistas e ignoram os direitos humanos, o ano de 2025 será
difícil para uma boa parte do mundo. Para os países do Sul Global a cooperação e o trabalho
conjunto serão suas forças. O informe de Marques traz destaques negativos e positivos de 2024
e suas conjunturas. Os negativos envolvem atores das superpotências; os positivos, envolvem
países do Sul Global, especialmente da Ásia Sul, Ocidental e Central, Oriente Médio e África. E
a liderança da China em tecnologia limpa, e agora de IA, mantém o gigante asiático na mira dos
EUA. Antecipando a ruptura dos EUA com a OMS, as três regionais da organização (Eastern
Mediterranean, South-East Asia e Western Pacific) trabalham para garantir aportes mais
robustos dos países membros. Depois de quinze meses, o fim da guerra em Gaza não veio;
conseguiu-se um frágil cessar-fogo em três fases, que pode ser interrompido a qualquer
momento, uma vez que a causa verdadeira da guerra não foi tratada profundidade. O que
esperar quando o novo líder da potência mais bélica do mundo afirma: “Continuaremos a
promover a paz [no Oriente Médio] por meio da força em toda a região”?

Nos Estados Unidos da América, novas políticas de saúde. Desde a posse, em 20 de


janeiro de 2025, o novo presidente emitiu 45 ordens executivas. Essas ações abrangem uma
variedade de áreas, incluindo comércio internacional, imigração e políticas de saúde, com
implicações significativas para a América Latina, comenta Guto Galvão. As mudanças nas
contribuições dos EUA para as Nações Unidas podem ter um impacto significativo em suas
operações. Em 2022, os Estados Unidos emergiram como o maior contribuinte para as Nações
Unidas, fornecendo mais de US$ 18 bilhões em financiamento. Esse apoio financeiro é essencial
para o funcionamento de várias agências, programas e missões da ONU. Uma das principais

10
preocupações de saúde pública nos EUA hoje é a gripe aviária, particularmente a cepa H5N1.
Esta doença pode afetar a saúde humana de várias maneiras significativas.

O Caderno se encerra com dois magníficos artigos do Embaixador Adhemar Bahadian,


extraordinário diplomata brasileiro, com inesquecíveis serviços prestado à Nação e à Diplomacia
brasileiras, como por exemplo na rejeição da Alca (Área de Livre Comércio das Américas) que os
EUA pretendiam impor na primeira década do século XXI. Analisa os primeiros dias do novo
governo estadunidense que considera ‘Trumpolinagens e outros desvios de conduta”, bem como
lamenta a perda da tradição americana com as ‘Memória póstumas dos passos perdidos”.
Leitura imperdível, caros leitores.

Convidamos a todos os queridos leitores a participar do primeiro Seminário Avançado


em Saúde Global e Diplomacia da Saúde 2025 do CRIS, no dia 12 de fevereiro próximo, 4ª feira,
de 10 às 13h.

O convite se estende à sessão inaugural do Curso


de Atualidades em Saúde Global e Diplomacia da
Saúde, às 9 horas do mesmo dia 12/02. Estão
inscritos mais de 1.500 participantes, oriundos de
mais de 25 países.

O Curso está estruturado em dois grandes blocos:


1) Seminários Avançados, quinzenais, que
transcorre de 12/02 a 17/12 de 2025, num total de
24 seminários; e 2) Leituras selecionadas, a partir
dos textos oferecidos nos Cadernos CRIS.

O Curso se desenvolve Campus Virtual da Fiocruz


e fornecerá Certificado de Participação aos alunos
que cumprirem 75% da carga horária estipulada.

11
Na mesma oportunidade será lançado o Catálogo de
Seminários Avançados em Saúde Global e Diplomacia
da Saúde 2020-2024, em edição digital, com descrição
dos 114 seminários já realizados e endereços de acesso
às versões em português, espanhol e inglês. Eles fazem
parte do acervo reunido no repositório dos Seminários,
com acesso possível nos seguintes endereços:

https://portal.fiocruz.br/seminarios-avancados-em-
saude-global

ou

https://www.youtube.com/playlist?list=PLz0vw2G9i8v-
mMVaQPrzpQUQhqa-0obSN

Boa leitura deste Caderno 01/2025, queridos leitores, em tempos muito difíceis, mas
nos quais é quando exatamente temos que manter vivas nossas esperanças e sustentar a luta
por tempos melhores, mais solidários, mais equitativos e mais humanos.

Rio de Janeiro, Manguinhos, 06 de fevereiro de 2025

Paulo M. Buss, Erica Kastrup e Pedro Burger


Coordenação do CRIS/Fiocruz

12
Geopolítica 2024 -2025 e a saúde global:
um mundo em ebulição e em frangalhos

Paulo M. Buss

Todos os acontecimentos e fatos na esfera da saúde global e diplomacia da saúde que


poderiam abrir este Caderno 01/2025 foram detidamente examinados, e unanimemente
concluímos que o destaque – talvez do ano – para a saúde global foi a formalização da saída dos
Estados Unidos da América como Estado-membro da Organização Mundial da Saúde (OMS), a
agência líder da saúde global e diplomacia da saúde no mundo. Uma das primeiras Ordens
Executivas (OE) de Donald J. Trump assinadas no Salão Oval da Casa Branca determinou a saída
do país, a suspensão das obrigações financeiras com a Organização, a retirada dos EUA das
negociações sobre o Tratado Pandêmico e dos compromissos com o Regulamento Sanitário
Internacional, e o retorno de todos os funcionários do governo estadunidense cedidos ao
sistema OMS1.

A OMS reagiu imediatamente com uma nota2 na qual lamenta a decisão de Trump e
pede que reconsidere a medida. Todos os jornais do mundo estamparam a decisão de Trump
como manchete de suas primeiras páginas e editoriais3, assim como os jornais de televisão e
rádio de todas as latitudes, tão absurda e injustificada foi a determinação. Inúmeras
organizações científicas e de saúde de todo o mundo expressaram imenso pesar e chamaram a
atenção para os incontáveis prejuízos que tal medida traz para a saúde dos povos do mundo e
da própria população dos EUA. Dezenas de editoriais e artigos de acadêmicos de renome, em
importantes revistas de saúde e medicina, alertaram para as implicações sobre a saúde mundial
da ordem executiva de Trump4,5,6.

A medida representa, de fato, a ponta do iceberg da profunda aversão ao


multilateralismo em geral, à cooperação e à solidariedade internacional, que o novo presidente
dos EUA tem demonstrado ao longo de sua carreira política, e que se manifestou de forma
avassaladora na quase centena de ordens executivas já firmadas: além da OMS e do Acordo de
Paris sobre o Clima, veio a ordem presidencial de retirada dos EUA do Conselho de Direitos
Humanos das Nações Unidas e, dentro de 180 dias, da revisão de todas as organizações
intergovernamentais internacionais das quais os Estados Unidos são membros e fornecem
qualquer tipo de financiamento ou outro suporte, assim como de todas as convenções e
tratados. Segundo a OE, para determinar quais organizações, convenções e tratados são
contrários aos interesses dos Estados Unidos e se tais organizações, convenções ou tratados

1
Ver: https://www.whitehouse.gov/presidential-actions/2025/01/withdrawing-the-united-states-from-
the-worldhealth-organization/
2
Ver: WHO comments on United States’ announcement of intent to withdraw
3
A exemplo de O Globo, edição 27/01/2025, mas também o New York Times, Washington Post, Le Monde,
The Guardian, El País, entre outros tantos.
4
Ver: https://jornal.usp.br/articulistas/deisy-ventura/o-sentido-e-o-impacto-da-retirada-dos-estados-
unidos-da-oms/
5
Science. Ver: Trump may decide to leave WHO next week. Here are seven possible impacts on the U.S.
and the world | Science | AAAS e ‘Cataclysmic’: Trump’s decision to leave WHO causes uproar among
global health experts | Science | AAAS
6
BMJ. Ver: The US withdrawal from the WHO: a global health crisis in the making | The BMJ

13
podem ser reformados, ou levando os Estados Unidos a se retirar de tais organizações,
convenções ou tratados7.

A saúde global - a saúde humana e planetária – será profundamente afetada por estas
medidas, assim como por outras que impactam importantes determinantes sociais, ambientais,
econômicos e políticos da saúde. Apenas como exemplos candentes: 1) as desumanas medidas
relacionadas com a deportação em massa de imigrantes ditos não-documentados, o que
ampliará as crises econômicas, sociais e sanitárias já existentes nos países – particularmente da
América Central e do Caribe – que receberão de volta milhares de pessoas sem o devido preparo
de serviços sociais, de saúde e ambientais nacionais básicos, e que, além disso, deixarão de
receber remessas de imigrantes a familiares, vitais para a compra de alimentos, serviços de
saúde, medicamentos etc., deteriorando ainda mais a qualidade de vida e a saúde; 2) a questão
incontornável das consequências sobre a saúde mental de todos os envolvidos; 3) os impactos
sobre pesquisa e desenvolvimento (P&D) e sobre a ajuda externa em saúde, pela suspensão dos
repasses de inúmeras agências dos EUA a todos os projetos que não estiverem de acordo com
as orientações do novo governo, a exemplo da saúde sexual e reprodutiva, aborto,
anticoncepção, pesquisas com células-tronco etc. Só a ajuda militar para parceiros estratégicos
muito bem escolhidos não vai faltar, o que atende ao sonho imperial (extemporâneo) de Trump
no século XXI e à poderosa indústria armamentista. Vamos voltar a estes temas (e correlatos)
mais adiante.

==*==

Há consenso entre analistas políticos que o mundo vive uma ‘crise multidimensional’, ou
uma ‘policrise’, em todas as dimensões que se considere: política, social, econômica, ambiental
e sanitária. Tal constatação é também consensual em todas as inúmeras declarações e
documentos emanados do mundo político global, seja no âmbito do multilateralismo das Nações
Unidas e suas principais agências, programas e fundos, seja nos diversos arranjos e organizações
plurilaterais globais ou regionais (como G7, G20, G77+China e Movimento dos Não-Alinhados,
União Africana, CELAC, ASEAN etc.) ou, ainda, nas diplomacias das Capitais, nas organizações da
sociedade civil ou no setor privado. Entretanto, a forma como cada grupamento explica a
situação e as soluções que propõem para seu enfrentamento são radicalmente diferentes. É isto
que mostram os diversos informes estampados nas páginas deste Caderno CRIS de Saúde Global
e Diplomacia da Saúde 01/2025.

O ano de 2024 foi marcado por eleições em cerca de 80 países mundo afora que,
somadas à guerra na Ucrânia, o massacre israelense sobre os palestinos em Gaza e Cisjordânia,
os conflitos militares e civis no Sahel, e o visível enfraquecimento do multilateralismo das
Nações Unidas em todas as frentes, produziu um verdadeiro tsunami político global,
desembocando num 2025 com perspectivas gerais bastante sombrias.

O consenso entre a maioria dos cientistas políticos é que o mundo foi para a direita nas
eleições, a começar pelos Estados Unidos, com Trump. A pergunta que a maioria dos analistas
políticos se faz é se a democracia sobreviverá8. A velha Europa social-democrata, que já há muito
pende para a direita, amplia a xenofobia com políticas anti-migratórias inéditas e implementa

7
Ver: https://www.whitehouse.gov/presidential-actions/2025/02/withdrawing-the-united-states-from-
and-ending-funding-to-certain-united-nations-organizations-and-reviewing-united-states-support-to-all-
international-organizations/
8
Ver, por exemplo: Yerushalmy e Holmes. Votes of Confidence. Did democracy survive the 2024 election
marathon? The Guardian Weekly, vol. 211, issue no. 25, 20/12/2024.

14
cortes importantes de programas sociais para suas populações, inclusive em saúde. Tais recursos
certamente serão destinados ao anunciado rearmamento da Europa e da OTAN e, por
consequência, literalmente mais fogo será jogado na fogueira do conflito ucraniano ou de uma
guerra fria do século XXI que a suceda.

Há sucessivas e simultâneas crises políticas no mundo. Como exemplo, em países


europeus, a França está no seu quarto primeiro-ministro nos últimos 4 meses; na Alemanha
rompeu-se a aliança de centro que sustentava Scholz, as eleições legislativas estão convocadas
para 23 de fevereiro e o direitista partido Alternativa para a Alemanha (AfD) apresenta-se como
a segunda força nas pesquisas eleitorais, aliás com declarado apoio de Elon Musk; o chanceler
austríaco, o conservador Karl Nehammer, se demite depois de não conseguir formar um
governo, abrindo caminho para que um partido de extrema direta o faça. Há inúmeros outros
exemplos.

A propósito, quando a nação alemã está indo a voto com um partido de extrema direita
em ascensão - e apoio de Elon Musk, do time de Trump - é muito importante que o mundo
relembre os 70 anos de liberação de Auschwitz pelos soviéticos, em janeiro de 1945, para que o
eleitorado alemão impeça qualquer tentativa de alçar-vôo do neonazismo em seu território.

Nesta ciranda política, os Estados Unidos de Trump – depois de sua ampla vitória – está
em todas, inclusive ameaçando romper frentes históricas do imperialismo, como a OTAN, ao
dizer dele, que a Europa deve financiar suas próprias guerras. Ademais, quer comprar a
Groenlândia aos dinamarqueses e anexá-la aos Estados Unidos e insiste que pode até usar os
marines para retomar o Canal do Panamá e atacar os narcotraficantes em território mexicano,
declarados ‘grupos terroristas’, em flagrante agressão e desrespeito com as soberanias destes
países. Além disso, declarou que o Canadá poderia se transformar no 51º. Estado norte-
americano e Justin Trudeau em um excelente governador, deboche que deve ter colaborado
para o pedido de demissão deste último do cargo de primeiro-ministro canadense, diante de
sua tíbia reação à provocação. Nas palavras de Lluis Bassets, “uma doutrina imperial para o
século XXI”9.

No que parece significar posições também de Trump, pois são todos plutocratas do
mesmo grupo de super-ricos e ultradireitistas, o onipresente e todo poderoso ministro-sem-
pasta norte-americano Elon Musk tem interferido abertamente, com sua plataforma X, na
política de diversos países europeus, a exemplo da declaração de apoio aos direitistas da AfD na
Alemanha. Em todas as intervenções, sempre propondo um maior protagonismo da extrema
direita.

Líderes mundiais repudiaram as declarações de Trump e Musk, com maior ou menor


intensidade, destacando-se à fina ironia da presidente do México que, valendo-se de mapas
históricos do século XVII, propõe que os EUA passem a chamar-se América Mexicana e assegura
que o Golfo se chama ‘do México’, mesmo, e assim deve permanecer. Contudo, Trump manteve
a determinação e o Google Maps afirmou em mensagem na rede social X que vai alterar o nome
do Golfo do México para Golfo da América nas suas plataformas nos Estados Unidos.

A posse de Donald J. Trump como 47º. Presidente dos EUA, foi um espalhafatoso show
midiático, com a assinatura de mais de 50 decretos (Executive Orders - OE)10 sobre os mais
diversos temas, todos com perfil conservador, isolacionista, centralizador e francamente

9
El País, 5/01/2025, pg.8.
10
Ver todas as Executive Orders em: Presidential Actions – The White House

15
xenófobo – verdade que cumprindo promessas de campanha que o levaram à Casa Branca.
Segundo analistas políticos, não é casual; há um ‘método’ e ‘objetivos’ nesta enxurrada, que é
produzir o ‘caos’ na oposição internamente e, externamente, choque e temor entre os
negociadores de outros países com os Estados Unidos. No dizer do antigo estrategista trumpista,
Steve Bannon: “flood the zone with shit”. A radicalização, as ordens e contraordens, ameaçar e
depois ceder, seriam ‘formas de negociar’ do novo presidente.

Adjetivos e adjetivações possíveis sobre o novo governo dos Estados Unidos da América
é o que não falta para caracterizar as medidas prometidas por Trump para seu segundo mandato
na Casa Branca, vindos de analistas políticos da academia ou dos meios de comunicação, assim
como de lideranças da sociedade civil nacional ou global: oligarquia11, plutocracia12, doutrina
Donroe13, neoimperialismo14 do século XXI, xenofobia15, neo-expansionismo americano, entre
outros. Escolha o seu. Para ajudá-lo, colocamos no rodapé as interpretações dos conceitos,
encontradas na Wikipedia e em algumas outras fontes.

As mais proeminentes OE foram sobre migração16. Deportar 1,5 milhão de imigrantes.


As prisões e deportações de milhares de imigrantes não-documentados (renomeados como
‘estrangeiros ilegais’) para seus países de origem começou, gerando a primeira grande crise de
Trump com a América Latina: o governo Lula pediu explicações formais sobre uso de algemas e
correntes em brasileiros deportados em aviões militares americanos, desalgemados na chegada
e transportados por aviões decentes da FAB, em território brasileiro; o México rejeitou o pouso
de dois aviões militares dos EUA com imigrantes; o mesmo ocorrendo com a Colômbia de Petro
que, ademais emitiu carta-aberta à Trump, enviou avião da presidência para buscar os
imigrantes e pediu reunião de emergência da CELAC (Comunidade de Estados Latino-americanos
e Caribenhos), entidade que a Colômbia preside em 2025. Por falta de consenso, devido a
discordâncias da Argentina e El Salvador (os aríetes trumpistas na ALC) com as possíveis
deliberações, a reunião não foi realizada.

Em retaliação à Colômbia, Trump suspendeu vistos à colombianos, restringiu viagens de


autoridades e aplicou tarifa de 25% sobre exportações do país, taxa que poderia subir a 50%. Ao
final, as duas Chancelarias chegaram a um acordo, levando os EUA a suspender as medidas
anunciadas e a acertar um protocolo para transporte de migrantes, o que também foi
encaminhado pelo Brasil (o chanceler Mauro Vieira anunciou que o Brasil negocia com os EUA,

11
Oligarquia ("oligarkhía" do grego ολιγαρχία, literalmente, "governo de poucos": oligi [poucos], e arqui
[domínio]) é a forma de governo em que o poder político está concentrado num pequeno número
pertencente a uma mesma família, um mesmo partido político ou grupo econômico ou corporação (fonte:
Wikipedia). A propósito, ver: Acemoglu, D; Stiglitz, JE e outros. Oligarchy in America. Acesso: Oligarchy in
America - Project Syndicate, 31/01/2025.
12
Plutocracia (em grego: πλοῦτος, ploutos, "riqueza" e κράτος, kratos, "poder") é uma sociedade que é
governada ou controlada por pessoas de grande riqueza ou renda (fonte: Wikipedia)
13
A chamada Doutrina Monroe foi anunciada pelo presidente dos EUA, James Monroe (presidente
de 1817 a 1825), em sua mensagem ao Congresso em 2/12/1823. A frase que resume a doutrina é:
"América para os americanos" ((fonte: Wikipedia). Diz-se que Donald Trump a estaria atualizando, daí
Donroe.
14
Neoimperialismo é uma política de dominação não só territorial, militar e econômico, como também
cultural, de uma nação sobre outra (fonte: Wikipedia).
15
Xenofobia (do grego antigo: ξένος (xénos), "estranho, estrangeiro ou alienígena", e φόβος (phóbos),
"medo") é o medo ou aversão a qualquer coisa que seja percebida como estrangeira ou estranha.
16
Ver: https://www.whitehouse.gov/presidential-actions/2025/01/realigning-the-united-states-refugee-
admissions-program/

16
que deverá avisar com antecedência e fornecer rotas aéreas sem escalas para brasileiros
repatriados).

O último capítulo desta novela de terror inclui o anúncio feito pelo novo presidente de
que vai usar a famigerada prisão de Guantánamo, onde haveria cerca de 30 mil vagas esperando
“ilegais condenados”, que seriam mantidos como prisioneiros17. Os primeiros deportados já
chegaram em Guantánamo. Jamais, em tempo algum, em qualquer país do mundo, viu-se
tratamento semelhante a imigrantes ilegais; os EUA inauguram uma nova era de práticas nem
um pouco diplomáticas para tratar de tema humanitário tão sensível como o da migração. Para
não serem identificados, os não-documentados que adoecem não procuram atendimento
médico; muitos abandonaram seus empregos; evitam o transporte público; o terror se espalhou
entre estas pessoas, já per se vulneráveis.

Por outro lado, ao passar a designar os cartéis do narcotráfico como grupos terroristas
que ameaçam a segurança nacional e a soberania dos EUA, Trump abre perigosíssimo caminho
para operações militares americanas na América Latina. A exemplo da fronteira sul, com o
Mexico, para onde Trump já enviou tropas do exército para vigiar e prender aqueles que ainda
tentam entrar no país.

Segundo o jornal estadunidense The Wall Street Journal, um quase-porta-voz do capital


financeiro dos EUA, a utilização de medidas tarifárias para corrigir déficits comerciais do país
(que ele chama de “subvenções” dos EUA) ou impor políticas a outros países pode estar
inaugurando “uma das mais estúpidas guerras comerciais”, jamais vistas. Foi o caso da ordem
de aplicação de 25% às importações provenientes do Canadá e do México e de 10% à China. O
Canadá e o México ameaçaram com retaliações também tarifárias, mas, ao fim e ao cabo, as
medidas de parte a parte foram ‘temporiamente’ canceladas, após conversas entre os
dirigentes. Em troca, Sheinbaum e Trudeau comprometeram-se em mobilizar milhares de
militares cada um para reforçar o combate ao tráfico de drogas, respectivamente nas fronteiras
sul e norte dos EUA. Trump teria se comprometido em impedir o tráfico de armamento pesado
que sabidamente municia às milícias e cartéis mexicanos. Diante das ameaças tarifárias, a União
Europeia realizou reunião de emergências de seus líderes para tratar das relações com o novo
governo dos EUA.

Com a China foi diferente e a guerra comercial entre os dois gigantes, para além das
ameaças, pode estar de fato instalada, pois os dois chefes ainda não conversaram sobre
suspensão ou adiamento de medidas, depois do revide feito pela China no campo das tarifas
comerciais aos 10% impostos pelos EUA, além de ter mandado investigar Google, Apple e outras
empresas que atuam em território chinês por práticas irregulares.

Muito apropriadamente, o diário espanhol El País rotulou esta prática de idas-e-vindas


de ameaças e suspensões, e utilizando irregularmente o mecanismo tarifário, como “diplomacia
da chantagem”.

Uma política neoexpansionista dos EUA também entrou na agenda, focando


particularmente na América Latina, uma espécie de ‘doutrina Monroe’ atualizada (alcunhada de
‘Donroe’ por alguns analistas ‘bem-humorados’), com a demanda de retomar o Canal do Panamá
- devolvido aos panamenhos em 1999, por acordo com o país feito na presidência do democrata
Jimmy Carter em 1977 - e o anúncio de comprar ou ocupar a Groenlândia, que pertence à

17
Ver: Expanding Migrant Operations Center at Naval Station Guantanamo Bay to Full Capacity – The
White House

17
Dinamarca, em flagrante confronto potencial com a OTAN (Organização do Tratado do Atlântico
Norte), aliança militar de que os próprios EUA fazem parte.

Na área do clima, a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris18 e a eliminação da


política de transição energética de combustíveis fósseis para fontes limpas, medidas propostas
em OEs firmadas logo na primeira semana, trazem forte impacto negativo para o esforço
mundial de conter o aquecimento global com todas suas consequências catastróficas para a
sobrevivência do planeta. Sobretudo por serem os EUA o maior emissor global de gases de efeito
estufa. Ademais, a Agência de Proteção Ambiental (EPA) disse a mais de 1.100 funcionários que
trabalham em questões como mudanças climáticas que eles poderiam ser demitidos a qualquer
momento. As posições do novo governo certamente impactarão também o que se poderia
esperar da COP30, a se realizar em Belém, presidida pelo Brasil. Mas este é tema para próximos
Cadernos.

Em cooperação internacional as medidas foram draconianas. Todos as agências de ajuda


19
externa , como a United States Agency for International Developmente (USAID), estão
ameaçadas ou de extinção ou de mudança radical na sua orientação. Musk disse que o
presidente está de acordo em extingui-la; o Secretário de Estado, Marco Rubio, disse que
passava a ser o “administrador interino” da USAID; seus funcionários foram desmobilizados dos
postos de trabalho e colocados à disposição da administração.

Quanto à saúde global, como afirmam Gostin e col.20, os valores centrais de Trump são
a antítese dos valores que animam a saúde global – cooperação internacional, solidariedade
mútua e diplomacia internacional. Ele tem hostilidade aberta em relação a instituições
internacionais como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e normas legais como o
Regulamento Sanitário Internacional e o Tratado de Pandemia. A saída dos Estados Unidos da
instituição fragiliza sua posição de pretenso líder global e prejudica imensamente as populações
mais vulneráveis do mundo.

As principais instituições de pesquisa biomédica, os Institutos Nacionais de Saúde (NIH)


ou cooperantes em epidemias e outras enfermidades infecciosas, caso dos Centros de Controle
de Doenças (CDC) – ambos ligados ao Departament of Health and Human Services (DHSS) –
deverão rever os projetos que estão sendo financiados e promover futuros financiamentos
segundo as orientações do governo, e não mais de comissões científicas. Segundo cientistas e o
corpo editorial de grandes revistas médicas, a inovação em saúde será seriamente prejudicada
nas próprias universidades estadunidenses e nas cooperações que as mesmas mantêm
globalmente.

A saída dos EUA da OMS está muito bem analisada em dois artigos de duas excelentes
pesquisadoras da saúde coletiva brasileira, Deisy Ventura4 e Sonia Fleury21, reproduzidas neste
fascículo do Caderno. Fleury destaca também outros aspectos importantes das políticas que
estão sendo implementadas pelo novo governo estadunidense. Dois artigos mais destes

18
Ver: https://www.whitehouse.gov/presidential-actions/2025/01/putting-america-first-in-
international-environmental-agreements/
19
Ver: https://www.whitehouse.gov/presidential-actions/2025/01/reevaluating-and-realigning-united-
states-foreign-aid/
20
Gostin LO, Finch A, Radhakrishnan A, Friedman EA. Global Public Health for a New President. Milbank
Quarterly Opinion. December 19, 2024. Acesso: Global Public Health for a New President | Milbank
Memorial Fund
21
Ver: https://cee.fiocruz.br/?q=O-que-esperar-de-um-ano-que-comecou-com-tanta-inseguranca-Sonia-
Fleury-Parte-I

18
Cadernos focam no novo governo Trump, ambos da lavra do experiente diplomata brasileiro
Embaixador Adhemar Bahadian.

Multilateralismo

O multilateralismo das Nações Unidas vive um momento de estertores muito


preocupantes. Em 24 de outubro de 2025, as Nações Unidas completam 80 anos de existência.
O projeto civilizatório da Agenda 2030 e seus ODS oferece perspectivas quase nulas de alcance
da maioria de suas metas dentro do prazo. A Cúpula do Futuro, organizada pela ONU durante a
79ª. Assembleia Geral (Nova York, setembro de 2024), para revitalizar o movimento do
desenvolvimento sustentável, gerou um documento, o Pacto pelo Futuro22, contendo 56
compromissos de ação e 2 anexos: i) pacto digital global, com 5 objetivos e o estabelecimento
de um mecanismo de seguimento; ii) declaração sobre futuras gerações, com 13 compromissos
e 9 propostas de ação. Como disse o Secretário-Geral, Antônio Guterres, na abertura do evento:
Estamos hoje aqui para resgatar o multilateralismo do abismo.

Apesar destes nobres objetivos declarados, o documento deixa de mencionar diversos


elementos críticos da realidade política, social, econômica e ambiental vigente. Por exemplo, a
maior tragédia sanitária dos últimos 100 anos, a pandemia de Covid19, que deixou cerca de 20
milhões de mortos, dezenas de milhares de sequelados e tremendas repercussões sociais e
econômicas das quais o mundo ainda não se recuperou. A saúde que, apenas por isso, mereceria
um capítulo inteiro e propostas de ações concretas, ficou fora dos compromissos estabelecidos.
Nenhum compromisso quanto a uma quase certa nova pandemia no futuro próximo. É como se
a Covid-19 sequer tivesse ocorrido, e se esvaneceu na memória coletiva. Até que venha a
próxima pandemia e, de novo, pegue todo mundo desprevenido.

No dizer de Alcázar23, o Pacto pelo Futuro, ainda que com a eventual boa-fé de alguns,
reduziu-se a repetir velhas fórmulas diplomáticas de reiterações do já dito, todos os anos, nos
mesmos espaços políticos.

As COPs de 2024 – do Clima, em Baku (Azerbaijão), e da Biodiversidade, em Cali


(Colômbia) – resultaram em inauditas frustrações. Em Baku, pedia-se US$1,3 trilhões para
mitigação e reparação, mas o acordo fechado não passou de U$300 bilhões. Em Cali, as metas
para restaurar a biodiversidade global não foram acompanhadas por planos de ação concretos
ou pelos compromissos financeiros que muitos esperavam da COP16.

As guerras

Em 2024 reacendeu-se de forma radical o conflito do Oriente Médio, romperam-se


linhas na guerra da Ucrânia e ambas as situações aproximam perigosamente o mundo do
Armagedon nuclear. Estas, somadas a outras guerras mais silenciosas, mas não menos letais,
fizeram de 2024 um ano de mortos e sequelados física e mentalmente como há muito não se
via. De outro lado, na tentativa de cumprir um dos principais objetos da Carta - a manutenção
da paz - sucessivas resoluções adotadas pelo Conselho de Segurança ficam inefetivas, seja pelos
vetos de algum dos 5 poderosos, seja pelo simples descumprimento dos litigantes dos conflitos.

22
Ver: https://documents.un.org/doc/undoc/ltd/n24/252/89/pdf/n2425289.pdf
23
Alcazar, S. O futuro do Pacto pelo Futuro. Cadernos CRIS/FIOCRUZ sobre Saúde Global e Diplomacia da
Saúde 17/2024, pg. 16-19. Acesso: https://portal.fiocruz.br/documento/2024/09/cadernos-cris-fiocruz-
informe-17-2024

19
O mesmo sucedeu algumas vezes neste ano fatídico, com resoluções de teor similar da
Assembleia Geral.

Depois de 15 meses e ao custo de mais de 40 mil palestinos mortos e milhares de


sequelados física e mentalmente, uma trégua em Gaza foi anunciada pelos mediadores Catar e
Egito, a partir de 19 de janeiro de 2025. A matança está temporariamente suspensa. Bem-
sucedida até aqui, a trégua tem envolvido a troca, a conta-gotas, de reféns israelenses em poder
do Hamas por prisioneiros palestinos prisioneiros de Israel. O cessar-fogo permitiu que milhares
de palestinos se deslocassem, entre escombros, do Sul para o Norte, mas, a rigor, do nada para
o nada... Não há mais residências viáveis de serem ocupadas e toda a infraestrutura está
destruída.

A fronteira Gaza-Egito foi finalmente aberta para urgências médicas, já que o sistema de
saúde da Faixa está quase todo destruído e inoperante. Feridos graves, crianças com câncer,
bebês prematuros são transportados em busca de socorro. Dos 16 mil necessitados apenas 450
conseguiram esta chance. Caminhões com ajuda humanitária chegam, para muitos, tarde
demais. Para sobreviventes, uma gota na imensidão de suas necessidades.

A dolorosa procissão de milhares de palestinos por uma via entre escombros, de nada,
para lugar nenhum, é uma das imagens indeléveis do século XXI até aqui. Ainda assim, os
palestinos comemoram reencontros com o pingo de alegria que lhes resta.

Na coletiva que se seguiu ao encontro de Trump e Netanyahu, em Washington, na


primeira semana de fevereiro, Trump fez declarações que surpreenderam o mundo: os Estados
Unidos “assumirão o controle” de Gaza, que será demolida e reconstruída para se tornar a
“Riviera do Oriente Médio”, onde “pessoas de todo o mundo” viverão após deslocar à força seus
habitantes “permanentemente”. A Casa Branca reafirmou o plano de Trump de controlar Gaza,
apesar do estupor da comunidade internacional, pois atropela qualquer regra internacional.
Ademais, internamente esbarra em limitações do poder presidencial e na resistência ao envio
de tropas. António Guterres e outros líderes mundiais alertaram que se trata de inaceitável
“limpeza étnica”. Ademais, avaliam que estas afirmações poderão agravar o problema em Gaza,
minando o cessar-fogo, a troca de reféns e prisioneiros e a frágil trégua vigente.

Os palestinos resistirão a qualquer tentativa na direção indicada por Trump, segundo o


Hamas e a Autoridade Palestina. Os países árabes estão também unidos em impedir a remoção
dos palestinos de seus territórios e reafirmam a inabalável defesa da solução dos dois Estados.
O Brasil considera inaceitável as propostas enunciadas e diz que não poderá haver solução sem
a participação do povo palestino.

Na Ucrânia, as promessas de Trump de acabar com a guerra imediatamente após sua


posse não se concretizaram, e as perdas de vidas continuam, aguardando um prometido
entendimento entre os líderes dos EUA e da Rússia.

As demais guerras ‘invisíveis’, no Sahel africano e outras regiões recônditas do planeta,


continuam sem solução. Sabe-se, contudo, que nelas se cometem atrocidades contra as
populações civis, com incontáveis mortos e feridos, principalmente nas vulneráveis populações
de mulheres, crianças e idosos, sem falar nos soldados-crianças que estão no front recrutados
nas periferias pobres e zonas rurais.

A OMS fez um apelo ao mundo para juntar US 1,5 bilhões necessários para emergências
de saúde que atingem 300 milhões de pessoas em 42 zonas de guerra ativa ao redor do mundo,

20
de Gaza ao Afeganistão, e por muitas partes do continente africano, com feridos, sequelados
física e mentalmente, sem a mínima assistência médica, famintos e desnutridos. Teme-se que a
resposta da comunidade internacional seja pífia, obnubilada pelo isolacionismo que paralisou
muitas dimensões das relações internacionais.

Saúde, sociedade e geopolítica

A seguir, passamos brevemente pelas principais características da chamada crise


multidimensional global, aproveitando a introdução ao 14º. Plano Geral de Trabalho da OMS24.

Mudanças demográficas são dinâmicas e dominadas hoje por uma população


envelhecida em muitos países, juntamente com a crescente urbanização em todos os lugares. A
migração e o deslocamento humanos atingiram níveis sem precedentes: estima-se que 1 bilhão
de pessoas escolheram migrar ou foram deslocadas à força, dentro ou fora de seu país, devido
a forças econômicas, ambientais, políticas, de conflito e outras. Os serviços públicos básicos
estão lutando para acompanhar, com quase 30% da população mundial sem acesso a um
suprimento de água potável e saneamento adequado.

As crescentes desigualdades dentro e entre os países, que foram exacerbadas pela


pandemia da Covid-19, estão levando a uma crescente divisão nos resultados de saúde, sociais
e econômicos entre aqueles com recursos financeiros e aqueles desprovidos deles.

A geopolítica está mudando, com novos relacionamentos, alterações nos equilíbrios de


poder e crescente instabilidade, polarização crescente, novos conflitos e uma ênfase crescente
no isolacionismo nacional e regional, o que complicou ainda mais a colaboração nacional e
internacional para promover a saúde e o bem-estar.

O número constante e crescente de crises e emergências sanitárias – mas também


econômicas e sociais – complicam ainda mais essas tendências de longo prazo e quaisquer
esforços bem-intencionados de equidade. A pandemia da Covid-19 teve um impacto terrível na
vida humana, com consequências massivas para a saúde e o bem-estar, além consequências
econômicas e sociais devastadoras, particularmente para pessoas em situações de
vulnerabilidade e marginalização.

Novos conflitos em larga escala surgiram, com consequências imediatas para as


populações civis, casos das guerras que alcançam a mídia, como a da Ucrânia e o devastador
massacre na Faixa de Gaza, mas também as guerras ‘invisíveis’, como as que transcorrem na
região do Sahel, na África. Um recorde de 340 milhões de pessoas precisaram de assistência
humanitária em todo o mundo em 2023.

O ritmo das mudanças climáticas e da degradação ambiental acelerou, emergindo como


uma grande ameaça à saúde humana no século XXI. As temperaturas globais continuam a subir,
e estima-se que excedam 1,5oC em relação aos níveis pré-industriais até 2030. Eventos
climáticos severos, poluição atmosférica e química, de lençóis freáticos e oceanos, ameaças
microbianas na interface animal-humano-ambiente e doenças epidêmicas sensíveis ao clima
estão aumentando em frequência em todo o mundo, com um impacto desproporcional em
territórios particularmente vulneráveis, como áreas pobres e densamente povoadas. A

24
Recomendamos complementarmente as leituras dos informes, neste Caderno, de: De Negri e De Negri
Filho, que traz uma análise do Global Risks Report, produzido pelo World Economic Forum; e o de Chamas
e Cesário, que traz uma análise de documento da UNCTAD sobre a situação global.

21
frequência e o impacto dos desastres ditos ‘naturais’ estão aumentando, com as mudanças
climáticas se tornando o maior impulsionador.

Os países estão enfrentando emergências mais frequentes, complexas e prolongadas do


que em qualquer outro momento da história, com vulnerabilidades se aprofundando e ameaças
convergindo para multiplicar e amplificar os riscos. Juntos, essas tendências e choques estão
contribuindo para uma profunda instabilidade social e níveis elevados de estresse e ansiedade,
especialmente entre crianças e jovens. Salários estagnados, crescente desigualdade de renda e
aumento do desemprego juvenil estão contribuindo para a erosão da confiança nas instituições
públicas e nas lideranças.

Neste contexto, a recuperação dos sistemas de saúde tem sido lenta e a incerteza
econômica continua, com desaceleração do crescimento, aumento dos encargos da dívida,
inflação persistente e redução do espaço fiscal, o que impacta negativamente os gastos sociais,
entre os quis na saúde.

Embora ausente do Pacto para o Futuro, como mencionado acima, a saúde teve seu
painel de alto nível na Assembleia Geral das Nações Unidas 2024, com o tema da resistência
antimicrobiana. A declaração resultante, contudo, foi tíbia, mencionando a necessidade da
implementação da estratégia One Health, mas sem enunciar, por exemplo, quem e como vai ser
paga a conta, globalmente, das ações que deverão, para serem efetivas, mexer com imensos
interesses dos negócios de produção agrícola, assim como da preservação e recuperação da
biodiversidade, do enfrentamento do aquecimento global e, mais amplamente, da crise
climática – todos imprescindíveis para a concretização da One Health.

Entretanto, em julho de 2025, no High-Level Political Fórum – espaço político dentro da


reunião anual do ECOSOC (Conselho Econômico-Social das Nações Unidas), criado para
acompanhar a evolução dos ODS – estarão em foco, simultaneamente o ODS 3 (Saúde) e, como
em todas as edições anuais do Fórum, o ODS 17, que visa fortalecer os meios de implementação
e revitalizar a parceria global para o desenvolvimento sustentável. Ele aborda diferentes frentes,
incluindo finanças, tecnologia, capacitação, comércio, coerência de políticas e de instituições,
parcerias multissetoriais, dados, monitoramento e prestação de contas. Caso bem conduzido,
este poderá ser um espaço político privilegiado, em 2025, para repactuar o compromisso com a
saúde e as políticas intersetoriais necessárias para enfrentar os decisivos determinantes sociais
da saúde, presentes nos demais ODS.

O Secretariado da ONU divulgou o projeto de programa para a sessão de julho do Fórum


Político de Alto Nível da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável (HLPF) de 202525, que se
realizará de 14 a 24 de julho, na sede da ONU, em Nova York, incluindo o segmento ministerial
de três dias de 21 a 23 de julho. O tema geral será 'Promover soluções sustentáveis, inclusivas,
baseadas em ciência e evidências para a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável e
seus ODS para não deixar ninguém para trás'.

Como de praxe, o HLPF e o segmento de alto nível do Conselho resultarão em uma


declaração ministerial negociada. O Representante Permanente da República Tcheca, Jakub
Kulhánek, e a Representante Permanente de São Vicente e Granadinas, Inga Rhonda King, já
estão facilitando consultas informais sobre a declaração ministerial.

25
Ver: Publicado o Projeto de Programa para o HLPF 2025 – SDG Knowledge Hub

22
O programa provisório26, datado de 27 de janeiro, indica que, após uma sessão de
abertura, a primeira semana do HLPF 2025 será dedicada à revisão aprofundada de: ODS 3 (boa
saúde e bem-estar); ODS 5 (igualdade de gênero); ODS 8 (trabalho decente e crescimento
econômico); e ODS 14 (vida abaixo da água), incluindo a construção da Terceira Conferência dos
Oceanos da ONU.

Reunida menos de duas semanas após a Quarta Conferência Internacional sobre


Financiamento para o Desenvolvimento (FfD4)27 (Sevilha, Espanha, 30/06 a 3/0/07/2025), o
HLPF discutirá os principais desenvolvimentos do FfD4 e explorará: como os países e as partes
interessadas podem avançar em uma estrutura robusta para financiar os ODS; como os recursos
podem ser efetivamente mobilizados e utilizados para alcançar os ODS; e como a cooperação
em ciência, tecnologia e inovação (CTI) pode acelerar o progresso em direção aos ODS.

A visão do Sul Global na 3ª. Cúpula do Sul

Em janeiro de 2024, o G77+China e o Movimento dos Não-Alinhados (MNA) realizaram


a 3ª. Cúpula do Sul, em Kampala, Uganda. Os Chefes de Estado e de Governo dos Países
Membros do Grupo, que representa cerca de 135 países do Sul Global, levantaram, na sua
Declaração Final, que os principais desafios gerados pela atual ordem econômica internacional,
injusta para os países em desenvolvimento, atingiram a sua expressão mais aguda nos tempos
atuais devido, inter alia:
aos efeitos negativos persistentes da pandemia de Covid-19; às tensões e conflitos
geopolíticos; às medidas coercivas unilaterais; às frágeis perspectivas econômicas globais;
ao aumento da pressão sobre os alimentos, fertilizantes e energia; à inflação contínua e à
volatilidade dos mercados financeiros; ao fardo crescente da dívida externa; ao aumento do
deslocamento de pessoas; aos níveis de pobreza extrema e insegurança alimentar e aos
retrocessos nos ganhos que foram alcançados na erradicação da pobreza nos países em
desenvolvimento; ao aumento das desigualdades dentro e entre os países, incluindo o
aprofundamento da desigualdade de gênero; e aos crescente desafios e efeitos adversos das
alterações climáticas, perda de biodiversidade, poluição, desertificação e degradação
ambiental, bem como as clivagens digitais, não existindo até agora um roteiro claro para
resolver estes problemas globais.

Coerente com esta visão, propuseram no referido Outcome Document um conjunto de


medidas políticas para enfrentar a crise multidimensional na qual o mundo se encontra
submergido. O compromisso de pleno respeito aos propósitos e princípios da Carta das Nações
Unidas e do direito internacional está na base da formulação política; isto implica em respeitar
os princípios da igualdade entre os Estados, da soberania nacional, da integridade territorial e
da independência política dos Estados e da não ingerência nos seus assuntos internos, assim
como o direito à autodeterminação dos povos que vivem sob ocupação colonial ou estrangeira
e outras formas de dominação estrangeira.

Nesta linha, e reafirmando uma postura já consagrada de que “não pode haver
desenvolvimento sustentável sem paz, nem paz sem desenvolvimento sustentável”, propõem
uma série de medidas políticas concretas e imediatas para o massacre israelense nos territórios
palestinos ocupados, o bloqueio econômico de Cuba e as disputas sobre as Ilhas Malvinas.

26
Ver: 2025 HLPF and ECOSOC HLS Draft Programme.pdf
27
Ver: The 4th International Conference on Financing for Development | Financing for Sustainable
Development Office

23
O compromisso com o desenvolvimento é outra dimensão política consagrada pelo G77
e MNA e reafirmada na 3ª. Cúpula do Sul. Entendem que a desigualdade entre os países
desenvolvidos e os países em desenvolvimento continuou a aumentar e que a ordem global,
sustentada pelo direito internacional e pelas instituições constituídas, está ameaçada pela
fragilização do multilateralismo e da abordagem coletiva à resolução de problemas, substituídos
por políticas e ações unilaterais nos domínios político, econômico e comercial, que são uma
grande ameaça ao multilateralismo.

O G77 e o MNA saem, então, em defesa das resoluções da Assembleia das Nações
Unidas e do Conselho de Direitos Humanos sobre o direito ao desenvolvimento e pedem o exame
e aprovação do Pacto Internacional sobre o Direito ao Desenvolvimento, em discussão na AGNU.

Lamentam o fracasso, até aqui, da proposta da Agenda 2030 e seus Objetivos do


Desenvolvimento Sustentável (ODS), particularmente pelo desinteresse dos países
desenvolvidos em cumprir o compromisso de destinar 0,27% dos respectivos PIBs como ‘ajuda
para o desenvolvimento’. Um sinal claro do abandono da Agenda 2030 foi a ausência de
menções à ela nas últimas declarações das cúpulas de líderes do G7 e do G20.

O compromisso político do Sul Global, representado pelo G77 e os Não-Alinhados, com


a Agenda 2030 e seus ODS é muito claro, mas retórico. Para torná-lo efetivo é imprescindível
construir um poderoso movimento de cooperação Sul-Sul, estruturante, vale dizer, sustentável
no tempo e nos resultados, não apenas com a dinâmica de ‘projetos’. As soluções encontradas
por alguns países do Sul Global em saúde, agricultura, saneamento básico, educação e em outras
dimensões são muitas vezes brilhantes, e seus métodos de implementação, em geral mais
baratos e sustentáveis, podendo ser compartilhados entre os países em desenvolvimento com
problemas similares.

A questão crítica do financiamento terá nova rodada de discussões em Madri, em julho


de 2025, por ocasião da IV Conferência sobre Financiamento para o Desenvolvimento,
oferecendo uma oportunidade para a busca de formas cooperativas entre países, além de
espaço político para pressionar as agências como o Banco Mundial, Novo Banco (de Brics), Banco
Africano de Desenvolvimento, Banco Islâmico e outros (ver a série de artigos de Laura Tavares
sobre os mesmos nestes Cadernos).

Plurilateralismo, incluindo BRICS e COP30

Não há como falar da geopolítica global sem abordar o plurilateralismo dos blocos de
países, como G7, G20, BRICS, além da COP30, pela importância da questão climática. Sobre o
G77 e Não-alinhados já tocamos acima em alguns pontos essenciais sobre suas principais
posições.

O G7 e o G20 estão bem comentados no informe do GT do Cris sobre o tema neste


Caderno, assim como as análises sobre BRICS e COP30, nos respectivos informes. Por isso, fica
aqui a sugestão de que nossos leitores acessem e leiam estes excelentes produtos da reflexão
dos nossos analistas.

G7 e G20, particularmente, terão impactos fortes da política externa do novo governo


estadunidense. Marco Rubio, chanceler americano disse, por exemplo, que os EUA não
participarão da Cúpula do G20 na África do Sul, porque o governo de Ramaphosa está fazendo
“coisas muito feias” – como a desapropriação de terras de brancos para a reforma agrária,
segundo o ministro-sem-pasta Elon Musk, que é sul-africano. A presidência do G7, o Canadá,

24
está constrangido pela proposta de virar 51º. Estado americano, e não se sabe o que ocorrerá
na reunião de Alberta.

A presidência de BRICS do Brasil pode ajudar a transformá-lo num polo importante de


alternativa às políticas isolacionistas e a não-diplomacia dos EUA ou, se o país optar por uma
presidência low profile, será uma oportunidade perdida para implementar uma cooperação Sul-
Sul valente e transformadora. Que articule positivamente a cooperação intra-BRICS mas
também, como proposto nas prioridades da PPT-BR para o bloco, “o fomento da cooperação
internacional com o Sul global, com ênfase em saúde pública”. A diplomacia do Brasil, mais a
comunidade da saúde pública brasileira, com a palavra para construir as iniciativas viabilizadoras
da proposição ainda genérica.

A COP30 ficou bastante pressionada com a saída dos EUA do Acordo de Paris, mas o
governo brasileiro promete a mobilização do Sul global para fazer do evento de Belém um
momento de reflexão e solidariedade em prol do clima e do planeta.

Agenda da Saúde Global

A agenda da saúde global é construída por um conjunto complexo de atores políticos,


distribuídos territorialmente em espaços globais, regionais, sub-regionais, nacionais,
subnacionais e locais. Tais atores se localizam, politicamente, em espaços governamentais (o
Estado), no setor privado (o ‘mercado’) e na sociedade civil (na sua mais ampla acepção). Este
grande conjunto de atores tem interesses e formula e implementa políticas, ações, iniciativas,
com foco na ‘saúde’, não apenas no interior dos ‘sistemas de saúde’ propriamente dito, mas em
outros setores do Estado, do setor privado e da sociedade civil que incidem sobre os
‘determinantes da saúde’, sejam eles políticos, sociais, econômicos, ambientais ou de outra
natureza - ou seja, a agenda política externa ao ‘setor saúde’ que têm impactos sobre a saúde.

Nos espaços global, regional e sub-regional, os mencionados atores se movem no


campo político da ‘diplomacia da saúde’, para negociar sobre temas da saúde, incluindo seus
determinantes, utilizando-se para isso de mecanismos e capacidades desenvolvidas segundo
suas necessidades e acúmulos de poder político e técnico.

Neste artigo, vamos privilegiar a análise da agenda da saúde global desenvolvida na


Organização Mundial da Saúde (OMS), ressalvando que ela é apenas um dos fatores da complexa
equação política vigente na saúde global.

A Organização Mundial da Saúde é, formalmente, o órgão gestor da saúde global no


sistema das Nações Unidas. Entretanto, ressalte-se, muitas outras agências, fundos, programas
e outras instâncias das Nações Unidas tem a saúde como foco, a exemplo do UNICEF, da UNFPA,
do PNUD, da OIT, para citar apenas de algumas instâncias mais proeminentes28.

A proposta de trabalho da OMS para o quadriênio 2025-2028 está contida no Décimo


Quarto Programa Geral de Trabalho (GPW 14)29, um roteiro de alto nível para a saúde global,
que orientará o trabalho da OMS em apoio aos Estados-Membros e parceiros. Tem como dísticos

28
Apenas como exemplo, mencione-se as recentes Reuniões de Alto-Nível da Assembleia Geral das Nações
Unidas (AGNU) (e resultantes declarações políticas) sobre: resistência antimicrobiana (2024); cobertura
universal de saúde (2023); prevenção, preparação e resposta a pandemias (2023); tuberculose (2023);
doenças não-transmissíveis (2018); e resistência antimicrobiana (2016). Na 80ª. AGNU (setembro de
2025), o tema será novamente doenças não-transmissíveis.
29
Ver: https://apps.who.int/gb/ebwha/pdf_files/WHA77/A77_16-en.pdf

25
principais: “Promovendo a equidade em saúde e a resiliência dos sistemas de saúde em um
mundo turbulento: Uma agenda global de saúde para 2025–2028 - Promovendo, fornecendo e
protegendo a saúde e o bem-estar para todos”. Alcançar essa ambiciosa meta exigirá uma
agenda de saúde global comum e o trabalho conjunto entre um amplo grupo de partes
interessadas, em apoio à ação governamental, globalmente e em cada país.

Foi aprovado pelos Ministros da Saúde de todos os Estados-membros na 77ª.


Assembleia Mundial da Saúde (maio de 2024), centrando-se em “revigorar as ações necessárias
para colocar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável relacionados à saúde no caminho
certo, ao mesmo tempo em que prepara os sistemas de saúde e assistência para o futuro, para
a era pós-ODS”.

Reconhecendo que o mundo mudou drasticamente desde a adoção dos ODS, em 2015,
o GPW 14 define uma agenda ambiciosa para a saúde global diante dos desafios e das principais
megatendências, incluindo mudanças climáticas, envelhecimento, migração, geopolítica em
evolução, e avanço da ciência e tecnologia30. O Comitê que analisa em primeira instância o
conteúdo do GPW, destacou a atenção prestada à mudança climática e a saúde, a ação sobre os
determinantes da saúde, a saúde mental, a igualdade de gênero, a saúde dos migrantes, a
inocuidade dos alimentos, a saúde digital e a inteligência artificial.

O GPW 14 foi desenvolvido por meio de um processo consultivo iterativo de 10 meses


com os Estados-membros da OMS e uma ampla gama de parceiros, incluindo agências da ONU,
organizações e fundos internacionais de saúde, sociedade civil, organizações públicas e privadas
em relações formais com a OMS, redes técnicas e de centros colaboradores da OMS, além de
técnicos da própria força de trabalho da Organização.

É operacionalizado por meio do processo de orçamento do programa bienal da OMS


que, ademais, vem realizando ‘Rodadas de Investimentos’ para captar recursos extras às
contribuições dos países, visando o financiamento do trabalho principal da OMS pelos próximos
quatro anos (2025-2028).

Reunião do Comitê Executivo da OMS 2025

O Comitê (ou Conselho) Executivo (CE) é composto por 34 membros tecnicamente


qualificados na área da saúde, com mandato de três anos, cuja principal função é dar
cumprimento às decisões e políticas da Assembleia Mundial da Saúde (AMS), aconselhá-la e, em
geral, facilitar o seu trabalho. Decidir a agenda da Assembleia 2025 e adotar resoluções a serem
apresentadas para sua aprovação, assim como relatórios de progressos e encaminhamento
sobre resoluções vigentes, é o objeto de sua primeira reunião em 2025 (03-11 de fevereiro, 156ª.
sessão), cujos conteúdos passamos a comentar31.

A presidência do CE é exercida pelo Dr. Jerome X. Walcott (representante de Barbados)


e os Estados-membros componentes (janeiro de 2025) são: África (Camarões, Comoras, Etiópia,
Lesoto, Senegal, Togo e Zimbábue); Américas (Barbados, Brasil, Canadá, Chile, Costa Rica e EUA);
Sudeste da Ásia (Maldivas, Coréia do Norte e Tailândia); Europa (Bulgária, Eslováquia, Israel,
Noruega, Polônia, Moldávia, Suíça e Ucrânia); Mediterrâneo Oriental (Líbano, Marrocos, Qatar,
Somália e Iêmen); Pacífico Ocidental (Austrália, Brunei, China, Micronésia e Coréia do Sul).

30
Valemo-nos, neste artigo, da descrição do GPW14 (aliás, bastante sombria) do contexto global para o
período 2025 a 2028, que lastreia o cenário para uma agenda de saúde global
31
Agenda do EB 2025. Ver: https://apps.who.int/gb/ebwha/pdf_files/EB156/B156_1(annotated)-sp.pdf

26
Os Estados Unidos, membro do EB no triênio 2022-2025, estão com representante “por
indicar”, o que certamente se deve ao pedido de desligamento do país da Organização, por
decisão do presidente Trump, em 20 de janeiro de 2025.

A agenda provisória a ser cumprida encontra-se no documento EB156/1, que está


‘anotada’, explicando seu conteúdo, em Agenda provisória EB156/1 (anotada) e Agenda
(anotada) EB156/3. Para maiores detalhes da agenda ver o anexo.

Diante da complexidade da situação global, parece-nos que a Agenda da Saúde Global


2025 em geral, e também na OMS, não está à altura dos grandes desafios que ameaçam a saúde
humana e planetária. É o que se depreende do conjunto de itens propostos para exame pelo EB
(fevereiro de 2025) e que servirão de base para a agenda da 77ª. Assembleia Mundial da Saúde
(AMS) (maio de 2025). A estagnação das negociações sobre o Tratado sobre Pandemias na OMS
e a ausência de referências à Preparação, Prevenção e Resposta à Pandemias no Pacto pelo
Futuro, anunciado na AGNU, em setembro de 2024, talvez sejam as melhores evidências da
nossa afirmação.

Reunião de Alto-Nível da AGNU 2025 sobre Doenças Não Transmissíveis (DNT)

A Quarta Reunião de Alto Nível da Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) sobre
Prevenção e Controle de Doenças Não Transmissíveis (DNT)32 será realizada em setembro de
2025, visando “adotar uma nova, ambiciosa e realizável declaração política sobre DNT para 2030
e 2050, com base em evidências e fundamentada em direitos humanos, e para acelerar a
resposta global para a prevenção e controle das DNT a partir de 2025. O processo preparatório
para a Quarta Reunião de Alto Nível terá como objetivo abordar lacunas e soluções para acelerar
o progresso em direção ao ODS 3.4 em 2030 e definir direções estratégicas para 2050. O
processo incluirá reuniões globais e técnicas de alto nível, comitês de especialistas e consultas
copatrocinadas pela OMS e parceiros relevantes, que podem servir como contribuições técnicas
para as negociações entre os Estados-Membros sobre o documento final. Além disso, eles
podem informar as recomendações a serem incluídas no relatório do Diretor-Geral da OMS para
a Assembleia Mundial da Saúde 2025.

Considerações finais

A complexidade da crise multidimensional mundial, que inclui, de forma drástica, a


geopolítica global, exige ampla e permanente reflexão, dado a velocidade de sua evolução.

O novo governo americano pretende, à base de um sonho neoimperialista e de uma


“diplomacia da chantagem”, impor uma agenda política ao mundo. Tocará à Europa, África, Ásia,
América Latina, G77 e BRICS repensar papel e práticas políticas de resistência para manter a
cooperação internacional em prol do desenvolvimento, e também da saúde.

ANEXO
Passo importante do EB são os ‘Relatório dos Comités Regionais ao Conselho Executivo’, contidos
em EB156/5. Já o Relatório do Comité Permanente de Prevenção, Preparação e Resposta a Emergências
Sanitárias pode ser lido em EB156/6.
Os temas que serão tratados no CE (e respectivo documento de referência) serão: Cobertura
universal de saúde (EB156/7); Acompanhamento da declaração política da terceira reunião de alto nível

32
Ver: https://www.who.int/teams/noncommunicable-diseases/on-the-road-to-2025/how-to-get-
involved

27
da Assembleia Geral sobre a prevenção e controle de doenças não transmissíveis (EB156/8); Saúde
mental e conexão social (EB156/10); Roteiro global para derrotar a meningite até
2030 (EB156/11); Produtos médicos de qualidade inferior e falsificados (EB156/12); Produtos médicos de
qualidade inferior e falsificados - Relatório de avaliação do Mecanismo dos Estados-
Membros (EB156/13); Normalização da nomenclatura de dispositivos médicos - Classificação, codificação
e nomenclatura internacional de dispositivos médicos (EB156/15); Profissionais de saúde e cuidados -
Estratégia Global de Recursos Humanos para a Saúde: Força de Trabalho em Saúde
2030 (EB156/16); Projeto de estratégia global sobre medicina tradicional (2025-
2034) (EB156/17); Estratégia Global para a Saúde de Mulheres, Crianças e
Adolescentes (EB156/18); Trabalho da OMS em emergências de saúde - Informações atualizadas sobre
resposta a emergências de saúde questões importantes em curso (EB156/21); Revisão e Preparação para
a Saúde Universal (EB156/22); Poliomielite (EB156/23); Efeitos de produtos químicos, resíduos e poluição
na saúde humana (EB156/25); Alterações climáticas e saúde - Projeto de plano de ação global sobre
alterações climáticas e saúde (EB156/26 Rev.1); Financiamento e execução do orçamento do programa
2024-2025 (EB156/33); Reforma da governança - Participação de atores não estatais nos órgãos diretivos
da OMS (EB156/34).
Nas ‘Estratégias Globais ou Planos de Ação programados para expirar dentro de um ano’, serão
discutidos: Orientação Estratégica Global sobre Enfermagem e Obstetrícia 2021-
2025 (EB156/35); Estratégia Global de Saúde Digital 2020-2025 (EB156/36); Plano de Ação Global sobre a
Resposta de Saúde Pública à Demência 2017-2025 (EB156/38). Em todos os itens, solicita-se a extensão
do prazo.
A participação social nos debates e decisões da OMS tem sido discutida no tema ‘Colaboração
com Atores Não-estatais’: Relatório sobre a implementação do Quadro para Colaboração com Atores Não
Estatais (EB156/39); e Atores não estatais com os quais a OMS mantém relações oficiais (EB156/39 Add.1)
e (EB156/39 Add.2).
Relatórios sobre temas de alta relevância para a saúde global estão em: Comitê Permanente de
Prevenção, Preparação e Resposta a Emergências de Saúde (EB156/45); e Comitê Permanente de
Prevenção, Preparação e Resposta a Emergências Sanitárias - Relatório sobre o funcionamento e impacto
do Comité Permanente (EB156/47).
Entre os temas administrativos e de gestão, encontram-se: Nomeação do Diretor Regional para
a Europa (EB156/48); Recursos humanos: atualização (EB156/49); Recursos humanos:
Atualização Aplicação do Estratégia das Nações Unidas para a Inclusão da Deficiência, incluindo a política
da OMS para a deficiência (EB156/50); Emendas ao Estatuto da Pessoa com Deficiência Pessoal e
Regulamentos de Pessoal (EB156/51); Relatório da Comissão Internacional da Função
Pública (EB156/52); Relatório sobre reuniões de comitês de especialistas e grupos de estudo (EB156/52
Add.1).; Relatório sobre reuniões de comitês de especialistas e grupos de estudo Painéis e comitês de
especialistas e sua composição.
A Agenda provisória para a 78ª. Assembleia Mundial da Saúde, a ser aprovada pelo CE, encontra-
se em: EB156/42.

28
As Nações Unidas que precisamos

Santiago Alcázar

Neste início de 2025, ante as preocupantes notícias que nos chegam de toda parte, duas
perguntas se fazem prementes: 1) que importância tem a ONU num mundo que parece a
ignorar? 2) o que deve esperar o aluno do Curso de Atualidades em Saúde Global e Diplomacia
da saúde à luz das múltiplas crises em andamento?

Creio que as duas perguntas devem ser contrapostas ao pano de fundo da demolição
em andamento de valores e princípios caros para sociedades “justas”, aquelas que causavam
inveja e desejo de incorporar-se a elas. Sonho de largar tudo e empreender uma travessia cheia
de riscos para viver e trabalhar em algum lugar que reconhece e respeite direitos. Olhem em
volta. A demolição já começou e não tem hora para acabar.

A desinformação sobrepõe-se à informação; as fakes news circulam livres, sem


empecilhos. A ciência perde status. Surgem os antis. Anti isto, anti aquilo. Por que estranhar que
muitos acolham narrativas soltas, teorias estapafúrdias, argumentos infundados, como se
fossem expressões da verdade que pouco tempo atrás, fariam sorrir?

Este curso é importante porque é uma tentativa de estabelecer um canal de


comunicação de especialistas que, por profissão ou por experiência, estão expostos aos temas
de saúde global e diplomacia da saúde, com o não especialista, que por essa razão não se
encontra exposto ante aqueles assuntos.

Por que isso seria importante? Porque os problemas tratados no curso afetam a todos
nós, de maneira vital. As nossas vidas e as das gerações vindouras estão em jogo. Ninguém ficará
de fora dos impactos que decorrerão das decisões políticas que são tomadas para continuar com
a demolição em andamento. Queremos informar, com o melhor de nossas respectivas
habilidades, sobre os prováveis impactos que todos sofrerão com o único objetivo de despertar
consciências. A mudança para um mundo melhor, mais justo e solidário, somente virá se nós,
todos nós, cada um a sua maneira, compreender os riscos e ameaças existenciais que pesam
sobre a continuação da demolição.

O mundo é a nossa casa comum, como lembra o Papa Francisco em sua encíclica
Laudato Si33. O aquecimento global é um fato. Mudança climática, por conta desse aquecimento,
é o exemplo mais conhecido de um problema global que, justamente por conta de sua natureza,
implica que o encaminhamento de soluções reclama o envolvimento de todos nós – governos,
parlamentos, sistema Nações Unidas, instituições internacionais, autoridades locais, povos
originários, sociedade civil, empresariado, sindicatos, academias e, naturalmente, vocês, alunos,
que não podem ficar à margem ou deixados para trás. A Carta das Nações Unidas34, que é uma
espécie de Constituição Universal para as relações internacionais, reconhece a importância
dessa totalidade ao fixar em seu preâmbulo a fórmula: Nós, os povos. A Agenda 203035, que é o

33
https://www.vatican.va/content/francesco/pt/encyclicals/documents/papa-
francesco_20150524_enciclica-laudato-si.html
34
https://www.oas.org/dil/port/1945%20Carta%20das%20Nações%20Unidas.pdf
35
https://brasil.un.org/sites/default/files/2020-09/agenda2030-pt-br.pdf

29
mapa do caminho de consenso para levar adiante os objetivos originais da Carta, também
reconhece a importância dessa totalidade ao expressar que a Agenda é dos povos, para os povos
e, por essa razão, deve ser conduzida por eles, os povos.

Este curso é importante porque vocês alunos fazem parte dessa totalidade que não pode
ser desmembrada. Todos devem participar, ou informar-se, das discussões e dos debates
multilaterais. Ninguém pode ser deixado para trás, como proclama a Agenda 2030.

Neste artigo espero oferecer uma visão crítica do que, creio, constitui o marco
civilizatório mais importante da história recente.

As Nações Unidas nascem dos escombros da Segunda Guerra. É preciso ter em mente a
gravidade dos traumas deixados por esse conflito, responsável pela morte de dezenas de
milhões de pessoas. As estimativas mais altas apontam 85 milhões de mortes, correspondentes
a aproximadamente 3.7% da população mundial à época, estimada em 2.3 bilhões. Para ter uma
ideia do que essa proporção representaria hoje, com a população mundial de 8 bilhões, o
número de mortos seria 296 milhões de pessoas. Trata-se, portanto, de uma verdadeira
catástrofe. Como sempre, as maiores vítimas foram os civis, mais do dobro do número de
militares. Ademais desses números impressionantes, a guerra elevou o horror a dimensões até
então desconhecidas. As explosões nucleares em Hiroshima e Nagasaki; os bombardeios de
cidades inteiras, destruídas, incendiadas, reduzidas a escombros – são provas de uma crueldade
humana levada ao extremo. As guerras existem desde sempre, mas essa foi diferente pela
desumanização alcançada com o uso da Razão, a mesma que no Iluminismo prometia livrar o
homem das trevas e o conduzir ao bom caminho da ciência e do progresso. Desprovida da ética,
no entanto, a Razão pode voltar-se contra o homem, como uma arma, como a Inteligência
Artificial, que à semelhança da fome (uso da fome como arma de guerra) e da falta de assistência

30
humanitária (impedir a ajuda humanitária é também uma arma de guerra) em Gaza, pode ser
weaponized36, para usar o termo em voga na mídia anglo-saxã.

É preciso deter-nos um pouco sobre a ética. Todos os acordos, compromissos,


promessas partem do princípio ético de que são concluídos em boa fé. Trata-se de algo
profundo, assentado na confiança e no respeito entre as pessoas. Poder-se-ia perguntar: que
pessoas são essas? E a resposta partiria de círculos concêntricos que se vão alargando, desde o
núcleo familiar, à comunidade, à sociedade nacional e, por último, internacional. A boa fé
implica que o outro, o próximo, é sujeito de todos os mesmos direitos. Nesse sentido, é a pedra
angular da Civilização, ao ponto de dizer que sem ela, sem a ética, não há Civilização. A história
mostra de que é capaz o uso da Razão desprovida de ética. Não se deve esquecer, mas tampouco
se deve fechar os olhos.

Em 27 de janeiro corrente, o Secretário-Geral das Nações Unidas, Antônio Guterres,


pronunciou discurso por ocasião da Memória pelas vítimas do Holocausto, estabelecida pela
resolução A/Res/70/637. Em sua fala, Guterres recordou a promessa de nunca esquecer as
atrocidades que tanto ultrajaram a consciência da humanidade. Recordou as palavras de Charles
Malik, o grande diplomata libanês que contribuiu na redação da Declaração Universal de Direitos
Humanos, que a mesma foi inspirada pela oposição às doutrinas bárbaras do nazismo e do
fascismo. O SG então recorda que a dignidade de todos nós, humanos, está consagrada nesse
documento, baseado nas tradições de todos os povos. E, em seguida, afirma que a Declaração
é a pura expressão de nossa humanidade compartilhada. Em tempos difíceis, a Declaração
permanece uma luz brilhante38.

O Secretário-Geral ressaltou a importância de não esquecer e de afirmar Nunca Mais,


mas esqueceu de abrir os olhos para o genocídio em Gaza. Não se entende por que no dia da
Memória não se fez menção às vítimas palestinas, em sua maioria, crianças e mulheres. A
demolição está em andamento. Debaixo de escombros estão os corpos de indivíduos que
aparentemente não tem a mesma dignidade humana. Olhos fechados.

As três ideias

É contra o pano de fundo da Segunda Guerra Mundial que surge a Organização das
Nações Unidas. Concebida para proteger as gerações vindouras, o projeto das Nações Unidas é
um Nunca Mais, como aqueles apelos que se fizeram ouvir após os anos de repressão de
governos de exceção na América Latina. Refletido no espelho retrovisor, o Nunca Mais onusiano
vem acompanhado por uma visão de futuro apoiada em três ideias, singelas como flores de
campo, frágeis como uma chama incerta na noite escura, esperançosas como um poema de
amor. Paz e segurança, direitos humanos e desenvolvimento são essas ideias. É difícil imaginar
como a ideia de paz pode ter surgido no meio do conflito, quando a lógica predominante
costuma ser a do dente por dente, olho por olho, que alimenta a espiral da violência. Não é
evidente que o reconhecimento e o respeito dos direitos humanos possam ter flutuado entre
homens pragmáticos, responsáveis pela formulação de políticas adotadas mediante a prática
costumeira de escambos partidários. E o que tem a ver desenvolvimento com tudo isso?

36
https://www.merriam-webster.com/dictionary/weaponize
37
https://docs.un.org/en/A/RES/60/7
38
https://www.un.org/sg/en/content/sg/statement/2025-01-27/secretary-generals-remarks-the-
united-nations-memorial-ceremony-marking-the-international-day-of-commemoration-memory-of-the-
victims-of-the-holocaust-delivered

31
As ideias nunca se apresentam de uma vez por todas, acabadas, perfeitas. Elas vão se
fazendo, misturando-se umas às outras, mudando, transformando-se, enfatizando este ou
aquele ponto, mostrando-se de uma maneira, escondendo outras. A história das ideias tem algo
da atividade desordenada em um garimpo.

Essencialmente inter-relacionadas umas com as outra, as três ideias fundacionais foram


se solidificando em pilares que sustentam todo o projeto do sistema das Nações Unidas. A um
só tempo, são a promessa de um Nunca Mais universal e expressão de um futuro que se quer39,
tanto ontem, à época da fundação das Nações Unidas, quanto hoje, oitenta anos depois, uma
vez que o futuro é o lugar temporal onde se depositam as esperanças e os desejos, ainda que
estes e aquelas possam ser diferentes em um e em outro caso.

O curioso é que no processo de elaboração, as três ideias foram criando uma unidade
indissociável, talvez não percebida. Três exemplos são suficientes para mostrar como esse inter-
relacionamento não foi imediatamente captado.

Inicialmente, o desenvolvimento foi concebido como a resultante do crescimento


econômico. Para muitos, o importante era concentrar-se no crescimento econômico. O
aumento da produção e do comércio puxaria o crescimento que, por sua vez, arrastraria o
desenvolvimento. Não se percebia então que crescimento econômico e desenvolvimento
expressam aspectos distintos da realidade, ainda quando para alcançar o segundo é importante
o primeiro. Crescimento refere-se à economia; desenvolvimento, ao social. Crescimento reflete-
se no PIB; desenvolvimento no desdobramento dos direitos humanos, uma vez que o significado
profundo de desenvolvimento é a realização dos direitos humanos – direito ao trabalho digno,
com seguridade e proteção social; direito à saúde e à educação, direitos humanos universais;
direito ao saneamento, ao transporte, à nutrição saudável, à cultura, à diversão, entre outros. É
curioso que não se tivesse feito essa associação, quando o que mais se admirava, e se admira,
nos países desenvolvidos eram, são, justamente essas realizações. Reduzir tudo ao que as
fábricas e as indústria despejam no mercado é fixar-se nas fumaças que elas produzem e deixar
de lado o propósito de humanizar, i.e., tornar humana toda e qualquer política, uma vez que o
homem deve ocupar o centro de toda e qualquer política.

Hoje, os que defendem as teses neoliberais de desregulação, redução do Estado,


precarização das condições de trabalho, retirada das garantias, guerra à cultura,
desinvestimentos em saúde e educação, saneamento, transporte, preferência manifesta à
destruição das conquistas passadas – parecem querer voltar no tempo, quando
desenvolvimento eram, e são, folhas e gráficos carregadas de números, curvas estatísticas –
para comparar e medir performances, bem como para permitir ao mercado a direção para
conseguir a otimização dos investimentos e do fluxo de capital. É extraordinário que ao escolher
essa via, poucos tenham percebido que o Nunca Mais agora referia-se, não aos desastres da
guerra, mas às conquistas alcançadas durante a segunda metade do século XX, como se o
sentido de tudo tivesse sido invertido, deixando para trás as esperanças e os desejos.

A ideia de direitos humanos universais, certamente a mais inovadora e revolucionária,


tampouco foi compreendida em suas profundas ramificações. A instauração do regime do

39
O futuro que queremos é o nome dado ao documento que emanou da Conferência das Nações Unidas
sobre Desenvolvimento Sustentável, Rio +20, e posteriormente adotado pela 66ª AGNU por meio da
resolução Assembleia Geral Resolução A/Res/66/288
https://www.un.org/en/development/desa/population/migration/generalassembly/docs/globalcompac
t/A_RES_66_288.pdf.

32
apartheid na África do Sul a partir de 1948, a ocorrência do Nakba, o desastre que representou
o êxodo forçado da população palestina de seus territórios, também naquele ano, o mesmo da
aprovação da Declaração Universal dos Direitos Humanos – são testemunhos da incompreensão
do significado dos direitos humanos. Por que nada se fez para evitar essas barbaridades que
ofendiam, e ofendem, os princípios e propósitos da Carta? O que esperar quando vigoravam
ainda as leis de segregação nos estados do Sul dos EUA, o colonialismo era ainda a realidade e a
autodeterminação, direito humano fundamental, objeto de debates inconclusivos?

O que esperar quando sequer havia consenso sobre o direito das mulheres ao voto?
Mais importante, alguns imaginavam que o importante eram os direitos civis e políticos40, contra
os que pensavam que o acento deveria recair sobre os direitos econômicos, sociais e culturais41.
Durante a guerra fria, o bloco ocidental, favorecia os primeiros; o bloco soviético, os segundos.
As razões, tanto de um lado quanto do outro, pareciam argumentações sofistas, mais
preocupadas em defender ideologias que em resgatar o significado do humano em cada direito.
O problema é que o reconhecimento e o respeito aos direitos humanos requerem a
compreensão profunda do sujeito dos mesmos, o próximo, o que está aí, defronte. Pode-se
perguntar: quem é o próximo? Quem é o que está defronte? Os membros do círculo íntimo, a
família, a comunidade, os da mesma cidade, do mesmo país, da mesma cultura e religião, os de
mesma cor e etnia, os da mesma educação e condição social – e assim por diante. Sim, os
próximos são todos esses, mas não somente. Em última análise, o próximo é o outro,
independente de raça, etnia, gênero, riqueza, condição social, cultura e religião – a quem devem
ser reconhecidos os mesmos direitos que a qualquer outro e, consequentemente, respeitá-los
da mesma maneira. Essa é a maior dificuldade ainda não resolvida e que, portanto, frustra a
realização do projeto das Nações Unidas que continua sendo o do mundo que queremos,
implicitamente inscrito na Carta.

Finalmente a ideia de paz e segurança parece ter sido entendida em sua dimensão
geográfica. Com efeito, desde a Segunda Guerra não houve conflito na Europa. As guerras na
Iugoslávia, de 1991 a 1999, com o bombardeio de Belgrado pela OTAN, em 1998, parecem
contradizer a tese, assim como a guerra da OTAN contra a Rússia na Ucrânia, de 2022 até o
presente, mas nem a antiga Iugoslávia, nem a Ucrânia eram Europa. O braço de opinião de
notícias da NBC, Think42, publicou artigo de Ahmed Twaij, intitulado How coverage of the
Ukraine-Russia conflict highlights a racist double standard43. No artigo, Twaij reúne os
comentários racistas de vários representantes da mídia ocidental, que parecem ter sido pegos
em verdadeiros deslizes do subconsciente, ou simplesmente atos falhos, pelos quais
reconhecem que a vida de brancos é mais importante que a de pessoas que morrem fora da
Europa.

Se o objetivo da Organização das Nações Unidas era salvar as gerações de europeus do


flagelo da guerra, então deve concluir-se que o projeto foi coroado de êxito. É preciso, no
entanto, considerar que segundo a UNICEF, 2024 foi provavelmente um dos piores anos para
crianças44, fora da Europa, naturalmente. E Gaza continua a chocar. Não mais o nome de uma

40
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0592.htm
41
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto/1990-1994/d0591.htm
42
https://www.nbcnews.com/think/opinion/welcome-think-nbc-news-new-opinion-section-ncna809221
43
https://www.nbcnews.com/think/opinion/ukraine-russia-conflict-highlights-racist-double-standard-
ncna1290822
44
https://www.unicef.org/brazil/innocenti/comunicados-de-imprensa/nao-e-o-novo-normal-2024-e-
um-dos-piores-anos-da-historia-do-unicef-para-crianças-em-conflitos

33
estreita faixa de território, Gaza é hoje o nome de um genocídio de palestinos, a céu aberto,
levado a cabo pelo governo de Benjamin Netanyahu, com a cumplicidade dos governos dos EUA
e de países europeus. É difícil imaginar o que aconteceu com a promessa do Nunca Mais, depois
dos desastres da guerra, do Holocausto, das torturas, das mortes e dos desaparecimentos
durantes os regimes militares, tão esperançoso como o pedido de uma criança, tão frágil como
uma vida que começa, tão singelo como um sim.

Como se pode observar, desde o início houve dificuldade em entender o profundo


significado das três ideias que deram início às Nações Unidas, bem como o fato de que elas
formam uma unidade indissociável. Hoje, quase 80 depois, deveria ser evidente que para haver
paz e segurança é fundamental a prévia condição do reconhecimento e do respeito aos direitos
humanos, bem como a realização do desenvolvimento. De maneira semelhante, deveria ser
óbvio que a plena efetivação dos direitos humanos somente é possível por meio da realização
do desenvolvimento, em um ambiente de paz e segurança. Por último, o desenvolvimento sem
o reconhecimento e o respeito dos direitos humanos, como tentado pelas potências coloniais
resultou nas sucessivas guerras de independência, dando razão ao velho proverbio quem semeia
vento, colhe tempestade.

É preciso agora, saber o que fizeram com as três ideias para torná-las operativas. Para
isso é preciso examinar a Carta da Organização das Nações Unidas.

A Carta

A Carta2 consta de um preâmbulo de 3 parágrafos. No primeiro, leem-se as celebres


palavras: Nós, os povos.

O Capítulo I tem 2 artigos. No primeiro são estabelecidos os propósitos e os princípios.


É aqui onde se encontram as 3 ideias-pilares.

O primeiro parágrafo do artigo 1 desvela o propósito de manter a paz e a segurança


internacional. O segundo, o desenvolvimento de relações amistosas entre as nações,
enfatizando o respeito à igualdade de direitos e de autodeterminação dos povos. A
autodeterminação, como se sabe, faz parte de um direito reconhecido pelo Pacto de Direitos
Civis e Políticos6, que, por sua vez fazem parte do universo dos direitos humanos. O terceiro
parágrafo faz menção à necessidade da cooperação internacional para à solução de questões
econômicas, sociais, culturais e humanitárias. Esse conjunto de ideias iria desembocar mais
tarde no Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais6. Aqui se tem a ideia
do coletivo: Nós, os povos, a ideia de desenvolvimento em suas dimensões econômica e social
e, por último, a ideia de direitos humanos encapsulada nos termos culturais e humanitárias.
Mais adiante, no mesmo parágrafo, a ideia do respeito aos direitos humanos fundamentais é
assentada para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou religião.

Como se pode observar, as três ideias são apresentadas nos propósitos que devem
guiar os trabalhos da Organização.

Os princípios fundacionais, por outro lado, são: i) a igualdade de todos os membros; ii)
a boa-fé; iii) a assistência dos Estados membros à Organização em qualquer ação prevista na
Carta; iv) a não intromissão da Organização em assuntos que dependam exclusivamente da
jurisdição interna dos países.

34
O Capítulo III, estabelece os órgãos principais: i) Assembleia Geral; ii) Conselho de
Segurança; iii) Conselho Econômico e Social (ECOSOC); iv) Conselho de Tutela; v) Corte
Internacional de Justiça; vi) Secretariado.

O Capítulo IV trata da Assembleia Geral. O Capítulo V, do Conselho de Segurança. O


Capítulo VI não trata do Conselho Econômico e Social, mas da Solução Pacífica de
Controvérsias, que é uma das atribuições do Conselho de Segurança. Curioso. O Capítulo VII
certamente deve tratar do Conselho Econômico e Social você imaginaria e estaria errado. O
Capítulo VII – Ação relativa a ameaças à paz, ruptura da paz e atos de agressão – como o
capítulo anterior, são funções do Conselho de Segurança. Três capítulos reservados à ideia de
paz e segurança. Por quê? Desconfiança? Sabedoria? Conhecimento da condição perversa dos
homens, cuja história, do nascimento à morte, parece feita de gritos e atos de violência? Bom,
você diria, agora vamos para o Capítulo VIII que, esse sim, cuida do ECOSOC. E você, de novo
estaria equivocado, pois o Capítulo VIII versa sobre os Acordos Regionais que podem ser criados
para apoiar o Conselho de Segurança. A relação até agora 1 para 4. Deve haver uma explicação.
Enquanto esta não vem, passamos ao Capítulo IX que, contra todas as expectativas, refere-se à
Cooperação Internacional Econômica e Social, uma espécie de prelúdio ao ECOSOC.

É tão interessante a redação do artigo 55, o primeiro do Capítulo IX, que vale a pena
reproduzi-lo na íntegra a seguir:

Com o fim de criar condições de estabilidade e bem estar, necessárias às relações
pacíficas e amistosas entre as Nações, baseadas no respeito ao princípio da igualdade de direitos
e da autodeterminação dos povos, as Nações Unidas favorecerão: a) níveis mais altos de vida,
trabalho efetivo e condições de progresso e desenvolvimento econômico e social; b) a solução
dos problemas internacionais econômicos, sociais, sanitários e conexos; a cooperação
internacional, de caráter cultural e educacional; e c) o respeito universal e efetivo dos direitos
humanos e das liberdades fundamentais para todos, sem distinção de raça, sexo, língua ou
religião.

As três ideias, como se pode ver, voltam a apresentar-se com mais clareza. Há, contudo,
um termo novo, que não está nas referências anteriores, mas é de enorme importância:
sanitário. O termo refere-se à conservação da saúde pública, ameaçada por doenças
transmissíveis vinculadas à falta de higiene de grande número de cidades arrasadas pela guerra.
O termo sanitário, no entanto, não capta as dimensões e ramificações do termo saúde. Talvez
por essa razão, delegados da China (Szeming Sze), Brasil (Geraldo de Paula Souza) e Noruega
(Karl Evang), presentes à Conferência de São Francisco que iria adotar a Carta das Nações Unidas,
propuseram o estabelecimento de uma organização internacional de saúde e a realização de
uma Conferência para concluir a sua constituição. Coube ao Conselho Econômico e Social
(ECOSOC) solicitar ao Secretário-Geral a convocação daquela Conferência, que se realizou em
junho de 1946, em Nova York. A Constituição foi aprovada e, assim, criada a OMS.

O Capítulo X, finalmente, trata do ECOSOC que, nos termos da Carta, fará estudos e
relatórios sobre assuntos econômicos, sociais, culturais, educacionais e sanitários (ver o
parágrafo anterior). Poderá, igualmente, fazer recomendações para promover o respeito e a
observância dos direitos humanos. Como se pode ver, ainda que a Carta deixe de estabelecer
um órgão específico para cuidar dos direitos humanos, o ECOSOC o fazia de maneira integrada
com as questões de desenvolvimento, sublinhando dessa maneira a natureza indissociável
dessas duas ideias. É importante notar que a Comissão de Direitos Humanos, que vigorou até
2006, dependia do ECOSOC.

35
O Conselho de Direitos Humanos, que substitui a Comissão, hoje depende da
Assembleia Geral. O status foi elevado, mas é óbvio que o Conselho de Direitos Humanos não
tem a mesma projeção do Conselho de Segurança ou do ECOSOC, que são os órgãos criados na
própria Carta. A ideia dos direitos humanos, a mais inovadora e revolucionária, como se pode
observar, não mereceu o lugar de privilégio na composição da Carta. Essa falha grave talvez
explique a falta de compreensão que perdura até os dias de hoje sobre o profundo significado
dos direitos humanos. É, nesse sentido, o pecado original da Organização que dizia Nunca Mais
para o passado e projetava sonhos e esperanças para o futuro, consubstanciados na ilusão do
mundo melhor que se quer.

O Capítulo XI é uma declaração sobre os territórios sem governo próprio. É quase uma
tentativa de resgatar a ideia de direitos humanos, um pouco empalidecida até aqui. A
Declaração incita os ocupantes de territórios que assumam o princípio de que os interesses dos
habitantes desses territórios são da mais alta importância e aceitem, como missão sagrada (sic),
a obrigação de promover no mais alto grau o bem-estar de seus habitantes, que naturalmente,
envolve todo o universo dos direitos humanos, ainda que de maneira implícita. Os colonizadores
nunca tiveram em mente a “missão sagrada” de promover no mais alto grau o bem-estar dos
habitantes dos territórios ocupados, assim como tampouco Israel, que desde 1967 ocupa a
Palestina e, pareceria, querer fazê-lo da maneira permanente45.

O Capítulo XII trata do Sistema Internacional de Tutela, também conhecido como


Sistema de Protetorado. A Liga das Nações havia estabelecido um sistema de protetorado,
substituído por outro ao final da Segunda Guerra, que responderia pela responsabilidade
fiduciária sobre 11 territórios46. O Capítulo enfatiza a necessidade de fomentar o progresso
político, econômico, social e educacional dos habitantes desses territórios, bem como estimular
o respeito aos direitos humanos.

O Capítulo XIII refere-se ao Conselho de Tutela, que suspendeu as suas operações com
a independência de Palau, em 1994. O Conselho de Tutela, no entanto, ainda que tenha
suspendido as suas funções, somente pode ser extinto mediante uma reforma da Carta.

O Capítulo XIV estabelece a Corte Internacional de Justiça, que não deve ser confundida
com o Tribunal Penal Internacional, que entrou em vigor em 2002. A Corte tem mandato para
julgar Estados; o Tribunal, para indivíduos. O Tribunal, ademais, não é reconhecido pela
totalidade dos países, ao contrário da Corte.

O Capítulo XV estabelece o Secretariado, que é o órgão principal encarregado de


assuntos administrativos. O Secretariado desempenha todas as funções a ele solicitados pelos
outros 5 órgãos principais. O Secretariado não pode solicitar ou receber instruções para o
desempenho de suas funções.

É importante notar que as 3 ideias fundacionais não receberam o mesmo tratamento na


Carta. A ideia de paz e segurança é, sem dúvida, a que mereceu maior destaque com a criação
do Conselho de Segurança. Não há um Conselho de Desenvolvimento para a realização dessa
ideia. O Conselho Econômico e Social trata de vários assuntos, inclusive do desenvolvimento e
poder-se-ia imaginar que essa ideia estaria contemplada nos trabalhos do ECOSOC. A ideia de
direitos humanos, no entanto, é diferente. Os direitos humanos são mencionados 7 vezes na
Carta, mas isso não foi suficiente para que fosse criado um Conselho, à semelhança das outras

45
Para ter um resumo da questão palestina ver https://www.un.org/unispal/history/
46
https://research.un.org/en/docs/tc/territories

36
duas ideias. O tema teve que esperar até fevereiro de 1946 para que o ECOSOC criasse a
Comissão de Direitos Humanos, que funcionou até junho de 2006, quando finalmente foi
estabelecido o Conselho de Direitos Humanos que, não obstante, tem status diferente ao dos
dois outros conselhos.

No âmbito da estrutura organizacional do Secretariado havia, de 1946 a 1954, uma


divisão de Direitos Humanos, subordinada ao Departamento de Assuntos Sociais. De 1955 a
1975, a mesma Divisão dependia do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais.
Finalmente, de 1974 a 1982, a Divisão de Direitos Humanos tornou-se independente e, de 1982
a 1994 criou-se o Centro de Direitos Humanos que foi substituído pelo Escritório do Alto
Comissariado das Nações Unidas para Direitos Humanos. O brasileiro Sérgio Viera de Melo foi
Alto Comissário de 2002 a 2003, quando faleceu em decorrência do atentado sofrido no Iraque,
quando exercia de Representante Especial do Secretário-Geral, Kofi Anan.

As atividades dos 6 órgãos principais são muitas e diversas, como se pode imaginar.
Com o correr do tempo, questões econômicas, sociais e humanitárias foram tornando-se mais
complexas, demandando assim a criação de órgãos secundários especializados.

Estes órgãos secundários especializados constituem o conjunto de Programas e Fundos,


estabelecidos mediante resolução específica da Assembleia Geral. Os Programas e Fundos fazem
parte da ONU, ainda que cada um tenha a sua própria governança, secretariado e orçamento. O
orçamento da ONU e de suas agências especializadas (ver mais abaixo) é uma combinação de
contribuições mandatórias e voluntárias. O orçamento dos Programas e Fundo é exclusivamente
voluntário.

A seguir, apresentam-se os Programas e Fundos47, bem como o link para acessar mais
informações sobre cada um deles.

47
https://www.dagdok.org/w/dd/en/un-system/un-funds-and-programmes

37
Programas e Fundos e Órgão Subsidiários Especializados

UNDP/PNUD - United Nations Development Programme o Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento é o maior Programa da ONU focado no apoio ao desenvolvimento.

UNEP - United Nations Environment Programme é o Programa que serve para promover o
desenvolvimento sustentável com foco no meio ambiente.

UNFPA - United Nations Population Fund o Fundo de População das Nações Unidas responde
pelos temas de população e saúde reprodutiva.

UN-Habitat - UN-Habitat, the United Nations Human Settlements Programme é o Programa


responsável pelas políticas de assentamento humano.

UNICEF - United Nations Children's Fund é o Fundo responsável pela melhoria das condições da
infância nos países em desenvolvimento. Pela história e intensa atuação tem um status de
agência de alto prestígio global, com representações em quase todos os países em
desenvolvimento do mundo.

WFP - World Food Programme o Programa Mundial de Alimentos tem o propósito de contribuir
para a erradicação da fome e da desnutrição.

Ademais dos Programas e Fundos, há também entidades e órgãos subsidiários


especializados. Todos, à semelhança daqueles, são financiados mediante contribuições
voluntárias e contam com governança e secretariado próprio.

ITC - International Trade Centre

UNAIDS - UNAIDS

UNCTAD - United Nations Conference on Trade and Development

UNHCR/ACNUR - United Nations High Commissioner for Refugees

UNOPS - United Nations Office for Project Services

UNODC - United Nations Office on Drugs and Crime

UNRWA - United Nations Relief and Works Agency for Palestine Refugees in the Near East

UM Women - UN Women

Merece destaque a UNRWA, criada em 1948 para auxiliar os refugiados palestinos após
o conflito Árabe-Israelense daquele ano. A Agência é a única que segue prestando assistência
ao povo palestino. Por motivos políticos, vários países ocidentais decidiram suspender as suas
contribuições voluntárias, caso de uma decisão recnete do novo presidente dos EUA. Israel
ameaça fechar a representação da Agência48. As consequências podem ser catastróficas.

Os institutos de capacitação e ensino e a Universidade das Nações Unidas são listadas


a seguir:

UNICRI United Nations Interregional Crime and Justice Research Institute

UNIDIR United Nations Institute for Disarmament Research

48
Para ter uma ideia do que faz a Agência ir a https://www.unrwa.org

38
UNITAR United Nations Institute for Training and Research

UNRISD United Nations Research Institute for Social Development

UNSSC United Nations System Staff College

UNU United Nations University.

Como se pode ver, a Organização é um universo complexo. É fácil perder-se. O que


importa, no entanto, é que em toda essa complexidade há um fio condutor que representa as
três ideias pilares da Organização. O propósito, em qualquer órgão principal ou subsidiário é a
busca da paz e da segurança, do reconhecimento e do respeito dos direitos humanos e do
desenvolvimento sustentável, que são os propósitos explícitos dos institutos de capacitação e
ensino, bem como os da Universidade das Nações Unidas.

Como se não bastasse toda essa complexidade, o universo da ONU comporta diversas
agências especializadas, algumas anteriores à criação da ONU49. Pela história e contribuições
anteriores e contemporâneas, cada uma delas mereceria um capítulo inteiro destes Cadernos,
mas optou-se por oferecer o acesso às páginas das mesmas, para exame dos leitores, segundo
seus interesses.

Agências Especializadas

FAO
Food and Agriculture Organization responsável pelos temas de agricultura, pesca e silvicultura.

ICAO
International Civil Aviation Organization Organização Internacional responsável pela aviação
civil.

IFAD
International Fund for Agricultural Development responsável pelo aumento da produção
agrícola em países em desenvolvimento.

ILO/OIT
International Labour Organization responsável pelos temas laborais.

IMF/FMI
International Monetary Fund resonsável pela promoção da estabilidade monetária.

IMO/OMI
International Maritime Organization responsável pela cooperação marítima internacional.

ITU
International Telecommunication Union responsável pela coordenação das redes e serviços de
telecomunicação.

UNESCO
United Nations Educational Scientific and Cultural Organization responsável pela promoção da
paz por meio da cultura, a ciência, a educação e a mídia.

49
https://www.dagdok.org/w/dd/en/un-system/un-specialized-agencies

39
UNIDO
United Nations Industrial Development Organization responsável pela coordenação das
atividades de cooperação industrial.

UNWTO
World Tourism Organization promove o desenvolvimento do Turismo sustentável.
UPU
Universal Postal Union promove o melhoramento dos serviços postais.

WHO/OMS
World Health Organization

WIPO
World Intellectual Property Organization responsável pela promoção de respeito à propriedade
intelectual.

WMO
World Meteorological Organization agência especializada em meteorologia

World Bank Group/Banco Mundial


World Bank Group (WBG) responsável por empréstimos, assistência técnica e recomendações
aos países em desenvolvimento com o objetivo de reduzir a pobreza e alcançar o
desenvolvimento sustentável.

Sistema Nações Unidas

O Sistema Nações Unidas é esse universo de órgãos oriundos da Carta, os Fundos e


Programas e entidades secundárias especializadas, bem como as agências especializadas. O
organograma completo do Sistema pode ser visualizado acessando a seguinte página web:

https://www.un.org/es/pdf/un_system_chart.pdf

Este ano, as Nações Unidas completarão 80 anos (1945-2025). Há certamente várias


maneiras de contar essa história, de interpretar os seus resultados e avaliar o seu desempenho.
Há uma, contudo, que me parece interessante explorar e que consiste em examinar, ainda que
de maneira perfunctória, 10 instrumentos históricos que parecem apontar na mesma direção:

Os instrumentos históricos

i) Carta50;
ii) Declaração Universal de Direitos Humanos51;
iii) Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos52;
iv) Pacto sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais53;
v) Declaração sobre Direito ao Desenvolvimento54;

50
Ver nota 2
51
https://www.oas.org/dil/port/1948%20Declaração%20Universal%20dos%20Direitos%20Humanos.pdf
52
Ver nota 6
53
Ver nota 7
54
https://acnudh.org/wp-content/uploads/2012/08/Declaração-sobre-o-Direito-ao-
Desenvolvimento.pdf

40
vi) Declaração e Plano de Ação de Viena55;
vii) Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável56;
viii) Declaração do Milênio57;
ix) Agenda 203058;
x) Pacto para o Futuro59.

Todos os instrumentos concluídos após a aprovação da Carta, retomam a centralidade


das três ideias fundacionais. Curiosamente, todos voltam a elas, como para recordar os passos
que nos levariam ao caminho inicialmente proposto. Os dois instrumentos mais novos, a Agenda
2030 e o Pacto para o Futuro o fazem com mais clareza. Todos os dois estão centrados nos
direitos humanos, no desenvolvimento sustentável e na paz e segurança – erradicação da
pobreza extrema, fome zero, saúde e bem-estar, igualdade de gênero, água potável e
saneamento, energia limpa e acessível, trabalho decente e crescimento sustentável, indústria,
inovação e infraestrutura, redução das desigualdades, cidades e comunidades sustentáveis,
consumo e produção responsáveis, ação contra a mudança global do clima, vida na água, vida
terrestre, paz, justiça e instituições eficazes, parceria e meios de implementação60.

Em realidade, as três ideias podem ser sintetizadas em uma só: direitos humanos, uma
vez que toda política, todo acordo, toda decisão, devem ter presente o impacto que podem
gerar sobre a vida de pessoas de carne e osso. Esse é o significado profundo da fórmula que dá
início à Carta: Nós, os povos, esquecido, ao contrário do Holocausto, passado por cima, como
em Gaza e em todos os desastres humanitários que perduram, não obstante a crescente
conscientização promovida pela sociedade civil. Esquecer a profundidade do significado inserido
em Nós, os povos e fechar os olhos para os determinantes que fazem possível o reconhecimento
e o respeito aos direitos humanos é a razão para o estado do mundo assolado por múltiplas
crises e o sentimento de fracasso. Não pergunte por quem os sinos dobram/eles dobram por
nós.

É importante, finalmente, para ter uma ideia do imenso trabalho desse universo que
se chama Sistema das Nações Unidas, recordar algumas conferências internacionais, realizadas
na década de 1990, com o fim da Guerra Fria. Durante praticamente todo o período pós Segunda
Guerra até a queda do Muro de Berlim, em novembro de 1989, os temas sociais foram
impedidos de florescer. Foi com o degelo que surgiu a primavera e realizou-se um ciclo
extraordinário de conferências sobre temas sociais.

O ciclo de conferências sobre temas sociais

Conferência Mundial em favor da infância, 1990, Nova York61;


Conferência Mundial sobre meio ambiente e desenvolvimento, 1992, Rio de Janeiro62;

55
https://www.oas.org/dil/port/1993%20Declaração%20e%20Programa%20de%20Acção%20adoptado
%20pela%20Conferência%20Mundial%20de%20Viena%20sobre%20Direitos%20Humanos%20em%20jun
ho%20de%201993.pdf
56
https://www5.pucsp.br/ecopolitica/projetos_fluxos/doc_principais_ecopolitica/Declaracao_rio_1992.
pdf
57
https://www.undp.org/pt/brazil/publications/declaracao-do-milenio
58
https://brasil.un.org/sites/default/files/2020-09/agenda2030-pt-br.pdf
59
https://docs.un.org/es/A/RES/79/1
60
Objetivos de Desenvolvimento Sustentáveis (ODS)
61
https://www.un.org/es/conferences/children/newyork1990
62
https://www.un.org/es/conferences/environment/rio1992

41
Conferência Mundial sobre Direitos Humanos, 1993, Viena63;
Conferência Mundial sobre População e Desenvolvimento, 1994, Cairo64;
Conferência Mundial sobre Desenvolvimento Social, 1995, Copenhague65;
Conferência Mundial sobre Mulheres, 1995, Beijing66;
Conferência Mundial sobre Assentamentos Humanos (Habitat), 1996, Istambul67

A estas conferências históricas da década de 1990, devem acrescentar-se mais três, de


grande importância e visibilidade: i) Cúpula Mundial do Milênio, 2000, Nova York68; ii) Cúpula
Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável, 2015, Nova York;69 e; iii) Conferência Mundial sobre
Mudança de Clima, que adotou o Acordo de Paris sobre mudança de clima, 2015, Paris70.

As duas primeiras conferências acima são claramente tentativas de resgatar as três


ideias pilares da ONU. Trata-se de estender o reconhecimento e o respeito aos direitos humanos
pela via de ações de desenvolvimento para erradicar a fome e a pobre, diminuir as
desigualdades, aumentar a igualdade de gênero e assim por diante.

O Acordo de Paris foca a questão da mudança de clima por conta do aquecimento global
causado pela emissão de gases de efeito estufa. Grande parte da economia mundial depende
da queima de combustíveis fósseis. Há três formas possíveis de diminuir os efeitos causados pela
emissão de gases na atmosfera, todas beirando um pouco à ciência ficção: i) aumentar a
capacidade dos sorvedouros naturais (oceanos e florestas); ii) lançar ao espaço defletores para
diminuir a incidência de raios solares sobre a Terra; iii) transformação para a economia verde.
Nenhuma é desprovida de dificuldades e custos e resta saber se qualquer uma delas, ou todas
em conjunto, poderão limitar o aumento de temperatura à faixa adequada para a vida humana,
animal e vegetal, sobretudo para os mais vulneráveis. Outra possibilidade, que sequer é
contemplada, mas que não beira à ciência ficção, é transformar radicalmente a economia e a
política com vistas a torná-las subordinadas a Nós, os povos, que com a falta de ética e com a
demolição em andamento é pouco provável.

Foi na demolição em andamento que se realizou a tão esperada Cúpula do Futuro, um


exercício do Secretariado das Nações Unidas para resgatar a Agenda 2030 e os Objetivos de
Desenvolvimento Sustentáveis, que não estão no caminho para serem realizados na data
prometida. A Cúpula do Futuro produziu o Pacto para o Futuro com os mesmos objetivos. Os
artigos “Nações Unidas acelera o passo para a Assembleia Geral 2024”, “A Agenda da AGNU”,
“O Pacto para o Futuro” e “Não fale com o motorista”, publicados nos cadernos CRIS/FIOCRUZ
15, 16, 17 e 1871 podem ajudar o aluno a ampliar o seu conhecimento sobre esse importante
marco das Nações Unidas.

É inevitável sentir-se frustrado com o estado do mundo, não obstante o empenho de


esforços para realizar um mundo mais humano. Muitos atribuem essa frustração ao fracasso das

63
https://www.un.org/en/conferences/human-rights/vienna1993
64
https://www.un.org/en/conferences/population/cairo1994
65
https://social.desa.un.org/world-summit-for-social-development-1995
66
https://www.un.org/en/conferences/women/beijing1995
67
https://www.un.org/en/conferences/habitat/istanbul1996
68
https://www.un.org/en/conferences/environment/newyork2000
69
https://www.un.org/en/conferences/environment/newyork2015
70
https://www.un.org/en/climatechange/paris-agreement
71
https://portal.fiocruz.br/cadernos-cris

42
Nações Unidas que não somente não pôde evitar inúmeras guerras e conflitos de diversas
intensidades, como tampouco conseguiu transformar em realidade o propósito do
desenvolvimento e a efetivação dos direitos humanos. Vimos como a culpa não deve ser
atribuída à ONU, mas à falta de ética que acomete aos principais atores das relações
internacionais, os únicos que podem, pela posição que ocupam, fazer diferença.

Não é de estranhar que nesse contexto, oligarcas, mais ricos e poderosos que a maioria
dos países do mundo, surjam como os possíveis realizadores de utopias. Vendedores de ilusões
e de passagens para viagens no espaço, anunciam que as regulações são as que impedem o voo
da liberdade e as possibilidades do empreendedorismo e, por isso, é preciso livrar-se delas. O
êxito como empreendedores os legitima junto a importantes segmentos da população que,
frustrados com as promessas que nunca vieram, jogam-se abraçados à ilusão de novos bezerros
de ouro. Fanatizados, armam-se de ódio e de violência contra tudo o que está aí, produto de
enganos e desilusões. Vestidos com bandeiras que, em sua imaginação, os identificam como
cidadãos nacionais de bem, vociferam contra tudo que ameaça a sua identidade. Enquanto isso,
os donos de plataformas digitais, permitem a ventilação da desinformação com vistas a levar
adiante o projeto de desregulação completa, valorizando o individualismo extremado,
desfazendo os laços comunitários de solidariedade e compreensão mútua, disciplinando os
congressos nacionais, direcionado os mercados para servir a seus próprios interesses. Do outro
lado da cerca, os oligarcas, como deuses do Olimpo, olham divertidos o andamento da
demolição, cientes que a destruição é condição para a construção, sem os empecilhos do
modelo anterior. A demolição em andamento implode a democracia em favor da oligarquia. O
Senador norte-americano Bernie Sanders ilustra o ponto no vídeo disponível no YouTube
“Welcome to the world of oligarchy”72.

Conclusão

O projeto das Nações Unidas baseadas nas três ideias fundamentais era, e é, o único
que serviria no fim da Segunda Guerra. O único que faria possível a reconstrução de um mundo
partido com os golpes da mais brutal barbárie. Sobreviveu à Guerra Fria porque as ideologias
que se contrapunham mantinham um princípio básico de convivência. Com o domínio do
neoliberalismo com Margareth Thatcher, primeiro, e Ronald Reagan, depois, avançou a
proposta de desregulação da economia, solicitada pelas grandes corporações. A desregulação
invadiu a política, os lobbys cresceram e muitos passaram a pedir a redução do tamanho do
Estado, que vinha junto com o projeto de desregulação. O sistema financeiro cresceu várias
vezes mais que a economia. Alguns até diziam que a economia real, aquela do homem comum,
nada tinha a ver com a economia financeira, a dos yuppies e dos lobos de Wall Street. As fortunas
aumentaram exponencialmente e a desigualdade também. Número inferior a 0.01 da população
mundial tem mais poder e dinheiro que a metade mais pobre da população mundial. O modelo
é francamente insustentável para a democracia. Por isso é preciso substitui-la pela oligarquia.

A desregulação conduziu à lei da selva, onde inexiste a ética e a Civilização, que é o seu
resultado. É preciso resgatar os valores que fizeram a Civilização. É preciso resgatar a ética, em
toda a sua profundidade. Para isso é preciso que a sociedade civil se mobilize contra a fome e a
pobreza; contra as desigualdades; contra o racismo e a discriminação de qualquer espécie. É
preciso que a sociedade civil se indigne contra as injustiças e a falta de solidariedade e que
reconheça e respeite o outro, que é aquele a quem se deve reconhecer como irmão e assim

72
https://youtu.be/79KDKWEOJ1s?si=GJCzZP8xF_8pygAH

43
respeitá-lo, independentemente de raça, etnia, cor, condição social, cultural ou educacional e
etc. e etc., pois a lista é infinita.

Somente assim, com a realização de Nós, os povos, teremos as Nações Unidas que
precisamos para o mundo que queremos.

44
O ano começou com grandes movimentos na Governança da Saúde Global

Paula Reges
Luana Bermudez
Luiz Augusto Galvão

Resumo. A retirada dos Estados Unidos da OMS sob Trump representa um ataque ao
multilateralismo e à ciência. A decisão pode refletir o avanço de políticas nacionalistas e
negacionistas, desacreditando evidências científicas e minando a governança da saúde global.
Nesse contexto, o Brasil e o Sul Global têm um papel essencial na defesa da saúde pública
internacional. Os mecanismos de cooperação em redes e fortalecimentos dos laços Sul-Sul
podem ser estratégias de reestruturação. Diante das crescentes ameaças sanitárias, o
fortalecimento da OMS e das redes de colaboração global são fundamentais. O Brasil pode
liderar essa agenda, promovendo uma arquitetura de saúde mais equitativa, resiliente e
comprometida com os direitos humanos. Neste meandro, acontece em Genebra a 156ª reunião
do Conselho Executivo da OMS, em um momento crítico da governança global da saúde,
marcado por desafios como financiamento, preparação pandêmica, ameaças emergentes,
mudanças climáticas e a necessidade de cooperação multilateral reforçada. As decisões
tomadas nesta reunião influenciarão a Assembleia Mundial da Saúde e definirão prioridades
para 2025, consolidando a OMS como peça central na resposta a emergências e fortalecimento
dos sistemas de saúde globais.

Palavras-chave: OMS, Trump, EB, Saúde global

Abstract. The United States’ withdrawal from the WHO under Trump represents an attack on
multilateralism and science. The decision may reflect the advancement of nationalist and
denialist policies, discrediting scientific evidence and undermining global health governance. In
this context, Brazil and the Global South have an essential role in defending international public
health. Network cooperation mechanisms and strengthening South-South ties can be
restructuring strategies. In the face of growing health threats, strengthening the WHO and
global collaboration networks is essential. Brazil can lead this agenda, promoting a more
equitable, resilient health architecture that is committed to human rights. In this context, the
156th meeting of the WHO Executive Board is taking place in Geneva, at a critical moment in
global health governance, marked by challenges such as financing, pandemic preparedness,
emerging threats, climate change, and the need for strengthened multilateral cooperation. The
decisions taken at this meeting will influence the World Health Assembly and set priorities for
2025, consolidating WHO as a central player in responding to emergencies and strengthening
global health systems.

Keywords: WHO, Trump, EB, Global health

O novo cenário global de saúde

Cumprindo uma promessa de campanha, o presidente Donald Trump anunciou a


retirada dos Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde (OMS) no início de seu segundo

45
mandato. Com isso, tentou completar um movimento iniciado em julho de 2020, quando
notificou oficialmente o abandono da organização. Embora o governo de Joe Biden tenha
revertido a decisão, a retórica de Trump não pode ser compreendida apenas como um
afastamento diplomático; é um ataque ao multilateralismo, à cooperação internacional e à
ciência de qualidade e compromisso com a solidariedade global e premissas para equidade. A
retirada dos EUA da OMS e suas iniciativas anti-científicas, como o apoio a políticas
negacionistas e a desinformação sobre a pandemia de Covid-19, por exemplo, colocam em risco
progressos históricos, como os alcançados pela resposta internacional ao HIV e outras
emergências sanitárias. Ademais, a limitação a sistemas de dados globais também enfraquece a
ciência em sua maior amplitude. Os recentes ataques a agência norteamericana de suporte
internacional, USAID, também fragiliza cenários e potencializa novas emergências humanitárias,
com crises de saúde e da paz. A visão de Trump, e de seu governo, de uma soberania nacional
absoluta, que desconsidera os princípios da solidariedade global e os compromissos
internacionais, reflete a ascensão de políticas nacionalistas que rejeitam a colaboração em
temas globais, como as mudanças climáticas e a saúde. A recusa em apoiar a OMS e a suspensão
do financiamento norte-americano à organização geram um vazio de liderança, e exige da
comunidade global novas estratégias de realinhamento colaborativo internacional, com
múltiplas frentes de trabalho.

A realidade enfrentada pela OMS e as iniciativas globais de saúde reflete um panorama


desafiador: a ameaça crescente do neoliberalismo epidemiológico, desconsiderando as
evidências científicas e colocando em risco populações vulneráveis. No contexto de emergências
de saúde pública, como o H5N1 e a reemergência de Mpox, o impacto de um sistema de saúde
enfraquecido é ainda mais crítico, especialmente para os países do Sul Global. Para lidar com
essas ameaças, o fortalecimento da cooperação internacional e a defesa de políticas de saúde
baseadas em evidências tornam-se essenciais.

A OMS, em sua missão de coordenar a resposta global à saúde, tem sido um pilar
fundamental na implementação de políticas baseadas em evidências científicas. No entanto, a
saída dos Estados Unidos e a crescente politização das questões de saúde pública, como vimos
na resposta à pandemia de Covid-19, põem em risco a integridade do multilateralismo e a
capacidade da organização de agir de maneira eficaz. A politização resultou em críticas
infundadas contra cientistas e em políticas que ignoram o bem-estar coletivo, em favor de
interesses econômicos e ideológicos.

A Organização é fundamental para a coordenação internacional da saúde e para a


criação de políticas baseadas em evidências científicas. Seu papel vai além de coordenar
respostas emergenciais; ela é responsável por fomentar e disseminar o conhecimento
necessário para que os sistemas de saúde adotem boas práticas e para que governos e
instituições internacionais adotem políticas públicas informadas. Ao longo dos anos, a OMS tem
sido peça chave na produção de normas e diretrizes para combater doenças, como a definição
de lista de medicamentos essenciais, a classificação de doenças e o fornecimento de dados
cruciais para a saúde pública mundial. A desqualificação de cientistas e pesquisadores podem
ser vistas como um ataque à integridade da ciência.

Em relação à pandemia de HIV, a OMS desempenhou um papel crucial, tanto na


definição de políticas globais quanto na implementação de práticas de prevenção e tratamento.
Contudo, a ascensão de governos que promovem políticas de desinformação e negacionismo
coloca a resposta ao HIV em risco. O movimento crescente contra os direitos humanos, com

46
ênfase em leis punitivas e estigmatizantes, também compromete a luta contra a epidemia, como
observado em países como Uganda e Rússia.

Com as crescentes dificuldades enfrentadas pela OMS e as ameaças ao financiamento


de iniciativas globais, o papel do Brasil torna-se ainda mais relevante. O país, aliado a outros
membros do Sul Global, pode liderar a defesa dos direitos humanos e da saúde coletiva,
articulando políticas que desafiem o retrocesso promovido por governos conservadores. A
cooperação entre nações do Sul Global tem o potencial de redefinir a arquitetura da saúde
pública internacional, promovendo soluções mais justas e inclusivas.

Diante desse cenário, o Brasil se posiciona como um agente crucial na saúde global,
especialmente em um momento em que a OMS enfrenta desafios financeiros e institucionais
sem precedentes. A cooperação Sul-Sul tem sido um elemento chave para a resposta a
emergências de saúde pública, como os surtos de Mpox e a preparação para pandemias futuras.
O país tem uma longa trajetória de contribuição para iniciativas de saúde pública internacional,
particularmente na cooperação Sul-Sul. Isso inclui parcerias com organizações como a Fiocruz,
bem como com países da África e da América Latina para promover a resposta a emergências
sanitárias. A experiência do Brasil no enfrentamento de doenças infecciosas, como a tuberculose
e o HIV, oferece um modelo de sucesso para outras nações em desenvolvimento. No entanto,
diante do enfraquecimento da OMS e das tentativas de desmantelamento do sistema
multilateral de saúde, a responsabilidade do Brasil se torna ainda maior.

O Brasil, através da estruturação participativa do Sistema Único de Saúde (SUS), com


sua experiência em saúde pública e sua infraestrutura de pesquisa, tem a capacidade de liderar
uma abordagem mais inclusiva e baseada em direitos humanos, ao mesmo tempo em que
oferece soluções locais para problemas globais. A experiência, por exemplo, da Fiocruz, com
cooperação com países como Moçambique, e com organizações como a Africa CDC,
demonstram o poder transformador da colaboração entre países do Sul Global, que
compartilham desafios e podem trabalhar em conjunto para fortalecer seus sistemas de saúde.

A ameaça do retrocesso nas políticas de saúde pública, alimentada pela desinformação


e pela desqualificação da ciência, representa um desafio monumental para a OMS e para a saúde
global. A resposta do Brasil, junto a outros países do Sul Global, pode ser determinante para a
construção de um futuro mais seguro e equitativo, onde a saúde pública seja tratada como um
direito humano fundamental e onde a cooperação internacional seja o pilar para a prevenção e
resposta a emergências sanitárias globais.

O 156º Conselho Executivo da OMS: Contexto Geopolítico e Desafios Emergentes

O 156º Conselho Executivo (EB 156, sigla em inglês para Executive Board) da
Organização Mundial da Saúde (OMS) é um dos principais órgãos de governança da instituição,
composto por 34 Estados-membros eleitos pela Assembleia Mundial da Saúde (AMS) por
mandatos de três anos. Sua função é implementar as decisões e diretrizes da AMS, aconselhar
sobre questões políticas e preparar a agenda da próxima Assembleia. O 156º Conselho Executivo
da OMS ocorre em um momento de transformações e desafios significativos para a governança
global da saúde, marcado por mudanças geopolíticas, discussões sobre financiamento e
resposta a emergências sanitárias. Esse encontro, realizado anualmente em dois momentos,
antes e após a AMS, reúne os 34 Estados-membros para deliberar sobre questões críticas que
impactam a saúde pública mundial. Neste ano, os debates se inserem em um contexto de
desafios persistentes, como o fortalecimento da preparação e resposta a pandemias, o
financiamento sustentável para a OMS e a regulação de práticas prejudiciais à saúde pública,

47
como o marketing digital de substitutos do leite materno. Além disso, os reflexos do cenário
geopolítico global, com disputas sobre o financiamento da OMS e a fragmentação da
cooperação multilateral, impõem camadas adicionais de complexidade às discussões.

O EB 156 tem um papel estratégico na definição da agenda da Assembleia Mundial da


Saúde (WHA), o principal órgão decisório da OMS. Entre os temas mais aguardados para esta
sessão, destacam-se:

-Financiamento sustentável da OMS: A OMS continua sua busca por um modelo de


financiamento mais previsível e sustentável, evitando a dependência excessiva de contribuições
voluntárias de doadores.

-Prevenção, Preparação e Resposta a Pandemias (PPPR): Avanços no Acordo Pandêmico


e a implementação das reformas no Regulamento Sanitário Internacional (RSI) são temas
centrais, dada a urgência de fortalecer mecanismos globais para lidar com futuras emergências
de saúde.

