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Livro Aqui Tem SUS

O documento apresenta a obra 'Aqui tem SUS', organizada por Maria Adriana Moreira, Marcia Cristina Marques Pinheiro e Júlio Cesar Schweickardt, que aborda cuidados em saúde nos territórios do Amazonas. A publicação é parte da Série Saúde & Amazônia e inclui contribuições de diversos autores sobre temas como saúde indígena, políticas públicas e educação em saúde. O livro tem o compromisso de promover o Sistema Único de Saúde (SUS) como uma política universal e equitativa.
Direitos autorais
© © All Rights Reserved
Levamos muito a sério os direitos de conteúdo. Se você suspeita que este conteúdo é seu, reivindique-o aqui.
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Livro Aqui Tem SUS

O documento apresenta a obra 'Aqui tem SUS', organizada por Maria Adriana Moreira, Marcia Cristina Marques Pinheiro e Júlio Cesar Schweickardt, que aborda cuidados em saúde nos territórios do Amazonas. A publicação é parte da Série Saúde & Amazônia e inclui contribuições de diversos autores sobre temas como saúde indígena, políticas públicas e educação em saúde. O livro tem o compromisso de promover o Sistema Único de Saúde (SUS) como uma política universal e equitativa.
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ORGANIZADORES

Maria Adriana Moreira


Marcia Cristina Marques Pinheiro
Júlio Cesar Schweickardt

Série Saúde & Amazônia, 35

“Aqui tem SUS” :


promovendo os cuidados
nos territórios do Amazonas

1a Edição
Porto Alegre
2025
Copyright © 2025 by Associação Rede UNIDA

Coordenador Geral da Associação Rede UNIDA


Alcindo Antônio Ferla
Coordenação Editorial
Editor-Chefe: Alcindo Antônio Ferla e Hêider Aurélio Pinto
Editores Associados: Carlos Alberto Severo Garcia Júnior, Denise Bueno, Diéssica Roggia Piexak, Fabiana Mânica
Martins, Frederico Viana Machado, Jacks Soratto, João Batista de Oliveira Junior, Júlio César Schweickardt, Károl
Veiga Cabral, Márcia Fernanda Mello Mendes, Márcio Mariath Belloc, Maria das Graças Alves Pereira, Michelle Kuntz
Durand, Quelen Tanize Alves da Silva, Ricardo Burg Ceccim, Roger Flores Ceccon, Stela Nazareth Meneghel, Stephany
Yolanda Ril, Suliane Motta do Nascimento, Vanessa Iribarrem Avena Miranda, Virgínia de Menezes Portes
Conselho Editorial
Adriane Pires Batiston (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil);
Alcindo Antônio Ferla (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil);
Àngel Martínez-Hernáez (Universitat Rovira i Virgili, Espanha);
Angelo Stefanini (Università di Bologna, Itália);
Ardigó Martino (Università di Bologna, Itália);
Berta Paz Lorido (Universitat de les Illes Balears, Espanha);
Celia Beatriz Iriart (University of New Mexico, Estados Unidos da América);
Denise Bueno (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil);
Emerson Elias Merhy (Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil);
Êrica Rosalba Mallmann Duarte (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil);
Francisca Valda Silva de Oliveira (Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Brasil);
Hêider Aurélio Pinto (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Brasil);
Izabella Barison Matos (Universidade Federal da Fronteira Sul, Brasil);
Jacks Soratto (Universidade do Extremo Sul Catarinense);
João Henrique Lara do Amaral (Universidade Federal de Minas Gerais, Brasil);
Júlio Cesar Schweickardt (Fundação Oswaldo Cruz/Amazonas, Brasil);
Laura Camargo Macruz Feuerwerker (Universidade de São Paulo, Brasil);
Leonardo Federico (Universidad Nacional de Lanús, Argentina);
Lisiane Bôer Possa (Universidade Federal de Santa Maria, Brasil);
Luciano Bezerra Gomes (Universidade Federal da Paraíba, Brasil);
Mara Lisiane dos Santos (Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Brasil);
Márcia Regina Cardoso Torres (Secretaria Municipal de Saúde do Rio de Janeiro, Brasil);
Marco Akerman (Universidade de São Paulo, Brasil);
Maria Augusta Nicoli (Agenzia Sanitaria e Sociale Regionale dell’Emilia-Romagna, Itália);
Maria das Graças Alves Pereira (Instituto Federal do Acre, Brasil);
Maria Luiza Jaeger (Associação Brasileira da Rede UNIDA, Brasil);
Maria Rocineide Ferreira da Silva (Universidade Estadual do Ceará, Brasil);
Paulo de Tarso Ribeiro de Oliveira (Universidade Federal do Pará, Brasil);
Priscilla Viégas Barreto de Oliveira (Universidade Federal de Pernambuco);
Quelen Tanize Alves da Silva (Grupo Hospitalar Conceição, Brasil);
Ricardo Burg Ceccim (Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Brasil);
Rossana Staevie Baduy (Universidade Estadual de Londrina, Brasil);
Sara Donetto (King’s College London, Inglaterra);
Sueli Terezinha Goi Barrios (Associação Rede Unida, Brasil);
Túlio Batista Franco (Universidade Federal Fluminense, Brasil);
Vanderléia Laodete Pulga (Universidade Federal da Fronteira Sul, Brasil);
Vanessa Iribarrem Avena Miranda (Universidade do Extremo Sul Catarinense/Brasil);
Vera Lucia Kodjaoglanian (Laboratório de Inovação Tecnológica em Saúde/LAIS/UFRN, Brasil);
Vincenza Pellegrini (Università di Parma, Itália).
Comissão Executiva Editorial Revisores
Alana Santos de Souza Júlio Cesar Schweickardt, Viviane Lima Verçosa, Lupuna Corrêa de
Jaqueline Miotto Guarnieri Souza, Cleudecir Siqueira Portela, Gercicley Rodrigues dos Santos,
Camila Fontana Roman Mariza Quércio Machado e Mayra Costa Rosa Farias de Lima,
Carolina Araújo Londero William Pereira Santos (LAHPSA/Fiocruz Amazônia), Fabiana
Mânica Martins e Raniele Alana Lima Alves (UFAM), Thalita Renata
Capa | Projeto Gráfico | Diagramação
das Neves Guedes (SEMSA Manaus), Janayla Bruna Oliveira de Aguiar
Lucia Pouchain
(DSEI ARS), Alcindo Antônio Ferla e Stela Meneguel (UFRGS),
Imagem Capa Gigellis Duque Vilaça, Liliam Rafaelle Souza da Silva, Maria Adriana
Claudioney da Silva Guimarães Moreira, Cristiano Fernandes da Costa (Cosems AM).

A Série Saúde & Amazônia é organizada pelo Laboratório de História, Políticas Públicas e Saúde na
Amazônia (LAHPSA) do Instituto Leônidas e Maria Deane (ILMD/Fiocruz Amazônia) e publicada pela
Associação Brasileira Rede Unida (REDE UNIDA). Os manuscritos compõem as áreas de antropologia da
saúde, gestão e planejamento, vigilância em saúde, atenção e cuidado em saúde, políticas públicas em saúde,
educação permanente, educação popular, promoção em saúde, participação e controle social, história da
saúde, saúde indígena, movimentos sociais em saúde e outros temas de interesse para a Região Amazônica.
Os autores são de diferentes segmentos como pesquisadores, estudantes, gestores, trabalhadores, usuários e
lideranças de movimentos sociais. A série tem o compromisso ético-político de contribuir com a defesa do
Sistema Único de Saúde (SUS) como uma política universal, integral e equitativa. Os livros são organizados
a partir de editais públicos e avaliados pelos pares. A organização dos livros é entendida como um processo
de Educação Permanente e de formação de novos autores e autoras que estão envolvidos na construção das
obras organizadas pela Série.
A Série tem coordenação editorial de: Dr. Júlio Cesar Schweickardt (Fiocruz Amazônia); Dr. Alcindo
Antônio Ferla (UFRGS) e Dr. Paulo de Tarso Ribeiro de Oliveira (UFPA).

Esta publicação foi realizada a partir das Mostras “Aqui Tem SUS” e “ImunizaSUS”, organizadas pelo
Conselho de Secretarias Municipais do Amazonas (COSEMS AM). Os textos tiveram o acompanhamento
de pesquisadores e alunos do Laboratório de História Políticas Públicas e Saúde na Amazônia – LAHPSA/
Fiocruz Amazônia, que fizeram o processo de Educação Permanente com os autores e autoras. Os
manuscritos foram avaliados pela equipe de organização do livro, com o apoio de revisores especializados
da área da saúde coletiva.
Esta obra teve incentivo:

DADOS INTERNACIONAIS DE CATALOGAÇÃO NA PUBLICAÇÃO (CIP)

A656
“Aqui tem SUS”: promovendo os cuidados nos territórios do Amazonas/ Maria Adriana Moreira;
Marcia Cristina Marques Pinheiro; Júlio Cesar Schweickardt (Organizadores) – 1. ed. -- Porto
Alegre, RS: Editora Rede Unida, 2025.
517 p. (Série Saúde & Amazônia, v. 35).
E-book: 29.00 Mb; PDF

Inclui bibliografia.
ISBN: 978-65-5462-202-8
DOI: 10.18310/9786554622028

1. Sistema Único de Saúde. 2. Amazônia. 3.Cuidado. 4. Assistência Integral à Saúde. I. Título. II.
Assunto. III. Organizadores.

NLM WA 525-590
CDU 614 (282.281.3)

Catalogação elaborada pela bibliotecária Alana Santos de Souza - CRB 10/2738

Todos os direitos desta edição reservados à Associação Rede UNIDA


Rua São Manoel, nº 498 - CEP 90620-110, Porto Alegre – RS. Fone: (51) 3391-1252

www.redeunida.org.br
Sumário

Prefácio CONASEMS........................................................................................ 13
Hisham Mohamad Hamida

Prefácio SES......................................................................................................... 15
Nayara de Oliveira Maksoud

A Mostra “Brasil, Aqui Tem SUS”: uma produção coletiva e


participativa do conhecimento nos territórios do Amazonas........... 17
Maria Adriana Moreira, Marcia Cristina Marques Pinheiro, Júlio Cesar Schweickardt

“Vale pela vida”: relato de uma experiência com a balsa da saúde em


Atalaia do Norte, Vale do Javari, AM.......................................................... 39
James Rodrigues Guedes, Antônio Amancio Barbosa Neto, Greyciane Rodrigues
Saldanha Mesquita, Viviane Lima Verçosa

Enfermaria indígena: um relato de experiência bem-sucedido no


hospital geral de Barcelos ............................................................................... 51
Mayara Victória Feitosa Veras, Gigellis Duque Vilaça, Fabiana Mânica Martins

Saúde Digital e Telemedicina: quebrando paradigmas e reformulando


caminhos............................................................................................................... 61
Ana Kelly Rodrigues Amaro Ugarte, Gigellis Duque Vilaça, Cleinaldo de Almeida
Costa, Jonas Tadeu Cau Sertorio, Cleudecir Siqueira Portela

Atendimento domiciliar: cuidado que transcende as adversidades


nas enchentes em território amazônico..................................................... 83
Anna Beatriz Chagas Freitas, Daniel Bezerra Arruda, Lourena da Silva Camurça,
Silvio Schimangogeski
Acompanhamento de usuários com feridas na Atenção Primária em
Saúde no município de Carauari-AM......................................................... 97
Everton Martins Honorato, Khylvia Nascimento da Costa, Alcinda Santiago da Rocha,
Raylan Nascimento da Silva, Tâmela Bruna Viana de Medeiros, Lupuna Corrêa de
Souza, Liliam Rafaelle Souza da Silva

Desafios da adesão dos usuários ao programa Hiperdia em uma


comunidade ribeirinha no Careiro Castanho, AM.............................. 109
Karina Sebastiana Macêdo Araújo, Carlos Alexandre Pereira da Silva, Yasmim Colares
de França, Gigellis Duque Vilaça, Lupuna Corrêa de Souza

Projeto visão além do futuro: uma ação intersetorial no município de


Coari, AM........................................................................................................... 119
Maria do Perpétuo Socorro Carvalho Barreto, José Carlos Ferreira Pinheiro Junior,
Wendel da Silva Barros, Fabricio da Rocha Botelho, Kelly de Nazaré Oliveira, Gercicley
Rodrigues dos Santos

Heróis das águas: desafios e potencialidades nas urgências e


emergências em um município amazônico............................................ 137
Karina Sebastiana Macêdo Araújo, Carlos Alexandre Pereira da Silva, Yasmim França
de Colares, Jackeline da Silva Gomes, Gigellis Duque Vilaça, Lupuna Corrêa de Souza

Fisioterapia em grupo: tratamento da lombalgia na Atenção Básica


em Eirunepé - AM............................................................................................ 149
Yanna Luane Souza Cavalcante, Thayana Oliveira Miranda, Francisco Loab Dos Santos
Silva, Marluce Mineiro Pereira, Liliam Rafaelle Souza da Silva

Projeto papo de mãe: educação e atenção à saúde na gestação em


Eirunepé, AM.................................................................................................... 167
Arielly Queiroz de Menezes, Liliam Rafaelle Souza da Silva, Viviane Lima Verçosa

Ampliação do acesso ao tratamento de doenças crônicas da população


de área remota em Humaitá/AM................................................................ 181
Gabriela de Almeida da Silva, Cleudecir Siqueira Portela

Centro municipal de referência ao autismo: relato de experiência


do apoio às crianças e aos pais atípicos do município de Itacoatiara-
AM......................................................................................................................... 201
Michel Fabrício Pereira de Souza, Thiago Silva dos Santos, Viviane Lima Verçosa
Desafios no cuidado em saúde mental de comunidades ribeirinhas:
estratégias do CAPS I em Lábrea, Amazonas........................................ 223
Betânia Lacerda Gomes, Ingrid Lima Silva, Lupuna Corrêa de Souza

Inovação no combate da tuberculose: tecnologia auxilia na


identificação de usuários com falha no seguimento do tratamento
em Manaus, AM................................................................................................ 233
Adriane Farias Valentin, Eliane Nogueira Campos, Elson Pessoa Vasques, Jacó
Miranda dos Santos

Da concepção à contracepção: como iniciou a estratégia de ofertar


DIU às mulheres em situação de rua de Manaus-AM......................... 243
Ezequiel Fernandes da Costa Neto, Layla Calazans Muller, Jacqueline Cavalcanti Lima,
Maria Dinez Fabá de Oliveira, Lúcia Helena de Araújo Jorge, Eucinara Buás Guedes,
Thalita Renata das Neves Guedes

Educação em saúde para professores e funcionários da educação


básica e recreação infantil............................................................................. 257
Leda Lima Sobral, Gisele Torrente, Elen Palmeira Assunção, Eduardo Fernandes

Agente indígena de saúde: uma rede viva no contexto urbano da zona


norte de Manaus............................................................................................... 267
Aline Aparecida Ferreira Artini, Beatriz Rodrigues Campinho, Francinara Batista
Neves Lima, Iranilson Militão Gabriel, Izomaria dos Santos Braga, Júlio César
Schweickardt, Sâmia Roberta da Silva Torres

Olimpíadas da terceira idade e práticas corporais na atenção primária


como estratégia de promoção da saúde, Manaus/AM........................ 287
Patrícia Guimarães Couto, Patricky Batista Da Silva, Thalita Souza Mendes, Maria de
Fátima Falcão da Silva, Wendell Mattheus Amâncio da Silva

Promoção de saúde bucal da população ribeirinha no município de


Manicoré-AM: uso do diário como estratégia de planejamento..... 299
Mesraim Salef Rocha do Rosário, Maria Adriana Moreira, Sabrina Araújo de Melo,
Vanessa Colares Magalhães Alves, Pablo Manuel oliveira almeida, Janayla Bruna
Oliveira de Aguiar
Saúde na Amazônia: a implantação e atuação das equipes de saúde
bucal na área ribeirinha município de Manicoré/AM........................ 311
Mesraim Salef Rocha do Rosário, Maria Adriana Moreira, Sabrina Araújo de Melo,
Vanessa Colares Magalhães Alves, Raniele Alana Lima Alves

Capacitação em primeiros socorros nas escolas: instrução de


manobra de Heimlich na prevenção de engasgos em crianças no
município Nhamundá, AM.......................................................................... 331
Milton Gama dos Santos, Lupuna Corrêa de Souza, Liliam Rafaelle Souza da Silva,
Alcineia Fontes Neto, Luan Marinho de Souza

“Chá de Bênçãos”: uma prática integrativa aplicada em um grupo de


grávidas em Nhamundá-AM....................................................................... 339
Neliane Tavares de Souza, Gercicley Rodrigues dos Santos

“Flor de tucumã”: serviço da eMulti e exame Papanicolau humanizado


em mulheres do município de Nhamundá, AM................................... 351
Fabíola Guimarães de Carvalho, Trindade de Jesus Vidal Furtado, Samara de Oliveira
Guimarães

Caravana de reabilitação: serviços de fisioterapia ofertados em


comunidades ribeirinhas de Nhamundá, AM....................................... 357
Carolina Neves Jacaúna, Priscila Santana

A fonoaudiologia no atendimento de crianças com Transtorno do


Espectro Autista em Rio Preto da Eva/AM............................................. 369
Vanessa Pereira Oliveira, André Luiz Freitas Nogueira, Gigellis Duque Vilaça, Victória
Villar Viana Queiroz

Convite ao cuidado: sensibilização de mulheres para o preventivo


por meio de cartas............................................................................................ 379
Andreza Cezar Fonseca, Mariana Rodrigues da Silva, Gigellis Duque Vilaça, Raniele
Alana Lima Alves

Radar Odonto: proporcionando acesso à assistência odontológica no


município de São Paulo de Olivença, AM............................................... 393
Valentina Victoria Tourinho Ramos, Thiago dos Santos da Silva, Mayra Costa Rosa
Farias de Lima, Antônio Amâncio Barbosa Neto
Equipe multiprofissional eMulti: promovendo qualidade de vida
para crianças com necessidades especiais de saúde e suas famílias no
município de Silves - AM.............................................................................. 407
Willian Lira Grana, Rayana Lima Martins, Elanne Martins Viana, Elivane Silva
Pacheco, Lupuna Corrêa de Souza

Faturamento hospitalar: aprimorando a gestão no município de


Silves, AM........................................................................................................... 419
Auricelia Maria Queiroz Assis, Laene Conceição Gadelha, Cleudecir Siqueira Portela

Fisioterapia pélvica: derrubando pré-conceitos e transformando


vidas em Silves, AM......................................................................................... 441
Auricelia Maria Queiroz Assis, Dennice Batista Neves, Laene Conceição Gadelha,
Denise Rodrigues Amorim de Araújo

Gestantes vivendo com HIV: o trabalho para eliminar a transmissão


Vertical no município de Tefé, AM ........................................................... 455
Sandra Caroline Pereira Machado, Patrizia Gonçalves de Araújo Pires , Mayra Costa
Rosa Farias de Lima

Inclusão das práticas integrativas e complementares no município de


Tefé-AM............................................................................................................... 467
Heloise Terezinha Alves Guimarães, Thaís Lorena Mouzinho de Brito, Lecita Marreira
de Lima Barros, Mariza Quercio Machado

Empodera gestão: instrumentos de planejamento para uma saúde


solidária no Amazonas................................................................................... 483
Gigellis Duque Vilaça, Liliam Rafaelle Souza da Silva, Laene Conceição Gadelha,
Ariane Guerreiro de Souza, Julio Cesar Schweickardt

Sobre Organizadores, Autores e Autoras................................................ 499


Prefácio CONASEMS

Falar sobre o SUS nos territórios do Amazonas é, para mim, falar sobre
coragem, compromisso e, sobretudo, presença e resiliência. É impossível olhar
para esse território sem se emocionar com a força de quem faz saúde todos os
dias em meio a tantos desafios.
O livro “Aqui tem SUS: promovendo os cuidados nos territórios do
Amazonas”, é mais do que um registro de boas práticas. Ele é um retrato vivo
de pessoas que acreditam no poder transformador do cuidado. Pessoas que,
mesmo enfrentando distâncias de rios e de tempo, conseguem estar perto.
Porque estar perto, no SUS, é uma escolha. É a escolha de estar presente onde
mais se precisa.
Como alguém que vive e acredita no SUS que acontece nos municípios,
me sinto profundamente sensibilizado por cada experiência contada aqui. São
histórias de resistência, mas também de mudanças. São pessoas que pensam
com o território, que escutam com o coração e que constroem saúde juntos.
O Amazonas nos ensina que o SUS só é possível quando a singularidade
de cada lugar é respeitada e valorizada. E é justamente isso que este livro faz:
ele dá visibilidade ao que, muitas vezes, é invisível.
Espero que esta leitura inspire, emocione e, principalmente, reforce
em cada um de nós a certeza de que o SUS dá certo, sim — porque tem gente
fazendo, com responsabilidade, afeto e compromisso real com a vida.
Sigamos na missão de garantir um SUS cada vez mais garantido e
fortalecido para toda a população e em todos os lugares.

Hisham Mohamad Hamida


Secretário Municipal de Saúde de Pirenópolis-GO e Presidente do CONASEMS

13
Prefácio SES

É com grande orgulho e profunda admiração que apresento esta obra,


que reúne experiências transformadoras do Sistema Único de Saúde (SUS)
nos territórios do nosso imenso Amazonas. A leitura deste livro nos revela não
apenas relatos de práticas exitosas, mas também testemunhos vivos da resistência,
cuidado e compromisso das trabalhadoras e trabalhadores do SUS, que enfrentam,
diariamente, os desafios do fazer saúde na maior e mais diversa região do país.
O Amazonas nos ensina, com seus caminhos entrecortados por
águas e florestas, que nossos territórios exigem soluções criativas, adaptadas
às realidades locais, que considerem as culturas, os saberes, as distâncias e a
beleza singular de cada comunidade, aldeia, vila ou cidade. E é exatamente
isso que este livro nos entrega: um mosaico de ações concretas que promovem
a equidade e garantem o acesso à saúde de forma digna e respeitosa.
As experiências aqui registradas mostram que é possível fazer mais e
melhor mesmo diante das adversidades. Elas revelam um SUS ativo nos hospitais,
nas Unidades Básicas, nas balsas, nos territórios ribeirinhos e indígenas, nos
espaços urbanos e remotos, de forma presencial e também com telemedicina. Um
SUS que escuta, acolhe, caminha junto. Um SUS feito de gente que cuida de gente.
Quero saudar e parabenizar todos os profissionais que participaram das
Mostras Municipais, Estaduais e Nacionais — cada trabalho aqui é uma semente
de esperança e de transformação. Também agradeço ao COSEMS-AM, à Fiocruz
Amazônia e a todos os parceiros que contribuíram para que essas experiências
fossem registradas e que, agora, estejam acessíveis a toda a sociedade.
Que esta publicação inspire novas ações, fortaleça as redes de cuidado
e reafirme nosso compromisso com um SUS público, universal, integral e
equânime. Sigamos em frente, com coragem e determinação, cuidando da
saúde do nosso povo e da vida que pulsa em cada canto do Amazonas.

Nayara de Oliveira Maksoud


Secretária de Estado de Saúde do Amazonas

15
A Mostra “Brasil, Aqui Tem SUS”:
uma produção coletiva e participativa do
conhecimento nos territórios do Amazonas
Maria Adriana Moreira
Marcia Cristina Marques Pinheiro
Júlio Cesar Schweickardt

Nos ajude a olhar a imensidão...

Diego não conhecia o mar.


O pai, Santiago Kovadloff, levou-o para que descobrisse o mar.
Viajaram para o Sul.
Ele, o mar, estava do outro lado das dunas altas, esperando.
Quando o menino e o pai enfim alcançaram aquelas alturas de areia,
depois de muito caminhar,
o mar estava na frente de seus olhos.
E foi tanta a imensidão do mar, e tanto seu fulgor,
que o menino ficou mudo de beleza.
E quando finalmente conseguiu falar,
tremendo, gaguejando,
pediu ao pai:
Me ajuda a olhar!
Livro dos Abraços, Eduardo Galeano (2002)

A “imensidão” pode estar no nosso cotidiano, no trabalho, nas falas,


nos encontros, no caminhar pelos lugares da Amazônia, podem estar por
detrás das “dunas”, que demanda muito caminhar para contemplarmos o
outro lado, o “mar”, a “imensidão” e a “beleza”. A “imensidão” está no nosso
lugar, e quando a vemos, ficamos “mudos” de tantas coisas que se mostram
aos nossos olhos e a nossos corpos. Por isso, o exercício de “desver”, como

17
nos ensina o poeta sulmatogrossense Manoel de Barros, é uma experiência e
um modo de ver o mundo. Desver para a imensidão é olhar para as presenças
em detrimento das ausências. Significa deixar a imensidão entrar nos nossos
corpos para produzir cuidado integral para promover a beleza da vida. Nas
histórias, aqui reladas, vemos as presenças das vidas, que nos ajudaram a olhar
os territórios, os profissionais e as pessoas.
O Estado do Amazonas é, em si, uma grande complexidade que envolve
muitos caminhos, rios, lagos, igarapés, comunidades, populações diversas,
diferentes línguas, dinâmicas socioeconômicas, tipos de transporte, situações
transfronteiriças, conflitos de projetos de desenvolvimento, grandes obras de
infraestrutura, longas estradas, reservas extrativistas, reservas ambientais,
parque industrial da Zona Franca de Manaus, migrações e tantas outras
dinâmicas sociais, culturais, econômicas e populacionais. Essas questões
trazem desafios para o campo da saúde, mas também são oportunidades para
a inovação e a invenção de estratégias de inclusão e de promoção da saúde. É
disso que trata este livro.
As dinâmicas locais têm desafiado os gestores e as equipes de saúde a
propor inovações, com situações que demandam uma atenção diferenciada
como um novo processo, uma oferta de educação em saúde, uma nova
tecnologia, uma adaptação para as enchentes e secas, os ajustes numa
Unidade de Saúde para acolher os diferentes. Por fim, os autores e autoras
nos apresentam muitas histórias que mostram o SUS em ato, aquele que está
presente na vida das pessoas, que se faz no chão do território, no meio da
floresta, na cidade, no bairro, na comunidade, na canoa, na rabeta e no barco.
São tantas as saúdes que se fazem que nos impressionamos com a potência
do SUS na Amazônia.

18
O papel da Mostra “Brasil, aqui tem SUS”: um espaço de
inovação, troca, valorização do trabalho e fortalecimento do SUS

Os avanços a favor de direitos à saúde,


estão consistentemente expostos
e documentados nas Mostras de Experiências nos
Congressos dos Conselhos de Secretarias Municipais de Saúde
dos Estados e Nacional.
Nelson Rodrigues dos Santos

O Congresso do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde


(Conasems) é um evento de grande magnitude para o Sistema Único de Saúde
(SUS) no Brasil, sendo hoje o maior evento de saúde pública do Brasil e quiçá
do mundo. Nesse contexto, a Mostra “Brasil, aqui tem SUS” emerge como um
componente essencial, desempenhando um papel multifacetado que vai além
da simples apresentação de trabalhos no congresso. Ela se configura como um
espaço dinâmico de aprendizado, troca de experiências, reconhecimento de
boas práticas e estímulo à inovação, contribuindo significativamente para o
aprimoramento e o fortalecimento do SUS em todo o território nacional.
O SUS, por sua natureza descentralizada e universal, abrange uma
vasta gama de realidades e desafios. A Mostra “Brasil, aqui tem SUS” reflete
essa diversidade, apresentando iniciativas desenvolvidas em municípios de
diferentes portes, regiões e contextos socioeconômicos. Essa pluralidade é
fundamental para demonstrar a riqueza e o potencial do SUS, evidenciando
a capacidade de adaptação e inovação dos gestores e trabalhadores de saúde
diante das singularidades de cada localidade.
Ao expor essa diversidade, a Mostra permite que os participantes do
Congresso do Conasems tenham contato com diferentes abordagens e soluções
para problemas semelhantes. Um município que obteve sucesso na abordagem
de determinado problema, por exemplo, pode compartilhar sua experiência

19
com outros que enfrentam o mesmo desafio. Essa troca de conhecimentos é
inestimável, pois pode evitar a duplicação de esforços e acelerar o processo de
aprendizado e aprimoramento das práticas em saúde.
A Mostra contribui para desmistificar a ideia de que o SUS é um
sistema homogêneo e engessado. Ao apresentar projetos inovadores e criativos,
ela demonstra que o SUS é um espaço de constante evolução e adaptação, onde
a criatividade e a iniciativa dos profissionais são valorizadas e incentivadas.
A Mostra hoje, e todos os movimentos que a antecedem, é um riquíssimo
espaço, oportunidade e ferramenta para a educação permanente em saúde dos
trabalhadores e gestores do SUS.
A gestão municipal é a base do SUS, sendo responsável pela
organização e oferta dos serviços de saúde à população. A Mostra “Brasil, aqui
tem SUS” desempenha um papel crucial no fortalecimento dessa gestão, ao dar
visibilidade ao trabalho realizado pelas Secretarias Municipais de Saúde e ao
promover a troca de experiências entre os gestores.
Ao apresentar a experiência de seu município na Mostra, os gestores
e trabalhadores têm a oportunidade de compartilhar seus desafios, conquistas
e aprendizados com outros. Essa troca de informações é fundamental para
o aprimoramento da gestão local do SUS, pois permite que o aprendizado
com os erros e acertos uns dos outros, evitando a repetição de equívocos e
acelerando a implementação de boas práticas.
A Mostra contribui para o fortalecimento da rede de atenção à saúde,
ao destacar a importância da integração entre os diferentes níveis de atenção.
Muitas experiências apresentadas na Mostra demonstram a importância da
articulação entre os serviços de saúde para garantir a integralidade do cuidado
e a continuidade da atenção ao cidadão, usuário do SUS.
A inovação é um elemento para o aprimoramento do SUS. A Mostra
“Brasil, aqui tem SUS” desempenha um papel no estímulo à inovação, ao
reconhecer e premiar iniciativas originais e criativas que contribuem para
a melhoria da qualidade e da eficiência dos serviços de saúde. Ao valorizar

20
a inovação, a Mostra incentiva os profissionais de saúde a buscar novas
abordagens e tecnologias para os problemas enfrentados no dia a dia. Ela
estimula a criatividade e a busca por soluções originais, que podem ser
adaptadas e replicadas em outros municípios.
Além disso, a Mostra contribui para a produção de conhecimento na
área da saúde. As experiências apresentadas são portadoras de evidências do
cotidiano do trabalho, que muitas vezes ainda não foram objeto de análises
acadêmicas, ao menos nas características que têm no mundo do trabalho e,
assim, contribuem para o avanço do conhecimento na área. A Mostra também
proporciona um espaço para o debate e a reflexão sobre os desafios e as
perspectivas do SUS, o que estimula a produção de novas ideias e soluções.
As trabalhadoras e trabalhadores de saúde são o principal ativo do SUS.
A Mostra “Brasil, aqui tem SUS” reconhece o trabalho e o empenho dessas
trabalhadoras e trabalhadores, que atuam na ponta, desenvolvendo projetos
e iniciativas que fazem a diferença na vida das pessoas. Ao dar visibilidade
a esses trabalhos, a Mostra fortalece o senso de pertencimento e o orgulho
de trabalhar no SUS. Ela contribui para a valorização dessas trabalhadoras e
trabalhadores, que muitas vezes enfrentam condições de trabalho desafiadoras
e são pouco reconhecidos pela sociedade.
A Mostra contribui para o fortalecimento do SUS como política de
Estado. Ao demonstrar a importância do sistema para a saúde da população e
o seu potencial para promover a equidade e a justiça social, a Mostra ajuda a
consolidar o SUS como um direito de todos os cidadãos brasileiros.
O Congresso do Conasems se transformou num espaço de diálogo e
articulação política entre os gestores municipais de saúde, gestores estaduais
de saúde, o Ministério da Saúde e outras instituições e organizações da área
da saúde. A Mostra “Brasil, aqui tem SUS” se insere nesse contexto como um
espaço de encontro e troca de ideias, onde os participantes podem discutir
os desafios e as perspectivas do SUS e buscar soluções conjuntas para os
problemas enfrentados pelo sistema.

21
Apesar de sua importância e relevância, a Mostra “Brasil, aqui tem
SUS” enfrenta alguns desafios que precisam ser superados para que ela possa
continuar desempenhando seu papel de forma eficaz. Um dos desafios é garantir
a participação de um número cada vez maior de municípios, especialmente
os menores e mais distantes dos grandes centros urbanos. É fundamental
que a Mostra seja acessível a todos os municípios, para que todos tenham a
oportunidade de compartilhar suas experiências e aprender com os outros.
Sobre este ponto - o apoio às Mostras Estaduais organizadas pelos Cosems
e o apoio à mobilização e qualificação dos relatos das experiências para a
participação nas Mostras Estaduais - tem sido valorizado e priorizado pelo
Conasems. Outro desafio é sempre aprimorar os mecanismos de avaliação e
seleção dos trabalhos apresentados na Mostra. Em muito já avançamos, mas é
incansável a busca para que nossa avaliação seja clara e objetiva, e o processo,
transparente e justo.
A Mostra “Brasil, aqui tem SUS” tem o potencial de se tornar um
espaço ainda mais relevante para o SUS. Ela pode se tornar um centro de
referência para a inovação e a produção de conhecimento na área da saúde,
e um espaço de articulação política ainda mais forte e eficaz. Em suma, a
Mostra “Brasil, aqui tem SUS” é o coração que pulsa SUS no Congresso do
Conasems e no SUS como um todo. Ela desempenha um papel multifacetado,
que vai desde a disseminação de boas práticas e o fortalecimento da gestão
municipal até o estímulo à inovação e a valorização das trabalhadoras e
trabalhadores de saúde.
Ao longo de 20 anos, a Mostra se consolidou como um espaço de
aprendizado, troca de experiências e articulação política, contribuindo
significativamente para o aprimoramento e o fortalecimento do SUS em
todo o Brasil. Com o apoio e o engajamento de todos os envolvidos, as
Mostras estaduais e nacional tem o potencial de se tornar ainda mais
relevante e eficaz no futuro, impulsionando o SUS rumo a um futuro mais
justo, equânime e eficiente.

22
A Mostra “Amazonas, Aqui tem SUS”: um processo de
conhecimento dos territórios, inclusão de gestores,
trabalhadoras e trabalhadores de saúde

A primeira participação do Conselho de Secretários Municipais de


Saúde do Amazonas (Cosems/AM) na Mostra “Brasil, aqui tem SUS” foi
em 2011. A presença foi modesta, apenas dois municípios apresentaram três
trabalhos, mas o esforço valoroso, considerando um estado constituído por 62
municípios, marcados pela vasta extensão territorial e dificuldades no acesso.
Depois de uma década, os avanços foram se tornando perceptíveis a cada ano.
Até 2018 a média da participação nas Mostras eram em torno de 5 municípios,
com 13 trabalhos. Nesse ano, pela primeira vez o Cosems AM conseguiu
realizar sua 1ª Mostra Estadual Amazonas, Aqui tem SUS. A média da
participação em torno de 5 municípios e no máximo 13 trabalhos.
A 2ª Mostra “Amazonas, Aqui tem SUS” foi realizada em 2019, em
Manaus, no quando foram selecionados seis trabalhos para representar o
estado na 16ª Mostra Nacional “Brasil, Aqui Tem SUS”, em Brasília. O objetivo
da Mostra Nacional é propiciar o compartilhamento de experiências no SUS;
divulgar as ações de municípios e suas inovações para solucionar problemas;
promover a visibilidade de práticas de saúde no nível local e territorial; refletir
sobre a gestão e organização de serviços de saúde para o fortalecimento
estratégico do Sistema Único de Saúde (SUS).
Marcia Cristina Marques Pinheiro, coordenadora nacional da Mostra
“Brasil, aqui tem SUS” e o professor Alcindo Ferla, da Universidade Federal
do Rio Grande do Sul, em 2019, realizaram a primeira Oficina de Escrita,
que teve como objetivo estimular os profissionais de saúde a reconhecerem a
importância de seus trabalhos e os registrarem na Mostra. Nesse ano, houve a
participação de 9 municípios e 36 trabalhos. O Amazonas foi premiado na 16ª
Mostra Brasil, aqui tem SUS – 2019, com o trabalho: Amazonas Combatente
municipal – Escola e Comunidade Livres do Aedes Aegypti. Autora: Liliam
Rafaelle Souza da Silva, município de Nova Olinda do Norte.

23
Em 2020, o Congresso Nacional, que aconteceu no município de Campo
Grande- MS foi suspenso, devido à pandemia de Covid-19. Por este motivo A 17ª
Mostra Brasil, aqui tem SUS foi a 1ª Mostra Virtual “Brasil, aqui tem SUS”, realizada
durante o I Congresso Virtual do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de
Saúde – Conasems nos meses de julho a novembro. A Mostra “Amazonas, Aqui tem
SUS” não aconteceu na modalidade presencial, sendo selecionado para participar
da 1ª Mostra virtual, o trabalho do município de Autazes-AM, intitulado: Saúde
ribeirinha no gerenciamento para organização dos serviços de saúde na UBS
flutuante para enfrentamento da Covid-19 no município de Autazes, tendo como
autora: Gigellis Duque Vilaça (Secretária Municipal de Saúde).
Em 2021 também não foi realizado o Congresso Conasems,
continuando suspensa a 17ª Mostra Brasil aqui tem SUS e a Mostra “Amazonas,
Aqui tem SUS”, por motivo agravante da pandemia Covid-19.
A 3ª Mostra Amazonas, Aqui Tem SUS selecionou os cinco melhores
trabalhos que concorreram nas 17ª Mostra “Brasil, Aqui tem SUS”, no
Congresso do Conasems, no período de 12 a 15 de julho de 2022, em Campo
Grande, Mato Grosso do Sul. Na mostra estadual participaram 14 municípios
e 54 autores, sendo os vencedores os municípios de Tefé (1º), Manaus (2º),
Presidente Figueiredo (3º), Barcelos (4º) e Manicoré(5º).

• OS DESAFIOS DA COLETA DO TESTE DO PEZINHO EM


TEMPO DE PANDEMIA, do Município de Tefé, que teve como
autores Clevelland Gomes Sampaio Junior, Denise de Castro
Rodrigues, Gleiciane Araujo Rodrigues e Danielison Sena e apoio
da Secretária de Saúde Lecita Marreira.

• PREVENTIVO EM SUAS MÃOS, da cidade de Manaus, que teve


como autores Hellen Bastos Gomes, Glória Pereira de Freitas,
Lorena Cleyce Vinhote Araújo, Ericleia Luna Costa de Souza,
Elisangela Goncalves de Oliveira, Cláudia Abreu Cardoso e apoio
do Secretário de Saúde Djalma Pinheiro Pessoa Coêlho.

24
• CONFERÊNCIAS LOCAIS DE SAÚDE: ESTRATÉGIAS DE
EDUCAÇÃO PERMANENTE PARA O PLANO MUNICIPAL
DE SAÚDE, do Município de Presidente Figueiredo, que teve como
autores Camilla Maria Nery Baracho de França, Izi Caterini Paiva Alves
Martinelli dos Santos, Júlio Cesar Schweickardt, Thalita Renata Oliveira
das Neves Guedes, Delcicleide Machado da Silva e Mariane de Souza
Abreu que também é Secretária de Saúde de Presidente Figueiredo.

• NÚCLEO DE APOIO À SAÚDE DO MUNICÍPIO DE BARCELOS


(EM SUBSTITUIÇÃO AO MODELO DE CASA DE APOIO), do
Município de Barcelos, que teve como autora Rayna Aparecida
Gadelha Sussuarana e apoio da Secretária de Saúde Patrícia Leite.

• DO RIBEIRINHO AO URBANO NA CONSTRUÇÃO DO


PLANO MUNICIPAL DE SAÚDE: UMA EXPERIÊNCIA
PARTICIPATIVA, DO MUNICÍPIO DE MANICORÉ. Autores:
Manoel Cetauro da Fonseca Júnior, Kedison da Silva Monteiro,
Liliane da Silva Soares, Mariles Bentes da Silva, Josely Maria
Brandão Colares e Maria Adriana Moreira que também é Secretária
de Saúde de Manicoré.

A 4ª Mostra “Amazonas, Aqui tem SUS” foi realizada no Tribunal de


Contas do Estado- TCE, em 2023. Nesse ano foi iniciado o curso de escrita pela
Laboratório de História, Políticas Públicas e Saúde na Amazônia (LAHPSA/
Fiocruz Amazônia) para apoiar os municípios na escrita das suas experiências. A
metodologia do curso foi definida em reuniões semanais, com a participação dos
apoiadores, da equipe técnica do Cosems e da coordenação do projeto, exercida
pela então secretária executiva do Conselho, Moana Mendes Fialho Serravalle,
e pelo professor e pesquisador da Fiocruz Amazonas, Júlio Cesar Schweickardt.
Além de ampliar a Mostra “Amazonas, aqui tem SUS”, o objetivo era
fortalecer a gestão municipal, dando visibilidade às boas práticas. A Fiocruz

25
disponibilizou uma plataforma digital para a realização dos encontros e
ajudou na construção metodológica do curso, dividido em quatro módulos: 1)
produção de conhecimento; 2) comunicação em saúde; 3) escrita e construção
de conteúdo; 4) relevância das práticas. O Curso teve duração de 40 horas, com
intervenções uma vez por semana. As aulas foram gravadas e disponibilizadas
no Campus Virtual da Fiocruz. A proposta surpreendeu pelo interesse. Foram
disponibilizadas inicialmente 300 vagas para o interior e 50 para a capital, mas
com a procura, o número foi ampliado para comportar 466 participantes de 56
municípios do Amazonas. Um dos efeitos positivos do processo de qualificação
da 4ª Mostra e a realização das mostras municipais.
A participação direta dos municípios na apresentação dos trabalhos
e na seleção das experiências apresentadas nas mostras estadual e nacional
tornou o processo mais democrático e representativo. Em 2023, 17 municípios
do Amazonas realizaram mostras municipais, apresentando 220 trabalhos.
A empolgação dos gestores levou à distribuição de prêmios como motos
e computadores para as experiências de maior destaque e financiamento para
participar da Mostra Nacional.
A grande movimentação das mostras municipais ampliou a atuação
dos municípios como Tefé e Manicoré, que reuniram, respectivamente, 30 e
37 trabalhos em suas cidades. A capital Manaus conseguiu apresentar na sua
Mostra Municipal com 80 trabalhos. Os autores das seis experiências vencedoras
também foram premiados nas etapas municipais, participaram do curso de
atualização em escrita, o que reflete o envolvimento de toda equipe do Cosems.
O Cosems Amazonas foi premiado na 18ª Mostra “Brasil, aqui tem SUS”:

• COSEMS: NO BANZEIRO DO AMAZONAS TEM SUS –


FORTALECENDO A GESTÃO ATRAVÉS DAS MOSTRAS DE
EXPERIÊNCIAS EXITOSAS. Autora: Moana Mendes Fialho Serravalle.

• Prêmio Conasems-documentários fez parte do Projeto “Webdoc


Brasil, aqui tem SUS” e recebeu um Certificado de Premiação

26
pelo respectivo Estado: TELEMEDICINA: QUEBRANDO
PARADIGMAS E REFORMULANDO CAMINHOS. Município:
Barcelos/AM. Autora: Ana Kelly Rodrigues Amaro Ugarte

• Prêmio Cosems pela capacidade de “Sensibilização e Mobilização”:


prêmio no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) e um Certificado
de Premiação.

Nesse mesmo ano, foi apresentado de forma virtual, os trabalhos


selecionados referente a 1ª Mostra ImunizaSUS Amazonas. Trata-se de uma
iniciativa do Conselho Nacional de Secretarias Municipais de Saúde Conasems,
em Parceria com os respectivos Conselhos de Secretarias Municipais de
Saúde (COSEMS) e a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), por
meio do Núcleo de Educação em Saúde Coletiva NESCOM. No Amazonas
se inscreveram 29 trabalhos, que contou com representante das nove regiões
de saúde. Entre os dias 19 e 20, os representantes tiveram a oportunidade de
apresentar as experiências para a banca avaliadora, composta por mestres
e doutores da Fiocruz, UFAM, UNICEF, FVS-RCP, todos com grande
experiência em Políticas Públicas de Saúde no Contexto Amazônico. Os nove
trabalhos selecionados do Amazonas foram apresentados nas experiências no
Congresso Nacional do Conasems em julho de 2023.
Em 2024 foi realizado a Oficina de escrita pela Fiocruz para a realização
da 5ª Mostra Amazonas Aqui tem SUS, realizado no Tribunal de Contas do
Estado- TCE. Evidenciou-se o aumento no número de Mostras Municipais
com 20 municípios e 263 trabalhos inscritos. Os seis trabalhos selecionados
apresentaram de forma virtual devido o cancelamento do XXXVIII Congresso
do Conasems em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, em razão da calamidade
pública declarada pela inundação das cidades durante as intensas chuvas. Os
trabalhos vencedores foram:

27
Vencedores da 5ª Mostra Vencedores da 19ª Mostra
Município Autores
Estadual Nacional
Cosems Gigellis Duque Empodera gestão: Prêmio CONASEMS. Premiação
Am Vilaça ações colaborativas Geral - modalidade 2 -
para qualificação experiências dos COSEMS.
dos instrumentos de Prêmio capacidade de
planejamento no amazonas “Sensibilização e Mobilização”
Atalaia do James Balsa da saúde flutuante Prêmio CONASEMS. Premiação
Norte Rodrigues promove a equidade a Geral - modalidade 1 (equipes
Guedes ribeirinhos e indígenas do de trabalho de da gestão dos
vale do javari municípios e do DF) - Maiores
Notas da Região Para Municípios
com até 20 mil habitantes
Boca do Anna Beatriz Atendimento domiciliar Prêmio IdeiaSUS. Fiocruz e SUS
Acre Chagas Freitas em meio às enchentes: Prêmio CONASEMS. Premiação
cuidado que transcende as Geral - modalidade 1 (equipes
adversidades de trabalho de da gestão dos
municípios e do DF) - Maiores
Notas da Região
Careiro Karina Hérois das águas: desafios e
Sebastiana potencialidades nas urgências
Macedo e emergências em um
Araújo município amazônico
Manicoré Alexsanderson Projeto Amazônia solidária Webdocs Brasil, Aqui Tem SUS
de Souza em Nazaré Capanãzinho: a
Passos construção de produtos de
comunicação em saúde
Nhamundá Carolina Neves Caravana de reabilitação:
Jacaúna serviços de fisioterapia
ofertados em comunidades
ribeirinhas de Nhamundá.
Rio Preto Andreza Cezar Sensibilização das mulheres Prêmio CONASEMS. Premiação
da Eva Fonseca para coleta do preventivo Geral - modalidade 1 (equipes
utilizando como estratégia de trabalho de da gestão dos
cartas convites municípios e do DF) - Maiores
Notas da Região
Silves Auricélia Fisioterapia pélvica:
Maria Queiroz derrubando pré-conceitos e
Assis transformando vidas

A 6ª Mostra “Amazonas, Aqui tem SUS”, versão 2025, teve o


regulamento publicado, com data prevista para acontecer nos dias 07 e 08 de
maio. Nesta edição, teremos 18 trabalhos para representar o estado na Mostra
Nacional nos dias 15 a 18 de junho em Belo Horizonte/MG.

28
O que nos dizem os textos

Os capítulos passaram por um longo processo de avaliação, pois, muitos


deles, passaram pelas Mostras Municipais, em seguida participaram da Mostra
“Amazonas, Aqui Tem SUS”, sendo que 6 foram selecionados para participar na
Mostra Nacional “Brasil, Aqui Tem SUS”. Os textos que compõem esta obra são
as experiências premiadas em 2023 e 2024, por isso que temos municípios com
mais de um capítulo ou que receberam dois ou mais prêmios na Estadual. Em
seguida, os autores e autoras foram convidados para participar da escrita do Livro
“Aqui tem SUS”: promovendo os cuidados nos territórios do Amazonas.
A metodologia das escritas partiu de uma concepção de que todos os
textos têm algo a dizer e, portanto, não há certo ou errado, mas um processo
de aprendizagem, de Educação Permanente. Assim, cada grupo de autores foi
acompanhado por pesquisadores, estudantes de mestrado e doutorado, apoiadores
do Cosems AM, que acompanharam as escritas em todo o processo. Os textos
foram encaminhados para avaliadores externos que fizeram sugestões para
qualificar a escrita e, em seguida, foi devolvido aos autores e autoras para revisão.
Por fim, os organizadores fizeram uma revisão final para a versão final dos textos.
Temos 115 autores e autoras, distribuídos em 20 municípios do Amazonas,
com temáticas diversas que abordam desde estratégias da Atenção Básica, saúde
ribeirinha, saúde bucal, atenção hospitalar, práticas integrativas e complementares,
educação em saúde, saúde mental, gestão e financiamento. Destacamos que todas
as 9 regiões de saúde estão representadas nos textos, mostrando a diversidade e
potência do SUS em territórios com realidades diferentes.
Iniciamos nossa caminhada pelo Alto Rio Solimões com o texto “Vale
pela vida”: relato de uma experiência com a balsa da saúde em Atalaia do
Norte, Vale do Javari, AM. Este capítulo aborda a utilização de uma balsa
para realizar atenção às populações ribeirinhas e indígenas do município de
Atalaia do Norte. A prática é inovadora porque traz uma resposta para superar
as questões de acesso que marcam a região do Vale do Javari.

29
A região do médio Rio Negro traz a experiência de criação de uma
Enfermaria indígena: um relato de experiência bem-sucedido no hospital
geral de Barcelos, uma questão que acompanha a saúde indígena em diversos
municípios do país. Os profissionais e gestão apresentam uma experiência de
adaptação de espaço e alimentação diferenciada para a população indígena,
diminuindo os impactos culturais que uma internação hospitalar acarreta à
vida dos indígenas. Barcelos ainda traz o texto Saúde Digital e Telemedicina:
quebrando paradigmas e reformulando caminhos, que mostra a introdução
de tecnologias de telemedicina ampliar o acesso aos atendimentos de média
complexidade, ampliando o cuidado às regiões de difícil acesso na Amazônia.
O município de Boca do Acre, região do Purus, traz o texto
Atendimento domiciliar: cuidado que transcende as adversidades nas
enchentes em território amazônico. A experiência descreve as estratégias
que a gestão construiu para realizar cuidados domiciliares no período das
enchentes, garantindo a continuidade da atenção na Atenção Básica, mesmo
em situações provocadas pelas mudanças climáticas, que têm gerado situações
de cheias e secas cada vez mais severas. Portanto, a experiência pode passar
a ser parte do planejamento da gestão municipal para enfrentar as questões
climáticas severas.
A região do Juruá traz o texto Acompanhamento de usuários com
feridas na Atenção Primária em Saúde no município de Carauari-AM,
quando analisa as práticas de acompanhamento e tratamento de usuários
com feridas crônicas na Atenção Básica, criando referências importantes
que impactam na diminuição das transferências para a alta complexidade. A
estratégia tem mostrado resultados importantes para a melhoria da qualidade
de vida dos usuários.
O município Careiro Castanho traz duas experiências da saúde
ribeirinha. O primeiro é a Desafios da adesão dos usuários ao programa
Hiperdia em uma comunidade ribeirinha no Careiro Castanho, AM,
quando promove a inclusão de usuários do programa Hiperdia em uma

30
comunidade ribeirinha, buscando estratégias para a adesão dos usuários ao
Programa, com sugestões próximas da realidade dos usuários, com símbolos
e uma linguagem acessível nos receituários e orientações. O segundo texto
Heróis das águas: desafios e potencialidades nas urgências e emergências
em um município amazônico aborda os desafios enfrentados pelas da saúde
ribeirinha em emergências em um município que tem a maior parte do seu
território alagado durante a cheia dos rios.
A região do Solimões traz o Projeto visão além do futuro: uma
ação intersetorial no município de Coari, AM, onde relata a iniciativa a
saúde visual dos usuários no município, especialmente da população escolar,
promovendo a inclusão dos jovens e o acesso aos óculos de modo gratuito.
Assim, o projeto fortalece o Programa Saúde e Escola, como uma proposta
intersetorial que amplia as ações da saúde.
O município de Eirunepé, na região do Juruá, traz duas experiências,
sendo a primeira Fisioterapia em grupo: tratamento da lombalgia na
Atenção Básica em Eirunepé – AM, que discute a eficácia de sessões de
fisioterapia em grupo no tratamento de lombalgia. A prática mostra a inclusão
do profissional fisioterapeuta na Atenção Aásica do SUS, pois pode ampliar as
possibilidades de um cuidado integral, realizando ações de promoção de saúde
e reduzindo a demanda na atenção especializada, sobretudo em um município
de difícil acesso. A segunda experiência é o Projeto papo de mãe: educação e
atenção à saúde na gestação em Eirunepé, AM, quando destaca a educação
em saúde no âmbito da Atenção Básica para a inclusão das gestantes ao pré-
natal. O compartilhamento coletivo das vivências, pela fala e da escuta, mostra
os efeitos sobre a saúde corporal e mental das gestantes.
O texto Ampliação do acesso ao tratamento de doenças crônicas da
população de área remota em Humaitá/AM analisa as estratégias implementadas
para ampliar o acesso ao tratamento de doenças crônicas na região do Rio Madeira,
especialmente para as questões logísticos da região. A experiência mostrou que
a interação entre as Equipe Saúde da Família, Equipe Multiprofissional com a

31
Assistência Farmacêutica é importante para uma abordagem mais integrada e
eficaz no cuidado ao usuário. O uso de medicamentos pode ser mais seguro e
adequado às necessidades de saúde da população.
A região do Médio Amazonas trouxe a experiência do Centro
municipal de referência ao autismo: relato de experiência do apoio às
crianças e aos pais atípicos do município de Itacoatiara-AM. Os autores
compartilham a experiência de um cuidado às crianças com autismo e suas
famílias. O Centro Municipal de Referência ao Autismo trouxe esperança
para as famílias, promovendo a inclusão e a possibilidade de que cada pessoa
com autismo alcance seu pleno potencial. Assim, a experiência mostra
que o acolhimento e a empatia trazem a esperança de que o autismo seja
compreendido e respeitado, em todos os espaços e por todas as pessoas.
A região do Purus, traz a experiência Desafios no cuidado em saúde
mental de comunidades ribeirinhas: estratégias do CAPS I em Lábrea,
Amazonas. As abordagens adotadas pelo Centro de Atenção Psicossocial nos
cuidados de saúde mental a comunidades ribeirinhas no município de Lábrea.
As comunidades ribeirinhas ficam, muitas vezes, isoladas pelas questões do
transporte e das emergências climáticas, impactando em tipos de cuidados
como da saúde mental. Além disso, há o estigma relacionado às questões de
saúde mental, sendo assim, a ação da equipe amplia o acesso ao cuidado e às
terapias propostas. Apesar disso, os profissionais do CAPS I têm o compromisso
com as populações ribeirinhas no acesso à saúde mental.
O município de Manaus apresenta cinco experiências que mostra as
inovações em Programas e serviços especializados na capital amazonense.
O texto Inovação no combate da tuberculose: tecnologia auxilia na
identificação de usuários com falha no seguimento do tratamento em
Manaus, AM. Destacamos o uso da tecnologia para o acompanhamento e
monitoramento dos usuários com tuberculose, impactando na adesão ao
tratamento e nos resultados de gestão do Programa. A segunda experiência vem
da Equipe do Consultório na Rua, intitulada Da concepção à contracepção:

32
como iniciou a estratégia de ofertar DIU às mulheres em situação de rua
de Manaus-AM. A implementação do fluxo de DIU em mulheres em situação
de rua garante a dignidade em saúde reprodutiva e sexual. A experiência
trouxe visibilidade e promoveu a autonomia sobre a saúde reprodutiva dessas
mulheres, possibilitando a expansão de outros métodos contraceptivos. O texto
Educação em saúde para professores e funcionários da educação básica e
recreação infantil apresenta as ações intersetoriais entre saúde e educação na
formação de professores e alunos em questões que envolve as emergências.
Importante destacar que a formação foi conduzida pelos profissionais do
SAMU. O texto Agente indígena de saúde: uma rede viva no contexto urbano
da zona norte de Manaus destaca o papel Agentes Indígenas de Saúde (AIS) em
território urbano. Os AIS contribuíram na identificação das redes dos usuários
indígenas, pois estavam invisíveis para os trabalhadores e gestores, pois não
tinham um cuidado diferenciado. Assim, o AIS por ser indígena contribuiu
com as equipes no mapeamento e no desenvolvimento das ações com a
população indígena em área urbana. Finalmente, a experiência Olimpíadas
da terceira idade e práticas corporais na atenção primária como estratégia
de promoção da saúde, Manaus/AM discute a implementação das práticas
corporais na Atenção Básica, buscando a promoção da saúde dos idosos e o
acompanhamento das ações de saúde no território.
O município de Manicoré, região do Rio Madeira, trouxe duas
experiências na saúde bucal. A Promoção de saúde bucal da população
ribeirinha no município de Manicoré-AM: uso do diário como estratégia de
planejamento analisa o uso de diários como ferramenta de planejamento na
promoção da saúde bucal entre a população ribeirinha. Os diários e relatórios
foram importantes para avaliar e monitorar as ações, assim como pensar nas
estratégicas de cuidado para o território líquido. O texto Saúde na Amazônia:
a implantação e atuação das equipes de saúde bucal na área ribeirinha
município de Manicoré/AM apresenta o processo de implantação das equipes
de saúde bucal nas áreas ribeirinhas. Esse processo foi acompanhado pela

33
territorialização das equipes que culminou no planejamento das ações e no
processo de criação de infraestrutura para o trabalho nesse território.
O município de Nhamundá, região do Baixo Rio Amazonas, trouxe três
experiências. Capacitação em primeiros socorros nas escolas: instrução de
manobra de Heimlich na prevenção de engasgos em crianças no município
de Nhamundá, AM aborda a importância da capacitação de professores e
funcionários de escolas em primeiros socorros, com foco na instrução da manobra
de Heimlich para a prevenção de engasgos em crianças. A Lei Federal nº 13.722,
conhecida como Lei Lucas, torna obrigatória essa capacitação, reforçando a
necessidade de treinamento adequado para lidar com emergências comuns no
ambiente escolar. A segunda experiência “Flor de tucumã”: serviço da eMulti e
exame Papanicolau humanizado em mulheres do município de Nhamundá,
AM descreve o projeto que teve como objetivo ampliar os exames de Papanicolau
às mulheres, como uma estratégia de prevenção do câncer cervical. Finalmente, a
Caravana de reabilitação: serviços de fisioterapia ofertados em comunidades
ribeirinhas de Nhamundá, AM relata a ação dos serviços de fisioterapia às
comunidades ribeirinhas. A estratégia busca superar as barreiras do território e
o isolamento dessa população, ampliando o acesso aos cuidados de fisioterapia.
O município de Rio Preto da Eva, região de Manaus e Entorno,
apresenta duas experiências. A fonoaudiologia no atendimento de crianças
com Transtorno do Espectro Autista em Rio Preto da Eva/AM destaca a
importância da fonoaudiologia no atendimento a crianças com Transtorno
do Espectro Autista (TEA). A abordagem é humanizada e busca promover
a inclusão e a socialização das famílias e crianças na sociedade, além de
promover a qualidade de vida dessas crianças. O texto Convite ao cuidado:
sensibilização de mulheres para o preventivo por meio de cartas é uma
iniciativa criativa da equipe da Atenção Básica para criar vínculo e promover
um acolhimento às mulheres. Assim, foi possível ampliar o rastreamento do
câncer do colo do útero, com um acolhimento humanizado, com tecnologias
leves que valorizam as relações de afeto no cuidado equânime.

34
A região do Alto Rio Solimões traz a experiência Radar Odonto:
proporcionando acesso à assistência odontológica no município de São
Paulo de Olivença, AM, que visa ampliar o acesso à atenção odontológica. As
dificuldades das equipes e da população no acesso aos serviços é um desafio
para regiões como a do Alto Rio Solimões. Os autores sugerem que isso pode
ser superado pela educação permanente e pelo investimento em infraestrutura
e insumos, assim como no transporte para áreas remotas, onde estão as
populações indígenas aldeados e ribeirinhas.
O município de Silves, região do Médio Rio Amazonas traz três
experiências. A primeira, Equipe multiprofissional eMulti: promovendo
qualidade de vida para crianças com necessidades especiais de saúde
e suas famílias no município de Silves – AM, aborda a atuação da equipe
multiprofissional na inclusão de crianças com necessidades especiais de saúde
e suas famílias. O trabalho da equipe possibilitou a promoção da saúde física
e mental das crianças, construindo a perspectiva de cidadania e respeito pela
condição das crianças e familiares. A segunda experiência, Faturamento
hospitalar: aprimorando a gestão no município de Silves, AM analisa as
estratégias implementadas para aprimorar a gestão financeira do hospital. O
texto, além de trazer uma ótima reflexão sobre a questão de financiamento
da Média e Alta Complexidade, mostra que a experiência de Silves é possível
encontrar soluções para os desafios de perdas e otimização de recursos.
O registro hospitalar ampliou a qualidade e oferta de serviços, respeitando
os princípios e diretrizes do SUS. Por fim, o texto Fisioterapia pélvica:
derrubando pré-conceitos e transformando vidas em Silves, AM explora a
introdução da fisioterapia pélvica para a promoção da saúde das mulheres. O
depoimento das mulheres mostra que passaram a ser protagonistas de suas
vidas, conhecendo o seu corpo. As mulheres tiveram a oportunidade de falar
sobre os seus temores e desconfortos. As autoras finalizam: “Temos a certeza
de que, em breve, a Fisioterapia Pélvica será amplamente conhecida e fará
parte da rotina de cuidados femininos”.

35
O município de Tefé, região do Médio Rio Solimões relata duas
experiências; A primeira, Gestantes vivendo com HIV: o trabalho para
eliminar a transmissão vertical no município de Tefé, AM, onde descreve as
ações desenvolvidas para prevenir a transmissão vertical do HIV de gestantes
para seus filhos. A abordagem humanizada foi importante no acolhimento e no
apoio emocional e psicológico às gestantes. Além disso, a experiência contribuiu
para a adesão da prevenção e para a qualificação dos profissionais de saúde.
O segundo texto, Inclusão das práticas integrativas e complementares no
município de Tefé-AM relata a inclusão das PICS nas ações de saúde. O relato
apresenta o alcance das PICS e como tem impactado na vida da população e
na saúde dos trabalhadores. A experiência traz o componente de compromisso
profissional e da gestão no fortalecimento das PICS no município. As práticas
utilizadas no cotidiano dos serviços são: acupuntura, quiropraxia, ventosas
meditação, dança circular, aromaterapia, musicoterapia, que possibilitam
formas de cuidado únicas e diferenciadas.
Por fim, o texto dos apoiadores do Cosems, intitulado Empodera gestão:
instrumentos de planejamento para uma saúde solidária no Amazonas
apresenta a experiência de Educação Permanente para o empoderamento dos
instrumentos de gestão. A metodologias foi ativa e buscou a participação dos
gestores do Amazonas, buscando cumprir com a legislação de transparência e
responsabilidade em relação aos órgãos de controle do SUS e das políticas públicas.

Finalizando a nossa caminhada

As palavras finais são de agradecimento as todas as pessoas envolvidas


na produção deste livro, a confiança da diretoria do Cosems, dos apoiadores
e dos colegas pesquisadores. Gratidão pelo engajamento e compromisso dos
estudantes de mestrado e doutorado, dos colegas do LAHPSA que toparam a
ideia de uma construção coletiva do conhecimento. Por fim, um agradecimento
especial para os trabalhadores, trabalhadoras e gestores do Amazonas que
realizam o seu trabalho nos mais distintos territórios da nossa Amazônia.

36
Temos o grande prazer de tornar público, por meio deste livro, uma pequena
parcela, mas muito significativa do que todos e todas realizam pela inclusão,
acolhimento e promoção da qualidade de vida das populações.
Concluímos com as palavras do pensador Nêgo Bispo (2023):

Um rio não deixa de ser um rio porque conflui com outro rio. Ao
contrário: ele passa a ser ele mesmo e outros rios, ele se fortalece.
Quando a gente confluencia, a gente não deixa de ser a gente, a gente
passa a ser a gente e outra gente.

Referências

Bispo, N. (2023). A terra dá, a terra quer. São Paulo: UBU

Galeano, E. (2002). O livro dos Abraços. Porto Alegre: L&PM.

37
“Vale pela vida”: relato de uma
experiência com a balsa da saúde em
Atalaia do Norte, Vale do Javari, AM
James Rodrigues Guedes
Antônio Amancio Barbosa Neto
Greyciane Rodrigues Saldanha Mesquita
Viviane Lima Verçosa

Vale do Javari
Javari Ituí
Javari Curuçá
Javari Itaquaí
Bacia dos belos Matsuí
Berço bravo dos Mayoruna-Curuçá
Sina feliz dos Kulina Itaquaí
Braço forte dos Marubo Javari
Cacete de morte dos Kixitos Kaniuá, ah, ah, ah

Vale do Javari
Vale das madeiras
Pérola, ah, ah, ah
Palmeiras do Javari
Dos índios arredios
Pérola, ah, ah, ah

Nada vale como um vale de lágrimas


Vale pela vida, pelo sangue dos Mayorunas

Pelo riso dos Matis


Pelo viço dos Kulinas
Pela arte dos Marubos
Pelo cacete dos Korubos
Pelo grito de guerra, ah, ah
Pelo grito de guerra, ah, ah

39
Remate dos males
Atalaia do Norte
Estirão do Equador

Pelo riso dos Matis


Pelo viço dos Kulinas
Pela arte dos Marubos
Pelo cacete dos Korubos
Pelo grito de guerra, ah, ah
Pelo grito de guerra, ah, ah
Dos Kanamarís

Javari Ituí
Javari Curuçá
Javari Itaquaí
Bacia dos belos Matsuí
Berço bravo dos Mayoruna-Curuçá
Sina feliz dos Kulina Itaquaí
Braço forte dos Marubo Javari
Cacete de morte dos Kixitos Kaniuá, ah, ah, ah

Pelo grito de guerra, ah, ah


Dos Kanamarís
Composição João Melo Faria / Ronaldo Barbosa

A toada Vale do Javari, que é entoada nas apresentações na festa cultural


de Parintins/AM e nas apresentações do Boi Caprichoso, faz um chamado de
denúncia da situação de abandono da região e dos povos originários e fala
sobre o “grito de guerra” como representação da resistência, luta pela existência
e força destes povos, discorre sobre as potências características de cada povo,
foi escrita por João Melo Farias e musicada por Ronaldo Barbosa em 1996, mas
que até os dias atuais tem uma forte representatividade sobre a realidade e o
contexto territorial.

40
Uma breve apresentação sobre Atalaia do Norte

Atalaia do Norte é mundialmente conhecida por abranger a


Terra Indígena Vale do Javari, a maior reserva de indígenas isolados
do mundo, onde vivem 7 etnias (Marubo, Mayuruna, Matis, Kulina,
Kanamari, Korubo e Tsohom Dyapa), distribuídos em 7 calhas de rios. O
município de Atalaia e o Vale do Javari ficaram mundialmente conhecidos
recentemente com o último acontecimento sobre o assassinato ocorrido
em junho de 2022 de Bruno Araújo Pereira, servidor de carreira da
FUNAI e uma significativa representatividade do indigenismo, e Dom
Phillips, jornalista inglês de 57 anos.
No Rio Javari, onde está o porto do município, atracam canoas
oriundas das comunidades rurais e aldeias indígenas, algumas embarcações
permanecem por períodos de até 4 meses. As pequenas embarcações são
utilizadas como moradia destas populações e povos que viajam por dias
para chegar ao município em busca de benefícios sociais e atendimentos de
saúde. A região portuária é um local de muita vulnerabilidade, suscetível a
doenças como as de veiculação hídrica devido ao uso das águas do rio para
suas necessidades básicas. Assim, em 2022, a Prefeitura de Atalaia do Norte
construiu uma Balsa de Atendimento Multiprofissional no porto da cidade
para estar mais próximo dos usuários, seus modos de vida e realidade.
Como uma proposta de inovação da organização em saúde, a Balsa
Flutuante de Atendimento Multiprofissional oferta desde 2022 atenção à
saúde para populações ribeirinhas e indígenas do município de Atalaia
do Norte, Amazonas. O município está localizado na região do Alto Rio
Solimões, a 1.136 km de distância da capital do Estado, Manaus, possui
uma área de 76.354,985 km, com uma população de 15.314 habitantes
(IBGE, 2022).

41
Figura 1. Mapa de localização (Atalaia do Norte).

Fonte: Organizado por: Lupuna Corrêa de Souza, 2024.

Equidade, transformação e garantia de direitos

A Amazônia traz consigo uma pluralidade de povos, populações,


territórios e realidades, por conseguinte, demanda que o olhar sobre o cuidado
em saúde seja transversalizado, entendendo a necessidade daqueles que vivem
em meio às diversidades de um local que poderíamos chamar de amazônias,
dada às diversidades existentes. A práxis é um exercício contínuo frente às
situações apresentadas para que se busque a tão almejada transformação das
realidades que fomentam iniquidades, o fazer saúde estará sempre atrelado em
fazer diferente ao diferentes.

42
A Amazônia não é o lugar “sólido” da desordem, como parecem
indicar repetidamente os estudos sobre endemias e padrões de
doenças. Apenas tem uma complexidade aguda nos acontecimentos,
inclusive endemias e adoecimentos, e uma diversidade que é
estruturante, o que gera tensões e movimentos contínuos. Para
tornar visíveis os saberes e dinâmicas locais, requer olhares fluidos
e também complexos com uma epistemologia aberta ao outro
(Martins, et al., 2022).

Imagem 1. Balsa Flutuante.

Fonte: Greyciane Rodrigues Saldanha Mesquita, 2024.

Falar sobre e promover equidade em saúde, perpassou por ampliar


uma visão holística acerca do cuidado percebendo a importância da
integralidade, das potencialidades do território e as reais necessidades
daqueles que precisam da garantia de acesso através das ações da atenção
básica realizadas pela equipe multiprofissional à população ribeirinha e
indígenas do Vale do Javari, no porto do município de Atalaia do Norte, a
balsa flutuante realiza atenção à saúde às populações em trânsito no porto
do município, identifica as condições de saúde destas pessoas, buscando
desenvolver ações de promoção e educação em saúde, especialmente em

43
relação às doenças diarreicas para promover uma saúde integral e intersetorial
próxima do território de vida das diversas gentes.
O Ministério da Saúde, considerando as questões de saúde dos
povos que vivem em contextos dos campos, florestas e águas, instituiu em 12
de dezembro de 2005 a Portaria MS/GM nº 2.460 o Grupo da Terra para a
elaboração da Política que, desde então, tem-se pensado e trabalhado para
a melhoria das condições de saúde e mitigação das iniquidades vivenciadas
por estes povos e populações que foram invisibilizados ao longo do tempo,
desta forma nasce em 2 de dezembro de 2011, através da Portaria n.º 2.866 A
Política Nacional de Saúde Integral das Populações do Campo, das Florestas
e das Águas (PNSIPCFA) para que a política fosse pensada no viés da teoria e
prática com base na realidade dos territórios e seus moradores (Brasil, 2013).

Imagem 2. Registro da Balsa Flutuante.

Fonte: Greyciane Rodrigues Saldanha Mesquita, 2024.

Sobre a terminologia PCFA (Populações dos Campos, Florestas e


Águas), Carneiro et al. (2018) pontuam sobre ser “um conceito contemporâneo

44
dos movimentos sociais e populares brasileiros, e integra a luta contra a
invisibilidade dessas populações dentro do setor saúde. Esta terminologia
destaca que as práticas culturais, o modo de vida e de cuidar popular e do SUS
precisam ser compreendidos e são diferenciados”.
A Balsa Flutuante de Atendimento Multiprofissional foi construída a
partir da observação do fluxo da população ribeirinha e indígena do território,
que tem características diferenciadas por serem eminentemente populações e
povos das águas e das florestas, e atende os povos indígenas em maior número,
com o objetivo de cumprir com o princípio da equidade do SUS e realizar uma
saúde diferenciada para uma população específica, indo ao encontro delas e de
seus modos de vida.
Desta forma, entendemos que uma equipe multiprofissional precisava
estar na região do porto e das canoas, que é ao mesmo tempo transporte e
moradia, para ofertar os atendimentos necessários a essa população. Na equipe
atuam: 01 médico, 01 enfermeiro, 01 técnico de enfermagem, 02 agentes de
combate às endemias, 02 microscopistas, 01 tradutor de línguas indígenas/
intérprete, sendo este profissional de saúde e indígena essencial no processo
de atendimento, 01 assistente social, 06 agentes comunitários de saúde. A
estrutura física conta com sinal de internet, Prontuário Eletrônico do Cidadão
– PEC e 05 cômodos, sendo eles: recepção, consultório de enfermagem/
médico, laboratório para exame de Malária, banheiro e cozinha. Associado aos
espaços voltados aos atendimentos em saúde, temos uma sala de atendimento
da Secretaria Municipal da Assistência Social (CRAS), visto as demandas das
populações em situação de vulnerabilidade, onde também tem um atendente
que fala em 5 línguas indígenas.

45
Imagens 3 e 4. Registro das canoas que ficam atracadas na orla de Atalaia do Norte.

Fonte: Secretaria de Saúde de Atalaia do Norte, 2024.

As transformações só se dão a partir da execução de ações que serão


efetivas e atendam a realidade, no entanto, o cenário impõe o suporte de
inúmeras redes de atenção e cuidado, levando em conta que essas pessoas
se deslocaram e não estão vivendo nos seus territórios, casas, comunidades
ou aldeias, tornando o quadro de privações, falta e escassez ainda maiores,
corroborando para a gravidade do quadro de carências e precariedades.
Os programas de cuidado em saúde desenvolvidos na balsa, perpassam
pelos cuidados ofertados pela Atenção Básica, onde trabalhamos os seguintes
programas: Saúde da Criança; Saúde da Mulher – realização de pré-natal,
dispensação de medicamentos, imunização, educação em saúde e Vigilância
em Saúde, mas sempre pensando no cuidado diferenciado de acordo com
a demanda apresentada. O trabalho é realizado diariamente, de segunda a
sexta-feira em horário integral, destacamos o trabalho desempenhado pela
equipe ESF Ribeirinha:

46
• Busca ativa de malária de indígenas em trânsito;
• Visitas do médico e enfermeira nas balsas ou canoas, visando
principalmente crianças indígenas com diarreia, vômitos, febre e
baixo peso;
• Visitas em balsas por parte da assistência social visando indígenas
sem documentos, bloqueio de benefícios, pensão pelo BPC e busca
ativa de usuários enfermos com diarreia, vômitos, febre e baixo peso;
• Realização de consultas médicas, teste rápidos, gota espessa,
entrega de medicamentos, curativos, orientações e cuidados com
a saúde indígena;
• É realizada a administração de medicamentos como xaropes,
pílulas, pastilhas e pomadas de forma presencial e com supervisão
da enfermagem, pelo fato que a maioria dos usuários tem
dificuldade na administração das medicações prescritas, por isso,
o acompanhamento é fundamental;
• Educação em saúde para cuidados com a higiene, alimentação e
saúde dos menores de idade e idosos, sempre pontuando as possíveis
doenças que possam acarretar a falta de cuidados a higiene;
• A equipe de endemias, Agentes de Combate as Endemias e
Microscopistas a realizam ações preventivas destinadas ao combate
de malária e dengue, além de orientação com relação a destinação
adequada do lixo que é um problema constante e que tem gerado
grande preocupação, pois mesmo sendo destinado vários depósitos
no local para a coleta dos resíduos, grande parte da população que ali
se encontra não o faz adequadamente, o que é notório ao se chegar
no local com grande quantidade de lixo às margens do rio, juntos
aqueles que também vivem por algum período naquelas margens;
• Coleta e leitura de lâmina de Malária pela equipe de microscopista,
tendo sido encontrado vários casos positivos de usuários que
chegam das aldeias.

47
Vale destacar que não há limite para a realização de consultas para
atendimento médico na Balsa e todos (as) são atendidos (as). Feriados, sábados
e domingos são os únicos dias que os indígenas em trânsito não são atendidos,
pois o funcionamento é de segunda a sexta-feira sendo que, em caso de extrema
urgência, os indígenas buscam atendimento hospitalar da cidade.
Os atendimentos e atividades de orientação e educação em saúde
são acompanhados pela Agente Comunitária de Saúde indígena do povo
Mayuruna que tem um papel fundamental no processo de cuidado,
viabilizando um atendimento direcionado e permitindo que os usuários
indígenas se sintam mais à vontade para compartilhar suas queixas, visto que a
maioria daqueles que procuram os serviços ofertados na balsa, são indígenas e
falam predominantemente as línguas maternas indígenas e pouco conseguem
se comunicar em português, portanto, este profissional aproxima a equipe de
saúde dos usuários e suas necessidades.

Imagem 5. gota espessa (exame para diagnosticar malária).

Fonte: Secretaria de Saúde de Atalaia do Norte, 2024.

48
Palavras Finais

A construção da balsa possibilitou monitorar a chegada das canoas


no porto, bem como identificar os principais agravos das populações
indígenas e ribeirinhas, proporcionando atendimentos imediatos, impedindo
o agravamento do quadro e possíveis óbitos por causas evitáveis. Desde a
inauguração em março/2022 foram atendidos mais de 1.500 usuários, sendo
uma média de 70 atendimentos/mês. A Gerência de Endemias coletou 1.772
lâminas para avaliação de malária, com 157 lâminas com resultado positivos,
sendo 104 Vivax e 41 falciparum, 12 LVC (Lâmina de Verificação de Cura).
A Unidade de referência possibilitou que ribeirinhos e indígenas sejam
atendidos em uma estrutura adequada, dispondo de uma equipe de profissionais
e serviços básicos, porém essenciais. Na unidade são desenvolvidas ações com
outras secretarias e instituições, como: Campanha Nacional de Vacinação
juntamente com Distrito Sanitário Especial Indígena Vale do Javari, palestras
do Março Lilás – mês dedicado à saúde da mulher, mutirão de atendimentos
com presença de médicos, fisioterapeutas, enfermeiros, assistentes sociais da
SEMAS, ações de combate e controle vetorial, especialmente contra a Malária,
a principal endemia da região.
A construção da Balsa fortaleceu significativamente a assistência em
saúde dessas populações na região portuária de Atalaia do Norte de modo
inédito, por conseguinte, fortalece a acessibilidade aqueles que necessitam de
atenção em saúde. Este tipo de Unidade e equipe permitem uma proximidade
com os modos de vida dos povos e populações, possibilitando a prática da
equidade e de um cuidado intercultural e intersetorial.
A região Amazônica, em destaque o Vale do Javari, tem como principal
característica longas distâncias, necessitando de uma logística cara e complexa,
onde as populações necessitam navegar dias pelos rios e lagos. Assim, uma
Unidade Básica de Saúde Flutuante possibilita uma atenção próxima das suas
demandas e de suas formas culturais, interferindo diretamente nas situações

49
de vulnerabilidade para possibilitar uma melhor qualidade de vida para essas
populações. A unidade de saúde flutuante é uma estratégia extremamente
positiva, nos cuidados primários, garantindo o direito à saúde universal e
equânime, conforme as diretrizes do Sistema Único de Saúde – SUS.

Referências

Brasil, 2013. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão Estratégica e Participativa. Departamento


de Apoio à Gestão Participativa. Política Nacional de Saúde Integral das Populações do
Campo e da Floresta. Brasília: Editora Ministério da Saúde.

Carneiro, F.F., Pessoa, V.M., & Teixeira, A.C.A. (2017). Campo, floresta e águas: práticas e
saberes em saúde [online]. Brasília: Editora UnB, 464 p. ISBN: 978-85-2301-204-5. https://
doi.org/10.7476/9786558460510

IBGE. (2022). Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Cidades. Disponível em: https://
www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/am/atalaia-do-norte.html. Acessado em 26 de marços
de 2025.

Martins, F. M., Schweickardt, K. H., Schweickardt, J. C., Ferla, A. A., Moreira, M. A., & Medeiros,
J. de S.. (2022). Produção de existências em ato na Amazônia, Brasil: “território líquido”
que se mostra à pesquisa como travessia de fronteiras. Interface - Comunicação, Saúde,
Educação, 26, e210361. https://doi.org/10.1590/interface.210361ç

Pessoa, V. M., Almeida, M. M. & Carneiro, F. F.. (2018). Como garantir o direito à saúde para as
populações do campo, da floresta e das águas no Brasil? Saúde em Debate, 42 (spell), 302-
314. https://doi.org/10.1590/0103-11042018s1

50
Enfermaria indígena: um relato de
experiência bem-sucedido no hospital
geral de Barcelos
Mayara Victória Feitosa Veras
Gigellis Duque Vilaça
Fabiana Mânica Martins

Introdução

A região amazônica apresenta particularidades que influenciam as


políticas públicas e, especialmente, a saúde. Essas particularidades se traduzem
em complexidades, tendo em vista seus ecossistemas variados, baixa densidade
demográfica e a dispersão populacional, o que gera desafios de ordem não
apenas logística, mas também em termos de acesso, adequação e efetividade
para o sistema de saúde (Garnelo, 2019).

Figura 1. Sede de Barcelos às margens do Rio Negro

Fonte: Google Earth, 2024.

51
O município de Barcelos, “Cidade Menina” como carinhosamente é
chamada pela população, tem uma população, de acordo com o último censo
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, de 18.834 habitantes. Foi a
primeira capital do estado do Amazonas, quando ainda chamada de Vila de
Mariuá. Situada às margens direita do Médio Rio Negro, fica aproximadamente
à 400km de distância da capital, Manaus. Rica em belezas naturais, ficou
conhecida nacionalmente pelo Festival do Peixe Ornamental (FESPOB) e
internacionalmente como a capital da Pesca Esportiva. A sede do município
de Barcelos encontra-se a uma altitude 40 m acima do nível do mar. Ocupa
uma área de 122.475,79 km² representando 36,85% da Região, 7,80% do
Estado e 1,44% de todo o território brasileiro, sendo que 2,45 km² são de área
urbanizada (IBGE, 2022).
A seguir, convido os senhores para acompanhar a jornada cheia de
encantos e desafios vivenciado por uma enfermeira carioca no interior do
Estado do Amazonas, onde a natureza e as culturas se entrelaçam no cuidado.
É no contexto amazônico que a produção se insere, cheio de desafios e de
potências, em que o cuidar da vida é entendido como um compromisso ético,
político e estético. Aqui nestas futuras cenas convidamos o leitor a produzir
encontros em ato conosco, encontros que potencializam a produção da
integralidade, do cuidado intercultural, da assistência diferenciada.
A Saúde indígena existe! O Norte existe na produção do pensamento e
da ciência. A saúde indígena é uma realidade importante e deve ser reconhecida
e valorizada. As comunidades indígenas possuem saberes e práticas de saúde
que são fundamentais para o bem-estar de seus povos. Além disso, é essencial
que esses conhecimentos sejam respeitados e integrados nas políticas de saúde
e nas pesquisas científicas, promovendo um diálogo entre diferentes saberes e
valorizando a riqueza cultural das populações indígenas.
O objetivo deste relato é contar a experiência da criação de um
ambiente acolhedor, pautado na humanização, contribuindo com o processo
de cuidado do usuário indígena e buscando a diminuição do tempo de

52
internação hospitalar. O resumo deste trabalho foi, inicialmente, intitulado
“Enfermaria indígena: humanização e respeito aos povos Yanomami, uma
experiência bem-sucedida no HGB”, que foi apresentado na V MOSTRA
ESTADUAL AMAZONAS AQUI TEM SUS, ocorrido nos dias 25 e 26 de abril
de 2024, em Manaus, sendo premiado como a melhor experiência do Prêmio
Saúde Ribeirinha no Território Líquido.

Descrição e elaboração da experiência

A experiência da escrita passou por diferentes mãos, uma mais


reflexiva a partir da jornada vivida em Barcelos, e outras que se somaram para
contribuir. Portanto, temos um texto de muitas mãos, com diferentes vozes que
se juntam para um relato de um cuidado diferenciado. Há uma gratidão pela
produção do conhecimento e o compartilhamento de saberes que aconteceu
com os colegas de trabalho e a gestão em saúde. A experiência de escrita é,
em si, um processo de aprendizagem. Assim, uma carioca mergulha fundo na
realidade e nos modos de vida no interior do estado do Amazonas.
O município de Barcelos possui os seguintes estabelecimentos de saúde:
6 Unidades Básicas de Saúde, uma Unidade Básica de Saúde na comunidade de
Moura, uma Equipe de Saúde da Família Ribeirinha e um hospital Geral com
30 leitos. Cabe destacar que o número de leitos hospitalares por mil habitantes
é inferior em relação à média estadual e nacional.
Em relação ao atendimento dos povos indígenas da região, o
Hospital Geral de Barcelos já realizou o atendimento de 29 etnias, como
apresentado a seguir:

53
Tabela 1. etnias atendidas no hospital Geral de Barcelos.

ORDEM ETNIA
01 Yanomami
02 Baré
03 Baniwa
04 Tukano
05 Marubo
06 Urubutapuia
07 Tariana
08 Arapaso
09 Axanica
10 Carapanã Tapuia
11 Mura
12 Dessana
13 Ticuna
14 Kubeo
15 Macuxi
16 Wanana
17 Apurinã
18 Tuiuka
19 Piratapuia
20 Aripuanã
21 Lanawa
22 Canamari
23 Kokama
24 Werekena
25 Apurinã
26 Sateré-Maué
27 Ashaninka
28 Wapixana
29 Kaxinawá

Fonte: elaborada pelos autores, 2024.

54
Figura 2. Adaptação de redes nos leitos do Hospital Geral

Fonte: Arquivo da Unidade Hospitalar, 2022.

O Hospital Geral de Barcelos Nazaré Lacerda Chaves, unidade


hospitalar mista do interior do Amazonas, frequentemente, realiza
atendimentos a população indígena, de etnias informadas (tabela 01). A
partir disto, identificou-se a necessidade da criação de uma enfermaria
exclusivamente voltada à população indígena a fim de prestar um serviço de
qualidade. Desse modo, foi possível criar vínculos que reforçam o sentimento
de acolhimento, especialmente na tentativa de criar uma proximidade com o
ambiente em que vivem. Para o acolhimento dos usuários indígenas, foi criado
um fluxograma de internação (Figura 3).

55
Figura 3. Fluxograma para internação do usuário indígena.

Fonte: Hospital Geral de Barcelos Nazaré Lacerda Chaves

A Enfermaria Indígena está localizada nas dependências do hospital,


funcionando 24h, dispõe de 02 leitos, 01 berço e 03 redes. Os indígenas têm a atenção
do corpo médico, de enfermagem e equipe multidisciplinar, bem como o apoio
de um intérprete disponibilizado pelo DSEI. Foi criado um protocolo alimentar
e cardápio exclusivo para a população Yanomami1, devido as especificidades
culturais de sua alimentação. Quando impossibilitados de dar seguimento ao
tratamento em nossa Unidade Hospitalar, necessitando de tratamento em Alta
Complexidade realizamos as transferências destes usuários para a capital, Manaus.
O cotidiano da assistência as relações e intervenções dos profissionais de
saúde não indígenas obedecem a um modelo compartimentalizado de cuidado
e excludente da alteridade, denotando, a falta de qualificação dos profissionais
para o trabalho em contextos de multietnicidade e interculturalidade,
especialmente com populações indígenas (Silva, 2021).
1 Segundo o Instituto Socioambiental (ISA), o povo Yanomami é formada “por uma sociedade de caça-
dores-agricultores da floresta tropical do Norte da Amazônia cujo contato com a sociedade nacional é, na
maior parte do seu território, relativamente recente. Seu território cobre, aproximadamente, 192.000 km²,
situados em ambos os lados da fronteira Brasil-Venezuela na região do interflúvio Orinoco - Amazonas
(afluentes da margem direita do rio Branco e esquerda do rio Negro). Constituem um conjunto cultural
e linguístico composto de, pelo menos, quatro subgrupos adjacentes que falam línguas da mesma família
(Yanomae, Yanõmami, Sanima e Ninam)” (ISA, 2024).

56
O Hospital Geral de Barcelos oferece atendimento em Telemedicina
junto ao PROADI-SUS, que permite o atendimento as demandas sem a
necessidade de deslocamento para aos grandes centros. As especialidades
oferecidas são: cardiologia, neurologia (adulto e pediátrico), pediatria (até 16
anos), endocrinologia (adulto e pediátrico), reumatologia, pneumologista,
psiquiatria (adulto e pediátrico), gastroenterologia (adulto e pediátrico) bem
como infectologia adulto.
O cardápio indígena, criado pelo serviço de nutrição, tem o objetivo de
prestar um serviço de qualidade, possibilitando uma maior proximidade dos
usuários indígenas aos seus hábitos alimentares de acordo com sua cultura e
modo de vida.
CARDÁPIO INDÍGENA
CAFÉ DA MANHÃ
Opção 1- Banana cozida com café
Opção 2 - Café com pão
Opção 3 – Batata doce cozida ou cará cozido com café
ALMOÇO
Opção 1- Peixe cozido ou assado com farinha
Opção 2 - Frango guisado ou assado com arroz
LANCHE
Opção 1- Banana ou batata doce cozida com café
Opção 2 - Café com pão
JANTAR
Opção 1- Peixe cozido ou assado com farinha
Opção 2 - Frango guisado ou assado com arroz
CEIA
Opção 1 - Bolacha cream cracker ou bolacha de motor com suco ou Batata
doce cozida ou cará cozido com café
ATENÇÃO: Alimentação livre de condimentos e excesso de sal. – Cardápio
seguindo orientação da nutricionista da unidade hospitalar.

57
No que tange às transferências para tratamento na capital devido a
demanda de saúde ser de alta complexidade, acontecem por meio fluvial ou de
UTI aérea, dependendo da gravidade do quadro clínico do usuário. No ano de
2023, por exemplo, houve um surto de síndrome gripal entre crianças Yanomami
de até 2 anos de idade, quando foi necessário realizou diversas transferências.
A Enfermaria Indígena foi criada no ano de 2022, e até maio de 2024
foram realizadas cerca de 600 internações distribuídos entre os povos Yanomami
e Baré2, sendo distribuídas entre clínico e obstétrico. A média de tempo de
internação é de 03 dias, sendo que a internação, por ser um tempo distante
do lugar de vida, é minimamente atenuada pelas adequações e melhorias na
enfermaria indígena. Por exemplo, a possibilidade de dormir numa rede faz
uma grande diferença no cuidado do indígena, sendo adaptações simples
que necessitam de uma negociação com os padrões e protocolos hospitalares
vigentes na biomedicina do país.

Figura 4. Remoção área do município de Barcelos a sede da capital Manaus.

Fonte: própria autora, 2024.


2 “Os índios Baré e Werekena (ou Warekena) vivem principalmente ao longo do Rio Xié e alto curso do
Rio Negro, para onde grande parte deles migrou compulsoriamente em razão do contato com os não-índios,
cuja história foi marcada pela violência e a exploração do trabalho extrativista. Oriundos da família lin-
güística aruak, hoje falam uma língua franca, o nheengatu, difundida pelas carmelitas no período colonial.
Integram a área cultural conhecida como Noroeste Amazônico” (ISA, 2024).

58
Considerações finais

O ambiente criado para o acolhimento aos usuarios indígenas produziu


um resultado bastante eficaz, especialmente no que se refere à diminuição do
tempo de internação. A humanização no atendimento à saúde é fundamental
para garantir que os usuários se sintam respeitados e valorizados. No caso dos
usuários indígenas, isso significa reconhecer e respeitar suas culturas, tradições
e modos de vida. A humanização envolve a criação de um ambiente em que
os usuários possam expressar suas necessidades e preocupações, e onde os
profissionais de saúde estejam dispostos a ouvir e adaptar suas abordagens
para melhor atender a essas necessidades.
O acolhimento é um aspecto crucial para que os usuários se sintam
seguros e confortáveis durante o tratamento. O acolhimento de indígenas deve
incluir a consideração de suas particularidades culturais e sociais. Isso pode
envolver a presença de mediadores culturais, a oferta de espaços que respeitem
suas tradições e a promoção de um diálogo aberto entre os profissionais
de saúde e os usuários. Um bom acolhimento pode reduzir a ansiedade e o
estresse, contribuindo para uma recuperação mais rápida.
A atenção diferenciada refere-se à adaptação dos serviços de saúde para
atender às necessidades específicas de grupos distintos, como os indígenas.
Isso pode incluir a formação de equipes de saúde que compreendam as
realidades culturais dos usuários, a implementação de práticas que respeitem
suas crenças e a oferta de serviços que considerem as barreiras de acesso que
esses grupos podem enfrentar. A atenção diferenciada é essencial para garantir
que os usuários indígenas recebam cuidados adequados e eficazes, resultando
em melhores desfechos de saúde e na diminuição do tempo de internação.
A integração dessas três categorias — humanização, acolhimento
e atenção diferenciada — é fundamental para melhorar a experiência e
os resultados de saúde dos usuários indígenas. Ao criar um ambiente que
respeite e valorize suas culturas, é possível não apenas reduzir o tempo de

59
internação, mas também promover um cuidado mais eficaz e humanizado. Isso
demonstra a importância de um sistema de saúde que seja inclusivo e sensível
às diversidades culturais. Por fim, podemos dizer que os serviços prestados
pela equipe de saúde do Hospital Geral de Barcelos têm demonstrado ser
uma experiência bem-sucedida de inclusão e uma atenção diferenciada às
populações indígenas.

Referências

Garnelo, L.. (2019). Especificidades e desafios das políticas públicas de saúde na Amazônia.
Cadernos De Saúde Pública, 35(12), e00220519. https://doi.org/10.1590/0102-
311X00220519

IBGE. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – Município Barcelos Amazonas, 2022.


https://www.ibge.gov.br/busca.html?searchword=barcelos

ISA. Instituto Socioambiental. (2024). Povos Indígenas: Yanomami. Disponível: https://pib.


socioambiental.org/pt/Povo:Yanomami.

Macedo, V.. (2021). O CUIDADO E SUAS REDES doença e diferença em instituições de saúde
indígena em São Paulo. Revista Brasileira De Ciências Sociais, 36(106), e3610602. https://
doi.org/10.1590/3610602/2021

Silva, B., & Rigon Dalla Nora, C.. (2021). Enfermagem e a atenção à saúde da população indígena
brasileira: Scoping review. Enfermería: Cuidados Humanizados, 10(2), 112-123. Epub 01 de
diciembre de 2021.https://doi.org/10.22235/ech.v10i2.2345

60
Saúde Digital e Telemedicina:
quebrando paradigmas e
reformulando caminhos
Ana Kelly Rodrigues Amaro Ugarte
Gigellis Duque Vilaça
Cleinaldo de Almeida Costa
Jonas Tadeu Cau Sertorio
Cleudecir Siqueira Portela

Introdução

O capítulo mergulha na importância da saúde digital e da telemedicina


no cenário brasileiro, com um olhar atento para a experiência do município
de Barcelos, no coração da Amazônia. Exploramos os conceitos-chave de
saúde digital, telessaúde e telemedicina, desvendando como essas ferramentas
inovadoras estão transformando a prestação de cuidados de saúde. Analisamos
a regulamentação da telemedicina no Brasil, que garante a segurança e a
qualidade dos serviços oferecidos, e destacamos o papel crucial da telemedicina
como ferramenta de cuidado à saúde, especialmente em áreas remotas e de
difícil acesso (Sabbatini, 2012).
Destacamos a recente criação da Secretaria de Informação e Saúde
Digital (SEIDIGI) e seu papel na formulação de políticas públicas para a
saúde digital também são abordados, assim como o impacto da telemedicina
no contexto amazônico, com foco na experiência de Barcelos. Ao longo deste
capítulo, evidenciamos o potencial da saúde digital e da telemedicina para
revolucionar o sistema de saúde brasileiro, democratizando o acesso à saúde e
melhorando a qualidade de vida da população, com a experiência de Barcelos
a ilustrar como a telemedicina pode superar barreiras geográficas e levar
cuidados de saúde a comunidades isoladas.

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A saúde digital representa uma revolução no modo como os
cuidados em saúde são prestados e gerenciados, aproveitando o potencial das
tecnologias da informação e comunicação (TIC) para aprimorar os sistemas
de saúde em todas as suas dimensões. A definição da Organização Mundial da
Saúde (OMS) estabelece que saúde digital é o uso seguro, ético e eficaz dessas
tecnologias para apoiar a saúde, abrangendo desde a prestação de serviços e
vigilância em saúde até a pesquisa, educação e gestão de informações (OMS,
2019). O conceito vai além da simples aplicação tecnológica, pois promove
uma transformação fundamental na maneira como os cuidados são oferecidos,
melhorando a eficiência, a qualidade e o alcance dos serviços de saúde.
A adoção de tecnologias digitais inclui uma ampla variedade de
ferramentas, como sistemas eletrônicos de registros de saúde, aplicativos
móveis, plataformas de gestão de informações, inteligência artificial e
dispositivos vestíveis, conhecidos como wearables. Esses recursos permitem o
monitoramento em tempo real da saúde dos usuários, criando oportunidades
para intervenções mais precisas e rápidas. A análise de grandes volumes de
dados de saúde, facilitada por bancos de dados em nuvem e técnicas avançadas
de ciência de dados, também impulsiona a personalização dos cuidados,
resultando em um atendimento mais eficaz e centrado nas necessidades
individuais de cada pessoa.
Um dos principais benefícios da saúde digital é sua capacidade de
promover a personalização dos tratamentos. Dispositivos vestíveis e outras
tecnologias de monitoramento contínuo coletam dados sobre a saúde do
usuário em tempo real, o que pode ser utilizado para ajustar os cuidados de
forma específica e personalizada. A inteligência artificial e o aprendizado de
máquina são especialmente úteis nesse contexto, pois são capazes de identificar
padrões de saúde e prever complicações antes mesmo que os sintomas
apareçam, possibilitando intervenções mais precoces e eficazes. Dessa forma,
a saúde digital não apenas melhora a eficiência dos tratamentos, mas também
contribui para melhores desfechos clínicos (Medeiros, 2004).

