Lázaro, Matos
REBELDIA EM REVISTA: JOÃO SALDANHA, AFONSINHO E
REINALDO NAS PÁGINAS DE PLACAR
João Pedro Prado Mercês Lázaro1
Rita de Cassia Aragão Matos2
Resumo: Como a revista Placar, durante o período ditatorial, construíu sentidos, em suas
publicações, sobre João Saldanha, Afonsinho e Reinaldo, personagens do universo do futebol
que, de alguma forma, confrontaram princípios e projetos defendidos pelo regime? Essa
questão norteou a construção do texto no intuito de analisar o futebol enquanto um fenômeno
complexo e dinâmico, para além da perspectiva estanque e unívoca que entende o futebol
apenas como “ópio do povo”. Além disso, analisar esses rebeldes do jogo da bola através das
páginas daquele que era o periódico esportivo brasileiro de maior circulação da época, nos
ajuda a ter um panorama sobre a própria Revista Placar em diferentes momentos da ditadura,
suas dinâmicas e complexidades.
Palavras chave: Futebol; João Saldanha, Afonsinho e Reinaldo; Revista Placar
Uprising in the magazine: João Saldanha, Afonsinho and Reinaldo on
the pages of Placar
Abstract: How did Placar magazine, during the dictatorial period, construct meanings, in its
articles and reports, about João Saldanha, Afonsinho and Reinaldo, characters from the
football universe who somehow conmonished principles and projects defended by the regime?
This question guided the construction of the text in order to analyze football as a complex and
dynamic phenomenon, beyond the watertight and unambiguous perspective that understands
football only as "opium of the people". In addition, analyzing the rebels of the ball game
through the pages of what was the most widely circulated Brazilian sports periodical of the
time helps us understand about the journal and its own dynamics and complexities.
Key words: Soccer; João Saldanha, Afonsinho and Reinaldo; Revista Placar
Rebeldía en la revista: João Saldanha, Afonsinho y Reinaldo en las
páginas de Placar
Resumen: ¿Cómo construyó la revista Placar, durante el período dictatorial, significados, en
sus artículos e informes, sobre Joao Saldanha, Afonsinho y Reinaldo, personajes del universo
del fútbol que de alguna manera conmonestó principios y proyectos defendidos por el
régimen? Esta pregunta guió la construcción del texto con el fin de analizar el fútbol como un
fenómeno complejo y dinámico, más allá de la perspectiva estanca e inequívoca que entiende
el fútbol sólo como "opio del pueblo". Además, analizar a los rebeldes del juego de pelota a
través de las páginas de lo que fue el periódico deportivo brasileño más difundido de la época
nos ayuda a entender sobre la revista y sus propias dinámicas y complejidades.
Palabras clave: Fútbol; João Saldanha, Afonsinho y Reinaldo; Revista Placar
1
Doutorando pelo Programa Multidiciplinar em Cultura e Sociedade (Pós Cult) do Instituto
de Humanidades Artes e Cultura (IHAC) da Universidade Federal da Bahia (UFBA).
[email protected] – Salvador – Bahia (Ba)
2
Professora Doutora do Instituto de Humanidades Artes e Cultura (IHAC) e do Programa
Multidiciplinar em Cultura e Sociedade (Pós Cult). [email protected] – Salvador – Bahia
(Ba)
Recorde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 1-28, jan./jun. 2020. 1
Lázaro, Matos
Introdução: Futebol, veneno?
“Pra frente Brasil”. Esse era o lema naqueles tempos de 1970. Estava
na Música tema da seleção para a Copa do mundo de futebol que aconteceria
no México naquele ano. A conquista consagraria um time que conseguiu
organizar em seu ataque cinco “camisas 10” juntos. Enquanto os onze davam
show em campos aztecas, em terras tupiniquins o Ato institucional nº 5,
publicado em 13 de dezembro de 1968, permanecia em vigor e implementava
ainda mais violência, controle, perseguição e autoritarismo. O triunfo do
selecionado naquela competição seria, em grande medida, capitaneado por
órgãos da propaganda ditatorial como efeito de uma nação que caminhava
rumo ao progresso. A euforia das ruas, associada as publicidade dos veículos
de comunicação, serviria para esconder o cenário real: porões e cárceres
manchados de sangue daqueles que pensavam um mundo diferente.3
A utilização do futebol como um dos mecanismos de publicidade de uma
visão positiva da ditadura empresarial militar brasileira4 contribuiu para
instituir, sobretudo nas ciências sociais e humanas, uma visão que reduzia o
velho esporte bretão ao patamar de “ópio do povo”, ou seja, instrumento
ideológico capaz de cegar as massas perante aos problemas da dominação.
Esse entendimento manteve-se por décadas hegemônico, e por conta dele
buscou-se pensar muito pouco outros caminhos à cerca da relação entre
futebol e Brasil.
Uma nova perspectiva começava a nascer em meados da década de
1980, visão que colidia diretamente com a interpretação que entendia o
ludopédio somente como um dos venenos do capitalismo e do poder
autoritário, e procurava analisar o futebol como “metáfora da vida”,
manifestação cultural carregada de complexidade e profundidade. Em
Universo do Futebol – Esporte e sociedade brasileira, Roberto Da Matta
organizou alguns ensaios preocupados em defender a possibilidade de
pesquisar esse fenômeno através da lupa sociológica, combatendo a visão
estanque que naturalizava o futebol e sua relação com a sociedade. O livro
surgiu como um oasis no deserto de pesquisas sobre temas a respeito da
relação entre cultura e sociedade. A partir dele podemos dizer que fundou-se
um momento de inflexão na forma de se observar o futebol enquanto essa
manifestação cultural complexa, que pode ser abordada através de prismas
diversos, detentora de “regras, objetos, cenários, personagens, tempo e
espaço”, conformada por um “conjunto de relações específicas” (DA MATTA,
1982, p. 15-16).
3
Carlos Fico apontou a Assessoria Especial de Relações Públicas (AERP) como estrutura
basilar na nova configuração que a propaganda do Estado tomou durante a Ditadura que se
instaurou a partir de 1964, procurando se distanciar dos modelos propostos por outro período
autoritário, o Estado Novo. A AERP procurava também se distanciar do próprio termo
“propaganda” vinculado ao projeto fascista, adotando a insígnia de “relações públicas”. Ver:
(FICO; 1997).
4
Denominamos a ditadura de “empresarial militar” com o objetivo de demarcar seu caráter
de classe, e identificar como, através dos governos autoritários que se seguiram desde 1964,
estava em curso a estruturação de um modelo de capitalismo para o Brasil. Sobre isso ver:
(SENA JUNIOR, MELO, CALIL; 2017).
Recorde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 1-28, jan./jun. 2020. 2
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Problematizar o futebol em sua complexidade, portanto, através da lupa
das ciências sociais e humanas significa, sobremedida, aborda-lo enquanto
“uma prática cultural” e “historicamente produzida” (RIBEIRO, 2004, p.1).
Analisar o futebol como objeto das ciências humanas, aqui parafraseando o
título do já bastante influente livro organizado por Flavio de Campos e Daniela
Alfonsi, passa por entendermos que pode ser visto e pesquisado através das
mais diversas abordagens, desde a literatura, passando pela relações de
gênero, masculinidade, violência, organização da cidade, elitização e
popularização, identidade.5
Influenciados por essa perspectiva mais abrangente em relação ao
futebol que revisitamos o período ditatorial, não para trata-lo de forma
unidimensional, como os equipamentos de propaganda do governo e alguns
estudiosos “apocalípiticos”6 sugeriam essa manifestação cultural bastante
popular, mas procurando a complexidade daquele mundo, universo no qual
a dominação se apresentava cortada por contradições, descaminhos e tensões,
elementos próprios do processo histórico.
Alguns trabalhos já revisitaram o período a partir do golpe de 1964 com
o objetivo de repensar a visão estanque a respeito do esporte de origem bretã
e, pesquisa-lo a partir de outros olhares, para além de seu vínculo com projeto
nacionalista hegemônico. Não há desacordo a respeito de como o Estado
ditatorial utilizou o futebol, desde a publicidade do título da Copa de 1970,
passando pelo controle de corpos através de um modelo de preparação física,
até a nomeação de militares para a direção de instituições como a
Confederação Brasileira de Desportos (CBD). A curiosidade de saber se não
houveram descaminhos, dissonâncias, desrazões (como diria Michel de
Certeau), nesse processo de dominação, impulsionou, por sua vez, outras
perspectivas de pesquisas. Surgiu a necessidade de descurtinar sujeitos que,
de formas variadas, representavam, eles próprios, descompassos nas
dinâmicas de dominação do poder estabelecido, e cada um ao seu modo,
problematizaram posturas e normas estabelecidas.
Nesse caminho destacamos aqui três personagens que durante a década
de 1970 tiveram algum tipo de conflito com princípios ditatoriais, foram
perseguidos e confrontaram-se contra regras autoritárias daqueles anos de
chumbo: João Saldanha, Afonsinho e Reinaldo. Abordar as ações inisurgentes
desses sujeitos não configura, no entanto, uma prática inédita. Destaco os
trabalhos, de Euclides de Freitas Couto que, através da perspectiva que
entende o universo esportivo futebolístico enquanto um lugar de disputas,
tratou de uma série de sujeitos que, através de suas posturas, incomodaram
o status quo, e José Paulo Florenzano que, ao tratar de Afonsinho, atribuiu a
ele a alcunha de rebelde, referência definida pela sua capacidade de, através
de sua individualidade, apresentar posturas que confrontaram um sistema de
ordenamento que procurava controlar e padronizar corpos e comportamentos.
5
Para termos uma noção dessa vastidão temática sobre a qual o futebol, enquanto tema de
pesquisa científica, pode ser abordado nas mais diversas áreas de conhecimento, ver: GIGLIO,
Sergio Settani. SPAGGIARI, Enrico. A produção das ciências humanas sobre o futebol no
Brasil: um panorama (1990-2009). Revista de História, São Paulo, n. 163, p. 293-350,
jul./dez. 2010.
6
Utilizamos aqui a terminologia criada por Humberto Eco para designar a visão que entende
elementos da cultura de massas estritamente como instrumentos de dominação ideológica
vinculado as classes dominantes.
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Se não está nos rebeldes escolhidos o ineditismo da abordagem, ele está
na perspectiva de entender como um órgão de mídia específico os abordou em
suas páginas. A partir da perspectiva que entende também o campo jornalístico
como um lugar de disputas, a intenção será entender como a recém criada
Revista Placar abordou esses sujeitos em suas páginas, entendendo-a
enquanto órgão de produção de sentidos sobre o futebol naqueles tempos.
Através de suas narrativas pretendemos entender como ela tratou esses
indivíduos cujos comportamentos se desviavam do padrão de jogador de
futebol docilizado e controlado, num tempo no qual o controle era parte de um
projeto, tanto no futebol quanto na mídia.
Porquê a Revista Placar?
Colocada em circulação permanente a partir do dia 21 de março de
1970, a revista Placar nasceu carregando a responsabilidade de ser o veículo
de comunicação especializado em esportes de uma editora com 20 anos de
experiência de publicações no mercado editorial brasileiro. A Editora Abril,
vinculada a Victor Civita desde 1950, contava, quando Placar foi lançada, além
dos direitos de publicação das revistas em quadrinho da Disney, principal
responsável pela sua manutenção e consolidação durante seus primeiros
anos, dos títulos: segmentados (Claudia, Capricho e Quatro Rodas) e
variedades (Realidade e Veja).