-Mudanças na governança global da saúde: A reconfiguração dos papeis das agências


internacionais, a influência de atores privados e a necessidade de maior participação dos países
do Sul Global são temas que permeiam as discussões.

-A ameaça do H5N1 e outras doenças emergentes: O surto crescente de gripe aviária e


suas implicações para a saúde humana e animal têm colocado a vigilância epidemiológica e a
resposta global em foco.

-Regulação do marketing digital de substitutos do leite materno: Tema liderado pelo


Brasil e México, essa resolução busca garantir maior controle sobre práticas de publicidade
digital que minam as recomendações da OMS e impactam negativamente a saúde infantil.

O discurso de abertura do Diretor-Geral da OMS, Dr. Tedros Adhanom Ghebreyesus,


destacou uma série de desafios e prioridades que moldarão as decisões do EB 156. Entre os
principais eixos abordados, destacam-se:

● Prevenção e Preparação para Pandemias: Dr. Tedros ressaltou que o mundo não pode
repetir os erros cometidos durante a pandemia de COVID-19. Ele enfatizou a necessidade
de acelerar as negociações sobre o Acordo Pandêmico e a reforma do Regulamento
Sanitário Internacional, garantindo que mecanismos de resposta sejam fortalecidos e que a
equidade no acesso a contramedidas médicas seja priorizada.

● Financiamento Sustentável da OMS: O Diretor-Geral alertou para os riscos de uma OMS


financeiramente instável e destacou a importância do aumento das contribuições

48
obrigatórias dos Estados-membros, para garantir maior previsibilidade no financiamento da
organização.

● Doenças Emergentes e Ameaças Biológicas: O surto de H5N1 e outras zoonoses foram


mencionados como preocupações crescentes, com Tedros enfatizando a necessidade de
vigilância epidemiológica reforçada e de uma abordagem “Uma Só Saúde” que integre saúde
humana, animal e ambiental.

● Atenção Primária à Saúde e Cobertura Universal: A equidade no acesso a serviços essenciais


continua sendo um dos pilares da OMS, com ênfase na necessidade de investimentos em
sistemas de saúde resilientes e na redução das desigualdades globais.

● A Regulação do Marketing Digital de Substitutos do Leite Materno: Tedros destacou que a


influência do marketing digital sobre os hábitos de alimentação infantil tem consequências
diretas para a saúde pública, tornando urgente a adoção de medidas regulatórias para
conter essas práticas prejudiciais.

● O Papel do Sul Global na Governança da Saúde: A importância de uma maior participação


dos países em desenvolvimento nas decisões da OMS foi um ponto forte do discurso,
reforçando a necessidade de um modelo de governança mais inclusivo e representativo.

O Secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Complexo Econômico-Industrial da


Saúde (SECTICS), Carlos Gadelha, chefe da delegação do Ministério da Saúde ao EB, destacou
em sua fala de abertura o compromisso do Brasil com o multilateralismo, a cooperação
internacional e a solidariedade como pilares fundamentais para o bem-estar das populações.
Ele reforçou a importância de um financiamento sustentável para a OMS, lembrando que o país
apoiou a realização de uma rodada de investimentos da Organização durante sua Presidência
do G20. Também mencionou a importância da criação da Coalizão Global para fortalecer a
produção local e regional, uma iniciativa lançada pelo Brasil no G20 para ampliar o acesso a
tecnologias em saúde, com foco nos mais vulneráveis. Além disso, ressaltou a necessidade de
tornar os sistemas de saúde mais equitativos, com melhor governança de dados, capacitação da
força de trabalho e maior participação social. O Secretário ainda destacou a proposta brasileira,
apoiada por 16 países, para regulamentar a publicidade digital de substitutos do leite materno.
Para concluir, reafirmou o compromisso do Brasil com a agenda de clima e saúde, ressaltando a
Declaração Ministerial do G20 sobre o tema e os preparativos para a COP-30.

Logo no primeiro dia de reunião, em 3 de fevereiro de 2025, ficou evidente a expressão


de unanimidade dos países no apoio à OMS. Ressaltaram a necessidade de diálogo diplomático
para tentar reverter a decisão norte-americana. Israel destacou que a saída dos EUA não se
limita a uma questão financeira, mas ameaça a credibilidade da OMS junto à comunidade
científica e à indústria. Já o Senegal defendeu uma mobilização da diplomacia sanitária para
convencer Washington a reconsiderar sua posição. Mesmo sem uma manifestação formal dos
representantes norte-americanos na reunião, a ausência de uma postura combativa sugere uma
margem para negociação. A falta de participação ativa da nova representante dos EUA em
Genebra reforça essa incerteza diplomática. Os EUA estavam representados por Michael Lim
and Steve Smith, e não houve participação de Tressa Rae Finerty, a nova Chargé d’Affaires na
missão estadunidense em Genebra.

A retirada dos EUA compromete um dos pilares financeiros da OMS, uma vez que o país
era seu maior contribuinte. Entretanto, os demais grandes financiadores – União Europeia,
Alemanha, Reino Unido, China, Japão, Canadá e França – reafirmaram seu apoio, com destaque

49
para a Alemanha, que se posicionou como defensora do multilateralismo e pediu um
compromisso mais sólido dos Estados-membros. O Reino Unido anunciou um novo aporte
flexível para a OMS, enquanto a China ressaltou a necessidade de reduzir as desigualdades no
acesso à saúde. França defendeu reformas no financiamento para evitar um enfraquecimento
institucional que poderia comprometer a resposta global a emergências sanitárias.

A questão financeira também foi abordada na proposta de aumento das contribuições


obrigatórias dos países em 20%, seguindo um plano aprovado na Assembleia Mundial da Saúde
de 2023, que prevê que até 2030 essas contribuições cubram 50% do orçamento da OMS. No
entanto, diante da incerteza sobre os recursos, foi sugerida uma redução no orçamento base da
organização para 2026-2027.

A retirada dos EUA ameaça desproporcionalmente os países em desenvolvimento,


especialmente na África, onde os programas financiados por doações norte-americanas são
essenciais.

Tedros rebateu os argumentos da administração Trump, que justificou a saída dos EUA
alegando falhas na governança da OMS. Segundo o diretor-geral, a organização implementou as
reformas mais abrangentes de sua história nos últimos sete anos, corrigindo fragilidades
estruturais e aprimorando a transparência e a prestação de contas. O Diretor Geral da OMS
também contestou a alegação de que os EUA eram explorados financeiramente, destacando
que as contribuições voluntárias do país sempre foram superiores às obrigatórias, e que a OMS
tem trabalhado para reduzir sua dependência de poucos doadores.

Quanto à resposta à COVID-19, Tedros defendeu que a OMS agiu rapidamente, emitindo
alertas e diretrizes antes mesmo do primeiro óbito oficial na China. Ele mencionou que a
organização adotou mais de 300 recomendações de revisões independentes e criou novas
estruturas, como o Fundo Pandêmico e o Hub de Inteligência Epidemiológica, para fortalecer a
segurança sanitária global. Por fim, ele rejeitou a acusação de que a OMS estaria sujeita à
influência política inadequada de determinados países, afirmando que a organização mantém
sua imparcialidade ao seguir a ciência como principal critério de decisão.

A crise desencadeada pela saída dos EUA coloca em evidência a fragilidade do


financiamento da OMS, que historicamente depende de doações voluntárias e enfrenta
dificuldades para manter uma previsibilidade. A proposta de aumento das contribuições
obrigatórias visa reduzir essa vulnerabilidade, mas pode encontrar resistência entre os países
com menor capacidade fiscal.

Outro ponto debatido no EB foi a necessidade de aprimorar a eficiência da OMS,


evitando a dispersão de esforços em resoluções excessivas. Com 23 propostas a serem
analisadas na Assembleia Mundial da Saúde em maio, há o risco de diluição das prioridades
estratégicas.

Além disso, o Conselho Executivo discutirá os procedimentos a serem seguidos caso haja
queixas formais contra o diretor-geral, evidenciando um crescente escrutínio sobre a liderança
da organização.

A saída dos EUA da OMS representa um desafio crítico para a governança da saúde
global, impactando desde o financiamento da organização até a implementação de programas
essenciais, sobretudo nos países mais vulneráveis. A reação dos demais membros demonstra

50
um compromisso com o multilateralismo, mas também evidencia a necessidade de reformas
estruturais para garantir a sustentabilidade da OMS.

A disputa entre Tedros e a administração Trump reflete um embate maior sobre o papel
da OMS no cenário internacional e sua capacidade de manter independência política. Enquanto
a organização busca fortalecer sua base financeira e aprimorar sua governança, o futuro da
cooperação internacional em saúde dependerá de como os países equilibram seus interesses
nacionais com a necessidade de um sistema global robusto e eficiente.

Com relação aos demais tópicos, uma das iniciativas que se destacam na pauta do EB
156 é a Resolução sobre a regulação do marketing digital de substitutos do leite materno. É
liderada pelo Brasil e México, com o apoio de Armênia, Bangladesh, Chile, Colômbia, El Salvador,
Iraque, Lesoto, Noruega, Panamá, Paraguai, Peru, Eslováquia, Sri Lanka, Uruguai e Vanuatu.

A resolução surge da crescente preocupação sobre o impacto da publicidade digital na


amamentação, já que práticas de marketing abusivas têm se intensificado no ambiente online.
A OMS publicou, em novembro de 2023, uma orientação sobre medidas regulatórias para
restringir essa publicidade, baseada em evidências apresentadas na 75ª Assembleia Mundial da
Saúde em 2022 e discutidas por 65 Estados-membros e organizações da sociedade civil durante
consulta pública realizada em setembro de 2023.

Segundo o UNICEF, o marketing digital de substitutos do leite materno tem


características que tornam sua regulação mais complexa, pois envolve múltiplos atores da
cadeia de fornecimento digital, incluindo plataformas de mídia social, anunciantes online e
provedores de internet. No entanto, estudos indicam que países que adotaram mecanismos
robustos de monitoramento e conformidade em suas legislações registraram taxas mais altas
de amamentação. Isso reforça a necessidade de implementar a orientação da OMS sobre o
tema, que já foi respaldada por um amplo processo de consulta pública. Enfatiza-se assim a
necessidade de regulação, apontando que:

● As práticas de marketing proibidas pelo Código Internacional de Comercialização de


Substitutos do Leite Materno agora predominam no espaço digital.

● O ecossistema digital envolve múltiplos atores, como plataformas de redes sociais,


anunciantes online e provedores de serviço de internet, além dos fabricantes e
distribuidores.

● Os governos precisam estabelecer mecanismos específicos de implementação e


cumprimento da legislação, atribuindo responsabilidades legais a cada um desses atores.

● Monitoramento e cumprimento da regulamentação podem ser viabilizados sem custos


excessivos para os governos, já que plataformas digitais já regulam conteúdos para outras
indústrias, como farmacêutica, tabaco e bebidas alcoólicas.

● A implementação de medidas regulatórias é essencial para proteger a amamentação e


melhorar os indicadores de saúde infantil globalmente.

A proposta defendida pelo Brasil destaca que a regulamentação não requer


investimentos excessivos dos governos, pois outras partes envolvidas no ecossistema digital já
possuem mecanismos para controlar conteúdos regulados, como ocorre com a publicidade de
produtos farmacêuticos, tabaco e álcool. Assim, a iniciativa busca garantir que os interesses
comerciais da indústria de fórmulas infantis não comprometam políticas públicas baseadas em

51
evidências científicas. O Brasil tem desempenhado um papel de liderança nessa discussão,
reforçando sua histórica defesa de políticas de saúde pública e regulação de interesses
comerciais que impactam a saúde infantil. A resolução será debatida no EB 156 sob o Item 14
da agenda, relacionado à Estratégia Global para a Saúde de Mulheres, Crianças e Adolescentes.

O EB 156 representa um momento crítico para definir os rumos da saúde global em um


cenário de incertezas geopolíticas e desafios sanitários emergentes. O Brasil, ao assumir a
liderança na discussão sobre a regulação do marketing digital de substitutos do leite materno,
fortalece seu papel na governança global da saúde, alinhando-se a uma agenda que prioriza a
equidade e o direito à saúde. Além disso, o discurso do Dr. Tedros reforça a necessidade de
compromissos concretos para enfrentar pandemias futuras, garantir o financiamento
sustentável da OMS, fortalecendo o financiamento da OMS e reduzindo a vulnerabilidade da
instituição frente a interesses externos. Ademais, fortalecer a participação dos países do Sul
Global nas decisões estratégicas é essencial para equidade global em saúde. O desdobramento
dessas discussões no EB 156 será fundamental para moldar a agenda da saúde global em 2025
e além.

E a OPAS?

O blog Monitor da Saúde, escrito por André Medici, publicou um apanhado sobre as
consequências para a OPS das mudanças nas políticas dos EUA sobre o financiamento e as
operações da Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS). Ele destacou que a retirada dos EUA
da Organização Mundial da Saúde (OMS) iniciada pelo presidente Donald Trump e o
subsequente congelamento temporário dos fundos de ajuda internacional podem ter
implicações na OPAS, que depende significativamente das contribuições dos EUA. Também
fornece uma visão geral das fontes de financiamento da OPAS e da importância histórica da
OPAS para a política de saúde dos EUA.

Principais conclusões:

● Retirada dos EUA da OMS: A ordem executiva do presidente Trump para retirar os EUA da
OMS e o congelamento temporário dos fundos de ajuda internacional criaram incerteza e
possíveis interrupções no financiamento global da saúde, inclusive para a OPAS.

● Fontes de financiamento para a OPAS: O orçamento da OPAS para o biênio 2022–2023 foi
derivado de contribuições avaliadas dos Estados Membros (20%), contribuições voluntárias
(37%), alocações da OMS (16%), outras fontes (9%) e programas especiais e fundos de
emergência (30%).

● Dependência dos EUA Contribuições: A OPAS depende fortemente das contribuições dos
EUA, tanto avaliadas quanto voluntárias. Quaisquer mudanças nas políticas de
financiamento dos EUA podem impactar significativamente a estabilidade financeira da
OPAS e sua capacidade de apoiar iniciativas de saúde nas Américas.

● Importância histórica da OPAS para os EUA: Os EUA desempenharam um papel crucial no


estabelecimento da OPAS e se beneficiaram de suas atividades, particularmente no controle
de doenças infecciosas e no apoio à segurança sanitária regional.

● Impacto potencial dos cortes de financiamento: As reduções nas contribuições dos EUA
podem prejudicar a capacidade da OPAS de responder aos desafios da saúde pública,
afetando os programas essenciais de saúde e a segurança sanitária regional.

52
● Importância estratégica: O trabalho da OPAS na vigilância de doenças, programas de
erradicação e gestão de crises de saúde é vital para minimizar os riscos à saúde dos EUA, da
América Latina e do Caribe.

● Incerteza futura: As contribuições futuras exatas dos EUA para a OPAS permanecem incertas
e dependerão de decisões políticas em andamento, alocações orçamentárias e
considerações geopolíticas.

Apesar da incerteza do momento, muitos atores esperam que o impacto na OPAS seja
limitado, pois, embora tenha grande dependência dos EUA, a organização possui personalidade
jurídica própria e não depende da OMS. Esse aspecto se reflete em seu financiamento, que, em
grande parte, é independente da OMS. Além disso, os indícios sugerem que o alvo dos EUA é
especificamente a OMS. Em 2020, por exemplo, quando os EUA anunciaram sua saída da OMS,
continuaram participando ativamente da OPAS e mantiveram seu financiamento. No entanto, é
fundamental permanecer vigilante sobre os desdobramentos desse tema, especialmente no
contexto da elaboração do plano estratégico da organização para o período de 2026 a 2031, cuja
aprovação está prevista para ocorrer no Conselho Diretivo em setembro deste ano.

53
O sentido e o impacto da retirada dos Estados Unidos da OMS73

Deisy Ventura

Cumprindo uma promessa de campanha, o presidente Donald Trump anunciou a


retirada dos Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde (OMS) já nas primeiras horas do
seu novo mandato. Com isto, busca completar o que começou em julho de 2020, ao final de seu
primeiro governo, quando já havia notificado oficialmente o abandono da organização.
Derrotado por Joe Biden nas eleições presidenciais, Trump teve sua iniciativa revertida no início
de 2021.

Do ponto de vista jurídico, a notificação de retirada levaria um ano para produzir os seus
efeitos. No entanto, não estamos diante de um simples afastamento, e sim de uma ruptura
estrondosa. Trump anunciou igualmente: a suspensão imediata de qualquer forma de
financiamento ou apoio do governo norte-americano à OMS; a ordem de retorno à Washington
dos servidores ou contratados dos Estados Unidos que desempenhem alguma função na
organização; e a retirada das negociações do acordo sobre pandemias, e também recusará as
emendas ao Regulamento Sanitário Internacional recentemente adotadas.

Sendo os Estados Unidos um dos principais financiadores da OMS, com o perdão pela
analogia, é claro que não estamos diante de uma separação amigável, e sim de um divórcio
litigioso, daqueles que incluem disputas pela partilha dos bens e pela guarda dos filhos.

Esta ruptura necessita ser interpretada em ao menos três dimensões.

Em primeiro lugar, a mais evidente: sair da OMS faz parte de um amplo e vigoroso
ataque ao multilateralismo, sendo anunciada a ruptura de outros compromissos internacionais,
entre eles os relativos a mudanças climáticas, também abandonados no primeiro mandato de
Trump. Sob o pretexto de defender a soberania nacional absoluta – no caso, a dos Estados
Unidos, eis que a dos demais países é por eles aviltada de forma sistemática, tanto por
republicanos como por democratas –, é bastante conhecida e comentada a aversão de Trump e
de suas bases de apoio à cooperação multilateral e às organizações internacionais, personagens

73
Publicado orginalmente no Jornal da USP, edição de 21/01/2025, reproduzido com autorização da
autora. Acesso ao original: O sentido e o impacto da retirada dos Estados Unidos da OMS – Jornal da USP

54
frequentes de mentiras deslavadas e dos enredos de teorias conspiratórias. Em setembro de
2020, por exemplo, a Casa Branca afirmou, em nota oficial, que a OMS não havia demonstrado
independência em relação ao Partido Comunista Chinês, entre outras pérolas. Na verdade, a
ferrenha oposição das extremas direitas ao sistema da Organização das Nações Unidas (ONU)
está relacionada principalmente à promoção de direitos individuais e coletivos pelo sistema
onusiano, que são contestados por alianças transnacionais conservadoras.

Em segundo lugar, é preciso reconhecer as especificidades da OMS. Coordenadora da


atuação internacional em matéria de saúde, sua essência é a defesa das evidências científicas
como base para a tomada de decisão e a elaboração de políticas de saúde. É fácil entender que,
composta de 194 Estados-membros com notável heterogeneidade política, religiosa e cultural,
cujos interesses ela é obrigada a compatibilizar, outra linguagem que não fosse a científica não
seria possível nem desejável.

Longe de ser perfeita, porém, a OMS é imprescindível. Por meio de seus comitês de
especialistas, órgãos e parcerias, ela fomenta, produz e difunde evidências científicas,
cumprindo missões que vão da elaboração de lista de medicamentos essenciais à classificação
internacional das doenças, passando por padrões que cotidianamente funcionam como
parâmetros para sistemas e profissionais de saúde, legisladores, pesquisadores, entidades
sociais, mídias etc.

Ora, para aqueles que pretendem impor as suas visões de mundo e os seus interesses
pessoais à coletividade, nada poderia ser mais inconveniente do que a atuação da OMS. Quando
trazidos para o terreno das evidências científicas, extremistas como o presidente Trump buscam
desqualificar os cientistas e pesquisadores, ou forjar evidências que sirvam aos seus objetivos
políticos imediatos. Esta prática recorrente gera falsas controvérsias científicas que, mesmo
quando desmentidas, causam estragos difíceis de reverter, entre eles morte e adoecimento
evitáveis, autoridades sanitárias desacreditadas e populações confusas. Neste plano, operam
publicações predatórias, ausência de regulação adequada da difusão de informações,
impunidade de quem atenta contra a saúde pública etc.

Infelizmente, pela emoção que é capaz de causar e pelo hermetismo da linguagem


científica, a saúde funciona como um nervo exposto, com potenciais sensibilidade e irradiação
que se prestam perfeitamente à propaganda ideológica e à desinformação. A posição da OMS
em favor da completa descriminalização do aborto, com amplo fundamento científico, é um
exemplo cabal do quanto evidências podem contrariar ambições políticas e religiosas baseadas
em preconceitos e crenças que não podem ser impostos à coletividade. Do mesmo modo, os
ataques às pessoas trans causam danos inestimáveis a elas e ao conjunto da sociedade, com
importantes repercussões sobre a sua integridade física e mental.

A politização da resposta à covid-19 nos Estados Unidos é outro exemplo fundamental.


As recomendações da OMS foram apresentadas pela base de Trump como ameaças à forma de
vida, à liberdade, à segurança e à economia norte-americanas, ou seja, como o contrário do que
elas de fato foram. As conferências de imprensa da OMS funcionaram como pedras no sapato
do presidente, pois fortaleciam as autoridades sanitárias independentes e todos aqueles que
buscavam conter a propagação da doença, enquanto Trump recomendava a ingestão de
desinfetantes e defendia tratamentos sem eficácia comprovada como forma de incitar a
população ao contágio.

Entre as críticas inesquecíveis à OMS, recordo a da consultora do alto escalão


governamental, Kellyanne Conway, a mesma que apresentou mentiras do presidente como

55
“fatos paralelos”, que declarou: “Isto é covid-19, não covid-1, pessoal. Seria de esperar que as
pessoas encarregadas dos fatos e números da OMS estivessem sabendo disso”, jogando com o
nome da doença para dar a entender que aquele seria o seu décimo nono surto, quando, como
sabemos, 2019 é o ano em que o vírus foi reconhecido.

A abordagem da pandemia que se afirma nos Estados Unidos é um risco não apenas
para o país, mas também para o mundo. Vale recordar que, em 2017, Trump eliminou o órgão
de preparação para emergências de saúde que havia sido criado por Barak Obama. Já anunciou
que fechará igualmente órgão similar criado por Biden. Em entrevista à revista Time, Trump
afirmou que a preparação para pandemias não compensa porque as doenças são muito variadas
e produtos de saúde podem ficar obsoletos, sendo melhor esperar que as crises aconteçam para
avaliar o que se pode fazer.

Isto nos leva à terceira dimensão importante da análise, que é a institucional e


regulatória. Tendo o controle do Parlamento, é provável que o segundo mandato de Trump
consiga minar salvaguardas legais e institucionais que contribuíram para minimizar o impacto
negativo de seu primeiro mandato. A defesa da redução do papel regulador do Estado,
supostamente corrupto e ineficiente, é fachada para os interesses de gigantes da indústria, que
sonham com a eliminação de regras e mecanismos de vigilância que priorizam a saúde da
população em detrimento do lucro.

No discurso da vitória eleitoral, o presidente anunciou Robert Kennedy Jr. como


importante colaborador de seu governo, e pediu que ele “sacudisse” as instituições sanitárias e
remodelasse os programas nacionais de saúde, em especial a regulação de alimentos e
remédios. Agitador antivacina e negacionista contumaz, Kennedy Jr. vem lutando há anos para
que o flúor seja retirado da água tratada, entre outros desserviços à saúde.

Por certo, Trump enfrentará a resistência de governos locais e atores sociais, e também
de setores dos poderes Legislativo e Judiciário. Mas um movimento de massas, a exemplo do
que sustenta o presidente, que exerça uma oposição aguerrida à agenda extremista, parece
estar distante.

É à luz dessas três dimensões que deve ser lida a notícia divulgada em primeira mão pelo
grande jornalista Jamil Chade, que fez uma brilhante cobertura da campanha eleitoral norte-
americana de 2024, e da mesma forma oferece uma leitura única da posse do novo
presidente. Segundo Jamil, Trump anunciou que vai “identificar parceiros confiáveis e
transparentes dos Estados Unidos e internacionais para assumir as atividades necessárias
anteriormente realizadas pela OMS”, e que a Estratégia de Segurança da Saúde Global dos EUA
de 2024 deve ser substituída assim que possível.

Assim, mais do que a retirada dos Estados Unidos da OMS, há a consolidação de um polo
rival no cenário internacional, já presente no primeiro mandato de Trump, e agora fortalecido.
As alianças conservadoras transnacionais encontrarão no presidente um ativista experiente, que
domina os meandros do Estado, conhecedor de todo o potencial de caos e desinformação que
uma pandemia pode trazer. Naquilo que vem sendo chamado de neoliberalismo
epidemiológico, manifestado entre outras formas pelo uso da imunidade de rebanho por
contágio como resposta à covid-19 – cientificamente falsa e, ainda que fosse verdadeira,
eticamente inaceitável pelo número avassalador de mortes evitáveis que causa. Deixar que as
epidemias avancem pode se afirmar como uma estratégia extremista para que os mais
vulneráveis, na qualidade de indesejados, sejam eliminados.

56
O poderio econômico, político e militar dos Estados Unidos se traduz na capacidade de
estabelecer iniciativas de cooperação em saúde com países de média e baixa renda orientadas
por valores antagônicos aos da OMS. Trump pode induzir ao desrespeito a direitos conquistados,
à frente deles os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, das populações LGBTQIA+ e dos
migrantes e refugiados, além de direitos relacionados ao meio ambiente e à proteção dos povos
originários. Também está clara a sua capacidade de organizar, financiar e promover a
desinformação em saúde em escalas inéditas, considerando o lugar de honra reservado aos
grandes empresários do setor da tecnologia na nova gestão.

Assim, com 42 emergências em curso no mundo, sendo 17 delas em grau máximo, a


OMS enfrenta um duro golpe, no momento em que mais precisa ser fortalecida. A redução do
financiamento da organização, tão comentada, embora muito importante, está longe de ser o
único impacto negativo do retorno de Trump ao poder.

Cresce, então, a importância de países como o Brasil no cenário da saúde global. Nossas
tarefas são muitas. Mas isto é assunto para uma outra coluna.

57
O que esperar de um ano que começou com tanta insegurança?74

Sonia Fleury

Ameaças à democracia no mundo

O início do governo Trump já deixou claras suas posições e ações de desrespeito aos
direitos humanos e às instituições democráticas, como no caso da negação do direito de
cidadania às crianças nascidas em território dos Estados Unidos, o que fere a Emenda 14 da
Constituição e está sendo objeto de disputa judicial. Ademais, centrando seu discurso na força
e na virilidade, tomou medidas contrárias aos direitos reprodutivos e eliminou medidas
progressistas como a identificação não binária. Tornando-se símbolo do autoritarismo no
mundo, foi sufragado pelo voto popular, conseguindo apoio inusitado nas comunidades de
latinos e negros. Isso decorre de uma conjuntura na qual a falta de perspectivas e a insegurança
econômica e social tornam as classes médias baixas presas fáceis dos discursos de líderes que
pretendem resgatar valores tradicionais e lhes oferecem promessas de retorno a uma situação
idealizada.

Trump representa uma séria ameaça em relação ao aquecimento global, ao retirar o


país do Acordo de Paris - o tratado internacional sobre mudanças climáticas de 2015 - e decretar
emergência energética visando impulsionar o setor de petróleo e eliminar as medidas do New
Green Deal, como a obrigação de produção de carros elétricos. Além de aumentar os riscos dos
eventos climáticos extremos, no país cuja produção de CO2 per capita já é a maior do mundo,
certamente terá um impacto negativo na COP 30, a ser realizada em Belém, sob a presidência
do Brasil, dificultando a construção dos acordos necessários para o avanço de ações de combate
às mudanças do clima.

O anúncio da saída dos EUA da OMS terá consequências no financiamento da


organização já que são o maior doador individual (18% do orçamento) além de financiar outros
programas, por exemplo, 75% para HIV e doenças sexualmente transmissíveis e mais da metade
das contribuições para o combate à tuberculose. Mais do que o impacto financeiro, que
certamente será muito mais sentido pelos países mais pobres e que dependem desses
programas, a saída dos EUA da OMS terá consequências que afetarão a saúde global, com
grande impacto também dentro do próprio país. Como membro fundador da OMS, sua retirada
significa minar o prestígio do sistema das Nações Unidas, acentuando a tendência a sua
desimportância como mecanismo de construção de consenso e implementação de programas e
ações para solução de problemas para benefício de toda humanidade.

Trump escolheu para comandar o Department of Health and Human Services (HHS), o
equivalente ao nosso Ministério da Saúde, tendo como missão supervisionar as principais
agências de saúde do país, Robert F. Kenedy Jr, um negacionista que segue defendendo que
vacinas provocam autismo, em um país onde a cobertura vacinal já é baixa, atendendo a
pressões empresariais. Também pretende recomendar às autoridades públicas locais acabar
com a fluoretação da água. Ambas as posições, terão impactos severos na deterioração das
condições de saúde da população estadunidense. Segundo Paulo Capel “o negacionismo, em

74 Artigo publicado originalmente no blog do CEE/FIOCRUZ, em 27/01/2025. Acesso: https://cee.fiocruz.br/?q=O-que-


esperar-de-um-ano-que-comecou-com-tanta-inseguranca-Sonia-Fleury-Parte-I

58
suas diferentes expressões, das vacinas às mudanças climáticas, não é, portanto,
desinteressado. Não é apenas produto de notável ignorância. É negócio”[1].

A retirada da participação dos EUA na OMS, que ainda deve ser aprovada pelo
Parlamento, representará um grande impacto para o desenvolvimento da ciência e tecnologia
em saúde, já que importantes instituições americanas estiveram na liderança de pesquisas
médicas e participam, através da OMS, de redes que articulam a produção de informações sobre
doenças e a difusão do desenvolvimento científico. Mas já se faz sentir o peso das decisões no
setor saúde, com o cancelamento de vários eventos científicos e proibição da divulgação de
comunicações externas, como relatórios científicos regulares e avisos de saúde, pelas agências
federais de saúde. Sem falar no temor que se espalha, pelo fato de que agências dos EUA e
Rússia são as únicas detentoras do vírus da varíola, enfermidade erradicada do mundo.

Além da demissão intempestiva e, para muitos, fora dos trâmites legais, de inspetores
gerais das grandes agências federais, ligados a programas de diversidade, equidade, inclusão,
acessibilidade e meio ambiente, consolida-se a estratégia de desmonte das políticas e da
inteligência estatal em áreas diretamente vinculadas à promoção do bem-estar dos cidadãos e
preservação do bem comum ambiental. Ao designar Elon Musk para dirigir o novo
Departamento de Eficiência Governamental, mesmo gerando questões éticas pelo fato de suas
empresas prestarem serviços ao governo, o presidente mostra a direção adotada, ao pretender
reduzir o tamanho do Estado em áreas que beneficiam a cidadania e impulsionar a indústria de
ativos digitais. O desmantelamento das burocracias pode ser entendido como uma mudança na
natureza política do Estado, enfraquecendo seus componentes democráticos e robustecendo os
processos que envolvem o poder militar e empresarial, inclusive do próprio presidente, que
faturou US$ 25 bilhões em um único dia com a moeda digital que leva o seu nome.

Culturalmente, o retrocesso do governo Trump é incomensurável, e já começa a ser


sentido ao opor, de forma desonesta, a meritocracia à inclusão social, não só eliminando
políticas inclusivas, como gerando um efeito multiplicador que já começa a impactar as
empresas privadas, com a extinção de programas de emprego para grupos minoritários.
Ignorando os importantes resultados sociais e econômicos dessas políticas de inclusão, a
propagação da noção de mérito como um atributo individual, descontextualizado das condições
sociais e institucionais geradoras das capacidades, tem o efeito de legitimar a dominação de
grupos de elite com o impedimento da ascensão social de outros setores populacionais.

Já o alinhamento do governo Trump a um movimento global de articulação da direita,


em países de vários continentes, tendo como lideranças seus assessores Steve Bannon e Elon
Musk – que fizeram saudações nazistas durante a cerimônia de posse – representa um perigo
global para a democracia. Está gerando expectativas da extrema-direita, inclusive aqui no Brasil,
onde o perdão dado aos invasores do Capitólio alimenta esperanças de que, algum dia,
Bolsonaro seja anistiado. Apesar de o mandato atual do governo de Trump contar com a maioria
conservadora no Congresso, no Senado e na Corte Suprema, facilitando a aprovação de sua
agenda nacional, não é provável que tente exercer sua influência de forma violenta em países
que estejam fora do seu raio de interesse econômico e político, como o Brasil.

No entanto, a influência ideológica em torno da disputa acerca do significado da


democracia tende a se intensificar e desbordar para outros contextos nacionais. Enquanto os
liberais defendem a democracia como a garantia da lei e dos direitos, os democratas adicionam
a esses princípios a necessidade de promoção de oportunidades e medidas políticas que
assegurem a igualdade e a justiça social. Já a extrema-direita atual defende a liberdade negativa,

59
como ausência da intervenção estatal e a desregulação, atribuindo primazia ao individualismo
possessivo e competitivo sobre todos os demais valores na organização das relações econômicas
e sociais.

Além de promover o desmonte do Estado, a identificação do líder populista autoritário


com o povo que o elegeu, sem a intermediação das instituições, ameaça a distinção entre Estado
e Sociedade, invisibilizando as linhas demarcatórias que separam o poder político do poder
administrativo. Trata-se da denegação de todo aspecto normativo da ordem administrativa,
particularmente, de toda garantia universalista da representação de direitos, como expusemos
na coletânea Cidadania em Perigo – Desmonte das Políticas Sociais e Desdemocratização no
Brasil[2].

A associação entre o governo e os donos das big techs, teatralmente manifestada na


presença dos seus proprietários bilionários na cerimônia de posse, teve a intenção de deixar
clara a fase atual de um capitalismo de negócios, no qual nem mesmo a aparência de
distanciamento entre o governo, como representante do interesse geral, do capital, com seu
interesse particular, parece ser útil e precisa ser mantida. Antecedida pela subserviência
pragmática do dono da Meta, Mark Zuckerberg, e sucedida pelo anúncio de um pacote de US$
500 bilhões em investimentos em inteligência artificial, com a criação da Stargate, vão se
consolidando os laços e a interpenetração dos interesses na área de IA. Cada vez mais
desregulada, a IA é uma ameaça à democracia e à liberdade de todos os cidadãos no mundo,
aumentando o controle, espalhando desinformação e desestabilizando os adversários.

No entanto, as contradições entre o apoio popular recebido nas eleições e os interesses


egoístas daqueles que já se vêem na perspectiva de se tornarem trilionários às custas do
aumento da miséria e da desigualdade no mundo (relatório da Oxfam), devem se manifestar ao
longo do termo do governo Trump. Da mesma forma, contradições entre uma visão empresarial
e outra ideológica, representadas por Musk e Bannon, provavelmente poderão se acirrar, por
exemplo, em relação à China.

No que concerne à geopolítica, as ameaças


de anexação do Canadá, compra da Groelândia,
intervenção no canal de Panamá, aumento da
taxação de produtos importados da China, do México
e dos BRICS, mudança do nome do golfo do México,
soaram, inicialmente, como bravatas de uma retórica
imperial, para, em seguida, serem consideradas como
lances iniciais de um jogo que inaugura um processo
de negociação, no qual a barganha pode favorecer os
interesses dos EUA. Mais que mera retórica, há
interesses econômicos em disputa e o discurso inicial
teve o efeito de colocá-los na agenda política global,
embora, como diz a sabedoria popular, “o jogo só
termina quando acaba”.

Confirmando nossa análise, já se abriu um canal de negociação com a China, mas se


espera uma posição mais dura em relação ao Brics, no caso de persistir na linha de não utilização
do dólar nas relações comerciais.

Trata-se de um projeto que envolve medidas protecionistas, com aumento de tarifas


para importação, em uma tentativa de reindustrialização dos Estados Unidos, por meio de

60
redução de impostos para que as indústrias se instalem em seu território. Uma estratégia
arriscada, face ao possível aumento da inflação, que já é um dos principais problemas para a
população, em especial para as classes médias.

José Fiori pondera que há diferenças para o governo Trump, entre os graus de liberdade
no âmbito nacional e no internacional: “As políticas internas de Donald Trump envolvem
decisões soberanas e autônomas, e poderão ser tomadas sem maiores consultas a outros países
e governos. Mas, no caso da agenda internacional do novo governo, o problema é muito mais
complexo, porque envolve acordos passados dos EUA, e se enfrenta com a vontade soberana
de outros países, e de outras grandes potências, como no caso da China, do Irã, da Rússia, ou
mesmo dos seus aliados da Otan”[3].

A perspectiva imperial adotada por Trump não se coaduna com um mundo multipolar,
no qual a China vem ocupando papel crescente no desenvolvimento tecnológico e nas relações
econômicas com outras nações, estreitando suas relações com a Rússia e intensificando sua
presença econômica com investimentos em diferentes países na Rota da Seda. Assim, o vazio
deixado pela política de Trump em relação à OMS e à liderança no desenvolvimento científico e
tecnológico em saúde abre espaço para que a China busque ocupar esse lugar; efeito não
considerado no cálculo político trumpista.

Os Estados Unidos seguem sendo uma potência em termos tecnológicos, científicos e


militares, mas a postura imperial de Trump parece ser mais uma tentativa desesperada de parar
um processo de decadência em curso do que uma análise consequente das possibilidades de a
MAGA[4] restaurar a hegemonia do império norte-americano. Dados do Instituto
Tricontinental[5] mostram o deslocamento global da base econômica para o Sul. Enquanto os
países do Norte Global enfrentam um declínio prolongado no crescimento, os países do Sul
Global, sobretudo da Ásia, apresentam a trajetória de crescimento mais alta nos últimos trinta
anos[6].

A situação é ainda mais dramática quando comparados dados sobre a participação dos
Estados Unidos no PIB mundial versus 43 países do Sul Global.

A análise da fase atual do capitalismo que o Instituto Tricontinental chamou de


um hiper imperialismo decadente, alerta para os perigos da estratégia dos Estados Unidos para
conter e derrotar a China como um inimigo estratégico central, simbolizada no slogan “a paz
através da força”. Atualizando o clima de guerra fria, tal estratégia tem propiciado o crescimento
de tensões e conflitos bélicos no mundo.

A expansão da presença chinesa na América Latina é monumental, sendo que o fluxo


comercial entre América do Sul e China cresceu de US$ 15 bilhões, em 2001, para cerca de US$
300 bilhões, em 2019, aponta José Fiori.

“Dividida em blocos, e com a maior parte dos países separados ou distantes do Brasil,
por conta do contencioso venezuelano, a América do Sul deverá se manter na sua condição
tradicional de periferia econômica do sistema internacional, mesmo diversificando e ampliando
seus mercados na direção da Ásia. Para não ser assim, o Brasil terá que assumir a liderança
material do continente, construindo uma estrutura produtiva que combine indústrias de alto
valor agregado e tecnologias de ponta, com a produção de alimentos e commodities de alta
produtividade, mantendo sua condição de grande produtor de energia tradicional e energia
limpa”. Para tanto, deverá enfrentar uma concorrência acirrada e um boicote explícito de
Donald Trump[7].

61
Bibliografia
[1]https://outraspalavras.net/outrasmidias/eua-os-arautos-do-negacionismo-de-negocio/
[2] Fleury, Sonia (org). Cidadania em Perigo – Desmonte das Políticas Sociais e Desdemocratização no
Brasil. Edições Livres, Cebes. Rio de Janeiro, 2024.
[3] https://aterraeredonda.com.br/donald-trump-e-o-sistema-mundial/
[4] MAGA – Make America Great Again
[5] Instituto Tricontinental – Hiperimperialismo: um novo estágio decadente perigoso
[6] https://outraspalavras.net/geopoliticaeguerra/trump-ea-doenca-do-colonizador-ressentido/
[7] https://outraspalavras.net/descolonizacoes/a-america-do-sul-a-beira-do-futuro/

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Sobre o Direito Humano à Saúde em 2025:
Do descredito do presente à reivindicação sistêmica de uma transformação das
políticas e sistemas de saúde

Armando De Negri Filho

2024 foi um ano difícil para os direitos humanos em todo o mundo.

No âmbito dos direitos civis e políticos vimos um avanço de movimentos de extrema


direita que tergiversam e distorcem os direitos em favor de ¨liberdades¨ que impõem a
possibilidade da desinformação disfarçada de liberdade de expressão e geram uma falsificação
da realidade ao ponto de tornar impossível a dignidade humana e a ética como balizadores das
relações internacionais e no interior de cada País.

A maior expressão desta distopia na interpretação dos direitos se expressou na anestesia


frente ao genocídio na Faixa de Gaza e a impotência em frear a barbárie, renaturalizando o
colonialismo e o apartheid em um mundo sem rumo, com a reinstituição de castigos coletivos
contra populações civis, retomando as piores práticas racistas orientadas ao extermínio.

No âmbito dos direitos econômicos, sociais e culturais, a escalada das desigualdades


injustas, com o aumento desenfreado da concentração de riqueza, encontrou na narrativa
hegemônica uma naturalização perversa que reitera a ¨liberdade do mercado¨ como princípio
reitor de uma dinâmica social indiferente ao empobrecimento massivo das populações e na
defesa da desproteção social consequente às políticas de austeridade apresentadas como a
única opção para reequilibrar sociedades e economias profundamente endividadas e
dependentes dos interesses do capital financeiro. A destruição das identidades coletivas de
caráter social e cultural, esmagadas por uma cultura de consumo mediada pelo individualismo,
tornou cada vez mais difícil construir bases de solidariedade, afetando a possibilidade
redistributiva dos impostos progressivos e o acesso igualitário à serviços públicos universais
como marcos de direitos humanos coletivos e signo de direção do direito ao desenvolvimento.

Os direitos da Natureza, recentemente assumidos como referência filosófica para


orientar as ações frente a crise ambiental e climática, é objeto de uma furiosa contraofensiva
que nega os efeitos deletérios de um antropoceno destruidor da vida e sustenta um consumo
insustentável e assimétrico em seus prometidos benefícios.

Para os que prospectamos os direitos humanos como signos de materialidade do direito


universal, integral e igualitário a saúde, torna-se imperativo apoiar nossa ação em sistemas de
saúde e de seguridade social organizados segundo estes referenciais.

Por esta razão, nos informes de 2025 pretendemos conectar a dinâmica


multidimensional dos direitos humanos e da natureza, em um processo de análise que possa
conectar a agenda do Conselho dos Direitos Humanos da ONU com as dinâmicas em torno a um
novo contrato ecosocial que nos guie na análise crítica das propostas em torno aos sistemas de
saúde e sua relação com o conjunto dos direitos humanos, em seus embates com os interesses
do capital financeiro e as distorções do crescimento econômico em desfavor do direito ao
desenvolvimento.

63
O convite a esta inflexão reflexiva nos informes e na sua leitura, está relacionado com a
percepção do debilitamento crescente das politicas de saúde que propõem responder à
totalidade do direito à saúde, concedendo mais e mais ao utilitarismo e à aceitação passiva de
desigualdades injustas, baseadas em avaliações que naturalizam as exclusões sociais a partir das
regras de restrição orçamentárias derivadas das políticas de austeridade e da ideia de resiliência
como aceitação passiva das restrições discriminatórias.

A filosofia dos direitos humanos em uma tradição não liberal, necessita servir-se da
materialidade desses direitos na vida cotidiana dos povos - direitos humanos plenos baseados
no desenvolvimento e não na naturalização de um crescimento econômico que aceita o limite
dos direitos humanos mediante uma reprodução de desigualdades injustas.

Especial destaque deveria ser dado aos processos de regressão dos direitos econômicos,
sociais e culturais, pois um princípio fundamental da jurisprudência internacional aplicada a
esses direitos é o da não regressividade, hoje tornada natural pela imposição das políticas de
austeridade e das medidas coercitivas unilaterais que literalmente destrocam os sistemas
nacionais de saúde e de seguridade social das nações e populações castigados.

Por isso convidamos a uma leitura crítica da agenda do CDH e suas projeções na AGNU,
com o objetivo de entender o potencial crítico do enfoque radical dos direitos humanos como
reorientação da tendencia hegemônica de naturalizar sistemas públicos de saúde insuficientes,
segmentados e fragmentados e por consequência geradores de injustiça social, ao lançar ao
mercado todos aqueles que não alcançam seus direitos.

Não é suficiente o enunciado dos direitos, necessitamos formas orgânicas de sua


expressão no processo de construção de estados e sociedades, esta deve ser a exigência crítica
para abordar o trabalho do CDH e da AGNU.

Com esta perspectiva, abrimos este primeiro informe indicando os elementos de


localização do exercício, reconhecendo o terreno do CDH e sus linhas para 2025.

Uma leitura importante é da agenda de resoluções adotadas pela AGNU em 2024 a partir
das resoluções adotadas preliminarmente pelo Conselho de Direitos Humanos. No documento
de informes do CDH adotados pela 79ª AGNU g2415591.pdf , podemos identificar a variedade
de temas que dispõe sobre os direitos de populações frente aos processos de discriminação e
exclusão e frente às exposições a vários agravos que ameaçam a saúde, desde elementos mais
estruturais como da ordem econômica injusta até o acesso a bens essenciais como água,
alimentos e habitação, mas infelizmente pouco se afirma sobre a materialidade sistêmica de
sistemas e serviços de saúde como garantia do direito humano a saúde, como se houvesse uma
barreira que impede cruzar a linha de dimensionamento e reivindicação do direitos em sua
máxima expressão coletiva. Parece haver uma despolitização do direito à saúde como guia para
a organização de políticas e sistemas, no momento em que as agendas identitárias tomam a
centralidade na explicação das desigualdades injustas, sem incluir a vertente de classe social e,
portanto, sem explicar cabalmente a origem plena das inequidades e sua reprodução social e
econômica.

Com isso não queremos dizer que esteja totalmente ausente a vertente crítica dos
direitos humanos, particularmente presente em vários informes dos relatores especiais e
especialistas independentes, mas o que chama a atenção é que não conseguem direcionar o
rumo geral dos debates e das resoluções, restringindo-se a um conjunto de informes valentes,
porém sem maior possibilidade de mudar a natureza dos processos políticos e da ordem vigente.

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Necessitamos avaliar como reverter esta situação, o que demandará uma outra dinâmica
na aplicação dos direitos e sua vinculação com medidas que penalizem sua violação, em
particular as violações massivas e sistemáticas, ao identificar quem ganha e quem perde nas
ações que afetam coletividades e impedem a materialidade dos direitos de povos e indivíduos.
Enfoque particularmente útil para abordar a negação do direito a saúde, derivada de políticas
que tem a intenção de provocar danos ainda que não a assumam.

Elementos para um debate sobre situação e futuro da agenda dos Direitos Humanos no ano
de 2025

Como outro elemento de localização para o debate, destacamos que o Comitê


Consultivo do Conselho de Direitos Humanos concluiu sua 32ª sessão em 20 de dezembro de
2024. Comitê Consultivo do Conselho de Direitos Humanos conclui sua 32ª sessão | ACNUDH
Uma leitura de síntese nos orienta sobre os temas de vanguarda propostos para o CDH:

O Comitê Consultivo do Conselho de Direitos Humanos concluiu sua 32ª sessão, realizada
desde 16 de dezembro na Câmara de Direitos Humanos e Aliança das Civilizações (Sala XX) no
Palais des Nations em Genebra. No final da sessão, o Comitê, que serve como "think tank" do
Conselho, atuou em seis questões.

Sobre as implicações para os direitos humanos de tecnologias novas e emergentes no


domínio militar (resolução 51/22), o Comitê solicitou ao grupo de redação que apresentasse um
relatório preliminar ao Comitê Consultivo em sua 33ª sessão em fevereiro de 2025, levando em
consideração as discussões realizadas.

Sobre o impacto da desinformação no gozo e realização dos direitos humanos


(resolução 55/10), o Comitê decidiu divulgar um questionário após a sessão para buscar as
opiniões e contribuições das partes interessadas e detentores de direitos e solicitou ao grupo de
redação que apresentasse um esboço do relatório ao Comitê Consultivo em sua 33ª sessão.

Sobre a violência de gênero facilitada pela tecnologia e seu impacto sobre mulheres e
meninas (resolução 56/11), o Comitê decidiu divulgar um questionário após a sessão para buscar
as opiniões e contribuições das partes interessadas e detentores de direitos, incluindo
sobreviventes e organizações centradas em sobreviventes e sociedade civil, incluindo
organizações de direitos das mulheres e jovens Também solicitou ao grupo de redação que
apresentasse um esboço do relatório ao Consultivo Comitê em sua 33ª sessão.

Sobre as implicações da poluição plástica para o pleno gozo dos direitos humanos
(decisão 56/117), o Comitê solicitou ao grupo de redação que preparasse um projeto de
questionário para buscar as opiniões e contribuições das partes interessadas e titulares de
direitos relevantes, incluindo povos indígenas e defensores dos direitos humanos ambientais, a
ser considerado pelo Comitê Consultivo em sua 33ª sessão e enviado posteriormente.

Sobre o impacto dos sistemas de inteligência artificial na boa governança (resolução


57/5), o Comitê solicitou ao grupo de redação que preparasse um projeto de questionário para
buscar as opiniões e contribuições das partes interessadas a serem consideradas pelo Comitê
Consultivo em sua 33ª sessão e enviadas posteriormente.

Por fim, o Comitê decidiu submeter uma proposta de pesquisa intitulada Elaboração de
princípios orientadores sobre a aplicação do marco de direitos humanos à neurotecnologia,
apresentada pela membro do Comitê, Milena Costas Trascasas, para consideração e aprovação
pelo Conselho de Direitos Humanos.

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A sessão de uma semana foi aberta por Omar Zniber, presidente do Conselho de Direitos
Humanos, que disse que a representação das mulheres no Comitê atingiu a paridade de gênero,
com mais de 50% dos 18 assentos agora ocupados por mulheres. Isso representou um progresso
desde 2019, disse ele, quando apenas três especialistas do Comitê eram mulheres.

O Sr. Zniber forneceu uma visão geral do trabalho do Conselho desde fevereiro de 2024
e referiu-se à discussão presidencial informal de alto nível sobre novas tecnologias, inteligência
artificial e exclusão digital realizada em setembro de 2024, durante a qual os participantes
ressaltaram a necessidade premente de fechar a exclusão digital para evitar a exacerbação das
desigualdades globais e garantir o acesso inclusivo aos avanços tecnológicos, bem como a
urgência de estabelecer diretrizes claras para a aplicação de padrões de direitos humanos na era
digital.

O Presidente observou como os Estados, organizações não governamentais e outras


partes interessadas se envolveram na discussão com o Presidente do Comitê durante o diálogo
interativo realizado durante a 57ª sessão do Conselho de Direitos Humanos em setembro de
2024. Ele disse que todas as partes interessadas expressaram apreço pelo relatório sobre
neurotecnologia e direitos humanos apresentado durante o diálogo, que foi reconhecido por sua
exploração equilibrada das oportunidades e desafios neste campo em rápida evolução.

Durante esta sessão, presidida por Javier Palummo, o Comitê realizou uma reunião
privada com organizações não governamentais e debateu os seus métodos de trabalho.

A documentação sobre a 32ª sessão está disponível na página da sessão do Comitê


Consultivo. A 33ª sessão do Comitê Consultivo do Conselho de Direitos Humanos está
programada para ocorrer no Palais des Nations, em Genebra, de 17 a 21 de fevereiro de 2025.

Seguindo elementos importantes para entender o panorama do CDH em 2025

Conselho de Direitos Humanos elege Jürg Lauber, da Suíça, como seu presidente para 2025 |
ACNUDH

¨O Conselho de Direitos Humanos elegeu o embaixador Jürg Lauber, representante


permanente da Suíça no Escritório das Nações Unidas em Genebra, para servir como seu
presidente por um mandato de um ano a partir de 1º de janeiro de 2025.

O Conselho também elegeu os embaixadores Tareq Md Ariful Islam de Bangladesh


(Grupo de Estados da Ásia-Pacífico), Razvan Rusu da Romênia (Grupo de Estados do Leste
Europeu) e Paul Empole Losoko Efambe da República Democrática do Congo (Grupo de Estados
Africanos) para servir como vice-presidentes no próximo ano. O embaixador Efambe atuará
como relator do órgão com sede em Genebra. Um quarto vice-presidente será eleito
posteriormente do Grupo de Estados Latino-Americanos e Caribenhos.

"Lembremos que, ao defender os direitos humanos, podemos evitar danos antes que
aconteçam", disse o presidente do Conselho, embaixador Omar Zniber, do Marrocos. "Ao
promover os direitos humanos, criamos um mundo mais justo. Ao proteger os direitos humanos,
protegemos nosso futuro."

Ele acrescentou: "O Conselho de Direitos Humanos é um fórum maravilhoso, essa


ferramenta de multilateralismo por meio da qual nossas diferenças são discutidas para serem
mais bem reunidas; mas também, e acima de tudo, é um fórum onde nossa vontade comum de
construir a arquitetura global de direitos humanos é expressa e implementada."

66
O embaixador Lauber disse aos delegados dos 47 Estados-membros do Conselho: "Sou
profundamente grato a vocês por me elegerem como o 19º presidente do Conselho de Direitos
Humanos e estou ansioso para acompanhá-los nesta jornada em 2025".

Ele acrescentou: "A Suíça desempenhou um papel ativo na concepção do Conselho de


Direitos Humanos e, desde a sua criação, ajudou a torná-lo um fórum forte e eficaz para
promover a proteção de todos os direitos humanos em todo o mundo. Eu mesmo trago comigo
os valores de um país multilíngue, multirreligioso e multicultural, exemplificando os valores da
democracia, do diálogo e do consenso."

"Acredito firmemente no mandato do Conselho de Direitos Humanos e sua influência


dentro do sistema das Nações Unidas. Sua contribuição efetiva é inquestionável e merece ser
ainda mais valorizada. Tenha certeza do meu compromisso pessoal de garantir que 2025 seja um
ano de sucesso para o Conselho de Direitos Humanos ao se aproximar de seu 20º aniversário
[em 2026]."

Antes das eleições, o Conselho aprovou a nomeação de Albert Kwokwo Barume, da


República Democrática do Congo, para o cargo de Relator Especial sobre os direitos dos Povos
Indígenas. Barume substitui Francisco Cali Tzay, da Guatemala.

Anteriormente, o Conselho ouviu uma atualização de Monica Varela Garcia, Chefe do


Serviço de Interpretação e Oficial Encarregada da Divisão de Gestão de Conferências do
Escritório das Nações Unidas em Genebra, sobre os serviços de conferência prestados ao
Conselho.

O Conselho ouviu também os co-facilitadores que analisam:

• a contribuição de Genebra para o processo de revisão do status do Conselho de


Direitos Humanos da Assembleia Geral;
• novas tecnologias, inteligência artificial e exclusão digital;
• a racionalização das iniciativas e actividades criadas através das decisões do Conselho
para uma maior eficácia do programa de trabalho;
• tornar o Conselho um órgão mais eficiente e inclusivo por meio do uso de tecnologia
moderna;
• a eficiência do processo de Revisão Periódica Universal;
• enfrentar os desafios enfrentados pelas delegações de países pequenos e em
desenvolvimento, em particular pequenos Estados insulares em desenvolvimento e
países menos desenvolvidos.

Maira Mariela Macdonal Alvarez, Representante Permanente do Estado Plurinacional da


Bolívia, informou o Conselho sobre suas atividades como Ponto Focal de Gênero, inclusive para
casos de assédio sexual e de gênero no Conselho, e Marcela Maria Arias Moncada,
Representante Permanente de Honduras, apresentou um relatório oral sobre seu trabalho como
Vice-Presidente e Presidente da Força-Tarefa do Conselho sobre acessibilidade para pessoas com
deficiência.

Além disso, o Conselho adotou uma declaração do Presidente sobre o processo de


eficiência de longo prazo do Conselho com o objetivo de melhorar os métodos de trabalho da
organização.

67
Os membros do Conselho também aprovaram o tema de um painel de discussão sobre
a integração dos direitos humanos como: "Trigésimo aniversário da Declaração e Plataforma de
Ação de Pequim". O painel está programado para ocorrer na 58ª sessão do Conselho (fevereiro-
abril de 2025).

Tomaram a palavra os seguintes Estados: Albânia, Argentina, Bangladesh, China, Cuba,


República Dominicana, União Europeia, Finlândia, Gâmbia, Índia, Cazaquistão, Lituânia,
Luxemburgo, Sudão, Ucrânia, Estados Unidos da América e República Bolivariana da Venezuela.
O Serviço Internacional para os Direitos Humanos também emitiu uma declaração.

O Conselho reúne-se em 13 de dezembro para ouvir uma atualização oral do Alto


Comissário para os Direitos Humanos, Volker Türk, sobre a situação dos direitos humanos na
República Bolivariana da Venezuela, conforme mandatado pelo Conselho.

Veja mais sobre o embaixador Jürg Lauber.

Notas de orientação para a realização da 58ª Sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU,
24 de fevereiro a 4 de abril de 2025 a-hrc-58-1-aev.docx

Data e local da sessão: O Conselho de Direitos Humanos realizará sua quinquagésima oitava
sessão de 24 de fevereiro a 4 de abril de 2025 no Escritório das Nações Unidas em Genebra.

Composição do Conselho de Direitos Humanos

A composição do Conselho de Direitos Humanos em sua quinquagésima oitava sessão é


a seguinte: Albânia (2026); Argélia (2025); Bangladesh (2025); Bélgica (2025); Benin (2027); Bolívia
(Estado Plurinacional de) (2027); Brasil (2026); Bulgária (2026); Burundi (2026); Chile (2025); China (2026);
Colômbia (2027); Costa Rica (2025); Costa do Marfim (2026); Cuba (2026); Chipre (2027); República Tcheca
(2027); República Democrática do Congo (2027); República Dominicana (2026); Etiópia (2027); França
(2026); Gâmbia (2027); Geórgia (2025); Alemanha (2025); Gana (2026); Islândia (2027); Indonésia (2026);
Japão (2026); Quênia (2027); Kuwait (2026); Quirguistão (2025); Malawi (2026); Maldivas (2025); Ilhas
Marshall (2027); México (2027); Marrocos (2025); Países Baixos (Reino do) (2026); Macedônia do Norte
(2027); Catar (2027); República da Coreia (2027); Romênia (2025); África do Sul (2025); Espanha (2027);
Sudão (2025); Suíça (2027); Tailândia (2027); e Vietnã (2025).

Na sessão organizativa do décimo nono ciclo do Conselho de Direitos Humanos,


realizada em 9 de dezembro de 2024, o Conselho elegeu os seguintes membros da Mesa para
seu décimo nono ciclo, que vai de 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2025:Presidente Jürg Lauber
(Suíça); Vice-presidente Tarek MD. Ariful Islam (Bangladesh); VP Razvan Rusu (Romênia); e Vice-Presidente
e relator: Paul Empole Losoko Efambe (República Democrática do Congo)

Revisão do trabalho e funcionamento do Conselho de Direitos Humanos

De acordo com o parágrafo 42 do anexo à resolução 16/21 do Conselho de Direitos


Humanos, o Conselho realizará um painel de discussão para interagir com os chefes dos órgãos
governamentais e secretarias das agências das Nações Unidas dentro de seus respectivos
mandatos sobre temas específicos de direitos humanos com o objetivo de promover a integração
dos direitos humanos em todo o sistema das Nações Unidas.

De acordo com a resolução 57/4 do Conselho de Direitos Humanos e a decisão


relacionada tomada pelo Conselho em sua sessão organizacional realizada em 9 de dezembro de
2024, o tema para 2025 do painel de discussão anual de alto nível sobre a integração dos direitos
humanos será "Trigésimo aniversário da Declaração e Plataforma de Ação de Pequim". O painel
de discussão será totalmente acessível a pessoas com deficiência (ver anexo).

68
Seleção e nomeação dos titulares de mandatos

Em conformidade com o ponto 47 do anexo da Resolução 5/1 do Conselho dos Direitos


do Homem, o ponto 22 do anexo da Resolução 16/21 do Conselho e os requisitos estabelecidos
na Decisão 6/102 do Conselho e na declaração do Presidente PRST OS/14/2, o Grupo Consultivo,
composto por Emmanuel Kwame Asiedu Antwi (Gana), Patricia Ann Hermanns (Baamas), Galib
Israfilov (Azerbaijão), Li Xiaomei (China) e Kelly Billingsley (Estados Unidos da América), 2
proporá ao Presidente do Conselho uma lista de candidatos a três membros do Mecanismo de
Peritos sobre os Direitos dos Povos Indígenas (um do Pacífico, um da América Central e do Sul e
do Caribe, e um da Europa Central e Oriental, Federação Russa, Ásia Central e Transcaucásia).

De acordo com o procedimento estipulado nos parágrafos 52 e 53 do anexo à resolução


5/1 do Conselho de Direitos Humanos, a nomeação de um procedimento especial e de um
mecanismo de peritos. Os titulares de mandatos serão concluídos após a aprovação subsequente
pelo Conselho. Os titulares de mandatos em questão serão nomeados antes do final da
quinquagésima oitava sessão.

Relatório anual do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos e relatórios
do Escritório do Alto Comissariado e do Secretário-Geral

Todos os relatórios do Secretário-Geral, do Alto Comissariado das Nações Unidas para os


Direitos Humanos e do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos
Humanos (ACNUDH) são apresentados no item 2 da agenda, que permanece um item em aberto
durante toda a sessão. O Conselho de Direitos Humanos considerará os relatórios nos itens
relevantes da agenda, conforme apropriado. O calendário específico da sua introdução refletir-
se-á no programa de trabalho.

Relatório anual do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos

De acordo com a resolução 48/141 da Assembleia Geral e a decisão contida na


declaração do Presidente PRST OS/18/1, o Conselho de Direitos Humanos ouvirá uma
atualização oral do Alto Comissário.

Relatório anual do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos e relatórios
do Gabinete do Alto Comissariado e do Secretário-Geral

Todos os relatórios do Secretário-Geral, do Alto Comissariado das Nações Unidas para os


Direitos Humanos e do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos
Humanos (ACNUDH) são apresentados no item 2 da agenda, que permanece um item em aberto
durante toda a sessão. O Conselho de Direitos Humanos considerará os relatórios nos itens
relevantes da agenda, conforme apropriado. O calendário específico da sua introdução reflectir-
se-á no programa de trabalho.

Relatório anual do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos

De acordo com a resolução 48/141 da Assembleia Geral e a decisão contida na


declaração do Presidente PRST OS/18/1, o Conselho de Direitos Humanos ouvirá uma
atualização oral do Alto Comissário.

Promoção e proteção de todos os direitos humanos, civis, políticos, econômicos, sociais e


culturais, incluindo o direito ao desenvolvimento

Direitos econômicos, sociais e culturais

69
Direito ao trabalho

Em sua resolução 55/9, o Conselho de Direitos Humanos decidiu organizar, durante sua
quinquagésima oitava sessão, um painel de discussão sobre a realização dos direitos ao trabalho
e à seguridade social na economia informal, no contexto de economias sustentáveis e inclusivas,
com ênfase na importância da cooperação e das parcerias internacionais nesse sentido.
identificar os principais desafios, experiências e boas práticas (ver anexo).

Direitos humanos no contexto do HIV e da AIDS

Em sua resolução 56/20, o Conselho de Direitos Humanos decidiu convocar, em sua


quinquagésima oitava sessão, um painel de discussão, acessível a pessoas com deficiência, para
discutir a realização dos direitos humanos na manutenção e aumento dos ganhos obtidos na
resposta ao HIV e não deixar ninguém para trás e fornecer recomendações aos países sobre esse
assunto (ver anexo).

Direitos culturais

Em sua resolução 49/7, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao Alto Comissariado


que convocasse, antes da quinquagésima quinta sessão do Conselho, um workshop de um dia
para revisar e promover as ferramentas para a disseminação e possíveis métodos de
implementação de uma abordagem para a proteção, restauração e preservação do patrimônio
cultural que promova o respeito universal pelos direitos culturais por todos. e apresentar um
relatório sobre o assunto ao Conselho em sua quinquagésima oitava sessão. O Conselho terá
diante de si o relatório do Alto Comissário (A/HRC/58/35).

Em sua resolução 55/5, o Conselho de Direitos Humanos decidiu renovar, por um


período de três anos, o mandato de Relator Especial no campo dos direitos culturais. O Conselho
analisará os relatórios da titular do mandato, Alexandra Xanthaki (A/HRC/58/60 e
A/HRC/58/60/Add.1), durante um diálogo interativo.

Questão da realização em todos os países dos direitos econômicos, sociais e culturais

Em sua resolução 52/11, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao Secretário-Geral


que preparasse e apresentasse um relatório ao Conselho, em sua quinquagésima oitava sessão,
em formatos acessíveis às pessoas com deficiência, sobre a questão da realização em todos os
países dos direitos econômicos, sociais e culturais nos termos do item 3 da agenda, com foco
especial nos desafios e boas práticas para fortalecer o cumprimento do direito à seguridade
social. O Conselho terá diante de si o relatório do Secretário-Geral (A/HRC/58/37).

Saúde mental e direitos humanos

Em sua resolução 52/12, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao Alto Comissariado


que preparasse um relatório abrangente, acessível às pessoas com deficiência, sobre o resultado
da consulta sobre os desafios e as melhores formas de implementar nos níveis local, nacional e
regional medidas normativas e políticas para a realização dos direitos humanos das pessoas com
deficiência psicossocial e usuários atuais ou potenciais de serviços de saúde mental, realizada
em 23 de outubro de 2024, com recomendações para os Estados e todas as outras partes
interessadas relevantes e sugestões de ferramentas políticas para a implementação de uma
perspectiva de direitos humanos para a saúde mental, e para apresentar o relatório ao Conselho
em sua quinquagésima oitava sessão. O Conselho terá diante de si o relatório do Alto Comissário
(A/HRC/58/38).

70
Centralidade do cuidado e apoio na perspectiva dos direitos humanos

Em sua resolução 54/6, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao Alto Comissariado


que organizasse um workshop de especialistas de dois dias para abordar os direitos humanos de
mulheres, pessoas com deficiência, crianças e idosos como cuidadores, bem como receptores
de cuidados e apoio, e para seu autocuidado a partir de uma perspectiva de igualdade de gênero
e direitos humanos, com o objetivo de avaliar experiências, boas práticas e os principais desafios
relativos ao reconhecimento efetivo dos direitos dos cuidadores e daqueles que recebem
cuidados e apoio, e preparar um estudo temático abrangente sobre a dimensão dos direitos
humanos do cuidado e apoio, com base nas discussões da oficina, em um formato acessível,
antes da quinquagésima oitava sessão do Conselho. O Conselho terá diante de si o relatório do
Alto Comissário (A/HRC/58/43).

Direito à alimentação

O Conselho analisará os relatórios do titular do mandato, Michael Fakhri (A/HRC/58/48


e A/HRC/58/48/Add.1), durante um diálogo interativo.

Moradia adequada como componente do direito a um padrão de vida adequado e do direito à


não discriminação neste contexto

O Conselho considerará os relatórios do titular do mandato, Balakrishnan Rajagopal


(A/HRC/58/50 e A/HRC/58/50/Add.1), durante um diálogo interativo.

Efeitos da dívida externa e de outras obrigações financeiras internacionais relacionadas dos


Estados sobre o pleno gozo de todos os direitos humanos, particularmente os direitos
econômicos, sociais e culturais

O Conselho analisará os relatórios do titular do mandato, Attiya Waris (A/HRC/58/51 e


A/HRC/58/51/Add.1), durante um diálogo interativo.

Direitos civis e políticos

Questão da pena de morte

A contribuição do judiciário para o avanço dos direitos humanos e a questão da pena de


morte.

Tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes

Relatório do Secretário-Geral sobre o Fundo Voluntário das Nações Unidas para as


Vítimas da Tortura (A/HRC/58/31).

O Conselho de Direitos Humanos terá diante de si o relatório do Secretário-Geral sobre


o Fundo Especial estabelecido pelo Protocolo Facultativo à Convenção contra a Tortura e Outros
Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (A/HRC/58/32).

O Conselho considerará os relatórios da titular do mandato, Alice Jill Edwards


(A/HRC/58/55 e A/HRC/58/55/Add.1), durante um diálogo interativo.

Registro de nascimento e o direito de todos ao reconhecimento em todos os lugares como pessoa


perante a lei

O Conselho terá diante de si o relatório do Alto Comissário (A/HRC/58/39).

71
Liberdade de religião ou de crença

O Conselho considerará os relatórios da titular do mandato, Nazila Ghanea


(A/HRC/58/49 e A/HRC/58/49/Add.1), durante um diálogo interativo.

Direito à privacidade

O Conselho analisará os relatórios da titular do mandato, Ana Brian Nougrères


(A/HRC/58/58, A/HRC/58/58/Add.1 e A/HRC/58/58/Add.2), durante um diálogo interativo.

Direito ao desenvolvimento

Um relatório sobre o painel de discussão bienal sobre o direito ao desenvolvimento,


realizado em sua quinquagésima sétima sessão. O Conselho terá diante de si o relatório do
ACNUDH sobre o painel de discussão (A/HRC/58/45).

Direitos dos povos e de grupos e indivíduos específicos

Direitos da criança

A reunião anual de um dia inteiro sobre os direitos da criança, plenamente acessível às


crianças e pessoas com deficiência, sobre o tema "Desenvolvimento na primeira infância" (ver
anexo).

Em sua resolução 78/187, a Assembleia Geral solicitou ao Representante Especial do


Secretário-Geral para Crianças e Conflitos Armados que continuasse a apresentar relatórios ao
Conselho de Direitos Humanos sobre as atividades realizadas no cumprimento do mandato. O
Conselho considerará o relatório da Representante Especial, Virginia Gamba (A/HRC/58/18),
durante um diálogo interativo.

Na mesma resolução, a Assembleia Geral solicitou ao Representante Especial do


Secretário-Geral sobre Violência contra Crianças que continuasse a apresentar relatórios anuais
ao Conselho de Direitos Humanos sobre as atividades realizadas no cumprimento do mandato.
O Conselho considerará o relatório da Representante Especial, Najat Maalla M'jid
(A/HRC/58/19), durante um diálogo interativo.

Em sua resolução 52/26, o Conselho de Direitos Humanos decidiu prorrogar o mandato


do Relator Especial sobre a venda e exploração sexual de crianças, incluindo prostituição infantil,
pornografia infantil e outros materiais de abuso sexual infantil, sob o título de Relator Especial
sobre a venda, exploração sexual e abuso sexual de crianças, por um período de três anos, e
solicitou ao Relator Especial que continuasse a apresentar um relatório anual sobre a
implementação do mandato ao Conselho. O Conselho considerará os relatórios da titular do
mandato, Mama Fatima Singhateh (A/HRC/58/52 e A/HRC/58/52/Add.1), durante um diálogo
interativo.

Pessoas desaparecidas

De acordo com a resolução 77/220 da Assembléia Geral, o Conselho de Direitos


Humanos terá diante de si uma nota do Secretariado referindo-se ao Conselho ao relatório do
Secretário-Geral sobre a implementação da resolução, incluindo recomendações práticas
relevantes (A/HRC/58/30).

Direitos das pessoas com deficiência

72
Em sua resolução 55/8, o Conselho de Direitos Humanos decidiu realizar seu próximo
debate interativo anual sobre os direitos das pessoas com deficiência em sua quinquagésima
oitava sessão e concentrá-lo nos direitos das pessoas com deficiência e nas tecnologias e
dispositivos digitais, incluindo tecnologias assistivas. Na sua Resolução 57/6, o Conselho decidiu
incluir o tema da luta contra o ciberassédio contra as pessoas com deficiência no contexto desse
debate interativo sobre os direitos das pessoas com deficiência (ver anexo). O debate será
totalmente acessível às pessoas com deficiência e será informado pelo relatório do ACNUDH
sobre os direitos das pessoas com deficiência e as tecnologias e dispositivos digitais, incluindo
tecnologias assistivas (A/HRC/58/33).

Em sua resolução 53/14, o Conselho de Direitos Humanos decidiu prorrogar o mandato


do Relator Especial sobre os direitos das pessoas com deficiência por um período adicional de
três anos e que o mandato incluiria continuar a apresentar relatórios anuais ao Conselho, em
formatos acessíveis. O Conselho analisará o relatório da titular do mandato, Heba Hagrass
(A/HRC/58/56 e A/HRC/58/56/Add.1), durante um diálogo interativo.

Questões de minorias

Em sua resolução 55/15, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao Alto Comissariado


que continuasse a apresentar ao Conselho um relatório anual contendo informações sobre os
desenvolvimentos relevantes dos órgãos e mecanismos de direitos humanos das Nações Unidas
e sobre as atividades realizadas pelo ACNUDH na sede e no campo que contribuíram para a
promoção e o respeito das disposições da Declaração sobre os Direitos das Pessoas Pertencentes
a Pessoas Nacionais ou Étnicas, Minorias religiosas e linguísticas. O Conselho terá diante de si o
relatório do ACNUDH (A/HRC/58/34).

Em sua resolução 52/5, o Conselho de Direitos Humanos decidiu prorrogar o mandato


do Relator Especial sobre questões de minorias por um período de três anos nos mesmos termos
previstos pelo Conselho em sua resolução 25/5. O Conselho analisará o relatório do titular do
mandato, Nicolas Levrat (A/HRC/58/54), durante um diálogo interactivo.

Defensores dos direitos humanos

Em sua resolução 52/4, o Conselho de Direitos Humanos decidiu prorrogar o mandato


do Relator Especial sobre a situação dos defensores de direitos humanos por um período de três
anos, nos mesmos termos previstos pelo Conselho em sua resolução 16/5. O Conselho
considerará os relatórios da titular do mandato, Mary Lawlor (A/HRC/58/53,
A/HRC/58/53/Add.1 e A/HRC/58/53/Add.2), durante um diálogo interativo.

Direitos das pessoas com albinismo

Em sua resolução 55/18, o Conselho de Direitos Humanos decidiu prorrogar o mandato


de Especialista Independente sobre o gozo dos direitos humanos por pessoas com albinismo por
um período de três anos, nos mesmos termos previstos pelo Conselho em sua resolução 46/12.
O Conselho examinará os relatórios da titular do mandato, Muluka-Anne Miti-Drummond
(A/HRC/58/57, A/HRC/58/57/Add.1 e A/HRC/58/57/Add.2), durante um diálogo interativo.

Inter-relação entre direitos humanos e questões temáticas de direitos humanos

Prevenção do genocídio

Em sua resolução 55/13, o Conselho de Direitos Humanos decidiu convocar, em sua


quinquagésima oitava sessão, um painel de discussão sobre alerta precoce e prevenção de

73
genocídio e solicitou ao ACNUDH que garantisse que o painel de discussão fosse acessível a
pessoas com deficiência (ver anexo).

Direitos humanos e justiça transicional

Em sua resolução 51/23, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao ACNUDH que


preparasse um relatório sobre as lições aprendidas e as boas práticas de justiça transicional no
contexto da manutenção da paz e do desenvolvimento sustentável, notadamente o Objetivo de
Desenvolvimento Sustentável 16, informado por reuniões regionais anteriores, e que o
apresentasse ao Conselho em sua quinquagésima oitava sessão durante um diálogo interativo
aprimorado. O Conselho examinará o relatório do ACNUDH (A/HRC/58/36).

Direitos humanos e alterações climáticas

Em sua resolução 53/6, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao Alto Comissariado


que apresentasse ao Conselho, em sua quinquagésima oitava sessão, um relatório resumido
sobre o painel anual de discussão sobre direitos humanos e mudança climática realizado em sua
quinquagésima sexta sessão. O Conselho considerará o relatório do Alto Comissário
(A/HRC/58/40).

Impacto das transferências de armas nos direitos humanos

Em sua resolução 53/15, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao ACNUDH que


organizasse um workshop intersessional de um dia inteiro para realizar discussões sobre o papel
dos Estados e do setor privado na prevenção, abordagem e mitigação do impacto negativo das
transferências de armas sobre os direitos humanos, a ser realizado antes da quinquagésima
sétima sessão do Conselho e para informar a preparação de um relatório sobre lacunas e passos
futuros sobre o assunto. a ser apresentado ao Conselho em sua quinquagésima oitava sessão.
O Conselho terá diante de si o relatório do ACNUDH (A/HRC/58/41).

Impacto negativo da corrupção no gozo dos direitos humanos

Em sua resolução 53/17, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao ACNUDH que


organizasse um seminário de especialistas de meio dia entre as sessões, em formato híbrido e
totalmente acessível a pessoas com deficiência, antes de sua quinquagésima sétima sessão, para
compartilhar boas práticas, conquistas, desafios e lições aprendidas na promoção e proteção dos
direitos econômicos, sociais e culturais nos esforços anticorrupção no contexto da recuperação
da pandemia da doença do coronavírus (COVID19), e apresentar um relatório resumido do
seminário em sua quinquagésima oitava sessão. O Conselho terá diante de si o relatório do
ACNUDH (A/HRC/58/42).

Contribuição para a implementação dos objetivos do Ano Internacional da Família e seus


processos de acompanhamento na promoção e proteção dos direitos humanos

Em sua resolução 54/17, o Conselho de Direitos Humanos decidiu convocar, em sua


quinquagésima sétima sessão, um painel de discussão, acessível a pessoas com deficiência,
sobre a implementação das obrigações dos Estados sob as disposições pertinentes do direito
internacional dos direitos humanos sobre o papel da família no apoio à proteção e promoção
dos direitos humanos de seus membros, para discutir os desafios e as melhores práticas a esse
respeito. Na mesma resolução, o Conselho solicitou ao Alto Comissário que preparasse um
relatório resumido sobre a discussão e o apresentasse ao Conselho em sua quinquagésima oitava
sessão. O Conselho terá diante de si o relatório do Alto Comissário (A/HRC/58/44).

74
Elaboração de um instrumento internacional juridicamente vinculante sobre empresas
transnacionais e outras empresas com respeito aos direitos humanos

De acordo com sua resolução 26/9, o Conselho de Direitos Humanos considerará o


relatório do grupo de trabalho intergovernamental aberto sobre empresas transnacionais e
outras empresas comerciais com relação aos direitos humanos em sua décima sessão, realizada
de 16 a 20 de dezembro de 2024 (A/HRC/58/46).

Terrorismo e direitos humanos

Em sua resolução 49/10, o Conselho de Direitos Humanos decidiu prorrogar o mandato


do Relator Especial sobre a promoção e proteção dos direitos humanos e liberdades
fundamentais no combate ao terrorismo por um período de três anos, nos mesmos termos
previstos pelo Conselho em sua resolução 40/16. Em sua resolução 57/11, o Conselho convidou
o Relator Especial a prestar atenção ao efeito negativo do terrorismo no gozo dos direitos
humanos e das liberdades fundamentais e a fazer recomendações a esse respeito. O Conselho
analisará os relatórios do titular do mandato, Ben Saul (A/HRC/58/47 e A/HRC/58/47/Add.1),
durante um diálogo interativo.

Direitos humanos e meio ambiente

Em sua resolução 55/2, o Conselho de Direitos Humanos decidiu renovar o mandato de


Relator Especial sobre a questão das obrigações de direitos humanos relacionadas ao gozo de
um meio ambiente seguro, limpo, saudável e sustentável sob o título de Relator Especial sobre
o direito humano a um meio ambiente limpo, saudável e sustentável, por um período de três
anos, e solicitou ao Relator Especial que apresentasse um relatório anual ao Conselho. O
Conselho examinará o relatório da nova titular do mandato, Astrid Puentes Riaño (A/HRC/58/59)
e o relatório do anterior titular do mandato, David R. Boyd (A/HRC/58/59/Add.1), durante um
diálogo interativo.

Organismos e mecanismos de direitos humanos

Fórum sobre Questões de Minorias

Em sua resolução 19/23, o Conselho de Direitos Humanos decidiu que o Fórum sobre
Questões de Minorias deveria continuar a se reunir anualmente. O Fórum realizou a sua décima
sétima sessão nos dias 28 e 29 de novembro de 2024, subordinada ao tema "Representação
minoritária e auto-representação em espaços e discursos públicos". O Conselho terá diante de
si o relatório do Relator Especial sobre questões de minorias, contendo as recomendações feitas
pelo Fórum em sua décima sétima sessão (A/HRC/58/69).

Procedimentos especiais

De acordo com sua decisão 2/102, o Conselho de Direitos Humanos terá diante de si o
relatório sobre a trigésima reunião anual de relatores especiais, especialistas independentes e
presidentes de grupos de trabalho dos procedimentos especiais do Conselho de Direitos
Humanos, realizada de 9 a 13 de dezembro de 2024 (A/HRC/58/70 e A/HRC/58/70/Add.1).

O Conselho de Direitos Humanos também terá diante de si o relatório de comunicações


dos procedimentos especiais (A/HRC/58/3).

Fórum Social

75
Em sua resolução 53/20, o Conselho de Direitos Humanos decidiu que o Fórum Social se
reuniria por dois dias úteis em 2024 e que deveria se concentrar na contribuição do
financiamento para o desenvolvimento para o avanço de todos os direitos humanos para todos.
Na mesma resolução, o Conselho solicitou ao Fórum que apresentasse um relatório contendo
suas conclusões e recomendações ao Conselho em sua quinquagésima oitava sessão. O
Conselho terá diante de si o relatório do Fórum, que se realizou em 31 de outubro e 1 de
novembro de 2024 (A/HRC/58/71).

Revisão periódica universal

O Grupo de Trabalho sobre a Revisão Periódica Universal realizou sua quadragésima


sétima sessão de 4 a 15 de novembro de 2024. Em sua quinquagésima oitava sessão, o Conselho
de Direitos Humanos terá diante de si para adoção os resultados finais das revisões da Albânia
(A/HRC/58/5), Butão (A/HRC/58/9), Brunei Darussalam (A/HRC/58/12), Costa Rica
(A/HRC/58/13), Costa do Marfim (A/HRC/58/7), República Popular Democrática da Coreia
(A/HRC/58/11), República Democrática do Congo (A/HRC/58/6), Dominica (A/HRC/58/10),
Guiné Equatorial (A/HRC/58/14), Etiópia (A/HRC/58/15), Nicarágua (A/HRC/58/17), Noruega
(A/HRC/58/4), Portugal (A/HRC/58/8) e Catar (A/HRC/58/16).

Situação dos direitos humanos na Palestina e em outros territórios árabes ocupados

Direitos humanos no Golã sírio ocupado

Em sua resolução 55/31, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao Secretário-Geral


que informasse sobre a situação dos direitos humanos no Golã sírio ocupado ao Conselho em
sua quinquagésima oitava sessão. O Conselho terá diante de si o relatório do Secretário-Geral
(A/HRC/58/72).

Assentamentos israelenses no Território Palestino Ocupado, incluindo Jerusalém Oriental, e no


Golã sírio ocupado

Em sua resolução 55/32, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao Alto Comissário


que informasse sobre a implementação das disposições dessa resolução ao Conselho em sua
quinquagésima oitava sessão. O Conselho terá diante de si o relatório do Alto Comissário
(A/HRC/58/73).

Seguimento e aplicação da Declaração e do Programa de Ação de Viena

Nenhum relatório foi apresentado no item 8 da agenda.

Racismo, discriminação racial, xenofobia e formas conexas de intolerância: seguimento e


aplicação da Declaração e do Programa de Ação de Durban

Apelo global por ações concretas para a eliminação do racismo, discriminação racial, xenofobia
e intolerância correlata e a implementação abrangente e o acompanhamento da Declaração e
do Programa de Ação de Durban

De acordo com a resolução 79/161 da Assembleia Geral, o Conselho de Direitos


Humanos realizará uma reunião em comemoração ao Dia Internacional para a Eliminação da
Discriminação Racial (ver anexo).

Grupo de Trabalho Intergovernamental sobre a Implementação Efetiva da Declaração e do


Programa de Ação de Durban

76
Em sua resolução 52/37, o Conselho de Direitos Humanos decidiu renovar o mandato do
Grupo de Trabalho Intergovernamental sobre a Implementação Efetiva da Declaração e do
Programa de Ação de Durban por um período adicional de três anos e solicitou ao Presidente do
Grupo de Trabalho que apresentasse um relatório anual sobre suas sessões ao Conselho. O
Conselho terá diante de si uma nota do Secretariado referindo-se ao relatório sobre a situação
da elaboração do projeto de declaração das Nações Unidas sobre a promoção e o pleno respeito
dos direitos humanos dos afrodescendentes que foi apresentado à Assembléia Geral em sua
septuagésima nona sessão (A/79/304). Este relatório contém igualmente um resumo dos
debates do grupo de trabalho na sua vigésima segunda sessão, realizada de 20 a 24 de maio de
2024, e na sua reunião intersessões realizada em 8 e 9 de fevereiro de 2024 (A/HRC/58/75).

Em sua resolução 57/33, o Conselho de Direitos Humanos solicitou ao Alto Comissário


que apresentasse ao Conselho uma atualização oral sobre o seguimento dessa resolução em sua
quinquagésima oitava sessão. O Conselho ouvirá uma atualização oral do Alto Comissário.

Anexo

Painéis de discussão a serem realizados durante a 58ª. sessão do Conselho de Direitos Humanos

Mandato Painel/discussão

Resoluções 16/21 e 57/4 do Painel anual de discussão de alto nível sobre a integração dos direitos
Conselho de Direitos Humanos humanos, sobre o tema "Trigésimo aniversário da Declaração e
Plataforma de Ação de Pequim"
(acessível a pessoas com deficiência)

Resoluções 26/2 e 54/35 do Painel de discussão bienal de alto nível sobre a questão da pena de
Conselho de Direitos Humanos morte, sobre o tema "Contribuição do judiciário para o avanço dos
direitos humanos e a questão da pena de morte"
(acessível a pessoas com deficiência)

Resolução 55/13 do Conselho Painel de discussão sobre alerta precoce e prevenção de genocídio
de Direitos Humanos (acessível a pessoas com deficiência)

Resolução 56/20 do Conselho Painel de discussão sobre a realização dos direitos humanos na
de Direitos Humanos sustentação e aumento dos ganhos obtidos na resposta ao HIV e não
deixando ninguém para trás
(acessível a pessoas com deficiência)

Resolução 55/9 do Conselho Painel de discussão sobre a efetivação dos direitos ao trabalho e à
de Direitos Humanos seguridade social na economia informal

Resoluções 7/9, 55/8 e 57/6 Debate interativo anual sobre os direitos das pessoas com
do Conselho de Direitos deficiência, subordinado ao tema "Direitos das pessoas com
Humanos deficiência: tecnologias digitais e de apoio, combate ao cyberbullying
e inclusão digital"
(acessível a pessoas com deficiência)

Resoluções 7/29 e 55/29 do Reunião anual de um dia inteiro sobre os direitos da criança, sobre o
Conselho de Direitos Humanos tema "Desenvolvimento na primeira infância"
(acessível a pessoas com deficiência)

Resolução 79/161 da Comemoração do Dia Internacional para a Eliminação da


Assembleia Geral Discriminação Racial

77
Ethical equity redistribution/contribution to global good

Juan Garay

Summary. The current inequitable distribution of resources between countries results in the
loss of 10% of the potential human life that could be feasible for all and sustainable within
nature's cycles. In this paper, we present a stepwise approach for the logical and ethical
redistribution of resources between countries that would help preserve human life, maintain
natural cycles, and foster knowledge advancement toward improved wellbeing in harmony with
nature. This approach involves first reallocating resources above the hoarding threshold, then
addressing those above the excess threshold, thereby releasing approximately 30% of the
world’s GDP that is disconnected from human wellbeing, contributes to environmental
degradation, and undermines the prospects for future generations. The final step is to smooth
the distribution into a normal bell curve based on equity, collaboration, and ecological balance.

Introduction

In previous articles and interactive SHEM webinarsi, we have identified ethical ecological
thresholds for the remainder of the centuryii, developed models for healthy, replicable, and
sustainable national practicesiii, examined the burden of health inequity to measure the gap
from the global shared health goaliv, and outlined the thresholds for equitable resource
distribution that define the equity curvev. In this paper, we analyze what it would take to
transform the current unjust distribution of resources—causing both intra- and
intergenerational inequity and loss of life (human and other forms)—into systems that align with
the universal right to health. We also explore approaches that preserve nature for future
generations, reduce global work and production, and promote the advancement of knowledge
to enhance human wellbeing in harmony with the environment.

1. Scene setting

The extreme inequalities in how humankind distributes natural resources and


transforms them into goods and exchange systems are directly linked to the state of well-being,
as reflected in life expectancy at birth. We have identified countries that achieve the "best
feasible level of health," meeting criteria such as higher-than-average life expectancy while
relying on feasible means for all: sustainable (intergenerational) use of natural resources
(planetary boundaries) and replicable levels of goods and services exchange (GDP per capita in
various units). These benchmarks allow us to measure progress toward the globally shared goal
of well-being and health for all nations, as outlined in the WHO Constitution (1948): the best
feasible level of health for all peoplevi.

The gap from this shared goal—defined as the burden of health inequity—is measured
either as a net figure (number of excess deaths or life-years lost) or as a relative proportion
(percentage of all deaths or population-years). Over the past 40 years, this gap has remained
largely stable, with 25-30% of all deaths attributable to global injustice, resulting in the loss of
approximately 10% of human life potential due to inequityvii.

78
Identifying the best feasible health reference levels also enables us to define the
minimum level of economic exchange capacity (GDP per capita) below which no country has
achieved universal access to health or the best feasible health—a threshold we call the "dignity
threshold."viii This threshold is less than half the global average GDP per capita. Yet, around half
the world’s population lives in countries where the national average GDP per capita falls below
this dignity threshold, leaving billions deprived of the global health goal and the universal right
to health measured in life years achievable for all.

This deficit, which denies over 4 billion people the opportunity to lead healthy lives,
amounts to approximately 7% of the world’s economic resources. Addressing this deficit would
require redistributing wealth from the top 5% population living in the GDP pc- richest nations—
those with GDP per capita levels more than five times the world average and over ten times the
dignity threshold. We refer to this upper limit as the "hoarding threshold." Redistribution from
hoarding to deficit is a critical first step toward achieving economic and health equity and justice.

However, the global average GDP per capita is itself unsustainable in terms of natural
resource consumption. We have identified the resource levels that enable the best well-being
and health outcomes (highest levels of life expectancy at birth), even if not universally replicable
or sustainable. Some subnational references demonstrate that maximum well-being requires no
more than twice the world average economic exchange (GDP per capita). Beyond this level, well-
being does not improve further—referred to by some as "wasted GDP"ix—and continued
economic excess accelerates environmental destruction and undermines future generations
(hence becoming “toxic GDP”x). We term this upper boundary the "excess threshold."

Ensuring the best feasible health for all humans, including future generations, hinges on
the principle that no one should have more than is necessary to enjoy the highest levels of well-
being and lifespan. Fair societies and nations require living within equity margins—from the
dignity threshold to the excess threshold. Achieving this would reduce the world’s GDP
(production, trade, consumption, speculation) by 30% while increasing 10% human life and
wellbeing and preserving those levels for coming generations by respecting and caring for
nature. Moreover, such equitable and sustainable degrowth could direct 10% of economic
resources toward the collective advancement of knowledge (independent of market dynamics)
-over 10 times the present levelsxi-and reduce one-fifth of the time and energy spent on working,
producing, and consuming (as some countries are beginning to considerxii), improving
progressively and in a sustainable way human wellbeing in our shared planet.

What does this vision require?

We must first understand the current distribution of economic resources and design
redistributive systems that lead to global equity and justice. The calculations and graphs
presented here aim to define these pathways.

2. World present levels of distribution of resources

We analyze the distribution of resources among countries by levels of GDP per capita
(GDP pc), which reflects the means and capacity to access and control natural and manufactured
goods and the services associated with them.

The graph below shows the cumulative population (horizontal axis) and GDP (vertical
axis) of all countries in 2023, arranged from the lowest to the highest GDP pc. This distribution
is compared to a hypothetical egalitarian scenario, where all individuals would have equal

79
economic means. The gap between the two curves represents the Gini indexxiii, a measure of
inequality: it would be zero in a perfectly equal society and one if all resources were
concentrated in a single entity. Currently, the global GDP Gini index stands at 0.52, indicating
that the world is more than halfway to complete inequality.

Each dot on the graph represents a country. The horizontal length corresponds to its
population (with India and China being the largest), and the steepness of the curve reflects the
country’s economic capacity or use, which increases with GDP pc. GDP pc ranges from the lowest
in Burundi ($262 per capita) to the highest in Monaco ($218,375 per capita)—a difference of
833 times.
Figure 1 - Current international GDP distribution vs egalitarian model, Gini index 2023

Given the large variation in the population size of countries, we have disaggregated data
in the three largest countries in terms of population - India, China and the USA-. The resulting
curve is displayed below. As disaggregation evens the differences between the mentioned
countries and the rest, the Gini index is reduced to 0.50. Higher levels of disaggregation applied
to all countries would smooth the curve of cumulative income and slightly reduce the Gini index,
as we will later see with the normal distribution, even if skewed, the tendency of any
distribution.
Figure 2 - International Gini curve with disagregation by subnational data form India, China and the
USA, 2023

80
While the Gini index decreases with higher disaggregation of Population/GDP pc/GDP in
the three largest countries, the range also increases, with lowest GDP pc still in Burundi and
highest in Columbia/USA, with 263,220 $ GDP pc, that is, over a thousand times higher than the
lowest national average. Interestingly Columbia state/ Washington DC, has concentrated as well
the highest political and military power in the world in the last 60 years.

Figure 3 Distribution of population and GDP by countries listed by GDP pc levels, 2023

The graph above displays the distribution of the population (orange bars) and GDP (grey
line) by country, from lowest to highest GDP pc. It shows a clear disconnect between people in
the mid and left side, and the majority of resources, concentrated in the right side, with the
highest peak corresponding to the USA.

When plotted by the levels of GDP pc, as below, the graph is even more telling, with a
large share of the population (orange line) below 12,000 $ GDP pc and a large share of the GDP
above $50,000, with countries in the “far right” with low shares of the world´s population yet
concentrating high GDP shares. As we plot here countries´ population and GDP, the three main
peaks are with India (much lower GDP than the proportionate population), China (both quite
even -as China´s GDP pc is very close to the world average) and the USA (with much higher GDP
share than its population).

Figure 4 - Distribution of international population and GDP by GDP pc intervals, 2023

81
The graph below includes the relation of the above representation of the international
population and GDP, with the 2equity zones” defined by the above-mentioned thresholds:
deficit, equity, excess and hoarding.

Figure 4 - Relation of world´s population and GDP with equity zones and thresholds, 2023

The graph above illustrates the deficit zone, below 3880$ GDP pc with the high
population peak of India; the countries in the equity range (above the dignity threshold and
below the excess threshold of 21,838 $ GDP pc), with the China population and GDP peak at the
center, the excess zone (between the excess and hoarding thresholds) with lower peaks of
population yet higher in GDP (mostly European countries, Canada and Japan) and the hoarding
zone (with GDP pc above 52977 $), with the high GDP peak of the USA and spread out of other
smaller countries in population concentrating resources at the far right.

Figure 5 - Excess deaths (net burden of health inequity) by national average GDP pc intervals,
2023

As mentioned in the introduction, the distribution of the people in the world according
to their national average GDP pc is related to the loss of human life. The above graph depicts
the levels of excess deaths (net burden of health inequity) by country, with almost 90% of them
taking place in the deficit zone, with GDP pc below the dignity threshold.

82
So, what would the world require as economic flows/redistribution between countries to
enable a humanity in equity saving lives, the planet and preserving and improving the living
conditions of coming generations?

3. Redistribution flows towards sustainable equity

The graph below shows how the international distribution of average GDP pc would look
like if the countries in the hoarding zone75 would redistribute their GDP pc above the hoarding
threshold of 52,977$ GDP pc to the countries in the deficit zone below 3,880 $ GDP pc. It would
result in a distribution of the world population between dignity and hoarding levels, with three
peaks of population: some half of the world population with the dignity GDP pc, a peak around
the middle representing China´s close to 20% of the world´s population and a peak of some 5%
of the world population yet with, even after redistribution, a quarter of all world´s economic
capacity.

Figure 6 - Redistribution from current to hoarding-to-deficit redistribution, by countries'


population and GDP according to GDP pc levels

The following step would be to redistribute the unnecessary-for-wellbeing excess GDP


pc (above 21,838 $ GDP pc) to the equity zone. The graph below represents that scenario where
besides all countries having at least average GDP pc above the dignity threshold, a billion people
(one in eight) would have the same excess GDP pc threshold levels, and concentrate some 20%
of the world´s resources vs. the present share of half of the world´s income, and wealth.
Currently, more than half of the GDP in the excess and hoarding zones is effectively "wasted"—
providing no additional benefit to human wellbeing—and "toxic," as it perpetuates inequality
(by denying dignified living conditions to half the world’s population) and causes significant
environmental harm (through excessive carbon emissions and ecological degradation).

75
Monaco, Liechtenstein, Bermuda, Luxembourg, Ireland, Isle of Man, Switzerland, Cayman Islands,
Gibraltar, Norway, Qatar, Singapore, United States, Channel Islands, Faroe Islands, Australia, Denmark
Iceland, Macao SAR, Sweden and Greenland

83
Figure 7 - Redistribution from current to excess-to-deficit redistribution, by countries'
population and GDP according to GDP pc levels

The graphs above are artificially clustered around peaks due to the use of national
average concentrations, particularly for the largest countries. As shown in the earlier graphs,
disaggregating the data further—by subnational regions, districts, communities, and individual
GDP per capita levels—would smooth the distribution curve, shifting it closer to a normal bell-
shaped curve, albeit skewed. This skewness, as the graphs predict, would be heavily biased to
the right, reflecting the concentration of resources among a small minority.

Figure 8 - Normal distribution of the world´s population by countries ‘GDP pc after H2D and
E2D redistributions

The graph above illustrates how the normal distribution would appear in the two
redistribution scenarios described: Hoarding to Deficit (H2D) and Excess to Deficit (E2D), while
maintaining the current world average GDP per capita. In the H2D scenario, the midpoint
between the dignity and hoarding thresholds would be significantly higher than the present
world GDP per capita average, resulting in a curve that is strongly skewed to the right. In
contrast, the redistribution curve for the dignity-to-excess scenario would have its midpoint

84
closer to the current global average GDP per capita. This would create a distribution that is
nearly symmetric, and it could even become slightly skewed to the left if the average GDP per
capita were reduced. This reduction would occur as GDP above the excess threshold is
redistributed to the deficit zone. The process would eliminate wasted and toxic GDP, allowing
for a global reduction in working days and hours (currently tied to competitive systems of
education, labor, production, trade, and consumption) while still enabling a fivefold increase in
investment toward advancing knowledge. Crucially, this approach would shift focus from
competition to collaboration, converting extreme profits and patents into global public goodsxiv.

Figure 9 - Current, H2D, E2D and their normal distributions, of international population and
GDP by GDP pc levels

Based on the analysis above, we can represent the current distribution of the world's
financial exchange capacity—closely correlated with wealth, typically averaging five times the
GDP per capita—and the resulting redistribution curves. These curves reflect the reallocation of
wasted/toxic GDP from hoarding and excess zones to the deficit zone, as depicted in the graph
above.

The following table provides a summary of the central and dispersion measures for the
current distribution, as well as for the Hoarding-to-Deficit (H2D) and Excess-to-Deficit (E2D)
redistribution scenarios.

85
Table 1 - Central and dispersion measures of current, H2D and E2D international distribution of
resources

real H2D E2D


average 11491 11450 8755
median 4198 4198 3880
mode 2239 3880 3880
SD 16297 12790 6308
Var 265580579 163585519 39785603
Coeff Var 1.42 1.12 0.72
max 218376 52977 21838
min 262 3880 3880
quartil 1 3.07% 8.47% 11.08%
quartil 2 6.11% 8.57% 11.20%
lower half 9.17% 17.03% 22.28%
quartil 3 20.38% 20.45% 26.75%
quartil 4 70.45% 62.52% 50.97%
decile <10% 0.65% 3.38% 4.43%
decile >90% 47.56% 39.55% 24.94%
top 1% 6.18% 4.16% 2.49%
top 0.1% 0.82% 0.42% 0.25%
GINI 0.5264 0.4209 0.2971

The data reveal that, under the Excess-to-Deficit (E2D) model, the average GDP per
capita could decrease by 23.8%, which would help reduce working hours globally while
facilitating the advancement of collective knowledge and promoting human wellbeing in
harmony with nature. The dispersion measures indicate that the standard deviation, coefficient
of variation, range, and ratio of extreme values, as well as the Gini index, would all gradually
decrease. This shift would make the distribution of GDP per capita more even across different
population percentiles.

Currently, the highest GDP per capita is more than 800 times higher than the lowest
(over 1,000 times if disaggregated at subnational levels), and the wealthiest 10% of countries
control almost half of the world’s income and wealth. Meanwhile, the poorest half of humanity
has access to less than 10% of global wealth and economic exchanges. This extreme inequality
would progressively change through a logical (minimizing wasted GDP) and ethical (redirecting
from hoarding and excess to deficit and wellbeing) approach. In this new scenario, the ratio
between the highest and lowest GDP per capita would be 5.6 times, and the wealthiest 10% of
countries would retain significant advantages, though limited to a quarter of the world's total
income and wealth. The poorest half would then gain access to 22% of global income and wealth.

The table below further explores how redistributing resources within the excess to
deficit thresholds could smooth the distribution, shifting it from a bipolar shape (where half of
the world’s resources are concentrated at both extremes of the equity curve) to a bell-shaped
normal distribution. This trend could continue toward an egalitarian (utopian?) distribution,
where disparities in property and social hierarchies would disappear, and all individuals would
have equal means to enjoy life and contribute to the common good while living in balance with
nature.

86
Table 2 - Central and dispersion measures of current, E2D and normal E2D normal
distribution of international GDP.

clustered real N D-E Egal degrowth


average 11723 8755 8755
median 4750 8755 8755
mode 2250 8755 8755
SD 17419 2993 0
Coeff Var 1.49 0.34
max 218376 21750 8754.94286
min 250 250 8754.94286
quartil 1 3.1% 14.3% 25.0%
quartil 2 6.1% 22.2% 25.0%
lower half 9.2% 36.5% 50.0%
quartil 3 20.4% 27.7% 25.0%
quartil 4 70.4% 35.8% 25.0%
decile <10% 0.7% 4.1% 10.0%
decile >90% 47.6% 16.0% 10.0%
top 1% 6.2% 1.9% 1.0%
top 0.1% 0.8% 0.2% 0.1%
GINI 0.411 0.012 0

As shown in the table above, grouping GDP per capita into intervals to compare current
and redistribution scenarios reduces the current Gini index to 0.41 by merging values in $500
per capita intervals. In the transition from the Excess-to-Deficit (E2D) scenario toward a normal
bell-shaped distribution, the concentration of half the population at the dignity threshold level
would expand proportionally towards the global (reduced) average GDP per capita, while GDP
clusters around the excess threshold would shift to the upper half above the world’s average
GDP per capita.

A normal, equitable distribution of income and wealth would share the range and ratio
seen in the E2D redistribution scenario, while significantly decreasing the standard deviation
and coefficient of variation to less than four times their current levels. The Gini index would drop
to 34% of its current value, and be 24% lower than in the E2D model. Under this distribution,
the wealthiest 10% would hold 16% of global resources, while the poorest half of the population
would gain access to over one-third of the world’s income and wealth.

In an egalitarian utopian distribution, there would be no dispersion from the mean; all
individuals would have equal means. The proportion of the population and the distribution of
income and wealth would be perfectly balanced.

The graphs below show again the distribution of humanity´s resources in the present
and progressive fairness phases and their dispersion measures.

87
Figure 10 - International current and redistribution schemes with central and dispersion
figures

4. Fiscal and territorial equity

How can resources be redistributed in phases to promote fairness, reduce preventable


loss of human life (the burden of health inequity), and gradually allocate time and knowledge
toward enhanced human wellbeing while maintaining balance with nature?

As long as humanity remains attached to borders, property ownership, and hierarchical


structures, achieving equitable redistribution of income and wealth will require both fiscal and
territorial equity measures.

The table below illustrates the redistribution needed between countries in 2024:

Giving countries Receiving countries


Hoarding to deficit GDP pc > hoarding threshold GDP pc < dignity
(52977) threshold 3880
(GDP pc – 52977) x (3880 -GDP pc)x
Population Population
Excess to deficit GDP pc > excess threshold GDP pc < dignity
21838 threshold 3880
(GDP pc-21838) x (3880-GDP pc) x
Population Population
Normal and World average GDPpc (8755) - (excess GDP/total population (2686)
equitable D-E + Z score of GDP pc x ((excess GDP pc (21388)- dignity threshold (3880)/6)-
GDP pc

6069 + (Z score x (GDP pc-3880)/6) – GDP pc)

The fiscal and territorial cohesion strategies require identifying the dignity, excess, and
hoarding thresholds, the world GDP per capita average after excess-to-deficit redistribution, and
the Z score of the current GDP per capita level (indicating how many standard deviations the
GDP per capita is from the mean).

88
Annex 1 provides the per capita receiving or giving levels within different GDP per capita
ranges.

The equitable redistribution model described can be implemented at local, subnational,


national, and international levels. The more granular the geographic and demographic
breakdown, the greater the sensitivity in identifying more health- and wellbeing-efficient and
sustainable lifestyles and economies. With smaller sample units and larger sample sizes, the
identification of wasted or toxic GDP increases, enhancing the capacity for equitable
redistribution and freeing up time from competitive production. This, in turn, supports
collaborative advancements in knowledgexv that promote human wellbeing while maintaining
ecological balance.

We recognize that the analysis presented here may sound utopian, especially given that
even the UN agreement aimed at preventing tax abuse by large corporations and saving half a
trillion dollars is being blocked by wealthy nationsxvi. Currently, there are no benchmarks or
indicators for subnational and international fiscal equity. In response, we propose a system
based on logical and ethical principles that could help develop international targets and
indicators. This would address the gaps in existing UN conventions on fiscal equity, fair
international redistribution (which is currently far below the first step of the Global Health 2
Development (GH2D) benchmark), and the provision of global public goods.

Conclusions

The analysis presented in this paper underscores the urgent need for an ethical and
equitable redistribution of global economic resources to foster well-being, environmental
sustainability, and intergenerational equity. By reallocating excess resources from high-income
nations and reducing the economic disparities between nations, we can approach a system
where the greatest number of people can achieve health and life expectancy aligned with the
shared global goal outlined in the WHO Constitution.

Our proposed approach would first prioritize the redistribution of wealth above the
hoarding threshold, addressing the economic excess concentrated within the wealthiest
segment of nations, and redirecting it toward the deficit zone, where billions live below the
dignity threshold. This redistribution could effectively release significant economic resources,
reduce global economic and social inequality, and decrease the burden of preventable deaths
caused by poverty.

Second, the model calls for the reallocation of resources above the excess threshold
(above which human wellbeing does not improve any further) to the equity zone, thereby
achieving a more balanced and sustainable economic structure. The scenario outlined illustrates
how this stepwise redistribution can decrease the global GDP's concentration of wealth,
diminish the Gini index, and reduce income dispersion, making economic distribution more
equitable and less skewed toward extreme wealth concentration.

The envisioned equitable distribution also aligns with the potential for a sustainable
reduction in the global work and consumption burden. This transition would foster more
harmonious relationships between economic activity, environmental sustainability, and human
well-being. Furthermore, redirecting a portion of GDP currently “wasted” or “toxic” into
collective knowledge and public goods can drive innovation and long-term societal progress.

89
The implications of these findings extend beyond economic redistribution; they
challenge traditional paradigms of growth and competition, promoting cooperation, ecological
balance, and shared prosperity. Realizing this vision would require robust fiscal and territorial
policies, alongside global cooperation to ensure that the dignity threshold is met for all while
curbing excessive consumption and environmental impact.

In sum, transitioning to an equitable and sustainable economic model, as proposed, can


enable a profound shift in how societies prioritize human potential, ecological sustainability, and
the collective future of our shared planet. Through careful, ethical redistribution of resources,
we can address the loss of life due to inequity, support future generations, and foster a world
where all individuals have the opportunity to lead fulfilling, healthy lives in balance with nature.
i. https://www.sustainablehealthequity.org/webnair
ii. https://www.peah.it/2024/07/13556/
iii. https://www.peah.it/2024/10/identifying-international-sustainable-health-models/
iv. https://www.peah.it/2024/11/the-price-of-global-injustice-in-loss-of-human-life/
v. https://www.peah.it/2024/11/enough-is-enough-and-more-is-too-much-between-basic-
dignity-and-excess-hoarding-thresholds/
vi. https://www.who.int/about/governance/constitution
vii. https://www.peah.it/2024/11/the-price-of-global-injustice-in-loss-of-human-life/
viii. https://www.peah.it/2024/11/enough-is-enough-and-more-is-too-much-between-basic-
dignity-and-excess-hoarding-thresholds/
ix. https://www.nature.com/articles/s41599-023-02210-y
x. https://www.peah.it/2023/12/12800/
xi. https://prosperitydata360.worldbank.org/en/indicator/UN+SDG+GB+XPD+RSDV+GD+ZS
xii. https://www.euronews.com/next/2024/02/02/the-four-day-week-which-countries-have-
embraced-it-and-how-s-it-going-so-far
xiii. https://databank.worldbank.org/metadataglossary/gender-statistics/series/SI.POV.GINI
xiv. https://www.sciencedirect.com/topics/social-sciences/global-public-goods
xv. https://open-science-training-handbook.github.io/Open-Science-Training-
Handbook_EN/02OpenScienceBasics/03OpenResearchSoftwareAndOpenSource.html
xvi. https://taxjustice.net/press/world-losing-half-a-trillion-to-tax-abuse-largely-due-to-8-countries-
blocking-un-tax-reform-annual-report-finds/

90
Annex: redistribution pc by present GDP pc levels
Real H2D net redistrE2D net redistrN redistr D-E Real H2D net redistr
E2D net redistrN redistr D-E Real H2D net redistrE2D net redistrN redistr D-E
250 3718 3718 5334.64378 36250 0 -14352 -25318.2009 72250 -19691 -50352 -60874.6234
750 3218 3218 5400.11559 36750 0 -14852 -25818.2009 72750 -20191 -50852 -61374.6234
1250 2718 2718 5333.88626 37250 0 -15352 -26221.1919 73250 -20691 -51352 -61868.7757
1750 2218 2218 5444.54909 37750 0 -15852 -26721.1077 73750 -21191 -51852 -62350.8543
2250 1718 1718 5323.08029 38250 0 -16352 -27221.1077 74250 -21691 -52352 -62850.8543
2750 1218 1218 4887.8235 38750 0 -16852 -27669.2856 74750 -22191 -52852 -63349.9978
3250 718 718 4573.22262 39250 0 -17352 -28169.2856 75250 -22691 -53352 -63849.9978
3750 218 218 4431.43724 39750 0 -17852 -28669.2856 75750 -23191 -53852 -64331.1916
4250 0 0 4359.01265 40250 0 -18352 -29169.2226 76250 -23691 -54352 -64825.8158
4750 0 0 3912.79516 40750 0 -18852 -29669.2226 76750 -24191 -54852 -65325.8158
5250 0 0 3417.23355 41250 0 -19352 -30169.2226 77250 -24691 -55352 -65825.8158
5750 0 0 3014.33179 41750 0 -19852 -30665.1878 77750 -25191 -55852 -66322.5184
6250 0 0 2685.28209 42250 0 -20352 -31165.1878 78250 -25691 -56352 -66813.3049
6750 0 0 2249.87892 42750 0 -20852 -31592.0205 78750 -26191 -56852 -67290.2045
7250 0 0 1774.54156 43250 0 -21352 -32092.0205 79250 -26691 -57352 -67790.2045
7750 0 0 1357.92444 43750 0 -21852 -32586.2152 79750 -27191 -57852 -68285.4007
8250 0 0 934.608725 44250 0 -22352 -33046.426 80250 -27691 -58352 -68784.2846
8750 0 0 526.192635 44750 0 -22852 -33546.426 80750 -28191 -58852 -69281.0556
9250 0 0 235.137585 45250 0 -23352 -34046.426 81250 -28691 -59352 -69781.0556
9750 0 0 -253.863315 45750 0 -23852 -34534.9354 81750 -29191 -59852 -70281.0556
10250 0 0 -344.832627 46250 0 -24352 -35034.9354 82250 -29691 -60352 -70781.0556
10750 0 0 -745.531194 46750 0 -24852 -35526.6346 82750 -30191 -60852 -71281.0556
11250 0 0 -1244.39796 47250 0 -25352 -35973.0621 83250 -30691 -61352 -71781.0556
11750 0 0 -1700.73185 47750 0 -25852 -36473.0621 83750 -31191 -61852 -72281.0256
12250 0 0 -2154.94898 48250 0 -26352 -36973.0621 84250 -31691 -62352 -72781.0256
12750 0 0 -2540.15805 48750 0 -26852 -37473.0621 84750 -32191 -62852 -73281.0256
13250 0 0 -3015.09674 49250 0 -27352 -37973.0621 85250 -32691 -63352 -73781.0256
13750 0 0 -3469.51371 49750 0 -27852 -38473.0621 85750 -33191 -63852 -74279.8726
14250 0 0 -3949.0253 50250 0 -28352 -38958.9499 86250 -33691 -64352 -74775.3786
14750 0 0 -4362.22683 50750 0 -28852 -39458.9499 86750 -34191 -64852 -75241.6962
15250 0 0 -4763.46553 51250 0 -29352 -39958.9499 87250 -34691 -65352 -75736.8629
15750 0 0 -5263.46553 51750 0 -29852 -40458.9499 87750 -35191 -65852 -76236.8629
16250 0 0 -5752.4323 52250 0 -30352 -40958.9499 88250 -35691 -66352 -76736.8629
16750 0 0 -6250.86423 52750 -191 -30852 -41458.9236 88750 -36191 -66852 -77236.8629
17250 0 0 -6706.95908 53250 -691 -31352 -41956.63 89250 -36691 -67352 -77736.8629
17750 0 0 -7155.36566 53750 -1191 -31852 -42456.5864 89750 -37191 -67852 -78229.9439
18250 0 0 -7617.68587 54250 -1691 -32352 -42956.5864 90250 -37691 -68352 -78712.453
18750 0 0 -8113.74745 54750 -2191 -32852 -43456.5864 90750 -38191 -68852 -79212.453
19250 0 0 -8609.44339 55250 -2691 -33352 -43956.5864 91250 -38691 -69352 -79712.3874
19750 0 0 -9100.79257 55750 -3191 -33852 -44448.3563 91750 -39191 -69852 -80208.334
20250 0 0 -9599.69012 56250 -3691 -34352 -44948.3563 92250 -39691 -70352 -80708.334
20750 0 0 -10091.7007 56750 -4191 -34852 -45448.3563 92750 -40191 -70852 -81208.334
21250 0 0 -10499.3014 57250 -4691 -35352 -45948.3563 93250 -40691 -71352 -81702.1698
21750 0 0 -10999.3014 57750 -5191 -35852 -46447.7994 93750 -41191 -71852 -82202.1698
22250 0 -352 -11491.1655 58250 -5691 -36352 -46947.4971 94250 -41691 -72352 -82702.1698
22750 0 -852 -11991.1655 58750 -6191 -36852 -47447.4971 94750 -42191 -72852 -83202.1698
23250 0 -1352 -12490.5209 59250 -6691 -37352 -47947.4971 95250 -42691 -73352 -83701.5976
23750 0 -1852 -12990.5209 59750 -7191 -37852 -48447.4971 95750 -43191 -73852 -84200.9822
24250 0 -2352 -13490.5209 60250 -7691 -38352 -48945.0877 96250 -43691 -74352 -84700.9822
24750 0 -2852 -13989.2966 60750 -8191 -38852 -49443.7101 96750 -44191 -74852 -85200.9822
25250 0 -3352 -14489.2966 61250 -8691 -39352 -49918.4388 97250 -44691 -75352 -85700.9822
25750 0 -3852 -14987.6442 61750 -9191 -39852 -50414.4272 97750 -45191 -75852 -86200.9822
26250 0 -4352 -15487.6442 62250 -9691 -40352 -50914.3845 98250 -45691 -76352 -86700.1677
26750 0 -4852 -15987.6442 62750 -10191 -40852 -51414.3845 98750 -46191 -76852 -87200.1677
27250 0 -5352 -16464.5651 63250 -10691 -41352 -51914.3845 99250 -46691 -77352 -87700.1677
27750 0 -5852 -16964.5299 63750 -11191 -41852 -52408.5699 99750 -47191 -77852 -88200.1677
28250 0 -6352 -17410.1238 64250 -11691 -42352 -52905.0281 100250 -47691 -78352 -88700.1677
28750 0 -6852 -17910.1238 64750 -12191 -42852 -53401.8392 100750 -48191 -78852 -89200.1677
29250 0 -7352 -18409.7658 65250 -12691 -43352 -53897.3237 101250 -48691 -79352 -89700.1677
29750 0 -7852 -18909.7658 65750 -13191 -43852 -54395 101750 -49191 -79852 -90200.1677
30250 0 -8352 -19406.9255 66250 -13691 -44352 -54892.4588 102250 -49691 -80352 -90700.1677
30750 0 -8852 -19905.8764 66750 -14191 -44852 -55392.4588 102750 -50191 -80852 -91200.1677
31250 0 -9352 -20405.4607 67250 -14691 -45352 -55892.4588 103250 -50691 -81352 -91700.1677
31750 0 -9852 -20905.3309 67750 -15191 -45852 -56392.4588 103750 -51191 -81852 -92200.1677
32250 0 -10352 -21405.3309 68250 -15691 -46352 -56892.4588 104250 -51691 -82352 -92700.1677
32750 0 -10852 -21905.3309 68750 -16191 -46852 -57392.4588 104750 -52191 -82852 -93200.1677
33250 0 -11352 -22405.3309 69250 -16691 -47352 -57892.4588 105250 -52691 -83352 -93700.1677
33750 0 -11852 -22858.9215 69750 -17191 -47852 -58391.3651 105750 -53191 -83852 -94200.085
34250 0 -12352 -23318.4938 70250 -17691 -48352 -58883.0276 106250 -53691 -84352 -94700.085
34750 0 -12852 -23818.4938 70750 -18191 -48852 -59383.0276 106750 -54191 -84852 -95200.085
35250 0 -13352 -24318.4938 71250 -18691 -49352 -59883.0276 107250 -54691 -85352 -95700.085
35750 0 -13852 -24818.2009 71750 -19191 -49852 -60379.4712 107750 -55191 -85852 -96200.085
108250 -55691 -86352 -96699.6831

91
Acordos multilaterais ambientais:
panorama global e acontecimentos de janeiro de 2025
Multilateral environmental agreements:
global overview and key events of january 2025

Danielly Magalhães
Guto Galvão

Resumo: Este informe inaugura o ano de 2025 e dá as boas-vindas aos participantes do Curso
de Atualidade em Saúde Global e Diplomacia da Saúde, que acompanharão nossos relatórios
quinzenais sobre as principais discussões ambientais ao longo do ano. Neste primeiro boletim,
contextualizamos a interseção entre saúde e meio ambiente, esclarecemos conceitos-chave e
destacamos os acordos multilaterais mais relevantes. Além disso, abordamos os principais
acontecimentos do último mês, incluindo as implicações da saída dos EUA do Acordo de Paris e
a publicação do Relatório sobre Mudanças Climáticas no Brasil, que apresenta uma síntese dos
impactos atuais e recomendações para o país.