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A capacidade de armazenar e analisar grandes volumes de dados
de saúde também promove avanços significativos na pesquisa e no
desenvolvimento de novos tratamentos. Os bancos de dados em nuvem, por
exemplo, possibilitam o acesso e a análise de informações em uma escala
sem precedentes, facilitando estudos de longo prazo e ensaios clínicos com
maior precisão. Além disso, essas tecnologias permitem uma colaboração
mais estreita entre profissionais de saúde em diferentes regiões do mundo,
promovendo o compartilhamento de conhecimento e a implementação de
práticas inovadoras que podem beneficiar a saúde global.
Ao integrar todas essas tecnologias em uma infraestrutura de saúde
digital robusta, cria-se um sistema de saúde mais acessível, eficiente e centrado
no usuário. Essa transformação não apenas facilita o acesso aos cuidados de
saúde, mas também melhora a qualidade do atendimento, especialmente para
populações vulneráveis ou que vivem em áreas de difícil acesso (Duarte, 2023).
A saúde digital tem o potencial de transformar completamente o cenário da
saúde pública, proporcionando uma melhoria significativa nos resultados para os
usuários e reduzindo as disparidades de acesso e qualidade dos cuidados de saúde.

Telessaúde e Telemedicina

A telessaúde e a telemedicina são componentes essenciais dentro


do ecossistema da saúde digital, oferecendo soluções inovadoras para
superar as barreiras geográficas e de infraestrutura que dificultam o acesso
a cuidados de saúde de qualidade, especialmente em áreas remotas e entre
populações negligenciadas. Telessaúde refere-se ao uso de TICs para
fornecer serviços de saúde a distância, enquanto a telemedicina é uma
subcategoria que envolve a prestação de cuidados médicos diretamente
ao usuário, sem a necessidade de deslocamento físico. Essas tecnologias
desempenham um papel crucial na democratização do acesso aos cuidados
de saúde, garantindo que mesmo pessoas em locais remotos possam receber
atendimento especializado e de alta qualidade.

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O impacto da telessaúde e da telemedicina na saúde pública é notável,
especialmente em regiões de difícil acesso ou com infraestrutura de saúde
insuficiente. Em muitos países em desenvolvimento, onde a distribuição desigual
de profissionais de saúde agrava o atendimento às populações rurais, a telemedicina
surge como uma solução estratégica para conectar usuários e médicos especialistas.
Por meio de consultas virtuais, usuários podem receber diagnósticos, orientações
e acompanhamento sem a necessidade de viagens longas e custosas, o que também
contribui para a redução das desigualdades regionais no acesso à saúde.
A telessaúde oferece uma oportunidade única de inclusão no sistema
de saúde para populações negligenciadas, como comunidades indígenas,
trabalhadores rurais e pessoas vivendo em condições de vulnerabilidade
socioeconômica. Ao facilitar o acesso a cuidados de saúde de qualidade,
essas tecnologias ajudam a mitigar os impactos das disparidades sociais
e econômicas, promovendo maior equidade no cuidado. Além disso, a
telemedicina pode ser usada para fornecer cuidados de saúde mental, uma
área frequentemente negligenciada em regiões onde o acesso a profissionais
especializados é limitado. Isso pode ter um impacto positivo na redução de
problemas relacionados à saúde mental, que muitas vezes são subdiagnosticados
e subtratados em populações remotas.
Outro aspecto importante da telessaúde é seu potencial para ampliar
programas de prevenção e monitoramento de doenças crônicas. usuários
com doenças como diabetes, hipertensão e doenças cardíacas, que requerem
acompanhamento constante, podem ser monitorados remotamente por meio
de dispositivos conectados, permitindo ajustes imediatos no tratamento e
prevenindo complicações graves. Em termos de saúde pública, isso significa
uma redução significativa na necessidade de hospitalizações e tratamentos
emergenciais, aliviando a carga sobre o sistema de saúde e proporcionando
melhor qualidade de vida para os usuários.
Em suma, a telessaúde e a telemedicina representam avanços cruciais
na luta contra a desigualdade no acesso à saúde, especialmente para aqueles

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que vivem em regiões remotas ou enfrentam barreiras socioeconômicas. Ao
integrar essas tecnologias na estratégia de saúde pública, é possível melhorar
o alcance e a eficiência dos serviços de saúde, promover uma abordagem mais
centrada no usuário e garantir que cuidados de qualidade sejam acessíveis a
todos, independentemente de sua localização ou condição social.

A Secretaria de Informação e Saúde Digital do Ministério


da Saúde

Em 1º de janeiro de 2023, por meio do Decreto 11.358, o Ministério da


Saúde (MS) estabeleceu a Secretaria de Informação e Saúde Digital (SEIDIGI).
Esta secretaria foi criada com o objetivo de formular políticas públicas que
orientem a gestão da saúde digital no país, promovendo a modernização e a
eficiência dos serviços de saúde por meio do uso estratégico da tecnologia. A
SEIDIGI tem a responsabilidade de apoiar as diversas Secretarias do MS, assim
como gestores, trabalhadores e usuários do sistema, no planejamento, uso e
incorporação de produtos e serviços de informação e tecnologia da informação
e comunicação (TIC). Essas áreas abrangem telessaúde, infraestrutura de TIC,
desenvolvimento de software, interoperabilidade, integração e proteção de
dados, além da disseminação de informações.
A Secretaria também monitora o portfólio de tecnologias de saúde
digital do MS, que inclui dicionários de dados, sistemas nacionais de
informação em saúde, sistemas internos de gestão, tecnologias de telessaúde,
padrões semânticos e tecnológicos, bem como diversas soluções de hardware
e software. Além disso, a SEIDIGI coordena as políticas de Monitoramento e
Avaliação do Sistema Único de Saúde (SUS), promove a inovação em saúde
digital e é responsável pela prospecção e incorporação de novas tecnologias
digitais e telessaúde ao SUS.
Para cumprir sua missão, a SEIDIGI trabalha em estreita colaboração
com instituições de pesquisa, universidades e empresas do setor de tecnologia,
buscando constantemente inovações que possam ser aplicadas ao sistema de

65
saúde. A secretaria também promove a capacitação de profissionais de saúde,
garantindo que eles estejam preparados para utilizar as novas tecnologias de
maneira eficaz. Outro papel crucial da SEIDIGI é garantir a interoperabilidade
entre os diversos sistemas de informação em saúde, permitindo uma
comunicação eficiente e segura entre diferentes plataformas e entidades de
saúde. Isso inclui o desenvolvimento e a manutenção de padrões semânticos
e tecnológicos que assegurem a qualidade e a integridade dos dados de saúde.
A SEIDIGI também desempenha um papel vital na proteção de dados,
implementando medidas robustas de segurança da informação para proteger
a privacidade dos usuários e a confidencialidade dos dados de saúde. Este
compromisso com a segurança é fundamental para manter a confiança do
público nas soluções digitais de saúde. A estrutura organizacional da SEIDIGI
é composta por três departamentos principais: o Departamento de Informação
e Informática do Sistema Único de Saúde (DataSUS), o Departamento de
Monitoramento, Avaliação e Disseminação de Informações Estratégicas em
Saúde (DEMAS) e o Departamento de Saúde Digital e Inovação (DESD). Cada
um desses departamentos desempenha um papel essencial na implementação
e na gestão das políticas de saúde digital.
O DESD, em particular, foca em duas áreas principais: Inovação em
Saúde Digital e Telessaúde. A Inovação em Saúde Digital busca integrar novas
tecnologias e soluções inovadoras ao sistema de saúde, promovendo avanços
contínuos que melhorem a eficiência e a qualidade dos serviços de saúde. Já
a Telessaúde, área essencial no contexto do SUS, visa expandir o acesso aos
cuidados de saúde, especialmente em regiões remotas, através de tecnologias
de comunicação que possibilitam consultas e diagnósticos a distância.

Telemedicina e sua regulamentação no Brasil

A telemedicina, como uma modalidade de prestação de serviços


médicos mediados por tecnologias digitais, ganhou um importante arcabouço
normativo com a Resolução CFM Nº 2.314, de 20 de abril de 2022. A resolução

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do Conselho Federal de Medicina (CFM) define a telemedicina como o
exercício da medicina mediado por Tecnologias Digitais, de Informação e de
Comunicação (TDIC), abrangendo assistência médica, educação, pesquisa,
prevenção, gestão e promoção da saúde. Essa regulamentação visa garantir
a qualidade dos serviços prestados por meio da telemedicina, assegurando o
cumprimento de padrões éticos, legais e técnicos, especialmente em contextos
em que o atendimento presencial é difícil ou inviável.
A resolução permite que a telemedicina seja realizada tanto de
forma síncrona, ou seja, em tempo real, quanto de forma assíncrona, com
a troca de informações ocorrendo em momentos diferentes. A utilização
de dados e imagens dos usuários segue normas rigorosas de preservação da
confidencialidade, veracidade e sigilo, em conformidade com a Lei Geral
de Proteção de Dados (LGPD). Além disso, é exigido que os registros dos
atendimentos sejam realizados em sistemas de prontuário médico eletrônicos,
assegurando a interoperabilidade e a segurança das informações.
Entre as modalidades de telemedicina regulamentadas estão a
teleconsulta, teleinterconsulta, telediagnóstico, telecirurgia, telemonitoramento,
teletriagem e teleconsultoria. A teleconsulta é definida como a consulta
médica realizada a distância, entre médico e usuário, estando ambos em locais
diferentes, sendo considerada uma alternativa complementar ao atendimento
presencial. No entanto, a resolução enfatiza que, em casos de doenças crônicas
ou que requerem acompanhamento prolongado, é necessária uma consulta
presencial em intervalos de até 180 dias, reforçando o caráter complementar
da teleconsulta e não sua substituição completa ao contato presencial.
Outro ponto importante da resolução é a autonomia do médico em
decidir quando utilizar ou recusar o uso da telemedicina, sempre levando
em consideração o melhor interesse do usuário e os princípios éticos de
beneficência e não maleficência. O médico é o responsável por avaliar a
necessidade de um atendimento presencial quando julgar que o formato a
distância não oferece segurança adequada para o usuário. Nesse sentido, a

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telemedicina se apresenta como uma ferramenta valiosa, mas seu uso deve ser
equilibrado com a necessidade de manter a qualidade assistencial.
A regulamentação também destaca a importância do telemonitoramento,
especialmente para usuários com doenças crônicas. Essa modalidade permite
o acompanhamento remoto de parâmetros de saúde por meio de dispositivos
que monitoram sinais vitais, como pressão arterial, níveis de glicose, entre
outros, possibilitando intervenções precoces e prevenindo complicações. O
telemonitoramento tem mostrado resultados positivos na redução de internações
hospitalares e no controle de doenças, sobretudo em regiões onde o acesso a
unidades de saúde é limitado.
A telemedicina, ao ser regulamentada de forma abrangente e segura,
representa um avanço significativo no acesso à saúde, especialmente em
populações negligenciadas e que vivem em áreas remotas. Para esses grupos,
que muitas vezes enfrentam grandes desafios para acessar cuidados médicos
de qualidade, a telemedicina oferece uma solução eficaz e imediata, garantindo
que o direito à saúde seja respeitado e promovido. Essa modalidade de
atendimento, aliada à infraestrutura digital em expansão, tem o potencial
de reduzir as desigualdades de acesso à saúde no Brasil e, ao mesmo tempo,
promover um sistema de saúde mais eficiente, moderno e inclusivo.

A Telemedicina como uma ferramenta de cuidado à saúde

A telemedicina emergiu como uma solução inovadora e eficaz no


cuidado à saúde, utilizando tecnologias de comunicação para superar as
limitações geográficas e ampliar o acesso a serviços médicos de qualidade. Esse
modelo de atendimento permite que usuários e profissionais de saúde interajam
de maneira remota, promovendo o diagnóstico, tratamento e acompanhamento
de condições de saúde sem a necessidade de deslocamentos. A telemedicina não
apenas facilita o acesso a cuidados especializados em áreas remotas e de difícil
acesso, mas também otimiza os recursos do sistema de saúde, reduzindo filas
e custos operacionais. Ao integrar-se cada vez mais no cotidiano dos serviços

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de saúde, a telemedicina desempenha um papel crucial no fortalecimento da
atenção primária e na ampliação da cobertura assistencial em todo o país.
A pandemia da Covid-19 acelerou ainda mais essa tendência, expondo
as fragilidades dos sistemas de saúde ao redor do mundo e aproximando-os
de um possível colapso (Cosme, 2024; Fontoura et al., 2021). A Organização
Mundial da Saúde recomendou medidas como quarentena, isolamento e
distanciamento social, o que impulsionou o uso de tecnologias da informação
e comunicação para garantir a continuidade dos cuidados. Essas tecnologias
já vinham sendo integradas à prática médica, alterando a forma como os
fluxos de informação são processados e criando novas rotinas de trabalho
para os profissionais de saúde. O Sistema Único de Saúde (SUS), por sua
vez, tem o potencial de se beneficiar enormemente dessas ferramentas, como
a digitalização de prontuários médicos, o compartilhamento remoto de
informações e diagnósticos, a emissão de laudos, o monitoramento remoto
de usuários e até mesmo a realização de cirurgias assistidas por robôs, em que
equipes médicas operam a distância (Santos, et al., 2020).
Com tantos benefícios, não surpreende que o Brasil seja um dos
pioneiros no uso dessas ferramentas, com a primeira iniciativa de telemedicina
ocorrendo em 1995. Naquele ano, o Instituto do Coração (INCOR) criou a
Telecardiologia, permitindo a análise de eletrocardiogramas realizados em
diferentes regiões do país. Poucos anos depois, em 1998, a Universidade
de São Paulo (USP) introduziu a telemedicina como disciplina, e, em 2000,
ocorreu a primeira teleconsulta internacional, conectando Recife a Memphis,
nos Estados Unidos (Wen, 2008). O Hospital Sírio Libanês, reconhecido por
sua excelência, foi o primeiro no Brasil a estabelecer parcerias com centros
internacionais, como o Memorial Sloan-Kettering Cancer Center em Nova
York, para oferecer segunda opinião em casos de oncologia e realizar educação
a distância (Medeiros & Wainer, 2004).
Desde 2006, o Hospital Sírio Libanês tem recebido investimentos do
Ministério da Saúde e de secretarias estaduais e municipais, com o objetivo de

69
fortalecer a atenção primária por meio de teleconsultorias, telediagnósticos e
teleducação (Lopes et al., 2019). Os resultados foram tão significativos que levaram
à criação do Programa Telessaúde Brasil Redes. Esse programa estabeleceu como
diretrizes fundamentais a superação de barreiras geográficas, socioeconômicas
e culturais, a redução de filas e custos, e a diminuição da necessidade de
deslocamentos desnecessários (Santos et al., 2020). Embora o programa tenha sido
formalizado em 2007, essas diretrizes continuam sendo essenciais para que o SUS
possa cumprir plenamente sua missão, especialmente em regiões de difícil acesso,
como é o caso de comunidades isoladas, como Barcelos.
A telemedicina, portanto, tem se mostrado uma poderosa ferramenta
para ampliar o acesso à saúde e melhorar a qualidade dos serviços oferecidos,
garantindo que populações em áreas remotas e negligenciadas possam ser
incluídas no sistema de saúde com mais eficiência e menos barreiras.

Telemedicina e o contexto amazônico

A região Amazônica se distingue das demais regiões brasileiras pelo


isolamento geográfico, a prevalência de doenças endêmicas e um ambiente
dinâmico, sujeito a variações climáticas. Nessas condições, comunidades
isoladas enfrentam dificuldades no acesso a serviços de saúde, o que torna a
telemedicina uma ferramenta promissora para atender às suas necessidades.
No entanto, a conectividade precária, com áreas desprovidas de acesso à
internet e outras com acesso instável, representa um obstáculo à implantação e
ao uso efetivo da telemedicina. Essa dificuldade de comunicação, por sua vez,
exige que muitos usuários percorram longas distâncias, por rios e estradas,
para buscar atendimento médico, o que onera os cofres públicos com os custos
de transporte e logística.
A vasta extensão da Amazônia, que abrange cerca de 59% do território
brasileiro, e suas barreiras geográficas, com áreas de difícil acesso, historicamente
dificultam a oferta de serviços assistenciais (Barreto, 2023). Nesse contexto, a
telemedicina surge como uma ferramenta promissora para democratizar o acesso

70
à saúde, alcançando um número maior de pessoas e otimizando os custos para as
redes públicas (De Paula, 2023). No Amazonas, em particular, as singularidades
do território impõem desafios ainda maiores à garantia do acesso à saúde para
a população mais remota. A ampliação dos serviços de telemedicina, portanto,
tem contribuído não apenas para agilizar os atendimentos, mas também para
melhorar a qualidade da assistência, transformando positivamente a qualificação
profissional e a atenção prestada aos usuários.
Além da telemedicina, outras estratégias, como as unidades básicas de
saúde móvel fluvial e as ambulanchas, ajudam a mitigar as desigualdades no
acesso à saúde na Amazônia (De Medeiros et al., 2020). A telemedicina, em
particular, tem contribuído para reduzir encaminhamentos desnecessários a
especialistas e otimizar a orientação de profissionais de saúde. Essa ferramenta
tem impacto positivo não apenas no cuidado em si, mas também no fluxo do
sistema público de saúde, fortalecendo a atenção primária, tornando-a mais
resolutiva e integrando instituições de ensino e pesquisa (Dos Santos et al.,
2016; Belber, 2021).
A telessaúde tem se expandido tanto na capital quanto no interior do
Amazonas, com a Universidade Federal do Amazonas (UFAM) desempenhando um
papel fundamental nesse processo desde 2014. Por meio da Gerência Multidisciplinar
de Telessaúde, a UFAM promove e oferece suporte para ações de teleconsultoria e
teleassistência em diversas áreas da saúde, abrangendo tanto a promoção quanto o
restabelecimento da saúde no estado. Além disso, a universidade fomenta atividades
de teleducação em saúde, oferece suporte docente-assistencial a alunos da área da
saúde em estágio, viabiliza conexões de videoconferência e telepresença, fornece
suporte técnico aos usuários do sistema e presta consultoria técnica especializada em
serviços de teleassistência (Araújo, 2021).
A expansão da Rede Universitária de Telemedicina (RUTE), por meio
dos Grupos de Interesse Especial (SIG) do Hospital Universitário Getúlio
Vargas (HUGV/UFAM), oferece suporte tecnológico para diversas atividades,
como videoconferências, webconferências, telediagnóstico, palestras, aulas a

71
distância, chats para debates, fóruns e compartilhamento de arquivos, além
da disponibilização de imagens de alta resolução e mídias eletrônicas (Araújo,
2021; Brasil, 2024). A RUTE também coordena a realização de congressos,
seminários e palestras na área da telessaúde e contribui para a formulação de
políticas públicas de telessaúde na região.
A Telestomaterapia, implementada em 2013 com o apoio do Polo de
Telemedicina da Amazônia e do Programa Institucional de Extensão (PROGEX) da
Universidade do Estado do Amazonas (UEA), e atualmente com o apoio da SOBEST®
(Associação Brasileira de Estomaterapia), expandiu o acesso a teleatendimento,
teleconsultoria e teleducação em estomaterapia para os 62 municípios e 8
comunidades indígenas do Amazonas (Pereira, 2023). Em pouco mais de dois
anos, o programa atendeu a inúmeras solicitações de diversos municípios, com
destaque para demandas relacionadas ao tratamento de feridas complexas, como o
pé diabético e lesões ocasionadas por acidentes ofídicos, prevalentes na região.
Um estudo de teleconsultas realizado no Amazonas, utilizando o
sistema de gestão de encaminhamento operado remotamente (RegulaSUS),
avaliou a eficiência da telemedicina no encaminhamento da atenção primária
para outros níveis de atenção (Junior et al., 2024). Os resultados mostraram
uma redução de 88,97% no número de casos após seis meses de implementação,
no período de 2019 a 2020.
A falta de apoio de alguns gestores, a ausência de estratégias para
incorporar a teleassistência nos processos de cuidado e a alta rotatividade de
profissionais de saúde impactam a adesão às ferramentas ofertadas pelo Projeto
de Telessaúde na Floresta, que conta com a parceria de diversas instituições para
o desenvolvimento de atividades de apoio à Atenção Primária à Saúde (Sachett,
2022). Esse achado se reflete na realidade de alguns municípios do interior do
Amazonas, que subutilizam o sinal disponível para teleconsultas e orientações,
dificultando o atendimento às necessidades de saúde da população.
A Telemedicina da Universidade do Estado do Amazonas (UEA)
apresentou, em 2024, um equipamento portátil inovador que possibilita a

72
interação de dados e comunicação em tempo real, com acesso universal,
integral e equânime à saúde para populações em áreas de difícil acesso no
Amazonas (Cunha, 2024). O projeto piloto “Acessibilidade em saúde a partir da
utilização do equipamento móvel de Telessaúde”, desenvolvido pela Unidade
de Desenvolvimento Docente e Apoio ao Ensino (Uddae/UEA), está em fase
de testes e capacitação.
O projeto TelePNAR, que utiliza uma plataforma de telemonitoramento
obstétrico, integra informações clínicas de equipes de atenção primária,
atenção ambulatorial especializada, SAMU, hospitais de pequeno porte e
maternidades de baixo e alto risco no Amazonas. Essa integração possibilita o
acompanhamento de gestações de alto risco, visando reduzir a mortalidade e
morbidade materna, fetal e neonatal. Desde 2023, o projeto, fruto da parceria
entre UFAM, COSEMS-AM e Ministério da Saúde, conta com a adesão de
67,74% dos municípios, com oferta de serviços para 42 secretarias municipais
de Saúde em todas as regiões do estado (COSEMS-AM, 2024).
A Telemedicina tem avançado no Amazonas, com 100% dos municípios
do estado aderindo ao Programa SUS Digital em 2024. A primeira etapa do
programa prevê a elaboração de Planos de Ação, com diagnóstico situacional
da rede e da maturidade digital, o que facilitará o acesso à saúde no interior do
estado (SES-AM, 2024).

Telemedicina e Barcelos: uma experiência no interior do


Amazonas

Barcelos foi a primeira capital do Amazonas, sendo transferida para Manaus


no ano de 1856, isso pela dificuldade de acesso enfrentada pelas embarcações, como
o único meio de transporte da época, para escoar produto e abastecer a cidade,
diante dos constantes desafios enfrentados nos períodos de cheia e seca dos rios. O
município fica a 400 km em linha reta de Manaus e está localizada à margem direita
do Rio Negro (Figura 1). É o segundo maior município em área territorial do Brasil e
tem o maior arquipélago fluvial do mundo, o arquipélago de Mariuá.

73
O Norte é uma das regiões mais afetadas pelo vazio assistencial no Brasil.
Segundo a demografia médica realizada em 2020 pela Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo, enquanto o país tem razão média de 2,27 médicos
por mil habitantes, a região Norte tem taxa de 1,30, 43% menor que a razão
média nacional. Existe, ainda, uma distribuição desigual de médicos entre as
capitais e os municípios do interior (Scheffer et al., 2020; PROADI-SUS, s.d.).
Barcelos foi uma das cidades escolhidas em 2021 para receber o projeto
TeleAMES, do Hospital Israelita Albert Einstein em parceria com o Ministério
da Saúde, por meio do Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional
do Sistema Único de Saúde (PROADI-SUS), a Secretaria Estadual de Saúde
do Amazonas (SES – AM) e a Secretaria Municipal de Saúde de Barcelos
(SEMSA), que juntas tinham como objetivo fortalecer a assistência médica
especializada em áreas com difícil acesso a esse serviço.

Figura 1. Localização do município de Barcelos, Amazonas.

Fonte: IBGE, 2022. Elaboração Cleudecir Portela, 2024.

74
O projeto foi desenhado para ofertar atendimento médico especializado
em áreas com distanciamento geográfico e particularidades no deslocamento
de usuários para consultas ambulatoriais, além de fornecer suporte aos
médicos generalistas que atuavam nessas áreas mais distantes. Sendo o uso da
ferramenta de baixo custo para o munícipio, necessitando apenas de acesso a
uma boa rede de internet e o equipamento básico de informática (Computador,
Webcam e caixa de som portátil), tornou-se de grande valia, fácil adesão e
uma boa oportunidade para resolução de um dos desafios em saúde que o
município apresentava.
O uso da telemedicina foi iniciado em Barcelos no mês de abril de
2021, seguindo ativo e em constante ampliação. Além de alcançar de forma
positiva o usuário do SUS, o projeto também alcança os profissionais médicos
com apoio técnico especializado, gerando educação continuada, atualização
de condutas e troca de experiências baseadas nas características regionais.
Como primeiros passos necessários, fora realizado um levantamento
dos encaminhamentos médicos já registrados na fila de espera do Sistema
de Regulação do Estado (SISREG), nas 07 (sete) especialidades disponíveis
inicialmente na plataforma. Esses usuários tiveram então seus encaminhamentos
cadastrados na plataforma do teleAMES, que disponibilizava um site exclusivo
com prontuário eletrônico e suporte para atendimento síncrono por vídeo.
Antes da chegada da telemedicina, o usuário que era encaminhado
para consultas ambulatoriais com médicos especialistas, além de entrar na fila
de espera do SISREG, precisavam se deslocar de barco, por um período de
até 30 horas, até a capital do estado, para que a consulta presencial pudesse
ocorrer, sendo essa a única opção válida até o momento, tendo em vista que o
custo para manter um médico especialista no município tornava-se inviável.
Além da demora para as consultas serem agendadas e os desafios para
o deslocamento dos usuários até Manaus, a maioria desses nunca havia saído do
município, nem mesmo para a capital do estado. Ainda, contávamos com custos
altos para manutenção deste usuário em Manaus, contando com necessidade de

75
logística para moradia, que na maioria das vezes precisava contar com a hospitalidade
de parentes, os custos com deslocamento fluvial até Manaus e terrestre dentro da
cidade, e os custos com alimentação e outras necessidades básicas.
É importante descrever que para além disso, o desafio tornava-se ainda
maior quando o usuário encaminhado para consulta especializada se tratava
de um ribeirinho, que além de não dispor de adequação e comodidade em
Barcelos, enxergava Manaus como um desafio ainda maior, fazendo com que
quase sempre, em casos de consultas ambulatoriais, houvesse desistência do
seguimento e do tratamento proposto, dado os procedimentos que precisariam
ser enfrentados a partir dali.
Os primeiros atendimentos via telemedicina aconteceram no Hospital
Geral de Barcelos, pois era a única instituição de saúde que dispunha de conexão
com a internet em fibra óptica. Os primeiros usuários oriundos da fila de
espera do SISREG foram avisados pelas equipes de atenção básica, alguns deles
já aguardavam consulta a mais de 02 (dois) anos. Em um primeiro momento,
alguns deles não entendiam exatamente como aconteceriam as consultas, já que
até mesmo o acesso à internet na cidade era difícil e quase sempre indisponível.
Inicialmente foram atendidos uma média de 20 (vinte) usuários por
semana, com a expectativa de zerar a fila de espera cadastrada no SISREG. Em
01 (um) mês do sistema implantado, foram atendidos 64 (sessenta e quatro).
Destes, 19 (dezenove) da cardiologia, 16 (dezesseis) da psiquiatria, 08 (oito)
da endocrinologia, 06 (seis) da pneumologia, 06 (seis) da neuropediatria, 05
(cinco) da neurologia adulto e 04 (quatro) da reumatologia.
Com o sistema em pleno funcionamento, o projeto começou
a ser divulgado entre os atendimentos da Atenção Básica (AB), sendo
disponibilizado informações do funcionamento as equipes, que passaram
a otimizar o recurso agora disponível em benefício do usuário. A primeira
impressão tida pelos usuários de medo do novo foi substituída pela satisfação
em ter um atendimento de qualidade, humanizado e que atendia as demandas
e necessidades dos usuários da localidade.

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Os novos rumos do atendimento médico especializado a
partir da Telemedicina em Barcelos

O impacto na gestão em saúde apresentou-se de forma expressiva. Em


30 (trinta) dias do pleno funcionamento do projeto TeleAmes em Barcelos, os
gastos com o translado de usuários para consultas ambulatoriais em Manaus
tiveram uma economia de R$ 28.160,00 calculados com base no valor apenas
das passagens via fluvial de ida e volta. Além disso, a comodidade e economia
dos usuários ao serem atendidos com qualidade por um médico especialista no
seu próprio município, evitando translado, gastos com locomoção e moradia,
forneceu ao usuário um melhor conforto geral.
É plausível de registro o impacto gerado no apoio que os médicos da
atenção básica receberam no contato direto com os médicos especialistas. O tom
das consultas que acontecem no projeto sempre fora em caráter de colaboração
e complementação ao diagnóstico ou investigação diagnóstica dos usuários,
mantendo uma linha de educação permanente, com a possibilidade de troca
de informações em tempo real, engrandecendo o serviço de atendimento de
imediato e nas posteriores consultas a serem realizadas na UBS.
Anterior ao serviço de telemedicina em Barcelos, o serviço de apoio em saúde
na capital, de manutenção necessária para receber os usuários que se deslocavam até
Manaus, contava com estruturas maiores, que passaram por mudanças ao longo dos
anos. O grande número de usuários que precisavam se deslocar até Manaus para
realizar os mais diversos serviços de saúde, sempre com as barreiras de acesso e
desafios de locomoção descritos anteriormente, foram tornando-se cada vez mais
insustentáveis no que diz respeito a estruturas físicas de acomodações padronizadas,
e investimentos financeiros necessários para manter as chamadas “casas de apoio”.
Com a possibilidade de realização de consultas especializadas no
próprio município, com a qualidade garantida através da telemedicina, o
fluxo de translado até Manaus para solucionar problemas de saúde, diminuiu
consideravelmente. Isso gerou impacto direto no serviço de apoio ofertado pela
equipe de saúde em Manaus, que pôde direcionar os recursos e serviços para

77
casos que a telemedicina não alcançava até o momento. A maioria dos casos
eram resolvidos sem precisar de nenhum complemento fora do domicílio, e
os casos em que havia necessidade de complementação disponíveis apenas
na capital, também se tornaram mais viáveis, tendo em vista que o tempo
de estadia seria menor, com uma boa organização da equipe de saúde que
compunha o Núcleo de Apoio em Saúde na capital.
Até novembro de 2023 já haviam sido realizadas mais de 1.000 consultas
especializadas no município de Barcelos através da telemedicina. O projeto
segue em expansão, ampliando em 2024 para 12 (doze) especialidades médicas
atendidas pela mesma plataforma, assegurando a qualidade do serviço, com
projeções reais de alcance de novas áreas médicas e mais populações que se
enquadrem no escopo do projeto, visando sempre a melhoria da completude
dos serviços de saúde ofertados nos municípios.
A telemedicina já não é mais uma ferramenta futurista, ela é o presente.
E esse presente está mudando a vida da população do interior do Amazonas,
ofertando um serviço seguro, resolutivo, complementar ao serviço já realizado
pelas equipes presentes no território e com a seguridade de manutenção da
humanização em todos os atendimentos.

Telemedicina: quebrando paradigmas e reformulando


caminhos

É inegável que a telemedicina tem desempenhado um papel crucial na


superação de barreiras historicamente intransponíveis, especialmente no que
se refere à oferta de assistência especializada aos municípios do interior. Dentre
suas inúmeras vantagens, destacam-se a agilidade e efetividade dos serviços, a
otimização de recursos financeiros – um fator crítico na Região Amazônica –,
a oferta de diagnósticos mais precisos e cuidados personalizados, priorizando
as pessoas de alto risco, a descentralização da assistência e a consequente
diminuição da demanda nos hospitais (Dos Santos et al., 2016; Dos Santos, da
Silva Gonçalves, Silva & Queiroz, 2022).

78
Ademais, a telemedicina possibilita levar atendimento especializado
a regiões carentes e de difícil acesso, como é a realidade na maioria dos
municípios do Amazonas, além de facilitar a troca de experiências entre
profissionais e viabilizar o atendimento em áreas de conflito, como em áreas
de garimpo. A ferramenta também se mostra promissora para atividades de
educação continuada e para o acompanhamento domiciliar de usuário com
doenças crônicas, proporcionando maior acesso, praticidade e agilidade aos
atendimentos (Santos et al., 2020).
Em suma, a telemedicina se configura como uma ferramenta poderosa
e indispensável para o SUS, capaz de impulsionar um sistema de saúde mais
próximo de quem realmente precisa, e de contribuir para a concretização dos
princípios de acesso universal e integral à saúde.

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81
Atendimento domiciliar: cuidado
que transcende as adversidades nas
enchentes em território amazônico
Anna Beatriz Chagas Freitas
Daniel Bezerra Arruda
Lourena da Silva Camurça
Silvio Schimangogeski

Entre os rios Purus e Acre,


Boiam saudades da terra amada.
A memória mergulha no rebojo,
Imerge no fundo do rio...
Um remanso chega e lhe acalma.
As lembranças da infância afloram.
Os rios Purus e Acre refletem vidas,
As letras boiam no encontro das águas,
Formando “Boca do Acre” a terra natal,
Boca do Acre meu território de saudades,
Hoje sou canoa ancorada, um barco sem quilha,
A vida vai descendo de barranco abaixo...
Eu serei um eterno viajante nos teus rios.3

Introdução

A pequena cidade de Boca do Acre, situada no sul do Amazonas,


tem uma população estimada de 35.447 habitantes (IBGE, 2022). Localizada
às margens dos rios Acre e Purus, a cidade é historicamente marcada pela
ocupação das etnias indígenas Capanas e Aripuanãs. Em 1878, o Comendador
João Gabriel de Carvalho e Melo ancorou nas proximidades da confluência dos
rios, com o objetivo de explorar a borracha, o que atraiu muitos nordestinos
3 Marilza de Melo Foucher escreveu, em março de 2009, o poema dedicado ao pai, o escritor centenário
Mário Diogo de Melo, transcrito pela coluna Taquiprati. (https://taquiprati.com.br/cronica/1354-adeus-a-
-mario-diogo--a-historia-do-acre

83
para a região. Essa migração culminou na formação do “Distrito de Boca do
Acre”, nome que se originou da localização na foz do Rio Acre no Rio Purus,
facilitando a navegação e o escoamento de produtos (IBGE (2023).
Atualmente, a economia de Boca do Acre é predominantemente
baseada na pecuária; no entanto, a agricultura ribeirinha também desempenha
um papel fundamental, sendo diretamente influenciada pelos ciclos das águas.
Entre as principais culturas estão a melancia, a banana e a macaxeira, que
impactam diretamente a alimentação dos ribeirinhos. Além disso, a farinha de
mandioca e o peixe assado são alimentos essenciais na dieta local, constituindo
uma importante fonte de sustento para muitas famílias (IBGE, 2023).
O “Encontro das Águas” dos rios Purus e Acre, retratado em sua
bandeira, oferece um espetáculo natural deslumbrante, especialmente ao
pôr do sol. Este cenário é também o palco do famoso Festival de Praia, onde
moradores e turistas se reúnem para se divertir às margens dos rios. Contudo,
essa atividade tradicional às vezes entra em conflito com a fauna local, em
particular com os botos-cor-de-rosa, que se aproveitam das redes de pesca
para capturar os peixes presos. Esse comportamento gera um conflito entre
os botos e os pescadores, pois os animais frequentemente rasgam as redes,
resultando em perda de peixes, uma fonte vital de alimento e renda para as
famílias ribeirinhas. Além do impacto econômico, esse conflito também resulta
na matança dos botos, uma espécie já ameaçada de extinção, acentuando ainda
mais os desafios ambientais da região.
A localização geográfica de Boca do Acre também contribui para suas
particularidades. A cidade encontra-se a 1.554,5 km de Manaus, capital do
estado do Amazonas, com trechos de difícil acesso. A viagem até a capital
pode levar até 3 dias por via terrestre, 5 dias por via fluvial (quando o volume
das águas está elevado) e até 7 dias durante o período de estiagem. Por outro
lado, a capital do Acre, Rio Branco, está a 220 km de distância, o que facilita o
acesso e o apoio em diversos setores, incluindo a saúde, com uma viagem de
aproximadamente 3 horas de carro.

84
Diante desse panorama, a complexa dinâmica territorial, onde o
isolamento e as dificuldades de acesso predominam, traz à tona a resiliência e a
adaptabilidade dos bocacrenses. Essa comunidade enfrenta desafios impostos
pelos ciclos das águas e as recorrentes enchentes, que não apenas impactam
a economia e o modo de vida, mas também exigem uma reorganização
constante das estratégias de cuidado em saúde, especialmente para as
comunidades ribeirinhas e áreas mais vulneráveis. Essas populações, que
muitas vezes dependem dos rios como principal via de acesso aos serviços de
saúde, representam um segmento vulnerável que exige uma atenção especial
e dedicada. O cuidado da saúde dos ribeirinhos, em particular, é uma missão
que nos impulsiona e a compartilhara essas vivências. Assim, contamos um
pouco dessa história, a partir de um trabalho coletivo, de profissionais que
fazem a diferença nesse território.
A motivação para a formação em medicina é a dedicação e o
compromisso com o cuidado das pessoas que vivem na Amazônia,
especialmente nos territórios líquidos e entre as populações ribeirinhas, nasce
de uma conexão profunda com a terra onde nasci e cresci.
O conceito de “território líquido” reflete a realidade dinâmica e fluida
da região, onde o ciclo das cheias e vazantes molda não apenas a paisagem, mas
também a vida cotidiana das comunidades ribeirinhas. As cheias transformam
o território em um espaço temporariamente alagado, exigindo soluções
inovadoras e rápidas para atender às necessidades emergentes da população.
Segundo Schweickardt, Lima, Alves, Simoes & Freitas (2016),

(...) território líquido, entendemos que, enquanto agenciador dos


encontros e energias das relações ribeirinhas, o espaço é considerado
o meio e o modelador das práticas de atenção à saúde na Amazônia.
Compreendemos ainda que o território amazônico é um lugar vivo,
dinâmico, repleto de atores sociais com interesses diversificados
(ribeirinhos, quilombolas, indígenas, seringueiros, garimpeiros,
empresários, agricultores, pecuaristas e outros), regido pelo tempo
diferente, singular e único e pelos ritmos dos banzeiros dos rios.

85
A água comanda a vida nesse território, e os pacientes e equipe de
saúde são entes integrantes e transeuntes do território.

Trazemos o relato da médica, autora deste texto, que se formou na


UDABOL-Bolívia), mulher negra, amazônida, nasci em Rio Branco - capital
do Acre, “acreana do pé-racho” (denominação dada a pessoas que nascem no
Acre), bisneta de seringueiros - meus bisavôs paternos e maternos migraram
do nordeste brasileiro (Ceará e Pernambuco) para o Acre durante o ciclo da
borracha em busca do “ouro branco”.
A decisão de seguir a medicina foi impulsionada pelo desejo de
retribuir à minha comunidade e região, oferecendo cuidados que considerem
as particularidades culturais, sociais e geográficas do lugar que moldou a minha
identidade. A Amazônia, com sua vasta e complexa teia de rios, florestas e
comunidades, não é apenas um cenário, mas a essência do que sou. Crescer em
meio à natureza exuberante e às comunidades ribeirinhas proporcionou uma
compreensão íntima das dificuldades e riquezas deste território.
Durante o período das enchentes, a atuação na Unidade Básica de
Saíde (UBS) Francisca Amélia no município de Boca do Acre, como parte
do Programa Mais Médicos para o Brasil, reflete um compromisso ético e
profissional de enfrentar as desigualdades estruturais que historicamente
deixaram muitas dessas comunidades à margem do sistema de saúde. A
complexidade do território líquido, onde barreiras geográficas e culturais
exigem abordagens inovadoras e adaptativas, motiva-me a aplicar e expandir
meus conhecimentos em saúde da comunidade, desenvolvendo soluções que
respeitem e integrem os saberes locais.
Por fim, a abordagem no atendimento domiciliar e a mobilização
rápida das equipes de saúde durante os períodos de enchente demonstram a
necessidade de estratégias inovadoras para atender uma população que vive no
que se conhece como “território líquido”. Neste contexto, busca-se fazer uma
“adaptação” às particularidades locais pode ser um diferencial no atendimento

86
de saúde, transcendendo as barreiras naturais e promovendo um cuidado
integral, atento às necessidades específicas das populações amazônicas.
Dessa forma, a proposta deste relato é destacar a experiência dessa
adaptação dos serviços de saúde em Boca do Acre no enfrentamento das
adversidades impostas pelo ciclo das águas. Buscamos, assim, refletir sobre as
práticas e estratégias que tornam o cuidado efetivo e inclusivo em regiões de
alta vulnerabilidade e complexidade territorial.

Francisca Amélia e o “atendimento domiciliar, em meio às


enchentes”

Os rios apresentam cheias recorrentes, com predomínio no primeiro


trimestre do ano, atingindo a cota de transbordamento no mês de março, em
que o nível dos rios atingiu a marca 19,98 metros, ou seja, mais de um metro
acima do normal para o período, conforme descrito na reportagem do G1
Amazonas intitulada “Boca do Acre decreta situação de emergência após cheia
dos rios Acre e Purus no interior do AM” (G1 AM, 2024).
É ao mesmo tempo incrível e assustador observar como os
bocacrenses se adaptaram ao verdadeiro território líquido formado pelo
exuberante encontro dos rios Acre e Purus. Apesar de muitos estarem
sempre “preparados” para as enchentes, com palafitas erguidas acima do
nível mais alto já registrado, ainda existem famílias que não estão prontas
para a rapidez dessas inundações, algumas até demonstram incredulidade
ou resistência diante da situação. Destaca-se ainda a vulnerabilidade acerca
das doenças de veiculação hídrica (DVH) são um dos principais desafios
de saúde pública, especialmente em regiões vulneráveis como Boca do
Acre, onde a realidade das cheias dos rios Acre e Purus agrava ainda mais o
cenário. Essas enfermidades são causadas pela ingestão de água contaminada
por patógenos, que incluem bactérias, vírus e protozoários. A contaminação
da água está frequentemente ligada à falta de saneamento básico e à poluição
ambiental (Guimarães et al., 2013).

87
Conforme destacado por Heller (2018), o acesso inadequado a sistemas
de saneamento é um fator crítico que contribui para a alta incidência de doenças
diarreicas, uma das formas mais comuns de DVH. A Unidade Básica de Saúde
(UBS) Francisca Amélia, localizada no bairro Praia do Gado e responsável por
uma população cadastrada de 7.439 habitantes, conta com duas equipes de
saúde da família. Durante o período de cheia, cerca de 80% da área adscrita foi
afetada, impactando aproximadamente 6.200 pessoas, de acordo com dados da
Defesa Civil municipal. Por estar situada em um terreno mais elevado, nossa
unidade acabou ficando isolada, ilhada pelas águas. Essa realidade sublinha a
necessidade urgente de intervenções eficazes em saneamento e saúde.
Ao realizar a territorialização e os atendimentos domiciliares,
compreendemos a profundidade dos desafios enfrentados pela população
local. Em colaboração a equipe implementou ações para promoção e
prevenção dos principais agravos de saúde durante as transições sazonais,
do verão para o inverno. A humanização no atendimento à saúde é um
princípio fundamental que se torna ainda mais relevante em momentos de
crise. A empatia e respeito entre profissionais e usuários. Scorsolini-Comin
(2022) argumenta que, em situações críticas, a comunicação efetiva e o apoio
emocional são indispensáveis.
A abordagem, que humanização no atendimento não se restringe a
aspectos técnicos, mas envolve uma relação de prioriza o cuidado integral
e a dignidade do usuário, é essencial para suavizar os impactos emocionais e
sociais das adversidades enfrentadas. De acordo com Malta et al. (2018), a
Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS) enfatiza a importância de uma
visão intersetorial que aborde os determinantes sociais da saúde, promovendo
qualidade de vida e bem-estar.
Com a chegada das cheias dos rios, nossa prioridade foi prestar
assistência às comunidades afetadas. A Equipe de Saúde da Família Francisca
Amélia, com o apoio da Secretaria Municipal de Saúde, reorganizou seu
funcionamento para fornecer cuidados de saúde prioritários. Adotamos

88
uma abordagem integral para reduzir os impactos da crise, assegurando
cuidados adequados e promovendo a conscientização para prevenir
problemas futuros.
A escassez de recursos e a pressão sobre o sistema de saúde podem
levar a um atendimento mais mecanizado, menos sensível às necessidades dos
usuários (Souza et al., 2023). Considerando que muitos dos nossos colegas de
trabalho também tiveram suas casas alagadas e visando reduzir o contato com
as águas contaminadas, reorganizamos nossa escala semanal. Cada colaborador
deveria comparecer apenas um dia por semana, em turno completo, recebendo
insumos essenciais como botas de borracha, alimentação e transporte.
Para isso, foi necessário identificar os profissionais que estavam
disponíveis em cada área, incluindo recepcionistas, auxiliares administrativos
e de limpeza, Agentes Comunitários de Saúde (ACS), Agentes de Endemias
(ACE), técnicos de enfermagem, dentistas, técnicos em saúde bucal, psicólogos,
técnicos de vacinação, enfermeiros e médicos. Assim, com o consenso da
equipe, formulamos a estratégia de dividir os pontos de apoio, o que ajudou a
reduzir o risco e a demora no atendimento. As equipes foram alocadas em três
pontos de atendimento:
• UBS Fluvial: uma médica, um técnico de enfermagem e um
técnico de vacinação.
• UBS Francisca Amélia: um recepcionista, um auxiliar de limpeza,
um dentista, um técnico em saúde bucal, a equipe de enfermagem
e uma médica.
• Equipe móvel para atendimento domiciliar: um enfermeiro, um
barqueiro e um ACS. Quando necessário, era acionado o apoio da
equipe da UBS.
Nesse contexto, o atendimento domiciliar emergiu como uma
estratégia essencial para garantir o acesso contínuo aos serviços de saúde,
reduzindo os impactos das enchentes sobre a população. Com os pontos
e horários de atendimento definidos e a escala de colaboradores montada,

89
iniciamos o processo de comunicação com a equipe e os usuários. Utilizamos
as redes sociais para divulgar os locais, horários e equipes disponíveis.
O trabalho conjunto entre os ACS e ACE, juntamente com a
equipe de enfermagem, envolveu uma triagem para identificar situações de
vulnerabilidade e suas necessidades. Em parceria com a Secretaria da Defesa
Civil, realizamos o cadastramento das pessoas afetadas, visando fornecer
alimentos e água mineral para a população vulnerável. Algumas pessoas
recusaram deixar suas casas, seja por falta de familiares próximos ou resistência
a ir para abrigos. Identificamos usuários em situação de vulnerabilidade
e intervenções básicas, como um simples abraço ou uma conversa, foram
algumas das formas de apoio.
Após identificar as necessidades dos usuários, a equipe móvel se
deslocava até as residências afetadas. Mesmo com um barco disponível
para o transporte, a alta demanda frequentemente exigia o uso de canoas
emprestadas. A equipe, composta por ACS, um enfermeiro e um médico,
transportava consigo medicações essenciais e outros suprimentos necessários
para garantir o atendimento adequado. Essa estratégia de mobilização rápida
é uma resposta vital às particularidades do “território líquido” de Boca do
Acre, onde a constante transformação das paisagens inundadas exige uma
abordagem flexível e adaptativa.
Ver a equipe empenhada em realizar os atendimentos, mesmo diante de
todas as dificuldades de acesso, alguns com suas próprias casas atingidas pelas
águas, trouxe ânimo e coragem para enfrentar as adversidades. Conectados
à fluidez da humanização, os profissionais atravessavam barreiras físicas e
emocionais para garantir o cuidado necessário.

90
Figura 1. Transporte de idosa para atendimento na unidade hospitalar.

Fonte: SEMSA Boca do Acre, 2024.

A cada atendimento, uma palavra de conforto, um abraço, o


abastecimento de água, comida e carinho ajudavam a contornar a tristeza de ver
os usuários, pessoas com quem criamos vínculos, conhecemos as realidades,
fraquezas e fortalezas, com suas casas devastadas. Novos laços foram criados
ao atracarmos as canoas nas escadas ou portas dessas residências, levando
atendimentos que iam além das necessidades físicas.
Com sorrisos no rosto, mas corações despedaçados, não medimos esforços:
dentro d’água, com remos improvisados, ACS e enfermeiros transformaram-se em
barqueiros, navegando entre ruas e vielas, “escutando o silêncio” - um silêncio que
não era “normal”, já que, durante nossa rotina de visitas domiciliares nos dias que
antecederam a enchente, as casas e comércios estavam cheios de vida, com músicas
e televisões ligadas. Para aliviar o longo silêncio, a equipe se unia em conversas
descontraídas e fazia registros sempre que possível.

91
Figura 2. Equipe Multidisciplinar no Atendimento domiciliar.

Fonte: SEMSA Boca do Acre, 2024.

O atendimento domiciliar no contexto da Estratégia Saúde da Família


(ESF) é uma das formas mais eficazes de promover a saúde, especialmente
em situações de vulnerabilidade social, como as ocasionadas por enchentes. A
ESF, ao integrar ações de saúde e assistência social, aproxima o profissional de
saúde da comunidade, permitindo um atendimento mais integral e preventivo.
Contudo, esse modelo de atenção exige adaptações durante emergências, como
inundações, para garantir a continuidade do cuidado.
Durante as enchentes, a mobilização das equipes da ESF torna-se crucial,
uma vez que muitos serviços de saúde convencionais, como postos de saúde, podem
ser inacessíveis devido ao alagamento das áreas. Segundo Souza et al. (2021), a
estratégia de atenção domiciliar contribui diretamente para a continuidade da
assistência e minimização dos impactos sanitários em comunidades afetadas por
desastres naturais. A atenção domiciliar é especialmente relevante na Amazônia,
onde a geografia complexa e a infraestrutura limitada dificultam o acesso a
serviços de saúde convencionais (Melo & Almeida, 2019).

92
Além disso, o acompanhamento domiciliar permite que profissionais
de saúde monitorem condições crônicas, como hipertensão e diabetes,
e assegurem o acesso a medicamentos e cuidados específicos. A atenção
domiciliar foi um pilar fundamental para assegurar o acesso ao cuidado,
minimizando os deslocamentos da população vulnerável e reduzindo o contato
com águas contaminadas. O atendimento domiciliar nestas condições visa não
apenas oferecer suporte físico e psicológico, mas também prevenir doenças de
veiculação hídrica, como diarreias, hepatite A e leptospirose, que tendem a
aumentar em contextos de enchentes (Santos, 2020).
Ademais, o atendimento domiciliar favorece a detecção precoce de
agravos relacionados ao ambiente, como doenças respiratórias, diarreicas e
dermatológicas, que frequentemente se agravam em situações de enchentes.
A presença das equipes da ESF também facilita o encaminhamento para
unidades de saúde de referência quando necessário. De acordo com Silva e
Santos (2022), os profissionais da ESF devem ser capacitados para identificar
os riscos e implementar protocolos de atendimento adaptados a contextos de
emergência, promovendo um cuidado mais seguro e eficiente.
Outro ponto importante é o vínculo de confiança que é estabelecido entre
a equipe de saúde e a comunidade. Em emergências, como as provocadas pelas
enchentes, esse vínculo se torna ainda mais relevante, pois facilita o processo de
orientação e a adesão das famílias a medidas preventivas, como o uso de água
potável e o controle de mosquitos. Segundo Lima et al. (2023), a ação do ACS no
acompanhamento domiciliar tem se mostrado fundamental na construção de
estratégias de resposta rápidas e eficazes em situações de crise.
Para garantir a humanização do atendimento, a equipe da UBS fez um
cuidado com empatia e solidariedade, oferecendo uma atenção que transcende o
físico e acolhendo emocionalmente as pessoas em momentos de vulnerabilidade.
A humanização é essencial na prática da saúde, especialmente em contextos de
crise, pois fortalece o vínculo entre a equipe de saúde e a comunidade, promovendo
uma confiança que é crucial para o sucesso das intervenções (Merhy, 2019). De

93
acordo com Santos Almeida & Silva (2021), a presença de profissionais da saúde
nos domicílios das famílias, mesmo em condições adversas, reforça a relevância
do SUS na garantia do direito universal à saúde.
Em síntese, o atendimento domiciliar na ESF, especialmente em
situações de enchentes, representa uma estratégia de saúde pública essencial
para garantir a continuidade dos cuidados e a proteção da saúde das populações
afetadas. A adaptação das práticas e a capacitação das equipes para atuar em
contextos emergenciais são determinantes para a efetividade da resposta do
Sistema Único de Saúde (SUS) em desastres naturais.
Assim, o atendimento domiciliar durante as enchentes em Boca do Acre
evidencia que o cuidado em saúde deve ser sensível e adaptável às necessidades
emergentes, respeitando as especificidades culturais e ambientais do território
amazônico. A experiência mostra que estratégias de cuidado humanizado e
integrador são fundamentais para diminuir os impactos das enchentes na saúde,
prevenindo a disseminação de doenças e fortalecendo o vínculo com a comunidade,
em consonância com os princípios do SUS e a promoção da cidadania.
Durante o período da enchente, em março de 2024, foram realizados
359 atendimentos pela equipe de saúde da família, sendo 136 deles
atendimentos domiciliares. Desses, 11 foram casos de urgência, incluindo 6
idosos, 2 crianças e 3 adultos. Os principais problemas de saúde identificados
foram pneumonia, asma grave, dengue, crise hipertensiva, síncope, diarreia e
desidratação. Garantimos tratamento oportuno e acompanhamento adequado,
resultando em uma redução significativa de encaminhamentos para serviços
de referência, com apenas dois casos de urgência hospitalar e nenhum óbito
registrado, demonstrando a eficácia dessa abordagem estratégica.
O conceito de “território líquido” descreve a Amazônia como uma região
de alta complexidade, onde as interações entre o visível e o invisível, o conhecido
e o desconhecido, moldam o cotidiano do sistema de saúde. Essa complexidade
exige que os profissionais de saúde e os programas, como o Mais Médicos, se
adaptem a essas particularidades ​(Schweickardt, Lima & Ferla, 2021).

94
A equipe se movia com a fluidez da correnteza, ajustando-se conforme
as necessidades surgiam, traçando novos horizontes a cada desafio enfrentado.
Essa experiência nos levou a refletir sobre a importância de um olhar mais
atento e específico para esse território líquido. O ciclo das águas se repete
há gerações, e, embora as estratégias tenham sido vivenciadas por equipes
anteriores, muitas vezes careciam de alinhamento e organização.
Esses resultados indicam que o cuidado de saúde na Amazônia,
especialmente no contexto do território líquido, requer abordagens adaptativas
e integrativas, que considerem as complexidades sociais e ambientais únicas
da região. As lacunas na literatura parecem estar relacionadas à necessidade
de mais estudos sobre como adaptar políticas de saúde a essas condições
específicas e como melhorar a eficácia dessas políticas em contextos territoriais
tão diversos e desafiadores.
A prática do cuidado transcendeu as atividades do cotidiano do
trabalho em saúde, pois havia a necessidade responder à situação climática que
atingiu os moradores de Boca do Acre. Assim, temos a responsabilidade de
planejar as ações para os próximos ciclos climáticas, que abalam o município e
o mundo pelo impacto das mudanças climáticas.

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96
Acompanhamento de usuários com
feridas na Atenção Primária em Saúde
no município de Carauari-AM
Everton Martins Honorato
Khylvia Nascimento da Costa
Alcinda Santiago da Rocha
Raylan Nascimento da Silva
Tâmela Bruna Viana de Medeiros
Lupuna Corrêa de Souza
Liliam Rafaelle Souza da Silva

Introdução

O município de Carauari faz parte dos 62 municípios do estado do


Amazonas e está situado na calha do Rio Juruá, que se caracteriza por suas curvas
sinuosas, tornando o deslocamento fluvial altamente perigoso. Carauari está a
aproximadamente a 787 km em linha reta da capital do estado, mas o acesso é feito
pelas curvas do Rio Juruá, aumentando consideravelmente o tempo da viagem. A
distância e o tempo tornam a viagem de quatro dias em embarcações convencionais,
e 36 horas em lanchas rápidas. Outra opção para chegar ao município, são as linhas
áreas de aviões de pequeno porte com voos de duas horas e meia de duração,
porém, além de não ter o serviço disponível diariamente, também não é um meio
de transporte financeiramente viável para toda a população.
O município de Carauari possui aproximadamente uma população de
29.176 habitantes conforme estimativas do Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE), em 2021, com uma cobertura de 100% da Atenção Primaria à
Saúde (APS) com seis Equipes de Estratégia Saúde da Família (ESF) Convencional
e uma Equipe de Estratégia de Saúde da Família Ribeirinha (eSFR) distribuídas
de forma homogênea, garantindo a área de cobertura de abrangência definida
dentro do território a oferta dos serviços a toda população.

97
Com uma extensão territorial de 25.767,348km² e uma densidade
demográfica de 1,1hab/km², o município ainda possui uma equipe da Unidade
Básica de Saúde Fluvial (UBSF) para garantir a oferta dos serviços de saúde
aos munícipes que residem em localidades mais distantes dentro do imenso
território líquido existente na sua área geográfica.
Considerando as barreiras geográficas que dificultam o acesso dos
usuários aos serviços de média e alta complexidades, que estão disponíveis
apenas na capital do estado, a Secretaria Municipal de Saúde (SEMSA) tem
como objetivo a expansão dos serviços de APS. Essa expansão visa garantir
um cuidado integral à saúde da população, com foco na promoção da saúde
e na prevenção de doenças e agravos, reduzindo assim a necessidade de
encaminhamentos e a demanda por serviços de saúde em Manaus.
Entre esses serviços, foi identificado muitos casos de usuários com
feridas de difícil cicatrização, principalmente devido à busca tardia por
tratamento, resultando, frequentemente, no encaminhamento desses para a
capital. No caso de usuários com doenças crônicas que apresentam feridas, a
solução, muitas vezes, é a amputação do membro afetado, o que pode causar
não apenas sequelas físicas, mas também psicológicas.
As feridas representam uma questão de saúde pública no Brasil, afetando
aproximadamente cinco milhões de pessoas (Andrade & Santos, 2016). Essas
lesões não apenas comprometem a qualidade de vida dos indivíduos, mas também
sobrecarregam o sistema de saúde devido ao tratamento prolongado e à necessidade
de cuidados especializados. Os custos diretos associados ao tratamento dessas lesões
têm aumentado significativamente, em grande parte devido à baixa resolutividade
dos casos, o que resulta em feridas abertas por períodos prolongados, tornando-as
crônicas e, em muitos casos, difíceis de tratar (Sanar, 2020).
O Sistema Único de Saúde (SUS) do Brasil, que tem a APS como sua
principal porta de entrada, possui orientações específicas para a realização de
curativos simples e especiais. Estas orientações são detalhadas em manuais que
servem de guia para os profissionais de saúde que atuam na linha de frente do

98
atendimento. Entretanto, além da necessidade de ter profissionais disponíveis
a fim de suprir a demanda registrada no serviço, para que as Unidades Básicas
de Saúde (UBS) possam executar esses procedimentos de forma adequada e
garantir a resolubilidade dos casos, é essencial que estejam bem estruturadas,
com infraestrutura física apropriada e acesso contínuo aos materiais e insumos
necessários para o cuidado eficaz (Brasil, 2011).
O município de Carauari traz uma realidade diferenciada, onde
foi possível observar que a parceria e o comprometimento entre a APS e a
média complexidade, o apoio da SEMSA e o comprometimento da equipe
de saúde tem mostrado resultados promissores no manejo de feridas. Assim,
buscamos apresentar a experiência no atendimento a usuários com feridas
crônicas, especialmente quando esse tipo de serviço não era oferecido nas
UBS do município. A introdução de um serviço municipal dedicado ao
acompanhamento e tratamento de feridas na APS não só melhora os resultados
clínicos, mas também alivia a carga sobre a média complexidade, pois eram os
únicos locais equipados para tratar feridas mais complexas.
A maioria dos usuários atendidos na APS são idosos, portadores
de doenças crônicas e acamados, colocando-os numa condição de
vulnerabilizados. Essas populações enfrentam desafios adicionais que
comprometem o cuidado e o autocuidado, tornando-os mais suscetíveis
à ocorrência de lesões. Além disso, fatores sociais e ambientais são
significativos na saúde desses indivíduos, exacerbando as condições que
levam ao desenvolvimento e à persistência de feridas. Dessa forma, o
objetivo principal da prática foi acompanhar de forma equitativa e integral
os usuários que possuem feridas, promovendo a melhoria da qualidade de
vida dessas pessoas com intervenções bem estruturadas e contínuas.
O acompanhamento é alcançado por meio da integração do Agente
Comunitário de Saúde (ACS), que, ao levar informações e cuidados diretamente
às casas dos usuários, estão fortalecendo as premissas do SUS. Além disso, o
estímulo à participação familiar nos cuidados domiciliares visa garantir que o

99
tratamento seja seguido de forma adequada, contribuindo para a eficácia das
intervenções. A importância desse tipo de cuidado na APS é que impacta na
redução das remoções dos usuários para a capital e contribui com a diminuição
das internações hospitalares por complicações e/ou agravos às pessoas com
feridas. Além disso, a implementação de tecnologias de cuidado no nível da
APS impacta na redução de custos com materiais e insumos, otimizando o
tempo de cicatrização da ferida. Por fim, a equipe da Saúde da Família (ESF)
tem a vantagem de estar no território do usuário, criando uma relação de afeto
e confiança, algo próprio das tecnologias leves.
O registro contínuo e a avaliação dos resultados são componentes
deste serviço, garantindo que os dados coletados informem a prática clínica
e permitam ajustes necessários para melhorar continuamente a qualidade do
cuidado oferecido.
Em Carauari, observa-se que cada cidadão é acompanhado por um
Agente Comunitário de Saúde (ACS), o que indica que os usuários com feridas
analisados neste relato já recebiam acompanhamento clínico pela equipe da
Atenção Básica, que possui um conhecimento detalhado das necessidades de saúde
dessa população. Contudo, devido à gravidade de algumas lesões, esses usuários
eram encaminhados a outro setor da Rede de Atenção à Saúde municipal, pois
faltavam materiais específicos, que só estavam disponíveis para o serviço de média
complexidade, não sendo contemplados nos procedimentos da UBS.
Dessa forma, a maioria das feridas era gerida pela atenção secundária
do município, especificamente na Unidade Hospitalar de Carauari, que possuía
os insumos necessários para os curativos, especialmente os mais complexos.
Essa divisão de responsabilidades muitas vezes gerava uma sobrecarga na
unidade hospitalar, que enfrentava dificuldades em atender a todos os casos
de forma eficaz, devido à alta demanda e à complexidade dos casos tratados.
Com a intenção de melhorar esse cenário e de otimizar o uso dos recursos
disponíveis, foi realizado uma ação estratégica entre a Coordenação da APS e
a Direção da Unidade Hospitalar.

100
Figura 1. Equipe da ESF da UBS referência serviço municipal de tratamento de
feridas.

Fonte: Autores, 2024.

A ação visava fornecer os insumos e instrumentais necessários para


a realização e acompanhamento dos curativos diretamente na UBS Michiê
Takeda, a qual ficou sendo uma unidade de referência para as demais equipes da
APS, descentralizando o atendimento da Unidade Hospitalar e aproximando
os serviços dos usuários. A equipe de ESF da UBS Michiê Takeda, apresentada
na Figura 1, foi reforçada com a ampliação das capacitações voltadas para os
profissionais de saúde incluindo a participação dos agentes comunitários de
saúde, enfermeiros, técnicos de enfermagem e o médico, com temas referentes
ao cuidado integral com o público específico para lidar com a complexidade
do tratamento de feridas.

101
Figura 2. Tratamento de Feridas no Atendimento Domiciliar.

Fonte: Autores, 2024.

Nesse primeiro momento, toda a equipe foi qualificada e sensibilizada


sobre os benefícios desse serviço para população e a importância de cada
ator envolvido no cuidado dos usuários, incluindo as orientações a serem
repassadas aos miliares, bem como a importância da busca ativa no território
de abrangência e o monitoramento das pessoas atendidos.
Inicialmente, os atendimentos foram realizados em domicílio devido
à falta de um espaço físico adequado na UBS. Esse modelo de atendimento
domiciliar foi utilizado para iniciar a oferta do serviço municipal de tratamento
de feridas na APS, permitindo que os usuários recebessem cuidados sem a
necessidade de deslocamento, o que é particularmente importante para aqueles
com mobilidade reduzida conforme é demonstrado na Figura 2.
Com o tempo, um consultório de enfermagem foi adaptado como sala
de curativos da UBS, o que permitiu uma maior organização dos atendimentos

102
e o oferecimento de um espaço adequado para o cuidado especializado. Essa
adaptação incluiu a reorganização do espaço físico e a aquisição de novos
equipamentos, garantindo que a Unidade Básica de Saúde estivesse preparada
e bem equipada para realizar os curativos de forma eficaz e segura.
Após a adaptação de um espaço físico adequado na UBS de referência
para tratamento de feridas, a equipe da ESF responsável pelo serviço realizou
uma triagem dos usuários em tratamento, identificando aqueles com boa
mobilidade, que poderiam deslocar-se facilmente até a UBS, e aqueles com
mobilidade reduzida, que continuariam recebendo atendimento domiciliar.
Com esse novo arranjo, a equipe passou a dispor de mais tempo para realizar
atendimentos na UBS e organizar-se de forma eficiente para os atendimentos
domiciliares, ampliando a qualidade do serviço, facilitando a rotina dos
profissionais e atendendo à demanda existente.
Assim, o uso de tecnologias de alto custo, como curativos especiais
e dispositivos para controle de infecções, foi controlado e constantemente
debatido pela equipe. Essa abordagem foi adotada para evitar interferências
no processo de cicatrização e para garantir que os recursos fossem utilizados
de maneira eficiente, sem desperdícios. A equipe adotou um protocolo para
o uso dessas tecnologias, garantindo que cada intervenção fosse baseada em
evidências e ajustada às necessidades específicas de cada pessoa.
A Prática Baseada em Evidências (PBE) constitui uma abordagem
segura e estruturada para estabelecer condutas profissionais, focando na
resolução de problemas com base nas melhores evidências científicas (Pedrosa,
Oliveira, Feijão & Machado, 2016). Na UBS Michiê Takeda, responsável pelo
Serviço Municipal de Tratamento de Feridas na Atenção Primária à Saúde
(APS), a capacitação contínua dos profissionais da Estratégia de Saúde da
Família (ESF) foi estabelecida como prioridade, desde a implantação do
serviço até o momento atual, garantindo que todos estejam atualizados sobre
as melhores práticas no tratamento de feridas.

103
Resultados

A adoção de novas tecnologias e técnicas no tratamento de feridas


trouxe benefícios significativos. Tecnologias avançadas, como curativos
bioativos e dispositivos de controle de infecção, foram incorporadas ao
protocolo de tratamento, resultando em uma cicatrização mais rápida. Essas
tecnologias, quando utilizadas de maneira criteriosa e baseada em evidências,
podem fazer uma diferença substancial nos resultados clínicos.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as tecnologias em
saúde são componentes essenciais dos sistemas de saúde, assegurando o acesso
equitativo a tecnologias que demonstrem qualidade, segurança, eficácia e custo-
efetividade comprovadas. Além disso, seu uso deve ser fundamentado em
evidências científicas de qualidade (Pedrosa, Oliveira, Feijão & Machado, 2016).
O serviço iniciou no ano de 2022 e os resultados apresentados são
referentes a um ano de trabalho, que teve 70 usuários atendidos. Destes, 62
receberam alta, 6 continuaram em tratamento até a conclusão da escrita dessa
experiencia (tendo em vista que foram usuários inseridos no tratamento nos
últimos meses do ano de 2022, o qual foi a referência para o levantamento de
dados). Embora todo o cuidado da equipe de saúde, ainda houve 2 usuários
que abandonaram o acompanhamento devido a mudança para outros
municípios. Esses números refletem o sucesso do serviço e a eficácia das
intervenções implementadas. A utilização de novas tecnologias em curativos,
a adequação das técnicas e a inserção do agente comunitário de saúde
foram fatores fundamentais para esse sucesso. A equipe conseguiu reduzir
significativamente o tempo de cicatrização, o que é um indicativo positivo da
qualidade dos cuidados oferecidos.
Além disso, o serviço teve um impacto positivo em várias áreas da
vida das pessoas. Melhorias na mobilidade, autoestima, saúde mental e hábitos
alimentares foram observadas ao longo do tratamento. Esses benefícios atingem
outros aspectos da saúde, mostrando que o cuidado integral traga bem-estar

104
geral ao usuário, o que garante o sucesso do tratamento. A capacitação da equipe
também foi uma conquista importante do serviço. Com a experiência adquirida,
os profissionais passaram a realizar os procedimentos com maior segurança e
eficiência, o que se refletiu nos resultados positivos que foram obtidos.
Em relação ao acompanhamento desses usuários pelos ACS em suas
áreas de abrangência, ressaltamos a qualificação desses profissionais sobre
a abordagem com o usuário e como realizar as orientações adequadas aos
cuidadores e familiares durante as visitas domiciliares. Dessa forma, pensando
na prevenção de feridas, os ACS receberam capacitações para levar orientações
aos usuários portadores de doenças crônicas não transmissíveis e idosos, os
quais são mais suscetíveis a feridas. Os temas de forma geral foram referentes
ao autocuidado, identificação de feridas e com os principais sinais de agravos
para acionar os demais profissionais quando necessário.
É relevante destacar a parceria formada pela SEMSA/APS e a Unidade
Hospitalar do município de Carauari, ampliou a integração e o vínculo
da Rede de Atenção à Saúde e o funcionamento do serviço de referência e
contrarreferência no município. Essa colaboração garantiu o fornecimento
contínuo dos produtos necessários para a realização dos procedimentos,
evitando interrupções no tratamento das pessoas.
No período de 12 meses, que antecederam a escrita dessa experiencia,
houve uma redução significativa nas amputações por infecções de pé diabético,
tendo em vista que os usuários com esse tipo de ferida foram priorizados
nos atendimentos. Também foi possível identificar a redução nas internações
por agravamento de feridas crônicas e nos custos hospitalares. Ademais, a
demanda por remoções das pessoas para a capital diminuiu, o que aliviou a
carga financeira sobre o sistema único de saúde do município e permitiu que os
usuários permanecessem no conforto de seus domicílios durante o tratamento.
Esses resultados mostram que o serviço não só melhorou a qualidade
de vida das pessoas, mas também contribuiu para a sustentabilidade do SUS
local. Ao reduzir a necessidade de intervenções mais complexas e dispendiosas,

105
a implantação do serviço demonstrou que é possível oferecer cuidados de alta
qualidade dentro da atenção primária, utilizando os recursos disponíveis de
forma eficiente e eficaz.

Considerações Finais

Podemos inferir que os investimentos em novas tecnologias de


curativos, a capacitação contínua, o comprometimento e a participação ativa de
toda a equipe de APS, aliados a uma parceria com as entidades mencionadas,
são essenciais para uma recuperação mais rápida dos usuários. Esses fatores
garantem assistência integral e qualificada, que contribui para a melhoria da
qualidade de vida das pessoas, minimizando a necessidade de trocas diárias
de curativos, preservando os tecidos revitalizados, controlando os níveis de
exsudato e promovendo a formação de tecido de granulação. Além disso, a
administração adequada dos níveis de glicemia, pressão arterial, alimentação
e hábitos saudáveis são necessários para alcançar os resultados desejados pelos
profissionais do município.
Vale destacar que a capacitação contínua da equipe que a partir de
treinamentos regulares e da troca de conhecimentos entre os profissionais,
elevou o padrão de cuidado oferecido aos usuários. Essa capacitação não só
melhorou a qualidade dos curativos realizados, mas também fortaleceu o
vínculo entre os membros da equipe, criando um ambiente de trabalho mais
colaborativo e centrado no usuário.
Dessa forma, o impacto da implantação desse serviço na APS vai
além da cura física das feridas. Ao melhorar a mobilidade, autoestima e saúde
mental dos usuários, contribuiu para o bem-estar geral e a qualidade de vida
dos indivíduos atendidos e seus familiares. Isso demonstra a importância de
uma abordagem holística no tratamento de feridas, que considera a pessoa
como um todo, e não apenas a lesão específica.
Por fim, parafraseando Souza (2020), é possível afirmar que “avaliar
uma ferida é cuidar de um todo: cuidar do ser humano”. Esta frase encapsula

106
a essência desse serviço, que buscou não apenas tratar as feridas físicas,
mas também apoiar os usuários em todas as esferas de sua vida. O sucesso
nos resultados mostra que, com os recursos adequados e uma equipe bem
treinada e dedicada, é possível oferecer um cuidado de alta qualidade na
APS, melhorando significativamente a vida das pessoas e contribuindo para a
sustentabilidade do sistema de saúde.

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107
Desafios da adesão dos usuários ao
programa Hiperdia em uma comunidade
ribeirinha no Careiro Castanho, AM
Karina Sebastiana Macêdo Araújo
Carlos Alexandre Pereira da Silva
Yasmim Colares de França
Gigellis Duque Vilaça
Lupuna Corrêa de Souza

Introdução

A atenção básica à saúde enfrenta desafios em todo o Brasil,


especialmente em áreas ribeirinhas, onde a implementação dos programas do
Ministério da Saúde se torna ainda mais complexa. Assim, este estudo foca
nas particularidades do estado do Amazonas, onde as condições de vida e a
concepção do território são influenciadas pelas limitações do transporte fluvial
nas áreas rurais e ribeirinhas. Essas limitações, causadas pelas distâncias, pelas
calhas dos rios e pelo regime das águas, afetam diretamente a assistência à
saúde, que precisa considerar não apenas as dificuldades geográficas, mas
também aspectos culturais, sociais e econômicos.
Para enfrentar esses desafios, o Amazonas utiliza modelos específicos
de atenção à saúde, como a Unidade Básica de Saúde Fluvial (UBSF) e as
Equipes de Saúde Ribeirinha (eSFR). Esses modelos têm o objetivo de fornecer
assistência a uma população que, por muito tempo, foi negligenciada (Sousa
Lima et al., 2021). As Doenças Crônicas Não Transmissíveis (DCNT) são
atualmente a principal causa de morbimortalidade em todo o mundo, com
mais de 41 milhões de mortes por ano, segundo a Organização Mundial da
Saúde (OMS). No Brasil, as DCNT são responsáveis por cerca de 75% das
mortes, e no Amazonas, foram registrados 19.273 óbitos por DCNT entre

109
2018 e 2022. Durante esse período, a taxa de mortalidade prematura (30 a
69 anos) por essas doenças aumentou, especialmente em 2021, com uma taxa
de 233,86 óbitos por 100 mil habitantes, seguida de uma redução em 2022.
As neoplasias e as doenças do aparelho circulatório são as maiores causas de
óbitos por DCNT no estado.
Esses números poderiam ser ainda mais altos se considerássemos
as falhas nos registros de atendimento e óbitos no interior do Amazonas,
sugerindo que os dados são subestimados em comparação aos níveis nacionais.
Este relato, portanto, aborda a população do Distrito do Purupuru, com uma
estimativa de 4.000 habitantes, localizado na zona rural do município de
Careiro Castanho, a 123 quilômetros de Manaus (IBGE, 2022).
Durante o período de observação, notamos um número elevado
de casos agravados por doenças crônicas, especialmente entre pessoas com
diabetes e hipertensão arterial, que frequentemente chegavam em estado de
urgência e emergência hipertensiva, muitas vezes com complicações como
infarto agudo do miocárdio (IAM), acidente vascular cerebral (AVC) e
diabetes descontrolada. Como profissional de saúde, nos sentimos impotente
diante desses casos, mesmo realizando os atendimentos de forma correta,
percebendo que algo mais precisava ser feito para enfrentar esses graves
problemas de saúde.
Após investigar cada usuário inscrito no programa HIPERDIA,
considerando as suas particularidades, concluímos que muitos deles não
seguiam o tratamento de forma adequada devido à falta de compreensão das
receitas médicas. A maioria desses usuários era pouco escolarizada, idosa e
vivia sozinha, sem orientação adequada sobre como seguir corretamente
o tratamento prescrito. Com o objetivo de reverter essa situação, buscamos
encontrar métodos mais compreensíveis e práticos para que os usuários
pudessem seguir seus tratamentos de maneira correta e eficaz.

110
Figura 1. Mapa do Distrito Purupuru.

Fonte: Organizado por Lupuna Corrêa de Souza, 2024.

Dessa maneira, o objetivo geral deste estudo foi incentivar a adesão


da população ribeirinha ao programa HIPERDIA. Especificamente, buscamos
identificar as necessidades da população do Distrito do Purupuru, no
município de Careiro Castanho, e desenvolver ferramentas que facilitassem
a compreensão e melhorassem a efetividade do atendimento médico nessa
comunidade ribeirinha.

Metodologia

A experiência foi realizada durante a assistência prestada na Unidade


Básica de Saúde (UBS) Josias Lira, na Comunidade do Purupuru, Careiro
Castanho, Amazonas. A UBS atende tanto a comunidade local quanto a duas

111
unidades ribeirinhas: Ribeirinha 1, localizada em Nossa Senhora de Nazaré; e
Ribeirinha 2, na Cabeceira do Purupuru, que atendem a nove comunidades,
com uma estimativa de 4.000 usuários. Destes, 428 possuem hipertensão e
diabetes, sendo 232 com hipertensão e 120 somente com diabetes.

Figura 2. Receita médica tradicional.

Fonte: Autores, 2024.

A principal dificuldade encontrada não observações realizadas, foi


o uso incorreto das medicações, especialmente pela baixa escolaridade dos
usuários, que tomavam os medicamentos em horários errados ou repetiam
doses. Mesmo aqueles mais escolarizados, frequentemente não compreendiam
as receitas médicas prescritas. Para enfrentar essa situação, passamos a
trabalhar com rodas de conversa, panfletos lúdicos de fácil interpretação,
receitas médicas ilustradas, utilizando cores e figuras para indicar os horários
corretos de medicação, e atendimento médico domiciliar conforme a demanda
e gravidade dos casos.
Observamos, na Figura 2, que a receita médica vinha com uma caligrafia
que não colabora com o entendimento, além de ser pouca compreensiva para a
maioria da população pouco escolarizada.

112
Figura 3. Receita médica ilustrada.

Fonte: Autores, 2024.

Na Figura 3, a receita está adaptada para a população ribeirinha, sendo


impressa do Prontuário Eletrônico (PEC) com as medicações prescritas e a
adaptação que realizamos é com adesivos de cores e ilustração do sol e da lua
para identificar o dia e da noite, para indicar o horário a ser tomado e as cores
para identificar cada medicação. As figuras e cores contribui para não haver
confusão durante a tomada das medicações, pois havia pessoas que tomavam a
mesma medicação por diversas vezes e outras medicações indicadas não eram
tomadas, devido seu mesmo tamanho. Desse modo, a identificação aumentou
a adesão ao uso da medicação.

113
Vale ressaltar que tanto nas receitas, como na própria medicação
realizamos a identificação da medicação, facilitando que mesmo que o
usuário perca a receita ele não se confunda com as medicações a serem
utilizadas (Cavalcanti de Albuquerque et al., 2016). Na receita anexamos
ilustrações de frutas típicas da região que podem ser consumidas,
incentivando o consuma das frutas na dieta. Ao lado está sinalizado, com
um sinal de alerta, o que deve ser evitado como refrigerantes, bebidas
alcoólicas e doces ultraprocessados.
A implementação de receitas médicas ilustradas, aliada a rodas de
conversa e panfletos lúdicos, mostrou-se uma estratégia eficaz para superar
as barreiras relacionadas ao analfabetismo e à compreensão inadequada das
prescrições médicas (Torres, 2023). Essa abordagem não apenas facilitou a
adesão dos usuários ao tratamento, como também reduziu significativamente
os erros na administração dos medicamentos, resultando em menos
complicações e crises de saúde. Abaixo, fala de usuários de 2 comunidades:

É importante pra nós a receita e os remédios com as figuras, eu sou


diabética e hipertensa e já não enxergo muito bem as letras então
com as cores e figuras eu não tomo mais remédio errado (Lucila
Souza Cavalcante - usuária Ribeirinha 2 - Comunidade Santa Maria).

Nós esquecia qual remédio ia tomar, com as figuras ficou mais fácil
porque a gente não confunde (Ana Maria Lopes da Silva - paciente
ribeirinha 1 - Comunidade Santa Luzia).

Eu agradeço a doutora por ter olhado por nós, a gente não tem
estudo e as vezes eu fico com vergonha de dizer que não sei ler e ela
ter olhado por nós ajuda a nossa vida e tomo meu remédio certinho
(Francisca Ribeiro Gomes - Comunidade São José).

A prática de personalizar o atendimento, utilizando recursos visuais


claros e acessíveis, demonstrou ser uma solução prática e impactante para
melhorar a qualidade do cuidado em populações com baixos níveis de

114
alfabetização, contribuindo para um tratamento mais eficaz e para a promoção
de uma saúde integral na comunidade.

Figura 4. Explicação ao usuário sobre a interpretação da receita médica.

Fonte: Autores, 2024.

Durante a realização e posterior implantação do receituário adaptado


foi implementado grupo de idosos do HIPERDIA com atividade de grupos de
dança, caminhada com a participação da equipe de saúde.
Este relato abordou um tema que muitas vezes parece distante da
realidade de muitos profissionais de saúde, mas que é cotidiano para a população
ribeirinha. Muitos usuários acreditavam que só deveriam usar a medicação
quando apresentassem sintomas, como pressão alta ou glicemia elevada. Após
esclarecer, de forma lúdica, a importância da medicação, o maior desafio foi
garantir que os usuários tomassem os remédios nos horários corretos.
Ao reinventar as prescrições e abordá-las de forma lúdica, utilizando
ilustrações para descrever os horários e a identificação das medicações por
cores, conseguimos uma maior adesão dos usuários ao programa HIPERDIA.

115
Chegamos com 590 pessoas cadastradas no programa. Em conjunto com a
implantação da receita médica incentivamos a prática de atividades física,
grupo de caminhadas, realização de atividade física e estabelecemos grupo de
idosos, o que melhorou tanto a adesão ao tratamento como interação com a
equipe de saúde.

Figura 5. Equipe Ribeirinha - Nossa Senhora de Nazaré.

Fonte: Autores, 2024.

Considerações Finais

Para estabelecer a necessidade da medicação para as patologias dos


usuários, foi essencial criar uma relação de confiança entre o profissional e o
usuário, incorporando as práticas de “medicina alternativa” ao cuidado, mas
enfatizando a importância do cuidado conjunto (Aguiar et al., 2022).
Apesar dos desafios que ainda temos, como a falta de medicações
nas unidades e a necessidade de melhorar as condições de trabalho para
os profissionais dessas localidades, conseguimos realizar e melhorar o
atendimento para essa comunidade, reduzindo consideravelmente as

116
remoções de usuários com complicações de hipertensão arterial sistêmica
(HAS) e diabetes mellitus (DM). O atendimento básico bem-feito é
fundamental para evitar que esses casos evoluam de forma desfavorável e
para garantir um serviço público de qualidade.

Com a união descobrimos não apenas a nossa força, mas também a


incrível sensação de fazer algo maior que nós mesmos (Dra Karina
Macêdo).

Referências

Aguiar, M. J. O. de, Cariolando, K. A., Palheta, A. K. de C., & Paiva, G. da S. (2022). Modelo de
atendimento farmacêutico e estratégia para atendimento adequado para pacientes analfabetos
portadores de Hipertensão: Pharmaceutical care model and strategy for appropriate care for
illphabe patients with Hypertension. Brazilian Journal of Development, 8(6), 47223–47243.
https://doi.org/10.34117/bjdv8n6-295

Cavalcanti de Albuquerque, G. S., et al. (2016). Adesão de hipertensos e diabéticos analfabetos


ao uso de medicamento a partir da prescrição pictográfica. Trabalho, Educação e Saúde,
14(2), May-Aug. https://doi.org/10.1590/1981-7746-sip00112

Machado, L. E., & Campos, R. (2015). O impacto da diabetes mellitus e da hipertensão arterial
para a saúde pública. Saúde e Meio Ambiente: Revista Interdisciplinar, 3(2), 53-61. https://
doi.org/10.24302/sma.v3i2.627

Sousa Lima, R. T., et al. (2021). Saúde em vista: uma análise da Atenção Primária à Saúde
em áreas ribeirinhas e rurais amazônicas. Ciência & Saúde Coletiva, 26(6). https://doi.
org/10.1590/1413-81232021266.02672021

Torres, L. S. (2023). Fatores associados à adesão de hipertensos e diabéticos ao uso de


medicamento a partir da prescrição pictográfica. Research, Society and Development, 12(9),
e0112943419. http://dx.doi.org/10.33448/rsd-v12i9.43419

117
Projeto visão além do futuro: uma ação
intersetorial no município de Coari, AM
Maria do Perpétuo Socorro Carvalho Barreto
José Carlos Ferreira Pinheiro Junior
Wendel da Silva Barros
Fabricio da Rocha Botelho
Kelly de Nazaré Oliveira
Gercicley Rodrigues dos Santos

A escolarização é um período de desenvolvimento humano,


conhecimentos, habilidades e o estabelecimento de relações interpessoais.
O ambiente escolar propicia o contato dos estudantes com as temáticas que
perpassam a vida individual e comunitária, sendo um espaço ideal para a
promoção de hábitos saudáveis para a realização de ações que favoreçam o
desenvolvimento integral dos sujeitos e para a produção social da saúde (OPAS,
2007). Nesse contexto, a integração das políticas públicas brasileiras de saúde
e educação voltadas às crianças, aos adolescentes, aos jovens e aos adultos da
educação pública uniram-se para promover o desenvolvimento pleno desse
público através do Programa Saúde na Escola (PSE).
O Programa Saúde na Escola (PSE) é uma política intersetorial
entre os setores de Saúde e Educação, instituída pelo Decreto Presidencial
nº 6.286, de 5 de dezembro de 2007. Seu principal objetivo é integrar ações
de saúde e educação para fortalecer a cidadania e qualificar as políticas
públicas brasileiras.
A adesão ao PSE possibilita a sistematização das intervenções
direcionadas aos estudantes no âmbito das redes públicas de saúde e de
educação. Esse compromisso, assumido conjuntamente pelas Secretarias de
Saúde e Educação, busca assegurar a atenção integral à saúde dos estudantes
e formação integral, por meio de ações de prevenção, promoção e assistência

119
à saúde, desenvolvidas nas comunidades escolas do território (Ministério da
Saúde, s.d.). Segundo a Portaria Interministerial nº 1.055, de 25 de abril de
2017, artigo 3º, “o PSE constitui estratégia para a integração e a articulação
permanente entre as políticas e ações de educação e de saúde, com a
participação da comunidade escolar, envolvendo as equipes de saúde da família
e da educação básica” (Brasil, 2017, p. 1).
A Atenção Básica (AB) desempenha um papel essencial no PSE,
sendo responsável por ações de promoção, prevenção e atenção à saúde no
ambiente escolar, especialmente por meio das equipes de Saúde da Família.
Sua ampla descentralização, atuação no território onde as pessoas vivem e
função de porta de entrada do Sistema Único de Saúde (SUS) favorecem
a articulação entre profissionais da educação, saúde e a comunidade. Esse
processo fortalece a acessibilidade, a permanência na escola, o diálogo,
os processos de aprendizagem e a continuidade do cuidado em saúde
dos estudantes para a construção de uma educação e saúde integrais. As
Unidades Básicas de Saúde (UBS), são locais onde as equipes de saúde
atuam, desempenham um papel de ponte entre comunidade escolar e os
serviços de saúde, facilitando a promoção da saúde, a prevenção de doenças
e o acompanhamento contínuo dos estudantes.
Desse modo, o PSE incentiva o fortalecimento do vínculo entre
estudantes, familiares, comunidade, equipes de saúde e equipes de educação. A
formação desse vínculo resulta do modo como as equipes se responsabilizam
pela saúde do conjunto de pessoas que vivem em um território, numa ótica
de corresponsabilidade compartilhada entre os atores dos setores saúde e
educação e demais parceiros.
A operacionalização do PSE é primordial o planejamento articulado
intrassetorial e intersetorial, assim como a troca de informação e a comunicação
entre todos os atores envolvidos e, dessa mesma forma, entre as esferas de gestão
(federal, estadual, distrital e municipal). Esse planejamento propicia a construção
de capacidades e desenvolvimentos locais com base no contexto existente.

120
O PSE indica 14 ações de promoção da saúde e prevenção de doenças
e agravos no ambiente escolar. Essas ações abrangem áreas como avaliação
das condições de saúde dos estudantes, promoção da alimentação saudável,
práticas corporais, prevenção ao uso de álcool, tabaco e outras drogas, saúde
bucal, saúde ocular, entre outras. Essas iniciativas estão alinhadas com
a Política Nacional de Promoção da Saúde (PNPS), que visa promover a
qualidade de vida e reduzir vulnerabilidades relacionadas aos determinantes
sociais de saúde, como educação, ambiente e condições de trabalho através do
SUS (Ministério da Saúde, 2010). Além disso, contribuem para o cumprimento
dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 (ONU,
n.d.), especialmente o ODS 3 (Saúde e Bem-Estar) que visa assegurar uma
vida saudável e promover o bem-estar para todas e todos, em todas as idades,
e o ODS 4 (Educação de Qualidade) que busca assegurar a educação inclusiva
e equitativa e de qualidade, e promover oportunidades de aprendizagem ao
longo da vida para todas e todos.

O Projeto Visão Além do Futuro: relato da experiência

Neste contexto no município de Coari/AM, a atuação do PSE foi além


das ações pactuadas entre o Ministério da Saúde e o Ministério da Educação.
Ampliamos as iniciativas de acordo com as necessidades específicas de cada
escola, garantindo uma abordagem alinhada à realidade local.

121
Figura 1. Localização do município de Coari/AM.

Fonte: Organização de Lupuna Corrêa de SOUZA, 2024.

Coari é um município brasileiro, localizado no Estado do Amazonas,


região norte do País. Situada no centro da maior floresta tropical do mundo, a
cidade está mais localizada à margem esquerda do Rio Solimões, entre o lago de
Coari e o lago do Mamiá. A cidade é conhecida como a rainha do rio Solimões
e foi apelidada de a terra do gás, onde se localiza a Província Petrolífera de
Urucu, que extrai petróleo e gás natural. De acordo com Censo Demográfico
2022, do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), registrou uma
população de 70.616 habitantes; um decréscimo de -7,04%, em relação a 2010,
sendo o sexto município mais populoso do estado.
Os serviços de saúde do município são compostos por uma rede
abrangente, que inclui, um hospital de média complexidade, equipado com

122
105 leitos, além de 15 UBS, das quais 13 estão localizadas na zona urbana, uma
na zona rural e outra em uma unidade fluvial, voltada para o atendimento das
comunidades ribeirinhas. Há 32 equipes de Saúde da Família atuando na sede
e 10 equipes dedicadas Unidade Básica Fluvial. O município dispõe de um
Instituto de Medicina Tropical, um Laboratório Central de Análises Clínicas,
um Serviço de Emergência, um Departamento de Vigilância em Saúde, uma
Policlínica, um Centro Especializado em Reabilitação e um Centro de Atenção
Psicossocial (CAPS). Essa estrutura visa proporcionar um atendimento de
qualidade e acessível a diferentes regiões e perfis da população coariense e
município adjacentes e até mesmo da capital do amazonas.
Nesta abordagem o “Projeto Visão Além do Futuro”, nasceu em 2021,
de uma ação realizada pelo Programa Saúde na Escola (PSE) em parceria com
os acadêmicos do curso de Enfermagem da Universidade Federal do Amazonas
(UFAM) de Coari. A inserção do PSE no ambiente escolar exige a qualificação
do Projeto Político Pedagógico (PPP) para a inclusão de novas abordagens
de maneira transversal, ou seja, integrar, no cotidiano escolar, conteúdos que
promovam a saúde e o bem-estar dos estudantes.
O objetivo do projeto foi contribuir para o fortalecimento de
ações de promoção, de prevenção e de atenção à saúde na perspectiva do
desenvolvimento integral e proporcionar à comunidade escolar a participação
em programas e projetos que articulem saúde, educação e outras redes sociais
para o enfrentamento das vulnerabilidades que comprometem o pleno
desenvolvimento de crianças, adolescentes, jovens e estudantes adultos.
Segundo dados da Organização Mundial da Saúde (OMS),
aproximadamente 20% dos escolares apresentam alguma afecção nos olhos,
sendo mais frequentes os erros de refração, representados pela “Hipermetropia”
(dificuldade para ver de perto), “Miopia” (dificuldade para ver de longe) e
“Astigmatismo” (dificuldade para ver de longe e de perto). A criança portadora
de algum erro de refração pode apresentar alterações no comportamento, como
irritabilidade, insegurança, falta de interesse, dificuldade para a leitura e a escrita,

123
além de fadiga ao esforço visual. Podendo estar presentes sintomas como: tonturas,
dores de cabeça, visão embaçada e fotofobia (sensibilidade excessiva à luz).
Os acadêmicos da UFAM realizaram o teste de Snellen para avaliar a
acuidade visual dos estudantes na Escola Municipal Sandra Braga no bairro do
Pera em Coari. Por meio do teste foi possível identificar possíveis alterações
na condição visual dos estudantes, que resultou em alto índice de alteração
visual, o exame Snellen aconteceu no final do período dos acadêmicos de
enfermagem da UFAM, portanto quem deu continuidade as ações nas demais
escolas foram as equipes de Saúde da Família das UBS de acordo com sua
pactuação escolar. O teste de Snellen é utilizado para verificar a acuidade
visual, que significa a capacidade das pessoas enxergarem objetos com clareza,
sendo muito importante para manter a saúde ocular (Filippo, 2023).

Figura 2. Realização do teste de Snellen.

Fonte: BARRETO, Maria do Perpétuo Socorro Carvalho, 2021.

124
O bairro onde fica localizado a escola na qual foi agraciada pela ação
do PSE com o teste de Snellen, é um local onde encontramos famílias com
maior vulnerabilidade social. Diante deste fato, observamos que as famílias
destes estudantes não teriam condições financeiras para custear um exame
oftalmológico e tão pouco comprar os óculos, pois o Programa Saúde na Escola
não disponibiliza nenhum recurso para a aquisição da ação de Saúde Ocular.
No ano de 2021, foi apresentada a problemática ao Gestor municipal.
Desse modo, foi feito uma pactuação das ações de pactuação no PSE para
orientar as atividades de saúde ocular e aplicação do teste de Snellen. A ação
detectou o problema, mobilizando a gestão e os trabalhadores para criar
melhores condições visuais aos estudantes.
O estudante é posicionado sentado a uma distância de 5 a 6 metros da
parede onde a tabela de Snellen está fixada. O exame inicia com a leitura de
letras de tamanhos diferentes, realizada com um olho de cada vez, para avaliar
a acuidade visual. O Projeto foi criado especificamente para estudantes da rede
pública de ensino do município de Coari, no qual todos os estudantes foram
triados pelos professores juntamente com cada equipe de Saúde da Família
de acordo com a pactuação por área da saúde. Depois disso, foi realizado um
agendamento e o comunicado aos pais em reunião escolar e encaminhados a
Policlínica Dr. Roque D`elloso, onde aconteceu os exames oftalmológicos e
escolha dos óculos.

125
Figura 3. Realização dos exames de vista na escola.

Fonte: BARRETO, Maria do Perpétuo Socorro Carvalho, 2021.

O projeto ocorreu em 6 etapas, 4 delas aconteceram na Policlínica


e 2 aconteceram nas respectivas escolas, por motivo de falta de espaço para
atendimento. O estudante realizava o exame oftalmológico e, caso tivesse alguma
alteração em seu diagnostico era encaminhado para escolha dos óculos.

Figura 4. Escolha dos óculos.

Fonte: BARRETO, Maria do Perpétuo Socorro Carvalho, 2021.

126
Os receituários eram encaminhados para Manaus, onde a ótica
confeccionava os óculos e encaminhava para Coari. A primeira entrega aos
estudantes foi realizada em um evento solene com a presença da Deputada
Mayara Pinheiro, a idealizadora da emenda parlamentar para a aquisição dos
exames oftalmológicos e os óculos. Ainda teve a presença do Prefeito Keitton
Pinheiro, Vereadores, Coordenador da SEDUC, Secretário Municipal de
Educação, professores e estudantes.

Figura 5. Evento de entrega dos óculos.

Fonte: Prefeitura municipal de Coari, 2021.

Figura 6. Exposição dos óculos.

Fonte: BARRETO, Maria do Perpétuo Socorro Carvalho, 2021.

127
No município de Coari foi pioneiro na realização deste projeto
exitoso, tendo os seguintes resultados: foram pactuados 18.542 estudantes
pelo Ministério da Saúde e Educação; foram realizados 4.272 exames
oftalmológicos nas escolas da rede pública de ensino, estaduais e municipais;
1.666 apresentaram alguma alteração no campo visual; foram fornecidos os
óculos pelo Programa. Os quadros a seguir apresentam as escolas contempladas
pelo projeto “Visão Além do Futuro” em sua edição.

Quadro 1. Escolas comtempladas com o projeto na 1ª edição.