Capricho, primeira revista da editora, criada em 1952, trazia em suas
páginas fotonovelas e os ídolos do rádio daqueles tempos, chegando a ser
recordista de vendas, atingindo o ápice de, no ano de 1961, em três meses,
vender mais de 500 mil exemplares. Quatro Rodas ganhava as ruas oito anos
depois de Capricho. Projetado como um períodico intencionalmente articulado
a industrialização brasileira, que tinha nas multinacionais automobilísticas,
com perdão do trocadilho, seu carro chefe, procurava pedagogizar o público
masculino ao consumo de veículos, associada ao turismo através da crescente
malha rodoviária que buscava cortar o território nacional. O público feminino
enquanto consumidor de bens materiais também era alvo de Abril. Através da
Revista Cláudia procurava-se difundir um modo de vida feminino, cujos
produtos e as ideias publicizadas, em grande medida, buscavam normatizar
os comportamentos e reduzir a atuação das mulheres ao espaço doméstico.
Na segunda metade da década de 1960 a editora colocaria em prática
dois projetos ambiciosos: Realidade e Veja. A primeira, de estilo Life, dizia
trazer em suas páginas o que a sua editoria chamava de temas de interesse
nacional (MIRA, 1997, p. 66). O título chegou a apresentar a vendagem recorde
de mais de 500 mil exemplares em apenas seis meses de circulação, o que
ganhava maior relevância se levarmos em conta que o periódico era mensal.
As primeiras duas décadas da editora, no entanto, não foram só de
glórias, houveram experiências te publicações mal sucedidas, no entanto
essas que se consolidaram no mercado abriram caminho para a construção
de uma tradição jornalística de Abril, tradição essa fundamental para a
criação da revista que se tornaria a voz políticoideológica da empresa (MIRA,
1997, p. 118) . Veja nascia com pretensões de grandeza, visível desde a
mobilização da empresa para o seu lançamento cuja intenção era difundir
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números por todo o território nacional, até sua estreita relação com o grupo
multinacional de notícias Time Life, um dos responsáveis pela expansão do
capital internacional na América Latina no campo das empresas editoriais.
Enquanto um método editoral, o formato Time caracterizava-se por
publicações semanais de notícias, modelo que marcaria a maioria das revistas
lançadas posteriores a Veja, dentre elas Placar.
Os primeiros vinte anos de Abril marcaram a história de uma empresa
que nasceu editora porém, ao ampliar seu parque industrial e sua capacidade
de distribuição, potencializou-se enquanto grupo ainda em 1966, quando
investiu no ramo dos fascículos, coleções, listas telefônicas, livros e discos,
marcas do empreendimento Abril Cultural. Nascia alí um frondoso galho da
arvorezinha.
Se por um lado todo esse percurso mostrava a história de uma empresa
que criava corpo e se consolidava em território brasileiro, tembém em contato
com a expansão de uma lógica empresarial de administração e organização do
trabalho editorial, bem como da própria ampliação do capitalismo
internacional (SILVA, 2005), tornando-se agente efetivo no processo de
mundialização da cultura que tomava o país, sobretudo a partir da década de
1970, uma das marcas para a inserção nacional no processo de Indústria
Cultural (ORTIZ, 1988), por outro nos conduzia ao lançamento de Placar como
parte de seu projeto de segmentação, enquanto revista especializada em
esporte da editora.
Se um dos lemas de Victor Civita era “ir de encontro a todos os
segmentos do mercado” (MIRA, p.65-66), ou seja, produzir revistas
direcionadas aos públicos e seus interesses7, faltou até 20 de março de 1970
um periódico da editora que tratasse do fenômeno esportivo mais popular no
país, o futebol.
Após a circulação de quatro números experimentais, com o objetivo de
prospectar o mercado e trabalhar editoralmente a revista, Placar “entrava em
campo”. Lançada intencionalmente às vésperas da Copa do Mundo de futebol
que aconteceria no México, naquele ano, a capa da edição inaugural, além de
outras manchetes com menor destaque, trazia em primeiro plano a imagem
de Pelé erguendo a taça Jules Rimet. A imagem era significativa pois carregava
em si uma série de significados. Os mais evidentes eram a utilização, no
periódico, do binômio Campeonato Mundial e Pelé. Através da conexão desses
dois signos Placar era lançada ao mercado. Essa conexão aparecia como a
imagem a ser utilizada por uma revista recém criada que buscava se
consolidar no universo editorial do país.
Se a Copa do Mundo, por um lado, carregava em si, desde 1938, o signo
do nacionalismo, momento em que todos brasileiros eram conclamados a se
unificar em torno do selecionado de futebol, já que a vitória dos onze aparecia
no imaginário coletivo e era reforçada pela mídia como o triunfo de todo o
7
Além do caráter subjetivo dos gostos fragmentados aos quais a editora procurava atingir,
entendemos, dialeticamente, que também as revistas, dentre elas as da editora Abril,
buscavam produzir e interferir nos seus públicos, organizavando, até mesmo, seus gostos.
Chamamos atenção, através dessa perspectiva, para o caráter pedagógico dos veículos de
comunicação, que através de suas linhas editoriais, abordagens das matérias, produtos
propagandeados, produziam e disseminavam sentidos e visões de mundo publicamente em
circulação.
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povo. Por outro lado, a marca simbólica da competição enquanto aglutinador
nacional associava-se a figura de um ídolo. Pelé naqueles tempos já havia
participado de três Copas, havendo conquistado duas delas. Era reconhecido
nacionalmente e internacionalmente como o melhor jogador do mundo,
carregava em si, segundo o conceito de Pierre Bourdieu, seu próprio Capital
simbólico. Nada mais auspicioso, portanto, para um veículo recém fundado
em busca de consolidação no mercado.
Mesmo que o vínculo com a editora Abril já atribuísse, em certa medida,
um lugar de respeito na cena editorial, alguns elementos apresentados ainda
na primeira edição da revista nos ofereciam indícios sobre a necessidade que
a própria apresentava de construir uma narrativa sobre si que fundamentasse
sua história particular, ou seja, elementos que produzissem sobre si uma
identidade própria.
O texto que marcava a construção dessa narrativa foi escrito por Victor
Civita. Naquele momento ocupava o lugar de diretor e editor principal da
Revista. Sob o título de Carta do editor apresentava o períodico ao seu público
e construía sentidos sobre a fundação de Placar, vinculando o projeto do
periódico ao ano de 1950, por acasião do campeonato mundial de futebol
organizado em terrras brasileiras e do quanto o evento havia afetado as
pessoas em geral, inclusive ele e aqueles que o ajudava na construção de Abril
quando, “mesmo preocupados em consolidar as bases da editora foram
contagiados pela ‘febre de Copa’ passando a viver aqueles dias de julho sob a
temperatura altíssima de incontidas emoções”.
Utilizando a Copa do Brasil e a própria memória produzida sobre o
evento, o editorial construía sentidos sobre o semanário recém lançado e
vinculava sua trajetória a própria história da editora. Segundo Civita, durante
esses vinte anos que antecedeu sua efetivação, “dentro da Editora Abril a ideia
de Placar continuava fermentando”, e “muitos projetos dessa revista foram
produzidos, lidos, revistos, analisados e guardados”. Demorar tanto tempo
para produzir uma revista, portanto, não significava, a partir do texto,
negligência ou esquecimento para com um assunto tão popular no Brasil, mas
o tempo necessário para “estarem prontos”, o que se materializava naquele
número, não antes de lançarem quatro publicações experimentais, frutos de
“dois meses de intensa movimentação, durante os quais a revista nasceu,
transformou-se e chegou a a sua forma final” (REVISTA PLACAR. São Paulo:
Editora Abril, número 1, 20 março 1970. p. 38).
O Carta do Editor, no entanto, mais do que contar o percurso dos fatos,
construía um discurso fundador sobre a revista “inventando um passado
inequívoco e empurrando um futuro pela frente”, dando a “sensação de
estarmos dentro de uma história de um mundo conhecido” (ORLANDI, 2003,
p. 12). Através desse discurso o editor procurava familirizar o empreendimento
Placar ao público, utilizando e reforçando a memória de um evento sobre o
qual construíram e solidificaram interpretações relacionadas a própria
identidade brasileira e sua relação com o futebol. Procurava-se, portanto,
vincular a revista a construção de uma tradição nacional associada ao jogo da
bola.
Porém, esse não aparecia como o único elemento na construção do
discurso fundador de Placar. A essa fala que reforçava um vínculo histórico
do Brasil com esporte bretão, portanto uma tradição do país para com o jogo,
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unia-se uma outra argumentação que vinculava a revista a um projeto
moderno de jornalismo esportivo. O padrão de modernidade estaria vinculado
ao que Civita chamou de uma “nova mentalidade”, onde “a paixão clubística,
as preocupações pessoais, os interêsses menores foram substituídos pela
crítica construtiva, pela análise ponderada, pela reportagem desassombrada
e imparcial” e concluía reforçando que seriam esses os princípios de uma
“filosofia de Placar” Filosofia que teria seus agentes para coloca-la em prática,
definida no texto a partir da reunião de “uma equipe jovem, talentosa e
altamente profissional” (REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número
1, 20 março 1970. p. 38).
Uma tradição, vinculada à prática do jogo da bola, unia-se alí a uma
outra tradição, configurada pela necessidade contínua de dizer-se moderno
(ORTIZ, 1988). A noção de modernidade, por sua vez, estava diretamente
vinculada, naquele momento, a um contexto de consolidação de uma
sociedade de consumo e um mercado de bens culturais brasileiro,
caracterizado, sobretudo, em função da complexidade pelo que passava a
divisão do trabalho, caracterizado por uma racionalidade empresarial e
marcado pela ideia de profissionalização que configurava uma relação de um
tipo novo entre empresa e funcionário.
A própria estrutura organizativa de Placar demonstrava essa
complexidade que tomava as relações de produção do mercado de bens
culturais. A equipe a qual o dono de Abril se dirigia não se resumia a
jornalistas, como Michel Laurence e José Maria Aquino (ganhadores do premio
Esso de 1969), mas a toda uma estrutura de diretores, editores, fotográfos,
redatores e reporteres. Estrutura que estrapolava a sede em São Paulo e se
ramificava pelo Brasil e no mundo através do intitulados Escritórios
Regionais. A revista tinha representações nas capitais: Rio de Janeiro,
Brasília, Recife, Belo Horizonte, Curitiba, Porto Alegre, Salvador. Além disso
correspondentes em Nova York, Paris, Roma, Londres e Tóquio. A
especialização e racionalização da revista se apresentava ainda através de
duas divisões denominadas: Serviços editoriais e Serviços fotográficos, ambas
com diretoria e ordenamentos autonomos. Além de um Departamento
comercial próprio do periódico, cujo objetivo era pensa-lo como um produto
de mídia e sua potencialização mercadológica.