Abstract: This report marks the beginning of 2025 and welcomes participants of the Global
Health and Health Diplomacy Current Affairs Course, who will follow our biweekly reports on key
environmental discussions throughout the year. In this first edition, we provide context on the
intersection of health and the environment, clarify key concepts, and highlight the most relevant
multilateral agreements. Additionally, we cover major events from the past month, including the
implications of the United States' withdrawal from the Paris Agreement and the publication of
the Report on Climate Change in Brazil, which presents a synthesis of current impacts and
recommendations for the country.

A relação entre o meio ambiente e a saúde é evidenciada pelo conceito de serviços


ecossistêmicos - benefícios que os ecossistemas naturais fornecem à nossa sobrevivência e bem
estar. Esses serviços incluem o fornecimento de recursos como alimentos e água potável,
regulação do clima e doenças, apoio aos ciclos de nutrientes e polinização das culturas e oferta
de benefícios culturais e recreativos. A biodiversidade, a diversidade da vida na Terra,
desempenha um papel fundamental na manutenção desses serviços. Por exemplo, ecossistemas
com alta biodiversidade podem reduzir a prevalência de certas doenças por meio de um
fenômeno conhecido como "efeito de diluição", em que a alta riqueza de espécies diminui o
risco de doenças infecciosas humanas, diluindo a transmissão de patógenos entre várias
espécies hospedeiras.

O impacto das atividades humana no ambiente nos coloca hoje na chamada tripla crise
planetária que refere-se aos três principais problemas interconectados que a humanidade
enfrenta atualmente: mudança climática, poluição e perda de biodiversidade. Essas crises estão
interligadas e afetam mutuamente os ecossistemas, a saúde humana e a estabilidade econômica
global. A mudança climática resulta em eventos climáticos extremos e alterações nos padrões
climáticos; a poluição compromete a qualidade do ar, da água, do solo e dos alimentos,
prejudicando a saúde humana e ambiental; e a perda de biodiversidade reduz a resiliência dos

92
ecossistemas, diminuindo sua capacidade de fornecer serviços ecossiatêmicos e essenciais à
nossa saúde. Abordar essa tripla crise requer ações integradas e sustentáveis para garantir um
futuro equilibrado para o planeta.

Dentro da saúde duas abordagens discutem essa relação de maneiras muito próximas.
As abordagens One Health (Saúde Única) e Planetary Health (Saúde Planetária) compartilham
o reconhecimento da interconexão entre a saúde humana, animal e ambiental, mas diferem em
seus focos e escopos.

A abordagem de Saúde Única concentra-se na interrelação da saúde humana, animal e


ambiental, enfatizando a colaboração entre múltiplos setores para prevenir e controlar doenças,
especialmente aquelas que podem ser transmitidas entre animais e humanos. Ao reconhecer
essas conexões, a One Health ou “Uma só Saúde” promove estratégias abrangentes para lidar
com as ameaças à saúde, reconhecendo que o bem-estar humano depende profundamente da
saúde do nosso ambiente natural. Historicamente, essa abordagem tem sido liderada pelas
comunidades veterinária e de ecologia de doenças, com foco em zoonoses e resistência
antimicrobiana.76 No entanto esse conceito vem se expandindo e sendo utilizado pelo setor
saúde para explicar qualquer relação humana com o ambiente.

Por outro lado, a Saúde Planetária é uma abordagem mais recente que se concentra na
saúde das civilizações humanas e no estado dos sistemas naturais dos quais dependem. Ela
aborda os impactos das atividades humanas nos sistemas naturais da Terra e como essas
alterações afetam diretamente e indiretamente na saúde e sobrevivência da humanidade. A
Saúde Planetária é um campo transdisciplinar e orientado para soluções focado em analisar e
abordar os impactos da desestabilização dos sistemas naturais na saúde humana e em toda a
vida na Terra.77

Uma governança global das políticas ambientais é crucial para salvaguardar esses serviços
ecossistêmicos e, por extensão, a saúde pública. Vários acordos, resoluções, e convenções
ambientais multilaterais foram estabelecidos para enfrentar esses desafios. Vamos citar
algumas abaixo:

1. Acordo Quadripartite de Saúde Única

O Acordo Quadripartite de Saúde Única (One Health) é uma colaboração formal entre
quatro organizações internacionais: Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a
Agricultura (FAO), Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP), Organização
Mundial da Saúde (OMS), Organização Mundial de Saúde Animal (WOAH, anteriormente OIE)

Essas entidades reconhecem a interdependência entre a saúde humana, animal, vegetal


e ambiental e, por meio desse acordo, buscam fortalecer a colaboração multissetorial para
enfrentar desafios globais de saúde de maneira integrada. O memorando de entendimento que
formaliza essa parceria foi assinado em abril de 2022, estabelecendo uma estrutura legal para
ações coordenadas nas interfaces entre humanos, animais, plantas e ecossistemas. 78

76
One Health and planetary health research: leveraging differences to grow together
77
Planetary Health Alliance
78
Quadripartite Memorandum of Understanding (MoU) signed for a new era of One Health collaboration

93
Em 2022, a Aliança Quadripartite lançou o Plano de Ação Conjunto de Saúde Única 2022-
2026, que visa orientar a implementação da abordagem de Saúde Única nos países. Este plano
destaca três caminhos principais:

1. Governança: Estabelecimento de estruturas de governança eficazes para facilitar a


colaboração intersetorial.
2. Integração Setorial: Promoção da integração entre os setores de saúde humana, animal,
vegetal e ambiental.
3. Evidências e Conhecimento: Fortalecimento da base de evidências e do
compartilhamento de conhecimento para apoiar decisões informadas.

O plano propõe cinco etapas para a implementação da abordagem de Saúde Única:

1. Mobilização de partes interessadas


2. Avaliação de necessidades e capacidades
3. Desenvolvimento de estratégias e planos de ação
4. Implementação de atividades
5. Monitoramento e avaliação

Essas etapas visam apoiar os países na operacionalização da abordagem de Saúde Única,


promovendo uma resposta coordenada e eficaz aos desafios de saúde que emergem na
interface entre humanos, animais e o meio ambiente. 79

Em março de 2023, os líderes das organizações da Aliança Quadripartite emitiram um


chamado inédito para uma ação global aprimorada, enfatizando a importância de uma
abordagem integrada para enfrentar ameaças à saúde e promover o bem-estar sustentável.80

Através dessa colaboração, a Aliança Quadripartite busca alcançar resultados que


nenhum setor poderia obter isoladamente, promovendo uma abordagem holística para a saúde
global.

2 - Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) e o Acordo de


Paris

A governança das mudanças climáticas no âmbito das agências da Organização das


Nações Unidas (ONU) é caracterizada por uma abordagem multinível e multissetorial,
envolvendo diversas entidades que colaboram para enfrentar os desafios climáticos globais.

Em 1988, o PNUMA e a OMM estabeleceram o Painel Intergovernamental sobre


Mudanças Climáticas (IPCC)81, encarregado de fornecer aos formuladores de políticas avaliações
científicas regulares sobre o estado atual do conhecimento sobre mudanças climáticas. Seu
Primeiro Relatório de Avaliação em 1990 forneceu a base científica para a negociação de um
acordo multilateral, a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima
(UNFCCC), criada em 1992 com a responsabilidade de implementação e revisão das políticas.

79
A guide to implementing the One Health Joint Plan of Action at national level
80
Quadripartite call to action for One Health for a safer world
81
The Intergovernmental Panel on Climate Change

94
A Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) serve como
o principal fórum internacional para negociações e acordos climáticos, reunindo países para
discutir e implementar estratégias de mitigação e adaptação às mudanças climáticas. 82

Ambos IPCC e a UNFCCC possuem secretariados independentes, porém o IPCC possui


escritórios juntos a WMO. Dentro da OMS as questões de saúde relacionadas ao clima são
tratadas pelo Departamento de Ambiente, mudanças climáticas e Saúde.

Dentro desse contexto, várias agências da ONU desempenham papéis complementares:

• Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA): Focado na promoção de
práticas ambientais sustentáveis, o PNUMA lidera iniciativas para reduzir a poluição,
conservar a biodiversidade e promover a transição para economias verdes.

• Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD): Atua no apoio aos países
em desenvolvimento na elaboração e implementação de políticas climáticas, fornecendo
assistência técnica e financeira para projetos de mitigação e adaptação.

• Fundo Verde para o Clima (GCF): Estabelecido para apoiar financeiramente os países em
desenvolvimento na implementação de ações climáticas, o GCF visa mobilizar recursos para
projetos que promovam a redução de emissões e o fortalecimento da resiliência climática.

Além dessas agências, outras entidades da ONU, como a Organização Meteorológica


Mundial (OMM) e a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO),
contribuem com dados científicos, monitoramento climático e estratégias para enfrentar os
impactos das mudanças climáticas nos sistemas alimentares e na agricultura.

A governança climática da ONU é, portanto, um esforço coletivo que integra múltiplas


agências e programas, cada uma com seu mandato específico, mas todas alinhadas ao objetivo
comum de combater as mudanças climáticas e promover o desenvolvimento sustentável.

O Acordo de Paris um tratado internacional juridicamente vinculativo sobre mudanças


climáticas adotado por 196 Partes em 2015. Seu objetivo é limitar o aquecimento global bem
abaixo de 2°C, de preferência a 1,5°C, reconhecendo que as mudanças climáticas representam
riscos significativos para a saúde humana, incluindo o aumento de doenças relacionadas ao calor
e a disseminação de doenças transmitidas por vetores, entre outros. 83

A COP de clima ocorre todo ano. Para entender o que aconteceu na última COP 29, veja
a nossa publicação no Caderno CRIS Saúde Informe 21 e 22, 2024.

3 - A Convenção de Diversidade Biológica e o Marco Global de Biodiversidade Kunming-


Montreal

As políticas globais em biodiversidade se dão no âmbito da Convenção de Diversidade


Biológica (CDB), um tratado multilateral criado em 1988 pelo PNUMA. O Secretariado da CDB,
com sede em Montreal, Quebec, Canadá, opera sob o PNUMA. Suas principais funções são
organizar reuniões, redigir documentos, auxiliar os governos membros na implementação do
programa de trabalho, coordenar com outras organizações internacionais e coletar e divulgar
informações.

82
Linha do tempo das medidas envolvendo Mudanças Climáticas.
83
What is the Paris Agreement?

95
O órgão dirigente da convenção é a Conferência das Partes (COP), composta por todos os
governos (e organizações regionais de integração econômica) que ratificaram o tratado. Essa
autoridade final analisa o progresso da convenção, identifica novas prioridades e define planos
de trabalho para os membros.

O Marco Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal (GBF – Global Biodiversity


Framework) não é um tratado internacional juridicamente vinculativo. Em dezembro de 2022,
durante a 15ª Conferência das Partes (COP15) da Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB),
196 países adotaram o GBF. Embora não seja legalmente vinculante, o GBF estabelece metas e
objetivos para orientar os esforços globais na conservação e uso sustentável da biodiversidade.
Os países signatários são incentivados a desenvolver e implementar estratégias nacionais para
alcançar essas metas até 2030.84

O Marco estabelece uma visão para 2050: "Para 2050, a diversidade biológica é valorizada,
conservada, restaurada e utilizada de forma racional, mantendo os serviços dos ecossistemas,
sustentando um planeta saudável e fornecendo benefícios essenciais para todas as pessoas".
Também estabelece o objetivo de conservar, até 2030, pelo menos 30% das áreas terrestres,
águas interiores e áreas marinhas e costeiras do planeta. Essa meta é comumente referida como
"30x30".

A COP de biodiversidade ocorre a cada dois anos. Para entender o que aconteceu na última
COP 16, veja a nossa publicação no Caderno CRIS Saúde Informe 16 - 2024.

4 - Poluição e vários tratados

As Convenções de Basileia, Estocolmo e Roterdã são acordos internacionais destinados


a proteger a saúde humana e o meio ambiente dos riscos associados a produtos químicos e
resíduos perigosos.

A Convenção de Basileia (1989) visa controlar os movimentos transfronteiriços de


resíduos perigosos e seu depósito, promovendo a gestão ambientalmente adequada desses
resíduos. Seu secretariado é parte do PNUMA. A Conferência das Partes (COP) é o principal
órgão decisório, composta por todas as partes da convenção e se reúne a cada dois anos.

A Convenção de Estocolmo (2001) tem como objetivo eliminar ou reduzir a liberação de


Poluentes Orgânicos Persistentes (POPs), substâncias químicas altamente tóxicas e persistentes
no ambiente. Seu secretariado também é fornecido pelo PNUMA. 85

A Convenção de Roterdã (1998) estabelece um procedimento de consentimento prévio


informado para certos produtos químicos e pesticidas perigosos no comércio internacional,
promovendo a troca de informações e a responsabilidade compartilhada. Seu secretariado é
fornecido conjuntamente pelo PNUMA e pela Organização das Nações Unidas para Agricultura
e Alimentação (FAO).

Essas três convenções se reúnem a cada dois anos em COPs distintas mas que ocorrem
ao mesmo tempo devido suas inter-relações. Elas desempenham papéis cruciais na proteção
ambiental e na saúde pública, estabelecendo mecanismos para o controle e a gestão de
substâncias químicas perigosas e resíduos.

84
Kunming-Montreal Global Biodiversity Framework
85
Stockholm Convention on Persistent Organic Pollutants (POPs)

96
A Abordagem Estratégica para a Gestão Internacional de Produtos Químicos (SAICM)
é uma iniciativa voluntária que busca promover a gestão segura de produtos químicos em todo
o ciclo de vida, considerando aspectos ambientais, econômicos, sociais, de saúde e trabalho.
Embora não seja um tratado vinculativo, a SAICM complementa as convenções existentes,
fornecendo uma plataforma para a implementação de ações coordenadas na área de segurança
química. 86 O secretariado da SAICM também é fornecido pelo PNUMA. A Conferência
Internacional sobre Gestão de Produtos Químicos (ICCM), que é o principal órgão decisório da
SAICM, se reúne a cada dois anos.

A Convenção de Minamata sobre Mercúrio (2013) é um tratado internacional que visa


proteger a saúde humana e o meio ambiente dos efeitos adversos do mercúrio e seus
compostos. Ela estabelece medidas para reduzir as emissões e liberações de mercúrio, incluindo
a eliminação de fontes de emissão, a redução do uso de mercúrio em produtos e processos, e a
gestão ambientalmente adequada de resíduos contendo mercúrio. O secretariado da
Convenção de Minamata é fornecido pelo PNUMA.87 A Conferência das Partes (COP) da
Convenção de Minamata se reúne a cada dois anos.

Novo Acordo sobre Plástico: Em março de 2022, uma resolução histórica foi endossada
para desenvolver um acordo juridicamente vinculativo até 2024 para acabar com a poluição
plástica, abordando todo o ciclo de vida dos plásticos. A poluição plástica representa riscos para
os ecossistemas e a saúde humana, incluindo exposição a produtos químicos e ingestão de
microplásticos. Em dezembro de 2024, mais de 170 países se reuniram para concluir o tratado
global para alcançar um mundo livre de poluição plástica até 2040. Embora as negociações
tenham sido inconclusivas, os países procuraram concluir o processo em 2025, destacando uma
necessidade urgente e com prazo determinado de superar as áreas de divergência restantes.

Destaques de Janeiro de 2025

A saída dos EUA da OMS e do Acordo de Paris

A decisão do presidente Donald Trump, anunciada em 20 de janeiro de 2025, de retirar


os Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Acordo de Paris, representa
um marco significativo com implicações profundas para a saúde global e os esforços climáticos
internacionais.

A retirada do Acordo de Paris enfraquece os esforços multilaterais para combater as


mudanças climáticas. Os EUA, sendo um dos maiores emissores de gases de efeito estufa,
desempenham um papel crucial nas iniciativas globais de mitigação. No âmbito doméstico, a
administração Trump está promovendo uma reversão das políticas climáticas anteriores. O
recém-nomeado Secretário do Interior, Doug Burgum, assinou ordens para facilitar a exploração
de petróleo e gás em terras federais, incluindo a remoção de restrições ao desenvolvimento
offshore e a promoção de recursos no Alasca. Essas ações contrastam com as políticas da
administração Biden, que priorizavam a redução da exploração de combustíveis fósseis e o
investimento em energias renováveis.88

86
The Basel, Rotterdam and Stockholm conventions
87
Minamata Convention
88
US Interior Department takes first steps to carry out Trump energy agenda

97
A atual administração demonstra ceticismo em relação às mudanças climáticas,
influenciando a agenda de pesquisa e financiamento federal. Projetos relacionados ao clima
estão sendo revisados, com congelamento de financiamentos até que sejam alinhados à nova
ideologia governamental. Isso pode atrasar ou interromper pesquisas essenciais para o
entendimento e mitigação dos impactos climáticos.

A comunidade internacional pode ser forçada a intensificar seus esforços climáticos para
compensar a ausência dos EUA. Países como a China podem assumir papéis de liderança tanto
na saúde global quanto na agenda climática, preenchendo o vácuo deixado pelos EUA. Além
disso, organizações internacionais podem buscar mecanismos alternativos para garantir o
progresso contínuo em direção aos objetivos climáticos globais.89

As recentes decisões da administração Trump representam um retrocesso significativo


nos esforços globais de saúde e clima, exigindo uma resposta coordenada da comunidade
internacional para mitigar seus efeitos adversos. Embora a saída dos Estados Unidos do Acordo
de Paris possa desencorajar outros países a adotarem compromissos mais robustos de redução
de exploração de combustíveis fósseis, os impactos das mudanças climáticas, evidenciados por
eventos extremos mais intensos e frequentes, são uma realidade incontestável em todas as
regiões do mundo. Consequentemente, é improvável que nações e instituições que já iniciaram
seus processos de descarbonização e adaptação revertam essas iniciativas. Além disso, planos
de mitigação e adaptação climática oferecem benefícios significativos para a saúde e a
economia, tornando-se de interesse estratégico para os governos a sua implementação.

Relatório "Mudança do Clima no Brasil – Síntese Atualizada e Perspectivas para Decisões


Estratégicas" (MCTI)

O relatório "Mudança do Clima no Brasil – Síntese Atualizada e Perspectivas para


Decisões Estratégicas", publicado pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), em
parceria com a Rede Clima, o Instituto Alana e o WWF Brasil, oferece uma análise abrangente
dos impactos das mudanças climáticas no país. Este documento integra dados do 6º Relatório
de Avaliação do Painel Intergovernamental sobre Mudança do Clima (IPCC) com estudos
nacionais e internacionais recentes, visando fornecer subsídios para formuladores de políticas
públicas, pesquisadores e demais interessados no tema.

Principais Conclusões:

- Aquecimento Acima da Média Global: O Brasil já enfrenta um aquecimento superior à


média global. Em algumas regiões, as temperaturas máximas médias aumentaram até 3°C nos
últimos 60 anos. Entre 1961 e 1990, o número de dias com ondas de calor não ultrapassava sete
por ano; esse número subiu para cerca de 52 dias entre 2011 e 2020.

- Eventos Extremos: Há um aumento significativo na frequência e intensidade de


eventos climáticos extremos, como secas, inundações e ondas de calor, afetando diretamente a
biodiversidade, a saúde pública e a economia nacional.

- Impactos Regionais: O Nordeste brasileiro enfrenta riscos de desertificação devido à


redução das chuvas, enquanto a Amazônia sofre com o desmatamento e as queimadas,
comprometendo sua função como reguladora climática.

89
EUA de Trump abrem mão de liderança em saúde ao sair da OMS e, ao deixar Acordo de Paris, lavam
as mãos para crise que ajudaram a criar

98
Recomendações Estratégicas

- Redução de Emissões: É imperativo que o Brasil mantenha o aumento da temperatura


média global abaixo de 1,5°C, conforme o Acordo de Paris. Para isso, é necessário revisar e
ampliar as metas nacionais de redução de emissões de gases de efeito estufa.

- Adaptação e Resiliência: Desenvolver e implementar políticas de adaptação que


aumentem a resiliência das comunidades vulneráveis, especialmente em áreas suscetíveis a
desastres naturais.

- Conservação Ambiental: Fortalecer ações de preservação dos biomas brasileiros, com


ênfase na Amazônia e no Cerrado, essenciais para a manutenção dos serviços ecossistêmicos e
para a mitigação das mudanças climáticas.

- Transição Energética: Investir em fontes de energia renovável, como solar e eólica,


reduzindo a dependência de combustíveis fósseis e promovendo um desenvolvimento
econômico sustentável.

O relatório destaca a urgência de ações coordenadas entre governo, sociedade civil e


setor privado para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas. A implementação
das recomendações propostas é crucial para garantir um futuro sustentável e resiliente para o
Brasil.

O relatório "Mudança do Clima no Brasil – Síntese Atualizada e Perspectivas para


Decisões Estratégicas" destaca diversos impactos das mudanças climáticas na saúde pública
brasileira. As alterações nos padrões climáticos têm contribuído para o aumento de doenças
transmitidas por vetores, como dengue e Oropouche, devido à proliferação de mosquitos em
ambientes mais quentes e úmidos. Além disso, eventos climáticos extremos, como ondas de
calor, estão associados a um aumento de doenças respiratórias e cardiovasculares,
especialmente entre populações vulneráveis. A redução dos impactos das mudanças climáticas
na saúde requer o fortalecimento do Sistema Único de Saúde (SUS) e a implementação de
políticas integradas que abordem os determinantes sociais e ambientais da saúde. Isso inclui a
preservação da biodiversidade, acesso ao saneamento básico e moradias adequadas. O
fortalecimento das ações de vigilância em saúde, com o uso de modelos preditivos que integrem
dados epidemiológicos e socioambientais, é essencial para desenvolver estratégias eficazes de
enfrentamento às mudanças climáticas.

99
Deportações na Era Trump 2.0, seus impactos e as respostas da comunidade
internacional
Deportations in the Trump 2.0 Era, their impact, and the responses from the
international Community

Rafael Gomes França


Caio Murta
Giacomo Gianelli
Giulia Mariano Machado
Júlia Moraes
Marina Sujkowski
Deisy de Freitas Lima Ventura

Abstract: In the first report of 2025, the Migration, Refugee, and Health Working Group explored
the anti-migration policies of the new Trump administration and the responses of countries in
receiving their deported citizens.

Keywords: Migration; Refuge; Global Health.

Resumo: No primeiro informe de 2025, o Grupo de Trabalho de Migrações, Refúgio e Saúde


explorou as políticas anti-migração do novo governo Trump e as respostas dos países no
acolhimento de seus cidadãos deportados.

Palavras-chave: Migração; Refúgio; Saúde Global.

Contextualização

Entre os principais temas que marcaram a campanha para a reeleição de Donald Trump,
a retórica anti-imigração destacou-se como um dos pilares centrais de sua plataforma política.
O ex-presidente, conhecido por sua abordagem dura em relação à imigração durante seu
primeiro mandato, reforçou seu discurso com promessas de intensificar as medidas para conter
a crise migratória nos Estados Unidos. Entre as propostas mais impactantes, Trump afirmou que
instruiria o Departamento de Segurança Interna (DHS) e o Pentágono para preparar instalações
para abrigar migrantes em larga escala, além de reiterar planos para deportações em massa e a
expansão de políticas restritivas na fronteira sul¹.

A crise migratória nos Estados Unidos tem sido um dos desafios mais complexos
enfrentados pelo país, com um fluxo recorde de migrantes cruzando a fronteira com o México.
Segundo análises, o discurso anti-imigração de Trump não apenas mobilizou sua base eleitoral,
mas também se mostrou uma estratégia eficaz para polarizar o debate público e atrair atenção
para suas propostas. Durante sua campanha, ele criticou duramente as políticas de imigração
do governo Biden, acusando-o de negligência e de promover uma "invasão" de migrantes,
retórica que ecoou fortemente entre eleitores preocupados com a segurança nacional e o
impacto econômico da imigração descontrolada².

100
A reeleição de Trump, portanto, representa não apenas uma continuidade de suas
políticas anti-imigração, mas também um aprofundamento de uma visão que coloca o controle
fronteiriço como prioridade máxima. Enquanto seus apoiadores celebram a promessa de uma
abordagem mais dura, críticos alertam para os possíveis impactos negativos na imagem
internacional dos Estados Unidos e no tratamento de milhares de migrantes que buscam refúgio
no país. A crise migratória, assim, permanece no centro do debate político americano, com
Trump liderando uma agenda que propõe transformações radicais no sistema de imigração do
país³.

Dentre as propostas ousadas que o


presidente eleito, Donald Trump, se
comprometeu a realizar ao longo de seu
mandato, as mais propagadas durante a sua
campanha foram: a deportação de cerca de 11
milhões de imigrantes sem documentos; o
bloqueio da fronteira sul e extinção do direito de
cidadania por meio do nascimento em solo
americano; a aplicação de altas tarifas sobre itens
estrangeiros, principalmente em produtos vindos
da China; a restrição dos gastos com a despesa
pública; as modificações nos sistemas de saúde e alimentação do país; as transformações na
pauta de regulamentação voltada ao combate das mudanças climáticas e a criação de um novo
escudo de defesa antimíssil4.

Vale destacar, que o presidente Donald Trump assinou diversas ordens executivas nas
duas primeiras semanas, desde a sua posse, que vão em direção às propostas relatadas no
projeto de política de extrema-direita, Projeto 2025, ainda que o presidente tenha buscado se
afastar do polêmico documento. O Projeto 2025 inclui um extenso relatório de 900 páginas,
sugerindo uma revisão completa do poder executivo, que foi criado pela Heritage Foundation e
demais grupos conservadores, no ano de 2023, como uma espécie de roteiro para o próximo
presidente conservador5.

Trump negou diversas vezes ter qualquer envolvimento com o referido Projeto 2025,
após os democratas destacaram a aproximação com as ideias descritas no projeto, como um dos
motivos fundamentais para não votar no candidato na eleição e, mesmo que não haja provas
concretas de que ele esteja seguindo claramente essas propostas ou tenha algum objetivo direto
para isso, diversas das ações que ele tomou até o momento, vão em direção ao plano de
política5.

Respostas dos países e da comunidade internacional

Colômbia

Houve fortes pressões entre os Estados Unidos e a Colômbia com uma série de
denúncias e ameaças entre os dois países. Além de uma crise diplomática, as tensões também
marcaram uma crise comercial que foi evitada por conta do aceite da deportação dos migrantes
em aviões militares. Em vários posts no X, o presidente da Colômbia, Gustavo Petro, anunciou
que iria bloquear os voos de deportação do exército americano e o Presidente Donald Trump
ameaçou com uma tarifa de 25% sobre produtos colombianos e imposição de restrições à
imigração. Posteriormente, Petro dirigiu um post ao Secretário de Estado norte-americano
Marco Rubio, avisando que nunca permitiria que os colombianos fossem trazidos algemados

101
durante uma crítica à Rubio 6. A reunião da Comunidade de Estados Latino-Americanos e
Caribenhos (Celac) seria na quinta (28/01) e foi cancelada por falta de consenso do bloco,
fortemente marcada pelos conflitos entre EUA e Colômbia e pelo apoio da Argentina e El
Salvador aos Estados Unidos 7.

Os migrantes colombianos deportados por voos militares relataram graves denúncias


em relação ao tratamento dado a eles pelo governo dos EUA. Os relatos contam com a retiradas
de bens pessoais, comida estragada e agressões verbais. De acordo com as fotos divulgadas
pelo governo colombiano, os deportados deixaram a aérea internacional dos aeroportos de El
Dorado (Bogotá) usando máscaras faciais e sem algemas. Após a confirmação do retorno dos
voos, Petro publicou em sua conta no X "Eles são colombianos, são livres e dignos e estão em
sua pátria, onde são amados. O migrante não é um criminoso, é um ser humano que quer
trabalhar e progredir, viver a vida" 8.

México

O governo mexicano recebeu mais de 6.000 migrantes deportados durante as duas


primeiras semanas do governo de Donald Trump e, dentre esses, 1.371 eram de outras
nacionalidades. A presidente do México, Claudia Sheinbaum, argumentou “No caso de
migrantes que não têm nacionalidade mexicana, o Instituto Nacional de Migração (INM) abre
diferentes possibilidades, a maioria deles quer ser repatriado para seus países, então nesse caso
facilitaremos o transporte para que possam chegar, principalmente à América Central.” O chefe
do Executivo da Colômbia destacou que foram dois casos de supostas violações de direitos
humanos de migrantes deportados dos Estados Unidos foram detectadas, um de uma mulher
guatemalteca e outro de uma mexicana, sem contar detalhes do ocorrido 10.

No México, as deportações em massa prometidas por Trump ainda durante a campanha


estão causando preocupação, pois os mexicanos são quase metade dos 11 milhões de
imigrantes ilegais nos Estados Unidos e suas remessas representam quase 4% do produto
interno bruto (PIB) do país, que em 2024 teria recebeu um recorde estimado de US$ 65 bilhões
10
.

De acordo com uma reportagem do El País, não se sabe em que condições os imigrantes
chegaram ao México, há quanto tempo viviam nos Estados Unidos e para onde foram levados,
após a confirmação do pouso de 4 aviões no Aeroporto internacional de Felipe Angeles por
Sheinbaum. “Temos muito cuidado, não para que [as imagens dos deportados] não sejam vistas,
mas sim para que o ser humano seja visto, é isso que buscamos”,disse a deputada Anaí Esparza,
presidente da Comissão de Atenção aos Migrantes de o Congresso do Estado do México quando
questionada sobre sigilo de voo. Esparza diz que seria “desumano” expor essas pessoas à mídia
porque “muitas chegam com sonhos desfeitos” e ressalta que a prioridade das autoridades é
dar-lhes ferramentas para reconstruir suas vidas no México.

O governo mexicano optou pela cautela e espera manter um bom relacionamento com
Washington, apesar da ameaça de deportações em massa. “O México está esperando por vocês
de braços abertos e não se esqueceu de vocês”, disse Sheinbaum em 20 de janeiro, horas antes
de Trump assumir o cargo 11.

Nesse ínterim, o governo de Claudia Sheinbaum lançou o programa Mexico Te Abraza


para receber os mexicanos que serão deportados 12. O documento vai na contramão da política
migratória de Trump: afirma que os mexicanos que cruzaram a fronteira não são criminosos,
mas trabalhadores, aos quais o México estende os braços para reinseri-los em sua economia. O

102
plano estipula os componentes de assistência e proteção consular (nos EUA, através da rede de
consulados), recepção e apoio (nos 6 estados fronteiriços) e reintegração (com oferta de
empregos e proteção social).

O plano de reintegração é gerido pelo Instituto Nacional de Migrações (INM), pela


Direção Nacional de Coordenação do Registro Nacional de População e Identidade (RENAMO) e
pelo Instituto Mexicano de Seguridade Social (IMSS). Estes órgãos estão sendo direcionados
para a recepção dos migrantes, preparando cartas de recepção e os traslados destes, num
primeiro momento. Posteriormente, prestarão auxílio na preparação dos documentos de
identidade, dos documentos dos registros de seguros de saúde e maternidade, assim como no
registro do serviço nacional de emprego.

O plano prevê ainda o cartão “bienestar paisano” (bem-estar civil). Esse cartão será
entregue aos migrantes repatriados, com o valor de dois mil pesos (em torno de R$550) para
cobrir o gasto de translado da fronteira até a comunidade de origem. Para além do cartão de
bem-estar civil, conforme o documento do programa, 18 programas sociais de 7 pastas
governamentais estão participando prontamente do México Te Abraza. Desde a pasta do
trabalho até agricultura e desenvolvimento territorial. O documento ainda delineia os esforços
de cooperação subnacional e empresarial. “Não estão sozinhas nem sozinhos, México Te
Abraça!”, é como termina a apresentação.

Reportagem do El País explica, também, quais são as categorias de seguro que os


migrantes terão acesso — às quais são as categorias já estabelecidas da seguridade social
mexicana 12:

“1. Doença e maternidade: Atendimento médico, farmacêutico e hospitalar sem restrições, e


pagamento por incapacidade devido a doença.

2. Riscos de trabalho: Atendimento médico, farmacêutico e hospitalar sem restrições, e


incapacidade por acidente ou doença relacionada ao trabalho.

3. Invalidez e vida: Pensão por invalidez para o segurado e pensão para os beneficiários em
caso de falecimento do titular.

4. Aposentadoria, desemprego em idade avançada e velhice: Poupança para a aposentadoria


(pensão).

5. Creche e benefícios sociais: Centros de cuidado infantil e atividades de lazer.”

Venezuela

O Departamento de Segurança Nacional dos Estados Unidos anunciou na quarta-feira,


29/01) que cancelará a recente extensão do estatuto de proteção temporária (TPS do inglês
Temporary Protected Status), que protege centenas de milhares de migrantes venezuelanos da
deportação e lhes permite residir e trabalhar legalmente nos Estados Unidos desde 2021. Antes
de deixar o cargo, o Presidente Joe Biden prorrogou este programa de proteção por 18 meses,
beneficiando cerca de 600.000 venezuelanos que fugiram do seu país devido à crise política e
econômica dos últimos anos. A prorrogação beneficiou igualmente pessoas de El Salvador, do
Sudão e da Ucrânia que se encontram atualmente nos EUA ao abrigo da proteção TPS 13.

O diretor jurídico do Northwest Immigrant Rights Project, Matt Adams, explica que
certamente haverá uma ação judicial contra a ação de Trump, pois há argumentos muito fortes
que os impedem de desfazer o que seu antecessor estabeleceu. Durante seu primeiro mandato,

103
Donald Trump já havia tentado eliminar o TPS de vários países, como El Salvador, Haiti e Sudão,
mas suas intenções foram bloqueadas pela Justiça. Assim, autorizações de trabalho concedidas
permanecerão válidas por enquanto. O advogado constitucionalista Rafael Peñalver afirma que
essas autorizações permanecerão até que um tribunal determine se é legal ou não. Além de que
sem uma mudança nas condições da Venezuela, seria inconstitucional a quebra da prorrogação
de 18 meses dada no final do governo Biden 14.

Por outro lado, e por mais incrível que pareça, o governo Maduro acena com boas
intenções para o governo Trump. Falou-se em uma “agenda-zero”, com o recomeço das relações
entre os dois países, no encontro entre Maduro e o enviado de Trump. Com isto, 6 americanos
que se encontravam presos, na Venezuela, foram libertados 15. A agenda de deportação de
Trump tampouco encontrou reforços em Caracas: “Queremos que eles voltem para que possam
ser felizes aqui. Para que venham criar negócios, trabalhar e construir em sua terra” afirmou o
Presidente Nicolás Maduro 16. As relações entre ambos os países seguem rompidas desde 2019,
no entanto.

Sem evidência, o presidente Donald Trump e outras pessoas de sua gestão alegaram que
migrantes venezuelanos prejudicam a economia e ameaçam a segurança nos Estados Unidos.
"Os Estados Unidos e o presidente Trump esperam que Nicolás Maduro receba de volta todos
os criminosos e membros de gangues que foram exportados para os Estados Unidos e que o faça
de forma inequívoca e sem condições" disse o representante dos Estados Unidos na Venezuela,
Richard Grenell 17, enquanto Maduro, presidente venezuelano, declarou que gostaria que os
migrantes retornassem ao país na segunda semana de presidência de Trump 18.

Brasil

O Brasil foi um dos países afetados pelas mudanças das políticas migratórias com o
governo Trump nos EUA. O primeiro voo com repatriados brasileiros chegou a Manaus no dia
25 de janeiro de 2025, com 88 pessoas que teriam adentrado as fronteiras estadunidenses de
maneira ilegal e/ou não possuíam visto para residir de maneira fixa no país¹⁹. Este foi o 46º voo
com brasileiros deportados vindos dos EUA desde 2022, somando cerca de 9 mil pessoas até o
momento¹⁹. Contudo, o que chamou a atenção neste evento, além de ser o primeiro da
administração de Trump dentro de um contexto de repúdio à imigração, foi o uso de algemas
entre os passageiros transportados após já estarem em solo brasileiro, no voo de Manaus a Belo
Horizonte. Embora o uso das algemas no processo de repatriação seja “de praxe”, segundo a PF,
as algemas não poderiam ter sido mantidas durante o transporte em solo brasileiro²⁰.

Diante desse cenário, o Presidente Lula enviou um avião da Força Aérea Brasileira para
realizar o transporte dos passageiros até Confins, em Minas Gerais. Em nota, o Itamaraty
posicionou-se contra essa prática e denunciou o tratamento “degradante” concedido aos
brasileiros²⁰. A Ministra dos Direitos Humanos e Cidadania (MDHC), Macaé Evaristo, reforçou
que as políticas imigratórias são definidas por cada país, mas que os direitos humanos não
podem ser violados; o Ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, reafirmou
a necessidade do respeito aos direitos fundamentais das pessoas, “sobretudo daquelas que não
são criminosas” ²¹. O MDHC também afirmou que iria posicionar um posto de acolhimento aos
repatriados no Aeroporto de Confins²¹.

Embora não haja políticas bilaterais entre os EUA e o Brasil sobre a deportação de
imigrantes ilegais, o Itamaraty afirmou que em 2018, durante o governo Temer e ainda no
primeiro mandato de Donald Trump, foi assinado um acordo que permitia a repatriação de
“imigrantes ilegais que não tinham mais possibilidade de recursos junto à administração

104
americana” ²¹. Ainda, o MRE destaca que esse processo deveria ser realizado de maneira
respeitosa e humana e que os EUA haviam se comprometido a não utilizar algemas dentro do
território brasileiro²². Embora o Brasil tenha endurecido sua postura frente ao governo norte-
americano, fica evidente que está tomando uma posição diferente de outros países latinos,
como a Colômbia, que inicialmente recusou as deportações estadunidenses²².

Referências Bibliográficas

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2. AP NEWS. Border immigration: Trump, Biden rhetoric in 2024 election. AP News, [data de publicação
não especificada]. Disponível em: https://apnews.com/article/border-immigration-trump-biden-rhetoric-
2024-election-327c08045edcc200f850d893de6a79d6. Acesso em: 01 fev. 2025

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Disponível em: https://cnnportugal.iol.pt/eua-2024/eleicoes-eua/eis-o-plano-de-donald-trump-para-
um-reforma-radical-no-governo-dos-eua/20241108/672d4b3cd34e94b8290730c4. Acesso em: 2 fev.
2025.

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Proposals. Disponível em: https://www.forbes.com/sites/alisondurkee/2025/02/02/heres-how-trumps-
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7. G1. Acordo entre EUA e Colômbia, além da pressão da Argentina e El Salvador, desmobilizou reunião
sobre deportações. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/blog/daniela-
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desmobilizou-reuniao-sobre-deportacoes.ghtml. Acesso em: 31 jan. 2025.

8. O Globo. 'Pesadelo americano': colombianos deportados pelos EUA chegam a Bogotá. Disponível em:
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105
13. El País. Programa ‘México te abraza’: la Tarjeta Bienestar Paisano y otros apoyos que recibirán los
migrantes deportados por Trump. Disponível em: https://elpais.com/mexico/2025-01-21/programa-
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14. BBC. Cuántos venezolanos en EE.UU. tienen TPS y cómo les afecta que Trump anule la extensión del
estatus que los protege de la deportación. Disponível em:
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15. El País. ¿Qué opciones tienen los 600.000 venezolanos que perderán el TPS para evitar la
deportación?. Disponível em: https://elpais.com/us/2025-01-31/que-opciones-tienen-los-600000-
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16. VEJA. O inesperado aceno de Maduro a Trump após gesto do americano. Disponível em:
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Acesso em: 2 fev. 2025.

17. CNN. “Queremos que voltem”, diz Maduro sobre imigrantes deportados dos EUA. Disponível em:
https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/queremos-que-voltem-diz-maduro-sobre-imigrantes-
deportados-dos-eua/. Acesso em 2 fev. 2025.

18. BBC. O que visita de assessor de Trump à Venezuela e libertação de americanos indica sobre
estratégia dos EUA com Maduro. Disponível em:
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19. BBC. Algemas, 3 aviões por semana, voo militar: como funciona a deportação sem e com Trump.
Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/articles/c1ez39wx8q5o. Acesso em: 02 fev. 2025.

20. G1. Veja perguntas e respostas sobre o impasse envolvendo a deportação de brasileiros algemados
pelos EUA. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2025/01/27/veja-perguntas-e-
respostas-sobre-o-impasse-envo

lvendo-a-deportacao-de-brasileiros-algemados-pelos-eua.ghtml#1. Acesso em: 02 fev. 2025.

21. AGÊNCIA BRASIL. Deportações de brasileiros dos EUA cresceram depois de acordo de 2018.
Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2025-01/deportacoes-de-
brasileiros-dos-eua-cresceram-depois-de-acordo-de-2018. Acesso em: 02 fev. 2025.

22. G1. Brasil e EUA não têm acordo formal sobre deportações de imigrantes ilegais. Disponível em:
https://g1.globo.com/politica/blog/julia-duailibi/post/2025/01/27/brasil-eua-deportacoes-imigrantes-
ilegais.ghtml. Acesso em: 02 fev. 2025.

106
Saúde das mulheres, crianças e adolescentes:
perspectivas e desafios globais no cenário atual

Women's, Children's, and Adolescents' Health:


global perspectives and challenges in the current landscape

Priscilla Paiva Gê Vilella dos Santos


Maria Teresa Rossetti Massari
Maria Auxiliadora Souza Mendes Gomes

Resumo: O retorno de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos traz desafios para a
diplomacia global e a saúde pública, considerando o histórico de seu primeiro mandato (2017-
2021). Sua política externa, marcada pela abordagem "América Primeiro" (America First), é
caracterizada por priorizar interesses nacionais, resultando na retirada ou redução de apoio a
organizações multilaterais, como o UNFPA e a OMS. Entre os principais impactos estão a
politização da cooperação internacional em saúde, o corte de financiamento para programas de
saúde materna e infantil e a restrição de direitos sexuais e reprodutivos. A continuidade dessas
políticas tende a aprofundar desigualdades e comprometer avanços conquistados nas últimas
décadas. Neste artigo contextualizamos este cenário de crise do multilateralismo, dando ênfase
aos impactos na saúde materna e infantil. O informe também traz a tradução de editorial da
revista The Lancet, que discute o tema. Ao final, um breve informe do Dia Internacional das
Mulheres 2025 da ONU Mulheres.
Palavras-chave: Saúde Global; Agências Internacionais; Diplomacia em Saúde; Saúde da Mulher;
Saúde da Criança.

Abstract: The return of Donald Trump to the presidency of the United States presents challenges
for global diplomacy and public health, considering the history of his first mandate (2017–2021).
His foreign policy, marked by the "America First" approach, prioritizes national interests, leading
to the withdrawal or reduction of support for multilateral organizations such as UNFPA and
WHO. Among the main impacts are the politicization of international health cooperation,
funding cuts for maternal and child health programs, and restrictions on sexual and reproductive
rights. The sequence of these policies is likely to deepen inequalities and undermine progress
achieved in recent decades. This article contextualizes this crisis of multilateralism, emphasizing
the impacts on maternal and child health. The report also includes a translation of an editorial
from The Lancet, which discusses the issue. Finally, a brief report on the UN Women’s
International Women’s Day 2025.
Keywords: Global Health; International Agencies; Health Diplomacy; Women Health; Children
Health.

Resumen: El regreso de Donald Trump a la presidencia de Estados Unidos trae desafíos a la


diplomacia global y a la salud pública, considerando la historia de su primer mandato (2017-
2021). Su política exterior, marcada por el enfoque "Estados Unidos primero", se caracteriza por
priorizar los intereses nacionales, lo que se traduce en la retirada o reducción del apoyo a
organizaciones multilaterales, como el UNFPA y la OMS. Entre los principales impactos se
encuentran la politización de la cooperación sanitaria internacional, el recorte de fondos para

107
programas de salud maternoinfantil y la restricción de los derechos sexuales y reproductivos. La
continuidad de estas políticas tiende a profundizar las desigualdades y comprometer los avances
logrados en las últimas décadas. En este artículo contextualizamos este escenario de crisis del
multilateralismo, enfatizando los impactos en la salud maternoinfantil. El informe también
incluye una traducción de un editorial de la revista The Lancet, que trata el tema. Finalmente, un
breve informe sobre el Día Internacional de la Mujer de ONU Mujeres 2025.
Palabras clave: Salud Global; Agencias Internacionales; Diplomacia em la Salud; Salud de la
Mujer; Salud Infantil.

O multilateralismo em crise

O multilateralismo, que pode ser compreendido como o compromisso de múltiplos


países em amenizar ou resolver desafios globais por meio de instituições e normas coletivas, já
enfrentava desafios mesmo antes da primeira gestão de Trump. O crescimento de tendências
de discursos nacionalistas, populistas e protecionistas em várias partes do mundo enfraqueceu
a capacidade de organizações diplomáticas, como a Organização das Nações Unidas (ONU), de
funcionar de maneira coesa.

Com Trump, esses desafios ganham nova intensidade. Sua retórica em prol da
manutenção de uma globalização perversa90, e sua rejeição a acordos, ilustram um afastamento
das abordagens colaborativas. Entretanto, seu desprezo em relação a essas instituições, acabam
minando ainda mais sua legitimidade, visto a influência que os EUA exerce na ordem mundial.

Redução do apoio aos organismos internacionais

Logo em seu primeiro dia de governo deste segundo mandato, Trump assinou diversas
revogações e ordens executivas que afetam questões de Imigração e Segurança Fronteiriça;
Energia e Meio Ambiente; Políticas Sociais e diversidade; e Saúde e Políticas Públicas. No que
tange ao campo da Saúde e Políticas Públicas, a tendência que já tem se concretizado é a de
intensificação dos cortes no financiamento dos EUA a organizações multilaterais, como a
Organização Mundial da Saúde (OMS), e a defesa de reformas que favoreçam os interesses
estadunidenses em detrimento de uma visão global compartilhada. Isso tende a criar lacunas

90
A teoria da globalização, proposta pelo geógrafo e teórico Milton Santos, analisa criticamente os
impactos da globalização a partir de uma perspectiva geográfica e social. Ele a divide em três
dimensões:
a) Globalização como fábula: Essa visão representa a globalização como um fenômeno positivo,
inclusivo e inevitável. O discurso dominante enfatiza os avanços tecnológicos, a integração econômica e
a promessa de benefícios universais. No entanto, essa narrativa ignora desigualdades, a concentração
de riquezas e o domínio de grandes corporações. Neste sentido, cria a ilusão de um mundo
interconectado e igualitário, mas esconde suas contradições.
b) Globalização perversa: Essa é a globalização tão como ela é/real; caracterizada pela desigualdade,
exclusão e exploração. A intensificação do capitalismo neoliberal gera maior concentração de poder em
empresas transnacionais e em países centrais, enquanto os países periféricos sofrem com a precarização
do trabalho, dependência econômica e exclusão social. Essa perversidade se manifesta na ampliação da
pobreza, no enfraquecimento dos Estados nacionais e na submissão das populações às regras do
mercado global.
c) Globalização possível: A globalização possível seria baseada na valorização do local, no
fortalecimento da cidadania e na criação de um sistema mais justo e solidário. Santos defende um
mundo em que a tecnologia e a economia estejam a serviço do bem comum, e não do lucro de poucos.

108
financeiras e institucionais que outros atores (como China e União Europeia) poderiam tentar
preencher, mas sem coordenação central.

A Organização tem se posicionado e ressaltou em nota que essas medidas podem causar
uma ameaça global a programas como o do HIV/Aids que, se prolongadas, podem levar ao
aumento de novas infecções e mortes, revertendo décadas de progresso e possivelmente
levando o mundo de volta aos anos 1980 e 1990.

A condução e cooperação em emergências sanitárias como pandemias, também acaba


sendo ameaçada visto que a retomada de uma agenda unilateralista enfraquece respostas
coordenadas e coletivas a crises globais. Este fator deve levar países a buscar e reforçar
alternativas regionais.

Saúde das Mulheres, Crianças e Adolescentes e seus (novos) desafios no cenário global

E é neste contexto que se inserem e se intensificam os desafios na área da saúde das


mulheres, crianças e adolescentes. O primeiro mandato do presidente Donald Trump teve um
impacto significativo sobre as políticas voltada para este público em nível global. As restrições
ao financiamento de saúde reprodutiva, a politização de organismos internacionais e as políticas
imigratórias restritivas geraram impactos profundos, especialmente para populações
vulneráveis.
Entre os principais desafios enfrentados naquele período e que já estão se
reatualizando/intensificando neste segundo mandato, destacam-se:

Restrição ao Financiamento para Saúde Reprodutiva

• Global Gag Rule: Trump reinstaurou e expandiu essa política “Regra da Mordaça
Global”, que proíbe o financiamento de ONGs internacionais que oferecem serviços ou
informações sobre aborto, mesmo que utilizem recursos próprios. Isso afetou programas de
planejamento familiar e saúde materna em países em desenvolvimento.

Redução do acesso à serviços e insumos de saúde

• Redução do apoio ao Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA): O governo


Trump cortou o financiamento ao UNFPA, alegando (sem evidências) que o órgão apoiava
abortos forçados na China. Essa decisão impactou programas de saúde materna e infantil em
países vulneráveis. A seguir traduzimos o artigo de Udani Samarasekera, publicado na renomada
The Lancet, que retrata mais detalhadamente este processo.

• Tentativas de revogação do Obamacare: Apesar de não ter sido totalmente revogado,


houve esforços para enfraquecer a Lei de Cuidados Acessíveis (ACA), limitando o acesso de
mulheres e crianças a serviços de saúde nos EUA.

Retrocessos em Direitos Sexuais e Reprodutivos

• Apoio a Políticas Antiaborto na ONU: O governo Trump se aliou a países


conservadores para limitar referências a direitos reprodutivos em documentos da ONU,
dificultando o avanço de políticas de saúde sexual e reprodutiva, ao reingressar na Declaração
de Consenso de Genebra.

• Proibição de procedimentos de redesignação de gênero para menores: Trump


assinou uma ordem executiva que proíbe o financiamento federal para tratamentos de transição
de gênero em menores de 19 anos.

109
Impacto da pandemia de Covid-19

• Saída da OMS: Trump anunciou a retirada dos EUA da Organização Mundial da Saúde
(OMS), prejudicando o financiamento global para programas de imunização infantil e saúde
materna, ainda mais com a nomeação de Robert F. Kennedy Jr. para o Departamento de Saúde
e Serviços Humanos (HHS), um ativista antivacina para liderar o HHS.

• Restrições à Comunicação sobre COVID-19: A desinformação e a politização da


pandemia durante a segunda metade de seu governo do primeiro mandato dificultaram a
implementação de políticas de saúde baseadas em evidências.

Redução das políticas de proteção para crianças e adolescentes migrantes

• Políticas Imigratórias Restritivas: Separação de famílias na fronteira e endurecimento


de políticas de asilo afetaram o bem-estar de crianças migrantes, aumentando os impactos na
saúde mental e problemas de saúde.

A seguir, apresentamos a tradução do artigo da seção World Report da revista The


Lancet, publicado em 25 de janeiro de 2025. O texto foi escrito por Udani Samarasekera,
jornalista especialista em saúde e ciência, que já atuou como editora sênior da revista e escreve
sobre saúde global, saúde pública, políticas de saúde e ciência.

A esperada retirada de financiamento da UNFPA por Trump prejudicará milhões


Mulheres e meninas perderão acesso a serviços de saúde essenciais caso o novo presidente dos
EUA corte o financiamento. (Por Udani Samarasekera)

Fundo de População das Nações Unidas (UNFPA) alerta que milhões de mulheres e
meninas em todo o mundo perderão o acesso a serviços essenciais de saúde sexual e
reprodutiva se a esperada retirada de financiamento por Donald Trump for concretizada. “O
impacto será devastador, especialmente para as mulheres em cenários humanitários”, disse
Sarah Craven, diretora do escritório do UNFPA em Washington, à The Lancet.

Quando The Lancet foi para impressão, Trump ainda não havia cortado o financiamento.
Em seu primeiro mandato como presidente, Trump interrompeu o financiamento dos EUA para
a agência dentro de poucos meses após assumir o cargo, e um cenário semelhante é provável.
“Se você observar a retórica durante a eleição, temos motivos para acreditar que perderemos
nosso financiamento dos EUA”, explica Craven. Ela menciona o Project 2025, um plano para o
novo presidente, que propõe interromper os fundos para o UNFPA.

Atualmente, os EUA são o maior doador do UNFPA no geral e o maior doador


humanitário da agência. Em 2024, o UNFPA recebeu mais de US$ 230 milhões dos EUA, dos quais
mais de US$ 200 milhões foram destinados ao trabalho humanitário. A perda desse
financiamento afetará muitos países em crise. Por exemplo, nas regiões afetadas por conflitos
na Nigéria, mais de meio milhão de pessoas vulneráveis, principalmente mulheres e meninas,
perderão acesso a serviços de saúde essenciais. No Iémen, quase 1 milhão de mulheres ficarão
sem serviços de saúde reprodutiva e quase 300.000 mulheres perderão acesso a serviços de
mitigação e prevenção da violência de gênero. Em Cox’s Bazar, Bangladesh, centenas de
mulheres rohingyas não poderão fazer cesarianas, os serviços de obstetrícia serão cortados e o
futuro da única unidade de atendimento de emergência obstétrica e neonatal 24 horas estará
em risco.

110
O governo Trump deverá invocar a Emenda Kemp-Kasten, que determina que nenhum
fundo dos EUA pode ser disponibilizado para “qualquer organização ou programa que, conforme
determinado pelo Presidente dos Estados Unidos, apoie ou participe da gestão de um programa
de aborto coercitivo ou esterilização involuntária”. Trump invocou essa emenda em 2017, assim
como administrações republicanas anteriores, que acusaram o UNFPA de participar de um
programa de aborto coercitivo ou esterilização involuntária na China. O UNFPA rejeita essas
alegações, e missões independentes de apuração dos fatos não encontraram evidências que
sustentem a base da Emenda.

Especialistas afirmam que a retirada do financiamento do UNFPA prejudicará as


mulheres. “[Isso] terá consequências devastadoras para o número cada vez maior de mulheres
e meninas que enfrentam violência de gênero e acesso inadequado a serviços de saúde sexual
e reprodutiva”, comenta Terry McGovern, reitor associado sênior de Assuntos Acadêmicos e
Estudantis da Escola de Saúde Pública e Política de Saúde da CUNY, em Nova York.

“Particularmente para mulheres e meninas em cenários humanitários, o UNFPA fornece


cuidados essenciais e que salvam vidas, desde kits de parto seguro até aconselhamento para
sobreviventes de violência de gênero”, diz Elisha Dunn-Georgiou, presidente e CEO do Global
Health Council, uma organização sem fins lucrativos dos EUA. “Cortar esse financiamento não
apenas elimina essas redes de apoio, mas também perpetua narrativas falsas às custas das
populações mais vulneráveis.”

O UNFPA tem se preparado para os cortes de financiamento. “Como já passamos por


isso antes, somos muito resilientes… já estamos buscando outros doadores”, observa Craven.
No entanto, a agência enfrenta uma tarefa desafiadora. “É um ambiente de financiamento
muito mais difícil”.

Janeen Madan Keller, pesquisadora sênior e vice-diretora de Política Global de Saúde no


Center for Global Development, comenta: “Se o financiamento dos EUA para o UNFPA for retido,
isso pode ter consequências muito diferentes em comparação a 2017, quando a primeira
administração Trump cortou o financiamento do UNFPA. Naquela época, outros doadores,
principalmente países europeus, intervieram para reforçar o orçamento do UNFPA, evitando
impactos negativos nos programas. Mas, desta vez, estamos enfrentando um período de
recursos limitados, com vários doadores reduzindo seus orçamentos de ajuda.”

Bloquear os fundos dos EUA para o UNFPA terá conseias de longo alcance, diz Nabeeha
Kazi Hutchins, presidente e CEO da Population Action International, uma organização sem fins
lucrativos voltada à saúde sexual e reprodutiva. “[Isso] mina o trabalho transformador do UNFPA
para proteger mulheres e meninas, aprofunda desigualdades, dificulta o progresso na redução
da mortalidade materna e reverte décadas de avanços na saúde e nos direitos sexuais e
reprodutivos, especialmente diante de conflitos e mudanças climáticas.” Sarah Shaw, diretora
associada de Advocacy na organização sem fins lucrativos MSI Reproductive Choices, afirma que
a retirada do financiamento dos EUA para o UNFPA seria “catastrófica”. Outras organizações,
incluindo a MSI, também devem perder financiamento quando Trump iniciar seu segundo
mandato. Para todas essas organizações, “será mais difícil do que nunca continuar oferecendo
serviços vitais”, observa Shaw, e “serão as mulheres e meninas que sofrerão e morrerão como
resultado.”

111
Perspectivas futuras

A crise do multilateralismo no contexto do retorno de Trump não se limita aos EUA; é


reflexo de tendências globais mais amplas, como o declínio da confiança nas elites globais e o
aumento de questões identitárias no discurso político. No entanto, sem a liderança ou ao menos
o engajamento construtivo dos EUA, será difícil revitalizar o multilateralismo como resposta
eficaz às ameaças globais.

Nesse cenário, o retorno de Trump pode ser tanto um catalisador para a fragmentação
do sistema internacional quanto uma oportunidade para o surgimento de novas formas de
cooperação mais descentralizadas e adaptadas ao século XXI. Essa dinâmica dependerá do
equilíbrio de poder entre os diversos atores globais e da capacidade das sociedades civis de
pressionar por maior cooperação internacional.

Além das questões geopolíticas, a crise do multilateralismo impacta diretamente áreas


como a saúde global, especialmente a saúde da mulher e da criança. Sem uma coordenação
internacional eficaz, programas de assistência, financiamento e distribuição de recursos para a
saúde materna e infantil podem ser prejudicados, ampliando desigualdades e dificultando o
combate a desafios como a mortalidade materna, neonatal e infantil, o acesso a vacinas e os
cuidados ao pré-natal. Nesse contexto, a retração dos EUA em fóruns multilaterais pode
enfraquecer iniciativas como a OMS, o UNICEF e o UNFPA exigindo que outros atores, como a
União Europeia, China e organizações não governamentais, assumam um papel mais central na
promoção de políticas de saúde voltadas a populações vulneráveis.

Dia Internacional das Mulheres 2025

Em 20 de dezembro de 2024, a ONU Mulheres anunciou que o tema do Dia Internacional


da Mulher de 2025 será "Para TODAS as mulheres e meninas: Direitos. Igualdade.
Empoderamento." Este tema destaca a necessidade de ações que promovam direitos iguais,
poder e oportunidades para todas, visando um futuro feminista inclusivo. A iniciativa retrata a
importância de capacitar a próxima geração, especialmente jovens mulheres e adolescentes,
como agentes de mudança.

O ano de 2025 marca o 30º aniversário da Declaração e Plataforma de Ação de Pequim,


adotada em 1995 por 189 governos durante a Quarta Conferência Mundial sobre as Mulheres.
Este documento continua sendo o plano mais progressista e amplamente endossado para os
direitos das mulheres e meninas globalmente, orientando políticas e investimentos em áreas
críticas como educação, saúde, paz, mídia, participação política, empoderamento econômico e
eliminação da violência contra mulheres e meninas. Com apenas cinco anos restantes para
alcançar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), é urgente abordar essas questões,
além de prioridades emergentes como justiça climática e o poder das tecnologias digitais.

A celebração deste marco ocorre num contexto de crescente insegurança e crises


múltiplas, conforme discorrido anteriormente, com confiança diminuída na democracia. Em
2024, 612 milhões de mulheres e meninas viviam em áreas afetadas por conflitos, destacando a
necessidade de esforços contínuos para garantir seus direitos e segurança.

Referência
Samarasekera U. Trump’s anticipated UNFPA defunding will harm millions. The Lancet. 2025 Jan
25;405(10345):286. doi:10.1016/S0140-6736(25)00134-5 (Disponível em:
<https://www.thelancet.com/journals/lancet/article/PIIS0140-6736(25)00134-
5/fulltext?dgcid=raven_jbs_etoc_email; acesso em: 31jan2025).

112
Quais são as perspectivas da segurança alimentar e nutricional global para 2025?

Eduardo Nilson
Denise Oliveira e Silva

Resumo: Nesse informe, refletiremos sobre a agenda global de segurança alimentar e


nutricional global em 2025, considerando a continuidade dos compromissos internacionais e
suas potencialidades e riscos diante das mudanças na conjuntura geopolítica mundial e como
isso se reflete no Brasil e suas políticas. Nesse ano, teremos oportunidades como a Cúpula de
Sistemas Alimentares +4 na Etiópia e a COP 30 no Brasil, mas diferentes riscos como o aumento
dos fenômenos climáticos extremos e a nova administração Trump ameaçam a segurança
alimentar e nutricional global.

O ano de 2025 começa novas e velhas esperanças e promessas na agenda de segurança


alimentar e nutricional (SAN), assim como novos e velhos desafios e ameaças. O desafio da
eliminação da fome no mundo continua atual e cada vez mais relacionado à transformação dos
sistemas alimentares globais. Enquanto isso, continuam a ser fortalecidos os diagnósticos no
nível global ao subnacional, bem como seu histórico e projeções. Nunca tivemos tanta
informação de qualidade, mas nunca tivemos tanta desinformação.

Os compromissos internacionais continuam sendo um chamamento para as agendas


relacionadas aos direitos humanos em particular relacionando cada vez mais a saúde humana e
a saúde planetária. E os alimentos têm um papel central por meio dos sistemas alimentares,
desde a sua produção e processamento até sua distribuição e consumo, com o enfrentamento
desigual dos sistemas hegemônicos com os sistemas transformadores.

Nesse meio, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) são mais atuais e


necessários do que nunca e movimentos como a Cúpula de Sistemas Alimentares buscam
integrar mais fortemente essa agenda com o papel dos alimentos. Contudo, o final um tanto
melancólico e desanimador da Década de Ação sobre a Nutrição não deixa de ser um alerta
sobre o risco da fragmentação dos compromissos globais.

Lembrando o contexto atual da nutrição, saúde e ambiente em nível global,


continuamos com a dupla carga da má nutrição, representada pela continuidade da desnutrição
e de outras carências nutricionais junto com o aumento da obesidade e das outras doenças
crônicas não-transmissíveis, que se alia às mudanças climáticas para criar uma sindemia global
sem precedentes, que chama para a transformação dos sistemas alimentares.

Nesse sentido, a COP 30, em Belém, no Brasil, por sua vez, traz uma expectativa enorme
de avançar sobre tópicos que não foram abordados em cúpulas anteriores, trazendo uma grande
responsabilidade para o Brasil como anfitrião que deve, ao mesmo tempo, ser modelo nas
agendas. Para os mais esperançosos, a COP 30 tem o potencial de ser um momento marcante
para a agenda dos sistemas alimentares, especialmente considerando sua localização na
Amazônia e o crescente reconhecimento da necessidade de transformar os sistemas
alimentares para enfrentar as mudanças climáticas, a perda de biodiversidade e a insegurança
alimentar. Por outro lado, o caminho para os avanços necessários (e que não teve êxito nas COPs

113
anteriores), incluem a construção de forte vontade política, do aumento de financiamento e de
esforços colaborativos entre setores e partes interessadas.

Em relação ao papel do Brasil, também há grande expectativa sobre a implementação


da Aliança Global contra a Fome, que foi um dos principais marcos da presidência brasileira do
G20, agora nas mãos da África do Sul. Ainda que a Aliança tenha sido desenhada para operar
junto ao bloco, mas com governança própria, a manutenção de sua prioridade, que se
expressam em compromissos e financiamento, depende diretamente das lideranças do bloco.

Ao mesmo tempo, o impacto das mudanças climáticas está cada vez mais presente nos
sistemas alimentares e sentido no cotidiano das populações, a exemplo do impacto nos preços
de produtos como o azeite de oliva e do café, mas que ameaçam cada vez mais alimentos
básicos. Nesse mesmo contexto, vemos, ainda, um aumento das migrações forçadas de
populações em virtude das mudanças climáticas, trazendo como uma causa e consequência a
insegurança alimentar e nutricional.

Para completar, é inevitável comentar sobre a nova presidência de Donald Trump, nos
Estados Unidos da América, que pode ameaçar significativamente as agendas globais de SAN e
saúde, bem como de sistemas alimentares, por meio de guerras comerciais, enfraquecimento
do multilateralismo (em especial em relação às Nações Unidas e seus organismos),
negacionismo e desinformação, desregulação, autoritarismo e poder político por oligopólios,
entre outros riscos.

Diante desse cenário, está crescentemente desafiador trabalhar sobre os mecanismos


para a transformação dos sistemas alimentares, de forma a priorizar sua saudabilidade,
sustentabilidade, inclusão e resiliência, equilibrando o mundo globalizado e urbanizado com a
necessidade de soluções predominantemente locais.

Os compromissos internacionais de SAN e sistemas alimentares

O ano de 2025 é chave para os principais compromissos globais nas agendas de


alimentação, nutrição e agenda climática, como os ODS, a Década de Ação Sobre a Nutrição e a
Cúpula de Sistemas Alimentares, em que persistem as e de governança, principalmente em
relação aos espaços de participação da sociedade civil e prevenção e manejo de conflitos de
interesses em relação à participação de entes privados, bem como o risco de fragmentação da
agenda pela falta de articulação entre esses compromissos.

Com seus compromissos mais amplos, os ODS são objeto de grande preocupação,
particularmente no campo dos indicadores relacionados à segurança alimentar e nutricional, na
medida em que o monitoramento do avanço de suas metas mostra avanços pouco expressivos
em alguns e mesmo a continuidade de retrocesso em outras. Não é novidade que a recuperação
pós pandemia em relação à redução da fome tem sido desigual entre as diferentes regiões do
mundo e insuficiente global e regionalmente (FAO/IFAD/UNICEF/WFP/WHO, 2024). Como
resultado, mantidas as atuais tendências, poucos ODS relacionados à nutrição e saúde que
poderão ser alcançados em 2030.

No caso da América Latina e o Caribe, por exemplo, o monitoramento dos indicadores


de segurança alimentar e nutricional no relatório “Panorama Regional de Segurança Alimentar
e Nutrição 2024” mostram uma redução da fome e a insegurança alimentar por dois anos
consecutivos na região, atribuída a programas de proteção social e esforços de recuperação pós-
COVID (FAO, FIDA, OPS, PMA, 2025). No entanto, persistem desigualdades significativas, que

114
afetam especialmente as mulheres, as populações rurais e os grupos vulneráveis, estando o
Caribe mais fortemente afetado. Além disso, a exemplo do resto do mundo, a região não
alcançará a maioria dos objetivos de nutrição, e as dietas saudáveis continuam sendo as mais
caras em comparação com outras regiões.

Outro ponto de grande relevância desse mesmo relatório foi o destaque à análise dos
potenciais impactos da variabilidade climática e os fenômenos climáticos extremos na segurança
alimentar e nutricional, considerando a disponibilidade, acesso, utilização e estabilidade dos
alimentos e sua produção. Nesse sentido, o documento reforça que esses fenômenos reduzem
a produtividade agrícola, interrompem as cadeias de abastecimento e aumentam os preços dos
alimentos e que as populações vulneráveis são as mais afetadas e os hábitos alimentares
também mudam. Em outras palavras, a variabilidade climática e os fenômenos climáticos
extremos já impactam e no futuro poderão impactar ainda mais negativamente todas as
dimensões da segurança alimentar e nutricional, agravando a insegurança alimentar e
nutricional e reforçando as causas da má nutrição.

Para além da fome e desnutrição, é importante destacar que o cenário de dupla carga
da má nutrição se intensifica ainda mais, principalmente em regiões do mundo como a América
Latina e Caribe, Sudeste da Ásia e África. Com isso, observa-se globalmente um aumento gradual
das prevalências de obesidade e das doenças crônicas não-transmissíveis (DCNTs) relacionadas
à alimentação inadequada, como cânceres, doenças cardiovasculares, diabetes e outras,
continuam aumentando a cada ano globalmente (World Health Organization (WHO), 2024).
Tornando esse cenário ainda mais complexo, não se pode esquecer, ainda, da relação entre a
dupla carga da má nutrição com as consequências negativas dos sistemas alimentares
hegemônicos sobre o meio ambiente, na forma da sindemia global de desnutrição, obesidade e
mudanças climáticas (Swinburn et al., 2019).

Em continuidade à discussão desses grandes compromissos globais, 2025 marca o


término da Década de Ação das Nações Unidas sobre a Nutrição, cujas ações reforçaram, nos
últimos anos, questões da atuação intersetorial mediante a cooperação para o desenvolvimento
industrial, o fortalecimento do papel das mulheres no desenvolvimento, o desenvolvimento de
recursos humanos, a erradicação da pobreza rural e outras prioridades.

Por outro lado, nos últimos anos observa-se um enfraquecimento gradual da Década de
Ação diante dos outros compromissos na agenda de alimentação e nutrição, de modo que suas
principais ações concentraram-se em sua primeira metade e sua relevância para os atores
globais não conseguiu se sustentar diante da competição com outras iniciativas afins, como a
Cúpula de Sistemas Alimentares, nem de responder adequadamente à deterioração da SAN
global e sua relação com as crises econômicas e políticas nacionais e as consequências da
pandemia de Covid-19 e das mudanças climáticas. Nesse cenário, pôde-se observar um gradual
enfraquecimento do apoio e incentivo pela FAO, pela OMS e pelo UN Nutrition à Década e a suas
iniciativas, como as redes de ação, assim como o direcionamento do interesse do setor privado
para a Cúpula de Sistemas Alimentares e fortalecer-se no contexto de outras iniciativas mais
permeáveis e menos críticas à participação privada, como o Scaling Up Nutrition e o Nutrition
for Growth, principalmente depois de 2020.

Portanto, diante da falta de manifestação inclusive dos organismos que coordenavam a


Década de Ação para a Nutrição, OMS e FAO, em relação ao ano final da iniciativa, infelizmente
temos uma despedida melancólica, possivelmente acompanhada de documentos de
monitoramento e encaminhando a continuidade da agenda para os demais compromissos.

115
Ainda como marco na agenda de segurança alimentar e nutricional global em 2025,
figura o balanço dos 4 primeiros anos da Cúpula de Sistemas Alimentares (“UN Food Systems
Summit +4 Stocktaking Moment”), em Adis Abeba, na Etiópia, durante o mês de julho, como um
de seus compromissos de gestão, por meio de uma reunião global de balanço a cada dois anos
para revisar o progresso na implementação dos resultados deste processo e suas contribuições
para o alcance da Agenda 2030.

Segundo seu núcleo de coordenação, a Cúpula de Sistemas Alimentares da ONU de 2021


(cuja sigla é UNFSS, em inglês), teria marcado uma nova narrativa para sistemas alimentares
sustentáveis como uma alavanca fundamental para os Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (ODS) e, apesar do progresso lento, tem catalisado um impulso considerável nos
países e em seu no ecossistema de apoio para colocar em movimento as transformações
necessárias até 2030. (United Nations Food Systems Coordination Hub, 2025).

No primeiro momento de balanço (UNFSS+2), buscou-se manter a prioridade aos


sistemas alimentares junto aos governos nacionais e manter e acelerar nessa agenda rumo a
sistemas alimentares sustentáveis, inclusivos e resilientes que beneficiem igualmente as
pessoas, o planeta e a prosperidade compartilhada. Esse chamado à ação comprometeu, ainda,
o sistema da ONU a modelar coletivamente uma nova forma de trabalhar a serviço das
transformações dos sistemas alimentares lideradas pelos governos e foi reiterado em outros
compromissos internacionais, como a Declaração Política do Fórum Político de Alto Nível sobre
Desenvolvimento Sustentável (HLPF) de 2023, a Cúpula dos ODS de 2023 e a Declaração da
COP28 sobre Agricultura Sustentável, Sistemas Alimentares Resilientes e Ação Climática,
buscando acelerar a integração da agricultura e dos sistemas alimentares na ação climática e,
simultaneamente, a incorporar a ação climática nas agendas políticas e ações relacionadas à
agricultura e aos sistemas alimentares.

Dentre as prioridades do chamado à ação da UNFSS+2, destacaram-se:

• Incorporar estratégias de sistemas alimentares em todas as políticas nacionais para o


desenvolvimento sustentável, para os meios de subsistência, nutrição e saúde das pessoas, para
o crescimento econômico, ação climática e natureza, e para abordar perdas pós-colheita, sem
deixar ninguém para trás.

• Estabelecer governança de sistemas alimentares que envolva todos os setores e partes


interessadas para uma abordagem de toda a sociedade, combinando abordagens de curto e
longo prazos.

• Investir em capacidades de pesquisa, dados, inovação e tecnologia, incluindo conexões


mais fortes com ciência, experiência e expertise.

• Aprofundar o desenho e a implementação participativos e integrados, incluindo


mulheres, jovens e povos indígenas no nível local, com compartilhamento de conhecimento,
programação intersetorial, parcerias multissetoriais, ações baseadas no contexto e no local,
produção mais forte e diversificada, e responsabilidade mútua.

• Promover maior engajamento das empresas, inclusive por meio de parcerias público-
privadas, para moldar a sustentabilidade dos sistemas alimentares e estabelecer e fortalecer
mecanismos de responsabilização, reconhecendo sua centralidade para os sistemas
alimentares.

116
• Garantir acesso a financiamento concessionário de curto e longo prazo, investimentos,
apoio orçamentário e reestruturação da dívida.

Contudo, ainda segundo o núcleo de coordenação da Cúpula, desde então, o contexto


global para a transformação dos sistemas alimentares tem apresentado grandes desafios, como
o conflito contínuo na Ucrânia, no Sudão e, mais recentemente, no Oriente Médio,
intensificando as preocupações com a segurança alimentar, de saúde e nutricional, destacando
a urgência de sistemas alimentares resilientes. A isso se somam as dificuldades em garantir
investimentos no fortalecimento e na transformação dos sistemas alimentares, exigindo
mudanças transformadoras a partir de interseções, interdependências e convergências dos
sistemas alimentares com finanças, energia, nutrição, ação climática, biodiversidade,
degradação do solo e meios de subsistência rurais.

Assim, para dar continuidade aos compromissos de 2023 e enfrentar o contexto atual
da agenda de sistemas alimentares, o Chamado à Ação do Secretário-Geral (SG) traz, no âmbito
da UNFSS+4, os seguintes objetivos gerais:

1. Documentar e avaliar o progresso da agenda: acompanhar e relatar os avanços na


implementação das transformações dos sistemas alimentares, com foco em abordagens
integradas e colaborações intersetoriais.

2. Fortalecer a responsabilização: reforçar mecanismos de transparência e prestação de


contas para garantir que os compromissos assumidos sejam cumpridos e que os resultados
sejam mensuráveis.

3. Investir em transformações sustentáveis: mobilizar recursos financeiros e técnicos


para apoiar iniciativas que promovam sistemas alimentares resilientes, inclusivos e sustentáveis.

4. Acelerar a ação: identificar e superar barreiras para acelerar a implementação de


mudanças transformadoras nos sistemas alimentares, alinhadas com os Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS).

5. Promover abordagens de "todo o governo": incentivar a coordenação entre


diferentes ministérios e níveis de governo para garantir uma abordagem holística e coerente
para a transformação dos sistemas alimentares.

6. Engajar múltiplas partes interessadas: fortalecer a participação de atores diversos,


incluindo setor privado, sociedade civil, comunidades locais e grupos vulneráveis, para garantir
que as transformações sejam inclusivas e equitativas.

Por fim, segundo a coordenação da Cúpula, esses objetivos visam consolidar os avanços
alcançados até o momento e direcionar esforços para enfrentar os desafios emergentes,
garantindo que os sistemas alimentares globais se tornem mais resilientes, sustentáveis e
capazes de atender às necessidades de todas as pessoas, do planeta e da prosperidade
compartilhada.

Diante dessa mensagem oficial, vale destacar que inúmeras organizações globais
também trabalham no monitoramento independente dos indicadores da Cúpula de Sistemas
Alimentares no contexto dos ODS, incluindo o Food Systems Countdown Initiative. Em reu último
relatório, essa iniciativa analisa as mudanças nos valores dos indicadores de 2000 a 2014,
mostrando a direção e o ritmo do progresso dos resultados desejados (Food Systems
Countdown Initiative, 2025)

117
A iniciativa monitora indicadores em cinco grandes temas, totalizando 42 indicadores:

1. Dietas, nutrição e saúde, que compreende:

• Acesso à água potável.


• Consumo de todos os cinco grupos alimentares.
• População que não pode pagar por uma dieta saudável.
• Custo de uma dieta saudável.
• População que enfrenta insegurança alimentar moderada ou grave.
• Disponibilidade de frutas e vegetais.
• Diversidade alimentar mínima para mulheres e para crianças pequenas.
• NCD-Protect: Pontuação média dos adultos em um indicador de práticas alimentares
protetoras contra doenças crônicas não transmissíveis, como consumir fibras suficientes.
• NCD-Risk: Pontuação média dos adultos em um indicador de práticas alimentares que
aumentam o risco de doenças crônicas não transmissíveis, como consumir muito açúcar.
• Prevalência de subnutrição.
• Consumo de refrigerantes.
• Vendas de alimentos ultraprocessados.
• Consumo zero de frutas ou vegetais.
2- Ambiente, recursos naturais e produção, que inclui:
• Retirada de água para agricultura.
• Mudança na área de terras cultiváveis.
• Intensidade das emissões de gases de efeito estufa, por grupo de produtos.
• Índice de Saúde das Pescarias.
• Emissões de gases de efeito estufa dos sistemas alimentares.
• Função do ecossistema agrícola.
• Uso de pesticidas.
• Eficiência no uso de nitrogênio.
• Rendimento dos produtos alimentares, por grupo alimentar.
3. Meios de subsistência, pobreza e equidade, contemplando:
• Trabalho infantil.
• Mulheres proprietárias de terras.
• Proteção social.
• Desemprego e subemprego rural.
4. Governança, que inclui:
• Acesso público à informação.
• Responsabilização.
• Participação da sociedade civil.
• Capacidade de segurança alimentar.

118
• Reconhecimento do direito à alimentação.
• Estratégias (caminhos ou pathways) nacionais para a transformação dos sistemas
alimentares.
5. Resiliência, que engloba indicadores de:
• Diversidade.
• Capital social.
• Volatilidade dos preços dos alimentos.

De modo geral, a análise é relativamente otimista, na medida em que quase metade (20
dos 42 indicadores com tendências temporais examinados) tem apresentado tendência de
melhora, globalmente, englobando indicadores em todos os cinco temas. Segundo esse
relatório, por exemplo, o acesso à água potável, que é essencial para a segurança alimentar e
nutricional e para manter os alimentos seguros, aumentou significativamente em todas as
regiões, e, em média, os sistemas de produção da maioria das regiões tornaram-se mais
eficientes no uso de nitrogênio, o que significa menos desperdício e menor poluição ambiental.

No entanto, 7 de seus 42 indicadores pioraram significativamente em nível global no


mesmo período. Por exemplo, a volatilidade dos preços dos alimentos aumentou, sugerindo
preços menos estáveis diante de choques nos sistemas alimentares, e a responsabilização
governamental diminuiu, indicando que a governança pode não estar à altura do desafio de
apoiar a transformação dos sistemas alimentares. Por fim, para 15 indicadores, não houve
mudança significativa, apesar da necessidade de progresso constante para atingir metas globais
importantes.

Além dos indicadores isolados, o relatório também examina as interações dentro e entre
os 50 indicadores da contagem regressiva. As interações são críticas porque mudanças (ou a
falta delas) em um indicador podem causar (ou bloquear) mudanças em outros, complicando a
tomada de decisões e gerando trade-offs entre objetivos, bem como consequências não
intencionais das ações. A partir dessas análises, os especialistas que participam da iniciativa
constataram que a maioria dos indicadores tem interações teóricas com outros indicadores,
sendo algumas diretas e outras, indiretas, operando por meio de indicadores intermediários.

Por exemplo, os indicadores de governança e resiliência mostram o maior número de


conexões com outros temas, refletindo sua importância transversal para os resultados dos
sistemas alimentares. Dado que mudanças nessas áreas podem afetar muitos outros
indicadores, os formuladores de políticas devem priorizar ações para direcioná-las em direções
desejáveis. Outros indicadores, como a qualidade da dieta e a volatilidade dos preços dos
alimentos, têm muitos fatores contribuintes; para esses indicadores, alcançar mudanças requer
ações coordenadas substanciais entre setores e atores. Esses indicadores devem ser um foco
central dos esforços para melhorar a coerência das políticas.

Em suma, o relatório da contagem regressiva dos sistemas alimentares para o ano de


2024 conclui que o progresso em direção à transformação dos sistemas alimentares está
ocorrendo e que os formuladores de políticas devem reforçar esse progresso onde ele ocorreu
e redirecionar esforços onde ele não ocorreu, mantendo-se conscientes de que cada elemento
do sistema alimentar interage com outros elementos. Com isso, o progresso requer uma
abordagem holística que aproveite essas interconexões para impulsionar mudanças
transformadoras.

119
Nesse conjunto de iniciativas e compromissos, não podemos deixar de destacar o
resultado do protagonismo brasileiro na agenda internacional de segurança alimentar e
nutricional por meio da presidência do G20 em 2024, que colocou em prioridade que a
presidência brasileira tem dado ao enfrentamento da fome, da pobreza e das desigualdades por
meio da criação e aprovação da Aliança Global contra a Fome e a Pobreza. O Brasil fez um
chamamento aos líderes globais para priorizar políticas públicas baseadas em direitos,
reconhecendo a interconexão da saúde, da educação, da agricultura, da renda e de outras
políticas e buscando modelos de governança participativa para que a sociedade civil possa atuar,
aliando ações emergenciais imediatas com políticas estruturantes para interromper a
transmissão intergeracional da pobreza, assim como demonstrou a experiência brasileira antes
do desmonte das políticas sociais e que ora estão sendo reconstruídas e ampliadas.

Ao final de 2024, foi criada a plataforma para a Aliança que reúne, além de 82 países
oficialmente aderidos à iniciativa, a União Africana, a União Europeia, bancos internacionais e
organizações da sociedade civil.

Em termos técnicos, vale destacar o forte alinhamento com o policy brief intitulado
“Caminhos das políticas para o enfrentamento global da pobreza e da fome” (Policy Pathways
for Tackling Global Poverty and Hunger), produzido pela Fiocruz e aprovado pelo T20 Brasil,
tendo como fundamentos a autonomia dos países e a base em experiências bem-sucedidas já
implementadas, de caráter emergencial e estruturante (Silva et al., 2024). No policy brief,
destaca-se que acabar com a pobreza e a fome deve ser uma prioridade global para as
organizações internacionais e para todos os governos, para que os compromissos existentes e
futuros sejam plenamente apoiados e continuados e que o alívio da fome requer respostas
imediatas, mas acabar com a fome exige mudanças estruturais, baseadas políticas de múltiplos
setores.

Espera-se, portanto que na atual presidência da África do Sul, os líderes do G20 e as


agências da ONU expandam e reforcem seu compromisso com a Aliança Global e utilizem esse
mecanismo poderoso para articular governos nacionais, agências da ONU, sociedade civil e
outros atores-chave para a eliminação da fome no mundo.

Possibilidades da COP 30 no Brasil sobre os sistemas alimentares

A reunião da COP 30 em 2025, que será realizada em Belém, Brasil, apresenta uma
oportunidade única para avançar a agenda dos sistemas alimentares no âmbito do quadro global
de mudanças climáticas. Como a primeira COP sediada na região amazônica, o evento
provavelmente enfatizará o papel crítico dos sistemas alimentares na ação climática, na
conservação da biodiversidade e no desenvolvimento sustentável e traz uma grande
responsabilidade de avançar no estabelecimento de compromissos que não foram alcançados
nas cúpulas que a precederam.

Uma primeira perspectiva da COP 30 é promover a integração dos Sistemas Alimentares


na Ação Climática. Para isso, A COP 30 deve reconhecer e integrar ainda mais os sistemas
alimentares na agenda climática global, reconhecendo sua contribuição significativa para as
emissões de gases de efeito estufa (estimadas em 25-30% das emissões globais) e seu potencial
para mitigação e adaptação climática. Além disso, deve reforçar os Planos Nacionais de Clima,
para que os países sejam incentivados a incluir transformações mais detalhadas dos sistemas
alimentares em suas Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), como a redução de
emissões da agricultura, a promoção de dietas sustentáveis e a proteção de florestas e
ecossistemas.

120
Em função da própria localização da COP 30, espera-se, ainda um foco na Amazônia e
nas regiões tropicais. Nesse sentido, os temas de desmatamento e uso da terra devem ter
destaque e o Brasil, como anfitrião, precisa priorizar discussões sobre o combate ao
desmatamento e a promoção do uso sustentável da terra, especialmente na Amazônia,
incluindo a abordagem da expansão da agricultura (por exemplo, soja e pecuária) em áreas
florestais. Além disso, é fundamental incorporar o conhecimento e os direitos de povos
indígenas, visto que o papel das comunidades indígenas na proteção das florestas e na gestão
de sistemas alimentares sustentáveis é central e deve ser acompanhado do reconhecimento dos
direitos à terra e das práticas tradicionais.

Outro tema central deve ser o da agricultura sustentável e resiliente, alinhada com a
Cúpula de Sistemas alimentares, buscando promover a discussão e adoção de práticas agrícolas
inteligentes para o clima (“climate smart”), como agroecologia, agricultura regenerativa e
agricultura de precisão, para reduzir emissões de gases de efeito estufa e contaminantes,
melhorar a saúde do solo e aumentar a resiliência a choques climáticos. Para tanto, é importante
trabalhar no apoio aos pequenos agricultores, especialmente em países de baixos e médios
rendimentos, por meio de acesso a financiamento, tecnologia e programas de capacitação.

Ainda no âmbito dos sistemas alimentares, é preciso incluir a discussão da transição para
dietas sustentáveis, em que prioridade deve ser dada à promoção de dietas baseadas em
plantas, reduzindo o consumo de carne e laticínios, para diminuir as emissões e melhorar a
saúde pública, além da redução das perdas e desperdícios de alimentos, incluindo políticas e
inovações para reduzir perdas e desperdícios em toda a cadeia de produção, processamento,
distribuição e consumo de alimentos.

Para a implementação das mudanças necessárias, será imprescindível avançar no


financiamento da transformação dos sistemas alimentares, principalmente em países de baixa
renda, priorizando investimentos em agricultura sustentável, segurança alimentar e nutricional
e adaptação climática. Para tanto, são propostos modelos de financiamento misto e aumento
do engajamento do setor privado para os sistemas alimentares, contudo é fundamental incluir
mecanismos de gerenciamento de conflitos de interesses nessas relações para que os interesses
coletivos e ambientais sejam preservados e priorizados.

Espera-se, ainda, que a COP 30 possa trazer avanços no campo da governança da agenda
de sistemas alimentares e ambiente. Por exemplo, o fortalecimento da governança e
colaboração global pode beneficiar-se significativamente da cooperação multilateral,
alinhamento com outras agendas (como outros quadros globais, como os Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável (ODS), o Marco Global de Biodiversidade de Kunming-Montreal e
os resultados da Cúpula de Sistemas Alimentares da ONU). Os avanços na governança devem
também prever espaços para o engajamento da juventude e da sociedade civil, incluindo grupos
de agricultores, ONGs e defensores dos consumidores, para garantir resultados inclusivos e
equitativos.

Junto com essas questões de governança, a COP 30 deve trazer amplamente a


abordagem de equidade e justiça, pensando em mecanismos para uma transição justa nos
sistemas alimentares, garantindo que populações vulneráveis, incluindo pequenos agricultores,
comunidades indígenas e mulheres, não sejam deixadas para trás, assim como reforçando o
direito humano à alimentação adequada e sua relação com a segurança alimentar e nutricional
no contexto das mudanças climáticas, com foco em garantir o acesso a alimentos nutritivos e
acessíveis para todos.

121
Por fim e não menos importante, todos os compromissos e ações precisam ser objeto
de monitoramento e responsabilização, por meio do estabelecimento de mecanismos para
monitorar e relatar o progresso dos compromissos dos sistemas alimentares, garantindo
responsabilização e transparência. Nesse mesmo contexto, deve-se trabalhar para a coleta de
dados aprimorada e o desenvolvimento de indicadores padronizados para o desempenho dos
sistemas alimentares e sua relação com o clima.

Portanto, a COP 30, em 2025, tem o potencial de ser um marco para a agenda dos
sistemas alimentares, especialmente devido à sua localização na Amazônia e ao crescente
reconhecimento da necessidade de transformar os sistemas alimentares para enfrentar as
mudanças climáticas, a perda de biodiversidade e a insegurança alimentar e nutricional. As
prioridades-chave provavelmente incluirão a integração dos sistemas alimentares na ação
climática, a promoção da agricultura sustentável, a transição para dietas sustentáveis e a
garantia de equidade e justiça. O sucesso dependerá de forte vontade política, aumento do
financiamento e esforços colaborativos entre setores e partes interessadas e, se esses
elementos se unirem, a COP 30 poderá catalisar um progresso significativo em direção a
sistemas alimentares resilientes, sustentáveis e equitativos em todo o mundo.

Possíveis impactos da nova administração Trump para a SAN global

Seria impossível analisar as perspectivas da agenda de SAN para 2025 sem incluir os
impactos possíveis da volta de Donald Trump à presidência dos Estados Unidos da América.
Alguns impactos mais imediatos de suas medidas, como a retirada do país da OMS e o corte no
financiamento de ações humanitárias tem fortes repercussões na agenda de SAN, desde a
limitação do funcionamento de ações globais de saúde e nutrição até a ação de organizações
locais em várias partes do mundo que atuam inclusive nas questões de insegurança alimentar e
nutricional de populações mais vulneráveis. Ainda, em uma interface entre a OMS e a FAO, o
próprio Codex Alimentarius pode sofrer repercussões com a ausência dos EUA na construção
dos consensos internacionais na regulação de alimentos e nas consequências das guerras
comerciais via Organização Mundial do Comércio.

Mesmo diretamente para a FAO, há um risco significativo de que uma nova


administração Trump possa reduzir ou alterar a participação dos Estados Unidos na agenda da
Organização, com base nas políticas e prioridades observadas durante seu primeiro mandato.
Aqui estão os principais fatores e riscos potenciais, especialmente em termos de financiamento,
ação climática e liderança global. Em princípio, é possível que os EUA possam continuar a se
envolver seletivamente em áreas que estejam alinhadas com seus interesses, mas, ao mesmo
tempo, criar um desengajamento mais amplo poderia enfraquecer a capacidade da FAO de
enfrentar os desafios globais de segurança alimentar e agricultura sustentável.

Dentre alguns riscos específicos, podemos começar pela abordagem da política


"America First, que certamente promoverá reduzido engajamento multilateral, priorizando
ações unilaterais em vez de cooperação multilateral, e fortalecerá o foco em prioridades
domésticas em detrimento dos esforços globais de segurança alimentar e nutricional regional e
global.

Somado a isso, não se pode descartar a possibilidade de possíveis cortes de


financiamento que cheguem também à FAO, lembrando que, a exemplo da OMS, os EUA são
um dos maiores contribuintes da FAO, fornecendo financiamento crítico para seus programas.
Lembrando, durante seu primeiro mandato, Trump propôs cortes significativos em organizações
internacionais, incluindo aquelas focadas em segurança alimentar e desenvolvimento e isso

122
poderia enfraquecer a capacidade da FAO de cumprir sua missão. Além disso, ainda no campo
do financiamento, os EUA podem impor condições às suas contribuições, como exigir reformas
ou priorizar programas que estejam alinhados com os interesses americanos (financiamento
condicional), o que poderia perturbar a agenda da FAO. Com isso, pode haver um impacto
inclusive na credibilidade e eficácia da FAO incluindo a erosão de sua confiança e a fragmentação
dos esforços, principalmente no escopo da SAN.

No campo de todas as agendas de sistemas alimentares, há fortes riscos do impacto do


ceticismo e negacionismo em relação às mudanças climáticas, podendo afetar o financiamento
da ciência climática e a revogação de regulamentações ambientais, assim como a falta de apoio
dos EUA a iniciativas da FAO focadas em adaptação e mitigação climática. Com isso, há risco de
grande impacto nos esforços globais de sistemas alimentares, na medida em que um
engajamento reduzido dos EUA em questões climáticas pode minar os esforços globais para
construir sistemas alimentares resilientes, especialmente em regiões vulneráveis. Ao mesmo
tempo, no próprio território dos EUA deve haver desincentivo à produção sustentável e
resiliente, bem como possível aumento das emissões de gases de efeitos estufa e outros
contaminantes, com consequências globais para o clima.

Da mesma maneira, é muito provável uma grande mudança em prioridades, incluindo o


foco em ganhos de curto prazo em vez de investimentos de longo prazo em segurança alimentar
nutricional e agricultura sustentável, que são centrais para a missão da FAO, e reduzido apoio a
ações globais de nutrição e saúde.

Detalhando um pouco algo que já foi mencionado anteriormente, a nova presidência


estadunidense pode certamente impactar as políticas comerciais e agrícolas, incluindo guerras
comerciais e protecionismo, além do foco no agronegócio nos EUA. Esse conjunto de medidas
mostra potencial conflito com os objetivos da FAO de promover comércio justo e sistemas
alimentares estáveis e já se mostra na taxação de importações imediatamente respondida por
taxação de produtos dos EUA pelo Canadá e México.

Junto a isso, há possibilidade de desregulamentação e influência do agronegócio, visto


que as políticas nacionais defendidas pelo novo presidente favorecer grandes empresas do
agronegócio em detrimento dos pequenos agricultores e das proteções ambientais. Com isso,
há sérios riscos de aumento do uso de pesticidas e cultivos geneticamente modificados sem
regulamentações rigorosas, levantando preocupações sobre segurança alimentar e nutricional
e biodiversidade, de redução na fiscalização sobre a pecuária industrial, contribuindo para a
resistência a antibióticos e riscos de doenças, e mesmo de enfraquecimento dos padrões de
segurança alimentar, afetando tanto o comércio doméstico quanto internacional de alimentos.

O sistema alimentar global é interconectado, e as políticas dos EUA podem ter


consequências de longo alcance. Restrições comerciais, reversões de políticas climáticas,
escassez de mão de obra e cortes em ajuda alimentar podem contribuir para o aumento da
insegurança alimentar e nutricional nos próprios EUA e em todo o mundo. Vale destacar,
inclusive, que no mercado interno dos EUA, pode haver importante impacto das políticas de
repressão à imigração e escassez de mão de obra sobre a SAN, visto que muitas fazendas nos
EUA dependem fortemente de mão de obra migrante, especialmente na produção de frutas,
vegetais e laticínios, com potenciais consequências no aumento dos custos de produção de
alimentos, na redução da produção em setores agrícolas importantes que pode elevar os preços
de determinados alimentos globalmente e em efeitos sobre o fornecimento de bens perecíveis,
afetando tanto os mercados domésticos quanto internacionais.

123
Podemos, ainda, especular sobre as possíveis reações dos países e do mercado
internacional diante das políticas específicas adotadas, rearranjando os sistemas alimentares
globais por meio da reação das principais economias globais.

Por exemplo, a China foi fortemente impactada pelas guerras comerciais de Trump
durante seu primeiro mandato, especialmente nas importações de soja, o que levou a uma
maior diversificação de fontes. Nesse sentido, o país pode aumentar as importações agrícolas
do Brasil, Argentina e Rússia para reduzir a dependência de soja, milho e trigo dos EUA, assim
como acelerar reformas agrícolas domésticas e iniciativas de segurança alimentar, incluindo
investimentos pesados em tecnologia agrícola e esforços de autossuficiência.

No âmbito da União Europeia (UE), que se se posicionou como líder em políticas


alimentares sustentáveis, diante de possíveis tentativas e enfraquecer as regulamentações
ambientais, a UE poderia impor padrões mais rigorosos de segurança alimentar e ambiental às
importações dos EUA, potencialmente levando a disputas comerciais, reforçar o Acordo Verde
Europeu para reduzir a dependência de importações dos EUA e impulsionar a produção
doméstica de alimentos e expandir acordos comerciais com outros exportadores agrícolas
(como Canadá, Austrália e nações africanas) para evitar a instabilidade do mercado americano.

Enquanto isso, é possível que grandes produtores de commodities como o Brasil e a


Argentina ampliem sua participação no mercado global, expandindo as exportações para a China
como alternativa à soja, carne bovina e milho dos EUA e aproveitando acordos comerciais com
a UE e a Ásia para capturar mais participação no mercado global, assim como utilizando o
mercado dos BRICS para isso, no caso do Brasil. Junto com esse possível benefício, porém, pode
também se intensificar o aumento do desmatamento na Amazônia (no caso do Brasil) para
expandir terras agrícolas, ampliando as preocupações ambientais relacionadas à monocultura
de commodities.

Respostas a essa nova configuração global também devem vir da África, tendo em vista
que muitas nações africanas dependem da ajuda alimentar e das exportações agrícolas dos EUA
e da UE. Medidas dos EUA podem gerar a busca de novos parceiros comerciais e estratégias de
SAN, como o aprofundamento de parcerias agrícolas com China, UE e Rússia, maiores
investimentos na agricultura local para reduzir a dependência de importações e a busca de
acordos comerciais regionais. É provável, contudo, que a insegurança alimentar e nutricional
venha a aumentar em algumas regiões vulneráveis do continente em consequência da redução
da ajuda externa e de impactos sobre o comércio com os EUA.

Conclusão

Começamos um novo ano reforçando que o tempo é curto para o alcance o de diversos
compromissos internacionais na agenda de segurança alimentar e nutricional e no decorrer de
2025 devemos trazer novas informações e análises sobre a evolução dos indicadores globais e
regionais. Continuamos entre esperanças e desafios, lembrando que temos muitas evidências,
informações e análises que podem e devem orientar políticas em todos os níveis.

Enquanto a Década de Ação sobre a Nutrição termina esvaziada, grandes expectativas


são colocadas sobre a Cúpula de Sistemas Alimentares e seu monitoramento de quatro anos de
implementação, somadas às perspectivas positivas trazidas pelo protagonismo brasileiro nas
agendas de SAN e meio ambiente, representadas pela Aliança Global contra a Fome e a Pobreza,
agora aprovada e em vias de implementação, e pela COP 30 que será realizada em território

124
brasileiro e representa importante marco para fortalecer a articulação da agenda climática com
os sistemas alimentares.

Além dessas perspectivas e seus desafios próprios, o mundo, incluindo países e


organismos internacionais, todo deve sentir as repercussões da nova gestão de Donald Trump
na presidência dos EUA, particularmente no âmbito das agendas de SAN e de sistemas
alimentares. Nesse sentido, há mais ameaças que oportunidades, visto que a saúde planetária
está conectada, e o imediatismo, aliado ao negacionismo e nacionalismo, podem afetar a SAN
global.

Falar da transformação dos sistemas alimentares globais é cada vez mais necessário e,
ao mesmo tempo, mais complexo. Possivelmente seja o momento para uma nova ordem global
a partir das agendas de SAN e o Brasil pode ter papel central nesse processo. E precisamos fazer
nosso dever de casa. O país do guia alimentar mais avançado no mundo precisa fortalecer sua
implementação, inclusive na indução das políticas. O país do Programa de Agricultura Familiar
precisa colocar essa agenda em igualdade ou, de preferência, superioridade à agricultura
comercial, priorizando a diversidade alimentar, baseada em alimentos locais e produzidos de
forma saudável e sustentável. O país do maior programa de alimentação escolar precisa regular
a venda de alimentos nas escolas e sua publicidade.

Referências
FAO, FIDA, OPS, PMA, U. América Latina y el Caribe - Panorama Regional de la Seguridad Alimentaria y
la Nutrición 2024. [s.l: s.n.]. Disponível em: <https://doi.org/10.4060/cd3877es>.

FAO/IFAD/UNICEF/WFP/WHO. The State of Food Security and Nutrition in the World 2024 - Financing to
end hunger, food insecurity and malnutrition in all its forms. [s.l: s.n.]. Disponível em:
<https://openknowledge.fao.org/items/18143951-4b0a-46d6-860b-0f8908745da1>.

FOOD SYSTEMS COUNTDOWN INITIATIVE. The food systems countdown report 2024: Tracking progress
and managing interactions. [s.l: s.n.]. Disponível em: <https://doi.org/10.36072/fsci2024.>.

SILVA, D. O. E et al. G20 Brasil 2024 - Policy Pathways for Tackling Global Poverty and Hunger, 2024.
Disponível em:
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SWINBURN, B. A. et al. The Global Syndemic of Obesity, Undernutrition, and Climate Change: The Lancet
Commission report. The Lancet, v. 393, n. 10173, p. 791–846, 2019.

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UNFSS+4. [s.l: s.n.]. Disponível em: <https://www.unfoodsystemshub.org/latest-
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WORLD HEALTH ORGANIZATION (WHO). World health statistics 2024: monitoring health for the SDGs,
Sustainable Development Goals. Geneva, Switzerland: [s.n.]. Disponível em:
<https://www.who.int/publications/i/item/9789240094703>.

125
Perspectivas 2025 para a UNESCO: Iniciativas para um futuro mais sustentável

Fabiane Gaspar
Gisele Sanglard
Heliton Barros
Vitor Rodrigues

Abstract. One of the pillars of the United Nations Educational, Scientific and Cultural
Organization (UNESCO) is the promotion of international cooperation in the areas of education,
science, culture, communication and information to achieve the sharing of knowledge and the
free flow of ideas to accelerate mutual understanding and a more perfect knowledge of each
other's lives. UNESCO's programs seek to contribute to the achievement of the Sustainable
Development Goals (SDGs) defined in the 2030 Agenda, adopted by the United Nations General
Assembly in 2015. If, on the one hand, the challenges faced in fulfilling its mandate are limitless
and continuous, on the other, they generate great prospects for action. For 2025, the prospects
for UNESCO's actions are linked to artificial intelligence; digital transformation; sustainable
education systems on the African continent; and climate change. In this report, we will highlight
UNESCO's prospects for artificial intelligence and climate change.

Keywords: UNESCO. Artificial Intelligence. Climate Change.

Resumo. A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) tem
como um de seus pilares de atuação a promoção de cooperação internacional nas áreas de
educação, ciência, cultura, comunicação e informação para alcançar o compartilhamento de
conhecimento e o livre fluxo de ideias para acelerar a compreensão mútua e um conhecimento
mais perfeito sobre a vida de cada um, assim os programas da UNESCO buscam contribuir para
a realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) definidos na Agenda 2030,
adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 2015. Se por um lado, os desafios
enfrentados para o cumprimento de seu mandato são ilimitados e contínuos, por outro, geram
grandes perspectivas de atuação. Para 2025, as perspectivas das ações da UNESCO estão
vinculadas à inteligência artificial; à transformação digital; aos sistemas educacionais
sustentáveis no continente africano; e às mudanças climáticas. Neste informe, destacaremos as
perspectivas da UNESCO para a inteligência artificial e as mudanças climáticas.

Palavras-chave: UNESCO. Inteligência Artificial. Mudanças climáticas.

A Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura (UNESCO) tem como
um de seus pilares de atuação a promoção de cooperação internacional nas áreas de educação,
ciência, cultura, comunicação e informação para alcançar o compartilhamento de conhecimento
e o livre fluxo de ideias para acelerar a compreensão mútua e um conhecimento mais perfeito
sobre a vida de cada um, assim os programas da UNESCO buscam contribuir para a realização
dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) definidos na Agenda 2030, adotada pela
Assembleia Geral das Nações Unidas em 2015.

Se por um lado, os desafios enfrentados para o cumprimento de seu mandato são


ilimitados e contínuos, por outro, geram grandes perspectivas de atuação. Para 2025, as

126
perspectivas das ações da UNESCO estão vinculadas à inteligência artificial; à transformação
digital; aos sistemas educacionais sustentáveis no continente africano; e às mudanças
climáticas. Neste informe, destacaremos as perspectivas da UNESCO para a inteligência artificial
e as mudanças climáticas.

Inteligência Artificial

Embora o marco oficial de nascimento da inteligência artificial (IA) seja reconhecido


como 1956, na Conferência de Dartmouth, nos Estados Unidos, essa tecnologia ganhou ampla
notoriedade e maior inserção na vida cotidiana das pessoas a partir de 2022, com o lançamento
do ChatGPT. O sucesso imediato dessa ferramenta proporcionou uma tecnologia poderosa para
as pessoas, incluindo seu uso em ambientes educacionais. Reconhecendo o impacto
transformador da IA nas escolas, a UNESCO desenvolveu um framework abrangente com o
objetivo de orientar professores e estudantes no uso ético e eficaz dessa tecnologia. Esse
framework busca maximizar o potencial da IA como uma ferramenta de aprendizado,
promovendo o desenvolvimento do conhecimento e do pensamento crítico, ao invés de
substituir ou enfraquecer as capacidades cognitivas humanas.

1.Linha do Tempo da UNESCO sobre Inteligência Artificial

2021

● Recomendação sobre a Ética da Inteligência Artificial: A UNESCO adotou a primeira norma


global sobre ética da IA, estabelecendo diretrizes para o uso responsável e ético dessa
tecnologia.

2022

● Relatório sobre Currículos de IA para Educação: A UNESCO lançou um relatório mapeando


currículos de IA para a educação básica, destacando a necessidade de preparar as crianças para
um futuro com IA.

2023

• Guia sobre Inteligência Artificial Generativa na Educação: Este guia visa apoiar os países na
implementação de diretrizes para o uso ético da IA nas instituições educacionais, fundamentado
na recomendação de 2021.

• Relatório de Monitoramento Global da Educação: Este relatório, que inclui uma análise do
impacto da IA na educação, foi divulgado em 2023, abordando como sistemas inteligentes
podem ser integrados ao ensino.

2024

• AI competency framework for teachers: Este documento visa auxiliar e preparar os


professores na utilização de IA nas escolas.

• AI competency framework for students: Este documento visa auxiliar os estudantes na


interação de forma eficaz e ética com as tecnologias de IA.

Desde que a inteligência artificial (IA) passou a integrar o cotidiano da população


mundial, a UNESCO tem desempenhado um papel fundamental no desenvolvimento de
diretrizes e iniciativas voltadas para a educação. Anualmente, a organização tem trabalhado
para assegurar que a educação seja capaz de aproveitar os benefícios proporcionados pela IA

127
promovendo uma abordagem ética e responsável. Além disso, a UNESCO busca capacitar tanto
professores quanto estudantes a compreenderem e utilizarem essa tecnologia de forma crítica
e consciente. A seguir, apresenta-se um resumo das recomendações elaboradas pela UNESCO
com o objetivo de apoiar educadores e discentes na integração e utilização da inteligência
artificial no contexto educacional.

2."AI Competency Framework for Teachers"

O "AI Competency Framework for Teachers" (Estrutura de Competências de IA para


Professores), publicado pela UNESCO, apresenta uma estrutura global para orientar professores
no uso ético e eficaz da Inteligência Artificial (IA) na educação. O documento destaca a
necessidade de preparar professores para integrar a IA em suas práticas pedagógicas,
garantindo que a tecnologia complemente, e não substitua, o papel humano no ensino. Com
foco na centralidade do humano, a estrutura enfatiza a proteção dos direitos humanos, a
inclusão e a sustentabilidade, promovendo o aprendizado contínuo e a inovação educacional.

A estrutura é dividida em cinco dimensões principais: mentalidade centrada no humano,


ética da IA, fundamentos e aplicações da IA, pedagogia com IA e uso da IA para desenvolvimento
profissional. Essas dimensões são complementadas por três níveis de progressão: adquirir,
aprofundar e criar, que permitem aos professores evoluírem de um nível básico de compreensão
da IA até a criação de soluções inovadoras. O objetivo é ajudar os educadores a desenvolverem
competências técnicas, éticas e pedagógicas para integrar a IA em suas práticas de forma
responsável e inclusiva.

O documento também fornece recomendações para a implementação de políticas e


estratégias que apoiem o uso da IA na educação. Entre elas, destaca-se a importância de
regulamentar ferramentas de IA para garantir sua confiabilidade e segurança antes de sua
adoção em larga escala. Além disso, políticas devem assegurar acesso inclusivo à tecnologia,
infraestrutura adequada e suporte financeiro para formação de professores. Essas condições
são essenciais para que a IA seja utilizada de forma responsável e eficaz no ambiente
educacional. A formação de professores é um dos pilares da ferramenta, com ênfase em
programas que abordam desde o treinamento inicial até o desenvolvimento contínuo ao longo
da carreira. A UNESCO sugere o uso de comunidades, mentorias e programas de capacitação
baseados no quadro de competências para apoiar os professores. Ferramentas de avaliação
também são recomendadas para medir o progresso e identificar lacunas nas competências dos
educadores, garantindo que os programas de treinamento atendam às necessidades específicas
de cada contexto.

Os princípios fundamentais do quadro incluem a inclusão, a centralidade do humano e


a sustentabilidade. A IA deve ser utilizada de forma equitativa, respeitando a diversidade
cultural e linguística, e promovendo a autonomia e o pensamento crítico dos alunos. Além disso,
o documento destaca a importância de considerar os impactos ambientais da tecnologia,
incentivando práticas que minimizem danos ao meio ambiente e promovam o uso responsável
de recursos tecnológicos.

3."AI Competency Framework for Students"

O "AI Competency Framework for Students" (Estrutura de Competências de IA para


Estudantes), elaborado pela UNESCO, tem como objetivo preparar os alunos para serem
usuários responsáveis, criadores pareceiros e líderes no desenvolvimento de tecnologias de
Inteligência Artificial (IA). O documento destaca a importância de integrar a IA nos currículos

128
escolares, promovendo uma abordagem ética, inclusiva e sustentável. Ele se baseia em
princípios como a centralidade humana, não discriminação e respeito à diversidade cultural,
além de enfatizar a necessidade de desenvolver competências que vão além do uso técnico,
abrangendo valores éticos, pensamento crítico e habilidades práticas.

A estrutura é organizada em quatro dimensões principais: mentalidade centrada no


humano, ética da IA, técnicas e aplicações de IA e design de sistemas de IA. Essas dimensões são
desenvolvidas em três níveis de progressão: entender, aplicar e criar. No nível inicial, os alunos
compreendem conceitos básicos e valores éticos. No nível intermediário, aprendem a aplicar
ferramentas de IA de forma prática e responsável. Já no nível avançado, desenvolvem
habilidades para projetar e criar soluções inovadoras, com foco em impacto social positivo e
sustentabilidade. Para a implementação, o documento recomenda que os currículos nacionais
integrem a IA como disciplina específica ou tema transversal, com abordagens interdisciplinares
que conectem áreas como ciência, tecnologia, engenharia e matemática (STEM). Além disso, é
essencial garantir infraestrutura digital básica, como dispositivos funcionais e acesso à internet.

Outro ponto central é a avaliação baseada em competências, que deve medir o


progresso dos alunos em aspectos éticos, técnicos e criativos. As avaliações devem incluir
tarefas autênticas, como projetos baseados em problemas reais, e verificar a capacidade dos
estudantes de transferir conhecimentos, adaptar-se a novos contextos e criar soluções
inovadoras. Essa abordagem busca alinhar o aprendizado ao desenvolvimento de habilidades
práticas e à aplicação de valores éticos no uso da IA.

Uma das recomendações é a necessidade de preparar os alunos para um futuro digital


sustentável, onde possam liderar a transformação tecnológica com responsabilidade. Ele
destaca a importância de projetar sistemas de IA que respeitem os direitos humanos, promovam
a inclusão e minimizem os impactos ambientais. Além disso, o documento incentiva a adaptação
local, considerando as diferentes realidades educacionais e níveis de prontidão tecnológica.

Nas últimas semanas, o cenário da inteligência artificial ganhou destaque global com o
surgimento da empresa chinesa Deepseek. Em apenas uma semana, a nova plataforma
ultrapassou o número de downloads do ChatGPT na Apple Store, causando um impacto
significativo no mercado. Esse movimento resultou em uma queda estimada de quase 1 trilhão
de dólares no valor das ações de empresas como Microsoft e OpenAI, evidenciando a magnitude
dessa competição. Essa disputa pelo título de melhor inteligência artificial do mundo,
protagonizada pelas duas maiores potências globais da atualidade, pode ser comparada a uma
nova "corrida espacial". No entanto, enquanto o objetivo da corrida espacial do século passado
era alcançar a Lua, os limites dessa nova competição tecnológica permanecem incertos. Trata-
se de uma disputa que não apenas redefine os avanços tecnológicos, mas também levanta
questões éticas, econômicas e sociais sobre o futuro da inteligência artificial e seu impacto no
mundo.

Por fim, vale ressaltar um tema transversal a todas as discussões: o papel das parcerias
para o alcance de vários objetivos por ser uma ação colaborativa e por propiciar a liberação dos
saberes. Foi considerada a forma mais eficaz de lutar contra as assimetrias, por propiciar acordos
bilaterais e a mobilidade de pesquisadores e estudantes. Contudo, frisam a necessidade de
incentivar os acordos Sul-Sul.

129
Mudanças Climáticas: preservação das geleiras e observação da criosfera

Em 2025, as iniciativas da UNESCO relacionadas às mudanças climáticas estão


associadas em especial à preservação dos glaciares, também conhecidas como geleiras; à
programas para observação da criosfera91 e mobilização de apoio político e financeiro para
viabilizar tais iniciativas.

As Nações Unidas declararam 2025 como o Ano Internacional da Preservação das


Geleiras, acompanhado da proclamação do dia 21 de março de cada ano como o Dia Mundial
das Geleiras a partir de 202592. Essa é uma oportunidade de aumentar a conscientização global
sobre o papel fundamental das geleiras, da neve e do gelo no sistema climático e no ciclo
hidrológico, além dos impactos econômicos, sociais e ambientais das mudanças iminentes na
criosfera da Terra93.

Assim, ao designar 2025 como o Ano Internacional da Preservação das Geleiras,


iniciativa liderada pela UNESCO, em colaboração com a Organização Meteorológica Mundial
(World Metereological Organization – WMO, em inglês), a ONU visa destacar a importância das
geleiras e garantir que as pessoas que dependem delas e as afetadas pelos processos criosféricos
recebam os serviços hidrológicos, meteorológicos e climáticos necessários. Esses esforços
enfatizam o papel fundamental que as regiões montanhosas desempenham como uma das
principais fontes de água doce e serviços ecossistêmicos globais.