Ord. ESCOLAS ETAPA

01 Creche Amélia Aires Educação Infantil

02 Escola Estadual Gilberto Mestrinho Ensino fundamental

03 Escola Municipal Maria de Nazaré Ensino fundamental

04 Escola Estadual Francisca Evangelista Ensino fundamental

05 Escola Estadual Inês de Nazaré Vieira Ensino fundamental e EJA

06 Escola Estadual Francisco Lopes Braga Ensino fundamental

07 Escola Municipal Maria Elisângela Litaiff Ensino fundamental

08 Escola Estadual Iraci Leitão Ensino fundamental

09 Escola Municipal Ursulina Souza de Oliveira Ensino fundamental

10 Escola Estadual Thomé de Medeiros Raposo Ensino fundamental

11 Escola Municipal Raimunda Cruz e Silva Ensino fundamental

12 Escola Municipal de Educação Infantil Cândida Aquino Educação Infantil

13 Escola Estadual Dom Mário Ensino fundamental e EJA

14 Escola Estadual Presidente Kennedy Ensino fundamental

TOTAL DE ATENDIMENTOS: 640

TOTAL DE ÓCULOS: 457

Fonte: Elaborado por BARRETO, Maria do Perpétuo Socorro Carvalho, 2021.

128
As escolas selecionadas para 1ª edição utilizaram como primeiro critério
o quantitativo de estudantes de cada escola, priorizando a educação infantil
e ensino fundamental, onde foram distribuídas nos dias de atendimentos
dependendo do quantitativo de cada escola.

Quadro 2. Escolas comtempladas com o projeto na 2ª edição.

Ord. ESCOLAS ETAPA

01 CETI Tempo Integral

02 Escola Municipal Dirce Pinheiro Educação Infantil

03 Escola Municipal Sandra Braga Educação Infantil

04 Escola Municipal Rui Souto de Alencar Ensino Fundamental

05 Escola Municipal Agenor Smith Ensino Fundamental e EJA

06 Escola Estadual Nossa Senhora do Perpétuo Socorro Ensino Fundamental e EJA

TOTAL DE ATENDIMENTOS: 605

TOTAL DE ÓCULOS: 521

Fonte: Elaborado por BARRETO, Maria do Perpétuo Socorro Carvalho, 2021.

Para a segunda edição do projeto, foram selecionadas quatro escolas


municipais e duas estaduais: escola municipal Dirce Pinheiro e escola estadual
Nossa Senhora do Perpétuo Socorro, respectivamente, ambas com grande
quantidade de estudantes que foram divididas em etapas seguintes do Projeto.

Quadro 3. Escolas contempladas com o projeto na 3ª edição.

Ord. ESCOLAS ETAPA


Ensino Fundamental e
01 Escola Estadual Dom Mário (EJA)
EJA
02 Escola Estadual Maria Almeida do Nascimento Ensino Fundamental

03 Escola Municipal José Manoel de Souza (vila do Itapeua) Ensino Fundamental

04 Escola Municipal Coronel Gaudêncio (zona rural) Ensino Fundamental

129
05 Escola Municipal Dirce Pinheiro Educação Infantil

06 Escola Municipal João Soares da Fonseca (Saubinha) Ensino Fundamental


Ensino Fundamental e
07 Escola Estadual Nossa Senhora do Perpétuo Socorro
EJA
Escola Municipal Maria Almeida do Nascimento (zona
08 Ensino Fundamental
rural)
Escola Municipal Indígena Dom Jackson Damasceno
09 Ensino Fundamental
(zona rural)
10 Escola Municipal Capitão Silva (zona rural) Ensino Fundamental
Ensino Fundamental e
11 Escola Estadual Prefeito Alexandre Montoril
Médio
12 Escola Municipal Rui Souto de Alencar Ensino Fundamental

TOTAL DE ATENDIMENTOS: 446

TOTAL DE ÓCULOS: 194

Fonte: Elaborado por BARRETO, Maria do Perpétuo Socorro Carvalho, 2021.

Na terceira edição participaram escolas estaduais e municipais da


zona urbana, e escolas municipais da zona rural do município. A seleção da
zona rural foi de acordo com logística do deslocamento dos estudantes até o
município para a realização do exame, portanto optou-se por escolas próximas
ao município.

Quadro 4. Escolas contempladas com o projeto na 4ª edição.

Ord. ESCOLAS ETAPA

01 Escola Municipal Raimundo Moreira (zona rural) Ensino Fundamental


Ensino Fundamental, Médio
02 Escola Estadual João Vieira
e EJA
03 Escola Municipal Raimundo Bezerra Ensino Fundamental

04 Instituto Bereano de Coari Ensino Fundamental e Médio


Escola Estadual Nossa Senhora do Perpétuo
05 Ensino Fundamental e EJA
Socorro (EJA)

130
06 Escola Municipal Rui Souto de Alencar Ensino Fundamental

07 Escola Estadual Inês de Nazaré (EJA) Ensino Fundamental e EJA

TOTAL DE ATENDIMENTOS: 319

TOTAL DE ÓCULOS: 184

Fonte: Elaborado por BARRETO, Maria do Perpétuo Socorro Carvalho, 2021.

A quarta etapa continuou com as escolas cujos alunos ainda não


haviam realizado o exame, exceto as escolas Instituto Bereano de Coari e
Raimundo Moreira, da zona rural do município, cujos estudantes realizaram o
exame pela primeira vez.

Quadro 5. Escolas contempladas com o projeto na 5ª etapa.

Ord. ESCOLAS ETAPA

01 Escola Estadual João Vieira Ensino Fundamental, Médio e EJA


Escola Estadual Prefeito Alexandre Montoril
02 Ensino Fundamental e Médio
Gm3
TOTAL DE ATENDIMENTOS: 1.083

TOTAL DE ÓCULOS: 212

Fonte: Elaborado por BARRETO, Maria do Perpétuo Socorro Carvalho, 2021.

Nesta etapa do Projeto, foram selecionadas escolas com grande


quantitativo de alunos, e que aqueles que ainda não haviam realizado o exame.
Os profissionais se direcionaram até a escola para realização dos exames
e escolha da armação dos óculos, os atendimentos ocorreram nos períodos
matutino, vespertino e noturno para os estudantes da Educação de Jovens e
Adultos (EJA).

131
Quadro 6. Escolas contempladas com o projeto na 6ª etapa.

Ord. ESCOLAS ETAPA

01 Escola Municipal Dirce Pinheiro Educação Infantil

02 Escola Estadual Elisângela Litaiff Ensino fundamental

03 Escola Estadual Lopes Braga Ensino fundamental

04 Escola Municipal Rui Souto De Alencar Ensino fundamental

TOTAL DE ATENDIMENTOS: 1.179

TOTAL DE ÓCULOS: 101

Fonte: Elaborado por BARRETO, Maria do Perpétuo Socorro Carvalho, 2021.

Dando seguimento aos atendimentos realizados nas escolas, nessa


última etapa, os exames foram realizados nas Escolas Municipais Dirce
Pinheiro e Elisangela Litaiff, nos turnos matutino, vespertino e noturno.
Ao término da execução do Projeto “Visão Além do Futuro”, ficou
evidente que o objetivo foi alcançado, considerando a ampla adesão dos
estudantes e a demanda significativa pela confecção de óculos. Os estudantes
se beneficiaram de forma expressiva com as consultas oftalmológicas, uma vez
que os exames permitiram a detecção precoce de complicações oftalmológicas.

Considerações Finais: as palavras dos estudantes,


professores, comunitários e gestores

Nada melhor do que os próprios beneficiários do Projeto para avaliar


o impacto das ações nas suas vidas. Assim, concluímos com as suas palavras.

Sou o estudante B.H.P.L, estudante da Escola Estadual Presidente


Kennedy, fui agraciado pelo Projeto visão do futuro através do
Programa Saúde na Escola, onde recebi os óculos. Que alegria, foi
um dia de festa, passei a fazer tudo melhor na escola e em casa. Hoje
só quero agradecer a todas as pessoas envolvidas no projeto.

132
Sou S.A.P, mãe do estudante B.H.P.L, e o que eu tenho é somente
gratidão a todos os envolvidos no Projeto Visão Além do futuro.
Pelo Projeto meu filho fez o exame oftalmológico e ganhou um
óculo, seu desempenho escolar melhorou muito, e acompanhar e
ver as melhoras do meu filho não tem preço.

Eu Z.A, Gestora da Escola Estadual professor Gilberto Mestrinho,


juntamente com os professores e familiares somos gratos pelo
Projeto Visão do Futuro, pois através deste projeto os alunos que
tinham dificuldade de baixa visão ou até mesmo uma deficiência
visual, conseguiram enxergar melhor os conteúdos trabalhados
pelos professores e a aprendizagem se tornou mais significativa.
Portanto, agradecemos e parabenizamos a todos envolvidos por
darem oportunidade aos nossos alunos enxergarem melhor. E assim
deram a todos a chance de continuarem seus estudos sem prejuízos
no processo ensino e aprendizagem.

A Escola Municipal Domingos Agenor Smith, atente alunos do 6°


ao 9° ano, sendo foi comtemplada com o Projeto Além do Futuro.
Com isso, trouxe vários benefícios para escola e toda a comunidade
escolar. Os estudantes que sentiam dificuldades em enxergar tiveram
a oportunidade de realizarem seus exames de vista e adquirirem
seus óculos. Para a estudante E.C.S, é a primeira vez que ela usa
óculos e tem sido muito difícil para ela se adaptar com a nova rotina,
mas tem sido maravilhoso enxergar melhor e poder melhorara a
aprendizagem. O feedback dos professores tem sido muito positivo.
Segundo eles o Projeto visão em do futuro é essencial para a escola,
uma vez que temos alunos que precisam fazer o exame de vista,
mas não fazem por problemas financeiros. Há relatos de professores
sobre alunos que desistiram de estudar porque não enxergavam.
As famílias dos estudantes também relataram com satisfação sobre
o Projeto, pois sabiam que seus filhos tinham algum problema
de visão, mas não podiam fazer exames oftalmológicos devidos
as condições financeiras. Com a vinda do Projeto, os alunos que
foram beneficiados, conseguiram realizar seus exames e adquirir
seus óculos inteiramente grátis, por meio do Programa Saúde na
escola e o Projeto visão Além do Futuro. Beneficiou não somente
os alunos, mas impactou no rendimento escolar, contribuindo para
uma melhoria na aprendizagem dos alunos.

133
A escola Dom Jackson Damasceno, escola indígena, situada na
comunidade Esperança I, à margem direita do Rio Solimões, vem
por desta relatar os benefícios que o Projeto visão Além do futuro
trouxe para os estudantes que foram contemplados com os exames
de vista e consequentemente com os óculos. Este projeto trouxe
para a comunidade escolar pontos positivos as quais os estudantes
obtiveram melhores desempenho em suas atividades, pois eles
tinham muitas dificuldades de fazer leitura e escrita. Os pais dos
alunos relatam que estão satisfeitos com o Projeto, pois seus filhos
quando começaram a usar os óculos melhoraram muito em seus
estudos e foi uma grande ajuda para eles, pois eles não tinham
recurso financeiro para custear o exame de e nem os óculos. Os
educadores narram sobre a importância deste Projeto desenvolvido
exclusivamente para estudantes, relatam também que os estudantes
tinham muitas dificuldades de aprendizagem, isso implica no
grau de dificuldade de visão que os alunos tinham, hoje neste viés
os discentes melhoraram muito, podendo-se falar que eles estão
realmente inclusos no contexto de ensino-aprendizagem porque
demonstram em suas atividades escolares.

Dessa forma, o Projeto consolidou-se como uma iniciativa essencial,


integrando cuidados com a saúde ocular e promovendo uma educação mais
inclusiva, além de melhorar a qualidade do aprendizado. O Projeto “Visão Além
do Futuro” buscou também, contribuir para a redução da evasão escolar e das
dificuldades de aprendizagem, além de mitigar as limitações na qualidade de
vida causadas por doenças que afetam a visão. Por fim, essa experiência destacou
a relevância do diagnóstico precoce das alterações visuais para obter melhores
resultados, ressaltando a necessidade de medidas preventivas para a atenção à
saúde ocular dos estudantes da rede pública do município de Coari-AM.

Referências
Organização Pan-Americana da Saúde. (2007). Escolas promotoras de saúde: Experiências
do Brasil. OPAS. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/escolas_promotoras_saude_
experiencias_brasil_p1.pdf

Brasil. (2007). Decreto nº 6.286, de 5 de dezembro de 2007 – Institui o Programa Saúde na


Escola (PSE) e dá outras providências. Diário Oficial da União. https://www.planalto.gov.br/

134
ccivil_03/_ato2007-2010/2007/decreto/d6286.htm

Brasil. (2017). Portaria Interministerial nº 1.055, de 25 de abril de 2017. Diário Oficial da União.
https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/20243115/
do1-2017-04-26-portaria-interministerial-n-1-055-de-25-de-abril-de-2017

Ministério da Saúde. (s.d.). Programa Saúde na Escola (PSE). Governo do Brasil. https://www.
gov.br/saude/pt-br/composicao/saps/pse

Ministério da Saúde. (2010). Política Nacional de Promoção da Saúde (3ª ed.). Brasília:
Ministério da Saúde. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/politica_nacional_
promocao_saude_3ed.pdf

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2022).thttps://cidades.ibge.gov.br/brasil/am/


coari/panorama.

Organização das Nações Unidas. (n.d.). Sobre o nosso trabalho para alcançar os Objetivos de
Desenvolvimento Sustentável no Brasil. Nações Unidas Brasil. https://brasil.un.org/pt-br/
sdgs

Filippo, R. (2023, 09 de março). Teste de snellen: o que é, como é feito e como interpretar o
resultado. Clínica de Oftalmologia Integrada. https://coioftalmologia.com.br/blog/exame-
oftalmologico/teste-de-snellen/#:~:text=O%20teste%20de%20Snellen%20%C3%A9%20
um%20procedimento%20rotineiro%20que%20faz,e%20a%20nitidez%20da%20
vis%C3%A3o

135
Heróis das águas: desafios e
potencialidades nas urgências e
emergências em um município amazônico
Karina Sebastiana Macêdo Araújo
Carlos Alexandre Pereira da Silva
Yasmim França de Colares
Jackeline da Silva Gomes
Gigellis Duque Vilaça
Lupuna Corrêa de Souza

Introdução

O acesso à saúde é um direito de todos os cidadãos e um dever do


Estado, conforme estabelecido pela Constituição Federal de 1988, que
implementou o Sistema Único de Saúde (SUS). Através do SUS, foram criadas
as Redes de Atenção à Saúde (RAS) e a Rede de Urgência e Emergência (RUE)
(Brasil, 1988). A PORTARIA Nº 814, DE 01 DE JUNHO DE 2001, reforça essa
responsabilidade, destacando a importância de serviços de atendimento pré-
hospitalar móvel para garantir assistência rápida e de qualidade em situações
de urgência (Brasil, 2001).

137
Figura 1. Mapa de Localização do Município do Careiro.

Fonte: Organizado por Lupuna Corrêa de Souza, 2024.

Embora o direito ao acesso universal e igualitário à saúde seja garantido,


persistem desafios significativos para os usuários do SUS, especialmente
aqueles em áreas remotas (Guimarães et al., 2020). Careiro, um município
amazonense próximo a Manaus, enfrenta dificuldades adicionais devido às
suas características geográficas, que incluem vastas áreas de várzea alagadas
durante a estação chuvosa e isoladas na seca, conforme Figura 1.

138
Figura 2. Trajeto de remoção – Comunidade -> Manaus.

Fonte: Google, 2024.

Nessa região, a atenção básica e os serviços de urgência e emergência


precisam ser adaptados às particularidades locais para garantir o acesso e a
eficácia dos processos de trabalho. Este trabalho visa dar voz às dificuldades
enfrentadas pelos profissionais de saúde que se esforçam para fornecer
atendimento de qualidade à população ribeirinha, destacando a complexidade
logística e os desafios das remoções em áreas ribeirinhas.
O objetivo geral desta escrita é apresentar estratégias utilizadas
localmente para melhorar os atendimentos de urgência e emergência em áreas
ribeirinhas do município de Careiro. Assim, foi realizada a coleta de dados e
identificadas as comunidades com maior demanda por atendimentos de urgência
e emergência. A partir disso, as demandas foram apresentadas aos gestores para
viabilizar recursos destinados à criação de Prontos Atendimentos Remotos
e garantir a acessibilidade dos usuários à equipe de saúde. Iniciou-se então
uma busca ativa das remoções realizadas nas comunidades, com o objetivo de
verificar as situações em que essas remoções ocorriam e, por meio de avaliação
médica, determinar quais atendimentos poderiam ser realizados localmente e
quais deveriam ser encaminhados a um nível de maior complexidade.
Com base nos dados coletados, foi elaborado um plano que priorizava
a instalação de um Pronto Atendimento de Referência nas comunidades com

139
maior demanda, visando atender de forma mais eficiente as necessidades locais.
Assim, foram estabelecidos pontos de referência para pronto atendimento nos
distritos de Araçá e Purupuru, contribuindo para a descentralização do Hospital
de Referência Deoclécio dos Santos e formando uma parceria com o hospital para
a regulação imediata de atendimentos que necessitem de maior complexidade,
com encaminhamento para a capital, Manaus, quando necessário.
Dessa forma, buscamos evidenciar as necessidades e desafios na
assistência de urgência e emergência (RUE) da população de Careiro,
motivando os profissionais a desenvolverem ferramentas, como um fluxograma
de protocolo, que aprimoraram o atendimento às urgências e emergências
nas comunidades ribeirinhas. Atualmente, almeja-se estabelecer um cuidado
longitudinal e integral, reduzindo os custos com remoções e reinvestindo esses
recursos na melhoria dos serviços de saúde locais.
Nesse cenário, a gestão da saúde em áreas remotas, como Careiro,
enfrenta desafios significativos devido às especificidades regionais. A dificuldade
de acesso, causada pela vasta extensão territorial e pela precariedade dos meios
de transporte e comunicação, é agravada pela escassez de profissionais de
saúde, que muitas vezes preferem trabalhar em grandes centros urbanos. As
estratégias de cooperação federal frequentemente se concentram no aspecto
financeiro, utilizando métricas de eficiência e sustentabilidade que não se
adequam à realidade amazônica (Heufemann, Schweickardt & Ferla, 2024).
Portanto, para garantir uma assistência de qualidade à população
ribeirinha, é fundamental adaptar os serviços de saúde às características
geográficas e socioeconômicas locais. A implementação de estratégias específicas,
como o desenvolvimento de um fluxograma de atendimento e a melhoria da
comunicação entre as equipes de saúde, mostrou-se essencial para superar os
desafios impostos pela região. Esses esforços têm o potencial de reduzir os custos
operacionais e, ao mesmo tempo, aumentar a eficiência e a eficácia dos serviços
de saúde, beneficiando diretamente a população ribeirinha e contribuindo para
a construção de um sistema de saúde mais equitativo e sustentável.

140
O relato de experiência dos profissionais que atuam nas Estratégias de
Saúde da Família e no Hospital Deoclécio dos Santos, localizado na sede do
município, mostra a realidade de um município com características ribeirinhas.
A distância entre as comunidades mais remotas e a sede municipal é similar
ao tempo de viagem de barco até Manaus, que dura em média de 3 a 4 horas,
dependendo das condições climáticas e do tipo das embarcações, bem como do
período de seca ou cheia dos rios. Este cenário reflete os desafios enfrentados
pela população ribeirinha para acessar serviços de saúde, especialmente em
situações de risco iminente à vida.
O município do Careiro possui uma estrutura composta por: uma
unidade fluvial, 14 Unidades Básicas de Saúde (UBS), e 9 Equipes de Saúde
da Família Ribeirinha (eSFR), distribuídas nas comunidades. A equipe de
saúde é composta por 123 Agentes Comunitários de Saúde, 32 Agentes de
Controle de Endemias, 20 médicos e 60 enfermeiros. O referenciamento
dos usuários é um desafio devido à distância das comunidades em relação
à sede municipal.
Dessa maneira, com o objetivo de reduzir o número de remoções, foi
elaborado um plano estratégico, incluindo a criação de um fluxograma de
atendimento que melhorou a rede de atendimentos ao estabelecer um fluxo
de comunicação eficiente entre as equipes de atenção básica e os serviços de
urgência e emergência. Diante das necessidades identificadas, foi elaborado
um plano estratégico focado nas demandas da localidade. A análise incluiu o
levantamento do número de remoções realizadas entre comunidades e aquelas
encaminhadas para a capital, Manaus.
Considerando esses desafios, avaliou-se quais remoções eram mais
recorrentes e quais poderiam ser solucionadas localmente. Em diálogo com
o Secretário de Atenção Básica e a Secretária de Saúde, foram definidos
“kits de atendimento” para as unidades, de modo que emergências
pudessem ser tratadas inicialmente na própria comunidade. Em seguida,
foram realizados treinamentos com as equipes locais para que pudessem

141
gerenciar emergências, realizando uma espécie de triagem para identificar
quais casos necessitariam de remoções imediatas e quais poderiam ser
resolvidos no município.

Fluxograma de Atendimento

A comunicação é o ponto central e de maior dificuldade em áreas


ribeirinhas, onde a telefonia celular não é acessível. Ela se dá principalmente
por WhatsApp, dependendo do acesso à internet local. Em casos de falta
de eletricidade, essa comunicação é prejudicada, afetando diretamente o
prognóstico dos usuários (Ferreira, 2024). Para mitigar esses desafios, foi criado
um fluxograma de atendimento via WhatsApp, conforme descrito abaixo:
• Atendimento inicial via WhatsApp (ACS - Técnico de
Enfermagem);
• Conduta conforme o quadro clínico do usuário, informado pelo
técnico ao enfermeiro e médico;
• Dependendo da gravidade do quadro, indica-se remoção para o
hospital municipal ou regulação estadual;
• Caso necessário, o caso é passado ao diretor clínico do Hospital
Municipal Deoclécio dos Santos;
• Acionamento da Ambulancha com a equipe na BR-319, às margens
do Rio Negro;
• Remoção para Manaus, com a equipe na CEASA, localizada na
outra extremidade do Rio Negro, para remoção para os grandes
hospitais.

142
Figura 3. Fluxo de Atendimento (contato via WhatsApp - enfermeira e médica).

Fonte: Equipe Estratégia Saúde da Família (ESF), 2024.

Figura 4. Transporte usuário em rabeta (área de difícil acesso).

Fonte: Equipe Estratégia Saúde da Família (ESF), 2024.

143
Figura 5. Transporte de usuário via terrestre (área de difícil acesso).

Fonte: Equipe Estratégia Saúde da Família (ESF), 2024.

Figura 6. Chegada (Ceasa – Manaus).

Fonte: Equipe Estratégia Saúde da Família (ESF), 2024.

144
A implementação do protocolo de atendimento foi necessária a
realização de treinamentos para as equipes de saúde na abordagem inicial e
orientação de conduta, estabelecendo as emergências que podem ser reguladas
diretamente. Este trabalho visa reduzir o tempo de percurso das comunidades
mais distantes, estabelecendo um sistema de regulação mais eficaz, diminuindo
danos aos usuários e aumentando as chances de sobrevivência.
Vale ressaltar que durante a elaboração deste projeto, contamos com
2 unidades em pontos estratégicos para condução de casos de urgência e
emergência “polos de triagem de atendimento em urgência e emergência” um
localizado no Distrito do Araça – há 80 km do Hospital do município, e outro
na Comunidade do Purupuru localizado a 120 km do hospital municipal,
ambos receberam maior investimentos através do retorno deste trabalho e
estão operantes com equipe plantonista com presença de médico durante os
finais de semanas e feriados.

Figura 7. Ampliação da UBS com Pronto Atendimento 24 horas (Distrito Purupuru).

Fonte: Equipe Estratégia Saúde da Família (ESF), 2024.

145
Considerações Finais

Em um “território líquido” como o amazônico, a atenção à saúde


exige estratégias adaptadas às necessidades das populações locais, que são
frequentemente invisibilizadas e apresentam maior vulnerabilidade e risco à
saúde (Heufemann, Schweickardt & Ferla, 2024). Este relato de experiência
foi escrito com base nos desafios enfrentados pelos profissionais de saúde
na condução dos casos de remoção de áreas remotas, atendendo a diversos
tipos de emergências, como acidentes ofídicos, mordeduras de jacaré,
afogamentos, ferimentos por arma branca, Acidente Vascular Cerebral, e
Infarto Agudo do Miocárdio.
O planejamento de ações estratégicas fora realizado após a comunicação
entre a gestão e os serviços de atenção básica e de urgência e emergência. Vale
destacar que o município de Careiro não possui Serviço Móvel de Urgência
(SAMU). Assim, foi criado um sistema de atendimento médico distrital,
posteriormente difundido em todo o município.
A priorização do atendimento às comunidades ribeirinhas,
especialmente em casos de urgência e emergência, requer investimentos
em políticas públicas e financiamento adequado para efetivar a RUE, além
de estratégias da gestão municipal. Uma assistência de qualidade em áreas
remotas deve considerar questões como equipamentos adequados, equipes
qualificadas, interação entre equipes de pronto-socorro e sistemas de regulação
de leitos adaptados às particularidades ribeirinhas.
O baixo nível econômico dos ribeirinhos agrava o impacto de
problemas de saúde, tornando relevante discutir os custos de deslocamento e
internação. A aplicação do fluxograma de atendimento foi fundamental para
reduzir remoções desnecessárias e fortalecer o vínculo entre profissionais de
saúde, melhorando a segurança nas remoções. Este esforço diário para salvar
vidas, mesmo sob condições adversas, reflete o compromisso com a saúde
pública e a esperança de dias melhores através do SUS.

146
Referências

Brasil. (2001). Portaria nº 814, de 01 de junho de 2001. http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/


gm/2001/prt0814_01_06_2001.html

Brasil. (1988). Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF: Senado.

Ferreira, D. (2024). Desafios na manutenção do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência


Fluvial no Alto Solimões.

Guimarães, A. F., Barbosa, V. L. M., Silva, M. P., Portugal, J. K. A., Reis, M. H. S., & Gama, A.
S. M. (2020). Acesso a serviços de saúde por ribeirinhos de um município no interior do
estado do Amazonas, Brasil. Revista Pan-Amazônica de Saúde, 11, e202000178. https://doi.
org/10.5123/s2176-6223202000178

Heufemann, N. E. C., Schweickardt, J. C., & Ferla, A. A. (2024). Desafios avaliativos em cenário
ribeirinho: pistas metodológicas no acesso à Rede de Urgência e Emergência. Revista Baiana
de Saúde Pública, 47(4). https://doi.org/10.22278/2318-2660.2024.v47.n4.a3635

147
Fisioterapia em grupo: tratamento
da lombalgia na Atenção Básica em
Eirunepé - AM
Yanna Luane Souza Cavalcante
Thayana Oliveira Miranda
Francisco Loab Dos Santos Silva
Marluce Mineiro Pereira
Liliam Rafaelle Souza da Silva

Introdução

O município de Eirunepé pertence a microrregião do rio Juruá, localiza-


se cerca de 1.160 KM distante da capital Manaus, possui aproximadamente
33.170 habitantes e densidade demográfica de 2,22 hab/km². No âmbito
educacional o município apresenta taxa de escolarização de 90,7% entre as
crianças de seis a 14 anos, na economia, em 2021 a renda per capita era de
15.726,02. Em relação ao meio ambiente 11,9% de domicílios apresentam
esgotamento sanitário adequado, 1,4% de domicílios na zona urbana
apresentam urbanização adequada e seu Índice de Desenvolvimento Humano
(IDH) é de 0,563 (IBGE, 2022).

149
Figura 1. Município de Eirunepé.

Fonte: geoftp.ibge.gov.br (2024).

Em relação a atenção básica à saúde há cinco unidades básicas de


saúde sendo uma delas fluvial, e dentro delas atuam 11 equipes de saúde da
família, dentre estas três ribeirinhas e um fluvial, englobando atendimentos
médicos, odontológicos e fisioterapêuticos (CNES, 2024). Os profissionais de
fisioterapia estão distribuídos nessas unidades de saúde da seguinte forma:
dois na unidade hospitalar do município, um na Unidade Básica de Saúde
Fluvial Expedito Barroso, dois na unidade básica de saúde Padre Antônio
Cremer. Embora estejam alocados nessas unidades, quando surgem projetos
ou programas voltados para atender demandas de reabilitação, cuidado, cura e
alívio da dor, os fisioterapeutas atuam conjuntamente no Centro Municipal de
Reabilitação Física e Ortopédica - CEMURFO.
O município tem registrado problemas de saúde associados à
prevalência de doenças neurológicas, com maior parte de queixas atendidas

150
pelos fisioterapeutas advindas principalmente de usuários com sequelas pós
acidente vascular cerebral (AVC) e crianças com paralisia cerebral. Dentre as
queixas ortopédicas a principal é a dor na coluna e afecções de ombro e joelho,
as quais implicam em uma alta demanda pelos serviços médicos especializados
e fisioterapêuticos. Tendo em vista que esses atendimentos são realizados
em no mínimo 10 sessões, gera uma longa lista de espera para realização
da consulta inicial dos usuários. Após análise dos usuários que aguardavam
para o atendimento fisioterapêutico, notamos o grande número de usuários
com queixas e sintomas em região lombar. Assim foi criado o “Grupão de
Fisioterapia”, projeto que visava o atendimento de pequenos grupos, reduzindo
assim o tempo de espera para as outras demandas do serviço.
O relato de experiência tem como objetivos: apresentar a experiência do
projeto “Fisioterapia em grupo para redução de lombalgia” que objetivou implementar
atendimentos em grupo e palestras voltados à redução dos sintomas de lombalgia;
promover atendimento integrado e permitir a troca de experiência entre os
participantes; conscientizar os participantes sobre a importância dos exercícios físicos
na melhora do quadro de lombalgia e reduzir a demanda de encaminhamentos e a
lista de espera para os atendimentos de fisioterapia.
Apresentaremos nesse relato de experiência os principais resultados
obtidos no projeto “Fisioterapia em grupo para redução de lombalgia”,
desenvolvido no CEMURFO por um grupo de cinco fisioterapeutas. As
atividades foram desenvolvidas semanalmente com dois grupos nos turnos da
matutino e vespertino cada. Antes de iniciarmos as atividades, aplicamos a
Escala de Oswestry The Oswestry Disabilty Index (ODI), para avaliação da
intensidade da dor. Ao final do período de desenvolvimento dos exercícios
com os grupos, aplicamos novamente o a Escala de ODI, a fim de avaliarmos
os resultados. Para obtenção de uma compreensão mais ampliada sobre os
resultados dos exercícios, perguntamos ao final do projeto aos usuários: 1-
O que eles acharam dos exercícios; 2 - Como se sentiam após a realização e
3 - Como estava o seu estado de saúde atual. Por fim, solicitamos a anuência

151
dos participantes para o registro fotográfico e divulgação dos resultados das
atividades na Mostra Aqui Tem SUS e em publicações científicas.
Ressaltamos a importância da atuação multi e interdisciplinar na saúde
coletiva, onde o papel do fisioterapeuta tem sua relevância considerando que é
por meio do trabalho em equipe que a saúde coletiva se materializa, respeitando
a identidade cultural e social dos indivíduos na oferta dos cuidados em saúde
de diferentes tipos de população.
A lombalgia ou lombociatalgia pode ser definida como dor, rigidez ou
qualquer desconforto na região inferior da coluna vertebral, a qual se estende
desde a última costela até a prega glútea. Os sintomas da doença incluem a
própria algia4, mas podem evoluir com parestesia e paresias, podendo causar
ou não irradiação para um, ou ambos os membros inferiores. De um ponto de
vista evolutivo a doença é realizada a seguinte classificação: aguda, quando
dura até seis semanas; subaguda, com duração de seis a 12 semanas; e crônica,
na qual a dor persiste por mais de 12 semanas (Costa, 2019).
A patologia tem uma etiologia multifatorial, e a causa em cada indivíduo
é raramente identificada, porém fatores como sedentarismo, tabagismo, sexo,
alto índice de massa corporal e baixa força muscular podem levar ao surgimento
do quadro. No entanto, as causas mais comuns são movimentos repetitivos e
extenuantes, principalmente relacionados com atividades laborais e posturas
viciosas. A dor lombar também é comumente associada a quadros de hérnia
de disco, onde o núcleo pulposo da vértebra infiltra a medula espinhal e gera
a compressão do nervo acometido, causando quadros dolorosos que são os
principais sintomas da doença (Oliveira,2014).
A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que cerca de 65%
da população adulta pode sofrer com episódios álgicos na região da coluna
lombar, destes, 40% podem desenvolver lombalgia crônica, com quadros de
dor contínuos e recorrentes que apresentam duração mínima de seis meses. Os
casos crônicos podem levar a diversas alterações na funcionalidade, redução
do nível de atividade e da qualidade de vida (Nascimento, 2015).
4 Dor em um órgão ou em uma região do corpo, sem apresentar lesão anatômica ou orgânica.

152
Com isso, os indivíduos acometidos com a lombalgia relatam, além
de crises dolorosas, dificuldade para realizar suas atividades de vida diária
(AVD), como carregar ou levantar pesos, efetuar tarefas domésticas, ou a
manutenção de posturas (ficar em pé ou sentado) por um longo período.
No curso da doença há ainda uma dificuldade de efetuar o cuidado pessoal,
como tomar banho, vestir-se, pentear o cabelo, entre outros. Em casos
avançados a dor pode causar também dificuldade na locomoção, causando
restrições na vida social e de lazer, redução da qualidade do sono, causando
impedimentos ao usuário, que se torna incapaz de exercer plenamente as
tarefas do dia a dia (Medeiros, 2014).
Os casos de lombalgia são identificados inicialmente nas visitas
domiciliares feitas pelos enfermeiros e agentes comunitários de saúde
(ACS), ou através de consultas rotineiras nas Unidades Básicas de Saúde
(UBS) do município, após a identificação esses usuários são encaminhados
para consulta com o ortopedista ou fisioterapeuta, que atuam na UBS Padre
Antônio Cremer. Dos usuários encaminhados à Unidade, cerca de 70%
apresentam queixas de dor lombar.
A alta prevalência de casos e seus efeitos deletérios na funcionalidade,
a lombalgia é hoje uma das principais causas de absenteísmo no trabalho, e
é considerada como a terceira maior causa de aposentadoria por invalidez
no Brasil, acarretando custos elevados ao sistema de Seguridade Social e ao
Sistema Único de Saúde (SUS), o que torna a patologia um problema de saúde
pública. Assim, é notória a necessidade de uma atenção cuidadosa e priorizada
para os casos de lombalgia, com o intuito principal de reinserir o indivíduo em
suas atividades cotidianas (Korelo et al.,2013).
O tratamento medicamentoso da lombalgia envolve principalmente
analgésicos, sendo o paracetamol e a dipirona os mais recomendados. Ainda
podem ser utilizados anti-inflamatórios e relaxantes musculares, que quando
associados aos analgésicos trazem maiores benefícios, principalmente ao
mitigar os quadros álgicos. Contudo, esses medicamentos podem causar

153
diversos efeitos adversos, tais como sonolência, tontura e constipação intestinal,
o que inviabiliza a sua utilização por tempos prolongados (Brazil et al., 2004).
O tratamento cirúrgico é raramente indicado e ocorre quando a dor
lombar está relacionada com a hérnia de disco, e tem como objetivo o alívio
rápido dos sintomas resultantes de quadros inflamatórios e da compressão
nervosa, como a parestesia e a paresia. O procedimento é realizado por meio
da remoção total ou parcial do disco herniado, é indicada em todos os casos
que envolvam a síndrome da cauda equina, quadro onde há a compressão e
inflamação dos feixes nervosos na parte inferior do canal vertebral, e quando
há paralisia importante dos membros inferiores (Sussela et al., 2017).
A Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), desde a sua primeira
versão, esteve voltada para a promoção da expansão, qualificação e consolidação
dos serviços na atenção básica do Sistema Único de Saúde (SUS). Esse nível
de atenção é composto por diferentes profissionais, inclusive o fisioterapeuta,
que pode atuar de forma preventiva através de visitas domiciliares e atividades
comunitárias, geralmente voltadas à educação em saúde e práticas corporais, visto
que, após avaliado e liberado pelo ortopedista, o usuário pode dar continuidade ao
tratamento de maneira conservadora, ou seja, sem tratamento medicamento ou
intervenção cirúrgica, sendo a fisioterapia a principal indicação (Tavares, 2018).
Importante destacar que a atuação do fisioterapeuta na atenção
básica se deu enquanto integrante da equipe do Núcleo de Apoio a Saúde da
Família (NASF), a partir da aprovação da portaria nº 154/2008 – GM/MS,
compreendendo ações de educação em saúde e prevenção de enfermidades
além da organização do fluxo e manejo dos usuários com inúmeras demandas,
como reabilitação, prevenção e tratamento de doenças ocupacionais, bem
como o desenvolvimento de práticas integrativas e complementares (PIC).
Atualmente, o fisioterapeuta atua na atenção básica por meio das equipes
Multiprofissionais na Atenção Primária à Saúde (eMULTI), podendo estar
inserido na eMULTI Ampliada ou eMULTI Complementar, conforme prevê a
portaria GM/MS nº 635/2023.

154
A abordagem fisioterapêutica envolve inicialmente técnicas de analgesia,
principalmente em quadros agudos e quadros álgicos não controlados. Dentre
os recursos mais utilizados nos serviços de saúde do município, se encontram
a termoterapia, o ultrassom terapêutico, a estimulação elétrica nervosa
transcutânea (TENS), liberação da fáscia muscular, alongamento, mobilização
neural e a técnica da medicina tradicional chinesa denominada ventosa. Tais
recursos são comprovadamente eficazes na redução da dor, apresentando
poucas contraindicações e menos efeitos adversos, quando comparados com
tratamento medicamentoso (Maia et al., 2015).
O papel fundamental do fisioterapeuta é a reabilitação e reinserção
do usuário as suas atividades de vida diária (AVD) e atividades laborais.
Após a mitigação da dor é iniciada a cinesioterapia, por meio de exercícios
que visem a estabilização segmentar da coluna lombar, sejam eles advindos
de métodos como o pilates, yoga ou musculação. O importante é que as
atividades priorizem o fortalecimento da musculatura profunda do tronco,
com exercícios isométricos e de baixa intensidade. Em adição, são realizados
treinos funcionais, os quais são baseados nas tarefas diárias do usuário e
busca reinseri-los aos poucos e de forma controlada, às atividades cotidianas.
Ademais, outro recurso importante envolve o componente cognitivo e
comportamental, e ocorre através da educação contínua, ensinando ao
usuário métodos e formas para alívio da dor, posturas adequadas para
realização das AVD, a maneira adequada de pegar e manusear cargas e no
geral técnicas que reduzam a sobrecarga na coluna lombar. Tais métodos ou
exercícios têm apresentado bons resultados na literatura e são eficazes na
melhora dos níveis de funcionalidade e na redução de recidivas dos quadros
de dor (Aguiar, 2018).
O fisioterapeuta é um profissional capacitado para atendimento nos
diferentes níveis de atenção, sendo principalmente associado ao cuidado
terciário, atuando na reabilitação do indivíduo. No entanto, ele pode atuar
também nos casos de prevenção. Para Silva, 2020 a intervenção no âmbito

155
primário deve iniciar com o componente educacional. Cerrilo (2015) criou
cartilhas informativas, em que por meio de fotos demonstrava a forma correta
de realizar diversas atividades presente no cotidiano, com informações voltadas à
reestruturação cognitiva, reestruturação de objetivos e desvio de atenção. Ainda
no âmbito preventivo é realizada a cinesioterapia, que consiste na realização de
movimentos como forma de terapia, com o objetivo de alongar e fortalecer os
músculos do tronco e membros inferiores, estimulando a estabilização segmentar
da região lombar, o que diminui a sobrecarga na coluna. A intervenção nesses
quadros pode ainda ser realizada em grupos, promovendo maior acolhimento
e autonomia, gerando interações sociais, troca de experiências, e promove a
atenção humanizada e integrada (Recco & Lopes, 2016).

Metodologia

O projeto teve início em novembro de 2022 e finalizou em janeiro


2023, com a avaliação dos usuários contidos na lista de espera para o
atendimento fisioterapêuticos. Os resultados apresentados neste relato
se baseiam no primeiro grupo criado, que contava com 23 usuários,
todos advindos de encaminhamentos da atenção básica e residentes no
município. O primeiro grupo teve encontros semanais, totalizando doze
semanas, após o final das atividades foram realizadas novas avaliações e
instituídos dois novos grupos que estão em atividade desde fevereiro de
2023, contando com dezoito usuários.
A captação inicial dos usuários ocorreu na Atenção Básica (AB),
durante atendimentos realizados nas UBS do município e através das visitas
feitas pelos agentes comunitários de saúde (ACS). Nesse primeiro contato
os enfermeiros e ACS analisam a necessidade de atendimento especializado,
então essa demanda é repassada aos enfermeiros e médicos da equipe de saúde
da família, que após avaliação, os encaminham ao médico ortopedista e/ou
ao serviço de fisioterapia, onde devido a uma alta demanda, os usuários eram
colocados em uma lista de espera.

156
Na primeira etapa para inclusão nos grupos foi realizada a convocação
dos usuários da lista com queixas e sintomas na região lombar. Posteriormente,
realizamos uma triagem, com o intuito de analisar através de escalas e
questionários, determinados critérios, para assim dividir os indivíduos entre
aqueles que necessitavam de atendimento individual e os que podem fazer o
atendimento em conjunto. Nesse segundo caso, os usuários foram divididos
em dois grupos de acordo com o nível de dor e funcionalidade, principalmente
na realização das AVD.
Na segunda etapa, foi realizada uma avaliação, com auxílio de um
questionário elaborado pelos fisioterapeutas visando estabelecer critérios para
o tratamento e era composto por perguntas sociodemográficas e relativas
à patologia, tais como o tempo de duração dos sintomas, utilização de
medicamentos para dor e quais os resultados que eles esperavam obter com
o tratamento fisioterapêutico. Uma vez que a intensidade da dor é subjetiva,
é necessário que sua avaliação possa ser quantificada, para isso foi utilizada a
escala visual análoga (EVA), a qual varia de zero a 10, sendo zero a ausência de
dor, pontuação de um a três, são consideradas dor leve, quatro a seis moderada
e 7 a 10 dor forte (Carvalho,2006).
Na avaliação da funcionalidade foi utilizada A Escala de Oswestry
[The Oswestry Disabilty Index (ODI). A escala é composta por 10 questões,
e a primeira delas analisa a intensidade da dor, e as outras nove, o efeito dos
quadros álgicos na realização de atividades cotidianas do indivíduo, tais
como cuidado pessoal (vestir-se, tomar banho e locomoção), levantamento
e manuseio de cargas com pesos variados, quantificação da dor em posições
diferentes (sentado, em pé, deitado). O índice inclui ainda questões que visam
analisar a qualidade do sono, vida sexual e social (Coelho et al., 2008). Para
melhor compreensão dos usuários a escala foi adaptada e a versão utilizada
foi composta cinco questões, que avaliaram a dor, AVD e a qualidade do sono,
como demonstrado na Tabela 1.

157
Tabela 1. Estrutura do questionário Oswestry The Oswestry Disabilty Index (ODI)
adaptado.

Intensidade da dor:
Sem dor
Dor leve
Dor mediana
Dor forte
Dor muito forte
Cuidados pessoais (Vestir, tomar banho):
Eu posso cuidar de mim sem dor extra
Posso me cuidar mais causa dor
Por causa da dor sou lento e cuidadoso
Preciso de alguma ajuda para me cuidar
Pesos:
Posso levantar coisa pesadas sem dor
Se levantar coisas pesadas sinto dor
Só posso levantar pesos leves
Não posso levantar nem carregar nada
Andar, sentar-se, em pé:
A dor me impede de realizar longas caminhadas
A dor piora quando estou sentado por muito tempo
A dor piora quando estou em pé por muito tempo
Nenhuma das alternativas
Sono:
Meu sono não é perturbado pela dor
Às vezes meu sono é interrompido por dor
A dor me impede de dormir

Fonte: adaptado pelos autores, 2023.

Para a triagem foram chamados trinta e três usuários, dos quais 10 foram
excluídos por apresentar dor intensa e grande incapacidade funcional, necessitando
de um atendimento individualizado, voltando para a lista de espera com prioridade
para atendimento. Assim foram incluídos nos grupos vinte e três usuários. Para
esses, a intervenção iniciou com uma palestra visando explicar de forma simples

158
e visual, sobre a dor lombar e suas principais causas. Ainda no primeiro encontro
foram ensinadas técnicas que poderiam ser utilizadas para o manejo da dor,
como o uso da termoterapia e alongamentos, bem como orientações posturais
na realização de atividades rotineiras como sentar-se, pegar e carregar objetos
pesados, visando a redução da sobrecarga imposta à lombar.
Nos encontros seguintes, os usuários foram divididos em dois grupos.
O primeiro composto por 10 usuários com nível de dor intensa e moderada e
com maior déficit funcional, e o segundo composto por 13 usuários, aqueles
com dor leve e pouco déficit funcional. Os atendimentos ocorreram em
horários diferentes com o mesmo fisioterapeuta às quartas feiras. Com isso,
diferentes exercícios foram ensinados aos participantes, mas ambos incluíam
fortalecimento da musculatura profunda do tronco, visando a estabilização da
coluna lombar, alongamentos para a coluna e membros inferiores e atividades
funcionais, como treino de levantar-se e se deitar na cama e pega e manuseio
de objetos pesados. Todas as atividades eram fotografadas e ensinadas de
forma simples para que pudessem ser replicadas sem dificuldades em casa. A
cada semana eram introduzidos diferentes exercícios, e os participantes eram
incentivados a realizá-los em casa por mais três dias, contabilizando assim, um
total de quatro dias semanais na realização dos exercícios, tendo em vista que
as atividades realizadas somente em um único dia na semana teriam pouco ou
nenhum resultado na dor ou funcionalidade.
As atividades ocorriam na UBS Padre Antônio Cremer, com duas
horas de duração para cada grupo. Durante os encontros os usuários eram
estimulados a contar suas experiências e a forma como lidavam com a dor
antes e depois das atividades em grupo, sobre a execução dos exercícios
passados em cada semana para que fossem replicados em casa e sobre como
estavam, se obtinham melhora ou não a cada semana. O componente social,
comprovado como de grande importância no tratamento da lombalgia, foi
utilizado para criar um senso de pertencimento aos participantes, gerando
mais acolhimento e autonomia. Para melhorar a comunicação e estimular a

159
realização dos exercícios semanais foi criado um grupo de WhatsApp, onde
os usuários tinham contato direto com os fisioterapeutas, e suas dúvidas
eram respondidas. Foi indicado ainda que os participantes enviassem fotos
de quando realizavam os exercícios, para acompanhamento dos profissionais
quanto a forma e postura correta, e gerar incentivo mútuo. Foi solicitado o
consentimento dos participantes para a realização do registro fotográfico das
atividades em grupo.
Posteriormente os encontros ocorreram semanalmente com usuários
divididos em dois grupos de nove pessoas cada, que após passarem por uma
avaliação inicial foram incluídos em um dos grupos, os quais se dividem de
acordo com o nível de dor e funcionalidade dos seus participantes.
As atividades de cada encontro foram planejadas para incluir atividades
periódicas de orientação postural, manejo da dor e o ensino de técnicas de
cinesioterapia, alongamento e treinamento funcional, técnicas com resultados
comprovados na literatura para melhora da dor e funcionalidade nos casos de
lombalgia. Essas atividades eram feitas com a finalidade de ensinar e habilitar
os usuários para que pudessem ser reproduzidas em casa, com o intuito de
reinseri-los em suas AVD e possibilitar a eles a realização das atividades
cotidianas sem desconforto e dor e uma maior autonomia e independência.

Promoção da saúde e qualidade de vida

Durante a primeira avaliação, realizada pelos fisioterapeutas,


observamos, pela escala visual, que 90% dos usuários que apresentaram dor
forte ou mediana. Após os 12 encontros, 100% desses usuários relataram
melhora nos quadros álgicos, com níveis de 0 a 3 na escala, ou seja, ausência
de dor ou dor leve. Resultado semelhante foi encontrado por Calatayud (2020)
que em seu protocolo envolvia três sessões semanais em grupo, durante oito
semanas e utilizando exercícios isométricos e funcionais para o fortalecimento
dos músculos do tronco, após os dois meses de intervenção observou-se que
quando comparados ao grupo, que realizou apenas alongamentos de costa e

160
membros inferiores, o grupo intervenção teve melhores resultados na redução
da dor, esse resultado permaneceu, mesmo depois de 100 dias após o final do
estudo. Quando perguntada no último dia de atividade sobre como se sentia
após os exercícios a usuária M.S. relatou:

Eu cheguei aqui com muita dor, tomando medicamentos, atividades


domésticas eu não conseguia mais fazer porque eu tinha dificuldade
até de andar. Após começar a fisioterapia eu melhorei 100%, não
tenho mais dores e consigo fazer qualquer atividade física e
doméstica.

A aplicação do questionário e da escala de dor aconteceu antes e ao


final das atividades em grupo. O gráfico 1 apresenta as queixas iniciais dos
usuários antes do tratamento.

Gráfico 1. Identificação das principais queixas antes da intervenção

Fonte: Escala ODI adaptado pelos autores, 2023).

A Escala de Oswestry foi utilizada para avaliação da funcionalidade e a


segunda questão avaliou as atividades de cuidado diário. Durante a avaliação
inicial 70% dos usuários afirmaram poder realizar o cuidado pessoal, porém,
com dor. Na avaliação final todos os indivíduos evoluíram para a ausência de
dor ao realizar as AVD. Ribeiro (2015) utilizou de exercícios para estabilização
segmentar baseados no método de pilates, que visa melhorar a consciência
corporal e aumentar a conexão entre a mente e o corpo, e avaliou a capacidade

161
funcional dos usuários, obtendo melhoras significativas na execução das
atividades de vida diária, resultado semelhante foi encontrado com os
participantes das atividades em grupo.
A terceira questão da escala de Oswestry avaliava a capacidade de
levantar pesos. Na avaliação inicial 70% afirmaram só poder levantar pesos leves
e ainda assim com quadro álgico. Desses 80% relataram melhora, conseguindo
levantar cargas mais pesadas. Esse resultado foi encontrado nos estudos de
Lamb et al. (2012) e Van Erp et al. (2019) e foram atribuídos ao componente
educacional, que também foi incluído nas atividades em grupo realizadas em
Eirunepé, isso é explicado pelo ensino de posturas adequadas para realizar
as AVD e para pega e manuseio de cargas, o que reduz a sobrecarga lombar,
diminui a dor e permite uma maior independência ao usuário na realização
das atividades cotidianas que envolvem a capacidade de levantar pesos.
A quarta e última questão da versão adaptada da escala de Oswestry
avaliou a qualidade do sono. Inicialmente 40% dos usuários afirmaram que às
vezes tinham o sono interrompido pela dor, e para 10% a dor impedia o sono.
Após a realização das atividades 90% dos participantes relataram melhora no
ciclo do sono. Há uma grande relação entre os níveis de dor e a qualidade
do sono, usuários com intensidades moderadas e alta geralmente apresentam
dificuldade para iniciar e manter o sono, há ainda uma relação importante entre
os níveis de incapacidade, usuários com menor funcionalidade apresentam
diminuição na qualidade do sono (França et al., 2015). Em estudo realizado
com vinte e cinco usuários com dor lombar crônica, utilizando métodos
de estabilização segmentar, que envolvem o fortalecimento dos músculos
abdominais e músculos da coluna lombar duas vezes por semana, durante dois
meses, observou -se a diminuição da dor, melhora na capacidade funcional e
na percepção da qualidade de vida, e com a melhora desses fatores houve como
consequência uma redução no nível de dor (Arins et al., 2016). O Gráfico 2
demonstra os resultados após os três meses de tratamento.

162
Gráfico 2. Resultados da avaliação do sono.

Fonte: Escala ODI adaptada pelos autores, 2023.

No questionário inicial foi relatado por todos os usuários o uso de


medicamentos para dor, muitas vezes sem indicação médica. Ao final das
sessões a maioria dos usuários afirmaram reduzir a quantidade ou parar
completamente o uso de remédios, resultado esperado uma vez que com as
atividades houve redução significativa nos quadros álgicos. Em relato no último
dia de atendimento a usuária A. M., quando perguntada sobre seu estado de
saúde atual, afirmou: “As sessões de fisioterapia têm me ajudado muito, porque
passo muito tempo sem dor e não preciso tomar a medicação”.

Figura 2. Exercício “Superman Quatro Apoios”.

Fonte: SEMSA Eirunepé, 2023.

163
As atividades presenciais eram sempre iniciadas com uma roda de
conversa, onde os usuários relatavam o estado atual e como havia sido a
realização das atividades na semana, gerando assim a interação social, citada
por muitos estudos como importante para a humanização e maior sensação de
pertencimento dos integrantes (Recco & Lopes, 2016). O canal no WhatsApp
também foi de suma importância para o componente social, levando a trocar
experiências e incentivar a realização dos exercícios de estabilização segmentar,
que envolvem o fortalecimento dos músculos abdominais e músculos da coluna
lombar (apresentados nas Figuras 1 e 2), com a constância necessária para
obterem os resultados esperados. Quando perguntada sobre as atividades a
usuária D.L. forneceu o seguinte relato: “Eu achei maravilhoso, porque melhora.
Eu passei três meses fazendo tratamento com remédio e quando comecei a levar
a sério os exercícios estou cada dia melhor. Graças a Deus” (D. L.).
As respostas dos usuários comprovam os resultados analisados
com as escalas, comprovando os benefícios que o “grupão de fisioterapia”
promoveu na vida de seus participantes, os quais não podem ser medidos
somente em números, mas também na qualidade de vida e independência
ganha pelos indivíduos.

Considerações Finais

O “Grupão da fisioterapia” foi criado com o intuito de estabelecer uma


rotina de cuidados para usuários com lombalgia crônica, visando a redução da
sintomatologia da doença. Desde o primeiro grupo, notamos uma aceitação
pela maioria dos participantes às atividades e métodos aplicados durante os
encontros. Com o passar das sessões, as melhorias observadas foram notórias
tanto em relação ao quadro álgico quanto na funcionalidade. Houve ainda
grande redução na lista para os atendimentos de fisioterapia, reduzindo o
tempo de espera dos usuários que aguardavam este serviço.
Assim, se comprova a importância do projeto não só na melhora
da qualidade de vida dos munícipes, como também na eficiência do número

164
de usuários atendidos. Os resultados alcançados reforçam a necessidade do
fisioterapeuta enquanto profissional que atua na atenção básica do SUS, com
vistas a ofertar um cuidado integral à comunidade, realizando ações de promoção
de saúde, prevenção de doenças e educação em saúde, reduzindo a demanda na
atenção especializada, sobretudo em regiões remotas da Amazônia.

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166
Projeto papo de mãe: educação e
atenção à saúde na gestação em
Eirunepé, AM
Arielly Queiroz de Menezes
Liliam Rafaelle Souza da Silva
Viviane Lima Verçosa

Introdução

Um pré-natal de boa qualidade é aquele que atende as especificações


do Sistema Único de Saúde (SUS) e às necessidades das usuárias, cuja
relevância é desempenhar um papel na redução da mortalidade materna e
riscos ao bebê, promover um desenvolvimento gravídico saudável e garantir a
ambos um processo de parto seguro. Para assegurar que este atendimento de
atenção e educação em saúde esteja de acordo com as determinações do SUS,
necessitamos de estratégias e a participação de uma equipe multiprofissional
qualificada no atendimento à mulher no ciclo gravídico-puerperal.
Os encontros com gestantes e puérperas, realizado uma vez ao
mês, idealizam a implementação e metodologia do projeto Papo de Mãe,
cujo objetivo destina-se ao acompanhamento mensal das gestantes locais
e ribeirinhas, a troca de experiências entre profissionais, mulheres e rede
de apoio, fortalecimento das relações intersetoriais através de ações de
promoção da saúde, investindo em informações que possam favorecer o
aprendizado da gestante, fortalecer a corresponsabilidade na assistência pré-
natal, parto e puerpério, e assim impactar positivamente os indicadores de
saúde do município de Eirunepé – AM, nesta esfera de conhecimento amplo
relacionados ao binômio mãe-bebê.
Desta forma, o projeto contribuiu para o cuidado integralizado
das gestantes e puérperas, ampliando a atenção ao pré-natal e pré-natal

167
odontológico, o vínculo entre os profissionais de saúde e gestantes, atenção à
saúde da mulher e favorece a educação popular em saúde.

Conhecendo o município de Eirunepé

Entre as curvas do Juruá na margem esquerda próximo à foz do Rio


Tarauacá encontramos Eirunepé, rodeado por belezas naturais e conhecido por
ter um pôr do sol sem igual, é o município mais populoso da calha do Rio Juruá
no estado do Amazonas, com uma extensão territorial de 14.966,242 km², 80%
da sua população se concentra na zona urbana onde tem um território de 7.226
km² e 20% da população se espalha na imensidão da zona rural, que possui
aproximadamente 8.600 km² de território até seus limite geográficos com seus
municípios limítrofes, totalizando aproximadamente 33.173 habitantes, segundo
os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2022).

Figura 1. Mapa de Eirunepé.

Fonte: Elaborado por Lupuna Corrêa de Souza, 2024.

168
Devido a sua localização centralizada dentro da Região de Saúde do
Juruá, Eirunepé se destaca como referência para os demais municípios desta
localidade, a qual tem em média uma população de aproximadamente 150
mil habitantes, dentro da Macrorregião Oeste do Amazonas. Sendo o polo de
referência para os municípios de Envira, Carauari, Itamarati, Ipixuna e Guajará
(DataSUS, 2024). Dessa forma, o município frequentemente recebe usuários
dos municípios adjacentes referenciados para os seus serviços de saúde. O que
aumenta sua responsabilidade em garantir acesso e qualidade a essa população.
Localizada na calha do Rio Juruá, Eirunepé é uma das regiões com a
logística mais complexa, sem rodovias e sem embarcações diárias. Segundo os
dados do Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável
do Estado do Amazonas (IDAM, 2013) o município está localizado a 1.452 km
de Manaus em linha reta e, seguindo a naturalidade das região amazônica, em
vias fluviais essa distância se aproxima de 3.448 Km devido às curvas dos rios até
chegar a seu destino, tornando o seu acesso difícil, levando aproximadamente
3 a 4 horas de avião ou 20 a 25 dias de barco, podendo ter o número de dias
de navegação maior dependendo das condições das águas dos rios, as quais
podem estar no período da cheia ou da seca.
Entendendo todos esses desafios geográficos de deslocamento da
população até a capital, os riscos da viagem, o desconforto fora do domicílio,
a falta de familiares, a ausência de hospedagem, a falta de conhecimento sobre
como chegar aos locais onde são ofertados os serviços de saúde e na maioria
das vezes a ausência de recursos para o usuário se manter em outra cidade. A
gestão municipal pela Secretaria Municipal de Saúde (SEMSA) de Eirunepé
tem investido continuamente no aprimoramento e qualidade dos serviços
da Atenção Primária à Saúde (APS), visando a ampliação de estratégias que
possam aumentar as medidas preventivas contra agravos a saúde dos usuários
e de promoção à saúde. Com a política de ampliação da cobertura da APS, um
público que não poderia deixar de ser priorizado são as mulheres no período
gestacional considerando os cuidados no pré-natal, neonatal e pós-natal,

169
entendendo a fragilidade desse momento para o binômio mãe-filho e todos os
riscos que os cercam.
Conforme os dados das Estimativas preliminares elaboradas pelo
Ministério da Saúde, disponibilizados no Sistema do DataSUS/Tabnet (2024)
referentes ao ano de 2021, o município de Eirunepé tinha aproximadamente
10.902 mulheres em idade fértil, sendo que nesse mesmo ano o número de
partos de nascidos vivos foi equivalente a 728 crianças. No entanto, com o
aumento populacional a estimativa municipal do número de nascidos vivos
pelo Ministério da Saúde para o ano de 2023 foi de 814.
A gestão municipal vem elaborando estratégias para melhorias
na organização e adequação das ofertas de serviços voltadas ao parto e ao
nascimento respeitando as singularidades do cuidado integral a mãe e filho
de acordo com os riscos existentes, entre eles podemos citar o investimento na
unidade hospitalar com a reforma e ampliação da ala obstétrica com aumento
dos leitos, berço aquecido, incubadora neonatal, implantação do serviço de
fisioterapia pré e pós parto, e o pilates que é oferecido durante a gestação.
O pilates na gestação também é um serviço inovador, implementado
em 2024, que atende as gestantes da zona urbana nas unidades básicas de saúde
e na zona rural por intermédio da UBS Fluvial. A prática oferece benefícios
fisiológicos, hormonais, proporciona um pós-parto funcional, além de obter
vantagens adaptativas, bem-estar e saúde, evita intercorrências gestacionais.
Os tipos de prática são determinados em conformidade com a condição física
da mulher (Faria, 2022).
Uma das estratégias inovadoras é a visita guiada a maternidade na ala
obstétrica do hospital municipal, essa visita conta com o apoio de profissionais
da equipe E-multi e de servidores da unidade, ela é oferecida como acolhimento
e conhecimento do espaço, quando ocorre uma etapa tão importante da vida,
o nascimento. Com o objetivo de sanar dúvidas, orientar, e fortalecer o vínculo
familiar, a visita é oferecida para a gestante e sua rede de apoio, em data e
horário previamente agendados.

170
Na APS, além de intensificar os serviços já existentes e sensibilizar os
profissionais sobre a importância da integralidade do cuidado, foi implantado
o serviço de Telemonitoramento de Pré-natal de Alto Risco em áreas Remotas
do Amazonas (TELEPNAR). Esta iniciativa é da Universidade Federal do
Amazonas (UFAM) e Ministério da Saúde (MS) voltado para reduzir a
mortalidade materna, fetal e neonatal, através de uma tecnologia de plataforma
digital criada pela equipe.
A SEMSA ainda aumentou a oferta de capacitações para os profissionais,
reorganizou o fluxograma de atendimento para as grávidas e verificou que
ainda estava faltando alguma coisa, uma forma de melhorar o vínculo da
gestante com as equipes de saúde e o autocuidado no período gestacional com
o esclarecimento de dúvidas e tabus. Assim, começaram as ideias entre os
profissionais para a construção de um projeto direcionado a essas demandas.

A Importância da Assistência Gestacional

A gestação é uma vivência extremamente rica para a mulher, para a


família e para a sociedade. Pressupõe uma etapa da vida onde as ações estão
focadas na geração de um novo ser, onde as mudanças são significativas, de
aprendizagem, (re) organização e acontecimentos que perpassam por uma
transição existencial (Maldonado, 2017).
Para que este período seja vivenciado com a importância que ele
possui, é preciso de toda a rede de apoio à saúde para sustentação das vivências
tão particulares, complexas, subjetivas e plurais, com isso, as ações das equipes
de saúde voltadas para orientação, esclarecimento de dúvidas e preparação da
mulher para a gestação, parto e puerpério são fundamentalmente importantes.
É perceptível muitas fragilidades nas orientações às gestantes que
ocorrem durante as consultas de pré-natal. Na maioria das vezes há percepção
da existência de dúvida após os atendimentos, dúvidas essas relacionadas aos
procedimentos durante o pré-parto, parto e pós-parto. Tais problemáticas
podem não só ocasionar insegurança neste período de grande importância,

171
como podem levar a alterações na taxa de morbidade e mortalidade tanto
do recém-nascido quanto das puérperas, ocasionadas pelo desconhecimento
e pelo descuido, por isso, o pré-natal é relevante para a prevenção de
doenças, deficiências, nascimento pré-termo e cuidado à saúde da gestante
e do bebê (Bee, 1997). O atendimento e acompanhamento interdisciplinar e
multiprofissional abre a possibilidade de um olhar transversal, contemplando
o princípio da integralidade do cuidado preconizado pelo Sistema Único de
Saúde (SUS).
Em Eirunepé, as Unidades Básicas de Saúde (UBS) contam com sete
equipes de estratégia saúde da família (ESF) que são compostas por médico,
enfermeiro, técnico de enfermagem e Agentes Comunitários de Saúde (ACS),
além de sete equipes de saúde bucal cada uma tendo em sua composição um
cirurgião dentista e um técnico em saúde bucal, bem como três equipes de
estratégia de saúde da família ribeirinha (eSFR) com sua composição ampliada
e uma Unidade Básica de Saúde Fluvial (UBSF) as quais garantem a cobertura
da atenção básica na zona urbana, na zona rural, ribeirinhas e águas conforme
informações disponibilizadas no sistema de informação do Ministério da
Saúde E-gestor Atenção Primária à Saúde (2024).
Os profissionais atuam conjuntamente com o apoio e auxílio de uma
equipe Multiprofissional E-Multi do tipo ampliada compondo profissionais
de outras especialidades incluindo fisioterapeuta, psicólogo, nutricionista,
professor de educação física, farmacêutico entre outros. Diante desse cenário,
julgamos necessário realizar uma ação mais impactante junto às gestantes de
Eirunepé-AM, para que todas e quaisquer dúvidas sejam esclarecidas, para
que tenham uma gestação tranquila e um parto humanizado, assegurando
todos os direitos e cuidados das parturientes e recém-nascidos. Neste
contexto, o projeto de intervenção tem importância fundamental para que as
equipes das unidades básicas de saúde sintam-se motivadas frente ao projeto
piloto, fazendo com que seja efetivado de forma contínua, gerando resultados
positivos durante e após o período gestacional.

172
Desta forma, nasceu o Projeto Papo de Mãe, com o acompanhamento
mensal das gestantes locais, através de ações de promoção e atenção à saúde,
investindo em informações que possam favorecer o aprendizado da gestante,
fortalecer a cor- responsabilidade na assistência pré-natal, parto e puerpério e
garantir um pré-natal de qualidade.

Figura 2. Gestantes participantes e equipe.

Fonte: Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Eirunepé, 2024.

A Gestação do Projeto Papo de Mãe

O objetivo da implementação da proposta foi possibilitar a integração


e vinculação entre gestantes e profissionais da saúde de diferentes áreas,
possibilitando esclarecer as dúvidas mais frequentes das gestantes sobre
a gestação, o parto e o puerpério e todas as temáticas pertinentes a estes
momentos, fomentando o estímulo à gestante a realizar consultas de pré-
natal mensalmente na Unidade Básica de Saúde (UBS) participando de
palestras com foco no apoio ao período gravídico-puerperal, dando ênfase
sobre a importância do aleitamento materno e seus benefícios nutricionais e
emocionais, autocuidado, compartilhamento de experiências e apoio coletivo
no enxoval das gestantes vulnerabilizadas socialmente.

173
A etapa que antecede a inserção no Projeto Papo de Mãe parte da coleta
de dados executada pela equipe, que realiza um levantamento situacional de
gestantes no território, atendendo alguns critérios, tais como: gestantes de
primeira viagem, no primeiro e segundo trimestre, gestantes que apresentam
vulnerabilidade social, dentre outras que se encaixem neste perfil. Para coleta
destas informações são utilizadas informações oriundas das consultas, na
ocasião são convidadas à participação no projeto.
A proposta de intervenção do grupo operativo foi dividida da
seguinte forma:
• Identificação das gestantes;
• Distribuição dos convites para participação do grupo operativo;
• Efetivação dos encontros (reuniões do grupo).

Figura 3. Roda de conversa.

Fonte: Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Eirunepé, 2024.

A Roda de Conversa é um método coletivo que consiste na criação de


espaços de diálogos, em que os integrantes possam se expressar e, sobretudo,
escutar os outros e a si. O objetivo é estimular a construção da autonomia dos
sujeitos por meio da problematização, da troca de informações e da reflexão
para a ação, trocas de experiências, conversas, discussão e divulgação dos
conhecimentos. Após a etapa da roda de conversa, delineamos os demais
encontros necessários para que as gestantes saiam dos encontros com os
conhecimentos necessários para sentirem-se seguras nesta fase da vida.

174
Figura 4. Educação em Saúde.

Fonte: Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Eirunepé, 2024.

A etapa seguinte consiste no planejamento do grupo operativo com as


enfermeiras e médicos das unidades de saúdes, aproveitando a oportunidade para
esclarecimento de dúvidas e alinhamento de propósitos, quando as enfermeiras
possam estar preparadas para responder questionamentos sobre os ciclos da
gestação, responder às dúvidas apresentadas, parto e puerpério, disponibilizando
de materiais que serão utilizados de forma lúdica na roda de conversa.

Figura 5. Entrega de Kit de enxoval.

Fonte: Assessoria de Comunicação da Prefeitura de Eirunepé, 2024.

175
Propondo a integração equipe e usuários, acontece sorteios de
brindes e um café ao final de cada momento, buscando estímulo e motivação
a mais para a participação das gestantes. Na etapa subsequente, os Agentes
Comunitários de Saúde (ACS) e enfermeiros convidam cada gestante,
confirmando o comparecimento, explicando como serão realizados os grupos
e a importância da participação de todas. Cabe aos ACS, durante as visitas de
acompanhamento, a função de motivar a participação das gestantes. A última
etapa é a intensificação da promoção do aleitamento materno com a realização
da campanha Agosto Dourado como finalização anual do projeto onde são
entregues os kits de enxoval e encerramento das atividades.

Trilhando o caminho do cuidado

A realização do projeto de atenção e educação em saúde na gestação


consegue cumprir com seus objetivos, ampliando os vínculos de vivência e
proporcionando maior integração entre as equipes de saúde e a comunidade,
buscando promover a educação em saúde. O atendimento integral é um
direito da gestante, mas na realidade nem todas as unidades de saúde veem
esta demanda como essencial, garantindo apenas as consultas de pré-natal.
Sendo assim, foi proposto um plano de intervenção em ações educativas para
possibilitar e estimular o pensamento crítico e participação das gestantes frente
ao ciclo gestacional, que tem diversos fatores que colocam em risco tanto a
vida da mãe como do recém-nascido.
Esperamos que esta intervenção possa contribuir de forma que todas
as gestantes saibam identificar qualquer anormalidade no pré-natal, parto e
pós-parto, permitindo assim uma diminuição da morbimortalidade materno-
infantil, além de promover apoio emocional a partir do compartilhamento da
fala e exercício da escuta frente às situações vividas.

176
A relevância do coletivo e da equipe de saúde no período
gravídico e puerperal e a experiência única de gestar

Destacamos o processo do compartilhamento das vivências que as


gestantes realizam coletivamente entre si, através da fala e da escuta que se faz
fundamentalmente importante nesta fase que carrega significativas mudanças
para além das mudanças corporais, a saúde mental pode ser impactada. Outra
questão é que o período gestacional seja vivido de forma subjetiva, o processo de
encontro num espaço seguro, livre de julgamentos, um encontro com ‘os pares’,
com àquelas que estão experimentando situações, sentimentos, ansiedade,
dúvidas, dificuldades, alegrias e emoções diversas favorece substancialmente à
saúde mental e emocional destas mulheres que fazem parte do grupo. O processo
de lidar com as emoções e administrá-la ao passo que tudo que é sentido pela
gestante reflete na saúde e na experiência intrauterina do bebê precisa ser
considerada, isso fortalece o vínculo mãe/bebê e a empodera sobre o papel que
começa a ser criado, o cuidado de uma vida para além da sua (Rosset, 2003).
Uma discussão que é relevante e que reflete no cuidado que esta mulher
vai ter com a gestação, consigo, com o bebê e até posterior ao parto, é o fato de
que nem toda gestação foi planejada ou desejada. Há inúmeras situações que
podem acarretar dificuldades, tais como: gestação na adolescência, gestação
tardia, gravidez indesejada, medo intenso das mudanças, gestação após perdas
gestacionais, gestação não aceita pela família, abandono do pai do bebê, gravidez
de um bebê com o gênero diferente do desejado, dificuldade no relacionamento
conjugal, comprometimentos na saúde física, entre outras situações.
Muitas mulheres podem não desejar o filho, dificultando o processo
de vinculação, fato que muitas vezes pode não ser verbalizado pela gestante
ou pode não ser compreendido pela mesma, visto que uma mãe que “não
quer” ou não aceita a gestação, pode sofrer rejeição da sociedade, mas que
emerge e reflete na relação de cuidado e atenção que pode ser insuficiente.
O sentimento ambivalente de desejar a vinda do bebê ou não é um fato que
pode ser vivido, assim como uma mistura de sentimentos, como amor, raiva,

177
alegria, arrependimento, ressentimento, contentamento e descontentamento
(Maldonado & Dickstein, 2010). “É tudo novo, dentro do nosso velho
conhecido corpo. O casulo se formando. Tantas coisas são gestadas ali dentro!
Sonhos, sentimentos. Espaços vão se abrindo. Órgãos são comprimidos.
Mistura dois corpos em um” (Vilarinho, 2017, p. 31).
Outro momento de destaque é o parto, e aqui não pontuamos o
grau de importância diante das fases do ciclo gravídico puerperal, pois
todas têm seu grau de importância e todo um complexo de experiências. É
necessário que sejam trabalhados os mitos e verdades acerca deste momento,
pois a informação é a chave para mitigar o alto nível de estresse e ansiedade
desencadeadas, muitas vezes, pela falta de conhecimento. Todo apoio ofertado
pela equipe e amparo da família que precisa estar atenta para defender a mulher
de possíveis maus-tratos e desumanização no momento de vulnerabilidade,
são importantes (Gutman, 2021). Após o parto, a realidade passa a ser outra,
e todas essas orientações sobre o período puerperal, amamentação, cuidados
e higiene do bebê, as primeiras semanas, o primeiro ano de vida entre outras
temáticas, também são trabalhadas nos encontros.
Empoderar estas grávidas e suas famílias com informações úteis para os
momentos potenciais na vida da mulher e do homem, proporcionar uma escuta
qualificada, afetiva e um local seguro, seguro no sentido de não julgamento
frente às falas compartilhadas para que possam dividir o que sentem e o que
passam, sem que se sintam tolhidas é o maior objetivo do Projeto Papo de Mãe,
fomentando a saúde física, nutricional, mental e emocional, tanto da gestante
como do bebê.

Referências
Amazonas (2013). Instituto de Desenvolvimento Agropecuário e Florestal Sustentável do
Estado do Amazonas-IDAM. Eirunepé, aspectos físicos e geográficos. [Manaus]: Governo
do Estado do Amazonas. https://www.idam.am.gov.br/municipio/eirunepe/

Bee, H. (1997). O ciclo vital. Porto Alegre: Artes Médicas.

Brasil. (2024). Ministério da Saúde. E-gestor Atenção Primaria a Saúde. Disponível em: https://

178
egestorab.saude.gov.br/paginas/acessoPublico/relatorios/relHistoricoCoberturaAB.xhtml.

Faria, G. S. (2022). Aplicação do método pilates e abordagem cinesioterapêutica em gestantes.


São Paulo: Pesquisa, Sociedade e Desenvolvimento.

Gutman, L. (2021). A maternidade e o encontro com a própria sombra. Rio de Janeiro: BestSeller
(Trabalho original publicado em 1958).

IBGE. (2022). Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Sinopse do censo demográfico de


2022. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/am/eirunepe.html

Maldonado, M., T. & Dickstein, J. (2010). Nós grávidos. São Paulo: Integrare Editora, 2010.

Maldonado, M. T (2017). Psicologia da gravidez: gestando pessoas para uma sociedade melhor.
São Paulo: Ideias & Letras.

Rosset, S. M. (2003). Pais e filhos: uma relação delicada. Curitiba, Pr: Ed. Sol. 159.

Vilarinho, T. (2017). Mãe fora da caixa. São Paulo: Buzz Editora.

179
Ampliação do acesso ao tratamento de
doenças crônicas da população de área
remota em Humaitá/AM
Gabriela de Almeida da Silva
Cleudecir Siqueira Portela

Com o processo de envelhecimento da população é esperado que as


doenças crônicas (DC) recebam maior atenção, por ser um relevante problema
de saúde pública que interfere na dependência, especialmente de idosos, que
estão naturalmente associados a inúmeras condições de vulnerabilidade. É
possível manter uma vida satisfatória, apesar das limitações e restrições em
hábitos e estilos de vida após receber um diagnóstico de doença crônica,
desde que o sistema de saúde esteja pronto para atuar na prevenção, atenção e
cuidados, que é considerado precário em todo o Brasil (Figueiredo, Ceccon &
Figueiredo, 2021). A população que reside em área remota de Humaitá enfrenta
desafios para acessar as ações e serviços de saúde, característica compartilhada
entre os municípios da Região Amazônica, marcada por desmatamentos,
intensa mobilidade de pessoas e mudanças decorrentes do ciclo das águas
(Schweickardt, Kadri & Lima, 2019).
Para que comunidades remotas, predominantemente ribeirinhas,
sejam assistidas, é necessária a implementação de políticas específicas, capazes
de organizar e direcionar as equipes de saúde ribeirinhas e fluviais, na busca
de mitigar os inúmeros desafios, como o acesso à saúde, historicamente
presente. Com políticas públicas específicas é possível avançar na oferta de
acesso aos serviços de saúde, mesmo em localidades remotas, por garantir
cuidados universais e equitativos (Guimarães et al., 2020). É nesse cenário que
a assistência farmacêutica (AF) municipal se destaca, onde sua implementação
pode impactar significativamente no uso dos serviços de saúde, por influenciar
diretamente na qualidade do atendimento e eficácia da terapêutica adotada. A

181
Atenção Primária à Saúde (APS) tem possibilitado transformações importantes
da AF no SUS, por ampliar a cobertura de distribuição de medicamentos e
reduzir custos (Oliveira et al., 2010).
A partir da compreensão dos diferentes cenários locais como únicos,
impactados por mudanças extremas nos períodos de vazante e cheia dos rios,
foi possível pensar em estratégias que possibilitassem aos humaitaenses acesso
à AF, ultrapassando os conhecidos desafios da Região. Este capítulo apresenta
a experiência de Humaitá na organização da AF municipal, que garantiu aos
portadores de doenças crônicas residentes em áreas remotas o acesso seguro
e eficaz aos medicamentos de uso contínuo. Apresentamos as estratégias
adotadas, além de uma contextualização teórica, a partir do entendimento de
que AF é uma prática essencial dentro do Sistema Único de Saúde (SUS), que
objetiva assegurar o uso seguro e eficaz dos medicamentos.

Humaitá e os principais agravos em saúde pública

Humaitá está localizado no sudeste amazônico, com área de mais de 33


mil km² e distância 600 km em linha reta de Manaus (Figura 1). Tem população
estimada de 57 mil habitantes em 2022 e possui clima e características de
solo comuns para as cidades da mesorregião Sul do Amazonas, propício
para a agropecuária (IBGE, 2023; Martins et al., 2023). Possui um dos mais
importantes biomas do mundo, o Amazônico, com rica biodiversidade e
importância ambiental, constituído principalmente por floresta tropical (IBF,
2020). Humaitá é um típico município da floresta amazônica, que tem quase
7 milhões de km², onde a maior biodiversidade do mundo abriga cerca de
10% de todas as espécies conhecidas no planeta, com relevante destaque para
a papel essencial na regulação do clima global, com influência nos padrões de
precipitação e temperatura ao redor do globo (De Negri, 2024).
Diante de tamanha singularidade, com diversidades socioespaciais
característicos da região, somado a ausência de estradas, grande dispersão
territorial e população agrupada em pequenas comunidades em locais de difícil

182
acesso, aonde se chega pela extensa rede fluvial, sem dúvida, nos leva a pensar
em estratégias que possibilitem levar assistência à saúde para quem ali reside
(Schweickardt et al., 2019). Estimasse que 29% da população residente em
Humaitá esteja em área remota, ou seja, cerca de 17 mil pessoas em área rural,
que necessitam de apoio na prevenção e controle de DC (IBGE, 2010; IBGE,
2023), que se caracterizam por um conjunto de doenças de múltiplas causas e
fatores de risco, com períodos longos de latência e de curso, cuja origem não
infecciosa pode levar a incapacidades funcionais importantes (Brasil, 2008).

Figura 1. Localização do município de Humaitá, Amazonas.

Fonte: IBGE, 2022.

Considerando apenas as duas DC mais prevalentes no mundo, que são a


hipertensão (22,1%) e a diabetes (8,8%), imaginando que cada pessoa apresente
apenas uma dessas doenças, teríamos 5.253 (30,9%) humaitaenses residentes
de área remota que necessitam ser acompanhados por uma equipe de saúde
e tratados com medicamento (Zhou et al., 2017; Ogurtsova et al., 2017). Uma
Atenção Primária à Saúde (APS) presente e organizada para atuar neste cenário,

183
exercendo os atributos essenciais (acesso de primeiro contato, longitudinalidade,
integralidade e coordenação do cuidado) e os derivados (orientação familiar,
comunitária e competência cultural), transformaria a organização do cuidado e
evitaria o surgimento/agravamento de muitas doenças (Starfield, 2006).
Em áreas rurais e remotas, como as encontradas em Humaitá, o SUS
se faz presente através da APS, onde, quando fortalecida, consegue enfrentar
iniquidades em saúde e coordenar a rede de atenção, com a oportunidade de
prevenir e acompanhar os problemas de saúde. Diante dessas possibilidades,
as áreas de difícil acesso são tidas como a causa do fracasso do alcance da
universalidade em saúde, onde o direito à saúde a partir da centralização do
cuidado na APS se mostrou incapaz de ser efetivado. É nessas áreas que a
APS é o único recurso disponível, que sofre com a ausência de vínculo a uma
rede regionalizada e estruturada para responder aos mais diferentes aspectos
específicos dos mais variados lugares a que se vincula (Franco et al., 2021). A
governança municipal tem limites para realizar mudanças regionais, porém, sem
maiores obstáculos, foi possível reorganizar a AF, a partir do reconhecimento do
momento importante de transições que passa a população de Humaitá.

Momento de transições em contexto amazônico

Populações ribeirinhas do Amazonas convivem com a necessidade de


cuidados relacionados às doenças crônicas, especialmente as não transmissíveis,
por representarem a principal carga de doença (66,3%), seguido pelas doenças
infecciosas (23,5%) e pelas causas externas (10,2%), isso de acordo com uma
pesquisa nacional (Campolina et al., 2013; Schramm et al., 2004). Ampliar o
acesso aos cuidados necessários, sem dúvida, pode contribuir para a melhora
da qualidade de vida e, consequentemente, um envelhecimento mais saudável.
Os serviços de saúde necessitam acompanhar indicadores de saúde que
apontem o risco ou a necessidade de ações de prevenção e detecção precoce,
para que suas consequências sejam evitadas. No Médio Amazonas, por
exemplo, os principais agravos são hipertensão, obesidade e diabetes, ligadas

184
ao sedentarismo, tabagismo e etilismo, o que não deve ser diferente em outras
regiões do Estado (Azevedo, 2017).
Humaitá, juntamente com Apuí, Borba, Manicoré e Novo Aripuanã,
compõem a Região de Saúde do Rio Madeira, não dispõe de dados publicados
sobre indicadores de morbidade e não há razões para acreditar que sejam
diferentes das encontradas no Médio Amazonas. Também é possível perceber
mudanças importantes na forma de se alimentar, onde um terço de escolares,
de 13 a 18 anos, estão acima do peso ou obesos, enquanto outro terço está com
o peso ideal, o que demonstra a necessidade da adoção de medidas urgentes
para controlar a obesidade. É, certamente, um problema de saúde pública,
que acomete ambos os sexos e com início cada vez mais precoce, pois, uma
alimentação inadequada resultará em adultos doentes. É muito importante que
os serviços de saúde conheçam sua população adscrita, saibam onde moram
e tenham a capacidade de garantir a assistência adequada, a fim de promover
saúde (Da Silva Furtado, 2022).
O modelo biomédico de atenção à saúde privilegia a doença e espera seu
surgimento para que, só então, ações sejam tomadas, por vezes, tarde demais
para evitar o estabelecimento e a permanência de doenças e condições crônicas
(Raimundo & Da Silva, 2020). Características importantes deste modelo, onde o
foco está na detecção dos sintomas e tratamento da doença já estabelecida, com
ausência de priorização de ações de promoção à saúde, além de falhas graves
na comunicação e articulação entre os diferentes pontos da rede de cuidados
em saúde, são uma demonstração clara de que a forma de organização atual da
saúde não atende às necessidades da população (Fertonani et al., 2015).
A partir da década de 1960, o Brasil passa por um processo de transição
demográfica e epidemiológica, em que a principal causa de morbimortalidade
está relacionada às doenças crônicas. A melhoria na qualidade de vida da
população será alcançada se forem tomadas ações de enfrentamento por todos
os níveis de governança do SUS, sobretudo através de medidas de vigilância
e controle dos principais fatores de risco, refletindo também profundas

185
questões sociais, como acesso desigual aos serviços de saúde, condições de
vida e hábitos alimentares. Recai, em especial, aos municípios, por estarem
mais próximos de sua população e conseguirem acompanhar seu cotidiano, a
necessidade de planejarem ações e estratégias que integrem diferentes esforços,
no sentido mais amplo, como as relacionadas à saúde da família e a assistência
farmacêutica (Peixoto, 2020).
São muitos os fatores que precisam ser levados em conta ao se pensar
uma política pública de saúde para a região amazônica, que vão muito além
das características geográficas espaciais, devem ser observados aspectos
econômicos, políticos, culturais, sociais e epidemiológicos. Em uma população
onde se nasce cada vez menos e se vive cada vez mais, torna-se evidente que
está passando por um momento importante de transição, é natural que as
doenças crônicas estejam como foco de atenção das autoridades sanitárias
(Mariosa, Dota, Gigliotti & Silva, 2015). Em vista disso, torna-se prioritário
organizar estratégias e ações da AF dentro da APS para assegurar o uso seguro
e eficaz dos medicamentos e impactar significativamente a saúde da população
assistida (Brasil, 2009; Oliveira et al., 2010).

Estrutura da assistência farmacêutica em Humaitá

De acordo com a Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080/90), em seu


Artigo 6°, o Estado brasileiro tem a obrigação de assegurar serviços de saúde
a toda a população, incluindo a provisão de tratamentos e fornecimento de
medicamentos (Brasil, 1990). Para garantir que a população tenha acesso
adequado aos medicamentos e os utilize de maneira correta, é essencial
contar com serviços estruturados que proporcionem as orientações
necessárias e resolvam eventuais problemas. Nesse contexto, a administração
de medicamentos na rede pública de saúde representa um desafio, devido
à complexidade envolvida na gestão dessa área. Diversas medidas têm sido
adotadas para garantir a disponibilidade de medicamentos, sendo esta, uma
estratégia crucial para a recuperação da saúde dos usuários (Dias, 2013).

186
A AF é uma prática essencial dentro do SUS, cujo objetivo é assegurar o
uso seguro e eficaz dos medicamentos. Quando aplicada em âmbito municipal,
sua implementação pode impactar significativamente a saúde da população local,
influenciando diretamente a qualidade do atendimento e a eficiência dos serviços de
saúde. A APS nos últimos anos, transformou a organização da AF no SUS, visando
ampliar a cobertura de distribuição gratuita de medicamentos e reduzir os custos.
Houve a necessidade de adaptação para sustentar o processo de descentralização
da gestão das ações de AF, garantindo, dessa forma, que a população tenha acesso
aos medicamentos considerados essenciais (Oliveira et al., 2010).
Para que as ações da AF sejam eficazes no atendimento às necessidades
de saúde da comunidade, é fundamental que o farmacêutico possua um
conhecimento abrangente da realidade local. Isso inclui não apenas a
estrutura dos serviços de saúde e da assistência farmacêutica no município,
mas também o funcionamento das unidades básicas de saúde. Além disso, é
imprescindível que compreenda os processos de trabalho, o perfil demográfico
e epidemiológico, assim como o panorama geral da saúde da população. Nesse
contexto, o farmacêutico deve atuar de forma integrada à equipe de saúde,
adotando uma abordagem colaborativa que assegure a inserção da assistência
farmacêutica nas políticas e ações de saúde do município (Brasil, 2009).
Torna-se um desafio ainda maior integrar e qualificar equipes que atuam
em comunidades dos campos, florestas e águas. Daí a importância da escolha do
método, tanto para a escrita deste capítulo, quanto para a replicação da experiência
aqui apresentada em outros cenários, cujo foco está no nível primário de atenção à
saúde, em portadores de doença crônica residentes em áreas remotas.

A escolha do método para a observação e escrita

O diagnóstico situacional da AF em Humaitá foi o ponto de partida,


que teve como objetivo conhecer e compreender a realidade da AF na APS e
identificar os fatores que interferiam seu desempenho, que se tornaram o alvo
das intervenções. Durante o diagnóstico, foram identificadas dificuldades que

187
comprometiam o acesso da população rural ao tratamento contínuo de hipertensão
e diabetes, escolhidas por serem as doenças crônicas de maior importância. As
questões geográficas se revelaram um obstáculo significativo para a população de
área remota, onde muitas são classificadas como de difícil acesso. Essas regiões não
são apenas distantes, mas também sofrem com a escassez de serviços de saúde, o
que agrava ainda mais a dificuldade de acesso aos atendimentos necessários.
Para superar estes desafios, houve a necessidade de fortalecer a
articulação entre a Coordenação da AF e as coordenações das equipes de
Estratégia Saúde da Família (ESF), das equipes de Agente Comunitário de Saúde
(ACS) e da coordenação das doenças crônicas, visando o desenvolvimento de
estratégias e, ações que envolvessem esforços conjuntos para a melhoria do
acesso aos medicamentos para hipertensão e diabetes.
Após a realização do diagnóstico situacional, assim, iniciou-se o processo
de sensibilização dos profissionais da APS, por meio de reuniões com o objetivo
de apresentar as necessidades de se realizar a qualificação e a reestruturação dos
serviços da AF, visando garantir o acesso da população aos medicamentos e
insumos. Nessa ocasião, a coordenação da AF propôs alternativas para mudar o
cenário encontrado, como a otimização das atividades executadas pelos Agentes
Comunitários de Saúde (ACS) para as dispensações dos medicamentos aos
usuários hipertensos e diabéticos que residem na sua microárea de atuação. E,
com isso, a equipe reconheceu que a estratégia poderia minimizar o problema e
auxiliou na criação do fluxo de trabalho.

Vivenciando a assistência farmacêutica: uma abordagem


integrada ao cuidado em saúde

O município de Humaitá conta com dez Unidades Básicas de Saúde


(UBS), um Hospital de Média Complexidade, um Centro de Atenção
Psicossocial, e um Centro de Especialidades (CEHUM). Na Zona Ribeirinha
existem cinco Equipes de Saúde da Família Ribeirinha (eSFR) e uma Equipe de
Saúde da Família Fluvial (eSFF). Além disso, o município possui dois distritos:

188
o de Realidade, situado ao longo da Rodovia BR-319, e o de Auxiliadora,
localizado às margens do Rio Madeira.
As equipes de saúde são organizadas em diferentes coordenações e
gerências para otimizar a gestão e o atendimento. A divisão pode incluir as
seguintes coordenações: Atenção Básica, Equipe Multiprofissional, Vigilância
em Saúde, Planejamento, Sistema de informação em Saúde e Assistência
Farmacêutica. Cada uma dessas áreas e equipes desempenham um papel
específico na estrutura de saúde, contribuindo para um sistema mais eficiente
e eficaz no atendimento às necessidades da população humaitaense.
No contexto do SUS brasileiro, as eSFR desempenham a maior parte
de suas atividades em UBS situadas em comunidades acessíveis apenas por via
fluvial (Brasil, 2014). Para atender às comunidades dispersas, essas equipes
de saúde precisam utilizar embarcações. Dessa forma, as eSFR funcionam
como o ponto de entrada e acesso ao SUS na atenção primária. Cada equipe
é composta, no mínimo, por um médico, um enfermeiro, um técnico de
enfermagem e alguns ACS (Figura 2).

Figura 2. Profissional da Equipe de Saúde da Família Ribeirinha realizando


atendimento em comunidade.

Fonte: Arquivo de Ketlen Ferreira Ximenes, 2023.

189
As eSFR foram constituídas por profissionais de diferentes áreas para
implementar a reorganização estrutural e aprimorar a descentralização dos
serviços de saúde. Essas equipes asseguram o atendimento às populações em
situação de vulnerabilidade, promovendo a reintegração social de indivíduos
isolados devido a barreiras geográficas. As iniciativas de saúde abrangem a
disseminação de informações, a promoção de medidas preventivas e a melhoria
da qualidade de vida das comunidades ribeirinhas de Humaitá.
Desde as últimas décadas do século XX, os indicadores de atenção à
saúde e farmacêutica têm se expandido em diferentes países. Esses indicadores
visam, principalmente, avaliar o desempenho dos sistemas de saúde. No
Brasil, esse desenvolvimento tem sido impulsionado pela expansão dos
serviços de saúde, pelas demandas dos usuários e pela administração, além do
desenvolvimento de políticas públicas de saúde (Costa & Nascimento, 2012).
Em dezembro de 2009, durante o IV Fórum Nacional de Assistência
Farmacêutica em Brasília, foi apresentado o HÓRUS – Sistema Nacional de Gestão da
Assistência Farmacêutica, uma solução tecnológica inovadora para o gerenciamento
da assistência farmacêutica. O HÓRUS é disponibilizado gratuitamente para
municípios e estados, mediante solicitação dos gestores de saúde locais. Desenvolvido
em uma plataforma online, o software facilita a integração das informações gerenciais
e assistenciais provenientes das farmácias e centrais de abastecimento farmacêutico
(CAF) do SUS, tanto em nível municipal quanto estadual (Dias, 2013).
O sistema integra o banco de dados nacional de atividades e serviços
de AF do SUS, conforme estabelecido pela Portaria GM/MS nº 271/2013. O
HÓRUS representou uma inovação tecnológica significativa ao possibilitar a
administração da AF por meio de uma base nacional de dados, abrangendo
ações e serviços da AF no SUS (Brasil, 2013). O município de Humaitá foi
integrado ao programa QUALIFAR-SUS em 2018, com a Portaria nº 3.931,
divulgada em 11 de dezembro de 2018. No entanto, o sistema HÓRUS não foi
implantado na época. A partir de 2019, a gestão municipal começou a investir
na AF, realizando a contratação e atualização do quadro de profissionais.

190
A estruturação da Assistência Farmacêutica inicialmente auxiliou na
organização e normatização em nível municipal. O estabelecimento e controle
dos processos de trabalho na Central de Abastecimento Farmacêutico (CAF),
que permitiram direcionar os investimentos em medicamentos de forma mais
eficiente. Entre os resultados alcançados, destacam-se a implantação do sistema
HÓRUS, que, embora tenha sido restrita à CAF, trouxe avanços significativos
para a APS, como a redução no consumo de medicamentos e a diminuição de
medicamentos vencidos.

Contribuição dos agentes comunitários de saúde

Após a realização do diagnóstico situacional, observou-se que os ACS


se deslocam até a sede do município para participar de capacitações, entregar
relatórios, receber suprimentos e realizar outras atividades. A equipe identificou
que essa estratégia poderia ajudar a resolver o problema e colaborou na criação
do fluxo de trabalho.
Inicialmente, o ACS apresenta a prescrição médica e entrega à AF
o formulário contendo as informações do tratamento da última prescrição
(nome do medicamento, posologia, CRM do médico e endereço do usuário).
A CAF separa a quantidade necessária para um tratamento de 30 a 90 dias,
de acordo com o estoque disponível e as necessidades específicas de cada
caso. Os medicamentos são acondicionados em embalagens individuais, com
a identificação do ACS, da localidade e o nome do usuário. Em seguida, a
dispensação é registrada no sistema HÓRUS. A caixa com os kits é retirada
pelo ACS e encaminhada para a comunidade, onde é entregue diretamente ao
usuário (Figura 3).

191
Figura 3. Dispensação dos medicamentos feita pelo ACS.

Fonte: Arquivo de Gabriela Silva, 2023.

O ACS desempenha um papel fundamental ao facilitar o acesso da


população rural e ribeirinha aos serviços de APS, e, por consequência, ao
tratamento de suas doenças crônicas. Com a implementação do novo fluxo de
trabalho, que envolvem os ACS no controle e distribuição de medicamentos,
foi possível organizar as atividades de forma mais eficiente, promovendo uma
melhor interação entre a AF e as ESF.