Da trajetória da editora Abril até a publicação de Placar, passando pela
estratégias diversas da revista esportiva recém lançada para se consolidar no
mercado, métodos que iam desde a utilização de símbolos como Pelé e a Copa
do Mundo de futebol, até a contrução de si, unindo um discurso que se
apropriava do futebol como um elemento tradicional brasileiro a uma ideia de
jornalismo moderno, tanto através das matérias publicadas quanto a partir
da sua complexa estrutura organizacional que expressava um novo modelo
nas relações que conformavam um mercado de bens simbólicos no Brasil, nos
oferecem elementos, tanto para entender o lugar de Placar no universo
editorial brasileiro quanto suas pretensões de se tornar, aquilo que acabou
virando, o principal periódico esportivo do país, revista que desde seu
lançamento procurava cobrir e distribuir suas publicações sobre a prática
esportiva em geral, sobretudo do futebol, no Brasil e no Mundo.
No contexto mais violento da ditadura empreserial militar, quando o Ato
Institucional N° 5 imperava juntamente com o Estado de Segurança Nacional,
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e a censura atuava cotidianamente interferindo em publicações das mais
diversas, Placar era criada. Pesquisando a Revista em suas primeiras
publicações, o historiador João Malaia apontou cominhos de análise para
jornalismo esportivo em períodos de exceção nos quais vigorem a censura
prévia. Defendeu que no periódico podemos identificar “a presença de um
discurso político crítico de grande amplitude, possibilitado por duas licenças,
a esportiva e a humorística”, no entanto percebe-se, em momentos, uma
“linha tênue entre a crítica e a necessidade e/ou opção ideológica de
alinhamento com o regime em vigor” (MALAIA, 2012, p. 153).
Essas características, no entanto, podem coexistir numa mesma
publicação em matérias distintas ou em edições diferentes, dependendo do
assunto que está sendo abordado, de uma mudança de perspectiva polítca
editorial, do interesse mercadológico do periódico. Assim, aquele
empreendimento que se dizia ocupar um lugar diferente na forma de se fazer
jornalismo esportivo e que mabilizava-se para ganhar espaço no mercado,
produzia sentidos por diversos aspectos do universo esportivo,em geral, e
futebolístico, no particular. Alguns desses sentidos serão aqui tratados
através do discurso de Placar.
Um dos principais temas abordados era a Copa do Mundo do México e
a preparação do selecionado brasileiro para a competição. Vinculado a esse
tema aparecia a questão Saldanha, mais precisamente a crise pela qual
passava João Saldanha na direção do time canarinho. Exatamente no
momento em que Placar entrava em circulação as críticas a respeito das
posturas do técnico, em torno da opinião pública, ficavam ainda mais
contundentes, e sobre o assunto o periódico esportivo da editora Abril
procurava abordar em suas páginas, através de reportagens, entrevistas,
artigos, crônicas.
João Saldanha: “João Sem Medo”, “João Quixote”, “João Domador”
Em dezembro de 2012, mais de quarenta anos depois da demissão de
João Saldanha da direção técnica da seleção brasileira, o jornalista carioca
Lúcio de Castro, à época contratado da ESPN, foi taxativo em afirmar:
“Nenhum personagem ligado ao esporte foi mais vigiado pela ditadura do que
João Saldanha. Nem de perto. Depois de um longo mergulho nos arquivos da
ditadura, é possível fazer tal afirmação com segurança” (BLOG DE LÚCIO DE
CASTRO, ESPN, 03/052010, A implacável vigilância sobre João Saldanha).
Ancorado na documentação que alicerçou a produção de Memórias do
chumbo – o futebol nos tempos do condor, série de documentários a respeito
da relação entre o futebol e as ditaduras do cone sul, o historiador e jornalista
comprovava aquilo que a maioria desconfiava. A suspeição contínua do João
para o regime.
A sua própria trajetória demonstrava seu perigo aos olhos daqueles que
dirigiam o país. Saldanha se filiara ao partido comunista ainda na década de
1930 durante o Estado Novo e permanecera com vínculos a ele até sua morte
em 1990. Assumiu o cargo de Secretário Geral da União da Juventude
Comunista (UJC), e posteriormente o posto de presidente da UJC, durante o
governo de Eurico Gaspar Dutra, com o Partido Comunista Brasileiro (PCB)
na ilegalidade. Mais tarde, em 1953, teve participação destacada na
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organização da greve dos 300 mil. Associada a essa vida política intensa
existia o seu vínculo com o futebol e o jornalismo esportivo. Em 1957 se tornou
técnico do Botafogo do Rio de Janeiro, um dos melhores times do Brasil na
época. Sagrou-se campeão carioca dirigindo craques, campeões mundiais,
como Garrincha e Nilton Santos. Sua popularidade crescia entre os brasileiros
através do vínculo com o clube e a partir da visibilidade adquirida pela sua
participação em programas do rádio e da televisão. Compôs, junto com Nelson
Rodrigues, Luiz Mendes e Armando Nogueira, um dos mais conhecidos
programas de debate esportivo brasileiro, na TV Rio, Canal 13 (SITE DO PCB.
03/07/2017. 100 anos de João Saldanha, o comunista que o povo consagrou).
O fiasco do selecionado brasileiro no campeonato mundial de futebol,
em 1966, quando todos esperavam o terceiro título consecutivo, causou
escoriações difíceis de cicatrizar. Na Inglaterra o time canarinho havia feito
sua pior campanha desde a Copa da Itália em 1934. O que antes era altivez e
puro otimismo, passava a ser desconfiança e temor. As críticas da imprensa
se multiplicavam nos diferentes meios de comunicação. O escrete iria disputar
as eliminatórias para a Copa de 1970, e, como tática para tranquilizar a
opinião pública, a Confederação Brasileira de Desportos (CBD), na figura de
seu presidente João Havelange, contratou aquele que era o mais influente e
crítico jornalista esportivo brasileiro à época. Contrariando o sentido das
coisas, já que a CBD mantinha contato direto com instituições militares como
a comissão de desporto do exército, João Saldanha foi convidado para ser o
técnico da seleção. O sucesso aconteceu de forma imediata. A seleção
conquistou o título invicto nas eliminatórias, com seis vitórias em seis jogos,
o que assegurou a participação do time na competição mundial no México.
Acalmados os ânimos, aplacadas as críticas da imprensa, autoestima
restabelecida, Saldanha cumprira seu papel, não poderia continuar naquele
posto alguém incontrolável como “João Sem Medo”, comunista por convicção
e princípio, principalmente naqueles anos de maior perseguição do regime.
No primeiro semestre do ano de 1970 entrava em circulação Placar.
Periódico do grupo Abril especializado em esportes. Como não poderia deixar
de ser, o futebol tomava a maioria de suas páginas, principalmente os temas
seleção e Copa do Mundo. João Saldanha protagonizava as matérias
principais das primeiras edições do semanário. Número experimental de
Placar, datado de 20 de fevereiro, as seguintes manchetes de capa chamavam
atenção. Em caixa alta e explicando uma foto em preto e branco de Saldanha
solitário com uma bola na mão, a expressão: “ACORDA, JOÃO!”. Ao lado, como
que um complemento da primeira manchete, também em caixa alta a frase,
como que um ultimato: “AIMORÉ EXCLUSIVO: SALDANHA NÃO PODE
PERDER DA ARGENTINA” (REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril,
número 1, 20 março 1970. p. Capa).
Através da capa dessa edição indícios daquilo que seria a tônica da
maioria das publicações de Placar até a demissão de Saldanha, a crítica e
vigilância persistente e sistemática sobre o técnico da seleção. A composição
da fotografia produzia sentidos ainda mais evidentes quando associada ao
aviso de Aimoré Moreira. Saldanha estava sozinho, na berlinda, o preto e
branco do retrato dava a ele um tom triste e antigo, como se o técnico
começasse a fazer parte do passado da seleção.
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No interior da revista, nas matérias que aprofundavam as chamadas da
capa, os sentidos produzidos pelo periódico ficavam ainda mais evidentes. Em
coluna nomeada Tiro Livre, assinada por Hamilton Almeida, uma série de
questões eram dirigidas ao técnico. As perguntas iam no sentido de interpela-
lo sobre suas convicções para um amistoso contra a seleção da Argentina que
aconteceria no estádio do Beira-Rio, em Porto Alegre. A coluna inquiria sobre
o time que seria escalado, a confiança do técnico entre os jogadores, o tipo de
futebol praticado pelo escrete, se Saldanha não lembrava da decepção de
1950, se estava treinando realmente a seleção, se continuava jornalista e, por
fim, se já havia pensado na possibilidade de perder a Copa (idem. p. 2).
Para cada pergunta o colunista tinha a sua resposta, e todas iam no
sentido de que a direção técnica de João Saldanha havia chegado ao limite,
seja por causa de sua incapacidade para escalar um time, seja pela confiança
perdida, pela falta de prioridade e compromisso com a seleção. Segundo o
texto, essas características causavam medo e insegurança no povo brasileiro,
que não mereciam passar por outra tragédia como a de 1950.
Medo, insegurança. Segundo as publicações de Placar esses eram
sentimentos presentes suscitados pela instabilidade provocada, naquele
momento, por João na direção do escrete. O termo medo apareceu de forma
significativa no periódico também nessa edição experimental. A revista
louvava a contratação exclusiva do último técnico brasileiro campeão
mundial. Aimoré Moreira tornava-se um de seus comentaristas, com a
autoridade de quem dirigiu o selecionado a um título mundial e de quem
“deixou os campos para escrever o jôgo da verdade do nosso futebol” (Idem. p.
37). Em seu primeiro editorial o título: “O Brasil tem medo”. Duas
interpretações podem ser observados a partir da relação título e texto. Uma
primeira que tratava “Brasil” como sinônimo de seleção e apontava que os
atletas do selecionado estavam amedrontados com o jogo, e uma segunda, que
dizia respeito a nação, temerosa da derrota, não apenas no amistoso contra o
time argentino, mas para a Copa do Mundo.
Esse medo fora disseminado na maioria dos textos publicados por
Placar enquanto Saldanha foi técnico da seleção. Mais do que isso, esse
sentimento foi personalizado, individualizado na figura de um personagem
que significava mais que um técnico de futebol. Isso ficou evidente na última
publicação experimental antes do primeiro número permanente do periódico.
Novamente a coluna “Tiro Livre”, agora assinada com o nome “redação”,
questionava a relação entre técnico e jornalismo. O texto deixava entender que
Saldanha negligenciava a seleção para proteger a si próprio através de sua
concomitante atividade jornalística, tratada pelo artigo como uma atividade
política, preocupante naquele momento em que a equipe necessitava de um
“bom técnico em tempo integral”, compromissado com seu trabalho e
equilibrado diante das críticas. (REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril,
número 0-3, 1970. p. 13).
As críticas ao comandante do escrete canarinho eram sistemáticas e
abarcavam uma série de características, que iam desde o próprio jogo,
organização e modelo tático, até sua personalidade, tratada como controversa
e instável. Nas publicações da revista o caráter emocional de “João Sem Medo”
piorava os problemas técnicos dos jogadores. Todos os defeitos atravessavam
a prática de Saldanha como técnico, desde a escolha dos jogadores que
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Lázaro, Matos
tivessem as características para uma equipe vencedora, passando por uma
organização tática defensiva definida, até a tranquilidade necessária para
esses atletas praticarem seu melhor, com “força e garra”. Saldanha era,
naquelas publicações, a expressão máxima da instabilidade emocional que
afetava a execução de um trabalho consistente. A Seleção era “um time
nervoso, do técnico ao ponta esquerda” (Idem. p.11).