As geleiras são fundamentais para regular o clima global e fornecer água doce, essencial
para bilhões de pessoas. No entanto, devido à mudança climática, impulsionada principalmente
pelas atividades humanas desde o século XIX, esses recursos vitais estão derretendo
rapidamente. O derretimento das geleiras afeta a todos: pessoas que vivem em áreas costeiras
afetadas pelo aumento do nível do mar, pessoas que vivem em áreas de alta montanha mais
propensas a riscos de inundações, deslizamentos de terra e avalanches, e pessoas que vivem em
áreas a jusante que dependem do abastecimento de água das geleiras.

O derretimento das geleiras e dos lençóis de gelo foi identificado como um dos maiores
contribuintes para o aumento do nível do mar nas últimas décadas, de acordo com o IPCC
202294. As geleiras nos locais de Patrimônio Mundial da UNESCO estão derretendo a uma taxa
alarmante, com um terço dos locais previstos para desaparecer até 205095. No mesmo período,
a maioria das geleiras tropicais remanescentes na América do Sul, na África e na Ásia
desaparecerá. A perda de geleiras também é acompanhada pela perda de biodiversidade,
especialmente de espécies endêmicas, bem como pela perda de valores culturais e modos de
vida tradicionais. O recuo das geleiras representa claramente uma séria ameaça ao
abastecimento natural e humano de água em muitas partes do mundo.

O Ano Internacional e o Dia Mundial das Geleiras, portanto, concentram-se em fornecer


recomendações concretas para lidar com os impactos da mudança climática na criosfera, que

91
A quinta esfera da Terra denominada criofera é constituída por regiões da superfície terrestre cobertas
permanentemente por gelo e neve e aquela parte do solo que contem gelo.
https://pt.wikipedia.org/wiki/Criosfera
92
Resolução A/RES/77/158 adotada em 14 de dezembro de 2022.
https://digitallibrary.un.org/record/3998543?v=pdf
93
Sobre o evento de lançamento, em 21 de Janeiro de 2025: https://www.un-glaciers.org/en/official-
launch-event
94
Relatório IPCC 2022: https://www.ipcc.ch/assessment-report/ar6/
95
UNESCO, IUCN, 2022: World Heritage Glaciers: Sentinels of climate change, Paris, UNESCO; Gland, IUCN

130
resultam em perdas cada vez mais irreversíveis, em defender uma mitigação mais ambiciosa,
em reunir países e comunidades afetadas pela perda de geleiras para compartilhar
conhecimentos e melhores práticas de preservação e adaptação, e em obter financiamento
internacional para ações de adaptação nas áreas afetadas.

O Ano Internacional e o Dia Mundial complementam os Cinco Anos de Ação para o


Desenvolvimento das Regiões de Montanha 2023-2027 adotados pela Assembleia Geral da ONU
em dezembro de 202296. Os Cinco Anos de Ação apresentam o principal resultado do Ano
Internacional do Desenvolvimento Sustentável de 2022, adotado pela Assembleia Geral da ONU
em dezembro de 202197. A importância das iniciativas relacionadas à criosfera da Terra para a
realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável é reconhecida pela adoção do Ano
Internacional e do Dia Mundial. As atividades também estão vinculadas à implementação da
Década Internacional de Ação “Água para o Desenvolvimento Sustentável” 2021-2028, da
Década das Nações Unidas para a Restauração de Ecossistemas 2021-2030 e da Estrutura Global
de Biodiversidade. O Ano Internacional e o Dia Mundial complementam os Cinco Anos de Ação
para o Desenvolvimento das Geleiras.

Os objetivos específicos dessa iniciativa envolvem98:

1. Aumentar a conscientização do público e das partes interessadas em todos os níveis


sobre a importância das geleiras no sistema climático, no ciclo hidrológico e nos recursos
hídricos globais, os impactos diferenciados das mudanças nas geleiras sobre as comunidades e
os ecossistemas a jusante e a ação urgente necessária para desenvolver estratégias de
adaptação.

2. Promover ações para facilitar a implementação de medidas sustentáveis e melhores


práticas para a preservação das geleiras, incentivando a cooperação transfronteiriça, o
compartilhamento de conhecimentos e abordagens inovadoras.

3. Aprimorar o entendimento científico ao apoiar iniciativas de pesquisa científica e


monitoramento para melhorar a compreensão das mudanças nas geleiras, os impactos das
mudanças climáticas, possíveis perdas e danos e as implicações para as comunidades, os
ecossistemas e os recursos hídricos.

4. Fortalecer as estruturas de políticas em nível nacional, regional e internacional para


abordar a preservação das geleiras, incorporando a adaptação às mudanças climáticas, o
gerenciamento sustentável da água e as estratégias de redução de riscos de desastres.

5. Fortalecer o apoio financeiro, assegurando a disponibilização de recursos financeiros


para apoiar o monitoramento das geleiras e o gerenciamento do impacto das mudanças
climáticas sobre o derretimento das geleiras e os impactos posteriores.

A implementação do Dia internacional da Preservação das Geleiras e do primeiro Dia


Mundial da Água é apoiada por um Conselho Consultivo e quatro Forças-Tarefas que
representam mais de 75 organizações internacionais e 35 países para que as principais
atividades sejam concretizadas que são a campanha global para o Ano Internacional da
Preservação das Geleiras 2025; a Conferência Internacional sobre Preservação de Geleiras que

96
Resolução A/RES/77/172 adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em dezembro de 2022.
Disponível em: https://digitallibrary.un.org/record/3998543?v=pdf
97
Resolução A/76/L.28 adotada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em dezembro de 2021.
98
https://www.un-glaciers.org/sites/default/files/medias/fichiers/2024/12/IYGP2025_Concept-Note.pdf

131
ocorrerá em Tajisquistão; os workshops regionais e capacitação, as iniciativas de pesquisa e
monitoramento e a defesa de políticas públicas e parcerias.

No caso das iniciativas de pesquisa e monitoramento, podemos destacar as seguintes


atividades:

• o estabelecimento de um Sistema Global Integrado de Informações sobre a Criosfera


como um mecanismo de longo prazo para facilitar o acesso a dados e indicadores consistentes
da criosfera e desenvolver abordagens padrão para monitorar as mudanças na criosfera,
integrado ao sistema global de monitoramento da água em coordenação com os Sistemas
Mundiais de Monitoramento de Geleiras (WGMS);

• a inclusão de sistemas de conhecimento local e indígena (LINKS) para o gerenciamento


eficaz da disponibilidade de água pelas comunidades das montanhas;

• o estabelecimento de uma plataforma de Política de Ciência Aberta para facilitar o


consenso com base científica entre os países sobre os principais desafios do derretimento da
neve das geleiras e do permafrost para a consequente disponibilidade de água nos sistemas
hidrológicos a montante e a jusante em todas as regiões montanhosas;

• o fortalecimento das capacidades de monitoramento, análise e resposta das


instituições para a Redução de Riscos de Desastres (DRR), por meio de treinamento e campanhas
de conscientização sensíveis à comunidade e ao gênero, e por meio do estabelecimento de
Sistemas de Alerta Antecipado (EWS) para sistemas de montanha;

• a avaliação dos riscos e das vulnerabilidades sociais associados às inundações de


explosão de lagos de geleiras (GLOFs) e abordagem desses riscos e vulnerabilidades para
estabelecer uma estrutura para a detecção precoce de possíveis perigos e riscos relacionados a
geleiras;

• os sistemas de previsão glacio-hidrológica e os mecanismos de perspectiva operacional


se unem para prever o derretimento das geleiras e atualizar as projeções futuras da água de
derretimento esperada.

Quanto à conscientização da importância das geleiras em todo o mundo, a UNESCO e a


WMO identificaram 12 mensagens principais relacionadas às geleiras99

1. As geleiras são essenciais para a vida: Uma geleira é um grande acúmulo,


principalmente de gelo e neve, que se origina na terra e flui lentamente por influência de seu
próprio peso. As geleiras são encontradas em todos os continentes. Elas existem em muitas
regiões montanhosas e ao redor das bordas das camadas de gelo da Groenlândia e da Antártica.
Existem mais de 275.000 geleiras no mundo, cobrindo uma área de cerca de 700.000 km². As
geleiras são consideradas importantes torres de água, armazenando cerca de 170.000 km3 de
gelo, o que equivale a aproximadamente 70% da água doce global. As geleiras são uma fonte de
vida, fornecendo água doce para pessoas, animais e plantas.

2. As geleiras são indicadores sensíveis da mudança climática e estão recuando


globalmente devido ao aumento das temperaturas: de modo geral, as geleiras vêm diminuindo
em todo o mundo desde meados do século XIX (fim da chamada pequena era glacial). Embora
tenha havido avanços ocasionais de curto prazo das geleiras em diferentes épocas e regiões,

99
https://www.un-glaciers.org/en/key-messages

132
elas têm recuado com velocidade acelerada mais recentemente, à medida que o mundo se
aquece rapidamente devido ao aumento das concentrações atmosféricas de gases de efeito
estufa. No entanto, as temperaturas globais mais altas levam a estações de acumulação mais
curtas, menos neve e mais chuvas.

3. O derretimento da neve e do gelo das montanhas é fundamental para o


abastecimento de água doce em muitas regiões: quase 70% da água doce da Terra é
armazenada na forma de neve ou gelo. O escoamento das geleiras, da neve e do gelo é essencial
para a água potável, a agricultura, a indústria e a produção de energia limpa. As mudanças
climáticas e na criosfera afetam o ciclo da água, incluindo a alteração da quantidade e do
momento do derretimento das geleiras e da descarga de neve, da recarga de água subterrânea
e dos fluxos baixos, além de contribuir para o aumento do nível do mar. Como as geleiras
continuam a encolher e a cobertura de neve muda, espera-se que a menor disponibilidade de
água contribua para uma maior competição por recursos hídricos, especialmente em regiões
sazonalmente secas. As geleiras que estão além de seu “pico de água”, que é o momento em
que o escoamento da água de derretimento está em seu nível máximo, fornecerão
gradualmente cada vez menos para os recursos hídricos a jusante.

4. O derretimento das geleiras, o degelo do permafrost e outras mudanças na criosfera


criam perigos e exacerbam os perigos existentes, aumentando o risco de desastres: a mudança
climática está afetando o momento, a frequência e o local dos eventos de risco geológico com
possíveis efeitos em cascata. A estabilidade das encostas e o risco de inundações podem ser
afetados pela recessão glacial e pelo degelo do permafrost em regiões de alta montanha e
subárticas. O recuo contínuo das geleiras também leva a eventos extremos e a riscos de
desastres novos e em evolução para as populações a jusante e para a infraestrutura vulnerável
de transporte e energia, como inundações com explosão de lagos de geleiras, deslizamentos de
terra ou aumento da erosão e dos sedimentos.

5. É necessária uma ação imediata e ambiciosa para reduzir as concentrações de gases


de efeito estufa a fim de estabilizar o clima, preservar as geleiras e garantir um futuro
sustentável para todos: as geleiras estão recuando a taxas sem precedentes, remodelando as
paisagens e o mundo como o conhecemos. Apesar de seu papel fundamental na
sustentabilidade ambiental, as políticas nacionais de adaptação raramente reconhecem os
desafios exclusivos relacionados às geleiras. No entanto, ainda há (pouco) tempo para protegê-
las e preservá-las por meio da redução das emissões de gases de efeito estufa e da adoção de
estratégias transformadoras de adaptação e mitigação. A complementação do conhecimento
dos povos indígenas com outras observações da Terra, dados e percepções científicas pode
fornecer uma base abrangente, inclusiva e sólida para políticas e decisões sobre medidas de
resposta. Para as áreas de geleiras, essas medidas devem incluir o estabelecimento de áreas
protegidas, práticas sustentáveis de uso da terra, implementação de gerenciamento integrado
de recursos hídricos e desenvolvimento de sistemas de alerta para lidar com o aumento dos
riscos criosféricos.

6. O monitoramento das geleiras fornece dados importantes para as estratégias de


adaptação e mitigação do clima, e precisa ser ampliado: há mais de 130 anos, algumas geleiras
ao redor do mundo têm sido sistematicamente monitoradas com medições anuais em campo e,
mais recentemente, por diferentes técnicas de sensoriamento remoto. No entanto, ainda há
grandes lacunas no monitoramento das geleiras, principalmente nas regiões de alta montanha.
Os inventários globais de geleiras e os conjuntos de dados sobre as mudanças globais nas
geleiras fornecem informações essenciais para avaliações científicas e para os formuladores de

133
políticas, informando as decisões sobre estratégias de adaptação e mitigação. O aprimoramento
da cobertura e da resolução da observação, do gerenciamento de dados e do compartilhamento
global de dados pode melhorar as análises e os serviços de previsão que apoiam ações oportunas
para lidar com ameaças, riscos e impactos.

7. As geleiras sustentam os meios de subsistência e as economias de bilhões de


pessoas em todo o mundo: mais de 2 bilhões de pessoas, incluindo muitos povos indígenas,
dependem do derretimento das geleiras e da neve para obter água doce, inclusive para sua
segurança alimentar, subsistência e necessidades culturais e domésticas. O declínio contínuo
das geleiras contribui significativamente para o aumento global do nível do mar, com o nível do
mar atual cerca de 20 cm mais alto do que em 1900, o que representa riscos para os recursos
hídricos das comunidades próximas e distantes das geleiras, bem como para as populações
costeiras. Essas mudanças também têm impactos econômicos globais, afetando muitos setores,
como agricultura, energia hidrelétrica, turismo, comércio e transporte. A preservação das
geleiras é essencial para a sustentabilidade ambiental, a estabilidade econômica e a proteção
dos serviços culturais e dos meios de subsistência.

8. A mudança climática que envolve a o degelo está afetando gravemente as regiões


polares e os oceanos globais: a criosfera está mudando rapidamente devido às mudanças
climáticas, principalmente nas regiões polares. O aumento das temperaturas no Ártico já está
levando a estações de neve mais curtas, ao degelo do permafrost e ao recuo do gelo marinho,
das calotas polares e das geleiras da região. As camadas de gelo da Antártida e da Groenlândia
detêm mais de 68% dos recursos de água doce do mundo, mas esse recurso está derretendo
rapidamente e contribui para o aumento do nível do mar e afeta o ambiente marinho. Além
disso, é muito provável que o aquecimento global aumente a frequência e o tamanho dos
eventos de “calving” (ou seja, pedaços de gelo que se desprendem na extremidade de uma
geleira) nas regiões polares, levando a mudanças significativas na dinâmica das geleiras e das
plataformas de gelo. Um clima mais quente está provocando um maior derretimento, alerta
oceânico, fratura hidráulica do gelo e pode promover o aumento de desprendimento de gelo
(calving) e a geração de icebergs com impactos na navegação.

9. A inclusão dos jovens pode impulsionar a ação coletiva e liderar o caminho a seguir:
os jovens são uma força motriz para a mudança social, pressionando por ações climáticas,
sustentabilidade e dignidade para todos. O engajamento significativo dos jovens nos processos
de tomada de decisão e formulação de políticas pode garantir maior diversidade, inclusão e
representação. Os programas liderados por jovens, a cooperação regional, a governança
inclusiva, o financiamento, a educação, a inovação e o conhecimento dos povos indígenas
podem impulsionar soluções de longo prazo, alcançar a justiça climática intergeracional e
garantir que as geleiras continuem a ser sentinelas do passado, do presente e do futuro do nosso
planeta.

10. As geleiras têm significado cultural e espiritual: as geleiras são consideradas a


morada de deuses e espíritos pelos povos indígenas da Ásia, América Latina, Pacífico e África
Oriental, e são o local de rituais e eventos festivos que foram reconhecidos na Lista do
Patrimônio Cultural Imaterial da Humanidade da UNESCO. O desaparecimento das geleiras
resultaria em uma perda substancial do patrimônio cultural e da conexão espiritual com a
paisagem e a natureza.

11. As geleiras são um testemunho crucial da história da Terra: em seu gelo, as geleiras
contêm um importante registro do clima e do ambiente do passado. O desaparecimento das

134
geleiras resulta na perda irreversível de arquivos exclusivos da história humana, ambiental e
climática. A memória do gelo deve ser preservada como patrimônio científico e registro histórico
para as gerações futuras. À medida que as geleiras recuam e desaparecem, ecossistemas
sensíveis e únicos estão sendo perdidos e, com eles, a biodiversidade globalmente importante
e os serviços essenciais de ecossistema que sustentam a vida.

12. A retração das geleiras revela novas paisagens e ecossistemas pós-glaciais: novas
paisagens estão surgindo onde as geleiras recuaram ou desapareceram. O surgimento de
paisagens pós-glaciais está gerando novos ecossistemas terrestres, marinhos e de água doce e
nos obriga a redefinir nossa conexão com essas terras. As reivindicações subsequentes dos
recursos terrestres recém-disponíveis geralmente não são claras e são contestadas, exigindo
estratégias urgentes de gerenciamento e proteção que lidem com a governança desses novos
ambientes.

Por meio da condução da Organização Meteorológica Mundial, o Observatório Global


da Criosfera (Global Cryosphere Watch – GCW) visa apoiar a observação e compreensão da
criosfera, o que inclui todas as áreas da superfície da Terra onde a água está em estado sólido,
tais como neve, gelo marinho, geleiras e permafrost, colaborando com as iniciativas da UNESCO
para o Ano Internacional e do Dia Mundial da Preservação das Geleiras.

Alguns aspectos do Observatório Global da Criosfera incluem:

• Monitoramento abrangente: O GCW fornece uma estrutura para a observação


confiável e sustentada da criosfera por meio de métodos in-situ e de sensoriamento remoto.
Isso inclui monitorar a cobertura de neve, gelo marinho, geleiras, camadas de gelo e permafrost.

• Integração e Acesso aos Dados: A iniciativa melhora a qualidade dos dados


observacionais padronizando práticas de medição e aprimorando a troca de dados. Isso garante
que os dados de várias fontes sejam acessíveis e utilizáveis para pesquisa científica e formulação
de políticas.

• CryoNet: O GCW está desenvolvendo uma rede de observações de superfície chamada


CryoNet, que se baseia em redes existentes para fornecer uma cobertura abrangente das
condições criosféricas.

• Apoio à Tomada de Decisões: O GCW organiza análises e avaliações da criosfera para


apoiar a ciência, a política ambiental e a tomada de decisões. Isso inclui fornecer dados claros e
utilizáveis sobre o estado passado, presente e futuro da criosfera.

• Colaboração Global: A iniciativa promove a colaboração internacional entre cientistas,


formuladores de políticas e organizações para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças
na criosfera.

O GCW busca desempenhar um papel crucial em aprimorar a compreensão da criosfera


e suas interações com o sistema climático global, ajudando a informar estratégias para mitigação
e adaptação às mudanças climáticas.

Estamos diante de iniciativas da UNESCO que buscam contribuir para as ações


climáticas, com relativo atraso e morosidade, aspectos comuns de uma agência do sistema ONU
que possui um dos menos orçamentos do sistema e com grandes limitações nesses campos de
atuação, porém, à margem do processo político, a UNESCO corre por fora unindo forças e
recursos para avançar, conectando relações científicas, comunitárias e culturais, em âmbito

135
local, nacional, regional e internacional, público ou privado. A conjunção de objetivos em prol
de soluções e adaptações diante dos efeitos das mudanças climáticas é a alma das ações da
UNESCO, na esperança de que sejam efetivas e duradouras.

Referências

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em: https://einvestidor.estadao.com.br/negocios/nova-ia-chinesa-deep-seek-bigtechs-bolsas-eua-hoje/.
Acesso em: 28 jan. 2025.
UNESCO. Artificial Intelligence in Education: UNESCO advances key competencies for teachers and
learners. UNESCO, 20 jan. 2025. Disponível em: https://www.unesco.org/en/articles/artificial-
intelligence-education-unesco-advances-key-competencies-teachers-and-learners. Acesso em: 27 jan.
2025.
UNESCO. AI competency framework for students. UNESCO, 2024. Disponível em:
https://www.unesco.org/en/articles/ai-competency-framework-students. Acesso em: 30 jan. 2025.
UNESCO. Artificial Intelligence and Education: Challenges and Opportunities. Paris: UNESCO, 2024.
Disponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000391104. Acesso em: 31 jan. 2025.
Intergovernamental Panel on Climate Chance – IPCC. Climate Change 2022: Impacts, Adaptation and
Vulnerability. Disponível em: https://www.ipcc.ch/assessment-report/ar6/
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Disponível em: https://www.un-
glaciers.org/sites/default/files/medias/fichiers/2024/12/IYGP2025_Concept-Note.pdf
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UNESCO, IUCN, 2022: World Heritage Glaciers: Sentinels of climate change. Paris, UNESCO; Gland, IUCN
Wikipedia. Criosfera. Disponível em: https://pt.wikipedia.org/wiki/Criosfera

136
As Instituições Financeiras Multilaterais (BID, Banco Mundial e FMI)
Multilateral Financial Institutions (IADB, World Bank and IMF)

Isis Pillar Cazumbá

Abstract: This article aims to show the actions considered most relevant in the last two months
that were carried out by Multilateral Financial Institutions (MFIs). The Inter-American
Development Bank (IADB) stood out for launching studies on the economy of Latin America and
the Caribbean (LAC). The World Bank (WB) celebrated the record financing of its Fund for the
poorest countries and the Third round of the Pandemic Fund. The International Monetary Fund
(IMF) promoted the launch of the updated global economic outlook.

Keywords: World Bank. IADB. IMF. Economy. Sustainable Development. Global Health

Resumo: O presente artigo tem como objetivo mostrar as ações consideradas mais relevantes
dos últimos dois meses que foram realizadas pelas Instituições Financeiras Multilaterais (IFMs).
O Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) obteve destaque em lançar estudos a
respeito da economia da América Latina e do Caribe (ALC). O Banco Mundial (BM) celebrou o
financiamento recorde do seu Fundo direcionado aos países mais pobres e a Terceira rodada do
Fundo Pandêmico. O Fundo Monetário Internacional (FMI) promoveu o lançamento das
perspectivas econômicas globais atualizadas.

Palavras-chave: Banco Mundial. BID. FMI. Economia. Desenvolvimento Sustentável. Saúde


Global

O Preparo para Futuras Pandemias

Desde o impacto negativo que a pandemia de COVID-19 provocou, o fortalecimento dos


sistemas de saúde vem sendo discutido continuamente, com a intenção de se evitar o período
trágico vivido no começo de 2020. A pandemia expôs as fraquezas dos sistemas de saúde de
países ricos e pobres, evidenciando a necessidade de ações que colaborem para a construção
de uma infraestrutura mais resiliente e mais assertiva, trazendo maior inclusão e qualidade de
vida.

Ao decretar o fim da pandemia, especialistas da área da saúde já discutiam a respeito


de como preparar o mundo para novas pandemias, especialmente os países mais pobres e
vulneráveis, que sofreram demais para combater o coronavírus em seus territórios. Sendo
assim, daí o surgimento do Fundo Pandêmico.

Lançado no final do ano de 2022 como o primeiro mecanismo de financiamento


multilateral para auxiliar os países de baixa e média renda a combater pandemias, o Fundo
Pandêmico conta com o apoio de 20 países mais a assistência do Banco Mundial (BM). O Fundo
é formado por um Conselho de Administração com representação igualitária entre os
contribuintes, os países investidores, organizações da sociedade civil e fundações. As doações

137
feitas para o Fundo incentivam o cofinanciamento dos governos e a garantia de apoio de
entidades implementadoras registradas100.

O Fundo Pandêmico conseguiu levantar US$ 2 bilhões em capital inicial de 27


contribuintes soberanos e filantrópicos em seu primeiro ano de operação. Através de duas
rodadas de financiamento, o Fundo autorizou US$ 885 milhões e doações, direcionando US$ 6
bilhões adicionais em recursos em prevenção, preparação e resposta a pandemias (PPPR) para
75 países de diferentes regiões. O Fundo calcula que 47 projetos foram financiados através
destas duas rodadas101.

A terceira rodada já está em curso, sendo aprovada pelo Conselho Administrativo com
um envelope de US$ 500 milhões para financiar a ajuda aos países de baixa e média renda no
desenvolvimento de capacidades dos seus sistemas de saúde, relacionados à vigilância de
doenças, diagnósticos eficazes e melhoria dos sistemas laboratoriais e da força de trabalho.
Tudo isso tem como objetivo construir a prevenção e a resposta à possíveis pandemias. Nesta
rodada, as propostas devem seguir os temas acordados no Plano Estratégico de Médio Prazo:
Institutos Nacionais de Saúde Pública (ou instituições públicas relevantes) e as redes,
organizações ou hubs regionais/globais e One Health, envolvimento da comunidade, igualdade
de gênero e equidade em saúde102.

Assistência aos Países Mais Pobres

A Associação Internacional de Desenvolvimento (International Development Association


em inglês) é o maior Fundo do BM, que tem como finalidade fornecer financiamento
concessional aos projetos que visam estimular o crescimento econômico, construir a resiliência
e a melhora de vida dos cidadãos de países de baixa e média renda, “com mais de dois terços
do financiamento indo para países de baixa renda na África103”. De acordo com o BM, os recursos
deste Fundo são importantes para cerca de 1,9 bilhão de pessoas, trazendo impactos positivos
em diversas áreas. Atualmente, este Fundo vem atuando em 78 países104 de diversas regiões.

Em 2024, apesar de uma economia global não favorável, o BM conseguiu uma


importante vitória para continuar com os seus programas de assistência aos países de baixa e
média renda: o reabastecimento de US$ 100 bilhões do Fundo105.

Anunciado pelo presidente do BM, Ajay Banga, este financiamento recorde chegou em
um momento importante para o desenvolvimento global. Com a ampliação dos desafios, o BM
entende que o cenário atual precisa de celeridade para gerar os resultados necessários em prol
de mudanças.

Os novos recursos demonstraram o comprometimento de 59 países mostrando a ampla


adesão as ideias do Fundo, que propõem soluções para impactar os investimentos na “saúde,

100
Disponível em: https://www.worldbank.org/en/news/press-release/2022/11/12/g20-hosts-official-
launch-of-the-pandemic-fund
101
Disponível em: https://www.worldbank.org/en/news/press-release/2024/12/19/the-pandemic-fund-
announces-third-round-of-funding-marking-another-milestone-in-pandemic-preparedness
102
Disponível em: https://www.worldbank.org/en/news/press-release/2024/12/19/the-pandemic-fund-
announces-third-round-of-funding-marking-another-milestone-in-pandemic-preparedness
103
Disponível em: https://ida.worldbank.org/en/what-is-ida
104
Disponível em: https://ida.worldbank.org/en/about/borrowing-countries
105
Disponível em: https://www.worldbank.org/en/news/press-release/2024/12/05/donors-and-world-
bank-group-boost-IDA-development

138
educação, infraestrutura e resiliência climática, ao mesmo tempo em que estabiliza as
economias, cria empregos e estabelece as bases para a prosperidade de longo prazo 106” para
milhões de pessoas em diversas partes do mundo.

Economia da América Latina e do Caribe

No último ano, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) lançou uma série de


medidas que visam promover o desenvolvimento econômico da América Latina e do Caribe
(ALC). Para a instituição financeira, a região precisa fortalecer este setor para reduzir a pobreza
e a desigualdade, fortalecendo assim a sua infraestrutura para ampliar as melhorias em outras
áreas consideradas fundamentais, como por exemplo, a saúde, a educação e o meio-ambiente.

A vista disso, o BID em parceria com a Organização para a Cooperação e


Desenvolvimento Econômico (OCDE) desenvolveram e lançaram um relatório contendo
informações importantes a respeito de como os países caribenhos podem liberar o seu potencial
econômico através das transições digital e energética, da economia azul e do turismo
sustentável107.

A publicação, intitulada “Caribbean Development Dynamics 2025108”, foi apresentada


durante um evento que contou com a presença do presidente do BID, Ilan Goldfajn, do
secretário-geral da OCDE, Mathias Cormann (em uma participação on-line) e de especialistas
caribenhos de diversos setores. O documento enfatiza o potencial inexplorado da região para
se desenvolver sustentavelmente, simultaneamente abordando os seus desafios, que são
amplamente vistos na integração regional, nos recursos financeiros, na produtividade e
estabilidade macroeconômica, na inclusão social e a resiliência climática109.

De acordo com o documento, a respeito da integração regional, o Caribe necessita de


uma cooperação regional mais aperfeiçoada devido ao declínio da sua participação no comércio
global110. O BID acredita que através de iniciativas como o ONE Caribbean111 podem ajudar a
atrair mais recursos para as áreas mais necessitadas – energética e digital.

Sobre os recursos financeiros, o relatório afirma que as receitas tributárias do Caribe são
inferiores as de outras regiões, evidenciando a necessidade do fortalecimento de arrecadação,
melhorando os gastos tributários, ampliando a cooperação tributária internacional. Quando se
trata de financiamento, a fim de disponibilizar as ferramentas para mobilizar recursos para o
desenvolvimento, o relatório aponta o uso de instrumentos financeiros, como os títulos azuis e
verdes112.

Ao tratar da produtividade e da estabilidade macroeconômica, o documento argumenta


que o PIB per capita da região possui um crescimento baixo e uma alta dívida pública. As

106
Disponível em: https://www.worldbank.org/en/news/press-release/2024/12/05/donors-and-world-
bank-group-boost-IDA-development
107
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/inaugural-idb-oecd-report-caribbean-highlights-
regional-integration-and-development
108
Disponível em: https://publications.iadb.org/en/caribbean-development-dynamics-2025
109
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/inaugural-idb-oecd-report-caribbean-highlights-
regional-integration-and-development
110
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/inaugural-idb-oecd-report-caribbean-highlights-
regional-integration-and-development
111
Disponível em: https://www.iadb.org/en/home/idbimpact/one-caribbean
112
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/inaugural-idb-oecd-report-caribbean-highlights-
regional-integration-and-development

139
soluções para promover as mudanças necessárias foram: diversificar a economia, aperfeiçoar o
ambiente de negócios e ampliar a produção agrícola visando a segurança alimentar. Ao
mencionar o tema da segurança alimentar, o relatório pontua que a região mostra progresso
socioeconômico, porém, uma parte dos caribenhos ainda vive na pobreza, sofrendo de
insegurança alimentar de moderada ou grave. A publicação entende que, para promover a
inclusão social a região, os sistemas de proteção social precisam ser fortalecidos e a promoção
da igualdade de gênero mais elaborada113.

As questões climáticas no Caribe são conhecidamente problemáticas devido ao número


alto de desastres naturais e a vulnerabilidade da infraestrutura da região. O documento ressalta
que para construir a resiliência climática nos países caribenhos, serão necessárias medidas que
possibilitem a melhoria da infraestrutura, com a criação de fortes sistemas de alerta e medidas
de adaptação mais arrojadas114.

Ao tratar das exportações da ALC, o BID lançou uma publicação sobre o tema. De acordo
com o BID, o valor das exportações cresceu em 4% no ano passado, mostrando recuperação de
uma queda de 1,6% no ano de 2023115. A publicação intitulada “Estimativas de Tendências
Comerciais para a América Latina e o Caribe116”, pontuou que o crescimento das exportações
aconteceram devido aos grandes volumes de embarque, conforme a estagnação dos preços.

A América do Sul liderou o crescimento do comércio, onde os volumes exportados


cresceram cerca de 4,0%. O Caribe melhorou o seu desempenho significativamente,
conseguindo um aumento de 18,3%. Na região da Mesoamérica, as exportações aumentaram
3,5% tendo o México como a principal liderança deste resultado, com um crescimento de 4,0%.
A única sub-região que não apresentou mudanças nas exportações – permanecendo estagnadas
– foi a América Central117.

O documento mostra que as perspectivas comerciais da ALC melhoraram devido às


exportações saírem da fase de contração, porém, estes resultados não sinalizam que este
crescimento permanecerá firme o suficiente118.

Saindo do campo das publicações, o BID conseguiu um pacote de recursos robusto do


Reino Unido. No ano passado, foi selado um compromisso entre a instituição financeira e o
conglomerado político que visa apoiar o desenvolvimento sustentável da ALC119.

O anúncio do pacote foi feito pelo Ilan Goldfajn e pelo secretário de Estado dos Negócios
Estrangeiros, da Commonwealth e do Desenvolvimento do Reino Unido, David Lammy. No

113
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/inaugural-idb-oecd-report-caribbean-highlights-
regional-integration-and-development
114
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/inaugural-idb-oecd-report-caribbean-highlights-
regional-integration-and-development
115
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/exports-latin-america-and-caribbean-grow-amid-
global-uncertainty
116
Disponível em: https://publications.iadb.org/en/trade-trends-estimates-latin-america-and-caribbean-
2025-edition
117
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/exports-latin-america-and-caribbean-grow-amid-
global-uncertainty
118
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/exports-latin-america-and-caribbean-grow-amid-
global-uncertainty
119
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/uk-idb-strengthen-partnership-development-latin-
america-and-caribbean

140
pacote consta “apoio ao modelo de negócios pioneiro Originate to Share do BID Invest, bem
como planos de investir até £ 80 milhões (US$ 100 milhões) em seu aumento de capital, com o
potencial de um aumento de cinco vezes na participação do Reino Unido no capital da
instituição120”. O pacote também prevê um reabastecimento do BID Lab, o laboratório de
inovação e capital de risco do Banco.

As Perspectivas Econômicas Globais

De acordo com as projeções do Fundo Monetário Internacional (FMI) no atualizado


World Economic Outlook, o crescimento econômico global permanece inalterado e continuará
abaixo da média histórica (2000-19). A previsão a respeito do crescimento foi estimada em 3,3%
para este ano e para o próximo; a inflação global foi estimada em 4,2% para 2025 e em 3,5%
para 2026, significando que a política monetária poderá ser normalizada, auxiliando na
finalização das interrupções globais dos últimos tempos (incluindo a guerra na Ucrânia e a
pandemia de COVID-19), que antecipou o recrudescimento da inflação em pelo menos quarenta
anos121.

Ainda que as perspectivas de crescimento global não tenham sofrido alterações, o FMI
adverte que há um distanciamento entre os países a respeito do tema. Ao mencionar as
economias mais avançadas, a instituição entende que os Estados Unidos estão mais fortes do
que foi projetado, tendo como o seu principal trunfo a demanda interna. A projeção de
crescimento do FMI para o país norte-americano foi para 2,7% ao invés do 0,5% dado
anteriormente122.

Já as projeções para zona do euro ficaram em 1%. O FMI explica que os problemas com
os fracos impulsos da indústria, somados a falta de confiança do consumidor e os altos preços
da energia e do gás são as razões para projeções nada animadoras. O FMI dá como o exemplo
que o preço do gás europeu é cinco vezes mais alto do que nos Estados Unidos123.

Sobre os mercados emergentes, seguem sem alterações as projeções, estimadas em


4,2% para 2025 e 4,3% para 2026. O FMI identificou que devido à incerteza política e comercial,
a demanda permanece baixa em muitos países, porém a atividade econômica vai ganhar fôlego
conforme a incerteza for diminuindo. A instituição dá como exemplo a China, onde foi projetado
o crescimento de 4,5% para este ano e um acréscimo de 0,4 ponto percentual da previsão dada
em outubro de 2024124.

Um assunto considerado preocupante para o FMI é a política fiscal de alguns países. A


instituição mostrou que as medidas de política fiscal foram tardias ou não suficientes para
estabilizar a dívida, se fazendo necessária a recuperação da sustentabilidade orçamental,
criando reservas suficientes para enfrentar os choques que possam vir, antes que seja tarde
demais. Os custos dos empréstimos podem aumentar se atrasos adicionais persistirem,

120
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/uk-idb-strengthen-partnership-development-latin-
america-and-caribbean
121
Disponível em: https://www.imf.org/en/Publications/WEO/Issues/2025/01/17/world-economic-
outlook-update-january-2025
122
Disponível em: https://www.imf.org/en/Publications/WEO/Issues/2025/01/17/world-economic-
outlook-update-january-2025
123
Disponível em: https://www.imf.org/en/Publications/WEO/Issues/2025/01/17/world-economic-
outlook-update-january-2025
124
Disponível em: https://www.imf.org/en/Publications/WEO/Issues/2025/01/17/world-economic-
outlook-update-january-2025

141
causando a perda de confiança do mercado e mais reajustes. O FMI cita o Reino Unido e a reação
ao seu micro orçamento no ano de 2022 e as recentes tensões vividas nos mercados financeiros
brasileiros, indicando que estes fatos podem ajudar para que as condições de financiamento se
deteriorem rapidamente125.

O FMI alerta que os países precisam preservar o crescimento econômico, mesmo que as
políticas fiscais ativas pesem sobre a atividade econômica. De acordo com o Fundo, os países
precisam ter metas ambiciosas na implementação de reformas estruturais que tenham como
foco o crescimento, incluindo as reformas que ajudem a designar eficazmente os recursos, a
ampliação das receitas do governo, a vinda de mais investimentos e o impulso da inovação e da
concorrência126.

Para finalizar, o FMI evitou fazer suposições sobre as possíveis mudanças de políticas
dos governos eleitos no ano de 2024. Porém, o Conselheiro Econômico e Diretor de Pesquisa da
instituição, Pierre-Olivier Gourinchas, alertou que os esforços devem continuar acontecendo
para melhorar e fortalecer as instituições multilaterais, ajudando a economia global a ser “mais
rica, resiliente e sustentável”, e que políticas unilaterais que forçam a concorrência – subsídios,
tarifas e barreiras não tarifárias – dificilmente trazem perspectivas duradouras para as
economias domésticas. O Conselheiro termina a sua análise dizendo que as consequências
podem ajudar na evolução de desequilíbrios externos, prejudicando os parceiros comerciais,
aguçando as retaliações, trazendo malefícios para os países127.

Perspectivas para 2025 e Considerações Finais

O ano de 2025 começa aprofundado em incertezas e com muitos problemas a serem


resolvidos. O que poderemos esperar de setores cruciais como economia, saúde, política, clima
e desenvolvimento sustentável? As respostas parecem difíceis, algo que nós já nos
acostumamos nesta década, que vem se mostrando cada vez mais negativa.

Em um mundo tão fragmentado, o papel das IFMs amplia a importância de ações que
atinjam diretamente os seus alvos, sem chances para muitos erros. Nos últimos tempos, BID,
BM e FMI têm mudado as suas diretrizes para atender melhor os seus países membros, apesar
das adversidades.

Observando cada instituição financeira trabalhada neste artigo, existem algumas


considerações a serem feitas. O BID, capitaneado pelo presidente Ilan Goldfajn, mostra o
compromisso com os países membros, especialmente com a região caribenha.

No ano passado, o BID começou a se envolver nas áreas da saúde – onde voltou a ter
relações mais estreitas com a Organização Pan Americana (OPAS)128 – e de segurança
transfronteiriça. Espera-se que durante as Reuniões Anuais em março, no Chile, as diretrizes
para estas e outras áreas sejam ampliadas.

125
Disponível em: https://www.imf.org/en/Publications/WEO/Issues/2025/01/17/world-economic-
outlook-update-january-2025
126
Disponível em: https://www.imf.org/en/Publications/WEO/Issues/2025/01/17/world-economic-
outlook-update-january-2025
127
Disponível em: https://www.imf.org/en/Blogs/Articles/2025/01/17/as-one-cycle-ends-another-
begins-amid-growing-divergence
128
Disponível em: https://www.iadb.org/en/news/idb-and-paho-join-forces-key-areas

142
World Economic Outlook Growth Projections [Fonte: IMF]

O BM adotou uma nova visão ousada de um “mundo livre da pobreza em um planeta


habitável129”. Para atingir isso, o Banco reformou as suas diretrizes para se tornar um parceiro
melhor para todos. O BM entendeu que as ações para mudança deveriam ser urgentes, pois o
cenário global evidencia um progresso decrescente na luta contra a pobreza, uma crise climática
persistente, uma dívida pública crescente, insegurança alimentar, uma recuperação desigual da
pandemia e os efeitos negativos dos conflitos geopolíticos. O BM deve continuar a seguir esse
caminho, mantendo sempre em mente que as ações devem ter como alvo a mitigação destes
problemas.

O FMI em 2024 anunciou várias medidas para direcionar os trabalhos em 2025 durante
as Reuniões Anuais. Um pacote que “inclui empréstimos que contarão com a redução de
encargos e sobretaxas em 36% mais a reforma no financiamento que dobre a capacidade de
empréstimo concessional, apoiando especialmente os países de baixa renda ao longo dos

129
Disponível em: https://openknowledge.worldbank.org/entities/publication/60ebab07-6e84-498a-
b389-3050ee6c160f

143
anos130”. A instituição deve se esforçar para cumprir uma agenda que realmente beneficie os
países mais pobres e com mais problemas para equilibrar as suas balanças de pagamentos. Será
um grande desafio, pois, de acordo com o próprio FMI, as estimativas de crescimento econômico
são medianas, acrescentado a forte incerteza das políticas comerciais e da regulamentação
financeira que podem remodelar a integração global.

Referências
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one-cycle-ends-another-begins-amid-growing-divergence

130
Disponível em: https://www.imf.org/en/News/Articles/2024/10/25/sp102524-annual-meetings-
plenary

144
O Banco Africano de Desenvolvimento (AfDB) e a Fome na África

Laura Tavares Soares

Resumo: Neste primeiro informe de 2025 se faz uma retrospectiva da atuação do Banco Africano
de Desenvolvimento (AfDB) no combate à Fome, à Desnutrição e à Insegurança Alimentar na
África. O ponto de partida para o desenvolvimento desse tema é dezembro de 2022 quando se
anuncia a Cúpula Africana sobre Alimentação realizada em Dacar. Foram levantadas (em
diversos documentos nacionais, regionais e internacionais) as ações do AfDB até dezembro de
2024. Analisando as várias iniciativas do Banco, se pode afirmar que elas ainda são fragmentadas
e sobretudo insuficientes diante das dramáticas condições em que se encontra a maioria do
povo Africano. Essas condições são agravadas nos países com profundos conflitos internos,
crônicos e agudos, que deixam suas populações em situações de insegurança social e alimentar,
dependentes da, cada vez mais escassa e igualmente insuficiente, ajuda internacional.

Palavras-Chave: Banco Africano de Desenvolvimento (AfDB) – África – Fome – Insegurança


Alimentar

Os 60 anos do Banco Africano de Desenvolvimento (AfDB) e a renovação de propósitos

Reunidos em Cartum, no Sudão, em setembro de 1964, representantes de 25 países


africanos concordaram com a visão de um Banco que pudesse impulsionar o desenvolvimento
econômico em África, através da mobilização de capital adicional. Esta visão levou à criação do
Banco Africano de Desenvolvimento (o Banco), com o seu principal objetivo claramente
definido: “Promover o crescimento econômico sustentável e reduzir a pobreza na África”. Na
consecução deste objetivo, o Banco tem-se concentrado em projetos que abrangem energia
elétrica fiável, água potável, cuidados de saúde, educação, transportes e outros setores críticos.

A última década (2014-2024) da história do Banco tem se caracterizado pela procura de


uma transformação económica sustentável e à escala continental, através da inovação, de
parcerias e de investimentos em grande escala. O Dr. Akinwumi Adesina, antigo ministro da
Agricultura da República Federal da Nigéria, foi eleito Presidente do Banco em 2015. Ao assumir
o cargo, delineou a agenda High-5 do Banco – os cinco objetivos principais que definem a sua
estratégia de financiamento: Iluminar e eletrificar África; Alimentar África; Industrializar África;
Integrar África; e Melhorar a qualidade de vida das pessoas em África.

Um relatório independente do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento


salienta que, ao atingir estes cinco objetivos principais, o continente cumpriria quase 90% dos
Objetivos do Desenvolvimento Sustentável.

Em 2018, o Banco, juntamente com sete parceiros, lançou o Fórum Africano de


Investimento como o principal mercado de investimento do continente. Até dezembro de 2018
o Fórum Africano de Investimento mobilizou mais de 180 bilhões de dólares.

Em 2019, os acionistas concordaram em aumentar o capital autorizado do Banco, de 93


bilhões de dólares, para 208 bilhões de dólares – um aumento de 150%, o maior nos seus 60
anos de história. Esta base de capital reforçada fez com que os empréstimos anuais do Banco

145
aumentassem de 5,5 bilhões de dólares, em 2020, para 6 bilhões de dólares em 2021 e 8,9
bilhões de dólares em 31 de dezembro de 2022, quando o Banco já tinha acumulado ativos de
cerca de 60 bilhões de dólares americanos.

Em 2022, os parceiros de desenvolvimento do Fundo Africano de Desenvolvimento


(ADF) do Banco concordaram em comprometer um total de 8,9 bilhões de dólares para o ciclo
de financiamento 2023-2025 do Fundo – mais uma vez, a maior reposição na história do Fundo.

Em 2024, o Banco redobrou o seu enfoque em mecanismos de financiamento


inovadores. Em janeiro, emitiu com sucesso os seus primeiros títulos de capital híbrido
sustentável em dólares (avaliados em 750 milhões de dólares). Esta angariação de fundos sem
precedentes é motivada pelo objetivo do Banco de aumentar consideravelmente o seu
investimento e impacto em todo o continente.

O poder de alavancagem do Banco poderá quadruplicar após o êxito da sua campanha


para a utilização dos Direitos Especiais de Saque (SDR) do Fundo Monetário Internacional como
capital híbrido.

Em abril de 2024, o Conselho de Administração aprovou a Estratégia Decenal do Banco


para o período 2024-2033. A nova Estratégia Decenal dá prioridade ao duplo objetivo do
crescimento inclusivo e da transição para o crescimento verde, em resposta ao impulso para o
desenvolvimento ambientalmente sustentável dos países africanos.

E 60 anos após a sua criação, o Global Finance Bank classificou o AfDB como o melhor
Banco Multilateral de Desenvolvimento do mundo, enquanto o Publish What You Fund, pela
segunda vez consecutiva, classificou a carteira soberana do Banco como a mais transparente de
entre 50 instituições mundiais focadas no desenvolvimento.

Cúpula de Dacar 2. Alimentar a África: Soberania e Resiliência Alimentares.

A erradicação da fome em África até 2030 é possível, afirmaram os líderes agrícolas


mundiais em Roma. Reunidos antes da Cúpula Africana da Alimentação (Dacar 2), o líder do
Grupo Banco Africano de Desenvolvimento, a liderança do Fundo Internacional para o
Desenvolvimento Agrícola (IFAD) e a Organização para a Alimentação e Agricultura (FAO)
disseram que o objetivo era alcançável.

Globalmente, 828 milhões de pessoas sofrem de fome (jan. 2023), sendo a África
responsável por 249 milhões, um terço do número de pessoas famintas no mundo. Atingir o
Objetivo de Desenvolvimento Sustentável Número 2 da Fome Zero não pode ser alcançado a
menos que seja alcançado na África. As Nações Unidas observaram que África deve ser o foco,
onde "o número de subnutridos está crescendo mais rapidamente do que em qualquer parte do
mundo".

Nessa Cúpula, o Presidente do Grupo Banco Africano de Desenvolvimento, Dr. Akinwumi


A. Adesina, afirmou: "A Cúpula de Dacar 2 mobilizará o compromisso político, os parceiros de
desenvolvimento e o investimento do setor privado; estabelecerá políticas muito necessárias e
impulsionará estrategicamente ações a serem realizadas em escala. Este acontecimento
marcante será um ponto de virada para a soberania alimentar e a resiliência de todo o
continente".

146
A Cúpula se situa no centro da Estratégia Alimentar da África do Grupo do Banco, uma
das cinco áreas prioritárias (High 5) da instituição para apoiar os países africanos a aumentarem
significativamente o crescimento agrícola.

Os objetivos da cúpula eram os seguintes:

● Mobilizar o compromisso político de alto nível, o apoio dos parceiros de


desenvolvimento e o investimento do setor privado em torno da produção, mercados e
comércio para aumentar a produção alimentar em África.

● Partilhar experiências alimentares e agrícolas bem sucedidas em países selecionados.

● Galvanizar os governos nacionais, os parceiros de desenvolvimento e o setor privado


em torno de compactos de distribuição de alimentos e agricultura para cada país a fim de
alcançar a segurança alimentar à escala.

● Desenvolver as infraestruturas e a logística necessárias, com zonas especiais de


processamento agroindustrial para construir mercados e cadeias de valor alimentares e
agrícolas competitivas.

Realizada em janeiro de 2023, ela foi uma continuação da edição inaugural de 2015,
durante a qual foi proposta a estratégia Alimentar África para a Transformação Agrícola (2016-
2025).

A expectativa desse encontro era a de que os países africanos assumissem


compromissos políticos mensuráveis para implementar políticas destinadas a eliminar a pobreza
extrema, a fome e a subnutrição na África.

As declarações da Vice-Presidente para a Agricultura do Banco Africano de


Desenvolvimento evidenciaram o caráter do encontro: "As zonas especiais por país fornecerão
roteiros orientados para a autossuficiência, e proporcionarão intervenções que tornarão o setor
agrícola africano mais orientado para os negócios e comercialmente viável". A cúpula,
acrescentou ela, “será o balcão único para os países africanos que procuram mais e melhores
investimentos para o setor público, e que sejam liderados pelo setor privado". (Grifo nosso).

A reunião mostrou programas que já contribuem para a soberania e resiliência alimentar


africana. Isto inclui a plataforma Tecnologias para a Transformação Agrícola Africana (TAAT), do
Banco Africano de Desenvolvimento, que está fornecendo trigo tolerante ao calor, milho
tolerante à seca e sementes de arroz de alto rendimento a 11 milhões de agricultores africanos
em 21 países.

Segundo o Diretor de Agricultura e Agroindústria (grifo nosso) do Banco Africano de


Desenvolvimento, a TAAT irá produzir 100 milhões de toneladas métricas de alimentos
adicionais para alimentar 200 milhões de pessoas.

Em outra declaração o Presidente do AfDB afirmou: "Este é o momento de investir no


futuro da África. O continente tem mais de 60% das terras aráveis restantes do mundo, e milhões
de africanos são produtivos no setor agrícola. Com a eliminação das barreiras ao
desenvolvimento agrícola ajudado por novos investimentos, estima-se que a produção agrícola
da África poderá aumentar de 280 bilhões de dólares por ano (2023) para 1 trilhão de dólares
até 2030".

147
A cúpula foi organizada pelo governo senegalês e pelo Banco Africano de
Desenvolvimento, além de reunir dezenas de dignatários, incluindo 34 chefes de estado e de
governo, 70 ministros do governo, e os chamados parceiros de desenvolvimento.

Esses parceiros concordaram em contribuir com 30 bilhões de dólares para apoiar a


determinação do continente em aumentar a produtividade agrícola e tornar-se um celeiro para
o mundo.

Entre os parceiros do desenvolvimento estavam o Banco Africano de Desenvolvimento,


que se propôs a contribuir com 10 bilhões de dólares ao longo de cinco anos, e o Banco Islâmico
de Desenvolvimento, que forneceria 5 bilhões de dólares.

Além desses Bancos, estavam entre os países parceiros a Irlanda, a Holanda, o Canadá e
a Alemanha.

Os Chefes de Estado e de Governo se comprometeram a criar conselhos consultivos


presidenciais de alto nível para supervisionar a implementação dos respectivos sistemas
agrícolas.

Na Declaração de Dacar, os líderes concordaram em comprometer pelo menos 10% da


despesa pública para aumentar o financiamento da agricultura. Resolveram também
implementar pacotes de produção robustos para aumentar a produtividade e aumentar a
resistência para alcançar a segurança alimentar e a autossuficiência.

O Presidente do AfDB reafirmou seu compromisso declarando: "Viemos em resposta a


um apelo vindo da África de que é tempo da África alimentar a África. Agora é a hora da África
se alimentar a si própria. Viemos da África. Viemos de todo o mundo".

Finalmente, nas suas observações finais, o Primeiro-Ministro senegalês declarou: "A


agricultura cria empregos e promove a riqueza e a saúde", afirmou e apelou a todos os cidadãos
de África para se reunirem e acordarem numa agenda conjunta dirigida por africanos para
africanos. “É um paradoxo que África seja o maior continente, mas também o mais dependente.
A partir de agora, temos de acabar com a dependência. África deve consumir o que produz, e
produzir o que consome", afirmou.

Mudança de “paradigma”, Tecnologia e “Vantagens Empresariais”

Vale a pena destacar alguns aspectos que estão por trás do discurso do incentivo à
agricultura e da autossuficiência com relação à produção de alimentos. Muitos desses aspectos
estão presentes em artigo de Tom Collins sobre a Cúpula de Dacar 2 publicado na revista African
Business (ver referência nas fontes), com destaque na página do AfDB.

O presidente do Senegal (anfitrião da Cúpula de Dacar) apelou a uma "mudança de


paradigma" na forma como os decisores políticos africanos pensam a agricultura. "Nós, como
políticos, sentamo-nos frequentemente nas nossas capitais, longe dos campos", disse ele.
"Precisamos destinar mais do nosso orçamento à agricultura para modernizar o setor e torná-lo
um negócio rentável, tal como o comércio ou a indústria". (grifo nosso)

Muitos dos presidentes presentes na cúpula de Dacar 2 disseram que a Tecnologia era
a chave para aumentar os rendimentos dos agricultores em toda a África. O artigo citado acima,
afirma que “Embora 60% das terras aráveis não cultivadas do mundo se encontrem em África,
os pequenos agricultores não precisariam de cortar florestas se fossem capazes de aumentar a
produtividade nas suas explorações agrícolas existentes”.

148
De fato, o autor do artigo cita o Banco Mundial que constatou que a África tinha alguns
dos trabalhadores agrícolas menos produtivos do mundo, medidos pela quantidade de valor
econômico que cada pequeno agricultor acrescenta ao PIB global. A África Subsaariana gera
apenas 1.526 dólares por pessoa na agricultura, em comparação com a média mundial de 4.035
dólares, liderada pelos EUA, com 100.062 dólares por pessoa.

O presidente da Zâmbia disse que a tecnologia era a forma mais importante de


aumentar o rendimento das colheitas em toda a África. "Tecnologia apropriada é muito
importante para nós no lado da criação de animais e das sementes", afirmou, sublinhando que
isso “é extremamente importante para aumentar os rendimentos na África". (grifo nosso)

É bom deixar claro que aqui se reconhece que o avanço tecnológico é importante. Uma
parte fundamental desse esforço tem sido o programa Tecnologias para a Transformação
Agrícola Africana (TAAT) do AfDB, lançado em 2018 como parte da Estratégia Alimentar África
2016-2025 do banco. Ao aproveitar o poder da tecnologia, estabelece metas para aumentar a
produção alimentar e tirar pessoas da pobreza até 2025.

O programa implementa tecnologias com escala ao longo de nove cadeias de valor de


mercadorias: milho, arroz, trigo, feijão de ferro alto, mandioca, batata-doce de casca de laranja,
sorgo/milho, gado e aquacultura. A Etiópia, que está frequentemente associada à fome, é um
país onde o TAAT tem sido avaliado como um sucesso. A iniciativa ajudou o governo etíope a
desenvolver sementes de trigo tolerantes ao calor que podem ser plantadas nas zonas baixas do
país, onde é difícil cultivar. A ministra das finanças da Etiópia afirma que o programa aumentou
as terras cultivadas com trigo do país de 5.000 hectares para 600.000 hectares em apenas cinco
anos. Ela disse que a Etiópia poderia agora tornar-se um "celeiro regional". O programa está
para ser lançado em 29 países de todo o continente, dando a 11 milhões de agricultores acesso
a tecnologias agrícolas adaptadas ao clima.

"Hoje temos as tecnologias para alimentar África", disse o presidente do AfDB. "Elas
estão na prateleira, mas precisamos de as tirar da prateleira e colocá-las nas mãos das pessoas
certas; o sistema de pesquisa e desenvolvimento é capaz de desenvolver tecnologias que
permitirão a África adaptar-se às alterações climáticas e também ser produtiva, eficiente e
competitiva".

Para além da tecnologia, as finanças também são consideradas uma barreira


fundamental para a expansão do setor agrícola africano. Os pequenos agricultores são
frequentemente incapazes de comprar insumos agrícolas fundamentais e aumentar os
rendimentos da produção devido à falta de financiamento disponível. O problema é que
segundo a ideologia das “vantagens empresariais”, esse financiamento deve estar disponível no
“mercado”.

Os bancos domésticos consideram frequentemente a agricultura um negócio arriscado


e raramente concedem empréstimos aos pequenos agricultores sem pedir em troca garantias,
que os agricultores pobres não podem fornecer. Não por acaso o cofundador e CEO da Verod
Capital Management, uma empresa de participações privadas da África Ocidental, disse que os
interessados devem apresentar o setor como um negócio para atrair capital privado; e que a
agricultura deve ser pensada em termos de agronegócio. Segundo esse empresário, essa seria a
única forma de atrair investimento; e que não deveria haver esmolas nem prêmios gratuitos.

149
Uma iniciativa de apoio aos pequenos agricultores

Entre todas as iniciativas pesquisadas, esta é a única que faz menção aos pequenos
agricultores. O Grupo Banco Africano de Desenvolvimento (AfDB) e a Organização Pan-Africana
de Agricultores (PAFO) assinaram um Memorando de Entendimento (MdE), em outubro de 2023,
em Nairobi, para reforçar o setor agrícola africano e estimular o crescimento sustentável no
continente.

O Memorando de Entendimento foi assinado pela Chefe da Divisão da Sociedade Civil e


do Envolvimento Comunitário do AfDB, e pelo Presidente da Organização Pan-Africana de
Agricultores. A Diretora-Geral do Banco para a África Oriental participou na cerimônia de
assinatura, em evento paralelo ao Fórum Regional da Sociedade Civil, organizado pelo Banco.

O protocolo ilustra o empenho do Banco Africano de Desenvolvimento em apoiar os


pequenos agricultores de todo o continente e em reforçar o seu papel na sua transformação
económica. O protocolo ajudará a resolver os desafios fundamentais enfrentados por estes
pequenos agricultores, incluindo o acesso limitado ao financiamento, à tecnologia e aos
mercados.

"O Fórum da Sociedade Civil do Banco Africano de Desenvolvimento tornou-se uma


plataforma importante para compreender o excelente trabalho do Banco, em particular o seu
apoio aos pequenos agricultores", afirmou o Presidente da PAFO, Organização Pan-Africana de
Agricultores.

"Esta parceria ilustra o nosso empenho inabalável em trabalhar com as organizações e


comunidades da sociedade civil, reconhecendo o seu papel indispensável no desenvolvimento
de África. Aguardamos com expectativa a implementação conjunta de soluções inovadoras e
inclusivas que beneficiarão os agricultores locais", sublinhou a Chefe da Divisão da Sociedade
Civil e do Envolvimento Comunitário do AfDB.

O Memorando de Entendimento foi considerado como um incentivador do diálogo


político, visando reforçar as capacidades dos agricultores locais através de apoio financeiro,
técnico e consultivo. Inclui vários objetivos principais: promover práticas agrícolas sustentáveis;
atenuar as perdas pós-colheita; fomentar o desenvolvimento da cadeia de valor; e aumentar a
produtividade no continente africano. Centra-se na capacitação das mulheres, na criação de
emprego para os jovens e na atenuação das alterações climáticas na agricultura.

A expectativa é que esta iniciativa contribua significativamente para a realização dos


Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas, em especial o ODS 1
(erradicar a pobreza), o ODS 2 (erradicar a fome) e o ODS 8 (promover o crescimento económico
e o trabalho digno), fomentando assim o desenvolvimento econômico sustentável.

Além disso o entendimento se insere no âmbito da prioridade "Alimentar África", uma


das cinco prioridades estratégicas do Grupo Banco Africano de Desenvolvimento (AfDB),
conhecidas como "High 5".

Crise climática e Soberania Alimentar

As catástrofes climáticas, mais intensas e mais frequentes, já não poupam nenhum


continente, causando danos irreversíveis às populações e aos ecossistemas. No entanto, assim
como afeta mais intensamente as populações e os países mais pobres e vulneráveis. É o caso
dos países africanos.

150
Para além das alterações climáticas, a intensidade dos impactos é agravada por
conflitos, crises financeiras, pandemias e fome, ameaçando todas as formas de saúde e
soberania alimentar. Esses agravantes estão presentes de modo agudo na África.

Face aos enormes desafios, "a Humanidade tem uma escolha: cooperar ou morrer; isto
será um pacto de solidariedade climática ou um pacto de suicídio coletivo", declarou o
Secretário-Geral da ONU, António Guterres, na COP27.

Já em dezembro de 2022, em Tânger, Marrocos, o Banco Africano de Desenvolvimento


(AfDB) e os seus parceiros mobilizaram 8,9 bilhões de dólares para o Fundo Africano de
Desenvolvimento, fundo para concessão de empréstimos aos países mais vulneráveis, criando
uma nova janela de ação climática para os países de baixo rendimento do continente. Esses
recursos irão apoiar o desenvolvimento de infraestruturas de qualidade que sejam sustentáveis
e resistentes à mudança climática, disse o presidente do Banco.

Em janeiro de 2023, na já citada Cúpula de Dacar 2, o Banco anunciou 10 bilhões de


dólares para ajudar a África na erradicação da fome.

No entanto, diante da ausência de uma ação concertada em matéria de clima, a


soberania alimentar global continua a ser apenas um objetivo. A maioria dos países fortemente
afetados pelas alterações climáticas encontra-se em África, onde as temperaturas já
ultrapassam os limiares para além dos quais a produção agrícola é quase impossível. Os
pequenos produtores de alimentos, em particular, estão seriamente ameaçados. O direito à
alimentação está em questão, tal como a adaptação da maioria dos países africanos.

Essa situação de crise ambiental, agravada pela ausência crônica e crítica de recursos de
todo o tipo, se torna um paradoxo cruel para um continente que tem 65% das terras aráveis não
cultivadas do mundo. A África importava em 2023 mais de 100 milhões de toneladas de
alimentos por um valor anual de 75 bilhões de dólares. O contexto de guerras externas e internas
perturbou gravemente o abastecimento alimentar e fez disparar os preços das mercadorias. Na
África mais de 280 milhões de pessoas passam fome.

Como resposta, o Banco Africano de Desenvolvimento (AfDB) mobilizou o Mecanismo


Africano de Produção Alimentar de Emergência: um pacote de 1,5 bilhões de dólares para apoiar
34 países africanos e 20 milhões de agricultores, para produzir 38 milhões de toneladas de
alimentos, no valor de 12 bilhões de dólares.

Esse Mecanismo de emergência surgiu em 2023, basicamente pela interrupção do


abastecimento alimentar resultante da guerra entre a Rússia e a Ucrânia. A África enfrentou
uma escassez de pelo menos 30 milhões de toneladas de alimentos, particularmente trigo, milho
e soja importados de ambos os países.

Os agricultores africanos necessitavam urgentemente de sementes e insumos de alta


qualidade antes do início da estação agrícola em maio de 2023, a fim de aumentar
imediatamente o abastecimento alimentar. O Mecanismo Africano de Produção Alimentar de
Emergência, do Banco Africano de Desenvolvimento, no valor de 1,5 bilhões de dólares foi uma
iniciativa para ajudar os pequenos agricultores a compensar a lacuna alimentar. Ele forneceu
sementes certificadas a 20 milhões de pequenos agricultores africanos, e aumentou o acesso a
fertilizantes que permitiu a produção de 38 milhões de toneladas de alimentos. Isto
representará um aumento de 12 bilhões de dólares na produção de alimentos em dois anos.
(2023/25).

151
Por outro lado, em uma abordagem mais ampla, não apenas emergencial, o Banco
Africano de Desenvolvimento (AfDB) criou o Mecanismo de Benefícios de Adaptação (ABM),
lançado em toda a África, desde 2019, tornando-se a primeira abordagem não mercantil
registrada na Plataforma de Abordagens Não Mercantis (NMA Non Market Approach) do Órgão
das Nações Unidas sobre Alterações Climáticas (UNFCCC). O ABM foi apresentado à UNFCCC
pelo Uganda na conferência sobre o clima COP29 realizada em Baku em 2024, com o apoio
inicial da Nigéria, Quénia, Madagáscar, Benim, Gâmbia e Guiné. Organizações internacionais,
empresas e agências governamentais também apoiaram a iniciativa, incluindo o Banco de
Desenvolvimento da África Ocidental (BOAD), o Centro Internacional de Investigação Florestal e
Agroflorestal Mundial (CIFOR-ICRAF), a Autoridade de Gestão de Resíduos do Senegal
SONAGED, SLAMDAM B.V., SaniTap , Allcot e Perspectives Climate Research GmbH .

O Banco Africano de Desenvolvimento está registrado na Plataforma NMA como


participante no ABM e como fornecedor de apoio financeiro, tecnológico e de capacitação,
devido ao seu papel no desenvolvimento e pilotagem do mecanismo.

O ABM é um mecanismo inovador para mobilizar financiamento novo e adicional dos


setores público e privado para melhorar a ação de adaptação às alterações climáticas. Tem o
potencial de acelerar a transformação dos países anfitriões em vias de desenvolvimento
sustentável, resiliente às alterações climáticas e com baixas emissões de carbono, certificando
o valor da resiliência em termos de benefícios e custos incrementais.

Este marco confirma o ABM como um mecanismo de cooperação pioneiro para a


adaptação às alterações climáticas no âmbito do Acordo de Paris.

O ABM certifica benefícios quantificados de adaptação às mudanças climáticas,


utilizando metodologias rigorosas e de verificação independente, fornecendo dados
transparentes sobre melhorias de resiliência, benefícios e o financiamento associado. Esta
informação apoia os relatórios do Acordo de Paris e o acompanhamento dos ODS. Através de
Acordos de Fornecimento de Benefícios de Adaptação com os utilizadores da informação gerada
através do ABM, o mecanismo permite aos promotores de projetos rentabilizar os benefícios
certificados e aceder aos mercados de capitais, ao mesmo tempo que torna os custos de
adaptação transparentes.

Há uma expectativa de que os doadores e investidores considerem o ABM um meio


atrativo para se envolverem de forma massiva na cooperação internacional em matéria de
adaptação.

Ainda sobre a relação entre mudanças climáticas e segurança alimentar, os Líderes


Africanos para a Nutrição, uma plataforma para o envolvimento político com o objetivo de
promover a nutrição na África, organizaram um evento paralelo de alto nível sobre a integração
do financiamento da nutrição no quadro das alterações climáticas, na COP28 (2023). A reunião
teve lugar em dezembro de 2023 e foi organizada pelo Governo da Somália, a Comissão da União
Africana, os Líderes Africanos para a Nutrição, o Banco Africano de Desenvolvimento e parceiros.

Na ocasião foi lançado um importante documento estratégico, "Do Compromisso à Ação


– Integrar o Financiamento da Nutrição no Quadro das Alterações Climáticas". Este documento
apela aos líderes africanos para darem prioridade à utilização do financiamento climático para
reforçar os sistemas alimentares.

152
Nesse evento, se considerou fundamental a adoção de estratégias abrangentes que
integrassem perfeitamente a adaptação às alterações climáticas, a redução do risco de
catástrofes e as intervenções nutricionais para garantir o bem estar e a resiliência das
comunidades que enfrentam os desafios da desnutrição relacionada com o clima em África.

A Comissária da União Africana para a Saúde, Assuntos Humanitários e


Desenvolvimento Social, sublinhou a necessidade de uma resposta global para adotar uma
abordagem abrangente que integre o financiamento da nutrição nas estratégias mais amplas de
alterações climáticas, afirmando que as alterações climáticas não são apenas uma preocupação
ambiental, mas um fator determinante da segurança alimentar, da nutrição e do bem-estar
geral. As alterações climáticas, segundo a mesma Comissária, têm um impacto significativo na
desnutrição, afetando os sistemas alimentares, a disponibilidade, o acesso e a qualidade
nutricional. As intrincadas interações entre as alterações climáticas e a desnutrição sublinham a
necessidade urgente de abordagens abrangentes e integradas para enfrentar ambos os desafios
em simultâneo, conclui.

O Diretor da Divisão de Produção Agrícola, Sustentabilidade e Investigação do Banco


Africano de Desenvolvimento afirmou que existe uma necessidade urgente de uma abordagem
abrangente e integrada que trate da complexidade entre as alterações climáticas e a
desnutrição.

Programa de Alimentação Escolar: uma possibilidade de universalização?

Em maio de 2024, numa primeira e única menção (em meio a inúmeros documentos do
AfDB) a um programa com potencial para a universalização da alimentação, o Programa de
Alimentação Escolar, foi realizado um importante evento paralelo aos chamados Encontros
Anuais do Grupo Banco Africano de Desenvolvimento, em Nairobi.

Nesse encontro se afirmou que os países africanos podem aumentar o fornecimento de


refeições escolares gratuitas, apesar de outros desafios económicos (grifo nosso), para
combater as consequências incalculáveis e prejudiciais para milhões de crianças que vão
diariamente para a escola em toda a África com fome.

O tema oficial desse evento paralelo foi ‘Criar espaço fiscal para a alimentação escolar:
Rumo à Agenda 2063, aos ODS e ao desenvolvimento do capital humano’. (grifos nossos).

Organizado pela Fundação Rockefeller em colaboração com a Parceria Global para a


Educação (GPE) e o Programa Alimentar Mundial, o evento centrou-se na forma como os países
podem aumentar o fornecimento de refeições escolares gratuitas para ajudar a cumprir os
objetivos de desenvolvimento sustentável e as aspirações da Agenda 2063 da União Africana –
denominada ‘A África que Queremos’.

No encontro de alto nível que juntou políticos e policy makers, o Diretor de Agricultura
e Agroindústria do Banco Africano de Desenvolvimento afirmou o óbvio: “Não passar fome é um
direito humano... as crianças que recebem uma boa refeição voltam sempre à escola, existe uma
ligação entre a fome e o desenvolvimento da massa cinzenta”. sublinhou que a produção
alimentar criou demanda para os agricultores e “garantiu mercados para os produtos que
contribuem para o crescimento econômico”. Observando que muitos governos africanos
estavam lutando com os impactos econômicos adversos da pandemia da COVID-19, o aumento
da inflação alimentar e as perdas e danos associados às catástrofes naturais induzidas pelas

153
alterações climáticas, entre outras questões, o Diretor informou que o Banco já apoiou, até
agora, iniciativas de refeições saudáveis no valor de cerca de 100 milhões de dólares.

O antigo Presidente da Tanzânia, Jakaya Kikwete, atual presidente da Parceria Global


para a Educação (PGE) declarou que “hoje em dia nenhuma criança deve ir para a escola com
fome”. “É necessário encontrar formas inovadoras de financiar as refeições escolares”,
acrescentou.

Dadas as atuais circunstâncias económicas, Kikwete fez um apelo para que a África
acelerasse significativamente o esforço do continente para cumprir os ODS pensando ‘fora da
caixa’ e não ficasse mais para trás, uma vez que as crianças em idade escolar eram os guardiões
do futuro de África e fundamentais para alcançar ‘a África que queremos’. Ele elogiou ainda os
recentes acordos de troca de dívida por educação celebrados com parceiros, destacando um
acordo recentemente concluído entre a França e a Costa do Marfim, e referiu o efeito
multiplicador que cada dólar gasto na educação, incluindo a iniciativa de refeições gratuitas,
teve no desempenho global do PIB.

No encontro destacou-se ainda algo muito importante e estrutural: o fato de que muitos
países africanos estão também se debatendo com um espaço orçamentário limitado,
exacerbado pelo aumento dos custos do serviço da dívida, criando uma silenciosa crise da
dívida. Os elevados pagamentos do serviço da dívida reduzem a despesa em intervenções
críticas que poderiam acelerar a implementação da Agenda 2063 e dos ODS.

Conclusão

A situação de fome e insegurança alimentar na África está profundamente associada a


uma combinação de fatores determinantes de caráter estrutural e conjuntural. A extrema
pobreza generalizada da região associada a situações de alta vulnerabilidade causadas, também
de forma combinada, pelas alterações climáticas e pelos conflitos crônicos e agudos internos em
diversos países, além das guerras externas, compõem um quadro de causalidade extremamente
complexo.

Fica patente que as ações do Banco Africano de Desenvolvimento (AfDB) - sem


iniciativas efetivamente transformadoras dos governos da região e sem um apoio internacional
mais efetivo - além do seu caráter fragmentado e ainda limitado, mesmo do ponto de vista do
aporte financeiro, são insuficientes, ou na melhor das hipóteses paliativas, para a solução do
grave e complexo problema da fome e da insegurança alimentar.

Sem atacar as causas estruturais da situação não apenas de desigualdade social, mas de
pobreza generalizada, como a inserção mundial extremamente injusta do continente africano,
em uma (des)ordem global já desigual, fica extremamente difícil superar a situação em questão
da fome e da insegurança alimentar.

Fontes de consulta
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alimentar-com-milhoes-de-pessoas-em-crise-53631
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grupo-banco-africano-de-desenvolvimento-planeia-investir-10-mil-milhoes-de-dolares-para-fazer-do-
continente-o-celeiro-do-mundo-58478
9. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/cimeira-de-dacar-2-
parceiros-de-desenvolvimento-prometem-30-mil-milhoes-de-dolares-para-impulsionar-producao-
alimentar-em-africa-58600
10. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/lideres-africanos-apoiam-
resultados-da-cimeira-alimentar-do-banco-africano-de-desenvolvimento-e-defendem-sua-
implementacao-urgente-59309
11. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/esta-na-altura-de-africa-se-alimentar-si-propria-
cimeira-de-dacar-2-faz-progressos-na-agenda-alimentar-de-africa-59478
12. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/esta-na-altura-de-dar-escala-solucoes-africanas-para-
crises-alimentar-e-climatica-do-continente-opiniao-59786
13. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/campeao-da-nutricao-
defende-transformacao-do-compromisso-politico-em-acoes-para-alcancar-os-objetivos-nutricionais-em-
africa-60131
14. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/crise-climatica-e-soberania-alimentar-renovar-formas-
de-agir-em-conjunto-60466
15. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/encontros-anuais-de-2023-em-sharm-el-sheikh-o-
banco-africano-de-desenvolvimento-quer-acelerar-implementacao-das-decisoes-de-dakar-2-sobre-
soberania-alimentar-61343
16. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/africa-dispoe-de-
tecnologia-e-inovacao-para-atingir-fome-zero-disse-o-presidente-do-banco-africano-de-
desenvolvimento-dr-akinwumi-adesina-na-semana-africana-do-agronegocio-e-da-ciencia-61833
17. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/africa-dispoe-de-
tecnologia-e-inovacao-para-atingir-fome-zero-disse-o-presidente-do-banco-africano-de-
desenvolvimento-dr-akinwumi-adesina-na-semana-africana-do-agronegocio-e-da-ciencia-61833
18. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/grupo-banco-africano-de-desenvolvimento-e-
organizacao-pan-africana-de-agricultores-assinam-memorando-de-entendimento-para-apoiar-os-
pequenos-agricultores-65223
19. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/dia-de-africa-para-
seguranca-alimentar-e-nutricional-vice-presidente-da-zambia-sublinha-o-papel-do-desenvolvimento-de-
infraestruturas-65624
20. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/o-tempo-esta-esgotar-se-para-ajudar-africa-alimentar-
se-si-propria-65924
21. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/rei-letsie-iii-do-lesoto-
lanca-documento-estrategico-sobre-integracao-da-nutricao-no-financiamento-climatico-66947
22. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/lideres-dizem-que-e-
preciso-financiamento-e-politicas-mais-robustas-para-combater-desnutricao-que-afeta-mais-de-80-
milhoes-de-criancas-68771
23. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/banco-africano-de-
desenvolvimento-uniao-africana-governo-dos-estados-unidos-fundo-internacional-para-o-
desenvolvimento-agricola-e-cgiar-estreitam-lacos-para-impulsionar-producao-alimentar-em-africa-
71545
24. https://www.undp.org/africa/publications/2024-africa-sustainable-development-report

155
25. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/lideres-africanos-reunem-se-para-combater-
degradacao-dos-solos-e-desertificacao-na-sessao-especial-da-amcen-74280
26. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/rei-letsie-iii-do-lesoto-
grupo-banco-africano-de-desenvolvimento-e-filantropias-mundiais-fazem-parceria-estrategica-para-
acabar-com-fome-em-idade-escolar-74477
27. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/presidente-do-banco-
africano-de-desenvolvimento-apela-solucoes-arrojadas-inovadoras-e-praticas-para-combater-pobreza-
em-africa-76072
28. https://www.afdb.org/pt/noticias-e-eventos/comunicados-de-imprensa/adesina-e-banga-lideram-
o-esforco-para-acabar-com-fome-em-africa-no-dialogo-borlaug-2024-76226
29. https://www.afdb.org/pt/search/content/Fome
30. https://www.afdb.org/pt/sobre-nos-missao-e-estrategia/alimentar-africa
31. https://www.afdb.org/pt/sobre-nos/informacao-empresarial/historia/o-banco-aos-60
32. https://african.business/2023/02/resources/time-for-africa-to-feed-itself-dakar-2-summit-takes-
africas-food-agenda-forward/

156
Tarifas, Multilateralismo e Transformação Econômica para o Desenvolvimento
Sustentável e Inclusivo
Tariffs, Multilateralism and Economic Transformation for Sustainable and Inclusive
Development

Claudia Chamas
Bernardo Bahia Cesário

Abstract: China’s Trade Ministry criticized President Trump’s decision to impose 10 percent
tariffs on Chinese exports, saying it would file a WTO case while threatening “countermeasures”
to protect its interests. The European Commission requested WTO consultations to challenge
what it called China’s “unfair and illegal trade practices” on intellectual property. At the World
Economic Forum in Davos, WTO Director-General Ngozi Okonjo-Iweala called on world leaders
to “relax” and take a measured approach to trade tensions. Paraguayan Presidential Address
Defends Multilateralism. Asian Development Bank and World Trade Organization Launch Critical
Minerals Trade Database to Support Clean Energy Transition. The latest report from UNCTAD
highlights the pressing challenges facing global development, emphasizing the slow progress
towards the Sustainable Development Goals (SDGs). Structural inequalities, geopolitical
conflicts, and financial instability have widened the development gap, particularly affecting low-
income and vulnerable countries. Key trends shaping the future include the shift towards a
multipolar economy, rapid technological advancements, climate change, demographic
transformations, and urbanization. The report calls for urgent action to accelerate economic
diversification, resilience-building, and multilateral cooperation to ensure an equitable and
sustainable global economy.

Keywords: Patents, China, European Union, Trade Tensions, Critical Minerals, Sustainable
Development, Economic Diversification, Technological Transformation, Climate Change,
Multilateralism, Trade and Investment, Global Inequality

Resumo: O Ministério do Comércio da China criticou a decisão do presidente Trump de impor


tarifas de 10% sobre as exportações chinesas, declarando que entraria com um processo na
OMC e, ao mesmo tempo, ameaçando "contramedidas" para proteger seus interesses. A
Comissão Europeia requisitou consultas na OMC para desafiar o que designou de “práticas
comerciais desleais e ilegais” de propriedade intelectual da China. No Fórum Econômico
Mundial, em Davos, a Diretora-Geral da OMC, Ngozi Okonjo-Iweala, pediu aos líderes mundiais
que "relaxem" e adotem abordagem comedida às tensões comerciais. Presidente do Paraguai
defende multilateralismo em Palestra Presidencial da OMC. O Banco Asiático de
Desenvolvimento e a Organização Mundial do Comércio lançaram Banco de dados sobre
comércio de minerais críticos lançado para apoiar a transição para energia limpa. O mais recente
relatório da UNCTAD ressalta os desafios urgentes que impactam o desenvolvimento global,
destacando o lento progresso rumo aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).
Desigualdades estruturais, conflitos geopolíticos e instabilidade financeira ampliaram a lacuna
do desenvolvimento, afetando particularmente países de baixa renda e populações vulneráveis.
Tendências-chave que moldam o futuro incluem a transição para uma economia multipolar,
avanços tecnológicos rápidos, mudanças climáticas, transformações demográficas e

157
urbanização. O relatório clama por ações urgentes para acelerar a diversificação econômica,
fortalecer a resiliência e impulsionar a cooperação multilateral para garantir uma economia
global equitativa e sustentável.

Palavras-chave: Patentes, China, União Europeia, Tensões Comerciais, Minerais Críticos,


Desenvolvimento Sustentável, Diversificação Econômica, Transformação Tecnológica, Mudança
Climática, Multilateralismo, Comércio e Investimento, Desigualdade Global

OMC: China ataca tarifas de Trump e ameaça com ‘contramedidas’

O Ministério do Comércio da China criticou a decisão do presidente Trump de impor


tarifas de 10% sobre as exportações chinesas, declarando que entraria com um processo na
Organização Mundial do Comércio e, ao mesmo tempo, ameaçando "contramedidas" para
proteger seus interesses. O ministério também sinalizou o desejo de manter um relacionamento
estável com os Estados Unidos, pedindo diálogo franco e respeito mútuo. A eficácia do desafio
na OMC é questionável, pois os Estados Unidos bloquearam nomeações, tornando o órgão de
apelação incapaz de formar quórum desde o final de 2019, o que significa que quaisquer
relatórios do painel não podem resultar em decisões juridicamente vinculativas (Bradsher,
2025).

Em disputas comerciais anteriores, a China respondeu consistentemente às tarifas de


Trump com medidas retaliatórias, embora suas opções tenham se tornado limitadas devido ao
desequilíbrio comercial que vê a China vendendo muito mais para os EUA do que compra. Trump
justificou as novas tarifas citando a necessidade de interromper o fluxo de fentanil para o
México, enquanto a China respondeu argumentando que a causa da epidemia de fentanil é a
falha dos Estados Unidos em lidar com o vício em drogas, não as exportações químicas chinesas.
O governo chinês sustentou que os EUA deveriam lidar com essas questões de forma objetiva e
racional, em vez de recorrer a ameaças econômicas, e concluiu sua declaração com um apelo à
cooperação com base em princípios de igualdade e benefício mútuo (Bradsher, 2025).

OMC: União Europeia inicia queixa de disputa relativa a medidas de licenciamento de patentes
chinesas

A Comissão Europeia requisitou consultas na OMC para desafiar o que designou de


“práticas comerciais desleais e ilegais” de propriedade intelectual da China, especificamente em
relação à autoridade dos tribunais chineses para definir taxas de royalties vinculativas (binding)
mundiais para patentes essenciais padrão (standard essential patentes) da União Europeia, sem
o consentimento dos proprietários das patentes. Essa prática força as empresas europeias de
alta tecnologia a reduzir suas taxas globais, fornecendo aos fabricantes chineses acesso mais
barato às tecnologias europeias, ao mesmo tempo em que interfere na jurisdição dos tribunais
da União Europeia sobre questões de patentes europeias. As consultas na OMC representam o
primeiro passo nos procedimentos de solução de controvérsias, com a UE preparada para
solicitar decisão formal do painel da OMC se nenhuma solução satisfatória surgir dentro de 60
dias.

De acordo com a Nota: “Este caso diz respeito a patentes essenciais padrão, que
protegem tecnologias essenciais para a fabricação de bens que atendem a um padrão, por
exemplo, 5G para celulares. Empresas europeias detêm muitas dessas patentes de alta
tecnologia, principalmente no setor de telecomunicações, o que lhes dá uma vantagem

158
tecnológica. Ao fixar taxas de royalties mundiais para essas patentes, a China tentou forçar
empresas da UE a dar aos fabricantes chineses acesso mais barato a essa tecnologia europeia.
A prática do tribunal chinês de fixar taxas de royalties mundiais para patentes essenciais padrão
está relacionada a outra disputa — a das liminares anti-processo — também atualmente
contestada pela UE na OMC. As liminares anti-processo chinesas efetivamente restringem os
detentores de patentes de alta tecnologia, multando-os ou sancionando-os de outra forma se
eles buscarem fazer valer seus direitos de propriedade intelectual por meio de um tribunal não
chinês. O Painel da OMC estabelecido naquele caso (DS 611) deve emitir um Relatório no
primeiro trimestre de 2025.”

OMC em Davos: Ngozi Okonjo-Iweala opina sobre as tensões comerciais

Na Reunião Anual do Fórum Econômico Mundial em Davos, Suíça, a Diretora-Geral da


OMC, Ngozi Okonjo-Iweala, pediu aos líderes mundiais que "relaxem" e adotem abordagem
comedida às tensões comerciais. Falando em vários eventos, ela enfatizou o papel crítico da
OMC na economia mundial e alertou contra a escalada de conflitos comerciais. A reunião, com
o tema "Colaboração para a Era Inteligente", forneceu uma plataforma para discutir os desafios
do comércio global, incluindo os riscos de fragmentação econômica e oportunidades
emergentes em inteligência artificial e economia verde (WTOa, 2025).

Durante sessão sobre "Encontrando Crescimento em Tempos Incertos", Okonjo-Iweala


destacou a resiliência do comércio e o potencial de crescimento. Ela fez referência a estudo da
OMC que sugere crescimento comercial de dois dígitos por meio da adoção de IA, o que poderia
reduzir os custos comerciais e aumentar a produtividade. De forma crítica, ela alertou sobre as
graves consequências econômicas da fragmentação comercial, alertando que a divisão em dois
blocos comerciais geopolíticos poderia resultar em uma perda global do PIB equivalente a todas
as economias do Japão e da Coreia combinadas (WTOa, 2025).

A Diretora-Geral também abordou a intersecção do comércio e da preservação


ambiental. Ela argumentou que a adoção de tecnologia de energia limpa é impossível sem
comércio e propôs que os países produzissem e exportassem bens com base em sua vantagem
comparativa ambiental. Durante discussão sobre tarifas, ela alertou contra políticas comerciais
retaliatórias, traçando paralelos com a devastação econômica da década de 1930, quando
tarifas crescentes pioraram uma crise econômica existente (WTOa, 2025).

Okonjo-Iweala alertou sobre as consequências catastróficas de potenciais guerras


comerciais desencadeadas pelas ameaças tarifárias do presidente dos EUA, Donald Trump.
Falando no Fórum Econômico Mundial em Davos, ela enfatizou que a retaliação retaliatória
poderia levar a perdas de dois dígitos no PIB global, traçando paralelos com as restrições
comerciais após a Lei Smoot-Hawley na década de 1930. Okonjo-Iweala pediu aos membros da
OMC que permanecessem calmos e utilizassem o sistema de resolução de disputas da
organização, mesmo que o tribunal de apelações permaneça parcialmente operacional devido
aos vetos anteriores de Trump à nomeação de juízes (Farge, 2025).

No mesmo evento, o enviado do Brasil, Alexandre Parola, ecoou preocupações sobre


adoção de tarifas por motivação política, pois provocam transbordamento negativo e são como
prejudiciais ao sistema baseado em regras internacionais (Farge, 2025).

Em 24 de janeiro, Okonjo-Iweala participou de reunião ministerial sobre questões da


OMC, onde encorajou os membros a irem além das abordagens tradicionais e se concentrarem
na reforma organizacional. Os ministros ressaltaram a importância de um sistema de comércio

159
multilateral baseado em regras, transparente e previsível. Olhando para o futuro, eles
começaram os preparativos iniciais para a 14ª Conferência Ministerial da OMC, programada
para março de 2026 em Yaoundé, Camarões, com compromisso compartilhado de modernizar
as interações comerciais globais (WTOa, 2025).

OMC: Presidente do Paraguai defende multilateralismo

Santiago Peña Palacios, Presidente do Paraguai, proferiu Palestra Presidencial da OMC,


em 31 de janeiro de 2025, na sede da OMC, em Genebra. O tópico foi “Sustentando o
Multilateralismo em Tempos Incertos: O Papel das Potências Médias” (WTOb, 2025).

O Presidente enfatizou a importância crítica do multilateralismo no cenário comercial


global atual. Ele posicionou o Paraguai como excelente exemplo de economia que prospera no
comércio aberto, sendo a segunda economia mais aberta da América Latina, sem restrições
comerciais significativas (WTOb, 2025).

Peña argumentou que, para economias de médio porte como o Paraguai, o sistema de
comércio multilateral não é apenas uma opção, mas caminho essencial para o desenvolvimento
e a prosperidade. Ele afirmou corajosamente que qualquer crise de multilateralismo só pode ser
resolvida por "mais multilateralismo", destacando a necessidade de integração mais profunda
do mercado global guiada por regras claras e justas (WTOb, 2025).

Com base na experiência do Paraguai como democracia estável, o presidente enfatizou


a oportunidade única para organizações como a OMC demonstrarem sua importância crucial
em tempos desafiadores. Ele elogiou a visão pós-Segunda Guerra Mundial de criar organizações
internacionais para trazer ordem ao comércio global, chamando a OMC de "grande ideia" que
continua vital para a cooperação econômica internacional (WTOb, 2025).

Em seu discurso, Peña também delineou áreas específicas para os membros da OMC
abordarem proativamente, incluindo a reforma agrícola, restaurando um sistema de solução de
controvérsias totalmente funcional e garantindo que as medidas ambientais apoiem, em vez de
dificultar, o comércio internacional. Sua palestra ressaltou a importância de garantir justiça,
imparcialidade e igualdade no comércio global (WTOb, 2025).

OMC: Banco de dados sobre comércio de minerais críticos lançado para apoiar a transição para
energia limpa

O Banco Asiático de Desenvolvimento (em inglês, Asian Development Bank - ADB) e o


Secretariado da Organização Mundial do Comércio (OMC) lançaram o banco de dados Trade in
Critical Minerals (TiCM) na conferência sobre mudanças climáticas COP29, em Baku, fornecendo
dados comerciais abrangentes para 250 minerais críticos. O banco de dados oferece
informações sobre fluxos comerciais, visualizações de redes comerciais e padrões de
especialização, e compila dados sobre tarifas e políticas comerciais usando fontes publicamente
disponíveis dos Bancos de Dados Analíticos da OMC e plataformas de monitoramento comercial
(WTOc, 2025).

Minerais críticos como lítio, cobalto e elementos de terras raras são cruciais para
tecnologias de energia limpa, como baterias, turbinas eólicas e veículos elétricos. A iniciativa
visa aumentar a transparência, promover a colaboração e apoiar a tomada de decisões
informadas por formuladores de políticas e partes interessadas, contribuindo para o
desenvolvimento de cadeias de suprimentos de minerais críticos sustentáveis e resilientes que
ajudarão a atingir as metas de energia renovável e eficiência energética até 2030 (WTOc, 2025).

160
UNCTAD: relatório Shaping the Future

O relatório Shaping the Future, apresentado pelo Secretário-Geral da UNCTAD à 16ª


sessão da Conferência, destaca os desafios e oportunidades para o desenvolvimento econômico
global em cenário marcado por crises múltiplas, transformações tecnológicas aceleradas e
urgência de ações climáticas. O documento enfatiza que, apesar do crescimento econômico
global, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) estão fora do rumo, com apenas
17% das metas em curso para serem alcançadas até 2030. A pandemia de COVID-19, os conflitos
geopolíticos e a crise climática agravaram as desigualdades, especialmente nos países menos
desenvolvidos (PMDs), países em desenvolvimento sem litoral (PDSLs) e pequenos Estados
insulares em desenvolvimento (PEIDs). A lacuna de financiamento para os ODS no Sul Global
aumentou de US$ 2,5 trilhões em 2015 para US 4 trilhões em 2024, pressionando ainda mais as
economias vulneráveis (UNCTAD, 2025).

O relatório identifica cinco tendências globais que estão redefinindo o futuro do


desenvolvimento: o surgimento de um mundo multipolar, a transformação tecnológica
acelerada, a crise planetária tripla (mudanças climáticas, perda de biodiversidade e poluição),
as mudanças demográficas e a urbanização. Essas tendências apresentam tanto desafios quanto
oportunidades, especialmente para o Sul Global, que deve liderar o crescimento econômico
global nas próximas décadas. No entanto, a fragmentação regulatória, a desigualdade no acesso
à tecnologia e os riscos ambientais exigem resposta multilateral coordenada para garantir um
desenvolvimento equitativo, inclusivo e sustentável (UNCTAD, 2025).

A UNCTAD propõe quatro transformações centrais para enfrentar esses desafios:


economias mais diversificadas, mais sustentáveis e resilientes, financiamento mais abundante e
estável para o desenvolvimento, e multilateralismo renovado em um mundo multipolar. Essas
transformações visam não apenas superar as crises atuais, mas também aproveitar as
oportunidades emergentes, como a transição energética e a digitalização, para promover
transformação estrutural que beneficie a todos, especialmente os países mais vulneráveis
(UNCTAD, 2025).

Desenvolvimento Contra as Adversidades

O Alvo Distante dos ODS

O cenário global de rápidas transformações compromete o progresso em direção aos


Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). A economia mundial enfrenta mudanças
profundas, influenciadas pelos impactos contínuos da pandemia de COVID-19, deslocamentos
geopolíticos sem precedentes e os efeitos acelerados da tecnologia e das mudanças climáticas.
Embora a crise sanitária imediata tenha diminuído, seus impactos persistem, agravando os
desafios existentes e colocando os ODS em uma trajetória preocupante. Mesmo antes da
pandemia, as metas dos ODS já estavam fora do rumo; nas taxas atuais, apenas 17% serão
alcançadas até 2030 (UNCTAD, 2025).

161
Figura 1 - Percentual de Metas dos ODS em Rumo ao Cumprimento

Fonte: UNCTAD, 2025, com base em United Nations, The Sustainable Development Goals Report 2024
(Special Edition).

Conjuntura global de desafios múltiplos

A pandemia de COVID-19, os conflitos geopolíticos e a crise climática aprofundaram as


desigualdades globais, afetando especialmente os países menos desenvolvidos (PMDs), países
em desenvolvimento sem litoral (PDSLs) e pequenos Estados insulares em desenvolvimento
(PEIDs). A lacuna de financiamento para os ODS no Sul Global aumentou de US$ 2,5 trilhões em
2015 para US$ 4 trilhões em 2024, pressionando ainda mais as economias vulneráveis. Conflitos
como os da Ucrânia e do Oriente Médio impactaram não apenas vidas e meios de subsistência,
mas também o comércio global e o transporte marítimo, intensificando os desafios econômicos
(UNCTAD, 2025).

Baixo crescimento e aumento das desigualdades

A economia global está entrando em período de crescimento reduzido, com projeções


de estabilização em torno de 2,7% ao ano, abaixo da média pré-pandemia de 3,1%. Embora a
inflação tenha moderado, os bancos centrais mantêm políticas monetárias restritivas, reduzindo
investimentos e ampliando o endividamento global. A desigualdade de renda permanece
elevada, com a metade mais pobre da população mundial mantendo participação inalterada na
renda global. Além disso, 3,3 bilhões de pessoas vivem em países onde os gastos com serviço da
dívida superam os investimentos em saúde e educação, limitando o potencial de crescimento
sustentável dessas economias (UNCTAD, 2025).

162
Figura 2 - O desenvolvimento sustentável enfrenta desafios crescentes.

Fonte: UNCTAD, 2025, com base em World Inequality Database and Chancel and and Pikkety, 2021.

Cinco megatendências moldando o futuro

O relatório da UNCTAD destaca cinco tendências globais que redefinem o


desenvolvimento: o avanço de uma economia multipolar, a aceleração tecnológica, a crise
ambiental tripla (mudanças climáticas, perda de biodiversidade e poluição), as transformações
demográficas e o crescimento da urbanização. Essas tendências apresentam tanto desafios
quanto oportunidades, especialmente para o Sul Global, que deve liderar o crescimento
econômico nas próximas décadas. No entanto, a fragmentação regulatória, as desigualdades no
acesso à tecnologia e os riscos ambientais exigem resposta multilateral coordenada para
garantir desenvolvimento mais equitativo, inclusivo e sustentável (UNCTAD, 2025).

Figura 3 - Cinco megatendências estão moldando o futuro

Fonte: UNCTAD, 2025.

163
A necessidade de transformação estrutural

A UNCTAD enfatiza a urgência de acelerar as quatro transformações propostas no Pacto


de Bridgetown: diversificação econômica, fortalecimento da resiliência e sustentabilidade,
ampliação do financiamento para o desenvolvimento e renovação do multilateralismo. Essas
mudanças são essenciais não apenas para mitigar as crises atuais, mas também para explorar
novas oportunidades, como a transição energética e a digitalização, promovendo transformação
estrutural que beneficie especialmente os países mais vulneráveis (UNCTAD, 2025).

Progresso requer mudança do status quo

Economias mais diversificadas - Para além do crescimento do PIB

O desenvolvimento inclusivo e sustentável exige ir além do crescimento do PIB. Embora


o comércio global tenha atingido recorde de US$ 33 trilhões, enquanto a riqueza global já
ultrapassa os US$ 400 trilhões, as perspectivas de crescimento global permanecem modestas. A
desigualdade crescente e as pressões inflacionárias estão alimentando o descontentamento
social e dificultando o progresso em direção a desenvolvimento verdadeiramente inclusivo. O
PIB, como métrica, falha em capturar as múltiplas dimensões do bem-estar humano, destacando
a importância de indicadores complementares, conforme previsto no ODS 17.19 (UNCTAD,
2025).

Capacidades produtivas e diversificação econômica

O desenvolvimento de capacidades produtivas é fundamental para avançar na


diversificação econômica e sustentar um crescimento de qualidade. As capacidades produtivas
referem-se aos recursos, capacidades empresariais e ligações de produção que determinam a
capacidade do país de produzir bens e serviços e permitir seu crescimento. Economias com
capacidades produtivas fracas tendem a ficar presas em setores de baixa produtividade, como
indústrias extrativas ou serviços informais. A dependência de commodities continua sendo
desafio para os países em desenvolvimento, com 66% deles dependendo de exportações de
commodities primárias entre 2020 e 2022. Essa dependência limita a capacidade de adicionar
valor e diversificar as economias, deixando os países vulneráveis a choques externos e
instabilidade macroeconômica (UNCTAD, 2025).

Figura 4 - Dois terços dos países em desenvolvimento são dependentes de commodities.


Commodities primárias como porcentagem do total das exportações de bens (2020-2022)

Fonte: UNCTAD, 2025.

164
Transformação estrutural e cadeias globais de valor

A transformação estrutural, que envolve a realocação de fatores de produção de


atividades de baixa produtividade para setores mais sustentáveis e intensivos em conhecimento,
é essencial para o progresso do desenvolvimento sustentável. No entanto, muitos países em
desenvolvimento enfrentam desafios significativos nessa transição, incluindo a
desindustrialização prematura e a baixa complexidade econômica. Mesmo antes da pandemia
de COVID-19, o risco de desindustrialização prematura já representava desafio significativo,
sobretudo para os países menos desenvolvidos (LDCs), que, embora representem 14% da
população global, respondem por apenas 0,6% das exportações mundiais de manufaturados. A
integração nas cadeias globais de valor oferece oportunidades, mas também riscos de
especialização em atividades de baixo valor agregado, limitando o potencial para
desenvolvimento sustentável e inclusivo (UNCTAD, 2025).

Figura 5 - Índice de Complexidade Econômica (2020-2022)

Fonte: UNCTAD, 2025, com base no Observatório de Complexidade Econômica.

A ascensão dos serviços e a digitalização

A ascensão dos serviços, impulsionada por avanços tecnológicos, aponta para novas vias
de diversificação econômica. O comércio de serviços tem demonstrado maior dinamismo em
comparação com o comércio de mercadorias, com tecnologias digitais expandindo o escopo dos
serviços transacionáveis. No entanto, para capitalizar esse potencial, os países em
desenvolvimento precisam fortalecer as ligações intersetoriais e investir em infraestrutura
digital e capacitação de habilidades. A digitalização oferece oportunidades significativas para
impulsionar a produtividade e reduzir custos comerciais, mas também apresenta desafios, como
a concentração de mercado e a ampliação das lacunas tecnológicas (UNCTAD, 2025).

Economias mais sustentáveis, inclusivas e resilientes - Os três pilares da sustentabilidade e


resiliência

A sustentabilidade e a resiliência são construídas sobre três pilares interconectados:


ambiental, social e econômico. A Agenda 2030 reconhece que o desenvolvimento só será
sustentável se for resiliente a choques e crises. Conflitos e crises prolongadas, como as
observadas em 39 países, representam 20% dos Estados-Membros da ONU e têm impactos
socioeconômicos devastadores, incluindo perda de infraestrutura, populações deslocadas e
redução de investimentos. Essas crises também têm efeitos de propagação, afetando economias

165
vizinhas e distantes por meio de interrupções no comércio internacional e nos fluxos financeiros
(UNCTAD, 2025).

Diversificação como chave para a resiliência

A diversificação da produção e das cadeias de suprimentos é essencial para mitigar o


impacto de choques externos. Em 2022, 80% dos PMDs dependiam de exportações de
commodities, com média de 88% de suas exportações provenientes de produtos primários. A
pandemia de COVID-19 destacou os perigos da dependência excessiva de um número limitado
de bens, serviços e parceiros comerciais. A diversificação pode reduzir essa vulnerabilidade,
permitindo que os países resistam melhor a choques externos e promovam o desenvolvimento
humano (UNCTAD, 2025).

Figura 6 - Nível de desenvolvimento humano dos países e sua dependência de commodities

Fonte: UNCTAD, 2025.

Impactos desproporcionais sobre os mais pobres

Os mais pobres pagam o preço mais alto por choques e crises. Durante a pandemia,
milhões de pessoas foram empurradas para a pobreza extrema, com trabalhadores de baixa
qualificação e mulheres sendo os mais afetados. Disrupções no comércio de alimentos, como as
causadas pela guerra na Ucrânia, levaram a aumentos recordes nos preços dos grãos,
impactando a acessibilidade e a segurança alimentar nos países em desenvolvimento. Políticas
pró-pobres são necessárias para garantir comércio mais resiliente e equitativo, especialmente
em mercados essenciais, como alimentos, onde a concentração de mercado e a financeirização
do comércio contribuem para a instabilidade de preços (UNCTAD, 2025).

Desafios da transformação digital para a inclusão

A transformação digital apresenta novos desafios para a inclusão nos benefícios do


comércio. Embora a economia digital ofereça oportunidades para reduzir custos e aumentar a
eficiência, a concentração de mercado em poucas plataformas digitais e as lacunas no acesso à
infraestrutura e habilidades digitais podem aprofundar as desigualdades existentes. Apenas 35%
das pessoas nos PMDs usam a internet, em comparação com a média global de 67%, e as
mulheres estão significativamente sub-representadas no acesso digital. Políticas inclusivas são

166
necessárias para garantir que os benefícios da digitalização sejam compartilhados de forma
equitativa (UNCTAD, 2025).

Desigualdades de gênero e transições econômicas

As persistentes disparidades de gênero são economicamente custosas. Mulheres em


países em desenvolvimento representam menos de 40% da força de trabalho em setores
transacionáveis e não transacionáveis. A transição para economias digitais e de baixo carbono
corre o risco de deixar as mulheres ainda mais para trás, especialmente em setores dominados
por homens, como energia renovável. Políticas sensíveis ao gênero são essenciais para garantir
que as mulheres sejam reconhecidas como agentes de mudança nessas transições (UNCTAD,
2025).

A crise planetária tripla e seus impactos

A crise planetária tripla – mudanças climáticas, perda de biodiversidade e poluição –


continua a exacerbar as desigualdades dentro e entre os países. Os países em desenvolvimento,
que contribuem menos para as emissões globais, são os mais afetados pelos impactos das
mudanças climáticas. A transição para padrões de produção e consumo ambientalmente
sustentáveis é essencial para enfrentar esses desafios interconectados. Medidas comerciais
relacionadas ao clima já afetam 26% do comércio global, mas a complexidade das
regulamentações pode aumentar as barreiras comerciais, dificultando a difusão de tecnologias
verdes (UNCTAD, 2025).

A pegada ambiental da digitalização

A pegada ambiental da digitalização continua a se expandir, com o setor de TIC


contribuindo para 1,5% a 3,2% das emissões globais de gases de efeito estufa. Além disso,
milhões de toneladas de resíduos plásticos são liberados anualmente, poluindo os oceanos e
ameaçando a biodiversidade. A adoção de práticas de economia circular e o investimento em
alternativas sustentáveis ao plástico podem ajudar a reduzir esses impactos ambientais, ao
mesmo tempo em que abrem novas oportunidades econômicas para os países em
desenvolvimento (UNCTAD, 2025).

Financiamento mais abundante e estável para o desenvolvimento - A necessidade de reforma


da arquitetura financeira internacional

A arquitetura financeira internacional (AFI) atual está desalinhada com as necessidades


dos países em desenvolvimento. A maior parte dos fluxos financeiros nas últimas décadas tem
sido de países em desenvolvimento para países desenvolvidos, deixando muitas economias
vulneráveis a choques externos e limitando sua capacidade de mobilizar recursos para o
desenvolvimento sustentável (UNCTAD, 2025).

Cinco transformações necessárias no financiamento

O financiamento para o desenvolvimento precisa ser mais abundante, estável e em


melhores condições. Os países em desenvolvimento enfrentam lacuna anual de financiamento
de US$ 4 trilhões até 2030. A maturidade do financiamento externo diminuiu, e os custos de
financiamento para os países em desenvolvimento são até 12 vezes maiores do que para os
países desenvolvidos. Além disso, o acesso à Rede Global de Segurança Financeira (GFSN) é
limitado, deixando muitos países vulneráveis a choques externos (UNCTAD, 2025).

167
Figura 7 - Cinco mudanças no financiamento são necessárias para a transformação
econômica sustentável.

Fonte: UNCTAD, 2025.

Cooperação internacional e financiamento climático

A cooperação internacional para o desenvolvimento e o financiamento climático


também enfrentam desafios. Entre 2016 e 2022, a lacuna entre os compromissos e a entrega de
Assistência Oficial ao Desenvolvimento (AOD) e financiamento climático foi de US$ 1,394 bilhões
e US$ 137 bilhões, respectivamente (UNCTAD, 2025).

Mobilização de recursos domésticos

A mobilização de recursos domésticos é fundamental para o desenvolvimento


sustentável. Os países em desenvolvimento arrecadam apenas 52% das receitas fiscais em
comparação com os países desenvolvidos, com disparidade ainda maior na África, onde a
arrecadação cai para 44% (UNCTAD, 2025).

Investimento estrangeiro direto, diversificação econômica e os ODS

O investimento estrangeiro direto (IED) continua sendo fonte importante de


financiamento externo para os países em desenvolvimento, mas sua distribuição é altamente
desigual. A África e os PMDs recebem parcela cada vez menor do IED global, e grande parte do
investimento continua concentrado em indústrias extrativas. Embora o número de projetos em
setores alinhados aos ODS tenha crescido cerca de 4% ao ano entre 2015 e 2023, esse avanço
se concentrou principalmente em infraestrutura e energia renovável. Em contrapartida, setores
críticos, como sistemas agroalimentares e água e saneamento, registraram menos projetos
internacionalmente financiados em 2023 do que em 2015, quando os ODS foram adotados
(UNCTAD, 2025).

168
Figura 8 - Número anual de projetos de investimento internacional em setores relevantes
para os ODS nos países em desenvolvimento (2015-2023)

Fonte: UNCTAD, 2025.

A dívida pública e a necessidade de reforma

A dívida pública nos países em desenvolvimento aumentou de US$ 8,1 trilhões em 2010
para US$ 28,8 trilhões em 2023, com muitos países gastando mais com o serviço da dívida do
que com saúde ou educação (UNCTAD, 2025).

Figura 9 - População em países em desenvolvimento onde os gastos com juros superam os


investimentos em educação ou saúde (2020-2022)

Fonte: UNCTAD, 2025.

169
Mais multilateralismo em um mundo multipolar - O surgimento do Sul Global

O surgimento do Sul Global como centro de crescimento econômico está redefinindo a


economia mundial. Até 2029, quase 70% do crescimento econômico global deve vir do Sul
Global. No entanto, a governança global não acompanhou essa mudança, com os países em
desenvolvimento sub-representados em instituições multilaterais como o FMI (UNCTAD, 2025).

Figura 10 – PIB mundial anual em trilhões de US$, por região

Fonte: UNCTAD, 2025.

Déficit de confiança no multilateralismo

O multilateralismo enfrenta déficit de confiança, em parte devido à lentidão das


instituições em se adaptar a um mundo multipolar. A fragmentação do comércio e do
investimento, impulsionada por medidas protecionistas e alianças políticas, ameaça o sistema
comercial multilateral e prejudica os países mais vulneráveis. Entre 1990 e 2023, a participação
dos países em desenvolvimento de alta renda nas exportações globais de mercadorias mais que
dobrou, passando de 17% para 35%, enquanto economias de média renda aumentaram sua
participação de 5% para 8%. Em contraste, países de baixa renda mantiveram participação
abaixo de 1%, refletindo disparidades estruturais persistentes (UNCTAD, 2025).

Desequilíbrios de representação

Países em desenvolvimento, que representam 83% da população global, contribuem


com apenas 55% do PIB mundial (em paridade de poder de compra) e detêm apenas 36% dos
votos no FMI. Em contraste, países desenvolvidos, com 17% da população, controlam 64% dos
votos no FMI (UNCTAD, 2025).

Fragmentação comercial e protecionismo

A ascensão de um mundo multipolar tem alinhado padrões comerciais a divisões


políticas, enfraquecendo o multilateralismo. Medidas protecionistas, como o "friendshoring"
(comércio entre aliados políticos), aumentaram significativamente, com 3.210 medidas
restritivas anunciadas desde 2010, contra apenas 841 medidas liberalizantes. Essa fragmentação

170
prejudica especialmente economias vulneráveis, como PMDs e PEIDs, que dependem de
mercados globais para diversificar suas exportações e reduzir a pobreza (UNCTAD, 2025).

Figura 11 – Aumento das Medidas Protecionistas: Mudanças no Tratamento de Interesses


Comerciais Nacionais e Estrangeiros

Fonte: UNCTAD, 2025.

A Importância dos Acordos Regionais e do Multilateralismo

A dinâmica global vem sendo transformada pelo crescimento acelerado de acordos


regionais e bilaterais, que, desde 1990, saltaram de 22 para mais de 350 acordos regionais (RTAs)
e de 202 para mais de 2.200 acordos internacionais de investimento (IIAs) até 2024. Esses
instrumentos têm promovido a transformação estrutural dos países, mas também acrescentam
camadas de complexidade ao ambiente de comércio e investimento. Para enfrentar esse
cenário, fóruns multilaterais e iniciativas de "multilateralismo em rede" são essenciais para
modernizar as relações comerciais, integrar imperativos de desenvolvimento sustentável e
harmonizar padrões (UNCTAD, 2025).

A defesa de um multilateralismo fortalecido

A UNCTAD defende um multilateralismo fortalecido e reformado, capaz de enfrentar os


desafios globais, como as mudanças climáticas, a transformação tecnológica e a desigualdade.
A organização propõe ações para promover a diversificação econômica, a resiliência climática,
o financiamento sustentável e a inclusão digital, garantindo que os benefícios do
desenvolvimento sejam compartilhados de forma equitativa (UNCTAD, 2025).

Referências
1. Bradsher, K. China Assails Trump Tariffs and Threatens ‘Countermeasures’ Disponível em:
https://www.nytimes.com/2025/02/01/us/politics/china-trump-tariffs.html
2. EU. EU challenges China at WTO on royalties for EU high-tech sector. 2025. Disponível em:
https://ec.europa.eu/commission/presscorner/detail/en/ip_25_293
3. WTOa. Davos: DG suggests deep breaths and to “chill” over trade tensions; ministers show WTO
support. 2025. Disponível em: https://www.wto.org/english/news_e/news25_e/dgno_24jan25_e.htm
4. WTOb. Paraguay President: Any multilateralism crisis can only be solved with more multilateralismo.
2025. Disponível em: https://www.wto.org/english/news_e/news25_e/pls_31jan25_e.htm

171
5. WTOc. New database on critical minerals trade launched to support clean energy transition. 2025.
Disponível em: https://www.wto.org/english/news_e/news24_e/envir_18dec24_e.htm
6. Unctad. Shaping the Future: Driving economic transformation for equitable, inclusive and sustainable
development. 2025. Disponível em: https://unctad.org/system/files/official-
document/osginf2024d7_en.pdf

172
A urgência da ação global diante das crises humanitárias, climáticas e de saúde

Patrícia Lewis Carpio, Matheus


dos Santos da Silveira, Tatiana
Cerqueira Machado Medrado, Jesús
Enrique Patiño Escarcina, Diana
Zeballos, Renan Amaral Oliveira,
Laurenice Pires, Ana Carol Aldapi
Vaquera e Luis Eugênio de Souza

Resumo: Neste informe, foram consideradas as manifestações feitas entre 10 de dezembro de


2024 e 10 de fevereiro de 2025. Quarenta-e-oito das 62 organizações da sociedade civil
monitoradas, tanto de interesse público quanto privado, fizeram manifestações dignas de nota.
A crise humanitária mundial continua a se intensificar, com conflitos prolongados e mudanças
climáticas exacerbando desigualdades na saúde e aumentando a vulnerabilidade social. Regiões
como Kivu do Norte, na República do Congo, e Gaza enfrentam emergências humanitárias
graves, enquanto na Síria, iniciativas de apoio psicossocial buscam mitigar os impactos da
guerra. Nos EUA, a extinção do aplicativo “CBP One” expôs migrantes a riscos maiores. A censura
em Israel e os ataques na Cisjordânia são exemplos da violação de direitos e da crescente
necessidade de proteção aos profissionais de saúde. Organizações globais, como os MSF e a
ActionAid, exigem acesso irrestrito à ajuda humanitária, enquanto ONGs apelam por cessar-
fogo, políticas eficazes e responsabilidade no cumprimento das leis internacionais. A crise
climática também agrava os problemas de saúde pública, como evidenciam os protestos do
Greenpeace e Oxfam contra as grandes corporações, notadamente pelos elevados níveis de
emissão de carbono. Em resposta, ações de saúde pública como a tributação de produtos
prejudiciais à saúde e as campanhas de enfrentamento do HIV/AIDS estão ganhando força, mas
desafios como monopólios farmacêuticos e a hesitação vacinal continuam. Iniciativas como a do
Global Fund e da Gates Foundation, além de investimentos para combater doenças tropicais e
melhorar a resiliência dos sistemas de saúde, buscam mitigar o impacto de crises sanitárias e
ambientais.

INTRODUÇÃO

A crise humanitária que afeta diversas regiões do mundo está se agravando a cada dia,
com a violência prolongada, os deslocamentos forçados e os desastres ambientais, levando
milhões de pessoas a viver em condições precárias. A situação no Kivu do Norte, na República
Democrática do Congo, é um exemplo claro disso. A violência contínua na região tem forçado
milhares de civis a deixar suas casas e a buscar refúgio em outras áreas, criando uma emergência
humanitária de grande escala. Organizações internacionais têm feito apelos urgentes por cessar-
fogo e pelo aumento do acesso humanitário para garantir que a ajuda chegue à população mais
afetada, especialmente nas zonas de conflito. Essa crise reflete uma realidade comum em várias
regiões do mundo, onde os conflitos prolongados dificultam a chegada de assistência e pioram
as condições de vida de populações que já viviam em situação de vulnerabilidade.

173
A Síria, que enfrenta mais de uma década de guerra civil, é outro exemplo de como os
conflitos prolongados causam impactos devastadores. Além da devastação material, a guerra
tem gerado um enorme sofrimento psicológico entre as vítimas. Iniciativas para fornecer
suporte psicossocial às pessoas afetadas são vitais para ajudar as vítimas a lidar com os traumas
e os efeitos psicológicos da crise. Em muitos casos, essas intervenções são essenciais para a
reconstrução do tecido social e para a restauração da dignidade dos indivíduos que sofrem com
os horrores da guerra.

A situação em Gaza, por sua vez, continua gravíssima, com o sistema de saúde local
praticamente destruído, sem recursos suficientes para lidar com a crescente demanda por
cuidados médicos. Ao mesmo tempo, na Ucrânia e no Sudão, a violência prolongada continua a
gerar crises humanitárias de proporções enormes, afetando gravemente a saúde da população
local e tornando muito difícil a prestação de assistência humanitária.

A crise humanitária não se limita, contudo, a zonas de guerra declarada. Nos Estados
Unidos, o fim do aplicativo “CBP One”, que ajudava migrantes a solicitar asilo, tem exacerbado
os riscos a que esses indivíduos estão expostos, especialmente no México, onde muitos
migrantes se veem em condições precárias e vulneráveis à violência, exploração e detenção. A
falta de uma política clara e de uma infraestrutura adequada tem contribuído para o aumento
da insegurança e da exploração de migrantes, tornando essa uma crise humanitária à parte, que
demanda uma resposta urgente. Em Gaza, a necessidade de apoio internacional é igualmente
crítica. Organizações como Médicos Sem Fronteiras (MSF) têm ressaltado a urgência de garantir
acesso irrestrito à ajuda humanitária, incluindo alimentos, medicamentos e cuidados médicos
para aqueles afetados pelo conflito.