Processo inovador da experiência

A interação entre as ESF, a Equipe Multiprofissional (eMult) e de


outras equipes com a AF é fundamental para o sucesso das ações de saúde no
município. Essa colaboração permite uma abordagem mais integrada e eficaz
no cuidado ao usuário, garantindo que o uso de medicamentos seja seguro,
adequado e alinhado às necessidades de saúde da população.
Com base nos dados dos sistemas HÓRUS e e-SUS AB, a estratégia
implementada pela AF para facilitar o acesso ao tratamento medicamentoso de

192
usuários em áreas rurais e ribeirinhas mostrou-se bem-sucedida. Atualmente,
1.137 pessoas com hipertensão e 63 com diabetes recebem acompanhamento
domiciliar da AF, em parceria com os ACS em áreas rurais. São entregues
62.250 unidades de medicamentos mensalmente a esses usuários.
Dentre as iniciativas voltadas para a melhoria das condições de saúde
por meio de políticas farmacêuticas, destacamos a recente institucionalização
do QUALIFAR-SUS. Este programa tem como objetivo qualificar a assistência
farmacêutica no SUS, buscando aprimorar tanto a gestão quanto a qualidade
dos serviços farmacêuticos. Além disso, visa promover uma abordagem mais
integrada e eficaz, alinhada às necessidades de saúde da população. Sua relevância
é notável, pois reconhece os medicamentos e as tecnologias como componentes
essenciais para a qualificação da assistência farmacêutica, com foco no cuidado
integral, na promoção da saúde e no bem-estar do cidadão (Brasil, 2017).
A estruturação da CAF e das farmácias das UBS foi realizada por
meio da aquisição de computadores com acesso à internet, capacitação da
equipe e implantação do sistema HÓRUS na CAF. Além disso, foram feitos
investimentos na melhoria da infraestrutura física da Central de Medicamentos
e das farmácias das UBS, que passaram por reformas para aprimorar o
atendimento. Assim, com o fluxo estabelecido, que envolve os ACS no controle
da distribuição dos medicamentos, foi possível organizar melhor o trabalho,
promovendo uma interação mais eficiente entre a AF e as ESF.
No entanto, mesmo com as ações estabelecidas, ainda foi é preciso
explorar alternativas para a promoção e educação em saúde, com o
objetivo de aumentar a adesão terapêutica dos usuários, além de promover
conhecimentos para a melhor qualidade de vida e saúde. Um ponto crucial
a ser destacado é que a integração da AF nas ações e serviços da APS,
que foram essenciais para ampliar e qualificar o acesso da população de
áreas ribeirinhas e florestais aos medicamentos essenciais. Dessa forma,
a estratégia destacada reforça a importância de priorizar o atendimento e
cuidado a essas comunidades, especialmente para os usuários com doenças

193
crônicas, garantindo a continuidade da assistência à saúde para a população
que reside em áreas remotas.

Inclusão de um apêndice

Com a implementação do fluxo, que envolve os ACS no controle


da distribuição de medicamentos, foi possível organizar melhor o trabalho,
promovendo uma interação mais eficaz entre a AF e as ESF. O formulário
desenvolvido pela AF em parceria com o programa de doenças crônicas é
uma ferramenta valiosa para o monitoramento dos usuários. A realização da
capacitação inicial e as orientações mensais sobre o fluxo e o preenchimento
do formulário teve como objetivo discutir e esclarecer as dúvidas dos ACS,
aprimorando a dinâmica e eficiência do trabalho.
A realização da capacitação inicial e das orientações mensais sobre
o fluxo e o preenchimento do formulário objetivou discutir e esclarecer as
dúvidas dos ACS em relação à dinâmica de trabalho. Dessa forma, a estratégia
adotada apresenta-se como uma alternativa eficaz para otimizar o acesso
contínuo da população de áreas remotas aos medicamentos de uso contínuo,
especialmente para hipertensão e diabetes. O formulário desenvolvido é uma
ferramenta essencial para o monitoramento eficaz dos usuários (documento
no Apêndice).

Considerações finais

A AF desempenha um papel fundamental na APS, significativamente


para a promoção da saúde e melhoria da qualidade de vida das pessoas, e,
consequentemente, de suas comunidades. Sua integração nas equipes de APS,
especialmente em áreas remotas e de difícil acesso, é crucial para assegurar
que todos as pessoas, incluindo aqueles com doenças crônicas, tenham acesso
contínuo e adequado aos medicamentos essenciais. Além disso, a colaboração
com a ESF fortalece o vínculo entre a comunidade e os serviços de saúde,

194
promovendo um cuidado mais humanizado e personalizado, centrado nas
necessidades individuais dos usuários.
O profissional farmacêutico deve estar integrado à equipe de saúde,
colaborando ativamente para garantir que a AF se torne uma parte essencial
das políticas e ações de saúde no município. Essa colaboração é crucial para
que as intervenções farmacêuticas sejam alinhadas às necessidades reais da
comunidade, promovendo um cuidado centrado no usuário e contribuindo
para a melhoria da qualidade de vida.
Investir na qualificação dos profissionais e na implementação de
estratégias eficazes de distribuição e monitoramento dos medicamentos é
essencial para melhorar a adesão ao tratamento e, consequentemente, os
resultados em saúde. A continuidade dessas ações e a busca constante por
novas abordagens para enfrentar os desafios do acesso aos medicamentos
são vitais para o sucesso da AF na APS, garantindo que a saúde curativa e
preventiva, através de educação em saúde, chegue a todas as parcelas da
população, independentemente de sua localização geográfica.
Em suma, a eficácia das ações da AF depende de um conhecimento
profundo do contexto local e do trabalho colaborativo dentro da equipe
de saúde. O farmacêutico desempenha um papel crucial na promoção da
saúde pública, sendo necessário que esteja sempre preparado para atender às
demandas específicas da população que serve.

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198
Apêndice
Formulário desenvolvido pela Assistência Farmacêutica em parceria
com o Programa de Doenças Crônicas.
PREFEITURA DO MUNICIPIO DE HUMAITÁ
SECRETARIA MUNICIPAL DE SAÚDE - SEMSA
COORDENAÇÃO DA ASSISTÊNCIA FARMACÊUTICA (COORAF)
CENTRAL DE ABASTECIMENTO FARMACÊUTICO - CAF
TRATAMENTO PARA HIPERTENSÃO ARTERIAL E DIABETES MELLITUS - 01/2021
Agente Comunistário de Saúde (ACS): Microárea:
Nome do Estabelecimento Assistencial de Saúde (Referência):
Nº de comprimidos/dia
Nº Cartão do SUS ou Cartão Provisório SUS
Identificação do Paciente (Nome Completo)

(1/2, 1,2,3,4,5 ou 6)

Outro Medicamentos (Preencher com X)


Não Medicamentoso (Preencher com X)
Data Nascimento DD/MM/AAA

Insulina Regular (Unidades/dia)


Conselho Regional de Mecidina
Hpertensão (Preencher com X)

Insulina NPH (Unidades/dia)


Data da Última Prescrição

Diabetes tipo 1 ou 2

Ac. acetilsalicílico 100mg

Hidroclorotiazida 25mg
Nº do CRM/UF

Glibenclamida 5mg
Metformina 850mg
Propranolol 40mg
Anlodipino 10mg
Anlodipino 5 mg

Losartana 50mg

Nº Captopril 25mg

1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
**Prencher nome do outro medicamento:
Ass. Responsável pelo preenchimento: Data da Entrega:

199
Centro municipal de referência ao
autismo: relato de experiência do
apoio às crianças e aos pais atípicos do
município de Itacoatiara-AM
Michel Fabrício Pereira de Souza
Thiago Silva dos Santos
Viviane Lima Verçosa

O presente trabalho é um relato de experiência realizado com pais e


profissionais do Centro Municipal de Referência ao Autismo no município
de Itacoatiara-AM, surge como uma resposta às necessidades específicas
das crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA) e suas famílias na
região, com objetivo de fornecer apoio integral às famílias de indivíduos
com TEA, abordando suas necessidades emocionais, educacionais e sociais,
reduzindo o estigma promovendo a inclusão coletiva, oferecendo a assistência
pelo SUS, recursos terapêuticos e educacionais personalizados, visando o
desenvolvimento pleno dos usuários. Este relato de experiência destaca os
esforços das redes municipal e estadual e conquistas dessa instituição no
apoio aos pais atípicos, oferecendo uma visão holística sobre o que é ser uma
referência no cuidado e na inclusão das pessoas com TEA.
Itacoatiara enfrenta desafios no que diz respeito ao apoio às crianças
com transtorno devido à falta de recursos especializados e a necessidade de
sensibilização da comunidade. O Centro Municipal de Referência ao Autismo
surge como o único centro com recursos próprios do executivo como uma
resposta a essas necessidades, oferecendo um ambiente acolhedor e recursos
terapêuticos para indivíduos com TEA e suas famílias.

201
Vila Serpa e Itacoatiara - cidade da pedra pintada é inclusão

A ordenação temporal de nossa Itacoatiara passa por períodos


emblemáticos até a sua nomeação de cidade. Itacoatiara é histórico,
encantador e ao mesmo tempo contemporâneo com sua fundação onde passa
por grandes nomes da política, religião e intendentes. A aldeia de Itacoatiara
é erguida a vila, com alcunha de Serpa, nome de aurora portuguesa (Velha
Serpa). Foi a terceira vila instalada no Amazonas, antecedida apenas por
Borba e Barcelos. Era, então, uma das mais importantes aglomerações da
região do médio baixo Amazonas (Silva, 2017). Em 25 de abril de 1874, a
vila (Vila Serpa) é elevada à condição de cidade com a denominação de
Itacoatiara, pela Lei Provincial n.º 283.
A cidade de Itacoatiara é conhecida como a “Cidade da Pedra Pintada”,
estando localizada às margens do Rio Amazonas. O município é a segundo
mais populoso do estado, depois da capital Manaus, depois de Parintins.
Desempenha um papel significativo tanto na economia quanto na cultura da
região (IBGE, 2023).
Nossa História tem origem na língua tupi e significa “pedra pintada”
ou “pedra riscada” “Itacoatiara”, uma referência às inscrições rupestres
encontradas em formações rochosas nas proximidades da cidade, um legado
deixado pelos povos indígenas que habitavam a região há séculos. A cidade
foi fundada em 1683, sendo uma das mais antigas do Amazonas, e ao longo
dos anos, Itacoatiara cresceu e se tornou um importante centro regional
(Silva, 2013). A economia de Itacoatiara é diversificada, com destaque para a
agropecuária, pesca, comércio e, mais recentemente, para a indústria. A cidade
é um ponto estratégico para o escoamento de produtos agrícolas e pecuários do
interior do Amazonas, devido à sua localização no Rio Amazonas e à presença
de um porto fluvial que facilita o transporte de mercadorias. Além disso, a
pesca e a exploração de recursos naturais também são atividades importantes
para a economia local (IBGE, 2023).

202
Itacoatiara é uma cidade rica em cultura e tradições. O município é
conhecido pelo Festival da Canção de Itacoatiara (Fecani), um dos maiores
festivais de música popular do Amazonas, que atrai artistas e visitantes de todo
o estado e de outras partes do Brasil. Além disso, as festas religiosas, como as
celebrações de São João e a festa de Nossa Senhora do Rosário, padroeira da
cidade, são eventos tradicionais que movimentam a comunidade e fortalecem
os laços culturais.
O turismo em Itacoatiara é impulsionado pelas belezas naturais e
pelo patrimônio histórico, as praias de água doce ao longo do Rio Amazonas,
as formações rochosas com inscrições rupestres, e as trilhas ecológicas nas
áreas de floresta são alguns dos atrativos turísticos da região. O ecoturismo e
o turismo de aventura têm grande potencial em Itacoatiara, atraindo visitantes
que buscam contato com a natureza e experiências autênticas na Amazônia.
Como outras cidades na Amazônia, Itacoatiara enfrenta desafios
relacionados à infraestrutura. A cidade tem um grande potencial de crescimento,
especialmente com investimentos em infraestrutura, turismo sustentável
e desenvolvimento industrial. A cidade é importante para o transporte por
navegação de Carga, intermunicipal, interestadual e internacional. Exceto
Travessia, todo grão, óleo, farelo e insumos do campo, produzidos no centro-
oeste do Brasil é escoado pelos rios Amazonas e Madeira. Começando por
via terrestre, chegando à cidade de Porto Velho/RO e encaminhada a cidade
de Itacoatiara e, por fim, o oceano atlântico com os navios abastecidos da
produção do agronegócio.

203
Imagem 1. Mapa do Município de Itacoatiara.

Fonte: IBGE, 2019 e 2020

O papel do SUS no diagnóstico precoce do autismo e os


avanços ao tratamento do TEA

O Ministério da Saúde aponta que os sinais do neurodesenvolvimento


da criança podem ser percebidos nos primeiros meses de vida, com o
diagnóstico estabelecido por volta dos 2 a 3 anos de idade. O diagnóstico
de TEA é eminentemente clínico e deve ser feito por uma equipe
multiprofissional. Até então, não existem marcadores biológicos e exames
que confirmem todo o espectro do TEA. Então, cabe aos profissionais
envolvidos um olhar sensível para observar o desenvolvimento e perceber
características clínicas associadas ao TEA naquela pessoa que chega para
uma confirmação diagnóstica (Brasil, 2023).
O Sistema Único de Saúde (SUS) desempenha um papel importante
no atendimento e suporte às pessoas com o Transtorno do Espectro Autista
(TEA) no Brasil, especialmente para a população em vulnerabilidade social
que depende dos serviços públicos. A contribuição do SUS para o autismo

204
abrange várias áreas essenciais, incluindo o diagnóstico, tratamento, apoio às
famílias e inclusão social.
Canguilhem (2015, p. 89) afirma que a diversidade não é doença,
o anormal não é patológico. [...] Mas o patológico é realmente anormal. O
autismo é uma anomalia, desde que compreendido como algo que está fora
dos padrões da normalidade estipulada pela sociedade tanto do ponto de vista
estatístico quanto do conceito socialmente rendido de normalidade, contudo
o espectro do autismo hoje faz parte da disparidade humana.
Os Desafios que o SUS enfrenta é a falta de profissionais especializados,
a sobrecarga dos serviços,a necessidade de mais centros de atendimento
especializados, a espera por diagnósticos e terapias,, especialmente em áreas
com menos recursos, mas hoje o melhoramento do sistema mostra grandes
avanços e expansão dos serviços e fortalecimento no apoio às famílias,
com políticas públicas e financiamento para construções de novos centros
especializados para melhorar o acesso e a qualidade nos atendimentos
direcionados ao TEA.

Saúde, educação e comunidade: um diálogo necessário

Em Itacoatiara, a integração entre saúde, educação e comunidade


é a chave para proporcionar um suporte abrangente e eficaz às pessoas com
autismo. Reconhecemos que a colaboração entre essas três áreas é fundamental
para o desenvolvimento e bem-estar dos autistas, garantindo que recebam os
cuidados necessários e uma educação inclusiva e de qualidade.
A tríade saúde, escola e comunidade são interdependentes e não
estão em lados opostos. Todos e cada um em seu contexto exercem funções
essenciais para o desenvolvimento da criança com autismo. A comunicação
é o elemento que liga cada um dos atores que compõem a tríade, havendo
ruído, há prejuízos no cuidado da criança. Pensando neste aspecto, Kwant
(2021) enfatiza que cada um tem uma importância no cuidado, destacando os
seguintes pontos:

205
• Pais/responsáveis: Entende como a criança é motivada e produtiva,
mas que tem a limitação de que muitas vezes não sabem como
ensinar seus filhos;
• Escola: Escuta ativa sobre o que os pais têm a dizer sobre as
crianças. Os professores têm as técnicas e estratégias de ensino,
mas muitas vezes não conhecem os elementos motivadores das
crianças, o que anima ou o que pode desestimular ou desregular
a criança.
• Comunidade: É o espaço social de desenvolvimento da criança. É
a comunidade local que pode, através da educação, lidar com as
dificuldades e construir uma identidade coletiva, atuando como
um facilitador no desenvolvimento da criança com TEA.
A comunicação entre os elementos família, escola e comunidade,
quando integrados, promovem um cuidado integral a pessoa com TEA. Desta
forma, a comunicação necessita ser alinhada e articulada de modo constante,
tendo em vista que as necessidades da pessoa com TEA podem mudar
no decorrer do tempo (Mello, 2014). Neste sentido, há de considerar que a
integração da saúde e educação também se reflete no suporte oferecido às
famílias. Em Itacoatiara, os pais e cuidadores têm acesso a uma rede de recursos
que inclui orientação médica, terapias especializadas, apoio psicológico e
programas educacionais adaptados.
O Programa de Saúde na Escola (PSE), conforme o Decreto nº 6.286, de
5 de dezembro de 2007, foi criado em conjunto pelos Ministérios da Saúde e da
Educação com o objetivo de promover a saúde e a qualidade de vida dos estudantes
da rede pública de ensino, contribuindo para o desenvolvimento integral dos
alunos com uma visão macro, o Programa de Saúde na Escola visa promover
ações de prevenção, promoção e atenção à saúde dos estudantes, considerando
que a escola é um espaço importante para hábitos saudáveis (Brasil, 2007).
O Município de Itacoatiara trabalha amplamente o Programa Saúde
na Escola (PSE), atribuída pelo Ministério da Saúde, que promove a saúde e a

206
cultura da paz, reforçando a Prevenção de agravos à saúde, bem como fortalecer
a relação entre as redes públicas de saúde por intermédio da coordenação Saúde
na Escola (SEMSA) e pela Secretaria de Educação (SEMED). As escolas do
município estão comprometidas conforme a Nota Técnica nº 98/2022, emitida
pelo Departamento de Promoção à Saúde (DEPROS) e pela Secretaria de
Atenção Primária à Saúde (SAPS), que visa fomentar indicadores de avaliação
nos ciclos 2023/2024, nela aplica-se ações conjuntas de promoções de saúde e
prevenção de doenças e agravos nas escolas públicas (Brasil, 2022). Com base
na Nota Técnica, o Programa Saúde na Escola busca desenvolver ambientes
inclusivos onde todas as crianças, incluindo aquelas com autismo, possam
aprender e crescer juntas dando o apoio necessário ao Centro.
O programa educacional é adaptado para atender às necessidades
individuais dos discentes autistas e não autistas, garantindo que recebam a
atenção e o apoio necessário para prosperar academicamente, auxiliando
também nas terapias. Professores e profissionais de vida são treinados para
implementar estratégias de ensino inclusivas e para promover um ambiente de
sala de aula acolhedor e compreensivo.
A união da escola pública com as demais instituições sociais e não
sociais facilitará o encontro com a qualidade do ensino. A escola pública
é uma instituição que tem o compromisso voltado à democratização do
ensino. Democratizar o ensino é permitir a todos o acesso aos bens culturais
produzidos pela humanidade (Lagar et al., 2013, p. 44).
As atividades educativas são desenvolvidas a partir do cronograma
anual sintetizado pela coordenação da saúde escolar (SEMSA) que realiza a
busca ativa nas redes de ensino das esferas estadual e municipal e nos centros
universitários de Itacoatiara, o Centro busca atuar além dos muros oferece
conhecimento e, não represa conhecimentos com informações que possam
contribuir no bem-estar da criança.

207
Imagem 2. Atividades realizadas na escola.

Fonte: Centro Municipal ao Autismo Itacoatiara, 2024.

Importância de um centro de autismo em Itacoatiara:


inclusão e acesso à saúde

Um sonho começa a se realizar em oferecer acolhimento e atendimento


especializado para mães atípicas na cidade de Itacoatiara. Um trabalho dedicado
em proporcionar um ambiente de apoio, compreensão e solidariedade para mães
que enfrentam desafios no cuidado de seus filhos. Cada mãe e cada criança são
únicas, e é por isso que nosso foco foi criar um espaço onde cada família possa
encontrar o suporte necessário para superar as dificuldades diárias.
A implantação do Centro deu-sepela demanda expressiva de crianças
com laudos e hipóteses do transtorno encaminhadas pela coordenação de ensino
de Itacoatiara, pela excrescência de discentes com características peculiares aos
transtorno do espectro autista, com isso, os núcleos de estratégias da Secretaria
Municipal de Saúde (SEMSA) e a Secretaria Municipal de Educação (SEMED)
entenderam que implantação do Centro era necessária pela demanda de crianças
não assistidas por outros profissionais habilitados a promover o bem-estar de
cada uma, hoje o Centro Municipal de Referência ao Autismo de Itacoatiara é
uma realidade, com recursos próprios do executivo, sendo a primeira unidade
do Estado do Amazonas a ofertar atendimentos direcionados ao transtorno do
Espectro Autista com adminículo da gestão municipal dos setores da atenção

208
básica, unidades de saúde da família, grupos escolares, associações de mães atípicas
e da comunidade em geral, visando promover saúde pública de boa qualidade.
O Centro de Autismo é mais do que um local de tratamento, é um
espaço de transformação e esperança. Nosso compromisso é criar um
ambiente adequado e especializado para crianças e famílias que enfrentam os
desafios do autismo. A equipe interdisciplinar esteve comprometida em ouvir,
compreender e atender as necessidades individuais de cada mãe, oferecendo
recursos onde cada profissional em sua especialidade contribui no tratamento
eficaz, pois a necessidade de um trabalho macro é ofertar melhores condições de
tratamento as famílias, para exemplificar, podemos mencionar o trabalho dos
fonoaudiólogos, psicólogos, musicoterapeuta, fisioterapeutas e neuropediatra,
para trazer reais condições saudáveis as crianças diagnosticadas com TEA.
Fidalgo (2020), salienta que cada Profissional executa suas habilidades
conforme o diagnóstico da criança, perpetrando planos terapêuticos, reuniões
e trocas de informações dos casos clínicos de cada profissional gerando
fatores positivos nas futuras sessões, sendo assim, buscando construir uma
implantação mais inclusiva e solidária.
O complexo é sistematizado em estratégias implementadas no apoio
familiar, oficinas e sessões individuais com psicólogos para orientar e apoiar os pais
no manejo do TEA, na capacitação de novos profissionais escolares, treinamentos e
workshops para profissionais da saúde, educação e comunidade visando aprimorar
suas habilidades no atendimento e acolhimento as crianças com TEA.
O propósito é desenvolver programas terapêuticos que atendam às
necessidades específicas de cada indivíduo e famílias utilizamos abordagens
baseadas em evidências científicas, incluindo profissionais capacitados e
comprometidos com dever de cuidar, o papel de cada um é ir além do gosta de
crianças, é imergir no mundo totalmente fora do seu dia a dia para promover
o desenvolvimento e a independência de nossas crianças.
Em relação à atenção às famílias, reconhecemos que o autismo afeta
toda a família por isso, o Centro também oferece apoio e orientação para pais

209
e cuidadores. Realizamos palestras informativas, grupos de apoio e sessões
de aconselhamento para garantir que as famílias tenham as ferramentas e o
conhecimento necessários para apoiar o desenvolvimento de seus filhos em
casa e na comunidade (Machado, 2019).
Nossos valores foram guiados pelos valores de respeito, inclusão e empatia
acreditando no potencial de cada criança e trabalhamos incansavelmente para
criar um ambiente onde elas pudessem se desenvolver. Estamos comprometidos
em promover a sensibilização sobre o autismo em nossa comunidade, combatendo
estigmas e construindo uma sociedade mais inclusiva e compreensiva. No
Centro, estamos transformando vidas com dedicação e atenção. Este é o começo
de um sonho, e juntos, podemos fazer a diferença.

Os primeiros atendimentos e acolhimentos às mães atípicas


– a telemedicina como mediadora

O TEA é uma condição descrita como um conjunto de sintomas.


Os sintomas são os mais variados que podem ser relacionados a alteração
sensorial, problemas na condição da comunicação verbal e não verbal, atrasos
cognitivos, estereotipias, fixação em determinados objetos ou assuntos
ou comportamentos obsessivos, mudanças repentinas de humor ou alta
irritabilidade, entre outras comorbidades (DMS-5, 2014).
Segundo Araújo (2017), ainda não são conhecidas com exatidão as causas
etiológicas que definem o autismo, no entanto hoje já temos estudos avançados que
indicam que o TEA, em sua maior constituição possui causas genéticas e ambientais,
onde seu neurodesenvolvimento ainda não é completamente compreendido pela
ciência. A prevalência estimada do Transtorno do Espectro Autista (TEA) é de um
em cada 54 nascimentos (18.5 em 1.000), de acordo com um estudo multicêntrico
realizado nos Estados Unidos da América (EUA), com dados coletados em 11
áreas do país (Centers for Disease Control and Prevention [CDCP], 2020).
Entendemos atualmente que o TEA é um transtorno de
Neurodesenvolvimento que engloba a forma que a pessoa percebe, interage

210
e lida com o mundo e as pessoas ao seu redor. Para o DSM-V os critérios que
caracterizam o autismo podem ser divididos em níveis e gravidade, conhecidos
como Níveis ou Níveis de suporte, sendo classificados em nível 1, nível 2 e
nível 3 (DSM-5, 2014).
No Brasil, a única pesquisa epidemiológica realizada foi um estudo-
piloto em 2011, que foi desenvolvido em um bairro de apenas 20 mil habitantes
da cidade de Atibaia, interior de São Paulo, que resultou em 1 autista para cada
367 crianças (Paula, Ribeiro, Fombonne & Mercadante, 2011).
Desta forma, reconhecemos a importância de apoiar as mães, que
desempenham um papel crucial no desenvolvimento e bem-estar de seus
filhos, sendo as principais defensoras e cuidadoras. As Mães das crianças
autistas nunca desistiram de um espaço para os seus filhos. Ser mãe é um
papel que vem com inúmeras responsabilidades e alegrias, mas ser mãe de
uma criança com autismo traz consigo um conjunto de desafios e recompensas
(Smeha, 2011). Elas não apenas cuidam das necessidades diárias, mas também
navegam por sistemas complexos de saúde e educação para garantir que seus
filhos recebam o apoio necessário. Essas mães frequentemente se envolvem
em terapias, reuniões escolares, consultas médicas e atividades de intervenção
precoce, sempre buscando o melhor para seus filhos, fato que, muitas vezes,
não é compreendido por seus familiares e parceiros, onde relatam o desamparo
e a solidão diante da maternidade atípica (Smeha & Cezar, 2011).
Em meados de 2023, com uma alta demanda e buscas dessas mães, a
equipe da SEMSA direcionou um fonoaudiólogo a uma sala do Telemedicina, onde
foram iniciados os atendimentos às famílias que necessitavam apoio especializado.
Em uma sala pequena, com alguns instrumentos de trabalhos (brinquedos), mães
chegavam com seus filhos com diagnósticos fechados ou com encaminhamento
de investigação. Acompanhadas de angústia, buscavam respostas, razões para que
o filho apresentasse determinados comportamentos. Por que seus filhos eram
diferentes de outras crianças? Em suas narrativas essas mães se culpavam pelo
fato de seus filhos serem diagnosticados dentro do espectro autista, mostravam

211
desespero e fragilidade diante de uma situação, sobre a qual não possuía controle,
o diagnóstico de Transtorno do Espectro Autista (TEA).
Mãe como dona Joyciane5, em apoio a outras mães, pontua: “a culpa não
é nossa. É algo que simplesmente pode acontecer com qualquer família, busque
apoio paralelamente e faça acompanhamento com outros profissionais, é um
alicerce importante para nós mães de filhos atípicos. Precisamos nos olhares, e
nos olhando internamente iremos granjear na melhora de nossos filhos”.
Para dona Fernanda, mãe de uma criança autista nível 3, a calma e o
controle são cruciais! “Toda angústia e aflição vai passar à medida que você
começar a entender a sua criança como ela deve ser ajudada, dar a ela a devida
dimensão, atenção, carinho, paciência e compreensão”.
Verônica, em sua narrativa, também mostra apoio às mães que “com muita
fé em nossos corações podemos nos acalmar e refletir diante das dificuldades.” Com
tudo isso, ela sinaliza que a esperança e a rede de apoio de todas as mães proporcionam
mais tranquilidade diante dos percalços que todas passam independentemente qual
seja o nível e suporte da criança. Há uma união, força e empatia entres elas, pois só
elas sabem a luta de serem assistidas, cuidadas e ouvidas em uma sociedade ainda
pregando passos curtos referente ao autismo (Verdi, 2003).

Imagem 3. Espaço da Telemedicina para o acolhimento e atendimento às mães atípicas

Fonte: Planejamento SEMSA Itacoatiara, 2024.


5   Os nomes são fictícios para garantir o sigilo das pessoas.

212
A união das mães atípicas no Centro Municipal de Referência ao
Autismo em Itacoatiara, é um dos pilares que fortalece o apoio e solidariedade
entre as famílias. Essas mães, que enfrentam os desafios diários de criar filhos
com autismo, encontram no Centro um espaço de acolhimento, troca de
experiências e fortalecimento mútuo, além do compartilhamento entre pares
dos desafios vivenciados. O Centro não é apenas um lugar de atendimento
especializado para as crianças, mas também um refúgio para as mães. Onde se
conectam com outras mulheres que compartilham experiências semelhantes,
criando uma rede de apoio que vai além do tratamento de seus filhos. Esta
união é essencial para lidar com os desafios emocionais, sociais e práticos que
fazem parte da vida dessas famílias.

Centro municipal de referência ao autismo: uma conquista


coletiva

O Centro Municipal de Referência ao Autismo no município de


Itacoatiara-AM, inaugurado no dia 25 de março de 2024 pelo Prefeito Mário
Jorge Bouez Abrahim e pela Secretária Municipal de Saúde Francieli dos Santos
Lima, surge como uma resposta às necessidades específicas das pessoas com
Transtorno do Espectro Autista (TEA) e suas famílias, na região. Destacamos
os esforços e conquistas desta instituição no apoio aos pais atípicos, oferecendo
uma visão holística sobre o que é ser uma referência no cuidado e na inclusão
das pessoas com TEA.
Neste sentido, ressaltamos a importância de fazer uma breve
diferenciação entre inclusão e integração. Para Mantoan (1998), a integração
representa uma introdução da pessoa ou de grupos em contextos maiores
com normas mais gerais, já a inclusão possui o significado de equidade entre
diferentes pessoas, ou seja, oportunidades iguais a todos. Com isso, entende-
se que integrar passa a ideia de quantidade e inclusão representa a qualidade.
O Município de Itacoatiara enfrenta desafios únicos no que diz respeito
ao apoio às crianças com transtorno devido à falta de recursos especializados

213
e à necessidade de sensibilização da comunidade. Nesse sentido, o Centro
surge como o único espaço com recursos próprios do executivo como uma
resposta a essas necessidades, oferecendo um ambiente acolhedor e recursos
terapêuticos para indivíduos com TEA e suas famílias.

Imagem 4. Centro Municipal de Referência ao Autismo

Fonte: Centro Municipal de Referência ao Autismo Itacoatiara, 2024.

O Centro é edificado com recursos do executivo sendo a primeira


unidade do Estado do Amazonas a ofertar atendimentos direcionados ao
transtorno do Espectro Autista com apoio da gestão municipal e dos setores
da Atenção Básica, unidades de saúde da família, grupos escolares, associações
de mães atípicas e da comunidade em geral. O objetivo é atender a demanda
expressiva de crianças com laudos fechados e das hipóteses do transtorno
proporcionando mais esclarecimentos a comunidade onde promovam a
inclusão, a troca de experiências e o desenvolvimento pessoal e social.
Toda estrutura foi arquitetada para ser um ambiente receptivo com
salas climatizadas e equipadas com instrumentos emergidos em terapias e do
lúdico, espaços kid, área externa onde possui um playground com brinquedos
que atendam crianças cadeirantes ou com dificuldades locomotoras. Além
disso, o espaço contará com ações em datas comemorativas da cidade,

214
proporcionando oportunidades de interação e colaboração entre sociedade,
profissionais e das famílias.
O espaço desenvolve em média 700 (setecentos) atendimentos mensais
com a equipe multidisciplinar conforme o prontuário eletrônico cidadão (PEC)
gerenciado pelo Datasus (Brasil, 2024), todo esse complexo qualitativo é sistematizado
em estratégias implementadas em programas de apoio familiar, oficinas e sessões
individuais com psicólogos para orientar e apoiar os pais no manejo do TEA, na
capacitação de novos profissionais, treinamentos para profissionais da saúde e da
educação visando aprimorar suas habilidades no atendimento a crianças com o
transtorno. Para além disso, o Centro atende nos eventos comunitários ofertando
palestras, campanhas de sensibilização em datas comemorativas alusivas e eventos
culturais voltados para a comunidade em geral. Estas ações visam promover a
compreensão, respeito, atenção, inclusão e desmistificação sobre o do TEA. Desta
forma, tencionamos a importância do Centro em atender a expressiva demanda de
crianças atípicas do município de Itacoatiara.

Imagem 5. Ações realizadas na área externa do Centro Municipal de Referência ao


Autismo de Itacoatiara.

Fonte: Centro Municipal ao Autismo Itacoatiara, 2024.

215
Esperançando em novos espaços como o centro de autismo
de Itacoatiara pode contribuir

É plausível aferir os resultados da experiência aqui descrita, que agregou


toda a rede de saúde, educacional e da comunidade em geral na idealização
do Centro Municipal de Referência ao Autismo. Apresentam progressos
significativos em diversas áreas no desenvolvimento individual de comunicação,
comportamental, incluindo linguagem, habilidades sociais e autonomia.
Outro ponto importante foi o fortalecimento familiar com os pais onde
relatam uma maior compreensão do TEA e uma melhora na qualidade de vida de
suas famílias no pós atendimentos. Aa inclusão comunitária está mais consciente
e receptiva às necessidades das pessoas com transtorno em seus espaços coletivos,
promovendo um ambiente mais inclusivo e acolhedor para todos.
O Centro Municipal do Autismo se orgulha de fazer parte de uma
comunidade vibrante e inclusiva. Nosso compromisso vai além do atendimento
especializado; estamos ativamente envolvidos nas ações culturais e coletivas
promovidas pela prefeitura de Itacoatiara, contribuindo para uma sociedade
mais unida e compreensiva.
A equipe interdisciplinar entende a importância do envolvimento
cultural e coletivo como uma forma de extensão natural do nosso trabalho no
Centro Municipal do Autismo, acreditamos que a inclusão deve ser vivida em
todos os aspectos da vida comunitária, por isso, estamos presentes em eventos,
feiras, festivais e outras iniciativas culturais promovidas pela prefeitura, sempre
buscando promover a integração e a conscientização sobre o autismo em uma
sociedade que está em fase de adaptação mesmo em pleno século XXI.
Nosso papel nas ações da prefeitura é colaborar ativamente com o
poder executivo para garantir que as crianças e suas famílias possam participar
plenamente das atividades culturais. Organizamos apresentações, exposições de
arte, oficinas e outras atividades que destacam os talentos e as habilidades das
crianças com autismo. Nossa participação não apenas enriquece esses eventos,
mas também ajuda a sensibilizar a comunidade para as questões relacionadas

216
ao autismo, a inclusão e a diversidade, desafiamos preconceitos e estigmas, e
criamos oportunidades para que todos possam aprender e crescer juntos.
A participação ajuda a construir uma comunidade mais forte, onde
todos são valorizados e respeitados. Acreditamos que a cultura e a coletividade
são fundamentais para o desenvolvimento de uma sociedade inclusiva. Estamos
comprometidos em continuar contribuindo para essas ações, tornando
Itacoatiara um lugar melhor para todos.
A socialização é um aspecto fundamental no desenvolvimento de
todas as crianças, e para as crianças com autismo, essa interação pode ter um
impacto especialmente significativo. A participação em ações paralelas, onde
crianças com e sem autismo interagem em atividades conjuntas, desempenha
um papel crucial na promoção de habilidades sociais, compreensão mútua e
inclusão. Para as crianças com autismo, a socialização em ações paralelas pode
trazer benefícios emocionais significativos. Sentir-se parte de um grupo, fazer
amigos e ser aceito pelos pares contribui para o aumento da autoestima e do
bem-estar emocional. Essas experiências positivas reforçam a confiança das
crianças com autismo em suas habilidades sociais e incentivam a participação
em novas atividades e desafios.
As crianças com autismo participam em ações paralelas que são
essenciais para seu desenvolvimento social, emocional e comunitário. Essas
interações promovem habilidades importantes, fortalecem laços de amizade
e contribuem para uma cultura de inclusão e respeito. O Centro participou
do aniversário da cidade com a temática: CELEBRANDO A DIVERSIDADE:
150 ANOS DE ITACOATIARA COM INCLUSÃO E APOIO ÀS CRIANÇAS
AUTISTAS, MARCO MEMORÁVEL DA NOSSA VELHA SERPA. Foi
emocionante para todos os pais presentes. A EXPOTEA no aniversário de
150 anos de Itacoatiara foi um marco e oportunidade para celebrar a inclusão
de nossas crianças regada com história, cultura e tradições da cidade, além de
promover o intercâmbio cultural com outras crianças não atípicas.

217
Imagem 6. EXPOTEA 2024

Fonte: Centro Municipal de Referência ao Autismo Itacoatiara, 2024

Investir em atividades que integrem todas as crianças é um passo


importante para construir uma comunidade mais forte e compreensiva, onde
cada indivíduo é valorizado por suas singularidades. O empoderamento das
crianças autistas pode ser uma oportunidade para se expressarem criativamente
por meio da arte ao exibir suas obras em um ambiente público e receber
reconhecimento pelo seu trabalho, onde elas sintam um senso de realização e
pertencimento, promovendo sua autoestima e confiança. O intuito da inclusão
durante o aniversário de Itacoatiara foi promover o envolvimento das famílias
e da comunidade no apoio às crianças fortalecendo os vínculos familiares e
comunitários oferecendo um espaço inclusivo e acolhedor para as famílias
participarem juntas, e com isso, promovendo um senso de solidariedade e
apoio mútuo deixando um legado de inclusão e apoio contínuo às crianças
autistas. Ao promover uma cultura de aceitação e acessibilidade, esperamos
que o trabalho de inclusão inspire outras iniciativas e eventos futuros que
priorizem a inclusão de todas as pessoas.

218
Imagem 7. Participação no ITAFOLC 2024.

Fonte: Centro Municipal ao Autismo Itacoatiara, 2024.

No Festival Folclórico de Itacoatiara, o ITAFOLC 2024, o centro foi


novamente inserido na participação com temática: CENTRO MUNICIPAL DE
REFERÊNCIA AO AUTISMO CELEBRANDO O FOLCLORE DA INCLUSÃO
REPLETO DE ATENÇÃO, AMOR, EMPATIA, MAGIA E DIVERSÃO.

Conclusão

O Centro Municipal de Referência ao Autismo em Itacoatiara


desempenha um papel fundamental na promoção da inclusão e no apoio às
famílias de pessoas com TEA. Apesar dos desafios enfrentados, os resultados e
as experiências obtidas até o momento demonstram o impacto positivo desse
trabalho, mesmo enfrentando desafios, a nossa determinação é implementar
novas estratégias eficazes para promover o desenvolvimento e a inclusão. O
comprometimento em oferecer um ambiente seguro, acolhedor e terapêutico
para todos que buscam nosso apoio é nossa missão.
O Transtorno do Espectro Autista está presente em todas as classes
sociais e independe de cor, sexo, religião. A ciência busca compreender e dar
respostas às questões ainda não elucidadas, que rondam o TEA. O Centro

219
não é construído de tijolos, cimentos, ferros, etc., ele é todo estruturado pelos
inúmeros corações das mães, sua pintura foi pincelada por esperança, amor
e visibilidade e, toda energia que supre o lugar, são das mães que nos fazem
acreditar que possamos sim, proporcionar uma qualidade de vida melhor aos
seus filhos. Este é um espaço onde não apenas as necessidades dos autistas
são atendidas, mas também em que as famílias encontram o suporte e a
solidariedade que necessitam para trilhar essa jornada única e desafiadora.
As terapias e ações desenvolvidas são cuidadosamente planejadas
para atender às necessidades específicas de cada criança, promovendo seu
desenvolvimento e inclusão social. Sabemos que essas intervenções são
cruciais para melhorar a qualidade de vida das pessoas com autismo, e por
isso, trabalhamos incansavelmente para oferecer o melhor suporte possível.
O amor incondicional que as famílias têm por seus filhos e a esperança de um
futuro melhor são as forças motrizes que nos inspiram diariamente.
No Centro Municipal de Referência ao Autismo, acreditamos
que, com amor e o esperançar, podemos superar qualquer desafio. Esses
sentimentos nos motivam a continuar lutando por uma sociedade mais
inclusiva, onde cada pessoa com autismo possa alcançar seu pleno potencial.
Assim, concluímos esse capítulo com a certeza de que o trabalho não termina
aqui. Cada dia é uma nova oportunidade para aprender, crescer e fazer a
diferença na vida das crianças e famílias que atendemos. Com acolhimento,
amor, empatia e esperança como nossos guias, seguimos comprometidos em
construir um futuro em que o autismo seja compreendido e respeitado, em
todos os espaços e por todos.
Paulo Freire (1970) nos ensinou o verbo esperançar, pois não podemos
ficar numa posição passiva diante da realidade e do mundo, por isso, agiremos
para imprimir novos amanhãs para transformar realidades, tornando as
ausências em presenças.

220
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222
Desafios no cuidado em saúde mental
de comunidades ribeirinhas: estratégias
do CAPS I em Lábrea, Amazonas
Betânia Lacerda Gomes
Ingrid Lima Silva
Lupuna Corrêa de Souza

Introdução

Lábrea, localizada no sul do estado do Amazonas, está situada na Região


de Saúde Rio Purus (Figura 1), destaca-se por sua vasta extensão territorial e
isolamento geográfico. Situada às margens do Rio Purus e cercada por densa
floresta amazônica e uma rede hidrográfica que atravessa seu território,
a região apresenta características únicas que influenciam diretamente a
vida de suas comunidades. A população é composta, majoritariamente por
indígenas, ribeirinhos e extrativistas, tendo como atividades econômicas a
pesca, agricultura de subsistência e coleta de produtos florestais. Contudo,
essas comunidades enfrentam desafios significativos relacionados ao acesso
a serviços básicos, especialmente à saúde, tendo a saúde mental emergindo
como uma preocupação prioritária.

223
Figura 1. Mapa de Localização Município de Lábrea/Região de Saúde.

Fonte: organizado por Lupuna Corrêa de Souza, 2024.

Nesse contexto, o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS I) Dr.


Raymundo Eusébio, inaugurado em 14 de agosto de 2020, representa uma
resposta estratégica à crescente demanda por cuidados em saúde mental e ao
tratamento de transtornos decorrentes do uso de álcool e outras drogas nos
municípios de Lábrea, Canutama e Pauini.
Com uma abordagem regional integrada, o CAPS I atende atualmente
1.284 usuários, oferecendo cuidados que vão além do tratamento clínico,
incluindo a promoção do bem-estar integral, o fortalecimento de vínculos
comunitários e a construção de projetos de vida. Esses esforços buscam
humanizar o atendimento e responder às complexas necessidades da população
atendida, marcadas por vulnerabilidades sociais, como pobreza, isolamento
geográfico e estigmas relacionados à saúde mental.

224
Apesar dos esforços institucionais, os desafios enfrentados pelas
comunidades ribeirinhas de Lábrea para acessar serviços de saúde,
especialmente em saúde mental, permanecem significativos. A distância das
áreas urbanas, a precariedade da infraestrutura e a dependência de transporte
fluvial dificultam a chegada de atendimentos especializados. As condições
climáticas e as variações do regime dos rios intensificam essas barreiras,
especialmente durante períodos de estiagem ou cheia.
Diante dessas adversidades, a equipe do CAPS I Dr. Raymundo Eusébio
desenvolveu estratégias inovadoras para expandir o alcance dos atendimentos
às comunidades ribeirinhas. Nesse sentido, aqui, buscamos analisar as ações
implementadas, os desafios enfrentados e os resultados alcançados, com foco
nas particularidades culturais, logísticas e sociais do cuidado em saúde mental
em contextos de vulnerabilidade extrema.

Desafios Geográficos, Culturais e Operacionais no Acesso


aos Serviços de Saúde Mental

As comunidades ribeirinhas de Lábrea enfrentam desafios significativos no


acesso aos serviços de saúde mental, sendo a distância geográfica uma das barreiras
mais críticas. O deslocamento até o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS I)
frequentemente requer jornadas longas e arriscadas, realizadas em canoas, voadeiras
ou barcos, com duração de dias, dependendo das condições dos rios e do clima.
Durante o período de seca, o nível dos rios pode diminuir
drasticamente, dificultando ou impossibilitando a navegação em determinadas
áreas. Já na estação de cheia, as fortes correntes e o aumento do volume das
águas introduzem riscos adicionais. Tais dificuldades logísticas impactam não
apenas o acesso inicial ao tratamento, mas também a continuidade do cuidado,
uma vez que o acompanhamento regular requer múltiplos deslocamentos,
frequentemente inviáveis para os moradores.
Além das barreiras físicas, existem desafios culturais que influenciam
a aceitação dos serviços de saúde mental. Em muitas dessas comunidades, a

225
compreensão sobre os transtornos mentais está profundamente enraizada em
crenças espirituais ou tradições culturais. Nessa perspectiva, doenças mentais
são frequentemente interpretadas como manifestações espirituais ou influências
sobrenaturais, o que pode conflitar com os modelos clínicos adotados pelo
CAPS I, gerando resistência ao tratamento. Adicionalmente, o estigma associado
aos transtornos mentais persiste em muitas comunidades, inibindo a busca por
auxílio e dificultando o trabalho das equipes de saúde. O desconhecimento sobre
os transtornos mentais e os benefícios do tratamento agrava ainda mais esse
cenário, resultando em baixa adesão aos serviços oferecidos.

Figura 2. Equipe Multidisciplinar do CAPS I em uma de suas visitas Domiciliares na


comunidade Ribeirinha Praia do Gado.

Fonte: CAPS I, 2024.

Para enfrentar essas dificuldades, o atendimento realizado pelo CAPS


I é adaptado às condições locais, exigindo esforços contínuos por parte das
equipes. Durante os deslocamentos para as comunidades ribeirinhas, além
de superarem os desafios logísticos, as equipes precisam lidar com a ausência
de infraestrutura básica para atendimento (Figura 2). Muitas vezes, as ações
ocorrem em escolas ou residências dos moradores, o que limita a capacidade

226
de oferecer um cuidado contínuo e eficaz. Isso demanda uma gestão cuidadosa,
priorizando os casos mais graves ou situações de risco para atendimento inicial.
O modelo de atendimento combina visitas presenciais e estratégias
de teleatendimento. As visitas são planejadas considerando as condições
de navegação e a disponibilidade de recursos, permitindo diagnósticos e
intervenções iniciais diretamente nas comunidades. Contudo, essas visitas são
esporádicas, o que torna a continuidade do cuidado dependente de tecnologias
de telemedicina ou do apoio de agentes comunitários de saúde. Apesar de
promissor, o uso da telemedicina enfrenta limitações significativas devido à
baixa conectividade em muitas áreas ribeirinhas, restringindo sua aplicação
ampla e efetiva.

Iniciativas Inovadoras para Ampliar o Acesso aos Serviços


de Saúde Mental nas Comunidades Ribeirinhas

Para superar os desafios no acesso aos serviços de saúde mental


enfrentados pelas comunidades ribeirinhas, o CAPS I implementou
estratégias inovadoras adaptadas às condições locais. Uma das principais
iniciativas foi a capacitação intensiva dos agentes comunitários de saúde
(ACS), que atuam como mediadores fundamentais entre os moradores e os
serviços especializados do CAPS I. Familiarizados com as particularidades
culturais e sociais das comunidades, os ACS foram treinados para identificar
sinais precoces de transtornos mentais e oferecer suporte inicial. Além disso,
eles desempenham um papel essencial ao orientar os moradores sobre a
importância do tratamento e facilitar o encaminhamento para o atendimento
especializado, sempre respeitando o contexto cultural e as crenças locais.
A abordagem foi importante para ampliar o alcance dos serviços,
considerando as longas distâncias e o isolamento geográfico das comunidades
ribeirinhas. A presença dos agentes comunitários nas localidades permite adaptar as
orientações à realidade dos moradores, reduzindo o estigma associado aos transtornos
mentais e promovendo a conscientização sobre a importância do cuidado em saúde

227
mental. Esse trabalho fortalece os vínculos comunitários e contribui para uma maior
adesão ao tratamento, promovendo inclusão social e bem-estar.
Outra estratégia importante foi a adoção de tecnologias de comunicação,
como o WhatsApp, para contornar as barreiras físicas e garantir a continuidade
do atendimento. Grupos de comunicação e contatos diretos entre profissionais
do CAPS e moradores viabilizaram interações mais ágeis, possibilitando
o agendamento de consultas, a resolução de dúvidas e o fornecimento de
orientações sem a necessidade de deslocamento até a sede do CAPS. Essa
medida tem se mostrado especialmente eficaz em regiões onde o transporte é
limitado e o acesso às áreas urbanas é prejudicado por condições geográficas
adversas. Apesar das limitações de infraestrutura, como conectividade instável
em algumas áreas, o uso dessas ferramentas complementa o atendimento
presencial, promovendo um cuidado contínuo.
Adicionalmente, o CAPS I investiu na formação de parcerias com
diversas instituições, como unidades de saúde da atenção primária, Centros de
Referência de Assistência Social (CRAS), Centros de Referência Especializado de
Assistência Social (CREAS) e o Centro Cidadão. A colaboração interinstitucional
fortalece a rede de cuidado, integrando recursos e ampliando as possibilidades de
atendimento à população. Essas parcerias permitem o planejamento e execução
de ações conjuntas que combinam o atendimento clínico com atividades de
promoção da saúde mental e estratégias para enfrentar vulnerabilidades sociais.
A avaliação constante dessas iniciativas garante ajustes e aprimoramentos,
alinhando as estratégias às necessidades locais.
A integração dessas ações – capacitação dos agentes comunitários, uso
de tecnologias de comunicação e estabelecimento de parcerias estratégicas –
tem permitido ao CAPS I oferecer um modelo de cuidado mais acessível e
alinhado às especificidades das comunidades ribeirinhas. Por meio de soluções
inovadoras e respeitando as particularidades locais, o CAPS I consolida-se
como uma referência em saúde mental na região, promovendo o bem-estar
dos usuários e construindo uma rede de cuidado inclusiva e humanizada.

228
Resultados e impactos: transformando ações em conquistas

As medidas implementadas pelo CAPS I resultaram em avanços


significativos no acesso à saúde mental para as comunidades ribeirinhas,
refletindo-se tanto no aumento do número de atendimentos quanto na
melhoria da qualidade dos serviços prestados. Essas iniciativas promoveram
uma conscientização mais ampla sobre a importância da saúde mental nas
comunidades, contribuindo para a redução do estigma que tradicionalmente
envolve o tema. Esse progresso foi especialmente notável em áreas onde antes
havia uma grande resistência ao tratamento, fruto da falta de conhecimento e
da percepção equivocada sobre os transtornos mentais, frequentemente vistos
através de lentes culturais ou espirituais.
Um dos nossos resultados positivos envolve o caso do senhor Alfredo,
morador da comunidade ribeirinha da Praia de Lábrea. A demanda relacionada
ao seu Alfredo foi encaminhada ao CAPS através do Agente Comunitário de
Saúde, João. Durante uma de suas visitas domiciliares, João foi procurado pela
mãe do senhor Alfredo, que relatou que ele não estava bem. Segundo ela, o senhor
Alfredo havia passado vários dias sem sair do quarto, sem se alimentar, falando
sozinho e demonstrando um medo excessivo. Diante da situação, a equipe do
CAPS, composta por médico, enfermeiro, técnico em enfermagem, psicóloga
e assistente social, dirigiu-se à residência do senhor Alfredo, onde realizaram
atendimentos conjuntos entre o médico e a psicóloga. Na ocasião, foi prescrito
um tratamento medicamentoso, além de acompanhamento psicológico.
Após um mês de tratamento, a equipe retornou à residência do senhor
Alfredo e o encontrou no terreiro, envolvido em suas atividades de agricultura.
Ele relatou estar se sentindo bem e ter retomado todas as suas atividades. O
senhor Alfredo foi diagnosticado com esquizofrenia e continua em tratamento
no CAPS I, encontrando-se estabilizado e vivendo uma vida de qualidade.
Os resultados trouxeram à tona as principais barreiras enfrentadas
pelos usuários na busca por atendimento. As dificuldades de acesso geográfico

229
permanecem como um desafio central, dado o isolamento das comunidades, que
muitas vezes só podem ser alcançadas por vias fluviais e exigem longos e perigosos
deslocamentos. Essas condições tornam o acesso regular ao CAPS I uma tarefa
árdua, especialmente durante os períodos de cheia ou seca dos rios. Além disso,
o estigma social continua a ser um fator limitante, com muitas pessoas ainda
relutantes em buscar ajuda devido à vergonha ou ao medo de serem marginalizadas.
A falta de conhecimento sobre os serviços disponíveis também impede que parte
da população reconheça a importância de procurar assistência especializada.
Diante dessas dificuldades, o CAPS I adotou estratégias para contornar
os obstáculos. Entre as principais ações estão as campanhas de sensibilização e
educação comunitária, realizadas tanto por meio de visitas presenciais quanto
pelo uso de tecnologias de comunicação, como o WhatsApp. Essas campanhas
têm o objetivo de esclarecer a população sobre o que são os transtornos
mentais, desmistificar o tratamento e informar sobre os serviços oferecidos.
Paralelamente, o estabelecimento de parcerias com outras instituições locais,
como escolas, associações comunitárias e órgãos de saúde, foi essencial para
fortalecer a rede de apoio e expandir o alcance dos atendimentos. Essas
colaborações possibilitaram um trabalho mais integrado e eficaz, ampliando os
recursos disponíveis e potencializando as ações voltadas ao bem-estar mental
das comunidades ribeirinhas.
As medidas adotadas pelo CAPS I demonstraram que, apesar das
adversidades, é possível avançar na promoção da saúde mental em contextos
de difícil acesso, desde que se leve em consideração as realidades locais e
se trabalhe de forma colaborativa e sensível às particularidades culturais e
geográficas das populações atendidas.

Considerações Finais

A partir da prática é possível inferir que o acesso aos serviços de


saúde mental oferecidos pelo CAPS I em Lábrea enfrenta desafios complexos
e persistentes, especialmente em razão das barreiras geográficas, culturais

230
e estruturais presentes na região. A localização remota das comunidades
ribeirinhas, combinada com a escassez de meios de transporte adequados e a
falta de infraestrutura, limita significativamente a regularidade e a abrangência
do atendimento. Além disso, o estigma social relacionado aos transtornos
mentais e a falta de compreensão sobre a importância do tratamento ainda
dificultam a busca por ajuda e a adesão dos usuários às terapias propostas.
Apesar dessas adversidades, o CAPS I tem implementado uma série de
estratégias eficazes para superar essas barreiras e ampliar o acesso à saúde mental.
A capacitação dos agentes comunitários de saúde, que atuam como mediadores
entre o CAPS e as comunidades, foi fundamental para adaptar o atendimento
às realidades locais. Esses agentes, por estarem inseridos nas comunidades
e compreenderem suas dinâmicas sociais e culturais, desempenham um
papel relevante na identificação precoce de casos e no encaminhamento para
tratamento, além de atuarem na conscientização e na redução do estigma.
Complementarmente, o uso de tecnologias como o WhatsApp possibilitou
a criação de canais de comunicação diretos e acessíveis, permitindo que
orientações, agendamentos e acompanhamentos sejam realizados mesmo à
distância, o que é essencial em uma região com tantas limitações logísticas.
Reconhecemos que ainda há muito a ser feito para garantir que todas as
pessoas, independentemente de onde vivam, tenham acesso a um atendimento
de saúde mental de qualidade e de forma contínua. O fortalecimento dessas
estratégias, combinado com investimentos em políticas públicas direcionadas,
é fundamental para promover um acesso mais equitativo e inclusivo aos
serviços de saúde mental na região. É preciso avançar no desenvolvimento
de iniciativas que considerem as especificidades culturais das comunidades,
ampliem a infraestrutura de atendimento e, sobretudo, consolidem uma rede
de apoio integrada, que envolva não apenas o CAPS I, mas também outras
instituições locais e regionais. Com essas ações, será possível não apenas
melhorar o acesso aos serviços, mas também garantir que esse cuidado seja
contínuo, efetivo e respeitoso às singularidades de cada comunidade.

231
Referências
Brasil. Ministério da Saúde. (2012). Política Nacional de Atenção Básica. Brasília: Ministério da
Saúde. Recuperado em 14 de agosto de 2024, de http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/
politica_nacional_atencao_basica_2012.pdf.

CAPS I Dr. Raymundo Eusébio. (2024a). Histórico do CAPS. Lábrea, Amazonas. [Documento
interno].

CAPS I Dr. Raymundo Eusébio. (2024b). Prontuário do paciente Alfredo. Lábrea, Amazonas.
[Documento interno].

Gomes, B. L., Silva, I. L., & Bonates, C. (2024). Desafios no cuidado em saúde mental de
comunidades ribeirinhas: estratégias do CAPS I/Lábrea – AM.

IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. (2021). Censo Demográfico 2020:


Resultados Gerais da Amazônia Legal. Brasília: IBGE.

Organização Mundial da Saúde. (2014). Relatório sobre a Saúde Mental no Mundo. Genebra:
OMS. Recuperado em 19 de agosto de 2024, de https://www.who.int/mental_health/world-
report/en/.

Ribeiro, P. S. O. (2015). Saúde Mental na Amazônia: desafios e perspectivas. Manaus: EDUA.

Santos, I. E. dos. (2019). O cuidado em saúde mental nas comunidades ribeirinhas do Amazonas.
Revista Brasileira de Saúde Mental, 7(2), 45–60.

232
Inovação no combate da tuberculose:
tecnologia auxilia na identificação de
usuários com falha no seguimento do
tratamento em Manaus, AM
Adriane Farias Valentin
Eliane Nogueira Campos
Elson Pessoa Vasques
Jacó Miranda dos Santos

Introdução

A tuberculose (TB) é uma doença infecciosa causada pelo


Mycobacterium tuberculosis, capaz de afetar todos os órgãos do corpo, sendo
o pulmão e a laringe os mais comumente atingidos. Altamente contagiosa, a
TB continua a ser uma das principais causas de morte por doenças infecciosas
em todo o mundo, segundo a Organização Panamericana de Saúde OPAS
(OPAS, 2020).
A OMS enfatiza que, para atingir as metas de redução da incidência
e mortalidade por TB, é essencial implementar ações simultâneas, incluindo
o tratamento precoce e adequado da TB pulmonar ativa e a identificação e
tratamento da Infecção Latente da Tuberculose (ILTB). Essas ações são
fundamentais para reduzir o risco de desenvolvimento da TB ativa e,
consequentemente, interromper a cadeia de transmissão (OMS, 2017).
O Brasil, como signatário dos Objetivos do Desenvolvimento
Sustentável (ODS), assumiu o compromisso de erradicar as epidemias causadas
por doenças negligenciadas, incluindo a TB, até 2030. Com o objetivo de
alcançar essa meta, o Ministério da Saúde (MS) lançou uma versão atualizada
para implementar a segunda fase Plano Nacional pelo Fim da Tuberculose
como Problema de Saúde Pública (PNCT), que abrange o período de 2021-

233
2025 e atualiza as diretrizes para que os municípios desenvolvam ações mais
eficazes de monitoramento e controle da doença (Brasil, 2021).
O PNCT é estruturado em três pilares fundamentais para o sucesso
das intervenções: i) Prevenção e cuidado integrado centrado na pessoa com
TB; ii) Políticas arrojadas e sistema de apoio e; iii) Intensificação da pesquisa e
inovação. Dentre as estratégias desses pilares podemos destacar diagnóstico e
tratamento oportuno visando a integralidade do cuidado, ações voltadas para a
populações mais vulneráveis, fortalecimento da vigilância e o monitoramento
e avaliação das ações definidas para o enfrentamento da doença bem como a
incorporação de tecnologias e iniciativas inovadoras (Brasil, 2021).
O processo identificação, tratamento e monitoramento de casos de
tuberculose deve ser conduzido na Atenção Primária à Saúde (APS), que
desempenha um papel vital para o alcance dos ODS e do PNCT. O cenário
epidemiológico atual revela que, a cada segundo, uma pessoa é infectada pelo
Mycobacterium tuberculosis. Entre os mais de oito bilhões de habitantes do
planeta, estima-se que 1,7 bilhões de pessoas tenham infecção latente, das
quais cerca de 10 milhões podem desenvolver TB ativa (OMS,2023).
A TB é uma doença de notificação compulsória que utiliza
formulário específico do Sistema de Informação de Agravos de Notificação
(SINAN) para informar as autoridades sanitária um novo caso detectado.
O SINAN é um sistema de vigilância epidemiológica que coleta, armazena
e proporciona a análise dados sobre agravos e doenças de notificação
compulsória, incluindo a tuberculose. É utilizado para o monitoramento
dos casos de TB, desde a notificação inicial até o encerramento do caso
e apoia indiretamente a aquisição de insumos e medicamentos (Rocha et
al.,2020). Outro sistema de informação que muitos municípios usam é o
Prontuário Eletrônico, seja o Prontuário Eletrônico do Cidadão (e-SUS
APS) ou outro tipo de prontuários eletrônico que, embora registre dados
individualizados dos atendimentos, carece de estrutura específica para a
gestão do cuidado dessas pessoas com TB.

234
O SINAN e o e-SUS APS são sistemas distintos utilizados em todo
território nacional para a gestão de informações em saúde, e cada um deles
desempenha um papel específico no monitoramento e controle da tuberculose,
entretanto, ambos não se conectam, deveriam ser complementares para que
houvesse integralidade no atendimento, porém há dispersão das informações
entre esses sistemas o que compromete a gestão do cuidado e o monitoramento
dos casos, dificultando a identificação de fragilidades no processo de trabalho
e a tomada de decisões oportunas.
O monitoramento do usuário com TB é crucial para garantir o sucesso
do tratamento, prevenir a transmissão da doença quebrando a cadeia de
transmissão, bem como evitar o surgimento de cepas resistentes, e assegurar
o bem-estar do usuário. É peça central na estratégia global de controle da
tuberculose e na proteção da saúde pública. Para um controle eficaz da TB, é
importante que ambos os sistemas sejam utilizados de forma complementar,
garantindo a integração e a interoperabilidade dos dados.
No início de 2023, Manaus implementou e institucionalizou o iTB®, uma
ferramenta tecnológica desenvolvida pela própria Secretaria de Saúde com o
objetivo de integrar dados dos sistemas PEC e-SUS APS e SINAN. O iTB é uma
ferramenta semiautomatizada e visa otimizar o processo de trabalho, dinamizar o
monitoramento e subsidiar a tomada de decisão, possibilitando o acompanhamento
completo integral e individualizado da pessoa em tratamento de TB e de seus
contatos. A ferramenta possui oito módulos: Fichas de TB; Fichas Registradas;
Monitoramento; Contatos; Alertas; Relatório de casos; Estatísticas (Manaus, 2023).
Diante deste cenário, este capítulo tem como objetivo relatar a experiência
do município de Manaus no uso do módulo Alertas para a identificação oportuna
dos usuários com falha no seguimento do tratamento da TB.

Módulo Alertas

O módulo Alertas, inserido no sistema iTB®, foi desenvolvido para auxiliar


os profissionais de saúde no monitoramento da adesão aos procedimentos

235
mínimos necessários para a controle da TB, como consultas periódicas, realização
de exame de HIV no primeiro mês de tratamento e o acompanhamento das
baciloscopias de controle mensais, bem como subsidiar as ações de busca ativa.
A vigilância contínua desses procedimentos é crucial para identificar alterações
precoce e garantir um tratamento adequado, individualizado e que fortaleça o
vínculo com o serviço de saúde e a adesão ao tratamento.
Na figura 1, tela de visualização do módulo alertas, observa-se na
parte superior da tela a disposição de botões rotulados Excel, CVC, Print e
PDF que possibilitam ao usuário do sistema baixar as informações apresentas
no formato desejado. Logo abaixo, visualiza-se um quadro que disponibiliza
dados de todos os usuários com falha no seguimento do tratamento. Esse
quadro é composto pelas seguintes variáveis: ordem, CNS/CPF, nome do
usuário, distrito, unidade de tratamento atual, consultas, teste de HIV e
BAAR controle.
Para identificar os usuários com falhas no seguimento do tratamento,
o módulo Alertas utiliza três critérios, sendo eles:
Paciente com consulta de acompanhamento em atraso: o módulo
Alertas identifica o usuário no 16º dia sem consulta e emite o alerta, seguindo
o protocolo estabelecido pela SEMSA Manaus de consultas quinzenais;
Ausência de teste HIV: o alerta é emitido quando, a partir da segunda
consulta, o registro do exame de HIV não é encontrado no PEC eSUS APS,
levando em consideração ao protocolo estabelecido pelo Ministério da Saúde
de realização preferencial do teste no primeiro mês de tratamento;
Ausência de BAAR controle: ocorre quando não há no PEC eSUS
APS o registro do resultado do exame referente ao mês de tratamento
seguindo o preconizado pelo Programa Nacional de Controle de Tuberculose
que determina a realização do exame de baciloscopia mensal para avaliar a
efetividade do tratamento.

236
Figura 1. Tela de visualização do módulo Alertas.

Fonte: SEMSA Manaus, 2024.

Cada falha é sinalizada por um ícone de cor vermelha, no caso de


falha na consulta de acompanhamento o ícone é substituído pela sinalização
dos dias em atraso destacado com vermelho. Caso um dos três segmentos do
tratamento não apresentem falha o ícone verde é sinalizado (Figura 1).
Ao longo de todo o tratamento, um usuário pode receber 1 ou 3 alertas
no mês ou nenhum. Considerando o protocolo, os alertas de consulta e de
baciloscopia são muito mais frequentes de observar, pois eles são avaliados
mensalmente e mesmo que tenha sido corrigido a situação do mês anterior,
pode entrar novamente em alerta no mês seguinte se ocorrer um novo atraso.
Vale ressaltar que o ciclo de mês de monitoramento depende da data de início
do tratamento para TB. Quanto ao exame de HIV uma vez corrigido não
haverá mais alerta a respeito, pois apenas um exame pode ser considerado
como satisfatório para o plano de atendimento.

237
Destaca-se também que o quantitativo de alertas emitidos está
diretamente relacionado a demora do profissional de saúde em solucioná-los,
uma vez que o módulo só deixa de emitir alertas quando o profissional de saúde
resolve a fragilidade no seguimento do tratamento indicada. Caso contrário,
um mesmo usuário acumulará vários alertas enquanto não for solucionado.

Fluxo de informações do módulo Alertas

O iTB® coleta e integra dados do SINAN e do PEC e-SUS APS e os


armazena em seu banco de dados. O módulo Alertas, por sua vez, acessa esse
banco de dados e realiza uma filtragem nominal, identificando exclusivamente
os usuários com falha no seguimento do tratamento. Esses casos são
apresentados na tela do módulo Alertas fornecendo aos profissionais de saúde
informações oportunas que influenciará diretamente na realização de busca
ativa definindo prioridades (Figura 2).

Figura 2. Fluxo de informações do módulo Alertas.

Fonte: SEMSA Manaus, 2024.

238
Resultados

Das 182 unidades de saúde avaliadas ao longo de oito meses (de julho
de 2023 a fevereiro de 2024), apenas uma, o Centro de Referência Cardoso
Fontes, não possui o iTB® implantado. As unidades estão distribuídas da
seguinte forma: 49 no Distrito de Saúde Leste (DISAL), 52 no Distrito de
Saúde Norte (DISAN), 40 no Distrito de Saúde Oeste (DISAO), 36 no Distrito
de Saúde Sul (DISAS) e 4 no Distrito de Saúde Rural (DISAR).
O módulo Alertas identificou 1.916 usuários fora do padrão esperado
de atendimento, resultando na emissão de alertas. Desses, 1.060 (55,49%)
estão concentrados nas unidades do DISAL e DISAN, enquanto os demais
se distribuem entre as unidades dos distritos Sul, Oeste, Rural, e na unidade
estadual Cardoso Fontes (Quadro 1).

Quadro 1. Usuários em tratamento para TB que receberam algum tipo de alerta, por
unidade de saúde e DISAS, Manaus, Amazonas, 2024.

UNIDADES DE SAÚDE PACIENTES


DISAS
n % n %
Leste 49 26,92% 581 30,32%
Norte 52 28,57% 479 25,00%
Oeste 40 21,98% 379 19,78%
Sul 36 19,78% 374 19,52%
Estado 1 0,55% 95 4,96%
Rural 4 2,20% 8 0,42%
TOTAL 182 100,00% 1916 100,00%

Fonte: Itb/Did/Semsa. 22/03/2024 Dados Sujeito A Alterações.


Nota: O Centro de Referência Cardoso Fontes, uma unidade de saúde gerida
pela Secretaria Estadual de Saúde (SES), ainda atende pessoas com TB pulmonar
sem complicações, apesar da descentralização desse serviço para a APS em 2000.
Esses usuários aparecem no iTB® para acompanhamento compartilhado com os
profissionais de saúde da rede de APS.

239
Dos 8.820 alertas emitidos ao longo do período analisado, a distribuição
por causa foi a seguinte: no DISAL, foram registrados 909 alertas (10,31%) por
atraso em consulta, 975 (11,05%) por atraso na realização do teste de HIV e
961 (10,90%) por atraso na realização da baciloscopia de controle. No DISAN,
foram emitidos 781 alertas (8,85%) por atraso em consulta, 690 (7,82%) por
atraso na realização do teste de HIV e 788 (8,93%) por atraso na realização
da baciloscopia de controle. A maior parte dos alertas, 5.104 (57,87%), está
concentrada nessas nesses dois DISAS, enquanto os alertas restantes estão
distribuídos entre os outros DISAS e a unidade estadual (Tabela 1).

Tabela 1. Distribuição de alertas por causa e DISA, Manaus, Amazonas, 2024.

ALERTAS
SEM
DISAS SEM CONSULTA SEM HIV TOTAL
BACILOSCOPIA
n % n % n % n %
Leste 909 10,31% 975 11,05% 961 10,90% 2845 32,26%
Norte 781 8,85% 690 7,82% 788 8,93% 2259 25,61%
Oeste 627 7,11% 468 5,31% 652 7,39% 1747 19,81%
Sul 578 6,55% 398 4,51% 578 6,55% 1554 17,62%
Estado 82 0,93% 175 1,98% 107 1,21% 364 4,13%
Rural 16 0,18% 19 0,22% 16 0,18% 51 0,58%
TOTAL 2993 33,93% 2725 30,90% 3102 35,17% 8820 100%

Fonte: iTB/DID/SEMSA. 22/03/2024 dados sujeitos a alterações.


Nota: Ressalta-se que o Centro de Referência Cardoso Fontes não realiza busca ativa,
sendo esta ação de responsabilidade dos profissionais de saúde da rede de APS.

Considerações Finais

O módulo Alertas do sistema iTB® mostra-se eficaz na identificação


precoce de usuários com falha no seguimento do tratamento, bem como
direciona esforços mais estratégicos para as ações de busca ativa, otimizando
o tempo dos profissionais de saúde e promovendo a continuação do cuidado.

240
Embora os resultados apresentados neste capítulo revelem fragilidades no
acompanhamento do tratamento dos casos de TB no município, o módulo Alertas
se destaca por sua capacidade de identificar, de forma oportuna e abrangente,
falhas que poderiam passar despercebidas pelos profissionais de saúde.
A possibilidade de identificação precoce de usuários com falha
no seguimento do tratamento propiciada aos profissionais de saúde a
tomada de decisão mais informada e direciona suas ações de maneira
mais eficaz e priorizando os usuários. Entretanto, o resultado positivo de
sua funcionalidade depende essencialmente da adequação do processo de
trabalho dos profissionais de saúde que devem incorporar no cotidiano de
suas atividades laborais o monitoramento diário dos usuários em tratamento
para TB sob sua responsabilidade.
A ferramenta tem o potencial de não apenas evitar a descontinuidade
do tratamento, mas também de oferecer uma visão clara sobre onde estão
os pontos críticos, possibilitando o redirecionamento das estratégias e o
aprimoramento dos cuidados. Assim, a utilização dessa tecnologia não só
fortalece o monitoramento da TB, como também contribui para melhorar a
qualidade dos serviços prestados, beneficiando diretamente os usuários.
Ressaltamos ainda que a implantação do sistema iTB® vem ocorrendo
de forma gradativa na rede de APS do município de Manaus. Logo, avaliar o
impacto desse módulo no controle da TB não é possível no momento, havendo
a necessidade de estudos posteriores para suprir essa lacuna de conhecimento.

Referências
Brasil. (2021). Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de
Doenças de Condições Crônicas e Infecções Sexualmente Transmissíveis. Brasil Livre da
Tuberculose: Plano Nacional pelo Fim da Tuberculose como Problema de Saúde Pública:
estratégias para 2021-202. Brasília: Ministério da Saúde.

Brasil. (2021). Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de


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de Dados Nacionais de Saúde. Epidemiol.Serv. Saúde, v. 29, n. 1.

242
Da concepção à contracepção: como
iniciou a estratégia de ofertar DIU
às mulheres em situação de rua de
Manaus-AM
Ezequiel Fernandes da Costa Neto
Layla Calazans Muller
Jacqueline Cavalcanti Lima
Maria Dinez Fabá de Oliveira
Lúcia Helena de Araújo Jorge
Eucinara Buás Guedes
Thalita Renata das Neves Guedes

Antes de falar sobre contracepção, falemos sobre a concepção deste


trabalho: quem é a população em situação de rua (PSR)? Segundo a Política
Nacional de Trabalho Digno e Cidadania para a População em Situação de Rua
(PNTC Pop Rua) instituída pela Lei 14.821/2024,

[...] grupo populacional heterogêneo que tem em comum a falta de


moradia e utiliza os logradouros públicos como espaço de moradia
e de sustento, bem como as unidades de acolhimento institucional
para pernoite eventual ou provisório, podendo tal condição estar
associada a outras vulnerabilidades como a pobreza e os vínculos
familiares interrompidos ou fragilizados (L14821, 2024).

Ou ainda, “Eu me chamo de excluído como alguém me chamou, mas


pode me chamar do que quiser seu doutor. Eu não tenho nome, eu não tenho
identidade, eu não tenho nem certeza se eu sou gente de verdade”, como versa
Gabriel O Pensador (1993).
Fato é que a PSR enfrenta grandes desafios para acessar os serviços
de saúde, especialmente na atenção primária. Entre esses desafios estão o
preconceito, a estigmatização, exigências burocráticas e a falta de preparo dos

243
profissionais (Andrade et al., 2022; Lima et al., 2022). E, mais especificamente,
de onde parte a reflexão de que é preciso questionar o acesso à contracepção
eficaz para as mulheres em situação de rua?
Embora sejam discutidas formas de melhorar este acesso aos serviços
de saúde e à educação, isto ainda é uma realidade ilusória para as mulheres em
situação de rua, que permanecem sendo marginalizadas e tendo seus direitos
reprodutivos negligenciados. Estudos internacionais demonstram que, apesar
dessas mulheres desejarem evitar ou adiar gravidezes, a maior parte não utiliza
nenhum método contraceptivo (Eugênio et al., 2024; Terefe et al.,2022).
Diante desse problema, as equipes de Consultório na Rua (CnaR) de
Manaus-AM pensaram numa estratégia de minimizar as iniquidades em saúde
inerentes a esse grupo populacional. Principalmente, no que concerne ao
acesso e distribuição de recursos de saúde que garantem contracepção eficaz.
Importante ressaltar que o CnaR é uma modalidade de equipe de Atenção
Primária à Saúde (APS) prevista desde a Política Nacional de Atenção Básica
(PNAB) de 2011 e tem o intuito de promover saúde integral à PSR, ampliando
o acesso desta população aos serviços de saúde (Morais et al., 2021).
E, para fecharmos este conchavo inicial e disparar as reflexões
que esta experiência proporcionou (e proporciona, porque ela continua a
acontecer) precisamos falar sobre métodos contraceptivos. Qual o método
contraceptivo mais eficaz? A resposta que logo vem à mente é: aquele que tem
maior porcentagem em garantir a contracepção. Mas, antes disso, é preciso
questionar: quem é a pessoa que utilizará o método?
Muitas são as variáveis ao se analisar qual contraceptivo indicar. A pessoa tem
outras doenças? Ela pode usar hormônios? Ela usa algum medicamento ou substância
que possa ter interação? Ela consegue cumprir a rotina que tal anticoncepcional
exige? Ferreira (2019) reforça que a escolha do método anticoncepcional está
intrinsicamente ligada aos determinantes sociais da saúde e envolve fatores como
história pessoal, condições clínicas, risco de IST, acesso, intenções reprodutivas,
diálogo com o parceiro, além de influências culturais e mitos.

244
Quando pensamos em ofertar contracepção eficaz para mulheres e
outras pessoas com útero em situação de rua, devemos levar em conta todo
o contexto que envolve especificidades desta população e adequar o cuidado
em saúde para essa realidade. Até porque, este é um atributo derivado da APS,
segundo Starfield (2002): a competência cultural.
A moradia irregular e a consequente migração constante no território,
como já mencionado, é uma característica comum à PSR. Nisto reside algumas
variáveis que devem ser levadas em conta ao se pensar em contracepção eficaz
para essas mulheres e outras pessoas com útero. Estar na rua é estar exposto a
muitas incertezas: é não ter um local seguro para guardar uma medicação; é estar
mais exposto à violência sexual e física; é ter que possuir algo para ser moeda de
troca, seja por necessidades ou por proteção; é fazer parte da estatística de alta
prevalência do abuso de álcool e outras drogas (Wright, 1991).
Enquanto equipe de saúde responsável para lidar com as necessidades
da PSR, pensamos: que método contraceptivo seria eficaz e realista para
ofertarmos? Consideramos que precisaria ser algum método que não
dependesse de armazenar em ambiente externo seguro; possuísse pouca
ou nenhuma interação medicamentosa e/ou com outras substâncias; não
dependesse de conhecer o histórico de doenças na família, como câncer de
mama; e que fosse reversível e de longa duração.
Diante do acima exposto e a partir das vivências e experiências das
equipes de Consultório na Rua de Manaus-AM, o Dispositivo Intrauterino
(DIU) de cobre foi vislumbrado como um método contraceptivo com ótima
elegibilidade para quem está em situação de rua. Mas porque o DIU?
O DIU de cobre é um método contraceptivo altamente eficaz,
com taxa de falha em torno de 1% (Slywitch et al., 2021). Possui poucas
contraindicações e não depende de hormônios, tornando-o acessível para
uma ampla variedade de pessoas (Bylaardt et al., 2020). Embora algumas
usuárias possam experimentar efeitos colaterais como dor abdominal, cólicas
mais intensas ou aumento do sangramento menstrual, esses efeitos geralmente

245
são manejáveis e não impedem a satisfação com o método. A ausência de
hormônios é um benefício importante para aquelas que não desejam ou não
podem usar métodos hormonais (Slywitch et al., 2021).
O DIU de cobre é um método contraceptivo de longa duração
oferecido pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no Brasil, com alta eficácia e
segurança (Morais et al., 2021). Sua inserção pode ser realizada por médicos
e enfermeiros capacitados na Atenção Primária à Saúde (APS), ampliando o
acesso das mulheres a este método (De Souza et al., 2021; Ferreira et al., 2024).
A inserção do DIU de cobre é um procedimento simples e pode ser realizada
em uma única consulta em Unidades Básicas de Saúde (Bylaardt et al., 2020),
sem a necessidade de retornos frequentes ao serviço de saúde, algo que se
alinha bem com a realidade de pessoas em situação de rua, que muitas vezes
têm dificuldades em manter compromissos regulares de saúde.
Além disso, o DIU de cobre é um método discreto, permitindo que
essas pessoas mantenham controle sobre sua fertilidade sem a necessidade de
métodos visíveis ou de uso diário (Franchini Da Silva, 2023), como pílulas
anticoncepcionais, que podem ser difíceis de armazenar e lembrar de tomar
regularmente em condições de vida instáveis.
O DIU de cobre se apresenta como uma opção contraceptiva valiosa para
mulheres e outras pessoas com útero em situação de rua, oferecendo uma solução
eficaz, duradoura e de baixo custo para o planejamento reprodutivo, adaptada às
necessidades e desafios específicos desta população vulnerável. A acessibilidade e a
baixa necessidade de manutenção fazem do DIU de cobre uma ferramenta crucial na
promoção da saúde reprodutiva e no fortalecimento da autonomia dessas pessoas.
Antes que iniciemos, de fato, o relato desta experiência, é preciso
reforçar que o objetivo do CnaR de Manaus-AM é proporcionar que mulheres
e outras pessoas com útero tenham acesso ao que lhe é de direito: planejamento
reprodutivo e sexual. A criação de um fluxo para o acesso à inserção do DIU
dessa população foi o fio condutor. Mas através desse fluxo, outros desfechos
associados também foram alcançados e serão relatados.

246
Entretanto, essa experiência de sucesso não se trata de números. O seu
aspecto qualitativo é ainda mais rico. Não é sobre quantos DIU se consegue
inserir, mas sobre o quão desafiador é garantir o acesso à contracepção
eficaz para a PSR. Trata-se, também, da potência que a APS do SUS tem de
fortalecer e promover equidade às populações vulneráveis, mesmo em meio
condições adversas. Para esta compreensão, partimos do conhecer a realidade
do Consultório na Rua de Manaus-AM primeiramente.

Precisamos falar sobre: a realidade de Manaus

A cidade de Manaus-AM, atualmente, possui uma população de cerca


de 2.063.689 de pessoas e uma área territorial de 11.401,092 km² (IBGE, 2022).
Dentre estes dois milhões de pessoas, estima-se cerca de 2.084 pessoas em situação
de rua, em julho/2024, segundo o Informe Técnico do Observatório Brasileiro de
Políticas Públicas com a População em Situação de Rua – POLOS/UFMG.
Diante desse panorama, Manaus dispõe de apenas duas equipes de
Consultório na Rua (ECR). Sendo que, estas duas equipes, trabalham juntas
já que dispomos de um carro institucional (Van não adaptada). Isso em muito
dificulta a cobertura de toda a região da capital, além de limitar os serviços que
podem ser ofertados para promover resolutividade e cuidado integral à PSR.
Pelo fato de as equipes estarem alocadas em uma unidade de saúde na
região centro-sul de Manaus, a cobertura das ECR limita-se, majoritariamente,
para esta região. Um ponto positivo é que grande parte da PSR, se não a maior,
se concentra no centro de Manaus, devido a área portuária e o grande número
de feiras urbanas. Além disso, nos centros urbanos, pessoas em situação de rua
podem encontrar uma comunidade e compartilhar recursos com seus pares
nas ruas, o que oferece tanto apoio psicológico quanto benefícios práticos,
embora também possam surgir riscos (Stablein, 2011).
Desse panorama, podemos refletir sobre o que já foi dito sobre a
dificuldade de acesso aos serviços de saúde da PSR. Mesmo com a existência
de CnaR, não há suficiência de números de ECR para se fazer cumprir o que

247
está preconizado pela PNAB, que é a ampliação desse acesso. Ter suficiência de
ECR para ampla cobertura de promoção, prevenção, tratamento e reabilitação
da PSR de Manaus seria o “Plano A”. Entretanto, trabalhamos com o que
temos. A despeito dessa situação desfavorável, o CnaR de Manaus-AM traçou
um outro plano de sensibilização e captação de mulheres e outras pessoas com
útero em situação de rua para a oferta de contracepção eficaz.

O Plano B: da captação ao dia “D” de DIU

Ao iniciarmos a busca, e ainda hoje é assim, ofertamos o DIU para


todas as pessoas potenciais em realizar a contracepção. Durante as abordagens,
procuramos primeiro saber se há o interesse e, se positivo, ofertamos o DIU de
cobre. Além disso, também exploramos se conhecem e suas percepções sobre
o método, a fim de esclarecer dúvidas e explanar sobre o DIU. Quando há
negativas sobre o DIU, ofertamos outros métodos contraceptivos, conforme a
aceitação e elegibilidade de cada pessoa em situação de rua.
Para a nossa surpresa, a aceitação do DIU é alta. Diferentemente das
consultas em UBS onde muitas mulheres trazem tabus e fakenews enraizadas
sobre o método, com as mulheres e pessoas em situação de rua há uma ótima
aceitação. Isso nos fez questionar se isso não se dá pelo fato do pouco acesso à
(des)informação amplamente divulgada nas redes sociais.
Entretanto, mesmo diante desse panorama de alta aceitação, ao partirmos
para o plano de ação para realizar a inserção do DIU, encontramos, talvez, um dos
maiores desafios. Para lidar com a PSR é preciso compreender que essa população
tem uma dinâmica de migração própria e constante. Os trajetos e movimentos das
pessoas em situação de rua nos centros urbanos oferecem uma compreensão sobre
suas conexões sociais e formas de lidar com as dificuldades (Wolch & Rowe, 1992).
Esse aspecto, especificamente, é algo que também dificulta em muito o
acompanhamento de saúde e a formação de vínculo com a ECR. Pois, como garantir
que iremos encontrá-los novamente? Ora por necessidade, ora por autoproteção,
frequentemente migram de território. Se de manhã faz sombra na praça, à tarde o sol
estrala, e este motivo é suficiente para migrarem de um lugar para o outro.

248
Nesse contexto de constante migração e, também, do abuso de álcool e
outras drogas, ao realizarmos busca ativa para realizar a inserção do DIU, não
as encontrávamos ou, quando sim, estavam sob o efeito de álcool/drogas. E,
então, vocês podem estar se perguntando: por que não realizar a inserção logo
na primeira abordagem? Aproveitar a oportunidade!
Essa é uma ótima ideia. Mas, infelizmente, não dispomos de estrutura
para tal. Nosso carro não é adaptado para realizar procedimentos. E como
fazemos? Todas as segundas-feiras, a Unidade Básica de Saúde Lúcio Flávio
Vasconcelos Dias, na zona sul de Manaus, disponibilizou um consultório com
aparato ginecológico para que utilizássemos para os procedimentos.
Então todas as segundas-feiras realizamos o procedimento? No início,
colocamos muita energia para fazer tudo isso dar certo. Mas as adversidades
foram lapidando o processo de eleger as pessoas para o procedimento,
como a tentativa de primeiro criar um vínculo mais longitudinal para que
aumentássemos as chances de sucesso. Mas a verdade é que não dá para prever,
como muita coisa quando se trata da PSR. Quando funcionou, para quem
acredita, parecia ser por providência divina que determinou que desse certo.

Figura 1. Primeiras inserções de DIU realizadas pelo CnaR.

Fonte: arquivo autores, 2024.

249
Além da dificuldade estrutural, relembremos também sobre a
proporção desmedida já mencionada de número de ECR para toda a cidade de
Manaus. Enquanto CnaR, somos responsáveis por dispensar todos os cuidados
que contemplam a atenção primária à saúde da PSR. Precisamos cuidar do
alto número de pessoas com tuberculose, pessoas que vivem com HIV, pessoas
com feridas crônicas, gestantes, hipertensos, diabéticos, transtornos mentais
variados, crianças etc.
Toda essa complexidade atravessa nossa estratégia de fluxo para conseguir
ofertar e chegarmos ao dia “D” de DIU para as mulheres e pessoas com útero em
situação de rua. Assim chamado, porque realmente, é um dia muito importante
quando conseguimos driblar todos os desafios para garantir o direito de acesso a
um planejamento reprodutivo de qualidade para essas pessoas.
E não se trata somente sobre o DIU. Já foi frisado, neste relato, que nessa
experiência os números não são o que mais saltam aos olhos. Conseguimos
inserir alguns (poucos?) dispositivos intrauterinos. E conseguimos, também,
desdobramentos secundários na organização e execução dessa estratégia que
enriquecem ainda mais o significado dessa experiência, tornando os números
meros coadjuvantes. Falemos, pois, de resultados.

Dobrando os desafios, desdobrando resultados

Em pouco mais de seis meses de implementação do fluxo, foram


inseridos com sucesso quatro dispositivos intrauterinos de cobre, com apenas
um caso de hipersensibilidade que impediu a continuidade do procedimento.
Apesar do número “modesto”, considerando as adversidades estruturais,
logísticas e as condições clínicas, cada inserção é considerada uma vitória.
Do ponto de vista técnico, cada dispositivo de cobre inserido oferece
proteção contraceptiva eficaz por até 10 anos, assegurando que essas quatro
mulheres estarão protegidas contra gestações indesejadas durante esse
período. Por se tratar de um método totalmente reversível, ele permite que a
fertilidade seja restaurada rapidamente após a remoção, que pode ser realizada

250
em qualquer ambulatório, sem a necessidade de exames complementares,
ambiente cirúrgico ou marcação prévia, preservando e garantindo autonomia
reprodutiva a essas mulheres.

Figura 2. Equipe do CnaR com a primeira mulher a inserir o DIU.

Fonte: arquivo autores, 2024.

Une-se a isso, o fato de que as gestações indesejadas nessa população


não só perpetuam o ciclo de pobreza como também aumentam o risco de
complicações de saúde materno-infantil, passando a constituir um problema
de saúde pública. Além das taxas nesse grupo serem mais altas de mortalidade
materno-infantil, internação do neonato, abortos e abandono (Cutts et al.,
2015; Ditosto et al., 2021; Gelberg et al., 2009;), estima-se que no Brasil os
gastos públicos com todas as gestações não planejadas atingiram 4,1 bilhões
de reais (Sakamoto et al., 2015).
Sendo assim, cada mulher que consegue utilizar um método eficaz e evitar
uma gestação não desejada, contribui para a redução de problemas de saúde e
de gastos públicos, gerando impacto positivo tanto econômico quanto na saúde.
Além dos benefícios reconhecidos do DIU, já citados previamente, o dia dedicado
à sua inserção proporciona muitas outras oportunidades para essas mulheres, que,
em muitos casos, estavam afastadas dos serviços de saúde há anos.

251
Mesmo quando a inserção não é possível, são oferecidas alternativas
existentes no SUS de Manaus, como injeções mensais, trimestrais e preservativos.
Para além da parte reprodutiva, o Consultório na Rua aproveita esse momento
para realizar rastreamentos de gravidez e IST, coleta de citopatológico para
prevenção do câncer do colo do útero, distribuição de kits de higiene e menstrual
e identificação de outros problemas de saúde, como também, tenta viabilizar o
acesso a direitos de cidadania, como a criação do cartão SUS e o contato com a
secretaria de serviço social (SEMASC), quando necessário, para regularização
de documentos, um desafio comum nessa população.

Dignidade menstrual? Uma luta invisível de pessoas com


útero em situações de rua

Durante nossas abordagens a pessoas com útero em situação de rua


em Manaus, ao discutir questões de saúde, raramente as mulheres mencionam
problemas relacionados à menstruação. Talvez por entenderem “saúde apenas
como ausência de doença”, muitas nem percebem a menstruação como um
fator associado a saúde, a menos que estejam sofrendo com cólicas. Nesse
cenário, grande parte das informações que obtemos vem de perguntas diretas
sobre o histórico e padrão menstrual, e como lidam com esse período. A
maioria das respostas revela o uso de materiais inapropriados, como papeis ou
tecidos encontrados na rua, sem acesso a locais adequados para higiene e água,
exemplificando a pobreza menstrual descrita na literatura.
A pobreza menstrual refere-se a um fenômeno multidimensional que
afeta meninas, mulheres, homens trans e pessoas não binárias que menstruam.
Essa realidade se traduz na ausência de dignidade menstrual, onde a falta de
acesso a instalações seguras e meios eficazes de higiene impede que essas
pessoas vivenciem o período menstrual com dignidade (Magan et al., 2022).
Mesmo com a criação do Programa Dignidade Menstrual do Governo
Federal, que visa conscientizar sobre a naturalidade do ciclo menstrual e
fornecer absorventes gratuitos, a falta de condições mínimas ainda é um desafio

252
para a população em situação de rua. Para acessar os absorventes, é necessário
apresentar documento com foto, CPF e autorização no “Meu SUS Digital”. Diante
dessas exigências, será que o programa realmente alcança quem mais precisa?
Sabendo que grande parte da população em situação de rua não tem
acesso a documentação atualizada e muito menos a serviços de internet,
como eles irão conseguir acessar esses programas? Então para quem são
esses programas? Parece que o foco está em apresentar números, e aquelas
pessoas sem documentos não geram números, e aos olhos do sistema, elas
sequer existem como pessoas. E aqui retomamos o trecho, que reflete muito
bem a realidade da PSR, da crítica musical de Gabriel, O Pensador (1993):
“Eu não tenho nome, eu não tenho identidade, eu não tenho nem certeza se
eu sou gente de verdade”. Nossa percepção é que, ao mesmo tempo em que se
implementam programas e políticas de acesso, também se criam barreiras, que
perpetuam a falta de dignidade menstrual para os mais vulneráveis.
Nesse cenário, embora função prioritária do Consultório na Rua seja
promover a autonomia desse grupo, fornecendo informações e facilitando
o acesso a programas como o de Dignidade Menstrual, a dinâmica e a
celeridade da rotina das pessoas em situação de rua dificultam essa tarefa.
Como resposta emergencial, o CnaR, por meio de doações limitadas de
organizações da sociedade civil, faculdades e seu próprio orçamento, acaba
distribuindo kits de higiene, incluindo absorventes, para garantir o mínimo
de assistência e dignidade a essas pessoas.

O DIU foi só o começo: perspectivas futuras do trabalho

Da concepção, formulação e implementação do fluxo de DIU no CnaR,


foram muitos obstáculos identificados e, que até hoje, são enfrentados para
garantir o mínimo de dignidade em saúde reprodutiva e sexual para pessoas em
situação de rua. Longe de assumir que atingimos o ideal, propõe-se diariamente
novas formas de aprimorar o fluxo, a captação, e de individualizar o cuidado de
forma ampla e integral, pautado no conceito de Educação Permanente.

253
A educação permanente tem como objetivo transformar e qualificar
a atenção à saúde e às práticas de educação em saúde, a partir de uma
problemática do processo de trabalho, que quando solucionada, fortalece o
trabalho articulado entre as esferas de gestão, ensino, serviço e comunidade
(Ferreira et al., 2019). Dessa forma, entendemos o Consultório na Rua como
um instrumento capaz de gerar discussões e iniciar mudanças que, embora
“modestas”, podem ser o ponto de partida para grandes transformações.
Com a consolidação do fluxo de inserção de DIU no Consultório na
Rua, voltado para populações vulneráveis, abre-se um horizonte promissor para
avanços ainda mais significativos na saúde reprodutiva dessas comunidades.
Este marco, que trouxe visibilidade e promoveu a autonomia sobre a saúde
reprodutiva das mulheres em situação de rua de Manaus, serve como um
alicerce para a expansão de outros métodos contraceptivos, como o implante
subdérmico e o DIU com levonorgestrel.
Ao garantir que essas tecnologias sejam acessíveis e rotineiras no
âmbito da atenção primária, busca-se não apenas a diversificação das opções
contraceptivas, mas também a efetiva incorporação de práticas de cuidado que
respeitem as particularidades e necessidades de cada indivíduo, assegurando
um atendimento mais inclusivo e eficaz. Entretanto, essa ampliação não exclui
a necessidade um atendimento global e universal nas Unidades Básicas de
Saúde, o que poderia minimizar a necessidade de ampliar as unidades móveis.
Por fim, os avanços não podem ocorrer isoladamente, dentro dos
CnaR. É essencial que as melhorias no atendimento às populações em situação
de rua e outras vulneráveis continuem sendo uma prioridade, com foco em
reduzir as barreiras de acesso, combater a desumanização e a marginalização
que esses grupos enfrentam diariamente.

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Wright, J. D. (1991). Prevalence of Alcohol and Drug Problems. American Psychologist.

256
Educação em saúde para professores
e funcionários da educação básica e
recreação infantil
Leda Lima Sobral
Gisele Torrente
Elen Palmeira Assunção
Eduardo Fernandes

É comum a sociedade vivenciar um cenário de risco com desfecho


negativo e se incomodar. Esse incomodo pode evoluir para movimentos
com foco na melhoria ou adequação das políticas públicas e, aqui cita-se a
lei N. 13.722 de 04 de outubro de 2018 que torna obrigatória a capacitação
em noções básicas de primeiros socorros de professores e funcionários de
estabelecimentos públicos e privados de educação básica e estabelecimentos
de recreação infantil (Brasil, 2018a).
A decisão ministerial é corroborada pela literatura que aponta numa
revisão sistemática incluindo mais de 7 mil professores escolares demonstrou
que esses profissionais possuem conhecimento insuficiente sobre emergências
nas escolas. Apesar da inegável importância que têm os professores e demais
funcionários nas escolas diante de situações de urgência, não há registro formal
na literatura sobre o conhecimento e as atitudes desses profissionais no âmbito
das escolas brasileiras (Alsulami, 2023)
Pontua-se em um estudo nacional que a internação por causas
externas corresponde ao 3º fator etiológico e ainda a sua morbi-mortalidade
em crianças de um a nove anos apresentam maior risco nos envenenamentos,
sufocamentos e afogamentos com predomínio do sexo masculino. Revelou que
37,99% das crianças de um a quatro anos morreram por afogamento; 27,27%
em acidentes de trânsito e 6,82% atropeladas(Valle, Morais, & Pacheco, 2021).