Segundo a revista, o projeto Copa do Mundo estava profundamente
ameaçado. Em 13 de março uma chamada dizia: “Ainda é tempo de mudar”
(PLACAR, 13/03/1970, p.2) (REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril,
número 0-6, 13 março 1970. p. 2).
No texto da coluna “Tiro Livre” a expressão do que deveria ser mudado:
o técnico. Não mais lembravam-se da campanha de um ano atrás nas
eliminatórias, daquele que transformou um coletivo de jogadores, deprimidos
pela derrota em 1966, em uma equipe coesa e vitoriosa. A demissão do “João
Domador” era condição basilar para a reestruração necessária, não só pelo “4-
2-4 ridículo” que havia colocado contra os jogadores argentinos, mas também
por ser jornalista, e fundamentalmente pelo seu destempero, que fomentava
“intranquilidade e desconfiança” no ambiente (Idem, Ibdem).
Como última cartada cabia alguém tentar controlar o ímpeto do técnico.
Essa função destinou-se àquele que Placar caracterizou como “o austero
presidente da CBD”, o outro João, Havelange. No entanto a tarefa seria árdua,
já que “o domador” afundava a seleção em crise. A revista não relutou em
enumerar “a evolução da crise”: Acusação ao médico do Santos; Invasão, com
revólver em punho, à concentração do Flamengo; Tentativa de agressão a um
jornalista.
Em meio a todos esses fatos, o técnico, de “domador” passava a ser
“Quixote”, lutando sozinho contra lógica que compunha todo departamento
da CBD. Diante da instabilidade plena e da solidão inconteste de João
Saldanha, Placar arrefecia seu discurso, e defendia, não a demissão, que
acarretaria uma “completa reestruração na Comissão técnica, atingiria os
jogadores, derrotaria o Brasil”, mas a transformação do técnico, de sua
personalidade contestadora. Dociliza-lo era necessário, faze-lo ceder em suas
convicções e princípios. O impossível. (REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora
Abril, número 1, 20 março 1970. p. 5)
O inevitável aconteceu. O “Quixote”, desgastado e solitário, foi demitido.
João Saldanha chegou a questionar: “porque vocês não discutem o técnico
Saldanha em vez de discutirem o homem Saldanha?” (REVISTA PLACAR. São
Paulo: Editora Abril, número 2, 27 março 1970. p. 8). A verdade é que era
impossível, porque o que incomodava era o homem, aquele que não tinha
papas na língua, incontrolável e comunista. O João Sem Medo, aquele que
entrou em rota de conflito com “o ditador”, que se recusara a jantar com o
General Médici, a convocar Dario. O mesmo que respondeu: “o presidente
escala o ministério e eu escalo a seleção”.
Placar não deixou de expressar o conflito em torno da convocação de
Dadá nas suas páginas. Datava de 13 de Março de 1970, junto a fotografias
do atacante do Atlético Mineiro e do Internacional de Porto Alegre, a legenda:
Um dos dois poderá ser o companheiro de Pelé. O primeiro, com
a camisa do Atlético Mineiro, deixou de ser o inexpressivo
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Lázaro, Matos
jogador do Campo Grande, Rio, e se transformou num grande
ídolo de Minas. É o preferido do Presidente da República: Dario.
O segundo é o artilheiro do clube mais popular do Rio Grande
do Sul e o jogador preferido de João Saldanha: Claudiomiro
(REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número 0-6, 13
março 1970. p. 13).
No texto acima a revista focava na polarização entre o comandante da
seleção e o chefe do executivo nacional. Era sabido todo vínculo de João com
o PCB, além de suas críticas ao regime. O periódico se aproveitava disso para
criar ainda mais tensão relacionada ao já questionado Saldanha. Mas não
apenas com o militar mor da nação eram os embates do “Quixote”. Brigou com
Admildo Chirol, integrante da comissão formado na Escola de Educação Fisica
do Exercíto, que tinha uma ideia de treinamento fundamentada no controle e
na disciplina total para a formação de corpos atléticos. Pronunciou-se sobre o
assistente de Antonio do Passo, diretor de futebol da seleção. Enviado do
exército atendia pelo nome de Capitão Bonetti, a quem Saldanha “definiu sua
antipatia antes do embarque de Bogotá para Caracas. Disse que Bonetti não
era ninguém e que na comissão técnica não passava de um quebra-galhos e
um marcador de passagens”. Travou batalha contra qualquer interferência
que parecesse externa ao time que comandava. Foi exatamente isso que o
derrubou. As constantes críticas da mídia abalou aquilo que o fizera ser
convidado e o fio que o segurava no cargo: a popularidade. Segundo Placar o
cerco fechou com um ultimato ao outro João, o Havelange. Recebeu a
informação de que o “govêrno estava muito interessado na seleção brasileira”
e caso “não fizesse nada o govêrno poderia virar-se contra ele.” (REVISTA
PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número 2, 27 março 1970. p. 8). E
Havelenge, como o bom camaleão que provou ser ao longo de sua vida como
dirigente de entidades de futebol, montou a cena para a demissão de
Saldanha. Afinal, “Soldado mandado não tem crimes”.
Através da demissão de João Saldanha a contestação ia embora, o
técnico que gritava aos sete ventos sobre a militarização do selecionada ao
dizer que um determinado Capitão não passava de um “marcador de
passagens”, perdia seu lugar de comando e com sua saída, as portas eram
abertas a sistematização de uma comissão militar através: do chefe de
delegação , o brigadeiro Jerônimo Bastos; da segurança, sob responsabilidade
do major Roberto Guaranyr, supervisionada pelo capitão Cláudio Coutinho,
também preparador físico. Preparação física que tinha a presença ainda dos
capitães Kléber Carneiro e Benedito José Bonetti, complementada pelo
subtenente Raul Carlesso para preparador de goleiros (FRANCO JUNIOR, p.
142).
Um homem como Saldanha no comando da seleção causava temor ao
regime. Ele era incontrolável. Durante o sorteio dos grupos da Copa do Mundo
“entregou um dossiê denunciando mais de 3000 presos políticos e centenas
de mortes e torturas produzidas pela ditadura brasileira” (SITE El PAÍS,
03/07/2017, João Saldanha, o técnico que atormentou a ditadura). Um
sujeito como esse não poderia carregar os louros de um título de Copa do
Mundo do esporte mais popular do Brasil. O quanto de perigo ele representava
ao sistema autoritário caso denunciasse ao planeta, como técnico campeão
mundial, o quão sanguinário e tirano era o governo brasileiro? A simples
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possibilidade disso acontecer apavorava os generais, que não esperaram para
ver.
Prezado amigo Afonsinho
Assim como Saldanha, outro botafoguense também incomodou o regime
com seu jeito inquieto, questionador e inconformado. Afonsinho não havia
ainda chegado ao clube alvinegro do Rio de Janeiro quando o “Sem medo” foi
campeão carioca em 1957, mas o germe da rebeldia, que tinha em Saldanha
uma expressão contumaz, ganhava mais uma referência no mundo desportivo
em finais da década de 1960. Chegara na escolinha do time de General
Severiano um ano antes da Copa da Inglaterra e um ano depois do Golpe
brasileiro. Aquele menino, sonhando em se tornar jogador profissional, ainda
não sabia mas esses dois eventos reverberariam direta ou indiretamente na
sua vida. Florenzano (1998) defende a tese de que a forma como se
desenvolveu a Copa do Mundo de futebol de 1966 influenciou profundamente
na maneira de se praticar o jogo no Brasil. A campanha ruim no campeonato
da FIFA e o sucesso de seleções que praticavam um jogo pautado na
resistência física, como a campeã Inglaterra, influenciou numa mudança
radical no pensamento sobre o jogo da bola no Brasil.
O protagonismo de um modelo esportivo que privilegiava a intensidade
física ganhava força entre a maioria daqueles que compunham a dinâmica
futebolística nacional. De técnicos à cartolas, de jogadores à jornalistas, os
discursos se multiplicavam no sentido de que a única maneira de recuperar o
sucesso nas competições era direcionar os esforços para preparação de atletas
cujos corpos deveriam ser disciplinados, aptos a um futebol força, dinâmico e
moderno. Esse projeto disciplinar casava intimamente com o modelo de
Estado autoritário que governava o país. Uma das principais frações sociais
que compunham o corpo ditatorial brasileiro, os militares, tinham um vínculo
histórico com a educação física no Brasil e suas formulações políticas e
teóricas, com destaque para a ditadura do Estado Novo, quando passou a ser
disciplina obrigatória na educação básica para a formação dos jovens, sob o
lema: “corpo cívico, corpo físico”(PARADA, 2006, p.155). Assim, essa nova
forma do jogo se conectava filosoficamente com a dinâmica disciplinar e
vigilante dos militares, e, cada vez mais, o mundo futebolístico passava a ser
composto por sujeitos formados nesse universo.
Nesse contexto de exaltação do futebol-força, permeado por disciplina e
vigilância, Afonsinho começava a jogar como profissional no Botafogo do Rio
de Janeiro. Suas características como futebolista destoavam das previstas
pelo novo modelo de esporte defendido naquele momento. Relativamente
franzino fisicamente e tecnicamente cerebral, era um meio-campo do tipo que
pensava o jogo, nem sempre objetivo em suas jogadas, característica que
afetava diretamente o dinamismo desse futebol que se pretendia moderno,
cuja velocidade era um de seus trunfos. Esse modelo de futebol disciplinar,
portanto, afetava, as diferentes formas de liberdades, individuais e coletivas.
A autonomia do jogador era diretamente atingida por esse projeto, a
criatividade, que havia sido a marca do futebol-arte brasileiro bi-campeão
mundial, deveria ser controlada em prol de um ordenamento tático
pragmático.
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Lázaro, Matos
Embora o domínio sobre a liberdade do jogador de futebol no Brasil
estivesse complexificando-se, a liberdade desses sujeitos sempre teve em
questão, já que, a partir da regulamentação internacional da “Lei do Passe”, o
jogador profissional não tinha o direito em escolher para onde ir jogar, já que
o atleta estava preso as decisões do clube. Assim o destino do jogador não
cabia a ele, mas ao time em que ele jogava. O esportista portanto não era dono
do seu próprio corpo, vivia a mercê da vontade do clube em que estava
vinculado (FLORENZANO, 1998, p. 107).
Foi contra o mandonismo que tomava o jogo da bola que Afonsinho
inicialmente se rebelou. O resultado representou uma fissura no
autoritarismo das relações de trabalho no futebol. Afonsinho jogava no
Botafogo. O alvinegro carioca saía da Copa de 1970 com o maior número de
campeões: quatro jogadores, o técnico Zagalo e o preparador físico Admildo
Chirol. O discurso em torno da vitória conferia a dupla Zagallo/Chirol a
capacidade de unir futebol-arte ao preparo físico e a disciplina. Eles eram os
responsáveis pelo sucesso do “Novo futebol brasileiro”. A maioria da mídia
esportiva saudava esse sucesso, e com Placar não era diferente (REVISTA
PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número 17, 10 Julho 1970. p. 10).