O papel das organizações internacionais tem sido central na resposta a essas crises.
Muitas dessas organizações têm se empenhado em reforçar a proteção a profissionais de saúde,
que se encontram em risco constante em áreas de conflito. As ONGs também têm cobrado
políticas públicas mais eficazes para enfrentar questões de saúde em tempos de crise, incluindo
a prevenção de doenças cardiovasculares, que se tornam ainda mais prevalentes em ambientes
de guerra e deslocamento forçado. Além disso, há um apelo crescente por soluções diplomáticas
que ajudem a reduzir as tensões políticas e os conflitos armados, especialmente no Oriente
Médio e na África, onde os efeitos das guerras prolongadas sobre a saúde pública são
devastadores. A busca por maior transparência e responsabilidade no cumprimento das leis
humanitárias internacionais também se tornou uma prioridade, com organizações
internacionais clamando por maior acesso a regiões afetadas por conflitos e pela
responsabilização daqueles que cometem violações dos direitos humanos.

Simultaneamente, a crise climática está amplificando os problemas de saúde pública e


vulnerabilidade social em diversas partes do mundo. A intensificação de fenômenos como ondas
de calor extremas, secas, inundações e desastres naturais está impactando diretamente a saúde
das populações, criando novas exigências para os sistemas de saúde. Organizações como
Greenpeace e Oxfam têm alertado para a responsabilidade das grandes corporações e dos mais
ricos na emissão de gases de efeito estufa e têm exigido medidas urgentes para combater as
mudanças climáticas. Essas ações incluem a limitação da exploração de combustíveis fósseis e a
implementação de políticas que promovam a transição para uma economia sustentável, com
foco na proteção da saúde e do meio ambiente. A atuação de organizações como a ACT
Promoção da Saúde, no Brasil, que defende políticas públicas mais eficazes para combater
doenças relacionadas ao consumo de substâncias prejudiciais, é um exemplo da importância da
luta pela alimentação saudável, especialmente em um cenário de crescente desigualdade social.

174
Além disso, organizações privadas, como a Wellcome Trust e a Gates Foundation, têm
investido em tecnologias inovadoras e em iniciativas de saúde global, com foco na redução de
doenças infecciosas e no fortalecimento da resiliência dos sistemas de saúde. O Global Fund,
por exemplo, tem mobilizado grandes investimentos para enfrentar doenças tropicais
negligenciadas e outras doenças infecciosas, enquanto a GAVI e a Fundação Rockefeller têm se
concentrado na criação de soluções para aumentar o acesso a vacinas e tratamentos em regiões
vulneráveis. Esses esforços visam não apenas aliviar o sofrimento imediato das populações
afetadas, mas também garantir que as comunidades possam resistir melhor a futuras crises
sanitárias e ambientais.

Enfim, esse conjunto de manifestações é apresentado em detalhes, a seguir. A primeira


seção reúne das manifestações das organizações da sociedade civil de interesse público,
agrupadas por temas e subtemas. A segunda seção registra as manifestações das grandes
fundações privadas. Por fim, estão registrados os eventos ocorridos ou anunciados nesta
quinzena.

ORGANIZAÇÕES DE INTERESSE PÚBLICO

Crise humanitária

A International Federation of Social Workers divulgou a declaração emitida pelo


presidente da regional africana da IFSW que chama a atenção para a crescente crise humanitária
em Kivu do Norte, Goma, na República do Congo, com aumento da violência, dos deslocamentos
em massar, greve e violações de direitos humanos, em especial para mulheres, crianças e outros
grupos em situação de vulnerabilidade. A declaração pede imediato cessar fogo na região e a
priorização de diálogo pacífico. No entanto, a região continua com comunidades mantidas como
reféns por grupos rebeldes, incluindo o M23. Exigem também o acesso irrestrito às ações
humanitárias, proteção de civis, especialmente mulheres, crianças e grupos vulneráveis e apoio
a assistentes sociais e socorristas na linha de frente.1

Saúde mental

A Federação Mundial para a Saúde Mental (WFMH) recebeu um convite da Associação


Mundial de Psiquiatria para colaborar em uma iniciativa de apoio psicossocial e psiquiátrico à
população síria, diante da crise humanitária persistente no país. A iniciativa busca oferecer
suporte imediato a vítimas de tortura, sobreviventes de violência e deslocados forçados,
incluindo aqueles que enfrentam a ameaça de deportação de países onde já haviam iniciado um
processo de integração. O programa contará com treinamentos online gratuitos sobre saúde
mental, trauma e documentação de violações de direitos humanos, além de suporte e
supervisão para profissionais da área. 2

Migrações

O encerramento abrupto do aplicativo CBP One, uma das poucas vias legais para
migrantes solicitarem asilo nos EUA, aumentou os riscos enfrentados por essas pessoas,
segundo Médicos Sem Fronteiras (MSF). Agora, muitos migrantes estão presos em áreas
perigosas no México, expostos à violência, tráfico humano e extorsão. A organização alerta para
os impactos negativos na saúde física e mental dessas populações e pede que os governos dos
EUA e do México implementem políticas migratórias mais humanas, que priorizem a segurança
e os direitos dos migrantes.3

175
Guerras e conflitos

A International Federation of Social Workers (IFSW) emitiu, pela segunda vez, uma carta
de censura executiva contra o sindicato israelense de Assistentes Sociais por “não defenderem
os princípios éticos da Federação de apoiar a paz e a não violência”. Em 2024 a carta referia-se
à negativa do sindicato em solicitar ao governo israelense a dispensa militar de assistentes
sociais de funções de combate. A Fundação considera que mesmo que negado por Israel, a
iniciativa configura um respeito ao princípio ético e profissional da categoria. Em 2018 a censura
foi em função da recusa do sindicato em reconhecer os direitos dos palestinos. Em 2022 a
censura foi removida após o sindicato reconhecer, em uma declaração, a igualdade de direitos
entre os povos palestinos e israelenses.4,5

O cessar-fogo temporário em Gaza trouxe alívio diante da devastação causada por mais
de 15 meses de conflito, com milhares de vidas perdidas e infraestrutura destruída. As
necessidades médicas e humanitárias são catastróficas, e a entrada de ajuda em larga escala é
urgente para atender à população em condições desesperadoras. Médicos Sem Fronteiras (MSF)
pede que Israel permita a chegada de suprimentos essenciais e evacuações médicas, enquanto
reforça a necessidade de um cessar-fogo duradouro para a reconstrução e recuperação das
vítimas.6

A ActionAid condena os ataques militares israelenses na Cisjordânia, especialmente no


campo de refugiados de Jenin, onde ao menos 12 pessoas morreram e dezenas ficaram feridas.
A ofensiva forçou centenas a fugir, destruiu infraestrutura e restringiu o acesso a serviços
básicos. Mulheres, crianças e doentes são os mais afetados, enquanto prisões arbitrárias e
violência de colonos agravam a crise. A organização exige o fim imediato da violência e lembra
as obrigações legais de Israel como potência ocupante, pedindo o fim da ocupação e a proteção
dos direitos dos palestinos.7

Global Health Council discute como conflitos armados em Gaza, Ucrânia e Sudan,
agravam as disparidades de saúde, afetando especialmente populações vulneráveis como
mulheres, crianças e idosos. Em Gaza, a escassez de suprimentos médicos e serviços de saúde
reprodutiva levou ao aumento da mortalidade materna. Na Ucrânia, houve um aumento
significativo nos casos de violência doméstica desde o início da guerra, e o acesso a serviços
essenciais diminuiu drasticamente. No Sudão, o conflito dificultou o acesso das mulheres
grávidas aos serviços de saúde materna devido à escassez e inacessibilidade das instalações de
saúde. Além disso, crianças nessas regiões enfrentam riscos imediatos à saúde e desafios de
desenvolvimento a longo prazo, incluindo desnutrição, traumas psicológicos e interrupção da
educação 8.

A World Heart Federation em parceria com a Fundação Novartis pediram, no Fórum


Econômico Mundial, que líderes globais endossassem a Declaração de Davos sobre saúde
Cardíaca Urbana. Com a expectativa de que as populações urbanas cheguem a 70% do total
global até 2050, as cidades são cruciais no tratamento de Doenças Cardiovasculares, diz a
notícia. 9

A CARE, em conjunto com outra 23 organizações humanitárias, divulgou documento


sobre a situação do conflito Sudão após dois anos, que contabiliza quase um milhão de
refugiados entre Sudaneses e Chadianos e registra exacerbada de violência contra mulheres e
crianças, incluindo tortura, estupro e escravidão sexual, documentados pela Organização das
Nações Unidas (ONU) em outubro de 2024. As entidades alertam para a situação de falta de
assistência e proteção dos refugiados que chegam ao Chade. 10

176
A World Medical Association manifestou apoio à trégua entre Israel e Gaza, destacando
a importância de proteger os profissionais de saúde em regiões de conflito. a organização
também enfatizou a necessidade de respeitar os direitos humanos e a legislação internacional,
especialmente no que se refere à proteção dos trabalhadores da saúde, que muitas vezes são
alvos durante conflitos armados.11

A Progressive International enviou uma delegação ao nordeste da Síria no décimo


aniversário da liberação de Kobanî do domínio do ISIS. Embora a resistência curda tenha sido
bem-sucedida na defesa da cidade, as comunidades curdas continuam a enfrentar agressões
militares da Turquia, incluindo ataques aéreos e operações transfronteiriças. Recentemente,
surgiram sinais de uma mudança na política turca, com conversas preliminares entre o governo
Erdogan e representantes curdos, gerando esperanças de paz por meio de reformas
constitucionais, direitos linguísticos e anistia política. A visita da Progressive International visa
apoiar o frágil processo diplomático em direção à paz.12

O Greenpeace saudou o acordo de cessar-fogo entre o Hamas e Israel, destacando a


necessidade de apoio internacional às vítimas inocentes do conflito, especialmente mulheres e
crianças. A organização defende uma paz duradoura que garanta segurança, justiça e direitos
iguais para todos, e faz um apelo à comunidade internacional para que priorize os esforços
humanitários. O Greenpeace também é a favor do fim da ocupação ilegal da Palestina e apoia a
Resolução do Conselho de Segurança da ONU, que visa a convivência pacífica entre Israel e
Palestina dentro de fronteiras seguras e reconhecidas. A declaração enfatiza a importância de
se cumprir a lei internacional ao lidar com as consequências humanitárias e ecológicas do
conflito.13

A Oxfam saudou o cessar-fogo em Gaza e pediu um fluxo massivo de ajuda humanitária


para a região, alertando que milhões de palestinos ainda lutam para sobreviver após 15 meses
de guerra. Sally Abi Khalil, diretora regional da Oxfam para o Oriente Médio e Norte da África,
destacou a necessidade de garantir acesso irrestrito à ajuda humanitária e restaurar a atividade
comercial para evitar a fome generalizada. A organização reforçou o apelo para que Israel seja
responsabilizado por crimes de guerra e para que a comunidade internacional se comprometa
com um processo de paz justo e duradouro.14

A Oxfam destacou uma pesquisa com 35 organizações humanitárias revelou que Israel
não melhorou o acesso à ajuda em Gaza no último ano, apesar da ordem da Corte Internacional
de Justiça (CIJ). A maioria das ONGs relata restrições sistemáticas à entrada de suprimentos
essenciais, atrasos de meses e destruição de infraestrutura humanitária. Mesmo com a trégua
temporária, a situação permanece crítica, e há denúncias de ataques a instalações e
trabalhadores humanitários. As organizações pedem acesso contínuo à ajuda e
responsabilização de Israel por violações do direito internacional, alertando para o risco de
repetição da crise sem medidas concretas.15

A Oxfam destacou que organizações humanitárias, de direitos humanos e de


desenvolvimento no Líbano pedem um cessar-fogo permanente e uma recuperação justa,
alertando sobre as contínuas violações da trégua temporária. A destruição causada pelo conflito
impede o retorno seguro de milhares de pessoas e agrava a crise humanitária e econômica do
país. O apelo inclui garantir acesso humanitário irrestrito, financiamento para reconstrução,
apoio a comunidades vulneráveis, fortalecimento de ONGs locais, suspensão do fornecimento
de armas a grupos em conflito e responsabilização por violações do direito internacional. O
apoio internacional é essencial para assegurar paz e justiça duradouras na região.16

177
O People’s Health Movement publicou declaração em apoio ao cessar-fogo e em
solidariedade à Palestina. Na declaração, afirma que está junto ao povo de Gaza em alívio e
esperança cautelosa, destacando que, após 15 meses de agressão devastadora e genocida, este
cessar-fogo oferece um alívio muito necessário. Acrescenta, contudo, que o cessar-fogo sozinho
não é suficiente. Exige a libertação imediata dos profissionais de saúde detidos, incluindo o Dr.
Ahmed Mohanna e o Dr. Hussam Abu Safiya, dois diretores de hospital, assim como exige que
Israel forneça acesso humanitário irrestrito sem demora.17

Segurança de profissionais de saúde em áreas de conflitos

A World Organization of National Colleges, Academies and Academic Associations of


General Practitioners/Family Physicians (WONCA) publicou sua newsletter de Ano Novo um
apelo aos governos, órgãos internacionais para que garantam a segurança dos profissionais de
saúde em áreas de conflitos, respeitando a santidade da assistência médica como uma atividade
apartidária e não combatente e fornecem recursos e apoio psicossocial aos profissionais de
saúde que arriscam suas vidas para servir comunidades em crise.18

Mudança climática

A diretora da Swasti The Health Catalyst publicou uma matéria em jornal online
chamando a atenção para o enfrentamento das mudanças climáticas como fator essencial para
a melhora dos resultados de saúde pública, lembrando que a crise climática tem afetado a vida
de milhões de pessoas. A matéria destacou o impacto da crise em populações em situação de
vulnerabilidade, como na Índia, onde ondas de calor extremas tornam-se um fenômeno mortal,
em especial em favelas urbanas (o Rajastão registrou temperatura de 51ºC), afetando mais
intensamente trabalhadores assalariados e idosos; as chuvas irregulares e secas agravam a
insegurança alimentar e desnutrição, afetando principalmente crianças, que têm seu
crescimento atrofiado e imunidade enfraquecida. 19

A CARE divulgou análise sobre os conflitos silenciosos que ocorrem em todo o mundo e
que afetam a mais de 180 milhões de pessoas. Entre as crises, a organização cita as mudanças
climáticas como promotora de crises negligenciadas e atinge uma população de mais de 35
milhões de pessoas, principalmente no Sul do continente africano, as quais vêm enfrentando a
fome extrema, sede e violências.20

O ciclone Chido devastou o norte de Moçambique em dezembro de 2024, deixando mais


de 120 mortos, destruindo casas, impactando 687 mil pessoas e agravando a crise em Cabo
Delgado, já afetada por conflitos. Além dos danos físicos, os sobreviventes enfrentam traumas
profundos, como relatado por Abudo Chuado, que perdeu sua casa e teme novos desastres.
Médicos Sem Fronteiras (MSF) atua na região oferecendo apoio psicológico, reabilitação de
centros de saúde e combate a surtos de doenças como cólera e malária. A crise climática
intensifica a vulnerabilidade da população, exigindo respostas integradas para garantir
recuperação e resiliência.21

A Federação Mundial de Associações de Saúde Pública (WFPHA) divulgou o lançamento


de uma pesquisa global sobre os impactos das mudanças climáticas na saúde. Coordenada pela
Grand Challenges Canada e apoiada por uma rede de parceiros de disseminação, esta iniciativa
prioriza ouvir as vozes de agentes comunitários de saúde, enfermeiros, médicos, pesquisadores,
formuladores de políticas de saúde e outros profissionais de saúde em países de baixa e média
renda (LMICs). Sua contribuição oferecerá perspectivas locais sobre as ameaças emergentes à

178
saúde exacerbadas pela crise climática, como doenças relacionadas ao calor, doenças
transmitidas por vetores e água, desafios de saúde mental e desnutrição.22

Greenpeace comentou sobre o ano de 2024, que foi o mais quente já registrado,
ultrapassando o limite de 1,5°C, de acordo com o relatório de destaque climático global de
organizações como WMO, Copernicus e NASA. O ano foi marcado por desastres climáticos
extremos, como incêndios florestais, inundações e falhas de colheitas, agravados pelas altas
temperaturas e poluição. Ian Duff, do Greenpeace, afirmou que o aumento de lucros das
grandes empresas de petróleo e gás em meio à crise climática é inaceitável, exigindo que os
governos façam as empresas poluidoras pagarem pelos danos causados. Greenpeace também
apontou que a expansão dos combustíveis fósseis precisa ser interrompida, e que políticas
robustas precisam ser implementadas para combater a crise de maneira eficaz.23

O Greenpeace protestou contra o projeto Neptun Deep de gás na Romênia, alertando


que ele pode causar dezenas de milhares de mortes prematuras devido às altas temperaturas
geradas pelas emissões de gases de efeito estufa. O projeto, liderado pela OMV Petrom, é a
maior iniciativa de perfuração de gás fóssil proposta na Europa e contribuiria significativamente
para as mudanças climáticas, aumentando a poluição do ar e eventos climáticos extremos. A
análise técnica do Greenpeace prevê que 46 mil pessoas possam morrer prematuramente até
2100 devido a causas relacionadas ao calor, além de milhões de crianças sofrerem com mais
ondas de calor. O Greenpeace pede a imediata interrupção desse projeto e exige que a UE e os
governos nacionais rejeitem novas infraestruturas de combustíveis fósseis, investindo em
energia renovável e eficiência energética.24

A nova análise da Oxfam revelou que o 1% mais rico da população mundial consome sua
cota anual de carbono em apenas 10 dias, enquanto a metade mais pobre leva quase três anos
para atingir o mesmo nível de emissões. Chamado de “Pollutocrat Day”, esse marco ressalta o
impacto desproporcional dos ultra ricos na crise climática. Oxfam alerta que as emissões desse
grupo desde 1990 já causaram trilhões de dólares em danos econômicos, perdas agrícolas e
milhões de mortes prematuras. A organização defende medidas urgentes, como taxação
progressiva sobre os mais ricos, restrições a bens de luxo altamente poluentes (como jatos
privados e iates), além da implementação de regulamentações mais rígidas para reduzir
emissões corporativas. Segundo a Oxfam, os países desenvolvidos devem cumprir suas
obrigações climáticas e mobilizar pelo menos US$ 5 trilhões para financiar ações nos países do
Sul Global.25

O Greenpeace condenou a intenção do presidente dos EUA, Donald Trump, de retirar o


país do Acordo de Paris, alertando que o isolamento não protegerá contra desastres climáticos,
como incêndios florestais e furacões. O diretor-executivo Mads Christensen afirmou que a
agenda pró-combustíveis fósseis de Trump não deterá o avanço global da transição para energia
limpa e apenas isolará os EUA, enquanto o resto do mundo avança rumo à justiça climática. O
Greenpeace reforçou que o Acordo de Paris permanece forte e que a resistência contra a
destruição climática continuará, apesar dos retrocessos da nova administração.26

Produtos e substâncias nocivos à saúde

A ACT Promoção da Saúde divulgou a pesquisa Datafolha que aponta que a maioria da
população brasileira apoia o aumento da tributação para produtos nocivos à saúde, 82% da
população concordam com o aumento da tributação de cigarro e derivados de tabaco, 77% com
aumento da taxação de bebidas alcoólicas, 81% são a favor de aumento de impostos para

179
produtos com alta emissão de carbono; 78%, para armas e munições e agrotóxicos; 66% para
embalagens plásticas; e 64% para combustíveis fósseis.27

A ACT Promoção da Saúde comemorou a aprovação da reforma tributária no Brasil e a


inclusão das bebidas açucaradas nos impostos seletivos, ao lado de produtos de tabaco e
bebidas alcoólicas. Após dois anos acompanhando esse processo, a organização informou que
na segunda semana de dezembro de 2024 foi aprovado o texto que garante a tributação mais
alta para tabaco e álcool, com reajuste anual de acordo com o IPCA, e para refrigerantes, a
inédita cesta básica composta de produtos saudáveis e sustentáveis com alíquota zero, além de
alíquota reduzida em 60% para produtos hortícolas e minimamente processados.28

A ACT Promoção da Saúde divulgou uma pesquisa que estima os custos da mortalidade
prematura por causas atribuíveis ao consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil, que
alcançam pelo menos R$10,4 bilhões por ano. Esse valor inclui os custos diretos do tratamento,
no Sistema Único de Saúde, de casos de hipertensão, obesidade e diabetes tipo 2 associados ao
consumo desses alimentos, além dos custos previdenciários decorrentes de aposentadorias
precoces e licenças médicas, e das perdas econômicas relacionadas às mortes por todas as
causas atribuíveis aos ultraprocessados.29

A ACT Promoção da Saúde divulgou estudo sobre os custos diretos e indiretos atribuíveis
ao consumo de álcool no Brasil, estimando que, em 2019, esses custos totalizaram R$18,8
bilhões. Desses, R$1,1 bilhão corresponde a despesas federais diretas com hospitalizações e
procedimentos ambulatoriais no Sistema Único de Saúde. E, os restantes R$17,7 bilhões são
atribuídos a custos indiretos e incluem perdas de produtividade devido à mortalidade
prematura, licenças e aposentadorias precoces decorrentes de doenças associadas ao consumo
de álcool, além da perda de dias de trabalho por internação hospitalar e afastamentos médicos
previdenciários. O estudo foi realizado pela Fiocruz a pedido das organizações Vital Strategies e
ACT Promoção da Saúde, como parte da iniciativa RESET Álcool.30

A ACON junto com organizações ADARRN, NUAA e NADA emitiram um comunicado


conjunto pedindo ao governo de Nova Gales do Sul que tome medidas urgentes após o NSW
Drug Summit. Durante o evento, especialistas, pesquisadores, profissionais de apoio e pessoas
com experiências vividas discutiram soluções para reduzir os danos relacionados às drogas.
Agora, essas organizações cobram que o governo transforme as discussões em ações concretas
e mudanças sistêmicas. O comunicado enfatiza a necessidade de uma estratégia governamental
baseada em evidências, com metas claras para a redução de danos.31

A ACON elogiou o anúncio do governo estadual de Nova Gales do Sul sobre um projeto-
piloto de testagem de drogas em festivais de música em 2025, uma medida voltada à redução
de danos e proteção da saúde pública. O programa permitirá que as pessoas obtenham
informações detalhadas sobre as substâncias que podem consumir, ajudando na tomada de
decisões mais seguras e minimizando riscos. A organização reforçou que testagens de drogas já
demonstraram eficácia em outras regiões ao reduzir danos, melhorar o acesso a serviços de
apoio e salvar vidas. A ACON apoia fortemente políticas baseadas em evidências e trabalhará
em parceria com o governo para garantir o sucesso da iniciativa, buscando torná-la uma medida
permanente na abordagem de redução de danos.32

A ACON divulgou dicas essenciais para que o público possa aproveitar o Mardi Gras Gay
e Lésbico de 2025, o maior evento anual do orgulho LGBTQ+ na Austrália, com segurança e
responsabilidade, promovendo o bem-estar coletivo e o respeito mútuo durante as festividades.
A organização também reforçou a importância de priorizar a saúde e destacou que a

180
comunidade LGBTQ+ tem uma história consolidada de autocuidado e prevenção, sempre
adotando estratégias eficazes para reduzir riscos e manter a saúde, incluindo a prevenção de
danos relacionados ao uso de substâncias.33

A ACT Promoção da Saúde divulgou uma nota pública manifestando indignação diante
da tentativa de interferência na proibição dos cigarros eletrônicos, após a divulgação de um
áudio de uma reunião entre o secretário da Receita Federal do Brasil (RFB), Robinson
Barreirinhas, e o presidente da ANVISA, Antônio Barra Torres. No áudio, o secretário tenta
interceder em favor da liberação da venda de cigarros eletrônicos, cuja comercialização foi
proibida por unanimidade pela diretoria colegiada da ANVISA em 2024, após cinco anos de
análise criteriosa sobre esses produtos.34

A ACT Promoção da Saúde, em nota pública, considerou acertada a decisão da Agência


Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) de cancelar a visita técnica às instalações da British
American Tobacco (BAT) e da AstraZeneca, em Londres, após a reação contrária de especialistas
e entidades da área da saúde. A visita a uma unidade da BAT, sem um objetivo claro
estabelecido, foi vista como preocupante, visto que a empresa tem consistentemente atuado
para impedir avanços na Política Nacional de Controle do Tabaco e expandir seu mercado no
Brasil por meio de lobby em favor da liberação da venda de dispositivos eletrônicos para fumar.35

Combate ao HIV/aids

A Fundação Huésped informou que realizou a campanha "Intransmissível” pelo Dia


Mundial da Aids, na qual canais de streaming, rádio e TV interromperam transmissões
simultaneamente para apresentar uma mensagem de combate ao HIV abordando temas de
acesso a tratamento, testagem e prevenção.36

A STOPAIDS informou que o CEO da organização participou da recepção organizada pelo


Primeiro Ministro do Reino Unido em comemoração ao Dia Mundial da AIDS, um evento que
reuniu representantes do Reino Unido e internacionais que trabalham com HIV e serviu como
plataforma para reafirmar o compromisso de erradicar a transmissão do HIV no Reino Unido até
2030. Durante o evento, o Primeiro Ministro refletiu sobre sua trajetória pessoal em direitos
humanos e afirmou a importância de o Reino Unido usar sua voz e influência diplomática para
garantir um forte apoio global aos direitos humanos e à igualdade de gênero frente aos ataques
aos direitos humanos que estão aumentando globalmente e reforçam as barreiras que impedem
as pessoas de acessar os serviços de HIV.37

A ACON emitiu uma mensagem em comemoração ao Dia Mundial da AIDS, destacando


que na Austrália o tema deste ano foi "Começa comigo". A organização também celebrou a 9ª
Estratégia Nacional de HIV do governo federal, que inclui uma nova campanha de
conscientização sobre o HIV e o combate ao estigma, além da introdução de novos modelos de
testagem e tratamento. A iniciativa também visa ampliar o acesso à medicação preventiva PrEP,
especialmente para aqueles que não são elegíveis ao Medicare.38

A STOPAIDS divulgou o lançamento da Plataforma Global Parlamentar sobre HIV e AIDS


(GPP HIV), um esforço colaborativo entre o Global TB Caucus, Global Equality Caucus, UNITE, e
parceiros como UNAIDS, STOPAIDS, WACI Health e a Sociedade Internacional de AIDS, que reúne
parlamentares de diferentes países para colaborar no combate ao HIV e à AIDS, com o objetivo
de erradicar a doença até 2030. A plataforma permite que os legisladores compartilhem práticas
eficazes, promovam mudanças legislativas, e trabalhem juntos para garantir acesso universal à

181
prevenção e tratamento do HIV, defendendo também os direitos humanos e a igualdade de
gênero.39

A STOPAIDS celebrou a suspensão do congelamento do financiamento dos EUA para


medicamentos contra o HIV, mas alerta que ainda não está claro se o apoio financeiro a outros
serviços essenciais, como testagem e prevenção, também será retomado. A organização pede
que todo o orçamento do PEPFAR seja mantido, pois seu corte teria graves impactos na resposta
global ao HIV e na meta de erradicar a AIDS. O PEPFAR, criado em 2003, é um programa essencial
que fornece tratamento e serviços de prevenção em mais de 50 países e já salvou milhões de
vidas.40

Acesso a medicamentos e tecnologias de saúde

A Public Citizen publicou relatório que destaca como os fabricantes de medicamentos


selecionados para a rodada de negociações de preços para medicamentos de marca populares
pelos Centros de Serviços de Medicare e Medicaid (CMS) sob a Lei de Redução da Inflação,
abusaram de patentes para prolongar monopólios e atrasar a concorrência de genéricos com
preços mais baixos. O relatório descreve como o CMS pode usar as negociações para controlar
abusos de patentes e táticas de evergreening (patentear mudanças menores em uma invenção
existente) em medicamentos prescritos, beneficiando os inscritos e economizando bilhões para
o Medicare.41

A Public Citizen publicou uma matéria sobre o acordo bipartidário referente ao sistema
de saúde, que inclui restrições aos gestores de benefícios farmacêuticos, mas exclui reformas
mais amplas que poderiam combater os abusos dos monopólios das corporações
farmacêuticas.42

A Public Citizen criticou a medida da administração Trump que removeu páginas do site
da FDA sobre diversidade, equidade e inclusão nos ensaios clínicos utilizados para testar
medicamentos e dispositivos médicos. Essas páginas continham orientações e iniciativas
relacionadas à diversidade nos ensaios clínicos e à equidade no tratamento do câncer. A
organização afirmou que a remoção dessas páginas prejudica a pesquisa clínica, compromete a
integridade científica da FDA e ameaça a qualidade do atendimento aos pacientes.43

A Public Citizen emitiu declaração sobre a nova política dos Institutos Nacionais de
Saúde (NIH) dos Estados Unidos que apoia o acesso às tecnologias médicas de propriedade do
governo. A política exige que as farmacêuticas que utilizam patentes do NIH apresentem planos
para garantir o acesso aos seus produtos. A Public Citizen e seus aliados há muito tempo pedem
ao NIH que assegure o acesso às tecnologias médicas financiadas com recursos públicos,
especialmente durante a crise global de desigualdade na distribuição de vacinas contra a Covid-
19.44

A Public Citizen criticou a Bavarian Nordic, fabricante dinamarquesa de vacinas, por não
transferir a tecnologia da vacina contra a mpox para fabricantes em países em desenvolvimento,
o que permitiria reduzir os preços e aumentar a oferta. A organização destacou que a Bavarian
Nordic cobra valores elevados pela vacina, chegando a até $65 por dose para a UNICEF,
enquanto fabricantes em países em desenvolvimento vendem vacinas com tecnologias
semelhantes por preços muito mais baixos, como $5 ou menos. Embora a empresa tenha
firmado um acordo com o Serum Institute of Índia para expandir a produção da vacina, o
controle exclusivo da Bavarian Nordic sobre a vacina fora da Índia e seus preços elevados não
resolvem a questão da justiça e do acesso universal.45

182
Governança

A World Medical Association (WMA) manifestou preocupação com a falta de um


processo justo e com a falta de transparência na decisão da IFMSA, que suspendeu a organização
dos estudantes de medicina de Israel (FIMS) sem apresentar provas claras ou seguir um processo
adequado. Em um comunicado subsequente, em 24 de novembro, a IFMSA indicou que está
realizando uma revisão dos procedimentos relacionados a essa suspensão, após preocupações
levantadas por algumas de suas organizações, membros e parceiros externos.46

A InterAcademy Partnership anunciou o lançamento do relatório, "A Comparative


Analysis of Themes Across S- and G-Statements" que analisa as semelhanças temáticas entre as
declarações das academias de ciência (S-Statements) e as declarações dos governos do G7 e G20
(G-Statements). O relatório revelou forte alinhamento entre as prioridades das academias
científicas e os objetivos definidos pelos líderes do G7 e G20, destacando o papel essencial das
academias científicas em fornecer expertise confiável e avançar questões emergentes nas
agendas de políticas globais.47

A InterAcademy Partnership divulgou artigo da Global Young Academy publicado na


Nature, que analisa os critérios de promoção acadêmica em 121 países, investigando como os
pesquisadores são avaliados globalmente. O estudo analisou 532 políticas de quase 250
universidades e agências governamentais, revelando diferenças regionais significativas na
avaliação da produção científica, impacto social, visibilidade e desenvolvimento de carreira.48

Vacinação

A Federação Mundial de Associações de Saúde Pública (WFPHA) repercutiu a publicação


no The Lancet Group de um estudo, liderado pela OMS, que mostra que os programas globais
de imunização foram bem sucedidos, pois mobilizaram muitas partes interessadas, incluindo
chefes de Estado, agências regionais e internacionais de saúde, cientistas, instituições de
caridade, agências de ajuda, empresas e comunidades.49

A Federação Mundial de Associações de Saúde Pública (WFPHA) repercutir a publicação


sobre um artigo sobre hesitação vacinal no Asian Pacific Journal of Public Health que retrata as
circunstâncias únicas do COVID-19 em que se combinaram o desenvolvimento de vacinas e o
fluxo de informação e desinformação e que trouxeram a hesitação vacinal para a lista de maiores
preocupações de saúde pública.22,50

A International Federation on Ageing (IFA) lançou uma declaração sobre a vacinação


contra a covid-19 no Canadá, alertando que as pessoas idosas continuam a enfrentar riscos
significativos da covid-19. A IFA se preocupa com o fato das províncias do Canadá, e não mais o
governo federal, serem responsáveis pela aquisição de vacinas e pelos programas de imunização
vir a comprometer a disponibilidade de vacinas contra a covid-19 para as pessoas idosas.51

Taxação da riqueza

Ativistas do Greenpeace “confiscaram” simbolicamente jatos privados no aeroporto de


Engadin, na Suíça, durante o Fórum Econômico Mundial (WEF), fixando bolas infláveis e adesivos
com a mensagem “CONFISCADO: Hora de taxar os super-ricos”. A ação integra a campanha
#TaxTheSuperRich, lançada junto a Oxfam e outras 22 organizações, exigindo tributação justa
sobre os ultrarricos, cujas emissões e investimentos poluentes agravam a crise climática. Nos
dias anteriores, o Greenpeace bloqueou o heliporto de Davos e realizou um protesto dentro do

183
congresso do WEF, pressionando por medidas concretas para redistribuir riqueza e financiar
ações sociais e ambientais.52

No Fórum Econômico Mundial (WEF) em Davos, ativistas da Greenpeace realizaram um


protesto pacífico dentro do salão principal do congresso, exibindo uma faixa com a mensagem
“Imponha impostos aos super-ricos! Financie um futuro justo e verde” e tocando uma
mensagem de áudio pedindo que os super-ricos sejam taxados. O protesto destaca a crescente
urgência de abordar a interseção entre a extrema riqueza e o poder, que impacta negativamente
a democracia e o planeta. A Greenpeace defende reformas nos sistemas fiscais globais para
redistribuir a riqueza, especialmente dos bilionários, que contribuem significativamente para a
crise climática. Um relatório da Greenpeace sugere que um imposto mínimo global sobre os
ultra-ricos poderia gerar recursos substanciais para ações climáticas e sociais.53

Ativistas da Greenpeace bloquearam o heliporto de Davos, na Suíça, em protesto contra


os líderes políticos e empresariais reunidos para o Fórum Econômico Mundial (WEF). O objetivo
do protesto pacífico foi pressionar os governos a taxar os super-ricos para financiar ações
climáticas, ambientais e sociais. Clara Thompson, porta-voz da Greenpeace, afirmou que é
inaceitável que a elite global se reúna para discutir desafios globais enquanto o mundo enfrenta
desastres climáticos e a desigualdade aumenta. A Greenpeace defende que os super-ricos
paguem sua parte justa de impostos, destacando que há recursos suficientes para enfrentar a
crise, mas estão concentrados nas mãos erradas. Estima-se que, apenas na Europa, a taxação da
riqueza dos super-ricos poderia arrecadar €185 bilhões, que poderiam ser investidos em bens
sociais e no combate à crise climática.54

A Oxfam alertou que a riqueza dos bilionários na UE cresceu €138 bilhões em 2024,
aumentando €376 milhões por dia, enquanto a pobreza global permanece quase inalterada
desde 1990. O relatório Takers Not Makers revela que 74% dessa riqueza vem de herança,
monopólio ou conexões políticas. Além disso, o 1% mais rico de 12 países da UE extraiu €84,4
bilhões do Sul Global em 2023. Com a fortuna dos bilionários acelerando, Oxfam prevê pelo
menos cinco trilionários na próxima década e pede maior taxação sobre grandes fortunas para
conter a desigualdade crescente.55

Saúde da população LGBTQIA+

A ACON celebrou o lançamento do Plano Nacional de Ação de 10 Anos para Saúde e


Bem-Estar LGBTQIA+, a primeira estratégia desse tipo do governo federal e que visa garantir
melhores condições de saúde e bem-estar para essas populações ao longo da próxima década.
O plano estabelece um marco nacional para coordenar ações baseadas em evidências e aborda
temas prioritários, incluindo: Reconhecimento das comunidades LGBTQIA+ em políticas de
saúde mental, câncer e drogas; apoio a serviços de saúde primária geridos pela comunidade
LGBTQIA+; garantia de segurança cultural nos serviços de saúde mental e prevenção do suicídio;
suporte específico para vítimas de violência doméstica e familiar; atualização de diretrizes
clínicas junto a órgãos profissionais de saúde; capacitação de profissionais de saúde para melhor
atender a comunidade; investimento em pesquisas sobre as necessidades de saúde LGBTQIA+.56

A ACON divulgou o lançamento de uma plataforma digital voltada para a prevenção do


suicídio e suporte emocional. O site oferece recursos específicos para pessoas LGBTQIA +,
familiares e profissionais de saúde em Nova Gales do Sul, incluindo acesso a serviços de
emergência 24/7 e apoio psicológico. Além disso, disponibiliza materiais educativos sobre como
lidar com pensamentos suicidas e como ajudar alguém nessa situação.57

184
Saúde do trabalhador

A International Federation of Social Workers publicou um estudo que evidencia a


precarização das condições de trabalho de assistentes sociais nos últimos três anos, em várias
regiões. Eles estão menos satisfeitos no trabalho, têm menos autonomia, as funções são pouco
claras e o bem-estar psicológico é menor, impactando sua eficácia e as comunidades que
atendem. “A equipe de pesquisa planeja um estudo de acompanhamento no outono para
rastrear tendências de longo prazo e expandir perspectivas culturais e geográficas”. 58

Doenças Crônicas Não Transmissíveis

A NCD Alliance lançou um Mapa de Envolvimento em que pessoas que vivem com DCNT
podem compartilhar como tem se envolvido com o avanço na resposta das DCNT. 59

European Lung Foundation (ELF) divulgou apelo global para ações urgentes para
combater a poluição do ar e melhorar sua qualidade, destacando que a poluição do ar mata mais
de 7 milhões de pessoas por ano, trazendo consequências para a saúde pública como asma,
DPOC e câncer de pulmão. A entidade, em apoio à OMS, publicou uma série de compromissos
que são pedidos aos setores tomadores de decisão, como: redução das emissões de poluição,
utilização de padrões de qualidade do ar, priorizar a redução da poluição do ar buscando a
equidade em saúde, fortalecimento das políticas voltadas ao controle dos níveis de poluição e
aumentar o financiamento.60

Assembleia Mundial de Saúde 2025

A NCD Alliance produziu um briefing para advocacy das DCNT na 156ª sessão do Comitê
Executivo da OMS (EB 156). O comitê reúne 34 experts técnicos que são responsáveis por definir
a agenda que será discutida na Assembleia Mundial de Saúde 61

Determinantes comerciais da saúde

A European Public Health Alliance (EPHA) publicou boletim informativo sobre a


necessidade de combater os determinantes comerciais da saúde, no contexto da redução do
financiamento da saúde, inclusive das organizações da sociedade civil (OSC) e da perda de
importância das questões de saúde na agenda política da União Europeia. A Organização ressalta
a necessidade de união entre as entidades da sociedade civil, tendo em vista que as indústrias
continuam a ameaçar a saúde pública com publicidade de alimentos ultraprocessados, álcool e
tabaco. 62

Educação sexual

A Fundação Huésped emitiu um pedido de informação pública ao Governo da Cidade de


Buenos Aires, questionando por que os materiais do programa de Educação Sexual Integral (ESI)
ficaram inacessíveis durante a avaliação "neutra" que está sendo realizada durante o recesso
escolar, sendo que ela deve ser conduzida no marco da Lei ESI vigente. Além disso, a Fundação
questionou os critérios, a equipe de avaliação, o enfoque e o marco conceitual da revisão.63

Direitos humanos

A Fundação Huésped divulgou uma revista “O papel da justiça no acesso efetivo à saúde:
Debates atuais sobre saúde e direitos humanos”, publicada em conjunto com a Defensoria Geral
da Nação, que inclui artigos sob a perspectiva dos direitos humanos e enfoque interseccional,

185
debates sobre discriminação e criminalização no âmbito da saúde, e experiências comunitárias
para uma atenção integral.64

Equidade de gênero

A World Medical Association (WMA) condenou as recentes restrições no Afeganistão,


que suspendem a formação médica para mulheres, impedindo-as de se qualificarem como
parteiras e enfermeiras. A WMA instou o governo afegão a garantir o direito universal à
educação para mulheres e meninas, ressaltando que a formação profissional feminina é
fundamental para o avanço da saúde pública.65

Apoio à OMS

A World Medical Association defendeu a continuidade da Organização Mundial da


Saúde, destacando sua importância global como mecanismo internacional para coordenar
iniciativas de saúde e enfrentar desafios de saúde em todo o mundo. A organização apelou
especificamente aos Estados que permaneçam comprometidos com a OMS, contribuam para
um diálogo construtivo sobre melhorias organizacionais e garantam um financiamento
consistente e justo para programas globais de saúde críticos.66

Força de trabalho em saúde

A World Medical Association divulgou duas declarações lideradas pela WHPA, pedindo
que os governos invistam nos profissionais de saúde para avançar na cobertura universal de
saúde. As declarações foram divulgadas no Dia da Cobertura Universal de Saúde, enquanto os
Estados-membros da OMS discutem uma resolução sobre a força de trabalho em saúde, que
será abordada na próxima reunião do Conselho Executivo da OMS (3-11 de fevereiro de 2025) e
poderá influenciar decisões na Assembleia Mundial da Saúde de 2025.67

Saúde ocular envelhecimento

A International Federation on Ageing (IFA) publicou notícia sobre seu projeto “Estrutura
de Mensagens sobre Visão e Envelhecimento Saudável, Banco de Mensagens e Boas Práticas”
desenvolvido em consulta com grupos de pacientes. Trata-se de um projeto que visa aproximar
os profissionais da área da saúde ocular e os da área do envelhecimento para identificar a
influência da visão no envelhecimento e vice-versa. Como resultado, a IFA espera que a saúde
da visão possa ser integrada às agendas do envelhecimento e as pessoas idosas possam ser
consideradas na política e prática de saúde da visão.68

Sustentabilidade e saúde

A Federação Internacional de Hospitais (IHF) publicou matéria sobre a relação entre a


sustentabilidade e saúde, destacando que reconhecer e integrar a conexão crítica entre
resultados positivos de saúde, equidade e sustentabilidade ambiental é o presente e o futuro da
assistência médica. A matéria faz referência ao World Hospital Congress, realizado no Rio de
Janeiro, em setembro de 2024, quando o Geneva Sustainability Centre da IHF organizou uma
sessão "Acelerando a sustentabilidade para melhorar a assistência médica globalmente" para
mostrar três excelentes exemplos de sustentabilidade na assistência médica de diferentes
regiões.69

A Oxfam condenou os abusos revelados pela investigação da Bloomberg, que expõe


hospitais privados financiados pelo Banco Mundial e outras instituições de desenvolvimento
detendo pacientes e negando atendimento médico. Anna Marriott, gerente de políticas de

186
saúde da Oxfam, classificou os achados como um “grotesco retrocesso” e denunciou o modelo
de “finanças privadas primeiro”, que prioriza lucro em detrimento do direito à saúde. Relatórios
da Oxfam já haviam alertado sobre extorsão, negação de tratamento e prisões de pacientes em
hospitais financiados por bancos de desenvolvimento do Reino Unido, Alemanha, França e UE.70

Doenças negligenciadas

Na passagem do Dia Mundial das Doenças Tropicais Negligenciadas, 30 de janeiro, a


Drugs For Neglected Diseases Initiative (DNDi) lançou uma campanha de mídia social para
conscientizar as pessoas sobre a necessidade de inovação para desenvolver melhores
tratamentos para essas doenças. A DNDi lembrou que mais de um bilhão de pessoas ao redor
do mundo são afetadas por doenças tropicais negligenciadas, que afetam
desproporcionalmente pessoas que já são vulneráveis, seja devido à pobreza. Acrescenta que
essas doenças são negligenciadas, porque não são lucrativas para a indústria farmacêutica.71

ORGANIZAÇÕES DE INTERESSE PRIVADO

Doenças negligenciadas

A Wellcome Trust alerta que a leishmaniose, uma doença tropical negligenciada, afeta
até um milhão de pessoas anualmente e se expande devido a mudanças climáticas e
urbanização. O aumento das temperaturas e a alteração dos padrões de chuva favorecem a
proliferação dos vetores, ampliando sua presença, inclusive na Europa. Em resposta, a fundação
firmou parcerias com a DNDi e o Global Health Innovative Technology Fund para desenvolver
tratamentos mais acessíveis e eficazes, alinhados às metas da OMS de reduzir a letalidade da
doença e ampliar o acesso ao tratamento.72

Doenças Infecciosas

O Global Fund lançou uma oportunidade de investimento do setor privado no valor de


US$2 bilhões para acelerar o combate ao HIV, tuberculose e malária, com o objetivo de salvar
mais de 2 milhões de vidas. A iniciativa, apresentada no Fórum Econômico Mundial, convida
empresas, líderes filantrópicos e fundações a contribuir para essa causa, ampliando o impacto
de inovações em saúde, como ferramentas de diagnóstico, prevenção e tratamento. O setor
privado tem sido fundamental no financiamento de programas de saúde e no desenvolvimento
de soluções inovadoras, como testes autônomos para HIV e plataformas de saúde digital. A
oportunidade de investimento também visa melhorar a acessibilidade a esses recursos,
promover a equidade de gênero e fortalecer sistemas de saúde em resposta a crises pandêmicas
e climáticas.73

Inovações tecnológicas

A Gates Foundation apresentou na CES 2025 (Consumer Electronics Show) seis


inovações, que foram financiadas pela fundação, que contam com potencial para transformar a
saúde global, incluindo alimentos terapêuticos para combater a desnutrição infantil, redes
tratadas com novos inseticidas para conter a malária, drones para entrega de suprimentos
médicos em áreas remotas, uma vacina hexavalente que reduz o número de injeções
necessárias, ultrassons portáteis com IA para ampliar o acesso a diagnósticos e um dispositivo
simples para monitorar hemorragia pós-parto. Segundo a fundação, essas tecnologias podem
salvar milhões de vidas se forem amplamente implementadas.74

187
Financiamento Global

Uma análise inédita elaborada por organizações como The Rockefeller Foundation,
divulgada no Fórum Econômico Mundial, revelou que o financiamento internacional para clima
e saúde atingiu US$7,1 bilhões em 2022, um aumento expressivo em relação a 2018. No entanto,
menos de 50% desse montante chegou a países de baixa renda, demonstrando as dificuldades
sistemáticas ao enfrentar os impactos das mudanças climáticas na saúde global. O relatório
destacou a necessidade de ampliar e agilizar o acesso a esses recursos, promovendo
investimentos mais coordenados, acessíveis e alinhados às prioridades globais para fortalecer
sistemas de saúde resilientes ao clima.75

Mudanças climáticas

As "cúpulas de calor" são sistemas de alta pressão que aprisionam o calor em uma
região, elevando as temperaturas e intensificando a poluição do ar. De acordo com a GAVI, The
Vaccine Alliance, em 2024, o mundo registrou o ano mais quente já registrado, com
temperaturas médias globais 1,5°C acima dos níveis pré-industriais. Essas condições extremas
resultaram em ondas de calor mortais, secas severas e incêndios florestais, especialmente em
países de baixa renda. Segundo a aliança, o calor persistente piora a qualidade do ar,
aumentando os riscos à saúde, como doenças respiratórias e cardiovasculares. 76

Governança Global do Clima

A vice-presidente executiva da The Rockefeller Foundation, Elizabeth Yee, criticou a


saída dos EUA do Acordo de Paris, destacando que as mudanças climáticas afetam todas as
comunidades e países. Reafirmando o compromisso da fundação com soluções sustentáveis,
Yee enfatizou a importância de parcerias globais para promover empregos, saúde e meios de
subsistência que fortaleçam as comunidades e protejam o planeta. 77

A Fundação Rockefeller anunciou, durante o 55º Fórum Econômico Mundial em Davos,


um investimento de US$ 500 mil no Taskforce on Nature-related Financial Disclosures (TNFD),
uma iniciativa global que busca integrar a natureza aos processos de tomada de decisão de
empresas e instituições financeiras. O aporte visa ampliar a adoção voluntária das
recomendações do TNFD, incorporando esses aspectos aos registros de risco, balanços
patrimoniais e decisões de alocação de capital. A iniciativa reflete a crescente conscientização
sobre a perda de biodiversidade, classificada pelo Fórum Econômico Mundial como o terceiro
maior risco global para a próxima década, e alinha-se aos esforços globais para mitigar as
mudanças climáticas, já que soluções baseadas na natureza podem contribuir com 37% da
mitigação necessária até 2030. 78

O Global Fund, em parceria com a Fundação Gates e a Sanofi, lançou o Fundo Catalítico
Climático e de Saúde, no valor de US$ 50 milhões, com o objetivo de apoiar países e
comunidades vulneráveis a enfrentar os impactos da mudança climática na saúde, ao mesmo
tempo em que fortalece sistemas de saúde resilientes e de baixo carbono. O fundo foi criado
em resposta ao aumento das demandas por ação climática, visando garantir que as
comunidades mais afetadas, como mulheres e crianças, recebam suporte urgente. Ele permitirá
que os países vulneráveis desenvolvam soluções locais para proteger a saúde frente aos
impactos climáticos e impulsionem propostas para aumentar o financiamento futuro. O fundo
também promoverá a adoção de tecnologias de saúde sustentáveis, sendo uma resposta crítica
para mitigar os efeitos das mudanças climáticas na saúde pública.79

188
Governança Global da Saúde

A Consortium of Universities for Global Health emitiu um comunicado alertando que a


saída dos Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde (OMS) representa uma ameaça à
segurança nacional . A OMS desempenha um papel crucial no combate a pandemias, na
erradicação de doenças e na promoção da saúde global. A retirada dos EUA enfraqueceria esses
esforços, prejudicando a capacidade de resposta a crises sanitárias internacionais. O CUGH
enfatiza que a colaboração com a OMS é essencial para proteger a saúde dos cidadãos
americanos e manter a liderança dos EUA em saúde global. A organização insta o governo a
reconsiderar essa decisão, destacando a importância da cooperação internacional em saúde.80

A World Medical Association (WMA) emitiu uma declaração enfatizando a importância


de uma colaboração multissetorial na preparação e resposta às pandemias, fundamentada em
equidade e transparência. A WMA destaca que o engajamento de profissionais de saúde e suas
associações é essencial para desenvolver estratégias inclusivas, informadas pelas realidades
enfrentadas na linha de frente. A Revisão Universal de Saúde e Preparação (UHPR) é vista como
uma plataforma valiosa para fortalecer os sistemas de saúde globais e promover resiliência. A
WMA aponta que está preparada para apoiar treinamentos, iniciativas de conscientização e a
integração de uma abordagem de Saúde Única entre profissionais de saúde em todo o mundo.81

Vacinação

A GAVI, The Vaccine Alliance em colaboração com parceiros, está implementando uma
nova abordagem para fornecer vacinas essenciais em conflitos humanitários. O objetivo é
garantir que populações vulneráveis, como refugiados e deslocados internos, tenham acesso a
imunizações vitais, mesmo em situações de crise. Essa iniciativa busca superar desafios logísticos
e de infraestrutura, adaptando estratégias de vacinação às necessidades específicas de
comunidades afetadas por conflitos ou desastres naturais. A parceria visa fortalecer a cobertura
vacinal e prevenir surtos de doenças em áreas de difícil acesso, promovendo a saúde global e a
equidade no atendimento. 82

A Gavi, The Vaccine Alliance, estabeleceu em 2021 o Programa de Imunização de Zero


Dose (ZIP) para vacinar crianças em zonas de conflito, onde os programas nacionais de
imunização enfrentam barreiras significativas. Até junho de 2024, o ZIP administrou 845.000
primeiras doses e 479.000 doses finais de vacinas a crianças em 11 países africanos. A iniciativa
é liderada por dois consórcios: REACH, liderado pelo Comitê Internacional de Resgate, e RAISE 4
Sahel, liderado pela World Vision. O ZIP monitora doses-chave, como a primeira e terceira doses
da vacina pentavalente, além da primeira e segunda doses da vacina meningocócica conjugada,
para avaliar o progresso na imunização de crianças anteriormente não vacinadas.83

Conflitos humanitários

A World Scouting afirmou que o cessar-fogo em Gaza é um passo crucial para encerrar
a violência e aliviar o sofrimento de inúmeras famílias e comunidades. A organização expressou
solidariedade com as pessoas afetadas pelo conflito, especialmente crianças e jovens que
enfrentaram dificuldades inimagináveis e perderam anos insubstituíveis de educação e
sustento, além de diversos problemas de saúde, físicos e psicológicos. 84

189
EVENTOS

Desigualdade

O Sustainable Health Equity Movement (SHEM) divulgou a realização de um webinário


para discutir desigualdades e sustentabilidade com Tadhg O'Mahony e Juan Garay. O webinário
tem como título: os limites éticos da equidade econômica e será realizado online no dia 06 de
fevereiro de 2025.85 Ataques aos direitos das mulheres

O Geneva Global Health Hub (G2H2) noticiou a realização de um evento, em Genebra,


no dia 30 de janeiro de 2025, contra os ataques aos direitos das mulheres. O G2H2 denunciou
que os ataques que têm ocorrido em espaços multilaterais sinalizam uma tentativa alarmante
de minar os papéis das mulheres nas sociedades.86

Saúde planetária

A Planetary Health Alliance anunciou a abertura do prazo para submissões de resumos


para a Reunião Anual de Saúde Planetária 2025, a ser realizada em setembro, em Roterdã.
Informações sobre a reunião se encontram aqui: https://lnkd.in/epan7fWj87

Crise climática

O Sustainable Health Equity Movement (SHEM) repercutiu as cinco prioridades


destacadas da ONU para conter a crise climática em 2025: manter o limite de 1,5°C vivo,
proteger a natureza, garantir financiamento climático, fortalecer a lei climática e acabar com a
poluição plástica.88

Armas nucleares

A International Physicians for the Prevention of Nuclear War (IPPNW) realizará sua
Reunião Regional Europeia em Genebra de 11 a 13 de abril de 2025, destacando o papel da
cidade como símbolo de paz e celebrando a inauguração do Escritório de Ligação de Genebra. O
evento reunirá representantes da sociedade civil, academia e política para debates e
planejamento estratégico, com o objetivo final de abolir as armas nucleares.89

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da contínua crise humanitária global, fica evidente a necessidade de respostas


coordenadas e eficazes para minimizar o sofrimento das populações afetadas. Conflitos em
diversas regiões do mundo demonstram a urgência de soluções diplomáticas e humanitárias que
garantam acesso irrestrito a cuidados médicos e assistência básica. A atuação de organizações
da sociedade civil é fundamental para fornecer suporte às comunidades vulneráveis e denunciar
violações de direitos humanos, reiterando a importância do compromisso internacional com a
proteção dos civis em tempos de guerra ou em contextos de crise.

A crise climática também se revela como um fator agravante das desigualdades e


condições de saúde em diversas partes do mundo. Ondas de calor extremas, desastres
ambientais e insegurança alimentar afetam principalmente as comunidades mais pobres, que
possuem menos recursos para se adaptar a essas mudanças. A atuação de grupos destaca a
necessidade de responsabilizar grandes corporações pelas suas emissões de carbono e de
implementar políticas públicas eficazes para reduzir os impactos ambientais e sociais da crise
climática.

190
No campo da saúde pública, observa-se um esforço permanente para promover políticas
que combatam doenças crônicas e infecciosas. O aumento da tributação de produtos nocivos à
saúde, como bebidas açucaradas e cigarros eletrônicos, representa um avanço significativo na
prevenção de doenças cardiovasculares e metabólicas. Paralelamente, diversas iniciativas
buscam garantir acesso equitativo a medicamentos essenciais, combatendo monopólios
farmacêuticos e altos preços que limitam o tratamento de doenças como HIV/AIDS e mpox.

O enfrentamento das desigualdades na saúde também passa pelo combate à hesitação


vacinal e pelo fortalecimento dos programas de imunização em escala global. Apesar do sucesso
das vacinas na erradicação e no controle de doenças infecciosas, desafios como a desinformação
e a falta de acesso a imunização em comunidades vulneráveis persistem. Iniciativas são
essenciais para garantir que vacinas cheguem a todas as populações, especialmente em regiões
de conflito e pobreza extrema.

Por fim, observa-se que a colaboração global é indispensável para enfrentar os desafios
sanitários e ambientais que ameaçam a humanidade. O engajamento de diversas organizações
que investimentos em pesquisa, prevenção e infraestrutura são fundamentais para melhorar a
resiliência dos sistemas de saúde. A integração entre diferentes setores da sociedade, governos
e organismos internacionais será essencial para construir um futuro mais equitativo, onde o
direito à saúde e à dignidade humana sejam garantidos para todos.

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196
A estrada perigosa a frente: ameaças que não cabem numa lista
The risky path ahead: threats that can not be ranked

Rafaela Venturella De Negri


Armando De Negri Filho

Abstract. In this inform, our first of 2025, we use the Global Risks Report 24-25 as a conductive
line, putting its ranking and concepts of threat upon scrutinization of CSO’ views and proposals.
We analysed a total of 17 documents on a 3 way division, first analysing risks under the category
of “State-based armed conflict”, then “Extreme Weather events” and “Critical change to Earth
systems” and a final section compiling the other 7 factors: “Geoeconomic confrontation”,
“Misinformation and disinformation”, “Societal polarization”, “Economic downturn”, “Lack of
economic opportunity or unemployment”, “Erosion of human rights and/or civic freedoms” and
“Inequality”. We also did a brief analysis of the risk number 20 “Decline of Health and Well-
being”.

Keywords: Davos. Trump Second term. COP29. Fossil Fascism. COP29. The Hague Group. Global
Risk Report.

Resumo. Neste informe, o nosso primeiro de 2025, utilizamos o Relatório de Riscos Globais 24-
25 como linha condutora, colocando a sua classificação e conceitos de risco no escrutínio das
opiniões e propostas das OSC. Analisamos um total de 17 documentos com divisão de três
partes, primeiro analisando os riscos na categoria de “conflito armado baseado no Estado”,
depois “eventos climáticos extremos” e “mudanças críticas nos sistemas terrestres” e uma seção
final compilando os outros 7 documentos. fatores: “Confronto geoeconómico”,
“Desinformação”, “Polarização social”, “Desaceleração económica”, “Falta de oportunidades
econômicas ou desemprego”, “Erosão dos direitos humanos e/ou liberdades civis” e
“Desigualdade”. Fizemos também uma breve análise do risco número 20 “Declínio da Saúde e
Bem-Estar”.

Palavras-chave: Davos. Segundo mandato de Trump. Fascismo Fóssil. Cop29. O Grupo de Haia.
Relatório de Risco Global.

Nos nossos 2 meses de hiato, tivemos o after-match da COP29, a confirmação de um -


suposto - cessar-fogo na Palestina, a tomada de posse do novo presidente norte americano, a
continuação da invasão do Líbano, a queda do regime de Bashar al-Assad, o Fórum de Davos;
tudo isso em meio a incêndios, enchentes e secas ao redor do mundo. As manifestações da
polycrisis são tantas que se torna difícil - mesmo com uma visão glocal - elencar o mais
importante, o mais urgente em meio às urgências. Com isso, decidimos estruturar nosso
primeiro dos 23 informes por vir ao redor do relatório de Riscos Globais do World Economic
Forum e partir daí.

“O relatório destaca as últimas descobertas da nossa Pesquisa Anual de Percepção de Riscos


Globais, que este ano reuniu a inteligência coletiva de mais de 900 líderes globais nas áreas
acadêmica, empresarial, governo, organizações internacionais e organizações civis sociedade.
Ele também aproveita insights de cerca de 100 especialistas temáticos, incluindo os especialistas

197
em risco que formam o Conselho Consultivo do Relatório de Riscos Globais, o Conselho Futuro
Global sobre Riscos Complexos e a Comunidade de Diretores de Risco.”

O documento exibe a lista dos 10 maiores riscos para os nossos próximos 10 anos,
mostrando as mudanças de ranking com o tempo (previsões), os colocando como riscos short-
term ou longer-term. A lista completa de ameaças tem mais de 30 fatores, como perda da
biodiversidade, rompimento de bolhas financeiras, perturbações em cadeias de fornecimento,
proteção social insuficiente etc. Esses riscos são divididos em 5 categorias: Economia, Meio-
ambiente, Geopolítica, Social e Tecnológica. As 10 maiores ameaças latentes elencadas pelo
relatório 24-25 são as seguintes: Conflito armado entre Estados, Eventos climáticos extremos,
Confronto geoeconômico, Desinformação, Polarização social, Recessão econômica, Mudança
crítica nos Sistema Terra, Falta de oportunidades econômicas ou desemprego, Erosão dos
direitos humanos e/ou liberdades cívicas e Desigualdade. O documento foi usado para formular
a agenda de diálogos de Davos, com a mesa sobre Riscos tendo acontecido no dia 23 de Janeiro,
moderada por Zanny Minton Beddoes, a editora-chefe do The economist. A conversa entre os
líderes e representantes de Estado presentes pode ser resumida em afirmações vagas - “vamos
manter a mudança climática no centro das discussões” - e um aparente desconhecimento da
crise multifatorial que enfrentamos e, mais ainda, um desconhecimento de suas causas
sistêmicas. O mesmo pode ser dito do relatório que mesmo com suas mais de 100 páginas
parece fugir de uma análise profunda e minuciosa do modelo social que nos trouxe até a beira
deste colapso.

Dado isso, vamos apresentar o que a sociedade civil diz sobre esses mesmos tópicos,
suas análises tendem a ser mais amplas, orientadas ao cumprimento dos direitos integrais e
tendo - de fato - um novo modelo de relação entre a sociedade e a natureza no centro das suas
indagações. Abrimos mão dos nossos dois grandes blocos e analisamos os 10 primeiros itens da
lista de riscos, utilizando agrupamento de acordo com temas e sinalizando também alguns riscos
abaixo dos top ten, como o declínio da saúde e o mau uso da IA.

Conflito armado entre Estados (1)

No topo, representando 23% dos cenários de risco. Categorizado como risco geopolítico.
Entra aqui todo tipo de conflito que tem, de algum dos lados, um Estado-Nação envolvido.
Basicamente tudo que vimos acontecer e escalar nos últimos 3 anos com Palestina, Ucrânia,
RDC, Sudão, Síria. Temos guerras com Estados envolvidos diretamente e Estados financiando,
formando realidades complexas de proxy war. A decaída da paz - dado o aparecimento de
conflitos latentes - também é apontado pelo Peace Index de 2024. O Index aponta uma escalada
da Militarização, trazendo um novo fator de análise, a global military capability, que junta
“sofisticação militar, tecnologia e prontidão para a batalha” num fator unificado - que aumentou
em 10% nos últimos 10 anos, caracterizando um mundo altamente armado e preparado para
conflitos complexos e grandes. O Index descreve a situação, apontando vagamente alguns
catalisadores - poderes emergentes, tecnologia.

A SCO devolve a razão ao tópico, pedindo libertação, espaço e garantia para a


autodeterminação dos povos envolvidos nos conflitos, reconhecendo as ligações entre os
conflitos atuais e a neocolonização do século 21, o uso da tecnologia para a guerra e o papel dos
países cujos interesses moldam o mundo.

Semana passada a Organização pró-Palestina Electronic Intifada publicou uma


denúncia contra a União Europeia, relatando como a organização havia, dias antes, renovado
um acordo com israel para a compra de Drones. A fabricação de tecnologia bélica é um dos

198
pilares de força econômica de Israel e o fato dos testes das armas serem realizados no território
de Gaza parece não importar ou afetar a região mais pacífica do globo (Europa segue em
primeiro lugar no Peace Index) que segue usando estas tecnologias para visar pessoas migrantes
e que buscam situação de refúgio.

“Em dezembro, dois fabricantes de armas – Israel Aerospace Industries (IAI) e Airbus –
anunciaram que tinham assinado um contrato “de continuação” com a Frontex, a agência de
guarda de fronteiras da UE.

Tais anúncios têm como objetivo impressionar os acionistas e potenciais clientes, e não
informar o público. A própria Frontex não promoveu o acordo.

O anúncio deu a impressão de que a Frontex tinha renovado um contrato no valor de


mais de 50 milhões de dólares quando foi originalmente assinado em 2020.

As empresas anunciaram que o drone Heron da IAI seria usado para rastrear refugiados
em perigosas viagens ao Mediterrâneo durante mais quatro anos.

Questionado sobre um comentário, um porta-voz da Frontex afirmou que o contrato “é


baseado num novo concurso público” em vez de ser uma extensão de um acordo anterior. O
novo contrato vale 192 milhões de USD ao longo de um período de dois anos.

A admissão da Frontex na verdade piora a situação. Mostra que uma agência da UE


aprovou um novo acordo envolvendo a indústria de armas de Israel em dezembro – enquanto
Gaza ainda estava sujeita a um genocídio.

Um porta-voz da Frontex não respondeu a uma pergunta que levantei sobre o genocídio
e o envolvimento da indústria de armas de Israel nele.”

Além disso, enquanto parte do arsenal de guerras que fazem crescer a tensão e a
possibilidade de conflitos, temos a instrumentalização da destruição de instituições de
manutenção da vida. A People’s Dispatch vem denunciando a destruição intencional dos
sistemas de saúde de Gaza - e também os projetos de privatização dos sistemas de saúde ao
redor do mundo - desde o início da escalada do genocídio em Outubro de 2023. Nos primeiros
dias do ano a rede publicou um novo documento, somando relatos locais de médicos e
trabalhadores da saúde de Gaza com um relatório da ONU publicado no último dia de 2024.

O relatório encomendado “Attacks on hospitals during the escalation of hostilities in


Gaza” foi produzido pelo OHCHR e analisa as ações bélicas de israel que tiveram como alvo
hospitais e centros de cuidado médico, de Outubro de 2023 a Junho de 2024.

“3. O sistema de saúde em Gaza era totalmente inadequado mesmo antes de 7 de


outubro de 2023. Os 17 anos de bloqueio a Gaza no contexto da ocupação de 57 anos por Israel,
combinado com a destruição causada por repetidas escaladas de hostilidades desde 2008,
durante as quais as forças israelenses regularmente bombardearam Gaza, criou uma ampla
dependência da ajuda externa e restringiu fortemente o acesso e a circulação de pessoas e bens
dentro e fora de Gaza, incluindo os essenciais para os cuidados de saúde. Isto criou as condições
para deficiências endémicas na prestação de cuidados de saúde e violações recorrentes dos
direitos humanos dos palestinos em Gaza, incluindo os seus direitos à vida e à saúde.

4. A situação deteriorou-se a um nível catastrófico desde outubro de 2023, uma vez que
o sistema de saúde já danificado foi alvo, resultando na morte de centenas de pessoas da saúde
e profissionais médicos. Este relatório estabelece padrões na condução das hostilidades em

199
relação a ataques a hospitais e nas suas imediações, examinando vários casos que o ACNUDH
tem acompanhado de perto. Os ataques a hospitais seguiram muitas vezes um padrão
semelhante, envolvendo ataques de mísseis contra edifícios hospitalares, a destruição de
instalações hospitalares, tiroteios contra civis, cercos, bem como assumindo temporariamente
edifícios hospitalares. O presente relatório não examina em detalhe os muitos casos de
detenção arbitrária, desaparecimento forçado e maus-tratos de pessoal médico e outros
palestinianos, incluindo pessoas deslocadas internamente (PDI), detidas no interior de hospitais,
o que foi relatado em outros lugares. Está claro, no entanto, que estas perdas de pessoal
qualificado contribuíram para o colapso do sistema de saúde.”

A reportagem do Dispatch, então, relaciona essas escolhas bélicas com um plano de


dizimação e controle, denunciando como essa prática - especialmente caso não seja punida -
poderá ser usada novamente em outras guerras imperialistas, denunciando o genocídio como
arma de escolha do capital sempre que conveniente.

“O Dr. Abu-Sittah enquadrou os acontecimentos na Palestina como parte de uma nova


tentativa imperialista de redesenhar o mapa da Ásia Ocidental de uma forma que sirva os
interesses ocidentais. Ele sugeriu que Israel e o seu governo fascista estão a ser usados como
ferramentas neste processo. Para permitir que os Estados Unidos se concentrem inteiramente
no seu impasse com a China, a Ásia Ocidental deve ser libertada de comunidades capazes de
resistir, explicou Abu-Sittah – e Israel desempenha um papel central nesta estratégia.

O âmbito das ações de Israel na Palestina vai além dos cuidados de saúde, mas é
fundamental compreender as estratégias utilizadas no setor da saúde de Gaza como um alerta
sobre o que poderá acontecer em outros lugares, alertaram os oradores. Esta nova “fase
genocida do capital global”, como descreve o Dr. Abu-Sittah, designou os cuidados de saúde
como um ponto-chave de ataque. Para aqueles que estão fora da Palestina, particularmente no
Sul Global, a devastação em Gaza serve como prova evidente de que o genocídio está a ser
utilizado como uma ferramenta de guerra imperialista – uma ferramenta que o capital não
hesitará em utilizar noutros lugares, concluiu o Dr.

Isto é verdade não só para o genocídio como estratégia imperialista, mas também para
os métodos específicos de guerra vistos na Palestina e no Líbano ao longo dos últimos 15 meses.
Nos ataques anteriores de Israel, “vimos muito sangue”, observou Zeina Mohanna. “Agora
estamos vendo pessoas queimando.” A mutilação deliberada de civis através de táticas como o
chamado ataque de pager no Líbano, juntamente com a utilização generalizada de fósforo
branco por Israel e a alegada utilização de urânio empobrecido, representa uma grave ameaça
à saúde humana e ecológica nos próximos anos. Estas ações não são acidentais – são calculadas
para alcançar a erradicação total.”

Em resposta e numa tentativa organizada de frear o avanço impune do projeto


imperialista, um grupo de 9 países organizados através da Progressive International foi a Haia
no dia 31 de janeiro para formalmente pediram o embargo de armamentos a israel, junto de
medidas de investigação para os crimes cometidos contra o povo palestino. Belize, Bolivia,
Colombia, Cuba, Honduras, Malaysia, Namibia, Senegal e South Africa (que já havia, de maneira
pioneira, ido a Haia buscar responsabilização aos crimes contra a Palestina) se chamam agora
The Hague Group e afirmam:

“Declaramos nossa intenção de:

200
1. Defender a Resolução A/RES/Es-10/24 da ONU e, no caso dos Estados Partes, apoiar
os pedidos do Tribunal Penal Internacional para cumprir as nossas obrigações junto do Estatuto
de Roma, no que diz respeito aos mandados emitidos em 21 de Novembro 2024; e implementar
as medidas provisórias do Tribunal Internacional de Justiça, emitidas em 26 de janeiro, 28 de
março e 24 de maio de 2024.

2. Impedir o fornecimento ou transferência de armas, munições e equipamentos


relacionados para Israel, em todos os casos em que exista um risco claro de que tais armas e
itens relacionados possam ser usados para cometer ou facilitar violações do direito humanitário,
do direito internacional dos direitos humanos ou do direito internacional; proibição do
genocídio, em conformidade com as nossas obrigações internacionais e em conformidade com
o parecer consultivo do Tribunal Internacional de Justiça de 19 de julho de 2024 e com a
resolução A/RES/Es-10/24 da Assembleia Geral da ONU.

3. Impedir a atracação de navios em qualquer porto, se aplicável, dentro da nossa


jurisdição territorial, em todos os casos em que haja um risco claro de o navio ser usado para
transportar combustível militar e armamento para Israel, o que pode ser usado para cometer
ou facilitar violações do direito humanitário, do direito internacional dos direitos humanos e da
proibição do genocídio na Palestina, em conformidade com a obrigação legal peremptória dos
Estados de cooperar para prevenir o genocídio e outras violações de normas imperativas através
de todas as medidas legais à sua disposição.

Tomaremos novas medidas eficazes para acabar com a ocupação de Israel do Estado da
Palestina e remover os obstáculos à realização do direito do povo palestiniano à
autodeterminação, incluindo o direito ao seu Estado independente da Palestina. Convidamos
todos os Estados a tomarem todas as ações e políticas possíveis para acabar com a ocupação do
Estado da Palestina por Israel. Apelamos a todas as nações para que se juntem a nós no Grupo
de Haia no compromisso solene com uma ordem internacional baseada no Estado de direito e
no direito internacional, que, juntamente com os princípios da justiça, é essencial para a
coexistência pacífica e a cooperação entre os Estados.”

Eventos Climáticos Extremos (2) e Mudanças Críticas aos Sistema Terra (7)

A mudança climática, seus eventos extremos e as mudanças causadas ao Sistema Terra


- perda da biodiversidade, dificuldade de cultivo, morte de animais, aparecimento de novas
ameaças virais, etc - representam 18% de risco (14 e 4, respectivamente) e foram categorizados
como ameaças ambientais. O ano de 2024 registrou o maior número de eventos climáticos
extremos já visto e teve as temperaturas mais altas da história. Em janeiro de 2025, o regime
Trump anunciou a saída dos Estados Unidos do Acordo de Paris, provando cada mais corretas as
afirmações de Malm sobre “fossil fascism”. Em questões monetárias, talvez o impacto não seja
tão grande, uma vez que os Estados Unidos NUNCA desembolsaram o valor acordado para as
ações mobilizadas pelo Acordo, porém, agora temos o segundo maior poluidor do mundo livre,
sem nenhum tipo de cabresto legal para regular suas emissões. Além disso, muitos acadêmicos
e ativistas da área apontam a saída dos EUA como um momento de inflexão, um momento para
os poderes emergentes tornarem suas medidas de proteção ambiental mais ambiciosas.

A triste realidade é que, mesmo antes da decisão do regime trumpista, as mobilizações


de proteção da biodiversidade e manutenção da vida na terra já iam mal. A COP29 foi taxada
pela SCO como uma vergonha, recebendo duras críticas pela presença de lobistas do
combustível fóssil e pelo acordo final com um valor comum acordado muito pequeno frente a

201
todo grande conjunto de necessidades para assegurar que todos os países, em especial os com
menos recursos, possam atingir patamares seguros de mitigação e adaptação.

Uma outra crítica se soma às muitas já feitas: em meio à extensão temporal (foi dado
um dia a mais ao evento, para se tentar alcançar uma decisão sobre o valor comum) e o
resultado decepcionante, temos ainda o novo papel dos Bancos Multilaterais de
Desenvolvimento. Essas instituições foram apontadas como atores pivô na financiação da
transição, mitigação e adaptação. E os Bancos aceitaram essa proposta com entusiasmo. Porém,
como nos mostra um artigo do The Bretton Woods Project, essa decisão só adiciona ao projeto
de irresponsabilização dos países mais ricos, além de aumentar a crise da dívida, dado que esses
bancos efetuam operações de crédito (loans) e não concessões\doações (grants), vistas como
ação necessária dentro da lente do CBDR.

“Ao reforçar o papel do financiamento do BMD no novo acordo climático, os países


desenvolvidos conseguiram escapar à sua obrigação de fornecer financiamento público sob a
forma de subvenções em grande escala aos países em desenvolvimento, reduzindo as
esperanças destes países de lidar eficazmente com os impactos climáticos e transição para um
futuro de energia limpa”, disse Mariana Paoli, da organização da sociedade civil (CSO) Christian
Aid, sediada no Reino Unido. “Isso não só corre o risco de agravar a sua dívida, mas também
transfere o fardo dos países desenvolvidos para as abordagens que priorizam o sector privado.
Esta inversão na narrativa é generalizada e moralmente errada porque o que orientará as
finanças é onde o lucro pode ser encontrado e não as necessidades dos países em
desenvolvimento, especialmente das comunidades que são mais marginalizadas”, acrescentou
Paoli. (...)

Apesar de serem observadores, e não partes, da UNFCCC, o Banco Mundial e outros


BMD continuam a ganhar proeminência no panorama do financiamento climático: o Banco tem
sido o anfitrião de numerosos fundos fiduciários de crédito de carbono (ver Por Dentro das
Instituições, O que qual é o papel do Banco Mundial nos mercados de comércio de carbono?);
criou os Fundos de Investimento Climático em 2008, que inicialmente pretendiam servir como
uma ponte temporária enquanto era criado um fundo climático baseado nas Nações Unidas (ver
Observer Summer 2019); e, mais recentemente, garantiu um acordo para acolher o Fundo de
Resposta a Perdas e Danos (FRLD) durante os próximos quatro anos (ver Observer Winter 2023),
com o seu papel de anfitrião e administrador confirmado na COP29.”

Esse tipo de movimento também leva as decisões e manobras sobre a justiça climática
para dentro de instituições privadas - e financeirizadas - e afasta e dificulta a adesão de
colocações da SCO. Durante a COP29 essas mesmas manobras de privatização da pauta pública
foram desafiadas através de um manifesto assinado por mais de 100 sindicatos de trabalhadores
da América Latina e do Caribe, da África e da Ásia (incluindo nossa CUT Brasil). O grupo pedia a
construção da justiça ambiental através de uma via popular, que restaure e garanta bens
públicos, movendo-se para longe da "descarbonização privada”.

A Nova Meta Quantificada Coletiva (NCQG) e uma nova era para a energia pública

Pedimos às partes na COP que reconheçam o papel essencial da propriedade pública e


do controle sobre setores vitais essenciais para a ação e a transição climática, como energia,
transporte público e matérias-primas. Conforme observado na declaração do Quinto Congresso
Mundial da ITUC, adotada em novembro de 2022, “as políticas neoliberais de clima e energia...
que estão ligadas à privatização e mercantilização, não conseguiram deter o aumento das
emissões de gases de efeito estufa”. O Congresso pediu “a retenção, recuperação e expansão

202
da propriedade pública de infraestrutura e serviços de energia”, uma política que apoiamos
totalmente. Também apoiamos a demanda da Confederação Sindical das Américas (TUCA) de
que “a energia deve ser desmercantilizada e democratizada por meio de mudanças nos regimes
de propriedade e gestão, fortalecendo o caráter público e reorientando o papel das empresas
públicas para que sua gestão seja democrática e focada na garantia de direitos e melhores
condições de vida para a população trabalhadora”. Além disso, o NCQG deve garantir que a
entrega de todo o financiamento climático seja moldada por mecanismos que promovam o
controle público, democrático e transparente, e seja baseada no reconhecimento do princípio
da UNFCCC de Responsabilidades Comuns, porém diferenciadas.

Portanto, o financiamento climático deve ser fornecido de maneira que possa:

1. Evitar o aumento da dívida e aliviar as imensas pressões da dívida existente nos países do
Sul. Muitos países do Sul já pagam mais pelo serviço da dívida do que se comprometem com
saúde, educação e serviços básicos. O financiamento climático deve manter e expandir esses
serviços públicos, que são vitais para os esforços de mitigação e adaptação.
2. Acabar com a política de "financiamento combinado" e "redução de riscos". Desde a COP15
em 2009, os níveis de capital comprometido têm sido, em primeiro lugar, mínimos e,
portanto, inadequados e, em segundo lugar, a maior parte das finanças foi mobilizada pelos
MDBs e, portanto, é financiamento público. A ideia de "bilhões a trilhões" do Banco Mundial
de que o dinheiro público "catalisaria" grandes quantidades de financiamento do setor
privado foi um fracasso absoluto. Um NCQG deve reconhecer que os investidores privados
não fornecerão o investimento necessário para atingir as metas climáticas e de energia de
baixo carbono, e a eficácia do financiamento climático dependerá das instituições públicas
e do financiamento público.
3. Ir além dos mecanismos de mercado, como a precificação e o comércio de carbono (que se
mostraram socialmente regressivos e ecologicamente ineficazes); e, finalmente, ver além
das compensações como um meio de reduzir as emissões por desmatamento e degradação
(REDD e REDD+). Conforme observado pela declaração da TUCA na COP29, essas políticas
foram promovidas por "países do Norte e corporações transnacionais para serem
desenvolvidas nos países do Sul global, aprofundam a crise e promovem a reprodução de
práticas colonialistas, ignorando as responsabilidades diferenciadas dos países do Norte
global".
4. Evite fazer o tipo de ataque ao setor público comum às Parcerias para Transição Energética
Justa. As propostas futuras não devem usar uma linguagem que favoreça e exiba os
interesses dos investidores privados. Em vez disso, elas devem usar uma linguagem que
aborde as principais preocupações dos trabalhadores, das comunidades e das necessidades
legítimas de desenvolvimento dos países do Sul
5. Permitir e incentivar uma abordagem de "recuperar e restaurar" os serviços públicos e de
utilidade pública e ajudar os governos do Sul a aumentarem seus ativos e capacidades,
colocando-os em uma posição mais forte para buscar o desenvolvimento industrial e social
de baixo carbono

Portanto, nossas demandas são as seguintes:

1. Os países desenvolvidos devem cumprir suas responsabilidades históricas: Eles devem


fornecer financiamento climático para o Sul Global de pelo menos US$ 5 trilhões por ano.
Esse financiamento climático deve ser novo e adicional, público, não gerador de dívidas,
adequado e previsível, e canalizado por meio de mecanismos democráticos, transparentes
e responsáveis. Ele deve consistir em doações, e não em empréstimos, para perdas e danos

203
relacionados ao clima e adaptação climática. Os países desenvolvidos também devem
cancelar (e não reprogramar) as dívidas ilegítimas e relacionadas ao clima (por exemplo,
dívidas por perdas e danos à infraestrutura, quebra de safras vitais etc.) para liberar espaço
fiscal para os países do Sul global responderem à crise climática. Tanto o financiamento
climático quanto o cancelamento da dívida podem ser considerados como parte das
reparações que o Norte global deve ao Sul global por sua responsabilidade histórica e
contínua pela crise climática.
2. O financiamento climático deve ser usado para expandir os ativos públicos: Ao contrário
dos esquemas de financiamento misto, como as Just Energy Transition Partnerships (JETPs),
que usam dinheiro público para reduzir o risco de investimentos privados e, ao mesmo
tempo, acumular dívidas governamentais, o compromisso anual de US$ 5 trilhões deve ser
direcionado para a reconstrução das capacidades dos governos de recuperar seus setores
de eletricidade e transporte para a propriedade e o controle públicos totais. As
condicionalidades do tipo JETP que visam criar "um ambiente propício para o setor privado"
por meio da desregulamentação, da liberalização e do enfraquecimento das empresas
públicas devem dar lugar a abordagens de "caminho público" para uma transição energética
justa.
3. Combater a pobreza energética: O sistema multilateral de empréstimos deve abandonar
sua agenda de "privatizar para descarbonizar" e endossar abertamente a abordagem de
"recuperar e restaurar" os serviços públicos de energia proposta pelos sindicatos que
apoiam o caminho público. Os bancos multilaterais de desenvolvimento deveriam parar de
favorecer as empresas privadas (como os chamados produtores independentes de energia,
ou IPPs) e insistir na "recuperação total dos custos" para as empresas públicas. Pioneiras do
Banco Mundial nas décadas de 1980 e 1990, as políticas de "ajuste estrutural" continuam a
ser uma característica dos atuais esquemas de financiamento climático, pois tornam o
financiamento dependente de reformas que promovem as empresas privadas, ao mesmo
tempo em que se esforçam para prejudicar os serviços e as entidades públicas. Esse é o
principal motivo pelo qual, no Sul Global, centenas de milhões de pessoas ainda não têm
acesso a eletricidade limpa e confiável e bilhões ainda dependem de fontes de energia sujas
para cozinhar e aquecer.
4. A transferência de tecnologia é necessária para a industrialização verde de alto valor
agregado e o desenvolvimento de baixo carbono: É preciso direcionar mais recursos
financeiros para a diversificação das cadeias de suprimentos globais por meio da
transferência de tecnologias, assistência técnica e parcerias público-públicas baseadas na
cooperação entre estados em termos não comerciais. Os setores verdes de hoje são
controlados por um punhado de países e empresas multinacionais que, com frequência,
estão mais preocupados com fluxos de receita, lucros e participação no mercado do que
com o enfrentamento da ameaça das mudanças climáticas.
5. O Norte deve liderar o declínio gerenciado do uso de combustíveis fósseis. O foco dos JETPs
na redução do uso de carvão em países como Indonésia, África do Sul e Vietnã evita a
realidade de que os países ricos são os maiores produtores e exportadores de combustíveis
fósseis. Os países ricos podem e devem assumir a liderança em termos de redução não
apenas do consumo de combustíveis fósseis, mas também de suas exportações. Isso deve
ser combinado com o fornecimento de assistência aos países em desenvolvimento para
acelerar a implantação de alternativas energéticas de baixo carbono, abordagens de última
geração para a eficiência energética e o desenvolvimento de infraestrutura e práticas
industriais modernas e resistentes ao clima.”

204
O Center for International Environmental Law - CIEL também fez denúncias importantes
sobre a COP29, dessa vez trazendo a perda gradativa de representação e recebimento das
colocações da SCO. Muitos ativistas preferiram não viajar ao Azerbeijão devido às violações
constantes aos direitos civis que acontecem no país, com isso, as participações foram menores
do que de costume. Junto a isso, vemos uma diminuição no espaço dado pelo mecanismo às
manifestações civis.

“Muitos ativistas decidiram não viajar para Baku ou praticar a autocensura e, à medida
que a COP se desenrolava, esses ativistas presentes na COP29 enfrentaram forte vigilância e
intimidação dentro da Zona Azul. Neste contexto, é ainda mais preocupante que o próprio
Secretariado da UNFCCC esteja cada vez mais restringindo a capacidade de organizar ações e
manifestações dentro do local da COP e policiar o que pode e o que não pode ser dito. Tais
restrições implicam a necessidade de provar uma ligação entre o ambiente e quaisquer
referências aos defensores dos direitos humanos, proibindo referências explícitas a
organizações intergovernamentais e implementando medidas desnecessárias, restrições
sonoras estritas, levando efetivamente a protestos silenciosos. O Acordo de Paris reconhece a
importância da ação climática participativa e o IPCC concluiu que o envolvimento ativo do
público é um pré-requisito para uma ação climática resiliente. Excluindo as vozes daqueles que
clamam por justiça e que tem experiências vividas sobre a crise climática irá minar ainda mais a
credibilidade e a legitimidade da UNFCCC. A UNFCCC e todas as suas Partes devem defender os
direitos humanos e garantir um ambiente seguro e um espaço cívico antes, durante e depois das
COPs dentro e fora da Zona Azul.”

A privatização da descarbonização parece ainda mais contraprodutiva uma vez que nos
deparamos com um novo artigo lançado pela The Lancet em sua edição de Fevereiro\2025, na
qual os autores demonstram como uma pesquisa feita com participação civil ativa é a chave para
a criação de programas e projetos que realmente consigam resolver a crise climática. “The
climate crisis and human health: identifying grand challenges through participatory research”
aponta um projeto com plena participação - acadêmicos, cientistas, ativistas, civis, pessoas que
enfrentam a crise cara a cara - e centrado na saúde e nas adaptações diferentes que cada local
deverá fazer a partir das suas necessidades e características singulares (health gap). A pesquisa
ainda está em fase preparatória e seus resultados serão publicados numa lista que terá acesso
público.

“Os resultados quantitativos de pesquisa e os resultados qualitativos da convocação


serão revisados por um painel global de especialistas em clima e saúde convocado pelo Grand
Challenges Canada, para desenvolver uma lista classificada de Grandes Desafios climáticos e de
saúde. Os resultados serão divulgados globalmente e publicamente como um documento para
o bem público, e também informará um novo Grande Desafio climático e de saúde sendo lançado
pela Grand Challenges Canada, Science for Africa Foundation e a Rede Global Grand Challenge.

A crise climática é uma crise de saúde. Fortes esforços internacionais, colaboração e


financiamento em grande escala são essenciais para apoiar as comunidades locais na adaptação
e construir resiliência aos desafios atuais e futuros.”

Confronto geoeconômico (3), Desinformação (4), Polarização social (5), Recessão econômica
(6), Falta de oportunidades econômicas ou desemprego (8), Erosão dos direitos humanos e/ou
liberdades cívicas (9) e Desigualdade (10)

Estas 7 ameaças representam juntas 33% das possibilidades analisadas serão analisadas
em conjunto. Apesar de serem categorizadas como pertencentes a 4 grupos diferentes -

205
geopolítica, tecnológica, social, econômica e social (as últimas 3) respectivamente - e referidas
como fatores isolados, as vemos como conectados fatores sistêmicos. Essa análise infelizmente
não é feita pelo documento original que, por exemplo, define a crise da desinformação como
um problema de tecnologia, não como um problema de disputa narrativa - quem dera as
fakenews se dessem pelo mau manejo das redes e não pela disseminação dolosa de inverdades
e pela inconveniente falta de regulação. Os confrontos geoeconômicos - tradewars - são um
problema, porém são um problema que releva como a intrincada rede de comércio
internacional que temos pode ser usada como arma - weaponized - pela economia mais forte.
Os pontos 5, 6, 8, 9 e 10 são ficha batida nos nossos informes. O descontentamento social, o
desespero gerado pela falta de possibilidades econômicas que garantam uma vida digna, junto
às políticas de austeridade que cortam políticas públicas e a ascensão de movimentos de
extrema-direita traduz uma realidade de infelicidade e insatisfação, um barril de pólvora social
no qual as narrativas batidas de culpabilização pontual de bodes expiatórios - como as usadas
pelos trumpistas - vencem análises radicais sistêmicas.

Essa realidade é alimentada pela realidade de que nunca antes vivemos num mundo tão
desigual, com tão pouca redistribuição de toda riqueza que é produzida. Segundo um novo
informe da OXFAM International 204 novos bilionários surgiram em 2024 e a fortuna dos super
ricos aumentou em 2 trilhões de USD em 2024 (lembrando que a proposta mais alta do NCQG
era de 1,3 trilhões de dólares por ano, sendo cortada para 300 bilhões). O número de pessoas
vivendo na pobreza não mudou muito em sua totalidade, mas a pobreza em si avança e atinge
níveis de indignidade novos, visto o corte global de políticas de proteção e seguridade social. A
pobreza nunca foi tão horrível quanto é hoje e, ao mesmo tempo, a riqueza nunca deu tantos
frutos quanto dá hoje ao seu seleto grupo. A Oligarquia econômica está - literalmente -
mandando no mundo, se juntando aos líderes fascista e negacionistas, inaugurando o “governo
dos bilionários” e encerrando com um estrondoso aplauso o que até ontem julgávamos que era
uma democracia - como se um regime que permitisse o surgimento de bilionários enquanto
meio mundo morre de fome fosse democrático para começo de história.

“Trump foi empossado rodeado pelos homens mais ricos e poderosos do mundo. Eles
tinham motivos para comemorar: os bilionários do mundo viram a sua riqueza crescer 2 biliões
de dólares no ano passado, três vezes mais rápido do que em 2023. E com um gabinete cheio
de bilionários, a nova administração está preparada para executar um programa de continuar a
enriquecer enquanto dividindo, reprimindo e levando à falência a classe trabalhadora. O nosso
país está a avançar rapidamente para uma forma de oligarquia mais flagrante e transparente –
governada pelos super-ricos. (...)

Trump atribuiu um papel proeminente na sua administração a Elon Musk, o homem


mais rico do mundo, um multimilionário com um histórico de anti-sindicalismo cruel e apoio a
partidos de extrema-direita e neonazis. Musk recebeu a co-liderança de um novo
“Departamento de Eficiência Governamental” (DOGE), que tentou vender ao Congresso 2 biliões
de dólares em cortes de despesas. Cortes desta profundidade são impossíveis sem reduções nas
despesas necessárias para manter o Medicare, o Medicaid e a Segurança Social nos atuais níveis
de benefícios. Independentemente de Musk ter sucesso no corte total de 2 biliões de dólares,
o seu novo departamento irá quase certamente prosseguir com cortes massivos em muitos
programas de redes de segurança social, incluindo cuidados de saúde, segurança alimentar,
habitação, reforma, iniciativas de transição climática geradoras de emprego e educação pública.
O presidente Trump já começou a ordenar o congelamento da ajuda federal crucial aos governos
estaduais e locais, e do financiamento para pesquisas científicas e agências sem fins lucrativos

206
que prestam serviços ao povo americano, deixando milhares de membros da UE sem saber se
receberão seu próximo salário – ou qualquer salário. – a partir desta semana. Todas essas
medidas resultarão na demissão de trabalhadores e na redução dos padrões de vida de muitos
famílias da classe trabalhadora nos EUA.

A política externa imperialista de Trump, com as suas ameaças de tarifas e anexações,


também está a tornar o mundo um lugar mais perigoso para todos os trabalhadores, à medida
que aumenta as tensões não só com a China, mas também com a União Europeia, Grã-Bretanha,
Canadá, México, Colômbia, e muitos outros.”

Seja em políticas domésticas ou de caráter externo, os super-ricos - sejam países ou


famílias - terão como objetivo primordial a proteção da sua fortuna, tornando toda e qualquer
discussão que vise garantia de direitos inúteis. As áreas do Estado que provêm direitos não são
lucrativas, podem até ser rentáveis a longo prazo, mas não geram dinheiro, não são mercadoria
- pelo menos não em sua visão integrativa e não financeirizada. Daqui pra frente veremos uma
governança pró capital como nunca vimos - abertamente - antes, como nos mostra o People’s
World.

“Capitalismo monopolista de estado - versão em esteroides

A administração Trump está a dar à classe capitalista o controle pessoal sobre os


poderes econômicos do Estado, que utilizará para manipular taxas de juro, tarifas, impostos,
regulamentações (e desregulamentações) e todas as outras ferramentas do governo, com o
objetivo de de enriquecer às custas de todos nós. É o capitalismo monopolista estatal, agora
engordado com esteroides. Mas, ao contrário do típico estado capitalista, que intervém na
economia para estabilizar o sistema em nome de toda a burguesia, o governo Trump foi
capturado por setores específicos – alta tecnologia (que se deslocou acentuadamente para a
direita), capital criptográfico e especulativo, combustíveis fósseis, grandes segmentos
financeiros e bancários, partes da indústria farmacêutica e “pequeno capital”, como empresas
industriais e independentes de nível médio sediadas nos EUA.”

As previsões podem estar erradas, claro, mas de maneira geral o segundo mandato de
Trump está caminhando para uma oligarquia capitalista que governará sua nação e todas as
relações externas de maneira pró-riqueza, posicionando-se contra medidas de redistribuição de
renda e influência. Essas medidas não serão capazes de lidar com os 7 riscos desta seção,
provavelmente - caso nada venha a mudar - gerando mais tensões e polarizações sociais durante
os próximos 4 anos de mandato.

Em contrapartida, e numa mobilização que visa avanços ao mesmo tempo que lida com
possíveis retardos do novo governo, e que busca novos caminhos passíveis de lidar com a crise
multifacetada, a SCO internacional publicou interessantes chamados de justiça econômica do
primeiro mês do ano.

A OXFAM International publicou um relatório intitulado “Takers not Makers: The unjust
poverty and unearned wealth of colonialism” no qual expõe as origens extrativistas e coloniais -
no sentido de práticas, mais do que um marcador temporal - das grandes fortunas atuais. A
organização citou como pilares deste sistema o BM, o FMI, o Conselho de Segurança, os bancos
privados e as multinacionais, expondo os fluxos fiscais ilegais e apontando a dívida externa como
produto de um sistema financeiro permeado por práticas de controle. O documento propõe
ações concretas para “descolonizar a nossa economia e destronar os super-ricos” e aponta o

207
ano de 2025 como palco perfeito para essa movimentação, uma vez que neste se completarão
70 anos da Conferência de Bandung e suas promessas de uma Nova Ordem Internacional.

“Para contribuir para uma mudança sistémica significativa, os governos devem:

• Reduzir radicalmente a desigualdade – definindo metas nacionais para fazê-lo. Fim das
riquezas exorbitantes. Comprometer-se com uma meta de desigualdade global que reduza
drasticamente a desigualdade entre o Norte Global e o Sul Global; por exemplo, os rendimentos
dos 10% mais ricos não devem ser superiores aos 40% mais pobres a nível mundial. Definir metas
semelhante com prazo determinado para reduzir a desigualdade econômica nacional, visando
que a renda total do 10% mais ricos não seja superior à renda total dos 40% mais pobres,
conhecida como Palma de 1,98

• Reparar as feridas do colonialismo histórico. Os antigos governos coloniais devem


reconhecer

e pedir desculpas formalmente por toda a gama de crimes cometidos sob o colonialismo
e garantir que estes entrem na memória pública. Reparações às vítimas devem ser obrigadas a
garantir a restituição, proporcionar satisfação, compensar danos incorridos, garantir a
reabilitação e prevenir futuros abusos. O custo das reparações deve ser providos pelos mais
ricos, que mais se beneficiaram do colonialismo.

• Acabar com os sistemas do colonialismo moderno. O FMI, o Banco Mundial, a ONU e


outras entidades globais, as instituições devem mudar completamente a sua governança para
acabar com o domínio formal e informal do Norte Global e os interesses de suas elites ricas e de
suas corporações. O domínio de nações e corporações ricas sobre os mercados financeiros e as
regras comerciais deve ser terminado. Em seu lugar, é necessário um novo sistema que promova
a soberania econômica para os governos do Sul Global e permita o acesso a salários justos e
práticas trabalhistas para todos os trabalhadores. Políticas de livre comércio e acordos
comerciais desiguais devem ser revogados.

• Tributar os mais ricos para acabar com a riqueza extrema. Uma política de imposto
global deveria enquadrar-se numa nova convenção fiscal da ONU e facilitar o pagamento de
impostos mais elevados pelas pessoas e corporações mais ricas a radicalmente reduzir a
desigualdade e acabar com a riqueza extrema.

• Promover a cooperação e a solidariedade Sul-Sul. Os governos do Sul Global devem


formar alianças e acordos regionais que priorizam a igualdade, trocas mutuamente benéficas;
promover independência económica; e reduzir a dependência às antigas potências coloniais ou
economias do Norte Global. Coletivamente, eles deveriam exigir reformas em instituições
internacionais como o Banco Mundial e o FMI, e promover o desenvolvimento coletivo
compartilhando conhecimento, tecnologia e recursos para apoiar o desenvolvimento
sustentável e resistir aos sistemas globais exploradores. Ao mesmo tempo, os governos devem
fortalecer os serviços públicos e implementar reformas agrárias para garantir o acesso à terra.

• Acabar com o colonialismo formal em curso em todas as formas. Os territórios não


autônomos restantes devem ser apoiados para concretizar os seus direitos à igualdade de
direitos e autodeterminação, em conformidade com o artigo 1.º, n.º 2 da Carta da ONU e da
Declaração da ONU sobre a Concessão de Independência aos Países Coloniais e povos.”

208
Junto a isso temos campanhas de cancelamento da dívida, pela Debt Justice UK e a
atenção da SCO com a atenção da SCO e dos acadêmicos-ativistas da área com a retomada dos
diálogos da UN Tax Convention - que será analisada na próxima quinzena.

Declínio na Saúde e no Bem-estar (20)

Adentrando um pouco o relatório, encontramos a saúde como risco, ocupando o lugar


20. Não necessariamente a saúde, mas o declínio do bem-estar populacional. Aqui podemos
analisar como “declínio” a falta de saúde em si e, sendo assim, a presença da enfermidade, o
que faz todo sentido tendo em vista a constante ameaça da próxima grande pandemia e dos
avisos constantes sobre como conflitos alimentam a AMR; assim como também podemos ler
esse risco como o declínio da Saúde em questões de oferta e acesso, a privatização da saúde,
sua financeirização e segmentação aos pagantes.

Esta última questão foi trazida pelo People’s Health Dispatch no seu último boletim do
ano, uma recapitulação de 2024 e o que ele representou para a saúde pública e como bem
comum ao redor do mundo. “Another year of struggle and resilience in global health”, traz os
horrores vividos por trabalhadores da saúde em Gaza, assim como a super exploração dos
seguros privados de saúde nos Estados Unidos, as condições de trabalho insalubres das
enfermeiras no Brasil e como a prática da privatização avançou sem grandes barreiras no último
ano, temos também hospitais franceses gastando fortunas com aluguel e tendo que pagar
senhorios privados, estressando ainda mais o sistema de saúde público francês e mostrando a
realidade da crise dos trabalhadores de saúde na Europa, movidos pelas diferenças de salário
entre trabalhadores do setor privado e público.

209
Sul Global sob nova direção
Global South under new leadership

Regina Ungerer
Erica Kastrup
Tiago Nery

Abstract: The most important event for UNOSSC in 2025 will be the 22nd session of the High-Level
Committee on South-South Cooperation, scheduled for May 27 to 30, 2025. This committee is
the main policymaking body on South-South Cooperation within the United Nations system,
convening every two years to assess progress on the Buenos Aires Plan of Action (BAPA), BAPA40,
the new South-South Cooperation strategy, and the Nairobi outcome document from the United
Nations High-Level Conference on South-South Cooperation.

Brazil's contributions to this report highlight South-South cooperation projects related to


cotton. As one of the world's largest producers of sustainable cotton, Brazil holds a significant
position in the global market, and its cooperation efforts extend to both Africa and Latin America.

On January 13, 2025, the Republic of Iraq assumed the pro tempore presidency of the G-
77 and China, outlining nine key priorities that encompass the 2030 Agenda, climate change,
economic and financial issues facing developing countries, technology transfer, global security,
and the strengthening of multilateralism. During their inaugural participation, they addressed
the informal meeting of the UN General Assembly (UNGA) regarding the priorities set by the
President of the General Assembly for 2025. Under the theme “Unity in Diversity,” the UNGA
President emphasized the year's major events aimed at tackling urgent challenges, which will
serve as pivotal moments for fostering change. The Non-Aligned Movement (NAM), led by
Uganda, will celebrate its 70th anniversary in 2025, while the Non-Aligned Youth Movement
continues to promote the movement's history.

The South Centre published four articles on topics ranging from access to essential
medicines, emphasizing the role of intellectual property rights; the TRIPS agreement in light of
European Union law; and unilateral coercive measures in multinational companies and financial
institutions.

Keywords: South-South Cooperation. UNOSSC. G-77 and China. Non-Aligned Movement. South
Centre.

Resumen: El principal evento de la UNOSSC en 2025 será la 22ª sesión del Comité de Alto Nivel
sobre Cooperación Sur-Sur que se celebrará entre el 27 y el 30 de mayo de 2025. Este es el
principal órgano de formulación de políticas sobre Cooperación Sur-Sur en Naciones Unidas y se
reúne cada dos años para revisar los avances del PABA, el PABA+40, la nueva estrategia de
Cooperación Sur-Sur y el documento final de Nairobi del Alto. Nivel de las Naciones Unidas sobre
cooperación Sur-Sur.

En cuanto a la cooperación de Brasil, el informe profundizó en los proyectos de


cooperación Sur-Sur en torno al algodón, ya que Brasil es uno de los mayores productores de
algodón sostenible del mundo y ocupa una posición destacada en el mercado global y esta
cooperación se extiende a África y América Latina.

210
El 13 de enero de 2025, la República de Irak asumió la presidencia pro-tempore del G-77
y China, destacando 9 prioridades de la Agenda 2030, el cambio climático, las cuestiones
económicas y financieras de los países en desarrollo, la transferencia de tecnología para la
seguridad global y el fortalecimiento multilateralismo. En su primera participación, hablaron en
la reunión informal de la AGNU sobre las prioridades del presidente de la Asamblea General para
2025. Bajo el tema “Unidad en la Diversidad”, el presidente de la AGNU destacó los principales
acontecimientos del año para afrontar los desafíos más urgentes que estos serán momentos
importantes para generar impulso para el cambio.

El MNA permanece bajo mando de Uganda y celebra 70 años en 2025 y el Movimiento


Juvenil No Alineado continúa dando a conocer la historia del movimiento.

El Centro Sul publicó cuatro artículos sobre temas que van desde el acceso a
medicamentos esenciales, destacando el papel de los derechos de propiedad intelectual; el
acuerdo ADPIC a la luz de la legislación de la Unión Europea y las medidas coercitivas unilaterales
en empresas multinacionales e instituciones financieras.

Palabras clave: Cooperación Sur-Sur. ONUSC. G-77 y China. Movimiento de Países No Alineados.
Centro Sur.

Resumo: O principal evento do UNOSSC em 2025 será a 22ª sessão do Comitê de Alto Nível
sobre Cooperação Sul-Sul que será realizada entre 27 a 30 de maio de 2025. Este é o principal
órgão de formulação de políticas sobre Cooperação Sul-Sul no sistema das Nações Unidas e se
reúne a cada dois anos para revisar o progresso do BAPA, BAPA+40, a nova estratégia de
Cooperação Sul-Sul e o documento final de Nairóbi da Conferência de Alto Nível das Nações
Unidas sobre Cooperação Sul-Sul.

Quanto à cooperação do Brasil, o informe se aprofundou nos projetos de cooperação


Sul-Sul em torno do algodão já que o Brasil é um dos maiores produtores de algodão sustentável
do mundo, ocupando uma posição de destaque no mercado global e esta cooperação se estenda
na África e América Latina.

No dia 13 de janeiro de 2025, a República do Iraque assumiu a presidência pró-tempore


do G-77 e da China destacando 9 prioridades desde a Agenda 2030, mudanças climáticas,
questões econômicas e financeiras dos países em desenvolvimento, transferência de tecnologia
até a segurança mundial e o fortalecimento do multilateralismo. Em sua primeira participação,
se manifestaram na reunião informal da AGNU sobre as prioridades do Presidente da
Assembleia Geral para 2025. Sob o tema “Unidade na Diversidade”, o Presidente da AGNU
destacou os principais eventos do ano para enfrentar os desafios mais urgentes e que serão
momentos importantes para criar um impulso para mudança.

O MNA segue sob comando de Uganda e comemora 70 anos em 2025 e o Movimento


Jovem dos não alinhados continuam divulgando a história do movimento.

O Centro Sul publicou quatro artigos com temas desde o acesso a medicamentos
essenciais, enfatizando o papel dos direitos de propriedade intelectual; o acordo TRIPS à luz do
direito da União Europeia e as medidas coercitivas unilaterais em empresas multinacionais e
instituições financeiras.

Palavras-chave: Cooperação Sul-Sul. UNOSSC. G-77 e China. Movimento dos Não-Alinhados.


Centro Sul.

211
Escritório das Nações Unidas para a Cooperação Sul-Sul (UNOSSC)

O Escritório das Nações Unidas para a Cooperação Sul-Sul promove, coordena e apoia a
cooperação Sul-Sul e triangular globalmente e dentro do sistema das Nações Unidas, incluindo:
1) Política e Apoio Intergovernamental; 2) Desenvolvimento de capacidades; 3) Cocriação e
Gestão do Conhecimento; 4) Gestão do Fundo Fiduciário Sul-Sul. O UNOSSC atua como uma
plataforma de compartilhamento de recursos onde parceiros do Sul Global se conectam
buscando soluções e explorando oportunidades de financiamento. Também conecta governos,
especialistas e grupos de reflexão para garantir que as perspectivas do Sul sejam incluídas nos
diálogos políticos.

Destaques do UNOSSC

Comitê de Alto Nível sobre Cooperação Sul-Sul – 22ª Sessão – 27 a 30 de maio de 2025

A 22ª sessão do Comitê de Alto Nível sobre Cooperação Sul-Sul será realizada de 27 a 30
de maio de 2025. Sendo o principal órgão de formulação de políticas sobre Cooperação Sul-Sul
no sistema das Nações Unidas e sendo um órgão subsidiário da Assembleia Geral da ONU
(AGNU), o Comitê se reúne a cada dois anos para:

1) Revisar o progresso alcançado na implementação do Plano de Ação de Buenos Aires para a


Promoção e Implementação da Cooperação Técnica entre Países em Desenvolvimento (BAPA);

2) Revisar a nova Estratégia para a Cooperação Sul-Sul;

3) Revisar o documento Final de Nairóbi da Conferência de Alto Nível das Nações Unidas sobre
Cooperação Sul-Sul;

4) Revisar o documento Final de Buenos Aires da Segunda Conferência de Alto Nível das Nações
Unidas sobre Cooperação Sul-Sul (BAPA + 40).

A Reunião preparatória para a 22ª Sessão do Comitê de Alto Nível sobre Cooperação
Sul-Sul será realizada em 24 de abril de 2025 para eleger a mesa diretora e adotar a agenda.

O UNOSSC já começou as reuniões informais com todos os grupos regionais, e outros,


sobre as prioridades e tendências emergentes na cooperação Sul-Sul e triangular que podem
contribuir para os relatórios do Comitê e sua discussão temática. Os Estados-membros estão
atualmente revisando temas potenciais e buscando consenso entre eles.

Em dezembro de 2024, o Bureau do Comitê de Alto Nível se reuniu para começar a


discutir os preparativos para a 22ª sessão, incluindo os temas prioritários para a reunião, tais
como revitalização do financiamento do desenvolvimento e o papel da cooperação Sul-Sul e
triangular; e o impulsionamento da Ciência, Tecnologia e Inovação, por meio da cooperação Sul-
Sul e triangular para o desenvolvimento sustentável.

212
Podem participar das reuniões do Comitê de Alto Nível de Cooperação Sul-Sul, os
representantes dos Estados-Membros das Nações Unidas e observadores, tais como: agências
especializadas da ONU, fundos e programas; comissões regionais; e outras organizações
intergovernamentais sub-regionais, regionais e inter-regionais, bem como organizações não
governamentais credenciadas.

Mais informações nos próximos informes.

As principais notícias do UNOSSC em janeiro, encontram-se no Boletim mensal - South-


South Monthly, Janeiro 2025

Basta clicar na figura abaixo, ou em cada destaque para entrar no Boletim.

Momento ADELANTE: O papel das


organizações multilaterais no avanço da
agenda de cooperação triangular

Crescimento que beneficia a todos:


integração regional e global ancorada
nos princípios da cooperação Sul-Sul e
triangular

Alavancando a Cooperação Sul-Sul e


Triangular na Moldagem do Futuro
Digital Inclusivo e Sustentável de África

Fundos Fiduciários Sul-Sul:


Potencializando o Progresso e Soluções
de Energia Limpa

Fundo Índia-ONU: Promovendo a


educação inclusiva na Nicarágua por
meio da cooperação Sul-Sul

Fundo Índia-ONU: Cerimônia de entrega


de sistemas solares de purificação de
água no estado de Chuuk, Micronésia

Fundo IBAS: Missão Técnica em Angola


Avança Práticas Inovadoras Sul-Sul em
Saneamento e Gestão de Resíduos

Jovens e estudantes do Sul Global


apresentaram projetos ecológicos
viáveis para suas comunidades

O Desafio de Inovação 2024 incentiva o


desenvolvimento de soluções inovadoras por meio de um processo de seleção competitivo, com
foco nos principais desafios do desenvolvimento sustentável

Para ler o Boletim completo, clique aqui

213
As principais notícias do final de 2024 encontram-se no Boletim mensal - South-South
Monthly, Dezembro de 2024

Basta clicar na figura abaixo, ou em cada destaque para entrar no Boletim.

Cooperação Sul-Sul em destaque na


preparação para a 4ª Conferência
Internacional sobre Financiamento
para o Desenvolvimento

COP16: A desertificação afeta


desproporcionalmente as populações
vulneráveis do Sul

Ásia-Pacífico: A cooperação Sul-Sul e


triangular pode impulsionar e
transformar o financiamento para o
desenvolvimento

O Instituto de Pesquisa de Inteligência


Artificial de Xangai está apoiando
parcerias impactantes com países em
desenvolvimento

Diálogo sobre políticas na África


destaca parcerias Sul-Sul e
triangulares para melhorar o ensino
superior

Fundo Fiduciário Pérez-Guerrero para


Cooperação Sul-Sul (PGTF) 2024 Visão
geral do impacto do projeto Sul-Sul

Fundo IBAS: Conselho de


Administração aprova novos projetos
de desenvolvimento na Libéria e no
Gabão

Fundo IBSA: Belize está capacitando


comunidades rurais com apoio das
Nações Unidas

Fundo IBAS: Programa de


Alimentação Escolar Destaca Conexão
Entre Agricultura Familiar e Alimentação Escolar

India-Fundo das Nações Unidas: Entrega do Centro de Cuidados Diários nos Estados Federados
da Micronésia

Para ler o Boletim completo, clique aqui

214
O Brasil na cooperação Sul-Sul: o caso do algodão

Nos últimos dois meses, a Agência Brasileira de Cooperação (ABC) divulgou uma série
de informações sobre projetos de cooperação Sul-Sul em torno do algodão. Tradicionalmente,
agricultura e saúde são assuntos importantes no diálogo internacional brasileiro e constituem
instrumentos para o exercício do soft power nacional. Com o crescimento do tema da
sustentabilidade dentro da agenda da política externa brasileira, os projetos em torno do
algodão ganharam espaço no noticiário de atividades de cooperação técnica internacional do
país, já que atualmente o Brasil se destaca na produção mundial de Algodão sustentável131.
Atualmente, o algodão é a fibra têxtil natural mais usada no mundo e representa um setor que
responde por cerca de 250 milhões de empregos diretos e indiretos no mundo132.

Com atividades na África e América Latina, projetos que tem como objeto a
cotonicultura parecem conformar a maior carteira de projetos de cooperação internacional para
o desenvolvimento do Brasil atualmente. A Agência Brasileira de Cooperação e o Instituto
Brasileiro do Algodão são as principais instituições desenvolvedoras dos projetos, que contam
também com a participação da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e de
outras instituições nacionais como universidades e institutos regionais. A cooperação
internacional brasileira em torno do tema segue a orientação nacional de compartilhar políticas
nacionais bem-sucedidas com países parceiros por meio da cooperação Sul-Sul

No início dos anos 2000, o Brasil se tornou referência em tecnologias de produção de


algodão tropical. Foram fundamentais para esse sucesso o investimento em ciência, tecnologia
e inovação e a expansão da produção para o cerrado, especialmente nos estados de Mato
Grosso, Bahia e Goiás. A adaptação de tecnologias agrícolas ao bioma, como o melhoramento
genético e desenvolvimento de sementes tolerantes ao clima tropical e a correção do solo
significaram que o país passava a desenvolver tecnologias de ponta, como também o plantio
direto, a irrigação eficiente e o manejo integrado de pragas133. O país mecanizou a colheita,
reduziu custos, aumentou a produtividade e passou a disputar espaço no mercado internacional
do algodão, e tal desenvolvimento despertou o interesse de nações africanas e latino-
americanas que enfrentavam desafios semelhantes, como clima, solo e condições
socioeconômicas.

A participação brasileira no comercio internacional do algodão provocou um conflito de


interesses entre Brasil e EUA na Organização Mundial do Comercio (OMC). No final dos anos de
1990, o programa Norte americano de crédito e os subsídios aos consumidores e aos
exportadores de algodão foram responsáveis pela queda dos preços internacionais, o que
causou prejuízo à produção brasileira. Em 2002, o Brasil contestou tal política norte americana
na OMC, abrindo um processo contra os EUA. Em 2003, Benin, Burkina Faso, Chade e Mali, países
africanos cujas economias eram dependentes do algodão, também contestaram os subsídios
dos EUA na OMC, se somando à posição do Brasil. Esse processo africano ficou conhecido como
Iniciativa do Algodão e a aliança dos países como “Cotton-4”134.

Em 2005, o Órgão de Solução de Controvérsias (OSC) da Organização reconheceu que o


programa federal do governo americano beneficiava os produtores locais e prejudicava outros
países, deliberando por sua ilegalidade. Em 2009, o Brasil obteve vitória na OMC, podendo

131
Cotonicultura brasileira é campeã de produtividade sem irrigação
132
Brasil investe em algodão com identidade latino-americana
133
Manejo agroecológico de insetos-praga do algodoeiro
134
Cooperação técnica brasileira na área de algodão

215
retaliar produtos norte-americanos. Na iminência de uma retaliação por parte do governo
brasileiro, os Estados Unidos resolveram firmar um acordo de compensação. Em 2010, foi
negociada a proposta de transferência de US$ 147,3 milhões anuais para ser destinado ao
Instituto Brasileiro do Algodão, instituição criada para gerir os recursos provenientes desse
acordo. Desde então, o objetivo deste fundo foi promover e fortalecer a cotonicultura brasileira,
impulsionando um importante desenvolvimento deste setor no Brasil135136. Na década de 2010,
o Brasil se consolidou como um dos maiores exportadores mundiais do algodão, e o produto
nacional se destacou por sua qualidade e sustentabilidade.

Cooperação Brasileira com a África

A cooperação brasileira em algodão na África iniciou em 2006 com um programa de


Apoio ao Desenvolvimento do Setor Algodoeiro dos Países do C4 (Benin, Burquina Faso, Chade,
Mali), denominado "Projeto Cotton-4".

No primeiro ano, técnicos brasileiros visitaram os quatro países e instituições brasileiras


receberam visitas de contrapartes africanas. No ano seguinte, foram negociados formatos e
modelos de atividades e, devido ao seu caráter regional envolvendo quatro países, o projeto e
seus respectivos instrumentos foram firmados sob a égide do Acordo de Cooperação Técnica
entre o Governo Brasileiro e a União Africana em 2007. Até julho de 2012, o Brasil implementou
essa iniciativa com recursos próprios.