257
Essas situações são relativamente comuns nas escolas e potencialmente
fatais, como a obstrução da via aérea por corpo estranho (“engasgo”), devem
receber especial atenção. Em um ensaio clínico randomizado, foi demonstrado
que um grupo de crianças treinadas foi superior quanto à capacidade de
atendimento quando comparado a outro grupo de crianças não treinadas,
mantendo-se essa superioridade em termos de qualidade de atendimento 2
meses e 7 meses após a capacitação (Tse, Plakitsi, Voulgaris, & Alexiou, 2024).
Outra revisão sistemática examinou o conteúdo, as práticas e a avaliação
das intervenções de primeiros socorros nas escolas de ensino primário e sua
efetividade. Esse trabalho ratificou a importância do treinamento, embora
tenha destacado também que a efetividade das manobras de ressuscitação
cardiopulmonar realizadas por crianças menores de 11 anos foi prejudicada
pela profundidade insuficiente das compressões, possivelmente relacionada
com os atributos físicos das crianças socorristas (Tse et al., 2024).
Dessa forma, compreende-se que é fundamental que esses aprendizes,
alunos e/ou professores, contribuam ativamente nesse processo de ensino-
aprendizagem. Pensando nisso, um grupo de pesquisadores explorou a visão
desses alunos e seus professores na construção de um curso voltado para o
atendimento de urgências no ambiente escolar, tendo apontado, a partir desse
olhar, relevantes contribuições para o aprimoramento de cursos tradicionais
de suporte básico de vida (Tse et al., 2024).
Um ponto fundamental que ainda carece de pesquisas é o
acompanhamento dessas ações educativos quanto a sua real efetividade. Em
outro estudo de revisão sistemática recente buscou compreender a variedade
de elementos para essa avaliação de atributos, incluindo as habilidades práticas,
o conhecimento e as perspectivas emocionais dos envolvidos, concluindo que
uma padronização dessas métricas e os seus métodos de avaliação ainda são
necessários (Tse et al., 2024).
No Brasil, foi possível identificar na literatura uma iniciativa que
envolveu profissionais atuantes no Serviço de Atendimento Móvel de Urgência

258
(SAMU) com o intuito de elaborar um instrumento educativo direcionado
especificamente às pessoas em idade escolar. Ainda que se trate de uma
experiência mais antiga, sua metodologia pode ainda ser válida, sendo passível
de revisão e atualização (Mota & De Andrade, 2015).
A saber, o SAMU é um componente da portaria N. 2048 de 2002
que compreende a política pública de atenção as urgências e emergências e
caracteriza-se como atendimento pré-hospitalar móvel. Tem como objetivo
atender pessoas em situações de urgência e emergência ocorridas no ambiente
extra-hospitalar. Por fazer parte do sistema único de saúde (SUS) e atendendo as
portarias ministeriais, possui seu núcleo de educação em urgência (Brasil, 2002).
O SUS além de atendimento à saúde possui a Política Nacional
de Educação Permanente em Saúde (PNEPS) com foco na capacitação e
qualificação dos seus trabalhadores, porém não exclusiva para eles. Importante
salientar que nos Núcleos de Educação Permanente em Saúde (NEP) os temas
são norteados pela expertise profissional do serviço (Brasil, 2018b).
Sendo assim, juntando as prerrogativas ministeriais da Lei Lucas, o
componente educacional do SUS e as relações amigáveis e colaborativas
entre as secretarias municipais, este texto continua com a apresentação da
experiência das ações educativas desenvolvidas pelo NEP do SAMU Manaus
nas creches, escolas municipais da educação infantil e ensino fundamental.
As atividades iniciaram-se com a aproximação dos servidores das
duas secretarias a Secretaria Municipal de Saúde (SEMSA) e Secretaria
Municipal de Educação (SEMED) para tratativas administrativas e
burocráticas. Em meados de maio de 2024 e após a oficialização, realizou-se
uma reunião remota para definição dos pontos focais, alinhamento sobre
quais os temas seriam abordados, quantitativo de participantes por turma e
estratégias metodológicas.
A SEMED se responsabilizou pela ficha de cadastro e dos seleção
participantes considerando a capacidade de multiplicação das informações,
organização das escolas, espaço físico e equipamentos de mídia e som

259
(computador, data show, microfone e caixa amplificadora). Na ficha
continha dados sociodemográficos, de identificação, contato e um termo de
compromisso com o projeto de capacitação e a SEMED.
As capacitações ocorreram nos meses de maio, junho e julho de 2023
com aulas presenciais expositivas, dialogadas e momento para atividade
prática em dois temas utilizando 16 simuladores inanimados (baixa fidelidade)
denominados meio torso adulto, meio torso infantil e bebê. Essas aulas foram
ministradas por um total de 10 profissionais do SAMU sendo enfermeiros e
técnicos de enfermagem, sendo quatro por encontro, as aulas tiveram duração
de 3 até 4 horas com intervalo de 15 minutos e todos os temas foram abordados
no mesmo dia, inclusive a parte prática.
Ao final da aula a SEMED disponibilizou um QRCODE com acesso ao
formulário via google forms para apontamentos relacionados ao palestrante,
cursista/participante e organização. Esses apontamentos obedeceram a uma
pontuação de 0 a 10, considerando zero menor valor e dez maior valor. Para os
palestrantes foram avaliados os itens de pontualidade, metodologia, domínio
do conteúdo, relação do conteúdo com o cotidiano, exposição atrativa e
postura respeitosa e aberta ao diálogo. Já para os cursistas foram avaliados os
itens de pontualidade, participação, respeito e interação.
Relacionado à organização, foram elencados os itens de ambiente
(limpeza, clima e acolhimento), alimentação e respeito. Ainda neste formulário,
foi oportunizado ao servidor que pontuasse os pontos positivos e pontos de
melhoria. Como comprovação da capacitação, o SAMU Manaus certificou
cada escola envolvida no projeto.
A capacitação ocorreu no período de junho e julho em auditórios das
sete zonas da cidade. Foram realizados 21 encontros presenciais, capacitando
512 instituições distribuídas nas zonas norte, sul, leste, oeste), centro-oeste,
rural e sede. Participaram 1523 pessoas: professores, pedagogos, psicólogos,
cozinheiras, copeiras e administrativos que atendem a crianças de um a quinze
anos, conforme o Quadro 1.

260
Quadro 1. Distribuição do quantitativo de instituições por divisão distrital zonal
(DDZ) de atuação e profissionais capacitados, Manaus.

ENSINO FUNDAMENTAL
DDZ INSTITUIÇÃO PROFISSIONAIS
SEMED 11 11
RURAL 26 52
CENTRO SUL 37 74
OESTE 50 100
NORTE 41 82
SUL 28 56
LESTE II 40 80
LESTE I 34 68
PARCIAL 267 523
EDUCAÇÃO INFANTIL - CMEI
DDZ INSTITUIÇÃO PROFISSIONAIS
RURAL 47 56
CENTRO SUL 22 42
OESTE 37 77
NORTE 23 41
SUL 37 63
LESTE II 24 49
LESTE I 31 59
PARCIAL 221 387
CRECHES MUNICIPAIS E CONVENIADAS
DDZ INSTITUIÇÃO PROFISSIONAIS
RURAL 0 0
CENTRO SUL 07 151
OESTE 02 61
NORTE 02 64
SUL 07 167
LESTE II 03 88
LESTE I 03 82
PARCIAL 24 613
TOTAL 512 1523

Fonte: Elaborado pelos autores, 2024.

261
Os temas teóricos abordados foram o desmaio, febre, intoxicação,
convulsão, epistaxe, ferimentos, fraturas, luxação, entorse, distensão e
aberto a discussão para casos de violência, uso e abuso de drogas lícitas e
ilícitas. Referente a parte teórica e prática ministrou-se sobre o engasgo e parada
cardiorrespiratória. As aulas aconteceram no período vespertino com duração
de até quatro horas. Durante as aulas foi permitida e estimulada a participação
dos profissionais com exposição de experiencias pessoas e casos vivenciados.
Na parte teórico-prática da manobra de desengasgo foi ensinado o
procedimento para a adulto, criança e bebê. Para o evento relacionado ao usuário
adulto realizou-se a demonstração pelos palestrantes e posteriormente foram
constituídas duplas por afinidade e, estas executaram a manobra entre si sob
supervisão. Para um possível evento acometendo criança ou bebê a mesma foi
demonstrando pelo palestrante com o auxílio dos simuladores e os participantes
puderam executar as manobras por adesão e supervisão. O mesmo ocorreu
para o tema de parada cardiorespiratória no bloco teórico prático. Esses dois
momentos foram considerados o ápice das atividades da tarde com empenho
dos participantes interação, discussão e execução das manobras.
Sobre a avaliação feita via QR Code foi obtida a pontuação máxima
em todos os tópicos e itens. Quanto aos pontos positivos foram citados sobre
as dinâmicas, seleção dos temas, conhecimento dos instrutores e interação
entre os grupos. Sobre os pontos de melhoria citou-se o local com melhor
acessibilidade e estacionamento, oportunizar a todos na realização das
atividades e o tempo de duração insuficiente.
A capacitação promovida vem em consonância com as políticas
públicas e, a educação em saúde realizada em conjunto com a comunidade
é item importante. Autores afirmam que esta estratégia participativa gera
conhecimento, segurança, autogestão e modificação no contexto social
(Rocha et al., 2021).
Considera-se importante o fortalecimento da articulação intersetorial
entre a saúde e a educação como proposta de melhoria da qualidade de vida

262
dos escolares com atuação sobre os seus determinantes sociais (Rumor,
Heidemann, Souza, Manfrini, & Souza, 2022).
Quando se olha para o tempo de duração das atividades pontua-se
como itens das ações do Programa de Saúde na Escolas (PSE) que as ações
de saúde não devem se sobrepor as ações do professor, o espaço físico a ser
utilizado deve respeitar as estratégias metodológicas, as intervenções do
programa devem ser pedagógicas e em sintonia com as ações pedagógicas da
escola e por último, os educandos preparados para execução das atividades
(Brasil, 2011).
A adoção de estratégias teórico-práticas de ensino vem sendo
fortalecida ao longo dos anos e com importantes melhorias na tecnologia.
O uso de simuladores na saúde é uma realidade há mais de 15 anos com
evolução para o uso de realidade virtual aumentada, metaverso e inteligência
artificial. Estudos demonstram uma curva de aprendizagem crescente e com
desenvolvimento das soft skills (Kumar et al., 2020; Lamiani, Mistraletti,
Moreschi, Andrighi, & Vegni, 2021).
A presença dos profissionais de saúde como agentes transformadores
de conhecimento é positiva e contribui para crescimento social. Na escola são
realizadas orientações referentes a educação sexual, prevenção de drogas e
outros temas, como bullying. No entanto, é considerado um cenário a ser melhor
explorado com propostas intersetoriais de promoção de saúde e bem estar
(Baroni & Silva, 2022; Carloni, Dal Bosco Silva, & Rodrigues da Silva, 2021).
A escola é uma estrutura com atores no processo de ensino
aprendizagem, mediados por estratégias metodológicas, com temáticas
pactuadas pela gestão. No entanto, cabe ressaltar que a escola é um espaço de
discussão ético, político e social com enorme capacidade de transformação de
saberes e troca de conhecimento (Santos & Macedo, 2022)
O projeto de capacitação teve seu início baseado na Lei Lucas e contou
com a interação interinstitucional com a finalidade de garantir a segurança,
conforto e bem-estar dos colaboradores e escolares. Os temas, as estratégias

263
adotadas foram balizadas por instrumentos metodológicos que garantiram o
processo de ensino aprendizagem e participação ativa dos inscritos. Acredita-
se que o ambiente oferece possibilidade de expansão dos temas e comunidade
visando atingir o maior número de pessoas e temáticas pertinentes.

“Ninguém educa ninguém, ninguém educa a si mesmo, os homens


se educam entre si mediatizados pelo mundo.” Paulo Freire

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​​

265
Agente indígena de saúde: uma rede
viva no contexto urbano da zona norte
de Manaus
Aline Aparecida Ferreira Artini
Beatriz Rodrigues Campinho
Francinara Batista Neves Lima
Iranilson Militão Gabriel
Izomaria dos Santos Braga
Júlio César Schweickardt
Sâmia Roberta da Silva Torres

Introdução

A Política Nacional de Atenção Básica – PNAB tem sido a melhor


estratégia para aplicação e ou aperfeiçoamento as práticas de cuidado nos
territórios, espaços onde se afloram as injustiças e as desigualdades sociais
que devem ser corrigidas pelas políticas públicas, pelo fato de que o Estado
possui a autoridade de tomar medidas para aumentar a igualdade. A PNAB
tem se fortalecido com a atuação de alguns profissionais da Atenção Primária
à Saúde (APS), particularmente, o Agente Indígena de Saúde (AIS), que vive
em espaço urbano, onde exerce o cuidado em saúde de todas as pessoas em sua
comunidade e área de abrangência.
O Sistema Único de Saúde (SUS) está garantido na Constituição
Federal de 1988 para todas as pessoas tenham direito à saúde em território
brasileiro. Considerando isso, discorremos sobre a importante atuação
do AIS de etnia Macuxí na construção de redes vivas para a produção do
cuidado no território das comunidades indígenas da zona norte de Manaus.
A atuação desse profissional na construção dessas redes se alinhou com seus
pares, o que tornou possível a prevenção e controle de doenças e agravos, por
meio de visitas domiciliares, realização de atividades educativas individuais

267
e coletivas, resultando em ações de serviços em saúde no território e,
posteriormente, ter o acompanhamento de profissionais de saúde qualificados
na atenção primária à saúde.
Esclarecemos ao leitor que a partir da atuação do AIS em território urbano
das comunidades indígenas da zona norte de Manaus, em tempo de pandemia
Covid 19, houve maior visibilidades de outras doenças e condições de saúde dessa
população. Ou seja, foi possível construir o primeiro quadro epidemiológico da
saúde indígena da zona norte. Demonstraremos algumas atividades dialogadas
realizadas por profissionais de saúde, em espaços dessa população.
A experiência fortaleceu a valorização do AIS no território e sua
capacidade de produzir redes. Temos como fundamentação a micropolítica do
trabalho vivo em ato (Merhy, 2002) dos AIS, buscando priorizar as narrativas
de um AIS de etnia Macuxí6, que sofreu processo de desterritorialização e
reterritorialização, com posterior inserção na APS na gestão do cuidado em
saúde. Estas, em meio a realidade epidemiológica dos territórios, se alinharam
a promoção e prevenção da saúde dessa população, fortalecendo temáticas da
tuberculose e nutrição, por meio dos processos de trabalhos executados por
profissionais de saúde, respeitando os direitos à saúde dos povos originários.
Redes Vivas podem ser entendidas como a forma de produzir o cuidado, em
meio a conexões entre usuários, profissionais de saúde, gestores e a comunidade,
comprometidos com a prevenção, sustentabilidade, desenvolvimento e promoção
da saúde, com valorização de saberes e práticas em saúde de forma contínua.
Quanto ao objetivo dessa experiência, pretendeu-se destacar alguns
resultados dos processos de trabalho do AIS Macuxí, como a identificação de
agravos evitáveis e não evitáveis na 1ª mostra epidemiológica dos territórios
das comunidades indígenas da zona norte de Manaus, construída juntamente
com seus pares, valorizando as Redes Vivas alinhadas à produção do cuidado
em território indígena urbano. Assim, a partir da construção da mostra
epidemiológica, foi estabelecido estratégias para a construção e execução
6   População indígena sul-americana, estão situados na região circum-Roraima,

268
de plano de ação nas comunidades indígenas, particularmente em razão da
identificação de pessoas obesas e pessoas acometidas de tuberculose (Tb),
Hanseníase entre outros agravos.
Quanto a metodologia, utilizamos informações de caráter
qualitativos, coletados a partir das narrativas do AIS Macuxi, com entrevistas
semiestruturadas. Desta forma, a seguir, compartilhamos com o leitor os
resultados da construção de redes vivas na APS, por meio do trabalho do AIS,
e enfatizar que essa construção se assemelha a um rizoma, no contexto do SUS.
Destacamos que a experiência apresentada nesta escrita está pautada
em pesquisa de Mestrado, intitulado Redes Vivas: o processo de trabalho de um
agente indígena na atenção primária à saúde, que foi desenvolvido a partir do
projeto “ Saúde da população indígena em contexto urbano: desafios da atenção
primária no município de Manaus”, aprovado pela Comissão de Ética e Pesquisa,
sob o parecer nº 5.200.890, Versão 05; CAAE:48611021.5.000.5020, tendo como
Instituição Proponente e patrocinadora o Centro de Pesquisa Leônidas e Maria
Deane -Fundação Oswaldo Cruz, coordenado pelo Dr. Rodrigo Tobias de Sousa
Lima. Esta pesquisa aconteceu no período de 2020 a 2023, nos territórios de 25
comunidades indígenas da Zona Norte, em Manaus – Amazonas.

Os direitos dos povos originários

Iniciaremos enfatizando os direitos dos povos originários, pontuando


que a população indígena deixa de ser tutelada pelo estado para ser detentora
de direitos a partir da promulgação da constituição federal de 1988, em que,
com base no art. 231 “são reconhecidos aos índios sua organização social,
costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras
que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e
fazer respeitar todos os seus bens” (Brasil, 1988, p.127).
Na ocasião, as ações de saúde direcionada a essa população, até
então, eram executadas por equipes volantes, ao qual a Delegacias Regionais
da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (FUNAI) era responsável por

269
supervisionar. Pontes (2013, p. 61) destaca que “até 1999, a oferta de serviços
de atenção à saúde para os povos indígenas ocorria de forma esporádica,
desenvolvida por equipes que percorriam terras indígenas realizando assistência
médica e outras ações pontuais”. Quanto a universalidade e igualdade ainda não
eram validados para os povos originários, esse cenário mudou com a Lei Arouca.
Sobre a Lei Arouca de nº 9.836 de 23 de setembro de 1999, pode-se afirmar que
foi um marco bastante importante no âmbito da saúde da população indígena
Nesse contexto, é fundamental enfatizar o proposto pelo Conselho dos
Direitos Humanos no dia 29 de junho de 2006 e aprovado pela Assembleia
Geral da ONU em 13 de setembro de 2007, que tornou oficial na 107a Sessão
Plenária da ONU em Nova York, a Declaração sobre os Direitos dos Povos
Indígenas, que é um documento da Organização das Nações Unidas (ONU)
que estabelece os compromissos que os Estados assumem com base nos
propósitos e missões da Carta das Nações Unidas.
A Declaração, com 46 (quarenta e seis) artigos, reconhece a
importância do respeito para todos os povos e declara que as crenças baseadas
em superioridade racial, religiosa, étnica ou cultural são racistas e condenáveis.
Reafirma o direito dos povos indígenas de serem livres de toda a forma de
discriminação. Além disso, a resolução enfatiza a necessidade de proteger
os direitos dos povos indígenas através da elaboração de tratados, acordos
e políticas que reduzam os problemas causados pela exploração e destaca a
injustiça histórica que os nativos sofreram como resultado da colonização. Por
fim, destaca o papel dos povos indígenas no desenvolvimento sustentável, na
gestão eficaz de recursos ambientais e no compromisso da ONU de proteger os
direitos dos povos indígenas.
A mobilização dos povos originários, inclusive de etnias estrangeiras
têm sido permanentes desde a pandemia de Covid 19. Em particular, a cidade
Manaus absorveu um número significativo de indígenas em busca de melhores
condições de vida e de cuidados em saúde. Em 2024, a cidade conta com pouco
mais de 71 mil pessoas indígenas (IBGE, 2022).

270
O protagonismo do AIS em contexto urbano

Em tempo de pandemia a Secretaria Municipal de Saúde (SEMSA)


contratou 11 profissionais na categoria de Agente Indígena de Saúde (AIS),
sendo 05 destes, para atuar na zona norte de Manaus. O AIS é o profissional
que o chefe da aldeia, cacique, procura para relatar alguma necessidade do seu
povo. Sabemos nas aldeias, o agente encaminha as demandas para o Polo Base,
para que seja atendida a necessidade ou realizada a referência para outro nível
de atenção à Saúde no SUS. Por razões diversas, essa população tem sofrido
um deslocamento para áreas urbanas. Esse cenário foi notório em tempo de
pandemia, na cidade de Manaus.
O AIS que vive em contexto urbano possui novos desafios que vão
além dos desafios nas aldeias. Os AIS desempenham necessitam conhecer as
comunidades, na maioria multiétnicas, os usuários, estabelecendo conexões e
escutando as demandas. O seu papel é de articulação entre a pessoa indígena,
profissionais de saúde e as instituições de saúde. Os AIS são vistos como
detentores de um saber específico, atuando como profissionais de saúde nas
comunidades indígenas, urbanas e não urbanas, alicerçando vínculos com essa
população, sendo capaz de construir redes para acesso aos serviços de saúde
(Artini, 2023; Diehl et al., 2012; Garnelo, 2020), considerado as diversidades
sociais e culturais.
No contexto urbano da zona norte de Manaus, foi realizado o
cadastramento das comunidades indígenas, tendo a importante atuação dos
AIS vinculados ao Distrito de Saúde Norte. A partir do Cadastro Individual
realizado por estes profissionais nos territórios das comunidades indígenas
trouxeram as demandas e as condições epidemiológico da área.

271
Figura 1. AIS Macuxí no Teatro Amazonas.

Fonte: arquivo AIS- DISAN- 2021.

O AIS fez o entrelaçamento, da rede de cuidado, unindo e permitindo


o acesso da comunidade indígena, aos serviços de saúde e contribuindo
na comunicação entre instituições (Artini, 2023; Cordeiro et al., 2020),
constituindo uma Rede Viva na atenção primária à saúde. Ressaltamos que a
atuação do profissional AIS e seus pares no território urbano da zona norte de
Manaus, até outubro de 2024, tem contribuído com a integralidade do cuidado,
possibilitando ir além dos muros biomédicos, com foco na valorização cultural
e saberes dos indivíduos no território do qual faz parte para a produção do
cuidado em saúde (Artini, 2023; Viegas & Penna, 2015).

Desterritorialização e reterritorialização de um AIS Macuxi


durante a pandemia de Covid-19

Haesbaert (2010) afirma que o processo de desterritorialização e


reterritorialização é um movimento complexo de territorialização, que inclui
a vivência concomitante de diversos territórios. Esse processo pode ser

272
considerado como uma das marcas fundamentais de no século XXI. Assim, é
válido pontuar para os leitores que essa movimentação possibilitou a interação
de um AIS da etnia Macuxi, oriundo da fronteira de Roraima, com moradores
indígenas de diversas etnias que vivem nos territórios das comunidades étnicas
e multiétnicas da zona norte da cidade de Manaus.

Figura 2. Processo de cadastramento das comunidades indígenas

Fonte: AIS – DISAN, 2022.

De acordo com Haesbaert, nos processos de desterritorialização/


reterritorialização, estão imbricadas as dimensões política e cultural. Estes
podem produzir a transformação de marcos históricos, identidades, relações
políticas e econômicas, alterando os antigos laços/fronteiras econômico-
políticos de integração. Assim, as pessoas e grupos grupos sociais passam por
mudanças significativas no processo de desterritorialização e reterritorialização
nos contextos migratórios, especialmente da população indígena que migra
dos seus territórios originários para a cidade.
Durante a experiência vivida no cenário pandêmico, na cidade
de Manaus, foi importante considerar os impactos do processo de
desterritorialização e reterritorialização, entendido como linha de fuga, segundo
as narrativas vivências por um dos AIS de etnia Macuxi, que o impulsionou

273
a desterritorializar-se de seu lugar de origem, comunidade indígena Raposa I
em Normandia RR (Fronteira), e reterritorializar-se na capital do Amazonas.
Posteriormente se tornou um profissional singular na produção de rede de
cuidado nas múltiplas comunidades indígenas da zona norte de Manaus.
Ressaltamos que a multiplicidade de etnias no espaço urbano foi primordial
a importância de integração e interação desses profissionais no território das
comunidades indígenas.
Para o AIS Macuxí, o processo de reterritorialização mostrou-se
árduo, devido as necessidades de adaptação, aceitação e vivência em um
novo universo coletivo, sendo indispensável o ato de esvaziar-se em meio
as diversidades socioculturais para absorver o novo. Assim, o trabalho em
saúde significou construir novas redes vivas que promoveu novas formas de
se relacionar com o território. A ideia de rede viva está baseada em Merhy
(2014), que entende que a produção de redes é um modo de construir
relações e conexões entre as pessoas e o coletivo, promovendo novos modos
de viver. No contexto da produção do cuidado no território das comunidades
da zona norte de Manaus, foi possível a partir do trabalho do profissional
AIS, observar melhor resultado no tecer das redes para garantir a prática do
cuidado em saúde.

Sobre as lentes de uma rede viva: micropolítica da gestão


do trabalho

A presente experiência mostrou que a micropolítica da gestão do


trabalho e dos processos de cuidado, fazem parte do trabalho vivo em territórios
específicos da APS. Feuerwerker (2014, p. 68) pontua sobre o modo de se
pensar a política e a gestão em saúde em meio as complexidades do mundo:
“Todos fabricam políticas em seu cotidiano de trabalho”. Foi notável observar
como o trabalho foi executado nas comunidades indígenas, pelos AIS, em
que se estabeleceu uma relação entre os sujeitos multiétnicos, imbricados na
situação de cuidado.

274
Segundo Franco e Merhy (2013), a micropolítica é sempre um campo
de relações de poder na produção cotidiana do cuidado. Como resultado,
estudar o conceito de trabalho vivo em ato, criado por Mehry, como o
potencial de mudar as práticas diárias. Nesse contexto, o profissional de saúde
deve ter uma percepção para além da pessoa, englobando também aspectos
culturais, sociais e ambientais que possam contribuir para a continuidade
desse movimento. Para melhor sustentabilidade dessa Rede Viva é importante
conhecer a realidade do território sob o qual o profissional irá atuar, trazendo a
comunidade para dentro do serviço, com o intuito de identificar as demandas
que afetam essas pessoas (Merhy et al., 2014).
No território da zona norte de Manaus, o AIS e seus pares de etnias
Tukano, Mura, Tikuna, realizaram o ato da escuta para compreender as
necessidades das pessoas das comunidades indígenas, respeitando as dimensões
culturais e sociais dos indivíduos e reconhecendo a importância da autonomia
no processo do cuidado. Ou seja, entenderam que o cuidado é partilhado
entre os atores sociais, que juntos o constroem nas Redes de Atenção à Saúde
(Hadad & Jorge, 2018). Essa interação para a construção dessas redes partiu do
AIS, no território das comunidades indígenas multiétnicas. A conexão entre
pessoas plurais produziu diferentes conexões, significados, relações, afetando
a vida de forma direta ou indireta (Abreu Filho, 1998).
De acordo com Merhy et al. (2014), os usuários e a comunidade
da qual fazem parte são exemplos de Redes Vivas, pois estão em constante
movimento, construindo, compartilhando saberes e cuidados em meio a
diversidades, acolhendo as vivências, criando conexões, que se manifestam
em múltiplas possibilidades (Artini, 2023; Merhy et al., 2014). Ressaltamos
que essas redes surgem a partir das demandas dos usuários e atuam por um
tempo determinado para solucionar a necessidade, podendo permanecer ou
não, como por exemplo, a rede vigilância epidemiológica.

275
Vigilância em saúde: uma rede nos territórios das “aldeias
urbanas” da zona norte de Manaus

A vigilância em saúde possui como componente a vigilância


epidemiológica que tem por finalidade estabelecer a detecção e prevenção de
doenças e agravos transmissíveis à saúde e seus fatores de risco no território.
Para isso, o processo de trabalho do Agente de Endemias (ACE), Agente
Comunitário de Saúde (ACS) e Agente Indígena de Saúde (AIS) devem estar
alinhados, especialmente em tempo de pandemia Covid-19.
Em 2020, uma equipe de pesquisadores da Fiocruz e da Fundação
Getúlio Vargas (FGV) elaborou um relatório sobre o risco de disseminação
da Covid-19 em populações indígenas, analisando o potencial de
propagação da Covid-19 nessa população com base nas questões geográficas
e sociodemográficas que as tornam mais vulneráveis. Segundo o relatório,
a chegada da Covid-19 representou um desafio significativo para as
comunidades indígenas, as autoridades de saúde e a sociedade em geral,
no sentido de garantir a proteção e prevenção contra essa nova doença, a
qual pode trazer impactos significativos para a saúde e o bem-estar dessas
populações. Do ponto de vista epidemiológico, de acordo com Andrey
Moreira Cardoso, os povos indígenas são mais vulneráveis, estando em
desvantagem econômica, social e de saúde em relação a outros grupos nas
mesmas localidades, inclusive no Brasil.
A contratação dos AIS, pela SEMSA, em tempo de Covid-19, fortaleceu
a vigilância epidemiológica nos territórios da zona norte, com identificação e
notificação de agravos, tendo em vista a necessidade de ação conjunta com os
agentes de endemias, em tempos distintos, em que sinalizam as demandas de
vigilância nos territórios. De forma geral, as comunidades indígenas da zona
norte de Manaus estão localizadas em lugares de difícil acesso, daí a necessidade
de planejamento estratégico para alcançar essas áreas, para sinalização e
realização das práticas dos profissionais capacitados, em relação a identificação
de agravos e coleta de materiais com possível risco de contaminação.

276
A experiência, alinhada ao setor de Vigilância Epidemiológica / DISAN
e Núcleo de Ações Estratégicas /DISAN, contribuiu para dar visibilidade
ao contexto epidemiológico dessas comunidades. No período de 2020/21,
durante a pandemia, até o mês de abril/ maio de 2023, foram coletados dados
e construído a 1ª mostra com o perfil epidemiológico das comunidades
indígenas da zona norte de Manaus. Como segue:

Quadro 1. demonstrativo do Perfil Epidemiológico das Comunidades Indígenas do


Distrito de Saúde Norte.

10 60 Ges-
Nome da Famí- Pes- <6 <2 <5 5a 20 a
Nº M F a 19 ou tan-
Comunidade lias soas M A A 9A 59 A
A +A tes

Centro
Comunitário
dos TIKUNAS
1 27 118 55 63 0 3 5 16 29 60 6 1
– Comunidade
Indígena
Wotchimaucû
2 Paxiubal 13 47 20 27 1 7 7 3 8 19 2 0
Maloka
Bayaroá –
3 21 101 52 49 0 1 6 8 22 54 10 0
Comunidade
São João
Comunidade
4 Povo Indígena 78 241 126 115 0 11 20 30 54 111 15 0
Nova Vida
Comunidade
5 Indígena 33 113 51 62 0 3 10 12 28 50 8 0
Ineamãnatã
Comunidade
Grupo de
6 Famílias 18 51 24 27 0 0 7 5 10 28 1 0
Indígenas do
Monte Horebe
Comunidade
do Povo Deni
7 6 23 11 12 0 1 2 4 7 9 0 0
da Cidade de
Deus
Comunidade
8 Povo Indígena 53 175 85 90 3 16 4 20 36 83 13 0
do Sol Nascente

277
Comunidade
Indígena
Kokama
9 Imakana Riai 38 133 66 67 0 2 11 16 31 66 7 1
Kiwikana
– Irmãos e
Primos
Comunidade
10 Raimundo 32 128 51 77 0 6 9 16 32 64 1 1
Mura
Comunidade
11 37 109 48 61 2 6 6 11 23 57 4 0
Aspira
Comunidade
12 Centro Cultural 16 59 27 32 0 2 3 8 15 28 8 2
Lua Verde
Comunidade
Indígena
13 34 106 55 51 0 7 1 13 21 59 5 2
Kokama Uka
Tapuya
Comunidade
14 Indígena 20 76 31 45 2 7 6 5 27 28 1 0
IFICAM
Comunidade
15 Pupyngare 59 196 73 123 5 9 7 22 51 92 10 2
Anawa Sâkyre
Comunidade
16 32 95 43 52 1 1 3 7 15 58 10 1
Dois Irmãos
Comunidade
17 79 271 127 114 2 14 17 21 61 139 17 5
Orquídea
Comunidade
18 25 84 40 44 0 2 9 9 20 42 2 0
Ritamakuara
Comunidade
19 29 79 36 43 0 2 5 9 13 42 8 0
Onça
Comunidade
20 58 164 83 81 3 6 12 16 34 86 7 4
Waina Parque
Comunidade
21 29 92 36 56 4 6 10 6 19 38 9 2
Mainuma
Comunidade
22 130 430 209 221 2 7 25 35 91 241 30 0
Tataiara
Total 867 2891 1349 1542 25 119 185 292 647 1454 174 21

Fonte: arquivo AIS -NUAES – DISAN -2022.

278
Peso Uso AVC
Nome da Uso de Diabé-
Nº Fumantes do HTA DER-
Comunidade drogas ticos
álcool RAME
Abaixo Adequado Acima
Centro
Comunitário
dos TIKUNAS
1 0 0 4 1 3 0 2 1 0
– Comunidade
Indígena
WOTCHIMAUCÜ
2 Paxiubal 4 0 0 8 9 0 1 0 0
Maloka Bayaroá –
3 Comunidade São 6 0 12 9 15 2 0 2 0
João
Comunidade Povo
4 0 0 7 30 45 3 7 9 0
Indígena Nova Vida
Comunidade
5 Indígena 6 0 18 5 12 2 12 4 0
Ineamãnatã
Comunidade
Grupo de Famílias
6 2 0 16 3 12 0 3 3 0
Indígenas do
Monte Horebe
Comunidade do
7 Povo Deni da 1 0 4 2 3 2 1 0 0
Cidade de Deus
Comunidade Povo
8 Indígena do Sol 8 0 8 0 0 0 5 4 0
Nascente
Comunidade
Indígena Kokama
9 Imakana Riai 2 0 12 12 27 1 9 0 0
Kiwikana – Irmãos
e Primos
Comunidade
10 9 0 23 8 1 0 8 3 0
Raimundo Mura
Comunidade
11 0 0 18 5 16 0 7 3 0
Aspira
Comunidade
12 Centro Cultural 2 0 10 0 0 0 9 0 0
Lua Verde
Comunidade
13 Indígena Kokama 5 0 14 6 0 0 10 6 0
Uka Tapuya

279
Comunidade
14 2 0 9 8 8 0 9 0 0
Indígena IFICAM
Comunidade
15 Pupyngare Anawa 6 0 22 7 0 0 27 8 0
Sâkyre
Comunidade Dois
16 1 0 15 13 15 1 11 3 0
Irmãos
Comunidade
17 9 0 31 12 0 0 29 12 13
Orquídea
Comunidade
18 0 0 0 0 0 0 6 0 0
Ritamakuara
19 Comunidade Onça 4 0 13 3 10 0 7 0 0
Comunidade
20 9 0 19 17 15 6 8 5 5
Waina Parque
Comunidade
21 0 0 18 0 4 0 7 7 3
Mainuma
Comunidade
22 0 0 0 0 0 0 0 0 0
Tataiara
Total 76 0 273 149 195 17 178 70 21

Fonte: Arquivo AIS- NUAES – DISAN, 2022.

A mostra epidemiológica fortaleceu o processo de trabalho dos AIS nos


territórios das comunidades indígenas, no que se refere a comunicação com o
setor da vigilância, com as áreas programáticas de saúde, particularmente as que
possuem indicadores de saúde, como por exemplo, os programas de Hiperdia,
Tuberculose (TB) e Hanseníase. A partir da identificação dos agravos, os AIS
têm participação primordial desde a sinalização dos casos em espaços indígenas,
no acompanhamento de alguns casos como de TB, até a alta, juntamente com
profissional capacitado em TB nas unidades de saúde. É válido ressaltar que foram
identificados no território das comunidades 43 pessoas indígenas deficientes, além
de alguns outros casos que acometeram essa população, tais como: Renal (05)
Pulmonar (47), problemas de coração (12), Hanseníase (01), HIV (02) e Neoplasia
(07). Dentre as ações, ainda destacamos o protagonismo do Programa da saúde
nutricional em território das comunidades indígenas, em razão dos resultados que
apontam 76 pessoas indígenas em condição de baixo peso e 273 acima do peso.

280
Casos de tuberculose em indígenas e estratégia de
mitigação na zona norte de Manaus

A tuberculose permanece como um grave desafio para a saúde pública


global, ocupando a 13ª posição entre as causas gerais de morte, sendo a segunda
mais letal entre as doenças infecciosas, só perdendo para a Covid-19 (superando
o HIV/AIDS). A TB pode ser prevenida, tratada e curada. No Brasil, em 2023,
foram notificados aproximadamente 80 mil casos. Em reação a essa situação, a
Organização Mundial da Saúde (OMS) fixou a meta de erradicar a tuberculose
como um problema de saúde pública até o ano de 2035. Para isso, foram
definidos objetivos desafiadores, como a identificação precoce da doença em
grupos de risco elevado. Entre esses grupos, a população indígena se destaca
por registrar as maiores taxas de incidência e prevalência de tuberculose. Essa
realidade pode ser atribuída a uma série de fatores socioeconômicos e de saúde
que impactam essa população vulnerável.
Pesquisas recentes indicam que as taxas de incidência de TB entre os
indígenas podem ser até quatro vezes maiores do que as observadas na população
em geral. Nesse contexto, destacamos o trabalho do AIS Macuxí e seus pares nas
comunidades indígenas da zona norte de Manaus, que teceram redes com a área
técnica de vigilância em Saúde (DISAN) para a produção do cuidado, monitoramento
e mitigação das pessoas indígenas acometidas de tuberculose, no território.
O monitoramento contínuo nas comunidades da zona norte de Manaus
não tem sido uma tarefa fácil. No entanto, a equipe de vigilância do Distrito
de Saúde Norte tem registrado os casos suspeitos de tuberculose, identificados
pelos agentes comunitários de saúde e agentes indígenas de saúde. O quadro
epidemiológico realizado pela equipe de AIS da zona norte de Manaus (2020/21
a junho de 2023), conferido pelos demais profissionais de saúde, retrata 05
casos de TB em pessoas indígenas que foram acompanhados pela área técnica
do programa da tuberculose da vigilância em saúde do DISAN. O processo de
trabalho da equipe de vigilância tem alcançado resultado positivo por meio
das atividades dialogadas realizadas nas comunidades.

281
A imagem 2 retrata profissional de saúde da área técnica da tuberculose,
implicada no território das comunidades indígenas urbanas da zona norte
de Manaus, realizando atividade dialogada com população indígena,
particularmente de etnia Warao7, alguns já familiarizados com o idioma de
língua portuguesa.

Figura 3. Espaço comunitário da zona norte de Manaus.

Fonte: arquivo vigilância DISAN, 2023.

O SUS em ato: o olhar de uma nutricionista em território


indígena da zona norte de Manaus

Os resultados da mostra epidemiológica (2021 a 2023) das comunidades


indígenas da zona norte de Manaus, retratam 76 pessoas indígenas em condição
de baixo peso e 273 acima do peso inseridas no universo de 2891 pessoas,
sendo 867 famílias. Nesse contexto, projetamos a necessidade de elaboração
de estratégias com base na equidade, uma das diretrizes do SUS, a fim de
garantir a continuidade de atividades educativas nutricionais nesses espaços
multiétnicos. Além da obesidade, observamos na mostra, o quantitativo
expressivo de pessoas indígenas com problemas de hipertensão e diabetes.
7   Principal contingente de migrantes e refugiados indígenas que chegam da Venezuela ao Brasil.

282
Seriam esses problemas ocasionados pelo processo de aculturação no
contexto urbano? As situações mencionadas, inclusive nas referências anteriores
foram o que me motivaram a estar presente, desenvolvendo o trabalho em ato
nos territórios das comunidades indígenas. Foi essencial estabelecer vínculos
com essa população, desenvolver práticas educativas para melhorar a qualidade
de vida, especialmente a alimentação. Assim, na atuação como nutricionista,
foi essencial compreender os hábitos e práticas alimentares, estabelecer trocas
de saberes, em meio as diversidades e especificidades de cada etnia.

Figura 4. Atividades dialogadas em território indígena, 2023.

Fonte: equipe Nutrição – DISAN, 2022.

Ressaltamos a importante atuação do AIS nesses territórios, no que


se refere a identificação e alinhamento das redes de cuidado para a saúde
nutricional dos povos originários. Com a mostra epidemiológica realizada
pelos AIS, foi possível criar estratégias para proporcionar cobertura de
segurança alimentar e nutricional nessas comunidades, a partir de incentivos
e orientações referentes a plantação, para o consumo da alimentação, e o
desenvolvimento de hábito na construção de canteiros para cultivo de temperos
(cebolinha, coentro, chicória, caruru, luzerna (alfafa), espinafre amazônico…)
e inúmeras outras Plantas Alimentícias Não Convencionais (PAN).

283
Em suma, as ações da APS na zona norte de Manaus marcam o
trabalho como uma atividade coletiva, promovendo a educação alimentar, em
comunidades indígenas contempladas ou não nas áreas de abrangência das
unidades de saúde, desconstruindo alguns conceitos e inúmeras situações
de preconceito nutricional, seja por desnutrição ou obesidade. “No campo
da saúde o objeto não é a cura, ou a promoção e proteção da saúde, mas a
produção do cuidado, através do qual poderá ser atingida a cura e a saúde, que
são de fato os objetivos que se quer atingir” (Merhy, 1999, p. 1).

Considerações Finais

A experiência buscou evidenciar as Redes Vivas do profissional AIS,


nos territórios das comunidades indígenas da zona norte da cidade Manaus,
bem como, discutir a partir dos encontros realizados com estes profissionais,
as situações epidemiológicas existentes nos territórios destas comunidades, tais
como tuberculose, hanseníase e agravos das situações nutricionais. O resultado
das ações foi a construção de estratégias que contribuíram para a continuidade
do monitoramento e o fortalecimento das redes vivas tecidas nesses espaços.
Foi importante considerar as conquistas e dificuldades vivenciadas
por um dos AIS da etnia Macuxi, que sofreu processo de desterritorialização
e reterritorialização, no cenário pandêmico, bem como sua inserção e
contribuição no contexto do Sistema Único de Saúde, especificamente na
atenção primária à saúde da zona norte da capital do Amazonas que projeta
maior representatividade indígena nos territórios urbanos.
Nos processos de desterritorialização e reterritorialização estão
imbricadas as dimensões política e cultural, o que tem sido grande realidade
atualmente. A partir das narrativas do indígena Macuxí, percebemos como a
mudança de território impactou sua participação na área da saúde, atuando
como Agente Indígena de Saúde em comunidades urbanas. Além disso, a
experiência possibilitou o entendimento sobre a importância da integração
e interação entre diferentes etnias no contexto urbano das comunidades

284
indígenas da zona norte de Manaus, bem como a possibilidade da troca de
conhecimentos com outros profissionais de saúde.
A experiência possibilitou aos AIS, particularmente, ao AIS Macuxi,
uma compreensão mais ampla sobre os processos de desterritorialização e
reterritorialização, indo além das fronteiras geográficas e ampliando os seus
recursos sociais que possibilitam interferir e contribuir pessoas e instituições. A
resiliência tornou-se a melhor condição para potencializar a luta pela saúde dos
povos indígenas, particularmente os que vivem em contexto urbano, por meio
da integração sociocultural baseada no princípio da equidade. Reterritorializar
é se deixar implicar com as necessidades do território, buscando melhorias
para si e para o coletivo. Sendo assim, os agentes indígenas na zona norte de
Manaus, Macuxi, Mura8, Ticuna9 e Tukano10, em suas diversidades étnicas,
têm se projetado como Rede Viva em contexto Urbano da capital manauara.

Referências
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8   Povo indígena que ocupam vastas áreas no complexo hídrico dos rios Madeira, Amazonas e Purus.
Vivem tanto em Terras Indígenas, quanto nos centros urbanos regionais
9   Povo ameríndio que vive na fronteira do Brasil com o Peru e na Colômbia.
10   Grupo indígena que habita o noroeste da Amazônia, no Brasil e na Colômbia, às margens do Rio Tiquié

285
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286
Olimpíadas da terceira idade e práticas
corporais na atenção primária como
estratégia de promoção da saúde,
Manaus/AM
Patrícia Guimarães Couto
Patricky Batista Da Silva
Thalita Souza Mendes
Maria de Fátima Falcão da Silva
Wendell Mattheus Amâncio da Silva

Introdução

A prática regular de atividades físicas desempenha um papel


fundamental na promoção da saúde e do bem-estar, especialmente para os
idosos, quando o corpo passa por diversas mudanças físicas, cognitivas e
emocionais. Manter-se ativo favorece a preservação da saúde, a prevenção
e/ou redução de danos de doenças crônicas não-transmissíveis e a melhora
da qualidade de vida. No entanto, sua efetividade e adoção podem ser
substancialmente influenciadas por fatores locais, como as condições
geográficas, socioeconômicas, culturais e ambientais. Dessa forma, para
garantir que todos os indivíduos, independentemente de suas circunstâncias
locais, tenham a oportunidade de se engajar em atividades físicas que
promovam a saúde e o bem-estar, é necessário desenvolver intervenções que
reconheçam e integrem as particularidades locais, garantindo a eficácia e a
sustentabilidade de programas de atividades físicas.
Na Atenção Primária à Saúde (APS), por meio das Unidades de Saúde
da Família (UBS), a oferta de práticas corporais para a população em geral e
especialmente para os idosos pode possibilitar cuidados de saúde acessíveis
e holísticos para a comunidade. Integrar serviços de práticas corporais nas

287
unidades de saúde e incentivar e promover a participação dos idosos em
eventos esportivos pode oportunizar a aderência à prática regular de atividade
física e, dessa forma, estimular uma vida mais ativa e saudável, no âmbito da
APS no Sistema Único de Saúde (SUS).
A Educação Física passou a integrar as equipes de saúde com a
Resolução do Ministério da Saúde de 2017 (Brasil, 2028) e, mais recentemente,
com a Portaria GM/MS nº 635, de 22 de maio de 2023, que regulamenta a
atuação do profissional de Educação Física nas equipes multiprofissionais
(eMulti) na Atenção Primária à Saúde, passou a atuar de forma complementar
nas equipes da Atenção Básica. Com isso, passou a ser possível a oferta de
práticas corporais nas unidades de saúde, ampliando a abordagem integrativa
da saúde e proporcionando aos usuários uma gama mais diversificada de
intervenções. A inclusão do Profissional de Educação Física nas equipes de
saúde permite a implementação de atividades físicas e, consequentemente, a
prescrição de programas de exercícios adaptados às necessidades específicas
da população atendida.
A implantação de programas de atividade física em (UBS) já
demonstrou ser satisfatória no município de Rio Claro - SP (Kokubun et
al., 2012), corroborando a ideia de que a integração da Educação Física na
Atenção Primária à Saúde representa um avanço significativo na abordagem
holística da saúde. Esse modelo não só enriquece a oferta de serviços nas
unidades de saúde, mas também reforça a importância da colaboração entre
diferentes profissionais para um cuidado mais completo e eficaz e ainda
estimula o autocuidado do usuário, incentivando-o a assumir um papel
ativo na sua própria saúde e a buscar práticas de atividade física como uma
responsabilidade pessoal (Oliveira, 2018).
O objetivo deste trabalho é relatar as atividades desenvolvidas pelo
Profissional de Educação Física na APS, destacando o grupo de práticas
corporais e a participação de idosos de uma USF na 23ª edição das Olimpíadas
da Terceira Idade, em Manaus.

288
Metodologia

O relato é de uma experiência que contou com a participação de


idosos do grupo de práticas corporais de uma Unidade de Saúde da Família
(USF) situada na zona norte da cidade de Manaus - AM. O grupo era parte
das atividades dos pós-graduandos do Programa de Especialização em Saúde
Pública, com ênfase na estratégia Saúde da Família (ESF), da Universidade
Estadual do Amazonas (UEA), em parceria com a Escola de Saúde Pública
de Manaus (ESAP), constituindo uma equipe multiprofissional (eMulti). A
equipe é formada por uma profissional de Educação Física, um psicólogo,
uma nutricionista, um fisioterapeuta e uma assistente social. A profissional de
educação física era a responsável pelo planejamento e condução das práticas
corporais. O presente trabalho se restringiu às atividades desenvolvidas na
USF no período de fevereiro de 2023 a março de 2024.
A USF atende cerca de 3.500 usuários cadastrados no SUS e contava
para isso com cinco equipes de saúde da família, duas equipes de saúde
bucal, uma equipe de gestão e uma eMulti, composta pelos pós-graduandos.
Localizada em um bairro relativamente novo, a região ainda enfrentava
desafios de infraestrutura, como falta de pavimentação e saneamento básico.
Apesar disso, dispunha de creches, escolas, faculdades privadas, igrejas e uma
rede comercial que incluía um shopping center. A população do território,
predominantemente de classe média baixa, incluía indígenas urbanos e pessoas
de diferentes nacionalidades em situação de alta vulnerabilidade social.
O grupo de práticas atendia cerca de 90 usuários de diversas faixas
etárias. As atividades ocorriam quatro vezes por semana, com duração
aproximada de 90 minutos, no pátio de uma igreja próxima à USF, utilizando
recursos disponibilizados pela própria comunidade. As atividades eram
planejadas para atender às necessidades e condições de saúde dos participantes,
com o objetivo de promover a saúde geral, melhorar a qualidade de vida e
complementar o cuidado holístico oferecido pela Atenção Primária em

289
Saúde (APS). Entre as principais práticas realizadas estavam exercícios de
alongamento e flexibilidade, atividades para equilíbrio e coordenação motora,
propostas lúdicas e recreativas, além de exercícios funcionais, de fortalecimento
muscular e atividades aeróbicas.
Um grupo da terceira idade foi criado especialmente para participar
das Olimpíadas da Terceira Idade de Manaus, uma competição promovida
pela Fundação Manaus Esporte, da Prefeitura Municipal. Nessa competição, a
USF foi representada por 30 idosos, com idades entre 50 e 84 anos, separados
em categorias de acordo com a faixa etária, nas seguintes modalidades: lance
livre na cesta, boliche, jogo de argolas e lançamento ao alvo. Vale destacar
que, apesar de o Estatuto do Idoso definir como idoso aquele com 60 anos
ou mais, para a competição a faixa etária foi ampliada para incluir pessoas
a partir dos 50 anos. Isso se deve à observação de que indivíduos nesta faixa
etária também enfrentam desafios significativos relacionados à socialização e
à prática de atividades físicas. Reconhecer e abordar essas questões mais cedo
pode contribuir para um envelhecimento mais ativo e saudável.
Trinta e um grupos da capital amazonense e de municípios adjacentes
participaram da competição, que abarcava ainda outras modalidades esportivas.
O grupo foi o primeiro de uma unidade de saúde a participar do evento, que
estava na sua 23ª edição, fortalecendo a integração também de serviços entre as
secretarias municipais de saúde e de esporte e cultura. Além dos treinamentos, os
idosos passaram por exame clínico e exames complementares, assim como todos
os demais participantes dos grupos de práticas corporais, por médico clínico da
USF, ressaltando a intersetorialidade no serviço e a assistência aos usuários.

Resultados

As atividades realizadas pela profissional de Educação Física no cenário


de prática consistiram em atendimento individual e compartilhado, atividades
coletivas, reuniões de equipe, acolhimento, construção de projeto terapêutico
singular (PTS), programa saúde na escola (PSE) e educação popular em saúde.

290
Os grupos de práticas corporais são incluídos nas atividades coletivas, para
cômputo de produção. Nos próximos parágrafos, serão relatadas algumas
dessas atividades, com ênfase nas atividades coletivas de práticas corporais e
na participação dos idosos do grupo nas Olimpíadas da Terceira Idade.
Os atendimentos individuais eram realizados a partir de encaminhamentos
feitos por médicos ou enfermeiros da própria unidade de saúde. Durante esses
atendimentos, eram conduzidos procedimentos como anamnese, avaliação física
e orientações sobre atividades físicas e metas, além de troca de informações sobre
hábitos de vida. Quando a pessoa tinha o perfil para algum dos grupos, de atividades
coletivas, havia o encaminhamento para esses grupos. No entanto, havia limitações
significativas na continuidade do atendimento. Não era possível encaminhar os
usuários para outros locais de prática devido à falta de centros de esporte e lazer
na região e à ausência de parcerias com outros centros. Adicionalmente, as pessoas
enfrentavam dificuldades relacionadas ao transporte para participar de atividades
em centros distantes de seu bairro, tanto devido ao acesso limitado de transporte
público quanto à restrição financeira, que dificultava a disponibilidade de recursos
para as passagens.
Em um caminho inverso de atendimento, havia usuários que ingressaram
diretamente no grupo de práticas corporais. O grupo era aberto à população e
muitos recebiam indicação para participar a partir de pessoas que já participavam
ou a partir de cartazes espalhados na USF e igreja. Ao ingressarem, os novos
participantes eram recebidos de forma acolhedora e passavam por uma triagem
inicial, que tinha como objetivo compreender suas necessidades e demandas
iniciais. Essa etapa permitia uma avaliação rápida e superficial, garantindo que cada
indivíduo fosse orientado de acordo com suas necessidades específicas desde o
início. Em seguida, era solicitado hemograma, exame de urina e eletrocardiograma
para homens a partir de 40 anos e mulheres a partir de 50 anos de idade.
Com os resultados em mãos, o médico da ESF realizava o atendimento,
em uma consulta compartilhada com a profissional de Educação Física, em que
eram avaliados os fatores de risco para a prática de exercícios, as medicações e

291
renovações de receita médica para a dispensação de medicamentos na farmácia
do SUS e demais encaminhamentos ou tratamentos médicos necessários para
cada pessoa. Essa experiência de partilhar o cuidado proporcionou ampliação
da clínica das categorias e enriqueceu o matriciamento de cada caso, além de
gerar segurança e satisfação dos usuários, segundo seus relatos.
As atividades coletivas, além de integrarem a produção do cuidado na
APS, são essenciais na atuação do profissional de Educação Física. O grupo de
práticas corporais, focado na realização de exercícios físicos, foi fundamental para
fortalecer o vínculo com os usuários e com a comunidade em geral. O grupo
começou suas atividades no estacionamento da clínica, mas devido à dificuldade
de remanejar os carros dos funcionários, foi necessário buscar um novo local para
as práticas. Assim, estabeleceu-se uma parceria com uma igreja católica próxima à
USF, que ofereceu um espaço aberto com chão cimentado ao lado da igreja, além de
um pequeno salão coberto nos fundos. Com o tempo, o número de participantes
cresceu consideravelmente, refletindo o sucesso e a aceitação do grupo.
As principais atividades realizadas, como citado anteriormente, eram
de fortalecimento muscular, circuito funcional, exercícios de alongamento e
flexibilidade, equilíbrio e coordenação motora, atividades lúdicas e recreativas,
além de atividades aeróbias, ajustadas para atender às condições de saúde
individuais dos participantes. As aulas aconteciam com o mínimo de material.
A caixa de som era de uso pessoal do profissional ou de algum usuário que
se disponibilizava a levar. Além disso, utilizavam-se alguns bambolês, cones
chineses — doados à USF pelo médico da Estratégia da Família —, cabos de
vassoura e garrafas PET, que eram reutilizados para as atividades.
A seguir, apresentaremos algumas práticas de sucesso que vivenciamos
ao longo da implementação das atividades, destacando os resultados positivos
e as experiências enriquecedoras que contribuíram para o fortalecimento
do vínculo com a comunidade. Nas práticas corporais, os usuários vestiam
uma camisa personalizada, desenvolvida especialmente para o grupo. Os
interessados tinham a opção de adquirir a camisa, uma ideia que se mostrou

292
bastante eficaz e bem recebida. Ao vestir a camisa, os participantes não só se
sentiam parte do grupo, como também eram facilmente reconhecidos pela
comunidade, funcionando como um meio de promover as práticas e reforçar a
identidade do grupo. Além disso, durante as atividades, tivemos a oportunidade
de organizar cafés da manhã em datas comemorativas. Nesses eventos, cada
participante contribuía conforme suas possibilidades, trazendo lanches e
bebidas para compartilhar, criando um ambiente de união e colaboração.
Em junho, realizamos uma festa junina que foi um grande sucesso. Os
participantes ensaiaram uma quadrilha e a apresentaram em um espaço público
próximo à USF. A festa foi animada, com os participantes vestidos a caráter.
Algumas mulheres, para entrar no clima, se fantasiaram de homens, já que a
maioria do grupo era feminina. Ao final da apresentação, todos se reuniram para
um delicioso lanche com comidas típicas juninas e danças, que aconteceram
no salão da igreja, promovendo um momento de celebração e integração
comunitária. Outra experiência exitosa foi o dia de embelezamento, em que, em
parceria com o Centro de Educação Tecnológica do Amazonas (CETAM), que
executa qualificação profissional, as participantes realizaram corte, hidratação
e escovação nos cabelos, além de design em sobrancelhas. Também podemos
destacar a gravação de vídeos curtos de coreografias, no estilo “TikTok”, que se
tornaram momentos de grande diversão e descontração durante as aulas. Essas
atividades proporcionaram risadas e um ambiente leve, onde os participantes
puderam se expressar de maneira criativa e se divertir em grupo.
Por fim, a implementação dos passeios culturais e regionais também
foram experiência muito bem-sucedidas. Com o apoio de transporte
fornecido pela Secretaria de Saúde do município, essa iniciativa teve resultados
extremamente positivos, desempenhando um papel crucial no aumento do
engajamento das pessoas. Além de estimular a prática de exercícios físicos,
os passeios proporcionaram uma valiosa oportunidade de integração social e
enriquecimento cultural, fortalecendo o vínculo dos usuários com os programas
de atividade física e promovendo um maior envolvimento e satisfação.

293
Com a participação de todos os profissionais da eMulti, outras
atividades coletivas foram realizadas, abrangendo grupos como o de Sobrepeso
e Obesidade, Saúde Mental, Saúde da Mulher, Saúde Indígena e Hiperdia. A
principal vantagem dessas abordagens coletivas é a integração de diferentes
categorias profissionais, que permite um olhar mais amplo e diversificado
sobre as necessidades dos participantes, além de promover uma rica troca de
experiências entre os profissionais e os usuários. Por fim, o grupo também
participava de ações de educação em saúde com os profissionais da eMulti, que
traziam temas variados sobre saúde e alimentação, por exemplo, em rodas de
conversa na parte final das aulas.
Em relação aos benefícios à saúde, observamos que as atividades
coletivas ajudaram a controlar o peso corporal, reduzir o risco/complicações
de doenças crônicas, fortalecer ossos e músculos e melhorar a saúde mental,
com impactos na função cognitiva e autoestima. É fundamental na atenção
primária incentivar e orientar as pessoas a adotarem um estilo de vida ativo,
promover práticas corporais adequadas à sua condição de saúde e preferências.
Observamos também que o contato regular e a interação com outras pessoas
tiveram um impacto positivo, promovendo a sensação de pertencimento e
apoio social. Esses resultados foram observados na prática, mas cabe relatar
que existe um desafio na avaliação de impacto dessas intervenções, pois
medir a eficácia dos programas de atividade física na APS é complexo, devido
aos múltiplos fatores envolvidos na saúde dos usuários e à dificuldade em
quantificar os benefícios de forma precisa, com escassez de recurso e insumos
para coletas de dados.
A participação nas Olimpíadas da Terceira Idade de Manaus, em que os
idosos participaram das competições nas modalidades de jogos de salão, foi o
ponto alto das atividades. Além dos jogos, o evento proporcionou a participação
da abertura e encerramento, com música ao vivo e grande interação social. A
participação nas Olimpíadas da Terceira Idade teve um impacto significativo na
saúde e na qualidade de vida dos participantes. Fisicamente, os idosos relatam

294
melhorias na mobilidade, resistência e em índices de saúde, como controle da
pressão arterial e glicemia, que podem ser atribuídas à aderência às práticas
corporais. Socialmente, os idosos puderam fortalecer os laços com os membros
do próprio grupo e desfrutaram da interação com outros competidores,
construindo novas amizades e trocando experiências. Emocionalmente, a
competição proporcionou um senso de realização, autoconfiança e propósito,
desafiando estereótipos sobre o envelhecimento e promovendo uma atitude
positiva em relação à vida. A participação resultou na conquista de medalhas
de ouro em duas modalidades da competição, trazendo enorme satisfação,
orgulho e fortalecendo os laços da comunidade com a USF.
Dessa forma, a participação nas Olimpíadas da Terceira Idade representou
uma experiência exitosa para os idosos do grupo de práticas corporais, tendo
impactos biológicos, psicológicos e sociais positivos, reforçando a importância
do envolvimento contínuo em atividades físicas e sociais para a promoção da
saúde, autonomia, funcionalidade e vitalidade dos idosos e a importância da
oferta de práticas corporais nas unidades de saúde. Além da adesão às práticas
corporais, a oferta desse serviço viabiliza a continuidade e integralidade do
cuidado, com consulta periódica, orientações multiprofissionais e educação
popular em saúde, fortalecendo o vínculo entre a equipe e usuários da USF e
transformando as condições de saúde da população e a realidade local desse
território. Saúde não é questão apenas de assistência médica e medicamentos,
por isso sugerimos que o fomento e a promoção de iniciativas semelhantes ações
possam ser encorajadas. Ressaltamos a atuação das eMulti na intersetorialidade
do serviço e na promoção da saúde na atenção primária.
Verificamos que o profissional de Educação Física, inserido na eMulti na
APS, tem um papel crucial para oportunizar o acesso de grupos populacionais
às práticas corporais. Outro aspecto interessante é que muitas vezes a pessoa
entende que a conquista de sua saúde está relacionada diretamente com o
procedimento medicamentoso, por uma questão de formação cultural, mas
quando se engajam em atividades coletivas, recebem informações valiosas sobre

295
sua saúde e começam a perceber melhorias em sua vida diária. Temos relatos
de usuários que, ao participar do grupo de práticas corporais, conseguiram
superar dificuldades cotidianas, como brincar com os filhos ou netos, ir à
padaria ou ao mercado e até mesmo subir degraus, evidenciando os benefícios
funcionais e a transformação positiva proporcionada pela participação no
grupo. Com esses resultados, podemos verificar o sucesso das atividades
propostas, pois com as práticas corporais os usuários da USF desenvolveram
autonomia com seu autocuidado, o que realmente se encaixa em uma prática
de prevenção e promoção da saúde e qualidade de vida.
Cabe ainda ressaltar que o trabalho do profissional de Educação
Física na APS enfrenta diversas dificuldades que podem impactar a eficácia
e a abrangência de suas atividades. Entre os principais desafios estão os
recursos limitados, pois muitas Unidades Básicas de Saúde (UBS) enfrentam
restrições orçamentárias e falta de infraestrutura adequada para implementar
e manter programas de atividade física. Além dessas dificuldades, o trabalho
do profissional de Educação Física na Atenção Primária à Saúde exige
iniciativa e proatividade, pois frequentemente é necessário superar a falta de
infraestrutura e recursos. Por meio de soluções criativas, como a utilização
de espaços públicos, equipamentos improvisados ou tecnologias digitais, é
possível garantir a qualidade das atividades oferecidas.
A colaboração entre profissionais de Educação Física e outros membros da
equipe de saúde, como médicos, enfermeiros, nutricionistas e psicólogos, é essencial
para um cuidado integrado. No entanto, a falta de coordenação e comunicação
eficaz entre os profissionais pode dificultar a criação e a implementação de
programas coesos e eficazes. Essa integração também exige que o profissional
de Educação Física tenha conhecimentos sobre condições clínicas diversas e
habilidades para adaptar atividades físicas a diferentes necessidades. Superar essas
dificuldades requer um esforço contínuo para melhorar a infraestrutura, promover
a capacitação dos profissionais e facilitar a integração eficaz entre os membros da
equipe de saúde, além de estratégias para engajar e motivar os usuários.

296
Em conclusão, a atuação do profissional de Educação Física na APS
demonstrou ser fundamental para a promoção da saúde e qualidade de vida
das pessoas. A diversidade de atividades realizadas, incluindo atendimentos
individuais, práticas corporais coletivas e eventos sociais como cafés da manhã
e festas juninas, não só enriqueceu a experiência dos participantes, mas
também fortaleceu o vínculo entre a comunidade e a USF. A participação dos
idosos nas Olimpíadas da Terceira Idade destacou-se como um ponto alto,
evidenciando os benefícios significativos das práticas corporais para a saúde
física, social e emocional dos participantes.
Apesar das dificuldades enfrentadas, como a limitação de recursos, a
necessidade de integração multidisciplinar e desafios logísticos, a proatividade
e criatividade do profissional de Educação Física foram essenciais para superar
essas barreiras e manter a qualidade das atividades oferecidas. A implementação
de passeios culturais e regionais mostrou-se uma estratégia eficaz para aumentar
o engajamento e proporcionar benefícios adicionais para os usuários.
A experiência evidencia que, ao engajar os usuários em atividades
coletivas e promover o autocuidado, os resultados vão além do simples controle
de doenças, contribuindo para a autonomia e a melhoria da qualidade de
vida. As práticas corporais promovem a integração social, o fortalecimento da
autoestima e a superação de limitações diárias, alinhando-se aos princípios de
prevenção e promoção da saúde na APS, reforçando a importância de continuar
investindo em atividades que promovam a saúde física e mental e que incentivem
a participação ativa das pessoas em seu próprio processo de cuidado.

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PORTARIA GM/MS Nº 635, DE 22 DE MAIO DE 2023 - https://www.in.gov.br/en/web/dou/-/


portaria-gm/ms-n-635-de-22-de-maio-de-2023- 484773799

298
Promoção de saúde bucal da
população ribeirinha no município
de Manicoré-AM: uso do diário como
estratégia de planejamento
Mesraim Salef Rocha do Rosário
Maria Adriana Moreira
Sabrina Araújo de Melo
Vanessa Colares Magalhães Alves
Pablo Manuel oliveira almeida
Janayla Bruna Oliveira de Aguiar

A Amazônia brasileira é comtemplada com um vasto território com


aproximadamente sete milhões de quilômetros quadrados de grandes riquezas
naturais que abriga uma grande diversidade de povos tradicionais, como ribeirinhos,
indígenas e quilombolas, que vivem em estreita relação com os campos, florestas
e território líquido. O território líquido se caracteriza pelas especificidades dessa
região, onde temos os rios não apenas como um meio de transporte, mas também
como uma via de comunicação que conecta os moradores com os outros, com os
serviços de saúde e seu estilo de trabalho, o ritmo é marcado pelas cheias e secas
desses rios onde mostra a necessidade de se reinventar na vida social, no trabalho
e no acesso a saúde (Schweickardt et al., 2016).
A população ribeirinha, em particular, habita as margens dos rios,
adaptando suas atividades de sobrevivência, como pesca e cultivo, aos ciclos da
natureza. Através do conhecimento tradicional sobre a agricultura e o manejo
dos recursos naturais, os ribeirinhos garantem sua subsistência e renda familiar
dentro de seu território onde se tem uma dificuldade maior quando se fala em
acesso a saúde (Santos et al., 2021).
Falando sobre a situação econômica dos povos ribeirinhos, a renda
dessas populações é complementada por alguns recursos de programas do

299
governo federal e municipal, como o Programa de Transferência de Renda
Bolsa Família. Apesar de termos o Programa Federal Luz para todos, a
distribuição de energia elétrica ainda não é suficiente. Muitas comunidades
foram contempladas com o Programa, contudo ainda é observado que as
residências ainda possuem eletricidade instável e necessitam do suporte de
geradores de energia, funcionando a base de combustíveis, também tendo a
opção de energia solar e baterias.
O principal meio de transporte utilizado na zona rural é a canoa
de madeira ou alumínio, que possuem acoplada a suas estruturas motores
conhecidos como popularmente conhecido “rabetas” e motor de popa, que
dependendo da situação financeira do proprietário pode variar de potência,
visto que quanto maior a potência mais caro o motor, em algumas áreas se tem
a opção de embarcações maiores com maior capacidade de transporte de carga
e passageiros (Silva et al., 2021).

Figura 1. Meios de transporte para zona rural na Amazônia.

Fonte: Autores, 2023.

A paisagem amazônica tem a várzea como local de vida e produção da


população ribeirinha, tendo como influencia a dinâmica das águas como em
período de cheia e seca. Nos últimos tempos, há a preocupação pelas mudanças

300
climáticas, que impactam os ciclos das águas, influenciando as grandes secas
nessa na região Norte, criando problemas como a disponibilidade de água
potável, alimentos e deslocamento dos povos das florestas de das águas. Povos
que tem como atividade econômica a caça, pesca e o extrativismo vegetal, suas
particularidades geográficas têm relevância sobre sua identidade sociocultural
e o trabalho em saúde. O acesso às políticas públicas é feito pelos rios, que
tem como característica o tempo e as distancias, portanto o transporte pode
levar desde minutos a dias de distância. Esses fatores podem gerar situações
de isolamento tanto no meio físico quanto social dessas comunidades. Assim,
promover o cuidado e a atenção dessas populações se torna um grande desafio
(Silva & Saldanha, 2023).
Com essa escrita buscamos relatar as condições, qualidade de vida
e desafios enfrentados pelos povos que ocupam a área ribeirinha do nosso
rio madeira, com foco no que se diz respeito a acesso aos serviços de saúde
odontológicos. A análise foi feita por compreender a necessidade de criar
políticas e estratégias da população atendida, que vive em sua maior parte e
via o meio fluvial, que sofrem influência dos ciclos da cheia e seca e depende de
recursos naturais. A descrição do território e das condições de vida, incluindo
as moradias, o acesso a informações, serviços básicos, vida social, colaboram
com a elaboração de estratégias para a promoção de saúde para esta população.
Por fim, buscamos relatar as ações realizadas pela equipe de saúde bucal da
Estratégia de Saúde da Família Ribeirinha (eSFR) no Barro Alto no município
de Manicoré - AM.

Acesso à saúde bucal na Amazônia: rompendo o isolamento


em Manicoré

Foi nesse contexto que a Secretaria Municipal de Saúde, juntamente


com a Prefeitura Municipal de Manicoré, iniciou um projeto desafiador: a
implementação de equipes de saúde bucal em zonas ribeirinhas do município
(Figura 2). Na execução do projeto, foram enfrentadas diversas dificuldades,

301
no entanto, os resultados obtidos foram e estão sendo extremamente
significativos, contribuindo diretamente para a melhora na qualidade de vida
e promoção da saúde bucal nas comunidades ribeirinhas da região (Rosário et
al., 2024, p. 182).

Figura 2. Uma das equipes de saúde da família da área ribeirinha.

Fonte: Autores, 2023.

Manicoré está localizado no interior do estado do Amazonas, região


norte do país, pertencente ao sul amazonense e microrregião do rio madeira,
com uma área total de 48 282,478 km² e uma população estimada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2022) de 53.914 habitantes, sendo
que desta população aproximadamente 22.000 habitantes residem em área
ribeirinha e dentro desse território temos uma divisão de 7 polos centrais
estratégicos Verdum, Cachoeirinha, Democracia, Capananzinho, Capanã
Grande, São Vicente e Barro Alto onde tem a atuação das equipes de saúde da
família ribeirinha.

302
Figura 3. Município de Manicoré, Amazonas, Brasil.

Fonte: SEMSA Manicoré, 2023.

A região do Norte do Brasil possui grandes desafios no que se refere


ao acesso, especialmente para territórios onde se encontram as comunidades
ribeirinhas, necessitando de um olhar diferenciado quanto as ações
apresentadas no âmbito da Política Nacional de Saúde Bucal (PNSB), que se
orienta por um respeito às especificidades locais. Um eixo estruturante dessa
Política é a ampliação do acesso e das atividades de saúde bucal por meio do
atendimento fluvial e móvel. A comunidade do Barro Alto, onde foi realizado
o presente trabalho, está integrada nessas especificidades, com uma equipe
de saúde da família ribeirinha temos a equipe de saúde bucal presente onde
pelo fato do isolamento e falta de acesso foi observado que a doença cárie
tem se tornado mais evidente. Importante destacar que a equipe de saúde
bucal necessita adequar-se aos contextos dessa região, para levar o cuidado
odontológico aos usuários ribeirinhos.
A presença da Equipe de Saúde Bucal (ESB) nas comunidades
ribeirinhas promove o bem-estar e saúde, tendo um impacto positivo na

303
saúde bucal dos usuários dessas comunidades. O território líquido traz em
dificuldades de locomoção tanto para as equipes de saúde como para as
populações. As equipes necessitam pensar no transporte de materiais e
equipamentos odontológicos, e vale destacar que os equipamentos e materiais
da saúde bucal são pesados o que dificulta mais ainda durante o transporte.
Nesse sentido, alguns desafios foram encontrados no presente relato como a
chuva, os extensos deslocamentos pelos rios, as longas distancias percorridas
a pé, levando os equipamentos e materiais odontológicos de uma comunidade
para outra as quais muitas das vezes a única via de acesso é por terra (Figura
4). Dito isso, a saúde de população ribeirinha na Amazônia Brasileira enfrenta
muitas dificuldades para sua execução.

Figura 4. Locomoção da Equipe de saúde.

Fonte: Autores, 2023.

A atuação da equipe em área nas comunidades proporciona uma


melhor qualidade de vida aos moradores por meio da presença e das atividades
desenvolvidas pela equipe de saúde. A atenção em saúde visa contribuir com
a prevenção de doenças e a redução de agravos bucais, superando a falta de
acesso a serviços odontológicos e promovendo a educação em saúde para
conscientizar sobre a importância da higiene bucal.

304
Figura 5. Cirurgião dentista atuando executando a educação permanente para equipe.

Fonte: Autores, 2023.

As estratégias de saúde bucal desenvolvidas no Barro Alto abarcou 20


comunidades, que juntas possuem a população de 1.775 pessoas de acordo
com dados obtidos até março de 2024. Fonte: Coordenação de Planejamento,
Secretaria Municipal de Saúde (SEMSA/Manicoré). A coleta de dados foi feita
por meio de anotações em diário de campo do cirurgião-dentista da área no
momento que eram realizados os atendimentos individuais dos usuários e
durante a realização das atividades coletivas.
A ideia do diário de campo e relatório surgiu de uma vivência do
atual coordenador de saúde bucal do município, uma vez que já atuou na área
ribeirinha e identificou a escassez de dados durante suas ações. A partir disso,
observamos a necessidade de se evidenciar quais são os desafios e avanços
que afetam a saúde bucal da população ribeirinha e a falta de um protocolo
que detalhasse o dia a dia da equipe e ao mesmo tempo levantando dados
importantes para o desenvolvimento de novas políticas públicas efetivas e
estratégias regionais com maior impacto dentro de cada território.
O diário tem como finalidade relatar as atividades realizadas, ações,
atendimentos, procedimentos, desafios encontrados no território, estratégias

305
utilizadas para o melhor desenvolvimento do trabalho e promoção de saúde,
relato de experiência durante a viagem, o qual também visa incentivar a escrita
de trabalhos que enfatizem as atividades realizadas nas comunidades ribeirinhas
e ao final ser apresentado a gestão, apresentando a necessidade de desenvolver
novas ideias, políticas e potencializar estratégias que estão sendo desenvolvidas.
Destacando que desenvolver ações de saúde bucal na Amazônia, em
específico em comunidades ribeirinhas, é necessário realizar o planejamento
em diálogo com a realidade local, buscando estratégias diferenciadas para
promover a continuidade dos serviços de saúde bucal. A periodicidade de
entrada da equipe de saúde bucal influencia diretamente no manejo e cuidado
no âmbito da saúde bucal. Assim, as estratégias buscam um cuidado integral e
contínuo da saúde da população ribeirinha.

Figura 6. Equipe de saúde bucal atuando com consultório portátil.

Fonte: Autores, 2023.

As atividades relatadas foram extraídas do relatório de viagem de


rotina da equipe de saúde bucal que realizado a cada 15 e/ou 18 dias a cada
mês. A viagem teve duração de dezoito dias tendo início dia 27.01.2024,
finalizando 13.02.2024. O deslocamento da equipe ocorreu por meio de

306
embarcação, unidade móvel fluvial fretada para auxiliar no transporte da
equipe e atendimento nas comunidades e regiões próximas pertencentes ao
polo. Foram feitas atividades coletivas com ênfase na escovação e prevenção da
doença cárie, com público-alvo crianças de até dez anos de idade acompanhadas
dos pais, e com a participação também dos demais moradores de outras faixas
etárias. O equipamento escovódromo se mostrou de grande importância
pois gerou curiosidade e maior participação da comunidade, sobretudo das
crianças. Foram distribuídos a cada atividade kits de higiene bucal infantil
contendo creme dental, fio dental e escova.

Figura 7. Equipe de saúde bucal realizando promoção em saúde na comunidade.

Fonte: Autores, 2023.

É importante destacar que ainda foram feitos atendimentos


odontológicos, ações coletivas e visitas domiciliares em áreas onde a embarcação
não tinha possibilidade de chegar. Nesses casos, o acesso foi feito com uma lancha,
embarcação de pequeno porte que acompanhou a viagem junto a embarcação
de grande porte, em algumas comunidades os agentes comunitários de saúde
auxiliavam com embarcação própria. Em casos como esses, a equipe se prepara e
organizava os materiais a serem levados para atendimento ainda na madrugada
(4:50 da manhã) para chegar em tempo hábil nas comunidades para ofertar aos
usuários acesso aos serviços de qualidade com maior cobertura.

307
Nessa viagem, foram atendidos 343 usuários e realizados 755
procedimentos clínicos pela equipe de saúde bucal, sendo eles divididos em 243
restaurações, aplicação de selante e tratamento restaurador atraumático, 105
exodontias, 30 raspagens, 325 aplicações tópica de flúor e 52 profilaxias, tudo com
apoio de um consultório portátil contendo uma cadeira portátil, um foco clínico
e um compressor que permitia assim uma amplitude nos números de usuários
atendidos e tipos de procedimentos ofertados para uma demanda elevada.
Podemos destacar a efetividade do diário quando comparamos com uma viagem
da equipe anterior a qual foram atendidos um total de 75 usuários e realizados 185
procedimentos onde claramente vemos uma evolução no relato da viagem atual a
qual tivemos um aumento significativo nos atendimentos e procedimentos.
O diário de campo e relatório são ferramentas de inovação na saúde
bucal do município que já se mostraram de grande importância uma vez que
conseguimos identificar os avanços e desenvolvimento de estratégias dentro
dos territórios atendidos, levantamento de dados, compreensão das barreiras
que dificultam o acesso e desafios encontrados durante a viagem, no trabalho
e relação interpessoal da equipe. Importante ressaltar que foi significativo para
o conhecimento e mapeamento dos locais de atuação. O desenvolvimento
das atividades realizadas pela equipe de saúde bucal vem sendo de grande
notoriedade para área ribeirinha de nosso município, beneficiando muito
os moradores dessas comunidades. Observamos um retorno favorável dos
moradores das comunidades em notar a relevância de ter a saúde bucal
saudável, e de que temos a necessidade de manter atendimento regular e
contínuo construindo e realizando a promoção a saúde efetiva e equânime.

Considerações Finais

O capítulo ilustra os desafios e avanços na promoção da saúde bucal em


comunidades ribeirinhas na Amazônia, destacando a iniciativa desse trabalho
em Manicoré na comunidade Barro Alto. A implementação de equipes de saúde
bucal nessas áreas remotas, apesar das adversidades geográficas e logísticas,

308
resultou em avanços significativos no acesso a cuidados odontológicos e na
conscientização sobre a importância da saúde bucal como é demonstrado no
aumento de atendimentos e procedimentos.
A utilização de ferramentas como o diário de campo e o relatório
permitiu o registro detalhado das atividades executadas, desafios encontrados
e conquistas da equipe, evidenciando a necessidade de adaptação, criação
de novas estratégias e planejamento para superar as barreiras existentes.
A experiência em Manicoré reforça a importância de políticas públicas
que considerem as particularidades dessas comunidades, garantindo a
continuidade e o aprimoramento dos serviços de saúde bucal.
Em última análise, este capítulo demonstra que, mesmo diante de
obstáculos consideráveis, é possível promover a saúde bucal de forma eficaz e
equitativa e de qualidade em áreas remotas e de difícil acesso. A dedicação da
equipe de saúde bucal, aliada ao apoio da comunidade com uma coordenação
ativa à busca por soluções inovadoras, resultou em um impacto positivo na
qualidade de vida dos ribeirinhos, consolidando a importância de ações
contínuas e abrangentes para a promoção da saúde bucal na Amazônia.

Referências
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novo dia: SUS presente nos territórios e na vida de Manicoré, AM. Porto Alegre: Editora
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interior do Amazonas. Revista Eletrônica Acervo Saúde, v. 13, n. 11, p. e9273-e9273.

310
Saúde na Amazônia: a implantação
e atuação das equipes de saúde
bucal na área ribeirinha município de
Manicoré/AM
Mesraim Salef Rocha do Rosário
Maria Adriana Moreira
Sabrina Araújo de Melo
Vanessa Colares Magalhães Alves
Raniele Alana Lima Alves

Introdução

A preservação do ecossistema da Amazônia e a relação entre sociedade


e natureza traz em discussão a exploração dos recursos naturais e as lógicas
de consumo num sistema capitalista. Esses recursos são essenciais para a
sobrevivência humana, influenciando diretamente a qualidade de vida e o
bem-estar, tendo como consequencia as desigualdades sociais e as iniquidades
em saúde. As ações humanas na Amazônia e os projetos de “desenvolvimento”
criam situações como desmatamento, queimadas, mineração, agricultura e
pecuária, que são realizadas de forma insustentável. Esses fatores têm potencial
para impactar negativamente a saúde da população (Couto, 2021).
A Amazônia constantemente é marcada por discurso que reforça
padrões de doenças e endemias, como um lugar de complexidade na
operacionalização de políticas públicas de saúde, por apresentar aspectos
geográficos e ecológicos diversos como a extensão territorial, e suas vias de
acesso que tem prevalência a via fluvial (Martins, et al. 2022). É importante
reforçar que as características desse território têm grande relevância quando
se fala na criação de acesso aos serviços de saúde, como nos exemplifica
Kadri et al. (2019) ao apontar as Unidades Básicas de Saúde Fluviais (UBSF)

311
como um modelo tecnoassistencial capaz de colaborar para superação das
iniquidades no SUS na Amazônia ribeirinha. Martins et al. (2022) reforçam
que a complexidade da Amazônia gera movimentos contínuos e visibiliza
saberes locais a partir de olhares abertos a epistemologias outras.
Para responder as novas demandas por saúde na Amazônia, é necessário
que o Sistema Único de Saúde (SUS) renove suas abordagens na região, assim
é importante levar algumas especificidades regionais em consideração. Sobre
isso, já se discute sobre o fator amazônico que diz sobre disponibilizar maior
alocação de recurso para a atenção à saúde na Amazônia, devido às distâncias
geográficas, fluxo migratório (Couto, 2021). Além disso, o cuidado em levar
saúde para populações com uma diversidade étnica, como são os casos dos
povos tradicionais: povos ribeirinhos, quilombolas, comunidades rurais e
indígenas. As características geográficas da região demandam estratégias
diferenciadas para tornar o acesso universal à saúde.
Dentro das necessidades de saúde da população brasileira no que diz
respeito atenção à saúde bucal, a doença cárie ainda hoje é um dos principais
desafios encontrados na odontologia, na saúde pública, pela sua prevalência
e gravidade. Por ter um caráter bio-social um dos principais fatores de risco
está associado a fatores culturais e socioeconômicos (Brasil, 2018). A doença
quando não tratada pode levar a agravos severos causando muita dor ao
usuário, impactando na sua qualidade de vida e em atividades do dia a dia
como na mastigação, ao sorrir, nas atividades do trabalho, escola e autoestima.
Rosário et al. (2024) salienta que as dificuldades de acesso a saúde bucal que
as populações rurais e ribeirinhas da Amazônia enfrentam quanto ao alcance
dessas políticas em seus territórios ainda persistem.
Sabe-se que por muito tempo a assistência odontológica no sistema
público de saúde foi caracterizada por estar restrita a um grupo populacional
específico, como os escolares. Com isso o restante da população ficava
excluído e acessava serviços de cunho predominantemente clínicos, com baixa
cobertura e baixa resolutividade (Brasil, 2018).

312
Nesse contexto que a secretaria municipal de saúde, juntamente
com a prefeitura municipal de Manicoré, iniciou um projeto desafiador: a
implantação de equipes de saúde bucal na zona ribeirinha do município. Na
execução desse projeto, foram enfrentadas diversas dificuldades, no entanto,
os resultados obtidos foram e estão sendo satisfatórios, contribuindo para a
promoção da saúde bucal nas comunidades ribeirinhas da região.
A implantação das Equipes de Saúde da Família Ribeirinhas (eSFR)
na zona rural dos pequenos municípios do interior do Amazonas enfrenta
diversas dificuldades. No entanto, tem desempenhado um papel fundamental
na ampliação da cobertura e no acesso da população aos serviços de saúde,
especialmente à atenção à saúde bucal. A população ribeirinha frequentemente
precisa se deslocar de suas comunidades para áreas urbanas em busca de
atendimento, o que pode acarretar o adiamento do tratamento de enfermidades
devido às dificuldades de locomoção, seja pela falta de transporte adequado ou
pelas longas distâncias a serem percorridas.
Neste capítulo, iremos abordar o processo de implantação das equipes
de saúde bucal na travessia no território líquido e discutir os resultados que
essa implantação obteve e os desafios para levar os serviços de saúde bucal
às comunidades mais remotas da região. Ademais, o presente texto também
é uma homenagem aos profissionais de saúde bucal que se dedicaram a essa
causa, e um registro importante de uma experiência que pode inspirar outras
iniciativas de promoção da saúde nas regiões mais remotas do país.
A implantação das equipes de saúde bucal nas comunidades ribeirinhas
contribuiu de forma significativa para a melhoria da saúde bucal dessa
população. Antes da implantação, menos de 15% da população era assistida
com esse serviço de saúde. O trabalho de sensibilização e educação em saúde
ajudou a mudar a cultura de cuidados em saúde bucal nas comunidades
ribeirinhas do município.

313
Acesso à Saúde Bucal: um Direito de todas as pessoas

Garantir acesso universal e integral é um grande desafio a ser superado pelo


nosso sistema único de saúde (SUS) principalmente para os povos ribeirinhos, em
que temos uma maior dificuldade de fazer saúde de levar as ações e serviços para
esses locais ditos remotos, que na Amazônia denominamos de território líquido
(Schweickardt et al., 2016). Assim, é direito dos ribeirinhos o acesso universal e
integral aos serviços de saúde bucal, que é fundamental para a qualidade de vida e
o bem-estar das comunidades ribeirinhas, quando todos devem ter a oportunidade
de receber atendimento de qualidade e humanizado. Além do mais, é justo e
equânime que essas ações sejam implantadas e implementadas em todas as regiões
do país a fazer valer todos os princípios do SUS.
O aprendizado com essa experiência é valioso em diversos aspectos.
Primeiramente, foi possível compreender a importância de considerar as
particularidades e desafios das áreas ribeirinhas ao planejar e implementar
políticas de saúde bucal em alvos prioritários. A geografia, a infraestrutura
limitada e o isolamento geográfico demandam abordagens adaptadas e
estratégias específicas para garantir o acesso aos serviços odontológicos.
Além disso, a inclusão da saúde bucal nas políticas de saúde ribeirinha
ressalta a necessidade de uma abordagem integral e interdisciplinar. A saúde
bucal não deve ser vista isoladamente, mas sim como parte integrante da
saúde geral dos usuários. A articulação entre os profissionais de saúde bucal,
os profissionais de atenção básica e outros membros da equipe de saúde é
fundamental para promover uma abordagem holística e abrangente.
Outro aspecto significativo é o reconhecimento da importância da
prevenção e da promoção da saúde bucal, mas ações que estejam de fato
alinhadas aos princípios da Política Nacional de Promoção da Saúde. Posto
isso, Kusma, Moysés & Moysés (2012) apontam que por um longo período
as práticas de saúde bucal descritas como promoção da saúde realizadas
no âmbito da APS foram baseadas em modelos tradicionais, intervenções

314
centradas em palestras, aplicação de fluoreto desenvolvido principalmente nas
escolas. Os autores reforçam que tais intervenções eram paliativas por ignorar
fatores estruturais que corroboram para uma saúde bucal deficiente.
A promoção da saúde bucal deve atuar na mitigação das iniquidades
por meio de ações em seus determinantes. Essas ações são implicadas com
o direito a saúde, a equidade, a cidadania, a proteção social. Além disso,
essas ações de promoção da saúde bucal alinham-se com as demandas de
populações de territórios específicos que dialogue com seus modos de vida
(Kusma, Moysés & Moysés, 2012).
A Política Nacional de Saúde Bucal define que as ações de saúde bucal
na APS devem envolver o cuidado em todos os ciclos de vida, garantindo a
resolutividade dessas ações nesse ponto da rede são fundamentais ações que
envolvam a prevenção, promoção, proteção e reabilitação em diferentes áreas
da odontologia. É necessário empenho em ações no campo da gestão do
trabalho, formação e educação permanente (Brasil, 2018).
Nesse sentido, a educação em saúde bucal na APS tem como principal
aspecto fortalecer a autonomia dos seus usuários no processo saúde-doença.
Desse modo, ações educativas e de promoção da saúde bucal são fundamentais
para conscientizar as comunidades ribeirinhas sobre a importância dos
cuidados bucais e incentivar práticas saudáveis. Essas ações se mostram como
experiências efetivas, visto que estão contextualizadas nos seus territórios de
atuação, superam práticas odontológicas clínicas e podem contribuir para a
redução da incidência de problemas bucais e para a melhoria da qualidade de
vida das pessoas. O estudo de Cordeiro et al. (2024) fortalece essa discussão
ao concluir em sua pesquisa que os serviços de saúde bucal na zona ribeirinha
rural na Amazônia ainda reproduzem o modelo biomédico centrado na
doença, e destacam a necessidade de reorientação do modelo de saúde bucal
com foco na promoção da saúde e prevenção de saúde bucais.
A inclusão da saúde bucal como direito dos ribeirinhos destaca a
importância da participação social e do envolvimento das comunidades. É

315
essencial ouvir as necessidades e demandas dos ribeirinhos, envolvê-los nas
decisões e nas ações de saúde bucal, e promover a autonomia e a capacitação
para que possam ser agentes ativos na promoção de sua própria saúde.

Território de Manicoré: um território pleno de potências

Manicoré está localizado no interior do estado do Amazonas, região


norte do país, pertencente ao sul amazonense e microrregião do rio madeira,
com uma área total de 48 282,478 km² e uma população estimada pelo Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 2022) de 53.914 habitantes,
sendo que desta população aproximadamente 22.000 habitantes residem em
área ribeirinha. O território está dividido em 7 polos estratégicos: Verdum,
Cachoeirinha, Democracia, Capananzinho, Capanã Grande, São Vicente
e Barro Alto onde tem a atuação das equipes de saúde da família ribeirinha
(Figura 1).

Figura 1. Cobertura das Estratégias de Saúde da Família Ribeirinha (eSFR) do


município de Manicoré/Amazonas.

Fonte: Coordenação de Planejamento, Secretaria Municipal de Saúde (SEMSA/


MANICORÉ).

316
Os esforços realizados pelas equipes de saúde na zona rural e gestores é
fundamental para superar esses desafios encontrados. Nesse contexto, a Secretaria
de Saúde de Manicoré tem atuado no planejamento e coordenar as ações de
saúde no município, incluindo a saúde bucal (Moreira et al., 2024). É necessário
o envolvimento de profissionais de saúde bucal, como dentistas e auxiliares de
saúde bucal, que possam atuar nas comunidades ribeirinhas, levando atendimento
preventivo, orientações de higiene bucal e tratamentos necessários.
É preciso também investir e promover a capacitação e educação
permanente desses profissionais, para que estejam preparados para lidar com
as particularidades e desafios do território ribeirinho. A utilização de barcos
e embarcações adaptadas como unidades móveis de saúde é uma estratégia
eficaz para levar atendimento odontológico às comunidades ribeirinhas mais
isoladas. A participação da população ribeirinha também é essencial nesse
processo. A promoção de ações educativas, como palestras e oficinas sobre
saúde bucal, pode ajudar a sensibilizar e engajar as comunidades em relação à
importância dos cuidados bucais e a busca por serviços de saúde disponíveis.

O Ponto de Partida: do ensaio à obra

O munícipio de Manicoré possui uma vasta extensão de território líquido


onde vivem as margens dos rios e igarapés, muitas famílias que formam as
comunidades ribeirinhas. O acesso a essas comunidades e oferta de serviços de saúde
é complexo devido os fatores relacionados ao meio ambiente (como os períodos de
seca e estiagem). Nesse contexto, conhecer esses territórios é o primeiro passo para
implementar qualquer projeto, seja na área de saúde ou áreas afins.
A implantação das equipes de saúde bucal nas comunidades ribeirinhas
de Manicoré foi realizada, inicialmente, com as comunidades polo, por meio de
um levantamento das demandas e necessidades das populações em seus territórios
(Figura 2). A partir disso, foi realizado um planejamento entre prefeitura e
secretaria municipal de saúde para acordar a construção e implementação das
equipes de saúde bucal em sete comunidades ribeirinhas estratégicas. Sendo

317
elas, distrito de São Vicente, Ponta do Campo (Capanã Grande), Capanazinho,
Democracia, Barro Alto, Verdum e Cachoerinha (Fonseca Junior et al., 2024).
No processo de planejamento das equipes de saúde bucal nas áreas
ribeirinhas, foi fundamental contar com o apoio e engajamento de diversos setores
de saúde. A coordenação teve articulação e empenho que foram fundamentais
para garantir uma abordagem abrangente e integrada, fortalecendo a prevenção e
a promoção da saúde bucal nas áreas ribeirinhas. Suas expertises e conhecimentos
técnicos foram essenciais para identificar as demandas e necessidades da população
ribeirinha, bem como para propor soluções viáveis e eficazes.
Com o comprometimento e trabalho conjunto dos gestores municipais
(prefeito, vice-prefeito, secretária), foi possível planejar e implementar ações
visando melhorar a saúde bucal das comunidades ribeirinhas, proporcionando
acesso igualitário e cuidados adequados para todos. Diante da extensão da área
rural e o número de pessoas que necessitavam de cuidados, foi dado início à
contratação e inscrição/cadastramento dos novos profissionais Cirurgiões
Dentistas e Auxiliares de Saúde Bucal das Estratégias de Saúde da Família
Ribeirinha (eSFR) no Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES).
• Para ocorrer a Implantação, foram desenvolvidas as seguintes
etapas:
• Levantamentos de dados, análise da cobertura e da qualidade dos
serviços;
• Apresentação e Aprovação do projeto ao Conselho Municipal de
Saúde em abril de 2021;
• Aprovação do projeto na Comissão Intergestores Bipartite;
• Credenciamento das equipes publicado em diário oficial no dia 10
de setembro de 2021;
• Contratação das equipes de saúde bucal;
• Aquisição de Equipamentos Odontológicos Portáteis;
• Aquisição de Escovódromo;
• Aquisição de Kits de Escovação (Escova, creme dental e fio dental).

318
Promoção de saúde bucal: desafios e perspectivas

A Atenção Básica significa o primeiro nível de atenção à saúde e


sustenta-se no princípio da integralidade, compreendido como a articulação
de ações de promoção da saúde e prevenção, tratamento e reabilitação de
doenças e agravos. Esta é uma formulação típica do SUS, que deixa evidente os
seus princípios e suas diretrizes organizativas e é incorporado pela Estratégia
da Saúde da Família (ESF). Desde a criação da Política Nacional de Atenção
Básica, a forma de pensar e agir vai em direção de um novo modelo de atenção
à saúde das pessoas, famílias e comunidades para a construção do SUS,
contando contado com a participação da saúde bucal (Lucena et al., 2011). No
contexto de saúde bucal, o SUS desempenha um papel crucial ao disponibilizar
serviços odontológicos para a população, mesmo diante dos inúmeros desafios
enfrentados no território amazônico (Figura 2).

Figura 2. Profissional de saúde bucal na produção do acesso no território ribeirinho.

Fonte: autores, 2023.

319
A luta pelo direito à saúde nos mobiliza para promover o acesso aos cuidados
adequados à saúde bucal. Assim, cada sorriso restaurado, cada dor aliviada e cada
prevenção realizada são vitórias conquistadas. A saúde bucal não deve ser tratada
como um luxo, mas sim como um direito básico de todos os cidadãos. Ela impacta
diretamente a saúde geral, a autoestima e a qualidade de vida das pessoas. Por
isso, devemos valorizar e apoiar os esforços do SUS na promoção da saúde bucal,
incentivando a conscientização, a prevenção e a busca por tratamento. Vamos
reconhecer a importância da saúde bucal no SUS, estimulando a valorização dos
profissionais e reivindicando investimentos que garantam melhores condições de
atendimento. Juntos, podemos construir um sistema de saúde que ofereça a todos
a oportunidade de sorrir com saúde e dignidade.

Saúde bucal na Área Ribeirinha: estratégias de promoção


da equidade do acesso

A Política Nacional de Saúde Bucal – Programa Brasil Sorridente foi


criado em 2004 para melhoria do acesso da população brasileira aos serviços
de saúde bucal. Desse modo, o Brasil Sorridente veio para garantir ações de
promoção, prevenção e recuperação da saúde bucal, e para mudar essa concepção
de uma odontologia clínica centrada na extração dentária (Brasil, 2022).
Embora haja uma política que oferte serviços odontológicos de forma
gratuita no SUS, quanto a equidade ainda persiste desafios relacionados às
desigualdades de uso de serviços de saúde bucal por diferentes grupos sociais,
relacionado às diferenças socioeconômicas e diferentes níveis de escolaridade.
Além disso, essas desigualdades são reforçadas pela localidade da residência,
ou seja, existem diferenças nas condições de saúde bucal entre áreas rurais e
urbanas (Cordeiro et al., 2024).
Promover equidade no acesso à saúde bucal no SUS em territórios
ribeirinhos na Amazônia sempre será desafiador. Buscamos apresentar as
estratégias e os resultados alcançados na gestão da saúde bucal no município de
Manicoré. Além disso, a aquisição de equipamentos portáteis (Figura 3) contribuiu

320
para a realização de restaurações, profilaxias, trabalhos coletivos como escovação
supervisionada e distribuição de kits de higiene oral (Figura 4).

Figura 3. Equipamento Portátil para a realização de procedimentos odontológicos.

Fonte: Autores, 2023.

Figura 4. Distribuição de kits de higiene oral para crianças ribeirinhas.

Fonte: autores, 2023.

