Análise comparativa de duas teorias explicativas do
conhecimento
O problema da possibilidade do conhecimento: o desafio cético.
O problema da origem e possibilidade do
conhecimento: Qual a fonte do Conhecimento? Será
o conhecimento possível?
O ceticismo é a perspetiva segundo a qual devemos suspender o juízo
relativamente à verdade ou falsidade de qualquer proposição, pois em geral a
nossa pretensão de que sabemos seja o que for é infundada.
Os céticos argumentam com a regressão infinita (além dos erros dos
sentidos e da discrepância de opiniões): é sempre possível pedir uma
justificação para cada uma das nossas crenças.
Exemplo: as crianças na idade dos
porquês
Pais - “Come a sopa!”
Criança – “Porquê?”
Pais – “Porque isso é importante para ti.”
Criança – “Porquê?”
Pais – “Porque te torna mais saudável.”
Criança – “Porquê?”
e assim sucessivamente...........
O racionalismo
Os racionalistas defendem que as nossas crenças básicas provêm da
razão, podemos saber que são verdadeiras através do pensamento
apenas.
Diz-se, por isso, que são conhecidas a priori.
O empirismo
Os empiristas consideram que as nossas crenças acerca do mundo
provêm da experiência sensível, isto é, são crenças que só podemos
saber se são verdadeiras através dos nossos sentidos.
Diz-se, por isso, que são conhecidas a posteriori.
Conhecimento a priori e a posteriori:
Chamou-se “conhecimento a priori” ao conhecimento que pode ser
adquirido apenas pelo pensamento (análise dos conceitos)
independentemente da experiência.
Chamou-se “conhecimento a posteriori” ao conhecimento que não
pode ser adquirido apenas pelos pensamento, uma vez que é
alcançado através da experiência sensível.
Exemplo/Exercício de identificação
de proposições a priori ou a
posteriori
1. Três mais dois são cinco.
2. Uma camisola verde não é vermelha.
3. A relva é verde.
4. A relva tem cor.
5. Os ursos polares são brancos.
6. Uma mãe tem, pelo menos, um filho.
René Descartes (1596-1650): a
resposta racionalista
Descartes não estava disposto a aceitar a impossibilidade do
conhecimento.
Decide levar o ceticismo ao extremo e vencê-lo no seu próprio jogo, ou
seja, decide recorrer ao próprio ceticismo como método para provar a
impossibilidade do ceticismo.
A dúvida metódica
Descartes pensou que se duvidasse de tudo, talvez pudesse encontrar
algo de absolutamente indubitável, ou seja uma crença básica que
fosse de tal modo auto evidente que nem a mais extrema das dúvidas a
pusesse em causa.
Uma crença com estas características constituiria uma base sólida
sobre a qual poderia edificar com segurança o conhecimento.
O seu objetivo era estabelecer um conhecimento seguro e indubitável.
O seu método era a dúvida metódica, que consistia em duvidar de
tudo o que se possa imaginar e averiguar se algo resistia a este
processo.
Ao contrário da dúvida cética, que era permanente, a dúvida cartesiana
era provisória, pois, era apenas uma estratégia ou um método para
alcançar um conhecimento certo e indubitável.
Características da dúvida
cartesiana:
- metódica (um método para encontrar um conhecimento seguro);
- Provisória (suspensa quando se encontrasse algo absolutamente
certo e indubitável);
- hiperbólica/radical (não se limitava a pôr tudo em dúvida, mas
rejeitava como falso tudo o que fosse meramente duvidoso).
Apresentação da razão pela qual Descartes começou por rejeitar todas
as suas crenças:
‒ Descartes reconheceu ter aceitado como verdadeiras muitas
opiniões falsas que recebeu ao longo da sua educação (“Notei, há
alguns anos já, que tendo recebido desde a mais tenra idade tantas
coisas falsas por verdadeiras, tinha de deitar abaixo tudo e começar de
novo...”);
‒ dada a dificuldade de separar as crenças falsas das outras crenças,
Descartes considerou que a melhor maneira de se proteger do erro
seria rejeitar provisoriamente todas as suas crenças, como se todas
fossem falsas e incertas (“vou dedicar-me com seriedade e livremente,
em destruir em geral as minhas opiniões”).
Argumentos ou razões para duvidar
- as ilusões/ erros dos sentidos;
- a indistinção vigília – sono (os sonhos);
- os erros de raciocínio;
- a hipótese do génio maligno (deus enganador)/(dúvida
radical/excessiva/hiperbólica) – coloca em causa a matemática.
A nossa presente experiência poder ser um sonho ou
uma ilusão (ler texto págs. 25,26)
- “Por vezes enganamo-nos no tamanho e forma dos objetos, devido à
distância”;
- “Por vezes sonhamos e tudo nos parece real, mas quando acordamos
….” ;
- “ Como posso saber que estou sentado junto da lareira, a escrever, e
não a dormir e a sonhar que estou sentado junto à lareira a
escrever….?”;
- “Todos podemos cometer erros nos raciocínios mais simples...”;
- “Vou supor, não o Deus sumamente bom, fonte da verdade, mas um
certo génio maligno, ao mesmo tempo poderoso e astuto, que
pusesse toda a sua indústria em me enganar...”.