Com a criação do Instituto Brasileiro do Algodão (IBA) em 2010, e os recursos oriundos


do contencioso com os EUA, a cooperação foi impulsionada. O IBA e o Itamaraty assinaram um
Memorando de Entendimento pelo qual o IBA se comprometia a destinar 10% dos recursos
disponibilizados pelos EUA para o financiamento de ações de assistência técnica e de
capacitação de recursos humanos relacionadas à produção de algodão, em proveito dos países
produtores na América Latina e na África Subsaariana. Foi o início da expansão do projeto para
outros países e para a região latino-americana137.

No primeiro período desta fase de uma cooperação robusta (2009-2013), foram


realizadas, junto aos países do Cotton-4, atividades de transferência de técnicas e metodologias,
desenvolvimento de cursos e materiais didáticos e técnicos e ações de incentivo à pesquisa e a
difusão de técnicas comprovadas e validadas em benefício da população rural. Em 2012, foi
negociado o projeto BRA2012/002, conhecido como “Cotton-4+Togo”, para o desenvolvimento
da cultura do algodão em países da África ocidental138.

Em 2014, a cooperação em cotonicultura foi expandida para as bacias dos rios Shire e
Zambeze no Malawi e em Moçambique, por meio de uma parceria entre a ABC, IBA, Embrapa e
o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Essa iniciativa foi denominada
projeto Cotton Shire Zambeze. Uma avaliação deste projeto divulgada em 2022 identificou
grandes benefícios aos produtores locais139.

Em 2016, as inciativas foram expandidas para a bacia do Rio Victoria envolvendo Quênia,
Tanzânia e Burundi por meio do projeto Cotton Victoria. No Brasil, o projeto é desenvolvido pela

135
O contencioso do algodão: conquista histórica em xeque
136
O Contencioso Brasil X EUA do Algodão na Organização Mundial do Comércio
137
Cooperação técnica brasileira na área de algodão
138
Fortalecimento tecnológico e difusão de boas práticas agrícolas para o algodão em países do Cotton 4
e no Togo
139
Malawi - Projeto Cotton Shire-Zambeze

216
Universidade Federal de Lavras, referência nacional em Ciências Agronômicas e em
melhoramento da cultura do algodão, e apoio do IBA. O propósito é ampliar a capacidade de
utilização, tanto das instituições como dos recursos humanos, de tecnologias mais avançadas
para a produção do algodão, respeitando-se as particularidades locais. As atividades são
desenvolvidas em conjunto com as organizações de pesquisa e coexecutoras locais, incluem
capacitação de técnicos e estão voltadas para a sustentabilidade econômica da empreitada e da
cadeia produtiva do algodão em cada país parceiro.

Outros países que foram incluídos em outros momentos na cooperação técnica em


torno do Algodão são Zimbábue e Senegal. Em 2024, o projeto algodão começou a ser expandido
para a Zâmbia. Em março de 2024, a ABC assinou o projeto "Fortalecimento da cadeia de valor
do algodão na Zâmbia”, que deverá contribuir para o desenvolvimento socioeconômico do país
africano, chegando a atingir cerca de 300.000 agricultores familiares. De 3 a 10 de dezembro de
2024, ocorreu a primeira reunião do Comitê Gestor da iniciativa140.

Atualmente na África, são estas cinco iniciativas de cooperação técnica em torno do


algodão em andamento: Cotton-4 + Togo, Cotton Shire Zambeze, Cotton Victoria, Cotton
Zâmbia, Cotton Zimbábue que, juntas, envolvem onze países: Benin, Burkina Faso, Chade, Mali,
Malawi, Moçambique, Quênia, Tanzânia, Burundi, Zâmbia, Zimbábue e Senegal.

Nos dias 12 e 13 de dezembro de 2024, durante o III Comitê Gestor


do Projeto “Cotton Zimbábue”, ficou definido a extensão da parceria
Brasil/Zimbábue até 2027 adicionando novas ações, como
treinamentos, intercâmbios e a compra de equipamentos para
promover tecnologias agrícolas brasileiras para superar desafios
locais, como a escassez de água, fortalecendo o algodão como um
pilar da segurança alimentar e econômica do Zimbábue.

Extensão do projeto Algodão no Zimbábue até 2027

Cooperação Brasileira com a América Latina

Na América Latina, as inciativas começaram em 2010, quando a ABC, em parceria com


a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e a Empresa Brasileira
de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), no projeto+ALgodão (a referência à América Latina – AL
– fica destacada com as iniciais do algodão, em letras maiúsculas)141.

O objetivo era promover o desenvolvimento sustentável da cadeia do algodão, com foco


em pequenos agricultores, melhorando a produtividade, a qualidade do algodão e a renda dos
produtores nos países parceiros. Nos anos seguintes, a iniciativa foi se expandindo e
consolidando sua orientação à adoção de práticas sustentáveis, como o uso de tecnologias de
baixo impacto ambiental e a promoção da agricultura familiar. Atualmente, o projeto envolve
os governos de Colômbia, Peru, Equador, Bolívia, Paraguai, Argentina, Haiti, além do Brasil e da
FAO.

Nos últimos anos, a cooperação tem se concentrado ainda mais em práticas


sustentáveis, como o uso de sementes melhoradas, manejo integrado de pragas e tecnologias

140
Projeto “Cotton Zâmbia” avança com instalação de Unidade Técnica Demonstrativa e primeira reunião
do Comitê Gestor
141
Brasil investe em algodão com identidade Latino-Americana

217
de irrigação eficientes. Tem também promovido a inclusão de gênero, capacitando mulheres
produtoras de algodão e fortalecendo sua participação na cadeia produtiva.

Desde 2017, o programa +ALgodão tem trabalhado na Colômbia com o uso de técnicas
utilizadas na agricultura familiar brasileira como substituição de agrotóxico por biofertilizante,
sistema de irrigação que não desperdiça água e rotação de culturas. Isso tem reduzido os custos
da produção para os pequenos produtores colombianos.

Outro exemplo é na região de Tolima, em um vale da Cordilheira dos Andes, onde


mulheres indígenas foram selecionadas para participar de capacitações de cultivo oferecias
gratuitamente pelo projeto142.

A cooperação em cotonicultura é um exemplo de como o Brasil utiliza os ganhos de seus


investimentos em ciência, pesquisa e desenvolvimento tecnológico e políticas públicas nacionais
para contribuir para o desenvolvimento sustentável do Sul global.

Últimos destaques da Cooperação do Brasil em torno dos projetos de cotonicultura de


dezembro de 202, e janeiro de 2025

Cooperação no Senegal: sustentabilidade e inovação no


cultivo do algodão

Um curso oferecido por especialistas da Universidade


Federal de Lavras (UFLA) de Minas Gerais, reuniu cerca de 30
profissionais do setor algodoeiro do Senegal, para uma
combinação de aulas teóricas e práticas.

O foco do treinamento foi apresentar tecnologias e


estratégias para melhorar a infiltração de água no solo, reduzir o escoamento superficial e
aumentar o armazenamento hídrico. Foram abordadas técnicas essenciais para promover a
proteção e sustentabilidade do solo, como o uso de cobertura vegetal, plantio em nível, preparo
adequado do solo e métodos de semeadura do algodão.

Saiba mais

Agrosavia, uma entidade de ciência, tecnologia e inovação


da Colômbia, parceiro do projeto+ALgodão, compartilhou
sua experiência no combate ao bicudo, a maior praga do
cultivo do algodão.

Com inovação impulsiona a produtividade sustentável e


apoia os agricultores.

Saiba mais.

142
Brasil investe em algodão com identidade Latino-Americana

218
Em Tolima, na Colômbia, o projeto +ALgodão, se
uniu com a universidade para revitalizar o algodão no
país.

Depoimento de um agricultor parceiro sobre algumas


atividades e benefícios do projeto.

Saiba mais.

O projeto +ALgodão, tem apoiado o resgate da


confecção algodoeira, incorporando a produção local
de fios por meio da cooperação, como uma forma de
agregar valor à cadeia do algodão na Colômbia

Saiba mais

Dentro do Projeto Cotton Victoria, profissionais africanos


vieram ao Brasil para uma missão de treinamento voltada para
o fortalecimento da produção de algodão em regiões
semiáridas.

A delegação de especialistas esteve no Centro de Difusão de


Tecnologias Algodoeiras de Catuti, no norte de Minas Gerais,
onde durante aulas teóricas e práticas discutiram os desafios e
soluções para a produção de algodão, conservação do solo e da
água, manejo nutricional e fitossanitário, tecnologias de
irrigação e avaliação da produtividade

Saiba mais.

Fortalecimento da capacitação de jovens


Colombianos dentro do projeto+ALgodão, que
aprendem agricultura de precisão com tecnologia
sustentável.

Assista ao vídeo.

O projeto "Integração Africana para o


Melhoramento Genético Sustentável do Algodão",
uma iniciativa de cooperação internacional
coordenada pela ABC está promovendo
transformações importantes na cotonicultura de 15
países africanos.

O projeto reúne produtores, pesquisadores e


representantes do setor algodoeiro dos países
africanos e do Brasil, com o objetivo de criar uma rede sustentável de intercâmbio de material

219
genético de cerca de 40 variedades de algodão. Ao longo dos 36 meses, o projeto prevê a
formação de um banco de germoplasma143.

Confira o vídeo e saiba mais sobre o projeto.

Neste vídeo, encontra-se a história do algodão na


América Latina, uma fibra que conecta passado,
presente e, especialmente, mulheres artesãs. Em
outubro de 2023, o desfile "América Latina se Veste
de Algodão" em Brasília lançou a primeira coleção de
roupas de algodão da região, dentro do projeto
+ALgodão.

Conforme descrito acima neste informe, o projeto


+ALgodão, fortalece a cadeia produtiva do algodão na
América Latina e no Caribe, gerando desenvolvimento
social e econômico, com foco na valorização do trabalho feminino e do artesanato tradicional.

Assista ao Vídeo

Reportagem do programa Caminhos da Reportagem,


da TV Brasil sobre a iniciativa de Cooperação Sul-Sul
liderada pela ABC em parceria com a Embrapa, FAO e
o Ministério da Agricultura da Colômbia.

O projeto +Algodão beneficiou cerca de 2 mil


agricultores familiares e 1.800 profissionais,
aplicando técnicas brasileiras em 25 unidades piloto
entre 2017 e 2021, gerando renda e melhorando
condições de vida.

Assista ao Vídeo

Grupo do G-77

O G-77 é a maior organização intergovernamental de países em desenvolvimento dentro


das Nações Unidas e sua missão é permitir que os países do Sul Global se articulem e promovam
seus interesses econômicos coletivos e aumentem sua capacidade internacional de negociação
conjunta dentro do sistema das Nações Unidas.

O G-77 é uma estrutura institucional permanente que se desenvolveu gradualmente, o


que levou à criação de Capítulos com escritórios de ligação em Genebra (UNCTAD)144, Nairóbi
(UNEP)145, Paris (UNESCO)146, Roma (FAO/IFAD)147, Viena (UNIDO)148 e Washington (G-24)149.

143
Germoplasma é o conjunto de material genético que caracteriza uma espécie ou população
144
UNCTAD - Comércio de Desenvolvimento da ONU
145
UNEP - Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
146
UNESCO - Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura
147
FAO - Organização para a Alimentação e Agricultura e IFAD - Fundo Internacional para o
Desenvolvimento Agrícola
148
UNIDO - Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial
149
G-24 - Assuntos monetários internacionais e desenvolvimento

220
Em 2025, o Iraque detém a presidência pró tempore do G-77.

Destaques do G-77 em janeiro de 2025

No dia 13 de janeiro de 2025, foi realizada a cerimônia de transferência de cargo da


Presidência pró-tempore do G-77 e China. A República de Uganda passou o cargo para a
República do Iraque.

Falando na cerimônia de transferência de cargo, o Secretário-Geral da ONU, António


Guterres disse que "2025 deve ser o ano de cumprir as promessas aos países em
desenvolvimento".

António Guterres, ressaltou o período de conflitos que o mundo enfrenta, destacando a


violência de Gaza e os outros conflitos no Oriente Médio. Falou das dificuldades do Sahel à
Ucrânia. Destacou o período de desastres climáticos que afetam os países com ondas de calor
mortais, derretimento de geleiras, aumento das secas, elevação do nível do mar, inundações e
tempestades, ao mesmo tempo em que restringiam o espaço fiscal já limitado. Um período em
que os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável e o futuro de milhões de pessoas ao redor do
mundo estão em jogo.

Juntando sua voz às da maioria dos países do Sul Global, ele ressaltou que, de muitas
maneiras, os países em desenvolvimento receberam um acordo injusto, particularmente em
relação às finanças. Seu desenvolvimento tem sido adiado, repetidamente, devido a recursos
financeiros insuficientes e inacessíveis, juntamente com ciclos implacáveis de pagamento de
dívidas. Uma situação injusta também em relação ao apoio climático, onde os países são
privados dos recursos necessários para aumentar sua resiliência contra uma crise climática para
a qual contribuíram minimamente; e uma injusta falta de representação em órgãos decisórios
cruciais, que vão do sistema financeiro global à gestão de tecnologias inovadoras, incluindo o
próprio Conselho de Segurança da ONU.

O Secretário-Geral disse que os esforços devem ser intensificados em 2025 para que os
ODS sejam uma realidade para todas as pessoas em todos os lugares; para acabar com a pobreza
e a fome, transformar a educação e criar empregos, e possibilitar o acesso equitativo e acessível

221
à energia, tecnologia, finanças e mercados, elementos essenciais para que os países em
desenvolvimento prosperem; e para garantir que os países em desenvolvimento possam acessar
os recursos financeiros necessários para alimentar o desenvolvimento.

O Vice Primeiro-Ministro e Ministro das Relações Exteriores do Iraque, Fuad Hussein,


aceitou a presidência em nome de seu país e destacou as prioridades do Iraque para esta
presidência.

1. Alcançar objetivos de desenvolvimento sustentável

2. Abordar as mudanças climáticas e os desafios ambientais

3. Promover a cooperação Sul-Sul

4. Abordar desafios especiais

5. Abordar os desafios econômicos

6. Manter o multilateralismo

7. Abordar os desafios de segurança

8. Transferência de tecnologia

9. O aspecto social

O Ministro também enfatizou que nas últimas décadas, o G 77 e a China


desempenharam um papel ativo na promoção dos objetivos econômicos e sociais dos países em
desenvolvimento e contribuíram para o avanço de muitas iniciativas destinadas a fortalecer a
cooperação internacional e construir um sistema econômico global justo e inclusivo no qual os
países em desenvolvimento podem contribuir efetivamente. Por isso é importante a reforma da
estrutura financeira internacional, incluindo a reforma da governança das finanças e instituições
internacionais, e dos Bancos de Desenvolvimento Multilaterais (MDBs), especialmente o FMI e
o Banco Mundial, a fim de aumentar a voz dos países em desenvolvimento e sua representação
na tomada de decisões no nível econômico internacional e na governança econômica global.

Aproveitando a oportunidade, destacou a "visão Iraque 2030" como sendo uma


iniciativa ambiciosa focada em colocar as pessoas no centro do desenvolvimento para garantir
prosperidade para as gerações atuais e futuras. Ela visa transformar o Iraque em uma economia
diversificada e próspera e uma sociedade avançada e sustentável por meio do desenvolvimento
de infraestrutura, reformas econômicas e melhorias na educação e inovação. A visão busca
prosperidade abrangente para todos os cidadãos iraquianos.

Além disso, a "Estratégia Nacional para Proteção e Melhoria Ambiental (2024-2030)"


foi lançada para enfrentar desafios ambientais como mudanças climáticas, desertificação,
escassez de água e degradação, alinhando-se com as metas nacionais de desenvolvimento.

Na ocasião, o Embaixador Adonia Ayebare, Representante Permanente de Uganda junto


às Nações Unidas e presidente do G-77 e da China em 2024, declarou que Uganda se sentiu
honrada por presidir o G-77 pela primeira vez. Acreditando firmemente que o multilateralismo
continua sendo um mecanismo fundamental e crucial para abordar os desafios comuns do
Grupo. Uganda entregou a presidência do G-77 e China para a República do Iraque, tendo
certeza que o país continuará a liderar o grupo na defesa e promoção de todos os interesses
coletivos do G-77 e da China.

222
Lembrando do sucesso da 3ª Cúpula do Sul que foi um marco importante de sua
presidência, o Embaixador Ayebare falou da importância da cooperação internacional mútua e
genuína para o desenvolvimento de acordo com os princípios estabelecidos de unidade,
complementaridade, cooperação e solidariedade dos países em desenvolvimento e sua
determinação em lutar pelo desenvolvimento econômico e social, individual ou coletivo.

No decorrer da presidência de Uganda do G-77 e da China, o país se comprometeu a


promover ainda mais a implementação da Agenda 2030; as ações para lidar com as mudanças
climáticas e a perda de biodiversidade; o fortalecimento da cooperação tributária internacional;
o financiamento para o desenvolvimento; a luta contrafluxos financeiros ilícitos e fortalecimento
da cooperação digital, entre outros. E ele destacou alguns dos resultados que o grupo garantiu
para apoiar os países em desenvolvimento a lidar com os múltiplos desafios atuais, tais como:

1) O acordo sobre medidas para abordar a crescente lacuna de financiamento


enfrentada pelos países em desenvolvimento para atingir os ODS no Fórum sobre
Financiamento para o Desenvolvimento do Conselho Econômico e Social (ECOSOC),
em abril de 2024;

2) A Declaração Renovada para a Prosperidade Resiliente para apoiar os Pequenos


Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS) a abordar suas vulnerabilidades
únicas e particulares durante a 4ª Conferência Internacional dos SIDS;

3) Negociação coletiva para acelerar a implementação da Agenda 2030 e a realização


de todos os 17 ODS nos seis anos restantes durante o HLPF em julho de 2024;

4) Na 48ª Reunião Ministerial do G-77 e China em setembro de 2024, os membros


reconheceram que a Declaração Ministerial aborda os diversos desafios enfrentados
pelos países em desenvolvimento. Destaque para a erradicação da pobreza em
todas as suas formas, especialmente a pobreza extrema, que é o maior desafio
global e uma meta central da Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável.
Portanto, a erradicação da pobreza deve ser uma prioridade na agenda da ONU para
alcançar o desenvolvimento sustentável;

5) Consenso para as principais questões econômicas, financeiras, de desenvolvimento


e ambientais nas sessões da UNGA;

6) Na CoP29, o Grupo conseguiu uma decisão histórica sobre a Nova Meta


Quantificável Coletiva sobre Financiamento Climático;

7) Consenso sobre o Programa de Ação para os Países em Desenvolvimento Sem Litoral


(LLDCs) para a década de 2024-2034, que contém ações para apoiar os LLDCs a
abordar suas necessidades e desafios especiais de desenvolvimento;

8) Na Cúpula do Futuro, garantiram o acordo sobre as prioridades do Grupo, conforme


contido no Pacto do Futuro e no Pacto Digital Global

Desta forma, o G-77 e a China precisam dar continuidade e priorizar o acompanhamento


da implementação desses resultados e todos os resultados anteriores para garantir que todos
os compromissos acordados sejam cumpridos.

Para assistir ao vídeo da transmissão de cargo, clique aqui.

223
Para ler a Declaração do Embaixador Adonia Ayebare, representante permanente da
República de Uganda junto à ONU, clique aqui.

Para ler a Declaração de SE Dr. Fuad Hussein, Vice Primeiro Ministro e Ministro das
Relações Exteriores da República do Iraque, clique aqui.

E começando os trabalhos do Iraque frente ao G-77 e a China, a primeira participação


do país, foi no dia 14 de janeiro, durante a reunião informal da AGNU sobre as prioridades do
Presidente da Assembleia Geral para 2025

Agenda 2025: “Não podemos deixar passar as oportunidades”,


diz presidente da Assembleia da ONU, Philemon Yang.

Sob o tema “Unidade na Diversidade”, o Presidente Yang ressaltou a importância da


ação coletiva para enfrentar desafios globais urgentes e alcançar resultados concretos. Ele
delineou eventos significativos, incluindo a Reunião de Alto Nível para comemorar o 30º
aniversário do Programa Mundial de Ação para a Juventude150, a ser realizada de 8 a 10 de
agosto de 2025 em NY e a 2ª Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Social de 2025 (WSSD2)
que será realizada de 4 a 6 de novembro de 2025 em Doha no Catar.

Refletindo sobre esses marcos, o Presidente Yang destacou a 4ª Quarta Conferência


Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento, programada para julho em Sevilha
na Espanha, considerada como "crucial" para o financiamento dos ODS. Outras reuniões de Alto
Nível irão abordar as barreiras estruturais enfrentadas pelos países de renda média, incluindo
as discussões sobre ir além do PIB como a principal medida do progresso econômico.

O Diálogo Interativo de Alto Nível sobre Cultura e Desenvolvimento Sustentável e a


Reunião de Alto Nível sobre Tempestades de Areia e Poeira serão momentos importantes para
criar um impulso para a mudança.

O Presidente enfatizou a dedicação da ONU aos direitos humanos e à igualdade,


afirmando que sua missão é garantir que ninguém seja deixado para trás.

Ele anunciou uma 2ª Década Internacional para Pessoas de Descendência Africana e


planeja melhorar os direitos dos idosos e reformar as prisões, marcando o 10º aniversário das

150
Nota Conceitual do 30º aniversário do Programa Mundial de Ação para a Juventude

224
Regras Nelson Mandela, que promovem o tratamento humano dos prisioneiros e oferecerá, pela
3ª vez, o Prêmio Nelson Mandela em 2025.

O Presidente Yang destacou a importância de lutar pela igualdade de gênero e


incentivou a participação nos 16 Dias de Ativismo contra a Violência de Gênero,
comprometendo sua presidência com a promoção da igualdade de gênero e o empoderamento
das mulheres.

Além disso, o 25º aniversário da resolução 1325 do Conselho de Segurança se


concentrará em melhorar os papéis das mulheres na paz e na segurança.

O Sr. Yang também destacou a importância do desenvolvimento sustentável e da


transformação digital.

A 3ª Conferência dos Oceanos da ONU em junho se concentrará em apoiar "economias


azuis" e acelerar o progresso no ODS 14, que visa conservar e desenvolver um uso sustentável
dos oceanos, mares e recursos marinhos.

Enquanto isso, a Cúpula Mundial sobre a Sociedade da Informação se concentrará nas


divisões digitais, reforçadas pelo estabelecimento de um Painel Científico Internacional
Independente sobre Inteligência Artificial. Este painel deverá construir uma base de
conhecimento científico confiável, para fechar firmemente as divisões digitais e criar um
futuro digital livre, aberto e seguro para todos.

No dia 26 de junho, haverá uma reunião comemorativa da AGNU para celebrar o 80º
aniversário da Carta da ONU. E também estão em andamento, discussões para uma possível
Cúpula da ONU80 em setembro para celebrar ainda mais este marco.

E Philemon Yang apelou aos Estados-Membros para refletirem sobre a crise de liquidez
na ONU, alertando que as contribuições atrasadas e a retenção de contribuições podem
desencadear “uma crise de confiança nas Nações Unidas”.

Para ler a declaração do G-77 e da China nesta reunião da AGNU, clique aqui.

No dia 15 de janeiro de 2025, o Secretário Geral da ONU, António Guterrez apresentou


suas prioridades para 2025 e o G-77 e a China comentaram na sessão informativa.

De acordo com António Guterrez, os conflitos, as desigualdades, a crise climática e a


tecnologia entre os “males” que se espalham da caixa de Pandora moderna e que precisam ser
enfrentados por meio da aceleração e da transformação, orientadas em torno do Pacto para o
Futuro, cuja implementação será uma prioridade central em 2025.

Para promover a paz, que ele chamou de "a razão de ser" da ONU, o Secretário-Geral
pediu que os Estados-Membros cumpram com seus compromissos do Pacto para o Futuro por:

• - Priorizar a prevenção, mediação e resolução de conflitos, juntamente com a


construção da paz.
• - Fortalecer os esforços de manutenção da paz.
• - Apoiar a inclusão significativa de mulheres em processos políticos e de paz.

Ele enfatizou os compromissos com o desarmamento nuclear, novas estratégias para


eliminar armas químicas e biológicas e os esforços para evitar uma corrida armamentista no
espaço, bem como discussões sobre armas autônomas letais.

225
António Guterres também destacou a necessidade de entender como a corrida
armamentista de hoje afeta o desenvolvimento sustentável e as oportunidades deste ano para
alcançar avanços nos ODS são:

• A 4ª Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento


(FfD4),
• A 2ª Cúpula Mundial para o Desenvolvimento Social,
• A Cúpula do G20 sob a presidência da África do Sul,
• A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas no Brasil (CoP30),
• A 3ª Conferência das Nações Unidas sobre os Oceanos (UNOC3) e,

A 69ª sessão da Comissão sobre o Status das Mulheres (CSW69), também conhecida
como ‘Pequim Mais-30.

O Secretário-Geral insistiu para que os Estados-Membros enfrentem as desigualdades,


comprometendo-se com “políticas que promovam a equidade”. Ele pediu uma aceleração das
ações para alcançar os ODS nos cinco anos restantes até 2030, com foco em áreas de alto
impacto, como erradicação da pobreza, segurança alimentar, educação de qualidade para todos,
proteção social, cobertura universal de saúde (UHC), acesso à energia e digitalização, com uma
atenção especial à África.

Citando o Pacto para o Futuro em relação ao estímulo aos ODS, ele destacou que o
financiamento é essencial para fechar a lacuna de financiamento dos ODS, atualmente estimada
em US$ 4 trilhões por ano. Ele afirmou que o Pacto apela aos doadores para que cumpram os
compromissos de assistência oficial ao desenvolvimento (ODA) e para que o setor privado invista
no desenvolvimento sustentável.

Para ler todas as prioridades do Secretário Geral, assista ao vídeo ou leia aqui.

Em sua declaração, o G-77 e a China reconheceram os complexos desafios globais de


conflitos persistentes, mudanças climáticas, pobreza e outras questões que exigem ação
coordenada imediata. Eles reafirmaram a necessidade do multilateralismo inclusivo e da
cooperação internacional, vendo o Pacto para o Futuro como uma oportunidade fundamental
para fortalecer o papel da ONU.

O Grupo enfatizou o enfrentamento das causas dos conflitos e o apoio aos países em
desenvolvimento para alcançar o desenvolvimento sustentável. Eles destacaram os desafios
climáticos sem precedentes enfrentados em 2024, pedindo a implementação total das decisões
das conferências climáticas da ONU, particularmente a COP29.

Eles insistiram para que os países desenvolvidos cumpram seus compromissos de


financiamento climático e
aguardam a COP 30 no Brasil em
2025, defendendo o aumento do
financiamento para o Fundo de
Perdas e Danos para ajudar
nações vulneráveis a
enfrentarem as crises climáticas.

Para ler a declaração do


G-77 sobre as prioridades do

226
secretário geral da ONU, clique aqui.

No dia 17 de janeiro de 2025, o G-77 e a China se pronunciaram durante as consultas


intergovernamentais sobre o rascunho 0 da Declaração da Conferência do Oceanos da ONU -
2025

A Conferência de alto nível das Nações Unidas de 2025 para Apoiar a Implementação do
Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14: Conservar e usar de forma sustentável os
oceanos, mares e recursos marinhos para o desenvolvimento sustentável (a Conferência dos
Oceanos da ONU de 2025 – UNOC3) será realizada em Nice, França, de 9 a 13 de junho de 2025,
coorganizada pela França e pela Costa Rica.

Na ocasião da apresentação do Rascunho 0 da Declaração para esta Conferência, o G-


77 e a China destacaram que o ODS 14 é o menos financiado de todos os ODS, apesar do papel
crítico dos oceanos na regulação do clima e da biodiversidade. Esse déficit de financiamento
dificulta os esforços para combater a perda de biodiversidade e a pesca insustentável,
principalmente em países em desenvolvimento. Para resolver isso, eles pedem maior apoio
financeiro e transferência de tecnologia, instando as nações desenvolvidas a se comprometerem
a aumentar o financiamento para iniciativas oceânicas por meio de vários mecanismos
financeiros.

De acordo com o G-77 e a China a declaração final da UNOC-3 deve reconhecer e


respeitar os mandatos de outras estruturas e instrumentos multilaterais, incluindo aqueles sob
a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas e seu Acordo de Paris, a
Convenção sobre Diversidade Biológica e seus protocolos, e a Agenda 2030 para o
Desenvolvimento Sustentável. Somente assim, haverá um impacto coletivo garantindo todos os
compromissos globais.

Para ler o Rascunho 0 da Declaração Final da UNOC3, clique aqui.

Também no dia 17 de janeiro de 2025, o G-77 e a China se pronunciaram durante o


processo intergovernamental e consultas para identificar os termos de referência e modalidades
para o estabelecimento e funcionamento do painel científico internacional independente sobre
a Inteligência Artificial

227
O Grupo enfatizou a necessidade de abordar a exclusão digital ao discutir o papel da
inteligência artificial (IA) e das tecnologias emergentes. Embora a tecnologia seja crucial para o
desenvolvimento, o acesso desigual aos seus benefícios persiste. Para promover uma Sociedade
da Informação inclusiva, é necessário que haja ações significativas para preencher essa lacuna.

À medida que existe uma transformação digital sem precedentes, a IA apresenta novas
oportunidades de desenvolvimento e pode acelerar o progresso em direção aos ODS em
dimensões econômicas, sociais e ambientais. No entanto, o Grupo expressou preocupação com
a falta de infraestrutura e habilidades digitais, particularmente em países em desenvolvimento
e menos desenvolvidos. Essa deficiência dificulta sua capacidade de utilizar a IA de forma eficaz
e exacerba as desigualdades existentes.

O Grupo defendeu o estabelecimento do Painel Científico Internacional Independente


sobre IA e do Diálogo Global sobre Governança de IA. Essas iniciativas visam aumentar a
compreensão dos estados-membros sobre como desenvolver e implantar tecnologias de IA de
forma centrada no ser humano, ética e sustentável, apoiando, em última análise, a realização
de todos os 17 ODS.

O Diálogo Global é vital para promover discussões inclusivas sobre as implicações mais
amplas da IA e deve-se priorizar a participação de todos mantendo uma base
intergovernamental forte, que garanta que as prioridades de todos os estados sejam centrais
para seus resultados.

No final das contas, as abordagens para IA e tecnologias emergentes determinará se a


digitalização levará a resultados inclusivos e sustentáveis ou ampliará ainda mais a exclusão
digital.

Para ler a Declaração completa, clique aqui.

New York, 17 de janeiro de2025 - Declaração feita por S.E.


Dr Abbas Kadhom Obaid, Representante Permanente
Adjunto e encarregado de negócios da República do
Iraque, em nome do G-77 e da China na cerimônia de
abertura do ano internacional da paz e da confiança.

Esta iniciativa, proclamada pela Assembleia Geral das


Nações Unidas através da Resolução 78/266, que afirma
2025 para ser o Ano Internacional da Paz e da Confiança;
reafirma o papel fundamental da paz e da confiança como
pilares do desenvolvimento sustentável e pedra angular da cooperação internacional.

O Ano Internacional da Paz e da Confiança constitui um meio de mobilizar os esforços


da comunidade internacional para promover a paz e a confiança entre as nações com base, entre
outros, no diálogo político, na compreensão mútua e na cooperação, a fim de construir uma paz
sustentável, solidariedade e harmonia;

Leia a resolução 78/266.

New York, 20 de janeiro de2025 - Declaração feita por S.E. Dr Abbas Kadhom Obaid,
Representante Permanente Adjunto e encarregado de negócios da República do Iraque, em
nome do G-77 e da China, na reunião informativa conjunta dos Presidentes da AGNU e do
ECOSOC

228
O presidente da AGNU, Philémon Yang, e o presidente do Conselho Econômico e Social
da ONU (ECOSOC), Bob Rae, realizaram uma reunião informativa anual conjunta para atualizar
os Estados-membros sobre suas expectativas para o ano.

Destacando a 4ª Conferência Internacional sobre Financiamento para o


Desenvolvimento (FfD4) como uma oportunidade para impulsionar ainda mais os
compromissos, o presidente da UNGA prometeu intensificar suas ações para priorizar as
necessidades dos países em desenvolvimento. Ele chamou a atenção para uma reunião que ele
realizará com a União Interparlamentar sobre a ampliação da ação sobre financiamento para os
ODS e identificou a ciência, inovação e digitalização para formas de intensificar a realização dos
ODS. Observou o diálogo interativo e multissetorial que ele convocará para avaliar a
implementação dos compromissos assumidos em relação ao desenvolvimento da África, com
foco na digitalização, e sinalizou o Fórum Multissetorial do ECOSOC sobre Ciência, Tecnologia e
Inovação para os ODS (Fórum STI) como outra oportunidade de colaboração.

Entre outras prioridades compartilhadas com o ECOSOC, Philémon Yang destacou ações
para conservar e usar de forma sustentável os oceanos, mares e recursos marinhos para o
desenvolvimento sustentável (ODS 14), paz e segurança e igualdade de gênero.

O Presidente do ECOSOC lembrou aos Estados-Membros que, embora ainda faltem


cinco anos para atingir a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, o mundo continua
enfrentando crises interconectadas, incluindo crescentes desigualdades, pobreza, fome,
mudanças climáticas e conflitos. Ele destacou o papel instrumental da colaboração entre a
AGNU e o ECOSOC em ajudar a colocar os ODS em um caminho melhor.

ECOSOC aproveitará o impulso da Cúpula do Futuro e apoiará os preparativos para a


FfD4; o 30º aniversário da 4ª Conferência Mundial sobre Mulheres e adoção da Declaração e
Plataforma de Ação de Pequim; a 3ª Conferência dos Oceanos da ONU (UNOC3); e a 2ª Cúpula
Mundial para o Desenvolvimento Social, para impulsionar o seu trabalho que será guiado pelo
HLPF de 2025 “Promovendo soluções sustentáveis, inclusivas, baseadas em ciência e
evidências para a Agenda 2030 para o desenvolvimento sustentável e seus ODS para não
deixar ninguém para trás”, e reiterou suas prioridades:

• Promover sistemas de migração bem administrados e adesão à proteção


internacional de pessoas deslocadas;
• Aproveitar a inteligência artificial (IA) para acelerar a implementação dos ODS
de forma segura, responsável, inclusiva e baseada em direitos humanos;
• Aprofundar o engajamento entre o Conselho e as instituições financeiras
internacionais (IFIs) para abordar as oportunidades e desafios do FfD4; e
• Promover a igualdade de gênero, a participação ativa da sociedade civil e a
representação de vozes diversas, incluindo os jovens.

Em seu pronunciamento, o G-7 e a China esclareceram que faltando cinco anos para
atingir as metas ambiciosas da Agenda 2030, constata-se que a implementação tem sido
decepcionante, refletindo mal na comunidade global. Este ano celebra-se o 80º aniversário das
Nações Unidas, e é, portanto, crucial refletir sobre as deficiências da Organização e mobilizar
esforços para atingir a Agenda 2030, o Acordo de Paris e a Agenda de Ação de Addis Abeba.

Em 2024, a AGNU adotou documentos importantes como o Pacto para o Futuro e o


Pacto Digital Global, entre outros, com o propósito de acelerar a implementação da Agenda

229
2030. Este ano, a colaboração entre a AGNU e o ECOSOC é essencial para cumprir com os
compromissos e aspirações dos Estados Membros.

Continuando seu pronunciamento, o Sr Obaid deixou claro que, hoje mais do que nunca,
é preciso abordar e superar os desafios globais com solidariedade, cooperação multilateral
renovada e uma resposta global coletiva. Portanto, é crucial que o ECOSOC intensifique seu
papel como órgão principal da ONU, bem como para os processos de acompanhamento de suas
atividades. É preciso cumprir com as promessas e compromissos assumidos, pois o tempo é
limitado e a ação é urgente e a única opção de sobrevivência.

Por isso, é importante fortalecer a 4ª Conferência Internacional sobre Financiamento


para o Desenvolvimento (FfD4), a Conferência dos Oceanos da ONU de 2025, a 2ª Cúpula
Mundial para o Desenvolvimento Social e o Fórum Político de Alto Nível (HLPF).

Esses fóruns devem ir além das palavras e serem mais ambiciosos, já que existe uma
lacuna de US$ 4,3 trilhões no financiamento dos ODS e uma lacuna de US$ 1,5 trilhão no
financiamento da ação climática. Portanto, é preciso:

a) Implementar compromissos sobre ODA (Ajuda Oficial ao Desenvolvimento),


b) Tomar medidas urgentes sobre alívio e reestruturação da dívida,
c) Aumentar o financiamento concessional e baseado em subsídios,
d) Recanalizar 50% da alocação dos Direitos Especiais de Saque (SDRs) de 2021,
e) Oferecer assistência financeira aos países impactados pelas mudanças climáticas.

Para ler a Declaração completa, clique aqui.

New York, 22 de janeiro de2025 – Declaração feita pela Delegação do Iraque junto às
Nações Unidas, em nome do G-77 e da China na apresentação informal sobre o rascunho 0 do
documento para a 4ª Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento
(FfD4)

A 4ª Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento oferece


uma oportunidade vital para enfrentar os desafios significativos que os países em
desenvolvimento enfrentam, especialmente a crescente omissão de financiamento para os ODS,
o aumento da carga da dívida e as desigualdades sistêmicas nos sistemas financeiros e
comerciais globais.

Por isso, é fundamental que o documento final contenha compromissos ambiciosos,


viáveis e transformadores, colocando o desenvolvimento no centro dos esforços para apoiar o
financiamento do desenvolvimento sustentável. Isso inclui reafirmar que a erradicação da
pobreza é o maior desafio global e um pré-requisito essencial para alcançar o desenvolvimento
sustentável, garantindo que ninguém fique para trás. Deve-se assegurar que as pessoas sejam o
foco do desenvolvimento, pois são os motores essenciais da prosperidade compartilhada para
as gerações atuais e futuras.

O Grupo destacou os seguintes pontos:

Abordando questões sistêmicas - a reforma da arquitetura financeira internacional é


crítica para garantir que ela seja adequada ao propósito para responder melhor aos desafios
presentes e futuros

230
Recursos públicos nacionais - compromissos para alinhar sistemas fiscais com
desenvolvimento sustentável, incluindo tributação progressiva e combate a fluxos financeiros
ilícitos. Bancos nacionais de desenvolvimento devem estar capacitados com financiamento
externo e estruturas regulatórias personalizadas para mobilizar financiamento de longo prazo
alinhado com estratégias nacionais de desenvolvimento.

Comércio internacional como um motor para o desenvolvimento - Importante para


fortalecer o sistema de comércio multilateral com base nos princípios de equidade,
transparência e tratamento especial, mas diferenciado, com a Organização Mundial do
Comércio (OMC). Os bancos multilaterais de desenvolvimento devem instar a eliminação de
medidas coercitivas unilaterais que prejudicam o comércio livre e justo.

Negócios e finanças privadas nacionais e internacionais - Importante reconhecer a


necessidade de mudança sistêmica em níveis nacional e global, bem como a ênfase no
fortalecimento do ambiente global favorável para investimento privado de longo prazo em
desenvolvimento sustentável.

Ciência, tecnologia e inovação (CTI) - necessidade de compromissos mais profundos


para abordar os impactos do mercado de trabalho dos avanços tecnológicos, incluindo fuga de
cérebros e deslocamento de empregos. É essencial desenvolver competências digitais em
instituições públicas em países em desenvolvimento, juntamente com a promoção de parcerias
público-privadas para fomentar o empreendedorismo, desenvolver ecossistemas de inovação
locais.

Dados, monitoramento e acompanhamento – necessidade de exigir investimentos em


metodologias inovadoras de coleta de dados para gerar informações em tempo real e para um
suporte reforçado para capacidades estatísticas em países em desenvolvimento.

Cooperação Internacional para o Desenvolvimento - A cooperação Norte-Sul continua


sendo um catalisador fundamental para o desenvolvimento sustentável. Necessidade de prazos
vinculativos para compromissos de Assistência Oficial ao Desenvolvimento e exigência de
reversão da tendência de empréstimos concessionais substituindo doações.

Para ler o Rascunho 0 apresentado aos Estados Membros no dia 22 de janeiro, clique aqui.

New York, 23 de janeiro de2025 – Declaração feita por S.E. Dr Abbas Kadhom Obaid,
Representante Permanente Adjunto e encarregado de negócios da República do Iraque, em
nome do G-77 e da China na apresentação conjunta do Banco Mundial e do Centro Universitário
da ONU para pesquisa de políticas (UNU-CPR) sobre a 4ª revisão acionária de 2025 do Grupo
Banco Mundial

A apresentação Conjunta do Banco Mundial e do Centro Universitário de Pesquisa de


Políticas das Nações Unidas (UNU-CPR) é um evento significativo, pois aborda desafios globais e
busca gerar soluções por meio de pesquisa e colaboração dentro do sistema multilateral.

De acordo com o G-77 e a China, a 4ª Revisão acionária de 2025 do Grupo Banco Mundial
tem grande importância, pois segue um movimento global que defende uma maior
representação de países emergentes e sub-representados em desenvolvimento dentro de
instituições financeiras internacionais.

231
A revisão também coincide com o 80º aniversário das Instituições de Bretton Woods e
das Nações Unidas, bem como a 4ª Conferência Internacional sobre Financiamento para o
Desenvolvimento (FfD4), criando uma oportunidade para reflexão e reforma.

Em nome do Sul Global, o G-77 e a China consideraram que a revisão acionária é uma
iniciativa essencial para garantir que o Grupo Banco Mundial (WBG) esteja bem equipado para
navegar no cenário de desenvolvimento global em evolução. Na última década, o ambiente
econômico global passou por mudanças significativas, com economias emergentes aumentando
sua participação na economia global enquanto outras ainda enfrentam novos desafios, como
mudanças climáticas, pandemias e fragilidade.

Esta revisão proporciona aos acionistas uma oportunidade crucial para investigar
abordagens que enfrentem riscos e vulnerabilidades globais emergentes. Ao realizar os ajustes
necessários na estrutura acionária, a revisão fortalece a representação de países em
desenvolvimento que são sub-representados e refletir de maneira precisa as dinâmicas em
constante mudança da economia global.

O G77 e a China esperam que a revisão não afete negativamente o financiamento


concessional para países em desenvolvimento por meio da Associação Internacional de
Desenvolvimento (IDA).

Para ler a Declaração Completa do G-77 e da China, clique aqui.

New York 28 de janeiro de 2025 – Declaração da República do Iraque em nome do nome


do G-77 e da China sobre a adoção do Programa de ação (2024- 2034) para os países em
desenvolvimento sem litoral

O Programa de Ação para Países em Desenvolvimento Sem Litoral para a Década de


2024–2034, se concentra na diversificação de economias, promoção do comércio, apoio a
empregos e aumento da resiliência climática nos próximos 10 anos neste grupo de nações. Deve-
se ter em mente que 570 milhões de pessoas moram em países em desenvolvimento sem litoral.

O representante do Iraque iniciou seu pronunciamento dizendo que a adoção deste


programa de ação personalizado para os Países em Desenvolvimento Sem Litoral (LLDCs), que
consiste em 32 membros que enfrentam desafios únicos devido ao seu status de países sem
litoral, exige uma ação urgente para abordar essas questões. Embora o programa se estenda
além da Agenda 2030, é crucial começar a implementá-lo o mais rápido possível para garantir
que os LLDCs não sejam deixados para trás. Este novo programa servirá como uma estrutura de
orientação para esses esforços.

O afastamento e o isolamento destes países dos mercados globais, juntamente com a


necessidade de travessias de fronteira adicionais, procedimentos de trânsito demorados,
sistemas logísticos inadequados e infraestrutura precária, levam a custos de transporte e
transações comerciais significativamente mais altos em comparação a outros países. Essa
situação cria um efeito substancial de redução do comércio que impacta negativamente o
crescimento econômico e dificulta seus esforços para atingir o desenvolvimento sustentável e
as metas de desenvolvimento nacional.

A AGNU reconheceu esses desafios específicos e adotou uma resolução abordando as


necessidades únicas dos LLDCs. Hoje, reafirmamos esse compromisso com a adoção desta
resolução.

232
As cinco áreas prioritárias da resolução são:

1) Transformação estrutural e ciência, tecnologia e inovação;


2) Comércio, facilitação do comércio e integração regional;
3) Trânsito, transporte e conectividade;
4) Aumento da capacidade adaptativa, fortalecimento da resiliência e redução da
vulnerabilidade às mudanças climáticas e desastres;
5) Meios de implementação.

****************

Destaques do G-77 em dezembro de 2024, finalizando a responsabilidade da república de


Uganda frente ao G-77 + China

New York, 24 de dezembro de 2024 - Declaração feita pelo Sr Medard Ainomuhisha, da


Missão Permanente da República de Uganda junto às Nações Unidas, em nome do G-77 e da
China no encerramento da parte principal da 79ª sessão da AGNU no 5º Comitê.

O 5º Comitê da AGNU é responsável pelas questões administrativas e orçamentárias da ONU

Na última sessão do ano, a República de Uganda, em sua declaração final em nome do


G-77 e da China, destacou a importância do trabalho das Nações Unidas e expressou orgulho
por ter abordado com sucesso questões complexas, como as escalas de avaliação, orçamento-
programa e financiamento do Sistema de Coordenador Residente da ONU. Liderando os países
em desenvolvimento, o grupo focou no financiamento do pilar de desenvolvimento da ONU para
promover os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). O G-77 e a China manifestaram
satisfação com os resultados relacionados ao financiamento do Sistema de Coordenador
Residente e com as estimativas revisadas para o Pacto para o Futuro. Eles defenderam o
princípio da capacidade de pagamento de cada país para o orçamento regular da Organização,
reconhecendo que, embora a metodologia atual apresente falhas, a manutenção de seus
elementos principais foi a melhor decisão para a Organização e seus membros neste momento.

O Grupo expressou satisfação por ter concluído com sucesso as deliberações sobre
outros itens importantes, incluindo as estimativas revisadas e as implicações orçamentárias do
programa para resoluções, o Sistema Comum da ONU, o Padrão de Conferências, o Fundo de
Pensão da ONU e os Termos de Referência para o fundo de construção da paz, que desbloqueou
US$ 50 milhões propostos no orçamento regular. Além disso, o Grupo ficou satisfeito com os
resultados revisados da Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina
no Oriente Próximo (UNRWA), esperando que isso traga alívio à agência durante este momento
difícil. O Grupo continuará a trabalhar para garantir que a UNRWA receba todos os recursos
necessários no futuro.

O Grupo se orgulhou de manter seu compromisso de envolver todos os parceiros de


negociação de maneira inclusiva e construtiva. Agradeceram a todos os outros grupos e
delegações por seguirem essa mesma diretriz e destacaram que esta abordagem colaborativa
foi fundamental para garantir que todos os itens fossem tratados com sucesso.

New York, 05 de dezembro de 2024 - Declaração feita pelo Sr Medard Ainomuhisha, da


Missão Permanente da República de Uganda junto às Nações Unidas, em nome do G-77 e da
China sobre o item 153 da pauta: Financiamento do Mecanismo Internacional de Resíduos para
Tribunais Criminais para 2025 na parte principal da 79ª sessão da AGNU no 5º Comitê.

233
O 5º Comitê da AGNU é responsável pelas questões administrativas e orçamentárias da ONU

O G-77 e a China analisaram o desempenho orçamentário de 2023, que mostrou uma


despesa final de US$ 77,9 milhões, refletindo uma sub despesa de US$ 4 milhões, que será
creditada aos Estados-Membros para 2025. O Grupo espera agora, receber informações sobre
as despesas projetadas para 2024.

Em relação à implementação das recomendações dos órgãos de supervisão, o Grupo


expressou preocupação sobre o ritmo lento da implementação das recomendações do Conselho
de Auditores. Concordaram com o Comitê Consultivo sobre a necessidade de o Mecanismo
Internacional de Resíduos para Tribunais Criminais agilizar a implementação das recomendações
restantes como prioridade.

O Grupo também reiterou a necessidade de o Mecanismo Internacional de Resíduos


para Tribunais Criminais concluir rápida e eficientemente seu trabalho pendente.

Além disso, o Grupo tomou nota das discussões sobre os aspectos administrativos e
orçamentários de possíveis locais para os arquivos do Tribunal Penal Internacional para Ruanda
(ICTR) e do Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia (ICTY), bem como do Mecanismo
Internacional de Resíduos para Tribunais Criminais. O Grupo está interessado em estudar o
contexto deste assunto durante as consultas informais. O Grupo reafirma que o 5º Comitê é o
Comitê Principal apropriado da AGNU, encarregado de responsabilidades por questões
administrativas e orçamentárias.

O Grupo observou que o orçamento proposto para 2025 é de US$ 60,2 milhões, uma
redução de US$ 5,27 milhões (8,1%) em relação a 2024, principalmente devido à abolição
planejada de 5 cargos temporários e 22 cargos gerais de assistência temporária até o final de
2025. A maioria desses cortes afeta a Filial de Arusha.

O Grupo dos 77 e a China expressaram sua preocupação com estas reduções e


rejeitaram o tratamento desigual das filiais do Mecanismo Internacional de Resíduos para
Tribunais Criminais. Eles enfatizaram a necessidade de nacionalizar cargos conforme
determinado pela resolução 78/249 da AGNU. Além disso, o Grupo acolheu com satisfação os
esforços do governo da Tanzânia para resolver reivindicações e questões de responsabilidade e
solicitaram o Secretário-Geral que agilize esse processo para o benefício da organização.

New York, 03 de dezembro de 2024 - Declaração feita pelo Embaixador Godfrey Kwoba,
Representante Permanente Adjunto da República de Uganda na ONU, em nome do G-77 e da
China na 2ª sessão do Comitê preparatório para a 4ª Conferência Internacional sobre
Financiamento para o Desenvolvimento.

O Embaixador começou afirmando que a 4ª Conferência Internacional sobre


Financiamento para o Desenvolvimento (FfD4) ocorrerá em um momento crucial em que os
países em desenvolvimento estão lutando com espaço fiscal limitado, dificultando sua
capacidade de atingir metas nacionais de desenvolvimento e implementar a Agenda 2030 para
o Desenvolvimento Sustentável. O financiamento é essencial para alcançar o desenvolvimento
sustentável e os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS).

O G-77 e a China enfatizaram que o documento final do FfD4 deve abordar os desafios
de financiamento que os países em desenvolvimento enfrentam, particularmente a lacuna
estimada de investimento anual para os ODS, que varia de US$ 2,5 trilhões a 4 trilhões. Essa
lacuna é exacerbada por fatores como altos encargos de dívida, fluxos financeiros ilícitos,

234
protecionismo comercial, medidas coercitivas unilaterais, um sistema financeiro internacional
desatualizado e impactos das mudanças climáticas. Eles reafirmaram a necessidade de um novo
financiamento adicional, de qualidade, adequado, sustentável e previsível para alcançar o
desenvolvimento sustentável e os ODS.

Sendo um dos eventos mais esperados e importantes do ano, o Grupo enfatizou que
abordar o espaço fiscal limitado em países em desenvolvimento requer fechar lacunas de
financiamento e investimento com urgência. O Grupo enfatizou que ações urgentes para
abordar o espaço fiscal limitado e acelerar a implementação da Agenda 2030 e a obtenção do
desenvolvimento sustentável em países em desenvolvimento devem incluir, entre outros, estes
19 itens:

a) Reforma urgente da arquitetura financeira internacional para fechar a lacuna de


financiamento dos ODS, incluindo instituições financeiras internacionais e reforma da
governança de bancos multilaterais de desenvolvimento, especialmente do FMI e do Banco
Mundial, para ampliar e fortalecer a voz, a participação e a representação dos países em
desenvolvimento na tomada de decisões econômicas internacionais, na definição de normas e
na governança econômica global;

b) Promover o acesso a subsídios, financiamento concessional e financiamento de longo


prazo acessível e previsível em escala por todos os países em desenvolvimento, em particular
países africanos, Países menos desenvolvidos. Países em desenvolvimento sem litoral; Pequenas
Ilhas em desenvolvimento e Países de renda média;

c) Melhorar a arquitetura global da dívida soberana, com a participação significativa de


todos os países em desenvolvimento;

d) Eliminação da política de sobretaxa pelo FMI;

e) Emitir novas alocações gerais de Direitos Especiais de Saque (SDRs), com distribuição
para países em desenvolvimento de acordo com suas necessidades;

f) Recanalização de Direitos Especiais de Saque existentes e recém-alocados não


utilizados dos países desenvolvidos por meio de Bancos Multilaterais de Desenvolvimento
(MDBs) para países em desenvolvimento mais necessitados de liquidez e para Bancos Regionais
de Desenvolvimento;

g) Aumentar as trocas de dívida para ODS, incluindo trocas de dívida para clima e
natureza para permitir que países em desenvolvimento possam usar pagamentos de serviço de
dívida para investir em desenvolvimento sustentável e tomar medidas multilaterais para
padronizar o uso desses mecanismos;

h) Cumprir compromissos existentes, incluindo a Ajuda Oficial ao Desenvolvimento


(ODA) por países desenvolvidos;

i) Apoiar o sistema de comércio multilateral, incluindo a resolução de questões de


negociação pendentes há muito tempo, como a reforma abrangente do comércio agrícola.
Trabalhar em direção à necessária reforma da Organização Mundial do Comércio (OMC),
fortalecendo o tratamento especial e diferenciado para países em desenvolvimento como um
princípio fundamental do multilateralismo, e garantir a transferência de tecnologia para
promover o desenvolvimento sustentável;

235
j) Eliminar imediatamente todas as leis e regulamentos com impacto extraterritorial e
todas as outras formas de medidas econômicas coercitivas e medidas restritivas ao comércio,
incluindo sanções unilaterais e mecanismos de ajuste de fronteira unilaterais e discriminatórios
e taxas impostas sob o pretexto de proteção ambiental, contra países em desenvolvimento;

k) Apoiar a transformação estrutural e aumentar as capacidades produtivas para


construir economias diversificadas, resilientes e sustentáveis que possam gerar empregos
decentes e produtivos;

l) Aumentar os investimentos em áreas, incluindo infraestrutura, conectividade,


inovação, tecnologia, educação, desenvolvimento de habilidades e capacitação, bem como
suporte para micro, pequenas e médias empresas;

m) Prevenir e combater os fluxos financeiros ilícitos que drenam recursos de países em


desenvolvimento;

n) Reforçar o compromisso de fortalecer a inclusão e a eficácia da cooperação tributária


internacional nas Nações Unidas;

o) Avançar no estabelecimento do conjunto de medidas de progresso no


desenvolvimento sustentável que complementam ou vão além do produto interno bruto para
informar o acesso ao financiamento concessional e à cooperação técnica para países em
desenvolvimento;

p) Reduzir ainda mais os custos das remessas, reconhecendo seu potencial para
contribuir para o desenvolvimento sustentável, sem substituir os fluxos financeiros tradicionais;

q) Promover e facilitar investimentos em países em desenvolvimento, inclusive por meio


do aumento dos fluxos de Investimento Estrangeiro Direto para países em desenvolvimento e
do apoio à capacitação para países em desenvolvimento;

r) Catalisar o aumento do financiamento e investimento dos setores público e privado


em desenvolvimento sustentável, inclusive por meio de financiamento inovador, como
financiamento combinado.

Finalmente, o G77 e a China reiteraram seu apelo aos países desenvolvidos e às


instituições financeiras internacionais para que tomem medidas urgentes, incluindo
aumentando massivamente o financiamento concessional e de longo prazo acessível para o
desenvolvimento e expandindo o financiamento de contingência para os países em
desenvolvimento necessitados.

O Grupo enfatizou que o FfD4 deve aproveitar os resultados das conferências anteriores,
bem como os resultados relevantes negociados inter governamentalmente e devem concordar
com ações apropriadas para implementação para apoiar os países em desenvolvimento em sua
busca para alcançar o desenvolvimento sustentável em todas as suas três dimensões.

Desta forma, reiteraram seu compromisso de se envolver construtivamente em todas


as atividades preparatórias desta Conferência e enfatizaram que o documento final deve ser
negociado entre os governos, linha por linha para garantir que os países em desenvolvimento
tenham o espaço fiscal e político para apoiar sua busca para alcançar o desenvolvimento
sustentável.

236
Espera-se que a conferência FfD4 que será realizada em Sevilha na Espanha de 30 de
junho a 3 de julho de 2025, produza um documento final que reflita compromissos e ações que
abordem os desafios de financiamento enfrentados pelos países em desenvolvimento. O
documento final deverá servir como um roteiro para a cooperação internacional e apoio no
financiamento de iniciativas de desenvolvimento sustentável

New York, 03 de dezembro de 2024 - Declaração feita pelo Sr Medard Ainomuhisha, da


Missão Permanente da República de Uganda junto às Nações Unidas, em nome do G-77 e da
China sobre as estimativas revisadas relacionadas ao orçamento-programa proposto para 2025,
conforme a seção 26, refugiados da Palestina, na parte principal da 79ª sessão da AGNU no 5º
Comitê.

O 5º Comitê da AGNU é responsável pelas questões administrativas e orçamentárias da ONU

O G-77 e a China relembraram a Resolução 302 (IV) da Assembleia Geral de 1949, que
estabeleceu a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina no Oriente
Próximo (UNRWA) para oferecer assistência humanitária e serviços essenciais aos refugiados
palestinos, particularmente na Faixa de Gaza e na Cisjordânia. O Grupo enfatizou que nenhuma
organização pode substituir o papel crítico da UNRWA e solicitou a comunidade internacional a
apoiar suas operações, alertando que qualquer interrupção afetaria severamente milhões de
refugiados.

O Grupo expressou profunda preocupação com as recentes ações legislativas


israelenses que obstruem as operações da UNRWA e condenaram a violência contra
funcionários da Agência e civis, incluindo ataques às escolas da UNRWA. Eles destacaram a
dedicação da equipe da UNRWA, que continua seu trabalho em condições terríveis, e
estenderam condolências pela perda de 237 funcionários em 28 de outubro de 2024,
destacando os riscos enfrentados pelo pessoal da ONU no Território Palestino Ocupado.

New York, 02 de dezembro de 2024 - Declaração feita pelo Sr Medard Ainomuhisha, da


Missão Permanente da República de Uganda junto às Nações Unidas, em nome do G-77 e da
China sobre o item 136 da pauta: Relatórios financeiros e demonstrações financeiras auditadas,
e relatórios do conselho de auditoria, na parte principal da 79ª sessão da AGNU no 5º Comitê.

O 5º Comitê da AGNU é responsável pelas questões administrativas e orçamentárias da ONU

O Grupo agradeceu o relatório resumido de 17 entidades que, om certeza, auxilia a


AGNU na avaliação da gestão orçamentária, o que é vital para a eficácia da ONU em enfrentar
os desafios globais e a realização da Agenda 2030. Das 17 entidades auditadas, 12 encerraram
o ano financeiro com superávit, enquanto 5 relataram déficit, e o Mecanismo Residual
Internacional para Tribunais Criminais (IRMCT) relatou déficit por cinco anos consecutivos. No
entanto, as posições financeiras das entidades foram geralmente suficientes e os índices de
liquidez fossem altos. O Grupo também ficou satisfeito que todas as entidades receberam
pareceres de auditoria sem ressalvas e solicitou que abordassem as fraquezas identificadas,
mantendo seus sucessos.

Em relação ao relatório, o Grupo expressou preocupação com várias questões, como


perda de recursos, fundos inativos, baixa eficiência operacional e dificuldades em atingir metas
de desempenho. A gestão financeira e orçamentária foi responsável por 43,8% das principais
descobertas em 2023, contra 36,1% em 2022, destacando sua importância para as operações da
ONU e motivando um apelo por uma melhor gestão econômica pelo Secretariado da ONU. Outro

237
ponto destacado foram as perdas financeiras significativas no Escritório das Nações Unidas para
Serviços de Projetos (UNOPS), incluindo uma perda de US$ 15,23 milhões devido a uma
transação financeira inadequada, levando a demandas por fortalecer a responsabilização e
controles internos.

Mais uma vez, o G-77 e a China destacaram a necessidade de haver melhor


representação geográfica entre a equipe, especialmente de Estados-Membros não
representados ou sub-representados. Em relação à implementação das recomendações do
Conselho, a taxa geral caiu para 51,08% em 2023, exigindo ação rápida de todas as entidades
para priorizar essas recomendações e responsabilizar os gerentes de programa por atrasos, com
uma solicitação de explicações do Secretariado sobre questões pendentes.

Movimento dos Países Não Alinhados (MNA)

Em 2025, os países do Sul global comemoram os 70 anos da histórica Conferência Afro-


Asiática de Bandung, realizada em abril de 1955, na Indonésia. O surgimento de um conjunto
distinto de organizações e agrupamentos cuja orientação se centrava na promoção dos
interesses dos países em desenvolvimento e descolonizados foi a marca do Sul na política
internacional na segunda metade do século XX. A partir de 1945, os países do Sul global se
articularam politicamente para enfrentar seus desafios comuns. No Pós-Segundo Guerra
Mundial, ocorreu o primeiro grande encontro dos países do Sul, a Conferência de Bandung, da
qual nasceu o Projeto Terceiro Mundista (Third World Project). A Conferência de Bandung
significou o primeiro grande concerto da periferia do sistema internacional sobre uma estratégia
de cooperação e de atuação coletiva no cenário global. Na ocasião, 29 países asiáticos e
africanos – e cerca de 30 movimentos de liberação nacional - articularam princípios
fundamentais de seu projeto político coletivo, como a luta contra o colonialismo e o
imperialismo, o direito de todos os povos à autodeterminação, e a estratégia de não
alinhamento no contexto da Guerra Fria151.

O “espírito de Bandung” transcendeu o contexto afro-asiático, incorporando nações da


América Latina. Em 1961, foi realizada a Conferência de Belgrado, responsável pela criação do
Movimento dos Países Não-Alinhados (Non Aligned Movement-NAM). Com base nos princípios
acordados na Conferência de Bandung, o Movimento dos Não-Alinhados foi formalmente
estabelecido em setembro de 1961, em Belgrado, na então Iugoslávia. Os vinte e cinco (25)
países que participaram desse primeiro encontro foram: Afeganistão, Argélia, Birmânia
(Mianmar), Camboja, Ceilão (Sri Lanka), Congo-Leopoldville (atual República Democrática do
Congo), Cuba, Chipre, Egito, Etiópia, Gana, Guiné, Índia, Indonésia, Iraque, Líbano, Mali,
Marrocos, Nepal, Arábia Saudita, Somália, Sudão, Tunísia, Iêmen e Iugoslávia. Além dos países-
membros, havia três países latino-americanos como observadores (Bolívia, Brasil e Equador). O
texto final do encontro fundador repudiava o imperialismo, o neocolonialismo e as intimidações
políticas no contexto da Guerra Fria. Os países reunidos reforçaram sua posição contra o
alinhamento e contra qualquer tipo de intimidação, interferência ou intervenção.

151
PESSINA, Maria Elisa H. Solidariedade e Cooperação Sul-Sul em perspectiva histórica. In.
MILANI, Carlos R. S.; KRAYCHETE, Elsa (Orgs.). Política Externa e desenvolvimento no Sul geopolítico.
Salvador: EDUFBA, 2022. p. 15-42.

238
De 2024 a 2027, a presidência do MNA está a cargo da República de Uganda. O
presidente de Uganda, Yoweri Museveni é o presidente do Movimento dos Não-Alinhados. A
Delegação de Uganda junto às Nações Unidas é o representante do Presidente na ONU.

Movimento Jovem dos Não Alinhados (NAMYO)

A Organização Jovem do Movimento dos Não-Alinhados (NAMYO) foi inaugurada


oficialmente em outubro de 2021 em Baku no Azerbaijão e, desde então, vem atuando como
uma plataforma ampla, criando oportunidades para que os jovens possam se manifestar,
apresentar suas ideias e perspectivas em temas relacionados com a conjuntura política global
capacitando os mais jovens para se tornarem líderes do futuro.

Destaques em janeiro 2025

24 de janeiro de 2025 - Dia Internacional da Educação

O Dia Internacional da Educação destaca o papel vital da


educação na promoção da paz e do desenvolvimento,
enfatizando seu status como um direito humano
fundamental, um bem público e uma responsabilidade
compartilhada.

A educação tem sido reconhecida globalmente como


crucial para alcançar os 17 Objetivos de Desenvolvimento
Sustentável (ODS), das Nações Unidas. Todavia, apesar
dos esforços contínuos, aproximadamente 244 milhões
de crianças e adolescentes em todo o mundo continuam
fora da escola.

Em 2025, o Dia Internacional da Educação destacou o empoderamento dos indivíduos e


a orientação para o uso responsável dos avanços tecnológicos, sob o tema: "IA e Educação:
Preservando a Agência Humana em um Mundo de Automação."

Fonte: https://www.instagram.com/p/DFNLKZGB5wN/

13 de janeiro de 2024 - História do MNA. 13ª Cúpula do MNA,


Kuala Lumpur, 24-25 de fevereiro de 2003

A 13ª Cúpula do MNA, realizada em Kuala Lumpur, Malásia,


em 2003, destacou o comprometimento do Movimento com
o multilateralismo, o desarmamento e a justiça global.

Líderes se uniram para rejeitar ações unilaterais, defender a


paz e abordar desafios urgentes como desigualdade
econômica e globalização.

Fonte:
https://www.instagram.com/p/DExNqTFNxL8/?img_index=1

239
Destaques do Movimento Jovem dos Não-Alinhados em dezembro de 2024

16 de dezembro de 2024 - História do MNA. 12ª Cúpula do


MNA, Durban, 1998.

A 12ª Cúpula do MNA, realizada em Durban, África do Sul,


em 1998, foi um marco importante para o movimento que
congrega nações em desenvolvimento com o objetivo de
promover a solidariedade e a cooperação entre países do
Sul Global.

Durante a cúpula, os líderes discutiram questões como a


reforma das instituições financeiras internacionais, o
desarmamento, a promoção de paz e segurança, além do
combate ao racismo e à discriminação.

A cúpula também refletiu sobre os desafios enfrentados pelas nações não alinhadas
diante das transformações geopolíticas pós-Guerra Fria. O evento reafirmou o compromisso do
MNA com a defesa da autodeterminação, da justiça social e dos direitos humanos, buscando
fortalecer a voz dos países em desenvolvimento no cenário global.

Fonte: https://www.instagram.com/p/DDo2tLwhJym/?img_index=1

10 de dezembro. Dia Internacional dos Direitos


Humanos.

Os direitos humanos foram construídos através das lutas e


dos sacrifícios de sucessivas gerações. O surgimento e a
evolução do conceito de direitos humanos foram marcados
por contradições e tensões. De um lado, resultaram da luta
dos oprimidos. De outro, foram consequência do espanto do
homem branco europeu com as atrocidades cometidas
contra outros seres humanos em nome da civilização.

O conceito de direitos humanos tem uma origem eurocêntrica


e foi contemporâneo da colonialidade e da modernidade.
Sempre que se fala em sua universalidade, esconde-se um processo de imposição dos valores e
das ideias dominantes de uma cultura sobre as demais. No entanto, o relativismo e a
demonização do universal também podem ser problemáticos e causar retrocessos, abrindo
espaços para manifestações nacionalistas e xenofóbicas.

A fim de superar as contradições que estão na origem do conceito de direitos humanos,


faz-se necessário construir uma nova ideia da totalidade histórico-social, núcleo de uma
racionalidade não eurocêntrica. A reconstrução do conceito deve ocorrer a partir de uma
dialética intercultural que não exclua o Sul global, os povos originários das Américas, as
comunidades tradicionais e quilombolas e outros grupos que foram ignorados na construção
eurocentrada do significado atribuído aos direitos humanos152.

152
OLIVEIRA, Maria Helena; TELES, Nair; CASARA, Rubens. Direitos humanos e saúde: reflexões e
possibilidades de intervenção. Rio de Janeiro: Editora Fiocruz, 2021; QUIJANO, Aníbal. Colonialidade do

240
O Dia Internacional dos Direitos Humanos, celebrado em 10 de dezembro, remonta à
adoção da Declaração Universal dos Direitos Humanos pela Assembleia Geral das Nações
Unidas, em 1948.

A declaração, que estabelece direitos fundamentais a todas as pessoas,


independentemente de sua raça, cor, religião, sexo ou qualquer outra condição, foi um marco
histórico no pós-Segunda Guerra Mundial, visando promover a paz e a dignidade humana. O dia
foi instituído para conscientizar a população global sobre a importância da proteção dos direitos
humanos e incentivar ações para a sua promoção e defesa. Ao longo das décadas, o Dia
Internacional dos Direitos Humanos tem servido como um momento de reflexão, mobilização e
luta contra abusos e violações desses direitos no mundo todo.

Fonte: https://www.instagram.com/p/DDZrNLizIN6/

Centro Sul

O Centro Sul é uma organização intergovernamental de nações em desenvolvimento,


com sede em Genebra, na Suíça, criada em 1995, que funciona como um think tank de reflexão
e ação política em prol do Sul global. O Centro Sul sucedeu a Comissão do Sul, cujo principal
objetivo era fortalecer a cooperação Sul-Sul nos assuntos internacionais.

Destaques do Centro Sul em janeiro de 2025

23 de janeiro de 2025 - Artigo de Pesquisa - Avaliação


dos cinco anos da Área de Comércio Livre
Continental Africana (African Continental Free
Trade Area - AfCFTA): Propostas sobre potenciais
alterações.

Por Kiiza Africa

Em 30 de maio de 2024, a Área de Livre Comércio


Continental Africana (AfCFTA) comemorou seu
quinto aniversário, o que implicou legalmente que o
acordo estivesse sujeito a uma revisão para possíveis
emendas. Para iniciar essa revisão, a 37ª Sessão Ordinária da Cúpula da União Africana que foi
realizada em fevereiro de 2024 orientou o Secretariado da AfCFTA a adotar as medidas
necessárias para o início da revisão do Acordo.

Esta revisão ocorreu em um momento em que a implementação da AfCFTA e seu


veículo, a Iniciativa de Comércio Guiado (GTI), têm enfrentado grandes desafios. De forma geral,
esses desafios incluem a lenta submissão das programações de liberalização tarifária pelos
Estados Partes, déficits de infraestrutura, barreiras não tarifárias persistentes, guerras
comerciais nas comunidades econômicas regionais e compromissos comerciais regionais
sobrepostos. Assim, a próxima revisão da AfCFTA oferecerá uma oportunidade para avaliar o
progresso, identificar gargalos na implementação e propor emendas viáveis.

Para mais informações, clique aqui:

poder e classificação social. In. SANTOS, Boaventura. S.; MENESES, Maria Paula (Orgs.), Epistemologias do
Sul. São Paulo: Cortez, 2010, p. 84-130.

241
15 de janeiro de 2025 - Artigo de Pesquisa - Aplicação da
Exceção Bolar: Diferentes Abordagens na União
Europeia (UE)

Por Dmytro Doubinsky

O artigo analisa o crescente problema do acesso a


medicamentos essenciais, enfatizando o papel dos
direitos de propriedade intelectual, particularmente os
direitos de patente, na restrição do acesso, ao permitir
monopólios no mercado farmacêutico que mantêm os
preços dos medicamentos elevados.

O texto destaca a exceção Bolar, um mecanismo legal projetado para permitir que os fabricantes
de medicamentos genéricos busquem a aprovação regulatória antes do vencimento de uma
patente, evitando assim a extensão de fato dos monopólios de patentes. Ademais, o estudo
examina a transformação da exceção Bolar de um caso legal específico em uma ferramenta
significativa do direito de propriedade intelectual, comercial e farmacêutico.

Para mais informações, clique aqui.

09 de janeiro de 2025 – Artigo de Pesquisa - Regulamentação internacional de desenhos


industriais: O acordo TRIPS à luz do direito da União Europeia

Por Adèle Sicot

O artigo analisa as disposições do Acordo sobre os Aspectos dos Direitos de Propriedade


Intelectual Relacionados ao Comércio (Acordo TRIPS) sobre desenhos industriais e a maneira
como os aspectos restritos abordados pelo Acordo foram tratados pela legislação da UE.

O texto destaca a ausência de uma definição de assunto passível de proteção e a considerável


flexibilidade deixada para os países membros da Organização Mundial do Comércio (OMC)
determinarem o quadro de proteção, notavelmente com base nos direitos autorais. O artigo
também observa certas áreas em que a legislação europeia é mais elaborada e outras que
poderiam ser consideradas incompatíveis com o Acordo TRIPS.

Para mais informações, clique aqui.

Janeiro de 2025 - Relatório do Centro Sul: Consulta sobre


excesso de conformidade de medidas coercitivas
unilaterais (UCMs)

Por Yuefen Li and Danish

Frente aos graves impactos negativos das medidas


coercitivas unilaterais (UCMs) nos países mais visados e na
comunidade internacional, e a pedido dos Estados
Membros, o Centro Sul organizou uma reunião em 18 de
novembro de 2024, com a participação de diplomatas de
alto escalão de vários países em desenvolvimento, muitos dos
quais haviam sido alvo das referidas medidas.

A reunião concentrou-se nas tendências e nos principais fatores do excesso de


conformidade das medidas coercitivas unilaterais em empresas multinacionais e instituições

242
financeiras, além das estratégias que podem ser adotadas para mitigar tal excesso,
especialmente em relação às isenções humanitárias.

Para mais informações, clique aqui.

ReAct Africa e o South Centre anunciaram as datas da 10ª


conferência regional da Resistência Antimicrobiana.

A ReAct Africa é uma organização focada no combate à


resistência antimicrobiana na África, trabalhando para
desenvolver e implementar Planos de Ação Nacionais
sobre RAM, aumentar a conscientização sobre o tema com
as partes interessadas para enfrentar a ameaça da
resistência aos antibióticos no continente.

A conferência está marcada para 11 a 13 de julho de 2025.

A resistência antimicrobiana tem sido bastante divulgada na


Nigéria (Gombe, Sokoto, Jigawa, Kwara, Damaturu) com sessões de conscientização sobre a
resistência antimicrobiana para estudantes e desta forma divulgar a importância do tema.

*******************

Destaques do Centro Sul em dezembro de 2024

Resumo de Políticas
Policy Brief n. 40, 19 de dezembro de 2024. Cooperação Fiscal. Rumo a um Protocolo da ONU para
Tributação de Serviços Transfronteiriços em uma Economia Digitalizada. Por Abdul Muheet Chowdhary,
Anne Wanyagathi Maina and Kolawole Omole.

Policy Brief n. 133, 2 de dezembro de 2024. Contribuições do Centro Sul para o Documento referente 4ª
Conferência sobre financiamento para o desenvolvimento (FfD4) - Sustentabilidade da Dívida, Negócios
e Finanças, Tributação. Por Yuefen Li, Danish, Abdul Muheet Chowdhary .

Artigos de Pesquisa
Research Paper n. 213, 13 de dezembro de 2024. Navegando no Grupo de Trabalho da OMC sobre
Comércio e Transferência de Tecnologia: Uma Análise Crítica sob a Perspectiva dos Países em
Desenvolvimento. Por Nirmalya Syam.

SOUTHVIEWS

Southview n. 280, 17 de dezembro de 2024. O que está impulsionando o debate do BRICS


sobre a desdolarização?. Por Ding Yifan

Antes da cúpula do BRICS de 2023, em Joanesburgo, na África do Sul, houve muita


discussão entre os países membros sobre a possibilidade de negociações para o
desenvolvimento de uma moeda do bloco, que contribuiria para acelerar o processo de
desdolarização, ou seja, a promoção da cooperação monetária e a redução do uso do dólar
americano. No final, os líderes dos países não discutiram especificamente a questão da moeda
do BRICS, mas aprovaram uma resolução sobre a expansão da adesão à organização. Todavia,
tanto sob uma perspectiva histórica quanto realista, é do interesse dos países do BRICS
promover a desdolarização.

243
Começa a presidência da África do Sul no G20.
Canadá assume a presidência do G7 com grandes desafios internos e na conjuntura
internacional.
A resiliência e os desafios da economia no horizonte da OCDE.
South Africa's G20 presidency begins.
Canada assumes the presidency of the G7 with significant internal and international
challenges.
Resilience and the challenges of the economy on the OECD's horizon.

Pedro Burger
João Miguel Estephanio
Vitória Kavanami
Thaiany Medeiros Cury
Nina Bouqvar
Paulo Esteves

Abstract

G20 - Keeping up with the succession of leaders from the Global South in the G20, South Africa
begins its mandate in the bloc. Under the theme “Solidarity, Equality and Sustainability”, still in
its preliminary stages, the presidency has defined its agendas and priorities for the year.

G7 - In this first report of 2025, we will discuss the background of Canada’s previous G7
presidencies and the expectations for this year. The country is facing a historic political crisis
while also involved in a potential trade war with the United States. In addition, there is growing
tension surrounding the future of multilateralism and the role of a G7 undergoing significant
leadership changes.

OECD - The OECD's highlights include the publication of two studies on the economy of the Latin
American region, another on the global economic outlook and a fourth on gender budgeting in
Brazil. Also highlighted are two articles published by the OECD on health.

Keywords: G20; G7; OECD; South Africa; Canada; United States; multilateralism; international
cooperation.

Resumos

G20 - Dando continuidade à sucessão de lideranças do Sul Global no G20, a África do Sul inicia o
seu mandato no bloco. Sob o tema “Solidariedade, Igualdade e Sustentabilidade”, ainda em fase
inicial, a presidência define suas agendas e prioridades para o ano.

G7 - Neste primeiro informe do ano discutiremos um pouco do histórico do Canadá em


presidências anteriores do G7 e as expectativas para 2025. O país atravessa uma crise política
histórica, ao mesmo tempo em que está à beira de uma guerra comercial com os Estados Unidos.
Há, ainda, a tensão sobre o futuro do multilateralismo e o papel de um G7 que passará por uma
intensa dança das cadeiras.

244
OCDE - Os destaques da OCDE se dividem entre a publicação de dois estudos sobre a economia
da região latino-americana, outro sobre a perspectiva econômica global e um quarto sobre
orçamentação de gênero no Brasil. Também são destaques dois artigos publicados pela OCDE
sobre saúde.

Palavras-chave: G20; G7; OCDE; África do Sul; Canadá; Estados Unidos; multilateralismo;
cooperação internacional.

G20 –

Dando continuidade à sucessão de lideranças do Sul Global no G20, após as gestões do


Brasil (2024), da Índia (2023) e da Indonésia (2022), a África do Sul assumiu a presidência do
bloco e inaugurou um importante momento de visibilidade para o continente africano. A partir
dessa nova etapa e da inclusão da União Africana (UA) como membro do G20 no último ano,
abrem-se possibilidades para que as demandas domésticas da África alcancem a agenda global.
Além disso, a expectativa é de que os interesses dos países em desenvolvimento sejam
impulsionados, no que parece ser uma das últimas oportunidades antes do bloco iniciar um novo
ciclo rotativo em 2026 com a presidência dos Estados Unidos sob comando de Donald Trump.

Pensando nas múltiplas crises que afetam o planeta e na necessidade de cumprir com
os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), o tema escolhido para guiar os trabalhos
da gestão foi: “Solidariedade, Igualdade e Sustentabilidade”. Com apenas 5 anos para completar
as metas propostas, muito ainda precisa ser feito e o G20 possui um importante papel para
acelerar a implementação da Agenda 2030 e promover um crescimento forte, sustentável e
inclusivo – sem deixar ninguém para trás.

A filosofia africana Ubuntu, que significa “eu sou porque nós somos”, aparece como
princípio norteador da presidência. Nesse sentido, por meio de soluções coletivas e da ideia de
uma humanidade compartilhada, o país pretende enfrentar esses desafios urgentes ao
reconhecer que as nações não prosperam de maneira isolada. Como coloca o ministro sul
africano das Relações Exteriores, Ronald Lamola: “Embora a cooperação internacional e o
multilateralismo sejam atualmente confrontados com uma geopolítica divisiva e desafios sem
precedentes, (...) o G20 deve avançar na formação de uma cooperação prática e mutuamente
benéfica que defenda uma ordem internacional mais justa, inclusiva e representativa”153.

Segundo o diagnóstico traçado, quatro pontos aparecem em destaque ao pensar no que


deve ser tomado como prioridade na gestão do bloco. O primeiro deles diz respeito ao
fortalecimento da resposta a desastres e à construção de resiliência. Uma vez que a ocorrência
de desastres ocasionados pelas mudanças do clima tem aumentado e afetado de maneira
desproporcional países que não conseguem arcar com os custos de recuperação, é necessário
elevar essa questão e pressionar a comunidade global e instituições financeiras para melhorar
as condições de reconstrução.

A sustentabilidade da dívida dos países de baixa renda aparece em seguida, sendo


considerada um dos principais obstáculos ao crescimento inclusivo das economias em
desenvolvimento. Para o continente africano o tema é urgente tendo em vista os altos custos

153
SA will use G20 to look ahead to the African Union’s 2063 agenda, says Lamola. 09 dez. 2024. Disponível
em: https://g20.org/news/sa-will-use-g20-to-look-ahead-to-the-african-unions-2063-agenda-says-
lamola/. Acesso em: 02 fev. 2025.

245
de empréstimos, acesso restrito aos mercados de capital internacionais e condições rigorosas
impostas pelas instituições financeiras internacionais. Zâmbia e Gana são exemplos de países
que enfrentam graves crises de endividamento resultantes de práticas de empréstimo
insustentáveis, as quais são agravadas pela volatilidade dos mercados globais e pelo aumento
das taxas de juros cobradas pelos bancos154.

Em terceiro lugar temos o financiamento para uma transição energética justa. Para
tanto, pretende-se criar um acordo para aumentar a qualidade e quantidade de fluxos de
financiamento climático. Segundo o presidente sul africano, Cyril Ramaphosa, é necessário
pensar em mecanismos financeiros inovadores como o uso de capital privado e a tributação para
financiar o desenvolvimento sustentável, a partir, por exemplo, do uso dos Direitos Especiais de
Saque (SDRs, na sigla em inglês) não utilizados pelas nações mais ricas para a África e outros
países do Sul Global155.

Por fim, chama atenção o foco dado ao aproveitamento de minerais considerados


essenciais para o crescimento. O intuito é pensar em uma governança de recursos justa e
garantir que as nações detentoras desses recursos não sejam lesadas no processo de extração
e que as comunidades locais sejam as principais beneficiárias desse processo. Tal tópico é de
extrema importância para o continente e aparece como um dos carros-chefes da presidência do
bloco, tendo em vista que grande parte dos recursos minerais utilizados nos processos de
desenvolvimento, como cobalto, ouro e platina, podem ser encontrados em território africano.

É válido dizer que tais direcionamentos servirão como base para guiar as discussões dos
Grupos de Trabalho ao longo do ano, tanto na trilha dos Sherpas, como na trilha de Finanças.
Além de influenciarem as três Forças-Tarefa temporárias criadas pela gestão156:

● FT 1: Crescimento Econômico Inclusivo, Industrialização, Emprego e Redução da


Desigualdade

● FT 2: Segurança Alimentar

● FT 3: Inteligência Artificial, Governança de Dados e Inovação para o


Desenvolvimento Sustentável

Além dessas contribuições específicas, a África do Sul levará adiante os avanços


alcançados sob as presidências anteriores. O país não criará novos GTs ou estruturas
permanentes, pois tem o intuito de garantir que o bloco permaneça focado nos seus objetivos
centrais. “Vamos nos basear nas presidências anteriores e dar impulso às estruturas e aos
processos existentes. Refletiremos sobre o impacto do G20 nos últimos 20 anos e o
posicionaremos para aumentar seu impacto no próximo ciclo de 20 anos”, disse Ramaphosa.

Diante disso, temas que continuam a compor a agenda são: (i) o aumento de
financiamento justo para o desenvolvimento, inclusive por meio da ampliação dos Bancos

154
As Africa Assumes G20 Leadership, Strengthening African Financial Systems Key to Global Financial
Reforms. G20. 22 jan. 2025. Disponível em: https://g20.org/news/as-africa-assumes-g20-leadership-
strengthening-african-financial-systems-key-to-global-financial-reforms/. Acesso em: 02 fev. 2025.
155
Ramaphosa sets Bold Agenda for South Africa’s G20 Presidency. G20. 22 jan. 2025. Disponível em:
https://g20.org/news/ramaphosa-sets-bold-agenda-for-south-africas-g20-presidency/. Acesso em: 02
fev. 2025.
156
G20 Presidency to establish three dedicated task forces. 03 dez. 2024. Disponível em:
https://g20.org/news/g20-presidency-to-establish-three-dedicated-task-forces/. Acesso em: 02 fev.
2025.

246
Multilaterais de Desenvolvimento (MDBs, na sigla em inglês); (ii) a reforma da arquitetura
financeira global; (iii) prevenção, preparação e resposta para futuras pandemias; (iv) regimes
tributários progressivos e a tributação de grandes fortunas.

Nessa toada, o governo sul-africano reconhece os avanços significativos alcançados pela


presidência brasileira do G20 no aprimoramento do bloco, sobretudo ao promover um ambiente
mais inclusivo e democrático, e pretende dar continuidade a essa trajetória. Para tanto, a África
do Sul também sediará uma Cúpula Social do G20 a fim de garantir que as vozes da sociedade
civil e as demandas dos Grupos de Engajamento sejam ouvidas e cheguem aos processos
decisórios. O Presidente Ramaphosa disse ainda que pretende apoiar a criação de um novo
Grupo de Engajamento, o Township20 (TS20), para destacar o potencial das economias dos
townships da África do Sul, áreas urbanas comerciais ou residenciais localizadas na periferia de
cidades ou vilas: “Isso destacará as capacidades criativas, culturais, financeiras e inovadoras que
nosso próprio país tem a oferecer quando se trata de pequenas e médias empresas, bem como
de cooperativas, e como elas operam nas áreas rurais e nos townships onde nosso povo vive”,
acrescentou.

Em relação à agenda da saúde do G20, a África do Sul pretende impulsionar a Cobertura


Universal de Saúde (CUS) com foco na Atenção Primária à Saúde (APS) como uma abordagem
inclusiva, equitativa, econômica e eficiente para melhorar a saúde física e mental e responder a
emergências de saúde157. Sob o tema “Acelerar a equidade, a solidariedade e o acesso universal
à saúde”, as seguintes prioridades, com seus respectivos resultados esperados, foram definidas
para orientar o percurso:

1. Acelerar a Cobertura Universal de Saúde por meio de uma abordagem de


Atenção Primária à Saúde:

● Realizar um encontro especializado em março de 2025 sobre o desenvolvimento e a


operacionalização de modelos de atendimento orientados para a APS, proteção
financeira e ganhos de eficiência para acelerar o progresso rumo à CUS.

● Consenso e elevado compromisso político entre os países do G20 para acelerar os


modelos de atendimento orientados para a APS e a proteção financeira para a CUS.

● Painel de controle do progresso global na reorientação para uma abordagem de APS,


proteção financeira e fluxos de financiamento para CUS por meio da Organização
Mundial da Saúde, comunidades econômicas regionais e parceiros, incorporando
referências baseadas em evidências informadas pela Agenda de Lusaka.

2. Fortalecimento dos Recursos Humanos para a saúde:

● Destacar essas questões e construir consenso entre os países do G20, parceiros e


instituições financeiras internacionais sobre estratégias para estimular ações e
investimentos na educação da força de trabalho da saúde e da assistência, na criação
de empregos decentes e na retenção da força de trabalho. O foco será criar soluções
sustentáveis para a força de trabalho que promovam a abordagem de APS para CUS,
preparação para emergências de saúde, resposta e inovação com base científica.

● Organizar um encontro técnico sobre a força de trabalho em saúde e cuidados na


terceira reunião do Grupo de Trabalho de Saúde em maio de 2025. O diálogo reunirá os

157
HWG. G20. [s.d.]. Disponível em: https://g20.org/track/health/. Acesso em: 03 fev. 2025.

247
ministros da Saúde e do Trabalho para chegar a um consenso sobre ações e
investimentos em educação, criação de empregos na área da saúde e retenção da força
de trabalho para concretizar as ambições da CUS, da segurança da saúde e dos ODS. O
diálogo também explorará opções de financiamento nacionais e internacionais para
lidar com a crise da força de trabalho. Essas opções poderiam facilitar a busca de
soluções sustentáveis, inovadoras e equitativas para a escassez e a má distribuição da
força de trabalho na área da saúde e do atendimento, concentrando-se naquelas que
têm o maior impacto e que impulsionam o poder das tecnologias digitais de saúde.

● Os Estados Membros do G20 devem considerar a possibilidade de alinhar seus esforços


com a Carta Africana de Investimento na Força de Trabalho em Saúde.

3. Controle da proliferação de Doenças não Transmissíveis (DNTs):

● Estabelecer uma forte rede de colaboração pública e privada com organizações


regionais e internacionais lideradas pela OMS para abordar os principais desafios e
melhorar o acesso equitativo a medicamentos e produtos de saúde para diabetes,
câncer, doenças cardiovasculares e respiratórias.

● Organizar um webinar de alto nível para enfatizar a necessidade de um guia sobre o


acesso a intervenções de DNTs a ser endossado em uma reunião em 2025, após o G20.

● Documento estratégico para melhorar o acesso a medicamentos das DNTs e outros


produtos de saúde.

● Usar intervenções políticas para limitar a comercialização de alimentos não saudáveis


para crianças, o que é uma prioridade crítica de saúde pública observando o ônus
crescente da obesidade.

● Organizar um seminário de alto nível para discutir as experiências dos Estados Membros
na limitação da comercialização de alimentos não saudáveis para crianças.

● Parcerias aprimoradas entre os membros do G20 para combater o câncer do colo do


útero, como uma ilustração concreta de como a cooperação pode promover a saúde da
mulher, fechar uma lacuna importante na resposta ao HIV e traçar uma meta
compartilhada que leva a primeira eliminação de um câncer.

4. Prevenção, preparação e resposta a pandemias (PPRP):

● A África do Sul convocará uma reunião global para fazer um balanço do progresso rumo
ao planejamento da PPRP. Essa reunião será baseada no encontro do G20 convocado
pelo Brasil para avançar no estabelecimento de uma Aliança para Produção e Inovação
Regional.

5. Ciência e inovação para a saúde e o crescimento econômico:

● Trabalhar com todos os países interessados na “Comissão/Iniciativa sobre Ciência e


Inovação para Saúde e Crescimento Econômico” em 2024/2025. Essa iniciativa
analisará, fortalecerá e alavancará os ecossistemas de ciência, pesquisa e inovação dos
Estados membros para melhorar as abordagens integradas à saúde e contribuir para a
oportunidade e o crescimento econômico.

● Mapa de evidências da abordagem atual e do financiamento de ecossistemas científicos


nacionais e regionais com países interessados no G20 e em outros países.

248
● Lições aprendidas em vários países sobre o que foi tentado, o que funciona e o que não
funciona ao usar recursos domésticos limitados para apoiar a ciência e estruturar a
consultoria científica no governo.

● Usar esse trabalho para estabelecer uma estrutura estratégica e prática para princípios
e possíveis práticas recomendadas de como os países podem estruturar, financiar e
sustentar seus ecossistemas científicos nacionais para a saúde e o crescimento
econômico.

● A África do Sul sediará um seminário presencial de alto nível sobre Ciência e Inovação
para a Saúde e o Crescimento Econômico.

Com mais de 130 reuniões planejadas ao longo do país, para além da Cúpula dos Líderes
que ocorrerá em Johanesburgo no mês de novembro, o ritmo do bloco no começo deste ano
ainda é lento e as primeiras reuniões dos Grupos de Trabalho passam a ocorrer a partir da
próxima quinzena.

Após uma gestão bem-sucedida por parte do Brasil, o qual conseguiu não somente
utilizar do espaço multilateral para promover seus interesses
e impulsionar novamente sua figura no cenário internacional,
mas também criar consensos e trazer inovações para dentro
do bloco, fica difícil para a África do Sul superar esse legado. A
ênfase em temas pouco explorados anteriormente como a
resiliência para desastres e a governança de recursos, todavia,
podem trazer bons resultados para o país. Com a presidência
de Trump nos Estados Unidos, mais incertezas são somadas a
um cenário já bastante complexo com guerras em andamento
e a contínua ascensão de uma extrema direita que cada vez
questiona mais o multilateralismo. Diante dessas condições, é
difícil imaginar uma humanidade compartilhada nos moldes
da filosofia que rege o ordenamento do G20 neste ano. No
entanto, a continuidade do protagonismo do Sul Global é algo
a ser celebrado. Resta a expectativa de que essas vozes continuem ecoando ainda que em
tempos mais difíceis e nebulosos.

G7 -

O G7 inicia mais um ano para discutir os grandes desafios globais entre as sete maiores
economias do mundo, à exceção da China e Índia158. Em 1º de janeiro de 2025 observamos o
Canadá assumir a presidência do G7 que alterna anualmente entre os países membros na
seguinte ordem: França, Estados Unidos, Reino Unido, Alemanha, Japão, Itália e Canadá. A União
Europeia não faz parte do rodízio. A Cúpula dos Líderes do G7 neste ano será realizada em
Kananaskis, Alberta, que se encontra na região oeste do Canadá, nos dias 15 a 17 de junho de

158
De acordo com o segundo o mais recente relatório Perspectiva Econômica Mundial (WEO, na sigla em
inglês) do Fundo Monetário Internacional (FMI), as maiores economias do mundo em 2024 eram: em
primeiro lugar, Estados Unidos, e em ordem decrescente: China, Alemanha, Japão, Índia, Reino Unido,
França, Itália, Canadá e, em décimo lugar, Brasil. “As 50 maiores economias do mundo em 2024”. VALOR
ECONÔMICO. 2025. Disponível em: <https://www.terra.com.br/economia/quais-serao-as-50-maiores-
economias-do-mundo-em-2024-segundo-o-
fmi,7261adb8bf02192fbb4a47f81d4cb712ia7712io.html?utm_source=clipboard>. Acesso em:
02/02/2025.

249
2025. Até o momento, foi divulgado que a nova presidência trabalhará com os parceiros do G7
em prioridades comuns, como a construção de economias que beneficiem a todos, o combate
às mudanças climáticas e o gerenciamento de tecnologias em rápida evolução.

O Canadá já sediou seis cúpulas do G7 até o momento, sendo Quebec (2018), Ontario
(2010), Alberta (2002), Nova Escócia (1995), Ontario (1988) e a primeira delas em Ontario-
Quebec (1981). Ao longo de todas as presidências canadenses, pode-se destacar o investimento
histórico do G7 de quase US$ 3,8 bilhões em educação para mulheres e meninas em situações
de crise e conflito, feito durante a Cúpula do G7 em Charlevoix, Quebec, em 2018159. Além disso,
em Ontário, 2010, os conservadores prometeram US$ 1,1 bilhão para a saúde materna e fizeram
com que os países parceiros concentrassem parte de seus orçamentos no apoio à causa160. Na
tabela 1 abaixo, há um breve levantamento dos temas discutidos nas seis últimas presidências
canadenses desde 1981.

Tabela 1. Temas discutidos pelas seis presidências canadenses desde 1981

Ontario-
Ontario Nova Escócia Ontario Quebec
Quebec Alberta (2002)
(1988) (1995) (2010) (2018)
(1981)
Crescimento
Comércio e Comércio Comércio
Comércio Comércio inclusivo
Energia
Países em
Segurança
Política Agricultura Crise desenvolvi- Futuro do
nuclear
Monetária financeira mento e trabalho
África
Igualdade de
gênero e
Desenvolvi- Desenvolvi-
Defesa e Segurança empoderame
Paz e mento mento
Terrorismo nuclear nto das
segurança sustentável sustentável
mulheres

Mudanças
Países em Países em climáticas,
Crise de Segurança Paz e
desenvolvi- desenvolvi- oceanos e
Refugiados alimentar segurança
mento mento energia limpa

Desenvolvi-
Relação Meio Paz e
mento Saúde
Norte-Sul ambiente segurança
sustentável
Segurança Paz e
Alimentar segurança

159
Government of Canada. GOV. 2025. Disponível em: <https://www.international.gc.ca/world-
monde/international_relations-relations_internationales/g7/index.aspx?lang=eng>. Acesso em:
02/02/2025.
160
Canada set to preside over G7 in 2025 amid political instability at home and abroad. CBC. 2025.
Disponível em: <https://www.cbc.ca/news/politics/canada-g7-presidency-2025-1.7421639>. Acesso em:
02/02/2025.

250
No ano de 2025, o G7 completa 50 anos de encontros multilaterais entre os países
membros do grupo, que começou em 1975 com a presidência da França. No ano seguinte, o
Canadá foi convidado a participar do grupo.

É importante relembrar que foi somente a partir dos anos 1980 que o G7 expandiu suas
áreas de discussão para segurança internacional, direitos humanos e estabilidade global. Apesar
de incluir a pauta de meio ambiente, foi a partir dos anos 1990, especificamente na Cúpula de
Munique, Alemanha (1992), que os líderes começaram a discutir de forma mais formal as
mudanças climáticas. No entanto, foi apenas a partir de 2005, na Cúpula do G7 de Gleneagles,
Escócia, que a mudança climática se fixou como um tópico central na agenda dos países, com
compromissos de redução das emissões globais, por exemplo. Temas como saúde só
começaram a ganhar espaço na Cúpula de Lyon, França, em 1996, quando os países
reconheceram a importância de abordar os desafios globais de saúde, incluindo a epidemia de
HIV/AIDS, e começaram a se concentrar mais nas questões de saúde dentro do contexto mais
amplo de desenvolvimento e segurança global. Já no que se refere à agenda de equidade de
gênero, foi propriamente a partir de 2015, que em Elmau, Alemanha, se tornou parte
importante das discussões do G7. A partir de então, o compromisso com o empoderamento
econômico das mulheres, a eliminação da violência contra as mulheres e o aumento da
participação das mulheres nos processos de tomada de decisão têm sido pautas frequentes nas
agendas das sete economias. Foi, portanto, a partir do século XXI, que o G7 buscou envolver os
países em desenvolvimento nas discussões.

Uma pergunta surge neste momento: o que esperar do G7, um grupo multilateral, em
um ano com uma conjuntura internacional tão abalada pela posse de Donald Trump, em seu
segundo mandato, e o cumprimento de suas promessas? Além disso, a preocupação não recai
apenas no cenário internacional, mas Justin Trudeau (Partido Liberal) atravessa uma crise
política também interna. 2025 é um ano de eleições no Canadá e esperava-se que Trudeau
seguisse na presidência até outubro deste ano. No entanto, o partido passa por um
enfraquecimento desde 2021, quando não conseguiu maioria nas eleições e tem feito coalizões
com outros partidos para governar. Trudeau chegou a anunciar, no dia 6 de janeiro de 2025, que
renunciará ao cargo de líder do partido161, ficando no cargo de primeiro-ministro apenas até o
partido conseguir um substituto. Pesquisas indicam que os liberais não conseguirão se reeleger,
independente do substituto encontrado. No entanto, fontes afirmam que a escala da derrota
pode ser amenizada se Trudeau não estiver no comando162.

Até então, o primeiro-ministro canadense se comprometeu a apoiar projetos que


pesquisem como a inteligência artificial pode ser usada sem violar os direitos humanos e os
valores democráticos, e informou que defenderá “a paz e a liberdade para a Ucrânia”163.
Portanto, a manutenção do apoio à Ucrânia pode ser uma pauta esperada para a presidência, a
depender dos rumos políticos internos. Outras questões que vêm à tona para a presidência

161
Justin Trudeau, premiê do Canadá, anuncia renúncia e diz que ficará no cargo até partido encontrar
substituto. G1. 2025. Disponível em: <Justin Trudeau, premiê do Canadá, anuncia renúncia e diz que ficará
no cargo até partido encontrar substituto | Mundo | G1>. Acesso em: 02/02/2025.
162
Ministros e ex-governadores: quem são os cotados a substituir Trudeau, premiê do Canadá; entenda
os cenários possíveis. G1. 2025. Disponível em:
<https://g1.globo.com/mundo/noticia/2025/01/07/ministros-e-ex-governadores-quem-sao-os-cotados-
a-substituir-trudeau-premie-do-canada-entenda-os-cenarios-possiveis.ghtml>. Acesso em: 02/02/2025.
163
Canada set to preside over G7 in 2025 amid political instability at home and abroad. CBC. 2025.
Disponível em: <https://www.cbc.ca/news/politics/canada-g7-presidency-2025-1.7421639>. Acesso em:
02/02/2025.

251
canadense são: o combate à interferência externa e a reforma de agências financeiras, como o
Banco Mundial. Grupos da sociedade civil e pesquisadores esperam que Trudeau reforce o apoio
à Organização Mundial da Saúde (OMS) em um momento em que Donald Trump anunciou a
saída da OMS, além disso que traga à mesa a reversão do corte nos gastos com ajuda externa
desde a pandemia de Covid-19, que impediram o progresso na erradicação de doenças graves.
Ainda, analistas refletem que essa é uma oportunidade para o Canadá recuperar a posição de
ator diplomático eficaz no mundo. O desafio será encaixar o calendário do G7, no calendário
político e eleitoral do Canadá este ano e quais iniciativas serão apresentadas para alcançar
algum consenso – analisa Peter Boehm, ex-diplomata que desempenhou um papel central na
participação do Canadá no G7 por décadas164.

Nos primeiros 2 meses de presidência canadense, lideranças do G7 se pronunciaram


acerca dos seguintes tópicos: i) ministros dos Negócios Exteriores condenaram a ofensiva do
grupo armado M23, apoiado por Ruanda, no leste da República Democrática do Congo e insistiu
que o M23 e as Forças de Defesa de Ruanda parem sua ofensiva. Diante da tomada de cidades
como Minova, Sake e Goma, na República Democrática do Congo, pelo grupo armado, os
ministros pediram com insistência para que os partidos protejam os civis165. Segundo a ONU,
cerca de 250 mil pessoas já foram obrigadas a se deslocarem devido ao acirramento do
conflito166. ii) líderes declararam seu apoio ao cessar fogo entre Israel e Hamas, agradeceram os
esforços dos Estados Unidos, Catar e Egito nas negociações e pediram às partes que se envolvam
de forma construtiva na negociação das fases subsequentes do acordo para ajudar a garantir
sua implementação total e o fim permanente das hostilidades; além disso, também exigiram a
atuação irrestrita da assistência humanitária, o respeito ao direito humanitário internacional e
reiteraram o compromisso de permanecer fornecendo ajuda humanitária e apoiando os
esforços de recuperação e reconstrução em Gaza. Por fim, reiteraram o apoio à solução de dois
estados167.

No cenário Internacional, Trump ameaça impor tarifas de 25% sobre todos os produtos
canadenses se Trudeau não conter a determinação de Trump sobre o fluxo de migrantes e
drogas. Em contrapartida, o Canadá é um grande exportador de petróleo e gás natural para os
EUA, bem como de aço, alumínio e automóveis. Em resposta, durante um conselho consultivo
sobre relações Canadá-EUA, Trudeau afirmou: “Estamos prontos com uma resposta – uma
resposta proposital, enérgica, mas razoável, imediata. Não é o que queremos, mas se ele seguir
em frente, também agiremos”168. Em seguida, o primeiro-ministro impôs uma tarifa também de
25% aos produtos estadunidenses. Como devolutiva, Trump declara que não precisa de nada
que o Canadá oferece em termos comerciais e, mais uma vez, declara o interesse de anexar o

164
Ibid. 2025.
165
Ministros do G7 condenam ofensiva do M23 no leste da RD Congo. BBC. 2025. Disponível em:
<https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/ministros-do-g7-condenam-ofensiva-do-m23-no-leste-da-
rd-congo/>. Acesso em: 02/02/2025.
166
Insegurança no leste da RD Congo é motivo de grande preocupação na ONU. NAÇÕES UNIDAS. 2025.
Disponível em: <https://news.un.org/pt/story/2025/01/1843991>. Acesso em: 02/02/2025.
167
G7 Leaders Statement on Ceasefire and Hostage Deal. EUROPEAN COMMISION. 2025. Disponível em:
<https://neighbourhood-enlargement.ec.europa.eu/news/g7-leaders-statement-ceasefire-and-hostage-
deal-2025-01-17_en>. Acesso em: 02/02/2025.
168
Canadá responderá às ameaças tarifárias de Trump, diz Trudeau. PODER 360. 2025. Disponível em:
<https://www.poder360.com.br/poder-internacional/canada-respondera-as-ameacas-tarifarias-de-
trump-diz-trudeau/>. Acesso em: 02/02/2025.

252
Canadá ao território dos EUA169. Na cúpula de 2018, última sediada pelo Canadá, Trump ofuscou
a reunião ao se recusar a assinar a declaração final, se retirando da reunião mais cedo e
criticando Trudeau como “desonesto e fraco” ao tratar de tarifas. Além disso, foi difícil chegar a
algum consenso nas negociações sobre mudanças climáticas e desenvolvimento de armas
nucleares pelo Irã.

Há, ainda, um ponto interessante para se observar. A Cúpula do G7 de 2025 poderá ter
5 novos chefes de governo. Fontes acreditam que apenas a primeira-ministra da Itália e última
a assumir a presidência do G7, Giorgia Meloni (Partido Irmãos da Itália, extrema direita), e o
presidente da França, Emmanuel Macron (Partido Renascimento, centro-direita), permanecerão
nos cargos em relação à Cúpula de 2024. A tendência é que Alemanha e Canadá deem uma
guinada à direita. Se o cenário esperado se confirmar, será a 1ª vez em 14 anos que o G7 terá 5
de seus 7 líderes mais inclinados ao espectro político da direita170. Isso será um ponto relevante
para se pensar os consensos futuramente, principalmente em temas como: gênero, ajuda
humanitária, Ucrânia, mudanças climáticas e desenvolvimento sustentável.

Para as próximas semanas cabe aguardar, com certa tensão, o futuro do


multilateralismo. A experiência do grupo em atravessar o primeiro mandato de Trump parece
não ter sido suficiente para estimar os danos do cumprimento das promessas de campanha do
seu segundo mandato. Até o momento, podemos perceber que com a saída dos EUA da OMS e,
pela segunda vez, do Acordo de Paris, consensos na área da saúde, assistência humanitária e
mudança climática poderão ser seriamente comprometidos no âmbito do G7. Grandes
preocupações podem ser levantadas quanto ao futuro de programas de assistência humanitária
financiados por órgãos americanos, fundos para conter os agravos climáticos, ou até mesmo da
piora das condições da vida da população migrante. Resta saber como outros países, ou mesmo
diferentes iniciativas somadas, podem preencher esse vácuo que já está demonstrando grande
impacto humano. Ainda, teremos tempo ao longo dos próximos informes para refletir como a
guinada à direita, tanto do núcleo duro do G7, como do mundo de forma geral, poderá alimentar
ou conter o discurso trumpista de isolamento.

OCDE –

Desde o período após o lançamento do último informe de 2024 até o período de análise
do presente informe, é possível observar e ressaltar alguns feitos dentro da miríade de
realizações, estudos, avanços e continuidades produzidas e promovidas pela Organização para
a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

A exemplo, ainda em dezembro de 2024, a OCDE publicou o estudo “Public Trust in Tax
2024: Latin America and Beyond”171 em conjunto com a International Federation of Accountants
(IFAC) e a Association of Chartered Certified Accountants (ACCA). O documento busca fornecer
informações sobre as percepções do público sobre impostos e a confiança do público nos

169
Trump volta a defender anexação ao território dos EUA. PODER 360. 2025. Disponível em:
<https://www.poder360.com.br/poder-internacional/trump-volta-a-defender-anexacao-do-canada-ao-
territorio-dos-eua/>. Acesso em: 02/02/2025.
170
G7 terá dança das cadeiras e mais líderes de direita em 14 anos. PODER 360. 2025.
<https://www.poder360.com.br/poder-internacional/g7-deve-ter-5-lideres-de-direita-em-2025-depois-
de-14-anos/>. Acesso em: 02/02/2025.
171
OCDE, IFAC, ACCA. Public Trust in Tax 2024: Latin America and Beyond. Paris: OECD Publishing, 2024
[cited 2025 Jan 31]. Available from: https://doi.org/10.1787/52ce48d5-en.

253
sistemas tributários de 26 países – majoritariamente localizados na América Latina, mas também
incluindo casos da África e da Ásia. O estudo avalia os posicionamentos em relação à tributação,
tanto na teoria quanto na experiência pessoal, apresentando novas evidências sobre o estado
do contrato fiscal nos países estudados, bem como as opiniões em relação à concorrência e à
cooperação tributária. Ademais, o relatório analisa o grau de confiança de nove atores distintos,
incluindo políticos, contadores de impostos e mídias sociais, como fontes de informações sobre
impostos e a frequência com que são consultados.

Outro estudo aqui em destaque publicado em dezembro na plataforma de biblioteca


virtual da organização foi o do artigo “Unlocking the potential of the social and solidarity
economy for people, places and firms in Latin America and the Caribbean”172. Explorando o
interesse no papel da chamada economia social e solidária no apoio a pessoas, lugares e
empresas na região da América Latina e no Caribe (ALC) e as ações políticas que os países podem
adotar para promover seu potencial, o artigo reflete sobre como a economia social e solidária
pode alavancar o capital social e oferecer soluções inovadoras para questões de desigualdades
espaciais, fomentar e apoiar o empreendedorismo na região e auxiliar na criação de empregos
locais.

Com a região latino-americana e caribenha ainda em evidência, a organização


internacional lançou também no período a edição de 2024 de seu relatório anual de perspectivas
econômicas para a região173. Nele, a organização internacional reforça seu posicionamento
sobre a necessidade dos países da ALC em expandir suas fontes de financiamento, propondo,
portanto, uma série de opções de políticas a fim de mobilizar os recursos necessários, baseadas
em ações coordenadas entre formuladores de políticas, setor privado e parceiros internacionais.

Dessa forma, o relatório argumenta que os recursos públicos devem ser investidos com
mais eficiência, os impostos mais bem arrecadados e a dívida mais bem administrada através de
estruturas fiscais robustas para manter a sustentabilidade fiscal174. No entanto, mesmo com tais
melhorias, os recursos privados são entendidos pela OCDE como igualmente cruciais, já que as
receitas públicas não serão suficientemente capazes para financiar plenamente as profundas
transformações das quais a região necessita. Inclusive, é defendido que a intensidade, o acesso,
a inclusividade e a eficiência dos sistemas financeiros precisam melhorar ainda mais,
especialmente no que tange o benefício dos cidadãos e das empresas menores. Não obstante,
as empresas requerem mercados de capital mais fortes para financiar seus projetos de
investimento de longo prazo.

Sob tal perspectiva, as recomendações apresentadas no documento incluem: (i) o uso


de instrumentos financeiros inovadores; (ii) a renovação do papel das instituições financeiras de
desenvolvimento; (iii) parcerias internacionais reforçadas a fim de mobilizar recursos externos;

172
OCDE. Unlocking the potential of the social and solidarity economy for people, places and firms in Latin
America and the Caribbean. OECD Local Economic and Employment Development (LEED) Papers
[Internet]. Paris: OECD Publishing, 2024 [cited 2025 Jan 31];2024/12. Available from:
https://doi.org/10.1787/11fbb636-en.
173
OCDE, CEPAL, CAF, Comissão Europeia. Latin American Economic Outlook 2024: Financing Sustainable
Development. Paris: OECD Publishing, 2024 [cited 2025 Jan 31]. Available from:
https://doi.org/10.1787/c437947f-en.
174
OCDE. Latin America and the Caribbean need better fiscal policies to finance their development. OECD
[Internet]. 2024 Dez 09 [cited 2025 Jan 31]. Available from: https://www.oecd.org/en/about/news/press-
releases/2024/12/latin-america-and-the-caribbean-need-better-fiscal-policies-to-finance-their-
development.html.

254
e (iv) a adoção de uma agenda regional compartilhada com o objetivo de abordar o contexto
desafiador do financiamento internacional.

O documento possui também seções individuais voltadas para os países da região


(incluindo o Brasil175), onde são considerados seus contextos, índices, dados e particularidades
e então recomendadas políticas de acordo com suas especificidades.

Na esteira de tal discussão, a OCDE também publicou em dezembro de 2024 a segunda


edição de seu tradicional semestral “Economic Outlook” (Perspectiva econômico, em tradução
livre), em que analisa e projeta as principais tendências e perspectivas econômicas mundiais
para os próximos dois anos, além de apresentar um conjunto consistente de projeções para
produção, emprego, gastos do governo, entre outros176.

A mais recente edição da iniciativa indica que a economia global permaneceu resiliente
em 2024, apesar das diferenças na força da atividade entre países e setores. A inflação
continuou a se moderar, com o retorno da inflação geral às metas do Banco Central na maioria
das economias analisadas, e o aperto no mercado de trabalho também se atenuando, embora
as taxas de desemprego permaneçam, em geral, em níveis mínimos históricos ou próximos a
eles. Todavia, é enfatizado que os riscos observados pelo estudo estão lançando uma sombra
sobre o que, de outra forma, é uma projeção central relativamente benigna do futuro. Tais riscos
se referem a situações tais como a intensificação das tensões políticas (como, por exemplo, os
conflitos em curso no Oriente Médio), a inflação se tornar mais persistente do que o previsto
anteriormente e a uma forte reavaliação dos riscos nos mercados financeiros após surpresas
adversas.

Desse modo, a economia global deverá permanecer resiliente apesar dos desafios
significativos177. O relatório projeta, então, um crescimento do PIB global de 3,3% em 2025,
acima dos 3,2% em 2024, e permanecendo em 3,3% em 2026. Espera-se também que a inflação
na OCDE diminua ainda mais, dos 5,4% observados em 2024 para 3,8% em 2025 e 3,0% em 2026,
apoiada pela postura ainda restritiva da política monetária na maioria dos países.

Assim, a OCDE recomenda aos formuladores de políticas três observações gerais:

1. A política monetária deve continuar a se afrouxar, porém precisa permanecer


prudente, com as políticas monetárias se baseando em avaliações cuidadosas e
dependente de dados para garantir que as pressões inflacionárias subjacentes
sejam contidas de forma duradoura;

2. Os governos precisam intensificar os esforços para consolidar as finanças


públicas, frisando assim a necessidade de ações fiscais decisivas para assegurar
a sustentabilidade da dívida, preservar o espaço para os governos reagirem a

175
OCDE, CEPAL, CAF, Comissão Europeia. Latin American Economic Outlook 2024: Financing Sustainable
Development – Brazil. Paris: OECD Publishing, 2024 [cited 2025 Jan 31]. Available from:
https://www.oecd.org/en/publications/latin-american-economic-outlook-2024_c437947f-en/full-
report/brazil_e57a5993.html.
176
OCDE. OECD Economic Outlook, Volume 2024 Issue 2. Paris: OECD Publishing, 2024 [cited 2025 Jan 31].
Available from: https://doi.org/10.1787/d8814e8b-en.
177
OCDE. Economic Outlook: Global growth to remain resilient in 2025 and 2026 despite significant risks.
OECD [Internet]. 2024 Dez 04 [cited 2025 Jan 31]. Available from:
https://www.oecd.org/en/about/news/press-releases/2024/12/economic-outlook-global-growth-to-
remain-resilient-in-2025-and-2026-despite-significant-risks.html.

255
choques futuros e gerar recursos para auxiliar a atender às grandes pressões de
gastos iminentes;

3. São necessárias reformas políticas estruturais ambiciosas para aprimorar as


bases do crescimento, com um maior investimento em educação e no
desenvolvimento de habilidades e na redução de restrições nos mercados de
trabalho e de produtos que impedem o investimento e a mobilidade da mão de
obra.

Figura 2. Projeções de crescimento real do PIB para 2024, 2025 e 2026 para economias
do G20, % em relação ao ano anterior.

Fonte: OCDE, 2024.

Ademais, em sua avaliação individual do projeto para o Brasil178, a OCDE projetou que o
PIB real brasileiro cresceu 3,2% em 2024 e que em 2025 será de 2,3% e em 2026, estima-se 1,9%.
Tais projeções são embasadas na percepção que a criação persistente de empregos e o forte
crescimento dos salários impulsiona o consumo das famílias até 2025 e que, após uma forte
retomada em 2024, o investimento privado permanecerá dinâmico, embora com uma gradual
desaceleração. Além disso, uma desaceleração no crescimento do mercado de exportação
limitará a expansão das exportações.

Paralelamente, a organização também lançou o interessante estudo “Gender budgeting


in Brazil”179, onde aborda sobre as estruturas institucionais existentes e o trabalho recente para

178
OCDE. OECD Economic Outlook, Volume 2024 Issue 2 – Brazil. Paris: OECD Publishing, 2024 [cited 2025
Jan 31]. Available from: https://www.oecd.org/en/publications/oecd-economic-outlook-volume-2024-
issue-2_d8814e8b-en/full-report/brazil_e26b6824.html.
179
OCDE. Gender budgeting in Brazil. OECD Papers on Budgeting [Internet]. Paris: OECD Publishing, 2024
[cited 2025 Jan 31];2024/04. Available from: https://doi.org/10.1787/fa31b226-en.