321
As condições de acesso a consulta odontológica apresentam algumas
dificuldades, tendo em vista que, a elevada prevalência da doença cárie
juntamente com a perda de elementos dentários de forma prematura. Nesse
sentido, o trabalho realizado pela equipe de saúde bucal vem sendo de grande
importância para a zona rural de nosso município beneficiando de forma
significativa os moradores das comunidades ribeirinhas. As estratégias de
visitas domiciliares, atendimentos e palestras percebemos tem produzido um
retorno favorável da comunidade em saber a importância de ter uma saúde
bucal saudável. Temos a necessidade de manter um atendimento regular e
contínuo para a promoção de saúde efetiva e de qualidade. Assim, podemos
destacar que a implantação das equipes de saúde bucal nas comunidades rurais
da região teve um impacto muito positivo na promoção da saúde bucal da
população local.
Após um período de trabalho árduo e constante, desafiador em
todos os níveis, os resultados da implantação das equipes de saúde bucal nas
comunidades ribeirinhas foram satisfatórios. As equipes conseguiram atingir
uma cobertura de 100% das comunidades ribeirinhas, alcançando todos os
moradores e prestando serviços de qualidade a todos. O indicador de saúde
bucal também mostrou melhora significativa, como observado no gráfico 1,
que demonstra um aumento na proporção de atendimentos odontológicos
realizados em gestantes correspondendo a evolução do indicador 3. Outras
melhorias também foram observadas, considerando que a população
local passou a ter amplo acesso a serviços de prevenção, como escovação
supervisionada e aplicação de flúor, o que contribuiu para a conscientização do
individual e coletivo da comunidade. As equipes de saúde bucal conseguiram
promover a mudança de hábitos e comportamentos em relação à saúde bucal,
conscientizando a população sobre a importância de cuidados preventivos e
incentivando a adoção de práticas saudáveis.

322
Gráfico 1. Proporção de gestantes com atendimentos odontológicos realizados no
período de 2021 a agosto de 2023.

Fonte: Planejamento SEMSA, 2023.

A implantação das equipes de saúde bucal nas comunidades ribeirinhas


de Manicoré/AM resultou em uma cobertura de 100%, melhorando o indicador
de saúde bucal e sensibilização da população sobre a importância da prevenção e
cuidados com a saúde bucal. Esses resultados correspondem às expectativas da gestão
de saúde do município, dos trabalhadores de saúde e principalmente dos usuários
de saúde ribeirinhos e contrariam estudos como a análise da Pesquisa Nacional
de Saúde de 2019, que apresentou disparidades no uso dos serviços odontológicos
pelas regiões do Brasil, em que as regiões Sudeste, Centro-Oeste e Sul apresentaram
maiores porcentagens de indivíduos que haviam realizado consulta com o dentista
em comparação as regiões Norte e Nordeste (Fagundes et al., 2021) .
O estudo de Cohen-Carneiro et al. (2009) evidencia a ausência de serviços
odontológicos e acesso precário em comunidades ribeirinhas do Amazonas.
Ainda, Cordeiro et al. (2024) reforçam que um quarto dos indivíduos que vivem
em comunidades ribeirinhas na zona rural de Manaus não foi ao dentista nos
últimos três anos, reforçando a persistência da reprodução do modelo biomédico
nos serviços odontológicos. Por isso, os resultados apresentados em Manicoré

323
são tão expressivos e significativos no que se refere ao acesso à saúde bucal à
essas populações que ficaram invisíveis pelas políticas de saúde.

Equipamentos: as tecnologias leves duras e duras que


potencializam a vida!

Merhy (2014) ao discutir sobre as tecnologias de saúde nos diz que


o trabalho em saúde é complexo uma vez que não envolve somente o uso
de equipamentos e máquinas, mas amplia sua dimensão numa relação de
interseção, que nos serviços de saúde envolve o ato da produção (produção do
cuidado em saúde) e o consumo do produto de forma simultânea.
Merhy & Feuerwerker (2014) acrescentam que para atuar nesse processo
de interseção o trabalhador de saúde utiliza “caixa de ferramentas tecnológicas”.
Os autores descrevem que são três tipos de caixa de ferramentas: a primeira se
refere as tecnologias que permitem as intervenções terapêuticas, são as chamadas
tecnologias duras e são exemplificadas pelos equipamentos tecnológicos como as
máquinas, instrumentos como o estetoscópio, como também ferramentas presentes
nas estruturas de organização dos serviços e nas normas que direcionam esses
serviços. Já a segunda caixa de ferramentas é formada pelos saberes constituídos na
formação do profissional de saúde, chamado de tecnologias leve-duras é ilustrado
pelos saberes da clínica médica, propedêutica, epidemiologia e são utilizados in
ato no momento do encontro entre profissional de saúde e usuário, permite o
raciocínio clínico do profissional. A terceira caixa de ferramentas é denominada de
tecnologias leves e é fundamentada na relação micropolítica, quando os produtos
relacionais são gerados a partir do encontro trabalhador-usuário e se baseia na
construção de vínculos, escuta, confiança. Portanto, para uma produção do
cuidado em saúde potente é necessário modos diferentes de produção de ações de
saúde. Assim, Merhy e Feuerwerker (2016, p. 67) afirmam que é preciso: “propor
novos arranjos organizativos para oferecer cuidados na intensividade necessária a
cada situação... Novos arranjos tecnológicos fazem-se necessários”.
A partir disso, a implantação da equipe de saúde bucal na área
ribeirinha trouxe consigo transformações significativas, tanto para as

324
comunidades próximas quanto para as mais distantes. Essas conquistas e
resultados positivos foram possíveis devido a aquisição de equipamentos
(tecnologia dura) para auxiliar no trabalho realizado na zona rural, como o
Consultório Odontológico Portátil que é composto por: uma cadeira, mocho,
refletor, maleta odontológica e um compressor odontológico esse equipamento
permitiu uma vasta amplitude de serviços ofertados (Figuras 5 e 6).

Figura 5. Consultório portátil utilizado nas estratégias de saúde da família ribeirinha

Fonte: Autores, 2023.

Figura 6. Cadeira, mocho, refletor, maleta odontológica e compressor odontológico.

Fonte: Arquivo pessoal, 2023.

325
A ação coletiva com os moradores é de muita importância
principalmente para o público infantil onde é trabalhada a educação em
saúde e conscientização para mudança de hábito. Foi feito investimento em
macro modelos que são modelos de boca em grande escala acompanhada por
escovas para ilustrar e ensinar a forma correta da escovação e no equipamento
o escovódromo portátil que é composto por duas pias, dois espelhos, dois
reservatórios e dois espelhos (Figura 7) também foi adquirido 8mil kits de
saúde bucal composto por 1 escova, 1 fio dental e 1 creme dental, possibilitando
assim um trabalho mais amplo e de melhor qualidade quando feita palestras e
a escovação supervisionada pelo cirurgião-dentista.
A aquisição de materiais odontológicos adequados se mostrou um
benefício crucial para garantir o atendimento e a qualidade dos serviços
prestados. Um dos resultados positivos alcançados foi a melhoria da qualidade
de vida da população ribeirinha. Através de consultas regulares, tratamentos
odontológicos e ações preventivas, muitos problemas bucais foram prevenidos,
tratados e solucionados. Isso resultou em uma redução significativa da dor,
desconforto e complicações associadas às condições bucais, permitindo que as
pessoas desfrutassem de uma melhor saúde geral. Além disso, a implantação
da equipe de saúde bucal também teve um impacto positivo na autoestima e
na qualidade de vida das comunidades ribeirinhas. A recuperação de sorrisos,
a resolução de problemas estéticos e a reabilitação de funções mastigatórias
trouxeram um aumento da confiança e do bem-estar das pessoas, refletindo
em sua interação social e autoconfiança.

326
Figura 7. Equipamento escovódromo portátil dos dentes.

Fonte: Autores, 2023.

A disponibilidade de instrumentais, equipamentos, medicamentos e


materiais de qualidade possibilitou um atendimento mais eficaz e seguro. Isso
contribuiu para a realização de procedimentos odontológicos diversos, desde a
restauração de dentes até a confecção de próteses, aumentando a capacidade da
equipe em atender às demandas das comunidades ribeirinhas. Essa requisição
beneficiou tanto as comunidades mais próximas quanto as mais distantes, uma
vez que garantir o abastecimento adequado em todas as áreas é essencial para a
prestação de um serviço de saúde bucal abrangente e de qualidade. Assim, foi
possível oferecer um atendimento mais equitativo, reduzindo as disparidades de
acesso e ampliando o alcance dos cuidados odontológicos nas áreas ribeirinhas.

Considerações Finais

Diante dos desafios enfrentados e superados pela equipe de saúde


bucal na implantação de serviços nas comunidades ribeirinhas de Manicoré/

327
AM, podemos concluir que a presença de profissionais de saúde nas áreas
mais remotas é fundamental para a promoção da saúde e qualidade de vida
da população local. Além disso, a implantação das equipes de saúde bucal
nas comunidades ribeirinhas foi um exemplo concreto da importância
da estratégia de saúde da família na promoção de cuidados preventivos e
na mudança de comportamento em relação à saúde bucal. É importante
ressaltar que o sucesso do projeto não teria sido possível sem a dedicação e o
comprometimento dos profissionais de saúde, que enfrentaram dificuldades e
superaram obstáculos para levar serviços de qualidade à população ribeirinha.
A interação dos profissionais com a comunidade local também foi um fator
crucial para o sucesso do projeto, mostrando a importância do diálogo e da
escuta ativa na promoção da saúde.
A inserção da equipe de saúde bucal nas comunidades ribeirinhas
também trouxe desafios e dificuldades. A falta de infraestrutura adequada
nas localidades mais remotas, como energia elétrica e água tratada, tornou o
trabalho dos profissionais de saúde mais difícil. Além disso, a navegação pelos
rios para chegar às comunidades ribeirinhas pode ser perigosa em algumas
épocas do ano, o que exige cuidados especiais por parte das equipes de saúde.
Mesmo diante desses desafios, a implantação das equipes de saúde bucal nas
comunidades ribeirinhas de Manicoré/AM foi uma experiência muito positiva.
O trabalho dos profissionais de saúde contribuiu para a melhoria da qualidade
de vida dos moradores e para a promoção da saúde bucal na região.
Isso nos mostra que a superação dos desafios enfrentados requer
esforços coletivos e a parceria entre diversos atores, como profissionais de
saúde, gestores públicos, comunidades e demais setores da sociedade. Somente
pela cooperação e o compromisso conjunto é possível avançar na promoção
da saúde bucal e na garantia do direito à saúde para todos, incluindo os
ribeirinhos. Esse aprendizado nos permite buscar soluções inovadoras para
fortalecer políticas públicas e garantir o acesso universal e equânime aos
serviços de saúde bucal nas áreas ribeirinhas.

328
Por fim, fica evidente que a implantação das equipes de saúde bucal
nas comunidades ribeirinhas teve um impacto positivo na vida das pessoas
e na saúde da população. Como profissionais da saúde, é importante
continuarmos trabalhando para levar serviços de qualidade para todas as
pessoas, especialmente aquelas que vivem em áreas mais remotas e de difícil
acesso. Podemos dizer que a universalidade, integralidade e equidade se
fazem presentes no coração da Amazônia. Apesar das barreiras encontradas,
demonstramos que no território líquido há condições de ter um SUS forte e
presente na vida dos ribeirinhos.

Referências
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Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Brasília. Saúde Buca no SUS. Disponível
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101-132.

330
Capacitação em primeiros socorros
nas escolas: instrução de manobra de
Heimlich na prevenção de engasgos em
crianças no município Nhamundá, AM
Milton Gama dos Santos
Lupuna Corrêa de Souza
Liliam Rafaelle Souza da Silva
Alcineia Fontes Neto
Luan Marinho de Souza

Introdução

A capacitação em primeiros socorros é uma medida essencial para


garantir a segurança das crianças em ambiente escolar. Assim, este estudo tem
como objetivo analisar a implementação de um programa de treinamento para
a realização da manobra de Heimlich em profissionais de educação infantil no
município de Nhamundá.
Nhamundá é um município do Estado do Amazonas localizado na
Região de Saúde Baixo Amazonas integrando a Macrorregião Leste fazendo
fronteira com os Estados de Roraima e Pará, tendo como limites geográficos os
municípios vizinhos de Parintins e Urucará. O município possui uma extensão
territorial de 14.107,040km² e sua população, segundo a estimativa de 2022
do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é de 20.136 habitantes
com uma densidade demográfica de 1,43hab/km² e uma distância considerável
da capital de 375Km em linha reta, o que na realidade amazônica não é
levado em conta por não haver estradas que façam esse percurso, totalizando
aproximadamente 577km por meio fluvial com o acréscimo das curvas dos rios.
A viagem entre o município e a capital dura aproximadamente 18 horas
numa embarcação convencional, sendo a disponibilidade 3 dias na semana.

331
Uma alternativa são as lanchas conhecidas como expresso pela sua velocidade
que fazem o mesmo percurso em 12 horas, porém, saindo apenas uma vez por
semana da capital para o município. A dificuldade de logística gera desafios
para o deslocamento e remoção dos usuários, assim houve a necessidade
de trabalhar projetos que minimizam o acesso aos serviços de média e alta
complexidade em Manaus, podendo ser evitados com ações preventivas
principalmente, referentes as capacitações para qualificação dos profissionais.
Nesse sentido, a Secretaria Municipal de Saúde em parceria com a
Secretaria Municipal de Educação por meio do Programa Saúde na Escola
(PSE) realizou uma intervenção no Centro Educacional Infantil Jardim Vitória
Régia, onde 40 dos 57 funcionários receberam instruções práticas sobre a
manobra de Heimlich. Os resultados mostraram uma melhora significativa
na capacidade dos participantes em executar a manobra corretamente,
destacando a importância da continuidade e expansão dessa capacitação para
outras instituições do município.
A segurança das crianças em ambiente escolar é uma preocupação
constante para educadores, pais e autoridades de saúde pública. Nesse sentido,
este projeto se fez relevante, pois, entre os riscos mais comuns enfrentados
pelas crianças em escolas de educação infantil está o engasgo, que pode resultar
em asfixia mecânica, uma condição que, se não tratada imediatamente, pode
levar a consequências graves, incluindo óbito. Diante dessa realidade, torna-se
importante que os profissionais que atuam diretamente com crianças de 0 a 5
anos estejam preparados para lidar com situações emergenciais, de maneira
eficiente e segura.
O capítulo busca relatar e analisar a iniciativa de capacitação realizada
no Centro Educacional Infantil Jardim Vitória Régia, no município de
Nhamundá. O projeto foi desenvolvido em parceria com o Programa Saúde
na Escola (PSE) através dos profissionais de saúde da equipe de estratégia
saúde da família da atenção primaria a saúde e visou instruir os profissionais
da educação infantil sobre a maneira correta de conduzir o desengasgo por

332
meio da manobra de Heimlich. Além disso, busca-se discutir a relevância
da expansão desse tipo de treinamento para todas as escolas do município,
visando a criação de um ambiente escolar mais seguro para as crianças.

O que diz a literatura sobre o problema

A asfixia por engasgo é uma das principais causas de morte acidental


entre crianças pequenas, especialmente aquelas com menos de cinco anos de
idade (Santos & Pereira, 2020). A literatura sobre primeiros socorros destaca
que a intervenção imediata é importante para evitar complicações graves
ou fatais. A manobra de Heimlich, também conhecida como compressão
abdominal, é recomendada como a técnica padrão para desobstruir as vias
aéreas superiores em casos de engasgo por corpos estranhos e após a Lei nº
13.722, de 2018, popularmente conhecida como Lei Lucas, tornou obrigatória
a capacitação dessa manobra como parte das noções básicas de primeiros
socorros para professores e funcionários de estabelecimentos de ensino,
públicos e privados, de educação básica e de estabelecimentos de recreação
infantil. Essa medida legislativa surgiu em resposta a incidentes de engasgo
que resultaram em tragédias evitáveis, sublinhando a necessidade de uma
resposta rápida e eficaz em emergências.
Estudos indicam que cerca de 50% das aspirações ocorrem em crianças
menores de 4 anos, com mais de 94% dos casos ocorrendo antes dos 7 anos de
idade (Oliveira & Mendes, 2019). Nas escolas, a oferta de alimentos sólidos,
como pipoca e feijão, pode aumentar o risco de engasgo, especialmente
quando as crianças são surpreendidas ou distraídas durante a alimentação.
A vulnerabilidade das crianças em situações de engasgo, aliada à falta de
preparo de muitos profissionais que atuam nas escolas, justifica a necessidade
de treinamentos específicos para a realização da manobra de Heimlich, uma
técnica relativamente simples, mas que pode salvar vidas.
Diversos estudos têm apontado a eficácia de programas de treinamento
em primeiros socorros voltados para profissionais da educação, mostrando que

333
esses programas não apenas aumentam o conhecimento técnico, mas também
melhoram a confiança e a prontidão dos funcionários para agir em emergências
(Macedo et al., 2018). A implementação de tais programas em escolas têm sido
visto como uma prática exitosa, especialmente em países como o Brasil, onde
a legislação agora exige que todos os profissionais da educação básica sejam
capacitados em noções básicas de primeiros socorros (Lei nº 13.722, 2018).
A cidade de Nhamundá é um exemplo de uma região onde a
implementação de programas governamentais é eficiente e apresentam bons
resultados denotando um incentivo de novas iniciativas para fomentar ações
preventivas pelos profissionais de saúde. Seguindo essa premissa, as capacitações
locais são estratégias prioritárias no município tendo como destaque o tema
de primeiros socorros principalmente por ser uma ação intersetorial onde
também há uma grande expectativa de resultados satisfatórios levando em
consideração os desafios logísticos relacionados à distância de centros médicos
avançados em caso de remoção de usuários, assim garantindo a segurança das
crianças nas escolas.
Dessa forma os profissionais da Atenção Primaria a Saúde (APS)
identificaram essa demanda bem como a necessidade de uma intervenção
nas escolas e através do Programa Saúde na Escola (PSE) foi possível iniciar o
programa de qualificação dos profissionais de educação. O PSE é uma política
intersetorial que agrega as Secretarias Municipais de Saúde e Educação e as
Coordenadorias Regionais de Educação vinculadas a Secretaria Estadual de
Educação do Amazonas - SEDUC, logo contempla todas as instâncias de
ensino seja municipal ou estadual. O mesmo foi instituído pelo Decreto Nº
6.286, de 5 de dezembro de 2007 e tem como um de seus objetivos promover
a saúde e a cultura da paz, reforçando a prevenção de agravos à saúde, bem
como fortalecer a relação entre as redes públicas de saúde e de educação.
O Programa além de incentivar a realização de avaliações clínicas de
saúde dos alunos, também traz em seu escopo temas transversais para serem
trabalhados nas instituições de ensino conforme a demanda e planejamento

334
municipal. Nesse sentido, a Lei Nº 13.722, de 4 de outubro de 2018, trouxe a
oportunidade de ampliar a parceria entre os setores de educação e saúde do
município de Nhamundá, tornando a capacitação dos profissionais de educação
uma prioridade para os profissionais de saúde, qualificando cada um deles como
agentes multiplicadores de saúde estando aptos para salvarem uma vida.

Relato da experiência no ambiente escolar

Nhamundá é um município que mantem em sincronia os serviços


desenvolvidos pela Secretaria Municipal de Saúde, a qual possui na composição
da APS três Equipes de Estratégia Saúde da Família (ESF) com modelo
tradicional, quatro Equipes de Estratégia Saúde da Família Ribeirinha (eSFR),
uma Equipe de Unidade Básica de Saúde Fluvial (eSFF), além de uma Equipe
Multiprofissional (eMulti) na retaguarda. Dessa maneira conseguem atingir
100% da cobertura da sua população e são responsáveis pelas escolas que
integram o PSE, que atualmente contempla 18 escolas, entre elas municipais
e estaduais totalizando 3.510 alunos tanto na zona urbana como na zona
rural. A unificação dos serviços acarreta inúmeros benefícios tanto para os
profissionais de educação, quanto para os alunos e seus familiares.
O foco da intervenção foi o Centro Educacional Infantil Jardim Vitória
Régia, uma instituição que atende 268 alunos com idades entre três e seis anos
e que conta com 57 funcionários, entre professores, auxiliares, e funcionários
administrativos e de serviços gerais, conforme localização no Mapa 1.

335
Mapa 1. Localização do Centro Educacional Infantil Jardim Vitória Régia.

Fonte: organizado por Lupuna Corrêa de Souza, 2024.

A equipe de saúde priorizou a rede de educação infantil onde há mais


casos de engasgo devido a fase de desenvolvimento da criança. Dessa maneira,
a estratégia para a realização do treinamento selecionou o Centro Educacional
Infantil Jardim Vitória Régia como a primeira escola a receber a capacitação. A
escolha da escola foi acordada com a diretora da instituição, que disponibilizou
o espaço necessário para a realização das atividades.
Os 57 colaboradores da escola foram convidados a participar do
treinamento e 40 deles compareceram. Durante a atividade, foi criada uma
situação hipotética de engasgo em uma boneca, e os participantes foram
questionados sobre como procederiam para realizar o desengasgo. Os
resultados iniciais mostraram que aproximadamente 90% dos participantes
não sabiam como realizar a manobra de Heimlich corretamente.
Após essa avaliação inicial, os participantes foram instruídos por
um profissional de saúde capacitado sobre a técnica correta para realizar a
manobra de Heimlich. A instrução incluiu demonstrações práticas, nas quais

336
os participantes puderam praticar a manobra em bonecas simuladoras de
engasgo. A avaliação final foi feita através de uma nova simulação, onde os
participantes foram convidados a aplicar a técnica aprendida.
Os resultados do treinamento foram bastante positivos. Após a
instrução e a prática supervisionada, todos os participantes demonstraram
uma compreensão clara da técnica e foram capazes de executá-la corretamente
durante as simulações. Esse resultado sugere que a capacitação foi eficaz em
fornecer aos profissionais da escola as habilidades necessárias para lidar com
situações de engasgo, aumentando a segurança dos alunos.
Dos 57 colaboradores da escola, 40 participaram ativamente do
treinamento, incluindo professores, funcionários de serviços gerais, cantineiros
e secretários. A alta adesão ao treinamento é um indicativo do interesse e da
conscientização dos funcionários sobre a importância de estarem preparados
para lidar com emergências. Além disso, os participantes relataram um aumento
significativo na confiança em suas habilidades para agir em caso de engasgo, o
que pode ser crucial em situações reais de emergência. Essa confiança, aliada
ao conhecimento técnico adquirido, sugere que a escola agora dispõe de uma
equipe mais preparada para garantir a segurança das crianças.
Dessa maneira, a capacitação em primeiros socorros nas escolas,
especialmente para a realização da manobra de Heimlich, pode salvar vidas.
Como demonstrado neste relato, a intervenção no Centro Educacional Infantil
Jardim Vitória Régia foi bem-sucedida em preparar os funcionários para lidar com
situações de engasgo, uma das emergências mais comuns entre crianças pequenas.
A expansão desse programa de capacitação para outras escolas do município de
Nhamundá é recomendada, dada a eficácia observada. A disseminação desse tipo
de treinamento pode criar uma rede de segurança mais ampla, garantindo que
todas as crianças do município estejam protegidas por profissionais capacitados.
No entanto, a implementação de programas de capacitação em
áreas rurais ou de difícil acesso, como Nhamundá, requer um planejamento
cuidadoso e a colaboração de múltiplos parceiros, incluindo autoridades de

337
saúde, gestores escolares e a comunidade local. Além disso, é importante que
esses treinamentos sejam contínuos e atualizados regularmente para garantir
que os profissionais estejam sempre prontos para agir.

Considerações Finais

A capacitação em primeiros socorros, com foco na manobra de Heimlich,


é uma medida com vista a segurança das crianças em ambientes escolares. A
intervenção realizada no Centro Educacional Infantil Jardim Vitória Régia
demonstrou a eficácia de programas de treinamento bem estruturados, que podem
capacitar os profissionais para agir de maneira rápida e eficaz em emergências.
A expansão dessa iniciativa para todas as escolas do município de
Nhamundá é fundamental para criar um ambiente escolar seguro e preparado
para lidar com emergências de saúde. Além disso, a continuidade desses
treinamentos, acompanhada de avaliações periódicas, é fundamental para
manter o nível de preparação dos profissionais. A parceria com programas
como o PSE e o apoio das autoridades locais são fatores chave para o sucesso
dessas iniciativas. Ao investir na capacitação dos profissionais da educação,
estamos investindo na segurança e no bem-estar de nossas crianças.

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338
“Chá de Bênçãos”: uma prática
integrativa aplicada em um grupo de
grávidas em Nhamundá-AM
Neliane Tavares de Souza
Gercicley Rodrigues dos Santos

A experiência do processo fisiológico da gestação é um momento


único e particular para a mulher. Um período de emoções apuradas, em
que, apesar de individual, envolve a família, amigos e comunidade em que
está inserida. Os tempos hodiernos, lutamos para cada vez mais atingir um
modelo de saúde que imprima um perfil humanizado para tudo que envolva a
gravidez, das etapas do pré-natal ao parto humanizado. Por parto humanizado,
Carneiro (2011) entende que é aquele com o mínimo de intervenções médicas
e farmacológicas possíveis ou, então, o que respeita o tempo físico e psíquico
de cada mulher para parir, em ambiente respeitoso e acolhedor e com seu
consentimento informado para todo e qualquer procedimento realizado. Nessa
busca de modelo flexível e humanizado, alicerçado as Práticas Integrativas e
Complementares em Saúde (PICS) foi estruturado atividades com um grupo
de grávidas a partir do projeto “Chá de Bênçãos”, uma iniciativa pioneira no
município de Nhamundá.
Segundo o Ministério da Saúde (2024), as PICS são abordagens
terapêuticas que têm como objetivo prevenir agravos à saúde, a promoção e
recuperação da saúde, enfatizando a escuta acolhedora, a construção de laços
terapêuticos e a conexão entre ser humano, meio ambiente e sociedade. Estas
práticas foram institucionalizadas pela Política Nacional de Práticas Integrativas
e Complementares no Sistema Único de Saúde (PNPIC) e, atualmente, o Sistema
Único de Saúde (SUS) oferece, de forma integral e gratuita à população. A PNPIC
foi aprovada através da Portaria GM/MS n 971, de 3 de maio de 2006.

339
O projeto “Chá de Bençãos” foi realizado no município de Nhamundá,
localizado na região do Baixo Rio Amazonas, estado do Amazonas, apresenta
uma população residente de aproximadamente 20.136 habitantes, com
uma taxa de crescimento anual de 0,81%. O território abrange uma área de
14.107,04 km², resultando em uma densidade demográfica de 143 habitantes
por quilômetro quadrado. No que diz respeito à saúde, a taxa média de
mortalidade infantil é de 23,6 para cada 1.000 nascidos vivos (IBGE, 2022).
A Unidade Mista de Saúde Municipal Coronel Pedro Macedo
registrava relatos de violência obstétrica, observados tanto em consultas
puerperais domiciliares quanto em atendimentos nos consultórios. Esses
casos refletem uma deficiência no acesso à assistência à saúde, agravada pelo
contexto pós-pandemia.
Ao longo da história, as mulheres têm sido vítimas de diversas formas
de violência, incluindo aquelas que ocorrem nos períodos de gestação,
parto, nascimento e pós-parto. Esses momentos de maior vulnerabilidade
feminina são frequentemente marcados pela violência obstétrica (VO), que
pode se manifestar por meio de agressões psicológicas, verbais, físicas e até
sexuais, podendo estar associada à discriminação na assistência, negligência e
imposição de procedimentos com ou sem o consentimento da mulher (Souza
& Dias, 2019). Esse tipo de violência caracteriza-se pela imposição de dor e
sofrimento evitáveis, comprometendo a dignidade e os direitos das gestantes.
O ano de 2022 marcou a necessidade imperativa de cada profissional
em tornar-se criativo para construir uma nova relação com os usuários. Diante
deste cenário, os profissionais realizaram o projeto “Chá de bênçãos” que é
caracterizado como um rito de passagem da mulher gravida, em preparação
para o parto. Para além, o “Chá de bênçãos” é um evento realizado ao término
da gestação, geralmente após a 37° semana, quando a gestante se prepara
para o parto e a chegada do bebê. Neste momento, marcado por ansiedade e
mudanças, é crucial contar com apoio da rede de amparo e o fortalecimento
proporcionado por outras mulheres que já passaram por experiências similares.

340
Apesar de sugerir um tom religioso, o “Chá de bênçãos” não é
necessariamente um evento de cunho religioso. Nele, é possível convidar
pessoas queridas de diversas religiões, crença para orarem e pedirem proteção
divina para mãe e o bebê durante o parto. A atmosfera do “Chá de bênçãos” é
geralmente serena e reconfortante, com decorações suaves, velas e flores. Uma
atividade comum é a pintura da barriga da gestante, simbolizando o vínculo
entre mãe e filho(a) celebrando a beleza da gravidez, representando um aporte de
fortalecimento e encorajamento emocional para o grupo de gravidas. A escolha
da abordagem para o grupo guarda íntima relação com a prática de doulagem
exercida pela coordenadora do projeto, buscando incorporar os princípios
norteadores dessa prática com esse grupo, destacando o apoio emocional,
conforto físico e construções de pontes entre os profissionais da saúde e a grávida.
Conforme explica Teixeira (2003), a doula é uma acompanhante de parto
treinada que oferecer apoio físico e emocional contínuo à mulher antes, durante
e após o parto. Seu trabalho concentra-se no corpo, utilizando técnicas como
toques, massagens, exercícios e compressas, que ajudam a reduzir a percepção
da dor e proporcionam um trabalho de parto mais acolhedor. O termo “doula”
vem do grego e significa “mulher que serve”, reforça esse papel essencial de apoio
à parturiente, sustentando uma relação de confiança e acolhimento.
O objetivo deste projeto foi fortalecer a vivência da gestante durante
o período gravídico por meio das PIC, promovendo seu empoderamento e
autonomia feminina. O projeto teve como propósito inserir a experiência do
“Chá de bênçãos” em um grupo de gestantes, proporcionando um espaço de
celebração e apoio. Para isso, buscou-se realizar um levantamento do número
de participantes e estruturar um cronograma de atividades adequado à idade
gestacional de cada uma, atendendo às suas necessidades específicas. Além
disso, o projeto visou contribuir para a redução de casos de violência obstétrica,
promovendo um ambiente de acolhimento e respeito. Também buscou
evidenciar os benefícios das práticas terapêuticas aplicadas, como escalda-pés,
varal de fotos, leitura de cartas de familiares, musicoterapia, aromaterapia e

341
coroação com flores, demonstrando o impacto positivo dessas atividades no
bem-estar das gestantes.
O projeto teve início em janeiro de 2022, no auditório da SEMSA,
com capacidade para atender as 40 gestantes cadastradas e vinculadas às suas
respectivas equipes territoriais. Na primeira etapa, foi realizada a busca ativa
das gestantes, conduzida pelos Agentes Comunitários de Saúde (ACS), com
a estratificação das participantes pela idade gestacional. Na segunda etapa,
reuniu-se a equipe multidisciplinar para organizar e distribuir as atividades e
métodos a serem implementados no projeto.
O planejamento e a execução envolveram uma atividade expositiva
seguida de uma roda de conversa sobre o parto humanizado. Seguido da
realização da prática do ritual de despedida da barriga para as gestantes que
aceitassem participar e que estivessem com 37 semanas de gestação ou mais,
conforme os critérios estabelecidos. Para realizar o ritual, foram necessários
itens como bacias, tapete, flores, ervas, velas, incensos, água morna, música e
um cenário temático. Todos os elementos foram selecionados com o objetivo
de criar um ambiente relaxante e confortável para as gestantes, promovendo
uma experiência de acolhimento e bem-estar.

“Chá de Bênçãos”: ritual de cuidado e preparação para o parto

As práticas “Chá de Bênçãos” foram conduzidas em rodas de conversa


com as gestantes presentes. Durante esses encontros, elas compartilhavam suas
experiências e relatavam a ausência de contrações ou outras alterações fisiológicas
indicativas do início do trabalho de parto. O “Chá de Bênçãos” começa com a
preparação de um escalda-pés com ervas estimulantes, que atuam para desinchar
os membros inferiores. Dentre as ervas, estão também flores e especiarias, como
Conta de Lágrimas, pétalas de rosas brancas e vermelhas, alecrim, jasmim, cravo,
canela e gengibre. Enquanto a gestante fica com os pezinhos na água quente, é lida
a carta de bênçãos para o parto. Ficou estabelecido que a ação teria uma duração
aproximada de duas horas, incluindo a aplicação de terapias ayurvédicas.

342
O Ayurveda é uma medicina de origem indiana, é considerado
o sistema de saber médico tradicional mais antigo do mundo. Seu nome
deriva do sânscrito, em que Ayus quer dizer ‘vida’ e Veda significa ‘ciência’
ou ‘conhecimento’, sendo, portanto, conhecida como a ‘Ciência da Vida’. Essa
tradição milenar é frequentemente descrita como a ‘ciência mãe’, da qual teriam
emanado diversas outras Racionalidades Médicas mundo (Carneiro, 2009).
O Ayurveda, medicina tradicional indiana com mais de cinco mil
anos, é reconhecido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como um
sistema terapêutico e um estilo de vida. Aplicado em diversas partes do
mundo, incluindo o Brasil, destaca-se pelos resultados positivos, face ao olhar
individualizado que tem sobre cada pessoa e sua constituição. A OMS ressalta
sua eficácia tanto na prevenção quanto no tratamento de doenças, indo além
da terapia para abranger uma filosofia de vida (Machado, 2020).
No Brasil, a Ayurveda foi incorporada ao SUS pelo Ministério da Saúde por
meio da Portaria nº 849, de 27 de março de 2017, no âmbito da PNPIC, instituída
pela Portaria nº 971, de 3 de maio de 2006. Essa política reconhece e incentiva o uso
de práticas integrativas na rede pública de saúde, ampliando as opções terapêuticas
disponíveis e promovendo uma abordagem integral do cuidado.
A Medicina Ayurvédica enfatiza a harmonia entre a alma (espírito),
a mente e o corpo, considerando esse equilíbrio essencial para a manutenção
da saúde e da felicidade. Diferente da abordagem da Medicina tradicional, o
ayurveda compreende a fisiologia humana de maneira distinta, associando o
metabolismo aos desequilíbrios dos tecidos corporais causados pela oscilação
dos doshas. Segundo a filosofia por trás desta terapia milenar, acredita-
se que o corpo humano é constituído por três princípios fundamentais
(doshas), que resultam da combinação dos elementos água, terra, fogo, éter
e ar. Para restaurar o equilíbrio entre corpo, mente e espírito, essa prática
milenar emprega diversas intervenções terapêuticas, incluindo aromaterapia,
fitoterapia, nutrição, massagens terapêuticas específicas e yoga (“Medicina
Ayurvédica”, 2023).

343
Ao longo do projeto, foram acompanhadas aproximadamente 70
grávidas na faixa etária de 16 até 35 anos estabelecido o cronograma de
encontro mensalmente onde acontecia no auditório da Unidade de Saúde Jose
Evangelista com demais temáticas sobre o processo gestacional e ao final do
encontro era realizado o chá de bênçãos e com estratificação de cumprimento
de todas as consultas de enfermagem, médico, odontológica, vacina, teste
rápidos sorológicos e exames laboratoriais preconizado pelo Ministério da
Saúde que tiveram acesso as PICS.
Avaliando as ações do projeto foi verificado o fortalecimento da
rede de serviços em saúde, uma vez que estes foram compartilhados com a
comunidade. Além disso, alcançamos um fortalecimento de vínculos, pois
a equipe de saúde estreitou relações de confiança a população adstrita. O
projeto foi um ponto de apoio para estreitamento dos vínculos participação
do parceiro, amigos e demais familiares. Observou-se melhoria de cobertura
de pré-natal, incidindo melhoria da problemática dos baixos índices de pré-
natal, como indicador de saúde. O indicador do Previne Brasil do Município
de Nhamundá apontava 10% de cobertura no Q1 2021 (1º quadrimestre de
2021), no Q2 2022 (2º quadrimestre de 2022) o índice subiu para 19%, Q1
e Q2 - 21%. Os indicadores do Previne Brasil abrangem grupos prioritários,
incluindo gestantes, mulheres, crianças e usuários com doenças crônicas.
É valido pontuar os benefícios emocionais, uma vez que a maioria das
participantes relatou relaxamento físico e emocional. As atividades propostas
proporcionaram empoderamento para o trabalho de parto, através de um
acolhimento humanizado, visando apoio emocional e psicológico da futura
mãe. Além disso, proporcionou um momento de reflexão sobre a condição de
gravidez, onde puderam compartilhar suas dúvidas e conhecimentos entre si.
Na Figura 1, está a apresentação das gestantes que atenderam a todas
as exigências do projeto ao longo da gestação eram convidadas a participar do
momento de relaxamento por meio da técnica de escalda-pés.

344
Figura 1. Apresentação das gestantes.

Fonte: Niick joander, 2022.

Nas Figuras 2 e 3, a terapia começava com as gestantes colocando os pés


em uma bacia com água morna, na qual eram adicionadas ervas como folha de
manjericão, que proporciona relaxamento e redução do edema, além de duas
colheres de sal grosso e sachês de camomila. As gestantes permaneciam até a
água esfriar. Esse momento incluía o escalda-pés seguido de uma massagem
nos pés das gestantes.

Figura 2. Terapia do escalda-pés com as gestantes

Fonte: Niick joander, 2022.

345
Figura 3. Momento da massagem nos pés da gestante.

Fonte: Niick joander, 2022.

A Figura 4 retrata o momento em que as cartas dos familiares são lidas,


proporcionando conforto e fortalecendo a segurança da gestante enquanto ela
aguarda o parto e a chegada do bebê.

Figura 4. Leitura das cartas

Fonte: Niick joander, 2022.

346
A coroação com flores, representando a gestante como uma rainha e
protagonista de seu parto, é ilustrada na Figura 5.

Figura 5. Momento da Coroação de flores.

Fonte: Niick joander, 2022.

Ao final das atividades realizadas no encontro, todas as gestantes eram


contempladas com um kit maternidade, como uma forma de reconhecimento,
apoio e gratidão pela confiança depositada na equipe, figura 6.

Figura 6. Entrega do kit maternidade.

Fonte: Niick joander, 2022.

347
Relatos e as experiências das Gestantes com o “Chá de
Bênçãos” como PICS

Gestante E.A - “É uma sensação aliviadora! como estou no final da


gestação, o estresse e cansaço fico ansiosa e com o escalda-pés que faz parte
do chá de bênçãos, alivia, dá uma sensação de alívio e hoje meu bebê mexeu
muito a mesma sensação de que eu sentir ele também teve”.
Gestante D.M - “Foi uma preparação para a minha gestação e trabalho
de parto, ajudou me acalmar, pois eu estava muito ansiosa com medo do que
poderia acontecer. Se eu iria ter parto normal ou cesária. A Neliane através do
chá de bênçãos me preparou para os dois tipos de parto, tinha muito estresse
devido a gravidez, meus pés ficaram muito inchados e foi muito maravilhoso a
sensação de relaxamento que tinha em cada sessão de escalda-pés”.
As PICS são recursos terapêuticos que buscam a prevenção de doenças e
a recuperação da saúde, com ênfase na escuta acolhedora, no desenvolvimento
do vínculo terapêutico e na integração do ser humano com meio ambiente e a
sociedade. O exemplo de PICS, o “Chá de Bênçãos” é um rito para exorcizar os
medos do final da gravidez e abastecer a gestante de boas energias. A gestante
precisa de um chá de injeção de energia, de fé, de confiança para poder viver a
gestação, o parto e a maternidade com muita segurança e afeto.
Em Nhamundá representou um momento de resgate no protagonismo
da gestante enquanto mulher, que chega no projeto com alta carga de ansiedade,
cobrança interna e preocupações com o futuro, onde cabe ao grupo, auxiliado
por familiares e amigos, conduzi-la ao resgate de sua individualidade e
subjetividade. A realização do projeto oportunizou apresentação de uma nova
proposta de saúde, que respeita os saberes populares, aproximação à realidade
do usuário, com utilização de técnicas místicas e medicina tradicional chinesa.
Além disso, possibilitou melhoria dos desconfortos da sintomatologia da reta
final da gestação.
Ainda que insistam em colocar uma linha divisória entre saberes
populares, tradicionais e os códigos da medicina acadêmica, o grupo de

348
gestante traz essa metodologia norteadora que evidencia a contextualização
que os dois campos de atuação possuem uma resolutividade dos serviços de
saúde. As PICS antes eram restritas à área privada, mas foi ampliada para
o SUS com o desafio de integrar os saberes e práticas nas diversas áreas do
conhecimento para desenvolvimento do projeto humanizado e integral.

Referências
Brasil. (2006). Ministério da Saúde. Portaria nº 971, de 3 de maio de 2006. Institui a Política
Nacional de Práticas Integrativas e Complementares (PNPIC). Diário Oficial da União.
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2006/prt0971_03_05_2006.html

Brasil. (2017). Ministério da Saúde. Portaria nº 849, de 27 de março de 2017. Institui a Ayurveda
no Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União. https://bvsms.saude.gov.br/bvs/
saudelegis/gm/2017/prt0849_28_03_2017.html

Brasil. (2024). Ministério da Saúde. Práticas Integrativas e Complementares em Saúde - PICS.


Recuperado em novembro de 2024. https://www.gov.br/saude/pt-br/assuntos/saude-de-a-
a-z/p/pics.

Carneiro, D. M. (2009). Ayurveda: Saúde e longevidade na tradição milenar na Índia. São Paulo.
Editora Pensamento.

Carneiro, R. G. (2011). Cenas de parto e políticas do corpo: Uma etnografia de práticas


femininas de parto humanizado (Tese de doutorado). Universidade Estadual de Campinas,
Campinas, SP.

IBGE. (2022). Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - Cidades e Estados. https://www.


ibge.gov.br/cidades-e-estados/am/nhamunda.html?.

Machado, K. (2020). Ayurveda: a ciência da longa vida e de longa data. CABSIN. https://cabsin.
org.br/ayurveda-a-ciencia-da-longa-vida-e-de-longa-data/

Medicina Ayurvédica: o que é e como funciona? (2023). Educação Médica Afya. https://
educacaomedica.afya.com.br/blog/medicina-ayurvedica-o-que-e-e-como-funciona?utm_
source=perplexity.ai&utm_medium=referrer

Souza, I. (2019). A percepção dos profissionais de enfermagem frente à violência obstétrica


em uma maternidade do norte do Espírito Santo. São Mateus. https://repositorio.ivc.br/
bitstream/handle/123456789/359/TCC%20%20VIOLENCIA%20%20OBSTETRICA.
pdf?sequence=1&isAllowed=y

Teixeira, M. de L. da S. (2003). A doula no parto: O papel da acompanhante de parto


especialmente treinada para oferecer apoio contínuo físico e emocional à parturiente. São
Paulo: Ground.

349
“Flor de tucumã”: serviço da eMulti e
exame Papanicolau humanizado em
mulheres do município de Nhamundá, AM
Fabíola Guimarães de Carvalho
Trindade de Jesus Vidal Furtado
Samara de Oliveira Guimarães

Apresentação

O câncer de colo de útero é manifestado por lesões que ocorrem nos


epitélios escamoso e glandular, considerando que essas alterações patológicas são
visualizadas pelo do exame papanicolau (INCA, 2021). A causa do câncer de colo
está relacionado com o contato direto com o Papiloma Vírus Humano (HPV),
apresenta-se mais de 118 espécies, quais os vírus HPV 16, 18, 31,33, 35, 39, 45,
51, 52, 56, e 58, são de características oncogênica e os demais apresentam baixo
risco e estão ligados com a transmissão por via sexual e a olho nu manifestam-se
por lesões verrucosas. Assim, considera-se que mais de 105 milhões de mulheres
no mundo inteiro terão contato com o vírus do HPV 16 ou HPV 18 pelo menos
uma vez na vida (Nakagawa, Schirmer, & Barbieri, 2010).
Levando em consideração que o câncer do colo do útero está ligado
99% dos casos a infecção do papilomavírus humano-HPV, que é a terceira
neoplasia mais incidente na população feminina brasileira. O Amazonas
está entre os estados de maior incidência do câncer do colo do útero, dados
do Instituto Nacional do Câncer-INCA (2022) que apresenta uma taxa de
incidência de 13 a 25 novos casos a cada 100 mil habitantes.
O Município de Nhamundá-AM é uma ilha distante da capital 382Km e
o acesso é apenas fluvial. A rede de atenção à saúde constitui-se de 11 Unidades
Básicas de Saúde (UBS), sendo 02 UBS na zona urbana, 08 UBS na zona rural e
01 UBS Fluvial. O município tem em sua composição 64 comunidades rurais e

351
a logística de fazer saúde no território líquido torna-se complexo, visando que
as equipes de saúde se descolam para determinados polos de saúde.

Mobilização local

A experiência do projeto “Flor de Tucumã” tem seu título inspirado


no fruto amazônico que reflete a originalidade e delicadeza da mulher
nhamundaense. Surgiu devido à baixa adesão das mulheres na coleta do
exame Papanicolau, com faixa etária de 25 a 64 anos em 2024, somado as
problemáticas: aumento de morbidade de atipias em células escamosas. Devido
os dados baixíssimos de coletas em janeiro, de 32 coletas, teve um aumento
significativo em fevereiro com 87 coletas.
A coordenação municipal de saúde da mulher, coletou dados de
cada UBS para contabilizar o número necessitando do serviço. Assim, foi
gerado um cronograma de ação que promoveu a coleta e oferta de serviços
multiprofissional no turno noturno nas UBSs urbana e rural. A mobilização
também trouxe impacto diretamente no Indicador 4 do Previne Brasil.

Gráfico 1. Gráficos de coleta de preventivo e alterações

Fonte: acervo coordenação saúde da mulher /DATASUS

O objetivo geral do trabalho foi ampliar o atendimento de coleta


humanizada com manejo de lesão em tempo oportuno e acesso aos serviços
eMulti, diminuindo a subnotificação de lesões no colo uterino nas mulheres

352
de Nhamundá. Os específicos foram: realizar o exame preventivo em tempo
oportuno, facilitando o acesso de coleta de Papanicolau e serviços da equipe
eMulti; referenciar os achados alterados ao ginecologista do município e Sistema
de Regulação (SISREG); capacitar as Equipes na melhoria do desempenho da
mobilização social e utilização de novas ferramentas de gestão do cuidado;
apresentar a cada quadrimestre o desempenho das equipes dos serviços ofertados,
promovendo a acreditação das Unidades Básicas de Saúde do Município.
A metodologia deste trabalho utilizou documentos e informações dos
serviços. Realizamos um levantamento epidemiológico das mulheres não atendidas
e contabilização da falha na cobertura do papanicolau e seus aspectos, como: coleta
em período oportuno, intervalo acima de 3 (três) anos, alterações no resultado
do laudo e sem intervenções de encaminhamento/acompanhamento. As ações
iniciaram com a organização das UBS e a divulgação da ação por mídia social, voz
comunitária e porta a porta com os Agentes Comunitários de Saúde (ACS).

Imagem 1. Organização com as Equipes de Saúde para Mobilização.

Fonte: Acervo de mídias – coordenação saúde da mulher, 2024.

A primeira ação aconteceu no dia 15 de março de 2024, na UBS Santo


do Mamoriacá, para atender as demandas dos serviços coadjuvantes com a
equipe ribeirinha, em que a equipe de eMulti descolou-se da sede do município
às 17h (por meio de lancha rápida) e retornando as 22h.

353
Figura 2. Equipe eMulti se deslocando em lancha.

Fonte: Acervo de mídias – coordenação saúde da mulher, 2024.

A segunda ação ocorreu dia 22 de março de 2024, na sede do município,


na UBS José Evangelista para atender a demanda, com 04 consultórios de
coleta, diminuindo o tempo de espera, atendimento odontológico, avaliação
nutricional, fisioterapia com pilates e atendimento médico.

Figura 3. Equipe eMulti e equipe da UBS.

Fonte: Acervo de mídias – coordenação saúde da mulher, 2024.

A última ação, teve o protocolo das coletas de Papanicolau, onde


efetuou-se no período de 01 de março a 31 de março de 2024, juntamente com
o número de coleta realizada em todas as UBSs e com reunião das equipes para
mostrar o resultado da ação.

354
Resultados

Os resultados das ações, nas UBSs de abrangência, mostraram-se


efetivos e positivos para o padrão das metas de coletas estimadas pela pactuação
anual municipal, evidenciada na quantidade de coletas comparadas com o ano
de 2023 que teve o total de 1.272 coletas e no primeiro quadrimestre do ano de
2024 totalizou-se em 615 coletas neste município. A ação na UBS Santo Antônio
teve 65 coletas de papanicolau em 02 consultórios ginecológicos montados, 25
avaliações odontológicas, 30 consultas médicas e 36 avaliações de fisioterapia.
Para a realização do projeto na UBS José Evangelista teve os consultórios
ginecológicos ampliados para o total de 04 ambiências, com iluminação
e sonorização peças anatômicas, reforçando total orientação que teve na
educação em saúde com ginecologista do município na sala de espera, obtendo
o total de 100 coletas, 30 avaliações odontológicas, 10 avalições nutricional, 40
consultas médicas, 40 mulheres participaram da seção de pilates, 10 atualização
de cadernetas de vacinas e 35 testes rápidos para sorologias.

Gráfico 2. Adesão aos serviços.

Fonte: coordenação saúde da mulher, 2024.

355
Considerações Finais

O projeto “Flor de Tucumã” foi de suma relevância, pois as estratégias se


mostraram efetiva e oportuna para a capitação das mulheres faltosas em horário
diurno, garantindo o direito à saúde e dando a visibilidade da importância
do trabalho integrado com a equipe eMulti. É possível observar que esta
promoção e prevenção de saúde foi assertiva, pois obteve excelente adesão ao
atender as mulheres que não conseguem realizar seus acompanhamentos de
saúde devido as condições de trabalhos ou rotina do lar, bem como, outros
motivos não identificados que dificultam o acesso a UBS.
Concluímos que a aplicabilidade do projeto “Flor de Tucumã” deve ser
estendida a todas as UBS, pois tem o caráter inovador pelo horário alternativo,
pela humanização e acesso aos demais serviços e principalmente pelo baixo
custo para ser utilizado como estratégia de rastreio qualitativo e quantitativo
para identificação precoce do câncer de colo de útero.

Referências
INCA. (2016). Diretrizes brasileiras para o rastreamento do câncer do colo do útero / Instituto

Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Coordenação de Prevenção e Vigilância.


Divisão de Detecção Precoce e Apoio à Organização de Rede. – 2. ed. rev. atual. – Rio de
Janeiro: INCA.

INCA. (2021). Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. Detecção precoce do
câncer / Instituto Nacional de Câncer José Alencar Gomes da Silva. – Rio de Janeiro: INCA.

Nakagawa, J. T. T., Schirmer, J., & Barbieri, M.. (2010). Vírus HPV e câncer de colo de útero.
Revista Brasileira De Enfermagem, 63(2), 307–311. https://doi.org/10.1590/S0034-
71672010000200021

INCA. (2023). Instituto Nacional de Câncer. Dados e números sobre câncer do colo do útero.
Relatório Anual.

356
Caravana de reabilitação: serviços de
fisioterapia ofertados em comunidades
ribeirinhas de Nhamundá, AM
Carolina Neves Jacaúna
Priscila Santana

Introdução

O presente relato apresenta uma atividade de atendimento em saúde na


cidade de Nhamundá, um município localizado no baixo amazonas, limítrofe
entre os estados do Amazonas, Roraima e Pará. A figura 1 ilustra a imagem
vista de cima da cidade de Nhamundá. O município é da região de Saúde
do Baixo Rio Amazonas, que tem como referência o município de Parintins,
distando desta cerca de 375 quilômetros da capital Manaus, sendo 577 km
por via fluvial, com altitude de 50 metros acima do nível do mar. A imagem
da figura 2 regista no mapa o trajeto da cidade de Nhamundá, até a cidade de
Manaus, identificando a localização dos municípios em seu entorno.

Figura 1. Imagem vista de cima do município de Nhamundá no Amazonas.

Fonte: Google Maps, 2024.

357
O presente texto apresenta os resultados das ações de saúde ocorrido
nas comunidades ribeirinhas do município de Nhamundá que receberam
a expedição da Caravana de Reabilitação. A ideia projeta “caravana de
reabilitação” surgiu a partir da necessidade de atendimento dos usuários com
dificuldades de acesso aos serviços de fisioterapia, que eram somente ofertados
na zona urbana. O projeto tem atuado, desde o ano de 2022, abrangendo
anualmente cerca de 1.920 usuários das comunidades ribeirinhas.

Figura 2. Imagem de acesso ao município de Nhamundá no Amazonas.

Fonte: https://nhamunda.am.gov.br/turismo/, 2024.

O acesso a saúde é composto pela rede de atenção à saúde do município


é constituída por cinco Unidades Básicas de Saúde (UBS), localizadas em cinco
comunidades, sendo elas: Cutipanã, Santa Maria, Santo Antônio, Sagrado
Coração e Corocoró. Neste contexto, dada a extensão territorial do município,
que ocupa a área de 14.105,619 km² e sua população 21.710 habitantes (IBGE
2021), comunidades ribeirinhas se encontram nas margens de rios e lagos, que
constituem numa barreira de acesso, especialmente durante a seca dos rios,
como aconteceu no segundo semestre de 2023.

358
A proposta do projeto visa oferecer um modelo assistencial à saúde
em áreas remotas do município que sofrem em decorrência da sazonalidade
dos rios, com cheias e secas, afetando o acesso às comunidades. Estas ações
possibilitaram aos profissionais da saúde, conhecer novas vivências e condições
socioeconômicas dos usuários inseridos em seus locais de domicílio.

Metodologia e procedimentos do trabalho em área


ribeirinha

O relato de experiência parte da observação participante, utilizando


como recurso de escrita o relato de experiência que foi apresentada na Mostra
Estadual Aqui Tem SUS, promovida pelo Conselho de Secretarias Municipais
de Saúde do Amazonas (COSEMS AM). No campo da saúde a realidade a ser
abordada se apresenta sempre como uma totalidade que envolve diferentes áreas
de conhecimento e abrange a dinâmica do mundo da vida (Minayo, 2014).
Os delineamentos do projeto de intervenção em saúde respondem
a uma demanda da população que impacta na continuidade do tratamento.
Elas partem das dificuldades em dar sequência na continuidade do serviço ao
usuário, deste modo, a demanda refere-se às barreiras de acesso a saúde, em
especial no período da cheia. É importante ressaltar a potência e inovação dos
trabalhadores sobre a atividade realizada.
A construção das estratégias de atendimento desenvolvidas no projeto
considerou o relato dos usuários sobre seus impedimentos no acesso da
população ribeirinha aos serviços de fisioterapia ofertados no município. A
realidade apresentada conduziu o grupo a avaliar as reais necessidades dessa
população, indicando estratégias de manejo sobre o trabalho dos profissionais
de fisioterapia para as comunidades. Deste modo, iniciamos o movimento de
saída dos consultórios urbanos para uma condução até a população ribeirinha.
A estratégia organizada pelos trabalhadores foi, inicialmente, sendo
conduzidas pelas equipes de saúde, Agentes Comunitários de Saúde (ACS)
da zona rural, que passavam as demandas para a equipe de saúde da família

359
(médicos e enfermeiros) da comunidade, que por sua vez avaliavam e nos
casos necessários encaminhavam a fisioterapia.
A Caravana de Reabilitação em Nhamundá é uma iniciativa da Secretaria
Municipal de Saúde (SEMSA), focada na promoção da saúde em comunidades
ribeirinhas. Esse projeto é financiado exclusivamente por recursos municipais,
visando atender às necessidades de saúde da população local, levando serviços de
reabilitação e cuidados de saúde diretamente às comunidades. Além de oferecer
atendimentos fisioterápicos, a caravana de reabilitação pôde incluir ações
educativas sobre prevenção de doenças e promoção de hábitos saudáveis. Essa
abordagem é essencial para alcançar populações que, muitas vezes, enfrentam
dificuldades de acesso aos serviços de saúde.
Em 2022, foram apresentados um total de 1.548 casos de diversas
patologias, sendo que de janeiro de 2023 até o primeiro trimestre de 2024
foram atendidos mais de 1.436 usuários na área de fisioterapia. Além dos
atendimentos clínicos, foram realizadas orientações e ações de educação em
saúde para a população ribeirinha, alcançando um total de 4.160 usuárias. A
tabela a seguir ilustra os resultados alcançados durante o período de janeiro de
2022 a março de 2024.

Quadro 1. Intervenções fisioterapêuticas nas comunidades ribeirinhas, janeiro de


2022 a março de 2024.

Fonte: elaborado pelos autores, 2024.

360
Estes dados foram selecionados e organizados de modo que os
usuários foram atendidos em expedições realizadas em embarcações de
médio porte. O transporte é realizado por estradas ou em motor rabeta
(motor típico da Amazônia de baixo HP) para atendimentos nas cabeceiras
dos rios. As embarcações são lanchas de pequeno e médio porte, de
propriedade da prefeitura, alugadas pela Secretaria de Saúde, no período da
cheia, tendo em vista as limitações do acesso terrestre. Essa logística permite
que a Caravana de Reabilitação chegue a locais remotos, assegurando que
as pessoas recebam o atendimento necessário e facilitando o alcance as
comunidades. A estratégia é eficaz na garantia aos serviços de saúde nas
comunidades rurais de Nhamundá.
Ao chegar na comunidade rural a equipe de fisioterapia monta os
consultórios itinerantes, que podem ser montados em locais, como barcos,
lanchas ou em salas de aulas, barracões, centros comunitários. Esses são
equipados com os recursos necessários para realizar consultas, exames
físicos e outros procedimentos. O consultório itinerante é uma estratégia
de atendimento que envolve levar serviços de saúde a áreas remotas ou de
difícil acesso, onde a população pode ter dificuldade em acessar atendimento
especializado regular. O principal objetivo do consultório itinerante é aumentar
a cobertura de saúde, promover a prevenção de doenças e oferecer cuidados
básicos de saúde diretamente nas comunidades. As imagens 03 e 04 ilustram a
locomoção das equipes de saúde chegando na comunidade.

361
Figura 3. Acesso às comunidades pela Equipe.

Fonte: Carolina Jacaúna, 2023.

Imagem 4. Equipe com o transporte fluvial.

Fonte: Carolina Jacaúna, 2023.

362
Em janeiro de 2022, iniciamos nossa primeira viagem da Caravana de
Reabilitação para a comunidade de Sagrado Coração de Jesus – Aduacá, sendo
foi a primeira a receber nossos atendimentos. Durante essa ação, também
atendemos comunidades vizinhas, ampliando nosso alcance e beneficiando
diversos públicos, incluindo não apenas os moradores locais, mas também
usuários de áreas próximas. Essa experiência nos permitiu levar cuidados de
saúde e reabilitação a um número maior de pessoas.
Utilizamos todos os recursos disponíveis para garantir a melhor
qualidade de atendimento, equiparando-nos ao que é oferecido nas áreas
urbanas. Contamos com aparelhos portáteis, como eletroestimuladores
TENS e FES, ultrassom, além de equipamentos para treino de propriocepção,
força e liberação miofascial. Também temos exercitadores de mão, material
para bandagens, halteres, bolas, macas e tatames, entre outros. Dessa forma,
asseguramos um atendimento completo e eficaz. As imagens 05, 06 e 07
ilustram a atividade das equipes de saúde na comunidade.

Imagem 5. atividade na comunidade.

Fonte: Carolina Jacaúna, 2023.

363
A equipe da Caravana de Reabilitação é composta por composta por
seis fisioterapeutas, um motorista, uma cozinheira e a secretária de saúde, essa
equipe se une aos profissionais da Equipe de Estratégia de Saúde da Família
(ESF), que inclui médicos, enfermeiros, técnicos de enfermagem e Agentes
Comunitários de Saúde (ACS). A caravana de reabilitação se faz presente
em dois sábados de cada mês nas comunidades, realizando atendimentos em
consultórios itinerantes com parte da equipe, enquanto outros membros saem
para prestar atendimento aos usuários domiciliados na mesma comunidade
ou até mesmo em núcleos fora da comunidade.

Imagem 6. atividades do Projeto na Comunidade.

Fonte: Carolina Jacaúna, 2023.

A colaboração entre as equipes é fundamental para o bom


desenvolvimento das atividades. Neste processo, os ACS desempenham
um papel crucial ao realizar a busca ativa nas comunidades, identificando
necessidades de saúde e facilitando o acesso aos serviços. Isso permite, que

364
os médicos e enfermeiros ofereçam atendimentos e encaminhamentos
adequados, assegurando que a população receba os cuidados necessários. Essa
integração entre os profissionais é vital para o sucesso da caravana, permitindo
uma abordagem holística e personalizada para cada comunidade atendida.

Imagem 7. atendimento domiciliar.

Fonte: Carolina Jacaúna, 2023.

No atendimento, utilizamos uma cartilha desenvolvida pela equipe


de fisioterapia da nossa unidade para proporcionar conhecimento e apoiar
a continuidade do tratamento dos usuários de forma didática. A cartilha
é ilustrativa e de fácil manuseio, apresentando exercícios de alongamento
e mobilidade organizados em três seções: membros superiores, membros
inferiores e coluna, com formato frente e verso, ela permite que os usuários
realizem os exercícios de maneira autônoma em casa, facilitando a prática e
a recuperação. A cartilha de exercícios entregues aos usuários apresentou-
se como uma excelente estratégia de apoio ao tratamento, de modo que,
favorecendo a autonomia, continuidade e constância.
A abordagem é especialmente valiosa em regiões rurais ou em
comunidades ribeirinhas, onde a infraestrutura ser uma barreira para o acesso a
serviços de saúde. Além de consultas fisioterapêuticas, os consultórios itinerantes

365
podem oferecer serviços de acompanhamento de doenças crônicas, orientações
sobre saúde e bem-estar, e atividades educativas para a promoção da saúde.

Resultados: produzindo acesso à população

Foram realizadas 54 caravanas de reabilitação com o apoio da Secretaria


Municipal de Saúde (SEMSA), entre janeiro de 2022 a março de 2024. Os seis
fisioterapeutas da equipe realizaram consultas, atendimentos e orientações na
zona ribeirinha, alcançando mais de 48 comunidades. Em média 1920 usuários
foram beneficiados anualmente, e mais de 4160 até março de 2024.
O quantitativo é significativo, pois há uma grande demanda de
usuários que necessitam de tratamento fisioterapêutico. A partir dos relatos,
foram realizadas intervenções fisioterapêuticas, iniciando com atendimentos
assistenciais de saúde nas áreas de ortopedia, neurologia, pediatria e
reumatologia. Foram realizados 4320 atendimentos, dos quais 3338 foram
clínicos e 982 de educação em saúde, com orientações e distribuição de
cartilhas de exercícios elaborada pela equipe de fisioterapia.
O projeto se mostra relevante, pois a partir da realidade observada,
foi possível redirecionar recursos para facilitar o atendimento à população
ribeirinha e, por conseguinte, melhorar a qualidade de vida desses usuários.
A experiência vivenciada por meio dessas ações nos mostrou a realidade desse
público e nos possibilitou incluir uma população que historicamente ficou
excluída de atendimentos mais especializados.
A experiência de atendimento fora dos espaços fechados dos
consultórios, revela uma realidade a ser abraçada, uma população cujo território
demanda uma atenção diferenciada, apesar das distâncias e os espaços que têm
pouca infraestrutura de atendimento. A visita domiciliar retrata uma atividade
de trabalho humanizada, que respeita as diferenças, independe de raça credo
e, principalmente, está comprometida com a garantia dos direitos à saúde. As
estratégias de atendimento aplicadas no projeto revelam a importância do uso
da criatividade e engenhosidade na garantia do acesso a saúde, tornando-o
mais humano e assim respeitando as realidades locais no acesso a saúde.

366
Considerações Finais

Concluímos que o aprimoramento do cuidado promove o acesso à


saúde e aos serviços especializados, de modo regular e contínuo, para que
os usuários possam ter uma atenção integral e equitativa. Os resultados nos
levam a pensar que podemos contribuir com a inclusão e promoção de saúde
das populações ribeirinhas do município de Nhamundá. Portanto, para
implementar linhas de cuidado nos programas de saúde nesse território, é
essencial entender a identidade das comunidades ribeirinhas, seu modo de
vida, territorialidade e as práticas cotidianas, a fim de efetivamente promover
a saúde da população.
A atividade de sair dos consultórios urbanos, possibilitou um olhar
diferenciado sobre os determinantes de saúde e possibilitou o acesso ao direito
de acesso a saúde da população ribeirinha. Do mesmo modo, o relato dos
usuários sobre suas dificuldades de acesso aos serviços de fisioterapia, trouxe
aos trabalhadores a satisfação de estar realizando um trabalho que garante
o direito universal à saúde. A prática dos trabalhadores sobre a atividade
realizada mostra que a promoção de saúde é potente quando conseguimos
utilizar de diferentes estratégias de educação, como foi o caso da cartilha.
A continuidade do serviço é um dos desafios enfrentados pela
regionalização da saúde, principalmente na região da Amazônia onde a
sazonalidade do clima determina as formas de acesso. Kadri (2022) argumenta
que a articulação da atenção básica para os serviços de atenção especializada
necessita compreender sobre que condições políticas, geográficas e sociais
para construir os fluxos da rede.
A complexidade que envolve o território amazônico nos leva a
reconstruir espaços e estratégias que garantam a continuidade do serviço de
modo a garantir oportunidades de acesso e integralidade nas ações. Neste
projeto, as ações integradas nas linhas de cuidado configuram o funcionamento
das redes crônicas, assegurando assim a equidade no atendimento. Em suma,

367
vale ressaltar a importância do projeto “Caravana de Reabilitação”, pois facilita
e viabiliza o acesso dos serviços de saúde remotas da Amazônia. Por fim,
entendemos que este tipo de projeto pode fazer parte da realidade de outros
municípios amazônicos, complementando as ações das equipes que atuam nos
territórios ribeirinhos e fluviais da região.

Referências
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). (2022). Censo Brasileiro de 2022:
Nhamundá. IBGE. Disponível em https://www.ibge.gov.br/cidades-e-estados/am/
nhamunda.html. Acesso em 13 de agosto de 2024.

Kadri, M. R. A. (2022). Da atenção básica à atenção especializada e de urgência regional: os


modos de fazer saúde na Amazônia das águas. Tese (Doutorado em Saúde Pública) - Escola
Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz. Rio de janeiro.

Minayo, Maria Cecília de Souza. (2014). O desafio do conhecimento: Pesquisa qualitativa em


saúde. Editora Hucitec, 14ª ed - São Paulo.

Prefeitura Municipal de Nhamundá. (2024). Turismo. Disponível em: https://nhamunda.


am.gov.br/turismo/. Acessado em 16/11/2024.

368
A fonoaudiologia no atendimento de
crianças com Transtorno do Espectro
Autista em Rio Preto da Eva/AM
Vanessa Pereira Oliveira
André Luiz Freitas Nogueira
Gigellis Duque Vilaça
Victória Villar Viana Queiroz

Introdução

A Fonoaudiologia tem se mostrado cada vez mais uma profissão


necessária para ampliação do escopo da Atenção Básica (AB) e da integralidade
do cuidado no Sistema Único de Saúde (SUS). Os profissionais que outrora se
limitavam à atuação reabilitadora, reclusos nos consultórios ambulatoriais e
nos hospitais, hoje se veem ocupando territórios adscritos às Equipes de Saúde
da Família (ESF) ou de Equipes de Atenção Básica, desenvolvendo ações não
apenas clínico-assistenciais, mas também de promoção à saúde, de prevenção,
vigilância e redução de danos (Chun & Vianna, 2022).
A fonoaudiologia no Brasil, teve início na década de 1930 com a
idealização da profissão de Fonoaudiólogo, oriunda da preocupação da
medicina e da educação com a profilaxia e a correção de erros de linguagem
apresentados pelos escolares. Na AB, surgiu com a implantação do Núcleo de
Apoio a Saúde da Família (NASF), com a função de atuar, tanto no campo da
saúde, de forma interdisciplinar e até transdisciplinar, quanto em seu núcleo
específico de formação, pode realizar ações comuns a equipe, em sua atuação,
deve promover condições que favoreçam a comunicação (Brasil, 2008).
A dimensão técnica do fonoaudiólogo foi atualizada com a mudança
do NASF AB para eMulti, referente entrada do usuário na rede de saúde,
o acolhimento e o horário de atendimento, a integralidade da atenção, o

369
compromisso e o vínculo (Dias et al., 2023). No ano de 2023, a fonoaudiologia
que atuava de maneira complementar e integrada às demais equipes da
APS, com a mudança para eMulti, retomando o fortalecimento ao cuidado
multiprofissional na APS com reformulações e mudanças para atender as
demandas do perfil demográfico e epidemiológico atual (Brasil, 2023).
O TEA é uma condição complexa que pode variar em intensidade e
apresentação de sintomas. Crianças com TEA podem apresentar desafios na
comunicação verbal e não verbal, dificuldades na interação social e padrões
de comportamento repetitivos. A intervenção precoce é fundamental para
fornecer às crianças com TEA as melhores chances de desenvolvimento e
desenvolvimento, perante essas informações, reconheceu a necessidade de
prestar um serviço humanizado, igualitário e promovendo o acesso a todos
dos seus direitos assegurado por lei.
A escrita desse trabalho partiu do incentivo do enfermeiro André Freitas
então gerente da Unidade Básica de Saúde Maria (UBS) de Lourdes em Rio Preto da
Eva/AM, a partir da sua observação do fluxo dos atendimentos de fonoaudiologia
na UBS, e as constantes evoluções das pessoas com TEA, ao longo dos atendimentos.

Atuação no território Amazônico

Neste capítulo, abordaremos a atuação fonoaudiológica na AB no município


de Rio Preto da Eva, por meio das experiências exitosas e as evoluções dos usuários
assistidos pelo serviço de fonoaudiologia, com predominância de crianças dentro
do Transtorno do Espectro Autista (TEA). Essa experiência foi apresentada na 1°
Mostra de Saúde Municipal de Saúde - Aqui tem SUS em Rio Preto da Eva.
Rio Preto da Eva é um município brasileiro localizado na Região
Metropolitana de Manaus, no estado do Amazonas. Situado a 50 km da capital
Amazonense via terrestre e 37 km em linha reta, na AM – 010. Em 2022, a
população era de 24.936 habitantes e a densidade demográfica era de 4,29
habitantes por quilômetro quadrado (IBGE, 2022).

370
Figura 1. Apresentação na 1° Mostra Municipal de Saúde em Rio Preto da Eva.

Fonte: Vanessa Oliveira, 2024.

No encontro foi apresentado o trabalho “A importância da


fonoaudiologia na atenção básica para o atendimento de crianças com
Transtorno do Espectro Autista – TEA, sendo reconhecido com o 4° lugar de
experiência exitosa a nível municipal. Essa classificação nos possibilitou a levar
essa experiência a nível estadual, para apresentação na V Mostra Estadual
“Amazonas aqui tem SUS”, em 2024. O evento realizado pelo Conselho de
Secretarias Municipais de Saúde do Amazonas (COSEMS/AM) e parceiros. Ao
final o trabalho foi uma das experiências selecionadas na categoria de melhor
experiência da Região de Manaus, Entorno e Alto Rio Negro, sendo certificado
pela Fiocruz Amazônia com o prêmio IDEASUS Amazonas “Fiocruz é SUS”.

Figura 2. Apresentação na V Mostra Estadual “Amazonas aqui tem SUS” 2024.

Fonte: Vanessa Oliveira, 2024.

371
Figura 3. Premiação na V Mostra Estadual e Certificado da Fiocruz Amazônia o
prêmio IDEASUS Amazonas “Fiocruz é SUS”.

Fonte: André Freitas, 2024.

O serviço de fonoaudiologia nos atendimentos aos usuários

As pesquisas sobre o trabalho fonoaudiológico tem contribuições


relacionadas aos tratamentos das alterações de linguagem e, mais especificamente,
de fala, bem como com o público infantil, embora atue da infância até a
senescência. Esses fatores podem justificar a maioria dos encaminhamentos
terem sido de crianças, feitos em grande parte pelo pediatra (Medeiros & Lima,
2019). As ações de educação permanente em saúde possibilitam a ampliação
da atuação da Fonoaudiologia, repercutindo em uma melhor identificação de
necessidades de saúde de usuários adultos e idosos que, assim como as crianças,
têm direito a acessar esse profissional (Fernandes et al., 2024).
Fonoaudiologia é uma ciência que estuda os processos de comunicação
humana e o seu desenvolvimento, desde a sucção do leite materno até à
deglutição na idade adulta. Atua em diferentes áreas da comunicação humana,

372
incluindo a voz, a fala, a audição, a escrita e as funções básicas, como respirar,
mastigar e engolir. O fonoaudiólogo pode realizar avaliações e diagnósticos
para identificar possíveis problemas relacionados à necessidade dos usuários
e, em seguida, tratá-los. Pode trabalhar com pessoas de todas as idades, desde
bebés a idosos, e pode ajudar a tratar distúrbios da linguagem, da fala, da
deglutição, da audição, da respiração, da sucção, da mastigação, da expressão
facial e da articulação da fala. Ainda pode no apoio às pessoas com sequelas de
acidentes a recuperar os movimentos e funções orofaciais.
Em Rio Preto da Eva, os atendimentos de fonoaudiologia são realizados
de forma humanizada e respeitando a individualidade de cada usuário do
serviço. Ao longo dos anos a equipe tem apresentado melhores domínios de
cuidados e assistência com os usuários. Quando o usuário chega na UBS, é
entregue a caderneta de fonoaudiologia, confeccionada pela administração
para anotações dos dias e horários dos atendimentos, evitando assim o
esquecimento das datas dos agendamentos. Os agendamentos são realizados
para cada usuários em um horário de atendimento, com esse sistema o usuário
pode chegar na UBS, com 20 a 30 minutos de antecedência. Quando chega, é
realizada a ficha de classificação de risco, protocolo esse usado para todos os
atendimentos realizados na Unidade, em seguida o usuário é adicionado no
Prontuário Eletrônico do Cidadão (PEC). Depois disso, é direcionado para
realizar a triagem, para avaliação antropométrica peso, altura, verificação de
temperatura. Sendo finalizado esse processo, a criança é direcionada para a
sala de atendimento. Observamos que essa forma de agendamento, reduziu o
tempo de espera na recepção para as sessões de fonoterapia, possibilitando um
processo mais calmo antes de entra na sala. Assim, criamos uma rotina que fica
estabelecida, possibilitando a criança se organizar internamente, diminuindo
os níveis de estresse e ansiedade na sala de espera.

373
Avanços no acompanhamento de crianças de Transtorno do
Espectro Autista - TEA

A atuação fonoaudiológica na Atenção Básica desempenha um papel na


promoção, proteção e recuperação da saúde relacionada à comunicação humana.
Os acompanhamentos são realizados na UBS Maria de Lourdes Azevedo, que
é a Unidade de referência para os acompanhamento e execução das atividades
com o profissional especialista na área de fonoaudiologia. Até o presente
momento temos registrados no PEC, cerca de 52 (cinquenta e duas), crianças
diagnosticadas com TEA, entre a faixa etária de 2 anos a 12 anos de idade.
Evidente a execução do serviço de atendimento de fonoaudiologia
na AB, conforme preconiza o SUS, estabelece uma melhor qualidade no
desenvolvimento da criança, seja ela na saúde ou na educação, bem como melhora
na comunicação e socialização dessa pessoa. Assim, é importante, facilitar o
acesso ao atendimento junto ao profissional Fonoaudiólogo, proporcionando
uma experiência comunicativa e auxílio na inclusão escolar e social.
Realizamos a busca ativa nas áreas, mas também há uma grande
procura pelos atendimentos de fonoaudiologia, assim como recebemos os
encaminhamentos de laudos médicos de crianças diagnosticada com TEA. Os
atendimentos vêm sendo ofertado desde 2021, com duração de 40 minutos
cada sessão de fonoterapia, com forte crescente e aumento na demanda desse
serviço. O serviço de saúde vem estreitando laços com a comunidade de Rio
Preto da Eva, sendo agendamentos de novas criança diagnosticadas com
TEA, buscando sempre oferta o atendimento ao maior número de criança na
primeira infância. Os atendimentos são realizados com fonoterapia de forma
humanizada, com estímulos lúdicos e dinâmicos.
O atendimento fonoaudiológico a crianças com TEA é estruturado
para maximizar os benefícios terapêuticos. Durante essas sessões, os
fonoaudiólogos utilizam abordagens individualizadas que focam na melhoria
da comunicação verbal e não verbal, essenciais para o desenvolvimento social e
acadêmico das crianças. Técnicas específicas, como o uso de jogos fonológicos

374
e atividades lúdicas, são empregadas para tornar o processo terapêutico mais
envolvente e eficaz, promovendo a participação ativa das crianças e facilitando
a generalização das habilidades aprendidas para outros contextos do dia a dia.
Além disso, a sessão permite um equilíbrio ideal entre a intensidade da
intervenção e a capacidade de atenção das crianças, garantindo que elas possam
se beneficiar plenamente do tempo dedicado sem se sentirem sobrecarregadas.
A continuidade e a regularidade dessas sessões são fundamentais para o
desenvolvimento contínuo, permitindo ajustes constantes nas estratégias
terapêuticas conforme as necessidades individuais de cada criança evoluem.
A equipe da UBS trabalha em estreita colaboração com os pais e cuidadores,
fornecendo orientações e suporte para que as práticas terapêuticas possam ser
reforçadas em casa, ampliando assim os resultados positivos da fonoterapia.

Resultados: ressignificando a de vida dos usuários

Os êxitos são contemplados tantos nos registros diários realizados


no PEC, quanto no quantitativo de atendimentos realizados, sendo que
dos 52 usuários atendidos, 49 apresentaram evoluções significativas no
desenvolvimento da fala, motricidade oral, linguagem, aprendizagem,
comunicação e socialização. Os outros três apresentam evoluções em aspectos
de motricidade, comportamento, aprendizagem e socialização, seguem sem
apresentar a fala como uso principal de comunicação, pois estão dentro
da categoria não verbal do Espectro Autista, com níveis II e III de suporte,
seguimos sempre ofertados sessões de atendimento buscando a evolução
singular e individual de cada criança atendida.
Os dados revelam não apenas a eficácia das intervenções
fonoaudiológicas, mas também a importância de um acompanhamento
contínuo e personalizado. Observamos que, mesmo entre os usuários que não
utilizam a fala como principal meio de comunicação, há progressos notáveis
em outras áreas cruciais para o desenvolvimento integral, como a motricidade
e a socialização. Esses avanços são indicativos de que as estratégias terapêuticas

375
adotadas são adequadas e eficazes, proporcionando melhorias significativas na
qualidade de vida dos usuários.
Além disso, o acompanhamento sistemático dos atendimentos permite
uma avaliação precisa dos resultados, facilitando ajustes nas abordagens
terapêuticas conforme necessário. Portanto, a continuidade desse serviço é
fundamental para garantir que todas as crianças, independentemente do nível
de suporte necessário, possam alcançar seu pleno potencial.
A continuidade e a eficácia dos atendimentos fonoaudiológicos na
AB foram um reflexo direto da robustez e abrangência do Sistema Único
de Saúde (SUS). O SUS, com sua estrutura capilarizada e princípios de
universalidade e integralidade, permite que serviços essenciais, como a
fonoaudiologia, cheguem a todas as regiões, inclusive as mais remotas. A
importância do SUS se evidencia na capacidade de oferecer atendimento
gratuito e de qualidade, garantindo que todas as crianças, independentemente
de sua condição socioeconômica, tenham acesso a terapias que promovem
seu desenvolvimento integral.
Ademais, o SUS possibilita a formação contínua dos profissionais de
saúde, assegurando que as práticas adotadas estejam sempre alinhadas com as
mais recentes evidências científicas. Dessa forma, o SUS não apenas promove a
saúde e o bem-estar das crianças atendidas, mas também fortalece a equidade
e a justiça social no Brasil.

Considerações Finais

A fonologia desempenha um papel crucial no desenvolvimento


de crianças com TEA, que por meio de estudo e da aplicação de técnicas
fonológicas, é possível melhorar significativamente a percepção e a produção
dos sons da fala, facilitando a alfabetização e a comunicação. Crianças com
TEA frequentemente enfrentam desafios únicos na aquisição da linguagem,
e a fonologia oferece ferramentas essenciais para superar essas barreiras,
promovendo um desenvolvimento linguístico mais robusto e eficaz.

376
Nesse contexto, a terapia com fonoaudiólogos torna-se fundamental
para aprimorar a fala e a socialização dessas crianças. O profissional utiliza
abordagens personalizadas para atender às necessidades específicas de cada
criança, trabalhando não apenas na articulação dos sons, mas também na
compreensão e uso funcional da linguagem. A intervenção precoce e contínua
pode levar a melhorias significativas na capacidade de comunicação e interação
social, proporcionando às crianças com TEA uma maior independência e
qualidade de vida.
Para garantir que todas as crianças, inclusive aquelas em regiões
remotas, tenham acesso a essas terapias essenciais, o SUS desempenha um
papel vital. O SUS promove a equidade no atendimento à saúde, oferecendo
serviços essenciais que muitas vezes não estão disponíveis em áreas distantes.
As políticas públicas e programas de saúde na AB asseguram que todas as
crianças, independentemente de sua localização geográfica, possam receber o
suporte necessário para seu desenvolvimento linguístico e social, contribuindo
para uma sociedade mais inclusiva e justa.
Em suma, os atendimentos realizados na AB vêm apresentando
evoluções significativa na comunicação e desenvolvimento humano, sendo
alcançado 90% de êxito. Na atualidade, a grande questão é a oferta adequada
dos serviços necessários a todas as pessoas com TEA e suas famílias, sendo
dirigidos esforços à garantia desses direitos a essas crianças. Os atendimentos
trazem avanços na qualidade de vida, comunicação funcional, bem como
redução no tempo de espera dos atendimentos especializados que demandam
viagens à capital do estado.

Referências
Brasil (2008). Ministério da Saúde. Portaria n. 154, de 24 de janeiro de 2008. Cria os Núcleos de
Apoio à Saúde da Família - NASF. Diário Oficial da União [Internet], 2008. Disponível em:
https://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2008/prt0154_24_01_2008.html

Brasil. (2023). Ministério da Saúde12. Histórico da eMulti. Disponível em: https://www.gov.br/


saude/pt-br/composicao/saps/acoes-interprofissionais/emulti/historico#:~:text=A eMulti é
instituída em e mudanças para atender as.

377
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protagonismo da Atenção Básica e Saúde na Escola. In: Feitosa ALF, Depolli GT, Costa SA.
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378
Convite ao cuidado: sensibilização
de mulheres para o preventivo por
meio de cartas
Andreza Cezar Fonseca
Mariana Rodrigues da Silva
Gigellis Duque Vilaça
Raniele Alana Lima Alves

Introdução

O câncer de colo do útero (CCU) tem repercussões de caráter alarmantes


na saúde feminina que o colocam como um problema de saúde pública mundial.
Em um panorama internacional a Organização Mundial da Saúde (OMS) alerta
para o índice de mortalidade três vezes mais alto na América Latina e Caribe
quando comparados a América do Norte, o que pontua o fator de desigualdades
em relação ao acesso aos serviços de saúde e marcadores como gênero, renda e
acesso aos serviços de saúde (INCA, 2023; OPAS, s.d).
No Brasil, o CCU é a terceiro tipo de câncer que mais mata mulheres
e no estado do Amazonas é a principal causa de mortalidade de mulheres em
idade fértil (INCA, 2023). Segundo o Ministério da Saúde avalia-se que até
2026 os números de casos no Amazonas cheguem a 1.800 casos.
O CCU embora possua altos indíces de mortalidade tem cura quando
detectado de forma precoce, além de ser prevenível (Cerqueira et al., 2022).
Sousa et al. (2021) apontam que a linha de cuidado do CCU no Brasil inicia
com a prevenção primária, através da imunização contra o papilomavírus
humano (HPV) para meninas e meninos, e segue com a prevenção secundária
que consiste no rastreio da doença pelo exame citopatológico do colo do
útero, conhecido também como Papanicolau e exame preventivo. Todos esses
serviços são ofertados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), pelas unidades

379
básicas de saúde (UBS) no âmbito da Atenção Primária a Saúde (APS), que
atua como coordenadora do cuidado e ordenadora das redes de atenção à
saúde (Brasil, 2016).
As ações na APS são fundamentais no controle do CCU. A APS
desenvolve ações para prevenção do câncer do colo do útero por meio de ações
de educação em saúde, vacinação de grupos indicados e detecção precoce do
câncer e de suas lesões precursoras por meio de seu rastreamento (INCA,
2016) além de importante atuação na mobilização de caráter comunitário
(Cerqueira et al., 2022). Vale ressaltar que é na APS que ocorrem as ações
de promoção a saúde, pois está próxima a vida cotidiana das mulheres e as
acompanha nos ciclos da vida. Além disso, a APS também concentra a maior
parte das ações relacionadas à detecção precoce, que inclui o rastreamento e o
diagnóstico precoce (Brasil, 2013).
No tocante ao rastreamento do CCU, as mulheres das regiões rurais,
remotas e povos tradicionais possuem pior acesso a esse serviço (Cerqueira
et al., 2022). Partindo dessa problemática e dos dados obtidos na análise da
vigilância epidemiológica, coletada no aplicativo E-SUS helper no município
de Rio Preto da Eva, foi identificado que 277 mulheres não haviam realizado a
coleta do preventivo nos últimos três anos. A partir disso, surgiu a necessidade de
implementar estratégias que impulsionassem a adesão dessas mulheres à coleta
do preventivo para o rastreamento do câncer do colo do útero nesse território.
Desse modo, esse capítulo é um relato de experiência que descreve a
implementação da estratégia de cartas-convites para a promoção da saúde das
mulheres, com foco na prevenção, rastreamento e controle do câncer de colo do
útero. Tal relato é escrito a partir do olhar da equipe da estratégia saúde da família
(ESF) de uma unidade de saúde da família do município de Rio Preto da Eva,
estado do Amazonas. A experiência foi destinada às mulheres na faixa etária de 25
a 64 anos, moradoras dos bairros Monte Castelo I e II e Morada do Sol. A coleta
das informações ocorreu no período de 10 de janeiro a 09 de abril de 2024.

380
Conhecendo o cenário da experiência

O cenário da experiência é o município de Rio Preto da Eva que fica


localizado no km 79 da rodovia estadual AM-010, Amazonas. O município faz
divisa com o município de Manaus a sudoeste, Itacoatiara a sudeste, Presidente
Figueiredo a nordeste e Itapiranga a leste. Além disso, compõe a região
metropolitana de Manaus, que agrupa oito municípios do estado do Amazonas,
sendo eles: Manaus, Manacapuru, Novo Airão, Itacoatiara, Careiro da Várzea,
Iranduba, Presidente Figueiredo e Rio Preto da Eva. O município compreende
uma extensão territorial de 5.815,622 km², com uma população de 24.936
habitantes, e densidade demográfica de 4,29 habitantes/km2 (IBGE, 2022).
O município abriga uma população feminina de 12.078 mulheres,
das quais 5.800 se encontram na faixa etária de 25 a 64 anos, público-alvo
definido pelo Ministério da Saúde para a coleta anual do preventivo. Dentre
essas, 847 residem nos bairros onde o projeto foi realizado e estão cadastradas
na Unidade Básica de Saúde (UBS) Ednaide Lopes da Costa.

Figura 1. Localização do município de Rio Preto da Eva.

Fonte: Google Maps, 2024.

381
A UBS Ednaide Lopes da Costa é uma das unidades que compõem
a rede de saúde da atenção básica do município e foi o lócus da experiência.
O Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES) identifica que
a UBS Ednaide Lopes da Costa tem vinculada 3 equipes de saúde, sendo 01
ESB- Equipe de Saúde Bucal - E. L SB EQUIPE 06 composta por 01 auxiliar
em saúde bucal; 01 técnico em saúde bucal e 01cirurgião dentista; 01 Equipe
de Saúde da Família - EQUIPE ESF E. LOPES RURAL 07, composta por 01
técnico de enfermagem; 01 microscopista; 04 agentes de combate a endemias;
07 agentes comunitários de saúde; 01 médico e 01 enfermeiro e 01 Equipe de
Saúde da Família - Equipe ESF E. Lopes Urbana 06, composta por 08 agentes
comunitários de saúde; 05 agentes de combate a endemias; 02 técnicos de
enfermagem; 02 enfermeiros; 02 médicos e 01 profissional de educação física e
têm como territórios adscritos os bairros Monte Castelo I e II e Morada do Sol.

Figura 2. Mapa do território adscrito pela UBS Ednaide Lopes.

Fonte: Semsa Rio Preto da Eva, 2025.

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O processo de construção e elaboração das cartas-convites

A partir das reuniões promovidas mensalmente pela Secretaria


Municipal de Saúde (SEMSA) de Rio Preto da Eva, com a participação de
enfermeiros, gerentes de unidades, gerentes de programas de saúde e a
secretária de saúde, foram estabelecidas como objetivo o planejamento de
ações para o cumprimento das metas do Previne Brasil. Uma das maiores
dificuldades do município estava no Indicador 4: Proporção de Mulheres
com coleta de citopatológico na APS, embora todas as equipes já tivessem
elaborado várias estratégias, a quantidade de coletas sempre ficava abaixo
das metas pactuadas. Além disso, havia no município um péssimo histórico
na entrega dos resultados das coletas de citopatológico. Durante muitos
anos, esses resultados demoravam até dois anos para serem entregues, o que
comprometia a estratégia de rastreamento. Por conta disso, muitas mulheres
do município deixaram de realizar essa coleta.
Começamos a pensar em ideias que pudessem motivar esse público
de mulheres a realizar a coleta do preventivo. Em anos anteriores, já havíamos
tentado outras estratégias, como a realização de sorteios. Embora essas
ações tivessem inicialmente aumentado o número de coletas, esse efeito logo
diminuía. Assim, surgiu a ideia de sensibilizar as mulheres, fazendo-as se
sentirem valorizadas e importantes dentro desse cenário da saúde da mulher.
Mas como conseguir tocar o coração delas? Foi então que surgiu a intenção de
enviar uma carta nominal a cada mulher, a relação dos nomes das usuárias foi
extraída do APP e-SUS Helper.
O e-SUS Helper é um plug-in criado para ajudar os municípios a
melhorarem seus Indicadores do Previne Brasil, antecipando os dados. Ele
deve ser instalado no servidor do e-SUS ou em outra máquina da mesma rede,
após configuração. Após a instalação e configuração do banco de dados do
e-SUS, o sistema monitora os indicadores e fornece relatórios e planilhas.

383
Figura 3. Texto da carta-convite elabora para as mulheres

Fonte: arquivo da equipe de saúde, 2024.

384
Desse modo, a equipe elaborou uma carta-convite com um texto
simples e objetivo, descrevendo a importância da coleta do preventivo e da
prevenção do câncer de colo de útero. A carta foi impressa em papel A4,
dobrada em forma de convite e identificada com o nome de cada mulher. Em
cada carta, foi colocado um laço de fita de cetim, com o objetivo de transmitir
todo o carinho e preocupação em trazê-las para realizar a coleta do preventivo.
Cada detalhe foi pensado para tocar o coração dessas mulheres.
Outro desafio, era transmitir esse carinho e preocupação para o restante
da equipe. O objetivo era que toda a equipe sentisse o afeto presente na carta,
para que pudessem entender e transmitir às mulheres o mesmo sentimento.
Os objetivos da estratégia de cartas-convite foram: aumentar a adesão das
mulheres à coleta do preventivo; sensibilizar as usuárias por meio de um
acolhimento humanizado e singular; conscientizar sobre o risco do câncer de
colo do útero, utilizando uma linguagem acessível e próxima à realidade das
usuárias; elevar o Indicador 04 do Previne Brasil – Proporção de Coleta de
Preventivo; e ampliar o rastreamento do câncer de colo do útero.

Figura 4. Equipe de Saúde entregando as cartas-convite às usuárias.

Fonte: acervo da equipe, 2024.

385
Na reunião, as cartas-convite foram entregues aos Agentes
Comunitários de Saúde (ACS), enfatizando a importância da maneira como a
carta deveria ser entregue: somente para a usuária destinatária, com atenção e
ressaltando a importância da coleta. Para as mulheres que não soubessem ler,
o ACS deveria ler a carta, enaltecendo as palavras e transmitindo carinho e
atenção, de modo que, por meio da leitura, a mulher se sentisse sensibilizada e
acolhida, tocando-a no coração com as palavras.
Iniciamos a distribuição das cartas-convites no dia 10 de janeiro de
2024. Os ACS foram os responsáveis pela distribuição e entrega nos territórios
dos bairros Monte Castelo I e II e Morado do Sol. Assim, logo no dia seguinte
começamos a receber na UBS Ednaide Lopes, as primeiras mulheres com
desejo de realizar a coleta, com relatos de recebimento das cartas-convite.

Figura 5. Usuária recebendo carta-convite na recepção da UBS.

Fonte: Acervo da equipe, 2024.

A potência das cartas-convite na coleta do preventivo

A partir da implantação desta estratégia, conseguimos realizar, no


período de 10 de janeiro a 10 de abril de 2024, 189 coletas de preventivo, de
um total de 277 nomes, alcançando 68,5% de coletas. No ano de 2023, nesse

386
mesmo período, foram realizadas 128 coletas. As análises foram realizadas em
laboratórios locais, e os resultados foram entregues em um prazo de 10 dias.
Destas coletas, já foram entregues 39 resultados de exames
citopatológico, sendo detectadas 4 alterações: 2 ASC-US e 2 ASC-H. ASC-
US refere-se a Células Escamosas Atípicas de Significado Indeterminado, e
ASC-H refere-se a Células Escamosas Atípicas de Significado Indeterminado,
não podendo excluir Lesão de Alto Grau. Os dados atuais das coletas de
preventivos estão apresentados no quadro abaixo onde se pode fazer um
comparativo do êxito do projeto.
Os dados foram obtidos do Prontuário Eletrônico do Cidadão (PEC),
um software gratuito do Ministério da Saúde que armazena informações de
saúde de um indivíduo de forma eletrônica ao longo da vida. O PEC é parte da
Estratégia e-SUS Atenção Básica e é utilizado para operacionalizar o Sistema
de Informação em Saúde para a Atenção Básica (SISAB). A partir dos dados,
percebe-se que o ano com menor número de coletas foi o ano de 2020, ano da
Pandemia de Covid-19, seguido pelos anos de 2021 e 2022. Os anos com maior
número de coletas foram em 2023 e 2024.

Tabela 1. Número de coletas de preventivo realizado anualmente.

Ano Nº de coletas realizadas por ano


2019 124
2020 23
2021 86
2022 90
2023 385
2024 422

Fonte: PEC-eSUS UBS Ednaide Lopes, 2024.

Os achados citológicos foram caracterizados pela presença de alterações


celulares insuficientes para o diagnóstico de lesão intraepitelial, mas mais
significativas do que aquelas encontradas em processos inflamatórios. Essa

387
categoria de diagnósticos citopatológico foi criada pelo Sistema Bethesda em
1988 (Brasil, 2016). As usuárias com resultados alterados foram encaminhadas
para consulta com clínico geral, para dar continuidade aos tratamentos
necessários, sendo acompanhadas pela atenção básica ou encaminhadas para
consultas com médicos especialistas.

Gráfico 1. Nº de coletas de exame citopatógico realizados na UBS Ednailde Lopes

Fonte: autoras, 2024.

A experiência relatada é um exemplo de como práticas de promoção


da saúde que envolve as tecnologias em saúde classificadas como leves, aquelas
que são descritas por Merhy & Feuewercker (2016) como o produto das relações
envolvidas no encontro trabalhador-usuário e se concretiza através da construção
de vínculo, escuta, interesse e confiança são ferramentas fundamentais no
cuidado em saúde na APS. A utilização da estratégia de cartas-convites assumiu
uma ação que considerou as demandas singulares das usuárias de saúde e
incentivou a equipe de saúde a refletir sobre sua própria atuação no cuidado,
destacando a necessidade de ir além da mera execução de procedimentos.
O arranjo tecnológico proposto pela equipe a partir das cartas-convite
surgiu como uma estratégia sensível para mobilizar mulheres em ações de saúde
preventiva, especialmente no que se refere ao exame citopatológico do colo do

388
útero (Papanicolau). O potencial dessa ferramenta consistiu em estabelecer uma
comunicação direta, respeitosa e acolhedora. A personalização do conteúdo, escrita
de forma humanizada, fortaleceu o vínculo entre a equipe de saúde e as mulheres
do território. Além disso, ao valorizar tecnologias leves como as cartas-convite,
reafirma-se a importância de práticas que aliam criatividade e sensibilidade para
envolver as pessoas no cuidado com a saúde. Essa experiência demonstra que
ações simples, mas sérias, podem transformar a relação entre os serviços de saúde
e a comunidade, promovendo uma atenção mais integral, acolhedora e eficaz.

Considerações finais

A partir da implementação da estratégia de cartas-convite e dos resultados


obtidos concluímos que foi possível sensibilizar um número significativo de
mulheres, fazendo com que se sentissem acolhidas pela carta. Nos dias seguintes
após a distribuição das cartas, as mulheres buscavam atendimento na UBS Ednaide
Lopes para a realização da coleta do preventivo. As mulheres que receberam as
cartas entregues pelos ACS relataram que gostaram da iniciativa das cartas-convite.
Além disso, nossa posição no indicador 04, que mede a proporção de mulheres
que realizam a coleta do preventivo, foi de 59,2%, um aumento significativo em
comparação aos anos anteriores em que não se atingiu 50%.
Percebemos que é possível ampliar o rastreamento do câncer do colo
do útero, aumentando a probabilidade de detectar casos em fases iniciais,
além de que, através de um acolhimento humanizado, conseguimos incentivar
confiança nas mulheres, mobilizando afetos e corações, o que evidencia que
o SUS que dá certo no interior do Amazonas baseia-se em tecnologias leves e
nas relações de afeto, que são essenciais para oferecer um cuidado equânime.
As cartas, mais do que ferramentas de sensibilização, tornam-se veículos de
acolhimento e pertencimento, reforçando o papel da Atenção Primária à Saúde
como espaço de proximidade e vínculo.
Em nossa região, uma das maiores dificuldades era o tempo de
entrega dos resultados, que muitas vezes se estendia até um ano ou nem

389
eram entregues. Com os resultados apresentados, conseguimos demonstrar
que as estratégias desenvolvidas pela APS foram eficazes. Essa prática não
apenas resgatou a importância do preventivo, mas também reafirmou o
compromisso do SUS em inovar na construção de estratégias que promovam
saúde e inclusão. Assim, as cartas-convites se consolidam como uma
ferramenta potente, reafirmando que o cuidado com a saúde pode — e deve
— ser humano, acessível e transformador.