As expectativas pela boa atuação do Botafogo nos campeonatos nacional
e estadual eram muitas, mas logo foram frustradas. Ao retornar aos trabalhos
no clube de General Severiano os dois símbolos da vitória tentaram
implementar a filosofia que havia sido executada na seleção. Essa tentativa
ganhou tons bastante autoritários quando Zagallo afastou Afonsinho por
considerar seu cabelo e barba não condizentes com o perfil do que ele achava
que deveria ser um jogador de futebol profissional (COUTO, 2010, p.6).
O afastamento do barbudo aconteceu em meados do mês de Agosto de
1970. No dia 27 de agosto o Jornal Correio da Manhã dedicava uma matéria
de meia página com o título: “Afonsinho e as farpas de sua barba”. Sua
intenção era apresentar como o jogador, de apenas 22 anos, havia se tornado,
na visão da direção do Botafogo e do técnico Zagallo, um “líder negativo”, ainda
em 1969, o que culminou com seu afastamento um ano depois, (JORNAL
CORREIO DA MANHÃ, 27/08/1970, p. 2). Em Placar, por sua vez, nada a
respeito da contenda com Zagallo. Durante o segundo semestre daquele ano
a revista esportiva da editora Abril apresentou, quase que semanalmente,
matérias sobre o Botafogo e os diversos problemas administrativos que
acompanhavam o clube. A única referência a Afonsinho apareceu de forma
bastante tímida em uma matéria cujo tema era a venda de jogadores,
consequência da falta de dinheiro do time, que não cumpria com o
compromisso salarial de todos que trabalhavam no clube e se afundava em
dívidas. A venda dos jogadores era tratada como única possibilidade de saldar
os compromissos. O título trazia: Pobre Botafogo, vende todo mundo”. Ao lado
as fotografias de Rogério, Afonsinho e Roberto. A legenda explicava: “Rogério
e Roberto são tricampeões. Afonsinho é ótimo jogador. Todos do Botafogo.
Todos à venda”. Essa foi a única citação ao cabeludo. Textualmente a matéria
destacava somente os dois jogadores que compunham o quadro de campeões
mundiais e que poderiam ser negociados. A reportagem apresentava Roberto
como um “ponta-de-lança que faz(ia) gols e mais gols, com muitos anos de
futebol pela frente, e que sempre foi disciplinado.” (REVISTA PLACAR. São
Paulo: Editora Abril, número 28, 25 setembro 1970. p. 38)
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Um aspecto na definição do ponta-de-lança chamava atenção, a
disciplina associada ao atleta alvinegro. Em meio a todo ambiente de conflitos
que tomava o Botafogo naquele momento, disciplina aparecia no periódico
como algo a ser valorizado. Em cantraposição a isso,embora o afastamento de
Afonsinho não tivesse sido abordado em nenhuma publicação da revista
Placar, era de conhecimento público a contenda entre o técnico e o jogador,
assim como a sua punição sob o argumento de indisciplina. O periódico,
naquele momento, associava a crise em que passava o Botafogo a má
administração do time, atrasos de salários, e não apontava a influência do
autoritarismo da comissão técnica também como um dos geradores dos
conflitos. A punição de Afonsinho consistiu, juntamente com o afastamento,
o corte de seu salário. Então, além de não poder treinar e jogar, tanto no time
de Genral Severiano quanto em qualquer outro clube, ficava Afonsinho
desamparado financeiramente, em função de uma decisão autoritária baseada
no julgamento a respeito de sua escolha individual de manter sua aparência
segundo seu gosto. Em depoimento ao documentário Passe Livre o advogado
de Afonsinho reconheceu que não esperava vencer o processo que seria
julgado no Tribunal de Justiça Desportiva (TJD), já que era “um tribunal
organizado por um dos lados (o do clube) quando Há(via) conflito de trabalho”.
Perdeu o primeiro julgamento, ao qual Afonsinho denominou de “jogo de
cartas marcadas”, no TJD da Federação Carioca. Recorreu ao Superior
Tribunal de Justiça Desportiva (STJD), onde venceu por unanimidade e
conquistou o direito sobre o passe (DOCUMENTÁRIO PASSE LIVRE, 1974).
Após a vitória de Afonsinho nos tribunais, já detentor do direito de
negociar, ele mesmo, onde jogaria, Placar produziu uma matéria, na qual
apresentava a união entre Olaria, clube do subúrbio escolhido pelo jogador
para atuar após a vitória judicial, e Afonsinho. Associada a isso estava
também o ex jogador e agora técnico Jair Rosa Pinto, detentor de uma visão
mais leve sobre o jogo, mais dialógica, menos unilateral. A matéria, assinada
por Teixeira Heizer, trazia uma enorme fotografia de Afonsinho ostentando um
sorriso brilhante. A alegria do jogador, apresentada também na capa da
Revista, contrastava com toda contenda de meses antes. Uma confluência de
fatores possibilitavam o novo estado do jogador, definido pelo jornalista:
“rapaz de cabelos, barbas e ideias longas, simpático tôda vida, inteligente, um
cara que brigou – e venceu - com Xisto Toniato, que joga bola redonda e vai
ser médico”. Segundo a reportagem, o Olaria procurava “revolucionar o futebol
carioca e, talvez, o brasileiro.” A causa disso: “os dirigentes haviam aceitado o
lema do técnico Jair Rosa Pinto: ‘É proibido proíbir”. As iniciativas que
caracterizavam essa liberdade: concentração só nas vésperas dos jogos,
permissão para atrasos de jogadores aos treinos e mesmas regalias dos sócios
para os atletas. E nada disso interferia negativamente no desempenho do time,
pelo contrário, eram incentivos a equipe que “corria noventa minutos” e se
tornou “fantasma dos grandes” (REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril,
número 58, 23 abril 1971. p. 12).
O Olaria aparecia como a antípoda do que foi instituído como a filosofia
da seleção brasileira na Copa de 1970, na qual a disciplina e o controle dos
atletas eram pilares fundamentais, sistema que Zagallo e Chirol procuraram
implementar no Botafogo quando voltaram do México. Jair Rosa Pinto
defendia o oposto da intransigência técnica, na sua concepção o diálogo era
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um mecanismo de trabalho mais eficaz que a ordem unilateral, e liberar o
atraso não significava legalizar a irresponsabilidade, mas pensar as
especificidades dos jogadores, como a de Afonsinho, que se dividia entre
treinamentos e aulas do curso de medicina. Assim reconhecia Afonsinho: “A
medida que eu interessar ao Olaria acho que eles me darão liberdade para
estudar.” Essa era uma questão importante para o jogador, no entanto, no
futebol profissional, com a dinâmica de treinamentos físicos, atividades
fisiológicas e psicológicas, exigia dedicação exclusiva e tempo integral
dedicado aos clubes. O barbudo reconhecia que as pretensões do time que
escolheu ainda eram tímidas, e por isso talvez a possibilidade de implementar
esse método de trabalho. Tanto que ponderou, questionando: “Só não sei o
que vai acontecer se o time crescer”.
Além de Jajá, apelido do técnico Jair, o Olaria ainda contava com um
dirigente bastante peculiar. Se o Botafogo tinha como cartola a representação
clássica e conservadora do administrador de agremiações futebolísticas na
figura de Xisto Toniato, personagem com quem Afonsinho tinha travado a
batalha pelo seu passe, o diretor do Olaria era quem dava todo o suporte e
respaldo para as inovações:
Por trás de toda onda revolucionária do Olaria está um
português setentão, bom de conversa, bom de mesa, amigo de
todos – ministros e mordedores -, ex padeiro, hoje incorporador:
Álvaro da Costa Melo. O velho Melo – todos tratam de seu Melo
– para começo de conversa, é o único cartola brasileiro que
confessa não entender de futebol (não parece, mas isso ajuda
muito o trabalho de Jajá). Rico, gosta de fazer as coisas direito:
por isso os ordenados, luvas e prêmios, no Olaria, andam
certinho. (Idem, p.13)
A matéria, ao se reportar a Melo, implicitamente o confrontava com um
jeito “tradicional” de ser cartola no Brasil. As suas características de
personalidade, seu trato sem burocracia nem pompa, o jeito e a forma de se
reportar, como o “seu Melo” em detrimento do “doutor”, muitas vezes exigidos
pelos cartolas Brasil a fora. Outra diferença era reconhecer que não entendia
de futebol, o que, em vez de atrapalhar ajudava, já que dava toda a liberdade
para a comissão técnica e os jogadores decidirem o que seria melhor para o
time, deixando de lado a impáfia características da maioria dos dirigentes
detentores da verdade. E por fim, mas não menos importante, o cumprimento
de seus compromissos financeiros. Alí, outra oposição ao Botafogo. Placar
havia, durante uma série de números publicados, feito reportagens
denunciando os atrasos de salários que acontecia no Alvinegro carioca,
inclusive no período em que Afonsinho estava integrado. No Olaria, “o camisa
azul e branco” do subúrbio do Rio de Janeiro, o cabeludo informava ao
jornalista: “Olha, aqui eu ganho o que nunca recebi no Botafogo” (Idem,
Ibdem).
Além de apresentar o projeto do Olaria para o futebol, a reportagem
abordava uma polêmica em torno do meio de campo. Os rumores de sua
contratação pelo Flamengo. O rubro negro carioca naqueles tempos se
confundia com seu técnico Iustrich, vencedor, mas reconhecidamente linha
dura. Ao ser questionado sobre o assunto, Afonsinho apontou as privações
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pelas quais teve que passar, e reafirmou seu poder, conquistado e que lhe
conferia a capacidade de decidir, ele mesmo e não o clube, sobre seu destino.
“Eu lutei quase um ano para não ser escravo de ninguém, fiquei parado, até
proibido de treinar, tudo para obter meu passe. Estou no Olaria, clube que
me aceitou como eu sou” (Idem, Ibdem).
Através da reportagem um outro sentido para o jogo e para o jogador
era apresentado. Inferiria-se sobre outras possibilidades de se viver o futebol
além daquelas definidas pelos defensores do futebol-força, baseado na
disciplina, no controle, e o Olaria seria um exemplo do sucesso daquela outra
forma. Além disso, o próprio periódico apresentava sua complexidade editorial
e de produção de sentidos, visto que, mesmo defendendo em diversos
momentos alguns princípios da disciplina, da ordem e de uma racionalidade
científica, outros significados estavam presentes. A mesma revista que
durante a contenda silenciou todo o processo autoritário da direção técnica
do Botafogo e de luta do Meio de campo pela sua liberação para poder jogar,
agora apresentava o quanto o atleta, juntamente com o clube que o aceitou
como ele era, representavam um futebol livre, “revolucionário”.