256
introduzir uma dimensão de gênero no planejamento plurianual, bem como no processo
orçamentário anual brasileiro. Dessa maneira, o artigo recomenda uma série de ações para
fortalecer a orçamentação de gênero, com base na ”Framework for Gender Budgeting”
(Estrutura para Orçamentação de Gênero) da própria OCDE, bem como nas melhores práticas
internacionais.

Ainda com o Brasil em foco, é relevante ressaltar a declaração do secretário-geral da


OCDE, Mathias Cormann, sobre sua pretensão de visita ao país a fim de debater seu “pleno
ingresso” como integrante do bloco180 – o que revela a insistência e o interesse por parte da
organização no progresso da relação e parceria entre o Brasil a OCDE, uma vez que o processo
de adesão tem estado estagnado e sem grande protagonismo na agenda de política externa
brasileira.

Por fim, no que tange às publicações diretamente relacionadas à área de saúde, ressalta-
se a publicação do estudo “What Do We Know about Young People’s Interest in Health
Careers?”181, cujo foco principal é a preocupação crescente sobre a escassez de mão de obra na
área da saúde e suas reverberações e efeitos no futuro, muito agravados pelo envelhecimento
populacional. Assim, o relatório técnico analisa os dados disponíveis sobre o interesse de
estudantes em empregos no setor da saúde a partir de duas fontes principais: a pesquisa PISA
da OCDE, que abrange cerca de 80 países e economias da OCDE e outros países, e inscrições e
admissões de estudantes em programas de educação em saúde com base em dados
administrativos nacionais. O resultado apontado pela análise dos dados da pesquisa PISA
indicam que o interesse de estudantes de 15 anos de idade em seguir carreira no setor da saúde
diminuiu em cerca de metade dos países da OCDE entre os anos de 2018 e 2022 e também
diminuiu em vários países não pertencentes à OCDE.

Já o artigo “Leading practices for the future of telemedicine: Implementing telemedicine


post-pandemic”182, cujo os autores investigam como os países da OCDE incorporaram a
telemedicina no atendimento diário e as implicações no acesso equitativo, no financiamento
sustentável e na tomada de decisões baseadas em dados. Através de discussões aprofundadas
com especialistas e análise das práticas de telemedicina nos países da OCDE, são identificadas
as principais práticas de coleta de dados, modelos inovadores de financiamento, governança
inclusiva e integração aos modelos de atendimento, principalmente no momento pós-
pandêmico, e os desafios e dificuldades encontrados nas experiências dos países.

180
Rigamonti S. Secretário da OCDE quer vir ao Brasil para discutir adesão ao bloco. Folha de S. Paulo
[Internet]. 2025 Jan 30 [cited 2025 Jan 31]. Available from:
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/painelsa/2025/01/secretario-da-ocde-quer-vir-ao-brasil-para-
discutir-adesao-ao-bloco.shtml.
181
OCDE. What Do We Know about Young People’s Interest in Health Careers? Paris: OECD
Publishing, 2025 [cited 2025 Jan 31]. Available from: https://doi.org/10.1787/002b3a39-en.
182
Keelara R, Sutherland E, Almyranti M. Leading practices for the future of telemedicine:
Implementing telemedicine post-pandemic. OECD Health Working Papers [Internet]. Paris: OECD
Publishing, 2025 [cited 2025 Jan 31];173. Available from: https://doi.org/10.1787/496a8ffe-en.

257
Prioridades do Brasil ao assumir a presidência de turno do BRICS em 2025
Brazil's priorities when assuming the BRICS presidency in 2025

Claudia Hoirisch

Resumo: Sob o lema “Fortalecendo a Cooperação do Sul Global por uma Governança mais
Inclusiva e Sustentável”, a presidência brasileira irá atuar nesse ano em dois eixos principais:
Cooperação do Sul Global e a Reforma da Governança Global. Entre os objetivos do foro está
o de fortalecer a cooperação econômica, política e social entre os membros e o aumento da
influência dos países do Sul Global na governança internacional, bem como impulsionar o
desenvolvimento socioeconômico sustentável e promover a inclusão social nessas nações. As
agendas do Brasil estão refletidas em cinco prioridades: facilitação do comércio e
investimentos entre os países do grupo, via desenvolvimento de meios de pagamento;
promoção da governança inclusiva e responsável da Inteligência Artificial para o
desenvolvimento; aprimoramento das estruturas de financiamento para enfrentar as
mudanças climáticas, em diálogo com a COP 30; estímulo aos projetos de cooperação entre
países do Sul Global, com foco em saúde pública e fortalecimento institucional do BRICS. Esse
artigo pretende desenvolver cada um desses pontos, inclusive a cooperação entre países do
Sul Global, com foco em saúde pública. Nessa área, a Fiocruz organizará reuniões da Rede de
Institutos de Saúde Pública do BRICS, do Centro de P&D de Vacinas do BRICS e a Conferência
de Institutos Nacionais de Saúde Pública do BRICS.

Palavras-chave: BRICS. Cooperação do Sul Global. Reforma da Governança Global. Facilitação


do comércio e investimentos. Desenvolvimento de meios de pagamento. Inteligência Artificial.
Financiamento para enfrentar as mudanças climáticas. COP30. Ccooperação entre países do Sul
Global, com foco em saúde pública. Fortalecimento institucional do BRICS. Rede de Institutos
de Saúde Pública do BRICS. do Centro de P&D de Vacinas do BRICS. Conferência de Institutos
Nacionais de Saúde Pública do BRICS.

Abstract: Under the theme “Strengthening Global South Cooperation for More Inclusive and
Sustainable Governance”, the Brazilian presidency will prioritize two main areas: advancing
Global South cooperation and reforming global governance structures. These themes translate
into five key priorities: facilitating Trade and Investment: Promoting economic integration
through the development of efficient payment systems; regulating Artificial Intelligence:
encouraging inclusive and responsible AI governance for development purposes; addressing
Climate Change: enhancing financing mechanisms to support global efforts, in coordination with
the COP30 Climate Summit; Public Health Collaboration: strengthening cooperation projects
among member countries, focusing on improving public health systems; Institutional
Development: bolstering the internal frameworks of BRICS to ensure effective governance and
decision-making. This article intends to develop each of these points, including cooperation
among countries in the Global South, with a focus on public health. In this field, Fiocruz will
organize meetings of the BRICS Network of Public Health Institutes, the BRICS Vaccine R&D
Centre and the Conference of the BRICS National Public Health Institutes.

Keywords: BRICS. Global South Cooperation. Global Governance Reform. Facilitation of trade
and investments. Development of methods of payment. Artificial intelligence. Financing to tackle

258
climate change. COP30. Cooperation between countries in the Global South, focusing on public
health. Institutional strengthening of BRICS. BRICS Network of Public Health Institutes. BRICS
Vaccine R&D Centre. Conference of the BRICS National Public Health Institutes.

2025: o ano que o Brasil assume a presidência de turno do BRICS

Sob o lema “Fortalecendo a Cooperação do Sul Global por uma Governança mais
Inclusiva e Sustentável”, a presidência brasileira irá atuar nesse ano, em dois eixos principais:
Cooperação do Sul Global e a Reforma da Governança Global.

Entre os objetivos do foro está o de fortalecer a cooperação econômica, política e social


entre os membros e o aumento da influência dos países do Sul Global na governança
internacional, bem como impulsionar o desenvolvimento socioeconômico sustentável e
promover a inclusão social nessas nações.

As agendas do Brasil estão refletidas em cinco prioridades:

1) facilitação do comércio e investimentos entre os países do grupo, via desenvolvimento de


meios de pagamento

2) promoção da governança inclusiva e responsável da Inteligência Artificial para o


desenvolvimento

3) aprimoramento das estruturas de financiamento para enfrentar as mudanças climáticas, em


diálogo com a COP 30 (Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas de 2025)

4) estímulo aos projetos de cooperação entre países do Sul Global, com foco em saúde pública

5) fortalecimento institucional do BRICS.

A seguir, desenvolverei cada um desses pontos.

1) Desenvolvimento Institucional

Em 2009, os países BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China) tornaram-se um grupo autônomo
com o objetivo de reformar instituições financeiras internacionais, apoiar uma ordem mundial
multipolar mais democrática e justa e servir aos interesses comuns de economias de mercado
emergentes e países em desenvolvimento. Embora os representantes do BRIC tenham
enfatizado que o grupo não era antiamericano, alcançar a multipolaridade requer alguma forma
de equilíbrio suave para restringir a hegemonia dos EUA e transformar o sistema.

Em 2010, o BRIC convidou a África do Sul a se juntar, formando o BRICS. Desde então, o
grupo vem investindo em seu desenvolvimento e criou instituições como o Novo Banco de
Desenvolvimento (NDB) e o Arranjo Contingente de Reservas (CRA).

O NDB foi concebido em 2013 como uma alternativa às instituições financeiras


internacionais estabelecidas e tem por objetivo mobilizar recursos para projetos de
infraestrutura e desenvolvimento sustentável em mercados emergentes e países em
desenvolvimento. Ao longo dos anos vem financiando projetos que vão desde o aumento da
capacidade de transporte de gás natural liquefeito na China até o Programa Emergencial de
Apoio à Resposta à Covid-19, que restaurou um crescimento forte e sustentável para seus
países-membros. O volume total de financiamento aprovado pelo Banco até o momento foi de

259
USD 30 bilhões. Já o Arranjo Contingente de Reservas foi criado em 2015 para apoiar
dificuldades temporárias de balanço de pagamento de seus membros.

A Cúpula do BRICS de 2023 anunciou a segunda ampliação do grupo original, que passou
a vigorar em 1º de janeiro de 2024183. Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e
Irã foram convidados a se unir ao grupo como membros plenos. A Arábia Saudita, apesar de não
ter assinado a adesão ao grupo, provavelmente priorizando sua relação com os EUA em meio
ao redesenho geopolítico no Oriente Médio, tem participado de todos os encontros.

Na Cúpula de Kazan, Rússia, em 2024, o grupo introduziu a categoria de país parceiro e


acordou em convidar treze países - Argélia, Nigéria, Uganda, Bolívia, Cuba, Indonésia, Malásia,
Vietnã, Tailândia, Bielorrússia, Cazaquistão, Uzbequistão e Turquia. Uganda, Bolívia, Cuba,
Malásia, Tailândia, Bielorrússia, Cazaquistão e Uzbequistão são as primeiras nações a aderir ao
BRICS nessa categoria184 e caberá à presidência brasileira supervisionar a gestão do processo de
ampliação.

Em janeiro de 2025, a Indonésia foi convidada a ingressar na lista de países-membros e


traz peso significativo ao grupo. Possui a quarta maior população do planeta, 284 milhões de
habitantes, tem a 10ª maior economia (PPC) e uma das maiores florestas tropicais do mundo.
Apresenta potencial de cooperação em áreas como meio ambiente, comércio e inovação
tecnológica.

A expectativa é que nove países ingressem formalmente no BRICS neste ano, entre
eles, Cuba, Bolívia, Malásia e Tailândia, sejam como membros plenos ou parceiros185.

2) Ampliação e facilitação do comércio e investimentos, via desenvolvimento de meios de


pagamento

De acordo com a análise denominada “O Efeito Bloco: Comércio Internacional com


Aliados Geopolíticos em Ascensão”, os países em geral negociaram quase US$ 270 bilhões a mais
com aliados geopolíticos em 2023, em relação a 2018. Em contraste, o comércio dos países com
blocos rivais teve um declínio de US$ 314 bilhões186. O movimento em direção ao fortalecimento
das relações comerciais com base na proximidade geopolítica é uma tendência global.

A China já previa essa correlação positiva. Durante a cúpula do BRICS de 2017, propôs
uma grande mudança institucional para transformar o grupo em uma plataforma econômica e
política, capaz de reformar a governança econômica global. O MRE da China, Wang Yi, afirmou
que a China queria "ampliar o círculo de amigos do BRICS e transformá-lo na plataforma mais
influente para a cooperação Sul-Sul do mundo"187. O conceito BRICS+ expandiria a associação
ao mesmo tempo em que formaria uma plataforma ampla e integrativa para promover
colaboração econômica e elevaria o status global do BRICS.

Tomando-se em conta o volume de exportações e importações de mercadorias, a


participação do BRICS nas exportações globais aumentou de 10,7% para 23,3%, de 2000 para

183 A primeira foi com o ingresso da África do Sul


184 https://agenciagov.ebc.com.br/noticias/202501/oito-nacoes-sao-anunciadas-como-2018paises-parceiros2019-do-
brics
185
https://agenciabrasil.ebc.com.br/internacional/noticia/2024-10/brics-vai-convidar-cuba-bolivia-
turquia-nigeria-e-mais-nove-paises
186
https://www.visualcapitalist.com/sp/hf02-international-trade-with-geopolitical-allies-rising/
187
Xinhuanet, 'O mecanismo do BRICS brilhará mais intensamente: Chanceler chinês', 8 de março de
2017, http://www.xinhuanet.com/english/2017-03/08/c_136112470.htm .

260
2023, por outro lado, a participação do grupo G7 nas exportações globais caiu de 45,1% para
28,9 %188. Um padrão semelhante é visível no caso da participação nas importações de
mercadorias. Enquanto a participação do BRICS+ aumentou de 7,2% para 18,9% de 2000 para
2023, a do G7 caiu de 49,8% para 33,7%. Isso mostra que a importância do BRICS tem aumentado
progressivamente em termos de tamanho da economia e em termos de sua participação nas
exportações e importações mundiais189. Analistas apontam que o BRICS+ deverá ultrapassar o
G7 em 2026 em volume de exportações de mercadorias190.

A guerra na Ucrânia e as sanções à Rússia vem desempenhando um papel significativo


na formação das principais tendências comerciais. Os BRICS vêm negociando menos com o G7 e
UE e estão contando mais com membros de seu grupo e parceiros comerciais fora de seu bloco
para compensar a perda de participação no G7 e na UE. O comércio intra-BRICS aumentou 56%
entre 2017 e 2022, atingindo USD 615 bilhões em 2022. O comércio mútuo entre os BRICS cresce
a um ritmo três vezes superior à média global a cada ano. Nos últimos dez anos, o comércio
global cresceu 3% ao ano, o comércio BRICS-mundo cresceu 2,9% ao ano e o comércio dentro
da associação cresceu 10,7% ao ano191.

Atualmente não há um acordo de livre comércio (ALC) BRICS+, os membros estão


trabalhando para estabelecer padrões comuns para produtos e remover barreiras à entrada no
mercado para facilitar o comércio. Enquanto o ALC não sai, os países BRICS+ podem alavancar
suas conexões com outros blocos de livre comércio aos quais pertencem. O Brasil e a Bolívia são
membros do Mercado Comum do Sul (MERCOSUL); a Rússia, Cazaquistão, Quirquistão e
Bielorrússia tem espaço comercial na União Econômica Eurasiática (UEE); a Índia desempenha
um papel de liderança na Área de Livre Comércio do Sul da Ásia (SAFTA); a China, Indonésia,
Malásia, Tailândia e Vietnã participam da Parceria Econômica Regional Abrangente (RCEP) e a
África do Sul, Argélia, Egito, Etiópia, Nigéria e Uganda participam da Área de Livre Comércio
Continental Africana (AfCFTA). O BRICS+ deve capitalizar essas conexões para ter uma atuação
sinérgica nos acordos e arranjos comerciais.

A construção de um sistema alternativo de financiamento e pagamento está no topo


da agenda do BRICS. O atual sistema financeiro de Bretton Woods é dominado pelo dólar
americano e operado pelo FMI e BM, liderados pelo Ocidente. Durante décadas, o BM
negligenciou o financiamento de infraestrutura em favor do alívio da pobreza e da boa
governança, enquanto o FMI forneceu empréstimos para mercados emergentes, mas exigiu
ajustes estruturais contraproducentes para os países beneficiários. O NDB (Banco do BRICS) foi
criado em 2015 para preencher a lacuna no financiamento de infraestrutura e desenvolvimento.
Aprovou bilhões de dólares em empréstimos para projetos como infraestrutura de água e
transporte e recursos para a recuperação da Covid-19. Além dos cinco membros fundadores, o
NDB acolheu quatro novos membros em 2021, incluindo Bangladesh, Egito, Emirados Árabes
Unidos e Uruguai.

188
https://www.business-standard.com/economy/news/brics-group-expected-to-surpass-g7-in-global-
trade-by-2026-ey-india-124103100815_1.html
189
https://www.business-standard.com/economy/news/brics-group-expected-to-surpass-g7-in-global-
trade-by-2026-ey-india-124103100815_1.html
190
https://www.business-standard.com/economy/news/brics-group-expected-to-surpass-g7-in-global-
trade-by-2026-ey-india-124103100815_1.html
191
https://brics-russia2024.ru/en/news/rossiya-predlozhila-stranam-briks-povysit-dostupnost-
vzaimnykh-investitsiy-i-tekhnologiy/

261
Tanto NDB quanto o CRA são organismos financeiros com os mesmos fins que o BM e o
FMI. O CRA foi criado para fornecer suporte de liquidez a países-membros que enfrentam
pressões de curto prazo na balança de pagamentos ou volatilidades cambiais.

Os membros do BRICS+ têm usado cada vez mais moedas locais para o comércio. Desde
2018, a parcela das exportações faturadas em dólares da Rússia para outras economias do BRICS
caiu de 85% para 36%192.

Antes da cúpula de Kazan, um novo sistema de pagamento transfronteiriço


denominado BRICS Pay193,194 foi apresentado, o sistema visa permitir pagamentos digitais
seguros e protegidos entre os diferentes países no formato BRICS+, possibilitando que
consumidores e empresas que lidam com comércio eletrônico transacionem em sua moeda
local.

Um dos aspectos mais inovadores da estratégia do BRICS é o plano para uma


infraestrutura financeira independente. O BRICS está explorando "a viabilidade de conectar as
infraestruturas dos mercados financeiros dos países do BRICS em uma infraestrutura
independente para pagamentos, transferências e depósitos transfronteiriços, o BRICS Clear",
que será o pilar de uma rede independente na qual os países do BRICS poderão liquidar
transações diretamente. Essa infraestrutura permitirá que os países do grupo controlem seus
próprios fluxos comerciais, livres de restrições e comissões bancárias. O BRICS Clear cria uma
estrutura para o comércio independente que permite que os membros do BRICS tomem as
rédeas de seu futuro econômico e sirvam de exemplo para os mercados emergentes que buscam
independência econômica.

Edward Fishman, pesquisador sênior da Universidade de Columbia e autor do próximo


livro Chokepoints: American Power in the Age of Economic Warfare, disse que “os BRICS
finalmente encontraram uma missão unificadora: contornar o domínio financeiro americano".

Para os membros do BRICS sob sanções dos EUA, a saber, Rússia e Irã, esta missão já é
uma prioridade nacional máxima. Outros, como a China, veem isso como uma maneira útil de
se isolar de potenciais sanções no futuro.

3) Aprimoramento das estruturas de financiamento para enfrentar as mudanças climáticas,


em diálogo com a COP 30

Os países BRICS possuem responsabilidades e deveres no combate à crise climática


(Figura 1). No entanto, por uma série de motivos e em diferentes graus, as metas, políticas e
ações climáticas atuais dos cinco países não são consistentes com o objetivo do Acordo de Paris
de limitar o aumento da temperatura do planeta a 1.5ºC. Matrizes energéticas altamente
dependentes de combustíveis fósseis (com exceção do Brasil), financiamento climático
insuficiente (principalmente nos casos de Índia e África do Sul) e disputas geopolíticas (no caso
do Rússia e China), constituem alguns dos principais obstáculos à implementação de políticas
mais efetivas.

192
www.project-syndicate.org/onpoint/making-global-monetary-system-work-for-global-south-by-
hippolyte-fofack-2023-02
193
https://www.brics-pay.com/
194
Apesar dos esforços do BRICS, nenhum país que use um sistema alternativo como o BRICS Pay estará
imune a sanções.

262
Figura 1 – Parcela de emissão global (%)

Apesar de líderes da transição energética global para as fontes renováveis, China e Índia
são os maiores produtores de carvão do mundo. Em 2022, a Rússia foi o maior fornecedor
individual de pagamentos de subsídios para o setor de combustíveis fósseis. Após a invasão da
Ucrânia, a pauta climática perdeu ainda mais protagonismo no país. No caso do Brasil, apesar
das iniciativas mais ambiciosas e voltadas para a transição energética, incentivos aos
combustíveis fósseis, principalmente petróleo e gás, ainda estão presentes no arcabouço
energético do país e o desmatamento e a atividade agropecuária continuam a ser responsáveis
por altas taxas de emissões de gases de efeito estufa (GEE). A África do Sul carece de fontes de
financiamento adequadas para transformar sua matriz energética, altamente dependente de
combustíveis fósseis, e cumprir sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC).195

Índia, África do Sul e Brasil, individualmente e no âmbito dos BRICS, reforçam o princípio
das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, e suas respectivas capacidades (CBDR-
RC)196 e defendem que países desenvolvidos assumam uma maior responsabilidade pelo
financiamento das ações de mitigação e adaptação climática em países em desenvolvimento,
assim como pela transferência de tecnologia e cooperação técnica.

A COP29, conferência do clima da ONU realizada em Baku, Azerbaijão, terminou em


novembro de 2024 com a aprovação de um acordo sobre a Nova Meta Quantificada Coletiva 197
(NCQG), para o financiamento climático global no contexto do Acordo de Paris. Mas a
Conferência de Baku foi considerada por muitos como “a COP que não entregou”. O Acordo da
NCQG estabelece que os países desenvolvidos devem assumir a liderança no fornecimento de,
pelo menos, US$ 300 bilhões anuais até 2035 para apoiar os países em desenvolvimento na

195
As NDC são metas de redução de emissões de gases de efeito estufa (GEE) que os países signatários do
Acordo de Paris devem apresentar. Na COP29, o Brasil apresentou uma nova NDC, que inclui o
compromisso de não expandir novas áreas de petróleo e gás, principalmente na Amazônia. O país
também se comprometeu a implementar o Plano Clima, que guiará as ações para reduzir as emissões e
se adaptar aos impactos da mudança do clima até 2035.
196
RCDR-RC é um princípio do direito ambiental internacional que considera que os países têm
responsabilidades comuns na proteção do meio ambiente, mas que essas responsabilidades devem ser
diferenciadas de acordo com as capacidades de cada país.
197
https://www.gov.br/mma/pt-br/noticias/cop29-termina-com-acordo-sobre-nova-meta-de-
financiamento-climatico-global

263
implementação de ações de mitigação de emissões de gases de efeito estufa e de adaptação aos
impactos da mudança climática, além disso, a decisão convida as nações a cooperarem para
alcançar, até 2035, a cifra de USD 1,3 trilhão por ano, proveniente de fontes públicas e
privadas.198 Embora a definição da NCQG fosse o principal objetivo da conferência de Baku, o
valor foi considerado insuficiente pelos países em desenvolvimento e pela delegação brasileira,
que demandam USD 1,3 tri/ano como base da meta. Estudos apontam que as necessidades dos
países em desenvolvimento no enfrentamento à crise climática superam a casa dos trilhões de
dólares anuais.

A COP29 estabeleceu o “Roteiro Baku a Belém para 1,3T”, até novembro de 2025,
quando ocorrerá a COP30 em Belém sob a presidência do Brasil, os países devem trabalhar para
acordar uma trajetória de escalonamento do financiamento climático às nações em
desenvolvimento.

O financiamento é crucial para viabilizar a implementação das Contribuições


Nacionalmente Determinadas (NDCs). Até fevereiro de 2025, os países devem apresentar NDCs
atualizadas, com compromissos de mitigação para 2035 alinhados ao objetivo do Acordo de
Paris de limitar o aquecimento médio do planeta a 1,5ºC em comparação ao período pré-
industrial, com foco na eliminação gradual de combustíveis fósseis, aumento de energias
renováveis e redução de emissões de metano.

O Brasil foi um dos primeiros países a apresentar sua nova NDC durante a COP29, com
um compromisso de reduzir até 53,1% e até 67% de suas emissões até 2030 e 2035
respectivamente, em relação aos níveis de 2005.

Apesar de avanços, a COP29 enfrentou críticas significativas. Países em


desenvolvimento expressaram insatisfação com o montante acordado para o financiamento
climático, considerando-o insuficiente para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças
climáticas. Além disso, a ausência de compromissos claros para a redução do uso de
combustíveis fósseis foi alvo de desaprovação por parte de ambientalistas e organizações da
sociedade civil.

4) Promoção da governança inclusiva e responsável da Inteligência Artificial para o


desenvolvimento

Os EUA e a China são as maiores potências na área de IA do mundo e o presidente eleito


Trump, nomeou um czar da IA para ajudar a garantir que os Estados Unidos continuem sendo a
potência mais rica e tecnologicamente mais avançada do mundo.

Além da China, a Rússia e a Índia estão entre os dez países, incluindo EUA, Reino Unido,
Canada, Alemanha, França, Japão e Israel que estão desenvolvendo seus próprios modelos de
IA generativa. A Rússia prevê que o uso de tecnologias de IA em todos os setores adicionará USD
109 bilhões ao seu PIB em 2030.

Uma análise das declarações de cúpulas de líderes e reuniões ministeriais indica que os
BRICS veem a IA como uma forma catalisadora para o crescimento econômico,
desenvolvimento, progresso tecnológico e para sociedades inclusivas.

198
https://www.gov.br/mma/pt-br/noticias/cop29-termina-com-acordo-sobre-nova-meta-de-
financiamento-climatico-global

264
Os BRICS buscaram desenvolver suas políticas de IA e avançar as capacidades nessa área
nos membros. Isso pode ser evidenciado não apenas na criação do BRICS AI Study Group (agosto
2023), mas também na criação de um GT sobre Economia Digital para se concentrar em
melhorar as capacidades e capacidades digitais dos países BRICS por meio do desenvolvimento
de habilidades, implementação de infraestrutura digital, inovação digital e aprimoramento da
conectividade intra-BRICS. Em janeiro de 2024, Pequim solicitou que um centro de “Cooperação
para o Desenvolvimento de IA dos BRICS” fosse estabelecido na China. Um mês depois,
pesquisadores chineses divulgaram o AI Governance International Evaluation Index, avaliando o
nível de desenvolvimento de IA dos BRICS, ferramentas de governança e eficácia da governança
em relação aos países do G7. Isso implica um interesse de estabelecer a posição do grupo, em
vez da de membros individuais, como um parceiro de diálogo na governança global de IA.

O Banco dos BRICS está investindo em aplicações de IA nos países do grupo como o
“desenvolvimento de metrô inteligente” na China e está utilizando IA para melhorar suas
próprias práticas institucionais.

Em dezembro de 2024, o presidente russo Vladimir Putin anunciou a criação de uma


Rede de Alianças de IA (AI Alliance Network) que incluirá instituições de desenvolvimento na
área de IA dos países BRICS e outros interessados. A China anunciou recentemente um Centro
de Desenvolvimento e Cooperação de Inteligência Artificial China-BRICS199. A aliança visa
promover pesquisa conjunta, desenvolvimento de tecnologia e regulamentação, mas ainda não
se sabe se os países do BRICS estão dispostos a se envolver no compartilhamento e na
transferência de tecnologia entre si, muito menos com o Sul Global mais amplo.

5) Estímulo aos projetos de cooperação entre países do Sul Global, com foco em saúde
pública

Os países BRICS enveredaram por diversas iniciativas de saúde incluindo um Centro de


P&D de Vacinas, Rede de Institutos de Saúde Pública, a Rede de Pesquisa em TB, o Sistema
integrado de Alerta Precoce (SIAP) para a Prevenção de Doenças Infecciosas em Massa, uma
Rede de Bancos de Leite Humano do BRICS (2019)200 e conta com o Programa-Quadro de CT&I.
Futuramente planeja criar uma Rede de combate à Resistência antimicrobiana (RAM).

Nessa prioridade, é importante sublinhar que serão “estimulados projetos de


cooperação entre países do Sul Global, como foco em saúde pública”. O G77 é o maior bloco de
países em desenvolvimento e conta hoje com mais de 130 países-membros.

A seguir, serão elencadas as iniciativas do BRICS em Saúde.

Iniciativas BRICS em Saúde Pública e CT&I:

a) Rede TB do BRICS

A Rede de TB tem por objetivo fortalecer a pesquisa entre os países do BRICS,


particularmente nas áreas de desenvolvimento de produtos, transferência de tecnologia e
capacitação. A rede estava explorando o estabelecimento de um centro de excelência para
pesquisa clínica.

199
https://www.mfa.gov.cn/eng/xw/zyxw/202410/t20241023_11514804.html
200
https://agenciabrasil.ebc.com.br/saude/noticia/2019-11/brasil-exporta-projeto-de-bancos-de-leite-
para-parceiros-do-brics

265
A participação de Instituições e laboratórios públicos brasileiros, o MS e governos e
laboratórios públicos e privados dos outros países dos BRICS são fundamentais.

A Fiocruz integra a Rede Brasileira de Pesquisas em Tuberculose (Rede-TB). Mais de uma


dezena de pesquisadores da Fiocruz fazem parte da Rede no biênio 2025-2026 e vem atuando
áreas de diagnósticos, ensaios clínicos, gestão da qualidade, pessoas privadas de liberdade (Júlio
Croda); TB indígena (Paulo Basta e outros), TB multirresistente (Margareth Dalcolmo e Jorge
Rocha (CRNHF)), TB pediátrica (Ana Cristina Calçada Carvalho (IOC)), tecnologia e inovação.

Na área de prevenção, a vacina BCG tem mais de 100 anos e ainda é a única que ajuda
a prevenir a TB. É administrada principalmente em bebês e crianças, no entanto, é
essencialmente ineficaz para os adultos e adolescentes que desenvolvem a doença a cada ano.
A OMS estima que uma vacina para adultos e adolescentes poderia evitar de 37-76 milhões de
novos casos e de 4,6-8,5 milhões de óbitos associados à doença até 2050.

O Instituto Butantan e colaboradores estão desenvolvendo uma versão mais potente da


vacina BCG (BCG recombinante), que protege contra a tuberculose201 e o Instituto Serum da
India vem desenvolvendo a candidata BCG recombinante VPM1002, que está na fase III de
testes. A sinergia entre países do BRICS com financiamento do banco do grupo, especialmente
com Dilma Rouseff como presidente do Banco, poderia acelerar o desenvolvimento e a
implementação de vacinas mais eficazes contra a doença.

Na área de tratamento, Farmanguinhos produz o 4x1 rifampicina + isoniazida +


pirazinamida + etambutol, indicado na fase inicial ou intensiva do tratamento e uma segunda
combinação isoniazida+rifampicina para a fase de manutenção.

Além da colaboração intra-grupo, outra estratégia que pode ser eficaz para enfrentar a
tuberculose é a criação de uma plataforma de colaboração entre os BRICS, para compartilhar
informações, recursos e experiências. Pode facilitar a realização de pesquisas conjuntas, o
treinamento de profissionais de saúde e a troca de informações sobre práticas eficazes de
prevenção, diagnóstico e tratamento da doença.

Os países do BRICS são responsáveis por 70% dos casos globais de TB. Ao assumir um
papel proativo na luta contra a tuberculose, o Brasil pode influenciar positivamente as políticas
de saúde e incentivar outros países do BRICS a definirem estratégias para a eliminação da
doença até 2030202.

Em dezembro de 2023 foi realizada a Reunião da Rede TB do BRICS na África do Sul,


unindo representantes dos cinco países membros fundadores e pesquisadores. O objetivo foi
compartilhar experiências e definir uma agenda de cooperação de pesquisa em vacinas,
diagnósticos, tratamentos e práticas bem-sucedidas de saúde pública. A maioria dos
pesquisadores da delegação brasileira eram coordenadores da Rede-TB203.

201
https://agencia.fapesp.br/resultados-de-nova-vacina-contra-a-tuberculose-sao-apresentados-na-
fapesp-week-china/52127
202
Também é fundamental que os governos dos BRICS trabalhem em estreita colaboração com
organizações internacionais, como a OMS e o Fundo Global de Combate à AIDS, Tuberculose e Malária,
para garantir que os esforços empreendidos sejam coordenados, eficazes e sustentáveis. Além disso, a
colaboração com organizações não governamentais e a sociedade civil é crucial para que as intervenções
propostas atendam às necessidades das comunidades afetadas.
203
https://redetb.org.br/rede-tb-participa-da-reuniao-do-brics-na-africa-do-sul/

266
b) O PQ BRICS em CT&I – O Programa-Quadro BRICS em CT&I vem publicando editais
em diferentes áreas. O de 2020, “Resposta à Pandemia Global COVID-19” selecionou quatro
projetos da Fiocruz, entre os quais está o reposicionamento de fármacos e validação de
compostos líderes contra a principal protease e a RNA polimerase dependente de RNA do Sars-
CoV-2204. A chamada de 2023 teve como tema Adaptação e Mitigação das Mudanças
Climáticas205.

c) Desenvolvimento do Sistema Integrado de Alerta Precoce do BRICS para prevenir


riscos de doenças infecciosas em massa

A criação do Sistema Integrado de Alerta Precoce para a Prevenção de Doenças


Infecciosas em Massa (SIAP)206 permitirá que os países do BRICS acelerem o intercâmbio de
dados, materiais, conhecimentos e melhores práticas para facilitar o desenvolvimento de
ferramentas de diagnóstico, medidas preventivas (incluindo o desenvolvimento de vacinas) e
terapêuticas para responder às grandes emergências de saúde pública causadas por doenças
infecciosas.

No dia 27 de março de 2024, foi realizada uma reunião de especialistas do SIAP para
elaboração dos TRs para posterior aprovação dos MS dos países do BRICS207. Na ocasião, os
participantes apresentaram relatórios sobre a situação epidêmica em seus países e sobre
sistemas nacionais para detecção precoce e resposta à disseminação de doenças infecciosas
existentes e emergentes. A delegação russa também apresentou uma proposta para o
desenvolvimento posterior do Sistema Integrado.

A reunião terminou com os representantes do BRICS endossando a proposta russa de


estabelecer um GT para:

• nomear coordenadores dos MS dos BRICS que mapearão os próximos passos para o
desenvolvimento do Sistema Integrado;

• desenvolver regulamentos e especificações técnicas para o Sistema Integrado:

• nomear especialistas técnicos que criarão uma rede de especialistas do BRICS para
vigilância epidemiológica.

Sistema de Alerta Precoce para Surtos com Potencial Epi-Pandêmico (ÆSOP) tem apoio do MS,
da Rockefeller e da Fiocruz

Pesquisadores do Cidacs/Fiocruz e da UFRJ lançaram em fevereiro de 2023, o projeto


Sistema de Alerta Precoce para Surtos com Potencial Epi-Pandêmico (ÆSOP, Alert-Early System
of Outbreaks with Pandemic Potential). A iniciativa tem o apoio do MS, da Fundação Rockefeller
e da Fiocruz e foi projetada para sinalizar novos surtos de doenças com potencial para causar
emergências de saúde, uma ocorrência cada vez mais comum devido às mudanças climáticas,

204
https://www.bio.fiocruz.br/index.php/br/noticias/2307-covid-19-e-brics-fiocruz-tem-4-entre-os-12-
projetos-escolhidos
205
http://brics-sti.org/index.php?p=new/36
206
A 1ª reunião técnica do Sistema Integrado de Alerta Precoce para a Prevenção de Doenças Infecciosas
em Massa, realizada em 17 de julho de 2023, sob a liderança da África do Sul como Presidente do BRICS
em 2023 e reuniões de especialistas do Sistema Integrado de Alerta Precoce para a Prevenção de Doenças
Infecciosas em Massa foram realizadas em 27 de março sob a Presidência da Federação Russa em 2024.
207
https://www.brics-russia2024.ru/en/news/vstrecha-ekspertov-po-formirovaniyu-kompleksnoy-
sistemy-rannego-preduprezhdeniya-riskov/

267
crescimento populacional e migração.

A plataforma ÆSOP permitirá que pesquisadores rastreiem surtos em estágio inicial,


integrando dados coletados do SUS com outras fontes de dados de saúde, ambientais e
sociodemográficos. O projeto possibilita que líderes explorem uma variedade de fontes de
dados em um único sistema e, usando IA e técnicas de aprendizado de máquina (machine
learning), identifiquem áreas onde as doenças infecciosas, como a dengue, provavelmente se
espalharão rapidamente. A ÆSOP busca identificar geograficamente o início do surto por meio
da análise de dados da APS e outros dados relacionados às manifestações da doença, como
venda de medicamentos e rumores nas redes sociais.

Após a identificação da área do surto, duas ações acontecem paralelamente para


modelar o risco e as características da propagação do surto: as equipes de pesquisa coletam
amostras de campo para identificar os agentes infecciosos envolvidos e os cientistas de dados
da ÆSOP integram outros dados para modelar o desenvolvimento do surto e informar as
medidas de controle.

O sistema será desenvolvido primeiramente para o monitoramento de síndromes


respiratórias agudas e depois ampliado para incluir também a detecção de outras síndromes
relevantes para a saúde pública e com potencial epidêmico.

Pretende-se também que o ÆSOP se torne um componente de uma plataforma


regional/global de vigilância e resposta a patógenos, formando parte dos ecossistemas de
prevenção a possíveis epidemias/pandemias.

O coordenador do projeto é Manoel Barral-Netto (IGM/Fiocruz-BA) e Gerson Penna


(Fiocruz) integra o grupo de pesquisa clínica.

d) Centro de P&D de Vacinas do BRICS (CPDV)208

Os países BRICS desejam reunir as vantagens complementares de seus países na P&D de


vacinas, aumentar a capacidade de seus países de prevenir e controlar doenças infecciosas e
fornecer ajuda a outros países em desenvolvimento. Espera-se que o Centro priorize a P&D
conjunta de vacinas, facilite o compartilhamento de informações e conhecimentos e apoie
projetos colaborativos de pesquisadores e instituições dos países do BRICS e promova a
distribuição e o uso inclusivos de vacinas para garantir acessibilidade.

Estão previstas três reuniões do CPDV, sendo uma no formato híbrido em 6 maio de
2025 e duas videoconferências, em 31 de março e 25 de setembro/2025.

e) Rede de Institutos de Saúde Pública dos BRICS

Dentre as diversas áreas de interação entre os países do BRICS, uma das mais
promissoras é a cooperação no fortalecimento da saúde pública.

Em 12 de setembro de 2024, a Rússia sediou a 1ª Reunião de Especialistas em Saúde


Pública do BRICS. A iniciativa teve como objetivo preparar o lançamento da Rede de Institutos
de Saúde Pública do BRICS (Rede) para promover a cooperação e o apoio mútuo no campo da
saúde; identificar iniciativas nacionais dos Estados membros do BRICS e determinar áreas
potenciais para colaboração e pesquisa conjunta. Também foi discutida a possibilidade de

208
https://brics-russia2024.ru/en/events/vstrechi-rabochikh-grupp-mekhanizmov/zasedanie-po-
voprosu-funktsionirovaniya-tsentra-vaktsin-briks/

268
envolver o Novo Banco de Desenvolvimento (NDB) para financiar projetos conjuntos de
pesquisa, alinhados com as prioridades e interesses de cada nação, bem como com os do grupo.
Na conclusão da reunião, a Rede foi aprovada por unanimidade e a Fundação Oswaldo Cruz
(Fiocruz) foi designada como representante nacional.

O objetivo central da Rede é desenvolver a cooperação especializada entre os países do


BRICS no campo da saúde pública e da saúde.

A Rede de Institutos de Saúde Pública realizará 3 encontros em 2025, sendo 2 reuniões


por videoconferência (I e II) em 18 março e 29 maio e uma reunião presencial no final de
setembro de 2025, no Rio de Janeiro.

f)Rede de Bancos de Leite Humano

Os líderes do Brasil decidiram estabelecer o Banco de Leite Humano como resultado da


11ª cúpula do BRICS (2019) e foi criada para reduzir a mortalidade infantil e como uma política
econômica viável que pode ser adaptada a diferentes contextos culturais.

A Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano (rBLH-BR) da Fiocruz foi um dos bancos de
referência da rede.

Entretanto, a iniciativa encontra-se estagnada e é preciso reativá-la.

BRICS e Fiocruz

A Fiocruz está encarregada de organizar reuniões de três iniciativas BRICS, a do Centro


de P&D de Vacinas, a da Rede de Institutos de Saúde Pública e a Conferência dos Institutos
Nacionais de Saúde Pública dos BRICS que será nos moldes da Conferência do G20 em 2024.

O calendário das reuniões está sumarizado abaixo.

DATAS REUNIÃO CARÁTER FORMATO

18/mar 1ª Rede de Inst de Saúde Pública dos BRICS oficial virtual

31/mar 1ª Centro P&D Vacinas oficial virtual

Reunião intermediária de Inst de Saúde Pública não


15/abr virtual
dos BRICS oficial

29/abr Conf. dos Inst. Nac. de Saúde Pública oficial virtual

não
06/mai 2ª Centro P&D Vacinas híbrida
oficial

não
29/mai 2ª Rede de Inst de Saúde Pública dos BRICS virtual
oficial

8,9,10 Conf. INSP (haverá espaços para a Rede TB, Rede não
presencial
set de Alerta Precoce...) oficial

não
25/set 3ª Centro P&D Vacinas virtual
oficial

269
Considerações finais

O BRICS se posiciona como uma instituição focal para o equilíbrio suave (soft
balancing209) das potências emergentes, ao mesmo tempo em que promove os interesses
individuais dos estados-membros. Como resultado, usam estrategicamente o grupo para
abordar necessidades mútuas, institucionalizar seletivamente a cooperação e buscar uma
agenda abrangente que inclui políticas de equilíbrio e não-equilíbrio.

A dinâmica de poder contemporânea tem girado em torno de países com mercados


emergentes se engajando em instituições informais para exercer pressão sobre os EUA
enquanto buscam promover seus próprios interesses e status e diversificar a liderança global.

Os países emergentes se engajam em parcerias estratégicas na forma de mini laterais


multi-questões como BRICS, IBAS ou RIC. Essas parcerias não têm hierarquias rígidas ou
coordenação política ou de segurança. Baseiam-se no avanço do desenvolvimento, apoio
econômico e político mútuo (no caso de um dos parceiros estar sob pressão externa) e na
promoção de vínculos não-ocidentais.

O sistema financeiro internacional dominante no Ocidente/Norte não conseguiu


fornecer financiamento suficiente para combater as mudanças climáticas e apoiar o
desenvolvimento sustentável210 , pelo contrário, produziu crises financeiras recorrentes,
ampliou a polarização econômica e social e intensificou as tensões geopolíticas.

Nesse sentido, o BRICS+ surgiu para promover a CSS em comércio, finanças,


investimento, cadeia de suprimentos, segurança financeira e desenvolvimento. A adição de seis
novos membros, sinaliza que o BRICS+ está adquirindo mais recursos, empreendendo mais
programas cooperativos e acumulando mais influência. Não há dúvida de que o grupo
continuará a fazer contribuições significativas para reequilibrar a ordem econômica global e
promover o desenvolvimento liderado pelo Sul de forma sustentável e inclusiva.

Empresas de tecnologia americanas e europeias perderam US$ 1 trilhão em valor de


mercado, com ameaça de IA chinesa. As perdas ocorreram diante da disparada de downloads
da chinesa DeepSeek, que superou seu rival norte-americano ChatGPT na App Store. O modelo
de IA apresentado pela startup chinesa se destaca por ser uma alternativa viável e mais barata
de inteligência artificial e logo colocou em dúvida o domínio ocidental no setor. O monopólio
dos EUA em IA começou a ser questionado.

Com a expansão do bloco, o BRICS+ passa a ocupar uma posição de maior destaque não
só nos rankings de emissão de GEE mas também no que diz respeito à produção e a reservas
globais de metais e minerais críticos para a transição energética. Em conjunto, o grupo detém
reservas significativas de metais como alumínio, cobalto, cobre, lítio, manganês, níquel e silício,

209
O conceito inicial de soft balancing de Robert Pape referia-se ao uso de coligações ad hoc pelas grandes
potências para conter a influência das políticas indesejáveis dos EUA. A literatura subsequente
reconheceu que potências menores também podem alvejar conjuntamente o hegemon por meio de
coligações ad hoc específicas para cada questão. Em 2002, sete países africanos resistiram à pressão dos
EUA para assinar um acordo que estabelecia o TPI, o que impediria esses países de processar cidadãos
dos EUA por crimes de guerra. A formação de uma coalizão permitiu que eles examinassem a política dos
EUA enquanto continuavam sendo os principais destinatários da ajuda dos EUA. Os Estados se envolvem
em tal balanceamento vinculando um Estado-alvo dentro de instituições internacionais para restringir seu
comportamento ou consolidando a unidade contra ele excluindo-o de instituições.
210 www.project-syndicate.org/onpoint/making-global-monetary-system-work-for-global-south-by-
hippolyte-fofack-2023-02

270
fundamentais para painéis fotovoltaicos para produção de energia limpa e renovável, turbinas
eólicas e veículos elétricos21.

A possível coordenação das políticas extrativas e comerciais, por um lado, promete


tornar o BRICS+ um ator internacional de peso na transição energética; por outro, considerando
os impactos socioambientais das energias “limpas” e os da extração de minérios críticos, os
países poderão agravar as desigualdades intrabloco e adiar políticas que tenham a justiça
climática como eixo central.

Por todos estes motivos, é fundamental estar atento às ambições climáticas dos países
BRICS+. Dada a importância do BRICS+ como emissores de GEE e detentores de recursos críticos
para a transição energética, suas políticas climáticas terão um impacto significativo no combate
às mudanças climáticas. Este impacto diz respeito não apenas à redução de emissões, mas aos
contornos que a transição energética irá adquirir nesses países: em direção à justiça climática
ou à exacerbação de desigualdades, violências, conflitos e violações de direitos.

Após os encontros do Centro de Vacinas e de Especialistas em Saúde Pública realizados


no final de 2024, foi solicitado e aguarda-se a entrega dos relatórios contendo aportes dos países
por parte do organizador dos eventos, a Rússia.

Para o fortalecimento institucional de BRICS em saúde, propõe-se a) fortalecer as redes


existentes em temas de saúde (centros de vacinas, TB e pesquisa em saúde pública), definindo
e implementando ações concretas; b) agregar, com prioridade traduzida em ações concretas, a
cooperação para o fortalecimento dos sistemas de saúde de BRICS+, por meio: da identificação
de seus problemas e de suas melhores práticas na rede de pesquisa em saúde; no
asseguramento da implementação de cooperação técnica entre países BRICS+ em temas de
mútuo interesse; e garantindo a formação de RRHH para os sistemas de saúde, em projetos de
mútuo interesse bem definidos.

271
Portas fechadas, algemas apertadas e “América para os Americanos”: novos
(ou velhos?) desafios para a migração latino-americana no continente
Puertas cerradas, esposas apretadas y “América para los americanos”: nuevos (¿o
viejos?) desafíos para la migración latinoamericana en el continente

Sebastián Tobar
Samia de Brito Franco
Miryam Minayo

Resumo: Na primeira edição do ano de 2025, este informe discute como as medidas do novo
governo Trump afetaram imigrantes latino-americanos nos EUA e reverberaram nas relações
com países na região. Além disso, enumeramos, sem sermos conclusivos, seis potenciais
desafios regionais para 2025 que podem contribuir para novas ondas de migração e o
acirramento dos conflitos políticos e até mesmo securitários no continente americano. Entre
esses desafios, destacam-se: novos padrões de envolvimento dos EUA com a América Latina; as
eleições presidenciais no Caribe e América do Sul; o fraco crescimento econômico; a persistência
das iniquidades e desigualdades sociais; o clima de terror instaurado pelo crime organizado; o
efeito das mudanças climáticas e o impacto nas populações; e o maior engajamento da China na
América Latina.

Palavras-chave: América Latina e Caribe; Política e Integração; Migração

Resumen: En la primera edición del año 2025, este informe analiza cómo las medidas de la nueva
administración Trump han afectado a los inmigrantes latinoamericanos en Estados Unidos y
repercutido en las relaciones con los países de la región. Además, enumeramos, sin ser
concluyentes, seis potenciales desafíos regionales para 2025 que podrían contribuir a nuevas
olas migratorias y a la intensificación de conflictos políticos e incluso de seguridad en el
continente americano. Estos desafíos incluyen: los nuevos patrones de compromiso de EEUU con
América Latina; las elecciones presidenciales en el Caribe y América del Sur; el débil crecimiento
económico; la persistencia de las desigualdades e inequidades sociales; el clima de terror
instigado por el crimen organizado; el efecto del cambio climático y el impacto en las
poblaciones; y el creciente compromiso de China en América Latina.

Palabras clave: América Latina y Caribe; Política e integración; Migración

2025 chegou fechando as portas para os migrantes latino-americanos

Considerando o contexto político global, o ano iniciou com a posse de Donald Trump na
presidência dos Estados Unidos. Trump assumiu o poder propondo uma agenda que questiona
os fundamentos do multilateralismo — particularmente a eficácia do sistema das Nações Unidas
— e que defende uma postura mais assertiva nas relações internacionais. Para tanto, o governo
tem priorizado a intensificação de negociações bilaterais com países como China, Rússia, Índia,
entre outros.

272
Diante desse cenário, a questão central é: de que maneira a ascensão de Trump à
presidência dos Estados Unidos afetará a América Latina?

A estratégia discursiva do governo Trump e o aprofundamento da dinâmica de disputa


comercial com a China parece orientar Washington a apostar em uma versão repaginada da
Doutrina Monroe211 e com novo “inimigo” declarado, a China. Inimigo que, nos últimos anos, se
afirmou como um parceiro definitivo para a região da América Latina.

Questões como tarifas, migração, tráfico de drogas e o uso da força deverão orientar a
política externa dos Estados Unidos em relação à América Latina nos próximos anos. A discussão
sobre tarifas já surgiu nas semanas que antecederam a posse de Trump. Destacando o déficit
comercial dos EUA, o então candidato já havia anunciado a aplicação de tarifas de 25% sobre
todos os produtos de origem mexicana, invocando princípios de segurança nacional e buscando
pressionar as relações comerciais com a China. Igualmente, Trump anunciou a taxação de 25%
dos produtos canadenses e 10% dos chineses.

Além disso, o Canal do Panamá também tem disso um tema importante da agenda de
política externa do presidente estadunidense desde antes de sua posse. Acusações foram feitas
por Trump sobre taxas “ridículas” e “exorbitantes”, acusando-as de “golpe”212., e o presidente
manifestou sua intenção de controlá-lo. O Canal do Panamá tem valor estratégico ao conectar
o Oceano Atlântico ao Pacífico, tanto para fins comerciais quanto de defesa. Os Estados Unidos,
seguidos pela China e pelo Japão, são os maiores clientes do Canal do Panamá, com quase 72%
da carga que passa por lá, originária ou destinada aos portos americanos.

No campo político, a indicação do senador Marco Rubio para o cargo de Secretário de


Estado dos Estados Unidos—mesmo considerando sua origem latino-cubana—sinaliza um
endurecimento das posições em relação à América Latina, com ênfase especial em regimes
autoritários na região, como os de Cuba, Venezuela e Nicarágua213. Além disso, Rubio é
conhecido por sua forte crítica à “onda rosa latino-americana”. Em particular, ele tem se
posicionado de forma contundente contra líderes como Andrés López Obrador, no México;
Gustavo Petro, na Colômbia; e Luiz Inácio Lula da Silva, no Brasil, acusando-os de ter fortalecido
regimes autoritários regionais por meio de alianças que, segundo suas declarações, teriam
“aberto a porta para ameaças externas”, incluindo a influência de países como China, Rússia e
Irã – este último, por sua vez, associado a apoios que ele relaciona aos ataques perpetrados pelo
Hamas contra civis em Israel.

A questão da imigração é um tema crucial e prioritário na agenda política do atual


governo republicano. Tal como Donald Trump anunciou durante a sua campanha eleitoral, um

211
James Monroe, presidente dos Estados Unidos de 1817 a 1825, foi o promotor da doutrina que leva
seu nome e um pilar da geopolítica dos EUA que parece ter se tornado mais relevante durante o primeiro
governo do presidente Trump, que em 2018, declarou perante as Nações Unidas: “Tem sido a política
formal do nosso país desde o Presidente Monroe que rejeitamos a interferência de nações estrangeiras
neste hemisfério e nos nossos próprios assuntos.” https://www.clarin.com/opinion/asuncion-trump-
puesta-valor-doctrina-monroe_0_1fdkTEeMJb.html
212
A autoridade do canal foi recentemente forçada a reduzir o número de embarcações devido à seca e
também aumentou os preços. O canal gerou US$ 3,45 bilhões em lucro líquido no ano fiscal de 2024.
213
Trump 2.o: Perspectivas y Desafíos para Centro América, Cuba y Venezuela. Evento organizado por el
Centro de Pensamiento Expediente Abierto y la asociación Gobierno y Análisis Político (Gapac). 16 de
diciembre. Disponible en: https://www.youtube.com/watch?v=P9wNlMsHNvs&t=272s

273
dos objetivos centrais da sua nova administração seria fechar as fronteiras dos EUA e levar a
cabo a “maior deportação” de migrantes da história dos EUA.

Nesse contexto, Trump214 assumiu o poder implementando uma série de ordens


executivas que intensificaram o controle sobre as fronteiras sul dos Estados Unidos. Entre as
medidas adotadas, destacam-se a mobilização das Forças Armadas, a suspensão de vistos para
refugiados, a realização de deportações em massa de migrantes sem documentação e a adoção
de políticas migratórias ainda mais restritivas. Esse endurecimento no controle imigratório, que
inclui a expulsão de imigrantes ilegais, independentemente de antecedentes criminais, levanta
questionamentos acerca dos possíveis impactos sobre os fluxos migratórios na região.

Esse endurecimento tem gerado um clima de muita tensão entre os migrantes latino-
americanos que estão no território ou em vias de entrar. Além disso, essas decisões têm efeito
também nas relações políticas e diplomáticas com os países de origem desses migrantes,
deflagrando um cenário de conflito entre o novo governo Trump e a região latino-americana.
Washington tem ensaiado uma reedição do “Big Stick”.

Brasil, Colômbia, México e outros países já precisaram se posicionar frente à nova


conjuntura215216. No México, o governo de Sheinbaum chegou a negar o pouso de um avião
militar dos EUA com imigrantes, mas, posteriormente, anunciou que o país já teria recebido mais
de 4000 mexicanos deportados entre os dias 20 e 26 de janeiro de 2025. Além disso, Sheinbaum
apresentou um programa destinado a acolher os nacionais que têm chegado em território
mexicano. A iniciativa inclui o fortalecimento das redes consulares nos Estados Unidos, o
desenvolvimento de um aplicativo móvel e a criação de uma rede de assistência que oferecerá
recursos para a integração socioeconômica dos deportados.

No Brasil, o governo Lula denunciou o tratamento dispensado aos cidadãos deportados:


maus-tratos, passageiros algemados, agressões e privação de alimentação no voo militar dos
EUA que chegou a Manaus poucos dias depois da posse do novo presidente. Em comunicado, o
governo brasileiro definiu as condições como degradantes e afirmou que era “[...] inaceitável
que não sejam respeitadas as condições acordadas com o governo norte-americano”217218 e
finalizou, afirmando que encaminharia um pedido de esclarecimento ao governo dos EUA. Nos
últimos dias, autoridades brasileiras se reuniram com suas contrapartes estadunidenses para
formar um grupo de trabalho que vai “trocar informações e aprimorar a operacionalização de
voos de retornos de brasileiros, garantindo tratamento digno e respeitoso aos passageiros.”219

214
Donald Trump já havia anunciado durante sua campanha eleitoral: um dos objetivos centrais de seu
novo governo seria fechar as fronteiras dos Estados Unidos e realizar a "maior deportação" de migrantes
da história daquele país. https://www.theguardian.com/us-news/2024/nov/18/trump-military-mass-
deportation
215 https://g1.globo.com/mundo/noticia/2025/01/24/mexico-se-nega-a-receber-voo-dos-eua-com-
imigrantes-deportados-diz-site.ghtml
216 https://www.bbc.com/mundo/articles/cn7g6d0z105o
217
https://www.gov.br/mre/pt-br/canais_atendimento/imprensa/notas-a-imprensa/voo-de-nacionais-
deportados-pelos-eua
218
Vôos de deportação já existiam anteriormente e fazem parte de um acordo firmado entre 2018-2019
Brasil para agilizar os procedimentos de deportação de brasileiros nos EUA. No entanto, devido a alguns
episódios que causaram mal-estar um novo acordo foi assinado em 2021 para assegurar condições dignas
no translado dos brasileiros.
219 https://oglobo.globo.com/mundo/noticia/2025/01/29/itamaraty-anuncia-grupo-de-trabalho-com-
os-estados-unidos-para-discutir-deportacao-de-brasileiros.ghtml

274
O caso colombiano ganhou grande repercussão midiática após o presidente Gustavo
Petro negar a entrada de dois voos militares transportando nacionais colombianos. A tensão
escalou em poucas horas, após os presidentes terem trocado acusações, ameaças de aumento
recíproco de tarifas e de bloqueio de vistos, gerando uma indisposição diplomática entre dois
aliados tradicionais220. No entanto, ainda no mesmo dia, as diplomacias conseguiram suspender
as ameaças e o governo Petro, por sua parte, concordou em enviar aeronaves colombianas para
transladar seus nacionais, segundo ele em situação mais digna, e o governo Trump decidiu que
iria pausar a aplicação das tarifas extras e demais sanções.221

Outros tipos de reação ao processo de deportação em massa também foram percebidos


na região, como no caso do presidente Bukele222 que expressou seu apoio à cooperação com os
Estados Unidos e deve se tornar “Terceiro País Seguro”, após negociações para um acordo de
recebimento de deportados latino-americanos, não só salvadorenhos223.

Ao mesmo tempo que a troca de acusações acontecia, Petro solicitou uma reunião
emergencial à CELAC e a presidente pro-tempore Xiomara Castro prontamente acatou o pedido.
No entanto, pouco tempo depois a reunião foi cancelada. Apesar do comunicado oficial indicar
que as deportações em massa são uma preocupação comum, a presidente pro-tempore afirmou
que o cancelamento está ligado a uma oposição sistemática de países-membros e à superação
do impasse entre Colômbia e EUA.224f

Finalmente, observa-se que, embora em alguns casos as respostas intensifiquem a


crítica às decisões do governo Trump, elas permanecem desarticuladas e raramente promovem
uma postura de unidade latino-americana. Em informes anteriores, já apontávamos para o
aumento das tensões entre os próprios países da região, o que pode resultar em uma América
Latina fragmentada e incapaz de se unir em torno de temas de interesse comum. Organizações
multilaterais enfraquecidas, como a CELAC, o Mercosul e a UNASUL, não seriam capazes de gerar
ações coordenadas, tornando as relações internacionais da região bastante dependentes de
acordos bilaterais entre países que compartilham algum nível de alinhamento ideológico.

É importante, no entanto, destacar que essa escalada de tensões geradas pelo governo
Trump no tema de migração está longe de acabar, pois as condições conjunturais e estruturais
latino-americanas podem produzir novos incentivos para que as mobilidades internas se
asseverem. Abaixo, enumeramos seis potenciais desafios regionais para 2025 que, finalmente,
podem contribuir para novas ondas de migração e o acirramento dos conflitos políticos e até
mesmo securitários no continente americano. Entre esses desafios, destacam-se: as eleições
presidenciais em alguns países da região; o fraco crescimento econômico; a persistência das
iniquidades e desigualdades sociais; o clima de terror instaurado pelo crime organizado em
diversas localidades da América Latina; efeitos das mudanças climáticas e seu impacto nas
populações latino-americanas e o maior engajamento da China na Região. Esses elementos se

220 https://g1.globo.com/mundo/noticia/2025/01/28/primeiros-deportados-dos-eua-chegam-a-
colombia-em-aviao-da-forca-aerea-do-pais.ghtml
221 https://g1.globo.com/mundo/noticia/2025/01/28/primeiros-deportados-dos-eua-chegam-a-
colombia-em-aviao-da-forca-aerea-do-pais.ghtml
222
https://www.swissinfo.ch/spa/asesor-de-trump-dice-que-bukele-ofreci%c3%b3-%22tremendos-
niveles-de-cooperaci%c3%b3n%22-en-migraci%c3%b3n/88794078
223
https://www.cronica.com.mx/mundo/2025/01/28/ideologo-de-las-deportaciones-dice-que-bukele-
ofrece-tremenda-cooperacion/
224
https://agenciabrasil.ebc.com.br/radioagencia-nacional/politica/audio/2025-01/reuniao-da-celac-
sobre-deportacao-de-imigrantes-nos-eua-e-cancelada

275
configuram como fatores cruciais que podem impulsionar o deslocamento de grandes grupos
populacionais em busca de condições mais dignas de sobrevivência.

1. O resultado do cenário eleitoral pode gerar novas acomodações políticas na região

A democracia latino-americana atravessa uma fase complexa, marcada por resiliência,


estagnação e sucateamento. Em 2025, inicia-se um novo ciclo eleitoral para a escolha de
presidentes: países como Equador, Bolívia, Chile, Haiti e Honduras já têm pleitos programados,
enquanto o processo se estenderá até 2026, com as votações previstas para Brasil, Colômbia,
Costa Rica e Peru. Espera-se que esse ciclo 2025/2026 reconfigure o panorama político regional
até o início da próxima década. Além das eleições para os cargos de chefia do Executivo,
ocorrerão também eleições legislativas e municipais na Argentina225, Venezuela226 e Uruguai227,
bem como eleições para o judiciário no México228.

Em 2025, o voto pragmático parece que ganhará força entre os eleitores latino-
americanos. A escolha por esquerda ou direita229 deve dar vez a temas como: perda de poder
de compra, ansiedade pela falta de segurança, fracas perspectivas de melhoria social e mau
funcionamento do Estado, dos partidos e da classe política. No Equador, Chile e Bolívia, o voto
deve transparecer a frustração de expectativas após os mandatos de Daniel Noboa, Gabriel Boric
e Luis Arce. Este ano também nos permitirá medir o comportamento de outras tendências
político-eleitorais presentes a partir de 2023-2024: a ascensão de candidatos anticastas (Javier
Milei e Nayib Bukele) e a consolidação de novas ditaduras, como a Nicarágua e a Venezuela,
onde as eleições parlamentares podem ser usadas para encobrir a deriva autoritária.

A frustração com a dificuldade de alcançar melhorias sociais – pessoais e


intergeracionais – está por trás do comportamento eleitoral de uma região que desde 2018 vota
consistentemente contra o governo230. Desde 2024, a variável “antigoverno”, como no Uruguai
e no Panamá, se alia ao apoio daqueles agentes que são eficientes na solução dos principais

225
Em 26 de outubro, a Argentina renovará metade da Câmara dos Deputados (127 cadeiras) e um terço
do Senado (24) e haverá eleições legislativas provinciais em 12 províncias e na Cidade Autônoma de
Buenos Aires. Também serão eleitos governadores em Corrientes e Santiago del Estero, e delegados para
reformar as constituições provinciais em Santa Fé e Formosa. As eleições serão uma oportunidade para
avaliar o apoio popular à administração presidencial, descobrir quem domina na direita e ver como o
kirchnerismo/peronismo pode sobreviver.
226
Após a fraude eleitoral e a postura do chavismo em 10 de janeiro, a oposição enfrenta o dilema de
competir ou não nas eleições legislativas, regionais e municipais, correndo o risco de sofrer uma nova
derrota. Espera-se que Maduro tente se recuperar após as eleições presidenciais, que foram marcadas
pela falta de transparência.
227
No Uruguai, no 11 de maio haverá eleições locais, que serão usadas como um barômetro para o
governo de Yamandú Orsi, que tomará posse em março.
228
Em 2025, o México viverá uma experiência sem precedentes: eleições judiciais, fruto das reformas
constitucionais de Andrés Manuel López Obrador. Em setembro, 1.650 juízes federais e mais de 5.000
juízes estaduais serão eleitos. Não apenas a justiça se tornará politizada, mas também abrirá a porta para
partidos políticos promoverem candidatos que eles gostam para controlar o poder judicial. Isso causou
inquietação nos setores políticos e empresariais dos EUA diante das ameaças à segurança jurídica.
229
Os resultados de 2023 e 2024 nos permitem descartar a ideia de virar à direita ou à esquerda. A
população não vota ideologicamente, mas com o bolso ou guiada por um sentimento de angústia por
insegurança ou frustração quanto ao funcionamento do Estado, dos partidos e da classe política. Somente
em 2024 houve o mesmo número de vitórias oficiais que em todo o mandato de seis anos de 2018-2023.
Ideologicamente, a região continua muito heterogênea.https://www.realinstitutoelcano.org/analisis/las-
elecciones-latinoamericanas-en-2025-nuevas-y-viejas-dinamicas/
230
Ressalvas podem ser feitas para os casos de Costa Rica, em 2018, no Paraguai, em 2018 e 2023, e na
Nicarágua em 2021, apesar de condições antidemocráticas existirem.

276
problemas dos cidadãos. Essa dinâmica explica as vitórias oficiais de Claudia Sheinbaum no
México231, Nayib Bukele232 em El Salvador e Luis Abinader na República Dominicana233.

A seguir, resumiremos os contextos eleitorais que se desenrolarão nos próximos


234
meses .

O Equador inaugurará o ciclo eleitoral latino-americano em fevereiro. Noboa (Ação


Democrática Nacional, ADN) deve enfrentar, como em 2023, uma oposição dividida235. Apenas
a candidata de Correa, Luisa González (Revolução Cidadã) tem apoio significativo da população
e do ex-presidente Rafael Correa. Em pesquisas pré-eleitorais, Noboa e Gonzalez aparecem
quase empatados e, provavelmente, haverá um segundo turno.

Após um ano e meio no governo, Noboa chega ao pleito acumulando algumas


insatisfações. Como foi discutido nestes Cadernos, segurança e a questão energética devem
pesar na decisão das urnas. A crise energética afetou negativamente os equatorianos, deixando-
os insatisfeitos pela falta de energia elétrica, e na área de segurança, apesar do reforço de
medidas (estados de emergência e mobilização militar) 236, o sentimento de insegurança entre
os equatorianos ainda resiste.

Na Bolívia, as eleições ocorrerão no dia 10 de agosto. O país vive uma dupla fratura:
evismo vs antievismo e masismo vs antimasismo. Na ausência de uma oposição competitiva, o
Movimento ao Socialismo, que apesar de estar há mais de 10 anos no poder, ainda se configura
como a única força de alcance nacional, rachou internamente, opondo o grupo que segue Evo
Morales e contra aquele liderado pelo presidente Luis Arce237, herdeiro político de Morales.

Enquanto isso, a oposição de direita e centro-direita tenta se unir para aproveitar um


contexto econômico-social desfavorável ao governo, a divisão do MAS e a ausência de seu líder
histórico. Parte da direita chegou a um pacto de unidade entre os ex-presidentes Carlos Mesa
(2005-2006) e Jorge “Tuto” Quiroga (2000-2001), o ex-governador de Santa Cruz, Fernando

231
Andrés Manuel López Obrador reduziu a pobreza e manteve o poder de compra e tornou possível a
vitória de Sheinbaum
232
Bukele conseguiu reduzir significativamente as taxas de insegurança (de 35 homicídios por 100.000
habitantes em 2019 para 2,4 em 2024).
233
A Abinader implementou políticas públicas focadas no crescimento econômico, especialmente durante
a pandemia e pós-pandemia (2020-2022), protegendo o turismo, principal indústria nacional, e seus
empregos.
234
Para interessados no contexto eleitoral, recomendamos a revisão de Informes da América Latina destes
Cadernos em 2024 para consolidar informações importantes.
235
O limiar eleitoral de Luisa Gonzáles é alto (30%) e está próximo dos 50% no segundo turno, como em
2023. Os candidatos restantes alcançam apenas 11% do voto direto, enquanto os votos em branco/nulo
somam 10,4%, segundo para a empresa de pesquisas Comunicaliza. O terceiro lugar fica com Leonidas
Iza, do movimento indígena Pachakutik, com 2,2% das intenções de voto. O único que poderia contestar
a dicotomia noboísmo-correísmo era o bukelista Jan Topic, que obteve cerca de 10% de seu apelo à mão
pesada, mas o Tribunal Contencioso Eleitoral aceitou as contestações contra ele devido a um suposto
conflito de interesses devido à sua contratos com o Estado.
236
A pesquisa da Cedatos de dezembro indica que o índice de aprovação de Noboa caiu de 80% em
fevereiro para 39,7%, com uma taxa de desaprovação de 52%. Eventos recentes, como o assassinato de
quatro crianças e adolescentes por uma patrulha militar, aumentaram a indignação pública e podem
afetar suas chances se o que aconteceu não for esclarecido de forma rápida e transparente. Sua imagem
também foi afetada pelo confronto com a vice-presidente Verónica Abad, que o substituiria durante a
campanha eleitoral.
237
Arce foi ministro da Economia entre 2006 e 2019 e pai do “milagre econômico boliviano”, tornou-se
presidente em 2020.

277
Camacho, ainda preso, e o empresário e político Samuel Doria Medina. Todos eles prometem
“tornar a unidade da oposição uma realidade’238 com um único candidato.

O Chile realizará eleições em 16 de novembro, após um processo fracassado de reforma


constitucional. As antigas coligações (Chile Vamos239 –centro-direita– e a antiga Concertación),
que se alternaram no poder de 1990 a 2022, continuam existindo, mas com formas e
componentes diferentes. Observa-se a emergência de outros atores políticos: a nova esquerda
que chegou ao poder com Boric, o ultraconservador Partido Republicano de José Antonio Kast,
os libertários como Johaness Kaiser, os populistas de Franco Parisi, os democratas de Ximena
Rincón e os amarelos (ex. DC) por Cristian Warnken etc.

A coalizão de esquerda liderada240 por Boric parece enfraquecida e o presidente acabou


governando com a Concertación, de centro-esquerda, apesar da rejeição inicial da esquerda
mais radical. Mas os resultados das eleições municipais de outubro passado mostram que a
esquerda ainda tem forte apoio, embora seja difícil extrapolar os resultados das eleições locais
para as eleições gerais. O baixo crescimento econômico, no entanto, se torna um obstáculo para
a reeleição de Boric e isso já reverbera nas pesquisas eleitorais241.

O pleito definitivo em Honduras também será realizado em novembro, com uma eleição
interna preliminar em 9 de março. E temas como corrupção, tráfico de drogas e a situação
econômica e social devem ser o motor das eleições.242243 A detenção, extradição e condenação
do ex-presidente Juan Orlando Hernandez (2014-2022) do Partido Nacional pelos EUA pesará
sobre qualquer um dos quatro candidatos de seu partido que disputarão a candidatura nas

238
O partido de Manfred Reyes Villa, APB Súmate, não está incluído no acordo. Villa lidera as pesquisas
como principal oposição e já lançou sua candidatura. Vicente Cuéllar e Branko Marinkovic também não
entraram no acordo. Todos eles são velhos conhecidos da política local e sempre estiveram mais de 10
pontos atrás do MAS nas eleições presidenciais.
239
Evelyn Matthei é a favorita para ser candidata do amplo espectro que vai do centro à direita e a única
capaz de derrotar a esquerda. Sua carreira política remonta à década de 1990. Ela foi candidata em 2013
e perdeu o segundo turno para Bachelet. Ela foi prefeita de Providencia. Ela se apresenta como a mulher
capaz de levar Chile Vamos ao poder, derrotando Kast pela direita e depois derrotando a esquerda no
segundo turno. O estilo calmo e reformista de Matthei contrasta com o de Kast, que defende uma
abordagem dura para lidar com a insegurança, uma questão central. Matthei também atacou o governo
pela escalada da insegurança, dizendo que “ninguém está assumindo a responsabilidade”.
240
A esquerda busca seu candidato: na Concertación, de centro-esquerda, destacam-se a ministra do
Interior, Carolina Tohá, e a ex-presidente Michelle Bachelet. Bachelet parece mais competitiva, mas sua
terceira candidatura significaria um retorno ao passado. Tohá, uma das figuras mais brilhantes da centro-
esquerda, está sobrecarregada pelo trabalho medíocre do governo. Mais à esquerda, a indefinição é
maior. No momento, estão surgindo Tomás Vodanovic (prefeito de Maipú) e as ministras comunistas
Camila Vallejo e Jeannette Jara.
241
As primeiras pesquisas de intenção de voto241 dão Matthei 26%, Kast 8%, Bachelet 7%, Kaiser 5% e
Vodanovic 3%. Matthei vence em todos os cenários do segundo turno. Ele supera Bachelet por 12 pontos
(51% / 39%), Claudio Orrego por 23 (56% / 33%), o ex-presidente Eduardo Frei por 28 (57% / 29%), Kast
por 36 (57% / 21%) , Tohá por 41 (62% / 21%) e Kaiser por 51 (64% / 13%). Ver em
https://www.infobae.com/america/america-latina/2024/11/18/evelyn-matthei-y-jose-antonio-kast-
siguen-al-alza-en-la-carrera-presidencial-chilena-segun-una-encuesta/.
242
https://www.elmundo.es/internacional/2025/01/02/6775efb221efa07d678b4585.html
243
De fato, a ideia de Castro de fechar a base americana em Palmerola se Trump expulsar em massa os
imigrantes hondurenhos provocou ataques de Nasralla, que acusa o governo de ser aliado da China.
Nasralla já começou a acusar o governo de tentar repetir o que aconteceu na Venezuela, para arquitetar
uma fraude e garantir a vitória oficial. Uma vitória do Libre poderia desencadear uma crise institucional,
como em 2017, quando o PN de Hernández venceu de forma questionável.
https://www.youtube.com/watch?v=l0VBRGPvTpA

278
primárias: Ana García, esposa do ex-presidente Hernández, o ex-prefeito da capital Nasry Asfura,
o deputado Jorge Zelaya e o advogado, Carlos Portilho.

A crise do Partido Nacional permitiu o crescimento político do Partido Liberal244 (PL),


hegemônico por quase um século desde sua criação em 1891. O PL apresentou quatro
candidatos para as eleições primárias: Nasralla, ex-aliado do Libre, os deputados Maribel
Espinoza e Jorge Cálix, e o ex-candidato presidencial Luis Zelaya. Nasralla tem se destacado e
apresentado alinhamento com as características da nova onda de populismo global245. O desafio
de Nasralla é fazer com que os Liberais escolham entre a popularidade de um outsider ou figuras
mais tradicionais como Zelaya ou Calix. No partido de Esquerda Libre246, que igual ao Nacional é
suspeito de corrupção e envolvimento no tráfico de drogas, Rix Moncada, Ministro da Defesa e
ex-Ministro das Finanças de Castro, aparece com vantagem significativa e com o apoio
majoritário dos zelaístas247.

Por fim, o Haiti também irá as urnas em 2025. O país, que está sem presidente desde o
assassinato de Jovenel Moïse, em 2021, enfrenta uma crise de governabilidade, securitária e
econômica grave, o que consolida o país como estado falido248. Em 2024, além dos movimentos
internos para a criação de um criado o Conselho Presidencial para a Transição249, a ONU criou
uma Missão Multinacional de Apoio à Segurança das Nações Unidas (MMAS)250, mas que sofre
com a escassez de recursos para fazer frente aos desafios complexos de segurança no território.
Nesse cenário de frágil governança (política e de segurança), apesar de o Conselho de Transição
buscar a elaboração de uma Constituição e eleição de um presidente até 2025, os dois objetivos
parecem ainda difíceis de concretizar.

244
O PL entrou em crise quando o presidente Manuel Mel Zelaya (2006-2009) se aliou a Hugo Chávez e
tentou reformar a Constituição para ser reeleito, dividindo o partido. Após os acontecimentos de 2009, o
zelaiismo abandonou o PL, criou a Liberdade e Refundação (Libre), principal rival do PN, e com sua esposa,
Xiomara Castro, como candidata, chegou ao poder em 2022. Agora, com o PN enfraquecidos, os liberais
aspiram recuperar sua posição dominante
245 Candidato presidencial em 2013 e 2017, é personalista e messiânico (em 2021 criou o partido Salvador
de Honduras), tem uma mensagem anticastas (em 2013 fundou o Partido Anticorrupção), que foi aliado
do Libre. Em 2022, ele era vice-presidente de Castro, de quem acabou se distanciando. Conseguiu crescer
em popularidade por meio de seu papel de jornalista esportivo na televisão local e seu estilo de liderança.
246
https://www.libre.hn/
247
Em 2024, ficou conhecido o caso do narco-vídeo, um encontro ocorrido em 2013 entre narcotraficantes
e Carlos Zelaya, cunhado de Castro. O vídeo, publicado pelo Insight Crime, mostra vários traficantes de
drogas oferecendo a Zelaya US$ 650.000 para uma campanha política do Libre, o partido de Castro e seu
marido, o ex-presidente Zelaya. Os liberais acusaram Libre de financiar sua campanha com dinheiro do
tráfico. https://www.youtube.com/watch?v=oiJ3v_TUr0U e
https://www.bbc.com/mundo/articles/ce80jed2r33o
248
Gangues armadas, especialmente a Vivre Ensemble, uma potência liderada por Jimmy Cherisier, a
Barbecue, controla quase 80% de Porto Príncipe. Sua estratégia clientelista para conquistar a população
coexiste com ações terroristas contra outras gangues rivais e massacres para intimidar a população.
249
Conselho de transição do Haiti demitiu o primeiro-ministro Garry Conille e nomeou o empresário Alix
Didier Fils-Aime em seu lugar, em meio a alegações de corrupção e disputas sobre a legalidade do
processo. ex-candidato ao Senado sob a bandeira do partido político Verite
https://cnnespanol.cnn.com/2024/11/10/consejo-transicion-haiti-destituye-primer-ministro-garry-
conille-trax
250
Em junho, 400 soldados quenianos chegaram, menos que os 12.000 membros de gangues haitianas. A
chegada de 150 soldados guatemaltecos e salvadorenhos pouco ajuda a restabelecer o monopólio estatal
sobre a violência. Quando a ONU autorizou a missão, ela planejou uma força de 2.500 soldados, que
deveriam chegar em novembro, mas ainda não chegaram.

279
2. O crescimento moderado de 2.5% deve gerar maior insatisfação entre os latino-
americanos

Segundo projeções da CEPAL, o crescimento econômico da região para o 2025 será


muito modesto, em torno de 2,4%. Embora seja um pouco maior do que o observado em 2024,
que que foi de 2,2%, é menor do que o crescimento global. Conforme assinalado no Balanço
Preliminar das Economias da América Latina e do Caribe 2024, o último relatório anual
(emblemático) do CEPAL251: as economias da região continuarão este ano e no próximo atoladas
numa armadilha que combinará taxas de crescimento baixas e dependência do consumo privado
e menos do investimento.

O crescimento da produtividade continua fraco: a produtividade média do trabalho


subiu para apenas 33% dos níveis da OCDE em 2023, enquanto 27,3% da população total da
região vivia na pobreza no mesmo ano, o nível mais baixo nas últimas duas décadas. A pobreza
extrema, no entanto, permanece persistentemente alta, afetando uma em cada dez (10,6%)
pessoas na América Latina e no Caribe. Essa situação econômica limitará a capacidade dos
governos latino-americanos de reduzir a pobreza.

A OECD252 aponta que os países da América Latina e do Caribe (ALC) devem melhorar a
arrecadação de impostos, os gastos e a gestão da dívida pública, bem como mobilizar mais
recursos privados para financiar suas ambiciosas agendas de desenvolvimento. Para reduzir a
lacuna de financiamento sustentável na ALC – estimada em US$ 99 bilhões por ano – a
coordenação entre os atores públicos e privados deve ser melhorada, com a ajuda de seus
parceiros internacionais. Dado o difícil contexto socioeconômico da região, é necessário um
conjunto abrangente de reformas.

3. A persistência das grandes inequidades e desigualdades podem acelerar a mobilidade em


busca de regiões mais desenvolvidas

A região da América Latina e do Caribe é a mais desigual do mundo. Os 10% mais ricos
da população têm em média 12 vezes mais renda do que os 10% mais pobres. A média para
países desenvolvidos na OCDE é de 4 vezes. Além disso, um em cada cinco habitantes da ALC é
classificado como pobre.

O Voces en Acción do BID253 observa que na Colômbia, Chile e Uruguai, cerca de um por
cento da população controla entre 37% e 40% da riqueza total, enquanto a metade mais pobre
controla apenas um décimo da riqueza. Ainda é observável que, segundo o relatório, o nível é
muito maior do que a faixa de 20% a 30% na Europa Ocidental e na Escandinavia. Na verdade, é
quase 42% dos Estados Unidos. Embora tenha havido conquistas entre 1990 e 2014, o progresso
na reversão da desigualdade estagnou e isso não parece se reverter no curto prazo de 2025.

A região abriga países com altíssima desigualdade de renda, como Brasil, Colômbia,
Guatemala, Panamá e Honduras. Mas também inclui Bolívia, República Dominicana, El Salvador
e Uruguai, onde as disparidades de renda são semelhantes às dos Estados Unidos.

251
https://www.cepal.org/es/publicaciones/81104-balance-preliminar-economias-america-latina-
caribe-2024
252
https://www.oecd.org/en/publications/latin-american-economic-outlook-2024_c437947f-en.html
253
O podcast “Voces en Acción” e sua série “Pensar la igualdad” (Pensando na Igualdade) oferecem uma
análise aprofundada da persistência, causas e consequências da desigualdade na América Latina e no
Caribe. Com evidências e rigor, aborda aspectos como trabalho, educação, gênero, raça, nutrição,
proteção social e poder.https://cloud.mail.iadb.org/PodcastVocesEnAccion

280
A desigualdade aumentou em média 2% entre 2019 e 2020 na América Latina e no
Caribe como consequência da pandemia da Covid-19.254 A queda nos níveis de emprego devido
à contração econômica causada pela pandemia está associada ao aumento da desigualdade de
renda, que, segundo as projeções da CEPAL, diminuirá progressivamente com a recuperação.
No entanto, a perda de escolaridade e de rendimento educacional devido à pandemia pode
gerar pressões sobre a desigualdade no futuro, quando os jovens em idade escolar entrarem no
mercado de trabalho, aprofundando ainda mais um cenário futuro de baixo desenvolvimento.

4. O crime organizado assusta e gera maior deslocamento interno e externo nos países da
América Latina

Como já apontamos em edições anteriores dos Cadernos CRIS, a América Latina, apesar
de ser considerada uma zona de paz, tem sido, historicamente, uma região extremamente frágil
do ponto de vista da segurança pública e cenário de altos índices de violência. A presença e
aprimoramento do crime organizado, especialmente do narcotráfico e do tráfico humano, em
lugar de reduzir, vem aumentando significativamente nas últimas décadas.255

Com o aumento do número de pessoas forçadas a deixar seus lares na América Latina e
no Caribe em 2024, o tráfico de migrantes passou de uma atividade criminosa periférica para se
tornar um pilar fundamental das operações de alguns dos grupos criminosos mais influentes da
região. Essa transformação ocorreu em um cenário onde esses mesmos grupos estão no cerne
das principais causas do deslocamento na região. Ao disputarem o controle de economias
ilícitas—como o narcotráfico e a extorsão—, desencadeiam conflitos que geram deslocamentos
forçados e impulsionam a migração irregular.256

Migrantes que fogem da violência, da crise ambiental e da instabilidade econômica


tornaram-se alvos lucrativos para essas redes criminosas, que não apenas lucram facilitando a
travessia ilegal, mas também exploram essas populações por meio de esquemas de extorsão e
sequestros. Como resultado, a economia migratória tornou-se uma das principais fontes de
renda dessas organizações.

É importante notar que, políticas restritivas e de endurecimento da imigração, como as


praticadas pelo governo Trump, podem ter um efeito cruel de acentuar a ação dessas redes
criminosas e aprofundar o abuso dessa população tão vulnerável que foge de um contexto de

254
https://publications.iadb.org/es/el-aumento-de-la-desigualdad-en-america-latina-un-efecto-
colateral-de-la-
pandemia#:~:text=La%20desigualdad%20aument%C3%B3%20en%20promedio,creciente%20en%20los%
20a%C3%B1os%20noventa.
255
As democracias latino-americanas enfrentam um duplo desafio, onde sua legitimidade e sobrevivência
a médio prazo estão em jogo: a estagnação econômica (que está entrando em seu décimo primeiro ano)
e o aumento da insegurança dos cidadãos (tanto em termos de vitimização quanto de percepção). Ambas
as dinâmicas alimentam a frustração e a desconfiança da população em relação a instituições ineficazes
cooptadas pelo crime organizado. A insegurança cidadã, que tem suas raízes nas transições para a
democracia na década de 1980, aumentou nos últimos 25 anos devido ao crescimento da economia e do
poder de fogo do crime organizado e dos cartéis de drogas que deram um salto qualitativo nos níveis de
violência e aumentaram sua presença regional e sua capacidade de penetração nas instituições. Esse
fracasso se deve ao fato de um problema de natureza estrutural, multilateral e regional ter sido abordado
apenas com uma visão nacional e não de forma abrangente.
https://www.realinstitutoelcano.org/analisis/america-latina-crimen-organizado-e-inseguridad-
ciudadana/
256
https://insightcrime.org/es/noticias/gamechangers-2024-crimen-organizado-se-beneficia-auge-
migratorio-latinoamerica/

281
violência e privação e entra em outro tão perverso quanto o que vivenciava – ou mais. Na
esperança de evadir do rígido controle migratório, os migrantes acabam caindo diretamente nas
mãos dos traficantes e se tornam ainda mais dependentes deles.

Por tanto, a presença do crime organizado, gangues e grupos criminosos na região tem
um importante impacto na mortalidade, deslocamentos de grupos populacionais e situações de
violência.

Outro tema muito atual e que vem sendo objeto de conflitos políticos e comerciais é o
opioide fentanil257. Hoje ele é um problema de segurança e de saúde pública não apenas para os
Estados Unidos, mas também para a América Latina258,259 e vem constituindo uma “ameaça
global”. Os fluxos de fentanil – droga opioide 50 vezes mais potente que a heroína e
extremamente letal, que utiliza precursores químicos de origem chinesa por meio de
laboratórios no México está se expandindo para além dos mercados dos EUA e se espalhando
para mercados no México, Brasil, Argentina e outros lugares da região. O novo governo Trump
já manifestou a ideia de declarar guerra ao fentanil e aos cartéis e grupos de tráfico de drogas,
que ele vincula à migração de latino-americanos em seu país.

Inclusive, com o pretexto – entre outros – de pressionar seus grandes parceiros


comerciais a conterem o fluxo de fentanil para os EUA, Trump anunciou dia 1 de fevereiro a
taxação de 25% das importações do Canadá e México e 10% da China e abriu as portas para uma
nova disputa comercial.260

A produção de cocaína, que historicamente ocorreu na região andina, está aumentando,


se deslocando e se diversificando além de suas fronteiras. De fato, o Escritório das Nações
Unidas sobre Drogas e Crime informou que, em 2023, a produção potencial de cocaína somente
na Colômbia cresceu 53%.

257
O fentanil, um opioide sintético desenvolvido na década de 1960, foi originalmente projetado como
um analgésico poderoso para tratar dores intensas, principalmente em pacientes com câncer avançado
ou submetidos a cirurgias complexas. Sua potência é aproximadamente 50 vezes maior que a da heroína
e até 100 vezes maior que a da morfina. Quimicamente, pertence à família das fenilpiperidinas, compostos
projetados para interagir com receptores opioides no cérebro, bloqueando a percepção da dor e gerando
uma intensa sensação de euforia.
258
Na América Latina, o fentanil ainda não é uma preocupação como nos Estados Unidos ou Canadá. No
entanto, os alarmes soaram na América Central em 21 de novembro, depois que a Costa Rica informou
ter desmantelado a primeira gangue da região dedicada à venda e distribuição de fentanil. Além disso,
dias antes, Honduras havia apreendido 48.600 doses de fentanil que estavam escondidas em um
contêiner vindo da Europa. https://www.20minutos.es/noticia/5195176/0/no-solo-estados-unidos-
fentanilo-se-extiende-por-mundo-se-convierte-amenaza-global/
259
Em dezembro de 2024, autoridades mexicanas realizaram uma operação em Sinaloa que resultou na
apreensão de uma tonelada e meia de fentanil, quantidade suficiente para produzir 20 milhões de doses
e com valor estimado de 400 milhões de dólares. https://www.eleconomista.com.mx/opinion/fentanilo-
crisis-alcanzo-20250122-743190.html
260
https://www.brasil247.com/mundo/china-critica-tarifas-de-trump-e-diz-que-fentanil-e-problema-
dos-eua

282
Neste novo mapa da produção de coca de Colômbia, Bolívia e Peru261, foram
incorporadas Venezuela, Equador262 e várias áreas da América Central263. Um acontecimento
preocupante foi o estabelecimento de plantações industriais de coca na Venezuela264,
Guatemala e Honduras que replicaram o sistema de produção de cocaína estabelecido na
Colômbia, com plantações de coca próximas a laboratórios e pistas de pouso.

Desse modo, a região está aberta às operações de uma grande variedade de


organizações criminosas transnacionais, desde grupos colombianos até os cartéis mexicanos de
Sinaloa e Jalisco Nueva Generación, passando pelo Primeiro Comando Capital (PCC) brasileiro e
o Comando Vermelho (CV), a Ndrangheta italiana, máfias albanesas e tríades chinesas. A
contínua fragmentação dos cartéis e a proliferação de seus braços armados, gangues afiliadas e
milícias de cidadãos corruptos, criadas para combatê-los, aumentaram a violência265.

Outro grave problema associado à criminalidade na América Latina é a mineração ilegal,


que não apenas facilita a lavagem de dinheiro proveniente de outras atividades ilícitas, mas
também está diretamente ligada a crimes como prostituição e tráfico de pessoas. Além disso,
essa prática causa sérios danos ambientais, agravando ainda mais a crise de segurança na região.

A mineração ilegal se expandiu significativamente nas últimas duas décadas,


impulsionada pelo aumento do preço dos minerais. Apesar da queda geral nos preços das
commodities desde 2014, o ouro continua altamente valorizado, sendo considerado um ativo

261
Embora o cultivo de coca tenha crescido exponencialmente na Colômbia, os outros países produtores,
Peru e Bolívia, também registraram aumentos. O que é preocupante em ambas as nações é como o caos
político está empurrando as estratégias de combate ao narcotráfico cada vez mais para baixo na lista de
prioridades governamentais. https://insightcrime.org/es/noticias/gamechangers-2023-cocaina-
fogonazo-estallido-2024/
262
No final de 2024, o presidente Daniel Noboa confirmou a descoberta de 2.000 hectares de plantações
de coca no Equador. Ao mesmo tempo, as Forças Armadas destruíram 12 laboratórios de drogas.
Especialistas sugerem que o país passou da fase de trânsito para a fase de processamento da substância.
https://www.ecuavisa.com/la-noticia-a-fondo/ecuador-pais-productor-y-refinador-de-coca-expertos-
responden-la-interrogante-XY8155077
263
Quase metade do norte da América Central tem condições agrícolas ideais para o cultivo de coca, a
matéria-prima da cocaína, de acordo com um novo estudo que alerta para a potencial expansão desse
cultivo ilícito na região. https://insightcrime.org/es/noticias/centroamerica-predispuesta-expansion-
coca/
264
A Venezuela se tornou um país de trânsito para um produtor de cocaína. Um estudo do 'Insight Crime'
afirma que durante o mandato de Maduro, a produção em plantações e laboratórios aumentou. "O tráfico
de drogas ganhou importância como um componente das estratégias de Maduro para se manter no poder
diante dos ataques sofridos por seu governo", afirma o Insight Crime.
https://elpais.com/internacional/2023-03-14/venezuela-de-pais-de-transito-a-productor-de-
cocaina.html
265
A América Latina está passando por uma grande transformação na forma como as estruturas do crime
organizado operam na região. A composição atual das gangues criminosas, o tipo de negócio que realizam,
a amplitude do território que seus tentáculos alcançam e o anonimato de muitos de seus líderes são
alguns dos fatores por trás dessa transformação. Uma tendência é a fragmentação. do crime paisagem
não era comum há cerca de dez anos. A segunda característica é a diversificação dos negócios desses
grupos, que vão desde o tráfico de pessoas e armas, prostituição, expansão de drogas sintéticas,
falsificação de medicamentos, assassinatos por encomenda e mineração ilegal, entre outros. Uma terceira
característica que podemos destacar é o anonimato dos líderes dessas organizações, que no passado
gostavam de se gabar de suas fortunas e poder. Por fim, outra característica é que esses grupos e o crime
organizado se espalharam por todos os países da América Latina, mesmo aqueles que costumavam ser
relativamente livres do crime organizado e que experimentaram um aumento na insegurança, violência e
ilegalidade. https://www.bbc.com/mundo/articles/cjmd4v847ewo

283
seguro e resiliente frente à desaceleração econômica global. Para sua extração, é necessário o
uso de mercúrio, um metal altamente tóxico empregado na separação do ouro de rochas e
sedimentos.

De acordo com a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA), estima-se


que a mineração ilegal libere, em média, 24 quilos de mercúrio por quilômetro quadrado,
gerando impactos ambientais devastadores. O garimpo tem sido objeto de crescente atenção
por parte de pesquisadores, devido não apenas aos crimes e violações associadas a essa
atividade, mas também aos riscos à saúde humana e à contaminação de ecossistemas causada
pelo mercúrio.

Todas essas atividades estão se expandindo na região, tanto em áreas florestais – como
a Amazônia, que abrange diversos países da América do Sul, as bacias do Orinoco na
Venezuela266 e o interior da Guiana e do Suriname – quanto em áreas urbanas, como a cidade
de Rosário, na Argentina267, e uma presença cada vez maior em Montevidéu, no Uruguai268.

5. Efeitos das mudanças climáticas e seu impacto nas populações latino-americanas

Espera-se que as consequências dos efeitos climáticos adversos derivados do


“aquecimento global” na região tragam novos episódios de secas severas e, igualmente, grandes
inundações que afetarão a agricultura e a pecuária, incêndios florestais, perdas de colheitas e
deslocamentos populacionais.

O desastre no estado brasileiro Rio Grande do Sul se torna um exemplo e,


provavelmente, replicável de situações extremas de inundações e contingências. Na América
Central e no Caribe, é bastante provável o aumento na frequência de furacões e tempestades
tropicais, como já foi observado no passado. O impacto das mudanças climáticas na saúde da
população é muito amplo. Segundo a OPAS269, as temperaturas médias estão aumentando a
cada ano, e mais pessoas estão sendo afetadas por desastres, doenças relacionadas ao clima e
outros problemas de saúde. Percebe-se um aumento das migrações de latino-americanos e
caribenhos devido a desastres naturais, degradação ambiental e impactos adversos das
mudanças climáticas. Somente em 2021, mais de 1,6 milhão de novos deslocamentos
relacionados a desastres foram registrados nas Américas. Até 2050, os cenários mais pessimistas
estimam que a América Latina terá 17 milhões de migrantes climáticos270.

As mudanças climáticas não só agravam as ameaças à saúde, como também impõem


desafios significativos à saúde pública. De acordo com a OPAS, apenas com base em alguns

266
https://nuso.org/articulo/el-arco-minero-del-orinoco/
267
A cidade de Rosário, localizada 300 quilômetros a noroeste de Buenos Aires, tornou-se conhecida como
a cidade mais perigosa da Argentina, com a maior taxa de homicídios do país. Em 2023, o Centro de
Estudos Latino-Americanos sobre Insegurança e Violência da Universidade de Tres de Febrero determinou
que em 2020 houve 16,4 pessoas assassinadas por 100.000 habitantes. Segundo o Observatório de
Segurança Verisure, Rosário também foi a cidade com maior número de atos criminosos do país no ano
passado. https://www.bbc.com/mundo/articles/cy6zd2gv734o
268
CROCI, G (2024) “Criminalidad y Crimen Organizado en Uruguay: Alguna Recomendaciones para la
Reducción de la Violencia”. Disponible en: https://confederacionuy.com/wp-
content/uploads/2024/06/anexo-cce-uruguay-y-crimen-organizado.pdf
269
https://www.paho.org/es/temas/cambio-climatico-salud
270
https://www.caf.com/es/actualidad/noticias/el-cambio-climatico-acentua-la-crisis-migratoria-de-
america-latina-y-el-
caribe/#:~:text=Cada%20vez%20m%C3%A1s%20latinoamericanos%20y,por%20desastres%20en%20las
%20Am%C3%A9ricas.

284
indicadores, as alterações climáticas poderão resultar em mais de 250.000 mortes por ano nas
próximas décadas. Além disso, os eventos climáticos extremos forçam populações humanas e
animais a migrarem, o que, ao intensificar o fluxo e o contato entre esses grupos, acelera a
propagação de doenças – abrangendo tanto aquelas transmitidas entre humanos quanto as que
afetam plantas e animais, que são fundamentais como fontes de alimento e para a manutenção
de ecossistemas complexos.

Nesse sentido, torna-se cada vez mais necessário incorporar a abordagem de “Saúde
Única” ou “One Health”271. Um exemplo importante dos efeitos deletério do aquecimento global
é a questão dos mosquitos e das doenças transmitidas por eles. A elevação das temperaturas
prolonga a temporada de mosquitos e outros insetos – vetores de doenças – e com isso as
probabilidades de se espalhar geograficamente.272. A Organização Mundial da Saúde já alertou
sobre a disseminação da dengue e da chikungunya para além das áreas onde historicamente
estavam confinadas.

Além do sofrimento humano, os fenômenos climáticos, as migrações e as crises


sanitárias mencionados testarão os recursos dos governos, a capacidade de mobilização da
cooperação internacional e as operações das forças de segurança. Com a redução dos recursos
previstos – decorrente da baixa prioridade que doadores internacionais atribuem à América
Latina e ao Caribe – esse cenário se configura como mais um desafio para a cooperação
internacional na região.

6. Maior engajamento chinês na região

O aumento dos investimentos, das relações comerciais e da cooperação com a China é


uma discussão recorrente em edições anteriores dos Cadernos CRIS/FIOCRUZ. O início de 2025
pode renovar esse debate, uma vez que, diante de um cenário marcado por incertezas e
restrições impostas pelo governo Trump273 274, os países latino-americanos tendem a buscar um

271
O conceito de “One Health” ou “Saúde Única" afirma que a saúde humana e a saúde animal são
interdependentes e estão ligadas aos ecossistemas nos quais coexistem. Nesse sentido, é definido como
“os esforços colaborativos de múltiplas disciplinas (pessoal médico, veterinários, pesquisadores, etc.) que
trabalham local, nacional e globalmente para alcançar a saúde ideal para pessoas, animais e nosso meio
ambiente”.
272
Como o World Mosquito Program coloca, "Doenças transmitidas por mosquitos matam mais de um
milhão de pessoas e infectam até 700 milhões a cada ano – quase uma em cada dez pessoas. À medida
que o planeta aquece e as mudanças climáticas prolongam a temporada de mosquitos, os mosquitos têm
mais probabilidade para se espalhar para outras partes do mundo. Os mosquitos, criaturas mais mortais
do mundo, expandirão seu alcance geográfico para novas regiões e ressurgirão em áreas onde o número
de mosquitos vinha diminuindo há décadas. Padrões climáticos extremos, como secas, ondas de calor,
inundações e chuvas, estão aumentando em gravidade e regularidade em todo o mundo. Tudo isso cria
condições favoráveis para a reprodução dos mosquitos e pode contribuir para a disseminação de seus
vírus para latitudes e altitudes mais altas”. https://www.worldmosquitoprogram.org/es/noticias-
historias/historias/explicativo-como-el-cambio-climatico-esta-amplificando-las
273
As tarifas de importação tornariam os produtos chineses mais caros para os consumidores americanos,
que acabariam tendo que pagar uma parcela significativa do custo de importação de tudo, de brinquedos
a roupas, o que provavelmente teria um efeito cascata na inflação americana.
274
A resposta oficial de Pequim à nova onda de tarifas de Donald Trump não demorou a chegar. A China
demonstrou sua rejeição total à "ação errônea" dos Estados Unidos de impor um imposto adicional de
10% sobre produtos importados do país asiático. A República Popular da China apresentará uma queixa à
Organização Mundial do Comércio (OMC) e tomará as contramedidas correspondentes para salvaguardar
firmemente seus direitos e interesses. https://elpais.com/internacional/2025-02-02/china-llevara-los-
aranceles-de-trump-a-la-omc-y-anuncia-contramedidas.html

285
aprofundamento das relações com a China e outras parcerias, incluindo nações dos BRICS. Esse
reposicionamento estratégico, no entanto, pode gerar novos conflitos e desafios diplomáticos
na região.275

Na frente comercial, a China deverá continuar a expandir a sua presença empresarial


em produtos e infraestruturas digitais, incluindo telecomunicações, computação em nuvem e
sistemas de vigilância, bem como produção de energia renovável, transmissão e distribuição de
eletricidade, veículos elétricos, mineração de metais estratégicos, transporte marítimo e
logística276, desenvolvimento de infraestrutura física e fabricação e distribuição em mercados
estratégicos como México e Brasil. A China já assinou Acordos de Livre Comércio com o
Equador277 e a Nicarágua278 e está em processo de finalização com Honduras279 e El Salvador280,
e possivelmente renovando-os com o Panamá281, a fim de expandir seu acesso comercial à
região.

A tensão entre Estados Unidos e China poderá levar o país asiático a evitar investimentos
em Títulos do Tesouro dos EUA282, possivelmente redirecionando esses recursos para a América

275
Historicamente, a América Latina tem sido considerada dentro da esfera natural de influência dos
Estados Unidos e um importante parceiro comercial dada sua proximidade geográfica. No entanto, as
relações entre as duas regiões não estão tão intimamente interligadas como antes. Os governos recentes
dos EUA se concentraram em outras regiões, como Oriente Médio e Ásia, e o envolvimento dos EUA com
a América Latina diminuiu. Enquanto isso, nos últimos dez anos, a China expandiu significativamente sua
influência na região por meio do aumento do comércio, investimento e crédito. À medida que as tensões
entre os Estados Unidos e a China continuam a aumentar, os laços estreitos da América Latina com a
China representam dilemas políticos significativos para os Estados Unidos. A chegada de Trump com sua
Recarga da Doutrina Monroe aumenta a possibilidade de tensões na América Latina
276
incluindo maior uso e exploração do porto de Chancay, operado pela COSCO
277
Em 11 de maio de 2023, a China e o Equador assinaram oficialmente o Acordo de Livre Comércio entre
o Governo da República Popular da China e o Governo da República do Equador, que entrou em vigor em
1º de maio de 2024. https://fta-mofcom-gov-
cn.translate.goog/topic/enecuador.shtml?_x_tr_sch=http&_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=es&_x_tr_hl=es&_x_tr
_pto=wa
278
Em 1º de janeiro de 2024, o Acordo de Livre Comércio entre a Nicarágua e a República Popular da China
entrou em vigor, avançando a passos largos para fortalecer ainda mais a unidade, o desenvolvimento, a
prosperidade e o futuro de ambos os povos e nações. https://www.lagaceta.gob.ni/tratado-de-libre-
comercio-entre-nicaragua-y-la-republica-popular-china-avanza-a-pasos-de-gigante/
279
22 capítulos do Acordo de Livre Comércio entre China e Honduras já foram negociados.
https://www.elheraldo.hn/honduras/que-se-ha-acordado-tratado-libre-comercio-honduras-china-
FF20078386.
Essa importante cooperação "fortalecerá" as relações diplomáticas entre Honduras e China, mas também
terá um "impacto positivo" nas comunidades hondurenhas, onde o projeto proporcionará oportunidades
educacionais, melhorias na infraestrutura escolar e beneficiará milhares de estudantes.
https://www.swissinfo.ch/spa/honduras-y-china-firman-acuerdo-para-estudio-sobre-proyecto-de-
infraestructura-
escolar/86784078#:~:text=Destac%C3%B3%20adem%C3%A1s%20que%20esta%20importante,beneficia
r%C3%A1%20a%20miles%20de%20estudiantes.
280
Em 2024, El Salvador e China iniciaram negociações para um acordo de livre comércio e estabeleceram
um grupo de trabalho para estabelecer a estrutura geral. O acordo não apenas fortalecerá o comércio
entre os dois países, mas também incentivará o investimento chinês em El Salvador.
https://www.elsalvador.com/noticias/negocios/el-salvador-china-tlc/1136739/2024/
281
Desde o estabelecimento das relações diplomáticas entre a China e o Panamá em 2017, um novo
capítulo foi aberto no relacionamento bilateral. Nestes sete anos, as relações bilaterais desenvolveram-
se de forma constante e a cooperação econômica e comercial rendeu frutos abundantes.
282
A China vem acumulando constantemente títulos do Tesouro dos EUA nas últimas décadas. Em
dezembro de 2019, o país asiático detinha US$ 1,07 trilhão, ou cerca de 5%, da dívida nacional dos EUA,

286
Latina, especialmente para grandes economias como o Brasil – que atua como porta de entrada
para o MERCOSUL – e o México, caso regularize sua situação com os Estados Unidos para acessar
seus mercados por meio do USMCA (Acordo Estados Unidos-México-Canadá). Além disso, como
parte de seu compromisso estratégico, a China deverá buscar novos “swaps bancários” e
acordos que permitam utilizar o yuan como moeda de transação com um número crescente de
governos regionalmente alinhados, contribuindo assim para reduzir a dependência do dólar
americano.

A China tem demonstrado interesse em promover a cooperação no setor espacial –


considerado de importância estratégica – e em estreitar laços com as forças de segurança da
América Latina e do Caribe. Essa postura poderá gerar oportunidades para países que investem
em pesquisa e desenvolvimento no setor espacial, além de aumentar as vendas de armas para
as forças de segurança e parceiros da região. Embora as atividades de cooperação em segurança
e defesa representem uma parcela relativamente pequena do envolvimento chinês na América
Latina e no Caribe283., elas possuem significado estratégico. Esse interesse foi explicitamente
reconhecido por Pequim nos Livros Brancos de Política China-América Latina de 2008 e 2016,
bem como no plano China-CELAC 2022-2024284., e se reflete ainda no Livro Branco do Ministério
das Relações Exteriores da China, que destaca a Iniciativa de Segurança Global da China.

A crescente relação entre a região e a China deverá intensificar os fóruns bilaterais, com
a provável realização da Cúpula China-CELAC ainda este ano, abrindo uma janela de
oportunidade cuja neutralização pelos Estados Unidos é incerta. Além disso, a próxima Cúpula
do BRICS, a ser realizada no Brasil em outubro de 2025, representará um marco crucial para o
reposicionamento da China na região, possivelmente atraindo novos parceiros estratégicos.

Nesta primeira edição dos Cadernos de 2025, concluímos que este será um ano de
importantes desafios para a região. Nas primeiras semanas de janeiro já experimentamos crises
políticas e muitas incertezas com relação ao futuro da cooperação regional e um possível
aprofundamento da fragmentação política latino-americana. O panorama de segurança na
América Latina se agrava diante da expansão e diversificação das atividades ilícitas, que
abrangem desde o narcotráfico e o tráfico humano até a mineração ilegal e o comércio de
opioides como o fentanil. Essa conjuntura complexa, que impulsiona deslocamentos forçados e
reforça a vulnerabilidade dos migrantes, evidencia o papel central que os grupos criminosos
transnacionais têm assumido na região, promovendo não apenas conflitos e instabilidade
política, mas também sérios danos ambientais e riscos à saúde pública. Para piorar, o
recrudescimento das políticas migratórias de Trump, aumenta a exposição da população forçada
a se deslocar a redes de criminosos com a esperança de escapar do controle migratório. Diante
desse cenário multifacetado, torna-se imperativo o desenvolvimento de políticas integradas e

de US$ 23 trilhões, uma parcela maior do que qualquer outro país estrangeiro. Alguns analistas e
investidores temem que a China comece a vender títulos do Tesouro dos EUA em retaliação e que essas
ações possam aumentar as taxas de juros, o que poderia prejudicar o crescimento econômico.
https://www.tecnicasdetrading.com/2021/10/china-compra-bonos-tesoro-eeuu.html
283
https://www.lapatilla.com/2024/02/24/la-avanzada-china-sobre-la-seguridad-de-america-latina-y-el-
caribe/
284
O Plano de Ação Conjunta China-CELAC foi assinado na Terceira Reunião Ministerial do Fórum China-
CELAC realizada virtualmente em 3 de dezembro de 2021, para o período de 2022-2024 e identifica a
Cooperação como seu primeiro capítulo. Política e Segurança. Também promove a cooperação para
intercâmbios e atividades na área aeroespacial. O plano pode ser consultado em:
https://www.mfa.gov.cn/esp/wjdt/gongbao/202112/t20211213_10467311.html

287
cooperação regional que consigam enfrentar os desafios comuns de forma eficaz e garantir a
proteção das populações afetadas.

Além disso, a crescente influência da China na América Latina, evidenciada pelo


fortalecimento de fóruns bilaterais, cooperações estratégicas e investimentos em setores
críticos como o espacial e o de segurança, tendem a redesenhar o cenário regional. Enquanto
os Estados Unidos procuram reafirmar seu domínio por meio de políticas restritivas e medidas
de contenção, cedem espaço para a intensificação das parcerias sino-latino-americanas. Este
cenário aponta para um realinhamento geopolítico que promete redefinir os equilíbrios de
poder e abrir novas oportunidades – e desafios – para a região.

288
África

Augusto Paulo Silva


Manuel Mahoche
Tomé Cá
Dala Djop
Felix Rosenberg

Abstract. This report addresses several crucial aspects of Africa's development, ranging from
agriculture and food security to health, the environment, the importance of data and statistics,
and international cooperation. The African Union has adopted a new Strategy and Action Plan
(2026-2035) for the Comprehensive Africa Agriculture Development Program (CAADP). Economic
and financial challenges require the mobilization of domestic resources, the fight against illicit
financial flows, and Africa's participation in building a fairer and more inclusive global financial
system. The WHO-AFRO report highlights the need for greater efforts to ensure that people have
access to quality health services without facing financial hardship. In the Great Lakes region, the
armed group M23, supported by Rwandan troops, has seized the city of Goma in the Eastern
Democratic Republic of Congo (DRC). The African Union has condemned the M23 attacks and
demanded the withdrawal of foreign forces. The humanitarian situation in Goma is dire, with
hospitals overcrowded, bodies in the streets, and basic services disrupted. Pope Francis has also
called for an end to the violence. The civil war in Sudan has worsened the humanitarian crisis,
with an increase in civilian casualties, displacement, and famine. Both conflicts highlight serious
humanitarian crises, with violence, displacement, and famine, requiring urgent international
action for peace and assistance.

Keywords: African Union. Great Lakes. Sudan. WHO. Pope Francis.

Resumo. Este informe aborda diversos aspectos cruciais para o desenvolvimento da África,
desde a agricultura e segurança alimentar, até à saúde, meio ambiente, a importância de dados
e estatísticas e à cooperação internacional. A União Africana adotou uma nova Estratégia e Plano
de Ação (2026-2035) para o Programa Abrangente de Desenvolvimento da Agricultura Africana
(CAADP). Desafios econômicos e financeiros demandam mobilização de recursos domésticos,
do combate aos fluxos financeiros ilícitos e da participação da África na construção de um
sistema financeiro global mais justo e inclusivo. O relatório da OMS-AFRO destaca a necessidade
de mais esforços para garantir que as pessoas tenham acesso a serviços de saúde de qualidade
sem enfrentar dificuldades financeiras. Nos Grandes Lagos, o grupo armado M23, apoiado por
tropas ruandesas, tomou a cidade de Goma, no leste da República Democrática do Congo (RDC).
A União Africana condenou os ataques do M23 e exigiu a retirada de forças estrangeiras. A
situação humanitária em Goma é grave, com hospitais lotados, corpos nas ruas e serviços
básicos interrompidos. O Papa Francisco também pediu o fim da violência. A guerra civil no
Sudão agravou a crise humanitária, com aumento de vítimas civis, deslocamentos e fome.
Ambos os conflitos destacam crises humanitárias graves, com violência, deslocamentos e fome,
exigindo ação internacional urgente para paz e assistência.

Palavras-chave: União Africana. Grandes Lagos. Sudão. OMS. Papa Francisco.

289
União Africana

Uma Cúpula extraordinária da União Africana em Kampala, Uganda, resultou na adoção


de uma Estratégia e Plano de Ação de 10 (dez anos para o Programa Abrangente de
Desenvolvimento da Agricultura Africana (CAADP). Este Plano, que abrange 2026 a 2035, visa
impulsionar a transformação agrícola e os sistemas alimentares na África, combatendo a fome
e a pobreza, e alinha-se com a Agenda 2063 da União Africana. A Estratégia, desenvolvida por
diversas partes interessadas, foca em investimentos, parcerias e empoderamento de pequenos
agricultores, buscando aumentar a produção de alimentos e reduzir as importações. Líderes
africanos enfatizaram a necessidade de ações concretas para alcançar a segurança alimentar no
continente.

O termo "CAADP" refere-se ao Programa de Desenvolvimento da Agricultura em África


(Comprehensive Africa Agriculture Development Programme), uma iniciativa continental da
Agenda 2063 da União Africana. Lançado em 2003 após a Declaração de Maputo e reafirmado
em 2014 na Guiné Equatorial com a Declaração de Malabo, o CAADP visa aumentar a
produtividade agrícola, aumentar o investimento público na agricultura e estimular o
crescimento económico através do desenvolvimento liderado pela agricultura, ajudando assim
os países africanos a eliminar a fome e reduzir a pobreza.

Os objetivos principais do CAADP incluem:

• Melhorar a segurança alimentar e a nutrição

• Aumentar os rendimentos nas economias africanas baseadas na agricultura

• Impulsionar o crescimento económico através da agricultura

• Reduzir a dependência do continente das importações de alimentos

O CAADP é considerado o esforço de reforma agrícola mais ambicioso e abrangente já


empreendido em África. Representa uma mudança fundamental para o desenvolvimento que é
totalmente propriedade e liderado pelos governos africanos.

Uma nova Estratégia e Plano de Ação do CAADP de 10 anos, a ser implementada de 2026
a 2035, foi adotada numa Cimeira Extraordinária da União Africana em Kampala, Uganda. Esta
estratégia visa aumentar a produção agroalimentar do continente em 45% até 2035, reduzir as
perdas pós-colheita em 50%, triplicar o comércio intra-africano de produtos agroalimentares e
aumentar a proporção de alimentos processados localmente para 35% do PIB agroalimentar até
2035.

A Estratégia e o Plano de Ação do CAADP procuram alcançar os seus objetivos através:

• Estimular o investimento
• Promover parcerias
• Capacitar os pequenos agricultores vulneráveis
• Promover a agricultura resiliente ao clima
• Melhorar as infraestruturas
• Reduzir o desperdício alimentar
• Melhorar o comércio regional de produtos agrícolas

A estratégia está alinhada com a Agenda 2063 da União Africana, que visa uma África
próspera baseada no crescimento inclusivo e no desenvolvimento sustentável. A estratégia

290
também pretende abordar desafios como as alterações climáticas, os conflitos, o rápido
crescimento populacional e as perturbações económicas que exacerbam a insegurança
alimentar em África.

A nova estratégia e plano de ação é diferente das declarações de Malabo e Maputo, pois
inclui uma estratégia abrangente e um plano de ação, o que permite que os estados membros
comecem a implementar imediatamente após a adoção. A estratégia enfatiza a importância dos
sistemas agroalimentares no crescimento económico e na garantia da segurança alimentar,
melhorando a nutrição e os resultados sustentáveis de saúde para todos.

O Presidente de Uganda, Yoweri Kaguta Museveni, apelou à promoção da adição de


valor aos produtos agrícolas e ao fim das barreiras não tarifárias. O Presidente da Etiópia, Taye
Atske Selassie, também destacou a necessidade urgente de um compromisso coletivo para
alcançar a visão de África de uma segurança alimentar e prosperidade. O Presidente da
Comissão da União Africana, Moussa Faki Mahamat, observou que o programa CAADP tem sido
implementado desde 2014, mas expressou insatisfação com o ritmo de progresso.

África e o sistema financeiro mundial inclusivo

Este é o título de uma entrevista sobre os desafios econômicos da África. Entre o


jornalista e seu convidado, discute-se a situação da dívida na África. A dívida da África não é um
problema. O autor argumenta que a África precisa abordar três questões na arquitetura
financeira internacional, tem um grande potencial econômico e conclui discutindo a próxima
Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento.

Nesta contribuição para as propostas da 4ª Conferência Internacional sobre o


Financiamento do Desenvolvimento, que se realizará em Sevilha, em Espanha, em 2025, o
economista guineense, antigo Secretário Executivo da Comissão Económica das Nações Unidas
para África e atual professor convidado da Escola Mandela de Governação Pública da
Universidade da Cidade do Cabo, na África do Sul, Carlos Lopes, partilha as suas perspectivas
sobre os desafios fiscais de África, as perspectivas económicas e as prioridades para a
conferência em Espanha. Seguem-se excertos de entrevista concedida à Africa Renewal.