O cogito ( o pensamento)
Depois de levar a dúvida ao seu extremo Descartes apercebe-se, que
ainda que não possa saber se está, ou não, a ser enganado por um
génio maligno, existe algo que pode saber com toda a certeza:
“Penso, logo existo”.
O primeiro princípio e fundamento
do saber:
A existência como pensamento é indubitável e evidente.
O cogito vai ser o primeiro princípio e o fundamento do saber/
conhecimento.
O critério de verdade: a evidência
(clareza e distinção das ideias).
Só devemos considerar verdadeiro aquilo que (à semelhança do
cogito) concebemos de forma absolutamente clara e distinta.
O Dualismo:
“Mas a minha existência não se pode confundir com a existência do
meu corpo, do qual posso duvidar”.
Descartes introduz assim o argumento dualista: se é possível que o
meu corpo seja uma ilusão, mas é impossível que eu seja uma ilusão,
então eu não sou idêntico ao meu corpo.
O ser humano é uma dualidade de substâncias: “Res Cogitans/coisa
pensante” e “Res Extensa/coisa extensa, material”.
Descartes afirma que é essencialmente uma coisa pensante, uma
mente. O corpo é composto de matéria física, tem massa, peso e
ocupa espaço (extensão), é uma espécie de máquina.
As ideias em Descartes:
- As ideias inatas, são provenientes da razão, claras e distintas,
garantindo a certeza e a universalidade do conhecimento
(estão em nós desde a nascença).
exs. Cogito, Deus/perfeição, infinito, conceitos matemáticos.
- As ideias adventícias, provenientes dos sentidos, são ideias falíveis,
incertas e confusas, que não conduzem ao conhecimento;
- As ideias factícias, são provenientes da imaginação.
exs. Sereia, cavalo alado.
A ideia de Deus , ou ser perfeito.
A ideia de Deus é fundamental porque provar que Deus existe não é
enganador é a única forma de de podermos estar certos de muitas
outras coisas para além da nossa existência como pensamento.
Um criador supremo e sumamente bom não nos teria criado de modo a
que nunca pudéssemos conhecer a verdade.
O argumento da marca: Deus como
ser perfeito.
1. Tenho a ideia de “ser perfeito”.
2. Se eu tenho a ideia de “ser perfeito”, é porque existe um ser perfeito
que é a origem desta ideia.
3. Ou eu sou o ser perfeito, ou há outra coisa, que é o ser perfeito e que
deu origem à minha ideia de perfeição.
4. Eu duvido.
5. Se eu duvido, então não sou perfeito.
6. Não sou perfeito.
7. Existe uma coisa que é o ser perfeito e que deu origem à minha ideia de
perfeição. (DEUS)
O papel da existência de Deus:
1. Posso confiar naquilo que concebo de forma clara e distinta se, e só
se, Deus existe e não é enganador.
2. Deus existe e não é enganador.
3. Logo, posso confiar naquilo que concebo de forma clara e distinta.
Ou seja,
Deus assegura que podemos confiar nos nossos raciocínios.
A partir daqui, Descartes pode deduzir muitas verdades e construir com
segurança o edifício do conhecimento, apoiando-se naquilo que
concebe com clareza e distinção.
1. Se nós temos sensações de alegados objetos materiais e estes não
existem, então Deus é enganador.
2. Nós temos sensações de objetos materiais.
3. Deus não é enganador.
4. Logo, os objetos materiais existem.
Provada a existência de Deus e afastada a hipótese do génio maligno, já
podemos confiar nas nossas evidências. Deus é a garantia da verdade.
Então por que razão erramos?
- O erro é da nossa inteira responsabilidade.
- Deus criou-nos com livre-arbítrio, e isso acarreta a possibilidade de
fazer más escolhas, como optar por dar o nosso consentimento a coisas
que não concebemos clara e distintamente.
- Quando os sentidos nos enganam é porque nos precipitamos.
- Devemos usar a razão (recorrer à lógica, geometria e matemática)
para compreender a verdadeira natureza das coisas.
Regras do método cartesiano
1. Nunca aceitar como verdadeira, qualquer coisa, sem a conhecer
evidentemente como tal /evitar a precipitação.
(regra da evidência: clareza e distinção)
2. Dividir as dificuldades no maior número de parcelas.
(regra da análise)
3. Conduzir por ordem os pensamentos, do mais simples para o mais
complexo. (regra da síntese)
4. Fazer sempre enumerações completas e revisões gerais, para nada
omitir. (regra da enumeração)
Objeções:
Ao argumento da marca –
1. não podemos compreender a perfeição de Deus;
2. duvidar é mais perfeito que saber;
3. causas mais simples podem originar coisas mais complexas;
4. Podemos formar a ideia de perfeito por oposição à ideia de
imperfeito, sem que isso implique a existência de um ser perfeito.
Objeção do círculo cartesiano -
Descartes incorre numa petição de princípio, pois procura estabelecer a
existência de Deus raciocinando a partir de ideias claras e distintas, mas
admite que só podemos estar certos de que as nossas ideias claras e
distintas atuais e passadas são verdadeiras porque Deus existe.