Naquele ano de 1971, meses depois dessa primeira reportagem, Placar
trazia Afonsinho novamente. Noticiava que havia fechado negociação com o
Santos, confirmação de que a negociação com o Flamengo não passava de
rumores. (REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número 61, 14 maio
1971. p. 10)
No entanto, dois anos depois, fecharia contrato com o Rubro-negro
carioca. Essa transação marcaria um reencontro na vida de Afonsinho. Agora
já estabelecido e reconhecido como um dos melhores Meio de campo do Brasil,
voltava a ser treinado por aquele que, três anos antes, o privara de jogar. Em
matéria de Placar o título: “Prezado amigo Afonsinho”. A utilização de uma
frase da música de Gilberto Gil feita em homenagem ao Meio campo, fazia um
jogo interpretativo com a relação, nada amistosa, entre o atleta e Zagalo. O
texto não escondia a surpresa pelo reencontro: “As voltas que dá o mundo – e
a bola – às vezes criam situações inesperadas. Quem poderia acreditar que,
um dia, Afonsinho jogaria num time dirigido por Zagalo e, mais que isso, com
a concordância do técnico? Pois Afonsinho está no Flamengo, disposto a tudo
esquecer, a trabalhar com Zagalo.” No conteúdo da matéria Afonsinho falava
de sua escolha em ir para o Flamengo e da responsabilidade que carregava,
além das consequências oriundas daquela experiência particular no futebol,
que era ser o dono de seu passe. A respeito da contenda antiga com Zagalo,
ele falava que profissionalmente tinha que “colocar de lado os problemas
pessoais para poder viver”, e não negar “a coexistência respeitosa e cordial no
ambiente de trabalho” (REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número
184, 21 setembro 1973. p. 22-23).
Placar que, quando fervilhava os embates entre Zagalo e Afonsinho no
segundo semestre de 1970 após a vitória do selecionado brasileiro no México,
silenciara as tensões, apresentava a matéria como a conclusão de um conflito
que deveria ficar no passado. A Revista, no entanto, deixava a entender que
Afonsinho havia revertido a partida e naquele momento, com autonomia de
decidir sobre suas negociaçoes, podia escolher o time rubro negro carioca. O
técnico, por outro lado, antes cheio de autoridade e disciplina, cedia diante do
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jogador, consolidado no futebol nacional e detentor do direito sobre seu passe,
não mais aquele jovem recém lançado entre os profissionais do Botafogo.
A Possibilidade de decidir sobre seu corpo marcou, sem dúvida, uma
conquista única no universo futebolístico. No entanto, numa realidade
opressora em que procuravam confiscar liberdades, controlar e modelar as
ações humanas, construir padrões e forçar as pessoas a essa normatização,
aquele era um poder que suscitava o tempo inteiro suspeição e vigilância.
Indenpendente do jogador entender aquelas ações como formas de rebeldia,
suas ações incomodavam um sistema que tinha num sentido de ordenamento
um de seus pilares.8
A Revista Placar, por sua vez, ao contrário, do momento anterior a
demissão de João Saldanha antes da Copa do Mundo do México, em que
procurou dizer semanalmente sobre o tema, a respeito de Afonsinho, nos
momentos mais tensos, que disseram respeito as brigas com Zagallo e as
disputas judciais, não tratou do assunto em suas páginas, por outro lado,
passado esses momentos, procurou produzir, sobre o universo do futebol,
outros sentidos que não aqueles que se aproximavam aos definidos por um
projeto conservador, autoritário, disciplinador e centralizador, implementado
pela ditadura.
Rei do “Galo”: braço erguido, punho fechado
Meses antes de Afonsinho negociar com Flamengo, em março de 1973,
o Clube Atlético Mineiro lançava, entre os jogadores princiais, um talentoso
centro avante de apenas dezesseis anos. De nome Reinaldo, sua capacidade
técnica e inteligência no jogo, desde a categoria de base já chamavam atenção,
e deixavam marcas claras de seu potencial. Capacidade logo confirmada.
Nos seus primeiros anos passou por uma série de contusões no joelho
que levaram a extrair ambos meniscos, no entanto, em quatro anos já se
destacava como principal artilheiro do Brasil. Havia conquistado um
campeonato mineiro invicto e das taças de Minas Gerais. Em 1977, com 23
anos, se destacava não só pela atilharia do campeonato brasileiro, mas pela
média de gols, mais de um tento por partida.9 Apenas isso seria o suficiente
para o destaque do Rei, como era chamado pela torcida do Atlético, no entanto
ele procurava acrescentar um significado ainda mais profundo ao comemorar
cada bola na rede. A euforia de cada finalização acertada em gol trazia consigo
uma manifestação política, intecionalmente pensada pelo jogador, que deveria
simbolizar a luta contrária a qualquer expressão de autoritarismo. Ao erguer
o braço direito e fechar o punho, com força, Reinaldo repetia uma imagem,
eternizada pelo movimento dos Panteras Negras, e, no universo esportivo,
pelos corredores John Carlos e Tommie Smith, representantes dos EUA
8
No documentário Memórias de Chumbo: Futebol nos tempos de condor, aparece uma ficha
que comprova a vigilância do regime sobre o jogador, entendendo-o como uma pessoa
suspeita.
9
Reinaldo mantém até hoje a maior média de gols por jogo da história do Campeonato
brasileiro de futebol, 1, 55 gol por partida. Em 18 partidas o jogador mineiro fez 28 gols. Na
ocasião o Atlético Mineiro ficou com o vice campeonato nacional, perdendo para o São Paulo
futebol Clube nos pênaltis, depois de um empate no tempo regulamentar. No entanto, o time
mineiro acabou a competição com a melhor campanha, invicto e com doze pontos a mais que
o time paulista, campeão na ocasião (LISBOA, 2003).
Recorde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 1-28, jan./jun. 2020. 18
Lázaro, Matos
durante a Olimpíada do México, em 1962, e, através do gesto, denunciavam o
racismo em seu país e a luta do povo negro pela conquista dos direitos civis.
No Brasil, através do mesmo símbolo, Reinaldo posicionava-se politicamente,
diante de milhares de torcedores brasileiros, contra opressões, violências e a
falta de direitos do Brasil daqueles tempos.
A partir de 1974, com a posse de Esrnesto Geisel no poder executivo
nacional, o discurso de uma transição caomeçava a tomar forma a partir da
fala do governo, o que deixava no horizonte uma perspectiva de transformação
para uma sociedade democrática. No entanto, Gelsom Almeida ressaltou que:
A ‘distensão’ lenta, gradual e segura, iniciada no governo do
General Ernesto Geisel, não indicaria, necessariamente, uma
transição para a democracia, nem a abertura, conforme
proposta inincialmente no governo Figueiredo, A transição da
ditadura militar para algo que se supunha deveria ser a
democracia se limitaria ao governo civil de José Sarney e seria
concluída com a posse de Fernando Collor de Mello em 15 de
março de 1990 (ALMEIDA, 2011).
O intervalo que compôs os anos de governo de Geisel à Figueiredo
significou, em grande medida, além de uma forma de permanência de poder
diante das crises que passava o regime, um período de disputas em torno de
como deveria ser feita a transição e consequentemente a derrubada da
ditadura, e o sobre quais bases seriam construídas a posterior democracia
brasileira.
Paralelo às mudanças no plano político nacional podia se ver
transformações mais contundentes na forma de Placar se posicionar
criticamente em relação ao universo político brasileiro. A forma que tratava
Afonsinho e a gestão de “Seu Melo”, como presidente do Olaria, serviam de
indícios de uma postura mais contundente do periódico em relação a uma
lógica autoritária de ordenação do jogo da bola, microcosmo do próprio
governo. A marca dessas alterações estava, em grande medida, na existência
de profissionais críticos ao regime se destacando no universo jornalístico
brasileiro e no interior da revista, sobretudo Juca Kfouri, que deixava, em
1974, o posto de gerente do centro de documentação de Abril (DEDOC), para
assumir o lugar de Gerente de reportagem de Placar. A partir de 1979 a
atuação do jornalista seria ainda mais efetiva na crítica ao regime a partir do
jogo da bola através do editorial da revista, intitulado Opinião de Placar.
Ocupando o cargo de diretor geral da revista, foi um dos responsáveis pela
contratação de João Saldanha, aquele mesmo perseguido em 1970, para
compor o grupo de jonalistas do semanário esportivo (SCHATZ, p.
109)(ROCHA, p. 36-38).
Em que pese algumas conquistas no período entre 1974 – 1984, como
o fim do AI-5, a Lei de Anistia, a estruturação de uma oposição política eleitoral
forte, um crescimento de movimentos coletivos estundantis, eclesiais e de
trabalhadores, durante a década de 1970, no futebol a militarização
mantinha-se presente e forte, tanto na seleção quanto no órgão que a
administrava, a Cofederação Brasileira de Desportos (CBD).
A militarização, fundada através da reestruturação da comissão técnica
da seleção antes da Copa de 1970 com a demissão de João Saldanha, ganhou
Recorde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 1-28, jan./jun. 2020. 19
Lázaro, Matos
força e se capilarizou ainda mais nos órgãos desportivos, atingindo inclusive
a Confederação Brasileira de Desportos (CBD), em 1975. O catalizador da
mudança foi, sobretudo, a má campanha do selecionado na Copa da
Alemanha um ano antes, o que fortaleceu um discurso pautado na
necessidade da substituição profunda de quadros da administração
futebolística como condição para um sucesso futuro do selecionado. A
representação mais expressiva desse processo se deu com a substituição de
João Avelange, na época mais preocupado com sua carreira internacional
através de sua condidatura para presidencia da FIFA, pelo almirante Heleno
de Barros Nunes. A mudança no comando do órgão máximo dos esportes
nacionais, cujo principal era o futebol, expressava além de uma intervenção
autoritária o papel do jogo da bola como um elemento politicamente
interessante para o regime.
O oficial que acabava de assumir a direção construíu sua carreira
política no partido Aliança Renovadora Nacional (ARENA). Quando assumiu a
direção da CBD era também presidente do ARENA no Rio de Janeiro, filiação
que influenciaria em ações de sua administração na entidade máxima do
futebol brasileiro (SCHATZ, p. 87). Segundo Sarmento (2007) o caráter
centralizador marcaria sua gestão, expressado, dentre outras ações, pelo
evento da troca de técnico Oswaldo Brandão, que havia substituído Zagallo
pós 1974, em função de um empate na primeira rodada das eliminatórias
sulamericanas para a Copa do Mundo de 1978, contra a seleção colombiana.
O substituto foi o capitão Cláudio Coutinho. Presente na seleção desde 1970
como preparador físico, assumia, em 1977, o cargo de técnico principal do
escrete canarinho.
Além de Coutinho e Heleno, outros militares passaram a ocupar cargos
de confiança, tanto na comissão do selecionado quanto na CBD, foram eles:
“o coronel Tinoco Marques como chefe da delegação, o major Kleber Camarino
como secretário, o tenente Osvaldo Costa Lobo como assessor, o major Carlos
Carvalheiro como supervisor (SCHATZ, p. 87).”
Se por um lado, no espectro administrativo do futebol, se via um
ambiente de maior centralização a partir da sistemática militarização da
Confederação, o que resultaria consequentemente numa maior intervenção
externa sobre a selecionado nacional, nos estádios brasileiros, na contramão
dessa tendência, Reinaldo ganhava cada vez mais visibilidade, a partir de suas
atuações com a camisa do Galo mineiro.10
Placar, por sua vez, em matéria de 20 de maio de 1977 defendia a
primeira convocação do jogador e, tanto se aproveitava do seu crescente
sucesso perante o público, quanto buscava caracterizar em suas páginas o
que, para ela, comporia o ainda jovem, mas “único”, jogador. O Sergio A
Carvalho construía uma linha argumentativa para justificar a necessidade da
convocação de Reinaldo. A reportagem o identificava como detentor de um
“estilo próprio”, “feito de criatividade e objetividade”, no qual a bola era “um
simples instrumento de trabalho”, mas sim fazia “partede do seu corpo”, ou
melhor, era “um prolongamento dele.” (REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora
Abril, número 369, 20 maio 1977. p. 4) Além da habilidade, sua capacidade
finalizadora era ressaltada no texto, expressa através dos 149 gols em 206
10
Apelido pelo qual é conhecido o Clube Atlético Mineiro.