Comecemos pela dívida. Qual é a gravidade da situação da dívida em África?


Prefiro dizer que a África enfrenta um problema de acesso à liquidez, o que se traduz em
dificuldades para honrar seus compromissos de dívida. Em comparação com outras regiões
do globo, as economias africanas são as menos financiadas. Como resultado, enfrentam
obstáculos para rolar suas dívidas.

As economias africanas também encontram dificuldades para financiar reformas


estruturais. A dependência da África em relação ao investimento estrangeiro direto (IED) é
fortemente influenciada por interpretações de risco que não refletem a realidade, pois o
retorno sobre o investimento na África é superior ao de outras regiões.

Outro fator crucial é que a África é a única região onde as agências de classificação de risco
aplicam ratings nacionais a todas as atividades. Por exemplo, se o país X possui uma
classificação ruim, uma empresa, um investimento ou um projeto específico será classificado
como o país, independentemente de seu mérito. Assim, ao pagar as taxas de juros mais
altas, a África possui a menor liquidez e é classificada como de alto risco pelas agências de
classificação de risco.

291
A dívida da África gira em torno de US$ 1,1 trilhão. Você acha que isso não é um problema?
Não, não é um problema. Se você analisar o nível da dívida soberana da África, verá que é
insignificante, muitas vezes de um único dígito. O sistema financeiro global não teria
dificuldade em absorver tal nível de dívida. Lembra da frase "too big to fail"? Algumas
empresas foram socorridas a custos superiores à dívida total da África.

Alguns economistas falam em reformas da arquitetura financeira global, citando os níveis de


dívida da África, a classificação de crédito desfavorável, os empréstimos indiscriminados e as
altas taxas de juros. Você não concorda com tudo isso?
Não, não concordo. As reformas que provavelmente veremos, particularmente em
instituições multilaterais como o FMI, gerarão mais fundos para os países, inclusive na
África. Essas reformas ocorrerão às custas de uma redução drástica da Ajuda Oficial ao
Desenvolvimento (AOD) no âmbito bilateral. O resultado final provavelmente será menos
dinheiro. Mais dinheiro do lado multilateral, mas menos dinheiro do lado bilateral. É um
curativo que não resolverá os problemas estruturais.

Existem três questões na arquitetura financeira internacional que devem ser abordadas:

Primeiro, precisamos regulamentar as agências de classificação de crédito. Suas


metodologias devem ser baseadas em dados. Atualmente, cerca de metade de seus critérios
são políticos ou subjetivos. Eles tendem a generalizar os desenvolvimentos negativos para
todo o continente, mas localizar os desenvolvimentos positivos para países específicos. Por
exemplo, se houver boas notícias sobre Maurício, é apenas Maurício; e se houver más
notícias sobre a Etiópia, elas são generalizadas para todo o continente. Isso precisa ser
corrigido. Não estamos pedindo que sejam benevolentes.

Segundo, precisamos rever o Acordo de Basiléia III (o quadro regulatório internacional


projetado para apoiar a gestão de riscos e a liquidez nos bancos). As regras atuais protegem
a integridade do sistema bancário, privilegiam entidades maiores e desfavorecem novos
entrantes. Essas regras exigem diligência devida e requisitos de testes de estresse que
dificultam a atuação de bancos internacionais em jurisdições consideradas arriscadas, como
a África, restringindo o acesso à liquidez para bancos no continente.

Algumas dessas regras são mais rigorosas agora do que eram antes da crise financeira
global de 2008-2009. As regras tentam corrigir erros que a África não cometeu.

A terceira questão é valorizar as oportunidades na arquitetura financeira internacional. A


oportunidade da África é tripla: a primeira é o clima. Você não pode resolver a questão
climática sem a África, e os investidores têm oportunidades de fazer parte da solução
climática – minerais críticos, hidrogênio verde, você escolhe; a segunda é a demografia,
porque a África tem a população e a força de trabalho mais jovens; e a terceira é a
tecnologia, porque o continente oferece um mercado para alta tecnologia.

Qual a importância da mobilização de recursos domésticos neste cenário?


Contrariamente à percepção, a mobilização de recursos domésticos na África melhorou
significativamente. É verdade que a África ainda tem cerca de 17% de pressão fiscal,
enquanto a média mundial é de 35%. Mas o que não é mencionado é que tivemos um leve
aumento de 15% para 17% durante um período em que muitos choques exógenos
impediram a África de arrecadar mais.

Podemos fazer mais? Claro que sim. Mas temos limitações porque 80% de nossas
exportações são commodities. Não controlamos seus preços, que dependem de choques de
demanda exógena.

292
Um país como a Nigéria, com 6% de pressão fiscal, pode tributar mais. Mas lembre-se, para
arrecadar mais internamente é necessário criar as condições certas para a transformação
estrutural, o que depende do acesso à liquidez. É uma espécie de problema cíclico.

Onde eu acho que não estamos fazendo o suficiente é no uso do dinheiro em fundos
institucionais como fundos de pensão. Há muito dinheiro lá que não está sendo usado
produtivamente.

O que podemos fazer para combater os fluxos financeiros ilícitos (FFI)?


Isso é um problema africano que requer uma solução global. Os africanos sozinhos não
podem enfrentá-lo. Questões como BEPS (Base Erosion and Profit Shifting/ erosão da base
tributária e transferência de lucros), fuga de capitais e altos custos de transação incentivam
os fluxos financeiros ilícitos. Obviamente, os fluxos ilícitos vão para algum lugar, e sabemos
para onde eles vão. Alguns países proclamam lutar contra a corrupção, mas não fazem o
suficiente.

Há uma solução a nível continental para combater os fluxos financeiros ilícitos?


A África pode apertar muito mais seus controles. Parte da culpa está no tipo de contratos
que assinamos. A ressurgência do nacionalismo de recursos e a necessidade de renegociar
contratos estão ganhando terreno na maioria dos países. Muitos países conseguem
recuperar quantias significativas ao renegociar contratos.

Mas com a geopolítica, se você tentar renegociar contratos e apertar os controles, pode
perder investimentos.

Quando entrevistei você há 10 anos, você estava bastante otimista com as perspectivas
econômicas da África. Você ainda está otimista?
Sim. Se você olhar a perspectiva recém-publicada do FMI, nove das 20 economias que mais
crescem são africanas. A África é a segunda região que mais cresce, depois do Sudeste
Asiático.

Do ponto de vista demográfico, os custos do envelhecimento nas sociedades mais ricas serão
exponenciais e trarão consequências em termos de padrões de consumo e capacidades de
absorver novos desenvolvimentos tecnológicos que vão acelerar de forma bastante
significativa com a IA.

Acredito também que, devido à demografia, haverá outros tipos de migração, como a
migração digital, onde os serviços serão muito caros para serem mantidos em determinadas
jurisdições e será mais fácil distribuí-los com IA e enormes capacidades de conversão em
outras regiões.

A África pode se beneficiar se implementar o conjunto de habilidades correto. Esse conjunto


de habilidades não se limita à educação formal, reformas e mudanças; também inclui como
tornamos a largura de banda disponível, o acesso à Internet e outros recursos.

A Conferência Internacional sobre Financiamento para o Desenvolvimento está marcada para


2025 em Espanha. Além de defender reformas na arquitetura financeira internacional, o que
a África deve priorizar?
Acontece que estou no grupo formado pela ONU e pelo governo espanhol para produzir
propostas para a conferência. Tive o privilégio de participar da conferência anterior em
Addis Abeba, quando apoiei o governo da Etiópia na minha então condição de Secretário
Executivo da CEA.

293
A discussão na Espanha se concentrará em mudanças sistêmicas na arquitetura financeira
internacional.

A tributação internacional será um elemento crítico de transformação porque, com os novos


desenvolvimentos tecnológicos, teremos uma reformulação dos regimes comerciais e de
propriedade intelectual.

Questões-chave incluirão o surgimento dos BRICS e sua posição sobre moeda e


interoperabilidade dos diferentes sistemas - o surgimento de criptomoedas e moedas
digitais que alguns bancos centrais já estão introduzindo será difícil de ignorar. E há o uso
de algoritmos para todos os tipos de transações financeiras.

A África não pode ficar para trás no surgimento de uma arquitetura financeira internacional
que abrace um novo tipo de transação e modelo de interoperabilidade.

A África também deve defender reformas que vão além do empréstimo concessional e
desempenhar um papel integral na construção de um sistema financeiro global mais justo e
inclusivo.

OMS AFRO

Custos crescentes de saúde empurrando famílias para a pobreza

Um novo relatório do Escritório da OMS para a África afirma que tratamentos onerosos
pagos do próprio bolso afetam mais de 200 milhões de pessoas no continente, empurrando 150
milhões para a miséria.

A prática de pagamentos diretos, alerta o referido relatório, continua a:

❖ impor uma carga financeira a mais de 200 milhões de pessoas, incluindo empurrar
mais de 150 milhões para a pobreza ou aprofundá-la (dados mais recentes, de 2019)
em toda a Região Africana da OMS;
❖ exigir um alto preço da saúde das pessoas;
❖ dificultar o progresso no alcance de acesso/cobertura universal de saúde.

Na verdade, globalmente, metade de todas as pessoas empobrecidas devido a


pagamentos diretos vive na África – uma tendência crescente e preocupante.
Ter que pagar por medicamentos e outros custos de saúde do próprio bolso pode
imediatamente desviar a trajetória de vida de alguém para a dificuldade financeira e a
saúde precária. Esses pagamentos obrigam muitas pessoas a gastarem menos com outras
necessidades básicas, como alimentação, moradia e serviços públicos, o que, por sua vez,
pode piorar suas condições. Isso também cria um grande obstáculo para os mais pobres e
vulneráveis, que, como resultado, não conseguem obter os cuidados de que precisam, disse
a Dra. Matshidiso Moeti, Diretora Regional da OMS para a África.

Apesar dos esforços dos países para construir sistemas de financiamento de saúde mais
sustentáveis, é preciso fazer mais para que as pessoas em toda a África tenham acesso aos
serviços de saúde de qualidade de que precisam, quando e onde precisam deles, sem ter que
enfrentar dificuldades financeiras, acrescentou a Dra. Moeti.

De 2000 a 2019, período analisado pelo relatório, o número de pessoas fazendo


pagamentos diretos "catastróficos" (ou seja, gastando mais de 10% do orçamento familiar com
medicamentos e outros custos de saúde) aumentou a cada ano em 2,5 milhões de pessoas (de
52 milhões em 2000 para 95 milhões em 2019).

294
Deve-se dizer que, embora em ritmo mais lento que no mundo, houve progresso no
mesmo período, com a redução pela metade do número total de pessoas empurradas para a
pobreza ou aprofundadas nela devido a pagamentos diretos entre 2000 e 2019.

Dados e conclusões do relatório:

▪ Em 2019, os pagamentos diretos representaram mais de um quarto dos gastos com


saúde em 31 países. Em 11 países, os pagamentos diretos representaram mais da
metade dos gastos com saúde, e em outros três países, eles excederam 70%.
▪ O número de pessoas empurradas para a pobreza e o número de pessoas vivendo em
extrema pobreza (com menos de US$ 2,15 por dia) empurradas ainda mais para a
pobreza devido a pagamentos diretos diminuiu, tendo sido reduzido pela metade de
302 milhões de pessoas em 2000 para 152 milhões em 2019. No entanto, não
diminuiu tão rapidamente como no resto do mundo, onde caiu em mais de três
quartos no mesmo período (de 1,3 bilhão de pessoas ou 22,2% da população global
em 2000 para 344 milhões de pessoas ou 4,4% em 2019).
▪ Preocupantemente, metade de todas as pessoas empobrecidas globalmente devido
a pagamentos diretos vive na Região Africana da OMS, uma tendência que vem
aumentando desde 2000, quando, globalmente, apenas dois em cada dez pessoas
empobrecidas estavam na África.
▪ Os pagamentos diretos catastróficos aumentaram, embora a uma taxa mais lenta do
que no mundo. São necessários mais esforços para reverter essa tendência. Isso inclui
isentar as pessoas pobres do pagamento de despesas médicas do próprio bolso.
▪ O número de pessoas empurradas para a pobreza ou aprofundadas nela devido a
pagamentos diretos é motivo de particular preocupação, dado que, em média, uma
pessoa na África gasta menos (cerca de US$ 35 por ano em 2019) com saúde do que
em qualquer outro lugar do mundo.
▪ Pessoas que vivem em famílias multigeracionais ou famílias chefiadas por idosos (60
anos ou mais), adultos que vivem com crianças e/ou adolescentes e pessoas que
vivem em áreas rurais têm maior probabilidade de sentir o ônus financeiro de ter que
fazer pagamentos diretos.
▪ Os países que investiram mais recursos públicos domésticos em serviços e sistemas
de saúde tenderam a apresentar níveis mais baixos de pagamentos diretos
catastróficos e empobrecimento devido a tais pagamentos.
▪ Medicamentos e cuidados ambulatoriais foram os principais impulsionadores dos
pagamentos diretos e das dificuldades financeiras relacionadas.
▪ Os países continuam a enfrentar desafios na geração, análise e utilização de dados de
monitoramento da proteção financeira contra riscos.

Qual a utilidade deste relatório?

É o único de seu tipo, ajuda os países a acompanhar o progresso na proteção financeira


em saúde e a tomar decisões baseadas em evidências para acelerar os esforços para alcançar a
acesso/cobertura universal de saúde.

O relatório destaca boas práticas de vários países para enfrentar o ônus dos pagamentos
diretos, por exemplo, abolindo as taxas dos pacientes no momento do atendimento,
introduzindo esquemas de seguro de saúde e aumentando progressivamente a dependência dos
serviços de saúde financiados pelo governo.

295
Espero que este relatório fortaleça a determinação dos países em melhorar a proteção
financeira em saúde para suas populações e em investir em melhor geração, análise e uso de
dados para informar uma tomada de decisão mais eficaz, disse a Dra. Moeti.

O Escritório Regional da OMS para a África apoia os 47 Estados-Membros a acompanhar


o progresso na proteção financeira em saúde, fortalecendo a capacidade dos Ministérios da
Saúde e dos Institutos Nacionais de Estatística; facilitando a tomada de decisões baseadas em
evidências por meio da divulgação de avanços e desafios – como neste relatório; e fornecendo
apoio técnico para redesenhar políticas para melhorar a proteção financeira em saúde.

Os gastos com saúde do próprio bolso incluem despesas formais e informais


diretamente relacionadas ao custo da busca por cuidados. Exclui o pré-pagamento (por
exemplo, impostos, contribuições ou seguros) e o reembolso da família por terceiros, como o
governo, um fundo de seguro de saúde ou uma seguradora privada.

Também exclui despesas indiretas (como custos de transporte não emergenciais) e o


custo de oportunidade de buscar atendimento (por exemplo, renda perdida). Mas inclui
qualquer gasto incorrido por uma família quando qualquer membro utiliza um bem ou serviço
de saúde para receber qualquer tipo de atendimento (preventivo, curativo, reabilitativo ou de
longa duração), prestado por qualquer tipo de prestador, para qualquer tipo de doença,
enfermidade ou condição de saúde, em qualquer tipo de ambiente (por exemplo, ambulatorial,
hospitalar ou domiciliar).

Intoxicação por chumbo: o risco contínuo do descarte inadequado de resíduos

O chumbo, em níveis elevados, pode contaminar alimentos, prejudicar a biodiversidade


e provocar graves danos neurológicos, especialmente em crianças.

Em toda a África, o espectro do envenenamento por chumbo continua a representar


uma grande ameaça tanto para o meio ambiente quanto para a saúde pública.

Apesar das rigorosas regulamentações sob as Convenções de Basileia e Bamako,


destinadas a controlar os resíduos contendo compostos de chumbo, a realidade no terreno
apresenta uma imagem diferente.

O chumbo, um metal que ocorre naturalmente, é utilizado na fabricação de diversos


produtos, incluindo tintas, munições, especiarias, certos cosméticos, joias, brinquedos, baterias
de chumbo-ácido usadas, gasolina, encanamentos, cerâmica e outros. Embora esteja presente
no ambiente, o chumbo pode se tornar um sério risco quando encontrado em quantidades
excessivas. O chumbo no solo pode contaminar fontes de alimentos e impactar negativamente
a biodiversidade. Também pode causar graves danos neurológicos em humanos, especialmente
em crianças.

De acordo com a Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO),
os locais de terra ou solo com altas concentrações de chumbo são os mais prevalentes dos
elementos traço.

Na África Subsaariana, mais de 55 milhões de crianças apresentam níveis de chumbo no


sangue superiores a 10 microgramas por decilitro (µg/dL), o dobro do limite considerado
perigoso pela Organização Mundial da Saúde (OMS).

Muitas crianças são expostas por contato direto, leite materno e até mesmo como fetos
em desenvolvimento quando as mães grávidas entram em contato com o chumbo.

296
Uma das fontes mais alarmantes de envenenamento por chumbo vem do
gerenciamento inadequado de e-waste e baterias de chumbo-ácido usadas (ULAB, Used Lead-
Acid Batteries). As práticas de reciclagem informais liberam partículas de chumbo no meio
ambiente, colocando em risco inúmeras comunidades.

A demanda global por baterias de chumbo-ácido impulsiona operações de reciclagem


informais, muitas vezes sem as salvaguardas necessárias. De acordo com a International Lead
Association, essas baterias fornecem 70% de todo o armazenamento de energia de baterias
recarregáveis em todo o mundo, tornando-as um recurso crítico, mas também uma importante
fonte de poluição. Quando recicladas em condições inseguras, os níveis de poluição aumentam
drasticamente, impactando tanto o meio ambiente quanto a saúde humana.

Durante a Semana Internacional de Prevenção do Envenenamento por Chumbo da OMS


em outubro de 2024, parceiros e partes interessadas se reuniram para compartilhar sucessos e
renovar o compromisso com ações urgentes sobre o chumbo.

Em toda a África, os numerosos casos ilustram a extensão do problema: mineração de


chumbo na Nigéria, processamento de ULAB no Senegal e resíduos tóxicos na região de Kabwe,
na Zâmbia.

Na cidade costeira de Mombasa, no Quênia, os moradores da área de Owino Uhuru


ainda carregam as cicatrizes da poluição de uma fundição de baterias de chumbo-ácido. Para
essas comunidades, o direito a um ambiente limpo depende de políticas eficazes para o
gerenciamento de resíduos perigosos.

No nível legislativo, a Resolução 3/9 da UNEA (The United Nations Environment


Assembly) visa eliminar a exposição à tinta à base de chumbo e melhorar o gerenciamento de
baterias usadas. O Manual de Orientação de 2022 do PNUMA oferece suporte aos formuladores
de políticas com estruturas de trabalho viáveis. No entanto, mais investimentos em
infraestrutura necessária, campanhas de conscientização e aplicação são essenciais para tornar
essas iniciativas eficazes.

Recorde-se, a Resolução 3/9 da UNEA é um documento crucial visando abordar o


problema global da poluição por chumbo e garantir a gestão segura de baterias usadas.

Objetivos principais da Resolução 3/9:

▪ Eliminar a exposição à tinta à base de chumbo: A resolução busca eliminar


gradualmente o uso de tintas à base de chumbo, especialmente em produtos
infantis, como brinquedos e móveis, devido aos seus perigos para a saúde,
particularmente para crianças.
▪ Melhorar o gerenciamento de baterias usadas: A resolução também se
concentra em melhorar a gestão de baterias usadas, especialmente as baterias
de chumbo-ácido, que são uma fonte significativa de poluição por chumbo. Ela
incentiva a coleta, o tratamento e a reciclagem seguros dessas baterias.

Importância da Resolução:

A Resolução 3/9 é um marco importante na luta contra a poluição por chumbo, pois
reconhece a gravidade do problema e estabelece um plano de ação global. Ao abordar tanto a
exposição ao chumbo em produtos como tintas quanto o gerenciamento inadequado de
baterias, a resolução contribui para a proteção da saúde humana e do meio ambiente.

297
Implicações para a África:

A África é uma região particularmente afetada pela poluição por chumbo, e a Resolução
3/9 oferece um roteiro para os países africanos implementarem políticas e medidas para reduzir
a exposição ao chumbo. Ao adotar as recomendações da resolução, os países africanos podem
proteger a saúde de suas populações, especialmente as crianças, e promover o desenvolvimento
sustentável.

Em resumo, a Resolução 3/9 da UNEA é um instrumento importante para combater a


poluição por chumbo em escala global e proteger a saúde humana e o meio ambiente. Ela
fornece um marco para os países adotarem medidas concretas para reduzir a exposição ao
chumbo e gerenciar de forma segura os resíduos contendo chumbo.

O caminho para um futuro mais seguro exige mais do que mudanças políticas e
investimentos. Exige um compromisso de proteger os mais vulneráveis.

Ao olharmos para a criação de um futuro sem chumbo, somos compelidos a pensar no


'futuro' não como algo distante e abstrato, mas sim como algo que está sendo construído a cada
momento.

Essa compreensão nos impulsiona a agir melhor para proteger o meio ambiente e a
saúde pública para nós mesmos e para as futuras gerações.

Dados e os ODS para desenvolver a África

O facto de um em cada três africanos não ser contabilizado como país que não cumpre
os prazos do censo é um enorme revés para o planejamento do desenvolvimento.

Com o prazo de 2030 para o alcance dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável


(ODS) se aproximando, pesquisas revelam que a África está atrasada no cumprimento das metas
cruciais. Outro desafio é que muitos países africanos não possuem informações precisas sobre
as necessidades socioeconômicas de suas populações para melhor planejar programas de
desenvolvimento.

Mas há um caminho a seguir: investir em sistemas robustos de dados e estatísticas,


afirma Oliver Chinganya, Diretor do Centro Africano de Estatística (ACS) e Estatístico-Chefe da
Comissão Econômica das Nações Unidas para a África.

Os governos africanos falam da importância dos dados, mas o investimento muitas vezes
fica aquém, diz Chinganya ao IPS. Ele destaca a urgência, apontando para a participação desigual
da África nos ciclos de censos liderados pela ONU desde 1990. Ele alertou que 376 milhões de
pessoas corriam o risco de não serem contabilizadas se mais países não participassem do censo.

"Estatísticas precisas e confiáveis são o 'novo petróleo' que impulsionará o crescimento


econômico nacional, ajudando os governos a melhorarem suas metas de ODS, pois podem
planejar melhor a alocação de gastos em desenvolvimento e, ao mesmo tempo, acompanhar o
que alcançaram", disse Chinganya ao IPS.

Sem dados e estatísticas precisos, o planejamento do desenvolvimento é difícil para


muitos países africanos, que são obrigados a depender de estatísticas não geradas por e pelo
continente, disse ele.

Na Cúpula dos ODS em 2023, a ONU lançou "O Poder dos Dados" para desbloquear o
Dividendo de Dados como uma das 12 iniciativas de alto impacto para ajudar a ampliar os ODS.

298
Os governos africanos se comprometeram a investir 0,15% de seus orçamentos nacionais no
setor de estatísticas, mas poucos países cumpriram isso.

O Inter Presse Service (IPS) conversou com Chinganya, após a 11ª reunião do Fórum para
o Desenvolvimento Estatístico Africano (FASDEV), uma iniciativa da Comissão Econômica para a
África (ECA), que promove conexões entre países, parceiros e instituições que apoiam o
desenvolvimento estatístico. A seguir transcreve-se esta entrevista.

IPS: Do que realmente estamos falando quando mencionamos dados e estatísticas e por que
eles são importantes para o desenvolvimento da África?
Oliver Chinganya: Dados e estatísticas são muito importantes; eles são usados para
planejamento em diferentes níveis. Não é apenas o governo que precisa de dados hoje em
dia, mas todos. Antes de ir ao mercado para comprar o que quiser, você sempre precisa de
dados primeiro para tomar decisões antes de comprar - quanto custa e o que você precisaria
para trazer essas coisas para casa. No nível do governo, decisões semelhantes às que você
toma no nível doméstico estão sendo tomadas, onde o governo está fazendo perguntas
sobre o que precisamos planejar para podermos nos desenvolver. Por exemplo, de quantas
escolas precisamos e que tipo de currículo precisamos implementar? Que tipo de estradas
precisamos? Quais sistemas de produção são necessários no país? São necessários
diferentes dados e estatísticas para poder informar decisões. As estatísticas fornecem
evidências para as políticas. Eles ajudam a estabelecer metas, identificar necessidades e
monitorar o progresso. É impossível aprender com os erros e responsabilizar os
formuladores de políticas sem boas estatísticas. Boas estatísticas são cruciais para gerenciar
a prestação de serviços básicos de forma eficiente e eficaz, e desempenham um papel crucial
na melhoria da transparência e da prestação de contas. As estatísticas contribuem para o
progresso do desenvolvimento, não apenas como uma ferramenta de monitoramento, mas
também como uma ferramenta para impulsionar os resultados medidos pelas estatísticas.
Em termos de desenvolvimento nacional, as estatísticas desempenham um papel muito
importante.

IPS: Como você descreveria o estado das estatísticas na África?


Chinganya: Quando se pergunta sobre o status das estatísticas no continente, é um saco
misto, dado que alguns países estão fazendo progressos muito bons e outros não. Por
exemplo, na rodada de censo de 2020, 39 países africanos realizaram seus censos. O
restante deles não conseguiu realizar seus censos e, até dezembro de 2024, uma em cada
três pessoas ainda não havia sido contada no continente. Isso é lamentável e tem
implicações para a prestação de serviços e o desenvolvimento. Atualmente, temos países
que não conseguiram modernizar seus sistemas estatísticos. Um dos nossos principais focos
agora é ver como podemos ajudar os países a modernizar e transformar seus sistemas
estatísticos nacionais. Isso significa passar da maneira tradicional de coletar dados usando
sistemas baseados em papel para modernizar a coleta de dados usando dispositivos como
tablets e telefones celulares. Estamos ajudando os países a modernizar e transformar seus
sistemas estatísticos nacionais. Mas mesmo assim, vários países estão enfrentando desafios
para avançar no processo de estabelecimento e uso de sistemas modernizados. O maior
desafio é o acesso à tecnologia. A tecnologia é impulsionada pela energia. Sem energia, você
não pode ter sistemas eficientes e tecnologicamente avançados em um país. Ter acesso a
serviços de Internet eficientes permite que os países coletem informações usando
dispositivos.

299
IPS: Quais conquistas foram alcançadas e quais desafios foram encontrados?
Chinganya: Os países africanos fizeram progressos muito bons na realização de censos
populacionais. Em rodadas de censo anteriores, os países levavam de dois a cinco anos para
coletar e disseminar os dados, mas com sistemas modernizados, isso foi reduzido para 45
dias em alguns países. Este é um grande marco. A ECA introduziu um programa de liderança
estatística, que levou a mudanças em todo o continente. Nesse programa, os estatísticos
são mantidos atualizados e apresentados a maneiras de gerenciar sistemas estatísticos,
aumentando assim suas capacidades em toda a linha. O surto da doença do coronavírus
(Covid-19) expôs a vulnerabilidade dos sistemas estatísticos nacionais africanos tanto em
suas operações rotineiras quanto, mais particularmente, em suas atividades de coleta de
dados em campo. Para responder a esses desafios, a ECA aumentou a capacidade e forneceu
suporte técnico aos Estados-Membros na produção e disseminação de estatísticas
econômicas e contas nacionais harmonizadas e comparáveis, seguindo os padrões
estatísticos internacionais.

IPS: O que precisa ser feito para ajudar os países que não conseguiram realizar censos, o que,
segundo você, terá impacto nos ODS?
Chinganya: Para os países que progrediram em direção aos ODS, eles precisam de apoio
para acelerar seu progresso para que até 2030 possam atingir esses ODS. Os governos
devem investir um pouco mais em dados e estatísticas. Eles não devem esperar que outros,
incluindo parceiros de desenvolvimento, façam isso por eles. Estes são seus dados. Todos os
governos reconhecem a importância dos dados. Mas se for importante, então eles devem
valorizar o que é importante. O que é necessário são recursos, priorização e garantir que
dados e estatísticas façam parte dos processos de desenvolvimento nacional, desenvolvendo
uma estratégia nacional para estatísticas.

IPS: A ECA desenvolveu um roteiro para a transformação e modernização das estatísticas


oficiais na África para o período de 2023 a 2030. Quais progressos foram feitos na
implementação disso?
Chinganya: Fizemos muitos progressos. Por exemplo, durante a rodada de censo de 2020,
os países usaram tablets para coletar os dados. Isso é modernização. Em outras palavras,
afastar-se das maneiras tradicionais de coletar dados. Além disso, por meio do Índice de
Preços ao Consumidor, os coletores de dados podem acessar a internet e verificar os preços
dos bens de consumo ou ir a supermercados e escanear os dados. Isso faz parte da
modernização. Além disso, os países estão agora usando o que chamamos de dados
administrativos. Isso faz parte da modernização dos sistemas. Os registros em centros de
saúde ou hospitais agora estão sendo transformados em formas digitais para que possam
ser coletados digitalmente.

Editorial do Mali Actu

“Macron e África – Um discurso controverso que revela o fracasso de uma política


ultrapassada”

Na reunião anual dos embaixadores, Emmanuel Macron fez um discurso que reflete uma
visão neocolonial ultrapassada e uma incompreensão das dinâmicas internacionais atuais. Este
discurso, longe de tranquilizar, destaca os desafios colossais enfrentados pela política externa
francesa, especialmente na África e em relação à Rússia.

Em suas declarações, Macron reiterou uma perspectiva paternalista sobre a África,


tratando o continente como uma zona de influência exclusiva da França. Essa postura, herdada
de uma história colonial marcada pela dominação, parece ignorar as crescentes aspirações das

300
nações africanas à autonomia. À semelhança das críticas formuladas pelos líderes dos BRICS,
esse discurso revela a incapacidade da França de se adaptar a uma nova ordem mundial
multipolar. Ao se apegar a um modelo ultrapassado, Paris não apenas alimenta as tensões, mas
também se priva das oportunidades que uma cooperação sincera e equitativa com a África
poderia oferecer.

O fracasso das intervenções francesas em África, como no Mali, ilustra uma estratégia
mal definida centrada na militarização das relações internacionais. Inicialmente entendida como
uma missão de paz, a intervenção no Sahel transformou-se num pântano de conflitos,
acentuando a deslocação de populações e o sofrimento local. Ao mesmo tempo, a exploração
dos recursos naturais de África por empresas francesas, muitas vezes sob o pretexto de
cooperação, continua a manchar a imagem da França no continente. Este fracasso estende-se
também às suas relações internacionais, onde a França parece marginalizada, nomeadamente
no seio da União Europeia e face ao poder crescente dos países emergentes.

Macron também se esquivou da questão crucial de reconhecer os erros históricos da


França, seja durante o genocídio no Ruanda ou no tratamento dado aos Tirailleurs senegaleses.
Esta recusa persistente em reconhecer as injustiças do passado é um grande obstáculo ao
estabelecimento de relações equilibradas e de respeito mútuo. Além disso, os atrasos na
restituição dos bens culturais e a ausência de esforços sérios para reparar os danos causados
durante a colonização revelam uma relutância em assumir as responsabilidades históricas.

Ao criticar a Rússia e adotar uma posição hostil, Macron está a comprometer as


hipóteses de colaboração em desafios globais como as alterações climáticas e a segurança
internacional. Esta escolha estratégica, entendida como um alinhamento cego com as políticas
da NATO, corre o risco de isolar ainda mais a França na cena internacional.

A África, outrora vista como o quintal da França, está gradualmente a emancipar-se


desta tutela, procurando novas alianças no seio dos BRICS e não só. Entretanto, a França está
atolada numa visão arcaica do seu papel global, agravando o seu isolamento. Se não houver uma
reorientação estratégica, a França arrisca-se não só a perder a sua influência em África, mas
também a ver o seu papel no mundo significativamente reduzido.

O discurso de Macron é sintomático de uma política externa em desordem, marcada


pela arrogância e pela cegueira face às realidades atuais. A França precisa urgentemente de
reinventar as suas relações com África, adoptando uma abordagem baseada no respeito mútuo
e numa verdadeira cooperação. Caso contrário, continuará a afastar-se das suas ambições
internacionais, dando lugar a outros atores mais bem preparados para responder às aspirações
dos povos africanos.

Conflitos nos Grandes Lagos

A tomada da cidade de Goma, a capital regional do Kivu Norte no leste da República


Democrática do Congo (RDC), pelo grupo armado do Movimento de 23 de Março (M23),
constituiu destaque do noticiário africano durante os últimos dias do mês de janeiro.

A captura de Goma ocorreu após um período de 48 horas imposto pelo M23 para que o
Exército da RDC depusesse as armas. Num comunicado de imprensa, o M23 pediu aos residentes
de Goma que se mantivessem calmos.

301
Por seu turno, o Presidente da República Democrática do Congo (RDC), Félix Tshisekedi,
garantiu que estava em curso "uma resposta vigorosa" no Leste do país e alertou para o risco de
uma escalada regional do conflito.

Goma, capital da província do Kivu-Norte e principal cidade do leste da RDC, foi ocupada
pelo grupo armado anti-governamental M23 e por tropas rwandesas, que tomaram o aeroporto.

A Ministra dos Negócios Estrangeiros da República Democrática do Congo, Thérèse


Kayikwamba Wagner, disse ao Conselho de Segurança da ONU que "não se pode permitir que o
Rwanda continue a atuar com impunidade" e apelou às Nações Unidas para que atua para além
da sua condenação e tome medidas concretas de intervenção.

Por sua vez, o Presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa, e o seu homólogo rwandês,
Paul Kagame, mantiveram uma conversa telefónica sobre o conflito intensificado no leste da
República Democrática do Congo (RDC). De acordo com uma declaração presidencial divulgada
em Pretória, “os dois chefes de Estado concordaram sobre a necessidade urgente de um cessar-
fogo e da retomada das conversações de paz entre todas as partes no conflito”.

Entretanto, num comunicado, citado pela Prensa Latina, o Chefe de Estado sul-africano
explicou como a presença de soldados sul-africanos na zona oriental da República Democrática
do Congo não constitui uma declaração de guerra contra qualquer país ou Estado.

Os membros da Força de Defesa Nacional Sul-Africana (Sandf, sigla em inglês) que estão
na RDC, lembrou, fazem parte dos esforços da Comunidade de Desenvolvimento da África
Austral (SADC) e das Nações Unidas para alcançar a paz e proteger milhares de vidas que são
constantemente ameaçados pelo conflito naquela nação.
“A presença das forças da Missão da SADC na República Democrática do Congo (SAMIDRC)
demonstra o compromisso dos Estados Membros da SADC em apoiar este país nos seus
esforços para alcançar uma paz e estabilidade duradouras e, em última análise, criar um
ambiente conducente ao desenvolvimento sustentável e à prosperidade”, destacou
Ramaphosa.

A este respeito, acrescentou, a África do Sul saúda a posição recentemente adoptada


pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas durante a sua sessão especial sobre a situação
na RDC, que apela ao fim imediato das hostilidades, à reversão da expansão territorial do M23,
a saída de forças externas daquele país e a retomada das conversações de paz no âmbito do
Processo de Nairobi.

A integridade territorial da República Democrática do Congo deve ser respeitada de


acordo com a Carta das Nações Unidas sobre o respeito pela soberania, integridade territorial e
independência política de outros Estados, destacou o Presidente no texto.

A declaração presidencial divulgada quarta-feira surge na sequência da intensificação


dos combates no leste da RDC, onde a África do Sul perdeu 13 soldados.

Estes combates, tal como descritos no texto, são o resultado de uma escalada de
combates por parte do grupo armado M23 e da milícia das Forças de Defesa do Rwanda (RDF),
que enfrenta as Forças Armadas da República Democrática do Congo (FARDC) e ataca as forças
de manutenção da paz do SAMIDRC.

302
O Conselho de Paz e Segurança da União Africana expressou profunda preocupação com
o aumento das tensões entre a República Democrática do Congo (RDC) e Rwanda, resultando
em mortes, feridos e deslocamentos.

Um comunicado divulgado nas redes sociais da organização continental, adoptado na


1256ª reunião ministerial de emergência do Conselho (CPS) realizada na véspera, condenou
veementemente os atrozes ataques do Movimento 23 de Março (M23) e alertou que os
envolvidos devem ser responsabilizado por seus atos. Segundo o texto, as atividades das Forças
Democráticas Aliadas (ADF) e das Forças Democráticas para a Libertação do Rwanda (FDLR)
agravaram a insegurança e o sofrimento da população no leste da RDC.

O CPS exigiu que o M23, as ADF e as FDLR, bem como outros grupos armados que
operam no leste de da RDC, cessassem imediata e incondicionalmente os seus ataques,
dispersassem e depusessem permanentemente as suas armas.

Da mesma forma, apelou à retirada imediata e incondicional do M23 de Minova, Sake,


Goma e outras áreas ocupadas, bem como de todos os outros grupos armados e
terroristas/mercenários estrangeiros que operam em território congolês.

O Conselho de Paz e Segurança da União Africana condenou inequivocamente qualquer


apoio militar estrangeiro prestado ao M23 e a outras guerrilhas que operam no leste da RDC,
exigindo a cessação imediata de tal ajuda e a retirada de qualquer parte externa do país.

Por último, elogiou os esforços do líder angolano, João Manuel Lourenço, como
Presidente da Conferência Internacional sobre a Região dos Grandes Lagos e Advogado da UA
para a Paz e Reconciliação, por facilitar o diálogo entre Kinshasa e Kigali e instou a continuar a
expandir a sua cooperação e colaboração aos esforços do facilitador.

O coordenador das Nações Unidas na República Democrática do Congo (RDC), Bruno


Lemarquis, alertou que a cidade de Goma enfrente uma situação humanitária "extremamente
grave" na sequência dos combates.

"A situação humanitária é extremamente grave em Goma exige uma atenção imediata
da comunidade internacional. Em nome da comunidade humanitária na RDC, apelo ao respeito
pelo direito humanitário internacional e à proteção dos civis por todas as partes", afirmou
Lemarquis através das redes sociais.

Lemarquis advertiu que Goma enfrenta necessidades humanitárias, enquanto a


capacidade de resposta está "gravemente afetada" e as instalações médicas encontram-se
lotadas. Entre 23 e 28 de janeiro, afirmou Lemarquis, os hospitais da cidade - apoiados pelos
Médicos Sem Fronteiras (MSF), pelo Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV) e pela
Organização Mundial de Saúde (OMS) - trataram mais de mil feridos. "Muitos feridos civis foram
vítimas de tiros e de explosões de artilharia pesada", disse.

Lemarquis avisou que as morgues da cidade de Goma "estão a transbordar" e que os


corpos foram "abandonados" nas ruas da cidade, representando um risco para a saúde dos
sobreviventes.

Um dirigente da sociedade civil local disse à agência de notícias espanhola EFE que pelo
menos 111 corpos de civis, rebeldes e soldados foram recolhidos entre quarta-feira e quinta-
feira nas ruas da cidade.

303
Por outro lado, Lemarquis denunciou que vários centros de saúde e armazéns foram
saqueados, o que compromete a resposta humanitária.

Estes ataques, que, segundo o Comissário, visaram o material armazenado das agências
da ONU e das Organizações Não-Governamentais humanitárias, implicaram a perda de
quantidades significativas de alimentos, medicamentos e equipamento médico essencial.

O mesmo responsável alertou também para o facto de os serviços básicos em Goma


terem sido paralisados já que a distribuição de eletricidade e de água potável terem sido
cortadas durante vários dias, obrigando a população a recorrer diretamente à água não tratada
do Lago Kivu, expondo milhares de pessoas ao risco imediato de contrair doenças como a cólera.

O coordenador da ONU apelou ainda à "recuperação imediata e sustentada" das


operações no aeroporto internacional de Goma, que está sob controlo do M23.

O Papa Francisco lamentou a violência no leste da República Democrática do Congo e


apelou ao fim dos combates, como noticiado na RTP Notícias.

"Exorto todas as partes em conflito a empenharem-se na cessação das hostilidades e na


proteção da população civil de Goma e de outras regiões afetadas pelas operações militares",
disse no final da audiência geral, apelando ao “fim mais rápido possível de todas as formas de
violência”.

O Papa prometeu rezar "pelo restabelecimento da paz e da segurança" e pediu "às


autoridades locais e à comunidade internacional a mostrarem o máximo empenho na resolução
do conflito por meios pacíficos".

Recorde-se, a atividade armada do M23 recomeçou em novembro de 2021 com ataques


contra o Exército de Kinshasa, apoiado por milícias aliadas, no Kivu do Norte e, desde então,
avançou em várias frentes até chegar a Goma, a capital da região onde vivem dois milhões de
habitantes. Desde 1998, o leste da RDC enfrenta um conflito entre milícias e o Exército, apesar
da presença da missão de manutenção da paz da ONU (Monusco).

A crise humanitária no Sudão deverá piorar em 2025

Enquanto a guerra civil faz estragos no Sudão, a crise humanitária nacional continua a
piorar. O conflito armado causou uma escalada no número de vítimas civis e deslocamentos nos
últimos meses. Além disso, a fome ameaça as áreas mais afetadas pelo conflito no país, o que é
agravado por restrições mais rígidas que impedem a entrega de ajuda humanitária. Apesar de
numerosos apelos da comunidade internacional para a cessação das hostilidades, os esforços
de socorro estão gravemente subfinanciados.

Em 2025, organizações humanitárias pretendem ajudar cerca de 21 milhões de pessoas


no Sudão, o que corresponde a aproximadamente metade da população do país. No entanto,
estima-se que esse número aumente após a escalada das hostilidades armadas registradas em
dezembro de 2024. De acordo com um relatório do Alto-Comissariado das Nações Unidas para
os Direitos Humanos (ACNUDH), o cerco em curso em El Fasher, a capital do Sudão, deixou pelo
menos 782 mortos e 1.143 feridos de maio de 2024 a dezembro de 2024.

Segundo Edem Wosornu, Diretor de Operações e Advocacia do Escritório das Nações


Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA, United Nations Office for the
Coordination of Humanitarian Affairs), o campo de refugiados de Zamzam, o maior refúgio para
pessoas deslocadas internamente do país, enfrentou fortes bombardeios nas últimas semanas

304
de 2024. Aproximadamente 80 pessoas morreram e 400 ficaram feridas como resultado de
bombardeios de artilharia no oeste de Darfur. Civis e grupos de ajuda humanitária, incluindo
Médicos Sem Fronteiras (MSF), atribuíram essas baixas às hostilidades perpetradas pelas Forças
de Apoio Rápido (RSF).

Nathaniel Raymond, diretor executivo do Humanitarian Research Lab da Universidade


de Yale, descreveu a situação atual no campo de Zamzam como uma "caixa de morte". A
escalada da guerra forçou os refugiados sudaneses a se moverem em direção a territórios
perigosos das RSF ou em direção aos desertos áridos, onde correm o risco de morrer de fome.
"Podemos ver do espaço pessoas acampando sob árvores, à beira da estrada. Elas estão saindo
da frigideira e caindo no fogo", disse Raymond, acrescentando que muitas dessas pessoas estão
gravemente feridas ou imunocomprometidas.

Em 6 de janeiro de 2025, o Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU) alertou


que as condições de fome estão previstas para se espalhar por todo o Sudão se as organizações
humanitárias não intervirem efetivamente em breve. Segundo Wosornu, a fome está presente
em cinco áreas, incluindo os campos de Zamzam, Al Salam e Abu Shouk, bem como regiões nas
montanhas Nuba ocidentais.

A Classificação Integrada da Fase de Segurança Alimentar (IPC, The Integrated Food


Security Phase Classification) afirma que cinco regiões adicionais, incluindo Um Kadada e El
Fasher, bem como outras 17 áreas de alto risco, podem enfrentar condições graves semelhantes
à fome até meados de 2025. Mulheres, crianças e idosos devem ser desproporcionalmente
afetados.

De acordo com a Diretora Adjunta da Organização das Nações Unidas para Alimentação
e Agricultura (FAO), Beth Bechdol, a vasta escala da fome é resultado direto da guerra
prolongada, do deslocamento e do acesso humanitário restrito. Além disso, o relatório da IPC
afirma que "somente uma cessação imediata das hostilidades pode impedir que a crise piore".

É crucial que as organizações humanitárias tenham acesso irrestrito às áreas


criticamente ameaçadas no Sudão. A travessia da fronteira de Adre, que fornece passagem
direta do Chade para algumas das áreas mais afetadas do Sudão, tem visto numerosos atrasos
e bloqueios de ajuda. Segundo Wosornu, "áreas-chave em Kordofan do Sul estão efetivamente
isoladas da assistência externa", enquanto "visto para pessoal humanitário não estão sendo
concedidos com rapidez suficiente".

O início de 2025 é um importante ponto de virada para a crise no Sudão, pois é


necessário agir agora para garantir a estabilidade de milhões de sudaneses. Bechdol afirma que
o acesso humanitário "imediato e sem obstáculos" é urgente neste momento para que as
organizações humanitárias possam entregar "assistência humanitária multissetorial".

O Plano de Resposta às Necessidades Humanitárias de 2025 busca cerca de 4,2 bilhões


de dólares para fornecer assistência que salva vidas a 21 milhões de civis sudaneses que estão
lutando para sobreviver. O financiamento deste plano ajudaria a restaurar serviços básicos,
como acesso a alimentos, água e abrigo, bem como serviços de proteção. "O risco de fome e sua
propagação está em nossa consciência coletiva desde agosto, e agora está aqui, não apenas com
pessoas morrendo de fome, mas também com o colapso dos sistemas de saúde, dos meios de
subsistência e das estruturas sociais", alerta Bechdol.

305
Considerações finais

Sendo o primeiro informe de 2025, destacamos o que de mais relevante marcou o


continente no ano pretérito sobre a complexidade dos desafios e oportunidades.

Constatou-se um esforço contínuo para promover o desenvolvimento econômico,


melhorar a saúde pública, fortalecer a segurança regional e garantir uma maior autonomia e voz
na cena internacional. A colaboração entre países africanos, bem como as parcerias com outras
regiões e organizações, foram cruciais para perseguir as duas agendas, a dos ODS e a de 2063,
para construir um futuro mais próspero e seguro para o continente.

Estes marcos refletem o compromisso da organização continental em abordar desafios


e promover o desenvolvimento e bem-estar das populações dos seus Estados-Membros:

Saúde e resiliência

• A UA, juntamente com o CDC África e o UNICEF, estabeleceu uma estrutura de parceria
expandida para fortalecer a Atenção Primária à Saúde, gestão da cadeia de suprimentos,
aquisição conjunta, produção local e respostas a emergências de saúde pública;

• O objetivo de treinar, mobilizar e apoiar 2 milhões de profissionais de saúde em África


foi reafirmado, com um foco particular em Agentes Comunitários de Saúde (ACS). A meta é
implantar 50.000 ACS nos próximos dois anos, chegando a 500.000 até 2027;

• Foi lançado o Mecanismo Africano de Aquisições Agrupadas (APPM) para melhorar o


acesso a produtos de saúde de qualidade e a preços acessíveis, e para promover a produção
local;

• A UA tem dado prioridade à produção local de medicamentos e vacinas, com o objetivo


de alcançar 60% de produção local até 2040;

• O CDC África lançou um programa de liderança em saúde mental, com uma perspectiva
de saúde pública e direitos humanos;

• A UA tem trabalhado para fortalecer a preparação e resposta a epidemias e


pandemias, incluindo através de um Memorando de Entendimento com o CEPI;

• A colaboração com a OMS AFRO resultou na definição de um novo roteiro para


remodelar o ecossistema de financiamento da saúde no continente;

• O continente africano tem se empenhado na erradicação da poliomielite;

• Um novo Diretor Regional da OMS para África foi eleito e, infelizmente, faleceu antes
de ser confirmado pelo Conselho Executivo da OMS na sua plenária de fevereiro de 2025;

Educação e desenvolvimento de competências

• A União Africana elegeu a educação como tema do ano de 2024, com o objetivo de
"Educar um africano apto para o século XXI".

• Vários eventos de alto nível foram realizados para comemorar o Ano da Educação da
União Africana, com foco na necessidade de transformar os sistemas educacionais em todo o
continente.

• O desenvolvimento de aptidões e a educação de técnico têm sido priorizados, com


ênfase no crescimento económico, coesão social e desenvolvimento sustentável;

306
• A UA também tem dado destaque à educação de raparigas e mulheres através da
campanha continental #AfricaEducatesHer e da 1ª Conferência Pan-Africana sobre a Educação
das Raparigas e das Mulheres;

• A UA está empenhada em construir sistemas educacionais resilientes que garantam


que nenhuma criança seja deixada para trás.

Desenvolvimento Sustentável e Mudanças Climáticas

• A UA tem impulsionado a transição ecológica do continente, promovendo o bem-estar


ambiental, social e económico interligados.

• A UA tem-se mostrado empenhada em implementar o Acordo de Paris da ONU sobre


as mudanças climáticas.

• Tem sido destacado o envolvimento da União Africana na COP29 e o mesmo


acontecerá na COP30 no Brasil em 2025;

• A necessidade de financiamento externo para adaptação às mudanças climáticas foi


realçada;

• A UA lançou a Plataforma Africana de Gestão e Recuperação do Risco de Desastres;

• A UA está a trabalhar com parceiros regionais e globais para implementar planos


ambiciosos através da mobilização de financiamento climático;

Paz e Segurança

• A UA tem reconhecido o seu importante papel na salvaguarda da paz e estabilidade


em África e na promoção da integração africana.

• A UA está a apoiar a capacitação em prevenção e resolução de conflitos;

• O Conselho de Paz e Segurança (CPS) da UA tem se envolvido ativamente na análise


de situações de crise, como as de Grandes Lagos, do Sudão e do Sahel;

• A UA tem trabalhado para o fortalecimento da resiliência urbana através de


ferramentas melhoradas;

• Um projeto de roteiro para a realização da Agenda de Lusaka foi desenvolvido,


estabelecendo ações prioritárias para a evolução a longo prazo das Iniciativas de Saúde Global
(GHI).

Integração Regional e Cooperação Internacional

• A União Africana aderiu ao G20 e juntou-se à Aliança Global Contra a Fome e a Pobreza,
comprometendo-se a prosseguir a missão, os objetivos e os princípios da Aliança;

• O apoio do Canadá à União Africana foi reforçado com o dobro da sua doação;

• A UA está a fortalecer a sua parceria com a China, especialmente através do


alinhamento da construção conjunta do Cinturão e Rota e da Iniciativa de Desenvolvimento
Global;

• O Fórum de Cooperação China-África (FOCAC) continua a ser um mecanismo-chave


para fortalecer a cooperação entre a China e África;

307
• A implementação da Área de Livre Comércio de África (AfCFTA) continua a ser uma
prioridade;

• A União Africana tem trabalhado para fortalecer as relações com a Turquia, criando
oportunidades de investimento e comércio.

• A UA tem promovido a colaboração com a Organização Internacional para as


Migrações (OIM) para lidar com os desafios da migração em África;

• Na Etiópia, na Cúpula da União Africana, Lula exaltou a união entre Brasil e África.
destacou a importância histórica, cultural e econômica das raízes do Brasil com a África.
“Primeiro, porque eu tenho claro — e gostaria que o Brasil tivesse claro — de que nós temos
que ter uma relação preferencial com o continente africano. Não só porque o continente
africano faz parte da nossa história, da nossa cultura, do nosso jeito de ser, do nosso jeito de
falar, do nosso jeito de cantar, faz parte da nossa cor, mas também porque o continente africano
é um espaço extraordinário de futuro para quem acredita que o Sul Global vai ser a novidade do
século XXI na nova economia mundial”. Anunciou a ampliação da cooperação em saúde com o
continente, com a criação de uma representação da Fiocruz em Adis Abeba. O Presidente da
Fiocruz, Mario Moreira, acompanhou a comitiva brasileira, representando a Ministra da Saúde,
Nísia Trindade Lima, durante o encontro de Ministros da Saúde do continente africano.

Um Editorial do Mali Actu criticou duramente o Presidente da França, Emmanuel


Macron, por adotar uma perspectiva paternalista em relação à África, tratando o continente
como uma zona de influência exclusiva da França. De acordo com o editorialista, essa postura
da França ignora as aspirações de autonomia das nações africanas e reflete a incapacidade deste
país europeu de se adaptar a uma ordem mundial multipolar. O fracasso das intervenções
francesas na África, como no Mali, é destacado, assim como a exploração de recursos africanos
por empresas francesas, que prejudica a imagem da França no continente. Macron também é
criticado por evitar reconhecer os erros históricos da França, como o genocídio de Ruanda e o
tratamento dos tirailleurs senegaleses285. A postura crítica de Macron em relação à Rússia e a
adesão às políticas da OTAN são vistas como prejudiciais para a cooperação em desafios globais.
O texto conclui que a França precisa reformular suas relações com a África com base no respeito
mútuo e na cooperação genuína para evitar a perda de influência e relevância na política
mundial.

285
Tirailleurs Sénégalais", ou Atiradores Senegaleses, eram soldados coloniais franceses recrutados na
África Ocidental para defender a França durante a II Guerra Mundial.

308
Um mundo mais dividido, mais desigual e mais violento. E isso não é uma surpresa

Lúcia Marques

• Paz em vez de conflito. • Diálogo em vez de


confronto. •Cooperação em vez de exploração. •
Justiça em vez de dois pesos e duas medidas. •
Igualdade em vez de discriminação.
•Democracia em vez de opressão.286

Resumo: As guerras políticas, ideológicas, religiosas, étnicas, econômicas e tecnológicas que


aconteceram em 2024, não dão sinal de arrefecimento em 2025, pelo contrário. O que se
avizinha é um mundo mais dividido, mais desigual e mais violente. E isso não é uma surpresa.
Considerando que o mundo vive agravamento da desigualdade em tempos de crises múltiplas e
sobrepostas, o impacto das decisões do novo governo americano, Donald Trump, o aumento de
governos de extrema direita, que são segregacionistas e ignoram os direitos humanos, o ano de
2025 será um ano difícil, para uma boa metade do mundo. Para os países do Sul Global a
cooperação e o trabalho conjunto serão suas forças. O informe traz destaques negativos e
positivos de 2024 e suas conjunturas. Os negativos envolvem atores das superpotências; os
positivos, envolvem países do Sul Global, especialmente da Ásia Sul, Ocidental e Central, Oriente
Médio e África. E a liderança da China em tecnologia limpa e agora de IA mantém o gigante
asiática na mira dos EUA. • Antecipando a ruptura dos EUA com a OMS, as três regionais
trabalharam para garantir aportes mais robustos dos países membros. • Depois de quinze
meses, o fim da guerra em Gaza não veio; conseguiu-se um frágil cessar-fogo em três fases, que
pode ser interrompido a qualquer momento, uma vez que a causa verdadeira da guerra não foi
tratada profundidade. O que esperar quando o novo líder da potência mais bélica do mundo
afirma: “Continuaremos a promover a paz [no Oriente Médio] por meio da força em toda a
região”?

Palavras chaves: Cenário 2024, Riscos 2025, Cessar-fogo em Gaza; Sul Global, EUA x OMS

Abstract: The political, ideological, religious, ethnic, economic and technological wars that took
place in 2024 show no signs of abating in 2025, quite the opposite. What lies ahead is a more
divided, more unequal and more violent world. And this is not a surprise. Considering that the
world is experiencing worsening inequality in times of multiple and overlapping crises, the impact
of the decisions of the new American government, Donald Trump, and the rise of far-right
governments that are segregationist and ignore human rights, 2025 will be a difficult year for a
good half of the world. For countries in the Global South, cooperation and joint work will be their
strengths. The report highlights both negative and positive aspects of 2024 and its
circumstances. The negative aspects involve actors from the superpowers; the positive aspects

286
Esses são os seis princípios muito atuais e que deveriam ser lembrados por governantes; princípios que
contam na primeira Declaração de Cúpula (Istambul, 1997) da Organização D-8 para a Cooperação
Econômica, que reúne oito países (Bangladesh, Egito, Indonésia, Irã, Malásia, Nigéria, Paquistão, Turquia)
e tem como foco melhorar as posições desses países em desenvolvimento na economia mundial,
diversificar e criar novas oportunidades nas relações comerciais, aumentar a participação na tomada de
decisões em nível internacional e proporcionar um melhor padrão de vida.

309
involve countries from the Global South, especially from South, West and Central Asia, the Middle
East and Africa. And China's leadership in clean technology and now AI keeps the Asian giant in
the US's sights. • Anticipating the US’s break with the WHO, the three regional bodies worked to
secure more robust contributions from member countries. • After fifteen months, the end of the
war in Gaza has not come; a fragile three-phase ceasefire has been achieved, which could be
interrupted at any time, since the true cause of the war has not been thoroughly addressed. What
can we expect when the new leader of the world’s most warlike power states: “We will continue
to promote peace [in the Middle East] through force throughout the region”?

Keywords: Scenario 2024, Risks 2025, Ceasefire in Gaza; Global South, US x WHO

Guerras políticas, ideológicas, religiosas, étnicas, econômicas e tecnológicas que


aconteceram em 2024, se mantêm em 2025. E cada vez mais acirradas, envolvendo cada vez
mais atores, o que torna mais difícil alcançar um bom termo, quiçá, uma paz. Quando cresce o
ódio nacionalista, acaba a solidariedade entre povos. As tecnologias digitais, a Inteligência
Artificial (IA), as redes sociais e a facilidade de acesso e a rapidez que as informações são
disponibilizadas têm provocado tantas desinformações, desentendimentos e agravos,
linchamentos e bullyings virtuais e físicos e, consequentemente, suicídios.

Os conflitos seguem – são mais de 110 no mundo287. A guerra no Oriente Médio e a


guerra na Ucrânia ganham destaque nas mídias. Enquanto isso, a guerra civil no Sudão, que não
ganha espaço na mídia, provoca uma crise humanitária de “proporções assustadoras”, segundo
as Nações Unidas288 e já gerou mais de 11,5 milhões de deslocadas internos e mais de 3,2
milhões fugiram para países vizinhos, que são países que vivem suas próprias crises
humanitárias, pela pobreza extrema e pelos eventos climáticos.289

De Gaza ao Sudão, milhões de crianças presas em conflitos armados sofrem de fome


aguda. O acesso à água, alimentos e outras formas de assistência vital para crianças não é apenas
uma questão de sobrevivência imediata, mas também é uma questão de saúde e crescimento
sustentáveis. Facilitar o acesso à ajuda humanitária não é uma escolha, é uma obrigação para
todas as partes em conflitos armados. Os líderes políticos falharam abjetamente. “Esses ataques
bárbaros são uma violação flagrante do direito internacional. Eles também são um ataque à
decência humana e à nossa humanidade coletiva”, falaram especialistas da ONU, em sessão
especial do Conselho de Direitos Humanos.290 A falta de preocupação com a vida humana,
principalmente de mulheres e crianças, demonstra a “desumanização do inimigo” praticada
pelos líderes dos conflitos.

Continuam as sanções econômicas, ações militares diretas ou por procuração e


interesses ocultos. A guerra não militar entre EUA e China também segue. Em um mundo cada
vez mais dividido; um mundo onde os ricos estão ficando mais ricos e os pobres ficando mais
pobres; um mundo dividido entre a “selva e o jardim”.

287
Segundo Geneva Academy, Instituto da Universidade de Genebra - https://geneva-
academy.ch/galleries/today-s-armed-conflicts
288
https://news.un.org/pt/story/2025/01/1843141
289
https://www.youtube.com/watch?v=9DYEQySRY0E
290
https://www.ohchr.org/en/press-releases/2024/05/un-experts-outraged-israeli-strikes-civilians-
sheltering-rafah-camps

310
Aconteceram mais de 70 eleições em todo o mundo, em países que abrigam mais da
metade da população global; entre elas, a eleição americana, que traz de volta ao poder o já
conhecido por suas políticas segregacionistas – e tão belicoso quanto seu antecessor –, Donald
Trump, que já nas primeiras medidas causa sérios impactos para a governança global, para a
saúde, para a ciência, para as questões climáticas e para ações de ajuda humanitária a países e
populações que vivem tragédias e conflitos – muitos deles provocados direta ou indiretamente
pelo país mais poderoso do mundo.

Governos de direita e extrema direita foram eleitos. Cresceram os nacionalismos e os


movimentos anti imigrantes e anti refugiados; cresceram as políticas armamentistas. Partidos
de extrema-direita dominam países como a Hungria e a Itália e influenciam direta o
indiretamente os governos dos países escandinavos, Portugal e podem agora tomar Viena.291 E
ainda temos uma Comissão Europeia sob liderança arquiconservadora de Ursula van der Leyer.

Vimos a queda de Bashar al-Assad, na Síria, que surpreendeu o mundo de certa forma,
embora houvesse sinais de enfraquecimento do exército sírio e aumento da dissidência. Sem
contar que os maiores aliados de Assad, Rússia e Irã, estavam, e ainda estão, cuidando de suas
próprias crises bélicas. O grupo Hay’at Tahrir al-Sham, que tomou o poder, é considerado
terrorista pelos EUA por suas ligações com a Al-Qaida. Formaram um governo provisório e o
discurso é construir uma Síria plural, para todos. Uma incógnita que devemos acompanhar.292

Também acompanhamos a crise política na não tão democrática Coreia do Sul,


deflagrada pela tentativa de imposição de lei marcial, pelo presidente conservador Yoon Suk-
yeol, atualmente suspenso. Yoon Suk-yeol “discordou” dos resultados das eleições legislativas,
que tornou maioria na Assembleia Legislativa o Partido Democrática (PD), seu opositor. A
justificativa para decretar lei marcial foi afirmar que o PD estava de conivência com a Coreia do
Norte – Coreia do Sul e Coreia do Norte vivem um cessar-fogo prolongado, não um acordo de
paz. A assembleia conseguiu suspender a lei marcial e votar o impeachment do presidente. O
imbróglio ainda não acabou.293

E acompanhamos estarrecidos o genocídio de palestinos em Gaza, praticado por Israel,


com apoio das armas americanas e de aliados. Foram 15 meses de meses de
desproporcionalidade, meses de restrição a acesso a água, a alimentos, energia, medicamentos
e/ou outras ajudas para manutenção da vida humana -, a situação caminhou para o extermínio.
Gaza está praticamente destruída; sua população de cerca 2,3 milhões de palestinos foram
deslocados. O número de mortos no conflito é impreciso. Um artigo no The Lancet – “Contar os
mortos em Gaza: difícil, mas essencial” aponta que o número de mortos em Gaza pode
ultrapassar os 186 mil, ao computar as mortes indiretas, em consequências do conflito, com a
destruição das infraestruturas de saúde, de energia e de saneamento e pela falta de tratamento,
entre outras causas. A falta de preocupação com a vida humana, principalmente de mulheres e
crianças, demonstra a “desumanização do inimigo” praticada por Israel, tanto nas ações bélicas,
quanto nas falas das autoridades israelenses - a desumanização ignora preocupação com os
Direitos Humanos. Ao olharmos para essas ações que visam desumanização e genocídio em Gaza

291
Aguiar, F. A América do Sul diante da Europa dm tempos de Trump. In: OBSERVATÓRIO
INTERNACIONAL DO SÉCULO XXI JANEIRO/2025. P. 18.
292
Aguiar, F. Afinal, o que aconteceu na Síria e na Coreia do Sul. In: OBSERVATÓRIO INTERNACIONAL DO
SÉCULO XXI JANEIRO/2025. P. 42.
293
Aguiar, F. Afinal, o que aconteceu na Síria e na Coreia do Sul. In: OBSERVATÓRIO INTERNACIONAL DO
SÉCULO XXI JANEIRO/2025. P. 44.

311
sob a ótica da ética social (capacidade de negociação, cooperação e paz), da etologia294
(capacidade de conflito e extermínio) e da geopolítica (poder, assimetralidade, inimigos e
aliados) podemos visualizar uma trajetória de extermínio de um grupo praticado por Israel e
seus aliados em prol de seus reais interesses em Gaza.295 E se o objetivo da guerra é o extermínio,
o cessar-fogo é frágil296, quiçá, um acordo de paz.297

A guerra em Gaza também mostrou o enfraquecimento do Conselho de Segurança da


ONU, que precisa ser reformulado para ser uma instância de governança mais justa e neutra
diante de tantas divisões e disputas de poder. Basta um veto para que resoluções não sejam
aprovadas.

Mas 2024 não foi de todo negativo. E terá desdobramentos em 2025. Apesar das guerras
e disputas geopolíticas – ou por causa delas -, cresceram as relações de cooperações
multilaterais, trilaterais e bilaterais entre os países do Sul Global, especialmente entre Ásia,
Oriente Médio e África. Os países das três regiões aprenderam a olhar para as oportunidades e
a superar as diferenças - diferentes níveis de desenvolvimento econômico e social, diferentes
realidades geográficas, climáticas, políticas e geopolíticas - e aproveitar as similaridades. Todos
buscam o desenvolvimento tecnológico, sustentável e reduzir as desigualdades. Quando a África
e a China, cuja população combinada chega a cerca de um terço da população mundial,
trabalharem juntas nessa agenda, haverá um efeito cascata em outras regiões, principalmente
no Sul Global.298

E a China teve um importante papel nessas aproximações e expansão de relações, seja


através da diplomacia, da Iniciativa Cinturão e Rota, que tem foco em infraestruturas, seja nas
cooperações bilaterais ou multilaterais ou através dos blocos que Pequim integra, como FOCAC
(Fórum de Cooperação África e China), RCEP (Parceria Econômica Regional Extensa), OCX
(Organização de Cooperação de Xangai), BRICS+, G77+China, por exemplo.299

A China tem tecnologia, conhecimento, capacidade de ter voz, capacidade financeira –


e de negociar na sua própria moeda - e uma diplomacia neutra. Os países da Ásia Central, da
Região Mena e da África buscam se modernizar, obter tecnologia e capacitação, fugir das
sanções e das armadilhas dos juros do sistema internacional. Essa relação que a China chama
ganha-ganha.

294
Etologia é o estudo de comportamento animal.
295
Daniel Barreiros em Guerra, Ética Etologia: fundamentos evolucionários do conflito e da cooperação
na linhagem do homem.p.1.
296
O cessar-fogo que entrou em vigor em 19 de janeiro, será implementado em três fases. A primeira fase
em andamento envolve a troca de reféns, retirada de soldados de áreas densamente povoadas e entrada
de ajuda humanitária (alimentos, medicamentos e combustível). As outras duas fases ainda estão em
negociação: Fase 2, mais troca de reféns e negociação do fim da guerra; Fase 3, quem governará Gaza.
Cessar-fogo em Gaza: como será interrupção do conflito e libertação de reféns - BBC News Brasil
297
Marques, L. Guerra em Gaza: Poder, Ética e Etologia. In: Cadernos CRIS-Fiocruz Informe 12-2024. P
223-228.
298
Paul Frimpong, diretor executivo do Centro de Política e Aconselhamento África-China, um think tank
sediado em Gana. https://2024focacsummit.mfa.gov.cn/eng/zpfh_1/202409/t20240909_11487355.htm
299
Saiba mais em Marques, L. O centro de mundo se deslocando para a Ásia e o Sul Global ficando mais
poderoso. In: Cadernos CRIS-Fiocruz Informe 3-2023. P. 183-192; Marques, L. Fórum de Cooperação
China-África: modernização, desenvolvimento e fortalecimento da Cooperação Sul-Sul. In: Cadernos
CRIS-Fiocruz 16-2024. P.164-168 ; Marques, L. China e países árabes avançam nas relações bilaterais.
In: CRIS-Fiocruz Informe 17-2024, P.263-268 ; Jabbour, E. América do Sul entre a China e o Trump. In:
OBSERVATÓRIO INTERNACIONAL DO SÉCULO XXI JANEIRO/2025. P. 21

312
No entanto, não sejamos ingênuos. Desde o primeiro governo Donald Trump (2017-
2020), que acirrou seu combate à China que foram desde provocações, jogadas geopolíticas,
aplicações de sanções, aumento de tarifas sobre produtos chineses, o estabelecimento de bases
militares e de lançadores de mísseis em países vizinhos da China, aumentando a pressão sobre
Taiwan e no Mar Meridional da China, o gigante vermelho acelerou seu avanço em tecnologias
militares e em acordos de armas. A guerra na Ucrânia e em Gaza aceleraram esse “progresso
militar”. Mas os analistas olham essa elevação em orçamento militar como resposta a uma
política nacional defensiva. Hoje a China foca em tecnologias duais – defesa e economia civil.300

Considerando que a China é um país com mais de 1,4 bilhões de habitantes; que ela
precisa alimentar esse quase um milhão e meio de pessoas; gerar emprego e bem-estar para
toda essa gente; gerar energia e produzir bens de consumo para sua população, observamos
que seus interesses nas relações globais não são bélicos; são para atender essas necessidades.
E todo seu movimento para ser um Estado Nacional que segue as regras estabelecidas pelo
mundo político e financeiro ocidental, visa atender essa população. Suas relações com os
Estados da Ásia Central, da África, do Oriente Médio e da América Latina visam o gigantesco
projeto de integração econômica centrado na Iniciativa Cinturão e Rota ou a Nova Rota da Seda.
Portanto, a estabilidade nessas regiões é de grande interesse de Pequim. E esses países têm seus
próprios interesses e necessidades que podem ser atendidos pela China, que já domina 33 das
44 tecnologias duais,301 que propõem transferência de tecnologias, capacitação e treinamento.
Além de ser um grande mercado com mais de 1,4 bilhões de pessoas. Como escreve, Jabbour,302
a China é desprovida de ideologias nas relações internacionais e com nenhuma propensão ao
proselitismo303. Diferente do discurso americano que foca na defesa bélica e em valores como
liberdade e democracia – embora a América imponha seu poder de veto e pratique coerção com
sanções econômicas e tecnológicas em defesa de sua ideologia.

Mas as duas guerras também contribuíram para o estabelecimento – liderado pela China
e Rússia - de novas alianças, cujos exemplos são o BRICS+ e seus novos Estados membros e a
OCX e seus novos Estados membros, configurando uma base para o Sul Global. E quando se
somam os mais de 53 membros do FOCAC – Fórum China-África, começa a surgir uma nova força
nas relações internacionais e econômicas. É a base para uma nova ordem global.

Além disso, China não é de fazer promessas. Estabelece planos de ação e planos de
trabalho. E os põe em execução. E é isso que atrai os países em desenvolvimento que estão
cansados de promessas.

Outro destaque positivo de 2024 foi o passo inicial dos países desérticos para
transformar as condições negativas e áridas de sua geografia, em riqueza verde, frente à crise
energética e necessidade de descarbonização. 304 Ao mesmo tempo que entram no caminho da

300
Hoje, a China é líder mundial em 37 das 44 tecnologias importantes para o desenvolvimento econômico
e militar do futuro, nos setores de defesa, aeroespacial, robótica, microeletrônica, telecomunicação,
energia nuclear, química e biotecnologia, inteligência artificial e tecnologia quântica. Fiori, J. In: A disputa
de Taiwan, a preparação para a guerra e a inovação tecnológica. P. 30. Boletim_06_Julho-24.pdf (ufrj.br)
301
Fiori, J. In: A disputa de Taiwan, a preparação para a guerra e a inovação tecnológica. P. 30.
Boletim_06_Julho-24.pdf (ufrj.br)
302
Jabbour, E. O Grande Jogo Chinês no Oriente médio. In: Boletim_Observatorio_01-24.pdf (ufrj.br) , p.
21.
303
Intenção de converter
304
Marques, L. Fazendo do limão uma limonada: Região MENA emerge como ator-chave no comércio
do combustível do futuro. In: Cadernos CRIS-Fiocruz Informe 10-2024. P. 254-262

313
transformação energética para energia limpa, criando o hidrogênio verde a partir da energia
eólica e solar, se tornam atores-chave na exportação desse ouro verde para países da Europa,
principalmente, e também para o mundo. E os próprios futuros consumidores começaram a
investir na região MENA (Oriente Médio e Norte da África 305) para garantir essa fonte de
energia limpa.

E novamente a China entra como um importante player nesse cenário: é


desenvolvedora, produtora e exportadora de tecnologia limpa. E agora de tecnologia IA –– o
DeepSeek, uma espécie de GPT chinês, que segundo especialistas entrega resultados iguais
ou melhores que o GPT4. Sem precisar dos nanochips de Taiwan! E com código fonte aberto.
O que fez despencar as ações da NVIDIA. 306

Nos anos recentes, os EUA foram confrontados por uma potência produtiva, comercial
e tecnológica em ascensão, a China, por economias em crescimento no Sul Global (que
ultrapassaram o PIB do Norte Global em termos de PPC em 2007), por anos de negligência no
investimento de capital doméstico, pela financeirização da economia e a perda da superioridade
na indústria. Não é à toa que China foi definida pelo governo americano Joe Biden307 e agora
também pelo seu sucessor, Donal Trump, como seu grande competidor estratégico que deve
ser cercado e bloqueado em todos os pontos do sistema econômico mundial.308

Como bem resume Andrés Ferrari Haines, enquanto os EUA, com seu apoio às guerras
na Ucrânia e em Gaza, se isolam do mundo não ocidental, a China fortalece as relações
econômicas e de segurança em mais países e regiões.309

As nações do Sul Global enfrentarão em 2025 as consequências e/ou desdobramentos


dessa competição entre gigantes e das ações e decisões do novo governo americano, cujo foco
é a economia americana, embora os meios possam não ser econômicos. Haja vista o carácter
fortemente belicoso e militarista dos nomeados para os principais cargos da política externa.

É o cenário que vimos em 2024 e parece que não será diferente em 2025. Portanto, nada
de novo no front.

305
O Norte da África está atualmente na vanguarda da energia solar, bem como dos recursos hídricos
renováveis, que em conjunto são utilizados para alimentar a eletrólise para produzir hidrogénio. O
potencial para uma produção significativa de hidrogénio em toda a África é de até 16 mil milhões de
toneladas por ano. Desbloquear esse potencial é uma oportunidade para garantir o fornecimento
global de energia, criar empregos, desenvolver a indústria pesada e transformar o acesso à água limpa
e à energia sustentável. https://www.world-hydrogen-summit.com/africa-forum-programme/
306
https://x.com/aguedescartoon/status/1883954359219745139?t=FLraZ4cNNgMq1SrZ9LS39g&s=08
307
“Competiremos efetivamente com a República Popular da China, que é o único concorrente tanto com
intenção quanto com, cada vez mais, capacidade de remodelar a ordem internacional, ao mesmo tempo em
que aperta uma Rússia perigosa.”https://www.state.gov/translations/portuguese/informativo-estrategia-de-
seguranca-nacional-do-governo-biden-
harris/#:~:text=A%20Estrat%C3%A9gia%20est%C3%A1%20enraizada%20em,do%20modo%20de%20vida%2
0americano.
308
Fiori, J. L. América do sul: um continente partido e tutelado. In: 308 Boletim do Observatório
Internacional do Século XXI, https://nubea.ufrj.br/images/Observatorio/Boletim_09_Janeiro_2025.pdf
pág. 7
309
Boletim do Observatório Internacional do Século XXI, do Grupo de Pesquisa Poder Global e Geopolítica
do Capitalismo do CNPQ/LABEPOG/NUBEA/UFRJ, edição de julho, p. 11. Boletim_06_Julho-24.pdf (ufrj.br)

314
O que atentar para 2025

Como aponta Tom Standage em seu The World Ahead 2025,310 a política de Trump
“América Primeiro” fará amigos e inimigos e isso poderá levar a realinhamentos geopolíticos,
elevar tensões e até proliferação nuclear. Segundo o autor, as economias ocidentais vão um
novo desafio: reduzir os déficits, aumentar os impostos, cortar gastos ou impulsionar o
crescimento. Muitos também podem ter que aumentar os orçamentos de defesa. E não será
diferente nos EUA uma vez que as políticas de Trump piorarão as coisas: pesadas tarifas de
importação podem dificultar o crescimento e reacender a inflação.

Outro fator que o mundo enfrentará é o envelhecimento das populações,


principalmente na Europa e alguns países da Ásia, como Japão e Coreia do Sul. A China, por sua
vez, está à procura de oportunidades econômicas em um mundo envelhecido.

Por outro lado, em partes do Oriente Médio, Sul da Ásia e África, há uma população
jovem em expansão que, diante das crises econômicas e da escassez de empregos, o que pode
gerar risco de instabilidade.311

Os riscos econômicos interconectados com tensões sociais e geopolíticas também são


apontados na 20ª edição do Relatório de Riscos Globais do Fórum Econômico Mundial, que
revela um cenário global cada vez mais fraturado, onde a escalada dos desafios geopolíticos,
ambientais, sociais e tecnológicos ameaça a estabilidade e o progresso. O conflito armado
baseado no Estado, que não era considerado um grande risco há apenas dois anos, também é
apontado pelo relatório como a ameaça material mais urgente em 2025. Em segundo lugar estão
os eventos climáticos extremos, o que não é uma surpresa.

310
https://www.economist.com/the-world-ahead/2024/11/18/tom-standages-ten-trends-to-watch-in-
2025
311
https://www.economist.com/interactive/the-world-ahead/2024/11/18/world-leaders-are-getting-
older-except-in-democracies

315
Mas uma das ações que mais afetará as populações dos países mais vulneráveis e
milhões de pessoas negligenciadas e que vivem em áreas de conflitos ou afetadas pelos eventos
climáticos estremos é a saída dos EUA da Organização Mundial da Saúde (OMS)312 e a retirada
dos financiamentos a agências das Nações Unidas.

Além disso, Trump suspendeu as ajudas financeiras dos National Institutes of Health
(NIH), agência que financia as pesquisas americanas dentro e fora dos EUA, que terá que explicar
em qual pesquisa e/ou para quem vai o financiamento.313 A pesquisa científica “pode perder
força no mundo e prejudicar a resposta mundial no combate às doenças”, como alerta Rubens
Belfort314, por tanto, a prevenção à futuras pandemias também está ameaçada.

Deisy Ventura faz uma excelente análise do impacto e do significado da ruptura dos EUA
com a OMS. Ventura aponta o movimento drástico, como a “ordem de retorno à Washington
dos servidores que desempenhem alguma função na organização; e a retirada das negociações
do acordo sobre pandemias, e recusará as emendas ao Regulamento Sanitário Internacional
recentemente adotadas.” A autora, metaforicamente, compara a um divórcio litigioso,
envolvendo muitas disputas. Para ela, sair da OMS faz parte de um amplo e vigoroso ataque ao
multilateralismo, sendo anunciada a ruptura de outros compromissos internacionais, entre eles
os relativos a mudanças climáticas. E lembra que “a ferrenha oposição das extremas direitas ao
sistema das Nações Unidas está relacionada principalmente à promoção de direitos individuais
e coletivos pelo sistema onusiano, que são contestados por alianças transnacionais
conservadoras.” Ventura lembra que são 42 emergências em curso no mundo, sendo 17 delas
em grau máximo.

Com o aumento de governos de extrema direita, essa decisão americana, e suas


motivações, poderão repercutir negativamente pelo mundo e provocar outras saídas. A OMS
trabalha com o princípio das evidências cientificas, o oposto que esses governos praticam, isto
é, forjam evidências para legitimar ações duvidosas.

Como era promessa de campanha, o ato não foi uma surpresa. Pelo estatuto, a saída
definitiva e suspensão dos pagamentos das contribuições devem acontecer daqui a um ano, por
tanto OMS e agências têm ainda um tempo para buscar alternativas.

As três regionais da OMS que cobrem a Região MENA, Ásia Pacífico e Sudeste,
respectivamente Mediterrâneo Oriental (EMRO); Pacífico Ocidental (WPRO); Sudeste Asiático
(SEARO), realizaram no final de 2024 as sessões dos seus comitês visando ouvir relatórios de
progresso, revisar e endossar novas iniciativas e formular políticas. E, antecipando a crise
anunciada que viria, destacaram a importância do aumento da participação financeira dos países
membros e aportes importantes foram anunciados, incluindo do Banco Islâmico de

312
https://www.whitehouse.gov/presidential-actions/2025/01/withdrawing-the-united-states-from-the-
worldhealth-organization/
313
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2025/01/22/pesquisa-cientfica-pode-perder-fora-no-mundo-
com-sada-dos-eua-da-oms-dizem-
especialistas.ghtml?giftId=1b37bc221aacc2c&utm_source=Copiarlink&utm_medium=Social&utm_camp
aign=compartilharmateria
314
https://valor.globo.com/brasil/noticia/2025/01/22/pesquisa-cientfica-pode-perder-fora-no-mundo-
com-sada-dos-eua-da-oms-dizem-
especialistas.ghtml?giftId=1b37bc221aacc2c&utm_source=Copiarlink&utm_medium=Social&utm_camp
aign=compartilharmateria

316
Desenvolvimento – lembrando que boa parte dos países das três regionais são de maioria
islâmica.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo de 30 anos, uma paz entre Israel e os Territórios Ocupados da Palestina nunca
foi para frente – as várias tentativas foram frustradas por diferentes causas e razões.315 Será
que agora, diante do novo contexto global, com novos atores em cena, com mais países ao redor
do mundo reconhecendo a Palestina como um Estado nacional, os dois lados da guerra
conseguirão manter o cessar-fogo e avançar para um processo de paz?

Conflito, guerra e ocupação, crises econômicas, crises institucionais e crises climáticas


ameaçam minar ganhos de desenvolvimento duramente conquistados. Em muitos casos, as
crises se sobrepõem e interagem com efeitos devastadores para exacerbar o impacto sentido
pelas populações, em um fenômeno conhecido como policrise. No entanto, o impacto das crises
não é sentido universalmente. Países e indivíduos com maior capital econômico e social
enfrentarão crises com mais facilidade, enquanto os menos afortunados podem se ver presos
na pobreza, com apenas mecanismos negativos de enfrentamento disponíveis.316

“O que era ideologia passou a ser crença. O que era política, tornou-se religião. O que
era religião, passou a ser estratégia de poder. Para fabricar armas, é preciso fabricar inimigos.
Para produzir inimigos, é imperioso sustentar fantasmas,”317 falou Mia Couto em discurso de
2011, que segue atualíssimo. O filósofo finalizou seu discurso afirmando que “há quem tenha
medo de que o medo acabe.”

As reflexões dos filósofos Mia Couto e Yuval Noah Harari, citada em publicação recente
do jornalista Mustafa Alrawi, refletem sobre a geografia do medo, sobre a necessidade de se
criar fantasmas, sobre a versão estereotipada versus a versão real, sobre os valores do Ocidente
contra os valores do Oriente, e que se encaixam no momento atual sobre as guerras de Israel,
no Oriente Médio, sobre a guerra na Ucrânia, sobre os interesses (ou medos) americanos e
europeus nas guerras e sobre o medo americano da perda da hegemonia econômica.

Por fim, considerando que o mundo vive agravamento da desigualdade em tempos de


crises múltiplas e sobrepostas, o impacto das decisões do novo governo americano, Donald
Trump, o aumento de governos de extrema direita, que são segregacionistas e ignoram os
direitos humanos, o ano de 2025 será um ano difícil, para uma boa metade do mundo.

Para os países do Sul Global a cooperação e o trabalho conjunto serão suas forças.

315
https://oglobo.globo.com/mundo/entenda-em-30-anos-tentativas-de-alcancar-paz-entre-israel-
palestinos-fracassaram-23759962
316
https://www.unescwa.org/sites/default/files/event/materials/9-
%20Reducing%20inequality%20in%20times%20of%20crisis%202400673E.pdf
317
https://www.youtube.com/watch?v=5xtgUxggt_4

317
Atualização EUA

Guto Galvão

Sumário: Novas políticas de saúde. Desde a posse em 20 de janeiro de 2025, o novo presidente
emitiu 45 ordens executivas. Essas ações abrangem uma variedade de áreas, incluindo comércio
internacional, imigração e políticas de saúde, com implicações significativas para a América
Latina.

Fontes de financiamento para as Nações Unidas. As mudanças nas contribuições dos EUA podem
ter um impacto significativo em suas operações. Em 2022, os Estados Unidos emergiram como
o maior contribuinte para as Nações Unidas, fornecendo mais de US$ 18 bilhões em
financiamento. Esse apoio financeiro é essencial para o funcionamento de várias agências,
programas e missões da ONU.

As preocupações com a gripe aviária. Uma das principais preocupações de saúde pública nos
EUA hoje é a gripe aviária, particularmente a cepa H5N1. Esta doença pode afetar a saúde
humana de várias maneiras significativas.

Palavras-chave: políticas de saúde, EUA, Financiamento da ONU, Influenza Aviária

Summary: New health policies. Since taking office on January 20, 2025, the new president has
issued 45 executive orders. These actions cover various areas, including international trade,
immigration, and health policies, with significant implications for Latin America.

Sources of funding for the United Nations. Changes in U.S. contributions could significantly
impact the organization's operations. In 2022, the United States emerged as the largest
contributor to the United Nations, providing over $18 billion in funding. This financial support is
essential for the functioning of various UN agencies, programmes, and missions.

Concerns about avian influenza. One of the major public health concerns in the U.S. today is bird
flu, particularly the H5N1 strain. This disease can affect human health in several significant ways.

Keywords: health policies, USA, UN funding, Avian Influenza

Novas políticas de saúde

Desde sua posse em 20 de janeiro de 2025, o novo presidente emitiu 45 ordens


executivas. Essas ações abrangem uma variedade de áreas, incluindo comércio internacional,
imigração e políticas de saúde, com implicações significativas para a América Latina.

Nesse segundo mandato, as ações tomadas pela administração devem gerar mudanças
significativas na política de saúde dos Estados Unidos, gerando debates e preocupações tanto
no âmbito nacional e internacional.

Como já foi mencionado em outros artigos dessa edição dos cadernos, a nomeação para
liderar o Departamento de Saúde e Serviços Humanos (HHS) de um secretário conhecido por
suas posições antivacina, tem gerado apreensão. Ele afirma que implementará as políticas da
nova administração, ainda quando tem demonstrado falhas na compreensão sobre temas

318
críticos como os sistemas de Medicare, Medicaid e de regulamentação e segurança de vacinas.
Especialistas temem que sua liderança possa comprometer iniciativas de saúde pública e a
confiança nas vacinas.

A decisão de retirar os EUA como estado-membro da Organização Mundial da Saúde


(OMS) pode enfraquecer a governança e a colaboração internacional em saúde pública,
fundamental para questões como a resposta a pandemias, além de abrir espaço para outros
países assumirem papéis mais proeminentes na organização.

A nova administração sinaliza a intenção de revisar ou revogar partes do Affordable Care


Act (Obamacare), o que pode resultar em redução de cobertura e aumento de custos para
milhões de americanos, especialmente aqueles de baixa renda e aposentados. Além disso, há
indicações de que políticas relacionadas a cuidados reprodutivos e de afirmação de gênero
possam ser restringidas.

As novas políticas de imigração podem comprometer a saúde pública, já que as novas


medidas podem afetar o acesso a serviços de saúde para populações imigrantes, aumentando
vulnerabilidades e desafios para a saúde pública.

A administração assinou uma ordem executiva proibindo iniciativas de Diversidade,


Equidade e Inclusão (DEI) em órgãos federais. Funcionários envolvidos nesses programas foram
afastados, e empresas com contratos federais estão sob escrutínio para garantir conformidade
com a nova legislação. Alguns meios circulam que poderiam ser iniciadas ações que afetariam
corporações e instituições acadêmicas, com a possibilidade de sanções para organizações que
mantiverem políticas de DEI consideradas "discriminatórias" pela nova administração.

Em conclusão, as mudanças impostas pela nova administração em 2025 podem ter


efeitos profundos na saúde pública e em políticas de inclusão. Enquanto aliados do governo
argumentam que essas medidas restauram a liberdade de escolha e reduzem a interferência do
governo, críticos alertam para os impactos negativos na população mais vulnerável e na
colaboração internacional em saúde. Os desdobramentos dessas políticas continuarão a ser
observados nos próximos anos.

Fontes de financiamento para as Nações Unidas

As mudanças nas contribuições dos EUA podem ter um impacto significativo em suas
operações. As principais fontes de financiamento da Organização das Nações Unidas (ONU)
consistem em:

1. Contribuições de quotas dos estados-membros: São pagamentos obrigatórios feitos


por todos os 193 estados-membros, determinados por meio de uma fórmula que considera a
renda nacional bruta e o tamanho da população de cada país. Eles são cruciais para financiar o
orçamento regular da ONU, despesas administrativas e missões de manutenção da paz.

2. Contribuições voluntárias: São pagamentos discricionários fornecidos pelos estados-


membros para programas e agências específicos da ONU. Várias entidades da ONU, incluindo o
Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), o Escritório do Alto Comissariado das Nações
Unidas para os Refugiados (ACNUR) e o Programa Mundial de Alimentos (PMA), dependem
predominantemente dessas contribuições voluntárias.

319
Esses mecanismos de financiamento permitem que a ONU se envolva em uma vasta
gama de atividades, incluindo manutenção da paz, prevenção de conflitos, iniciativas de saúde,
assistência humanitária e desenvolvimento socioeconômico e cultural.

Em 2022, os Estados Unidos emergiram como o maior contribuinte para as Nações


Unidas, fornecendo mais de US$ 18 bilhões em financiamento. Esse apoio financeiro é essencial
para o funcionamento de várias agências, programas e missões da ONU. Enquanto o governo
Trump anterior promulgou reduções no financiamento de certas agências da ONU, o governo
Biden restabeleceu amplamente essas alocações. Podem ser retiradas as seguintes conclusões
desta situação:

- Contribuições dos EUA: Em 2022, os Estados Unidos contribuíram com mais de US$ 18
bilhões para a ONU, com cerca de 17% alocados como contribuições avaliadas e o financiamento
restante classificado como contribuições voluntárias.

- Restauração do financiamento: O governo anterior restabeleceu o financiamento de


várias agências da ONU que sofreram cortes orçamentários, principalmente o Fundo de
População das Nações Unidas (UNFPA) e a Organização Mundial da Saúde (OMS).

- Financiamento da UNRWA: O presidente Biden inicialmente retomou o financiamento


dos EUA para a Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina (UNRWA);
No entanto, esse financiamento foi pausado em 2024 devido a alegações sobre o envolvimento
de funcionários da agência em atividades terroristas.

- Contribuições avaliadas: Os EUA são obrigados a contribuir com 22% do orçamento


regular da ONU e 27% do orçamento de manutenção da paz, embora o Congresso tenha imposto
um limite de 25% às contribuições de manutenção da paz.

- Contribuições voluntárias: Muitas entidades da ONU, incluindo o UNICEF e o Programa


Mundial de Alimentos (PMA), dependem significativamente de contribuições voluntárias dos
estados membros.

- Impacto dos cortes de financiamento: Reduções no financiamento dos EUA podem ter
repercussões substanciais para as operações da ONU, potencialmente levando à diminuição de
capacidades e serviços.

- Contribuições globais: Outros países, particularmente a China, aumentaram suas


contribuições para a ONU nos últimos anos, especialmente em termos de esforços de
manutenção da paz e apoio de agências de desenvolvimento.

As contribuições financeiras dos Estados Unidos são críticas para a eficácia operacional
da ONU, e as flutuações nessas contribuições podem influenciar substancialmente o
desempenho e o impacto geral da organização.

As preocupações com a gripe aviária

Uma das principais preocupações de saúde pública nos EUA hoje é a gripe aviária,
particularmente a cepa H5N1. Esta doença pode afetar a saúde humana de várias maneiras
significativas:

320
Infecções humanas: O vírus pode infectar humanos, levando a doenças respiratórias
graves. No surto atual, 66 dos 68 casos humanos nos Estados Unidos ocorreram desde março,
com uma morte relatada na Louisiana.

Sintomas e gravidade: Indivíduos infectados podem apresentar sintomas que variam de


problemas respiratórios leves a pneumonia grave, síndrome do desconforto respiratório agudo
(SDRA) e até morte. A gravidade da doença pode variar, mas muitas vezes resulta em sérias
complicações de saúde.

Preocupações com a transmissão: Embora a transmissão da gripe aviária de humano


para humano seja atualmente rara, a capacidade do vírus de infectar humanos levanta
preocupações sobre seu potencial de sofrer mutações e se tornar mais facilmente transmissível
entre as pessoas, potencialmente levando a uma pandemia.

Impacto na saúde mental: O estresse e a ansiedade associados ao gerenciamento de


surtos, principalmente para os da indústria avícola, também podem afetar negativamente a
saúde mental. Agricultores e trabalhadores que lidam com o abate em massa de aves
experimentam uma tensão emocional e psicológica significativa.

Riscos à saúde pública: A propagação da gripe aviária para humanos representa um risco
mais amplo à saúde pública, exigindo monitoramento extensivo, testes e medidas preventivas
para gerenciar surtos e prevenir novas infecções humanas.

No geral, o impacto da gripe aviária na saúde humana é multifacetado, envolvendo


infecções diretas, doenças graves potenciais e implicações mais amplas para a saúde pública.

O grave impacto do surto de gripe aviária em curso nos produtores de ovos e na indústria
avícola em geral nos Estados Unidos destaca o custo emocional e financeiro para os agricultores,
os desafios impostos pelas medidas de biossegurança e o debate sobre a vacinação de aves para
controlar o vírus.

Os produtores de ovos estão passando por um estresse emocional e financeiro


significativo devido à necessidade de abater milhões de aves para controlar o surto de gripe
aviária. O custo mental dos trabalhadores é imenso, com os funcionários chorando e sofrendo
de noites sem dormir. A fazenda teve que demitir muitos trabalhadores e ainda está em
processo de reconstrução de seus rebanhos. Algumas ações estão sendo implementadas, como:

Medidas de biossegurança:

Apesar dos investimentos substanciais em biossegurança, como estações de lavagem de


caminhões, protocolos de banho de funcionários e sistemas de luz laser para deter as aves
aquáticas, o vírus continua a se espalhar. As fazendas investiram milhões de dólares nessas
medidas, mas não contiveram suficientemente o surto que começou há três anos. O vírus afetou
147 milhões de aves em bandos comerciais e de quintal nos EUA.

Debate sobre vacinação:

Há um debate contencioso dentro da indústria avícola sobre a vacinação de aves.


Embora alguns especialistas e líderes do setor defendam a vacinação, persistem as
preocupações com as implicações comerciais e os desafios logísticos. Países como China, Egito
e França já estão vacinando aves contra a gripe aviária. O USDA está considerando estocar
vacinas que correspondam às cepas atuais do surto, mas há preocupações sobre sua eficácia e
as implicações comerciais da implantação de uma vacina.

321
Necessidade de novas abordagens:

As medidas de biossegurança existentes são inadequadas para conter o surto, levando


a pedidos de novas estratégias, incluindo a vacinação potencial, para controlar o vírus e
minimizar os riscos à saúde humana. Especialistas em doenças infecciosas argumentam que a
redução infections in animals near humans, such as cows and chickens, is crucial for preventing
human infections. The industry is desperate for new tools to combat the virus, and some leaders
are advocating for vaccination as a necessary measure, despite the challenges involved.

322
Trumpolinagem e outros desvios de conduta

Adhemar Bahadian

Escrevo poucas horas depois do discurso de posse de Trump no maior país do mundo.
O mais armado. O mais bem dotado de recursos humanos à disposição do progresso da ciência
e da tecnologia.

Talvez o mais unanimemente admirado por suas universidades e pelos progressos que
imprimiu à pesquisa científica.

O mais avançado na manufatura de máquinas e robôs capazes de substituir a mão


humana nas mais delicadas intervenções cirúrgicas em nossos intrincados sistemas nervosos, no
cérebro humano, em nossas colunas cervicais, e igualmente capazes de enviar raios a destruir
células cancerígenas nos seios de nossas mulheres.

Uma civilização do bem. Particularmente após a mortandade da Segunda Guerra


Mundial, quando liderou vencedores e vencidos na tarefa de criar um sistema internacional
regido pelo que se passou a chamar Nações Unidas, nações amantes da paz.

O Brasil nunca se absteve de juntar-se a este trabalho construtivo. Na Segunda Guerra


Mundial contribuímos para libertar a Itália, país que até hoje, nas cercanias de Pistóia, rende
homenagem a nossos pracinhas da FEB que ali perderam a vida.

E, a cada ano, é comovente a homenagem de Pistóia e de cidades vizinhas aos


representantes do governo brasileiro, o Embaixador do Brasil na Itália e o Comandante das
Forças Armadas brasileiras, quando ambos hasteiam as bandeiras da Itália e do Brasil no campo
santo dos pracinhas brasileiros mortos em solo italiano na Segunda Guerra.

E nunca reclamamos quando, em Dumbarton Oaks, o Brasil não foi escolhido como
membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, assim como nunca fomos
parcialmente contemplados no Plano Marshall, nós, único país da América do Sul a mandar
forças militares para o teatro de guerra.

Portanto, quando se fala da amizade Brasil-Estados Unidos sabemos que nossas relações
se pautam muito mais por nossos elos de afinidade com o sistema democrático do que por
interesses materiais que não se coadunem com o Direito Internacional, com a Carta das Nações
Unidas e com os propósitos de paz, justiça e combate à desigualdade nela inscritos.

Hoje, chocou-me ver o Presidente eleito denunciar o desrespeito de nações amigas aos
princípios de soberania e igualdade jurídica dos Estados, na bela cenografia da posse de Trump.

Bem verdade que a transferência das cerimônias de posse para o interior da Rotunda do
Capitólio não deixou de nos lembrar as ações de vandalismo ocorridas no mesmo local, em
grande parte apoiadas, senão orquestradas, pelo mesmo cidadão que hoje volta ao poder.

Impossível não ver as festividades de hoje senão turvadas por nossos olhos incapazes
de focar com nitidez a alegria de uma solenidade irreparavelmente confiscada pelo desrespeito
sacrílego do passado.

323
Há em tudo um certo olor de flores murchas, uma reminiscência arranhada de dor de
um passado que insiste em se fazer presente.

Por tudo isso, não esqueço a advertência de Biden de que se está a instalar no poder da
mais poderosa nação da terra uma conurbação entre o pior do capital e o mais abjeto da política.

Não há dúvida de que Trump não é o único responsável pelas distorções do capitalismo
que estamos a ver. Temos que reconhecer com humildade e honestidade que o renascimento
das políticas das canhoneiras - a se camuflar por trás do slogan MAGA - só se justifica porque
hoje se refaz a política do "empobrecimento do seu vizinho” como fórmula canhestra do
comércio livre.

A hora não é de desespero. E muitíssimo menos de enfraquecimento moral. Nós


continuamos o mesmo Brasil de Dumbarton Oaks. O mesmo Brasil que se aliou contra o fascismo
e nazismo na Itália.

Nós não temos nada a temer. Permanecemos a mesma nação confiante nos princípios
democráticos e, até por termos vivido experiências dramáticas ainda muito próximas, sabemos
do valor da liberdade e da dignidade humana.

O Rei-Sol feneceu faz tempo na França.

324
Memórias póstumas dos passos perdidos

Adhemar Bahadian

Vivo, Machado de Assis certamente não escolheria nem a pena da galhofa, nem a tinta
da melancolia, para descrever as memórias póstumas de nossos passos perdidos neste primeiro
quarto do século, ainda sem nome, mas certamente muito distante do Século das Luzes.

Se há constatação inescapável é a de que estamos mais para o século das trevas, que
nossos antepassados ja ultrapassaram, e muito próximos das irracionalidades pretensiosas a
revestir nosso cotidiano de um obsessivo discurso de gralhas.

Apenas uma semana no governo, Trump semeia os grãos da discórdia, da tristeza, da


desumanidade, com a empáfia retórica de um Buda sonolento com ácidos refluxos de ódio.

À tristeza devastadora da faixa de Gaza se juntam agora as patrulhas armadas diante do


pranto inconsolável de imigrantes retirados à força de seus magros sonhos de pão e liberdade.

Animado, talvez por uma pulsão, que se Freud fosse vivo talvez denominasse de “Pulsão
de Herodes”, Trump extirpa os nascituros da cidadania redentora e, finalmente, acende a
primeira revolta de seu próprio povo contra o desrespeito ao preceito constitucional.

Outros conflitos virão, anunciados pelo desprezo granítico aos esforços da humanidade
contra os desastres climáticos que compuseram a música de fundo da cerimônia da posse
presidencial, destruindo a fogo as mansões de Los Angeles e soterrando no gelo as vias e
estradas de Washington, DC.

Triste sinfonia para um narcisista tóxico, a ter que fazer seu horrendo discurso inaugural
na Rotunda do Capitólio, a nos lembrar a todos, universo afora, a barbaridade dita patriótica do
6 de janeiro.

Não há como ainda não lembrar de Freud, quando, perguntado sobre o que achou da
Rotunda, Trump tenha dito que se havia maravilhado com “a excelência acústica” da sala, o que
não deixa de reconhecer que o bem ou o mal que ali ocorram chegam sempre aos ouvidos de
todos nós. Para nosso aplauso. Para nosso repúdio.

Ainda não satisfeito com o desmonte dos melhores passos de seus antepassados, Trump
anuncia com soberba a retirada dos Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde, como se
a epidemia da COVID19 não pudesse se repetir desta ou de outra forma e, mais do que nunca,
a pesquisa e o acesso a medicamentos fossem mais do que prioritários. Muito mais prioritários
do que as travessuras de Musk no Espaço.

Trump se esmerou em poucas horas a pisotear sobre os passos de Roosevelt e Churchill


na construção de um pós-guerra centrado no Direito Internacional. Os passos dos grandes
estadistas dos pós-guerra foram perdidos na memória de Trump, que se assanha em expor o
projeto regressivo-autoritário do MAGA, codinome "Nova-Diplomacia das Canhoneiras".

Não creio que os Estados Unidos da América, mergulhado no malévolo conúbio entre o
pior do capitalismo e a mais mercantilista das visões políticas, darão apoio a esta aventura.

325
Não me parece compatível com a essência da liberdade e da democracia americanas.

Trump tem dois anos para espargir sua insânia. Em 2026 haverá eleições para o
Congresso americano e minha convicção é de que o povo americano melhor equilibrará os
tradicionais “pesos e contra-pesos” do jogo diplomático. Pato manco hoje, pato assado em
2026.

Claro que muito dependerá da capacidade de reação da comunidade internacional e seu


compromisso com os ideais democráticos que nos unem.

Parece-me, por muitas razões, dentre as quais nossa responsabilidade como país
signatário original da Carta de São Francisco, a importância de nossa Diplomacia como defensora
dos princípios consagrados nas Nações Unidas e seus órgãos subsidiários.

Nosso compromisso maior é com o Direito Internacional, a igualdade jurídica dos


Estados , os Direitos Humanos internacionalmente reconhecidos e com uma ordem econômica
internacional justa e equilibrada.

Temos muito trabalho pela frente, talvez igual ou maior do que tivemos a partir dos anos
60, quando um equívoco de visão política nos fez confundir diplomacia com subserviência.

==*==

EM TEMPO

1. Com perdões por falar do meu clube, só o Itamaraty, depois de escolher um craque
como Mauricio Lyrio para coordenar o G-20, nos apresenta Corrêa do Lago, outro maestro, para
coordenar as negociações climáticas. E temos outros, fazendo linha de passe. Bela Instituição do
Brasil.

2. “Ainda estou aqui” não é um filme. É uma virada espetacular no cinema brasileiro, só
comparável ao encontro de Tom-Jobim com Sinatra na música brasileira. Só que, desta vez, o
responsável se chama Walter Salles.

3. É humilhante e mesquinho extraditar imigrantes ilegais em voos internacionais


acorrentados nas pernas e nas mãos. Seria bom levar para o Conselho de Direitos Humanos das
Nações Unidas. No mínimo. Ponto para o governo brasileiro que mostrou a diferença entre ser
humano e boiada.

326
CRÉDITOS DOS AUTORES DOS CADERNOS

Adhemar Bahadian - Diplomata aposentado do Ministério das Relações Exteriores do Brasil

Ana Helena Gigliotti de Luna Freire - Mestre em Relações Internacionais, especialista em


Divulgação e Popularização da Ciência, Analista de Gestão em Saúde, Cris/Fiocruz

André Lobato - Mestre em mídias globais e comunicações, doutorando UFRJ, membro das
equipes do CRIS e do Centro de Desenvolvimento Tecnológico em Saúde, Fiocruz

Augusto Paulo José da Silva - Biólogo, mestre em biologia, Moldova State University, assessor
e pesquisador, Cris/Fiocruz

Armando De Negri Filho - Médico, mestre em epidemiologia, doutor em medicina preventiva,


pesquisador visitante sênior do CRIS/Fiocruz

Bernardo Bahia Cesáreo - Pesquisador, CEE Fundação Oswaldo Cruz

Caio Murta - Graduando, Instituto de Relações Internacionais (IRI), Universidade de São Paulo

Claudia Chamas - Pesquisadora sênior, CDTS Fiocruz e Instituto Nacional de Ciência, Tecnologia
e Inovação em Doenças de Populações Negligenciadas

Claudia Hoirisch - Engenheira química, mestre em gestão e políticas de saúde, membro da


equipe do Cris/Fiocruz

Danielly P. Magalhães - Pós-doutora em saúde pública, doutora em química ambiental e mestre


em saúde pública, pesquisadora associada do CRIS Fiocruz, pesquisadora da Columbia
University, EUA

Deisy de Freitas Lima Ventura - Professora Titular e Coordenadora do Doutorado em Saúde


Global e Sustentabilidade da Faculdade de Saúde Pública da USP, Vice-Diretora do Instituto de
Relações Internacionais da USP

Denise Oliveira e Silva - Doutora em saúde pública, Pós Doutora em Antropologia, Pesquisadora
em Saúde Pública, Fiocruz Brasília

Diana Reyna Zeballos Rivas - Médica; Mestre em Medicina e Saúde; Doutoranda, Instituto de
Saúde Coletiva, UFBA

Eduardo Nilson - Doutor em Saúde Global e Sustentabilidade; Pesquisador em Saúde Pública,


Fiocruz Brasília

Erica Kastrup - Mestre em Saúde Global e Diplomacia da Saúde; Doutora em História das
Ciências e da Saúde; Analista do Cris/Fiocruz

Fabiane Gaspar - Assessora de Cooperação da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz; Graduação em


Comércio Exterior e Direito; Especialista em Saúde Pública; Mestranda em Direito Internacional

Felix Júlio Rosenberg - Médico veterinário, mestre em ciências médicas. Diretor do Fórum
Itaboraí, Fiocruz. Secretário Executivo da RINSP/CPLP, coordenador da Rede Latino-Americana
e do Caribe de Institutos Nacionais de Saúde Pública, IANPHI

Gisele Sanglard - Pesquisadora e docente da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz; Graduação em


História; Mestrado em História Social da Cultura; Doutorado em História das Ciências da Saúde

327
Heliton Barros - Pesquisador do Museu da Vida, Casa de Oswaldo Cruz, Fiocruz

Isis Pillar Cazumbá da Cruz - MBA em Gestão de Projetos e Relações Internacionais pela
Universidade Estácio de Sá. Assistente de pesquisa do CRIS/Fiocruz

João Miguel Estephanio - Pesquisador do CRIS/Fiocruz e Fiocruz Brasília

Juan Garay - Professor of global health equity in Spain (ENS), Mexico (UNACH) and Cuba (ELAM,
UCLV and UNAH); Pesquisador Visitante Sênior, CRIS/Fiocruz

Laurenice Pires - Assistente Social, mestre em Serviço Social, doutoranda em Saúde Pública na
Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca/Fiocruz

Luana Bermudez - Graduada em Relações Internacionais, Mestre em Saúde Pública, doutoranda


em saúde pública, assessora técnica da AISA/MS

Lúcia Marques - Jornalista, mestre em Saúde Pública, analista de gestão em saúde pública,
assessora Programa Fiocruz na Antártica, CRIS/Fiocruz

Luiz Augusto Galvão - Mestre em saúde pública, doutor em saúde coletiva. Professor adjunto
na Universidade Georgetown, EUA, e membro do Cris/Fiocruz

Luís Eugenio Portela Fernandes de Souza - Professor do Instituto de Saúde Coletiva da UFBA,
Vice-presidente / Presidente-eleito da Federação Mundial de Associações de Saúde Pública

Manuel Mahoche - Professor da Universidade Lúrio de Moçambique; Doutorando em


Epidemiologia, Faculdade de Saúde Pública. USP

Marciglei Brito Morais - Enfermeira e Historiadora, Mestra em Educação, Doutoranda no


Instituto de Saúde Coletiva da UFBA

Maria Auxiliadora de Souza Mendes Gomes - Pediatra, Doutora em Ciências, Pesquisadora e


Docente da Pós-Graduação em Saúde da Mulher e da Criança, Coordenadora de Ações Nacionais
e de Cooperação, IFF/Fiocruz

Maria Teresa Rossetti Massari - Enfermeira, Mestre em Saúde da Mulher e da Criança,


Coordenadora de Conteúdo do eixo Mulher e Criança do Portal de Boas Práticas, IFF/Fiocruz

Mariam Yacoub - Graduada em Ciências da Saúde, mestre em Saúde Pública e Inteligência de


Doenças Infecciosas. Trabalha no Colégio de Médicos e Cirurgiões de Ontário.

Miryam de Souza Minayo - Analista de relações internacionais, doutora em Direito e Relações


Internacionais, assessora e pesquisadora CRIS/Fiocruz

Nina Bouqvar - Mestranda em Análise e Gestão de Políticas Internacionais: Resolução de


Conflitos e Cooperação para o Desenvolvimento (MAPI) pela PUC-Rio e bacharela em Ciência
Política (UNIRIO)

Patrícia Lewis - Psicóloga, mestre em ciências pela USP, pesquisadora do Observatório Saúde e
Migração (OSM)

Paula Reges - Médica infectologista, Instituto Nacional de Infectologia Evandro Chagas


(INI/Fiocruz); pesquisadora do CRIS/FIOCRUZ

Paulo Esteves - Doutor em Ciência Política, Professor Associado do Instituto de Relações


Internacionais da PUC-Rio

328
Paulo Marchiori Buss - Médico, doutor em ciências. Professor emérito da Fiocruz, Coordenador
do Cris/Fiocruz, membro titular da Academia Nacional de Medicina, Presidente da Alianza
Latino-americana de Salud Global - ALASAG

Pedro Burger - Licenciado em História, Mestre em Economia Política Internacional, Especialista


em Saúde Pública, Coordenador adjunto do CRIS/Fiocruz

Rafael Gomes França - Doutorando da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo

Renan Amaral Oliveira - Mestrando em Relações Internacionais, UFBA; Bacharel em Ciências e


Humanidades e em Relações Internacionais, UFABC

Regina Ungerer - Médica, Doutora em Ciências, pesquisadora sênior do Cris/Fiocruz

Samia de Brito - Graduação e Mestrado em Relações Internacionais; Analista em cooperação


internacional, Instituto René Rachou Fiocruz Minas

Santiago Alcázar - Diplomata; Pesquisador Honorário do CRIS/Fiocruz

Sebastian Tobar - Sociólogo, Doutor em Saúde Pública, assessor de cooperação do CRIS/Fiocruz,


assessor da Aliança Latino-Americana de Saúde Global – ALASAG

Sonia Fleury – Doutora em Ciência Política, pesquisadora sênior do CEE, coordenadora do


Dicionário de Favelas Marielle Franco (wikifavelas.com.br)

Thaiany Medeiros Cury - Bacharel em Relações Internacionais, Mestranda em Análise e Gestão


de Políticas Internacionais, IRI/PUC-Rio

Tiago Nery - Doutor em ciência política e assessor de cooperação internacional do Instituto


Nacional de Infectologia Evandro Chagas (INI) da Fiocruz

Tomé Cá - Estatístico-epidemiologista, mestre em ciências econômicas e em saúde pública,


membro da Organização Oeste Africana de Saúde (OOAS/CEDEAO)

Vitor Rodrigues - Graduado em relações internacionais, assistente de pesquisa da Casa de


Oswaldo Cruz

Vitória Kavanami - Graduada em Relações Internacionais e bolsista da Casa de Oswaldo Cruz /


Fundação Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz)

329
Cadernos CRIS Fiocruz sobre Saúde Global e Diplomacia da Saúde
Desde abril de 2020 o CRIS vem produzindo Cadernos sobre Saúde Global e Diplomacia
da Saúde. Desde então, já foram produzidos mais de 105 Informes quinzenais. Os
interessados na coleção podem acessar o conjunto de Informes em:

https://portal.fiocruz.br/cadernos-cris

Seminários Avançados em Saúde Global e Diplomacia da Saúde


Desde setembro de 2020, o CRIS vem realizando os Seminários Avançados em Saúde
Global e Diplomacia da Saúde, sobre temas de alta relevância para este campo
conceitual e de práticas da saúde pública e das relações internacionais. Os Seminários
são um dos produtos do Observatório de Saúde Global e Diplomacia da Saúde. Entre
2020 e 2024 foram realizados 114 Seminários e, em 2025, estão programados 24
Seminários. Os Seminários são acessíveis em:

https://portal.fiocruz.br/seminarios-avancados-em-saude-global
ou

https://www.youtube.com/playlist?list=PLz0vw2G9i8v-
mMVaQPrzpQUQhqa-0obSN

Próximos seminários – Série 2025

Dia 12 de fevereiro – Governança e agenda da saúde global 2025

Dia 26 de fevereiro – Panorama demográfico e epidemiológico global:


situação atual e tendências

Os seminários são transmitidos ao vivo na página da Fiocruz no Youtube:


https://www.youtube.com/channel/UC5z5hsnZOZJH8vFacP-9poQ

330
FICHA CATALOGRÁFICA
FUNDAÇÃO OSWALDO CRUZ
Centro de Relações Internacionais em Saúde
Centro Colaborador OMS/OPAS em Diplomacia da Saúde Global e Cooperação Sul-Sul

Cadernos CRIS/FIOCRUZ sobre Saúde Global e Diplomacia da Saúde


Número: 01/2025
Período de 05 de dezembro de 2024 a 02 de fevereiro de 2025

Organizadores: PAULO MARCHIORI BUSS, ERICA KASTRUP e PEDRO BURGER

Fundação Oswaldo Cruz; Centro de Relações Internacionais em Saúde; Observatório de Saúde


Global e Diplomacia da Saúde; Centro Colaborador da OMS/OPAS para a Diplomacia da Saúde
Global e Cooperação Sul-Sul. Rio de Janeiro, 06 de fevereiro de 2025

331 pp; il.

Bibliografia: Inclui Bibliografias.

1. SAUDE GLOBAL. 2. DIPLOMACIA DA SAÚDE. 3. RELAÇÕES INTERNACIONAIS. I. Título.

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Nota: Os artigos dos Cadernos CRIS/FIOCRUZ sobre Saúde Global e Diplomacia da Saúde são
de responsabilidade de seus autores a as opiniões expressas nos mesmos não
necessariamente coincidem com as opiniões dos organizadores ou do Centro de Relações
Internacionais em Saúde da Fiocruz.

i https://www.s ustainabl ehealthe quity.org/we bnair


ii https://www. peah.it/20 24/0 7/13 556/
iii https://www. peah.it/20 24/1 0/ide ntifying-i nternational -s ustainable -health -models/
iv https://www. peah.it/20 24/1 1/the -price-of-global -injustice -in-l oss -of-human -life/
v https://www. peah.it/20 24/1 1/en ough -is -en ough -and-more -is -too-much-between -basi c-dignity-and-excess -hoar ding -thresholds /
vi https://www.who.int/a bout/g overnance/ constitution
vii https://www. peah.it/20 24/1 1/the -price-of-global -injustice -in-l oss -of-human -life/
viii https://www. peah.it/20 24/1 1/en ough -is -en ough -and-more -is -too-much-between -basi c-dignity-and-excess -hoar ding -thresholds /
ix https://www. nature.com/articles/ s4159 9-0 23-0221 0-y
x https://www. peah.it/20 23/1 2/12 800/
xi https:// prosperitydata360.worldbank. org/en/i ndicat or/UN +SDG+G B+X PD+RSDV+G D+ZS
xii https://www.e uronew s.com/next/202 4/02 /02/the-four -day -week-whi ch -countrie s-have -e mbraced -it-and-how-s-it-g oing -so-far
xiii https:// databank.worldbank. org/meta dataglossary/gen der-statistics/s eries/SI.P OV.GINI
xiv https://www.s cien cedire ct.com/topi cs/s ocial -scie nce s/global-publi c-goods
xv https:// open -s cien ce-traini ng-handbook.github.i o/Open -Scie nce -Training -Handbook_EN/ 02OpenS cien ceBa sics /03Open Resear chSoftwareAndOpe nSour ce.ht ml
xvi https://taxjustice.net/ press/w orld-l osing -hal f-a -trillion-t o-tax-abuse -largely-due-t o-8 -countries-bl ocking -u n-tax-re for m-a nnual -rep ort-fi nds /

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