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Básica. Controle dos cânceres do colo do útero e da mama / Ministério da Saúde, Secretaria
de Atenção à Saúde, Departamento de Atenção Básica. Disponível em: http://189.28.128.100/
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Cerqueira, R. S., Santos, H. L. P. C. dos, Prado, N. M. de B. L., Bittencourt, R. G., Biscarde, D.


G. dos S., & Santos, A. M. dos. (2022). Controle do câncer do colo do útero na atenção
primária à saúde em países sul-americanos: revisão sistemática. Revista panamericana de
salud publica [Pan American journal of public health], 46, 1. https://doi.org/10.26633/
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Merhy, E. E., & Feuerwerker, L. C. M. (2016). Novo olhar sobre as tecnologias de saúde:

390
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surpreendendo o instituído nas redes/organização. Rio de Janeiro: Héxis.

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Sousa, G. A. de, Viana, J. N., Souza, C. da S. M., & Moysés, R. P. C. (2021). Linha de Cuidado do
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391
Radar Odonto: proporcionando acesso
à assistência odontológica no município
de São Paulo de Olivença, AM
Valentina Victoria Tourinho Ramos
Thiago dos Santos da Silva
Mayra Costa Rosa Farias de Lima
Antônio Amâncio Barbosa Neto

Apresentação

São Paulo de Olivença está localizado no interior do estado do Amazonas,


região norte do Brasil, pertencente a mesorregião do sudoeste amazonense e
microrregião do Alto Rio Solimões. Segundo dados (IBGE, 2022) a população
urbana é de 14,267 habitantes e a população rural é de 17,159 habitantes,
totalizando 32,967 habitantes, é banhado pelos rios, Solimões, Jandiatuba,
Jacurapá e Camatiã (IDAM, 2011). O município faz limite com as cidades de
Amaturá, Jutaí, Benjamim Constant, Tabatinga, e Santo Antônio do Içá.
A cidade é originária da Missão de São Paulo Apóstolo, fundada pelo
Missionário da Companhia de Jesus, Samuel Fritz, quando estava a serviço do
governo espanhol no início do ano de 1689. São Paulo de Olivença era uma
grande aldeia indígena, denominada de “A Capital da Província dos kambebas,
também eram conhecidos como Omáguas descritos por Fritz e por Alexandre
Rodrigues Ferreira, em viagem filosófica. Os indígenas habitavam a nossa
terra há bastante tempo, em função disso, todos os municípios dessa região são
originários das aldeias indígenas que foram transformadas em missões pelos
jesuítas e depois em municípios. Por meio do Decreto de 31 de março de 1938,
foi elevado à categoria de cidade e finalmente, por intermédio da Lei nº 599, de
31 de maio de 1882, a Vila foi elevada à categoria de Município de São Paulo
de Olivença (IBGE Cidades, 2023; Elias & Barberio, 2021).

393
Compartilhamos com você caro leitor a dança cultural e folclórica
do município, o Cordão do Africano. Suas apresentações são realizadas nos
festejos do mês de junho nas ruas da cidade e são caracterizadas por uma dança
conduzida de acordo com os ritmos dos tambores, inicialmente em formato de
cordão humano com movimentos simples. As canções são de própria autoria
dos moradores e suas vestimentas têm como destaque o modo popular de
produção costuradas pelos próprios brincantes e costureiras locais. Além
disso, as máscaras utilizadas chamam atenção, pois carregam traços físicos
dos negros que passaram pelo município, caracterizadas com tecido preto e
lábios grossos e avermelhados. Agora você conhece um pedacinho do Brasil,
um pouco do Amazonas, do povo indígena kambeba, e a querida cidade, São
Paulo de Olivença.

A interface da experiência com o SUS

O Sistema Único de Saúde (SUS) foi instituído pela Constituição Federal


de 1988 como uma resposta às demandas sociais por uma saúde mais justa e
acessível a todos os brasileiros. Antes de sua criação, o acesso aos serviços
de saúde pública era restrito e desigual, com a maior parte da população
dependendo de um sistema fragmentado e ineficiente. O SUS surgiu como uma
proposta de universalizar o acesso à saúde, garantir a integralidade dos cuidados
e promover a equidade na distribuição dos serviços, ele se baseia em princípios
fundamentais como a descentralização das ações e serviços, a participação da
comunidade na gestão e o financiamento compartilhado entre as esferas federal,
estadual e municipal. Desde sua implementação, o SUS tem sido um marco
na democratização da saúde no Brasil, enfrentando desafios constantes, mas
também obtendo conquistas significativas na melhoria dos indicadores de saúde
e na ampliação da cobertura assistencial (Ocké-Reis, 2012).
Em 1986, a VIII Conferência Nacional de Saúde marcou um momento
histórico para a saúde pública no Brasil, sendo fundamental para a criação
do Sistema Único de Saúde (SUS). Esta conferência, que contou com ampla

394
participação de diversos setores da sociedade, incluindo movimentos sociais,
profissionais de saúde, acadêmicos e gestores, consolidou a ideia de que a saúde
é um direito de todos e dever do Estado. Foi nesta conferência que se discutiu,
pela primeira vez de forma abrangente, a necessidade de um sistema de
saúde universal, integral e equitativo, propondo a reorganização dos serviços
de saúde no país. As diretrizes estabelecidas na conferência influenciaram
diretamente a formulação dos artigos sobre saúde na Constituição de 1988,
sendo consideradas um marco na luta pela democratização da saúde no Brasil.
A VIII Conferência Nacional de Saúde não só ampliou o debate sobre o acesso
à saúde, mas também fortaleceu o movimento da Reforma Sanitária, que
pavimentou o caminho para o SUS como conhecemos hoje (Brasil, 1986).
Ao falarmos de saúde, é essencial mencionar Dom Adalberto Marzi,
uma figura histórica que deixou um legado significativo em nosso município.
Em 31 de maio de 1968, ele lançou a pedra fundamental do antigo Hospital
Santa Izabel, que viria a se tornar um marco na assistência à saúde local. Esse
hospital, que atualmente abriga a Secretaria Municipal de Saúde, foi inaugurado
três anos depois, em 1971, e inicialmente oferecia serviços de ambulatório.
Após alguns anos passou por uma estruturação dos cuidados de saúde na
região, proporcionando à população um acesso mais amplo e qualificado aos
serviços de saúde, refletindo o compromisso com o bem-estar da população,
influenciando positivamente gerações e contribuindo para o fortalecimento da
rede de saúde local (Arantes, 2017).
Em 1994, o Ministério da Saúde criou a Estratégia Saúde da Família
(ESF) reformulando o sistema de saúde brasileiro, com a inclusão de equipes
multidisciplinares. Em seguida introduziu a equipe de saúde bucal, através da
portaria n°1.444 no ano de 2000 e em 2002 foi inserida a assistência domiciliar
no SUS (Brasil, 2004).
Os serviços de saúde bucal passaram por importantes transformações
para se alinharem aos princípios do Sistema Único de Saúde (SUS), assumindo
um papel fundamental no enfrentamento dos desafios da área. Essas mudanças

395
buscam ampliar o acesso aos cuidados odontológicos e assegurar que esses
serviços sejam oferecidos de forma equitativa, integral e contínua, conforme as
diretrizes do SUS. A 1ª Conferência e Levantamento Nacional de Saúde Bucal,
realizada em 1986, deu início a esse processo; em 2000, surgiram as equipes
de saúde bucal (eSB), integradas à Estratégia Saúde da Família em 2001. Em
2004, foram publicadas as diretrizes da Política Nacional de Saúde Bucal,
com a criação dos Centros de Especialidades Odontológicas (CEO) e dos
Laboratórios Regionais de Prótese Dentária (LRPD). Em 2009, foram lançadas
as Unidades Odontológicas Móveis (UOM); em 2012, os CEOs passaram a
integrar a Rede de Cuidado à Pessoa com Deficiência; e em 2019, foi criado
o indicador de pré-natal odontológico pelo programa Previne Brasil. Para
ampliar o acesso aos serviços odontológicos no país, foi instituído o Brasil
Sorridente – Política Nacional de Saúde Bucal, que visa superar as barreiras
de acesso à saúde bucal com ações de promoção e reabilitação, prevenindo
diagnósticos tardios e proporcionando cuidado adequado e oportuno à
população (Brasil, 2023; Brasil, 2024).
A reestruturação dos serviços tem como objetivo não apenas tratar
doenças, mas também promover a saúde bucal como um componente fundamental
do bem-estar geral dos indivíduos. A saúde bucal está intrinsecamente ligada
à saúde como um todo, desempenhando um papel crucial em funções básicas
como mastigação, deglutição e fonação. Essas funções são essenciais para a
nutrição adequada, a comunicação eficaz e a autoestima, aspectos que impactam
diretamente o convívio social e a qualidade de vida. Uma boa condição oral vai
além da ausência de cáries ou doenças gengivais; ela reflete uma situação de
equilíbrio que permite ao indivíduo viver plenamente suas atividades cotidianas,
sem limitações ou desconfortos (Brasil, 2008).
A manutenção da saúde bucal é fundamental na prevenção de doenças
sistêmicas, como diabetes e doenças cardiovasculares, que podem ser agravadas
por infecções bucais não tratadas. Portanto, a promoção de hábitos saudáveis,
a educação em saúde bucal e a oferta de tratamentos preventivos e curativos

396
são essenciais para a construção de uma sociedade mais saudável. Essas ações
são particularmente importantes em contextos de vulnerabilidade social, onde
o acesso aos serviços de saúde pode ser limitado, e a conscientização sobre a
importância da saúde bucal ainda é incipiente (Carneiro et al., 2024).

“Radar Odonto Em Ação”: relato da experiência

Diante dessas necessidades, identificamos a importância de soluções


que fossem não apenas eficazes, mas também adaptadas às realidades
socioeconômicas do município. As propostas, desenvolvidas com base em
um estudo detalhado das particularidades locais, foram então apresentadas
aos coordenadores da atenção primária e à Secretaria de Saúde, liderada por
Juliana da Silva Lucas, que representava a administração municipal, no período
de 2022 a 2024, que não só autorizou a implementação das iniciativas, como
também colaborou ativamente em sua execução. A Secretaria desempenhou
um papel fundamental, disponibilizando materiais, transporte e outros
recursos essenciais, criando as condições necessárias para que nossas ações
fossem colocadas em prática de forma eficiente e sustentável.
Esse esforço conjunto desencadeou uma série de novas parcerias com
outras secretarias municipais, incluindo as de Educação, Esporte, e o CRAS.
A integração de nossas ações em eventos municipais permitiu uma ampliação
significativa do impacto das iniciativas, fortalecendo a rede de apoio à saúde e
promovendo uma abordagem mais holística ao cuidado da população.
Através dessas colaborações, conseguimos criar um ambiente mais
favorável para o desenvolvimento de atividades de promoção da saúde,
educação preventiva, e apoio social, alinhadas com os objetivos principais
da parceria. Essa articulação intersetorial tem sido essencial para maximizar
os recursos disponíveis e garantir que as soluções implementadas gerem
benefícios duradouros para a comunidade.
A partir deste contexto, pensamos em uma estratégia que possibilitasse a
identificação e localização dos usuários sem acesso ao tratamento odontológico.

397
Desta forma, com produto restou a criação do” RADAR ODONTO:
PROPOCIONANDO ACESSO À ASSISTÊNCIA ODONTOLOGICA”
como ferramenta de acesso aos serviços de saúde odontológicos. A princípio
foi elaborado e implementado o projeto piloto com intuito de estruturar e
qualificar tal estratégia, a partir disto, avaliar sua expansão dentro do território.
De fato, sua principal característica foi a busca ativa, realizada em parceria
com os agentes comunitários.
Além disso, a estratégia buscou oferecer uma contribuição ao
incremento da promoção, prevenção e cuidado em saúde bucal. Destacamos
as ações de mobilização, motivação, educação em saúde, diagnóstico e
tratamento de doenças bucais em indivíduos incapacitados de se locomover
até as unidades básicas por razões como envelhecimento, portadores de
limitações físicas, psíquicas, motoras, sociais e sequelas de enfermidades.
Esta oportunidade proporcionou também a investigação das dificuldades
enfrentadas na acessibilidade aos serviços de saúde obtendo subsídios para
o planejamento e estruturação melhorando os serviços para que atenda esse
público de forma adequada.
A gestão do sistema de saúde local está dívida entre zona urbana e zona
rural. A sua zona urbana conta com um hospital e cinco UBS, enquanto a zona
rural conta com uma UBS física e uma UBS fluvial neste contexto, a equipe
odontológica conta com seis cirurgiões dentista e sete técnicos de saúde bucal,
sendo dois dentistas e dois técnicos lotados na zona rural. O referido projeto
se desenvolveu em visitas domiciliares, assistidas pela atenção primaria a saúde
e ações educativas desde fevereiro de 2022, que são programadas e planejadas
com os profissionais e familiares.
As orientações desenvolvidas nos territórios são as seguintes: dietéticas,
palestras, atividades lúdicas, escovação supervisionada, aplicação tópica
de flúor, anamnese, odontograma, exames intra/extraoral, restaurações e
exodontias. A abordagem odontológica deve ser embasada em uma anamnese
detalhada, com todos os dados do indivíduo para auxiliar no planejamento,

398
diagnóstico e prognóstico do tratamento (Borsatto et al., 2014). Devido a alta
demanda das pessoas, criamos um cronograma semanal, pois os profissionais
precisam realizar as ações e atender a demanda na sua UBS de referência.

Tabela 1. Cronograma semanal.

Segunda-feira Terça-feira Quarta-feira Quinta-feira Sexta-feira

Idosos Visitas Crianças Comunidades Visitas


ribeirinhas

Hipertensos Adolescentes

Diabéticos

Demanda Gestantes Demanda Demanda Demanda


espontânea espontânea espontânea espontânea

Fonte: Própria autoria, 2024.

Os usuários estão suscetíveis a ter uma saúde bucal insatisfatória, variando


de acordo com o comprometimento neuropsicomotor, aspectos socioeconômicos,
a conduta dos cuidadores ou responsáveis, e profissionais aptos para realização
do atendimento. É de suma Importância que os responsáveis por esses indivíduos
sejam orientados desde princípio acerca dos cuidados com a higiene pessoal,
ensinando a eles manobras que possam ser aplicadas no dia a dia.
Habitualmente observamos na cavidade oral desses usuários cárie
dentária, doença periodontal, dentes fraturados, maloclusão, alterações de
esmalte e na dentina, macroglossia, bruxismo, xerostomia, hiperplasia gengival,
agenesia, dentes supranumerários, retenção prolongada de dentes decíduos,
lesões na mucosa e língua. Essas alterações podem estar relacionadas com os
hábitos alimentares, culturais, sociais e negligência a saúde.
Vale ressaltar que é fundamental o conhecimento tanto das técnicas
odontológicas como as de manejo comportamental, abordagem psicológica,

399
adaptação do profissional a realidade socioeconômica de cada pessoa como,
por exemplo, a utilização de faixas estabilizadoras e colchões a vácuo, na
ausência dos equipamentos os atendimentos são realizados no chão, redes e
cadeira de balaço.

Figura 1. Realização de exodontia. Visita domiciliar, na área urbana.

Fonte: Thiago Santos, 2023.

Em uma de nossas ações, realizamos visitas às Comunidades Indígenas


de Bom Sucesso, Monte Santo e São Francisco. Embora exista uma estrada de
barro que conecta essas comunidades, durante os dias chuvosos, o acesso por
essa via se torna impossível devido às condições precárias. Nessas ocasiões,
precisamos recorrer ao transporte por canoa, uma jornada que, apesar
das dificuldades, levou cerca de trinta minutos e nos permitiu alcançar as
comunidades de maneira segura e eficiente.
Durante nossas visitas, realizamos uma série de atividades essenciais
em cada comunidade, incluindo avaliação bucal completa, aplicação de flúor
para prevenção de cáries, procedimentos de exodontia quando necessário, e
encaminhamentos para prótese dentária. Além disso, oferecemos orientações

400
detalhadas sobre higiene oral, buscando promover hábitos saudáveis entre os
membros da comunidade.

Figura 2. Realização de exodontia. Comunidade indígena São Francisco.

Fonte: Valentina Tourinho, 2022.

Para reforçar essas práticas, distribuímos kits de higiene bucal,


contendo escovas de dente, creme dental, fio dental, e cadernos educativos sobre
cuidados orais. Essas ações não apenas atenderam às necessidades imediatas de
saúde bucal, mas também contribuíram para a educação e empoderamento da
população em relação aos cuidados preventivos, promovendo uma melhoria
sustentável na saúde oral das comunidades atendidas.
Em 2024, realizamos o acompanhamento de mais de 120 pessoas
acamados e portadores de deficiência no município. As visitas contribuíram
para a aproximação entre usuários e profissionais, a boa relação torna-se
uma ferramenta útil na humanização do cuidado, bem como na adequação
de linguagens técnicas para melhor compreensão durantes as orientações e
promoção de saúde. Esse foi o ponta pé inicial para expansão do Radar Odonto.

401
Figura 3. Avaliação Bucal. Comunidade Indígena Monte Santo.

Fonte: Valentina Tourinho, 2024.

Diante dessa experiencia exitosa, o esperado aconteceu, tivemos que


expandir o projeto. O município vinha enfrentando dificuldade para alcançar
os indicadores no Previne Brasil pré-natal odontológico, situação que gerava
preocupação tanta para as condições de saúde da gestante, como para o bebê,
na esperança de evitarmos complicações com por exemplo pré-eclâmpsia e
nascimento prematuro, colocamos em ação o Radar Odonto.
Identificamos, também, as gestantes e conseguimos realizar tanto a
consulta inicial quanto o acompanhamento mensal de cada uma. Para garantir
um monitoramento eficaz, elaboramos prontuários físicos individuais, que
incluíam o número de contato, endereço, número da família e o nome do
agente comunitário de saúde responsável pela área. Esse sistema permitiu um
controle rigoroso das consultas, e, em casos de ausência, entrávamos em contato
com a gestante via WhatsApp ou solicitávamos que o ACS entregasse uma
notificação em sua residência. Como resultado dessa estratégia, conseguimos
atingir a meta estipulada, alcançando 50% no indicador.

402
Em parceria com o centro de referência em assistência social (CRAS)
implementamos na semana do bebê, evento anual que presta assistência
multiprofissional as usuárias, palestras e orientações de higiene oral e a
importância do acompanhamento odontológico. Como tudo que apresenta
resultado faz sucesso, o Radar Odonto continuou expandindo, desde janeiro
de 2024 atuamos em centro de reabilitação química, centro de idosos,
comunidades ribeirinhas, nas escolas e em eventos municipais.
Ao colocamos em pratica o projeto observamos que a motivação e
a educação em saúde bucal são poderosas quando empregadas de maneira
agradável e atrativa para transmissão de informação, indo de encontro aos
usuários, conhecendo o território, as condições socioeconômicas de cada
indivíduo, os problemas e com isso mudar a maneira de conduzir os fatos,
ofertando além de tratamento, ações preventivo-promocionais.

Considerações Finais

Compartilhar essa vivência, com seus aprendizados, memórias,


sentimentos e resultados, é uma experiência de grande valor, tanto para nossas
trajetórias profissionais quanto para a vida de cada cidadão que teve acesso
a uma saúde de qualidade e humanizada. A realidade de outras pessoas nos
transforma, muda nossa percepção e dá novos significados às nossas ações,
tornando cada desafio uma oportunidade de crescimento pessoal e profissional.
Os sorrisos, os abraços de gratidão e as palavras de reconhecimento
que recebemos em retorno são recompensas inestimáveis. Esses momentos
nos lembram do compromisso que assumimos ao fazer o juramento de nossa
profissão. A sensação de dever cumprido nos confirma que estamos colocando
em prática os valores fundamentais que abraçamos ao nos formar, e nos enche
de alegria e propósito.
No entanto, as dificuldades enfrentadas por profissionais de saúde nas
regiões de difícil acesso, como o Alto Rio Solimões, são diárias e complexas.
A falta de capacitação, a escassez de instrumentais cirúrgicos e materiais de

403
consumo, e as barreiras geográficas, como a necessidade de transporte para
áreas remotas, são desafios constantes. Além disso, em um contexto com um
número expressivo de população indígenas aldeados, os tabus relacionados à
saúde e a falta de informação agravam essas dificuldades.
A implantação dos Centros de Especialidades Odontológicas (CEO)
fortalece o acesso a serviços odontológicos especializados, especialmente
para a pessoa com necessidades especiais. Embora a atenção primária seja
o primeiro ponto de contato, garantindo proximidade e cuidado integral,
o encaminhamento ao CEO se torna necessário para tratamentos mais
complexos. No entanto, é preocupante que os interiores do Alto Rio Solimões
não sejam contemplados com esses centros, deixando os dentistas clínicos
gerais sobrecarregados com a responsabilidade de atender casos que deveriam
ser tratados por especialistas.
Diante dessa realidade, é essencial que os três níveis de gestão do SUS
invistam continuamente em Educação Permanente em Saúde e na valorização
dos profissionais de saúde. A inserção do cirurgião-dentista na equipe
multidisciplinar deve ser uma prioridade, assegurando que essa população
receba um atendimento equitativo e humanizado. Somente assim será possível
oferecer uma assistência realmente inclusiva e eficaz, que respeite a dignidade
e os direitos de todos os cidadãos. Fazer o SUS presente em todos os cantos
do Brasil – do longe ao muito longe, no remoto e no profundo – é reafirmar o
compromisso com a saúde pública para todos. Viva, aqui tem SUS!

Referências
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coracaofiel.com.br/conhecendo-cidade-de-sao-paulo-de-olivenca/

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Ocké-Reis, C. O. (2012). SUS: O desafio de ser único. Editora Fiocruz.

405
Equipe multiprofissional eMulti:
promovendo qualidade de vida para
crianças com necessidades especiais de
saúde e suas famílias no município de
Silves - AM
Willian Lira Grana
Rayana Lima Martins
Elanne Martins Viana
Elivane Silva Pacheco
Lupuna Corrêa de Souza

Introdução

Em 2021, na Unidade Básica de Saúde (UBS) Guiomar de Oliveira


Lira, localizada no município de Silves-AM (Figura 1), que está situado na
Região Metropolitana de Manaus. De acordo com estimativas do Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) de 2020, sua população é
de 9.230 habitantes. O município abrange uma área de 3.748,818 km²,
resultando em uma densidade populacional de aproximadamente 2,5
habitantes por km².

407
Figura 1. Mapa de localização do Município de Silves.

Fonte: organizado por Lupuna Corrêa de Souza, 2024.

Neste município que havia uma pessoa, R.L.A., de oito anos, diagnosticado
com transtorno do espectro autista (TEA). Todas as quintas-feiras, ele comparecia
ao atendimento contínuo realizado pela equipe do Núcleo Ampliado da Saúde da
Família e Atenção Básica (NASF-AB). A equipe multiprofissional e interdisciplinar
era formada por quatro profissionais: um assistente social, um fisioterapeuta,
uma farmacêutica e uma psicóloga. Essa equipe atuava de forma complementar e
integrada, oferecendo suporte clínico aos profissionais da Atenção Básica.
Nesse período, o NASF-AB estava diretamente integrado às equipes de
saúde da família das UBS Guiomar de Oliveira Lira e Zolima Garcia, ambas situadas
na sede do município. Entretanto, os atendimentos ambulatoriais eram realizados
apenas na UBS Guiomar de Oliveira Lira, onde alguns profissionais enfrentavam
dificuldades de infraestrutura para atender crianças com necessidades especiais,
devido ao espaço limitado e à falta de equipamentos adequados.
Apesar desses desafios, a equipe se esforçava para garantir assistência
de qualidade ao usuário. Durante o atendimento, adotava-se um acolhimento

408
humanizado, considerando as dificuldades da criança em lidar com alterações na
rotina, a aversão a ficar longe do responsável e a resistência em manter contato
visual. A equipe empregava estratégias para desenvolver a concentração do usuário
e reduzir sua agitação, proporcionando momentos de tranquilidade. Um episódio
comum era quando a criança, em um instante de distração, corria pelo corredor da
unidade, sendo sempre acolhida com carinho ao retornar à sala de atendimento.
O pai da criança, ciente das dificuldades e dos estereótipos enfrentados,
nunca deixou de levá-la ao atendimento, acreditando na importância do tratamento
e na relevância da estimulação precoce para o desenvolvimento psicossocial de seu
filho. Muitas famílias em situações semelhantes hesitam em buscar atendimento
para evitar preconceitos ou pela crença de que a exposição poderia agravar a saúde
da criança. A falta de conhecimento sobre crianças com necessidades especiais
reforça estereótipos e preconceitos na sociedade, que identifica a visão equivocada
de que crianças autistas são perigosas e devem ser isoladas.
Diante desse cenário, a equipe multidisciplinar necessitava
constantemente tomar decisões para promover um ambiente acolhedor e uma
discussão construtiva com o usuário e a família, buscando um atendimento
integral. A intervenção terapêutica, conforme Andrade et al. (2024), está
associada ao diagnóstico precoce e deve ser estruturada de acordo com as
etapas de vida do usuário. Todas as crianças com necessidades especiais devem
receber incentivo para reabilitação, com intervenções iniciadas o mais cedo
possível e envolvimento da família.
A rotina das famílias de crianças com necessidades especiais é marcada
por desafios, como hospitalizações frequentes, isolamento social por medo de
preconceito, dificuldade de locomoção e a falta de apoio familiar. Segundo o
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2022, o Brasil contava
com aproximadamente 760 mil crianças de dois a nove anos com algum
tipo de deficiência, representando 4,1% do total de pessoas com deficiência
no país (IBGE, 2022). Em relação à acessibilidade ao atendimento primário,
essas crianças precisam de atenção contínua e intervenções específicas,

409
fundamentais para o desenvolvimento psicomotor e por serem consideradas
clinicamente frágeis e socialmente vulneráveis.
Nesse contexto, a Atenção Primária à Saúde (APS) desempenha
um papel relevante na identificação precoce e no tratamento de possíveis
problemas de desenvolvimento, como atrasos nas habilidades motoras,
de linguagem, cognitivas ou sociais. A APS no município de Silves, em
conjunto com a equipe multidisciplinar e o Sistema Único de Saúde (SUS),
prioriza a equidade no atendimento e assegura os direitos essenciais em
saúde para essas crianças, garantindo-lhes uma atenção integral e uma
rede de cuidados especializada.

O trabalho da eMulti: por uma saúde integral para as


crianças com necessidades especiais e seus cuidadores

O usuário em questão foi importante na tomada de decisões da equipe


do NASF-AB. Após reuniões e discussões entre as equipes da Atenção Primária à
Saúde (APS) e do NASF-AB, foram expostas todas as necessidades e dificuldades
da família e do usuário em destaque, assim como de outros usuários atendidos
semanalmente pela equipe, incluindo crianças com microcefalia, síndrome
de Down e paralisia cerebral. Esse cenário nos revelou a necessidade de uma
intervenção integrada entre os profissionais do NASF-AB.
A decisão tomada visou fortalecer os serviços de assistência à saúde
para crianças com necessidades especiais, de modo a garantir condições
igualitárias e promover a equidade em saúde. Assim, ficou estabelecido que
todos os usuários seriam atendidos não apenas por um profissional em dias
específicos, mas por toda a equipe do NASF-AB. Diante disso, os atendimentos
passaram a ocorrer semanalmente, com uma consulta na UBS e outra
domiciliar. Definimos que, às quintas-feiras, seriam realizados atendimentos
ambulatoriais, enquanto, às terças-feiras, seriam realizados atendimentos
domiciliares, inicialmente direcionados às crianças cujas famílias ainda não
concordaram com o atendimento ambulatorial.

410
Para encorajar a participação das mães nos atendimentos,
intensificamos a oferta de transporte, disponibilizando um serviço de busca
e retorno para aos usuários e seus responsáveis. Além disso, oferecemos
atendimento simultâneo às mães, considerando que essas mulheres enfrentam
uma rotina exaustiva, marcada pelo preconceito, pressões constantes, uma
rotina imprevisível e sentimentos de inadequação.
A equipe buscou ser um ponto de apoio, valorizando o papel da
mãe como referência essencial no cuidado, reconhecendo que ela é quem
melhor conhece seu filho. Por isso, é importante que as mães recebam uma
atenção especial e se sintam valorizadas, compreendendo-se como mulheres
de grande força. Diariamente, essas mães se adaptam às diferentes fases de
desenvolvimento de seus filhos e enfrentam grandes desafios para garantir
uma boa qualidade de vida para eles.
Com essa perspectiva, a equipe elaborou uma estratégia em que
sempre seriam acolhidos pela psicóloga e pelo fisioterapeuta, quando a
mãe ou responsável levasse a criança ao atendimento. Essa abordagem
trouxe resultados satisfatórios, aumentando a adesão aos atendimentos e
proporcionando satisfação às mães, que saem das consultas demonstrando
alívio e relatando bem-estar.
Quando os atendimentos a crianças com necessidades especiais de
saúde (CRIANES) estavam se consolidando, houve um aumento na demanda
por atendimentos ambulatoriais em relação aos domiciliares, refletindo uma
aceitação crescente por parte dos responsáveis. No entanto, com a chegada da
segunda onda de Covid-19 (SARS-CoV-2), em 2021, foi necessário modificar
os planos e estratégias, gerando mudanças drásticas em diversos setores,
especialmente na saúde.
Essa situação exigiu a busca urgente por soluções que possibilitassem
atendimentos à distância. Assim, os atendimentos, que até então eram
presenciais, passaram a ser realizados remotamente. Esse ajuste foi essencial,
pois as CRIANES representam um grupo de risco elevado, com maior

411
propensão ao desenvolvimento de disfunções físicas, comportamentais ou
emocionais. As restrições impostas pela pandemia agravaram as dificuldades
enfrentadas por essas crianças, que possuem sistema imunológico mais
vulnerável e, portanto, maior suscetibilidade a infecções.
Diante dessa circunstância, o cuidado com crianças com necessidades
especiais de saúde revelou-se um grande desafio para as equipes da APS e do
NASF-AB, representando também uma pressão adicional para os cuidadores
durante a pandemia. Foi necessário que os profissionais desenvolvessem
estratégias para minimizar as consequências das restrições impostas aos
atendimentos de saúde dessas crianças. Para as crianças com demandas
específicas de saúde, essas mudanças tendem a ocorrer de forma ainda mais
intensa e frequente, considerando o contexto de desigualdade e vulnerabilidade
a que estão sistematicamente expostas.
Em 2022, iniciaram-se de forma efetiva os atendimentos a crianças
com necessidades especiais de saúde no município de Silves, com a integração
das CRIANES na rede de saúde local. Esse processo foi estruturado com base
em um diagnóstico situacional, considerando as dificuldades específicas de
cada criança. O objetivo era fortalecer e compartilhar o cuidado integral por
meio de uma assistência multiprofissional, em uma iniciativa liderada pela
equipe do NASF, proporcionando uma experiência promissora.
A iniciativa se fundamentou na oferta de um serviço multiprofissional
especializado, que promovesse o desenvolvimento de um plano terapêutico
individualizado, humanizado e adaptado a cada criança com necessidade
especial de saúde. O foco era favorecer o desenvolvimento motor, cognitivo e
social de cada uma dessas crianças.
A integração da equipe com a APS foi essencial, pois é responsável
pelos primeiros cuidados com essas crianças, funcionando como porta
de entrada e coordenadora do cuidado. Esse modelo garante que todos os
aspectos da saúde das crianças sejam abordados de maneira multiprofissional.
Devido à complexidade e variabilidade dos aspectos comportamentais desses

412
usuários, o prognóstico exige uma abordagem multidisciplinar, que vá além do
acompanhamento médico e envolva toda a equipe multiprofissional.
A importância da equipe multiprofissional no acompanhamento
de crianças com necessidades especiais de saúde se deve à capacidade de
promover, em conjunto, a extensão dos cuidados em saúde, melhorando
o desenvolvimento, a interação e a qualidade de vida das crianças. Nesse
contexto, propõe-se uma nova etapa de trabalho, pautada na articulação
e divisão de saberes entre os profissionais. Cada profissional é fundamental
no desenvolvimento das crianças, realizando atividades em conjunto e
compartilhando conhecimentos.
A fisioterapia, por exemplo, desempenha relevante participação no
tratamento de usuários com necessidades especiais de saúde. Seu principal
objetivo é promover uma melhor qualidade de vida por meio da promoção de
saúde, utilizando técnicas e recursos específicos. De acordo com as diretrizes
da Estratégia de Saúde da Família (ESF), o fisioterapeuta atua na prestação
de serviços de tratamento, reabilitação e prevenção de agravos, com ações
voltadas ao indivíduo, grupos e comunidade.
O Fisioterapeuta deve atuar na Equipe Multiprofissional, através de
uma abordagem interdisciplinar, objetivando a integralidade da assistência.
A atuação deve ocorrer, preferencialmente, no âmbito coletivo, com o
envolvimento e a participação da população. O tratamento fisioterapêutico
busca inibir a atividade reflexa anormal para normalizar o tônus muscular, e
com isso gerar maior ganho de força, melhorar a flexibilidade e a amplitude de
movimento, reduzindo dificuldades, contraturas e deformidades (Gonçalves,
Almeida & Pereira, 2023). O foco da intervenção fisioterapêutica é fazer com
que a criança desenvolva o sistema motor o mais próximo do normal possível,
conforme pode ser observado na Figura 2.

413
Figura 2. Atendimento do profissional de Fisioterapia.

Fonte: Autores, 2023.

Segundo Bonomo et al. (2007), a inibição de atividades reflexas


anormais facilita a normalização do tônus muscular e promove o movimento
corporal, resultando em melhorias na flexibilidade, nos padrões e na amplitude
de movimento, na força e nas capacidades motoras.
O papel do fonoaudiólogo, profissional que possui o papel de intervenção
direta no que se relaciona com as habilidades de comunicação e de socialização,
com o objetivo de proporcionar para as crianças autistas uma maior autonomia e
o uso da linguagem funcionalmente em prol da interação com o meio no qual se
encontra inserida (Isaías, 2019). Com base na apresentação clínica das crianças, a
fonoaudiologia passa a intervir em aspectos relacionados com o desenvolvimento
da linguagem, possibilitando, assim a promoção dos aspectos comunicativos de
forma ampla e pautada na eficiência, contribuindo diretamente na habilitação
e, consequentemente na redução dos déficits que a criança autista tende a
apresentar na sua integração na sociedade. Sendo assim é de suma importância
que o fonoaudiólogo sempre possua um olhar, tanto, individualizado, como um
olhar clínico direcionado as principais necessidades dos indivíduos (Bagarollo &
Panhoca, 2011; Saad & Goldfeld, 2009).

414
A intervenção psicológica de forma precoce, em uma família que
recebe um filho com deficiência, diminui consideravelmente as dificuldades
na aceitação e ajuda a ter uma presença mais realista e otimista de suas
possibilidades no processo de desenvolvimento. O trabalho do psicólogo neste
caso, não é promover a cura, não obstante, a estimulação do desenvolvimento,
dando ênfase na autonomia e propor a qualidade de vida tendo em vista, o
usuário e os familiares (Ribeiro & Silva, 2017, p. 17) O profissional da área da
Psicologia possui um papel fundamental no desenvolvimento da sociabilidade,
do bem-estar, bem como da afetividade e propiciar a qualidade de vida da
criança com deficiência.

Policlínica Elizabeth de Sousa Assis: possibilidade de


Atendimento Integral a usuários com CRIANES

A fim de atender à crescente demanda e à necessidade de um espaço


adequado, a administração do município decidiu construir a Policlínica
Elizabeth de Sousa Assis, inaugurada em dezembro de 2022. Com essa
inauguração, não apenas o espaço físico foi ampliado, mas também a visão
sobre saúde integrada. A policlínica buscou substituir a atuação isolada
de cada profissional por um modelo colaborativo e multiprofissional, que
permite maior capacidade de análise e intervenção. A estrutura das salas e a
qualidade dos equipamentos contribuem para a prestação de um atendimento
de excelência voltado para crianças com necessidades especiais em saúde e
seus familiares.
Localizada na área central do município, conforme Figura 3. A
Policlínica conta com uma recepção ampla, onde trabalham uma recepcionista
e um técnico em enfermagem, responsáveis pela triagem. Há salas específicas
para atendimento conforme a área de atuação do profissional, incluindo
Serviço Social, Fonoaudiologia, Fisioterapia e Psicologia, além de uma sala de
Telemedicina, uma de Ultrassonografia, sala de reuniões, sala do Programa
Nacional de Imunizações (PNI) e banheiros.

415
Figura 3. Mapa de Localização - Policlínica Elizabeth de Sousa Assis.

Fonte: organizado por: Lupuna Corrêa de Souza, 2024.

O quadro de funcionários é composto por 13 profissionais: 2


assistentes sociais, 4 fisioterapeutas, 1 fonoaudióloga, 1 psicóloga, 1 auxiliar
de serviços gerais, 2 técnicos de enfermagem, 1 motorista e 1 recepcionista.
Os atendimentos ocorrem de segunda a sexta-feira, das 8h às 11h e das 14h
às 17h. Os atendimentos domiciliares são realizados nas quintas-feiras pela
manhã. Para agendar uma consulta, é necessário encaminhamento médico ou
de enfermagem, após o qual o usuário passa por avaliação com o profissional
especialista, que define as sessões conforme os dias e horários disponíveis na
semana, com duração média de 40 minutos cada sessão. Os atendimentos
voltados a usuários com necessidades especiais de saúde acontecem às quintas-
feiras à tarde, com transporte disponibilizado para a condução dos usuários,
acompanhados por seus responsáveis, até o local de atendimento.

416
As Família no Processo de Reabilitação da Criança com
Necessidades Especiais de Saúde

As famílias de crianças com necessidades especiais de saúde enfrentam


uma jornada contínua em busca de atendimento especializado e requerem
uma rede de cuidados multiprofissional que assegure a assistência necessária
para o desenvolvimento adequado dessas crianças. Nesse contexto, a equipe
multiprofissional atende essa demanda por meio de uma rede de cuidado
que promove ações de promoção e prevenção à saúde, favorecendo o
desenvolvimento de diversas habilidades.
Os pais, mães e responsáveis relatam diversas mudanças no
desenvolvimento das crianças, desde melhorias no comportamento social até
avanços no desenvolvimento psicomotor, a partir do início do projeto pela
equipe multiprofissional. Entre esses relatos, destacam-se:
A senhora S.V.N., mãe de uma criança diagnosticada com paralisia
cerebral, observa que, após o início do tratamento, sua filha parou de ser
internada frequentemente devido a episódios recorrentes de pneumonia, que
anteriormente resultavam em hospitalizações contínuas. A mãe relata que,
com o apoio da fisioterapia respiratória e da fonoaudiologia, houve melhorias
na mastigação e deglutição da criança, além de uma significativa redução da
salivação excessiva. Ela também expressa gratidão pelas sessões de analgesia
que recebe para aliviar as dores nas costas, causadas pelo ato de carregar a filha,
confirmando que, mesmo morando longe, faz questão de trazer a filha para o
atendimento devido aos progressos observados em seu desenvolvimento.
O senhor C.l.C., pai de uma criança diagnosticada com Transtorno do
Espectro Autista (TEA), também compartilha sua experiência:

Meu filho teve uma evolução muito significativa quando ele início o
tratamento ele era uma criança que não tinha interação social, ficava
todo tempo inquieto e não tinha comunicação com as pessoas, hoje
não! meu filho com a ajuda da equipe principalmente da fisioterapia,
fonoaudiologia e psicóloga, consegue se comunicar com as pessoas,

417
tem noção de espaço, não fica mais inquieto podemos até ir às missas
nos domingos, e ele estuda normalmente, eu só tenho a agradecer
(C.I.C, 2024).

Nesse contexto, a senhora M.S.N., mãe de uma criança diagnosticada


com síndrome de Down, relata que o atendimento multiprofissional trouxe um
impacto significativo para sua filha, promovendo avanços notáveis na fala, na
capacidade de andar e na compreensão. Para ela, esses progressos representam
algo grandioso, trazendo uma nova normalidade à vida da filha. Nesse cenário,
fazer parte de uma equipe multiprofissional comprometida com a assistência
à saúde de crianças proporciona enorme satisfação e gratidão. Poder oferecer
conforto e suporte aos responsáveis nos motiva a desenvolver um trabalho
cada vez mais sólido e eficaz.
Como fisioterapeuta, tenho a oportunidade de transformar a vida de
uma criança, promovendo melhorias em sua perspectiva de vida. Movimentos
simples, como rolar, mover um membro ou até mesmo estimular um dedo, dão
sentido a essa profissão tão humana. A possibilidade de auxiliar uma criança
em sua deambulação e ver seu progresso até conseguir andar demonstra que
ser fisioterapeuta vai muito além de uma profissão; é uma verdadeira missão.

Considerações finais

Para o sucesso deste projeto, o apoio administrativo foi primordial,


pois sem uma estrutura de suporte adequada, projetos e planejamentos
dificilmente se concretizariam. Nesse sentido, a Secretaria Municipal de Saúde
(SEMSA) teve um papel fundamental ao acreditar no potencial da iniciativa,
providenciando a estrutura física para os atendimentos e assegurando a
logística necessária, incluindo o transporte.
Além disso, cada profissional da equipe contribuiu de forma decisiva,
compartilhando seus conhecimentos e promovendo um cuidado integral
e equitativo para cada criança. Esse trabalho coletivo permitiu oferecer

418
um acolhimento verdadeiramente humanizado, no qual o usuário e seus
responsáveis sempre serão tratados como protagonistas do processo de
cuidado. Dessa forma, os responsáveis puderam não só acompanhar a saúde
física e mental das crianças, mas também trocar experiências e sentir-se
acolhidos em um ambiente de confiança. Esses elementos combinados —
apoio administrativo, estrutura adequada e a dedicação dos profissionais —
demonstram a importância de uma abordagem integrada e colaborativa na
construção de uma rede de cuidados eficiente e humanizada.

Referências
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crianças com espectro autista. Brazilian Journal of Health Review, 7(1), 3568-3580.

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paralisia cerebral. Revista de Neurociência.

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doi.org/10.1590/S0103-05822011000100016

Gonçalves, B. S., de Almeida, C. G., & Pereira, R. G. B. (2023). A eficácia das técnicas
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Multidisciplinar do Nordeste Mineiro, 6(1).

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mudou nos últimos cinco anos? [Dissertação de mestrado, Universidade da Beira Interior].
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ser beneficiárias da Previdência Social. Disponível em: https://www.terra.com.br/economia/
financas-pessoais/criancas-com-deficiencia-podem-ser-beneficiarias-da-previdencia-socia
l,b8891ba3cfb656e59c0b9b0102038c379h4khk3e.html Acesso em: 5 de fevereiro de 2025.

Ribeiro, J. L., & Silva, P. de L. (2017). Família do deficiente intelectual: Reflexões acerca do
sofrimento familiar e do trabalho do psicólogo. Psicologia.pt. https://www.psicologia.pt/
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Saad, A. G. F., & Goldfeld, M. (2009). A ecolalia no desenvolvimento da linguagem de pessoas


autistas: uma revisão bibliográfica. Pró-Fono Revista de Atualização Científica, 21(3), 255–
260. https://doi.org/10.1590/S0104-56872009000300013

419
Faturamento hospitalar: aprimorando
a gestão no município de Silves, AM
Auricelia Maria Queiroz Assis
Laene Conceição Gadelha
Cleudecir Siqueira Portela

Introdução

O Sistema Único de Saúde (SUS) é um dos pilares fundamentais da


saúde pública no Brasil, sendo responsável por garantir o acesso universal e
igualitário aos serviços de saúde para toda a população. Desde a sua criação, o
SUS tem enfrentado desafios significativos, especialmente no que diz respeito
ao financiamento e à gestão dos recursos destinados à saúde. A Constituição
Federal de 1988 estabelece diretrizes claras para o financiamento do SUS, que
deve ser sustentado por recursos da seguridade social, abrangendo saúde,
assistência social e previdência social. No entanto, a realidade mostra que
a média de despesas com saúde tem ficado aquém do ideal, o que levanta
questões sobre a eficácia e a eficiência na utilização dos recursos disponíveis.
Neste contexto, o presente texto aborda a experiência do Hospital
de Silves, no estado do Amazonas, que conseguiu aumentar seus recursos
financeiros por meio da correta alimentação dos sistemas de informação do
Ministério da Saúde. A partir da assinatura do Termo de Compromisso entre
o Estado do Amazonas e a Prefeitura Municipal de Silves, em 2018, o hospital
passou a ter maior autonomia na gestão de seus recursos, o que possibilitou
melhorias significativas na oferta de serviços de média e alta complexidade. A
análise dos processos de regionalização e descentralização do SUS revela que,
ao aumentar o financiamento e dar mais autonomia aos municípios, é possível
promover avanços importantes na saúde pública, especialmente em regiões
com características e desafios específicos, como é o caso da Amazônia.

421
O SUS e o financiamento da saúde

A Constituição Federal de 1988 estabelece que o SUS deve ser financiado


com recursos da seguridade social (saúde, assistência social e previdência
social), mantidos por toda a sociedade de forma direta e indireta, através de
recursos dos orçamentos da União, estados, Distrito Federal e municípios
(CONASS, 2015). A parte destinada ao setor saúde, até a aprovação da Lei
de Diretrizes Orçamentárias, ficou definida em, no mínimo, 30% do Produto
Interno Bruto (PIB), sendo que a média das despesas com saúde para os anos
de 2019 a 2023, foi de 1,86% (variou de 1,7% a 2,2%) (TCU, 2025).
A assinatura do Termo de Compromisso (TC) entre o Estado do
Amazonas (SES-AM) e a Prefeitura Municipal de Silves (SEMSA-Silves) em
2018 representou um marco na gestão do Hospital Municipal. Anteriormente
sob gestão da SES-AM, o hospital possuía pouca ou nenhuma influência da
SEMSA-Silves nos processos de gestão e gerência das ações e serviços de média
e alta complexidade (MAC) (TCGM, 2018). A mudança na gestão possibilitada
pelo TC, alinhada com a crescente importância da autonomia municipal para
o financiamento e aprimoramento da regionalização da saúde, conforme
apontado por Duarte, Mendes e Louvison (2018), permitiu que o município
de Silves assumisse um papel mais ativo na gestão da saúde da população.
A maior autonomia e o aumento do financiamento possibilitaram
a melhoria dos processos de regionalização, refletindo em diversos avanços
para o Hospital Municipal de Silves, como a ampliação da oferta de serviços
e profissionais, a partir da identificação das necessidades específicas da
população e direcionar os recursos para a contratação de profissionais e
ampliação da oferta de serviços. Bem como, a melhoria na gestão dos recursos,
por gerir de forma mais eficiente os recursos destinados à saúde, otimizando
os gastos e investindo em áreas prioritárias para a população. Ao assumir a
gestão do hospital, o município pôde identificar as necessidades específicas
da população, direcionar os recursos de forma mais eficiente e fortalecer a

422
regionalização da saúde, garantindo um atendimento mais completo e de
qualidade para todos.
Com maior volume de recursos e utilização de mecanismos inovadores
de financiamento é possível pensar em expansão da implantação do modelo de
rede de atenção à saúde, ainda em processo de implantação no Amazonas.
Gestores municipais de todo o estado assumiram novas responsabilidades após
a assinatura do TC, desde a contratualização de serviços, execução de recursos,
pactuação de indicadores ou mesmo a mediação de conflitos, que só foi
possível graças a três fatores: financiamento, descentralização e regionalização.
Sem dúvida, aumentar o volume de recursos, mediante incentivos repassados
pelo MS, sempre bem definidos e específicos quanto ao seu uso, pode ser
motivo de preocupação, pela complexidade na utilização em especificidades
locorregionais não previstas. Pode, também, trazer avanços importantes para
a dinâmica do SUS, visto que nunca houve essa possibilidade, de o secretário
municipal assumir a gestão plena da saúde, levantando dilemas sobre questões
pertinentes, como autonomia, responsabilidades, capacidade de arrecadação
e, até mesmo, operacionalização (Moreira, Ferré & Andrade, 2017).
Se espera que nos mais diversos cenários do setor saúde ocorram
contínuas melhorias, mas, em especial, quando se trata de MAC, não há
tempo para o erro, vidas podem ser perdidas se decisões não forem tomadas.
O cenário amazônico impõe desafios aos hospitais de pequeno porte, que
devem suprir as mais diversas demandas, das complicações agudas e de
doenças crônicas, às causas externas. Para tanto, é necessário compreender
a importância do processo de regionalização, em conformidade com os mais
diversos atos normativos e especificidades de cada rede e seus cenários de
implantação (Koide, 2023).
Afinal, os recursos escassos e os elevados custos não são todos os
desafios que um gestor municipal enfrenta para realizar bem seu papel, para
citar alguns: falta de profissionais de saúde; infraestrutura inexistente ou
deficitária; indicadores de saúde menos favoráveis do que os do restante do

423
país; longas distâncias e logística complexa; vazios demográficos; insuficiência
de serviços e de infraestrutura em saneamento; ausência ou má qualidade de
dados e informações; baixa articulação institucional e planejamento regional;
diversidade linguística e cultural (Rocha et al., 2021). E nesse cenário, comum
a grande maioria dos municípios amazonenses, foi possível aumentar o
faturamento hospitalar a partir de mudanças sensíveis e estratégicas, sobretudo
no processo de trabalho, para que os resultados começassem a aparecer.

Média e alta complexidade e evolução do financiamento

Historicamente o interior do estado do Amazonas tem sido prejudicado


por fatores que vão desde o abstrato “fator amazônico”, porte populacional,
centralização dos serviços de MAC na capital e até a deficiência na informação
de produtividade e faturamento hospitalar. A finalidade da configuração do
espaço geográfico, baseado no Decreto nº 7508/2011, é que ele seja a base para
integrar a organização, o planejamento e a execução de ações e serviços de saúde
(Brasil, 2011). Essa argumentação tomava por referência, sistematicamente, os
recursos disponibilizados para a assistência médico-hospitalar, sem levar em
conta, entre outros elementos, o tamanho e o nível de complexidade da rede
de assistência à saúde ou os recursos disponibilizados para a atenção básica, a
vigilância epidemiológica e o controle de doenças (De Souza, 2002).
O estado do Amazonas possui características peculiares em relação às
responsabilidades sanitárias nos territórios, onde nos municípios do interior
(com exceção de algumas unidades) o comando é único na Atenção Básica (AB)
e na MAC. Já na capital, que possui população superior a 50% do quantitativo
do estado, o comando das ações de MAC é do estado (com discreta participação
da capital em exames laboratoriais, de imagem, atendimento e procedimentos
de especialistas e uma maternidade), enquanto a capital se responsabiliza pelo
comando da AB (Garnelo et al., 2014).
Desta feita, é notório que a regionalização é uma diretriz estruturante
da organização e fundamental ao desenvolvimento do Sistema Único de

424
Saúde (SUS) na busca pela efetivação do acesso universal à saúde, entretanto,
desigualdades territoriais afetam capacidades e condições locais para
provisão de serviços em uma política pública nacional com implementação
descentralizada (Gurgel, 2020). Essa descentralização garante aos estados
e municípios autonomia na tomada de decisão acerca dos serviços a serem
implementados, e deveria conferir ao governo federal um papel menos efetivo
do ponto de vista operacional, entretanto, com uma capacidade maior de
redução de desigualdades através das transferências constitucionais.
No Amazonas, o processo de descentralização ocorreu entre os anos de
2017 e 2018, onde todos os municípios, com exceção da capital, se tornaram
“plenos”, ou seja, responsáveis sanitários pela AB e pelos procedimentos de
MAC em seu território. Assim, o estado descentralizou a responsabilidade pelas
unidades hospitalares do interior para os municípios através de um TCGM,
vinculado a um Plano Operativo Anual (POA), que validaria anualmente esse
termo de compromisso realizado entre município e estado (TCGM, 2018; Brasil,
2020; Amazonas, 2020). Desde o primeiro POA enviado pelos municípios ao
estado, ainda em 2018, nenhum outro Plano foi realizado desde então, o que é
preocupante, pois os municípios não realizam a validação há cerca de 6 anos,
apesar de o instrumento legal regulamentar a periodicidade como anual.
Neste sentido, é importante refletir nos valores recebidos pelos
municípios em seus Fundos Municipais de Saúde, fundo a fundo, como a base
do financiamento municipal das ações de MAC, utilizada para o custeio da
unidade hospitalar, em caso de ausência, ou desigualdade de condições no
repasse, coloca os municípios em dificuldade extrema para prover serviços
públicos de saúde. Uma das desigualdades está no critério per capita, na região
amazônica, onde predominam grandes extensões territoriais com baixíssima
densidade populacional, conferindo à grande maioria dos municípios uma
classificação de baixo porte (Biasoto, 2004). Em relação ao porte populacional,
nota-se que nas faixas com até 50 mil habitantes (mais de 95% dos municípios
do Amazonas) as receitas oriundas de arrecadação direta de tributos não

425
ultrapassam 10% das receitas próprias, enquanto nos municípios com mais
de 400 mil habitantes (1,5% dos municípios do Amazonas, especificamente a
capital) ela ultrapassa os 34% (Amaral, 2014).
A equação porte populacional versus critério per capita nas
transferências do SUS ainda apresentam significativas variações: aqueles
com até 50 mil habitantes não ultrapassam a média de R$ 130,50 per capita,
enquanto os vinculados às faixas populacionais superiores partem de R$ 156,05
para até R$ 189,79, isso em municípios com mais de 400 mil habitantes. Isso
endossa a máxima de que a lógica per capita, de pronto, já gera iniquidade para
o nosso estado, potencializada pela desigualdade desse critério de repasse para
o Estado do Amazonas. Os valores que cada município recebe mensalmente
para custear sua unidade hospitalar não chega a 30% do Custo Efetivo Total
da unidade, que tem sido alvo de insatisfação generalizada, pela diferença e
iniquidade que gera.
Um dos pontos importantes para a formação das despesas é o custo
amazônico, que reflete nas capacidades locais acumuladas e nas condições
locais dos mercados de produção de serviços. Esse custo, abstrato aos olhos
das últimas políticas públicas, gera altos níveis de despesa municipal per
capita, entretanto, não necessariamente traduzem maiores níveis qualitativos
ou quantitativos de serviços de saúde. É notória, por exemplo, a escassez de
médicos, insumos e equipamentos. Não existem critérios regionais para o rateio
dos recursos da União, prevalecendo a distribuição dos recursos com base
na capacidade instalada existente, no histórico de produção e nos incentivos
isolados. Exemplificando: a lógica da capacidade instalada não leva em conta
a diferença de preços para efetuar os mesmos serviços no interior, sendo mais
um fator de iniquidade para o financiamento do SUS no Amazonas.
Desde 2018 não existe uma política de estado que realiza a cogestão
financeira das unidades hospitalares, uma vez que o financiamento em saúde
deve ser tripartite. Atualmente, os municípios recebem diretamente o valor de
Teto MAC do governo federal, sendo a parte federal do custeio, que, como já

426
dito, é insatisfatório. Já o estado informa que a estrutura física e o pagamento
de despesas, como água, luz e profissionais (muito aquém das necessidades)
se configura sua parte como custeio. Entretanto, existem relatos de retirada de
profissionais sem a devida reposição, sobretudo médicos, e da ausência pela
aposentadoria. Recaindo aos municípios a pesada responsabilidade de manter
as ações e serviços de saúde, e suprir as ausências, cobrindo a maior parcela da
equação do financiamento do SUS, que deveria ser tripartite. Há municípios
que arcam com até 80% do custeio, apesar de ser o mais pobre e limitado
dentre os entes federados.
A Programação Pactuada Integrada (PPI) do Amazonas se tornou um
problema histórico por permanecer muito tempo desatualizada, limitando
a capacidade de produção dos municípios, sobretudo no interior. Muitos
municípios produzem muito mais do que recebem, superando em 200% o
percentual de execução em relação ao seu Teto MAC. A média percentual de
execução do Teto MAC no estado gira em torno de 75%. É importante frisar
que ainda existe um destaque orçamentário superior a R$ 6.000.000,00 (seis
milhões de reais) que sai do recurso MAC dos municípios para custeio de ações
na capital, sob a justificativa de que esses serviços não seriam realizados in loco.
A PPI do estado teve sua última atualização em 2005, onde permanece igual
há 19 anos, lidando com realidades completamente diferentes, especialmente
pelos avanços conquistados pelos municípios.

Piso da Atenção Básica, Teto Financeiro de Média e Alta


Complexidade e Incrementos

A diferença entre o Piso da Atenção Básica (PAB), Teto Financeiro


de MAC e os Incrementos (que são Emendas Parlamentares), é que os dois
primeiros são repasses mensais da União para os municípios, para custeio das
atividades nas respectivas linhas de cuidado. Já os Incrementos, são despesas
discricionárias, cuja execução está sujeita a avaliações de oportunidades. Já as
emendas parlamentares do orçamento impositivo, trata-se de um percentual

427
do recurso federal da saúde disponibilizado aos parlamentares da bancada
estadual para decisão do envio e rateio. Essa situação reforça a desigualdade
na distribuição dos recursos federais, especialmente pela não uniformidade de
gastos nas mais diferentes localidades, ou pela (in)capacidade de mobilização
que os problemas/agravos de saúde mais prevalentes carregam junto consigo,
com potencial de mobilização.
O SUS não dispõe de consenso quanto a quais variáveis poderiam
indicar as necessidades, ou demandas, para as mais variadas regiões, que
indique o padrão para alocar receitas. Nesse caso, a inexistência de uma
variável que identifique com clareza a localização das demandas, torna ainda
mais difícil a equiparação necessária à região amazônica. Os recursos do
Incremento Temporário do PAB, conforme Portaria nº 395 de 14 de março
de 2019, corresponde ao valor máximo, por município, de até 100% do valor
total do somatório dos PAB Fixo e Variável no ano do exercício anterior ao
vigente. Para questões de cálculo, a definição do valor do Teto do Incremento
Temporário do PAB, utiliza a seguinte equação: Incremento Temporário do
PAB = PAB Fixo + PAB Variável (Brasil, 2019).
O Teto MAC, por sua vez, trata-se de recurso temporário destinado a
complementar o custeio dos serviços de Assistência a MAC, com o objetivo
de melhorar o atendimento à população, incrementando o financiamento da
rede própria de atendimento e/ou, ainda, atuando na ampliação do custeio,
proporcionando a redução de filas de atendimento. Poderão ser alocados
recursos de emenda na ação 2E90 (Incremento Temporário ao Custeio dos
Serviços de Assistência Hospitalar e Ambulatorial para Cumprimento de
Metas) para posterior cadastro de solicitação por estado ou município para
incrementar o MAC, de maneira temporária, em até 100% da produção
aprovada no Sistema de Informações Ambulatoriais de Saúde (SIA) e no
Sistema de Informações Hospitalares (SIH) de 2018.
Daí a importância da correta alimentação dos sistemas, já que os limites
máximos de transferência se fixam pelo que se produz no ano anterior. Para

428
questões de cálculo, a definição do valor do Teto do Incremento Temporário
ao Custeio de Serviços de Assistência Hospitalar e Ambulatorial, utiliza a
seguinte equação: Incremento Temporário do MAC = Produção aprovada SIS
+ Produção aprovada SIH.

Avanços e conquistas no financiamento do SUS no


Amazonas

O financiamento justo é aquele que assegura o caráter igualitário do


acesso a bens e serviços, garante processos bem-sucedidos de descentralização
sob a regulação federal. Combina garantias constitucionais e legais plenas
de acesso universal, integral e igualitário aos serviços em todas as suas
modalidades, cuja atribuição legal recaia sobre os municípios, enquanto
os demais entes federados cuidam de outras competências, como planejar,
organizar, controlar e avaliar as ações e os serviços de saúde. Deve partir das
diferenças regionais a orientação sobre como formular e implementar políticas
de saúde, com a merecida importância ao papel do financiamento federal,
como um elemento indutor do processo de regionalização, sempre respeitando
os princípios fundamentais do SUS (Vieira et al., 2023).
Um avanço notável dentro da atenção especializada do Amazonas
ocorreu com a assinatura da Portaria GM/MS nº 1571, de 16 de outubro
de 2023, que estabelece recurso financeiro do “Bloco de Manutenção das
Ações e Serviços Públicos de Saúde – Grupo de Atenção Especializada”, a
ser disponibilizado aos municípios do Estado do Amazonas. Seus recursos
somam R$ 225.120.797,00 (duzentos e vinte e cinco milhões, cento e vinte
mil, setecentos e noventa e sete reais), divididos em duas partes. A primeira,
se trata de um valor anual a incorporar ao Teto MAC do estado no valor de R$
122.793.162,00 (cento e vinte e dois milhões, setecentos e noventa e três mil,
cento e sessenta e dois reais), por ocasião da necessidade da correção do valor
do Teto MAC estadual, disponibilizados fundo a fundo aos municípios, em
relação aos valores disponibilizados aos outros estados da federação.

429
Já a segunda parte, trata-se de valor em parcela única de R$
102.327.635,00 (cento e dois milhões, trezentos e vinte e sete mil, seiscentos
e trinta e cinco reais) valor solicitado pela “Associação Amazonense de
Municípios” a ser disponibilizado aos municípios do estado do Amazonas
em situação da emergência, decorrente da severa estiagem no período de
vazante dos rios no ano de 2023. Também foi incorporado ao limite financeiro
de MAC do Amazonas o valor de R$ 172.200.502,26 (cento e setenta e dois
milhões, duzentos mil, quinhentos e dois reais e vinte e seis centavos), através
da Portaria nº 758, de 22 de junho de 2023, onde foi incorporado creditado
fundo a fundo em 12 parcelas iguais.
Essas conquistas se devem à melhor compreensão e entendimento das
necessidades apresentadas pelos municípios do interior, onde, em sua quase
totalidade, sobrevivem sem a capacidade de arrecadação para incrementar
custos, onde os investimentos devem crescer, acompanhando as necessidades
da população. Na conformação estabelecida em 2005, o MAC era dividido
entre SES-AM e municípios no percentual de 75% e 25% respectivamente. No
processo de discussão, o estado renunciou 15% do valor que lhe é conferido,
o que permitiu um avanço para os municípios de 40% do valor da portaria.
Sobre a distribuição do novo valor repassado pelo MS, ficou acordado da
seguinte forma: SES-AM, fica com 60%; SEMSA-Manaus, com 9% e as demais
secretarias municipais de saúde do interior, com 31%.
Manaus nunca havia sido incluída no critério de rateio de forma direta,
sendo disponibilizado valores percentuais relacionados à sua capacidade de
produção ambulatorial e hospitalar. Neste novo momento, reconhecendo
a importância da capital nos serviços de saúde, sobretudo na garantia do
acesso a exames e consultas, abre-se a possibilidade de ampliar os serviços
com um investimento mais justo. Esses recursos são para custeio da Atenção
Especializada – MAC, devendo ser investidos na manutenção das atividades
que não contribuem, diretamente, para a formação ou aquisição de um bem
de capital, de acordo com a normativa vigente.

430
Esses detalhes são relevantes, uma vez que destinam recursos
importantes para Silves, e para os municípios que servem de referência,
Itacoatiara e Manaus. São conquistas importantes que estão possibilitando
avanços consideráveis na construção de um SUS mais resolutivo e humano
na região do Médio Amazonas. A Tabela 1 apresenta a evolução dos recursos
recebidos para a atenção hospitalar de Silves, no período de 2018 a 2024.

Tabela 1. Evolução histórica de transferências recebidas fundo a fundo, para a


atenção hospitalar, ação detalhada: “Procedimentos no MAC”.

Anos/
2018 2019 2020 2021 2022 2023 2024
Mês
Jan - 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 69.226,15 145.026,70
66.512,30
15.082,97 66.900,00
Fev - 66.512,30 66.512,30 66.512,30 145.026,70
(Parcela 8.700,00
única)
Mar - 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.900,00 145.026,70
Abr - 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.900,00 145.026,70
Mai - 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.900,00 145.026,70
Jun 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.900,00 145.026,70
66.900,00
Jul 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 164.950,89
19.924,19
66.900,00
Ago 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 164.950,89
19.924,19
87.416,55
Set 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 164.950,89
19.924,19
107.340,74
775.343,33
Out 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 164.950,89
(parcela
única)
Nov 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 184.875,07 164.950,89
Dez 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 66.512,30 184.875,07 164.950,89

Total 465.585,10 798.147,68 798.147,68 798.147,68 813.230,57 1.945.849,48 1.859.865,54

Fonte: FNS.

431
A ilha de Silves e sua unidade hospitalar

O Município de Silves está localizado no estado do Amazonas, na


Região do Médio Amazonas. Com uma área territorial de 3.723,382 km², Silves
contava com uma população de 11.559 habitantes em 2022, resultando em uma
densidade populacional de apenas 3 habitantes por km². A cidade se encontra
a 200 km em linha reta de Manaus e a 250 km por via fluvial, a montante do Rio
Amazonas (Figura 1). A sede do município é uma ilha encantadora, situada
no Lago Saracá, e é cercada por uma paisagem deslumbrante, em confluência
com o Rio Urubu e o Lago Canaçari. A região é caracterizada por áreas de
várzea e igapós, que abrigam uma rica diversidade de peixes. A maior parte
da população de Silves reside na zona rural, com 52,11% dos habitantes, o que
corresponde a aproximadamente 6.029 pessoas, a maioria delas ribeirinhos.
Além disso, 49,1% da população vive com uma renda per capita de até meio
salário-mínimo (Silves, 2021; IBGE, 2022).
A Unidade Hospitalar de Silves, com Cadastro Nacional de
Estabelecimento de Saúde (CNES) nº 2016249, foi inaugurado em 18 de
janeiro de 2014 e está localizado na Rua Florindo de Almeida, S/N, Bairro
Mucajatuba, com o funcionamento 24h em todos os dias da semana (Figura
2) (Amazonas, 2014). Esta unidade esteve subordinada à Secretaria de Estado
de Saúde do Amazonas (SES-AM) até o dia 31 de janeiro de 2018, quando foi
celebrado o Termo de Compromisso entre o Estado e a Prefeitura Municipal de
Silves, através da Secretaria Municipal de Saúde de Silves – SEMSA, onde ficou
estabelecido o termo de cooperação entre a SES-AM e SEMSA Silves, no que
concerne a gestão e gerência de recursos de estabelecimentos que desenvolvem
ações e serviços de MAC no município (TCGM, 2018).

432
Figura 1. Localização do município de Silves, Amazonas.

Fonte: IBGE, 2022. Elaborado por Cleudecir Portela, 2024.

No ato de sua inauguração o hospital recebeu o nome, ainda que


informal, de Hospital Delphina Rinald Abdel Aziz de Silves, ainda necessitando
de homologação jurídica, visto que seu nome fantasia no CNES permanece
como Unidade Hospitalar de Silves desde 2014. Este hospital é um órgão público
credenciado ao SUS, não cobra pela prestação de serviços e segue as normas
regidas pelo SUS. Tem por objetivo prestar assistência hospitalar nas áreas
de pronto atendimento, centro cirúrgico, clínicas médicas, clínica obstétrica,
clínica pediátrica, laboratório de análises e atendimento de enfermagem.

433
Figura 2. Vista lateral (A) e da fachada (B) do Hospital Delphina Aziz de Silves.

Fonte: SEMSA Silves, 2024.

Organização e construção do faturamento hospitalar

Após assinatura do Termo de Compromisso de Gestão em 2018,


passou a ser de responsabilidade do município o envio de dados MAC,
onde permaneceu sem informar ao Ministério da Saúde o que se produzia
de assistência até o ano de 2020, o que ocorria por desconhecer a exigência
legal e pela falta de apoio por parte da Secretaria Municipal de Saúde do
Município de Silves. A partir de uma nova gestão municipal, iniciada em
2021, foi possível mudar essa situação, com a realização do envio regular da
produção hospitalar, isso apesar do cenário econômico mundial desafiador.
Mesmo diante dos desafios impostos pela crise sanitária desencadeada pela
pandemia da Covid-19, com aumento dos custos em saúde, mais do que nunca,
foi necessário conhecer os gastos e direcionar adequadamente os recursos em
saúde, além de buscar ferramentas para aquisição de recursos extras.
O setor responsável pelo Serviço de Arquivo Médico e Estatístico
(SAME) é conhecido como o cérebro do hospital, sendo o responsável por
consolidar, organizar e quantificar todos os procedimentos realizados dentro

434
da unidade hospitalar. Nesse setor são processadas todas as produções, sejam
ambulatoriais (procedimentos que são rotineiramente realizados sem que haja
internação, a exemplo de uma consulta com administração de medicamento
em período de até 24 horas) ou de internações (procedimentos realizados
em um período superior a 24 horas). O processamento correto da produção
hospitalar inicia desde o primeiro atendimento do usuário na recepção, onde
são coletados os dados pessoais, até o envio dos procedimentos realizados em
forma de arquivo para o Ministério da Saúde.
Para que esse processo passasse a ser realizado de forma sistemática,
dentro da rotina hospitalar, foi necessário capacitar os funcionários desse setor
através de curso presencial realizado em Manaus, promovido pelo Departamento
de Controle e Avaliação Assistencial (DECAV/SES-AM). Foram abordados os
sistemas utilizados para a realização da produção, que são: Boletim de Produção
Ambulatorial (BPA) e Sistema de Dados de Entrada de Autorização de Internação
Hospitalar (SISAIH). Ambos utilizam como base para registro o Sistema de
Gerenciamento da Tabela de Procedimentos, Medicamentos e OPM do SUS
(SIGTAP). O curso foi realizado de forma gratuita, dentro das atribuições do
DEVAC, sendo essencial para que, finalmente, existissem dados de atendimento no
Hospital de Silves, tão necessários para o planejamento e monitoramento de ações
de vigilância, além de controle epidemiológico e para acompanhar o faturamento.
Alimentar sistemas oficiais de informação em saúde é crucial para a
continua oferta e sobrevivência dos serviços, uma vez que só será possível exigir
maiores recursos se for comprovada a necessidades destes, onde prevalece
a máxima: “não registrou, não fez”. Para que esse registro seja feito se exige o
comprometimento e organização de todos os profissionais envolvidos, com a
revisão dos processos de trabalho no ambiente hospitalar, onde cada setor deve
entender sua importância para o bom andamento da unidade hospitalar. Para
que os usuários tenham suas necessidades de atendimento supridas é necessário
interligar os diferentes setores envolvidos, com a garantia do bom atendimento e
da correta utilização dos recursos financeiros públicos necessários.

435
Os principais entraves que dificultavam a inserção correta e a
catalogação dos procedimentos pelo SAME, quando se analisou as fichas de
atendimento e internação, foram: falta de identificação correta do usuário, a
não descrição e quantitativo de todos os procedimentos realizados e a ausência
do Procedimento Médico junto com o código de Classificação Internacional
de Doenças (CID). Em busca de sanar essas dificuldades foram realizados
treinamentos e a revisão dos fluxos de trabalho de cada setor, através de cada
Procedimento Operacional Padrão (POP), que é a ferramenta que norteia a
forma de trabalho de cada setor.
Na recepção uma nova ficha de atendimento foi implementada
contendo os dados de registro necessários para se identificar o usuário, com
a disponibilização de computador mais eficiente. Para o corpo de cuidados
(enfermeiros, técnicos de enfermagem e de patologia, médicos, assistentes
sociais, nutricionistas e fisioterapeutas) se realizou rodas de conversa em
cada plantão, para orientar sobre a importância de registrar corretamente
todos os procedimentos realizados, com a descrição e a quantidade do que foi
executado. Os médicos foram orientados sobre como registrar adequadamente
as patologias, seguindo a tabela SIGTAP, dentro da AIH, que descreve a
situação de doença da pessoa, o caráter de seu atendimento, a especialidade do
leito, a patologia acometida, o procedimento submetido e o encerramento de
seu quadro clínico.
Ao corpo de apoio (laboratório, eletrocardiograma, raio-x, ultrassonografia,
banco de sangue e farmácia) também se orientou sobre o registro correto do
procedimento realizado, com fichas especificas em cada setor. Com a implantação
desses novos recursos foi possível reconhecer gastos, registrar despesas e
contabilizar corretamente os serviços ofertados, tanto no ambulatório quanto na
internação. Saber exatamente o que se faz e com qual custo, possibilitou mudanças
significativas no cenário de faturamento hospitalar, o que levou Silves a estar
entre os municípios do Amazonas com melhor desempenho, com faturamento
comprovado superior ao MAC a ele destinado, isso desde o final de 2022.

436
Resultados alcançados e considerações finais

Os resultados alcançados evidenciam uma melhora significativa


no fluxo produtivo do hospital, refletindo na redução da perda de dados
iniciais e ampliação da capacidade resolutiva tanto no ambulatório quanto
nas internações. O aumento no número de partos, atendimentos e cirurgias,
aliado à diminuição de transferências de usuários, possibilitou um melhor
controle dos gastos com transporte e planejamento da manutenção das
ambulâncias, otimizando a gestão de recursos. A correta contabilização dos
exames ambulatoriais permitiu identificar os exames e procedimentos mais
utilizados, direcionando os gastos com insumos de forma mais eficiente e
ampliando a oferta de ações e serviços de saúde. A identificação das patologias
mais frequentes na população, através da contabilização completa dos
procedimentos, possibilitou o direcionamento de intervenções preventivas
adequadas, inclusive no nível primário de atenção à saúde.
A correta informação dos gastos também impactou positivamente
no incremento do recurso MAC, que passou de R$ 798.147,63 em 2021 para
R$ 1.102.033,55 em 2023, formalizado pela Portaria GM/MS nº 3.053, de 8
de janeiro de 2024. Esta portaria, estabelece o teto MAC do município de
Silves em R$ 1.979.410,65 (Brasil, 2024a). Adicionalmente, a partir de 2024, o
município está apto a receber recursos via emendas parlamentares, destinadas
ao atendimento de MAC, com as transferências de recursos regidas pela
Portaria GM/MS nº 3.283, de 7 de março de 2024 (Brasil, 2024b). Apesar da
complexidade do processo, envolvendo diferentes agentes, o correto registro
do faturamento hospitalar possibilitou ampliar o volume de recursos recebidos
pelo município para a execução da MAC, além de apresentar a realidade do
funcionamento do hospital.
Para consolidar estas mudanças nos processos de trabalho dos
diferentes setores do hospital, é fundamental manter uma gestão focada no
monitoramento e processos educativos contínuos. É imprescindível que os

437
gestores municipais incentivem o registro constante e necessário do que é
executado, e que novos processos sejam desenvolvidos para potencializar ainda
mais a capacidade de resolução das demandas de saúde da população de Silves.
A experiência de Silves demonstra que é possível identificar falhas e buscar
soluções para os desafios, sendo essencial o comprometimento da gestão e
dos funcionários, com a diminuição de perdas e otimização de recursos, além
da revisão constante dos processos de trabalho. Através do correto registro
hospitalar, foi possível melhorar a qualidade e ampliar a oferta de serviços,
respeitando os princípios e diretrizes do SUS, e tendo como foco principal a
saúde e o bem-estar dos usuários.

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440
Fisioterapia pélvica: derrubando
pré-conceitos e transformando vidas
em Silves, AM
Auricelia Maria Queiroz Assis
Dennice Batista Neves
Laene Conceição Gadelha
Denise Rodrigues Amorim de Araújo

Apresentação

Silves é um município brasileiro, na Região do Médio Amazonas, com


uma população registrada no censo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE) de 2022 de 11.559 habitantes, em sua maioria ribeirinhos, dos quais
5.499 são mulheres, sendo que 3.114 estão na faixa etária de 15 a 59 anos (IBGE,
2022). Estas mulheres são as que mais sofrem com as disfunções do assoalho
pélvico. Por ser um município com população predominante ribeirinha que vive
do cultivo e da pesca, estas mulheres desde muito jovens labutam de forma a
causar muita descarga sobre a musculatura do assoalho pélvico.
O Assoalho Pélvico é um grupo de músculos, ligamentos, nervos e
tecido conjuntivo que sustenta os órgãos que ficam na área do abdômen. São os
responsáveis por segurar a urina, as fezes e os órgãos internos femininos como
o útero e vagina (Baracho, 2018). As mulheres historicamente subjugadas
vêm ganhando a autonomia de suas vidas, porém grande parte delas ainda
sofrem caladas as disfunções do assoalho pélvico. Seja por vergonha ou
constrangimento as mesmas têm dificuldade de buscar atendimento, para
vencer esse tabu a fisioterapia tem sido fundamental, mostrando que nenhuma
mulher precisa conviver com essas patologias.
A Fisioterapia Pélvica vem sendo ofertada à população feminina do
município desde o ano 2018, porém no ano de 2022 com o início do atendimento

441
do médico ginecologista houve um aumento gradativo e significativo da
procura pelo procedimento. Nesse contexto a Fisioterapia Pélvica atua na
prevenção e tratamento de diversas patologias causadas pela diminuição ou
perda do tônus muscular perineal. Este capítulo visa mostrar o caminhar
da implementação da intervenção da Fisioterapia Pélvica no tratamento de
doenças do assoalho pélvico feminino buscando a melhoria da qualidade de
vida das munícipes silvenses.

Silves nos braços do rio

Silves tem sua sede localizada em uma ilha de beleza única, onde o
visitante pode desfrutar as belezas naturais o ano inteiro, em época de cheia do
rio podemos apreciar um delicioso suco natural vendo o pôr do sol em um dos
quiosques à frente da cidade, e em época de vazante, a praia de arreia branquinha
é um convite para se refrescar. Devido as suas proporções demográficas e
geológicas o deslocamento dos usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) é feito
por embarcação em uma área extensa de rios, lagos e calhas fluviais. Tem um
povo acolhedor e feliz, sendo conhecida como Silves, a Cidade Risonha

Favônio de Murucutu
Do bar da Jandira a bela paisagem
a mata que é margem do rio urubu
e o negro das águas matiza a folhagem
que baila agitada ao som da aragem
que vem lá das bandas do murucutu

O vento sussurra a canção tão bonita


que todo cenário parece dançar
da praia alvinha de lá do terceiro
avança ansioso o primeiro banzeiro
num manso galope pra ilha beijar

E Silves se torna um recanto de prece


erguido nas águas em forma de altar

442
Uma rede se aquieta
e Deus nesse instante parece que desce
em forma de brisa
e se põe a cantar
(Braga, 2021)

Silves possui, conforme dados do Cadastro Nacional de Estabelecimentos


de Saúde (CNES), um total de 14 (quatorze) estabelecimentos de saúde públicos
municipais (Brasil, 2024). Devido a sua demografia, o atendimento de saúde
feito pela equipe multidisciplinar é realizado na Policlínica Elizabeth de Sousa
Assis, localizada na região central da sede de Silves. Neste ambiente de cuidado,
a população pode ser atendida de maneira contínua pelos profissionais das
seguintes áreas: Nutrição, Assistência Social, Fonoaudiologia, Psicologia e
Fisioterapia. Essa equipe multidisciplinar atua junto à equipe da Estratégia de
Saúde da Família (ESF).

“Não fala disso, menina...”

O empoderamento feminino é um conceito que surgiu no século XIX


e que se consolidou como um movimento político, social e filosófico. Tendo
como objetivo promover a força da mulher e a luta pela igualdade de gênero,
para que as mulheres possam ter uma maior participação na sociedade. Em
pouco mais de 100 anos, esse conceito se tornou tão abrangente que podemos
dizer que ele passou de liberal para libertador, onde as mulheres passaram a ser
mais que autossuficientes e se tornaram inspiração para toda uma sociedade
(Cornwal, 2018).
Nós, mulheres, historicamente subjugadas estamos conquistando a
autonomia de nossas vidas, nunca se falou tanto em “Empoderamento Feminino
que vai além de garantir que homens e mulheres tenham os mesmos espaços,
com direitos e oportunidades iguais. Empoderar uma mulher é permitir ela a
liberdade de falar sobre o que sente e pensa, sem julgamentos ou preconceitos
(Cornwal, 2018). Isso nos leva a refletir, o quanto nós somos empoderadas.

443
Até onde podemos garantir a uma mulher o direito de ser Mulher? Ser mulher,
por si só, já é uma vivência de várias facetas, somos mães, trabalhadoras,
produtoras, empresárias, educadoras, entre tantas, somos muitas. Mas apesar
de todo o empoderamento feminino, ainda existe um tabu quando se trata de
buscar atendimento para os distúrbios do assoalho pélvico.
Quando se trata de Saúde da Mulher e Fisioterapia Pélvica, muitas
mulheres ainda sofrem em silêncio com disfunções do assoalho pélvico.
Guardam segredos, dores e, seja por vergonha ou constrangimento, as mesmas
têm dificuldade de buscar atendimento, para as mais diversas patologias que
acometem o assoalho pélvico, comprometem a sua saúde física e emocional
(Buzo, Cruz & Garbin, 2017). Elas, em sua maioria, lidam com incontinências
urinária e fecal, dores lombares e pélvicas, inchaço, dores durante a relação
sexual provocadas pelo vaginismo uma doença que causa forte desconforto por
se tratar de contrações involuntárias da musculatura da vagina que dificulta a
penetração do pênis durante o ato sexual, outra patologia também comum é
vulvodínia caracterizada por quadro álgico na região da vagina, apresentam
prolapsos pélvicos e vaginais, perdendo completamente o prazer sexual e
muitas a vontade de viver (Nagamine, Dantas e Silva, 2021).

O começo

Os benefícios da atuação da fisioterapia dentro da Saúde da Família


vêm sendo amplamente analisados, de modo a ser nítida a diferença e impactos
no cuidado da população. Tavares, destacou que foi em 1997, quando o
Sistema Único de Saúde (SUS) reorganizou a ESF, através da Portaria 154/GM
de 24 de janeiro de 2008 revogada posteriormente e criou o Núcleo de Apoio
à Saúde da Família (NASF), que se deu a atuação do Fisioterapeuta na Atenção
Básica, com oportunidades de ampliar, no âmbito teórico e prático, ações e
contribuições para a saúde individual e coletiva.
A fisioterapia como campo amplo de conhecimento eleva o
atendimento do usuário do SUS, a introdução deste profissional na Atenção

444
Básica de início se apresentou, aos demais membros já estabelecidos da ESF, de
forma curativa e reabilitadora, com uma visão limitada, ainda se entendia que
o profissional de fisioterapia deveria intervir apenas quando solicitado. Porém,
em um breve caminhar junto à ESF se destacou a importância da atuação do
fisioterapeuta, elevando as ações de promoção da saúde em busca de atender às
necessidades que o usuário apresenta como sujeito único e portador do direito
à saúde (Portes, Caldas, de Paula & Freitas, 2011).
A atuação do fisioterapeuta no município de Silves iniciou em 2014
ainda mais voltada a prática da reabilitação ortopédica e os demais profissionais
da ESF não visualizavam a amplitude de cuidados que esta profissão promove.
E foi justamente no campo do atendimento de fisioterapia ortopédica que
a primeira pessoa de fisioterapia pélvica se apresentou, no ano de 2018. A
usuária Esmeralda11, 44 anos, veio em busca do atendimento de fisioterapia,
encaminhada pelo médico da ESF porque relatava dores na região lombar há
muitos anos, que a impossibilitava de trabalhar.
Esmeralda já estava há duas semanas em tratamento de fisioterapia
quando, ao realizar um exercício na bola, começou a chorar. Como profissional
da fisioterapia não imaginava quais seriam as razões, de início perguntei se o
exercício tinha causado dor. Esmeralda, em um impulso, contou que, quanto
ficava sentada na bola, sentia uma dor que a incomodava, mas que a razão de
suas lágrimas não era o exercício, mas o fato de seu companheiro, parceiro de
muitos anos, ter dito que iria sair de casa, porque os dois não tinham mais vida
sexual. Relatou que o motivo de não manter relações sexuais com o marido
acontecia porque sentia dores intensas durante o ato. Esmeralda permitiu o
exame e foi observado prolapso vaginal e uterino.
A partir dessa avaliação pude perceber que sozinha não poderia tratar
Esmeralda, o cuidado demandava a atuação da equipe multidisciplinar. Junto
com a equipe formada pelo médico, assistente social e psicólogo, montamos
o Projeto Terapêutico Singular (PTS) no qual a participação de Esmeralda foi
11   Todos os nomes usados nesse relato foram mudados para títulos de pedras preciosas para preservar
a identidade das usuárias

445
fundamental para que pudéssemos entender a vivência, rotina e escolher o
melhor caminho para sua saúde. Como mecanismo de tratamento integrado
o PTS é uma ferramenta que se utiliza do conhecimento individual de saberes
de cada profissão para, junto com o usuário, traçar o melhor caminho para
amenizar ou sanar a problemática de saúde. Sendo o tratamento construído
em coletivo (Cadernos Humaniza SUS; v. 2, 2010).
Durante cinco meses Esmeralda fez o tratamento voltado para a fisioterapia
ginecológica pélvica, realizou a cirurgia de Histerectomia e Colpoperineoplastia,
e, após o procedimento cirúrgico, retornou por mais 3 meses para concluir o
tratamento terapêutico. Esmeralda voltou à normalidade de sua vida sexual, não
se queixou mais de dores e, como ela mesma disse: “Eu voltei a viver”!
Diante a experiência de Esmeralda, observou-se que existia um grupo de
mulheres portadoras de patologias do assoalho pélvico que, por constrangimento,
não buscavam tratamento. Decidimos, portanto, realizar trabalho de divulgação
em todas as unidades de ESF sobre a importância do tratamento e a oferta do
serviço pela equipe de fisioterapia, junto aos profissionais de saúde do município
com a necessidade de identificação dessas pessoas.

Fisioterapia Pélvica: a evolução do cuidado na saúde da


mulher

A Resolução N°. 401/2011 do Conselho Federal de Fisioterapia e


Terapia Ocupacional (CONFITO), disciplina a atividade do Fisioterapeuta
no exercício da Especialidade Profissional Fisioterapia na Saúde da Mulher.
No inciso IX destaca como atribuições: planejar e executar estratégias de
intervenção fisioterapêuticas utilizando recursos fisioterapêuticos gerais e
os específicos como: massagem perineal, cinesioterapia dos músculos do
assoalho pélvico, biofeedback mamométrico, eletromiográfico, de superfície
e intracavitário (anal e vaginal), biofeedback ultrassonográfico, propriocepção
e fortalecimento muscular intra-anal e intra-vaginal, programas de exercícios
para gestantes, entre outras (CONFITO, 2011).

446
A Fisioterapia Pélvica atua na prevenção e tratamento de diversas
patologias causadas pela diminuição ou perda do tônus muscular perineal,
promovendo uma melhor conscientização corporal e propriocepção perineal,
ajudando na reeducação vesical (de Andrade, Costa, Cavalcante & Silva, 2023).
Nesse contexto, a Fisioterapia Pélvica vem sendo ofertada à população
feminina do município de Silves desde o ano 2018, envolvendo várias práticas
de saberes em busca do cuidado individual de cada usuária portadora de
patologia. Funciona com uma equipe multidisciplinar que conta com o apoio
direto da psicologia, do serviço social e da nutrição, além da participação de
todos os profissionais que compõem a ESF. Essa atuação foi ampliada a partir
de 2022, com o início do atendimento do médico ginecologista, quando houve
um aumento gradativo na procura pelo procedimento terapêutico.
A usuária, ao ser encaminhada para a fisioterapia pélvica, é avaliada
e de acordo com a sua sintomatologia se monta o melhor Projeto Terapêutico
Singular (PTS) que será executado pela equipe e direcionado pela usuária com a
fisioterapeuta. Os tratamentos ofertados no Centro de Reabilitação Elizabeth de
Sousa Assis, para as mulheres que sofre distúrbios relacionados ao assoalho pélvico
são o Treinamento Muscular, podendo ser de forma individual (cone vaginal)
ou em grupo; a Uroterapia, que consiste em um controle da ingesta correta de
líquido e alimentos. Esse é realizado em conjunto com outros profissionais, como
a nutricionista e a psicóloga. A Eletroestimulação como a utilização de eletrodos
vaginais ou de superfície; e, quando a pessoa não tem consciência da contração do
assoalho pélvico, se emprega o Biofeedback um método de reeducação que utiliza
a retroinformação externa como meio de aprendizagem.
Para que cada usuária se sinta à vontade para atuar amplamente em
seu tratamento, o acolhimento é fundamental. Dentro da Política Nacional de
Atenção Básica (PNAB) já se propõe a importância de receber o usuário de
forma que esse se sinta abraçado pela equipe que o assiste, firmando a relação
entre profissionais e usuários do SUS com base nos preceitos de universalidade
e integridade, caracterizados pelo reconhecimento do usuário como sujeito,

447
como o participante ativo do processo de produção de saúde, onde pode e deve
ser o autor principal (Brasil, 2012).
Acolher é uma prática inerente ao comportamento humano, nem
sempre é fácil realizar. Para orientar o caminho, no ano de 2006, o Ministério da
Saúde lançou o Livro “Acolhimento nas Práticas de Produção de Saúde” que visa
ampliar o nosso horizonte quanto à temática, nos levando a refletir como nós,
profissionais de saúde, nos sentimos em relação ao trabalho que executamos,
como somos acolhidos e como podemos acolher o usuário. Mais do que um
sorriso no rosto, praticar o acolhimento exige boa vontade e dedicação para o
envolvimento com a necessidade e dor do outro (Brasil, 2006).
Observamos que, após alguns meses de atendimento do médico
ginecologista, a busca pelo serviço de fisioterapia pélvica continuava pequena
em relação ao número de usuárias atendidas pela ginecologia. Algumas
usuárias, mesmo com o encaminhamento, não buscavam tratamento para
as disfunções do assoalho pélvico. Para vencer esse tabu, no ano de 2023,
criou-se o Grupo de Fisioterapia na Saúde da Mulher, composto por usuárias
e profissionais de fisioterapia, que se reúnem todas às terças-feiras no CER
Elizabeth de Sousa Assis. Esse grupo tem como objetivo envolver todas as
mulheres na faixa etária de 15 anos em diante, incluindo as não patológicas.
Como forma de propaganda do grupo realizamos educação em saúde em
várias repartições públicas, como nas Unidades Básicas de Saúde, polos na
Zona Rural, escolas e Centro dos Idosos.
A fisioterapia pélvica feminina vem ganhando espaço e derrubando
tabus e preconceitos. O município de Silves promove a oportunidade de
tratamento das doenças do assoalho pélvico pelo SUS. A cada dia, mais
mulheres buscam o atendimento. Podemos destacar que, no ano de 2022, 275
mulheres fizeram consulta ginecológica, dessas, 11 mulheres fizeram fisioterapia
individual e duas usuárias fizeram cirurgia (colpoperineoplastia). No ano de
2023, 910 mulheres fizeram consulta ginecológica, dessas, 16 delas fizeram a
fisioterapia individual e cinco usuárias fizeram cirurgia (colpoperineoplastia).

448
No ano de 2024, 452 mulheres fizeram consulta ginecológica, dessas, 14 estão
em tratamento de fisioterapia individual. No atendimento em grupo, 16
mulheres participam ativamente.

Grupo de Fisioterapia na Saúde da Mulher Caboquenas

Segundo a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), as equipes de


saúde devem promover atenção integral, contínua e organizada à população
dentro de seu território, com base nas necessidades sociais e de saúde de seus
usuários. A Atenção Básica deve buscar a atenção integral e de qualidade,
resolutiva e que contribua para o fortalecimento da autonomia das pessoas
no cuidado à saúde, onde possam ser promotores de seus próprios cuidados
preventivos, estabelecendo um conjunto de cuidados dentro da rede de atenção
à saúde (Brasil, 2012).
Segundo o Cadernos Humaniza SUS, volume 2:

Grupos são uma ferramenta de trabalho na Atenção Primária a


Saúde (APS) que podem auxiliar os profissionais na promoção de
saúde por propiciar espaço de troca de experiências e informações,
favorecendo aprendizagens e reflexões sobre o processo de saúde-
doença, estimulando assim, a transformação de atitudes e crenças,
por muitas vezes, firmemente arraigadas do usuário e levando ao
aumento de habilidades de lidar com seus problemas provocando o
autocuidado. Os grupos podem propiciar a formação de um espaço
para criação ou fortalecimento de redes sociais e de experimentação
de novas formas de viver (Brasil, 2010).

Com o intuito de uma abrangência maior da população feminina


optamos por formar um grupo aberto, no qual todas as mulheres podem se
sentir à vontade para participar, sejam elas portadoras de alguma patologia ou
não, sem a obrigatoriedade de vir regulamente, sendo livre a permanência. Dessa
forma, temos um grupo em constante movimento e podemos afirmar que temos
neste espaço 21 usuárias que participam ativamente (Figuras 1 e 2).

449
O objetivo do Grupo de Fisioterapia na Saúde da Mulher Caboquenas é
falar abertamente sobre os desafios de ser mulher, tratar e prevenir as patologias
do assoalho pélvico. De início, ouve uma inibição por parte das mulheres, mas,
aos poucos, com as rodas de conversas que antecedem os exercícios, as usuárias
passaram a verbalizar as suas problemáticas e, juntas, serem fonte de apoio e
encorajamento. Quando alcançam evoluções favoráveis em seu tratamento,
as mesmas passam a dividir suas conquistas, ampliando a sensibilização pela
problemática do outro e fortalecendo a vida em comunidade.

Figuras 1 e 2. Grupo de Fisioterapia na Saúde da Mulher Caboquenas: atividade com


exercícios de Kegel.

Fonte: Acervo autoras, 2024.

Contanto suas histórias


Ametista

Ametista, 45 anos, casada desde os 14 anos, 4 filhos, sempre viveu em


área ribeirinha. Ama tratar a terra, cultivar e pescar. Relata que a primeira vez que
sentiu que perdia urina estava carregando o motor rabeta do bote para a terra.
Achou, em princípio, que a força empregada tinha sido grande e que já estava
com vontade de ir ao banheiro, por isso, ter o escape de urina. Seu sofrimento
foi ampliando quando ela passou a ter escapes fazendo qualquer atividade, não
conseguia mais viver sem usar absorvente, passou a evitar contato íntimo com

450
o esposo, que chegou a acusá-la de traição. Para evitar atritos, ela passou a optar
por manter relações sexuais com seu esposo sempre dentro do rio, para que
ele não percebesse a perda de urina. Usava a desculpa que os filhos já estavam
maiores e para preservar a intimidade, seria melhor namorar quando iam pescar.
A intimidade, junto ao seu companheiro, deixou de ser algo prazeroso e passou a
lhe causar sofrimento. Ao ouvir uma palestra sobre a fisioterapia pélvica se sentiu
motivada a fazer o tratamento, não imaginava que pudesse ter cura. Após 5 meses
de tratamento a mesma passou a controlar a micção. Depois de quase 4 anos de
sofrimento, a intimidade com seu esposo voltou a regularidade de afeto dentro do
quarto. Ela relata que não se sente à vontade para contar ao esposo o que ela sentiu
por anos. Para ele, o seu tratamento de fisioterapia é por dores na região lombar.

Turquesa

Turquesa, 38 anos, solteira, 2 filhos, veio em busca de tratamento


encaminhada pelo médico ginecologista, relata que a fisioterapia pélvica transformou
a sua vida porque ela vivia com medo de passar por constrangimento. Deixou
de praticar exercício físico, que era a sua grande paixão, porque não podia fazer
nenhum esforço por mais simples que fosse, como um simples espirro que a urina já
descia. Passava a maioria do tempo usando absorvente e isso provocava desconforto
intenso. Relata que é muito grata por ter conhecido a fisioterapia pélvica. Com o
tratamento, restaurou a sua dignidade e a sua autoestima e, emocionada, diz que “a
transformação foi além de parte física, foi uma redescoberta pela alegria de viver”.
Hoje ela pode dizer que conhece seu corpo e controla seus desejos, não sendo mais
dominada pela incontinência urinária que não permitia que ela vivesse amplamente.

Opala

Opala, 58 anos, viúva, 5 filhos, chegou ao atendimento de fisioterapia


pélvica após realizar uma cirurgia de histerectomia total encaminhada pela
médica da Unidade Básica de Saúde (UBS). Relatou que não conseguia

451
controlar a vontade de urinar que, quando ela pensava em ir ao banheiro, já
estava urinando. Uma mulher alegre e cheia de vida, se viu refém da micção de
urgência, passou a usar absorvente e não conseguia mais praticar o Carimbó.
Entristecida pela perda do esposo, agora sentia a ausência das suas amigas de
dança. De início, teve muita vergonha de usar os cones vaginais. Relata que,
em sua mente, estava fazendo algo errado. O acompanhamento da psicóloga
foi fundamental para ela aderir definitivamente o tratamento. Hoje sua vida
está completamente transformada, após 2 anos de tratamento, afirma que os
exercícios serão para a vida toda, que não imagina como seria vida dela se não
tivesse encontrado o tratamento correto.