Recorde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 1-28, jan./jun. 2020. 20
Lázaro, Matos
jogos feitos pelo jogador, desde a categoria de base até aquele momento da
carreira (Idem, p. 5). Adversários, companheiros de time, o seu técnico e
técnicos adversários, cronistas esportivos reconheciam e ecoavam o talento
diferenciado de Reinaldo. O texto inclusive trazia um trecho publicado por
João Saldanha no Jornal do Brasil, no qual o ex técnico e jornalista destacava
que o jogador mineiro traria uma melhora ao ataque da seleção “dando
seguimento às jogadas de Zico, Rivelino e Cerezzo com mais finura”. Cláudio
Coutinho até havia feito contato com o atleta, o que aumentava ainda mais as
expectativas sobre a convocação do atacante, que sonhava acordado com o
rádio baixinho, imaginando-se na seleção (Idem, p. 6). Embora tudo indicasse
que havia chegado sua vez, a reportagem ressaltava, como pontos fracos do
Jogador, que poderiam influenciar no seu sucesso, a falta de “malandragem”
e “picardia”, característica dos melhores, como Pelé e Tostão, personagens dos
quais Reinaldo seria “herdeiro do gênio”, mas com “estilo próprio” (Idem, p. 2).
Esses pontos, característica de uma certa imaturidade, teriam influenciado no
seu histórico de contusões, marcado por “três operações no menisco e uma no
tornozelo”, consequencias de entradas maldosas dos advérsários (Idem, p. 6).
Num outro sentido do texto de maio, Sergio A. Carvalho escrevia
novamente sobre Reinaldo. Já convocado para a seleção, ele era apresentado,
nas páginas de Placar, como um jogador renovado. A causa da revação: “O
poder da mente” (REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número 397, 2
dezembro 1977. p. 21). A reportagem tecia um atleta diferente daquele do
primeiro semestre, caracterizado pela falta de “malandragem” e “picardia”. O
centro avante do final estaria mudado, havia despertado “sua vontade de fazer
as coisas com mais entusiasmo” e passado “a exigir mais de si mesmo”, o que
repercutia inclusive nas lesões, já que teria “sumido do departamento médico”
(Idem, p. 22). Toda essa transformação, por sua vez, teria sido em decorrência
do acompanhamento com um psicólogo. Através dos encaminhamentos do
profissional o jogador “descobria os segredos da mente” e seu poder de
transformação. Segundo o texto, portanto, o processo de mantalização havia
produzido aquele artilheiro ainda mais letal, produtor da marca de quinze gols
em nove jogos no campeonato nacional, e cujos objetivos estariam bem
traçados para o futuro: “(1) Ser campeão brasileiro; (2) Ganhar a bola de prata;
(3) Ser convocado para Copa; (4) Ganhar a Copa; (5) Ganhar a Libertadores da
América”(Idem, p. 23). Focado, portanto, a mentalização o motivaria a se
aplicar cada vez mais nos treinamento e o impulsionaria a conquistar seus
objetivos.
Em que pese, nas duas matérias, identifiquemos a construção de
narrativas nas quais o talento de Reinaldo como jogador de futebol eram
evidenciados, na segunda houve uma reconficuração da sua imagem.
Enquanto o texto de maio apresentava-o como um atleta talentoso, diferente
e com potencial enorme, porém ainda inseguro, sonhador, em busca de um
lugar entre os grandes, o de dezembro procurava apresentar um jogador que,
em pouco tempo, notava-se amadurecido e cada vez mais preparado para lidar
com as transformações pelas quais passava na vida, desde a fama até a
responsabilidade de ser o camisa nove da Seleção.
Tais caracterísitcas, que serviam para construir uma ideia de atleta
cada vez mais preparado e pronto para ocupar o lugar de centro avante titular
Recorde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 1-28, jan./jun. 2020. 21
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na Copa, era reafirmada em Placar pouco mais de um mês depois, em janeiro
de 1978.
A reportagem, cujo título, “O homem da camisa 9”, trazia dois
subtítulos. Um primeiro tratava Reinaldo como unanimidade para
centroavante na Argentina, do “Almirante Heleno Nunes ao goleiro Raul”. O
outro reforçava as tranformações do jogador, já apontadas na matéria anterior
e naquele momento entendidas como consequência de sua ida para a Seleção.
Ele era conhecido como ‘o atacante das pernas de vidro’. Até que
veio a convocação para seleção, provocando uma súbita tomada
de consciência. E, de repente, Reinaldo se transformou num
centro avante ágil, malicioso, experiente, eclético. Com 19 gols
em treze jogos do Brasileiro, ele já fez seu nome. (REVISTA
PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número 404, 20 janeiro
1978. p. 11)
O texto, mais uma vez escrito por Sergio Carvalho, agora em parceria
com Luiz Augusto Chabassus, reforçava a “mutação” pela qual passou o
jogador, em pouco tempo, na qual havia deixado de ser “o antigo centroavante
dos gols perdidos, da canela de vidro, da irritante ingenuididade”, e evoluído
para “(...) o artilheiro consumado e polivalente, capaz de marcar gols e
preparar jogadas pas os parceiros que vinham de trás”. Porém, além disso,
novos elementos eram acrescentados àquele contexto pré Copa do Mundo no
qual Reinaldo Estava inserido. A disputa com outros atacantes como
Serginho, Roberto e Nunes, e a preferencia até pelo diretor máximo da CBD, o
Almirante Heleno Nunes. Na disputa com os outros jogadores a revista
esportiva destacava o jogador como o nome a estar em campo, independente
do esquema tático utilizado pelo treinador, defesa feita inclusive pelo
almirante Heleno Nunes, que identificava-o como uma das revelações da
seleção, detentor de “qualidades para ser um Tostão melhorado” (Idem, p. 12).
Placar reforçava ainda mais sua campanha em prol de Reinaldo como
destinado para a posição no selecionado em campos portenhos. A admiração
do presidente da CBD pelo seu futebol, apontada na reportagem, procurava
produzir o sentido da unanimidade em torno do jogador e o ponto final numa
suposta dúvida sobre quem seria o centroavante titular do time verde e
amarelo.
No entanto, após uma entrevista consedida ao periódico alternativo
Movimento, em março daquele mesmo ano, a relação entre militar e jogador
ganharia novos contornos. Ao se posicionar abertamente a favor da
organização coletiva entre jogadores de futebol, defender anistia e a
constituinte, Reinaldo demarcava sau opinião contrária aos ditames da
ditadura (MOVIMENTO, 06/03/1978, p. 8 Apud COUTO, 2010, p. 14).
Segundo Euclides Couto (2010, p. 16), a matéria provocou alvoroço nos meios
da grande imprensa mineira, que publicava o possível corte do atacante
atleticano da Seleção, por iniciativa de Heleno Nunes. O diriginte no entanto,
procurando camuflar a questão política em torno do acontecido, justificava a
decisão afirmando alegando que Reinaldo nao teria as “condições físicas
exigidas para uma competição de alto nível” (ESTADO DE MINAS,
07/04/1978, p. 6 Apud COUTO, 2010, p. 16).
Recorde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 1-28, jan./jun. 2020. 22
Lázaro, Matos
A revista esportiva da editora Abril, no entanto, não apresentou
cobertura da seleuma entre o artilheiro e o presidente da CBD. Até o término
da Copa do Mundo, a mídia que antes fazia campanha explícita para o
atacante em suas páginas deixava de aborda-lo, citando-o apenas em algumas
matérias sobre o selecionado. Nada apareceu sobre o embate, nem tão pouco
sobre as manifestações políticas do atleta. Isso, no entanto, não significava
que o periódico estivesse alheio as questões políticas em suas páginas.
Naquele ano de eleição, a revista se posicionava a respeito das discussões em
torno do fato de que jogador de futebol não deveria se posicionar
politicamente, colocada a baila muito em função da reportagem de Movimento
com Reinaldo. O períodico publicou matéria sobre o interesse dos jogadores a
respeito das eleições, quais candidatos e qual legenda era a mais popular entre
futebolistas de diversos estados do país (REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora
Abril, número 446, 10 novembro 1978. p. 12). Como apontou João Malaia
(2012) o recurso humorístico aparecia como forma de apresentação dos
posicionamentos políticos da revista. Através das tirinhas da coluna “Camisa
12”, o semanário pautava e se posicionava a respeito de temas como anistia,
democracia, corrupção, autoritarismo, eleições (SCHATZ, 2018).
Se o hebdomadário não se furtava de participar dos debates sobre
questões políticas no futebol, porque não pautar o caso Reinaldo? Essa
questão ficava no ar. Em que pese não tenhamos resposta objetiva para a
pergunta, através das publicações do periódico entendemos que, ao silenciar
o caso a revista procurava não se posicionar explicitamente diante da
polaridade, mesmo que, através de outros temas, Placar caminhasse num
sentido próximo àquele defendido por Reinaldo.
A situação colocava em oposição presidente da CBD e centroavante, e
aquela harmonia apresentada em Placar no mês de janeiro, pouco tempo
depois transformava-se em tensão. Segundo Couto (2010), a repercussão da
reportagem teria sido importante para a posterior convocação do atleticano
para o campeonato mundial, visto que, possibilitou uma vizibilização ainda
maior da popularidade do jogador, nacionalmente conhecido, além do que, a
ação autoritária de cortá-lo poderia ampliar os debates e consequentemente
produzir um mártir em Reinaldo, cuja figura seria usada pela oposição para
enfraquecer ainda mais o regime e o partido da situação, ao qual o Almirante
era dirigente.
Efetivada a convocação, em 3 de junho de 1978, no Estádio José Maria
Minella, em Mar del Plata, a seleção estreava na maior competição
internacional de futebol. O gol de empate contra a Suécia, na partida
inaugural do selecionado transmitida pela TV, possibilitava Reinaldo mostrar
para o mundo sua mensagem através da comemoração. A expectativa em
torno do atacante para goleador da competição era enorme entre os
brasileiros, quantidade de gols que seria diretamente proporcional a
visibilidade do jogador, inclusive para se posicionar politicamente, algo
perigoso, não só a ditadura brasileira, mas para própria Argentina, que
também passava por um governo autoritário.
Aqueles que esperavam uma Copa decidida pelos tentos de Reinaldo
acabaram sendo frustrados, pelo indicativo da primeira partida e a falta de
continuidade de boas atuações. Um jogador em que pairava a suspeição não
poderia ser menos que brilhantet, assim uma partida média contra a espanha
Recorde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 1-28, jan./jun. 2020. 23
Lázaro, Matos
o tirou da equipe, substituído por Roberto. O time canarinho acaberia na
terceira colocação da competição, depois de perder a vaga da final em virtude
de uma “estranha” goleada de da Seleção anfitriã na equipe peruana,
resultado que levou o conjunto argentino a decisão do campeonato.11
A grande imprensa brasileira, em geral, ecoava a vergonha do triunfo
argentino contra os peruanos. Em Placar não era diferente. O períodico, a
partir de uma longa reportagem, dizia trazer tudo sobre o escândalo. No
entanto, outra matéria da revista, publicada logo após a Copa, também
chamava atenção. No título, a interrogação em caixa alta: OS MINEIROS
AMARELARAM? No subtítulo a explicação de tudo: “Como sempre aconteceu
a partir de 50 mais uma vez vemos jogadores brasileiros serem acusados de
tremerem na hora h: Cerezzo e Reinaldo. Os dois negam da mesma forma
como fizeram outros acusados. Mas boato é um alvo difícil de acertar.”
(REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número 427, 30 junho 1978. p.
52)
Em diálogo com o subtítulo, a reportagem apontava como
historicamente, ao não sagrar-se campeã de uma Copa, a derrota da seleção
brasileira era atrelada a participação de alguns jogadores, para justificar o
insucesso. Mesmo apontando que tais conclusões surgiam de boatos,
ressaltava o quanto essas notícias se naturalizavam e eram “repetidas com
foro verdades” entre o senso comum. Passeando pela história caminhou,
desde 1950 com Bigode e Barbosa, passando por Didi em 1966, até 1974 com
Paulo César. Todos acusados de amarelarem, de formas diferentes, diante das
dificuldade e desafios de um campeonato mundial. As derrotas eram portanto
individualizadas e sujeitos eram massacrados durante anos pelo peso dos
insucessos. A bola da vez seriam Cerezzo e Reinaldo. Ambos não jogaram a
partida contra o selecionado argentino e, ao final da competição, isso era
disseminado, como covardia dos jogadores que tremeram perante a partida
decisiva. O texto, desta vez sem assinatura de quem o escreveu, ainda
ressaltava que existiam sim, casos de jogadores dos quais a camisa verde e
amarela pesava e não conseguiam atingir na Seleção o nível de jogo que
tinham nos clubes em que jogavam. Os dois mineiros, no entanto, não foram
citados entre eles no escrito, porém, também através do texto de Placar,
aqueles que acreditavam na teoria da covardia dos atletas, poderiam, muito
bem, coloca-los entre os que nao aguentavam a responsabilidade de jogar com
a amarelinha. Os jogadores não escondiam a ira e a mágoa. Cerezzo dizia até
que “partiria a cara, mataria o sujeito” que havia invetado que ele não jogou
por que nao quis. As afirmações, por sua vez, segundo a reportagem, teriam
sido feitas por um membro da comissão técnica, mais precisamente o médico
Mauro Pompeu, que “dizia abertamente que Reinaldo tinha pedido para não
jogar”. O jogador por outro lado se explicava, dizendo apenas concordar com
o chefe do departamento médico, dr. Lídio Toledo, que resolveu poupá-lo após
acusar dores no joelho (Idem, p. 52-55).
11
A Seleção Argentina precisava vencedor por saldo igual ou maior que quatro gols para se
classificar para a final da Copa do Mundo e acabou aplicando uma goleada de 6 a 1 no time
peruano. As suspeitas de interferencia externa do regime ditatorial argentino no resultado do
placar eram proliferados pela mídia brasileira que seria o finalista caso os alvicelestes não
conseguissem atingir a diferença de gols.
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Lázaro, Matos
Em que pese a veracidade da acusação em torno dos jogadores, atingir
Reinaldo naquele momento aparecia como algo bastante conveniente, diante
de tudo que havia acontecido, antes da Copa, entre ele e Heleno Nunes. Não
seria de se espantar, portanto, alguém da comissão ter produzido tal boato
com o objetivo de desgastar a imagem do centroavante diante do público,
mesmo público que havia se mobilizado em torno de sua presença na Copa.
Seria, para o Almirante presidente da CBD, a redenção.
Placar, por sua vez, desde o título da matéria questionava a afirmativa
de que os jogadores teriam acorvadado. Recorreu a história para identificar
como o recurso de individualizar as falhas em derrotas foram utilizados em
diferentes momentos, desde o Maracanaço. Aquilo se repetia naquele
momento de crise, possivelmente criado por alguém da comissão, para
apontar em Reinaldo um dos responsáveis pela derrota, junto com Toninho
Cerezzo. Além disso, apresentava a indgnação e tristeza dos atletas acusados,
bem como suas explicações a respeito de não terem jogado a partida.
Mesmo que de forma pouco incisiva, e as vezes perigosa, como no
momento em que abordou o fato de existirem jogadores que sentiram o peso
da responsabilidade de jogar pela Seleção, o que poderia ser vinculado aos
atletas mineiros acusados, Placar construíu seu discurso num sentido que
apontava para o fato deles serem os escolhidos como os responsáveis pelo
insucesso, narrativa recorrente em momentos de derrotas. Isso naquele
momento poderia servir para tirar a resposabilidade da comissão técnica,
bastante criticada antes da competição, e/ou, no caso de Reinaldo, desgastar
sua imagem perante os torcedores que, no embate anterior contra o presidente
da CBD, havia saído fortalecida.
Considerações finais: Futebol não é um jogo de linha reta
Durante o período ditatorial no Brasil que começou em 1964 uma série
de liberdades foram confiscadas, corpos eram atacados violentamente. A
potência de um esporte popularizado na sociedade brasileira, tratado como
elemento da cultura nacional, se por um lado aparecia como um instrumento
poderoso para os governos, como uma maneira de reverberar conquistas, de
apresentar uma nação unificada num projeto, se utilizado no caminho
contrário, como um espaço de denúncia, de visibilazação das dominações
daqueles tempos, se apresentava bastante perigoso. Do mesmo jeito são os
veículos de comunicação, que se por um lado poderiam produzir sentidos que
colaboravam com a tirania, por outro apresentavam visões mais complexas e
até contestadoras do poder instalado. Assim, tanto o futebol quanto a mídia
não devem ser tratados como elementos monolíticos, mas lugares polifônicos,
detentores de multiplas vozes, dotados de contradições e de disputas. Tanto
os personagens escolhidos, que são em si a mostra de que o jogo era mais que
o “ópio do povo”, quanto a forma que Placar os tratou nos possibilita perceber
essa polivalência e suas capacidades de produção de sentidos múltiplos.
João Saldanha, Afonsinho e Reinaldo eram, portanto, personagens que
destoavam do “comportamento geral”, como diria Gonzaguinha, no universo
do futebol. Incomodaram a ditadura quando procuraram autonomia em
tempos de tirania. Assim, procura-los em Placar serviu para entender como
um periódico da grande mídia, em busca de mercado cada vez maior nacional
Recorde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 1-28, jan./jun. 2020. 25
Lázaro, Matos
e internacionalmente, abordava aqueles sujeitos em contextos de acirramento
dos seus embates com a lógica disciplinar implementada. Debruçar sobre isso
permitiu entender um pouco da trajetória da revista e suas transformações
em relação ao tempo, quando no seu primeiro ano, 1970, a revista fez côro a
demissão de João Saldanha, o que ajudou, mesmo que de forma não
intencional, na execução de um primeiro plano de militarização em curso da
comissão técnica do selecionado nacional. Além disso, o silenciamento sobre
o embate entre o técnico recém campeão mundial, Zagallo, e o jovem jogador
Afonsinho, quando o técnico procurava disciplinar esteticamente o jogador,
entendendo seu perfil de jogador estudante, contestador e barbudo, como
insubordinado. Mesmo periódico que menos de um ano depois publicou uma
matéria na qual Afonsinho era protagonista, após de conquistar o direito sobre
seu passe e assinar com o Bangu. Nela podia se perceber a exautação de uma
administração que confrontava a lógica autoritária expressa não apenas no
ambiente futebolístico, em geral, mas no país, a partir da ditadura. Revista
que, assim como aconteceu com Afonsinho, silenciou-se sobre o embate entre
Reinaldo e o Almirante Heleno Nunes, mesmo num contexto no qual a censura
possibilitava maior posicionamento. Mesmo jogador para quem a revista fez
campanha, em suas páginas, para ser convocado à Seleção entre 1977 e início
de 1978.
Em que pese os limites deste artigo, essa multiplicidade de abordagens
de Placar nos oferece indícios para reafirmar sua polifonia, ou seja, para
mostrar a dificuldade de defini-la e caracteriza-la a partir de um caminho
unidimensional e de posicionamentos contínuos. Pelo contrário, percebemos
uma mídia que, num período extremamente complexo, ao tratar desses
rebeldes, reproduzia em suas páginas toda essa complexidade.
Referências
Reportagens e colunas publicadas em Placar:
“ACORDA, JOÃO!” (COLUNA / TIRO LIVRE) - REVISTA PLACAR. São Paulo:
Editora Abril, número 0, 3 de fevereiro de 1970.
“SELEÇÃO NAO POPDE PERDER” - REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora
Abril, número 0, 3 de ferreiro de 1970.
“A CRISE DA FERA” - REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número
1, 20 de março de 1970.
“SALDANHA: JAMAIS DEIXAREI A SELEÇÃO” (CARA CARA / ENTREVISTA)
- REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número 1, 20 de março de
1970.
“JOÃO QUIXOTE” (COLUNA / TIRO LIVRE) - REVISTA PLACAR. São Paulo:
Editora Abril, número 1, 20 de março de 1970.
“JOÃO TECNICO MORREU BRIGANDO” - REVISTA PLACAR. São Paulo:
Editora Abril, número 2, 27 de março de 1970.
Recorde, Rio de Janeiro, v. 13, n. 1, p. 1-28, jan./jun. 2020. 26
Lázaro, Matos
“A REVOLUÇÃO DE SALDANHA” - REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora
Abril, número 3, 3 de abril de 1970.
“POBRE BOTAFOGO, VENDE TODO MUNDO” - REVISTA PLACAR. São
Paulo: Editora Abril, número 28, 25 de setembro de 1970.
“RUBRO NEGROS E VASCAÍNOS JÁ TEM TIME PRA TORCER: OLARIA” -
REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora Abril, número 58, 23 de abril de 1971.
“O SANTOS MONTA SEU ESCRETE” - REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora
Abril, número 61, 14 de maio de 1971.
“PREZADO AMIGO AFONSINHO” - REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora
Abril, número 184, 20 de setembro de 1973.
“MINAS TEM O SEU GALO DE OURO” - REVISTA PLACAR. São Paulo:
Editora Abril, número 369, 20 de maio de 1977.
“O PODER DE PROGRAMAR SEUS GOLS” - REVISTA PLACAR. São Paulo:
Editora Abril, número 397, 2 de dezembro de 1977.
“REINALDO: O BRASIL COM FOME DE GOLS” - REVISTA PLACAR. São
Paulo: Editora Abril, número 404, 20 de janeiro de 1978.
“O HOMEM DA CAMISA NOVE” - REVISTA PLACAR. São Paulo: Editora
Abril, número 404, 20 de janeiro de 1978.
“MINEIRÃO: GALO, REINALDO E MAIS NINGUÉM” - REVISTA PLACAR. São
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