Diamante

Diamante, 61 anos, casada, 3 filhos, foi em busca do atendimento


de fisioterapia depois de uma amiga que já fez o tratamento confidenciar as
melhorias que estava tendo. Relata que, por mais de 12 anos sentia dores ao
manter relações sexuais com o esposo, que fugia dele quando ele a procurava e
que, por várias vezes, tomou medicamentos e fez asseios íntimos em busca de
aliviar as dores. Apesar de ter um casamento feliz e duradouro, nunca contou
para o esposo o que sentia. Quando ele perguntava o que ela tinha sempre
dizia que era “dor de cabeça”. Quando a neta foi morar com eles, foi um alívio
pois colocava a criança para dormir no quarto, o que impedia investidas de
seu esposo. Ela afirma que a fisioterapia pélvica foi um divisor de águas, uma
transformação completa da vida pessoal e íntima, que “nem quando eram mais
jovens, como casal, foram tão felizes e íntimos”. Após muito tempo, ela relata
que criou coragem contando para o esposo o que sentia e como seu sofrimento
era intenso antes de fazer a fisioterapia pélvica. O esposo, solidário, disse que
sentia muito por ela ter vivido tantos anos sofrendo. Segundo Diamante, a
maior alegria dela é perceber que as dores passaram e que não precisará mais
ter segredos com seu companheiro de vida.

452
Considerações Finais

A fisioterapia pélvica como terapia de fortalecimento do assoalho


pélvico ajuda a prevenir e tratar distúrbios cinético-funcionais da pelve humana
sendo uma grande aliada à saúde da mulher. Seus benefícios são inúmeros,
tanto físicos, como psicológicos. As mulheres aprendem a contrair e relaxar
a região pélvica, alongar músculos tensos e fortalecer os fracos, melhorar a
flexibilidade, prevenir doenças, além de preparar o períneo para atividades
sexuais sem desconforto.
O município de Silves se destaca no cenário nacional. Em uma
pesquisa realizada no Distrito Federal, constatou-se que 90,64% das mulheres
nunca procuraram a fisioterapia, apesar de terem sintomas, e menos de 5%
das mulheres patológicas conseguem tratamento pelo SUS (de Andrade et
al., 2023). Estamos derrubando algumas barreiras de preconceito e tabus
milenarmente incorporados à saúde da mulher e transformando vidas por
resgatar a dignidade de viver sem sofrimento.
As mulheres, protagonistas de suas vidas, caminham a cada dia para o
completo conhecimento do seu corpo e de suas vontades. Falam abertamente
sobre os seus temores e desconfortos. Durante esse percurso, por muitas vezes,
nos envolvemos emocionalmente com as usuárias, vivenciando junto a elas
seus temores e dificuldades, apesar de sermos mulheres, exigiu bastante estudo
e pesquisa para ampliar nossos conhecimentos de como tratar as patologias do
assoalho pélvico.
A vivência no Grupo de Fisioterapia na Saúde da Mulher Caboquenas,
abriu os nossos horizontes. Nele, as usuárias com a ajuda dos profissionais
da fisioterapia e apoio da equipe multidisciplinar, aprendem que não são as
únicas que tem algum transtorno no assoalho pélvico, que existe tratamento
e que nenhuma delas precisa enfrentar calada e sozinha. Temos a certeza de
que, em breve, a Fisioterapia Pélvica será amplamente conhecida e fará parte
da rotina de cuidados femininos.

453
Referências
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454
Gestantes vivendo com HIV: o trabalho
para eliminar a transmissão Vertical no
município de Tefé, AM
Sandra Caroline Pereira Machado
Patrizia Gonçalves de Araújo Pires
Mayra Costa Rosa Farias de Lima

Apresentação

O município de Tefé, localizado na região de Saúde do Triângulo, no


Médio Solimões, a 516 km de Manaus, é acessível por via fluvial e aérea, e
se destaca por sua localização central na Amazônia Internacional. Com uma
população estimada em 139.086 habitantes, Tefé registra 191 pessoas vivendo
com HIV, vírus responsável pela AIDS.
A transmissão vertical do HIV, definida como a transferência do vírus
da mãe para o filho durante a gestação, o parto ou a amamentação, configura-
se como um dos principais desafios no enfrentamento global da epidemia de
HIV/AIDS. Apesar dos avanços substanciais na prevenção e tratamento, essa
modalidade de transmissão continua a ser uma preocupação significativa,
especialmente em contextos caracterizados por restrições de recursos e
desigualdades no acesso aos serviços de saúde.
A eliminação da transmissão vertical é não apenas uma meta crucial
para a proteção da saúde infantil, mas também um imperativo para o cuidado
integral das mulheres vivendo com HIV, contribuindo para a redução
sustentada da incidência do HIV na população (Costa et al., 2021; Vilhaba et
al., 2021).
Nas últimas décadas, a implementação de políticas públicas de saúde e
o desenvolvimento de intervenções biomédicas, como a terapia antirretroviral
(TARV) durante a gestação, a realização de partos assistidos, e a substituição

455
da amamentação por fórmulas infantis, têm demonstrado alta eficácia na
mitigação da transmissão vertical do HIV. No entanto, a efetividade dessas
medidas depende de um acompanhamento clínico rigoroso e interdisciplinar,
que também leve em consideração os desafios psicossociais enfrentados
por gestantes vivendo com HIV. Tais desafios exigem uma abordagem que
transcenda os aspectos estritamente biomédicos, integrando ações que
promovam o bem-estar emocional e a adesão ao tratamento (Brasil, 2017).
A terapia antirretroviral (TARV) é o pilar central na prevenção da
transmissão vertical do HIV. Seu uso durante a gestação permite o controle da
carga viral materna, reduzindo significativamente o risco de transmissão para o
bebê. Quando administrada corretamente, a TARV pode suprimir a replicação
do vírus a níveis indetectáveis, tornando a transmissão praticamente inexistente.
Para alcançar esse resultado, é necessário um acompanhamento
contínuo, que avalie regularmente a eficácia do tratamento e a adesão da
gestante. A TARV, combinada com outras intervenções, como o monitoramento
da carga viral e o planejamento adequado do parto, tem transformado o cenário
da prevenção da transmissão vertical, permitindo que gestantes vivendo com
HIV tenham gestações seguras e que seus filhos nasçam livres do vírus (Brasil,
2017; Trindade et al., 2021).
As medidas de prevenção recomendadas pelo Ministério da Saúde
para a transmissão vertical do HIV são fundamentais para garantir a saúde
de gestantes e crianças expostas ao vírus, com destaque para a testagem
para HIV e outras Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST) durante o
pré-natal, nos primeiros e terceiros trimestres da gestação. O uso de terapia
antirretroviral profilática é essencial antes, durante a gravidez e no momento
do nascimento, assim como a realização de cesariana para mulheres com carga
viral desconhecida ou acima de 1.000 cópias/mL, com o objetivo de reduzir o
risco de transmissão no parto.

456
Figura 1. Visita Domiciliar.

Fonte: Aldemir Jânio, 2022.

Além disso, recomenda-se a substituição do leite materno por fórmula


láctea para evitar a transmissão do HIV, além do uso de zidovudina e outros
fármacos para prevenir pneumonia em recém-nascidos. Desde 2000, a
notificação de casos no Sistema de Informação e Agravos de Notificação (SINAN)
é obrigatória, garantindo o registro e monitoramento de todos os casos.
Embora grande parte dessas medidas tenha sido implementada, ainda
há fragilidades, especialmente no acompanhamento de gestantes e crianças
que residem fora da capital, onde há uma diferença temporal significativa entre
o diagnóstico e a admissão no serviço de atenção secundária, além de lacunas
nos registros de sorologia para HIV nos prontuários (Vasconcelos et al., 2021).
Este relato de experiência tem como objetivo discutir as práticas e
abordagens desenvolvidas no cuidado de gestantes vivendo com HIV, com
foco na eliminação da transmissão vertical. O acompanhamento contínuo e
multiprofissional, com apoio emocional e intervenções educativas, observamos
um impacto significativo na adesão ao tratamento e na saúde materno-infantil.
Este relato surge do sucesso no acompanhamento de crianças expostas ao
HIV, que, graças a um cuidado rigoroso, não receberam diagnóstico positivo,

457
desafiando o preconceito de que mulheres com HIV (PVHIV), não poderiam
engravidar com segurança. Tal êxito reflete a implementação dos protocolos de
manejo do Ministério da Saúde, demonstrando a importância de um cuidado bem
coordenado que tem transformado a realidade dessas mulheres e de seus filhos.

A experiência do trabalho em Tefé

A condução do pré-natal em Tefé tem como ponto central o diagnóstico


precoce do HIV, preferencialmente logo no início da gestação, permitindo a
implementação de intervenções preventivas adequadas. Como uma condição
crônica tratável, o HIV requer o controle rigoroso da carga viral para garantir
a segurança da gestante. O início da gravidez em boas condições de saúde é
essencial, e para isso é crucial a adesão ao tratamento antirretroviral (TARV),
acompanhada de suporte emocional. Participar de rodas de gestantes e grupos
de apoio também é incentivado, proporcionando um ambiente acolhedor onde
as mulheres podem receber orientações e apoio psicológico, além de ajudar a
combater o estigma do HIV (Trindade et al., 2021).
O tratamento antirretroviral tem sido uma das ferramentas mais eficazes
na prevenção da transmissão vertical do HIV. A terapia suprime a replicação
viral na gestante, mantendo a carga viral indetectável e, consequentemente,
reduzindo significativamente as chances de transmissão para o bebê. O uso
de profilaxia tanto para a mãe quanto para o recém-nascido, combinado com
inibidores de lactação, compõe um conjunto de medidas preventivas eficazes.
Esse cuidado não apenas protege a saúde da mãe e da criança, mas também
quebra preconceitos sociais, demonstrando que a maternidade em mulheres
vivendo com HIV pode ser segura com o acompanhamento correto.

458
Figura 2. Consulta de Pré-natal.

Fonte: Patrizia Pires, 2022.

Em Tefé, a avaliação dos fatores de risco é decisiva para o sucesso das


intervenções. As mulheres já diagnosticadas com HIV, que estão em uso de
TARV e apresentam carga viral indetectável, necessitam de monitoramento
clínico contínuo e medidas profiláticas adequadas durante o parto. Já aquelas
diagnosticadas durante o pré-natal ou no parto exigem atenção imediata,
com início rápido do tratamento antirretroviral para minimizar os riscos de
transmissão. A equipe de saúde local, composta por profissionais capacitados,
atua de forma eficaz para garantir que todas as intervenções necessárias sejam
realizadas com rapidez e precisão.
Um dos principais recursos utilizados para garantir o cuidado integrado
é o formulário de resumo de alta de criança exposta ao HIV, que facilita a
comunicação entre o Centro de Testagem e Aconselhamento (CTA), a Atenção
Básica e a Maternidade. Esse instrumento assegura que todas as fases do cuidado,
do diagnóstico ao acompanhamento pós-natal, sejam bem coordenadas.
Além disso, fluxogramas foram adotados para padronizar as
intervenções, garantindo que os profissionais de saúde estejam preparados para
o manejo de gestantes vivendo com HIV e seus recém-nascidos. Esse sistema
de cuidado integrado tem sido fundamental para a redução da transmissão

459
vertical no município, assegurando que as crianças expostas ao HIV possam
crescer saudáveis e livres da infecção.
A implementação rigorosa do protocolo de manejo do Ministério
da Saúde foi fundamental para garantir a eficácia das ações de prevenção da
transmissão vertical do HIV. O protocolo orientou cada etapa do cuidado,
desde o diagnóstico precoce durante o pré-natal até o acompanhamento pós-
parto, proporcionando uma abordagem sistemática e coordenada.
Parte central desse processo foi a capacitação intensiva dos profissionais
de saúde, principalmente aqueles envolvidos diretamente no manejo de
gestantes no momento do parto. Essas capacitações focaram não apenas no
conhecimento técnico, mas também no desenvolvimento de habilidades para
lidar com a complexidade emocional e os desafios psicossociais enfrentados
por mulheres vivendo com HIV. Por meio de simulações, treinamentos
práticos e discussões de casos, os profissionais puderam aperfeiçoar suas
competências e adquirir segurança na condução dos casos mais delicados.
Essas capacitações garantiram que todos os envolvidos estivessem aptos a
seguir os fluxogramas de prevenção da transmissão vertical, desenvolvidos
de acordo com as recomendações mais recentes do Ministério da Saúde e
adaptados à realidade local.
Os fluxogramas, que detalhavam as etapas do cuidado desde a admissão da
gestante na maternidade até os cuidados neonatais, foram instrumentos essenciais
para assegurar que cada profissional soubesse exatamente como proceder em
diferentes cenários, reduzindo a margem para erros ou inconsistências no
manejo clínico. A padronização dos procedimentos com base em evidências
científicas promoveu uma uniformidade no cuidado, assegurando que todas as
gestantes e seus recém-nascidos tivessem acesso ao melhor tratamento possível,
independentemente do nível de complexidade do caso.
Além da abordagem técnica, houve também um esforço significativo
em garantir que os profissionais compreendessem a importância de um
atendimento humanizado e acolhedor. Mulheres vivendo com HIV muitas

460
vezes enfrentam estigmas sociais e emocionais, que podem impactar sua
adesão ao tratamento e a confiança no sistema de saúde.
A educação permanente abordou as questões como a empatia, a
comunicação eficaz e o suporte psicológico, que são componentes essenciais
para garantir que essas gestantes se sintam seguras e apoiadas durante todo
o processo. A abordagem holística, que integrava cuidados clínicos e suporte
emocional, foi crucial para o sucesso da experiência, garantindo não apenas
a saúde física das gestantes e seus bebês, mas também o bem-estar mental e
emocional de todos os envolvidos.
A aplicação desses fluxogramas e a capacitação contínua dos
profissionais refletiram o compromisso do município em seguir os mais altos
padrões de cuidado e garantir a sustentabilidade dos resultados alcançados. Isso
se traduziu em uma redução significativa da taxa de transmissão vertical do HIV,
evidenciando que, com uma abordagem estruturada e colaborativa, é possível
alcançar resultados expressivos mesmo em regiões com recursos limitados.
A escolha da via de parto no contexto das gestantes vivendo com
HIV foi cuidadosamente planejada com base no prognóstico individual de
cada pessoa, levando em consideração o risco de transmissão vertical. Esse
planejamento envolveu a realização de monitoramentos rigorosos durante o
pré-natal, com foco na carga viral, adesão à terapia antirretroviral (TARV),
exames laboratoriais detalhados e administração de inibidores de lactação
quando necessário.
A profilaxia foi aplicada de forma sistemática antes do parto, durante
o acompanhamento da gestante, e no recém-nascido, com a profilaxia de
28 dias, além de um seguimento ambulatorial especializado com médico
infecto-pediatra, garantindo a continuidade do cuidado após o nascimento.
O acompanhamento multidisciplinar oferecido às gestantes vivendo com
HIV, atendidas pelo Programa de Controle de Transmissão Vertical (CTA),
foi uma das bases mais sólidas para o sucesso na redução da transmissão
do vírus. As gestantes não foram excluídas das atividades promovidas pelas

461
Unidades Básicas de Saúde (UBS), como rodas de gestantes, onde puderam
compartilhar experiências e receber informações relevantes para o preparo
durante a gestação.
Nesses encontros, profissionais de diversas áreas, como Enfermagem,
Nutrição, Odontologia e Fisioterapia, participaram ativamente na promoção da
educação em saúde. As atividades foram essenciais não só para informar sobre
os cuidados durante a gravidez, mas também para apoiar emocionalmente as
mães, especialmente as de primeira viagem, que enfrentam desafios únicos.

Figura 3. Roda de Gestante.

Fonte: Flaviane Gonçalves, 2022.

Entre os anos de 2000 e 2020, o município de Tefé acompanhou 68 crianças


expostas ao HIV. Desse total, apenas dois casos foram classificados como de alto
risco para transmissão vertical, mas ambos resultaram em desfechos positivos,
sem a infecção das crianças. Até 2023, cinco crianças ainda sob monitoramento
completaram o período de acompanhamento de 18 meses e receberam alta
sem diagnóstico de HIV. Esses resultados refletem o compromisso contínuo da
equipe de saúde com a implementação de políticas públicas bem estruturadas e
a adoção de intervenções precoces e baseadas em evidências.
A experiência acumulada ao longo dos anos no município de Tefé
evidencia que o sucesso na prevenção da transmissão vertical do HIV não se

462
resume apenas ao uso adequado de medicações e intervenções biomédicas. O
cuidado deve ser integral, abrangendo tanto o monitoramento da carga viral
e a TARV quanto um olhar atento às necessidades psicossociais das gestantes.

Gráfico 1. Crianças expostas entre 2000 e 2020, segundo Município de residência Tefé.

Fonte: Dados levantados do Programa IST/AIDS e HV do Município de Tefé.

Muitas mulheres enfrentam um cenário de vulnerabilidade emocional e


medo, não apenas pelo processo natural da gestação, mas também pelas implicações
de viver com HIV. Por isso, o apoio psicológico e a promoção da equidade no
cuidado são tão importantes quanto os aspectos clínicos do tratamento.
As medidas preventivas eficazes, como diagnóstico precoce e intervenções
rápidas, aliadas a um acompanhamento contínuo e humanizado, possibilitam
o avanço na eliminação da transmissão vertical do HIV. A experiência de Tefé
demonstra que, com políticas públicas bem articuladas, equipes multidisciplinares
capacitadas e intervenções precoces, mais mulheres e crianças podem viver livres
do impacto dessa infecção, com saúde e dignidade asseguradas.

Considerações Finais

A experiência aqui relatada comprova que a eliminação da transmissão


vertical do HIV é uma meta tangível, quando há uma articulação eficaz entre
intervenções clínicas e abordagens psicossociais, sustentadas por uma rede

463
de cuidados multiprofissional. O êxito das ações desenvolvidas em Tefé está
diretamente relacionado à adesão ao tratamento antirretroviral (TARV), que,
junto ao monitoramento contínuo e à aplicação de protocolos clínicos, tem
permitido que gestantes vivendo com HIV possam ter gestações seguras,
resultando no nascimento de crianças livres do vírus.
A abordagem humanizada, que vai além do tratamento médico,
também se mostrou vital, ao oferecer apoio emocional e psicológico às
gestantes, promovendo um ambiente de acolhimento e cuidado integral.
Adicionalmente, a experiência demonstrou que o fortalecimento de políticas
públicas voltadas à prevenção e à capacitação contínua dos profissionais de
saúde é essencial para garantir a sustentabilidade dos resultados alcançados.
A formação de equipes preparadas para lidar com as especificidades do
manejo clínico e psicossocial de gestantes vivendo com HIV foi um dos pilares
do sucesso na implementação das ações preventivas. As capacitações periódicas
e o envolvimento de diferentes atores da rede de saúde contribuíram para criar
um ambiente colaborativo, onde o conhecimento técnico e a sensibilidade no
trato com essas mulheres foram constantemente aprimorados.
O impacto da experiência em Tefé reforça a importância de expandir
esse modelo de cuidado para outras regiões, especialmente aquelas com acesso
limitado a serviços de saúde especializados. A replicação dessa estratégia,
com as adaptações necessárias às realidades locais, poderia contribuir para a
redução expressiva dos índices de transmissão vertical do HIV em áreas mais
remotas. Além disso, o monitoramento contínuo e a avaliação dos resultados
são fundamentais para identificar desafios emergentes e ajustar as práticas,
garantindo que o progresso não seja interrompido.
Concluímos que a eliminação da transmissão vertical do HIV não é
uma questão de viabilidade técnica, mas uma responsabilidade compartilhada
por toda a sociedade. A promoção da saúde e da dignidade das mulheres
vivendo com HIV e de seus filhos é um compromisso que deve ser assumido
por profissionais de saúde, gestores, e a comunidade em geral. É necessário

464
que haja uma mobilização em torno da saúde reprodutiva dessas mulheres,
assegurando que elas recebam um cuidado equitativo e abrangente, que atenda
tanto às suas necessidades clínicas quanto emocionais.
Contudo, as medidas preventivas adequadas, especialmente a adesão
ao TARV e a substituição da amamentação por fórmulas infantis, o risco de
transmissão vertical pode ser reduzido para menos de 2%. Esse resultado
reflete não apenas o sucesso das intervenções biomédicas, mas também a
capacidade de um sistema de saúde eficiente e sensível em responder às
demandas complexas que envolvem o cuidado de mulheres vivendo com HIV,
garantindo a elas e a seus filhos um futuro mais saudável e promissor.
As lições aprendidas e os desafios enfrentados ao longo desse processo
fornecem subsídios importantes para profissionais de saúde, gestores e
pesquisadores engajados na prevenção da transmissão vertical do HIV,
destacando a relevância de um cuidado integral e humanizado no contexto da
saúde pública.

Referências
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trabalhadores(as) e gestores(as) de saúde. https://www.gov.br/aids/pt-br/central-de-
conteudo/publicacoes/2017/prevencao_combinada_-_bases_conceituais_web.pdf

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Vasconcelos, C. S. D. S., Pereira, R. J., Santos, A. F. B. D. S., & Gratão, L. H. A. (2021). Prevention
measures for vertical HIV transmission: Monitoring infected pregnant women and
exposed children. Revista Brasileira de Saúde Materno Infantil, 21(1), 207–215. https://doi.
org/10.1590/1806-93042021000100011

Vilhaba, J. J., Moraes, I. D. da S., Lima, I. M., Lima, I. M., Montino, M. C., Anjos, F. C. de Q. S.,
& Barbosa, P. F. (2021). Transmissão vertical do HIV e pré natal: Uma revisão de literatura.
REVISTA CEREUS, 13(1), Artigo 1. http://ojs.unirg.edu.br/index.php/1/article/view/3313

465
Inclusão das práticas integrativas e
complementares no município de Tefé-AM
Heloise Terezinha Alves Guimarães
Thaís Lorena Mouzinho de Brito
Lecita Marreira de Lima Barros
Mariza Quercio Machado

Conhecendo a “antiga vila de Ega, Tefé”

A história de Tefé revela a ambição territorial da Espanha no Amazonas


durante os tempos coloniais, tendo no jesuíta Samuel Fritz um de seus mais
notáveis defensores. No final do século XVII, Fritz fundou várias aldeias na
região, e Tefé foi uma delas. Em 1759, essa aldeia foi elevada à categoria de vila,
recebendo o nome de Ega, e, no mesmo ano, foi criado o município de Tefé. Em
1817, o município de Olivença foi estabelecido a partir do desmembramento
do território de Tefé. Posteriormente, em 19 de março de 1855, a Vila de Ega se
tornou sede da comarca do Solimões. Em 15 de junho de 1855, pela Resolução
Provincial nº 44, a vila foi elevada à categoria de cidade, passando a se chamar
Tefé. O nome do município e de sua sede tem origem no termo “Tapibás”, o
nome da tribo indígena da região, do qual “Tefé” é uma derivação. Depois
de Manaus, Tefé foi a primeira localidade no Amazonas a ser reconhecida
oficialmente como cidade (Prefeitura de Tefé, 2024).
Tefé exerce uma influência econômica significativa sobre diversas
cidades da região, incluindo Alvarães, Uarini, Fonte Boa, Maraã, Jutaí,
Carauari, Eirunepé, São Paulo de Olivença, Santo Antônio do Içá e Tabatinga.
O município está localizado cerca de 520 quilômetros de Manaus, capital do
Amazonas, sendo a maior cidade da região do médio Solimões com uma
população estimada de 73.669 pessoas (IBGE, 2022). A região é conhecida
como triângulo, devido os Jutaí, Solimões e Juruá.

467
Por sua Localização na Amazônia, Tefé desempenha um papel como
centro regional, o que lhe confere o título de “Coração da Amazônia”. Sua
posição estratégica permite que a cidade atenda a diversas necessidades
dos municípios vizinhos, que muitas vezes carecem da infraestrutura, e
dos recursos que Tefé oferece, destacando se aqui serviços de saúde mais
especializados e complexos. Além de ser um núcleo econômico e logístico para
a região, Tefé é amplamente reconhecida como o “portão de entrada” para a
Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, um Patrimônio Natural
da Humanidade tombado pela UNESCO. A reserva é um é uma unidade de
conservação dos maiores atrativos da região, proporcionando aos visitantes
uma experiência única de imersão na riqueza natural e na extraordinária
biodiversidade da Amazônia, onde é possível explorar ecossistemas únicos,
observar a fauna selvagem e compreender a importância da conservação
Ambiental (Prefeitura de Tefé, 2024)
As Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) integram a
categoria legal das unidades de conservação que têm como objetivo básico
compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela
dos seus recursos naturais. Essas reservas abrigam populações tradicionais
cuja existência baseia-se em sistemas sustentáveis de exploração dos recursos
naturais, desenvolvidos ao longo de gerações e adaptados às condições
ecológicas locais (Fundo Amazônia, 2024).
O acesso ao município se dá por diferentes tipos de transporte: lanchas
rápidas que percorrem os rios da região, barcos tradicionais que oferecem
uma viagem mais lenta e panorâmica, ou ainda por via aérea, com voos que
proporcionam uma vista privilegiada da floresta amazônica e dos rios que
serpenteiam a paisagem. Essas opções de acesso permitem que os visitantes
escolham a forma de viagem que melhor se adapta às suas necessidades e
preferências, garantindo uma chegada confortável e única ao nosso destino.

468
Ponto de apoio a saúde

Tefé dispõe de uma rede de atenção primária à saúde bem estruturada


e fortalecida, gerida pela Secretaria Municipal de Saúde (SEMSA), sendo
composta por 10 Unidades Básicas de Saúde (UBS) estrategicamente
distribuídas conforme as necessidades do território, garantindo atendimento
abrangente tanto para a população urbana quanto para a rural. Além disso,
conta com uma UBS Fluvial que leva os serviços de saúde a comunidades
ribeirinhas de difícil acesso, às margens dos rios e igarapés.
A UBS Rossini Barbosa Lima, situada no Distrito do Caiambé, uma
comunidade localizada às margens do Rio Solimões, realiza na cobertura
de saúde de 31 comunidades e sete localidades nas regiões do Caiambé, Rio
Solimões e Lago do Caiambé, com uma população estimada de 4.854 residentes.
Para garantir um atendimento abrangente e contínuo, os profissionais de saúde
são escalados quinzenalmente, permitindo uma cobertura de atendimento
contínuo mais eficaz para a população local.
A UBS Irmã Adonai está localizada no centro da cidade de Tefé, onde
atende a zona urbana e as comunidades flutuantes e ribeirinhas do Lago de Tefé
e da costa de Tefé. A equipe é itinerante, realizando visitas regulares para levar os
cuidados de saúde a essas áreas. A UBS São Francisco tem uma equipe itinerante
que abrange 23 comunidades, incluindo locais como Estrada da Agrovila,
Emade, Curupira e outras ao longo do Lago de Tefé com uma população
estimada em 3.800 residentes. Esta equipe realiza translados terrestres e fluviais
diariamente, assegurando que cada comunidade tanto ribeirinha quanto rural
receba atendimento de saúde uma vez por mês. Além dessas unidades, a cidade
é atendida pelas UBS São Miguel, Dr. José Lins, Maíra Fachinni, Francisca das
Chagas Trindade, Lourival Pires e Josefa Rodrigues das Chagas, que cobrem os
diversos bairros da cidade, oferecendo serviços essenciais à população.
A UBS Fluvial Vila de Ega leva os serviços de saúde a 21 comunidades
que estão situados nas beiras dos rios e 12 localidades no Lago de Tefé, buscando

469
a inclusão da população e a acessibilidade aos cuidados de saúde em todas
as suas áreas. A rede de saúde de Tefé trabalha atendendo de forma integral
não somente a seus pilares da atenção primária, mas à atenção secundária
e terciária a cidade conta com atendimentos com especialistas nas diversas
áreas de saúde, um hospital que oferece atendimentos para casos de média
complexidade e tecnologias de saúde. No âmbito da Atenção Primária em
Saúde (APS) temos as Práticas Integrativas e Complementares (PICS), sendo
uma iniciativa que promove o atendimento integral em todas os territórios,
incluindo os mais remotos.

Terapias alternativas como complemento a saúde

A Medicina Tradicional e Complementar – MTC, possui um conjunto


de práticas terapêuticas que visualiza o indivíduo como um todo, visando seu
o bem-estar físico, mental e espiritual, em busca de promover uma melhor
qualidade de vida utilizando meios naturais de tratamento, e as PICS estão
incluídas nestes cuidados.
As PICS são práticas de saúde que não fazem parte dos tratamentos
de saúde tradicionais ou biomédicos, mas visam promover saúde, prevenir
males e atuar na recuperação ou complementar ações que promovam e/ou
recuperem a saúde. As PICS incluem práticas de auriculoterapia, acupuntura,
homeopatia, fitoterapia dentre outras, e preocupam-se com a abordagem
acolhedora, valorizam a relação entre os profissionais de saúde e os usuários,
estabelecendo um vínculo de confiança e respeito, entendendo que a saúde do
indivíduo está intimamente ligada ao meio ambiente e às relações sociais. Essa
visão integral busca um equilíbrio entre corpo, mente, espírito e ambiente,
podendo ainda ser utilizada em conjunto com a medicina biomédica,
potencializando os resultados (OMS, 2013).
A Organização Mundial da Saúde (OMS) reconhece as PICS como ações
válidas para o cuidado em saúde. Apesar de não fazerem parte de tratamentos
de saúde convencionais, são disponibilizadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS),

470
institucionalizadas pela Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares
no Sistema Único de Saúde (PNPICS), criada em 2006 e, atualizada em 2018,
totalizando 29 práticas integrativas, disponíveis a toda população, embora os tipos
de atendimento oferecido variem de região para região.
No Brasil as práticas integrativas têm sido cada vez mais aceitas e
disponibilizadas para a população, desde a sua inclusão no SUS. É consenso
internacional a avaliação de que as PICS trazem benefícios para a saúde.
Portanto, a Secretaria Municipal de Saúde incluiu a oferta das PICS aos
usuários e usuárias do SUS no município de Tefé.

Inclusão das PICS na assistência à saúde em Tefé

A introdução das PICS nas práticas de saúde em Tefé teve início


com a oferta de formação de dez profissionais da saúde nas atividades de
auriculoterapia, incluindo fisioterapeutas, assistente social, farmacêuticos
e educadores físicos que atuavam no Núcleo de Apoio a Saúde da Familia
(NASF), atualmente Equipes Multiprofissionais (eMulti), aumentando o
número de profissionais e aréas de atuação.
O curso disponibilizado foi gratuito e ofertado para profissionais de
nível superior da Atenção Básica, disponibilizado a partir de convênio entre
o Ministério da Saúde e a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC),
no ano de 2019. O curso foi composto por uma 1ª etapa EAD, abrangendo a
teoria e uma 2ª etapa, incluindo práticas presenciais. Embora o curso fosse
gratuito, a SEMSA – TEFÉ custeou todas as despesas, translados e estadia
dos profissionais.
Em julho de 2019 iniciou-se a inclusão das PICS no Município de
Tefé, com atendimentos no Centro Especializado em Reabilitação (CER). O
público inical era constituído pelos clientes do local e usuários encaminhados
pelas UBS, de modo que todas as quintas-feiras ocorriam atendimentos
usando as técnicas de auriculoterapia e massoterapia. A oferta dessas práticas
aos usuários do SUS proporciona um atendimento mais humanizado.

471
Após a inserção das PICS em Tefé, percebemos a necessidade
de ampliação de acesso e qualificação das PICS nos serviços, como forma
de disponibilizar de modo mais amplo a integralidade da atenção à saúde
da população. O processo de implantação foi desafiador, pois existia uma
resistência de muitos profissionais pelo pouco conhecimento sobre as PICS
ou por descrença de seus beneficios como atividade complementar a um
tratamento conservador e, por vezes, não direcionavam aos usuários para fazer
o uso das mesmas. A resistência dos profissionais à implantação das PICS
se devia à preocupação de que essa atividade seria “mais um trabalho” a ser
realizado. Com o intuito de incentivar estes e outros profissionais a utilizarem
as PICS em suas rotinas de atendimento, decidimos envolvê-los em diversas
ações promovidas pelo município, demonstrando na prática os benefícios e a
importância dessas técnicas para o público. Assim, conseguimos evidenciar a
relevância das PICS e torná-las indispensáveis para o atendimento à população.

Imagem 1. Aplicando auriiculoterapia na ação Outubro Rosa.

Fonte: Pâmela Souza, 2021.

472
A inclusão das PICS foi tão bem aceita pela população que a demanda
rapidamente superou o espaço disponível e o número de profissionais
capacitados para atendê-la. Muitos usuários foram encaminhados para
os atendimentos segundo recomendação de parentes, amigos e vizinhos
que haviam experimentado as práticas e melhorado. Diante desse cenário,
conseguimos a adesão cada vez maior dos profissionais, incentivando-os a
se tornarem multiplicadores e aplicadores dessas práticas, já que os usuários
frequentemente buscavam os serviços e relatavam melhorias no bem-estar
geral, como melhor qualidade do sono e sensação de relaxamento corporal.
Após a grande procura pelos serviços das PICS e os relatos positivos
da população sobre a melhoria na qualidade de vida, tanto física, quanto
mental e emocional, foi necessário capacitar mais profissionais para se
tornarem multiplicadores dessas práticas e oferecer uma assistência mais
abrangente. Desse modo, foram organizadas diversas oficinas conduzidas
por profissionais capacitados nessas técnicas, incluindo práticas, como
auriculoterapia, shantala (massagem para bebês), dança circular, ventosa
de fogo (uma técnica para relaxamento muscular que se utiliza copo, pinça
e algodão com álcool), preparação e uso de chás medicinais, massoterapia
e meditação. Cada oficina teve como objetivo não apenas ensinar essas
técnicas, mas também promover a adoção de uma abordagem mais holística
e integrativa na atenção à saúde, valorizando o bem-estar físico, mental e
emocional dos(as) usuários(as) dos serviços.
Com o objetivo de facilitar e expandir o acesso a essas práticas e
aproximá-las ainda mais da comunidade, em 2020 foi iniciado o processo
de descentralização das PICS para as UBS, abrangendo tanto a zona
urbana quanto a rural. Essa descentralização também se estendeu a setores
especializados, como o Centro de Referência em Saúde do Trabalhador
(CEREST), o Centro de Atenção Psicossocial (CAPS), e em ações externas
de campanhas de saúde.

473
Um SUS integrativo em Tefé

As queixas predominantes dos atendimentos de usuários na Atenção


básica compreendem a saúde mental, incluindo ansiedade, insônia, estresse
e tristeza, que frequentemente se manifestam em sintomas físicos, como
cefaléias, fadiga muscular e respiratória. Com o início da pandemia em 2020,
esses problemas de saúde mental e física se intensificaram significativamente.
O impacto da pandemia agravou os sintomas emocionais já presentes
na população, aumentando a frequência e a gravidade das queixas. Esse
aumento ocorreu justamente durante o processo de descentralização dos
serviços de saúde, quando a rede de atendimento estava se reorganizando para
melhor atender a comunidade. A demanda por cuidados para esses problemas
cresceu exponencialmente, evidenciando a necessidade de estratégias mais
abrangentes e integradas para o manejo das condições psicossomáticas que
emergiram nesse período crítico.
Olhando o cenário geral, a disponibilização e aceitação das PICS como
estratégia de tratamento pelos usuários do SUS , mostrou-se não apenas benéfica
para a qualidade de vida, mas também resultou em uma redução significativa
no uso indiscriminado de certos medicamentos. Ao longo do tempo, observou-
se uma diminuição na necessidade de fármacos como Torsilax, Clonazepam,
Haldol, Fluoxetina, Insonix e Diclofenaco, frequentemente utilizados para
tratar dores físicas, ansiedade e insônia. Essa redução foi relatada tanto por
profissionais responsáveis de prescrever medicamentos conservadores, quanto
pelos próprios usuários.
Durante os atendimentos nas consultas e conversas com os usuários
buscavam informações para saber se o uso das PICS traria mudanças nas
rotinas, se fazia alguma diferença na sua vida, e muitos relatos diziam que
passaram a dormir melhor, que diminuiram o uso de medicamentos e que os
medicamentos podiam ser comprados em qualquer drogaria como torsilax,
haldol, insonix, dipirona, diclofenaco e entre outros. Ao conversar com alguns

474
médicos, relataram que a procura de medicamentos para dor foi diminuindo,
pois os usuários que faziam uso das PICS percebiam que não havia a
necessidade de tal consumo.
Receber feedback de usuários que estavam em tratamento com
medicamentos controlados foi uma experiência extremamente gratificante
para todos os profissionais envolvidos. Quando esses usuários começaram
a relatar que conseguiram reduzir as doses de medicamentos para insônia
e ansiedade, sob a orientação de seus médicos psiquiatras, a emoção foi
gigantesca. Esse progresso não apenas refletiu a eficácia do tratamento, mas
também demonstrou a importância de investir em abordagem integrada,
humanizada e menos farmacológica na saúde mental. Observar a melhora
significativa na qualidade de vida desses usuários e, ao mesmo tempo,
diminuir a dependência de medicamentos controlados, trouxe uma sensação
de realização e esperança a toda a equipe de saúde e que nossos esforços e
nosso trabalho estavam rendendo bons frutos.
Nesse cenário, é importante a consolidação e fortalecimento das PICS na
atenção primária como um todo, configurando ações de ampliação de acesso e
qualificação dos serviços, na perspectiva da integralidade da atenção à saúde da
população como mais uma estratégia terapêutica e promotora de saúde.
A adesão satisfatória às PICS nas práticas de saúde e, visando fortalecer
cada vez mais essa estratégia na APS, a Secretaria Municipal de Saúde de
Tefé (SEMSA TEFÉ) tem investido continuamente no aperfeiçoamento
dos profissionais de saúde. Essa abordagem permite a inclusão de novos
multiplicadores capacitados, ampliando o acesso e a efetividade das
PICS no município. Atualmente a expansão das PICS vem acontecendo
simultaneamente em UBS, campanhas alusivas, projetos de atividade física,
para que os(as) usuários(as) do SUS possam ser assistidos de forma integral,
em todos os níveis de atenção ao cuidado.

475
Transformando esforço em sucesso

Em 2020, a fim de mitigar os impactos que a pandemia causou nos


trabalhadores, o CEREST tomou a iniciativa de promover o “Projeto de
intervenção à saúde física e mental dos trabalhadores no município de Tefé”,
no qual as PICS foram inseridas para aplicação nos trabalhadores. A realização
das PICS nesse contexto ocorreu de forma não invasiva na intenção de deixar
cada profissional livre para que se sentisse autorizado para expressar ou não o
que aquele momento lhe proporcionou.
Os profissionais que aplicaram as PICS se dividiram em dois grupos: os
que aplicavam auriculoterapia e os que usavam relaxamento (massagem relaxante
e ventosa de fogo). Ao entrarem nas salas, os participantes eram orientados a
deixar o calçado na porta e o celular no silencioso. Inicialmente ao adentrar a sala,
já se sentia o aroma e a essência da aromaterapia, música relaxante transmitindo
calma, e uma conversa inicial abordando o que iria acontecer.
Depois da prática era oferecido o Chá Medicinal de cidreira ou capim
santo para ansiedade, insônia, entre outros benefícios. As luzes apagadas
para que os participantes entrassem em relaxamento profundo de meditação,
palavras leves e música ao fundo. Após, deitavam-se em decúbito ventral
já retirando a blusa e deixando as costas livres para receber massagens de
relaxamento. Olhos fechados para que todos se sentissem à vontade, apenas
uma luz acesa para realizar as técnicas, sempre mantendo o silêncio e calma.
Ao final era realizada a aplicação de auriculoterapia usando protocolo para
ansiedade, insônia, estresse e relaxamento físico.
Ao longo do projeto, observamos que os profissionais estavam afetados
emocionalmente pela pandemia, com vários relatos de medo, insônia, estresse,
tristeza, um misto de sentimentos que cada participante relatava. Momentos
em que falavam não haver tempo para cuidar da saúde física, se sentiam
sobrecarregados, que não havia um momento de silêncio em suas casas para
realizar o relaxamento profundo e que no grupo puderam relaxar, “dormir” e

476
meditar sobre suas vidas. Alguns relataram que conheciam algumas técnicas
e sabiam de seus benefícios, mas queriam conhecer mais, levar para seu
ambiente de trabalho. Discorreram sobre chás de ervas diversas, disseram
que não sabiam para que serviam e se sentiram instigados a buscar conhecer
sobre os saberes tradicionais e resgatar esses remédios naturais. Relataram
ainda, que muitas vezes optavam por fazer uso irracional de medicamento
para qualquer algias. Muitos se emocionaram conhecendo as PICS e terem
se sentido cuidados naquele momento, despertando a vontade de cuidar da
saúde e adotar hábitos mais saudáveis.
Pediram por capacitações para realizar em seus ambientes de trabalho,
que o projeto pudesse ocorrer mais vezes para terem esse momento somente
para si. Importante salientar a resistência da maioria dos profissionais da
Secretaria de Educação e Polícia Militar ao expressar sentimentos e emoções,
pontuando a necessidade de mais encontros para trabalhar a carga emocional,
física e energética.
Foram atendidos 455 profissionais, no período de setembro a outubro
de 2020, pertencentes às Secretarias de Saúde, Administração, Educação,
Assistência Social, Educação, Esporte e Cultura e Polícia Militar. As equipes
que realizavam a intervenção, embora já tivessem se deparado com relatos
similares em outros momentos, se emocionaram. Muitos dos participantes
eram colegas de trabalho, sentiram empatia e se sensibilizaram com o
processo. Essas experiências demonstraram como a potência do trabalho com
PICS pode afetar positivamente uma pessoa, fazê-la sentir-se agradecida por
ter contribuído para melhorar a qualidade de vida, levando conhecimento aos
profissionais que participaram do projeto. “Eu nunca esqueci estes momentos
e me sinto feliz por ter feito um pouco melhor a vida destes profissionais”.
Quando transformamos aos relatos de melhoria da qualidade de vida
e bem estar em números, podemos analisar estes dados na base de dados do
ESUS Municipal e TABNET Nacional. No período de julho a dezembro de
2019, foram realizados 1694 procedimentos, denotando nossos esforços e

477
aceitação do público no ano de sua implantação. Em 2020, o primeiro ano
das atividades em sua integralidade, com a descentralização das PICS para as
UBS, contabilizaram-se 5376 procedimentos. No ano seguinte, 2021, houve
um aumento para 8234 procedimentos, fazendo um paralelo com o ano
anterior observamos um aumento equivalente a 53% da oferta do serviço das
PICS, demonstrando por meio dos quantitativos de atendimentos crescentes,
que a implantação das PICS foi um sucesso e teve grande adesão dos usuários
do SUS. Entre 2019 e 2022, foram realizados 29737 procedimentos de PICS,
sendo 30% referentes à auriculoterapia, 14% massoterapia e 56% outras
PICS. Esses números, no entanto, podem ser subestimados, pois não foram
considerados os atendimentos realizados na rede privada, que também
contribuem significativamente para o acesso da população a essas práticas.
Em suma, percebemos que após as novas formações profissionais, nossos
atendimentos abrangeram também o Centro de Atendimento Psicossocial
(CAPS), Centro de Referência em Saúde do Trabalhador (CEREST) e Hospital
Regional de Tefé (HRT), com isso alcançamos 14433 procedimentos em 2022,
que equivale ao aumento de 75% comparado ao ano anterior.
De 2019 até junho de 2024 foram registrados 58629 procedimentos,
de acordo com o sistema e-SUS municipal e o TABNET nacional. No entanto,
conforme mencionado anteriormente, esses números provavelmente são
maiores que o real, considerando tanto os atendimentos realizados fora do
sistema público quanto as situações em que, por diferentes motivos, os
profissionais não conseguem registrar todos os procedimentos.
A inclusão das PICS nas UBS, CAPS e CEREST, além de outras ações
promovidas tanto pela SEMSA quanto por instituições públicas e privadas em
todo o município, demonstra claramente a importância e o impacto positivo
dessas práticas. Os resultados obtidos são um reflexo direto do suporte
contínuo da SEMSA aos profissionais de saúde, que têm se empenhado em
expandir e implementar as PICS com eficácia e dedicação. Esse apoio tem
sido fundamental para que esses profissionais possam avançar com o trabalho,

478
garantindo o acesso e a aplicação de métodos inovadores que proporcionam
benefícios significativos à população.
O modelo de cuidado integrado tem se mostrado essencial
na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, ao proporcionar um
atendimento mais integral e centrado na pessoa, evidenciando a eficácia
das PICS em atender às necessidades complexas e diversificadas da
população. Com os impactos positivos já observados através da quntidade
de atendimentos mencionados, espera-se que o trabalho realizado
impulsione um maior reconhecimento das PICS em diversos setores da
sociedade, como associações comunitárias, escolas, núcleos religiosos e
outros espaços. Assim, será possível estabelecer metas claras e objetivos
específicos, melhorando indicadores de saúde e promovendo um modelo
de cuidado mais sustentável e integrado.

Um depoimento pessoal

A minha formação foi diferenciada, pois desde 2018, já realizava cursos


particulares em técnicas como ventosaterapia, acupuntura, craniopuntura,
auriculoterapia, entre outros. O objetivo sempre foi ampliar as habilidades
profissionais. Embora tenha buscado especialização em diversas técnicas,
inicialmente, mesmo não sabendo, já aplicava de forma indireta, métodos
reconhecidos como Práticas Integrativas e Complementares em Saúde (PICS).
Hoje, ao refletir sobre essa trajetória, percebo com emoção que, desde o
início, meu enfoque sempre foi oferecer cuidado integral, levando em conta as
dimensões física, mental e emocional de cada pessoa.
Relato experiências que tive e ainda tenho em cada atendimento, além
de ações e locais que passei no decorrer deste processo enriquecedor. Não
houve um dia no qual em quaisquer atendimentos, as práticas integrativas não
tenham estado incorporadas. Quando realizava uma visita domiciliar, em uma
reunião, nas ações em programas de saúde, nas rodas de conversas é como se
as PICs estivessem intrinsecamente dentro de mim. Qualquer oportunidade

479
ou necessidade de estar realizando alguma prática, individual ou em grupo, eu
já estava usando as PICS e nem percebia.
Inúmeros pessoas me deram retorno: melhora no sono, diminuição da
ansiedade, das dores musculares, do estresse, de cefaleias e entre outros, recordo
de um atendimento em que o cliente relatou sobre seu desempenho sexual, falta
de libido que afetava sua autoestima, causando estresses diários. Realizei com
ele protocolos de auriculoterapia uma vez por semana. Imagine minha alegria
quando, certo dia ele me chama e diz: “Drª funcionou e funcionou muito bem
o negócio’’, eu sorri e fiquei tão feliz, pois em alguns momentos sentia dúvidas,
porém naquele momento percebi que devo continuar com meu trabalho junto
com minha profissão de base. Os saberes tradicionais e científicos andam juntos,
um complementando o outro para um olhar mais global.
Na rede do SUS já atuei no CER, Hospital Regional de Tefé Carlos Bragda
(HRT), NASF e CEREST. Em atendimentos realizados em clínicas de fisioterapia
do setor privado ou público, as PICS sempre estão incluídas no tratamento, seja
auriculoterapia, acupuntura, cromoterapia, Reiki ou alguma outra. Ressalto que
minha forma de atender não se diferencia do privado para o público, volto a
minha atenção e cuidado da mesma forma em qualquer lugar, com o diferencial
do tempo e materiais que não possuo no atendimento pelo SUS.

Imagem 2. Dança Circular com Idosos.

Fonte: autor desconhecido, 2023.

480
Ao lembrar dos atendimentos iniciais realizados pelo SUS,
trabalhávamos com escassez de materiais, tínhamos que investir em
equipamentos ou providenciar reparo nas placas de auriculoterapia para não
paralisar os atendimentos, levando em consideração que a procura não cessava.
Atualmente, com o apoio da SEMSA, fomos comtemplados com insumos e
materiais novos para usarmos no decorrer de nossos atendimentos. Atualmente,
inclusive a zona rural recebe atendimentos de acupuntura, quiropraxia e
ventosas pelo SUS, atendimentos anteriormente só disponibilizados pela
rede privada. Aprecio todas as práticas, mas as que eu amo trabalhar são as
atividades grupais, como meditação, dança circular (figura 2), aromaterapia,
musicoterapia, pois podemos ter as trocas de conversas e ver a vida por diversas
óticas, tocando cada pessoa de uma forma única.

Referências
Fundo Amazônia. (2024). Projeto Mamirauá – Instituto de Desenvolvimento Sustentável
Mamirauá (IDSM). https://www.fundoamazonia.gov.br/pt/projeto/Mamiraua/

IBGE. (2022). Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Censo Demográfico. IBGE. https://
www.ibge.gov.br/estatisticas/sociais/saude/22827-censo-demografico-2022.html

OMS. (2013). Organização Mundial da Saúde. Estratégia da OMS sobre medicina tradicional:
2014-2023. Organização Mundial da Saúde.

Prefeitura Municipal de Tefé. (2024). Conheça Tefé: a história de Tefé. Prefeitura de Tefé. https://
tefe.am.gov.br/conheca-tefe/

481
Empodera gestão: instrumentos de
planejamento para uma saúde solidária
no Amazonas
Gigellis Duque Vilaça
Liliam Rafaelle Souza da Silva
Laene Conceição Gadelha
Ariane Guerreiro de Souza
Julio Cesar Schweickardt

Instrumentos de planejamento do SUS

O planejamento no Sistema Único de Saúde (SUS) é uma função


e responsabilidade dos gestores de cada esfera de governo em relação à
saúde da população do território (Brasil, 2016). Em conjunto com o próprio
desenvolvimento e estruturação do sistema de articulação, o empoderamento
da gestão na decisão e pactuação entre as esferas nacionais do SUS em todos
os níveis e órgãos da administração pública na elaboração dos planos de
saúde, o Plano Plurianual- PPA, Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e Lei
Orçamentária Anual - LOA, se direciona na lógica de ascendência (do nível
local até o federal).
Conforme prevê a legislação, a Portaria MS nº 3.085/2006, ao instituir
o “PlanejaSUS”, buscou concretizar o Sistema de Planejamento do SUS nos
seguintes instrumentos: Plano Municipal de Saúde – PMS, Programação
Anual de Saúde – PAS e Relatório Anual de Gestão - RAG. Atualmente estão
ratificadas na Lei Complementar nº 141/2012 e nas Portarias de Consolidação
do SUS publicadas em 2017 pelo Ministério da Saúde (Brasil, 2017).
O Relatório Detalhado do Quadrimestre Anterior – RDQA, na
Portaria de Consolidação MS nº 01/2017 é o instrumento de monitoramento
e acompanhamento da execução da PAS (Tribunal de Contas do Estado do

483
Amazonas, 2021). Para registro de informações e documentos são inseridos
no Sistema DigiSUS Gestor – Módulo Planejamento (DGMP), utilizado pelos
Estados, Distrito Federal e Municípios.
Por meio do desse Sistema, os relatórios de gestão são enviados para
análise e manifestação do Conselho Municipal de - CMS (Brasil, 2021). Esse
relato tem como objetivo promover a reflexão e instrumentalizar Secretários
Municipais de Saúde e Coordenação de Planejamento, Monitoramento e
Avaliação para a qualificação dos instrumentos de Planejamento no Sistema
Único de Saúde. Dessa forma, conectar os gestores de saúde, atuando na
Educação Permanente em Sáude (EPS) para alinhamento da lógica do ciclo do
planejamento do SUS.
Deste processo resultam estratégias para atender às necessidades de
saúde da população, através da construção do Plano Municipal de Saúde e
Plano Plurianual no início de cada gestão, seguido da Lei Orçamentária Anual
e Lei de Diretrizes Orçamentárias para a formulação da Programação Anual
de Saúde anualizada, tendo no Relatório Detalhado Quadrimestral Anterior
sua avaliação e monitoramento quadrimestral apresentados em audiência
pública nos meses de maio, agosto e janeiro, e o Relatório Anual de Gestão
apresentado até março do ano seguinte.

Características dos Instrumentos de Gestão no contexto


Amazônico

O planejamento municipal em saúde é um processo democrático


representativo de cidadãos legalmente constituídas pelo Plano de Governo
e as Conferências Municipais e Saúde no início de cada ano de Gestão. As
Conferência de Saúde no interior do estado do Amazonas, vem promovendo
debates participativo e democrático das diferentes formas de saber e de
conhecimento, através da Educação Permanente. A realização das pré-
conferências oportuniza escutar ativamente a população e os trabalhadores
de forma ascendente para que a formulação de propostas consiga contemplar

484
as necessidades locais e juntamente com a gestão, evidenciar as situações-
problema para inserir no plano municipal as diretrizes dos eixos de atuação,
ação, metas e indicadores de saúde. O plano de governo também é discutido e
inserido dentro das propostas para aprovação da plenária.
O Amazonas vem buscando direcionamentos das políticas públicas
voltadas para a saúde ribeirinha, os povos originários, as doenças endêmicas
da região, para superar os vazios assistenciais, buscando um financiamento
de acordo com a realidade amazônico. Isso tem impacto direto na ampliação
das Equipes de Saúde da Família Ribeirinha (eSFR), as Unidades Básicas de
Saúde Fluvial (UBSF), assim como o fortalecimento da Política Nacional de
Saúde da População Indígena (PNASPI). As tecnologias relacionais valorizam
a multiplicidade de encontros e das redes de colaboração, priorizando
participação e o aprendizado coletivo que promovam a ampliação do cuidado
nos diferentes territórios (Guedes et al., 2022).

Figura 1. Oficinas com gestores, COSESM, SES, CMS e equipe da SEINP do MS.

Fonte: autores, 2023.

Os principais desafios no contexto amazônico, consiste no cumprimento


desses prazos para a elaboração dos instrumentos e envio no sistema DigiSUS,

485
sendo que os gestores devem observar a lógica desse ciclo de planejamento
no SUS. Esses fatores impactam na qualificação das informações por não
acompanhar a lógica do ciclo de planejamento (planejar, agir, monitorar e
avaliar) para execução das ações e metas no compromisso da transparência de
acordo com as legislações vigentes (Brasil, 2021).

Estratégia Apoiador da Rede CONASEMS – COSEMS na


evolução dos Instrumentos de Gestão no Amazonas

A Estratégia Apoiador realiza atividades prioritárias voltadas


diretamente aos processos de planejamento e organização das equipes gestoras,
promovendo apoio e subsídios para os processos de tomada de decisão, por
meio de informação de qualidade e em tempo oportuno. A Rede CONASEMS
– COSEMS vem buscando aprimorar as atividades do apoio para fomentar o
protagonismo dos gestores municipais nos espaços de discussão, decisão e
pactuação do SUS, buscando a otimização dos recursos disponíveis. O apoiador
desenvolve suas ações nas nove regiões de saúde do Amazonas, atuando no
empoderamento da gestão municipal e efetivação da consolidação do SUS e
melhorar a saúde da população do Estado do Amazonas (Brasil, 2021).

O COSEMS é de salutar importância no processo de atualização dos


instrumentos de gestão dos Municípios do Estado do Amazonas,
como por exemplo, para o município de Envira - Am, articulando
e orientando através de informes e vídeos conferências, ouvindo as
queixas e demandas de cada município com suas peculiaridades,
congregando e defendendo os interesses dos Municípios, e se
posicionando como ator político no processo de construção do
SUS. Assim, reitero a importância do COSEMS, no processo apoio
na Construção dos instrumentos de gestão de cada município do
Estado do Amazonas (Maronilton Silva Clementino - Secretário de
Saúde do Município de Envira).

Cada apoiador faz um diagnóstico regional e, em seguida, elabora


o Plano Regional do Apoio, contendo as diretrizes, objetivos, ações, metas,

486
indicadores e responsáveis das atividades relacionadas a Conferência
Municipal de Saúde e os Instrumentos de Planejamento. Nesse caso, o gestor
solicita do COSEMS a presença da visita técnica para ajudar na organização e
realização da Conferência na apresentação dos eixos. E em seguida o apoiador
do Cosems pode também orientar o CMS na elaboração do relatório final.
Os apoiadores também realizam capacitações sobre o sistema DigiSUS para
qualificar as informações dos relatórios, no cumprimento dos prazos e o
processo de monitoramento e avaliação.

Empoderamento dos Gestores no planejamento em saúde

A estratégia de empoderar o gestor surgiu da necessidade de qualificação


dos instrumentos de planejamento, inserindo o processo de monitoramento e
avaliação. Esse conceito de empoderamento foi usado para transmitir a ideia
de tornar os gestores de saúde mais proativos em suas ações, para a tomada
de decisões e compromisso na elaboração e apresentação de instrumentos de
planejamento de articulação Interfederativa.
Com a preocupação da situação dos Instrumentos de Planejamento
das regiões de saúde do Estado do Amazonas, nas ações semanais de Educação
Permanente em Saúde (EPS) do COSEMS-AM, os apoiadores entenderam a
necessidade de acompanhar os municípios na atualização dos instrumentos
de gestão. Identificamos algumas dificuldades dos gestores na elaboração dos
Instrumentos na data oportuna: inexistência de gestão participativas, falta de
conhecimento sobre os instrumentos, alta taxa de rotatividade de profissionais
na equipe de planejamento, inconformidade e segurança das informações,
insegurança do Conselho Municipal de Saúde na avaliação dos instrumentos,
ausência da memória dos processos de gestões anteriores.
Desse modo, realizamos uma discussão coletiva e participativa com
os coordenadores de planejamento municipais e os membros dos Conselhos
Municipais de Saúde para ter autonomia na revisão e construção das propostas
surgidas nas Conferências Municipais. Outra barreira está associada às

487
características geográficas, que acarreta dificuldades de conectividade, acesso
intermunicipal e regional, impactando na logística de transporte e das informações.

Figura 2. Encontros presenciais do grupo de gestores.

Fonte: autores, 2023.

As competências do gestor municipal do SUS envolve fatores de impacto


na saúde pública, utilizando a recursos de forma inteligente e apropriada. O
método utilizado foi da Pesquisa-ação buscando identificar os problemas e as
soluções, realizada durante o ano de 2023 nas Regiões de Saúde do Estado do
Amazonas. A estratégia foi aprovada nas Comissões Intergestores Regional
(CIR) com encontros presenciais, híbridos e virtuais de EPS, permitindo
a compressão da responsabilidade legal e do objeto de conhecimento,
possibilitando a implementação de mudanças no cenário da prática da gestão.
Na fase exploratória foi realizado um diagnóstico aplicado um questionário,
identificando os municípios com instrumentos atrasados na série histórica de
2018 a 2023 por meio dos canais oficiais do Ministério da Saúde (Portal SAGE;
DIGISUS; LIASAÚDE/PainelDGMP; DEPLAN/SES-AM, 2024).
Na fase de Planejamento foi proposto um formulário de monitoramento
mensal de informação. Na fase da Ação foram realizadas oficinas de qualificação,
seguindo três etapas: 1. Municípios sem instrumentos de gestão: auxiliar

488
na construção coletiva e revisar os anteriores para ajuste; 2. Municípios com
instrumentos finalizados: qualificação para o conhecimento de toda a equipe
quanto as diretrizes, objetivos, metas e indicadores municipais; 3. Atualização
sobre os Instrumentos de Gestão para os Conselheiros Municipais de Saúde. E na
fase de Avaliação implementou-se modelo de fluxo dos relatórios observados para
ajustes no sistema DigiSUS na inserção de dados dentro do prazo, priorizando a
qualidade das informações, monitoramento e avaliação dos resultados.

Trançando caminhos tecnológicos para empoderar os


gestores no Amazonas

Com o grande desafio de superar os quilômetros que separam muitos


municípios da capital, principalmente visando o alto custo para deslocamento
dos apoiadores até os municípios, os profissionais adaptaram estratégias ao dia
a dia para conseguir suprir as necessidades dos gestores e suas equipes, dessa
forma, foi criado um grupo de Whats App PlanejaSus Cosems-AM com a
participação dos coordenadores de planejamento para a discussão coletiva das
principais dúvidas e alternativas de trabalho, bem como, minimizar a distância
através do contato direto usando as redes de telecomunicação.
A estratégia possibilitou a ampliação do vínculo dos apoiadores com
os coordenadores municipais estabelecendo uma rede de apoio na qual a
todo o momento é possível agendar um horário para tirar as dúvidas, ligar
diretamente para o apoiador ou simplesmente se comunicar por meio de
mensagens privadas.

A vivência durante o Projeto foi de fundamental importância para


a equipe da SEMS de Presidente Figueiredo no desenvolvimento
das atividades de elaboração, aplicação e monitoramento dos
instrumentos de gestão e principalmente a utilizar ferramentas como
o Planejamento Regional Integrado, o Monitoramento e Avaliação
de Programas de Saúde, além dos instrumentos de financiamento
e gestão de recursos. A equipe do COSEMS estava sempre
disposta a apoiar a nossa equipe sempre no que fosse necessário,

489
tirando dúvidas e assessorando a gestão municipal, facilitando a
compreensão e incentivando a execução das ações e atividades
destinadas a esfera municipal. Subsidiando as notas técnicas e
relatórios de acompanhamento, legislações periódicas, assim
como também realizando os tão bem-vindos lembretes dos prazos
a vencer e as metas a serem cumpridas em tempo hábil (Liliane
Sales - Coordenadora Municipal de Planejamento - Município de
Presidente Figueiredo).

Em relação aos gestores que não compareceram nos encontros


presenciais, buscamos a alternativa de adaptar os encontros para oficinas
virtuais. A princípio foram realizados contatos individuais com os Secretários
através de ligações para explicar como o projeto seria trabalhado de forma
remota. Após essa sensibilização sobre a importância de regularizar os
instrumentos de planejamento e a liberação dos gestores para ser realizado
esse trabalho com suas equipes, foram agendadas oficinas virtuais com os
gestores e coordenadores municipais de saúde por município conforme
demanda existente e priorizando aqueles cujo instrumentos de planejamento
ainda necessitavam de elaboração ou ajustes.
Após a elaboração ou/e ajustes nos instrumentos, também foram
organizadas outras oficinas para orientar os profissionais sobre como inserir
os dados no Sistema do Digisus e seu manuseio. Assim, como nos encontros
presenciais, foram organizados os mesmos conteúdos para serem transmitidos
de forma remota considerando todas as informações necessárias para o
empoderamento da Gestão e do Conselho Municipal de Saúde.
Todos os atores envolvidos desempenharam papeis importantes para
a superação dos desafios locais de conexão, a organização das equipes foi
essencial para desenvolvimento dessas estratégias. E o suporte proveniente dos
apoiadores do Cosems-AM teve destaque nesse cenário inovando as condições
para se trabalhar remotamente.

Sou enfermeira vou falar um pouco dessa experiência com instrumentos


de planejamento, uma experiência inovadora para o nosso município,

490
uma vez que a gente acabava enviando vários relatórios e isso veio para
facilitar através de ferramentas que facilitam além do nosso trabalho,
como também do nosso Coordenador de Planejamento, que pôde ter
um acesso e uma brevidade de todos os relatórios que a gente apresenta
a sua coordenação, então isso foi uma experiência que facilitou muito o
nosso trabalho (Nirlene Smith - Coordenadora Municipal do Programa
Saúde da Mulher - Município de Itacoatiara).

A experiência trouxe alguns resultados importantes: transparência


dos instrumentos, redução de 90% das pendencias no DigiSUS, maior
preocupação da gestão em finalizar os instrumentos de gestão e aumentou o
acompanhamento do CMS e celeridade na avaliação pelo colegiado. O grupo
de trabalho com técnicos municipais criado em plataforma de comunicação
instantânea do WhatsApp possibilitou o agendamento de encontros para tirar
as dúvidas de encontros anteriores e agendamento dos próximos encontros,
além de organizar o fluxo de comunicação entre os envolvidos.
Os encontros remotos possibilitaram a ampla participação dos gestores
e suas equipes nas oficinas de planejamento organizadas pelos apoiadores,
assim como foram solucionadas várias demandas através da inclusão dessa
estratégia, a qual reduziu a distância entre os municípios e o Cosems-Am
tornando tangível e acessível a participação da Gestão no projeto proposto.
As rodas de conversa presenciais, hibridas e remotas com secretários
de saúde, coordenadores de planejamento e Conselho Municipal de Saúde
ampliaram as trocas de informações sobre o ciclo de planejamento. Ainda foi
aplicado um questionário sobre o perfil da gestão municipal e do planejamento
em saúde para subsidiar a condução dos próximos passos. De acordo com as
perguntas, foi possível verificar que a maioria (87%) dos gestores possuem
escolaridade de nível superior, e 66,7% realizaram especialização na área
da gestão em saúde e o curso “Ser Gestor do SUS”, disponibilizado pelo
CONASEMS, para aprimorar os conhecimentos sobre a saúde no Brasil.
Os pontos críticos foram os cumprimentos dos prazos dos Instrumentos
de gestão (Plano Municipal de Saúde - PMS (1º ano de gestão), Programação

491
Anual de Saúde - PAS (até 30 de março), Relatório Detalhado Quadrimestral
Anterior - RDQA (1º RDQA - maio; 2º RDQA - setembro; 3º RDQA -
fevereiro) e Relatório Anual de Gestão - RAG (até 30 de março). Os motivos
foram os seguintes: 100% de falta de capacitação/treinamento, 46,60% sem
monitoramento e avaliação, 46,60% falta de internet para alimentar o DigiSUS
e 20% o excesso de atividades com prazo exíguo. O prazo de atualização
de dados dos sistemas como por exemplo o Sistema de Informação sobre
Orçamentos Públicos de Saúde - SIOPS e a PAS que é encaminhada somente
no 2º semestre com a LOA.
Há uma menor participação de usuários nas reuniões extraordinárias,
agendadas com pauta única relativas a assuntos como RAG, PAS, LDO e
LOA, tópicos de maior complexidade que demandam linguagem técnica,
análises e discussões de tais documentos. A participação dos usuários nestas
discussões também é reduzida, demonstrada pela ausência nessas reuniões,
indicando que as discussões e deliberações centrais de instrumentos de
planejamento ficavam reduzidas a gestores, prestadores e profissionais da
saúde (Cavalcante, 2023).
Em seguida, a pergunta foi sobre o que precisa melhorar no
Planejamento da saúde em seu município, sendo possível marcar mais de uma
opção no questionário. Nessa questão foi possível identificar que 80% relataram
difícil acesso em tempo hábil dos relatórios das áreas técnicas responsáveis
pela fonte de informação (Exemplo: produção de serviços, vigilância em saúde,
urgência e emergência, relatório financeiro entre outros).
Os resultados também mostraram a necessidade de qualificação/
atualização do Conselho Municipal de Saúde, tendo 66,70% dos relatos
e 33,30% a falta de participação do Gestor no processo de Planejamento,
Monitoramento e Avaliação. Ainda, 26,70% informaram que a Coordenação
de Planejamento precisa ser mais atuante na elaboração dos instrumentos de
gestão e 26,70% não realiza monitoramento e avaliação dos instrumentos de
gestão no mínimo quadrimestral. Em relação a capacitação/atualização do

492
Conselho Municipal de Saúde, foi evidenciado que 35,30% não teve em menos
de 6 meses e 29,40% com mais de 6 anos sem atualização.
A qualificação dos conselheiros se apresenta como um desafio que vai
para além de uma formação técnica da compreensão do planejamento de saúde
e orçamentário, a capacitação para compreensão da função do conselheiro,
para a valorização do conselho e para o desenvolvimento de competências
como ética, moral e responsabilidade também se apresentam como demandas
para o exercício do controle social, garantir a participação dos cidadãos nas
discussões com uso de linguagem apropriada e apresentação de documentos
acessíveis aos conselheiros.
Neste sentido, verificamos que a capacitação dos conselheiros não
se restringe a momentos determinados, mas na perspectiva de educação
permanente (Shimizu; Moura, 2015). O que mais demanda conhecimento e
formação é sobre os instrumentos de gestão, que tem múltiplas opções para
completar como: 100% sobre SIOPS, 86,70% na Execução Orçamentária e
Financeira de Recursos, 86,70% em Auditoria e 66,60% no monitoramento e
avaliação. A Coordenação de Planejamento exerce a função exclusiva 75% com
40 h semanal e 25% executam mais de uma função (Assistente Administrativo,
ESF, Gerente de UBS, Direção Hospitalar). E sobre os membros dos Conselhos
Municipais de Saúde, 63,6 % são de gestores, desses 50% com 2 anos no CMS
e 12,50% mais de 11 anos como membro.
A formação de comissões junto à gestão mostrou-se necessária para
apreciação de todos os instrumentos de planejamento. As comissões voltadas
aos instrumentos de planejamento permitiram a capacitação tanto dos
conselheiros como dos gestores para compreensão de cada instrumento. Ainda,
estas comissões iniciaram a reflexão sobre a apresentação dos documentos de
forma mais compreensível aos conselheiros, evitando a apresentação de apenas
documentos técnicos de alimentação em sistemas como o SIOPS.

493
Figura 3. Questionário do perfil da gestão e planejamento do SUS.

Fonte: elaboração dos autores, 2023.

Neste sentido, as comissões se constituíram em grande avanço para os


trabalhos de apreciação dos instrumentos de planejamento (Cavalcante et al.,
2023). O envolvimento dos Apoiadores do COSEMS conseguiu sensibilizar os

494
atores envolvidos e melhorou consideravelmente as estratégias de qualificação
desses instrumentos de planejamento em cada região de saúde da Amazônia,
ampliando a comunicação para uma ação colaborativa e solidária entre os
entre os municípios.
Agradecemos todo apoio e suporte técnico do COSEMS/AM na
elaboração dos instrumentos de gestão do município, foi de relevância e
importância, tendo em vista, que a gestão em saúde se trata do planejamento,
organização, controle e direção com foco no gerenciamento dos recursos
humanos, financeiros, logísticos, sanitários, entre outros, para verificar todas
as atividades e oferecer um serviço seguro e efetivo (Raimundo André Oliveira
da Silva - Coordenador Municipal de Sistemas de Programas de Saúde -
Município de Boca do Acre).

Considerações Finais

A gestão na saúde é o processo que conecta com o planejamento


estratégico à implementação, ao monitoramento e à avaliação da ação
municipal. Na região amazônica, ainda precisa avançar no empoderamento
à governança, que é a capacidade de implementar políticas públicas e prestar
serviços à sociedade, sendo uma das atividades atuantes dos apoiadores
COSEMS-AM. Contudo, ainda existe a necessidade de qualificação de gestores
e coordenadores para o cumprimento dos prazos e envio do DigiSus.
O Apoiador, olhando para a gestão do SUS, promove os processos de
planejamento dentro das realidades locais das regiões de saúde da Amazônia.
Ainda busca fomentar a qualificação e a comunicação entre os coordenadores de
Planejamento para uma ação colaborativa e solidária entre os entre os municípios.
Neste relato, apresentamos o diagnóstico desse problema estrutural
do SUS e recomendamos ações em parcerias com a Rede CONASEMS-
COSEMS, técnicos do MS e SIOPS, Superintendência Estadual do Ministério
da Saúde no Amazonas (SEMS/AM), Serviço de Articulação Interfederativa e
Participativa (SEINP), Secretaria Estadual de Saúde (SES), Conselho Estadual

495
de Saúde (CES), Tribunal de Contas do Estado (TCE/AM) e Departamento
de Auditoria (DENASUS/SEAUD). Por fim, concluímos que a qualificação
dos instrumentos de Planejamento do SUS no município precisa ampliar a
participação dos Conselhos Municipais de Saúde e dos usuários. Concluímos
com o depoimento de um gestor.
Fazer gestão na Amazônia hoje, nesse cenário globalizado, explicita o
universo vivenciado cotidianamente pelo caboclo, pelo indígena e por quem
mais se aventurou a fazer desse espaço o seu habitat, que contrasta a beleza
exuberante e singular de sua fauna e flora com as agruras causadas sobretudo
pelo isolamento próprio de territórios de dimensões continentais. Sem ter a
intenção de poetizar a nossa realidade, mas já o fazendo, porque assim fica mais
bonita e leve, diria, então que, parafraseando o poeta ser gestor local do SUS “é
padecer no paraíso”, onde a atuação do Conselho de Secretarias Municipais de
Saúde – COSEMS, através de seus técnicos e apoiadores tem papel fundamental
e imprescindível nessa árdua mas prazerosa missão na busca contínua de melhor
qualificar nosso pessoal que atua no planejamento de ações e atualização dos
instrumentos de gestão, acompanhamento e revisões necessárias.
Assim, fazer gestão de saúde no interior do Amazonas sem a efetiva
participação e destacada colaboração do COSEMS seria muito mais difícil. Por
isso, concluímos dizendo: obrigado por vocês existirem! (Sebastião Pinheiro
da Silva - Secretário Municipal de Saúde de Itamarati).

Referências
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de setembro de 1990, para dispor sobre a organização do Sistema Único de Saúde - SUS,
o planejamento da saúde, a assistência à saúde e a articulação interfederativa, e dá outras
providências. Disponível em: < http:// www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2011/
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1. ed. rev. Brasília, DF: MS: Fiocruz. Série Articulação Interfederativa, v. 4. Disponível em:
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496
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Brasil. (2021). Ministério da Saúde. Manual do usuário: módulo planejamento – DigiSUS


Gestor. Brasília, DF: MS. Disponível em: https://bit.ly/manualdgmp.

Brasil. (2021). Ministério da Saúde. Guia da Estratégia Apoiador COSEMS-CONASEMS


[recurso eletrônico] / Ministério da Saúde, Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Conselho
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Cavalcante, Amanda Araujo, Magdalena, Patricia Cristina e Moriguchi, Cristiane Shinohara.


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uploads/2021/07/INSTRUMENTOS_DE_PLANEJAMENTO_DO_SUS-2.pdf

497
Sobre Organizadores,
Autores e Autoras

Organizadores

Maria Adriana Moreira


Enfermeira, graduada pela Universidade Federal de Alagoas. Pós-
graduação Lato Sensu em MBA Gestão e Auditoria em Sistemas de
Saúde, Mestre em Saúde da Família (PROFSAÚDE/FIOCRUZ/AM -
Instituto Leônidas e Maria Deane. Secretária Municipal de Saúde de
Manicoré/AM, presidente do COSEMS/AM e membra da diretoria do
CONASEMS. E-mail: [email protected]

Marcia Cristina Marques Pinheiro


Graduação em Odontologia pela Pontifícia Universidade Católica de
Campinas (1988), Especialização em Saúde Pública pela Universidade
Estadual de Campinas/UNICAMP (2002), Especialização em Políticas
Públicas e Gestão Estratégica em Saúde pela Universidade de Brasília/
UnB (2007) e Mestrado em Saúde Coletiva pela Universidade de Brasília/
UNB (2017). Assessora técnica do Conselho Nacional de Secretarias
Municipais de Saúde (Conasems) e coordenadora da Mostra Brasil, aqui
tem SUS. E-mail: [email protected]

Júlio Cesar Schweickardt


Graduação em Ciências Sociais, Mestrado em Sociedade e Cultura na
Amazônia (UFAM), doutor em História das Ciências e da Saúde (COC/
Fiocruz). Pesquisador do Laboratório de História, Políticas Públicas
e Saúde na Amazônia (LAHPSA/Fiocruz Amazônia. Coordenador

499
do Mestrado Profissional Saúde da Família (PROFSAÚDE/Fiocruz
Amazônia) e coordenador do Doutorado em Saúde Pública na Amazônia
(DASPAM). Membro da coordenação nacional da Associação Rede
Unida. E-mail: [email protected]

Autores e Autoras

Alcinda Santiago da Rocha


Técnica de enfermagem da ESF na Unidade Básica de Saúde Michiê
Takeda. E-mail: [email protected]

Alcineia Fontes Neto


Secretária Municipal de saúde (Nhamundá). E-mail: neianetto@
hotmail.com

Aline Aparecida Ferreira Artini


Mestre em Saúde Pública (2023); Sanitarista (2020) pelo Instituto
Leônidas Maria Deane- FIOCRUZ. Bacharel em Relações Internacionais
(2012); Graduada em Letras – Francês (2009); Graduada em Letras
Inglês /Português (2021); Integrante do Laboratório de Pesquisa
e História de Saúde da Amazônia – LAPHSA- ILMD – FIOCRUZ;
Vigilância em saúde epidemiológica/ Secretaria Municipal de Saúde –
SEMSA – Manaus. E-mail: [email protected]

André Luiz Freitas Nogueira


Enfermeiro, Pós-graduado em Urgência, Emergência e Terapia Intensiva
(Líder Instituto Educacional). E-mail: [email protected]

500
Andreza Cezar Fonseca
Enfermeira da Estratégia Saúde da Família, Secretaria Municipal de
Saúde de Rio Preto da Eva. E-mail: [email protected]

Adriane Farias Valentin


Mestra em Saúde da Família pelo Instituto Lêonidas e Maria Deane
(ILMD) Fiocruz/Amazônia. Apoiadora Cosems/AM. E-mail:
[email protected]

Anna Beatriz Chagas Freitas


Médica da USF Francisca Amélia/Boca do Acre-AM. E-mail:
[email protected]

Ana Kelly Rodrigues Amaro Ugarte


Médica, mestranda em epidemiologia em saúde pública pela Fiocruz,
diretora geral da Unidade Hospitalar de Santa Isabel do Rio Negro.
E-mail: [email protected].

Antônio Amancio Barbosa Neto


Graduado em odontologia, Mestrado em Saúde Pública. Apoiador
Ministério da Saúde. E-mail: [email protected]

Ariane Guerreiro de Souza


Nutricionista, Apoiadora Regional do COSEMS-AM. E-mail:
[email protected]

Arielly Queiroz de Menezes


Graduada em fisioterapia, pós-graduada em traumatologia e ortopedia
com ênfase em terapia manual (Estácio/Am). E-mail: arielly1313@
gmail.com

501
Auricelia Maria Queiroz Assis
Fisioterapeuta, especialista em gestão de saúde, Unidade Hospitalar de
Silves. E-mail: [email protected].

Beatriz Rodrigues Campinho


Mestranda em Saúde Pública- ILMD-PPGVIDA FIOCRUZ; Cirurgiã
Dentista.

Betânia Lacerda Gomes


Sanitarista e Especialista em Gestão Pública Municipal. Pesquisadora
do PNSI (Fiotec). E-mail: [email protected]

Camila Trindade da Silva


Enfermeira. Secretaria Municipal de Saúde de Barreirinha-AM. E-mail:
[email protected]

Carlos Alexandre Pereira da Silva


Médico, ESF-Careiro AM, E-mail: [email protected]

Carolina Neves Jacaúna


Fisioterapeuta; Pós-graduada em traumato-ortopedia, Especialista em
biomecânica do movimento humano. E-mail: [email protected]

Cleinaldo de Almeida Costa


Médico, doutor em medicina pela USP, Diretor do Departamento de
Saúde Digital e Inovação da Secretaria de Informação e Saúde Digital do
Ministério da Saúde. E-mail: [email protected].

502
Cleudecir Siqueira Portela
Enfermeiro, mestre em doenças tropicais e doutorando em Ciências do
ILMD/ Fiocruz Amazônia. E-mail: [email protected]

Daiana Santana Ramos


Educadora Física. Secretaria Municipal de Saúde de Barreirinha-AM.
E-mail: [email protected]

Daniele Santana Ramos


Sanitarista. Secretaria Municipal de Saúde de Barreirinha-AM. E-mail:
[email protected]

Daniel Bezerra Arruda


Enfermeiro da USF Francisca Amélia/Boca do Acre-AM. E-mail:
[email protected]

Dennice Batista Neves


Fisioterapeuta, Centro de Especialidades Elizabeth de Sousa Assis.
E-mail: [email protected]

Denise Rodrigues Amorim de Araújo


Comunicóloga, Mestre em Saúde Pública, Gerente de Ensino da Escola
de Saúde Pública de Manaus. E-mail: [email protected]

Elen Palmeira Assunção


Enfermeira, especialista. SAMU Manaus

Eduardo Fernandes
Médico, mestre. SAMU Manaus

503
Elanne Martins Viana
Fonoaudióloga (Pós-graduação em Saúde coletiva, Pós-graduação em
ABA) Fonoaudióloga Sentidos Clinica de Desenvolvimento – Boa Vista
- RR. E-mail: [email protected]

Eliane Nogueira Campos


Mestranda em Enfermagem e Saúde Pública - ProENSP/UEA.
Especialista em Pneumologia Sanitária Fiocruz/Helio Fraga. E-mail
[email protected]

Elison Gonçalves da Silva


Enfermeiro. Secretaria Municipal de Saúde de Barreirinha-AM. E-mail:
[email protected]

Elivane Silva Pacheco


Assistente Social (Pós-graduação em Educação em Direitos Humanos,
Diversidade e Questões Étnicas Sociais) Assistente Social Equipe Emult
– Silves-AM. E-mail: [email protected]

Elson Pessoa Vasques


MBA em Gestão de Projetos. Fundação Centro de Análise, Pesquisa e
Inovação Tecnológica. E-mail: [email protected]

Eucinara Buás Guedes


Técnica em enfermagem. Atua no Consultório na Rua da Secretaria
Municipal de Saúde de Manaus (SEMSA). E-mail: [email protected]

Everton Martins Honorato


Enfermeiro. Gerente da Unidade Básica de Saúde Michiê Takeda.
E-mail: [email protected]

504
Ezequiel Fernandes da Costa Neto
Médico de família e comunidade. Atua no Consultório na Rua da
Secretaria Municipal de Saúde de Manaus (SEMSA). Mestrando
em Saúde da Família (PROFSAÚDE/Fiocruz Amazônia). E-mail:
[email protected]

Fabiana Mânica Martins


Enfermeira, Docente Adjunta no Departamento de Saúde Coletiva
da Faculdade de Medicina-UFAM. Mestre em Saúde, Sociedade e
Endemias na Amazônia (FIOCRUZ/AM). Doutora em Ciências do
Ambiente e Sustentabilidade na Amazônia (UFAM). Coordenadora do
Mestrado Profissional em Saúde da Família (PROFSAÚDE/UFAM).
E-mail: [email protected]

Fabíola Guimarães de Carvalho


Enfermeira. Secretaria Municipal de Saúde de Nhamundá-AM. E-mail:
[email protected]

Fabricio da Rocha Botelho


Enfermeiro, especialista em gestão hospitalar e saúde pública, diretor da
atenção básica do município de Coari. E-mail: botelhofabrí[email protected]

Francinara Batista Neves Lima


Mestre em Doenças Tropicas e Infecciosas. Bacharel em Enfermagem.
Gerente da Vigilância em saúde epidemiológica do Distrito de Saúde
NorteSecretaria Municipal de Saúde – SEMSA – Manaus

Francisco Loab dos Santos Silva


Fisioterapeuta, Unidade Básica de Atendimento Padre Antônio Cremer/
Secretaria de Saúde de Eirunepé. E-mail: [email protected]

505
Gercicley Rodrigues dos Santos
Engenheira Ambiental - CEULM/ULBRA, especialista em Saúde
Ambiental e Mestra em Ciências do Ambiente e Sustentabilidade na
Amazônia. E-mail: [email protected]

Gigellis Duque Vilaça


Enfermeira, Mestre em Enfermagem no Contexto Amazônico, UFAM/
PPGENF, Coordenadora do Apoio Regional do COSEMS-AM. E-mail:
[email protected]

Gisele Torrente
Enfermeira, doutora. SAMU Manaus

Greyciane Rodrigues Saldanha Mesquita


Graduada em enfermagem, atua na Equipe de Saúde Ribeirinha na Balsa
Multiprofissional de Saúde. E-mail: [email protected]

Heloise Terezinha Alves Guimarães


Fisioterapeuta. Unidade Básica de saúde São Francsico. E-mail:
[email protected]

Ingrid Lima Silva


Enfermeira, Mestranda em Enfermagem no Contexto Amazônico
PPGENF/MP UFAM. Coordenadora da Atenção Básica (SEMSA).
E-mail: [email protected]

Iranilson Militão Gabriel


Agente Indígena de Saúde – SEMSA – Manaus.

506
Izomaria dos Santos Braga
Bacharel em Enfermagem. Vigilância em saúde epidemiológica área técnica
da /Tuberculose/Secretaria Municipal de Saúde – SEMSA – Manaus

Jackeline da Silva Gomes


Técnica em enfermagem, ESF-Careiro AM. E-mail: jackeline.s.gomes@
outlook.com.br

Jacqueline Cavalcanti Lima


Enfermeira. Atua no Consultório na Rua da Secretaria Municipal de
Saúde de Manaus (SEMSA). E-mail: [email protected]

Jacó Miranda dos Santos


Mestre em Informática pela Universidade Federal do Amazonas
(UFAM). E-mail:[email protected]

James Rodrigues Guedes


Enfermeiro na Secretaria de Saúde de Atalaia do Norte/AM.

Jonas Tadeu Cau Sertorio


Farmacêutico, doutor em farmacologia pela UNICAMP e pós-doutor
pela USP, consultor em saúde digital do Ministério da Saúde. E-mail:
[email protected].

Janayla Bruna Oliveira de Aguiar


Graduada em Nutrição. Especialista em Saúde Indígena. Especialista
em Gestão Regionalizada do SUS no Amazonas. Especialista em
Nutrição Materno Infantil e Nutrição Clínica. Mestre em Condições
de Vida e Situações de Saúde na Amazônia – PPGVIDA/Leônidas e
Maria Deane- ILMD/ Fiocruz Amazônia. Pesquisadora do LAHPSA/

507
Fiocruz Amazônia. Responsável Técnica pela Vigilância Alimentar
e Nutricional Indígena no DSEI Alto Rio Solimões. Pesquisadora
do LAHPSA/Fiocruz Amazônia e do Minilaboratório da Nova
Cartografia Social da Amazônia/UEA-Tabatinga/AM. E-mail:
[email protected]

Karina Sebastiana Macêdo Araújo


Médica, ESF- Careiro AM. E-mail: [email protected]

Kelly de Nazaré Oliveira


Nutricionista na secretaria municipal de saúde do município de Coari.
E-mail: [email protected]

Khylvia Nascimento da Costa


Enfermeira da ESF da Unidade Básica de Saúde Michiê Takeda. E-mail:
[email protected]

José Carlos Ferreira Pinheiro Junior


Enfermeiro, especialista em saúde pública e coletiva, diretor do hospital
regional de Coari. E-mail: [email protected]

Layla Calazans Muller


Médica da família e comunidade. Atua no Consultório na Rua
da Secretaria Municipal de Saúde de Manaus (SEMSA). E-mail:
[email protected]

Laene Conceição Gadelha


Sanitarista, Especialista em Equipes Municipais e Estaduais em Gestão
de Sistema e Serviços de Saúde. E-mail: [email protected]

508
Lecita Marreira de Lima Barros
Farmacêutica.Secretaria Municipal de Saúde de Tefé. E-mail:
[email protected]

Leda Lima Sobral


Enfermeira, mestre. SAMU Manaus

Leopoldo Pimentel Tavares Neto


Fisioterapeuta. Secretaria Municipal de Saúde de Barreirinha-AM.
E-mail: [email protected]

Liliam Rafaelle Souza da Silva


Fonoaudióloga, Especialista em saúde pública, Apoiadora Regional do
COSEMS-AM. E-mail: [email protected]

Lourena da Silva Camurça


Enfermeira da USF Francisca Amélia/Boca do Acre-AM. E-mail:
[email protected]

Luan Marinho de Souza


Coordenador do Programa Saúde na Escola (PSE)- E-mail: neianetto@
hotmail.com

Lucas da Silva de Almeida


Enfermeiro. Secretaria Municipal de Saúde de Barreirinha-AM. E-mail:
[email protected]

Lúcia Helena de Araújo Jorge


Técnica em enfermagem. Atua no Consultório na Rua da Secretaria
Municipal de Saúde de Manaus (SEMSA). E-mail: [email protected]

509
Lupuna Correa de Souza
Pesquisadora no Laboratório de História, Políticas Públicas e Saúde na
Amazônia (LAHPSA) - Fiocruz Amazônia. Pós-doutora em Cartografia
Social e Política da Amazônia. E-mail: [email protected]

Maria de Fátima Falcão da Silva


Assistente Social especializanda em Saúde Pública, com Ênfase na Estratégia
Saúde da Família – Universidade do Estado do Amazonas/UEA.

Maria do Perpétuo Socorro Carvalho Barreto


Nutricionista, especialista em saúde pública, coordenadora de
alimentação e nutrição e programa saúde a escola do município de
Coari. E-mail: [email protected]

Mariana Rodrigues da Silva


Enfermeira Gerente de Unidade Básica de Saúde Ednaide Lopes, E-mail:
[email protected]

Mariza Quércio Machado


Enfermeira.Mestranda Saúde Coletiva pelo Instituto Leônidas e Maria
Deane – Fiocruz Amazônia. Pesquisadora Laboratório de História e
Políticas Públicas de Saúde na Amazônia – LAHPSA/ ILMD/Fiocruz
Amazônia. E-mail: [email protected]

Marluce Mineiro Pereira


Assistente Social, aluna do Doutorado Acadêmico em Saúde Pública
na Amazônia- DASPAM-ILMD/Fiocruz Amazônia e integrante do
Laboratório de História e Políticas Públicas de Saúde na Amazônia –
LAHPSA/ ILMD/Fiocruz Amazônia. E-mail: [email protected]

510
Maria Dinez Fabá de Oliveira
Enfermeira. Atua no Consultório na Rua da Secretaria Municipal de
Saúde de Manaus (SEMSA). E-mail:[email protected]

Mayra Costa Rosa Farias de Lima


Enfermeira. Especialista em Gestão Hospitalar e Auditoria em Saúde.
Mestre em Saúde Pública. Pesquisadora do Laboratório de História,
Políticas Públicas e saúde na Amazônia do Instituto Leônidas e Maria
Deane. E-mail: [email protected]

Mayara Victória Feitosa Veras


Enfermeira. Pós-graduação em Terapia Intensiva (UNYLEYA); Pós-
graduação em Gestão da Qualidade e Acreditação Hospitalar e Segurança
do Paciente e Gestão dos Riscos Assistenciais (FACULESTE). Diretora
Geral do Hospital Geral de Barcelos. E-mail: [email protected]

Mesraim Salef Rocha do Rosário


Cirurgião-Dentista, graduado pelo centro universitário do Norte
- Uninorte. Especialista em saúde pública com foco em estratégia de
saúde da família. Coordenador de Saúde Bucal na Secretaria Municipal
de Saúde (SEMSA) de Manicoré. E-mail: [email protected]

Michel Fabrício Pereira de Souza


Graduado em Fonoaudiologia e Pedagogia pela Universidade Nilton
Lins, Especialista nas áreas da Fonoaudiologia Educacional, Saúde do
Trabalhador, Saúde Coletiva, Linguagem, ABA (Applied Behavior Analysis)
aplicada no TEA, Saúde Pública/PSF, Psicopedagogia e Educação Inclusiva,
Fonoaudiólogo e Coordenador do Centro Municipal de Referência ao
Autismo de Itacoatiara. E-mail: [email protected]

511
Milton Gama dos Santos
Enfermeiro (Pós-graduado em Unidade de Terapia Intensiva). E-mail:
[email protected]

Neliane Tavares de Souza


Enfermeira, Semsa- Santa Isabel do Rio Negro. E-mail: neliane.
[email protected]

Pablo Manuel Oliveira Almeida


Graduado em odontologia pela Universidade Nilton Lins. Atua como
dentista da saúde da família na área ribeirinha em Manicoré, AM.
E-mail [email protected]

Patrícia Guimarães Couto


Profissional de Educação Física especializanda em Saúde Pública, com
Ênfase na Estratégia Saúde da Família – Universidade do Estado do
Amazonas/UEA.

Patricky Batista da Silva


Psicólogo especializando em Saúde Pública, com Ênfase na Estratégia
Saúde da Família – Universidade do Estado do Amazonas/UEA.

Patrizia Gonçalves de Araújo Pires


Assistente Social na Secretaria Municipal de Saúde de Tefé – SEMSA.
E-mail: [email protected]

Péricles Tavares Vieira Filho


Administrador. Secretaria Municipal de Saúde de Barreirinha-AM.
E-mail: [email protected]

512
Priscila Santana
Psicóloga; doutorado em Psicologia Social pela PUC/SP. Mestra em
psicologia pela UFAM. E-mail: [email protected]

Raniele Alana Lima Alves


Graduação em enfermagem. Mestra em Saúde Pública pelo ILMD/
Fiocruz-Amazônia. Especialista em Saúde Pública com ênfase em Saúde
Indígena e Saúde da Família. Pesquisadora do LAHPSA - Fiocruz-
Amazônia. E-mail: [email protected]

Rayana Lima Martins


Psicóloga (Pós-graduação em ABA e Análise do Comportamento
Aplicado). Psicóloga Hapvida NotreDame Manaus- AM.. E-mail:
[email protected]

Raylan Nascimento da Silva


Técnico de enfermagem da Unidade Básica de Saúde Michiê Takeda.
E-mail: [email protected]

Sabrina Araújo de Melo


Graduação em Biomedicina. Mestre em Ciências da Saúde. Especialista
em Análises Clínicas e Microbiologia. Coordenadora de Vigilância em
Saúde. E-mail:[email protected]

Sâmia Roberta da Silva Torres


Bacharel em Nutrição – Programa Bolsa Família -SEMSA – Manaus.

Samara de Oliveira Guimarães


Enfermeira. Secretaria Municipal de Saúde de Nhamundá-AM. E-mail:
[email protected]

513
Sandra Caroline Pereira Machado
Enfermeira na Secretaria Municipal de Saúde de Tefé – SEMSA. E-mail:
[email protected]

Silvio Schimangogeski
Enfermeiro Supervisor da USF Francisca Amélia/Boca do Acre-AM.
E-mail: [email protected]

Sonaria Serrão Castro Ribeiro


Graduada em odontologia. Mestre em Saude da Familia (PROFSAÚDE).
Secretaria Municipal de Saúde de Parintins-AM. E-mail: sonna_castro@
yahoo.com.br

Tâmela Bruna Viana de Medeiros


Enfermeira e Coordenadora da APS na Secretária Municipal de Saúde
de Carauari/AM. E-mail: [email protected].

Thaís Lorena Mouzinho de Brito


Fisioterapeuta.Centro Especializado em Reabilitação – CER II. E-mail:
[email protected]

Thalita Renata Oliveira das Neves Guedes


Graduação em Serviço Social. Mestrado em Serviço Social e
Sustentabilidade na Amazônia. Doutorado em Saúde Pública na
Amazônia – ILMD/Fiocruz Amazônia. Assistente Social na Secretaria
Municipal de Saúde de Manaus. Pesquisadora do LAHPSA/ILMD -
Fiocruz Amazonia. E-mail: [email protected]

514
Thalita Souza Mendes
Nutricionista especializanda em Saúde Pública, com Ênfase na Estratégia
Saúde da Família – Universidade do Estado do Amazonas/UEA.

Thayana Oliveira Miranda


Enfermeira, Secretária de Saúde do Município de Eirunepé. E-mail:
[email protected]

Thiago dos Santos da Silva


Cirurgião Dentista. Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo de
Olivença, Amazonas, Brasil. E-mail: [email protected]

Thiago Silva dos Santos


Graduado em Psicologia pelo Centro Universitário Luterano do Brasil
- ULBRA/AM, Mestre em Desenvolvimento Humano pela Faculdade
de Psicologia da Universidade Federal do Amazonas e especialista
em Desenvolvimento Humano adulto e infantil pela Universidade de
Araraquara – São Paulo. Especializando em Deficiência Intelectual e
TEA – MBI of Miami. E-mail: [email protected]

Trindade de Jesus Vidal Furtado


Gerente de sistemas. Secretaria Municipal de Saúde de Nhamundá-AM.
E-mail: [email protected]

Valentina Victoria Tourinho Ramos


Cirurgiã Dentista. Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo de
Olivença, Amazonas, Brasil. E-mail: [email protected]

515
Vanessa Colares Magalhães Alves
Graduação em Fisioterapia, pela Universidade Federal do Amazonas
(UFAM). Especialista em Saúde Pública pela UNIP. Atualmente, atua na
Coordenação de Educação Permanente em Saúde (EPS) e Coordenação
de Planejamento em Manicoré. E-mail: [email protected]

Vanessa Pereira Oliveira


Fonoaudióloga. Pós-graduação em Transtorno do Espectro Autista -TEA
(FINAMA); Pós- graduanda em Analise do Comportamento Aplicada
-ABA (FAVENI). E-mail: [email protected]

Victória Villar Viana Queiroz


Enfermeira, Mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Condições
de Vida e Situações de Saúde na Amazônia - PPGVIDA - da Fundação
Oswaldo Cruz - Instituto Leônidas e Maria Deane (Fiocruz Amazônia).
E-mail: [email protected]

Viviane Lima Verçosa


Graduada em Psicologia, Mestrado em Saúde Pública na Amazônia
e pesquisadora e colaboradora do Laboratório de História, Políticas
Públicas e Saúde na Amazônia (LAHPSA), ILMD/ Fiocruz Amazônia.
E-mail: [email protected]

Wendel da Silva Barros


Enfermeiro, diretor de planejamento da secretaria municipal de saúde
do município de Coari. E-mail: [email protected]

516
Wendell Mattheus Amâncio da Silva
Fisioterapeuta especializanda em Saúde Pública, com Ênfase na Estratégia
Saúde da Família – Universidade do Estado do Amazonas/UEA.

Willian Lira Grana


Fisioterapeuta (Especialista em Gestão em Saúde e Pós-graduação em
Fisioterapia Gerontológica e Geriátrica) Coordenador da Equipe Emult
– Silves-AM. E-mail: [email protected]

Yanna Luane Souza Cavalcante


Fisioterapeuta, Unidade Básica de Atendimento Padre Antônio Cremer/
Secretaria de Saúde de Eirunepé. E-mail: [email protected]

Yasmim França de Colares


Enfermeira, ESF-Careiro AM. E-mail: [email protected]

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